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A Estética da Receção

A estética da receção surge em ’68 e na Alemanha. Já no momento que o Estruturalismo


estava a passar para pós-estruturalismo. A estética de receção surge através de uma
comunicação e da sua publicação; um professor da Escola de Constança na Alemanha; a
Escola de Costança vai inaugurar as teorias da leitura.
Vai haver nos EUA uma teoria que se vai centrar na circulação do texto.
Isan: vai estudar também o leitor: leitor interno ao texto e o leitor em concreto. Vai
estudar o ato de ler. As neurociências vão a partir de algumas escritas de Isan sobre os
mecanismos da leitura; vai concluir que o ato de leitura vai ser fundamental na
maturação intelectual, porque obriga o raciocínio e a imaginação. A leitura é um
processo extremamente complexo.
A literatura é a arte mais intelectual de todas, porque ela obriga determinados
procedimentos de natureza racional. Isan chama a atenção para isso.

No mesmo ano (’68) na escola de Constança na Alemanha – Robert Jauss produz a lição
inaugural na / da Universidade. Pode se resumir da seguinte forma: a história literária
como desafio à ciência literária ou história literária como provocação à ciência. Ele
conhecia muito bem as correntes teóricas importantes do século XX e uma excelente
formação filosófica, filológica e refletiu sobre as propostas dos formalistas (Formalismo
Russo, Praga, Newcriticos, isto é, Estruturalismo francês.
Temos um texto que vai propor uma mudança de paradigma.
Constata basicamente dois factos: grande parte das abordagens científicas sobre o
fenómeno literário (Formalismo, um pouco de newcriticism e Estruturalismo trabalham
um pouco a dimensão histórica; Praga não o faz, dentro do pensamento praguense
chamam atenção para uma abordagem histórica e sociológica.
Há preocupação com o texto, mas o lado da circulação é pouco estudado, porque o
conceito de obra implica sempre a construção de um objeto estético. Para Ingarden no
ponto de vista individual e para Mukarovski no ponto de vista coletivo / social.
Mukarovski chama a atenção para o facto de as normas literárias, a funcionalidade
literária e o valor de uma obra terem uma componente social e, por isso, estão ligadas à
circulação da obra, que ele vai chamar de receção, porque para ele, a obra só existe
quando é lida; a obra implica a leitura e diz que a teorização literária não se ocupa da
leitura, porque é uma leitura. Por outro lado, positivismo trabalhava numa área que nós
chamamos de história da literatura (fixava muito no autor). PORÉM, Jauss chama a
atenção para o facto de que a história da literatura vivia da dicotomia vida e obra, como
se houvesse de determinismo e abordagem do fenómeno literário numa perspetiva
histórica muito restritiva; havia uma visão muito redutora na abordagem do fenómeno e,
portanto, isto é uma lacuna. As atitudes tradicionais não reconhecem autonomia da
literatura.
Mukarovski ao falar de forma e função do valor como factos sociais está-se a referir à
receção da obra, o modo como a obra é percecionada socialmente e essa perceção da
obra vai ter implicações na própria produção.
Vodicka, Praga, vai continuar na mesma linha de ótima, para além de Mukarovski, é um
dos elementos do Estruturalismo dinâmico. Para eles estrutura é dinâmica, autorregula-
se e Mukarovski vai chamar atenção para uma abordagem que abarga uma dimensão
sociológica, porque a obra só existe na consciência coletiva / objeto crítico só existe na
consciência coletiva; portanto, fatores sociais e necessariamente históricos têm
influência não só na circulação da obra, como na produção. Vodicka continua esta linha
de pensamento e vai mais longe (finais dos anos 30) dizendo que há uma necessidade de
restaurar a história literária. Faz uma crítica muito conducente aos marxistas, porque a
visão histórica deles sendo dialética ele aceita, mas não pode aceitar o modo como o

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pensamento marxista define o social, porque o social para os marxistas é sempre o


reflexo da economia dessa sociedade.

Robert Jauss (vai seguir Mukarovski e Vodicka) propor uma estética da receção (uma
teoria da receção); com eles inauguram as poéticas da leitura. A obra só existe através
da leitura e a leitura é dinâmica. E relação que a obra mantém com a história não é uma
relação de determinismo que a história da literatura proponha. Vai mostrar que a leitura
é um processo ativo e que a obra só existe através da leitura e manifesta-se
historicamente, isto é, a obra vive no tempo histórico e socialmente, mas ele perdura no
tempo.
A estética da receção terá que ser a reconstituição do sistema de uma época: o que é a
literatura para uma época? Depois é necessário trabalhar com rigor o conceito de
géneros, repensar muito bem as definições do género e vai chamar atenção para o facto
de existirem gerações (em que continuam os paradigmas existentes) onde não há
evolução e noutras a evolução face aos paradigmas existentes é muito forte e noutras há
recusa do paradigma e a proposta é tentar perceber estes acontecimentos. Também
refere que há obras que integram no horizonte de expetativas, quando falamos em
literatura a nossa mente vai para uma definição, mas ele nunca vai trabalhar em termos
individuais, mas coletivos.
Chama a atenção para a primeira receção de uma obra que é um elemento determinante
na funcionalidade dessa obra. Robert Jauss vai ser um dos grandes nomes que vai estar
ligado ao restaurar da hermenêutica – eucaristia e hermenêutica vão ser duas grandes
disciplinas que vão codificar a prática da leitura; são disciplinas nucleares. A teoria da
interpretação (nos ensina interpretar um teto procurando o seu sentido objetivo, mas é
muito importante a subjetividade). A leitura é receção, e receção é ativa, porque vai
haver uma interpretação, que é uma atualização na medida em que cada um de nós dá
uma nova vida ao texto e fazê-lo nós, estamos a materizá-lo, expandi-lo. As leituras da
ora revertem para o interior.

Wolfgang Iser foi professor na escola de Constança e vai trabalhar a partir dos
pressupostos mencionados na aula anterior, estética da receção. Vai ser influenciado por
Ingarden e vai propor num primeiro momento uma abordagem da leitura e do próprio
leitor num ponto de vista fenomenológico. O que é afinal a leitura?
“A Estrutura Apelativa dos textos”: conferência proferida por Iser, que vai pensar na
obra como uma entidade / objeto de uma concretização / de uma materialização.
Seguindo Ingarden a receção tem uma importância fundamental, porque a receção vai
implicar o efeito da obra, no social ou no próprio leitor.
O texto tem uma função apelativa.
Uma das características da função poética é assentar numa função apelativa.
Iser vai chamar atenção ao facto de aquilo que chamamos de obra na sua totalidade
implicar a coexistência de dois polos: um polo artístico (que está materializada no texto
que é resultante de um autor e tem uma componente objetiva) e polo estético (implica o
leitor) – sem estes dois polos não há obra (já tínhamos visto em Ingarden).
A obra é uma entidade complexa, tem uma componente objetiva (real), tem outra
componente que é constitutiva da obra tanto quanto a outra e implica o leitor.
-. MAS, a leitura é sempre histórica e os textos literários são objetos polissémicos, no
entanto, são também textos performativos (ficcionais).

Umberto Eco quando fala da obra aberta e quando cria a teoria cooperação
interpretativa, ele diz na obra “sair passeios Bosque de ficção” – “a obra é uma máquina

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preguiçosa que necessita de colaboração do leitor para trabalhar” – a obra implica um


trajeto, há um projeto (uma espécie de programação), contudo, proposto, materializado
pelo autor, mas a obra não se resume apenas à componente material. E nessa
componente material ou estrutural, cria uma série de mecanismos que controlam o
trajeto leitor e, portanto, controlam a leitura (mas não na sua totalidade).
Iser vai chamar a atenção para este conjunto de mecanismos (que controlam a leitura)
que constituem uma estrutura.
O leitor implícito é uma instância intratextual.
Definição de Umberto Eco: “a obra manifesta uma tendência para abertura. Há obras
mais abstratas do que outras.”
Ingarden refere zonas de indeterminação (Iser vai aplicar o termo): pessoas diferentes,
visões diferentes, por exemplo, poema sobre Ofélia.
Iser vai chamar atenção para o facto de que a leitura é um fenómeno extramente
complexo e dinâmico, é um fenómeno que implica o envolvimento de quase todas as
nossas funções cerebrais. A leitura tem uma componente intelectual enorme do ponto de
vista racional, mas não só, também do ponto de vista imaginativo, sensitivo.
A literatura tem uma dimensão antropológica, porque ela não se situa ao nível factual,
mas ao nível universal. (remete para Aristóteles)
Temos o leitor implícito vs. leitor explícito:
Leitor implícito: uma instância intratextual e é essa instância que controla o percurso, o
trajeto do livro, a leitura.
Leitor explícito: leitor empírico, concreto, que tem uma história.
Iser vai trabalhar muito a questão do leitor implícito.

Poema “Arte Poética” de Jorge Luís Borges


Olhar: físico, o contrário de ver
Olhar o rio que é de tempo e água
Primeiro verso – Heraclito: para falar do tempo cria uma
E recordar que o tempo é outro rio, metáfora “tudo muda”
Saber que nos perdemos como o rio Saber: ter consciência de
E que os rostos passam como a água. Último verso: implica uma consciência do tempo, que é a
consciência da morte
Sentir que a vigília é outro sono
Que sonha não sonhar e que a morte
Que teme a nossa carne é essa morte Primeiro verso: era o que Platão dizia
De cada noite, que se chama sono.

Ver no dia ou até no ano um símbolo


Quer dos dias do homem quer dos anos, Definição de arte; permitir transformar aquilo que é
Converter a perseguição dos anos negativo em positivo.
Numa música, um rumor e um símbolo,

Ver só na morte o sono, no ocaso Os dois primeiros versos são de Aristóteles – ouro velho
Um triste ouro, assim é a poesia Temos a definição de poesia; é esse tipo de instância que nos
Que é imortal e pobre. A poesia permite, de certa maneira, minimizar as perdas ou transformar
Volta como a aurora e o ocaso. aquilo que é negativo em positivo.

O que é o pôr do sol? A luz do pôr do sol assemelha-se ao


Às vezes certas tardes uma cara ouro velho.
Olha-nos do mais fundo dum espelho;
A arte deve ser como esse espelho
Que nos revela a nossa própria cara. Não somos nós que olhamos ao espelho, mas é uma face
que nos olha (é nossa). “A arte como um espelho da vida”
Shakespeare
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Contam que Ulisses, farto de prodígios


Chorou de amor ao divisar a Ítaca
Verde e humilde. A arte é essa Ítaca
De verde eternidade e não prodígios.

Também é como o rio interminável


Quem passa e fica e é cristal dum mesmo
Heraclito inconstante, que é o mesmo
E é outro, como o rio interminável.

Justamente o leitor (instância interna do texto) implícito no ato de leitura, mas também é
fundamental no ato de leitura, porque ele controla e torna-o possível. O leitor implícito
não é só quem controla a leitura, como é também a instância que permite a leitura. Há
instâncias intratextuais que são constitutivas e vão permitir controlar, direcionar a
leitura.
Temos várias sequências que nos permite definir o que é a arte, a poesia.
O texto refere a relatividade.
A arte poética é um texto teórico sobre poesia. É um texto / objeto e ao mesmo tempo
Metatexto. É um texto que refere a arte, a poesia, mas também o ser humano. Este texto
começa a citar textos filosóficos, nomeadamente Heraclito.
O leitor implícito deste texto tem de ser ou ter conhecimento da cultura ocidental.
Temos primeiro olhar, depois sentir, depois ver.

“O Ato de Leitura” de Iser (’72) – avanço antropológico. O leitor implícito existe


marcado no texto, mas é uma instância intratextual e constitutiva do ato de leitura. O
leitor implícito não está só no artefacto, mas também no objeto estético. O leitor
implícito para Umberto Eco tem instâncias internas: leitor modelo (desenvolvido em
“Lector in fabula”) vai construir uma ideia do autor.

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