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Resumo
Atualmente, muito se tem debatido acerca do impacto das práticas e valores corporativos no
seu ambiente interno, principalmente no que se refere à relação da empresa com seus
funcionários. O presente artigo discute o processo de auditoria interna baseado na norma SA
8000: 2001, cuja finalidade é a de promover a melhoria das condições de trabalho. Por se
tratar de um tema ainda em desenvolvimento, esta certificação é cercada de muitas dúvidas
no que diz respeito ao enquadramento de seus termos. O estudo foi baseado em revisão
bibliográfica concernente à discussão e na experiência profissional dos autores no
tratamento prático da problemática. Dessa forma, o presente trabalho almeja contribuir
como um referencial prescritivo para desenvolvimento de auditorias internas sob o foco da
norma SA 8000, capaz ainda de prover, minimamente, orientação às demais partes
interessadas (auditores, empregadores ou empregados) em questões técnicas relacionadas à
referida norma.
Palavras-chave: SA 8000: 2001; saúde e segurança ocupacional; práticas de auditoria.
1. Introdução
De acordo com o relatório da Organização Internacional do Trabalho – OIT (2006), intitulado
“a eliminação do trabalho infantil: um objetivo ao nosso alcance”, cerca de 200 milhões de
crianças, de 05 a 14 anos, e 140 milhões de jovens, com idades entre 15 e 17 anos, exercem
no mundo atividades econômicas. Deste número, destaca-se com pesar que, a grande maioria,
nas duas faixas etárias, está submetida às consideradas piores formas de trabalho infantil, o
que inclui a escravidão, a prostituição e as atividades ilícitas como o tráfico de drogas.
Ao longo de anos, já foram noticiados milhares de casos de repreensão severa e até mesmo
assassinato de ativistas e sindicalistas em todo o mundo, principalmente em nações
submetidas a regimes ditatoriais. O direito à liberdade de associação e negociação é uma
reivindicação trabalhista anterior à Declaração Universal dos Direitos Humanos, da
Organização das Nações Unidas (1948), e às convenções da OIT – que adotou este princípio a
partir da Declaração da Filadélfia, em 1944.
A igualdade no local de trabalho sempre foi assunto polêmico nas empresas, envolvendo
diversos casos de segregação e discriminação por raça, preferências pessoais, idade, credo e,
principalmente, sexo, sem falar dos abusos de poder por níveis hierárquicos e os assédios
morais e sexuais.
A crescente preocupação com as penalidades previstas em lei, a maior rigidez na fiscalização
das condições de trabalho, principalmente por parte dos sindicatos, e os altos custos com
acidentes, vêm direcionando a atenção das empresas e dos próprios governos, a partir dos
gastos com previdência e saúde, para as questões de SSO – Segurança e Saúde Ocupacional.
Investimentos em Equipamentos de Proteção Individual – EPI, treinamento dos funcionários e
melhoria dos ambientes de trabalho têm sido as respostas diretas a esta questão.
2. Revisão da literatura
2.1. SA 8000: considerações históricas
Desde a década de 90, empresas norte-americanas e européias já ensaiavam alguns passos
sobre normas de conduta no local de trabalho. A dificuldade de acompanhar o cumprimento
dos códigos estabelecidos, principalmente devido à parcialidade e desqualificação dos
avaliadores, levou o Council on Economic Priorities Acreditation Angency – CEPAA – a criar
uma norma que pudesse avaliar as condições laborais de maneira independente.
O CEPAA, hoje conhecida como SAI – Social Accountability International – é uma
organização da sociedade civil de direitos humanos, que visa melhorar as condições de
trabalho por meio do desenvolvimento sustentável e de normas socialmente responsáveis,
através de convênios com as partes interessadas e da divulgação e implantação global da
norma SA 8000 (SAI, 2005).
Partindo de normas da OIT e de Convenções, Postulados e orientações da Organização das
Nações Unidas (ONU), como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a CEPAA
estruturou a SA 8000 tendo como base o já bem aceito modelo da ISO 9001, considerando
requisitos como ação corretiva e preventiva, melhoria contínua e auditorias internas e
externas. Porém, novos pontos foram incluídos nesta norma:
− A eleição de um representante por parte dos empregados para acompanhar a implantação e
manutenção do sistema de gestão social, o que ajuda a dar maior credibilidade ao processo;
− O contato permanente dos auditores com organizações não-governamentais, empregados e
sindicatos, a fim de manter um aprendizado contínuo e constante;
− Um canal de denúncia (denominado “preocupações”) para que trabalhadores e outras
partes envolvidas possam evidenciar anomalias nas organizações.
gerenciais:
− Responsabilidade social interna, que contempla: trabalhadores, acionistas e gerentes;
− Responsabilidade social externa, composta por: clientes, fornecedores, governo,
comunidades locais, e público em geral.
Adicionalmente, Alledi (2002) sinaliza que Responsabilidade Social se dá como ação pró-
ativa das empresas no que concerne à superação do cumprimento legal.
Para o Instituto Ethos (1998), a responsabilidade social empresarial é uma forma de conduzir
os negócios que torna a empresa parceira e co-responsável pelo desenvolvimento social. A
empresa socialmente responsável é aquela que possui a capacidade de ouvir os interesses das
diferentes partes (acionistas, funcionários, prestadores de serviço, fornecedores,
consumidores, comunidade, governo e meio ambiente) e conseguir incorporá-los ao
planejamento de suas atividades, buscando atender às demandas de todos, não apenas dos
acionistas ou proprietários.
Assim, Araujo (2005) identifica as práticas de responsabilidade social como necessárias à
sustentabilidade organizacional.
Fora da questão relacionada à norma SA 8000, o termo responsabilidade social tem um
escopo mais abrangente, ou seja, é uma responsabilidade que a empresa assume perante a
sociedade gerando ações de forma a beneficiar a mesma, não se restringindo somente ao
âmbito da empresa.
Cabe ressaltar que a implantação de uma norma não é garantia de total compromisso da
empresa no seu pleno atendimento e do envolvimento de toda a força de trabalho. Entretanto,
numa perspectiva prática, a empresa pode ser encarada de forma mais positiva,
principalmente se o sistema de gestão implantado estiver certificado.
2.3. Normatização e auditoria
Normatização consiste na elaboração, revisão e atualização das instruções, manuais, rotinas e
regulamentos nos quais são definidos os procedimentos e indicadores a serem aplicados na
empresa (Portal da Qualidade Total, 2006).
A ISO 9000 é uma das séries de normas publicadas pela organização internacional para
normatização. Em inglês a denominação da organização é International Organization for
Standardization. O termo “ISO” não é um anagrama e sim uma abreviatura derivada do termo
grego isos, cujo significado denota unicidade, como em isométrico.
As publicações ISO são feitas em inglês e francês e essa é mais uma razão porque não foi
apropriada uma abreviatura derivada de uma língua. A organização foi fundada em 1947 para
desenvolver um conjunto de normas para manufatura, comércio e comunicação na Europa.
Tem sede em Genebra, Suíça, e possui mais de 130 países membros. Cada país tem um
representante junto à ISO. A ABNT é o representante do Brasil (Biblioteca dos Sistemas da
Qualidade, Segurança de Alimentos e Gestão Ambiental, 2006).
Com base no sucesso da norma ISO 9001 desenvolvida para a qualidade de produtos e
serviços, a norma SA 8000 foi criada à luz do modelo, igualmente no caso de outras normas,
como a ambiental ISO 14001 e a norma voltada para saúde e segurança – OHSAS 18001.
A auditoria é uma das ferramentas mais poderosas para avaliar o grau de conformidade de um
sistema de gestão implantado em uma empresa com um critério estabelecido, seja este um
requisito legal, norma ou procedimento interno. Através do processo de auditoria se é possível
4. Conclusão
Uma auditoria baseada na norma SA 8000 é um processo atípico se comparado às auditorias
ditas convencionais, baseadas nas séries ISO 9001 e ISO 14001, por exemplo. A
particularidade da confidencialidade das entrevistas e a forma como devem ser conduzidas, os
locais de sua realização, os contatos com ONGs e sindicatos, tornam a auditoria da SA 8000
bastante peculiar, devendo-se ter cuidados e regras de abordagem específicos de modo a
garantir o efeito desejado nas entrevistas.
5. Considerações finais
Um sistema baseado na norma SA 8000 pode contribuir para o processo de melhoria contínua
do ambiente organizacional na medida em que propicia: a redução de riscos de acidentes; um
canal sigiloso para reclamações e sugestões; melhores condições no ambiente de trabalho;
maior qualificação dos funcionários através de treinamentos nas áreas de saúde e segurança; e
salários mais dignos e adequados às necessidades básicas dos funcionários.
Porém, a implantação de um sistema de gestão não pode ser justificada apenas dentro destes
termos. A perspectiva a ser demonstrada deve abranger, igualmente, os benefícios para a
organização, advindos não só do cumprimento aos requisitos legais como também da redução
nos índices de acidente e rotatividade de funcionários; da manutenção de bons profissionais;
da melhoria nas relações com governos, ONGs e sindicatos; da consolidação da imagem e da
performance em índices de investimento, como o Dow Jones Sustainability Index – DJSI.
A verdade é que, para a maioria das empresas, especialmente seus acionistas, o lucro, foco
primordial, ainda é visto como fruto direto, e quase que exclusivo, da relação produtividade
versus redução de custos, o que deixa em segundo plano a demanda subjetiva por qualidade
de vida, relacionada principalmente com as condições de trabalho dos funcionários.
Dentro desta circunstância, a norma SA 8000 é ainda um desafio a ser enfrentado na cultura
das organizações, disseminada a consciência de que o contingente humano, a ética e a
reputação podem ser alguns dos maiores patrimônios das empresas no mercado atual e futuro.
Referências
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Sistemas de Gestão). Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2002.
ARAUJO, Fernando Oliveira de. Sistema de Gestão da Responsabilidade Social Corporativa: Proposta para
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COSTA, Tânia Maria Zambelli de Almeida. Organização e Responsabilidade Social. Texto complementar do
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