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1.1.

Cultura e Socialização
A socialização pode ser definida como “o processo por meio do qual o indivíduo
aprende a ser membro da sociedade” (BERGER, 1977, p. 204) ou ainda como a
“interiorização de padrões de comportamento” (DAHENDORF, 1974, p. 73). Aprendemos a
ser membros de uma sociedade específica, particular e interiorizamos padrões de
comportamentos de acordo com a cultura que fazemos parte. Podemos definir cultura
como fez o antropólogo britânico Edward Tylor (1832-1917): um “todo complexo que
inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade
ou hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade” (Apud LARAIA, 1994, p.
25), ou ainda, como fez a antropóloga americana Ruth Benedict (1887-1948), para quem
os padrões culturais condicionam nossa visão de mundo: “a cultura é como uma lente
através da qual o homem vê o mundo” (Apud, LARAIA, P. 69). Observe a amplitude do
conceito de Tylor, abrangendo o que comumente designamos por toda a realização da
humanidade, isto é, da “civilização”. O conceito de Benedict nos possibilita perceber que
enxergamos o mundo de acordo com a lente da cultura que fazemos parte, nossa visão de
mundo é influenciada pelos padrões culturais, isto é, nossa ação é orientada pelos
modelos, pelos valores de nossa cultura. Dessa forma a floresta amazônica, por exemplo,
para um índio Tupi, significará a morada dos espíritos, terá um sentido mágico, os
vegetais, as árvores, os animais terão uma referência especial, o índio conhecerá os
hábitos dos animais e aqueles que representam grave transgressão cultural matá-los,
dispõe de conhecimentos sobre as plantas medicinais, ou seja, sua cultura está
profundamente integrada ao meio natural, sua tecnologia está adaptada às suas
necessidades sociais. A mesma floresta para um leigo que não dispõe de conhecimento
de botânica, significará um amontoado indiferente de árvores. Portanto, “o modo de ver
o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos
sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança cultural, ou
seja, o resultado da operação de uma determinada cultura” (LARAIA, 1994, p. 70). No
processo recente de desenvolvimento da antropologia, procurando uma definição mais
sintética e de forma crítica em relação ao saber antropológico de então, Clifford Geertz
(1926-2006), antropólogo norte-americano que escreveu, dentre outros livros A
interpretação das culturas (1973) entende a cultura como um conjunto de mecanismos
de controle, planos, receitas, regras, instruções (que os técnicos em computadores
chamam programas) para governar o comportamento. Geertz, sofisticando um pouco
mais, compreenderá a cultura, como um sistema de significados, um sistema simbólico
que orienta o comportamento humano. (GEERTZ, 1989, p.57). Seu ponto de vista é o da
antropologia interpretativa das culturas, dos discursos, dos significados.
Quando valoramos os padrões culturais dos outros como se o nosso fosse melhor
ou superior designamos pelo conceito de etnocentrismo. Peguemos como exemplo, o
contato dos europeus com os índios da América no século XV e XVI, ou dos mesmos
europeus, com os africanos durante o período histórico designado por Imperialismo no
final século XIX e durante toda primeira metade do século XX. Numa postura
etnocêntrica os europeus consideravam seus padrões culturais superiores aos dos nativos,
consideravam-se mais “civilizados” que os indígenas, por exemplo, por ter a tecnologia
da fundição de metais e as armas de fogo, uma religião evoluída, o cristianismo, enquanto
os nativos usavam utensílios de pedra ou madeira e guerreavam com lanças, arcos e
flechas, e uma religião primitiva de crenças mágicas, no caso da América portuguesa,
espanhola e inglesa no século XVI e XVII. Muitas atrocidades cometidas no Congo
Belga, possessão africana do Rei da Bélgica no século XX, oferece outro exemplo:
praticava-se mutilamentos, cortando dedos, orelhas e narizes dos africanos que não
trouxessem a quantidade estipulada do látex da seringueira, a borracha. A mensagem era
bem objetiva: não deixem de pagar os impostos, cumpram a lei, caso contrário serão
punidos. O discurso ideológico “civilizador”, passava a imagem que os europeus estariam
levando a ciência e a modernidade para os nativos no estágio da “barbárie”, pretendia
acobertar tais atrocidades.
Esse etnocentrismo pode ser considerado um eurocentrismo, ou seja, a crença de
que os europeus são superiores a outras culturas. Essa visão de mundo (etnocêntrica e
eurocêntrica), influenciou as produções intelectuais (a perspectiva evolucionista em
Antropologia)de antropólogos como Edward Tylor e a do antropólogo Lewis Morgan
(1818-1881), de origem norte-americana, que sustentavam a superioridade da cultura
europeia em relação aos povos considerados não-civilizados, pois viviam num estágio
inferior de produção cultural, por não possuírem tecnologias semelhantes ou produções
culturais superiores como as de Shakespeare ou a dos gregos da antiguidade. Como vimos
essa visão de mundo trouxe trágicas consequências para os povos indígenas e africanos:
em nome dessa “cultura superior” e dos interesses políticos e econômicos praticou-se
todo tipo de atrocidade e desrespeito à cultura do outro. A crítica ao etnocentrismo
começou a ser feita, dentre outros, pelo antropólogo alemão Franz Boas (1848-1942) e
pelo francês Claude Lévi-Straus (1908-2009) que esteve no Brasil e lecionou na
Universidade São Paulo entre 1935 a 1938. Não existem culturas inferiores ou superiores,
avançadas ou atrasadas, cada cultura encontra respostas singulares para os seus
problemas, de acordo com suas necessidades. Levi-Strauss observou que a cultura não
caminha em linha reta, do inferior para o superior, como pensavam os evolucionistas, mas
como o cavalo do xadrez, em L, com isso quis expressar que as culturas têm ritmos
evolutivos diferentes. Essa crítica fez surgir uma corrente antropológica chamada
relativismo cultural, essa corrente de pensamento sustenta que os traços culturais de uma
sociedade, seus padrões culturais, sua maneira de ver o mundo, precisam ser
compreendidas dentro de sua própria cultura, ou seja, não é possível, comparar e julgar o
outro, qualificando-o de inferior ou superior, de acordo com os valores de minha cultura
particular.
Essa perspectiva panorâmica e simplificada do conceito de cultura tem por
objetivo traçarmos brevemente os elementos culturais que compõem o conteúdo da
socialização. Na escola, as crianças, os adolescentes e jovens passam por processos de
socialização. A socialização primária se dá preponderantemente na família. A
socialização secundária envolve processos que ampliam as fronteiras da família,
abrangendo uma vida social mais ampla, incluindo a escola, os grupos aos quais os
adolescentes se inserem, o ambiente de trabalho na vida adulta etc. Mais interessante do
que uma definição exaustiva do conceito de cultura – para os propósitos da disciplina
Cultura Escolar, Família e Comunidade – é compreendermos o seu funcionamento
através de alguns elementos fundamentais. Quais são os elementos da cultura que
podemos considerar fundamentais nos processos de socialização? É o que veremos a
seguir.
1.2. Os elementos fundamentais da cultura
I. Linguagem: A linguagem é a matéria prima da cultura e, por consequência do
processo de socialização. Segundo a antropóloga Ruth Benedict a linguagem é
“todo sistema de sinais de tipo definido que sirva aos fins da comunicação
humana” (Apud, FERREIRA, 1993, p. 44). A linguagem nos possibilita apreender o
mundo cultural e social. Observe que toda revolução, para implantar uma nova
ordem social, instaura uma nova linguagem, no caso das revoluções do século
XVIII na Europa (Revolução Francesa e Revolução industrial Inglesa), por
exemplo, nosso vocabulário passou a incorporar ideias como as de governo
constitucional, cidadão, burguesia, operariado e a própria palavra revolução.
Observe que “no nosso idioma, a maioria dos substantivos femininos são
compostos pelo acréscimo de uma desinência ao substantivo masculino: gato/gata,
barão/baronesa, isso é um indicativo da posição central que o homem tem ocupado
na sociedade”. (Idem, p. 45). Geralmente quando o movimento das mulheres quer
realizar uma crítica social e política, procuram influenciar o uso de uma nova
linguagem (por exemplo, presidenta ao invés de presidente). A linguagem é um
elemento fundamental no processo de socialização, a criança ao assenhorear-se da
linguagem adquire a capacidade de pensamento abstrato e de reflexão “fenômeno
através do qual a atenção da criança retorna do mundo exterior para incidir sobre
ela própria” (BERGER, 1977, p. 206). Através da linguagem a criança adquire
autonomia. A criança é moldada, configurada pela sociedade, essa moldagem, no
entanto, não é uma via única “a socialização é um processo recíproco, visto que
afeta não apenas o indivíduo socializado, mas os socializantes” (Idem, 206). Desde
os primeiros passos de iniciação na vida a criança exerce um papel de sujeito ativo
e não de passividade a tudo que vem de fora: a reciprocidade da criança, isto é,
sua autonomia cresce em razão direta da capacidade de usar a linguagem. Quando
ela responde aos adultos, é malcriada como costumamos dizer, é a linguagem
sedimentando sua capacidade de ação independente no mundo e em relação aos
outros.

II. Ciência e tecnologia: A ciência é um tipo de conhecimento metódico que parte


de determinadas proposições que precisam ser verificadas racionalmente. A
aplicação dos conhecimentos científicos à vida concreta, à indústria, por exemplo,
chamamos de tecnologia. Na escola os alunos são socializados nessa linguagem
científica e tecnológica (matemática, física, química etc.). A ciência e a tecnologia
revelam a maneira que o homem moderno se relaciona com a natureza,
transformando-a para determinados fins. Todavia, como as culturas são diversas,
a tecnologia do um índio, por exemplo, que fabrica o arco e a flecha para suas
caçadas, se utiliza de um conhecimento que vem da experiência, e não da
aplicação de leis científicas no sentido moderno. Os conhecimentos acumulados
por uma cultura resultam em tecnologias apropriadas às suas necessidades. A
ciência transformou profundamente a nossa visão de mundo, nos dando um
sentimento de onipotência em relação ao mundo que não encontramos no homem
primitivo, mais condicionado às determinações da natureza e a uma concepção
mágica do mundo. “O desenvolvimento da ciência e da tecnologia marca
profundamente a feição da sociedade na qual elas existem. Como Marx afirmou,
uma sociedade cuja tecnologia mais avançada é o moinho de vento (sociedade
feudal) não pode se organizar da mesma maneira que uma baseada na produção
fabril”. Esse desenvolvimento material influencia nossa noção de tempo: A
sociedade feudal com seu moinho de vento funda-se na noção de tempo ampla
que segue as estações do ano, enquanto a sociedade moderna, com seu complexo
sistema de produção fabril, o minuto torna-se uma unidade básica de tempo. “Na
primeira o tempo passa na segunda o tempo é um elemento de cálculo de todas as
atividades sociais (econômicas, políticas, educacionais e até mesmo familiares).
Não restam dúvidas de que a visão de mundo de indivíduos que vivem sob noções
de tempo tão díspares será bem distinta. A relação do homem com a natureza nas
sociedades industriais é meramente instrumental, isto é, o homem se preocupa
apenas em encontrar o meio mais eficiente para atingir um determinado fim. O
cientista social Hebert Marcuse (1898-1979), acompanhando as ideias de Weber,
denunciou que a relação instrumental (meio/fim) típica da ação humana sobre a
natureza está dominando também as relações dos homens entre si e instaura uma
ditadura do planejamento. Marcuse critica o fato de, nas sociedades
contemporâneas qualquer oposição a essas determinações tende a ser considerada
irracional e interpretada como recusa em escolher o meio mais eficiente para
atingir determinado fim” (FEEREIRA, 1993, p. 45-47). O movimento ecológico, por
exemplo, ao denunciar a degradação da natureza e a necessidade de preservar a
diversidade natural e cultural, pode ser taxado de irracional. Sabemos que onde a
cultura indígena é preservada a natureza também é, mas muitos consideram
irracional e antieconômica a quantidade de terras nas mãos dos índios. Perceba
que sempre quando falamos em ciência e tecnologia e relacionamos ao
pensamento de Karl Marx nos vem a questão: a ciência na sociedade capitalista
está a serviço da emancipação humana? E quando relacionamos o mesmo tema ao
pensamento de Max Weber a questão é: o processo de racionalização científica e
tecnológica aumentou nossa capacidade de intervir conscientemente no mundo ou
só faz aumentar um tipo de dominação anônima e instrumental que desencanta e
desumaniza as relações humanas?

III. Valores: Não existe cultura que não possua um conjunto de valores que
orientam a conduta das pessoas diante da vida. Vimos a importância que Max
Weber confere às ações orientadas por valores. Os valores são diversos de
acordo com a cultura. Nas sociedades capitalistas, por exemplo, o crescente
individualismo é uma prova de que se valoriza a iniciativa particular e o
sucesso individual, enquanto numa sociedade socialista, real ou hipotética,
valoriza-se justamente o contrário, a cooperação e os fins coletivos. No valor
econômico de uma mercadoria, por exemplo, pode estar embutido um valor
estético ou ético: um indivíduo pode dar um valor para um carro que vai além
de sua função como meio de transporte. O antropólogo Ralph Linton em seu
livro O homem: uma introdução à antropologia observa que o modo de
compreender a velhice, por exemplo, muda de cultura para cultura, em algumas
sociedades os velhos fazem parte de um conselho especial e é procurado como
uma reserva cultural da memória, mas o valor da velhice não é mesmo em todas
as culturas: “Dizem que em Fidji [Oceania], era dever do filho observar seu pai
e matá-lo quando apresentasse sinais de aproximação de senilidade ou extrema
decrepitude. Desde que a condição da alma no outro mundo correspondia à
condição do indivíduo na época de sua morte, seria cruel proceder de outra
maneira. Em todo caso a família tem obrigação de dar funerais descentes a seus
membros idosos e de cuidar do bem-estar no outro mundo” (LINTON, 1981, p.157-
158). Esse costume narrado por Linton choca-se com a maneira como
compreendemos a velhice em nossa sociedade. Todavia, perceba que se temos
o dever de amar os velhos e lhes dar amparo em nossa sociedade, naquela o
amor era expresso dessa maneira muito singular. Os valores éticos ou morais
orientam nossa ação em relação ao que é o bem, o mal, o dever e como devemos
proceder em determinada situação. Os valores estéticos, igualmente nos
orientam em relação ao que vem a ser o belo. Cada cultura ou grupo particular
possui seus critérios estéticos. Embora hoje uma tela do pintor holandês Van
Gogh custe milhões, na época seus quadros eram comprados só para aproveitar
a moldura e por isso morreu na pobreza. Realizamos julgamentos éticos e
estéticos o tempo todo. A pobreza, por sua vez, não significa somente ausência
de condições materiais, pode representar uma virtude e um valor a ser
estimulado na sociedade como era durante a idade média a exemplo de São
Francisco de Assis. A riqueza, por outro lado, pode ser um valor igualmente
estimulado, mesmo por aqueles que não são ricos, o “dinheiro não traz a
felicidade, manda buscar” diz o ditado popular, uma vida feliz seria aquela que
desfruta de forma hedonista e imediata do prestígio e dos prazeres que a riqueza
pode proporcionar.

IV. Normas: As normas estão intimamente ligadas aos valores e aos padrões de
comportamento vigentes em uma sociedade. As normas podem ser explícitas
(são formuladas pela linguagem e constam em códigos legais) ou implícitas
(não formuladas explicitamente pela linguagem ou em leis, mas que são
transmitidas de geração em geração). As normas consagradas pelo costume e
que se tornam padrões orientadores da conduta podem ter uma força até maior
que aquelas escritas. As leis de trânsito, por exemplo, são constantemente
transgredidas, já a norma social que diz que devamos amar e honrar o pai e a
mãe, quando desrespeitada traz ao transgressor uma culpa que muitas vezes lhe
atormenta a alma. A sociedade elabora códigos legais para orientar as várias
dimensões da vida social (Código de Trânsito, Código Civil, Código Penal
etc.), essas leis objetivas, no entanto, são, em grande parte, determinadas, como
diria Durkheim, pela consciência coletiva, e a sociedade possui um aparelho
burocrático, jurídico e policial para fazer respeitar as regras sociais. As normas
precisam ser experimentadas como legítimas pelos sujeitos, pois é isso que faz
com que sejam obedecidas. As normas que orientam os padrões de conduta
dos indivíduos regulam suas ações em relação a algo externo a nós, por
exemplo: não devemos maltratar os animais, não devemos poluir a atmosfera
ou as águas dos rios, ou em relação ao outro, devemos respeitar para ser
respeitados, mas também pode regular a relação do indivíduo consigo próprio,
uma sociedade que estimulasse o suicídio estaria atentando contra a sua própria
existência. As normas sempre existiram em todos os tempos históricos e em
todas as culturas, todavia, em alguns momentos históricos os homens acharam
por bem estipulá-las em códigos legais em um estatuto especial, veja o exemplo
bíblico: “Moisés sobe ao Monte Sinai e lá recebe, das mãos de Deus, os Dez
Mandamentos. Quando lemos os Dez Mandamentos, notamos que apenas três
falam explicitamente sobre Deus; os sete restantes são de natureza social, isto
é, regula a vida do homem em sociedade (honrar o pai e a mãe, não matar, não
roubar, não cobiçar a mulher do próximo etc.). Isso não significa que antes de
Moisés receber os Dez mandamentos o povo hebreu pudesse matar ou se
apropriar dos bens de outrem sem problemas. Evidentemente tais normas já
existiam; a diferença é que elas estavam sob a forma de costumes (mores)
aceitos”. (FERREIRA, 1993, p. 48). Tornar explícito a norma “não matarás” reflete
a preocupação, em determinado momento histórico, em consagrar a vida
humana como um valor a ser defendido em qualquer circunstância. Da mesma
forma “não roubar” acaba por consagrar o direito à propriedade privada. Nem
todos os padrões de comportamento, no entanto, resultam da interiorização de
normas. Quando Émile Durkheim nos fala de comportamento anômico (do
grego: a + nomos = sem normas), ele está nos dizendo que em determinados
contextos e situações sociais, o comportamento não refletem normas, podendo
o comportamento anômico se tornar um padrão regular de comportamento,
como no caso da corrupção, quando está arraigada na cultura política, ou
quando as normas ao invés de proporcionar conformidade necessária à coesão
do corpo social tendem a formas anômicas de comportamento, por exemplo,
de rebeldia, de contestação e não aceitação das normas sociais, possibilitando,
no entanto, a criatividade e o revigoramento da organização social propondo
novas normas, como bem apontou o sociólogo Robert Merton. (VILA NOVA,
2012, p. 118, 122, 123).

V. Crenças: As crenças consistem no conjunto de ideias presentes em uma sociedade


e que orientam o comportamento dos indivíduos. Não importa para as ciências
sociais se elas são ou não expressão da “verdade”, o que importa é que as pessoas
acreditam e orientam seu comportamento por elas. As crenças podem estar ligadas
à religião, mas não necessariamente. Determinadas crenças religiosas fazem parte
das representações coletivas e as pessoas orientam sua visão de mundo por elas:
muitas pessoas acreditam que tudo o que acontece no mundo tem uma explicação
religiosa, as doenças, a pobreza, as guerras, seria uma forma de Deus punir os
homens pelos seus pecados, a crença na vida após a morte e que a morte não é um
fim, também está no campo religioso. Muitas mães levam seus filhos em
benzedeiras e acreditam que suas práticas curam. As crenças incluem valores: A
crença de que a democracia é a única forma de coexistência humana pacífica, ou,
ao contrário, de que nada adianta fazer porque a política é o campo da
desonestidade e da corrupção. As crenças fazem parte do dia-a-dia das pessoas:
num mesmo cenário social encontraremos aqueles que acreditam que a Aids é um
castigo de Deus e outros que, por ter informações médicas e de saúde pública
dificilmente têm essa crença, mas podem acreditar que a doença representa uma
degeneração moral da sociedade. No campo da sociologia marxista, as crenças,
ou seja, o conjunto de ideias dominantes é designado por ideologia.

VI. Símbolos: O antropólogo Leslie White (1900-1975) observa que a singularidade


do homem quando o comparamos com outros animais é que os humanos têm a
capacidade de simbolizar e usam esses símbolos para se comunicar. Os símbolos
estão entre os componentes mais importantes da cultura e da organização social.
Os símbolos estão diretamente ligados à linguagem, é uma forma de linguagem,
a própria palavra é simbólica. Quando digo “amor” ou “perdão”, estas palavras
estão carregadas de significado simbólico. Max Weber já havia observado a
importância das ações orientadas por significados. Gestos, cores, vestuário,
objetos sagrados, são exemplos de recursos simbólicos: Os sentimentos de dor e
de tristeza pela perda de um ente querido no ocidente são simbolizados pela cor
preta, já entre os orientais é o branco. A cruz é o símbolo da religião cristã, evoca
todo um conjunto de valores e ideias (o calvário, o sacrifício, a ressurreição)
reveladas aos fiéis, tendo sido os apóstolos os primeiros missionários. A bandeira
nacional é o símbolo da nação. Então a cor não é só cor, a cruz não é só um pedaço
de madeira, são expressões simbólicas. Os símbolos são diretamente ligados às
normas: “Quando obedeço à norma que estabelece que é com deferência e respeito
que devo tratar meus pais, é porque tal norma simboliza precisamente deferência
e respeito; de outro modo não seria norma. Se, como cristão, obedeço à norma que
é meu dever ajudar o próximo, é porque essa norma simboliza amor a Deus e ao
próximo. Quando, como professor, obedeço a norma que me obriga a ter maior
domínio intelectual possível da matéria que ensino, é porque essa norma simboliza
competência e autoridade intelectual. Se obedeço à norma que me diz que devo
ser solidário com o amigo que enfrenta alguma situação difícil, é porque tal norma
simboliza o sentimento de amizade. Quando procuro obedecer às normas de
etiqueta, é porque essas normas simbolizam boa educação e refinamento. Não são
os símbolos que possuem uma função normativa – embora a linguagem, verbal,
ou não, seja constituída de um conjunto de regras para a comunicação simbólica
-, mas, ao contrário, são as normas que possuem uma função simbólica, e, assim
estão carregadas de significados, sem os quais não teriam poder de pressão sobre
os indivíduos”. (VILA NOVA, 2012, p. 67).

Texto adaptado de...


PAMPLONA, R. C. Sociologia. São Paulo: Unicastelo, 2013.
_______________. Sociologia da Educação. São Paulo. Unicastelo, 2013
Bibliografia

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