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Curso de Iniciação Cristã

Aula 5 – Creio na Igreja

2022
Sumário
Aula 05 – Creio na Igreja ........................................................................................................... 2
A Igreja de Cristo ................................................................................................................... 2
O Reino de Deus e a Igreja na pregação de Jesus ................................................................... 3
A Igreja e seus mistérios........................................................................................................ 4
Corpo Místico de Cristo ......................................................................................................... 4
As notas da Igreja .................................................................................................................. 5
A Missão da Igreja ................................................................................................................. 5
A Salvação pela Igreja............................................................................................................ 6
A Hierarquia da Igreja ........................................................................................................... 7
Os leigos ............................................................................................................................... 8
Leitura Complementar - Os pecados da Igreja ....................................................................... 9

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Aula 05 – Creio na Igreja

“Creio na Igreja, Una, Santa, Católica e Apostólica”


A fé que professamos na Igreja é uma extensão da fé no próprio Cristo, que a fundou e prometeu
que o mal não prevaleceria sobre ela (cf. Mt 16,18). Necessitamos, no entanto, vencer alguns
obstáculos para perceber a essência da Igreja e nela crer. Esses obstáculos são os pecados dos
homens que a representam e toda séria de maldades que caem sobre a Igreja procurando
destruí-la.

Um episódio da vida de São Josemaría Escrivá (1928-1975) é significativo para nos ensinar como
deve ser nossa fé na Igreja. Ele era espanhol e mudou-se para Roma em 1946, morando lá por
29 anos. Conta-se que a primeira vez que ele viu a Cúpula da Basílica de São Pedro, rezou o
Credo com muita devoção. Algumas pessoas perceberam que muitas vezes ele repetia: “Creio
na minha Mãe a Igreja Romana...”, mas intercalava “apesar dos pesares”. E questionado por um
Cardeal da Igreja o que queria dizer com essa expressão, ele respondeu: “Apesar dos meus
pecados e dos seus”.

Precisamos, portanto, saber diferenciar os pecados dos homens que aviltam a Igreja, o mal
exemplo de pessoas da Igreja, inclusive clérigos, bem como das calúnias que recaem sobre ela,
do que a Igreja é em si: querida e fundada por Cristo para ser “sacramento universal de
salvação”, como coloca o Concílio Vaticano II.

A Igreja de Cristo
A Igreja é uma obra da Trindade. Sua origem está no libérrimo decreto do Pai Eterno que decide
elevar a todos a participar de sua vida divina. Cristo enviou o Espírito Santo para que santificasse
a Igreja, de modo que a Igreja aparece como um povo reunido em virtude da unidade da
Trindade.

Nosso Senhor Jesus Cristo não é apenas o Fundador, mas o fundamento da Igreja. O ato
fundador de Cristo não pode ser identificado com um ato solene em que Ele proclamasse o
surgimento da Igreja, mas como a extensão de sua vontade criadora e da vontade de
compartilhar o amor do Pai a todo mundo. No entanto, podemos identificar algumas ações
particulares de Cristo que denotam seu desejo de que a Igreja se tornasse uma realidade. Os
principais atos preparatórios de Cristo são os seguintes:

A constituição de uma comunidade de discípulos: “O gérmen e o começo do Reino são o


pequeno rebanho dos que Jesus reuniu em torno de si e dos que Ele mesmo é o pastor.
Constituem a verdadeira família de Cristo”. CIC 764.

Eleição e Missão dos Doze Apóstolos: “O Senhor Jesus dotou a sua comunidade duma estrutura
que permanecerá até ao pleno acabamento do Reino. Temos, antes de mais, a escolha dos Doze,
com Pedro como chefe. Representando as doze tribos de Israel, são as pedras do alicerce da
nova Jerusalém. Os Doze e os outros discípulos participam da missão de Cristo, do seu poder,
mas também da sua sorte. Com todos estes atos, Cristo prepara e constrói a sua Igreja”. CIC 765.

Vocação e Missão de Pedro: Existe uma vontade explícita de Cristo de que entre os Apóstolos
haja um que seja a Rocha que os dê sustentação (nos Evangelhos Pedro sempre aparece em
primeiro lugar) e que deve confirmar a seus irmãos. Depois da confissão de Pedro aparece a

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promessa de que Cristo edificará a sua Igreja sobre a pessoa de Pedro e sua fé no messias. O
trecho do Evangelho em que lemos isso é o seguinte:

“E vós”, retomou Jesus, “quem dizeis que eu sou?” Simão Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o
Filho do Deus vivo”. Jesus então declarou: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi carne
e sangue quem te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. Por isso, eu te digo: tu és Pedro,
e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e as forças do Inferno não poderão vencê-la. Eu te
darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que
desligares na terra será desligado nos céus”. Mt 16, 15-19.

A Última Ceia do Senhor do Senhor é um ato antecipador e fundacional que dá sentido aos
outros, pois a Nova Igreja surge pela entrega de Cristo e a participação dos que crêem. Quando
Jesus toma o Pão e o Vinho, antecipa a entrega que faria no dia seguinte da própria vida. Esse
Rito é o central da Nova Aliança inaugurada por Cristo e ele pede aos Apóstolos: “Fazei isso em
memória de Mim”. Lc 22, 19

Cristo Ressuscitado dos mortos também dá indicações aos apóstolos e realiza atos que são
indicativos da Igreja. Primeiro manda, com todo poder dos Céus, que os Apóstolos perdoem os
pecados como fruto da Cruz: “A quem perdoardes os pecados, serão perdoados; a quem os
retiverdes, ficarão retidos”. Jo 20,22.

Jesus também confirma o primado de Pedro, mesmo depois de ele O ter negado três vezes:
“Cuida dos meus cordeiros... Sê pastor das minhas ovelhas”. Jo 21, 15-16.

O poder que Cristo dá aos Apóstolos como seus continuadores não é um poder delegado, mas
participação no mesmo poder de Cristo. Os versículos finais do Evangelho de Mateus fazem
referência a isso: “Jesus se aproximou deles e disse: “Foime dada toda a autoridade no céu e na
terra. Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do
Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco
todos os dias, até o fim dos tempos”. Mt 28, 18-20.

O Reino de Deus e a Igreja na pregação de Jesus


“O Senhor Jesus deu início à sua Igreja, pregando a boa-nova do advento do Reino de Deus
prometido desde há séculos nas Escrituras. Para cumprir a vontade do Pai, Cristo inaugurou na
terra o Reino dos céus. A Igreja «é o Reino de Cristo já presente em mistério”. CIC 763. Os
protestantes costumam contrapor o Reino pregado por Cristo com a Igreja, como se Jesus não
desejasse uma Igreja, mas apenas o Reino de Deus. Como vimos, as referências de Cristo à Igreja
são explícitas. Outros teólogos interpretam as escrituras dizendo que Cristo pregou um Reino
espiritual que se consumaria no fim dos tempos. A Igreja seria uma criação humana apenas. O
Papa São Pio X condenou essas ideias, explicando seus erros na Encíclica Pascendi e no Concílio
Vaticano II, a Lumen Gentium explica a relação do Reino com a Igreja de mundo muito claro:

“O mistério da santa Igreja manifesta-se na sua fundação. O Senhor Jesus deu início à Sua Igreja
pregando a boa nova do advento do Reino de Deus prometido desde há séculos nas Escrituras:
«cumpriu-se o tempo, o Reino de Deus está próximo» (Mc. 1,15; cfr. Mt. 4,17). Este Reino
manifesta-se na palavra, nas obras e na presença de Cristo. A palavra do Senhor compara-se à
semente lançada ao campo (Mc. 4,14): aqueles que a ouvem com fé e entram a fazer parte do
pequeno rebanho de Cristo (Lc. 12,32), já receberam o Reino; depois, por força própria, a
semente germina e cresce até ao tempo da messe (cfr. Mc. 4, 26-29). Também os milagres de
Jesus comprovam que já chegou à terra o Reino: «Se lanço fora os demônios com o poder de
Deus, é que chegou a vós o Reino de Deus» (Lc. 11,20; cfr. Mt. 12,28). Mas este Reino manifesta-

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se sobretudo na própria pessoa de Cristo, Filho de Deus e Filho do homem, que veio «para servir
e dar a sua vida em redenção por muitos» (Mt. 10,45).

E quando Jesus, tendo sofrido pelos homens a morte da cruz, ressuscitou, apareceu como Senhor
e Cristo e sacerdote eterno (cfr. At. 2,36; Hebr. 5,6; 7, 17-21) e derramou sobre os discípulos o
Espírito prometido pelo Pai (cfr. At. 2,33). Pelo que a Igreja, enriquecida com os dons do seu
fundador e guardando fielmente os seus preceitos de caridade, de humildade e de abnegação,
recebe a missão de anunciar e instaurar o Reino de Cristo e de Deus em todos os povos e constitui
o germe e o princípio deste mesmo Reino na terra. Enquanto vai crescendo, suspira pela
consumação do Reino e espera e deseja juntar-se ao seu Rei na glória”. Lumen Gentium 5.

A Igreja e seus mistérios


“A Igreja é, simultaneamente: «sociedade dotada de órgãos hierárquicos e corpo místico de
Cristo»; «agrupamento visível e comunidade espiritual»; «Igreja terrestre e Igreja ornada com
os bens celestes». Estas dimensões constituem, em conjunto, «uma única realidade complexa,
formada pelo duplo elemento humano e divino». É próprio da Igreja ser «simultaneamente
humana e divina, visível e dotada de elementos invisíveis, empenhada na ação e dada à
contemplação, presente no mundo e, todavia, peregrina; mas de tal forma que o que nela é
humano se deve ordenar e subordinar ao divino, o visível ao invisível, a ação à contemplação, e
o presente à cidade futura que buscamos». CIC 771.

A Igreja é um Mistério de Comunhão. “É na Igreja que Cristo realiza e revela o seu próprio
mistério, como a meta do desígnio de Deus: «recapitular tudo n'Ele» (Ef 1, 10). São Paulo chama
«grande mistério» (Ef 5, 32) à união esponsal de Cristo e da Igreja. Porque está unida a Cristo
como a seu esposo, a própria Igreja, por seu turno, se torna mistério. E é contemplando nela
este mistério, que S. Paulo exclama: «Cristo em vós — eis a esperança da glória!» (Cl 1, 27).

“Na Igreja, esta comunhão dos homens com Deus pela «caridade, que não passa jamais» (1 Cor
13, 8), é o fim que comanda tudo quanto nela é meio sacramental, ligado a este mundo que
passa. «A sua estrutura está completamente ordenada à santidade dos membros de Cristo. CIC
772,773.

Corpo Místico de Cristo


Jesus anunciou uma comunhão misteriosa e real entre seu Corpo e o nosso quando disse: “Quem
come a minha carne e bebe meu sangue permanece em Mim e eu nele” Jo 6, 56. Iremos
compreender mais profundamente o significado destas palavras quando estudar o Sacramento
da Eucaristia. Mas esta união de Cristo conosco também é imagem da Igreja. Quando Jesus envia
seu Espírito, esta comunhão se torna mais intensa e constitui o Corpo Místico de Cristo. cf. CIC
787, 788.

“A comparação da Igreja com um corpo lança uma luz particular sobre a ligação íntima existente
entre a Igreja e Cristo. Ela não está somente reunida à volta d'Ele: está unificada n'Ele, no seu
Corpo. Na Igreja, Corpo de Cristo, são de salientar mais especificamente três aspectos: a unidade
de todos os membros entre si, pela união a Cristo; Cristo, Cabeça do Corpo; a Igreja, Esposa de
Cristo”. CIC 789.

O Espírito Santo é a alma desse corpo, seu princípio de ação, de unidade e da riqueza dos dons
e carismas. Por isso é tantas vezes mencionado nos Atos dos Apóstolos, pois ali se conta a
história da Igreja nascente.

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As notas da Igreja
As notas da Igreja são certas propriedades que a fazem exteriormente reconhecíveis.
Constituem a Igreja no que ela é e dimanam de sua essência. São consequência de sua natureza
sacramental e condição imprescindível de sua missão. Estas notas são quatro: Una, Santa,
Católica e Apostólica. Seguindo o CIC 866-870:

“A Igreja é una: tem um só Senhor, professa uma só fé, nasce dum só Baptismo e forma um só
Corpo, vivificado por um só Espírito, em vista duma única esperança (388), no termo da qual
todas as divisões serão superadas. A Igreja é santa: é seu autor o Deus santíssimo; Cristo, seu
Esposo, por ela Se entregou para a santificar; vivifica-a o Espírito de santidade. Embora encerra
pecadores no seu seio, ela é «a sem-pecado feita de pecadores». Nos santos brilha a sua
santidade; em Maria, ela é já totalmente santa.

A Igreja é católica: anuncia a totalidade da fé, tem à sua disposição e administra a plenitude dos
meios de salvação; é enviada a todos os povos; dirige-se a todos os homens; abrange todos os
tempos; «é, por sua própria natureza, missionária».

A Igreja é apostólica: está edificada sobre alicerces duradouros, que são «os Doze apóstolos do
Cordeiro»; é indestrutível; é infalivelmente mantida na verdade: Cristo é quem a governa por
meio de Pedro e dos outros apóstolos, presentes nos seus sucessores, o Papa e o colégio dos
bispos.

«A única Igreja de Cristo, da qual professamos no Credo que é una, santa, católica e apostólica,
[...] é na Igreja Católica que subsiste, governada pelo sucessor de Pedro e pelos bispos que estão
em comunhão com ele, embora numerosos elementos de santificação e de verdade se
encontrem fora das suas estruturas”.

A Missão da Igreja
Como já viemos fazendo, transcrevemos abaixo mais um trecho do Catecismo da Igreja sobre a
Missão da Igreja, uma exigência da catolicidade.

“O mandato missionário. «Enviada por Deus às nações, para ser o sacramento universal da
salvação, a Igreja, em virtude das exigências íntimas da sua própria catolicidade e em obediência
ao mandamento do seu fundador, procura incansavelmente anunciar o Evangelho a todos os
homens». «Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do
Filho e do Espírito Santo, e ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei. E eis que Eu estou
convosco todos os dias, até ao fim do mundo» (Mt 28, 19-20).

A origem e o fim da missão. O mandato missionário do Senhor tem a sua fonte primeira no amor
eterno da Santíssima Trindade: «Por sua natureza, a Igreja peregrina é missionária, visto ter a
sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na missão do Filho e do Espírito Santo». E o fim
último da missão consiste em fazer todos os homens participantes na comunhão existente entre
o Pai e o Filho, no Espírito de amor.

O motivo da missão. É ao amor de Deus por todos os homens que, desde sempre, a Igreja vai
buscar a obrigação e o vigor do seu ardor missionário: «Porque o amor de Cristo nos impele...»
(2 Cor 5, 14) (348). Com efeito, «Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao
conhecimento da verdade» (1 Tm 2, 4). Deus quer a salvação de todos, mediante o
conhecimento da verdade. A salvação está na verdade. Os que obedecem à moção do Espírito
da verdade estão já no caminho da salvação. Mas a Igreja, à qual a mesma verdade foi confiada,

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deve ir ao encontro dos que a procuram para lha levar. É por acreditar no desígnio universal da
salvação que a Igreja deve ser missionária.

Os caminhos da missão. «O protagonista de toda a missão eclesial é o Espírito Santo». É Ele que
conduz a Igreja pelos caminhos da missão. E esta «continua e prolonga, no decorrer da história,
a missão do próprio Cristo, que foi enviado para anunciar a Boa-Nova aos pobres. É, portanto,
pelo mesmo caminho seguido por Cristo que, sob o impulso do Espírito Santo, a Igreja deve
seguir, ou seja, pelo caminho da pobreza, da obediência, do serviço e da imolação de si mesma
até à morte – morte da qual Ele saiu vitorioso pela ressurreição». É assim que «o sangue dos
mártires se torna semente de cristãos».

Porém, no seu peregrinar, a Igreja também faz a experiência da «distância que separa a
mensagem de que é portadora, da fraqueza humana daqueles a quem este Evangelho é
confiado». Só avançando pelo caminho «da penitência e da renovação» e entrando «pela porta
estreita da Cruz» é que o povo de Deus pode expandir o Reino de Cristo. Com efeito, «assim
como foi na pobreza e na perseguição que Cristo realizou a redenção, assim também a Igreja é
chamada a seguir pelo mesmo caminho, para comunicar aos homens os frutos da salvação».

Pela sua própria missão, «a Igreja faz a caminhada de toda a humanidade e partilha a sorte
terrena do mundo. Ela é como que o fermento e, por assim dizer, a alma da sociedade humana,
chamada a ser renovada em Cristo e transformada em família de Deus». O esforço missionário
exige, portanto, paciência. Começa pelo anúncio do Evangelho aos povos e grupos que ainda
não acreditam em Cristo; prossegue no estabelecimento de comunidades cristãs, que sejam
«sinais da presença de Deus no mundo» e na fundação de Igrejas locais; compromete-se num
processo de inculturação, para incarnar o Evangelho nas culturas dos povos; e também não
deixará de conhecer alguns fracassos. «Pelo que diz respeito aos homens, aos grupos humanos
e aos povos, a Igreja só a pouco e pouco os atinge e penetra, assim os assumindo na plenitude
católica».

A missão da Igreja requer um esforço em ordem à unidade dos cristãos (363). «De fato, as
divisões entre cristãos impedem a Igreja de realizar a plenitude da catolicidade que lhe é própria,
naqueles seus filhos que, sem dúvida, lhe pertencem pelo Batismo, mas que se encontram
separados da plenitude da comunhão com ela. Mais ainda: para a própria Igreja, torna-se mais
difícil exprimir, sob todos os seus aspectos, a plenitude da catolicidade na própria realidade da
sua vida».

A tarefa missionária implica um diálogo respeitoso com aqueles que ainda não aceitam o
Evangelho. Os crentes podem tirar proveito para si mesmos deste diálogo, aprendendo a
conhecer melhor «tudo quanto de verdade e graça se encontrava já entre os povos, como que
por uma secreta presença de Deus». Se anunciam a Boa Nova aos que a ignoram, é para
consolidar, completar e elevar a verdade e o bem que Deus espalhou entre os homens e os
povos, e para os purificar do erro e do mal, «para glória de Deus, confusão do demônio e
felicidade do homem».

A Salvação pela Igreja


Nos primeiros séculos do cristianismo, eminentes teólogos da Igreja, conhecido como Padres da
Igreja, afirmaram que “fora da Igreja não há salvação”. Esta frase é muitas vezes mal
compreendida. Ela significa que “toda salvação vem de Cristo, Cabeça, pela Igreja, que é seu
Corpo”. Não se exclui, com essa afirmação, a possibilidade da salvação por aqueles que sem
culpa própria ignoram o Evangelho de Cristo e a Igreja, mas procuram a Deus com coração

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sincero e se esforçam para cumprir a vontade de Deus pelo que a consciência os dita. O CIC 847
diz que esses também agem por influxo da graça e, portanto, ao alcançarem a salvação, obtêm-
na por meio da Igreja de Cristo, ainda que não tenham conhecido essa Igreja e a próprio Cristo
em sua vida.

No Concílio Vaticano II, o documento Lumen Gentium disse a ʻIgreja de Cristo subsiste na Igreja
Católicaʼ. O documento Dominus Iesus, de Fevereiro de 2000, assinado pelo então Cardeal
Ratzinger, explica essa afirmação da seguinte forma:

“Com a expressão « subsistit in » (subsiste em), o Concílio Vaticano II quis harmonizar duas
afirmações doutrinais: por um lado, a de que a Igreja de Cristo, não obstante as divisões dos
cristãos, continua a existir plenamente só na Igreja Católica e, por outro, a de que «existem
numerosos elementos de santificação e de verdade fora da sua composição», isto é, nas Igrejas
e Comunidades eclesiais que ainda não vivem em plena comunhão com a Igreja Católica”. cfr.
Dominus Iesus 16.

Esta explicação nos permite fazer o elo entre o aspecto espiritual da Igreja (a Igreja de Cristo) e
sua parte visível, instituída por Cristo na pessoa de São Pedro e do colégio apostólico, que hoje
conhecemos como a nossa Igreja Católica.

A Hierarquia da Igreja
Jesus elegeu os Doze para vivessem com Ele e para enviá-los a pregar o Reino de Deus. Constituiu
estes Apóstolos como um colégio, ou seja, um grupo estável a frente do qual colocou Pedro,
eleito dentre eles. ! Por meio dos Bispos se manifesta e conserva até nós a tradição apostólica
em todo mundo. Os Bispos receberam o ministério sobre a comunidade juntamente com seus
colaboradores, os presbíteros e os diáconos, presidindo em nome de Deus o rebanho de quem
são pastores como mestres de doutrina, sacerdotes do culto sagrado e ministros de governo.

O Papa, Bispo de Roma e sucessor de São Pedro, é o princípio e fundamento perpétuo e visível
de unidade, tanto dos Bispos quanto dos fiéis. O Pontífice Romano, de fato, tem na Igreja, em
virtude da sua função de Vigário de Cristo e Pastor de toda Igreja, a potestade plena, suprema
e universal. O Papa exerce essa potestade com plena liberdade. Em Roma o Papa tem um
conjunto de pessoas que o ajudam no ministério da Igreja. Um documento do Concílio Vaticano
II explica isso: “No exercício do poder supremo, pleno e imediato sobre a Igreja universal, o
Romano Pontífice serve-se dos Dicastérios da Cúria romana, que, por isso, trabalham em seu
nome e com a sua autoridade, para bem das igrejas e em serviço dos sagrados pastores”.
Christus Dominus 9.

O Colégio dos Bispos, que não existe sem a cabeça, é também sujeito da suprema e plena
potestade sobre a Igreja, mas não pode exercer esse poder sem o consentimento do Romano
Pontífice. O poder supremo sobre a Igreja que este colégio possui se exercita de modo solene
nos Concílios ecumênicos.

Os Bispos são os que, em primeiro lugar, recebem a tripla missão confiada por Cristo à sua Igreja.
Para o desempenho dessa missão, Cristo prometeu o Espírito Santo e o enviou no dia de
Pentecostes. Devem manter a fé da Igreja ensinando a reta doutrina, santificam o povo pelo
ministério da palavra e pelos sacramentos e governam suas Igrejas particulares. Os padres
vivem seu ministério nas suas paróquias, também com a missão de ensinar, santificar e governar
o povo que lhe foi confiado.

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Os leigos
“Por leigos entendem-se aqui todos os cristãos que não são membros da sagrada Ordem ou do
estado religioso reconhecido pela Igreja, isto é, os fiéis que, incorporados em Cristo pelo Batismo,
constituídos em Povo de Deus e tornados participantes, a seu modo, da função sacerdotal,
profética e real de Cristo, exercem, pela parte que lhes toca, a missão de todo o Povo cristão na
Igreja se no mundo”. Lumen Gentium 31.

Temos uma missão singular na Igreja: santificar as realidades temporais, dar testemunho de
Deus no mundo e nas realidades seculares. Mostrar, com seu exemplo e atitudes, que:

“Todas as realidades que constituem a ordem temporal, os bens da vida e da família, a cultura,
os bens econômicos, as artes e profissões, as instituições políticas, as relações internacionais e
outras semelhantes, bem como a sua evolução e progresso não só são meios para o fim último
do homem, mas possuem valor próprio, que lhes vem de Deus, quer consideradas em si mesmas,
quer como partes da ordem temporal total: «e viu Deus todas as coisas que fizera, e eram todas
muito boas» (Gen. 1, 31). Apostolicam Actuositatem 7.

A Igreja precisa de gente comprometida com uma vida cristã séria. Somente assim se dará a
‘recristianização da sociedade’ tão importante nos tempos atuais. Para terminar colocamos um
ponto de meditação de São Josemaría Escrivá que fala do Apostolado dos Leigos:

“Um segredo. - Um segredo em voz alta: estas crises mundiais são crises de santos. Deus quer
um punhado de homens “seus” em cada atividade humana. - Depois... "pax Christi in regno
Christi" - a paz de Cristo no reino de Cristo”. Caminho 301.

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Leitura Complementar - Os pecados da Igreja
Trecho adaptado do artigo ʻThe Church ask for Forgivenessʼ, publicado por Alice von Hildebrand
em 2000.

Conta-se que Napoleão, o vencedor de tantas batalhas, após ter mantido o Papa Pio VII
prisioneiro em Fontainebleau por longo tempo, queria tomar a Igreja Católica sob a sua tutela
para assim alcançar a hegemonia total na Europa. Com isso em mente, redigiu uma Concordata
que entregou ao Secretário de Estado, o cardeal Consalvi. O imperador disse ao cardeal que
voltaria no dia seguinte e que queria o documento assinado.

Depois de ler a Concordata, Consalvi informou Sua Santidade de que assinar o documento
equivaleria a vender a Igreja ao Imperador da França e, por conseguinte, implorou-lhe que não
o assinasse. Quando Napoleão voltou, o cardeal informou-o de que o documento não havia sido
assinado. O imperador começou então a usar um dos seus conhecidos estratagemas: a
intimidação. Teve uma explosão de raiva e gritou: “Se este documento não for assinado, eu
destruirei a Igreja Católica Romana”. Ao que Consalvi calmamente replicou: “Majestade, se os
papas, cardeais, bispos e padres não conseguiram destruir a Igreja em dezenove séculos, como
Vossa Alteza espera consegui-lo durante os anos da sua vida?”

Tenho um motivo concreto para relatar esse episódio. Consalvi deixa claro que embora existam
inumeráveis pecadores no seu seio, também em posições de governo, a Igreja conseguiu
subsistir por ser a Esposa Imaculada de Cristo, santa e protegida pelo Espírito Santo. Como disse
certa vez Hilaire Belloc, se a Igreja fosse uma instituição puramente humana, não teria
sobrevivido aos muitos prelados idiotas e incompetentes que já a lideraram. Por que a Igreja
sobrevive e continuará a sobreviver? A resposta é simples. Cristo nunca disse que daria líderes
perfeitos à Igreja. Nunca disse que todos os membros da Igreja seriam santos. Judas era um dos
Apóstolos, e todos aqueles que traem o Magistério da Esposa de Cristo tornam-se Judas. O que
Nosso Senhor disse foi: As portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16, 18).

A palavra “Igreja” tem dois sentidos: um sobrenatural e outro sociológico. Para todos os não-
católicos e, infelizmente, também para muitos católicos de hoje, a Igreja é uma instituição
meramente humana, constituída por pecadores, uma instituição cuja história está carregada de
crimes. É preocupante o fato de que o significado sobrenatural da palavra “Igreja” – a saber, a
santa e imaculada Esposa de Cristo – seja totalmente desconhecido da esmagadora maioria das
pessoas, e até de um alto percentual de católicos cuja formação religiosa foi negligenciada desde
o Vaticano II. Por isso, quando o Papa ou algum membro da hierarquia pede perdão pelos
pecados dos cristãos no passado, muitas pessoas acabam pensando que a Igreja – a instituição
religiosa mais poderosa da terra – está finalmente a admitir as suas culpas e que a sua própria
existência foi prejudicial à humanidade.

Na realidade, a Esposa de Cristo é a maior vítima dos pecados dos seus filhos; no entanto, é ela
que implora a Deus que perdoe os pecados daqueles que pertencem ao seu corpo. É a Santa
Igreja que implora a Deus que cure as feridas que esses filhos pecadores infligiram a outros,
muitas vezes em nome da mesma Igreja que traíram. Somente Deus pode perdoar os pecados;
é por isso que a liturgia católica é rica em orações que invocam o perdão de Deus. As vítimas
dos pecados podem (e devem) perdoar o mal que sofreram, mas não podem de forma alguma
perdoar o mal moral em si, e, caso se recusem a perdoar, movidas pelo rancor e pelo ódio, Deus,
que é infinitamente misericordioso, nunca nega o seu perdão àqueles que o procuram de
coração contrito.

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A Santa Igreja Católica não pode pecar; mas muitas vezes é a mãe dolorosa de filhos díscolos e
desobedientes. Ela dá-lhes os meios de salvação, dá-lhes o pão puro da Verdade. Mas não pode
forçá-los a viver os seus santos ensinamentos. Isto aplicase tanto a papas e bispos como aos
demais membros da Igreja. Cristo foi traído por um dos seus Apóstolos e negado por outro. O
primeiro enforcou-se; o segundo arrependeu-se e chorou amargamente.

A distinção entre os sentidos sobrenatural e sociológico da Igreja deve ser continuamente


enfatizada, pois fatalmente causa confusão quando não é explicitada com clareza.

Assim como os judeus que aderem ao ateísmo traem tragicamente o seu título de honra – serem
parte do povo escolhido de Deus –, assim os católicos romanos que pisoteiam o ponto central
da moralidade – amar a Deus e, por Ele, o próximo –, traem um princípio sagrado da sua fé.

Por outro lado, em nome da justiça e da verdade, é imperioso mencionar que os católicos
verdadeiros (aqueles que vivem a fé e enxergam a Santa Igreja com os olhos da fé) sempre
ergueram a voz contra os pecados cometidos pelos membros da Igreja. São Bernardo de Claraval
condenou em termos duríssimos as perseguições que os judeus sofreram na Alemanha do
século XII (cf. Ratisbonne, Vida de São Bernardo). Os missionários católicos no México e no Peru
protestavam constantemente contra a brutalidade dos conquistadores, geralmente movidos
pela ganância. A Igreja deve ser julgada com base naqueles que vivem os seus ensinamentos,
não naqueles que os traem. Recordo-me das palavras com que um amigo meu, judeu muito
ortodoxo, lamentava o fato de muitos judeus se tornarem ateus: “Se somente um judeu
permanecer fiel, esse judeu é Israel”. O mesmo pode ser dito com relação à Igreja Católica;
apenas as pessoas fiéis ao ensinamento de Cristo podem falar em seu nome. Ela deve ser julgada
de acordo com a santidade que alguns dos seus membros alcançam, não de acordo com os
pecados e crimes de inúmeros cristãos que julgam os seus ensinamentos difíceis de praticar e
que por isso traem a Deus na sua vida cotidiana.

Os pecadores, aliás, estão igualmente distribuídos pelo mundo e não são uma triste prerrogativa
da religião católica. Se fosse assim, estaria justificada a afirmação de um dos meus alunos judeus
em Hunter, feita diante de uma sala lotada: “Teria sido melhor para o mundo que o cristianismo
nunca tivesse existido”. A história julgará se o conflito atual entre judeus e muçulmanos é
moralmente justificável.

Este modesto comentário foi motivado pelo que disse um rabino à televisão, um dia após o
pronunciamento histórico de João Paulo II na Basílica de São Pedro, a 12 de março de 2000,
quando o Santo Padre pediu perdão pelos pecados dos cristãos no passado 1. O rabino não

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É digno de nota que somente o Papa tenha pedido desculpas pelos pecados cometidos pelos membros
da Igreja. Não deveriam fazer o mesmo os hindus, por terem praticamente erradicado o budismo da Índia
e forçado os seus membros a fugir para o Tibet, a China e o Japão? Não deveriam os anglicanos pedir
desculpas por terem assassinado São Thomas More, São John Fisher e São Edmund Campion, para
mencionar apenas três nomes? E quanto ao extermínio de um milhão de armênios pelos turcos em 1914?
Ninguém fala a respeito desse “holocausto”; ninguém parece saber dele. E o extermínio de cristãos que
acontece agora no Sudão?
Tal afirmação deixa claro que o rabino não fazia a menor idéia daquilo que os católicos entendem por
Esposa Imaculada de Cristo – uma realidade que não pode ser percebida ou compreendida por aqueles
que usam os óculos do secularismo. Pergunto-me quando o “mundo” considerará que a Igreja já pediu
desculpas suficientes. Por séculos a Igreja tem sido o bode expiatório ideal. O que os seus acusadores
fariam se ela deixasse de existir?
Aqueles que a acusam de “silêncio” não estão apenas mal informados, mas pressupõem que eles próprios
seriam heróicos se estivessem na mesma situação. Como o Papa Pio XII disse a meu marido numa

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apenas achou o pedido de desculpas de Sua Santidade “incompleto” por não mencionar
explicitamente o Holocausto (esquecendo-se de mencionar que os católicos eram e são minoria
na Alemanha, país basicamente protestante), como também disse que os pecados cometidos
pela Igreja foram freqüentemente endossados pelos seus líderes, dando a entender que o
antisemitismo faria parte da própria natureza da Igreja.

entrevista privada, quando ainda era Secretário de Estado: “Não se obriga ninguém a ser mártir”. Quantas
pessoas se julgam heróicas sem nunca terem sido realmente testadas! Quantos judeus arriscariam a vida
para salvar católicos perseguidos? Por que esquecem que milhões de católicos também pereceram nos
campos de concentração? Se a Gestapo tivesse apanhado o meu marido, considerado o inimigo número
um de Hitler em Viena, tê-lo-ia feito em pedaços. Ele lutava contra o nazismo em nome da Igreja e perdeu
tudo porque odiava a iniqüidade. Quantas pessoas fariam o mesmo – não na sua imaginação, mas na
realidade?
Também não devemos esquecer que inúmeros católicos foram (e são) perseguidos por causa da sua fé.
Mas um verdadeiro católico não espera desculpas dos seus perseguidores. Perdoa os seus perseguidores,
quer eles lhe peçam desculpas, quer não. Reza por eles, ama-os em nome dAquele que padeceu e morreu
pelos pecados de todos. É sempre lamentável ouvir um católico dizer: “Fulano e beltrano devem-me
desculpas”.Somente a pessoa que enxerga a Santa Igreja Católica (chamada santa cada vez que o Credo é
recitado) com os olhos da fé, só essa pessoa compreende com imensa gratidão que a Igreja é a Santa
Esposa de Cristo, sem ruga nem mácula, por causa da santidade do seu ensinamento, porque aponta o
caminho para a Vida Eterna e porque dispensa os meios da graça, ou seja, os sacramentos.
O pecado é uma realidade medonha e que os pecados cometidos por aqueles que se dizem servos de
Deus são especialmente repulsivos. Nunca serão excessivamente lamentados, mas devemos ter presente
que, apesar de muitos membros da Igreja serem – infelizmente – cidadãos da Cidade dos Homens e não
da Cidade de Deus, a Igreja permanece santa.

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