Quando nascemos para o òrìsà, aprendemos logo de início a importância de
reconhecer e saudar Èsù. Ele é o guardião, é quem protege, é quem nos acompanha a mando dos nossos santos para nos livrar dos caminhos tortuosos, é quem nos traz a prosperidade. Mas, qual a ligação entre Èsù e Ògún? O livro de Adilson de Oxalá, Igbadu, a Cabala da Existência, mostra que Èsù foi o primeiro protótipo humano a ser confeccionado por Orunmilá e Obatalá. Sobre Ògún mostra que ele foi o òrìsà que desbravava diversos caminhos e um dos primeiros a lhe dar com os metais aqui na terra. O que Èsù e Ògún possuem em comum é o fato caminharem pelas estradas dia e noite, acompanhando seus filhos e seguidores, apesar de terem histórias diferentes. A escritora Marlúcia Mendes da Rocha, em um de seus artigos existentes na Revista Kàwé, fala da ligação entre Èsù e Ògún ao afirmar que eles são irmãos, filhos de Yemonja. Reginaldo Prandi, em seu livro, Mitologia dos Orixás, também afirma essa ligação materna entre eles. De fato, para nós do àse, Èsù e Ògún caminham sempre juntos, desbravando caminhos e acompanhando seus filhos pela estrada da vida. Na cidade de Iré, na Nigéria, Ògún é cultuado e reconhecido como irmão de Èsù. Também é reconhecido como o pai da agricultura por ter criado instrumentos de ferro para esta prática, como ancinho, enxada, pá e arado. Existe na região, festividades relacionadas ao período do plantio onde ele é cultuado junto com um outro òrìsà chamado Òkò, porém, este está mais ligado a plantação em si. Aqui no Brasil, temos uma demonstração clara do reconhecimento em relação a irmandade e parceria entre Èsù e Ògún através de Ògún Soroké. Existe muitas controvérsias em relação a esta divindade, o fato é que, no caso de Ògún Soroké, o Èsù que o acompanha em suas empreitadas não pode jamais ser esquecido. João Castilho, em seu livro Ogum Soroke, afirma que este òrìsà é uma construção brasileira e não há registros de culto a esta divindade em nenhum país africano. Em Cuba, na cultura Lucumi, também conhecido como Santeria Cubana, é possível encontrar uma entidade que lembra as características de Soroké. Quando se assenta um Ògún Soroké em uma casa de àse, existem elementos que não podem ser esquecidos devido a ligação existente entre ele e Èsù. Ambos são colocados no mesmo assentamento, porém, Ogum fica na parte superior e Èsù na parte inferior. Não se deve esquecer de colocar em seu assentamento uma esfera de ferro, representando o mundo, as caminhadas realizadas por Ògún e Èsù pelas estradas e caminhos, também deve ser acrescentado 21 ferramentas de ferro em miniatura para representar a sua prosperidade, trabalho e a agricultura. Outra características comum entre eles está na tarefa de vigiar e proteger todo o terreiro. Por esta razão, é muito comum nos terreiros Jeje e Nagô Vodum ver Ògún Soroké logo na entrada, pois ele guarda todos aqueles que entram e que saem, além de impedir que espíritos nefastos adentrem o ambiente. Existe um itan, trazido por João Castilho contando a história de Soroké e o sentido desta palavra. Segundo o escritor, após seguir para desbravar novos caminhos, Soroké retornou para a cidade antes do tempo previsto. Com muita sede, seguiu para os seus aposentos em busca da sua bebida, vinho de palma, porém não a encontrou em nenhum de seus recipientes. As calhas vazias deixou Soroké indignado, ele pensou: Que incompetência e falta de atenção comigo! Chego e não tem um recipiente cheio”. Com um temperamento muito explosivo e impaciente, ele saiu sem dizer uma palavra se quer e seguiu contrariado para o alto de uma montanha. Ao chegar no topo da montanha soltou toda a sua fúria em um único grito. Segundo João Castilho, o sentido da palavra Soroké é “gritar alto, gritar ferozmente”. A energia que ele lançou para o universo ao soltar o seu grito foi tão intenso, que ele se transformou em uma bola de fogo e seguiu enfurecido pelo mundo. Seis meses após o acontecido, Ògún Soroké retornou a sua cidade, mais calmo, menos agressivo, e assim ele foi aclamado pelo povo que sentiu a falta das orientações de seu rei. Apesar da figura de Ògún estar muito vinculada ao trabalho, ele e Èsù estão sempre juntos a defender e proteger seus filhos e o Ilé. Ambos transitam em todos os ambientes durante o dia e durante à noite, não temem a nada e encaram toda e qualquer situação. São destemidos e desbravadores, realizam as tarefas que lhe forem dadas custe o que custar. Ambos filhos de Yemonja e desapegados do seio familiar. As contas de Èsù são sempre marcadas pelas cores vermelho e preto, porém, as de Ògún podem sofrer uma variação de acordo com o seu enredo. Por exemplo, as de Soroké costumam ser azul e preto. Também há na cor verde escuro por conta da sua ligação com Osala, ou seja, as tonalidades da cor de cada guia ou conta dependerá da qualidade e caminhos do òrìsà. Ogunhé!! Laroyé!!