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O EVANGELHO

DO REINO:
UMA TEOLOGIA
DA MISSÃO

EPISÓDIO 7

EVANGELHO

2021 | ANO DA PANDEMIA


WORKBOOK
O EVANGELHO DO REINO: UMA TEOLOGIA DA MISSÃO

Não me envergonho do evangelho, porque é o poder


de Deus para a salvação de todo aquele que crê.
[Romanos 1.16]

Se alguém lhes anuncia um evangelho diferente daquele


que já receberam, que seja amaldiçoado!

[Gálatas 1.9]

Existe o Evangelho. E existe “outro Evangelho”, ou de fato, um sem número de “outro


Evangelho”. A primeira maneira de distinguir um do outro é a partir dos conteúdos, das
afirmações conceituais, doutrinárias, as crenças que pretendem resumir o Evangelho. O que
está de acordo com o Evangelho é verdade, o que não está de acordo é heresia, ou “outro
Evangelho”.

Mas existe uma distinção mais sutil, que antecede ao conteúdo do sistema de crenças que
se pretende afirmar como “o Evangelho”, a saber, a maneira como se compreende a essência
do que se entende por Evangelho.

EVANGELHO
A fé cristã afirma que a verdade é uma pessoa: Jesus Cristo. A experiência cristã de Deus é
fundamentada em Jesus, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós [João 1.14]. “Eu e o
Pai somos um”, “quem me vê, vê o Pai”, pois “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém
vem ao Pai, a não ser por mim”, disse Jesus [João 10.30; 14.6,9].

O Evangelho não é um conjunto de proposições racionais a respeito de Deus ou mesmo de


Jesus. A espiritualidade cristã não é confessional (crer em doutrinas corretas), é relacional –
o relacionamento dinâmico com a pessoa de Jesus, que nos insere na experiência do amor
de Deus, que por sua vez transborda no amor ao próximo.

A redução do Evangelho ao um conjunto de afirmações a respeito de Deus, um sistema de


verdades nas quais se deve acreditar equivale a “pregar outro Evangelho”. Deus se revelou
encarnado. A encarnação é o critério hermenêutico do Evangelho. O discipulado de Jesus
não se resume ao mundo das ideias, teorias e doutrinas racionais.

Seguir a Jesus é muito mais do que acreditar coisas a respeito de Jesus. O discipulado implica
a imitação de Cristo. Seguir a Jesus é da ordem da práxis, não apenas das crenças: “aquele
que diz que está nele, também deve andar como ele andou” [1 João 2.6].
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O EVANGELHO DO REINO: UMA TEOLOGIA DA MISSÃO

OUTRO EVANGELHO
A Bíblia não nos permite considerar adesão intelectual equivalente à conversão, e também
não considera a possibilidade do discipulado de Jesus como algo absolutamente dissociado
da práxis da fé. Quem acredita que conheceu Jesus independentemente da práxis da fé, não
tem qualquer conflito em seguir a Jesus sem ela. Mas essa experiência de dissociação entre a
crença e a vida é de fato “outro Evangelho”: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’,
entrará no Reino dos céus, mas apenas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos
céus. Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? Em
teu nome não expulsamos demônios e não realizamos muitos milagres?’ Então eu lhes direi
claramente: ‘Nunca os conheci. Afastem-se de mim vocês, que praticam o mal!’”, disse Jesus
[Mateus 7.21-23]

EVANGELHO EM
PERSPECTIVA INTEGRAL
A “missão integral” é muito mais do que a mera reconciliação entre evangelização e
responsabilidade social, isto é, acrescentar a práxis da justiça ao testemunho verbal das
crenças cristãs. Esse reducionismo sugere a cisão entre “fé e obras”, como se fosse possível
viver o seguimento de Jesus e pregar o Evangelho à parte da práxis da justiça. Assim como
“a fé sem obras é morta” [Tiago 2.17], o Evangelho como crença sem equivalência na
obediência a Jesus Cristo, é “outro Evangelho”.

A expressão “missão integral da igreja” não é apenas uma convocação para somar a
responsabilidade social à evangelização, mas de fato refere um critério hermenêutico do
Evangelho que afirma a essencialidade da fé encarnada. Por essa razão, mais do que falar em
“missão integral da igreja”, é urgente falar em “teologia da missão integral”, ou “teologia a
partir do paradigma da missão integral”, que afirma que, ou o Evangelho resulta na práxis
da fé, ou não passa de assentimento a ideias-conceitos-doutrinas a respeito de Deus e,
nesse caso, será algo mais próximo de uma filosofia do que do Evangelho do reino de Deus
revelado no Deus que se fez carne.

As declarações de Jon Sobrino: “crer é seguir a Jesus, e não apenas entender a Jesus”, e René
Padilla: “conhecemos à medida que obedecemos”, ilustram a forma como o conceito de
Evangelho se consolidou na consciência e na experiência dos teólogos do chamado mundo
dos dois terços.

Existe abissal diferença entre aceitar uma doutrina a respeito de Jesus e estar no caminho de
Jesus. Somente na práxis da fé Jesus se revela, e somente na práxis da fé é possível segui-lo. O
encontro com Jesus acontece e se sustenta na práxis do amor. Seguir a Jesus vai muito além
de acreditar em Deus e em Jesus. Seguir a Jesus não é apenas uma questão de acreditar, é uma
questão de obedecer. O Evangelho não é do mundo das ideias, é da ordem da encarnação. Em
Jesus, Deus não se fez ideia, conceito ou doutrina; em Jesus, Deus se fez carne.
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O QUE DIZ A BÍBLIA


Não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo
aquele que crê. [Romanos 1.16]

Se alguém lhes anuncia um evangelho diferente daquele que já receberam, que seja
amaldiçoado! [Gálatas 1.9]

O Verbo que se fez carne e habitou entre nós. [João 1.14]

Eu e o Pai somos um [João 10.30]

Quem me vê, vê o Pai. [João 10.30]

Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, a não ser por mim. [João 14.6,9]

Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos céus, mas apenas
aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor,
Senhor, não profetizamos nós em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios e não
realizamos muitos milagres?’ Então eu lhes direi claramente: ‘Nunca os conheci. Afastem-se
de mim vocês, que praticam o mal!’, disse Jesus. [Mateus 7.21-23]

De que adianta, meus irmãos, alguém dizer que tem fé, se não tem obras? Acaso a fé pode
salvá-lo? Se um irmão ou irmã estiver necessitando de roupas e do alimento de cada dia e
um de vocês lhe disser: “Vá em paz, aqueça-se e alimente-se até satisfazer-se”, sem porém
lhe dar nada, de que adianta isso? Assim também a fé, por si só, se não for acompanhada de
obras, está morta. Mas alguém dirá: “Você tem fé; eu tenho obras”. Mostre-me a sua fé sem
obras, e eu lhe mostrarei a minha fé pelas obras. Você crê que existe um só Deus? Muito
bem! Até mesmo os demônios crêem — e tremem! [Tiago 2.14-19]

Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida
que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por
mim. [Gálatas 2.20]

Aquele que diz que está nele, também deve andar como ele andou.[1 João 2.6]

ENTRE ASPAS
A teologia na Europa e na América do Norte geralmente tem sido um exercício acadêmico.
Tem acreditado na possibilidade de verdades “puras” derivadas das Escrituras (e talvez
da Tradição) que se sistematizam ou se aplicam a problemas éticos práticos. Em outras
palavras tem acreditado na possibilidade de um conhecimento da verdade separado da
prática da verdade. Como resultado, a revelação foi reduzida à comunicação de verdades
abstratas e a fé foi intelectualizada.A teologia da libertação está sem dúvida correta quando
critica essa abordagem racionalista da teologia. Do ponto de vista bíblico, o logos de Deus
(a Palavra) foi feito “carne” (uma pessoa histórica) e, portanto, o conhecimento deste
logos não é mero conhecimento de ideias, mas compromisso, comunhão, e participação
em um novo estilo de vida.
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O EVANGELHO DO REINO: UMA TEOLOGIA DA MISSÃO

A verdade do evangelho é sempre verdade que você vive, não é verdade que você apenas
conhece em um nível intelectual. O conhecimento correto depende da ação correta. Ou
melhor, o conhecimento é revelado no fazer. [PADILLA, René. La teologia de la liberación:
uma evaluación crítica. IN: Misión: Revista internacional de orientación cristiana. Julio-
Setiembre, 1982,Vol. 1 No 2.]

Conhecemos à medida que obedecemos (esse é o lado existencial da verdade), mas estamos
mais capacitados a obedecer à medida que conhecemos os mandamentos, promessas, juízos
de Deus revelados nas Escrituras (esse é o lado cognitivo da verdade). [...] A fé cristã não é
uma gnosis, mas um estilo de vida, não, porém, um estilo de vida qualquer, senão um que se
baseia na Palavra de Deus e dela se nutre. [PADILLA, René. La teologia de la liberación:
uma evaluación crítica. IN: Misión: Revista internacional de orientación cristiana. Julio-
Setiembre, 1982,Vol. 1 No 2.]

Quem quer conhecer Cristo e não só ter notícia sobre ele, que o siga. [...] Quem quiser
conhecer o mistério cristão de Deus, que esteja pronto a se por diante de Deus, a viver e a
agir como Jesus. [...] Quem quiser saber da ação renovadora e vivificadora do Espírito que
se ponha como Jesus, no meio dos pequenos e pobres, lá onde surge a esperança quando
só se deveria reinar o desespero, lá onde surge a criatividade, a solidariedade, a fortaleza,
a fé e, também, o perdão, onde deveria reinar só a resignação, o egoísmo, a decadência,
a incredulidade e a vingança. [SOBRINO, Jon. Jesus de Nazaret. IN: FLORISTAN, C. &
TOMAYO, J. J. (Orgs.) Conceptos fundamentals de cristianismo. Madrid: Cristianidad,
1883, p. 774]

Fora do seguimento pode haver um saber correto e formulado ortodoxamente, mas isto
não garante sem mais que o homem se introduza na verdade do mistério de Cristo. [...] É
isto quer aparece na composição teológica de Marcos 8.27-38. O aparentemente correto
conhecimento teológico de Pedro sobre Cristo mostra-se o mais falso; os pensamentos não
são os pensamentos de Deus. Mudar a falsidade destes pensamentos em verdade não é coisa,
segundo Jesus, que se consiga apenas ao nível cognoscitivo. Segundo Jesus, isto depende de
segui-lo ou não na cruz. [SOBRINO, Jon. Jesus na América Latina: seu significado para a
fé e a cristologia. São Paulo/Petrópolis: Loyola/Vozes, 1985, p.34,35]

A presença do amor de Deus em nós acontece no amor solidário ao próximo. Não há relação
de causalidade entre o que vem primeiro e o que vem depois. Nas palavras de Assmann,
“Deus solidário é o Deus em todos e de todos”. A presença de Deus se faz presente em
nós quando nos abrimos ao próximo no amor solidário, e nós somos capazes disso porque
o amor de Deus opera em nós. É um “acontecimento” onde os “dois amores” ocorrem
simultaneamente, que só acontece na medida em que o amor solidário pelo próximo e o
amor de Deus se fazem presentes ao mesmo tempo. [ASSMANN, Hugo. SUNG, Jung Mo.
Deus em nós: o reinado que acontece no amor solidário aos pobres. São Paulo: Paulus,
2010, p. 183]
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O EVANGELHO DO REINO: UMA TEOLOGIA DA MISSÃO

DESIGN DE CONVERSA
1 - Explique com suas palavras o significado de “anátema”.

2 - Em termos de doutrinas, quais são as maiores distorções que você observa no “evangelho”
pregado no Brasil contemporâneo?

3 - Por que a redução do Evangelho a um conjunto de doutrinas pode ser considerada


“outro Evangelho”?

4 - Comente a declaração de Jon Sobrino: “crer é seguir a Jesus, e não apenas entender a
Jesus”. Quais as implicações dessas duas maneiras de definir o que é “crer em Jesus” (seguir
x entender)?

5 - O que você entende por “práxis do amor”, e como isso se relaciona com a missão da
Igreja?
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