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Capítulo 15
Novela de
Gilberto Braga e Alcides Nogueira
escrita com:
Sérgio Marques
Márcia Prates
Lilian Garcia
Eliane Garcia
Colaboração de
Marília Garcia
Direção Geral
Marcos Paulo
Mauro Mendonça Filho
Núcleo
Marcos Paulo
ABELARDO LEOPOLDO
ALICE MARTA
BARTOLOMEU OLINTO
BÁRBARA PALMIRA
CLEMENTE QUEIROZ
CRISTÓVÃO PEREIRA
DARIO REINALDO
ESTER ROSÁLIA
EUGÊNIO SOBRAL
FABÍOLA TRAJANO
FELÍCIO UBALDO
GASPAR VIOLETA
GUIOMAR VITÓRIO
HELENA WALDIR
HIGINO XAVIER
IDALINA YVETTE
INÁCIO ZULMIRA
JULIANA
Participação Especial
CLARISSA
NOVELA DAS SEIS 15/1
Corta para:
enxuga com um lenço o suor no rosto de Helena. (Talvez só nesta cena nossa
Sônia devesse aparecer com seus cabelos completamente soltos, mas isso
depende da evolução que puder haver desde o início do capítulo, fica a critério
de vocês.) Sobral se aproxima.
Sobral — (a Rosália e Idalina) Eu preciso falar com ela.
Rosália — (enfrentando) Não pode, não! Ela já se cansou
demais!
Helena, muito frágil, pega a mão de Rosália, com carinho.
Helena — Por favor, Rosália, obedeça.
Contra a vontade, Rosália sai, seguida por Idalina. Sobral olha Helena
longamente. Closes alternados dos dois.
Corta para:
Ester — (serena) Não fale assim. Vamos rezar pra que ela se
recupere. Quem sabe nesse exato momento a mãe do
Inácio já não está bem? De qualquer modo, eu sei que
dentro de poucos dias o Inácio vai voltar, é o meu
amor! o único amor que eu tive na vida! E me ama,
Guiomar, tenho certeza, tanto quanto eu a ele!
Corta para:
FIM
Maria Helena, que conseguiu despertar até um novo interesse pelo problema da
adoção e do menor abandonado. Elas amaram Nelson Fragonard e tiveram
sentimentos confusos a respeito de seu irmão Miguel. Torceram desesperadamente
por Sueli e reagiram violentamente a Lígia, já que ambas disputavam Nelson. Mas o
personagem que reuniu a quase unanimidade de sentimentos foi o de Lurdes Mesquita,
inspirado - segundo Gilberto - na madrasta da Branca de Neve. Rapaz, como ela foi
odiada! Mas o melhor é que todos esses sentimentos continuarão sendo alimentados
até o fim deste mês, quando todas as peripécias de Água Viva crescerão em
intensidade até atingirem um clímax que, para milhões, será comparável ao de um
orgasmo.
Depois de Água Viva, todas as praias do Brasil adotaram o windsurf. Reginaldo Faria
tornou-se o novo símbolo sexual masculino do país, após vinte anos de carreira
cinematográfica. Lucélia Santos firmou a imagem de menina-moça que explodiria em
toda a sua suave beleza nas páginas de PLAYBOY de Abril último. E Betty Faria, de
quem os leitores de PLAYBOY sentiam saudades desde a nossa edição de Agosto de
1978, voltou com força total, após quase dois anos fora das novelas.
Gilberto Braga, carioca de 34 anos, não tem apenas um grande futuro como escritor de
televisão. Já tem até passado. Começou adaptando A Dama das Camélias para um
"Caso Especial" e, durante alguns anos, habitou o horário das seis com Senhora,
Helena, A Escrava Isaura e Dona Xepa. Todas essas eram adaptações de romances
ou peças conhecidos, mas os créditos na abertura foram passando aos poucos de
"Adaptação de Gilberto Braga" para "Uma Novela de Gilberto Braga", tal a margem de
invenção a que ele se permitia. A novela das seis é aquela em que a Globo tenta
formar escritores novos, antes de lançá-los na grande aventura da novela das oito, que
é o filé do Ibope.
Para Gilberto, o salto para o horário das oito não foi uma aventura - foi uma apoteose.
A novela chamou-se Dancin’ Days, e, de Outubro de 1978 a Março de 1979, manteve o
país inteiro ao ritmo da discothèque, e fez todo mundo se apaixonar por Júlia (Sônia
Braga) e Cacá (Antônio Fagundes). Com Dancin’ Days, Gilberto Braga passava a fazer
parte desse clube fechadíssimo, composto por Janete Clair, Dias Gomes, Bráulio
Pedroso e poucos outros.
Água Viva teve uma característica que, de saída, tornou-a diferente de todas as
novelas: deu 80 de Ibope logo no primeiro mês, seus astros foram capa de todas as
revistas e o clima da história - pesca, veleiro, topless, patins, festas e juventude -
envolveu imediatamente o grande público numa atmosfera de euforia. A maioria das
novelas começa por baixo e leva quase dois meses para decolar.
Mas como será a cabeça do autor de Água Viva? Para descobrir isso, como se faz um
noveleiro de sucesso e o que acontece por trás das câmeras, o editor Ruy Castro
passou dois dias inteiros no amplo apartamento de Gilberto Braga no Flamengo, no Rio
- teto preto, spots aparentes e uma estante cheia de livros sobre o cinema americano.
"Eu já conhecia o Gilberto desde que ele era crítico de teatro, no início dos anos 70, e
ainda se assinava Gilberto Tumscitz. Perguntei-lhe por que tinha mudado para Gilberto
Braga", diz Ruy.
"Braga é o sobrenome de minha mãe”, respondeu Gilberto. "Mas só mudei para facilitar
as chamadas de áudio na televisão. Ia ser difícil o público entender: 'Uma novela de
Gilberto Tumscitz, dirigida por Ziembinsky e estrelada por Sura Berditchevsky e Ísis
Koschdoski'. Não ia vender bem, ia?"
E Gilberto Braga gosta de vender bem o seu produto.
PLAYBOY - O incrível sucesso de Água Viva fez de você a maior revelação de escritor
de televisão em muitos anos. Por que aparecem tão poucos bons autores de novela?
GILBERTO BRAGA - Deve ser porque é difícil escrever novela, não? E além disso é
muito chato escrever uma história que tem de durar 150 capítulos e te obriga a produzir
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vinte laudas por dia, trabalhando a noite toda, acordando às 3 da tarde, sem ir ao
cinema, sem ir ao teatro. É desumano. Outro dia eu li uma entrevista do Carlos
Eduardo Novaes dizendo que, depois de Chega Mais, ele não quer escrever outra
novela, porque não tem visto a mulher dele e tal. Eu entendo. E, se olhar para a minha
cara, você vai ver que eu estou arrasado, física e psicologicamente.
PLAYBOY - Parece em bom estado de conservação. Mas como seria a estrutura ideal
de novela para você? Noventa, cem capítulos, ou seja, três ou quatro meses no ar?
GILBERTO - Não. Eu tenho a impressão de que, pelo menos por enquanto, vai ter que
continuar assim, porque acho que o público prefere novela longa. Ele demora muito a
se ligar na novela, principalmente as classes B e C.
PLAYBOY - Mas com as suas não acontece isso. O público adorou Água Viva desde o
começo.
GILBERTO - É. Com as minhas não. Talvez porque eu tenha uma boa audiência na
classe A, e classe A se liga mais depressa. Mas o grosso dos telespectadores só
começa a se interessar depois de um mês da novela no ar. Eu sinto isso na minha
casa, pela minha cozinheira, que só fica ligadona a essa altura. Comigo é o contrário,
porque eu só acho muito interessantes os primeiros capítulos e, quando o público
começa a gostar, eu já estou cansado, estou noutra e não queria mais estar
escrevendo aquilo.
PLAYBOY - Então por que continua? Por dinheiro?
GILBERTO - É claro que dinheiro é superimportante na minha vida, mas dizer que eu
faço televisão por dinheiro seria uma simplificação. Tem outras coisas também. A
sensação do sucesso é muito boa e eu lamento minha mãe não estar viva, porque ela
adoraria. É ótimo quando, depois de um capítulo bom, o telefone não pára, os amigos
ligam para dizer que gostaram daquela frase ou daquela cena.
PLAYBOY - Seja como for, dinheiro é muito importante na vida dos seus personagens,
não?
GILBERTO - Demais! Eu acho um saco o quanto se fala em dinheiro em Água Viva.
[Risos.]
PLAYBOY - Você tinha algum preconceito cultural contra a televisão no tempo em que
era crítico de teatro?
GILBERTO - Preconceito, não tinha, não. Problema em relação ao veículo eu tenho até
hoje, e só estou conseguindo superar um pouquinho com o meu vídeo-cassete. Me
grila muito esse negócio de ter que ver alguma coisa numa hora que escolheram para
mim. Mas isso não tem a ver com preconceito, e sim com liberdade. Eu não era um
espectador de televisão. Não era mesmo, não via nada. Uma dúvida que eu nunca vou
resolver na minha cabeça é a de que, caso não tivesse entrado para a televisão, se
algum dia eu seria espectador de televisão. Eu sempre me pergunto se veria Água Viva
se não fosse o autor. Tenho a impressão de que, vendo, eu ia gostar, ia achar
interessante. Mas não teria saco para ligar toda noite às oito horas. Há muito mais
coisas para fazer.
PLAYBOY - Suponhamos que a maioria dos telespectadores não tenha tantas coisas
para fazer.
GILBERTO - Pois é. Talvez isso tenha a ver com o fato de eles preferirem novela
longa. Essa gente tem tão poucas opções de vida que precisa conviver durante seis
meses com personagens que eles amam ou odeiam, mas que fazem parte da vida
deles. Se as novelas fossem mais curtas, eles iam perder essa convivência e, até se
acostumarem com uma nova família de personagens, seria trágico para eles. Pode ser
isto, sim.
PLAYBOY - Como se explica que Água Viva tenha dado 80 pontos no Ibope logo no
primeiro mês?
GILBERTO - Acredito que foi porque entrou numa época favorável, logo depois de uma
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novela que não era muito amada, como Os Gigantes, e então o público devia estar com
vontade de ver alguma coisa interessante. Porque, em geral, é o contrário. Depois de
um grande de sucesso, como Dancin’ Days, por exemplo, o público pensa assim: "Ah,
não vou mais ver novela, porque me atrapalha o jantar ou chega uma visita e eu não
posso conversar por causa da novela, e não sei o quê". As pessoas ficam com
sentimento de culpa por não estarem fazendo outra coisa, por se sentirem escravos.
Mas aí entra a novela seguinte e, como eles não têm opções, não resistem e vêem até
o capítulo 150. Mas não vamos ser modestos demais: eu acho que o sucesso de Água
Viva tem muito a ver também com a qualidade da novela. Ela é viva, os personagens
são interessantes.
PLAYBOY - Como se cria uma novela como Água Viva?
GILBERTO - No meu caso, eu começo por uma boa lista de personagens e de atores,
uns cinco ou seis. Depois vou fazendo outros personagens que tenham a ver com eles,
quer dizer, pai, mãe, tios, irmão, namorada. Dai em diante, vou criando situações até o
último capítulo, numa redundância que possa manter o público interessado. Porque
novela é isso mesmo: é redundância, é encher lingüiça, tem que inventar pra cacete...
PLAYBOY - Você não faz uma idéia muito boa das novelas...
GILBERTO - Faço sim! Além disso, encher lingüiça pode ser uma coisa muito
agradável.
PLAYBOY - Bem, aí você reúne esses personagens numa sinopse que você submete à
Globo, ou já aconteceu de a Globo te dar uma dica: "Olha, vamos fazer uma novela
bem pro alto ou bem dramática"?
GILBERTO - Já aconteceram as duas coisas. Na minha primeira novela, a idéia geral
foi da Globo. O Daniel Filho, que era o diretor geral das novelas, queria uma história de
herança, me deu uma ideinha e surgiu A Corrida do Ouro, que eu escrevi junto com o
Lauro César Muniz. Nas novelas seguintes, as idéias foram minhas. Claro que isso tem
muito de intuição, e é mais ou menos óbvio que, depois de uma novela mais pra baixo
como Os Gigantes, tinha de sair uma bem pro alto. No caso de Água Viva, eu não
conseguia entregar uma história definitiva, só esboços. Eu tinha os dois irmãos, Nelson
e Miguel, tinha a Lígia, mas o resto estava obscuro. Eu não sabia se o Nelson devia ser
irmão bastardo, se começava rico ou começava pobre. Aí a gente discutiu com o Boni e
surgiu a idéia do barco e da pesca, porque nós já tínhamos Angra dos Reis. Aliás, a
idéia do veleiro foi do Daniel Filho, que me disse: “Ah, você vai gostar de veleiro! Você
não lembra quantas vezes o Humphrey Bogart comeu a Lauren Bacall num veleiro?"
[Risos.]
PLAYBOY - Quando você cria um personagem, você tem em vista um ator para ele ou
isso não chega a ser uma preocupação?
GILBERTO - Eu sempre tenho em vista um ator, só que nem sempre é esse ator que
vai fazer o papel. O ideal seria fazer o contrário. Em Água Viva, por exemplo, em que
quase todos os papéis foram criados em cima dos atores, um dos que mais funciona é
justamente o único que foi escrito sem ator definido: a Lurdes. A Tônia Carrero chegou
a gravar, depois houve uma troca de papéis e a Lurdes acabou sendo a Beatriz Segall,
que hoje é uma das melhores da novela.
PLAYBOY - Água Viva tem nada menos que 55 personagens com falas. Como é que
você faz para não se perder no meio da novela e misturar características de
personagens?
GILBERTO - Bem, eu não posso ir pela memória, porque não tenho muita. Eu vou pelo
grande dom que eu acho que está me ajudando a vencer na vida, e que é o ouvido. Eu
tenho muito ouvido. Eu vou muito no tom do ator que está fazendo o papel e, quando
estou escrevendo, quase ouço ele falando, como se ele estivesse ditando a novela
para mim.
PLAYBOY - Acontece às vezes de certos atores recusarem pegar determinados
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concluo: "Não, não dá. Às 8 horas da noite não dá". Não é preciso ninguém da TV
Globo vir me dizer, eu mesmo sei. Talvez daqui a uns dez anos possa.
PLAYBOY - Talvez a insistência nessa pergunta se deva ao fato de a televisão sem
censura ainda não ter sido testada no Brasil. Como seria essa televisão para você?
GILBERTO - Isso é uma coisa que eu queria ver, porque, para mim, mais censor do
que a censura é o próprio público. Eu peguei o tempo da censura braba, agora esse
tempo passou e o público continua extremamente reacionário. Gente sem informação,
de baixo poder aquisitivo, tem sempre os valores mais antigos possíveis. Mesmo a pior
censura, como a do tempo do Medici, não chegava a ser tão reacionária quanto a do
público. Então, se a televisão for estatal e eles não tiverem outro canal para escolher,
tudo bem. Mas, enquanto a televisão for comercial e tiver anúncio, você vai ter sempre
um problema grave com o público. Em Água Viva, por exemplo, a censura não cortou
muita coisa, a não ser expressões como "pombas!" e "puxa-saco". Em compensação,
teve gente que escreveu para o Jornal do Brasil dizendo que a novela é anticristã, que
eu preciso ler o Evangelho e que eu estou destruindo a família brasileira.
PLAYBOY - Isso o preocupa de alguma maneira?
GILBERTO - Me preocuparia se eu estivesse mesmo tentando destruir a família
brasileira. Mas, como eu sou muito careta nesse ponto e acredito totalmente nos
valores familiares, não me preocupa nem um pouco.
PLAYBOY - A censura já o incomodou diretamente?
GILBERTO - Não, a censura nunca encheu o meu saco porque eu sempre fui muito
autocensurado. Talvez eu fique louco daqui a uns dez anos, de bloquear tanta coisa
dentro de mim. Quando comecei a escrever A Escrava Isaura, fui chamado a Brasília
para conversar, porque eles achavam a novela perigosa. Então, na reunião com
censores, ficou mais ou menos estabelecido que eu poderia escrever A Escrava Isaura,
mas que não poderia falar de escravo. Uma censora me disse que a escravatura tinha
sido uma mancha negra na história do Brasil, e que não deveria ser lembrada - aliás,
segundo ela, o ideal seria arrancar essa página dos livros didáticos; imagine então falar
disso na novela das seis...
PLAYBOY -... para criancinhas desprevenidas...
GILBERTO - É. Um censor falou que a novela podia despertar sentimentos racistas na
netinha dele, porque ela via os brancos batendo nos escravos na televisão e podia
querer bater nas coleguinhas pretas dela. Aí eu disse ao censor que ele devia ver um
psicólogo para a menina porque, se ela se identificava assim com os bandidos... De
qualquer maneira, eu prometi que ia falar o mínimo possível em escravo e falei o
mínimo possível em escravo em A Escrava Isaura. [Risos.]
PLAYBOY - Algum problema quando a Tônia Carrero transou com um negro em Água
Viva?
GILBERTO - Não, porque a censura está muito mais aberta agora, né? De qualquer
maneira, eu não sei a quem possa fazer mal uma senhora de 60 anos transando com
um negro numa novela. É que a gente está tão acostumada a que não pode nada que,
às vezes, as coisas mais naturais a gente acha que não pode e, quando vai ver, pode.
PLAYBOY - Você não se sente um tanto limitado por não poder sequer insinuar que,
quando um casal está "namorando" na novela, eles estão efetivamente trepando?
GILBERTO - Não. Eu fui criado dentro de uma estética cinematográfica dos anos 50,
imposta pelo macarthismo, e não tenho dificuldade nenhuma em fazer isso. Essa
limitação continua até hoje porque nem em Emmanuelle você vê o peru sendo enfiado -
só se vê isso em filme pornô, clandestino. De qualquer maneira, se eu fizer uma cena
de gente não casada num quarto com cama, não passaria na censura. Mas eu estou
contente porque agora os casados já podem...
PLAYBOY - Você diria que, embora a televisão não te imponha nada, há uma série de
regras não escritas a respeito de temas em que não se pode tocar?
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GILBERTO - Talvez, mas a gente sabe lidar com regra não escrita, né?
PLAYBOY - Ninguém tem interesse em ir minando aos poucos essa resistência?
GILBERTO - Todo mundo tem esse interesse, tá todo mundo tentando, e eu sou um
deles. Como é que eu posso garantir, por exemplo, que a Lurdes não chupa o Marcos,
filho dela?
PLAYBOY - Chupa?
GILBERTO - Não sei, não sei... Não posso garantir que não. O que eu vejo na novela é
que ela é muito sacana e ele é muito carinhoso com ela... [Risos.] Mas eu não posso
nem mostrar um adultério bem bonitinho, com final feliz, para defender a coitada da
amante, que é sempre sacaneada. Isso eu gostaria de fazer: defender a outra.
PLAYBOY - E por que não faz?
GILBERTO - Porque não pode. Que eu saiba, não pode.
PLAYBOY - E divórcio, pode?
GILBERTO - Ah, divorciar pode à vontade. Só não pode mostrar as causas normais
que levam ao divórcio, entende? A partir do momento em que os personagens já estão
separados, podem ter uma vida sexual normal. Mas, enquanto estão casados, não
podem nem olhar para outra pessoa, porque é considerado pernicioso...
PLAYBOY - Homossexualismo em novela também é considerado pernicioso?
GILBERTO - Nunca vi homossexualismo em novela, não.
PLAYBOY - Você mesmo já fez. O Everaldo, personagem de Dancin' Days, não era
homossexual?
GILBERTO - Ah, sim! Mas era tão em nível de comédia que eu nem me toquei que
estava tratando de homossexualismo. E, naquele tempo, a censura era violenta, mas
ninguém reclamou.
PLAYBOY - Quer dizer que, em nível de comédia, pode?
GILBERTO - O Everaldo não ameaçava a moral de ninguém, assim como o Clóvis
Bornay também não ameaça. Eu já vi mães pedindo autógrafo ao Clóvis Bornay,
dizendo: "Ah, dá aqui pro meu filho, dá!" E ele bem desmunhecado e tal, era muito
engraçado. Acho que a bichona não ameaça a moral de ninguém.
PLAYBOY - Então, pode-se concluir que, se você inventasse um personagem que
fosse um homossexual sensível, sofrido, com problemas, e que discutisse esses
problemas com os outros personagens, não passaria?
GILBERTO - Acredito que não. Porque, se foi cortada de Água Viva a única alusão um
pouquinho mais clara de que a Janete não era virgem... a fala foi cortada!... Então, se
não pode não ser virgem, claro que também não pode ser homossexual.
PLAYBOY - Mas pode ser viado.
GILBERTO - É, pode ser bichona. Não sei, varia muito, depende do grupo de censores.
A censura não é uma coisa tão organizada como a gente supõe.
PLAYBOY - E, no entanto, o homossexualismo é um dado da realidade que as pessoas
ainda costumam discutir, não?
GILBERTO - Talvez. Mas o tesão que eu sinto para escrever sobre isso é mesmo que
eu sentiria se escrevesse aquela história do adultério. É o tesão da dramaticidade.
Daria cenas melodramáticas incríveis, como a da amante desprezada, sozinha, na
noite de 31 de dezembro. Ou essa mesma situação com homossexuais que chocariam
as pessoas quando começassem a se beijar na boca numa festa de réveillon, por
exemplo.
PLAYBOY - Você tem percebido um aumento grande do homossexualismo feminino
neste país, ultimamente?
GILBERTO - Não sei, mas tenho ouvido dizer que não. Pode parecer que está
aumentando porque hoje elas usam o sapato na frente de todo mundo, e antes era
mais escondidinho.
PLAYBOY - E não é uma pena que o mundo da novela deixe de fora todos esses
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assuntos?
GILBERTO - Mas é como eu disse: eu não fico me lamentando porque não pode isso
ou aquilo. Eu prefiro ficar contente porque já pode isso ou aquilo.
PLAYBOY - Um dos motivos pelos quais você é considerado um renovador da novela é
que os seus personagens femininos, como a Júlia de Dancin' Days e a Lígia de Agua
Viva são sempre mulheres fortes, decididas, que botam pra quebrar. Isso é
premeditado?
GILBERTO - Não, não acho que seja. É que eu escrevo mulheres melhor do que
homens.
PLAYBOY - E por que a maioria dos seus personagens masculinos são homens frágeis
e supersensíveis!
GILBERTO - Quais, por exemplo?
PLAYBOY - O Cacá de Dancin’ Davs, o Nélson e o Edir de Água Viva...
GILBERTO - O Edir é frágil, mas menos do que a mulher dele. E o Nélson foi bolado
pra isso, pra ser o irmão frágil do Miguel.
PLAYBOY - Você se acha frágil?
GILBERTO - Não, não me acho frágil, não. Mas eu tenho um lado frágil, como tenho
um lado forte. O Nélson e o Miguel devem ter partido de alguma divisão minha: o
Gilberto forte, o Gilberto fraco, o Gilberto que venceu, o Gilberto que perdeu...
PLAYBOY - Seja como for, nenhum desses personagens é o machão tradicional, como
os que o Tarcísio Meira costuma interpretar.
GILBERTO - Mas só porque eu não sei fazer. Eu acho ótimo o machão tradicional,
como o Rhett Buttler de ...E o Vento Levou, mas todas as vezes em que eu tentei fazer,
saiu uma merda. Eu sempre fui mais para aquela linha do herói fraco, como os que o
Montgomery Clift fazia, e que são a antítese do machista.
PLAYBOY - Você acha que o machista é uma espécie em extinção?
GILBERTO - Acho. Está havendo uma transformação na cabeça dos caras, e talvez
isto se deva à cultura, né?... ao fato de o mundo andar pra frente.
PLAYBOY - Não será talvez o comportamento das mulheres que estará levando os
homens a rever as posições deles?
GILBERTO - Pode ser. Há as feministas, há muitas mulheres independentes por aí, eu
mesmo sou amigo de um monte delas.
PLAYBOY - Antigamente havia uma pressão para o homem ser o machão inflexível.
Não estará havendo hoje uma pressão ao contrário, para o homem assumir a sua
"porção mulher" e "transar o corpo numa boa", como foi proposto pelo Fernando
Gabeira?
GILBERTO - Toda ação provoca uma reação em sentido contrário, não? A gente
aprende isso no colégio...
PLAYBOY - Uma conseqüência natural para o homem que assuma tudo isso não será
o bissexualismo?
GILBERTO - Esse é um assunto que eu não vejo com muita clareza. Tenho alguns
amigos bissexuais que eu sinto dificuldade de entender. Na minha cabeça, a tendênda
mais espontânea é achar que eles estão divididos e que vão acabar pendendo para um
lado ou para outro. Acho difícil alguém gostar de homem e de mulher ao mesmo tempo.
Já com o bissexualismo feminino é diferente, porque eu conheço mulheres que gostam
de homem e de mulher ao mesmo tempo.
PLAYBOY - Você já participou de alguma orgia ou suruba?
GILBERTO - Já. Várias vezes, mas há muito tempo. Houve até uma época em que eu
participava bastante, mas suruba sempre me deu uma certa frustração, porque eu não
sou surubeiro por temperamento. Ficava sempre a impressão de que havia alguém ali
por quem eu tinha mais tesão do que pelos outros e aí eu queria me concentrar nessa
pessoa. Mas numa suruba não dá pra se concentrar, porque tem muita gente na cama.
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Além disso, para quem gosta mesmo de suruba, tem que ser na base de número
ímpar. Não dá certo com quatro, nem com seis, nem com oito pessoas, porque acaba
casal com casal. Quem curte mesmo tem que ir com três, com cinco ou com sete.
PLAYBOY - Das que você participou, havia mais homens ou mais mulheres?
GILBERTO - Acho que a tendência é ter mais mulheres, mas, embora eu não saiba
explicar, sinto que os homens gostam mais de suruba do que elas. Porque, em geral, é
homem quem organiza, não?
PLAYBOY - O que você achou dessas experiências?
GILBERTO - Eu nunca saí de uma suruba achando que tinha sido satisfatória. Quer
dizer, eu sempre gozei, mesmo que tivessem me jogado pra escanteio. Tinha pelo
menos uma satisfação primária. Mas no fundo eu vivia com uma nostalgia da relação a
dois, que é o que a minha cabeça prefere. Então eu entrei numa mais romântica e saí
desse esquema.
PLAYBOY - Você tem algum problema de culpa em relação a sexo?
GILBERTO - Tenho. A minha cabeça não aceita bem poligamia.
PLAYBOY - E gostaria de aceitar?
GILBERTO - Não sei se seria uma boa pra mim.
PLAYBOY - Você também não gosta de ser passado pra trás?
GILBERTO - Não. Eu tenho todos os problemas do machão brasileiro.
PLAYBOY - Não é interessante você, que é o biógrafo desse "novo homem” brasileiro,
antimachista, ter um problema típico do machismo?
GILBERTO - Claro que é interessante. E é claro também que eu tenho que ter
problema de machismo, quem é que não tem? A gente foi educada por esse esquema.
Todos os homens e mulheres que eu conheço são machistas.
PLAYBOY - As mulheres também?
GILBERTO - Extremamente. Às vezes até mais do que nós. Eu acho o feminismo um
negócio muito legal, que eu defendo pra cacete, mas a gente vai ter que lutar muito
para chegar lá, porque vivemos num sistema machista.
PLAYBOY - Quais as mulheres de Água Viva que têm comportamento extremamente
machista?
GILBERTO - Quase todas as de classe média e de meia-idade. A mãe da Janete, a tia
da Janete, deixe eu ver quem mais... Pô! Quer coisa mais machista do que a família
pressionando a moça para casar com um rapaz rico porque só casamento é solução de
vida? Ninguém nunca pensou na hipótese remota de aquela moça transar a vida dela
numa boa. É machismo isso, não?
PLAYBOY - Engraçado como o casamento é um dos temas favoritos de novela. O que
esses personagens casam e descasam não é normal. Ou é?
GILBERTO - É. Eu acho, inclusive, que, na vida real, os casamentos estão muito
melhores do que antigamente, na medida em que hoje acontecem mais separações. As
pessoas estão se sentindo um pouquinho menos culpadas quando não dá certo. E,
quando elas sentem que, se errarem, vão ter uma chance de partir pra outra, passam a
ter menos medo do casamento. Aquela história do "até que a morte nos separe" era
uma violentação, um compromisso de doido. Porque, se você se compromete a ter o
mesmo parceiro até a morte, você não está se permitindo o erro. E, não se permitindo
o erro, você está fodido.
PLAYBOY - Por que tanta ênfase?
GILBERTO - Porque eu sou traumatizado por ser filho de um casamento ruim que se
manteve até o fim. E tomei muita porrada na vida para não ter ficado assim tão pró-
separação.
PLAYBOY - Que grilos isso deixou na sua formação?
GILBERTO - Os grilos na minha formação foram as relações dos meus pais entre si,
não as deles comigo. Eles fizeram pressão para que eu me tornasse diplomata ou
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militar, mas quando eu disse que não queria ser uma coisa nem outra, desistiram. Mas,
com isso, eu tive um problema de identificação profissional que custou a se resolver.
Demorei a entender que tinha de usar profissionalmente o meu interesse natural, que
era o cinema, o teatro e a leitura. Fiquei perdidão, um tempo, fui professor de francês
durante cinco ou seis anos, fìz vestibular para o Instituto Rio Branco e comecei até a
fazer curso de Letras na PUC, que abandonei porque achava chato pra cacete. Eu não
tinha saco pra estudar José de Alencar nem meia hora. Anos depois, quando adaptei
Senhora para a televisão, às vezes ficava sem idéias e tinha de abrir o livro para
procurar alguma coisa, e aquilo quase me matava de tédio. Aí, finalmente, fui ser crítico
de teatro de O Globo e, depois, pintou a televisão.
PLAYBOY - Voltando aos seus pais, eles reprimiam a sua sexualidade de alguma
forma?
GILBERTO - Meu pai morreu quando eu tinha 17 anos e minha mãe se matou louca
quando eu tinha 27. Se havia algum problema sexual dentro de casa era o dela. Aquele
negócio de insistir em ser a viúva virgem, de querer dar e não ter coragem, de achar
que tinha de casar para dar... Na história da minha vida, não teve muita repressão
sexual, não.
PLAYBOY - E hoje, tem alguma?
GILBERTO - Ao nível consciente, acho que não, mas é muito difícil garantir isso. Tanto
que estou fazendo análise há seis anos, desde que minha mãe morreu.
PLAYBOY - A morte de sua mãe parece ter sido decisiva para você. Dá para falar a
respeito?
GILBERTO - Dá, mas já contei quase tudo em Dancin’ Days. Só mudei o final porque
não tive coragem de contar tudo. Depois que meu pai morreu, ela ficou com
características de psicose maníaco-depressiva. Mas só teve as fases de depressão,
nunca teve a fase maníaca. Esteve várias vezes internada, sofreu tratamento à base de
choques elétricos, saía da clínica numa boa, ficava assim uns tempos, depois voltava,
saía de novo e, numa dessas, jogou-se pela janela do nosso apartamento em
Copacabana. Foi uma coisa que eu nunca pude aceitar. A Áurea de Dancin’ Days foi
toda baseada nela. A Janete Clair, que entende tanto de novela e de vida, leu a
sinopse de Dancin’Days e disse pra mim: "Ah, a Áurea não vai poder se jogar pela
janela. Primeiro, porque a barra vai ser violenta e você não vai agüentar. Segundo,
porque o público não vai aceitar ficar sem a Áurea". E, realmente, a Áurea acabou
numa boa... [Risos.]
PLAYBOY - De certa forma, a personalidade da sua mãe interfere até hoje nos seus
personagens femininos, não?
GILBERTO - Deve interferir muito. Minha mãe tinha todo esse problema de ter parado
de estudar, de não ter uma profissão, por causa do casamento. E o casamento era
ruim. Quando meu pai morreu, ela pegou uma barra mais pesada do que era na
realidade, não resistiu e se matou. Claro que isso tem muito a ver com a força que eu
dou para as mulheres na novela, não é?
PLAYBOY - É por isso que todas as mães que você cria são supermães?
GILBERTO - Eu não sei se todas são supermães, mas a única coisa que faz com que
os telespectadores não pensem que o personagem de Lígia é o demônio é aquela
transa com o filho. Até a Danusa Leão reclamou comigo outro dia: "Ih, esse negócio de
puta com filho pra cá, filho pra lá, tou achando muito chato!” Mas tem personagens que
não são supermães, e talvez isso seja uma idealização minha a respeito de uma mãe
que eu gostaria de ter tido. Em Água Viva, essa mãe é a Estela.
PLAYBOY - A Estela, interpretada por Tônia Carrero, é uma mulher rica. Você era
pobre?
GlLBERTO - Ah, era pobre, pobre, pobre, de marré de ci. Pobre da rua Miguel Lemos,
em Copacabana.
NOVELA DAS SEIS 15/28
pelo resto da vida. A Globo bancou O Bofe, do Bráulio Pedroso, O Rebu, também do
Bráulio, e, pelo que sei, havia coisas geniais nessas novelas e elas estiveram longe de
ser fracasso.
PLAYBOY - Porque, se fossem...
GILBERTO - Ah, mas aí, também, você não acha que está certo? Alguém vai fazer
uma novela pra ninguém ver?
PLAYBOY - Qual é o piso de Ibope que uma novela pode dar sem que ninguém se
sinta ameaçado?
GILBERTO - Não sei, mas acho que a Globo não agüentaria produzir Água Viva, por
exemplo, se ela desse só 40 ou 50 de Ibope. Os custos são muito altos.
PLAYBOY - Quer dizer que, falando português claro, existe a ditadura do Ibope na sua
cabeça?
GILBERTO - Mas eu acho que essa ditadura vai existir mesmo que eu saia da televisão
e vá fazer teatro, cinema ou qualquer outra coisa. Porque eu vou estar sempre
preocupado com o sucesso, com o dinheiro e com agradar. Eu raciocino muito com a
TV Globo, porque eu quero mais ou menos a mesma coisa: que gostem da novela...
PLAYBOY - Ou seja: você não conseguiria jogar sem regras?
GILBERTO - Não. É assim: "Me diz quais são as regras que eu faço direito".
PLAYBOY - Outra coisa: por que personagem de novela bebe tanto? Ninguém bebe
assim na vida real.
GILBERTO - Bebem tanto assim em Água Viva? Eu não tinha notado. Acho que é
muito pra facilitar a marcação dos atores, não é? Quantas horas de cena você acha
que se passaram na sala da Lígia? Então, como os atores não podem plantar
bananeira, o diretor manda eles pegarem um copo, prepararem um uísque, sei lá.
PLAYBOY - Se essa marcação quisesse estar mais próxima da realidade, você não
acha que eles deveriam estar enrolando um charo?
GILBERTO - Não, porque os meus personagens não fumam maconha.
PLAYBOY - E você, fuma?
GILBERTO - Olha, eu acredito que seria bom que legalizassem a maconha, embora
eu, pessoalmente, tenha muito bloqueio em relação a drogas, inclusive bebida. Mas,
em Nova York, onde eu passei dois meses antes da novela, eu senti que, depois da
legalização, as pessoas estavam fumando menos - mais abertamente, mas fumando
menos. Eu já fumei algumas vezes e, há muito tempo, me deu um efeito assim
parecido com o de ficar de pileque. Mas muito breve, porque eu me bloqueio, porque
tenho medo de ficar dependente. Eu já fico puto de ser dependente de cigarro. Mas,
mesmo assim, não gostaria que proibissem o cigarro. Eu sou contra qualquer proibição.
PLAYBOY - O que leva as pessoas a tomarem drogas, na sua opinião?
GILBERTO - Escapismo, não? Deve ser a mesma coisa que me leva a dormir muito...
PLAYBOY - E você está tentando escapar de quê?
GILBERTO - De enfrentar a realidade, eu acho...
PLAYBOY - As novelas não seriam outra forma de escapismo?
GILBERTO - É provável que elas tenham esse lado também, mas, ao mesmo tempo,
as pessoas querem ter emoções fortes. Será que ter emoções fortes é uma atitude
escapista?
PLAYBOY - Você acha que o público pega tudo que você tenta passar na novela?
GILBERTO - Não sei. Outro dia, eu escrevi uma fala para o personagem da Lucélia
Santos em que ela devia dizer: "Isto aqui não é convento de carmelitas, não!" Mas acho
que o datilógrafo comeu uma sílaba de "convento” e saiu "conto". Aí a Lucélia disse no
ar "conto de carmelitas" e todo mundo achou muito natural, ninguém estranhou nada!
[Risos.]
PLAYBOY - Você não faz uma idéia muito boa da inteligência dos atores.
GILBERTO - Faço sim! Eu acho que eles são inteligentes e sensíveis pra cacete. Mas
NOVELA DAS SEIS 15/30
o que eles têm que decorar não tá no gibi. Já me perguntei várias vezes se seria
possível fazer novela nos Estados Unidos e concluí que não, porque, nos Estados
Unidos, os sindicatos não permitiriam que eles trabalhassem tanto.
PLAYBOY - Por falar no personagem da Lucélia, por que todas as mulheres jovens da
novela são agressivas, despachadas, ativas?
GILBERTO - Ativas elas são. Mas, agressivas, nem todas. O personagem da Lucélia é
agressivo, mas o da Glória Pires nem um pouco. E o da Natália do Vale também não.
Há um equilíbrio entre agressivas e não-agressivas.
PLAYBOY - Você diria que, na vida real, está havendo uma tendência das mulheres a
se tornarem mais ativas e agressivas do que eram?
GILBERTO - Num certo nível social, ou no meio que eu freqüento, acho que sim. Em
geral, eu acho que não, o que é uma pena.
PLAYBOY - Você preferiria que elas fossem?
GlLBERTO - Preferiria. Eu acho que as mulheres foram muito sacaneadas no curso da
história. Que se agitem!
PLAYBOY - Você acha que, à medida que elas se agitam e ficam mais agressivas, ou,
digamos, menos passivas, o homem tende a se assustar?
GILBERTO - Homem de cabeça boa gosta de mulher livre e ativa, porque assim ele
divide mais as coisas com ela. Quem tem a cabeça boa não está a fim de controlar
mulher, não. Está mais é a fìm de uma relação equilibrada.
PLAYBOY - Bem, hoje você é um sucesso, não? Água Viva deverá dar 90 pontos no
Ibope neste último mês. E, como você sempre quis ser um sucesso, isso não o deixa
super-realizado?
GILBERTO - Eu nunca pensei em me olhar no espelho e dizer: "Eu sou mais eu!" Em
geral, eu penso: "Tou chegando lá, tou ficando contente!"
PLAYBOY - E aonde você quer chegar?
GILBERTO - Pragmaticamente, eu estou planejando a minha vida até meados do ano
que vem, mais ou menos. Estou pensando em escrever um filme, estou pensando na
minha próxima novela na Globo, e gostaria que os dois fossem sucessos. Ao nível da
fantasia, eu gostaria de chegar à fama internacional. Com que, não sei. [Risos.] Quero
fazer um trabalho que repercuta no mundo inteiro, de preferência nos Estados Unidos.
E quero que pinte mesa em qualquer restaurante de lá na hora, porque esperar meia
hora de pé na fila é muito chato. Para dizer a verdade, eu não quero ser reconhecido
no Régine's, no Rio. Eu quero ser reconhecido é no Elaine's em Nova York.
PLAYBOY - Uau! Bem, agora a pergunta óbvia: como termina Água Viva?
GILBERTO - Você pode ter certeza de que vai terminar com o final mais feliz possível -
nem que a Lígia tenha de acabar com o Nélson.
in "Playboy"