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IGHOR FITZNER

NUTRIÇÃO
RAIZ

Baseado em evidência científica

Sem Sem Sem


achismo terrorismo enrolação
NUTRIÇÃO RAIZ IGHOR FITZNER

Uma leitura voltada tanto para profissionais como para


estudantes e amantes de nutrição. Uma mistura de informações
atualizadas usando sempre a evidência científica como base.
PARTE 1

Seja mais crítico

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NUTRIÇÃO RAIZ SEJA MAIS CRÍTICO

NÃO ACREDITE EM
TUDO QUE OUVE
Essa primeira parte foi pensada no posicionamentos diferentes diante de
intuito de levar você, como leitor, a um mesmo tema. Isso ocorre porque
questionar mais as coisas que são vistas nem todo mundo sabe ler um artigo
e ouvidas e não apenas aceitar qualquer científico. Mas eu ainda acredito que
argumento supostamente baseado em isso se dá mais por conta que muitos
ciência, apenas porque o indivíduo não abrem mão de suas crenças e
disseminando a informação é um conceitos, mesmo que deparados com
profissional da área x e possui títulos novos achados. Afinal, outra coisa
acadêmicos atraentes. Nessa área da muito comum é profissionais não
saúde é comum encontrar profissionais serem nada profissionais. Por fim, é
picaretas que apresentarão uma solução necessário entender que todo estudo
sofisticada para todos os seus problemas, apresenta um contexto específico para
até porque você está como está pois o qual foi feito e limites potenciais no
nunca passou pelo método do Doutor que diz respeito à generalização de
ciclano. É comum encontrar profissionais situações similares. Logo, dedicarei
que demonizam comida, assim como é essa primeira parte pra trazer luz em
comum encontrar os que adotaram para como ler de forma mais crítica um
si uma dieta de estimação. É comum artigo científico, te dando alguns
profissionais dizerem que existe estudo toques valiosos, para que assim, você,
para tudo, e que cada um acredita no ao contrário de muitos, esteja pela
que quer, visto que, certamente, você já ciência e não pelo ego. Para isso, eu
viu profissionais da área da saúde terem preciso te fazer uma pergunta antes...

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NUTRIÇÃO RAIZ SEJA MAIS CRÍTICO

VOCÊ PULARIA DE UM AVIÃO


SEM USAR PARAQUEDAS?
Por mais óbvio que seja a resposta para trolado randomizado”, esse estudo é,
essa pergunta, saiba que talvez nem na verdade, uma crítica e ao mesmo
tanto. Eu fiz essa pergunta porque tempo uma aula. Uma aula sobre
gostaria de comentar sobre um estudo como ler um artigo científico. Alerta
de 2018 que se propôs a avaliar a eficácia de spoiler: utilizando de um método
dos paraquedas em diminuírem a chance de padrão ouro, o resultado do
de fatalidade ao pular de um avião. Você estudo é de que não houve diferença
pode questionar a relação disso com estatística significante no desfecho
nutrição ou com essa primeira parte, e entre o grupo que utilizou
eu posso afirmar: tudo. Embora o título paraquedas e o que não utilizou.
do estudo seja: “Uso de paraquedas na Como isso foi possível ? Bom, antes
prevenção de mortes e traumas graves de responder qualquer pergunta, é
ao pular de uma aeronave: estudo con- necessário entender o contexto dela.

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NUTRIÇÃO RAIZ SEJA MAIS CRÍTICO

SOBRE O ESTUDO

Entre setembro de 2017 a agosto do ano uma média de 0 km / h (DP 0). Sim,
de 2018 foram feitas as seleções dos você não entendeu errado. Os
participantes, separados em dois grupos: participantes pularam de um avião
paraquedas e controle. Os participantes parado, a uma altura de 60 cm, como
preenchiam um consentimento por apresentado na figura 1. Alguns
escrito e assim eram instruídos a pular da parágrafos após esse dado ter sido
aeronave, que variava entre avião apresentado, no primeiro momento
comercial a jato, biplano e um de bom senso aparente, os autores
helicóptero. Os saltos foram feitos em 2 admitem que o estudo também tem
localidades, Massachusetts e Michigan. várias limitações, sendo que a mais
No momento de cada salto, os importante é que essas descobertas
pesquisadores registraram a altitude e a podem não ser generalizáveis ao uso
velocidade da aeronave e realizaram de paraquedas em aeronaves que
uma entrevista de acompanhamento viajam em altitudes ou velocidades
com cada participante para verificar o mais altas. Independente de esse
status vital e registrar quaisquer lesões estudo poder parecer ou soar como
sofridas pela queda livre em cinco uma grande brincadeira, ele é muito
minutos após o impacto no solo, e mais que isso. Na palavra dos autores:
novamente 30 dias após o impacto. o estudo PARACHUTE destaca
Dentre os 92 indivíduos selecionados satiricamente algumas das limitações
apenas 23 permaneceram, já que 69 dos ensaios clínicos randomizados.
deles ou não estavam dispostos a serem No entanto, acreditamos que esses
randomizados ou foram considerados estudos continuam sendo o padrão-
inelegíveis pelos investigadores. Dos 23 ouro para a avaliação da maioria dos
participantes, 12 deles pularam de novos tratamentos. O estudo
paraquedas e 11 com uma mochila vazia. PARACHUTE sugere, no entanto, que
Como já havia mencionado no spoiler, sua interpretação precisa exija mais do
não houve diferença significativa na taxa que uma leitura superficial do resumo
de morte ou lesão traumática grave (abstract). Pelo contrário, a
entre os grupos dentro de cinco minutos interpretação requer uma avaliação
após o impacto no solo (0% para completa e crítica do estudo. Quem
paraquedas v 0% para controle; P> 0,9) nunca teve preguiça de ler um artigo
ou 30 dias após o impacto (0% para e foi direto aos resultados? O
paraquedas v 0% para controle; P> 0,9). problema é que quando fazemos isso,
Ao analisarmos a tabela 1, rapidamente nos sujeitamos a tirar conclusões
entendemos o porquê desse resultado. precipitadas e totalmente fora de
Rufem os tambores. Os participantes contexto. Quando eu primeiro fiz
saltaram de uma altitude média de 0,6 m aquela pergunta sobre saltar de um
(DP 0,1) em aeronaves em movimento a avião sem paraquedas você provável-

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NUTRIÇÃO RAIZ SEJA MAIS CRÍTICO

velmente respondeu de forma imediata pesquisa não são óbvios, mas sim
na sua própria cabeça, mesmo que eu obscuros em termos de aplicação
ainda não tivesse mencionado o prática, o que exige que o profissional
contexto. Você só soube do que se tenha a mente aberta e pratique a
tratava porque te apresentei o estudo “arte da profissão” usando a
como um inteiro. Logo, tenha consigo experiência, o bom senso e o senso
que não existe estudo perfeito. Nenhum comum nas escolhas feitas a partir da
estudo consegue contar a história toda e interpolação ou extrapolação dos
que na maioria das vezes, o estudo achados de pesquisa. E aí, eu retorno
produz mais perguntas que respostas. a te perguntar: Você pularia de um
Assim, muitas vezes, os achados da avião sem usar paraquedas ?

Tabela 1.1 Características dos participantes randomizados em paraquedas versus


controle.

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NUTRIÇÃO RAIZ SEJA MAIS CRÍTICO

Figura 1.1 Foto representativa do salto feito pelos participantes do estudo

Referências:
1. Parachute use to prevent death and major trauma when jumping from aircraft:
randomized controlled trial

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PARTE 2

Álcool:
Fator protetor?

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NUTRIÇÃO RAIZ ÁLCOOL: FATOR PROTETOR?

O IMPACTO DO
ÁLCOOL NA SAÚDE
RISCO CARDIOVASCULAR

O risco relacionado ao consumo que a dose média diária aumenta


excessivo de álcool é amplamente (imagem 2.1). O consumo moderado
conhecido, por mecanismos fisiológicos de álcool é definido, de acordo com o
de aumento da coagulação e redução Dietary Guidelines for Americans,
do limiar para fibrilação ventricular, logo, como o consumo de até 1 dose/dia
não entraremos nessa questão. No (mulheres) ou 2 doses/dia (homens).
entanto, nos últimos anos o consumo de Em termos práticos, uma dose de
álcool tem sido associado à um efeito bebida alcoólica equivale a 355 ml de
cardioprotetor, onde se observa um cerveja, 150 ml de vinho, ou 45 ml de
comportamento de curva em forma de J bebidas destiladas. Muitos desses
para doenças coronarianas, alguns tipos efeitos benéficos do álcool seriam
de câncer e risco de mortalidade por devido seu conteúdo polifenólico e a
todas as causas, onde o risco é reduzido sua capacidade de elevar os níveis de
com o consumo moderado em HDL-C. Primeiramente, é necessário
comparação com a abstenção, seguido entendermos que grande parte da
de um aumento acentuado à medida evidência científica sobre os efeitos

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NUTRIÇÃO RAIZ ÁLCOOL: FATOR PROTETOR?

abstêmios pessoas que já


beberam e que não
bebem mais (pessoas
tendem a diminuir ou até
parar de beber quando
complicações e doenças
surgem), assim como
aqueles que bebem
ocasionalmente, o que
desfavoreceria o público
dos abstêmios. O aparen-
te efeito protetor do
álcool desapareceu em
duas meta-análises
(Fillmore et al., 2007;
Stockwell et al., 2007)
Figura 2.1 Risco de mortalidade e ingestão de álcool quando esse erro de classificação foi
concertado. A meta-análise de
benéficos do consumo moderado de Stockwell et al. selecionou 87 estudos,
álcool é proveniente de estudos e desses, 30 reportaram estimativas
epidemiológicos observacionais e por separadas para homem e mulher.
isso é preciso cuidado ao analisar os Somente 13 desses estudos foram
resultados desse tipo de estudo. Esses considerados como livres de vieses de
estudos observacionais reportaram abstêmios. Em resumo, as análises de
melhoras em inúmeras condições, grupos de estudos de maior
incluindo: surdez, fraturas de quadril, qualidade e livres de vieses de
resfriado, câncer, complicações no parto, abstinência tiveram menos
demência e cirrose hepática com o probabilidade de encontrar evidências
consumo moderado quando de redução do risco de mortalidade
comparados aos abstêmios e abusivos. (ou seja, benefícios para a saúde) em
Esses resultados nos mostram que, baixos níveis de consumo de álcool. O
embora exista bastante estudo padrão dos resultados é mais
observacional mostrando tal correlação, consistente a uma resposta linear a
isso não se traduz em forte evidência de dose do que uma curva em forma de
causalidade, já que um efeito causal para J relacionado ao risco entre o nível de
algumas das associações citadas acima é consumo de álcool e a mortalidade
altamente improvável. Além das por todas as causas. Ainda, de acordo
limitações dos estudos observacionais, com Hansel et al., em vez de um
existe também um problema de efeito benéfico do consumo de álcool.
classificação referente aos grupos. O sobre fatores clássicos ou emergentes
problema mais comum na hora da de risco cardiovascular, devemos
classificação é não separar do grupo dos supor que o consumo moderado de

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NUTRIÇÃO RAIZ ÁLCOOL: FATOR PROTETOR?

álcool é um marcador de nível social morte por doença isquêmica do coração


mais alto, estado geral de saúde superior pode ser obtida de forma mais eficaz por
e menor risco CV. ser fisicamente ativo e comer uma dieta
Compartilho da bela conclusão de mais saudável do que beber uma dose
Mukamal et al.: Uma maior redução na baixa de álcool.

Referências:

1. Effects of Dine, Alcohol and Polyphenols on Cardiovascular Disease Risk Factors:


Evidences from Human Studies
2. Prevention of cardiovascular risk by moderate alcohol consumption:
epidemiologic evidence and plausible mechanisms
3. Alcohol in the European Union Consumption, harm and policy approaches
4. Do “Moderate” Drinkers Have Reduced Mortality Risk? A Systematic Review and
Meta-Analysis of Alcohol Consumption and All-Cause Mortality
5. Relationship between alcohol intake, health and social status and cardiovascular
risk factors in the urban Paris-Ile-De-France Cohort: is the cardioprotective action of
alcohol a myth?

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PARTE 3

Carboidratos:
Nunca mais
confunda

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NUTRIÇÃO RAIZ CARBOIDRATOS: NUNCA MAIS CONFUNDA

O QUE É, O QUE É?
NASCE A SOCOS
E MORRE A FACADAS.
SIMPLES E COMPLEXO

Caso não tenha ficado claro, a resposta é os monossacarídeos, estão: glicose,


pão. Quando pensamos em pão, logo frutose e galactose; Dissacarídeos:
pensamos em carboidrato e quando o maltose, sacarose (açúcar) e lactose,
assunto é carboidrato, o classificamos esses que, por sua vez, são moléculas
em simples ou complexo, e ainda que formadas por 2 monossacarídeos. Ex.:
esses conceitos sejam amplamente glicose e glicose formam a maltose,
abordados em livros, blogs, ou em posts glicose e frutose formam a sacarose, e
no instagram, ainda há um certo a junção de glicose com galactose
equívoco cometido até mesmo entre forma a lactose. Os carboidratos
profissionais da saúde quando se trata complexos são compostos de 3 a
de definir de forma correta o que são os centenas ou até milhares de
carboidratos simples e complexos. monossacarídeos, como o amido e
Os carboidratos simples incluem fibras. Ainda, podem ser definidos
monossacarídeos e dissacarídeos. Entre como oligossacarídeos e polissacarí-

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NUTRIÇÃO RAIZ CARBOIDRATOS: NUNCA MAIS CONFUNDA

deos quando compostos por 3 a 10 frutas, alimentos fontes de vitaminas,


unidades de monossacarídeos ou minerais, fitoquímicos, fibras e
quando compostos por mais de 10 pasmem, de carboidratos simples
monossacarídeos , respectivamente. (glicose, frutose). Seguindo a lógica
do “ evite carboidrato simples, dê
Como havia comentado, existe um preferência aos complexos ”, seria
equívoco no momento de classificar os preferível descartar a fruta e tomar
carboidratos e o erro mais comum é um hipercalórico, que é uma fonte de
presumir que o alimento fonte de oligossacarídeos como a
carboidrato simples é também um maltodextrina. Não é possível rotular
alimento pobre em fibras, de forma que um alimento de saudável só por ser
julgam o carboidrato simples ser um tipo fonte de carboidratos simples ou
pior de carboidrato e que, então, deve complexos, é preciso entender o que
ser evitado. Não é bem assim que isso significa e olhar com mais
funciona, uma vez que a quantidade de cuidado para a composição do
fibras varia entre alimentos do mesmo alimento. Ao invés de chamar
grupo. Podemos citar o exemplo do pão carboidratos pobres em fibras de
francês e do pão integral, já que ambos simples, opte pela palavra refinado e
são fontes de carboidratos complexos quando se referir a uma fonte de
(amido), porém o pão integral possui carboidrato com maior aporte de
maior quantidade de fibras. Tampouco fibras, opte por chamá-los de
podemos esquecer das integrais.

Tabela 3.1 Tipos de carboidratos simples e complexos

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NUTRIÇÃO RAIZ CARBOIDRATOS: NUNCA MAIS CONFUNDA

Referências:

1. Nutrição no fisiculturismo (dieta, metabolismo e fisiologia)


2. Fisiologia do exercício: Teoria e Prática

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