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Ciência: Uma explicação com exemplos

Gabriel A. Donato
Maio de 2022

Ciência, Método Cientı́fico, Divulgação Cientı́fica


Abstract
Pode-se afirmar, de maneira simplificada, que a ciência é, na verdade,
um método. Comumente se confunde a ciência com os campos nos quais o
método cientı́fico é aplicado. Sendo versátil, metódico e eficiente, o meio
cientı́fico de validar e descobrir novos conhecimentos é utilizado em larga
escala por acadêmicos do mundo todo.
Neste artigo serão discutidos a definição de ciência, seu método e im-
plicações. .

1 O método
Primero, há um problema. Uma dúvida, um fenômeno a ser explicado, uma ideia
a ser entendida. A partir daı́, começa-se a estudar tal objeto, de maneira que se
encontre todas as perguntas que precisam ou que deseja-se responder. Com os
conhecimentos prévios e observados, monta-se diversos modelos e explicações -
hipóteses - sobre o assunto, os quais vão ser testados por meio de experimentos.
Feito isso, com bastante cautela, liga-se o que se aprendeu com o que já se sabia,
e é montada uma teoria, a qual é utilizada para fazer previsões, as quais podem
reforçá-la ou refutá-la.
Ao menos, isso é o que se aprende no ensino médio. É importante ressaltar
que variações desse método não só existem, como são também necessárias, para
as várias áreas em que ele é utilizado. Aprofundaremos um pouco mais à frente.

1.1 Problemas
“Qual o tamanho da Terra?” “O que é um cometa?” “Do que são feitas as
coisas?” “Por quê ainda há vida na terra se as espécies se extinguem?” Estes
são exemplos de problemas clássicos resolvidos pela ciência em seus primórdios.
Citaremo-nos como meio de exemplificação.
Todos eles, apesar de parecerem perguntas bobas, levam a questões muito
mais interessantes e desafiadoras do que se parece. Reza a lenda que, quando
indagado pela Rainha Vitória, da Inglaterra, sobre a função de seus experi-
mentos, Michael Faraday a respondeu perguntando: “E qual é a função de um

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bebê?”. Pois bem, a ciência é como um bebê, que parece não produzir nada a
princı́pio, mas, conforme se desenvolve, mostra tornar-se algo surpreendente.

1.2 Observações
Antes de tudo, o ideal é que as observações sejam imparciais. Não devem de
forma alguma ter vieses polı́tico-ideológicos ou de metodologia, como os vieses
de confirmação ou de causalidade. Também está incluı́do assumir que algo é
verdadeiro somente porque já se há um consenso de que o seja (claro que na
maioria das vezes é preciso basear-se em trabalhos anteriores para chegar a
algum lugar, mas estes devem ser devidamentes checados e aprovados). Este
princı́pio vale tanto para as observações feitas para propor hipóteses e teorias
como para propor e realizar experimentos. Infelizmente, porém, a ciência, como
qualquer área do conhecimento, está sujeita às inclinações dos que a operam,
e teve muitas ”ondas” ao longo da história. A princı́pio, muito se colocava
nas costas de Deus, e este era usado como postulado cientı́fico. Houve também
coisas como a inclinação nazista, que afirmava que as diferenças genéticas faziam
seres humanos arianos superiores, e o tentava provar. Felizmente, hoje, dentro
do possı́vel, a ciência tem se tornado cada vez mais ética e imparcial, mas todos
sabemos que nunca o será por completo.
De acordo com a Royal Atronomical Society, Edmond Halley observou que,
pelos registros, nos anos de 1305, 1380 e 1456, algum cometa foi visı́vel a partir
da Terra. Essas observações o levaram a se questionar se estas aparições seriam
na verdade do mesmo cometa.
Segundo a Royal Astronomical Society of Canada, Erastótenes observou por
relatos que, em Syene, no solstı́cio de verão, uma vareta, fincada perpendic-
ularmente no chão, não projetava sombra; e a mesma vareta em Alexandria
projetava uma sombra de aproximadamente 7°30’ em relação à haste. Isto é,
neste dia do ano, em Syene o sol estava perpendicular ao solo, enquanto em
alexandria o ângulo relativo era de 7°30’. Também observou que a distância
entre Syene e Alexandria era de 5000 stadia (unidade usada na época).
Charles Darwin observou ao longo de sua viagem a bordo do navio Beagle
que, animais de locais com caracterı́sticas ambientais parecidas tinham anato-
mias similares. Percebeu também, em sua criação de pombos, que as ninhadas,
ainda que dos mesmos pais, apresentavam variações entre os seus indivı́duos.
Essas observações iniciam o caminho para a resolução de três clássicos prob-
lemas. Hoje, damo-nos como óbvias, mas foram grandes avanços para a época.
Essas três questões serão tratadas de maneira informal neste artigo, sendo apre-
sentadas cada fase de seu desenvolvimento, desde a formulaçao das perguntas até
a conclusão do problema. Importante citar que, mesmo que um problema seja
concluı́do, nenhum conceito ou modelo cientı́fico permanece fechado. Sempre
há algo a ser modificado ou acrescentado!

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1.2.1 Viés de confirmação
Este viés pode ser exemplificado com a seguinte situação: Uma criança faz
aniversário, sopra a vela do bolo e faz um pedido: Uma bola de basquete. Por
vias do acaso, ela ganha uma bola de basquete. Novamente, no ano seguinte, ela
sopra a vela, e, como pediu em sua cabeça, sem que ninguém saiba do pedido,
recebe uma bicicleta. No terceiro ano, por mais que não tenha relação alguma
o soprar à vela com o recebimento do pedido, a criança vai fazê-lo. Ela está
enviesada.

1.2.2 Viés de confirmação


Em Recife (PE), há uma certa incidência de tubarões. Suponhamos que seja
feito um levantamento em que o resultado apresentado seja o de que o consumo
de protetor solar nas praias de Recife está linearmente conectado aos ataques de
tubarão. Isso significa que protetor solar atrai tubarões? Claro que não! Este
seria o viés de causalidade.
A associação mais correta, e mais sutil, é a de que um maior consumo de pro-
tetor solar significa uma praia mais lotada, portanto, mais pessoas vulneráveis.

1.3 Hipóteses
Uma hipótese é, basicamente, uma suposição de como algo funciona, e são
necessárias várias delas para formular uma teoria. Uma hipótese assumida como
verdadeira na formulação de uma teoria é chamada de postulado.
Halley hipotetizou que as aparições regulares de cometas no céu seriam na
verdade do mesmo cometa.
Darwin hipotetizou que caracterı́sticas eram passadas por meio da reprodução
sexuada dos indivı́duos e que estas influenciavam na sua sobrevivência.

1.4 Experimentos
Importante dizer que: Experimentos não comprovam teorias, e sim, as refutam.
Uma boa teoria é uma teoria que não foi refutada ainda. A teoria da evolução
é uma boa teoria porque não foi refutada. Há múltiplas evidências fortı́ssimas
de que ela é verdadeira, muito fortes mesmo, mas ainda não é uma verdade
absoluta.
Alguns quesitos são essesciais na hora de montar um bom experimento. Nem
todos estão familiarizados com estes, então serão explicados os mais inusuais
masi a frente. Alguns são:

1. Conhecimentos prévios, provenientes das observações e de estudos anteri-


ores:
Deve-se ter uma base vinda de algum lugar para começar o experimento;
2. Hipóteses a serem testadas:

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Antes de iniciar um experimento, formula-se diversas hipóteses. A função
deste é selecionar a(s) mais funcional(is), eliminando as que são refu-
tadas, ou, em muitos casos, desenvolver hipóteses pré existentes;
3. Definição de metodologia:
Esta etapa depende da natureza do problema. Deve-se verificar a ne-
cessidade de grupo controle, tamanho da amostragem, variáveis testadas,
etc.
4. Replicabilidade do experimento:
Todo e qualquer experimento cientı́fico, para ser válido, deve ser repro-
duzı́vel nas mesmas condições por pesquisadores diferentes, de maneira
que possa ser testado novamente, isto é, revisado por pares.
5. Testagem de uma única variável por vez:
O resultado de uma variável pode influenciar no de outra, portanto o ideal
para ter um resultado exato é isolar cada possı́vel influência no experi-
mento
6. Amostra ampla e variada:
Um resultado isolado nem sempre é o suficiente para afirmar que algo é
verdadeiro. Pode ser que haja um erro no momento do teste, influências
externas, ou objetos de estudo diferentes. Tudo isso pode fazer com que o
resultado varie, portanto, é necessário considerar um parâmetro geral.
Também é necessário descartar resultados incoerentes ou absurdos, caso
estes sejam isolados. Resultados inesperados recorrentes podem significar
uma nova descoberta.

7. Resultados mensuráveis:
A ciência se baseia em grandezas, as quais podem ser de natureza fı́sica,
estatı́stica ou matemática. Em todas elas o quesito numérico é essencial
tanto na definição como na comparação. Mesmo quando se trata de as-
pectos como anatomia, que parecem difı́ceis de quantificar, é possı́vel e
necessário estabelecer a frequência com que estes aparecem na população,
qual as dimensões (ex: tamanho do bico de um trentilhão), dentre outras
questões. Assim sendo, relatórios meramente qualitativos não são satis-
fatórios.
8. Resultados válidos e confiáveis:
A confiabilidade e a validez dos resultados dependem dos itens anteriores.
9. Fidelidade aos resultados:
Uma vez conseguidos resultados válidos e confiáveis, deve-se ser fiel a eles.

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1.4.1 Grupo controle
Imagine o seguinte: Um cientista vai avaliar os efeitos da presença de um certo
predador sobre a reprodução de um besouro num ambiente fechado. Como este
cientista poderia saber qual foi esta influência se não pode compará-la? Por mais
que ele tente fazer isso dividindo o experimento em duas etapas - isto é, com e
sem o predador -, as condições do experimento, como temperatura, iluminação
e umidade podem se alterar. Assim, é necessário manter uma parte separada do
experimento, sem qualquer modificação em relação ao status quo do objeto de
estudo, para que seja comparada nas mesmas condições, sem que uma interaja
na outra. A esta “parte separada”, chamamos de grupo controle.

1.4.2 Amostra
Basicamente, uma amostra é quando pega-se uma certa quantidade limitada de
objetos ou situações e os utiliza para representar o todo. Darwin não examinou
todos os trentilhões das Ilhas Galápágos. Ele pegou uma amostra.

1.4.3 Variável
Uma variável é qualquer coisa que possa influenciar num experimento. Oferta
de comida e água, presença de predadores e relevo são variáveis que influenciam
na seleção reprodutiva de animais e plantas.

1.4.4 Revisão por pares


Como verificamos antes, todo e qualquer experimento, para ser válido, deve ser
reproduzı́vel em iguais condições por pesquisadores independentes. Quando um
pesquisador replica um experimento alheio, ou revisa a metodologia utilizada e
seus resultados, chamamos isso de revisão por pares.

1.4.5 Grandeza
Uma grandeza é qualquer coisa que possa ser medida numericamente.

1.5 Teorias e previsões


Há uma certa confusão sobre a diferença entre teoria, hipótese e lei. Erronea-
mente, dá-se à teoria a definição de hipótese, e à lei a de teoria. Na verdade,
não é bem assim.
O conceito de hipótese já foi explicado, e, como bem dito, diversas são
necessárias na formulação de uma teoria. Pois bem: Quando se tem uma quanti-
dade razoável de hipóteses aprovadas, conhecimentos para ligá-las, conhecimen-
tos para a elas acrescentar, e uma certa base experimental, pode-se começar a
se pensar em montar uma teoria.
Isso não é tarefa simples, tampouco fácil. Charles Darwin só publicou A
Origem das Espécies quando tinha 50 anos! A maioria das teorias famosas que
conhecemos hoje são, na maioria dos casos, trabalhos de uma vida inteira!

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Então, meu caro leitor, pense duas vezes antes de usar a frase “É só uma
teoria”.
Uma boa teoria pode fazer previsões. A teoria de Edmond Halley foi confir-
mada quando sua previsão de que seu cometa cortaria o céu em 1680 se cumpriu.
(Royal Astronomical Society)
Uma lei, por fim, é uma expressão matemática que descreve o comporta-
mento de algum objeto ou sistema. Assim como qualquer outra coisa na ciência,
uma lei também pode ser alterada. Vide gravidade.

1.5.1 Erastótenes
Erastótenes conhecia a distância entre Syene e Alexandria, o ângulo do sol
incidente ao solo nas duas cidades e a geometria do cı́rculo. Bastou calcular que
7º30’ era 1/48 de 360º e multiplicar 5000 stadia por 48, chegando à conclusão
de que a circunferência da terra era de 240.000 stadia, ou 37.848km. (Royal
Astronomical Society of Canada)

1.5.2 Darwin
As teorias de Darwin foram, desde que surgiram, revisadas e verificadas inúmeras
vezes no mundo inteiro. Nunca foram refutadas, somente incrementadas.

2 Conclusão
Seguir o método cientı́fico não significa estar certo. Significa genuinamente
procurar estar certo. O fato de a ciência cometer erros é natural, e não é motivo
para desmerecê-la. Procurar estar certo em suas validações de conhecimentos
foi uma inovação do ser humano que deve ser comemorada todos os dias.
Foi o método cientı́fico que nos levou a entender a poesia de sermos apenas
um grão de poeira num pálido ponto azul; que nos ligou com pessoas do outro
lado do planeta numa velocidade que jamais alcançaremos fisicamente; que nos
permitiu viver por três vezes mais tempo do que vivı́amos antes, e, assim, per-
mitindo que nos tornássemos 8 bilhões de mentes pensantes, com cada uma
sendo um universo próprio.
Isso tudo foi possı́vel, não estando certo o tempo todo, mas o tempo todo
procurando estarmos certos. Isso tudo só foi possı́vel com séculos de tra-
balho árduo de milhares de acadêmicos de todas as partes do mundo, trabalho
que busquei explicar brevemente neste artigo. Jamais será possı́vel fazê-lo de
maneira completa num único documento, inclusive porque o próprio metodo se
inova cada dia mais.
Que fique claro: A ciência não é uma panaceia, mas que todos tenham de
sua importância a devida ideia.

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