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Problema: Pode certos estados mentais serem reduzidos ou mesmo eliminados ao vocabulário
científico?
Objeto: Consciência
Contexto: Leva-se em conta os avanços científicos com base na História das ciências naturais, o
status ontológico da psicologia de senso comum e o da neurociência.
“Vermos o nosso enquadramento conceptual de senso comum para os fenômenos mentais como
uma teoria traz uma organização simples e unificadora à maioria dos tópicos da filosofia da
mente, incluindo a explicação e previsão de comportamento, a semântica dos predicados mentais, a
teoria da ação e o problema das outras mentes, a intencionalidade dos estados mentais, a natureza
da introspecção, e o problema mente-corpo.”
“A sua função [do postulado], em conjunção com as leis de fundo da psicologia de senso comum, é
oferecer explicações/previsões/entendimento do comportamento continuado do indivíduo, e é
credível até ao ponto em que é bem sucedido quanto a isto em relação a hipóteses concorrentes.
(…) [Assim] O conhecimento das outras mentes não tem nenhuma dependência do conhecimento
da nossa própria mente. Aplicando os princípios da nossa psicologia do senso comum ao nosso
comportamento, um Marciano adscrever-nos-ia o conjunto familiar de estados mentais, mesmo se a
sua própria psicologia for muito diferente da nossa, Ele não estaria portanto, a ‘generalizar a
partir do seu próprio caso’. Da mesma forma, juízos introspectivos acerca do nosso próprio caso
revelam não ter nenhum especial estatuto, ou integridade. Nesta forma de ver as coisas, um juízo
introspectivo é apenas uma instância de um hábito adquirido de resposta conceptual aos nossos
próprios estados internos, e a integridade de qualquer resposta particular é sempre contingente à
integridade do enquadramento conceptual adquirido (teoria) no qual a resposta é formulada.”
Ele até realiza paralelos entre as proposições dentro das ciências físicas e a FP, procurando
demonstrar suas semelhanças teórico-estruturais. Porém, quando Churchland apresenta a FP como
teoria, a questão para ele torna-se saber se tal teoria pode adequar sua ontologia a da área de estudo
na qual investiga-se o estatuto dos estados mentais assim como sua intencionalidade1.
Inicialmente, com o intuito de fazer uma “limpeza de terreno” das posições filosóficas
concorrentes no momento, Churchland as expõe de maneira rápida e simplificada:
“O teórico da identidade de forma optimista espera que a psicologia de senso comum seja
suavemente reduzida à neurociência completa, e a sua ontologia preservada por meio de
identidades transteóricas. O dualista espera que ela prove ser irredutível à neurociência completa,
em virtude de ser uma descrição não redundante de um domínio autônomo e não físico de
fenômenos naturais. O funcionalista também espera que ela venha a mostrar ser irredutível, mas
com os fundamentos muito diferentes de a economia interna caracterizada pela psicologia de senso
comum não ser, em última análise, uma economia governada por leis de estados naturais, mas sim
uma organização abstrata de estados funcionais, uma organização instanciável numa variedade de
substratos materiais bastante diferentes. Ela é por isso irredutível aos princípios peculiares a cada
um deles. Finalmente, o materialista eliminativo também é pessimista acerca das perspectivas de
redução, mas a sua razão é que a psicologia de senso comum é um relato radicalmente inadequado
das atividades internas, demasiado confuso e demasiado defeituoso para sobreviver através de
redução teórica. Segundo esta forma de ver, ela será simplesmente deslocada por uma melhor
teoria dessas atividades.”
1 Tais intenções foram chamadas por Russell de atitudes proposicionais, como exemplo destas
atitudes temos desejar, aceitar, querer, crer), o último será ao que ele aterá sua crítica.
“(…) A falha em desenvolver seus recursos e a estender o âmbito do seu sucesso é por isso
nebulosamente curioso, e temos obrigação de inquirir acerca da integridade das suas categorias
básicas. Para usar os termos de Imre Lakatos, a FP é um programa de investigação estagnado ou
degenerescente, e tem sido isso mesmo desde há milênios.”
Desta forma, para continuar sua argumentação visando à aceitação da eliminação da FP,
Churchland procura elucidar as críticas feitas a esta postura filosófica, com argumentos de duas
linhas do funcionalismo: uma delas, advoga pelo caráter normativo das atitudes proposicionais,
além de termos a nossa concepção de racionalidade assentada nesta estrutura. Não poderíamos abrir
mão de quando versamos e descrevemos conceitos e propriedades psicológicas, temos como base
estados mentais como crenças e desejos e nelas o estabelecimento de nossas decisões racionais. A
outra linha advoga pela via da natureza abstrata da FP, colocando que a mesma postula apenas
acerca de estruturas abstratas que tem relações causais entre seus componentes que em uma
analogia de imput-output temos reações comportamentais e sensoriais específicas, ou seja, não há
uma estrutura física em que a FP esteja fundada para ser reduzida ou mesmo eliminada, e sim um
conjunto de relações abstratas implementados fisicamente que geram um conjunto de ações,
experiências e comportamentos. (exemplo do hardware/software da apresentação anterior). Em suas
palavras:
O que importa ao funcionalista é uma caracterização funcional dos termos utilizados, pois
eles não se instanciam fisicamente, mas apenas são conceitos abstratos que nos possibilita falar
sobre uma determinada organização física com uma determinada função. Portanto, não é necessário
eliminar a FP, apenas talvez refiná-la ou revisá-la para adequar-se as características funcionais
observadas.
A partir desta exposição, Churchland constrói um argumento para mostrar que na realidade o
funcionalismo não tem nada de avant garde, e sim mantêm-se conservador em princípios por ainda
considerar o léxico estabelecido pela FP. Ele abre a analogia de que o que os funcionalistas estão
fazendo é como se químicos buscassem adequar as terminologias e fenômenos observados a teoria
alquímica estabelecida na época, “contorcendo” conceitos e ontologias para encaixarem-se uma na
outra, portanto:
“Não há dúvida que a linha mais simples de resolução, e aquela que historicamente aconteceu, é a
simples substituição. A interpretação dualista das quatro essências – como espíritos imateriais –
aparecerá sem determinação e desnecessária dado o poder da taxonomia corpuscular da química
atômica. E uma redução da velha taxonomia à nova parecerá impossível, dada a extensão na qual
a velha teoria comparativamente impotente classifica as coisas transversalmente relativamente à
nova. A eliminação aparecerá como única solução possível. (...)”
Ele volta-se para a ultrapassada teoria química do flogisto, mostrando que dependendo dos
subterfúgios explicativos e argumentos ad hoc que se dê, podemos ter com qualquer teoria em
declínio uma certa adequação estrutural que a fará manter-se:
“Uma defesa fabulosa da teoria flogística da combustão pode ser erguida nesta linha. Pense-se em
ser altamente flogisticado e ser deflogisticado como estados funcionais definidos por certos sinais
de disposições causais; aponte-se para a grande variedade de substratos naturais capazes de
combustão e calcificação; clame-se uma integridade funcional irredutível para aquilo que provou
não ter nenhuma integridade natural; esconda-se os defeitos que permanecem sob um
compromisso de procurar melhorias. Uma receita semelhante dará nova vida aos quatro humores
da medicina medieval, para a essência vital ou archeus da biologia pré-moderna, etc. Se a sua
aplicação noutros casos for de todo um guia, o estratagema funcionalista é uma cortina de fumo
para a preservação do erro e da confusão.”
2 Este exemplo aparentemente se assemelha a comunicação realizada pelo povo Navii do filme
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