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Escola Secundária Júlio Dinis

Filosofia 11ºCTA

Será a comunidade
científica acrítica?

Catarina Tordo nº5


Neste ensaio proponho-me a debater sobre se a comunidade científica é ou não acrítica,
assunto que pode acabar por ser um pouco vacilante dado à variedade de ciências que
existem. A ciência, na sua generalidade, é uma atividade de explicação e de criação de teorias
desenvolvidas pela comunidade científica, num dado contexto histórico, porém, como já
referido anteriormente, existem diversos tipos de ciências e eu pretendo apresentar o meu
ponto de vista sob três deles: as ciências exatas, tal como a Física, Química e Matemática, as
ciências sociais, tal como a psicologia e a antropologia, e as pseudociências, informações que
se afirmam como cientificas mas na realidade não são. Para se exercer a ciência, seja ela qual
for é necessário que exista uma comunidade científica que trabalhe com um paradigma. Para
Kuhn por exemplo, a comunidade científica vai sempre trabalhar a partir desse paradigma, que
nada mais é que um modelo composto por leis, teorias e conceções acerca do mundo e que
deve ser usado por todos os cientistas envolvidos nessa comunidade, visto que este fornece
regras para resolver problemas e investigar a natureza. Para Kuhn a ciência tem várias fases,
sendo uma delas a fase de ciência normal, que consiste, simplificadamente, num período de
instauração e aceitação de um paradigma. Outro período é o da ciência extraordinária em que
ocorre a divergência e rivalidade entre paradigmas alternativos, visto que o anterior não
conseguia responder às anomalias, factos ou ideias que podem pôr em causa a validade do
paradigma, que foram surgindo. Para alguns autores a comunidade científica, em algumas
situações pode ser acrítica e é isso que eu vou tentar dissecar neste ensaio.

Visto que a ciência é a chave para todo o nosso desenvolvimento é de extrema importância
perceber se a comunidade científica é ou não critica perante aos seus paradigmas, visto que se
isso não se verificar, podemos considerar como corretas, teorias que não foram bem
analisadas e fundamentadas e que podem ter grande impacto nas nossas vidas.

Na minha perspetiva, a comunidade científica, em especial a responsável pelo estudo de


ciências mais subjetivas e pelas pseudociências, pode, por vezes, ser acrítica. Isto porque: (1)
no período de ciência normal o cientista não está preocupado em criticar o paradigma e sim
em confirmá-lo, de forma a instituí-lo definitivamente. Para isso é necessário que este
paradigma resista a anomalias, a forma mais fácil de um cientista o fazer é simplesmente se
abster de criticá-lo, o que demonstra a falta de criticidade da comunidade cientifica; (2) os
cientistas adaptam os factos ao seu paradigma, de forma a que ele não seja criticado e assim
não seja destituído; (3) a comunidade científica tenta, ao máximo, evitar revoluções científicas,
visto que pretendem manter o seu paradigma, e para isso abstêm-se de criticá-lo; (4) em
ciências de caracter mais subjetivo a comunidade científica pode ser mais relutante ao criticar
um paradigma, visto que não tem acesso aos mesmos tipos de resultados que a comunidade
de ciências exatas; (5) e em pseudociências a comunidade cientifica pode também, ser
extremamente acrítica visto que tem como base conhecimentos não científicos.

(1) No período de ciência normal, visto que tem como objetivo a expansão e aplicação de um
paradigma, o cientista não o critica, quase como se este fosse infalível, e quando o paradigma
é confrontado com um facto persistente, este é dispensado para não pôr em causa o
paradigma. (2) Muitas vezes, os cientistas adaptam alguns factos aos seus paradigmas, isso foi
observado por Popper em marxistas e em psicanalistas que pensavam verificar as suas
conceções, mesmo em situações quase que adversas o que faz com que avaliá-las à luz de um
mesmo paradigma e confirmar ambas com o mesmo seja algo um tanto quanto questionável.
Um exemplo bem claro disso é a psicologia de Adler, que diz que qualquer comportamento
humano pode ser explicado através do complexo de inferioridade: Adler diria que uma pessoa
que empurrasse uma criança para um lago com a intenção de a afogar o fez porque tem
complexo de inferioridade e por isso queria provar a sua audácia ao cometer este crime.
Também Adler diria que uma pessoa que salvasse uma criança de se afogar, só o fez porque
tem um complexo de inferioridade e por isso queria mostrar o seu valor arriscando a sua vida
por aquela criança. (3) O facto de a comunidade científica querer evitar revoluções científicas
implica que eles tentem, ao máximo, manter o mesmo paradigma, para isso eles evitam
criticar o paradigma ou expô-lo a problemas. (4) É normal que um cientista que estude ciências
como a psicologia, que são mais subjetivas, tenha mais dificuldade e relutância ao criticar um
paradigma, pois como referido anteriormente, uma situação como a de empurrar ou salvar
uma criança de um lago pode ser “encaixada” numa só teoria. Estes cientistas não tem a
oportunidade de obter resultados concretos e, em muitos casos, não tem acesso a todos os
fatores que vão desencadear esses resultados, não podendo assim, analisá-los na sua
completude. Por isso muitas vezes o cientista pode tentar explicar situações antagónicas à luz
de um mesmo paradigma. Contudo, admito que a comunidade científica responsável por
ciências mais exatas, como a matemática, não seja considerada como acrítica visto que os
resultados que esta obtém podem, muitas vezes, ser confirmados e por isso corroborar um
paradigma. Tendo em conta que este paradigma seja quase infalível e que se consegue prová-
lo, esta comunidade não tem a necessidade de estar constantemente a criticá-lo e a tentar
melhorá-lo. (5) Em relação a pseudociências, como por exemplo a astrologia, é, para mim,
bastante óbvio que os responsáveis por estas são pouquíssimo críticos em relação aos
paradigmas que os regem visto que, eles descrevem uma pessoa com uma lista de adjetivos
totalmente abrangentes e facilmente associáveis a qualquer pessoa. É então natural que uma
pessoa de um qualquer signo se veja refletido naqueles adjetivos, e assim faça parecer que
realmente existam factos que corroboram os seus paradigmas. Todos estes argumentos levam-
nos de encontro à minha tese.

Algumas pessoas podem considerar a comunidade científica como critica visto que eles
corrigem erros e dão lugar a novos paradigmas, o que traria um caráter mais critico às
mesmas, ou podem até dizer que sendo a ciência algo fiável, não é plausível que os indivíduos
que a façam sejam acríticos, pois assim todos os conhecimentos provenientes da mesma não
seriam fiáveis, o que não se verifica.

Em relação à primeira objeção, Kuhn diz que a troca de paradigmas é feita de forma quase que
religiosa, ou seja, a comunidade científica vai passar a acreditar de forma muito acentuada
nesse novo paradigma, voltando a um período em que não se vai contestar nem criticar esse
paradigma. Ou seja, pelo menos numa fase do desenvolvimento científico, vai se verificar uma
atitude acrítica por parte da comunidade científica face aos paradigmas vigentes. Em relação à
segunda objeção, penso que a ciência só se torna fiável, de facto, depois de muito tempo, visto
que nos primórdios do desenvolvimento de uma teoria, a comunidade científica está mais
preocupada em afirmá-la do que torná-la menos falível. Para além disso, é importante reforçar
que muitas ciências não são capazes de nos oferecer uma resposta completamente certa visto
que estas baseiam-se muitas vezes em fatos subjetivos e muitas vezes dedutivos, o que
dificulta a critica aos seus paradigmas.

Concluindo, a comunidade científica, em alguns dos seus ramos, muitas vezes é acrítica em
relação aos seus paradigmas. Admito também que as ciências exatas não sejam acríticas visto
que muitos dos seus paradigmas são verificáveis e concretos, o que possibilita que os erros de
um paradigma sejam mais visíveis e corrigíveis, o que lhes confere um carácter mais critico.

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