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OBJETIVIDADE E PROGRESSO NA CIENCIA

KARL POPPER VS THOMAS KUHN

KARL POPPER

I. OBJETIVIDADE NA CIÊNCIA
Conhecemos o argumento de Popper onde ele mostra a impossibilidade da certeza: nenhuma
experiência pode algum dia demonstrar a verdade, uma vez que isso incorre na falácia da afirmação
do consequente. Face a isto, resta-nos ou a certeza do erro ou a incerteza da conjetura - hipótese
corroborada que resistiu à tentativa de refutação.
Segundo Popper, a conjetura não constitui uma verdade nem uma probabilidade; ela é apenas uma
ideia mais “resiliente”, mais resistente à refutação e o máximo que sobre ela podemos afirmar é
que está corroborada – nunca verificada – ou que é verosímil.

2. Existe progresso?
Problema: Se não há certeza, como é que podemos falar de progresso?
Tese: Popper defende que a ciência que segue o método refutacionista progride e proxima-se da
verdade. Apesar da ciência produzir explicações refutáveis, de cada vez que uma conjetura é
refutada, ela é substituída por outra explicação mais resistente à refutação.
Argumento: No quadro de uma ciência que segue o método refutacionista, uma conjetura/teoria
corroborada, mesmo podendo ser refutada, vale mais do que a conjetura/teoria anterior que foi
refutada, porque, apesar de ser refutável, resistiu aos testes que a outra não passou. Neste sentido,
as conjeturas refutadas vão sendo substituídas por outras mais amplas, mais arrojadas, mas mais
resistentes.
Assim, mesmo sendo uma incerteza, enquanto não for refutada, ela funciona como quadro válido
de inteligibilidade. Quer isto dizer que uma “conjetura”, ou teoria, apresenta-se como um
“representação” que nos ajuda a compreender (inteligir), prever e controlar o real, apesar da
validade destes “quadros” ser sempre temporária
NOTA: não é só na ciencia que o ser humano é capaz de investir/apostar naquilo que sabe não ser eterno/seguro.
Exemplo: fazemos projetos a longo prazo, apesar de não sabermos quando morremos, investimos nos amigos ou na
carreira, correndo o risco de errar, construímos casas em cimento e pontes em materiais que sabemos perecíveis, em
suma, o homem está adaptado a viver com o efémero e o cientista, como homem que é, sabe aceitar a precariedade das
suas conjeturas
Qual é então a objetividade que podemos esperar da ciência? A resposta a esta questão é: uma
objetividade fraca, e não uma objetividade forte. Assim, uma teoria diz-se objetiva se foi obtida de
acordo com os procedimentos científicos exigidos, isto é, se foi testada segundo o método refutativo.
Hoje em dia, nenhum cientista afirma que as teorias correspondem ao real, ou que são descrições

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fieis do mesmo. A verdade já não é sinónimo de correspondência ao real, mas de “legalidade”, quer
isto dizer que uma teoria é objetiva e racional na medida em que cumpriu os procedimentos exigidos
pelo método. Verdade passa, assim, a ser sinónimo de validade.
Einstein expressou esta mesma ideia recorrendo a uma analogia interessante, comparando a
natureza com o relógio: ouvimos o tique taque do relógio e vemos os seus ponteiros a andar, a
partir daí podemos imaginar a máquina que faz mover o relógio, mas como nunca vamos poder
abrir o relógio, nunca poderemos ter a certeza se aquilo que imaginámos é certo.
David Bohm também defendeu a relatividade da objetividade científica ao comparar a ciência à
arte. Partindo de um quadro de Margritte, afirmou que, tal como a arte representa o real mas não
deve confundir as suas representações com o próprio real, também o cientista não deve tomar por
real as suas leis e teorias. Assim, o cientista devia fazer como Magritte* e colocar uma legenda por
baixo de cada teoria a dizer “Isto não é o real”.

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II. PROGRESSO NA CIÊNCIA
POPPER: O método da conjetura e refutação
Se não há certezas, podemos falar de progresso na ciência? Segundo Popper é possível falar de
progresso e evolução na ciência, entendendo-se este progresso como uma caminhar no sentido da
verdade objetiva, e o melhor método para isso é o método refutacionista, o método das conjeturas
e refutações,
Popper defende que devemos procurar refutar as hipóteses em vez de tentar prová-las. O princípio
subjacente a esta teoria é que progredimos através da eliminação do erro, ou seja, através da
falsificação de hipóteses, e não através da comprovação das mesmas.
Segundo esta teoria, as hipóteses devem ser hipóteses ousadas, inventadas, pouco prováveis, que
contrariam não só o senso comum como o conhecimento científico já provado, uma vez que aquilo
que pretendemos é refutar e não provar. Isto não significa que o cientista vai propor uma hipótese
absurda que ele sabe ser falsa, mas uma hipótese possível, só que contra-intuitiva.
A vantagem deste método é que, se a hipótese (contra-intuitiva) passar o teste, ela faz cair todo o
conjunto de teorias contrárias contribuindo, assim, para uma aceleração do progresso da ciência
(Descartes também defendeu a mesma ideia ao afirmar que devíamos duvidar de tudo, mesmo das
certezas matemáticas). Popper acredita que a ciência progride através da eliminação de hipóteses,
numa crescente aproximação à verdade. Este é o método da conjetura e refutação, que se pode
representar pelo seguinte esquema P1 ! TT ! EE ! P2 sendo que P1 representa o problema
inicial, TT representa a tentativa de teoria e EE representa eliminação do erro.
Assim, uma teoria que resistiu à eliminação do erro, ou seja, que foi corroborada, é melhor do que
a anterior, mas não deixa de ser refutável e substituída por outra melhor. Isto pode ser comparável
àqueles objectos que são úteis, mas que estamos prontos a abandonar quando outros melhores
aparecerem: os novos fazem o mesmo que os anteriores, mas são melhores porque resolvem os
problemas que os anteriores não resolviam.
Tal como no mundo da técnica e da arte o “inventor” nunca se sente limitado por aquilo que os
outros realizaram, mas encara o que existe como algo sempre imperfeito e suscetível de ser
melhorado, também o cientista não deve encarar as teorias corroboradas como soluções definitivas,
verdades eternas, mas verdades provisórias, “conjeturas” que podem sempre ser melhoradas.
Assim, a ciência é uma sucessão ilimitada de problemas e soluções (provisórias) que
eventualmente nos vão aproximando da verdade absoluta.

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THOMAS KUHN

I. CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA FILOSOFIA DE KUH

PARADIGMA
O que é:
Um paradigma é um conjunto de teorias, princípios metafísicos, experiencias,
procedimentos, regras e linguagem, que constituem um todo coeso que enforma e condiciona o
trabalho de investigação durante um certo período. Um paradigma é, assim, o conjunto de
pressupostos, uma espécie de axiomática, ou a priori, que o cientista utiliza sem contestar na
busca das soluções para os problemas que tem de resolver. É ele que permite a organização da
informação num todo coerente, dita os problemas que precisam de ser resolvidos, condiciona a
observação e a elaboração de hipóteses e conduz a experimentação.
Neste sentido, o paradigma é condicionador do trabalho do cientista e funciona como uma
espécie de lente pela qual todos os que partilham do mesmo paradigma olham e representam o
mundo.

Como se desenvolve
Para Kuhn, um paradigma NASCE, CRESCE e MORRE e quando morre é substituído por
um novo paradigma diferente que não lhe dá continuidade.
Neste sentido, podemos observar ao longo da história da ciência a um duplo movimento:
numa análise diacrónica, verificamos uma DESCONTINUIDADE PARADIGMÁTICA, ou seja,
paradigmas desconexos que se seguem uns aos outros sem qualquer ligação entre si; numa
visão sincrónica, vemos que dentro de cada paradigma existe uma linha de crescimento
contínua.
NOTA: a vida dos paradigmas é muito longa e, até agora, não houve muitos paradigmas. O período
de desenvolvimento/crescimento de um paradigma designa-se de CIÊNCIA NORMAL e o período
que se sucede à sua morte designa-se de CIÊNCIA EXTRAORDINÁRIA.

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CIÊNCIA NORMAL
A ciência realizada segundo um paradigma designa-se Ciência Normal, entendendo-se por
isso a investigação que segue CRITÉRIOS, VALORES, TEORIAS, LEIS e MÉTODOS acordados
pela comunidade científica e que foram definidos pelo paradigma vigente.
Durante o período da ciência normal existe CRESCIMENTO PARADIGMÁTICO, no sentido
em que o paradigma adotado vai sendo aperfeiçoado e aplicado de forma cada vez mais
generalizada, dando origem a teorias cada vez mais amplas e melhores (capazes de resolver um
número crescente de problemas). Aqui, o progresso existe (crescimento linear) e é racionalmente
controlado no sentido em que os problemas que são levantados e as teorias que são propostas
não aparecem por acaso, mas são ditados pelo paradigma.
Mas este crescimento e acumulação de sucessos não deve ser interpretado como sinónimo
de aproximação à verdade. Para Kuhn, o sucesso de um paradigma deve-se, por um lado, à sua
funcionalidade, isto é, ao facto de ele fornecer uma boa “história/narrativa” onde toda a realidade
parece encaixar-se e, por outro, ao facto de haver um CONTROLO RÍGIDO DA COMUNIDADE
CIENTÍFICA que regista apenas os casos de sucesso e não permite que os insucessos venham à
luz do dia. Assim, durante a Ciência Normal, os fenómenos que contrariam o paradigma não são
olhados como contraexemplos capazes de refutar o paradigma, mas como “ANOMALIAS”.
Concluímos, assim, que Kuhn discorda de Popper quando este afirma que aquilo que guia
a ciência é a crítica e o desejo de refutação. Para Kuhn, a ciência normal é CONSERVADORA e
ACRÍTICA e a prova é que ao surgirem anomalias, que objetivamente contrariam o paradigma, e
o deviam refutar, estas passam despercebidas ou são desprezadas pela comunidade científica,
acabando por se justificar estes factos ou a defeitos dos instrumentos ou a erros dos cientistas.

NOTA: A descrição de Kuhn de ciência normal, como o conjunto de investigações orientadas por
um TODO COESO de teorias, princípios, critérios e procedimentos, não representa a totalidade
das ciências, uma vez que em algumas áreas, como a sociologia e a antropologia, o que se
verifica é uma divergência/cisão dentro da comunidade científica e a adoção simultânea de
paradigmas diferentes. Neste sentido, e ao contrário das ciências da natureza, na sociologia não
há uma hegemonia paradigmática, mas uma pluralidade de modelos para interpretar os
fenómenos sociais humanos.

CRISE PARADIGMÁTICA:
Mas se a refutação e mudança de paradigma é limitada pelo conservadorismo da ciência
normal e pela falta de crítica, ela não deixa de acontecer, surgindo um momento em que a
comunidade começa a desconfiar do paradigma e a valorizar mais os casos de insucesso do que
os de sucesso.
Segundo Kuhn, a CRISE PARADIGMÁTICA não se deve ao espírito crítico de alguns

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cientistas mais independentes, mas apenas à acumulação de anomalias ou à ocorrência de uma
anomalia de dimensões tão escandalosas que os cientistas mais competentes não podem
ignorar.
Assim, quando os cientistas se confrontam com uma acumulação de anomalias, instala-se a
suspeição de que o paradigma pode ser falso, pondo-se a hipótese da sua revisão.

CIENCIA EXTRAORDINÁRIA
A crise dá origem àquilo que Kuhn designa por período da CIÊNCIA EXTRAORDINÁRIA,
um período curto e raro, de grande produtividade e criatividade, muito próximo do ideal de ciência
defendido por Popper.
Durante este período, os cientistas, sobretudo os mais novos que ainda não estão
demasiado comprometidos e condicionados pelo paradigma vigente, começam a desenvolver
um trabalho mais crítico e autónomo, propondo soluções novas e independentes do paradigma.
Neste sentido, o período da Ciência Extraordinária, acaba por corresponder mais à conceção
refutacionista de Popper, uma vez que nesta fase os cientistas propõe, sem medo de ser
refutados, hipóteses arrojadas que testam de forma crítica.

REVOLUÇÃO CIENTÍFICA
À medida que os defensores do velho paradigma vão desaparecendo e que uma das novas
teorias começa a ganhar maior consenso, a REVOLUÇÃO CIENTÍFICA declara-se. Neste
momento cai o velho paradigma e instaura-se o novo que se tornará, com o tempo, na Nova
Ciência Normal.

DESCONTINUIDADE / INCOMENSURABILIDADE PARADIGMÁTICA


Segundo Kuhn, o NOVO paradigma não dá continuidade ao antigo paradigma, uma vez
que ele assenta em princípios metafísicos, teorias e procedimentos completamente diferentes.
Neste sentido, ele não contribui para um crescimento da ciência, mas para uma rutura absoluta
que torna a história da ciência um empreendimento DESCONTINUO.
Assim, Kuhn rejeita a ideia de progresso, uma vez que os novos paradigmas não permitem
uma melhor interpretação do real, mas uma interpretação radicalmente distinta e incompatível
da anterior que, a seu tempo, acabará também por ser substituído.
Deste modo, a história da ciência mostra que ao longo dos séculos os Homens foram
criando lentes/modelos/paradigmas para interpretar e explicar a natureza parecendo, no entanto
nenhum destes paradigmas se revelou perfeito e eterno, uma vez que todos acabam por ser
substituídos por outros que, no início parecem resolver de forma mais satisfatória as necessidades
dos homens, mas que, com o tempo, deixam de ser eficientes na resolução dos problemas,
acabando todos por ser substituídos por outros.

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EXEMPLOS:
Descontinuidade paradigmática: física aristotélica vs física coperniciana
Vimos isto acontecer na astronomia, com a revolução coperniciana, quando cientistas como
Giordano Bruno, Copérnico e Galileu defenderam, contra o paradigma geocêntrico, que era o sol,
e não a terra, que ocupava o centro do universo. Esta nova ideia só foi possível devido à
acumulação sucessiva de falhas do paradigma geocêntrico, que levou a uma crise e ao
aparecimento de uma nova conceção do mundo.
Assim, se compararmos a Física de Aristóteles com a Física de Copérnico, percebemos que
se trata de 2 paradigmas completamente distintos e que o segundo não dá continuidade ao primeiro.
Por exemplo, a física aristotélica não valoriza a observação quantitativa, recorre a uma linguagem
qualitativa e a princípios metafísicos que defendem a centralidade da terra e do homem, e defende
a imobilidade do mundo sublunar. A Física de Galileu, e dos seus seguidores, valoriza a observação
quantitativa, assenta na crença que Deus é um geómetra e escreveu as leis do universo em
linguagem matemática, desvaloriza o lugar do homem e põe a terra a mover-se em torno do sol.

Continuidade paradigmática: Copérnico vs Kepler


Muito diferente é o efeito que a teoria de Kepler teve no paradigma heliocêntrico
coperniciano. A ideia proposta por Kepler não punha em causa os princípios básicos do
heliocentrismo coperniciano, mas apenas uma das teorias: a teoria do movimento circular das
orbitas dos planetas. Assim, apesar de introduzir alterações ao paradigma heliocêntrico inicial, a
teoria de Kepler não levou a uma revolução, mas a uma correção, substituindo a ideia de
movimento circular pela de movimento elíptico. Claro que isto acarretou também algumas
alterações ao nível dos princípios metafísicos subjacentes ao paradigma, uma vez que o
fundamento da escolha da orbita circular, em detrimento da elipse, assentava na ideia de que o
universo era perfeito e, por isso, tinha de mover-se segundo a forma geométrica perfeita: o círculo.
Daqui decorre que um paradigma pode ser corrigido e desenvolver-se sem que isso
implique uma revolução, mas quando surge uma anomalia e a solução não consegue ser
integrada, este deve cair e dar lugar a um novo.

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II. OBJETIVIDADE NA CIENCIA

PROBLEMA: Podemos falar de objetividade na Ciência?


Se os problemas, teorias e regras científicas são definidas por paradigmas, a questão que
se coloca é a de saber se a escolha dos paradigmas obedece a critérios independentes e objetivos
ou se, pelo contrário, é determinada por interesses económicos, políticos, culturais ou religiosos.

TESE: A ciência não é objetiva no sentido de Popper, mas tem alguma objetividade
Segundo Kuhn, a escolha dos paradigmas é apenas, em parte, objetiva. Existem alguns
critérios que são seguidos na escolha, mas há fatores subjetivos que também condicionam a
escolha final.

ARGUMENTO
O homem é um ser racional e isso significa que privilegia certos valores como a ordem, em
detrimento do caos, a clareza/simplicidade, em detrimento do confuso/complicado, a
certeza/provado, em detrimento da incerteza/discutível. Neste sentido, no período da Ciência
Extraordinária, quando se tem que escolher, de entre paradigmas rivais, o paradigma que vai
substituir o antigo, os cientistas têm em conta critérios racionais. Vejamos os CRITÉRIOS DE
CIENTIFICIDADE pelos quais um paradigma/teoria é avaliado:
• EXATIDÃO – modelo deve permitir fazer previsões exatas
• CONSISTÊNCIA – modelo não pode conter afirmações/teorias contraditórias
• SIMPLICIDADE – modelo deve unificar fenómenos aparentemente distintos de forma a dar uma
imagem simplificada do real
• ABRANGÊNCIA – modelo deve explicar um número de fenómenos acima daquilo que tinha
previsto
• FECUNDIDADE – modelo deve permitir a descoberta de novos fenómenos e relação entre eles

Contudo Kuhn argumenta que a escolha dos novos paradigmas não é inteiramente
objetiva, porque, por um lado, os critérios não estão bem definidos e cada cientista interpreta os
critérios de forma diferente e, por outro, alguns critérios conflituam e anulam-se uns com os outros
e, quando isto acontece, não há acordo relativamente à prioridade que se deve dar a cada um.
Por exemplo, os cientistas podem escolher o paradigma (A) em função da sua simplicidade, mas
esse mesmo paradigma, do ponto de vista da abrangência é inferior ao paradigma (B). Ora, como
não há acordo relativamente à interpretação e hierarquização dos critérios, a escolha de (A) em
detrimento de (B) não é inteiramente objetiva e racional, mas uma escolha que se assemelha mais
propriamente a uma conversão religiosa.
Assim, Kuhn conclui que a ciência não é totalmente objetiva/racional, uma vez que existem
fatores de ordem pessoal, política, social, económica e religiosa que influenciam, numa

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determinada época a escolha de um paradigma em detrimento de outros rivais.
Exemplo:
A teoria heliocêntrica já tinha sido proposta por Aristarco na Grécia antiga (séc. III a.C), no entanto
só se conseguiu impor quase 1000 anos depois uma vez que contrastava demasiado com a cultura,
crenças e religião da época.

III.PROGRESSO NA CIENCIA

PROBLEMA: Podemos afirmar que há progresso na ciência?


A questão que se coloca é a de saber se os paradigmas novos constituem modelos
interpretativos melhores do que os velhos que foram abandonados e se, dessa maneira, estamos
hoje mais próximo da verdade.

TESE: Não há progresso, mas apenas substituição de paradigmas. O movimento da ciência


é descontínuo e não linear. Os paradigmas são incomensuráveis
Segundo Kuhn, os paradigmas desenvolvem-se e aperfeiçoam-se durante uma primeira fase
a que Kuhn chama de ciência normal, contudo com o avançar dos anos, a perceção do número
de anomalias aumenta e a própria imperfeição dos modelo acaba por se revelar, conduzindo a
uma crise que traz com ela, mais cedo ou mais tarde, a queda e substituição do paradigma.
Contudo os novos paradigmas não dão continuidade aos anteriores, constituindo modelos
radicalmente diferentes, que impõe uma nova interpretação da realidade que não é, mais
verdadeira do que a anterior, mas apenas diferente.

ARGUMENTO
Kuhn argumenta que os novos paradigmas são sistemas únicos, dotados de uma identidade
e “personalidade” própria, assente em pressupostos e lógicas inteiramente diferentes e irredutíveis
aos paradigmas anteriores. Este facto, torna, no entendimento de Kuhn, a comparação entre os
paradigmas, e a sua avaliação, uma espécie de “missão impossível”. Assim, Kuhn defende a
INCOMENSURABILIDADE DOS PARADIGMAS, querendo com isto dizer que não podemos
comparar nem medir as conquistas de cada paradigma.
A diferença entre os paradigmas não é de grau, mas de essência ou natureza. O que os
separa não é uma diferença quantitativa, no sentido em que o novo explica tudo o que o antigo
explica e mais, mas uma diferença qualitativa, ou de natureza, uma vez que o novo tem uma outra
descendência, uma outra lógica, outros pressupostos que lhe conferem uma identidade própria,
tornando-o incomparável, único.

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CRÍTICAS A KUHN
1. Alguns críticos de Kuhn contestam a tese da incomensurabilidade argumentando que se a
escolha a favor de um novo paradigma tem por base o facto do novo paradigma ser capaz de
resolver as anomalias que o seu antecessor não resolve, então isso prova que podemos fazer
uma comparação entre ambos: o novo resolve e o antigo não.
Neste sentido parece legitimo afirmar que o novo é melhor, o que contraria a tese da
incomensurabilidade.
Exemplo:
A teoria da relatividade de Einstein é superior à de Newton, uma vez que esta teoria conseguiu
resolver o problema das previsões da posição de Mercúrio que a teoria de Newton não resolvia.
Comentário: um defensor de Kuhn pode objetar que os exemplos invocados encontram-se dentro da ciência
normal e não entre dois paradigmas. Com efeito, Kuhn admite o crescimento do paradigma, mas não o
crescimento da ciência no seu todo.

2. Um outro argumento contra a teoria da incomensurabilidade apoia-se nas inúmeras


conquistas da Medicina, Biologia, tecnologia, Química e Física, que permitem que hoje a
esperança média de vida tenha duplicado, que o homem tenha ido à lua, que satélites explorem
as profundezas do nosso universo, que se consigam prever catástrofes e agir preventivamente,
que se venha a evitar que o novo vírus da gripe - Covid 19 – seja tão mortífero quanto o vírus da
gripe espanhola que no início do séc. XX matou 50 milhos de pessoas. Todos estes casos
parecem contradizer a ideia de que a ciência não progride.
3. Uma outra crítica é dirigida ao relativismo radical de Kuhn e a ideia de que não há uma
verdade, mas interpretações múltiplas e incompatíveis do real.

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