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Rev. Bras.

de Hipnose 2015; 26(2): 54-67

ISSN 1516-232X
Revista
Associação Brasileira de Hipnose - ASBH
Brasileira de
Hipnose
www.revistabrasileiradehipnose.org.br

A hipnose Auxiliando em Provas de Concurso


Hypnosis Helping to Contest
Miriam Pontes de Faria

Associação de Hipnose do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil

Resumo.
O objetivo do presente trabalho foireunir dados bibliográficos visando a apresentação da hipnose e a auto-hipnose
como recursos eficazes para a redução da ansiedade e do estresse a que são submetidas as pessoas em processo de
preparação para provas e concursos.

Palavras-chave: hipnose, auto-hipnose, prova, concurso.


Abstract.
The aim of the present study was to gather bibliographic data to present hypnosis and self-hypnosis as effective
resources for the reduction of anxiety and stress in people preparing process for tests and contests.
Keywords: hypnosis, self-hypnosis, test, contest.

1. Introdução
Cada vez mais revistas, jornais e meios de O estresse e a ansiedade são condições in-
comunicação em geral debatem sobre a situa- ternas naturais em tais candidatos, que acresci-
ção do desemprego. As tecnologias modernas, dos de fatores emocionais intervenientesque
a informatização, a automação, geram uma interferem no aprendizado e prejudicam, sem
queda significativa da demanda de mão-de- dúvida, o desempenho do indivíduo, prejudi-
obra, dificultando a empreitada dos jovens que cando tanto na sua preparação quanto na exe-
buscam o primeiro emprego. cução de provas, o que pode acarretar a perda
No Brasil, o desemprego tem provocado da tão almejada vaga.3
uma crescente procura por concursos públicos, Há vários autores mostrando que a hipnose
que pode ser verificado na mídia especializada é uma modalidade de psicoterapia breve que
onde a oferta por cursos preparatórios é gran- pode valorizar a auto-estima, a autoconfiança e
de. Além disso, um número crescente de pro- a segurança, e acreditamos que seja um recurso
fissionais temprocurado capacitação para mi- capaz de desenvolver a segurança e diminuir o
nistrar aulas das matérias específicas de con- estresse e a ansiedade, contribuindo para o su-
cursos. Não podemos deixar de mencionar a cesso frente à realização de provas de concur-
Internet, que tem várias páginas sobre o te- so. A introdução da técnica da auto-hipnose na
ma1,2. vida do candidato pode maximizar o seu po-
tencial de aprendizagem e tornar o resultado de
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seus estudos mais efetivo, além derepresentar consideradas valiosas para a redução e inibição
uma possibilidade de melhora na sua qualidade da ansiedade3. As técnicas de relaxamento e
de vida4,5. redução da ansiedade induzem a atuação do
O objetivo deste trabalho foi reunir dados sistema nervoso parassimpático e levam o or-
bibliográficos que justifiquem a hipnose e a ganismo a um estado de conforto e bem-estar3.
auto-hipnosecomo recursos eficazes para a re- A ansiedade é um sinal de alerta, que permite ao
dução da ansiedade e do estresse a que são indivíduo ficar atento a um perigo iminente e
submetidas as pessoas em processo de prepa- tomar as medidas necessárias para lidar com a
10
ração para provas e concursos. ameaça .
A ansiedade é uma resposta reconhecida
2. Método pelos sintomas e difícil de conceituar devido à
sua complexidade e variação. Por outro lado,
Otrabalho de cunho bibliográfico teve como todas as pessoas experimentam algum grau de
referencial teórico autores tais como: David ansiedade em diferentes situações de suas vi-
Akstein1,6, Milton Erickson, Osmar Andrade das. A ansiedade é basicamente uma resposta
Faria7, Sofia Bauer8 e Tereza Robles9, autores de proteção, que prepara o organismo para ata-
esses estudiosos da hipnose. Consultamos, na car ou fugir de um perigo percebido, seja ele
área da psicologia cognitivo-comportamental, real ou não3.
principalmente as obras do Prof. Bernard É importante entender que a ansiedade é
Range3. uma sensação natural. Todos os indivíduos
sentem ansiedade, podendo ela se apresentar
3.Ansiedade e Estresse em intensidades e momentos diferentes, princi-
palmentediante de alguma ameaça. Numa si-
3.1. Ansiedade
tuação onde a pessoa esteja correndo perigo, é
Em se tratando de ansiedade, sabemos que natural aparecer ansiedade como forma de de-
é uma condição humana, necessária para nossa fesa; nesse caso, atuará como um alarme, para
existência; sem ela, não conseguiríamos sobre- que a pessoa possa se preservar. Portanto,
viver. A ansiedade nos impele (Drive) para certo nível de ansiedade é normal. Mas quando
realizar nossos objetivos. O que a torna preju- ela aparece de forma muito intensa e constante
dicial é quando se torna incontrolável, exces- provocando dificuldades na execução das
siva e exacerbada.10 tarefas diárias, impedindo e paralisando com o
O candidato de provas e concursos, na medo (agorafobia) a realização dos afazeres
maioria das vezes, apresenta-se bastante ansio- quotidianos, leva a pessoa a muito sofrimento.
so. Ele percebe cobrança por parte dos fami- Nestes casos, é recomendado procurar um o
liares, dos amigos e de si próprio quanto ao auxílio médico e paralelamente psicoterápico.
resultado, a aprovação no concurso. Faz-se
mister passar logo nos primeiros concursos.
3.2.Estresse
Esta ansiedade é natural, pois há investimento
por parte do candidato tanto em questão de O candidato a provas e concursos tende a
tempo quanto de dinheiro4. ficar estressadopor várias razões, entre elas4:
Através de algumas técnicas da terapia a) pela quantidade de matéria a estudar até a
cognitivo-comportamental, principalmente da data da realização da prova;
estratégia “Acalme-se”, vislumbra-se um mé- b) pelo curto tempo para dar conta de todo o
todo excelente para diminuir a ansiedade. A- programa sugerido pelo edital;
lém disso, há também o relaxamento pro- c) pela necessidade de conciliação entre sua
gressivo, técnicas respiratórias e outras. Mas, vida pessoal, profissional e afetiva, que de-
sobretudo, as técnicas de hipnose têm sido

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verá ser administrada junto ao empre- Resistência – as mudanças da fase anterior, se


endimento do estudo para a prova. persistirem por tempo indeterminado, levam a
pessoa à fase da resistência. Nesta fase, o
Enfim, várias atividades deverão ser acres-
organismo busca a adaptação. Isto ocorre por
cidas ao estudo. É muito comum o candidato
causa da tendência a procurar a homeostase
apresentar tanto ansiedade quanto estresse,
interna.11
nesse período de dedicação e empenho aos
estudos. Exaustão – quando os sintomas da fase
O estresse é uma resposta complexa do anterior persistirem, e a pessoa ainda não
organismo, que envolve reações físicas, psi- encontrou nenhuma forma satisfatória de
quícas e hormonais frente a qualquer evento administrar seu estresse, poderá chegar à fase
que seja interpretado pela pessoa como desa- de exaustão. Nesta última, o organismo exaure
fiante. Nosso enfoque é a resposta do orga- a sua reserva de energia adaptativa, podendo
nismo a um estímulo mediado pela interpre- surgir então doenças, que são, em geral,
tação que lhe é dada. Esse estímulo, inter- chamadas de psicosomáticas.11
pretado como desafiador provoca uma quebra As doenças mais comuns são: hiperten-
na homeostase do funcionamento interno que, sãoarterial, úlceras gastroduodenais, câncer,
por sua vez, cria uma necessidade de adapta- psoríase, vitiligo, retração de gengivas entre
ção para preservar o bem-estar e a vida. A outras. Quando o estresse ocorre por um tempo
necessidade de adaptação exige a emissão de muito prolongado, ele atinge diretamente o
vários comportamentos adaptativos que se sistema imunológico, deixando o organismo
constituem na forma como a pessoa lida com o com pouca defesa, propenso à infecções e
estresse, ou seja, suas estratégias, adequadas doenças contagiosas13.
ou não, de enfrentamento.3,11 O estresse é um processo que se desenvolve
O estresse é um tema que passou a ser cada por etapas, é possível que um indivíduo tenha um
vez mais objeto de pesquisas. Muitos autores estresse temporário, de baixa ou grande intensi-
ao longo dos tempos vêm tentando definir dade, esteja na etapa de resistência ao fato gera-
dor de desequilíbrio, ou já esteja em estado de
cientificamente o que é estresse. Vários con-
depauperização tão grande que doenças graves
ceitos foram criados, sem que se tenha surjam.
3
chegado a um acordo, mas quando se fala em
estresse, não podemos deixar de citar Selye12, O estresse provoca reações físicas eemo-
endocrinologista, que ficou conhecido como o cionais. Do ponto de vista psicológico, podem
“pai da estressologia”. ocorrer apatias, depressão, desânimo, sensação
Através de experimentos com ratos, Selye12, de desalento, hipersensibilidade emocional,
observou que o estresse se desenvolve em três raiva, ira, irritabilidade, quadros de ansiedade
fases e que em cada uma delas ocorrem etc...
alterações no organismo. Para ele, o organismo Sabe-se que o estresse não é propriamente
tenta, o tempo inteiro, se adaptar a situação uma doença a ser tratada, e sim, um facilitador
estressora e, nesta tentativa, usa uma grande para que se desenvolvam doenças que o indiví-
quantidade de energia que, de certa forma, vai duoé predisposto. Não é considerado um
exaurindo o organismo. As fases são: alerta, transtorno, mas uma resposta que o organismo
resistência e exaustão. encontra para dar conta e garantir o seu equilí-
brio e manutenção do próprio corpo13.
Alerta – o organismo se prepara para reações Quanto ao tratamento do estresse, consiste
de luta e fuga que estão associadas à preser- em aprenderformas de lidar melhor com este,
vação da espécie. Nesta fase os sintomas prevenindo para que não exceda à capacidade
incluem o preparo do corpo e da mente para do organismo e não resulte em prejuízos à
que o indivíduo priorize a preservação da saúde física e mental. Essas estratégias para
própria vida.11

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contornar o estresse promovem melhora na dos objetivos básicos da terapia cognitivo-


qualidade de vida. A auto-hipnose é uma comportamental é prever e controlar com-
estratégia que vem sendo utilizada com muito portamentos15.
sucessoneste sentido. O método psicoterapêuticose baseia no
estudo objetivo e experimental do comporta-
mento, fazendo com que a psicologia se torne
4. Terapia Cognitivo-Comportamental parte das ciências da natureza, tal como a
Aaron Beck foi um dos primeiros teóricos a Biologia.
desenvolver a terapia cognitiva, no início dos
anos 60. Atendendo pacientes com depressão, 4.1.Pensamentos e Crenças.
percebeu que o conteúdo, tanto dos pensamen- Dentro da linha cognitiva, existem três tipos
tos quanto dos sonhos, apresentava uma tem- de pensamentos, são eles: os pensamentos
dência para interpretar os acontecimentos do automáticos, as crenças intermediárias e as
dia-a-dia, sempre de forma negativa. Segundo crenças centrais15.
os pressupostos da teoria cognitiva, o indiví-
Pensamentos automáticos. São aqueles que
duo com transtornos psicológicos, conce-bem
surgem sem que o indivíduo deseje ou escolha,
a realidade de forma distorcida.14
são pensamentos persistentes e invasivos que
Depois de várias observações na clínica
causam sofrimento e angústia. Os pensamentos
médica e fazendo experimentos em pacientes
automáticos fazem com que a pessoa piore nos
depressivos, verificou que o fator principal,
seus sintomas de depressão, angústia e ansie-
que desencadeava a depressão, era a cognição
dade, porque releva as crenças negativas sobre
e não a emoção, como várias pessoas pensa-
si próprio. Eliminando-os, a pessoa se tornará
vam14.
mais positiva e ativa em suas novas aquisições.
É muito comum, ocorrer em candidatos que
estudam para concursos, dificuldades de aten- Crenças intermediárias. É muito comum can-
ção e concentração, em virtude de um quadro didatos a provas e concursos terem pensamen-
de depressão que muitas vezes nem se dão tos tais como: “não suporto esta matéria, eu
conta. Tal quadro ocorre pelo sentimento de não consigo aprender esta matéria, esta matéria
menos valia e da iminência de um fracasso. é muito difícil, este professor não sabe passar a
Um estudo realizado por Dattilio e Padesky
matéria” e outros do gênero... Estes pensamen-
(1995) sugere ser a terapia cognitiva tão efetiva tos são chamados de crenças intermediárias.
quanto os medicamentos para o alívio da Depres- Mesmo que o indivíduo não se dê conta, a
são Maior, além de apresentar uma taxa inferior crença intermediária é um recurso que ele
de recaídas quando comparada ao tratamento encontra para se livrar da crença central que
farmacológico. Outros estudos revisados por
Beck (1977) demonstram a eficácia da terapia
está no âmago do pensamento. Pode ocorrer
cognitiva no tratamento de transtornos de ansie- que crenças intermediárias se misturem aos
dade, transtornos alimentares, abuso de substân- pensamentos automáticos. 15
cias, problemas conjugais e depressão em pacien-
tes internados.
14 Crenças centrais. Em candidatos a provas e
concursos os pensamentos em relação às cren-
A terapia cognitivo-comportamental é ças centrais mais encontrados são: “não tenho
uma linha psicoterápica, que vem apresentando conhecimento suficiente para concorrer com os
resultados tão positivos que, com o passar dos outros candidatos, eu sou incompetente, eu sou
anos, se expandiu muito. Atualmente, atende a incapaz”. Tais pensamentos, na maioria das
uma demanda muito grande de pessoas que vezes, estão sempre relacionados com a baixa
apresentam quadros diversos, tais como: de- auto-estima do indivíduo. Nessas pessoas, são
pressão, síndrome do pânico, fobias diversas, observadospensamentos rígidos, ideias absolu-
ansiedade, compulsões e outros sintomas. Um tistas, em relação a ele próprio, ao próximo e

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ao mundo que os rodeia. São crenças muitas Contemple as coisas a sua volta, não fique
arraigadas em suas vidas e, portanto, difíceis olhando para dentro de você, observando tudo e
cada coisa que você sente. Deixe acontecer com
de serem mudadas. Geralmente, elas se desen- o seu corpo o que ele quiser, sem julgamento,
volvem muito cedo, na mais tenra idade, por nem bom nem mau. Olhe a sua volta, observando
meio de alguma expe-riência desagradável que cada detalhe da situação em que você está.
o indivíduo viven-ciou, até mesmo por um Descreva-os minuciosamente para você, como
trauma ou ainda pelo desenvolvimento de um meio de afastar-se de sua observação interna.
Lembre-se: você não é sua ansiedade. Quanto
complexos gerados pela criação dos pais e no mais você puder separar-se de sua experiência
convívio em família. A partir daí a pessoa interna e ligar-se nos acontecimentos externos,
passa a fazer associações com outras experiên- melhor você se sentirá. Esteja com ansiedade,
cias desagradáveis que experimentam ao longo mas não seja ela, seja apenas observador. É
de sua vida.15 necessário lembrar que esse segundo passo
também é uma estratégia de distração, técnica
A proposta psicoterapêutica também tem que faz parte e é muito usada na terapia
por meta desenvolver no candidato a provas e cognitivo-comportamental.
concursos a relativização de suas crenças. As- Haja com sua ansiedade. Haja como se você
bemos que os pensamentos geram compor- não estivesse ansioso(a), isto é, funcione com
tamentos, que por sua vez, geram novos senti- suas sensações de ansiedade. Diminua o ritmo, a
velocidade com que você faz as suas coisas, mas
mentos. Quando se entra com um recurso psi- mantenha-se ativo(a) e não se desespere,
coterapêutico, pode-se romper com o círculo interrompendo tudo para fugir. Se você fugir, a
vicioso entre pensamento, comportamento e sua ansiedade vai diminuir, mas o seu medo vai
sentimento que está causando a dificuldade pa- aumentar, e na próxima vez a sua ansiedade será
ra se estabelecer estratégias de estudo e execu- pior. Se você ficar onde está e continuar fazendo
as suas coisas, tanto a sua ansiedade quanto o seu
tá-las. A ideia principal é promover a mudança medo vão diminuir. Continue agindo, bem
de comportamento; iniciando atitudes diferen- devagar...
tes para a obtençãode resultados diferentes, Libere o ar de seus pulmões, bem devagar!
pois continuar fazendo ou pensando da mesma Respire bem devagar, calmamente, inspirando
formalevará aos mesmos resultados, ou seja, pouco ar pelo nariz e expirando longa e
suavemente pela boca. Conte até três, devagar, na
dificuldade de estudar e, o que é pior, senti- inspiração, outra vez até três, prendendo um
mentos de menos valia. pouco a respiração e até seis, na expiração. Faça
o ar ir para o seu abdome, estufando-o ao inspirar
4.2. A Estratégia “Acalme-se” e deixando-o encolher-se ao expirar. Não encha
os pulmões. Ao exalar, não sopre, apenas deixe o
Além de trabalharmos a cognição do indiví- ar sair lentamente por sua boca. Procure
duo utilizamo-nos de outras técnicas. Uma descobrir o ritmo ideal de sua respiração, neste
técnica que tem sido largamente eficaz é a estilo e nesse ritmo, e você descobrirá como isso
é agradável.
Estratégia “Acalme-se”, muito utilizada com Mantenha os passos anteriores. Repita cada
pessoas que apresentam um alto grau de ansie- um, passo a passo. Continue a: 1) aceitar sua
dade. A estratégia tem oito passos, são eles14: ansiedade, 2) contemplar, 3) agir com ela e 4)
respirar calma e suavemente até que o indivíduo
Aceite a sua ansiedade. Um dicionário define
diminua e atinja um nível confortável. Se você
aceitar como dar “consentimento em receber”.
continuar repetindo estes quatro passos,a pessoa
Concorde em receber as suas sensações de
irá aceitar, contemplar, agir e respirar.
ansiedade. Mesmo que lhe pareça absurdo no
Examine seus pensamentos. Você talvez
momento, aceite as sensações em seu corpo,
esteja antecipando coisas catastróficas. Você
assim como você aceitaria em sua casa um
sabe que elas não acontecem. Você já passou por
hóspede inesperado e desconhecido ou uma dor
isso muitas vezes e sabe que nunca aconteceu
incômoda. Substitua seu medo, raiva e rejeição
nada do que você pensou que aconteceria.
por aceitação. Não lute contra as sensações.
Examine o que você está dizendo para você
Resistindo você estará prolongando e intensi-
mesmo(a) e reflita racionalmente para ver se o
ficando o seu desconforto. Ao invés disso, flua
que você pensa é verdade ou não, você tem
com ela.

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provas sobre se o que você pensa é verdade? Há ça uma respiração abdominal, procure sempre
outras maneiras de você entender o que está lhe inspirar pouco ar e soltar bastante ar, uma
acontecendo? Lembre-se: você está apenas
ansioso(a): isto pode ser desagradável, mas não é
quantidade de ar bem superior à que foi inspi-
perigoso. Você está pensando que está em perigo, rada.
mas o eu você tem de provas reais e definitivas O quinto passo: mantenha os passos anterio-
disso? res, ou seja, aceite a sua ansiedade, contemple
Sorria, você conseguiu! Você merece todo o as coisas a sua volta, aja como se você não
seu crédito e todo o seu reconhecimento. Você
conseguiu, sozinho(a) e com seus próprios
estivesse ansioso(a) e por fim, libere o ar de
recursos, tranquilizar-se e superar este momento. seus pulmões.
Não é uma vitória, pois não havia um inimigo, O sexto passo: examine os seus pensa-
apenas um visitante de hábitos estranhos você mentos, é importante lembrar que os nossos
passou a compreendê-lo e aceitá-lo melhor. Você pensamentos são os nossos maiores aliados,
agora saberá como lidar com visitantes estranhos.
Espere o futuro com aceitação. Livre-se do
então examine os seus pensamentos agora e
pensamento mágico de que você terá se livrado observe o que você está dizendo para você, ali-
definitivamente de sua ansiedade, para sempre. mente a sua mente com pensamentos agra-
Esta é necessária para você viver e continuar dáveis, positivos e prósperos. Faça com que os
vivo(a). Em vez de considerar-se livre dela, seus pensamentos trabalhem ao seu favor e não
surpreenda-se pelo jeito como você a maneja,
como você acabou de fazer agora. Esperando a
contra você. Deixe ao seu alcance e use o car-
ocorrência de ansiedade no futuro, você estará tão de lembretes, com frases positivas e anima-
em uma boa posição para lidar com ela doras.
3
novamente. O sétimo passo: sorria, você é capaz de so-
O primeiro passo: aceitar a sua ansiedade, zinho, através de seus próprios recursos admi-
mesmo que no momento lhe pareça absurdo, nistrar um momento de ansiedade, ouse a fazer
sabemos que somos impotentes diante do fun- por você aquilo que somente você pode fazer.
cionamento corporal e das sensações que O oitavo e último passo: espere o futuro
percebemos. Assim, do que adianta nos preo- com aceitação, se livrar do pensamento mágico
cuparmos com elas? que o está atrapalhando, você terá se livrado,
O segundo passo: contemple as coisas à sua de uma vez por todas, de sua ansiedade, pois
volta, pare de ficar olhando para dentro de fique sabendo, que a nossa ansiedade é uma
você observando tudo, e cada coisa que sente. condição humana e necessária para a nossa
Ao invés de ficar se observando, ligue-se nos existência. Sem ela, jamais iríamos realizar
acontecimentos externos. É necessário lembrar nossos sonhos ou os nossos objetivos. Por-
que esse segundo passo também é uma estra- tanto, ter ansiedade é natural e somente quando
tégia de distração, técnica que é muito usada ela está a um nível muito elevado, trazendo
na terapia cognitivo-comportamental para vá- desconforto para o indivíduo é que precisamos
rias situações. A ideia principal é voltar-se pa- procurar ajuda, com profissionais da área de
ra fora do corpo e se distrair com o que está à saúde. Nos demais casos, o segredo é saber
sua volta. manejar o momento de ansiedade.
O terceiro passo: aja como se você não Com o recurso da estratégia “Acalme-se”
estivesse ansioso. Vá agindo bem devagar, cal- você pode sozinho administrar o momento de
mamente, sem pressa, diminuindo o ritmo e a ansiedade.
velocidade com que você faz as suas coisas. É percebido que o exercício constante da
Comece a transmitir para sua mente movimen- estratégia “Acalme-se”, promove nos alunos
tos, atitudes e comportamentos mais lentos, de de provas e concursos uma redução significa-
calma e tranquilidade. tiva da ansiedade. É recomendada como tarefa
O quarto passo: libere o ar de seus pulmões, de casa, uma vez ao dia, para que assim,
inspire pelas narinas e solte o ar pela boca, fa- possam criar o hábito de manterem-se calmos
e tranquilos, mesmo que as coisas à sua volta
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apresentem um ritmo frenético. A estratégia Nessa técnica a orientação é que o indiví-


“Acalme-se” é simples e fácil de memorizar, duo relaxe progressivamente, parte por parte
pois o termo“acalme-se” é uma técnica de me- do seu corpo, até que, no final, alcance um
mória chamada mnemônica, sendo cada letra relaxamento completo. Com o decorrer da
uma frase que forma um passo.15,16 prática a pessoa conseguirá sozinha ficar ime-
diatamente relaxada.
4.3. Relaxamento Progressivo
É importante ressaltar que o Relaxamento
Progressivo, além de ser uma técnica usada na 5. Hipnose
da terapia cognitivo-comportamental, é tam- De acordo com o conceito estabelecido pelo
bém um método muito utilizado nas práticas Dicionário Aurélio (9), hipnose é um “tipo
de hipnose assim como em auto-hipnose. É especial e incompleto de sono, provocado por
considerado uma técnica da hipnose clássica. meios vários, executados pelo hipnotizador,
As outras técnicas de hipnose clássica serão cujas sugestões o hipnotizado obedece”.
apenas citadas nasessãoa seguir, a título de É muito comum encontrarmos conceitos ou
informação, mas não serão detalhadas tal como citações associando à hipnose ao sono. Sabe-se
a técnica do relaxamento progressivo, que é a que, em hipnose, o indivíduo fica em um es-
mais relevante para o nosso trabalho. tado entre o sono e a vigília, estado de relaxa-
O relaxamento progressivo foi criado e mento em que se concentra a atenção em um
desenvolvido por Jacobson em 1938, médico e foco e se dispersa os estímulos periféricos,
fisiologista. Nesse método, espera-se obter, portanto, não há sono, apenas relaxamento.
progressivamente um estado de relaxamento, Quando se fala da hipnose como uma
sabe-se que a tensão física está ligada direta- prática de submissão, em que o paciente fica à
mente ao estado psíquico, pois quando se rea- mercê do hipnólogo, observa-se que isso é um
liza o relaxamento muscular, o indivíduo pro- mito e deve ser esclarecido. Em momento
moverá um benefício para a parte psicológica e algum o paciente, sob transe hipnótico, perde a
esse benefício trará um grande estado de rela- consciência. Quem faz tratamento sob hipnose,
xamento. Atualmente comprova-se que tanto o fica o tempo inteiro atento a voz do hipnólogo,
relaxamento progressivo quanto a hipnose co- apenas em estado de atenção concentrada.
laboram para redução dapressão arterial, bem Portanto, somente obedecerá às sugestões que
como na melhoria da função cardíaca2. A não sejam contrárias as suas crenças e aos seus
prática do relaxamento progressivo constante- valores1.
mente visa à eliminação da tensão e, especi-
ficamenteno trabalho de preparo para provas e 5.1. História da Hipnose
concursos, a redução do estresse e ansiedade. Para começarmos com o tema, vamos fazer
O relaxamento progressivo pode ser tanto uma viagem de volta no tempo; ou seja, vamos
fisiológico quanto cognitivo, o fisiológico discorrer sobre a história da hipnose.
quando você vai orientando o indivíduo e reco- As benzedeiras, os pajés, os curandeiros, os
mendando que ele contraia as partes do corpo. espíritas e os ministros religiosos executam
O exercício é de contração e, em seguida, de uma espécie de hipnose aceita pela sociedade.
relaxamento, o objetivo disso é que a pessoa Através deles, podemos observar o poder da
perceba a diferença entre estar com os mús- palavra e a crença de um povo.
culos contraídos e os músculos relaxados. Já o Desde o início da humanidade o transe
cognitivo é orientado para que a pessoa sinta, hipnótico vinha sendo realizado por diversos
perceba ou observe a parte do corpo e em povos, culturas e também através de rituais
seguida solte e relaxe a parte citada2,15. religiosos. Em momento algum a hipnose foi
vista como prática científica. Somente com

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Mesmer é que a hipnose deu um salto de lizou inúmeras cirurgias sem que o paciente
qualidade: passou de misticismo para ciência. sentisse dor, com muito sucesso. Pelos resul-
Franz Anton Mesmer, médico, em 1765 na tados satisfatórios, recebeu apoio governamen-
França, colocava magnetos na cabeça dos seus tal para dar continuidade ao seu trabalho de
pacientes e fazia induções. Os pacientes ti- pesquisa. 1,17
nham uma melhora surpreendente. Em alguns O inglês James Braid era contrário ao pen-
casos chegavam à cura. A procura pelo trata- samento mesméricoe, para ele, o que na época
mento era tanta que ele resolveu criar um ins- se chamava de fluido magnético era na verda-
trumento para tratar muitas pessoas ao mesmo de um fenômeno neurofisiológico. No ano de
tempo. Tinha capacidade para atender, de cada 1842, Braid tentou mudar o nome de hipnose
vez, 130 pessoas. Foi construído com hastes para monodeísmo, pois a palavra hipnose nos
metálicas magnetizadas e quando os pacientes remete à palavra sono. Apesar de todo esforço,
o tocavam, recebiam o fluido magnético. A ele não conseguiu tal mudança, e o termo
prática criada era tão surpreendente, que come- hipnose continua a ser usado. 1,17-19
çaram a investigar. Troca-ram o ímã por outros Na França, no final do século XIX, sur-
objetos e se obtinha os mesmos resultados. giram duas escolas que proporcionaram uma
Diante deste fato, conside-raramMesmer um grande contribuição científica para a hipnose,
charlatão e assim foi expul-so da França1,17. são elas:

Ele acreditou que alguma desconhecida força Escola de Nancy. Fundada por Ambroise
estivesse presente. Conjeturou que o corpo Auguste Liébeault e HyppoliteBernheim. Com
humano se apresentava como um ímã, com dois Berhneim a hipnose passou a ter maior crédito,
pólos, havendo um fluido magnético invisível pois ele era professor de medicina, sendo um
que dele emanava. A doença seria explicada pelo
profissional respeitado no meio acadêmico.
desarranjo deste fluído e poderia ser curada
pela correção do mesmo. Somente certas pessoas Esta escola se referia a Lei do Ideodinamismo,
podiam controlar o fluido magnético e emana-lo ou seja, acreditava na sugestão: toda sugestão,
1
para o corpo da pessoa enferma. quando repetida por várias vezes, o paciente
atingia a cura.
Mesmer foi um inovador: criou o mesme-
Escola de Charcot (Escola de Paris). Jean
rismo, teoria do magnetismo animal. Sua téc-
Martin Charcot, em atendimentos com histé-
nica suscitou polêmica na época e foi criticado
ricas na faculdade de medicina, começou ob-
no meio acadêmico. Entretanto, conseguiu aju-
servando o que acontecia quando uma paciente
dar muita gente junto à população. Cabe res-
entrava em estado de transe; depois, desenvol-
saltar que ele foi um ícone para que a hipnose
veu suas próprias pesquisas. Charcot discorda-
se inserisse no meio científico.
va da escola de Nancy no que tange à sugestão,
Abade José Custódio de Faria, monge, em
mas acreditava no magnetismo. Descreveu 3
1813 em Paris, se baseando no método do
níveis de hipnose, são eles: catalepsia, letargia
mesmerismo, usado em anestesia cirúrgica, ve-
e sonambulismo. A escola de Charcot tinha,
rificou que os resultados benéficos da hipnose
por meta, estudar os fenômenos objetivos. Em
não eram um poder especial que o hipnólogo
1878, começou a ministrar aulas sobre hipno-
possuía, mas recursos do próprio paciente.
se, vários médicos eram seus alunos, entre
Abade Faria, inseriu alguns conceitos em hip-
eles, Sigmundo Freud.
nose tais como: signo-sinal ou sinal-hipnóge-
EmilieCoué, farmacêutico, realizou pesqui-
no, sugestão pós-hipnótica e autos-sugestão1,17.
sa com vários dos seus pacientes usando a
O cirurgião inglês James Esdaile, em 1830,
autossugestão. Percebeu que para se obter bons
foi para Índia, e por falta de anestésico, utili-
resultados não havia necessidade de se estar
zou a indução hipnótica para anestesiar paci-
em estado de hipnose. O seu trabalho ficou
entes. Através da anestesia mesmérica, ele rea-
conhecido como método de Coué ou da Nova

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Escola de Nancy. Segundo ele, o horário mais esperar já que os prejuízos da guerra eram
indicado para se fazer a autossugestão ocorre avassaladores. 19,20
nos momentos antes de se adormecer19. Milton H. Erickson (1901-1980), médico
Sigmundo Freud, estudou com Charcot, de- psiquiatra e psicólogo,considerado o marco da
pois com Liébeaut eBernheim, e se interessou hipnose moderna, pois foi o criador da hipnose
muito pela sugestão pós-hipnótica. Através de hoje conhecida como “hipnose com aborda-
suas práticas com hipnose, verificou que nem gemEricksoniana” ou “hipnose feita sob medi-
todos os pacientes entravam em estado de da”. Nessa abordagem, a história do paciente é
transe. Além disso, quando a paciente, através acessada através das metáforas, que facilita o
da hipnose, descobria o que acontecera com acesso aos dados inconscientes e consequente-
ela, não trazia melhora alguma para seus mente, ativando o processo psicoterapêutico21.
sintomas. Desistiu da hipnose para se dedicar
ao método da associação livre, ao qual deu o
5.1.1 –Hipnose no Brasil
nome de Psicanálise.
É importante ressaltar que dois aconte- O médico brasileiro Dr. David Akstein1,6,
cimentos fizeram com que a hipnose caísse em autor do livro intitulado “Hipnologia”, é
descrédito: primeiro, o surgimento da anestesia considerado um hipnólogo de reconhecimento
química. Depois, o advento das psicoterapias, internacional. Através de sua dedicação e pai-
em especial, a Psicanálise com a posição de xão pela hipnose, o Dr. Aksteinconseguiu, jun-
Freud frente à hipnose, o que influenciou to à sociedade, elevar a Visão da hipnose aum
muito os seus seguidores. A partir desses patamar científico, retirando-a da apresenta-
dados de realidade a hipnose teve um grande ção de palco. Criou a técnica de hipnose T.T.T,
retrocesso, voltou à apresentação de palco ao outerpsicoretranseterapia, e o teste do reflexo
momento anterior a Mesmer. A comunidade concentrador. Em 1956, Dr. Akstein começou
científica a abandonou. Continuou somente em a difundir a hipnose no Brasil e trouxe o pro-
laboratório de psicologia e de reflexologia da fessor argentino José Torres Norry, que minis-
Escola Pavloviana. trou o primeiro curso de hipnose nos estados
Ivan Petrovich Pavlov, considerado o pai da do Rio de Janeiro, São Paulo, Campinas e
reflexologia, trouxe grande contribuição para a Curitiba, com o respaldo do Ministro da Saúde
hipnose e adotou o termo reflexo condicionado Dr. Maurício de Medeiros, psiquiatra.
simples. Segundo ele, através da palavra pode Outra contribuição muito importante do Dr.
se ativar, modificar, estimular ou inibir uma David Akstein foi que, junto com outros
reação e assim, alterar a emoção e o sentimen- médicos, fundou em 27 de agosto de 1957 a
to. Sociedade Brasileira de Hipnose (SBH), hoje
No período da segunda Guerra Mundial Associação Brasileira de Hipnose (ASBH),
(1939-1945), a hipnose voltou a ser praticada tendo sido seu primeiro presidente. Em 27 de
e, sobretudo, a ser reconhecida pela comuni- agosto de 1983, o Dr. Walter Mastrocolla
dade científica. Nos campos de concentração, fundou a Sociedade de Hipnose Médica do
o anestésico químico era somente usado em Estado do Rio de Janeiro(SOHIMERJ).16
grandes cirurgias, já que era escasso. Os de- No período de 1991 a 1998, o Dr. Fernando
mais procedimentos cirúrgicos se realizavam Rabello21, médico, autor do livro “A Hipnose
através da hipnose. Houve também neces- no terceiro Milênio”, ministrou cursos e super-
sidade de lançarem mão de uma psicoterapia visões no Hospital Miguel Couto e abriu no
breve para ajudar os indivíduos que sofriam as serviço público um ambulatório de Hipnose,
consequências da guerra, os chamados neuró- para a população de baixa renda. Entretanto,
ticos de guerra. O objetivo era de auxilia-los depois do seu falecimento, a direção do hospi-
de forma mais rápida pois, não havia como tal fechou o ambulatório.

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A hipnose é uma prática médica, foi apro- que sentimos e o que pensamos. Enfim, a lin-
vada pelo CFM (Conselho Federal de Medici- guagem nos coloca em contato com outros
na), em 20 de agosto de 1999 sendo autorizada seres e é através dessa relação com o outro é
aos médicos. Em 2000, o Conselho Federal de que construímos a nós mesmos. Partindo desse
Psicologia autorizou o uso da hipnose pelos princípio, podemos pensar sobre a relação
psicólogos, e os dentistas já tinham essa autori- terapêutica entre o paciente e o hipnólogo. A
zação por parte do Conselho Federal de Odon- palavra é o instrumento fundamental de comu-
tologia desde 1987. Cabe aos profissionais das nicação entre o hipnólogo e o paciente. É atra-
respectivas áreas fazer uso das técnicas de hip- vés da sugestão que o indivíduo entra em
nose com transparência, seriedade e ética, so- estado de transe.
bretudo, promovendo melhor qualidade de vi- A sugestão pode ser direta ou indireta. Na
da para a população2,17. direta, o hipnólogo, através da anamnese colhe
Segundo o CFM, a hipnose é indicada como os dados do paciente para na hora da prática
tratamento complementar nos seguintes qua- direta, fazer a indução que seja consoante com
dros: ansiedade, estresse, fobias, transtorno a linguagem do paciente. Procurar falar as
pós-traumático, transtornos alimentares e sexu- próprias palavras do mesmo. Já na indireta, a
ais, depressão, transtornos do sono, transtor- indução é transmitida através das metáforas, as
nos de personalidade, dependência química, estórias são formas de falar diretamente ao
doenças psicossomáticas de uma forma geral. inconsciente do paciente e assim, obter as mu-
danças almejadas13.
5.2.Classificação da Hipnose Há uma metáfora muito interessante. É a
metáfora do elefante acorrentado, que pode-
A hipnose pode ser dividida em dois tipos:
mos trabalhar com alunos se preparando para
hipnose clássica e a ericksoniana A hipnose
provas e concursos4.
clássica surgiu no século passado. Nesse méto-
do, o hipnólogo faz induções diretas. Dentre as
várias técnicas da hipnose clássica, podemos 5.2.1 – Metáfora Ericksoniana
citar as mais comuns, são elas: o método do O Elefante acorrentado. Você já parou para
relaxamento progressivo, citado anteriormente, observar o elefante no circo? Aquele enorme
que é também uma técnica da linha cognitivo- animal capaz de demonstrações de forças des-
comportamental. O método do pestanejamento comunais, mas antes de entrar em cena perma-
comandado, também conhecido como pestane- nece preso, quieto, contido somente por uma
jamento sincrônico. Método do levantamento corrente, que aprisiona uma de suas patas a
da mão que foi criado por Milton Erickson. A uma pequena estaca cravada no solo, a estaca é
técnica da reversão do olhar. A técnica de apenas um pedaço de madeira, parece óbvio,
fixação do olhar criado por James Braid e o que aquele enorme animal, capaz de derrubar
método do relaxamento autógeno criado por uma árvore, com sua própria força, poderia
Schultz. Já na hipnose Ericksoniana, o método com facilidade, arrancá-la do solo e fugir. Que
é realizado por metáforas. Através das estórias mistério é esse? Porque será que o elefante do
contadas, pelo hipnólogo, o paciente poderá circo não foge? O elefante do circo não foge
ressignificar os conteúdos emocionais que es- porque ele está condicionado a não fugir, nos
tão provocando desconforto e diminuir a inten- primeiros momentos em que foi preso, ele for-
sidade da emoção que tanto o aflige12,17. çou, puxou, tentou se soltar e nada. Então, pas-
A diferença fundamental que distingue os sou a pensar que esse era o seu destino, ficar
animais dos seres humanos é a linguagem. Isso balançando o corpo de lá para cá eternamente,
é um fato: é através da palavra que nos relacio- esperando a hora de entrar em cena e fazer o
namos e interagimos com outros seres. É tam- seu show. O elefante do circo não foge por que
bém através da linguagem que expres-samos o pensa que não pode, pois, desde pequeno, foi

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condicionado. Para que o elefante do circo tar a mão, ele levanta bem devagar. Este estado
quebre as correntes, é necessário que ocorra de transe é o ideal para a hipnose, principal-
algo fora do comum, como por exemplo, um mente, para se fazer às sugestões, pois o
grande incêndio no circo. Isto faria com que o paciente está mais suscetível a voz do hipnó-
elefante, em desespero, quebrasse as correntes logo.
e fugisse. Essa é uma das possibilidades. Transe profundo. Alguns pacientes quando
Esta metáfora, em especial, nos remete aos estão realizando as práticas de hipnose relaxam
momentos em que estamos presos a valores, tanto que, às vezes, dormem. No transe profun-
pensamentos, sentimentos, comportamentos ou do, o indivíduo fica quase dormindo. Quando o
hábitos que nos impedem de estudar. Na mai- hipnólogo perceber que o paciente está dor-
oria das vezes, deixamos de estudar por estar-
mindo, é bom verificar certificando-se, per-
mos condicionados a situações que não trazem guntando, pois este é um estado desfavorável à
tanta satisfação e retorno quanto o simples ato hipnose. Quando o paciente dorme, rompe a
de estudar. É preciso que se comece a se refle- atenção com o hipnólogo, assim não aprovei-
tir, e a fazer coisas diferentes para se obter tando a prática, apenas estará descansando.
resultados diferente. Porque se continuarmos
fazendo as mesmas coisas, iremos ter os mês- Transe sonambúlico. É um tipo de transe mui
mos resultados que outrora. O objetivo é que to raro, mas pode ocorrer, é quando o paciente
assim se construa uma nova forma de atuarmos entra em estado de sono, se mexendo, andando
no mundo, criando mudança de comportamen- e falando.
to, então, criaremos novos hábitos13. Sinal-hipnogenio ou signo-sinal. Conceito
desenvolvido por Abade Faria, compreende-se
como o “sinal de sinais”, quando se realiza
5.3.Alguns Conceitos de Hipnose uma prática hipnótica seguida de indução.
5.3.1 – Transe Quando se percebe que o paciente está em
estado alfa, faz-se o signo-sinal. Através do
Existem quatro tipos de transe: o transe le- signo-sinal, não há necessidade de repetir to-
ve, o médio, o profundo e o sonambúlico. O dos os passos que levaram o paciente ao estado
tipo de transe no qual o paciente entra está hipnótico. Com ele, se acelera o processo do
relacionado com o nível de suscetibilidade de transe, não há necessidade de ir passo a passo.
cada um. Mas também, pode-se treinar um Trata-se de um condicionamento, o hipnólogo
paciente a entrar em transe com mais facili- condiciona o paciente a entrar rapidamente no
dade17. estado agradável que ele se encontra7.
Transe leve. O transe leve acontece o tempo Formar em alguém um reflexo condicionado
inteiro em nosso dia-a-dia, quando estamos é firmar uma resposta biológica dessa pessoa a
vendo um filme, um programa de televisão, uma determinada expressão verbal. Quando essa
assistindo a uma aula, lendo um livro ou até expressão verbal,por seu turno, reúne em si um
mesmo numa simples conversa; em todas essas conjunto de imagens representativas de outras
tantas realidades concretas, teremos que tal
situações, estamos atentos às atividades que expressão sinaliza, já em plano superior, a outras
estamos realizando. Na maioria das vezes não expressões sinalizadoras.
7

nos damos conta que estamos em estado de


transe leve, o que acontece naturalmente. Suscetibilidade.A suscetibilidade hipnótica é
a capacidade que o indivíduo possui de entrar
Transe moderado. Acontece quando o no estado de hipnose. Alguns autores acredi-
indivíduo atinge a frequência cerebral alfa, a tam que o grau de suscetibilidade é uma condi-
pessoa fica mais calma, mais relaxada, os seus ção genética, mas, outros, pensam que pode ser
movimentos ficam mais lentos, principalmente aprendido. No trabalho de hipnose é impor-
a fala. Quando se pede para o paciente levan- tante observar o grau de suscetibilidade do
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paciente. Quando ograué pequeno, através de Pele. Pode ocorrer alteração na cor da pele, so-
treinamento pode-se desenvolver a entrada em bretudo na face, que pode ficar avermelha-
nível alfa, com a ajuda detécnicas de relaxa- da17.
mento progressivo ou respiratórias17.
Dehipnotização ou apagamento. Ao
5.5. A Palavra e a indução hipnótica
términodo trabalho de hipnose, é recomendado
que o hipnotizado seja tirado lentamente deste Através das palavras nos comunicamos e
estado. O paciente em transe moderado apre- nos relacionamos com o mundo. A palavra é
senta um ritmo eletroencefalográfico na uma das formas de expressão mais comuns
frequência alfa. Este estado é propício para o entre os seres humanos. Ela tem um conteúdo
aprendizado, pois é relacionado com um esta- emocional e simbólico muito específico para
do de relaxamento e calma, tendo como resul- cada povo, civilização e, sobretudo, uma carga
tado a melhora da atenção e da concentração. cultural muito grande. A palavra é também
É o estado ideal para as induções hipnóticas. primordial no processo de cura.
Na dehipnotização, o paciente sai do ritmo Na hipnose, a palavra é o instrumento de
alfa, passando para o ritmo beta. Este é o ritmo trabalho essencial. É considerado o estímulo
normal da vigília17. Para a dehipnotização, a mais importante. Através dela conseguimos
voz do hipnotista abandona o tom monótono, colocar o paciente em um estado receptivo pa-
débil e ritmado, voltando ao tom normal e ra se obter respostas positivas e resultados efi-
utilizando alguma técnica de restauração do cazes ao tratamento. A palavra, quando expres-
estado de vigília normal. sada pelo hipnólogo, na indução, precisa ser
débil, monótona, ritmada e constante, porém
pungente1.
5.4. Alguns Sinais Físicos que Indicam O reflexo é a base fisiológica da adaptação.
Estado de Hipnose. “os reflexos constituem o elemento de adaptação
que possui o organismo em relação ao ambiente,
Respiração. Dependendo do paciente, a sua adaptação que permite ao organismo chegar a um
1
respiração pode estar mais lenta ou acelerada. estado de equilíbrio com esse ambiente”.
Para se perceber a alteração, é recomendado Segundo Pavlov, a palavra é o reflexo con-
observar-se o ritmo respiratório do paciente dicionado mais simples que existe; portanto,
antes de iniciar a prática de hipnose. através da sugestão, pode-se alterar, modificar
Temperatura. Pode ocorrer alteração na tem- estimular ou inibir uma emoção. Pensando nis-
peratura corporal, o paciente pode sentir muito to, devemos aproveitar ao máximo os recursos
frio ou muito calor, sem que o hipnólogo tenha da palavra para ajudar aqueles que nos procu-
feito sugestão alguma. ram6.
É preciso conhecer bem o paciente antes de
Pulso. Na maioria das vezes, o pulso fica mais realizar qualquer sugestão. Para isso é impor-
lento. tantíssimo que se faça uma anamnese, para
Olhos. Podemocorrer lacrimejar, movimento investigar a história de vida do paciente, desde
dos olhos, principalmente, quando o paciente a infância até a data atual.
está vendo, criando imagens mentais ou Na indução, deve-se incluir características
sonhando (Rapid Eye Movement), e vermelhi- intelectuais, emocionais e culturais do paci-
dão; mas isto é raro. ente. É preciso que o hipnólogo entre em sinto-
nia com o mundo do paciente, que fale a lin-
Músculos. Relaxamento na face, a boca fica
guagem que lhe é familiar e que mencione as
entreaberta, a cabeça, os pés e as mãos ficam
palavras, as frases que são ditas por ele. As-
mais soltos e podem pender pesadamente.
sim, o paciente aceitará a sugestão com mais

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facilidade. É o princípio da terapia “feita sob faz que promove efeito no paciente e sim, a
medida”2. sugestão que é aceita por ele mesmo que ajuda
A sugestão deve ser também entendida pelo a melhorar seu estado de saúde. Pensando
subconsciente, que tem apenas capacidade de nisso, toda sugestão é autossugestão. Portanto,
raciocínio dedutivo, percebendo e interpretando não há pessoa mais indicada para sugestionar
as sugestões de modo literal. Esse significado você do que você mesmo19.
literal muitas vezes é o significado aprendido
Seguem alguns princípios desenvolvidos
durante o período da aquisição da linguagem
falada.
2 por Emile Coué sobre a auto-hipnose.
-Toda ideia, boa ou má, introduzida no subcons-
Um item crucial para se observar, é o canal ciente, tende a se transformar, na medida do
de comunicação predominante no indivíduo, se possível, numa realidade.
ele é auditivo, visual ou cinestésico. Percebe- -A intensidade de uma sugestão é proporcional à
se o canal preferido através da linguagem e das emoção que a acompanha.
frases que o indivíduo expressa. Para as pes- -Não é a vontade a principal qualidade do homem,
mas a imaginação. Em todos os conflitos em que se
soas que tendem a ser visuais, na hora das opõem vontade e imaginação, é sempre a
sugestões, recomendar-se visualizar, imaginar, imaginação que importa.
recordar, transportar. Os auditivos, as induções -Quando uma ideia se apodera do espírito de uma
devem ser feitas de forma que ouçam um som pessoa, a ponto de provocar uma sugestão, todos os
agradável. A voz do hipnólogo deve assumir esforços que a pessoa faz para resistir à sugestão só
a fortificam e a ativam.
um tom suave. Para os cinestésicos, fala-se de -Tendo sido escolhido um objetivo, o subconsciente
tudo que se relacione com sensações: tocar, da pessoa se encarregará de encontrar os meios
pegar etc. e, finalmente, para os gustativos e os para realiza-lo. Chama-se a isto de “finalidade
olfativos que estão, intrinsecamente, ligados à subconsciente”.
degustação e ao cheiro, fala-se de sabores e - A sugestão só age se for transformada em
19
autossugestão.
odores.
O hipnólogo deve ter muito cuidado ao
selecionar as palavras. A Programação Neuro-
linguística (PNL) traz alguns auxiliares lin- 6. Conclusão.
guísticos que podem guiar nas induções22.
A psicologia vem, ao longo dos anos, se
apresentando como possibilidade de tratamen-
5.6. Auto-hipnose.
to que tem por objetivo os sintomas,doençasou
Antes de qualquer explanação sobre o tema, transtornos. Neste trabalho o enfoque é a saúde
é importantíssimo saber que “toda hipnose é e o auxílio àqueles que se predispõem a
auto-hipnose” e toda sugestão é autossugestão. estudar, vislumbrando alcançar algum objetivo
A autossugestão é a hipnose praticada pelo e, assim, atingir o um sonho. Compreende-se
próprio indivíduo, sem o auxílio de terceiros, que tanto a psicologia quanto a hipnose podem
para sugestiona-lo ou induzi-lo. oferecer uma atenção à saúde e ao bem-estar
Não podemos falar em auto-hipnose, sem do indivíduo e assim promover melhor quali-
deixar de citar Emile Coué, psicólogo e dade de vida para aqueles que estão em busca
farmacêutico francês que criou a técnica da de uma boa colocação ou para quem quer se
auto-hipnose. Observou que seus pacientes ti- projetar no mercado de trabalho. Segundo a
nham uma melhora surpreendente em seu tra- OMS – Organização Mundial de Saúde, saúde
tamento quando, juntamente com a medica- não é apenas ausência de doença, implica em
ção, Coué induzia alguma frase com o objetivo uma condição de equilíbrio biopsicossocial.
de potencializar o efeito do remédio, mesmo Pensando em qualidade de vida, previne-se
quando o medicamento era apenas placebo. doenças e promove-se a saúde.
Segundo Coué, não é a sugestão que o outro

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