Você está na página 1de 5

Universidade Veiga De Almeida

Pós-graduação em teoria psicanalítica e prática


clínico-institucional
Disciplina: Escritos técnicos
Docente: Adriana Bastos

ESCRITOS TÉCNICOS – O INÍCIO DO TRATAMENTO (1913)

Rachel de Mello Bandeira


Natália Russo de Andréa

Rio de Janeiro,
agosto/2020
ESCRITOS TÉCNICOS – O INÍCIO DO TRATAMENTO (1913)

Em 1913 Freud apresenta em seus escritos técnicos um artigo de


tamanha relevância à Psicanálise. Ele discorre sobre o início do tratamento
colocando em voga as recomendações técnicas da psicanálise. No presente
trabalho é sobre o artigo nomeado originalmente de Zur Einleitung Der
Behandlung. (Weitere Rastschläge Zur Technik Der Psychdanalyse I (O início
do tratamento. Novas recomendações sobre a técnica da Psicanálise I) que
iremos tratar.

É de significativa pontuação dizer que Freud não se propôs a fazer uma


espécie de manual técnico, nem que essas “recomendações” não foram
reivindicadas como obrigatórias para o exercício da clínica, portanto, são
parâmetros de tamanha importância afim de uma boa condução dos processos
analíticos.

Dentre tais recomendações está o período pré-analítico, onde é


necessário realizar com o possível analisante um momento determinado em
aproximadamente duas semanas, de escuta livre, com o propósito de perceber
se a psicanálise é apropriada para tal sujeito. Sem esse processo, existe
grandes chances de a análise cair em fracasso, visto que, é fundamental
identificarmos enquanto analistas a relação com o diagnóstico, como se
manifesta a neurose e/ou a psicose naquele sujeito, e sobretudo, se são
passíveis de tratamento analítico. O erro diagnóstico é caro ao psicanalista
caso ocorra “ele não pode manter sua promessa de cura caso o paciente sofra,
não de histeria ou de neurose obsessiva, mas parafrenia [esquizofrenia], e
então tem motivos particularmente fortes para evitar o erro diagnóstico” (Freud,
2010, p.125)

Freud marca que o tempo e o dinheiro são fatores relevantes para o


início do tratamento.

No tocante ao tempo, sigo estritamente o princípio de contratar uma


hora definida. Cada paciente recebe uma determinada hora de meu
dia de trabalho; ela é sua, ele é responsável por ela, mesmo quando
não a utiliza. [...] Com uma prática mais tolerante, as desistências
“eventuais” se multiplicam de tal forma que o médico vê ameaçada a
sua existência material. Na observância rigorosa dessa determinação,
porém, verifica-se que impedimentos ocasionais não ocorrem

1
absolutamente, e enfermidades intercorrentes são raras. (FREUD,
2010, p. 127)
O analista e o analisante, ambos são responsáveis pela hora do dia em
que foi combinada. O analista reserva para o analisante, e o analisante é
dirigente dela, mesmo quando este falta ao compromisso pactuado com o
analista. Todavia, as rupturas no tratamento são prejudiciais tanto para o
analista, quanto para o analisante. Para Freud (1913, p. 128) é fundamental
que a vivência real dos pacientes seja acompanhada de perto.
Freud ainda vai pontuar sobre os questionamentos que são feitos pelos
analisados sobre a duração do tratamento, que as considera legitimas tal
preocupação, mas assenta como uma indagação quase impossível de ser
respondida, dado a atemporalidade dos processos do inconsciente de cada
um. Mas, pondera que, existe uma proporcionalidade necessária a ser
considerada entre tempo, trabalho e êxito.

Freud deixa explícito a não recomendação em atender um paciente


quando existe algum vínculo social ou de amizade entre o analista e o
analisante, alertando que, independente do resultado da análise, isso poderá
custar a amizade, orientando dessa forma, a encaminhar o candidato à análise
para um outro profissional que confie.

Uma observação interessante feita por Freud em relação ao tempo de


análise, é quando ele afirma que é muito comum para a sociedade ter uma
hora determinada para algumas atividades como aula de idiomas, aula de
música, por exemplo, mas quanto trata-se do agendamento do horário com o
analista, o compromisso com o dia e horário da análise, nota-se que muitos
contratempos ocorrem levando ao não comparecimento do analisante ou
resultando em atrasos no horário acordado previamente. Com isso, Freud
alerta que quanto mais tolerante aos atrasos e faltas, mais eles ocorrerão.

Para tal, o dinheiro tem uma função importante na análise, pois está
relacionado com o empenho na análise, o quanto você está investindo tanto o
seu tempo, quanto o seu dinheiro, sendo um bom motivo para empenhar-se
pelo fim do tratamento, segundo Freud. Ressalta que a terapia analítica pode
não ser acessível financeiramente para todos e que não há muito o que pode
ser feito em relação a isso, uma vez que o tratamento gratuito tende a

2
aumentar as resistências e representa um significado maior para o analista do
que para o analisante.

Para a classe média, o gasto de dinheiro exigido na psicanálise é


excessivo apenas na aparência. Sem considerar que são
incomensuráveis, de um lado, saúde e capacidade de realização, e, de
outro, um moderado dispêndio financeiro: somando os gastos
infindáveis com sanatórios e tratamento médico, e contrapondo a eles
o acréscimo da capacidade de realização e aquisição, após uma
terapia analítica bem-sucedida, pode-se dizer que os doentes fizeram
um bom negócio. Não há nada mais caro na vida que a doença — e a
estupidez (FREUD, 2010, p. 134).

Freud recomenda o uso do divã, para que o analista se posicione


sentado atrás dele, de uma forma que o analisante não possa vê-lo. A ideia é
que as expressões no analista não sirvam de material para o analisante
interpretar e supor que determinada expressão se deu por algum motivo,
podendo atrapalhar de alguma forma a associação livre. É importante ressaltar
que no início do tratamento, é indicado que o analista explique ao analisante
que ele deve falar livremente sobre tudo o que lhe vier à cabeça, independente
de ordem cronológica ou sentido. O paciente deve falar sem interferências,
tomando o ponto de partida que quiser, pois o assunto que se inicia o
tratamento é indiferente.

Não é indicado que o tratamento seja conduzido de forma sugestiva,


pois cabe ao analisante sustentar uma posição onde ele supere determinadas
resistências, para isso, é preciso ter paciência e permitir que o analisante
desfaça a sua fixidez em relação a fantasia, permitindo ocupar um outro lugar
diante da fantasia. O que faz o neurótico sofrer tanto é a fixidez na função
fálica, quando a fantasia começa a não funcionar tão bem, abre espaço para a
angústia. A angústia é o único afeto que não mente, já o sintoma pode ser
considerado uma “mentirinha” para se defender da angústia.

3
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

FREUD, Sigmund; DE SOUZA, Paulo César. Observações psicanalíticas


sobre um caso de paranoia relatado em autobiografia (" o caso
Schreber"): artigos sobre técnica e outros textos. Companhia das Letras,
2010.

Você também pode gostar