Você está na página 1de 37

TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS DE ATENDIMENTOS

1
SUMÁRIO

FACULESTE............................................................................................ 2

Introdução ................................................................................................ 3

A Entrevista Clínica Psicanalítica ............................................................ 7

Entrevista Inicial ................................................................................... 8


Compreensão processualmente orientada na primeira entrevista .. 12

O uso da interpretação na entrevista inicial .................................... 13

A contratransferência...................................................................... 15

Processo terapêutico psicanalítico: Objetivos e procedimentos na


prática ........................................................................................................... 18
Devolução e contrato ......................................................................... 31
REFERÊNCIAS ..................................................................................... 34

1
FACULESTE

A história do Instituto FACULESTE, inicia com a realização do sonho de


um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para
cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a FACULESTE,
como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A FACULESTE tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas


de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

2
Introdução

Uma técnica utilizada pelos psicanalistas para um momento de avaliação


prévio à análise, da verdadeira demanda do sujeito são as entrevistas
preliminares. Freud estabelece um período de pelo menos duas semanas para
o diagnóstico e o prosseguimento ou não de análise (FREUD, 1913; 1976). O
analista pedirá que o paciente fale o mais livremente possível, pela técnica da
associação livre, ouvindo o paciente em sua totalidade e procurando transmutar
a queixa-sintoma em sintoma-enigma(PRISZKULNIK, 2000).

Os primeiros encontros com o analista no qual a partir da escuta


empreendida este terá condições de avaliar com um menor risco um
encaminhamento ou o modus de tratamento, clareamento da demanda e
instauração da transferência, a inauguração de um “diagnóstico estrutural”, ou
seja, o modo como o sujeito lida com a falta e se posiciona inconscientemente
diante da castração .

Três pontos são levantados aqui quanto à sagacidade de Freud, o


primeiro é a dimensão potencial do diagnóstico, pois o suspende laçando a um
devir a partir das observações subsequentes, o segundo refere-se ao valor dessa

3
ação que prorroga qualquer intervenção dita terapêutica e terceiro consiste no
aproveitamento desse tempo de observação para o desenrolar do possível
tratamento(DOR, 1991)

As entrevistas preliminares nem sempre tiveram essa nomenclatura,


foram inicialmente chamadas por Freud de “análise de prova” ou mesmo
“tratamento de ensaio”. Já em Lacan obtivemos a nomenclatura utilizada
atualmente.

De acordo com Freud (1913), para que o processo de análise aconteça e


se atinja um determinado objetivo, torna-se necessário um período que o
antecede, no qual seja possível traçar um caminho para que o analista possa
cumprir sua promessa de cura.

Freud (1913), no texto “Sobre o início do tratamento”, refere-se à prática


de um tratamento de ensaio para evitar a interrupção da análise, a fim de se
conhecer o caso e decidir sobre a possibilidade de sua analisabilidade; como
exemplo, a falta de compreensão interna (insight) do paciente poderia ser um
empecilho.

Esse período, o qual Freud (1913) nomeava de tratamento preliminar é,


ele próprio, o início da análise e, portanto, considera a regra fundamental da
associação livre. É neste momento da entrevista que acontece o primeiro contato
entre analisante (paciente) e analista. Etapa importante para o restante do
processo de análise. Isso porque esse primeiro contato abre espaço para a
transferência de análise, que até o momento ainda não está, de fato, instalada.

No entanto, não podemos dizer que não há transferência, pois se o


analisante chegou até o consultório deste analista em especial, isso se deve ao
fato de que algo da transferência ocorreu, mesmo que de maneira mais frágil, e
que ela se consolida no decorrer do processo, ou seja, se o analisante voltar na
próxima sessão. Como sabemos, a transferência é a mola propulsora do
tratamento. Ela pode ser positiva ou negativa, e por isso temos a relação entre
amor/ódio, que são afetos para a psicanálise.

A queixa inicial do sujeito quase sempre demanda uma palavra de cura,


livrando o paciente do seu sintoma. Ele espera o auxílio de alguém, que supõe-

4
se saber algo do sofrimento dele, podendo tratá-lo. Mas isso não é o suficiente
para que a análise ocorra.

Logo, essas entrevistas iniciais servem para investigar os motivos que


trazem o paciente àquela consulta, é a mola mestra que vai direcionar o analista
a montar suas hipóteses iniciais. Este primeiro contato pode ser exatamente o
momento no qual se detectará o que é possível ou não ser “tratado” em termos
psicanalíticos, podendo, além disso, proporcionar em si mesmo um resultado
terapêutico.

A postura do analista, neste primeiro contato, deve voltar-se para a


escuta, a receptividade ao discurso do sujeito, mantendo, segundo Freud (1913),
uma ‘atenção uniformemente suspensa’, ou seja, uma atenção flutuante. Este
discurso direcionado ao analista é diferente dos outros, devido ao sentido novo
que ele adquire aos ouvidos do psicanalista. Seu posicionamento é que vai
determinar se o atendimento vai servir apenas para tamponar o sofrimento
psíquico que o sujeito traz ou se irá abrir espaço para que a sua subjetividade
seja revelada e que este possa se implicar em suas questões.

Portanto, o analista não deve criar interpretações precipitadas, pois é o


paciente que dá sentido às suas experiências. A função sintomal compreende
questões sobre a demanda e analisabilidade. De acordo com Lacan, há apenas
uma demanda verdadeira para se dar início a uma análise: a de se desvencilhar
de um sintoma.

Quinet (2000) afirma que para Lacan, a analisabilidade é função do


sintoma e não do sujeito e deve ser buscada, a partir da transformação do
sintoma do qual o sujeito se queixa em sintoma analítico. Isso significa que é
preciso que: “a queixa se transforme numa demanda endereçada àquele analista
e que o sintoma passe de estatuto de resposta ao estatuto de questão para o
sujeito, para que este seja instigado a decifrá-lo” (Quinet, 2000, p.16).

A partir do momento em que o analista entra em contato com este


‘candidato à análise’, concretiza-se esta dupla escolha (tanto do analista,
aceitando o indivíduo em análise, quanto pelo analisando, que se deixa analisar
por aquele em específico), o sujeito será levado a elaborar sua demanda de

5
análise, o que seria caracterizado na prática como um fator de histerização
(Quinet, 2000).

Quinet (2000) afirma que é necessário que a queixa se transforme em


demanda, endereçada àquele analista, e que o sintoma saia da posição de
resposta para a de uma questão para o sujeito. Assim, esse mesmo sujeito será
incitado a decifrá-la. O analista entra como um questionador deste sintoma.
Outra função das entrevistas preliminares compreende a função diagnóstica.

Segundo Freud (1913), existem razões diagnósticas para começar o


tratamento desta forma, pois nos casos de neurose com sintomas histéricos ou
obsessivos, há certa dificuldade em diferenciá-los das chamadas demências
precoces (esquizofrenia, parafrenia). Portanto, torna-se necessário a realização
de um diagnóstico diferencial, em particular, o diagnóstico diferencial entre
neurose e psicose na medida em que a forma de conduta frente ao caso se torna
diferente para cada uma dessas estruturas clínicas.

Contudo é preciso que o analista sustente esta posição de sujeito suposto


saber para transformar a transferência demandante em transferência produtora
pelo trabalho da associação livre – regra fundamental da psicanálise. É
importante ressaltar que o analista vai ‘tomar este lugar de saber’ emprestado,
não devendo nunca se identificar com essa posição, o que, para Quinet (2000),
seria um erro.

A função diagnóstica das entrevistas preliminares se institui como um


papel de direção da análise, ou seja, ela só terá sentido se servir de respaldo
para a condução da análise. Essa tática do analista no direcionamento da análise
está correlata com a transferência, na qual o diagnóstico está intimamente
ligado.

Porém, este só pode ser investigado no registro do simbólico, atentando


para o que Lacan anuncia ao dizer que um sujeito é incurável, pois não se pode
curar o inconsciente. Cabe ao psicanalista o desafio de articular as entrevistas
preliminares ao contexto em que está inserido e aproveitar a eficácia desta
prática terapêutica.

6
A Entrevista Clínica Psicanalítica

A entrevista é um instrumento fundamental do método clínico, sendo uma


técnica de investigação científica em Psicologia. Por se tratar de uma técnica,
possui procedimentos empíricos com os quais se aplica o conhecimento,
fazendo coexistir no psicólogo clínico as funções de investigador e profissional.
Etchegoyen (2004) chama de entrevista a tudo que seja uma “visão” entre duas
ou mais pessoas, reservada para algum encontro especial e não para contatos
regulares.

Nesse sentido, há diferenças conceituais entre “entrevista inicial” e


“primeira sessão”, já que, a partir do momento em que os encontros passam a
ter uma periodicidade estipulada e regular, eles deixam de constituir uma
entrevista propriamente dita. A primeira antecede o contrato enquanto a segunda
implica que a análise ou psicoterapia já começou formalmente. Os objetivos de
uma entrevista e da psicoterapia são radicalmente diferentes: em um caso é
orientar uma pessoa para determinada atividade terapêutica; no outro, realiza-
se o que antes se indicou.

Bleger (1971) citado por Etchegoyen (2004) ainda difere entrevista,


interrogatório e anamnese. A anamnese é uma investigação de dados
preestabelecidos sobre o princípio e evolução de uma sintomatologia. O
interrogatório tem o objetivo de obter informação, de investigar o que o
entrevistado sabe conscientemente. A entrevista pretende ver como funciona um
indivíduo e não como diz que funciona.

7
Entrevista Inicial

Trata-se do primeiro contato entre terapeuta e paciente pessoalmente.


Geralmente, antecede ao encontro algum telefonema ou contato agendando a
entrevista, e já se instalam nesse primeiro momento determinadas pré-
transferências que vão se desenvolver ou não ao longo das entrevistas e do
tratamento.

Algumas investigações têm demonstrado que a fase inicial é crucial para


a permanência ou não em tratamento (CEITLIN & CORDIOLI, 1998). Langs
(1973) afirma que a maioria dos pacientes que abandonam a terapia o faz nas
primeiras entrevistas e que a permanência em terapia depende de desenvolver
uma boa relação com o terapeuta.

O objetivo principal desta entrevista é levantar hipóteses sobre o


funcionamento psíquico do paciente, possibilitando traçar um plano de
tratamento ou ter melhores condições para realizar um encaminhamento a outro
profissional. Esse processo de avaliação geralmente necessita de mais de um
encontro, sendo mais correto referir-se a este como entrevistas iniciais. “Deve-
se levar em conta que o entrevistado muda, em geral, de uma para outra
entrevista, e o próprio entrevistador pode mudar e mesmo recuperar-se do

8
impacto que pode ter-lhe significado o primeiro encontro” (ETCHEGOYEN, 2004,
p. 46).

No entanto, diversos autores defendem a ideia de que, mesmo que o


terapeuta opte por diversas entrevistas, ele deve ter em mente que não é
prudente prolongá-las demais, devido à grande ansiedade que podem despertar
no entrevistado. Ademais, para os autores que acreditam não ser aconselhável
fazer interpretações transferenciais durante as entrevistas, o prolongamento
excessivo desse processo inicial pode complicar a relação analítica futura pela
impossibilidade de interpretar desde o início o vínculo que está sendo formado.

Zimerman (2004) disserta em seu livro Manual de técnica psicanalítica


acerca dos objetivos da entrevista inicial. Para ele, os objetivos gerais da
entrevista inicial são:

1) avaliar as condições mentais, emocionais, materiais e circunstanciais


da vida do paciente que o buscou e

2) estabelecer um rapport com o paciente, isto é, o início de uma relação


pautada por um vínculo empático, por uma atmosfera de veracidade e
confiabilidade.

Para que os objetivos gerais sejam atingidos, deve-se ter como objetivo
específico, durante essa etapa inicial, os seguintes itens:

1) ajuizar os prós e os contras, as vantagens e as desvantagens, os riscos


e benefícios de indicar psicoterapia para aquele paciente (conforme critérios de
analisabilidade e acessibilidade vigentes ou do próprio terapeuta),

2) inferir o grau e o tipo de psicopatologia, de modo a formar alguma


impressão diagnóstica e prognóstica do paciente,

3) avaliar a qualidade da motivação do paciente, tanto a manifesta quanto


a inconsciente,

4) verificar a capacidade de insight do paciente, sua capacidade de


abstrair, simbolizar e dar acesso ao seu inconsciente,

9
5) avaliar a realidade exterior do paciente: condições sócioeconômicas,
entorno familiar, sua posição profissional, seu projeto de vida próximo e futuro,
existência de fatos traumáticos, etc.,

6) conferir se a teoria de tratamento e cura do terapeuta coincide com a


do paciente.

A impressão diagnóstica deve ser formada levando em conta que existem


diferentes tipos, níveis e perspectivas de diagnóstico clínico. Ainda segundo
Zimerman (2004), há dois tipos de abordagem para a construção desta hipótese
diagnóstica. A primeira diz respeito às classificações do DSM IV-TR: eixo I
(aspectos sindrômicos), eixo II (tipos e transtornos de personalidade), eixo III
(transtornos físicos), eixo IV (estressores) e eixo V (nível de funcionamento). A
segunda consiste em considerar os seguintes enfoques:

1) Nosológico: determinada categoria clínica

2) Dinâmico: a lógica do inconsciente

3) Evolutivo: as etapas do direcionamento da libido oral, anal, fálica,


latente, genital, já que cada etapa exige implicações técnicas específicas

4) Funções do ego: atenção, senso-percepção, memória, orientação,


consciência, pensamento, linguagem, inteligência, afeto, conduta.

5) Configurações vinculares: funcionamento e papel desempenhado pelo


indivíduo na família, no casal, nos grupos em geral.

6) Corporal: cuidados corporais, autoimagem, somatizações e


hipocondria.

7) Manifestações transferenciais e contratransferenciais: expectativas do


paciente em relação ao terapeuta e afetos que o paciente mobiliza no terapeuta.

O analista deve ter em mente que muitas vezes o paciente se apresenta


na entrevista de uma forma muito diferente do que ele realmente é (por
ansiedade paranóide ou fóbica excessiva, por masoquismo, para seduzir o
terapeuta a aceitá-lo em tratamento, etc). Por isso fala-se em impressão
diagnóstica, embora o terapeuta precise estar atento e aberto a possíveis
mudanças nesta primeira percepção.

10
A entrevista, para Etchegoyen (2004), tem como objetivo avaliar o que se
pode esperar do potencial analisando e, reciprocamente, o que ele necessitará
do terapeuta. Avalia também até que ponto a interação que se estabelece entre
entrevistador e entrevistado será curativa ou iatrogênica.

Há ainda a discussão a respeito do uso de instrumentos psicodiagnósticos


durante esse processo. Alguns terapeutas (especialmente os que se
autodenominam “psicanalistas clássicos”) pensam que a testagem
psicodiagnóstica “suja” o processo terapêutico (já que a testagem interrompe a
associação livre), preferindo obter dados mais profundos do seu paciente na
medida em que este for se revelando no curso do tratamento psicanalítico.
Defendem a ideia de que o entrevistador deve buscar as informações
necessárias para fazer uma indicação de tratamento, mas que um conhecimento
prévio muito profundo do paciente pode chegar a perturbar a compreensão
deste.

Para esses seguidores, torna-se mais importante durante as entrevistas a


construção de uma postura empática e continente do que uma postura
investigativa. Gabbard (1992) citado por Marques (2005), por exemplo, pode ser
considerado um representante desta escola ao postular que o entrevistador deve
manter um estilo de entrevista flexível, passando da busca estruturada de fatos
a uma atitude não-estruturada de escuta das associações do pensamento do
entrevistado. Por outro lado, há psicanalistas que advogam a favor do uso dos
instrumentos, como Abuchaem (1985), o qual defende o uso da testagem por
acreditar que os resultados desta deixam o analista em melhores condições para
indicar a terapia adequada.

A postura adotada dependerá da concepção de tratamento que o analista


segue, já que, como diz Zimerman (2004, p. 60): Sou dos que acreditam que a
entrevista inicial funciona como uma espécie de trailler de um filme, que
posteriormente será exibido na íntegra; isto é, ela permite observar, de forma
extremamente condensada, o essencial da biografia emocional do paciente e
daquilo que vai se desenrolar no campo analítico.

11
Compreensão processualmente orientada na primeira entrevista

Na primeira entrevista psicanalítica, os pacientes desejam retratar seu


mundo interno, um mundo interno que em certa medida, lhes é inteiramente
desconhecido.

Antes do primeiro encontro, o entrevistador já está associado à


esperança, ao medo ou destruição. O processo começa com os "fenômenos
preliminares", como por exemplo, marcar a entrevista por telefone (Argelander,
1976). A escolha de palavras e a voz do paciente ao telefone pode ter uma
influência duradoura positiva ou negativa no entrevistador e, reciprocamente, a
atitude do analista ao telefone pode determinar se a entrevista será realmente
produtiva.

Em seguida vem o primeiro encontro pessoal, a cena de abertura, a


primeira comunicação verbal do paciente, a primeira intervenção verbal do
psicanalista, comunicações acerca do histórico de vida e do caso, a primeira
interpretação no sentido mais estrito, o acordo sobre como prosseguir e,
finalmente, o agendamento da próxima consulta ou a última despedida. Nesse
processo, a atitude interna do psicanalista está constantemente alternando entre
a escuta, a conceitualização, uma atenção introspectiva, assumir papéis, reagir
e intervir, entre o passado e presente, e, entre uma atitude diagnóstica e
terapêutica (Wegner, 2008).

12
Para o analista, a possibilidade de entender algo sobre o paciente e sobre
a relação que se inicia, é uma precondição essencial para encorajar e manter
uma relação terapêutica, à medida que muitas motivações inconscientes ainda
não podem ser transformadas para a relação transferencial.

Inversamente, a não ser que o desamparo do paciente tenha atingido


proporções extremas, na maioria da vezes, ele só manterá uma relação
terapêutica se ele se sentir adequadamente compreendido pela atitude e
intervenção do analista. A possibilidade do paciente tolerar ou não uma
compreensão inadequada, pode ser uma medida das suas capacidades egoicas.
Se o analista conseguir escutar atentamente, ele também detectará que
frequentemente o paciente traz seu próprio "diagnóstico" sobre seu sofrimento
psíquico ou somático, que também é veiculado através do processo de interação.
A tarefa do analista é formulá-lo do modo mais exato possível.

O objetivo da entrevista é conseguir descrições intersubjetivas do


processo que conduzam a avaliações terapêuticas relevantes, tal como
documentado, por exemplo, por von Eckstaedt (1991). Também podemos
entender assim as reflexões de Danckwardt e Gattig, que sugerem "uma variante
especial da entrevista inicial" para obter respostas a respeito de como a
indicação de tratamento psicanalítico de alta frequência pode ser sustentada:

Além das observações sobre o curso de uma sessão de entrevista,


observações sobre o curso de todas as entrevistas preliminares devem ser
conduzidas uma ou duas vezes por semana. Dessa maneira, muitos dados
dinâmicos poderiam ser coligidos com base numa interrogação conclusiva além
dos dados objetivos (por exemplo, acerca de manifestações da compulsão à
repetição), que dariam uma resposta à provável melhor densidade de frequência
das sessões. (1998, p. 44)

O uso da interpretação na entrevista inicial

É bastante controversa entre os psicanalistas a decisão se cabe ou não


interpretar na entrevista inicial. Zimerman (2004) acredita que as clássicas
interpretações alusivas à neurose de transferência devem ser evitadas ao

13
máximo, mas defende as “interpretações compreensivas” nesta etapa, ou seja,
aquelas que dizem o suficiente para o paciente sentir-se compreendido.

Etchegoyen (2004) defende que uma interpretação só é possível quando


antes foram fixados os termos da relação, ou seja, após o contrato. O autor
legitima uma interpretação se esta objetiva remover um obstáculo concreto à
tarefa que está sendo realizada na entrevista, mas nunca com o objetivo de
modificar a estrutura do entrevistado ou lhe fornecer insight. Ele acredita não ser
a busca de insight o propósito da entrevista, e nem o que o entrevistando precisa
naquele momento.

Abuchaem (1985), em seu livro La interpretación en las etapas iniciales


del tratamiento psicoanalitico, explora justamente essa discussão. Para ele, há
autores como Theodor Reik e Freud que assumem e defendem uma postura não
intervencionista durante as entrevistas, por entenderem que enquanto não se
estabelecer a chamada neurose de transferência, o analista deve abster-se de
verbalizar a interpretação ao analisando, mesmo que tenha compreendido
perfeitamente o sentido oculto das associações livres.

O analista deve aguardar com paciência e parcimônia a aparição de sinais


que delatam a emergência e instalação permanente da neurose transferencial.
Para atingir esse objetivo, o analista deve intervir mediante assinalamentos
breves, pois a função do analista nesse primeiro momento é basicamente
escutar o paciente e promover as manifestações incipientes da neurose
transferencial.

14
Por outro lado, o autor descreve e defende a postura intervencionista, que
consiste em interpretar desde a primeira entrevista, desde o momento em que
se entenda o significado do conteúdo latente do discurso do analisando. Essa
posição, defendida por muitos desde Melanie Klein, parte do pressuposto que a
transferência se estabelece de forma intensa desde o início do tratamento, sendo
sua intensidade dependente da resistência inicial ao processo terapêutico.

Assim, é aconselhável o ato interpretativo desde a primeira entrevista, já


que a transferência (seja ela positiva, negativa ou erótica) já se estabeleceu e
precisa ser interpretada para garantir o bom andamento do tratamento.

A contratransferência

O analista não deve apenas diagnosticar e intervir; ele precisa se observar


como parte do que ocorre na interação, na transferência e na
contratransferência. Deve-se ressaltar que o analista não reage apenas, mas é
também influenciado por muitos outros fatores: sua atitude fundamental, sua vida
individual e a história do seu aprendizado, sentimentos situacionais específicos
acerca da expectativa de um novo paciente e estratégias subjetivas
investigativas e de resolução de problemas, que reduzem o fluxo de informação.
Todos esses fatores da parte do analista entram na cena da abertura.

Heimann (1950, 1960, 1964) deu um status importante à análise da


contratransferência como um instrumento diagnóstico, e Rosenfeld ressaltou
que: "Os bloqueios mais comuns na interação paciente-analista referem-se às
ansiedades mais primitivas da infância do analista" (1987, p. 40).

Hoje em dia, precisamos lidar de modo mais sistemático com as


ansiedades do analista a respeito do método psicanalítico, porque essas
ansiedades são "contingentes ao sistema e, por isso, específicas à profissão"
(Danckwardt, 2011a, p. 113).

Há duas escolas de pensamento principais no debate acerca da


contratransferência: a contratransferência é colocada como reação inconsciente
do analista ao paciente, no sentido de uma perturbação da sua capacidade de

15
trabalho ("abordagem clássica", Kernberg, 1965) ou como a totalidade das
reações cognitivas e emocionais do analista ao paciente ("abordagem totalista",
ibid.). Recentemente essa discussão levou ao estabelecimento de uma
psicologia orientada pelo processo bipessoal, que descreve como "lidamos com
o sistema relacional no qual um fator é também função do outro" (Loch, 1965a,
p. 15).

Loch ressalta decisivamente o aspecto analítico da relação de objeto na


reciprocidade. Afirmações tais como a de Heimann de que "a contratransferência
do analista não é só parte integrante da relação analítica, mas é também criação
do paciente, é uma parte da personalidade do paciente" (1950, p. 83) ou a de
Bion, de que "interpretações psicanalíticas podem ser vistas como teorias
mantidas pelo analista sobre os modelos e teorias que o paciente tem do
analista" (1984, p. 17) estão afinadas, consequentemente, com os termos de
uma psicologia bipessoal.

Enquanto o analista anteriormente era visto no campo de investigação


como uma variável dependente (em relação ao paciente como variável
independente), hoje ele é problematizado como variável independente, ou seja,
independente da transferência do paciente. "A interpretação do comportamento
transferencial como reação à contratransferência é um desses problemas",
escreve Fliess (1953, p. 273) e Loch afirma:

O analista precisa da contratransferência para poder entender o paciente,


no entanto ele precisa simultaneamente ultrapassá-la para poder fazer uma
interpretação. (Loch, 1965a, p. 21)

Isso dá margem à suposição de que "a dialética da dupla negação é um


princípio operante da nossa técnica" (p. 20, 21).

Na verdade, é assim que se tece entre paciente e analista uma malha de


processos interativos, reciprocamente influenciáveis, que requer uma linguagem
(modelo representacional; cf. também Bion, (1984 [1965]) para ser descrita e
entendida conceitualmente, e que deve ser sempre, e a cada vez, buscada. Isso
significa, essencialmente, que não podemos supor uma causalidade
unidimensional.

16
O instrumento de investigação é o analista sozinho, e Loch ressalta: "o
objeto de investigação e o instrumento de pesquisa … [pertencem] à mesma
categoria" (Loch, 1965a, p. 21). Ele processa sinais em duas direções como se
houvesse dois vetores no campo psicodinâmico da situação investigativa:

1. um vetor representa as comunicações conscientes e seu correlato


inconsciente, em que as distorções reconhecíveis nas comunicações do
paciente no contexto do aqui-e-agora, (por exemplo pelos aspectos
transferenciais) são especialmente importantes.

2. o segundo vetor se dirige ao processamento detalhado que ocorre no


próprio analista. Isso é o que eu chamaria de direcionamento introspectivo que
diz respeito aos processos internos conscientes e inconscientes.

Mesmo no início de uma entrevista, a quantidade de informação que o


analista processa abrange uma proporção quase infinita. Noutras palavras, ele
se confronta com uma complexa situação de resolução de problemas, em que
ele só consegue manter um comportamento competente, artificialmente
reduzindo ou ordenando todos os dados. Sem isso, o sistema do analista entraria
em colapso, o que frequentemente ocorre em parte, e é de grande relevância
diagnóstica.

Geralmente leva algum tempo para o entrevistador realmente se adaptar


ao novo paciente. O analista, assim como o paciente, também precisa
ultrapassar um limiar a partir do qual ele pode escutar verdadeiramente. Esse
limiar também implica no direito do entrevistador decidir se deseja assumir a
responsabilidade por um paciente em particular. Há evidências consideráveis de
que essas decisões são feitas – de modo mais ou menos consciente – muito
rapidamente.

Acima de tudo, porém, esse limiar é colocado contra a investida dos


desejos descontrolados do paciente, os quais o analista só pode estar
verdadeiramente pronto para processar se sentir que lhe é concedido ter acesso
aos conflitos inconscientes intrapessoais e interpessoais inconscientes. A
maioria dos pacientes conhece isso muito bem, afinal de contas eles não são
somente vítimas de seus sintomas, mas também agentes da sua própria história

17
de sofrimento, ainda que prefiram outros conceitos explicativos em nível
consciente.

Além do mais, esse limiar protege o analista do fato de que todo paciente,
com sua maneira específica, é capaz de incitar a estrutura de personalidade
inconsciente do analista ou sua estrutura conflitual, afetando assim suas áreas
de vulnerabilidade narcísica. Todos esses problemas são acompanhados por
afetos intensos, especialmente por ansiedade do analista a respeito tanto dos
seus próprios sentimentos quanto dos sentimentos do paciente.

Processo terapêutico psicanalítico: Objetivos e


procedimentos na prática

O processo terapêutico psicanalítico consiste em descortinar conflitos


originados, na maioria das vezes, no passado do paciente e submersos em seu
inconsciente causando-lhe sofrimento em sua vida atual. Esse processo permite
ao paciente, compreender seus conflitos e a razão da repetição de seu sintoma.
Para isso deve haver o estabelecimento de um contrato entre terapeuta e
paciente que, envolvidos na busca de um acordo consensual, promovam
condições para que a terapêutica possa se desenvolver. Esse acordo e a
evolução do tratamento irão depender de ambas as partes, tendo em vista de
que o que se busca no setting terapêutico (relação contratual) é o enfoque nos
aspectos inconsciente do sujeito, cujas representações só poderão ser
compreendidas por meio do comprometimento do paciente e da disposição do

18
terapeuta, em tentar descobrir quais os significantes inconscientes envolvidos
causaram no paciente essa situação atual. Por ser o inconsciente atemporal,
desejos insatisfeitos e experiências traumáticas recalcadas pelo sujeito, e que
não estão acessíveis à consciência, tem um significado simbólico atual e
presente causando-lhe sofrimento. Segundo Freud (1996/1925-1926), esse
recalque acontece pela tendência do ser humano em buscar o prazer e renunciar
ao desprazer.

Para explicar isso Freud formulou um hipotético aparelho psíquico que


seria responsável pelo funcionamento psíquico do indivíduo. Com a tarefa de
manter o equilíbrio pulsional, esse aparelho afastaria a um nível inconsciente
qualquer situação traumática ou comovedora mantendo-as inacessíveis a
consciência do indivíduo. Da mesma forma que o aparelho psíquico é
responsável por manter longe da consciência o que causa desprazer, ele
também é responsável por não deixar que todos os desejos do indivíduo sejam
satisfeitos aleatoriamente, especialmente aqueles contraditórios as exigências
externas socioculturais, então esse aparelho, para manter seu equilíbrio
pulsional, leva o indivíduo a renunciar ao prazer (obedecendo ao principio da
realidade), recalcando desejos proibidos e que não foram satisfeitos.

Para manter esses impulsos proibidos ou desagradáveis afastados da


consciência, é exigido do aparelho psíquico um dispêndio de energia muito
grande, e, como coloca, Hermmann (1999), esse grande dispêndio de energia
mobilizado para manter esses impulsos recalcados, deixa o ego frágil e
vulnerável ao adoecimento. Freud (1996/1910-[1909], p. 131) já alertava que “O
empobrecimento do ego devido ao grande dispêndio de energia, no recalque,
exigido de cada indivíduo pela civilização, pode ser uma das principais causas
desse estado de coisas”. Os desejos e traumas recalcados mantêm de certa
maneira a sua força e em algum momento atravessam disfarçados para o campo
consciente, há uma simbolização dos impulsos recalcados traduzidos e
expressados em sintomas, sonhos, atos falhos etc..., funcionando, assim, como
uma válvula de escape, para que o indivíduo não tenha contanto direto,
consciente, com as ideias originais reprimidas. No processo psicoterapêutico o
objetivo não seria o de atacar esses sintomas, mas sim de identificar e remover
as suas causas. Remover aquilo que está recalcado e inconsciente.

19
Existem para Freud (1996/1911-1913), três causas precipitantes que
levam o indivíduo ao adoecimento psíquico, a primeira se deve ao fator externo,
que pode ser descrito como frustração, ou seja, o indivíduo será sadio enquanto
sua necessidade de amor for satisfeita por um objeto real no mundo externo. O
indivíduo, ao se deparar com a ameaça de perda desse objeto real, e não
conseguindo adaptar-se de maneira satisfatória diante das frustrações
relacionadas com essa perda, poderá adoecer. O segundo tipo, o indivíduo
poderá vir a adoecer pelo ensejo de sua tentativa de atender às exigências da
realidade - tentativa no curso da qual se defronta com dificuldades internas
insuperáveis. Nesse segundo tipo há uma contradição entre os desejos arcaicos
proibidos que foram recalcados, e a condição real a que estão submetidos devido
à exigência externa que não lhe permite a satisfação destes desejos. No terceiro
tipo o indivíduo fica doente devido a uma inibição no desenvolvimento, parece
uma exageração do segundo, ou seja, cair doente devido às exigências da
realidade. (FREUD, 1996/1911-1913).

Sabendo que a fonte das tensões do indivíduo é proveniente de aspectos


inconscientes, o trabalho do psicoterapeuta consiste em auxiliar o paciente a
encontrar esses aspectos encobertos envolvido na simbolização do seu sintoma,
ou seja, fazer emergir ao consciente o que está reprimido, possibilitando ao
paciente lidar com seus conflitos conscientemente (FREUD, 1996/1911-1913). A
partir do momento em que esse material recalcado torna-se consciente, a
quantidade de libido que estava sendo mobilizada para mantê-lo inconsciente, é
liberada e poderá ser usada pelo ego em outras atividades mais produtivas. E
ainda, como coloca Del Nero (2003), essa liberação dos conteúdos reprimidos,
fazem com que os impulsos destrutivos recalcados percam sua força,
possibilitando que o sofrimento que acompanhava o indivíduo seja amenizado
ou deixe de existir.

O significado consciente desse material inconsciente, fruto do sofrimento


do paciente, se dá em meio a um processo que envolve terapeuta e paciente,
que juntos irão fazer parte de um cenário que poderá vir a propiciar o
aparecimento de representações, de significantes, aos quais certas pulsões
estão ligadas ao aparecimento da demanda do paciente. (NASIO, 1999). Para
emergir o que está submerso, o terapeuta dispõe da técnica da associação livre,

20
que consiste em ouvir, sem juízo de valores, os conteúdos do material
apresentado pelo paciente, de modo a possibilitar assim a sua interpretação.

O terapeuta irá interpretar aquilo que ele dispuser com relação à fala, aos
sonhos, aos atos falhos e ao próprio sintoma do paciente. Tendo o terapeuta
"descoberto" o material inconsciente, seu próximo passo será como propõe
Freud (1996/1916-1917), a eliminação do recalque efetuando-se em seguida a
substituição do que está inconsciente pelo que é consciente. Porém essa
substituição não se dá na forma de conselhos ou orientações, “[...] posso
assegurar-lhes que estão mal informados se supõem que o conselho e a
orientação nos assuntos da vida façam parte integral da influência analítica”.
(FREUD, 1996/1916-1917, p. 506). Pelo contrário, o terapeuta deve se abster de
conselhos ou orientações deixando que o paciente venha tomar decisões por si
mesmo. Menezes (2001) considera a ideia de que os fundamentos do tratamento
analítico é tentar propiciar ao paciente a possibilidade de vir a se apropriar,
dando forma e sentido, daquilo que por estar silenciado, inacessível e confuso
lhe causa sofrimento. Concordando com Freud, ele vem dizer que essa
apropriação por parte do paciente, não se dá por meio de sugestão ou conselhos
do psicoterapeuta, mas por meio de uma disposição receptiva, paciente e
reservada. Ou seja, o feedback ao paciente é transmitido, como preconiza Freud,
por meio de inferências que levam o paciente a tomar consciência por si só de
sua condição e é na relação terapêutica que se evidencia sua cristalização, por
meio da análise da transferência.

Na linha psicanalítica, o terapeuta trabalha de forma a refletir, como um


espelho opaco, somente aquilo que o paciente lhe mostra, refletindo a ele os
seus medos, desejos e fantasias, possibilitando-o a um reconhecimento de seus
processos psíquicos. Desse modo, é necessário que dentro desse processo
terapêutico, o terapeuta haja no sentido de não colocar seus próprios pontos de
vista, desejo ou compreensão, que apoiem visões particulares da situação em
curso ou que está sendo expressa.

Del Nero (2003) recomenda que o terapeuta deva adotar uma


neutralidade benévola, uma postura neutra e imparcial que propicie ao paciente
a possibilidade de um melhor reconhecimento de seus conflitos inconscientes.
Isso não quer dizer que o terapeuta deva agir de modo passivo e distante, ao

21
contrário o terapeuta deve se fazer presente, de forma que o paciente o perceba
plenamente focalizado na sua pessoa, o terapeuta deve permanecer em alerta
diante do que acontece no setting terapêutico, no sentido de estar à disposição
do paciente. (NASIO, 2003). Haja vista que a significação do que está submerso
no inconsciente não será alcançado pelo paciente ao menos que o terapeuta
esteja engajado e se faça presente nesse processo. A tomada de consciência
de seus conflitos inconscientes propicia ao paciente o alargamento do seu ego,
quanto mais ele tiver consciência de seus desejos, medos e fantasias
desconhecidas, mais recursos ele disporá para lidar com as exigências da
realidade. Essa tomada de consciência propicia ao paciente uma alternativa de
transformação de sua vida psíquica, desde que seu sistema defensivo também
seja amenizado.

A emergência do que está inconsciente para a consciência é conduzida


por meio da inferência do terapeuta, da ideia antecipadora consciente (a ideia do
que o paciente espera encontrar). Isso se formaliza por meio da transferência,
que é condição essencial para que ocorra um processo terapêutico com
progressos. A transferência consiste em mudar o foco do dispêndio da libido,
que antes estava à disposição do recalque (recalcando aspectos inconscientes),
para a figura do terapeuta (FREUD, 1996/1910-(1909). De acordo com Freud,
(1996/1911-1913), na transferência, o indivíduo, ao invés de recordar, repete, e
repete sob condições de resistência (operações defensivas utilizadas por ele em
sua vida passada), vivenciando seus conflitos no presente. Como coloca
Hermmann (1999), a transferência permite que o paciente construa e viva muitas
histórias na figura do analista que é uma posição de referência.

22
Para Nasio (1993), a relação terapêutica permite que o terapeuta seja o
Outro do paciente, esse Outro como sombra do próprio Eu do paciente, essa
condição permite a ele reconhecer no terapeuta aspectos de sua vida interior.
Assim, no inicio o terapeuta faz parte do sintoma do paciente, e a medida que a
transferência se instala e que o paciente vai interpretando, o terapeuta vira a
causa do seu sintoma. Nasio, (1999), apoiado na teoria de Lacan, vem dizer que
há um desejo do analista, desejo de ocupar o lugar que se institui como a de
sujeito suposto saber, de autoridade, presente em qualquer situação terapêutica,
mas é somente na terapia psicanalítica que essa autoridade tem a dimensão de
o grande Outro. Todavia esse desejo do analista se converte na condição
essencial para que o terapeuta ocupe o lugar desse Outro na análise, a “do
objeto recoberto pelo véu de uma falo imaginário, opaco e enigmático”. (Nasio,
1999, p. 46). Para Nasio, (1999), a condição necessária para que o paciente fale
e se engane, para que haja novos sintomas e demandas de amor é que o
terapeuta venha ocupar esse lugar de objeto, a do falo imaginário (representação
psíquica do pênis no que se refere à anatomia, a carga libidinal nele acumulado
e a angustia pela fantasia de perda desse órgão). Mas por que falo? Na teoria
Lacaniana o falo é o regulador dos desejos inconscientes, e é responsável pelos
desejos que vão se satisfazer ou aparecer como sintoma e os que vão continuar
recalcados.

O processo terapêutico analítico fornece a quantidade necessária de


energia para a transferência, isso possibilita ao paciente ter acesso a
informações no momento atual, e o terapeuta irá mostrar-lhe os caminhos os
quais ele pode dirigir essas energias. (FREUD, 1996/1911-1913). “O trabalho da
análise consistirá num trabalho de ligação (ou de simbolização) pelas
representações da palavra”. (MENEZES, 2001. p. 20). Desse modo, “a análise
visaria estabelecer a ligação do afeto com a representação original.” (MENEZES,
2001, p. 17). Del Nero (2003), explica que para que o paciente consiga fazer
essa ligação, o analista tem que interpretar algo do que o paciente lhe diz,
sugerindo-o elos que podem ser ou não reconhecido previamente pelo paciente.

Na relação terapêutica podem-se encontrar muitas dificuldades e uma


dessas dificuldades reside no campo da contratransferência. Freud, no decorrer
de suas obras sempre alertou para os perigos que o terapeuta/analista pode

23
estar sujeito com relação à contratransferência. A contratransferência se define
como todo sentimento hostil ou desejoso do terapeuta com relação ao seu
paciente. Ela implica em deixar-se levar pelas emoções do que lhe é mostrado
ou dirigido pelo paciente. É a possibilidade perigosa de projeção de seus
conflitos e angústias na figura do paciente, atribuindo ao mesmo aquilo que se
refere a si próprio. Já para Násio (1999), a contratransferência designa o
conjunto de obstáculos imaginários que se opõe à ocupação do terapeuta no
lugar do objeto, do Outro, do sujeito suposto saber. Ele coloca que “se o desejo
do analista designa o fato de ocupar efetivamente o lugar do objeto, a
contratransferência designa tudo o que se opõe a isso” (NASIO, 1999, p. 106).
Para autores como Freud, Lacan, Nasio entre outros, a condição essencial para
que o terapeuta não caia nos perigos da contratransferência é ter passado ou
que esteja passando por um processo de análise, por um tempo relativamente
longo.

Outra condição essencial para que ocorra o processo terapêutico com


sucesso é a de que o paciente fale, pois é por meio da fala do paciente que o
terapeuta terá condições de ter acesso ao material inconsciente do mesmo.
Nasio (1997) revela que o sintoma aparece justamente quando há um fracasso
da fala, quando o paciente não consegue simbolizar aquilo que sente por meio
da palavra, é representado por meio de sintomas. Assim o terapeuta tem a
função de auxiliar seu paciente na simbolização do que está submerso em seu
inconsciente. Isso torna a fala o elo entre o que está consciente e o inconsciente.
Menezes (2001) coloca que não teríamos condição de explorar o inconsciente
sem a sua representação por meio de interação com o sistema consciente-pré-
consciente. Então, para emergir o que está inconsciente no paciente, o terapeuta
terá que encoraja-lo a falar, falar tudo o que vier a mente, sem se preocupar se
essa fala tem ou não algum significado.

A representação verbal irá possibilitar vir à tona fragmentos inconscientes


por meio de associação livre possibilitando, assim uma interpretação do material
recalcado pelo terapeuta. Menezes (2001), aponta ainda que a psicanálise como
técnica terapêutica é baseada exclusivamente na decodificação dos sentidos
subjacentes à fala do analisando, limitando o analista a resgatar, restituir “os
fragmentos perdidos ou deformados, por efeito da defesa, de um texto histórico,

24
que se encontra substituído por outras representações no sintoma”. (MENEZES,
2001, p. 61 e 62). Mesmo que ocorram manifestações não verbais no processo
de significação ou ressignificação que é próprio na análise, esta é totalmente
dependente das potencialidades verbais. A discriminação e referenciação só são
possíveis por meios verbais. (MENEZES, 2001). Assim, o inconsciente poderia
ser pensado como “a projeção de estrutura da linguagem”. (MENEZES, 2001, p.
19).

Ao afirmar que a fala do paciente é o principal meio de exploração de seu


inconsciente, faz a atenção e a escuta do terapeuta, ser de primordial
importância no processo terapêutico, visto que são esses os mecanismos que
ele dispõe para fazer a interpretação do que é verbalizado pelo paciente. Desse
modo, com relação à atenção, Freud recomenda que o analista não a dirija para
algo específico que o paciente venha a expressar, para isso a atenção deve ser
colocada uniformemente em suspenso em face de tudo que se escuta, ou seja,
uma atenção flutuante. Ao concentrar a atenção para algo específico fatalmente
ele começará a selecionar o material que lhe é apresentado, e ao fazer isso, o
terapeuta correrá o risco de estar seguindo suas expectativas ou inclinações.
(FREUD, 1996/1911-1913). “Ver-se-á que a regra de prestar igual reparo a tudo
constitui a contrapartida necessária da exigência feita ao paciente, de que
comunique tudo o que lhe ocorre, sem crítica ou seleção.” (FREUD, 1996/1911-
1913, p. 126).

Para Freud (1996/1911-1913), não se deve esquecer que se escuta, na


maioria das vezes, são coisas cujo significado só é identificado posteriormente.
Há de se ressaltar também que, geralmente o motivo alegado pelo paciente na
busca pelo tratamento só vai se confirmar ou não em comentários posteriores.
Teremos que desconfiar que por detrás de uma queixa explícita, há sempre outro
motivo latente que conduzirá a terapia, e que, por ocasião, poderá ser ou não o
motivo alegado por ele inicialmente. Isso não quer dizer que não devamos levar
em consideração o motivo alegado pelo paciente, pelo contrário, devemos
considerar tudo o que ele diz como sua verdade psíquica, o que não devemos é
considerar seus motivos conscientes como sendo o cerne de seus conflitos
psíquicos, visto que os motivos reais estão sempre submerso no inconsciente.

25
Neste caso o terapeuta deve abandonar o artifício de buscar focar algum
momento ou problema específico, estudando tudo que se achar presente no
momento, pois como foi dito anteriormente o inconsciente é atemporal e se faz
presente e o sintoma se repete em qualquer situação independente de algum
assunto específico. Segundo Menezes (2001), para se desenvolver uma escuta
eficiente, baseada na atenção flutuante o analista necessita de uma mobilidade
descontraída, assim como respeitar o silêncio do paciente e quando necessário,
lançar mão de seu próprio silêncio. Além de, como salienta Herrmann (1999),
conseguir ouvir de maneira que se vá suprimindo de maneira gradual a redução
consensual, ou seja, a rotina.

Para Herrmann (1999), na vida quotidiana, tendemos a reduzir


consensualmente, por meio de um acordo, o significado de nossa comunicação.
Na análise, não devemos prestar atenção a cada assunto em separado, pois
perderia o sentido do conjunto. O terapeuta terá que ter uma falta de educação
sistemática, juntando pedaços da conversa sem se deter no que, de hábito,
significaria mudança de assunto. (HERRMANN, 1999). O analista trabalha
psiquicamente com restos e não com conteúdo que seja intencionalmente
significante para o paciente, não é a realidade material que é almejada, mas os
fragmentos das falas que permite inferir, adivinhar, testemunhando o “agir” da
realidade do que é dito por meio de um encadeamento. (MENEZES, 2001).

A realidade psíquica é uma forma de existência particular, que não deve


ser confundida com a realidade material (MENEZES, 2001). Desse modo o
analista não deve se apegar aos fatos concretos que o paciente o transmite,
salvo nas entrevistas iniciais, anamneses, quando se atem para o que acontece
na realidade histórica do individuo. O que se dispõe na escuta são os fragmentos
das falas e não a realidade material. Freud propõe que o terapeuta simplesmente
escute sem se preocupar se está lembrando ou não de alguma coisa. Freud
(1996/1911-1913), não aconselha a tomada de notas integrais, durante as
sessões analíticas, salvo no que se refira a anotação de datas, textos de sonhos
ou algum evento digno de nota.

No que diz respeito ao procedimento de interpretação, Freud (1996/1911-


1913) observa que o analista não deve se sentir alarmado pelas dificuldades que
possa vir a apresentar-se quanto a interpretação das associações do paciente

26
do que lhe está recalcado. As únicas dificuldades realmente sérias que o analista
tem de enfrentar residem no manejo da transferência. Para Del Nero (2003), as
interpretações têm o objetivo de ligar os conteúdos manifestos aos conteúdos
latentes dos sintomas, possibilitando, desse modo, ao terapeuta estabelecer a
unidade da experiência vivida pelo paciente. Já Freud (1996/1901-1905, p. 238),
coloca que o objetivo da interpretação é “extrair do minério bruto das
associações inintencionais o metal puro dos pensamentos recalcados.”.

A interpretação que o terapeuta faz do que se evidencia psiquicamente de


seu paciente, demanda um trabalho de absorção do que lhe é falado, ou seja, é
necessário pegar uma coisa aqui, outra ali, de modo que no final forme um
quadro do que se passa na vida psíquica do paciente. Como diz Herrmann
(1999), a interpretação é um trabalho de arqueologia do inconsciente. A tarefa
aqui seria tentar descobrir, a partir das associações livres do paciente, o que ele
deixou de recordar. Porém o importante “não é a lembrança da cena real que se
encontra recalcada, mas a fantasia masturbatória associada a ela.” (MENEZES,
2001, p. 23). A interpretação deve estar solidamente apoiada na trama
associativa de forma que o analisando não a note como forçada. Qualquer
interpretação inadequada, por menor que seja, é sentida pelo sujeito como um
esmagamento de seu pensamento e que o analista quer destrui-lo
psiquicamente. (MENEZES, 2001).

A simbolização é uma convenção subjetiva, o significado de alguma coisa


para um não será o mesmo para o outro. Não há padrões universais de análise
de qualquer fenômeno psíquico. Freud, em seu artigo Psicanálise Silvestre
(1996/1910), adverte que, os principiantes em psicanálise estão sujeitos a
cometer o erro de realizar interpretações, baseadas somente na teoria, tais como
o complexo de Édipo e o desenvolvimento psicossexual, sem levar em
consideração os mecanismos de funcionamento do indivíduo e sua realidade
psíquica que é única, colocando em risco todo o tratamento. Del Nero (2003)
chama atenção para o fato de que quando se faz uma interpretação justa, o
paciente sente-se compreendido experimentando um sentimento mais vivo de
identidade entre ele e o analista, da mesma forma que a interpretação mal feita
é um sinal de incompreensão por parte do terapeuta do que o paciente lhe traz.

27
Freud profere que o psicanalista precisa de certa quantidade de
sensibilidade e reserva quanto à interpretação, visto que o ouvinte só lhe dará
ouvidos quando tiverem familiarizado com a técnica. Assim o psicanalista tem
todo direito de resguardar-se do risco de uma exagerada exibição de perspicácia
de sua parte que poderá diminuir ou comprometer a fidedignidade dos seus
resultados. (FREUD, 1996/1911-1913).

Um outro ponto importante dentro do contexto terapêutico analítico é a


comunicação do terapeuta com seu paciente. Essa comunicação deve ser, na
medida do possível, impessoal, sem gírias, maneirismo, sotaques grosseiros
para que o paciente não subverta o que está sendo transmitido a ele. A
comunicação ao paciente dos significados ocultos (interpretação) de suas ideias
que lhe ocorrem deve ter a hora certa e o momento certo de ser dita. Freud
(1996/1911-1913) diz que a comunicação de algum significado com relação à
fala do paciente só pode ser feita após ter instalado uma transferência eficaz e
um rapport apropriado com o paciente. Pois o paciente, só faz uso da instrução
na medida em que é “induzido” a fazê-lo pela transferência, é por esta razão que
a primeira comunicação deve ser retida até que uma forte transferência se tenha
estabelecido. Segundo Freud (1996/1911-1913), o primeiro objetivo do
tratamento é o estabelecimento do vínculo do paciente ao processo terapêutico,
assim como ao terapeuta, para isto é necessário conceder-lhe tempo.

Freud (1996/1911-1913) destaca ainda que mesmo nos estágios mais


avançados da análise, e em todas as comunicações subsequentes, deve-se
tomar o cuidado em não “fornecer ao paciente a solução de um sintoma ou a
tradução de um desejo até que ele esteja tão próximo delas que só tenha de dar
mais um passo para conseguir a explicação por si próprio.” (FREUD, 1996/1911-
1913, p. 155). “Temos de esperar até que a perturbação da transferência pelo
aparecimento sucessivo de resistências transferências tenha sido removida.”
(FREUD, 1996/1911-1913, p. 158).

Com relação à comunicação da interpretação ao paciente, Hermmann


(1999), diz que, depois de ter descoberto ou considerado algum aspecto infantil
do paciente, de nada vale tentar explicar-lhe aquilo que descobriu. Embora a
explicação possa vir a ser correta, não se dá o efeito pretendido no paciente. As
intervenções realmente eficazes, ao invés, não devem ser explicadas, são

28
pedaços de frases, toques emocionais, repetições de uma palavra ou de uma
imagem que parecem importantes, silêncios bem colocados etc. (HERMMANN,
1999).

No que se refere às falas interrogativas, em que o terapeuta visa buscar


mais informações sobre a vida e o funcionamento psíquico do paciente, pode ser
usada sempre que julgar necessário, mas para isso é necessário que o terapeuta
exerça com sutileza e cautela a suas indagações de modo a não invadir os
pensamentos do paciente com os seus próprios. O terapeuta deve também,
valorizar o silêncio, tanto do paciente, quanto o seu próprio, pois “O silêncio
permite ao analista esquivar a interação defensiva em favor da manutenção da
ausência, potencialmente produtiva”. (MENEZES, 2001, p. 39). Essa ausência
que é sustentada pelo analista é que facilita a emergência do inusitado na fala,
o que faz com que o trabalho do analista seja não o de codificação, mas de
detecção e significação. (MENEZES, 2001).

Com relação à linguagem corporal o terapeuta deve ter um cuidado


especial, de modo a não influenciar o paciente com seus gestos, pois como alerta
Freud, “enquanto estou escutando o paciente, também me entrego à corrente de
meus pensamentos inconscientes; não desejo que minhas expressões faciais
deem ao paciente material para interpretação ou influenciem-no no que me
conta.” (FREUD, 1996/1911-1913, p. 149).

Em suma, o tratamento psicanalítico busca dar condições para que o


paciente em seu próprio tempo atinja a maturidade emocional, propiciada pela
tomada de consciência de suas realidades psíquicas, criando condições para
restaurar e/ou criar condições de autonomia no paciente (DEL NERO, 2003).
Assim, para Freud o término da análise se dará quando, em seu próprio tempo,
houver uma identificação do paciente com o analista. Essa identificação ocorre
não com a figura do analista, mas com a condição de analista, com o processo
de análise a que foi submetido, que possibilitará condições de agora em diante
se “autoanalisar”. Já para Lacan o processo de análise terminará quando o
paciente descobrir a fonte de suas fantasias. Mas, tanto Freud, quanto Lacan,
concordam que a condição para o término da análise é o reconhecimento e a

29
tomada de consciência pelo paciente de seus desejos inconscientemente
recalcados.

Ante o exposto, conclui-se que o principal objetivo do terapeuta dentro do


contexto psicanalítico, é auxiliar o paciente a tomar consciência de aspectos
recalcados e inconscientes de sua vida psíquica, contando para que isso seja
possível, com uma abordagem ou interpretação eficaz da transferência
estabelecida entre ambos. O terapeuta precisa dispor de manejo das condições
para que a fala do paciente entre em cena, com uma escuta empática, uma
atenção flutuante, ou seja, não se apegar a um fato específico e prestar igual
reparo a todo discurso do paciente, respeitando o seu silêncio e silenciando-se
quando necessário. A terapia psicanalítica não aceita de forma alguma que haja
sugestões, conselhos ou compadecimento com alguma situação do paciente.

Do mesmo modo não deve deixar-se surpreender por sentimentos hostis


ou desejosos em relação ao paciente, tendo maturidade e experiência
necessária para que consiga distinguir os seus sentimentos dos que se fazem
presentes no paciente para que não ocorra um erro de interpretação baseada na
projeção de seus próprios conflitos como se fossem do paciente. O terapeuta se
constitui num instrumento, ativo e consciente de si, que possibilita ao paciente o
descortinamento ou descoberta, ao seu próprio tempo, por meio de associações
livres, propiciada por uma boa interpretação pertinente do terapeuta, a vir
conscientizar-se e a apropriar-se de si mesmo.

30
Devolução e contrato

A última etapa de um processo de entrevistas está constituída por uma


entrevista de devolução. As entrevistas iniciais encerram-se no momento em que
o terapeuta perceber que já é capaz de formular uma impressão diagnóstica do
paciente, é capaz de definir a necessidade e possibilidade ou não de tratamento
e perceber que o vínculo formado entre ambos é capaz de garantir um trabalho
analítico proveitoso.

O terapeuta necessita fazer uma devolução ao entrevistado, ou seja,


colocar a sua percepção e as suas conclusões frente ao que foi exposto durante
as entrevistas.

Etchegoyen (2004) acredita que na devolução o terapeuta deve


aconselhar o entrevistado sobre o tratamento mais conveniente, deve fazer a
indicação com seus fundamentos, mantendo esses sempre muito sucintos. O
autor acredita que um informe muito detalhado presta-se mais a ser mal-
entendido e facilita a racionalização.

Nesse momento, caso a devolução indique a necessidade de psicoterapia


e o paciente opte por realizá-la com o mesmo terapeuta, dá-se a realização de
um contrato. Trata-se de um acordo manifesto acerca de algumas combinações
práticas que servirão de referência à longa jornada da análise. Essa combinação

31
básica antes de iniciar uma análise ou psicoterapia inclui o tipo de tratamento
indicado (psicoterapia ou análise), o número de sessões semanais, tempo de
duração das sessões, horários, honorários, faltas e férias.

Etchegoyen (2004) inclui na ideia de contrato a de que o tratamento deve


finalizar por acordo das partes e, por isso, se apenas um dos dois assim decide,
não se fala de término, mas de interrupção.

Alguns analistas optam por combinar detalhes como, por exemplo, o


direito que eles se reservarão de responder ou não às perguntas dos pacientes;
atender ou não o pedido de mudança de horário das sessões; o pagamento no
caso de doença ou viagem do paciente; o dia e a forma do pagamento;
permissão para fumar ou não durante as sessões; aceitação de presentes;
encontros sociais; forma de cumprimentar; uso ou não do divã, etc.

Zimerman (2004) defende a realização das combinações básicas, mas


acredita que as demais são implícitas ao processo terapêutico, devendo ser
analisadas à medida que surgirem, principalmente porque variam de caso para
caso. O autor enfatiza que deve ficar bastante claro para o analista e para o
analisando (ainda que não se esclareça explicitamente) que a interrelação do
par analítico obedece a três princípios básicos:

1) Ela não é simétrica: os lugares ocupados e os papéis a serem


desempenhados são desiguais e obedecem a uma natural hierarquia, com
direitos, deveres e privilégios distintos.

2) Ela não é de similaridade: os dois do par analítico não são iguais,


diferentemente do que imaginam muitos pacientes regressivos, que têm
dificuldade em admitir que o terapeuta é uma pessoa autônoma, tem a sua
própria técnica e o seu próprio estilo de trabalhar, pensar e viver.

3) A relação que o paciente reproduz com o analista é isomórfica: na


essência, terapeuta e paciente se comportam da mesma forma, como seres
humanos que são; o fato do analista desempenhar transitoriamente as funções
de maternagem (ou outras equivalentes) que o paciente carece não pode ser
confundido com a ideia de que o analista será um substituto para uma mãe que
foi ausente ou falha.

32
Etchegoyen (2004) também pensa que não é prudente ser muito prolixo
ou fornecer muitas diretivas no momento do contrato. Enfatiza, no entanto, que
a introdução da regra fundamental de associação livre e uso do divã, no caso de
análise, deve ser feita já no contrato. Caso o paciente pergunte, no contrato,
acerca da duração do tratamento, o autor acredita que o terapeuta deve apenas
dizer que a análise é longa e que sua duração é imprevisível.

Abuchaem (1985), entretanto, acredita que o sujeito não tem obrigação


de saber a prática de um processo terapêutico e, por isso, procura explicar
minuciosamente a dinâmica das sessões e do tratamento, além de estipular um
tempo mínimo de duração da análise.

Ao contrário de Etchegoyen (2004), Abuchaem (1985) pensa que essa


explicação detalhada evita inconvenientes e mal-entendidos futuros e dá ao
analista melhores condições para interpretar a ruptura do enquadre. Inclui, na
entrevista de devolução, a explicitação de suas opiniões sobre o funcionamento
e a dinâmica da personalidade do paciente, no que se refere tanto às suas partes
sãs como às suas partes enfermas.

O autor reconhece, entretanto, que muitas dessas informações são


instantaneamente reprimidas (por não haver uma preparação para ouvi-las e
pela ansiedade que provocam) pelo paciente, o qual geralmente esquece grande
parte da devolução que foi feita e raramente faz referência às questões ali
levantadas ao longo do tratamento.

33
REFERÊNCIAS

ARGELANDER, H. (1976). The Initial Interview in Psychotherapy.


Translated by Hella Freud Bernays. New York: Human Sciences Press.
BUCHAEM, J. La interpretación en las etapas iniciales del tratamiento
psicoanalitico. Buenos Aires: El Lugar, 1985.
CEITLIN, L., CORDIOLI, A. O início da psicoterapia. In: CORDIOLI, A.
(Org.). Psicoterapias – abordagens atuais. Porto Alegre: Artes Médicas, p. 99-
109, 1998.
DANCKWARDT, J. F. (2011a). The fear of method in psychoanalysis.
Psychoanalysis in Europe. Bulletin, 65, 113-124.
DANCKWARDT, J. F. and Gattig, E. (1998). The Indication for High-
Frequency Analytical Psychotherapy in the Contractual Medical Health Service.
A Manual. Stuttgart (frommannholzboog).
DEL NERO, S. (2003) Conflitos Intrapsiquicos. 1a ed. São Paulo: Vetor.
DOR, J. Estruturas e clínica psicanalítica. Rio de Janeiro: Livrarias
Taurus-Timbre, 1991.
ECKSTAEDT, A. (1991). Die Kunst des Anfangs. [The art of beginning].
Frankfurt: Suhrkamp.
ETCHEGOYEN, R. Fundamentos da técnica psicanalítica. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2004.
FLIESS, R. (1953). Countertransference and counteridentification. J.
Amer. Psychoanal. Assn. 1, 268-284.
FREUD, S. (1996). A história do movimento psicanalítico, artigos sobre
metapsicologia e outros trabalhos. In S. Freud, Obras Completas, vol. 14. Rio de
Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1914-1916).
FREUD, S. (1996). Além do princípio de prazer psicologia de grupo e
outros trabalhos. In S. Freud, Obras Completas, vol. 18. Rio de Janeiro: Imago.
(Trabalho original publicado em 1925-1926).
FREUD, S. (1996). Cinco lições de psicanálise, Leonardo da Vinci e outros
trabalhos. In S. Freud, Obras Completas, vol. 11. Rio de Janeiro: Imago.
(Trabalho original publicado em 1910[1909]).
FREUD, S. (1996). Conferências introdutórias sobre psicanálise: Partes I
e II. In S. Freud, Obras Completas, vol. 15. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho
original publicado em 1915-1916).
FREUD, S. (1996). Duas histórias clínicas (O "Pequeno Hans" e o
"Homem dos ratos"). In S. Freud, Obras Completas, vol. 10. Rio de Janeiro:
Imago. (Trabalho original publicado em 1909).

34
FREUD, S. (1996). História de uma neurose infantil e outros trabalhos. In
S. Freud, Obras Completas, vol. 17. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original
publicado em 1917-1919).
FREUD, S. (1996). O caso Schreber, artigos sobre técnica e outros
trabalhos. In S. Freud, Obras Completas, vol. 12. Rio de Janeiro: Imago.
(Trabalho original publicado em 1911-1913).
FREUD, S. (1996). O ego e o Id e outros trabalhos. In S. Freud, Obras
Completas, vol. 19. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1923-
1925).
FREUD, S. (1996). Os chistes e sua relação com o inconsciente. In S.
Freud, Obras Completas, vol. 8. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original
publicado em 1905b).
FREUD, S. (1996). Sobre a psicopatologia da vida cotidiana. In S. Freud,
Obras Completas, vol. 6. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em
1901).
FREUD, S. (1996). Totem e tabu e outros trabalhos. In S. Freud, Obras
Completas, vol. 13. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1913-
1914).
FREUD, S. (1996). Um caso de histeria. Três ensaios sobre a teoria da
sexualidade e outros trabalhos. In S. Freud, Obras Completas, vol. 7. Rio de
Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1905a).
FREUD, S. A perda da realidade na neurose e na psicose. ESB Vol. XIX.
Rio de Janeiro: Imago, (1924, 1976)
FREUD, S. Sobre o início do tratamento. ESB vol. XII. Rio de Janeiro:
Imago, (1913; 1976)
FREUD, Sigmund. Recomendações aos médicos que exercem a
psicanálise. In:______ Obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de
Janeiro: Imago, 1996, p.123-133. (Edição standard brasileira das obras
psicológicas Sigmund Freud, Vol.12).
FREUD, Sigmund. Sobre o início do tratamento. In:______ Obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, p.137-
158. (Edição standard brasileira das obras psicológicas Sigmund Freud, Vol.12).
HEIMANN, P. (1950). On counter-transference. Int. J. Psychoanal., 31, 81-
84.
HEIMANN, P. (1960). Counter-transference. Brit. J. med. psychol., 33, 9-
17.
HEIMANN, P. (1964). Bemerkungen zur Gegenubertragung [Observations
on the countertransference]. Psyche, 18, 483-93.

35
HERRMANN, F. (1999). O que é Psicanálise para iniciantes ou não.... São
Paulo: Editora Psique.
KERNBERG, O. F. (1965). Notes on counter-transference. J. Am. Psa.
Ass., 13, 38-56.
LANGS, R. The technique of psychoanalytic psychotherapy. New York:
Jason Aroson Inc, 1973.
MARQUES, N. Entrevista de triagem: espaço de acolhimento, escuta e
ajuda terapêutica. In: MACEDO, M. e CARRASCO, L. (Orgs). (Con)textos de
entrevista: olhares diversos sobre a interação humana. São Paulo: Casa do
Psicólogo, p. 161-179, 2005.
MENEZES, L. C. (2001). Fundamento de uma Clinica Freudiana. 1a ed.
São Paulo: Casa do Psicólogo.
NASIO, J. D. (1993). Cinco lições sobre a psicanálise. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor.
NASIO, J. D. (1997). Os 7 Conceitos Cruciais da Psicanálise. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor.
NASIO, J. D. (1999). Como Trabalha um Psicanalista. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor.
NASIO, J. D. (2003). Um Psicanalista no Divã. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor.
PRISZKULNIK, L. Clínica(s): Diagnóstico e Tratamento. In
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sciarttext&pid=S01036564200000010000
2.
QUINET. Antonio. As 4 + 1 condições da análise. 8. ed. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2000 p.7- 34
WEGNER, P. (2008). Erstinterview [First interview]. In Mertens, W. and
Waldvogel, B. (Eds.). Handbuch psychoanalytischer Grundbegriffe. (pp. 177-
180) [Handbook of basic psychoanalytic concepts] (3rd revised and expanded
edition). Stuttgart: Kohlhammer.
ZIMERMAN, D. Manual de técnica psicanalítica: uma revisão. Porto
Alegre: Artmed, 2004.

36

Você também pode gostar