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Brazilian Journal of Development

Educação para relações étnico-raciais: experiências na rede federal de


educação

Education for ethnic-racial relations: experiences in the federal education


network

DOI:10.34117/bjdv6n5-167

Recebimento dos originais:20/04/2020


Aceitação para publicação:11/05/2020

Mariana da Silva de Lima


Mestra em Biotecnologia pela Universidade Federal do Ceará
Instituição: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
Endereço institucional: Rua Francisco da Rocha Martins, s/ nº. Bairro Pabussu, Caucaia,
CE. cep: 61609-090
E-mail: marianalima@ifce.edu.br

RESUMO
O relato de experiência descreve experiências exitosas no desenvolvidas Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, campus Caucaia, sobre a questão racial na escola.
Os principais temas abordados foram a religiosidade afro-brasileira e o combate ao racismo
no cotidiano escolar da rede pública do Estado do Ceará. A educação decolonial é uma
temática ainda recente no ambiente acadêmico, no entanto é um assunto extremamente
necessário a ser trabalhado visto que tanto a ciência produzida quanto os saberes ensinados na
maioria das escolas do país ainda são baseados em uma epistemologia eminentemente
eurocêntrica, sem levar em consideração as vivências e peculiaridades da formação de nossa
sociedade. Assim, educadores do IFCE campus Caucaia, em dois momentos distintos,
promoveram atividades de discussão e reflexão sobre o assunto. Inicialmente uma palestra foi
promovida com uma professora de história, negra e militante do movimento INEGRA do
Ceará. A palestrante abordou com os alunos conceitos como racismo institucional, racismo
recreativo e injúria racial. Também abordou a temática da militância e sua importância para a
construção de uma sociedade mais igualitária e justa. Posteriormente uma mesa redonda foi
promovida com um sociólogo e uma pedagoga, ambos praticantes da umbanda, para falar
sobre religiões de matriz africana para os estudantes.Os resultados das discussões tecidas ao
longo dos dois eventos mostraram a importância da inclusão freqüente de temáticas raciais no
âmbito escolar, de forma que a escola possa ser um lugar de construção de diálogo e respeito
às diferenças.

Palavras-chave: Educação decolonial, Relações étnico-raciais, Educação antirracista.

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n.5, p.26067-26076 may. 2020. ISSN 2525-8761


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ABSTRACT
The experience report describes successful experiences at the Federal Institute of Education,
Science and Technology of Ceará, campus Caucaia, on the racial issue at school. The main
themes addressed were Afro-Brazilian religiosity and the fight against racism in the public
school system of the state of Ceará. Decolonial education is still a recent topic in the academic
environment, however it is an extremely necessary subject to be addressed since both the
science produced and the knowledge taught in most schools in the country are still based on
an eminently Eurocentric epistemology, without taking into account considering the
experiences and peculiarities of the formation of our society. Thus, educators at the IFCE
campus Caucaia, in two different moments, promoted activities of discussion and reflection
on the subject. Initially a lecture was promoted with a history teacher, black and activist from
the INEGRA movement in Ceará. The speaker discussed with students concepts such as
institutional racism, recreational racism and racial injury. It also addressed the issue of
militancy and its importance for the construction of a more egalitarian and just society.
Subsequently, a round table was held with a sociologist and a pedagogue, both Umbanda
practitioners, to talk about African-based religions for students. school, so that the school can
be a place for building dialogue and respect for differences.

Keywords: Decolonial education, Ethnic-racial relations, Anti-racist education.

1 INTRODUÇÃO
As pesquisas e estudos acadêmicos acerca das questões raciais no Brasil e como essas
questões influenciam nossa sociedade ainda é considerado algo relativamente recente no
Brasil. Santos (1997) foi um dos pesquisadores que se destacou no estudo da questão,
abordando em seus textos a forma desproporcional com a qual a população negra é tratada em
nossa sociedade. O pesquisador foi um dos primeiros a denunciar o estado de subcidadania
dos afrodescententes em nosso país, o que ele chamou de “cidadania mutilada”.
Acerca da conjuntura das tensões raciais em nossa sociedade, é importante que haja
uma diferenciação do que é a prática racista, por meio de condutas individuais, e racismo
estrutural. A prática de exclusão, ou qualquer outra atitude individual que leve ao
desfavorecimento, entre indivíduos, e que tenha como origem a discriminação racial, é a
prática racista individual. Já o racismo estrutural é algo mais amplo, conjuntural, pois é a
exclusão social de um grupo, levando esse grupo a ser submetido a uma sistemática
desvantagem, algo que se torna ostensivo a nível cultural, institucional, e social como um todo
(JONES, 2002). A estrutura da sociedade, principalmente por meio de políticas públicas e do
funcionamento das instituições, exclui um grupo e o torna socialmente vulnerável
(NASCIMENTO, 2016). Acerca do assunto, Almeida (2018, página 29) esclarece:

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“A concepção institucional significou um importante avanço teórico no que
concerne ao estudo das relações raciais. Sob esta perspectiva, o racismo não se
resume a comportamentos individuais, mas é resultado do funcionamento das
instituições, que passam a atuar em uma dinâmica que confere, ainda que
indiretamente, desvantagens e privilégios a partir da raça.”

A partir dessa reflexão acerca do racismo, é importante que se faça uma análise das
instituições acadêmicas e educacionais como um todo. Nas instituições educacionais
brasileiras, observa-se que a forma de fazer e legitimar o conhecimento são pouco
democráticas, não representando os saberes de povos nativos ou afrodescentes. Na formação
das instituições que atuam na educação de crianças e jovens de nosso país a epistemologia
eurocêntrica foi e ainda é dominante em diversos aspectos. Sobre esse assunto, Benite e Silva
(2018, página 192) afirmam:

“Neste contexto acadêmico, grupos não hegemônicos (negos, grupos iletrados,


indígenas e subproletariados) vivem à margem do estrato escolar e social, sem voz
ativa.
O currículo escolar é um cúmplice da ideologia excludente Ocidental. A escola
reproduz as estruturas excludentes de poder e opressão historicamente herdadas,
mantendo os grupos subalternos excluídos e silenciados.”

Assim, é necessário que estratégias possam ser postas em ação com o objetivo de
corrigir essa grave falha de nosso sistema educacional, para que a forma de se fazer educação
no Brasil possa respeitar a pluralidade da população.
A partir da conjuntura apresentada, acerca da carência de representatividade nos
currículos escolares, é que as leis 10639/03 e 11645/08 vêm com a proposta de dar voz aos
grupos historicamente subalternizados para que esses grupos possam contribuir com os
currículos das instituições. A ciência deve ser plural, pois os saberes são plurais. É necessário
que os currículos sejam descolonizados.
Foi pensando na necessidade de descolonizar os saberes que o Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, campus Caucaia vem promovendo uma série de
eventos e ações com a finalidade de inserir no cotidiano escolar temáticas que contemplem a
população negra, fazendo sempre um paralelo com os saberes curriculares. A proposta dos
eventos extra-classe tem objetivo de iniciar uma cultura de dialogar com essas temáticas para
posteriormente serem inseridas pelos docentes em sala de aula.
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O município de Caucaia faz parte da região metropolitana de Fortaleza, situado no
Estado do Ceará. Nesse município há forte presença de povos indígenas e comunidades
quilombolas. Segundo o último mapeamento das comunidades quilombolas do Estado do
Ceará, Caucaia possui um total de nove comunidades oficialmente reconhecidas. Logo, é
comum que muitos de nossos estudantes pertençam a essas comunidades, sendo, portanto,
legítimo que os educadores pertencentes ao quadro do IFCE campus Caucaia pensem e
dialoguem sobre novas metodologias e saberes a serem trabalhados na instituição, a fim de
atender a realidade da diversidade de nosso público discente.

2 OBJETIVOS
Como objetivo geral, o trabalho teve como finalidade contribuir para a construção de
uma cultura de educação antirracista no IFCE campus Caucaia.
Como objetivos específicos as intervenções buscaram:
Facilitar uma discussão acerca da questão racial no cotidiano escolar,
Contribuir para a sensibilização da comunidade escolar quanto à necessidade da
inserção de conteúdos que contemplem a diversidade da população local,
Contribuir para o conhecimento acerca da diversidade religiosa, fomentando o respeito
entre as diversas expressões da religiosidade.

3 METODOLOGIA
Educadores do IFCE campus Caucaia, em dois momentos distintos, promoveram
atividades de discussão e reflexão sobre relações étnico-raciais, movimento negro e cultura e
religiosidade afro-brasileira.
Inicialmente uma palestra foi promovida por uma professora convidada, pertencente
ao quadro permanente dos docentes da Secretaria de Educação do Estado do Ceará. A docente
convidada tem um histórico de engajamento na causa por uma educação decolonial,
historiadora de formação, negra e militante do movimento INEGRA (Instituto Mulher Negra)
do Ceará. As turmas envolvidas eram turmas do ensino médio integral do IFCE, logo,
estudantes com uma faixa etária entre 15 a 18 anos. Além disso, tivemos a participação
também de alguns docentes de outras disciplinas, algo considerado importante, visto que uma
pedagogia antirracista deve ser abordada em todas as disciplinas do currículo escolar. A
participação de outros docentes possibilita uma reflexão sobre o assunto por parte dos mesmos,
se caracterizando também em um momento de aprendizado para os próprios docentes. Os
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estudantes do ensino médio do IFCE Caucaia estudam no regime de integral, participando de
atividades letivas durante o turno da manhã e da tarde. No entanto, em dois dias da semana,
no turno da manhã, outras atividades extra-curriculares podem ser desenvolvidas para o
enriquecimento da formação dos alunos. Assim, em um dia da semana de atividade extra-
curricular as turmas foram liberadas para a participação deste primeiro evento, intitulado “
Relações étnico-raciais no currículo escolar.”
Inicialmente a palestrante abordou com os alunos conceitos como racismo
institucional, racismo recreativo e injúria racial. Explicou o racismo enquanto atitude
individual, que o mesmo causa prejuízos para quem sofre e para as relações sociais como um
todo. Conceituou também racismo institucional, mostrando que esse tipo de racismo é ainda
mais amplo, e está nas instituições como escolas, universidades e outras organizações,
causando uma exclusão de um grupo por questões de raça, tornando-o mais vulnerável do que
outros grupos da sociedade. A seguir, a palestrante mostrou a crueldade que é o racismo
recreativo, que se baseia na depreciação do indivíduo por meio de piadas e exposições de
pessoas negras, algo muito comum entre os adolescentes. A professora investiu boa parte do
tempo para mostrar que esse tipo de racismo, ao contrário do que muitos pensam, não é
inofensivo e pode causar prejuízos psicológicos e de auto-estima nos indivíduos que sofrem
com essa conduta.
Posteriormente deu-se início ao momento que a palestrante chamou de Relato de Vida,
com a abordagem de suas experiências escolares até a juventude. A militante abordou na
palestra experiências pessoais enquanto estudante, e como se deu em sua vida as relações com
colegas de escola e de faculdade. Falou de sua adolescência de preterimento na vida escolar,
de como não se reconhecia no conteúdo estudado, inclusive na disciplina de história, matéria
escolar com a qual sempre se identificou mais. Porém, para a palestrante, o fato das disciplinas
tratarem sempre de saberes eminentemente eurocêntricos causava um constante
estranhamento e certo desconforto. À medida que a juventude chegou ela foi desenvolvendo
ainda mais o senso crítico acerca do que estudava, da cultura dominante que a cercava e de
como ela não se reconhecia em tudo aquilo.
A estratégia usada pela docente na palestra, ao relatar suas experiências, tinha o
objetivo de desenvolver a empatia nos estudantes, para que a partir daí muitos se colocassem
no lugar apresentado pela professora
Uma palestrante negra, militante, que tem consciência da real conjuntura na qual a
população negra está inserida no Brasil e que, sobretudo, passou por experiências de racismo,
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é importante nesse tipo de intervenção. Isso possibilita uma atividade mais humanizada, não
apenas técnica no sentido da apreensão do conhecimento. O relato de vida também objetiva o
encorajamento do público para participar do último momento da palestra, que é a escuta atenta,
para uma construção coletiva da intervenção.
No terceiro momento, foi feita uma explanação sobre os dados de pesquisas acerca do
racismo no Brasil. Esses dados tratavam dos mais diversos assuntos como segurança pública
e a relação racial no encarceramento, racismo e preterimento nas relações sociais, a exclusão
da população negra na mídia nacional, racismo e mercado de trabalho. Esse momento foi
importante por dois motivos. Primeiramente para que o público constatasse o nível do
problema, visto que muitos afirmam ainda hoje que o racismo no Brasil não existe ou é algo
que ocorre com pouca freqüência. Além disso, a importância desse momento se dá a partir do
momento em que a palestrante mostra que a questão não é tratada ou enfatizada com certa
parcialidade (visto que o momento anterior foi o Relato de Vida), mas que existem dados que
embasam o discurso ali apresentado.
A seguir a professora abordou a temática da militância e sua importância para a
construção de uma sociedade mais igualitária e justa. Ela mostrou para o público que há
maneiras de organização coletiva para reivindicação de direitos, educar e conscientizar a
população e trabalhar o auto-cuidado coletivo para fortalecer a população negra vítima de
constantes injustiças. Além disso, foram dados vários exemplos de coletivos e movimentos
pacíficos existentes que têm a finalidade de promover uma sociedade igualitária e combater
todo o tipo de discriminação racial.
Ao final, foi aberto o espaço para fala dos participantes. Aqueles que quiseram se
manifestar realizaram a inscrição com a mediadora da palestra, tendo sido aberto o espaço de
fala tanto para professores quanto para estudantes. Após as manifestações, perguntas dos
participantes e respostas da palestrante, o primeiro dia de intervenção foi concluído. A seguir,
a Tabela 1 mostra a sistematização da intervenção do primeiro dia.

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Tabela 1: Planejamento sistematizado da primeira intervenção no IFCE campus Caucaia (CE).

Temas específicos Objetivos a serem alcançados


Estratégia de apresentação
apresentados no público
Fazer o público formar um
Conceitos gerais sobre Por meio de figuras, slides e arcabouço de conhecimento
racismo no Brasil exemplos práticos básico para entendimento do
tema.
Desenvolver a empatia do
público sobre a temática;
Relato de Vida Depoimento pessoal
Encorajamento de outros
estudantes.
Desenvolver no público a
percepção da gravidade do
Dados quantitativos referentes Uso de dados de pesquisas problema;
ao assunto sobre racismo no Brasil Mostrar que isso é um
problema social e não uma
percepção pessoal.
Desenvolver no público a
Explanar os resultados de percepção de que há formas de
Experiências de militância intervenções práticas e mudar a situação;
coletivas Estimular o engajamento
cotidiano do público.
Encorajar o público a relatar
Convite feito ao público em
Momento de escuta dos suas experiências;
geral (professores e
estudantes Fazer o público refletir acerca
estudantes)
de seu cotidiano.

Na semana seguinte à primeira intervenção, um segundo evento foi planejado pela


direção de ensino, por meio de um dos docentes de biologia, em parceria com o serviço social
do campus. O planejamento prévio foi importante para que se pudesse organizar uma boa
divulgação no âmbito escolar, para servidores e alunos, e também fora da escola, para a
comunidade local. O segundo evento consistiu em uma mesa redonda sobre Religiões de
Matriz Africana, tendo tido ampla divulgação nos espaços reservados para este fim no campus
Caucaia. O setor de comunicação social apoiou o evento com a elaboração e divulgação de
cartazes sobre a mesa-redonda e chamadas nas redes sociais para os alunos participarem.
O evento teve como palestrantes uma conhecida pedagoga, que também atua
ativamente como escritora e cantora de um grupo tradicional de Afoxé no Estado do Ceará,
tendo a mesma já lançado livros infantis com temáticas étnico-raciais. Além disso, a referida
palestrante também é praticante de umbanda. O segundo palestrante é sociólogo e umbandista.
Militante contra o racismo cultura e religioso.

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A pedagoga iniciou o debate apresentando de maneira muito poética as religiões de
matriz africana. Sua abordagem foi riquíssima em imagens, músicas e poesia. À medida que
o tempo ia avançando ela abordava divindades e suas histórias. Fez um paralelo com os santos
e com as histórias da cultura cristã. Ao final, a artista cantou uma música sobre as divindades,
ensinando para os estudantes e solicitando que todos ajudassem a cantar. O encerramento de
sua fala aconteceu sob aplausos de todo o público participante. O segundo palestrante, o
sociólogo, era um jovem recém-formado e seu foco principal foi apresentar a umbanda, relatar
como iniciou suas atividades na religião e as dificuldades enfrentadas. A fala do sociólogo foi
interessante pelo fato de ter se mostrado mais próxima dos alunos, já que sua fala também foi
permeada de suas experiências na juventude, o que facilitou de certa forma a identificação do
público com a fala do sociólogo. Ao concluir sua fala, foi aberto um espaço para perguntas do
público. Muitos estudantes tiraram suas dúvidas e outros elogiaram publicamente o evento,
reconhecendo como algo bastante enriquecedor.

4 RESULTADOS
A escola é um dos lugares onde os indivíduos aprendem a viver em sociedade,
desenvolvem valores pessoais a partir de suas experiências com outros grupos e têm a
possibilidade de aprender noções de moral e de ética de maneira coletiva (OLIVEIRA et al.,
2013). Nosso objetivo com as intervenções promovidas no IFCE campus Caucaia foi de fazer
com que o público tivesse a experiência de dialogar uns com os outros sobre algo tão relevante
e presente em nosso cotidiano que é o preconceito racial e suas conseqüências reais na vida de
todos. Além disso, levar o público a refletir sobre o assunto por meio de debates coletivos é
uma das formas de propiciar a superação de preconceitos e a construção de valores a partir das
relações que os próprios adolescentes têm uns com os outros, dando-lhes a liberdade de
desenvolverem uma ética própria, sendo o momento formativo o impulsionador e norteador
do processo.
A primeira intervenção foi muito positiva para os alunos, sendo o resultado desse
primeiro momento mensurado de maneira qualitativa por meio do momento de escuta livre do
público. Os estudantes, e alguns professores, reconheceram como a fala da professora ampliou
a percepção de que algumas atitudes individuais, antes consideradas inofensivas, poderiam se
mostrar bastantes nocivas para pessoas vítimas de certos comportamentos como piadas,
comentários e juízos de valor. Também foi comentado como a visão de alguns estudantes

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sobre a participação de afro-descentes na mídia ganhou um novo sentido depois da fala da
palestrante.
Na segunda intervenção os estudantes também se expressaram de maneira satisfatória,
sendo também os resultados mensurados de maneira qualitativa, por meio do feedback do
público. A pedagoga foi muito reverenciada por sua fala e pela maneira lúdica com a qual
apresentou as religiões de matriz africana, suas divindades e seus ritos. De acordo com os
estudantes, foi uma forma muito prazerosa de aprender sobre a cultura negra e como ela está
tão presente no cotidiano da sociedade brasileira. Após a palestra, muitos estudantes foram
conversar pessoalmente com o sociólogo, pois a identificação do público adolescente com a
fala do palestrante foi bastante significativa, o que também contribuiu para o resultado positivo
do evento.
Os resultados das discussões tecidas ao longo dos dois eventos mostraram a
importância da inclusão freqüente de temáticas raciais no âmbito escolar, de forma que a
escola possa ser um lugar de construção de diálogo e respeito às diferenças.
Após ambos os eventos, diálogos com o corpo docente também mostraram que muitos
foram positivamente influenciados pelas duas intervenções.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O enfrentamento dos problemas sociais e a decisão de como enfrentar esses problemas
é algo a ser trabalhado conjuntamente no âmbito escolar. Ao mesmo tempo em que a escola
tem o objetivo de ensinar o conhecimento científico, cabe a escola também propiciar
momentos para que os estudantes entendam como colocar o conhecimento científico a serviço
da sociedade.
Como observado por meio da reação do público, nossos objetivos de contribuir para
que a temática das questões raciais fosse discutida na escola foi contemplado, além de também
sensibilizar não só estudantes, mas também servidores em geral quanto ao tema trabalhado.
Os educadores que participaram das atividades tiveram a oportunidade de ver metodologias
de abordagem do assunto com o público adolescente, além de perceber a importância do tema
enquanto parte do conteúdo a ser trabalhado, ainda que de maneira transversal, ao longo do
semestre. Uma educação ativa e que emancipa os estudantes precisa ser pensada de maneira
coletiva por todo o corpo docente, e ambos os eventos contribuíram para o início dessa
percepção em todos os servidores que participaram.

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Por fim, é sempre importante refletir que não se respeita o que não se conhece. Assim,
para que alcancemos uma sociedade onde o respeito à diversidade religiosa é uma realidade,
é necessário que as diversas expressões da religiosidade brasileira, sua história e valorização,
possam ser abordadas em momentos formativos na escola. A segunda intervenção alcançou o
objetivo de apresentar de maneira positiva religiões de matriz africana, contribuindo para
desenvolvimento do respeito de diferentes crenças.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, S. L. O que é racismo estrutural? 1ª.Ed. Belo Horizonte/MG: Letramento. 2018.


p. 29.
BENITE, A. C.; SILVA, J. P. Educação e Descolonização: Tessituras sobre a reinvenção do
poder no Currículo de Química. In: KOMINEK, A. M. V.; VANALI, A. C. Roteiros
temáticos da diáspora: caminhos para o enfrentamento ao racismo no Brasil. 1ª. Ed. Porto
Alegre, RS: Editora Fi. 2018.
JONES, C. P. Confronting institutionalized racism. Phylon, Atlanta. v. 50, n. 1, p. 7-22, 2002.
NASCIMENTO, A.. O genocídio do Negro brasileiro: processos de um racismo
mascarado. 1ª Ed. São Paulo: Perspectivas. 2016.
OLIVEIRA, T.; VIANA, A.P.S.; BOVETO, L.; SARACHE, M.V. Escola, conhecimento e
formação de pessoas: considerações históricas. Políticas Educativas. Porto Alegre, v. 6, n.2,
p. 145-160, 2013.
SANTOS, M.. As cidadanias mutiladas. In: LERNDER, JÚLIO. O preconceito. 1ª. Ed. São
Paulo, 1997.

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