Você está na página 1de 5

UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

CE NT RO D E CI Ê NC I A S HU M A N AS E CO MU NI CA Ç ÃO
DE P A RT A M ENT O DE P SI CO LO G I A
DIS CIPLI NA : P SICO LO G IA O RG AN IZA CIO N AL I I
PRO FES SO RA : SI RLE I CAV IN ATO

A LOUCURA
DO
TRABALHO

A ca d ê m i c a: C a s si a na M a rt i n s

C axi a s d o S ul , 1 6 d e j u nh o d e 2 0 0 3
A Loucura do trabalho, de Christophe Dejours

O livro traz a história do trabalho com apontamentos de Dejours que questionam a forma
como os trabalhadores resistem aos ataques ao seu funcionamento psíquico, provocados pelo
trabalho. Posicionando-se também frente a questão da utilização que os sujeitos fazem de seus
subsídios internos, para que não haja uma desestruturação de sua psique nesse meio ambiente
hostil.
As três questões básicas que contextualizam o livro são: As relações entre trabalho e
saúde mental; o seu método de investigação e a sua análise do assunto.
O autor posiciona seu pensamento em uma análise que é o ponto de referência para
seguirmos seu entendimento do relacionamento humano com as condições produtivas, criando,
produzindo e transformando a sociedade. Essa relação recíproca, tem seus alicerces na história da
Idade Antiga, e simbolizada em sua forma de produzirem para sua sobrevivência.
A política de trocas foi instaurada quando houveram sobras de produção, dando início as
trocas de mercadorias pelos clãs. A escravidão já é fruto da cobiça entre os povos gregos e
romanos, criando novas formas de relação entre dominadores e dominados.
A evolução histórica do trabalho demonstra que as relações de trabalho são altamente
carregadas de paradigmas , norteando a correlação de forças entre trabalhadores, patrões e o
Estado. Nessa história, um recorte importante é a saúde dos trabalhadores, como um subcapítulo
bem atual da história popular.
No século XIX, houve um período de desenvolvimento do capitalismo industrial,
caracterizado pelo crescimento da produção. As altas horas de trabalho, os salários baixos, a falta
de higiene, o esgotamento físico, a promiscuidade, os acidentes de trabalho e a subalimentação
potencializam as condições de uma alta morbidade e desvalorização do ser humano. A guerra é
um fator determinante nesse contexto histórico-sócio-econômico.
“Não se cabe falar em saúde em relação a classe operária do século XIX. Antes é preciso
que seja assegurada a subsistência , independentemente da doença. A luta pela saúde (...)
identifica-se com a luta pela sobrevivência”. (p. 14)
Descreve-se esse período com o nome de Miséria Operária: “As faltas e os crimes são as doenças
da sociedade” (p.15) Os meios de cura provém apenas do Governo.
Na Idade Moderna, surge a classe burguesa, em decorrência das guerras que transformam
Feudos em nações na Europa, tendo como pensamento dominante a libertação dos camponeses e
servos; o aumento dos excedentes para a base de trocas mais complexas, pela moeda e comércio
internacional e por fim, a valorização do corpo, fruto de pesquisas científicas.
Os pensamentos que alicerçam as atitudes dessa época, são de cunho Liberalista
(Positivismo, funcionalismo) e a teoria Marxista.
A ineficiência das teorias econômicas, fica visível pelos problemas sociais e com o valor
alto da mão de obra. O sistema socialista se mostra altamente desestruturador para a sociedade,
pois propaga e provoca a desigualdade em todos os âmbitos. A soberania e exploração da classe
capitalista sobre seu oposto: uma classe trabalhadora oprimida, que nos traz como conseqüência o
avanço do capitalismo, como um modelo diferenciado.
A proposta de Marx perdura na atualidade, configurando a supressão da liberdade de
mercado em prol do estado e de lideranças fortes que possam se sobressair às empresas,
acabando com elas.
O objeto de estudo de Dejours se modifica, passando do título de loucura para o sofrimento
no trabalho, “um estado compatível com a normalidade, mas que implica numa série de
mecanismos de regulação”. Mostrando a luta do sujeito contra as forças que o estão empurrando
em direção à doença mental.
A base da teoria de Dejours é o papel da organização do trabalho. Os sujeitos criam
estratégias defensivas para se proteger, com isso ele explica no que consistem essas estratégias ,
como surgem e evoluem; articulando com o sofrimento psíquico. Isso se mostra na fala, no
silêncio e na intersubjetividade entre os trabalhadores e pesquisadores.
A psicanálise ortodoxa se mostra imprópria para dar conta das relações de trabalho, na
medida em que estas são regidas por regras que não se deixam reduzir ao jogo das relações
chamadas de “objetais”. Mas ela pode colaborar com grupos e a psicossociologia.
O investimento psíquico na organização tem uma conotação de sofrimento psíquico, a
medida que o sujeito coloca a organização acima de si mesmo.
O “assujeitamento” do trabalhador parece ser uma das regras dessas organizações
altamente perversas que transgridem as normas internas, da personalidade de cada um. Essa
alienação no sentido psiquiátrico é entendido como uma substituição da vontade do próprio sujeito.
O trabalhador acaba por confundir seus desejos próprios a injunção organizacional que substituem
seu livre arbítrio.
A falta de saúde mental no ambiente de trabalho é uma conseqüência desse processo
mecanicista e pouco humanizado, dos elementos formadores do trabalho. Há forças que atuam
sobre o homem, sobre sua saúde mental, como a forma que as relações de trabalho se
organizando e o desorganizam.
A divisão do trabalho funciona de forma disfuncional para toda a sociedade, pois não traz
satisfação, invade a vida do sujeito e suas possibilidades de desenvolvimento.
A carga psíquica exigida pelo trabalho pode ser favorável, quando as exigências
intelectuais, motoras e psicossensoriais da tarefa estão de acordo com a s necessidades do
trabalhador e se o conteúdo do trabalho for uma fonte de satisfação sublimatória. Um exemplo
disso são as vivências subjetivas, mantendo sua homeostasia. Mesmo assim, as exigências do
materiais assim como materiais fazem com que o trabalhador se torne novamente um escravo de
suas próprias necessidades.
Em uma profissão liberal, como o dos artistas, nos enganamos em pensar que essas
exigências materiais não os façam sofrer, pois tratam-se de sacrifícios aos quais eles também tem
de postergar o prazer para alcançar sua meta de valorização monetária e mesmo assim existe
mais insegurança nos subsídios recebidos. Eles o fazem sofrer como a todo mundo, mas o prazer
do trabalho lhes permite uma melhor forma de defesa.
Pensando no futuro, as profissões parecem caminhar cada vez mais por uma organização
do trabalho cada vez mais autoritária, rígida e parcelizante. Quem define o ritmo é o trabalhador,
mas suas metas de crescimento são ainda determinadas pela empresa, que exige o dobro de
quem trabalha em casa, pois a carga e montante do trabalho se torna maior.
O sofrimento causado pelo trabalho parece ter uma relação direta com a produtividade. Na
maioria das tarefas, mesmo as mais desqualificadas, a exploração passa também pela profundeza
do aparelho mental. O corpo apenas se submete ao que a mente determina, como a
desapropriação dessa personalidade, entregue a organização.
Contra os ataques a essa estrutura, como: o sofrimento, ansiedade e insatisfação; se
constróem os mecanismos defensivos. A função desse sintoma do trabalho é justamente aliviar a
dor psíquica e esse poder em ocultar o sofrimento o torna invisível nas organizações. Podem ser
tomadas então como contra a própria evolução, pois não deixam que isso seja visto ou entendido,
podendo ter como uma das possibilidades a mudança.
A fadiga e o esgotamento do corpo, são uma peça necessária, mas insuficiente da
alienação pela organização do trabalho.
Podemos ver claramente onde a Psicologia se encaixa: na leitura do sofrimento que está
contido nas palavras e atitudes, através dos sistemas defensivos de cada operário. Usando um
esquema de decodificação da própria organização, na sua interiorização coletiva.
“A interpretação limitada no conteúdo e não a uma transferência coloca a psicopatologia do
trabalho nos antípodas da psicossociologia”. Nossa função parece tornar o trabalho uma busca ao
acesso pela satisfação interna. Como as resistências individuais acompanham as coletivas,
precisam tornar-se ideologias coletivas da profissão.
O duplo movimento de transformação da organização do trabalho pode contribuir para
que uma nova população mais feliz, menos perversa seja emergente em poucos anos,
ressignificando o trabalho e o lugar desse sujeito trabalhador, com um trabalho que colabore com a
sua realização pessoal.
Referência bibliográfica

DEJOURS, Christophe. A Loucura do Trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho.


São Paulo: Cortez – Oboré, 1992.

Você também pode gostar