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A LOUCURA DO TRABALHO - Christophe Dejours

- A luta pela saúde, nesta época, identifica-se com a luta pela sobrevivência: "viver, para o
operário, é não morrer" (Pagina 14)

O próprio trecho fala por si, das condições precárias oferecidas no século XIX. O ambiente
caracterizava-se pela falta de higiene, esgotamento físico, subalimentação e diversos acidentes
de trabalho. Período no qual a taxa de morbidade e mortalidade eram altas, o tempo esperado
de vida era muito menor. É bizarro pensar que antigamente o trabalhador tinha que lutar pela
vida além de lutar pelo seu salário. Eram diversas doenças, patologias que surgiam, causando
mais um problema na vida do trabalhador.

-As relações de um e de outro são primeiramente de dominação, e depois de ocultação.


Dominação da vida mental do operário pela organização do trabalho. Ocultação e coarctação
de seus desejos no esconderijo secreto de uma clandestinidade imposta. (Página 26)

A liberdade de pensamento é caracterizada como direito da personalidade. Mas em muitos


locais de trabalho isso é ignorado, buscando manter seus funcionários doutrinados e
alienados, sem que tenham sua liberdade de expressão dentro da empresa. Muitas vezes essa
dominação ocorre de forma sutil para que o próprio trabalhador não perceba, podendo vir
através de discursos e imposições. E mesmo que o funcionário perceba, o medo de discordar
prevalece, o funcionário deve apenas aderir e acatar o que é proposto, pois senão há
possibilidade de uma demissão, por exemplo. Essa dominação por parte da empresa gera
situações desgastantes que mais tarde podem se tornar certos adoecimentos.

- Quando as condições de sobrevivência são tão precárias quanto as que observamos no sub
proletariado ou nas populações dos países subdesenvolvidos, não há lugar para a ansiedade
face à doença enquanto tal (o que não significa que tal angústia não exista!) (Página 34)

Neste trecho pode-se haver uma relação muito grande com a situação atual que estamos
vivendo relacionado ao vírus Covid-19. Por mais que a maioria saiba do perigo do vírus e da
fácil transmissão, ainda existe outro problema que é o das condições financeiras do
empregado. Nem todos tem condições de ficar em casa cumprindo a quarentena, muitos são
dependentes desse emprego, sendo sua única maneira de subsistência e sustento para a
família. Por mais que haja o medo de contrair o vírus, o medo de ficar sem receber seu salário
ou do desemprego se torna maior e mais importante. Como o próprio trecho diz: “o que não
significa que tal angustia não exista!”, mas mesmo assim é necessário enfrenta-la para não
ficar sem trabalhar.

-Até indivíduos dotados de uma sólida estrutura psíquica podem ser vítimas de uma paralisia
mental induzida pela organização do trabalho. (Página 45)

O sofrimento mental aparece como intermediário necessário à submissão do corpo. E por mais
que o indivíduo tenha uma estrutura psíquica saudável, isso logo mais pode ser prejudicado
devido as condições de trabalho. O condicionamento do comportamento produtivo faz com
que haja essa paralisia mental, que o indivíduo passe por uma despersonalização. A
inteligência e a imaginação são abaladas frente ao trabalho repetitivo, na qual o trabalhador é
proibido de botar em prática a sua liberdade e criatividade.

-Uma anamnese psiquiátrica permite afirmar que se trata de uma descompensação de uma
neurose histerofóbica, subseqüente ao recente nascimento do primeiro filho. (Página 58)
Como dito no texto A Carga Psíquica do Trabalho: “o trabalhador não chega ao seu local de
trabalho como uma máquina nova. Ele possui uma história pessoal que se concretiza por uma
certa qualidade de aspirações, de seus desejos, motivações, necessidades psicológicas, que
integram sua história passada”. Sendo assim, percebe-se que cada funcionário tem suas
características, experiências e formas de lidar com os problemas do dia a dia, por trás deste
trabalhador há uma história. Então cabe ao psicólogo e até mesmo o próprio empregador
buscar entender o que se passa na vida do trabalhador fora do ambiente de trabalho, pois
muitas vezes são situações de fora que estão influenciando na vida do mesmo dentro da
empresa. Logo, problemas, mal estares e desconfortos que ocorrem dentro da organização
nem sempre são problemas causados pela organização.

-Uma prova a mais da intensidade deste medo é fornecida pelos problemas de sono e,
sobretudo, pelo consumo de medicamentos psicotrópicos pela maioria do pessoal
trabalhando numa fábrica: ansiolíticos durante o dia, soníferos à noite e psicoestimulantes
pela manhã. (Página 68)

As substâncias psicoativas são substâncias que quando ingeridas no organismo, são capazes de
alterar os processos mentais e cognitivos do indivíduo. Em função de diversos fatores há o uso
de medicações por parte dos trabalhadores, seja para dormir, estimular, tratar a ansiedade, a
depressão e o medo também. Medo que os funcionários, principalmente, de indústrias
químicas, como dito no texto, sofrem. É uma tensão tão grande com os riscos e acidentes que
podem sofrer que isso gera uma busca por alivio através destes medicamentos. Mudanças no
trabalho, baixos salários, a falta de segurança, cobranças, entre outros, também são fatores
determinantes para que o indivíduo recorra para as medicações.

- A partir do momento que existem tais rivalidades, o chefe tem interesse de nelas
participar, com o poder que lhe é conferido por sua posição hierárquica (Página 76) & -O
chefe tenta também que os empregados falem de seus colegas, e o que não consegue obter
diretamente do interessado, acaba extorquindo dos colegas mal-intencionados. (Página 76)

Nestes trechos percebe-se que o chefe não está agindo como um líder. O líder deve dar o
exemplo, deve incentivar o bem estar e as boas relações dentro da empresa, o contrário pode
vir a causar até problemas no desempenho dos funcionários. O respeito e a empatia são as
melhores formas de construir algo positivo dentro da organização. O chefe deve se mostrar
neutro e também mostrar que se importa com a empresa e com seu funcionamento, estando
disposto a combater situações desagradáveis, ao invés de participar delas como esse chefe
acima. Dar ouvidos aos funcionários e as suas críticas e preocupações é importante porque faz
com que o funcionário se sinta importante e participativo dentro da organização. Se esses
conflitos não forem solucionados, futuramente eles podem se tornar grandes problemas.

- A necessidade de descarregar a agressividade provoca a contaminação das relações fora da


fábrica, e em particular, das relações familiares. Às vezes, o recurso às bebidas alcoólicas é
uma maneira de atenuar a tensão interna. (Página 78)

Muitas vezes o ambiente de trabalho apresenta diversos fatores estressantes, principalmente


relacionado as condições de trabalho, o que pode vir a causar problemas na vida e até mesmo
na saúde do trabalhador. O desgaste emocional o qual as pessoas são submetidas nas relações
com o trabalho, além dos problemas das relações familiares e problemas da vida pessoal pode
gerar transtornos na vida do indivíduo. Sendo assim, o álcool acaba tornando-se um motivo de
fuga para o trabalhador, na qual usa com o intuito de aliviar as tensões e estresses causados
pelo trabalho. Contudo, o alcoolismo mais tarde pode se tornar um grande problema até
mesmo dentro da empresa, sendo responsável pelo absenteísmo, acidentes, etc.

-O sofrimento mental e a fadiga são proibidos de se manifestarem numa fábrica. Só a doença


é admissível. Por isso, o trabalhador deverá apresentar um atestado médico, geralmente
acompanhado de uma receita de psicoestimulantes ou analgésicos. (Não existem psicoses de
trabalho, nem neuroses do trabalho.) (Página 121)

Quem está doente, ou passando por um sofrimento psíquico, não rende, não consegue se
concentrar, não apresenta resultados produtivos. Mas para um trabalhador é muito difícil de
chegar no seu chefe e falar que o mesmo está com esse sofrimento mental causado pelo
próprio emprego. Alguns chefes não entenderiam, outros pensariam que é besteira, desculpas
esfarrapadas. Então o atestado vem com um disfarce do sofrimento mental. O medo de ser
despedido, desvalorizado ou de não ser levado a sério prevalece, então aí entra o uso dos
atestados, pois aparentemente só a doença física é levada a sério. O fato do sofrimento mental
não receber grande importância, faz o trabalhador recorrer a alternativas incoerentes a sua
realidade, tudo pelo fato de não haver credibilidade nesse sofrimento psíquico.

- Quando as defesas caracteriais e comportamentais não conseguem se exercer durante o


trabalho, há o risco de uma acumulação de energia pulsional, que não consegue se
descarregar. (Página 126)

Com base no texto A Carga Psiquica do Trabalho: “Em termos econômicos, o prazer do
trabalhador resulta da descarga de energia psíquica que a tarefa autoriza, o que corresponde a
uma diminuição da carga psíquica do trabalho”. Isso significa que quando não há o descargo da
energia pulsional no exercício do trabalho ela se acumula no aparelho psíquico, e mais tarde
isso vem a se tornar uma doença psicossomática como o exemplo dado no livro A Loucura do
Trabalho e no próprio texto. No momento em que um senhor muda de emprego,
direcionando-se a um emprego mais tranquilo e com menos esforços, ele sente que não
descarrega toda energia que tem, o mesmo até tenta buscar soluções através de atividades
como o futebol, mas isso não é suficiente, tendo que retomar seu antigo posto. Isso nos
mostra que nem sempre o “melhor emprego”, dito por outros, é o melhor emprego pra gente.
Cada indivíduo vai se adaptar conforme as suas necessidades, optando por aquilo que faz com
que se sinta melhor.
Abordagem sobre o tema – referências da disciplina
Abordar sobre o tema “a loucura do trabalho” é de extrema importância porque nos dias
atuais vemos pessoas adoecendo por conta disso. É necessário entender o funcionamento da
organização e como ele se dá na vida do trabalhador. O sofrimento humano e esse
entendimento do trabalho inicia-se ainda a partir do desenvolvimento industrial, com uma alta
morbidade e uma crescente taxa de mortalidade.

O trabalhador passa a maior parte do dia e da sua vida no trabalho, vendendo a si mesmo,
suas horas de vida e sua força de trabalho a quem melhor pagar. Ele usa disso como maneira
de sobreviver e de sustentar a sua família, muitas vezes sendo o único provedor, sendo que
milhões de operários não recebem o suficiente para viver e se reproduzir. Sem contar que o
medo maior ainda vem a ser o desempregado, fazendo com que haja um acumulo de tensão
psíquica em meio a toda essa situação.

Segundo Dejours, o bem-estar está relacionado à idéia de ambiente gratificante e, assim,


quando o mesmo é realizado em tal ambiência, leva os trabalhadores a gostarem do trabalho
realizado. Então, o ambiente de trabalho deve se então um lugar saudável, que permita a
criatividade e a liberdade de expressão do funcionário, com o objetivo de evitar um cotidiano
estressante e que mais tarde possa a vir um sofrimento mental ou até mesmo uma doença
somática. Afinal, muitos desses trabalhadores tem que lidar com o desconforto psíquico de
estar trabalhando em meio aos riscos físicos e psicológicos, como é o exemplo do Covid-19
atualmente.

Em meio a essa pandemia do Covid-19 podemos ter exemplos de locais que estão tentando se
adaptar de uma forma agradável tanto para o cliente quanto para o trabalhador, evitando
principalmente aos trabalhadores que haja grande desconforto, afinal não é uma situação fácil.
Podemos aqui retomar o caso do hotel de Belo Horizonte, na qual além de tomar todas as
providencias necessárias ainda está oferecendo acompanhamento psicológico para que os
próprios funcionários falem de seus medos e angustias relacionados as situações atuais e
cotidianas. Por isso vem a ser de grande responsabilidade da empresa os cuidados com o
trabalhador, além de preservar sua saúde e bem estar dentro da organização. Incluindo que o
psicólogo tem uma importância muito grande dentro da organização, seu papel é
fundamental.

Portanto, este livro abrange através de uma leitura fácil e simples um tema tão próximo da
realidade de todos os trabalhadores. Fala sobre a relação de trabalho e saúde mental,
constando os diferentes mecanismos de defesa que são utilizados pelos trabalhadores, na qual
é uma forma de sobrevivência ao sofrimento imposto pela organização. Valeu a pena a leitura,
e também um entendimento mais amplo sobre a psicopatologia do trabalho.

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