Você está na página 1de 328

O S E CON OMIS TAS

J OHN M AYN ARD K EYN ES

A T EORIA G ERAL D O E MP REGO ,


D O J U RO E D A M OED A

Apresen tação d e Adr oa ldo Mou r a da Silva


T rad u ção d e Má r io R. da Cr u z
R evisão técn ica d e Clá u dio Rober t o Con t a dor
T rad u ção d os Prefácios d e P a u lo de Alm eida
F u n da dor
VICTOR CIVITA
(1907 - 1990)

E dit or a Nova Cu lt u r a l Lt da .

Copyr igh t © dest a ediçã o 1996, Cír cu lo do Livr o Lt da .

Ru a P a es Lem e, 524 - 10º a n da r


CE P 05424-010 - Sã o P a u lo - SP .

Tít u lo or igin a l:
T h e Gen eral T h eory of E m ploym en t, In terest an d M on ey
© Roya l E con om ic Societ y, 1973.

Text os or igin a lm en t e pu blica dos n o Rein o Un ido por


Ma cm illa n P r ess Lt d., Lon dr es.

Text os pu blica dos sob licen ça de Ma cm illa n P r ess Lt d., Lon dr es,
e E dit or a At la s S.A., Sã o P a u lo
(A T eoria Geral d o E m prego, d o J u ro e d a M oed a).

Tr a du çã o do t ext o de A T eoria Geral d o E m prego, d o J u ro e d a


M oed a pu blica da sob licen ça da E dit or a At la s S.A., Sã o P a u lo.

Dir eit os exclu sivos sobr e a Apr esen t a çã o de Adr oa ldo Mou r a da
Silva , E dit or a Nova Cu lt u r a l Lt da ., Sã o P a u lo.

Dir eit os exclu sivos sobr e a t r a du çã o dos P r efá cios de


A T eoria Geral d o E m prego, d o J u ro e d a M oed a,
Nova Cu lt u r a l Lt da ., Sã o P a u lo.

Im pr essã o e a ca ba m en t o:
DONNE LLE Y COCH RANE GRÁF ICA E E DITORA BRASIL LTDA.
DIVISÃO CÍRCULO - F ONE : (55 11) 4191-4633

ISBN 85-351-0917-X
AP RES EN TAÇÃO
Ke y n e s e a Te o ria Ge ra l

J oh n Ma yn a r d Keyn es n a sceu em Ca m br idge em ju n h o de 1883


e fa leceu em Su ssex em a br il de 1946. Su a vida é m a r ca da por de-
sem pen h o excepcion a l em in ú m er a s á r ea s da a t ivida de h u m a n a : h o-
m em de n egócios e dir et or de Com pa n h ia s de Segu r o e In vest im en t o,
com o qu e t er m in ou por a cu m u la r expr essiva r iqu eza pessoa l;1 fu n cio-
n á r io pú blico por dois a n os a pa r t ir de 1906, a ssessor in flu en t e do
Tesou r o Br it â n ico e fin a lm en t e dir et or do Ba n co da In gla t er r a , o Ba n co
Cen t r a l In glês, a pa r t ir de 1942;2 pr ot et or da s a r t es, pr odu t or t ea t r a l,
edit or e colecion a dor de livr os r a r os;3 a r t icu list a da im pr en sa diá r ia e
co-pr opr iet á r io de u m sem a n á r io lon dr in o a t r a vés do qu a l pa r t icipou
da ca m pa n h a polít ica de 1929 em defesa do P a r t ido Liber a l, com o
qu a l m a n t eve per m a n en t e a ssocia çã o in for m a l a o lon go de su a vida ;4

1 J á em 1921 Keyn es er a ch airm an da Na t ion a l Mu t u a l In su r a n ce Com pa n y e post er ior m en t e


foi t a m bém dir et or da In depen den t In vest m en t Co. e da P r ovin cia l In su r a n ce Com pa n y.
2 Keyn es t eve dest a ca do pa pel em n egocia ções in t er n a cion a is com o r epr esen t a n t e do gover n o
in glês: pr im eir o, n o Tr a t a do de P a z em Ver sa lh es em 1918 e, segu n do, du r a n t e a Segu n da
Gu er r a Mu n dia l, pa r t icu la r m en t e n o qu e r espeit a à r eor ga n iza çã o fin a n ceir a da econ om ia
m u n dia l. E m ver da de a or ga n iza çã o do F u n do Mon et á r io In t er n a cion a l m u it o deve a o gên io
fin a n ceir o de Keyn es.
3 Esta ativida de foi fa cilita da pela dupla a ssocia çã o que Keynes m anteve ao lar go de sua vida:
de um lado, o a cesso à s fontes de financiam ento que seu pa pel junto a o Gover no lhe pr opor-
cionava ; de outr o, a sua intim idade com Duncan Gr ant, Va nessa Bell, e outros intelectua is do
“Bloom sbur y Group” e seu ca sam ento com Lydia Lopokova , baila rina r ussa. P or conta dessa
feliz associação e por ela m otivado Keynes term inou desem penhando impor tante papel de
a dministr ador fina nceir o em prol do ba lé a tra vés da Ca ma rgo Society, do Vic-Wells Ba llet e
da Ra mbert Ballet, empr eendimentos que se beneficiar am do gênio financeiro de Keynes. Foi
m ais: conselheir o da “Nationa l Ga llery” e do “Council for the Encour agem ent of Music and the
Ar ts”. Deve-se r egistra r que Keynes construiu um tea tro em Ca mbridge com seus pr óprios
r ecur sos. Depois de sua mor te, esse tea tro pa ssou a o patr imônio da cidade.
4 Keyn es foi dir et or e por vezes edit or ia list a do jor n a l sem a n a l N ation an d Ath en oeu m e
t a m bém do N ew S tatesm an an d N ation , a lém de con t r ibu ir com a r t igos fr eqü en t es pa r a
os m a is con h ecidos diá r ios de Lon dr es. E dit or do E con om ic J ou rn al.

5
OS ECON OMIS TAS

pr ofessor de E con om ia e a dm in ist r a dor n a Un iver sida de de Ca m br idge.5


Con t u do, a cim a e a lém de t u do, Keyn es foi econ om ist a e a u t or de u m a
fecu n da e, pr ova velm en t e, a m a is in flu en t e obr a em t eor ia econ ôm ica
n o sécu lo XX, on de m er ece dest a qu e A T eoria Geral d o E m prego, d o
J u ro e d a M oed a, or a pu blica da pela Abr il Cu lt u r a l.
Keyn es desde cedo desfr u t ou da m elh or edu ca çã o, for m a l e in -
for m a l, qu e a In gla t er r a vit or ia n a ofer ecia à s su a s m a is ilu st r es fa m í-
lia s. E du cou -se em Ca m br idge, cida de on de su a m ã e, F lor en ce, exer ceu
in ú m er os ca r gos pú blicos, in clu sive o de P r efeit o, e n a Un iver sida de,
on de seu pa i, J oh n Neville, dest a cou -se com o pr ofessor e a dm in ist r a dor .
Ao lon go de su a edu ca çã o Keyn es dedicou -se a o est u do da Ma t em á t ica ,
F ilosofia e H u m a n ida des. À E con om ia , só se volt a r ia a pós a con clu sã o
do en sin o for m a l. Su a a t u a çã o m a is dest a ca da en qu a n t o est u da n t e
ocor r e por con t a de su a pa r t icipa çã o em deba t es, a t ivida des polít ica s
n ã o-pa r t idá r ia s e, pa r t icu la r m en t e, n u m a socieda de secr et a fu n da da
em 1820, os “Apóst olos”, qu e en t ã o r eu n ia u m a m plo gr u po de fu t u r a s
per son a lida des, a exem plo de Ber t r a n d Ru ssell, Desm on d Ma cCa r t h y,
Lyt t on St r a ch ey, Leon a r d Woolf, Clive Bell e ou t r os.
Os vín cu los de a m iza de com esse gr u po t iver a m m a r ca da in flu ên -
cia n a vida de Keyn es. E m pa r t icu la r pela s m ã os de Lyt t on St r a ch ey,
Leon a r d Woolf, Clive Bell, Du n ca n Gr a n t e Th oby St eph en , Keyn es se
a ssociou à s ir m ã s St eph en , ir m ã s de Th oby, Va n essa Bell (ca sa da com
Clive) e Vir gin ia Woolf (ca sa da com Leon a r d) e con st it u ír a m o qu e
vir ia a ser con h ecido com o o “Bloom sbu r y Gr ou p”, em Lon dr es. In t e-
lect u a is de su cesso, t in h a m com o m a r ca de seu com por t a m en t o socia l
a ir r ever ên cia . Cu lt iva va m o idea l liber t á r io, a bu sca da “ver da de”,
lu t a va m pela a m plia çã o do pa pel da m u lh er n a socieda de, pela desi-
n ibiçã o sexu a l e con t est a va m os va lor es m or a is h er da dos da socieda de
vit or ia n a .6
P or con t a dessa m u lt ifa cet a da exper iên cia , Keyn es er a u m h om em
polêm ico, e, pa r a n ã o pou cos, a r r oga n t e.7 A su a a t u a çã o pú blica , n o
en t a n t o, viveu dividida en t r e o a pego e a cr ít ica à h er a n ça cu lt u r a l

5 A a t ivida de docen t e de Keyn es foi in t en sa en t r e 1908 e 1915, qu a n do se a fa st ou pa r a


t r a ba lh a r n o Tesou r o. Volt a n do à Un iver sida de a pa r t ir de 1919, su a ca r ga didá t ica da í
pa r a fr en t e se r edu z dr a m a t ica m en t e: m in ist r a a lgu m a s con fer ên cia s por a n o e dir ige a
dist â n cia u m Sem in á r io. Vive a pa r t ir de en t ã o em Lon dr es e pa ssa os fin s de sem a n a ,
in clu sive a 2ª feir a , em Ca m br idge. No en t a n t o, com eça a t er cr escen t e in flu ên cia n a a d-
m in ist r a çã o dos r ecu r sos fin a n ceir os da Un iver sida de.
6 O com por t a m en t o socia lm en t e a gr essivo dos m em br os do Gr u po é bem con h ecido. P a r a
u m a br eve h ist ór ia do Gr u po o leit or in t er essa do deve con su lt a r E del (1979). At é seu
ca sa m en t o com Lydia em 1925, Keyn es m a n t eve est r eit o con t a t o com o Gr u po, pa r t icu la r -
m en t e com St r a ch ey, Du n ca n Gr a n t e Va n essa Bell. De in ício o Gr u po r ea giu fr ia m en t e
à esposa de Keyn es. Depois pa ssa r a m a se r eu n ir n o qu e eles ch a m a r a m de “Clu be da
Mem ór ia ”. Um a im por t a n t e con t r ibu içã o de Keyn es a est e clu be est á pu blica da n o volu m e
X da s obr a s com plet a s de Keyn es e r ecebeu o t ít u lo de M y E arly B eliefs.
7 O per fil a r r oga n t e de Keyn es é dest a ca do, por exem plo, por H a r r y J oh n son em M ilo Keyn es
(1977). J oh n son “a cu sa ”: “Keyn es er a u m opor t u n ist a e u m oper a dor ”.

6
KEYN ES

vit or ia n a . N o con vívio exigido pela s su a s fu n ções de in flu en t e m em -


br o do gover n o, n ã o ficou im u n e a os va lor es da cla sse dir igen t e
in glesa : colon ia list a e a n gu st ia do com a con t ín u a p er d a de p r est ígio
econ ôm ico e p olít ico d a In gla t er r a , qu e se segu iu à P r im eir a Gu er r a
Mu n dia l. De ou t r o la d o, a solida r ieda de qu e dedicou a o lon go de
su a vida a os a m igos de a d olescên cia possibilit ou -lh e cu lt iva r e a pr en -
der a con viver com o “n ovo”, r epr esen t a do pelo com p or t a m en t o so-
cia lm en t e a gr essivo de seu s a m igos, va n gu a r da in t elect u a l e liber a l
da cosm opolit a n a Lon dr es de en t ã o. 8
Keyn es deixa a Un iver sida de e in gr essa n o fu n cion a lism o pú blico
em 1906. Aí n ã o en con t r a a m bien t e pr opício a o desen volvim en t o de
su a ir r equ iet a per son a lida de. P a ssa a t r a ba lh a r em su a disser t a çã o
com o pr opósit o de volt a r à vida a ca dêm ica . Seu in t er esse en t ã o se
con cen t r a n os fu n da m en t os filosóficos da P r oba bilida de. E m 1908 a
su bm et e a Ca m br idge, n ã o sen do a ceit a . É en t ã o qu e in gr essa defin i-
t iva m en t e n o est u do da E con om ia . A con vit e de Ma r sh a ll e P igou , e
sem vín cu lo for m a l com a Un iver sida de, volt a a Ca m br idge pa r a m i-
n ist r a r essa disciplin a , qu e a t é en t ã o for a o t r a ba lh o de Ma r sh a ll e
qu e n esse m esm o a n o se a posen t a va . E m Ca m br idge volt a a t r a ba lh a r
em su a disser t a çã o sobr e a Teor ia da P r oba bilida de, en qu a n t o est u da
e en sin a E con om ia . Su a disser t a çã o é en t ã o a ceit a , e a ssu m e for m a l-
m en t e a s fu n ções de docen t e da Un iver sida de. De 1908 a 1915 dedica -se
in t en sa m en t e a o en sin o e se fa m ilia r iza com o u n iver so do sa ber eco-
n ôm ico da or t odoxia , com o r epr esen t a da por P igou , Ma r sh a ll, St u a r t
Mill, Rica r do e Sm it h . Desde en t ã o con cebe a E con om ia com o u m a
“ciên cia m or a l”, va lor iza n do a in t u içã o em con t r a st e à r a zã o n a escolh a
dos m odelos r eleva n t es e cu lt iva n do o espír it o de con t r ovér sia , u m bi-
lica lm en t e a ssocia do à polít ica econ ôm ica .9 Seu s escr it os, n esse per íodo,
sã o espa r sos e de pou ca sign ifica çã o pr ofission a l. É dessa fa se seu livr o
In d ian Cu rren cy an d Fin an ce (1913).

8 Algu m a s ilu st r a ções dest e com por t a m en t o: du r a n t e a pr im eir a gu er r a Keyn es t r a ba lh a va


n o Tesou r o. De ou t r o la do, seu s a m igos St r a ch ey, Du n ca n Gr a n t , Ru ssell e ou t r os er a m
pa cifist a s, r ecu sa n do-se a a t en der o com a n do de a list a m en t o m ilit a r com pu lsór io exigido a
pa r t ir de 1916, e cr it ica va m Keyn es por ser vir a o Gover n o du r a n t e a Gu er r a . Keyn es en t ã o
decide a pr esen t a r su a s “objeções de con sciên cia ” a o a list a m en t o ju n t o a u m Tr ibu n a l, em
solida r ieda de e pa r a a t est a r a legit im ida de da dem a n da de seu s a m igos. F in a lm en t e se
coloca con t r a a polít ica oficia l. E m 1919 sa i do Tesou r o e pu blica u m a deva st a dor a cr ít ica
a o Tr a t a do de P a z: E con om ic Con sequ en ces of th e Peace. Da m esm a for m a Keyn es eviden cia ,
em su a obr a escr it a , u m a r ela çã o de a m or e ódio a seu s pa r es de Ca m br idge, defen sor es
da or t odoxia econ ôm ica . Aí a s m a ior es vít im a s sã o P igou e Rober t son .
9 E m 1934 Keyn es escr eve: “E m E con om ia n ã o se pode con den a r o opon en t e pelo er r o; só se
pode con ven cê-lo a a ceit a r o m esm o. E m esm o qu e se t en h a r a zã o, n ã o é possível per su a di-lo
qu a n do exist e fa lh a n a su a pr ópr ia ca pa cida de de per su a sã o ou de exposiçã o, ou se a ca beça
dele est iver já t ã o r eplet a de n oções con t r á r ia s qu e isso n ã o lh e per m it a m a is ca pt a r a
ch a ve do r a ciocín io qu e se lh e t en t a for n ecer ”. Cit . em Moggr idge (1976), p. 29. E st a posiçã o
con t r a st a for t em en t e com a posiçã o de Robbin s, a u t or do en t ã o in flu en t e t ext o T h e N atu re
an d S ign ifican ce of E con om ic S cien ce. Ao con t r á r io de Robbin s, pa r a Keyn es E con om ia é
u m a “ciên cia m or a l” e n ã o se con fu n de com “n atu ral scien ce. Isso por qu e ela t r a t a de
m ot ivos, expect a t iva s, dú vida s psicológica s”.

7
OS ECON OMIS TAS

E m 1915 volt a a o Tesou r o e a í per m a n ece a t é 1919. Na qu a lida de


de r epr esen t a n t e do Tesou r o ju n t o à Con fer ên cia de P a z, em P a r is,
cr it ica a posiçã o dos a lia dos, deixa o post o e volt a à Un iver sida de.
P u blica en t ã o T h e E con om ic Con sequ en ces of th e Peace em dezem br o
de 1919. É a sú bit a n ot or ieda de, den t r o e for a da In gla t er r a . A con -
t r ovér sia qu e desen ca deia diz m a is r espeit o à s cr ít ica s à s per son a li-
da des de Clem en cea u , Wilson e Lloyd Geor ge do qu e à s cr ít ica s eco-
n ôm ica s a o Tr a t a do. J á u m a per son a lida de, Keyn es dedica -se in t en si-
va m en t e a o deba t e sobr e a polít ica econ ôm ica vigen t e e r edu z su a
pa r t icipa çã o n a Un iver sida de a a lgu m a s con fer ên cia s a n u a is e à or ien -
t a çã o a ca dêm ica de u m gr u po de joven s econ om ist a s, qu e se a gr ega r a m
n o “Clu be de E con om ia P olít ica ” fu n da do por Keyn es.10
Tem a í in ício u m a n ova fa se n a vida de Keyn es. É o gr a n de
m om en t o do “Keyn es h om em de n egócios, jor n a list a e a u t or de su cesso
pú blico”. Um a boa a m ost r a de seu s t r a ba lh os de en t ã o est á r eu n ida
em E ssays in Persu asion , pu blica do em 1931.11 Seu m a is im por t a n t e
t r a ba lh o a ca dêm ico desse per íodo, T ract on M on etary R eform (1923),
em n a da a n t ecipa o Keyn es da T eoria Geral. Su a pr eocu pa çã o se con -
cen t r a em t em a s da econ om ia or t odoxa : est a bilida de de pr eços, polít ica
ca m bia l e m oeda . A qu est ã o do desem pr ego é t r a t a da em seu s escr it os
de divu lga çã o, m a s n ã o é ela bor a da com o u m a qu est ã o a n a lít ica e da
t eor ia econ ôm ica . E r a , em su m a , u m bom discípu lo de Ma r sh a ll: a plica
a t eor ia econ ôm ica or t odoxa a os pr oblem a s da época com com pet ên cia ,
m a s, em n ível t eór ico, n ã o va i a lém do m est r e. O com ba t e a o desem pr ego
m edia n t e a a m plia çã o de obr a s pú blica s só a pa r ece de for m a sist em á t ica
a pa r t ir de 1929 n o pa n flet o “Ca n Lloyd Geor ge do it ?”, escr it o com
H u ber t H on der son . E isso em n a da o difer en cia de P igou ou Vin er e
m u it os ou t r os econ om ist a s or t odoxos, qu e t a m bém a dvoga r a m pr ogr a -
m a s de obr a s pú blica s com o for m a de en fr en t a r o desem pr ego.
Segu n do seu s m a is a u t or iza dos biógr a fos — E . A. G. Robin son ,
R. H a r r od e D. Moggr idge —, a pa r t ir de 1925 t em in ício o per íodo
de t r a n siçã o qu e cu lm in a r á com a T eoria Geral. O in ício dessa fa se
coin cide com dois even t os im por t a n t es n a vida de Keyn es. O pr im eir o,
em n ível pessoa l: depois de a lgu n s a n os de r ela çã o ín t im a , ca sa -se com
Lydia e com eça a se dist a n cia r u m pou co do “Bloom sbu r y Gr ou p”. P a ssa
a t er u m a vida pessoa l m a is or ga n iza da . O segu n do, em n ível a ca dêm ico,

10 A pa r t ir de en t ã o, n os in for m a E . A. G. Robin son , Keyn es pa ssa os sá ba dos, dom in gos e


segu n da s-feir a s em Ca m br idge, qu a n do cu ida de a fa zer es a dm in ist r a t ivos n a Un iver sida de
e in t er a ge com seu s discípu los. Dá pou ca s lectu res e se dedica , a pa r t ir de Lon dr es, a o
deba t e sobr e polít ica econ ôm ica da época e a seu s m ú lt iplos n egócios.
11 E n t r e ou t r a s coisa s est ã o a í r eu n idos os segu in t es a r t igos: “E con om ic Con sequ en ces of Mr .
Ch u r ch ill” (1925), u m a cr ít ica à polít ica ca m bia l de volt a a o pa dr ã o ou r o; “Th e E n d of
La issez-F a ir e” (1925), u m a n ot a sobr e os fu n da m en t os do liber a lism o e cr ít ica a o “liber a lism o
pr im it ivo” da m ã o-in visível; “Ca n Lloyd Geor ge do it ?”.

8
KEYN ES

é a in t er a çã o in t en sa com Den is Rober t son en qu a n t o est e pr epa r a va


pa r a pu blica çã o o seu B an k in g Policy an d th e Price L evel (1926), qu e
con t ém o ger m e a n a lít ico qu e con du zir á Keyn es a o T reatise on M on ey
e depois à T eoria Geral: a sepa r a çã o dos a t os de pou pa r e in vest ir e
su a in t er -r ela çã o com a t eor ia m on et á r ia n a explica çã o da s flu t u a ções
econ ôm ica s.12 Nesse m esm o a n o dá in ício a o t r a ba lh o qu e t er m in a r ia
n a pu blica çã o de A T reatise on M on ey em 1930.
P or cer t o, com o u m h om em pr á t ico e in t u it ivo, Keyn es t a m bém
t em su a cu r iosida de in t elect u a l a gu ça da pelos even t os econ ôm icos da
época . Na déca da de 20, a econ om ia in glesa a t r a vessa su cessiva s cr ises
qu e cu lm in a m n a gr a n de Depr essã o dos a n os 30. E m 1932, por exem plo,
se obser va desem pr ego em m a ssa n a s pr in cipa is econ om ia s ca pit a list a s.
Nessa m esm a da t a , a pr odu çã o in du st r ia l a m er ica n a cor r espon dia a
58%, a a lem ã a 65% e a in glesa a 90% da ver ifica da em 1913.
Dia n t e dessa r ea lida de, Keyn es in t u it iva m en t e com eça a se a fa s-
t a r da or t odoxia com o r epr esen t a da pela “Lei de Sa y”. De a cor do com
essa “Lei”, n ã o poder ia ocor r er “esca ssez de poder de com pr a ” n o sist em a
econ ôm ico, pr im eir a m en t e por qu e o pr ocesso de pr odu çã o ca pit a list a
é t a m bém o de ger a çã o de r en da (sa lá r io, lu cr os, a lu gu éis et c.) e, por -
t a n t o, de cr ia çã o da fon t e de fin a n cia m en t o da dem a n da ; e, segu n do,
por qu e da da a exist ên cia dos m eca n ism os a u t om á t icos dos m er ca dos
livr es, os m ovim en t os cor r et ivos e espon t â n eos de sa lá r ios, pr eços e
ju r os ga r a n t ir ia m qu e os n íveis de dem a n da n ã o fica ssem per m a n en -
t em en t e a qu ém dos n íveis de pr odu çã o de plen o em pr ego.
Da cr ít ica à “Lei de Sa y” Keyn es ca m in h a em bu sca de u m a
explica çã o a n a lít ica pa r a o desem pr ego e t en t a da r fu n da m en t o t eór ico
à s su gest ões de in t er ven çã o est a t a l com o ger a dor a de dem a n da pa r a
ga r a n t ir n íveis eleva dos do em pr ego. É im por t a n t e n ot a r qu e in ú m er os
econ om ist a s de or ien t a çã o or t odoxa t a m bém a dvoga r a m ga st os pú blicos
pa r a com ba t er o desem pr ego, a exem plo de P igou e Rober t son . A cr ít ica
de Keyn es se con cen t r a n a in con sist ên cia en t r e os fu n da m en t os t eór icos
desses a u t or es, de u m la do, e su a s r ecom en da ções pr á t ica s, de ou t r o.13
A su a pr im eir a t en t a t iva de su per a r a t eor ia clá ssica r esu lt a n a
pu blica çã o de A T reatise on M on ey em 1930. In felizm en t e foi u m a
t en t a t iva fr u st r a da . Ain da qu e n ã o t en h a en con t r a do u m a explica çã o
a n a lít ica pa r a o pr oblem a do desem pr ego, n esse livr o Keyn es r ea fir m a

12 H a r r od escr eve qu e os a m igos de Bloom sbu r y, depois do ca sa m en t o de Keyn es, “...h a via m
se t or n a do u m m a gn ífico pa ssa t em po a o in vés de con st it u ír em a r a zã o pr in cipa l de su a
vida ”. Ta n t o H a r r od com o Au st in Robin son vêem em seu ca sa m en t o com Lydia u m im por -
t a n t e m a r co n a vida de Keyn es n o qu e r espeit a à r eor ga n iza çã o de su a vida pessoa l e
pr ofission a l.
13 Uma ilustr ação deste ponto nos é oferecida num comentá rio de Keynes quanto a o livro de
P igou: “Com o no ca so de Dennis, (Rober tson)... Por que insistem em m anter teoria s que não
ser vem de ba se par a suas pr ópria s conclusões pr áticas?” Cita do em Moggridge (1976), p. 25.

9
OS ECON OMIS TAS

seu pr est ígio pr ofission a l com o con h ecedor dos in t r in ca dos pr oblem a s
m on et á r ios da econ om ia ca pit a list a . Nã o fa lt a r a m cr ít ica s, t a m bém .
H a yek e Rober t son , em pa r t icu la r , a pon t a r a m u m gr a ve equ ívoco n o
qu e Keyn es pr et en dia ser a ba se do livr o. E st e, segu in do a s idéia s de
Rober t son , pr et en dia explica r a s flu t u a ções de pr eço e pr odu çã o a pa r t ir
dos desequ ilíbr ios en t r e in vest im en t o e pou pa n ça . Ta n t o H a yek qu a n t o
Rober t son det ect a r a m u m a in con sist ên cia en t r e a explica çã o dessa r e-
la çã o e a equ a çã o escr it a por Keyn es n o cor po do livr o. Ta m bém os
discípu los de Keyn es em Ca m br idge (J oa n e Au st in Robin son , Rich a r d
Ka h n , J a m es Mea d, P ier o Sr a ffa e ou t r os) a n ot a r a m vá r ia s cr ít ica s a o
seu t r a ba lh o. A m a is sever a dizia r espeit o a o fa t o de qu e Keyn es h a via
desen volvido u m a t eor ia de flu t u a ções de n ível ger a l de pr eços qu e
pr essu pu n h a , a exem plo dos clá ssicos, a h ipót ese de pr odu t o con st a n t e
em n ível de plen o em pr ego. Ou seja , n ã o explica va o qu e se pr opu n h a
explica r : a s flu t u a ções de em pr ego e pr odu çã o.
E ssa s a va lia ções cr ít ica s im edia t a m en t e in du zem Keyn es a t en t a r
u m a n ova explica çã o. Do t r a ba lh o qu e se segu e en t r e 1930 e 1935,
r esu lt a a pu blica çã o da T eoria Geral em 1936. De im edia t o se est a be-
leceu u m a a m pla con t r ovér sia en t r e Keyn es e seu s discípu los, de u m
la do, e P igou , H a yek, Rober t son , H a wt r ey e ou t r os, de ou t r o. O deba t e
en t r e con ver t idos e n ã o-con ver t idos t a m bém em polga im edia t a m en t e
os econ om ist a s do ou t r o la do do At lâ n t ico.14 Sa m u elson expr essa com
elegâ n cia o sign ifica do da obr a , n a qu eles n egr os dia s de r ecessã o: “P a r a
o est u da n t e m oder n o é t ot a lm en t e im possível en t en der o plen o efeit o
do qu e foi con ven ien t em en t e den om in a do ‘A Revolu çã o keyn esia n a ’,
sobr e a qu eles qu e, com o n ós, for a m edu ca dos den t r o da t r a diçã o or t o-
doxa . O qu e pa r a os n ova t os de h oje é vist o com fr eqü ên cia com o t r ivia l
é óbvio, er a pa r a n ós en t ã o en igm á t ico, n ovo e h er ét ico... T h e Gen eral
T h eory a t in giu a m a ior ia dos econ om ist a s em ida de a ba ixo dos t r in t a
e cin co a n os e fê-lo com a in esper a da vir u lên cia de u m a doen ça qu e
pela pr im eir a vez a t a ca e dizim a u m a t r ibo isola da dos m a r es do su l.15

14 O livr o de im edia t o r ecebeu in ú m er a s cr ít ica s e elogios dos m elh or es econ om ist a s da época .
Den t r e a s cr ít ica s m er ecem dest a qu e os com en t á r ios de P igou , Vin er , Rober t son , H a yek e
H a wt r ey. De cer t a for m a Keyn es r ecebeu com a lt ivez essa a va la n ch e cr ít ica . A exceçã o
ocor r e n o ca so de Rober t son . Seu ex-a lu n o e a m igo, Keyn es n u t r ia pr ofu n do r espeit o pelo
t r a ba lh o de Rober t son e n ele r econ h ecia o ger m e de su a pr ópr ia t eor ia . F icou pr ofu n da m en t e
decepcion a do com a s cr ít ica s de Rober t son , t en t ou con ven cê-lo in fr u t ifer a m en t e e por fim
r om peu r u dem en t e su a r ela çã o com ele. Volt a m a t r a ba lh a r ju n t os n o Tesou r o Br it â n ico
du r a n t e a Gu er r a , m a s m esm o a í m a n t êm r ela ções fr ia s. Den t r e os con ver t idos est ã o H a r r od,
H icks, Mea de, Abba Ler n er , H a n sen e ou t r os.
15 As du a s cit a ções de Sa m u elson sã o ext r a ída s do a r t igo ”Th e Gen er a l Th eor y", pu blica do
em LE KACH MAN, R. (edit or ), Keyn es’ Gen eral T h eory. A esse r espeit o é con ven ien t e ex-
pr essa r a opin iã o de u m dos m a is a r den t es a dept os de Keyn es sobr e a T eoria Geral: “...a ssim
com o a B íblia e Das Kapital, ela é pr ofu n da m en t e a m bígu a e, com o n o ca so da B íblia e
de Ma r x, essa a m bigü ida de a ju dou m u it o a con qu ist a r a dept os... se h ou ver u m bom n ú m er o
de con t r a dições e a m bigü ida des, com o t a m bém exist em n a B íblia e em Ma r x, o leit or
sem pr e pode en con t r a r a lgo em qu e qu eir a a cr edit a r . Isso t a m bém ser ve pa r a con qu ist a r
discípu los”. E xt r a ído de Ga lbr a it h , J . K. (1980), p. 214.

10
KEYN ES

No en t a n t o, o leit or deve ler a t en t a m en t e o con selh o de Sa m u elson


sobr e a T eoria Geral: “É u m livr o m a l escr it o e m a l or ga n iza do... Nã o
ser ve pa r a u so em cla sse. É a r r oga n t e, m a l-edu ca do, polêm ico e n ã o
m u it o gen er oso n os a gr a decim en t os. É ch eio de fa lá cia s e con fu sões:
desem pr ego in volu n t á r io, u n ida des de sa lá r io, equ iva lên cia da pou pa n -
ça e do in vest im en t o, ca r á t er in t er t em por a l do m u lt iplica dor , in t er a ções
da eficiên cia m a r gin a l sobr e a t a xa de ju r os, pou pa n ça for ça da , t a xa s
de ju r os específica s, e m u it os ou t r os... depois de en t en dida a su a a n á lise,
se m ost r a óbvia e a o m esm o t em po n ova . E m r esu m o, é u m t r a ba lh o
de gên io”.
II

Discu t ir a s con t r ibu ições de u m livr o t ã o polêm ico qu a n t o a T eoria


Geral t a lvez seja im pr u dên cia . Cen t en a s de a u t or es con t in u a m a r e-
descobr ir u m a “n ova ” e ver da deir a t eor ia keyn esia n a a ca da a n o. O
ca r á t er polêm ico do livr o a in da h oje n u t r e in ú m er a s con t r ovér sia s.
Cr eio, n o en t a n t o, qu e se possa explicit a r de for m a sim ples o con t eú do
da m en sa gem de Keyn es. Sa iba o leit or , en t r et a n t o, qu e isso poder á
desper t a r ir a s e a m or es n os m a is in su speit os esca n in h os da pr ofissã o.
Mu it os se ju lga m isola da m en t e os ver da deir os cu lt or es do Keyn es da
T eoria Geral.
Afin a l, qu a l en t ã o a n ovida de?
A m en sa gem bá sica do livr o est á con t ida n a s m u it a s vezes r e-
pet ida pr oposiçã o de qu e o sist em a ca pit a list a t em u m ca r á t er in t r in -
seca m en t e in st á vel. Ou seja , a oper a çã o da “m ã o in visível”, a o con t r á r io
do qu e a in da é su st en t a do por econ om ist a s de in clin a çã o m a is or t odoxa ,
n ã o pr odu z a h a r m on ia a pr egoa da en t r e o in t er esse egoíst ico dos a gen -
t es econ ôm icos e o bem -est a r globa l. E m bu sca de seu ga n h o m á xim o,
o com por t a m en t o in dividu a l e r a cion a l dos a gen t es econ ôm icos — pr o-
du t or es, con su m idor es e a ssa la r ia dos — pode ger a r cr ises a despeit o
do bom fu n cion a m en t o da s poder osa s for ça s a u t om á t ica s dos m er ca dos
livr es. E essa s cr ises a dvêm de in su ficiên cia s de dem a n da efet iva . Nisso
se a pr oxim a , den t r e ou t r os, de Ma r x; dest e, n o en t a n t o, se a fa st a r a -
dica lm en t e qu a n t o a o m ét odo de a n á lise e qu a n t o a o fu t u r o do sist em a
ca pit a list a .16
Veja m os o qu e ist o sign ifica . pa r a est u da r flu t u a ções n os n íveis
de pr odu t o e em pr ego, Keyn es com eça por explicit a r a s pr in cipa is de-
t er m in a n t es da Dem a n da e da Ofer t a Agr ega da s. Isso post o, a fir m a

16 E m ver da de Keyn es n u t r ia pr ofu n da a n t ipa t ia pelos a n a list a s m a r xist a s. Depois de u m a


br eve via gem à Rú ssia em 1925 Keyn es escr eve: “Com o posso a ceit a r u m a dou t r in a qu e
est a belece com o su a Bíblia , a cim a e a lém da cr ít ica , u m livr o-t ext o obsolet o de E con om ia
qu e, pelo qu e sei, n ã o é a pen a s cien t ifica m en t e er r ôn eo, m a s igu a lm en t e sem in t er esse e
a plica çã o n o m u n do m oder n o?” A r efer ên cia é a o Capital de Ka r l Ma r x. Repr odu zido de
E ssays in Persu asion (1931). E m ou t r a in st â n cia se r efer e cr it ica m en t e a u m pequ en o livr o
de Tr ot ski. Veja E ssays in B iograph y (1933).

11
OS ECON OMIS TAS

qu e os n íveis de pr odu çã o e em pr ego sã o det er m in a dos pela igu a lda de


en t r e ofer t a e dem a n da a gr ega da s, sem a ga r a n t ia de qu e t odos a qu eles
qu e qu eir a m t r a ba lh a r possa m efet iva m en t e en con t r a r em pr ego.
On de r eside o pr oblem a ? Keyn es cen t r a su a discu ssã o pr im or -
dia lm en t e n os det er m in a n t es da dem a n da a gr ega da . A dem a n da a gr e-
ga da é en t ã o decom post a por ben s de con su m o e dem a n da por ben s
de in vest im en t o.
A dem a n da por ben s de con su m o depen de pr im or dia lm en t e da
r en da cor r en t e dos a gen t es econ ôm icos e, secu n da r ia m en t e, da t a xa
de ju r os. Aqu i su a in ova çã o r eside n a h ipót ese de qu e o n ível de con su m o
cr esça m en os qu e pr opor cion a lm en t e com r ela çã o à r en da cor r en t e.
Diz m a is, qu e essa é u m a r ela çã o est á vel. A dem a n da por ben s de
in vest im en t o, de ou t r a pa r t e, depen de da expect a t iva de lu cr o fu t u r o
dos em pr esá r ios, por ele cr ist a liza da n o con ceit o de eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, e da t a xa de ju r os. Or a , com o a dem a n da por ben s de
con su m o gu a r da u m a r ela çã o est á vel com a r en da , segu e-se qu e a s
flu t u a ções da dem a n da a gr ega da est ã o a ssocia da s a os m ovim en t os do
n ível de in vest im en t o. E m cr escim en t o, com expect a t iva s ot im ist a s de
lu cr o fu t u r o, os in vest im en t os ger a m m a is em pr ego, m a ior n ível de
pr odu t o e de r en da e, por t a n t o, m a ior n ível de con su m o e pou pa n ça .
E m depr essã o, per spect iva s pessim ist a s de lu cr o ger a m fr u st r a çã o de
lu cr o da in dú st r ia de ben s de ca pit a l, qu eda de em pr ego e de r en da
e, por t a n t o, qu eda n os n íveis de con su m o e pou pa n ça .
Na s flu t u a ções do n ível de in vest im en t o r eside, por t a n t o, a ch a ve
da com pr een sã o dos m ovim en t os cíclicos do ca pit a lism o. É im por t a n t e
com pr een der qu e em Keyn es in vest im en t o sign ifica a qu isiçã o de equ i-
pa m en t os do set or pr odu t or de ben s de ca pit a l, a m plia çã o da ca pa cida de
pr odu t iva e, fin a lm en t e, expa n sã o da pr odu çã o cor r en t e de ben s de
ca pit a l. Nã o sign ifica a qu isiçã o de ben s físicos ou fin a n ceir os pr é-exis-
t en t es e n ã o-r epr odu zíveis pelo sist em a econ ôm ico, a exem plo de t er r a .
Então por que as decisões de investim ento têm caráter instável?
Nesta resposta reside a grande contribuição de Keynes à teoria econôm ica.
P a r a Keyn es, em qu a lqu er decisã o de in vest im en t o, o ca pit a list a
se vê obr iga do a a n t ever a evolu çã o fu t u r a e, por t a n t o, in cer t a do
m er ca do pa r a o pr odu t o específico a ser ger a do pela n ova in st a la çã o
in du st r ia l; da m esm a for m a , a t a xa de sa lá r io qu e ele esper a pa ga r
pa r a o t r a ba lh a dor qu e ir á oper a r a s n ova s in st a la ções e, fin a lm en t e,
o pr eço e a dispon ibilida de da m a t ér ia -pr im a a ser t r a n sfor m a da com
o a u xílio do n ovo equ ipa m en t o. In qu iet a ções sobr e o com por t a m en t o
fu t u r o de u m a ou do con ju n t o dest a s va r iá veis t er m in a m por se con s-
t it u ir n a fon t e pr im á r ia da in st a bilida de dos in vest im en t os e, por t a n t o,
do n ível de em pr ego. E m con dições n or m a is, o em pr esá r io est im a a
t a xa de r et or n o de seu in vest im en t o (a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l)
cot eja n do o lu cr o esper a do, ca lcu la do a pa r t ir de su a visã o sobr e o
com por t a m en t o da s va r iá veis a cim a a lin h a da s, com o cu st o de a qu isiçã o

12
KEYN ES

dos equ ipa m en t os n ecessá r ios à im pla n t a çã o de su a s decisões de in -


vest im en t o. Se essa t a xa de r et or n o é m a ior qu e a t a xa pa r a a obt en çã o
de fu n dos ou de a plica çã o de r ecu r sos n o m er ca do fin a n ceir o — ou
seja , a t a xa de ju r os — en t ã o ele se sen t e m ot iva do à r ea liza çã o desse
in vest im en t o.
Dessa for m a , a in st a bilida de do sist em a ca pit a list a t a n t o pode
a dvir de flu t u a ções n a s expect a t iva s em pr esa r ia is qu a n t o a o lu cr o fu -
t u r o com o do com por t a m en t o da t a xa de ju r os.
É eviden t e qu e est a s va r iá veis — a s expect a t iva s sobr e lu cr o
fu t u r o e a t a xa de ju r os — n ã o sã o det er m in a da s a r bit r a r ia m en t e. No
la do da s expect a t iva s t em -se o qu e Keyn es ch a m a de an im al spirits
dos em pr esá r ios, fu n da do n a m ot iva çã o bá sica do ca pit a lism o: a cu m u -
la r , a cu m u la r e a cu m u la r . No en t a n t o, a qu i en t r a m dois elem en t os
fu n da m en t a is da t eor ia de Keyn es pa r a explica r com o e por qu e a
decisã o de a cu m u la r pode ser post er ga da e a ssim en gen dr a r cr ises.
P r im eir o, o fa t o elem en t a r de qu e ca da ca pit a list a in dividu a lm en t e é
pr ision eir o de su a pr ópr ia h ist ór ia . Ou seja , a decisã o de expa n dir ou
cr ia r u m a n ova fá br ica é t a m bém u m a decisã o de “sa ir ” de u m a t ivo
de liqu idez u n iver sa l — a m oeda ou o ca pit a l fin a n ceir o de m er ca do
a m plo — pa r a “en t r a r ” n u m a t ivo específico — a exem plo de u m a
fá br ica de a u t om óveis — cu ja liqu idez (ven da do a u t om óvel) depen de
de con dições específica s do m er ca do de a u t om óveis. Or a , com o a s m á -
qu in a s de pr odu zir a u t om óveis só podem pr odu zir isso (e n ã o podem
ser t r a n sfor m a da s a cu st o zer o em m á qu in a s de pr odu zir leit e em pó),
segu e-se qu e a decisã o de in vest ir é t a m bém u m a decisã o de a ssu m ir
o r isco de “iliqu idez” de u m m er ca do específico. E m bor a a socieda de
seja in exor a velm en t e vít im a de a lgu m in vest im en t o sem su cesso, o
ca pit a list a in dividu a l poder ia esca pa r da iliqu idez a u m cu st o fin a n -
ceir o, se h ou vesse m er ca do or ga n iza do pa r a fá br ica s ou se o m er ca do
de a ções fosse u m ba r ôm et r o segu r o sobr e a va lor iza çã o dos equ ipa -
m en t os exist en t es e fosse a m plo o su ficien t e pa r a a bsor ver a ven da
da s a ções do em pr een dim en t o.
Keyn es é en fá t ico, n o en t a n t o, a o a fir m a r qu e m er ca dos fu t u r os
ou de a ções n ã o sã o m a is eficien t es do qu e o ca pit a list a in dividu a l
qu a n t o a pr ever ocor r ên cia s fu t u r a s. E m ca sos de cer t os t ipos de em -
pr een dim en t os (in vest im en t os de gr a n de in t en sida de de ca pit a l e lon ga
m a t u r a çã o ou de pr odu t os n ovos) o t ipo de r isco en volvido n ã o é su s-
cet ível de m edida s e, por t a n t o, n ã o dá a zo à for m a çã o de m er ca dos
fu t u r os... É on de en t r a o an im al spirits do em pr esá r io e a fon t e even t u a l
de in st a bilida de do ca pit a lism o.
Segu n do, Keyn es ela bor a sobr e o r isco da iliqu idez a pa r t ir da
dem a n da de din h eir o. E st e com a n da u m “pr êm io” de liqu idez sobr e
t oda s a s dem a is m er ca dor ia s. E st e pr êm io de liqu idez det er m in a , por
seu t u r n o, a t a xa de ju r os. Keyn es, obvia m en t e, pen sa n u m sist em a
m on et á r io est á vel e n ã o su jeit o a pr ocessos in fla cion á r ios cr ôn icos.

13
OS ECON OMIS TAS

Agor a t em os a s du a s peça s bá sica s pa r a m elh or en t en der a s flu -


t u a ções do in vest im en t o e, por t a n t o, da dem a n da a gr ega da : a escolh a
in t em por a l en t r e r et er a t ivos de liqu idez u n iver sa l (m oeda ), de u m
la do, e em pr een der a cr ia çã o de a t ivos de liqu idez específica (fá br ica
de a u t om óveis), de ou t r o.
A segu n da lâ m in a da t esou r a é a ofer t a a gr ega da , ou a s m ot i-
va ções em pr esa r ia is pa r a a m plia r ou con t r a ir a pr odu çã o e o em pr ego
cor r en t es. O pon t o de pa r t ida é a t eor ia de for m a çã o dos pr eços. Da
expect a t iva de qu a n t o ser á a bsor vido pelo m er ca do e da do o pr ocesso
de ba r ga n h a de fixa çã o da t a xa de sa lá r io n om in a l, a ssim com o o es-
t oqu e de ca pit a l e a t ecn ologia — por t a n t o, a r ela çã o in ver sa en t r e
n ível de em pr ego e a pr odu t ivida de do t r a ba lh o —, o em pr esá r io fixa
t en t a t iva m en t e o pr eço com o qu a l esper a ven der o volu m e pla n eja do
de pr odu t o. P or r esídu o, se r ea liza da a ven da esper a da , ocor r e o lu cr o.
Isso defin e o volu m e pla n eja do de ven da s e, por t a n t o, a Ofer t a Agr e-
ga da . Aqu i os elem en t os cr ít icos sã o: o pr ocesso de ba r ga n h a en t r e
ca pit a list a s e a ssa la r ia dos, o qu a l fixa a t a xa de sa lá r io n om in a l, on de
Keyn es se dist a n cia da or ien t a çã o or t odoxa qu e vê est a t a xa com o
r esu lt a do da s for ça s a u t om á t ica s dos m er ca dos livr es; e a pr odu t ivida de
do t r a ba lh o, n o qu e Keyn es segu e a or t odoxia .
Isso post o, pode-se per gu n t a r a gor a com o esse sist em a r ea ge a
u m desequ ilíbr io qu a lqu er . E m Keyn es esses desequ ilíbr ios qu a se sem -
pr e ocor r em a t r a vés da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. Su pon h a -se qu e
ocor r a u m a qu eda n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, por con t a da a n -
t ecipa çã o fir m e de esca ssez a gu da de u m a m a t ér ia -pr im a bá sica , a
exem plo do pet r óleo.17 Or a , com o n u m da do m om en t o a est r u t u r a de
pr odu çã o é u m da do da h ist ór ia e é específica (fá br ica s pa r a pr odu zir
a u t om óveis, fá br ica s pa r a pr odu zir m á qu in a s de pr odu zir a u t om óveis
et c.), segu e-se qu e a a n t evisã o da esca ssez de pet r óleo r epr esen t a u m
cor t e n a dem a n da de m á qu in a s pa r a pr odu zir a u t om óveis. E st e cor t e,
por su a vez, pr ovoca qu eda de em pr ego e, por t a n t o, de r en da (sa lá r ios
n ã o m a is pa gos n est a in dú st r ia ), a qu a l, por seu t u r n o, pr ovoca n ova
qu eda de dem a n da , dest a vez n o set or de ben s de con su m o.
Not e-se qu e a qu eda in icia l da dem a n da é oca sion a da n ã o por
qu eda de r en da cor r en t e, m a s sim por a n t ecipa çã o de u m even t o fu t u r o.
E n t ã o, o qu e fa zer h oje com a r en da , o lu cr o, e, por t a n t o, com a pou pa n ça
ger a da n o m om en t o im edia t a m en t e a n t er ior à qu eda do in vest im en t o?
Nã o ser ia in evit á vel qu e essa r en da se t r a n sfor m a sse em dem a n da de
ou t r os ben s, de con su m o ou de in vest im en t o?

17 Keyn es ela bor a su a t eor ia n a h ipót ese sim plifica dor a de qu e o pr ocesso de pr odu çã o r equ er
som en t e t r a ba lh o e equ ipa m en t os. Con t u do, n a ilu st r a çã o do t ext o defin im os a qu eda n a
eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l a pa r t ir de u m a m a t ér ia bá sica . A r econ cilia çã o dist o, n o
en t a n t o, é im edia t a . Ba st a se a dm it ir u m a r ela çã o de pr opor cion a lida de en t r e m a t ér ia -pr im a
e in su m os de t r a ba lh o.

14
KEYN ES

Na r espost a a essa s qu est ões ocor r e o r om pim en t o de Keyn es


com os en sin a m en t os da Lei de Sa y. P a r a Keyn es, a pr efer ên cia pela
liqu idez ou pela m a n u t en çã o de “a t ivos líqu idos” (m oeda em cir cu n s-
t â n cia s de qu eda de pr eços, com o ocor r eu n a déca da dos 30, ou ou t r os
a t ivos com expect a t iva de r en t a bilida de r ea l posit iva em sit u a ções in -
fla cion á r ia s) pode, em cir cu n st â n cia s com o a a n u n cia da , con st it u ir -se
n u m a a lt er n a t iva va n t a josa à dem a n da de n ovos equ ipa m en t os ou de
ben s de con su m o. Segu n do a Lei de Sa y, essa sit u a çã o — com m er ca dos
livr es — ser ia r ever t ida pela qu eda da t a xa de ju r os, de sa lá r ios e de
pr eços. Keyn es en t ã o n os lem br a qu e a qu eda da t a xa de ju r os, a in da
qu e im por t a n t e pa r a even t u a lm en t e r ecu per a r o n ível de in vest im en t os,
poder ia n ã o fu n cion a r se a eficiên cia m a r gin a l do in vest im en t o ca ísse
m a is r a pida m en t e qu e a t a xa de ju r os. E essa qu eda poder ia ser en -
gen dr a da pela pr ópr ia qu eda de sa lá r ios e pr eços, a qu a l depr im ir ia
m a is a in da a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. E est e pr ocesso t er m in a r ia
t a m bém por se con st it u ir n u m desa st r e socia l, por pr om over ociosida de
do equ ipa m en t o in st a la do e desem pr ego. Isso r epr esen t a u m a sever a
cr ít ica a u m dos m it os sa gr a dos da m or a l bu r gu esa : n ã o fu n cion a ,
por t a n t o, a con ver gên cia en t r e o in t er esse in dividu a l (n o ca so a pr e-
fer ên cia pela liqu idez) e o colet ivo (o m á xim o em pr ego possível da for ça
de t r a ba lh o). E est e con flit o de in t er esses é pr odu t o do fu n cion a m en t o
dos m eca n ism os a u t om á t icos dos m er ca dos livr es.
Com o esca pa r dessa a r m a dilh a r ecessiva ? Com o en t ã o evit a r a
“a cu m u la çã o im pr odu t iva ” e ger a r dem a n da efet iva ?
E st a va a ssim legit im a da a a çã o do E st a do com o elem en t o in t e-
gr a n t e e in dispen sá vel a o bom fu n cion a m en t o do sist em a econ ôm ico
ca pit a list a . Ao E st a do ca ber ia , por t a n t o, elim in a r a ca r ên cia de de-
m a n da efet iva em m om en t os de r ecessã o e desem pr ego. Com o? F a zen do
déficit or ça m en t á r io e em it in do t ít u los pa r a ext r a ir a “r en da n ã o ga st a ”
do set or pr iva do e com ela ga r a n t ir qu e a s m á qu in a s ociosa s volt em
a oper a r . E a qu i m a is dois m it os ca em . At é en t ã o a pou pa n ça er a
en ca r a da com o u m dos pila r es da m or a l bu r gu esa . Keyn es vem e diz:
a ca u sa da depr essã o é a “pou pa n ça excessiva ” em fa ce da expect a t iva
de lu cr o fu t u r o n u m m om en t o de eleva da pr efer ên cia pela liqu idez.
Cr ise, por t a n t o, r epr esen t a ca r ên cia de in vest im en t o e ociosida de de
m á qu in a s e h om en s, e n ã o, com o a pr egoa do, ca r ên cia de pou pa n ça .
Dest r ói t a m bém o m it o de qu e a oper a çã o do E st a do se deve pa u t a r
por gr a n de a u st er ida de fin a n ceir a , n ã o se ga st a n do m a is do qu e colet a
em t r ibu t os. Most r a , a ssim , qu e em cir cu n st â n cia s de desem pr ego o
déficit fisca l é u m a peça im por t a n t e pa r a o bom fu n cion a m en t o do
sist em a econ ôm ico.
A r espeit o do déficit , é n ecessá r io fixa r u m pon t o im por t a n t e.
Um déficit pode ocor r er t a n t o por a u m en t o de despesa s qu a n t o por
qu eda de t r ibu t os. Nu m a sit u a çã o de depr essã o, n o en t a n t o, só o a u -

15
OS ECON OMIS TAS

m en t o de despesa s ga r a n t e o a u m en t o da dem a n da efet iva ; qu eda n a


t r ibu t a çã o pode ger a r , sim plesm en t e, m a ior dem a n da de a t ivos líqu idos.
E is, por t a n t o, os pila r es t eór icos qu e in for m a r a m a polít ica eco-
n ôm ica a pa r t ir de fin s da déca da dos 30, a qu a l foi decisiva pa r a a
sa ída da Depr essã o e m u it o a ju dou o cr escim en t o sem pr eceden t es do
ca pit a lism o in du st r ia l do pós-gu er r a .18 A a t ivida de econ ôm ica do E st a do
n a ger a çã o de dem a n da efet iva é defin it iva m en t e in cor por a da à pr á t ica
econ ôm ica do sist em a ca pit a list a pa r a r evigor á -lo. Na m a ior n a çã o ca -
pit a list a do m u n do, os E st a dos Un idos da Am ér ica do Nor t e, a s com pr a s
de ben s e ser viços do Govern o Fed eral pa ssa m de 2,5%, em 1929, pa r a
10% do P r odu t o Na cion a l Br u t o em 1939.19
An t es de en cer r a r est a seçã o con vém com en t a r dois a spect os con -
t r over sos da t eor ia keyn esia n a : o fu n cion a m en t o do m er ca do de t r a ba lh o
e a in t er a çã o do bin ôm io pou pa n ça -in vest im en t o.
Do pon t o de vist a da polít ica econ ôm ica , a t eor ia keyn esia n a pr i-
vilegia a s flu t u a ções do n ível de em pr ego e o con t r ole da dem a n da
efet iva . A t eor ia clá ssica pr ivilegia a est a bilida de de pr eços e o con t r ole
m on et á r io. Veja m os est e deba t e n a per spect iva do m er ca do de t r a ba lh o.
E m Keyn es, a a m plia çã o da dem a n da efet iva objet iva a m plia r o
n ível de em pr ego da for ça de t r a ba lh o a t é o pon t o de plen o em pr ego.
P a r a a or t odoxia , est a qu est ã o é ir r eleva n t e. Na m edida em qu e, a r -
gu m en t a m , o em pr ego globa l é o r esu lt a do espon t â n eo dos in t er esses
dos a gen t es econ ôm icos in dividu a is oper a n do em m er ca dos livr es, qu a l-
qu er n ível de desem pr ego du r a dou r o só poder á ser volu n t á r io. Se in -
volu n t á r io, só poder á ser t em por á r io — pr odu t o de m u da n ça s t ecn o-
lógica s ou ca u sa da s pela im per t in ên cia dos sin dica t os ou gover n os qu e
im põem sa lá r ios “ir r ea list a s”, em desr espeit o à s for ça s a u t om á t ica s e
n ã o discr icion á r ia s dos m er ca dos livr es. Nest e ca so, qu a lqu er a çã o do
E st a do só pr om over á a a m plia çã o do pa pel do E st a do em det r im en t o
do set or pr iva do, sem a m plia r o n ível de em pr ego. Keyn es m u da dr a -
m a t ica m en t e a qu est ã o. P r im eir o, por qu e o pr ocesso de fixa çã o do sa -
lá r io n om in a l t er m in a por cr ist a liza r em con t r a t os cr it ér ios de eqü ida de
dist r ibu t iva e eficiên cia econ ôm ica e, por t a n t o, n ã o se pa u t a tão-som en te
por even t u a is excessos de dem a n da e/ou de ofer t a de m er ca do de t r a -
ba lh o; segu n do, por qu e a lém do n ível de sa lá r io r ea l, o n ível de em pr ego
globa l é t a m bém det er m in a do pelo n ível de dem a n da efet iva . E m a is,
a defin içã o da dem a n da a gr ega da n ã o é in depen den t e dos m ovim en t os
de sa lá r ios e pr eços, e a ssim os m ovim en t os de sa lá r io r ea l e seu s
con seqü en t es efeit os sobr e a dem a n da a gr ega da det er m in a m con ju n -
tam en te o n ível de em pr ego. Ou seja , é u m equ ívoco se a dm it ir qu e
em Keyn es u m a u m en t o de sa lá r io r ea l via a u m en t o de sa lá r io n om in a l

18 Na t u r a lm en t e isso n ã o deve m in im iza r os est ím u los econ ôm icos qu e vêm com a II Gr a n de


Gu er r a pa r a a expa n sã o da in du st r ia liza çã o.
19 Os gastos do gover no, em todos os níveis, pa ssam de 10% em 1924 pa ra 20% do P IB em 1939.

16
KEYN ES

n ã o ca u se desem pr ego. P a r a Keyn es est e a u m en t o t a m bém ca u sa u m


cor t e n a dem a n da efet iva , oca sion a da pela qu eda da liqu idez r ea l do
sist em a econ ôm ico, a qu a l é en gen dr a da pela eleva çã o do sa lá r io n o-
m in a l. A posiçã o de Keyn es n est e pon t o é cla r a : se o sa lá r io n om in a l
for excessiva m en t e eleva do, a est a bilida de do sist em a econ ôm ico ser á
m elh or pr eser va da se o cor t e do sa lá r io r ea l r equ er ido pa r a expa n dir
o em pr ego for obt ido pelo a u m en t o de m oeda e pr eços do qu e pela
qu eda de sa lá r io n om in a l. Se t a l objet ivo for per segu ido a t r a vés da
qu eda do sa lá r io n om in a l, o r esu lt a do fin a l poder á ser m en os e n ã o
m a is em pr ego, por qu e o m ovim en t o ba ixist a de sa lá r ios pode en gen dr a r
expect a t iva s depr essiva s n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
O bin ôm io pou pa n ça -in vest im en t o t em sido objet o de in ú m er a s
con t r ovér sia s. P a r a os clá ssicos, pou pa n ça e in vest im en t o se con fu n dem
n ã o por qu e t en h a m iden t ida de pr ópr ia , m a s sim por qu e a oper a çã o de
t a xa de ju r os é de t a l or dem poder osa qu e a dist in çã o per de r a zã o de
ser . E m Keyn es, a o con t r á r io, a dist in çã o é m a gn ifica da exa t a m en t e
por qu e a oper a çã o dos m eca n ism os de m er ca do via t a xa de ju r os n ã o
t em essa for ça . Além de ju r os, a expect a t iva de lu cr o fu t u r o ger a in -
vest im en t o, e a r en da cor r en t e ger a pou pa n ça . P or t a n t o, a despeit o da
for ça equ ilibr a n t e dos ju r os (sobr e pou pa n ça e in vest im en t o) e de r en da
(sobr e pou pa n ça ) pode ocor r er u m a in con sist ên cia bá sica en t r e a efi-
ciên cia m a r gin a l do ca pit a l e a t a xa de ju r os, de for m a a ger a r qu eda
de pr odu t o. E m a is, em con dições n or m a is u m a u m en t o de in vest im en t o
pode ger a r pou pa n ça e m a ior n ível de r en da , en qu a n t o u m a u m en t o
de pou pa n ça em r ela çã o à r en da cor r en t e n ão gera n ecessariam en te
n em m a is in vest im en t o n em a u m en t o, m a s sim qu eda do pr odu t o. Ou
seja , pou pa n ça n ã o ger a in vest im en t o, m a s in vest im en t o ger a pou pa n -
ça . Melh or a in da , m a is pou pa n ça só n ã o ger a r ecessã o se, e som en t e
se, o m eca n ism o da t a xa de ju r os, com plem en t a do por ou t r os m eca -
n ism os, t a m bém ger a r igu a l a u m en t o de in vest im en t o ou igu a l a u m en t o
de su per á vit com er cia l com o r est o do m u n do, ou igu a l a m plia çã o do
déficit do set or pú blico, ou u m a com bin a çã o dest es t r ês ú lt im os ele-
m en t os.20 P or t a n t o, n u m a sit u a çã o de in solvên cia ext er n a com déficit

20 Ao con t r á r io do qu e m u it os pen sa m , a m plia r os n íveis de pou pa n ça n ã o a pa r ece com o u m a


pr opost a t ola em Keyn es. Dia n t e de u m a r est r içã o bá sica , a exem plo de u m a econ om ia de
gu er r a , o a u m en t o da pou pa n ça é u m a exigên cia da s n ecessida des de fin a n cia m en t o da
cor r ida bélica . E m 1940 Keyn es pu blica o pa n flet o “H ow t o pa y for t h e Wa r ”, qu e t r a t a do
pr oblem a de a u m en t a r a pou pa n ça . Na t eor ia de Keyn es, a s in opor t u n ida des de a m plia çã o
da pou pa n ça só ocor r em em m om en t os depr essivos. No en t a n t o, em cir cu n st â n cia s de es-
t r a n gu la m en t o ext er n o ou de econ om ia de gu er r a , a socieda de n ã o t em escolh a a n ã o ser
a u m en t a r a pou pa n ça dom ést ica . No ca so de est r a n gu la m en t o ext er n o, isso só pode se
m a t er ia liza r a t r a vés da dim in u içã o do déficit ou de a u m en t o do sa ldo em con t a s cor r en t es
com o r est o do m u n do. De qu a lqu er for m a , n u m a econ om ia m on et á r ia , pa r a se ch ega r à
pou pa n ça de r ecu r sos r ea is, o pon t o de pa r t ida é a pou pa n ça fin a n ceir a , a in da qu e est a
n ã o pr odu za n ecessa r ia m en t e a qu ela . Nesse ca so, a fr u st r a çã o se da r ia pela in ca pa cida de
de a m plia r a s expor t a ções. Se ist o n ã o pu der ocor r er , a r ecessã o ser ia in evit á vel. É est e o
sign ifica do do est r a n gu la m en t o ext er n o.

17
OS ECON OMIS TAS

do set or pú blico e com déficit n a s t r oca s in t er n a cion a is, só h á u m a


for m a possível de a u m en t a r a pou pa n ça in t er n a : a m plia r o su per á vit
n a s t r oca s in t er n a cion a is.
III

É de ju st iça lem br a r qu e a r evolu çã o keyn esia n a n ã o foi pr odu t o


t ã o-som en t e do t r a ba lh o isola do do br ilh a n t e e gen ia l J oh n Ma yn a r d
Keyn es.
E m pr im eir o lu ga r , su a in spir a çã o bá sica — a do pa pel de de-
m a n da efet iva n o sist em a econ ôm ico — t em lon gín qu a s e sólida s or igen s
n os t r a ba lh os de Ma lt h u s, H obson , Ma r x e ou t r os. Segu n do, por qu e
n ã o ser ia exa ger o a fir m a r qu e a T eoria Geral m u it o r eflet e a s idéia s
e cr ít ica s de u m con ju n t o pa r t icu la r m en t e br ilh a n t e de discípu los de
Keyn es, a exem plo de Rober t son , J oa n Robin son , Au st in Robin son , R.
Ka h n , J a m es Mea de e Roy H a r r od, e ou t r os. Com est e gr u po Keyn es
in t er a giu con t ín u a e in t en sa m en t e en qu a n t o escr evia a T eoria Geral.
At r a vés de ca r t a s, con ver sa s e sem in á r ios, a s pr im eir a s pr ova s da T eo-
ria Geral for a m discu t ida s, cor r igida s e a t é r eescr it a s por su gest ões
dest e gr u po. Ter ceir o, por qu e a lgu n s pr in cípios bá sicos da T eoria Geral
for a m t a m bém for m u la dos in depen den t e e qu a se sim u lt a n ea m en t e por
ou t r os econ om ist a s, sem n o en t a n t o obt er a n ot or ieda de do en t ã o já
in flu en t e e br ilh a n t e econ om ist a in glês. E st e é o ca so de M. Ka lecki,
n a P olôn ia — qu e t r a t ou in depen den t em en t e do pr in cípio da dem a n da
efet iva de for m a m u it o sem elh a n t e a Keyn es e Myr da ll, e de ou t r os
discípu los de Wicksell n a Su écia , qu e t r a t a r a m t a m bém in depen den -
t em en t e a s qu est ões do equ ilíbr io m on et á r io, à sem elh a n ça do qu e
fizer a Keyn es.21 Qu a r t o, por qu e o su cesso da obr a em m u it o depen deu
da s ext en sões e con t r ovér sia s qu e ela per m it iu , n a s m ã os de u m br i-
lh a n t e gr u po de econ om ist a s qu e, com o Keyn es, bu sca va m esca pa r dos
en sin a m en t os da Lei de Sa y, t or n a dos obsolet os pela cr ise da déca da
dos 30. Além dos joven s econ om ist a s in gleses, a T eoria Geral en con t r a
en t u sia st a a colh ida n os E st a dos Un idos, n os escr it os da déca da dos
30, 40 e 50, de Alvin H a n sen , P a u l Sa m u elson , J oh n K. Ga lbr a it h ,
La u r en ce Klein e m u it os ou t r os.22
A T eoria Geral n a scia a ssim com in gr edien t es de u m a obr a clá s-
sica : seu a u t or er a u m a per son a lida de im por t a n t e, in t u it iva , con t r o-

21 Au st in Robin son — a lu n o, a m igo, escu deir o e por fim u m dos m a is a u t or iza dos biógr a fos
de Keyn es — a fir m a qu e da lit er a t u r a econ ôm ica se pode dest a ca r , a lém de Ma r sh a ll,
Rober t son (1926) e Wicksell (1936), t r a du zido por su gest ã o de Keyn es, com o a s fon t es
in spir a dor a s de Keyn es pa r a a ela bor a çã o da T eoria Geral.
22 Ga lbr a it h a ssim r ela t a seu pr im eir o en con t r o com Keyn es. Ga lbr a it h en t ã o er a ch efe do
sist em a de con t r ole de pr eços: “Cer t o dia , ele (Keyn es) a pa r eceu , sem se a n u n cia r n a
a n t e-sa la de m eu ga bin et e em Wa sh in gt on , pa r a en t r ega r u m t r a ba lh o... O n om e, disse-m e
ela (a secr et á r ia ), er a Kin es. E u dei u m a olh a da n os pa péis e a li est a va ... J . M. Keyn es...
F oi com o se Sã o P edr o su bit a m en t e a pa r ecesse a u m pá r oco de a ldeia ”. GALBRAITH
(1980), p. 223.

18
KEYN ES

ver sa e in t elect u a lm en t e br ilh a n t e; seu sist em a de a n á lise cr ia va u m


pa r a digm a con sist en t e e a dequ a do a o com ba t e a u m dos m a is a n gu s-
t ia n t es pr oblem a s de en t ã o: a r ecessã o e o desem pr ego; seu t om polê-
m ico e h et er odoxo desper t ou en t u sia sm o n u m im por t a n t e gr u po de
joven s econ om ist a s, os qu a is ca r r ega r a m su a ba n deir a (os in st r u m en t os
de a n á lise de Keyn es), espa lh a r a m a “n ova sa bedor ia ” (a t r a vés do en -
sin o e da a plica çã o da t eor ia de Keyn es pa r a m elh or com pr een sã o de
n ovos ou velh os pr oblem a s) e, a pa r t ir da T eoria Geral, su per a r a m a
a n á lise or igin a l n a á r ea de Com ér cio In t er n a cion a l (J a m es Mea de, L.
Met zler , J oa n Robin son , Sa m u elson e ou t r os), de Teor ia Mon et á r ia
(H icks, Sa m u elson , Modiglia n i, Ka h n e ou t r os), de Desen volvim en t o
E con ôm ico (H a r r od, J oa n Robin son , Ka ldor e ou t r os), de P olít ica E co-
n ôm ica (Mea de, Tin ber gen , Sa m u elson e ou t r os), de Con t a s Na cion a is
(St on e, Colin Cla r k e ou t r os), e difer en t es á r ea s.
No en t a n t o, con vém r epet ir , a T eoria Geral n ã o é u m livr o de
leit u r a fá cil e livr e de a m bigü ida des. A con t r ovér sia a in da h oje gr a ssa
sobr e o sign ifica do da in ova çã o con t ida n a T eoria Geral. De qu a lqu er
for m a , n en h u m ou t r o livr o de t eor ia econ ôm ica escr it o n est e sécu lo
exer ceu t ã o dom in a n t e in flu ên cia n o en sin o e n a pesqu isa qu a n t o a
T eoria Geral.
In felizm en t e, a pós a su a pu blica çã o, Keyn es t eve pou ca opor t u -
n ida de pa r a escla r ecer o sign ifica do de seu livr o e or ga n iza r os ele-
m en t os m a is cr ít icos do deba t e qu e su a obr a su scit ou .23 E m m ea dos
de 1937 sofr e u m sever o a t a qu e ca r día co e a pa r t ir de en t ã o n ã o m a is
se dedica à t eor ia econ ôm ica . Com o in ício da Gu er r a , a in da n ã o t o-
t a lm en t e r est a belecido, Keyn es volt a a o Tesou r o Br it â n ico, on de de-
sem pen h a pa pel cr ít ico, por ém bu r ocr á t ico, n a or ga n iza çã o da est r u t u r a
de fin a n cia m en t o pa r a os ga st os bélicos. É dest e per íodo o pa n flet o
“H ow t o P a y for t h e Wa r ” (1940), on de a s ca t egor ia s a n a lít ica s da
T eoria Geral sã o ela bor a da s pa r a com ba t er n ã o o desem pr ego, m a s
sim a in fla çã o; pa r a est im u la r n ã o o in vest im en t o, m a s sim a pou pa n ça ;
pa r a a m plia r n ã o o ga st o do gover n o, m a s sim a t r ibu t a çã o. É a ou t r a
fa ce da m eda lh a da T eoria Geral. 24
A pa r t ir de 1943 pa ssa a t r a ba lh a r sobr e a s qu est ões de fin a n -
cia m en t o in t er n a cion a l e os pr oblem a s qu e a í ser ia m en fr en t a dos n o
pós-gu er r a . P r odu z en t ã o u m pla n o sobr e a r eor ga n iza çã o do sist em a
fin a n ceir o in t er n a cion a l. Com o r epr esen t a n t e do Tesou r o Br it â n ico pa r -
t icipa da Con fer ên cia de Br et t on Woods em 1944, cu jo pr opósit o er a

23 P ou cos sã o os r egist r os pu blica dos de com o Keyn es r ea giu a a lgu n s com en t á r ios sobr e o
con t eú do a n a lít ico da T eoria Geral. Ta lvez a m a is im por t a n t e r ea çã o de Keyn es a os cr ít icos
seja T h e Gen eral T h eory of E m ploym en t, qu e su r ge com o r espost a a Vin er , Leon t ief, Ro-
ber t son e Ta u ssig n o QJ E (1937).
24 Após seu a t a qu e ca r día co em 1937, est a t a lvez seja a m a is im por t a n t e e ú n ica obr a de
Keyn es qu e ele ela bor a sobr e pr oblem a s de t eor ia econ ôm ica . Su a pr eocu pa çã o a pa r t ir de
1939 se volt a in t eir a m en t e pa r a os pr oblem a s pr á t icos en fr en t a dos n o Tesou r o Br it â n ico.

19
OS ECON OMIS TAS

or ga n iza r u m a a gên cia m u lt ila t er a l e su pr a n a cion a l de fin a n cia m en t o.


Dois pla n os est a va m em pa u t a : o in glês, pr odu zido por Keyn es; o a m e-
r ica n o, con cebido por H a r r y Wh it e. Da sín t ese de a m bos em er gem os
fu n da m en t os qu e n or t ea r ia m a or ga n iza çã o do F MI. No in ício de 1946
a t en de à Con fer ên cia de Sa va n n a h , on de efet iva m en t e n a sceu o F u n do
Mon et á r io In t er n a cion a l e o Ba n co Mu n dia l. Mor r e em a br il de 1946.
Nã o deixou filh os; su a h er a n ça m a ior : a T eoria Geral e u m sem -n ú m er o
de discípu los qu e sou ber a m est en der e a pr ofu n da r seu s en sin a m en t os.
Volt em os à T eoria Geral. A obr a de Keyn es é m a r ca da m en t e
pr odu t o de u m a época ca r a ct er iza da por con t r a çã o da pr odu çã o in du s-
t r ia l, por desem pr ego e por defla çã o de pr eços. Ser á en t ã o su a con t r i-
bu içã o t eór ica , h oje, r eleva n t e pa r a a com pr een sã o da a t u a l cr ise de
desa celer a çã o do cr escim en t o, desem pr ego e a celer a çã o in fla cion á r ia ?
Ou seja , in fla çã o a ssocia da a cr ise de cr escim en t o n ã o t or n a m obsolet os
os en sin a m en t os de Keyn es?
Ser ia n a t u r a lm en t e u m equ ívoco despr eza r os en sin a m en t os bá -
sicos de su a obr a e a cr edit a r qu e em n a da a ju dem à com pr een sã o do
pr esen t e. É cer t o qu e Keyn es n ã o n os legou u m a obr a a ca ba da e de-
fin it iva ; en sin ou -n os, n o en t a n t o, qu e a oper a çã o de u m a econ om ia
m on et á r ia n ã o pode ser com pr een dida a pa r t ir de m odelos a n a lít icos
a n cor a dos n a Lei de Sa y. Ma is im por t a n t e a in da , in cor por ou à E con o-
m ia a gr a n de descober t a filosófica do sécu lo XIX, cr ist a liza da n a m á -
xim a — “O H om em est á só” — ou seja , n ã o podem os con t a r com a
“m ã o in visível” pa r a ga r a n t ir o su pr im en t o dos ben s e ser viços e pa r a
ger a r t odos os em pr egos r equ er idos por a qu eles qu e deseja m t r a ba lh a r .
Keyn es n os en sin ou qu e a a çã o do E st a do, a t r a vés da polít ica econ ôm ica ,
é u m in gr edien t e bá sico do bom fu n cion a m en t o do sist em a ca pit a list a .
Ou seja , o a t ivism o do E st a do é u m com plem en t o in dispen sá vel a o
fu n cion a m en t o dos m er ca dos pa r a se obt er o m á xim o n ível de em pr ego
possível e, por t a n t o, m a xim iza r o n ível de bem -est a r da colet ivida de.
E st a é a m a is du r a dou r a con t r ibu içã o de Keyn es.
E n sin ou -n os, a in da , o sign ifica do específico da s cr ises do sist em a
ca pit a list a . E la s espelh a m , em ú lt im a in st â n cia , u m a ociosida de de
m á qu in a s e h om en s e n ã o de esca ssez de pou pa n ça . In do a lém de
Keyn es, m a s a in da a n cor a dos em seu t r a ba lh o, h oje sa bem os qu a is a s
im plica ções da s r ela ções con t r a t u a is expr essa s em m oeda e da exis-
t ên cia de ca pit a l físico específico: a esca ssez de pou pa n ça é pr odu t o
da in exist ên cia de m er ca dos ext er n os pa r a a bsor ver a pr odu çã o espe-
cífica de n osso pa r qu e in du st r ia l (a u t om óveis, a ço, a lu m ín io, pr odu t o
pet r oqu ím ico, ca fé e ou t r os). O est r a n gu la m en t o ext er n o é o r et r a t o
da “iliqu idez” do n osso pa r qu e in du st r ia l, cu jo fu n cion a m en t o exige
im por t a ções. A expa n sã o da dem a n da efet iva em n ível m u n dia l é con -
diçã o sin e qu a n on pa r a se volt a r à ocu pa çã o da s m á qu in a s h oje ociosa s
n o pa ís e pa r a expa n dir o em pr ego in t er n o.
Igu a lm en t e equ ivoca do ser ia a dvoga r , pa r a o m om en t o a t u a l, a l-

20
KEYN ES

gu m a s m edida s da polít ica econ ôm ica ext r a ída s de Keyn es. H oje sa -
bem os qu e n em t odo déficit do Gover n o é igu a lm en t e sa u dá vel. Da da
a especia lida de do n osso pa r qu e in du st r ia l, su a dim en sã o e n ível de
depen dên cia de im por t a ções, expa n dir m a is a in da o déficit do Gover n o
pa r a t en t a r expa n dir o n ível de em pr ego t er á u m r esu lt a do per ver so:
a gu diza r á m a is a in da o est r a n gu la m en t o ext er n o e n ã o ocor r er á ex-
pa n sã o per m a n en t e do n ível de em pr ego. Rea loca r sem expa n dir o
dispên dio do set or pú blico é o ú n ico ca m in h o possível pa r a se obt er
u m a expa n sã o dos n íveis de em pr ego.
Tam bém sabemos que nem todo investim ento é igualm ente saudá-
vel. Nem o Estado é capaz de adm inistrar e im plantar com sucesso in-
vestim entos totalm ente inviáveis do ponto de vista estritam ente econômico
e técnico, a exem plo do projeto nuclear brasileiro. Antever a especificidade
da dem anda no futuro e localizar, por antecipação, os mercados onde esta
demanda se m aterializará (aqui ou lá fora) escapam ao nosso controle.
Esta incapacidade de perscrutar o futuro nos recoloca na tradição de
Keynes: devido à especificidade das máquinas e à tirania dos contratos
(dívida externa), terminam os por nos transformar em prisioneiros do tem -
po. Isso significa dizer que a máxima keynesiana de que investimento
cria renda e, portanto, poupança para financiá-lo, tropeça na especificidade
do investimento e na existência ou não de m ercados para absorver a
produção daí resultante. Este é o “pecado” do “superinvestimento” em
equipamentos e plantas industriais para produzir um produto para o qual
não haja mercado, nem a preço abaixo dos custos.
Ta m pou co se pode en con t r a r n a T eoria Geral a solu çã o pa r a a
qu est ã o in fla cion á r ia . Descon h ecer seu s en sin a m en t os, n o en t a n t o, pode
n os con du zir a desa st r a da s r ecom en da ções de polít ica econ ôm ica qu e
su b-r ept icia m en t e t en t a m r evigor a r en sin a m en t os obsolet os desde
1936. Nest a ca t egor ia est ã o a s a lega ções de qu e os sin dica t os sã o dis-
t or ções e n ã o, com o efet iva m en t e o sã o, ca r a ct er íst ica s do sist em a ca -
pit a list a ; de qu e os m er ca dos livr es e o livr e-com ér cio en t r e a s n a ções
pr odu zem a a loca çã o m a is eficien t e dos r ecu r sos, com o se a s or ga n i-
za ções ju r ídica s, m on et á r ia s e a pr ópr ia or ga n iza çã o da s em pr esa s m o-
der n a s n ã o t ivessem u m a en or m e visibilida de n a fixa çã o da s t a xa s de
ju r os, da s t a xa s de câ m bio, da s t a xa s de sa lá r io e m u it os ou t r os pr eços
de pr odu t os bá sicos.
E m su m a , m a n t er em m en t e os en sin a m en t os bá sicos de Key-
n es n ã o n os dá a ga r a n t ia d e qu e seja m os ca pa zes de en con t r a r
solu ções p a r a a cr ise de n ossos dia s. Dá -n os, n o en t a n t o, a segu r a n ça
pa r a r ejeit a r p r op ost a s velh a s, t r a vest ida s de n ova r ou pa gem , a
exem plo dos m odelos m a cr oecon ôm icos ch a m a dos de “expect a t iva s
r a cion a is”, e a con vicçã o de qu e a p a r t ir de seu s en sin a m en t os se
pode con st r u ir a lgo de n ovo, com o cu ida do de qu e n em t odo déficit
do set or pú blico é desejá vel e n em t odo in vest im en t o ser á n ecessa -
r ia m en t e viá vel e sa u dá vel.

21
OS ECON OMIS TAS

Ad ro a ld o Mo u ra d a S ilv a
(Am a zon a s, 1941), ba ch a r el em E co-
n om ia pela F a cu lda de de E con om ia
e Adm in ist r a çã o da Un iver sida de de
Sã o P a u lo em 1966, obt eve os gr a u s
de Mest r e e Dou t or (P h D) em E co-
n om ia pela Un iver sida de de Ch ica -
go, E UA, com t ese sobr e in fla çã o n a
Am ér ica La t in a (1970/72).
É a u t or de in ú m er os a r t igos sobr e
in fla çã o, in t er m edia çã o fin a n ceir a
n o Br a sil e pr oblem a s de polít ica eco-
n ôm ica . P r ofessor a dju n t o de Ma -
cr oecon om ia do Depa r t a m en t o de
E con om ia da F a cu lda de de E con o-
m ia e Adm in ist r a çã o da Un iver sida -
de de Sã o P a u lo desde 1967, e Di-
r et or de P esqu isa da F IP E (F u n da -
çã o In st it u t o de P esqu isa s E con ôm i-
ca s). É co-a u t or de Altern ativas para
o Fin an ciam en to d o S istem a Previ-
d en ciário (1982), E dit or a P ion eir a ; e
a u t or de E m prego, Preços e S alários
(1980), t ext o edit a do pela F IP E .

22
N OTAS B IB LIOGRÁF ICAS

As in for m a ções sobr e a vida e a obr a de Keyn es for a m ext r a í-


da s de:

I. H ARROD, R. F . T h e L ife of M ayn ard Keyn es. Nova Yor k, Avon Books,
1961.
II. LE KACH MAN, R. T h e Age of Keyn es. Nova Yor k, McGr ow-H ill,
1966.
III. MOGGRIDGE , D. E . J oh n M ayn ard Keyn es. Nova Yor k, P en gu in ,
sér ie Moder n Ma st er s, 1976.
IV. ROBINSON, A. “J oh n Ma yn a r d Keyn es”. In : E con om ic J ou rn al.
Ma r ço, 1947.

Os dem a is t r a ba lh os cit a dos n o t ext o sã o:


I. E DE L, L. B loom sbu ry, A H ou se of L ion s. Nova Yor k, Avon Books,
1979.
II. GALBRAITH , J . K. A E ra d a In certeza. Sã o P a u lo, P ion eir a , 1980.
Ca pít u lo 7.
III. J OH NSON, H . Keyn es e a E con om ia In glesa. In : KE YNE S, M.
(edit or ). E n saios sobre J oh n M ayn ard Keyn es. Rio de J a n eir o,
P a z e Ter r a , 1977.
IV. SAMUE LSON, P . A. T h e Gen eral T h eory. In : LE KACH MAN, R.
(edit or ). Keyn es’ Gen eral T h eory. Lon dr es, Ma cMilla n , 1964. O
en sa io biogr á fico de A. Robin son é r epr odu zido n est e livr o.
V. ROBE RTSON, D. H . B an k in g Policy an d Price L evel. Nova Yor k,
Kelley, 1949 (1ª ediçã o de 1926).
VI. WICKSE LL, K. In terest an d Prices. (Tr a du çã o de Ka h n est im u la do
por Keyn es), Lon dr es, Ma cMilla n , 1936.

Um a a m ost r a da va r ieda de de in t er pr et a ções r ecen t es sobr e a


T eoria Geral:
MINSKY, H . J oh n M ayn ard Keyn es. Nova Yor k, Colu m bia Un iv. P r ess,
1975 (ver sã o h et er odoxa ).

23
OS ECON OMIS TAS

P ATINKIN, D. Keyn es’ M on etary T h ou gh t. Nor t h Ca r olin a , Du ke Un i-


ver sit y P r ess, Du r h om , 1976.
LE IJ ONH UF UND, A. On Keyn esian E con om ics an d th e E con om ics of
Keyn es. Nova Yor k, Oxfor d Un iv. P r ess, 1968.
H AH N, F . H . e ARROW, K. Gen eral Com petitive An alysis. Sa n F r a n -
cisco, H olden -Da y, 1971. Ca pít u lo 14.
H ICKS, J . T h e Crisis in Keyn esian E con om ics. Nova Yor k, Ba sic Books,
1974.
F RIE DMAN, M. A T h eorical Fram ew ork for M on etary An alysis. Nova
Yor k, Na t ion a l Bu r ea u of E con om ic Resea r ch , 1971.

Text os de Keyn es em Lín gu a P or t u gu esa :


SZMRE CSÁNYI, J . (or g) Keyn es. Sã o P a u lo, E dit or a Át ica , 1978.
SINGE R, P . (or g) E n saios E con ôm icos. Sã o P a u lo, “Os P en sa dor es”,
Abr il Cu lt u r a l, 1976, p. 7-54.

Text os de Keyn es:


T h e Collected Writin gs of J oh n M ayn ard Keyn es, 22 volu m es, edit a dos
por J oh n son , E . e Moggr idge, D. pa r a a Roya l E con om ic Societ y
e pu blica do pela Ma cMilla n , Lon dr es.

24
A T EORIA G ERAL D O E MP REGO ,
D O J U RO E D A M OED A *

T rad u ção d e Má r io R. da Cr u z

R evisão técn ica d e Clá u dio Rober t o Con t a dor

T rad u ção d os Prefácios d e P a u lo de Alm eida

* Tr a du zido de KE YNE S, J oh n Ma yn a r d. T h e Gen eral T h eory of E m ploym en t, In terest an d


M on ey. Lon dr es, Th e Ma cm illa n P r ess, 1973. Reim pr essã o de 1978. (N. do E .)
P REF ÁCIO

E st e livr o é dir igido pr in cipa lm en t e a m eu s colega s econ om ist a s.


E sper o qu e ele seja in t eligível a ou t r os, t a m bém , m a s o pr opósit o pr i-
m or dia l dele é t r a t a r de qu est ões difíceis de t eor ia e, só em segu n do
lu ga r , da s a plica ções dessa t eor ia à pr á t ica . Se a econ om ia or t odoxa
est á em desgr a ça , o er r o n ã o se en con t r a n a su per est r u t u r a , qu e foi
ela bor a da com gr a n de cu ida do, leva n do em con t a a con sist ên cia lógica ,
m a s n a fa lt a de cla r eza e de gen er a lida de da s pr em issa s. Assim , só
posso con segu ir m eu objet ivo de per su a dir os econ om ist a s a r eexa m i-
n a r em cr it ica m en t e cer t os de seu s post u la dos bá sicos a t r a vés de u m a
a r gu m en t a çã o a lt a m en t e a bst r a t a e t a m bém de m u it a con t r ovér sia .
Gost a r ia qu e t ivesse podido h a ver m en os dest a ú lt im a , m a s ju lgu ei-a
im por t a n t e, n ã o a pen a s pa r a explica r m eu pr ópr io pon t o de vist a com o
t a m bém pa r a dem on st r a r em qu e a spect os ele diver ge da t eor ia pr e-
dom in a n t e. Su pon h o qu e os qu e est ã o for t em en t e a pega dos à qu ilo qu e
ch a m a r ei “a t eor ia clá ssica ” flu t u a r ã o en t r e a cr en ça de qu e est ou
com plet a m en t e er r a do e a cr en ça de qu e n ã o est ou dizen do n a da de
n ovo. Ca be a ou t r os det er m in a r se u m a dessa s du a s ou a in da u m a
t er ceir a a lt er n a t iva est á cor r et a . Os t r ech os de con t r ovér sia objet iva m
for n ecer a lgu m m a t er ia l pa r a u m a r espost a , e devo pedir per dã o se,
n a bu sca de dist in ções cla r a s, m eu s a r gu m en t os sã o dem a sia do du r os.
E u m esm o defen di com con vicçã o, du r a n t e a n os, a s t eor ia s qu e a gor a
a t a co, e n ã o ign or o, a ch o, seu s pon t os for t es.
Os a ssu n t os em discu ssã o sã o da m á xim a im por t â n cia . P or ém ,
se m in h a s explica ções est iver em cer t a s, é a m eu s colega s econ om ist a s,
e n ã o a o pú blico em ger a l, qu e t en h o qu e con ven cer em pr im eir o lu ga r .
A est a a lt u r a da dispu t a , o pú blico em ger a l, em bor a seja bem -vin do
a o deba t e, a pen a s obser va r á de for a u m a t en t a t iva de u m econ om ist a
n o sen t ido de r esolver a s pr ofu n da s diver gên cia s de opin iã o en t r e seu s
colega s econ om ist a s qu e qu a se ch ega r a m a dest r u ir a in flu ên cia pr á t ica
da t eor ia econ ôm ica e qu e con t in u a r ã o, a t é qu e seja m r esolvida s, a t er
esse efeit o.
A r ela çã o en t r e est e livr o e m eu T ratad o S obre a M oed a (J MK,

27
OS ECON OMIS TAS

v. V e VI), qu e pu bliqu ei h á cin co a n os, pr ova velm en t e est á m a is cla r a


pa r a m im do qu e est a r á pa r a os ou t r os, e a qu ilo qu e em m in h a m en t e
con st it u i u m a evolu çã o n a t u r a l n u m a lin h a de pen sa m en t o qu e ven h o
segu in do h á vá r ios a n os pode à s vezes pa r ecer a o leit or u m a m u da n ça
con fu sa de pon t o de vist a . E ssa dificu lda de n ã o dim in u i dia n t e de
cer t a s m odifica ções de t er m in ologia qu e m e sen t i obr iga do a fa zer .
E ssa s m u da n ça s de lin gu a gem sã o dest a ca da s n o decu r so da s pá gin a s
segu in t es, m a s a r ela çã o ger a l en t r e os dois livr os pode ser expr essa
su cin t a m en t e com o segu e. Qu a n do com ecei a escr ever m eu T ratad o
S obre a M oed a eu a in da est a va m e m ovim en t a n do a o lon go da s lin h a s
t r a dicion a is, en ca r a n do a in flu ên cia da m oeda com o a lgo, por a ssim
dizer , sepa r a do da t eor ia ger a l da ofer t a e da dem a n da . Qu a n do t er -
m in ei de escr ever o livr o, t in h a feit o a lgu m pr ogr esso n a t en t a t iva de
en ca m in h a r a t eor ia m on et á r ia n o sen t ido de se t or n a r u m a t eor ia da
pr odu çã o com o u m t odo. Ma s m in h a fa lt a de em a n cipa çã o de idéia s
pr econ cebida s a pa r eceu n a qu ilo qu e a gor a pa r ece-m e ser a fa lh a pr in -
cipa l da s pa r t es t eór ica s da qu ela obr a (a sa ber , os Livr os III e IV),
ist o é, qu e eu n ã o con segu i lida r com plet a m en t e com os efeit os da s
variações do n ível de pr odu çã o. As m in h a s ch a m a da s “equ a ções fu n -
da m en t a is” er a m u m a fot ogr a fia in st a n t â n ea t ir a da su pon do u m vo-
lu m e de pr odu çã o da do. E la s t en t a va m dem on st r a r com o, su pon do-se
o volu m e de pr odu çã o da do, podia m desen volver -se for ça s qu e ger a va m
u m desequ ilíbr io dos lu cr os, exigin do a ssim u m a va r ia çã o do n ível da
pr odu çã o. Ma s o desen volvim en t o din â m ico, em con t r a st e com a fot o-
gr a fia in st a n t â n ea , fica va in com plet o e ext r em a m en t e con fu so. O pr e-
sen t e livr o, por ou t r o la do, evolu iu pa r a a qu ilo qu e é pr ecipu a m en t e
u m est u do da s for ça s qu e det er m in a m a s va r ia ções n a esca la da pr o-
du çã o e do em pr ego com o u m t odo, e, em bor a se descu br a qu e a m oeda
en t r a n o esqu em a econ ôm ico de u m a m a n eir a essen cia l e pecu lia r , os
det a lh es m on et á r ios t écn icos vã o pa r a segu n do pla n o. Um a econ om ia
m on et á r ia , ir em os ver , é essen cia lm en t e u m a econ om ia em qu e a s m u -
da n ça s de pon t os de vist a sobr e o fu t u r o sã o ca pa zes de in flu en cia r o
volu m e de em pr ego e n ã o m er a m en t e a su a dir eçã o. Ma s n osso m ét odo
de a n a lisa r o com por t a m en t o econ ôm ico do pr esen t e sob a in flu ên cia
da s m u da n ça s de idéia s sobr e o fu t u r o é u m m ét odo qu e depen de da
in t er a çã o da ofer t a e da dem a n da , liga n do-se dessa for m a a n ossa
t eor ia fu n da m en t a l do va lor . Som os leva dos dessa for m a a u m a t eor ia
m a is ger a l, qu e in clu i com o ca so pa r t icu la r a t eor ia clá ssica com a
qu a l est a m os fa m ilia r iza dos.
O a u t or de u m livr o com o est e, t r ilh a n do ca m in h os descon h ecidos,
t er á qu e a poia r -se m u it o n a cr ít ica e n a t r oca de idéia s se qu iser evit a r
u m a pr opor çã o in devida de er r os. É su r pr een den t e em qu e coisa s t ola s
pode-se a cr edit a r t em por a r ia m en t e se se pen sa sozin h o por t em po de-
m a sia do, pa r t icu la r m en t e n a E con om ia (bem com o n a s ou t r a s ciên cia s
m or a is), em qu e m u it a s vezes é im possível su bm et er a s idéia s qu e se

28
KEYN ES

t em a u m t est e con clu sivo, qu er for m a l qu er exper im en t a l. Ao escr ever


est e livr o, a in da m a is t a lvez do qu e n o ca so do m eu T ratad o S obre a
M oed a, a poiei-m e con st a n t em en t e n os con selh os e n a s cr ít ica s con s-
t r u t iva s do Sr . R. F . Ka h n . H á m u it a s coisa s n est e livr o qu e n ã o t er ia m
a ssu m ido a for m a qu e a ssu m ir a m se n ã o fosse por su a s su gest ões.
Ta m bém r ecebi m u it o a u xílio da Sr a . J oa n Robin son , do Sr . R. G.
H a wt r ey e do Sr . R. F . H a r r od, qu e ler a m t oda s a s pr ova s. O ín dice
r em issivo25 foi com pila do pelo Sr . D. M. Ben su sa n -Bu t t , do Kin g’s Col-
lege, Ca m br idge.
A ela bor a çã o dest e livr o foi pa r a o a u t or u m a lon ga lu t a de li-
ber t a çã o, e su a leit u r a deve ser o m esm o pa r a a m a ior ia dos leit or es
se a s in vest ida s do a u t or sobr e eles t iver em su cesso — u m a lu t a de
liber t a çã o da s for m a s h a bit u a is de pen sa m en t o e de expr essã o. As
idéia s a qu i expr essa s t ã o la bor iosa m en t e sã o ext r em a m en t e sim ples e
dever ia m ser óbvia s. A dificu lda de n ã o est á n a s n ova s idéia s, m a s em
esca pa r da s velh a s, qu e se r a m ifica m , pa r a a qu eles qu e for a m cr ia dos
com o a m a ior ia de n ós foi, por t odos os ca n t os de n ossa s m en t es.
J . M. Keyn es

13 de dezem br o de 1935

25 Nã o in clu ído n a pr im eir a ediçã o. (N. do E .)

29
P REF ÁCIO À E D IÇÃO A LEMÃ

A lfr ed Ma r sh a ll, cu jos Prin cípios d e E con om ia con st it u em a obr a


fu n da m en t a l n a for m a çã o de t odos os econ om ist a s in gleses con t em po-
r â n eos, t eve u m cu ida do especia l em dest a ca r a con t in u ida de exist en t e
en t r e o pen sa m en t o dele e o de Rica r do. Su a obr a em gr a n de pa r t e
con sist iu em en xer t a r o pr in cípio m a r gin a list a e o pr in cípio da su bs-
t it u içã o n a t r a diçã o r ica r dia n a ; e su a t eor ia da pr odu çã o e do con su m o
com o u m t odo, a o con t r á r io de su a t eor ia da pr odu çã o e da dist r ibu içã o
de u m d ad o m on t a n t e da pr odu çã o, n u n ca foi expost a sepa r a da m en t e.
Nã o est ou segu r o de qu e ele m esm o sen t isse a n ecessida de de t a l t eor ia .
Ma s seu s su cessor es im edia t os e segu idor es cer t a m en t e a coloca r a m
de la do e a pa r en t em en t e n ã o sen t ir a m su a fa lt a . F oi n essa a t m osfer a
qu e m e for m ei. E u m esm o en sin ei essa s dou t r in a s e foi só n a ú lt im a
déca da qu e pa ssei a t er con sciên cia de su a in su ficiên cia . E m m eu pr ó-
pr io pen sa m en t o e desen volvim en t o, por t a n t o, est e livr o r epr esen t a
u m a r ea çã o, u m a t r a n siçã o n o sen t ido de m e a fa st a r da t r a diçã o clá ssica
(ou or t odoxa ) in glesa . A ên fa se qu e dou n a s pá gin a s segu in t es a isso
e a os pon t os em qu e divir jo da dou t r in a t r a dicion a l t em sido con sider a da
por a lgu n s, n a In gla t er r a , com o in devida m en t e con t r over sa . Com o pode,
por ém , a lgu ém qu e foi edu ca do com o ca t ólico em t er m os de econ om ia
in glesa , u m sa cer dot e m esm o dessa fé, evit a r u m pou co de ên fa se con -
t r over sa logo qu a n do se t or n a pr ot est a n t e?
Im a gin o n o en t a n t o qu e isso pode ser per cebido pelos leit or es
a lem ã es de u m a for m a ligeir a m en t e difer en t e. A t r a diçã o or t odoxa ,
dom in a n t e n a In gla t er r a do sécu lo XIX, n u n ca con segu iu im por -se com
fir m eza a o pen sa m en t o a lem ã o. Sem pr e exist ir a m im por t a n t es escola s
de pen sa m en t o en t r e os econ om ist a s a lem ã es qu e con t est a r a m for t e-
m en t e a a dequ a çã o da t eor ia clá ssica à a n á lise dos a con t ecim en t os
con t em por â n eos. Ta n t o a escola de Ma n ch est er com o o m a r xism o em
ú lt im a in st â n cia der iva m de Rica r do — con clu sã o qu e só su r pr een de
a o n ível su per ficia l. Ma s n a Alem a n h a sem pr e t em exist ido u m a m plo
set or da opin iã o qu e n ã o a der iu n em a u m a n em a o ou t r o.
Dificilm en t e se pode a fir m a r , con t u do, qu e essa escola de pen -

31
OS ECON OMIS TAS

sa m en t o t en h a ela bor a do u m a r ca bou ço t eór ico r iva l, ou qu e t en h a


sequ er t en t a d o fa zê-lo. E la t em sid o cét ica e r ea list a , con t en t a n do-se
com os m ét od os e r esu lt a dos h ist ór icos e em pír icos, qu e d ispen sa m
a a n á lise for m a l. A a r gu m en t a çã o n ã o or t od oxa m a is im por t a n t e
em t er m os d e lin h a t eór ica foi a de Wick sell. Seu s livr os podia m
ser en con t r a dos em a lem ã o (n ã o o podia m , a t é h á pou co, em in glês);
de fa t o, u m d os m a is im por t a n t es deles foi escr it o em a lem ã o. Seu s
segu idor es, por ém , er a m pr in cip a lm en t e su ecos e a u st r ía cos, sen do
qu e est es ú lt im os com bin a r a m a s idéia s dele com t eor ia s especifi-
ca m en t e a u st r ía ca s, de for m a a en ca m in h á -la s, r ea lm en t e, de volt a
pa r a a t r a d içã o clá ssica . Assim a Alem a n h a , bem a o con t r á r io de
seu s h á bit os n a m a ior p a r t e da s ciên cia s, con t en t ou -se p or t odo u m
sécu lo em fica r sem u m a t eor ia for m a l d e E con om ia qu e fosse pr e-
dom in a n t e e ger a lm en t e a ceit a .
Ta lvez, p or t a n t o, eu possa esp er a r m en os r esist ên cia por pa r t e
dos leit or es a lem ã es do qu e dos in gleses a o ofer ecer u m a t eor ia do
em p r ego e da pr odu çã o com o u m t odo qu e diver ge em a sp ect os im -
por t a n t es da t r a diçã o or t odoxa . Ma s posso esper a r ven cer o a gn os-
t icism o econ ôm ico d a Alem a n h a ? P osso con ven cer os econ om ist a s
a lem ã es de qu e os m ét od os de a n á lise for m a l t êm u m a con t r ibu içã o
im p or t a n t e a da r à in t er p r et a çã o d os a con t ecim en t os con t em por â -
n eos e à for m u la çã o da s polít ica s con t em por â n ea s? Afin a l, é a lem ã o
gost a r de t eor ia s. Com o os econ om ist a s a lem ã es devem se sen t ir
fa m in t os e seden t os depois de t er vivido t odos esses a n os sem t eor ia !
Cer t a m en t e va le a pen a eu t en t a r . E se eu p u der con t r ibu ir com
a lgu m a s m iga lh a s pa r a a pr epa r a çã o, por p a r t e dos econ om ist a s
a lem ã es, de u m a la u t a r efeiçã o de t eor ia dest in a da a fa zer fr en t e
à s con dições específica s d a Alem a n h a , fica r ei sa t isfeit o. Con fesso
qu e a m a ior pa r t e d o qu e est e livr o exem plifica e expõe se r efer e
à s con dições exist en t es n os p a íses a n glo-sa xões.
No en t a n t o a t eor ia da pr odu çã o com o u m t odo, qu e é o qu e o
livr o pr opõe expor , ser ia m u it o m a is fa cilm en t e a da pt a da à s con dições
de u m E st a do t ot a lit á r io do qu e a t eor ia da pr odu çã o e dist r ibu içã o
de u m volu m e da do em con dições de livr e-con cor r ên cia e u m a a m pla
dose de laissez-faire. A t eor ia da s leis psicológica s r efer en t es a o con su m o
e à pou pa n ça , a in flu ên cia da s despesa s ba sea da s em em pr ést im os
sobr e os pr eços e os sa lá r ios r ea is, o pa pel desem pen h a do pela t a xa
de ju r os — t odos esses elem en t os per m a n ecem com o in gr edien t es n e-
cessá r ios em n osso esqu em a de pen sa m en t o.
Apr oveit o a opor t u n ida de pa r a expr essa r m eu s a gr a decim en t os
pelo excelen t e t r a ba lh o de m eu t r a du t or H er r Wa eger (esper o qu e o
voca bu lá r io or ga n iza do por ele qu e a pa r ece n o fim do volu m e26 de-

26 Nã o in clu ído n a pr esen t e ediçã o. (N. do E .)

32
KEYN ES

m on st r e ser de u t ilida de qu e t r a n scen da seu pr opósit o im edia t o) e a


m eu s edit or es, Sr s. Du n cker e H u m blot , cu ja in icia t iva t em -m e per -
m it ido m a n t er con t a t o com os leit or es a lem ã es desde qu a n do, h á de-
zesseis a n os já , pu blica r a m m eu livr o As Con seqü ên cias E con ôm icas
d a Paz.
J . M. Keyn es

7 de set em br o de 1936

33
P REF ÁCIO À E D IÇÃO J AP ON ES A

A lfr ed Ma r sh a ll, cu jos Prin cípios d e E con om ia con st it u em a obr a


fu n da m en t a l n a for m a çã o de t odos os econ om ist a s in gleses con t em po-
r â n eos, t eve u m cu ida do especia l em dest a ca r a con t in u ida de exist en t e
en t r e o pen sa m en t o dele e o de Rica r do. Su a obr a em gr a n de pa r t e
con sist iu em en xer t a r o pr in cípio m a r gin a list a e o pr in cípio da su bs-
t it u içã o n a t r a diçã o r ica r dia n a ; e su a t eor ia da pr odu çã o e do con su m o
com o u m t odo, a o con t r á r io de su a t eor ia da pr odu çã o e da dist r ibu içã o
de u m d ad o m on t a n t e da pr odu çã o, n u n ca foi expost a sepa r a da m en t e.
Nã o est ou segu r o de qu e ele m esm o sen t isse a n ecessida de de t a l t eor ia .
Ma s seu s su cessor es im edia t os e segu idor es cer t a m en t e a coloca r a m
de la do e a pa r en t em en t e n ã o sen t ir a m su a fa lt a . F oi n essa a t m osfer a
qu e m e for m ei. E u m esm o en sin ei essa s dou t r in a s e foi só n a ú lt im a
déca da qu e pa ssei a t er con sciên cia de su a in su ficiên cia . E m m eu pr ó-
pr io pen sa m en t o e desen volvim en t o, por t a n t o, est e livr o r epr esen t a
u m a r ea çã o, u m a t r a n siçã o n o sen t ido de m e a fa st a r da t r a diçã o clá ssica
(ou or t odoxa ) in glesa . A ên fa se qu e dou n a s pá gin a s segu in t es a isso
e a os pon t os em qu e divir jo da dou t r in a t r a dicion a l t em sido con sider a da
por a lgu n s, n a In gla t er r a , com o in devida m en t e con t r over sa . Com o pode,
por ém , a lgu ém qu e foi edu ca do n a or t odoxia econ ôm ica in glesa , qu e
de fa t o ch egou a ser sa cer dot e dessa fé, evit a r u m pou co de ên fa se
con t r over sa logo qu a n do se t or n a pr ot est a n t e?
Ta lvez os leit or es ja pon eses, con t u do, n em exija m m in h a s in ves-
t ida s con t r a a t r a diçã o in glesa e n em r esist a m a ela s. E st a m os bem
con scien t es da a m pla esca la em qu e a s obr a s econ ôm ica s in glesa s sã o
lida s n o J a pã o, m a s n ã o est a m os t ã o bem in for m a dos qu a n t o à opin iã o
qu e os ja pon eses t êm dela s. O r ecen t e e lou vá vel em pr een dim en t o do
Cír cu lo E con ôm ico In t er n a cion a l de Tóqu io de r eim pr im ir os Prin cípios
d e E con om ia Política de Ma lt h u s com o o pr im eir o volu m e da Sér ie de
Repr odu ções de Tóqu io en cor a ja -m e a pen sa r qu e u m livr o qu e descen de
de Ma lt h u s m a is do qu e de Rica r do possa ser r ecebido com sim pa t ia
pelo m en os em a lgu n s set or es.

35
OS ECON OMIS TAS

De qu a lqu er for m a , a gr a deço a o E con om ista Orien tal por possi-


bilit a r m eu con t a t o com os leit or es ja pon eses sem a desva n t a gem ext r a
de u m a lín gu a est r a n geir a .
J . M. Keyn es

4 de dezem br o de 1936

36
P REF ÁCIO À E D IÇÃO F RAN CES A

P or cem a n os ou m a is a E con om ia P olít ica in glesa vem sen do


dom in a da por u m a or t odoxia . Isso n ã o qu er dizer qu e t en h a pr eva lecido
u m a dou t r in a im u t á vel. Ao con t r á r io. Tem h a vido u m a pr ogr essiva
evolu çã o da dou t r in a . Ma s seu s pr essu post os, su a a t m osfer a , seu m é-
t odo t êm con t in u a do su r pr een den t em en t e igu a is, e t em sido obser vá vel
u m a n ot á vel con t in u ida de a t r a vés de t oda s a s m u da n ça s. Nessa or t o-
doxia , n essa t r a n siçã o con t ín u a foi qu e eu m e for m ei. E u a a pr en di,
eu a en sin ei, eu a escr evi. P a r a os qu e obser va m de for a , pr ova velm en t e
a in da per t en ço a ela . Os h ist or ia dor es da dou t r in a ir ã o con sider a r est e
livr o com o per t en cen t e essen cia lm en t e à m esm a t r a diçã o. Ma s a o es-
cr evê-lo, e em ou t r a obr a r ecen t e qu e levou a ele, sen t i-m e r om pen do
com essa ortodoxia, num a forte reação contra ela, fugindo de algum a
coisa, conquistando um a emancipação. E esse estado de espírito de m inha
parte é a explicação de certas falhas do livro, em particular o tom con-
trovertido de alguns trechos e seu ar de ser dirigido muito aos que detêm
um ponto de vista específico e pouco ad urbem et orbem . E u estava que-
rendo convencer m eu próprio ambiente e não me dirigi de m odo suficien-
temente direto à opinião dos de fora. Agora, três anos depois, tendo-m e
acostumado à nova pele e quase m e esquecido do cheiro da velha, devo,
como se estivesse escrevendo de novo, esforçar-me para livrar-m e dessa
falha, estabelecendo m inha posição de maneira mais definida.
Digo t u do isso em pa r t e pa r a explica r -m e e em pa r t e pa r a des-
cu lpa r -m e per a n t e os leit or es fr a n ceses; n a F r a n ça n ã o h ou ve u m a
t r a diçã o or t odoxa com a m esm a a u t or ida de sobr e a opin iã o con t em po-
r â n ea com o h ou ve em m eu pa ís. Nos E st a dos Un idos, a posiçã o é ba s-
t a n t e sem elh a n t e à da In gla t er r a , m a s n a F r a n ça , com o n o r est o da
E u r opa , n ã o t em h a vido u m a escola dom in a n t e desse t ipo desde a
ext in çã o da escola dos econ om ist a s liber a is fr a n ceses qu e est iver a m
em seu a pogeu h á vin t e a n os (a pesa r de t er em a lca n ça do u m a ida de
t ã o pr ovect a qu e, bem depois de su a in flu ên cia t er desa pa r ecido, cou -
be-m e, qu a n do com ecei a t r a ba lh a r com o jovem r eda t or do E con om ic
J ou rn al, escr ever os n ecr ológios de m u it os deles — Leva sseu r , Molin a r i,

37
OS ECON OMIS TAS

Ler oy-Bea lieu ). Se Ch a r les Gide t ivesse a t in gido a m esm a in flu ên cia
e o m esm o pr est ígio de Alfr ed Ma r sh a ll, a posiçã o de vocês, fr a n ceses,
ser ia m a is sem elh a n t e à n ossa . Do m odo com o a s coisa s ocor r er a m ,
seu s econ om ist a s sã o eclét icos, dem a sia do (a ch a m os n ós, à s vezes) de-
sen r a iza dos do pen sa m en t o sist em á t ico. Ta lvez isso possa fa zê-los m a is
a cessíveis a o qu e t en h o a dizer . Isso pode por ém t a m bém r esu lt a r em
qu e m eu s leit or es à s vezes fiqu em im a gin a n do a qu e m e r efir o qu a n do
est ou fa la n do, com a qu ilo qu e a lgu n s de m eu s cr ít icos in gleses con si-
der a m u m m a u u so da lín gu a , da escola “clá ssica ” de pen sa m en t o e
dos econ om ist a s “clá ssicos”. P ode ser ú t il a m eu s leit or es fr a n ceses,
por t a n t o, qu e eu t en t e in dica r bem r esu m ida m en t e o qu e con sider o a s
pr in cipa is d ifferen tiae de m in h a per spect iva .
Dei a m in h a t eor ia o n om e de t eor ia geral. Com isso qu er o dizer
qu e est ou pr eocu pa do pr in cipa lm en t e com o com por t a m en t o do sist em a
econ ôm ico com o u m t odo — com a r en da globa l, com o lu cr o globa l,
com o volu m e globa l da pr odu çã o, com o n ível globa l de em pr ego, com
o in vest im en t o globa l e com a pou pa n ça globa l, em vez de com a r en da ,
o lu cr o, o volu m e da pr odu çã o, o n ível do em pr ego, o in vest im en t o e
a pou pa n ça de r a m os da in dú st r ia , fir m a s ou in divídu os em pa r t icu la r .
E a fir m o qu e for a m com et idos er r os im por t a n t es a o se est en der pa r a
o sist em a com o u m t odo a s con clu sões a qu e se t in h a ch ega do de for m a
cor r et a com r ela çã o a u m a pa r t e desse sist em a t om a da isola da m en t e.
P er m it a m -m e a pr esen t a r exem plos da qu ilo a qu e m e est ou r efe-
r in do. Min h a a sser t iva de qu e pa r a o sist em a com o u m t odo o volu m e
de r en da qu e é pou pa do, n o sen t ido de qu e n ã o é ga st o n o con su m o
cor r en t e, é e t em n ecessa r ia m en t e qu e ser exa t a m en t e igu a l a o volu m e
do n ovo in vest im en t o líqu ido, t em sido con sider a da u m pa r a doxo e
t em pr ovoca do con t r ovér sia gen er a liza da . A explica çã o pa r a isso in du -
bit a velm en t e se en con t r a n o fa t o de qu e essa r ela çã o de igu a lda de
en t r e pou pa n ça e in vest im en t o, qu e n ecessa r ia m en t e se ver ifica com
r ela çã o a o sist em a com o u m t odo, n ã o se ver ifica com r ela çã o a u m
in divídu o em pa r t icu la r . Nã o h á r a zã o a bsolu t a m en t e por qu e o n ovo
in vest im en t o pelo qu a l sou r espon sá vel t en h a qu e a pr esen t a r qu a lqu er
r ela çã o com o m on t a n t e de m in h a pou pa n ça pessoa l. De for m a bem
legít im a con sider a m os a r en da de u m in divídu o in depen den t e da qu ilo
qu e ele pr ópr io con som e e in vest e. Ma s isso, t en h o qu e sa lien t a r , n ã o
deve n os leva r a despr eza r o fa t o de qu e a dem a n da r esu lt a n t e do
con su m o e do in vest im en t o de u m in divídu o é a fon t e da r en da de
ou t r os in divídu os, de for m a qu e a s r en da s em ger a l n ã o sã o in depen -
den t es — m u it o pelo con t r á r io — da disposiçã o dos in divídu os a des-
pen der e a in vest ir , e já qu e por su a vez a in clin a çã o dos in divídu os
a despen der e a in vest ir depen de de su a r en da , est a belece-se u m a
r ela çã o en t r e a pou pa n ça globa l e o in vest im en t o globa l qu e pode fa -
cilm en t e ser dem on st r a da , a lém de qu a lqu er possibilida de de r efu t a çã o
r a zoá vel, com o sen do de igu a lda de exa t a e n ecessá r ia . E n ca r a da de

38
KEYN ES

for m a ju st a , essa é u m a con clu sã o ba n a l. Ma s ela põe em m ovim en t o


u m a ca deia de r a ciocín io de on de se segu em qu est ões m a is su bst a n -
ciosa s. F ica dem on st r a do qu e, de m odo ger a l, o m on t a n t e r ea l da pr o-
du çã o e o n ível r ea l do em pr ego depen dem n ã o da ca pa cida de de pr o-
du zir ou do n ível de r en da pr eexist en t es, m a s da s decisões cor r en t es
de pr odu zir , qu e depen dem por su a vez da s decisões cor r en t es de in -
vest ir e da s expect a t iva s pr esen t es do con su m o cor r en t e e do con su m o
pr evist o. Adem a is, a ssim qu e con h ecem os a pr open sã o a con su m ir e
a pou pa r (com o eu a ba t izei), ist o é, o r esu lt a do pa r a a com u n ida de
com o u m t odo da s in clin a ções psicológica s in dividu a is qu a n t o a com o
dispor de da da s r en da s, podem os ca lcu la r qu e n ível de r en da , e por t a n t o
qu e n ível de pr odu çã o e de em pr ego, est á em equ ilíbr io lu cr a t ivo com
u m da do n ível de n ovo in vest im en t o, a pa r t ir do qu e se desen volve a
dou t r in a do m u lt iplica dor . Ou a in da , t or n a -se eviden t e qu e o a u m en t o
da pr open sã o a pou pa r pr ovoca r á ceteris paribu s a con t r a çã o da r en da
e do volu m e da pr odu çã o, en qu a n t o u m a u m en t o do est ím u lo a in vest ir
fa r á com qu e se expa n da m . E st a m os por t a n t o em con dições de a n a lisa r
os fa t or es qu e det er m in a m a r en da e a pr odu çã o do sist em a com o u m
t odo — t em os, n o sen t ido m a is exa t o, u m a t eor ia do em pr ego. Desse
r a ciocín io su r gem con clu sões qu e sã o pa r t icu la r m en t e r eleva n t es pa r a
os pr oblem a s de fin a n ça s pú blica s e de polít ica s gover n a m en t a is em
ger a l e do ciclo econ ôm ico.
Ou t r o a spect o especia lm en t e ca r a ct er íst ico dest e livr o é a t eor ia
da t a xa de ju r os. Nos ú lt im os t em pos m u it os econ om ist a s t êm a fir m a do
qu e o m on t a n t e de pou pa n ça a t u a l det er m in a a ofer t a de ca pit a l dis-
pon ível, qu e o r it m o de in vest im en t o cor r en t e gover n a su a dem a n da
e qu e a t a xa de ju r os é, por a ssim dizer , o fa t or de equ ilíbr io de pr eços
det er m in a do pelo pon t o de in t er seçã o en t r e a cu r va da ofer t a da pou -
pa n ça e a cu r va da dem a n da do in vest im en t o. Ma s se a pou pa n ça
globa l é n ecessa r ia m en t e e em t oda s a s cir cu n st â n cia s exa t a m en t e igu a l
a o in vest im en t o globa l, é eviden t e qu e essa explica çã o n ã o se su st en t a .
Tem os qu e ir pr ocu r a r a solu çã o em ou t r a pa r t e. E u a en con t r o n a
idéia de qu e é fu n çã o da t a xa de ju r os pr eser va r o equ ilíbr io n ã o en t r e
a dem a n da e a ofer t a de n ovos ben s de ca pit a l m a s en t r e a dem a n da
e a ofer t a de din h eir o, ist o é, en t r e a dem a n da pela liqu id ez e os m eios
de sa t isfa zer essa dem a n da . Nesse pon t o r et or n o à dou t r in a dos eco-
n om ist a s a n t igos, a n t er ior es a o sécu lo XIX. Mon t esqu ieu , por exem plo,
en xer gou essa ver da de com con sider á vel cla r eza 27 — Mon t esqu ieu qu e
foi o ver da deir o equ iva len t e fr a n cês de Ada m Sm it h , o m a ior de seu s
econ om ist a s, m u it o a cim a dos fisiocr a t a s em t er m os de in t eligên cia
pen et r a n t e, cla r eza de idéia s e bom sen so (qu e sã o qu a lida des qu e u m
econ om ist a dever ia t er ). Devo deixa r por ém pa r a o t ext o do livr o a
dem on st r a çã o em det a lh e de com o t u do isso fu n cion a .
Ba t izei est e livr o A T eoria Geral d o E m prego, d os J u ros e d a

27 Tenho em m ente de m odo especia l o Livr o Vigésimo Segundo, ca p. 19 de O Espírito das L eis.

39
OS ECON OMIS TAS

M oed a; a t er ceir a ca r a ct er íst ica pa r a a qu a l qu er o ch a m a r a t en çã o é


o t r a t a m en t o da m oeda e dos pr eços. A a n á lise segu in t e r egist r a m in h a
fu ga fin a l da s con fu sões da t eor ia qu a n t it a t iva , em qu e a n t es m e em a -
r a n h a r a . Con sider o qu e o n ível de pr eços com o u m t odo é det er m in a do
pr ecisa m en t e da m esm a m a n eir a qu e os pr eços in dividu a is, ist o é, sob
a in flu ên cia da ofer t a e da dem a n da . As con dições t écn ica s, o n ível
dos sa lá r ios, o gr a u de ca pa cida de ociosa da s u n ida des de pr odu çã o e
da m ã o-de-obr a , e o est a do do m er ca do e da con cor r ên cia det er m in a m
a s con dições de ofer t a dos pr odu t or es t om a dos in dividu a lm en t e e dos
pr odu t os com o u m t odo. As decisões dos em pr esá r ios, qu e or igin a m a
r en da dos pr odu t os t om a dos in dividu a lm en t e, e a s decisões desses in -
divídu os qu a n t o à disposiçã o da da a essa r en da det er m in a m a s con -
dições de dem a n da . E os pr eços — t a n t o os pr eços t om a dos in dividu a l-
m en t e com o o n ível de pr eços — a pa r ecem com o a r esu lt a n t e desses
dois fa t or es. A m oeda e a qu a n t ida de da m oeda n ã o con st it u em in -
flu ên cia s dir et a s a essa a lt u r a do pr ocesso. E la s já fizer a m seu t r a ba lh o
n u m a et a pa a n t er ior da a n á lise. A qu a n t ida de da m oeda det er m in a a
ofer t a de r ecu r sos líqu idos e, con seqü en t em en t e, a t a xa de ju r os, e,
em con ju n t o com ou t r os fa t or es (pa r t icu la r m en t e a con fia n ça ), o est í-
m u lo a in vest ir , o qu e por su a vez fixa o n ível de equ ilíbr io da r en da ,
da pr odu çã o e do em pr ego e (a ca da et a pa em con ju n t o com ou t r os
fa t or es) o n ível de pr eços com o u m t odo a t r a vés da s in flu ên cia s da
ofer t a e da dem a n da a ssim est a belecida s.
Acr edit o qu e a econ om ia em t oda pa r t e, a t é r ecen t em en t e, t en h a
sido dom in a da , m u it o m a is do qu e com pr een dida , pela s dou t r in a s a s-
socia da s a o n om e de J .-B. Sa y. É ver da de qu e a “lei dos m er ca dos”
dele já foi a ba n don a da h á t em po pela m a ior ia dos econ om ist a s, m a s
eles n ã o se livr a r a m de seu s post u la dos bá sicos, pa r t icu la r m en t e de
su a idéia er r ôn ea de qu e a dem a n da é cr ia da pela ofer t a . Sa y est a va
su pon do im plicit a m en t e qu e o sist em a econ ôm ico est á sem pr e oper a n do
com su a ca pa cida de m á xim a , de for m a qu e u m a a t ivida de n ova a pa -
r ecer ia sem pr e em su bst it u içã o e n ã o em su plem en t a çã o a a lgu m a
ou t r a a t ivida de. Qu a se t oda a t eor ia econ ôm ica su bseqü en t e t em de-
fen dido, n o sen t ido de qu e ela t em exigido, esse m esm o pr essu post o.
No en t a n t o, u m a t eor ia com essa ba se é cla r a m en t e in com pet en t e pa r a
en fr en t a r os pr oblem a s do desem pr ego e do ciclo econ ôm ico. Ta lvez eu
possa expr im ir m elh or a m eu s leit or es fr a n ceses o qu e a pr egôo sobr e
est e livr o dizen do qu e n a t eor ia da pr odu çã o ele é u m a r u pt u r a r a dica l
com a s dou t r in a s de J .-B. Sa y e qu e n a t eor ia dos ju r os ele é u m
r et or n o à s dou t r in a s de Mon t esqu ieu .

J . M. Keyn es

20 de fever eir o de 1939


Kin g’s College
Ca m br idge

40
L IVRO P RIMEIRO

I N TROD U ÇÃO
C AP ÍTU LO 1
A Te o ria Ge ra l

D en om in ei est e livr o A T eoria Geral d o E m prego, d o J u ro e d a


M oed a, da n do especia l ên fa se a o t er m o ger a l. O objet ivo dest e t ít u lo
é con t r a st a r a n a t u r eza de m eu s a r gu m en t os e con clu sões com os da
t eor ia clássica,28 n a qu a l m e for m ei, qu e dom in a o pen sa m en t o econ ô-
m ico, t a n t o pr á t ico qu a n t o t eór ico, dos m eios a ca dêm icos e dir igen t es
dest a ger a çã o, t a l com o vem a con t ecen do n os ú lt im os cem a n os. Ar -
gu m en t a r ei qu e os post u la dos da t eor ia clá ssica se a plica m a pen a s a
u m ca so especia l e n ã o a o ca so ger a l, pois a sit u a çã o qu e ela su põe
a ch a -se n o lim it e da s possíveis sit u a ções de equ ilíbr io. Adem a is, a s
ca r a ct er íst ica s desse ca so especia l n ã o sã o a s da socieda de econ ôm ica
em qu e r ea lm en t e vivem os, de m odo qu e os en sin a m en t os da qu ela
t eor ia ser ia m ilu sór ios e desa st r osos se t en t á ssem os a plica r a s su a s
con clu sões a os fa t os da exper iên cia .

28 "Os econ om ist a s clá ssicos" é u m a den om in a çã o in ven t a da por Ma r x pa r a design a r Rica r do
e J a m es Mill e seu s pred ecessores, ist o é, os fu n da dor es da t eor ia qu e cu lm in ou em Rica r do.
Acost u m ei-m e, t a lvez per pet r a n do u m solecism o, a in clu ir n a “escola clá ssica ” os segu idor es
de Rica r do, ou seja , os qu e a dot a r a m e a per feiçoa r a m su a t eor ia , com pr een den do (por exem -
plo) J . S. Mill, Ma r sh a ll e o P r of. P igou .

43
C AP ÍTU LO 2
Os P o s tu la d o s d a Ec o n o m ia Clá s s ic a

critica a teoria classica

A m a ior pa r t e dos t r a t a dos sobr e a t eor ia do va lor e da pr odu çã o


discor r e, pr in cipa lm en t e, sobr e a dist r ibu içã o en t r e u sos difer en t es de
d eterm in ad o volu m e de r ecu r sos a plica dos e a s con dições qu e, a dm it in do
a h ipót ese do em pr ego dessa qu a n t ida de de r ecu r sos, det er m in a m su a s
r em u n er a ções cor r espon den t es e os va lor es r ela t ivos de seu s pr odu t os.29
Ta m bém a qu est ã o do volu m e de r ecu r sos d ispon íveis, n o sen t ido
da qu a n t ida de da popu la çã o su scet ível de ser em pr ega da , da ext en sã o
da r iqu eza n a t u r a l e do ca pit a l de equ ipa m en t o a cu m u la do, t em sido,
m u it a s vezes, t r a t a da de m a n eir a descr it iva . Toda via , a t eor ia pu r a
dos det er m in a n t es do em prego efetivo dos r ecu r sos dispon íveis pou ca s
vezes foi objet o de exa m e det a lh a do. Na t u r a lm en t e, ser ia a bsu r do dizer
qu e n u n ca foi exa m in a da , pois t oda s a s discu ssões r ela t iva s à s flu t u a -
ções do em pr ego, qu e t êm sido m u it a s, se ocu pa r a m dela . Nã o qu er o
dizer qu e o a ssu n t o t en h a sido descu ida do, m a s qu e a t eor ia fu n da -
m en t a l su bja cen t e foi ju lga da t ã o sim ples e óbvia qu e foi, qu a n do m u it o,
objet o de m en çã o su per ficia l.30

29 E ssa é a t r a diçã o r ica r dia n a , pois Rica r do r ecu sou expr essa m en t e a t r ibu ir qu a lqu er in t er esse
a o valor do n ível do dividen do* n a cion a l, con sider a do in depen den t em en t e de su a dist r ibu içã o.
Com isso a va lia va cor r et a m en t e a n a t u r eza de su a pr ópr ia t eor ia . P or ém , seu s su cessor es,
m en os per spica zes, ser vir a m -se da t eor ia clá ssica n a s discu ssões sobr e a s ca u sa s da r iqu eza .
Ver a ca r t a de Rica r do a Ma lt h u s, de 9 de ou t u br o de 1820: “A E con om ia P olít ica , n o seu
pen sa r , é u m a in vest iga çã o sobr e a n a t u r eza e a s ca u sa s da r iqu eza — eu pen so qu e dever ia
ch a m a r -se in vest iga çã o da s leis qu e det er m in a m a dist r ibu içã o do pr odu t o da in dú st r ia
en t r e a s cla sses qu e con cor r em pa r a su a for m a çã o. Nã o se pode en u n cia r n en h u m a lei com
r espeit o à qu a n t ida de, m a s se pode for m u lá -la com su ficien t e exa t idã o com r espeit o à s
pr opor ções. Ca da dia m a is m e con ven ço de qu e o pr im eir o est u do é vã o e ilu sór io e de qu e
o segu n do é o ver da deir o objet ivo da ciên cia ”.
* Keyn es em pr egou o t er m o “dividen do” com o sin ôn im o da qu ilo qu e m a is t a r de se t or n ou
m a is con h ecido com o “r en da ”, n o Br a sil, ou “r en dim en t o”, em P or t u ga l, n os sist em a s m o-
der n os de Con t a s Na cion a is. P or fidelida de à obr a , o t er m o dividen do é m a n t ido com o a
t r a du çã o m a is pr óxim a de d ivid en d. F ica m , por ém , os leit or es a ler t a dos pa r a a sin on ím ia
dos t er m os “dividen do”, “r en da ” e “r en dim en t o”. (N. do R. T.)
30 P or exem plo, o pr of. P igou , em su a obr a E con om ics of Welfare, 4ª ed., p. 127, escr eve (os
it á licos sã o m eu s): “A n ã o ser qu e o con t r á r io seja dit o expr essa m en t e, ign or a -se o fa t o de

45
OS ECON OMIS TAS

I
A t eor ia clá ssica do em pr ego — su post a m en t e sim ples e óbvia
— ba seou -se, a ch o eu , pr a t ica m en t e sem discu ssã o, n os dois post u la dos
fu n da m en t a is qu e segu em :
I. O salário é igu al ao prod u to m argin al d o trabalh o.
Isso qu er dizer qu e o sa lá r io de u m a pessoa em pr ega da é igu a l
a o va lor qu e se per der ia se o em pr ego fosse r edu zido de u m a u n ida de
(a pós a dedu çã o de qu a isqu er ou t r os cu st os qu e essa r edu çã o evit a r ia ),
com a r est r içã o de qu e a igu a lda de pode ser a fet a da , de a cor do com
cer t os pr in cípios, pela im per feiçã o da con cor r ên cia e dos m er ca dos.
II. A u tilid ad e d o salário, qu an d o se em prega d eterm in ad o
volu m e d e trabalh o, é igu al à d esu tilid ad e m argin al d esse m esm o
volu m e d e em prego.
Ist o sign ifica qu e o sa lá r io r ea l de u m a pessoa em pr ega da é exa -
t a m en t e su ficien t e (n a opin iã o da s pr ópr ia s pessoa s em pr ega da s) pa r a
oca sion a r o volu m e de m ã o-de-obr a efet iva m en t e ocu pa do, com a r es-
t r içã o de qu e a igu a lda de pa r a ca da u n ida de in dividu a l de t r a ba lh o
pode ser a lt er a da por com bin a ções en t r e a s u n ida des dispon íveis pa r a
em pr ega r -se, a n á loga s à s im per feições da con cor r ên cia qu e qu a lifica m
o pr im eir o post u la do. O qu e se en t en de por desu t ilida de é qu a lqu er
m ot ivo qu e in du za u m h om em ou gr u po de h om en s a r ecu sa r t r a ba lh o,
em vez de a ceit a r u m sa lá r io qu e pa r a eles r epr esen t a u m a u t ilida de
in fer ior a cer t o lim it e m ín im o.
E sse post u la do é com pa t ível com o qu e se pode ch a m a r desem -
pr ego “fr iccion a l”, pois u m a in t er pr et a çã o r ea list a do m esm o per m it e,
com plen a ju st ifica çã o, con cilia r cer t a s im per feições de a ju st a m en t o
qu e im pedem u m est a do con t ín u o de plen o em pr ego, com o, por exem plo,
o desem pr ego em r a zã o de u m a t em por á r ia despr opor çã o dos r ecu r sos
especia liza dos, r esu lt a n t e de cá lcu los er r a dos, da pr ocu r a in t er m it en t e,
de a t r a sos decor r en t es de m u da n ça s im pr evist a s, ou , a in da , do fa t o de
qu e a t r a n sfer ên cia de u m em pr ego pa r a ou t r o n ã o se r ea liza sem
cer t a dem or a , de m odo qu e, n u m a socieda de n ã o est á t ica , sem pr e exist e
cer t a pr opor çã o de r ecu r sos n ã o em pr ega dos “en t r e u m e ou t r o t r a ba -
lh o”. Além do desem pr ego “fr iccion a l”, o post u la do é a in da com pa t ível
com o desem pr ego “volu n t á r io”, em r a zã o da r ecu sa ou in ca pa cida de
de determinada unidade de mão-de-obra em aceitar uma remuneração

qu e a lgu n s r ecu r sos per m a n ecem sem em pr ego con t r a a von t a de de seu s pr opr iet á r ios.
Isso n ão afeta a essên cia d o argu m en to, se bem qu e sim plifiqu e su a exposiçã o”. Assim
sen do, en qu a n t o Rica r do n ega expr essa m en t e qu a lqu er in t en çã o de r efer ir -se a o dividen do
n a cion a l com o u m t odo, o pr of. P igou , em u m livr o qu e se ocu pa especifica m en t e do pr oblem a
do dividen do n a cion a l, su st en t a qu e a m esm a t eor ia é t ã o a plicá vel n os ca sos de desem pr ego
in volu n t á r io qu a n t o n o ca so de plen o em pr ego.

46
KEYN ES

equ iva len t e à su a pr odu t ivida de m a r gin a l, em decor r ên cia da legisla çã o,


dos cost u m es socia is, de u m en t en dim en t o pa r a con t r a t o colet ivo de
t r a ba lh o, ou , a in da , da len t idã o em a da pt a r -se à s m u da n ça s ou , sim -
plesm en t e, em con seqü ên cia da obst in a çã o h u m a n a . Toda via , est a s
du a s ca t egor ia s de em pr ego, “fr iccion a l” e “volu n t á r ia ”, sã o a br a n gen t es.
Os post u la dos clá ssicos n ã o a dm it em a possibilida de de u m a t er ceir a
ca t egor ia qu e pa ssa r ei a defin ir , m a is a dia n t e, com o o desem pr ego
“involuntário”.
Su jeit o a est a s r est r ições, o volu m e dos r ecu r sos em pr ega dos a ch a -
se, em con for m ida de com a t eor ia clá ssica , con ven ien t em en t e det er m i-
n a do pelos dois post u la dos. O pr im eir o dá -n os a cu r va de dem a n da
por em pr ego e o segu n do, a cu r va de ofer t a ; o volu m e do em pr ego é
fixa do pelo pon t o em qu e a u t ilida de do pr odu t o m a r gin a l igu a la a
desu t ilida de do em pr ego m a r gin a l.
Com o con seqü ên cia disso, h a ver ia a pen a s qu a t r o m eios possíveis
de a u m en t a r o em pr ego:

(a) m elh or ia da or ga n iza çã o ou da pr evisã o, de m a n eir a qu e


dim in u a o desem pr ego “fr iccion a l”;
(b) r edu çã o da desu t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o expr essa pelo
sa lá r io r ea l, pa r a o qu a l a in da exist e m ã o-de-obr a dispon ível, de
m odo qu e dim in u a o desem pr ego “volu n t á r io”;
(c) a u m en t o da pr odu t ivida de m a r gin a l física do t r a ba lh o n a s
in dú st r ia s pr odu t or a s de ben s de “con su m o de a ssa la r ia dos”31
(pa r a u sa r o t er m o a dequ a do, com o qu a l o pr of. P igou design a
os a r t igos de cu jos pr eços depen dem a u t ilida de dos sa lá r ios n o-
m in a is); ou
(d) aum ento em relação aos preços dos bens de consum o de não
assalariados 32 comparativamente aos das outras categorias de bens,
juntamente com o deslocam ento das despesas dos indivíduos não
assalariados dos bens salariais para os de outras categorias.

Ta l é, segu n do m eu m elh or en t en der , a su bst â n cia da obr a T h eory


of Un em ploym en t do pr of. P igou — o ú n ico r ela t o det a lh a do qu e exist e
da t eor ia clá ssica do em pr ego.33

II

Ser á ver da de qu e a s ca t egor ia s a n t er ior es a br a n gem t odo o pr o-


blem a , con sider a n do qu e, de m odo ger a l, a popu la çã o r a r a m en t e en -

31 Tr a du çã o m a is pr óxim a pa r a o t er m o w age-good s, qu e cor r espon de a os ben s e ser viços


bá sicos qu e com põem o con su m o t ípico de u m t r a ba lh a dor a ssa la r ia do. (N. do R. T.)
32 A obr a T h eory of Un em ploym en t do pr of. P igou é exa m in a da em m a ior es det a lh es n o Apên dice
a o ca p. 19, m a is a dia n t e.
33 Cf. a cit a çã o do P r of. P igou , p. 47, n ot a de r oda pé.

47
OS ECON OMIS TAS

con t r a t a n t o em pr ego qu a n t o deseja r ia a o sa lá r io cor r en t e? Deve-se,


pois, a dm it ir qu e, se fosse m a ior a pr ocu r a de m ã o-de-obr a , m a ior
qu a n t ida de de t r a ba lh o ser ia ofer ecida a o n ível do sa lá r io n om in a l
vigen t e.34 A escola clá ssica con cilia est e fen ôm en o com seu segu n do
post u la do, a r gu m en t a n do qu e, se a pr ocu r a de m ã o-de-obr a a o sa lá r io
n om in a l vigen t e se a ch a sa t isfeit a a n t es de est a r em em pr ega da s t oda s
a s pessoa s desejosa s de t r a ba lh a r em t r oca dele, isso se deve a u m
a cor do decla r a do ou t á cit o en t r e os oper á r ios de n ã o t r a ba lh a r em por
m en os, e qu e, se t odos eles a dm it issem u m a r edu çã o dos sa lá r ios n o-
m in a is, m a ior ser ia o volu m e de em pr ego a t en dido. Sen do est e o ca so,
tal desem prego, embora aparentemente involuntário, não o seria estrita-
mente falando, devendo incluir-se na categoria do desemprego “voluntário”,
em virtude dos efeitos dos contratos coletivos de trabalho etc.
Isso su scit a du a s obser va ções, a pr im eir a da s qu a is se r ela cion a
com o com por t a m en t o dos t r a ba lh a dor es em fa ce dos sa lá r ios r ea is e
dos sa lá r ios n om in a is, r espect iva m en t e, e n ã o é t eor ica m en t e fu n da -
m en t a l; a segu n da , por ém , o é.
Su pon h a m os, por en qu a n t o, qu e a m ã o-de-obr a n ã o est eja dis-
post a a t r a ba lh a r por u m sa lá r io n om in a l m en or e qu e u m a r edu çã o
desse n ível con du za , a t r a vés de gr eves ou por qu a lqu er ou t r o m eio, a
u m a sa ída do m er ca do de t r a ba lh o de u m a pa r t e da m ã o-de-obr a a t u a l-
m en t e em pr ega da . P ode-se, a pa r t ir disso, dedu zir qu e o n ível pr esen t e
dos sa lá r ios r ea is equ iva le exa t a m en t e à desu t ilida de m a r gin a l do t r a -
ba lh o? Nã o n ecessa r ia m en t e, pois, em bor a u m a r edu çã o do sa lá r io n o-
m in a l em vigor leve à sa ída de cer t a qu a n t ida de de m ã o-de-obr a , isso
n ã o qu er dizer qu e u m a r edu çã o do sa lá r io n om in a l m edido em t er m os
de ben s de con su m o de a ssa la r ia dos pr odu za o m esm o efeit o, ca so
r esu lt e de u m a a lt a de pr eços desses ben s. E m ou t r a s pa la vr a s, pode
a con t ecer qu e, den t r o de cer t os lim it es, a s exigên cia s da m ã o-de-obr a
t en da m a u m m ín im o de sa lá r io n om in a l e n ã o a u m m ín im o de sa lá r io
r ea l. A escola clá ssica pr esu m iu , t a cit a m en t e, qu e est e fa t o n ã o t r a r ia
u m a m u da n ça sign ifica t iva de su a t eor ia . Ma s isso n ã o é exa t o, pois,
se a ofer t a de t r a ba lh o n ã o for u m a fu n çã o dos sa lá r ios r ea is com o
su a ú n ica va r iá vel, seu a r gu m en t o desm or on a -se por com plet o, deixa n -
do t ot a lm en t e in det er m in a da a qu est ã o do qu e ser á o n ível efet ivo de
em pr ego.35 E st a m esm a escola clá ssica pa r ece n ã o t er con cebido qu e
su a cu r va de ofer t a de m ã o-de-obr a se desloca r á a ca da m ovim en t o
dos pr eços, a n ã o ser qu e t a l ofer t a seja fu n çã o exclu siva do sa lá r io
r ea l. Dia n t e disso, seu m ét odo en con t r a -se vin cu la do à s su a s h ipót eses

34 Ter m o a n á logo a o da n ot a a n t er ior , r epr esen t a n do a t r a du çã o m a is pr óxim a de n on -w age-


good s, qu e cor r espon de a os ben s e ser viços fin a is qu e com põem a cest a t ípica de con su m o
de u m in divídu o n ã o a ssa la r ia do. (N. do R. T.)
35 E st e pon t o ser á t r a t a do det a lh a da m en t e n o Apên dice a o ca p. 19, m a is a dia n t e.

48
KEYN ES

m u it o especia is e n ã o pode ser a da pt a do pa r a se fa zer u m a a n á lise do


ca so m a is ger a l.
Or a , a exper iên cia com u m en sin a -n os, sem a m en or som br a de
dú vida , qu e, em vez de m er a possibilida de, a sit u a çã o em qu e a m ã o-
de-obr a est ipu la (den t r o de cer t os lim it es) u m sa lá r io n om in a l, em vez
de u m sa lá r io r ea l, con st it u i o ca so n or m a l. Se bem qu e o t r a ba lh a dor
r esist a , n or m a lm en t e, a u m a r edu çã o do seu sa lá r io n om in a l, n ã o cos-
t u m a a ba n don a r o t r a ba lh o a o se ver ifica r u m a a lt a de pr eços dos
ben s de con su m o sa la r ia is. Cost u m a -se, à s vezes, dizer qu e ser ia ilógico,
por pa r t e do t r a ba lh a dor , r esist ir à dim in u içã o dos sa lá r ios n om in a is
e n ã o r esist ir à dos sa lá r ios r ea is. P or m ot ivos qu e m en cion a r em os
a dia n t e (p. 52), t a lvez isso n ã o seja t ã o ilógico com o pa r ece à pr im eir a
vist a e, con for m e ver em os m a is t a r de, é va n t a joso qu e a ssim o seja .
Toda via , lógica ou ilógica , a exper iên cia pr ova ser est e, de fa t o, o com -
por t a m en t o do t r a ba lh a dor .
Adem a is, o a r gu m en t o de qu e o desem pr ego qu e ca r a ct er iza u m
per íodo de depr essã o se deva à r ecu sa da m ã o-de-obr a em a ceit a r u m a
dim in u içã o dos sa lá r ios n om in a is n ã o est á cla r a m en t e r espa lda do pelos
fa t os. Nã o é m u it o pla u sível a fir m a r qu e o desem pr ego n os E st a dos
Un idos em 1932 t en h a r esu lt a do de u m a obst in a da r esist ên cia do t r a -
ba lh a dor em a ceit a r u m a dim in u içã o dos sa lá r ios n om in a is, ou de u m a
in sist ên cia obst in a da de con segu ir u m sa lá r io r ea l su per ior a o qu e
per m it ia a pr odu t ivida de do sist em a econ ôm ico. Am pla s sã o a s va r ia -
ções por qu e pa ssa o volu m e de em pr ego sem qu e h a ja m u da n ça a pa -
r en t e n os sa lá r ios r ea is m ín im os exigidos pelo t r a ba lh a dor ou em su a
pr odu t ivida de. O t r a ba lh a dor n ã o se m ost r a m a is in t r a n sigen t e n o pe-
r íodo de depr essã o qu e n o de expa n sã o, a n t es pelo con t r á r io. Ta m bém
n ã o é ver da de qu e a su a pr odu t ivida de física seja m en or . E st es fa t os,
em a n a dos da exper iên cia , con st it u em , prim a facie, o m ot ivo pa r a pôr
em dú vida a a dequ a çã o da a n á lise clá ssica .
Ser ia in t er essa n t e exa m in a r os r esu lt a dos de u m a a n á lise est a -
t íst ica sobr e a s ver da deir a s r ela ções en t r e a s m u da n ça s dos sa lá r ios
n om in a is e r ea is. No ca so de u m a va r ia çã o qu e a fet a a pen a s cer t o
gên er o de in dú st r ia , é de se esper a r qu e os sa lá r ios r ea is va r iem n o
m esm o sen t ido dos sa lá r ios n om in a is. Ma s n o ca so de va r ia ções n o
n ível de sa lá r ios, obser va r ía m os, ju lgo eu , qu e a va r ia çã o dos sa lá r ios
r ea is qu e a com pa n h a a dos sa lá r ios n om in a is, lon ge de se a pr esen t a r
n or m a lm en t e n o m esm o sen t ido, ocor r e qu a se sem pr e em sen t ido opos-
t o. Isso qu er dizer qu e, qu a n do os sa lá r ios n om in a is sobem , con st a t a -se
qu e os sa lá r ios r ea is ba ixa m , e qu a n do os sa lá r ios n om in a is ba ixa m ,
sã o os sa lá r ios r ea is qu e sobem . Isso se deve a o fa t o de qu e, em u m
cu r t o per íodo, a ba ixa dos sa lá r ios n om in a is e a eleva çã o dos sa lá r ios
r ea is con st it u em , por m ot ivos difer en t es, fen ôm en os liga dos à dim in u i-
çã o do em pr ego, pois, em bor a o t r a ba lh a dor se m ost r e m a is dispost o
a a ceit a r r edu ções de sa lá r io qu a n do o em pr ego declin a , os sa lá r ios

49
OS ECON OMIS TAS

r ea is t en dem , in evit a velm en t e, a cr escer n a s m esm a s cir cu n st â n cia s,


em vir t u de do m a ior r et or n o m a r gin a l de det er m in a do est oqu e de ca -
pit a l qu a n do a pr odu çã o dim in u i.
Se, efet iva m en t e, for exa t o qu e o sa lá r io r ea l vigen t e est eja u m
pou co a ba ixo do qu a l em n en h u m a cir cu n st â n cia se con t a r ia com m a is
m ã o-de-obr a do qu e a a t u a lm en t e em pr ega da , n en h u m ou t r o desem -
pr ego in volu n t á r io exist ir ia a lém do “fr iccion a l”. No en t a n t o, ser ia a b-
su r do im a gin a r qu e seja sem pr e a ssim , pois u m a qu a n t ida de de m ã o-
de-obr a su per ior à a t u a lm en t e em pr ega da en con t r a -se, n or m a lm en t e,
dispon ível a o sa lá r io n om in a l vigen t e, m esm o qu a n do se ver ifica u m a
a lt a n o pr eço dos ben s de con su m o de a ssa la r ia dos e, con seqü en t em en t e,
decr esce o sa lá r io r ea l. Sen do isso ver da deir o, os ben s de con su m o de
a ssa la r ia dos equ iva len t es a o sa lá r io n om in a l vigen t e n ã o r epr esen t a m
a ver da deir a m edida da desu t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o e o segu n do
post u la do deixa de t er va lidez.
E xist e, n o en t a n t o, u m a objeçã o a in da m a is fu n da m en t a l. O se-
gu n do post u la do decor r e da idéia de qu e os sa lá r ios r ea is depen dem
da s n egocia ções sa la r ia is en t r e t r a ba lh a dor es e em pr esá r ios. Adm it e-se,
por cer t o, qu e essa s n egocia ções se r ea liza m , efet iva m en t e, em t er m os
m on et á r ios, e t a m bém qu e os sa lá r ios r ea is con sider a dos a ceit á veis
pelos t r a ba lh a dor es n ã o sã o, de cer t o m odo, in depen den t es do n ível
de sa lá r io n om in a l cor r espon den t e. Nã o obst a n t e, é a est e sa lá r io n o-
m in a l a ssim fixa do qu e se r ecor r e pa r a det er m in a r o sa lá r io r ea l. A
pa r t ir disso, a t eor ia clá ssica con sider a ser sem pr e possível à m ã o-de-
obr a r edu zir seu sa lá r io r ea l, a ceit a n do u m a dim in u içã o do seu sa lá r io
n om in a l. O post u la do de qu e o sa lá r io r ea l t en de a igu a la r -se à desu -
t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o pr esu m e, cla r a m en t e, qu e a pr ópr ia m ã o-
de-obr a est eja em con dições de fixa r o seu sa lá r io r ea l, em bor a o m esm o
n ã o a con t eça com o volu m e de em pr ego ofer ecido em t r oca .
A t eor ia t r a dicion a l su st en t a , em essên cia , qu e as n egociações
salariais en tre trabalh ad ores e em presários d eterm in am o salário real,
de t a l m odo qu e, su pon do qu e h a ja livr e-con cor r ên cia en t r e os em pr e-
ga dor es e a a u sên cia de com bin a çã o r est r it iva en t r e os t r a ba lh a dor es,
os ú lt im os poder ia m , se deseja ssem , fa zer coin cidir os seu s sa lá r ios
r ea is com a desu t ilida de m a r gin a l do volu m e de em pr ego ofer ecido
pelos em pr ega dor es a o dit o sa lá r io. Nã o sen do a ssim , desa pa r ece qu a l-
qu er r a zã o pa r a se esper a r u m a t en dên cia à igu a lda de en t r e o sa lá r io
r ea l e a desu t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o.
É n ecessá r io t er em m en t e qu e a s con clu sões clá ssica s pr et en -
dem -se a plicá veis à m ã o-de-obr a em seu con ju n t o e n ã o sign ifica m ,
m er a m en t e, qu e u m in divídu o isola do possa a ch a r t r a ba lh o a ceit a n do
u m a r edu çã o n o sa lá r io n om in a l qu e seu s com pa n h eir os r ecu sa m . Su -
põem -se, igu a lm en t e, a plicá veis t a n t o a u m sist em a fech a do qu a n t o a
u m sist em a a ber t o, e n ã o depen dem da s ca r a ct er íst ica s pr ópr ia s de
u m sist em a a ber t o n em dos efeit os qu e u m a r edu çã o dos sa lá r ios n o-

50
KEYN ES

m in a is em u m ú n ico pa ís exer ce sobr e seu com ér cio ext er ior , efeit os


est es qu e est ã o com plet a m en t e for a do escopo do pr esen t e r a ciocín io.
Nã o se pr en dem , t a m pou co, a os efeit os in dir et os, qu e u m a r edu çã o da
folh a de pa ga m en t os em t er m os m on et á r ios exer ce sobr e o sist em a
ba n cá r io e a s con dições de cr édit o, cu jos efeit os exa m in a r em os det a -
lh a da m en t e n o ca pít u lo 19. E ssa s con clu sões ba seia m -se n a cr en ça de
qu e, em u m sist em a fech a do, a r edu çã o do n ível ger a l dos sa lá r ios
n om in a is é n ecessa r ia m en t e a com pa n h a da , pelo m en os em cu r t os pe-
r íodos e a pen a s su jeit a a a lgu m a s r est r ições secu n dá r ia s, por cer t a
r edu çã o dos sa lá r ios r ea is, em bor a n em sem pr e pr opor cion a l.
Or a , a h ipót ese de qu e o n ível ger a l dos sa lá r ios r ea is depen de
da s n egocia ções en t r e os em pr ega dor es e os t r a ba lh a dor es n ã o é, ob-
via m en t e, vá lida . Na ver da de é de se a dm ir a r qu e pou cos esfor ços t êm
sido feit os n o sen t ido de com pr ova r ou de r efu t a r est a h ipót ese, pois
est á lon ge de ser con sist en t e com o con t eú do ger a l da t eor ia clá ssica ,
qu e n os en sin ou qu e os pr eços sã o det er m in a dos pelo cu st o m a r gin a l
expr esso em t er m os n om in a is e qu e os sa lá r ios n om in a is gover n a m ,
em gr a n de pa r t e, o cu st o m a r gin a l. Assim sen do, se h ou vesse va r ia ções
n os sa lá r ios n om in a is, ser ia de esper a r qu e a escola clá ssica su st en t a sse
qu e os pr eços va r ia ssem em pr opor çã o qu a se igu a l, de t a l m odo qu e
o sa lá r io r ea l e o n ível de desem pr ego per m a n ecessem pr a t ica m en t e
os m esm os e, com o con seqü ên cia , qu a isqu er ga n h os ou per da s, por
m en or es qu e seja m , pa r a a m ã o-de-obr a , ocor r em à cu st a ou em pr oveit o
de ou t r os elem en t os do cu st o m a r gin a l qu e per m a n eceu in a lt er a do.36
P a r ece, en t r et a n t o, qu e h ou ve u m desvio desse pon t o de vist a , em
pa r t e por ca u sa da fir m e con vicçã o de qu e o t r a ba lh a dor est á em con -
dições de fixa r o seu pr ópr io sa lá r io r ea l e, em pa r t e, t a lvez, pela
pr eocu pa çã o de qu e os pr eços depen dem da qu a n t ida de da m oeda . Ao
a dm it ir qu e o t r a ba lh a dor est á sem pr e em con dições de fixa r o seu
pr ópr io sa lá r io r ea l, est a cr en ça con t in u ou a ser su st en t a da pela con -
fu sã o com o pr in cípio segu n do o qu a l a m ã o-de-obr a se a ch a sem pr e
em con dições de det er m in a r o sa lá r io r ea l cor r espon den t e a o plen o
em pr ego, ist o é, a o volu m e m áxim o de em pr ego com pa t ível com det er -
m in a do sa lá r io r ea l.
E m r esu m o, leva n t a m -se du a s objeções con t r a o segu n do post u -
la do da t eor ia clá ssica . A pr im eir a r efer e-se a o com por t a m en t o efet ivo
do t r a ba lh a dor . Um a r edu çã o dos sa lá r ios r ea is, devida a u m a a lt a de
pr eços, n ã o a com pa n h a da da eleva çã o dos sa lá r ios n om in a is, n ã o de-
t er m in a , por via de r egr a , u m a dim in u içã o da ofer t a de m ã o-de-obr a
dispon ível à ba se do sa lá r io cor r en t e, a ba ixo do volu m e de em pr ego
a n t er ior à a lt a dos pr eços. Su por o con t r á r io ser ia a dm it ir qu e a s pes-

36 No m eu en t en der , est e r a ciocín io de fa t o con t ém gr a n de dose de ver da de, em bor a os r esu l-


t a dos com plet os e u m a a lt er a çã o n os sa lá r ios n om in a is seja m m en os sim ples, com o ver em os
n o ca p. 19, m a is a dia n t e.

51
OS ECON OMIS TAS

soa s n o m om en t o desem pr ega da s, em bor a desejosa s de t r a ba lh a r a o


sa lá r io cor r en t e, deixa r ia m de ofer ecer os seu s ser viços n o ca so de u m a
pequ en a eleva çã o do cu st o de vida . Mesm o a ssim , é n est a cu r iosa su -
posiçã o qu e pa r ece ba sea r -se a obr a T h eory of Un em ploym en t do pr o-
fessor P igou 37 e é ela qu e, t a cit a m en t e, a dm it em t odos os pa r t idá r ios
da escola or t odoxa .
Con t u do, a ou t r a objeçã o, de fu n da m en t a l im por t â n cia , qu e for -
m u la r em os n os ca pít u los segu in t es, decor r e de n ossa con t est a çã o da
h ipót ese de qu e o n ível ger a l dos sa lá r ios r ea is seja dir et a m en t e de-
t er m in a do pelo ca r á t er da s n egocia ções sobr e sa lá r ios. Ao su por qu e
a s n egocia ções sobr e sa lá r ios det er m in a m o sa lá r io r ea l, a escola clá s-
sica desca m bou pa r a u m a h ipót ese a r bit r á r ia , pois os t r a ba lh a dor es,
em con ju n t o, n ão dispõem de n en h u m m eio de fa zer coin cidir o equ i-
va len t e do n ível ger a l de sa lá r ios n om in a is expr esso em ben s de con -
su m o com a desu t ilida de m a r gin a l do volu m e de em pr ego exist en t e.
P r ova velm en t e n ã o exist e n en h u m expedien t e por m eio do qu a l a m ã o-
de-obr a , em con ju n t o, possa r edu zir os seu s sa lá r ios reais a u m a cifr a
det er m in a da , r evisa n do a s clá u su la s m on et á r ia s dos a cor dos celebr a dos
com os em pr ega dor es. E st a ser á a n ossa a r gu m en t a çã o. E sfor ça r -n os-
em os pa r a dem on st r a r qu e o pa pel pr in cipa l n a det er m in a çã o do n ível
ger a l dos sa lá r ios r ea is é desem pen h a do por diver sos ou t r os fa t or es.
Um dos n ossos t em a s pr in cipa is ser á a elu cida çã o desse pr oblem a .
Su st en t a r em os t er h a vido n essa m a t ér ia u m m a l-en t en dido fu n da m en -
t a l n o t oca n t e à s r egr a s qu e det er m in a m o r ea l fu n cion a m en t o da eco-
n om ia em qu e vivem os.

III

E m bor a se ju lgu e, fr eqü en t em en t e, qu e a lu t a en t r e in divídu os


e gr u pos pelos sa lá r ios n om in a is det er m in a o n ível dos sa lá r ios r ea is,
n a r ea lida de essa lu t a t em u m objet ivo difer en t e. Um a vez qu e a m o-
bilida de do t r a ba lh o é im per feit a e os sa lá r ios n ã o t en dem a est a belecer
u m a exa t a igu a lda de de va n t a gen s líqu ida s pa r a a s difer en t es ocu pa -
ções, qu a lqu er in divídu o ou gr u po de in divídu os qu e con sin t a n u m a
r edu çã o dos seu s sa lá r ios n om in a is em r ela çã o a ou t r os sofr e u m a
r edu çã o relativa do sa lá r io r ea l, o qu e é su ficien t e pa r a ju st ifica r a
su a r esist ên cia . P or ou t r o la do, ser ia im pr a t icá vel opor -se a qu a lqu er
r edu çã o dos sa lá r ios r ea is qu e r esu lt a sse de a lt er a çã o n o poder a qu i-
sit ivo do din h eir o e qu e a fet a sse igu a lm en t e a t odos os t r a ba lh a dor es;
com efeit o, n ã o h á , em ger a l, r esist ên cia a est e m odo de r edu zir os
sa lá r ios n om in a is, a n ã o ser qu e ist o ven h a a t in gir n íveis excessivos.
Além do m a is, a oposiçã o à s r edu ções n os sa lá r ios n om in a is a plica da s
a cer t a s in dú st r ia s n ã o er gu e a m esm a ba r r eir a in su per á vel a o a u m en t o

37 Cf. ca p. 19, Apên dice.

52
KEYN ES

do em pr ego a gr ega do qu e r esu lt a r ia de u m a r esist ên cia a n á loga a t oda


e qu a lqu er r edu çã o dos sa lá r ios r ea is.
E m ou t r a s pa la vr a s, a com pet içã o em t or n o dos sa lá r ios n om in a is
in flu i, pr im or dia lm en t e, sobr e a d istribu ição do sa lá r io r ea l a gr ega do
en t r e os difer en t es gr u pos de t r a ba lh a dor es e n ã o sobr e o m on t a n t e
m édio por u n ida de de em pr ego, o qu a l depen de, com o ver em os, de
ou t r a sér ie de fa t or es. A con seqü ên cia da u n iã o de u m gr u po de t r a -
ba lh a dor es é a pr ot eçã o de seu sa lá r io r ea l relativo. O n ível geral dos
sa lá r ios r ea is depen de de ou t r a s for ça s do sist em a econ ôm ico.
É , pois, u m a cir cu n st â n cia fa vor á vel os t r a ba lh a dor es m ost r a -
r em -se por in st in t o, em bor a sem se a per ceber em disso, econ om ist a s
m a is r a zoá veis do qu e a escola clá ssica , pelo fa t o de r esist ir em à s
r edu ções dos sa lá r ios n om in a is qu e r a r a m en t e ou n u n ca a ssu m em ca -
r á t er ger a l, m esm o qu e o equ iva len t e r ea l dest es sa lá r ios exceda a
desu t ilida de m a r gin a l do em pr ego exist en t e; isso en qu a n t o n ã o se opõ-
em à s r edu ções do sa lá r io r ea l qu e a com pa n h a m os a u m en t os do em -
pr ego a gr ega do e deixa m in a lt er a dos os sa lá r ios n om in a is r ela t ivos, a
n ã o ser qu e essa s r edu ções a t in ja m t a l pr opor çã o qu e o sa lá r io r ea l
cor r a o r isco de ca ir a ba ixo da desu t ilida de m a r gin a l do volu m e de
em pr ego exist en t e. Todos os sin dica t os ofer ecer ã o a lgu m a r esist ên cia ,
por m en or qu e seja , a u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is. Ma s, con -
sider a n do-se qu e os sin dica t os n ã o ou sa r ia m en t r a r em gr eve t oda vez
qu e h ou vesse u m a u m en t o de cu st o de vida , eles n ã o r epr esen t a m
obst á cu lo, com o pr et en de a escola clá ssica , a u m a u m en t o do volu m e
a gr ega do de em pr ego.
IV
P r ecisa m os a gor a defin ir a t er ceir a ca t egor ia de desem pr ego, ou
seja , o desem pr ego “in volu n t á r io” n o sen t ido est r it o da pa la vr a , cu ja
possibilida de a t eor ia clá ssica n ã o a dm it e.
É cla r o qu e por desem pr ego “in volu n t á r io” n ã o qu er em os sign i-
fica r a m er a exist ên cia de u m a ca pa cida de de t r a ba lh o pa r cia lm en t e
u t iliza da . Um a jor n a da de oit o h or a s n ã o con st it u i desem pr ego sim -
plesm en t e por qu e n ã o est á a lém da ca pa cida de h u m a n a de t r a ba lh a r
dez h or a s. Nem devem os con sider a r desem pr ego “in volu n t á r io” o a ba n -
don o do t r a ba lh o por u m gr u po de t r a ba lh a dor es qu e pr efer isse n ã o
t r a ba lh a r a ba ixo de cer t a r em u n er a çã o r ea l. Além disso, con vém exclu ir
da n ossa defin içã o de desem pr ego “in volu n t á r io” o desem pr ego “fr ic-
cion a l”. E st a defin içã o ser á , por t a n t o, a segu in t e: E xistem d esem pre-
gad os in volu n tários qu an d o, n o caso d e u m a ligeira elevação d os preços
d os ben s d e con su m o d e assalariad os relativam en te aos salários n om i-
n ais, tan to a oferta agregad a d e m ão-d e-obra d isposta a trabalh ar pelo
salário n om in al corren te qu an to a procu ra agregad a d a m esm a ao d ito
salário são m aiores qu e o volu m e d e em prego existen te. No ca pít u lo
segu in t e (p. 60 et seq.) da r em os ou t r a defin içã o qu e, n a r ea lida de, cor -
r espon de a est a .

53
OS ECON OMIS TAS

Resu lt a dessa defin içã o qu e a igu a lda de en t r e o sa lá r io r ea l e a


desu t ilida de m a r gin a l do em pr ego, pr esu m ida pelo segu n do post u la do,
cor r espon de, qu a n do in t er pr et a da de m a n eir a r ea list a , à a u sên cia de
desem pr ego “in volu n t á r io”. Descr ever em os est e est a do de coisa s den o-
m in a n do-o “plen o” em pr ego, en globa n do t a n t o o desem pr ego “fr iccion a l”
qu a n t o o “volu n t á r io” den t r o do con ceit o de “plen o” em pr ego, em u m a
ú n ica defin içã o. Ist o coin cide, com o ver ifica r em os, com ou t r a s ca r a ct e-
r íst ica s da t eor ia clá ssica , qu e dever ia ser logica m en t e con sider a da
u m a t eor ia da dist r ibu içã o em con dições de plen o em pr ego. À m edida
qu e os post u la dos clá ssicos per m a n ecem vá lidos, o desem pr ego, qu e é
in volu n t á r io n o sen t ido a n t er ior , n ã o poder á ocor r er . O desem pr ego
a pa r en t e deve, con seqü en t em en t e, ser o r esu lt a do de u m a per da t em -
por á r ia de t r a ba lh o do t ipo de “t r a n siçã o en t r e em pr egos”, de ca r á t er
in t er m it en t e da pr ocu r a de r ecu r sos a lt a m en t e especia liza dos, ou de
u m a polít ica dos sin dica t os n o sen t ido de im pedir o em pr ego de m ã o-
de-obr a n ã o sin dica liza da . P or isso, os a u t or es qu e segu em a t r a diçã o
clá ssica , ign or a n do a h ipót ese especia l em qu e se ba sea va a su a t eor ia ,
for a m leva dos à con clu sã o in evit á vel e per feit a m en t e lógica , de a cor do
com essa h ipót ese, de qu e o desem pr ego a pa r en t e (sa lvo a s exceções
a dm it ida s) er a fu n da m en t a lm en t e devido à r ecu sa dos fa t or es n ã o em -
pr ega dos em a ceit a r u m a r em u n er a çã o cor r espon den t e à su a pr odu t i-
vida de m a r gin a l. Um econ om ist a clá ssico pode sim pa t iza r com a m ã o-
de-obr a qu a n do est a se n ega a a ceit a r u m a r edu çã o do seu sa lá r io
n om in a l, e a dm it ir á qu e, t a lvez, n ã o seja pr u den t e obr igá -la a su jei-
t a r -se a con dições t r a n sit ór ia s; m a s a pr obida de cien t ífica for ça -o a
decla r a r qu e est a n ega t iva n em por isso deixa de ser a ca u sa fu n da -
m en t a l da s dificu lda des.
Con t u do, se a t eor ia clá ssica é a pen a s a plicá vel a o ca so do plen o
em pr ego, t or n a -se obvia m en t e en ga n oso a plicá -la a os pr oblem a s de de-
sem pr ego in volu n t á r io — su pon do-se qu e t a l coisa exist a (e qu em o
n ega r á ?). Os t eór icos da escola clá ssica sã o com pa r á veis a os geôm et r a s
eu clidia n os em u m m u n do n ã o eu clidia n o, os qu a is, descobr in do qu e,
n a r ea lida de, a s lin h a s a pa r en t em en t e pa r a lela s se en con t r a m com
m u it a fr eqü ên cia , a s cr it ica m por n ã o se con ser va r em r et a s, com o ú n ico
r ecu r so con t r a a s desa st r osa s in t er seções qu e se pr odu zem . Sen do est a
a r ea lida de, n ã o h á , de fa t o, n en h u m a ou t r a solu çã o a n ã o ser r ejeit a r
o a xiom a da s pa r a lela s e ela bor a r u m a geom et r ia n ã o eu clidia n a . A
ciên cia econ ôm ica r ecla m a h oje u m a m edida desse gên er o. P r ecisa m os
desem ba r a ça r -n os do segu n do post u la do da dou t r in a clá ssica e ela bor a r
u m sist em a econ ôm ico em qu e o desem pr ego in volu n t á r io seja possível
n o seu sen t ido m a is est r it o.
V

Ao en fa t iza r os a spect os qu e os sepa r a m da dou t r in a clá ssica ,


n ã o devem os esqu ecer u m a con cor dâ n cia im por t a n t e. Ma n t er em os, pois,

54
KEYN ES

o pr im eir o post u la do com o a t é a qu i, a pen a s su jeit o à s m esm a s r est r ições


da t eor ia clá ssica , e con vém fa zer u m a pa u sa , por u m in st a n t e, a fim
de exa m in a r -lh e a s con seqü ên cia s.
Sign ifica est e post u la do qu e, em cer t o est a do de or ga n iza çã o,
equ ipa m en t o e t écn ica , os sa lá r ios r ea is e o volu m e de pr odu çã o (e,
por t a n t o, do em pr ego) sã o cor r ela cion a dos de u m a ú n ica for m a , de t a l
m odo qu e, em t er m os ger a is, u m a u m en t o do em pr ego só pode ocor r er
sim u lt a n ea m en t e com u m decr éscim o da t a xa de sa lá r ios r ea is. Com
isso, n ã o est ou con t est a n do est e fa t o fu n da m en t a l qu e os econ om ist a s
clá ssicos (cor r et a m en t e) decla r a r a m in a t a cá vel. E m cer t o est a do de
or ga n iza çã o, equ ipa m en t o e t écn ica , em ca da n ível de sa lá r io r ea l ga n h o
por u m a u n ida de de t r a ba lh o h á u m a ú n ica cor r ela çã o (in ver sa ) com
o volu m e de em pr ego. P or t a n t o, se o em pr ego a u m en t a , isso qu er dizer
qu e em per íodos cu r t os a r em u n er a çã o por u n ida de de t r a ba lh o, ex-
pr essa em ben s de con su m o dos a ssa la r ia dos, deve, em ger a l, dim in u ir
e os lu cr os devem a u m en t a r .38 E st e é, sim plesm en t e, o r ever so da pr o-
posiçã o, já ba st a n t e con h ecida , segu n do a qu a l a in dú st r ia t r a ba lh a
n or m a lm en t e su jeit a a r en dim en t os decr escen t es a cu r t o pr a zo, du r a n t e
o qu a l se su põe qu e per m a n eça m con st a n t es o equ ipa m en t o et c., dessa
for m a , o pr odu t o m a r gin a l da s in dú st r ia s de ben s de con su m o dos
a ssa la r ia dos (o qu a l det er m in a os sa lá r ios r ea is) n ecessa r ia m en t e se
r edu z à m edida qu e o em pr ego a u m en t a . P or t a n t o, n a m edida em qu e
se con sider a r vá lida est a pr oposiçã o, qu alqu er m eio dest in a do a a u -
m en t a r o em pr ego con du zir á , in evit a velm en t e, a u m a dim in u içã o pa -
r a lela do pr odu t o m a r gin a l e, por t a n t o, do n ível dos sa lá r ios m edido
em t er m os desse pr odu t o.
Um a vez a fa st a do o segu n do post u la do, por ém , u m declín io do
em pr ego, em bor a n ecessa r ia m en t e a ssocia do a o fa t o de qu e o t r a ba lh o
receba u m sa lá r io equ iva len t e a u m a qu a n t ida de m a ior de ben s de
con su m o, n ã o se deve, n ecessa r ia m en t e, a o fa t o de qu e a m ã o-de-obr a
reclam e u m a qu a n t ida de m a ior desses ben s; e a a ceit a çã o, pela m ã o-
de-obr a , de m en or es sa lá r ios n om in a is n ã o é, n ecessa r ia m en t e, u m
r em édio pa r a o desem pr ego. A t eor ia dos sa lá r ios em su a r ela çã o com
o em pr ego, à qu a l est a m os sen do con du zidos pelo r a ciocín io a qu i ex-

38 O r a ciocín io con figu r a -se da segu in t e m a n eir a : n h om en s en con t r a m -se em pr ega dos, o en é-
sim o a cr escen t a u m bu sh el * diá r io à colh eit a e os sa lá r ios t êm o poder a qu isit ivo de u m
bu sh el por dia . O n + 1 ésim o h om em , en t r et a n t o, a pen a s a cr escen t a r ia 0,9 bu sh el por dia
e o em pr ego n ã o pode, por t a n t o, su bir a n + 1 h om en s, a n ã o ser qu e o pr eço do t r igo su ba
em r ela çã o a os sa lá r ios a t é qu e o poder a qu isit ivo dos sa lá r ios seja de 0,9 bu sh el. Os
sa lá r ios a gr ega dos ser ia m en t ã o de 9/10 (n + 1) bu sh el, qu a n do a n t er ior m en t e er a m de n
bu sh el. Dest a r t e, o em pr ego de u m h om em su plem en t a r , n o ca so de ocor r er , im plica u m a
t r a n sfer ên cia de r ecu r sos dos qu e a n t es est a va m em pr ega dos pa r a os em pr ega dor es.
*
No or igin a l em in glês a pa r ece o t er m o bu sh el, u m a m edida de volu m e sem t r a du çã o pa r a
o por t u gu ês, cor r espon den t e a 0,036 m 3 n a In gla t er r a , ou 35,238 lit r os n os E UA. P or fide-
lida de a o t ext o é m a n t ido o t er m o or igin a l. Com o se t r a t a de u m exem plo h ipot ét ico, n ã o
h á m a ior es pr oblem a s decor r en t es da con ser va çã o dest a m edida . (N. do R. T.)

55
OS ECON OMIS TAS

post o, n ã o pode ser com plet a m en t e elu cida da a n t es de ch ega r m os a o


ca pít u lo 19 e a seu Apên dice.
VI

Desde o t em po de Sa y e de Rica r do os econ om ist a s clá ssicos t êm


en sin a do qu e a ofer t a cr ia su a pr ópr ia pr ocu r a ; ist o sign ifica de m odo
expr essivo, m a s n ã o cla r a m en t e defin ido, qu e o t ot a l dos cu st os de
pr odu çã o deve ser ga st o por com plet o, dir et a ou in dir et a m en t e, n a
com pr a do pr odu t o.
Na obr a Prin ciples of Political E con om y de J . S. Mill, est a dou t r in a
est á expr essa m en t e expost a :
“O qu e con st it u i os m eios de pa ga m en t o da s m er ca dor ia s sã o
a s pr ópr ia s m er ca dor ia s. Os m eios de qu e ca da in divídu o dispõe
pa r a pa ga r a pr odu çã o a lh eia sã o os pr odu t os qu e ele m esm o
possu i. Todos os ven dedor es sã o, n o pr ópr io sen t ido da pa la vr a ,
com pr a dor es. Se pu déssem os du plica r r epen t in a m en t e a s for ça s
pr odu t or a s de u m pa ís, poder ía m os du plica r a ofer t a de m er ca -
dor ia s em t odos os m er ca dos, m a s a o m esm o t em po du plica r ía m os
o poder a qu isit ivo. Todo o m u n do du plica r ia sim u lt a n ea m en t e a
pr ocu r a e a ofer t a ; t odos poder ia m com pr a r o dobr o, pois t er ia m
du a s vezes m a is pa r a ofer ecer em t r oca ”.39
Com o cor olá r io dest a m esm a dou t r in a , ju lgou -se qu e qu a lqu er
a t o in dividu a l de a bst en çã o de con su m ir n ecessa r ia m en t e leva e equ i-
va le a u m in vest im en t o n a pr odu çã o de r iqu eza sob a for m a de ca pit a l,
r esu lt a n t e do t r a ba lh o e da s m er ca dor ia s a ssim liber a da s da n ecessi-
da de de con su m o. A segu in t e pa ssa gem da obr a Pu re T h eory of Dom estic
Valu es 40 de Ma r sh a ll ilu st r a o pon t o de vist a t r a dicion a l:
“A r en da t ot a l d e ca da pessoa é in t eir a m en t e ga st a n a com -
pr a de m er ca dor ia s e ser viços. Diz-se, m esm o, qu e u m h om em
ga st a u m a pa r t e de su a r en da e econ om iza a ou t r a . P or ém é
u m a xiom a econ ôm ico m u it o con h ecido qu e u m h om em com pr a
t r a ba lh o e m er ca dor ia s com a pa r t e da r en da pou p a da , do m es-
m o m odo qu e com a p a r t e desp en did a . Qu a n do a lgu ém p r ocu r a
obt er u m a sa t isfa çã o im edia t a por m eio dos ser viços e m er ca -
dor ia s qu e com pr a , d iz-se qu e ga st a . Qu a n d o fa z com qu e o
t r a ba lh o e a s m er ca d or ia s qu e com pr a con t r ibu a m pa r a a pr o-
du çã o de r iqu eza da qu a l esp er a t ir a r m eios de sa t isfa çã o n o
fu t u r o, diz-se qu e pou p a ”.
É ver da de qu e dificilm en t e se poder ia m cit a r pa ssa gen s sem e-

39 Prin ciples of Political E con om y. Livr o Ter ceir o, ca p. XIV, § 2.


40 P . 34.

56
KEYN ES

lh a n t es n a s obr a s post er ior es de Ma r sh a ll,41 e n a s de E dgewor t h ou


do pr ofessor P igou . A dou t r in a n ã o é h oje expost a de for m a t ã o r u di-
m en t a r . Ma s n em por isso deixa de ser a ba se sobr e a qu a l se a ssen t a
t oda a t eor ia clá ssica , qu e sem ela desm or on a r ia . E con om ist a s con -
t em por â n eos, qu e h esit a r ia m em a ceit a r a dou t r in a de Mill, a ceit a m
sem va cila çã o a s con clu sões qu e r equ er em essa dou t r in a com o pr em issa .
A con vicçã o qu e per m eia , por exem plo, em qu a se t oda a obr a do pr o-
fessor P igou de qu e a m oeda n ã o fa z, r ea lm en t e, gr a n de difer en ça ,
excet o de for m a fr iccion a l, e de qu e a t eor ia da pr odu çã o e do em pr ego
pode ser ela bor a da (com o a de Mill) sobr e u m a ba se de t r oca s “r ea is”,
e com a m oeda in t r odu zida su per ficia lm en t e n u m ca pít u lo post er ior .
O pen sa m en t o con t em por â n eo est á a in da for t em en t e im pr egn a do da
n oçã o de qu e, se o din h eir o n ã o for ga st o de u m a for m a , o ser á de
ou t r a .42 Na ver da de, os econ om ist a s do pós-gu er r a n em sem pr e logr a -
r a m su st en t a r est e pon t o de vist a de m a n eir a con sisten te, pois su a s
idéia s a t u a is a ch a m -se dem a sia da m en t e in flu en cia da s pela t en dên cia
con t r á r ia e por fa t os da exper iên cia em fla gr a n t e desa cor do com su a
con cepçã o a n t er ior .43 Toda via , n ã o for a m ext r a ída s dessa sit u a çã o con -
seqü ên cia s de lon go a lca n ce, n em h ou ve u m a r evisã o de su a t eor ia
fu n da m en t a l.
E m pr im eir o lu ga r , est a s con clu sões podem t er -se a plica do a o
t ipo de econ om ia em qu e r ea lm en t e vivem os por fa lsa a n a logia com
a lgu m t ipo de econ om ia sem t r oca s, com o a de Robin son Cr u soé, n a
qu a l a r en da qu e os in divídu os con som em ou pou pa m com o r esu lt a do
de su a a t ivida de pr odu t iva é r ea l e exclu siva m en t e con st it u ída pela
pr odu çã o in specie dessa a t ivida de. P or ém , for a disso, a con clu sã o de
qu e os cu stos de pr odu çã o sã o sem pr e globa lm en t e cober t os pelo pr odu t o
da s ven da s r esu lt a n t es da pr ocu r a é ba st a n t e pla u sível, por qu e é difícil
dist in gu ir est a pr oposiçã o de ou t r a a n á loga e in con t est a velm en t e ver -
da deir a , ou seja , a de qu e a r en da obt ida globa lm en t e por t odos os

41 J . A. H obson , depois de cit a r o pa r á gr a fo a n t er ior de Mill, em su a obr a Ph ysiology of


In d u stry (p. 102), a ssin a la qu e Ma r sh a ll fez o segu in t e com en t á r io em u m a de su a s pr im eir a s
obr a s, E con om ics of In d u stry, p. 154: “Con t u do, em bor a os h om en s t en h a m o poder de
com pr a r , podem pr efer ir n ã o se u t iliza r em dele”. “Ma s”, a cr escen t a H obson , “ele n ã o pa r ece
t er per cebido a im por t â n cia ca pit a l dest e fa t o e dá a im pr essã o de lim it a r -lh e a s con se-
qü ên cia s a os per íodos de ‘cr ise’.” E st e com en t á r io é vá lido, ju lgo eu , à lu z dos t r a ba lh os
post er ior es de Ma r sh a ll.
42 Cf. MARSH ALL, Alfr ed e Ma r y. E con om ics of In d u stry. p. 17: “Nã o é con ven ien t e pa r a a
in dú st r ia qu e exist a m r ou pa s feit a s com t ecido qu e se ga st a depr essa , pois, se a s pessoa s
n ã o ga st a ssem seu s r ecu r sos n a com pr a de r ou pa s n ova s, ir ia m ga st á -los em coisa s qu e
pr opor cion a r ia m t r a ba lh o de a lgu m a ou t r a m a n eir a ”. O leit or h á de n ot a r qu e est ou cit a n do
os pr im eir os t r a ba lh os de Ma r sh a ll. O Ma r sh a ll da obr a Prin ciples t or n ou -se ba st a n t e cét ico
pa r a ser ca u t eloso e eva sivo. Ma s a s a n t iga s idéia s n u n ca for a m r epu dia da s n em ext ir pa da s
da s h ipót eses fu n da m en t a is de su a t eor ia .
43 O pr of. Robbin s dist in gu e-se por ser qu a se o ú n ico qu e con t in u a a defen der u m a lin h a
con sist en t e de pen sa m en t o; su a s r ecom en da ções pr á t ica s per t en cem a o m esm o sist em a de
su a t eor ia .

57
OS ECON OMIS TAS

elem en t os da com u n ida de, qu e pa r t icipa m de u m a a t ivida de pr odu t iva ,


t em n ecessa r ia m en t e u m va lor exa t a m en t e igu a l a o valor da pr odu çã o.
Do m esm o m odo, é n a t u r a l su por qu e o a t o pelo qu a l u m in divídu o
en r iqu ece, sem a pa r en t em en t e t ir a r n a da de ou t r o, deve t a m bém en -
r iqu ecer a com u n ida de in t eir a ; em con seqü ên cia disso (com o n a pa s-
sa gem de Ma r sh a ll qu e a ca ba m os de cit a r ), u m a t o de pou pa n ça in -
dividu a l con du z in evit a velm en t e a u m a t o pa r a lelo de in vest im en t o,
pois, m a is u m a vez, é in con t est á vel qu e a som a dos in cr em en t os líqu idos
da r iqu eza dos in divídu os deve ser exa t a m en t e igu a l a o in cr em en t o
líqu ido a gr ega do da r iqu eza da com u n ida de.
Os qu e a ssim pen sa m for a m , con t u do, vít im a s de u m a ilu sã o de
ópt ica qu e con fu n de du a s a t ivida des essen cia lm en t e difer en t es. J u lga -
r a m , er r a da m en t e, qu e exist e u m n exo u n in do a s decisões de a bst er -se
de u m con su m o im edia t o à s de pr over a u m con su m o fu t u r o, qu a n do
n ã o h á n en h u m a r ela çã o sim ples en t r e os m ot ivos qu e det er m in a m a s
pr im eir a s e os qu e det er m in a m a s segu n da s.
P or t a n t o, a h ipót ese da igu a lda de en t r e o pr eço da pr ocu r a da
pr odu çã o globa l e o pr eço da ofer t a é qu e deve ser con sider a da o “a xiom a
da s pa r a lela s” da t eor ia clá ssica . Adm it ida est a h ipót ese, t u do o m a is
se dedu z n a t u r a lm en t e — a s va n t a gen s socia is da pou pa n ça in dividu a l
e n a cion a l, a a t it u de t r a dicion a l pa r a com a t a xa de ju r os, a t eor ia
clá ssica do desem pr ego, a t eor ia qu a n t it a t iva da m oeda , a s va n t a gen s
ilim it a da s do laissez-faire qu a n t o a o com ér cio ext er n o e m u it os ou t r os
a spect os qu e t er em os de discu t ir .
VII resumo
E m diver sos pon t os dest e ca pít u lo fizem os, su cessiva m en t e, a
t eor ia clá ssica depen der da s segu in t es h ipót eses:

(1) qu e o sa lá r io r ea l é igu a l à desu t ilida de m a r gin a l do t r a -


ba lh o exist en t e;
(2) qu e n ã o exist e o qu e se ch a m a desem pr ego in volu n t á r io
n o seu sen t ido est r it o;
(3) qu e a ofer t a cr ia a su a pr ópr ia pr ocu r a , n o sen t ido de qu e
o pr eço da pr ocu r a a gr ega da é igu a l a o pr eço da ofer t a a gr ega da
pa r a t odos os n íveis de pr odu çã o e de em pr ego.

E ssa s t r ês h ipót eses, en t r et a n t o, equ iva lem -se en t r e si, n o sen t ido
de qu e su bsist em ou desm or on a m ju n t a s, pois qu a lqu er dela s depen de,
logica m en t e, da s ou t r a s du a s.

58
C AP ÍTU LO 3
O P rin c íp io d a D e m a n d a Efe tiv a

P r ecisa m os, de in ício, r ecor r er a a lgu n s t er m os, os qu a is ser ã o


defin idos com m a is r igor post er ior m en t e. E m det er m in a da sit u a çã o
t écn ica , de r ecu r sos e de cu st os, o em pr ego de cer t o volu m e de m ã o-
de-obr a im põe a o em pr esá r io du a s espécies de ga st os: a pr im eir a sã o
os m on t a n t es qu e ele pa ga a os fa t or es de pr odu çã o (excet u a n do-se os
qu e pa ga a ou t r os em pr esá r ios) por seu s ser viços h a bit u a is, e qu e de-
n om in a r em os cu sto d e fatores do em pr ego em qu est ã o; a segu n da sã o
os m on t a n t es qu e pa ga a ou t r os em pr esá r ios pelo qu e lh es com pr a ,
ju n t a m en t e com o sa cr ifício qu e fa z u t iliza n do o seu equ ipa m en t o em
vez de o deixa r ocioso, a o qu e ch a m a r em os cu sto d e u so do em pr ego
em qu est ã o.44 A difer en ça en t r e o va lor da pr odu çã o r esu lt a n t e e a
som a do cu st o de fa t or es e do cu st o de u so é o lu cr o, ou , com o pa ssa r em os
a ch a m a r -lh e, a ren d a do em pr esá r io. O cu st o de fa t or es vem a ser ,
n a t u r a lm en t e, a r en da dos fa t or es de pr odu çã o con sider a da do pon t o
de vist a do em pr esá r io, de m odo qu e o cu st o de fa t or es e o lu cr o for m a m ,
ju n t a m en t e, o qu e defin ir em os com o ren d a total r esu lt a n t e do em pr ego
ofer ecido pelo em pr esá r io. O lu cr o do em pr esá r io a ssim defin ido é,
com o dever ia ser , a qu a n t ia qu e ele pr ocu r a eleva r a o m á xim o qu a n do
est á decidin do qu a l o volu m e de em pr ego qu e deve ofer ecer . P or vezes,
qu a n do se t r a t a do pr oblem a da ót ica do em pr esá r io, é con ven ien t e
ch a m a r a r en da a gr ega da (ist o é, cu st o de fa t or es m ais lu cr o) r esu lt a n t e
de cer t o volu m e de em pr ego de prod u to dest e n ível de em pr ego. P or
ou t r o la do, o pr eço da ofer t a a gr ega da 45 da pr odu çã o r esu lt a n t e de
det er m in a do volu m e de em pr ego é o pr odu t o esper a do, qu e é exa t a -

44 Um a defin içã o pr ecisa de cu sto d e u so ser á a pr esen t a da n o ca p. 6.


45 Qu e n ã o deve ser con fu n dida (ver in fra) com o pr eço de ofer t a de u m a u n ida de de pr odu t o
n o sen t ido com u m do t er m o.

59
OS ECON OMIS TAS

m en t e su ficien t e pa r a qu e os em pr esá r ios con sider em va n t a joso ofer ecer


o em pr ego em qu est ã o.46
Disso se dedu z qu e, leva n do em con t a cer t a s con dições da t écn ica
de r ecu r sos e de cu st o dos fa t or es por u n ida de de em pr ego, t a n t o pa r a
ca da fir m a in dividu a l qu a n t o pa r a a in dú st r ia em con ju n t o, o volu m e
do em pr ego depen de do n ível de r eceit a qu e os em pr esá r ios esper a m
r eceber da cor r espon den t e pr odu çã o.47 Os em pr esá r ios, pois, esfor ça m -
se por fixa r o volu m e de em pr ego a o n ível em qu e esper a m m a xim iza r
a difer en ça en t r e a r eceit a e o cu st o dos fa t or es.
Seja Z o pr eço de ofer t a a gr ega da da pr odu çã o r esu lt a n t e do
em pr ego de N h om en s e seja a r ela çã o en t r e Z e N , qu e ch a m a r em os
fu n ção d a oferta agregad a,48 r epr esen t a da por Z = φ (N ). Da m esm a
for m a , seja D o pr odu t o qu e os em pr esá r ios esper a m r eceber do em pr ego
de N h om en s, sen do a r ela çã o en t r e D e N , a qu e ch a m a r em os fu n ção
d a d em an d a agregad a, r epr esen t a da por D = ƒ (N ).
Dessa m a n eir a , se pa r a det er m in a do va lor de N o pr odu t o espe-
r a do for m a ior qu e o pr eço da ofer t a a gr ega da , ist o é, se D for su per ior
a Z , h a ver á u m in cen t ivo qu e leva os em pr esá r ios a a u m en t a r o em pr ego
a cim a de N e, se for n ecessá r io, a eleva r os cu st os dispu t a n do os fa t or es
de pr odu çã o, en t r e si, a t é ch ega r a o va lor de N pa r a o qu a l Z é igu a l
a D. Assim , o volu m e de em pr ego é det er m in a do pelo pon t o de in t er seçã o
da fu n çã o da dem a n da a gr ega da e da fu n çã o da ofer t a a gr ega da , pois

46 O leit or obser va r á qu e elim in o o cu st o de u so t a n t o da r eceit a qu a n t o do preço d e oferta


agregad a de det er m in a do volu m e de pr odu çã o, de t a l for m a qu e a m bos os t er m os devem
ser in t er pr et a dos com o líqu id os r ela t iva m en t e a o cu st o de u so, a o pa sso qu e a s som a s
a gr ega da s pa ga s pelos com pr a dor es sã o, n a t u r a lm en t e, o bru to r ela t iva m en t e a o cu st o de
u so. As r a zões pa r a a ssim pr oceder ser ã o a pr esen t a da s n o ca p. 6. O essen cia l é qu e a s
r eceit a s a gr ega da s e o pr eço da ofer t a a gr ega da , líqu idos do cu st o de u so, possa m defin ir -se
de m a n eir a exclu siva e n ã o a m bígu a . Vist o qu e, eviden t em en t e, o cu st o de u so depen de
do gr a u de in t egr a çã o da in dú st r ia e da im por t â n cia da s com pr a s qu e os em pr esá r ios
r ea liza m en t r e si, n ã o pode h a ver defin içã o da s som a s a gr ega da s pa ga s pelos com pr a dor es,
in clu in d o o cu st o de u so, qu e seja in depen den t e desses fa t or es. H á u m a dificu lda de sem e-
lh a n t e m esm o n a defin içã o de pr eço de ofer t a n o sen t ido com u m da expr essã o, pa r a u m
pr odu t or in dividu a l; e, n o ca so da ofer t a a gr ega da da prod u ção em con ju n to, cor r e-se o
r isco de sér ia s dificu lda des de du plica çã o qu e n em sem pr e for a m leva da s em con t a . Se o
t er m o for in t er pr et a do in clu in do o cu st o de u so, os in con ven ien t es só podem ser ven cidos
à cu st a de h ipót eses especia is a r espeit o do gr a u de in t egr a çã o dos em pr esá r ios em gr u pos,
con for m e su a pr odu çã o seja de ben s de con su m o ou de ca pit a l, h ipót eses qu e sã o, em si
m esm a s, obscu r a s e com plica da s e n ã o cor r espon dem a os fa t os. Se, pelo con t r á r io, o pr eço
de ofer t a a gr ega da se defin e com o a n t es, ist o é, líqu id o r ela t iva m en t e a o cu st o de u so,
essa s dificu lda des desa pa r ecem . O leit or dever á a gu a r da r o ca p. 6 e seu Apên dice, on de
h á u m a a n á lise m a is com plet a dessa qu est ã o.
47 Um em pr esá r io qu e t en h a de t om a r u m a decisã o pr á t ica a r espeit o da su a esca la de
pr odu çã o n ã o t er á , n a t u r a lm en t e, u m a ú n ica expect a t iva in du bit á vel sobr e qu a l ser á a
r eceit a de ven da de u m a pr odu çã o det er m in a da , m a s vá r ia s expect a t iva s h ipot ét ica s, for -
m u la da s com gr a u s va r iá veis de pr oba bilida de e de exa t idã o. P or su a expect a t iva de r eceit a
qu er o dizer , por t a n t o, a qu ela qu e, se for m u la da em con dições de cer t eza , o leva r ia à m esm a
con du t a qu e o con ju n t o da s possibilida des m a is diver sa s e va ga s qu e com põem o seu est a do
de expect a t iva n o in st a n t e de t om a r su a decisã o.
48 No ca p. 20, a fu n çã o qu e est á in t im a m en t e liga da à a n t er ior ser á design a da fu n çã o do
em pr ego.

60
KEYN ES

é n est e pon t o qu e a s expect a t iva s de lu cr o dos em pr esá r ios ser ã o m a -


xim iza da s. Ch a m a r em os d em an d a efetiva o va lor de D n o pon t o de
in t er seçã o da fu n çã o da dem a n da a gr ega da com o da ofer t a a gr ega da .
Com o est a é a essên cia da Teor ia Ger a l do E m pr ego, a qu a l n os pr o-
pom os expor , os ca pít u los segu in t es ser ã o, em gr a n de pa r t e, con sa gr a -
dos a o exa m e dos diver sos fa t or es de qu e depen dem essa s du a s fu n ções.
A dou t r in a clá ssica , por ou t r o la do, qu e se r esu m ia ca t egor ica -
m en t e n a pr oposiçã o de qu e “a Ofer t a cr ia a su a pr ópr ia Dem a n da ” e
qu e con t in u a su bja cen t e em t oda a t eor ia econ ôm ica or t odoxa , en volve
u m a h ipót ese especia l a r espeit o da r ela çã o exist en t e en t r e est a s du a s
fu n ções. Isso por qu e a pr oposiçã o “a Ofer t a cr ia a su a pr ópr ia Dem a n da ”
deve sign ifica r qu e ƒ(N ) e φ (N ) sã o igu a is pa r a tod os os va lor es de N ,
ist o é, pa r a qu a lqu er volu m e de pr odu çã o e de em pr ego; e qu e, qu a n do
h á u m a u m en t o em Z (= φ(N )) cor r espon den t e a u m a u m en t o em N ,
D (= ƒ(N )) a u m en t a n ecessa r ia m en t e n a m esm a qu a n t ida de qu e Z . A
t eor ia clá ssica su põe, em ou t r a s pa la vr a s, qu e o pr eço da dem a n da
agregada (ou produto) sempre se ajusta ao preço da oferta agregada, de
tal modo que, seja qual for o valor de N , o produto D adquire um valor
igual ao do preço da oferta agregada Z que corresponde a N . Isto quer
dizer que a dem anda efetiva, em vez de ter um único valor de equilíbrio,
comporta uma série infinita de valores, todos igualmente admissíveis, e
que o volume de em prego é indeterminado, salvo na medida em que a
desutilidade m arginal do trabalho lhe fixe um limite superior.
Se isso fosse ver da de, a con cor r ên cia en t r e os em pr esá r ios leva r ia
sem pr e a u m a u m en t o do em pr ego, a t é o pon t o em qu e a ofer t a a gr ega da
cessa de ser elá st ica , ou seja , u m pon t o a pa r t ir do qu a l u m n ovo
a u m en t o n o va lor da dem a n da efet iva já n ã o é a com pa n h a do por u m
a u m en t o da pr odu çã o. E viden t em en t e, ist o é o m esm o qu e o plen o
em pr ego. No ca pít u lo a n t er ior , dem os u m a defin içã o de plen o em pr ego
ba sea da n o com por t a m en t o da m ã o-de-obr a . Ou t r o cr it ér io, a liá s equ i-
va len t e, a qu e ch ega m os a gor a é o da sit u a çã o em qu e o em pr ego
a gr ega do é in elá st ico dia n t e de u m a u m en t o n a dem a n da efet iva r e-
la t iva m en t e a o n ível de pr odu t o cor r espon den t e à qu ele n ível de em -
pr ego. Assim , a lei de Sa y, segu n do a qu a l o pr eço da dem a n da a gr ega da
da pr odu çã o em con ju n t o é igu a l a o pr eço da su a ofer t a a gr ega da pa r a
qu a lqu er volu m e de pr odu çã o, equ iva le à pr oposiçã o de qu e n ã o h á
obst á cu lo pa r a o plen o em pr ego. Con t u do, n ã o sen do est a a ver da deir a
lei qu e r ela cion a a dem a n da a gr ega da e a s fu n ções da ofer t a , fa lt a
a in da escr ever u m ca pít u lo da t eor ia econ ôm ica , cu ja im por t â n cia é
decisiva e sem o qu a l é in ú t il qu a lqu er discu ssã o a r espeit o do volu m e
do em pr ego a gr ega do.
II

P a r a o leit or t a lvez seja ú t il, n est e pon t o, a a pr esen t a çã o de u m


br eve su m á r io da t eor ia do em pr ego qu e ser á desen volvida n o decor r er

61
OS ECON OMIS TAS

dos ca pít u los segu in t es, a in da qu e esse r esu m o possa n ã o ser de t odo
in t eligível. Os t er m os u sa dos ser ã o, em seu devido t em po, defin idos
com m a ior pr ecisã o. Nest e r esu m o, pa ssa r em os a su por qu e o sa lá r io
n om in a l e os ou t r os elem en t os de cu st o per m a n eça m con st a n t es por
u n ida de de t r a ba lh o a gr ega da . E n t r et a n t o, est a sim plifica çã o, de qu e
m a is t a r de pr escin dir em os, é in t r odu zida a pen a s pa r a fa cilit a r a ex-
posiçã o. O fa t o de os sa lá r ios n om in a is e de ou t r os a spect os est a r em
ou n ã o su jeit os a va r ia çã o em n a da a lt er a a n a t u r eza do r a ciocín io.
As gr a n des lin h a s da n ossa t eor ia podem expr essa r -se da m a n eir a
qu e se segu e. Qu a n do o em pr ego a u m en t a , a u m en t a , t a m bém , a r en da
r ea l a gr ega da . A psicologia da com u n ida de é t a l qu e, qu a n do a r en da
r ea l a gr ega da a u m en t a , o con su m o de a gr ega do t a m bém a u m en t a , po-
r ém n ã o t a n t o qu a n t o a r en da . E m con seqü ên cia , os em pr esá r ios so-
fr er ia m u m a per da se o a u m en t o t ot a l do em pr ego se dest in a sse a
sa t isfa zer a m a ior dem a n da pa r a con su m o im edia t o. Dessa m a n eir a ,
pa r a ju st ifica r qu a lqu er volu m e de em pr ego, deve exist ir u m volu m e
de in vest im en t o su ficien t e pa r a a bsor ver o excesso da pr odu çã o t ot a l
sobr e o qu e a com u n ida de deseja con su m ir qu a n do o em pr ego se a ch a
em det er m in a do n ível. A n ã o ser qu e h a ja est e volu m e de in vest im en t o,
a s r eceit a s dos em pr esá r ios ser ã o m en or es qu e a s n ecessá r ia s pa r a
in du zi-los a ofer ecer t a l volu m e de em pr ego. Da qu i se segu e, por t a n t o,
qu e, da do o qu e ch a m a r em os de pr open sã o a con su m ir da com u n ida de,
o n ível de equ ilíbr io do em pr ego, ist o é, o n ível em qu e n a da in cit a os
em pr esá r ios em con ju n t o a a u m en t a r ou r edu zir o em pr ego, depen der á
do m on t a n t e de in vest im en t o cor r en t e. O m on t a n t e de in vest im en t o
cor r en t e depen der á , por su a vez, do qu e ch a m a r em os de in cen t ivo pa r a
in vest ir , o qu a l, com o se ver ifica r á , depen de da r ela çã o en t r e a esca la
da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e o com plexo da s t a xa s de ju r os qu e
in cidem sobr e os em pr ést im os de pr a zos e r iscos diver sos.
Assim sen do, da da a pr open sã o a con su m ir e a t a xa do n ovo
in vest im en t o, h a ver á a pen a s u m n ível de em pr ego com pa t ível com o
equ ilíbr io, vist o qu e qu a lqu er ou t r o leva r ia a u m a desigu a lda de en t r e
o pr eço da ofer t a a gr ega da da pr odu çã o em con ju n t o e o pr eço da
dem a n da a gr ega da . E st e n ível n ã o pode ser m aior qu e o plen o em pr ego,
ist o é, o sa lá r io r ea l n ã o pode ser m en or qu e a desu t ilida de m a r gin a l
do t r a ba lh o. Ma s n ã o h á , em ger a l, r a zã o pa r a qu e ele seja igu al a o
plen o em pr ego. A dem a n da efet iva a ssocia da a o plen o em pr ego é u m
ca so especia l qu e só se ver ifica qu a n do a pr open sã o a con su m ir e o
in cen t ivo pa r a in vest ir se en con t r a m a ssocia dos en t r e si n u m a det er -
m in a da for m a . E st a r ela çã o pa r t icu la r , qu e cor r espon de à s h ipót eses
da t eor ia clá ssica , é, em cer t o sen t ido, u m a r ela çã o ót im a . Ma s ela só
se ver ifica qu a n do, por a ciden t e ou desígn io, o in vest im en t o cor r en t e
pr opor cion a u m volu m e de dem a n da ju st a m en t e igu a l a o exceden t e do
pr eço da ofer t a a gr ega da da pr odu çã o r esu lt a n t e do plen o em pr ego

62
KEYN ES

sobr e o qu e a com u n ida de decida ga st a r em con su m o qu a n do se en con t r e


em est a do de plen o em pr ego.
E st a t eor ia pode ser r esu m ida n a s segu in t es pr oposições:

(1) Sob certas condições de técnica, de recursos e de custos, a renda


(tanto monetária quanto real) depende do volume de em prego N .

(2) A r ela çã o en t r e a r en da de u m a com u n ida de e o qu e se pode


esper a r qu e ela ga st e em con su m o, design a do por D 1, depen der á da s
ca r a ct er íst ica s psicológica s da com u n ida de, a qu e ch a m a r em os de su a
propen são a con su m ir. Isso qu er dizer qu e o con su m o depen de do m on -
t a n t e da r en da a gr ega da e, por t a n t o, do volu m e de em pr ego N , excet o
qu a n do h ou ver a lgu m a m u da n ça n a pr open sã o a con su m ir .

(3) A qu a n t ida de de m ã o-de-obr a N qu e os em pr esá r ios r esolvem


em pr ega r depen de da som a (D) de d u as qu a n t ida des, a sa ber : D 1 , o
m on t a n t e qu e se esper a seja ga st o pela com u n ida de em con su m o, e
D 2 , o m on t a n t e qu e se esper a seja a plica do em n ovos in vest im en t os.
D é o qu e já ch a m a m os a n t es de d em an d a efetiva.

(4) Desde qu e D 1 + D 2 = D = φ (N ), on de φ é a fu n çã o da ofer t a


a gr ega da , e com o, segu n do vim os em (2), D 1 é u m a fu n çã o de N , a
qu a l podem os escr ever χ (N ), qu e depen de da pr open sã o a con su m ir ,
dedu z-se qu e φ (N ) – χ (N ) = D 2.

(5) Con seqü en t em en t e, o n ível de em pr ego de equ ilíbr io depen de


(i) da fu n çã o da ofer t a a gr ega da , φ, (ii) da pr open sã o a con su m ir , χ, e
(iii) do m on t a n t e do in vest im en t o, D 2 . E st a é a essên cia da Teor ia
Ger a l do E m pr ego.

(6) A ca da volu m e de N cor r espon de cer t a pr odu t ivida de m a r gin a l


da m ã o-de-obr a n a s in dú st r ia s de ben s de con su m o dos a ssa la r ia dos,
e é ist o qu e det er m in a o sa lá r io r ea l. A pr oposiçã o (5) est á , por t a n t o,
su jeit a à con diçã o de qu e N n ã o pode exced er o va lor qu e r edu z o
sa lá r io r ea l a t é ch ega r à igu a lda de com a desu t ilida de m a r gin a l da
m ã o-de-obr a . Ist o sign ifica qu e n em t oda s a s va r ia ções de D sã o com -
pa t íveis com a n ossa h ipót ese pr ovisór ia de qu e os sa lá r ios n om in a is
seja m con st a n t es. Desse m odo, é essen cia l pa r a a exposiçã o com plet a
de n ossa t eor ia qu e coloqu em os de pa r t e est a h ipót ese.

(7) Na t eor ia clá ssica , segu n do a qu a l D = φ (N ) pa r a tod os os


va lor es de N , o n ível de em pr ego est á em equ ilíbr io n eu t r o sem pr e
qu e N seja in fer ior a o seu va lor m á xim o, de m odo qu e se possa esper a r
qu e a s for ça s da con cor r ên cia en t r e os em pr esá r ios o elevem a t é esse

63
OS ECON OMIS TAS

va lor m á xim o. Apen a s n est e pon t o, segu n do a t eor ia clá ssica , pode
h a ver u m equ ilíbr io est á vel.

(8) Qu an d o o em prego au m en ta, D 1 t a m bém a u m en t a , porém n ão


tan to qu an to D, vist o qu e, qu a n do n ossa r en da sobe, n osso con su m o
t a m bém sobe, em bor a m en os. A ch a ve do n osso pr oblem a pr á t ico en -
con t r a -se n est a lei psicológica . Disso decor r e qu e, qu a n t o m a ior for o
n ível de em pr ego, m a ior ser á a difer en ça en t r e o pr eço da ofer t a a gr e-
ga da (Z ) da pr odu çã o cor r espon den t e e a som a (D 1 ) qu e os em pr esá r ios
esper a m r ecu per a r com os ga st os dos con su m idor es. Con seqü en t em en -
t e, qu a n do a pr open sã o a con su m ir n ã o va r ia , o em pr ego n ã o pode
a u m en t a r , a n ã o ser qu e isso a con t eça a o m esm o t em po qu e D 2 cr esça ,
de m odo qu e pr een ch a a cr escen t e la cu n a en t r e Z e D 1. Dia n t e disso,
o sist em a econ ôm ico pode en con t r a r u m equ ilíbr io est á vel com N em
u m n ível in fer ior a o plen o em pr ego, ist o é, n o n ível da do pela in t er seçã o
da fu n çã o da pr ocu r a a gr ega da e da fu n çã o da ofer t a a gr ega da —
excluídas as hipóteses especiais da teoria clássica, segundo as quais, quan-
do o emprego aumenta, certa força intervém sem pre, obrigando D2 a subir
o necessário para preencher a lacuna crescente entre Z e D 1.

Nã o é, por t a n t o, a desu t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o, expr essa


em t er m os de sa lá r ios r ea is, qu e det er m in a o volu m e de em pr ego,
excet o n o ca so em qu e a ofer t a de m ã o-de-obr a dispon ível a cer t o sa lá r io
r ea l fixe u m n ível m áxim o de em pr ego. A pr open sã o a con su m ir e o
n ível do n ovo in vest im en t o é qu e det er m in a m , con ju n t a m en t e, o n ível
de em pr ego, e é est e qu e, cer t a m en t e, det er m in a o n ível de sa lá r ios
r ea is — n ã o o in ver so. Se a pr open sã o a con su m ir e o m on t a n t e de
n ovos in vest im en t os r esu lt a m em u m a in su ficiên cia da dem a n da efe-
t iva , o n ível r ea l do em pr ego se r edu zir á a t é fica r a ba ixo da ofer t a de
m ã o-de-obr a pot en cia lm en t e dispon ível a o sa lá r io r ea l em vigor , e o
sa lá r io r ea l de equ ilíbr io ser á su perior à desu t ilida de m a r gin a l do n ível
de em pr ego de equ ilíbr io.
E st a a n á lise n os ofer ece u m a explica çã o do pa r a doxo da pobr eza
em m eio à a bu n dâ n cia , pois a sim ples exist ên cia de u m a dem a n da
efet iva in su ficien t e pode pa r a lisa r , e fr eqü en t em en t e pa r a lisa , o a u -
m en t o do em pr ego an tes de h a ver ele a lca n ça do o n ível de plen o em -
pr ego. A in su ficiên cia da dem a n da efet iva in ibir á o pr ocesso de pr o-
du çã o, a despeit o do fa t o de qu e o va lor do pr odu t o m a r gin a l do t r a ba lh o
con t in u e su per ior à desu t ilida de m a r gin a l do em pr ego.
Além disso, qu a n t o m a is r ica for a com u n ida de, m a is t en der á a
a m plia r a la cu n a en t r e a su a pr odu çã o efet iva e a pot en cia l; e, por t a n t o,
m a is óbvios e m a léficos os defeit os do sist em a econ ôm ico. Assim , u m a
com u n ida de pobr e t en der á a con su m ir a m a ior pa r t e da su a pr odu çã o
de m odo qu e u m in vest im en t o m odest o ser á su ficien t e pa r a lh e ga r a n t ir
o plen o em pr ego, a o pa sso qu e u m a com u n ida de r ica t er á de descobr ir

64
KEYN ES

opor t u n ida des de in vest im en t o m u it o m a is a m pla s, pa r a qu e possa


con cilia r a pr open sã o pa r a a pou pa n ça dos seu s m em br os m a is r icos
com o em pr ego dos seu s m em br os m a is pobr es. Se em u m a com u n ida de
pot en cia lm en t e r ica o in cen t ivo pa r a in vest ir for fr a co, a in su ficiên cia
da dem a n da efet iva a obr iga r á a r edu zir su a pr odu çã o r ea l a t é qu e,
a despeit o de su a r iqu eza pot en cia l, ela se t or n e t ã o pobr e qu e os
exceden t es sobr e o con su m o dim in u a m a t é ch ega r a o n ível cor r espon -
den t e a o seu fr a co in cen t ivo pa r a in vest ir .
A sit u a çã o, con t u do, é a in da m a is som br ia . Nã o a pen a s a pr o-
pen sã o m a r gin a l a con su m ir 49 é m a is fr a ca em u m a com u n ida de r ica ,
com o t a m bém , em vir t u de de o ca pit a l a cu m u la do já ser gr a n de, a s
opor t u n ida des pa r a n ovos in vest im en t os sã o m en os a t r a t iva s, a n ã o
ser qu e a t a xa de ju r os desça a u m r it m o ba st a n t e r á pido; isso n os
leva à t eor ia da t a xa de ju r os e à s r a zões pela s qu a is est a n ã o ba ixa
a u t om a t ica m en t e a o n ível a dequ a do, a ssu n t o de qu e n os ocu pa r em os
n o Livr o Qu a r t o.
P or essa r a zã o, a a n á lise da pr open sã o a con su m ir , a defin içã o
da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e a t eor ia da t a xa de ju r os sã o a s
t r ês la cu n a s pr in cipa is dos n ossos a t u a is con h ecim en t os qu e t em os
n ecessida de de pr een ch er . Qu a n do isso for con segu ido, ver em os qu e a
t eor ia dos pr eços ocu pa r á o seu lu ga r a pr opr ia do com o a ssu n t o su bsi-
diá r io da n ossa t eor ia ger a l. Con st a t a r em os, a dem a is, qu e a m oeda
r epr esen t a u m pa pel essen cia l n a n ossa t eor ia da t a xa de ju r os e t en -
t a r em os desem a r a n h a r a s ca r a ct er íst ica s pa r t icu la r es qu e a dist in gu em
de ou t r os fa t or es.

III

Na econ om ia r ica r dia n a , qu e ser ve de ba se a o qu e n os vem sen do


en sin a do h á m a is de u m sécu lo, a idéia de qu e podem os pôr de la do,
sem ou t r a s cogit a ções, a fu n çã o da dem a n da a gr ega da é fu n da m en t a l.
Ma lt h u s, n a ver da de, se opôs com veem ên cia à dou t r in a de Rica r do
de qu e er a im possível u m a in su ficiên cia da dem a n da efet iva , por ém ,
em vã o. Nã o t en do con segu ido explica r com cla r eza (a n ã o ser por
fa t os da obser va çã o pr á t ica ) com o e por qu e a dem a n da efet iva poder ia
ser deficien t e ou excessiva , deixou de for n ecer u m a est r u t u r a ca pa z
de su bst it u ir a t ese qu e a t a ca va ; a ssim , Rica r do con qu ist ou a In gla t er r a
de m a n eir a t ã o com plet a com o a Sa n t a In qu isiçã o con qu ist a r a a E s-
pa n h a . Su a t eor ia n ã o só foi a ceit a pelos m eios in flu en t es de Lon dr es,
pelos est a dist a s e pelo m u n do a ca dêm ico, com o t a m bém cessou t oda
con t r ovér sia , e o pon t o de vist a con t r á r io desa pa r eceu por com plet o e
deixou de ser discu t ido. O gr a n de en igm a da dem a n da efet iva com qu e
Ma lt h u s h a via lu t a do desa pa r eceu da lit er a t u r a econ ôm ica . Nã o se lh e

49 Defin ida n o ca p. 10.

65
OS ECON OMIS TAS

fa z n en h u m a m en çã o, u m a vez sequ er , em t oda a obr a de Ma r sh a ll,


de E dgewor t h e do pr ofessor P igou , qu e der a m à t eor ia clá ssica a su a
for m a m a is defin it iva . Apen a s sobr eviveu , fu r t iva m en t e, n os su bt er r â -
n eos do m u n do de Ka r l Ma r x, de Silvio Gesell e do m a jor Dou gla s.
O fa t o de a vit ór ia r ica r dia n a t er sido t ã o com plet a fa z com qu e
seja r evest ida de cu r iosida de e de m ist ér io. E ssa vit ór ia pr ova velm en t e
se deveu a u m com plexo de a fin ida des en t r e a su a dou t r in a e o m eio
em qu e foi la n ça da . Cr eio qu e o fa t o de t er ch ega do a con clu sões in -
t eir a m en t e diver sa s da s qu e poder ia esper a r u m in divídu o com u m e
pou co in st r u ído con t r ibu iu pa r a seu pr est ígio in t elect u a l. Deu -lh e vir -
t u de a cir cu n st â n cia de qu e seu s en sin a m en t os, t r a n spor t a dos pa r a a
pr á t ica , er a m a u st er os e, por vezes, desa gr a dá veis. Deu -lh e pr im or o
poder su st en t a r u m a su per est r u t u r a lógica , va st a e coer en t e. Deu -lh e
a u t or ida de o fa t o de poder explica r m u it a s in ju st iça s socia is e cr u el-
da des a pa r en t es com o in ciden t es in evit á veis n a m a r ch a do pr ogr esso,
e de poder m ost r a r qu e a t en t a t iva de m odifica r esse est a do de coisa s
t in h a , de m odo ger a l, m a is ch a n ces de ca u sa r da n os qu e ben efícios.
P or t er for m u la do cer t a ju st ifica t iva à liber da de de a çã o do ca pit a list a
in dividu a l, a t r a iu -lh e o a poio da s for ça s socia is dom in a n t es a gr u pa da s
a t r á s da a u t or ida de.
E m bor a , a t é h á pou co, a dou t r in a em si n u n ca t en h a sido con -
t est a da pelos econ om ist a s or t odoxos, su a óbvia in a dequ a çã o n o qu e
t a n ge à s fin a lida des de pr ediçã o cien t ífica dim in u iu ba st a n t e, com o
pa ssa r do t em po, o pr est ígio de seu s a dept os. Apa r en t em en t e, depois
de Ma lt h u s, os econ om ist a s pr ofission a is fica r a m in sen síveis dia n t e da
fa lt a de con for m ida de en t r e os r esu lt a dos de su a t eor ia e dos fa t os
obser va dos; u m a discr epâ n cia qu e o h om em com u m n ã o deixa de ob-
ser va r , com o r esu lt a do de u m a cr escen t e obst in a çã o em con ceder a os
econ om ist a s a m a n ifest a çã o de r espeit o qu e t r ibu t a a ou t r os gr u pos
de cien t ist a s cu ja s con clu sões t eór ica s sã o con fir m a da s pela obser va çã o,
qu a n do a plica da s a os fa t os.
O celebr a do otim ism o da t eor ia econ ôm ica t r a dicion a l — qu e levou
os econ om ist a s a ser em con sider a dos Câ n didos, os qu a is, t en do-se r e-
t ir a do do m u n do pa r a cu lt iva r em seu s ja r din s, cla m a m qu e t u do ca -
m in h a do m elh or m odo n o m elh or dos m u n dos possível, con t a n t o qu e
deixem os a s coisa s a n da r em sozin h a s — t em com o or igem , n o m eu
en t en der , o fa t o de n ã o h a ver sido leva do em con t a o em pecilh o qu e
u m a in su ficiên cia da dem a n da efet iva pode sign ifica r pa r a a pr ospe-
r ida de, pois em u m a socieda de qu e fu n cion a de a cor do com os post u la dos
clá ssicos dever ia exist ir u m a t en dên cia n a t u r a l pa r a o em pr ego ót im o
dos r ecu r sos. P ode m u it o bem ser qu e a t eor ia clá ssica r epr esen t e o
ca m in h o qu e a n ossa econ om ia , segu n do o n osso desejo, dever ia segu ir ,
m a s su por qu e n a r ea lida de ela a ssim se com por t a é pr esu m ir qu e
t oda s a s dificu lda des est eja m r em ovida s.

66
L IVRO S EGU N D O

D EF IN IÇÕES E I D ÉIAS
C AP ÍTU LO 4
A Es c o lh a d a s U n id a d e s

N est e e n os t r ês ca pít u los segu in t es pr ocu r a r em os escla r ecer cer -


t a s dú vida s qu e n ã o t êm r ela çã o pecu lia r ou exclu siva com os pr oblem a s
cu jo exa m e n os pr opu sem os fa zer de m a n eir a especia l. Assim , est es
ca pít u los devem ser con sider a dos u m a digr essã o qu e n os a fa st a r á , t em -
por a r ia m en t e, do n osso t em a pr in cipa l. E st es a ssu n t os sã o est u da dos
a qu i por n u n ca t er em sido t r a t a dos em n en h u m a ou t r a pa r t e, de m odo
con ven ien t e pa r a a s n ecessida des de m in h a in vest iga çã o pa r t icu la r .
As t r ês per plexida des qu e m a is dificu lt a r a m m eu pr ogr esso n a
ela bor a çã o dest e livr o e im pedir a m qu e m e expr essa sse con ven ien t e-
m en t e a t é en con t r a r a lgu m a solu çã o pa r a ela s for a m : em pr im eir o
lu ga r , a escolh a da s u n ida des qu a n t it a t iva s a dequ a da s a os pr oblem a s
do sist em a econ ôm ico em seu con ju n t o; em segu n do, o pa pel r epr esen -
t a do pela s expect a t iva s n a a n á lise econ ôm ica ; e, em t er ceir o, a defin içã o
da r en da .
II

A im per feiçã o da s u n ida des com qu e os econ om ist a s cost u m a m


t r a ba lh a r pode ser ilu st r a da pelos con ceit os de dividen do n a cion a l, es-
t oqu e de ca pit a l r ea l e n ível ger a l de pr eços:

(i) O dividen do n a cion a l, t a l com o o defin ir a m Ma r sh a ll e o pr o-


fessor P igou ,50 m ede o volu m e da pr odu çã o cor r en t e ou r en da r ea l e
n ã o o va lor da pr odu çã o ou r en da m on et á r ia .51 Além disso, depen de,

50 Ver P IGOU. E con om ics of Welfare et pas., e pa r t icu la r m en t e P a r t e P r im eir a , ca p. III.


51 E m bor a se con sider e com u m en t e, por r a zões de u m a ju st e con ven ien t e, a r en da r ea l qu e
con st it u i o dividen do n a cion a l com o lim it a da a os ben s e ser viços qu e se podem com pr a r
com din h eir o.

69
OS ECON OMIS TAS

em cer t o sen t ido, da pr odu çã o líqu id a, qu er dizer , da a diçã o líqu ida


a os r ecu r sos da com u n ida de dispon íveis pa r a o con su m o ou r et idos
com o pr ovisã o de ca pit a l, qu e r esu lt a da s a t ivida des econ ôm ica s e dos
sa cr ifícios de u m per íodo, depois de leva do em con t a o desga st e do
est oqu e do ca pit a l r ea l exist en t e n o com eço desse m esm o per íodo. Sobr e
est a s ba ses se pr ocu r ou er igir u m a ciên cia qu a n t it a t iva . H á , por ém ,
sér ia objeçã o a est e con ceit o, a plica do pa r a t a l fim , n o fa t o de a pr odu çã o
da com u n ida de em ben s e ser viços ser u m com plexo n ã o h om ogên eo
qu e n ã o se pode m edir (n o est r it o sen t ido da pa la vr a ) sen ã o em ca sos
especia is, com o, por exem plo, qu a n do t odos os a r t igos de u m a pr odu çã o
en t r a m n a m esm a pr opor çã o em ou t r a pr odu çã o.

(ii) A dificu lda de é a in da m a is a cen t u a da qu a n do, pa r a ca lcu la r


a pr odu çã o líqu ida , se pr ocu r a m edir a a diçã o líqu ida de equ ipa m en t o
a o ca pit a l, pois é n ecessá r io en con t r a r a lgu m a ba se de com pa r a çã o
qu a n t it a t iva en t r e a s n ova s for m a s de equ ipa m en t o pr odu zida s du r a n t e
o per íodo e a s a n t iga s, con su m ida s pelo desga st e. P a r a ch ega r a o di-
viden do n a cion a l líqu ido, o pr ofessor P igou 52 dedu z a qu ela m a r gem de
obsolescên cia et c., “qu e pode r a zoa velm en t e den om in a r -se ‘n or m a l’; e
a pr á t ica de n or m a lida de é a qu ela em qu e a obsolescên cia é ba st a n t e
r egu la r pa r a ser pr evist a , se n ã o em det a lh e, pelo m en os grosso m od o”.
Ma s, com o essa dedu çã o n ã o se fa z em u n ida des m on et á r ia s, o pr o-
fessor P igou é leva do a con sider a r qu e p ode h a ver u m a va r ia çã o n a
qu a n t ida d e física , em bor a n ã o t en h a h a vid o va r ia çã o física a lgu m a ;
ist o é, ele est á in t r odu zin d o, im plicit a m en t e, va r ia ções n o valor.
Além d isso, ele é in ca p a z d e con ceber u m a fór m u la sa t isfa t ór ia 53
pa r a a va lia r o equ ipa m en t o n ovo em r ela çã o a o a n t igo qu a n do, em
vir t u de d e m u da n ça s n a t écn ica , os d ois deixa m de ser idên t icos.
Cr eio qu e o con ceit o a pon t a do pelo pr ofessor P igou é o cor r et o e
a d equ a do pa r a a a n á lise econ ôm ica . E n qu a n t o n ã o for a dot a do u m
sist em a sa t isfa t ór io d e u n ida d es, é u m a t a r efa im possível defin i-lo
com pr ecisã o. O pr oblem a de com pa r a r u m a p r od u çã o r ea l com ou t r a
e ca lcu la r depois a pr odu çã o líqu id a , com pen sa n do com a s n ova s
pa r t ida s de equ ipa m en t o o desga st e da s a n t iga s, a ca r r et a en igm a s
qu e, pod em os dizer com segu r a n ça , sã o in solú veis.

(iii) E m t er ceir o lu ga r , o con h ecido m a s in evit á vel elem en t o de


im pr ecisã o qu e, com o se sa be, a com pa n h a o con ceit o do n ível ger a l de
pr eços t or n a o u so dest e t er m o m u it o in a dequ a do pa r a a n á lise ca u sa l,
qu e deve ser exa t a .

52 E con om ics of Welfare. P a r t e P r im eir a . Ca p. V, em “Wh a t is m ea n t by Ma in t a in in g Ca pit a l


In t a ct ”; con for m e a s cor r eções feit a s em r ecen t e a r t igo n o E con om ic J ou rn al. J u n h o de
1935. p. 225.
53 Cf. a s cr ít ica s do P r of. H AYE K. In : E con om ica. Agost o de 1935. p. 247.

70
KEYN ES

E ssa s dificu lda des, con t u do, sã o ju st a m en t e con sider a da s “en ig-
m a s”. E la s sã o “pu r a m en t e t eór ica s”, n o sen t ido de qu e ja m a is con -
fu n dem ou a fet a m , de qu a lqu er m a n eir a , a s decisões dos h om en s de
n egócios, n ã o in flu in do n a seqü ên cia ca u sa l dos fen ôm en os econ ôm icos,
t ã o cla r os e det er m in a dos, a pesa r da in det er m in a çã o qu a n t it a t iva des-
t es con ceit os. É n a t u r a l, por t a n t o, con clu ir qu e est es con ceit os n ã o
a pen a s ca r ecem de pr ecisã o com o t a m bém sã o desn ecessá r ios. É evi-
den t e qu e a n ossa a n á lise qu a n t it a t iva deva ser expost a sem u sa r
n en h u m t er m o qu a n t it a t iva m en t e va go. E , n a ver da de, u m a vez in i-
cia da essa t a r efa , ver ifica -se, com o esper o dem on st r a r , qu e se pode
m u it o bem pa ssa r m elh or sem eles.
O fa t o de dois gr u pos in com en su r á veis de objet os diver sos n ã o
poder em for n ecer , por si m esm os, o m a t er ia l n ecessá r io pa r a u m a a n á -
lise qu a n t it a t iva n ã o deve, n a t u r a lm en t e, im pedir -n os de r ea liza r com -
pa r a ções est a t íst ica s a pr oxim a da s qu e, depen den do m a is de elem en t os
de a pr ecia çã o im per feit os do qu e de cá lcu los r igor osos, deixa m de ser ,
den t r o de cer t os lim it es, vá lida s e sign ifica t iva s. Ma s o ver da deir o lu ga r
de con ceit os com o a pr odu çã o r ea l líqu ida e o n ível ger a l de pr eços é
den t r o do ca m po da descr içã o est a t íst ica e h ist ór ica , e o seu objet o
dever ia ser sa t isfa zer a cu r iosida de h ist ór ica ou socia l, pr opósit o pa r a
o qu a l n ã o é h a bit u a l n em n ecessá r ia u m a pr ecisã o a bsolu t a — t a l
com o exige a n ossa a n á lise ca u sa l, seja ou n ã o com plet o ou exa t o o
n osso con h ecim en t o dos va lor es r ea is da s qu a n t ida des en volvida s. Dizer
qu e a pr odu çã o líqu ida de h oje é m a ior qu e a de dez a n os a t r á s ou a
do a n o a n t er ior , m a s qu e o n ível de pr eços é in fer ior , equ iva le a a fir m a r
qu e a Ra in h a Vit ór ia er a u m a sober a n a m elh or , por ém n ã o u m a m u lh er
m a is feliz, qu e a Ra in h a E lisa bet e — a sser çã o n ã o desp r ovida de
sign ifica d o ou de in t er esse, m a s in ú t il com o m a t er ia l p a r a o cá lcu lo
difer en cia l. N ossa pr ecisã o ser ia ilu sór ia se u sá ssem os t a is con ceit os
pa r cia lm en t e va gos e n ã o qu a n t it a t ivos com o ba se de u m a a n á lise
qu a n t it a t iva .
III

Nã o esqu eça m os qu e em tod os os ca sos con cr et os u m em pr esá r io


pr eocu pa -se com decisões a r espeit o da esca la em qu e u sa r á cer t o equ i-
pa m en t o de ca pit a l; e qu a n do a fir m a m os qu e a expect a t iva de u m
a cr éscim o de dem a n da , ou seja , de u m desloca m en t o da fu n çã o de
dem a n da a gr ega da , con du z a u m a u m en t o n a pr odu çã o a gr ega da , o
qu e r ea lm en t e qu er em os dizer é qu e a s em pr esa s pr opr iet á r ia s do equ i-
pa m en t o de ca pit a l se ver ã o in du zida s a a ssocia r -lh e u m volu m e m a ior
de em pr ego de m ã o-de-obr a a gr ega da . No ca so de u m a em pr esa ou
in dú st r ia isola da qu e pr odu za a r t igos h om ogên eos, é legít im o fa la r , se
qu iser m os, de a u m en t os e dim in u ições de pr odu çã o. P or ém , qu a n do
som a r m os a s a t ivida des de t oda s a s em pr esa s, só n os expr im ir em os
com exa t idã o por m eio de qu a n t ida des de em pr ego a plica da s a det er -

71
OS ECON OMIS TAS

m in a do equ ipa m en t o. Os con ceit os de pr odu çã o t ot a l e seu n ível de


pr eços deixa m en t ã o de ser in dispen sá veis, pois n ã o n ecessit a m os de
u m a m edida a bsolu t a da pr odu çã o a gr ega da cor r en t e, com o a qu e n os
per m it ir ia com pa r a r o seu m on t a n t e com o qu e r esu lt a r ia da a ssocia çã o
de u m equ ipa m en t o de ca pit a l difer en t e e u m a qu a n t ida de de em pr ego
difer en t e. Qu a n do, pa r a fin s descr it ivos ou de sim ples com pa r a çã o,
qu er em os fa la r do a u m en t o de pr odu çã o, devem os a ceit a r a su posiçã o
ger a l de qu e o volu m e de em pr ego a ssocia do a det er m in a do equ ipa -
m en t o de ca pit a l ser á u m ín dice sa t isfa t ór io do m on t a n t e da pr odu çã o
qu e da í r esu lt a — su pon do-se qu e a m bos a u m en t em e dim in u a m ju n t os,
a in da qu e n ã o em pr opor çã o n u m ér ica defin ida .
P a r a t r a t a r da t eor ia do em pr ego pr opon h o-m e, por t a n t o, u sa r
a pen a s du a s u n ida des de qu a n t ida des fu n da m en t a is, a sa ber , qu a n t i-
da des de va lor m on et á r io e qu a n t ida des de em pr ego. As pr im eir a s sã o
est r it a m en t e h om ogên ea s e pode-se fa zer com qu e a s segu n da s a ssim
o seja m , pois, n a m edida em qu e diver sa s ca t egor ia s e espécies de
t r a ba lh o e em pr ego a ssa la r ia do obt êm u m a r em u n er a çã o r ela t iva m a is
ou m en os fixa , a qu a n t ida de de em pr ego pode ser sa t isfa t or ia m en t e
defin ida pa r a a n ossa fin a lida de, t om a n do u m a h or a de em pr ego de
mão-de-obra comum como unidade e ponderando um a hora de mão-de-obra
especializada proporcionalm ente à sua rem uneração, ou seja, contando
por duas um a hora de mão-de-obra especializada rem unerada ao dobro
da taxa com um. Cham arem os unidade de trabalho à unidade em qu e se
mede o volum e de emprego e unidade de salário ao salário nominal de
uma unidade de trabalho.54 Portanto, E representa a folha de salários,
W a unidade de salários e N a quantidade de emprego, E = N × W.
E st a h ipót ese de h om ogen eida de n a ofer t a de m ã o-de-obr a n ã o
se a lt er a pelo fa t o eviden t e de gr a n des difer en ça s n a ca pa cida de pr o-
fission a l dos diver sos t r a ba lh a dor es e n a s su a s a pt idões pa r a a s t a r efa s
diver sa s. Se a r em u n er a çã o da m ã o-de-obr a é pr opor cion a l à su a efi-
ciên cia , a s difer en ça s sã o leva da s em con t a a o con sider a r qu e os in di-
vídu os con t r ibu em pa r a a ofer t a de t r a ba lh o pr opor cion a lm en t e à su a
r em u n er a çã o; a o pa sso qu e, à m edida qu e a pr odu çã o a u m en t a , a em -
pr esa se vê obr iga da a ocu pa r m ã o-de-obr a ca da vez m en os ú t il pa r a
seu s fin s especia is por u n ida de de sa lá r io pa go; est e é a pen a s u m en t r e
os fa t or es qu e leva m a o r et or n o decr escen t e do equ ipa m en t o de ca pit a l,
em t er m os de pr odu çã o, qu a n do u m a qu a n t ida de m a ior de t r a ba lh o
lh e é a plica da . E n globa m os, por a ssim dizer , a h et er ogen eida de da s
u n ida des de t r a ba lh o igu a lm en t e r em u n er a da s den t r o do equ ipa m en t o,
o qu a l con sider a m os ca da vez m en os a dequ a do pa r a em pr ega r a s u n i-
da des de t r a ba lh o dispon íveis à m edida qu e a pr odu çã o a u m en t a , em
vez de con sider a r qu e est a s u n ida des de t r a ba lh o dispon íveis se t or n a m

54 Se X r epr esen t a u m a u n ida de qu a lqu er m edida em u n ida des m on et á r ia s, ser á , n a m a ior ia


dos ca sos, con ven ien t e r epr esen t a r por X w a m esm a qu a n t ida de m edida em u n ida des de
sa lá r io.

72
KEYN ES

ca da vez m en os a pt a s a u t iliza r u m equ ipa m en t o de ca pit a l h om ogên eo.


Con seqü en t em en t e, se n ã o h á exceden t e de m ã o-de-obr a especia liza da
ou qu a lifica da e se o em pr ego da m ã o-de-obr a m en os ca pa cit a da ca u sa
m a ior cu st o de t r a ba lh o por u n ida de de pr odu çã o, ist o qu er dizer qu e
o r en dim en t o do equ ipa m en t o dim in u i m a is depr essa com a expa n sã o
do em pr ego do qu e dim in u ir ia n u m a sit u a çã o em qu e h ou vesse exce-
den t e de m ã o-de-obr a .55 Mesm o n o ca so ext r em o em qu e a s difer en t es
u n ida des de t r a ba lh o fossem de t a l m odo especia liza da s qu e n ã o pu -
dessem a bsolu t a m en t e su bst it u ir -se u m a s pela s ou t r a s, isso n ã o t r a r ia
dificu lda des, sign ifica n do a pen a s qu e a ela st icida de da ofer t a da pr o-
du çã o, der iva da de u m t ipo especia l de equ ipa m en t o de ca pit a l, desce
r epen t in a m en t e a zer o, qu a n do t oda a m ã o-de-obr a especia liza da dis-
pon ível pa r a seu u so já se en con t r a em pr ega da .56 P or t a n t o, a n ossa
h ipót ese de u m a u n ida de de t r a ba lh o h om ogên ea n ã o su scit a objeções,
a n ã o ser qu e h a ja gr a n de in st a bilida de n a r em u n er a çã o r ela t iva da s
difer en t es u n ida des de t r a ba lh o; e a in da a ssim est a dificu lda de pode
ser leva da em con t a , ca so se a pr esen t e, su pon do qu e a ofer t a de m ã o-
de-obr a e a for m a da fu n çã o da ofer t a a gr ega da t a m bém est a r ia m
su jeit a s a m u da n ça s br u sca s.
No m eu en t en der , evit a r -se-ia m u it a per plexida de desn ecessá r ia

55 É pr incipa lmente por essa r azão que o preço de ofer ta da pr oduçã o cr esce ao m esmo tempo
que a dem anda , mesm o qua ndo existe um excedente de equipa mento do tipo idêntico ao que
está em uso. Se supom os que o excedente de oferta de mã o-de-obr a com põe um a reser va
igua lmente utilizável por todos os empr esár ios e que a mã o-de-obr a em prega da pa ra um fim
deter mina do r ecebe r emuner ação, pelo m enos em pa rte, por unidade de esfor ço e não estr ita-
m ente em propor çã o com a sua eficiência no empr ego específico (hipótese compr ovada na m aior ia
dos casos), a eficiência decrescente da mã o-de-obr a empr egada é um exemplo ma rcante da a lta
de pr eço de ofer ta, com o a umento da pr oduçã o, não devida a deseconomia s interna s.
56 Nã o posso dizer de qu e m odo se su põe qu e a cu r va de ofer t a , n o seu u so com u m , leva em
con t a a dificu lda de a cim a , pois a qu eles qu e dela s se t êm ser vido n ã o escla r ecer a m su fi-
cien t em en t e su a s h ipót eses. P r ova velm en t e su põem qu e a m ã o-de-obr a em pr ega da pa r a fim
det er m in a do é sem pr e r em u n er a da em est r it a pr opor çã o com a su a eficiên cia pa r a est e
fim , m a s ist o é ir r ea list a . Ta lvez a r a zã o pr in cipa l pa r a se con sider a r a va r ia çã o da eficiên cia
da m ã o-de-obr a , com o se est a se r ela cion a sse com o equ ipa m en t o, r esida n o fa t o de os
cr escen t es exceden t es, qu e su r gem à m edida qu e h á a u m en t o de pr odu çã o, ben eficia r em
n a pr á t ica sobr et u do os pr opr iet á r ios do equ ipa m en t o e n ã o a m ã o-de-obr a m a is eficien t e
(em bor a est a possa t er a va n t a gem de ser em pr ega da com m a ior r egu la r ida de e con segu ir
pr om oções m a is r á pida s); ist o sign ifica qu e h om en s de difer en t es eficiên cia s qu e t r a ba lh a m
n o m esm o ser viço r a r a m en t e sã o pa gos em exa t a pr opor çã o com a su a eficiên cia . Qu a n do,
en t r et a n t o, a r em u n er a çã o a u m en t a com a pr odu t ivida de, e à m edida qu e o ca so se a pr esen t a ,
m eu m ét odo t om a -o em con sider a çã o, vist o qu e pa r a ca lcu la r o n ú m er o de u n ida des de
t r a ba lh o em pr ega da s se a t r ibu i a ca da t r a ba lh a dor in dividu a l u m coeficien t e de pon der a çã o
pr opor cion a l à su a r em u n er a çã o. P a r t in do da s m in h a s h ipót eses, obvia m en t e su r gem com -
plica ções in t er essa n t es qu a n do se t r a t a de cu r va s da ofer t a específica s, em se con sider a n do
qu e a su a for m a depen de de pr ocu r a de m ã o-de-obr a qu a lifica da pa r a ou t r os fin s. Ign or a r
essa s com plica ções ser ia , com o disse, n ega r a r ea lida de. No en t a n t o, n ã o pr ecisa m os levá -la s
em con t a qu a n do se t r a t a do em pr ego em con ju n t o, vist o t er m os su post o qu e cer t o volu m e
da dem a n da efet iva se dist r ibu i de m odo pr eciso en t r e os difer en t es pr odu t os, a os qu a is
est á sin gu la r m en t e a ssocia da . P ode a con t ecer , t oda via , qu e essa dist r ibu içã o n ã o se m a n-
t en h a em vir t u de de ca u sa s específica s de va r ia ções n a dem a n da . P or exem plo, u m a u m en t o
na dema nda efetiva devido a um forta lecim ento da pr opensão a consum ir poder ia encontr ar -se
a ssocia do a uma função de ofer ta agr egada difer ente da que corr esponderia a um a umento
igua l da dem anda devido a um ma ior incentivo a investir . Tudo isso, contudo, per tence à
a nálise por menor iza da das idéia s ger ais exposta s e que nã o tenciono, de imedia to, a bor dar .

73
OS ECON OMIS TAS

se n os lim it á ssem os est r it a m en t e à s du a s u n ida des, m oeda e em pr ego,


qu a n do t r a t a m os do com por t a m en t o do sist em a econ ôm ico em seu con -
ju n t o, r eser va n do o u so de u n ida des de det er m in a da s pr odu ções e equ i-
pa m en t os pa r a a a n á lise da pr odu çã o de em pr esa s ou in dú st r ia s con -
sider a da s isola da m en t e; e a o u so de con ceit os va gos, com o o volu m e
de pr odu çã o globa l, a qu a n t ida de de equ ipa m en t o do ca pit a l com o u m
t odo e o n ível ger a l de pr eços, pa r a a s oca siões em qu e bu sca m os
a lgu m a com pa r a çã o h ist ór ica qu e, den t r o de cer t os lim it es (à s vezes
bem a m plos), é r econ h ecida m en t e im pr ecisa e a pr oxim a t iva .
Segu e-se da qu i qu e m edir em os a s m u da n ça s da pr odu çã o cor r en t e
com r efer ên cia a o n ú m er o de h or a s de t r a ba lh o pa ga s e a plica da s a o
equ ipa m en t o exist en t e (t a n t o pa r a sa t isfa zer os con su m idor es com o
pa r a pr odu zir n ovo equ ipa m en t o de ca pit a l), pon der a n do a s h or a s de
t r a ba lh o qu a lifica do de a cor do com su a r em u n er a çã o. Nã o pr ecisa m os
fa zer u m a com pa r a çã o qu a n t it a t iva en t r e est a pr odu çã o e a qu e r e-
su lt a r ia da a ssocia çã o de u m gr u po de t r a ba lh a dor es difer en t e com
u m equ ipa m en t o de ca pit a l difer en t e. P a r a pr ever a m a n eir a com o os
em pr esá r ios qu e possu em cer t o equ ipa m en t o r ea gir ia m à s va r ia ções
da fu n çã o da dem a n da a gr ega da n ã o é n ecessá r io sa ber com o o volu m e
da pr odu çã o r esu lt a n t e, o n ível de vida e o n ível ger a l de pr eços se
com pa r a r ia m com o qu e ser ia m em ou t r a s época s e em ou t r os pa íses.
IV
É fá cil dem on st r a r qu e a s con dições da ofer t a , t a is com o se ex-
pr essa m ger a lm en t e pela cu r va da ofer t a , e a ela st icida de da ofer t a ,
qu e r ela cion a a pr odu çã o com o pr eço, podem ser t r a t a da s n a s du a s
u n ida des escolh ida s, por m eio da fu n çã o da ofer t a a gr ega da , sem r e-
fer ên cia à s qu a n t ida des de pr odu çã o, qu er se t r a t e de u m a em pr esa
ou in dú st r ia in dividu a l, qu er da a t ivida de econ ôm ica em con ju n t o, pois
a fu n çã o da ofer t a a gr ega da pa r a det er m in a da fir m a (e de m odo se-
m elh a n t e pa r a det er m in a da in dú st r ia ou pa r a a in dú st r ia em con ju n t o)
est á r epr esen t a da por
Z r = φr (N r ),

em qu e Z r r epr esen t a o pr odu t o (dedu zido o cu st o de u so) cu ja expec-


t a t iva m ot iva r á u m volu m e de em pr ego N r . P or t a n t o, se a r ela çã o en t r e
em pr ego e pr odu çã o for t a l qu e u m em pr ego N r r esu lt e n u m a pr odu çã o
O r , n a qu a l O r = ψr (N r ), segu e-se qu e

p = Z r + U r (N r ) φr (N r ) + U r (N r )
=
Or ψr (N r )

é a cu r va con ven cion a l da ofer t a , on de U r (N r ) é o cu st o de u so (pr evist o)


cor r espon den t e a u m volu m e de em pr ego N r .
Por esta razão, no caso de qualquer produto hom ogêneo, para o

74
KEYN ES

qu a l O r = ψr (N r ) tenha um valor definido, podemos avaliar Z r = φr (N r )


da m aneira com um; m as então podem os agregar as quantidades N r de
uma forma que não é possível agregar com as Or, porque ΣO r não é um a
quantidade numérica. Além disso, se nos for permitido supor que, em
determ inadas circunstâncias, certo volum e agregado de emprego será dis-
tribuído de um a forma específica entre as indústrias, de tal m odo que N r
seja função de N , pode-se chegar a m aiores sim plificações.

75
C AP ÍTU LO 5
A Ex p e c ta tiv a c o m o Ele m e n to D e te rm in a n te d o
P ro d u to e d o Em p re g o

T oda pr odu çã o se dest in a , em ú lt im a a n á lise, a sa t isfa zer o con -


su m idor . Nor m a lm en t e decor r e a lgu m t em po — à s vezes ba st a n t e —
en t r e o m om en t o em qu e o pr odu t or a ssu m e os cu st os (t en do em vist a
o con su m idor ) e o da com pr a da pr odu çã o pelo con su m idor fin a l. E n -
qu a n t o isso, o em pr esá r io (a plica n do-se est a design a çã o t a n t o a o pr o-
du t or qu a n t o a o in vest idor ) t em de fa zer a s m elh or es pr evisões 57 qu e
lh e sã o possíveis sobr e o qu e os con su m idor es est a r ã o dispost os a pa -
ga r -lh e qu a n do, a pós u m la pso de t em po qu e pode ser con sider á vel,
est iver em con dições de os sa t isfa zer (dir et a ou in dir et a m en t e); e n ã o
lh e r est a ou t r a a lt er n a t iva sen ã o gu ia r -se por est a s pr evisões, se su a
pr odu çã o t em de ser r ea liza da , de qu a lqu er for m a , por pr ocessos qu e
r equ er em t em po.
E st a s expect a t iva s, da s qu a is depen dem a s decisões da a t ivida de
econ ôm ica , dividem -se em dois gr u pos, h a ven do cer t os in divídu os ou
fir m a s especia liza da s n a ela bor a çã o de expect a t iva s do pr im eir o t ipo
e ou t r a s n a ela bor a çã o do segu n do. O pr im eir o t ipo r ela cion a -se com
o pr eço qu e u m fa br ica n t e pode esper a r obt er pela su a pr odu çã o “a ca -
ba da ”, n o m om en t o em qu e se com pr om et e a in icia r o pr ocesso qu e o
pr odu zir á , con sider a n do qu e os pr odu t os est ã o “a ca ba dos” (do pon t o
de vist a do fa br ica n t e) qu a n do pr on t os pa r a ser em u sa dos ou ven didos
a ou t r em . O segu n do r efer e-se a o qu e o em pr esá r io pode esper a r ga n h a r
sob a for m a de r en dim en t os fu t u r os, n o ca so de com pr a r (ou t a lvez
m a n u fa t u r a r ) pr odu t os “a ca ba dos” pa r a os a dicion a r a seu equ ipa m en t o

57 Com r espeit o a o m ét odo pa r a a lca n ça r u m equ iva len t e dest a s expect a t iva s, expr esso em
r eceit a s de ven da s, ver a n ot a 4, Livr o P r im eir o, ca p. 3.

77
OS ECON OMIS TAS

de ca pit a l. Ch a m a r em os à s pr im eir a s expectativas a cu rto prazo e à s


segu n da s expectativas a lon go prazo.
Dest e m odo, o com por t a m en t o de ca da fir m a in dividu a l, a o fixa r
su a pr odu çã o diá r ia ,58 é det er m in a do pela s expectativas a cu rto prazo
— expect a t iva s r ela t iva s a o cu st o da pr odu çã o em diver sa s esca la s e
expect a t iva s r ela t iva s a o pr odu t o da ven da dest a pr odu çã o; n o ca so de
a dições a o equ ipa m en t o de ca pit a l ou m esm o de ven da s a dist r ibu idor es,
est a s expect a t iva s a cu r t o pr a zo depen der ã o, em gr a n de pa r t e, da s
expect a t iva s a lon go pr a zo (ou pr a zo m édio) de ou t r em . Sã o est a s di-
ver sa s expect a t iva s qu e det er m in a m o volu m e de em pr ego ofer ecido
pela s em pr esa s. Os r esu lt a dos efetivam en te realizad os da fa br ica çã o e
da ven da da pr odu çã o só t er ã o in flu ên cia sobr e o em pr ego n a m edida
em qu e con t r ibu a m pa r a m odifica r a s expect a t iva s su bseqü en t es. Ta m -
bém sã o ir r eleva n t es, por ou t r o la do, a s expect a t iva s in icia is qu e in -
du zir a m a fir m a a a dqu ir ir o equ ipa m en t o de ca pit a l e o est oqu e de
pr odu t os in t er m ediá r ios e m a t er ia is sem i-a ca ba dos de qu e dispõe n o
m om en t o em qu e deve decidir sobr e a pr odu çã o do dia segu in t e. P or -
t a n t o, t oda s a s vezes qu e t iver de ser t om a da u m a decisã o, ela o ser á
leva n do em con t a est e equ ipa m en t o e est es est oqu es, m a s à lu z da s
expect a t iva s atu ais a r espeit o dos cu st os e da s ven da s fu tu ras.
Dia n t e disso, de m odo ger a l, u m a m u d an ça n a s expect a t iva s (qu er
a cu r t o qu er a lon go pr a zo) só pr odu zir á plen o efeit o sobr e o em pr ego
depois de u m la pso de t em po con sider á vel. A va r ia çã o do em pr ego
r esu lt a n t e dessa m u da n ça de expect a t iva s n ã o ser á n o segu n do dia
igu a l à m u da n ça do pr im eir o, n em n o t er ceir o igu a l à do segu n do, e
a ssim por dia n t e, a in da qu e n ã o se ver ifiqu em n ova s m u da n ça s de
expect a t iva s. No ca so de expect a t iva s a cu r t o pr a zo, ist o ocor r e pelo
fa t o de a s m u da n ça s de expect a t iva s n ã o se ver ifica r em , em ger a l, com
su ficien t e violên cia ou r a pidez, qu a n do desfa vor á veis, pa r a oca sion a r
o a ba n don o do t r a ba lh o em t odos os pr ocessos pr odu t ivos, cu jo in ício
à lu z de u m a n ova expect a t iva t en h a sido u m er r o; a o pa sso qu e,
qu a n do sã o fa vor á veis, t or n a -se n ecessá r io qu e decor r a cer t o t em po de
pr epa r a çã o a n t es qu e o em pr ego a lca n ce o n ível a qu e t er ia ch ega do,
se a s expect a t iva s t ivessem sido r evist a s a n t es. No ca so da s expect a -
t iva s a lon go pr a zo, o equ ipa m en t o qu e n ã o for su bst it u ído con t in u a r á
pr opor cion a n do em pr ego a t é t or n a r -se desga st a do; a o pa sso qu e, se a
m u da n ça de expect a t iva a lon go pr a zo for fa vor á vel, o em pr ego pode
est a r em u m n ível m a is a lt o n o pr in cípio do qu e depois de pa ssa do o
t em po n ecessá r io pa r a a ju st a r o equ ipa m en t o à n ova sit u a çã o.
Se su pu ser m os qu e cer t o est a do de expect a t iva du r e o t em po
su ficien t e pa r a qu e seu s efeit os sobr e o em pr ego seja m t ã o com plet os

58 Diária sign ifica a qu i o in t er va lo m a is cu r t o a pós o qu a l a em pr esa se a ch a livr e pa r a


r evisa r su a decisã o qu a n t o a o volu m e de em pr ego qu e pr et en de ofer ecer . É , por a ssim
dizer , a u n ida de efet iva m ín im a de t em po econ ôm ico.

78
KEYN ES

qu e, em t er m os ger a is, n ã o h a ja n en h u m a pa r cela do n ível de em pr ego


exist en t e qu e n ã o seja pr odu t o dest e est a do de expect a t iva s, o volu m e
est á vel do em pr ego a ssim obt ido poder á ch a m a r -se em pr ego a lon go
pr a zo,59 cor r espon den t e a esse est a do de expect a t iva . Segu e-se da í qu e,
em bor a a s expect a t iva s possa m m u da r com t a l fr eqü ên cia qu e o volu m e
r ea l do em pr ego n u n ca t en h a t ido t em po de a lca n ça r o em pr ego a
lon go pr a zo cor r espon den t e a o est a do de expect a t iva exist en t e, a ca da
est a do de expect a t iva cor r espon de u m volu m e específico de em pr ego
a lon go pr a zo.
Con sider a r em os, em pr im eir o lu ga r , o pr ocesso de t r a n siçã o pa r a
u m a posiçã o de lon go pr a zo, devida a u m a m u da n ça n a s expect a t iva s,
qu a n do a t r a n siçã o n ã o é per t u r ba da n em in t er r om pida por qu a lqu er
ou t r a m u da n ça de expect a t iva . Su pon h a m os, pr im eir o, u m a m u da n ça
de t a l n a t u r eza qu e o n ovo volu m e de em pr ego de lon go pr a zo seja
m a ior qu e o a n t igo. E m r egr a , a pr in cípio só ser á a fet a do de m a n eir a
con sider á vel o m on t a n t e dos in su m os, ist o é, o volu m e de t r a ba lh o n a s
pr im eir a s et a pa s dos n ovos pr ocessos de pr odu çã o, a o pa sso qu e a
pr odu çã o dos ben s de con su m o e o volu m e de em pr ego n a s et a pa s
fin a is dos pr ocessos em pr een didos a n t es da m u da n ça con t in u a r ã o, sen -
sivelm en t e, os m esm os. Na m edida em qu e exist a m est oqu es de a r t igos
sem i-a ca ba dos, est a con clu sã o poder á ser m odifica da , em bor a pa r eça
pr ová vel qu e o a u m en t o in icia l de em pr ego seja m oder a do. E n t r et a n t o,
com o pa ssa r dos dia s, o em pr ego a u m en t a r á gr a du a lm en t e. Além disso,
é fá cil im a gin a r con dições qu e o leva r ã o, em det er m in a do pon t o, a u m
n ível m ais alto qu e o do n ovo em pr ego a lon go pr a zo. O pr ocesso de
cr ia r ca pit a l pa r a sa t isfa zer o n ovo est a do da s expect a t iva s pode leva r
a u m n ível de em pr ego e, t a m bém , a u m m on t a n t e de con su m o cor r en t e
su per ior es a os a t in gidos qu a n do a lca n ça da a posiçã o de lon go pr a zo.
Assim , a s m u da n ça s n a s expect a t iva s podem leva r o em pr ego a su bir
gr a du a lm en t e a t é a t in gir u m pon t o m á xim o e, em segu ida , declin a r
a t é o n ovo n ível do lon go pr a zo. Ist o t a m bém a con t ece, a in da qu e o
n ovo n ível seja igu al a o a n t er ior , sem pr e qu e a m u da n ça r epr esen t e
u m a n ova or ien t a çã o do con su m o qu e t or n e obsolet os cer t os pr ocessos
exist en t es, ju n t a m en t e com seu r espect ivo equ ipa m en t o. Ou a in da , se
o n ovo volu m e de em pr ego a lon go pr a zo for m en or qu e o a n t igo, o
volu m e de em pr ego du r a n t e a t r a n siçã o pode est a biliza r -se por a lgu m
t em po abaixo do n ível qu e depois ser á a lca n ça do. P or est a r a zã o, u m a
sim ples m u da n ça de expect a t iva é ca pa z, n o decor r er do per íodo em
qu e a m esm a se ver ifica , de pr ovoca r u m a oscila çã o com pa r á vel à de
um movim ento cíclico. Foi esta espécie de m ovimentos que estudei em

59 Nã o é n ecessá r io qu e o volu m e de em pr ego a lon go pr a zo seja con stan te, ist o é, a s con dições
de lon go pr a zo n ã o sã o n ecessa r ia m en t e est á t ica s. P or exem plo, u m a u m en t o r egu la r da
r iqu eza ou da popu la çã o pode con st it u ir u m dos elem en t os de u m a expect a t iva in va r iá vel.
A ú n ica con diçã o é qu e a s expect a t iva s exist en t es deva m t er sido for m u la da s com su ficien t e
a n t ecedên cia .

79
OS ECON OMIS TAS

m in h a obr a T reatise on Money, a propósito da form ação e diminuição dos


estoques de capital circulante e líquido que acom panham as m udanças.
Um pr ocesso de t r a n siçã o in in t er r u pt o, com o o a n t er ior , a t é ch e-
ga r a u m a n ova posiçã o de lon go pr a zo, pode com plica r -se n os por m e-
n or es. Ma s o cu r so r ea l dos a con t ecim en t os é m a is com plica do a in da ,
pois o est a do de expect a t iva s est á su jeit o a va r ia ções con st a n t es, su r -
gin do u m a n ova expect a t iva a n t es qu e a a n t er ior h a ja pr odu zido t odo
o seu efeit o, de t a l m odo qu e o m eca n ism o econ ôm ico est á sem pr e
ocu pa do com n u m er osa s a t ivida des qu e se sobr epõem , cu ja exist ên cia
se deve a os vá r ios est a dos a n t er ior es da s expect a t iva s.
Ist o n os con scien t iza da im por t â n cia qu e t em est e t em a pa r a o
fim a qu e n os pr opom os. É eviden t e, pelo qu e foi dit o a cim a , qu e o
volu m e de em pr ego em u m m om en t o qu a lqu er depen de, em cer t o sen -
t ido, n ã o a pen a s do est a do a t u a l da s expect a t iva s, m a s t a m bém de
t odos os est a dos de expect a t iva qu e exist ir a m n o cu r so de cer t o per íodo
a n t er ior . Toda via , a s expect a t iva s pa ssa da s qu e a in da n ã o se dissol-
ver a m por com plet o est ã o in cor por a da s n o equ ipa m en t o de ca pit a l
a t u a l; dia n t e disso o em pr esá r io deve t om a r su a s decisões, pois a qu ela s
só in flu em sobr e est a s n a m edida em qu e n ela s t en h a m sido in cor po-
r a da s. P ode-se, pois, a despeit o do a n t er ior , dizer qu e o em pr ego de
h oje é gover n a do pela s expect a t iva s de h oje, con sider a da s ju n t a m en t e
com o equ ipa m en t o de ca pit a l de h oje.
Ra r a m en t e se podem evit a r a s r efer ên cia s expr essa s à s expect a -
t iva s cor r en t es a lon go pr a zo. Con t u do, pode-se evit a r u m a a lu sã o ex-
pr essa à expect a t iva a cu rto prazo, vist o qu e, n a pr á t ica , o pr ocesso
de r evisã o da s expect a t iva s a cu r t o pr a zo é gr a du a l e con t ín u o e ocor r e,
em su a m a ior pa r t e, t en do em vist a os r esu lt a dos r ea liza dos, de t a l
m odo qu e os r esu lt a dos esper a dos e os r ea liza dos se con fu n dem e se
en t r ela ça m n os seu s efeit os. Isso por qu e, em bor a a pr odu çã o e o em -
pr ego seja m det er m in a dos pela s expect a t iva s a cu r t o pr a zo do pr odu t or
e n ã o pelos r esu lt a dos obt idos n o pa ssa do, m esm o a ssim os r esu lt a dos
m a is r ecen t es desem pen h a m pa pel pr edom in a n t e n a det er m in a çã o des-
sa s expect a t iva s. Ser ia com plica do dem a is ela bor a r a s expect a t iva s d e
n ovo t oda vez qu e se in icia sse u m pr ocesso pr odu t ivo; m a is do qu e
ist o, ser ia per der t em po, por qu e, de m odo ger a l, gr a n de pa r t e da s cir -
cu n st â n cia s se m a n t ém su bst a n cia lm en t e in va r iá vel de u m dia pa r a
ou t r o. É , por t a n t o, com r a zã o qu e os pr odu t or es ba seia m su a s expec-
t a t iva s n a h ipót ese de qu e a m a ior ia dos r esu lt a dos obser va dos m a is
r ecen t em en t e con t in u a r á , sa lvo n o ca so de h a ver m ot ivos defin idos
pa r a se esper a r u m a m u da n ça . P or isso, exist e, n a r ea lida de, u m a
gr a n de sobr eposiçã o dos efeit os sobr e o em pr ego, os a dvin dos do m on -
t a n t e obt ido com a s ven da s já r ea liza da s da pr odu çã o r ecen t e e os
a dvin dos da s ven da s, qu e se esper a r ea liza r , da pr odu çã o cor r en t e.
Qu a n do os pr odu t or es m odifica m gr a du a lm en t e a s su a s pr evisões, fa -

80
KEYN ES

zem -n o com m a is fr eqü ên cia à lu z dos r esu lt a dos obt idos do qu e t en do


em vist a a s m u da n ça s pr ová veis.60
Nã o devem os, en t r et a n t o, esqu ecer qu e, n o ca so dos ben s du r á veis,
a s expect a t iva s a cu r t o pr a zo do pr odu t or ba seia m -se n a s expect a t iva s
cor r en t es a lon go pr a zo do in vest idor , e qu e n ã o fa z pa r t e da n a t u r eza
da s expect a t iva s a lon go pr a zo poder em ser r evist a s a cu r t os in t er va los
à lu z dos r esu lt a dos r ea liza dos. Além disso, a s expect a t iva s a lon go
pr a zo est ã o su jeit a s a r evisões im pr evist a s, com o ver em os n o ca pít u lo
12, on de pr et en dem os exa m in á -la s m a is det a lh a da m en t e. Assim , o fa t or
da s expect a t iva s cor r en t es a lon go pr a zo n ã o pode, n em sequ er a pr o-
xim a da m en t e, ser elim in a do ou su bst it u ído pelos r esu lt a dos r ea liza dos.

60 E st a ên fa se n a expect a t iva qu e se fa z qu a n do a decisã o de pr odu zir é t om a da con cor da ,


n a m in h a opin iã o, com o pon t o de vist a de H a wt r ey, qu a n do expõe qu e o u so dos fa t or es
de pr odu çã o e o em pr ego sofr em a in flu ên cia da a cu m u la çã o dos est oqu es an tes qu e os
pr eços t en h a m ba ixa do ou qu e a fr u st r a çã o com r espeit o à pr odu çã o se r eflit a n u m a per da
sofr ida pr opor cion a lm en t e à expect a t iva . Isso por qu e a a cu m u la çã o de est oqu es n ã o ven didos
(ou a dim in u içã o de pedidos pa r a o fu t u r o) é pr ecisa m en t e o t ipo de a con t ecim en t o qu e
m a is pr oba bilida de t em de fa zer com qu e o u so de fa t or es pr odu t ivos difir a , m a is a in da
qu e o in dica do pela s sim ples est a t íst ica s a r espeit o da r eceit a de ven da s da pr odu çã o pr évia
se a s m esm a s fossem pr ojet a da s sem leva r em con t a o per íodo segu in t e.

81
C AP ÍTU LO 6
D e fin iç ã o d e Re n d a , P o u p a n ç a e In v e s tim e n to

I. Re n d a

D en t r o de det er m in a do per íodo, u m em pr esá r io t er á ven dido pr o-


du t os a ca ba dos a con su m idor es ou a ou t r os em pr esá r ios por u m a im -
por t â n cia qu e design a r em os A. E le t er á , t a m bém , ga st o cer t a som a
qu e ser á design a da A 1 , pa r a com pr a r a r t igos a ca ba dos de ou t r os em -
pr esá r ios. Ter á , a o fin a l, u m equ ipa m en t o de ca pit a l qu e in clu i t a n t o
seu s est oqu es de ben s n ã o a ca ba dos, ou ca pit a l cir cu la n t e, com o seu s
est oqu es de ben s a ca ba dos, com o va lor de G.
E n t r et a n t o, cer t a pa r t e de A + G – A 1 n ã o deve ser a t r ibu ída à s
a t ivida des do per íodo em qu est ã o, e sim a o equ ipa m en t o de ca pit a l
qu e o em pr esá r io possu ía n o in ício do per íodo. P or t a n t o, a fim de ch ega r
a o n osso con ceit o de r en da do per íodo cor r en t e, t em os de dedu zir de
A + G – A 1 cer t o m on t a n t e qu e é, de cer t a for m a , devido a o equ ipa m en t o
h er da do do per íodo a n t er ior . O pr oblem a de defin ir a r en da ser á r e-
solvido logo qu e t en h a m os en con t r a do u m m ét odo sa t isfa t ór io pa r a
ca lcu la r est a dedu çã o.
H á dois pr ocessos difer en t es pa r a est e cá lcu lo, ca da qu a l com
su a im por t â n cia ; u m deles se r ela cion a com a pr odu çã o, e o ou t r o se
r ela cion a com o con su m o. Va m os exa m in á -los su cessiva m en t e.

(i) O va lor efet ivo G do equ ipa m en t o de ca pit a l n o fim do per íodo
é o r esu lt a do líqu ido, de u m la do, do qu e o em pr esá r io fez pa r a con -
ser vá -lo e m elh or á -lo du r a n t e esse per íodo, qu er pela s com pr a s a ou t r os
em pr esá r ios, qu er pelo t r a ba lh o por ele m esm o r ea liza do, e, de ou t r o
la do, do desga st e ou da depr ecia çã o decor r en t e do u so a qu e o su bm et eu
n a pr odu çã o de ben s. Se ele t ivesse decidido n ão u sá-lo pa r a a pr odu çã o,
a in da a ssim lh e con vir ia ga st a r cer t o m on t a n t e de r ecu r sos, a t ít u lo
de ot im iza çã o pa r a m a n t ê-lo e m elh or á -lo. Su pon h a m os qu e, n est e ca so,
t ivesse ga st o a qu a n t ia B & pa r a essa con ser va çã o e m elh or ia e qu e,

83
OS ECON OMIS TAS

n essa s cir cu n st â n cia s, o va lor do equ ipa m en t o fosse G& n o fin a l do


per íodo. Ist o sign ifica qu e G& – B & é o m á xim o va lor líqu ido qu e poder ia
t er sido con ser va do do per íodo a n t er ior , se o equ ipa m en t o n ã o h ou vesse
sido u t iliza do n a pr odu çã o de A . O exceden t e desse va lor pot en cia l do
equ ipa m en t o sobr e G – A 1 é a m edida do qu e se sa cr ificou (de u m
m odo ou de ou t r o) pa r a pr odu zir A. Ch a m a r em os a essa qu a n t ida de,
a sa ber ,

(G& – B &) – (G – A 1 ),

qu e m ede o sa cr ifício do va lor com pr een dido n a pr odu çã o de A, o cu sto


d e u so d e A. O cu sto d e u so ser á r epr esen t a do por U.61 À qu a n t ia pa ga
pelo em pr esá r io a os dem a is fa t or es de pr odu çã o em t r oca de seu s ser -
viços, qu e pa r a os m esm os vem a ser a su a r en da , ch a m a r em os cu sto
d e fatores de A. Ch a m a r em os cu sto prim ário da pr odu çã o A à som a
do cu st o de fa t or es F e do cu st o de u so U.
P odem os, en t ã o, defin ir a ren d a 62 do em pr esá r io com o a difer en ça
en t r e o va lor da su a pr odu çã o a ca ba da , ven dida du r a n t e o per íodo, e
o cu st o pr im á r io. E st a é a qu a n t ida de qu e ele bu sca m a xim iza r , su jeit a
à esca la de su a pr odu çã o, ou seja , é o seu lu cr o br u t o, n a a cepçã o
cor r en t e dest e t er m o, o qu e est á de a cor do com o sen so com u m . Con -
seqü en t em en t e, com o a r en da do r est o da com u n ida de é igu a l a o cu st o
de fa t or es do em pr esá r io, a r en da a gr ega da é igu a l a A – U.
A r en da , a ssim defin ida , é u m a qu a n t ida de com plet a m en t e in e-
qu ívoca . Adem a is, com o a expect a t iva do em pr esá r io, qu a n do fixa o
volu m e de em pr ego a con ceder a os ou t r os fa t or es de pr odu çã o, é obt er
a m á xim a difer en ça en t r e est a qu a n t ida de e a som a pa ga a os fa t or es
de pr odu çã o, segu e-se qu e a r en da do em pr esá r io t em im por t â n cia
vit a l pa r a o em pr ego.
P ode-se con ceber , n a t u r a lm en t e, qu e G – A 1 exceda G& – B&, de
m odo qu e o cu st o de u so ven h a a ser n ega t ivo. Ist o pode ser o ca so,
por exem plo, se a con t ecer de escolh er m os u m per íodo em qu e a u t ili-
za çã o dos in su m os t en h a a u m en t a do sem qu e a pr odu çã o r esu lt a n t e
t en h a t ido t em po de a lca n ça r a et a pa de a ca ba m en t o e de ven da . O
m esm o poder á , t a m bém , ocor r er sem pr e qu e h ou ver in vest im en t o po-
sit ivo, se con sider a r m os a possibilida de de a in dú st r ia ch ega r a t a l
gr a u de in t egr a çã o qu e os em pr esá r ios pr odu za m , eles pr ópr ios, a m a ior
pa r t e de seu equ ipa m en t o. Nã o obst a n t e isso, desde qu e o cu st o de
u so a pen a s seja n ega t ivo qu a n do o em pr esá r io t en h a a u m en t a do seu
equ ipa m en t o com o pr ópr io t r a ba lh o, podem os pen sa r qu e o cu st o de
u so é n or m a lm en t e posit ivo n u m a econ om ia cu jo equ ipa m en t o de ca pit a l
t en h a sido, em su a m a ior pa r t e, fa br ica do por em pr esa s difer en t es da s

61 O cu st o de u so ser á objet o de obser va ções m a is a m pla s n o Apên dice a est e ca pít u lo.
62 Difer en t e de seu ren d im en to líqu id o, qu e defin ir em os m a is a dia n t e.

84
KEYN ES

qu e o u t iliza m . Além disso, é difícil con ceber u m ca so em qu e o cu st o


dU
de u so m argin al a ssocia do a u m a u m en t o de A, ist o é, , seja ou t r a
dA
coisa qu e n ã o posit ivo.
Ta lvez seja con ven ien t e m en cion a r a qu i, em a n t ecipa çã o à ú lt im a
pa r t e dest e ca pít u lo, qu e, pa r a a com u n ida de em con ju n t o, o con su m o
a gr ega do (C) do per íodo é igu a l a Σ (A – A 1 ), e o in vestim en to agregad o
(I) igu a l a Σ (A 1 – U). Além disso, U é o desin vest im en t o do em pr esá r io
in dividu a l (e – U, seu in vest im en t o) r ela t iva m en t e a o seu pr ópr io equ i-
pa m en t o, exclu in do o qu e ele com pr a a ou t r os em pr esá r ios. Assim ,
n u m sist em a com plet a m en t e in t egr a do (n o qu a l A 1 = O), o con su m o é
igu a l a A e o in vest im en t o a – U, ist o é, a G – (G& – B &). A pequ en a
com plica çã o a n t er ior , ca u sa da pela in t r odu çã o de A 1 , deve-se sim ples-
m en t e a o desejo de a dot a r u m a fór m u la ger a l qu e com pr een da o ca so
de u m sist em a de pr odu çã o n ã o in t egr a do.
Além disso, a d em an d a efetiva é sim plesm en t e a r en da a gr ega da
(ou pr odu t o) qu e os em pr esá r ios esper a m r eceber , in clu ída s a s r en da s
qu e fa zem pa ssa r à s m ã os dos ou t r os fa t or es de pr odu çã o, por m eio
do volu m e de em pr ego cor r en t e qu e r esolvem con ceder . A fu n çã o de
dem a n da a gr ega da r ela cion a vá r ia s qu a n t ida des h ipot ét ica s de em pr e-
go com os r en dim en t os qu e se esper a obt er do volu m e de su a pr odu çã o;
e a pr ocu r a efet iva é u m pon t o n a fu n çã o da dem a n da a gr ega da qu e
se t or n a r ea lida de por qu e, leva n do em con t a a s con dições da ofer t a ,
ela cor r espon de a o n ível de em pr ego qu e m a xim iza a s expect a t iva s de
lu cr o do em pr esá r io.
E st e con ju n t o de defin ições t em a in da a va n t a gem de n os per m it ir
igu a la r o va lor do pr odu t o m a r gin a l (ou r en da ) a o cu st o m a r gin a l dos
fa t or es, ch ega n do a ssim à m esm a sér ie de pr oposições qu e r ela cion a
o pr odu t o m a r gin a l, com o foi defin ido, com o cu st o m a r gin a l dos fa t or es,
t a l com o foi est a belecido pelos econ om ist a s qu e, ign or a n do o cu st o de
u so ou su pon do-o zer o, igu a la r a m o pr eço da ofer t a 63 a o cu st o m a r gin a l
dos fa t or es.64

63 O preço d e oferta é, pen so eu , u m a expr essã o in su ficien t em en t e defin ida qu a n do se ign or a


o con ceit o de cu st o de u so. O a ssu n t o ser á est u da do m a is a m pla m en t e n o Apên dice a est e
ca pít u lo, on de su st en t o qu e a exclu sã o do cu st o de u so do pr eço de ofer t a , em bor a seja por
vezes cor r et a pa r a o ca so do pr eço da ofer t a a gr ega da , é in a dequ a da qu a n do se t r a t a dos
pr oblem a s r ela t ivos a o pr eço de ofer t a de u m a u n ida de de pr odu çã o pa r a u m a em pr esa
in dividu a l.
64 P or exemplo, tom emos Z ω = φ(N ) ou, alter nativa mente, Z = W. φ(N ) como a função da ofer ta
a grega da (onde W é a unida de de sa lár io e X.Z ω = Z ). Entã o, desde que a receita m ar ginal
seja igua l a o custo ma rgina l dos fator es par a ca da ponto da curva da oferta a grega da, temos

ΔN = ΔA ω – ΔU ω = ΔZ ω = Δφ(N ),

ist o é, φ&(N ), desde qu e o cu st o de fa t or es m a n t en h a r ela çã o con st a n t e com o cu st o de sa lá r io


e qu e a fu n çã o da ofer t a a gr ega da pa r a ca da em pr esa (cu jo n ú m er o se su põe con st a n t e)
seja in depen den t e do n ú m er o de h om en s em pr ega dos n a s ou t r a s in dú st r ia s, de m a n eir a

85
OS ECON OMIS TAS

(ii) P a ssem os, em segu ida , a o segu n do dos pr in cípios m en cion a dos
a n t es. At é a qu i t r a t a m os da pa r t e da s va r ia ções n o va lor do equ ipa -
m en t o de ca pit a l en t r e o com eço e o fim do per íodo, r esu lt a n t es da s
decisões volu n tárias t om a da s pelo em pr esá r io a fim de con segu ir o
lu cr o m á xim o. Ma s podem , t a m bém , ser ver ifica da s per da s (ou lu cr os)
in volu n tárias n o va lor do seu equ ipa m en t o de ca pit a l, por m ot ivos qu e
esca pa m a o seu con t r ole e qu e sã o in depen den t es de su a s decisões
cor r en t es, com o, por exem plo, u m a m u da n ça n os va lor es de m er ca do,
desga st e por obsolescên cia ou m er a a çã o do t em po ou , a in da , dest r u içã o
r esu lt a n t e de ca t á st r ofes, t a is com o u m a gu er r a ou u m t er r em ot o. Al-
gu m a s dessa s per da s in volu n t á r ia s, em bor a in evit á veis, n ã o sã o — em
t er m os ger a is — im pr evisíveis, com o é o ca so da s per da s devida s à
a çã o do t em po in depen den t em en t e do u so e, t a m bém , da obsolescên cia
“n or m a l” qu e, com o a cen t u a o pr ofessor P igou , “é ba st a n t e r egu la r
pa r a ser pr evist a , se n ã o em det a lh e, pelo m en os grosso m od o”. In -
clu in do, poder ía m os a cr escen t a r a s per da s da com u n ida de em con ju n t o,
a s qu a is sã o ba st a n t e r egu la r es pa r a ser h a bit u a lm en t e con sider a da s
“r iscos segu r á veis”. Ign or em os, por en qu a n t o, o fa t o de qu e o m on t a n t e
da s per da s pr evist a s va r ia segu n do a época em qu e se su põe for m u la da
a expect a t iva , e ch a m em os à depr ecia çã o do equ ipa m en t o — qu e é
in volu n t á r ia , m a s n ã o im pr evist a , a o exceden t e da depr ecia çã o pr evist a
sobr e o cu st o de u so — de cu sto su plem en tar, qu e r epr esen t a r em os
por V . Decer t o, é desn ecessá r io in dica r qu e est a defin içã o n ã o é a
m esm a do cu st o su plem en t a r de Ma r sh a ll, em bor a a idéia su bja cen t e,
qu e é a de leva r em con sider a çã o a pa r t e da depr ecia çã o pr evist a qu e
n ã o en t r a n o cu st o pr im á r io, seja sem elh a n t e.
P or t a n t o, qu a n do se ca lcu la m a ren d a líqu id a e o lu cro líqu id o
do em pr esá r io, é com u m dedu zir da r en da e do lu cr o br u t o, t a is com o
for a m defin idos a n t es, o m on t a n t e com pu t a do do cu st o su plem en t a r ,
por qu e o efeit o psicológico do cu st o su plem en t a r sobr e o em pr esá r io,
qu a n do est e con sider a o qu e pode ga st a r ou pou pa r , é vir t u a lm en t e
igu a l a o qu e lh e pr odu zir ia o lu cr o br u t o. Na su a qu a lida de de prod u tor,
decidin do se u t iliza r á ou n ã o o seu equ ipa m en t o, o cu st o pr im á r io e
o lu cr o br u t o, t a is com o for a m defin idos a n t er ior m en t e, sã o pa r a ele
os con ceit os im por t a n t es. P or ém , n a qu a lida de de con su m id or, o m on -
t a n t e do cu st o su plem en t a r exer ce em su a m en t e o m esm o efeit o qu e
se fizesse pa r t e do cu st o pr im á r io. P or t a n t o, a o defin ir m os a r en da
agregada líquida, deduzindo tanto o custo suplementar com o o custo de
uso, de maneira que a renda líquida agregada seja igual a A – U – V,

qu e os t er m os da equ a çã o a n t er ior , vá lidos pa r a ca da em pr esá r io in dividu a l, possa m a pli-


ca r -se a t odos em con ju n t o. Isso qu er dizer qu e, se os sa lá r ios for em con st a n t es e os dem a is
fa t or es do cu st o con ser va r em r ela çã o fixa com a folh a de sa lá r ios, a fu n çã o da ofer t a
a gr ega da é lin ea r com u m a in clin a çã o da da pela r ecípr oca dos sa lá r ios n om in a is.

86
KEYN ES

n ã o a pen a s n os a pr oxim a m os do cost u m e gen er a liza do, com o t a m bém


ch ega m os a u m con ceit o r eleva n t e pa r a o n ível de con su m o.
Rest a -n os exa m in a r a va r ia çã o n o va lor do equ ipa m en t o, decor -
r en t e de m u da n ça s im pr evist a s n os va lor es de m er ca do, obsolescên cia
excepcion a l ou dest r u içã o por efeit o de ca t á st r ofes, va r ia çã o est a qu e
é — n u m sen t ido a m plo — im pr evist a . A per da r ea l decor r en t e dest a
va r ia çã o, qu e n ã o leva m os em con t a m esm o a o ca lcu la r a r en da líqu ida ,
e qu e la n ça m os n a con t a de ca pit a l, pode ch a m a r -se perd a im previsível.
A im por t â n cia cau sal da r en da líqu ida r eside n a in flu ên cia psi-
cológica da m a gn it u de de V sobr e o m on t a n t e do con su m o cor r en t e,
pois a ren d a líqu id a é a qu a n t ia qu e o h om em com u m con sider a su a
r en da dispon ível qu a n do decide qu a n t o ga st a r á em seu con su m o cor -
r en t e. Ist o n ã o é, n a t u r a lm en t e, o ú n ico fa t or qu e ele t em em vist a
qu a n do decide o m on t a n t e de seu s ga st os. At r ibu i, por exem plo, con -
sider á vel im por t â n cia a os lu cr os ou per da s im pr evisíveis qu e r ea liza
n a con t a de ca pit a l. Ma s o cu st o su plem en t a r e u m a per da im pr evisível
difer em n o sen t ido de qu e a s a lt er a ções n o pr im eir o podem a fet á -lo
exatam en te d a m esm a m an eira qu e a s va r ia ções de seu lu cr o br u t o. O
qu e gover n a o con su m o do em pr esá r io é o exceden t e do pr odu t o da
ven da da pr odu çã o cor r en t e sobr e a som a do cu st o pr im á r io e do cu st o
su plem en t a r , a o pa sso qu e, m esm o qu a n do a s per da s (ou lu cr os) im -
pr evisíveis in t er vêm n a s su a s decisões, n ã o o fa zem n a m esm a esca la ,
pois det er m in a da per da im pr evisível n ã o t em o m esm o efeit o qu e u m
cu st o su plem en t a r cor r espon den t e.
Con t u do, devem os a gor a r ecor r er à idéia de qu e a lin h a de se-
pa r a çã o en t r e os cu st os su plem en t a r es e a s per da s im pr evisíveis, ist o
é, en t r e a s per da s in evit á veis qu e ju lga m os n or m a l debit a r à con t a de
r en da e a s qu e con sider a m os r a zoá vel com pu t a r com o per da (ou lu cr o)
im pr evisível à con t a de ca pit a l, é, em pa r t e, con ven cion a l ou psicológica ,
depen den do de qu a is seja m os cr it ér ios com u m en t e a ceit os pa r a a es-
t im a t iva da s pr im eir a s. Nã o se pode, pois, est a belecer u m pr in cípio
exclu sivo pa r a a s a va lia ções do cu st o su plem en t a r , e o seu m on t a n t e
depen der á do m ét odo de cá lcu lo qu e escolh er m os. O va lor pr evist o do
cu st o su plem en t a r , qu a n do se pr odu z in icia lm en t e o equ ipa m en t o, é
u m a qu a n t ida de defin ida . P or ém , se t or n a r a ser ca lcu la do em época
u lt er ior , seu m on t a n t e pa r a o r est o da vida do equ ipa m en t o pode t er
va r ia do em con seqü ên cia de u m a a lt er a çã o qu e se t en h a pr odu zido,
n o in t er va lo, em n ossa s expect a t iva s, sen do a s per da s im pr evisíveis
de ca pit a l o va lor descon t a do da difer en ça en t r e a s sér ies pr ová veis
de U + V n a s expect a t iva s a n t iga e r evisa da . É u m pr in cípio a m pla -
m en t e a dm it ido n a con t a bilida de com er cia l, com a sa n çã o da s a u t or i-
da des do In la n d Reven u e,65 fixa r em cer t a qu a n t ia a som a do cu st o

65 B oard of In lan d R even u e. Na Gr ã -Br et a n h a , o ór gã o en ca r r ega do de fixa r e de r ecolh er


t a xa s dir et a s (im post o sobr e a r en da , im post o sobr e ga n h os de ca pit a l, im post o sobr e t r a n s-
fer ên cia de ca pit a l et c.).

87
OS ECON OMIS TAS

su plem en t a r e do cu st o de u so qu a n do se a dqu ir e o equ ipa m en t o, e


m a n t ê-lo sem a lt er a çã o du r a n t e a vida do equ ipa m en t o, qu a isqu er qu e
seja m a s m u da n ça s u lt er ior es da expect a t iva . Nest e ca so, con sider a -se
cu st o su plem en t a r cor r espon den t e a u m per íodo qu a lqu er o exceden t e
da qu a n t ia fixa da de a n t em ã o sobr e o cu st o de u so r ea l. Ist o t em a
va n t a gem de a ssegu r a r qu e os lu cr os ou per da s im pr evisíveis se r e-
du zir ã o a zer o en qu a n t o du r a r o equ ipa m en t o, con sider a do em seu
con ju n t o. Ta m bém é r a zoá vel, em cer t a s cir cu n st â n cia s, t or n a r a ca l-
cu la r o cu st o su plem en t a r n a ba se dos va lor es e da s expect a t iva s cor -
r en t es a in t er va los con t á beis a r bit r á r ios, por exem plo, a n u a lm en t e. De
fa t o, os h om en s de n egócio diver gem sobr e o m ét odo a ser a dot a do.
Ta lvez seja con ven ien t e ch a m a r a expect a t iva in icia l do cu st o su ple-
m en t a r , qu a n do se a dqu ir e o equ ipa m en t o, de cu sto su plem en tar básico,
e de cu sto su plem en tar atu al a m esm a qu a n t ida de r ea ju st a da n a ba se
dos va lor es e da s expect a t iva s a t u a is.
O m a is qu e podem os a pr oxim a r -n os, por t a n t o, de u m a defin içã o
qu a n t it a t iva do cu st o su plem en t a r é dizer qu e ele in clu i a s dedu ções
feit a s por u m em pr esá r io t ípico em su a r en da a n t es de ca lcu la r o qu e
ele con sider a a su a r en da líqu id a qu a n do decla r a u m dividen do (n o
ca so de u m a socieda de), ou qu a n do det er m in a a esca la do seu con su m o
cor r en t e (n o ca so de u m in divídu o). Desde qu e n ã o se podem su pr im ir
os en ca r gos im pr evist os da con t a de ca pit a l, é n a t u r a lm en t e pr efer ível,
em ca so de dú vida , la n ça r u m it em n est a con t a de ca pit a l e só in clu ir
n o cu st o su plem en t a r o qu e r igor osa m en t e lh e cor r espon da . Qu a lqu er
sobr eca r ga , pois, n a pr im eir a pode ser cor r igida a t r ibu in do-lh e m a is
im por t â n cia s sobr e o m on t a n t e do con su m o cor r en t e do qu e lh e ser ia
dest in a do de ou t r o m odo.
Obser ve-se qu e a n ossa defin içã o de ren d a líqu id a se a pr oxim a
m u it o da defin içã o de ren d a de Ma r sh a ll, qu a n do est e decidiu r efu -
gia r -se n a s pr á t ica s da s a u t or ida des do Im post o sobr e a Ren da e, em
t er m os ger a is, con sider a r r en da t u do o qu e a qu ela s a u t or ida des, de
a cor do com su a exper iên cia , ju lga m dever ser t r a t a do com o t a l. Isso
por qu e a est r u t u r a de su a s decisões pode ser con sider a da o r esu lt a do
da a n á lise m a is cu ida dosa e ext en sa de qu e se dispõe pa r a in t er pr et a r
o qu e, n a pr á t ica , h a bit u a lm en t e, se con sider a r en da líqu ida . E la cor -
r espon de, t a m bém , a o va lor m on et á r io do dividen do n a cion a l segu n do
a m a is r ecen t e defin içã o do pr ofessor P igou .66
Acon t ece, en t r et a n t o, qu e a r en da líqu ida n ã o é u m a n oçã o per -
feit a m en t e cla r a , por r epou sa r n u m cr it ér io equ ívoco qu e difer en t es
a u t or ida des podem in t er pr et a r de for m a difer en t e. O pr ofessor H a yek,
por exem plo, su ger iu qu e, in dividu a lm en t e, u m pr opr iet á r io de ben s
de ca pit a l pode pr ocu r a r m a n t er con st a n t e a r en da qu e deles t ir a , de

66 E con om ic J ou rn al. J u n h o de 1935, p. 235.

88
KEYN ES

t a l m odo qu e n ã o se sen t e livr e pa r a ga st a r su a r en da em con su m o


a n t es de h a ver post o de la do o su ficien t e pa r a com pen sa r qu a lqu er
t en dên cia pa r a ba ixa qu e, por qu a lqu er m ot ivo, m a n ifest a sse a su a
r en da dest in a da a in vest im en t o.67 Du vido qu e exist a sem elh a n t e in di-
vídu o, m a s, eviden t em en t e, n ã o se pode opor n en h u m a objeçã o t eór ica
a est a dedu çã o com o ba se de u m possível cr it ér io psicológico de r en da
líqu ida . Con t u do, qu a n do o pr ofessor H a yek dedu z qu e os con ceit os de
pou pa n ça e de in vest im en t o sã o m a r ca dos por u m a cor r espon den t e
im pr ecisã o, só t em r a zã o à m edida qu e se r efer e à pou pan ça líqu id a
e a o in vestim en to líqu id o. As n oções de pou pan ça e de in vestim en to,
qu e sã o r eleva n t es n a t eor ia do em pr ego, est ã o isen t a s desse defeit o
e, con for m e já dem on st r a m os a n t es, a dm it em u m a defin içã o objet iva .
É pois u m er r o pôr t oda a ên fa se n a ren d a líqu id a, cu ja r elevâ n cia
a pen a s se a plica à s decisões r ela t iva s a o con su m o, e qu e, a lém dist o,
est á sepa r a da u n ica m en t e por u m a t ên u e lin h a dos vá r ios ou t r os fa t or es
qu e a fet a m o con su m o; é t a m bém u m er r o n egligen cia r (com o a con t ece
com u m en t e) o con ceit o de ren d a pr opr ia m en t e dit o, qu e é o con ceit o
r eleva n t e pa r a a s decisões con cer n en t es à pr odu çã o cor r en t e e qu e est á
isen t o de qu a lqu er a m bigü ida de.
As defin ições de r en da e de r en da líqu ida , a pr esen t a da s a cim a ,
pr ocu r a m a pr oxim a r -se t a n t o qu a n t o possível do u so com u m . Devo,
por t a n t o, lem br a r desde já a o leit or qu e em m in h a obr a T reatise on
M on ey defin i a r en da n u m sen t ido especia l. A pecu lia r ida de da m in h a
defin içã o a n t er ior r efer ia -se à pa r t e da r en da a gr ega da qu e obt êm os
em pr esá r ios, já qu e n ã o levei em con t a a r en da (br u t a ou líqu ida ) de
fa t o pr oven ien t e da s su a s oper a ções cor r en t es, n em o lu cr o qu e espe-
r a va m con segu ir qu a n do r esolver a m in icia r su a s n ova s oper a ções cor -
r en t es, m a s a n t es, em cer t o sen t ido (qu e a gor a m e pa r ece in su ficien -
t em en t e defin ido se con sider a r m os a possibilida de de m u da n ça s n a
esca la de pr odu çã o), u m lu cr o n or m a l ou de equ ilíbr io, com o r esu lt a do
de qu e, n est a defin içã o, a pou pa n ça su per a va o in vest im en t o n o exce-
den t e do lu cr o n or m a l sobr e o lu cr o r ea l. Receio qu e o u so dest es t er m os
t en h a ca u sa do ba st a n t e con fu sã o, especia lm en t e n a u t iliza çã o cor r ela -
t iva da pa la vr a pou pa n ça , vist o qu e a s con clu sões (especia lm en t e a s
r ela cion a da s com o exceden t e da pou pa n ça sobr e o in vest im en t o), a pe-
n a s vá lida s se os t er m os em pr ega dos fossem in t er pr et a dos n o sen t ido
especia l qu e lh es a t r ibu í, pa ssa r a m a ser fr eqü en t em en t e u sa da s em
discu ssões popu la r es, on de os t er m os sã o em pr ega dos n u m sen t ido m a is
com u m . P or est a r a zã o, e t a m bém por qu e os t er m os de qu e m e ser vi
deixa r a m de ser in dispen sá veis pa r a expr im ir m in h a s idéia s com pr e-
cisã o, r esolvi a ba n don á -los, la m en t a n do m u it o a con fu sã o qu e eles t e-
n h a m ca u sa do.

67 "Th e Ma in t en a n ce of Ca pit a l". In : E con om ica. Agost o de 1935. p. 241 et seqs.

89
OS ECON OMIS TAS

II. P o u p a n ç a e In v e s tim e n to
É sem pr e a gr a dá vel descobr ir u m pon t o fixo em m eio a o t u r bilh ã o
de a cepções diver gen t es da s pa la vr a s. Segu n do eu en t en do, t odos con -
cor da m em qu e pou pan ça sign ifica o exceden t e do r en dim en t o sobr e
os ga st os de con su m o. Assim sen do, a s ú n ica s dú vida s possíveis a r es-
peit o do sign ifica do de pou pan ça sã o a s dú vida s qu e podem or igin a r
qu er o sen t ido de ren d a qu er o sen t ido de con su m o. A ren d a já foi
defin ida a cim a . Os ga st os em con su m o du r a n t e u m per íodo qu a lqu er
deve r epr esen t a r o va lor dos a r t igos ven didos a os con su m idor es du r a n t e
esse per íodo, o qu e n os r econ du z a o pr oblem a de sa ber o qu e se en t en de
por con su m idor -com pr a dor . Qu a lqu er defin içã o r a zoá vel da lin h a de
sepa r a çã o en t r e con su m idor es-com pr a dor es e in vest idor es-com pr a dor es
n os ser á igu a lm en t e ú t il desde qu e a plica da de m a n eir a coer en t e. J á
se t em discu t ido sobr e pr oblem a s com o, por exem plo, o de sa ber se é
legít im o con sider a r a com pr a de u m a u t om óvel u m ga st o de con su m o
e a com pr a de u m a ca sa u m ga st o de in vest im en t o, e eu n a da t en h o
de essen cia l a a cr escen t a r a o deba t e. O cr it ér io deve, eviden t em en t e,
cor r espon der a o pon t o em qu e se h á de t r a ça r a lin h a qu e sepa r a o
con su m idor do em pr esá r io. Assim , a o defin ir m os A 1 com o o va lor do
qu e u m em pr esá r io com pr a a ou t r o, r esolvem os, im plicit a m en t e, a qu es-
t ã o. Segu e-se da qu i qu e o ga st o em con su m o pode ser defin ido, in e-
qu ivoca m en t e, com o Σ (A – A 1 ), on de ΣA r epr esen t a o t ot a l da s ven da s
feit a s du r a n t e o per íodo, e ΣA 1 , o t ot a l da s ven da s em ger a l por u m
em pr esá r io a ou t r o, n o qu e segu e con vir á , em ger a l, om it ir Σ e design a r
por A a s ven da s a gr ega da s de t oda s a s espécies, por A 1 a s ven da s
a gr ega da s r ea liza da s en t r e em pr esá r ios, e por U a som a a gr ega da do
cu st o de u so dos em pr esá r ios.
Ch ega n do-se a gor a à defin içã o t a n t o de ren d a com o de con su m o,
a defin içã o de pou pan ça, qu e é o exceden t e da r en da sobr e o con su m o,
t orn a -se u m a con seqü ên cia n a t u r a l. Um a vez qu e a r en da é igu a l a
A – U e o con su m o a A – A 1 , d edu z-se qu e a pou p a n ça é igu a l a
A 1 – U . De m odo sem elh a n t e, a p ou pa n ça líqu ida , qu e é o exceden t e
da r en da líqu id a sobr e o con su m o, é igu a l a A 1 – U – V .
Nossa defin içã o de r en da t a m bém n os leva logo à defin içã o de
in vestim en to corren te. Qu er em os, pois, dizer com isso a a diçã o cor r en t e
a o va lor do equ ipa m en t o de ca pit a l qu e r esu lt ou da a t ivida de pr odu t iva
do per íodo. E viden t em en t e, ela equ iva le a o qu e a ca ba de ser defin ido
com o pou pa n ça , pois r epr esen t a a pa r t e da r en da do per íodo n ã o a b-
sor vida pelo con su m o. Com o vim os a cim a , o r esu lt a do da s oper a ções
pr odu t iva s de u m per íodo é qu e os em pr esá r ios, dedu zida s a s com pr a s
A 1 qu e fa zem en t r e si, ch ega m a o fim do per íodo t en do ven dido os
pr odu t os a ca ba dos com va lor A e con ser va n do u m equ ipa m en t o de
ca pit a l qu e sofr eu , com o r esu lt a do da ven da A, u m a det er ior a çã o m edida
por U (ou u m a m elh or ia expr essa por – U , on de U é n ega t ivo). Du r a n t e

90
KEYN ES

o m esm o per íodo, t er ã o sido a bsor vidos pelo con su m o pr odu t os a ca ba dos
com va lor de A – A 1. O exceden t e de A – U sobr e A – A 1 , ou seja , A 1
– U , é a a diçã o a o equ ipa m en t o de ca pit a l qu e r esu lt ou da s a t ivida des
pr odu t iva s do per íodo, con st it u in do, por t a n t o, o in vestim en to r ea liza do
n esse per íodo. Do m esm o m odo, A 1 – U – V, qu e é a a diçã o líqu id a
a o equ ipa m en t o de ca pit a l, u m vez dedu zida a depr ecia çã o n or m a l do
seu va lor in depen den t e do u so e in depen den t e da s m u da n ça s im pr e-
visíveis de va lor do equ ipa m en t o qu e podem ser la n çá veis à con t a de
ca pit a l, é o in vestim en to líqu id o do per íodo.
P or est a r a zã o, em bor a o m on t a n t e da p ou pa n ça seja o r esu l-
t a do do com por t a m en t o colet ivo dos con su m idor es in dividu a is, e o
m on t a n t e do in vest im en t o r esu lt e d o com por t a m en t o colet ivo dos
em p r esá r ios, est es d ois m on t a n t es sã o, n ecessa r ia m en t e, igu a is, vis-
t o qu e qu a lqu er deles é igu a l a o exceden t e da r en da sobr e o con su m o.
Adem a is, est a con clu sã o de m od o a lgu m depen de de su t ileza s ou
pecu lia r ida d es d e defin içã o de r en da expost a a n t es. Desde qu e se
a d m it a qu e a r en da seja igu a l a o va lor da p r od u çã o cor r en t e, qu e
o in vest im en t o cor r en t e seja igu a l à pa r t e da d it a pr odu çã o cor r en t e
n ã o con su m ida e qu e a p ou pa n ça seja igu a l a o exceden t e da r en da
sobr e o con su m o — sen d o qu e t u do ist o est á de con for m id a de com
o sen so com u m e com o cost u m e t r a dicion a l d a gr a n de m a ior ia dos
econ om ist a s —, a igu a ld a de en t r e a pou pa n ça e o in vest im en t o é
u m a con seqü ên cia n a t u r a l. E m r esu m o:

Ren da = va lor da pr odu çã o = con su m o + in vest im en t o.


P ou pa n ça = r en da – con su m o.
P or t a n t o, pou pa n ça = in vest im en t o.

Assim , qu alqu er con ju n t o de defin ições qu e sa t isfa ça a s con dições


a n t er ior es leva à m esm a con clu sã o. É a pen a s com a n ega çã o da va lidez
de qu a lqu er u m a dela s qu e se pode evit a r est a con clu sã o.
A equ iva lên cia en t r e a qu a n t ida de de pou pa n ça e a qu a n t ida de
de in vest im en t o decor r e do ca r á t er bilateral da s t r a n sa ções en t r e o
pr odu t or , de u m la do, e o con su m idor ou o com pr a dor de equ ipa m en t o
de ca pit a l de ou t r o la do. A r en da cr ia -se pelo exceden t e do va lor qu e
o pr odu t or obt ém da pr odu çã o qu e ven deu sobr e o cu st o de u so, m a s
a t ot a lida de dest a pr odu çã o deve t er sido ven dida , obvia m en t e, a u m
con su m idor ou a ou t r o em pr esá r io e o in vest im en t o cor r en t e de ca da
em pr esá r io é igu a l a o exceden t e sobr e o seu pr ópr io cu st o de u so do
equ ipa m en t o qu e com pr ou a ou t r os em pr esá r ios. P or t a n t o, em con ju n t o,
o exceden t e da r en da sobr e o con su m o, a qu e ch a m a m os pou pa n ça ,
n ã o pode difer ir da a diçã o a equ ipa m en t o de ca pit a l, a qu e ch a m a m os
in vest im en t o. O m esm o su cede com a pou pa n ça líqu ida e o in vest im en t o
líqu ido. A pou pa n ça , de fa t o, n ã o pa ssa de u m sim ples r esídu o. As
decisões de con su m ir e a s decisões de in vest ir det er m in a m , con ju n t a -

91
OS ECON OMIS TAS

m en t e, os r en dim en t os. P r esu m in do qu e a s decisões de in vest ir se t or -


n em efet iva s, é for çoso qu e ela s r est r in ja m o con su m o ou a m pliem a
r en da . Assim sen do, n en h u m a t o de in vest im en t o, por si m esm o, pode
deixa r de det er m in a r qu e o r esídu o ou m a r gem , a qu e ch a m a m os pou -
pa n ça , a u m en t e n u m a qu a n t ida de equ iva len t e.
P oder ia a con t ecer n a t u r a lm en t e qu e os in divídu os fossem t ã o tête
m on tée em su a s decisões a r espeit o do qu e dever ia m pou pa r ou in vest ir ,
r espect iva m en t e, qu e n ã o h ou vesse n ível de equ ilíbr io de pr eços em
qu e a s t r a n sa ções pu dessem r ea liza r -se. Nest e ca so, n ossa s pr oposições
deixa r ia m de ser a plicá veis, vist o qu e a pr odu çã o n ã o m a is t er ia u m
va lor de m er ca do defin ido e os pr eços n ã o en con t r a r ia m pon t o de equ i-
líbr io en t r e zer o e o in fin it o. Toda via , a exper iên cia m ost r a qu e, de
fa t o, n ã o é a ssim ; e qu e exist em r ea ções psicológica s h a bit u a is qu e
per m it em a lca n ça r u m equ ilíbr io n o qu a l a disposiçã o de com pr a r é
igu a l à disposiçã o de ven der . A exist ên cia de u m va lor de m er ca do
pa r a a pr odu çã o é, a o m esm o t em po qu e con diçã o n ecessá r ia pa r a qu e
a r en da n om in a l t en h a u m va lor defin ido, u m a con diçã o su ficien t e
pa r a qu e o m on t a n t e a gr ega do qu e os qu e pou pa m decidem pou pa r
seja igu a l a o m on t a n t e a gr ega do qu e os qu e in vest em decidem in vest ir .
Ta lvez n est e pon t o o a ssu n t o possa ser escla r ecido, pen sa n do-se,
de pr efer ên cia , em t er m os da s decisões de con su m ir (ou de se a bst er
de con su m ir ), em vez da s decisões de pou pa r . Um a decisã o de con su m ir
ou n ã o con su m ir est á , cer t a m en t e, a o a lca n ce do in divídu o, o m esm o
su ceden do com u m a decisã o de in vest ir ou n ã o in vest ir . Os m on t a n t es
da r en da a gr ega da e da pou pa n ça a gr ega da sã o resu ltad os da livr e
escolh a dos in divídu os sobr e se con su m ir ã o ou deixa r ã o de con su m ir ,
sobr e se fa r ã o ou n ã o in vest im en t os; por ém , n en h u m desses m on t a n t es
logr a r á a lca n ça r u m va lor in depen den t e qu e r esu lt e de u m gr u po se-
pa r a do de decisões est r a n h a s à s qu e con cer n em a o con su m o e a o in -
vest im en t o. De a cor do com est e pr in cípio, o con ceit o da propen são a
con su m ir t om a r á n a con t in u a çã o dest a obr a o lu ga r da pr open sã o ou
disposiçã o a pou pa r .

92
A P ÊN D ICE S OB RE O
C U S TO D E U S O
I

O cu st o de u so, n a m in h a opin iã o, t em pa r a a t eor ia clá ssica


do va lor u m a im por t â n cia qu e t em sido m u it a s vezes ign or a da . H á
m a is pa r a dizer a esse r espeit o do qu e ser ia r eleva n t e ou opor t u n o
fa zê-lo a qu i. P or ém , a t ít u lo de digr essã o, fa r em os n est e a pên dice u m a
a n á lise m a is por m en or iza da a seu r espeit o.
O cu st o de u so de u m em pr esá r io é, por defin içã o, igu a l a
A 1 + (G& – B &) – G,
on de A 1 r epr esen t a o m on t a n t e da s com pr a s qu e o em pr esá r io fa z a
ou t r os em pr esá r ios, G o va lor r ea l do seu equ ipa m en t o de ca pit a l n o
fim do per íodo, e G& o va lor qu e esse equ ipa m en t o t er ia n o fim do
per íodo se ele se h ou vesse a bst ido de o u t iliza r e t ivesse ga st o a som a
ót im a B & pa r a su a m a n u t en çã o e m elh or a m en t o. Or a , G – (G& – B &), a
sa ber , o exceden t e do va lor , do equ ipa m en t o do em pr esá r io sobr e o
va lor líqu ido pr oven ien t e do per íodo a n t er ior , r epr esen t a o in vest im en t o
cor r en t e do em pr esá r io feit o n o seu equ ipa m en t o, qu e pode ser expr esso
por I. Assim , U , o cu st o de u so de seu gir o de ven da s A, é igu a l a A 1
– I, on de A 1 r epr esen t a o qu e ele com pr ou a ou t r os em pr esá r ios e I o
qu e ele in vest iu cor r en t em en t e n o seu pr ópr io equ ipa m en t o. Um a li-
geir a r eflexã o m ost r a r á qu e isso n ã o pa ssa de sim ples sen so com u m .
Um a pa r t e de seu s desem bolsos qu e vã o pa r a ou t r os em pr esá r ios é
com pen sa da pelo va lor do in vest im en t o cor r en t e r ea liza do em seu pr ó-
pr io equ ipa m en t o, e o r est o r epr esen t a o sa cr ifício qu e lh e cu st ou a
pr odu çã o ven dida a lém da som a qu e ele pa gou a os fa t or es da pr odu çã o.
Se o leit or t en t a r expr im ir o essen cia l dest a s idéia s de ou t r a for m a ,
ver ifica r á qu e est a ofer ece a va n t a gem de evit a r pr oblem a s de con t a -
bilida de in solú veis (e desn ecessá r ios). Cr eio n ã o h a ver ou t r o m eio de
a n a lisa r de for m a in equ ívoca os r esu lt a dos cor r en t es da pr odu çã o. Se

93
OS ECON OMIS TAS

a in dú st r ia se a ch a com plet a m en t e in t egr a da ou se o em pr esá r io n a da


com pr ou for a , de m a n eir a qu e A 1 = 0, o cu st o de u so é sim plesm en t e
o equ iva len t e do desin vest im en t o cor r en t e r ela t ivo a o u so do equ ipa -
m en t o, m a s fica -n os a va n t a gem de n ã o t er , em m om en t o a lgu m dest a
a n á lise, de dist r ibu ir o cu st o dos fa t or es en t r e os ben s qu e se ven dem
e o equ ipa m en t o qu e se con ser va . P odem os, a ssim , con sider a r o volu m e
de em pr ego ofer ecido por u m a em pr esa , in dividu a l ou in t egr a da , com o
r esu lt a do de u m a ú n ica decisã o globa l; m ét odo qu e cor r espon de a o
ca r á t er efet iva m en t e in t er depen den t e en t r e a pr odu çã o do qu e se ven de
cor r en t em en t e e a pr odu çã o t ot a l.
O con ceit o de cu st o de u so n os per m it e, a lém disso, da r u m a
defin içã o m a is cla r a qu e a u su a l do pr eço da ofer t a de cu r t o pr a zo de
u m a u n ida de da pr odu çã o ven dá vel de u m a em pr esa , pois o pr eço da
ofer t a a cu r t o pr a zo é, com efeit o, a som a do cu st o m a r gin a l de fa t or es
e do cu st o m a r gin a l de u so.
Or a , é u m a pr á t ica u su a l n a t eor ia m oder n a do va lor igu a la r o
pr eço de ofer t a de cu r t o pr a zo som en t e a o cu st o m a r gin a l dos fa t or es.
Con t u do, é óbvio qu e t a l pr á t ica só é vá lida qu a n do o cu st o m a r gin a l
de u so for zer o, ou se for a dot a da u m a defin içã o especia l do pr eço de
ofer t a qu e exclu a o cu st o m a r gin a l de u so, da m esm a m a n eir a qu e
defin i (p. 59) o “pr odu t o de ven da s” e o “pr eço da ofer t a a gr ega da ” sem
leva r em con t a o cu st o de u so a gr ega do. P or ém , em bor a possa ser à s
vezes con ven ien t e dedu zir o cu st o de u so, qu a n do se est u da a prod u ção
com o u m tod o, est e m ét odo t ir a à n ossa a n á lise t odo r ea lism o, se de
m odo h a bit u a l (e t á cit o) se a plica à pr odu çã o de u m a ú n ica in dú st r ia
ou em pr esa , pois cr ia u m a difer en ça en t r e o “pr eço de ofer t a ” de u m
a r t igo e o seu “pr eço” n o sen t ido h a bit u a l da pa la vr a ; e est a pr á t ica
pode t er or igin a do cer t a con fu sã o. P a r ece qu e se su pôs t er o “pr eço de
ofer t a ” u m sign ifica do eviden t e qu a n do se a plica a u m a u n ida de da
pr odu çã o, dest in a da à ven da , pr oven ien t e de u m a fir m a in dividu a l,
sem ju lga r n ecessá r io en t r a r em m a ior es discu ssões sobr e o a ssu n t o.
Toda via , a o t r a t a r do qu e se com pr a a ou t r a s fir m a s e da depr ecia çã o
do equ ipa m en t o da pr ópr ia fir m a com o con seqü ên cia da pr odu çã o m a r -
gin a l, t r opeça -se com t oda a sér ie de com plica ções qu e a com pa n h a m
a defin içã o de r en da . Mesm o a dm it in do qu e, n o ca so de com pr a s feit a s
a ou t r a s em pr esa s, o cu st o m a r gin a l da s com pr a s cor r espon den t es à
ven da de u m a u n ida de a dicion a l deva ser dedu zido do pr odu t o da ven da
dessa u n ida de, a fim de obt er o qu e defin im os com o pr eço de ofer t a
da em pr esa , r est a -n os a in da leva r em con t a o in vest im en t o m a r gin a l
qu e a ca r r et a n o pr ópr io equ ipa m en t o da em pr esa a pr odu çã o da u n ida de
m a r gin a l. Ain da qu e t oda a pr odu çã o est ivesse a ca r go de u m a em pr esa
com plet a m en t e in t egr a da , n ã o ser ia m ot ivo pa r a su por qu e o cu st o
m a r gin a l de u so fosse zer o, ist o é, qu e, em ger a l, o desin vest im en t o
m a r gin a l det er m in a do n o equ ipa m en t o pela pr odu çã o m a r gin a l possa
ser n egligen cia do.

94
KEYN ES

Os con ceit os de cu st o de u so e de cu st o su plem en t a r t a m bém


n os per m it em est a belecer u m a r ela çã o m a is cla r a en t r e o pr eço de
ofer t a pa r a lon go pr a zo e o pr eço de ofer t a pa r a cu r t o pr a zo. O cu st o
de lon go pr a zo deve, n a t u r a lm en t e, in clu ir u m a som a dest in a da a cobr ir
o cu st o su plem en t a r bá sico, a ssim com o u m a m édia do cu st o pr im á r io
pr evist o, devida m en t e ca lcu la da pa r a a du r a çã o do equ ipa m en t o. Ist o
sign ifica qu e o cu st o de pr odu çã o de lon go pr a zo é igu a l à som a pr evist a
pa r a o cu st o pr im á r io e o cu st o su plem en t a r ; e, a lém disso, pa r a qu e
h a ja u m lu cr o n or m a l, o pr eço de ofer t a de lon go pr a zo deve exceder
o cu st o de lon go pr a zo, a ssim ca lcu la do, n u m m on t a n t e qu e se det er -
m in a a plica n do a o cu st o do equ ipa m en t o u m per cen t u a l a dicion a l igu a l
à t a xa de ju r os cor r en t e sobr e em pr ést im os de pr a zos e r iscos equ iva -
len t es. Ou , se pr efer ir m os t om a r u m a t a xa de ju r os pa dr ã o “pu r a ”,
dever em os in clu ir n o cu st o de lon go pr a zo u m t er ceir o t er m o, a qu e
poder ía m os ch a m a r cu sto d e risco, dest in a do a cobr ir a s difer en ça s qu e
possa m su r gir por m ot ivos ign or a dos en t r e o r en dim en t o pr evist o e o
efet ivo. P or t a n t o, o pr eço de ofer t a de lon go pr a zo é igu a l à som a do
cu st o pr im á r io, do cu st o su plem en t a r , do cu st o de r isco e do cu st o de
ju r os, o qu a l pode ser a n a lisa do exa m in a n do-se est es com pon en t es. O
pr eço de ofer t a de cu r t o pr a zo, por ou t r o la do, é igu a l a o cu st o pr im á r io
m argin al. O em pr esá r io, qu a n do com pr a ou con st r ói o seu equ ipa m en t o,
deve, por t a n t o, esper a r cobr ir os seu s cu st os su plem en t a r es, de r isco
e de ju r os com o exceden t e de va lor m a r gin a l do cu st o pr im á r io sobr e
o va lor m édio do m esm o; desse m odo, n o equ ilíbr io a lon go pr a zo, o
exceden t e do cu st o pr im á r io m a r gin a l sobr e o cu st o pr im á r io m édio é
igu a l à som a dos cu st os su plem en t a r , de r isco e de ju r os.68
O n ível da pr odu çã o, n o qu a l o cu st o pr im á r io m a r gin a l é exa -
t a m en t e igu a l à som a dos cu st os pr im á r ios e su plem en t a r es m édios,
t em u m a im por t â n cia especia l, por ser a qu ele n o qu a l os cu st os e a s
r eceit a s do em pr esá r io se equ ilibr a m . Ist o é, cor r espon de a o pon t o em
qu e o lu cr o líqu ido é zer o; a o pa sso qu e com u m a pr odu çã o m en or
est a r á ele oper a n do com per da líqu ida .
À m edida qu e é n ecessá r io a t en der a o cu st o su plem en t a r , in de-

68 E ssa m a n eir a de expr im ir t em com o ba se a h ipót ese con ven ien t e de qu e a cu r va do cu st o


pr im á r io m a r gin a l é con t ín u a em t oda a fa ixa de va r ia ções n a pr odu çã o. De fa t o, est a
h ipót ese n em sem pr e se a da pt a à r ea lida de, e pode h a ver u m ou m a is pon t os de descon -
t in u ida de, sobr et u do qu a n do a pr odu çã o a lca n ça u m volu m e cor r espon den t e à plen a ca pa-
cida de t écn ica do equ ipa m en t o. Nest e ca so, a a n á lise m a r gin a l é pa r cia lm en t e defeit u osa ;
e o pr eço pode exced er o cu st o pr im á r io m a r gin a l, qu a n do est e seja ca lcu la do n o ca so de
u m a ligeir a d im in u ição da pr odu çã o. (Igu a lm en t e, pode a pr esen t a r -se com cer t a fr eqü ên cia
u m a descon t in u ida de pa r a ba ixo, ist o é, pa r a u m decr éscim o da pr odu çã o abaixo d e certo
n ível.) Ist o é im por t a n t e qu a n do con sider a m os o pr eço de ofer t a de cu r t o pr a zo n o equ ilíbr io
de lon go pr a zo, pois em t a l ca so devem -se su por em a çã o qu a isqu er descon t in u ida des cor -
r espon den t es a o n ível de plen a ca pa cida de t écn ica . Assim , o pr eço de ofer t a de cu r t o pr a zo
n o equ ilíbr io a lon go pr a zo pode t er de exceder o cu st o pr im á r io m a r gin a l (ca lcu la do em
t er m os de u m a ligeir a d im in u ição da pr odu çã o).

95
OS ECON OMIS TAS

pen den t em en t e do cu st o pr im á r io, va r ia m u it o de u m t ipo de equ ipa -


m en t o pa r a ou t r o. E is a qu i dois ca sos ext r em os:

(i) Um a pa r t e da m a n u t en çã o do equ ipa m en t o deve, n ecessa r ia -


m en t e, r ea liza r -se pari passu com o a t o de u t iliza çã o (por exem plo,
lu br ifica r a m á qu in a ). E st e t ipo de ga st o (à pa r t e a s com pr a s feit a s
for a ) in clu i-se n o cu st o de fa t or es. Se por m ot ivos de or dem física o
m on t a n t e exa t o do t ot a l da depr ecia çã o cor r en t e t iver de ser cober t o
dest e m odo, o m on t a n t e do cu st o de u so (à pa r t e a s com pr a s feit a s
for a ) ser ia igu a l e opost o a o do cu st o su plem en t a r ; e n o equ ilíbr io a
lon go pr a zo, o cu st o m a r gin a l de fa t or es exceder ia o cu st o m édio de
fa t or es n u m a som a igu a l a os cu st os de r isco e de ju r os.

(ii) Um a pa r t e da dim in u içã o do va lor do equ ipa m en t o só se


pr odu z qu a n do est e é u t iliza do. E st a pa r cela é debit a da a o cu st o à
m edida qu e n ã o é r ea liza da pari passu com o a t o de u t iliza çã o. Se a
per da do va lor do equ ipa m en t o se ver ifica sse u n ica m en t e dest a m a -
n eir a , o cu st o su plem en t a r ser ia zer o.

Ta lvez va lh a a pen a a ssin a la r qu e u m em pr esá r io n ã o u t iliza


em pr im eir o lu ga r o seu equ ipa m en t o pior e m a is velh o pelo fa t o de
seu cu st o de u so ser ba ixo, pois est e pode ser m a is qu e a n u la do pela
su a in eficiên cia r ela t iva , ou seja , pela eleva çã o do cu st o de fa t or es.
P or est e m ot ivo, u m em pr esá r io u t iliza de pr efer ên cia a pa r t e do seu
equ ipa m en t o em qu e o cu st o de u so m ais o cu st o dos fa t or es é m ín im o
por u n ida de pr odu zida .69 Segu e-se qu e a ca da volu m e de pr odu çã o do
bem em pa u t a cor r espon de u m cu st o de u so,70 m a s qu e n ã o exist e
r ela çã o u n ifor m e en t r e est e cu st o de u so t ot a l e o cu st o de u so m a r gin a l,
ist o é, com o a u m en t o do cu st o de u so r esu lt a n t e de u m a u m en t o do
n ível de pr odu çã o.

II

O cu st o de u so é u m dos elos qu e liga m o pr esen t e e o fu t u r o,


pois, qu a n do u m em pr esá r io fixa a su a esca la de pr odu çã o, t em de
escolh er en t r e u t iliza r im edia t a m en t e o seu equ ipa m en t o ou con ser vá -lo
pa r a o u t iliza r m a is t a r de. O qu e det er m in a o m on t a n t e do cu st o de

69 Um a vez qu e o cu st o de u so depen de, em pa r t e, da s expect a t iva s r ela t iva s a o n ível fu t u r o


dos sa lá r ios, u m a r edu çã o n a u n ida de de sa lá r io qu e se esper e seja pr ovisór ia fa r á com
qu e o cu st o de fa t or es e o cu st o de u so se desloqu em em pr opor ções difer en t es e dest e
m odo in flu a m sobr e o t ipo de equ ipa m en t o a ser u sa do e, possivelm en t e, sobr e o m on t a n t e
da dem a n da efet iva , pois o cu st o de fa t or es e o cu st o de u so podem in t er vir de m a n eir a
difer en t e n a det er m in a çã o da dem a n da efet iva .
70 O cu st o de u so do equ ipa m en t o u t iliza do em pr im eir o lu ga r n ã o é n ecessa r ia m en t e in de-
pen den t e do volu m e t ot a l da pr odu çã o (veja -se m a is a dia n t e), ist o é, o cu st o de u so pode
ser a fet a do em t oda a su a ext en sã o qu a n do o volu m e t ot a l da pr odu çã o va r ia .

96
KEYN ES

u so é o sa cr ifício esper a do de lu cr os fu t u r os decor r en t e da u t iliza çã o


im edia t a , e é o volu m e m a r gin a l dest e sa cr ifício qu e, ju n t a m en t e com
o cu st o m a r gin a l dos fa t or es e a r eceit a m a r gin a l esper a da , det er m in a
a su a esca la de pr odu çã o. Com o, en t ã o, ca lcu la o em pr esá r io o cu st o
de u so de u m a t o de pr odu çã o?
Defin im os o cu st o de u so com o sen do a r edu çã o de va lor sofr ida
pelo equ ipa m en t o em vir t u de de su a u t iliza çã o, com pa r a da com a qu e
t er ia sofr ido se n ã o t ivesse h a vido t a l u t iliza çã o, leva n do em con t a o
cu st o de m a n u t en çã o e da s m elh or ia s qu e con viesse r ea liza r , a lém da s
com pr a s a ou t r os em pr esá r ios. P a r a det er m in a r esse cu st o de u so,
por t a n t o, deve ser ca lcu la do o va lor descon t a do do r en dim en t o a dicion a l
pr ová vel qu e se obt er ia em da t a post er ior se o equ ipa m en t o n ã o fosse
u t iliza do im edia t a m en t e. Or a , est e va lor deve ser pelo m en os igu a l a o
va lor a t u a l da opor t u n ida de de a dia r a r eposiçã o do equ ipa m en t o em
vir t u de de su a in a t ivida de; e o m esm o pode ser m a ior .71
Se n ã o h ou ver est oqu es excessivos ou r edu n da n t es, de m a n eir a
qu e n ova s u n ida des de equ ipa m en t o sim ila r seja m pr odu zida s t odos
os a n os pa r a ser em a dicion a da s à s a n t iga s ou su bst it u í-la s, é eviden t e
qu e o cu st o m a r gin a l de u so se ca lcu la r á t en do em con t a a r edu çã o
da vida pelo u so ou a eficá cia do equ ipa m en t o e t en do em con t a t a m bém
o cu st o cor r en t e de r eposiçã o. Se, pelo con t r á r io, o equ ipa m en t o for
r edu n da n t e, o cu st o de u so t a m bém depen der á da t a xa de ju r os e do
cu st o su plem en t a r cor r en t e (qu er dizer , ca lcu la do de n ovo) n o per íodo
a n t er ior à qu ele em qu e se pr evê qu e a r edu n dâ n cia ser á a bsor vida
pelo desga st e et c. Dest a m a n eir a , o cu st o de ju r os e o cu st o su plem en t a r
cor r en t e en t r a m dir et a m en t e n os cá lcu los do cu st o de u so.
O cá lcu lo a pr esen t a -se em su a for m a m a is sim ples e in t eligível
qu a n do o cu st o de fa t or es é zer o, com o, por exem plo, n o ca so de u m
est oqu e r edu n da n t e de m a t ér ia -pr im a t a l com o o cobr e, de a cor do com
os pr in cípios qu e est a beleci em m in h a obr a T reatise on M on ey, v. II,
ca p. 29. Tom em os os va lor es pr ová veis do cobr e em vá r ia s da t a s fu t u r a s,
sér ie qu e ser á det er m in a da pela pr opor çã o em qu e o exceden t e seja
a bsor vido e t en da gr a du a lm en t e pa r a o cu st o ju lga do n or m a l. O va lor
a t u a l ou o cu st o de u m a t on ela da de cobr e exceden t e ser á , por t a n t o,
igu a l a o m a ior dos va lor es qu e possa m ser obt idos su bt r a in do-se do
va lor fu t u r o ca lcu la do de u m a t on ela da de cobr e, pa r a qu a lqu er da t a
est a belecida , o cu st o dos ju r os e o cu st o su plem en t a r cor r en t e de u m a
t on ela da de cobr e en t r e a da t a con sider a da e o m om en t o a t u a l. Do
m esm o m odo, o cu st o de u so de u m n a vio, u m a fá br ica ou u m a m á qu in a ,
qu a n do h á ofer t a exceden t e dest es t ipos de equ ipa m en t o, é o seu cu st o

71 Ser á m a ior qu a n do se esper a con segu ir u m r en dim en t o su per ior a o n or m a l em a lgu m a


da t a fu t u r a e esse per íodo n ã o seja ba st a n t e lon go pa r a ju st ifica r (ou per m it ir ) a pr odu çã o
de u m equ ipa m en t o n ovo. O cu st o de u so a t u a l é igu a l a o m á xim o dos va lor es descon t a dos
dos r en dim en t os pot en cia is esper a dos em t oda s a s da t a s fu t u r a s.

97
OS ECON OMIS TAS

esper a do de r eposiçã o descon t a do a u m a t a xa igu a l à per cen t a gem qu e


r epr esen t a a som a do seu cu st o de ju r o e do cu st o su plem en t a r cor r en t e,
com ba se n a da t a pr esu m ível da a bsor çã o do exceden t e.
Supusemos que o equipam ento será oportunam ente substituído por
outro artigo idêntico. Se o equipam ento em questão não for substituído
por outro idêntico quando estiver gasto, seu custo de uso deverá ser cal-
culado aplicando-se ao custo de uso do equipam ento novo que será instalado
no lugar do antigo, na época em que este for posto fora de uso, um coe-
ficiente determinado pela sua respectiva eficiência relativa.
III

O leit or deve n ot a r qu e, qu a n do o equ ipa m en t o n ã o é obsolet o,


m a s a pen a s su pér flu o n o m om en t o, a difer en ça en t r e o cu st o de u so
efet ivo e o seu va lor n or m a l (ist o é, o va lor qu e t er ia se n ã o h ou vesse
equ ipa m en t o de sobr a ) va r ia com o in t er va lo de t em po qu e se ju lga
t r a n scor r er a n t es qu e o exceden t e seja a bsor vido. P or t a n t o, se o t ipo
de equ ipa m en t o con sider a do for dos qu e se vã o a ca ba n do a os pou cos,
e n ã o “de u m a só vez”, de m odo qu e u m a pr opor çã o r a zoá vel ch egu e
a o fim de su a vida ú t il a n u a lm en t e, o cu st o m a r gin a l de u so n ã o ca ir á
m u it o, a m en os qu e a pa r t e su pér flu a seja excepcion a lm en t e gr a n de.
No ca so de u m a depr essã o ger a l, o cu st o m a r gin a l de u so depen der á
da du r a çã o pr ová vel qu e os em pr esá r ios a t r ibu ír em à cr ise. Dest e m odo,
a a lt a do pr eço de ofer t a qu a n do os n egócios com eça r em a m elh or a r
pode dever -se, em pa r t e, a u m r á pido a u m en t o do cu st o m a r gin a l de
u so, r esu lt a n t e de u m a r evisã o da s expect a t iva s.
Con t r a r ia m en t e à opin iã o dos h om en s de n egócios, t em -se su s-
t en t a do a lgu m a s vezes qu e os esqu em a s or ga n iza dos pa r a t r a n sfor m a r
em su ca t a a s in st a la ções in du st r ia is exceden t es n ã o podem pr odu zir
os deseja dos efeit os de eleva r os pr eços a n ã o ser qu e se a pliqu em a o
total da in st a la çã o exceden t e. A n oçã o de cu st o de u so, por ém , m ost r a
com o a elim in a çã o (diga m os) da m et a de do equ ipa m en t o exceden t e
pode pr ovoca r u m a a lt a im edia t a dos pr eços, por qu e, a o a pr oxim a r -se
a da t a da r ea bsor çã o do m a t er ia l exceden t e, essa polít ica a u m en t a o
cu st o m a r gin a l de u so e, con seqü en t em en t e, eleva o pr eço cor r en t e de
ofer t a . P oder ia , a ssim , pa r ecer qu e os h om en s de n egócios t êm im plícit a
em m en t e a n oçã o do cu st o de u so, em bor a n ã o a for m u lem cla r a m en t e.
Se o cu st o su plem en t a r for eleva do, dedu z-se qu e o cu st o de u so
ser á ba ixo qu a n do h ou ver equ ipa m en t o exceden t e. Além disso, qu a n do
h ou ver equ ipa m en t o exceden t e, n ã o é pr ová vel qu e os cu st os m a r gin a is
de fa t or es e de u so u lt r a pa ssem em m u it o seu s va lor es m édios. Se
est a s du a s con dições sã o a t en dida s, a exist ên cia de equ ipa m en t o ex-
ceden t e leva r á , pr ova velm en t e, o em pr esá r io a t r a ba lh a r com u m a per -
da líqu ida — e t a lvez com u m a eleva da per da líqu ida . Nã o h a ver á
t r a n siçã o br u sca dest e est a do de coisa s pa r a o de lu cr os n or m a is, qu e
su r ge n o m om en t o em qu e o equ ipa m en t o exceden t e é a bsor vido. À

98
KEYN ES

m edida qu e o exceden t e dim in u i, o cu st o de u so eleva -se gr a du a lm en t e;


e a difer en ça en t r e o va lor m a r gin a l e o va lor m édio dos cu st os de
fa t or es e de u so pode, t a m bém , a u m en t a r gr a du a lm en t e.
IV

Na obr a Prin ciples of E con om ics de Ma r sh a ll (6ª ed., p. 360),


u m a pa r t e do cu st o de u so é in clu ída n o cu st o pr im á r io sob a r u br ica
de “desga st e ext r a do equ ipa m en t o”. Ma s n ã o h á n en h u m a in dica çã o
sobr e o m odo de ca lcu la r est e fa t or ou sobr e a su a im por t â n cia . Na
su a obr a T h eory of Un em ploym en t (p. 42), o P r ofessor P igou su põe,
expr essa m en t e, qu e o desin vest im en t o m a r gin a l det er m in a do n o equ i-
pa m en t o pela pr odu çã o m a r gin a l pode, em ger a l, ser despr eza do: “As
va r ia ções n o m on t a n t e do desga st e sofr ido pelo equ ipa m en t o e n os
cu st os do t r a ba lh o n ã o m a n u a l em pr ega do, qu e a com pa n h a m a s va -
r ia ções do volu m e de pr odu çã o, em ger a l n ã o sã o leva da s em con t a
por ser em de im por t â n cia secu n dá r ia ”.72 Na ver da de, a idéia de qu e
o desin vest im en t o n o equ ipa m en t o é zer o n a m a r gem de pr odu çã o en -
con t r a -se em boa pa r t e da t eor ia econ ôm ica r ecen t e. Ma s o pr oblem a
a dqu ir e im por t â n cia eviden t e logo qu e se a pr esen t a a n ecessida de de
explica r com exa t idã o o qu e sign ifica o pr eço de ofer t a de u m a fir m a
in dividu a l.
É ver da de qu e o cu st o de m a n u t en çã o de u m equ ipa m en t o in a t ivo
pode, fr eqü en t em en t e, pela s r a zões in dica da s, r edu zir o m on t a n t e do
cu st o m a r gin a l de u so, especia lm en t e qu a n do se pr evê qu e a depr essã o
du r a r á m u it o t em po. Nã o obst a n t e isso, u m cu st o de u so ba ixo n a
m a r gem n ã o é a ca r a ct er íst ica do per íodo cu r t o com o t a l, m a s a n t es
de cer t a s sit u a ções e espécies de equ ipa m en t o cu jo cu st o de m a n u t en çã o
se r evela eleva do qu a n do in a t ivo, bem com o dos desequ ilíbr ios qu e se
ca r a ct er iza m por u m a r á pida obsolescên cia ou gr a n de r edu n dâ n cia ,
especia lm en t e se u n idos a u m a gr a n de pr opor çã o de equ ipa m en t o com -
pa r a t iva m en t e n ovo.
No ca so da s m a t ér ia s-pr im a s, a n ecessida de de leva r em con t a
o cu st o de u so é óbvia ; se u m a t on ela da de cobr e for u t iliza da h oje,
n ã o poder á ser u t iliza da a m a n h ã , e o va lor qu e o cobr e t er ia pa r a os
pr opósit os de a m a n h ã deve ser con sider a do u m a pa r t e do cu st o m a r -
gin a l. Ma s o qu e n ã o se t em leva do em con t a é qu e o cobr e é a pen a s
u m ca so ext r em o do qu e su cede sem pr e qu e o equ ipa m en t o de ca pit a l
é u t iliza do pa r a pr odu zir . A h ipót ese de qu e exist e u m a sepa r a çã o
n ít ida en t r e a s m a t ér ia s-pr im a s, cu jo desin vest im en t o deve ser leva do
em con t a qu a n do u t iliza da s n a pr odu çã o, e o ca pit a l fixo, cu jo desin -
vest im en t o pode ser legit im a m en t e descon sider a do, n ã o cor r espon de à

72 H a wt r ey (E con om ica. Ma io de 1934. p. 145) ch a m ou a a t en çã o pa r a o fa t o de qu e o pr of.


P igou iden t ifica o pr eço da ofer t a com o cu st o m a r gin a l da m ã o-de-obr a e su st en t a qu e os
a r gu m en t os do pr of. P igou se en con t r a m , por t a n t o, ser ia m en t e vicia dos.

99
OS ECON OMIS TAS

r ea lida de — especia lm en t e em con dições n or m a is, qu a n do se t em de


r epor ca da a n o u m a pa r t e do equ ipa m en t o e su a u t iliza çã o t or n a m a is
pr óxim a a da t a em qu e essa r eposiçã o é n ecessá r ia .
Um a va n t a gem dos con ceit os r ela t ivos a o cu st o de u so e a o cu st o
su plem en t a r con sist e em ser em a plicá veis t a n t o a o ca pit a l cir cu la n t e
e a o ca pit a l líqu ido com o a o ca pit a l fixo. A difer en ça essen cia l en t r e
a s m a t ér ia s-pr im a s e o ca pit a l fixo n ã o r eside n a su a su jeiçã o a os
cu st os de u so e su plem en t a r , m a s n o fa t o de qu e o r et or n o do ca pit a l
líqu ido se fa z n u m ú n ico per íodo; a o pa sso qu e n o ca so do ca pit a l fixo,
qu e é du r á vel e se ga st a gr a du a lm en t e, esse r et or n o com pr een de u m a
sér ie de cu st os de u so e de lu cr os obt idos em su cessivos per íodos.

100
C AP ÍTU LO 7
Ma io re s Co n s id e ra ç õ e s S o bre o S ig n ific a d o d e
P o u p a n ç a e d e In v e s tim e n to
I

N o ca pít u lo a n t er ior , a pou pan ça e o in vestim en to for a m de t a l


m odo defin idos qu e sã o, for çosa m en t e, de m on t a n t e igu a l e, pa r a a
com u n ida de con sider a da em con ju n t o, n ã o pa ssa m de dois a spect os da
m esm a coisa . Algu n s escr it or es con t em por â n eos (in clu sive eu pr ópr io
em m in h a obr a T reatise on M on ey) der a m , en t r et a n t o, defin ições es-
pecia is dest es dois t er m os qu e n ã o lh es a t r ibu em , n ecessa r ia m en t e,
u m a igu a lda de. Ou t r os discor r er a m sobr e eles ba sea n do-se n a h ipót ese
de qu e podem n ã o ser igu a is, sem , t oda via , pr efa cia r seu s a r gu m en t os
com qu a lqu er defin içã o. Ser á con ven ien t e, por t a n t o, a fim de liga r o
qu e pr ecede a ou t r os est u dos de qu e eles for a m objet o, cla ssifica r a l-
gu m a s da s su a s vá r ia s a cepções qu e pa r ecem cor r en t es.
Qu e eu sa iba , t odo o m u n do est á de a cor do em design a r por
pou pan ça o excesso da r en da sobr e o qu e se ga st a em con su m o. Cer -
t a m en t e, ser ia m u it o in con ven ien t e e en ga n a dor da r -lh e ou t r o sign ifi-
ca do. Ta m bém n ã o h á diver gên cia s de opin iã o sobr e o qu e se pr et en de
design a r por ga st os de con su m o. Assim sen do, a s difer en ça s de in t er -
pr et a çã o su r gem da defin içã o de in vestim en to ou n a de ren d a.
II
Tom em os o in vestim en to em pr im eir o lu ga r . Na lin gu a gem cor -
r en t e, est a pa la vr a design a a com pr a de u m a t ivo, velh o ou n ovo, por
u m in divídu o ou por u m a em pr esa . P or vezes, o a lca n ce do t er m o é
lim it a do à com pr a de u m a t ivo n a Bolsa de Va lor es. Ma s t a m bém
fa la m os, igu a lm en t e, de in vest im en t os em im óveis, m á qu in a s, est oqu es
de pr odu t os a ca ba dos ou n ã o; e, de m a n eir a ger a l, n ovo in vest im en t o,
por oposiçã o a r ein vest im en t o, sign ifica a com pr a , por a plica çã o dos
r en dim en t os, de u m bem de ca pit a l de qu a lqu er espécie. Se con side-

101
OS ECON OMIS TAS

r a r m os a ven da de u m in vest im en t o com o u m in vest im en t o n ega t ivo,


ist o é, com o u m desin vest im en t o, m in h a pr ópr ia defin içã o est á de a cor do
com a de u so popu la r , vist o qu e a s t r a n sa ções ocor r ida s n os in vest i-
m en t os a n t igos for çosa m en t e se a n u la m . Na t u r a lm en t e t em os de a ju s-
t a r o ca so com vist a à cr ia çã o e à liqu ida çã o de débit os (in clu in do a s
va r ia ções da qu a n t ida de de cr édit o ou de m oeda ); m a s, em bor a pa r a
a com u n ida de em seu con ju n t o o a u m en t o ou a dim in u içã o n o sa ldo
do cr édit o a gr ega do seja sem pr e exa t a m en t e igu a l a o a u m en t o ou à
dim in u içã o do sa ldo do débit o a gr ega do, est a com plica çã o se n eu t r a liza
t a m bém qu a n do se t r a t a do in vest im en t o a gr ega do. P or con seqü ên cia ,
a dm it in do-se qu e a n oçã o popu la r de r en da coin cide com a m in h a de
r en da líqu ida , o in vest im en t o a gr ega do n o sen t ido cor r en t e cor r espon de
à m in h a defin içã o de in vest im en t o líqu ido, ou seja , à a diçã o líqu ida a
t oda espécie de equ ipa m en t os de ca pit a l, a pós dedu çã o da s va r ia ções
n o va lor dos equ ipa m en t os de ca pit a l velh os qu e en t r a m n o cá lcu lo da
r en da líqu ida .
O in vest im en t o, a ssim defin ido, in clu i, por t a n t o, o a u m en t o do
equ ipa m en t o de ca pit a l, qu er ele con sist a em ca pit a l fixo, ca pit a l cir -
cu la n t e ou ca pit a l líqu ido, e a s pr in cipa is difer en ça s en t r e a s defin ições
(a bst r a in do-se da dist in çã o en t r e in vest im en t o e in vest im en t o líqu ido)
sã o devida s à exclu sã o de u m a ou de vá r ia s dest a s ca t egor ia s.
H a wt r ey, por exem plo, qu e a t r ibu i gr a n de im por t â n cia à s va r ia -
ções do ca pit a l líqu ido, ist o é, a os a u m en t os (ou à s dim in u ições) in vo-
lu n t á r ios do est oqu e de pr odu t os n ã o ven didos, pr opôs u m a defin içã o
de in vest im en t o de on de sã o exclu ída s a s va r ia ções dessa n a t u r eza .
Nest e ca so, u m excesso de pou pa n ça sobr e o in vest im en t o ser ia o m esm o
qu e u m a u m en t o in volu n t á r io n o est oqu e de pr odu t os n ã o ven didos,
ist o é, u m a u m en t o do ca pit a l líqu ido. H a wt r ey n ã o m e con ven ceu de
qu e seja est e o fa t or pr epon der a n t e, vist o pôr t oda a ên fa se n a cor r eçã o
da s va r ia ções n ã o pr evist a s n o in ício, com pa r a t iva m en t e à s qu e, bem
ou m a l, for a m a n t ecipa da s. H a wt r ey con sider a qu e a difer en ça en t r e
a esca la de pr odu çã o fixa da t odos os dia s pelos em pr esá r ios e a esca la
do dia a n t er ior depen de da s va r ia ções sofr ida s pelo est oqu e de pr odu t os
n ã o ven didos. Sem dú vida , n o ca so dos ben s de con su m o, est a s va r ia ções
desem pen h a m pa pel im por t a n t e em su a s decisões. E n t r et a n t o, n ã o vejo
m ot ivo pa r a exclu ir a in flu ên cia exer cida sobr e essa s decisões por ou t r os
fa t or es, e pr efir o, por t a n t o, da r ên fa se à va r ia çã o t ot a l da dem a n da
efet iva e n ã o a pen a s à pa r t e da va r ia çã o qu e r eflet e o a u m en t o ou a
dim in u içã o dos est oqu es n ã o ven didos n o per íodo a n t er ior . Além disso,
n o ca so do ca pit a l fixo, o a u m en t o ou a dim in u içã o de su a ca pa cida de
n ã o u t iliza da cor r espon de, em seu s efeit os sobr e a s decisões de pr odu zir ,
a o a u m en t o ou à dim in u içã o dos est oqu es de ben s n ã o ven didos; e n ã o
vejo com o o m ét odo de H a wt r ey possa lida r com est e fa t or pelo m en os
t ã o im por t a n t e qu a n t o o ou t r o.
P a r ece pr ová vel qu e a for m a çã o de ca pit a l e o con su m o de ca pit a l,

102
KEYN ES

t a l com o os con sider a m os econ om ist a s da escola a u st r ía ca , n ã o seja m


idên t icos a o in vest im en t o n em a o desin vest im en t o segu n do a defin içã o
a cim a , n em a o in vest im en t o ou desin vest im en t o líqu ido. E m especia l,
diz-se qu e o con su m o de ca pit a l ocor r e em cir cu n st â n cia s t a is qu e n ã o
h á cla r a m en t e dim in u içã o líqu ida n o equ ipa m en t o de ca pit a l t a l com o
foi defin ido a cim a . Toda via , n ã o en con t r ei r efer ên cia n en h u m a on de
se explica sse cla r a m en t e o sign ifica do dest es t er m os. P or exem plo, dizer
qu e a for m a çã o de ca pit a l ocor r e qu a n do se pr olon ga o per íodo de
pr odu çã o pou co con t r ibu i pa r a escla r ecer o a ssu n t o.
III

P a ssa m os a gor a à s diver gên cia s en t r e pou pa n ça e in vest im en t o


devida s a u m a defin içã o especia l da r en da e, logo, do excesso da r en da
sobr e o con su m o. O em pr ego qu e fiz dest es t er m os em m in h a obr a
T reatise on M on ey é u m bom exem plo disso, pois, con for m e expliqu ei
n a pá gin a 51, a defin içã o de r en da qu e a í a dot ei se dist in gu e da qu e
est ou a gor a da n do pelo fa t o de qu e en t ã o er a con sider a da r en da dos
em pr esá r ios, n ã o os lu cr os r ea lm en t e obt idos, m a s (em cer t o sen t ido)
o seu “lu cr o n or m a l”. Assim , por exceden t e da pou pa n ça sobr e o in -
vest im en t o qu er ia dizer qu e a esca la de pr odu çã o er a t a l qu e os em -
pr esá r ios, com o pr opr iet á r ios do equ ipa m en t o de ca pit a l, est a va m r e-
t ir a n do u m lu cr o in fer ior a o n or m a l; e qu a n do fa la va de u m excesso
m a ior de pou pa n ça sobr e o in vest im en t o qu er ia dizer qu e os lu cr os
efet ivos est a va m sen do r edu zidos de t a l m a n eir a qu e os em pr esá r ios
t er ia m m ot ivo pa r a con t r a ir a pr odu çã o.
Na m in h a m a n eir a a t u a l de pen sa r , de u m la do o volu m e de
em pr ego (e por con seqü ên cia o da pr odu çã o e da r en da r ea l) é fixa do
pelo em pr esá r io sob o m ot ivo de pr ocu r a r m a xim iza r seu s lu cr os pr e-
sen t es e fu t u r os (sen do a pr evisã o cor r espon den t e a o cu st o de u so de-
t er m in a da segu n do a m a n eir a com o ele con cebe a u t iliza çã o do equ i-
pa m en t o pa r a qu e est e lh e pr opor cion e, n o cu r so de su a du r a çã o, u m
r en dim en t o m á xim o); de ou t r o la do, o volu m e de em pr ego qu e lh e pr o-
por cion a r á est e m á xim o de lu cr os depen de da fu n çã o da dem a n da a gr e-
ga da det er m in a da pela s su a s pr evisões de ven da s qu e, n a s difer en t es
h ipót eses, devem r esu lt a r , r espect iva m en t e, do con su m o e do in vest i-
m en t o. E m m in h a obr a T reatise on M on ey, o con ceit o de variações n o
exceden t e do in vest im en t o sobr e a pou pa n ça , com o foi a li defin ido, er a
u m m eio de t r a t a r a s va r ia ções do lu cr o, em bor a n esse livr o n ã o fizesse
dist in çã o cla r a en t r e os r esu lt a dos pr evist os e os r ea liza dos.73 Dizia
eu en t ã o qu e a va r ia çã o n o excesso do in vest im en t o sobr e a pou pa n ça
er a a for ça m ot or a qu e gover n a va a s m odifica ções do volu m e da pr o-

73 Meu m ét odo, n essa obr a , con sist e em con sider a r os lu cr os con segu idos n o pr esen t e com o
det er m in a dor es da expect a t iva cor r en t e desses lu cr os.

103
OS ECON OMIS TAS

du çã o. Dest a m a n eir a , o r a ciocín io n ovo, em bor a sen do (pelo m en os


n a m in h a opin iã o a t u a l) m u it o m a is exa t o e in st r u t ivo, é essen cia lm en t e
u m desen volvim en t o do a n t er ior . Tr a du zido n a lin gu a gem de m in h a
obr a T reatise on M on ey, a ssim se en u n cia r ia : a expect a t iva de u m
a u m en t o n o excesso do in vest im en t o sobr e a pou pa n ça , da do o volu m e
a n t er ior de em pr ego e pr odu çã o, in du zir á os em pr esá r ios a a u m en t a r
o volu m e do em pr ego e da pr odu çã o. A im por t â n cia de m eu s r a ciocín ios
a t u a is e a n t er ior es r eside n a su a t en t a t iva de m ost r a r com o o volu m e
de em pr ego é det er m in a do pela s est im a t iva s da dem a n da efet iva feit a s
pelos em pr esá r ios, sen do o cr it ér io pa r a u m a u m en t o n a dit a dem a n da
u m a u m en t o pr evist o do in vest im en t o em r ela çã o à pou pa n ça , con for m e
a defin içã o a pr esen t a da em T reatise on M on ey. É ver da de, por ém , qu e
m in h a exposiçã o em T reatise on M on ey se a pr esen t a m u it o con fu sa e
in com plet a à lu z dos n ovos desen volvim en t os a qu i expost os.
D. H . Rober t son defin iu a r en da de h oje com o sen do igu a l a o
con su m o de on t em m ais o in vest im en t o, de m odo qu e a pou pa n ça de
h oje, n o sen t ido qu e ele lh e a t r ibu iu , é igu a l a o in vest im en t o de on t em
m ais o excesso de con su m o de on t em sobr e o de h oje. Segu n do est a
defin içã o, a pou pa n ça pode ser su per ior a o in vest im en t o, ist o é, por
h a ver u m excesso n a r en da de on t em (n o sen t ido por m im a t r ibu ído)
sobr e a de h oje. Assim , qu a n do Rober t son diz qu e h á u m exceden t e
de pou pa n ça sobr e o in vest im en t o, expr im e lit er a lm en t e a m esm a idéia
qu e eu qu a n do digo qu e a r en da deca i, e o exceden t e da pou pa n ça n o
seu en t en der é exa t a m en t e igu a l a o declín io da r en da n o m eu en t en der .
Se fosse cer t o qu e a s expect a t iva s cor r en t es fossem sem pr e det er m i-
n a da s pelos r esu lt a dos obt idos on t em , a dem a n da efet iva de h oje ser ia
igu a l à r en da de on t em . P ode-se, por t a n t o, con sider a r o m ét odo de
Rober t son u m a t en t a t iva a lt er n a t iva do m eu (sen do, t a lvez, u m a pr i-
m eir a a pr oxim a çã o dele) pa r a est a belecer a m esm a dist in çã o, t ã o vit a l
pa r a a a n á lise ca u sa l, qu e t en t ei fa zer pon do em con t r a st e a dem a n da
efet iva e a r en da .74
IV

Abor da m os, em segu ida , a s idéia s m u it o va ga s a ssocia da s à ex-


pr essã o “pou pa n ça for ça da ”. O qu e se poder á depr een der disso? E m
m in h a obr a T reatise on M on ey (v. I, p. 171, n ot a de r oda pé) [J MK, v.
V, p. 154] dei a lgu m a s r efer ên cia s sobr e o u so a n t er ior m en t e feit o
dest a expr essã o e su ger i qu e ela t er ia cer t a a fin ida de com a difer en ça
en t r e in vest im en t o e “pou pa n ça ” n o sen t ido em qu e a li u sei est e ú lt im o
t er m o. Nã o m e pa r ece h a ver t a n t a a fin ida de com o h a via pen sa do. De
qu a lqu er m a n eir a , est ou cer t o de qu e “pou pa n ça for ça da ” e a s expr es-

74 Ver o a r t igo de ROBE RTSON. “Sa vin g a n d H oa r din g”. In : E con om ic J ou rn al. Set em br o
de 1933. p. 399; e o deba t e en t r e Rober t son , H a wt r ey e eu pr ópr io. In : E con om ic J ou rn al.
Dezem br o de 1933. p. 658 [J MK, v. XIII].

104
KEYN ES

sões a n á loga s em pr ega da s m a is r ecen t em en t e (por exem plo, pelos P r o-


fessor es H a yek e Robbin s) n ã o t êm r ela çã o defin ida com a difer en ça
en t r e in vest im en t o e “pou pa n ça ” n o sen t ido qu e lh e dei em T reatise
on M on ey. E m bor a est es a u t or es n ã o t en h a m explica do exa t a m en t e a
sign ifica çã o qu e a t r ibu ír a m a esse t er m o, é cla r o qu e pa r a eles a “pou -
pa n ça for ça da ” é u m fen ôm en o dir et a m en t e r esu lt a n t e da s va r ia ções
n a qu a n t ida de de m oeda ou do cr édit o ba n cá r io, cu ja m edida se fa z
por essa s m esm a s va r ia ções.
É eviden t e qu e u m a va r ia çã o n o volu m e da pr odu çã o e do em pr ego
pr ovoca r á m u da n ça s n a r en da m edida em u n ida des de sa lá r io; qu e
u m a va r ia çã o n a u n ida de de sa lá r io oca sion a r á , por su a vez, u m a a l-
t er a çã o n a dist r ibu içã o da r en da en t r e os m u t u á r ios e os m u t a n t es e
u m a va r ia çã o n a r en da a gr ega da m edida em m oeda ; e qu e em a m bos
os ca sos h a ver á (ou poder á h a ver ) u m a va r ia çã o n o m on t a n t e pou pa do.
Com o a s va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda podem , con seqü en t em en t e,
t er com o r esu lt a do, a gin do sobr e a t a xa de ju r os, m odifica r o volu m e
e a dist r ibu içã o da r en da (con for m e ver em os m a is a dia n t e), é possível
qu e t en h a m u m a a çã o in dir et a sobr e o m on t a n t e pou pa do. E st a s a l-
t er a ções n o m on t a n t e pou pa do n ã o sã o, por ém , m a is “pou pa n ça for ça da ”
do qu e qu a lqu er ou t r a va r ia çã o n o m on t a n t e pou pa do, em vir t u de de
u m a va r ia çã o da s cir cu n st â n cia s; e n ã o h á m eio pa r a dist in gu ir esses
dois ca sos, a n ã o ser qu e especifiqu em os o m on t a n t e pou pa do em cer t a s
con dições t om a da s com o n or m a ou pa dr ã o. Além disso, com o ver em os,
a a m plit u de da s a lt er a ções n a pou pa n ça a gr ega da , qu e r esu lt a de de-
t er m in a da m odifica çã o n a qu a n t ida de de m oeda , é ext r em a m en t e va -
r iá vel e depen de de m u it os ou t r os fa t or es.
Assim sen do, a expr essã o “pou pa n ça for ça da ” n ã o t em sen t ido a
n ã o ser qu e t om em os com o pa dr ã o a lgu m a t a xa de pou pa n ça . Se es-
colh er m os (com o pa r ece r a zoá vel) a t a xa qu e cor r espon da a u m n ível
obser va do de plen o em pr ego, a defin içã o pa ssa a ser : “P ou pa n ça for ça da
é o exceden t e da pou pa n ça r ea l sobr e o qu e se pou pa r ia se h ou vesse
plen o em pr ego n u m a sit u a çã o de equ ilíbr io a lon go pr a zo”. E st a defi-
n içã o t er ia sen t ido, m a s sign ifica r ia ser o exceden t e for ça do da pou pa n ça
u m fen ôm en o m u it o r a r o e m u it o in st á vel, e u m a d eficiên cia for ça da
da pou pa n ça o est a do n or m a l da a t ivida de econ ôm ica .
O in t er essa n t e t r a ba lh o do pr ofessor H a yek, in t it u la do “Not e on
t h e Developm en t of t h e Doct r in e of Forced S avin g”,75 m ost r a qu e est e
foi, de fa t o, o sign ifica do or igin a l do t er m o. “P ou pa n ça for ça da ” ou
“fr u ga lida de for ça da ” foi, or igin a lm en t e, u m a con cepçã o de Ben t h a m ;
e Ben t h a m a fir m ou expr essa m en t e t er em m en t e a s con seqü ên cia s de
u m a u m en t o n a qu a n t ida de de m oeda (r ela t iva m en t e à qu a n t ida de de
coisa s ven dá veis con t r a m oeda ) em cir cu n st â n cia s em qu e “t odos os

75 Qu arterly J ou rn al of E con om ics. Novem br o de 1932. p. 123.

105
OS ECON OMIS TAS

br a ços est ivessem em pr ega dos da m a n eir a m a is va n t a josa possível”.76


E m t a is cir cu n st â n cia s, obser va Ben t h a m , a r en da r ea l n ã o pode a u -
m en t a r e, por con seqü ên cia , o in vest im en t o a dicion a l qu e se pr odu z
com o r esu lt a do da t r a n siçã o im plica fr u ga lida de for ça da “à cu st a do
bem -est a r n a cion a l e da ju st iça n a cion a l”. Todos os a u t or es do sécu lo
XIX qu e se ocu pa r a m do a ssu n t o t iver a m vir t u a lm en t e pr esen t e a m es-
m a idéia . Ma s u m a t en t a t iva pa r a est en der est a n oçã o per feit a m en t e
cla r a a u m a sit u a çã o qu e n ã o seja a de plen o em pr ego a ca r r et a difi-
cu lda des. É ver da de, n a t u r a lm en t e, qu e (em vir t u de dos r en dim en t os
decr escen t es de u m a qu a n t ida de cr escen t e de em pr ego a plica da a de-
t er m in a do equ ipa m en t o de ca pit a l) qu alqu er a u m en t o n o em pr ego im -
põe u m sa cr ifício da r en da r ea l à s pessoa s já em pr ega da s, m a s a t en -
t a t iva de r ela cion a r esse sa cr ifício a o a cr éscim o de in vest im en t o, qu e
pode a com pa n h a r o a u m en t o de em pr ego, dificilm en t e ser á bem -su ce-
dida . De qu a lqu er m a n eir a , pelo qu e eu sa iba , n en h u m esfor ço foi
t en t a do pelos a u t or es m oder n os, qu e se in t er essa r a m pela “pou pa n ça
for ça da ”, pa r a est en der essa idéia a u m a sit u a çã o em qu e o em pr ego
est eja a u m en t a n do e pa r ece qu e esses a u t or es, n a su a m a ior pa r t e,
ign or a m o fa t o de qu e, pa r a ser a plica do a sit u a ções de em pr ego in -
fer ior es a o plen o em pr ego, o con ceit o de Ben t h a m da fr u ga lida de for ça da
r equ er a lgu m a explica çã o ou qu a lifica çã o.

A pr epon der â n cia da idéia de qu e a pou pa n ça e o in vest im en t o,


t om a dos n o seu sen t ido lit er a l, podem ser difer en t es só se explica , n o
m eu en t en der , por u m a ilu sã o de ót ica , em vir t u de de a r ela çã o en t r e
u m deposit a n t e in dividu a l e seu ba n co ser en ca r a da com o u m a t r a n -
sa çã o u n ila t er a l em vez de bila t er a l com o r ea lm en t e é. Su põe-se qu e
u m deposit a n t e e seu ba n co podem a r t icu la r -se de m a n eir a qu e r ea lizem
u m a oper a çã o qu e fa ça desa pa r ecer a s pou pa n ça s do sist em a ba n cá r io
de m odo a se per der em pa r a o in vest im en t o, ou , pelo con t r á r io, qu e o
sist em a ba n cá r io t or n e possível a r ea liza çã o de u m in vest im en t o a qu e
n ã o cor r espon de pou pa n ça a lgu m a . Nin gu ém pode, por ém , pou pa r sem
a dqu ir ir u m a va lor a t ivo, seja din h eir o, u m débit o ou ben s de ca pit a l;
e pa r a qu e a lgu ém possa a dqu ir ir u m bem qu e a n t es n ã o possu ía , é
n ecessá r io qu e ou t r o bem de va lor igu a l se cr ie, ou qu e ou t r a pessoa
se desfa ça de u m bem do m esm o va lor qu e a n t es possu ía . No pr im eir o
ca so, h á u m in vest im en t o n ovo cor r espon den t e; n o segu n do, a lgu ém
t em de deixa r de pou pa r u m a qu a n t ia igu a l, por qu e su a per da de
r iqu eza decor r e, de fa t o, de u m excesso do seu con su m o sobr e a su a
r en da e n ã o de u m a per da n a con t a de ca pit a l por m odifica çã o n o
va lor de u m a t ivo de ca pit a l, pois n ã o se t r a t a a qu i de u m a per da

76 L oc. cit., p. 125.

106
KEYN ES

sobr e o va lor qu e seu a t ivo de ca pit a l t in h a a n t er ior m en t e; o in divídu o


r ecebe ju st a m en t e o va lor cor r en t e de seu a t ivo e, con t u do, n ã o o r et ém
em for m a a lgu m a de r iqu eza , ist o é, deve est a r ga st a n do n o con su m o
cor r en t e, exceden do o r en dim en t o cor r en t e. Além disso, se é o sist em a
ba n cá r io qu e cede u m bem , a lgu ém t em de r en u n cia r à posse de din h eir o
líqu ido. Da qu i se dedu z qu e a pou pa n ça a gr ega da do pr im eir o in divídu o,
som a da à dos ou t r os, deve ser , n ecessa r ia m en t e, igu a l a o m on t a n t e
do n ovo in vest im en t o cor r en t e.
A idéia de qu e a cr ia çã o de cr édit o pelo sist em a ba n cá r io per m it e
r ea liza r in vest im en t os, a os qu a is “n en h u m a pou pa n ça gen u ín a ” cor -
r espon de, r esu lt a , u n ica m en t e, de se isola r u m a da s con seqü ên cia s do
a u m en t o do cr édit o ba n cá r io, com a exclu sã o da s dem a is. Se a con cessã o
de u m cr édit o a dicion a l a cr édit os já exist en t es per m it e a o em pr esá r io
efet u a r u m a a diçã o a o seu in vest im en t o cor r en t e, qu e de ou t r o m odo
n ã o poder ia ocor r er , a s r en da s a u m en t a r ã o n ecessa r ia m en t e e n u m a
pr opor çã o qu e, em ger a l, exced erá a do in vest im en t o su plem en t a r . Além
disso, sa lvo em ca so de plen o em pr ego, t a n t o a r en da r ea l com o a
m on et á r ia ser ã o a cr escida s. O pú blico exer cer á “u m a livr e escolh a ” da s
pr opor ções em qu e dividir á o seu a cr éscim o de r en da s en t r e pou pa n ça
e dispên dio; e é im possível qu e a in t en çã o do em pr esá r io qu e pediu
em pr est a do pa r a a u m en t a r o seu in vest im en t o possa t or n a r -se efet iva
(excet o com o su bst it u içã o dos in vest im en t os de ou t r os em pr esá r ios qu e,
do con t r á r io, t er ia m ocor r ido) a u m r it m o m a is a celer a do do qu e o
pú blico decide a u m en t a r a s su a s pou pa n ça s. Além disso, a s pou pa n ça s
qu e r esu lt a m dessa decisã o sã o t ã o gen u ín a s qu a n t o qu a isqu er ou t r a s.
Nã o se pode obr iga r n in gu ém a fica r n a posse da m oeda a dicion a l
cor r espon den t e a o n ovo cr édit o ba n cá r io, a n ã o ser qu e esse a lgu ém
pr efir a deliber a da m en t e gu a r da r m a is din h eir o a ou t r a for m a de r i-
qu eza . Mesm o a ssim , o em pr ego, a s r en da s e os pr eços n ã o podem
su bt r a ir -se a o m ovim en t o qu e n a n ova sit u a çã o lh es im põe o fa t o de
a lgu ém pr efer ir con ser va r o din h eir o a dicion a l. É ver da de qu e o a u -
m en t o in esper a do do in vest im en t o n u m a dir eçã o pa r t icu la r pode ca u sa r
n o m on t a n t e a gr ega do da pou pa n ça e do in vest im en t o u m a per t u r ba çã o
qu e se n ã o ver ifica r ia se ele t ivesse sido pr evist o com ba st a n t e a n t e-
cipa çã o. Ta m bém é ver da de qu e a con cessã o do cr édit o ba n cá r io fa z
su r gir t r ês t en dên cia s: (1) a u m en t o da pr odu çã o; (2) a lt a n o va lor da
pr odu çã o m a r gin a l expr essa em u n ida des de sa lá r io (o qu e em con dições
de r en dim en t os decr escen t es deve n ecessa r ia m en t e a com pa n h a r u m
a u m en t o da pr odu çã o); e (3) a lt a da u n ida de de sa lá r ios em t er m os
de m oeda (efeit o qu e em ger a l a com pa n h a a m elh or ia do em pr ego); e
est a s t en dên cia s podem a fet a r a dist r ibu içã o da r en da r ea l en t r e os
difer en t es gr u pos. Ma s est a s t en dên cia s sã o ca r a ct er íst ica s de u m es-
t a do de pr odu çã o cr escen t e e se m a n ifest a m do m esm o m odo qu a n do
o a u m en t o da pr odu çã o t em ou t r a or igem qu e n ã o a ext en sã o do cr édit o
ba n cá r io. E la s só podem ser evit a da s se elim in a r m os qu a lqu er a çã o

107
OS ECON OMIS TAS

ca pa z de m elh or a r o em pr ego. Aliá s, gr a n de pa r t e do qu e foi dit o a cim a


a n t ecipa o r esu lt a do da a n á lise post er ior .
Dest e m odo, o pon t o de vist a já a n t iqu a do de qu e a pou pa n ça
sem pr e su põe in vest im en t o, em bor a in com plet o e en ga n oso, é cer t a -
m en t e m a is ju st o qu e a idéia m oder n a segu n do a qu a l pode h a ver
pou pa n ça sem in vest im en t o ou in vest im en t o sem pou pa n ça “gen u ín a ”.
O er r o ocor r e qu a n do se ch ega à dedu çã o pla u sível de qu e, qu a n do
u m in divídu o pou pa , a u m en t a em qu a n t ida de igu a l o in vest im en t o
a gr ega do. É ver da de qu e, qu a n do u m in divídu o pou pa , ele a u m en t a
su a pr ópr ia r iqu eza . Con clu ir , por ém , qu e ele a u m en t a t a m bém a r i-
qu eza a gr ega da é qu er er ign or a r a s r ea ções possíveis do a t o de pou pa n ça
de u m in divídu o sobr e a s pou pa n ça s de ou t r em e, por t a n t o, sobr e a
r iqu eza de ou t r em .
A con cilia çã o da iden t ida de en t r e a pou pa n ça e o in vest im en t o
com a a pa r en t e “livr e von t a de” do in divídu o pa r a econ om iza r o qu e
qu iser , in depen den t em en t e do qu e os ou t r os ou ele m esm o possa in -
vest ir , depen de especia lm en t e do fa t o de ser a pou pa n ça , com o dispên -
dio, u m fen ôm en o de du plo ca r á t er . E m bor a n ã o seja pr ová vel por qu e
o m on t a n t e da pou pa n ça de u m in divídu o t en h a a lgu m a in flu ên cia
sen sível sobr e a su a pr ópr ia r en da , a s r ea ções do m on t a n t e do seu
con su m o sobr e a s r en da s dos ou t r os t or n a m im possível qu e t odos os
in divídu os pou pem sim u lt a n ea m en t e qu a isqu er som a s da da s. Toda t en -
t a t iva de pou pa r m a is, r edu zin do o con su m o, a ge de t a l m odo sobr e
a s r en da s qu e n ecessa r ia m en t e a n u la a si m esm a . É , sem dú vida ,
igu a lm en t e im possível à com u n ida de em su a t ot a lida de pou pa r m en os
qu e o m on t a n t e do in vest im en t o cor r en t e, já qu e u m a t en t a t iva dest a
or dem fa r á su bir n ecessa r ia m en t e os r en dim en t os a t é a u m n ível em
qu e a s som a s qu e os in divídu os decidem pou pa r a lca n cem u m a cifr a
exa t a m en t e igu a l a o m on t a n t e do in vest im en t o.
H á u m a est r eit a a n a logia en t r e o qu e ficou dit o e a pr oposiçã o
segu n do a qu a l a liber da de de t odo in divídu o de fa zer va r ia r , qu a n do
lh e a pr ou ver , a qu a n t ida de de din h eir o qu e det ém con cilia -se com a
n ecessida de de qu e o volu m e t ot a l de din h eir o, for m a do pela som a dos
en ca ixes in dividu a is, igu a le exa t a m en t e o m on t a n t e da m oeda qu e o
sist em a ba n cá r io cr iou . Nest e ú lt im o ca so, a igu a lda de r esu lt a do fa t o
de qu e o m on t a n t e de din h eir o qu e ca da qu a l decide con ser va r n ã o é
in depen den t e da su a r en da ou dos pr eços da s coisa s (pr in cipa lm en t e
cer t ifica dos de va lor es) qu e é n a t u r a l com pr a r , em vez de con ser va r
din h eir o. Assim a s r en da s, do m esm o m odo qu e os pr eços, va r ia m obr i-
ga t or ia m en t e a t é qu e se est a beleça a igu a lda de en t r e o m on t a n t e a gr e-
ga do da s som a s em din h eir o, qu e os in divídu os r esolvem gu a r da r n o
n ível de r en dim en t os e pr eços, e o m on t a n t e da m oeda cr ia do pelo
sist em a ba n cá r io. Ist o con st it u i, n a ver da de, a pr oposiçã o fu n da m en t a l
da t eor ia m on et á r ia .
Ma s est a s pr oposições decor r em sim plesm en t e do fa t o de qu e

108
KEYN ES

n ã o pode h a ver u m com pr a dor sem u m ven dedor , n em u m ven dedor


sem u m com pr a dor . E m bor a u m in divídu o, cu ja s t r a n sa ções sã o de
pou ca im por t â n cia em r ela çã o a o m er ca do, possa , despr eocu pa da m en t e,
despr eza r o fa t o de qu e a dem a n da n ã o é u m a oper a çã o u n ila t er a l,
ser ia in sen sa t ez despr ezá -lo t r a t a n do-se da dem a n da a gr ega da . É est a
a difer en ça vit a l en t r e a t eor ia do com por t a m en t o econ ôm ico da com u -
n ida de e a do com por t a m en t o de u m a u n ida de in dividu a l, n a qu a l
a dm it im os qu e a s va r ia ções n a dem a n da do pr ópr io in divídu o n ã o a fe-
t a m su a r en da .

109
L IVRO T ERCEIRO

A P ROP EN S ÃO A C ON S U MIR
C AP ÍTU LO 8
A P ro p e n s ã o a Co n s u m ir: I. Os F a to re s Obje tiv o s
I

E st a m os, a gor a , em con dições de volt a r a o n osso t em a pr in cipa l,


de qu e n os a fa st a m os n o fin a l do Livr o P r im eir o pa r a exa m in a r cer t os
pr oblem a s ger a is de m ét odo e defin içã o. O objet ivo fin a l de n ossa a n á lise
é descobr ir o qu e det er m in a o volu m e de em pr ego. At é a qu i est a bele-
cem os a con clu sã o pr elim in a r de qu e o volu m e de em pr ego é det er m i-
n a do pelo pon t o de in t er seçã o da fu n çã o de ofer t a a gr ega da com a
fu n çã o de pr ocu r a a gr ega da . A fu n çã o de ofer t a a gr ega da , con t u do,
qu e depen de pr in cipa lm en t e da s con dições física s da ofer t a , en volve
pou ca s con sider a ções qu e a in da n ã o n os sã o fa m ilia r es. A for m a pode
ser pou co con h ecida , m a s os fa t or es n ela su bja cen t es n ã o sã o n ovos.
Volt a r em os a ocu pa r -n os da fu n çã o de ofer t a a gr ega da n o ca pít u lo 20,
qu a n do exa m in a r em os a su a in ver sa sob o n om e de fu n ção d e em prego.
E m t er m os ger a is, por ém , o qu e se t em descu ida do é da pa r t e cor r es-
pon den t e à fu n çã o de dem a n da a gr ega da ; e é à fu n çã o da dem a n da
a gr ega da qu e dedica r em os os Livr os Ter ceir o e Qu a r t o.
A fu n çã o de dem a n da a gr ega da r ela cion a det er m in a do volu m e
de em pr ego com o pr odu t o da s ven da s qu e se esper a r ea liza r desse
volu m e de em pr ego. O pr odu t o da s ven da s for m a -se pela som a de du a s
qu a n t ida des — a som a qu e ser á despen dida em con su m o qu a n do o
em pr ego est á em cer t o n ível e a som a qu e se dest in a r á a o in vest im en t o.
Os fa t or es qu e det er m in a m est a s du a s qu a n t ida des sã o ba st a n t e dife-
r en t es. Nest e livr o est u da r em os os pr im eir os, a sa ber , qu a is os fa t or es
qu e det er m in a m a som a qu e se ga st a r á em con su m o qu a n do o em pr ego
se a ch a em det er m in a do n ível; n o Livr o IV con t in u a r em os com os fa t or es
qu e fixa m a som a a ser em pr ega da n o in vest im en t o.
Con sider a n do qu e a qu i n os in t er essa a det er m in a çã o da som a
qu e deve ser ga st a em con su m o qu a n do o em pr ego est á em cer t o n ível,
devem os, est r it a m en t e fa la n do, t r a t a r da fu n çã o qu e liga o m on t a n t e
de C a o n ível de N . Toda via , é m a is con ven ien t e oper a r com u m a

113
OS ECON OMIS TAS

fu n çã o ligeir a m en t e difer en t e, ou seja , a qu e r ela cion a o con su m o, m e-


dido em u n ida des de sa lá r io (C ω), com a r en da , m edida em u n ida des
de sa lá r io (Y ω), cor r espon den t e a cer t o volu m e de em pr ego N . E st e
m ét odo est á su jeit o à r est r içã o de qu e Y ω n ã o é u m a fu n çã o u n ívoca
de N , o qu a l é idên t ico em t oda s a s cir cu n st â n cia s. Com efeit o, a r ela çã o
en t r e Y ω e N pode depen der (em bor a pr ova velm en t e em gr a u m u it o
lim it a do) da n a t u r eza pr ecisa do em pr ego. E m ou t r a s pa la vr a s, du a s
dist r ibu ições desigu a is de u m em pr ego a gr ega do N en t r e ocu pa ções
difer en t es (em vir t u de da for m a difer en t e da s fu n ções do em pr ego in -
dividu a l — qu est ã o qu e ser á t r a t a da n o ca pít u lo 20) podem con du zir
a va lor es difer en t es de Y ω. E m cer t os ca sos, poder ia ser n ecessá r io da r
especia l a t en çã o a est e fa t or . E m ger a l, por ém , con st it u i u m a boa a pr o-
xim a çã o con sider a r Y ω com o det er m in a do por N de m a n eir a u n ívoca .
Defin ir em os, por t a n t o, a qu ilo a qu e ch a m a r em os propen são a con su m ir
com o a r ela çã o fu n cion a l χ en t r e Y ω (det er m in a do n ível de r en da m edida
em u n ida des de sa lá r io) e C ω (o ga st o qu e, pa r a o con su m o, se t om a
do dit o n ível de r en dim en t o), de m odo qu e

C ω = χ(Y ω) ou C = W.χ(Y ω).

O m on t a n t e qu e a com u n ida de ga st a em con su m o depen de, evi-


den t em en t e: (i) em pa r t e, do m on t a n t e da su a r en da ; (ii) em pa r t e, de
ou t r a s cir cu n st â n cia s objet iva s qu e o a com pa n h a m ; e (iii), em pa r t e,
da s n ecessida des su bjet iva s, pr open sões psicológica s e h á bit os dos in -
divídu os qu e o com põem , bem com o dos pr in cípios qu e gover n a m a
dist r ibu içã o da r en da en t r e eles (qu e sã o pa ssíveis de m odifica ções à
m edida qu e a u m en t a a pr odu çã o). Os m ot ivos qu e im pelem a ga st a r
ca r a ct er iza m -se por su a in t er a çã o, e u m a t en t a t iva de cla ssificá -los
pode leva r a divisões a r bit r á r ia s. Nã o obst a n t e isso, pa r a cla r eza da s
idéia s, va m os sepa r á -los em du a s ca t egor ia s, qu e ch a m a r em os fa t or es
objet ivos e fa t or es su bjet ivos. Os fa t or es su bjet ivos, qu e exa m in a r em os
m a is det a lh a da m en t e n o pr óxim o ca pít u lo, in clu em a s ca r a ct er íst ica s
psicológica s da n a t u r eza h u m a n a , bem com o os cost u m es e a s in st i-
t u ições socia is qu e, em bor a n ã o im u t á veis, a pr esen t a m pou ca s pr oba -
bilida des de sofr er va r ia ções pon der á veis em cu r t o per íodo de t em po,
sa lvo cir cu n st â n cia s a n or m a is ou r evolu cion á r ia s. Um a a n á lise h ist ó-
r ica ou u m a com pa r a çã o en t r e dois sist em a s socia is de t ipos difer en t es
dever á n ecessa r ia m en t e leva r em con t a a m a n eir a pela qu a l a s m u -
da n ça s n os fa t or es su bjet ivos podem a fet a r a pr open sã o a con su m ir .
Na con t in u a çã o dest a obr a , por ém , con sider a r em os os fa t or es su bjet ivos
com o da dos e a dm it ir em os qu e a pr open sã o a con su m ir a pen a s depen de
da s a lt er a ções n os fa t or es objet ivos.

II

Os pr in cipa is fa t or es objet ivos qu e in flu em n a pr open sã o a con -


su m ir pa r ecem ser os segu in t es:

114
KEYN ES

(1) Um a variação n a u n id ad e d e salário. O con su m o (C) é, evi-


den t em en t e, u m a fu n çã o (em cer t o sen t ido) m u it o m a is da r en da real
do qu e da r en da n om in a l. E m da da sit u a çã o da t écn ica , da s pr efer ên cia s
do pú blico e da s con dições socia is qu e det er m in a m a dist r ibu içã o da
r en da , a r en da r ea l de u m in divídu o sobe e desce com a qu a n t ida de
de u n ida des de t r a ba lh o de qu e pode dispor , ist o é, com o m on t a n t e
da su a r en da m edida em u n ida des de sa lá r io, em bor a a su a r en da
r ea l su ba em pr opor çã o m en or qu e o seu r en dim en t o m edido em u n i-
da des de sa lá r io (devido à in flu ên cia dos r en dim en t os decr escen t es),
qu a n do o volu m e a gr ega do da pr odu çã o m u da . P odem os, por t a n t o, a d-
m it ir r a zoa velm en t e, com o pr im eir a a pr oxim a çã o, qu e, se a u n ida de
de sa lá r io va r ia , o ga st o em con su m o cor r espon den t e a cer t o n ível de
em pr ego va r ia r á a ssim com o os pr eços, n a m esm a pr opor çã o, a in da
qu e, em cer t a s cir cu n st â n cia s, t en h a m os de leva r em con t a a s possíveis
con seqü ên cia s sobr e o con su m o a gr ega do de u m a m u d a n ça n a dis-
t r ibu içã o da r en da r ea l en t r e os em pr esá r ios e os ren tiers, pr ovoca da
por u m a va r ia çã o n a u n ida de de sa lá r io. Além do m a is, já con side-
r a m os a n t er ior m en t e a s va r ia ções n a u n ida d e de sa lá r io, qu a n do
defin im os a p r op en sã o a con su m ir em t er m os de r en da m ed ida em
u n id a des de sa lá r io.

(2) Um a variação n a d iferen ça en tre ren d a e ren d a líqu id a. De-


m on st r a m os a n t es qu e o m on t a n t e do con su m o depen de m a is da r en da
líqu ida do qu e da r en da , vist o qu e, por defin içã o, é a r en da líqu ida
qu e o in divídu o t em em m en t e, a n t es de m a is n a da , qu a n do decide a
esca la do seu con su m o. E m det er m in a da sit u a çã o pode exist ir cer t a
r ela çã o est á vel en t r e a m bos os con ceit os, n o sen t ido de qu e h a ver á
u m a fu n çã o r ela cion a n do de m a n eir a biu n ívoca os diver sos n íveis de
r en da a os cor r espon den t es n íveis de r en da líqu ida . E n t r et a n t o, se n ã o
for est e o ca so, a pa r t e da va r ia çã o da r en da qu e n ã o a fet e a r en da
líqu ida deve ser n egligen cia da , pois n ã o in flu i sobr e o con su m o; e, de
for m a sem elh a n t e, deve ser leva da em con t a a va r ia çã o n a r en da líqu ida
qu e n ã o r eflit a n a r en da . Toda via , sa lvo cir cu n st â n cia s especia is, du vido
qu e est e fa t or t en h a im por t â n cia pr á t ica . F a r em os, n a qu a r t a seçã o
dest e ca pít u lo, u m a a n á lise m a is det a lh a da dos efeit os sobr e o con su m o
da difer en ça en t r e r en da e r en da líqu ida .

(3) Variações im previstas n os valores d e capital n ão con sid erad os


n o cálcu lo d a ren d a líqu id a. E st a s va r ia ções t êm im por t â n cia m u it o
m a ior pa r a m odifica r a pr open sã o a con su m ir por n ã o gu a r da r em n e-
n h u m a r ela çã o est á vel ou r egu la r com o m on t a n t e da r en da . O con su m o
da s cla sses pr opr iet á r ia s de r iqu eza pode ser ext r em a m en t e su scet ível
à s va r ia ções im pr evist a s n o va lor n om in a l de seu s ben s. E st e fa t or
deve ser con sider a do en t r e os m a is im por t a n t es da qu eles ca pa zes de
oca sion a r va r ia ções de cu r t o pr a zo n a pr open sã o a con su m ir .

115
OS ECON OMIS TAS

(4) Variações n a taxa in tertem poral d e d escon to, isto é, n a relação


d e troca en tre os ben s presen tes e os ben s fu tu ros. Nã o se t r a t a a qu i
da m esm a coisa qu e a t a xa de ju r os, já qu e est a leva em con t a a s
va r ia ções fu t u r a s n o poder a qu isit ivo do din h eir o, à m edida qu e sã o
pr evist a s. Deve-se con sider a r t a m bém t oda a sor t e de r iscos, t a is com o
a pr oba bilida de de n ã o viver ba st a n t e pa r a u su fr u ir dos ben s fu t u r os
ou de u m a t r ibu t a çã o con fisca t ór ia . A t ít u lo de a pr oxim a çã o, con t u do,
podem os iden t ifica r ist o com a t a xa de ju r os.
A in flu ên cia dest e fa t or sobr e a pr opor çã o em qu e se ga st a de-
t er m in a da r en da est á su jeit a a m u it a s dú vida s. P a r a a t eor ia clá ssica
da t a xa de ju r os,77 qu e se ba seia n a idéia de ser a t a xa de ju r os o
fa t or de equ ilíbr io en t r e a ofer t a e a pr ocu r a de pou pa n ça , er a con ve-
n ien t e su por qu e a s despesa s de con su m o, coet. par., va r ia ssem n a
r a zã o in ver sa da s va r ia ções n a t a xa de ju r os, de m a n eir a qu e qu a lqu er
eleva çã o da t a xa de ju r os dim in u ir ia con sider a velm en t e o con su m o.
Toda via , r econ h eceu -se h á m u it o t em po qu e o efeit o t ot a l da s va r ia ções
da t a xa de ju r os sobr e a pr open sã o a despen der em con su m o im edia t o
é com plexo e in cer t o, depen den do de t en dên cia s a n t a gôn ica s, da do qu e
a lgu n s dos m ot ivos su bjet ivos pa r a pou pa r sã o m a is fa cilm en t e sa t is-
feit os qu a n do a t a xa de ju r os sobe, en qu a n t o ou t r os dim in u em . A lon go
pr a zo, é pr ová vel qu e va r ia ções su bst a n cia is n a t a xa de ju r os t en da m
a m odifica r con sider a velm en t e os h á bit os socia is e, por t a n t o, a pr o-
pen sã o su bjet iva a despen der , em bor a , sem a s lu zes da exper iên cia ,
se t or n e difícil in dica r em qu e sen t ido. Con t u do, n ã o é pr ová vel qu e
o t ipo u su a l de flu t u a çã o a cu r t o pr a zo n a t a xa de ju r os t en h a m u it a
in flu ên cia d ireta sobr e os ga st os, n u m sen t ido ou n o ou t r o. Ra r a s sã o
a s pessoa s qu e a lt er a m o seu m odo de vida por qu e a t a xa de ju r os
ba ixou de 5 pa r a 4%, qu a n do a su a r en da a gr ega da per m a n ece a m esm a .
In dir et a m en t e, por ém , podem ocor r er ou t r os efeit os, em bor a n ã o t odos
n a m esm a dir eçã o. Ta lvez a in flu ên cia m a is im por t a n t e, qu e oper a
a t r a vés de va r ia ções n a t a xa de ju r os sobr e a pr open sã o a ga st a r fu n dos
pr oven ien t es de det er m in a da r en da , seja o efeit o dessa s va r ia ções sobr e
a a lt a ou ba ixa do pr eço de t ít u los e de ou t r os a t ivos. Se u m a pessoa
se ben eficia de u m a u m en t o in esper a do n o va lor de seu ca pit a l, é n a t u r a l
qu e os seu s m ot ivos pa r a ga st a r n o per íodo cor r en t e se for t a leça m
(a in da qu e em t er m os de r en da o va lor de seu ca pit a l n ã o t en h a a u -
m en t a do), a o pa sso qu e, se est iver sofr en do per da s de ca pit a l, seu s
m ot ivos pa r a ga st a r en fr a qu ecer ã o. J á n o it em (3), por ém , leva m os em
con t a est a in flu ên cia in dir et a . F or a disso, a con clu sã o m a is im por t a n t e
su ger ida pela exper iên cia é, segu n do cr eio, a de qu e a in flu ên cia a
cu r t o pr a zo da t a xa de ju r os sobr e os ga st os in dividu a is feit os com
det er m in a da r en da é secu n dá r ia e r ela t iva m en t e de pou ca im por t â n cia ,

77 Cf. ca p. 14.

116
KEYN ES

excet u a n do-se, t a lvez, o ca so de va r ia ções excep cion a lm en t e gr a n des.


Qu a n do a t a xa de ju r os ba ixa m u it o, o a u m en t o da r a zã o en t r e o
va lor d e u m a per pet u ida de com p r á vel por det er m in a d a im p or t â n cia
e o ju r o a n u a l qu e se obt ém dessa m esm a im p or t â n cia p ode, con t u do,
pr opor cion a r u m a im por t a n t e fon t e de pou pa n ça , for t a lecen do a pr á -
t ica de pr eca ver -se con t r a a s vicissit u d es d a velh ice, pela com pr a
de u m a per pet u ida de.
A sit u a çã o a n or m a l, em qu e a pr open sã o a con su m ir se vê pr o-
fu n da m en t e a fet a da pela con cor r ên cia de in cer t eza ext r em a qu a n t o a o
fu t u r o e a o qu e ele possa t r a zer , dever ia t a lvez ser in clu ída t a m bém
n est e pa r á gr a fo.

(5) Variações n a política fiscal. Se o in cen t ivo do in divídu o pa r a


pou pa r depen der dos fu t u r os r en dim en t os qu e esper a , ele eviden t e-
m en t e depen der á n ã o só da t a xa de ju r os com o t a m bém da polít ica
fisca l do Gover n o. Os im post os sobr e a r en da , pa r t icu la r m en t e qu a n do
gr a va m a r en da “n ã o ga n h a ”, os im post os sobr e lu cr os de ca pit a l, sobr e
h er a n ça s et c., sã o t ã o im por t a n t es qu a n t o a t a xa de ju r os, sen do m esm o
possível qu e a s m odifica ções even t u a is da polít ica fisca l t en h a m , pelo
m en os n a s expect a t iva s, m a ior in flu ên cia qu e a pr ópr ia t a xa de ju r os.
Se a polít ica fisca l for u sa da com o u m in st r u m en t o deliber a do pa r a
con segu ir m a ior igu a lda de n a dist r ibu içã o da s r en da s, seu efeit o sobr e
o a u m en t o da pr open sã o a con su m ir ser á , n a t u r a lm en t e, t a n t o m a ior .78
Con vém leva r igu a lm en t e em con t a a in flu ên cia exer cida sobr e
a pr open sã o a gr ega da a con su m ir pelos fu n dos de a m or t iza çã o qu e o
Gover n o r eser va pa r a sa lda r su a dívida , u t iliza n do o pr odu t o dos im -
post os com u n s. E st es fu n dos r epr esen t a m u m a espécie de pou pa n ça
de em pr esa , de m odo qu e u m a polít ica t en den t e a cr ia r gr a n des fu n dos
de a m or t iza çã o deve ser con sider a da , em det er m in a da s cir cu n st â n cia s,
u m a for m a de r edu zir a pr open sã o a con su m ir . P or est a r a zã o, u m a
r evir a volt a da polít ica do Gover n o, pa ssa n do do en divida m en t o à cr ia çã o
de fu n dos de a m or t iza çã o (ou vice-versa), pode oca sion a r u m a sér ia
dim in u içã o (ou n ot á vel expa n sã o) da pr ocu r a efet iva .

(6) M od ificações d as expectativas acerca d a relação en tre os n íveis


presen tes e fu tu ros d a ren d a. Devem os in clu ir est e fa t or pa r a qu e a
en u m er a çã o seja com plet a . Ma s, em bor a ele possa a fet a r con sider a vel-
m en t e a pr open sã o a con su m ir de u m in divídu o, é pr ová vel qu e, qu a n do
se t r a t a da com u n ida de com o u m t odo, seu s efeit os t en da m a com pen -
sa r -se. Adem a is, t r a t a -se de u m a qu est ã o qu e su scit a , em ger a l, m u it a
in cer t eza pa r a poder exer cer in flu ên cia im por t a n t e.

78 Deve-se m en cion a r , de pa ssa gem , qu e a r espeit o da in flu ên cia exer cida pela polít ica fisca l
sobr e o a u m en t o da r iqu eza h á u m sér io m a l-en t en dido; con t u do, só o poder em os a n a lisa r
a dequ a da m en t e com o a u xílio da t a xa de ju r os qu e ser á expost a n o Livr o Qu a r t o.

117
OS ECON OMIS TAS

Ch ega m os, pois, à con clu sã o de qu e, em det er m in a da sit u a çã o,


a pr open sã o a con su m ir pode ser con sider a da u m a fu n çã o r ela t iva m en t e
est á vel desde qu e t en h a m os elim in a do a s va r ia ções n a u n ida de de
sa lá r io em t er m os de m oeda . As flu t u a ções im pr evist a s n os va lor es de
ca pit a l podem m odifica r a pr open sã o a con su m ir , bem com o poder ã o
a fet á -la va r ia ções su bst a n cia is n a t a xa de ju r os e n a polít ica fisca l;
por ém , n ã o é pr ová vel qu e os ou t r os fa t or es objet ivos ca pa zes de a t u a r
sobr e ela , con qu a n t o n ã o deva m ser despr eza dos, t en h a m im por t â n cia
em cir cu n st â n cia s com u n s.
E m vir t u de da sit u a çã o econ ôm ica ger a l, o fa t o de o ga st o de
con su m o, em t er m os de u n ida de de sa lá r io, depen der essen cia lm en t e
do volu m e da pr odu çã o e do em pr ego ju st ifica o a gr u pa m en t o dos ou t r os
fa t or es n a expr essã o com post a “a pr open sã o a con su m ir ”. Ist o por qu e,
con qu a n t o os dem a is fa t or es possa m va r ia r (e con vém n ã o esqu ecer
ist o), a r en da a gr ega da m edida em u n ida des de sa lá r io é, r egr a ger a l,
a pr in cipa l va r iá vel de qu e depen de o com pon en t e con su m o da fu n çã o
de pr ocu r a a gr ega da .

III

Adm it in do, pois, qu e a pr open sã o a con su m ir é u m a fu n çã o ba s-


t a n t e est á vel, de m a n eir a qu e, em ger a l, o m on t a n t e do con su m o a gr e-
ga do depen de pr in cipa lm en t e do m on t a n t e da r en da a gr ega da (a m bos
m edidos em u n ida des de sa lá r io), e con sider a n do de im por t â n cia se-
cu n dá r ia a s va r ia ções n a m esm a pr open sã o, qu a l é a for m a n or m a l
dest a fu n çã o?
A lei psicológica fu n da m en t a l em qu e podem os ba sea r -n os com
in t eir a con fia n ça , t a n t o a priori, pa r t in do do n osso con h ecim en t o da
n a t u r eza h u m a n a , com o a pa r t ir dos det a lh es dos en sin a m en t os da
exper iên cia , con sist e em qu e os h om en s est ã o dispost os, de m odo ger a l
e em m édia , a a u m en t a r o seu con su m o à m edida qu e a su a r en da
cr esce, em bor a n ã o em qu a n t ia igu a l a o a u m en t o de su a r en da . Ist o
qu er dizer qu e, se C ω é o m on t a n t e do con su m o e Y ω o da r en da (a m bos
m edidos em u n ida des de sa lá r io), ΔC ω t em o m esm o sin a l qu e ΔY ω,
d Cω
por ém é de gr a n deza m en or , ist o é, é posit ivo e in fer ior à u n ida de.
dYω
E st e é o ca so especia lm en t e qu a n do t em os em vist a per íodos
cu r t os, com o n o ca so da s ch a m a da s flu t u a ções cíclica s do em pr ego,
du r a n t e a s qu a is os h á bit os, n a qu ilo em qu e se dist in gu em da s pr o-
pen sões psicológica s m a is per m a n en t es, n ã o dispõem de t em po ba st a n t e
pa r a se a da pt a r em à s m u da n ça s n a s cir cu n st â n cia s objet iva s. O pa dr ã o
de vida h a bit u a l de u m in divídu o ba seia -se n a pr im eir a sa t isfa çã o qu e
pode ext r a ir da su a r en da , e ele t en de a pou pa r a difer en ça qu e su r ge
en t r e a su a r en da efet iva e a s despesa s cor r espon den t es a o seu pa dr ã o
cost u m eir o de vida ; ou en t ã o, n o ca so de a com oda r os seu s ga st os à s

118
KEYN ES

variações na sua renda em períodos curtos, só o fará imperfeitam ente.


Por conseguinte, uma renda crescente será com freqüência acompanhada
de uma poupança m aior, e uma renda decrescente o será de um a poupança
menor, em maior escala a princípio do que posteriormente.
F or a da s variações de cu r t o per íodo n o n ível da r en da , por ém ,
t a m bém é eviden t e qu e a eleva çã o a bsolu t a do m on t a n t e da r en da
con t r ibu i, via de r egr a , pa r a a la r ga r a br ech a en t r e a r en da e o con su m o.
Isso por qu e a sa t isfa çã o da s n ecessida des pr im á r ia s im edia t a s de u m
in divídu o e de su a fa m ília é, n or m a lm en t e, m a is for t e qu e os seu s
m ot ivos pa r a pou pa r , qu e só a dqu ir em pr edom ín io efet ivo qu a n do se
a lca n ça det er m in a do n ível de con for t o. E st a s r a zões fa zem com qu e,
em ger a l, u m a proporção m aior da r en da seja pou pa da à m edida qu e
a r en da r ea l a u m en t a . P or ém , pou pe-se ou n ã o n u m a pr opor çã o m a ior ,
som os leva dos a con sider a r r egr a psicológica fu n da m en t a l em u m a co-
m u n ida de m oder n a qu e, qu a n do a su a r en da r ea l a u m en t a , o seu con -
su m o n ã o cr escer á em m on t a n t e absolu to igu a l, de m odo qu e ela pou -
pa r á n ecessa r ia m en t e u m a som a a bsolu t a m a ior , a n ã o ser qu e, a o
m esm o t em po, ocor r a u m a a lt er a çã o for a do com u m n os dem a is fa t or es.
Com o ver em os depois,79 a est a bilida de do sist em a econ ôm ico depen de
essen cia lm en t e da pr edom in â n cia dest a r egr a n a pr á t ica . Ist o sign ifica
qu e, se o em pr ego e, por t a n t o, a r en da a gr ega da a u m en t a m , n em tod o
o em pr ego a dicion a l ser á r equ er ido pa r a sa t isfa zer a s n ecessida des do
con su m o a dicion a l.
P or ou t r o la do, u m a dim in u içã o da r en da devida à qu eda n o
volu m e de em pr ego, se for a lém de cer t os lim it es, pode m u it o bem ser
m ot ivo pa r a qu e o con su m o exceda a r en da , n ã o a pen a s por qu e os
in divídu os ou in st it u ições pa ssa m a u t iliza r a s r eser va s fin a n ceir a s
a cu m u la da s em m elh or es dia s, com o t a m bém por qu e o Gover n o, deli-
ber a da m en t e ou n ã o, poder á ca ir n u m déficit or ça m en t á r io ou poder á
vir a for n ecer a u xílio em ca so de desem pr ego, por exem plo, com din h eir o
em pr est a do. P or isso, qu a n do o em pr ego desce a u m n ível ba ixo, o
con su m o a gr ega do ca ir á em volu m e m en or qu e a dim in u içã o da r en da
r ea l, t a n t o por for ça da s r ea ções h a bit u a is dos in divídu os com o por
for ça da polít ica pr ová vel dos Gover n os, o qu e explica a possibilida de
de con segu ir , m u it a s vezes, u m a n ova posiçã o de equ ilíbr io den t r o de
lim it es r a zoá veis de flu t u a çã o. Se a ssim n ã o fosse, o declín io do em pr ego
e da r en da , u m a vez in icia do, poder ia ir m u it o lon ge.
E st e pr in cípio sim ples leva , com o se poder á ver , à m esm a con -
clu sã o de a n t es, a sa ber , o em pr ego só pode a u m en t a r pari passu com
u m a u m en t o do in vest im en t o; a n ã o ser , bem en t en dido, qu e ocor r a
a lgu m a m u da n ça n a pr open sã o a con su m ir . Com efeit o, vist o qu e n o
ca so de u m a u m en t o do em pr ego os con su m idor es vã o ga st a r m en os

79 Cf. p. 240.

119
OS ECON OMIS TAS

do qu e o a u m en t o n o pr eço da ofer t a a gr ega da , o dit o a u m en t o de


em pr ego se r evela r á desva n t a joso, a n ã o ser qu e u m a cr éscim o n o
in vest im en t o ven h a pr een ch er a la cu n a .

IV

Nã o devem os su best im a r a im por t â n cia do fa t o já a ssin a la do a n -


t er ior m en t e de qu e, en qu a n t o o em pr ego é fu n çã o do con su m o e do
in vest im en t o pr evist os, o con su m o é, coet. par., fu n çã o da r en da líqu id a,
isto é, d o in vestim en to líqu id o (sen do a r en da líqu ida igu a l a o con su m o
m ais o in vest im en t o líqu ido). E m ou t r a s pa la vr a s, qu a n t o m a ior for a
pr ovisã o fin a n ceir a qu e se ju lgu e n ecessá r io con st it u ir a n t es de ca lcu la r
a r en da líqu ida , m en os fa vor á vel ser á pa r a o con su m o, e, por t a n t o,
pa r a o em pr ego, u m volu m e det er m in a do de in vest im en t o.
Qu a n do t oda est a pr ovisã o fin a n ceir a (ou cu st o su plem en t a r ) é
efet iva m en t e ga st a n a con ser va çã o do equ ipa m en t o de ca pit a l exist en t e,
n ã o é pr ová vel qu e isso pa sse desper cebido. Con t u do, qu a n do a pr ovisã o
fin a n ceir a exced e o ga st o r ea l de con ser va çã o, n em sem pr e se a va lia m
a s con seqü ên cia s pr á t ica s qu e da í r esu lt a m pa r a o em pr ego, pois o
m on t a n t e dest e exceden t e n ã o dá or igem dir et a a u m in vest im en t o
cor r en t e n em se a ch a dispon ível pa r a o con su m o. Tem , por t a n t o, de
ser equ ilibr a do com n ovo in vest im en t o, cu ja pr ocu r a n a sce de m ot ivos
com plet a m en t e in depen den t es do desga st e a t u a l do equ ipa m en t o velh o,
pa r a o qu a l se con st it u iu a pr ovisã o fin a n ceir a , com a con seqü ên cia
de qu e o n ovo in vest im en t o dispon ível pa r a m a n t er a r en da a t u a l di-
m in u i pa r a lela m en t e e se t or n a n ecessá r ia u m a pr ocu r a m a is in t en sa
de n ovos in vest im en t os, pa r a qu e se t or n e possível a t in gir det er m in a do
n ível de em pr ego. Além disso, con sider a ções m u it o pa r ecida s se a plica m
a os elem en t os do cu st o de u so dest in a dos a com pen sa r o desga st e,
qu a n do est e n ã o é efet iva m en t e r epa r a do.
Tom em os, por exem plo, u m a ca sa qu e con t in u a sen do h a bit á vel
a t é qu e seja dem olida ou a ba n don a da . Se do a lu gu el a n u a l pa go pelos
in qu ilin os é descon t a da cer t a pa r t e do seu va lor , qu e o pr opr iet á r io
n ã o ga st a em su a con ser va çã o n em con sider a r en da líqu ida , dispon ível
pa r a o con su m o, est a r eser va , qu er fa ça pa r t e de U ou de V, con st it u i
u m em pecilh o pa r a o em pr ego du r a n t e t odo o t em po em qu e du r e a
ca sa , em pecilh o est e qu e logo ser á com pen sa do, de u m a só vez, qu a n do
a ca sa for r econ st r u ída .
E m u m a econ om ia est a cion á r ia t a lvez n ã o va lesse a pen a m en -
cion a r esses fa t or es, em se con sider a n do qu e os a ba t im en t os pela de-
pr ecia çã o feit os a n u a lm en t e sobr e a s ca sa s velh a s ser ia m exa t a m en t e
com pen sa dos pela s ca sa s n ova s, con st r u ída s em su bst it u içã o da s qu e
em ca da a n o ch ega m a o fim de su a s vida s. Ta is fa t or es, por ém , podem
ser de m u it a im por t â n cia n u m a econ om ia n ã o est á t ica , especia lm en t e
du r a n t e o per íodo im edia t o a u m a expa n sã o pr on u n cia da de in vest i-
m en t os em ca pit a l de lon ga vida ú t il. E m t a is cir cu n st â n cia s, gr a n de

120
KEYN ES

pa r t e dos n ovos it en s de in vest im en t o pode ser a bsor vida pela s m a ior es


pr ovisões fin a n ceir a s qu e os em pr esá r ios fa zem pa r a pr epa r a r e r en ova r
o equ ipa m en t o de ca pit a l exist en t e, o qu a l, em bor a se desga st e com o
t em po, a in da n ã o ch egou a o pon t o de exigir ga st os qu e se a pr oxim em
do t ot a l da r eser va fin a n ceir a con st it u ída ; com o con seqü ên cia , a s r en da s
n ã o podem su bir a lém de u m n ível ba st a n t e ba ixo pa r a cor r espon der
à pequ en a qu a n t ia a gr ega da do in vest im en t o líqu ido. Os fu n dos de
a m or t iza çã o e ou t r a s r eser va s a n á loga s podem , por t a n t o, r edu zir o
poder de dispên dio do con su m idor m u it o t em po a n t es qu e ocor r a a
n ecessida de dos ga st os de r eposiçã o (pa r a os qu a is t a is r eser va s for a m
con st it u ída s), ist o é, dim in u em a pr ocu r a efet iva cor r en t e e só a a u -
m en t a m n o a n o em qu e, efet iva m en t e, se fa z a r eposiçã o. Se est e efeit o
for a gr a va do pela “pr u dên cia fin a n ceir a ”, ou seja , pela idéia da con ve-
n iên cia de “a m or t iza r ” o cu st o in icia l com m aior r a pidez qu e o desga st e
r ea l do equ ipa m en t o, o r esu lt a do cu m u la t ivo pode ser ba st a n t e sér io.
Nos E st a dos Un idos, por exem plo, a o ch ega r em 1929, a r á pida
expa n sã o de ca pit a l n os cin co a n os a n t er ior es levou cu m u la t iva m en t e
à con st it u içã o, com vist a a u m equ ipa m en t o qu e n ã o n ecessit a ser
r en ova do, de fu n dos de a m or t iza çã o e de m a r gen s de depr ecia çã o em
t ã o gr a n de esca la qu e se t or n a va n ecessá r io u m volu m e en or m e de
in vest im en t os com plet a m en t e n ovos a pen a s pa r a a bsor ver essa s r eser -
va s fin a n ceir a s; ch egou , a in da , a ser qu a se im possível en con t r a r m a is
in vest im en t os n ovos em esca la su ficien t e pa r a cor r espon der a o volu m e
de pou pa n ça n ova , qu e u m a com u n ida de pr ósper a e em sit u a çã o de
plen o em pr ego se dispu ser a a gu a r da r . Apen a s est e fa t or ba st a r ia ,
pr ova velm en t e, pa r a ca u sa r u m a depr essã o. E , a lém disso, a m esm a
“pr u dên cia fin a n ceir a ” con t in u ou a ser exer cida a o lon go da depr essã o
pela s gr a n des fir m a s em con dições de fa zê-lo, fa t o qu e con st it u iu sér io
obst á cu lo pa r a u m a r ecu per a çã o im edia t a .
Ta m bém n a Gr ã -Br et a n h a , n a a t u a lida de (1935), o gr a n de volu m e
de con st r u ções e ou t r os in vest im en t os r ea liza dos depois da gu er r a le-
va r a m a u m volu m e de fu n dos de a m or t iza çã o m u it o su per ior à s n e-
cessida des pr esen t es pa r a os ga st os de r epa r a ções e r en ova ções, t en -
dên cia qu e se for t a leceu n o ca so dos in vest im en t os feit os pela s a u t o-
r ida des loca is e pú blica s, de a cor do com os pr in cípios de “sã ” a dm in is-
t r a çã o fin a n ceir a , qu e fr eqü en t em en t e r equ er em fu n dos de a m or t iza çã o
su ficien t es pa r a r ecu per a r o cu st o in icia l a lgu m t em po a n t es qu e a
r eposiçã o se fa ça n ecessá r ia ; com o r esu lt a do de qu e, m esm o se os
pa r t icu la r es est ivessem dispost os a ga st a r o t ot a l de su a s r en da s lí-
qu ida s, ser ia u m a difícil t a r efa r est a belecer o plen o em pr ego dia n t e
dest e volu m e opr essivo de r eser va s est a t u t á r ia s con st it u ída s pela s a u -
t or ida des pú blica s e sem ipú blica s, in t eir a m en t e dissocia da s de qu a lqu er
in vest im en t o n ovo cor r espon den t e. Cr eio qu e, n o m om en t o,80 os fu n dos

80 As cifr a s su scit a m t ã o pou co in t er esse qu e só sã o pu blica da s com a t r a so de dois a n os


ou m a is.

121
OS ECON OMIS TAS

de a m or t iza çã o da s a u t or ida des loca is a lca n ça m u m a cifr a a n u a l su -


per ior à m et a de da som a qu e essa s a u t or ida des ga st a m em t odos os
seu s n ovos in vest im en t os.81 E decer t o o Min ist ér io da Sa ú de, qu a n do
in sist e em exigir dessa s a u t or ida des loca is a for m a çã o de fu n do de
a m or t iza çã o, ign or a a t é qu e pon t o sem elh a n t e polít ica con t r ibu i pa r a
a gr a va r o pr oblem a do desem pr ego. No ca so de a dia n t a m en t os feit os
por socieda des im obiliá r ia s pa r a a ju da r u m in divídu o a con st r u ir su a
pr ópr ia ca sa , o desejo de se livr a r da dívida a n t es qu e a ca sa se det er ior e
pode est im u la r o pr opr iet á r io a pou pa r m a is do qu e fa r ia de ou t r a
for m a , em bor a , t a lvez, se devesse cla ssifica r est e fa t or com o ca pa z de
r edu zir a pr open sã o a con su m ir dir et a m en t e, em vez de ca u sa r efeit o
sobr e a r en d a líqu ida . De fa t o, a s a m or t iza ções dos em pr esá r ios
h ipot ecá r ios feit os pela s socied a des im obiliá r ia s, qu e em 1925 a l-
ca n ça va m 24 m ilh ões de libr a s est er lin a s, su bir a m pa r a 68 m ilh ões
de libr a s em 1933, em com p a r a çã o com n ovos a dia n t a m en t os n o
m on t a n t e de 103 m ilh ões d e libr a s; h oje, a s a m or t iza ções sã o, pr o-
va velm en t e, a in d a m a ior es.
O fa t o de ser o in vest im en t o br u t o m a is do qu e o in vest im en t o
líqu ido qu e se m a n ifest a n a s est a t íst ica s de pr odu çã o depr een de-se de
m a n eir a n a t u r a l e con clu den t e da obr a de Colin Cla r k, N ation al In com e,
1924-1931. E le t a m bém m ost r a qu e h á u m a eleva da pr opor çã o de de-
pr ecia çã o e ou t r os fa t or es qu e n or m a lm en t e a fet a m o in vest im en t o.
E le ca lcu la , por exem plo, qu e n a Gr ã -Br et a n h a os m on t a n t es do in -
vest im en t o e do in vest im en t o líqu ido en t r e 1928 e 1931 82 for a m os
m en cion a dos a dia n t e, em bor a o in vest im en t o br u t o pa r a ele seja pr o-
va velm en t e u m pou co m a ior qu e o m eu in vest im en t o, n a m edida em
qu e poder á in clu ir pa r t e do cu st o de u so, e n ã o fica cla r o a t é qu e pon t o
o seu “in vest im en t o líqu ido” coin cide com a m in h a defin içã o dest e t er m o:

81 No decor r er do a n o fin a n ceir o qu e t er m in ou em 31 de m a r ço de 1930, a s a u t or ida des loca is


ga st a r a m 87 m ilh ões de libr a s est er lin a s n a con t a de ca pit a l, dos qu a is 37 m ilh ões de
libr a s for a m pr opor cion a dos pelos fu n dos de a m or t iza çã o et c., cor r espon den t es a os ga st os
a n t er ior es da m esm a n a t u r eza ; n o a n o qu e t er m in ou em 31 de m a r ço de 1933, a s cifr a s
for a m , r espect iva m en t e, 81 e 46 m ilh ões de libr a s.
82 Op. cit., pp. 117-138.

122
KEYN ES

Ku zn et s ch egou a con clu sã o pa r ecida a o com pila r a s est a t íst ica s


da for m a çã o br u t a de ca pit a l (o qu e eu ch a m o “in vest im en t o”), n os
E st a dos Un idos, en t r e 1919 e 1933. O fa t o físico qu e a s est a t íst ica s
da pr odu çã o con st a t a m n ã o é, in evit a velm en t e, o in vest im en t o líqu ido,
m a s o br u t o. Ku zn et s iden t ificou , t a m bém , a s dificu lda des qu e sã o
en con t r a da s pa r a pa ssa r do in vest im en t o br u t o a o líqu ido. “A dificu l-
da de”, escr eve ele, “em pa ssa r da for m a çã o br u t a do ca pit a l à for m a çã o
líqu ida , ist o é, a dificu lda de de fa zer cor r eções cor r espon den t es a o con -
su m o dos ben s du r á veis fin a is exist en t es, n ã o r eside u n ica m en t e n a
fa lt a de da dos. O pr ópr io con ceit o do con su m o a n u a l de ben s qu e du r a m
certo número de anos está sujeito a ambigüidade.” Ele se apóia, portanto,
“na hipótese de que a reserva para depreciação e exaustão nos livros das
empresas representa, corretam ente, o volum e de consumo dos bens du-
ráveis existentes usados por essas em presas”.83 Por outro lado, não tenta
fazer dedução algum a relativamente a casas e a outros bens duráveis em
mãos dos indivíduos. Seus resultados, m uito interessantes, relativos aos
Estados Unidos, podem ser resumidos como segue:

83 E st a s cit a ções sã o ext r a ída s do B u lletin n º 52 do Na t ion a l Bu r ea u of E con om ic Resea r ch ,


n o qu a l se dã o os r esu lt a dos pr elim in a r es do livr o em pr epa r a çã o de Ku zn et s.

123
OS ECON OMIS TAS

Dest e qu a dr o r essa lt a m vá r ios fa t os im por t a n t es. A for m a çã o lí-


qu ida de ca pit a l con ser vou -se m u it o est á vel n o qü in qü ên io 1925-1929,
a pen a s com u m a u m en t o de 10% n a ú lt im a et a pa do m ovim en t o a s-
cen den t e. As dedu ções cor r espon den t es a os ga st os dos em pr esá r ios com
r epa r a ções, m a n u t en çã o, depr ecia çã o e exa u st ã o m a n t iver a m -se n u m a
cifr a a lt a , m esm o n o pon t o cu lm in a n t e da depr essã o. O m ét odo de
Ku zn et s, por ém , leva cer t a m en t e a u m a su best im a t iva do a u m en t o
a n u a l n a depr ecia çã o et c., pois ca lcu la est a ú lt im a em m en os de 1,5%
da n ova for m a çã o líqu ida do ca pit a l. Ver ifica -se, sobr et u do, qu e a for -
m a çã o líqu ida do ca pit a l sofr eu u m desa st r oso cola pso depois de 1929,
descen do em 1932 a u m a cifr a n ã o m en os qu e 95% in fer ior à m éd ia
do qü in qü ên io 1925-1929.
O qu e foi dit o a n t er ior m en t e n ã o pa ssa , a t é cer t o pon t o, de u m a
digr essã o. Toda via , é im por t a n t e in sist ir sobr e a m a gn it u de do a ba t i-
m en t o qu e deve ser feit o da r en da de u m a socieda de qu e já possu i
gr a n de est oqu e de ca pit a l, a n t es de ch ega r à r en da líqu ida qu e est á
n or m a lm en t e dispon ível pa r a o con su m o. Se ign or a r m os est e fa t or ,
a r r isca m os su best im a r o poder oso fr eio qu e m oder a a pr open sã o a con -
su m ir , m esm o qu a n do o pú blico est eja dispost o a con su m ir gr a n de
pa r t e da su a r en da líqu ida .
O con su m o — pa r a r epet ir o óbvio — é o ú n ico fim e objet ivo
da a t ivida de econ ôm ica . As opor t u n ida des de em pr ego est ã o n ecessa -
r ia m en t e lim it a da s pela ext en sã o da pr ocu r a a gr ega da . A dem a n da
a gr ega da só pode ser der iva da do con su m o pr esen t e ou da s r eser va s
pa r a o con su m o fu t u r o. O con su m o qu e podem os pr over va n t a josa m en t e
com a n t ecedên cia n ã o pode est en der -se in defin ida m en t e n o fu t u r o. Nã o
podem os, com o socieda de, pr over con su m o fu t u r o por m eio de expe-
dien t es fin a n ceir os, m a s a pen a s m edia n t e a pr odu çã o física cor r en t e.
Na m edida em qu e n ossa or ga n iza çã o socia l e com er cia l sepa r a a for -
m a çã o de r eser va s fin a n ceir a s pa r a o fu t u r o da pr ovisã o física fu t u r a ,
de t a l for m a qu e os esfor ços pa r a a ssegu r a r a s pr im eir a s n ã o a r r a st em
n ecessa r ia m en t e con sigo a con secu çã o da segu n da , a pr u dên cia fin a n -
ceir a pode ca u sa r r est r ições n a pr ocu r a a gr ega da e, por t a n t o, dim in u ir
o bem -est a r , con for m e t est em u n h a m m u it os exem plos. Ma is do qu e
isso, qu a n t o m a ior for a pr ovisã o qu e fa ça m os com a n t ecedên cia pa r a
o con su m o, m a ior ser á a dificu lda de em en con t r a r n ova s n ecessida des
pa r a pr over , e m a ior a n ossa depen dên cia do con su m o pr esen t e com o
fon t e de pr ocu r a . E n t r et a n t o, qu a n t o m a ior es for em a s n ossa s r en da s,
m a ior , in felizm en t e, ser á a m a r gem en t r e essa s r en da s e o n osso con -
su m o. Na a u sên cia de a lgu m n ovo expedien t e, n ã o h á , com o ver em os,
m a n eir a de r esolver o en igm a , excet o a qu e con sist e n u m desem pr ego
su ficien t e pa r a pr ovoca r u m em pobr ecim en t o ba st a n t e pa r a qu e a di-
fer en ça , en t r e n osso con su m o e a n ossa r en da , n ã o seja m a ior qu e o

124
KEYN ES

equ iva len t e da pr ovisã o física pa r a o con su m o fu t u r o qu e seja lu cr a t ivo


con st it u ir h oje.
E xa m in em os t a m bém a qu est ã o pelo segu in t e pr ism a . O con su m o
se sa t isfa z, em pa r t e, com os ben s pr odu zidos n a a t u a lida de e, em
pa r t e, com os pr odu zidos a n t er ior m en t e, ist o é, com o desin vest im en t o.
Na m edida em qu e o con su m o se sa t isfizer com os ben s do segu n do
t ipo ver ifica -se u m a con t r a çã o n a dem a n da cor r en t e, vist o qu e, n a m es-
m a m edida , u m a pa r t e dos ga st os pr esen t es deixa de r et or n a r com o
pa r t e da r en da líqu ida . P elo con t r á r io, sem pr e qu e se pr odu z u m a
m er ca dor ia , du r a n t e o per íodo, com a in t en çã o de sa t isfa zer o con su m o
post er ior m en t e, r esu lt a da í u m a expa n sã o da dem a n da cor r en t e. Or a ,
t odo o in vest im en t o de ca pit a l est á dest in a do a r esu lt a r , m a is cedo ou
m a is t a r de, em desin vest im en t o de ca pit a l. Dest a r t e, o pr oblem a de
con segu ir qu e os n ovos in vest im en t os de ca pit a l exceda m sem pr e o
desin vest im en t o de ca pit a l, n a m edida n ecessá r ia pa r a pr een ch er a
la cu n a qu e sepa r a a r en da líqu ida do con su m o, a pr esen t a dificu lda de
cr escen t e à m edida qu e o ca pit a l a u m en t a . Os n ovos in vest im en t os de
ca pit a l só podem r ea liza r -se em excesso a o desin vest im en t o a t u a l do
ca pit a l qu a n do se esper a u m a u m en t o dos ga st os fu tu ros em con su m o.
Ca da vez qu e ga r a n t im os o equ ilíbr io de h oje a u m en t a n do o in vest i-
m en t o, est a m os a gr a va n do a dificu lda de de a ssegu r a r o equ ilíbr io de
a m a n h ã . Um a dim in u içã o n a pr open sã o a con su m ir de h oje só pode
con for m a r -se com o in t er esse pú blico se esper a r m os qu e h a ja a lgu m
dia m a ior pr open sã o a con su m ir . Isso n os fa z r ecor da r a “F á bu la da s
Abelh a s”: a s sa t isfa ções de a m a n h ã sã o a bsolu t a m en t e in dispen sá veis
pa r a ju st ifica r a s pr iva ções de h oje.
É cu r ioso e dign o de n ot a qu e a sa bedor ia popu la r só pa r eça
per ceber -se dest a per plexida de fin a l n o ca so dos in vest im en t os pú blicos,
qu a n do, por exem plo, se t r a t a da con st r u çã o de est r a da s, de h a bit a ções
ou a lgo sem elh a n t e. Apr esen t a -se, com u m en t e, com o objeçã o a os pla n os
t en den t es a a u m en t a r o em pr ego por m eio de in vest im en t os pa t r oci-
n a dos pela a u t or ida de pú blica , o fa t o de qu e a ssim est ã o sen do cr ia da s
dificu lda des pa r a o fu t u r o. “Qu e fa r em os”, per gu n t a -se, “qu a n do t iver -
m os con st r u ído t oda s a s ca sa s, est r a da s, pr efeit u r a s, r edes de en er gia
elét r ica , sist em a s de dist r ibu içã o de á gu a e ou t r a s in st a la ções de qu e
possa n ecessit a r a popu la çã o est a cion á r ia do fu t u r o?” H á , con t u do, m a is
dificu lda des em com pr een der qu e o m esm o in con ven ien t e se a pr esen t a
n o ca so dos in vest im en t os pr iva dos e da expa n sã o in du st r ia l, pa r t icu -
la r m en t e com a ú lt im a , desde qu e é m u it o m a is fá cil pr ever a pr óxim a
sa t u r a çã o da s n ecessida des de n ova s fá br ica s e equ ipa m en t os, qu e iso-
la da m en t e a bsor vem pou co din h eir o, do qu e a pr ocu r a de con st r u ções
pa r a m or a dia .
O obst á cu lo qu e se a n t epõe a u m cla r o en t en dim en t o dest a s qu es-

125
OS ECON OMIS TAS

t ões pa r ece con st it u ir -se, com o su cede, n a m a ior ia da s discu ssões a ca -


dêm ica s sobr e o ca pit a l, de u m a a pr ecia çã o in a dequ a da do fa t o de qu e
o ca pit a l n ã o é u m a en t ida de qu e su bsist a por si m esm a , in depen den -
t em en t e do con su m o. P elo con t r á r io, ca da en fr a qu ecim en t o n a pr open -
sã o a con su m ir , con sider a da h á bit o per m a n en t e, leva a dem a n da de
ca pit a l a en fr a qu ecer -se ju n t a m en t e com a dem a n da de con su m o.

126
C AP ÍTU LO 9
A P ro p e n s ã o a Co n s u m ir: II. Os F a to re s S u bje tiv o s

R est a -n os exa m in a r a segu n da ca t egor ia de fa t or es qu e a fet a m


o m on t a n t e d o con su m o d e u m a r en d a — a sa ber , a s for ça s su bjet iva s
e socia is qu e det er m in a m o m on t a n t e dos ga st os dep ois de con h ecidos
a r en da a gr ega da , m ed ida em u n ida des de sa lá r io, e os fa t or es ob-
jet ivos r eleva n t es já a n a lisa dos. Com o a a n á lise desses fa t or es n ã o
leva n t a n en h u m pr oblem a n ovo, t a lvez seja su ficien t e en u m er a r os
m a is im por t a n t es, sem en t r a r m os em m a ior es con sider a ções a seu
r espeit o.
H á , em ger a l, oit o m ot ivos ou fin s im por t a n t es de ca r á t er su bjet ivo
em vir t u de dos qu a is os in divídu os se a bst êm de ga st a r su a r en da :

(i) con st it u ir u m a r eser va pa r a fa zer fa ce a con t in gên cia s im -


pr evist a s;
(ii) pr epa r a r -se pa r a u m a r ela çã o fu t u r a pr evist a en t r e a r en da
e a s n ecessida des do in divídu o e su a fa m ília , difer en t e da qu e
exist e n o m om en t o, com o por exem plo n o qu e diz r espeit o à ve-
lh ice, à edu ca çã o dos filh os ou a o su st en t o da s pessoa s depen -
den t es;
(iii) ben eficia r -se do ju r o e da va lor iza çã o, ist o é, por qu e u m
con su m o r ea l m a ior em da t a fu t u r a é pr efer ível a u m con su m o
im edia t o m a is r edu zido;
(iv) desfr u t a r de u m ga st o pr ogr essiva m en t e cr escen t e, sa t is-
fa zen do, a ssim , u m in st in t o n or m a l qu e leva os h om en s a en ca r a r
a per spect iva de u m n ível de vida qu e m elh or e gr a du a lm en t e,
de pr efer ên cia a o con t r á r io, m esm o qu e a ca pa cida de de sa t isfa çã o
t en da a dim in u ir ;
(v) desfr u t a r de u m a sen sa çã o de in depen dên cia ou do poder

127
OS ECON OMIS TAS

de fa zer a lgo, m esm o sem idéia cla r a ou in t en çã o defin ida da


a çã o específica ;
(vi) ga r a n t ir u m a m asse d e m an oeu vre pa r a r ea liza r pr ojet os
especu la t ivos ou econ ôm icos;
(vii) lega r u m a for t u n a ;
(viii) sa t isfa zer a pu r a a va r eza , ist o é, in ibir -se de m odo
ir r a cion a l, m a s per sist en t e, de r ea liza r qu a lqu er a t o de despesa
com o t a l.

E st es oit o m ot ivos podem ser ch a m a dos de: P r eca u çã o, P r evidên -


cia , Cá lcu lo, Melh or ia , In depen dên cia , In icia t iva , Or gu lh o e Ava r eza ;
t a m bém poder ía m os for m u la r u m a list a de m ot ivos pa r a con su m ir t a is
com o: P r a zer , Im pr evidên cia , Gen er osida de, Ir r eflexã o, Ost en t a çã o e
E xt r a va gâ n cia .
Além da s pou pa n ça s a cu m u la da s pelos in divídu os h á t a m bém
u m a gr a n de pr opor çã o de r en da s, va r iá vel t a lvez, n u m a com u n ida de
in du st r ia l m oder n a com o a Gr ã -Br et a n h a ou os E st a dos Un idos, en t r e
u m e dois t er ços da a cu m u la çã o t ot a l, qu e é r et ida pelos Gover n os
cen t r a is ou loca is, por in st it u ições e por em pr esa s com er cia is — por
m ot ivos m u it o sem elh a n t es, m a s n ã o idên t icos, a os qu e a n im a m os
in divídu os e m a is pa r t icu la r m en t e pelos qu a t r o segu in t es:

(i) o m ot ivo de em pr esa — con segu ir r ecu r sos pa r a r ea liza r


u m n ovo in vest im en t o de ca pit a l, sem con t r a ir dívida ou r ecor r er
a o ca pit a l do m er ca do;
(ii) o m ot ivo de liqu idez — ga r a n t ir r ecu r sos líqu idos pa r a
en fr en t a r a s em er gên cia s, dificu lda des e cr ises;
(iii) o m ot ivo de m elh or ia — a ssegu r a r u m a u m en t o gr a du a l
de r en da qu e, in ciden t a lm en t e, isen t a r á os dir igen t es da cr ít ica ,
vist o qu e n o a u m en t o da r en da é difícil dist in gu ir o qu e r esu lt a
da a cu m u la çã o do qu e pr ovém da eficiên cia ;
(iv) o m ot ivo da pr u dên cia fin a n ceir a e a pr eocu pa çã o de se
sen t ir segu r o pela con st it u içã o de u m a r eser va fin a n ceir a qu e
exceda o cu st o de u so e o cu st o su plem en t a r , de m odo qu e liqu ide
os débit os e qu e a m or t ize o cu st o do a t ivo a u m r it m o a n t es
su per ior do qu e in fer ior a o r it m o r ea l de desga st e e obsolescên cia ,
depen den do a for ça dest e m ot ivo sobr et u do da qu a n t ida de e da
n a t u r eza do equ ipa m en t o de ca pit a l e da r a pidez do pr ogr esso
t écn ico.

A est es m ot ivos, qu e t en dem a exclu ir do con su m o u m a pa r t e


da r en d a , cor r espon d em ou t r os qu e à s vezes pr ovoca m u m exceden t e
do con su m o sobr e a r en d a . Vá r ios dos m ot ivos qu e fa vor ecem u m a
pou pa n ça p osit iva en u m er a dos a n t es, e qu e a fet a m os in divídu os,

128
KEYN ES

t êm su a con t r a pa r t ida n a pou p a n ça n ega t iva em da t a post er ior , com o


su cede, por exem plo, com a pou pa n ça feit a p a r a p r over à s n ecessi-
da des d a fa m ília ou d a velh ice. O a u xílio de desem pr ego fin a n cia do
por em pr ést im os deve ser con sider a do, de pr efer ên cia , u m a pou pa n ça
n ega t iva .
Agor a , a for ça de t odos est es m ot ivos va r ia en or m em en t e segu n do
a s in st it u ições e a or ga n iza çã o da socieda de econ ôm ica qu e pr esu m im os;
segu n do os h á bit os devidos à r a ça , à edu ca çã o, à s con ven ções, à r eligiã o
e à s a t it u des m or a is cor r en t es; segu n do a s esper a n ça s a t u a is e a ex-
per iên cia pa ssa da ; segu n do a esca la e a t écn ica do equ ipa m en t o de
ca pit a l; segu n do a for m a pr eva lecen t e da dist r ibu içã o da r iqu eza e os
n íveis de vida est a belecidos. Toda via , n a t ese qu e con st it u i o objet ivo
dest a obr a , n ã o n os ocu pa r em os, excet o em digr essões oca sion a is, dos
r esu lt a dos da s m u da n ça s socia is de lon go pr a zo n em dos len t os efeit os
do pr ogr esso secu la r . Isso sign ifica qu e da r em os por a ceit a a ba se dos
m ot ivos su bjet ivos qu e leva m , r espect iva m en t e, a pou pa r e a con su m ir .
Na m edida em qu e a dist r ibu içã o da r iqu eza é det er m in a da pela es-
t r u t u r a socia l m a is ou m en os per m a n en t e da com u n ida de, podem os
igu a lm en t e con sider a r essa ba se u m fa t or qu e só va r ia em r it m o len t o
e n o cu r so de u m lon go per íodo, o qu e t a m bém da r em os por a ceit o n o
pr esen t e est u do.
II

Con sider a n do, por t a n t o, qu e a ba se pr in cipa l da s for ça s su bjet iva s


e socia is m u da len t a m en t e, en qu a n t o por ou t r o la do a in flu ên cia a
cu r t o pr a zo n a s a lt er a ções da t a xa de ju r os e ou t r os fa t or es su bjet ivos
é, n o m a is da s vezes, de im por t â n cia secu n dá r ia , som os leva dos a con -
clu ir qu e a s va r ia ções de cu r t o pr a zo n o con su m o depen dem , em gr a n de
pa r t e, da s a lt er a ções do r it m o com qu e se ga n h a m a s r en da s (m edida s
em u n ida des de sa lá r io) e n ã o da s va r ia ções n a pr open sã o a con su m ir
u m a pa r t e de det er m in a da r en da .
Devem os, n o en t a n t o, pr eca ver -n os con t r a u m m a l-en t en dido. O
qu e ficou dit o a cim a sign ifica qu e a in flu ên cia de va r ia ções m oder a da s
n a t a xa de ju r o sobr e a propen são a con su m ir é ger a lm en t e pequ en a .
Nã o sign ifica qu e a s va r ia ções n a t a xa de ju r os t en h a m a pen a s u m a
in flu ên cia lim it a da sobr e a s qu a n t ia s realm en te pou pa da s ou con su -
m ida s. P elo con t r á r io, a in flu ên cia dessa s va r ia ções sobr e o m on t a n t e
r ea lm en t e pou pa do é de pr im or dia l im por t â n cia , m a s se exer ce em
d ireção oposta à qu e, ger a lm en t e, lh e é a t r ibu ída . Mesm o se a a t r a çã o
de u m a r en da fu t u r a m a ior , a ser obt ida de u m a eleva çã o da t a xa de
ju r os, t iver por con seqü ên cia dim in u ir a pr open sã o a con su m ir , podem os
est a r cer t os de qu e u m a eleva çã o da m esm a t a xa de ju r os r esu lt a
n u m a r edu çã o da qu a n t ia r ea lm en t e pou pa da . Com efeit o, a pou pa n ça

129
OS ECON OMIS TAS

a gr ega da depen de do in vest im en t o a gr ega do e a eleva çã o da t a xa de


ju r os (se n ã o for com pen sa da por u m a eleva çã o cor r espon den t e n a es-
ca la da pr ocu r a de in vest im en t o) fa r á ba ixa r o in vest im en t o; por t a n t o,
u m a eleva çã o da t a xa de ju r os t er á por efeit o ba ixa r a s r en da s a u m
n ível em qu e a dim in u içã o da pou pa n ça igu a la a do in vest im en t o. E m
se con sider a n do qu e, em va lor a bsolu t o, a s r en da s dim in u em m a is qu e
o in vest im en t o, é in du bit á vel qu e o con su m o dim in u i qu a n do a t a xa
de ju r os a u m en t a . Isso, por ém , n ã o qu er dizer qu e a m a r gem da pou -
pa n ça fiqu e por isso a cr escida . Ao con t r á r io, a pou pa n ça e o dispên dio
sofr er ã o, am bos, u m a dim in u içã o.
Desse m odo, a in da qu e u m a eleva çã o n a t a xa de ju r os possibilit e
à com u n ida de m a ior pou pa n ça com d eterm in ad a ren d a, pode-se t er a
cer t eza de qu e a eleva çã o da t a xa de ju r os (se n ã o ocor r er n en h u m a
m u da n ça fa vor á vel n a esca la da pr ocu r a de in vest im en t o) fa r á dim in u ir
o pr ópr io m on t a n t e a gr ega do da pou pa n ça . A m esm a lin h a de r a ciocín io
pode m esm o n os dizer em qu a n t o, coet. par., u m a u m en t o da t a xa de
ju r os fa r á dim in u ir a s r en da s. Isso por qu e a s r en da s — pa r a u m a
pr open sã o a con su m ir — t er ã o de ba ixa r (ou ser em r edist r ibu ída s) u m
m on t a n t e exa t a m en t e su ficien t e pa r a dim in u ir a s pou pa n ça s n u m a
som a igu a l à qu e a t a xa de ju r os pr ovoca r ia de dim in u içã o do in ves-
t im en t o, pa r a u m esqu em a de eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. Um exa m e
det ido dessa qu est ã o ser á objet o do ca pít u lo segu in t e.
A eleva çã o da t a xa de ju r os poder ia in du zir -n os a pou pa r m a is
se a s n ossa s r en da s per m a n ecessem in va r iá veis. Se essa eleva çã o da
t a xa de ju r os r et a r da o in vest im en t o, por ém , n ossa s r en da s n ã o fica r ã o
n em poder ã o con t in u a r in a lt er á veis. E la s t êm de ba ixa r , for çosa m en t e,
a t é qu e o declín io da ca pa cida de de pou pa r seja su ficien t e pa r a com -
pen sa r o est ím u lo cor r espon den t e oca sion a do por u m a t a xa de ju r os
m a is a lt a . Qu a n t o m a is vir t u osos, qu a n t o m a is r esolu t a m en t e fr u ga is
e m a is obst in a da m en t e or t odoxos for m os em n ossa s fin a n ça s pa r t icu -
la r es e n a cion a is, m a is t er ã o de ba ixa r a s n ossa s r en da s qu a n do o ju r o
su bir pr opor cion a lm en t e à eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. A obst in a çã o
só n os t r a r á u m ca st igo, e ja m a is u m a r ecom pen sa , pois o r esu lt a do
é in evit á vel.
Com t oda cer t eza , por t a n t o, os m on t a n t es r ea is da pou pa n ça e
do con su m o a gr ega dos n ã o depen dem da P r eca u çã o, da P r evidên cia ,
do Cá lcu lo, da Melh or ia , da In depen dên cia , da In icia t iva , do Or gu lh o
ou da Ava r eza . A vir t u de e o vício n ã o t êm pa pel a desem pen h a r . Tu do
depen de da m edida com qu e a t a xa de ju r os seja fa vor á vel a o in ves-
t im en t o, leva n do-se em con t a a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.84 Nã o,

84 E m a lgu m a s pa ssa gen s dest a seçã o a n t ecipa m os idéia s qu e só ser ã o desen volvida s n o Livr o
Qu a r t o.

130
KEYN ES

isso n ã o é u m a a fir m a çã o exa ger a da . Se a t a xa de ju r os fosse gover n a da


de t a l m odo qu e m a n t ivesse con t in u a m en t e o plen o em pr ego, a vir t u de
t om a r ia su a posiçã o dom in a n t e; a t a xa de a cu m u la çã o do ca pit a l de-
pen der ia da debilida de da pr open sã o a con su m ir . Assim , m a is u m a
vez, o t r ibu t o qu e os econ om ist a s clá ssicos pr est a m à vir t u de é u m a
con seqü ên cia da su a disfa r ça da h ipót ese de qu e a t a xa de ju r os é sem pr e
gover n a da desse m odo.

131
C AP ÍTU LO 10
A P ro p e n s ã o Ma rg in a l a Co n s u m ir e o Mu ltip lic a d o r

D em on st r a m os n o ca pít u lo 8 qu e o em pr ego só pode a u m en t a r


pari passu com o in vest im en t o, a n ã o ser qu e h a ja u m a m u da n ça n a
pr open sã o a con su m ir . P odem os leva r est a idéia u m pou co m a is a dia n t e,
pois, em da da s cir cu n st â n cia s, é possível est a belecer u m a r ela çã o de-
fin ida , qu e ch a m a r em os m u ltiplicad or, en t r e a r en da e o in vest im en t o,
e, su jeit a a a lgu m a s sim plifica ções, en t r e o em pr ego t ot a l e o em pr ego
dir et a m en t e liga do a o in vest im en t o (a qu e ch a m a r em os em prego pri-
m ário). E st e pa sso a dia n t e con st it u i pa r t e in t egr a n t e da n ossa t eor ia
do em pr ego, vist o qu e, da da a pr open sã o a con su m ir , est a belece u m a
r ela çã o pr ecisa en t r e o flu xo de in vest im en t o e os volu m es a gr ega dos
do em pr ego e da r en da . O con ceit o de m u lt iplica dor foi in t r odu zido,
pela pr im eir a vez, n a t eor ia econ ôm ica por R. F . Ka h n , em seu a r t igo
ver sa n do sobr e “Th e Rela t ion of H om e In vest m en t t o Un em ploym en t ”
(E con om ic J ou rn al, ju n h o de 1931). Seu r a ciocín io, n esse a r t igo, de-
pen dia da n oçã o fu n da m en t a l de qu e se a pr open sã o a con su m ir em
vá r ia s cir cu n st â n cia s h ipot ét ica s (bem com o em a lgu m a s ou t r a s con -
dições) for da da com o a ceit a , e se su por m os qu e a a u t or ida de m on et á r ia
ou ou t r a a u t or ida de pú blica t om em m edida s pa r a est im u la r ou r et r a ir
o in vest im en t o, a va r ia çã o do volu m e de em pr ego ser á fu n çã o da va -
r ia çã o líqu ida do m on t a n t e do in vest im en t o; pr et en dia , a in da , est a be-
lecer pr in cípios ger a is pa r a ca lcu la r a r ela çã o qu a n t it a t iva r ea l en t r e
o in cr em en t o do in vest im en t o líqu ido e o a u m en t o de em pr ego a gr ega do
qu e o a com pa n h a . Toda via , a n t es de ch ega r a o m u lt iplica dor , con vém
in t r odu zir o con ceit o de propen são m argin al a con su m ir.
I
As flu t u a ções da r en da r ea l con sider a da s n est e livr o sã o a s qu e
r esu lt a m da a plica çã o de difer en t es qu a n t ida des de em pr ego (ist o é,
de u n ida des de t r a ba lh o) a da do equ ipa m en t o de ca pit a l, de t a l m odo
qu e a r en da r ea l a u m en t a e dim in u i con for m e o n ú m er o de u n ida des

133
OS ECON OMIS TAS

de t r a ba lh o em pr ega da s. Se, com o ger a lm en t e a dm it im os, h ou ver u m


r et or n o decr escen t e m a r gin a l qu a n do o n ú m er o de u n ida des de t r a ba lh o
a plica da s a cer t o equ ipa m en t o de ca pit a l a u m en t a , a r en da , m edida
em u n ida des de sa lá r io, a u m en t a r á m a is qu e pr opor cion a lm en t e em
r ela çã o a o volu m e de em pr ego, qu e, por su a vez, su bir á m a is qu e pr o-
por cion a lm en t e a o a u m en t o da r en da r ea l m edida (se ist o for possível)
em u n ida des de pr odu çã o. Nã o obst a n t e, a r en da r ea l ca lcu la da em
t er m os de pr odu çã o e a r en da m edida em u n ida des de sa lá r io a u m en -
t a r ã o e dim in u ir ã o con ju n t a m en t e (n o cu r t o per íodo em qu e o equ ipa -
m en t o de ca pit a l per m a n ece vir t u a lm en t e in a lt er a do). P or t a n t o, em se
con sider a n do qu e a r en d a r ea l expr essa em u n ida d es de pr odu çã o
n ã o se p ossa m edir n u m er ica m en t e com exa t id ã o, con vém m u it a s
vezes con sider a r a r en da em u n ida des de sa lá r io (Y ω) u m ín d ice
a d equ a do da s m odifica ções n a r en da r ea l. E m cer t os ca sos, n ã o po-
dem os despr eza r o fa t o de qu e, em ger a l, Y ω a u m en t a e dim in u i
pr opor cion a lm en t e m a is qu e a r en da r ea l; por ém , em ou t r os, a cir -
cu n st â n cia de qu e os dois sem pr e sobem e descem ju n t os t or n a -os
vir t u a lm en t e in t er ca m biá veis.
A n ossa lei psicológica n or m a l de qu e, n o ca so de a u m en t os e
dim in u ições da r en da r ea l da com u n ida de, o con su m o a u m en t a e di-
m in u i, m a s n ã o t ã o depr essa , pode, por t a n t o, t r a du zir -se — sem pr e-
cisã o a bsolu t a decer t o, m a s a pen a s su jeit a a r eser va s eviden t es qu e
se podem dem on st r a r fa cilm en t e e de m a n eir a for m a l — pela s pr opo-
sições de qu e ΔC ω e ΔY ω t êm o m esm o sin a l, m a s ΔY ω > ΔC ω, on de
C ω r epr esen t a o con su m o m edido em u n ida des de sa lá r io. Ist o sign ifica
sim plesm en t e r epet ir a pr oposiçã o já expr essa n a pá gin a 32. Defin a m os,
d Cω
por t a n t o, com o a propen são m argin al a con su m ir.
dY ω
Esta quantidade é de considerável im portância por nos dizer com o
se dividirá o próximo incremento da produção entre o consumo e o in-
vestim ento. Isso porque ΔY ω = ΔC ω + ΔI ω , onde ΔC ω e ΔI ω são incre-
mentos do consum o e do investimento, de m aneira que podemos escrever
1
ΔY ω = k ΔI ω, onde 1 – é igual à propensão marginal a consumir.
k
Ch a m em os a k o m u ltiplicad or d e in vestim en to. E le n os in dica
qu e, qu a n do se pr odu z u m a cr éscim o n o in vest im en t o a gr ega do, a r en da
sobe n u m m on t a n t e igu a l a k vezes o a cr éscim o do in vest im en t o.

II

O m u lt iplica dor de Ka h n é pou co difer en t e dest e, con st it u in do o


qu e poder ía m os ch a m a r de m u ltiplicad or d e em prego, a ser design a do
por k &, vist o qu e m ede a r ela çã o do a u m en t o de em pr ego t ot a l der iva do
de det er m in a do in cr em en t o do em pr ego pr im á r io n a s in dú st r ia s de

134
KEYN ES

in vest im en t o. Qu er dizer , se o in cr em en t o do in vest im en t o ΔI ω leva a


u m a u m en t o do em pr ego pr im á r io ΔN 2 n a s in dú st r ia s de in vest im en t o,
o in cr em en t o do em pr ego t ot a l ΔN = k &ΔN 2 .
Nã o h á r a zã o, em ger a l, pa r a su por qu e k = k&, pois n a da leva
n ecessa r ia m en t e a a dm it ir qu e for m a t os da s fu n ções da ofer t a a gr ega da
pecu lia r es a os difer en t es t ipos de in dú st r ia s seja m t a is qu e a pr opor çã o
do a u m en t o n u m dos gr u pos de in dú st r ia s, r ela t iva m en t e a o in cr em en t o
da dem a n da qu e o pr ovocou , seja a m esm a n os dem a is gr u pos de in -
dú st r ia s.85 Na ver da de, é possível fa cilm en t e im a gin a r ca sos com o, por
exem plo, qu a n do a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir é m u it o difer en t e
da pr open sã o m édia , t a l qu e exist ir ia u m a pr esu n çã o em fa vor de cer t a
ΔY ω ΔI ω
desigu a lda de en t r e e , u m a vez qu e h a ver ia va r ia ções pr o-
ΔN ΔN 2
por cion a is m u it o diver gen t es n a pr ocu r a de ben s de con su m o e de ben s
de in vest im en t o r espect iva m en t e. S e qu iser m os leva r em con t a essa s
possíveis difer en ça s n a for m a d a s pa r t es r eleva n t es da s fu n ções da
ofer t a a gr ega da p a r a os dois gr u p os de in d ú st r ia s, r espect iva m en t e,
n ã o h a ver á d ificu lda de em r econ st r u ir o a r gu m en t o segu in t e em
su a for m a m a is gen er a liza d a . E n t r et a n t o, p a r a a cla r a r a s idéia s
qu e ele con t ém , ser á con ven ien t e con sid er a r o ca so sim plifica do em
qu e k = k &.
Com o con seqü ên cia disso, qu a n do a a t it u de psicológica da com u -

85 P ode-se dizer de m a n eir a m a is pr ecisa qu e, se ee e e&e sã o a s ela st icida des de em pr ego n a


in dú st r ia em con ju n t o e n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l, r espect iva m en t e, e se N e N 2
sã o o n ú m er o de h om en s em pr ega dos em t oda a in dú st r ia e n a s de ben s de ca pit a l, t er em os

135
OS ECON OMIS TAS

n ida de a r espeit o do con su m o é t a l qu e in du z, por exem plo, a con su m ir


n ove décim os de u m in cr em en t o de r en da ,86 o m u lt iplica dor k é igu a l
a 10, e o em pr ego t ot a l ca u sa do (por exem plo) por u m in cr em en t o de
obr a s pú blica s ser á dez vezes su per ior a o em pr ego pr im á r io pr opor -
cion a do pela s pr ópr ia s obr a s pú blica s, su pon do qu e n ã o h a ja r edu çã o
de in vest im en t os em ou t r os set or es. Apen a s n o ca so de a com u n ida de
m a n t er seu con su m o in a lt er a do a despeit o do a u m en t o do em pr ego e,
por t a n t o, da r en da r ea l fica r á o a u m en t o do em pr ego r est r in gido a o
a u m en t o do em pr ego pr im á r io pr opor cion a do pela s obr a s pú blica s. Se,
por ou t r o la do, ela decide con su m ir o t ot a l de qu a lqu er in cr em en t o da
r en da , n ã o h a ver á u m equ ilíbr io est á vel e os pr eços su bir ã o sem lim it e.
De a cor do com a s h ipót eses psicológica s n or m a is, u m a u m en t o n o em -
pr ego só ser á a com pa n h a do por declín io do con su m o se a o m esm o t em po
se pr odu zir u m a a lt er a çã o n a pr open sã o a con su m ir — com o r esu lt a do,
por exem plo, da pr opa ga n da em t em po de gu er r a t en den t e a dim in u ir
o con su m o in dividu a l; som en t e n est e ca so o a u m en t o de em pr ego n a s
in dú st r ia s de in vest im en t o ser á a com pa n h a do de r eper cu ssã o desfa vo-
r á vel sobr e o em pr ego n a s in dú st r ia s qu e t r a ba lh a m pa r a o con su m o.
Isso a pen a s r esu m e n u m a fór m u la o qu e, em t er m os ger a is, já
devia ser eviden t e pa r a o leit or . Um in cr em en t o do in vest im en t o m edido
em u n ida des de sa lá r io só pode ocor r er se o pú blico est iver dispost o
a a u m en t a r a su a pou pa n ça , com pu t a da n a s m esm a s u n ida des. Co-
m u m en t e fa la n do, o pú blico n ã o fa r á isso a n ã o ser qu e su a r en da
a gr ega da , m edida em u n ida des de sa lá r io, est iver a u m en t a n do. Desse
m odo, seu esfor ço pa r a con su m ir u m a pa r t e da r en da su plem en t a r
est im u la r á a pr odu çã o a t é qu e o n ovo n ível (e dist r ibu içã o) da s r en da s
pr opor cion e u m a m a r gem de pou pa n ça su ficien t e pa r a cor r espon der
a o m a ior in vest im en t o. O m u lt iplica dor diz em qu e pr opor çã o t er á de
a u m en t a r o em pr ego pa r a pr ovoca r u m a cr éscim o n a r en da r ea l su fi-
cien t e pa r a in du zir o pú blico a r ea liza r u m a pou pa n ça a dicion a l, e é
fu n çã o de su a s pr open sões psicológica s.87 Se a pou pa n ça é a pílu la e
o con su m o é a geléia , a geléia ext r a t em de ser pr opor cion a l a o t a m a n h o
da pílu la a dicion a l. Se a s t en dên cia s psicológica s do pú blico sã o r ea l-
m en t e a s qu e su pom os, est a belecem os a qu i a lei de qu e o a u m en t o de
em pr ego con sa gr a do a o in vest im en t o est im u la n ecessa r ia m en t e a s in -
dú st r ia s qu e pr odu zem pa r a o con su m o, det er m in a n do, a ssim , u m a u -
m en t o t ot a l do em pr ego qu e é u m m ú lt iplo do em pr ego pr im á r io exigido
pelo pr ópr io in vest im en t o.
Dedu z-se do qu e foi dit o qu e, se a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir
n ã o est á lon ge da u n ida de, a s pequ en a s flu t u a ções n o in vest im en t o
pr ovoca r ã o gr a n des va r ia ções n o em pr ego; por ém , a o m esm o t em po,

86 E m t odo o r a ciocín io a s qu a n t ida des ser ã o m edida s em u n ida des de sa lá r ios.


87 E m bor a , n o ca so m a is gen er a liza do, seja t a m bém fu n çã o da s con dições física s da pr odu çã o
n a s in dú st r ia s de in vest im en t o e n a s de con su m o, r espect iva m en t e.

136
KEYN ES

u m a u m en t o r ela t iva m en t e pequ en o do in vest im en t o ba st a r á pa r a ca u -


sa r o plen o em pr ego. Se, por ou t r o la do, a pr open sã o m a r gin a l a con -
su m ir est á pr óxim a de zer o, a s pequ en a s flu t u a ções do in vest im en t o
oca sion a r ã o pequ en a s flu t u a ções do em pr ego; m a s, a o m esm o t em po,
pode ser n ecessá r io u m in cr em en t o con sider á vel do in vest im en t o pa r a
pr odu zir o plen o em pr ego. No pr im eir o ca so, o desem pr ego in volu n t á r io
é u m m a l de cu r a fá cil, em bor a su scet ível de se a gr a va r r a pida m en t e
se o deixa r m os desen volver . No segu n do ca so, o em pr ego pode ser m en os
in st á vel, m a s t en de a fixa r -se n u m n ível ba ixo e a m ost r a r -se r efr a t á r io
a qu a lqu er r em édio, sa lvo os m a is dr á st icos. Na r ea lida de, a pr open sã o
m a r gin a l a con su m ir pa r ece sit u a r -se en t r e esses dois ext r em os, em bor a
bem m a is per t o da u n ida de qu e de zer o, com o r esu lt a do de qu e n os
en con t r a m os, em cer t o sen t ido, com a pior de a m ba s a s cir cu n st â n cia s,
por qu e a s flu t u a ções n o em pr ego sã o con sider á veis e, a o m esm o t em po,
pa r a det er m in a r o plen o em pr ego, ser ia n ecessá r io u m in cr em en t o de
in vest im en t o dem a sia do gr a n de pa r a qu e se possa m a n ejá -lo com fa -
cilida de. In felizm en t e, a s flu t u a ções t êm sido su ficien t es pa r a im pedir
qu e se com pr een da a n a t u r eza cr ôn ica do m a l e, por ou t r o la do, essa
gr a vida de é t a m a n h a qu e se t or n a im possível r em ediá -la sem lh e com -
pr een der a n a t u r eza .
Qu a n do o plen o em pr ego é a lca n ça do, qu a lqu er t en t a t iva de a u -
m en t a r a in da m a is o in vest im en t o fa z com qu e os pr eços t en da m a
su bir sem lim it e, seja qu a l for a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir , ist o
é, ch ega -se a u m est a do de ver da deir a in fla çã o.88 At é est e pon t o, n o
en t a n t o, a a lt a dos pr eços ser á a com pa n h a da de u m a u m en t o da r en da
r ea l a gr ega da .

III

At é a gor a t em o-n os ocu pa do dos a cr éscim os líqu id os do in vest i-


m en t o. P or t a n t o, se qu iser m os a plica r sem r est r ições o qu e ficou dit o
a os efeit os (por exem plo) de u m in cr em en t o de obr a s pú blica s, t er em os
de su por qu e esse in cr em en t o n ã o é com pen sa do por u m decr éscim o
do in vest im en t o em ou t r os set or es — e n ã o h á , n a t u r a lm en t e, n en h u m a
m u da n ça con com it a n t e n a pr open sã o da com u n ida de a con su m ir . No
a r t igo cit a do, Ka h n pr ocu r ou sobr et u do exa m in a r a s com pen sa ções qu e,
por ca u sa da su a im por t â n cia , m er ecem ser con sider a da s e a pr esen t ou
su gest ões de est im a t iva s qu a n t it a t iva s. No ca so con cr et o em qu e h a ja
u m a u m en t o específico do in vest im en t o, exist em com efeit o diver sos
fa t or es qu e con cor r em com esse a u m en t o pa r a o r esu lt a do fin a l. Se,
por exem plo, u m gover n o em pr ega 100 m il h om en s a m a is em obr a s
pú blica s, e o m u lt iplica dor (t a l com o foi defin ido a n t es) for 4, n ã o h á
m ot ivo pa r a su por qu e o em pr ego a gr ega do a u m en t a r á de 400 m il

88 Cf. ca p. 21, p. 283.)

137
OS ECON OMIS TAS

u n ida des, pois sem elh a n t e polít ica pode t er r ea ções desfa vor á veis sobr e
o in vest im en t o em ou t r a s dir eções.
Os fa t or es qu e se segu em (segu n do Ka h n ) sã o os qu e, pr ova vel-
m en t e, n u m a com u n ida de m oder n a , devem ser leva dos em con sider a çã o
em vir t u de da su a im por t â n cia (em bor a os dois pr im eir os n ã o se t or n em
com plet a m en t e in t eligíveis a n t es qu e se ch egu e a o Livr o Qu a r t o):

(i) O m ét odo de fin a n cia r a polít ica e o a u m en t o de ca pit a l de


gir o exigido pelo em pr ego a dicion a l e a a lt a de pr eços qu e o a com pa n h a
podem t er por efeit o eleva r a t a xa de ju r os e r et a r da r a ssim o in ves-
t im en t o em ou t r os set or es, ca so a a u t or ida de m on et á r ia n ã o t om e pr o-
vidên cia s em con t r á r io, en qu a n t o, a o m esm o t em po, a eleva çã o dos
cu st os dos ben s de ca pit a l r edu z a su a eficiên cia m a r gin a l pa r a o in -
divídu o qu e in vest e, sen do n ecessá r ia u m a baixa efet iva n a t a xa de
ju r os pa r a com pen sa r esse efeit o.

(ii) Da da a psicologia con fu sa qu e fr eqü en t em en t e pr eva lece, o


pr ogr a m a do Gover n o pode, a t r a vés de seu s efeit os sobr e a “con fia n ça ”,
a u m en t a r a pr efer ên cia pela liqu idez ou dim in u ir a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, o qu e t a m bém con t r ibu i pa r a r et a r da r ou t r os in vest im en t os
se n ã o h ou ver m edida s qu e o con t r a ba la n cem .

(iii) Nu m sist em a a ber t o, qu e m a n t ém r ela ções com er cia is com


o ext er ior , pa r t e do m u lt iplica dor do in vest im en t o su plem en t a r ben e-
ficia r á o em pr ego em pa íses est r a n geir os, vist o qu e cer t a por çã o do
con su m o a dicion a l r edu zir á o sa ldo fa vor á vel do ba la n ço ext er n o do
n osso pa ís, de m odo qu e, se con sider a r m os a pen a s o efeit o sobr e o
em pr ego dom ést ico, com o dist in t o do em pr ego m u n dia l, t em os de r e-
du zir a cifr a do m u lt iplica dor . P or ou t r o la do, a s per da s dessa n a t u r eza
podem ser m a is ou m en os com pen sa da s pela s r eper cu ssões fa vor á veis
devida s à a çã o do m u lt iplica dor n os pa íses est r a n geir os qu e a u m en t a m
a su a a t ivida de econ ôm ica .
Além disso, se con sider a r m os m odifica ções su bst a n cia is, t em os
de leva r em con t a u m a m u da n ça pr ogr essiva n a pr open sã o m a r gin a l
a con su m ir e, por t a n t o, n o m u lt iplica dor , à m edida qu e o a cr éscim o
n a m a r gem se desloca gr a du a lm en t e. A pr open sã o m a r gin a l a con su m ir
n ã o é con st a n t e pa r a t odos os n íveis de em pr ego, e é pr ová vel qu e,
em ger a l, t en da a dim in u ir qu a n do o em pr ego a u m en t a , ou seja , qu a n do
a r en da r ea l cr esce, a com u n ida de só deseja r á con su m ir u m a pa r t e
gr a du a lm en t e decr escen t e da m esm a .
Além da a çã o da r egr a ger a l qu e a ca ba m os de m en cion a r , ou t r os
fa t or es poder ã o a in da fa zer va r ia r a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir
e, por t a n t o, o m u lt iplica dor ; e pa r ece qu e est es ou t r os fa t or es, com u -
m en t e, con t r ibu em m a is pa r a a cen t u a r do qu e pa r a a t en u a r o efeit o
da r egr a ger a l. P ois, em pr im eir o lu ga r , o a u m en t o do em pr ego t en de

138
KEYN ES

por efeit o dos r en dim en t os decr escen t es em per íodos cu r t os a a u m en t a r


a pr opor çã o da r en da a gr ega da dest in a da a os em pr esá r ios, cu ja pr o-
pen sã o m a r gin a l a con su m ir é, pr ova velm en t e, in fer ior à m édia pa r a
o con ju n t o da com u n ida de. E m segu n do lu ga r , o desem pr ego se m a n i-
fest a , ger a lm en t e, a ssocia do a u m a pou pa n ça n ega t iva em cer t os set or es
pr iva dos ou pú blicos, por qu e os desem pr ega dos podem est a r viven do
t a n t o da s su a s econ om ia s pessoa is com o da s de seu s a m igos, com o
a in da do a u xílio pú blico pa r cia lm en t e fin a n cia do por em pr ést im os; com
o r esu lt a do de qu e o r eem pr ego dim in u ir á a os pou cos est a s for m a s
específica s de pou pa n ça n ega t iva , r edu zin do, por t a n t o, a pr open sã o
m a r gin a l a con su m ir m a is r a pida m en t e do qu e o fa r ia u m a cr éscim o
igu a l da r en da r ea l da com u n ida de obt ido em cir cu n st â n cia s difer en t es.
De qu a lqu er m a n eir a , o m u lt iplica dor ser á pr ova velm en t e m a ior
pa r a u m pequ en o in cr em en t o líqu ido do in vest im en t o do qu e pa r a u m
gr a n de, de m odo qu e, qu a n do se t êm em vist a m u da n ça s su bst a n cia is,
devem os gu ia r -n os pelo va lor m édio do m u lt iplica dor , t om a n do com o
ba se o va lor m édio da pr open sã o m a r gin a l a con su m ir n a a m plit u de
de va r ia çã o em ca u sa .
Ka h n exa m in ou o r esu lt a do qu a n t it a t ivo pr ová vel dos fa t or es des-
t a n a t u r eza em cer t os ca sos h ipot ét icos especia is. P or ém n ã o é, evi-
den t em en t e, possível gen er a liza r m u it o. P ode-se dizer a pen a s qu e, por
exem plo, n u m a com u n ida de m oder n a t ípica , com pon do u m sist em a fe-
ch a do e n o qu a l o con su m o dos desem pr ega dos é pa go por t r a n sfer ên cia s
do con su m o de ou t r os con su m idor es, a t en dên cia ser á , pr ova velm en t e,
de con su m ir n ã o m u it o m en os de 80% de qu a lqu er in cr em en t o da r en da
r ea l, de m odo qu e o m u lt iplica dor , leva n do em con t a a s com pen sa ções,
t a lvez n ã o se m ost r e m u it o in fer ior a 5. Toda via , n u m pa ís em qu e o
com ér cio ext er ior r epr esen t a , diga m os, 20% do con su m o e on de os de-
sem pr ega dos r ecebem , por m eio de em pr ést im os ou seu equ iva len t e,
a t é 50% de seu con su m o n or m a l qu a n do em pr ega dos, o m u lt iplica dor
pode descer a t é o pon t o de cor r espon der a 2 ou 3 vezes o volu m e de
em pr ego pr opor cion a do por u m in vest im en t o n ovo. P or isso, n u m pa ís
on de o com ér cio ext er n o desem pen h a u m pa pel im por t a n t e e n o qu a l
o a u xílio a os desem pr ega dos é fin a n cia do em la r ga esca la por em pr és-
t im os (com o su cedeu , por exem plo, n a Gr ã -Br et a n h a em 1931), a flu -
t u a çã o do em pr ego qu e a com pa n h a cer t a va r ia çã o do in vest im en t o é
bem m en os violen t a do qu e n u m pa ís on de esses fa t or es sã o m en os
im por t a n t es (com o n os E st a dos Un idos em 1932).89
E n t r et a n t o, é pelo pr in cípio ger a l do m u lt iplica dor qu e se deve
explica r com o a s flu t u a ções n o m on t a n t e do in vest im en t o, com pa r a t i-
va m en t e pequ en a s em pr opor çã o à r en da n a cion a l, podem ger a r a lt e-

89 Cf., en t r et a n t o, p. 141, u m a est im a t iva n or t e-a m er ica n a .

139
OS ECON OMIS TAS

r a ções n o em pr ego e n a r en da a gr ega da de a m plit u de m u it o m a ior


qu e ela s pr ópr ia s.
IV
At é a gor a , o r a ciocín io vem t om a n do com o ba se u m a a lt er a çã o
do in vest im en t o a gr ega do pr evist a com ba st a n t e a n t ecipa çã o pa r a qu e
a s in dú st r ia s de ben s de con su m o pr ogr ida m , pari passu , ju n t a m en t e
com a s in dú st r ia s de in vest im en t o, sem m a ior t r a n st or n o pa r a o pr eço
dos ben s de con su m o qu e o der iva do de u m a u m en t o n a qu a n t ida de
pr odu zida , em con dições de r en dim en t o decr escen t e.
Toda via , pr ecisa m os, em ger a l, leva r em con t a o ca so em qu e a
in icia t iva pr oven h a de u m a u m en t o n ã o in t eir a m en t e pr evist o n a pr o-
du çã o dos ben s de ca pit a l. É eviden t e qu e u m a in icia t iva dest a s só
pr odu z t odos os seu s efeit os sobr e o em pr ego depois de t r a n scor r ido
cer t o la pso de t em po. Ten h o obser va do, en t r et a n t o, n a discu ssã o qu e
est e fa t o eviden t e dá , m u it a s vezes, or igem a a lgu m a con fu sã o en t r e
a t eor ia lógica do m u lt iplica dor , cu ja a plica çã o se ver ifica con t in u a -
m en t e, sem a t r a so, em t odos os in st a n t es, e a s con seqü ên cia s de u m a
expa n sã o n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l qu e só a t u a gr a du a lm en t e,
com a t r a so e a pós cer t o in t er va lo.
A r ela çã o en t r e est es dois fa t or es pode ser escla r ecida obser va n do,
em pr im eir o lu ga r , qu e u m a expa n sã o im pr evist a da s in dú st r ia s de
ben s de ca pit a l n ã o se pr odu z in st a n t a n ea m en t e por u m a cr éscim o de
igu a l im por t â n cia n o m on t a n t e a gr ega do do in vest im en t o, a pen a s oca -
sion a u m a u m en t o gr a du a l desse m on t a n t e; e, em segu n do lu ga r , qu e
pode cr ia r u m a diver gên cia t em por á r ia en t r e a pr open sã o m a r gin a l a
con su m ir e o seu va lor n or m a l, ver ifica n do-se, en t r et a n t o, u m gr a du a l
r et or n o à su a posiçã o or igin a l.
Assim sen do, u m a expa n sã o n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l
det er m in a u m a sér ie de a u m en t os n o in vest im en t o a gr ega do, qu e se
a pr esen t a m em per íodos su cessivos n u m cer t o in t er va lo de t em po, e
u m a sér ie de va lor es da pr open sã o m a r gin a l a con su m ir du r a n t e esses
per íodos su cessivos qu e difer e t a n t o do qu e t er ia m sido esses va lor es
se a dit a expa n sã o h ou vesse sido pr evist a , com o do qu e ser ã o qu a n do
a com u n ida de ch ega r a est a biliza r -se n u m n ovo e fir m e n ível de in -
vest im en t o a gr ega do. P or ém , em ca da per íodo, a t eor ia do m u lt iplica dor
con t in u a sen do vá lida n o sen t ido de qu e o in cr em en t o da dem a n da
a gr ega da é igu a l a o pr odu t o do a cr éscim o do in vest im en t o a gr ega do e
do m u lt iplica dor det er m in a do pela pr open sã o m a r gin a l a con su m ir .
A explica çã o dessa s du a s or den s de fa t os su r ge com m a ior cla r eza
qu a n do se con sider a o ca so ext r em o em qu e o a u m en t o de em pr ego
n a s in dú st r ia s dedica da s à pr odu çã o de ben s de ca pit a l é de t a l m a n eir a
im pr evist o qu e a pr in cípio n ã o se ver ifica a u m en t o a lgu m n a pr odu çã o
de ben s de con su m o. Nest e ca so, os esfor ços dos qu e for a m r ecen t em en t e
em pr ega dos n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l pa r a con su m ir cer t a

140
KEYN ES

pr opor çã o da s su a s r en da s fa r ã o su bir os pr eços dos ben s de con su m o


a t é qu e se a lca n ce u m equ ilíbr io t em por á r io en t r e a ofer t a e a pr ocu r a ,
ca u sa do, em pa r t e, pelo a dia m en t o do con su m o pr ovoca do pela eleva çã o
dos pr eços, em pa r t e pela r edist r ibu içã o de r en da fa vor á vel à s cla sses
qu e pou pa m devido a o a u m en t o de seu s lu cr os ger a do pelos pr eços
a lt os e, em pa r t e, pela depleçã o dos est oqu es ca u sa da pela eleva çã o
dos pr eços. Na m edida em qu e o equ ilíbr io se r est a belece pelo a dia m en t o
do con su m o, a pr esen t a -se u m a r edu çã o t em por á r ia da pr open sã o m a r -
gin a l a con su m ir , ist o é, do pr ópr io m u lt iplica dor e, n a m edida em qu e
h a ja u m a depleçã o dos est oqu es, o a cr éscim o do in vest im en t o a gr ega do
per m a n ece du r a n t e cer t o t em po in fer ior a o a cr éscim o do in vest im en t o
r ea liza do n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l — ist o é, o va lor a ser
m u lt iplica do n ã o a u m en t a n a pr opor çã o do t ot a l do in vest im en t o feit o
n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l. E n t r et a n t o, a s in dú st r ia s de ben s
de con su m o vã o-se, com o pa ssa r do t em po, a da pt a n do por si m esm a s
à n ova dem a n da , de m odo qu e, qu a n do se r ea liza o con su m o a n t es
a dia do, a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir sobe t em por a r ia m en t e a lém
do seu n ível n or m a l, pa r a com pen sa r a ba ixa a n t er ior e, even t u a lm en t e,
r et or n a a seu n ível n or m a l, en qu a n t o a r econ st it u içã o dos est oqu es
fa z com qu e o a cr éscim o do in vest im en t o a gr ega do seja t em por a r ia -
m en t e su per ior a o do in vest im en t o n a s in dú st r ia s de ben s de ca pit a l
(t en do t em por a r ia m en t e o m esm o efeit o o in cr em en t o do ca pit a l cir -
cu la n t e cor r espon den t e a o a u m en t o da pr odu çã o).
O fa t o de qu e u m a m u da n ça im pr evist a só exer ce o seu plen o
efeit o sobr e o em pr ego a pós cer t o la pso de t em po t em im por t â n cia em
det er m in a dos ca sos; in t er vém , especia lm en t e, n a a n á lise do ciclo eco-
n ôm ico (da m a n eir a qu e in diqu ei em m in h a obr a T reatise on M on ey).
Toda via , n ã o a fet a de m odo a lgu m o a lca n ce da t eor ia do m u lt iplica dor ,
t a l com o foi expost a n est e ca pít u lo; n em lh e r et ir a a su a u t ilida de
com o in dica dor do a u m en t o t ot a l do em pr ego qu e se pode esper a r de
u m a expa n sã o da s in dú st r ia s pr odu t or a s de ben s de ca pit a l. Ma is do
qu e isso, sa lvo con dições em qu e a s in dú st r ia s de con su m o já est eja m
per t o da su a ca pa cida de t ot a l, de t a l m odo qu e u m a u m en t o da pr odu çã o
exige ou t r o a u m en t o cor r espon den t e do equ ipa m en t o e n ã o sim ples-
m en t e u m em pr ego m a is in t en sivo, n ã o h á r a zã o pa r a su por qu e deva
decor r er m a is de u m cu r t o in t er va lo a n t es qu e o em pr ego n a s in dú st r ia s
de ben s de con su m o pr ogr ida pari passu com o da s in dú st r ia s de ben s
de ca pit a l, com o m u lt iplica dor a t u a n do per t o da su a cifr a n or m a l.
V

Vim os qu e, qu a n t o m a ior for a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir ,


m a ior ser á o m u lt iplica dor e, por con seqü ên cia , m a ior dist ú r bio ca u sa r á
sobr e o em pr ego u m a va r ia çã o do in vest im en t o. Isso pa r ece con du zir -
n os à con clu sã o pa r a doxa l de qu e u m a com u n ida de pobr e, pou pa n do
a pen a s u m a pa r t e m u it o pequ en a de su a s r en da s, est á m a is expost a

141
OS ECON OMIS TAS

a flu t u a ções violen t a s do qu e u m a com u n ida de r ica , n a qu a l a pou pa n ça


r epr esen t e u m a pr opor çã o m a ior da r en da e, por t a n t o, o m u lt iplica dor
seja m a ior .
Esta conclusão, no entanto, não levaria em conta a diferença exis-
tente entre os efeitos da propensão m arginal a consumir e os da propensão
média a consum ir, pois, enquanto uma alta propensão m arginal a consumir
implica um efeito proporcionalm ente maior, como resultado de certa per-
centagem de variação no investim ento, o efeito absoluto será, todavia,
menor se a propensão m édia a consum ir for, também, alta. Isso pode ser
ilustrado através do exem plo num érico apresentado a seguir.
Su pon h a m os qu e a pr open sã o a con su m ir de u m a com u n ida de
seja t a l qu e, desde qu e su a r en da r ea l n ã o exceda a pr odu çã o obt ida
pelo t r a ba lh o de 5 m ilh ões de h om en s com o equ ipa m en t o de ca pit a l
qu e possu i, ela con su m a in t egr a lm en t e a dit a r en da ; qu e a pr odu çã o
r esu lt a n t e do em pr ego dos pr im eir os 100 m il h om en s a dicion a is seja
con su m ida à r a zã o de 99%, a dos 100 m il segu in t es à r a zã o de 98%,
a dos 100 m il qu e vêm em t er ceir o lu ga r à r a zã o de 97% e a ssim por
dia n t e; e qu e a cifr a de 10 m ilh ões de h om en s r epr esen t e o plen o
em pr ego. Dedu z-se da qu i qu e, qu a n do 5 000 000 + n × 100 000 est iver em
100 n (n + 1)
em pr ega dos, o m u lt iplica dor n a m a r gem ser á e qu e por
n 2(50 + n)
cen t o da r en da n a cion a l ser ã o in vest idos.
Dest e m odo, qu a n do 5,2 m ilh ões est ã o em pr ega dos, o m u lt ipli-
ca dor é m u it o a lt o, ist o é, igu a l a 50, m a s o in vest im en t o r epr esen t a
a pen a s u m a pa r t e in sign ifica n t e da r en da cor r en t e, ou seja , 0,06%,
com o r esu lt a do de qu e, se o in vest im en t o dim in u i em gr a n de esca la ,
diga m os, em dois t er ços, o em pr ego só ba ixa r á a t é 5,1 m ilh ões, o qu e
r epr esen t a a pr oxim a da m en t e 2%. P or ou t r o la do, qu a n do est iver em
em pr ega dos 9 m ilh ões de h om en s, o m u lt iplica dor ser á r ela t iva m en t e
ba ixo, igu a l a 2,5, por ém o in vest im en t o r epr esen t a r á , a gor a , u m a pa r t e
su bst a n cia l da r en da cor r en t e, ou seja , 9%, com o r esu lt a do de qu e,
se o in vest im en t o dim in u i de dois t er ços, o em pr ego ba ixa r á a 6,9
m ilh ões, ist o é, 19%. No lim it e em qu e o in vest im en t o ca ia a zer o o
em pr ego ba ixa r á em cer ca de 4% n o pr im eir o ca so, en qu a n t o, n o se-
gu n do ca so, ba ixa r á a 44%.90
No exem plo a n t er ior , a m a is pobr e da s du a s com u n ida des com -
pa r a da s é m a is pobr e por m ot ivo de su bem pr ego. P or ém o m esm o r a -
ciocín io se a plica , m edia n t e u m a a da pt a çã o fá cil, ca so a pobr eza se
deva à in fer ior ida de da h a bilit a çã o pr ofission a l, da t écn ica ou do equ i-
pa m en t o. Con seqü en t em en t e, em bor a o m u lt iplica dor seja m a ior n u m a

90 O volu m e de in vest im en t o a cim a m ediu -se pelo n ú m er o de h om en s em pr ega dos em r ea lizá -lo.
Desse m odo, se os r en dim en t os por u n ida de de em pr ego decr escem à m edida qu e o em pr ego
a u m en t a , o qu e é o dobr o do m on t a n t e da in ver sã o n a esca la a n t er ior ser á m en os do dobr o
n a esca la física (su pon do qu e ela exist a ).

142
KEYN ES

com u n ida de pobr e, o efeit o da s va r ia ções do in vest im en t o sobr e o em -


pr ego ser á m u it o m a ior n u m a com u n ida de r ica , su pon do qu e n est a o
in vest im en t o cor r en t e r epr esen t a u m a pr opor çã o m u it o m a is eleva da
da pr odu çã o cor r en t e.91
É eviden t e, pela s obser va ções a n t er ior es, qu e o em pr ego de cer t o
n ú m er o de h om en s em obr a s pú blica s pr odu zir á (n a s h ipót eses con si-
der a da s) sobr e o em pr ego a gr ega do u m efeit o m u it o m a ior , qu a n do o
desem pr ego for sever o, do qu e m a is t a r de, qu a n do o plen o em pr ego
est iver pr est es a ser a lca n ça do. No exem plo a pr esen t a do, se n o m om en t o
em qu e o em pr ego desceu a 5,2 m ilh ões se em pr ega r em n a s obr a s
pú blica s m a is 100 m il h om en s, o em pr ego t ot a l su bir á a 6,4 m ilh ões.
Ma s, se o em pr ego já é de 9 m ilh ões, qu a n do se u sa r em m a is 100 m il
h om en s n os m esm os t r a ba lh os, o em pr ego t ot a l a pen a s su bir á a 9,2
m ilh ões. Assim , em t em pos de desem pr ego r igor oso, a s obr a s pú blica s,
a in da qu e de du vidosa u t ilida de, podem ser a lt a m en t e com pen sa dor a s,
m esm o qu e a pen a s pelo m en or cu st o dos ga st os de a ssist ên cia , desde
qu e se possa a dm it ir qu e a pa r t e pou pa da da r en da seja m en or qu a n t o
m a is in t en so for o desem pr ego; por ém a va lida de dest a pr oposiçã o t or -
n a -se ca da vez m a is con t est á vel à m edida qu e n os a pr oxim a m os do
plen o em pr ego. Além disso, se for cor r et a a n ossa h ipót ese de qu e a
pr open sã o m a r gin a l a con su m ir dim in u i con st a n t em en t e à m edida qu e
n os a pr oxim a m os do plen o em pr ego, dedu z-se qu e se t or n a ca da vez
m a is difícil a lca n ça r n ovos a u m en t os do em pr ego a t r a vés de in vest i-
m en t os cr escen t es.
Nã o ser ia difícil com por u m gr á fico da pr open sã o m a r gin a l a
con su m ir em ca da et a pa do ciclo econ ôm ico com a s est a t íst ica s (su pon do
qu e est ivessem dispon íveis) da r en da a gr ega da e do in vest im en t o a gr e-
ga do em da t a s su cessiva s. No m om en t o, con t u do, a s n ossa s est a t íst ica s
n ã o sã o ba st a n t e exa t a s (ou com pila da s com esse objet ivo específico)
pa r a n os per m it ir em m a is do qu e est im a t iva s a pr oxim a da s. As m elh o-
r es pa r a est a fin a lida de, da s qu a is t en h o con h ecim en t o, sã o a s cifr a s
a pr esen t a da s por Ku zn et s, r ela t iva s a os E st a dos Un idos (já m en cio-
n a da s n a pá gin a 123), em bor a ba st a n t e in com plet a s. Tom a da s ju n t a -
m en t e com os cá lcu los da r en da n a cion a l, in dica m , sem qu e se leve

91 De m odo m a is ger a l, a r ela çã o en t r e a va r ia çã o pr opor cion a l n a dem a n da t ot a l e a ocor r ida


n o in vest im en t o é

143
OS ECON OMIS TAS

em con t a os seu s m ér it os, t a n t o u m a cifr a m en or com o m a is est á vel


pa r a o m u lt iplica dor de in vest im en t o do qu e eu esper a r ia . Se t om a r m os
a n os isola dos, o r esu lt a do é a in da m a is in con gr u en t e. Se os ju n t a r m os,
por ém , a os pa r es, o m u lt iplica dor pa r ece t er sido in fer ior a 3 e, pr o-
va velm en t e, ba st a n t e est á vel a o r edor de 2,5. Ist o su ger e u m a pr open -
sã o m a r gin a l a con su m ir n ã o m a ior do qu e 60 a 70%, cifr a per feit a m en t e
a dm issível pa r a o per íodo de expa n sã o, m a s su r pr een den t em en t e pe-
qu en a e, n o m eu en t en der , pou co ver ossím il em per íodo de cr ise. Ta lvez
ist o se expliqu e pelo ext r em a do con ser va dor ism o da polít ica fin a n ceir a
da s em pr esa s a m er ica n a s, m esm o du r a n t e a cr ise. P or ou t r a s pa la vr a s,
se h ou ver u m a en or m e qu eda de in vest im en t o devido à a u sên cia de
t r a ba lh os de r epa r a çã o de su bst it u içã o, e se for con st it u ída u m a r eser va
fin a n ceir a pa r a com pen sa r est e desa ju st e, o efeit o ser á im pedir o cr es-
cim en t o qu e t er ia ocor r ido n a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir , cr esci-
m en t o esse qu e, de ou t r a m a n eir a , t er ia a con t ecido. P a r ece-m e qu e
est e fa t or t a lvez t en h a desem pen h a do u m pa pel im por t a n t e n o a gr a -
va m en t o da r ecen t e cr ise n os E st a dos Un idos. Aliá s, é possível qu e a s
estatísticas exagerem , de certo modo, o declínio do investim ento, que em
geral se avalia em m ais de 75% entre 1929 e 1932, ao passo que a queda
da form ação líquida do capital foi de mais de 95%; um a ligeira diferença
nestas estimativas pode modificar substancialm ente o multiplicador.

VI

Qu a n do exist e desem pr ego in volu n t á r io, a desu t ilida de m a r gin a l


do t r a ba lh o é, n ecessa r ia m en t e, m en or qu e a u t ilida de do pr odu t o m a r -
gin a l. Na r ea lida de, pode ser m u it o m en or , pois cer t a qu a n t ida de de
t r a ba lh o, pa r a u m h om em qu e est eve m u it o t em po desem pr ega do, em
vez de desu t ilida de, pode t er u t ilida de posit iva . Adm it in do ist o, o r a -
ciocín io a n t er ior dem on st r a com o os ga st os “in ú t eis” pr oven ien t es de
em pr ést im os 92 podem , a pesa r disso, en r iqu ecer n o fim de con t a s a co-
m u n ida de. A con st r u çã o de pir â m ides, os t er r em ot os e a t é a s gu er r a s
podem con t r ibu ir pa r a a u m en t a r a r iqu eza , se a edu ca çã o dos n ossos
est a dist a s n os pr in cípios da econ om ia clá ssica for u m em pecilh o a u m a
solu çã o m elh or .
É cu r ioso ver com o o bom sen so popu la r , em seu s esfor ços pa r a
fu gir a con clu sões a bsu r da s, pôde ch ega r a pr efer ir a s for m a s e ga st os

92 É m u it a s vezes con ven ien t e u sa r a expr essã o “despesa s com em pr ést im os” pa r a design a r
t a n t o o in vest im en t o pú blico fin a n cia do por em pr ést im os de in divídu os, com o qu a lqu er
ou t r o ga st o pú blico cor r en t e cober t o pelo m esm o m eio. E st r it a m en t e fa la n do, est e ú lt im o
dever ia ser con sider a do u m a pou pa n ça n ega t iva , m a s a polít ica oficia l n est a m a t ér ia n ã o
obedece a m ot ivos psicológicos a n á logos a os qu e gover n a m a pou pa n ça pr iva da . A expr essã o
“despesa s com em pr ést im os” é, por isso, con ven ien t e pa r a design a r o pr odu t o líqu ido dos
em pr ést im os con t r a ídos pela s a u t or ida des pú blica s, seja em con t a de ca pit a l ou em con t a
pa r a cobr ir u m déficit or ça m en t á r io. A pr im eir a dessa s for m a s de despesa s de em pr ést im os
a t u a n o sen t ido de a u m en t a r o in vest im en t o e a segu n da , de eleva r a pr open sã o a con su m ir .

144
KEYN ES

de em pr ést im os totalm en te “in ú t eis” à s qu e a pen a s o sã o parcialm en te,


e qu e, por n ã o ser em com plet a m en t e despr ovida s de u t ilida de, t en dem
a ser ju lga da s à lu z de pr in cípios est r it a m en t e “econ ôm icos”. P or exem -
plo, o a u xílio a os desem pr ega dos, fin a n cia do por em pr ést im o, é m a is
fa cilm en t e a ceit o qu e fin a n cia m en t o de m elh or ia s a u m cu st o in fer ior
à t a xa de ju r os cor r en t e, e a solu çã o de a br ir bu r a cos n o ch ã o, con h ecida
pelo n om e de m in er a çã o de ou r o, qu e n ã o a cr escen t a n a da à r iqu eza
r ea l do m u n do e a in da su põe a desu t ilida de do t r a ba lh o, é a m a is
a ceit á vel de t oda s.
Se o Tesou r o se dispu sesse a en ch er ga r r a fa s u sa da s com pa pel-
m oeda , a s en t er r a sse a u m a pr ofu n dida de con ven ien t e em m in a s de
ca r vã o a ba n don a da s qu e logo fossem cober t a s com o lixo da cida de e
deixa sse à in icia t iva pr iva da , de a cor do com os bem exper im en t a dos
pr in cípios do laissez-faire, a t a r efa de desen t er r a r n ova m en t e a s n ot a s
(n a t u r a lm en t e obt en do o dir eit o de fa zê-lo por m eio de con cessões sobr e
o t er r en o on de est ã o en t er r a da s a s n ot a s), o desem pr ego poder ia de-
sa pa r ecer e, com a a ju da da s r eper cu ssões, é pr ová vel qu e a r en da
r ea l da com u n ida de, bem com o a su a r iqu eza em ca pit a l, fossem sen -
sivelm en t e m a is a lt a s do qu e, n a r ea lida de, o sã o. Cla r o est á qu e ser ia
m a is a ju iza do con st r u ir ca sa s ou a lgo sem elh a n t e; m a s se t a n t o se
opõem dificu lda des polít ica s e pr á t ica s, o r ecu r so cit a do n ã o deixa de
ser pr efer ível a n a da .
E n t r e est e expedien t e e o da explor a çã o da s m in a s de ou r o do
m u n do r ea l, a a n a logia é com plet a . Nos per íodos em qu e o ou r o é
en con t r a do a pr ofu n dida des con ven ien t es, a exper iên cia en sin a qu e a
r iqu eza r ea l do m u n do a u m en t a r a pida m en t e; e qu a n do ele só é en -
con t r á vel em pequ en a s qu a n t ida des, a r iqu eza per m a n ece est á vel ou
m esm o dim in u i. Desse m odo, a s m in a s de ou r o sã o do m a is a lt o va lor
e im por t â n cia pa r a a civiliza çã o. Da m esm a for m a qu e a s gu er r a s t êm
sido a ú n ica for m a de ga st os com em pr esá r ios em gr a n de esca la qu e
os est a dist a s a ch a r a m ju st ificá vel, a ext r a çã o de ou r o é o ú n ico pr et ext o
pa r a a br ir bu r a cos n o ch ã o qu e os ba n qu eir os con sider a m u m a a t it u de
fin a n ceir a sa u dá vel, e ca da u m a dest a s a t ivida des r epr esen t ou o seu
pa pel n o pr ogr esso — pelo fa t o de n ã o se en con t r a r u m a solu çã o m elh or .
Um det a lh e a ser a ssin a la do é a t en dên cia do pr eço de o ou r o su bir
em t er m os de m ã o-de-obr a e de m a t er ia is du r a n t e a s depr essões, a ju -
da n do a even t u a l r ecu per a çã o, por qu e a u m en t a a pr ofu n dida de da m i-
n er a çã o e dim in u i a qu a lida de do m in ér io ca pa z de ser cu st eá vel.
Além do efeit o pr ová vel da cr escen t e ofer t a de ou r o sobr e a t a xa
de ju r os, h á dois m ot ivos pa r a qu e a ext r a çã o de ou r o seja u m a for m a
a lt a m en t e r ecom en dá vel de in vest im en t o, se n ã o pu der m os a u m en t a r
o em pr ego por m eios qu e, a o m esm o t em po, elevem os n ossos est oqu es
de r iqu eza ú t il. E m pr im eir o lu ga r , em vir t u de da a t r a çã o especu la t iva
dessa espécie de in vest im en t o, h á a t en dên cia de o r ea liza r sem leva r
m u it o em con t a a t a xa de ju r os vigen t e. E m segu n do lu ga r , o seu

145
OS ECON OMIS TAS

r esu lt a do, ou seja , o a u m en t o do est oqu e de ou r o, n ã o t em , com o em


ou t r os ca sos de in vest im en t o, o efeit o de lh e r edu zir a u t ilida de m a r -
gin a l. Desde qu e o va lor de u m a ca sa depen de de su a u t ilida de, ca da
ca sa qu e se con st r u a t en de a r edu zir a r en da pr ová vel qu e se pode
obt er da s fu t u r a s con st r u ções e, por t a n t o, dim in u i o a t r a t ivo de fu t u r os
in vest im en t os sim ila r es, a n ã o ser qu e a t a xa de ju r os ba ixe pari passu .
A extração do ouro não apresenta o m esm o inconveniente, e só pode so-
brevir um im pedim ento através de um a alta taxa de salários medida em
ouro, o que é pouco provável acontecer, a não ser que o emprego se tenha
tornado substancialm ente maior. Além disso, em virtude das reservas
constituídas a título do custo de uso e do custo suplementar, como no
caso de riquezas menos duráveis, não há um efeito reverso posterior.
O a n t igo E git o t in h a a du pla va n t a gem , qu e sem dú vida explica
a su a fa bu losa r iqu eza , de possu ir d u as espécies de a t ivida des: a con s-
t r u çã o de pir â m ides e a ext r a çã o de m et a is pr eciosos, cu jos fr u t os, pelo
fa t o de n ã o ser vir em à s n ecessida des do h om em pelo seu con su m o,
n ã o se a vilt a va m por ser em a bu n da n t es. A Ida de Média edificou ca -
t edr a is e en t oou câ n t icos. Du a s pir â m ides, du a s m issa s de r équ iem
va lem du a s vezes m a is qu e u m a — o qu e, por ém , n ã o é ver da de t r a -
t a n do-se de du a s est r a da s de fer r o qu e liga m Lon dr es a Yor k. Dest a r t e,
a ssim n os m ost r a m os t ã o r a zoá veis e n os edu ca m os de m odo t ã o se-
m elh a n t e a os fin a n cist a s pr u den t es, m edit a n do bem a n t es de a u m en t a r
a s ca r ga s “fin a n ceir a s” da s fu t u r a s ger a ções pela edifica çã o da s ca sa s,
on de se pode viver , qu e já n os n ã o é t ã o fá cil esca pa r a os in con ven ien t es
do desem pr ego. Tem os de a ceit a r esse fa t o com o o r esu lt a do in evit á vel
de a plica r à con du t a do E st a do a s m á xim a s con cebida s pa r a “en r iqu e-
cer ” u m in divídu o, per m it in do-lh e a cu m u la r dir eit os a sa t isfa ções qu e
ele n ã o t en cion a exer cer em qu a lqu er época det er m in a da .

146
L IVRO Q U ARTO

O I N CEN TIVO A I N VES TIR


C AP ÍTU LO 11
A Efic iê n c ia Ma rg in a l d o Ca p ita l

Q u a n do u m in divídu o obt ém u m in vest im en t o ou u m bem de


ca pit a l, a dqu ir e o dir eit o a o flu xo de r en da s fu t u r a s qu e esper a obt er
da ven da de seu s pr odu t os, en qu a n t o du r a r esse ca pit a l, feit a a dedu çã o
da s despesa s cor r en t es n ecessá r ia s à obt en çã o dos dit os pr odu t os. Con -
vém ch a m a r a essa sér ie de a n u ida des Q 1, Q 2... Q n ren d a esperad a do
in vest im en t o.
E m con t r a st e com a r en da esper a da do in vest im en t o, t em os o
preço d e oferta do bem de ca pit a l, qu er en do dizer com est a expr essã o
n ã o o pr eço de m er ca do a o qu a l pode com pr a r -se efet iva m en t e n o m o-
m en t o u m bem desse t ipo, m a s o pr eço qu e ba st a r ia , exa t a m en t e, pa r a
in du zir u m fa br ica n t e a pr odu zir u m a n ova u n ida de su plem en t a r desse
ca pit a l, ist o é, a qu ilo a qu e, por vezes, se ch a m a cu sto d e reposição.
A r ela çã o en t r e a r en da esper a da de u m bem de ca pit a l e seu pr eço
de ofer t a ou cu st o de r eposiçã o, ist o é, a r ela çã o en t r e a r en da esper a da
de u m a u n ida de a dicion a l da qu ele t ipo de ca pit a l e seu cu st o de pr o-
du çã o, dá -n os a eficiên cia m argin al d o capital desse t ipo. Ma is pr eci-
sa m en t e, defin o a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l com o sen do a t a xa de
descon t o qu e t or n a r ia o va lor pr esen t e do flu xo de a n u ida des da s r en da s
esper a da s desse ca pit a l, du r a n t e t oda a su a exist ên cia , exa t a m en t e
igu a l a o seu pr eço de ofer t a . Ist o n os dá a s eficiên cia s m a r gin a is dos
difer en t es t ipos de ben s de ca pit a l. A m a is a lt a dest a s eficiên cia s m a r -
gin a is pode, en t ã o, ser con sider a da a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l
em ger a l.
O leit or n ot a r á qu e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l é defin ida
a qu i em t er m os da expectativa da r en da e do pr eço de ofer t a corren te
do bem de ca pit a l. E la depen de da t a xa de r et or n o qu e se esper a obt er
do din h eir o in vest ido n u m bem recen tem en te pr odu zido; e n ã o do r e-

149
OS ECON OMIS TAS

su lt a do h ist ór ico obt ido por u m in vest im en t o em r ela çã o a seu cu st o


or igin a l, qu a n do exa m in a do r et r ospect iva m en t e a o fim de su a vida .
Qu a n do o in vest im en t o, em da do t ipo de ca pit a l, a u m en t a du r a n t e
cer t o per íodo, a eficiên cia m a r gin a l desse ca pit a l dim in u i à m edida
qu e o in vest im en t o a u m en t a , em pa r t e, por qu e a r en da pr ospect iva
ba ixa r á con for m e su ba a ofer t a desse t ipo de ca pit a l e, em pa r t e, por qu e
a pr essã o sobr e a s fá br ica s pr odu t or a s da qu ele da do t ipo de ca pit a l
ca u sa r á , n or m a lm en t e, u m a eleva çã o de seu pr eço de ofer t a ; sen do
qu e o segu n do dest es fa t or es é, ger a lm en t e, o m a is im por t a n t e pa r a
est a belecer o equ ilíbr io n o cu r t o pr a zo, em bor a qu a n t o m a is lon go for
o per íodo qu e se con sider e m a ior im por t â n cia a dqu ir e o pr im eir o fa t or .
P odem os, a ssim , cr ia r pa r a ca da t ipo de ca pit a l u m a esca la m ost r a n do
a pr opor çã o em qu e dever á a u m en t a r o in vest im en t o n esse ca pit a l
du r a n t e o per íodo, pa r a qu e a su a eficiên cia m a r gin a l ba ixe pa r a de-
t er m in a do n ível. P odem os, depois, a gr ega r essa s esca la s de t odos os
difer en t es t ipos de ca pit a l, de m odo qu e se obt en h a ou t r a esca la qu e
r ela cion e a t a xa de in vest im en t o a gr ega do com a cor r espon den t e efi-
ciên cia m a r gin a l do ca pit a l em ger a l qu e a qu ela t a xa de in vest im en t o
est a belecer á .
Ch a m a r em os a ist o de cu r va da dem a n da por in vest im en t o ou ,
a lt er n a t iva m en t e, a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
Tor n a -se, por t a n t o, eviden t e qu e a t a xa efet iva de in vest im en t o
cor r en t e t en de a a u m en t a r a t é o pon t o em qu e n ã o h a ja m a is n en h u m a
cla sse de bem de ca pit a l cu ja eficiên cia m a r gin a l exceda a t a xa de
ju r os cor r en t e. E m ou t r a s pa la vr a s o in vest im en t o va i va r ia r a t é a qu ele
pon t o da cu r va de dem a n da de in vest im en t o em qu e a eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l em ger a l é igu a l à t a xa de ju r os do m er ca do.93
E st a idéia pode, t a m bém , ser expr essa da m a n eir a qu e segu e.
Se Q r for o r et or n o esper a do de u m a t ivo n o t em po r, e d r for o va lor
pr esen t e de 1 libr a difer ido por r a n os à taxa corren te d e ju ros,
ΣQ r d r é o preço de dem anda do investim ento; e este será efetuado até o
ponto em que ΣQ r d r se torne igual ao preço da oferta do investim ento na
forma como foi definido antes. Se, por outro lado, ΣQ r d r for m enor que o
preço de oferta, não haverá investimento corrente no bem considerado.
Segu e-se qu e o in cen t ivo pa r a in vest ir depen de, em pa r t e, da
cu r va de dem a n da por in vest im en t o e, em pa r t e, da t a xa de ju r os. Só
n o fin a l do Livr o Qu a r t o ser á possível t er u m a visã o globa l dos fa t or es
qu e det er m in a m a t a xa de in vest im en t o em su a r ea l com plexida de.
Con t u do, peço a o leit or t om a r n ot a , desde já , de qu e n em o con h ecim en t o

93 P a r a m a ior sim plicida de de exposiçã o, om it i o fa t o de qu e est a m os t r a t a n do com u m a


com plexida de de t a xa s de ju r os e de descon t os cor r espon den t es a os difer en t es per íodos qu e
devem t r a n scor r er a n t es qu e su r ja m os diver sos r et or n os esper a dos dos a t ivos, por ém , n ã o
é difícil r efor m u la r o a r gu m en t o a fim de cobr ir esse pon t o.

150
KEYN ES

do r et or n o esper a do de u m a t ivo n em o con h ecim en t o da su a eficiên cia


m a r gin a l n os per m it em dedu zir a t a xa de ju r os ou o va lor pr esen t e
desse a t ivo. Tem os de det er m in a r a t a xa de ju r os em a lgu m a ou t r a
fon t e, e só en t ã o poder em os a va lia r o bem , “ca pit a liza n do” a su a r en da
pr ospect iva .
II

Com o se r ela cion a a defin içã o a n t er ior da eficiên cia m a r gin a l do


ca pit a l com a lin gu a gem cor r en t e? A Prod u tivid ad e, a R en d a, a E fi-
ciên cia ou a Utilid ad e M argin ais do ca pit a l sã o t er m os fa m ilia r es qu e
t em os em pr ega do com fr eqü ên cia . Nã o é fá cil, por ém , en con t r a r n a
lit er a t u r a econ ôm ica u m a exposiçã o cla r a do sen t ido qu e os econ om ist a s
lh es t êm , ger a lm en t e, qu er ido a t r ibu ir .
H á pelo m en os t r ês a m bigü ida des a escla r ecer . A pr im eir a dessa s
a m bigü ida des é a de sa ber se o qu e n os in t er essa é o in cr em en t o da
pr odu çã o física por u n ida de de t em po qu e r esu lt a do em pr ego su ple-
m en t a r de u m a u n ida de física de ca pit a l, ou o in cr em en t o em va lor
qu e r esu lt a do em pr ego a dicion a l de u m a u n ida de de va lor de ca pit a l.
No pr im eir o ca so, a defin içã o da u n ida de física de ca pit a l ca u sa difi-
cu lda des qu e m e pa r ecem a o m esm o t em po in solú veis e desn ecessá r ia s.
Na t u r a lm en t e, pode-se dizer qu e dez t r a ba lh a dor es colh er ã o m a is t r igo
n u m a á r ea det er m in a da se pu der em r ecor r er a o u so de cer t a s m á qu in a s
a dicion a is, m a s n ã o vejo m eio a lgu m de r edu zir est a idéia a u m a ex-
pr essã o a r it m ét ica in t eligível qu e n ã o t r a ga con sigo a n oçã o de va lor .
Con t u do, n u m er osa s discu ssões sobr e est e t em a pa r ecem r efer ir -se,
pr in cipa lm en t e, à pr odu t ivida de física do ca pit a l, em bor a os a u t or es
n ã o logr em fa zer -se cla r os.
E m segu n do lu ga r , vem a qu est ã o de sa ber se a eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l é u m a qu a n t ida de a bsolu t a ou u m a pr opor çã o. Os
con t ext os em qu e ela a pa r ece e o cost u m e de a t r a t a r com o se ela
t ivesse a m esm a dim en sã o qu e a t a xa de ju r os pa r ecem r equ er er qu e
ela seja u m a pr opor çã o. Toda via , n ã o é ger a lm en t e in dica do cla r a m en t e
qu a is sã o os t er m os dest a pr opor çã o.
Rest a , por fim , u m a dist in çã o cu ja n egligên cia t em sido a ca u sa
pr in cipa l de con fu sã o e equ ívocos en t r e o in cr em en t o de va lor qu e se
pode obt er u sa n do u m a qu a n t ida de a dicion a l de ca pit a l n a sit u a çã o
existen te, e a sér ie de in cr em en t os qu e se esper a obt er através d e tod o
o períod o d e u tilização do bem de ca pit a l a dicion a l; ist o é, a dist in çã o
en t r e Q 1 e a sér ie com plexa Q 1 , Q 2 ,...Q r ,... E st e a spect o en volve t oda
a qu est ã o do pa pel da s expect a t iva s n a t eor ia econ ôm ica . A m a ior ia
da s discu ssões sobr e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l pa r ece descon si-
der a r os ou t r os t er m os da sér ie, excet u a n do-se Q 1 . Ta l posiçã o, por ém ,
só poder ia ju st ifica r -se n u m a t eor ia est á t ica em qu e t odos os va lor es
de Q fossem igu a is. A t eor ia u su a l da dist r ibu içã o, n a qu a l se su põe
qu e o ca pit a l obt ém n o presen te va lor igu a l à su a pr odu t ivida de m a r -

151
OS ECON OMIS TAS

gin a l (n u m sen t ido ou n o ou t r o), só é vá lida n u m a sit u a çã o est a cion á r ia .


A r en da a gr ega da cor r en t e do ca pit a l n ã o t em r ela çã o dir et a com a
su a eficiên cia m a r gin a l, a o pa sso qu e a su a r en da cor r en t e n a m a r gem
de pr odu çã o (ist o é, r et or n o do ca pit a l qu e en t r a n o pr eço de ofer t a
da pr odu çã o) é o seu cu st o m a r gin a l de u so, qu e t a m bém n ã o t em
r ela çã o im edia t a com a su a eficiên cia m a r gin a l.
H á , com o já disse a n t er ior m en t e, u m a eviden t e fa lt a de escla r e-
cim en t o sobr e o a ssu n t o. Ao m esm o t em po, est ou con ven cido de qu e
a defin içã o qu e a pr esen t ei a cim a se a pr oxim a ba st a n t e da a cepçã o qu e
Ma r sh a ll deu a o t er m o. A expr essã o u t iliza da por Ma r sh a ll é “eficiên cia
m a r gin a l líqu ida ” de u m fa t or de pr odu çã o: ou , a lt er n a t iva m en t e, a
“u t ilida de m a r gin a l do ca pit a l”. O qu e segu e é u m r esu m o da s pa ssa gen s
m a is r eleva n t es qu e pu de en con t r a r em su a obr a Prin ciples (6ª ed.,
pp. 519-520). Reu n i a lgu m a s sen t en ça s qu e n ã o sã o con t ígu a s n o livr o
pa r a dest a ca r a essên cia de seu pen sa m en t o.
“E m cer t a fá br ica , podem -se em pr ega r 100 libr a s est er lin a s
a dicion a is de m a qu in á r io de m odo qu e n ã o a ca r r et e n en h u m ou t r o
ga st o su plem en t a r , e a cr escen t a r 3 libr a s a n u a is de va lor à pr o-
du çã o líqu ida dessa fá br ica , feit a s a s dedu ções cor r espon den t es
a o seu u so e desga st e. Se os in vest idor es de ca pit a l a plica r em
esse m on t a n t e em qu a lqu er u so qu e a pr esen t e per spect iva s de
lu cr o a lt o, e se, u m a vez feit o o in vest im en t o e en con t r a do o
equ ilíbr io, a in da com pen sa r o em pr ego desse m a qu in á r io, pode-
m os dedu zir qu e a t a xa a n u a l de ju r os é de 3%. Os exem plos
dest a espécie som en t e in dica m , por ém , pa r t e da in flu ên cia da s
gr a n des ca u sa s qu e gover n a m o va lor . Nã o se pode, sem r a ciocin a r
em cír cu lo vicioso, ser vir -se deles pa r a con st r u ir u m a t eor ia da
t a xa de ju r os ou m esm o u m a t eor ia dos sa lá r ios... Su pon h a m os
qu e a t a xa de ju r os de cer t os pa péis a bsolu t a m en t e ga r a n t idos
seja de 3% a o a n o, e qu e a in dú st r ia ch a peleir a a bsor va o ca pit a l
de 1 m ilh ã o de libr a s. Ist o sign ifica qu e a in dú st r ia de ch a péu s,
a t é a qu a n t ia de 1 m ilh ã o de libr a s, est á em con dições de t ir a r
do ca pit a l u m lu cr o su ficien t e pa r a pa ga r pela su a u t iliza çã o o
ju r o líqu ido de 3% a o a n o, em vez de pr escin dir dele. P ode h a ver
m a qu in á r io de qu e a in dú st r ia se n egu e a pr escin dir se a t a xa
de ju r os for de 20% a o a n o. Se a t a xa h ou vesse sido de 10%,
m a is m a qu in á r io t er ia sido em pr ega do; se fosse de 6%, m a is a in -
da ; m a is a in da se fosse de 4; e, fin a lm en t e, sen do de 3% u t iliza
m a qu in á r io a in da em m a ior qu a n t id a de. Qu a n do esse volu m e
de m a qu in á r io é em p r ega do, a su a eficiên cia m a r gin a l, i. é, a
u t ilida de desse m a qu in á r io, qu e exa t a m en t e va le a pen a u sa r ,
m ed e-se por 3%.”
É eviden t e, pelo qu e foi vist o a cim a , qu e Ma r sh a ll est a va per -
feit a m en t e cien t e do fa t o de qu e n os en volvem os n u m cír cu lo vicioso

152
KEYN ES

qu a n do t en t a m os det er m in a r , por sem elh a n t e r a ciocín io, o va lor efet ivo


da t a xa de ju r os.94 Nest e t r ech o pa r ece a ceit a r o pon t o de vist a a n t es
expost o, segu n do o qu a l a t a xa de ju r os det er m in a o m on t a n t e qu e o
in vest im en t o n ovo t en de a a lca n ça r , da da a cu r va da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l. Se a t a xa de ju r os for de 3%, sign ifica ist o qu e n in gu ém
pa ga r á 100 libr a s por u m a m á qu in a , a n ã o ser qu e esper e a cr escen t a r
3 libr a s à su a pr odu çã o a n u a l líqu ida , depois dedu zidos os cu st os de
u so e de depr ecia çã o. No ca pít u lo 14, por ém , ver em os qu e Ma r sh a ll
foi m en os ca u t eloso em ou t r os pon t os — em bor a r ecu a sse qu a n do o
r a ciocín io o leva va a u m t er r en o in cer t o.
E m bor a n ã o lh e ch a m e “eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l”, o P r o-
fessor Ir vin g F ish er deu , n a su a T h eory of In terest (1930), u m a defin içã o
da qu ilo qu e den om in a “a t a xa de r en dim en t o em r ela çã o a o cu st o”,
defin içã o essa idên t ica à m in h a . “A t a xa de r en dim en t o em r ela çã o a o
cu st o”, diz ele,95 “é a t a xa qu e, u sa da pa r a m edir o va lor pr esen t e de
t odos os cu st os e de t odos os r en dim en t os, t or n a essa s du a s qu a n t ida des
igu a is”. O pr ofessor F ish er explica qu e a expa n sã o dos in vest im en t os
em qu a lqu er sen t ido depen der á de u m a com pa r a çã o en t r e a t a xa de
r en dim en t o em r ela çã o a o cu st o e à t a xa de ju r os. P a r a in du zir in ves-
t im en t os n ovos “a t a xa de r en dim en t o em r ela çã o a o cu st o deve ser
su per ior à t a xa de ju r os”.96 “E st a n ova gr a n deza (ou fa t or ) r epr esen t a ,
em nosso estudo, o papel principal do lado referente às oportunidades de
investim ento da teoria do juro.”97 Portanto, o professor F isher usa a sua
“taxa de rendimento em relação ao custo” no m esm o sentido e com o
mesmo objetivo que eu empreguei “a eficiência marginal do capital”.

III

A con fu sã o m a is im por t a n t e qu a n t o à im por t â n cia e a o sign ifica do


da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l a dvém do fa t o de n ã o se t er com -
pr een dido qu e ela depen de t a m bém da r en da esperad a do ca pit a l e
n ã o a pen a s da su a r en da cor r en t e. Isso pode ser m elh or ilu st r a do in -
dica n do-se o efeit o sobr e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l qu e t em a
expect a t iva de m odifica ções n o cu st o pr ospect ivo de pr odu çã o, qu er se
esper em essa s m u da n ça s com o r esu lt a do de a lt er a ções n o cu st o do
t r a ba lh o, ist o é, n a t a xa de sa lá r io, qu er de in ven ções e t écn ica s n ova s.
A pr odu çã o obt ida com o equ ipa m en t o fa br ica do h oje t er á de com pet ir ,
en qu a n t o du r a r , com a do equ ipa m en t o fa br ica do m a is t a r de, t a lvez a
u m cu st o m en or em t r a ba lh o, t a lvez com u m a t écn ica m elh or qu e pos-
sibilit e ven der su a pr odu çã o a pr eços m en or es e a a u m en t e em qu a n -

94 Ma s n ã o est a r ia ele en ga n a do a o su por qu e a t eor ia da pr odu t ivida de m a r gin a l dos sa lá r ios


é igu a lm en t e u m cír cu lo vicioso?
95 Op. cit., p. 168.
96 Op. cit., p. 159.
97 Op. cit., p. 155.

153
OS ECON OMIS TAS

t ida de a t é qu e seu pr eço t en h a descido a o m ín im o sa t isfa t ór io. Além


disso, o lu cr o do em pr esá r io (em t er m os m on et á r ios) a dvin do do equ i-
pa m en t o velh o ou n ovo ser á r edu zido se t odo o pr odu t o vier a ser
pr odu zido de m odo m a is ba r a t o. À m edida qu e t a is desen volvim en t os
pa r eça m pr ová veis, ou m esm o a pen a s possíveis, a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l pr odu zido n o pr esen t e dim in u i a pr opr ia da m en t e.
E st e é o fa t or a t r a vés do qu a l a expect a t iva de m odifica ções n o
va lor da m oeda in flu i sobr e o volu m e da pr odu çã o pr esen t e. A expec-
t a t iva de u m a ba ixa n o va lor da m oeda est im u la o in vest im en t o e, em
con seqü ên cia , o em pr ego em ger a l, por qu e eleva a cu r va da eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l, ist o é, a esca la da dem a n da de in vest im en t os; a
expect a t iva de u m a a lt a n o va lor da m oeda pr odu z, a o con t r á r io, efeit o
depr essivo, por qu e r edu z a esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
E st a é a ver da de im plícit a n a t eor ia do pr ofessor Ir vin g F ish er ,
or igin a lm en t e ch a m a da Appreciation an d In terest (Va lor iza çã o e J u r o),
ou seja , a dist in çã o en t r e a t a xa n om in a l e a t a xa r ea l de ju r os, pela
qu a l a segu n da se igu a la à pr im eir a depois de devida m en t e cor r igida
pa r a a t en der à s va r ia ções n o va lor da m oeda . É difícil en con t r a r u m
sen t ido n a t eor ia a ssim a pr esen t a da , pois n ã o est á cla r o se a m u da n ça
n o va lor da m oeda est á ou n ã o sen do su post a com o esper a da . Nã o h á
com o esca pa r do dilem a de qu e, se a m u da n ça n ã o é pr evist a , n en h u m
efeit o t er á sobr e os n egócios cor r en t es, a o pa sso qu e, se for pr evist a ,
os pr eços da s m er ca dor ia s se a ju st a r ã o t ã o depr essa e de t a l m a n eir a
qu e a s va n t a gen s de r et er m oeda e m er ca dor ia s se igu a la m n ova m en t e,
e ser á t a r de dem a is pa r a qu e os det en t or es de m oeda possa m ga n h a r
ou sofr er u m a a lt er a çã o n a t a xa de ju r os qu e com pen se a va r ia çã o
esper a da n o va lor do din h eir o em pr est a do n o decor r er da du r a çã o do
em pr ést im o. Ta m pou co o pr ofessor P igou con segu iu esca pa r desse di-
lem a a t r a vés do expedien t e de su por qu e a va r ia çã o esper a da n o va lor
da m oeda é pr evist a por u m gr u po de pessoa s e n ã o por ou t r o.
O er r o con sist e em su por qu e a s va r ia ções esper a da s n o va lor
da m oeda a t u a m dir et a m en t e sobr e a t a xa de ju r os, em vez de fa zê-lo
sobr e a eficiên cia m a r gin a l de det er m in a do volu m e de ca pit a l. Os pr eços
dos ben s existen tes sem pr e se a ju st a r ã o à s m u da n ça s n a s expect a t iva s
con cer n en t es a o va lor esper a do da m oeda . A im por t â n cia de t a is m u -
da n ça s n a s expect a t iva s r eside n os seu s efeit os sobr e a r a pidez de se
pr odu zir n ovos ben s, a t r a vés da su a r ea çã o sobr e a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l. A expect a t iva da eleva çã o dos pr eços t em u m efeit o est i-
m u la n t e n ã o por qu e fa ça su bir a t a xa de ju r os (o qu e ser ia u m m odo
pa r a doxa l de est im u la r a pr odu çã o — à m edida qu e a t a xa de ju r os
sobe, o est ím u lo é n eu t r a liza do n a m esm a ext en sã o), m a s por qu e eleva
a eficiên cia m a r gin a l de det er m in a do volu m e de ca pit a l. S e a t a xa de
ju r os su bisse pari passu com a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, a expec-
t a t iva da a lt a de pr eços n ão t er ia efeit os est im u la n t es, pois o est ím u lo
à pr odu çã o depen de do a u m en t o da eficiên cia m a r gin a l de cer t o volu m e

154
KEYN ES

de ca pit a l relativam en te à t a xa de ju r os. H a ver ia , decer t o, va n t a gem


em r efa zer a t eor ia do pr ofessor F ish er em t er m os de u m a “t a xa r ea l
de ju r os”, defin ida com o sen do a t a xa de ju r os qu e, su bseqü en t e a u m a
va r ia çã o n o est a do da expect a t iva qu a n t o a o va lor fu t u r o da m oeda ,
devesse pr eva lecer de m odo qu e essa va r ia çã o n ã o exer cesse n en h u m a
in flu ên cia sobr e a pr odu çã o cor r en t e.98
Con vém n ot a r qu e a expect a t iva de u m a qu eda fu t u r a n a t a xa
de ju r os t er á por efeit o fa zer baixar a esca la da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, pois sign ifica qu e a pr odu çã o r esu lt a n t e do equ ipa m en t o
cr ia do h oje t er á de com pet ir , du r a n t e pa r t e de su a vida , com a pr odu çã o
pr oven ien t e de equ ipa m en t o a qu e ba st a r á u m a r et r ibu içã o m en or .
E st a expect a t iva n ã o t er á gr a n de efeit o depr essivo, pois a s expect a t iva s
qu e se fa zem r ela t iva m en t e a o com plexo da s t a xa s de ju r os pa r a di-
fer en t es pr a zos qu e pr eva lecer ã o n o fu t u r o se r eflet ir ã o, em pa r t e, n o
com plexo da s t a xa s de ju r os qu e pr eva lecem h oje. Nã o obst a n t e, poder á
ver ifica r -se cer t o efeit o depr essivo, pois pode ser qu e n o per íodo fin a l
da vida do equ ipa m en t o fa br ica do h oje, a pr odu çã o obt ida por seu
in t er m édio t en h a de con cor r er com a pr odu çã o de u m equ ipa m en t o
m u it o m a is n ovo, a o qu a l é ba st a n t e u m a r et r ibu içã o m en or , em vir t u de
de t a xa de ju r os m en or qu e pr eva lece n os per íodos segu in t es a o t ér m in o
da du r a çã o do equ ipa m en t o pr odu zido h oje.
É im por t a n t e com pr een der a depen dên cia qu e h á en t r e a eficiên -
cia m a r gin a l de det er m in a do volu m e de ca pit a l e a s va r ia ções n a ex-
pect a t iva , pois é pr in cipa lm en t e est a depen dên cia qu e t or n a a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l su jeit a a cer t a s flu t u a ções violen t a s qu e explica m
o ciclo econôm ico. No capítulo 22, veremos que a alternância da expansão
e da depressão pode ser descrita e analisada em term os das flutuações
da eficiência m arginal do capital relativamente à taxa de juros.

IV

Dois t ipos de r iscos com u m en t e n ã o difer en cia dos, m a s qu e devem


ser dist in gu idos, a fet a m o volu m e do in vest im en t o. O pr im eir o é o
r isco do em pr esá r io ou o r isco do t om a dor do em pr ést im o e su r ge da s
dú vida s qu e o m esm o t em qu a n t o à pr oba bilida de de con segu ir , r ea l-
m en t e, a r et r ibu içã o qu e esper a . Qu a n do a lgu ém a ven t u r a o pr ópr io
din h eir o, esse é o ú n ico r isco qu e é r eleva n t e.
Ma s qu a n do exist e u m sist em a de con ceder em pr ést im os e de
t om a r em pr est a do, e com isso pr et en do design a r a con cessã o de cr édit os
pr ot egidos por cer t a m a r gem de ga r a n t ia r ea l ou pessoa l, a pa r ece u m
segu n do t ipo de r isco a qu e podem os ch a m a r r isco do em pr est a dor .
E st e pode dever -se ou a u m a con t in gên cia m or a l, ist o é, fa lt a volu n t á r ia

98 Cf. o a r t igo de ROBE RTSON, “In du st r ia l F lu ct u a t ion s a n d t h e Na t u r a l Ra t e of In t er est ”.


In : E con om ic J ou rn al. Dezem br o de 1934.

155
OS ECON OMIS TAS

ou qu a lqu er ou t r o m eio, t a lvez lícit o, pa r a fu gir a o cu m pr im en t o da


obr iga çã o, ou à possível in su ficiên cia da m a r gem de segu r a n ça , ist o é,
n ã o-cu m pr im en t o in volu n t á r io ca u sa do por u m a expect a t iva m a logr a -
da . P ode-se a cr escen t a r u m t er ceir o m ot ivo de r isco, ou seja , a possi-
bilida de de u m a va r ia çã o desfa vor á vel n o va lor do pa dr ã o m on et á r io,
t or n a n do o em pr ést im o em din h eir o m en os segu r o, à m edida da de-
pr ecia çã o, do qu e u m a t ivo r ea l, em bor a t odo ou a m a ior pa r t e dest e
r isco já dever ia t er -se r eflet ido, e, por t a n t o, sido in cor por a do, n os pr eços
dos ben s r ea is du r á veis.
Su cede qu e o pr im eir o t ipo de r isco é, em cer t o sen t ido, u m cu st o
r ea l, a pesa r de ser su scet ível de dim in u içã o, pela m édia de su a dis-
t r ibu içã o, ou por efeit o de u m a exa t idã o m a ior n a s pr evisões. O segu n do,
pelo con t r á r io, é u m a pu r a a diçã o a o cu st o do in vest im en t o, qu e n ã o
exist ir ia se qu em em pr est a e qu em t om a em pest a do fossem a m esm a
pessoa . Além disso, su põe, em pa r t e, a du plica çã o de u m a pa r cela do
r isco do em pr esá r io, o qu a l é a dicion a do d u as vezes à t a xa de ju r os
pu r a , qu e é com pa r a da à r en da m ín im a esper a da , qu e in du z a in vest ir .
Se u m a em pr esa for a r r isca da , a pessoa qu e t om a em pr est a do n eces-
sit a r á de u m a m a r gem m a is a m pla en t r e su a expect a t iva qu a n t o a o
r et or n o e a t a xa de ju r os à qu a l lh e pa r ece va n t a joso con t r a ir a dívida ,
a o pa sso qu e ju st a m en t e a m esm a r a zã o leva r á a pessoa qu e em pr est a
a exigir u m a m a r gem m a ior en t r e a su a r em u n er a çã o e a t a xa de
ju r os qu e ba st a pa r a in du zi-lo a em pr est a r (sa lvo se o poder e a r iqu eza
do devedor for em t ã o gr a n des qu e lh e per m it a m ofer ecer u m a m a r gem
excepcion a l de ga r a n t ia ). A esper a n ça de u m r esu lt a do m u it o fa vor á vel,
qu e pode com pen sa r o r isco n a idéia do t om a dor do em pr ést im o, n ã o
é a dequ a da pa r a t r a n qü iliza r o m u t u a n t e.
E st a du pla pr eca u çã o com u m a pa r cela do r isco n ã o r ecebeu , qu e
eu sa iba , a t é a gor a , a su a devida im por t â n cia ; por ém , em cer t os ca sos,
pode a dqu ir ir r elevâ n cia . E m per íodo de expa n sã o, a opin iã o cor r et a
sobr e a m a gn it u de de a m bos os r iscos, o do t om a dor do em pr ést im o e
o do em pr est a dor , pode r epr esen t a r u m a su best im a t iva a n or m a l e pe-
r igosa m en t e ba ixa .
V

A esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l é de fu n da m en t a l im -


por t â n cia , por ser sobr et u do a t r a vés dest e fa t or (m u it o m a is do qu e
pela t a xa de ju r os) qu e a expect a t iva do fu t u r o in flu i sobr e o pr esen t e.
O er r o de con sider a r a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l pr in cipa lm en t e
em t er m os do r en dim en t o corren te do equ ipa m en t o de ca pit a l, o qu e
só ser ia cor r et o n u m a econ om ia est á t ica on de n en h u m a m u da n ça fu t u r a
pu desse in flu ir sobr e o pr esen t e, t eve com o r esu lt a do a r u pt u r a do elo
t eór ico en t r e o h oje e o a m a n h ã . Mesm o a t a xa de ju r os é, vir t u a l-

156
KEYN ES

m en t e,99 u m fen ôm en o corren te; se r edu zir m os a eficiên cia m a r gin a l


do ca pit a l à m esm a con diçã o, r en u n cia m os a leva r em con sider a çã o,
dir et a m en t e, a in flu ên cia do fu t u r o n a a n á lise do equ ilíbr io pr esen t e.
O fa t o de qu e a s h ipót eses da sit u a çã o est á t ica est ã o, qu a se sem -
pr e, su bja cen t es n a t eor ia econ ôm ica con t em por â n ea con du z a u m a
gr a n de dose de ir r ea lism o. A in t r odu çã o, por ém , dos con ceit os de cu st o
de u so e da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, con for m e se defin ir a m a n t es,
t er á o efeit o, a ch o eu , de t r a zê-la de volt a à r ea lida de, r edu zin do a o
m ín im o o gr a u de in dispen sá vel a da pt a çã o.
É a exist ên cia de u m equ ipa m en t o du r á vel qu e liga a econ om ia
futura à econom ia presente. É , portanto, consoante com e em concordância
a nossos princípios gerais de pensam ento que a expectativa sobre o futuro
deva afetar o presente por interm édio do preço de demanda por equipa-
mento durável.

99 P or ém , n ã o com plet a m en t e, pois a t a xa de ju r os r eflet e, em pa r t e, a in certeza do fu t u r o.


Além disso, a r ela çã o en t r e a s t a xa s de ju r os pa r a difer en t es pr a zos depen de da s expect a t iva s.

157
C AP ÍTU LO 12
O Es ta d o d a Ex p e c ta tiv a a Lo n g o P ra zo

V im os, n o ca pít u lo a n t er ior , qu e o volu m e de in vest im en t o de-


pen de da r ela çã o en t r e a t a xa de ju r os e a cu r va da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l cor r espon den t e a os difer en t es volu m es de in vest im en t o cor -
r en t e, a o pa sso qu e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l depen de da r ela çã o
en t r e o pr eço de ofer t a de u m a t ivo de ca pit a l e a su a r en da esper a da .
No pr esen t e ca pít u lo exa m in a r em os, m a is det a lh a da m en t e, a lgu n s dos
fa t or es qu e det er m in a m a r en da esper a da de u m a t ivo.
As con sider a ções sobr e a s qu a is se ba seia m a s expect a t iva s de
r en da s esper a da s sã o, em pa r t e, fa t os exist en t es qu e se pode su por
seja m con h ecidos m a is ou m en os com cer t eza e, em pa r t e, even t os
fu t u r os qu e podem ser pr evist os com u m m a ior ou m en or gr a u de
con fia n ça . E n t r e os pr im eir os, dest a ca -se o volu m e exist en t e dos vá r ios
t ipos de ben s de ca pit a l e os a t ivos de ca pit a l em ger a l, bem com o a
in t en sida de da pr ocu r a a t u a l dos con su m idor es n o t oca n t e a a r t igos
qu e r equ er em , pa r a qu e su a pr odu çã o seja eficien t e, u m a a ssist ên cia
m a ior de ca pit a l. E n t r e os segu n dos, figu r a m a s m u da n ça s do t ipo e
da qu a n t ida de do est oqu e dos ben s de ca pit a l e a s pr efer ên cia s dos
con su m idor es, a in t en sida de da pr ocu r a efet iva n os diver sos per íodos
da vida do in vest im en t o con sider a do e, por fim , a s va r ia ções da t a xa
de sa lá r io em t er m os n om in a is qu e podem ocor r er du r a n t e o r espect ivo
per íodo. P odem os r esu m ir o est a do da expect a t iva psicológica r esu lt a n t e
dos segu n dos fa t or es n a expr essã o estad o d a expectativa a lon go prazo,
sa lien t a n do-se qu e deve ser feit a a dist in çã o da expect a t iva a cu r t o
pr a zo, com ba se n a qu a l os pr odu t or es fa zem a est im a t iva do qu e
poder ã o obt er pelo pr odu t o a ca ba do, n o ca so de decidir em in icia r su a
pr odu çã o h oje, com a s in st a la ções exist en t es e qu e exa m in a m os n o
ca pít u lo 5.

159
OS ECON OMIS TAS

II

Ser ia in sen sa t o, n a for m a çã o de n ossa s expect a t iva s, a t r ibu ir


gr a n de im por t â n cia a t ópicos qu e pa r a n ós sã o m u it o in cer t os.100 É ,
por t a n t o, r a zoá vel qu e n os deixem os gu ia r , em gr a n de pa r t e, pelos
fa t os qu e m er ecem n ossa con fia n ça , m esm o se su a r elevâ n cia for m en os
decisiva pa r a os r esu lt a dos esper a dos do qu e ou t r os fa t os a r espeit o
dos qu a is o n osso con h ecim en t o é va go e lim it a do. P or essa r a zã o, os
fa t os a t u a is desem pen h a m u m pa pel qu e, em cer t o sen t ido, podem os
ju lga r despr opor cion a l n a for m a çã o de n ossa s expect a t iva s a lon go pr a -
zo, sen do qu e o n osso m ét odo h a bit u a l con sist e em con sider a r a sit u a çã o
a t u a l e depois pr ojet á -la n o fu t u r o, m odifica n do-a a pen a s n a m edida
em qu e t en h a m os r a zões m a is ou m en os defin ida s pa r a esper a r m os
u m a m u da n ça .
O est a do da expect a t iva a lon go pr a zo, qu e ser ve de ba se pa r a
a s n ossa s decisões, n ã o depen de, por t a n t o, exclu siva m en t e do pr ogn ós-
t ico m a is pr ová vel qu e possa m os for m u la r . Depen de, t a m bém , da con -
fian ça com a qu a l fa zem os est e pr ogn óst ico — n a m edida em qu e pon -
der a m os a pr oba bilida de de o n osso m elh or pr ogn óst ico r evela r -se in -
t eir a m en t e fa lso. Se esper a r m os gr a n des m u da n ça s, m a s n ã o t iver m os
cer t eza qu a n t o à for m a pr ecisa com qu e t a is m u da n ça s possa m ocor r er ,
n osso gr a u de con fia n ça ser á , en t ã o, fr a co.
O estad o d e con fian ça, qu e é o t er m o com u m en t e em pr ega do,
con st it u i u m a m a t ér ia à qu a l os h om en s pr á t icos dedica m a m a is cu i-
da dosa e desvela da a t en çã o. Toda via , os econ om ist a s n ã o a n a lisa r a m
est a m a t ér ia com o devido cu ida do e se lim it a r a m , n o m a is da s vezes,
a discu t i-la em t er m os ger a is. E m pa r t icu la r , n ã o se dem on st r ou com
cla r eza qu e su a r elevâ n cia r ela t iva m en t e a os pr oblem a s econ ôm icos
decor r e da con sider á vel in flu ên cia qu e exer ce sobr e a cu r va da eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l. Nã o se t r a t a de dois fa t or es dist in t os exer cen do
in flu ên cia sobr e o flu xo de in vest im en t o, ou seja , a esca la de eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l e o est a do de con fia n ça . O est a do de con fia n ça é
r eleva n t e pelo fa t o de ser u m dos pr in cipa is fa t or es qu e det er m in a m
essa esca la , a qu a l é idên t ica à cu r va da dem a n da de in vest im en t o.
E n t r et a n t o, n ã o h á m u it o pa r a se fa la r , a priori, a r espeit o do
est a do de con fia n ça . Nossa s con clu sões devem fu n da m en t a r -se, pr in -
cipa lm en t e, n a obser va çã o pr á t ica dos m er ca dos e da psicologia dos
n egócios. E st a é a r a zã o pela qu a l a digr essã o qu e se segu e est á coloca da
em u m n ível difer en t e de a bst r a çã o r ela t iva m en t e à m a ior pa r t e do
pr esen t e livr o.
P a r a sim plifica r a exposiçã o, n a discu ssã o qu e se segu e sobr e o

100 Qu a n do u t ilizo “m u it o in cer t os” n ã o qu er o dizer a m esm a coisa qu e “m u it o im pr ová veis”.


Cf. m in h a obr a T reatise on Probability [J MK, v. VIII]. Ca p. 6, “Th e Weigh t of Ar gu m en t s”.

160
KEYN ES

est a do de con fia n ça su por em os qu e n ã o h á n en h u m a va r ia çã o da t a xa


de ju r os; discor r er em os, n a s seções segu in t es, com o se a s va r ia ções dos
va lor es de in vest im en t o fossem pr oven ien t es, exclu siva m en t e, de m u -
da n ça s n a s expect a t iva s de su a s r en da s esper a da s e ja m a is da s va r ia -
ções da t a xa de ju r os sobr e cu ja ba se est a s r en da s pr ová veis sã o ca -
pit a liza da s. É , en t r et a n t o, fá cil sobr epor o efeit o da s va r ia ções da t a xa
de ju r os a o efeit o da s va r ia ções do est a do de con fia n ça .
III

O fa t o de m a ior im por t â n cia é a ext r em a pr eca r ieda de da ba se


do con h ecim en t o sobr e o qu a l t em os qu e fa zer os n ossos cá lcu los da s
r en da s esper a da s. O n osso con h ecim en t o dos fa t or es qu e r egu la r ã o a
r en da de u m in vest im en t o a lgu n s a n os m a is t a r de é, em ger a l, m u it o
lim it a do e, com fr eqü ên cia , despr ezível. Se fa la r m os com fr a n qu eza ,
t em os de a dm it ir qu e a s ba ses do n osso con h ecim en t o pa r a ca lcu la r a
r en da pr ová vel den t r o de dez a n os de u m a est r a da de fer r o, u m a m in a
de cobr e, u m a fá br ica de t ecidos, a a ceit a çã o de u m pr odu t o fa r m a -
cêu t ico, u m n a vio t r a n sa t lâ n t ico ou u m im óvel n o cen t r o com er cia l de
Lon dr es pou co sign ifica m e, à s vezes, a n a da leva m . De fa t o, a qu eles
qu e t en t a m , com ser ieda de, fa zer u m cá lcu lo dest a n a t u r eza con st it u em
u m a pequ en a m in or ia , cu ja con du t a n ã o ch ega a in flu en cia r o m er ca do.
E m ou t r os t em pos, qu a n do a s em pr esa s per t en cia m , qu a se t oda s,
a os qu e a s t in h a m fu n da do ou a os seu s a m igos e sócios, o in vest im en t o
depen dia da exist ên cia de u m n ú m er o su ficien t e de in divídu os de t em -
per a m en t o en t u siá st ico e de im pu lsos con st r u t ivos qu e em pr een dessem
n egócios com o u m a m a n eir a de viver , sem r ea lm en t e t om a r com o ba se
os cá lcu los pr ecisos de lu cr os pr ová veis. Os n egócios er a m , em pa r t e,
u m a lot er ia , em bor a o r esu lt a do fin a l fosse, pr edom in a n t em en t e, de-
t er m in a do pelo fa t o de ser em a s a pt idões e o t em per a m en t o dos dir i-
gen t es su per ior es ou in fer ior es à m édia . Un s fr a ca ssa r ia m , ou t r os se-
r ia m bem -su cedidos. Ma s, m esm o a pós o a con t ecim en t o, n in gu ém fica va
sa ben do se a m édia dos r esu lt a dos, em r ela çã o à s som a s in vest ida s,
er a su per ior , igu a l ou in fer ior à t a xa de ju r os pr eva lecen t e; con t u do,
se exclu ir m os a explor a çã o dos r ecu r sos n a t u r a is e a dos m on opólios,
é pr ová vel qu e a m édia efet iva dos r esu lt a dos dos in vest im en t os, m esm o
em per íodos de pr ogr esso e pr osper ida de, t en h a fr u st r a do a s esper a n ça s
qu e in spir a r a m t a l a con t ecim en t o. Os h om en s de n egócio fa zem u m
jogo qu e é u m a m escla de h a bilida de e de sor t e, cu jos r esu lt a dos m édios
sã o descon h ecidos pelos joga dor es qu e dele pa r t icipa m . Se a n a t u r eza
h u m a n a n ã o sen t isse a t en t a çã o de a r r isca r a sor t e, n em de sen t ir a
sa t isfa çã o (exclu in do-se o lu cr o) de con st r u ir u m a fá br ica , u m a est r a da
de fer r o, de explor a r u m a m in a ou u m a fa zen da , pr ova velm en t e n ã o
h a ver ia m u it os in vest im en t os com o m er o r esu lt a do de cá lcu los fr ios.
Toda via , a s decisões de in vest ir em n egócios pr iva dos do t ipo
a n t igo er a m , em gr a n de pa r t e, ir r evogá veis n ã o só pa r a a com u n ida de

161
OS ECON OMIS TAS

em ger a l, com o t a m bém pa r a os in divídu os. Com a sepa r a çã o en t r e a


pr opr ieda de e a gest ã o qu e pr eva lece a t u a lm en t e e com o desen volvi-
m en t o de m er ca dos fin a n ceir os or ga n iza dos, su r giu u m n ovo fa t or de
gr a n de im por t â n cia qu e, à s vezes, fa cilit a o in vest im en t o, m a s qu e, à s
vezes, con t r ibu i sobr em a n eir a pa r a a gr a va r a in st a bilida de do sist em a .
Na a u sên cia de bolsa s de va lor es n ã o h á m ot ivo pa r a se pr ocu r a r , com
fr eqü ên cia , r ea va lia r os in vest im en t os qu e fa zem os. Ma s a bolsa de
va lor es r ea va lia , t odos os dia s, os in vest im en t os e est a s r ea va lia ções
pr opor cion a m a opor t u n ida de fr eqü en t e a ca da in divídu o (em bor a ist o
n ã o ocor r a pa r a a com u n ida de com o u m t odo) de r ever su a s a plica ções.
É com o se u m a gr icu lt or , t en do exa m in a do seu ba r ôm et r o a pós o ca fé
da m a n h ã , pu desse decidir r et ir a r seu ca pit a l da a t ivida de a gr ícola
en t r e a s dez e a s on ze da m a n h ã , pa r a r econ sider a r se dever ia in vest i-lo
m a is t a r de, du r a n t e a sem a n a . Toda via , a s r ea va lia ções diá r ia s da
bolsa de va lor es, em bor a se dest in em , pr in cipa lm en t e, a fa cilit a r a
t r a n sfer ên cia de in vest im en t os já r ea liza dos en t r e in divídu os, exer cem ,
in evit a velm en t e, u m a in flu ên cia decisiva sobr e o m on t a n t e do in ves-
t im en t o cor r en t e. Isso por qu e n ã o h á n en h u m sen t ido em se cr ia r u m a
em pr esa n ova a u m cu st o m a ior qu a n do se pode a dqu ir ir u m a em pr esa
sim ila r exist en t e por u m pr eço m en or , a o pa sso qu e h á u m a in du çã o
pa r a se a plica r em r ecu r sos em u m n ovo pr ojet o qu e possa pa r ecer
exigir u m a som a exor bit a n t e, desde qu e esse em pr een dim en t o possa
ser liqu ida do n a bolsa de va lor es com u m lu cr o im edia t o.101 Dest a r t e,
cer t a s ca t egor ia s de in vest im en t o sã o r egu la da s pela expect a t iva m édia
dos qu e n egocia m n a bolsa de va lor es, t a l com o se m a n ifest a n o pr eço
da s a ções, em vez de expect a t iva s gen u ín a s do em pr esá r io pr ofissio-
n a l.102 Com o se r ea liza m , en t ã o, n a pr á t ica , est a s r ea va lia ções dos in -
vest im en t os exist en t es qu e ocor r em t odos os dia s, m esm o t oda s a s h o-
r a s, e qu e sã o de su m a im por t â n cia ?
IV

Na pr á t ica , con cor da m os, ger a lm en t e, em r ecor r er a u m m ét odo


qu e é, n a ver da de, u m a con ven ção. A essên cia dest a con ven çã o — em -
bor a ela n em sem pr e fu n cion e de u m a for m a t ã o sim ples — r eside em

101 Em minha obr a T reatise on Money (v. II, p. 195) [J MK, v. VI, p. 174], obser vei que, quando
a s ações de uma empr esa sã o cota das m uito a lto, de m odo que essa m esma em presa possa
a umenta r seu ca pital emitindo nova s a ções em condições fa vorá veis, os resulta dos da í decor-
r entes sã o os m esmos que se ela conseguisse obter empr éstimos a uma ta xa reduzida de juros.
Agor a, eu descr everia este fato dizendo que um a cotação alta pa ra a s a ções existentes supõe
um aum ento na eficiência ma rgina l do tipo corr espondente de capita l e, por tanto, tem o m esmo
efeito que uma dim inuiçã o na taxa de juros (uma vez que o investimento depende de um a
compa ra çã o entr e a eficiência ma rgina l do capita l e a ta xa de jur os).
102 Ist o n ã o se a plica , n a t u r a lm en t e, a o t ipo de em pr esa s qu e n ã o podem ser fa cilm en t e cot a da s
n a bolsa de va lor es e pa r a a s qu a is t a m pou co exist a m in st r u m en t os de n egocia çã o pr óxim os
a esses pa péis qu e est a m os discu t in do. As ca t egor ia s qu e se en qu a dr a m n essa s exceções
er a m a n t er ior m en t e n u m er osa s. Toda via , su a im por t â n cia r ela t iva m en t e a o va lor t ot a l do
n ovo in vest im en t o est á dim in u in do r a pida m en t e.

162
KEYN ES

se su por qu e a sit u a çã o exist en t e dos n egócios con t in u a r á por t em po


in defin ido, a n ã o ser qu e t en h a m os r a zões con cr et a s pa r a esper a r u m a
m u da n ça . Ist o n ã o qu er dizer qu e, n a r ea lida de, a cr edit em os n a du r a çã o
in defin ida do est a do a t u a l dos n egócios. A va st a exper iên cia en sin a
qu e t a l h ipót ese é m u it o im pr ová vel. Os r esu lt a dos r ea is de u m in ves-
t im en t o, n o decor r er de vá r ios a n os, r a r a s vezes coin cidem com a s
pr evisões or igin a is. Ta m bém n ã o podem os r a cion a liza r a n ossa a t it u de
a r gu m en t a n do qu e pa r a u m h om em em est a do de ign or â n cia os er r os
em qu a lqu er sen t ido sã o igu a lm en t e pr ová veis e qu e, por t a n t o, su bsist e
u m a esper a n ça est a t íst ica ba sea da em pr oba bilida des igu a is. Isso por -
qu e podem os fa cilm en t e dem on st r a r qu e a h ipót ese de pr oba bilida des
a r it m et ica m en t e igu a is, ba sea da em u m est a do de ign or â n cia , con du z
a a bsu r dos. E fet iva m en t e, est a m os su pon do qu e a a va lia çã o do m er ca do
exist en t e, seja qu a l for a m a n eir a por qu e a ela se ch egou , é sin gu -
la r m en t e correta em r ela çã o a o n osso con h ecim en t o a t u a l dos fa t os
qu e in flu ir ã o sobr e a r en da do in vest im en t o, e só m u da r á n a pr opor çã o
em qu e va r ia r o dit o con h ecim en t o, em bor a n o pla n o filosófico essa
a va lia çã o n ã o possa ser u n ivoca m en t e cor r et a , u m a vez qu e o n osso
con h ecim en t o a t u a l n ã o n os for n ece a s ba ses su ficien t es pa r a u m a
esper a n ça m a t em a t ica m en t e ca lcu la da . De fa t o, n a s a va lia ções do m er -
ca do in t er vém t oda a espécie de con sider a ções qu e sã o de m odo a lgu m
r eleva n t es pa r a a r en da esper a da .
Entretanto, o m étodo convencional de cálculo acima indicado será
compatível com um considerável grau de continuidade e estabilidade em
nossos negócios, enquanto puderm os confiar na continuação do raciocínio.
Se exist em m er ca dos or ga n iza dos de in vest im en t o e desde qu e
possa m os con fia r n a con t in u a çã o do a r gu m en t o o in vest idor pode, le-
git im a m en t e, en cor a ja r -se com a idéia de qu e n ã o cor r e ou t r o r isco
sen ã o a qu ele de u m a va r ia çã o efet iva n a s con dições do fu tu ro im ed iato,
sobr e cu ja pr oba bilida de pode t en t a r for m a r u m a opin iã o pessoa l e
qu e n ã o é pr ová vel seja cot a da em a lt o n ível. Na su posiçã o de qu e o
r a ciocín io su bsist a , est a s m u da n ça s sã o a s ú n ica s qu e podem a fet a r o
va lor do seu in vest im en t o e ele n ã o t er á de per der o son o pelo sim ples
fa t o de n ã o t er n en h u m a idéia do va lor qu e o seu in vest im en t o t er á
dez a n os m a is t a r de. Desse m odo, o in vest im en t o t or n a -se r a zoa vel-
m en t e “segu r o” pa r a o in vest idor in dividu a l em per íodos cu r t os e, por
con seqü ên cia , pa r a u m a su cessã o de t a is per íodos, por m a is n u m er osos
qu e seja m , desde qu e ele possa r a zoa velm en t e con fia r n a va lida de do
r a ciocín io e, por t a n t o, t en h a a opor t u n ida de de r ever su a s decisões e
m odifica r o in vest im en t o a n t es qu e h a ja t em po su ficien t e pa r a qu e
ocor r a m gr a n des a lt er a ções. Assim , os in vest im en t os qu e sã o “fixos”
pa r a a com u n ida de t or n a m -se “líqu idos” pa r a o in divídu o.
E st ou cer t o de qu e os n ossos pr in cipa is m er ca dos de in vest im en t o
se desen volver a m ba sea dos em pr ocedim en t os pa r ecidos. Toda via , n ã o

163
OS ECON OMIS TAS

é de se su r pr een der qu e u m a r gu m en t o, em cer t os a spect os t ã o a r bi-


t r á r io, a pr esen t e seu s pon t os fr a cos. É a su a pr eca r ieda de qu e cr ia
u m a pa r t e con sider á vel do pr oblem a con t em por â n eo de obt en çã o de
u m volu m e su ficien t e de in vest im en t os.
V
P odem ser m en cion a dos, br evem en t e, a lgu n s dos fa t or es qu e a gr a -
va m essa pr eca r ieda de.

(1) Com o r esu lt a do do a u m en t o gr a du a l da pr opor çã o qu e r epr e-


sen t a m n o in vest im en t o a gr ega do de ca pit a l da com u n ida de a s a ções
possu ída s por pessoa s qu e n ã o dir igem n em t êm con h ecim en t o especia l
da s cir cu n st â n cia s, r ea is ou esper a da s, dos n egócios em qu est ã o, h á
u m a sér ia r edu çã o do elem en t o de r ea l con h ecim en t o n a a va lia çã o
desses in vest im en t os feit a pelos qu e os possu em ou pelos qu e t en cion a m
a dqu ir i-los.

(2) As flu t u a ções de cu r t o pr a zo dos lu cr os n os in vest im en t os


exist en t es, em bor a seja m m a n ifest a m en t e efêm er a s e despr ovida s de
sign ifica çã o, t en dem a exer cer sobr e o m er ca do u m a in flu ên cia excessiva
e m esm o a bsu r da . Diz-se, por exem plo, qu e a s a ções da s em pr esa s
n or t e-a m er ica n a s qu e fa br ica m gelo podem ser ven dida s a u m pr eço
m a is eleva do n o ver ã o, qu a n do os seu s lu cr os sã o, sa zon a lm en t e, ele-
va dos, do qu e n o in ver n o, qu a n do n in gu ém qu er gelo. A ocor r ên cia de
fer ia dos ba n cá r ios m a is pr olon ga dos pode a u m en t a r o va lor de m er ca do
do sist em a fer r oviá r io br it â n ico em vá r ios m ilh ões de libr a s.

(3) Um a a va lia çã o con ven cion a l, fr u t o da psicologia de m a ssa de


gr a n de n ú m er o de in divídu os ign or a n t es, est á su jeit a a m odifica ções
violen t a s em con seqü ên cia de r epen t in a s m u da n ça s n a opin iã o su sci-
t a da por cer t os fa t or es qu e n a r ea lida de pou co sign ifica m pa r a a r en da
pr ová vel, já qu e essa a va lia çã o ca r ece de r a ízes pr ofu n da s qu e per m it a m
su a su st en t a çã o. E m per íodos a n or m a is em pa r t icu la r , qu a n do a h i-
pót ese de u m a con t in u a çã o in defin ida do est a do a t u a l dos n egócios é
m en os pla u sível do qu e u su a lm en t e, m esm o qu e n ã o exist a m m ot ivos
con cr et os pa r a pr ever det er m in a da m u da n ça , o m er ca do est a r á su jeit o
a on da s de sen t im en t os ot im ist a s ou pessim ist a s, qu e sã o pou co r a -
zoá veis e a in da a ssim legít im os n a a u sên cia de u m a ba se sólida pa r a
cá lcu los sa t isfa t ór ios.

(4) H á , por ém , u m a ca r a ct er íst ica especia l qu e m er ece a n ossa


a t en çã o. Ta lvez se t en h a su post o qu e a con cor r ên cia en t r e os pr ofis-
sion a is com pet en t es, dot a dos de ju lga m en t o m a is segu r o e de con h e-
cim en t os m a is a m plos do qu e o in vest idor pr iva do m édio, cor r igir ia os
deva n eios do in divídu o ign or a n t e e à m er cê de su a pr ópr ia in icia t iva .

164
KEYN ES

Su cede, por ém , qu e a s en er gia s e a s h a bilida des do in vest idor pr ofis-


sion a l e do especu la dor est ã o pr in cipa lm en t e a plica da s de ou t r a m a -
n eir a . Com efeit o, a m a ior ia deles dedica -se n ã o a fa zer pr evisões a ba -
liza da s a lon go pr a zo sobr e a r en da pr ová vel de u m in vest im en t o por
t oda su a vida , m a s em pr ever m u da n ça s de cu r t o pr a zo com cer t a
a n t ecedên cia em r ela çã o a o pú blico em ger a l. Nã o se pr eocu pa m com
o qu e r ea lm en t e sign ifica u m va lor de in vest im en t o pa r a o in divídu o
qu e o com pr ou “pa r a gu a r da r ”, m a s com o va lor qu e lh e a t r ibu ir á o
m er ca do den t r o de t r ês m eses ou u m a n o sob a in flu ên cia da psicologia
de m a ssa s. Adem a is, est a con du t a n ã o é o r esu lt a do de u m pr open sã o
m a l dir ecion a da , m a s a con seqü ên cia in evit á vel de u m m er ca do fin a n -
ceir o or ga n iza do segu n do a s n or m a s descr it a s. Na ver da de, ser ia in -
sen sa t o pa ga r 25 por u m in vest im en t o cu ja r en da esper a da , su põe-se,
ju st ifica u m va lor de 30 se, por ou t r o la do, se a cr edit a qu e o m er ca do
o a va lia r á em 20, t r ês m eses depois.
Dessa m a n eir a , o in vest idor pr ofission a l sen t e-se for ça do a est a r
a ler t a pa r a a n t ecipa r essa s va r ia ções im in en t es n a s n ot ícia s ou n a
a t m osfer a qu e, com o dem on st r a a exper iên cia , sã o a s qu e exer cem
m a ior in flu ên cia sobr e a psicologia colet iva do m er ca do. E st e é o r e-
su lt a do in evit á vel dos m er ca dos fin a n ceir os or ga n iza dos em t or n o da
ch a m a da “liqu idez”. E n t r e a s m á xim a s da fin a n ça or t odoxa , segu r a -
m en t e n en h u m a é m a is a n t i-socia l qu e o fet ich e da liqu idez, a dou t r in a
qu e diz ser u m a da s vir t u des posit iva s da s in st it u ições in vest idor a s
con cen t r a r seu s r ecu r sos n a posse de va lor es “líqu idos”. E la ign or a qu e
n ã o exist e a lgo com o a liqu idez do in vest im en t o pa r a a com u n ida de
com o u m t odo. A fin a lida de socia l do in vest im en t o bem or ien t a do de-
ver ia ser dom ín io da s for ça s obscu r a s do t em po e da ign or â n cia qu e
r odeia m o n osso fu t u r o. O objet ivo r ea l e secr et o dos in vest im en t os
m a is h a bilm en t e efet u a dos em n ossos dia s é “sa ir dispa r a do n a fr en t e”
com o se diz coloqu ia lm en t e, est im u la r a m u lt idã o e t r a n sfer ir a dia n t e
a m oeda fa lsa ou em depr ecia çã o.
E st a lu t a de esper t eza pa r a pr ever com a lgu n s m eses de a n t e-
cedên cia a s ba ses da a va lia çã o con ven cion a l, m u it o m a is do qu e a
r en da pr ová vel de u m in vest im en t o du r a n t e a n os, n em sequ er exige
qu e h a ja idiot a s n o pú blico pa r a en ch er a pa n ça dos pr ofission a is: a
pa r t ida pode ser joga da en t r e est es m esm os. Ta m bém n ã o é n ecessá r io
qu e a lgu n s con t in u em a cr edit a n do, in gen u a m en t e, qu e a ba se con ven -
cion a l de a va lia çã o t en h a qu a lqu er va lidez r ea l a lon go pr a zo. Tr a t a -se,
por a ssim dizer , de br in ca deir a s com o o jogo do a n el, a ca br a -cega , a s
ca deir a s m u sica is. É pr eciso pa ssa r o a n el a o vizin h o a n t es de o jogo
a ca ba r , a ga r r a r o ou t r o pa r a ser por est e su bst it u ído, en con t r a r u m a
ca deir a va ga a n t es qu e a m ú sica pa r e. E st es pa ssa t em pos podem con s-
t it u ir a gr a dá veis dist r a ções e desper t a r m u it o en t u sia sm o, em bor a t o-
dos os pa r t icipa n t es sa iba m qu e é a ca br a -cega qu e est á da n do volt a s
a esm o ou qu e, qu a n do a m ú sica pá r a , a lgu ém fica r á sem a ssen t o.

165
OS ECON OMIS TAS

P a r a va r ia r u m pou co de m et á for a , o in vest im en t o por pa r t e de


pr ofission a is pode ser com pa r a do a os con cu r sos or ga n iza dos pelos jor -
n a is, on de os pa r t icipa n t es t êm de escolh er os seis r ost os m a is belos
en t r e u m a cen t en a de fot ogr a fia s, ga n h a n do o pr êm io o com pet idor
cu ja seleçã o cor r espon da , m a is a pr oxim a da m en t e, à m édia da s pr efe-
r ên cia s dos com pet idor es em con ju n t o; a ssim , ca da con cor r en t e dever á
escolh er n ã o os r ost os qu e ele pr ópr io con sider e m a is bon it os, m a s os
qu e lh e pa r ecem m a is pr ópr ios a r eu n ir a s pr efer ên cia s dos ou t r os
con cor r en t es, os qu a is en ca r a m o pr oblem a do m esm o pon t o de vist a .
Nã o se t r a t a de escolh er os r ost os qu e, n o en t en der de ca da u m , sã o
r ea lm en t e os m a is lin dos, n em m esm o a qu eles qu e a opin iã o ger a l
con sider e r ea lm en t e com o t a is. Alca n ça m os o t er ceir o gr a u , n o qu a l
em pr ega m os a n ossa in t eligên cia em a n t ecipa r o qu e a opin iã o ger a l
esper a qu e seja a opin iã o ger a l. E h á pessoa s, segu n do cr eio, qu e vã o
a t é o qu a r t o e o qu in t o gr a u , ou m a is lon ge a in da .
Ta lvez o leit or obser ve qu e, du r a n t e u m per íodo ba st a n t e lon go,
u m in divídu o in t eligen t e e in difer en t e a o pa ssa t em po da m oda pode
r ea liza r gr a n des lu cr os à cu st a de ou t r os joga dor es se per sist ir fa zen do
in vest im en t os de a cor do com a s su a s m a is per feit a s expect a t iva s a
lon go pr a zo. A ist o con vém r espon der , desde logo, qu e exist em , n a
ver da de, pessoa s com est e t ipo de m en t a lida de sér ia e qu e, de fa t o,
pa r a u m m er ca do de in vest im en t o h a ver á u m a en or m e difer en ça , de-
pen den do da in flu ên cia qu e essa s pessoa s exer ça m sobr e a opin iã o dos
joga dor es. Ma s devem os a cr escen t a r qu e diver sos fa t or es a fet a m a pr e-
dom in â n cia de t a is pessoa s n os m oder n os m er ca dos de ca pit a l. O in -
vest im en t o ba sea do n a s pr evisões a u t ên t ica s a lon go pr a zo é h oje t ã o
difícil qu e m a l pode ser post o em pr á t ica . Os qu e t en t a r em fa zê-lo
poder ã o est a r cer t os de pa ssa r dia s de t r a ba lh o m u it o in t en so e de
cor r er r iscos m u it o m a ior es qu e os qu e t en t a m a divin h a r a s r ea ções
do pú blico m elh or qu e o pr ópr io pú blico; e, da da igu a l in t eligên cia ,
eles podem com et er er r os m u it o m a is desa st r osos. Nã o h á evidên cia
cla r a a dem on st r a r qu e a polít ica de in vest im en t o socia lm en t e m a is
va n t a josa coin cida com a m a is lu cr a t iva . É pr eciso m ais in t eligên cia
pa r a der r ot a r a s for ça s do t em po e da n ossa ign or â n cia sobr e o fu t u r o
do qu e pa r a sa ir n a fr en t e. Além disso, a vida n ã o é ba st a n t e lon ga
pa r a essa t a r efa ; a n a t u r eza h u m a n a exige su cessos im edia t os, h á u m
deleit e especia l em ga n h a r din h eir o r a pida m en t e e os lu cr os r em ot os
sã o descon t a dos pelo h om em m édio a t a xa s m u it o eleva da s. O jogo
dos in vest idor es pr ofission a is é in t oler a velm en t e fa st idioso e dem a sia do
exigen t e pa r a qu em n ã o t en h a a bsolu t a m en t e o in st in t o de joga dor ;
qu em o t em h á de pa ga r o cor r espon den t e t r ibu t o por essa in clin a çã o.
Ma is a in da , o in vest idor qu e se pr opon h a a ign or a r a s flu t u a ções de
m u it o cu r t o pr a zo do m er ca do n ecessit a m a ior es r ecu r sos pa r a a su a
segu r a n ça e n ã o deve oper a r em t ã o la r ga esca la , se é qu e oper a em
a lgu m a , com din h eir o em pr est a do — u m a r a zã o a m a is pa r a qu e, da da

166
KEYN ES

a igu a lda de de in t eligên cia e de r ecu r sos, lh e seja m a is va n t a joso de-


dica r -se a o pa ssa t em po. F in a lm en t e, o in vest idor a lon go pr a zo é a qu ele
qu e m elh or ser ve o in t er esse pú blico e é o qu e, n a pr á t ica , in cor r e em
m a ior cr ít ica , a o pa sso qu e os fu n dos de in vest im en t o sã o m a n eja dos
por com issões ou ba n cos,103 pois, em essên cia , su a con du t a é excên t r ica ,
in con ven cion a l e t em er á r ia a os olh os da opin iã o m édia . Se obt ém êxit o,
isso a pen a s con fir m a r á a cr en ça ger a l n a su a t em er ida de; se, n o fin a l
de con t a s, sofr e r eveses m om en t â n eos, pou co ser ã o os qu e dele se com -
pa decer ã o. A sa bedor ia u n iver sa l in dica ser m elh or pa r a a r epu t a çã o
fr a ca ssa r ju n t o com o m er ca do do qu e ven cer con t r a ele.

(5) At é a gor a t ivem os em vist a pr in cipa lm en t e o est a do de con -


fia n ça do pr ópr io especu la dor ou in vest idor especu la t ivo e t a lvez pa r eça
qu e t en h a m os su post o, im plicit a m en t e, qu e, se ele est á sa t isfeit o com
su a s pr ópr ia s per spect iva s, t em a cesso ilim it a do a o din h eir o à t a xa de
ju r o do m er ca do. Ta l n ã o é, eviden t em en t e, o ca so. P or isso devem os
con sider a r t a m bém ou t r o a spect o do est a do de con fia n ça , ou seja , o
gr a u de con fia n ça qu e a s in st it u ições de cr édit o con cedem à s pessoa s
qu e n ela s pr ocu r a m em pr ést im os, e qu e, à s vezes, se den om in a m con -
dições de cr édit o. Um a ba ixa violen t a n o pr eço da s a ções, qu e pr odu z
u m efeit o desa st r oso sobr e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, pode ser
pr ovoca da pelo en fr a qu ecim en t o seja da con fia n ça especu la t iva seja
da s con dições de cr édit o. Ma s en qu a n t o o debilit a m en t o de qu a lqu er
dos dois fa t or es é su ficien t e pa r a det er m in a r u m a qu eda violen t a , a
r ecu per a çã o exige qu e am bos seja m r est a u r a dos, pois, con qu a n t o o en -
fr a qu ecim en t o do cr édit o seja ba st a n t e pa r a leva r a u m a cr ise, o seu
for t a lecim en t o, em bor a u m a con diçã o n ecessá r ia da r ecu per a çã o, n ã o
é con diçã o su ficien t e.

VI

E st a s con sider a ções n ã o dever ia m sa ir do ca m po da a n á lise eco-


n ôm ica . Con t u do con vém colocá -la s em su a devida per spect iva . Se m e
é per m it ido a plica r o t er m o especu lação à a t ivida de qu e con sist e em
pr ever a psicologia do m er ca do e o t er m o em preen d im en to à qu e con sist e
em pr ever a r en da pr ová vel dos ben s du r a n t e t oda su a exist ên cia , de
m odo a lgu m se pode dizer qu e a especu la çã o sem pr e pr eva leça sobr e
o em pr een dim en t o. À m edida qu e pr ogr ide a or ga n iza çã o dos m er ca dos
de in vest im en t o, o r isco de u m pr edom ín io da especu la çã o, en t r et a n t o,
a u m en t a . Nu m dos m a ior es m er ca dos de in vest im en t o do m u n do, a

103 A pr á t ica ger a lm en t e con sider a da pr u den t e, qu e leva a s com pa n h ia s qu e a dm in ist r a m fu n dos
de in vest im en t o ou a s com pa n h ia s de segu r os a ca lcu la r , com fr eqü ên cia , n ã o a pen a s a
r en da de su a ca r t eir a de in vest im en t o, m a s t a m bém a va lor iza çã o de seu ca pit a l n o m er ca do,
pode igu a lm en t e leva r a a t r ibu ir im por t â n cia excessiva à s flu t u a ções a cu r t o pr a zo desse
m esm o m er ca do.

167
OS ECON OMIS TAS

sa ber , o de Nova Yor k, a in flu ên cia da especu la çã o (n o sen t ido da


pa la vr a a cim a expost o) é en or m e. Mesm o for a do ca m po da s fin a n ça s,
a t en dên cia dos a m er ica n os é a t r ibu ir u m in t er esse excessivo n a des-
cober t a do qu e a opin iã o ju lga ser a opin iã o m édia e est e pen der n a cion a l
en con t r a seu ca st igo n a Bolsa de Va lor es. Diz-se ser r a r o u m a m er ica n o
in vest ir , com o o fa zem a in da m u it os in gleses, “pa r a obt er u m a r en da ”,
e qu e som en t e n a expect a t iva de u m ga n ch o de ca pit a l est á dispost o
a a dqu ir ir u m t ít u lo. Ist o é a pen a s ou t r a m a n eir a de dizer qu e, qu a n do
u m a m er ica n o com pr a u m in vest im en t o, est á coloca n do su a s esper a n ça s
n ã o t a n t o em su a r en da pr ová vel, m a s em su a m u da n ça fa vor á vel n a s
ba ses con ven cion a is de a va lia çã o, ou seja , qu e ele é, o sen t ido da do
a cim a , u m especu la dor . Os especu la dor es podem n ã o ca u sa r da n o qu a n -
do sã o a pen a s bolh a s n u m flu xo con st a n t e de em pr een dim en t o; m a s
a sit u a çã o t or n a -se sér ia qu a n do o em pr een dim en t o se con ver t e em
bolh a s n o t u r bilh ã o especu la t ivo. Qu a n do o desen volvim en t o do ca pit a l
em u m pa ís se con ver t e em su bpr odu t o da s a t ivida des de u m ca ssin o,
o t r a ba lh o t en de a ser m a lfeit o. A m edida do êxit o obt ido por Wa ll
St r eet , con sider a da u m a in st it u içã o cu ja fin a lida de socia l pr ecípu a é
con du zir os n ovos in vest im en t os pelos ca n a is m a is pr odu t ivos em t er -
m os de r en dim en t o fu t u r o, n ã o pode ser a pon t a da com o u m dos m a is
br ilh a n t es t r iu n fos do ca pit a lism o do t ipo laissez-faire — o qu e n ã o é
de su r pr een der , se é ver da de, com o pen so, qu e os m a is br ilh a n t es cé-
r ebr os de Wa ll St r eet se or ien t a m , de fa t o, pa r a u m fim difer en t e.
E st a s t en dên cia s sã o u m a con seqü ên cia qu a se in evit á vel do êxit o
de se t er em or ga n iza do os m er ca dos de in vest im en t os “líqu idos”. Ad-
m it e-se, em ger a l, qu e, n o pr ópr io in t er esse do pú blico, o a cesso a
ca ssin os deve ser difícil e dispen dioso. E , t a lvez o m esm o dever ia a con -
t ecer n o ca so da s Bolsa s de Va lor es. O fa t o de qu e os peca dos da Bolsa
de Va lor es de Lon dr es t en h a m sido m en or es do qu e os de Wa ll St r eet
t a lvez n ã o se deva t a n t o a difer en ça s n os t em per a m en t os n a cion a is
com o à cir cu n st â n cia de qu e, pa r a o in glês m edia n o, Th r ogm or t on St r eet
é in a cessível e m u it o dispen diosa com pa r a da com Wa ll St r eet , pa r a o
m esm o t ipo de n or t e-a m er ica n o. A pr opor çã o dos “joga dor es”, a s a lt a s
com issões de cor r et a gem e a s pesa da s t a xa s sobr e t r a n sfer ên cia s qu e
se pa ga m a o Tesou r o, ga st os qu e a com pa n h a m t oda s a s t r a n sa ções n a
Bolsa de Va lor es de Lon dr es, r edu zem a liqu idez do m er ca do (em bor a
a pr á t ica da s liqu ida ções qu in zen a is oper e em sen t ido in ver so) o su fi-
cien t e pa r a elim in a r gr a n de pa r t e da s oper a ções ca r a ct er íst ica s de Wa ll
St r eet .104 A cr ia çã o de u m eleva do im post o sobr e a s t r a n sfer ên cia s
pa r a t oda s a s t r a n sa ções t a lvez fosse a m a is sa lu t a r da s m edida s ca -

104 Diz-se qu e, qu a n do Wa ll St r eet est á em per íodo a t ivo, pelo m en os m et a de da s com pr a s e


ven da s de t ít u los de in vest im en t o se r ea liza com a in t en çã o, por pa r t e do especu la dor , de
se desfa zer desses t ít u los n o m esm o d ia. Ist o se a plica t a m bém , com fr eqü ên cia , à s bolsa s
de m er ca dor ia s.

168
KEYN ES

pa zes de a t en u a r , n os E st a dos Un idos, o pr edom ín io da especu la çã o


sobr e o em pr een dim en t o.
O espet á cu lo dos m er ca dos fin a n ceir os m oder n os levou -m e, a lgu -
m a s vezes, a con clu ir qu e, se a s oper a ções de com pr a de u m in vest i-
m en t o fossem t or n a da s defin it iva s e ir r evogá veis, à m a n eir a do ca sa -
m en t o, sa lvo em ca so de m or t e ou por ou t r o m ot ivo gr a ve, os m a les
da n ossa época ser ia m , com gr a n de u t ilida de, a livia dos. Isso obr iga r ia
os in vest idor es a dir igir su a a t en çã o a pen a s pa r a a s per spect iva s a
lon go pr a zo. Ba st a , por ém , u m m om en t o de r eflexã o pa r a com pr een der
qu e sem elh a n t e m ét odo n os leva a u m dilem a e n os m ost r a qu e, se a
liqu idez do m er ca do fin a n ceir o à s vezes dificu lt a u m n ovo in vest im en t o,
em com pen sa çã o fa cilit a -o com m a is fr eqü ên cia ; isso por qu e o fa t o de
ca da in vest idor in dividu a lm en t e con sider a do t er a ilu sã o de qu e pa r -
t icipa de u m n egócio “líqu ido” (em bor a isso n ã o possa ser ver da deir o
pa r a t odos os in vest idor es colet iva m en t e) a ca lm a -lh e os n er vos e a n i-
m a -o m u it o m a is a cor r er o r isco. Se a s a qu isições in dividu a is de va lor es
de in vest im en t o per dessem su a liqu idez, da í poder ia m r esu lt a r sér ia s
dificu lda des pa r a os in vest im en t os n ovos sem pr e qu e se ofer ecessem
a os in divídu os ou tros m eios de con ser va r su a s econ om ia s. Aqu i ja z o
dilem a . Na m edida em qu e u m in divídu o possa em pr ega r su a r iqu eza
en t esou r a n do ou em pr est a n do d in h eiro, a a lt er n a t iva de a dqu ir ir ben s
r ea is de ca pit a l n ã o ser ia ba st a n t e a t r a en t e (sobr et u do pa r a a pessoa
qu e n ã o m a n eja esses ben s e pou co sa be a r espeit o deles), excet o or -
ga n iza n do m er ca dos on de esses ben s possa m con ver t er -se fa cilm en t e
em din h eir o.
O ú n ico r em édio r a dica l pa r a a s cr ises de con fia n ça qu e a fligem
a vida econ ôm ica do m u n do m oder n o ser ia r est r in gir a escolh a do in -
divídu o à ú n ica a lt er n a t iva de con su m ir a su a r en da , ou ser vir -se dele
pa r a en com en da r a pr odu çã o de ben s específicos de ca pit a l, qu e, em bor a
com evidên cia pr ecá r ia , se lh e a figu r a m o in vest im en t o m a is in t er es-
sa n t e a o seu a lca n ce. Ta lvez, em cer t os m om en t os, qu a n do se visse,
m a is do qu e de cost u m e, a ssober ba do por dú vida s a r espeit o do fu t u r o,
a per plexida de o leva sse a con su m ir m a is e a r ea liza r m en os in vest i-
m en t os n ovos, m a s ist o evit a r ia a s r eper cu ssões desa st r osa s, cu m u la -
t iva s e de a m plo a lca n ce, or iu n da s do fa t o de poder a bst er -se de ga st a r
a su a r en da de u m a ou de ou t r a for m a .
Os qu e vin h a m in sist in do n os per igos socia is r esu lt a n t es do en -
t esou r a m en t o da m oeda t in h a m em vist a , n a t u r a lm en t e, con sider a ções
a n á loga s a est a s. Con t u do, n ã o der a m a devida a t en çã o à possibilida de
de qu e o fen ôm en o pode ocor r er sem m odifica çã o a lgu m a , ou pelo m en os
sem u m a va r ia çã o a pr eciá vel, n o en t esou r a m en t o da m oeda .
VII

Além da ca u sa devida à especu la çã o, a in st a bilida de econ ôm ica


en con t r a ou t r a ca u sa , in er en t e à n a t u r eza h u m a n a , n o fa t o de qu e

169
OS ECON OMIS TAS

gr a n de pa r t e da s n ossa s a t ivida des posit iva s depen de m a is do ot im ism o


espon t â n eo do qu e de u m a expect a t iva m a t em á t ica , seja m or a l, h edo-
n ist a ou econ ôm ica . P r ova velm en t e a m a ior pa r t e da s n ossa s decisões
de fa zer a lgo posit ivo, cu jo efeit o fin a l n ecessit a de cer t o pr a zo pa r a
se pr odu zir , deva ser con sider a da a m a n ifest a çã o do n osso en t u sia sm o
— com o u m in st in t o espon t â n eo de a gir , em vez de n ã o fa zer n a da —,
e n ã o o r esu lt a do de u m a m édia pon der a da de lu cr os qu a n t it a t ivos
m u lt iplica dos pela s pr oba bilida des qu a n t it a t iva s. O em pr een dedor pr o-
cu r a con ven cer a si pr ópr io de qu e a pr in cipa l for ça m ot r iz da su a
a t ivida de r eside n a s a fir m a ções de seu pr opósit o, por m a is in gên u a s
e sin cer a s qu e possa m ser . Ba st a qu e o em pr een dim en t o seja u m pou co
m a ior qu e u m a expediçã o a o P ólo Su l pa r a ser ba sea do n o cá lcu lo
exa t o dos lu cr os fu t u r os. Dessa m a n eir a , a o se a r r efecer o en t u sia sm o,
e a o va cila r o ot im ism o espon t â n eo, fica m os n a depen dên cia a pen a s
da pr evisã o m a t em á t ica e a í o em pr een dim en t o desfa lece e m or r e —
em bor a o t em or da per da seja t ã o despr ovido de ba se lógica com o er a m
a n t es a s esper a n ça s de ga n h a r .
P ode-se a fir m a r , sem r eceio, qu e a em pr esa qu e depen de de es-
per a n ça s fu t u r a s ben eficia a com u n ida de com o u m t odo. A in icia t iva
in dividu a l, por ém , som en t e ser á a dequ a da qu a n do a pr evisã o r a zoá vel
for secu n da da e su st en t a da pelo din a m ism o, de t a l m a n eir a qu e a
idéia dos pr eju ízos fin a is, qu e fr eqü en t em en t e ven ce os pion eir os, com o
a exper iên cia pr ova t a n t o a n ós qu a n t o a eles, é r epelida do m esm o
m odo qu e o h om em sa u dá vel r epele a pr oba bilida de de su a m or t e.
Ist o sign ifica , in felizm en t e, qu e n ã o só a s cr ises e a s depr essões
t êm a su a in t en sida de a gr a va da , com o qu e a pr osper ida de econ ôm ica
depen de, excessiva m en t e, de u m clim a polít ico e socia l qu e sa t isfa ça
a o t ipo m édio do h om em de n egócios. Qu a n do o t em or de u m gover n o
t r a ba lh ist a ou de N ew Deal depr im e a em pr esa , est a sit u a çã o n ã o é,
n ecessa r ia m en t e, con seqü ên cia de pr evisões ou de m a n obr a s com fi-
n a lida des polít ica s; é o sim ples r esu lt a do de u m t r a n st or n o n o delica do
equ ilíbr io do ot im ism o espon t â n eo. Ao ca lcu la r a s per spect iva s qu e se
ofer ecem a o in vest im en t o devem os leva r em con t a os n er vos e a h ist er ia ,
a lém da s digest ões e da s r ea ções à s con dições clim á t ica s da s pessoa s
de cu ja a t ivida de espon t â n ea ele depen de pr in cipa lm en t e.
Nã o devem os con clu ir da í qu e t u do depen de de on da s de psicologia
ir r a cion a l. P elo con t r á r io, o est a do de expect a t iva a lon go pr a zo é, n o
m a is da s vezes, est á vel e, m esm o qu a n do n ã o o seja , os ou t r os fa t or es
exer cem seu s efeit os com pen sa t ór ios. O qu e a pen a s deseja m os lem br a r
é qu e a s decisões h u m a n a s qu e en volvem o fu t u r o, seja m ela s pessoa is,
polít ica s ou econ ôm ica s, n ã o podem depen der da est r it a expect a t iva
m a t em á t ica , u m a vez qu e a s ba ses pa r a r ea liza r sem elh a n t es cá lcu los
n ã o exist em e qu e o n osso im pu lso in a t o pa r a a a t ivida de é qu e fa z
gir a r a s en gr en a gen s, sen do qu e a n ossa in t eligên cia fa z o m elh or
possível pa r a escolh er o m elh or qu e pode h a ver en t r e a s diver sa s a l-

170
KEYN ES

t er n a t iva s, ca lcu la n do sem pr e qu e se pode, m a s r et r a in do-se, m u it a s


vezes, dia n t e do ca pr ich o, do sen t im en t o ou do a za r .
VIII
H á , a lém disso, ou t r os fa t or es im por t a n t es qu e t en dem a a t en u a r ,
n a pr á t ica , os efeit os da n ossa ign or â n cia do fu t u r o. E m vir t u de do
m eca n ism o do ju r o com post o e da pr oba bilida de de obsolescên cia com
o cor r er do t em po, exist em n u m er osos in vest im en t os in dividu a is cu ja
r en da pr ová vel est á legit im a m en t e dom in a da pelos r en dim en t os n u m
fu t u r o com pa r a t iva m en t e pr óxim o. No ca so da pr in cipa l ca t egor ia de
in vest im en t os a pr a zo m u it o lon go, ou seja , a con st r u çã o, o r isco pode
ser , fr eqü en t em en t e, t r a n sfer ido do in vest idor pa r a o in qu ilin o, ou pelo
m en os pode ser r epa r t ido en t r e a m bos por m eio de con t r a t os a lon go
pr a zo, fica n do o r isco com pen sa do n a m en t e do in qu ilin o pela con t i-
n u ida de e segu r a n ça de seu dir eit o de in qu ilin a t o. No ca so de ou t r a
cla sse im por t a n t e de in vest im en t o a lon go pr a zo, a s em pr esa s de ser -
viços pú blicos, u m a gr a n de pr opor çã o da r en da pr ová vel est á pr a t ica -
m en t e ga r a n t ida pelos pr ivilégios de m on opólio e pelo dir eit o de a u -
m en t a r a s t a r ifa s n a m edida n ecessá r ia pa r a m a n t er cer t a m a r gem
est ipu la da . H á , fin a lm en t e, u m a ca t egor ia cr escen t e de in vest im en t os
em pr een dida em socieda de ou ga r a n t ida pela s a u t or ida des pú blica s,
cla r a m en t e in flu en cia da pela pr esu n çã o ger a l de h a ver va n t a gen s so-
cia is pr ová veis n o in vest im en t o, seja qu a l for seu r esu lt a do com er cia l
den t r o de u m a la r ga m a r gem e sem pr ocu r a r sa ber se a esper a n ça
m a t em á t ica da r en da ser á pelo m en os igu a l à t a xa cor r en t e de ju r os
— em bor a a t a xa qu e a a u t or ida de pú blica t en h a de pa ga r possa a in da
desem pen h a r u m pa pel decisivo n a det er m in a çã o do volu m e da s ope-
r a ções de in vest im en t o a qu e ela pode-se en ga ja r .
Assim , a pós h a ver plen a m en t e a ssin a la do a im por t â n cia da in -
flu ên cia da s m u da n ça s a cu r t o pr a zo n o est a do da s expect a t iva s a
lon go pr a zo, in depen den t em en t e da s va r ia ções n a t a xa de ju r os, a in da
devem os volt a r -n os a essa ú lt im a , qu e exer ce, de qu a lqu er m odo, em
cir cu n st â n cia s n or m a is, gr a n de in flu ên cia , em bor a n ã o decisiva , sobr e
o flu xo de in vest im en t o. Só a exper iên cia , con t u do, pode m ost r a r a t é
qu e pon t o a a dm in ist r a çã o da t a xa de ju r os é ca pa z de est im u la r ,
con t in u a m en t e, u m flu xo de in vest im en t o a dequ a do.
Da m in h a pa r t e sou , pr esen t em en t e, a lgo cét ico qu a n t o a o êxit o
de u m a polít ica m er a m en t e m on et á r ia or ien t a da n o sen t ido de exer cer
in flu ên cia sobr e a t a xa de ju r os. E n con t r a n do-se o E st a do em sit u a çã o
de poder ca lcu la r a eficiên cia m a r gin a l dos ben s de ca pit a l a lon go
pr a zo e com ba se n os in t er esses ger a is da com u n ida de, esper o vê-lo
a ssu m ir u m a r espon sa bilida de ca da vez m a ior n a or ga n iza çã o dir et a
dos in vest im en t os, a in da m a is con sider a n do-se qu e, pr ova velm en t e, a s
flu t u a ções n a est im a t iva do m er ca do da eficiên cia m a r gin a l dos diver sos
t ipos de ca pit a l, ca lcu la da n a for m a descr it a a n t es, ser ã o dem a sia do
gr a n des pa r a qu e se possa com pen sá -la s por m eio de m u da n ça s viá veis
n a t a xa de ju r os.

171
C AP ÍTU LO 13
A Te o ria Ge ra l d a Ta x a d e J u ro s
I

M ost r a m os n o ca pít u lo 11 qu e, em bor a cer t a s for ça s fa ça m su bir


ou descer a t a xa de in vest im en t o de m odo qu e igu a le a eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l à t a xa de ju r os, a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, em
si, é u m con ceit o difer en t e da t a xa de ju r os cor r en t e. P ode-se dizer
qu e a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l gover n a a s con dições em
qu e se pr ocu r a m fu n dos dispon íveis pa r a n ovos in vest im en t os, en qu a n -
t o a t a xa de ju r os gover n a os t er m os em qu e esses fu n dos sã o cor r e-
t a m en t e ofer ecidos. P a r a com plem en t a r a n ossa t eor ia , pr ecisa m os,
por t a n t o, sa ber o qu e det er m in a a t a xa de ju r os.
No ca pít u lo 14 e em seu Apên dice, con sider a r em os a s r espost a s
qu e a t é a gor a for a m da da s a est a per gu n t a . E m t er m os ger a is, ver i-
fica r em os qu e ela s con dicion a m a t a xa de ju r os à in t er a çã o en t r e a
cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e a pr open sã o psicológica a
pou pa r . A t a xa de ju r os ser ia o fa t or de equ ilíbr io qu e est a belece a
igu a lda de en t r e, de u m la do, a dem a n da de pou pa n ça r esu lt a n t e do
in vest im en t o n ovo qu e pode ser r ea liza do a det er m in a da t a xa de ju r os
e, de ou t r o la do, a ofer t a de pou pa n ça , su pr ida essa t a xa pela pr open sã o
psicológica da com u n ida de a pou pa r . Toda via , est a t eor ia vem a ba ixo
t ã o logo se per ceba ser im possível dedu zir a t a xa de ju r os a pa r t ir do
con h ecim en t o dest es dois fa t or es.
Qu a l ser á , por t a n t o, a n ossa pr ópr ia r espost a a est a per gu n t a ?
II
P a r a efet iva r plen a m en t e su a s pr efer ên cia s psicológica s t em po-
r a is, u m in divídu o depa r a -se com dois con ju n t os de decisões a ser em
t om a da s. A pr im eir a r ela cion a -se com a qu ele a spect o de pr efer ên cia
t em por a l qu e den om in ei propen são a con su m ir, fa t or qu e, sob a in -
flu ên cia dos diver sos m ot ivos expost os n o Livr o Ter ceir o, det er m in a

173
OS ECON OMIS TAS

qu e pa r t e de su a r en da ca da in divídu o con su m ir á e qu e pa r t e r eser va r á


sob algu m a for m a de com a n do sobr e o con su m o fu t u r o.
Um a vez t om a da est a decisã o, por ém , ou t r a o esper a , a sa ber ,
em qu e form a con ser va r á o poder de com a n do sobr e o con su m o fu t u r o,
qu er de su a r en da cor r en t e, qu er de su a pou pa n ça a n t er ior . Deseja
con ser vá -lo sob a for m a líqu ida im edia t a (ist o é, em din h eir o ou seu
equ iva len t e)? Ou est á dispost o a a lien a r esse poder a qu isit ivo im edia t o
por u m per íodo específico ou in det er m in a do, deixa n do à sit u a çã o fu t u r a
do m er ca do a fixa çã o da s con dições em qu e pode, se n ecessá r io, con -
ver t er o poder de com a n do post er ga do sobr e ben s específicos em poder
a qu isit ivo im edia t o sobr e ben s em ger a l? E m ou t r a s pa la vr a s, qu a l é
o gr a u de su a preferên cia pela liqu id ez, on de a pr efer ên cia pela liqu idez
do in divídu o é r epr esen t a da por u m a esca la do volu m e dos seu s r ecu r sos
m edidos em t er m os m on et á r ios ou em u n ida des de sa lá r io, qu e deseja
con ser va r em for m a de m oeda em difer en t es cir cu n st â n cia s?
Ver em os qu e, n a s t eor ia s a ceit a s, o er r o con sist iu em qu er er de-
du zir a t a xa de ju r os do pr im eir o dest es dois elem en t os da pr efer ên cia
psicológica t em por a l, n egligen cia n do o segu n do; é est a om issã o qu e
devem os pr ocu r a r r epa r a r .
Dever ia ser óbvio qu e a t a xa de ju r os n ã o pode ser u m r en dim en t o
da pou pa n ça ou da esper a com o t a l. Qu a n do a lgu ém a cu m u la su a s
econ om ia s sob a for m a de din h eir o líqu ido, n ã o ga n h a ju r o, em bor a
econ om ize t a n t o qu a n t o a n t es. P elo con t r á r io, a sim ples defin içã o da
t a xa de ju r os diz-n os, lit er a lm en t e, qu e ela é a r ecom pen sa da r en ú n cia
à liqu idez por u m per íodo det er m in a do, pois a t a xa de ju r os n ã o é,
em si, ou t r a coisa sen ã o o in ver so da r ela çã o exist en t e en t r e u m a som a
de din h eir o e o qu e se pode obt er desist in do, por u m per íodo det er m i-
n a do,105 do poder de com a n do da m oeda em t r oca de u m a dívida .106
Desse m odo, sen do a t a xa de ju r os, a qu a lqu er m om en t o, a r e-
com pen sa da r en ú n cia à liqu idez, é u m a m edida de r elu t â n cia dos qu e
possu em din h eir o a lien a r o seu dir eit o de dispor do m esm o. A t a xa de
ju r os n ã o é o “pr eço” qu e equ ilibr a a dem a n da de r ecu r sos pa r a in vest ir

105 P a r a u m a discu ssã o ger a l, a o con t r á r io dos pr oblem a s con cr et os em qu e o per íodo de débit o
é expr essa m en t e especifica do, é con ven ien t e qu e a t a xa de ju r os sign ifiqu e o com plexo da s
vá r ia s t a xa s cor r en t es pa r a os difer en t es per íodos, ist o é, pa r a dívida s de m a t u r a ções
difer en t es.
106 Sem dist or cer est a defin içã o, podem os t r a ça r a lin h a divisór ia en t r e “din h eir o” e “débit o”
em qu a lqu er pon t o qu e m elh or con vier a o est u do de det er m in a do pr oblem a . P odem os, por
exem plo, con sider a r m oed a qu a lqu er com a n do sobr e o poder ger a l de com pr a do qu a l o
possu idor n ã o a lien a por u m per íodo su per ior a t r ês m eses, e “débit o” o qu e se pode r ecu per a r
em per íodos m a is lon gos. E m vez de t r ês m eses, podem os t a m bém est a belecer u m m ês,
t r ês dia s ou t r ês h or a s ou ou t r o per íodo; ou podem os exclu ir da m oed a t u do qu e n ã o seja
m oeda lega l cor r en t e. É m u it a s vezes con ven ien t e n a pr á t ica in clu ir com o m oed a os depósit os
a pr a zo n os ba n cos e, oca sion a lm en t e, m esm o cer t os in st r u m en t os de cr édit o, com o, por
exem plo, a s Let r a s do Tesou r o. De m odo ger a l, a dot a r ei a m esm a su posiçã o a pr esen t a da
em m in h a obr a T reatise on M on ey, em qu e foi dit o qu e a m oeda com pr een de os depósit os
ba n cá r ios.

174
KEYN ES

e a pr open sã o de a bst er -se do con su m o im edia t o. É o “pr eço” m edia n t e


o qu a l o desejo de m a n t er a r iqu eza em for m a líqu ida se con cilia com
a qu a n t ida de de m oeda dispon ível. Isso im plica qu e, se a t a xa de ju r os
fosse m en or , ist o é, se a r ecom pen sa da r en ú n cia à liqu idez se r edu zisse,
o m on t a n t e a gr ega do de m oeda qu e o pú blico deseja r ia con ser va r ex-
ceder ia a ofer t a dispon ível e qu e, se a t a xa de ju r os se eleva sse, h a ver ia
u m exceden t e de m oeda qu e n in gu ém est a r ia dispost o a r et er . Se est a
explica çã o for cor r et a , a qu a n t ida de de m oeda é ou t r o fa t or qu e, a lia do
à pr efer ên cia pela liqu idez, det er m in a a t a xa cor r en t e de ju r os em
cer t a s cir cu n st â n cia s. A pr efer ên cia pela liqu idez é u m a pot en cia lida de
ou t en dên cia fu n cion a l qu e fixa a qu a n t ida de de m oeda qu e o pú blico
r et er á qu a n do a t a xa de ju r os for da da ; r esu lt a da í qu e r é a t a xa de
ju r os, M a qu a n t ida de de m oeda e L a fu n çã o da pr efer ên cia pela
liqu idez, t er em os M = L (r). Ist o m ost r a on de e com o a qu a n t ida de de
m oeda en t r a n o esqu em a econ ôm ico.
A esta altura, contudo, é necessário que voltemos atrás e exam inemos
por que existe o que se denom ina preferência pela liquidez. Para este
fim , convirá usar a velha distinção entre o uso da moeda para as transações
comerciais correntes e seu uso como reserva de riqueza. No que concerne
ao prim eiro destes usos, é evidente que vale a pena sacrificar, até certo
ponto, alguma quantidade de juro pela conveniência da liquidez. Porém,
dado que a taxa de juros nunca é negativa, por que alguém preferiria
guardar sua riqueza de forma que renda pouco, ou nenhum juro, a con-
servá-la de outra que renda algum (supondo, naturalmente, neste est ágio
que o risco de perda é igual tanto para um depósito bancário quanto para
uma obrigação)? A explicação integral deste fato é complexa e só poderá
ser dada no capítulo 15. Há, todavia, um a condição necessária sem a qual
não poderia existir a preferência de liquidez pela moeda com o m eio de
conservação da riqueza.
E st a con diçã o n ecessá r ia é a exist ên cia de in certeza qu a n t o a o
fu t u r o da t a xa de ju r os, ist o é, qu a n t o a o com plexo de t a xa s pa r a
ven cim en t os va r iá veis a pr eva lecer em da t a s fu t u r a s; pu déssem os, pois,
pr ever com cer t eza t oda s a s t a xa s qu e ir ia m dom in a r n o fu t u r o, t oda s
a s t a xa s vin dou r a s poder ia m ser in fer ida s da s t a xa s presen tes pa r a a s
dívida s de diver sos ven cim en t os e est a s se a ju st a r ia m a o va lor con h e-
cido da s t a xa s fu t u r a s. P or exem plo, se 1 d r é o va lor , n o pr esen t e a n o
1, de 1 libr a , difer idos r a n os, e se sa be qu e n d r ser á o va lor , n o a n o
n , de 1 libr a difer idos r a n os a pa r t ir da qu ela da t a , t er em os: n d r =
d
1 n + r
; de on de se dedu z qu e a t a xa a qu e u m a dívida qu a lqu er pode
1d n
ser con ver t ida em din h eir o n a n os m a is t a r de ser á det er m in a da por
du a s en t r e o com plexo de t a xa s de ju r os cor r en t es. Se a t a xa cor r en t e
for posit iva pa r a a s dívida s de qu a lqu er pr a zo, ser á sem pr e m a is va n -
t a joso a dqu ir ir u m a dívida do qu e con ser va r a r iqu eza em for m a de
din h eir o líqu ido.

175
OS ECON OMIS TAS

Se, pelo con t r á r io, a t a xa fu t u r a for in cer t a , n ã o m a is podem os


in fer ir com segu r a n ça qu e, ch ega n do o m om en t o, n d r ser á efet iva m en t e
d
1 n + r
igu a l a . P or isso, n o ca so con cebível de poder pr odu zir -se even -
1d n
t u a lm en t e u m a n ecessida de de liqu idez a n t es de expir a r em os n a n os,
h á o r isco de se in cor r er em per da n a a qu isiçã o de u m a dívida a lon go
pr a zo a o con ver t ê-la , depois, em din h eir o, com pa r a t iva m en t e a t er con -
ser va do o din h eir o en qu a n t o t a l. O lu cr o a t u a r ia l ou esper a n ça m a t e-
m á t ica de ga n h o ca lcu la do n a ba se da s pr oba bilida des exist en t es —
ca so esse cá lcu lo possa ser feit o, o qu e é du vidoso — deve ser su ficien t e
pa r a com pen sa r o r isco de r eveses.
H á , a lém disso, ou t r a r a zã o pa r a a pr efer ên cia pela liqu idez r e-
su lt a n t e da in cer t eza qu a n t o a o fu t u r o da t a xa de ju r os, desde qu e
h a ja u m m er ca do or ga n iza do pa r a n egocia r com débit os. Ca da qu a l
pr evê o fu t u r o a su a m a n eir a e a qu ele qu e diver gir da opin iã o dom i-
n a n t e, t a l com o ela se m a n ifest a n a s cot a ções do m er ca do, pode t er
boa s r a zões pa r a con ser va r r ecu r sos líqu idos com o fim de r ea liza r u m
lu cr o se est iver cer t o, a o com pr ova r n o m om en t o opor t u n o qu e a s r e-
la ções en t r e os 1 d r est a va m er r a da s.107
E st e fen ôm en o t em m u it a a n a logia com o qu e já a bor da m os, com
cer t a a m plit u de, a o t r a t a r da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. Assim
com o a ch a m os qu e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l n ã o é det er m in a da
pela “m elh or ” opin iã o e sim pela a va lia çã o do m er ca do t a l com o ela
r esu lt a da psicologia de m a ssa s, a ssim t a m bém a s expect a t iva s qu a n t o
a o fu t u r o da t a xa de ju r os, fixa da pela psicologia de m a ssa , t êm seu s
r eflexos n a pr efer ên cia pela liqu idez; com o a cr éscim o, por ém , de qu e
o in divídu o, pa r a qu em a s fu t u r a s t a xa s de ju r os est a r ã o a cim a da qu ela s
pr evist a s pelo m er ca do, t em m ot ivos pa r a con ser va r em ca ixa din h eir o
líqu ido,108 a o pa sso qu e qu em diver ge do m er ca do em sen t ido opost o
t er á m ot ivos pa r a pedir din h eir o em pr est a do a cu r t o pr a zo, a fim de
a dqu ir ir débit os a pr a zo m a is lon go. O pr eço do m er ca do se fixa r á n o
n ível em qu e a ven da dos “ba ixist a s” se equ ilibr a r com a s com pr a s
dos “a lt ist a s”.
As t r ês divisões qu e a ca ba m os de dist in gu ir n a pr efer ên cia pela
liqu idez podem ser defin ida s pelos m ot ivos qu e a s gover n a m : (i) o m ot ivo
t r a n sa çã o, ist o é, a n ecessida de de m oeda pa r a a s oper a ções cor r en t es
de t r oca s pessoa is e com er cia is; (ii) o m ot ivo pr eca u çã o, ou seja , o

107 E st e é o m esm o pon t o qu e discu t i em m in h a obr a T reatise on M on ey, sob a design a çã o


da s du a s opin iões e da posiçã o em “a lt a ” e em “ba ixa ”.
108 P oder -se-ia su por , da m esm a m a n eir a , qu e, se u m in divídu o a ch a sse qu e o r en dim en t o
pr ová vel dos in vest im en t os fosse in fer ior a o pr evist o pelo m er ca do, t er ia r a zã o su ficien t e
pa r a con ser va r din h eir o. Ma s n ã o é esse o ca so. E le t em bon s m ot ivos pa r a r et er m oeda
ou dívida s de pr efer ên cia a a ções; t oda via , a a qu isiçã o de u m t ít u lo de dívida ser á u m a
a lt er n a t iva pr efer ível à de gu a r da r din h eir o, a n ã o ser qu e ele ju lgu e t a m bém qu e a t a xa
fu t u r a de ju r os seja su per ior à qu e su põe o m er ca do.

176
KEYN ES

desejo de segu r a n ça com r ela çã o a o equ iva len t e do va lor m on et á r io


fu t u r o de cer t a pa r t e dos r ecu r sos t ot a is; e (iii) o m ot ivo especu la çã o,
ist o é, o pr opósit o de obt er lu cr os por sa ber m elh or qu e o m er ca do o
qu e t r a r á o fu t u r o. Ta l com o qu a n do discu t im os a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, a qu est ã o de sa ber se é desejá vel t er u m m er ca do or ga n iza do
pa r a a n egocia çã o de débit os n os coloca dia n t e de u m dilem a : n a a u -
sên cia de u m m er ca do or ga n iza do, a pr efer ên cia pela liqu idez, devida
a o m ot ivo de pr eca u çã o, a u m en t a r ia m u it o, a o pa sso qu e a exist ên cia
de um mercado organizado proporcionaria a oportunidade de amplas flu-
tuações da preferência pela liquidez, devida ao m otivo de especulação.
Ta lvez se escla r eça est e r a ciocín io a t r a vés do segu in t e a r gu m en t o:
su pon do qu e a pr efer ên cia pela liqu idez devida a o m ot ivo t r a n sa çã o e
a o m ot ivo pr eca u çã o a bsor va u m a qu a n t ida de de m oeda qu e n ã o seja
m u it o sen sível à in flu ên cia dir et a da s a lt er a ções n a t a xa de ju r os, sem
leva r em con t a su a s r ea ções devida s a o a u m en t o da r en da , a qu a n t ida de
t ot a l de m oeda , dim in u ída dessa qu a n t ida de, fica , a ssim , dispon ível
pa r a sa t isfa zer a pr efer ên cia pela liqu idez devido a o m ot ivo especu la çã o.
A t a xa de ju r os e o pr eço da s obr iga ções devem , en t ã o, fixa r -se a o
n ível em qu e a som a globa l, qu e cer t os in divídu os deseja m con ser va r
líqu ida (por qu e n esse n ível se sen t em “ba ixist a s” r ela t iva m en t e a o fu -
t u r o da s obr iga ções), seja exa t a m en t e igu a l à qu a n t ida de de m oeda
dispon ível pa r a a t en der à s a t ivida des do m ot ivo de especu la çã o. Des-
t a r t e, ca da a u m en t o n a qu a n t ida de de din h eir o deve a u m en t a r o pr eço
da s obr iga ções o su ficien t e pa r a exceder a s pr evisões de a lgu n s “altistas”
e in flu ir sobr e eles pa r a qu e a s ven da m e ven h a m ju n t a r -se a o gr u po
dos “ba ixist a s”. Nã o obst a n t e, se h ou ver u m a pr ocu r a in sign ifica n t e
de m oeda pa r a sa t isfa zer o m ot ivo de especu la çã o, excet o pa r a u m
cu r t o per íodo de t r a n siçã o, u m a u m en t o da qu a n t ida de de m oeda deve
fa zer ba ixa r , qu a se im edia t a m en t e, a t a xa de ju r os e n o gr a u n ecessá r io
pa r a eleva r o n ível de em pr ego e a u n ida de de sa lá r ios n a m edida
su ficien t e pa r a qu e a m oeda a dicion a l seja a bsor vida pelos m ot ivos de
t r a n sa çã o e de pr eca u çã o.
Via de r egr a , podem os a dm it ir qu e a cu r va da pr efer ên cia pela
liqu idez qu e r ela cion a a qu a n t ida de de m oeda à t a xa de ju r os é da da
por u m a cu r va r egu la r , a qu a l m ost r a qu e essa t a xa va i decr escen do
à m edida qu e a qu a n t ida de de m oeda a u m en t a . H á diver sa s ca u sa s
qu e leva m a esse r esu lt a do.
E m pr im eir o lu ga r , à m edida qu e a t a xa de ju r os ba ixa , é pr ová vel,
coeteris paribu s, qu e a pr efer ên cia pela liqu idez, em vir t u de do m ot ivo
de t r a n sa çã o, a bsor va m a is m oeda . Se a qu eda da t a xa de ju r os a u m en t a
a r en da n a cion a l, o volu m e de m oeda qu e con vém r eser va r pa r a a s
t r a n sa ções cr escer á m a is ou m en os pr opor cion a lm en t e com o a u m en t o
da r en da , en qu a n t o, a o m esm o t em po, dim in u ir á o cu st o da con ven iên -
cia de m a n t er a bu n da n t e a m oeda , em t er m os dos ju r os per didos. Re-
su lt a dos a n á logos ser ã o pr odu zidos se o a u m en t o de em pr ego qu e segu e

177
OS ECON OMIS TAS

a u m a ba ixa da t a xa de ju r os det er m in a u m a a lt a dos sa lá r ios, ist o


é, u m a a lt a n o va lor m on et á r io da u n ida de de sa lá r ios, a n ã o ser qu e
a pr efer ên cia pela liqu idez seja m edida em u n ida des de sa lá r io em
vez de u n ida des de m oeda (qu e é con ven ien t e em cer t os con t ext os).
E m segu n do lu ga r , ca da qu eda n a t a xa de ju r os pode, com o a ca ba m os
de ver , a u m en t a r a qu a n t ida de de m oeda qu e cer t os in divídu os deseja m
con ser va r , por qu e seu s pon t os de vist a qu a n t o à fu t u r a t a xa de ju r os
difer em dos do m er ca do.
No en t a n t o, podem ocor r er det er m in a da s cir cu n st â n cia s em qu e
m esm o u m a cr éscim o con sider á vel da qu a n t ida de de m oeda exer cer á
u m a in flu ên cia com pa r a t iva m en t e pequ en a sobr e a t a xa de ju r os. E sse
gr a n de a cr éscim o pode oca sion a r t a l in cer t eza qu a n t o a o fu t u r o qu e a
pr efer ên cia pela liqu idez decor r en t e do m ot ivo pr eca u çã o pode ser for -
t a lecida ; por ou t r o la do, é possível qu e h a ja u m a opin iã o t ã o u n â n im e
sobr e a fu t u r a t a xa de ju r os qu e u m a ligeir a va r ia çã o n a s t a xa s a t u a is
det er m in e u m m ovim en t o m a ciço em dir eçã o à bu sca da liqu idez. É
in t er essa n t e obser va r com o a est a bilida de do sist em a e su a sen sibili-
da de dia n t e da s va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda depen dem a t a l
pon t o da exist ên cia de u m a d iversid ad e de opin iões sobr e o qu e é in cer t o.
O m elh or ser ia qu e con h ecêssem os o fu t u r o. Ma s, n ã o sen do est e o
ca so, se t iver m os de con t r ola r a a t ivida de do sist em a econ ôm ico a t r a vés
da va r ia çã o da qu a n t ida de de m oeda , é im por t a n t e qu e h a ja diver gên -
cia s de opin iã o. Assim sen do, est e m ét odo de con t r ole é m a is pr ecá r io
n os E st a dos Un idos, on de t odos t en dem a a dot a r a m esm a opin iã o a o
m esm o t em po, do qu e n a In gla t er r a , on de a s diver gên cia s de opin iã o
sã o m a is com u n s.
III

Introduzimos, assim , a m oeda em nosso nexo causal e podemos ter


uma primeira idéia do modo com o as variações na quantidade de moeda
intervêm no sistem a econôm ico. Contudo, se nos vemos tentados a con-
siderar a m oeda com o a bebida que estimula a atividade do sistem a, não
nos esqueçamos que podem surgir m uitos percalços entre a taça e os
lábios. E mbora seja de esperar que, coeteris paribus, um aum ento na
quantidade de m oeda reduza a taxa de juros, isto não ocorrerá se a pre-
ferência do público pela liquidez aumentar mais que a quantidade de
moeda; e, conquanto se possa esperar que, coeteris paribus, um a baixa
na taxa de juros estimule o fluxo de investim ento, isto não acontecerá se
a escala da eficiência m arginal do capital cair m ais rapidamente que a
taxa de juros; quando, enfim , se possa esperar que, coeteris paribus, um
aumento do fluxo de investimento faça aumentar o em prego, isso não se
produzirá se a propensão a consum ir estiver em declínio. Finalm ente, se
o emprego aumentar, os preços subirão num a proporção que depende, em
parte, da forma das funções da oferta e, em parte, da tendência da taxa
de salários subir em term os monetários. Quando a produção tiver au-

178
KEYN ES

m en t a do e os pr eços su bido o efeit o qu e da í r esu lt a r á sobr e a pr efer ên cia


pela liqu idez ser á o de a u m en t a r a qu a n t ida de de m oeda n ecessá r ia
pa r a a u m en t a r da da t a xa de ju r os.
IV
Embora a preferência pela liquidez devida ao m otivo especulação
corresponda ao que em minha obra T reatise on Money denominei “o estado
da baixa”, estes dois conceitos não são, de modo algum, idênticos. Esse
“baixismo” não foi definido naquela obra como a relação funcional entre a
taxa de juros (ou preços das dívidas) e a quantidade de moeda, mas entre
o preço de ativos e débitos, tom ados em conjunto, e quantidade de moeda.
Este conceito, entretanto, envolve certa confusão entre os resultados de-
correntes da variação na taxa de juros e aqueles oriundos da variação na
escala da eficiência marginal do capital — o que espero ter evitado aqui.
V
O con ceit o de en tesou ram en to pode ser con sider a do u m a pr im eir a
a pr oxim a çã o do con ceit o de preferên cia pela liqu id ez. De fa t o, se su bs-
t it u íssem os “en t esou r a m en t o” por “pr open sã o a en t esou r a r ”, ch ega r ía -
m os, su bst a n cia lm en t e, a o m esm o r esu lt a do. P or ém , qu a n do por “en -
t esou r a m en t o” qu er em os sign ifica r u m a u m en t o efet ivo dos en ca ixes
líqu idos, ist o se con figu r a com o u m a idéia in com plet a — e qu e pode
ca u sa r sér ios er r os se for m os leva dos a pen sa r em “en t esou r a m en t o”
e “n ã o en t esou r a m en t o” com o sim ples a lt er n a t iva s. A decisã o de en -
t esou r a r n ã o é t om a da de m a n eir a a bsolu t a ou sem leva r em con t a a s
va n t a gen s ofer ecida s pela r en ú n cia à liqu idez; essa decisã o r esu lt a do
equ ilíbr io de va n t a gen s e t em os, por t a n t o, de sa ber o qu e h á n o ou t r o
pr a t o da ba la n ça . Adem a is, é im possível qu e o m on t a n t e r ea l do en -
t esou r a m en t o va r ie com o r esu lt a do da s decisões do pú blico, desde qu e
con sider em os o “en t esou r a m en t o” com o sen do o en ca ixe efet ivo de m oe-
da . O volu m e de en t esou r a m en t o t em de ser igu a l à qu a n t ida de de
m oeda (ou — segu n do cer t a s defin ições — à qu a n t ida de de m oeda
m en os o qu e se r equ er pa r a sa t isfa zer o m ot ivo t r a n sa çã o), e a qu a n -
t ida de de m oeda n ã o é det er m in a da pelo pú blico. A ú n ica coisa qu e a
pr open sã o do pú blico a en t esou r a r pode con segu ir é fixa r a t a xa de
ju r os qu e igu a le o desejo globa l de en t esou r a r a o en ca ixe dispon ível.
O h á bit o de n ã o se da r a devida a t en çã o à r ela çã o da t a xa de ju r os
com o en t esou r a m en t o pode explica r , em pa r t e, a r a zã o pela qu a l o
ju r o t em sido u su a lm en t e con sider a do u m a r ecom pen sa por n ã o ga st a r ,
qu a n do, n a r ea lida de, ele é a r ecom pen sa por n ã o en t esou r a r .

179
C AP ÍTU LO 14
A Te o ria Clá s s ic a d a Ta x a d e J u ro s

Q u e é a t eor ia clá ssica da t a xa de ju r os? Tr a t a -se da t eor ia qu e


ser viu de ba se pa r a a for m a çã o de t odos n ós e qu e, a t é r ecen t em en t e,
t odos n ós a ceit a m os qu a se sem r eser va s. Mesm o a ssim , pa r ece-m e difícil
expô-la com pr ecisã o ou descobr ir -lh e u m en u n cia do explícit o n os pr in -
cipa is t r a t a dos da escola clá ssica m oder n a .109
É ba st a n t e cla r o, en t r et a n t o, qu e essa t r a diçã o con sider ou a t a xa
de ju r os o fa t or qu e equ ilibr a a dem a n da de in vest im en t os com a ofer t a
pa r a a pou pa n ça . O in vest im en t o r epr esen t a a dem a n da por r ecu r sos
pa r a in vest ir , a pou pa n ça r epr esen t a a ofer t a , e a t a xa de ju r os é o
“pr eço” dos r ecu r sos in vest íveis qu e t or n a essa s du a s qu a n t ida des
igu a is. Da m esm a for m a qu e o pr eço de u m a m er ca dor ia é fixa do,
n ecessa r ia m en t e, a o n ível em qu e su a pr ocu r a seja igu a l à ofer t a , a
t a xa de ju r os se r egu la , n ecessa r ia m en t e, sob a a çã o da s for ça s do
m er ca do, n o pon t o em qu e o m on t a n t e de in vest im en t o a essa t a xa
seja igu a l a o m on t a n t e de pou pa n ça à m esm a t a xa .
O r a ciocín io a cim a n ã o é en con t r a do, n esses m esm os t er m os, n os
Prin ciples de Ma r sh a ll. Nã o obst a n t e, pa r ece ser est a a su a t eor ia , a
m esm a em qu e t a m bém fu i edu ca do e qu e, por m eu t u r n o, en sin ei a
ou t r os por m u it os a n os. Tom em os, por exem plo, a segu in t e pa ssa gem
dos Prin ciples: “O ju r o, sen do o pr eço pa go pelo u so do ca pit a l em
qu a lqu er m er ca do, t en de a u m n ível de equ ilíbr io t a l qu e a pr ocu r a
a gr ega da de ca pit a l n o dit o m er ca do, a essa t a xa de ju r os, é igu a l a o
est oqu e a gr ega do, qu e n ele se a pr esen t a à m esm a t a xa ”.110 Do m esm o
m odo, em N atu re an d N ecessity of In terest, o pr ofessor Ca ssel explica
qu e o in vest im en t o con st it u i a “pr ocu r a da esper a ”, a pou pa n ça a “ofer t a

109 Ver n o Apên dice a est e ca pít u lo u m r esu m o do qu e foi possível en con t r a r .
110 Cf. p. 133, pa r a u m a a n á lise com plem en t a r sobr e est a pa ssa gem .

181
OS ECON OMIS TAS

da esper a ”, e o ju r o é u m “pr eço” qu e ser ve — ist o est á su ben t en dido


— pa r a t or n a r a s du a s qu a n t ida des igu a is, m a s t a m bém n ã o en con t r ei
n en h u m t r ech o pa r a cit a r . No ca pít u lo 6 de su a obr a Distribu tion of
Wealth o pr ofessor Ca r ver con sider a , cla r a m en t e, o ju r o com o o fa t or
qu e põe em equ ilíbr io a desu t ilida de m a r gin a l da esper a com a pr o-
du t ivida de m a r gin a l do ca pit a l.111 Sir Alfr ed F lu x (E con om ic Prin ciples,
p. 95) escr eve:
“Se h á ver da de n a s t eses da n ossa a r gu m en t a çã o ger a l, t em -se
de a dm it ir qu e se pr odu z u m a ju st e a u t om á t ico en t r e a pou pa n ça
e a s opor t u n ida des de em pr ega r o ca pit a l lu cr a t iva m en t e... A
pou pa n ça n ã o t er á u lt r a pa ssa do a su a possibilida de de a plica çã o
ú t il..., en qu a n t o a t a xa de ju r os líqu ida for su per ior a zer o”.
O pr ofessor Ta u ssig (Prin ciples, v. II, p. 29) t r a ça u m a cu r va da ofer t a
de pou pa n ça e u m a cu r va da pr ocu r a r epr esen t a n do “a pr odu t ivida de
decr escen t e de su cessivos volu m es de ca pit a l”, t en do pr evia m en t e es-
t a belecido (p. 20) qu e “a t a xa de ju r os se est a biliza n u m pon t o em qu e
a pr odu t ivida de m a r gin a l do ca pit a l é su ficien t e pa r a fa zer su r gir o
volu m e de pou pa n ça ”.112 Wa lr a s, n o Apên dice I (III) de su a obr a É lé-
m en ts d ’écon om ie pu re, on de se ocu pa de “L’éch a n ge d’épa r gn es con t r e
ca pit a u x n eu fs”, su st en t a expr essa m en t e qu e cor r espon den do a ca da
possível t a xa de ju r os h á u m a som a qu e os in divídu os pou pa m e ou t r a
qu e in vest ir ã o em n ovos ben s de ca pit a l; qu e est es dois a gr ega dos
t en dem a igu a la r -se e qu e a t a xa de ju r os é a va r iá vel qu e os igu a la ;
de t a l m odo qu e est a se fixa n o n ível em qu e a pou pa n ça , qu e r epr esen t a
a ofer t a de ca pit a l n ovo, é igu a l à pr ocu r a do m esm o. Dia n t e disso,
ele se coloca , r igor osa m en t e, den t r o da t r a diçã o clá ssica .
Cer t a m en t e, o h om em pr á t ico — ba n qu eir o, fu n cion á r io pú blico
ou polít ico —, edu ca do n a t eor ia t r a dicion a l e, t a m bém , o econ om ist a
pr ofission a l vivem n a idéia de qu e sem pr e qu e u m in divídu o r ea liza
u m a t o de pou pa n ça fa z a lgo qu e, a u t om a t ica m en t e, r edu z a t a xa de
ju r os e qu e essa ba ixa est im u la , a u t om a t ica m en t e, a cr ia çã o de ca pit a l
e de qu e a ba ixa n a t a xa de ju r os t em lu ga r , pr ecisa m en t e, n a pr opor çã o
qu e se n ecessit a pa r a est im u la r a pr odu çã o de ca pit a l n u m a a m plit u de

111 A a n á lise do pr of. Ca r ver sobr e o ju r o é difícil de ser a com pa n h a da 1) por qu e n ã o escla r ece
o sen t ido da “pr odu t ivida de m a r gin a l do ca pit a l”, ist o é, se se t r a t a de qu a n t ida de de
pr odu t o m a r gin a l ou de va lor do pr odu t o m a r gin a l e 2) por qu e n ã o pr ocu r a defin ir a
qu a n t ida de de ca pit a l.
112 Nu m a a n á lise m u it o r ecen t e dest es pr oblem a s (KNIGH T, P r of. F . H . “Ca pit a l, Tim e a n d
t h e In t er est Ra t e”. In : E con om ica. Agost o de 1934), a qu a l in clu i m u it a s obser va ções pr o-
fu n da s e in t er essa n t es sobr e a n a t u r eza do ca pit a l e con fir m a a solidez da t r a diçã o m a r s-
h a llia n a sobr e a in u t ilida de da a n á lise de Böh m -Ba wer k, a t eor ia do ju r o é a pr esen t a da
de m a n eir a pr ecisa e con for m e a t r a diçã o clá ssica . O equ ilíbr io n o dom ín io da pr odu çã o
de ca pit a l sign ifica , segu n do o pr of. Kn igh t , “u m a t a xa de ju r os t a l qu e a s pou pa n ça s
a flu a m a o m er ca do ju st a m en t e a u m r it m o ou velocida de igu a is à su a a bsor çã o pelos
in vest im en t os qu e pr odu zem u m a t a xa de r en dim en t o igu a l à pa ga pelo seu u so a os qu e
fa zem pou pa n ça ”.

182
KEYN ES

igu a l a o a u m en t o da pou pa n ça ; e de qu e ist o é, a lém do m a is, u m


fen ôm en o de a ju st a m en t o a u t o-r egu la dor qu e oper a sem n ecessida de
de n en h u m a in t er ven çã o especia l ou de cu ida dos m a t er n a is por pa r t e
da a u t or ida de m on et á r ia . De m a n eir a idên t ica — e est a é u m a cr en ça
a in da m a is gen er a liza da , m esm o h oje —, ca da a t o a dicion a l de in ves-
t im en t o fa r á , n ecessa r ia m en t e, su bir a t a xa de ju r os, se n ã o for com -
pen sa do por u m a m u da n ça n a disposiçã o pa r a pou pa r .
Or a , a a n á lise dos ca pít u los a n t er ior es eviden cia qu e est a expli-
ca çã o da m a t ér ia deve ser er r ôn ea . An t es de r em on t a r à or igem da
diver gên cia en t r e a s du a s opin iões, ocu pem o-n os, em pr im eir o lu ga r ,
dos seu s pon t os de con cor dâ n cia .
Ao con t r á r io da escola n eoclá ssica , qu e ju lga possível a desigu a l-
da de en t r e a pou pa n ça e o in vest im en t o, a escola clá ssica pr opr ia m en t e
dit a a dm it iu o pr in cípio de su a igu a lda de. Ma r sh a ll, por exem plo, a cr e-
dit a va , com cer t eza , em bor a n ã o o t en h a dit o expr essa m en t e, qu e a
pou pa n ça a gr ega da e o in vest im en t o a gr ega do sã o n ecessa r ia m en t e
igu a is. De fa t o, a m a ior ia dos m em br os da escola clá ssica levou est a
cr en ça dem a sia da m en t e lon ge, vist o su st en t a r qu e t odo a t o in dividu a l
de a u m en t o n a pou pa n ça su scit a , n ecessa r ia m en t e, ou t r o cor r espon -
den t e a t o de a u m en t o de in vest im en t o. No pr esen t e con t ext o, t a m bém
n ã o h á u m a difer en ça su bst a n cia l en t r e m in h a esca la de eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l ou da esca la da pr ocu r a de in vest im en t o e a cu r va
da pr ocu r a de ca pit a l com o a con sider a va m a lgu n s dos a u t or es clá ssicos
a n t es cit a dos. Qu a n do ch ega m os à pr open sã o a con su m ir e a o seu
cor olá r io, a pr open sã o a pou pa r , est a m os m a is pr óxim os de u m a dife-
r en ça de opin iã o, pois os econ om ist a s clá ssicos en fa t iza r a m o pa pel
r epr esen t a do pela t a xa de ju r os n a s va r ia ções da pr open sã o a pou pa r .
Ma s, pr esu m ivelm en t e, eles n ã o deseja r ia m n ega r qu e o n ível de r en da
exer ce u m a in flu ên cia t a m bém im por t a n t e sobr e o t ot a l pou pa do; en -
qu a n t o, da m in h a pa r t e, n ã o n ega r ia qu e a t a xa de ju r os possa , t a lvez,
in flu ir (em bor a , a liá s, n ã o n a for m a qu e eles su põem ) sobr e a pa r t e
pou pa da d e d ad a ren d a. Todos est es pon t os de con cor dâ n cia podem
ser r esu m idos n u m a pr oposiçã o qu e a escola clá ssica a ceit a r ia e eu
n ã o con t est a r ia , ou seja , qu e, se se su põe con h ecido de a n t em ã o o n ível
de r en da , podem os in fer ir qu e a t a xa cor r en t e de ju r os deve est a r n o
pon t o on de a cu r va da dem a n da por ca pit a l cor r espon den t e à s difer en t es
t a xa s in t er cept a a cu r va de ofer t a da s qu a n t ida des pou pa da s dessa
r en da a difer en t es t a xa s de ju r os.
Ma s est e é o pon t o em qu e u m er r o decisivo se in sin u a n a t eor ia
clá ssica . Se a pr oposiçã o a n t er ior da escola clá ssica se lim it a sse a de-
du zir qu e, da da s a cu r va da pr ocu r a de ca pit a l e a in flu ên cia da s
va r ia ções n a t a xa de ju r os sobr e a disposiçã o a pou pa r pa r t in do de
det er m in a dos n íveis de r en da , a r en da e a t a xa de ju r os devem t er
u m a cor r ela çã o ba st a n t e sin gu la r , n est e ca so, n a da h a ver ia a opor .
Além disso, essa pr oposiçã o leva r ia , n a t u r a lm en t e, a ou t r a pr oposiçã o

183
OS ECON OMIS TAS

qu e con t ém u m a ver da de im por t a n t e, ou seja , da da s a t a xa de ju r os,


a cu r va da pr ocu r a de ca pit a l e a in flu ên cia dos ju r os sobr e a disposiçã o
a pou pa r de n íveis de r en da con h ecidos, o n ível de r en da deve ser o
fa t or qu e igu a la o m on t a n t e pou pa do com o m on t a n t e in vest ido. A
t eor ia clá ssica , por ém , n ã o a pen a s ign or a a in flu ên cia da s va r ia ções
do n ível da r en da , com o a in da pr om ove u m er r o for m a l.
Dessa for m a , a t eor ia clá ssica , com o pr ova m a s cit a ções a cim a ,
su põe qu e se pode pr oceder a o exa m e do efeit o pr odu zido sobr e a t a xa
de ju r os por u m desloca m en t o da cu r va de dem a n da por ca pit a l (por
exem plo), sem con t r a dizer ou m odifica r a h ipót ese r ela t iva a o n ível da
r en da da do do qu a l va i fa zer -se a pou pa n ça . Na t eor ia clá ssica da t a xa
de ju r os a s va r iá veis in depen den t es sã o a cu r va da dem a n da por ca pit a l
e a in flu ên cia da t a xa de ju r os sobr e a pa r t e de da da r en da qu e se
pou pa ; e, qu a n do (por exem plo) a cu r va de dem a n da por ca pit a l se
desloca , a n ova t a xa de ju r os, de a cor do com est a t eor ia , é da da pelo
pon t o de in t er seçã o dessa n ova cu r va com a qu e r ela cion a a t a xa de
ju r os com os m on t a n t es qu e ser ã o pou pa dos dessa da da r en da . A t eor ia
clá ssica da t a xa de ju r os pa r ece su por qu e se a cu r va de dem a n da por
ca pit a l se desloca ou a qu e liga a t a xa com os m on t a n t es pou pa dos de
da da r en da se desloca ou se a m ba s se desloca m , a n ova t a xa de ju r os
ser á det er m in a da pelo pon t o de in t er seçã o da s n ova s posições da s du a s
cu r va s. Ma s essa é u m a t eor ia a bsu r da , pois a h ipót ese de qu e a r en da
seja con st a n t e n ã o é com pa t ível com a de qu e est a s du a s cu r va s podem
desloca r -se, in depen den t em en t e u m a da ou t r a . Se qu a lqu er dela s se
desloca , em ger a l, a r en da va r ia t a m bém e, por con seqü ên cia , t odo o
esqu em a ba sea do n a h ipót ese de ca da r en da se desin t egr a . A posiçã o
só poder ia ser sa lva por u m a com plica da h ipót ese qu e pr evisse u m a
va r ia çã o a u t om á t ica n a u n ida de de sa lá r ios, com efeit o sobr e a pr efe-
r ên cia pela liqu idez de t a l m a gn it u de qu e ba st a sse exa t a m en t e pa r a
est a belecer u m a t a xa de ju r os su ficien t e pa r a com pen sa r o su post o
desloca m en t o de m odo qu e deixa sse a pr odu çã o n o m esm o n ível pr évio.
De fa t o, n ã o se en con t r a n os a u t or es cit a dos n en h u m a su gest ã o sobr e
a n ecessida de de sem elh a n t e h ipót ese, a qu a l, n a m elh or da s cir -
cu n st â n cia s, só ser ia possível t r a t a n do-se de u m equ ilíbr io a lon go
pr a zo, m a s qu e n ã o pod er ia ser vir de ba se a u m a t eor ia de pr a zo
cu r t o; en t r et a n t o, t a m pou co h á r a zã o pa r a su por qu e ela t en h a va -
lidez pa r a o lon go p r a zo. Na ver da de, a t eor ia clá ssica n ã o se m a n t eve
a ler t a pa r a a im p or t â n cia d a s va r ia ções do n ível d e r en da ou p a r a
a possibilida de de qu e est e n ível seja efet iva m en t e u m a fu n çã o da
t a xa de in vest im en t o.
Os a r gu m en t os a cim a podem ser ilu st r a dos por m eio do dia gr a -
m a 113 segu in t e:

113 E st e dia gr a m a foi-m e su ger ido por R. F . H a r r od. Cf. t a m bém u m esqu em a , em pa r t e
sem elh a n t e, de ROBE RTSON, D. H . E con om ic J ou rn al. Dezem br o de 1934. p. 652.

184
KEYN ES

Nest e dia gr a m a , o m on t a n t e do in vest im en t o (ou da pou pa n ça )


I é m edido ver t ica lm en t e e a t a xa de ju r os r h or izon t a lm en t e. X 1 X 1 & é
a pr im eir a posiçã o da cu r va da pr ocu r a de in vest im en t o e X 2 X 2 & é a
segu n da posiçã o dest a cu r va . A cu r va Y 1 r ela cion a os m on t a n t es pou -
pa dos de u m a r en da Y 1 com os vá r ios n íveis da t a xa de ju r os, sen do
Y 2 , Y 3 et c. a s cu r va s cor r espon den t es pa r a n íveis de r en da Y 2, Y 3 et c.
Su pon h a m os qu e Y 1 seja a cu r va Y com pa t ível com u m a t a xa de ju r os
r 1 e u m a cu r va da pr ocu r a de in vest im en t o X 1 X 1 &. Or a , se a cu r va da
pr ocu r a de in vest im en t o se desloca de X 1 X 1 & pa r a X 2 X 2 , em ger a l a
r en da se desloca r á t a m bém . E n t r et a n t o, o dia gr a m a a cim a n ã o con t ém
d ad os su ficien t es pa r a n os in dica r qu a l ser á o n ovo va lor ; e, por t a n t o,
n ã o sa ben do qu a l é a cu r va Y a pr opr ia da , n ã o sa bem os em qu e pon t o
ela ser á cor t a da pela n ova cu r va -dem a n da dos in vest im en t os. Toda via ,
se con sider a r m os o est a do da pr efer ên cia pela liqu idez e a qu a n t ida de
de m oeda e, con h ecidos est es dois fa t or es, sou ber m os qu e a t a xa de
ju r os é r 2 , en t ã o, t oda a posiçã o fica det er m in a da . A cu r va Y qu e cor t a
X 2 X 2 & n o pon t o sit u a do n a ver t ica l a cim a de r 2 , a sa ber , a cu r va Y 2 ,
ser á a cu r va a pr opr ia da . Dest a for m a , a cu r va X e a s cu r va s Y n a da
n os dizem sobr e a t a xa de ju r os. Apen a s n os in dica m qu a l ser á a
r en da , sem pr e qu e por ou t r os m eios possa m os det er m in a r qu a l a t a xa
de ju r os. Se n ã o h ou ver n en h u m a a lt er a çã o n o est a do da pr efer ên cia
pela liqu idez n em n a qu a n t ida de de m oeda , de m odo qu e a t a xa de
ju r os per m a n eça in va r iá vel, en t ã o a cu r va Y 2& qu e cor t a a n ova cu r va
de dem a n da dos in vest im en t os a ba ixo do pon t o on de a cu r va Y 1 cor t a va
a a n t iga cu r va da dem a n da ser á a cu r va Y a pr opr ia da e Y 2 ’ ser á o
n ovo n ível de r en da .
Dest a r t e, a s fu n ções u t iliza da s pela t eor ia clá ssica , a sa ber , a s

185
OS ECON OMIS TAS

r espost a s do in vest im en t o e da pou pa n ça de det er m in a da r en da à s


va r ia ções n a t a xa de ju r os, n ã o for n ecem elem en t os su ficien t es pa r a
u m a t eor ia da t a xa de ju r os; en t r et a n t o, poder ia m ser u t iliza da s pa r a
det er m in a r o m on t a n t e da r en da , qu a n do con h ecida (por ou t r os m eios)
a t a xa de ju r os e, a lt er n a t iva m en t e, ca so o n ível de r en da t en h a de
ser m a n t ido em det er m in a do m on t a n t e (por exem plo, n o n ível cor r es-
pon den t e a o plen o em pr ego), o qu a l ser á a t a xa de ju r os.
O er r o se or igin a em se con sider a r o ju r o com o a r ecom pen sa da
esper a com o t a l, em vez da r ecom pen sa pelo n ã o-en t esou r a m en t o; a ssim
com o a s t a xa s de r et or n o dos em pr ést im os ou dos in vest im en t os qu e
im plica m gr a u s diver sos de r isco devem ser con sider a da s a r ecom pen sa
n ã o da esper a em si, m a s da a ceit a çã o do r isco. Sem dú vida , n ã o exist e
u m a lin h a defin ida en t r e est a s e a s ch a m a da s t a xa s de ju r os “pu r a s”,
pois t oda s ela s sã o a r ecom pen sa da a ceit a çã o de u m r isco ou in cer t eza
de qu a lqu er n a t u r eza . Só n o ca so em qu e a m oeda ser visse a pen a s
pa r a t r a n sa ções, e n u n ca fosse em pr ega da com o r eser va de va lor , u m a
t eor ia difer en t e poder ia ser a pr opr ia da .114
H á , en t r et a n t o, dois pon t os con h ecidos qu e poder ia m , t a lvez, t er
a dver t ido a escola clá ssica de qu e a lgu m a coisa est a va er r a da . E m
pr im eir o lu ga r , t em sido a ceit o, pelo m en os desde a pu blica çã o de N a-
tu re an d N ecessity of In terest, do pr ofessor Ca ssel, qu e n ã o é cer t o qu e
a pa r t e pou pa da de da da r en da a u m en t e n ecessa r ia m en t e qu a n do sobe
a t a xa de ju r os; a o pa sso qu e n in gu ém du vida qu e a cu r va da pr ocu r a
de in vest im en t o ba ixe a o su bir a t a xa de ju r os. Se a s cu r va s Y e X ,
por ém , vier em a ba ixa r qu a n do su bir a t a xa de ju r os, n a da ga r a n t e
qu e det er m in a da cu r va Y cor t a r á ou t r a cu r va det er m in a da X em u m
pon t o qu a lqu er . Ist o su ger e qu e n ã o podem ser a s cu r va s Y e X, por
si sós, qu e det er m in a m a t a xa de ju r os.
E m segu n do lu ga r , t em -se u su a lm en t e su post o qu e u m a u m en t o
n a qu a n t ida de de m oeda t en de a r edu zir a t a xa de ju r os, pelo m en os
n u m pr im eir o m om en t o e em per íodos cu r t os. Ma s n en h u m a r a zã o se
deu a in da pa r a qu e u m a va r ia çã o da qu a n t ida de de m oeda a fet e a
cu r va de pr ocu r a por in vest im en t os ou a pr open sã o a pou pa r pa r t e de
u m a r en da da da . Dest a for m a , a escola clá ssica a dot ou du a s t eor ia s
da t a xa de ju r os com plet a m en t e difer en t es, u m a n o volu m e I, qu e t r a t a
da Teor ia do Va lor , e a ou t r a n o volu m e II, qu e t r a t a da Teor ia da
Moeda . P a r ece, a liá s, n ã o se t er per t u r ba do com a con t r a diçã o e, pelo
m en os qu e eu sa iba , n ã o fez n en h u m esfor ço pa r a con st r u ir u m a pon t e
en t r e a s du a s t eor ia s. Na t u r a lm en t e, isso se r efer e à escola clá ssica
pr opr ia m en t e dit a , pois for a m a s t en t a t iva s da escola n eoclá ssica de
con st r u ir u m a pon t e qu e leva r a m à pior da s con fu sões. E st a ú lt im a
escola a ca bou ch ega n do à con clu sã o de qu e deve h a ver d u as fon t es de

114 Cf. ca p. 17, a dia n t e.

186
KEYN ES

ofer t a pa r a se ch ega r à cu r va da pr ocu r a de in vest im en t o: a sa ber , a


pou pa n ça pr opr ia m en t e dit a , da qu a l se ocu pa a escola clá ssica , m ais
a som a qu e se t or n a dispon ível em con seqü ên cia de qu a lqu er a u m en t o
n a qu a n t ida de de m oeda (sen do a ofer t a equ ilibr a da por cer t a s espécies
de im posições ou t r ibu t a çã o sobr e o pú blico, ch a m a dos “pou pa n ça for -
ça da ” ou coisa sem elh a n t e). Ist o leva à idéia de qu e exist e u m a t a xa
de ju r os “n a t u r a l” ou “n eu t r a ”115 ou “de equ ilíbr io”, ou seja , u m a t a xa
qu e igu a la o in vest im en t o com a pou pa n ça efet iva n o sen t ido clá ssico,
sem a diçã o a lgu m a à “pou pa n ça for ça da ”; e con du z, fin a lm en t e, su pon do
qu e se est eja n a t r ilh a a dequ a da desde o pr in cípio, pa r a a solu çã o
m a is eviden t e de t oda s, ist o é, qu e se a qu a n t ida de de m oeda pu desse
m a n t er -se con stan te em qu a lqu er cir cu n st â n cia , n en h u m a dessa s difi-
cu lda des se a pr esen t a r ia , pois os m a les qu e se a t r ibu em a u m su post o
excesso dos in vest im en t os sobr e a pou pa n ça efet iva deixa r ia m de ser
possíveis. Nesse in st a n t e, por ém , en t r a m os em á gu a s pr ofu n da s. “O
pa t o selva gem m er gu lh ou a t é o fu n do — o m a is fu n do qu e pôde ch ega r
— e a ga r r ou -se fir m em en t e à veget a çã o, à s a lga s e a o lodo a li exist en t es;
ser ia n ecessá r io u m cã o ext r em a m en t e h á bil pa r a m er gu lh a r e t r a zê-lo
de volt a à su per fície.”
Dest a r t e, a a n á lise t r a dicion a l é defeit u osa , por qu e n ã o con segu iu
isola r cor r et a m en t e a s va r iá veis in depen den t es do sist em a . A pou pa n ça
e o in vest im en t o sã o a s va r iá veis det er m in a da s e n ã o os det er m in a n t es
do sist em a . Sã o o pr odu t o gêm eo dos det er m in a n t es, qu er dizer , da
pr open sã o a con su m ir , da esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e
da t a xa de ju r os. Na ver da de, est es det er m in a n t es sã o, por si só, com -
plexos e ca da u m deles pode ser a fet a do pela s va r ia ções pr ová veis dos
outros, m as continuam independentes no sentido de que seus valores não
podem ser deduzidos uns dos outros. A análise tradicional com preendeu
que a poupança depende da renda, m as se esqueceu do fato de que esta
depende do investimento em tal relação que, quando o investim ento varia,
a renda é forçada a variar no grau justamente necessário para fazer com
que a variação na poupança seja igual à do investimento.
De for m a idên t ica , essa s t eor ia s n ã o logr a r a m su cesso n a t en t a -
t iva de fa zer com qu e a t a xa de ju r os depen desse da “eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l”. É ver da de qu e, em equ ilíbr io, a t a xa de ju r os ser á igu a l
à eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, vist o qu e ser á va n t a joso a u m en t a r
(ou dim in u ir ) o volu m e cor r en t e de in vest im en t o a t é qu e se a t in ja a
igu a lda de, m a s fa zer disso u m a t eor ia da t a xa de ju r os ou der iva r da í
a t a xa de ju r os é ca ir n u m cír cu lo vicioso, com o per cebeu Ma r sh a ll
qu a n do est a va a m eio ca m in h o de u m a explica çã o da t a xa de ju r os
ba sea da n est e pr in cípio.116 A “eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l” depen de,

115 A t a xa de ju r os “n eu t r a ” dos econ om ist a s con t em por â n eos difer e t a n t o da t a xa “n a t u r a l”


de Böh m -Ba wer k qu a n t o da t a xa “n a t u r a l” de Wicksell.
116 Ver o Apên dice a est e ca pít u lo.

187
OS ECON OMIS TAS

pois, em pa r t e, do volu m e cor r en t e de in vest im en t o e pa r a ca lcu la r


esse volu m e é n ecessá r io con h ecer a n t es a t a xa de ju r os. A con clu sã o
im por t a n t e é qu e o flu xo de in vest im en t o se est en de a t é qu e a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l ca ia a o n ível da t a xa de ju r os e o qu e a esca la da
eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l n os in dica n ã o é t a xa de ju r os, m a s os
pon t os a t é os qu a is o flu xo de n ovos in vest im en t os t en de a a lca n ça r
qu a n do a t a xa de ju r os t em u m va lor da do.
O leit or per ceber á , sem dificu lda de, a im por t â n cia t eór ica fu n -
da m en t a l e o a lca n ce pr á t ico con sider á vel do pr oblem a qu e est a m os
exa m in a n do. Os econ om ist a s qu a se sem pr e ba sea r a m seu s con selh os
pr á t icos n a t eor ia de qu e, coeteris paribu s, u m a dim in u içã o n os ga st os
t en der á a fa zer ba ixa r a t a xa de ju r os e u m a u m en t o do in vest im en t o
t en der á a fa zê-la su bir , por ém , se o qu e est a s du a s qu a n t ida des de-
t er m in a m n ã o é a t a xa de ju r os, m a s o volu m e a gr ega do do em pr ego,
en t ã o, n ossa visã o sobr e o fu n cion a m en t o do sist em a econ ôm ico n os
a pa r ecer á pr ofu n da m en t e m odifica da . Um a m en or disposiçã o pa r a ga s-
t a r ser á vist a de u m a per spect iva ba st a n t e difer en t e se, em vez de
con sider á -la u m fa t or qu e, coeteris paribu s, a u m en t a o in vest im en t o,
for con sider a da u m fa t or qu e, coeteris paribu s, fa z dim in u ir o em pr ego.

188
A P ÊN D ICE AO C AP ÍTU LO 14
Ap ê n d ic e S o bre a Ta x a d e J u ro s e m “P rin c ip le s o f
Ec o n o m ic s ” d e Ma rs h a ll, e m “P rin c ip le s o f P o litic a l
Ec o n o m y ” d e Ric a rd o e e m Ou tra s Obra s

N ã o h á n en h u m est u do sist em á t ico sobr e a t a xa de ju r os n a s


obr a s de Ma r sh a ll, de E dgewor t h e do pr ofessor P igou — excet u a n do-se
obiter d icta a qu i, a li e a colá . Além da pa ssa gem já cit a da a n t er ior m en t e
(p. 103), a ú n ica in dica çã o im por t a n t e sobr e a posiçã o de Ma r sh a ll a
r espeit o da t a xa de ju r os en con t r a -se em su a obr a Prin ciples of E co-
n om ics (6ª ed.), Livr o VI, p. 534 e 593, cu ja essên cia pode ser en con t r a da
n a s cit a ções segu in t es:

“O ju r o, sen do pa go pelo u so do ca pit a l em qu a lqu er m er ca do,


t en de a u m n ível de equ ilíbr io, n o qu a l a pr ocu r a a gr ega da de
ca pit a l n o dit o m er ca do, a essa t a xa de ju r os, é igu a l a o est oqu e
a gr ega do,117 qu e n ele se a pr esen t a à m esm a t a xa . Se o m er ca do
qu e est a m os con sider a n do for pequ en o — diga m os, u m a ú n ica
cida de ou u m r a m o de com ér cio isola do em u m pa ís em pr ogr esso
—, u m a u m en t o n a su a pr ocu r a de ca pit a l ser á logo com pen sa do
pelo a u m en t o da ofer t a pr oven ien t e de dist r it os ou r a m os com er -
cia is vizin h os. P or ém , se con sider a r m os o m u n do em con ju n t o,
ou pelo m en os t odo gr a n de pa ís, com o u m ú n ico m er ca do de ca -
pit a l, n ã o poder em os pen sa r qu e u m a va r ia çã o n a t a xa de ju r os

117 Deve-se n ot a r qu e Ma r sh a ll em pr ega a pa la vr a ”ca pit a l" e n ã o “m oeda ”, bem com o a pa la vr a


“est oqu e” e n ã o “em pr ést im o”; t oda via , o ju r o é u m pa ga m en t o pelo em pr ést im o de m oed a
e “pr ocu r a de ca pit a l” n est e con t ext o dever ia sign ifica r “pr ocu r a de em pr ést im os de m oeda
pa r a com pr a r u m est oqu e de ben s de ca pit a l”. Ma s a igu a lda de en t r e o est oqu e de ben s
de ca pit a l ofer t a do e o volu m e dem a n da do é cr ia da pelo preço dos ben s de ca pit a l e n ã o
pela t a xa de ju r os. O qu e a t a xa de ju r os igu a la , efet iva m en t e, é a pr ocu r a e a ofer t a de
em pr ést im os de m oeda , ist o é, de débit os.

189
OS ECON OMIS TAS

a lt er e r á pida e a m pla m en t e a ofer t a a gr ega da de ca pit a l. O fu n do


ger a l de ca pit a l é o pr odu t o do t r a ba lh o e da esper a ; o t r a ba lh o
ext r a 118 e a esper a ext r a , pa r a os qu a is u m a a lt a n a t a xa de
ju r os ser ia u m in cen t ivo, n ã o a t in gir ia m gr a n des volu m es n u m
pr a zo br eve, com pa r a dos com o t r a ba lh o e a esper a qu e or igin a m
a t ot a lida de do est oqu e exist en t e de ca pit a l. Gr a n de a u m en t o da
pr ocu r a de ca pit a l, em ger a l, é, pois, sa t isfeit o du r a n t e cer t o t em po
m en os por u m in cr em en t o da ofer t a do qu e por u m a a lt a n a t a xa
de ju r os,119 o qu e leva r á o ca pit a l a desvia r -se, pa r cia lm en t e, dos
u sos em qu e a su a u t ilida de m a r gin a l seja m en or . A a lt a n a t a xa
de ju r os só a u m en t a r á o est oqu e t ot a l de ca pit a l de for m a len t a
e gr a du a l" (p. 534).
“É n ecessá r io sem pr e r epet ir qu e a expr essã o ‘t a xa de ju r os’
só é a plicá vel em sen t ido m u it o lim it a do a os a n t igos in vest im en t os
de ca pit a l.120 P oder ía m os, por exem plo, ca lcu la r qu e u m ca pit a l
in du st r ia l de u n s set e bilh ões est á in vest ido n a s difer en t es a t i-
vida des pr odu t iva s desse pa ís a u m a t a xa de ju r os líqu ida de
cer ca de 3%. Ma s est a m a n eir a de dizer , em bor a con ven ien t e e
ju st ificá vel em m u it os ca sos, n ã o é exa t a . O qu e se dever ia dizer
é qu e, con sider a n do a t a xa de ju r os líqu ida sobr e os in vest im en t os
de ca pit a l n ovo em ca da u m a dessa s a t ivida des (ist o é, sobr e os
in vest im en t os m a r gin a is) em t or n o de 3%, a r en da a gr ega da lí-
qu ida pr odu zida por t odo o ca pit a l in vest ido n a s diver sa s a t ivi-
da des é de t a l n a t u r eza qu e, ca pit a liza da em 33 a n os (ou seja ,

118 Isso su põe qu e a r en da n ão é con st a n t e, m a s a m a n eir a pela qu a l a a lt a t a xa de ju r os


pr ovoca o “t r a ba lh o ext r a ” n ã o é explicit a da cla r a m en t e. Dever -se-ia en t en der qu e u m a
eleva çã o da t a xa de ju r os, pelo fa t o de t or n a r m a ior es os a t r a t ivos do t r a ba lh o, com o fim
de pou pa r , é pa r a ser con sider a da u m a for m a de a u m en t o dos sa lá r ios r ea is, qu e in du zir á
os fa t or es de pr odu çã o a t r a ba lh a r em por u m sa lá r io m en or ? Ta l é, pen so eu , o m odo de
ver de D. H . Rober t son , n u m con t ext o sem elh a n t e. Cer t a m en t e, “ist o n ã o sign ifica r ia gr a n de
coisa a cu r t o pr a zo”; e ser ia t em er á r io, pa r a n ã o dizer a bsu r do, qu er er explica r dest e m odo
a s flu t u a ções efet iva s do in vest im en t o. A for m a em qu e r edigir ia de n ovo a segu n da m et a de
dest a fr a se ser ia : “e se u m a u m en t o con sider á vel n a dem a n da de ca pit a l em ger a l, em
vir t u de de u m desloca m en t o n a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, n ão for com pen sa do
por u m a a lt a da t a xa de ju r os, o a u m en t o su bseqü en t e do em pr ego e da r en da , r esu lt a n t e
de u m a cr éscim o n a pr odu çã o de ben s de ca pit a l, leva r á a u m m on t a n t e de esper a ext r a
qu e, m edido em t er m os m on et á r ios, ser á exa t a m en t e igu a l a o va lor do in cr em en t o efet ivo
de ca pit a l e ba st a r á , por t a n t o, ju st a m en t e pa r a o sa t isfa zer ”.
119 P or qu e n ã o por u m a a lt a n o pr eço de ofer t a dos ben s de ca pit a l? Su pon h a m os, por exem plo,
qu e “o gr a n de a u m en t o n a dem a n da de ca pit a l em ger a l” se deva a u m a ba ixa n a t a xa de
ju r os. Su ger ir ia qu e a fr a se t ivesse est a n ova r eda çã o: “P or t a n t o, n a m edida em qu e u m
a u m en t o con sider á vel n a pr ocu r a de ben s de ca pit a l n ã o possa ser im edia t a m en t e sa t isfeit o
por u m a u m en t o do est oqu e t ot a l, est e a u m en t o dever á ser con t ido, du r a n t e o t em po qu e
se fizer n ecessá r io, por u m a eleva çã o do pr eço de ofer t a dos ben s de ca pit a l qu e ba st e pa r a
con ser va r a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l em equ ilíbr io com a t a xa de ju r os, sem qu e h a ja
a lt er a çã o su bst a n cia l n o m on t a n t e físico do in vest im en t o; en qu a n t o isso (com o sem pr e
a con t ece) os fa t or es de pr odu çã o a da pt a dos à pr odu çã o de ben s de ca pit a l ser ã o u sa dos
pa r a ela bor a r a qu eles ben s cu ja eficiên cia m a r gin a l seja m a ior n a s n ova s con dições”.
120 De fa t o, n ã o se pode fa la r de t a l coisa a bsolu t a m en t e. P odem os fa la r pr opr ia m en t e a pen a s
da t a xa de ju r os sobr e o d in h eiro qu e foi t om a do em pr est a do pa r a a a qu isiçã o de in vest i-
m en t os de ca pit a l, n ovo ou velh o (ou pa r a qu a lqu er ou t r o objet ivo).

190
KEYN ES

à t a xa de 3%), a lca n ça r ia o m on t a n t e de u n s set e bilh ões de


libr a s, pois o va lor do ca pit a l já in vest ido pa r a pr epa r a r a t er r a ,
n a con st r u çã o de edifícios, de est r a da s de fer r o ou de m á qu in a s
é o va lor a gr ega do descon t a do, cor r espon den t e a su a s fu t u r a s
r en da s líqu ida s est im a da s (ou qu a se-r en da s); e se a su a r en da
pr ová vel dim in u ísse, seu va lor ba ixa r ia pr opor cion a lm en t e e n ã o
ser ia m a is qu e o va lor ca pit a liza do dessa r en da r edu zida , depois
de leva da em con t a a depr ecia çã o” (p. 593).

E m su a obr a E con om ics of Welfare (3ª ed.), p. 163, o pr ofessor


P igou escr eve:
“A n a t u r eza do ser viço da ‘esper a ’ t em sido m u it o m a l in t er -
pr et a da . Algu m a s vezes, foi feit a a su posiçã o de qu e con sist ia n a
pr ovisã o de m oeda , ou t r a s vezes, n a pr ovisã o de t em po e, em
a m ba s a s h ipót eses, su st en t ou -se qu e ela em n a da con t r ibu i pa r a
o dividen do. Nen h u m a dest a s su posições é cor r et a . A ‘esper a ’
sign ifica a pen a s a dia r o con su m o qu e u m a pessoa t em o dir eit o
de efet u a r im edia t a m en t e, liber a n do a ssim os r ecu r sos, qu e po-
der ia m t er sido dest r u ídos, pa r a t om a r a for m a de in st r u m en t os
de pr odu çã o...121 A u n ida de de ‘esper a ’ é, por t a n t o, o u so de u m a
qu a n t ida de det er m in a da de r ecu r sos 122 — por exem plo, m ã o-de-
obr a ou m a qu in a r ia — du r a n t e cer t o t em po... E m t er m os m a is
ger a is, podem os dizer qu e a u n ida de de esper a é u m a u n ida de
de va lor a n u a l ou , n a lin gu a gem m a is sim ples, em bor a m en os
exa t a , do dr . Ca ssel, u m a libr a -a n o... É pr eciso qu e se fa ça u m a
a dver t ên cia con t r a o pon t o de vist a gen er a liza do de qu e o volu m e
de ca pit a l a cu m u la do du r a n t e u m a n o seja , n ecessa r ia m en t e,
igu a l a o m on t a n t e da s ‘pou pa n ça s’ feit a s du r a n t e o m esm o. Ta l
n ã o é o ca so, a in da qu e in t er pr et em os a pa la vr a ‘pou pa n ça s’ n o
sen t ido de pou pa n ça s líqu ida s, elim in a n do a ssim a pou pa n ça de
u m in divídu o em pr est a da a ou t r o pa r a a u m en t a r seu con su m o,
e ign or a n do a s a cu m u la ções t em por á r ia s de dir eit os de h a ver
n ão exercid os, sob a for m a de m oeda ba n cá r ia , pois m u it a s da s
pou pa n ça s dest in a da s a se con ver t er em em ca pit a l de fa t o n ã o
cu m pr em o seu objet ivo, desvia da s qu e sã o pa r a u sos qu e r epr e-
sen t a m u m desper dício”.123

121 E st a for m u la çã o é a m bígu a , n ã o n os diz se o a dia m en t o do con su m o t em , n ecessariam en te,


est e efeit o ou se t em a pen a s por r esu lt a do liber a r r ecu r sos qu e, con for m e a s cir cu n st â n cia s,
fica r ã o em em pr ego ou ser vir ã o pa r a in vest im en t os.
122 E n ã o, cu m pr e n ot a r , a qu a n t ida de de din h eir o qu e o ben eficiá r io do r en dim en t o poder ia
ga st a r , m a s n ã o ga st a , em con su m o; a r em u n er a çã o da esper a t em , por t a n t o, o ca r á t er n ã o
de u m ju r o, m a s de u m a qu a se-r en da . E st a fr a se pa r ece a dm it ir , im plicit a m en t e, qu e os
r ecu r sos liber a dos sã o n ecessa r ia m en t e u sad os. Qu a l ser á , pois, a r em u n er a çã o da esper a ,
se os r ecu r sos liber a dos n ã o for em u t iliza dos?
123 E st a pa ssa gem n ã o n os diz se a s pou pa n ça s líqu ida s ser ia m igu a is ou n ã o a o in cr em en t o
do ca pit a l, ca so n ã o levá ssem os em con t a os in vest im en t os m a l or ien t a dos, em bor a con si-

191
OS ECON OMIS TAS

A ú n ica m en çã o sign ifica n t e feit a pelo pr ofessor P igou a r espeit o


do qu e det er m in a a t a xa de ju r os se en con t r a , a ch o eu , em seu livr o
In d u strial Flu ctu ation s (1ª ed.), p. 251-253, on de discu t e a t ese de qu e
a t a xa de ju r os, pelo fa t o de ser det er m in a da pela s con dições ger a is
da ofer t a e da pr ocu r a de ca pit a l físico, esca pa a o con t r ole dos ba n cos
ou do ba n co cen t r a l. E m con t r a diçã o a est a t ese, a pr esen t a o segu in t e
a r gu m en t o:

“Qu a n do os ba n qu eir os cr ia m m a is cr édit o pa r a os h om en s de


n egócios, efet u a m em seu pr ópr io in t er esse, con for m e explica ções
feit a s n o ca pít u lo XIII da P a r t e P r im eir a ,124 u m a t r ibu t a çã o for -
ça da sobr e os ben s r ea is do pú blico, a u m en t a n do a ssim o flu xo
cor r en t e de ca pit a l r ea l de qu e dispõem e oca sion a n do u m a ba ixa
n a t a xa r ea l de ju r os, t a n t o pa r a o lon go qu a n t o pa r a o cu r t o
pr a zo. E m r esu m o, é cer t o qu e a t a xa ba n cá r ia do din h eir o est á
liga da por u m vín cu lo m ecâ n ico à t a xa r ea l de ju r os n os em pr és-
t im os a lon go pr a zo, m a s n ã o é ver da de qu e est a ú lt im a seja
det er m in a da por fa t or es qu e esca pa m com plet a m en t e a o con t r ole
dos ba n cos".

Meu s br eves com en t á r ios sobr e a s pa ssa gen s a cim a for a m feit os
n a s n ot a s de r oda pé. A per plexida de qu e ver ifico n a s idéia s de Ma r sh a ll
sobr e o a ssu n t o r eside, fu n da m en t a lm en t e, n a in t r odu çã o do con ceit o
de “ju r o”, o qu a l per t en ce a u m a econ om ia m on et á r ia , n u m t r a t a do
qu e n ã o leva em con t a a m oeda . O “ju r o”, n a r ea lida de, est á for a de
con t ext o n a obr a Prin ciples of E con om ics de Ma r sh a ll — per t en ce a
ou t r o r a m o da m a t ér ia . O pr ofessor P igou , de a cor do com su a s ou t r a s
h ipót eses t á cit a s, leva -n os a con clu ir (em su a obr a E con om ics of Welfare)
qu e a u n ida de de esper a é a m esm a qu e a u n ida de de in vest im en t o
cor r en t e e qu e a r em u n er a çã o de esper a t em o ca r á t er de u m a qu a -
se-r en da ; pr a t ica m en t e qu a se n u n ca m en cion a o ju r o — e t em r a zã o
em n ã o o m en cion a r . Con t u do, est es a u t or es n ã o est ã o t r a t a n do com

der á ssem os a s “a cu m u la ções t em por á r ia s dos dir eit os de h a ver n ão exercid os sob for m a de
m oeda ba n cá r ia ”. Ma s o pr of. P igou , em In d u strial Flu ctu ation s (p. 22), explica cla r a m en t e
qu e t a is a cu m u la ções n ã o t êm efeit o sobr e o qu e ele ch a m a “pou pa n ça r ea l”.
124 O t ext o a qu e o pr of. P igou se r efer e (op. cit., p. 129-134) expõe seu pon t o de vist a sobr e
a m edida em qu e a cr ia çã o pelos ba n cos a u m en t a o flu xo de ca pit a l r ea l dispon ível pa r a
os em pr esá r ios. Na ver da de, pr ocu r a dedu zir ”do cr édit o flu t u a n t e con cedido a os em pr esá r ios
por m eio de cr ia çã o de cr édit o o ca pit a l flu t u a n t e qu e t er ia sido for n ecido por ou t r os m eios
se os ba n cos n ã o est ivessem lá ". Depois de feit a s est a s dedu ções, o r a ciocín io t or n a -se
ba st a n t e obscu r o. P a r a com eça r , a s pessoa s qu e vivem de r en da s (ren tiers) t êm u m a r en da
de 1 500, da qu a l con som em 500 e econ om iza m 1 000; o a t o de cr ia çã o de cr édit o r edu z-lh es
a r en da a 1 300, da qu a l con som em 500 – x e econ om iza m 800 + x; e x, con clu i o pr of.
P igou , r epr esen t a o a u m en t o líqu ido de ca pit a l qu e ficou dispon ível em r a zã o da cr ia çã o
de cr édit o. Deve-se su por qu e a r en da dos em pr esá r ios é in fla da pelo m on t a n t e qu e eles
con segu em em prestad o dos ba n cos (depois de feit a s a s dedu ções cit a da s? Ou a u m en t a pelo
va lor 200, su bt r a ído da r en da dos ren tiers?). E m qu a lqu er da s h ipót eses, deve-se su por
qu e pou pa m o t ot a l desse va lor ? O in vest im en t o su plem en t a r é igu a l a os cr édit os cr ia dos
m en os a s dedu ções? Ou é igu a l a x? P a r ece qu e o r a ciocín io a ca ba on de dever ia com eça r .

192
KEYN ES

u m a econ om ia n ã o m on et á r ia (se é qu e exist e t a l coisa ); a dm it em cla -


r a m en t e qu e se u t iliza a m oeda e qu e exist e u m sist em a ba n cá r io.
Igu a lm en t e, em In d u strial Flu ctu ation s, do pr ofessor P igou (on de es -
t u da sobr et u do a s flu t u a ções da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l), ou em
su a T h eory of Un em ploym en t (qu e é, pr im or dia lm en t e, u m est u do da s
ca u sa s da va r ia çã o n o volu m e de em pr ego, n a h ipót ese de qu e n ã o
exist a desem pr ego in volu n t á r io), a t a xa de ju r os t a m pou co r epr esen t a
u m pa pel m a is im por t a n t e do qu e em su a obr a E con om ics of Welfare.
II
A pa ssa gem segu in t e, ext r a ída da obr a Prin ciples of Political E co-
n om y (p. 511), con t ém o essen cia l da t eor ia de Rica r do sobr e a t a xa
de ju r os:
“O ju r o do din h eir o n ã o é r egu la do pela t a xa à qu a l o ba n co
em pr est a r á , seja ela de 5, 3 ou 2%, m a s pela t a xa de lu cr o qu e
se pode obt er do em pr ego do ca pit a l, a qu a l é in t eir a m en t e in -
depen den t e da qu a n t ida de ou do va lor do din h eir o. Ain da qu e o
Ba n co em pr est e u m m ilh ã o, dez m ilh ões ou cem m ilh ões, isso
n ã o a lt er a de m odo per m a n en t e a t a xa de ju r os do m er ca do,
sen ã o a pen a s o va lor da m oeda a ssim em it ida . E m cer t o ca so,
poder -se-ia n ecessit a r de dez ou vin t e vezes m a is din h eir o do
qu e em ou t r o pa r a explor a r o m esm o n egócio. Os pedidos de
em pr ést im os ba n cá r ios depen dem , por t a n t o, da r ela çã o en t r e a
t a xa de lu cr o qu e se pode con segu ir com seu em pr ego e a qu ela
à qu a l o Ba n co est á dispost o a em pr est á -los. Se est a ú lt im a for
m en or qu e a t a xa de ju r os do m er ca do, n ã o h a ver á din h eir o ba s-
t a n t e qu e n ã o possa ser em pr est a do; se for m a ior , a pen a s os
esba n ja dor es e os pr ódigos est a r ã o dispost os a t om á -lo”.
Ist o é t ã o cla r o qu e ofer ece u m pon t o de pa r t ida pa r a u m a m elh or
discu ssã o da s a fir m a ções dos a u t or es su bseqü en t es, os qu a is, sem r ea l-
m en t e se a fa st a r em da essên cia da dou t r in a r ica r dia n a , se sen t em ,
en t r et a n t o, con st r a n gidos a pon t o de pr ocu r a r em r efú gio em coloca ções
n ebu losa s. Decer t o, o qu e foi dit o, com o sem pr e a con t ece qu a n do se
t r a t a de Rica r do, t em de ser in t er pr et a do com o u m a dou t r in a de lon go
pr a zo, com ên fa se sobr e a pa la vr a “per m a n en t e” in ser ida n o m eio da
pa ssa gem ; e é in t er essa n t e con sider a r a s h ipót eses n ecessá r ia s pa r a
va lida r est a t eor ia .
Um a vez m a is, a h ipót ese qu e se a plica é a h ipót ese clá ssica de
qu e h á sem pr e plen o em pr ego: desse m odo, su pon do a in exist ên cia de
m u da n ça s n a cu r va de ofer t a de t r a ba lh o em t er m os de pr odu t o, h á
a pen a s u m n ível possível de em pr ego n o equ ilíbr io a lon go pr a zo. Nest a
h ipót ese, e com a u su a l con diçã o de coeteris paribu s, ist o é, de qu e
n ã o h a ja n a s pr open sões ou expect a t iva s psicológica s n en h u m a ou t r a
m u da n ça a lém da qu ela s decor r en t es de u m a a lt er a çã o n a qu a n t ida de

193
OS ECON OMIS TAS

de m oeda , a t eor ia r ica r dia n a é vá lida , n o sen t ido de qu e, com ba se


n essa s h ipót eses, r est a a pen a s u m a t a xa de ju r os com pa t ível com o
plen o em pr ego a lon go pr a zo. Rica r do e seu s su cessor es n ã o der a m a
devida im por t â n cia a o fa t o de qu e, m esm o a lon go pr a zo, o n ível de
em pr ego n ã o é n ecessa r ia m en t e plen o, poden do a lca n ça r n íveis diver sos
e qu e a ca da polít ica ba n cá r ia cor r espon de u m n ível de em pr ego dife-
r en t e a lon go pr a zo; em con seqü ên cia , pode h a ver , a lon go pr a zo, di-
ver sa s posições de equ ilíbr io cor r espon den t es à s diver sa s polít ica s de
ju r os su scet íveis de ser em a dot a da s pela a u t or ida de m on et á r ia .
Se Rica r do h ou vesse r est r in gido a a pr esen t a çã o de seu a r gu m en t o
à su a a plica çã o a pen a s à s va r ia ções da qu a n t ida de de m oeda cr ia da
pela a u t or ida de m on et á r ia , t er ia a in da sido cor r et o, a dm it in do a h i-
pót ese de qu e os sa lá r ios n om in a is fossem flexíveis. E m ou t r os t er m os,
se Rica r do h ou vesse su st en t a do qu e a t a xa de ju r os n ã o sofr er ia a lt e-
r a çã o per m a n en t e, em bor a a a u t or ida de m on et á r ia fixa sse em dez m i-
lh ões ou em cem m ilh ões a qu a n t ida de de m oeda , a su a con clu sã o
ser ia vá lida . Ma s, se por polít ica da a u t or ida de m on et á r ia qu er em os
sign ifica r , t a m bém , os t er m os em qu e essa a u t or ida de a u m en t a r á ou
dim in u ir á a qu a n t ida de de m oeda , ist o é, a t a xa de ju r os à qu a l, seja
por m u da n ça n o volu m e dos descon t os seja por oper a ções de m er ca do
a ber t o, ela a u m en t a r á ou r edu zir á su a s dispon ibilida des — qu e é ex-
pr essa m en t e o qu e Rica r do est á dizen do n a cit a çã o a cim a —, en t ã o
deixa de ser exa t o qu e a polít ica m on et á r ia seja in efica z ou qu e a pen a s
u m a ú n ica polít ica seja com pa t ível com o equ ilíbr io a lon go pr a zo,
em bor a , n o ca so ext r em o em qu e se su põe u m a ba ixa ilim it a da n os
sa lá r ios n om in a is em fa ce do desem pr ego in volu n t á r io, em r a zã o da
in ú t il con cor r ên cia en t r e os t r a ba lh a dor es desocu pa dos, h a ja a pen a s
du a s posições possíveis a lon go pr a zo — plen o em pr ego e n ível de
em pr ego cor r espon den t e à t a xa de ju r os em qu e a pr efer ên cia pela
liqu idez se t or n a a bsolu t a (ca so est e volu m e de em pr ego seja in fer ior
a o plen o em pr ego). Adm it in do sa lá r ios n om in a is flexíveis, a qu a n t ida de
de m oeda com o t a l é, com efeit o, in efica z a lon go pr a zo; m a s os t er m os
em qu e a a u t or ida de m on et á r ia m odifica essa qu a n t ida de in t er vêm n o
esqu em a econ ôm ico com o det er m in a n t e r ea l.
Va le a pen a a cr escen t a r qu e a s ú lt im a s fr a ses da cit a çã o su ger em
qu e Rica r do n ã o levou em con t a a s possíveis m odifica ções n a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l de a cor do com o m on t a n t e in vest ido. Ma s ist o pode
ser in t er pr et a do com o u m n ovo exem plo da su a m a ior coer ên cia lógica ,
com pa r a da à dos seu s su cessor es. Se t om a r m os com o da dos o volu m e
de em pr ego e da s t en dên cia s psicológica s da com u n ida de, só pode, de
fa t o, h a ver u m a t a xa possível de a cu m u la çã o de ca pit a l. Rica r do ofe-
r ece-n os a su pr em a r ea liza çã o in t elect u a l, in a t in gível por espír it os m e-
n os pr ivilegia dos, de a dot a r u m m u n do h ipot ét ico dist a n t e da expe-
r iên cia , com o se for a o pr ópr io m u n do da exper iên cia , e, em segu ida ,
de n ele viver con sist en t em en t e. No ca so da m a ior pa r t e dos seu s su -

194
KEYN ES

cessor es, é im possível evit a r a in t er fer ên cia do “bom sen so”, qu e ca u sa


pr eju ízos à coer ên cia lógica .

III

O pr ofessor von Mises pr opôs u m a t eor ia pecu lia r da t a xa de


ju r os, a qu a l foi a dot a da pelo pr ofessor H a yek e t a m bém , cr eio eu ,
pelo pr ofessor Robbin s. Segu n do est a t eor ia , poder -se-ia m iden t ifica r
a s va r ia ções da t a xa de ju r os com a s dos n íveis de pr eços r ela t ivos
dos ben s de con su m o e dos ben s de ca pit a l.125 O m eio de ch ega r a est a
con clu sã o n ã o ficou cla r o. Ma s o r a ciocín io pa r ece desen volver -se da
segu in t e m a n eir a : a t r a vés de u m a sim plifica çã o u m t a n t o dr á st ica , a
eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l é con sider a da com o m edida pela r ela çã o
en t r e os pr eços de ofer t a dos n ovos ben s de con su m o e por pr eços de
ofer t a dos n ovos ben s de pr odu çã o.126 E m segu ida , est a r ela çã o é iden -
t ifica da com a t a xa de ju r os. Ch a m a -se a a t en çã o pa r a o fa t o de qu e
u m a ba ixa n a t a xa de ju r os é fa vor á vel a o in vest im en t o. E rgo, u m a
ba ixa n a r ela çã o en t r e os pr eços dos ben s de con su m o e os ben s de
pr odu çã o é fa vor á vel a o in vest im en t o.
P or est e m eio, cr ia -se u m elo en t r e o in cr em en t o da pou pa n ça
de u m in divídu o e do in vest im en t o a gr ega do, pois é sa bido qu e o a u -
m en t o da pou pa n ça in dividu a l fa z ba ixa r o pr eço dos ben s de con su m o
e, possivelm en t e, em pr opor çã o bem m a ior qu e o dos ben s de pr odu çã o;
por t a n t o, ist o sign ifica , de a cor do com o r a ciocín io pr eceden t e, u m a
r edu çã o da t a xa de ju r os qu e est im u la r á o in vest im en t o. Tor n a -se,
por t a n t o, eviden t e qu e u m a dim in u içã o da eficiên cia m a r gin a l de cer t os
ben s de ca pit a l específicos e, em con seqü ên cia , u m a ba ixa da cu r va
da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l em ger a l pr odu zem u m efeit o exa t a -
m en t e opost o a o qu e pr esu m e o r a ciocín io a n t er ior , pois o in vest im en t o
é est im u la do qu er por u m a alta da cu r va da eficiên cia m a r gin a l qu er
por u m a baixa da t a xa de ju r os. P or h a ver con fu n dido a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l com a t a xa de ju r os, o pr ofessor von Mises e seu s
discípu los ch ega r a m a con clu sões exa t a m en t e con t r á r ia s e er r a da s. Um
bom exem plo de con fu sã o dest a espécie é o segu in t e t r ech o do pr ofessor
Alvin H a n sen :127

“Algu n s econ om ist a s su ger ir a m qu e u m a r edu çã o dos ga st os


t er ia com o r esu lt a do líqu ido u m n ível de pr eços dos ben s de con -
su m o in fer ior a o qu e exist ir ia em ou t r a s con dições e qu e, em

125 T h e T h eory of M on ey an d Cred it. p. 339 et pas., pa r t icu la r m en t e p. 363.


126 Nu m equ ilíbr io de lon go pr a zo, poder -se-ia m con ceber h ipót eses especia is em qu e est e r a -
ciocín io ser ia exa t o, m a s, qu a n do os pr eços em qu est ã o sã o os qu e pr eva lecem em per íodo
de cr ise, é er r a do su por , a t ít u lo de sim plifica çã o, qu e o em pr esá r io fa z su a s pr evisões com o
se esses pr eços devessem ser per m a n en t es. Além disso, se o fizer , os pr eços de ben s de
pr odu çã o exist en t es ba ixa r ia m n a m esm a pr opor çã o qu e os pr eços dos ben s de con su m o.
127 E con om ic R econ stru ction . p. 233.

195
OS ECON OMIS TAS

con seqü ên cia , o est ím u lo pa r a o in vest im en t o em ca pit a l fixo t en -


der ia a r edu zir -se. E st e pon t o de vist a é, con t u do, in cor r et o e
ba seia -se n u m a con fu sã o en t r e os efeit os qu e exer cem r espect i-
va m en t e sobr e a for m a çã o do ca pit a l: (1) da a lt a ou ba ixa do
pr eço dos ben s de con su m o e (2) da s va r ia ções da t a xa de ju r os.
É ver da de qu e, em con seqü ên cia da r edu çã o dos ga st os e do a u -
m en t o da pou pa n ça , os pr eços dos ben s de con su m o ba ixa r a m
em r ela çã o a os dos ben s de pr odu çã o. Ma s ist o sign ifica , n a r ea -
lida de, u m a t a xa de ju r os m en or e u m a t a xa de ju r os m en or
pr ovoca u m a expa n sã o do in vest im en t o de ca pit a l em á r ea s on de
n ã o ser ia lu cr a t ivo se a s t a xa s fossem m a is eleva da s”.

196
C AP ÍTU LO 15
Os In c e n tiv o s P s ic o ló g ic o s e Em p re s a ria is p a ra a Liqu id e z

C u m pr e-n os, a gor a , a n a lisa r m a is det a lh a da m en t e os m ot ivos


da pr efer ên cia pela liqu idez qu e a pr esen t a m os, de for m a in t r odu t ór ia ,
n o ca pít u lo 13. O a ssu n t o é su bst a n cia lm en t e idên t ico a o qu e, por
vezes, t em sido est u da do sob a design a çã o de dem a n da de m oeda . Ist o
se r ela cion a , t a m bém , de for m a ín t im a , com a qu ilo qu e se t em ch a m a do
a velocida de-r en da da m oeda , pois a velocida de-r en da da m oeda m ede
sim plesm en t e a pr opor çã o de r en da qu e o pú blico deseja con ser va r em
for m a de m oeda , de t a l m odo qu e u m a u m en t o n a velocida de-r en da
da m oeda pode ser sin t om a de u m a r edu çã o n a pr efer ên cia pela liqu idez.
Toda via , n ã o é a m esm a coisa , u m a vez qu e é em r ela çã o a o seu en foqu e
a cu m u la do de pou pa n ça em vez de em r ela çã o à su a r en da qu e o
in divídu o pode exer cer su a escolh a en t r e a liqu idez e a iliqu idez. E ,
de qu a lqu er m a n eir a , a expr essã o “velocida de-r en da da m oeda ” t em
im plícit a a su gest ã o en ga n osa de a ssu m ir qu e a pr ocu r a da m oeda em
con ju n t o seja pr opor cion a l ou t en h a det er m in a da r ela çã o com a r en da ;
or a , con for m e ver em os, est a su posiçã o só dever á a plica r -se a u m a parte
dos en ca ixes líqu idos do pú blico; com o r esu lt a do disso n ã o leva em
con t a o pa pel desem pen h a do pela t a xa de ju r os.
E m m in h a obr a T reatise on M on ey est u dei a dem a n da t ot a l da
m oeda sob t r ês design a ções: depósit os de r en da , depósit os pa r a n egócios
e depósit os de pou pa n ça , e pa r ece-m e desn ecessá r io r epet ir a qu i a a n á -
lise do ca pít u lo 3 dessa obr a . O din h eir o gu a r da do pa r a ca da u m dest es
t r ês m ot ivos con st it u i, n o en t a n t o, u m fu n do ú n ico, qu e o seu det en t or
n ã o pr ecisa dividir em t r ês com pa r t im en t os est a n qu es, pois eles podem
n ã o ser n it ida m en t e sepa r a dos, n em m esm o em su a m en t e, e cer t a
som a pode ser r eser va da pr im or dia lm en t e pa r a u m fim e, secu n da r ia -
m en t e, pa r a ou t r o. Dest a r t e, podem os — de for m a idên t ica e, t a lvez,
m elh or — con sider a r a dem a n da a gr ega da da m oeda do in divídu o, em

197
OS ECON OMIS TAS

det er m in a da s cir cu n st â n cia s, com o u m a decisã o ú n ica , pa r a a qu a l


con cor r em vá r ios m ot ivos difer en t es.
Ao a n a lisa r est es m ot ivos, é, a pesa r de t u do, con ven ien t e cla ssi-
ficá -los, com o foi feit o a n t er ior m en t e, em ca t egor ia s, a pr im eir a da s
qu a is cor r espon de, em lin h a s ger a is, a os depósit os de r en da e a os de-
pósit os pa r a n egócios, e a s du a s ú lt im a s a os depósit os de pou pa n ça .
J á os a pr esen t ei su cin t a m en t e, n o ca pít u lo 13, sob a s design a ções de
m ot ivo-t r a n sa çã o, qu e pode a in da su bdividir -se em m ot ivo-r en da e m o-
t ivos-n egócios, m ot ivo-pr eca u çã o e m ot ivo-especu la çã o.

(i) O m otivo-ren d a. Um a da s r a zões pa r a con ser va r r ecu r sos lí-


qu idos é ga r a n t ir a t r a n siçã o en t r e o r ecebim en t o e o desem bolso da
r en da . A for ça dest e m ot ivo pa r a in du zir u m a decisã o de con ser va r
u m m on t a n t e a gr ega do de m oeda depen der á , pr in cipa lm en t e, do m on -
t a n t e da r en da e da du r a çã o n or m a l do in t er va lo en t r e o seu r ecebi-
m en t o e o seu desem bolso. O con ceit o de velocida de-r en da da m oeda
é est r it a m en t e a pr opr ia do a pen a s a est e con t ext o.

(ii) Os m otivos-n egócios. Da m esm a m a n eir a , os r ecu r sos líqu idos


sã o con ser va dos pa r a a ssegu r a r o in t er va lo en t r e o m om en t o em qu e
com eça m a s despesa s e o do r ecebim en t o do pr odu t o da s ven da s, in -
clu in do-se sob est e t ít u lo os r ecu r sos líqu idos qu e con ser va m os em -
pr esá r ios pa r a ga r a n t ir o in t er va lo en t r e a com pr a e a r ea liza çã o. A
in t en sida de dest a dem a n da depen der á , pr in cipa lm en t e, do va lor da
pr odu çã o cor r en t e (e, por t a n t o, do r en dim en t o cor r en t e) e do n ú m er o
de m ã os a t r a vés da s qu a is pa ssa essa pr odu çã o.

(iii) O m otivo-precau ção. E n t r e ou t r os m ot ivos pa r a con ser va r


r ecu r sos líqu idos, dest a ca m -se os de a t en der à s con t in gên cia s in espe-
r a da s e à s opor t u n ida des im pr evist a s de r ea liza r com pr a s va n t a josa s
e os de con ser va r u m a t ivo de va lor fixo em t er m os m on et á r ios pa r a
h on r a r u m a obr iga çã o est ipu la da em din h eir o.
A for ça desses t r ês t ipos de m ot ivos depen der á , em pa r t e, do
cu st o e da segu r a n ça dos m ét odos pa r a obt er din h eir o em ca so de
n ecessida de, por m eio de a lgu m a for m a de em pr ést im o t em por á r io,
especia lm en t e r et ir a da s a descober t o ou o seu equ iva len t e, pois n ã o
h á n ecessida de de con ser va r din h eir o ocioso pa r a a ssegu r a r os in t er -
va los se se pode obt ê-lo sem dificu lda de n o m om en t o opor t u n o. Su a
for ça depen der á , t a m bém , do qu e podem os den om in a r o cu st o r ela t ivo
da r et en çã o de r ecu r sos líqu idos. Se os r ecu r sos líqu idos só podem ser
r et idos m edia n t e o sa cr ifício da com pr a de u m bem lu cr a t ivo, est a
cir cu n st â n cia a u m en t a o cu st o r ela t ivo de su a r et en çã o e, por t a n t o,
debilit a o m ot ivo pa r a gu a r da r cer t o m on t a n t e de r ecu r sos líqu idos.
Se os depósit os a u fer em ju r os ou se se evit a m despesa s ba n cá r ia s con -
ser va n do o din h eir o, isso dim in u i o cu st o e r efor ça o m ot ivo. E st e fa t or ,

198
KEYN ES

con t u do, pode ser de im por t â n cia secu n dá r ia , sa lvo em ca so de gr a n des


a lt er a ções n o cu st o da r et en çã o de r ecu r sos líqu idos.

(iv) Rest a o m otivo-especu lação. E le r equ er u m est u do m a is de-


t a lh a do qu e os ou t r os, t a n t o pelo fa t o de ser m en os com pr een dido,
com o por ser especia lm en t e im por t a n t e pa r a t r a n sm it ir os efeit os de
u m a variação n a qu a n t ida de de m oeda .
E m cir cu n st â n cia s n or m a is, o volu m e de m oeda n ecessá r io pa r a
sa t isfa zer os dois m ot ivos, t r a n sa çã o e pr eca u çã o, é pr in cipa lm en t e o
r esu lt a do da a t ivida de ger a l do sist em a econ ôm ico e do n ível da r en da
n a cion a l em t er m os m on et á r ios. Toda via , a a dm in ist r a çã o m on et á r ia
(ou , em su a a u sên cia , a s m u da n ça s for t u it a s qu e podem a dvir da qu a n -
t ida de de m oeda ) fa z sen t ir seu efeit o sobr e o sist em a econ ôm ico por
su a in flu ên cia sobr e o m ot ivo-especu la çã o. Isso por qu e a dem a n da de
m oeda pa r a sa t isfa zer os m ot ivos a n t er ior es é, em ger a l, in sen sível a
qu a lqu er in flu ên cia qu e n ã o a de u m a a lt er a çã o efet iva n a a t ivida de
econ ôm ica ger a l e n o n ível da r en da , a o pa sso qu e a exper iên cia m ost r a
qu e a dem a n da de m oeda pa r a sa t isfa zer o m ot ivo-especu la çã o va r ia
de m odo con t ín u o sob o efeit o de u m a a lt er a çã o gr a du a l n a t a xa de
ju r os, ist o é, h á u m a cu r va con t ín u a r ela cion a n do a s va r ia ções n a de-
m a n da de m oeda pa r a sa t isfa zer o m ot ivo-especu la çã o com a s qu e ocor -
r em n a t a xa de ju r os, devida s à s va r ia ções n o pr eço dos t ít u los e à s
dívida s de ven cim en t os diver sos.
De fa t o, se a ssim n ã o fosse, a s oper a ções de m er ca do a ber t o ser ia m
im pr a t icá veis. E u disse qu e a exper iên cia in dica a r ela çã o con st a n t e
h á pou co m en cion a da por qu e de fa t o o sist em a ba n cá r io est á sem pr e
a pt o, em cir cu n st â n cia s n or m a is, a com pr a r (ou ven der ) t ít u los e obr i-
ga ções em t r oca de m oeda , ofer ecen do por eles u m pr eço de m er ca do
m odest a m en t e m a ior (ou m en or ); e qu a n t o m a ior for a qu a n t ida de de
r ecu r sos líqu idos qu e os ba n cos deseja m cr ia r (ou ca n cela r ) pela com pr a
(ou ven da ) de t ít u los e dívida s, m a ior dever á ser a ba ixa (ou a lt a ) n a
t a xa de ju r os. E n t r et a n t o, qu a n do a s oper a ções de m er ca do a ber t o (com o
n os E st a dos Un idos em 1933-1934) se lim it a m à com pr a de t ít u los de
ven cim en t o m u it o pr óxim o, o seu efeit o pode, eviden t em en t e, lim it a r -se
à sim ples t a xa de ju r os a pr a zo m u it o cu r t o e pr ovoca r a pen a s ligeir a
r ea çã o sobr e a s t a xa s de ju r os a lon go pr a zo, qu e sã o m u it o m a is
im por t a n t es.
Ao t r a t a r do m ot ivo de especu la çã o, con vém dist in gu ir , en t r e a s
va r ia ções da t a xa de ju r os, a s qu e se devem a m u da n ça s n a ofer t a de
m oeda dispon ível pa r a sa t isfa zer esse m ot ivo, sem qu e h a ja ocor r ido
a lt er a çã o a lgu m a n a fu n çã o de liqu idez, e a s qu e t êm com o ca u sa
pr in cipa l a s m u da n ça s n a s expect a t iva s qu e a fet a m dir et a m en t e essa
fu n çã o. As oper a ções de m er ca do a ber t o podem , sem dú vida , in flu ir
sobr e a t a xa de ju r os de a m ba s a s m a n eir a s, qu er a lt er a n do o volu m e
de m oeda , qu er da n do or igem a n ova s expect a t iva s r ela t iva m en t e à

199
OS ECON OMIS TAS

polít ica fu t u r a do ba n co cen t r a l ou do gover n o. As m u da n ça s pr ópr ia s


da fu n çã o de liqu idez, r esu lt a n t es de m odifica ções n a s in for m a ções qu e
pr ovoca m r evisã o da s pr evisões, sã o fr eqü en t em en t e descon t ín u a s e
en gen dr a m descon t in u ida des cor r espon den t es n a s va r ia ções da t a xa
de ju r os. Decer t o, só h a ver á lu ga r pa r a u m a a t ivida de m a ior de n egócios
n o m er ca do de t ít u los n a m edida em qu e a va r ia çã o de in for m a ções
for in t er pr et a da de m odo difer en t e pelos difer en t es in divídu os ou a fet e
os in t er esses in dividu a is de m a n eir a desigu a l. Qu a n do u m a m u da n ça
n o n ot iciá r io a fet a a opin iã o e a s n ecessida des de ca da u m de for m a
pr ecisa m en t e idên t ica , a t a xa de ju r os (t a l com o é in dica da pelos pr eços
de t ít u los e dívida s) se a ju st a r á im edia t a m en t e à n ova sit u a çã o sem
n ecessida de de qu a isqu er t r a n sa ções de m er ca do.
Assim sen do, n o ca so m a is sim ples em qu e t odos os in divídu os
t êm opin iões e in t er esses sem elh a n t es, u m a a lt er a çã o n a s cir cu n st â n -
cia s ou n a s expect a t iva s n ã o oca sion a r á n en h u m desloca m en t o de m oe-
da ; a pen a s m odifica r á a t a xa de ju r os n o gr a u n ecessá r io pa r a con t r a -
ba la n ça r o desejo qu e, n o n ível a n t er ior de ju r o, ca da in divídu o sen t ia
no sentido de ajustar suas reservas líquidas às circunstâncias ou expec-
tativas novas, e, desde que todos m udem , no mesmo grau, suas idéias
quanto à taxa que os induzam a alterar suas reservas líquidas, não re-
sultará transação alguma. A cada conjunto de circunstâncias e de expec-
tativas corresponderá um a taxa de juros apropriada e nunca se verificarão
suspeitas de alguém modificar suas reservas líquidas habituais.
De m odo ger a l, en t r et a n t o, u m a a lt er a çã o n a s cir cu n st â n cia s ou
expect a t iva s pr ovoca r á u m r ea ju st e n a s r eser va s líqu ida s in dividu a is
— desde qu e, de fa t o, u m a m u da n ça in flu a n a s idéia s dos difer en t es
in divídu os de m odo diver so, devido, em pa r t e, à s difer en ça s de m eio
a m bien t e e a o m ot ivo qu e os levou a gu a r da r din h eir o e, em pa r t e, à s
difer en ça s de con h ecim en t o e in t er pr et a çã o da n ova sit u a çã o. Desse
m odo, a n ova posiçã o de equ ilíbr io da t a xa de ju r os est a r á a ssocia da
a u m a r edist r ibu içã o da r et en çã o dos r ecu r sos líqu idos. Toda via , o qu e
m a is n os in t er essa é a m u da n ça n a t a xa de ju r os e n ã o a r edist r ibu içã o
dos r ecu r sos líqu idos. E st a ú lt im a é devida a pen a s a difer en ça s even -
t u a is en t r e os in divídu os a o pa sso qu e o fen ôm en o essen cia l é o qu e
ocor r e n o ca so m a is sim ples. Ma is do qu e isso, m esm o n o ca so ger a l,
a va r ia çã o da t a xa de ju r os é, com u m en t e, o efeit o m a is im por t a n t e
da r ea çã o a u m a m u da n ça n a s in for m a ções. O m ovim en t o n os pr eços
dos t ít u los e obr iga ções est á , com o cost u m a m dizer os jor n a is, “for a
de qu a lqu er pr opor çã o com a a t ivida de dos n egócios” — e é n a t u r a l
qu e a ssim o seja , t en do-se em vist a qu e a s r ea ções dos diver sos in di-
vídu os à s in for m a ções sã o m u it o m a is sim ila r es do qu e dessem elh a n t es.
II

E m bor a o m on t a n t e de r ecu r sos líqu idos qu e u m in divídu o r esolve


con ser va r pa r a sa t isfa zer os m ot ivos de t r a n sa ções e de pr eca u çã o n ã o

200
KEYN ES

seja in t eir a m en t e in depen den t e do qu e ele con ser va pa r a sa t isfa zer o


m ot ivo de especu la çã o, podem os con sider a r , com o u m a a bor da gem in i-
cia l vá lida , est a s du a s ca t egor ia s de r ecu r sos líqu idos com o sen do, em
gr a n de pa r t e, in depen den t es u m a da ou t r a . Con seqü en t em en t e, pa r a
fa cilit a r n ossa a n á lise a pr esen t a da a segu ir , desdobr a r em os o pr oblem a
dest e pon t o de vist a .
Seja m M 1 o m on t a n t e de r ecu r sos líqu idos con ser va do pa r a sa -
t isfa zer o m ot ivo-t r a n sa çã o e o m ot ivo-pr eca u çã o e M 2 o m on t a n t e con -
ser va do pa r a sa t isfa zer o m ot ivo-especu la çã o. Cor r espon den do a est es
dois com pa r t im en t os de r ecu r sos líqu idos t em os, en t ã o, du a s fu n ções
de liqu idez L 1 e L 2. L 1 depen de, pr in cipa lm en t e, do n ível de r en da ,
en qu a n t o L 2 depen de da r ela çã o en t r e a t a xa cor r en t e de ju r os e o
est a do da s expect a t iva s. P or t a n t o,
M = M 1 + M 2 = L 1 (Y ) + L 2 (r),

on de L 1 é a fu n çã o de liqu idez cor r espon d en t e à r en d a Y , qu e de-


t er m in a M 1 , e L 2 a fu n çã o de liqu idez em r ela çã o à t a xa de ju r os
r, qu e det er m in a M 2 . Ist o leva à con fu sã o de qu e h á t r ês qu est ões
a in vest iga r : (i) a r ela çã o en t r e a s va r ia ções d e M e a s de Y e r,
(ii) os fa t or es qu e det er m in a m a for m a de L 1 ; (iii) os fa t or es qu e
det er m in a m a for m a de L 2 .

(i) A r ela çã o en t r e a s va r ia ções de M e a s de Y e r depen de, n a


pr im eir a in st â n cia , da m a n eir a com o ocor r em a s va r ia ções de M . Su -
pon h a m os qu e M con sist a em m oeda s de ou r o e qu e só possa va r ia r
em con seqü ên cia de u m in cr em en t o de r en da n a s a t ivida des de m in e-
r a çã o de ou r o per t en cen t e a o sist em a econ ôm ico qu e est á sen do exa -
m in a do. Nest e ca so, a s va r ia ções de M est ã o, n a pr im eir a in st â n cia ,
dir et a m en t e a ssocia da s à s de Y , em se con sider a n do qu e o n ovo ou r o
se a cr escen t a à r en da de a lgu ém . A sit u a çã o é exa t a m en t e a m esm a
qu a n do a s va r ia ções de M sã o devida s a em issões de pa pel-m oeda
feit a s pelo Gover n o pa r a a t en der a su a s despesa s cor r en t es; n est e ca so,
t a m bém , o n ovo din h eir o se a cr escen t a à r en da de a lgu ém . O n ovo
n ível de r en da , en t r et a n t o, n ã o per m a n ecer á su ficien t em en t e a lt o pa r a
qu e a s n ecessida des de M 1 a bsor va m t odo o a u m en t o de M ; e u m a
pa r t e do din h eir o pr ocu r a r á sa ída n a com pr a de t ít u los ou de ou t r os
ben s a t é qu e r t en h a ba ixa do, de m odo qu e pr ovoqu e u m a a lt a n o
m on t a n t e de M 2 e, a o m esm o t em po, est im u le u m a u m en t o de Y a t a l
pon t o qu e o n ovo din h eir o seja a bsor vido qu er por M 2 qu er por M 1 , o
qu e cor r espon de a o a u m en t o de Y oca sion a do pela ba ixa de r. E st e
ca so t or n a -se, a ssim , a pr oxim a da m en t e igu a l a o ou t r o, em qu e o n ovo
din h eir o só pode ser em it ido, n a pr im eir a in st â n cia , por m eio de u m
a fr ou xa m en t o da s con dições de cr édit o por pa r t e do sist em a ba n cá r io,
de m odo qu e in du za a lgu ém a ven der a os ba n cos u m t ít u lo ou let r a
em t r oca de n ova m oeda .

201
OS ECON OMIS TAS

E st a r em os, por t a n t o, bem fu n da m en t a dos se t om a r m os o ú lt im o


ca so com o t ípico. P ode-se a dm it ir qu e u m a va r ia çã o de M con du za a
u m a va r ia çã o em r, e u m a va r ia çã o em r con du za a n ovo equ ilíbr io,
em pa r t e, por a lt er a r M 2 e, em pa r t e, por m odifica r Y e con seqü en t e-
m en t e, M 1 . Na posiçã o de equ ilíbr io, a divisã o do in cr em en t o de r ecu r sos
líqu idos en t r e M 1 e M 2 depen der á da r ea çã o do in vest im en t o a u m a
ba ixa n a t a xa de ju r os e da r en da a u m a cr éscim o do in vest im en t o.128
Desde qu e Y depen de, em pa r t e, de r, segu e qu e det er m in a da va r ia çã o
em M terá de ocasionar um a variação suficiente em r para que a som a
das variações resultantes de M 1 e M 2 seja igual à variação dada de M.

(ii) Nem sem pr e ficou cla r o se a velocida de-r en da da m oeda é


defin ida com o a pr opor çã o en t r e Y e M ou com o a pr opor çã o en t r e Y
e M 1 . P r opon h o, con t u do, t om á -la n est e ú lt im o sen t ido. Assim sen do,
se V for a velocida de-r en da da m oeda , t er em os,

Y
L 1 (Y ) = = M1 .
V

Nã o h á , n a t u r a lm en t e, n en h u m a r a zã o pa r a su por qu e V seja
con st a n t e. Seu va lor depen der á do ca r á t er da or ga n iza çã o ba n cá r ia e
in du st r ia l, dos h á bit os socia is, da dist r ibu içã o da r en da en t r e a s dife-
r en t es cla sses e do cu st o r ea l de con ser va r din h eir o ocioso. Nã o obst a n t e
isso, se t iver m os u m pr a zo cu r t o em m en t e e se pu der m os a dm it ir qu e
n ã o h a ver á m u da n ça su bst a n cia l em n en h u m dest es fa t or es, poder em os
con sider a r V qu a se con st a n t e.

(iii) Rest a , fin a lm en t e, a qu est ã o da r ela çã o en t r e M 2 e r. Vim os,


n o ca pít u lo 13, qu e a in certeza da s fu t u r a s va r ia ções n a t a xa de ju r os
é a ú n ica explica çã o in t eligível da pr efer ên cia pela liqu idez L 2 , qu e
ju st ifica a con ser va çã o de r ecu r sos líqu idos M 2 . Segu e-se, da í, qu e,
en t r e cer t o m on t a n t e e cer t a t a xa de ju r os r n ã o h a ver á r ela çã o qu a n -
t it a t iva defin ida ; o qu e im por t a n ã o é o n ível absolu to d e r, m a s o seu
gr a u de diver gên cia qu a n t o a o qu e se con sider a u m n ível r a zoa velm en t e
segu ro de r, leva n do em con t a os cá lcu los de pr oba bilida de a qu e se
r ecor r e. E xist em , en t r et a n t o, du a s r a zões pa r a cr er qu e, em cer t o est a do
de expect a t iva , u m a ba ixa de r est a r á a ssocia da a u m a u m en t o de M 2 .
E m pr im eir o lu ga r , se o n ível de r, qu e a opin iã o ger a l con sider a segu ro,
per m a n ece in va r iá vel, ca da ba ixa de r dim in u i a t a xa do m er ca do r e-
la t iva m en t e a o n ível con sider a do “segu r o” e, por t a n t o, a u m en t a os r iscos
de liqu idez; em segu n do lu ga r , ca da ba ixa de r r edu z os lu cr os cor r en t es
pr oven ien t es da iliqu idez, qu e est á dispon ível com o u m a espécie de

128 Tem os de post er ga r pa r a o Livr o Qu in t o a qu est ã o de sa ber o qu e det er m in a o ca r á t er do


n ovo equ ilíbr io.

202
KEYN ES

pr êm io de segu r o pa r a com pen sa r o r isco de per da de ca pit a l, em qu a n -


t ida de igu a l à difer en ça en t r e os qu ad rad os da t a xa a n t iga de ju r os e
da n ova . P or exem plo, se a t a xa de ju r os n a s dívida s a lon go pr a zo
for de 4%, é pr efer ível qu e se sa cr ifiqu e a liqu idez, a n ã o ser qu e u m
ba la n ço da pr oba bilida de fa ça t em er u m a a lt a da t a xa de ju r os a lon go
pr a zo su per ior a 4% do seu va lor por a n o, ist o é, su per ior a 0,16% a o
a n o. E n t r et a n t o, se a t a xa de ju r os for de 2%, o r en dim en t o cor r en t e
a pen a s com pen sa r á u m a a lt a even t u a l do ju r o de 0,04% a o a n o. É
est e, de fa t o, o pr in cipa l obst á cu lo pa r a u m a ba ixa m u it o a cen t u a da
da t a xa de ju r os. A n ã o ser qu e possa m exist ir r a zões pa r a cr er qu e
a exper iên cia fu t u r a seja m u it o difer en t e da pa ssa da , u m a t a xa de
ju r os a lon go pr a zo de, diga m os, 2% deixa m a is a t em er de qu e a
esper a r e, a o m esm o t em po, ofer ece u m r en dim en t o cor r en t e qu e é
a pen a s su ficien t e pa r a com pen sa r u m ligeir o t em or .
É , por t a n t o, eviden t e qu e a t a xa de ju r os é u m fen ôm en o ba si-
ca m en t e psicológico. Ver em os, de fa t o, n o Livr o Qu in t o qu e ela n ã o
poder á m a n t er -se em equ ilíbr io em u m n ível in ferior a o qu e cor r espon de
a o plen o em pr ego, por qu e n esse n ível se pr odu zir á u m est a do de in fla çã o
r ea l, em qu e M 1 a bsor ver á qu a n t ida des sem pr e cr escen t es de din h eir o.
P or ém , n u m n ível qu e est eja acim a do cor r espon den t e a o plen o em -
pr ego, a t a xa de ju r os a lon go pr a zo depen der á n ã o a pen a s da polít ica
cor r en t e da a u t or ida de m on et á r ia , m a s t a m bém da s expect a t iva s do
m er ca do n o qu e se r efer e à su a polít ica fu t u r a . A a u t or ida de m on et á r ia
con t r ola , com fa cilida de, a t a xa de ju r os a cu r t o pr a zo, n ã o só pelo
fa t o de n ã o ser difícil cr ia r a con vicçã o de qu e su a polít ica n ã o m u da r á
sen sivelm en t e em u m fu t u r o m u it o pr óxim o, com o t a m bém em vir t u de
de a possível per da ser pequ en a , qu a n do com pa r a da com o r en dim en t o
cor r en t e (a n ã o ser qu e est e ch egu e a pon t o de ser qu a se n u lo). Ma s
a t a xa a lon go pr a zo pode m ost r a r -se m a is r eca lcit r a n t e n o m om en t o
em qu e ca ia a u m n ível qu e, com ba se n a exper iên cia pa ssa da e n a s
expect a t iva s cor r en t es da polít ica m on et á r ia fu tu ra , a opin iã o a ba liza da
con sider a “in segu r o”. P or exem plo, em u m pa ís liga do a u m pa dr ã o-ou r o
in t er n a cion a l, u m a t a xa de ju r os in fer ior à pr eva lecen t e em qu a lqu er
ou t r a pa r t e ser á vist a com ju st ificá vel descon fia n ça ; m esm o a ssim , u m a
t a xa de ju r os in t er n a eleva da à pa r ida de com a m ais alta (a m a is a lt a
depois de con sider a dos os r iscos) exist en t e n os ou t r os pa íses per t en -
cen t es a o sist em a in t er n a cion a l pode est a r m u it o a cim a do n ível com -
pa t ível com o plen o em pr ego in t er n o.
Assim sen do, u m a polít ica m on et á r ia qu e a opin iã o pú blica con -
sider e exper im en t a l em su a n a t u r eza e fa cilm en t e su jeit a a m u da n ça s
pode fa lh a r n o seu objet ivo de r edu zir con sider a velm en t e a t a xa de
ju r os a lon go pr a zo, por qu e M 2 pode leva r a u m a u m en t o qu a se sem
lim it e em r espost a a u m a r edu çã o de r a ba ixo de cer t a cifr a . A m esm a
polít ica , por ou t r o la do, pode ser fa cilm en t e bem -su cedida se a opin iã o
pú blica ju lgá -la r a zoá vel e com pa t ível com o in t er esse pú blico, ba sea da

203
OS ECON OMIS TAS

em con vicçã o sólida e pr om ovida por u m a a u t or ida de qu e n ã o cor r a


r isco de ser su pla n t a da .
Ta lvez fosse m a is exa t o dizer qu e a t a xa de ju r os seja u m fen ô-
m en o a lt a m en t e con ven cion a l do qu e ba sica m en t e psicológico, pois o
seu va lor obser va do depen de sobr em a n eir a do va lor fu t u r o qu e se lh e
pr evê. Qu alqu er t a xa de ju r os a ceit a com su ficien t e con vicçã o com o
provavelm en te du r a dou r a será du r a dou r a ; su jeit a , n a t u r a lm en t e, em
u m a socieda de em m u da n ça a flu t u a ções or igin a da s por diver sos m o-
t ivos, em t or n o do n ível n or m a l esper a do. E m pa r t icu la r , qu a n do M 1
a u m en t a m a is depr essa qu e M , a t a xa de ju r os su bir á e vice-versa.
Ma s pode flu t u a r du r a n t e déca da s a o r edor de u m n ível cr on ica m en t e
eleva do dem a is pa r a per m it ir o plen o em pr ego — pa r t icu la r m en t e se
pr eva lecer a opin iã o de qu e o a ju st e da t a xa de ju r os se fa z de m a n eir a
a u t om á t ica , se se ju lga r qu e o n ível est a belecido pela con ven çã o t en h a
su a s r a ízes em ba ses objet iva s, m u it o m a is fir m es qu e a con ven çã o,
uma vez que de modo algum está associada na m ente do público ou das
autoridades a idéia de não ser possível alcançar um nível ótim o de em prego,
com a existência de um a gama inadequada de taxas de juros.
J á devem ser ba st a n t e eviden t es pa r a o leit or a s dificu lda des
qu e se a n t epõem a o pr opósit o de m a n t er u m a dem a n da efet iva de
n ível su ficien t em en t e a lt o pa r a ga r a n t ir o plen o em pr ego, r esu lt a n t es
da a ssocia çã o de u m a t a xa de ju r os a lon go pr a zo con ven cion a l e ba s-
t a n t e est á vel com u m a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l in con st a n t e e
a lt a m en t e in st á vel.
Se qu iser m os t ir a r pr oveit o de r eflexões m a is a n im a dor a s, t em os
de pr ocu r á -lo con vict os de qu e a con ven çã o n em sem pr e ofer ecer á m u it a
r esist ên cia a u m a lógica con t u n den t e e a u m fir m e pr opósit o da a u -
t or ida de m on et á r ia . A opin iã o pú blica é su scet ível de a cost u m a r -se
com ba st a n t e r a pidez a u m a ba ixa m oder a da da t a xa de ju r os e, con -
seqü en t em en t e, podem m odifica r -se a s expect a t iva s con ven cion a is
qu a n t o a o fu t u r o, pr epa r a n do-se, a ssim , o ca m in h o pa r a u m n ovo m o-
vim en t o — a t é cer t o pon t o. A ba ixa da t a xa de ju r os a lon go pr a zo n a
Gr ã -Br et a n h a a pós t er sido a ba n don a do o pa dr ã o-ou r o for n ece u m
exem plo in t er essa n t e desse fa t o: os m ovim en t os m a is a m plos r ea liza -
r a m -se por m eio de u m a sér ie de sa lt os descon t ín u os, n a m edida em
qu e a fu n çã o de liqu idez do pú blico, qu e se a cost u m a r a à s su cessiva s
r edu ções, ficou a pt a a r espon der a cer t os n ovos in cen t ivos do n ot iciá r io
ou da polít ica da s a u t or ida des.
III
P odem os r esu m ir a pr oposiçã o a cim a est a belecen do qu e, em qu a l-
qu er est a do de expect a t iva , h á n a m en t e do pú blico cer t a in clin a çã o
pa r a con ser va r din h eir o líqu ido em qu a n t ida de su per ior à qu e r equ er
o m ot ivo de t r a n sa çã o ou o m ot ivo de pr eca u çã o, qu e se t r a du zir á em
det en çã o efet iva de m oeda , depen den do dos t er m os em qu e a a u t or ida de

204
KEYN ES

m on et á r ia se a ch a dispost a a cr ia r r ecu r sos líqu idos. É est a pot en cia -


lida de qu e r esu m e a fu n çã o de liqu idez L 2.
A ca da m on t a n t e da qu a n t ida de de m oeda cr ia da pela a u t or ida de
m on et á r ia cor r espon der á , por t a n t o, coeteris paribu s, det er m in a da t a xa
de ju r os ou , m a is est r it a m en t e, det er m in a do com plexo de t a xa s de
ju r os pa r a a s dívida s de diver sos ven cim en t os. A m esm a pr oposiçã o,
en t r et a n t o, a plica -se pa r a qu a lqu er ou t r o fa t or do sist em a econ ôm ico
isola da m en t e con sider a do. Assim sen do, est a a n á lise só ser á ú t il e
sign ifica t iva qu a n do h ou ver a lgu m a r ela çã o pa r t icu la r m en t e dir et a ou
objet iva en t r e a s va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda e a s qu e se ver i-
fiqu em n a t a xa de ju r os. A r a zã o qu e n os leva a su por a exist ên cia
de t a l r ela çã o especia l é in spir a da pelo fa t o de qu e, fa la n do em t er m os
ger a is, o sist em a ba n cá r io e a a u t or ida de m on et á r ia n egocia m com
din h eir o e dívida s e n ã o com va lor es ou ben s de con su m o.
Se a a u t or ida de m on et á r ia est ivesse dispost a a oper a r em t er m os
especifica dos n os dois sen t idos com dívida s de qu a lqu er ven cim en t o e,
m a is a in da , se est ivesse dispost a a oper a r com dívida s de r iscos va -
r iá veis, a r ela çã o en t r e o com plexo da s t a xa s de ju r os e a qu a n t ida de
de m oeda ser ia dir et a . O com plexo da s t a xa s de ju r os expr im ir ia , a pe-
n a s, os t er m os em qu e o sist em a ba n cá r io est ivesse dispost o a a dqu ir ir
ou ceder a s dívida s; e a qu a n t ida de de din h eir o ser ia igu a l a o m on t a n t e
qu e pu desse en con t r a r r et en çã o n a posse de in divídu os qu e — con si-
der a da s t oda s a s cir cu n st â n cia s r eleva n t es — pr efer issem o con t r ole
de r ecu r sos líqu idos a cedê-los em t r oca de dívida s, n a s con dições in -
dica da s pela t a xa de ju r os do m er ca do. A m elh or ia pr á t ica m a is im -
por t a n t e qu e t a lvez se pu desse in t r odu zir n a t écn ica de a dm in ist r a çã o
m on et á r ia ser ia a su bst it u içã o da t a xa de descon t o ú n ica pa r a os t ít u los
a cu r t o pr a zo, por u m a ofer t a com plexa do ba n co cen t r a l de com pr a r
e ven der a pr eços fixa dos os t ít u los e pa péis de pr im eir a lin h a de
qu a lqu er pr a zo.
H oje, en t r et a n t o, n a pr á t ica r ea l, com o os pr eços da s dívida s,
con for m e fixa dos pelo sist em a ba n cá r io, sã o “efet ivos” n os m er ca dos,
qu er en do dizer com isso qu e sã o esses pr eços qu e gover n a m o pr eço
cor r en t e de m er ca do, a m a gn it u de deles va r ia segu n do a s ca r a ct er íst ica s
dos diver sos sist em a s. Às vezes ela é m a is efet iva n u m sen t ido qu e
n ou t r o, sign ifica n do isso qu e o sist em a ba n cá r io pode com pr om et er -se
a com pr a r dívida s a cer t o pr eço, m a s n ã o n ecessa r ia m en t e a ven dê-la s
por u m m on t a n t e qu e r epr esen t e a pen a s u m a com issã o de cor r et a gem ,
em bor a n ã o h a ja n en h u m a r a zã o pa r a im pedir qu e o pr eço se t or n e
efet ivo n os dois sen t idos com a a ju da de oper a ções de m er ca do a ber t o.
E xist e, t a m bém , u m a exceçã o im por t a n t e qu e su r ge do fa t o de a a u -
t or ida de m on et á r ia n ã o est a r , por via de r egr a , dispost a a n egocia r ,
com a m esm a fa cilida de, dívida s de qu a lqu er ven cim en t o. A a u t or ida de
m on et á r ia ger a lm en t e t en de, n a pr á t ica , a con cen t r a r su a a t ivida de
n a s dívida s a cu r t o pr a zo, e a deixa r o pr eço da s obr iga ções de lon go

205
OS ECON OMIS TAS

pr a zo sob a in flu ên cia t a r dia e im per feit a da s r ea ções pr oven ien t es do


pr eço da s dívida s de cu r t o pr a zo — em bor a , t a m bém a qu i, n ã o h a ja
m ot ivo a lgu m qu e a obr igu e a a gir dest a m a n eir a . Na s cir cu n st â n cia s
em qu e est a s exceções in t er vêm , a r ela çã o dir et a en t r e a t a xa de ju r os
e a qu a n t ida de de din h eir o sofr e m odifica ções. Na Gr ã -Br et a n h a , pa r ece
qu e o ca m po de con t r ole deliber a do va i a la r ga n do-se. Ma s ca da vez
qu e se a plica a pr esen t e t eor ia a ca sos pa r t icu la r es, con vém leva r em
con t a a s ca r a ct er íst ica s especia is do m ét odo r ea lm en t e em pr ega do pela
a u t or ida de m on et á r ia . Se a a u t or ida de m on et á r ia n egocia a pen a s com
dívida s a cu r t o pr a zo, deve-se exa m in a r qu e in flu ên cia s exer cem o
pr eço cor r en t e e o pr eço pr ospect ivo dos t ít u los de cu r t o pr a zo sobr e
a s dívida s de ven cim en t os m a is pr olon ga dos.
Dia n t e disso, h á cer t a s lim it a ções n a ca pa cida de da a u t or ida de
m on et á r ia n o sen t ido de est a belecer cer t o com plexo de t a xa s de ju r os
pa r a dívida s de difer en t es pr a zos e r iscos, qu e podem r esu m ir -se da
segu in t e m a n eir a :

(1) H á lim it es qu e a pr ópr ia a u t or ida de se im põe a plica n do r es-


t r ições a su a s oper a ções de m odo qu e n egocie a pen a s com dívida s de
u m t ipo pa r t icu la r .

(2) H á a possibilida de, por m ot ivos expost os a n t er ior m en t e, de


qu e, t ã o logo a t a xa de ju r os h a ja ba ixa do a cer t o n ível, a pr efer ên cia
pela liqu idez se t or n e vir t u a lm en t e a bsolu t a , n o sen t ido de qu e t odos
pr efir a m m a n t er r ecu r sos líqu idos a con ser va r u m a dívida qu e r en de
u m a t a xa de ju r os t ã o ba ixa . Nesse ca so, a a u t or ida de m on et á r ia t er ia
per dido o con t r ole efet ivo sobr e a t a xa de ju r os. Ma s, con qu a n t o est e
ca so ext r em o possa vir a t er im por t â n cia pr á t ica n o fu t u r o, n ã o con h eço
a in da n en h u m exem plo do m esm o. De fa t o, con sider a n do a r elu t â n cia
da m a ior ia da s a u t or ida des m on et á r ia s em oper a r dest em ida m en t e
com dívida s a lon go pr a zo, n ã o se ofer ecer a m m u it a s opor t u n ida des
pa r a fa zer u m a pr ova sem elh a n t e. Adem a is, se t a l sit u a çã o se a pr e-
sen t a sse, sign ifica r ia qu e a pr ópr ia a u t or ida de pú blica poder ia obt er
em pr ést im os em esca la lim it a da do sist em a ba n cá r io a u m a t a xa de
ju r os n om in a l.

(3) Os exem plos m a is n ot á veis de u m cola pso com plet o da est a -


bilida de da t a xa de ju r os, em vir t u de de n ivela m en t o da fu n çã o de
liqu idez em u m a dir eçã o ou em ou t r a , ocor r er a m em cir cu n st â n cia s
m u it o a n or m a is. A Rú ssia e a E u r opa Cen t r a l con h ecer a m , depois da
gu er r a , u m a cr ise ou fu ga da m oeda , du r a n t e a qu a l n ã o se podia
in du zir n in gu ém a con ser va r , de for m a a lgu m a , h a ver es em din h eir o
ou dívida s; m esm o u m a t a xa de ju r os eleva da e cr escen t e foi in ca pa z
de m a n t er o r it m o da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l (especia lm en t e em

206
KEYN ES

se t r a t a n do de est oqu e de ben s líqu idos) sob a in flu ên cia da pr evisã o


de u m a ba ixa u lt er ior m a ior n o va lor do din h eir o; en qu a n t o isso, n os
E st a dos Un idos, em cer t os per íodos de 1932, ver ificou -se u m a cr ise de
n a t u r eza opost a — u m a cr ise fin a n ceir a ou de liqu ida çã o, qu a n do foi
im possível con ven cer pr a t ica m en t e qu a lqu er pessoa a desfa zer -se dos
seu s h a ver es líqu idos, em qu a lqu er con diçã o r a zoá vel.

(4) Rest a , fin a lm en t e, a dificu lda de já exa m in a da n a seçã o IV do


ca pít u lo 11, p. 53, qu e im pede a t a xa de ju r os efet iva de ba ixa r a lém
de cer t a cifr a , dificu lda de est a qu e pode t or n a r -se sér ia n u m a época
de t a xa s de ju r os ba ixa s, ou seja , os cu st os in t er m ediá r ios de est a belecer
o con t a t o en t r e o m u t u á r io e o m u t u a n t e fin a l, bem com o n a m a r gem
pa r a r isco, especia lm en t e pa r a o r isco m or a l, qu e o m u t u a n t e exige
a lém da t a xa de ju r os pu r a . Ao se ver ifica r u m declín io n a t a xa de
ju r os pu r a , n ã o segu e, com o con seqü ên cia n a t u r a l, u m declín io pari
passu da s m a r gen s pa r a despesa s e r iscos. Assim sen do, a t a xa de
ju r os qu e h á de pa ga r o m u t u á r io t ípico pode ba ixa r m a is len t a m en t e
qu e a t a xa de ju r os pu r a e, con for m e os m ét odos da or ga n iza çã o ba n cá r ia
e fin a n ceir a exist en t e, pode ser im possível t r a zê-la a ba ixo de cer t a
cifr a m ín im a . E st e fa t o a dqu ir e im por t â n cia especia l qu a n do o r isco
m or a l é ca lcu la do n u m va lor a pr eciá vel, pois, qu a n do o r isco pr ovém
de dú vida s qu e o m u t u a n t e vislu m br a sobr e a h on est ida de do m u t u á r io,
est e, qu e n ã o t en cion a ser deson est o, n a da t em pa r a com pen sa r o en -
ca r go m a ior qu e da í lh e r esu lt a . E sse m esm o fa t or é t a m bém im por t a n t e
n o ca so dos em pr ést im os a cu r t o pr a zo (por exem plo, os em pr ést im os
ba n cá r ios), qu a n do os cu st os de ca pt a çã o sã o eleva dos, pois u m ba n co
pode ser obr iga do a cobr a r a os seu s clien t es de 1,5 a 2%, m esm o qu e
a t a xa de ju r os pu r a seja n u la pa r a o m u t u a n t e.
IV

An t ecipa n do a qu ilo qu e ser á objet o do ca pít u lo 21, m a is a dia n t e,


t a lvez con ven h a in dica r br evem en t e, a est a a lt u r a , a r ela çã o do qu e
foi dit o a cim a com a t eor ia qu a n t it a t iva da m oeda .
Nu m a socieda de est á t ica ou n u m a socieda de em qu e, por qu a lqu er
ou t r a r a zã o, n in gu ém exper im en t e n en h u m a in cer t eza sobr e a s fu t u r a s
t a xa s de ju r os, a fu n çã o de liqu idez L 2 ou a pr open sã o a en t esou r a r
(com o poder ía m os ch a m a r -lh e) ser á sem pr e zer o qu a n do em equ ilíbr io.
P or t a n t o, em est a do de equ ilíbr io, M 2 = O e M = M 1 ; de m odo qu e
qu a lqu er va r ia çã o em M fa r á com qu e a t a xa de ju r os flu t u e a t é qu e
o r en dim en t o a lca n ce u m n ível n o qu a l a va r ia çã o M 1 seja igu a l à qu e
se su põe qu e ocor r e em M . Or a , sen do V a velocida de-r en da da m oeda ,
t a l com o foi a n t es defin ida , e Y a r en da a gr ega da , t em os M 1 V = Y .
P or t a n t o, se é possível m edir a qu a n t ida de Y e o pr eço P da pr odu çã o

207
OS ECON OMIS TAS

corrente, tem os Y = OP e, portanto, M V = OP, relação que tem muita


analogia com a teoria quantitativa da m oeda em sua form a tradicional.129
P a r a os pr opósit os do m u n do r ea l, u m a gr a n de fa lh a da t eor ia
qu a n t it a t iva é qu e ela n ã o fa z dist in çã o en t r e a s va r ia ções n os pr eços,
qu e sã o u m a fu n çã o da s va r ia ções da pr odu çã o, e a s qu e pr ovêm da s
m odifica ções n a u n ida de de sa lá r io.130 E st a om issã o t a lvez possa ser
explica da pela s h ipót eses de qu e n u n ca h á pr open sã o a en t esou r a r e
qu e h á sem pr e plen o em pr ego, pois, n est e ca so, sen do O con st a n t e e
M 2 igu a l a zer o, segu e-se, se t a m bém pu der m os t om a r V com o con st a n t e,
qu e t a n t o a u n ida de de sa lá r ios qu a n t o o n ível de pr eços sã o dir et a -
m en t e pr opor cion a is à qu a n t ida de de m oeda .

129 Se t ivéssem os defin ido V n ã o igu a l a Y / M 1, m a s igu a l a Y / M , n a t u r a lm en t e a t eor ia


qu a n t it a t iva ser ia u m t r u ísm o qu e se m a n t ém em qu a lqu er cir cu n st â n cia , em bor a sem
n en h u m sign ifica do.
130 E st e pon t o ser á desen volvido m a is a m pla m en t e n o ca p. 21.

208
C AP ÍTU LO 16
Obs e rv a ç õ e s D iv e rs a s S o bre a N a tu re za d o Ca p ita l

U m a t o de pou pa n ça in dividu a l sign ifica — por a ssim dizer —


u m a decisã o de n ã o ja n t a r h oje, m a s n ão im plica , n ecessa r ia m en t e, a
decisã o de ja n t a r ou de com pr a r u m pa r de sa pa t os da qu i a u m a sem a n a
ou u m a n o, ou de con su m ir u m a coisa específica n u m a da t a especifica da .
Assim sen do, pr odu z u m efeit o depr essivo sobr e a s a t ivida des econ ô-
m ica s a plica da s n a pr epa r a çã o do ja n t a r de h oje, sem est im u la r a s
qu e pr epa r a r a m a lgu m a t o fu t u r o de con su m o. Nã o é u m a su bst it u içã o
da dem a n da de con su m o pr esen t e por u m a dem a n da de con su m o fu t u r o,
m a s a pen a s u m a dim in u içã o líqu ida dest a dem a n da . Além disso, a
expect a t iva de con su m o fu t u r o est á de t a l m odo ba sea da n o con h eci-
m en t o do con su m o pr esen t e qu e qu a lqu er r edu çã o do ú lt im o pr ova vel-
m en t e depr im ir á o pr im eir o, com o r esu lt a do de qu e esse a t o de pou -
pa n ça n ã o a pen a s fa r á ba ixa r o pr eço dos ben s de con su m o, in depen -
den t em en t e da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l exist en t e, com o t a m bém
pode en fr a qu ecer est a ú lt im a . Nesse ca so pode r edu zir a dem a n da de
in vest im en t o a t u a l t a n t o qu a n t o a dem a n da de con su m o pr esen t e.

Se a pou pa n ça con sist isse n ã o a pen a s em a bst er -se de u m con -


su m o pr esen t e, m a s t a m bém em fa zer , sim u lt a n ea m en t e, u m a r eser va
específica pa r a u m con su m o post er ior , o r esu lt a do poder ia ser bem
difer en t e. Au m en t a r ia , pois, em t a l ca so, a expect a t iva de t ir a r cer t o
r en dim en t o do in vest im en t o, e os r ecu r sos liber a dos da disposiçã o do
con su m o pr esen t e poder ia m ser u t iliza dos n a pr ovisã o do con su m o fu -
t u r o. Nã o qu e esses r ecu r sos o fossem , m esm o n est e ca so, n u m a esca la
n ecessa r ia m en t e igu al a o m on t a n t e dos r ecu r sos liber a dos, vist o qu e
o in t er va lo deseja do de esper a poder ia exigir u m m ét odo de pr odu çã o
t ã o desfa vor a velm en t e “in dir et o” qu e a su a eficiên cia se t or n a sse ba s-
t a n t e in fer ior à t a xa de ju r os cor r en t e; en t ã o, o efeit o fa vor á vel a o

209
OS ECON OMIS TAS

em pr ego det er m in a do por u m a en com en da pa r a con su m o fu t u r o n ã o


se m a n ifest a r ia logo, sen ã o n u m a da t a post er ior , de t a l m odo qu e a
con seqü ên cia im ed iata do a t o de pou pa r con t in u a r ia sen do a in da a d-
ver sa a o em pr ego. De qu a lqu er m a n eir a , u m a decisã o in dividu a l de
pou pa r n ã o sign ifica , de fa t o, em it ir u m pedido con cr et o pa r a con su m o
post er ior , m a s a pen a s o ca n cela m en t o de u m pedido pr esen t e. Assim
sen do, a dm it in do-se qu e a expect a t iva de con su m o seja a ú n ica raison
d ’être do em pr ego, n ã o h á n en h u m pa r a doxo n a con clu sã o de qu e u m a
dim in u içã o n a pr open sã o a con su m ir t en h a , coeteris paribu s, u m efeit o
depr essivo sobr e o em pr ego.
A dificu lda de su r ge do fa t o de qu e o a t o de pou pa r su põe n ã o
u m a su bst it u içã o do con su m o pr esen t e por a lgu m con su m o a dicion a l
específico, cu ja pr epa r a çã o exija t a n t a a t ivida de econ ôm ica qu a n t o a
qu e se n ecessit a r ia pa r a o con su m o equ iva len t e à som a pou pa da , m a s
a n t es u m desejo de “r iqu eza ” com o t a l, ist o é, a possibilida de de con -
su m ir u m a r t igo in det er m in a do em u m a da t a in det er m in a da . A idéia
a bsu r da , em bor a qu a se u n iver sa l, de qu e u m a t o de pou pa n ça in dividu a l
é t ã o fa vor á vel à pr ocu r a efet iva qu a n t o ou t r o de con su m o in dividu a l,
em a n a da fa lá cia , m u it o m a is pla u sível do qu e a con clu sã o dela der i-
va da , de qu e o desejo de possu ir m a is r iqu eza , sen do m a is ou m en os
idên t ico a o de fa zer m a is in vest im en t os, deve, a u m en t a n do a pr ocu r a
de in vest im en t o, est im u la r a pr odu çã o r espect iva ; de on de segu e qu e
a pou pa n ça in dividu a l fa vor ece o in vest im en t o cor r en t e à m esm a m e-
dida qu e dim in u i o con su m o a t u a l.
É m u it o difícil elim in a r est a fa lá cia da m en t e dos h om en s. E la
pr ovém da su posiçã o de qu e o pr opr iet á r io de r iqu eza deseja u m bem
de ca pit a l por si m esm o qu a n do, n a r ea lida de, o qu e ele r ea lm en t e
deseja é o seu ren d im en to provável. Or a , est e r en dim en t o pr ová vel
depen de in t eir a m en t e da pr evisã o da pr ocu r a efet iva em r ela çã o à s
fu t u r a s con dições da ofer t a . P or t a n t o, se u m a t o de pou pa n ça n a da
fa z por m elh or a r o r en dim en t o pr ová vel, t a m bém em n a da con t r ibu ir á
pa r a est im u la r o in vest im en t o. Além disso, pa r a qu e u m in divídu o qu e
pou pa possa a t in gir o seu fim , qu e é o de a dqu ir ir r iqu eza , n ã o é
n ecessá r io qu e u m n ovo bem de ca pit a l seja pr odu zido pa r a sa t isfa zê-lo.
O m er o a t o de pou pa r r ea liza do por u m in divídu o, sen do bilateral,
com o dem on st r a m os a n t es, obr iga ou t r o in divídu o a t r a n sfer ir -lh e a l-
gu m a r iqu eza , velh a ou n ova . Ca da a t o de pou pa n ça im plica t r a n sfe-
r ên cia “for ça da ” in evit á vel de r iqu eza a qu em pou pa , em bor a est e, por
su a vez, possa sofr er a s con seqü ên cia s da pou pa n ça dos ou t r os. E ssa s
t r a n sfer ên cia s de r iqu eza n ã o r equ er em a cr ia çã o de r iqu eza n ova —
n a r ea lida de, com o vim os, podem ser a t iva m en t e a n t a gôn ica s. A cr ia çã o
de r iqu eza n ova depen de in t eir a m en t e de qu e o seu r en dim en t o pr ová vel
a lca n ce o n ível est a belecido pa r a a t a xa cor r en t e de ju r os. O r en dim en t o
pr ová vel do n ovo in vest im en t o m a r gin a l n ã o a u m en t a pelo fa t o de qu e

210
KEYN ES

a lgu ém deseje a u m en t a r su a r iqu eza , pois qu e ele depen de da expec-


t a t iva de pr ocu r a de det er m in a do bem em da t a det er m in a da .
Nã o esca pa m os a est a con clu sã o a r gu m en t a n do qu e o possu idor
de r iqu eza deseja n ã o u m r en dim en t o pr ová vel det er m in a do, por ém o
r en dim en t o pr ová vel m a is va n t a joso en t r e os qu e lh e sã o ofer ecidos,
de m a n eir a qu e u m desejo m a ior de possu ir r iqu eza r edu z o r en dim en t o
pr ová vel com qu e t er ã o de con fr on t a r -se os pr odu t or es de n ovos in ves-
t im en t os. E st e r a ciocín io n ã o con sider a , pois, o fa t o de qu e sem pr e se
pode opor u m a a lt er n a t iva à pr opr ieda de de ben s r ea is de ca pit a l, ou
seja , a pr opr ieda de de din h eir o ou débit os; desse m odo o r en dim en t o
pr ová vel com qu e t er ã o de con t en t a r -se os pr odu t or es de in vest im en t os
n ovos n ã o pode ba ixa r a lém do n ível fixa do pa r a a t a xa de ju r os cor r en t e.
E a t a xa de ju r os cor r en t e depen de, con for m e vim os, n ã o da in t en sida de
do desejo de possu ir r iqu eza , m a s da in t en sida de do desejo de con ser -
vá -la r espect iva m en t e em for m a líqu ida ou ilíqu ida , a lia da à m a gn it u de
da ofer t a de r iqu eza , n u m a dessa s for m a s em r ela çã o à su a ofer t a n a
ou t r a . Se o leit or se a ch a a in da per plexo, per gu n t e-se por qu e, per m a -
n ecen do in a lt er a da a qu a n t ida de de din h eir o, u m n ovo a t o de pou pa n ça
dever ia dim in u ir a som a qu e se deseja con ser va r em for m a líqu ida à
t a xa exist en t e de ju r os.
E xa m in a r em os n o pr óxim o ca pít u lo a lgu m a s dificu lda des m a is
sér ia s qu e podem a pr esen t a r -se qu a n do t en t a m os a pr ofu n da r -n os n a s
r a zões de com o e por qu e isso ocor r e.
II

E m vez de dizer do ca pit a l qu e ele é prod u tivo, é pr efer ível dizer


qu e ele for n ece n o cu r so da su a exist ên cia u m r en dim en t o exceden t e
sobr e seu cu st o or igin a l. A ú n ica r a zã o, pois, pela qu a l u m bem per m it e
u m a expect a t iva de r en der , du r a n t e su a exist ên cia , ser viços com u m
va lor a gr ega do su per ior a o seu pr eço de ofer t a in icia l deve-se a o fa t o
de qu e é escasso; e con t in u a sen do esca sso pela con cor r ên cia da t a xa
de ju r os do din h eir o. À m edida qu e o ca pit a l se t or n a m en os esca sso
o exceden t e de r en dim en t o dim in u ir á sem qu e ele se t or n e por isso
m en os pr odu t ivo — pelo m en os n o sen t ido físico.
P or isso, eu a ceit o a dou t r in a pr é-clá ssica de qu e t u do é prod u zid o
pelo trabalh o; a lém da a ju da do qu e a n t es er a ch a m a do de a r t e e a gor a
se ch a m a t écn ica , dos r ecu r sos n a t u r a is isen t os de cu st os ou qu e cu st a m
u m a r en da , con for m e su a esca ssez ou a bu n dâ n cia , e dos r esu lt a dos do
t r a ba lh o a n t er ior , in cor por a dos a os ben s pa t r im on ia is, qu e a u fer em ,
t a m bém , u m pr eço va r iá vel segu n do su a esca ssez ou a bu n dâ n cia . É
pr efer ível con sider a r o t r a ba lh o, in clu in do, n a t u r a lm en t e, os ser viços
pessoa is do em pr esá r io e de seu s cola bor a dor es, com o o ú n ico fa t or da
pr odu çã o, oper a n do den t r o de u m a m bien t e de t écn ica r ecu r sos n a t u -
r a is, equ ipa m en t os e pr ocu r a efet iva . Ist o explica , em pa r t e, por qu e
pu dem os t om a r a u n ida de de t r a ba lh o com o a ú n ica u n ida de física de

211
OS ECON OMIS TAS

qu e n ecessit a m os em n osso sist em a econ ôm ico, à pa r t e da s u n ida des


de m oeda e de t em po.
É ver da de qu e cer t os pr ocessos lon gos e in dir et os sã o fisica m en t e
eficien t es, em bor a o m esm o a con t eça com a lgu n s pr ocessos cu r t os. Os
pr ocessos lon gos n ã o der iva m su a eficiên cia t en do com o ca u sa a su a
ext en sã o. Algu n s deles, pr ova velm en t e a m a ior pa r t e, ser ia m fisica -
m en t e m u it o in eficien t es em vir t u de da s pr oba bilida des de per da s e
de est r a gos ca u sa dos pelo t em po.131 P a r a det er m in a da for ça de t r a ba lh o
h á u m lim it e defin ido n o t oca n t e à qu a n t ida de de t r a ba lh o su scet ível
de ser in cor por a do n os pr ocessos in dir et os qu e pode ser u sa do va n t a -
josa m en t e. F or a de ou t r a s con sider a ções, deve h a ver u m a pr opor çã o
defin ida en t r e a qu a n t ida de de t r a ba lh o em pr ega da em con st r u ir m á -
qu in a s e a qu e ser á em pr ega da em u t ilizá -la s. A qu a n t ida de fin a l de
valor obt ido n ã o a u m en t a in defin ida m en t e em r ela çã o à qu a n t ida de
de t r a ba lh o em pr ega do, n a m edida em qu e os pr ocessos a dot a dos se
t or n a m ca da vez m a is in dir et os, m esm o n o ca so de a su a eficiên cia
física con t in u a r a u m en t a n do. Só n o ca so de o desejo de a dia r o con su m o
ser ba st a n t e in t en so pa r a cr ia r u m a sit u a çã o em qu e o plen o em pr ego
exigisse u m volu m e de in vest im en t o su ficien t em en t e gr a n de pa r a t or -
n a r n ega t iva a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l ser ia va n t a joso u m pr o-
cesso pelo sim ples fa t o de ser dem or a do; n esse ca so dever ía m os a dot a r
os pr ocessos qu e sã o fisica m en t e in eficien tes, desde qu e fossem ba st a n t e
lon gos pa r a qu e o lu cr o pr opor cion a do pelo a dia m en t o equ ilibr a sse a
su a eficiên cia . Aca ba r ía m os en con t r a n do-n os, de fa t o, n u m a sit u a çã o
em qu e os pr ocessos cu rtos t er ia m de con ser va r -se ba st a n t e esca ssos
pa r a qu e su a eficiên cia física com pen sa sse a desva n t a gem da pr on t a
en t r ega do seu pr odu t o. Um a t eor ia cor r et a , por t a n t o, deve ser r ever -
sível, de m odo qu e possa in clu ir os ca sos de eficiên cia m a r gin a l do
ca pit a l cor r espon den t es a u m a t a xa de ju r os t a n t o posit iva qu a n t o
n ega t iva , e, n o m eu en t en der , só a t eor ia da esca ssez, esboça da a cim a ,
t em est a pr opr ieda de. Além dist o, h á in ú m er a s r a zões pa r a qu e a s
diver sa s espécies de ser viços e fa cilida des seja m esca ssa s e, por t a n t o,
dispen diosa s, r ela t iva m en t e à qu a n t ida de de t r a ba lh o qu e lh es est á
in cor por a da . P or exem plo, os pr ocessos dos qu a is em a n a m a u ch eir o
im plica m r em u n er a çã o m a ior , pois de ou t r o m odo n ã o se en con t r a r ia
gen t e pa r a os execu t a r . O m esm o su cede com os pr ocessos a r r isca dos.
E n t r et a n t o, n ã o delin ea m os u m a t eor ia da pr odu t ivida de com ba se em
pr ocessos dos qu a is em a n e m a u ch eir o ou qu e seja m a r r isca dos. E m
r esu m o, n em t odo o t r a ba lh o se r ea liza em cir cu n st â n cia s igu a lm en t e
a gr a dá veis, e a s con dições de equ ilíbr io exigem qu e os a r t igos pr odu -
zidos em con dições m en os a t r a en t es (ca r a ct er iza da s pelo m a u ch eir o,
o r isco ou o la pso de t em po) con t in u em ba st a n t e esca ssos pa r a qu e se

131 Cf. a n ot a de Ma r sh a ll sobr e Böh m -Ba wer k. Prin ciples. p. 583.

212
KEYN ES

lh es a t r ibu a u m pr eço m a is eleva do. Se o t r a n scu r so de t em po se t or n a ,


por ém , u m a cir cu n st â n cia a gr a dá vel, o qu e pode m u it o bem ser o ca so,
e já o é pa r a m u it os in divídu os, en t ã o, com o disse a n t es, sã o os pr ocessos
cu r t os qu e devem con t in u a r su ficien t em en t e esca ssos.
Da do o gr a u ót im o em qu e u m pr ocesso possa ser in dir et o, es-
colh er em os, n a t u r a lm en t e, os pr ocessos in dir et os m a is eficien t es qu e
possa m os en con t r a r pa r a a t in gir o t ot a l r equ er ido. E sse gr a u ót im o
em si m esm o dever ia ser a dequ a do pa r a sa t isfa zer , n a s da t a s cor r es-
pon den t es, a pa r t e da dem a n da dos con su m idor es cu jo a dia m en t o se
deseja . E m con dições ót im a s, o qu e se qu er dizer é qu e a pr odu çã o
deve ser or ga n iza da de m a n eir a m a is eficien t e pa r a qu e seja com pa t ível
com a en t r ega n a s da t a s em qu e se esper a qu e a dem a n da dos con -
su m idor es se t or n e efet iva . Na da a dia n t a pr odu zir pa r a en t r ega em
da t a s difer en t es dest a s, a in da qu e a m u da n ça da s da t a s de en t r ega
pu desse a u m en t a r a pr odu çã o física — sa lvo se, por a ssim dizer , a
per spect iva de u m a r efeiçã o m a is a bu n da n t e in du zir o con su m idor a
a n t ecipa r ou a r et a r da r a h or a de ja n t a r . Se depois de ou vir t odos os
por m en or es sobr e os pr a t os qu e pode obt er m a r ca n do o ja n t a r pa r a
h or a s difer en t es esper a -se qu e o con su m idor se decida pela s 8 h or a s,
com pet e a o cozin h eir o pr epa r a r a m elh or r efeiçã o qu e possa ser ser vida
a essa h or a , sem leva r em con t a qu e à s 7:30, 8 h or a s ou 8:30 poder ia
ser o h or á r io qu e m a is lh e con vir ia se o t em po n ã o fosse leva do em
con sider a çã o, de u m m odo ou de ou t r o, e se su a ú n ica t a r efa con sist isse
em pr epa r a r a bsolu t a m en t e o m elh or ja n t a r possível. E m cer t a s fases
da sociedade, talvez pudéssemos obter refeições fisicam ente melhores jan-
tando mais tarde do que costum amos, m as é igualm ente concebível que,
em outras fases, as conseguíssem os melhores fazendo-o mais cedo. Com o
dissemos antes, nossa teoria é aplicável às duas contingências.
Se a t a xa de ju r os fosse zer o, h a ver ia u m in t er va lo ót im o pa r a
qu a lqu er a r t igo da do, en t r e a da t a m édia do in ício de su a fa br ica çã o
e a da t a de con su m o, pa r a o qu a l o cu st o em t r a ba lh o ser ia m ín im o;
u m pr ocesso de pr odu çã o m a is cu r t o ser ia t ecn ica m en t e m en os eficien t e,
a o pa sso qu e u m pr ocesso m a is lon go ser ia , t a m bém , m en os eficien t e,
em vir t u de da s despesa s de a r m a zen a gem e de det er ior a çã o. Con t u do,
se a t a xa est iver a cim a de zer o, in t r odu z-se u m n ovo elem en t o de cu st o
qu e a u m en t a com a du r a çã o do pr ocesso; desse m odo, o in t er va lo ót im o
se r edu zir á e a fa br ica çã o cor r en t e pa r a en t r ega even t u a l do a r t igo
t er á de ser dim in u ída a t é qu e o pr eço pr ová vel t en h a su bido o su ficien t e
pa r a cobr ir o a u m en t o do cu st o — u m cu st o qu e se eleva r á t a n t o pelos
en ca r gos do ju r o qu a n t o pela m en or eficiên cia do m ét odo a br evia do de
pr odu çã o. Do con t r á r io, se a t a xa de ju r os ca ir a ba ixo de zer o (a dm it in do
qu e ist o seja t ecn ica m en t e possível), o in ver so se ver ifica r á . Da da a
pr ová vel dem a n da dos con su m idor es, em vez de se in icia r a pr odu çã o
cor r en t e h oje, t em -se a a lt er n a t iva de com eçá -la em da t a post er ior .
Con seqü en t em en t e, o in ício da pr odu çã o cor r en t e só se ju st ifica r ia qu a n -

213
OS ECON OMIS TAS

do seu ba ixo cu st o, em vir t u de de m a ior eficiên cia t écn ica ou de per s-


pect iva s de va r ia ções de pr eços, a o se pr odu zir h oje ou em da t a pos-
t er ior , for in su ficien t e pa r a com pen sa r o r en dim en t o m en or de ju r os
n ega t ivos. No ca so da gr a n de m a ior ia dos a r t igos, ser ia de gr a n de
in eficiên cia t écn ica o in ício de su a pr odu çã o em u m a época qu e se pode
con sider a r m odest a m en t e a n t er ior a o seu pr ová vel con su m o. Dest e
m odo, m esm o qu e a t a xa de ju r os seja zer o, h á u m lim it e est r it o pa r a
a pr opor çã o da dem a n da pr ová vel dos con su m idor es qu e con vém co-
m eça r a a t en der de a n t em ã o; e, se a t a xa de ju r os sobe, a pr opor çã o
da dem a n da pr ová vel dos con su m idor es pa r a a qu a l con vém pr odu zir
h oje r est r in ge-se pari passu .
III

Vim os qu e, a lon go pr a zo, o ca pit a l deve con ser va r -se su ficien -


t em en t e esca sso pa r a qu e a su a eficiên cia m a r gin a l seja pelo m en os
igu a l à t a xa de ju r os cor r espon den t es à du r a çã o de su a exist ên cia , t a l
com o o det er m in a m a s con dições psicológica s e in st it u cion a is. Qu e sig-
n ifica r ia isso pa r a u m a socieda de t ã o bem pr ovida de ca pit a l, cu ja
eficiên cia m a r gin a l fosse zer o e se t or n a sse n ega t iva em con seqü ên cia
de u m in vest im en t o su plem en t a r , m esm o possu in do u m sist em a m o-
n et á r io em qu e o din h eir o “con ser va ” o seu va lor , en volven do a pen a s
despesa s de a r m a zen a gem e con ser va çã o de pou ca m on t a , de m odo
qu e, n a pr á t ica , o ju r o n ã o possa ser n ega t ivo, e qu e em sit u a çã o de
plen o em pr ego est ivesse dispost a a pou pa r ?
Se, em t a is cir cu n st â n cia s, pa r t im os da posiçã o de plen o em pr ego,
os em pr esá r ios t er ã o, n a t u r a lm en t e, pr eju ízos se con t in u a r em a ofer ecer
em pr ego em u m a esca la qu e u t ilize a t ot a lida de do ca pit a l exist en t e.
E m con seqü ên cia o est oqu e de ca pit a l e o volu m e de em pr ego t er ã o
de r edu zir -se a t é qu e a com u n ida de se a ch e ba st a n t e pobr e pa r a qu e
a pou pa n ça a gr ega da seja n u la , n eu t r a liza n do-se a pou pa n ça posit iva
de cer t os in divídu os ou gr u pos pela pou pa n ça n ega t iva de ou t r os. P a r a
u m a socieda de t a l com o a qu e a ca ba m os de su por , a sit u a çã o de equ i-
líbr io em r egim e de laissez-faire ser á a qu ela em qu e o em pr ego seja
ba st a n t e ba ixo e o n ível de vida su ficien t em en t e m iser á vel pa r a leva r
a s pou pa n ça s a zer o. O m a is pr ová vel é qu e h a ja u m m ovim en t o cíclico
em r edor dest a posiçã o de equ ilíbr io. Se per sist e, pois, a in cer t eza a
r espeit o do fu t u r o, a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l su bir á oca sion a l-
m en t e a cim a de zer o, leva n do a u m a “expa n sã o”, e n a “depr essã o”
segu in t e o est oqu e de ca pit a l pode ba ixa r du r a n t e cer t o t em po a u m
n ível in fer ior a o qu e det er m in a r ia , a lon go pr a zo, u m a eficiên cia m a r -
gin a l de zer o. Su pon do pr evisões cor r et a s, o n ível de equ ilíbr io do es-
t oqu e de ca pit a l, a o qu a l cor r espon der á u m a eficiên cia m a r gin a l de
zer o ser á , n a t u r a lm en t e, in fer ior a o cor r espon den t e a o plen o em pr ego
da m ã o-de-obr a dispon ível, pois o equ ipa m en t o qu e cor r espon de a essa
pr opor çã o de desem pr ego ser á o qu e a ssegu r a r u m a pou pa n ça n u la .

214
KEYN ES

A ú n ica ou t r a posiçã o de equ ilíbr io possível ser ia u m a sit u a çã o


em qu e u m est oqu e de ca pit a l ba st a n t e eleva do, pa r a t er u m a eficiên cia
m a r gin a l n u la , r epr esen t a sse, t a m bém , u m a qu a n t ida de de r iqu eza
su ficien t e pa r a sa cia r por com plet o o desejo a gr ega do do pú blico de
a t en der a o fu t u r o, m esm o em sit u a çã o de plen o em pr ego, em cir cu n s-
t â n cia s t a is qu e n en h u m a bon ifica çã o em for m a de ju r o pu desse ser
obt ida . Con t u do, ser ia u m a coin cidên cia im pr ová vel qu e a pr open sã o
a pou pa r em con dições de plen o em pr ego se sa t isfizesse ju st a m en t e
n o in st a n t e em qu e o est oqu e de ca pit a l a t in ge o m on t a n t e qu e t or n a
n u la a su a eficiên cia m a r gin a l. P or con segu in t e, se est a possibilida de
m a is fa vor á vel in t er vém , deve n or m a lm en t e pr odu zir -se n ã o n o m o-
m en t o exa t o em qu e a t a xa de ju r o se a n u la , m a s em a lgu m m om en t o
a n t er ior , du r a n t e o declín io pr ogr essivo da t a xa de ju r os.
Adm it im os a t é a gor a u m fa t or in st it u cion a l qu e n ã o per m it e t a xa
de ju r os n ega t iva , o qu e se ca r a ct er iza por m oeda pa r a a qu a l a s des-
pesa s de con ser va çã o sã o m u it o pequ en a s. E xist em , de fa t o, fa t or es
in st it u cion a is e fa t or es psicológicos qu e m a r ca m lim it e m u it o a cim a
de zer o pa r a o declín io pr a t ica m en t e possível da t a xa de ju r os. E m
especia l, os cu st os de est a belecim en t o de con t a t o en t r e os m u t u á r ios
e m u t u a n t es e a in cer t eza qu a n t o a o fu t u r o da t a xa de ju r os, qu e já
exa m in a m os a n t es, fixa m u m lim it e m ín im o qu e, n a s cir cu n st â n cia s
pr esen t es, t a lvez n ã o seja in fer ior a 2 ou 2,5% a lon go pr a zo. Se ist o
for exa t o, em br eve poder á a pr esen t a r -se n a pr á t ica a desa gr a dá vel
possibilida de de u m est oqu e cr escen t e de r iqu eza , em con dições qu e
im pedem a t a xa de ju r os de ba ixa r m a is em u m r egim e de laissez-faire.
Além disso, se o m ín im o a ba ixo do qu a l é pr a t ica m en t e im possível
fa zer ca ir a t a xa de ju r os est iver sen sivelm en t e a cim a de zer o, m en or
é a pr oba bilida de de qu e o desejo a gr ega do de a cu m u la r r iqu eza se
sa cie a n t es de a t a xa de ju r os h a ver a lca n ça do seu n ível m ín im o.
As exper iên cia s do pós-gu er r a da Gr ã -Br et a n h a e dos E st a dos
Un idos ofer ecem exem plos r ea is de com o u m a a cu m u la çã o de r iqu eza
— t ã o gr a n de qu e su a eficiên cia m a r gin a l t en h a ca ído m a is r a pida m en t e
do qu e é possível à t a xa de ju r os ba ixa r dia n t e dos fa t or es in st it u cion a is
e psicológicos pr eva lecen t es — pode in t er fer ir , em con dições pr in cipa l-
m en t e de laissez-faire, com u m volu m e de em pr ego r a zoá vel e com o
n ível de vida qu e a s con dições t écn ica s de pr odu çã o sã o ca pa zes de
pr opor cion a r .
Da í r esu lt a qu e, se du a s com u n ida des igu a is dispõem da m esm a
t écn ica , m a s de difer en t es est oqu es de ca pit a l, a com u n ida de qu e t em
m en or est oqu e de ca pit a l poder á goza r , du r a n t e cer t o t em po, de u m
n ível de vida m a is a lt o qu e a com u n ida de possu idor a de m a ior es es-
t oqu es; t oda via , qu a n do a com u n ida de m a is pobr e a lca n ça r a m a is r ica
— o qu e é de se pr esu m ir qu e even t u a lm en t e a con t eça — a m ba s co-
n h ecer ã o a sor t e de Mida s. E st a con clu sã o pessim ist a est á , n a t u r a l-
m en t e, su jeit a à h ipót ese de qu e a pr open sã o a con su m ir e o flu xo de

215
OS ECON OMIS TAS

in vest im en t o, em vez de ser em deliber a da m en t e con t r ola dos a bem do


in t er esse socia l, seja m , em gr a n de pa r t e, a ba n don a dos pela in flu ên cia
do laissez-faire.
Se — por qu a lqu er r a zã o — a qu eda da t a xa de ju r os n ã o pu der
ser t ã o r á pida qu a n t o a qu eda da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l de-
t er m in a da por u m a a cu m u la çã o cor r espon den t e a o qu e a com u n ida de
pr efer ir ia pou pa r a u m a t a xa de ju r os igu a l à eficiên cia m a r gin a l do
ca pit a l em sit u a çã o de plen o em pr ego, en t ã o m esm o u m desvio do
desejo de gu a r da r r iqu eza pa r a a a qu isiçã o de ben s qu e, de fa t o, n ã o
pr odu zir ã o n en h u m fr u t o econ ôm ico, a u m en t a r á o bem -est a r econ ôm ico.
O dia em qu e a a bu n dâ n cia de ca pit a l ven h a a in t er fer ir com a a bu n -
dâ n cia da pr odu çã o pode ser post er ga do à m edida qu e os m ilion á r ios
en con t r em sa t isfa çã o em edifica r va st a s m a n sões pa r a n ela s m or a r em
en qu a n t o vivos e pir â m ides pa r a se r ecolh er em depois de m or t os, ou ,
a r r epen didos de seu s peca dos, leva n t em ca t edr a is e dot em m ost eir os
ou m issões n o est r a n geir o. “Ca va r bu r a cos n o ch ã o” à cu st a da pou pa n ça
n ã o só a u m en t a r á o em pr ego, com o t a m bém a r en da n a cion a l em ben s
e ser viços ú t eis. Con t u do, n ã o é r a zoá vel qu e u m a com u n ida de sen sa t a
con cor de em depen der de pa lia t ivos t ã o for t u it os e fr eqü en t em en t e t ã o
ext r a va ga n t es, qu a n do já sa bem os de qu e in flu ên cia s depen de a de-
m a n da efet iva .
IV

Su pon h a m os qu e se t om em m edida s pa r a qu e a t a xa de ju r os
seja com pa t ível com o in vest im en t o qu e cor r espon de a o plen o em pr ego.
Su pon h a m os, a dem a is, qu e a a çã o do E st a do in t er ven h a com o elem en t o
de equ ilíbr io pa r a r egu la r o cr escim en t o do ca pit a l e im pedir qu e ele
t en da pa r a o seu pon t o de sa t u r a çã o a u m a velocida de ca pa z de im por
à ger a çã o pr esen t e u m a r edu çã o excessiva de seu pa dr ã o de vida .
Da da s est a s h ipót eses, su pon h o qu e u m a com u n ida de r a cion a l-
m en t e dir igida e pr ovida de r ecu r sos t écn icos m oder n os, e cu ja popu -
la çã o n ã o cr esça r a pida m en t e, ser ia ca pa z, n o espa ço de u m a ú n ica
ger a çã o, de r edu zir a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l a u m n ível de
equ ilíbr io pr óxim o de zer o, de t a l m odo qu e a t in gir ía m os a s con dições
de u m a com u n ida de qu a se est a cion á r ia , n a qu a l a s m u da n ça s e os
pr ogr essos r esu lt a r ia m u n ica m en t e de m odifica ções em t écn ica s, gost os,
popu la çã o e in st it u ições, ven den do-se os pr odu t os do ca pit a l a u m pr eço
em pr opor çã o a o t r a ba lh o et c. a eles in cor por a dos, ju st a m en t e com os
pr in cípios qu e r egem os pr eços dos ben s de con su m o n os qu a is os en -
ca r gos de ca pit a l en t r a m em pr opor çã o in sign ifica n t e.
Se t en h o r a zã o em su por qu e é r ela t iva m en t e fá cil t or n a r os ben s
de ca pit a l t ã o a bu n da n t es qu e su a eficiên cia m a r gin a l seja zer o, est e
pode ser o ca m in h o m a is r a zoá vel pa r a elim in a r gr a du a lm en t e a m a io-
r ia da s ca r a ct er íst ica s r epr een síveis do ca pit a lism o. Um in st a n t e de
r eflexã o m ost r a r á a s en or m es m u da n ça s socia is qu e r esu lt a r ia m do

216
KEYN ES

desa pa r ecim en t o pr ogr essivo de u m a t a xa de r en dim en t o sobr e a r i-


qu eza a cu m u la da . Qu a lqu er pessoa poder ia a in da a cu m u la r o r en di-
m en t o de seu t r a ba lh o com a in t en çã o de o ga st a r em da t a post er ior .
Ma s su a a cu m u la çã o n ã o cr escer ia . E la est a r ia sim plesm en t e n a posiçã o
do pa i de P ope qu e, a o r et ir a r -se dos n egócios, levou u m ba ú ch eio de
gu in éu s pa r a su a vila de Twicken h a m pa r a a t en der à s despesa s do-
m ést ica s n a m edida de su a s n ecessida des.
E m bor a o r en deir o desa pa r ecesse, con t in u a r ia , en t r et a n t o, h a -
ven do lu ga r pa r a o em pr een dim en t o e pa r a a h a bilida de n a est im a t iva
dos r en dim en t os pr ová veis, su scet íveis da s m a is difer en t es opin iões.
O qu e ficou dit o r efer e-se, pois, em pr im eir o lu ga r , à pu r a t a xa de
ju r os, in depen den t em en t e de qu a lqu er pr evisã o pa r a o r isco e cir cu n s-
t â n cia s sem elh a n t es, e n ã o a o r en dim en t o br u t o dos va lor es pa t r im o-
n ia is, in clu in do a r et r ibu içã o r efer en t e a o r isco. Dest a r t e, a n ã o ser
qu e a t a xa de ju r os se m a n t ivesse n u m n ível n ega t ivo, h a ver ia a in da
u m r en dim en t o posit ivo pa r a o in vest im en t o sen sa t o em det er m in a dos
va lor es pa t r im on ia is a pr esen t a n do cer t a pr oba bilida de de lu cr o. Desde
qu e h ou vesse det er m in a da r elu t â n cia em cor r er r iscos, h a ver ia t a m bém
u m r en dim en t o líqu ido posit ivo do con ju n t o de t a is va lor es du r a n t e
um período de tempo. Não é provável, porém, que, nessas circunstâncias,
houvesse tal avidez de obter uma renda dos investim entos duvidosos que,
em conjunto, seu rendimento líquido acabasse sendo negativo.

217
C AP ÍTU LO 17
As P ro p rie d a d e s Es s e n c ia is d o s J u ro s e d o D in h e iro

A taxa d e ju ros sobre o d in h eiro pa r ece, por t a n t o, r epr esen t a r


u m pa pel especia l n a fixa çã o de u m lim it e a o volu m e de em pr ego,
vist o m a r ca r o n ível qu e deve a lca n ça r a eficiên cia m a r gin a l de u m
bem de ca pit a l pa r a qu e ele se t or n e objet o de n ova pr odu çã o. Qu e
ist o deva ser a ssim é, à pr im eir a vist a , m u it o con fu so. É n a t u r a l qu e
se in da gu e, en t ã o, qu a l é a pecu lia r ida de qu e dist in gu e o din h eir o de
ou t r os va lor es pa t r im on ia is, pr ocu r a n do det er m in a r se a pen a s o di-
nheiro possui uma taxa de juros, bem como o que acontece numa econom ia
não monetária. Enquanto não tiverm os encontrado respostas a estas ques-
tões, o sentido da nossa teoria não se tornará suficientemente claro.
A t a xa m on et á r ia de ju r os — qu er em os ch a m a r a a t en çã o do
leit or — ou t r a coisa n ã o é qu e a per cen t a gem de exceden t es de u m a
som a de din h eir o con t r a t a da pa r a en t r ega fu t u r a , por exem plo, a u m
a n o de pr a zo, sobr e o qu e podem os ch a m a r o pr eço “spot ” ou a vist a
da dit a som a con t r a t a da pa r a en t r ega fu t u r a . P a r ece, por t a n t o, qu e
pa r a ca da ca t egor ia de ben s de ca pit a l dever ia exist ir u m a t a xa a n á loga
à do ju r o sobr e o din h eir o. P ois h á u m a qu a n t ida de defin ida de (por
exem plo) t r igo pa r a ser en t r egu e den t r o de u m a n o, qu e t em h oje o
m esm o va lor de t r oca de 100 “qu a r t os”132 de t r igo pa r a en t r ega im edia t a .
Se a pr im eir a qu a n t ida de é de 105 “qu a r t os”, podem os dizer qu e a
t a xa de ju r os do t r igo é de 5% a o a n o, e se é 95 “qu a r t os”, dizem os
qu e é m en os de 5% a o a n o. Assim , pa r a ca da bem du r á vel t em os u m a
t a xa de ju r os ca lcu la da em t er m os do pr ópr io bem — u m a t a xa de
ju r os do t r igo, u m a t a xa de ju r os do cobr e, u m a t a xa de ju r os da
h a bit a çã o, u m a t a xa de ju r os de u m a u sin a sider ú r gica .

132 N o or igin a l con st a a m ed id a de volu m e qu art er, qu e cor r es pon d e a 1/4 de t on e la d a .


(N . d o R . T.)

219
OS ECON OMIS TAS

A difer en ça en t r e os con t r a t os “a t er m o” e “a vist a ”, r ela t ivos a


u m bem com o o t r igo, qu e t em cot a çã o n o m er ca do, m a n t ém u m a r ela çã o
defin ida com a t a xa de ju r os do t r igo, m a s, desde qu e o con t r a t o a
t er m o é cot a do em m oeda pa r a en t r ega fu t u r a e n ã o em t r igo pa r a
en t r ega im edia t a , est a difer en ça t a m bém depen de da t a xa m on et á r ia
de ju r os. A r ela çã o exa t a é a segu in t e:
Su pon h a m os qu e o pr eço do t r igo pa r a en t r ega im edia t a seja de
100 libr a s est er lin a s por 100 “qu a r t os”, e qu e o pr eço do t r igo em
con t r a t o “a t er m o” pa r a en t r ega den t r o de u m a n o seja de 107 libr a s
por 100 “qu a r t os” e qu e a t a xa m on et á r ia de ju r os seja de 5%; qu a l é
a t a xa de ju r os do t r igo? 100 libr a s com pr a r ã o h oje 105 pa r a en t r ega
105
fu t u r a , e 105 libr a s pa r a en t r ega fu t u r a com pr a r ã o . 100 (= 98)
107
“quartos” nas m esm as condições. Por sua vez, 100 libras hoje com prarão
100 “quartos” de trigo para entrega im ediata. Assim sendo, 100 “quartos”
de trigo para entrega im ediata comprarão 98 “quartos” a term o. De onde
se conclui que a taxa de juros do trigo é m enos de 2% ao ano.133
Segu e-se n ã o h a ver r a zã o pa r a qu e su a s t a xa s de ju r os deva m
ser igu a is pa r a ben s difer en t es — pa r a qu e a t a xa do t r igo deva ser
igu a l à t a xa de ju r os do cobr e —, pois a r ela çã o en t r e os con t r a t os “a
vist a ” e “a t er m o”, t a l com o a s cot a ções de m er ca do, é n ot or ia m en t e
difer en t e pa r a difer en t es ben s. Ist o, com o ver ifica r em os, n os leva r á à
t r ilh a qu e pr ocu r a m os. P ois pode su ceder qu e seja a m ais elevad a da s
t a xa s específica s de ju r o (com o poder em os ch a m a r -lh es) qu e est a beleça
o pa r â m et r o (pois é a m a ior da s t a xa s qu e a eficiên cia m a r gin a l de
u m bem de ca pit a l t em de a lca n ça r pa r a est e vir a ser o objet o de
n ova pr odu çã o); e t a lvez h a ja r a zões pa r a qu e a t a xa m on et á r ia de
ju r os seja fr eqü en t em en t e a m a is eleva da (pois, com o ver em os, cer t a s
for ça s qu e con t r ibu em pa r a r edu zir a s t a xa s de ju r os específica s de
ou t r os ben s n ã o a t u a m n o ca so do din h eir o).
P ode-se a cr escen t a r qu e, da m esm a m a n eir a qu e exist em , pa r a
ca da m om en t o, t a xa s de ju r os difer en t es pa r a a s m er ca dor ia s, t a m bém
os ca m bist a s est ã o fa m ilia r iza dos com o fa t o de qu e a t a xa de ju r os
n ã o é igu a l sequ er pa r a du a s m oeda s difer en t es, por exem plo a libr a
e o dóla r . P or qu e t a m bém a qu i a difer en ça en t r e os con t r a t os “a vist a ”
e “a t er m o” pa r a u m a m oeda est r a n geir a em t er m os de libr a est er lin a ,
va r ia , em ger a l, de u m a m oeda pa r a ou t r a .
Or a , ca da u m a dessa s m er ca dor ia s-pa dr ã o n os ofer ece a m esm a
fa cilida de qu e a m oeda pa r a m edir a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
P odem os, com efeit o, escolh er a qu e qu iser m os, por exem plo, o t r igo,
e ca lcu la r o va lor -t r igo dos r en dim en t os pr ová veis de qu a lqu er bem

133 E st a r ela çã o foi a ssin a la da pela pr im eir a vez por Sr a ffa . E con om ic J ou rn al. Ma r ço de
1932, p. 50.

220
KEYN ES

de ca pit a l; a t a xa de descon t o qu e igu a la o va lor pr esen t e dest a s sér ies


de a n u ida des de t r igo a o pr eço a t u a l de ofer t a do bem em t er m os de
t r igo n os dá , expr essa em t r igo, a eficiên cia m a r gin a l desse bem . Se
n en h u m a va r ia çã o é esper a da n o va lor r ela t ivo dos dois pa dr ões dife-
r en t es, a eficiên cia m a r gin a l de u m bem de ca pit a l ser á a m esm a em
qu a lqu er de a m bos qu e se m eça , vist o qu e o n u m er a dor e o den om in a dor
da fr a çã o qu e a expr im e va r ia r ã o n a m esm a pr opor çã o. Toda via , se se
esper a qu e u m desses pa dr ões m u de de va lor em r ela çã o a o ou t r o, a
eficiên cia m a r gin a l de t odos os ben s de ca pit a l per m a n ecer á a m esm a
em qu a lqu er u m dos dois pa dr ões u sa dos pa r a a m edida . P a r a ilu st r a r
est e r a ciocín io, t om em os o ca so m a is sim ples em qu e se esper a qu e
u m dos dois pa dr ões, o t r igo, su ba de va lor a u m r it m o de a por cen t o
a o a n o em t er m os de m oeda ; a eficiên cia m a r gin a l de u m bem qu e se
expr im e em m oeda por x por cen t o ser á , en t ã o, x – a por cen t o em
t er m os de t r igo. Um a vez qu e a s eficiên cia s m a r gin a is dos diver sos
ben s de ca pit a l se a lt er a r ã o n a m esm a pr opor çã o, dedu z-se qu e a or dem
da s su a s gr a n deza s ser á igu a l, seja qu a l for o pa dr ã o escolh ido.
Se h ou vesse u m a m er ca dor ia com post a qu e se pu desse con sider a r
r epr esen t a t iva n o sen t ido est r it o da pa la vr a , poder ía m os con sider a r
qu e a t a xa de ju r os e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l det er m in a dos
por m eio dessa m er ca dor ia ser ia m , em cer t o sen t ido, a t a xa de ju r os
ú n ica e a eficiên cia m a r gin a l ú n ica do ca pit a l. P or ém , ist o leva n t a ,
eviden t em en t e, os m esm os obst á cu los qu e a fixa çã o de u m pa dr ã o ú n ico
de va lor .
At é a gor a , p or t a n t o, a t a xa m on et á r ia de ju r os n ã o a pr esen t a
n en h u m a sin gu la r ida de, en con t r a n do-se exa t a m en t e n o m esm o pé
com pa r a da com ou t r a s. On d e est á , en t ã o, a pecu lia r ida de da t a xa
m on et á r ia d e ju r o, on de r eside a im por t â n cia pr á t ica p r ed om in a n t e
qu e lh e foi a t r ibu ída n os ca pít u los a n t er ior es? P or qu e devem os
volu m es da p r od u çã o e do em pr ego depen der m a is est r eit a m en t e
da t a xa m on et á r ia de ju r os d o qu e da t a xa d e ju r os do t r igo ou da
t a xa de ju r os d e m or a dia s?
II
Con sider em os qu a is ser ã o, n or m a lm en t e, a s t a xa s de ju r os da s
m er ca dor ia s n o per íodo (diga m os) de u m a n o pa r a os difer en t es ben s.
Desde qu e t om em os ca da u m dos ben s com o pa dr ã o, os r en dim en t os
de ca da u m devem con sider a r -se pa r a est e pr opósit o com o m edidos em
t er m os de si m esm os.
H á t r ês a t r ibu t os qu e os diver sos t ipos de ben s possu em em gr a u s
difer en t es, con for m e a exposiçã o feit a em segu ida :

(i) Algu n s ben s dã o u m r en dim en t o ou pr odu çã o q, m edidos em


t er m os de si m esm os, pa r a fa cilit a r em a lgu m pr ocesso de pr odu çã o ou
pr est a r em ser viços a u m con su m idor .

221
OS ECON OMIS TAS

(ii) A m a ior ia dos ben s, excet u a n do o din h eir o, sofr e desga st e ou


a ca r r et a a lgu m a despesa pelo sim ples cor r er do t em po (in depen den t e-
m en t e de qu a lqu er a lt er a çã o n o seu va lor r ela t ivo), seja m ou n ã o u t i-
liza dos em pr odu zir r en dim en t o; ist o é, im plica m u m cu st o de m a n u -
t en çã o c m edidos em t er m os de si m esm os. P a r a o n osso objet ivo pr e-
sen t e, n ã o im por t a sa ber exa t a m en t e on de coloca r em os a lin h a de se-
pa r a çã o en t r e os cu st os qu e dedu zim os a n t es de ca lcu la r q e os qu e
in clu ím os em c, vist o qu e a segu ir a pen a s n os ocu pa r em os de q – c.

(iii) Finalmente, o poder de dispor de um bem durante certo tempo


pode oferecer um a conveniência ou segurança potencial que não é igual
para os bens de natureza diferente, embora sejam do mesmo valor inicial.
Não há, por assim dizer, nenhum resultado em form a de produção no
fim do período considerado e, mesmo assim, trata-se de algo pelo qual as
pessoas estão dispostas a pagar um preço. Chamaremos prêmio de liquidez
l de certo bem ao montante (medido em termos de si m esm o) que as
pessoas estão dispostas a pagar pela conveniência ou segurança potenciais
proporcionadas pelo poder de dispor dele (excluindo o rendimento ou os
custos de manutenção que lhe são próprios).
Dedu z-se qu e a r et r ibu içã o t ot a l qu e se esper a da pr opr ieda de
de u m bem , du r a n t e cer t o per íodo, é igu a l a o seu r en dim en t o m en os
o seu cu st o de m a n u t en çã o m ais o seu pr êm io de liqu idez, ou seja , a
q – c + l. P or ou t r a s pa la vr a s, q – c + l é a t a xa de ju r os específica
de qu a lqu er bem , on de q, c e l se m edem em u n ida des de si m esm os
com o pa dr ã o.
A ca r a ct er íst ica fu n da m en t a l do ca pit a l in st r u m en t a l (por exem -
plo, u m a m á qu in a ) ou do ca pit a l de con su m o (por exem plo, u m a ca sa )
é o fa t o de qu e seu s r en dim en t os excedem , em ger a l, seu cu st o de
m a n u t en çã o e de qu e seu pr êm io de liqu idez é, pr ova velm en t e, des-
pr ezível; a ca r a ct er íst ica de u m est oqu e de ben s líqu idos ou a in da de
u m exceden t e de ca pit a l in st r u m en t a l ou de con su m o é ser gr a va da
por u m cu st o de m a n u t en çã o, expr essa em u n ida des de si m esm o, qu e
n en h u m r en dim en t o com pen sa , sen do n esse ca so ger a lm en t e despr e-
zível t a m bém o pr êm io de liqu idez, sem pr e qu e os est oqu es u lt r a pa ssa m
u m n ível m oder a do, em bor a su scet ível de t or n a r -se a pr eciá vel em cir -
cu n st â n cia s especia is; a ca r a ct er íst ica da m oeda , en fim , é t er u m r en -
dim en t o n u lo, u m cu st o de m a n u t en çã o in sign ifica n t e, por ém u m pr ê-
m io de liqu idez su bst a n cia l. Na ver da de, os difer en t es ben s podem t er
gr a u s difer en t es de pr êm io de liqu idez e a m oeda pode in cor r er em
cer t o volu m e de cu st o de m a n u t en çã o, por exem plo, o de cu st ódia . É ,
por ém , u m a difer en ça essen cia l en t r e a m oeda e t odos os dem a is ben s
(ou a m a ior ia ) qu e, n o ca so da m oeda , o seu pr êm io de liqu idez exceda
de m u it o o seu cu st o de m a n u t en çã o, a o pa sso qu e n o dos ou t r os ben s
seu cu st o de m a n u t en çã o é m u it o m a ior qu e o pr êm io de liqu idez. Com
a fin a lida de de ilu st r a r o r a ciocín io, su pon h a m os qu e o r en dim en t o

222
KEYN ES

da s ca sa s seja q 1 e o cu st o de m a n u t en çã o, bem com o o pr êm io de


liqu idez, seja m despr ezíveis; qu e pa r a o t r igo o cu st o de m a n u t en çã o
seja c2 e o r en dim en t o e pr êm io de liqu idez in sign ifica n t es, e qu e pa r a
a m oeda o pr êm io de liqu idez seja l 3 e o r en dim en t o e o cu st o de
m a n u t en çã o despr ezíveis. Sign ifica ist o qu e q 1 é a t a xa de ju r os da
ca sa , – c2 a t a xa de ju r os do t r igo e l 3 a t a xa m on et á r ia de ju r os.
P a r a det er m in a r a s r ela ções en t r e os r en dim en t os esper a dos dos
difer en t es t ipos de ben s, com pa t íveis com o equ ilíbr io, pr ecisa m os t a m -
bém con h ecer a s va r ia ções qu e se esper a m em seu s va lor es r ela t ivos
du r a n t e o a n o. Tom em os a m oeda com o pa dr ã o de m edida (qu e pa r a
est e fim pode ser a pen a s u m a m oeda de con t a , ou poder ía m os, igu a l-
m en t e, t om a r o t r igo) e su pon h a m os qu e a per cen t a gem de va lor iza çã o
(ou depr ecia çã o) esper a da da s ca sa s seja a 1 e a do t r igo a 2 . Ch a m a m os
q 1, – c2 e l 3 à s t a xa s de ju r os específica s da s ca sa s, do t r igo e da m oeda ,
m edida s em t er m os de si m esm a s com o pa dr ã o de va lor , ist o é, q 1 é
a t a xa de ju r os da ca sa m edida em ca sa s, – c2 é a t a xa de ju r os do
t r igo m edida em t r igo e l 3 a t a xa m on et á r ia de ju r os m edida em din h eir o.
Ta m bém con vir á ch a m a r a 1 + q 1 , a 2 – c2 e l 3 , qu e r epr esen t a m a s
m esm a s qu a n t ida des r edu zida s a m oeda com o pa dr ã o de va lor , a t a xa
m on et á r ia de ju r os da ca sa , a t a xa m on et á r ia de ju r os do t r igo e a
t a xa m on et á r ia de ju r os sobr e a m oeda , r espect iva m en t e. Com est a
obser va çã o, é fá cil ver qu e a dem a n da dos possu idor es de r iqu eza se
or ien t a r á pa r a a s ca sa s, pa r a o t r igo ou pa r a a m oeda , depen den do
de qu a l é o m a ior : a 1 + q 1 , a 2 – c2 ou l 3 . Assim sen do, em est a do de
equ ilíbr io, o pr eço de dem a n da da s ca sa s e o do t r igo em t er m os de
m oeda ser ã o t a is qu e desa pa r ecer á qu a lqu er va n t a gem en t r e a s a lt er -
n a t iva s; qu er dizer , a 1 + q 1 , a 2 – c2 e l 3 ser ã o igu ais. A escolh a de
pa dr ã o de va lor n ã o a lt er a est a con clu sã o, por qu e a su bst it u içã o de
u m pa dr ã o por ou t r o m odifica r á por igu a l t odos os t er m os, ou seja ,
n u m a qu a n t ida de idên t ica à t a xa de va lor iza çã o (ou depr ecia çã o) qu e
se esper a n o n ovo pa dr ã o r ela t iva m en t e a o a n t igo.
Or a , os ben s cu jo pr eço n or m a l de ofer t a é m en or qu e o pr eço
da dem a n da ser ã o a gor a objet o de n ova pr odu çã o, e esses ser ã o os
ben s qu e t êm u m a eficiên cia m a r gin a l m a ior (sobr e a ba se do seu
pr eço n or m a l de ofer t a ) qu e a t a xa de ju r os (sen do a m ba s a s qu a n t ida des
m edida s pelo m esm o pa dr ã o de va lor , qu a lqu er qu e est e seja ). À m edida
qu e a u m en t a o est oqu e de ben s cu ja eficiên cia m a r gin a l er a , a pr in cípio,
pelo m en os igu a l à t a xa de ju r os, essa eficiên cia m a r gin a l t en de a
ba ixa r (pela s r a zões su ficien t em en t e cla r a s já a pr esen t a da s). Ch ega
en t ã o o m om en t o em qu e deixa r á de ser va n t a joso con t in u a r a pr odu -
zi-los, a m en os qu e a taxa d e ju ros caia “pari passu ”. Qu a n do n ã o
h ou ver m a is bem a lgu m cu ja eficiên cia m a r gin a l a lca n ce a t a xa de
ju r os, a pr odu çã o de n ovos ben s de ca pit a l ser á pa r a lisa da .
Su pon h a m os (com o m er a h ipót ese n est a a lt u r a do r a ciocín io) qu e
h á cer t o bem (por exem plo, a m oeda ) cu ja t a xa de ju r os seja fixa ou

223
OS ECON OMIS TAS

declin e, à m edida qu e su a pr odu çã o a u m en t a , m a is deva ga r qu e qu a l-


qu er ou t r a t a xa de ju r os de m er ca dor ia ; com o se equ ilibr a r á est a po-
siçã o? Um a vez qu e a 1 + q 1 , a 2 – c2 e l 3 sã o, n ecessa r ia m en t e, igu a is,
e u m a vez qu e, por h ipót ese, l 3 é fixa ou declin a com m a is len t idã o
qu e q 1 ou – c2 , dedu z-se qu e a 1 e a 2 t en der ã o a a u m en t a r . P or ou t r a s
pa la vr a s, os pr eços n or m a is cor r en t es de qu a isqu er ou t r os ben s qu e
n ã o a m oeda t en der ã o a ba ixa r r ela t iva m en t e à s pr evisões dos pr eços
fu t u r os. Con seqü en t em en t e, se q 1 e – c2 con t in u a r em descen do, ch ega r á
u m m om en t o em qu e n ã o h a ver á va n t a gem em pr odu zir qu a lqu er des-
ses ben s, sa lvo se se esper a u m a a lt a de t a l m a gn it u de n o cu st o de
pr odu çã o em a lgu m a da t a fu t u r a r ela t iva m en t e a o a t u a l qu e ba st e
pa r a cobr ir os cu st os de m a n u t en çã o do est oqu e pr odu zido en t r e o
m om en t o a t u a l e a da t a pr ová vel do a u m en t o de pr eço.
P a r ece a gor a qu e a n ossa a fir m a çã o a n t er ior de qu e a t a xa m o-
n et á r ia de ju r os m a r ca u m lim it e a o volu m e da pr odu çã o n ã o er a es-
t r it a m en t e cor r et a . Dever ía m os t er dit o qu e a t a xa de ju r os do bem ,
qu e declin a m a is len t a m en t e à m edida qu e o est oqu e de ben s em ger a l
a u m en t a , é a qu e, even t u a lm en t e, elim in a a pr odu çã o va n t a josa de
ca da u m dos ou t r os — sa lvo n o ca so m en cion a do de u m a r ela çã o en t r e
os cu st os pr esen t es e os cu st os pr ová veis de pr odu çã o. À m edida qu e
a pr odu çã o a u m en t a , a s t a xa s específica s de ju r os ba ixa m a n íveis n os
qu a is u m bem a pós ou t r o ca i a ba ixo do qu e cor r espon de à pr odu çã o
va n t a josa , a t é qu e, fin a lm en t e, u m a ou m a is t a xa s específica s de ju r os
se fixa m n u m n ível su per ior à eficiên cia m a r gin a l de qu a lqu er bem .
Se por m oed a en t en dem os o p a dr ã o de va lor , t or n a -se cla r o
n ã o ser , n ecessa r ia m en t e, a t a xa d e ju r os m on et á r ia qu e ca u sa a
dificu ld a de. P a r a fu gir à s d ificu lda des n ã o ba st a r ia (com o a lgu n s
a cr ed it a r a m ) decr et a r sim p lesm en t e qu e o t r igo ou a s ca sa s seja m
o pa dr ã o de va lor em vez d o ou r o ou da libr a est er lin a . P ois a gor a
vem os qu e a exist ên cia de u m bem qu alqu er con t in u a r á a pr ovoca r
a s m esm a s dificu ld a des ca so a su a t a xa de ju r os r esist a a ba ixa r
qu a n do a su a pr odu çã o a u m en t a . P ode a con t ecer , por exem plo, qu e
o ou r o con t in u e a exer cer u m a in flu ên cia dessa n a t u r eza n u m pa ís
qu e a dot ou u m pa dr ã o in con ver sível.
III

P or t a n t o, a o a t r ibu ir u m a sign ifica çã o especia l à t a xa m on et á r ia


de ju r os, su pu sem os, t a cit a m en t e, qu e o t ipo de m oeda a qu e est a m os
a cost u m a dos t em a lgu m a s ca r a ct er íst ica s especia is qu e t or n a m a su a
t a xa específica de ju r os, expr essa por m eio de si m esm a com o pa dr ã o,
m a is r esist en t e à ba ixa , qu a n do a pr odu çã o a u m en t a , qu e a s t a xa s
específica s de ju r os de qu a lqu er ou t r o bem expr essa s da m esm a for m a .
Ser á ju st ifica da est a su posiçã o? No m eu en t en der , a r eflexã o m ost r a
qu e a s pecu lia r ida des segu in t es, qu e de or din á r io ca r a ct er iza m a m oeda
t a l com o a con h ecem os, sã o ca pa zes de a ju st ifica r . Na m edida em qu e

224
KEYN ES

o pa dr ã o de va lor est a belecido t en h a est a s pecu lia r ida des, ser á vá lida
a pr oposiçã o su m á r ia de qu e a t a xa m on et á r ia de ju r os é a im por t a n t e.

(i) A pr im eir a ca r a ct er íst ica qu e leva à con clu sã o a n t er ior é o


fa t o de t er a m oeda , t a n t o a logo com o a cu r t o pr a zo, u m a ela st icida de
de pr odu çã o igu a l a zer o, ou pelo m en os m u it o pequ en a , n o qu e r espeit a
o poder da em pr esa pr iva da com o coisa dist in t a da a u t or ida de m on e-
t á r ia — qu er en do dizer por ela st icida de de pr odu çã o134 n est e sen t ido
a r espost a do volu m e de m ã o-de-obr a dedica do a pr odu zi-la dia n t e de
u m a u m en t o n a qu a n t ida de de t r a ba lh o qu e se pode obt er com u m a
u n ida de da m esm a . Qu er ist o dizer qu e a m oeda n ã o se pode pr odu zir
fa cilm en t e — os em pr esá r ios n ã o podem a plica r à von t a de t r a ba lh o
pa r a pr odu zir din h eir o em qu a n t ida des cr escen t es à m edida qu e o seu
pr eço sobe em t er m os de u n ida des de sa lá r ios. No ca so de u m a m oeda
in con ver t ível, est a con diçã o sa t isfa z-se est r it a m en t e. No ca so, por ém ,
de u m a m oeda de pa dr ã o-ou r o t a m bém a in da su cede, de m a n eir a a pr o-
xim a da , n o sen t ido de qu e o m á xim o da qu a n t ida de de t r a ba lh o su -
plem en t a r su scet ível de ser em pr ega do dessa for m a é pr opor cion a l-
m en t e m u it o pequ en o, sa lvo, n a t u r a lm en t e, n u m pa ís em qu e a m in e-
r a çã o de ou r o seja a in dú st r ia pr in cipa l.
Or a , n o ca so dos ben s cu ja pr odu çã o dem on st r e ela st icida de, a
r a zã o pela qu a l a dm it im os qu e a su a t a xa específica de ju r os declin a
decor r e do fa t o de su por m os qu e o seu est oqu e a u m en t a em con se-
qü ên cia do m a ior volu m e da pr odu çã o. No ca so do din h eir o, en t r et a n t o
— a dia n do, por en qu a n t o, o exa m e dos efeit os de u m a r edu çã o n a
u n ida de de sa lá r ios ou de u m a a lt a deliber a da em su a ofer t a pr ovoca da
pela a u t or ida de m on et á r ia —, a ofer t a é fixa . Assim , a ca r a ct er íst ica
segu n do a qu a l a m oeda n ã o pode pr odu zir -se fa cilm en t e pelo t r a ba lh o
leva , im edia t a m en t e, a su por prim a facie ser cor r et o o pon t o de vist a
de qu e a su a t a xa específica de ju r os ser á r ela t iva m en t e r efr a t á r ia à
ba ixa ; a o pa sso qu e se a m oeda pu desse ser cu lt iva da com o u m cer ea l
ou fa br ica da com o u m a u t om óvel, a s depr essões poder ia m ser evit a da s
ou a t en u a da s, por qu e se o pr eço de ou t r os ben s t en desse a ba ixa r em
t er m os de m oeda m a is t r a ba lh o ser ia desvia do pa r a a pr odu çã o de
din h eir o, com o vem os ser o ca so n os pa íses de m in er a çã o de ou r o,
em bor a pa r a o m u n do, em con ju n t o, o desvio m á xim o n est e sen t ido
seja qu a se in sign ifica n t e.

(ii) É eviden t e, n o en t a n t o, qu e n ã o a pen a s a m oeda sa t isfa z a


con diçã o a n t er ior , m a s t a m bém t odos os fa t or es pu r a m en t e de r en da ,
cu ja pr odu çã o é com plet a m en t e in elá st ica . P or t a n t o, n ecessit a -se u m a
segunda condição para distinguir a moeda de outros elem entos de renda.

134 Ver ca p. 20.

225
OS ECON OMIS TAS

A segu n da d ifferen tia da m oeda é qu e ela t em u m a ela st icida de


de su bst it u içã o igu a l, ou qu a se igu a l, a zer o, o qu e sign ifica qu e, qu a n do
o seu va lor de t r oca sobe, n ã o a pa r ece n en h u m a t en dên cia pa r a su bs-
t it u í-la por a lgu m ou t r o fa t or , a n ã o ser t a lvez em pr opor çã o ín fim a ,
qu a n do a m oeda -m er ca dor ia é t a m bém u sa da n a m a n u fa t u r a ou n a s
a r t es. Ist o decor r e da pa r t icu la r ida de de a m oeda t er u m a u t ilida de
der iva da a pen a s do seu va lor de t r oca , de t a l m odo qu e a m bos sobem
e descem pari passu ; qu a n do o seu va lor de t r oca a u m en t a , n ã o h á ,
por t a n t o, com o n o ca so de ou t r os fa t or es de r en da , m ot ivo ou t en dên cia
pa r a su bst it u í-la por qu a lqu er ou t r o fa t or .
Assim sen do, n ã o a pen a s é im possível em pr ega r m a is m ã o-de-obr a
n a pr odu çã o de m oeda qu a n do o seu pr eço em r ela çã o à m ã o-de-obr a
sobe, com o t a m bém a m oeda con st it u i u m poço sem fu n do pa r a o poder
de com pr a qu a n do a su a dem a n da cr esce, vist o n ã o h a ver — com o n o
ca so de ou t r os fa t or es de r en da — u m va lor a cim a do qu a l essa dem a n da
é desvia da pa r a ou t r a s coisa s.
A ú n ica r est r içã o pa r a est a sit u a çã o vem da in cer t eza qu e a ele-
va çã o do va lor da m oeda oca sion a com r ela çã o à su a pr ópr ia du r a çã o,
ca so em qu e a 1 e a 2 sobem , o qu e equ iva le a u m a u m en t o n a s t a xa s
de ju r os m on et á r ios da m er ca dor ia e é, por t a n t o, u m est ím u lo pa r a a
pr odu çã o de ou t r os ben s.

(iii) E m t er ceir o lu ga r , devem os con sider a r se est a s con clu sões


se a lt er a m pelo fa t o de qu e, m esm o qu a n do é im possível a u m en t a r a
qu a n t ida de de m oeda desvia n do m a is t r a ba lh o pa r a su a pr odu çã o, n ã o
se ju st ifica a su posiçã o de qu e su a ofer t a efet iva seja a bsolu t a m en t e
im u t á vel. E m pa r t icu la r , u m a r edu çã o da u n ida de de sa lá r ios deixa r á
em liber da de os r ecu r sos de m oeda cir cu la n t e qu e se dest in a va m a
ou t r os u sos pa r a a sa t isfa çã o do m ot ivo de liqu idez; en qu a n t o, a lém
disso, à m edida qu e os va lor es m on et á r ios ba ixa m , o est oqu e de m oeda
m a n t er á u m a pr opor çã o m a is eleva da r ela t iva m en t e à r iqu eza t ot a l
da com u n ida de.

Nã o é possível n ega r qu e, por pr in cípios pu r a m en t e t eór icos, est a


r ea çã o poder ia leva r a u m a ba ixa a dequ a da da t a xa m on et á r ia de
ju r os. Toda via , por diver sa s r a zões qu e, t om a da s em con ju n t o, t êm
u m a for ça decisiva , é m u it o pr ová vel qu e, n u m a econ om ia do t ipo a
qu e est a m os a cost u m a dos, a t a xa m on et á r ia de ju r os r esist a com fr e-
qü ên cia a ba ixa r a dequ a da m en t e:

(a) Tem os de leva r em con t a , em pr im eir o lu ga r , os efeit os qu e


u m a ba ixa n a u n ida de de sa lá r ios pr odu z sobr e a s eficiên cia s m a r gin a is
dos ou t r os ben s em t er m os de m oeda , pois é a d iferen ça en t r e est a s e
a t a xa m on et á r ia de ju r os qu e n os in t er essa . Se o efeit o da ba ixa n a
u n ida de de sa lá r ios for u m a expect a t iva de a lt a post er ior , o r esu lt a do

226
KEYN ES

ser á com plet a m en t e fa vor á vel. Se, pelo con t r á r io, seu efeit o for pr odu zir
u m a expect a t iva de n ova ba ixa fu t u r a , a r ea çã o sobr e a eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l pode con t r a ba la n ça r a ba ixa n a t a xa de ju r os.135

(b) O fa t o de ser em os sa lá r ios pr open sos à r igidez qu a n do m edidos


em m oeda , sen do o sa lá r io n om in a l m a is est á vel qu e o r ea l, t en de a
a u m en t a r a pr open sã o da u n ida de de sa lá r ios a ba ixa r em t er m os de
m oeda . Adem a is, se a ssim n ã o fosse, a sit u a çã o poder ia ser a n t es pior
do qu e m elh or , por qu e, se os sa lá r ios n om in a is pu dessem ba ixa r com
fa cilida de, isso con t r ibu ir ia , n a s m a is da s vezes, pa r a cr ia r u m a pr e-
visã o de n ova ba ixa com r ea ções desfa vor á veis pa r a a eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l. Além disso, se os sa lá r ios fossem est ipu la dos em qu a l-
qu er ou t r a m er ca dor ia , por exem plo, em t r igo, é im pr ová vel qu e con -
t in u a ssem sen do r ígidos. É por ca u sa da s ou t r a s ca r a ct er íst ica s da
m oeda — especia lm en t e a s qu e a fa zem líqu id a — qu e os sa lá r ios,
qu a n do est ipu la dos em m oeda , m a n ifest a m cer t a r igidez.136

(c) E m t er ceir o lu ga r , ch ega m os à con sider a çã o m a is im por t a n t e


n est e con t ext o, ou seja , à s ca r a ct er íst ica s da m oeda qu e sa t isfa zem a
pr efer ên cia pela liqu idez. P ois em det er m in a da s cir cu n st â n cia s, qu e
a liá s ocor r em com fr eqü ên cia , ela s fa r ã o com qu e a t a xa de ju r os per -
m a n eça in sen sível, pa r t icu la r m en t e a ba ixo de cer t o n ível,137 a u m a u -
m en t o m esm o su bst a n cia l n a qu a n t ida de de m oeda pr opor cion a lm en t e
à s ou t r a s for m a s de r iqu eza . P or ou t r a s pa la vr a s, a ba ixa qu e u m
a cr éscim o da qu a n t ida de de m oeda det er m in a n o r en dim en t o qu e o
din h eir o pr opor cion a , em r a zã o de su a liqu idez, t or n a -se, a lém de cer t o
n ível, in sign ifica n t e em r ela çã o à ba ixa do r en dim en t o dos ou t r os t ipos
de r iqu eza qu e a com pa n h a u m a u m en t o com pa r á vel de su a qu a n t ida de.
A esse r espeit o, os ba ixos (ou in sign ifica n t es) cu st os de m a n u -
t en çã o da m oeda r epr esen t a m u m pa pel essen cia l, pois, se os cu st os
de m a n u t en çã o fossem a pr eciá veis, com pen sa r ia m o efeit o da s pr evisões
sobr e o va lor do din h eir o em época s fu t u r a s. A pr est eza com qu e o
pú blico a u m en t a o seu est oqu e de m oeda por efeit o de u m est ím u lo
r ela t iva m en t e pequ en o deve-se a o fa t o de qu e a s va n t a gen s da liqu idez
(r ea l ou su post a ) n ã o t êm com pen sa çã o a lgu m a em for m a de cu st o de
m a n u t en çã o n o decor r er do t em po. No ca so de u m a m er ca dor ia difer en t e
do din h eir o, u m pequ en o est oqu e da m esm a pode ofer ecer a lgu m a s
va n t a gen s pa r a os qu e a u t iliza m . Ma s m esm o qu a n do u m est oqu e
m a ior pu desse t er cer t o a t r a t ivo com o r eser va de r iqu eza possu in do
u m va lor est á vel, essa va n t a gem fica r ia n eu t r a liza da pelos cu st os de

135 E st a qu est ã o ser á exa m in a da m a is det a lh a da m en t e n o ca p. 19.


136 Se os sa lá r ios (e os con t r a t os) fossem est ipu la dos em t r igo, pode ser qu e est e a dqu ir isse
u m a pa r t e do pr êm io de liqu idez do din h eir o; volt a r em os a o a ssu n t o em (IV), a segu ir .
137 Ver p. 76.

227
OS ECON OMIS TAS

m a n u t en çã o da dit a r iqu eza , sob a for m a de despesa s de a r m a zen a gem ,


desga st e et c. P or t a n t o, a lém de cer t o n ível, con ser va r u m est oqu e m a ior
leva a u m pr eju ízo cer t o.
Toda via , n o ca so da m oeda , a s coisa s n ã o se pa ssa m a ssim , com o
vim os, e isso por diver sa s r a zões, com o, por exem plo, a qu ela s qu e, n o
en t en der do pú blico, t or n a m o din h eir o “líqu ido” par excellen ce. P or -
t a n t o, os r efor m a dor es qu e vir a m u m r em édio n a cr ia çã o de cu st os
a r t ificia is de m a n u t en çã o da m oeda , a t r a vés do expedien t e de obr iga -
r em os m eios de pa ga m en t o com cu r so lega l a ser em per iodica m en t e
ca r im ba dos com u m a t a xa det er m in a da , a fim de poder em con ser va r
a su a qu a lida de de m oeda , est a va m n o ca m in h o cer t o, e o va lor pr á t ico
de su a s pr oposições m er ece con sider a çã o.
O sign ifica do da t a xa de ju r os m on et á r ia su r ge, por t a n t o, da com -
bin a çã o de ca r a ct er íst ica s qu e, sob a in flu ên cia do m ot ivo de liqu idez,
fa z com qu e a t a xa possa ser m a is ou m en os in sen sível a u m a m u da n ça
n a pr opor çã o qu e a qu a n t ida de de m oeda gu a r da com ou t r a s for m a s
de r iqu eza m edida s em din h eir o e qu e est e t em (ou pode t er ) ela st i-
cida des n u la s (ou in sign ifica n t es) de pr odu çã o, e qu e a m oeda t em (ou
pode t er ) ela st icida des n u la s ou in sign ifica n t es de su bst it u içã o. A pr i-
m eir a con diçã o sign ifica qu e a dem a n da pode con cen t r a r -se n a m oeda ,
a segu in t e qu e, qu a n do ist o ocor r e, n ã o se pode em pr ega r t r a ba lh o
pa r a pr odu zir m a is m oeda , e a t er ceir a , qu e é est a sit u a çã o, seja qu a l
for a su a gr a vida de, n ã o pode ser a t en u a da pela in t er ven çã o de ou t r o
fa t or ca pa z, se su ficien t em en t e ba r a t o, de pr est a r os m esm os ser viços
qu e a m oeda . A ú n ica solu çã o — for a da s va r ia ções da eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l — pr ovém (en qu a n t o a pr efer ên cia pela liqu idez se
m a n t en h a con st a n t e) do a u m en t o da qu a n t ida de da m oeda ou — o
qu e vem a da r exa t a m en t e n a m esm a — de u m a a lt a do va lor da
m oeda qu e per m it a a u m a qu a n t ida de det er m in a da pr est a r m a ior es
ser viços m on et á r ios.
Assim sen do, u m a u m en t o da t a xa m on et á r ia de ju r os r et a r da
a pr odu çã o de r iqu eza s em t odos os r a m os em qu e ela é elá st ica , sem
est im u la r a pr odu çã o da m oeda (qu e, por h ipót ese, é per feit a m en t e
in elá st ica ). A t a xa m on et á r ia de ju r os, det er m in a n do o n ível de t oda s
a s dem a is t a xa s de ju r os de m er ca dor ia s, r efr eia o in vest im en t o pa r a
pr odu zir essa s m er ca dor ia s, sem poder est im u la r o in vest im en t o n e-
cessá r io pa r a pr odu zir m oeda qu e, por h ipót ese, n ã o pode ser pr odu zida .
Além disso, em vir t u de da ela st icida de da dem a n da de r ecu r sos líqu idos
em t er m os de débit os, u m a ligeir a va r ia çã o n a s con dições qu e r egem
essa dem a n da pode n ã o a lt er a r m u it o a t a xa m on et á r ia de ju r os, en -
qu a n t o, por ou t r o la do, da da a in ela st icida de da pr odu çã o da m oeda ,
t a m bém n ã o é possível (for a da in t er ven çã o oficia l) a s for ça s n a t u r a is
fa zer em ba ixa r a t a xa m on et á r ia de ju r os a t r a vés de u m a in flu ên cia
sobr e a ofer t a . No ca so de u m a m er ca dor ia com u m , a in ela st icida de
da dem a n da de est oqu es líqu idos da m esm a per m it ir ia qu e pequ en a s

228
KEYN ES

va r ia ções dessa dem a n da se t r a du zissem por u m a a lt a ou ba ixa im e-


dia t a da t a xa de ju r os, en qu a n t o a ela st icida de de su a ofer t a t a m bém
t en der ia a im pedir gr a n de á gio da s en t r ega s pr esen t es sobr e a s fu t u r a s.
Assim , se os ou t r os ben s fossem a ba n don a dos a si m esm os, a s “for ça s
n a t u r a is”, ist o é, a s for ça s com u n s do m er ca do, t en der ia m a fa zer ba ixa r
a s su a s t a xa s de ju r os a t é qu e o plen o em pr ego pr odu zisse n a s m er -
ca dor ia s, em ger a l, a in ela st icida de da ofer t a qu e su pu sem os com o
u m a ca r a ct er íst ica n or m a l da m oeda . Desse m odo, à fa lt a de m oeda e
— n a t u r a lm en t e devem os su pô-lo t a m bém — de qu a lqu er ou t r a m er -
ca dor ia com a s ca r a ct er íst ica s qu e a t r ibu ím os à m oeda , a s t a xa s de
ju r os só se equ ilibr a r ia m em con dições de plen o em pr ego.
Qu er isso dizer qu e o desem pr ego a u m en t a por qu e a s pessoa s
qu er em a Lu a ; os h om en s n ã o podem con segu ir em pr ego qu a n do o
objet o de seu s desejos (ist o é, o din h eir o) é u m a coisa qu e n ã o se
pr odu z e cu ja dem a n da n ã o pode ser fa cilm en t e con t ida . O ú n ico r e-
m édio con sist e em per su a dir o pú blico de qu e Lu a e qu eijo ver de sã o
pr a t ica m en t e a m esm a coisa , e a fa zer fu n cion a r u m a fá br ica de qu eijo
ver de (ist o é, u m ba n co cen t r a l) sob o con t r ole do poder pú blico.
É in t er essa n t e n ot a r qu e a ca r a ct er íst ica t r a dicion a lm en t e con -
sider a da a qu e t or n a o ou r o especia lm en t e a dequ a do pa r a ser vir de
pa dr ã o de va lor , a sa ber , a in ela st icida de de su a ofer t a , vem a ser
ju n t a m en t e a ca r a ct er íst ica qu e é o pon t o foca l do pr oblem a .
Nossa con clu sã o pode ser en u n cia da n a for m a m a is ger a l (da da
a pr open sã o a con su m ir ) da segu in t e m a n eir a . O volu m e do in vest i-
m en t o n ã o pode ser a u m en t a do qu a n do a m a is a lt a da s t a xa s de ju r os
específica s de t odos os ben s dispon íveis, m edidos por cer t o pa dr ã o, é
igu a l à m a is a lt a da s eficiên cia s m a r gin a is de t odos os ben s, m edida
pelo m esm o pa dr ã o.
E m con dições de plen o em pr ego, est a con diçã o sa t isfa z-se n eces-
sa r ia m en t e. Ma s ela t a m bém pode ser sa t isfeit a a n t es qu e o plen o
em pr ego seja a lca n ça do, ca so h a ja a lgu m bem cu ja s ela st icida des de
pr odu çã o e de su bst it u içã o138 seja m n u la s (ou r ela t iva m en t e pequ en a s),
e cu ja t a xa de ju r os declin e, à m edida qu e su a pr odu çã o a u m en t e m a is
len t a m en t e qu e a s eficiên cia s m a r gin a is de ben s de ca pit a l m edida s
em t er m os desse bem .

IV

J á vim os a n t es qu e n ã o é su ficien t e u m a m er ca dor ia ser o pa drã o


de va lor pa r a qu e a t a xa de ju r os dessa m er ca dor ia seja sign ifica t iva .
Toda via , é in t er essa n t e con sider a r a t é qu e pon t o a s ca r a ct er íst ica s da
m oeda t a l com o a con h ecem os, e qu e con fer em à su a t a xa de ju r os
u m a im por t â n cia sign ifica t iva , est ã o liga da s a o fa t o de ser ela o pa dr ã o

138 Um a ela st icida de zero é con diçã o m a is est r it a do qu e a qu e n ecessa r ia m en t e se r equ er .

229
OS ECON OMIS TAS

em qu e h a bit u a lm en t e se est ipu la m a s dívida s e os sa lá r ios. O a ssu n t o


deve ser con sider a do sob dois a spect os.
E m pr im eir o lu ga r , o fa t o de ser em os con t r a t os fixos e de ser em
os sa lá r ios ger a lm en t e ba st a n t e est á veis, em t er m os de m oeda , con -
t r ibu i sem dú vida em la r ga m edida pa r a qu e a m oeda t en h a u m pr êm io
de liqu idez t ã o eleva do. H á u m a va n t a gem eviden t e em con ser va r ben s
n o m esm o pa dr ã o e qu e ir ã o ven cer os com pr om issos fu t u r os e n ele
esper a r qu e o cu st o de vida per m a n eça r ela t iva m en t e est á vel. Ao m esm o
t em po, a expect a t iva de r ela t iva est a bilida de n o cu st o m on et á r io da
pr odu çã o fu t u r a n ã o se m a n t er ia com m u it a con fia n ça se o pa dr ã o de
va lor fosse u m bem com gr a n de ela st icida de de pr odu çã o. Além disso,
os ba ixos cu st os de m a n u t en çã o da m oeda con t r ibu em t a n t o qu a n t o a
im por t â n cia do seu pr êm io de liqu idez pa r a da r à su a t a xa de ju r os
u m a im por t â n cia sign ifica t iva . O qu e in t er essa , com efeit o, é a d iferen ça
en t r e o pr êm io de liqu idez e os cu st os de m a n u t en çã o; e n o ca so da
m a ior pa r t e dos ben s qu e n ã o seja m ou r o, pr a t a ou n ot a s de ba n co,
os cu st os de m a n u t en çã o sã o pelo m en os t ã o eleva dos qu a n t o o pr êm io
de liqu idez qu e ger a lm en t e a com pa n h a o pa dr ã o em qu e sã o est ipu la dos
os con t r a t os e os sa lá r ios, de t a l m odo qu e, m esm o se o pr êm io de
liqu idez qu e a gor a t em (por exem plo) a libr a est er lin a se t r a n sfer isse
(por exem plo) pa r a o t r igo, ser ia a in da im pr ová vel qu e a t a xa de ju r os
do t r igo se eleva sse a cim a de zer o. Nã o obst a n t e os con t r a t os e sa lá r ios
ser em fixa dos em t er m os m on et á r ios, a u m en t a r a im por t â n cia da t a xa
m on et á r ia de ju r os n ã o ba st a r ia , en t r et a n t o, por si só, pa r a con fer ir
a essa t a xa a s ca r a ct er íst ica s qu e lh e t êm sido a t r ibu ída s.
O segu n do pon t o a con sider a r é m a is su t il. A expect a t iva n or m a l
de qu e o va lor da pr odu çã o seja m a is est á vel em t er m os de m oeda de
qu e em t er m os de qu a lqu er ou t r o bem n ã o depen de n a t u r a lm en t e do
fa t o de os sa lá r ios ser em est ipu la dos em m oeda , m a s do fa t o de, em
t er m os de m oeda , eles ser em r ela t iva m en t e rígid os. Qu e su ceder ia ,
en t ã o, se se pr esu m isse qu e os sa lá r ios fossem m a is r ígidos (ist o é,
m a is est á veis) em t er m os de u m a ou m a is m er ca dor ia s difer en t es da
m oeda , do qu e em t er m os da pr ópr ia m oeda ? Ta l expect a t iva exigir ia
n ã o a pen a s qu e os cu st os do bem em qu est ã o fossem r ela t iva m en t e
con st a n t es em u n ida des de sa lá r ios pa r a u m a esca la de pr odu çã o m a ior
ou m en or , t a n t o n o cu r t o com o n o lon go pr a zo, m a s t a m bém qu e qu a l-
qu er exceden t e sobr e a dem a n da n or m a l, a o pr eço de cu st o, pu desse
ser in clu ído n o est oqu e sem despesa s, ist o é, o seu pr êm io de liqu idez
exceder ia os seu s cu st os de m a n u t en çã o (pois, de ou t r o m odo, qu a n do
n ã o h á esper a n ça de lu cr o m edia n t e u m pr eço m a is a lt o, a m a n u t en çã o
de u m est oqu e t em de su por , n ecessa r ia m en t e, u m pr eju ízo). Se h ou ver
u m bem qu e sa t isfa ça est a s con dições, n a da im pede, sem dú vida , qu e
ele se t or n e u m r iva l da m oeda . Assim sen do, n ã o é logica m en t e im -

230
KEYN ES

possível a exist ên cia de u m bem em t er m os do qu a l o va lor da pr odu çã o


pa r eça ser m a is est á vel do qu e em r ela çã o à m oeda . Ma s n ã o pa r ece
pr ová vel qu e exist a t a l bem .
Con clu o, por t a n t o, qu e o bem em fu n çã o do qu a l se esp er a qu e
os sa lá r ios seja m m a is r ígidos só pode ser u m cu ja ela st icida de de
pr odu çã o seja m ín im a e cu jo exceden t e d e cu st os de m a n u t en çã o
sobr e o pr êm io de liqu id ez seja igu a lm en t e m ín im o. E m ou t r a s pa -
la vr a s, a expect a t iva d e r igidez r ela t iva dos sa lá r ios em t er m os de
m oeda é u m cor olá r io d o fa t o d e o exced en t e do pr êm io d e liqu id ez
sobr e os cu st os de m a n u t en çã o ser m a ior pa r a a m oeda do qu e p a r a
qu a lqu er ou t r o bem .
Vem os a ssim qu e a s vá r ia s ca r a ct er íst ica s qu e se com bin a m pa r a
t or n a r sign ifica t iva a t a xa m on et á r ia de ju r os in t er a gem de for m a cu -
m u la t iva . O fa t o de t er a m oeda ba ixa s ela st icida des de pr odu çã o e
su bst it u içã o e ba ixos cu st os de m a n u t en çã o t en de a cr ia r a expect a t iva
de cer t a est a bilida de de sa lá r ios expr essos em m oeda ; essa expect a t iva
a u m en t a o pr êm io de liqu idez do din h eir o e evit a a cor r ela çã o excep-
cion a l en t r e a t a xa m on et á r ia de ju r os e a s eficiên cia s m a r gin a is de
ou t r os ben s, qu e poder ia , se exist isse, pr iva r est a t a xa m on et á r ia de
ju r os de seu pr edom ín io.
O pr ofessor P igou (en t r e ou t r os) cost u m a va su por a exist ên cia
de u m a pr esu n çã o n o sen t ido de qu e os sa lá r ios r ea is sã o m a is est á veis
qu e os n om in a is. P or ém , ist o só poder ia ocor r er em vir t u de de ou t r a
pr esu n çã o em fa vor da est a bilida de do em pr ego. Adem a is, r est a a in da
a dificu lda de de qu e os ben s de con su m o sa la r ia is sã o gr a va dos de
eleva dos cu st os de m a n u t en çã o. Na ver da de, se se t en t a sse est a biliza r
os sa lá r ios r ea is est ipu la n do a r em u n er a çã o do t r a ba lh o em ben s de
con su m o sa la r ia is, o ú n ico r esu lt a do ser ia u m a violen t a oscila çã o dos
pr eços m on et á r ios, pois qu a lqu er ligeir a flu t u a çã o da pr open sã o a con -
su m ir e do in cen t ivo a in vest ir fa r ia com qu e os pr eços n om in a is os-
cila ssem violen t a m en t e en t r e zer o e o in fin it o. Ser em os sa lá r ios n o-
m in a is m a is est á veis qu e os sa lá r ios r ea is é u m a con diçã o pa r a qu e o
sist em a possu a u m a est a bilida de in t r ín seca .
At r ibu ir a os sa lá r ios r ea is u m a est a bilida de r ela t iva é n ã o a pen a s
com et er u m er r o de fa t o e de exper iên cia , m a s t a m bém u m er r o de
lógica , ist o se su pu ser m os qu e o sist em a con sider a do é est á vel, n o
sen t ido de qu e a s pequ en a s va r ia ções n a pr open sã o a con su m ir e n o
in cen t ivo a in vest ir n ã o pr odu zem efeit os violen t os sobr e os pr eços.

Com o com en t á r io a o qu e ficou dit o, t a lvez seja ú t il in sist ir sobr e


o fa t o, já a ssin a la do, de qu e a “liqu idez” e os “cu st os de m a n u t en çã o”
sã o, a m bos, qu est ã o de gr a u e qu e é u n ica m en t e n a im por t â n cia da
pr im eir a em r ela çã o a os ú lt im os qu e r eside a pecu lia r ida de da “m oeda ”.

231
OS ECON OMIS TAS

Con sider em os, por exem plo, u m a econ om ia n a qu a l n ã o h á u m


bem cu jo pr êm io de liqu idez est eja sem pr e a cim a de seu s “cu st os de
m a n u t en çã o”; est a é a m elh or defin içã o qu e posso da r da ch a m a da
econ om ia “n ã o m on et á r ia ”. Qu er dizer , n ã o h a ver ia n essa econ om ia
sen ã o det er m in a dos ben s de con su m o e det er m in a dos equ ipa m en t os
de ca pit a l, m a is ou m en os difer en cia dos, con for m e a n a t u r eza dos ben s
de con su m o qu e n u m espa ço de t em po m a is ou m en os lon go pr odu zem
ou a ju da m a pr odu zir ; t odos est es ben s, a o con t r á r io do din h eir o líqu ido,
ca so se con ser vem em est oqu e, se det er ior a m ou su põem despesa s de
u m va lor m a ior qu e o seu pr êm io de liqu idez.
E m sem elh a n t e econ om ia , os equ ipa m en t os de ca pit a l se dist in -
gu em u n s dos ou t r os: (a) pela va r ieda de dos ben s de con su m o em cu ja
pr odu çã o podem in t er vir ; (b) pela est a bilida de do va lor de su a pr odu çã o
(n o sen t ido de qu e o va lor do pã o é m a is est á vel a t r a vés do t em po do
qu e o da s n ovida des qu e logo pa ssa m de m oda ); e (c) pela r a pidez com
qu e a r iqu eza qu e lh es est á in cor por a da pode t or n a r -se “líqu ida ”, ou
seja , pela r a pidez com qu e cr ia m ben s cu jo pr odu t o da ven da pode ser
r ein cor por a do, se se deseja r , de for m a in t eir a m en t e difer en t e.
Os pr opr iet á r ios de r iqu eza pon der a r ã o a fa lt a de “liqu idez”, n o
sen t ido a n t er ior , dos difer en t es equ ipa m en t os de ca pit a l, com o m eio
de con ser va r a r iqu eza , com o cá lcu lo a t u a r ia l m elh or possível dos
seu s r en dim en t os pr ová veis, a pós con sider a r o r isco. Obser va r em os qu e
o pr êm io de liqu idez se a ssem elh a , em pa r t e, a o pr êm io de r isco, por ém
dele difer e, em pa r t e; a difer en ça cor r espon de à qu e exist e en t r e os
m elh or es cá lcu los qu e possa m os fa zer da s pr oba bilida des e a con fia n ça
com qu e o fa r em os.139 Qu a n do t r a t a m os, em ca pít u los a n t er ior es, do
cá lcu lo do r en dim en t o esper a do, n ã o en t r a m os em por m en or es sobr e
com o er a feit o esse cá lcu lo; e, pa r a n ã o com plica r o r a ciocín io, n ã o
dist in gu im os a s difer en ça s de liqu idez da s difer en ça s de r isco pr opr ia -
m en t e dit o. É , con t u do, eviden t e qu e, n o cá lcu lo da t a xa de ju r os es-
pecífica , devem os levá -la s em con t a .
É claro que não existe um padrão de “liquidez” absoluto, m as sim -
plesm ente um a escala de liquidez — um prêm io variável que se tem de
levar em conta, além do rendimento do uso e dos custos de m anutenção,
ao calcular o atrativo de conservar diversas form as de riqueza. A noção
do que contribui para a “liquidez” é, em parte, vaga, modificando-se de
tempos em tempos e dependendo das práticas sociais e das instituições.
Existe, entretanto, na idéia dos proprietários de riqueza um a ordem de
preferência bem definida, na qual eles exprim em em qualquer tempo o

139 Ver a n ot a de r oda pé da p. 158.

232
KEYN ES

qu e pen sa m a r espeit o da liqu idez, e n ã o pr ecisa m os de m a is n a da


pa r a a n ossa a n á lise do com por t a m en t o do sist em a econ ôm ico.
P ode ser qu e em det er m in a da s cir cu n st â n cia s h ist ór ica s os pr o-
pr iet á r ios de r iqu eza t en h a m pen sa do qu e a posse de t er r a se ca r a c-
t er iza va por u m a lt o pr êm io de liqu idez, e, vist o qu e a t er r a pa r t icipa va
com a m oeda da pa r t icu la r ida de de t er , em pr in cípio, ela st icida des de
pr odu çã o e de su bst it u içã o m u it o ba ixa s,140 é con cebível qu e t en h a
h a vido n a h ist ór ia oca siões em qu e o desejo de possu ir t er r a h a ja de-
sem pen h a do o m esm o pa pel qu e a m oeda em t em pos r ecen t es, n o sen -
t ido de m a n t er a t a xa de ju r os n u m n ível dem a sia do a lt o. É difícil
det er m in a r est a in flu ên cia qu a n t it a t iva m en t e, da da a fa lt a de u m pr eço
fu t u r o pa r a a t er r a , m edido em u n ida des de si m esm a , qu e seja est r i-
t a m en t e com pa r á vel à t a xa de ju r os de u m a dívida m on et á r ia . Tem os,
en t r et a n t o, u m fa t or qu e em cer t a s época s desem pen h ou pa pel a n á logo,
r epr esen t a d o pela s eleva da s t a xa s d e ju r os h ipot ecá r ios. 141 As a lt a s
t a xa s de ju r os sobr e h ip ot eca s da t er r a , m u it a s vezes exceden do o
r en dim en t o pr ová vel de su a cu lt u r a , con st it u em u m a spect o com u m
de m u it a s econ om ia s a gr ícola s. As leis sobr e u su r a er a m especia l-
m en t e d ir igida s con t r a a s ext or sões dessa n a t u r eza . E com r a zã o,
pois, n a s a n t iga s or ga n iza ções socia is, n a s qu a is in exist ia m a s obr i-
ga ções a lon go pr a zo n o sen t ido m oder n o, a con cor r ên cia d e u m a
eleva da t a xa d e ju r os sobr e h ipot eca s p ode m u it o bem t er t id o o
m esm o efeit o em r et a r d a r o cr escim en t o da r iqu eza pr oced en t e do
in vest im en t o cor r en t e em a t ivos de ca p it a l r ecém -pr odu zidos, t a n t o
qu a n t o a s a lt a s t a xa s de ju r os sobr e dívida de lon go pr a zo o fizer a m
n os t em pos m a is r ecen t es.
O fa t o de ser o m u n do t ã o pobr e com o é em ben s de ca pit a l
a cu m u la dos, a pesa r da in in t er r u pt a pou pa n ça in dividu a l du r a n t e vá -
r ios m ilên ios, n ã o deve ser explica do, n a m in h a opin iã o, pela t en dên cia
da h u m a n ida de pa r a a im pr evidên cia , n em m esm o pela s dest r u ições
da s gu er r a s, m a s, a n t es, pelos pr êm ios de liqu idez qu e ou t r or a t in h a
a pr opr ieda de da t er r a e qu e a gor a t em a m oeda . Nest e pon t o, a m in h a

140 O a t r ibu t o de “liqu idez” n ã o é, de m a n eir a a lgu m a , in depen den t e dest a s du a s ca r a ct er íst ica s.
P ois, se a ofer t a de u m bem pode ser fa cilm en t e a u m en t a da ou se o desejo de qu e ele é
objet o pode fa cilm en t e ser desvia do por u m a va r ia çã o n o seu pr eço r ela t ivo, n ã o é pr ová vel
qu e esse bem goze do a t r ibu t o de “liqu idez” n a idéia dos possu idor es de r iqu eza . O pr ópr io
din h eir o n ã o t a r da a per der o a t r ibu t o de “liqu idez” qu a n do se esper a m for t es va r ia ções
n a su a ofer t a .
141 É eviden t e qu e u m a h ipot eca e seu ju r o se est ipu la m em t er m os m on et á r ios. P or ém , o fa t o
de o devedor de h ipot eca goza r da fa cu lda de de en t r ega r a t er r a pa r a sa lda r su a dívida —
e a ssim t em de fa zer se n ã o con segu ir opor t u n a m en t e o din h eir o — fez com qu e o sist em a
de h ipot eca s se a pr oxim a sse de u m con t r a t o de t er r a pa r a en t r ega fu t u r a con t r a t er r a pa r a
en t r ega im edia t a . Tem h a vido ven da s de t er r a s a os a r r en da t á r ios con t r a h ipot eca s efet u a da s
por eles, qu e, de fa t o, se a pr oxim a r a m m u it o da s t r a n sa ções dest a n a t u r eza .

233
OS ECON OMIS TAS

opin iã o diver ge da dou t r in a a n t iga , t a l com o Ma r sh a ll a expr im iu com


dogm a t ism o in com u m em su a obr a Prin ciples of E con om ics, p. 581:

“Tod os sa bem qu e a a cu m u la çã o de r iqu eza é r efr ea da , e


qu e a t a xa de ju r os se su st en t a em vir t u d e d a p r efer ên cia qu e
a m a ior pa r t e d a h u m a n ida de t em pela s sa t isfa ções im edia t a s
sobr e a s difer ida s, ou , em ou t r a s pa la vr a s, pela su a r elu t â n cia
em ‘esp er a r ’”.

VI

E m m in h a obr a T reatise on M on ey defin i o qu e pr et en dia ser


u m a t a xa de ju r os de n a t u r eza ú n ica , a qu e ch a m ei taxa n atu ral de
ju r os — ist o é, a qu ela qu e n a t er m in ologia de m eu T reatise m a n t in h a
a igu a lda de en t r e o m on t a n t e da pou pa n ça (segu n do a defin içã o a li
a dot a da ) e o m on t a n t e do in vest im en t o. P en sei a ssim desen volver e
escla r ecer a n oçã o de “t a xa n a t u r a l de ju r os” de Wicksell qu e, segu n do
ele, er a a qu e con ser va r ia a est a bilida de de cer t o n ível de pr eços n ã o
m u it o bem defin ida .
Tin h a eu , con t u do, ign or a do o fa t o de qu e, segu n do est a defin içã o,
h á em ca da socieda de u m a t a xa de ju r os d iferen te pa r a ca da volu m e
t eór ico de em pr ego h ipot ét ico. E pa r a ele a m esm a é “n a t u r a l” n o sen t ido
de qu e o sist em a est a r á em equ ilíbr io com esse n ível de t a xa de ju r os
e esse volu m e de em pr ego. F oi, por t a n t o, u m er r o fa la r da t a xa n a t u r a l
de ju r os ou su ger ir qu e a a n t er ior defin içã o lh e da r ia u m va lor ú n ico
in depen den t em en t e do volu m e de em pr ego. E u n ã o com pr een der a en t ã o
qu e, em cer t a s cir cu n st â n cia s, o sist em a pode est a r em equ ilíbr io a ba ixo
do plen o em pr ego.
Agor a já n ã o sou da opin iã o de qu e o con ceit o de u m a t a xa
“n a t u r a l” de ju r os, qu e a n t es m e pa r eceu u m a id éia d a s m a is pr o-
m issor a s, p ossa t r a zer à n ossa a n á lise u m a con t r ibu içã o ver da d ei-
r a m en t e ú t il ou im por t a n t e. E la é sim p lesm en t e a t a xa qu e m a n t er á
o statu s qu o; e, em ger a l, n ã o t em os in t er esse pr edom in a n t e n o
statu s qu o com o t a l.
Se exist e t a xa de ju r os ú n ica e im por t a n t e, t em de ser a qu ela a
qu e poder ía m os ch a m a r n eu tra, 142 ist o é, a t a xa n a t u r a l n o sen t ido
a n t er ior qu e é con sist en t e com o plen o em pr ego, da dos os ou t r os pa -
r â m et r os do sist em a , a liá s, t a lvez fosse pr efer ível design á -la pelo n om e
de t a xa ótim a.
A t a xa n eu t r a de ju r os pode defin ir -se m a is r igor osa m en t e com o

142 E st a defin içã o n ã o cor r espon de a n en h u m a da s diver sa s defin ições de m oed a n eu tra da da s
por a u t or es m oder n os, em bor a h a ja t a lvez cer t a r ela çã o com o objet ivo qu e esses a u t or es
t êm em m en t e.

234
KEYN ES

sen do a qu e pr eva lece em equ ilíbr io qu a n do a pr odu çã o e o em pr ego


sã o t a is qu e a ela st icida de do em pr ego, com o u m t odo, é zer o.143
O qu e ficou dit o n os dá , m a is u m a vez, a r espost a à qu est ã o de
qu a l h ipót ese é n ecessá r io a dm it ir , t a cit a m en t e, pa r a qu e a t eor ia clá s-
sica de ju r os t en h a u m sen t ido. E ssa t eor ia su põe qu e a t a xa r ea l é
sem pr e igu a l à n eu t r a , n o sen t ido em qu e a ca ba m os de defin i-la , ou ,
r ecipr oca m en t e, qu e a t a xa r ea l de ju r os é sem pr e igu a l à qu e m a n t er á
o em pr ego em cer t o n ível especifica do e con st a n t e. Se a t eor ia t r a di-
cion a l for a ssim in t er pr et a da , pou co ou n a da h á em su a s con clu sões
pr á t ica s com qu e deixa r em os de est a r de a cor do. A t eor ia clá ssica su põe
qu e a a u t or ida de ba n cá r ia ou a s for ça s n a t u r a is leva m a t a xa ju r os
do m er ca do a sa t isfa zer u m a ou ou t r a da s con dições a n t er ior es, e in -
vest iga a s leis qu e gover n a m , n est a h ipót ese, a a plica çã o e a r em u n e-
r a çã o dos r ecu r sos pr odu t ivos da com u n ida de. Com essa lim it a çã o, o
volu m e da pr odu çã o depen de, u n ica m en t e, do n ível con st a n t e de em -
pr ego qu e se su põe, a lia do à t écn ica e a o equ ipa m en t o a t u a is; e fica m os
devida m en t e pr ot egidos n o m u n do r ica r dia n o.

143 Cf. ca p. 20.

235
C AP ÍTU LO 18
N o v o En u n c ia d o d a Te o ria Ge ra l d o Em p re g o

C h ega m os a o m om en t o de r eu n ir t odos os fios do n osso r a ciocín io.


P a r a com eça r , poder ia ser ú t il in dica r qu a is elem en t os do sist em a eco-
n ôm ico t om a m os, h a bit u a lm en t e, com o da dos, qu a is sã o a s va r iá veis
in depen den t es do n osso sist em a e qu a is a s depen den t es.

Tom a m os com o da dos a ca pa cida de e a qu a n t ida de de m ã o-de-obr a


dispon ível, a qu a lida de e qu a n t ida de do equ ipa m en t o dispon ível, o es-
t a do da t écn ica , o gr a u de con cor r ên cia , os gost os e h á bit os dos con -
su m idor es, a desu t ilida de da s difer en t es in t en sida des de t r a ba lh o e
da s a t ivida des de su per visã o e or ga n iza çã o, bem com o a est r u t u r a so-
cia l, in clu in do a s for ça s qu e det er m in a m a dist r ibu içã o da r en da n a -
cion a l, n ã o com pr een dida s em n ossa s va r iá veis cit a da s m a is a dia n t e.
Isso n ã o sign ifica qu e su pon h a m os con st a n t es t a is fa t or es, m a s sim -
plesm en t e qu e, n est e in st a n t e e n est e con t ext o, n os a bst em os de a n a -
lisa r ou m esm o de leva r em con sider a çã o a s con seqü ên cia s da s su a s
va r ia ções.
Nossa s va r iá veis in depen den t es sã o, em pr im eir o lu ga r , a pr o-
pen sã o a con su m ir , a esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e a t a xa
de ju r os, em bor a , com o já vim os, est a s va r ia ções seja m su scet íveis de
m a ior a n á lise.
Nossa s va r iá veis depen den t es sã o o volu m e de em pr ego e a r en da
n a cion a l (ou dividen do n a cion a l) m edida em u n ida de de sa lá r ios.
Os fa t or es qu e t om a m os com o da dos in flu em sobr e a s n ossa s
va r iá veis in depen den t es, m a s n ã o a s det er m in a m com plet a m en t e. P or
exem plo, a esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l depen de, em pa r t e,
do volu m e de equ ipa m en t o exist en t e, qu e é u m dos fa t or es da dos, m a s
t a m bém , em pa r t e, da s expect a t iva s a lon go pr a zo, qu e n ã o se pode
in fer ir dos fa t or es da dos. H á , por ém , ou t r os elem en t os t ã o com plet a -

237
OS ECON OMIS TAS

m en t e det er m in a dos pelos fa t or es já con h ecidos qu e podem os t r a t a r


est es elem en t os der iva dos com o se t a m bém fossem da dos. P or exem plo,
os fa t or es da dos per m it em sa ber qu a l o m on t a n t e da r en da n a cion a l,
m edido em u n ida des de sa lá r io, qu e cor r espon der á a qu a lqu er volu m e
de em pr ego, de m a n eir a qu e, den t r o da est r u t u r a econ ôm ica qu e con -
sider a m os da da , a r en da n a cion a l depen de do volu m e de em pr ego, ist o
é, da qu a n t ida de de esfor ço a t u a l con sa gr a do à pr odu çã o, n o sen t ido
de qu e h á u m a cor r ela çã o ú n ica en t r e os dois.144 Dos fa t or es da dos
podem os, a lém disso, dedu zir a for m a da s fu n ções da ofer t a a gr ega da
qu e com pr een dem a s con dições físicas da ofer t a pa r a os difer en t es t ipos
de pr odu t os, qu er dizer , o volu m e de em pr ego qu e se dedica r á à pr o-
du çã o cor r espon den t e a da do n ível qu a lqu er da dem a n da efet iva , m e-
dida em u n ida des de sa lá r ios. F in a lm en t e n os dã o a fu n çã o da ofer t a
de m ã o-de-obr a (ou esfor ço), in dica n do, in ter alia, em qu e pon t o a fu n çã o
do em pr ego145 deixa r á de ser elá st ica .
A esca la da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l depen de, con t u do, em
pa r t e, dos fa t or es da dos e, em pa r t e, do r en dim en t o pr ová vel dos ben s
de ca pit a l de difer en t es espécies, a o pa sso qu e a t a xa de ju r os é pa r -
cia lm en t e gover n a da pelo est a do da pr efer ên cia pela liqu idez (ist o é,
pela fu n çã o de liqu idez) e t a m bém pela qu a n t ida de de m oeda m edida
em u n ida des de sa lá r ios. Assim , podem os em a lgu n s ca sos con sider a r
va r iá veis in depen den t es fin a is (1) os t r ês fa t or es psicológicos fu n da -
m en t a is, a sa ber , a pr open sã o psicológica a con su m ir , a a t it u de psico-
lógica r ela t iva à liqu idez e a expect a t iva psicológica do r en dim en t o
fu t u r o dos ben s de ca pit a l; (2) a u n ida de de sa lá r ios, t a l com o é de-
t er m in a da pelos a cor dos celebr a dos en t r e pa t r ões e oper á r ios; e (3) a
qu a n t ida d e de m oeda t a l com o é det er m in a da pela a çã o do ba n co
cen t r a l, d e m a n eir a qu e, se t om a r m os com o da d os os fa t or es a n t es
esp ecifica dos, est a s va r iá veis det er m in a m a r en da (ou dividen do)
n a cion a l e o volu m e de em pr ego. Ma s ela s sã o, t a m bém , su scet íveis
de a n á lise u lt er ior e n ã o con st it u em os n ossos ú lt im os elem en t os
m ín im os in depen den t es.
A divisã o da s det er m in a n t es do sist em a econ ôm ico n os dois gr u pos
de fa t or es da dos e da s va r iá veis in depen den t es é, de u m pon t o de vist a
a bsolu t o, com plet a m en t e a r bit r á r ia . E la deve ba sea r -se a pen a s n a ex-
per iên cia , de m odo qu e cor r espon da , por u m la do, a os fa t or es cu ja s
va r ia ções pa r ecem ser t ã o len t a s ou t ã o pou co im por t a n t es qu e a pen a s
t en h a m pequ en a e, com pa r a t iva m en t e, despr ezível in flu ên cia a cu r t o
pr a zo em n osso qu aesitu m ; e, por ou t r o la do, a os fa t or es cu ja s va r ia ções
exer cem , n a pr á t ica , u m a in flu ên cia dom in a n t e em n osso qu aesitu m .

144 Deixa m os de la do, n est e pon t o, cer t a s dificu lda des qu e su r gem qu a n do a s fu n ções de em pr ego
dos difer en t es pr odu t os t êm cu r va t u r a s desigu a is a o r edor do n ível de em pr ego r eleva n t e.
Ver ca p. 20.
145 Defin ida n o ca p. 20.

238
KEYN ES

O n osso objet ivo pr esen t e é descobr ir o qu e, em da do sist em a econ ôm ico,


det er m in a em u m m om en t o pr eciso a r en da n a cion a l e (o qu e vem a
ser qu a se a m esm a coisa ) o volu m e de em pr ego qu e lh e cor r espon de,
o qu e sign ifica , n u m est u do t ã o com plexo com o o da econ om ia , on de
n ã o é possível esper a r gen er a liza ções com plet a m en t e exa t a s, descobr ir
os fa t or es cu ja s va r ia ções det er m in a m prin cipalm en te o n osso qu aesi-
tu m . Nossa t a r efa fin a l poder ia con sist ir em selecion a r a s va r iá veis
qu e a a u t or ida de cen t r a l pode con t r ola r ou dir igir deliber a da m en t e n o
t ipo de sist em a em qu e r ea lm en t e vivem os.
II

Ten t em os, a gor a , r esu m ir o r a ciocín io dos ca pít u los a n t er ior es,
t om a n do os fa t or es n a or dem in ver sa à qu ela em qu e for a m in t r odu zidos.
E xist e u m in cen t ivo pa r a a u m en t a r o flu xo de in vest im en t os n o-
vos a t é u m pon t o em qu e a a lt a do pr eço de ofer t a de ca da espécie de
bem de ca pit a l seja su ficien t e, da do o seu r en dim en t o pr ová vel, pa r a
fa zer ca ir a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l em ger a l a t é a s pr oxim ida des
da t a xa de ju r os. Isso sign ifica qu e a s con dições física s da ofer t a n a s
in dú st r ia s de ben s de ca pit a l, o est a do da con fia n ça qu a n t o a o r en di-
m en t o pr ová vel, a a t it u de psicológica r ela t iva à liqu idez e a qu a n t ida de
de m oeda (ca lcu la da de pr efer ên cia em t er m os de u n ida des de sa lá r ios)
det er m in a m , em con ju n t o, o flu xo de in vest im en t os n ovos.
No en t a n t o, u m a u m en t o (ou dim in u içã o) do flu xo de in vest im en -
t os a com pa n h a -se, n ecessa r ia m en t e, de u m a u m en t o (ou dim in u içã o)
do flu xo de con su m o, pois o com por t a m en t o do pú blico é, em ger a l, de
t a l n a t u r eza qu e só pr est a a a la r ga r (ou est r eit a r ) a la cu n a qu e sepa r a
seu r en dim en t o e seu con su m o se o r en dim en t o for , por su a vez, a u -
m en t a do ou dim in u ído. Isso sign ifica qu e a s va r ia ções do flu xo de con -
su m o est ã o, em ger a l, n a m esm a d ireção (em bor a de gr a n deza m en or )
qu e a s va r ia ções do flu xo de r en dim en t o. A r ela çã o en t r e u m in cr em en t o
de con su m o e o in cr em en t o n a pou pa n ça a qu e ele est á a ssocia do é
det er m in a da pela pr open sã o m a r gin a l a con su m ir . A r ela çã o, a ssim
det er m in a da , en t r e u m in cr em en t o do in vest im en t o e o in cr em en t o
cor r espon den t e à r en da a gr ega da , a m bos m edidos em u n ida des de sa -
lá r ios, é da da pelo m u lt iplica dor de in vest im en t o.
F in a lm en t e, se su pu ser m os (com o pr im eir a a pr oxim a çã o) qu e o
m u lt iplica dor de em pr ego é igu a l a o m u lt iplica dor de in vest im en t o,
podem os, a plica n do-o a o in cr em en t o (ou a o decr escim en t o) qu e os fa -
t or es a n t er ior m en t e in dica dos pr ovoca m n o flu xo de in vest im en t o, in -
fer ir dele o in cr em en t o do em pr ego.
Um in cr em en t o (ou decr escim en t o) do em pr ego pode, con t u do,
fa zer su bir (ou ba ixa r ) a cu r va da pr efer ên cia pela liqu idez, exist in do
t r ês m a n eir a s de a u m en t a r a dem a n da da m oeda , a sa ber : pelo fa t o
de qu e o va lor da pr odu çã o sobe qu a n do o em pr ego a u m en t a , m esm o
qu e a u n ida de de sa lá r ios e os pr eços (em u n ida des de sa lá r ios) n ã o

239
OS ECON OMIS TAS

m u dem ; pelo fa t o de qu e a pr ópr ia u n ida de de sa lá r ios t en de a su bir


à m edida qu e o em pr ego m elh or a , e pelo fa t o de qu e o a u m en t o da
pr odu çã o é a com pa n h a do por u m a a lt a de pr eços (em t er m os da u n ida de
de sa lá r ios), devida a o a u m en t o dos cu st os em pr a zo cu r t o.
A posiçã o de equ ilíbr io ser á , por t a n t o, a fet a da por est a s r eper -
cu ssões e t a m bém por ou t r a s. Além disso, n ã o h á u m só dos elem en t os
a n t er ior es qu e n ã o est eja su jeit o a va r ia r sem pr évio a viso e, à s vezes,
su bst a n cia lm en t e. Com o con seqü ên cia , a ext r em a com plexida de do cu r -
so r ea l dos a con t ecim en t os. E m t odo ca so, est es pa r ecem ser os fa t or es
qu e é con ven ien t e e ú t il isola r . Qu a n do exa m in a m os u m pr oblem a
con cr et o de a cor do com o esqu em a a n t er ior , a ch a m o-lo m a is fá cil de
m a n eja r , e a n ossa in t u içã o pr á t ica (qu e pode leva r em con t a u m con -
ju n t o de fa t os m a is por m en or iza dos do qu e é possível t r a t a r segu n do
pr in cípios ger a is) se exer cer á sobr e u m m a t er ia l m en os in a bor dá vel.
III

O qu e ficou dit o é u m r esu m o da Teor ia Ger a l. Os fen ôm en os


r ea is do sist em a econ ôm ico, por ém , est ã o t a m bém color idos por cer t a s
ca r a ct er íst ica s especia is de pr open sã o a con su m ir , da esca la da efi-
ciên cia m a r gin a l do ca pit a l e da t a xa de ju r os, sobr e a s qu a is podem os
gen er a liza r com segu r a n ça , a pa r t ir da exper iên cia , m a s qu e n ã o sã o,
logica m en t e, n ecessá r ia s.
E m especia l, é u m a da s ca r a ct er íst ica s essen cia is do sist em a eco-
n ôm ico em qu e vivem os n ã o ser ele violen t a m en t e in st á vel, m esm o
est a n do su jeit o a sever a s flu t u a ções n o qu e con cer n e à pr odu çã o e a o
em pr ego. Na ver da de ele pa r ece a pt o a per m a n ecer em con dições cr ô-
n ica s de a t ivida de su bn or m a l du r a n t e u m t em po con sider á vel sem t en -
dên cia m a r ca da pa r a a r ecu per a çã o ou o cola pso com plet o. Adem a is,
a evidên cia pr ova qu e o plen o em pr ego, ou m esm o o a pr oxim a da m en t e
plen o, é u m a sit u a çã o t ã o r a r a qu a n t o efêm er a . As flu t u a ções podem
com eça r de r epen t e, m a s pa r ecem a t en u a r -se a n t es de ch ega r a gr a n des
ext r em os, e o n osso dest in o é a sit u a çã o in t er m ediá r ia , n ã o pr opr ia -
m en t e desesper a da e t a m pou co sa t isfa t ór ia . F oi n o fa t o de qu e a s flu -
t u a ções t en dem a a t en u a r -se por si m esm a s a n t es de a lca n ça r em lim it es
ext r em os e de, even t u a lm en t e, se in ver t er em qu e se ba seou a t eor ia
dos ciclos econ ôm icos de fa se r egu la r . O m esm o se a plica a os pr eços
qu e, em r espost a a u m a ca u sa in icia l de per t u r ba çã o, se m ost r a m a pt os
a en con t r a r u m n ível em qu e podem per m a n ecer r ela t iva m en t e est á veis
por cer t o t em po.
Or a , com o est es fa t os da exper iên cia n ã o sã o dedu zidos por n e-
cessida de lógica , deve-se a dm it ir qu e eles, por su a n a t u r eza , pr odu zem
est es r esu lt a dos em vir t u de da s t en dên cia s psicológica s e da s cir cu n s-
t â n cia s do m u n do m oder n o. Ser á , por t a n t o, ú t il com eça r exa m in a n do
qu a is sã o a s t en dên cia s psicológica s qu e, por h ipót ese, t or n a m u m sis-
t em a est á vel, e depois ver ifica r se é pla u sível, leva n do em con t a os

240
KEYN ES

n ossos con h ecim en t os ger a is da n a t u r eza h u m a n a con t em por â n ea , a t r i-


bu í-la s a o m u n do em qu e vivem os.
Segu n do a a n á lise pr eceden t e, a s con dições de est a bilida de pr ó-
pr ia s pa r a explica r os r esu lt a dos obser va dos sã o a s segu in t es:

(i) A pr open sã o m a r gin a l a con su m ir é t a l qu e, qu a n do a pr odu çã o


de det er m in a da com u n ida de a u m en t a (ou dim in u i) por qu e se a plica
m a is (ou m en os) m ã o-de-obr a a o seu equ ipa m en t o de ca pit a l, o m u l-
t iplica dor qu e r ela cion a os dois a u m en t os é su per ior à u n ida de, m a s
n ã o m u it o gr a n de.

(ii) Qu a n do se pr odu z u m a va r ia çã o n o r en dim en t o pr ová vel do


ca pit a l ou n a t a xa de ju r os, a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l
dever á ser t a l qu e a va r ia çã o do n ovo in vest im en t o n ã o fiqu e em gr a n de
despr opor çã o com a m u da n ça n o pr im eir o, ist o é, a s va r ia ções m ode-
r a da s n o r en dim en t o pr ová vel do ca pit a l ou n a t a xa de ju r os n ã o devem
ser a ssocia da s a va r ia ções m u it o gr a n des de flu xo de in vest im en t o.

(iii) Qu a n do o volu m e de em pr ego va r ia , os sa lá r ios n om in a is


t en dem a va r ia r n a m esm a dir eçã o, m a s n ã o de for m a m u it o despr o-
por cion a da , ist o é, a s va r ia ções m oder a da s n o em pr ego n ã o se a com -
pa n h a m de gr a n des a lt er a ções n os sa lá r ios n om in a is. E st a é u m a con -
diçã o da est a bilida de dos pr eços a o in vés do em pr ego.

(iv) P odem os a cr escen t a r u m a qu a r t a con diçã o qu e n ã o se r ela -


cion a t a n t o com a est a bilida de do sist em a com o com a t en dên cia de
a s flu t u a ções, em cer t o sen t ido, se in ver t er em n o devido t em po; t a l
con diçã o é a de qu e u m flu xo de in vest im en t o, su per ior (ou in fer ior )
a o qu e pr eva lecia , com eça a r ea gir desfa vor a velm en t e (ou fa vor a vel-
m en t e) sobr e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l se se pr olon ga r por u m
per íodo qu e, m edido em a n os, n ã o seja m u it o lon go.

(i) Nossa pr im eir a con diçã o de est a bilida de (a de qu e o m u lt ipli-


ca dor , em bor a su per ior à u n ida de, n ã o é m u it o eleva do) é per feit a m en t e
pla u sível se con sider a da u m a ca r a ct er íst ica psicológica da n a t u r eza
h u m a n a . À m edida qu e a r en da a u m en t a , a s n ecessida des n ã o sa t is-
feit a s t or n a m -se m en os pr em en t es e a m a r gem sobr e o n ível de vida
est a belecido a u m en t a ; qu a n do a r en da r ea l dim in u i, ver ifica -se o con -
t r á r io. É , por t a n t o, n a t u r a l — a o m en os pa r a o t er m o m édio da com u -
n ida de — qu e, em ca so de a u m en t o de em pr ego, o con su m o cor r en t e
se a m plie, por ém em m en or pr opor çã o qu e o in cr em en t o a bsolu t o da
r en da r ea l, e qu e, em ca so de dim in u içã o do em pr ego, ele declin e,
em bor a n ã o t a n t o qu a n t o a ba ixa a bsolu t a do r en dim en t o r ea l. Além
disso, o qu e é cer t o pa r a a m a ior ia dos in divídu os pr ova velm en t e t a m -
bém o ser á pa r a os gover n os, especia lm en t e n u m a época em qu e o

241
OS ECON OMIS TAS

a u m en t o pr ogr essivo do desem pr ego obr iga , ger a lm en t e, o E st a do a


for n ecer a ju da com r ecu r sos em pr est a dos.
Qu er est a lei psicológica , a priori, pa r eça ou n ã o pla u sível a o
leit or , o fa t o é qu e a r ea lida de ser ia ba st a n t e difer en t e se t a l lei n ã o
fosse vá lida . Nesse ca so, u m a cr éscim o do in vest im en t o, por m en or
qu e fosse, desen ca dea r ia u m a u m en t o cu m u la t ivo da dem a n da efet iva
a t é qu e se a lca n ça sse u m a sit u a çã o de plen o em pr ego, a o pa sso qu e
u m a dim in u içã o do in vest im en t o pr ovoca r ia u m a qu eda cu m u la t iva da
dem a n da efet iva a t é qu e n in gu ém m a is t ivesse em pr ego. Nã o obst a n t e
isso, a exper iên cia pr ova qu e n os en con t r a m os, ger a lm en t e, em posiçã o
in t er m ediá r ia . Nã o é im possível h a ver u m a á r ea on de, de fa t o, r ein e
a in st a bilida de; m a s, se a ssim o é, ser á pr ova velm en t e em est r eit os
lim it es, a lém dos qu a is e em qu a lqu er dir eçã o a n ossa lei psicológica
é, in con t est a velm en t e, vá lida . Além disso, é eviden t e t a m bém qu e o
m u lt iplica dor , em bor a u lt r a pa sse a u n ida de, n ã o é, em cir cu n st â n cia s
n or m a is, excessiva m en t e gr a n de. Se o fosse, det er m in a da va r ia çã o n o
flu xo de in vest im en t o im plica r ia gr a n de m odifica çã o (a pen a s lim it a da
pelo em pr ego plen o ou n u lo) n o flu xo de con su m o.

(ii) E n qu a n t o a pr im eir a con diçã o n os ga r a n t e qu e u m a va r ia çã o


m oder a da n o flu xo de in vest im en t o n ã o pr ovoca r á ou t r a va r ia çã o in -
defin ida m en t e gr a n de n a dem a n da de ben s de con su m o, n ossa segu n da
con diçã o est a belece qu e u m a va r ia çã o m oder a da n o r en dim en t o pr o-
vá vel dos ben s de ca pit a l ou n a t a xa de ju r os n ã o pr ovoca r á u m a
va r ia çã o de gr a n deza in det er m in a da n o flu xo de in vest im en t o. E st e é
pr ova velm en t e o ca so, devido a o cu st o cr escen t e de u m a pr odu çã o m a is
volu m osa com o equ ipa m en t o exist en t e. Decer t o, se pa r t ir m os de u m a
posiçã o em qu e exist a m gr a n des exceden t es de r ecu r sos pa r a a pr odu çã o
de ben s de ca pit a l, pode h a ver , den t r o de cer t os lim it es, u m a in st a bi-
lida de con sider á vel; o m esm o n ã o su ceder á , por ém , se o exceden t e de
r ecu r sos for u t iliza do em gr a n de esca la . Além disso, est a con diçã o m a r ca
u m lim it e à in st a bilida de r esu lt a n t e da s r á pida s va r ia ções do r en di-
m en t o pr ová vel dos ben s de ca pit a l, com o a con t ece n o ca so de br u sca s
flu t u a ções da psicologia n os m eios de n egócios ou a pós in ven ções qu e
m a r ca m época — t a lvez m a is em dir eçã o a scen den t e qu e descen den t e.

(iii) Nossa t er ceir a con diçã o con cor da com n ossa exper iên cia da
n a t u r eza h u m a n a . E m bor a a lu t a pelos sa lá r ios n om in a is t en h a por
fim essen cia l, com o já a ssin a la m os, m a n t er u m eleva do sa lá r io relativo,
é pr ová vel qu e, à m edida qu e o em pr ego a u m en t a , essa lu t a ven h a a
in t en sifica r -se em ca da ca so in dividu a l: pr im eir o por qu e o oper á r io se
ben eficia n a s n egocia ções de u m a posiçã o m a is fa vor á vel, e depois por -
qu e a r edu zida u t ilida de m a r gin a l do seu sa lá r io e a m elh or ia de su a
m a r gem fin a n ceir a o t or n a m m a is in clin a do a cor r er r iscos. Assim sen -
do, est a s in flu ên cia s a t u a r ã o den t r o de cer t os lim it es, e os t r a ba lh a dor es

242
KEYN ES

n ã o pr ocu r a r ã o u m sa lá r io n om in a l m u it o m a ior qu a n do o em pr ego


a u m en t a , ou pr efer ir ã o su por t a r cer t o gr a u de desem pr ego a con sen -
t ir em n u m a sen sível r edu çã o dos sa lá r ios.
Ma s, ou t r a vez, seja est a con clu sã o pla u sível ou n ã o a priori, a
exper iên cia m ost r a qu e deve h a ver u m a lei psicológica dest e t ipo vá lida
n a r ea lida de. Isso por qu e, se a con cor r ên cia en t r e os t r a ba lh a dor es
sem em pr ego con du zisse sem pr e a u m a gr a n de r edu çã o dos sa lá r ios
n om in a is, o n ível de pr eços est a r ia su jeit o a u m a violen t a in st a bilida de.
Adem a is, n ã o poder ia h a ver posiçã o de equ ilíbr io est á vel, sa lvo em
con dições com pa t íveis com o plen o em pr ego, desde o m om en t o em qu e
a u n ida de de sa lá r ios devesse ba ixa r sem lim it e, a t é qu e o efeit o da
a bu n dâ n cia de din h eir o, em u n ida des de sa lá r ios, sobr e a t a xa de ju r os
fosse su ficien t e pa r a est a belecer u m n ível de plen o em pr ego. E m n e-
n h u m ou t r o pon t o poder ia h a ver equ ilíbr io du r á vel.146

(iv) Nossa qu a r t a con diçã o, qu e n ã o é t a n t o de est a bilida de com o


de r ecessã o e de r ecu per a çã o a lt er n a da s, ba seia -se, sim plesm en t e, n a
pr esu n çã o de qu e os ben s de ca pit a l da t a m de época s diver sa s, ga s-
t a m -se com o t em po e n em t odos sã o m u it o du r á veis; a ssim , se o flu xo
de in vest im en t o ca i a lém de cer t o n ível m ín im o, ba st a cer t o la pso de
t em po (à fa lt a de gr a n des flu t u a ções em ou t r os elem en t os) pa r a de-
t er m in a r , n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, u m a a lt a ba st a n t e for t e
pa r a qu e se r est a beleça o flu xo de in vest im en t o a cim a desse m ín im o.
E , n a t u r a lm en t e, de m odo sim ila r , se os in vest im en t os sobem a u m
n ível m a ior qu e a n t es, ba st a igu a lm en t e cer t o la pso de t em po pa r a
det er m in a r n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l u m a ba ixa su ficien t em en t e
for t e pa r a pr ovoca r u m a r ecessã o, a n ã o ser qu e m u da n ça s com pen -
sa dor a s se pr odu za m em ou t r os fa t or es.
P or essa r a zã o, é pr ová vel qu e m esm o a qu eles gr a u s de r ecu pe-
r a çã o e de r ecessã o qu e podem ocor r er den t r o da s lim it a ções est a be-
lecida s pela s n ossa s ou t r a s con dições de est a bilida de pr ovoqu em u m
m ovim en t o de r et r ocesso, a t é qu e a s m esm a s for ça s de a n t es t or n em
a in ver t er a dir eçã o, se per sist ir em por u m la pso de t em po su ficien t e
e n ã o for em con t r a r ia da s por va r ia ções n os ou t r os elem en t os.
As n ossa s qu a t r o con dições t om a da s em con ju n t o ba st a m , por -
t a n t o, pa r a explica r os a spect os sa lien t es da n ossa exper iên cia r ea l,
ist o é, m ost r a m qu e oscila m os, evit a n do os ext r em os m a is gr a ves da s
flu t u a ções n o em pr ego e n os pr eços em a m ba s a s dir eções, a o r edor
de u m a posiçã o in t er m ediá r ia , sen sivelm en t e a ba ixo do plen o em pr ego
e sen sivelm en t e a cim a do m ín im o, já qu e u m a qu eda a ba ixo dest e
m ín im o con st it u i u m per igo de vida .
Nã o devem os, por ém , con clu ir qu e a posiçã o in t er m ediá r ia a ssim

146 Os efeit os da s va r ia ções n a u n ida de de sa lá r io ser ã o t r a t a dos em det a lh e n o ca p. 19.

243
OS ECON OMIS TAS

det er m in a da pela s t en dên cia s “n a t u r a is”, a sa ber , pela s t en dên cia s qu e


pr ova velm en t e per sist ir ã o à fa lt a de m edida s expr essa m en t e dest in a -
da s a cor r igi-la s, cor r espon da a u m a sit u a çã o in evit á vel. O pr edom ín io
da s con dições a n t er ior es é u m fa t o obser va do n o m u n do, t a n t o n o pr e-
sen t e com o n o pa ssa do, m a s n ã o u m pr in cípio n ecessá r io qu e n ã o possa
ser m odifica do.

244
L IVRO Q U IN TO

S ALÁRIOS N OMIN AIS E P REÇOS


C AP ÍTU LO 19
Va ria ç õ e s n o s S a lá rio s N o m in a is

T er ia sido pr efer ível exa m in a r os efeit os da s va r ia ções n os sa -


lá r ios n om in a is em ca pít u lo a n t er ior , pois a t eor ia clá ssica t em o cos-
t u m e de ba sea r n u m a pr et en sa flu idez dos sa lá r ios n om in a is a su post a
a pt idã o do sist em a econ ôm ico pa r a se a ju st a r por si m esm o; e, qu a n do
h á r igidez, de a t r ibu ir a essa r igidez a r espon sa bilida de pelos desa -
ju st a m en t os.
E r a im possível, en t r et a n t o, fa zer u m est u do com plet o dest a qu es-
t ã o a n t es de t er expost o a n ossa pr ópr ia t eor ia , pois a s con seqü ên cia s
de u m a a lt er a çã o n os sa lá r ios n om in a is sã o com plexa s. Um a r edu çã o
dos sa lá r ios é ca pa z, em det er m in a da s cir cu n st â n cia s, de est im u la r a
pr odu çã o, t a l com o o su põe a t eor ia clá ssica . A difer en ça en t r e est a
t eor ia e a m in h a r eside pr in cipa lm en t e n a m a t ér ia de a n á lise, de m odo
qu e n ã o poder ia expô-la cla r a m en t e a n t es qu e o leit or est ivesse fa m i-
lia r iza do com m eu m ét odo.
A explica çã o ger a lm en t e a dm it ida é, n o m eu en t en der , m u it o
sim ples. E la n ã o depen de da s r eper cu ssões in dir et a s, com o a s qu e exa -
m in a r em os em segu ida . O a r gu m en t o con sist e sim plesm en t e em qu e
u m a r edu çã o n os sa lá r ios n om in a is est im u la r á , coeteris paribu s, a de-
m a n da a o fa zer ba ixa r o pr eço dos pr odu t os a ca ba dos, a u m en t a n do,
por t a n t o, a pr odu çã o e o em pr ego a t é o pon t o em qu e a r edu çã o qu e
os oper á r ios con cor da r a m a ceit a r em seu s sa lá r ios n om in a is fiqu e com -
pen sa da ju st a m en t e pela eficiên cia m a r gin a l decr escen t e do t r a ba lh o
à m edida qu e a u m en t a a pr odu çã o (de det er m in a do equ ipa m en t o).
E m su a for m a m a is r u dim en t a r , ist o equ iva le a su por qu e a
r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is n ã o a fet a r á a dem a n da . H á , t a lvez, a l-
gu n s econ om ist a s qu e su st en t a m n ã o h a ver r a zã o pa r a qu e a dem a n da
seja a fet a da , a r gü in do qu e a dem a n da a gr ega da depen de da qu a n t ida de
de m oeda m u lt iplica da pela velocida de-r en da da m esm a , e qu e n ã o h á

247
OS ECON OMIS TAS

r a zã o eviden t e pa r a qu e u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is dim in u a


a qu a n t ida de de m oeda ou a su a velocida de-r en da . P oder ã o su st en t a r ,
a in da , qu e a ba ixa dos sa lá r ios a u m en t a n ecessa r ia m en t e os lu cr os.
P a r ece-m e m a is n or m a l, en t r et a n t o, con vir qu e a r edu çã o dos sa lá r ios
n om in a is pode t er algu m efeit o sobr e a dem a n da a gr ega da a t r a vés da
qu eda qu e oca sion a n o poder de com pr a de a lgu n s t r a ba lh a dor es, em -
bor a a dem a n da r ea l de ou t r os fa t or es, cu ja s r en da s n om in a is n ã o
for a m r edu zida s, se veja est im u la da pela ba ixa de pr eços, e a dem a n da
a gr ega da dos pr ópr ios t r a ba lh a dor es a u m en t e, com ba st a n t e pr oba bi-
lida de, com o r esu lt a do do m a ior volu m e de em pr ego, a n ã o ser qu e a
ela st icida de da dem a n da de m ã o-de-obr a , em r espost a à s m odifica ções
n os sa lá r ios n om in a is, seja in fer ior à u n ida de. Con seqü en t em en t e,
qu a n do o n ovo equ ilíbr io se est a belece, h á m a is em pr ego do qu e exist ir ia
em ou t r a s con dições, excet o, t a lvez, em a lgu n s ca sos ext r em os qu e
ca r ecem de r ea lida de n a pr á t ica .
Divir jo, fu n da m en t a lm en t e, dest e t ipo de a n á lise, ou m elh or , do
qu e pa r ece est a r por t r á s de obser va ções com o a s a n t er ior es, pois,
en qu a n t o o qu e ficou dit o r epr esen t a m u it o bem , segu n do cr eio, o es-
pír it o com qu e fa la m e escr evem m u it os econ om ist a s, r a r a s vezes o
r a ciocín io em qu e se ba seia m foi expost o det a lh a da m en t e.
P a r ece, en t r et a n t o, pr ová vel qu e se t en h a ch ega do a esse m odo
de pen sa r da m a n eir a qu e se segu e. E m qu a lqu er in dú st r ia , t em os
u m a cu r va da dem a n da do seu pr odu t o qu e r ela cion a a s qu a n t ida des
dispon íveis pa r a a ven da a os pr eços solicit a dos; t em os u m a sér ie de
cu r va s de ofer t a in dica n do os pr eços qu e ser ã o exigidos pa r a a ven da
de difer en t es qu a n t ida des em ca da ba se de cu st o; e a com bin a çã o dest a s
cu r va s per m it e obt er u m a n ova qu e, su pon do a in va r ia bilida de dos
dem a is cu st os (excet o com o con seqü ên cia de u m a m u da n ça n a pr odu -
çã o), n os dá a cu r va da dem a n da de m ã o-de-obr a n a in dú st r ia , r ela -
cion a n do o volu m e de em pr ego com os difer en t es n íveis de sa lá r io,
sen do qu e a for m a dest a cu r va em ca da u m dos seu s pon t os for n ece
a ela st icida de da dem a n da de m ã o-de-obr a . Tr a n sfer e-se, en t ã o, est e
con ceit o sem m odifica ções su bst a n cia is pa r a o con ju n t o da in dú st r ia ,
e su põe-se, por a n a logia , qu e t em os pa r a a in dú st r ia in t eir a u m a cu r va
da dem a n da de m ã o-de-obr a r ela cion a n do o volu m e de em pr ego com
difer en t es n íveis de sa lá r ios. Afir m a -se qu e est e a r gu m en t o n ã o se
a lt er a essen cia lm en t e, qu er se r a ciocin e em t er m os de sa lá r ios n om in a is
ou r ea is. Se pen sa m os em t er m os de sa lá r ios n om in a is, t em os, n a t u -
r a lm en t e, de fa zer a s cor r eções cor r espon den t es à s va r ia ções n o va lor
da m oeda ; m a s isso n ã o a lt er a a t en dên cia ger a l do a r gu m en t o, pois
decer t o os pr eços n ã o va r ia m em pr opor çã o exa t a com a s m odifica ções
n os sa lá r ios n om in a is.
Se é est a a ba se do r a ciocín io (e do con t r á r io n ã o sei qu a l possa
ser ), t r a t a -se, eviden t em en t e, de a lgo fa la cioso. P a r a t r a ça r , pois, a
cu r va da dem a n da em in dú st r ia s em pa r t icu la r , é in dispen sá vel a dot a r

248
KEYN ES

cer t a s h ipót eses fixa s qu a n t o à for m a da s cu r va s da ofer t a e da pr ocu r a


n a s ou t r a s in dú st r ia s e qu a n t o a o m on t a n t e da dem a n da a gr ega da
efet iva . Nã o é vá lido, por t a n t o, a plica r o a r gu m en t o à in dú st r ia em
con ju n t o, a n ã o ser qu e lh e t r a n sfir a m os t a m bém a n ossa h ipót ese de
qu e a dem a n da efet iva a gr ega da é fixa . E st a h ipót ese r edu z, por ém ,
o a r gu m en t o a u m ign oratio elen ch i. Nin gu ém pen sa r ia , pois, em n ega r
a pr oposiçã o de qu e u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is, acom pan h ad a
d e d em an d a efetiva agregad a id ên tica a n íveis an teriores, é segu ida
por u m a u m en t o de em pr ego; m a s a qu est ã o qu e se pr opõe é ju st a m en t e
sa ber se os sa lá r ios n om in a is r edu zidos ser ã o ou n ã o a com pa n h a dos
por u m a dem a n da a gr ega da efet iva qu e, m edida em din h eir o, seja igu a l
à dem a n da a n t er ior , ou pelo m en os n ã o t en h a sofr ido u m a r edu çã o
plen a m en t e pr opor cion a l à dos sa lá r ios n om in a is (ist o é, qu e seja u m
t a n t o m a ior , qu a n do m edida em u n ida des de sa lá r ios). Se n ã o é per -
m it ido, por ém , à t eor ia clá ssica est en der su a s con clu sões, por a n a logia ,
da in dú st r ia em pa r t icu la r à in dú st r ia em con ju n t o, ela é in t eir a m en t e
in ca pa z de r espon der qu e efeit os pr odu zir á sobr e o em pr ego u m a ba ixa
dos sa lá r ios n om in a is. Nã o h á , pois, n en h u m m ét odo de a n á lise qu e
possibilit e r esolver o pr oblem a . P a r ece-m e qu e a T h eory of Un em ploy-
m en t do pr ofessor P igou ext r a i da t eor ia clá ssica t u do qu a n t o se pode
t ir a r dela , com o r esu lt a do de qu e o livr o se con ver t e n u m a dem on s-
t r a çã o su r pr een den t e de qu e essa t eor ia n a da t em pa r a ofer ecer qu a n do
a plica da a o pr oblem a de sa ber o qu e det er m in a o volu m e r ea l do em -
pr ego n o a gr ega do.147

II

Apliqu em os, por t a n t o, o pr ópr io m ét odo de a n á lise à solu çã o do


pr oblem a . O m ét odo divide-se em du a s qu est ões. (1) Um a r edu çã o n os
sa lá r ios n om in a is, coeteris paribu s, t en de a a u m en t a r dir et a m en t e o
em pr ego, e com “coeteris paribu s” se qu er dizer qu e a pr open sã o a
con su m ir , a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e a t a xa de ju r os
sã o a s m esm a s qu e a n t es pa r a a com u n ida de em con ju n t o? (2) De
m a n eir a cer t a ou pr ová vel u m a r edu çã o n os sa lá r ios n om in a is t en de
a a fet a r o em pr ego n u m sen t ido pa r t icu la r , a t r a vés de su a s r eper cu ssões
cer t a s ou pr ová veis sobr e esses t r ês fa t or es?
J á r espon dem os à pr im eir a per gu n t a em sen t ido n ega t ivo n os
ca pít u los a n t er ior es. Dem on st r a m os qu e o n ível de em pr ego depen de
u n ica m en t e do da dem a n da efet iva m edida em u n ida des de sa lá r ios,
e qu e sen do est a a som a do con su m o pr ová vel e do in vest im en t o pr o-
vá vel, n ã o pode va r ia r se a pr open sã o a con su m ir , a cu r va da eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l e a t a xa de ju r os per m a n ecem con st a n t es. Se, n a

147 Nu m Apên dice a o pr esen t e ca pít u lo ser á cr it ica da em det a lh e a T h eory of Un em ploym en t,
do pr of. P igou .

249
OS ECON OMIS TAS

a u sên cia de qu a lqu er m odifica çã o n est es elem en t os, os em pr esá r ios


a u m en t a ssem o volu m e de em pr ego, seu s r en dim en t os ser ia m n eces-
sa r ia m en t e in fer ior es a o pr eço da ofer t a .
P a r a r efu t a r a con clu sã o su m á r ia de qu e u m a r edu çã o dos sa lá r ios
n om in a is a u m en t a r ia o em pr ego “por qu e r edu z o cu st o de pr odu çã o”,
t a lvez seja ú t il segu ir o cu r so dos a con t ecim en t os n a h ipót ese m a is
a dequ a da a est e r a ciocín io, ist o é, qu e os em pr esá r ios esperam qu e a
r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is pr odu za esse efeit o. Sem dú vida , n ã o é
im pr ová vel qu e o em pr esá r io in dividu a l, ven do dim in u ir seu s pr ópr ios
cu st os, com ece n egligen cia n do efeit os sobr e a dem a n da de seu pr odu t o
e a t u e ba sea do n a h ipót ese de qu e ser á ca pa z de ven der com lu cr o
u m a pr odu çã o m a ior qu e a de a n t es. Se os em pr esá r ios em ger a l r e-
gu la r em su a a t it u de ba sea n do-se n est a expect a t iva , con segu ir ã o eles,
n a r ea lida de, a u m en t a r os seu s lu cr os? Som en t e se a pr open sã o m a r -
gin a l a con su m ir da com u n ida de for igu a l à u n ida de, de m odo qu e n ã o
h a ja la cu n a en t r e o in cr em en t o dos r en dim en t os e o in cr em en t o do
con su m o; ou en t ã o se h ou ver u m a u m en t o n o in vest im en t o qu e cor -
r espon da à la cu n a exist en t e en t r e o in cr em en t o da r en da e o in cr em en t o
do con su m o, o qu e só a con t ecer á n o ca so de a cu r va da s eficiên cia s
m a r gin a is do ca pit a l t er a u m en t a do r ela t iva m en t e à t a xa de ju r os.
Desse m odo, os r esu lt a dos obt idos com o a u m en t o de pr odu çã o desa -
n im a r ã o os em pr esá r ios, e o em pr ego volt a r á , ou t r a vez, a o seu n ível
a n t er ior , sa lvo se a pr open sã o m a r gin a l a con su m ir for igu a l à u n ida de
ou a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is r esu lt a r n u m a u m en t o da esca la
da s eficiên cia s m a r gin a is do ca pit a l em r ela çã o à t a xa de ju r os e, por -
t a n t o, n o m on t a n t e do in vest im en t o. Se os em pr esá r ios ofer ecem ba s-
t a n t e em pr ego, a dm it in do-se qu e possa m ven der su a pr odu çã o a o pr eço
pr evist o, pa r a qu e, da s r en da s cor r espon den t es a esse em pr ego, o pú -
blico r et ir e pou pa n ça su per ior a o in vest im en t o cor r espon den t e, os em -
pr esá r ios a r r isca m -se a sofr er u m pr eju ízo igu a l à difer en ça ; est e ser á
o ca so, seja qu a l for o n ível dos sa lá r ios n om in a is. Na m elh or da s
h ipót eses, a da t a do seu desa pon t a m en t o a pen a s ser á r et a r da da por
u m in t er va lo de t em po n o qu a l os seu s pr ópr ios in vest im en t os pa r a
a cr éscim o do ca pit a l cir cu la n t e est iver em pr een ch en do a la cu n a .
Desse m odo, a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is n ã o t en der á a a u -
m en t a r o em pr ego du r a n t e m u it o t em po, a n ã o ser pela s su a s r eper -
cu ssões sobr e a pr open sã o da com u n ida de em con ju n t o a con su m ir ,
sobr e a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l ou sobr e a t a xa de
ju r os. Nã o h á ou t r o m ét odo, pa r a a n a lisa r a s con seqü ên cia s de t a l
r edu çã o, qu e o de a com pa n h a r os seu s possíveis efeit os sobr e esses
t r ês fa t or es.
Na pr á t ica , a s r eper cu ssões m a is im por t a n t es sobr e est es fa t or es
pa r ecem ser a s segu in t es:

(1) Um a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is dim in u ir á , em cer t a m e-

250
KEYN ES

dida , os pr eços. Aca r r et a r á , por t a n t o, cer t a r edist r ibu içã o da r en da


r ea l (a) dos a ssa la r ia dos pa r a ou t r os fa t or es qu e en t r em n o cu st o pr i-
m á r io m a r gin a l e cu ja r em u n er a çã o n ã o t en h a sido r edu zida , e (b) dos
em pr esá r ios pa r a os r en deir os a os qu a is se ga r a n t iu cer t o r en dim en t o
fixo em t er m os m on et á r ios.
Qu a l ser á o efeit o dessa r edist r ibu içã o sobr e a pr open sã o a con -
su m ir da com u n ida de em con ju n t o? A t r a n sfer ên cia de r en dim en t o dos
qu e r ecebem sa lá r ios pa r a ou t r os fa t or es de pr odu çã o t en der á , pr ova -
velm en t e, a r edu zir a pr open sã o a con su m ir . O r esu lt a do da t r a n sfe-
r ên cia dos em pr esá r ios pa r a os qu e vivem de r en da é m a is du vidoso.
Se os qu e vivem de r en da , por ém , r epr esen t a m , em con ju n t o, a pa r t e
m a is r ica da com u n ida de e o gr u po cu jo n ível de vida é m en os flexível,
o efeit o ser á t a m bém desfa vor á vel. Só podem os con ject u r a r sobr e qu a l
ser á o r esu lt a do líqu ido da som a dest a s con sider a ções. P r ova velm en t e
ser á m a is a dver so qu e fa vor á vel.

(2) Se n os r efer im os a u m sist em a n ã o fech a do, e se a r edu çã o


dos sa lá r ios n om in a is for u m a red u ção relativam en te aos salários n o-
m in ais n o estran geiro, qu a n do a m bos se con ver t em a u m a u n ida de
com u m , eviden t em en t e a m u da n ça ser á fa vor á vel a o in vest im en t o, vist o
t en der a m elh or a r o sa ldo da ba la n ça com er cia l. Isso im plica , n a t u -
r a lm en t e, qu e a va n t a gem n ã o seja a n u la da por a lt er a ções n a s t a r ifa s,
cot a s et c. Se a cr en ça t r a dicion a l n a eficá cia de u m a r edu çã o de sa lá r ios
n om in a is com o m eio de a u m en t a r o em pr ego é m a is fir m e n a Gr ã -Br e-
t a n h a do qu e n os E st a dos Un idos, isso se deve, pr ova velm en t e, a o fa t o
de est e ú lt im o pa ís ser u m sist em a fech a do em com pa r a çã o com o
br it â n ico.

(3) No ca so de u m sist em a a ber t o, é pr ová vel qu e u m a r edu çã o


dos sa lá r ios n om in a is, em bor a a u m en t e o sa ldo fa vor á vel da ba la n ça
com er cia l, pior e os t er m os com er cia is. P or t a n t o, h a ver á u m a r edu çã o
n os r en dim en t os, sa lvo n o ca so dos r ecém -em pr ega dos, o qu e pode in -
flu ir n o a u m en t o da pr open sã o a con su m ir .

(4) Se se esp er a qu e a ba ixa dos sa lá r ios n om in a is seja u m a


red u ção relativam en te aos sa lários n om in a is n o fu tu ro, a m u da n ça
ser á fa vor á vel a o in vest im en t o, por qu e, com o vim os a n t es, a u m en -
t a r á a eficiên cia m a r gin a l d o ca pit a l, a o m esm o t em po qu e, pela
m esm a r a zã o, poder á ser fa vor á vel a o con su m o. Se, por ou t r o la do,
a r edu çã o leva à exp ect a t iva ou , pelo m en os, à sér ia possibilid a de
de u m a ba ixa post er ior , t er á ju st a m en t e o efeit o con t r á r io, pois di-
m in u ir á a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e pr ovoca r á o a dia m en t o
do in vest im en t o e do con su m o.

(5) A r edu çã o da folh a de sa lá r io, a com pa n h a da por cer t a ba ixa

251
OS ECON OMIS TAS

n os pr eços e n os r en dim en t os m on et á r ios em ger a l, dim in u ir á a n e-


cessida de de r ecu r sos líqu idos pa r a o pa ga m en t o de r en dim en t os e
pa r a a s t r a n sa ções; e, por con seqü ên cia , fa r á ba ixa r pro tan to a cu r va
da pr efer ên cia pela liqu idez da com u n ida de em con ju n t o. Coeteris pa-
ribu s, ist o r edu zir á a t a xa de ju r os e ser á fa vor á vel a o in vest im en t o.
Nest e ca so, o efeit o da pr evisã o, r ela t iva m en t e a o fu t u r o, ser á de t en -
dên cia opost a à qu e con sider a m os em (4). Se se esper a , por t a n t o, m a is
t a r de, u m n ovo a u m en t o dos sa lá r ios e dos pr eços, a r ea çã o fa vor á vel
ser á m u it o m en os a cen t u a da n o ca so dos em pr ést im os a lon go do qu e
n os a cu r t o pr a zo. Além disso, se a r edu çã o dos sa lá r ios dim in u i a
con fia n ça n o pla n o polít ico por ca u sa do descon t en t a m en t o popu la r , o
a u m en t o n a pr efer ên cia pela liqu idez decor r en t e dest a ca u sa poder á
com pen sa r a liber a çã o de r ecu r sos líqu idos da cir cu la çã o a t iva .

(6) Desde qu e u m a r edu çã o especia l dos sa lá r ios n om in a is é sem -


pr e va n t a josa pa r a u m em pr esá r io ou in dú st r ia , in dividu a lm en t e, u m a
r edu çã o ger a l (em bor a os seu s efeit os r ea is seja m difer en t es) pode,
t a m bém , da r u m t om ot im ist a à s idéia s dos em pr esá r ios, os qu a is, por
su a vez, podem r om per o cír cu lo vicioso dos cá lcu los in devida m en t e
pessim ist a s sobr e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e r egu la r a s coisa s
de m odo qu e est a s fu n cion em sobr e ba ses m a is n or m a is de expect a t iva .
P or ou t r o la do, se os t r a ba lh a dor es com et er em o m esm o er r o qu e seu s
pa t r ões sobr e os efeit os de u m a r edu çã o ger a l, a s dispu t a s t r a ba lh ist a s
poder ã o a n u la r est a cir cu n st â n cia fa vor á vel; even t u a lida de est a t a n t o
m a is de t em er pelo fa t o de n ã o exist ir , via de r egr a , m eio a lgu m de
con segu ir u m a r edu çã o igu a l e sim u lt â n ea dos sa lá r ios n om in a is em
t oda s a s in dú st r ia s e, por t a n t o, ca da t r a ba lh a dor t em in t er esse em
opor -se a ela em seu ca so pa r t icu la r . De fa t o, u m m ovim en t o dos em -
pr ega dor es com vist a a u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is pela r evisã o
dos con t r a t os en con t r a r á r esist ên cia m u it o m a ior qu e a ba ixa gr a du a l
e a u t om á t ica dos sa lá r ios r ea is com o r esu lt a do da a lt a dos pr eços.

(7) P or ou t r o la do, a in flu ên cia depr im en t e qu e exer ce sobr e


os em pr esá r ios a r espon sa bilida d e cr escen t e da s d ívid a s pode n eu -
t r a liza r , em pa r t e, qu a lqu er r ea çã o ot im ist a pr oven ien t e da r edu çã o
dos sa lá r ios. N a ver da d e, se a ba ixa dos sa lá r ios e d os pr eços a lca n ça
cer t a ext en sã o, os em pr esá r ios for t em en t e en divida d os p odem ch ega r
logo a o est a d o de in solvên cia , com efeit os ext r em a m en t e a dver sos
sobr e o in vest im en t o. Adem a is, a s con seqü ên cia s d e u m n ível in fer ior
de pr eços sobr e a ca r ga r ea l da dívida n a cion a l e, por t a n t o, sobr e
os im p ost os sã o de n a t u r eza a p r ovoca r n os m eios de n egócios u m
pr ofu n do a ba lo da con fia n ça .
A en u m er a çã o pr eceden t e n ã o é u m a list a com plet a da s con se-
qü ên cia s qu e, n o com plexo m u n do r ea l, podem ser ca u sa da s por u m a

252
KEYN ES

r edu çã o dos sa lá r ios. E n t r et a n t o, in clu i, n o m eu en t en der , a s com u -


m en t e m a is im por t a n t es.
P or t a n t o, se lim it a r m os o n osso r a ciocín io a o ca so de u m sist em a
fech a do, e a dm it ir m os qu e n a da se pode esper a r , a n ã o ser sim ples-
m en t e o con t r á r io, da s r eper cu ssões qu e a n ova dist r ibu içã o da r en da
r ea l pr odu z sobr e a pr open sã o da com u n ida de a despen der , a esper a n ça
de qu e u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is possa a t u a r fa vor a velm en t e
sobr e o em pr ego deve ba sea r -se, pr in cipa lm en t e, n u m a m elh or ia do
in vest im en t o devida a u m a u m en t o n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l
segu n do (4), ou n u m a t a xa m en or de ju r os de a cor do com (5). E xa m i-
n a r em os m a is de per t o est a s du a s possibilida des.
A con t in gên cia fa vor á vel de u m a u m en t o n a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l é a qu ela em qu e se ju lga qu e os sa lá r ios n om in a is t en h a m
a lca n ça do o seu lim it e in fer ior , de m odo qu e a s va r ia ções post er ior es
t en h a m de ser em dir eçã o a scen den t e. A con t in gên cia m a is desfa vor á vel
é a qu ela em qu e os sa lá r ios n om in a is descem len t a m en t e e em qu e
ca da r edu çã o dim in u i a con fia n ça n a pr oba bilida de qu e t êm os m esm os
de se m a n t er em . Qu a n do en t r a m os n u m per íodo de declín io da dem a n da
efet iva , u m a ba ixa r epen t in a e su bst a n cia l dos sa lá r ios n om in a is, le-
va n do-os a u m n ível t ã o ín fim o qu e n in gu ém pu desse a cr edit a r n a su a
con t in u ida de in defin ida , ser ia o a con t ecim en t o m a is fa vor á vel pa r a r es-
t a u r a r a dem a n da efet iva . Ma s isso só poder ia ser r ea liza do por u m a
decisã o a dm in ist r a t iva , e dificilm en t e ser ia possível n u m r egim e de
livr e discu ssã o dos sa lá r ios. P or ou t r o la do, ser ia m u it o m a is va n t a joso
qu e os sa lá r ios fossem r igida m en t e fixa dos e ju lga dos isen t os de va -
r ia ções im por t a n t es do qu e a ocor r ên cia de per íodos de depr essã o a com -
pa n h a dos de u m a t en dên cia pr ogr essiva pa r a a ba ixa dos sa lá r ios n o-
m in a is, com a esper a n ça de qu e ca da n ova r edu çã o m oder a da n os sa -
lá r ios t r a du zisse u m a u m en t o de, diga m os, 1% n o volu m e de desem -
pr ego. Su pon do, por exem plo, qu e se esper a u m a ba ixa de, diga m os,
2% n os sa lá r ios du r a n t e o a n o segu in t e, essa pr evisã o det er m in a r á
u m efeit o m a is ou m en os equ iva len t e a o de u m a a lt a de 2% n o ju r o
pa gá vel por u m em pr ést im o de igu a l du r a çã o. As m esm a s obser va ções
a plica m -se m u tatis m u tan d is a u m per íodo de expa n sã o.
Segu e qu e, com a s pr á t ica s e a s in st it u ições exist en t es n o m u n do
con t em por â n eo, é m a is con ven ien t e a ba n don a r u m a polít ica de sa lá r ios
n om in a is r ígidos do qu e u m a polít ica flexível, qu e se a da pt e gr a du a l-
m en t e à s va r ia ções do desem pr ego, ist o é, n o qu e se r efer e à eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l. Ma s n ã o se a lt er a r á est a con clu sã o qu a n do t r a -
t a r m os a t a xa de ju r os?
P or isso, é sobr e o efeit o qu e u m n ível decr escen t e de pr eços e
sa lá r ios pr ovoca n a dem a n da de din h eir o qu e devem ba sea r o peso de
su a a r gu m en t a çã o os qu e a cr edit a m n a ca pa cida de do sist em a econ ô-
m ico de a ju st a r -se a u t om a t ica m en t e, em bor a n ã o m e con st e qu e o t e-
n h a m feit o ja m a is. Se a qu a n t ida de de m oeda é por si m esm a fu n çã o

253
OS ECON OMIS TAS

do n ível de sa lá r ios e pr eços, n ã o h á , de fa t o, n a da a esper a r n est e


sen t ido. P or ém , se a qu a n t ida de de m oeda for vir t u a lm en t e fixa , é
eviden t e qu e, por m eio de u m a r edu çã o a dequ a da dos sa lá r ios, a qu a n -
t ida de de m oeda m edida em u n ida des de sa lá r ios pode ser a u m en t a da
in defin ida m en t e, e qu e o seu m on t a n t e, em pr opor çã o a os r en dim en t os
em ger a l, pode ser gr a n dem en t e a u m en t a do, depen den do o lim it e desse
a u m en t o da pr opor çã o qu e o cu st o dos sa lá r ios con ser va com o cu st o
pr im á r io m a r gin a l e da r ea çã o de ou t r os elem en t os do cu st o pr im á r io
m a r gin a l r ela t iva m en t e à ba ixa n a u n ida de de sa lá r ios.
P odem os, por t a n t o, a o m en os t eor ica m en t e pr odu zir os m esm os
efeit os sobr e a t a xa de ju r os, r edu zin do os sa lá r ios sem a lt er a r a qu a n -
t ida de de m oeda e a u m en t a n do a qu a n t ida de de m oeda sem a lt er a r o
n ível dos sa lá r ios. Da í, dedu z-se qu e a s r edu ções dos sa lá r ios, com o
m ét odo de a ssegu r a r o plen o em pr ego, est ã o su jeit a s à s m esm a s lim i-
t a ções qu e o m ét odo pa r a a u m en t a r a qu a n t ida de de m oeda . As m esm a s
r a zões a n t es m en cion a da s, qu e lim it a m a eficá cia dos a u m en t os n a
qu a n t ida de de din h eir o com o m eio de eleva r o in vest im en t o à cifr a
ót im a , a plica m -se, m u tatis m u tan d is, à s r edu ções de sa lá r ios. Assim
com o u m a cr éscim o m oder a do n a qu a n t ida de de m oeda pode exer cer
u m a in flu ên cia in a dequ a da sobr e a t a xa de ju r os a lon go pr a zo, u m
a u m en t o excessivo pode n eu t r a liza r , pelos seu s efeit os per t u r ba dor es
sobr e a con fia n ça , a s ou t r a s va n t a gen s qu e a pr esen t a ; do m esm o m odo,
u m a r edu çã o m oder a da n os sa lá r ios n om in a is pode r evela r -se pou co
efica z, en qu a n t o a r edu çã o exa ger a da , su pon do qu e fosse exeqü ível,
poder ia dest r u ir a con fia n ça .
Nã o h á , por t a n t o, m ot ivo pa r a cr er qu e u m a polít ica flexível de
sa lá r ios possa m a n t er u m est a do per m a n en t e de plen o em pr ego, n em
com o pen sa r qu e u m a polít ica m on et á r ia de m er ca do a ber t o possa a t in -
gir , sozin h a , est e r esu lt a do. Ta is m eios n ã o sã o su ficien t es pa r a con fer ir
a o sist em a econ ôm ico a pr opr ieda de de se a ju st a r por si m esm o.
Se, n a r ea lida de, os t r a ba lh a dor es pu dessem in t er vir (e a ssim o
fizessem ) sem pr e qu e o em pr ego fosse in fer ior a o n ível plen o, pa r a
r edu zir por u m a a çã o com bin a da a s su a s dem a n da s de m oeda , n o pon t o
em qu e a a bu n dâ n cia de din h eir o r ela t iva m en t e à u n ida de de sa lá r ios
ba st a sse pa r a fa zer ba ixa r a t a xa de ju r os a u m n ível com pa t ível com
o plen o em pr ego, a a dm in ist r a çã o da polít ica m on et á r ia est a r ia , de
fa t o, n a s m ã os dos sin dica t os oper á r ios, com vist a a o plen o em pr ego,
e n ã o n a s do sist em a ba n cá r io.
E m bor a u m a polít ica flexível de sa lá r ios e u m a polít ica m on et á r ia
flexível ven h a m a con st it u ir , a n a lit ica m en t e, a m esm a coisa , vist o qu e
a m ba s sã o m eios de a lt er a r a qu a n t ida de de m oeda m edida em u n ida des
de sa lá r ios, n ã o é m en os ver da de qu e, a ou t r os r espeit os, h a ja difer en ça s
fu n da m en t a is en t r e a s m esm a s. Gost a r ia de r ecor da r br evem en t e a o
leit or a s t r ês con sider a ções pr in cipa is.

254
KEYN ES

(i) E xcet o n u m a com u n ida de socia liza da on de a polít ica sa la r ia l


é fixa da por decr et o, n ã o h á m eio a lgu m de a ssegu r a r r edu ções u n i-
for m es de sa lá r ios pa r a t oda s a s ca t egor ia s de m ã o-de-obr a . O r esu lt a do
só pode ser con segu ido por u m a sér ie de m u da n ça s gr a du a is e ir r egu -
la r es, qu e n en h u m cr it ér io de ju st iça socia l ou de con ven iên cia econ ô-
m ica ju st ifica , e qu e, pr ova velm en t e, só se com plet a m depois de lu t a s
desa st r osa s e n ociva s, n a s qu a is os qu e se a ch a m em posiçã o m a is
fr a ca pa r a n egocia r pa decem em com pa r a çã o com os ou t r os. P or ou t r o
la do, a m odifica çã o da qu a n t ida de de din h eir o já est á n a a lça da da
m in or ia dos gover n os, qu e a r ea liza m por m eio da polít ica de m er ca do
a ber t o ou m edida s a n á loga s. Con sider a n do a n a t u r eza h u m a n a e n ossa s
in st it u ições, som en t e u m a pessoa in sen sa t a pr efer ir ia u m a polít ica de
sa lá r ios flexíveis a u m a polít ica m on et á r ia elá st ica , a n ã o ser qu e pu -
desse in voca r a fa vor da pr im eir a va n t a gen s im possíveis de ser em
obtidas com a segunda. Além disso, em igualdade de condições em outros
aspectos, um método com parativam ente fácil de aplicar deveria ser pre-
ferível a outro sem dúvida mais difícil, a ponto de ser impraticável.

(ii) Qu a n do os sa lá r ios n om in a is per m a n ecem con st a n t es, os pr e-


ços só podem va r ia r (exceçã o feit a , por exem plo, a os pr eços “dir igidos”
ou a os de m on opólio, qu e sã o det er m in a dos por ou t r os fa t or es a lém
do cu st o m a r gin a l) por m ot ivo da dim in u içã o da pr odu t ivida de m a r gin a l
do equ ipa m en t o qu e a com pa n h a o a u m en t o da pr odu çã o. Assim , m a n -
t er -se-á a m a ior eqü ida de exeqü ível en t r e a m ã o-de-obr a e os fa t or es
cu ja r em u n er a çã o n om in a l fixa é ga r a n t ida por con t r a t o, ou seja , os
qu e vivem de r en da s e a s pessoa s qu e t êm or den a dos fixos n os qu a dr os
per m a n en t es da s em pr esa s, da s in st it u ições ou do E st a do. P a r a qu e
a s cla sses socia is im por t a n t es t en h a m r em u n er a çã o n om in a l qu e per -
m a n eça fixa em qu a lqu er ca so, a ju st iça e a con ven iên cia socia l fica m
m a is bem ser vida s se a r em u n er a çã o de tod os os fa t or es for , de cer t o
m odo, in flexível em t er m os de din h eir o. Leva n do-se em con t a os gr a n des
gr u pos de r en da s qu e sã o com pa r a t iva m en t e in flexíveis em t er m os
n om in a is, a pen a s u m a pessoa in ju st a pode pr efer ir u m a polít ica flexível
de sa lá r ios a ou t r a flexível da m oeda , a n ã o ser qu e a pr im eir a ofer eça
va n t a gen s qu e n ã o se podem obt er n a segu n da .

(iii) O método para aumentar a quantidade de dinheiro em unidades


de salários, através da redução da unidade dos mesmos, eleva proporcio-
nalmente a carga dos débitos, ao passo que o m esm o resultado pelo au-
mento da quantidade de moeda, sem mudar a unidade de salários, causa
o efeito oposto. Considerando a carga excessiva de m uitos tipos de débitos,
som ente um a pessoa inexperiente pode preferir o prim eiro.

(iv) Se pa r a con segu ir u m a qu eda da t a xa de ju r os for pr eciso


r edu zir o n ível de sa lá r ios, exist ir á , pela s r a zões expost a s a n t es, u m

255
OS ECON OMIS TAS

du plo em pecilh o à eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e u m du plo m ot ivo


pa r a a dia r os in vest im en t os, r et a r da n do, a ssim , a r ecu per a çã o.
III

Da í se dedu z qu e, se a m ã o-de-obr a r espon desse à dim in u içã o


gr a du a l do em pr ego, ofer ecen do seu s ser viços por u m sa lá r io n om in a l
gr a du a lm en t e ba ixo, n ã o r esu lt a r ia disso, com o r egr a ger a l, n en h u m a
dim in u içã o dos sa lá r ios r ea is, qu e a liá s poder ia m a u m en t a r , por m eio
de su a in flu ên cia a dver sa sobr e o volu m e de pr odu çã o. O efeit o pr in cipa l
de sem elh a n t e polít ica ser ia ca u sa r gr a n de in st a bilida de de pr eços,
t a lvez violen t a o ba st a n t e pa r a t or n a r fú t eis os cá lcu los em pr esa r ia is
em u m a econ om ia fu n cion a n do com o a qu ela em qu e vivem os. Su por
qu e a polít ica de sa lá r ios flexíveis seja u m a t r ibu t o n or m a l e cor r ela t o
de u m sist em a ba sea do, em seu con ju n t o, n o pr in cípio de laissez-faire
é o opost o à ver da de. Apen a s em u m a socieda de a lt a m en t e a u t or it á r ia ,
ca pa z de im por m u da n ça s sú bit a s, su bst a n cia is e com plet a s, poder ia
fu n cion a r com êxit o u m a polít ica de sa lá r ios flexíveis. P ode-se im a gi-
n á -la oper a n do n a It á lia , n a Alem a n h a ou n a Rú ssia , m a s n ã o n a
F r a n ça , n os E st a dos Un idos ou n a Gr ã -Br et a n h a .
Se, com o n a Au st r á lia , fosse feit a a t en t a t iva de fixa r , por via
legisla t iva , os sa lá r ios r ea is, h a ver ia , en t ã o, cer t o volu m e de em pr ego
cor r espon den t e a o n ível dos m esm os; e o volu m e efet ivo de em pr ego,
n u m sist em a fech a do, oscila r ia violen t a m en t e en t r e esse n ível e a a u -
sên cia t ot a l de em pr ego, con for m e o in vest im en t o fosse su per ior ou
in fer ior a o m on t a n t e com pa t ível com o dit o volu m e, a o pa sso qu e os
pr eços se a ch a r ia m em equ ilíbr io in st á vel qu a n do o in vest im en t o a l-
ca n ça sse o n ível cr ít ico, t en den do pa r a zer o qu a n do est e se en con t r a sse
a ba ixo do dit o n ível, e su bin do a t é o in fin it o qu a n do ele est ivesse a cim a .
O elem en t o de est a bilida de, se a ca so exist isse, t er ia de ser en con t r a do
n o fa t o de a s for ça s qu e gover n a m a qu a n t ida de de m oeda est a r em
det er m in a da s de t a l m odo qu e sem pr e h ou vesse a lgu m n ível de sa lá r ios
n om in a is n o qu a l a qu a n t ida de de m oeda fosse a n ecessá r ia pa r a cr ia r
u m a r ela çã o en t r e a t a xa de ju r os e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l
r equ er ida pa r a m a n t er o in vest im en t o n o n ível cr ít ico. Nest a cir cu n s-
t â n cia , o em pr ego ser ia , en t ã o, con st a n t e (n o n ível a dequ a do pa r a o
sa lá r io r ea l lega l) e os sa lá r ios n om in a is e os pr eços oscila r ia m r a pi-
da m en t e n a m edida ju st a pa r a m a n t er est a t a xa de in vest im en t o n a
cifr a con ven ien t e. No ca so con cr et o da Au st r á lia a solu çã o foi en con -
t r a da , em pa r t e, é cla r o, n a in evit á vel in ca pa cida de da legisla çã o pa r a
a t in gir os seu s fin s, m a s, em pa r t e, t a m bém , n o fa t o de qu e a Au st r á lia
n ã o é u m sist em a fech a do, de m odo qu e o n ível dos sa lá r ios n om in a is
er a , por si m esm o, u m a det er m in a n t e do in vest im en t o ext er n o e, con -
seqü en t em en t e, do in vest im en t o t ot a l, en qu a n t o a r ela çã o de in t er -
câ m bio exer cia u m a in flu ên cia im por t a n t e sobr e os sa lá r ios r ea is.
À lu z dest a s con sider a ções, sou a gor a de opin iã o qu e a m a n u -

256
KEYN ES

t en çã o de u m n ível ger a l est á vel de sa lá r ios n om in a is é, r esu m in do


t oda s a s con sider a ções, a polít ica m a is a con selh á vel pa r a u m sist em a
fech a do; a m esm a con clu sã o per m a n ece vá lida pa r a u m sist em a a ber t o,
desde qu e o equ ilíbr io com o r est o do m u n do possa ser a ssegu r a do
pela s flu t u a ções do câ m bio. A exist ên cia de cer t o gr a u de flexibilida de
dos sa lá r ios em det er m in a da s in dú st r ia s t em su a s va n t a gen s, desde
qu e sir va pa r a fa cilit a r a t r a n sfer ên cia de m ã o-de-obr a da s in dú st r ia s
qu e se en con t r a m em deca dên cia r ela t iva pa r a a s qu e est ã o r ela t iva -
m en t e pr ogr edin do. O n ível ger a l dos sa lá r ios n om in a is, por ém , deve
ser m a n t ido t ã o est á vel qu a n t o possível, pelo m en os em per íodos cu r t os.
E st a polít ica t er á com o r esu lt a do u m gr a u con ven ien t e de est a -
bilida de n o n ível dos pr eços — m a ior est a bilida de, em t odo ca so, do
qu e com u m a polít ica de sa lá r ios flexíveis. E xcet u a n do-se os pr eços
“dir igidos” ou os de m on opólio, o n ível de pr eços só se m odifica r á em
per íodos cu r t os à m edida qu e a s va r ia ções do em pr ego a fet em os cu st os
pr im á r ios m a r gin a is; já n os per íodos lon gos, só va r ia r á em con seqü ên cia
da ba ixa do cu st o de pr odu çã o devida a n ova s t écn ica s e a equ ipa m en t os
n ovos ou a m plia dos.
É ver da de qu e, se a pesa r de t u do ocor r er em gr a n des flu t u a ções
n o em pr ego, ela s ser ã o a com pa n h a da s de su bst a n cia is va r ia ções n o
n ível dos pr eços. E st a s flu t u a ções, com o disse, ser ã o, por ém , m en os
im por t a n t es do qu e u m a polít ica de sa lá r ios flexíveis.
Assim sen do, com u m a polít ica r ígida de sa lá r ios, a est a bilida de
dos pr eços est á liga da , em per íodos cu r t os, à a u sên cia de flu t u a ções
n o em pr ego. P or ou t r o la do, n o qu e con cer n e a os per íodos lon gos, a in da
n os r est a escolh er en t r e u m a polít ica de sa lá r ios est á veis, per m it in do
a os pr eços qu e ba ixem len t a m en t e com o pr ogr esso da t écn ica e do
equ ipa m en t o, e u m a polít ica de pr eços est á veis, deixa n do os sa lá r ios
su bir len t a m en t e. E m lin h a s ger a is, pr efir o a segu n da a lt er n a t iva , por -
qu e é m a is fá cil con ser va r o n ível r ea l de em pr ego den t r o de det er m i-
n a da esca la de plen o em pr ego, com esper a n ça de m a ior es sa lá r ios n o
fu t u r o do qu e com a expect a t iva de sa lá r ios m en or es, e t a m bém em
vir t u de da s va n t a gen s socia is de a lívio gr a du a l da s dívida s, da m a ior
fa cilida de n os desloca m en t os de m ã o-de-obr a da s in dú st r ia s qu e decli-
n a m pa r a a s qu e pr ogr idem , e do est ím u lo psicológico qu e or din a r ia -
m en t e r esu lt a de u m a t en dên cia m oder a da a su bir dos sa lá r ios n om i-
n a is. Ma s isso n ã o en volve n en h u m pr in cípio essen cia l, e m e fa r ia ir
a lém de m eu pr esen t e objet ivo, pa r a expor , em det a lh e, a r gu m en t os
em a m bos os sen t idos.

257
A P ÊN D ICE AO C AP ÍTU LO 19
A “ Th e o ry o f U n e m p lo y m e n t” d o P ro fe s s o r P ig o u

E m su a T h eory of U n em p loym en t o pr ofessor P igou fa z o vo-


lu m e d e em pr ego depen der de dois fa t or es fu n da m en t a is, a sa ber :
(1) a s t a xa s de sa lá r ios r ea is est ip u la dos pelos t r a ba lh a dor es; e (2)
a for m a da F u n çã o d a Dem a n da Rea l de Mã o-de-obr a . As pa r t es
cen t r a is de seu livr o pr ocu r a m det er m in a r a for m a dest a fu n çã o. A
cir cu n st â n cia de qu e os t r a ba lh a dor es est ipu la m , d e fa t o, os seu s
sa lá r ios, n ã o em t er m os r ea is, m a s n om in a is, n ã o é ign or a da , m a s
a d m it e-se, com efeit o, qu e a t a xa efet iva d e sa lá r ios n om in a is, di-
vidida pelo pr eço dos ben s de con su m o sa la r ia is, pode ser vir de
m ed ida à t a xa r ea l qu e se pr ocu r a .
As equ a ções qu e, com o ele diz, “con st it u em o pon t o de pa r t ida
do est u do” da F u n çã o da Dem a n da Rea l de Mã o-de-obr a sã o da da s n a
pá gin a 90 de su a T h eory of Un em ploym en t, m a s com o a s h ipót eses
t á cit a s qu e r egem a a plica çã o de su a a n á lise desa pa r ecem qu a se n o
pr in cípio da su a a r gu m en t a çã o, fa r ei u m r esu m o da m a t ér ia por ele
t r a t a da a t é o pon t o cr u cia l.
O pr ofessor P igou divide a s in dú st r ia s em du a s ca t egor ia s, a
sa ber : a s qu e “pr odu zem os ben s de con su m o sa la r ia is pa r a u so n o
pa ís, bem com o os ben s expor t á veis cu ja ven da n o ext er ior cr ia dir eit os
sobr e ben s de con su m o sa la r ia is n o ext er ior ”, e a s “ou t r a s” in dú st r ia s,
a qu e con vém ch a m a r , r espect iva m en t e, in dú st r ia s qu e pr odu zem ben s
de con su m o sa la r ia is e in dú st r ia s qu e pr odu zem ben s n ã o dest in a dos
a o con su m o sa la r ia l. E le su põe qu e x h om en s est ã o em pr ega dos n a s
pr im eir a s e y h om en s n a s segu n da s. Ch a m a F(x) a o va lor dos ben s de
con su m o sa la r ia is pr odu zidos pelos x h om en s e F&(x) à t a xa ger a l de
sa lá r ios. Ist o, em bor a ele n ã o se det en h a a m en cion á -lo, equ iva le a
su por qu e o cu st o m a r gin a l do sa lá r io é igu a l a o cu st o pr im á r io m a r -
gin a l.148 Além disso, su põe qu e x + y = φ (x), ist o é, qu e o n ú m er o de

148 A or igem da pr á t ica er r ôn ea de igu a la r o cu st o m a r gin a l do sa lá r io a o cu st o pr im á r io

259
OS ECON OMIS TAS

h om en s em pr ega dos n a s in dú st r ia s de ben s de con su m o sa la r ia is é


fu n çã o do em pr ego t ot a l. E m segu ida , m ost r a qu e a ela st icida de da
dem a n da r ea l a gr ega da de m ã o-de-obr a (qu e n os dá a for m a do n osso
qu aesitu m , ou seja , a F u n çã o da Dem a n da Rea l de Mã o-de-obr a ) pode
escr ever -se
φ& (x) F& (x)
Er = . .
φ (x) F&& (x)

No qu e r espeit a à n ot a çã o, n ã o h á difer en ça sign ifica t iva en t r e


est a e a s m in h a s pr ópr ia s for m a s de expr essã o. Na m edida em qu e
possa m os iden t ifica r os ben s de con su m o sa la r ia is do pr ofessor P igou
com os m eu s ben s de con su m o, e os seu s “ou t r os ben s” com os m eu s
F (x)
ben s de in vest im en t o, dedu z-se qu e, sen do o seu , o va lor da
F& (x)
pr odu çã o da s in dú st r ia s de ben s de con su m o sa la r ia is m edido em u n i-
da des de sa lá r ios é o m esm o qu e o m eu C ω. Além dist o, su a fu n çã o
φ (su jeit a à iden t ifica çã o dos ben s de con su m o sa la r ia is com os ben s
de con su m o) é u m a fu n çã o da qu ilo a qu e ch a m ei a n t es o m u lt iplica dor
do em pr ego k&. P or qu e
Δx = k &Δy,

de m a n eir a qu e
1
φ& (x) = 1 + .
k&

Dest a r t e, “a ela st icida de da dem a n da r ea l a gr ega da de m ã o-de-


obr a ” do pr ofessor P igou é u m a est r u t u r a sem elh a n t e a a lgu m a s da s
m in h a s, depen den do, em pa r t e, da s con dições física s e t écn ica s da in -
dú st r ia (n a for m a da da pela su a fu n çã o F) e, em pa r t e, da pr open sã o

m a r gin a l vem t a lvez de u m a a m bigü ida de n o sen t ido de cu sto m argin al d o salário. P odem os
da r -lh e o sign ifica do t a n t o do cu st o de u m a u n ida de a dicion a l de pr odu çã o, qu a n do n ã o é
gr a va da por n en h u m ou t r o cu st o a dicion a l a lém dos cu st os dos sa lá r ios, com o de cu st o
a dicion a l dos sa lá r ios, qu e im plica a pr odu çã o de u m a u n ida de a dicion a l de r iqu eza , qu a n do
r ea liza da n a s con dições m a is econ ôm ica s, com a a ju da do equ ipa m en t o exist en t e ou de
ou t r os fa t or es n ã o em pr ega dos. No pr im eir o ca so, n ã o podem os com bin a r com a m ã o-de-obr a
a dicion a l a m en or in t er ven çã o a dicion a l do em pr esá r io, do ca pit a l cir cu la n t e ou de qu a lqu er
coisa difer en t e do t r a ba lh o qu e se a cr escen t a r ia a o cu st o; n em sequ er podem os per m it ir a
essa m ã o-de-obr a qu e desga st e o equ ipa m en t o m a is depr essa do qu e o fa r ia u m m en or
con t in gen t e de t r a ba lh o. Vist o qu e exclu ím os do cu st o pr im á r io m a r gin a l qu a lqu er elem en t o
de cu st o a lh eio a o t r a ba lh o, segu e-se, n a t u r a lm en t e, qu e o cu st o m a r gin a l dos sa lá r ios e
o cu st o pr im á r io m a r gin a l sã o igu a is. As con clu sões de u m a a n á lise ba sea da n est a pr em issa ,
por ém , qu a se n ã o t êm a plica çã o, vist o qu e, n a pr á t ica , a h ipót ese bá sica r a r a m en t e se
r ea liza , pois n ã o som os ba st a n t e in sen sa t os, n a pr á t ica , pa r a r ecu sa r a ssocia r a o t r a ba lh o
a dicion a l qu a n t ida des a pr opr ia da s de ou t r os fa t or es, n a m edida em qu e se en con t r em
dispon íveis, e a h ipót ese só se a plica , por t a n t o, se su pu ser m os qu e t odos os fa t or es, ex-
clu in do-se o t r a ba lh o, já est ã o em pr ega dos a o m á xim o.

260
KEYN ES

a con su m ir os ben s de con su m o sa la r ia is (n a for m a da da pela su a


fu n çã o φ); sem p r e com a con diçã o de qu e os lim it em os a o ca so esp ecia l
de qu e o cu st o m a r gin a l do t r a ba lh o seja igu a l a o cu st o pr im á r io
m a r gin a l.
P a r a det er m in a r o volu m e de em pr ego, o pr ofessor P igou com bin a ,
en t ã o, u m a fu n çã o de ofer t a de m ã o-de-obr a com su a “dem a n da r ea l
de m ã o-de-obr a ”. Su põe qu e isso seja u m a fu n çã o do sa lá r io r ea l e
n a da m a is, pois com o t a m bém já su pôs qu e o sa lá r io r ea l é fu n çã o do
n ú m er o de h om en s x, em pr ega dos n a s in dú st r ia s qu e pr odu zem ben s
de con su m o sa la r ia is, ist o equ iva le a su por qu e a ofer t a t ot a l de m ã o-
de-obr a , n o n ível exist en t e de sa lá r ios r ea is, é fu n çã o de x e de n a da
m a is. Isso qu er dizer qu e n = χ (x), on de n é a ofer t a de m ã o-de-obr a
dispon ível a u m sa lá r io r ea l de F& (x).
Assim , livr e de qu a lqu er com plica çã o, a a n á lise do pr ofessor P igou
equ iva le a u m a t en t a t iva de en con t r a r o volu m e efet ivo de em pr ego
por m eio da s equ a ções
x + y = φ (x)

e
n = χ (x).

Aqu i h á , por ém , t r ês in cógn it a s e a pen a s du a s equ a ções. P a r ece


cla r o qu e ele con t or n ou est a dificu lda de con sider a n do n = x + y. Ist o
su põe, n a t u r a lm en t e, qu e h á desem pr ego in volu n t á r io n o sen t ido est r it o
da pa la vr a , ist o é, qu e a m ã o-de-obr a dispon ível a o sa lá r io r ea l exist en t e
est á t oda em pr ega da . Nest e ca so, x t em o va lor qu e sa t isfa z a equ a çã o
φ (x) = χ (x)

e qu a n do a ch a m os, a ssim , qu e o va lor de x é igu a l a (diga m os) n 1 , y


deve ser igu a l a χ(n 1) – n 1 , e o em pr ego t ot a l n é igu a l a χ(n 1).
Va le a pen a det er m o-n os u m m om en t o pa r a con sider a r o qu e
ist o sign ifica . Qu er dizer qu e se a fu n çã o da ofer t a de m ã o-de-obr a se
m odifica , fica n do dispon ível m a is t r a ba lh o a da do sa lá r io r ea l (de m odo
qu e n 1 + d n 1 seja a gor a o va lor de x qu e sa t isfa z a equ a çã o
φ (x) = χ (x) , a dem a n da pela pr odu çã o da s in dú st r ia s de ben s n ã o
dest in a dos a o con su m o sa la r ia l ser á t a l qu e o em pr ego n essa s in dú st r ia s
h a ver á de su bir ju st a m en t e o n ecessá r io pa r a m a n t er a igu a lda de en t r e
φ (n 1 + d n 1 ) e χ (n 1 + d n 1 ). A ú n ica a lt er n a t iva qu e r est a pa r a qu e o
em pr ego a gr ega do va r ie é a t r a vés de u m a m u da n ça n a pr open sã o a
com pr a r r espect iva m en t e ben s de con su m o de a ssa la r ia dos e ben s n ã o
dest in a dos a o con su m o de a ssa la r ia dos, de m odo qu e h a ja u m a u m en t o
de y a com pa n h a do de u m a dim in u içã o m a ior de x.

261
OS ECON OMIS TAS

A su posiçã o de qu e n = x + y sign ifica , n a t u r a lm en t e, qu e a


m ã o-de-obr a est á sem pr e em con dições de poder det er m in a r o seu pr ó-
pr io sa lá r io r ea l. P or t a n t o, a su posiçã o de qu e a m ã o-de-obr a est á em
con dições de det er m in a r o seu pr ópr io sa lá r io r ea l sign ifica qu e a de-
m a n da pela pr odu çã o da s in dú st r ia s qu e pr odu zem ben s n ã o dest in a dos
a o con su m o de a ssa la r ia dos obedece à s leis a n t er ior es. E m ou t r a s pa -
la vr a s, su põe-se qu e a t a xa de ju r os sem pr e se a ju st a por si m esm a
à cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l de m odo qu e m a n t en h a o
plen o em pr ego. Sem est a su posiçã o do pr ofessor P igou a a n á lise de-
m on st r a e n ã o m a is ofer ece m eios de det er m in a r qu a l ser á o volu m e
de em pr ego. É r ea lm en t e est r a n h o qu e o pr ofessor P igou t en h a im a -
gin a do poder a pr esen t a r u m a t eor ia do desem pr ego qu e n ã o fa z n e-
n h u m a a lu sã o à s va r ia ções n o m on t a n t e do in vest im en t o (ist o é, à s
va r ia ções do em pr ego n a s in dú st r ia s de ben s n ã o dest in a dos a o con su m o
de a ssa la r ia dos) e qu e n ã o pr ovém de m u da n ça s n a fu n çã o de ofer t a
da m ã o-de-obr a , m a s de m odifica ções (por exem plo) n a t a xa de ju r os
ou n o est a do da con fia n ça .
O t ít u lo de T h eory of Un em ploym en t é, con seqü en t em en t e, u m
t a n t o im pr ópr io. N a r ea lid a de, o livr o n ã o t r a t a d est a qu est ã o. É
u m est u do sobr e qu a l ser á o volu m e de em pr ego, da da a fu n çã o de
ofer t a de m ã o-de-obr a , qu a n d o se a ch a m sa t isfeit a s a s con dições de
plen o em pr ego. A fin a lida de do con ceit o de ela st icida de da d em a n da
r ea l a gr ega da de m ã o-de-obr a é m ost r a r em qu e pr opor çã o su bir á
ou ba ixa r á o plen o em pr ego em fa ce de cer t o d esloca m en t o n a fu n çã o
de ofer t a de m ã o-d e-obr a . Ou — a lt er n a t iva m en t e e, t a lvez, m a is
pr ecisa m en t e — p odem os con sider a r est a obr a u m a in vest iga çã o n ã o
ca u sa l da s r ela ções fu n cion a is det er m in a da s d o n ível de sa lá r ios
r ea is qu e cor r espon der á a qu a lqu er volu m e da d o de em p r ego. E la
n ã o é, por ém , ca pa z de n os d izer o qu e det er m in a o volu m e efetivo
do em p r ego; e n ã o t em r ela çã o dir et a com o pr oblem a do d esem pr ego
in volu n t á r io.
Se o pr ofessor P igou n ega sse, com o t a lvez o fizesse, a possibilida de
do desem pr ego in volu n t á r io n o sen t ido qu e a n t er ior m en t e o defin i, ser ia
a ssim m esm o difícil ver com o poder ia ser a plica da su a a n á lise, pois,
a bst en do-se de discu t ir o qu e det er m in a a r ela çã o en t r e x e y, ist o é,
en t r e o em pr ego n a s in dú st r ia s de ben s de con su m o de a ssa la r ia dos
e o em pr ego n a s dem a is in dú st r ia s, r espect iva m en t e, ele com et e a in da
u m a om issã o ir r epa r á vel.
Além disso, ele a dm it e qu e, em cer t os lim it es, os t r a ba lh a dor es
fr eqü en t em en t e est ipu la m a su a r em u n er a çã o, n ã o em sa lá r ios r ea is
da dos, m a s em sa lá r ios n om in a is. Nest e ca so, a fu n çã o da ofer t a de
m ã o-de-obr a já n ã o é a pen a s fu n çã o de F&(x), m a s t a m bém do pr eço
n om in a l dos ben s de con su m o de a ssa la r ia dos, com a con seqü ên cia de

262
KEYN ES

qu e a a n á lise pr évia se desm or on a e pa ssa a in t er vir u m fa t or n ovo,


sem qu e exist a u m a equ a çã o n ova pa r a a t en der a est a in cógn it a su -
plem en t a r . Nã o ser ia possível ilu st r a r m elh or os per igos de u m m ét odo
pseu dom a t em á t ico qu e só pode pr ogr edir fa zen do qu e t u do seja fu n çã o
de u m a ú n ica va r iá vel e su pon do qu e t oda s a s difer en cia is desa pa r eça m .
Nã o t er ia sen t ido, pois, a dm it ir m a is t a r de qu e, de fa t o, exist em ou t r a s
va r iá veis e, a pesa r disso, pr ossegu ir n o r a ciocín io sem r et ifica r o qu e
foi escr it o a t é en t ã o. Desse m odo, se (den t r o de cer t os lim it es) os t r a -
ba lh a dor es est ipu la m a su a r em u n er a çã o em sa lá r ios n om in a is, o n ú -
m er o de da dos é, a in da , in su ficien t e, m esm o su pon do qu e n = x + y,
sa lvo se os fa t or es qu e det er m in a m o pr eço n om in a l dos ben s de con -
su m o de a ssa la r ia dos seja m con h ecidos, por qu e o pr eço n om in a l dos
ben s de con su m o de a ssa la r ia dos depen der á do volu m e a gr ega do de
em pr ego. Con seqü en t em en t e, n ã o podem os sa ber qu a l ser á o volu m e
a gr ega do de em pr ego en qu a n t o n ã o con h ecer m os o pr eço n om in a l dos
ben s de con su m o de a ssa la r ia dos, e n ã o podem os sa ber qu a l ser á o
pr eço n om in a l dos ben s de con su m o de a ssa la r ia dos en qu a n t o n ã o co-
n h ecer m os o volu m e a gr ega do do em pr ego. F a lt a , com o disse, u m a
equ a çã o. Toda via , é u m a su posiçã o pr ovisór ia da r igidez dos sa lá r ios
n om in a is, em vez dos sa lá r ios r ea is, qu e fa z a n ossa t eor ia m a is se
a pr oxim a r da r ea lida de. P or exem plo, n a Gr ã -Br et a n h a , a pesa r da de-
sor dem , da in cer t eza e da s a m pla s flu t u a ções dos pr eços qu e m a r ca r a m
a déca da de 1924-1934, os sa lá r ios n om in a is a pen a s va r ia r a m den t r o
de u m lim it e de 6 por cen t o, en qu a n t o os sa lá r ios r ea is va r ia r a m em
m a is de 20 por cen t o. Um a t eor ia n ã o pode pr et en der -se geral desde
qu e n ã o seja a plicá vel a o ca so (ou den t r o d os lim it es) em qu e os
sa lá r ios n om in a is seja m fixos, bem com o a qu a lqu er ou t r o ca so. Os
polít icos t êm d ir eit o de qu eixa r -se de qu e os sa lá r ios d everiam ser
a lt a m en t e flexíveis, por ém u m t eór ico deve est a r pr epa r a do p a r a
t r a t a r in d ifer en t em en t e t od a s a s sit u a ções qu e se a p r esen t a r em .
U m a t eor ia cien t ífica n ã o p ode pr et en der qu e os fa t os se a ju st em
a su a s pr ópr ia s h ipót eses.
Qu a n do o pr ofessor P igou ch ega a exa m in a r expr essa m en t e a s
con seqü ên cia s de u m a r edu çã o dos sa lá r ios n om in a is, m a is u m a vez
se t or n a m a n ifest o, n o m eu en t en der , qu e os da dos in t r odu zidos sã o
in su ficien t es pa r a obt er u m a solu çã o defin it iva . E le com eça por r ejeit a r
o a r gu m en t o (op. cit., p. 101) de qu e se o cu st o pr im á r io m a r gin a l é
igu a l a o cu st o m a r gin a l do sa lá r io, os r en dim en t os dos n ã o a ssa la r ia dos
a lt er a r -se-ã o, qu a n do os sa lá r ios n om in a is se r edu zir em , n a m esm a
pr opor çã o qu e os dos a ssa la r ia dos, ba sea n do-se em qu e ist o só é vá lido
se o volu m e de em pr ego per m a n ecer in va r iá vel — o qu e é pr ecisa m en t e
o pon t o em discu ssã o. Ma s n a pá gin a segu in t e (op. cit., p. 102), ele
pr ópr io com et e o er r o a o su por qu e “n o pr in cípio n a da a con t eceu a o

263
OS ECON OMIS TAS

r en dim en t o n om in a l dos n ã o a ssa la r ia dos”, o qu e, com o ele pr ópr io


a ca ba de m ost r a r , só é vá lido se o volu m e de em pr ego n ã o per m a n ecer
in va r iá vel — qu e é pr ecisa m en t e o qu e se discu t e. De fa t o, o pr oblem a
n ã o a dm it e n en h u m a solu çã o en qu a n t o n ã o se in t r odu zir em ou t r os
fa t or es en t r e os da dos qu e con sider a m os.
O fa t o de qu e a m ã o-de-obr a est ipu la det er m in a do sa lá r io n om in a l
e n ã o da do sa lá r io r ea l (con t a n t o qu e o sa lá r io r ea l n ã o desça a lém
de cer t o lim it e) a fet a a a n á lise de u m m odo qu e se pode t a m bém m os-
t r a r , a ssin a la n do a h ipót ese fu n da m en t a l, segu n do a qu a l u m a qu a n -
t ida de m a ior de t r a ba lh o só se ofer ece em t r oca de u m sa lá r io r ea l
m a is a lt o, qu e qu a se t odo o r a ciocín io desm or on a . O pr ofessor P igou
r ejeit a , por exem plo, a t eor ia do m u lt iplica dor (op. cit., p. 75), su pon do
qu e se con h eça a t a xa de sa lá r ios r ea is, ist o é, su pon do qu e, a lca n ça n do
o plen o em pr ego, n ã o h a ver á ofer t a de m ã o-de-obr a a dicion a l a u m
sa lá r io r ea l m en or . Den t r o dessa h ipót ese, o seu a r gu m en t o é, sem
dú vida , cor r et o. Nessa pa ssa gem , por ém , o pr ofessor P igou est á cr it i-
ca n do u m a pr oposiçã o r ela t iva à polít ica pr á t ica ; é exa ger o a fir m a r
qu e, n u m m om en t o em qu e a s est a t íst ica s de desem pr ego excedia m
n a Gr ã -Br et a n h a a cifr a de 2 m ilh ões (ist o é, qu a n do h a via 2 m ilh ões
de h om en s dispost os a t r a ba lh a r a o sa lá r io n om in a l exist en t e), qu a lqu er
eleva çã o n o cu st o de vida , por m oder a da qu e fosse, em r ela çã o a o
sa lá r io n om in a l, oca sion a r ia a r et ir a da do m er ca do de t r a ba lh o de u m a
qu a n t ida de de m ã o-de-obr a su per ior à equ iva len t e a esses 2 m ilh ões
de h om en s.
Im por t a en fa t iza r qu e t odo o livr o do pr ofessor P igou se ba seia
n a h ipót ese de qu e qu alqu er elevação n o cu sto d e vid a, por m ais m o-
d erad a qu e seja, em relação ao salário n om in al, ocasion ará a retirad a
d o m ercad o d e trabalh o d e u m n ú m ero d e trabalh ad ores m aior qu e o
d e tod os os d esem pregad os existen tes.
Além disso, o pr ofessor P igou n ã o n ot a n est a pa ssa gem (op. cit.,
p. 75) qu e o a r gu m en t o qu e opõe a o em pr ego “secu n dá r io”, com o r e-
su lt a do de obr a s pú blica s, é igu a lm en t e con t r á r io, n a s m esm a s h ipó-
t eses, a o a u m en t o do em pr ego “pr im á r io” com a m esm a polít ica , pois
se a t a xa de sa lá r ios r ea is em vigor n a s in dú st r ia s de ben s de con su m o
sa la r ia is for da da , n en h u m a u m en t o se t or n a possível — excet o, n a -
t u r a lm en t e, se os n ã o a ssa la r ia dos r edu zir em seu con su m o de ben s
sa la r ia is, por qu e a s pessoa s qu e en t r a r a m r ecen t em en t e n o em pr ego
pr im á r io decer t o a u m en t a r ã o seu con su m o de ben s sa la r ia is, o qu a l
r edu zir á o sa lá r io r ea l e, con seqü en t em en t e (segu n do su a h ipót ese),
leva r á a r et ir a r -se do m er ca do m ã o-de-obr a a n t es em pr ega da . Nã o obs-
t a n t e, o pr ofessor P igou a ceit a , a pa r en t em en t e, a possibilida de de a u -
m en t o do em pr ego pr im á r io. A lin h a qu e sepa r a o em pr ego pr im á r io

264
KEYN ES

do secu n dá r io pa r ece ser o pon t o cr ít ico psicológico em qu e o seu bom


sen so deixa de pr eva lecer em fa ce da su a m á t eor ia .
A diver gên cia de con clu sões a qu e con du zem a s difer en ça s a n t e-
r ior es de h ipót eses e de r a ciocín io eviden cia -se n est a im por t a n t e pa s-
sa gem em qu e o pr ofessor P igou r esu m e seu pon t o de vist a : “Com u m a
con cor r ên cia per feit a m en t e livr e en t r e os t r a ba lh a dor es, e a m ã o-de-
obr a per feit a m en t e m óvel, a n a t u r eza da r ela çã o (ist o é, en t r e os t ipos
de sa lá r ios r ea is est ipu la dos pela m ã o-de-obr a e a fu n çã o da dem a n da
de t r a ba lh o) ser á da s m a is sim ples. H a ver á sem pr e u m a for t e t en dên cia
n o sen t ido de qu e a s t a xa s de sa lá r ios con ser vem u m a r ela çã o t a l com
a dem a n da qu e t odos est eja m em pr ega dos. P or t a n t o, em con dições es-
t á veis, t odos est a r ã o r ea lm en t e em pr ega dos. Ist o sign ifica qu e o de-
sem pr ego, exist en t e em qu a lqu er m om en t o, se deve u n ica m en t e a qu e
a s con dições da dem a n da va r ia m de m a n eir a con t ín u a e qu e a s r esis-
t ên cia s fr iccion a is im pedem a r ea liza çã o im edia t a dos a ju st a m en t os
cor r espon den t es a os sa lá r ios”.149
E le con clu iu (op. cit., p. 253) qu e o desem pr ego se deve, sobr et u do,
a u m a polít ica de sa lá r ios qu e n ã o con segu e a da pt a r -se su ficien t em en t e
à s m odifica ções da dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a .
Con seqü en t em en t e, o pr ofessor P igou a ch a qu e, a lon go pr a zo, o
desem pr ego pode ser r em edia do por m eio de a ju st es sa la r ia is,150 en -
qu a n t o eu su st en t o qu e o sa lá r io r ea l (su jeit o a pen a s a u m lim it e fixa do
pela desu t ilida de m a r gin a l do em pr ego) n ã o é det er m in a do pr im or dia l-
m en t e pelos “a ju st es sa la r ia is” (em bor a est es possa m in t er vir ), m a s
pela s ou t r a s for ça s do sist em a , a lgu m a s da s qu a is (especia lm en t e a
r ela çã o en t r e a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l e a t a xa de
ju r os) o pr ofessor P igou n ã o in clu iu , se est iver cor r et a a m in h a m a n eir a
de pen sa r , n o seu esqu em a for m a l.
F in a lm en t e, qu a n do o pr ofessor P igou ch ega à “Ca u sa çã o do De-
sem pr ego”, fa la , n a ver da de, t a n t o qu a n t o eu de flu t u a ções n o est a do
da dem a n da , por ém ele iden t ifica o est a do da dem a n da com a F u n çã o
Rea l da Dem a n da de Mã o-de-obr a , esqu ecen do qu ã o est r eit a é a su a
defin içã o dest a ú lt im a . P or defin içã o, a F u n çã o Rea l da Dem a n da de
Mã o-de-obr a depen de, con for m e vim os a n t es, exclu sivam en te de dois
fa t or es, a sa ber : (1) a r ela çã o exist en t e em da do m eio en t r e o n ú m er o
t ot a l de h om en s em pr ega dos e o n ú m er o dos qu e devem ser em pr ega dos
n a s in dú st r ia s de ben s de con su m o de a ssa la r ia dos pa r a lh es for n ecer
o qu e con som em ; e (2) o est a do da pr odu t ivida de m a r gin a l n a s in dú s-
t r ia s de ben s de con su m o de a ssa la r ia dos. Con t u do, n a P a r t e V de su a
T h eory of Un em ploym en t, ele a t r ibu i u m pa pel im por t a n t e à s flu t u a ções
da “dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a ”. A “dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a ”

149 Op. cit., p. 252.


150 Nã o h á n en h u m a a lu sã o ou su gest ã o a o fa t o de qu e est e a ju st e se r ea lize por m eio da s
r ela ções sobr e a t a xa de ju r os.

265
OS ECON OMIS TAS

é con sider a da u m fa t or ca pa z de va r ia r a m pla m en t e a cu r t o pr a zo (op.


cit., P a r t e Qu in t a , ca p. VI-XII), e pa r ece su ger ir qu e a s oscila ções n a
“dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a ” sã o, com bin a da s com a fa lt a de sen -
sibilida de da polít ica de sa lá r ios à s oscila ções da dem a n da r ea l de
m ã o-de-obr a , r espon sá veis em gr a n de pa r t e pelo ciclo com er cia l. À pr i-
m eir a vist a , t u do ist o pa r ecer á a o leit or r a zoá vel e fa m ilia r , pois a n ã o
ser qu e ele r et or n e à defin içã o, a s “flu t u a ções n a dem a n da r ea l de
m ã o-de-obr a ” lh e t r a r ã o à m en t e o m esm o gên er o de idéia s qu e eu
desejo pr ovoca r com a s “flu t u a ções n o est a do da dem a n da a gr ega da ”.
Se volt a r m os à defin içã o da “dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a ”, t u do ist o
per de a su a lógica , pois a ca ba m os descobr in do qu e n ã o h á n a da n o
m u n do m en os su jeit o a oscila ções pr on u n cia da s a cu r t o pr a zo do qu e
est e fa t or .
A “dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a ” do pr ofessor P igou depen de,
por defin içã o, a pen a s de F(x), qu e r epr esen t a a s con dições física s da
pr odu çã o de ben s de con su m o de a ssa la r ia dos, e de φ (x), qu e r epr esen t a
a r ela çã o fu n cion a l en t r e o em pr ego n a s in dú st r ia s qu e pr odu zem ben s
de con su m o de a ssa la r ia dos e o em pr ego t ot a l cor r espon den t e a qu a l-
qu er n ível da do do ú lt im o. É difícil ver u m a r a zã o pela qu a l a lgu m a
dest a s du a s fu n ções devesse m u da r , a n ã o ser gr a du a lm en t e, em pe-
r íodos lon gos. Nã o h á cer t a m en t e m ot ivo a lgu m pa r a cr er qu e ela s
possa m flu t u a r du r a n t e u m ciclo com er cia l. P ois F(x) só pode m u da r
com len t idã o, e n u m sen t ido fa vor á vel, se a com u n ida de r ea liza pr o-
gr essos t écn icos; a o pa sso qu e φ (x) per m a n ecer á est á vel, a n ã o ser qu e
im a gin em os u m a r epen t in a m a n ifest a çã o de fr u ga lida de n a s cla sses
oper á r ia s ou , m a is ger a lm en t e, u m br u sco desloca m en t o n a pr open sã o
a con su m ir . E u esper a r ia , por t a n t o, qu e a dem a n da r ea l de m ã o-de-obr a
per m a n ecesse vir t u a lm en t e igu a l du r a n t e t odo u m ciclo com er cia l. Re-
pit o qu e o pr ofessor P igou om it iu com plet a m en t e em su a a n á lise o
fa t or in st á vel, a sa ber , a s flu t u a ções n a esca la do in vest im en t o, qu e,
n o m a is da s vezes, n ã o sã o a ca u sa do fen ôm en o da s flu t u a ções n o
em pr ego.
Cr it iqu ei, de m a n eir a det a lh a da , a t eor ia do desem pr ego do pr o-
fessor P igou , n ã o por qu e ela m e pa r eça m a is cr it icá vel qu e ou t r a s
t eor ia s dos econ om ist a s clá ssicos, m a s por qu e r epr esen t a o ú n ico esfor ço
qu e con h eço pa r a expor a t eor ia clá ssica do desem pr ego de m odo pr eciso.
P or est a r a zã o, a ch ei ser m eu dever dir igir m in h a s objeções con t r a
est a t eor ia , n a exposiçã o m a is a u da z qu e dela a in da se fez.

266
C AP ÍTU LO 20
A F u n ç ã o d e Em p re g o 151

N o ca pít u lo 3 (p. 59), defin im os a fu n çã o da ofer t a a gr ega da


Z = φ (N ), qu e liga o em pr ego N a o pr eço da ofer t a a gr ega da da pr odu çã o
cor r espon den t e. A fu n ção d e em prego a pen a s difer e da fu n çã o de ofer t a
a gr ega da pelo fa t o de qu e é, pr a t ica m en t e, a su a fu n çã o in ver sa e se
expr im e em u n ida des de sa lá r io; sen do o objet ivo da fu n çã o de em pr ego
r ela cion a r o volu m e da dem a n da efet iva , m edida em u n ida des de sa -
lá r io, qu e com pet e a det er m in a da em pr esa ou in dú st r ia , ou a u m a
in dú st r ia in t eir a , com o volu m e de em pr ego cu ja pr odu çã o t en h a u m
pr eço de ofer t a com pa r á vel com o volu m e de dem a n da efet iva . Assim
sen do, se u m m on t a n t e de dem a n da efet iva D w r , m edido em u n ida de
de sa lá r ios, or ien t a do pa r a u m a fir m a ou in dú st r ia , fa z su r gir n essa
fir m a ou n essa in dú st r ia u m volu m e de em pr ego N r , a fu n çã o de em -
pr ego ser á da da por N r = F r (D w r ). Ou , de m odo m a is ger a l, se n os for
per m it ido su por qu e a ca da m on t a n t e D w r da dem a n da efet iva t ot a l
cor r espon de u m ú n ico va lor de D w , a fu n çã o de em pr ego ser á da da por
N r = F r (D w ). O qu e qu er dizer qu e N r h om en s est a r ã o em pr ega dos n a
in dú st r ia r qu a n do a dem a n da efet iva for D w .
E xpor em os, n est e ca pít u lo, cer t a s pr opr ieda des da fu n çã o de em -
pr ego. Ma s, seja qu a l for o in t er esse qu e essa s possa m t er , h á du a s
r a zões pela s qu a is a su bst it u içã o da fu n çã o de em pr ego pela cu r va
con ven cion a l de ofer t a con cor da com os m ét odos e fin a lida des dest e
livr o. E m pr im eir o lu ga r , expr essa os fa t os r eleva n t es em t er m os da s
u n ida des a qu e decidim os r est r in gir -n os, sem in t r odu zir n en h u m a da s
qu e t êm u m ca r á t er qu a n t it a t ivo du vidoso. E m segu n do lu ga r , pr est a -se
m elh or qu e a cu r va h a bit u a l da ofer t a a o est u do dos pr oblem a s r ela t ivos

151 Os qu e (com r a zã o) n ã o t êm in clin a çã o pa r a a á lgebr a poder ã o om it ir a pr im eir a pa r t e


dest e ca pít u lo sem per der m u it a coisa .

267
OS ECON OMIS TAS

à in dú st r ia e à pr odu çã o com o u m tod o, dist in gu in do-os dos de u m a


in dú st r ia ou fir m a isola da em m eio det er m in a do — p ela s r a zões
qu e segu em .
A cu r va h a bit u a l da dem a n da de da do bem é t r a ça da com ba se
em su posições sobr e os r en dim en t os do pú blico em ger a l, e t em de ser
cor r igida sem pr e qu e esses r en dim en t os va r ia m . Da m esm a for m a , a
cu r va h a bit u a l da ofer t a de det er m in a do bem é t r a ça da com ba se em
su posições sobr e o volu m e da pr odu çã o da in dú st r ia in t eir a , e est á
su jeit a a m odifica ções qu a n do o m on t a n t e a gr ega do da in dú st r ia va r ia .
P or t a n t o, qu a n do exa m in a m os a r ea çã o da s in dú st r ia s in dividu a is à s
va r ia ções do em pr ego agregad o, en con t r a m o-n os n ecessa r ia m en t e em
pr esen ça , n ã o de u m a ú n ica cu r va de dem a n da pa r a ca da in dú st r ia
con ju ga da com u m a ú n ica cu r va de ofer t a , m a s de u m con ju n t o de
cu r va s per t en cen t es a du a s fa m ília s, cor r espon den do, ca da qu a l, à h i-
pót ese de cer t o volu m e de em pr ego a gr ega do. No ca so da fu n çã o de
em pr ego, t oda via , é m a is fá cil obt er u m a fu n çã o qu e r eflit a pa r a a
in dú st r ia em con ju n t o a s va r ia ções globa is do em pr ego.
Su pon h a m os (pa r a com eça r ) qu e a pr open sã o a con su m ir se a ch a
det er m in a da , a ssim com o os ou t r os elem en t os qu e, n o ca pít u lo 18, de-
m os por con h ecidos, e qu e est a m os exa m in a n do a s m odifica ções n o
em pr ego r esu lt a n t es da s m u da n ça s n a t a xa de in vest im en t o. De a cor do
com est a h ipót ese, pa r a ca da n ível de dem a n da efet iva , em t er m os de
u n ida des de sa lá r ios, h a ver á u m volu m e a gr ega do de em pr ego, e est a
dem a n da efet iva va i-se dividir em det er m in a da s pr opor ções en t r e o
con su m o e o in vest im en t o. Além disso, ca da n ível de dem a n da efet iva
cor r espon der á a cer t a dist r ibu içã o da r en da . É r a zoá vel, por t a n t o, su por
t a m bém qu e a det er m in a do m on t a n t e da dem a n da efet iva cor r espon de
u m a dist r ibu içã o sin gu la r da m esm a en t r e a s diver sa s in dú st r ia s.
Isso n os per m it e det er m in a r qu e volu m e de em pr ego cor r espon -
der á em ca da in dú st r ia , a ca da volu m e da do de em pr ego a gr ega do. O
qu e qu er dizer qu e n os dá o volu m e de em pr ego em ca da in dú st r ia
pa r t icu la r cor r espon den t e a ca da n ível da dem a n da efet iva a gr ega da ,
m edida em u n ida des de sa lá r ios, de m odo qu e fiqu em sa t isfeit a s a s
con dições da segu n da for m a da fu n çã o de em pr ego pa r a a in dú st r ia
a n t es in dica da , a sa ber , N r = F r (D w ). Tem os a ssim a va n t a gem , n est a s
con dições, de qu e a s fu n ções in dividu a is de em pr ego sã o a dit iva s, n o
sen t ido de qu e a fu n çã o de em pr ego pa r a a in dú st r ia em con ju n t o,
cor r espon den t e a cer t o n ível de dem a n da efet iva , é igu a l à som a da s
fu n ções de em pr ego pa r a ca da in dú st r ia em sepa r a do, ist o é,
F(D w ) = N = ΣN r = ΣF r (D w ).

E m segu ida , defin a m os a ela st icida de do em pr ego. A ela st icida de


do em pr ego pa r a det er m in a da in dú st r ia é

268
KEYN ES

dNr D wr
eer = . ,
d D wr Nr

vist o qu e m ede a r ea çã o do n ú m er o de u n ida des de t r a ba lh o em pr ega da s


n essa in dú st r ia à s va r ia ções do n ú m er o de u n ida des de sa lá r io qu e se
esper a ser em ga st a s n a com pr a de su a pr odu çã o. Repr esen t a m os a
ela st icida de do em pr ego pa r a a in dú st r ia em seu con ju n t o por

dN Dw
ee = . .
dD w N

Ca so pu déssem os en con t r a r a lgu m m ét odo su ficien t em en t e sa -


t isfa t ór io pa r a m edir a pr odu çã o, ser ia ú t il t a m bém defin ir o qu e poder ia
ch a m a r -se a ela st icida de da pr odu çã o, qu e dá a m edida do coeficien t e
da pr odu çã o em qu a lqu er in dú st r ia qu a n do se dir ige pa r a ela u m a
dem a n da efet iva m edida em u n ida des de sa lá r ios m a is eleva da , a sa ber ,
d Or D wr
eor = . .
d D wr Or

Se pu déssem os su por qu e o pr eço fosse igu a l a o cu st o pr im á r io


m a r gin a l, t er ía m os en t ã o
1
ΔD wr = ΔP r
1 – eor

on de P r r epr esen t a o lu cr o esper a do.152 Segu e-se disso qu e se eor = O,

152 Com efeit o, se p w r for o pr eço pr evist o de u m a u n ida de de pr odu çã o, expr esso em u n ida des
de sa lá r ios,

269
OS ECON OMIS TAS

ist o é, se a pr odu çã o da in dú st r ia for per feit a m en t e in elá st ica , pr evê-se


qu e a a lt a t ot a l da dem a n da efet iva (m edida em u n ida des de sa lá r ios)
ca ber á in t eir a m en t e a o em pr esá r io com o lu cr o, ist o é, ΔD w r = ΔP r ; a o
pa sso qu e se eor = 1, ist o é, se a ela st icida de de pr odu çã o for igu a l à
u n ida de, pr evê-se qu e n en h u m su plem en t o de lu cr o r esu lt a r á do a u -
m en t o da dem a n da efet iva , sen do ele t ot a lm en t e a bsor vido pelos ele-
m en t os qu e en t r a m n o cu st o pr im á r io m a r gin a l.
Adem a is, se a pr odu çã o de u m a in dú st r ia for fu n çã o φ (N r ) da
m ã o-de-obr a em pr ega da n ela , t er em os 153
1 – eor N r φ&&(N r )
= – 2
,
eer ) ,
p wr *+φ& (N r )-.

on de p w r é o pr eço pr evist o de u m a u n ida de de pr odu çã o expr essa em


u n ida des de sa lá r ios. Dest e m odo, a con diçã o eor = 1 sign ifica qu e
φ&& (N r ) = O, ist o é, qu e h á r et or n os con st a n t es em r espost a a o cr esci-
m en t o do em pr ego.

Or a , n a m ed ida em qu e a t eor ia clá ssica su põe qu e os sa lá r ios


r ea is sã o sem pr e igu a is à desu t ilida de m a r gin a l d o t r a ba lh o e qu e
est a a u m en t a a o m esm o t em po qu e o em pr ego, de m a n eir a qu e a
ofer t a de m ã o-de-obr a dim in u i, coeteris paribu s, qu a n d o os sa lá r ios
r ea is ba ixa m , equ iva le a su por -se qu e, n a pr á t ica , é im possível a u -
m en t a r a d espesa em t er m os d e u n ida de de sa lá r ios. Se isso fosse
ver d a de, o con ceit o de ela st icid a de do em pr ego n ã o t er ia u m ca m po
de a plica çã o. Além d isso, n est e ca so, ser ia im possível a u m en t a r o
em p r ego eleva n do a despesa em t er m os m on et á r ios, por qu e os sa -
lá r ios n om in a is su bir ia m pr opor cion a lm en t e a o a cr éscim o da despesa
m on et á r ia e em defin it ivo n ã o h a ver ia n en h u m a u m en t o de despesa ,
m ed ida em u n ida des de sa lá r ios, n em , por con seqü ên cia , a u m en t o
de em p r ego. P or ém , se a h ipót ese clá ssica n ã o for vá lida , ser á pos-
sível a u m en t a r o em pr ego fa zen do su bir a s d espesa s em t er m os
m on et á r ios a t é qu e os sa lá r ios r ea is t en h a m ba ixa do de m od o qu e

153 P ois, desde qu e D w r = p w rO r, t em os

270
KEYN ES

se igu a lem à desu t ilida de m a r gin a l do t r a ba lh o, pon t o em qu e, por


defin içã o, h a ver á plen o em pr ego.
Con ven cion a lm en t e, est á cla r o, eor t er á u m va lor in t er m ediá r io
en t r e zer o e a u n ida de. A ext en sã o em qu e su bir ã o os pr eços (em
t er m os de u n ida des de sa lá r ios), ist o é, a ext en sã o em qu e os sa lá r ios
r ea is ba ixa m qu a n do a u m en t a m a s despesa s m on et á r ia s, depen de, por -
t a n t o, da ela st icida de qu e a pr odu çã o a pr esen t e em r espost a à s despesa s
em t er m os de u n ida des de sa lá r ios.
Con sider em os qu e a ela st icida d e do pr eço pr evist o p w r em r es-
d pw r Dw r
post a à s va r ia ções n a dem a n d a efet iva D w r , a sa ber , . ,
d Dw r pw r
seja escr it a e&pr .
Um a vez qu e O r .p w r = D w r , t er em os

d Or Dw r d p wr Dw r
. + . = 1
dD w r Or dD w r p wr

ou

e&pr + eor = 1.

O qu e equ iva le a dizer qu e a som a da s ela st icida des do pr eço e


da pr odu çã o com o r espost a à s m u da n ça s n a dem a n da efet iva (m edida s
em u n ida des de sa lá r ios) é igu a l à u n ida de. A va r ia çã o da dem a n da
efet iva é a bsor vida pela s va r ia ções qu e pr ovoca em pa r t e n o n ível e
em pa r t e n o pr eço da pr odu çã o, de a cor do com est a lei.
Se con sider a r m os a in dú st r ia em con ju n t o e est iver m os dispost os
a a dm it ir a exist ên cia de u m a u n ida de per m it in do m edir a pr odu çã o
globa l, o m esm o t ipo de r a ciocín io se a plica de m a n eir a qu e
e&p + eo = 1, on de a s ela st icida des sem o su fixo r se r efer em a o con ju n t o
da in dú st r ia .
Meça m os, a gor a , os va lor es em m oeda e n ã o m a is em u n ida des
de sa lá r ios, e a pliqu em os, n est e ca so, a s n ossa s con clu sões r ela t iva s à
in dú st r ia em con ju n t o.
Se W r epr esen t a o sa lá r io n om in a l de u m a u n ida de de t r a ba lh o
e p o pr eço esper a do de u m a u n ida de da pr odu çã o t ot a l em t er m os
/ Dd p 2
n om in a is, podem os design a r por ep 0= 3 a ela st icida de dos pr eços
1 pdD 4
n om in a is em r espost a à s va r ia ções da dem a n da efet iva m edida em
/ Dd W 2
t er m os n om in a is, e por ew 0= 3 a ela st icida de dos sa lá r ios n om in a is
1 W dD 4
em r espost a à s va r ia ções da dem a n da efet iva m edida em t er m os n o-
m in a is. E n t ã o, fa cilm en t e se dem on st r a qu e

271
OS ECON OMIS TAS

ep = 1 = eo (1 – ew ).154

E st a equ a çã o, com o ver em os n o pr óxim o ca pít u lo, con st it u i o pr i-


m eir o pa sso pa r a u m a for m a ger a l da t eor ia qu a n t it a t iva da m oeda .
Se eo = 0 ou se ew = 1, a pr odu çã o per m a n ecer á in va r iá vel e os pr eços
su bir ã o n a m esm a pr opor çã o qu e a dem a n da efet iva em t er m os m o-
n et á r ios. De ou t r o m odo, su bir ã o em pr opor çã o m en or .

II

Volt em os à fu n çã o do em pr ego. Su pu sem os, n a s exposições pr e-


ceden t es, qu e a ca da n ível de dem a n da efet iva a gr ega da cor r espon de
u m a ú n ica dist r ibu içã o dessa dem a n da en t r e os pr odu t os de ca da in -
dú st r ia in dividu a l. Or a , qu a n do o m on t a n t e da despesa a gr ega da va r ia ,
a despesa cor r espon den t e a os pr odu t os de u m a in dú st r ia in dividu a l
n ã o va r ia r á , em ger a l, n a m esm a pr opor çã o, em pa r t e por qu e os in di-
vídu os n ã o a u m en t a r ã o pr opor cion a lm en t e a s som a s qu e dest in a m à
com pr a dos pr odu t os de ca da in dú st r ia , à m edida qu e sobem a s su a s
r en da s, e em pa r t e por qu e os pr eços dos difer en t es ben s r ea gir ã o, em
difer en t es gr a u s, à s va r ia ções da despesa de qu e sã o objet o.
Disso se dedu z qu e a h ipót ese de qu e a s va r ia ções do em pr ego
depen dem u n ica m en t e da s va r ia ções da dem a n da efet iva (m edida em
u n ida de de sa lá r io), e n a qu a l a t é a gor a ba sea m os o n osso r a ciocín io,
n ã o pa ssa de u m a pr im eir a a pr oxim a çã o, a dm it in do qu e h a ja m a is de
u m m odo de ga st a r u m a u m en t o de r en da s. A m a n eir a qu e su pom os
pa r a a dist r ibu içã o pr evist a de u m a cr éscim o de dem a n da a gr ega da
en t r e os difer en t es ben s pode in flu ir con sider a velm en t e sobr e o volu m e

154 Vist o qu e p = p w .W e D = D w .W, t em os

272
KEYN ES

do em pr ego. Se, por exem plo, a dem a n da su plem en t a r for em gr a n de


pa r t e dir igida pa r a a s in dú st r ia s com a lt a ela st icida de de em pr ego, o
a u m en t o a gr ega do de em pr ego ser á m a ior do qu e se o m esm o se or ien t a r
pa r a a s in dú st r ia s qu e ofer ecem pou ca ela st icida de de em pr ego.
Do m esm o m odo, o em pr ego pode ba ixa r sem qu e t en h a ocor r ido
n en h u m a m u da n ça n a dem a n da a gr ega da , se a or ien t a çã o da dem a n da
se m odifica r em pr oveit o da s in dú st r ia s com ela st icida de r ela t iva m en t e
ba ixa de em pr ego.
E st a s con sider a ções sã o pa r t icu la r m en t e im por t a n t es qu a n do n os
ocu pa m os dos fen ôm en os a cu r t o pr a zo, n o sen t ido de va r ia ções n o
m on t a n t e ou n a dir eçã o da dem a n da qu e n ã o for a m pr evist a s com
cer t a a n t ecipa çã o. A pr odu çã o de cer t os ben s leva t em po, de m odo qu e
é pr a t ica m en t e im possível a u m en t a r a su a ofer t a com r a pidez. Assim ,
se a dem a n da a dicion a l se en ca m in h a pa r a eles sem pr évio a viso, su a
pr odu çã o eviden cia r á u m a ba ixa ela st icida de de em pr ego, em bor a possa
a con t ecer qu e, se h ou ver a viso com ba st a n t e a n t ecedên cia , su a ela st i-
cida de de em pr ego se a pr oxim e da u n ida de.
É a esse r espeit o qu e a idéia de u m per íodo de pr odu çã o pa r ece
t er m a ior im por t â n cia . P r efer ir ia dizer 155 qu e, se u m pr odu t o t em u m
per íodo de pr odu çã o n , ser á n ecessá r io da r a viso da s va r ia ções em su a
dem a n da com a n t ecipa çã o de n u n ida des de t em po pa r a qu e ele t en h a
a ela st icida de m á xim a de em pr ego. E viden t em en t e, os ben s de con su m o,
con sider a dos em con ju n t o, t êm o m a is lon go per íodo de pr odu çã o, vist o
ser em a et a pa fin a l de t odo o pr ocesso pr odu t ivo. E m con seqü ên cia
disso, se a expa n sã o da dem a n da efet iva t iver , por ca u sa pr im eir a ,
u m a u m en t o do con su m o, a ela st icida de in icia l do em pr ego est a r á m a is
a ba ixo do seu n ível even t u a l de equ ilíbr io do qu e se esse im pu lso pr o-
viesse de u m a cr éscim o n o in vest im en t o. Além do m a is, se a dem a n da
a dicion a l se dir ige a os pr odu t os qu e t êm ela st icida de r ela t iva m en t e
ba ixa de em pr ego, u m a pr opor çã o m a ior dessa dem a n da ir á a u m en t a r
a s r en da s dos em pr esá r ios, e ou t r a pr opor çã o m en or ir á a u m en t a r a
dos qu e r ecebem sa lá r ios e ou t r os fa t or es qu e en t r a m n o cu st o pr im á r io,
com o r esu lt a do de qu e a s r eper cu ssões poder ã o en t ã o m ost r a r -se u m
pou co m en os fa vor á veis à despesa , vist o qu e é pr ová vel qu e os em pr e-
sá r ios econ om izem u m a pa r t e m a ior de su a r en da su plem en t a r do qu e
a qu e econ om iza r ia m os a ssa la r ia dos. E n t r et a n t o, a difer en ça en t r e os
dois ca sos n ã o deve ser exa ger a da , pois a s r ea ções em a m bos ser ã o
em gr a n de pa r t e a s m esm a s.156
P or m a is cedo qu e ocor r a a a n t ecipa çã o com qu e se a visa m os
em pr esá r ios de u m a pr ová vel a lt er a çã o n a dem a n da , n ã o é possível
qu e a ela st icida de in icia l de em pr ego, em con seqü ên cia de d ad o a cr és-

155 E st a defin içã o n ã o é idên t ica à u su a l, m a s pa r ece-m e con t er o qu e a idéia t em de im por t a n t e.


156 Um t r a t a m en t o m a is det a lh a do dest a qu est ã o pode ser en con t r a do em m in h a obr a T reatise
on M on ey [J MK, v. V]. Livr o Qu a r t o.

273
OS ECON OMIS TAS

cim o n o in vest im en t o, seja da m esm a gr a n deza do seu va lor even t u a l


de equ ilíbr io, a n ã o ser qu e h a ja exceden t es de est oqu es e de ca pa cida de
pr odu t iva em ca da et a pa da pr odu çã o. P or ou t r o la do, a exa u st ã o do
excesso de est oqu e t er á efeit o com pen sa dor sobr e o m on t a n t e do in -
vest im en t o a dicion a l. Se a dm it ir m os qu e h a ja a lgu m exceden t e in icia l
em t odos os set or es, a ela st icida de in icia l de em pr ego pode a pr oxim a r -se
da u n ida de; em segu ida , qu a n do os est oqu es se t iver em esgot a do, por ém
a n t es qu e su r ja u m a u m en t o a dequ a do da ofer t a n a s pr im eir a s et a pa s
da pr odu çã o, a ela st icida de declin a r á , t en den do de n ovo pa r a a u n ida de,
qu a n do n os a pr oxim a r m os da n ova posiçã o de equ ilíbr io. Ist o est á su -
jeit o, n o en t a n t o, a cer t a s lim it a ções, n a m edida em qu e h ou ver fa t or es
de r en da qu e a bsor va m m a is despesa qu a n do a u m en t a o em pr ego, ou
se a t a xa de ju r os su bir . P or essa s r a zões, é im possível u m a est a bilida de
per feit a de pr eços n u m a econ om ia su jeit a a m u da n ça s, sa lvo, t oda via ,
se h ou ver a lgu m m eca n ism o especia l qu e det er m in e flu t u a ções t em -
por á r ia s n a pr open sã o a con su m ir exa t a m en t e n a a m plit u de deseja da .
Ma s a in st a bilida de dos pr eços or igin a da dest a m a n eir a n ã o con du z à
espécie de est ím u lo de lu cr o qu e possa oca sion a r u m excesso de ca pa -
cida de, pois os lu cr os im pr evist os ir ã o em su a t ot a lida de pa r a a s m ã os
dos em pr esá r ios qu e possu a m m er ca dor ia s n u m a et a pa r ela t iva m en t e
a dia n t a da de pr odu çã o, e o em pr esá r io qu e n ã o possu i r ecu r sos espe-
cia liza dos do t ipo a dequ a do n ã o t em m eio a lgu m de a t r a ir pa r a si o
dit o lu cr o. P or esse m ot ivo, a in evit á vel in st a bilida de dos pr eços em
r a zã o de m u da n ça s n ã o pode in flu ir n a s ações dos em pr esá r ios, sen ã o
a pen a s en ca m in h a r u m a r iqu eza d e facto in esper a da pa r a a s m ã os dos
m a is felizes (m u tatis m u tan d is qu a n do a su post a m u da n ça ocor r e em
sen t ido con t r á r io). E sse fa t o t em sido, n o m eu en t en der , ign or a do em
cer t a s r ecen t es con t r ovér sia s sobr e a s m oda lida des pr á t ica s de u m a
polít ica de est a biliza çã o dos pr eços. É ver da de qu e n u m a socieda de
propensa a mudar, tal política não alcançaria êxito com pleto. Porém não
segue disso que todo o pequeno desvio transitório relativo à estabilidade
de preços ocasione, necessariamente, um desequilíbrio cum ulativo.
III

Dem on st r a m os qu e, qu a n do a dem a n da efet iva é deficien t e, exist e


su bem pr ego de m ã o-de-obr a , n o sen t ido de qu e h á h om en s desem pr e-
ga dos dispost os a t r a ba lh a r por u m sa lá r io r ea l m en or qu e o exist en t e.
Con seqü en t em en t e, à m edida qu e a dem a n da efet iva a u m en t a , o em -
pr ego sobe, em bor a a u m sa lá r io r ea l igu a l ou m en or qu e o exist en t e,
a t é o m om en t o em qu e n ã o h a ja exceden t e de m ã o-de-obr a dispon ível
a o sa lá r io r ea l en t ã o em vigor , ist o é, a t é qu e n ã o h a ja m a is h om en s
(ou h or a s de t r a ba lh o) dispon íveis, sa lvo se (a pa r t ir desse pon t o) os
sa lá r ios n om in a is su bir em m ais d epressa qu e os pr eços. O pr oblem a
segu in t e é con sider a r o qu e a con t ecer á se, a t in gido est e pon t o, a despesa
con t in u a r a cr escer .

274
KEYN ES

At é est e pon t o, a dim in u içã o de r en da qu e a com pa n h a va o a u -


m en t o da m ã o-de-obr a a plica da a cer t o equ ipa m en t o de ca pit a l foi n eu -
t r a liza da pela a qu iescên cia da m ã o-de-obr a em ver r edu zido seu sa lá r io
r ea l. Ma s pa r a a lém dest e pon t o, u m a u n ida de de t r a ba lh o exigir ia o
est ím u lo do equ iva len t e de u m a qu a n t ida de m a ior de pr odu t o, en qu a n t o
o em pr ego de u m a u n ida de su plem en t a r de m ã o-de-obr a r esu lt a n u m a
qu a n t ida de m en or de pr odu t o. As con dições de equ ilíbr io est r it o exigem ,
por t a n t o, qu e os sa lá r ios e os pr eços e t a m bém , con seqü en t em en t e, os
lu cr os, su ba m t odos n a m esm a pr opor çã o da despesa , sem qu e a posiçã o
“r ea l”, in clu in do o volu m e da pr odu çã o e do em pr ego, sofr a a m en or
a lt er a çã o em qu a lqu er sen t ido. Isso sign ifica qu e ch ega m os a u m a si-
t u a çã o n a qu a l a t eor ia qu a n t it a t iva da m oeda em su a for m a r u di-
m en t a r (in t er pr et a n do a “velocida de” com o “velocida de-r en da ”) sa t is-
fa z-se plen a m en t e, por qu e a pr odu çã o fica in a lt er a da e os pr eços sobem
n a m edida exa t a m en t e pr opor cion a l a M V.
Toda via , essa con clu sã o ofer ece cer t a s lim it a ções pr á t ica s, a s
qu a is devem ser con sider a da s qu a n do a plica da s a u m ca so r ea l:

(1) Ao m en os por cer t o t em po, os pr eços cr escen t es, pela s ilu -


sões qu e cr ia m n os em p r esá r ios, podem levá -los a a u m en t a r o em -
pr ego a lém do n ível qu e eleva a o m á xim o os seu s lu cr os in dividu a is
m ed idos em t er m os do pr odu t o, pois eles est ã o de t a l m odo a cost u -
m a d os a ver n o a u m en t o do volu m e de ven d a s, em t er m os m on et á -
r ios, o sin a l d e u m desen volvim en t o da pr odu çã o, qu e podem con -
t in u a r a con sider á -lo a ssim qu a n do essa polít ica já deixou de lh es
con vir n a r ea lida de, ist o é, qu e pod em su best im a r o cu st o m a r gin a l
de u so n o n ovo a m bien t e d e p r eços.

(2) Um a vez qu e pa r t e do lu cr o qu e o em pr esá r io é obr iga do a


ceder a o ren tier157 é fixa em t er m os de m oeda , a a lt a de pr eços, m esm o
qu a n do n ã o a com pa n h a da por qu a lqu er m u da n ça n a pr odu çã o, pr ovoca ,
em ben efício do em pr esá r io e em det r im en t o dos qu e vivem de r en da ,
u m a dist r ibu içã o de r en da qu e pode a fet a r a pr open sã o a con su m ir .
E st e, con t u do, n ã o é u m pr ocesso qu e a pen a s se m a n ifest a qu a n do se
a lca n çou o plen o em pr ego; desen volve-se de m a n eir a r egu la r du r a n t e
o per íodo de a u m en t o de despesa . Se o ren tier for m en os in clin a do a
ga st a r qu e o em pr esá r io, a dim in u içã o gr a du a l do r en dim en t o r ea l
da qu ele sign ifica qu e o plen o em pr ego exigir á u m a u m en t o da qu a n -
t ida de de m oeda e u m a r edu çã o m en or da t a xa de ju r os do qu e n a
h ipót ese con t r á r ia . Um a vez a lca n ça do o plen o em pr ego, u m a n ova
a lt a de pr eços sign ifica r á , ca so a pr im eir a h ipót ese con t in u e vá lida ,
qu e a t a xa de ju r os t er á de eleva r -se u m pou co pa r a evit a r qu e os

157 O t er m o in glês ren tier sign ifica o a gen t e qu e vive de r en da s. Nã o exist e u m a t r a du çã o em


por t u gu ês expr essa n u m a ú n ica pa la vr a .

275
OS ECON OMIS TAS

pr eços con t in u em su bin do in defin ida m en t e, e qu e o a u m en t o r ela t ivo


da qu a n t ida de de m oeda ser á in fer ior a o da despesa ; a o pa sso qu e, se
a segu n da h ipót ese pr eva lecer , se ver ifica r á o con t r á r io. P ode a con t ecer
qu e, a o ir dim in u in do o r en dim en t o r ea l do ren tier, ch egu e o m om en t o
em qu e se pa sse da pr im eir a h ipót ese pa r a a segu n da , em con seqü ên cia
do seu em pobr ecim en t o r ela t ivo; m om en t o est e qu e pode sit u a r -se t a n t o
a n t es qu a n t o depois de t er sido a t in gido o plen o em pr ego.
IV
H á , t a lvez, cer t o m ot ivo de per plexida de n a a pa r en t e a ssim et r ia
qu e se m a n ifest a en t r e a in fla çã o e a defla çã o. E n qu a n t o u m a defla çã o
da dem a n da efet iva a ba ixo do n ível a dequ a do pa r a o plen o em pr ego
fa r á ba ixa r o em pr ego e os pr eços, u m a in fla çã o da m esm a a cim a desse
n ível a pen a s a fet a r á os pr eços. Con t u do, est a a ssim et r ia r eflet e sim -
plesm en t e o fa t o de qu e, en qu a n t o a m ã o-de-obr a est á sem pr e em con -
dições de se r ecu sa r a t r a ba lh a r n u m a esca la cor r espon den t e a u m
sa lá r io r ea l in fer ior à desu t ilida de m a r gin a l desse volu m e de em pr ego,
n ã o est á em con dições de r ecla m a r qu e lh e ofer eça m t r a ba lh o em qu a n -
t ida de su ficien t e pa r a com por t a r u m sa lá r io r ea l qu e n ã o exceda a
desu t ilida de m a r gin a l cor r espon den t e a esse volu m e de em pr ego.

276
C AP ÍTU LO 21
A Te o ria d o s P re ç o s

O cu pa n do-se do qu e se ch a m a t eor ia do va lor , os econ om ist a s


a cost u m a r a m -se a en sin a r qu e os pr eços sã o r egidos pela s con dições
da ofer t a e da pr ocu r a ; e, em pa r t icu la r , a s va r ia ções n o cu st o m a r gin a l
e a ela st icida de da ofer t a em per íodos cu r t os t êm , n est e a spect o, de-
sem pen h a do u m pa pel pr epon der a n t e. P or ém , qu a n do em u m volu m e
II ou , m a is fr eqü en t em en t e, em u m t r a t a do em sepa r a do, pa ssa m a
a bor da r a t eor ia da m oeda e dos pr eços, n ã o m a is ou vim os fa la r desses
con ceit os fa m ilia r es e sim ples de com pr een der , e pa ssa m os pa r a u m
m u n do on de os pr eços sã o gover n a dos pela qu a n t ida de de m oeda , pela
su a velocida de-r en da , pela velocida de de cir cu la çã o em r ela çã o a o vo-
lu m e de t r a n sa ções, pelo en t esou r a m en t o, pela pou pa n ça for ça da , pela
in fla çã o e pela defla çã o et h oc gen u s om n e; n u n ca ou qu a se n u n ca se
t en t a liga r essa s expr essões m a is va ga s a os n ossos a n t igos con ceit os
da s ela st icida des da ofer t a e da pr ocu r a . Qu a n do r eflet im os sobr e a s
t eor ia s qu e n os for a m en sin a da s e t en t a m os da r -lh es u m a for m a r a -
cion a l, n a s a n á lises m a is sim ples, pa r ece qu e a ela st icida de da ofer t a
deve t er ch ega do a zer o e a pr ocu r a pa r ece ser pr opor cion a l à qu a n t ida de
de m oeda , a o pa sso qu e, n os est u dos m a is ela bor a dos, n os a ch a m os
per didos em u m n evoeir o on de n a da é cla r o e t u do é possível. A t odos
n ós já ocor r eu en con t r a r m o-n os a lgu m a s vezes de u m la do da lu a e
ou t r a s vezes do la do opost o, sem sa ber m os qu e ca m in h o os liga , r es-
t a n do-n os a pen a s os n ossos pa ssos e a n ossa im a gin a çã o.
Um dos objet ivos dos ca pít u los pr eceden t es foi pr ocu r a r evit a r
est a du pla exist ên cia e r est a belecer u m est r eit o con t a t o en t r e a t eor ia
dos pr eços em seu con ju n t o e a t eor ia do va lor . A divisã o da E con om ia
em t eor ia do va lor e da dist r ibu içã o de u m la do e em t eor ia da m oeda
do ou t r o pa r ece-m e fa lsa . A dicot om ia cor r et a é, n o m eu m odo de ver ,
en t r e a t eor ia da in dú st r ia ou da em pr esa in dividu a l e da s r em u n e-

277
OS ECON OMIS TAS

r a ções e dist r ibu içã o de d ad a qu a n t ida de de r ecu r sos en t r e diver sos


u sos, de u m a pa r t e, e a t eor ia da pr odu çã o e do em pr ego com o u m
tod o, de ou t r a . E n qu a n t o n os lim it a r m os a o est u do da in dú st r ia ou
em pr esa in dividu a l, su pon do qu e a qu a n t ida de a gr ega da de r ecu r sos
é con st a n t e e, pr ovisor ia m en t e, qu e a s con dições de ou t r a s in dú st r ia s
ou em pr esa s n ã o m u da r a m , é ver da de qu e n ã o est a r em os t r a t a n do
ca r a ct er íst ica s da m oeda . Ma s n o m om en t o em qu e pa ssa r m os a o pr o-
blem a do qu e det er m in a a pr odu çã o e o em pr ego com o u m t odo, t or n a -se
in dispen sá vel a t eor ia com plet a de u m a econ om ia m on et á r ia .
Ta lvez pu déssem os t r a ça r u m a lin h a divisór ia en t r e a t eor ia do
equ ilíbr io est a cion á r io e do equ ilíbr io m óvel — qu er en do design a r com
o ú lt im o a t eor ia de u m sist em a on de a s va r ia ções de pon t os de vist a
sobr e o fu t u r o podem in flu ir sobr e a sit u a çã o pr esen t e —, porqu e a
im portân cia d a m oed a d ecorre essen cialm en te d o fato d e con sistir ela
u m elo en tre o presen te e o fu tu ro. P odem os con sider a r qu e a dist r ibu içã o
de r ecu r sos en t r e os difer en t es u sos ser á com pa t ível com o equ ilíbr io
sob a in flu ên cia dos m ot ivos econ ôm icos n or m a is, em u m m u n do n o
qu a l a s n ossa s opin iões r ela t iva s a o fu t u r o sã o est á veis e dign a s de
con fia n ça a r espeit o de t u do — t a lvez com ou t r a divisã o, pa r a sepa r a r
u m a econ om ia im u t á vel de ou t r a su jeit a a va r ia r , m a s n a qu a l ser ia
pr evist o desde o com eço. Ou t a lvez pu déssem os pa ssa r dest a pr ope-
dêu t ica sim plifica da a os pr oblem a s do m u n do r ea l, n o qu a l a s n ossa s
expect a t iva s a n t er ior es podem t r a zer -n os desa pon t a m en t os, e a s n ossa s
esper a n ça s n o fu t u r o a fet a r n ossos a t os pr esen t es. Só a pós t er m os r ea -
liza do est a t r a n siçã o é qu e dever ía m os in t r odu zir em n ossos cá lcu los
a s pa r t icu la r ida des da m oeda com o u m elo en t r e o pr esen t e e o fu t u r o.
Ma s, em bor a a t eor ia do equ ilíbr io m óvel deva n ecessa r ia m en t e ser
con cebida em t er m os de u m a econ om ia m on et á r ia , per m a n ece, m esm o
a ssim , u m a t eor ia do va lor e da dist r ibu içã o, e n ã o u m a “t eor ia da
m oeda ” in depen den t e. A m oeda , con sider a da em seu s a t r ibu t os m a is
sign ifica t ivos, é sobr et u do u m pr ocesso su t il de liga r o pr esen t e a o
fu t u r o, e sem ela n em sequ er poder ía m os in icia r o est u do dos efeit os
da s expect a t iva s m u t á veis sobr e a s a t ivida des cor r en t es. Nã o h á m eios
pa r a n os liber t a r m os da m oeda , m esm o a bolin do o ou r o, a pr a t a e os
m eios lega is de pa ga m en t o. E n qu a n t o su bsist ir a lgu m bem du r á vel,
ele poder á possu ir os a t r ibu t os m on et á r ios 158 e, con seqü en t em en t e, da r
or igem a os pr oblem a s ca r a ct er íst icos de u m a econ om ia m on et á r ia .

II

E m u m a in dú st r ia específica , o seu n ível de pr eços depen de, em


pa r t e, da t a xa de r em u n er a çã o dos fa t or es pr odu t ivos qu e en t r a m n o
cu st o m a r gin a l e, em pa r t e, da esca la de pr odu çã o. Nã o h á m ot ivo

158 Cf. ca p. 17.

278
KEYN ES

a lgu m pa r a m odifica r essa con clu sã o qu a n do pa ssa m os à in dú st r ia em


con ju n t o. O n ível ger a l dos pr eços depen de, em pa r t e, da t a xa de r e-
m u n er a çã o dos fa t or es pr odu t ivos qu e en t r a m n o cu st o m a r gin a l e, em
pa r t e, da esca la globa l da pr odu çã o, ist o é, do volu m e de em pr ego
(con sider a n do con h ecidos o equ ipa m en t o e a t écn ica ). É ver da de qu e,
qu a n do pa ssa m os à pr odu çã o com o u m t odo, o cu st o da m esm a , pa r a
qu a lqu er in dú st r ia , depen de pa r cia lm en t e da pr odu çã o da s dem a is in -
dú st r ia s. A difer en ça pr in cipa l qu e n ã o t em os leva do em con t a , por ém ,
é qu e a s va r ia ções da d em an d a a t u a m a o m esm o t em po sobr e os cu st os
e sobr e o volu m e. É a pa r t ir desse a spect o qu e t em os de in t r odu zir
idéia s com plet a m en t e n ova s qu a n do est u da m os a dem a n da em con ju n t o
e n ã o m a is a de u m pr odu t o isola do, su pon do in va r iá vel a dem a n da
com o u m t odo.

III

Se su pu ser m os, a t ít u lo de sim plifica çã o, qu e a s for m a s de r e-


m u n er a çã o dos diver sos fa t or es pr odu t ivos qu e en t r a m n o cu st o m a r -
gin a l va r ia m t oda s n a m esm a pr opor çã o qu e a u n ida de de sa lá r ios,
segu e-se qu e o n ível ger a l dos pr eços depen der á en t ã o (da dos com o
con h ecidos o equ ipa m en t o e a t écn ica ), em pa r t e, da u n ida de de sa lá r ios,
e, em pa r t e, do volu m e de em pr ego. Con seqü en t em en t e, o efeit o da s
va r ia ções da qu a n t ida de de m oeda sobr e o n ível de pr eços pode ser
con sider a do a r esu lt a n t e dos efeit os qu e exer ce sobr e a u n ida de de
sa lá r io e sobr e o em pr ego.
P a r a t or n a r m a is cla r a s a s idéia s con t ida s n est a pr oposiçã o, sim -
plifiqu em os a in da m a is a s n ossa s h ipót eses e su pon h a m os: (1) qu e os
r ecu r sos de t odos os desem pr ega dos seja m h om ogên eos e in t er ca m biá -
veis n o qu e con cer n e à su a eficiên cia pa r a pr odu zir o qu e se deseje, e
(2) qu e os fa t or es de pr odu çã o qu e en t r a m n o cu st o m a r gin a l se con -
t en t em com o m esm o sa lá r io n om in a l en qu a n t o h ou ver u m exceden t e
deles sem em pr ego. Nesse ca so t er em os r en dim en t os con st a n t es e u m a
u n ida de r ígida de sa lá r ios en qu a n t o h ou ver qu a lqu er desem pr ego. Se-
gu e-se da í qu e, h a ven do desem pr ego, o a u m en t o da qu a n t ida de de
m oeda n ã o t er á n en h u m efeit o sobr e os pr eços, e qu a lqu er a u m en t o
da qu a n t ida de de m oeda n a dem a n da efet iva se t r a du zir á por u m a u -
m en t o exa t a m en t e pr opor cion a l do em pr ego, a o pa sso qu e, t ã o logo se
a lca n ce o plen o em pr ego, a u n ida de de sa lá r ios e os pr eços su bir ã o,
da í em dia n t e, n a m edida exa t a m en t e pr opor cion a l a o a u m en t o da
dem a n da efet iva . Assim sen do, se a ofer t a per m a n ece per feit a m en t e
elá st ica en qu a n t o su bsist e o desem pr ego e t or n a -se per feit a m en t e in e-
lá st ica t ã o logo o plen o em pr ego é a lca n ça do, e, a in da , se a dem a n da
efet iva va r ia n a m esm a pr opor çã o qu e a qu a n t ida de de m oeda , a t eor ia
qu a n t it a t iva da m oeda pode ser en u n cia da com o segu e: “E n qu a n t o h ou -
ver desem pr ego, o em prego va r ia r á pr opor cion a lm en t e à qu a n t ida de

279
OS ECON OMIS TAS

de m oeda e, qu a n do o plen o em pr ego é a lca n ça do, os preços va r ia r ã o


pr opor cion a lm en t e à qu a n t ida de de m oeda ”.

Ten do, por t a n t o, sa t isfeit o a t r a diçã o, a o in t r odu zir m os vá r ia s


h ipót eses sim plifica dor a s qu e n os per m it em en u n cia r u m a t eor ia qu a n -
t it a t iva da m oeda , exa m in em os a gor a a s possíveis com plica ções qu e,
de fa t o, in flu ir ã o sobr e os a con t ecim en t os:

(1) A dem a n da efet iva n ã o va r ia r á em pr opor çã o exa t a à qu a n -


t ida de da m oeda .

(2) Desde qu e os r ecu r sos n ã o sã o h om ogên eos, h a ver á r en di-


m en t os decr escen t es, e n ã o con st a n t es, à m edida qu e o em pr ego a u -
m en t e gr a du a lm en t e.

(3) Desde qu e os r ecu r sos n ã o sã o in t er ca m biá veis, a ofer t a de


cer t os ben s t or n a r -se-á in elá st ica , a pesa r de h a ver r ecu r sos desem pr e-
ga dos dispon íveis pa r a a pr odu çã o de ou t r os ben s.

(4) A t a xa de sa lá r ios t en der á a su bir a n t es qu e o plen o em pr ego


seja a lca n ça do.

(5) As r em u n er a ções dos fa t or es qu e en t r a m n o cu st o m a r gin a l


n ã o va r ia m t oda s n a m esm a pr opor çã o.

P r ecisa m os, por t a n t o, con sider a r em pr im eir o lu ga r o efeit o da s


va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda sobr e o m on t a n t e da dem a n da efe-
t iva ; com o r egr a ger a l, o a u m en t o da dem a n da efet iva t r a du z-se, em
pa r t e, pelo a u m en t o do em pr ego e, em pa r t e, pela eleva çã o do n ível
dos pr eços. Nest a s con dições, os pr eços, em vez de per m a n ecer em con s-
t a n t es qu a n do exist e desem pr ego e de a u m en t a r em pr opor cion a lm en t e
à qu a n t ida de de m oeda qu a n do se a t in ge o plen o em pr ego, sobem pr o-
gr essiva m en t e à m edida qu e o em pr ego a u m en t a . A t eor ia dos pr eços,
ist o é, a a n á lise da r ela çã o en t r e a s va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda
e n o n ível dos pr eços, per m it in do a det er m in a çã o da ela st icida de dos
pr eços em r ela çã o à s va r ia ções da qu a n t ida de de m oeda , gir a r á , por -
t a n t o, sobr e os cin co fa t or es de com plica çã o a cim a descr it os.

Va m os exa m in á -los u m de ca da vez. E st e pr ocedim en t o, por ém ,


n ã o deve leva r -n os a su por qu e eles seja m in depen den t es, n o sen t ido
est r it o da pa la vr a . P or exem plo, a pr opor çã o em qu e se dividem os
efeit os de u m a u m en t o da dem a n da efet iva en t r e a a lt a pr odu çã o e a
eleva çã o dos pr eços pode in flu ir n a for m a pela qu a l a qu a n t ida de de
m oeda se r ela cion a com o m on t a n t e da dem a n da efet iva , ou , a in da ,
a s difer en ça s n a s pr opor ções em qu e va r ia m a s r em u n er a ções dos di-

280
KEYN ES

ver sos fa t or es podem in flu ir sobr e a r ela çã o en t r e a qu a n t ida de de


m oeda e o m on t a n t e da dem a n da efet iva . O objet ivo da n ossa a n á lise
n ã o é for n ecer u m m eca n ism o ou m ét odo de m a n ipu la çã o cega qu e n os
dê u m a r espost a in fa lível, m a s dot a r -n os de u m m ét odo or ga n iza do e
or den a do de r a ciocin a r sobr e pr oblem a s con cr et os; depois de obt er m os
u m a con clu sã o pr ovisór ia , t er em os de volt a r a t r á s e leva r em con t a ,
da m elh or m a n eir a possível, a s r ea ções pr ová veis dos diver sos fa t or es
en t r e si. E st a é a n a t u r eza do r a ciocín io econ ôm ico. Qu a lqu er ou t r a
m a n eir a de a plica r os n ossos pr in cípios for m a is de r a ciocín io (sem os
qu a is, con t u do, est a r em os per didos n a flor est a ) n os leva r á a o er r o. Os
m ét odos pseu dom a t em á t icos, qu e dã o a figu r a çã o sim bólica de u m sis-
t em a de a n á lise econ ôm ica , com o o qu e a pr esen t a r em os n a seçã o VI
dest e ca pít u lo, t êm o gr a ve defeit o de su por expr essa m en t e a in depen -
dên cia r igor osa dos fa t or es qu e u t iliza m , e de per der su a coesã o lógica
e a u t or ida de qu a n do est a h ipót ese é r ejeit a da ; já n o r a ciocín io com u m ,
on de n ã o a va n ça m os de olh os fech a dos, m a s on de a t odo m om en t o
sa bem os o qu e est a m os fa zen do e o qu e sign ifica m a s pa la vr a s, podem os
con ser va r “n o fu n do da m en t e” a s n ecessá r ia s r eser va s e lim it a ções,
bem com o a s cor r eções qu e t er em os de fa zer depois, de u m a m a n eir a
pela qu a l n ã o ser ia igu a lm en t e possível r et er com plica da s difer en cia is
pa r cia is “n o ver so” de a lgu m a s pá gin a s de á lgebr a qu e su põem a n u -
lida de de t oda s ela s. Gr a n de pa r t e da r ecen t e econ om ia “m a t em á t ica ”
n ã o pa ssa de u m em a r a n h a m en t o, t ã o im pr eciso qu a n t o su a s h ipó-
t eses in icia is, leva n do os a u t or es a p er d er d e vist a , n u m la bir in t o
de sím bolos pr et en siosos e in ú t eis, a s com plexida des e in t er dep en -
dên cia s do m u n do r ea l.
IV

(1) O efeit o pr im á r io de u m a va r ia çã o n a qu a n t ida de de m oeda


sobr e o m on t a n t e da dem a n da efet iva r esu lt a de su a in flu ên cia sobr e
a t a xa de ju r os. Se est a fosse a ú n ica r ea çã o, o efeit o qu a n t it a t ivo
poder ia der iva r -se dos t r ês elem en t os segu in t es — (a) a cu r va de pr e-
fer ên cia pela liqu idez, qu e n os in dica qu a n t o a t a xa de ju r os deve
ba ixa r pa r a qu e os n ovos m eios m on et á r ios seja m a bsor vidos pela s
pessoa s desejosa s de con ser vá -los, (b) a cu r va da eficiên cia m a r gin a l,
qu e n os diz qu a n t o a u m en t a r á o in vest im en t o em con seqü ên cia de
cer t o declín io n a t a xa de ju r os, e (c) o m u lt iplica dor de in vest im en t o,
qu e n os in for m a de qu a n t o su bir á a dem a n da efet iva , em con ju n t o,
com u m a cr éscim o da do do in vest im en t o.
E m bor a est a a n á lise t en h a o m ér it o de in t r odu zir or dem e m ét odo
em n ossa in vest iga çã o, a pr esen t a , con t u do, u m a sim plicida de en ga n osa
se esqu ecer m os qu e os t r ês fa t or es (a), (b) e (c) sã o t a m bém pa r t e
in t egr a n t e dos elem en t os de com plica çã o (2), (3), (4) e (5), qu e n ã o
for a m a in da exa m in a dos. A pr ópr ia cu r va da pr efer ên cia pela liqu idez
depen de, pois, de qu a n t o da n ova m oeda é a bsor vido n a cir cu la çã o da

281
OS ECON OMIS TAS

r en da e de pr odu t os in du st r ia is, qu e, por su a vez, depen dem da pr o-


por çã o em qu e a u m en t a a dem a n da efet iva e da m a n eir a com o se
divide o a u m en t o en t r e a a lt a de pr eços, a a lt a dos sa lá r ios e o volu m e
de pr odu çã o e de em pr ego. Além disso, a cu r va da eficiên cia m a r gin a l
depen de, em pa r t e, do efeit o qu e a s cir cu n st â n cia s qu e a com pa n h a m
o a u m en t o da qu a n t ida de de m oeda exer cem sobr e a s expect a t iva s
qu a n t o à fu t u r a sit u a çã o m on et á r ia . F in a lm en t e, o m u lt iplica dor ser á
in flu en cia do pelo m odo com o se dist r ibu i a r en da a dicion a l r esu lt a n t e
do a u m en t o da dem a n da efet iva en t r e a s difer en t es cla sses de con su -
m idor es. Na t u r a lm en t e, est a list a n ã o in clu i t oda s a s in t er a ções pos-
síveis. E n t r et a n t o, se dispu séssem os de t odos os fa t os, t er ía m os su fi-
cien t es equ a ções sim u lt â n ea s pa r a obt er u m r esu lt a do det er m in a do.
H a ver á det er m in a do volu m e de a u m en t o n o m on t a n t e da dem a n da
efet iva qu e, con sider a dos t odos os fa t or es per t in en t es, cor r espon der á
a o a u m en t o da qu a n t ida de de m oeda e fica r á em equ ilíbr io com o
m esm o. Adem a is, só em cir cu n st â n cia s m u it o excepcion a is a con t ece
qu e u m a u m en t o n a qu a n t ida de de m oeda seja a com pa n h a do por u m a
d im in u ição n o m on t a n t e da dem a n da efet iva .
A pr opor çã o en t r e o m on t a n t e da dem a n da efet iva e a qu a n t ida de
de m oeda cor r espon de m u it o de per t o à qu ilo a qu e fr eqü en t em en t e se
den om in a a “velocida de-r en da da m oeda ” — excet u a n do-se qu e a de-
m a n da efet iva cor r espon de à ven da cu ja expect a t iva m ot ivou a pr odu -
çã o, e n ã o à r en da efet iva m en t e r ea liza da , e, de ou t r a pa r t e, cor r es-
pon der á à r en da br u t a e n ã o à líqu ida . Ma s a “velocida de-r en da da
m oeda ” n ã o pa ssa , em si m esm a , de u m a expr essã o qu e n a da explica .
Nã o h á m ot ivo a lgu m pa r a esper a r qu e ela seja con st a n t e, pois ela
depen de, com o vim os n a a n á lise a n t er ior , de m u it os fa t or es va r iá veis
e com plexos. O em pr ego dest a expr essã o obscu r ece, n o m eu en t en der ,
o ca r á t er r ea l da ca u sa çã o, e só t em pr ovoca do con fu sões.

(2) Com o vim os a n t er ior m en t e (p. 72), a dist in çã o en t r e os r en -


dim en t os decr escen t es e os r en dim en t os con st a n t es depen de, em pa r t e,
do fa t o de os t r a ba lh a dor es ser em ou n ã o r em u n er a dos em est r it a
pr opor çã o a su a eficiên cia . E m ca so a fir m a t ivo, t er em os cu st os de t r a -
ba lh o con st a n t es (em t er m os de u n ida des de sa lá r ios) qu a n do o em pr ego
a u m en t a . P or ém , se o sa lá r io de cer t a cla sse de t r a ba lh a dor es for u n i-
for m e, in depen den t em en t e da eficiên cia dos in divídu os, ver ifica m os qu e
o cu st o do t r a ba lh o su bir á in depen den t em en t e da eficiên cia do equ i-
pa m en t o. Além disso, se o equ ipa m en t o for h om ogên eo e cer t a pa r t e
dele su pu ser u m cu st o pr im á r io m a ior por u n ida de de pr odu çã o, t er em os
cu st os pr im á r ios m a r gin a is cr escen t es, a cim a de qu a lqu er a u m en t o
r esu lt a n t e dos cu st os cr escen t es do t r a ba lh o.
Assim , o pr eço da ofer t a t em , con seqü en t em en t e, t en dên cia pa r a
su bir à m edida qu e a pr odu çã o obt ida por m eio de da do equ ipa m en t o
a u m en t a . Assim sen do, o a u m en t o da pr odu çã o é a com pa n h a do por

282
KEYN ES

u m a a lt a de pr eços, in depen den t em en t e de qu a lqu er va r ia çã o n a u n i-


da de de sa lá r ios.

(3) No it em (2) con sider a m os a possibilida de de a ofer t a n ã o ser


in t eir a m en t e elá st ica . Se h ou ver u m equ ilíbr io per feit o n a s r espect iva s
qu a n t ida des de r ecu r sos especia liza dos n ã o em pr ega dos, t odos eles a l-
ca n ça r ã o, sim u lt a n ea m en t e, o est a do de plen o em pr ego. Ma s, em ger a l,
a dem a n da de cer t os ser viços e ben s a lca n ça r á u m n ível a lém do qu a l
a ofer t a é, por a lgu m t em po, in elá st ica , em bor a em ou t r a s á r ea s h a ja
a in da exceden t es im por t a n t es de r ecu r sos sem em pr ego. Assim , a u -
m en t a n do a pr odu çã o, ch ega -se su cessiva m en t e a u m a sér ie de “es-
t r a n gu la m en t os” n os qu a is a ofer t a de det er m in a dos ben s deixa de ser
elá st ica , e seu s pr eços t êm de su bir a o n ível n ecessá r io, seja qu a l for
esse n ível, pa r a desvia r a dem a n da pa r a ou t r a s dir eções.
É pr ová vel qu e o n ível ger a l de pr eços n ã o su ba m u it o, qu a n do
a pr odu çã o a u m en t a , en qu a n t o h ou ver dispon íveis r ecu r sos eficien t es
sem em pr ego em t oda s a s ca t egor ia s. Ma s, t ã o logo a pr odu çã o t en h a
su bido o n ecessá r io pa r a a lca n ça r a zon a dos “est r a n gu la m en t os”, é
pr ová vel qu e se ver ifiqu e u m a a lt a a cen t u a da n os pr eços de cer t a s
m er ca dor ia s.
E n t r et a n t o, n est e it em , com o n o it em (2), a ela st icida de da ofer t a
depen de, em pa r t e, do t r a n scu r so do t em po. Se a dm it ir m os u m in t er va lo
su ficien t e pa r a qu e o pr ópr io volu m e de equ ipa m en t o va r ie, even t u a l-
m en t e a s ela st icida des de ofer t a ser ã o decidida m en t e m a ior es. Nessa s
con dições, u m a va r ia çã o m oder a da da dem a n da efet iva , qu e se a pr e-
sen t e em cir cu n st â n cia s de a m plo desem pr ego, pode t r a du zir -se pr in -
cipa lm en t e pelo a u m en t o do em pr ego e, em m edida m u it o lim it a da ,
pela a lt a de pr eços, a o pa sso qu e u m a va r ia çã o m a is a cen t u a da , qu e,
n ã o sen do pr evist a , leva a cer t os “est r a n gu la m en t os” t em por á r ios, in flu i
m a is sobr e os pr eços e m en os sobr e o em pr ego, em m a ior pr opor çã o
n o com eço do qu e su bseqü en t em en t e.

(4) O fa t o de qu e a u n ida de de sa lá r ios pode t en der a su bir a n t es


de a lca n ça do o plen o em pr ego r equ er a lgu n s com en t á r ios ou explica ções.
Um a vez qu e ca da gr u po de t r a ba lh a dor es t ir a va n t a gen s, coeteris pa-
ribu s, de u m a a lt a de seu s pr ópr ios sa lá r ios, ver ifica -se n a t u r a lm en t e
u m a pr essã o n est e sen t ido da pa r t e de t odos os gr u pos, à qu a l os
em pr esá r ios est a r ã o m a is dispost os a ceder qu a n do est iver em fa zen do
m elh or es n egócios. É por essa r a zã o qu e n or m a lm en t e u m a pa r t e de
qu a lqu er a u m en t o n a dem a n da efet iva se dest in a a sa t isfa zer a t en -
dên cia a scen den t e da u n ida de de sa lá r ios.
P or t a n t o, a lém do pon t o cr ít ico fin a l do plen o em pr ego, n o qu a l
u m a u m en t o da dem a n da efet iva expr essa em m oeda pr ovoca u m a
a lt a dos sa lá r ios n om in a is in t eir a m en t e pr opor cion a l à a lt a de pr eços
dos ben s de con su m o sa la r ia is, exist e u m a su cessã o de pon t os sem i-

283
OS ECON OMIS TAS

cr ít icos a n t er ior es, n os qu a is u m a u m en t o da dem a n da efet iva t en de


a eleva r os sa lá r ios n om in a is, em bor a n ã o em pr opor çã o exa t a à ele-
va çã o dos pr eços dos ben s de con su m o sa la r ia is; o m esm o ocor r e n o
ca so de u m a dem a n da efet iva decr escen t e. Na pr á t ica , a u n ida de de
sa lá r ios n ã o va r ia de m a n eir a u n ifor m e em t er m os m on et á r ios, em
r espost a a ca da pequ en a a lt er a çã o n a dem a n da efet iva ; a s r ea ções sã o
descon t ín u a s. E st es pon t os de descon t in u ida de sã o det er m in a dos pela
psicologia dos t r a ba lh a dor es e pela polít ica dos pa t r ões e dos sin dica t os
t r a ba lh ist a s. E m u m sist em a a ber t o, n o qu a l sign ifica m u m a m u da n ça
em r ela çã o a os cu st os de sa lá r ios em ou t r os sist em a s, e n o ciclo de
n egócios, on de (m esm o n u m sist em a fech a do) podem sign ifica r u m a
va r ia çã o r ela t iva m en t e a os cu st os de sa lá r ios pr evist os pa r a o fu t u r o,
su a im por t â n cia pr á t ica pode ser con sider á vel. De cer t o pon t o de vist a ,
est es pon t os de descon t in u ida de, n os qu a is u m a u m en t o post er ior da
dem a n da efet iva em t er m os de m oeda pode oca sion a r u m a a lt a des-
con t ín u a n a u n ida de de sa lá r ios, podem ser con sider a dos est a dos de
sem i-in fla çã o a pr esen t a n do cer t a a n a logia (em bor a m u it o im per feit a )
com a in fla çã o a bsolu t a (cf. p. 283), a qu a l r esu lt a de u m a u m en t o da
dem a n da efet iva em cir cu n st â n cia s de plen o em pr ego. E les t êm , a lém
disso, a pr eciá vel im por t â n cia h ist ór ica . Nã o se pr est a m , por ém , fa cil-
m en t e a gen er a liza ções t eór ica s.

(5) A n ossa pr im eir a sim plifica çã o con sist iu em su por qu e a s


r em u n er a ções dos diver sos fa t or es qu e en t r a m n o cu st o m a r gin a l va -
r ia m t oda s n a m esm a pr opor çã o. Ma s, se fa t o, a s t a xa s de r em u n er a çã o
dos difer en t es fa t or es, em t er m os m on et á r ios, a pr esen t a m gr a u s va -
r iá veis de r igidez, e esses fa t or es podem t a m bém m ost r a r difer en t es
ela st icida des de ofer t a em r espost a a va r ia ções n a s r em u n er a ções m o-
n et á r ia s ofer ecida s. Se n ã o fosse isso, poder ía m os dizer qu e o n ível de
pr eços se com põe de dois fa t or es: a u n ida de de sa lá r ios e o volu m e de
em pr ego.
Ta lvez o elem en t o m a is im por t a n t e n o cu st o m a r gin a l, com pr o-
ba bilida des de va r ia r em pr opor çã o difer en t e da u n ida de de sa lá r ios,
e t a m bém de flu t u a r den t r o de lim it es m u it o m a is a m plos, seja o cu st o
m a r gin a l de u so. Isso por qu e o cu st o m a r gin a l de u so pode su bir a cen -
t u a da m en t e qu a n do o em pr ego com eça a m elh or a r , já qu e (com o é
pr ová vel qu e a con t eça ) o a u m en t o da dem a n da efet iva pr ovoca u m a
r á pida m u da n ça n a s expect a t iva s pr eva lecen t es com r espeit o à da t a
em qu e ser á n ecessá r io su bst it u ir o equ ipa m en t o.
E m bor a pa r a m u it os fin s seja ba st a n t e ú t il, com o pr im eir a a pr o-
xim a çã o, su por qu e a s r em u n er a ções de t odos os fa t or es qu e en t r a m
n o cu st o pr im á r io m a r gin a l va r ia m n a m esm a pr opor çã o da u n ida de
de sa lá r ios, t a lvez fosse m elh or con sider a r u m a m édia pon der a da da s
r em u n er a ções qu e en t r a m n o cu st o pr im á r io m a r gin a l, e a ist o da r a
den om in a çã o de u n id ad e d e cu stos. A u n ida de de cu st os, ou , su jeit a à

284
KEYN ES

a pr oxim a çã o a n t er ior , a u n ida de de sa lá r ios, pode, a ssim , ser con side-


r a da o pa dr ã o essen cia l de va lor ; o n ível de pr eços, da do o est a do da
t écn ica e do equ ipa m en t o, depen der á , em pa r t e, da u n ida de de cu st os
e, em pa r t e, da esca la de pr odu çã o, a u m en t a n do, qu a n do a ssim va r ia
a pr odu çã o, m ais do qu e qu a n do pr opor cion a l a qu a lqu er a lt a n a u n i-
da de de cu st os, de a cor do com o pr in cípio dos r en dim en t os decr escen t es
em per íodo cu r t o. Tem os plen o em pr ego qu a n do a pr odu çã o a t in ge o
n ível em qu e o volu m e m a r gin a l pr odu zido por u m a u n ida de r epr e-
sen t a t iva dos fa t or es da pr odu çã o ba ixa a o m ín im o n ecessá r io pa r a
qu e esses fa t or es se t or n em dispon íveis em n ú m er o su ficien t e pa r a o
pr odu zir .
V

Qu a n do u m n ovo a cr éscim o n o volu m e de dem a n da efet iva n ã o


m a is pr odu z a u m en t o n a pr odu çã o e se t r a du z a pen a s n u m a a lt a da
u n ida de de cu st os, em pr opor çã o exa t a a o a u m en t o da dem a n da efet iva ,
t er em os a lca n ça do u m est a do qu e se pode a dequ a da m en t e qu a lifica r
de ver da deir a in fla çã o. At é esse pon t o, o efeit o da expa n sã o m on et á r ia
é a pen a s u m a qu est ã o de gr a u , e n ã o h á pon t o a n t er ior em qu e possa m os
t r a ça r u m a lin h a defin ida e decla r a r qu e u m est a do de in fla çã o se
r evela r á . Ca da a u m en t o a n t er ior n a qu a n t ida de de m oeda , à m edida
qu e a u m en t e a dem a n da efet iva , t r a du z-se, em pa r t e, n u m a eleva çã o
da u n ida de de cu st os e, em pa r t e, n u m a u m en t o da pr odu çã o.
P a r ece, por t a n t o, qu e cer t a a ssim et r ia se m a n ifest a en t r e a s du a s
zon a s sepa r a da s pelo pon t o cr ít ico em qu e se obser va a ver da deir a
in fla çã o. Um a con t r a çã o da dem a n da efet iva a ba ixo do pon t o cr ít ico
r edu zir á o seu m on t a n t e m edido em u n ida des de cu st o, a o pa sso qu e
u m a expa n sã o da dem a n da efet iva a cim a desse n ível n ã o t er á , em
ger a l, o efeit o de a u m en t á -la em t er m os de u n ida des de cu st o. E sse
r esu lt a do decor r e da h ipót ese de qu e os fa t or es da pr odu çã o, e em
pa r t icu la r os t r a ba lh a dor es, pr ocu r a m r esist ir a u m a r edu çã o n a s su a s
r em u n er a ções m on et á r ia s, e de qu e n ã o h á m ot ivo cor r espon den t e pa r a
opor a u m a u m en t o dela s. E st a h ipót ese é, con t u do, con fir m a da pelos
fa t os, devido à cir cu n st â n cia de qu e u m a va r ia çã o qu e n ã o t en h a ca r á t er
ger a l t or n a -se ben éfica pa r a os fa t or es específicos a t in gidos qu a n do
oper a em sen t ido a scen den t e, e pr eju dicia l qu a n do o fa z n o sen t ido
descen den t e.
Se, pelo con t r á r io, os sa lá r ios n om in a is ba ixa ssem ilim it a da m en t e
sem pr e qu e h ou vesse u m a t en dên cia pa r a u m n ível in fer ior a o do plen o
em pr ego, é cer t o qu e a a ssim et r ia desa pa r ecer ia . P or ém , n est e ca so,
n ã o h a ver ia a ba ixo do plen o em pr ego n en h u m a posiçã o de equ ilíbr io
possível a t é qu e a t a xa de ju r os fosse in ca pa z de ba ixa r m a is ou os
sa lá r ios ch ega ssem a zer o. De fa t o, pr ecisa m os t er algu m fa t or cu jo
va lor expr esso em m oeda seja , se n ã o fixo, pelo m en os r ígido, pa r a da r
a lgu m a est a bilida de a os va lor es, n u m sist em a m on et á r io.

285
OS ECON OMIS TAS

A opinião de que qualquer aum ento na quantidade de m oeda é in-


flacionário (a não ser que entendamos por inflacionário apenas uma alta
de preços) está ligada à hipótese subjacente da teoria clássica de que sem pre
nos encontram os em circunstâncias tais que uma baixa das remunerações
reais dos fatores produtivos levará a um a redução de sua oferta.
VI

Com o a u xílio da s a n ot a ções a pr esen t a da s n o ca pít u lo 20, pode-


m os, se qu iser m os, expr im ir de for m a sim bólica a su bst â n cia do qu e
ficou dit o.
E scr evem os M V = D, on de M r epr esen t a a qu a n t ida de de m oeda ,
V su a velocida de-r en da (defin içã o qu e se difer e, por pequ en os det a lh es,
da in dica da a n t es, r ela t iva m en t e à defin içã o u su a l), e D a dem a n da
efet iva . Se, en t ã o, V for con st a n t e, pa r a qu e os pr eços va r iem pr opor -
/ Ddp 2
cion a lm en t e à qu a n t ida de de m oeda é n ecessá r io qu e ep = 0 3 seja
1 pd D 4
u n it á r io. E st a con diçã o é sa t isfeit a (ver p. 270) se eo = 0 ou se ew = 1.
E st a con diçã o sign ifica qu e a u n ida de de sa lá r ios, expr essa em t er m os
Dd W
de m oeda , sobe pr opor cion a lm en t e à dem a n da , vist o qu e ew = ;
Wd D
e a con diçã o eo = 0 qu er dizer qu e a pr odu çã o n ã o m a is r ea ge a o
Dd O
a u m en t o da dem a n da efet iva , vist o qu e eo = . E m a m bos os ca sos
Od D
a pr odu çã o per m a n ecer á in va r iá vel.
P odem os, em segu ida , exa m in a r o ca so em qu e a velocida de-r en da
n ã o é con st a n t e, in t r odu zin do a in da u m a n ova ela st icida de, a sa ber ,
a ela st icida de da dem a n da efet iva r ela t iva à s va r ia ções n a qu a n t ida de
de m oeda ,
MdD
ed = .
DdM

Isso n os dá
M dp
= ep . ed on de ep = 1 – ee . eo (1 – ew ) ;
pd M

de m odo qu e
e = ed – (1 – ew ) ed . ee eo

= ed (1 – ee eo + ee eo . ew )

/ Mdp2
on de e sem su fixo 0= 3 r epr esen t a o vér t ice dest a pir â m ide e m ede
1 pd M 4
a r ea çã o dos pr eços n om in a is à s va r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda .

286
KEYN ES

Vist o qu e est a ú lt im a expr essã o n os dá a pr opor çã o em qu e va r ia m


os pr eços em r espost a à va r ia çã o n a qu a n t ida de de m oeda , podem os
con sider á -la u m a expr essã o gen er a liza da da t eor ia qu a n t it a t iva da m oe-
da . P essoa lm en t e, n ã o dou m u it o va lor a m a n ipu la ções dest a espécie;
e qu er o r epet ir a a dver t ên cia feit a a n t er ior m en t e de qu e ela s im plica m
t a n t a s h ipót eses t á cit a s a r espeit o de qu a is va r iá veis se con sider a m
in depen den t es (ign or a n do com plet a m en t e a s difer en cia is pa r cia is)
qu a n t a s se fa zem n o r a ciocín io com u m , du vida n do a o m esm o t em po
qu e ela s n os levem m a is lon ge do qu e o r a ciocín io com u m . Ta lvez a
su a m a ior u t ilida de seja a de eviden cia r a gr a n de com plexida de da
r ela çã o en t r e os pr eços e a qu a n t ida de de m oeda , qu a n do t en t a m os
da r -lh e u m a expr essã o for m a l. Va le a pen a , en t r et a n t o, ch a m a r a a t en -
çã o pa r a os qu a t r o t er m os ed , ew , ee e eo qu e gover n a m o efeit o da s
va r ia ções da qu a n t ida de de m oeda sobr e os pr eços; ed r epr esen t a os
fa t or es de liqu idez qu e det er m in a m a dem a n da de m oeda em ca da
sit u a çã o; ew os elem en t os de t r a ba lh o (ou , m a is exa t a m en t e, os qu e
en t r a m n o cu st o pr im á r io) qu e det er m in a m a m edida n a qu a l os sa lá r ios
n om in a is sobem qu a n do o em pr ego a u m en t a ; e, en fim , ee e eo os fa t or es
físicos qu e det er m in a m a t a xa dos r en dim en t os decr escen t es qu a n do
se a ssocia m a is em pr ego a o equ ipa m en t o exist en t e.

Se o pú blico con ser va u m a pr opor çã o con st a n t e de seu s r en di-


m en t os em m oeda , ed = 1; se os sa lá r ios n om in a is fossem fixos, ew =
0; se h ou ver r en dim en t os con st a n t es, de m odo qu e o r en dim en t o m a r -
gin a l igu a le o r en dim en t o m édio, ee.eo = 1; e, se h ou ver plen o em pr ego
da m ã o-de-obr a ou do equ ipa m en t o, ee.eo = 0.
Nest e ca so, e = 1 se ed = 1 e ew = 1; ou se ed = 1, ew = 0 e ee.eo
= 0; ou se ed = 1 e eo = 0. E xist em , eviden t em en t e, ou t r os ca sos especia is
em qu e e = 1. P or ém , em ger a l, e n ã o igu a la a u n ida de; e t a lvez n ã o
h a ja in con ven ien t e em fa zer a gen er a liza çã o de qu e, segu n do h ipót eses
pla u síveis r ela t iva s a o m u n do r ea l, e exclu in do o ca so de u m a “fu ga
do din h eir o” (n o qu a l ed e ew a lca n ça m u m va lor a lt o), e é, via de r egr a ,
m en or qu e a u n ida de.
VII
At é a gor a n os ocu pa m os pr in cipa lm en t e da m a n eir a com o a s va -
r ia ções n a qu a n t ida de de m oeda in flu em n os pr eços a cu r t o pr a zo. Ma s
n ã o h a ver á , n os pr eços a lon go pr a zo, u m a r ela çã o m a is sim ples?
E st e é u m pr oblem a qu e se r ela cion a m a is com a gen er a liza çã o
h ist ór ica do qu e com a t eor ia pu r a . Se o est a do da pr efer ên cia pela
liqu idez dá pr ova s de cer t a t en dên cia pa r a a u n ifor m ida de a lon go
pr a zo, é m u it o possível qu e h a ja u m a r ela çã o in defin ida en t r e a r en da
n a cion a l e a qu a n t ida de de m oeda n ecessá r ia pa r a sa t isfa zer a pr efe-
r ên cia pela liqu idez, t om a da com o t er m o m édio dos per íodos de pes-
sim ism o e de ot im ism o em con ju n t o. P or exem plo, é possível qu e o

287
OS ECON OMIS TAS

pú blico n ã o con ser ve em per íodos lon gos e n a for m a de sa ldos ociosos
u m a som a su per ior a cer t a pr opor çã o ba st a n t e est á vel da r en da n a -
cion a l, desde qu e a t a xa de ju r os se m a n t en h a su per ior a cer t o m ín im o
psicológico, de t a l m odo qu e, se a qu a n t ida de de m oeda qu e excede a s
n ecessida des da cir cu la çã o a t iva u lt r a pa ssa r est a pr opor çã o da r en da
n a cion a l, h a ver á u m a t en dên cia , m a is cedo ou m a is t a r de, pa r a a qu eda
da t a xa de ju r os n a s pr oxim ida des dest e m ín im o. A t a xa de ju r os de-
cr escen t e a u m en t a r á , en t ã o, coeteris paribu s, a dem a n da efet iva , e a
cr escen t e dem a n da efet iva a lca n ça r á u m ou m a is dos pon t os sem icr í-
t icos, n os qu a is a u n ida de de sa lá r ios t en der á a m ost r a r u m a a lt a
descon t ín u a , com o efeit o cor r espon den t e sobr e os pr eços. As t en dên cia s
opost a s m a n ifest a r -se-ã o se a qu a n t ida de de m oeda exceden t e est iver
em pr opor çã o a n or m a l ba ixa com a r en da n a cion a l. Assim sen do, o
r esu lt a do líqu ido da s flu t u a ções ser á est a belecer , a pós cer t o t em po,
u m n ível m édio com pa t ível com a pr opor çã o est á vel qu e a psicologia
do pú blico t en de, m a is cedo ou m a is t a r de, a r est a belecer en t r e a qu a n -
t ida de de m oeda e a r en da n a cion a l.
E st a s t en dên cia s a t u a r ã o, pr ova velm en t e, com m en os fr icçã o n o
sen t ido a scen den t e qu e n o descen den t e. Se a qu a n t ida de de m oeda
con t in u a r sen do m u it o esca ssa por lon go t em po, por ém , a solu çã o ser á
en con t r a da , n or m a lm en t e, n a m u da n ça do pa dr ã o m on et á r io ou do
sist em a m on et á r io qu e a u m en t a r á a qu a n t ida de de m oeda , pr efer ivel-
m en t e a u m a com pen sa çã o da u n ida de de sa lá r ios qu e, con seqü en t e-
m en t e, a u m en t a r á a ca r ga dos débit os. Desse m odo, a dir eçã o dos m o-
vim en t os de pr eços em per íodos m u it o lon gos foi qu a se sem pr e a scen -
den t e. Isso por qu e, qu a n do o din h eir o é r ela t iva m en t e a bu n da n t e, a
u n ida de de sa lá r ios sobe e, qu a n do ele é r ela t iva m en t e esca sso, sem pr e
se en con t r a m m eios de a u m en t a r a qu a n t ida de efet iva da m oeda .
Du r a n t e o sécu lo XIX, o a cr éscim o da popu la çã o e da s in ven ções,
a explor a çã o de n ova s t er r a s, o est a do da con fia n ça e a fr eqü ên cia da s
gu er r a s (em m édia , diga m os, a ca da déca da ), ju n t a m en t e com a pr o-
pen sã o a con su m ir , pa r ecem t er sido su ficien t es pa r a m a n t er u m a cu r va
da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, qu e per m it e u m n ível m édio de em -
pr ego ba st a n t e sa t isfa t ór io pa r a ser com pa t ível com u m a t a xa de ju r os
su ficien t em en t e a lt a , a fim de ser psicologica m en t e a ceit á vel pelos pos-
su idor es de r iqu eza . H á evidên cia de qu e, por u m per íodo de a pr oxi-
m a da m en t e cen t o e cin qü en t a a n os, a t a xa n or m a l de ju r os a lon go
pr a zo n os pr in cipa is cen t r os fin a n ceir os foi de cer ca de 5% e a dos
t ít u los de pr im eir a or dem oscilou en t r e 3 e 3,5%, e qu e essa s t a xa s
de ju r os er a m ba st a n t e m ódica s pa r a su scit a r u m flu xo de in vest im en t o
com pa t ível com u m volu m e m édio de em pr ego r a zoa velm en t e ba ixo.
P or vezes, a u n ida de de sa lá r ios, por ém com m a is fr eqü ên cia o pa dr ã o
m on et á r io ou o sist em a m on et á r io (especia lm en t e a t r a vés do desen -
volvim en t o da m oeda ba n cá r ia ), a ju st a va -se pa r a a ssegu r a r qu e a qu a n -
t ida de de m oeda m edida em t er m os de sa lá r ios ba st a sse pa r a sa t isfa zer

288
KEYN ES

a pr efer ên cia n or m a l pela liqu idez, sem qu e a s t a xa s de ju r os r a r a m en t e


fossem in fer ior es à s cifr a s n or m a is in dica da s a n t es. A t en dên cia da
u n ida de de sa lá r ios er a , com o de h á bit o, fir m em en t e a scen den t e, m a s
a eficiên cia do t r a ba lh o a u m en t a va t a m bém . Nest a s con dições, o equ i-
líbr io de for ça s er a t a l qu e per m it ia u m gr a u r a zoá vel de est a bilida de
n os pr eços; a m édia qü in qü en a l m a is eleva da do ín dice de Sa u er beck,
en t r e 1820 e 1914, foi a pen a s 50% m a ior qu e a m édia m a is ba ixa . Ist o
n ã o foi a ciden t a l. Com r a zã o, a t r ibu iu -se est e fa t o a o equ ilíbr io de
for ça s n u m a época em qu e os gr u pos in dividu a is de em pr ega dor es er a m
ba st a n t e for t es pa r a evit a r qu e a t a xa de sa lá r ios su bisse m u it o m a is
depr essa qu e a eficiên cia da pr odu çã o, e n u m a época em qu e os sist em a s
m on et á r ios er a m , a o m esm o t em po, su ficien t em en t e flu idos e per m a -
n en t es pa r a a ssegu r a r u m a ofer t a m édia de m oeda , em t er m os de
u n ida des de sa lá r ios, pa r a per m it ir a m a n u t en çã o da t a xa m édia de
ju r os n o n ível m a is ba ixo qu e os possu idor es de r iqu eza pu dessem
a ceit a r , leva n do em con t a a s su a s pr efer ên cia s pela liqu idez. O n ível
m édio de em pr ego er a , sem dú vida , su bst a n cia lm en t e in fer ior a o do
plen o em pr ego, m a s n ã o t ã o in t oler a velm en t e a ba ixo do m esm o, a pon t o
de pr ovoca r m u da n ça s r evolu cion á r ia s.
H oje, e pr ova velm en t e n o fu t u r o, a cu r va da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l est á , por diver sa s r a zões, m u it o a ba ixo do qu e er a n o sécu lo
XIX. A a gu deza e a pecu lia r ida de de n ossos pr oblem a s con t em por â n eos
em a n a m , por t a n t o, do fa t o de qu e a t a xa m édia de ju r os com pa t ível
com u m volu m e m édio r a zoá vel de em pr ego pode ser in a ceit á vel pa r a
os possu idor es de r iqu eza , de for m a qu e seja im possível est a belecê-la
fa cilm en t e por m eio de sim ples m a n ipu la ções da qu a n t ida de de din h ei-
r o. E n qu a n t o se podia a lca n ça r u m n ível t oler á vel de em pr ego du r a n t e
u m a m édia de u m a , du a s ou t r ês déca da s, sim plesm en t e ga r a n t in do
u m a ofer t a a dequ a da de m oeda em u n ida des de sa lá r ios, m esm o o
sécu lo XIX pôde en con t r a r solu ções. Se est e fosse o n osso ú n ico pr oblem a
n a a t u a lida de — se u m gr a u su ficien t e de desva lor iza çã o fosse t u do
o qu e n ecessit a m os —, cer t a m en t e n ós, t a m bém , en con t r a r ía m os, h oje,
u m a solu çã o.
P or ém , o elem en t o m a is est á vel e o m a is difícil de m odifica r em
n ossa econ om ia con t em por â n ea t em sido a t é a gor a , e poder á con t in u a r
a sê-lo n o fu t u r o, a t a xa m ín im a de ju r os a ceit á vel pela m a ior ia dos
possu idor es de r iqu eza .159 Se u m n ível t oler á vel de em pr ego r equ er
u m a t a xa de ju r os m u it o in fer ior à s t a xa s m édia s qu e pr eva lecer a m
n o sécu lo XIX, é m u it o du vidoso qu e o m esm o possa ser a lca n ça do por
sim ples m a n ipu la ções da qu a n t ida de de m oeda . Da por cen t a gem de
lu cr o qu e a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l per m it e a o m u t u á r io
esper a r ga n h a r , t em de dedu zir -se (1) a despesa de pôr em con t a t o os

159 Cf. a m á xim a do sécu lo XIX, cit a da por Ba geh ot , segu n do a qu a l “J oh n Bu ll é ca pa z de


su por t a r m u it a s coisa s, m a s é in ca pa z de su por t a r u m a t a xa de ju r os de 2%”.

289
OS ECON OMIS TAS

m u t u á r ios e os m u t u a n t es, (2) o im post o sobr e a r en da e os im post os


a dicion a is e (3) a m a r gem qu e o m u t u a n t e exige pa r a cobr ir seu r isco
e in cer t eza , a n t es de ch ega r a o r en dim en t o líqu ido dispon ível pa r a
in du zir o possu idor de r iqu eza a sa cr ifica r a su a liqu idez. E m con dições
de u m a m édia t oler á vel de em pr ego, se est e r en dim en t o líqu ido r esu lt a
in fin it esim a l, os m ét odos con sa gr a dos pelo t em po podem m ost r a r -se
in efica zes.
P a r a volt a r a o n osso t ópico im edia t o, a r ela çã o exist en t e a lon go
pr a zo en t r e a r en da n a cion a l e a qu a n t ida de de m oeda depen der á da s
pr efer ên cia s pela liqu idez. E a est a bilida de dos pr eços em per íodo lon go
depen der á da r a pidez com qu e a u n ida de de sa lá r ios (ou m a is pr eci-
sa m en t e, a u n ida de de cu st os) t en de a cr escer com pa r a t iva m en t e à
eficiên cia do sist em a pr odu t ivo.

290
L IVRO S EXTO

B REVES N OTAS S U GERID AS P ELA T EORIA G ERAL


C AP ÍTU LO 22
N o ta s S o bre o Cic lo Ec o n ô m ic o

V ist o qu e pen sa m os t er dem on st r a do n os ca pít u los a n t er ior es o


qu e det er m in a o volu m e de em pr ego em qu a lqu er m om en t o, dedu z-se,
se est iver m os cer t os, qu e a n ossa t eor ia deve ser ca pa z de explica r o
fen ôm en o do ciclo econ ôm ico.
Qu a n do exa m in a m os em det a lh e qu a lqu er exem plo con cr et o do
ciclo econ ôm ico, con st a t a m os a su a gr a n de com plexida de, e pa r a a su a
explica çã o com plet a ser ã o n ecessá r ios t odos os elem en t os de n ossa a n á -
lise. Ver ifica -se, em especia l, qu e a s flu t u a ções n a pr open sã o a con su -
m ir , n o est a do da pr efer ên cia pela liqu idez e n a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l desem pen h a m t oda s o seu pa pel. Su gir o, t oda via , qu e o
ca r á t er essen cia l do ciclo econ ôm ico e, sobr et u do, a r egu la r ida de de
ocor r ên cia e du r a çã o, qu e ju st ifica m a den om in a çã o ciclo, se devem
pr in cipa lm en t e a o m odo com o flu t u a a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
Na m in h a m a n eir a de ver , o ciclo econ ôm ico deve, de pr efer ên cia , ser
con sider a do o r esu lt a do de u m a va r ia çã o cíclica n a eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, em bor a com plica do e fr eqü en t em en t e a gr a va do por m odifi-
ca ções qu e a com pa n h a m ou t r a s va r iá veis im por t a n t es do sist em a eco-
n ôm ico n o cu r t o pr a zo. O desen volvim en t o dest a t ese exigir ia a n t es
u m livr o qu e u m ca pít u lo, a lém de n ecessit a r u m a a n á lise m in u ciosa
dos fa t os; por ém , a s segu in t es br eves n ot a s ser ã o su ficien t es pa r a in -
dica r a lin h a de a n á lise qu e su ger e a n ossa t eor ia a n t er ior .
I
P or m ovim en t o cíclico qu er em os dizer qu e, qu a n do o sist em a evo-
lu i, por exem plo, em dir eçã o a scen den t e, a s for ça s qu e o im pelem pa r a
cim a a dqu ir em in icia lm en t e im pu lso e pr odu zem efeit os cu m u la t ivos
de m a n eir a r ecípr oca , m a s per dem gr a du a lm en t e a su a pot ên cia a t é
qu e, em cer t o m om en t o, t en dem a ser su bst it u ída s pela s for ça s qu e
oper a m em sen t ido opost o e qu e, por su a vez, a dqu ir em t a m bém in -
t en sida de du r a n t e cer t o t em po e for t a lecem -se m u t u a m en t e, a t é qu e,

293
OS ECON OMIS TAS

a lca n ça do o m á xim o desen volvim en t o, declin a m e cedem lu ga r à s for ça s


con t r á r ia s. Toda via , por m ovim en t o cíclico n ã o qu er em os dizer sim -
plesm en t e qu e essa s t en dên cia s a scen den t es e descen den t es, u m a vez
in icia da s, n ã o per sist a m in defin ida m en t e n a m esm a dir eçã o, m a s qu e
a ca ba m por in ver t er -se. Qu er em os dizer , t a m bém , qu e exist e cer t o gr a u
r econ h ecível de r egu la r ida de n a seqü ên cia e du r a çã o dos m ovim en t os
a scen den t es e descen den t es.
Con t u do, pa r a qu e a n ossa explica çã o seja a dequ a da , devem os
in clu ir ou t r a ca r a ct er íst ica do ch a m a do ciclo econ ôm ico, ou seja , o fe-
n ôm en o da crise — o fa t o de qu e a su bst it u içã o de u m a fa se a scen den t e
por ou t r a descen den t e ger a lm en t e ocor r e de m odo r epen t in o e violen t o,
a o pa sso qu e, com o r egr a , a t r a n siçã o de u m a fa se descen den t e pa r a
u m a fa se a scen den t e n ã o é t ã o r epen t in a .
Qu alqu er flu t u a çã o n o in vest im en t o, n ã o com pen sa da por u m a
va r ia çã o cor r espon den t e n a pr open sã o a con su m ir , r esu lt a , n ecessa r ia -
m en t e, n u m a flu t u a çã o n o em pr ego. P or t a n t o, da do qu e o flu xo de
in vest im en t o est á su jeit o a in flu ên cia s ba st a n t e com plexa s, é m u it o
im pr ová vel qu e t oda s a s flu t u a ções, t a n t o a s do pr ópr io in vest im en t o
com o a s da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, seja m de ca r á t er cíclico. Um
ca so especia l, a sa ber , o da s flu t u a ções a ssocia da s a os m ovim en t os da
pr odu çã o a gr ícola , ser á objet o de exa m e n u m a seçã o post er ior dest e
ca pít u lo. Toda via , n o ca so dos ciclos econ ôm icos t ípicos da econ om ia
in du st r ia l do sécu lo XIX, con sider o qu e h a ja cer t a s r a zões defin ida s
pa r a qu e a s flu t u a ções n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l t en h a m t ido
ca r a ct er íst ica s cíclica s. E ssa s r a zões n ã o sã o, em si m esm a s, n ova s,
m esm o com o explica ções dos ciclos econ ôm icos. Meu ú n ico pr opósit o
a qu i é r ela cion á -la s com a t eor ia pr eceden t e.
II

P osso desen volver m elh or o qu e t en h o a dizer com eça n do pela s


ú lt im a s et a pa s da expa n sã o e pelo com eço da “cr ise”.
Vim os a n t es qu e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l 160 depen de n ã o
a pen a s da a bu n dâ n cia ou da esca ssez exist en t e de ben s de ca pit a l e
do cu st o cor r en t e da pr odu çã o dos ben s de ca pit a l, m a s t a m bém da s
expect a t iva s cor r en t es r ela t iva s a o fu t u r o r en dim en t o dos ben s de ca -
pit a l. Con seqü en t em en t e, n o ca so dos ben s du r á veis, é n a t u r a l e r a -
zoá vel qu e a s expect a t iva s do fu t u r o desem pen h em u m pa pel pr epon -
der a n t e n a det er m in a çã o da esca la em qu e se ju lgu em r ecom en dá veis
n ovos in vest im en t os. Com o vim os, por ém , a s ba ses pa r a t a is expect a -
t iva s sã o m u it o pr ecá r ia s. F u n da da s em in dícios va r iá veis e in cer t os,
est ã o su jeit a s a va r ia ções r epen t in a s e violen t a s.

160 Qu a n do o con t ext o n ã o a pr esen t a possibilida de de n en h u m equ ívoco, é qu a se sem pr e m a is


con ven ien t e escr ever “a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l” qu a n do se qu er a pon t a r “a cu r va
da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l”.

294
KEYN ES

Ora, para explicar a “crise”, temos enfatizado que a taxa de juros


tende a subir sob o efeito de maior dem anda de m oeda, tanto para fins
de transações como para fins especulativos. Algum as vezes este fator pode,
certam ente, representar um papel de agravam ento e talvez, ocasional-
mente, de desencadeam ento. Creio que a explicação mais normal, e por
vezes a essencial, da crise não é prim ordialm ente uma alta taxa de juros,
mas um repentino colapso da eficiência marginal do capital.
As ú lt im a s et a pa s da expa n sã o sã o ca r a ct er iza da s por expect a -
t iva s ot im ist a s r ela t iva s a o r en dim en t o fu t u r o dos ben s de ca pit a l su -
ficien t em en t e for t es pa r a com pen sa r a a bu n dâ n cia cr escen t e desses
ben s, a a lt a de seu s cu st os de pr odu çã o e, pr ova velm en t e, t a m bém , a
a lt a t a xa de ju r os. É pr ópr io da n a t u r eza dos m er ca dos fin a n ceir os
or ga n iza dos, sob a in flu ên cia de com pr a dor es em su a m a ior ia ign or a n -
t es do qu e com pr a m e de especu la dor es m a is in t er essa dos n a s pr evisões
da pr óxim a m u da n ça de opin iã o do m er ca do do qu e n u m a est im a t iva
r a cion a l do fu t u r o r en dim en t o dos ben s de ca pit a l, qu e, qu a n do a de-
cepçã o a dvém a u m desses m er ca dos ot im ist a s em dem a sia , e su per a -
ba st ecidos, a s cot a ções desça m em m ovim en t o sú bit o e m esm o ca t a s-
t r ófico.161 Além disso, o pessim ism o e a in cer t eza a r espeit o do fu t u r o
qu e a com pa n h a m u m cola pso da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l su sci-
t a m , n a t u r a lm en t e, u m for t e a u m en t o da pr efer ên cia pela liqu idez e,
con seqü en t em en t e, u m a eleva çã o da t a xa de ju r os. Nest a s con dições,
o fa t o de a qu eda da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l ser fr eqü en t em en t e
a com pa n h a da por u m a eleva çã o da t a xa de ju r os pode a gr a va r ser ia -
m en t e o declín io do in vest im en t o. O essen cia l, por ém , de t a l est a do
de coisa s r eside, n ã o obst a n t e, n a qu eda da eficiên cia m a r gin a l do
ca pit a l, especia lm en t e n o ca so da s ca t egor ia s de ca pit a l qu e, n o cu r so
da fa se a n t er ior , m a is con t r ibu ír a m pa r a os n ovos in vest im en t os. A
pr efer ên cia pela liqu idez, excet o n a s su a s m a n ifest a ções a ssocia da s a o
a u m en t o da a t ivida de com er cia l e da especu la çã o, só com eça a a u m en t a r
após o desm or on a m en t o da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
É ist o qu e, de fa t o, t or n a a depr essã o t ã o in t r a t á vel. P ost er ior -
m en t e, u m declín io de t a xa de ju r os ser á de gr a n de a u xílio pa r a a
r ecu per a çã o e, pr ova velm en t e, u m a con diçã o n ecessá r ia da m esm a ,
m a s, de m om en t o, o cola pso da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l pode ser
t ã o com plet o qu e n en h u m a r edu çã o possível de t a xa de ju r os ba st e
pa r a o con t r a ba la n ça r . Se a r edu çã o da t a xa de ju r os con st it u ísse por
si m esm a u m r em édio efet ivo, a r ecu per a çã o poder ia ser con segu ida
n u m la pso de t em po r ela t iva m en t e cu r t o, e por m eios m a is ou m en os
dir et a m en t e sob con t r ole da a u t or ida de m on et á r ia . Isso, por ém , n ã o

161 E viden ciei (n o ca p. 12) qu e os in vest idor es pa r t icu la r es r a r a m en t e sã o dir et a m en t e r espon-


sá veis pela s in ver sões n ova s, em bor a os em pr esá r ios qu e t êm essa r espon sa bilida de ver i-
fiqu em ser fin a n ceir a m en t e va n t a joso e fr eqü en t em en t e obr iga t ór io con for m a r em -se com a s
idéia s do m er ca do, a in da qu e pessoa lm en t e est eja m m a is bem in for m a dos.

295
OS ECON OMIS TAS

cost u m a a con t ecer , n ã o sen do fá cil r ea n im a r a eficiên cia m a r gin a l do


ca pit a l, t a l com o a det er m in a a psicologia ca pr ich osa e in disciplin a da
do m u n do dos n egócios. É a volt a da con fia n ça , pa r a em pr ega r a lin -
gu a gem com u m , qu e se a figu r a t ã o difícil de con t r ola r n u m a econ om ia
de ca pit a lism o in dividu a list a . E st e é o a spect o da depr essã o qu e os
ba n qu eir os e os h om en s de n egócios in sist em , com r a zã o, em en fa t iza r ,
e a o qu a l os econ om ist a s cr en t es n a eficá cia de u m r em édio “pu r a m en t e
m on et á r io” n ã o dispen sa r a m a a t en çã o qu e m er ece.
Ist o m e fa z a lca n ça r o pon t o a qu e qu er o ch ega r . A explica çã o
do elem en to tem po n o ciclo econ ôm ico, o fa t o de qu e em ger a l t em de
decor r er u m la pso det er m in a do de t em po a n t es qu e se in icie a r ecu -
per a çã o, deve ser pr ocu r a da n a s in flu ên cia s qu e gover n a m a r ecu pe-
r a çã o da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. H á r a zões da da s, pr im eir o,
pela ext en sã o da vida ú t il dos ben s du r á veis em r ela çã o a o r it m o n or m a l
de cr escim en t o em cer t a época e, segu n do, pela s despesa s cor r en t es
de con ser va çã o dos est oqu es exceden t es, qu e explica m por qu e a du r a çã o
do m ovim en t o descen den t e deve t er u m a m a gn it u de qu e n ã o é for t u it a ,
qu e n ã o flu t u a en t r e, diga m os, u m a n o a gor a , e dez a n os a pr óxim a
vez, m a s a n t es eviden cia det er m in a da r egu la r ida de sit u a da en t r e, di-
ga m os, t r ês e cin co a n os.
Volt em os a o qu e ocor r e n a cr ise. E n qu a n t o a expa n sã o con t in u a ,
a m a ior ia dos n ovos in vest im en t os ofer ece u m r en dim en t o cor r en t e
qu e n ã o é in sa t isfa t ór io. A desilu sã o ch ega por qu e, de r epen t e, su r gem
dú vida s qu a n t o à con fia n ça qu e se pode t er n o r en dim en t o esper a do,
t a lvez por qu e o r en dim en t o a t u a l dê sin a is de ba ixa à m edida qu e os
est oqu es de ben s du r á veis pr odu zidos r ecen t em en t e a u m en t em r egu -
la r m en t e. Se se cr ê qu e os cu st os cor r en t es de pr odu çã o sã o m a is ele-
va dos do qu e poder ã o vir a ser fu t u r a m en t e, est a ser á m a is u m a r a zã o
pa r a a ba ixa da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. Um a vez su r gida , a
dú vida pr opa ga -se r a pida m en t e. Assim , n o com eço da depr essã o, exist e
pr ova velm en t e u m a boa pa r t e do ca pit a l qu e a pr esen t a u m a eficiên cia
m a r gin a l ín fim a ou m esm o n ega t iva , m a s o in t er va lo de t em po qu e
dever á decor r er a n t es qu e a esca ssez do ca pit a l pelo u so, a det er ior a çã o
e a obsolescên cia se t or n em ba st a n t e óbvia s pa r a a u m en t a r a eficiên cia
m a r gin a l pode ser u m a fu n çã o r ela t iva m en t e est á vel da du r a çã o m édia
do ca pit a l n u m a época da da . Se a s ca r a ct er íst ica s da época m u da m ,
o in t er va lo de t em po-pa dr ã o va r ia r á . Se, por exem plo, pa ssa r m os de
u m per íodo de a u m en t o a u m per íodo de declín io da popu la çã o, a fa se
ca r a ct er íst ica do ciclo se pr olon ga r á . Ma s t em os, n o qu e a n t ecede, u m a
r a zã o su bst a n cia l de por qu e exist e u m a r ela çã o defin ida liga n do a
du r a çã o da depr essã o à ext en sã o da vida ú t il dos ben s du r á veis e à
t a xa n or m a l de cr escim en t o em época det er m in a da .
O segu n do dos fa t or es qu e con du zem a est a est a bilida de de du -
r a çã o t em por a l se deve a os cu st os de con ser va çã o dos est oqu es exce-
den t es, qu e for ça m a su a a bsor çã o den t r o de cer t o per íodo, n em m u it o

296
KEYN ES

cu r t o n em m u it o lon go. A r epen t in a su spen sã o de n ovos in vest im en t os


depois da cr ise leva r á , pr ova velm en t e, a u m a a cu m u la çã o de est oqu es
de pr odu t os n ã o a ca ba dos. O cu st o de con ser va çã o dest es pr odu t os
r a r a m en t e é in fer ior a 10% a o a n o. Seu s pr eços devem , por t a n t o, ba ixa r
o ba st a n t e pa r a ca u sa r u m a r est r içã o da pr odu çã o qu e a ssegu r e a
r ea bsor çã o dos est oqu es exceden t es n u m pr a zo de, diga m os, t r ês a
cin co a n os. Or a , o pr ocesso de a bsor çã o dos est oqu es r epr esen t a u m
in vest im en t o n ega t ivo, qu e t a m bém con t r ibu i pa r a dim in u ir o em pr ego,
e, ch ega n do a seu t er m o, ca u sa u m con sider á vel a lívio.
Adem a is, a r edu çã o do ca pit a l cir cu la n t e, qu e n ecessa r ia m en t e
a com pa n h a o declín io da pr odu çã o, é u m n ovo fa t or , à s vezes im por -
t a n t e, de desin vest im en t o, e, qu a n do a r ecessã o se in st a lou , est e fa t or
exer ceu for t e in flu ên cia cu m u la t iva n o sen t ido da ba ixa . Nos pr im eir os
m om en t os de u m a depr essã o t ípica ver ifica -se pr ova velm en t e u m in -
vest im en t o n o a u m en t o dos est oqu es, qu e a ju da a com pen sa r o desin -
vest im en t o n o ca pit a l cir cu la n t e; n a fa se segu in t e pode h a ver u m cu r t o
per íodo de desin vest im en t o, t a n t o em est oqu es com o em ca pit a l cir cu -
la n t e; depois qu e se a lca n çou o n ível in fer ior da depr essã o a pa r ece,
em ger a l, u m desin vest im en t o su plem en t a r n os est oqu es qu e equ ilibr a
pa r cia lm en t e os r ein vest im en t os n o ca pit a l cir cu la n t e; e, fin a lm en t e,
qu a n do a r ecu per a çã o t iver a va n ça do ba st a n t e, a m bos os fa t or es ser ã o
sim u lt a n ea m en t e fa vor á veis a o in vest im en t o. É n est e cen á r io qu e con -
vém exa m in a r os efeit os a dicion a is devidos à s flu t u a ções do in vest i-
m en t o em ben s du r á veis. Qu a n do u m declín io n est a espécie de in ves-
t im en t o desen ca deia u m a flu t u a çã o cíclica , h a ver á pou ca s pr oba bilida -
des de r ecu per a çã o dos m esm os en qu a n t o o ciclo n ã o h ou ver per cor r ido
pa r t e de seu ca m in h o.162
In felizm en t e, u m a qu eda su bst a n cia l da eficiên cia m a r gin a l do
ca pit a l t en de, t a m bém , a a fet a r n ega t iva m en t e a pr open sã o a con su m ir ,
pois pr ovoca u m a ba ixa con sider á vel n o va lor do m er ca do de t ít u los.
Or a , est a ba ixa exer ce u m a in flu ên cia depr essiva sobr e a cla sse de
pessoa s qu e a com pa n h a m de per t o os seu s in vest im en t os n a bolsa de
va lor es, especia lm en t e qu a n do a plica m din h eir o em pr est a do. A dispo-
siçã o dessa s pessoa s pa r a ga st a r t a lvez depen da m a is da s a lt a s e ba ixa s
n o va lor de seu s in vest im en t os do qu e do est a do do flu xo de seu s
r en dim en t os. Com u m pú blico de “m en t a lida de a cion ist a ” com o o dos
E st a dos Un idos de h oje, u m m er ca do de t ít u los em a lt a pode ser con -
diçã o qu a se essen cia l pa r a u m a pr open sã o a con su m ir sa t isfa t ór ia ; e
est a cir cu n st â n cia , ger a lm en t e descon sider a da a t é h á pou co, ser ve ob-

162 Cer t a pa r t e da a r gu m en t a çã o em m in h a obr a T reatise on M on ey [J MK, v. V]. Livr o Qu a r t o,


gir a em t or n o dest e a ssu n t o.

297
OS ECON OMIS TAS

via m en t e pa r a a gr a va r m a is a in da o efeit o depr essivo de u m a ba ixa


n a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l.
Um a vez in icia da a r ecu per a çã o, a m a n eir a com o ela se a lim en t a
em si m esm a e se desen volve cu m u la t iva m en t e é óbvia . Na fa se des-
cen den t e, por ém , en qu a n t o h á por cer t o t em po exceden t es de ca pit a l
fixo e de est oqu es de m a t ér ia s-pr im a s e h á u m a r edu çã o do ca pit a l
cir cu la n t e, a cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l pode ba ixa r t a n t o
qu e dificilm en t e é possível cor r igi-la de m odo qu e a ssegu r e u m flu xo
sa t isfa t ór io de n ovos in vest im en t os por m eio de qu a lqu er r edu çã o exe-
qü ível n a t a xa de ju r os. Assim sen do, com os m er ca dos or ga n iza dos e
in flu en cia dos do m odo qu e se ver ifica a t u a lm en t e, a est im a t iva qu e
fa z o m er ca do da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l pode sofr er flu t u a ções
de t ã o gr a n de a m plit u de qu e dificilm en t e podem ser com pen sa da s por
flu t u a ções cor r espon den t es n a t a xa de ju r os. Além do m a is, con for m e
vim os a n t es, a s flu t u a ções da Bolsa de Va lor es podem en fr a qu ecer a
pr open sã o a con su m ir ju st a m en t e qu a n do ela é m a is n ecessá r ia . P or -
t a n t o, em con dições de laissez-faire, t a lvez seja im possível evit a r gr a n -
des flu t u a ções n o em pr ego sem u m a pr ofu n da m u da n ça n a psicologia
do m er ca do de in vest im en t os, m u da n ça essa qu e n ã o h á r a zã o pa r a
esper a r qu e ocor r a . E m con clu sã o, a ch o qu e n ã o se pode, com segu r a n ça ,
a ba n don a r à in icia t iva pr iva da o cu ida do de r egu la r o volu m e cor r en t e
de in vest im en t o.
III

A a n á lise a n t er ior pode pa r ecer de a cor do com a m a n eir a de ver


dos qu e pr et en dem qu e o sobr ein vest im en t o seja a ca r a ct er íst ica da
expa n sã o, qu e a a bst en çã o desse sobr ein vest im en t o seja o ú n ico m eio
de im pedir a depr essã o su bseqü en t e, e qu e, pelos m ot ivos a n t er ior es,
con qu a n t o a depr essã o n ã o possa ser evit a da por u m a ba ixa t a xa de
ju r os, a expa n sã o possa , n ã o obst a n t e, ser evit a da por u m a t a xa de
ju r os eleva da . H á , de fa t o, su bst â n cia n o a r gu m en t o de qu e u m a t a xa
de ju r os eleva da é m u it o m a is efica z con t r a o a u ge da expa n sã o do
qu e u m a t a xa de ju r os ba ixa o é con t r a u m a depr essã o.
E n t r et a n t o, dedu zir est a s con clu sões do qu e ficou dit o sign ifica r ia
u m a in t er pr et a çã o fa lsa de m in h a a n á lise e, a m eu ver , ser ia com et er
u m gr a ve er r o. Isso por qu e o t er m o sobr ein vest im en t o é a m bígu o. P ode
a plica r -se a os in vest im en t os dest in a dos a desa pon t a r a s expect a t iva s
qu e os in cit a r a m ou pa r a os qu a is n ã o h á lu ga r em per íodos de in t en so
desem pr ego, m a s pode t a m bém a plica r -se a u m a sit u a çã o ca r a ct er iza da
por t a l a bu n dâ n cia de ca pit a l qu e n ã o h a ja in vest im en t o n ovo a pa r en -
t em en t e ca pa z de, m esm o em con dições de plen o em pr ego, r en der n o
cu r so de su a du r a çã o m a is do qu e o seu cu st o de r eposiçã o. É a pen a s
n est e ú lt im o est a do de coisa s qu e h á sobr ein vest im en t o, est r it a m en t e

298
KEYN ES

fa la n do, n o sen t ido de qu e qu a lqu er in vest im en t o post er ior ser ia m er o


desper dício de r ecu r sos.163 Além disso, m esm o qu e o sobr ein vest im en t o
n esse sen t ido fosse u m a ca r a ct er íst ica n or m a l da fa se de a u ge da ex-
pa n sã o, o r em édio n ã o con sist ir ia em fa zer in cidir u m a eleva da t a xa
de ju r os, qu e pr ova velm en t e desa n im a r ia a lgu n s in vest im en t os ú t eis
e en fr a qu ecer ia a in da m a is a pr open sã o a con su m ir , m a s em t om a r
m edida s en ér gica s, com o por exem plo u m a n ova dist r ibu içã o dos r en -
dim en t os ou ou t r a qu a lqu er , a fim de est im u la r a pr open sã o a con su m ir .
N o en t a n t o, segu n d o a m in h a a n á lise, só n o pr im eir o sen t ido
é qu e o sobr ein vest im en t o pode ser con sider a do ca r a ct er íst ica do
per íodo d e a u ge da expa n sã o. A sit u a çã o qu e est ou in d ica n d o com o
t ípica n ã o é a qu ela em qu e o ca pit a l seja t ã o a bu n da n t e qu e a co-
m u n id a de em con ju n t o n ã o possa r a zoa velm en t e em p r ega r m a is n e-
n h u m , m a s a qu ela em qu e o in vest im en t o se efet u a em con dições
in st á veis e efêm er a s pelo fa t o de ser su scit a do p or expect a t iva s des-
t in a da s a m a logr a r .
P ode a con t ecer , n a t u r a lm en t e — e n a r ea lida de é pr ová vel qu e
a ssim seja —, qu e a s ilu sões da expa n sã o levem a pr odu zir cer t os t ipos
de ben s de ca pit a l em t a m a n h a a bu n dâ n cia qu e pa r t e da pr odu çã o
seja , in depen den t em en t e de qu a lqu er cr it ér io, u m desper dício de r e-
cu r sos — o qu e à s vezes se ver ifica , podem os a cr escen t a r , m esm o qu a n -
do n ã o h á expa n sã o. Qu er dizer , leva m a u m in vest im en t o m al orien -
tad o. Além disso, por ém , u m a ca r a ct er íst ica essen cia l do a u ge da ex-
pa n sã o é qu e os in vest im en t os qu e t er ã o u m r en dim en t o efet ivo de,
diga m os, 2% em con dições de plen o em pr ego se r ea liza m n a esper a n ça
de, diga m os, 6% e sã o a va lia dos n est a ba se. Qu a n do ch ega a desilu sã o,
est a expect a t iva é su bst it u ída por u m “er r o de pessim ism o” in ver so,
com o r esu lt a do de qu e se pa ssa a esper a r u m r en dim en t o n ega t ivo
dos in vest im en t os qu e em sit u a çã o de plen o em pr ego r en der ia m efe-
t iva m en t e 2%; o cola pso r esu lt a n t e do in vest im en t o n ovo qu e da í r esu lt a
leva en t ã o a u m est a do de desem pr ego n o qu a l os in vest im en t os, qu e
em sit u a çã o de plen o em pr ego t er ia m r en dido 2%, pa ssa m , de fa t o, a
r en der m en os qu e n a da . Ch ega -se a u m a sit u a çã o em qu e h á esca ssez
de ca sa s de m or a dia n a qu a l, t oda via , n in gu ém dispõe de m eios pa r a
viver n a s ca sa s qu e exist em .
Assim , o r em édio pa r a o a u ge da expa n sã o n ã o é a a lt a , m a s a
ba ixa da t a xa de ju r os!164 P ois a qu ela pode fa zer per du r a r o ch a m a do
a u ge da expa n sã o. O ver da deir o r em édio pa r a o ciclo econ ôm ico n ã o

163 Con t u do, em cer t a s h ipót eses com o a da dist r ibu içã o n o t em po da pr open sã o a con su m ir ,
os in vest im en t os qu e dã o u m r en dim en t o n ega t ivo poder ia m ser va n t a josos n o sen t ido de
qu e, pa r a a com u n ida de em con ju n t o, m a xim iza r ia m a sa t isfa çã o.
164 Ver a dia n t e (p. 301) a lgu n s a r gu m en t os qu e podem ser in voca dos em sen t ido con t r á r io. Se
for in viá vel, pois, fa zer gr a n des a lt er a ções n os n ossos m ét odos pr esen t es, eu con cor da r ia
em qu e a eleva çã o da t a xa de ju r os du r a n t e u m a fa se de boom poder ia ser , n a s con dições
a ssim con cebida s, u m m a l m en or .

299
OS ECON OMIS TAS

con sist e em evit a r o a u ge da s expa n sões e em m a n t er a ssim u m a


sem idepr essã o per m a n en t e, m a s em a bolir a s depr essões e m a n t er dest e
m odo per m a n en t em en t e em u m qu asi-boom !
O a u ge da expa n sã o qu e a ca ba por leva r a u m a cr ise r esu lt a ,
por t a n t o, da com bin a çã o de u m a t a xa de ju r os, qu e n u m est a do cor r et o
de expect a t iva ser ia dem a sia da m en t e a lt a pa r a per m it ir o plen o em -
pr ego, e de u m est a do en ga n oso de expect a t iva qu e, en qu a n t o du r a ,
im pede essa t a xa de ju r os de ser , de fa t o, u m obst á cu lo. O boom é
u m a sit u a çã o em qu e o excesso de ot im ism o t r iu n fa sobr e u m a t a xa
de ju r os qu e, ju lga da a sa n gu e-fr io, ser ia con sider a da a lt a dem a is.
E xcet o du r a n t e a gu er r a , du vido qu e h a ja a lgu m exem plo r ecen t e
de u m a expa n sã o ba st a n t e for t e qu e t en h a leva do a o plen o em pr ego.
Nos E st a dos Un idos, o em pr ego foi m u it o sa t isfa t ór io em 1928-29, ju l-
ga n do por pa dr ões n or m a is; m a s n ã o t ive pr ova s de n en h u m a esca ssez
de m ã o-de-obr a , a n ã o ser , t a lvez, em cer t os gr u pos de t r a ba lh a dor es
a lt a m en t e especia liza dos. Ver ifica r a m -se a lgu n s “est r a n gu la m en t os”,
m a s a pr odu çã o em con ju n t o a in da a pr esen t a va ca pa cida de pa r a a u -
m en t os u lt er ior es. Ta m bém n ã o h ou ve sobr ein vest im en t o n o sen t ido
de qu e os equ ipa m en t os-pa dr ã o e de h a bit a çã o fossem t ã o eleva dos
qu e t odos, su pon do qu e exist isse plen o em pr ego, t ivessem t u do qu e
deseja ssem à t a xa n ecessá r ia pa r a cobr ir o cu st o de r eposiçã o, sem
descon t o pa r a os ju r os, pelo t em po de du r a çã o da ca sa , e t a m pou co de
qu e os t r a n spor t es, os ser viços pú blicos e os m elh or a m en t os a gr ícola s
t ivessem a lca n ça do u m n ível em qu e n ovos in cr em en t os a o est oqu e
exist en t e n ã o pu dessem r a zoa velm en t e esper a r pr odu zir r en dim en t os
sequ er igu a is a seu cu st o de r eposiçã o. P elo con t r á r io, ser ia a bsu r do
pr et en der qu e n os E st a dos Un idos, em 1929, t en h a h a vido sobr ein ves-
t im en t o n o sen t ido est r it o da pa la vr a . A ver da deir a sit u a çã o er a de
n a t u r eza bem difer en t e. Os n ovos in vest im en t os, du r a n t e os cin co a n os
a n t er ior es, t in h a m -se, n a r ea lida de, r ea liza do em t ã o gr a n de esca la ,
em con ju n t o, qu e o r en dim en t o pr ová vel dos in vest im en t os su plem en -
t a r es, a n a lisa do com fr ieza , est a va deca in do r a pida m en t e. Um a pr evi-
sã o cor r et a t er ia depr im ido a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l a u m n ível
sem pr eceden t es de m odo qu e o boom n ã o poder ia t er con t in u a do em
ba ses fir m es, excet o com u m a t a xa de ju r os a lon go pr a zo m u it o ba ixa
e evit a n do in vest im en t os m a l dir igidos em det er m in a dos r a m os com
r isco de sobr eexplor a çã o. De fa t o, a t a xa de ju r os m a n t eve-se eleva da
o ba st a n t e pa r a desa n im a r os n ovos in vest im en t os, excet o n a qu eles
r a m os pa r t icu la r es qu e est a va m sob a in flu ên cia do est ím u lo especu -
la t ivo e qu e, con seqü en t em en t e, cor r ia m u m per igo especia l de ser em
su per explor a dos; u m a t a xa de ju r os su ficien t e pa r a r esist ir a o m ovi-
m en t o especu la t ivo t er ia , a o m esm o t em po, det ido qu a isqu er n ovos
in vest im en t os r a zoá veis. Nest a s con dições, a eleva çã o da t a xa de ju r os
com o a n t ídot o pa r a a sit u a çã o cr ia da pela per sist ên cia de u m flu xo

300
KEYN ES

a n or m a l de in vest im en t os per t en ce à ca t egor ia dos r em édios qu e cu r a m


a doen ça m a t a n do o pa cien t e.
É m u it o possível, n a ver da de, qu e a exist ên cia do em pr ego qu a se
plen o du r a n t e vá r ios a n os fosse a com pa n h a da , em pa íses t ã o r icos
com o a Gr ã -Br et a n h a ou os E st a dos Un idos, por u m flu xo de n ovos
in vest im en t os, a dm it in do a pr open sã o a con su m ir exist en t e, t ã o in t en so
qu e leva sse even t u a lm en t e a u m est a do de plen o em pr ego n o sen t ido
de n ã o poder m a is esper a r de u m n ovo in cr em en t o de ben s du r á veis
de qu a lqu er t ipo, segu n do cá lcu los r a zoá veis, u m r en dim en t o a gr ega do
br u t o su per ior a seu cu st o de r eposiçã o. Além do m a is, t a l est a do poder ia
a lca n ça r -se n u m fu t u r o r ela t iva m en t e pr óxim o — diga m os, den t r o de
vin t e e cin co a n os ou m en os. Nã o se deve pen sa r qu e n ego est a pos-
sibilida de qu a n do a fir m o ja m a is t er exist ido, sequ er m om en t a n ea m en -
t e, u m a sit u a çã o de plen o in vest im en t o, n o sen t ido est r it o da pa la vr a .
Aliá s, a in da qu e a s fa ses de expa n sã o da época con t em por â n ea
pu dessem leva r t em por a r ia m en t e a u m a sit u a çã o de plen o in vest im en t o
ou sobr ein vest im en t o n o sen t ido est r it o, con t in u a r ia sen do a bsu r do con -
sider a r u m a t a xa de ju r os m a is eleva da com o r em édio a dequ a do. E
isso por qu e n esse ca so fica r ia plen a m en t e con fir m a da a h ipót ese dos
qu e a t r ibu em a a n om a lia a o su bcon su m o. O r em édio con sist ir ia em
t om a r vá r ia s m edida s ca pa zes de a u m en t a r a pr open sã o a con su m ir
a t r a vés de u m a r edist r ibu içã o da r en da ou de u m pr ocesso sem elh a n t e
de m odo qu e da do volu m e de em pr ego pu desse ser m a n t ido com u m
volu m e de in vest im en t o m en or .
IV
Ta lvez con ven h a , n o pon t o a qu e ch ega m os, dizer u m a s pa la vr a s
sobr e a s im por t a n t es cor r en t es de pen sa m en t o qu e su st en t a m , de m a -
n eir a s difer en t es, qu e a t en dên cia cr ôn ica da s socieda des con t em por â -
n ea s pa r a o su bem pr ego deve t er su a ca u sa pr ocu r a da n o su bcon su m o,
qu er dizer , n os h á bit os socia is e n u m a dist r ibu içã o da r iqu eza qu e
r esu lt a m n u m a pr open sã o a con su m ir dem a sia do ba ixa .
Na s con dições a t u a is — ou , pelo m en os, n a s qu e pr eva lecer a m
a t é h á pou co —, em qu e o flu xo de in vest im en t o n ã o é pla n eja do n em
dir igido, a n t es se a ch a a ba n don a do a os ca pr ich os de u m a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l, qu e depen de da s opin iões pessoa is de in divídu os
n ã o con h ecedor es ou de especu la dor es, e à in flu ên cia de u m a t a xa de
ju r os a lon go pr a zo qu e r a r a s vezes, ou n u n ca , ba ixa a lém de u m n ível
con ven cion a l, essa s cor r en t es de pen sa m en t o, com o gu ia s de polít ica
pr á t ica , est ã o in du bit a velm en t e cer t a s. E m t a is con dições, pois, n ã o
h á ou t r o m eio ca pa z de leva r o volu m e m édio de em pr ego a u m n ível
m a is fa vor á vel. Se é m a t er ia lm en t e im pr a t icá vel a u m en t a r o in vest i-
m en t o, t or n a -se eviden t e n ã o h a ver ou t r os m eios de a lca n ça r u m n ível
m a ior de em pr ego a lém do de a u m en t a r o con su m o.
P r a t ica m en t e, a ú n ica difer en ça en t r e essa s cor r en t es de pen sa -

301
OS ECON OMIS TAS

m en t o e a m in h a é qu e n u m m om en t o em qu e h á a in da m u it a s va n -
t a gen s socia is a esper a r de u m a cr éscim o do in vest im en t o, ela s pa r ecem
da r u m a ên fa se u m t a n t o exa ger a da a o in cr em en t o do con su m o. Teo-
r ica m en t e, en t r et a n t o, podem os cr it icá -la s por descon sider a r o fa t o de
qu e h á d ois ca m in h os pa r a a u m en t a r a pr odu çã o. Mesm o se t ivéssem os
de decidir o qu e ser ia pr efer ível: a u m en t a r o ca pit a l m a is len t a m en t e
e con cen t r a r esfor ços n o a u m en t o do con su m o, dever ía m os t om a r essa
decisã o com m u it a pon der a çã o depois de con sider a r a ou t r a a lt er n a t iva .
Pessoalm ente, vejo de bom alvitre as grandes vantagens sociais que ad-
viriam do crescim ento do estoque de capital suficiente para pôr fim à sua
escassez, m as isso é um julgam ento prático e não um im perativo teórico.
Aliá s, est ou dispost o a a dm it ir qu e o m a is pr u den t e ser ia a va n ça r
em a m ba s a s fr en t es a o m esm o t em po. E m bor a pr ocu r a n do con segu ir
u m flu xo de in vest im en t o con t r ola do socia lm en t e com vist a à ba ixa
pr ogr essiva da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, est ou dispost o a a poia r ,
a o m esm o t em po, t oda sor t e de m edida s pa r a a u m en t a r a pr open sã o
a con su m ir . Com o é im pr ová vel qu e o plen o em pr ego possa ser m a n t ido
com a pr open sã o a con su m ir exist en t e, fa ça m os o qu e fizem os com
r ela çã o a o in vest im en t o. H á con dições, por t a n t o, pa r a qu e a m ba s a s
polít ica s fu n cion em ju n t a s; pr om over o in vest im en t o e a o m esm o t em po
o con su m o, n ã o a pen a s a t é o n ível qu e cor r espon der ia a o a cr éscim o
do in vest im en t o com a pr open sã o a con su m ir exist en t e, m a s t a m bém
a u m n ível a in da m a ior .
Se — em pr ega n do n ú m er os r edon dos pa r a ilu st r a r n osso r a cio-
cín io — o n ível m édio de pr odu çã o a t u a l fosse 15% in fer ior a o qu e
ser ia com o plen o em pr ego con t ín u o, e se 10% dest a pr odu çã o r epr e-
sen t a ssem o in vest im en t o líqu ido, e os r est a n t es 90% o con su m o — se
o in vest im en t o líqu ido t ivesse de su bir 50% pa r a con segu ir o plen o
em pr ego com a pr open sã o a con su m ir exist en t e, de m odo qu e com esse
em pr ego a pr odu çã o su bisse de 100 pa r a 115, o con su m o de 90 pa r a
100 e o in vest im en t o líqu ido de 10 pa r a 15 —, poder ía m os en t ã o pr o-
por -n os, t a lvez, m odifica r de t a l m a n eir a a pr open sã o a con su m ir qu e,
com o plen o em pr ego, o con su m o su bisse de 90 pa r a 103 e o in vest im en t o
líqu ido de 10 pa r a 12.
V

Ou t r a cor r en t e de pen sa m en t o en con t r a a solu çã o pa r a o ciclo


econ ôm ico n ã o n o a u m en t o do con su m o ou do in vest im en t o, m a s n a
dim in u içã o da ofer t a de m ã o-de-obr a qu e pr ocu r a em pr ego, ist o é, a l-
t er a n do a dist r ibu içã o do volu m e a t u a l de em pr ego sem a u m en t a r o
em pr ego n em a pr odu çã o.
Ist o m e pa r ece u m a polít ica pr em a t u r a — m u it o m a is cla r a m en t e
qu e o pla n o de a u m en t a r o con su m o. Ch ega u m m om en t o em qu e t odo
o in divídu o pon der a a s va n t a gen s de u m a u m en t o de la zer com a s de
u m a u m en t o de r en da , m a s pa r ece cla r o qu e a t u a lm en t e a gr a n de

302
KEYN ES

m a ior ia dos in divídu os pr efer e u m a u m en t o de r en da a u m a u m en t o


de la zer ; e n ã o vejo r a zões vá lida s pa r a obr iga r os qu e pr efer em m a is
r en da a goza r em de m a ior la zer .
VI

P ode pa r ecer est r a n h o qu e exist a u m a cor r en t e de pen sa m en t o


qu e t en h a com o r em édio pa r a o ciclo econ ôm ico r efr ea r o a u ge da ex-
pa n sã o em su a s pr im eir a s m a n ifest a ções por m eio de u m a eleva çã o
da t a xa de ju r os. O ú n ico a r gu m en t o qu e pode legit im a r sem elh a n t e
polít ica é o qu e n os ofer ece D. H . Rober t son , qu a n do pr et en de dizer
qu e o plen o em pr ego é u m idea l pr a t ica m en t e ir r ea lizá vel e qu e, qu a n do
m u it o, n os é lícit o esper a r u m n ível de em pr ego bem m a is est á vel qu e
o a t u a l e t a lvez ligeir a m en t e su per ior à m édia .
Se exclu ir m os a possibilida de de u m a r efor m a pr ofu n da da polít ica
n o qu e con cer n e t a n t o a o con t r ole do in vest im en t o qu a n t o a o da pr o-
pen sã o a con su m ir , e su pu ser m os, em lin h a s ger a is, u m a con t in u a çã o
do est a do de coisa s exist en t e, n ã o m e pa r ecer á a bsu r do a r gu m en t a r
qu e se con segu ir ia , em m édia , u m est a do m a is fa vor á vel da expect a t iva
a t r a vés de u m a polít ica ba n cá r ia qu e dest r u ísse sem pr e n o em br iã o o
in ício de u m per íodo de a u ge da expa n sã o por m eio de u m a t a xa de
ju r os su ficien t em en t e a lt a pa r a desen cor a ja r o ot im ism o m a l dir igido.
A desilu sã o qu a n t o à s expect a t iva s, ca r a ct er íst ica da depr essã o, pode
a ca r r et a r t a n t a per da e desper dício qu e o n ível m édio de in vest im en t os
ú t eis poder ia ser m a is eleva do se fosse a plica do a lgu m m ét odo dissu a -
sivo. É difícil a ssegu r a r se est a dou t r in a é ou n ã o cor r et a em su a s
h ipót eses, pois se t r a t a de u m a qu est ã o de a pr ecia çã o pr á t ica em qu e
fa lt a m os elem en t os de cer t eza . Ta lvez ela n ã o con sider e a s va n t a gen s
socia is der iva da s do a u m en t o do con su m o qu e a com pa n h a a t é m esm o
os in vest im en t os qu e se m ost r a m t ot a lm en t e m a l or ien t a dos, t en do-se
em vist a qu e t a is in vest im en t os podem ser m a is va n t a josos do qu e a
su a a u sên cia t ot a l. Nã o obst a n t e, a a u t or ida de m on et á r ia m a is lú cida
se en con t r a r ia em dificu lda des dia n t e de u m a expa n sã o com o a da
Am ér ica em 1929, n ã o t en do ou t r a s a r m a s a lém da s qu e dispu n h a
n a qu ele t em po o Sist em a de Reser va F eder a l, e n en h u m a da s a lt er -
n a t iva s a o seu a lca n ce logr a r ia m odifica r m u it o os r esu lt a dos. Seja
com o for , sem elh a n t e opin iã o pa r ece-m e per igosa e in u t ilm en t e der r o-
t ist a . Recom en da , ou pelo m en os su põe, pa r a a a ceit a çã o per m a n en t e,
dem a sia da s ca r a ct er íst ica s qu e sã o im per feit a s n o n osso sist em a eco-
n ôm ico a t u a l.
O pon t o de vist a a u st er o qu e pr econ iza a u t iliza çã o de u m a t a xa
de ju r os eleva da pa r a det er im edia t a m en t e qu a lqu er t en dên cia de ele-
va çã o a pr eciá vel n o n ível de em pr ego, diga m os, a lém da m édia da
déca da a n t er ior , a póia -se com m a is fr eqü ên cia em a r gu m en t os dest i-
t u ídos de ou t r a ba se qu e n ã o seja a con fu sã o da s idéia s. Decor r e, em
cer t os ca sos, da cr en ça de qu e n u m a expa n sã o o in vest im en t o t en de

303
OS ECON OMIS TAS

a u lt r a pa ssa r a pou pa n ça e de qu e u m a a lt a da t a xa de ju r os r est a -


belecer á o equ ilíbr io con t r a r ia n do o in vest im en t o, por u m la do, e es-
t im u la n do a pou pa n ça , por ou t r o la do. Isso su põe qu e a pou pa n ça e o
in vest im en t o podem ser desigu a is e ca r ece, por t a n t o, de sign ifica çã o
en qu a n t o est es t er m os n ã o for em defin idos n a lgu m sen t ido especia l.
Ou su ger e, a lgu m a s vezes, qu e o a u m en t o da pou pa n ça qu e a com pa n h a
o in vest im en t o cr escen t e n ã o é desejá vel n em ju st o, por qu e se a ch a ,
via de r egr a , a ssocia do a u m a a lt a de pr eços. Se a ssim fosse, por ém ,
qu alqu er eleva çã o n o n ível pr eva lecen t e da pr odu çã o e do em pr ego
dever ia ser con sider a da in desejá vel, pois a a lt a de pr eços; n ã o se deve
essen cia lm en t e a o a cr éscim o n o in vest im en t o, m a s a o fa t o de, n o cu r t o
pr a zo, o pr eço de ofer t a ger a lm en t e cr escer a o a u m en t a r a pr odu çã o,
qu er em r a zã o do fa t o físico dos r en dim en t os decr escen t es, qu er por qu e
o cu st o u n it á r io t en de a su bir em t er m os n om in a is qu a n do a pr odu çã o
a u m en t a . Se a sit u a çã o se ca r a ct er iza sse por u m pr eço de ofer t a con s-
t a n t e, n ã o h a ver ia , n a t u r a lm en t e, eleva çã o de pr eços, n ã o obst a n t e
isso com o n os ou t r os ca sos, a pou pa n ça cr escen t e a com pa n h a r ia o a cr és-
cim o do in vest im en t o. É o in cr em en t o da pr odu çã o qu e pr ovoca o a u -
m en t o da pou pa n ça ; a a lt a de pr eços n ã o pa ssa de u m su bpr odu t o
desse in cr em en t o, qu e t a m bém ocor r e qu a n do é a pr open sã o a con su m ir
e n ã o a pou pa n ça qu e a u m en t a . Nen h u m in t er esse con st it u ído legít im o
pode exigir qu e a s com pr a s se efet u em a pr eços ba ixos exclu siva m en t e
por qu e a pr odu çã o est á ba ixa .
Su põe-se t a m bém qu e o m a l seja devido a o fa t o de o a u m en t o
do in vest im en t o t er t ido or igem n u m a ba ixa do ju r o pr ovoca da por u m
a u m en t o n a qu a n t ida de de m oeda . Or a , a t a xa de ju r os pr eexist en t e
n ã o a pr esen t a n en h u m a vir t u de in t r ín seca e t a m pou co n in gu ém é “for -
ça do” a r et er o n ovo din h eir o — ele é cr ia do com o fim de sa t isfa zer
a m a ior pr efer ên cia pela liqu idez cor r espon den t e à m en or t a xa de ju r os
ou a o m a ior volu m e de t r a n sa ções, e é r et ido pelos in divídu os qu e
preferem con ser va r din h eir o a em pr est á -lo a u m a t a xa de ju r os m a is
r edu zida . Su ger e-se, a in da , qu e u m a expa n sã o é ca r a ct er iza da pelo
“con su m o de ca pit a l”, o qu e pr ova velm en t e sign ifica in vest im en t o lí-
qu ido n ega t ivo, ist o é, por u m a excessiva pr open sã o a con su m ir . A n ã o
ser qu e se t en h a m con fu n dido os fen ôm en os do ciclo econ ôm ico com
os da fu ga ou r ecu sa em r et er din h eir o qu e se ver ifica r a m n a E u r opa
du r a n t e os cola psos m on et á r ios post er ior es à Gu er r a , os fa t os in dica m
exa t a m en t e o con t r á r io. Além disso, m esm o qu e a ssim fosse, u m a r e-
du çã o n a t a xa de ju r os ser ia u m r em édio m a is pla u sível pa r a a s con -
dições de su bin vest im en t o do qu e a eleva çã o dessa t a xa . Nã o con sigo
en con t r a r n en h u m sen t ido n essa s cor r en t es de pen sa m en t o, sa lvo, t a l-
vez, a dm it in do a h ipót ese t á cit a de qu e a pr odu çã o a gr ega da seja in -
ca pa z de va r ia r . Toda via , u m a t eor ia qu e su põe u m a pr odu çã o con st a n t e
eviden t em en t e n ã o é de m u it a u t ilida de pa r a explica r o ciclo econ ôm ico.

304
KEYN ES

VII
Nos pr im eir os est u dos sobr e o ciclo econ ôm ico, especia lm en t e n os
de J evon s, a explica çã o foi coloca da n a s flu t u a ções a gr ícola s devida s
à s est a ções, m a is do qu e n os fen ôm en os da in dú st r ia . À lu z da t eor ia
a cim a , est a explica çã o do pr oblem a pa r ece ba st a n t e pla u sível, por qu e
m esm o n a época a t u a l a s flu t u a ções de u m a n o pa r a ou t r o dos est oqu es
de pr odu t os a gr ícola s con st it u em u m a da s ca u sa s pr in cipa is da s va -
r ia ções do in vest im en t o cor r en t e. E n t r et a n t o, n a época em qu e J evon s
escr eveu , e m a is a in da du r a n t e o per íodo a qu e se r efer em a s su a s
est a t íst ica s, est e fa t or pr eva leceu de m a n eir a con sider á vel sobr e t odos
os dem a is.
A t eor ia de J evon s de qu e o ciclo econ ôm ico se deve, pr im or dia l-
m en t e, à a bu n dâ n cia desigu a l da s colh eit a s pode ser r eexpost a da m a -
n eir a qu e segu e. Qu a n do a colh eit a é excepcion a lm en t e fa r t a em ger a l
fa z-se u m a a diçã o im por t a n t e a o est oqu e con ser va do pa r a os a n os fu -
t u r os. Os r esu lt a dos dest a a diçã o a cr escen t a m -se à r en da cor r en t e dos
a gr icu lt or es e sã o con sider a dos por est es com o u m a r en da en qu a n t o
esse in cr em en t o n ã o im plica sa n gr ia n os ga st os qu e os ou t r os set or es
da com u n ida de fa zem , sen ã o qu a n do fin a n cia dos pela pou pa n ça . Qu er
ist o dizer qu e o est oqu e su plem en t a r é u m a a diçã o a o in vest im en t o
cor r en t e. E st a con clu sã o n ã o se in va lida m esm o qu e os pr eços sofr a m
u m a qu eda a cen t u a da . De m a n eir a sem elh a n t e, qu a n do a colh eit a é
esca ssa , r ecor r e-se a os est oqu es a r m a zen a dos pa r a a t en der a o con su m o
cor r en t e, de m a n eir a qu e u m a pa r t e cor r espon den t e dos ga st os qu e os
con su m idor es fa zem de su a s r en da s n ã o cr ia n en h u m r en dim en t o cor -
r en t e pa r a os a gr icu lt or es. Qu er ist o dizer qu e o qu e se r et ir a dos
est oqu es im plica u m a r edu çã o cor r espon den t e n o in vest im en t o cor r en t e.
Nest a s con dições, se o in vest im en t o n os ou t r os r a m os da pr odu çã o for
con st a n t e, pode ser gr a n de a difer en ça n o in vest im en t o a gr ega do en t r e
u m a n o em qu e h a ja u m a a diçã o su bst a n cia l a os est oqu es e ou t r o em
qu e h a ja u m a r edu çã o su bst a n cia l dos m esm os; e, n u m a com u n ida de
on de a a gr icu lt u r a seja a a t ivida de pr edom in a n t e, est e fa t or ser á in -
com pa r a velm en t e m a is im por t a n t e qu e a s ou t r a s ca u sa s de va r ia çã o
do in vest im en t o. É , por t a n t o, n a t u r a l qu e a r ever sã o da s fa ses a scen -
den t es seja in dica da por boa s colh eit a s e a da s descen den t es pela s
colh eit a s m á s. O pa sso segu in t e dessa t eor ia , segu n do a qu a l exist ir ia m
ca u sa s física s qu e m ot iva m u m ciclo r egu la r de boa s e m á s colh eit a s,
é n a t u r a lm en t e a ssu n t o difer en t e qu e n ã o n os ca be t r a t a r a qu i.
Segu n do u m a t eor ia pr opost a m a is r ecen t em en t e, ser ia m a s m á s
colh eit a s e n ã o a s boa s qu e est im u la r ia m o com ér cio, por qu e in cit a m
a popu la çã o a t r a ba lh a r por u m sa lá r io r ea l m en or , ou por qu e se con -
sider a qu e u m a m u da n ça n a dist r ibu içã o da ca pa cida de a qu isit iva seja
fa vor á vel a o con su m o. É desn ecessá r io dizer qu e n ã o sã o est a s a s t eor ia s

305
OS ECON OMIS TAS

a qu e r ecor r o a o fa zer a descr içã o a n t er ior dos fen ôm en os da s colh eit a s


com o u m a explica çã o do ciclo econ ôm ico.
As ca u sa s a gr ícola s da s flu t u a ções t êm u m a im por t â n cia m u it o
m en or n o m u n do m oder n o, e isso por du a s r a zões. E m pr im eir o lu ga r ,
a pr odu çã o a gr ícola r epr esen t a u m a pa r cela m u it o pequ en a da pr odu çã o
t ot a l. E m segu n do lu ga r , o desen volvim en t o de u m m er ca do m u n dia l
pa r a a m a ior pa r t e dos pr odu t os a gr ícola s, qu e se a ba st ece n os dois
h em isfér ios, fa z com qu e, em m édia , se n eu t r a lizem os efeit os da s boa s
e da s m á s est a ções, sen do a por cen t a gem de flu t u a çã o sobr e o volu m e
da s colh eit a s m u n dia is m u it o m en or qu e a por cen t a gem de flu t u a çã o
cor r espon den t e à s dos pa íses in dividu a lm en t e. Nos t em pos a n t igos,
por ém , qu a n do u m pa ís depen dia pr in cipa lm en t e de su a s pr ópr ia s co-
lh eit a s, é difícil en con t r a r a lgu m a ca u sa de flu t u a çã o do in vest im en t o,
excet u a n do-se a gu er r a , qu e pu desse com pa r a r -se em im por t â n cia à s
va r ia ções n os est oqu es de pr odu t os a gr ícola s.
Ain da h oje é im por t a n t e pr est a r m a ior a t en çã o a o pa pel qu e r e-
pr esen t a m a s va r ia ções n os est oqu es de m a t ér ia s-pr im a s, t a n t o a gr í-
cola s com o m in er a is, n a det er m in a çã o da t a xa de in vest im en t o cor r en t e.
E u a t r ibu ir ia a len t a m a r ch a da r ecu per a çã o de u m a depr essã o, u m a
vez a lca n ça do o pon t o de r ever sã o, pr in cipa lm en t e a o efeit o defla cio-
n á r io da ba ixa dos est oqu es r edu n da n t es a os seu s volu m es n or m a is.
A pr in cípio, a a cu m u la çã o de est oqu es qu e m a r ca o fim da expa n sã o
m oder a a velocida de do cola pso; m a s t em os de pa ga r m a is t a r de esse
a lívio com a len t idã o da m a r ch a su bseqü en t e da r ecu per a çã o. Su cede,
à s vezes, qu e a r ecu per a çã o n ã o se fa ça sen t ir de m a n eir a a pr eciá vel
sen ã o qu a n do a r ea bsor çã o dos est oqu es t en h a sido vir t u a lm en t e con -
clu ída , pois u m flu xo de in vest im en t o em ou t r a s dir eções, ba st a n t e
pa r a pr odu zir u m m ovim en t o a scen den t e qu a n do n ã o h a ja desin vest i-
m en t o a t u a l n os est oqu es pa r a n eu t r a lizá -lo, pode ser in t eir a m en t e
in a dequ a do en qu a n t o per sist ir esse desin vest im en t o.
Vim os, n o m eu en t en der , n a s pr im eir a s fa ses do N ew Deal a m e-
r ica n o, u m exem plo n ot á vel dest e fen ôm en o. Qu a n do o P r esiden t e Roo-
sevelt en cet ou su bst a n cia is despesa s cober t a s por em pr ést im os, os es-
t oqu es de t oda s a s espécies — e n ot a da m en t e os de pr odu t os a gr ícola s
— a lca n ça va m a in da u m n ível m u it o a lt o. O N ew Deal con sist iu pa r -
cia lm en t e n u m esfor ço en ér gico pa r a r edu zir esses est oqu es por m eio
de r est r ições à pr odu çã o e por t odos os ou t r os m eios. A r edu çã o dos
est oqu es a u m n ível n or m a l er a u m pr ocesso n ecessá r io ou u m a fa se
qu e t in h a de ser su por t a da , m a s en qu a n t o du r ou , a sa ber , por u m ou
dois a n os, sign ificou su bst a n cia l a n u la çã o dos ga st os fin a n cia dos com
em pr ést im os qu e ocor r er a m em ou t r os t em pos. Só qu a n do essa fa se
se com plet ou , ficou a ber t o o ca m in h o pa r a su a r ecu per a çã o su bst a n cia l.
A exper iên cia r ecen t e dos E st a dos Un idos da Am ér ica pr opor cio-
n ou t a m bém bon s exem plos do pa pel qu e a s flu t u a ções dos est oqu es
de pr odu t os a ca ba dos ou n ã o a ca ba dos — de “in ven t á r ios”, com o é

306
KEYN ES

cost u m e ch a m á -los a gor a — exer cem n a ca u sa çã o da s oscila ções m e-


n or es qu e se sobr epõem a o m ovim en t o pr in cipa l do ciclo econ ôm ico.
Os fa br ica n t es, qu a n do est a belecem a esca la de pr odu çã o segu n do
o volu m e de con su m o qu e pr evêem pa r a a lgu n s m eses m a is t a r de,
su jeit a m -se a com et er p equ en os er r os de cá lcu lo, ger a lm en t e n o sen -
t ido d e a dia n t a r -se u m p ou co a os fa t os. Qu a n do eles descobr em o
er r o, sã o obr iga dos, por a lgu m t em po, a m a n t er -se n u m n ível de
pr odu çã o in fer ior a o do con su m o cor r en t e, de m odo qu e se pr odu za
a a bsor çã o dos in ven t á r ios exced en t es; e a d ifer en ça de r it m o en t r e
a d ia n t a r -se u m pou co e a t r a sa r ou t r a vez t em dem on st r a do in flu ir
ba st a n t e n o flu xo de in vest im en t o cor r en t e pa r a se d est a ca r com
ba st a n t e n it idez n o qu a dr o da s excelen t es e com plet a s est a t íst ica s
de qu e a gor a d ispõem os E st a dos U n idos.

307
C AP ÍTU LO 23
N o ta s S o bre o Me rc a n tilis m o , a s Le is Co n tra a U s u ra , o
D in h e iro Ca rim ba d o e a s Te o ria s d o S u bc o n s u m o

D u r a n t e cer ca de du zen t os a n os, t a n t o os t eór icos da econ om ia


com o os h om en s de n egócios for a m u n â n im es em a dm it ir qu e u m a
ba la n ça com er cia l fa vor á vel t in h a va n t a gen s especia is, e u m a ba la n ça
desfa vor á vel con st it u ía gr a ve per igo sobr et u do qu a n do pr ovoca va a sa í-
da de m et a is pr eciosos. Nos ú lt im os cem a n os, por ém , su r giu u m a
sér ia diver gên cia de opin iões. Na m a ior ia dos pa íses, qu a se t odos os
est a dist a s e h om en s de bom sen so, e m esm o n a Gr ã -Br et a n h a , ber ço
da con cepçã o opost a , qu a se a m et a de deles se m a n t eve fiel à a n t iga
dou t r in a , a o pa sso qu e os t eór icos da econ om ia , em su a m a ior ia , a fir -
m a m qu e a s pr eocu pa ções dest a or dem ca r ecem de fu n da m en t o, sa lvo
se a dot a r m os u m pon t o de vist a m u it o lim it a do, vist o o m eca n ism o do
com ér cio ext er n o ser de a ju st e a u t om á t ico e a s t en t a t iva s pa r a dir igi-lo
ser em n ã o a pen a s fú t eis, m a s t a m bém de n a t u r eza a em pobr ecer em
qu em a s pr a t ica , por a n u la r em a s va n t a gen s da divisã o in t er n a cion a l
do t r a ba lh o. Ser á con ven ien t e, de a cor do com a t r a diçã o, ch a m a r a
velh a cor r en t e de opin iã o de m ercan tilism o, e a m a is r ecen t e de livre-
com ércio, em bor a est es t er m os deva m in t er pr et a r -se com r efer ên cia a o
con t ext o, pois ca da u m deles t em u m sen t ido a m plo e ou t r o r est r it o.
F a la n do em t er m os ger a is, os econ om ist a s m oder n os su st en t a m
n ã o só qu e h á , via de r egr a , u m sa ldo posit ivo r esu lt a n t e da divisã o
in t er n a cion a l do t r a ba lh o qu e se sobr epõe à s va n t a gen s qu e r a zoa vel-
m en t e poder ia r eivin dica r a escola m er ca n t ilist a , m a s t a m bém qu e o
r a ciocín io da escola m er ca n t ilist a se fu n da m en t a , do pr in cípio a o fim ,
n u m a con fu sã o in t elect u a l.
Ma r sh a ll,165 por exem plo, em bor a n em t oda s a s su a s r efer ên cia s

165 Ver In d u stry an d T rad e. Apên dice D; M on ey, Cred it an d Com m erce. p. 130; e Prin ciples
of E con om ics. Apên dice I.

309
OS ECON OMIS TAS

a o m er ca n t ilism o seja m a dver sa s, a bst ém -se de exa m in a r com o t a l a


su a t eor ia bá sica e n em sequ er m en cion a os elem en t os de ver da de qu e
n ela podem ser en con t r a dos, con for m e exa m in a r em os m a is a dia n t e.166
Da m esm a for m a , a s con cessões t eór ica s qu e os econ om ist a s pa r t idá r ios
do livr e-com ér cio con cor da r a m em fa zer n a s con t r ovér sia s con t em po-
r â n ea s sobr e, por exem plo, o est ím u lo à s in dú st r ia s n a scen t es ou a
m elh or ia dos t er m os do com ér cio n ã o in t er essa m à pr ópr ia su bst â n cia
do pen sa m en t o m er ca n t ilist a . Du r a n t e a s discu ssões fisca is do pr im eir o
qu a r t el dest e sécu lo, n ã o r ecor do qu e n en h u m a con cessã o ja m a is t en h a
sido feit a pelos econ om ist a s a o pr in cípio de qu e a pr ot eçã o pode a u -
m en t a r o em pr ego n u m pa ís. Ta lvez o m a is ju st o seja cit a r com o exem -
plo o qu e eu m esm o escr evi. Ain da em 1923, com o discípu lo fiel da
escola clá ssica qu e de m odo a lgu m pu n h a em dú vida o qu e m e h a via
sido en sin a do e t u do a ceit a va sem r eser va sobr e est a m a t ér ia , escr evi:
“Se h á u m a coisa qu e a P r ot eçã o n ão pode fa zer é su pr im ir
o Desem pr ego... E xist em em fa vor da P r ot eçã o a lgu n s a r gu m en t os
ba sea dos em va n t a gen s possíveis, em bor a im pr ová veis, pa r a os
qu a is n ã o h á r espost a fá cil. Ma s pr et en der qu e ela cu r e o De-
sem pr ego im plica o sofism a P r ot ecion ist a em su a for m a m a is
cr u a e gr osseir a ”.167
Qu a n t o à t eor ia m er ca n t ilist a m a is a n t iga , n ã o se dispu n h a de
u m a in t er pr et a çã o in t eligen t e e fom os leva dos a a cr edit a r qu e se t r a t a va
de coisa pr a t ica m en t e sem n en h u m sen t ido. Ta l er a o dom ín io sober a n o
e a bsolu t o qu e exer cia a escola clá ssica .
II

Desejo expor , em pr im eir o lu ga r , o qu e a gor a m e pa r ece h a ver


de ver da de cien t ífica n a dou t r in a m er ca n t ilist a . E m segu ida com pa r a -
r em os essa exposiçã o com os a r gu m en t os efet iva m en t e em pr ega dos pe-
los m er ca n t ilist a s. Deve-se t er pr esen t e qu e a s va n t a gen s pr ocla m a da s
sã o con fessa da m en t e de ca r á t er n a cion a l e t êm pou ca pr oba bilida de
de ben eficia r o m u n do em seu con ju n t o.
Qu a n do u m a n a çã o est á a u m en t a n do a su a r iqu eza com cer t a
r a pidez, su cede qu e em r egim e de laissez-faire est e feliz est a do de
coisa s pode ser in t er r om pido por in su ficiên cia de est ím u lo pa r a n ovos
in vest im en t os. Da dos o m eio socia l e polít ico e a s ca r a ct er íst ica s n a -
cion a is qu e det er m in a m a pr open sã o a con su m ir , o bem -est a r de u m a

166 Su a opin iã o sobr e os m er ca n t ilist a s est á bem r esu m ida n a n ot a à pr im eir a ediçã o de su a
obr a Prin ciples, p. 51: “Nu m er osos est u dos for a m dedica dos, n a In gla t er r a e n a Alem a n h a ,
à s idéia s da Ida de Média sobr e a s r ela ções en t r e a m oeda e a r iqu eza n a cion a l. E m ger a l,
devem ser con sider a dos con fu sos por fa lt a de u m a idéia cla r a da s fu n ções da m oeda , m a is
do qu e ju lga dos fa lsos por ser em ba sea dos n a h ipót ese explícit a de qu e o a u m en t o da s
r eser va s de m et a is pr eciosos é a ú n ica coisa qu e pode a u m en t a r a r iqu eza de u m a n a çã o”.
167 T h e N ation an d th e Ath en aeu m . 24 de n ovem br o de 1923 [J MK, v. XVIII].

310
KEYN ES

n a çã o pr ogr essiva depen de essen cia lm en t e, pela s r a zões já expost a s,


da su ficiên cia de t a is est ím u los. E st es podem ser en con t r a dos t a n t o
n os in vest im en t os in t er n os qu a n t o n os ext er n os (in clu in do n os ú lt im os
a a cu m u la çã o de m et a is pr eciosos), qu e, ju n t os, com põem o in vest im en t o
a gr ega do. Se o volu m e de in vest im en t o a gr ega do a pen a s obedece a o
m ot ivo de lu cr o, a t a xa de ju r os n a cion a l é qu e a ca ba gover n a n do o
volu m e dos in vest im en t os in t er n os, en qu a n t o o sa ldo cr edor da ba la n ça
com er cia l det er m in a , n ecessa r ia m en t e, o volu m e do in vest im en t o ex-
t er n o. Assim sen do, n u m a socieda de on de n ã o exist a possibilida de de
in ver sã o dir et a sob a égide da a u t or ida de pú blica , os objet ivos econ ô-
m icos qu e devem legit im a m en t e pr eocu pá -la sã o a t a xa de ju r os in t er n a
e o ba la n ço do com ér cio ext er ior .
Or a , se a u n ida de de sa lá r ios for r ela t iva m en t e est á vel e n ã o
fica r su jeit a a va r ia ções espon t â n ea s de gr a n de a m plit u de (con diçã o
est a qu e qu a se sem pr e se sa t isfa z), se o est a do da pr efer ên cia pela
liqu idez a pr esen t a r cer t a est a bilida de n o decor r er de su a s flu t u a ções
a cu r t o pr a zo e se a s pr á t ica s ba n cá r ia s for em , t a m bém , ba st a n t e es-
t á veis, a t a xa de ju r os t en der á a depen der do m on t a n t e de m et a is
pr eciosos, m edido em u n ida des de sa lá r ios, dispon ível pa r a sa t isfa zer
o desejo de liqu idez da com u n ida de. Ao m esm o t em po, n u m a er a em
qu e os em pr ést im os su bst a n cia is n o est r a n geir o e a pr opr ieda de dir et a
dos ben s sit u a dos n o ext er ior sã o dificilm en t e pr a t icá veis, a s a lt a s ou
ba ixa s n a qu a n t ida de de m et a is pr eciosos depen der ã o, pr in cipa lm en t e,
do ca r á t er fa vor á vel ou desfa vor á vel da ba la n ça com er cia l.
Ocor r e, a ssim , qu e a pr eocu pa çã o da s a u t or ida des por u m a ba -
la n ça com er cia l fa vor á vel ser viu a am bos os pr opósit os, e foi, a lém
disso, o ú n ico m eio dispon ível de pr om ovê-los. Nu m a época em qu e
essa s a u t or ida des n ã o t in h a m con t r ole dir et o sobr e a t a xa de ju r os
in t er n a n em sobr e os ou t r os est ím u los pa r a o in vest im en t o n a cion a l,
a s m edida s pa r a a u m en t a r o sa ldo fa vor á vel da ba la n ça com er cia l er a m
o ú n ico m eio d ireto de qu e dispu n h a m pa r a a u m en t a r o in vest im en t o
ext er n o; a o m esm o t em po, a s en t r a da s de m et a is pr eciosos r esu lt a n t es
de u m a ba la n ça com er cia l fa vor á vel er a m os ú n icos m eios in d iretos de
r edu zir a t a xa de ju r os in t er n a e a u m en t a r a ssim o est ím u lo pa r a
in ver sões den t r o do pa ís.
O êxit o de t a l polít ica , en t r et a n t o, est á su jeit o a du a s lim it a ções
qu e n ã o devem ser esqu ecida s. Se a t a xa de ju r os in t er n a descer t a n t o
qu e o volu m e de in vest im en t o seja su ficien t em en t e est im u la do pa r a
eleva r o em pr ego pa r a a lém do n ível cr ít ico n o qu a l a u n ida de de
sa lá r ios se eleva , o a u m en t o do n ível in t er ior de cu st os com eça r á a
exer cer u m a a çã o desfa vor á vel sobr e a ba la n ça de com ér cio ext er n o,
de m a n eir a qu e o esfor ço pa r a m elh or a r est a ba la n ça t er á ido lon ge
dem a is e se a n u la r á a si m esm o. P or seu t u r n o, se a difer en ça en t r e
a t a xa de ju r os in t er n a e ext er n a for ba st a n t e gr a n de pa r a pr ovoca r
em pr ést im os ext er n os despr opor cion a dos com a ba la n ça fa vor á vel, pode

311
OS ECON OMIS TAS

r esu lt a r da í u m êxodo de m et a is pr eciosos su ficien t e pa r a a n u la r a s


va n t a gen s a n t er ior m en t e obt ida s. O r isco de qu a lqu er dest a s lim it a ções
se t or n a r r ea lida de, qu a n do se t r a t a de u m pa ís gr a n de e de im por t â n cia
in t er n a cion a l, com pr odu çã o cor r en t e de m et a is pr eciosos em esca la
r ela t iva m en t e pequ en a , é devido a o flu xo de din h eir o pa r a u m pa ís e
a o êxodo de din h eir o em ou t r o; os efeit os a dver sos dos cu st os cr escen t es
e da s t a xa s de ju r os decr escen t es n o m er ca do dom ést ico podem , por -
t a n t o, a cen t u a r -se (ca so a polít ica m er ca n t ilist a seja a m pla m en t e exe-
cu t a da ) pelos cu st os decr escen t es e a s t a xa s de ju r os a scen den t es n o
ext er ior .
A h ist ór ia econ ôm ica da E spa n h a n os fin s do sécu lo XV e du r a n t e
o sécu lo XVI for n ece-n os o exem plo de u m pa ís cu jo com ér cio ext er n o
foi dest r u ído pela eleva çã o da t a xa de sa lá r ios r esu lt a n t e de u m a ex-
cessiva a bu n dâ n cia de m et a is pr eciosos. A Gr ã -Br et a n h a , n os a n os do
sécu lo XX a n t er ior es à Gu er r a , pr opor cion a -n os o exem plo de u m pa ís
on de a s excessiva s fa cilida des con cedida s a os em pr ést im os ext er n os e
a com pr a de pr opr ieda des n o est r a n geir o im pedir a m , fr eqü en t em en t e,
a qu eda da t a xa dom ést ica de ju r os n ecessá r ia pa r a a ssegu r a r o plen o
em pr ego n o pa ís. A h ist ór ia da Ín dia em t odos os t em pos for n ece o
exem plo de u m pa ís em pobr ecido por u m a pr efer ên cia pela liqu idez
m ot iva da por u m a pa ixã o t ã o for t e qu e, a pesa r de u m a flu xo en or m e
e per m a n en t e de m et a is pr eciosos, a t a xa de ju r os n ã o pôde ba ixa r a
u m n ível com pa t ível com o cr escim en t o da r iqu eza r ea l.
Nã o obst a n t e isso, se con sider a r m os u m a socieda de com u m a
u n ida de de sa lá r io m a is ou m en os est á vel e com ca r a ct er íst ica s n a cio-
n a is su ficien t es pa r a det er m in a r a pr open sã o a con su m ir e a pr efer ên cia
pela liqu idez, e com u m sist em a m on et á r io qu e r ela cion e, de m a n eir a
r ígida , a qu a n t ida de de m oeda com os est oqu es de m et a is pr eciosos,
a m a n u t en çã o da pr osper ida de exige qu e a s a u t or ida des obser vem , de
m u it o per t o, o est a do da ba la n ça com er cia l, por qu e u m a ba la n ça fa -
vor á vel, desde qu e n ã o excessiva , pode ser u m gr a n de est ím u lo, a o
pa sso qu e u m a ba la n ça desfa vor á vel pode leva r r a pida m en t e a u m
est a do de depr essã o per sist en t e.
Ist o n ã o sign ifica qu e u m a r est r içã o m á xim a da s im por t a ções
con du za a u m a ba la n ça com er cia l m a is fa vor á vel. Os pr im eir os m er -
ca n t ilist a s en fa t iza r a m m u it o est e pon t o, e m u it a s vezes ch ega r a m a
opor a s r est r ições com er cia is por qu e com o t em po essa s r est r ições vir ia m
a obst a r u m a ba la n ça fa vor á vel. P ode-se, sem dú vida , a r gu m en t a r qu e
n a s cir cu n st â n cia s especia is em qu e se a ch a va a Gr ã -Br et a n h a n os
m ea dos do sécu lo XIX, a liber da de com er cia l qu a se a bsolu t a er a a
polít ica m a is a dequ a da a leva r a u m a ba la n ça fa vor á vel. A exper iên cia
con t em por â n ea de r est r ições com er cia is n a E u r opa de pós-gu er r a ofe-
r ece n u m er osos exem plos de im pedim en t os m a l con cebidos con t r a a
liber da de qu e, dest in a dos a m elh or a r a ba la n ça fa vor á vel, pr odu zir a m ,
de fa t o, o r esu lt a do in ver so.

312
KEYN ES

P or est a s e ou t r a s r a zões, o leit or n ã o deve t ir a r con clu sões pr e-


m a t u r a s r ela t iva m en t e à polít ica prática a qu e con du z o n osso r a cio-
cín io. H á for t es pr esu n ções de ca r á t er ger a l con t r a a s r est r ições co-
m er cia is, a m en os qu e ela s possa m ser ju st ifica da s por r a zões especia is.
As va n t a gen s da divisã o in t er n a cion a l do t r a ba lh o sã o r ea is e su bs-
t a n cia is, a pesa r de a escola clá ssica a s t er exa ger a do en or m em en t e.
O fa t o de u m a va n t a gem pr opor cion a da a u m pa ís por u m a ba la n ça
fa vor á vel a ca r r et a r u m pr eju ízo igu a l ca u sa do a ou t r o pa ís (fa t o de
qu e os m er ca n t ilist a s t in h a m plen a con sciên cia ) n ã o sign ifica a pen a s
qu e se t or n a n ecessá r ia u m a gr a n de m oder a çã o pa r a qu e n en h u m pa ís
r et en h a u m est oqu e de m et a is pr eciosos su per ior à su a pa r t e legít im a
e r a zoá vel, m a s t a m bém qu e u m a polít ica im oder a da pode desen ca dea r
u m a a bsu r da com pet içã o in t er n a cion a l por u m a ba la n ça fa vor á vel n o-
civa pa r a t odos sem exceçã o.168 E , fin a lm en t e, a polít ica de r est r ições
com er cia is é u m in st r u m en t o per igoso m esm o qu a n do u t iliza do pa r a
os seu s objet ivos ost en sivos, vist o qu e os in t er esses pa r t icu la r es, a
in com pet ên cia a dm in ist r a t iva e a dificu lda de in t r ín seca da t a r efa po-
dem desviá -la e levá -la a pr odu zir r esu lt a dos dir et a m en t e opost os a os
pr et en didos.
Assim sen do, o peso de m in h a cr ít ica é dir igido con t r a a in a de-
qu a çã o da s ba ses teóricas da dou t r in a do laissez-faire, qu e m e foi en -
sin a da e qu e eu en sin ei du r a n t e m u it os a n os; con t r a a idéia de qu e a
t a xa de ju r os e o volu m e de in vest im en t os se a ju st a m a u t om a t ica m en t e
a o n ível ót im o, de m odo qu e t oda a pr eocu pa çã o com a ba la n ça com er cia l
seja u m a per da d e t em po, pois n ós, pr ofessor es de E con om ia , n os
t or n a m os cu lpa dos do pr esu n çoso er r o de con sider a r obsessã o p u er il
o qu e d u r a n t e sécu los foi o objet ivo p r in cipa l da a r t e pr á t ica de
gover n a r .
Sob a in flu ên cia dest a t eor ia fa lh a , a “Cit y” de Lon dr es gr a du a l-
m en t e desen volveu a t écn ica m a is per igosa qu e se possa im a gin a r pa r a
a m a n u t en çã o do equ ilíbr io, ou seja , a de a ssocia r a t écn ica da t a xa
ba n cá r ia com u m a pa r ida de r ígida do câ m bio. Ist o sign ificou qu e o
objet ivo de m a n t er u m a t a xa in t er n a de ju r os com pa t ível com o plen o
em pr ego foi t ot a lm en t e exclu ído. E m se con sider a n do qu e n ã o er a pos-
sível, n a pr á t ica , ign or a r o ba la n ço de pa ga m en t os, for jou -se u m m eio
pa r a o dir igir qu e em vez de pr eser va r a t a xa dom ést ica de ju r os o
a ba n don ou à a çã o de for ça s cega s. Nos ú lt im os a n os os ba n qu eir os de
Lon dr es a pr en der a m m u it o e qu a se se pode t er cer t eza de qu e a t écn ica
da t a xa ba n cá r ia n ã o ser á n ova m en t e u sa da n a Gr ã -Br et a n h a pa r a
pr ot eger a ba la n ça ext er n a , em cir cu n st â n cia s em qu e seja possível
ca u sa r o desem pr ego n o pa ís.

168 O r em édio con st it u ído por u m a t a xa de sa lá r ios elá st ica , per m it in do com ba t er a depr essã o
por u m a ba ixa dos sa lá r ios, a pr esen t a , pela m esm a r a zã o, o in con ven ien t e de só n os ben eficia r
à cu st a de n ossos vizin h os.

313
OS ECON OMIS TAS

Con sider a da u m a t eor ia da em pr esa in dividu a l e da dist r ibu içã o


do pr odu t o r esu lt a n t e do em pr ego de u m volu m e de r ecu r sos, a t eor ia
clá ssica for n eceu a o pen sa m en t o econ ôm ico u m a con t r ibu içã o qu e n ã o
se pode n ega r . É im possível t er idéia s cla r a s sobr e est e a ssu n t o sem
con sider a r t eor ia com o pa r t e do n osso m eca n ism o m en t a l. Nã o qu er o
da r a im pr essã o de qu e est ou n ega n do a m esm a qu a n do ch a m o a a t en -
çã o pa r a a om issã o qu e ela com et eu ign or a n do a pa r t e de ver da de
con t ida n a s t eor ia s a n t er ior es. Toda via , com o con t r ibu içã o pa r a a a r t e
pr á t ica de gover n a r , qu e se pr eocu pa com o sist em a econ ôm ico em
con ju n t o e t en t a em pr ega r a o m á xim o a t ot a lida de dos r ecu r sos dest e
sist em a , os m ét odos dos pion eir os do pen sa m en t o econ ôm ico dos sécu los
XVI e XVII podem t er ca pt a do cer t os fr a gm en t os de sa bedor ia pr á t ica
qu e a s a bst r a ções ir r ea is de Rica r do com eça r a m por esqu ecer pa r a
depois oblit er a r . H a via sa bedor ia em su a in t en sa pr eocu pa çã o de m a n -
t er r edu zida a t a xa de ju r os por m eio de leis de u su r a (à s qu a is vol-
t a r em os pa r a n ova s con sider a ções m a is a dia n t e n est e ca pít u lo), defen -
den do o est oqu e dom ést ico de m oeda e desest im u la n do a a lt a da t a xa
de sa lá r ios, a ssim com o n a su a pr edisposiçã o pa r a r est a u r a r , com o
ú n ico r ecu r so, os est oqu es de m oeda por m eio da desva lor iza çã o, qu a n do
se t in h a m t or n a do fr a n ca m en t e deficien t es gr a ça s a u m a dr en a gem
ir r esist ível pa r a o ext er ior , à eleva çã o da t a xa de sa lá r ios 169 ou a qu a l-
qu er ou t r a coisa .

III

É possível que os prim eiros precursores do pensam ento econômico


tenham adotado suas máximas de sabedoria prática sem estar muito
cientes das bases teóricas em que elas repousavam. Exam inemos, rapi-
damente, os motivos que eles deram , assim como o que recomendaram.
Isto nos é facilitado fazendo referência à grande obra do professor Hecks-
cher sobre o M ercantilism o, na qual, pela primeira vez, as características
especiais do pensamento econômico durante dois séculos são colocadas ao
alcance do leitor comum de E conom ia. As citações que se seguem foram,
em sua maior parte, tiradas das páginas desse livro.170

(1) O pen sa m en t o m er ca n t ilist a n u n ca su pôs qu e h ou vesse u m a

169 A exper iên cia , qu e r em on t a pelo m en os a o t em po de Sólon e qu e pr ova velm en t e poder ia


r ecu a r a in da a m u it os sécu los se dispu séssem os de est a t íst ica s, in dica -n os o qu e o con h e-
cim en t o da n a t u r eza h u m a n a n os leva r ia a esper a r , ou seja , qu e h á u m a t en dên cia con st a n t e
da t a xa de sa lá r ios pa r a a a lt a , a t r a vés de lon gos per íodos, qu e som en t e pode ser r edu zida
em plen o declín io e dissolu çã o da s socieda des econ ôm ica s. Assim sen do, por m ot ivos in t ei-
r a m en t e in depen den t es do pr ogr esso t écn ico e do a u m en t o da popu la çã o, é in dispen sá vel
qu e o est oqu e m on et á r io a u m en t e gr a du a lm en t e.
170 E la s vã o per feit a m en t e se a dequ a r à m in h a pr oposiçã o por qu e o pr ópr io pr of. H ecksch er
e, em t er m os ger a is, pa r t idá r ios da t eor ia clá ssica , sim pa t iza m com a s t eor ia s m er ca n t ilist a s
bem m en os do qu e eu . Nã o h á , por t a n t o, r isco a lgu m de qu e a escolh a da s cit a ções t en h a
sido pr econ cebida , com o desejo de m ost r a r su a sa bedor ia .

314
KEYN ES

t en dên cia pa r a o a ju st e a u t om á t ico a t r a vés do qu a l a t a xa de ju r os se


fixa sse a o n ível a pr opr ia do. P elo con t r á r io, en fa t izou qu e u m a t a xa
in devida m en t e a lt a er a o m a ior obst á cu lo a o desen volvim en t o da r i-
qu eza ; e os m er ca n t ilist a s h a via m t a m bém com pr een dido qu e a t a xa
de ju r os depen dia da pr efer ên cia pela liqu idez e da qu a n t ida de de
m oeda . E les se em pen h a r a m , a o m esm o t em po, em dim in u ir a pr efe-
r ên cia pela liqu idez e a u m en t a r a qu a n t ida de de m oeda , e m u it os deles
decla r a r a m qu e a su a pr eocu pa çã o em a u m en t a r a qu a n t ida de de m oeda
er a devida a o desejo de fa zer em ba ixa r a t a xa de ju r os. O pr ofessor
H ecksch er r esu m e est e a spect o de su a t eor ia da m a n eir a segu in t e:

“A posiçã o dos m er ca n t ilist a s m a is per spica zes er a n est e pon t o,


com o em t a n t os ou t r os, per feit a m en t e cla r a den t r o de cer t os li-
m it es. P a r a eles, o din h eir o er a — em pr ega n do a t er m in ologia
a t u a l — u m fa t or de pr odu çã o equ ipa r a do à t er r a , à s vezes qu a -
lifica do de r iqu eza ‘a r t ificia l’ pa r a o dist in gu ir da ‘n a t u r a l’, e o
ju r o do ca pit a l er a u m pa ga m en t o pelo u so do din h eir o, sem e-
lh a n t e à r en da do solo. À m edida qu e os m er ca n t ilist a s se esfor -
ça va m por en con t r a r r a zões objet iva s pa r a a eleva çã o da t a xa
de ju r os — o qu e fizer a m ca da vez m a is n o decor r er desse per íodo
— ba sea r a m essa s r a zões n o volu m e t ot a l da qu a n t ida de de m oe-
da . Do a bu n da n t e m a t er ia l dispon ível, a pen a s os exem plos m a is
t ípicos ser ã o escolh idos pa r a dem on st r a r a n t es de m a is n a da
qu a n t o essa idéia t in h a r a ízes pr ofu n da s e er a a lh eia a qu a lqu er
con sider a çã o pr á t ica .
“Am bos os pr ot a gon ist a s da polêm ica qu e se defla gr ou n a In -
gla t er r a a r espeit o da polít ica m on et á r ia e do com ér cio da s Ín dia s
Or ien t a is, n o in ício da déca da de 1620, est a va m plen a m en t e de
a cor do n esse pon t o. Ger a r d Ma lyn es a fir m a va , ba sea n do-se n u m a
a r gu m en t a çã o m in u ciosa , qu e ‘a a bu n dâ n cia de din h eir o dim in u i
a u su r a dos pr eços e da s t a xa s’ (L ex M ercatoria e M ain ten an ce
of Free T rad e, 1622). Seu t r u cu len t o e pou co escr u pu loso a dver -
sá r io, E dwa r d Misselden , r eplica va qu e ‘o r em édio pa r a a Usu r a
pode r esidir n a a bu n dâ n cia de din h eir o’ (Free T rad e or th e M ean es
to m ak e T rad e Florish , do m esm o a n o.) E n t r e os escr it or es n o-
t á veis m eio sécu lo m a is t a r de, Ch ild, on ipot en t e dir igen t e e o
m a is h á bil a dvoga do da Com pa n h ia da s Ín dia s Or ien t a is, discu t iu
(1688) a qu est ã o da m edida em qu e a lim it a çã o lega l da t a xa de
ju r os, qu e ele r ecla m a va com in sist ên cia , con t r ibu ir ia pa r a ex-
pu lsa r da In gla t er r a ‘o din h eir o’ dos h ola n deses. E le en con t r ou
o r em édio pa r a est a gr a ve desva n t a gem n o expedien t e m a is fá cil
da t r a n sfer ên cia dos t ít u los de dívida qu a n do er a m u sa dos à
gu isa de din h eir o, pois isso, dizia ele, ‘poder ia cer t a m en t e su pr ir
u m a boa m et a de do n u m er á r io dispon ível u t iliza do n o pa ís’. P et t y,

315
OS ECON OMIS TAS

u m ou t r o a u t or , sit u a do in t eir a m en t e à m a r gem dos in t er esses


em con flit o, a ch a va -se de a cor do com o r est o dos a u t or es pa r a
explica r pelo a u m en t o do est oqu e m on et á r io a ba ixa ‘n a t u r a l’ do
ju r o de 10 pa r a 6% (Political Arith m etick , 1676) e pa r a a con selh a r
o em pr ést im o a ju r os com o r em édio a dequ a do pa r a u m pa ís com
excessiva a bu n dâ n cia de ‘m oeda cor r en t e’ (Qu an tu lu m cu m qu e
con cern in g M on ey, 1682).
“E st a m a n eir a de p en sa r n ã o er a , com o se poder ia esper a r ,
r est r it a à In gla t er r a . Algu n s a n os depois (1701 e 1706), os
n egocia n t es e est a dist a s fr a n ceses, por exem plo, qu eixa va m -se
da ‘esca ssez de m oeda ’ (d isette d es espèces) exist en t e, com o
sen do a ca u sa d a eleva çã o da t a xa de ju r os; e esfor ça va m -se
por fa zer ba ixa r essa t a xa d e u su r a a u m en t a n do a cir cu la çã o
da m oeda .”171

O gr a n de Locke foi t a lvez o pr im eir o a expr essa r em t er m os


a bst r a t os a r ela çã o exist en t e en t r e a t a xa de ju r os e a qu a n t ida de de
m oeda , em su a con t r ovér sia com P et t y.172 Opu n h a -se à pr oposiçã o de
P et t y de u m a t a xa m á xim a de ju r os, su st en t a n do qu e ela er a t ã o im -
pr a t icá vel com o a de fixa r u m a r en da m á xim a pa r a a t er r a , em se
con sider a n do qu e
“o Va lor n a t u r a l do Din h eir o, da da a su a a pt idã o pa r a for n ecer
u m a Ren da a n u a l sob a for m a de J u r o, depen de da r ela çã o en t r e
a qu a n t ida de globa l do Din h eir o cir cu la n t e n o Rein o e o Com ér cio
t ot a l do Rein o (ist o é, a Ven da t ot a l de t oda s a s m er ca dor ia s)”.173
Locke explica qu e a m oeda t em dois va lor es: (1) o va lor de u so, qu e é
det er m in a do pela t a xa de ju r os “e n ist o a dqu ir e a Na t u r eza da Ter r a ,
sen do o Ren dim en t o de u m ch a m a do Ren da e do ou t r o Uso”,174 e (2)
o de t r oca , “e n ist o a dqu ir e a Na t u r eza de u m a Mer ca dor ia ”, sen do
qu e seu va lor de t r oca “depen de u n ica m en t e da Abu n dâ n cia ou E sca ssez
de Moeda em pr opor çã o com a Abu n dâ n cia ou E sca ssez dos pr odu t os
e n ã o do qu e ser á J u r o”. Dest a r t e, Locke foi o pa i de t eor ia s qu a n t i-
t a t iva s gêm ea s. E m pr im eir o lu ga r , ele a fir m ou qu e a t a xa de ju r os
depen de da pr opor çã o en t r e a qu a n t ida de de m oeda (leva n do em con t a
a su a velocida de de cir cu la çã o) e o va lor t ot a l da s t r a n sa ções. E m
segu n do lu ga r , su st en t ou qu e o va lor de t r oca da m oeda depen dia da
pr opor çã o en t r e a qu a n t ida de de m oeda e o volu m e t ot a l de ben s n o
m er ca do. P or ém — com u m pé n o m u n do m er ca n t ilist a e ou t r o n o

171 H E CKSCH E R. M ercan tilism . v. II, pp. 200-201, de for m a ligeir a m en t e r esu m ida .
172 S om e Con sid eration s of th e Con sequ en ces of th e L ow erin g of In terest an d R aisin g th e Valu e
of M on ey, 1692, por ém , escr it o a lgu n s a n os a n t es.
173 E le a cr escen t a : “Nã o a pen a s da qu a n t ida de de m oeda , com o t a m bém da su a velocida de de
cir cu la çã o”.
174 Sen do o t er m o “u so”, n a t u r a lm en t e, a velh a for m a in glesa pa r a den om in a r o “ju r o”.

316
KEYN ES

m u n do clá ssico —,175 con fu n diu -se n o qu e r espeit a à r ela çã o en t r e est a s


du a s pr opor ções e descon sider ou com plet a m en t e a possibilida de da s
flu tu ações n a pr efer ên cia pela liqu idez. Con t u do, ele m ost r ou -se á vido
em explica r qu e a ba ixa da t a xa de ju r os n ã o t em n en h u m a in flu ên cia
d ireta sobr e o n ível dos pr eços e só os a fet a “à m edida qu e a s Va r ia ções
do J u r o Com er cia l pr ovoca m a en t r a da ou sa ída de Din h eir o ou Mer -
ca dor ia s, a lt er a n do a ssim , com o t em po, a P r opor çã o a n t es exist en t e
n a In gla t er r a ”, ist o é, se a r edu çã o da t a xa de ju r os leva à expor t a çã o
de n u m er á r io ou a u m a u m en t o da pr odu çã o. P or ém , ele n u n ca ch egou ,
n a m in h a opin iã o, a u m a sín t ese gen u ín a .176
A fa cilida de com qu e o pen sa m en t o m er ca n t ilist a dist in gu ia en t r e
a t a xa de ju r os e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l é ilu st r a da n u m a
pa ssa gem (pu blica da em 1621) qu e Locke cit a de A L etter to a Frien d
con cern in g Usu ry:
“O J u r o eleva do a r r u ín a o Com ér cio. As va n t a gen s do J u r o
sã o m a ior es qu e o Lu cr o do Com ér cio, o qu e leva os Com er cia n t es
r icos a r et ir a r -se coloca n do seu s H a ver es a J u r os, e os Com er -
cia n t es m en or es à F a lên cia ”.
F or t r ey (E n glan d ’s In terest an d Im provem en t, 1663) ofer ece ou t r o exem -
plo dessa im por t â n cia a fir m a n do qu e u m a t a xa de ju r os é u m fa t or
de a u m en t o de r iqu eza .
Os m er ca n t ilist a s n ã o ign or a va m o fa t o de qu e, qu a n do u m a pr e-
fer ên cia excessiva pela liqu idez desvia pa r a o en t esou r a m en t o o in flu xo
de m et a is pr eciosos, a va n t a gem pa r a a t a xa de ju r os desa pa r ece. E m
a lgu n s ca sos (por exem plo, Mu n ), o objet ivo de r efor ça r o poder do
E st a do levou -os, n ã o obst a n t e, a a dvoga r a a cu m u la çã o de u m t esou r o
gover n a m en t a l. P or ém ou t r os opu ser a m -se fr a n ca m en t e a essa polít ica :
“Sch öt t er , por exem plo, em pr ega va os a r gu m en t os h a bit u a is

175 H u m e, a lgu n s a n os depois, t in h a pé e m eio n o m u n do clá ssico, pois in t r odu ziu en t r e os


econ om ist a s a pr á t ica de da r à posiçã o de equ ilíbr io m a is im por t â n cia do qu e à s sit u a ções
sem pr e ca m bia n t es qu e a ela con du zia m , em bor a a in da fosse ba st a n t e m er ca n t ilist a pa r a
n ã o ign or a r o fa t o de qu e a n ossa exist ên cia r ea l se en con t r a n a t r a n siçã o: “É u n ica m en t e
n est e in t er va lo ou sit u a çã o in t er m ediá r ia en t r e a a qu isiçã o de m oeda e u m a a lt a de pr eços
qu e o a u m en t o dos est oqu es de ou r o e pr a t a se m ost r a fa vor á vel à in dú st r ia . (...) Nã o
im por t a a bsolu t a m en t e à pr osper ida de in t er n a de u m E st a do qu e o din h eir o exist a em
m a ior ou m en or qu a n t ida de. A boa polít ica do m a gist r a do con sist e a pen a s em con ser vá -lo,
se for possível, a in da em a u m en t o, por qu e é a ssim qu e se m a n t ém o espír it o em pr een dedor
da n a çã o e se a u m en t a a a t ivida de do t r a ba lh o n o qu a l se en con t r a m t odo o poder io e
r iqu eza r ea is. Um a n a çã o cu jo din h eir o dim in u i é r ea lm en t e n est e m om en t o m a is fr a ca e
m iser á vel do qu e ou t r a qu e n ã o possu i m a is din h eir o, m a s qu e est eja em via s de a u m en t á -lo”.
(E n sa io On M on ey, 1752.)
176 Ist o ser ve pa r a m ost r a r o t ot a l esqu ecim en t o em qu e ca iu a idéia m er ca n t ilist a de qu e o
ou r o sign ifica ju r o sobr e o din h eir o (idéia qu e a gor a se m e a figu r a in du bit a velm en t e cor r et a ),
con for m e se expr essou o pr of. H ecksch er , com o bom econ om ist a clá ssico, r esu m in do su a
exposiçã o da t eor ia de Locke: “O r a ciocín io de Locke ser ia ir r efu t á vel (...) se o ju r o fosse
sin ôn im o do pr eço do din h eir o em pr est a do, m a s com o n ã o é a ssim , esse r a ciocín io é in t ei-
r a m en t e ir r eleva n t e”. (Op. cit., v. II, p. 204.)

317
OS ECON OMIS TAS

dos m er ca n t ilist a s pa r a pin t a r u m som br io qu a dr o de com o a


cir cu la çã o den t r o do pa ís se ver ia defr a u da da de t odo o din h eir o
em con seqü ên cia de u m in cr em en t o excessivo de t esou r o do E s-
t a do (...) e est a belece, t a m bém , pa r a lelo per feit a m en t e lógico en t r e
a a cu m u la çã o de t esou r os por pa r t e dos m ost eir os e a expor t a çã o
da s sobr a s de m et a is pr eciosos, qu e er a m , pa r a ele, a pior coisa
qu e se pode im a gin a r . Da ven a n t discor r eu sobr e a ext r em a po-
br eza de m u it a s n a ções or ien t a is — qu e pa ssa m por t er m a is
ou r o e pr a t a qu e qu a lqu er ou t r o lu ga r do m u n do — com ba se
n o fa t o de ela s ‘su por t a r em qu e esses t esou r os fica ssem est a g-
n a dos n a s Ar ca s dos P r ín cipes’. (...) Sen do o en t esou r a m en t o do
E st a do con sider a do, n a m elh or da s h ipót eses, de u t ilida de du vi-
dosa , e m u it a s vezes a pr esen t a do com o u m gr a ve per igo, t or n a -se
eviden t e qu e o en t esou r a m en t o pr iva do er a evit a do com o a pest e.
F oi essa u m a da s t en dên cia s con t r a a s qu a is n u m er osos a u t or es
m er ca n t ilist a s cla m a r a m em a lt os br a dos, e n ã o pa r ece qu e t en h a
h a vido u m a ú n ica voz discor da n t e”.177
(2) Os m er ca n t ilist a s est a va m cien t es do er r o qu e im plica a ba ixa
de pr eços e do per igo de qu e u m a con cor r ên cia exa ger a da ven h a a ser
n ociva à r ela çã o de in t er câ m bio de u m pa ís. P or isso, Ma lyn es escr eveu
em su a obr a L ex M ercatoria (1622):

“Não procureis, em detrim ento da Com unidade, vender mais ba-


rato que os outros com o pretexto de aum entar o comércio; pois o
comércio não se desenvolve quando as mercadorias são muito ba-
ratas, porque a barateza resulta da módica procura e da escassez
de dinheiro que tornam as coisas baratas; pelo contrário, é quando
existe abundância de dinheiro que as m ercadorias sendo procuradas
se tornam mais caras, que o com ércio aumenta”.178

O pr ofessor H ecksch er a ssim r esu m e est a fa cet a do pen sa m en t o


m er ca n t ilist a :

“Du r a n t e sécu lo e m eio for m u lou -se r epen t in a m en t e est e pon t o


de vist a , dizen do qu e u m pa ís r ela t iva m en t e m en os r ico qu e os
ou t r os pa íses é obr iga do a ‘ven der ba r a t o e com pr a r ca r o’. (...)
“E st a a t it u de já se m a n ifest a va desde a ediçã o or igin a l da
obr a Discou rse of th e Com m on Weal, ou seja , n os m ea dos do
sécu lo XVI, H a les dizia com efeit o: ‘E m esm o qu e os est r a n geir os
se lim it a ssem a t om a r a pen a s a s n ossa s m er ca dor ia s em t r oca
da s su a s, qu e é qu e os im pedir ia de fa zer su bir os pr eços da s
ou t r a s coisa s (o qu e sign ifica , en t r e ou t r a s, a s qu e n ós lh es com -

177 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, pp. 210-211.


178 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 228.

318
KEYN ES

pr a m os), a pesa r da ba r a t eza da s qu e lh es ven dem os? E dest e


m odo con t in u a r ía m os sen do lesa dos e eles a ca ba r ia m por sobr e-
pu ja r -n os, ven den do ca r o o seu e com pr a n do ba r a t o o n osso, e
con seqü en t em en t e en r iqu ecen do-se, en qu a n t o n ós n os em pobr e-
cem os. P or isso m e pa r ece pr efer ível a u m en t a r , com o fa zem os
a gor a , o pr eço da s n ossa s m er ca dor ia s à m edida qu e eles a u m en -
t a m o pr eço da s deles, em bor a a lgu n s sa ia m per den do, n ã o ser ia m
t a n t os com o a con t ecer ia com ou t r o m ét odo’. Nest e pon t o r ecebeu
a plen a a pr ova çã o de seu edit or a lgu m a s déca da s m a is t a r de
(1581). No sécu lo XVII, est a m esm a a t it u de r essu r giu sem a pr e-
sen t a r n en h u m a m u da n ça n o seu sign ifica do. Dest a m a n eir a , Ma -
lyn es en t en dia qu e est a sit u a çã o in desejá vel r esu lt a va do qu e
ele t em ia a cim a de t u do, a sa ber , a su best im a çã o da t r oca in glesa
n o est r a n geir o. (...) E st e m esm o con ceit o viu -se r epet ido con t i-
n u a m en t e. E m seu Verbu m S apien ti (escr it o em 1665 e pu blica do
em 1691), P et t y opin a va qu e os violen t os esfor ços pa r a a u m en t a r
a qu a n t ida de de m oeda só deixa r ia m de ser n ecessá r ios ‘qu a n do
t iver m os cer t a m en t e m a is din h eir o qu e os n ossos E st a dos Vizi-
n h os (por pequ en os qu e seja m ), t a n t o em pr opor çã o Ar it m ét ica
com o em pr opor çã o Geom ét r ica ’. No per íodo qu e decor r eu en t r e
a pr epa r a çã o e a pu blica çã o desse livr o, Coke decla r ou : ‘Se o
n osso Tesou r o fosse m a ior qu e o da s n ossa s Na ções Vizin h a s,
pou co m e im por t a se t ivéssem os u m a qu in t a pa r t e do Tesou r o
qu e t em os a t u a lm en t e’. (1675)”.179

(3) Os m er ca n t ilist a s der a m or igem à pr oposiçã o qu e a t r ibu ía a s


ca u sa s do desem pr ego a o “m edo dos ben s” e à esca ssez de din h eir o,
pr oposiçã o est a qu e dois sécu los depois os clá ssicos den u n cia r a m com o
sen do u m a bsu r do:

“Um dos pr im eir os exem plos da a plica çã o do a r gu m en t o do


desem pr ego pa r a pr oibir a s im por t a ções ocor r eu em F lor en ça n o
a n o de 1426. (...) A legisla çã o in glesa n est a m a t ér ia r em on t a pelo
m en os a 1455. (...) Um decr et o fr a n cês qu a se con t em por â n eo dessa
de 1466, e qu e foi a ba se da in dú st r ia da seda em Lyon , t ã o
fa m oso m a is t a r de, ofer ece m en os in t er esse por n ã o ser dir igido
r ea lm en t e con t r a m er ca dor ia s est r a n geir a s. Ma s t a m bém n ele se
m en cion a va a possibilida de de da r t r a ba lh o a dezen a s de m ilh a r es
de h om en s e m u lh er es desem pr ega dos. P or a í se vê com o n esse
t em po a qu ela idéia a n da va n o a r . (...)
“E st a qu est ã o, com o a m a ior ia dos pr oblem a s econ ôm icos e
socia is, foi pela pr im eir a vez ser ia m en t e discu t ida n a In gla t er r a

179 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 235.

319
OS ECON OMIS TAS

n os m ea dos do sécu lo XVI ou u m pou co a n t es, n os r ein a dos de


H en r iqu e VIII e E du a r do VI. A t a l r espeit o n ã o podem os deixa r
de m en cion a r u m a sér ie de escr it os qu e pa r ecem da t a r , n o m á -
xim o, da déca da de 1530, e dois dos qu a is, pelo m en os, sã o a t r i-
bu ídos a Clem en t Ar m st r on g. (...) Neles, por exem plo, o t em a é
a ssim for m u la do: ‘E m vir t u de da gr a n de a bu n dâ n cia de gên er os
e m er ca dor ia s in t r odu zidos a n u a lm en t e n a In gla t er r a , ver ificou -
se com o ca u sa n ã o a pen a s a esca ssez da m oeda com o a in da a
r u ín a de t odos os ofícios em qu e a gr a n de m a ssa do povo poder ia
en con t r a r t r a ba lh o e t ir a r dele o din h eir o pa r a pa ga r a com ida
e a bebida em vez de fica r r edu zida com o h oje a viver n a ocio-
sida de, a m en diga r e a r ou ba r ’.180
“O m elh or exem plo qu e con h eço de u m a discu ssã o t ipica m en t e
m er ca n t ilist a em t or n o dest a sit u a çã o é o deba t e r ela t ivo à es-
ca ssez da m oeda qu e se ver ificou n a Câ m a r a dos Com u n s in glesa
em 1621, por oca siã o de u m a gr a ve cr ise especia lm en t e n a s ex-
por t a ções de t ecidos. A sit u a çã o foi expost a com a m a ior cla r eza
por u m dos m em br os m a is in flu en t es do P a r la m en t o, Sir E dwin
Sa n dys. E le decla r ou qu e os a gr icu lt or es e a r t esã os a t r a vessa va m
u m a sit u a çã o difícil em qu a se t oda a pa r t e, qu e os t ea r es est a va m
pa r a dos por fa lt a de din h eir o n o pa ís, e qu e os ca m pon eses se
a ch a va m n a im possibilida de de cu m pr ir seu s con t r a t os, ‘n ã o (lou -
va do seja Deu s) por fa lt a dos fr u t os da t er r a , m a s por fa lt a de
din h eir o’. O fa t o levou a m in u ciosa s in vest iga ções n o sen t ido de
a ver igu a r pa r a on de t er ia ido o din h eir o cu ja esca ssez se fa zia
sen t ir t ã o a m a r gu r a da m en t e. Nu m er osos a t a qu es for a m dir igidos
à s pessoa s su speit a s de t er em con t r ibu ído pa r a a expor t a çã o dos
m et a is pr eciosos (sa ldo de expor t a çã o) ou pa r a seu desa pa r eci-
m en t o por m eio de oper a ções cor r espon den t es den t r o do pa ís”.181

Os m er ca n t ilist a s est a va m cien t es de qu e su a polít ica , con for m e


a expr essã o do pr ofessor H ecksch er ,
“m a t a va dois coelh os com u m a ca ja da da ”. “De u m la do, livr a r a -se
o pa ís de u m in desejá vel exceden t e de m er ca dor ia s, qu e se a cr e-
dit a va ser a ca u sa do desem pr ego, e do ou t r o, a u m en t a va -se o
est oqu e de din h eir o exist en t e”,182

o qu e r esu lt a va n a va n t a gem de fa zer ba ixa r a t a xa de ju r os.


É im possível est u da r a s idéia s a qu e for a m a r r a st a dos os m er -
ca n t ilist a s pela s su a s exper iên cia s con cr et a s, sem per ceber qu e a pr o-
pen sã o a econ om iza r a pr esen t a u m a t en dên cia cr ôn ica , a o lon go de

180 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 122.


181 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 223.
182 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 178.

320
KEYN ES

t oda a h ist ór ia da h u m a n ida de, a ser m a ior qu e o in cen t ivo a in vest ir .


A fr a qu eza da pr open sã o a in vest ir t em sido, em t odos os t em pos, a
ch a ve do pr oblem a econ ôm ico. É possível qu e h oje a explica çã o dessa
fr a qu eza est eja n a im por t â n cia dos ca pit a is a cu m u la dos, a o pa sso qu e
a n t iga m en t e os r iscos e per igos de t oda a espécie t a lvez t en h a m r e-
pr esen t a do u m pa pel m a is im por t a n t e. P or ém , o r esu lt a do é o m esm o.
O desejo do in divídu o de a u m en t a r su a for t u n a pessoa l, a bst en do-se
de con su m ir , t em sido ger a lm en t e m a is for t e qu e a t en dên cia do em -
pr esá r io pa r a a u m en t a r a r iqu eza n a cion a l em pr ega n do m ã o-de-obr a
n a pr odu çã o de ben s du r á veis.

(4) Os m er ca n t ilist a s n ã o t in h a m a m en or ilu sã o a r espeit o do


ca r á t er n a cion a list a de su a polít ica e de su a t en dên cia a pr om over a
gu er r a . E r a a va n t a gem n acion al e a for ça relativa qu e a ber t a m en t e
pr ocu r a va m .183
P odem os cr it ica r -lh es a a pa r en t e in difer en ça com qu e a ceit a va m
est a con seqü ên cia in evit á vel de u m sist em a m on et á r io in t er n a cion a l.
Ma s in t elect u a lm en t e seu r ea lism o é m u it o pr efer ível à s idéia s con fu sa s
dos con t em por â n eos qu e a dvoga m u m pa dr ã o-ou r o in t er n a cion a l fixo
e o laissez-faire em matéria de crédito internacional, que acreditam ser
justam ente estas políticas as mais favoráveis à m anutenção da paz.
P or qu e, n u m a econ om ia su jeit a a con t r a t os e cost u m es m on et á r ios
m a is ou m en os fixos por u m per íodo de t em po a pr eciá vel, n a qu a l a
m oeda em cir cu la çã o e a t a xa de ju r os in t er n a depen dem , pr in cipa l-
m en t e, do ba la n ço de pa ga m en t os, com o er a o ca so da Gr ã -Br et a n h a
a n t es da Gu er r a , a s a u t or ida des n ã o dispõem de m eios or t odoxos pa r a
com ba t er o desem pr ego n o pa ís, a n ã o ser por u m excesso de expor t a çã o
e u m a im por t a çã o de m et a l m on et á r io à cu st a de seu s vizin h os. Nu n ca
a h ist ór ia r egist r ou m ét odo m a is efica z qu e o pa dr ã o-ou r o in t er n a cion a l
(ou a n t iga m en t e o da pr a t a ) pa r a qu e u m pa ís obt en h a a lgu m a va n -
t a gem sobr e seu s vizin h os. P ois ele fez com qu e a pr osper ida de in t er n a
depen desse dir et a m en t e do r esu lt a do de u m a lu t a pela posse dos m er -
ca dos e pela com pet içã o a cir r a da por m et a is pr eciosos. Qu a n do, por
u m feliz a ca so, a s n ova s pr ovisões de ou r o e pr a t a er a m com pa r a t iva -
m en t e a bu n da n t es, a lu t a podia a r r efecer -se u m pou co. Ma s com o
in cr em en t o da r iqu eza e a dim in u içã o da pr open sã o m a r gin a l a con -
su m ir , t en deu a ser ca da vez m a is dest r u t ivo pa r a a m bos os la dos. O
pa pel desem pen h a do pelos econ om ist a s or t odoxos, cu jo sen so com u m
n ã o ba st ou pa r a equ ilibr a r a su a lógica deficien t e, foi desa st r oso a t é

183 "In t eir a m en t e, o m er ca n t ilism o per segu ia fin s a m pla m en t e din â m icos. P or ém est a con cepçã o
con ju ga va -se com u m a idéia est á t ica qu a n t o à econ om ia m u n dia l em su a t ot a lida de, pois
a ist o se deve a cr ia çã o do desa cor do fu n da m en t a l qu e m ot ivou a s in t er m in á veis gu er r a s
com er cia is. (...) Ta l foi o dr a m a do m er ca n t ilism o. A Ida de Média com seu idea l u n iver sa l
est á t ico e o laissez-faire com seu idea l u n iver sa l din â m ico evit a r a m est a con seqü ên cia ."
(H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, pp. 25-26.)

321
OS ECON OMIS TAS

o fim . P ois qu a n do a lgu n s pa íses, n o seu cego esfor ço pa r a en con t r a r


u m a for m a de eva sã o, r en ega r a m a s obr iga ções qu e, a n t er ior m en t e,
im possibilit a r a m a exist ên cia de u m a t a xa de ju r os a u t ôn om a , esses
econ om ist a s en sin a r a m qu e a r est a u r a çã o da s a n t iga s a lgem a s er a o
pr im eir o pa sso n ecessá r io pa r a a r ecu per a çã o ger a l.
N a r ea lida d e, o op ost o é qu e é ver da deir o. U m a p olít ica de
t a xa s d e ju r os a u t ôn om a s, isen t a de qu a lqu er pr eocu p a çã o in t er n a -
cion a l, e de u m pr ogr a m a de in vest im en t os d om ést icos com vist a
a o n ível m á xim o de em pr ego in t er n o, é du p la m en t e sa lu t a r n o sen -
t ido de qu e n os a ju d a a o m esm o t em po a n ós e a n ossos vizin h os.
E é a bu sca sim u lt â n ea dest a s du a s p olít ica s em t odos os pa íses
qu e p ode r est a u r a r , in t er n a cion a lm en t e, a est a bilida de e a for ça
econ ôm ica s, qu er a s m eça m os p elo n ível de em pr ego in t er n o qu er
pelo volu m e de com ér cio in t er n a cion a l. 184

IV

Os m ercantilistas perceberam a existência do problema, porém não


foram capazes de levar a sua análise até o ponto de resolvê-lo. Mas a
escola clássica ignorou este problem a, por ter introduzido em suas pre-
missas condições incom patíveis com sua existência, cujo resultado foi o
afastamento das conclusões da teoria econôm ica e as do bom senso. A
extraordinária realização da teoria clássica foi sobrepor-se às crenças do
“homem natural”, e ao mesmo tempo estar equivocada. O professor Hecks-
cher expressou-se sobre o assunto da seguinte maneira:

“O fa t o de a s idéia s su bja cen t es r ela t iva s à m oeda e à su a


su bst â n cia n ã o t er em va r ia do desde a s Cr u za da s a t é o sécu lo
XVIII pr ova qu e est a m os dia n t e de idéia s for t em en t e en r a iza da s.
Ta lvez m esm o essa s idéia s t en h a m per sist ido a lém do r efer ido
per íodo de qu in h en t os a n os, em bor a com m u it o m en os for ça qu e
a idéia do ‘m edo à s m er ca dor ia s’. (...) E xcet u a n do o per íodo do
laissez-faire, t a lvez n en h u m a ou t r a época t en h a esca pa do a essa s
idéia s. Só a t en a cida de ver da deir a m en t e sin gu la r do laissez-faire
pôde sobr epu ja r , por a lgu m t em po, a s cr en ça s do ‘h om em n a t u r a l’
n esse pon t o.185
“F oi pr eciso t odo o fa n a t ism o dou t r in á r io do laissez-faire pa r a
elim in a r a idéia do ‘m edo à s m er ca dor ia s’. (...) [qu e] é, n a econ om ia
m on et á r ia , a a t it u de m a is com pr een sível do ‘h om em n a t u r a l’. O
Livr e-com ér cio n ega va a exist ên cia de fa t or es qu e pa r ecia m evi-
den t es, e est a va con den a do a o descr édit o n a opin iã o do h om em

184 A con sist en t e a pr ecia çã o dest a ver da de pelo In t er n a t ion a l La bou r Office, pr im eir o n o t em po
de Alber t Th om a s e depois n o de H . B. Bu t ler , dest a cou -se de m a n eir a n ot á vel en t r e a s
decla r a ções pu blica da s pelos n u m er osos or ga n ism os in t er n a cion a is de pós-gu er r a .
185 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, pp. 176-177.

322
KEYN ES

da r u a a pa r t ir do m om en t o em qu e o laissez-faire n ã o m a is fosse
ca pa z de m a n t er os espír it os a cor r en t a dos à su a ideologia ”.186

Recor do a m ist u r a de ir r it a çã o e de per plexida de qu e se a poder a va


de Bon a r La w per a n t e os econ om ist a s, pelo fa t o de n ega r em o qu e er a
óbvio. E le se m ost r a va á vido por u m a explica çã o. Recor r e-se à a n a logia
en t r e o poder da escola clá ssica e o de cer t a s r eligiões, pois é a m a ior
pr ova da for ça de u m a idéia escon ju r a r a evidên cia do qu e in t r odu zir
n a s idéia s com u n s do h om em o r ecôn dit o e o r em ot o.

Rest a u m a ssu n t o r ela cion a do com ist o, em bor a difer en t e, qu e


du r a n t e sécu los, t a lvez m esm o por m ilên ios, ilu st r ou a opin iã o t ida
com o cer t a e eviden t e de u m a dou t r in a qu e a escola clá ssica r ep u diou
com o pu er il, m a s qu e m er ece r ea bilit a çã o e h on r a s. Refir o-m e à
dou t r in a de qu e a t a xa de ju r os n ã o se a ju st a por si m esm a a o n ível
m a is a dequ a d o a o ót im o socia l, a n t es t en de con st a n t em en t e a ele-
va r -se d em a is, de t a l m odo qu e u m gover n o pr u den t e pr ocu r a r es-
t r in gi-la pela legisla çã o e pelo cost u m e, e a t é m esm o in voca n do a s
sa n ções d a lei m or a l.
As disposições con t r a a u su r a en con t r a m -se en t r e a s pr á t ica s
econ ôm ica s m a is a n t iga s de qu e t em os m em ór ia . Na An t igu ida de e n a
Ida de Média , con sider a va -se a liqu ida çã o do est ím u lo pa r a in vest ir sob
o efeit o de u m a excessiva pr efer ên cia pela liqu idez com o o m a ior dos
m a les, con st it u in do o pr in cipa l obst á cu lo a o desen volvim en t o da r iqu e-
za . O qu e er a n a t u r a l, já qu e cer t os r iscos e a za r es da vida econ ôm ica
r edu zem a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, a o pa sso qu e ou t r os r efor ça m
a pr efer ên cia pela liqu idez. E m u m m u n do qu e n in gu ém con sider a va
segu r o, er a qu a se in evit á vel qu e a t a xa de ju r os, se n ã o fosse r edu zida
por t odos os m eios de qu e a socieda de dispu n h a , su bisse dem a is pa r a
t or n a r possível u m a t r a t ivo a dequ a do pa r a in vest ir .
E u fu i edu ca do n a cr en ça de qu e a a t it u de da Igr eja n a Ida de
Média pa r a com a t a xa de ju r os er a in er en t em en t e a bsu r da e qu e os
su t is a r gu m en t os visa n do dist in gu ir en t r e o r en dim en t o dos em pr és-
t im os m on et á r ios e a r en da dos in vest im en t os a t ivos n ã o pa ssa va m
de r ecu r sos jesu íst icos pa r a en con t r a r u m a sa ída pr á t ica pa r a u m a
t eor ia in sen sa t a . H oje, en t r et a n t o, esses a r gu m en t os pa r ecem -m e u m
esfor ço in t elect u a l h on est o pa r a con ser va r sepa r a do o qu e a t eor ia clá s-
sica m ist u r ou de m odo in ext r in ca velm en t e con fu so, a sa ber , a t a xa de
ju r os e a eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l. Agor a vê-se cla r a m en t e qu e
a s in da ga ções dos escolá st icos se dest in a va m a en con t r a r u m a fór m u la
qu e per m it isse à cu r va da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l ser eleva da ,

186 Op. cit., v. II, p. 335.

323
OS ECON OMIS TAS

a o m esm o t em po qu e a plica va m os r egu la m en t os, os cost u m es e a lei


m or a l pa r a m a n t er u m a t a xa de ju r os ba ixa .
O pr ópr io Ada m Sm it h m ost r ou -se en or m em en t e m oder a do n a
su a a t it u de com r ela çã o à s leis con t r a a u su r a . E le bem sa bia qu e a s
pou pa n ça s in dividu a is podem ser a bsor vida s t a n t o pelos in vest im en t os
com o pela s dívida s, e qu e n ã o h á cer t eza de en con t r a r sa ída n os pr i-
m eir os. Além disso, ele foi a fa vor de u m a ba ixa da t a xa de ju r os, pelo
fa t o de a u m en t a r a possibilida de de u m a sa ída pa r a a pou pa n ça em
n ovos in vest im en t os, em vez de en con t r á -la n a s dívida s; por essa r a zã o,
n u m a pa ssa gem qu e lh e va leu ser sever a m en t e cr it ica do por Ben t -
h a m ,187 r ecom en da u m a a plica çã o m oder a da da s leis con t r a a u su r a .188
Adem a is, a s cr ít ica s de Ben t h a m in cidia m , pr in cipa lm en t e, sobr e o
r igor excessivo com qu e a pr u dên cia escocesa de Ada m Sm it h a bor da va
os “pr ecu r sor es” e sobr e o fa t o de qu e u m a t a xa de ju r os m á xim a pou ca
m a r gem deixa r ia pa r a r em u n er a r os r iscos legít im os e socia lm en t e
r ecom en dá veis. Ben t h a m en t en deu por precu rsores “t oda s a s pessoa s
qu e, per segu in do a r iqu eza ou m esm o qu a lqu er ou t r o objet ivo, se es-
for ça m , com a a ju da da r iqu eza , por a br ir n ovos ca m in h os à in ven çã o
(...) t oda s a s pessoa s qu e, segu in do qu a lqu er dos seu s pr opósit os, t en t a m
r ea liza r o qu e pode ser ch a m a do de aperfeiçoam en to. (...) Tr a t a -se, em
r esu m o, de t oda a a plica çã o da s for ça s h u m a n a s n a s qu a is o en gen h o
t em de r ecor r er à a ju da da r iqu eza ”. Na t u r a lm en t e, Ben t h a m pr ot est a
com r a zã o con t r a a s leis qu e im pedem cor r er os r iscos legít im os. “Nest a s
con dições”, a cr escen t a Ben t h a m , “n en h u m h om em pr u den t e pr ocu r a r á
escolh er en t r e os bon s e os m a u s pr ojet os por qu e n ã o se en volver á em
pr ojet o a lgu m ”.189
P ode-se per gu n t a r se o qu e ficou dit o cor r espon de exa t a m en t e à
idéia qu e Ada m Sm it h qu is da r a o t er m o. Ou ser á qu e est a m os ou vin do
em Ben t h a m (em bor a escr even do em m a r ço de 1787 de “Cr ich off in
Wh it e Ru ssia ”) a voz da In gla t er r a do sécu lo XIX fa la n do à do sécu lo
XVIII? Isso por qu e, ú n ica e exclu siva m en t e, a exu ber â n cia qu e ca r a c-
t er izou a época cu lm in a n t e do a t r a t ivo pa r a in vest ir poder ia esqu ecer
a possibilida de t eór ica de su a in su ficiên cia .

VI

Con vém m en cion a r , n est e pon t o, o est r a n h o e in ju st ifica da m en t e


esqu ecido pr ofet a Silvio Gesell (1862-1930), cu ja obr a con t ém cen t elh a s

187 E m su a L etter to Ad am S m ith , em a pên dice a su a Defen ce of Usu ry.


188 Wealth of N ation s. Livr o Segu n do. Ca p. IV.
189 Vist o qu e com ecei a cit a r Ben t h a m n est e con t ext o, devo r ecor da r a o leit or su a m elh or
pa ssa gem : “A ca r r eir a da a r t e, a gr a n de sen da por on de ca m in h a m os pr ecu r sor es, pode
con sider a r -se u m a va st a e t a lvez lim it a da pla n ície, t oda cober t a de a bism os com o a qu ele
pelo qu a l foi en golido Cú r sio. Ca da u m r ecla m a qu e u m a vít im a h u m a n a n ele se pr ecipit e
a n t es de fech a r -se, m a s, qu a n do se fech a , é pa r a n ã o m a is a br ir , e dest e m odo gr a n de
pa r t e do ca m in h o fica segu r o pa r a os qu e pr ossegu em ”.

324
KEYN ES

de pr ofu n da per cepçã o e est eve a pon t o de a lca n ça r a essên cia do pr o-


blem a . Du r a n t e os a n os do pós-gu er r a , seu s a dm ir a dor es m e bom ba r -
dea r a m com exem pla r es de seu s livr os; con t u do, por ca u sa de cer t os
defeit os pa lpá veis de a r gu m en t a çã o, fu i com plet a m en t e in ca pa z de des-
cobr ir -lh es os m ér it os. Com o fr eqü en t em en t e a con t ece n os ca sos de
in t u ições im per feit a m en t e a n a lisa da s, seu sign ifica do só se m e t or n ou
cla r o qu a n do ch egu ei, por m eu s pr ópr ios m eios, a m in h a s pr ópr ia s
con clu sões. Nesse in t er va lo pa r eceu -m e, com o a ou t r os econ om ist a s
a ca dêm icos, qu e os seu s esfor ços pr ofu n da m en t e or igin a is pou co m a ior
a t en çã o m er ecia m qu e a obr a de u m dem en t e. Com o é pr ová vel qu e
pou cos leit or es dest e livr o t en h a m ba st a n t e con sciên cia sobr e a im por -
t â n cia de Gesell, dedica r -lh e-ei u m espa ço qu e de ou t r o m odo pa r ecer ia
exa ger a do.
Gesell foi u m pr ósper o com er cia n t e a lem ã o190 de Bu en os Air es
leva do a o est u do dos pr oblem a s m on et á r ios pela cr ise dos ú lt im os a n os
da déca da de 1880, qu e n a Ar gen t in a foi especia lm en t e violen t a ; seu
pr im eir o t r a ba lh o, Die R eform ation im M ü n zw esen als B rü ck e zu m
socialen S taat, foi pu blica do em Bu en os Air es em 1891. Su a s idéia s
fu n da m en t a is sobr e a m oeda for a m pu blica da s em Bu en os Air es n o
m esm o a n o com o t ít u lo de N ervu s R eru m , a qu e se segu ir a m m u it os
livr os e folh et os, a t é qu e ele se a posen t ou e foi pa r a a Su íça em 1906
com o h om em de cer t a s posses, ca pa z de dedica r a s ú lt im a s déca da s
de su a exist ên cia à s du a s ocu pa ções m a is a gr a dá veis pa r a qu em n ã o
pr ecisa ga n h a r a vida : ser a u t or e a gr icu lt or exper im en t a l.
A pr im eir a pa r t e de su a obr a bá sica foi pu blica da , em 1906, em
Les H a u t s Gen eveys, Su íça , com o t ít u lo Die Verw irk lich u n g d es R ech tes
au f d em vollen Arbeitsertrag e a segu n da , Die n eu e L eh re vom Z in s,
em 1911, em Ber lim . Am ba s for a m r eu n ida s em u m só volu m e, pu bli-
ca do em Ber lim e n a Su íça du r a n t e a Gu er r a (1916), t en do a lca n ça do
seis edições em vida do a u t or com o t ít u lo de Die n atü rlich e Wirts-
ch aftsord n u n g d u rch Freilan d u n d Freigeld ; a t r a du çã o in glesa (feit a
por P h ilip P ye) r ecebeu o t ít u lo T h e N atu ral E con om ic Ord er. E m a br il
de 1919, Gesell pa r t icipou do efêm er o ga bin et e soviét ico da Ba vier a
com o m in ist r o da F a zen da , t en do sido post er ior m en t e ju lga do por u m
con selh o de gu er r a . P a ssou seu s ú lt im os dez a n os de vida em Ber lim
e n a Su íça en t r egu e à pr opa ga n da . Gesell, a t r a in do pa r a si o fer vor
qu a se r eligioso qu e a n t es cer ca r a H en r y Geor ge, t or n ou -se o pr ofet a
ven er a do de u m cu lt o com m u it os m ilh a r es de discípu los em t odo o
m u n do. O pr im eir o con gr esso in t er n a cion a l da F r eila n d-F r eigeld Bu n d
Su íça e a lem ã e de or ga n iza ções a n á loga s de m u it os pa íses celebr ou -se
em Ba siléia em 1923. Após su a m or t e, em 1930, gr a n de pa r t e do fer vor
t ípico qu e su scit a m dou t r in a s com o a s su a s desviou -se pa r a ou t r os

190 Na scido per t o da fr on t eir a de Lu xem bu r go, de pa i a lem ã o e m ã e fr a n cesa .

325
OS ECON OMIS TAS

pr ofet a s (m en os em in en t es n a m in h a opin iã o). O Dr . Bü ch i é o ch efe


do m ovim en t o n a In gla t er r a , m a s a s pu blica ções pa r ecem pr ovir de
Sa n An t on io, Texa s; su a m a ior for ça pa r ece est a r h oje n os E st a dos
Un idos, on de o pr ofessor Ir vin g F ish er é o ú n ico en t r e os econ om ist a s
dos cír cu los a ca dêm icos qu e lh e r econ h eceu a im por t â n cia .
Apesa r da pom pa pr ofét ica com qu e o or n a r a m seu s a dm ir a dor es,
o livr o m a is im por t a n t e de Gesell foi escr it o em lin gu a gem ser en a e
cien t ífica , em bor a est eja im pr egn a do, do pr in cípio a o fim , de u m a de-
voçã o a pa ixon a da e em ot iva pela ju st iça socia l qu e a lgu n s con sider a m
excessiva n u m cien t ist a . A pa r t e qu e der iva de H en r y Geor ge 191 qu e,
sem dú vida , m u it o con t r ibu iu pa r a a for ça do m ovim en t o é, em ger a l,
de in t er esse secu n dá r io. P ode-se dizer qu e o in t u it o do livr o, com o u m
t odo, é o est a belecim en t o de u m socia lism o a n t im a r xist a , u m a r ea çã o
con t r a o laissez-faire em pr ega n do ba ses t eór ica s in t eir a m en t e difer en t es
da s de Ma r x, vist o qu e m a is se a póia m n o r epú dio do qu e n a a ceit a çã o
da s h ipót eses clá ssica s, e a liber a çã o da con cor r ên cia em vez de su a
a boliçã o. Cr eio qu e o fu t u r o t er á m a is a a pr en der do espír it o de Gesell
qu e do de Ma r x. O leit or qu e con su lt a r o pr efá cio de T h e N atu ral
E con om ic Ord er poder á a pr ecia r o va lor m or a l de Gesell. É n esse pr e-
fá cio, n o m eu en t en der , qu e se pode en con t r a r a r espost a a o m a r xism o.
A con t r ibu içã o específica de Gesell pa r a a t eor ia da m oeda e do
ju r o é a segu in t e: em pr im eir o lu ga r , ele dist in gu e cla r a m en t e a t a xa
de ju r os da eficiên cia m a r gin a l do ca pit a l, e a fir m a ser a t a xa de ju r os
a qu e m a r ca u m lim it e a o cr escim en t o do ca pit a l r ea l. Most r a , depois,
qu e a t a xa de ju r os é u m fen ôm en o pu r a m en t e m on et á r io; qu e a pe-
cu lia r ida de da m oeda , da qu a l em a n a a im por t â n cia da t a xa m on et á r ia
de ju r os, r eside n o fa t o de su a posse, com o m eio de a cu m u la r r iqu eza ,
im por a qu em a t em despesa s de m a n u t en çã o despr ezíveis; e qu e r i-
qu eza s com por t a n do despesa s de m a n u t en çã o a pr eciá veis, com o os es-
t oqu es de m er ca dor ia s, dã o de fa t o u m r en dim en t o qu e se deve a o
pa dr ã o est a belecido pela m oeda . Cit a a com pa r a t iva est a bilida de da
t a xa de ju r os a t r a vés dos t em pos com o pr ova de qu e ela n ã o pode
depen der de fa t or es pu r a m en t e físicos, por qu e a s va r ia ções dest es ú l-
t im os, de u m a época pa r a ou t r a , devem t er sido in ca lcu la velm en t e
m a ior es do qu e a s obser va da s n a t a xa de ju r os; isso qu er dizer (n a
m in h a t er m in ologia ) qu e a t a xa de ju r os, qu e depen de de fa t or es psi-
cológicos con st a n t es, per m a n eceu est á vel, a o pa sso qu e os fa t or es m a is
in st á veis, qu e pr im or dia lm en t e a t u a m sobr e a cu r va da eficiên cia m a r -
gin a l do ca pit a l, n ã o fixa r a m a qu ela t a xa , m a s a pr opor çã o segu n do
a qu a l a t a xa de ju r os (m a is ou m en os) da da per m it e a u m en t a r os
est oqu es de ca pit a l r ea l.
H á , por ém , u m gr a n de defeit o n a t eor ia de Gesell. E le dem on st r a

191 Gesell diver ge de Geor ge a o r ecom en da r o pa ga m en t o de in den iza ções em ca so de n a cio-


n a liza çã o da t er r a .

326
KEYN ES

qu e é u n ica m en t e por exist ir u m a t a xa m on et á r ia de ju r os qu e se pode


obt er u m r en dim en t o do em pr ést im o de est oqu es de m er ca dor ia s. Seu
diá logo en t r e Robin son Cr u soé e u m est r a n geir o192 é u m a excelen t e
pa r á bola econ ôm ica — t ã o boa com o qu a lqu er da s qu e se escr ever a m
— pa r a eviden cia r est e pon t o. P or ém , t en do expost o a s r a zões pela s
qu a is a t a xa m on et á r ia de ju r os, a o con t r á r io da m a ior ia da s t a xa s de
ju r os de m er ca dor ia s, n ã o pode ser n ega t iva , esqu ece por com plet o a
n ecessida de de explica r por qu e a t a xa m on et á r ia de ju r os é posit iva ,
e n ã o con segu e dem on st r a r qu e n ã o é o n ível fixa do pelo r en dim en t o
do ca pit a l pr odu t ivo qu e gover n a a t a xa m on et á r ia de ju r os (com o
su st en t a a escola clá ssica ). Isso por qu e a n oçã o de pr efer ên cia pela
liqu idez esca pou -lh e. E le for m u lou a pen a s pela m et a de u m a t eor ia da
t a xa de ju r os.
O ca r á t er in com plet o de su a t eor ia explica -se, sem dú vida , pelo
fa t o de su a obr a t er sido ign or a da pelos m eios a ca dêm icos. Con t u do,
ele a pr ofu n dou -a su ficien t em en t e pa r a levá -la a u m a r ecom en da çã o
pr á t ica qu e t a lvez con t en h a a essên cia da s solu ções n ecessá r ia s, em bor a
n ã o a plicá vel n a for m a qu e ele pr opôs. Su st en t a qu e o cr escim en t o do
ca pit a l r ea l é con t ido pela t a xa m on et á r ia de ju r os, e qu e, se esse
obst á cu lo fosse elim in a do, esse cr escim en t o n o m u n do m oder n o ser ia
t ã o r á pido qu e decer t o ju st ifica r ia u m a t a xa de ju r os igu a l a zer o, se
n ã o im edia t a m en t e, pelo m en os n u m pr a zo r ela t iva m en t e cu r t o. Desse
m odo, a n ecessida de pr im or dia l con sist e em r edu zir a t a xa m on et á r ia
de ju r os, e isso, con for m e ele in dicou , pode con segu ir -se obr iga n do o
din h eir o a su por t a r despesa s de m a n u t en çã o igu a is à s qu e in cidem
sobr e ou t r os est oqu es de ben s im pr odu t ivos. Ist o levou -o à fa m osa pr es-
cr içã o da “m oeda ca r im ba da ”, a qu e est á a ssocia do sobr et u do o seu
n om e, e qu e r ecebeu o ben eplá cit o do pr ofessor Ir vin g F ish er . De a cor do
com su a pr opost a , a s n ot a s em cir cu la çã o (e é cla r o qu e pelo m en os
cer t a s for m a s de m oeda ba n cá r ia dever ia m ser su bm et ida s a esse r e-
gim e) som en t e con ser va r ia m o seu va lor se fossem ca r im ba da s t odos
os m eses, com o u m ca r t ã o de segu r o, com est a m pilh a s a dqu ir ida s em
r epa r t ições com o a s do cor r eio. O cu st o dessa s est a m pilh a s ser ia fixa do,
n a t u r a lm en t e, em da da cifr a con ven ien t e. De a cor do com a m in h a t eo-
r ia , esse pr êm io dever ia ser a pr oxim a da m en t e igu a l a o exceden t e da
t a xa m on et á r ia de ju r os (exclu in do-se a s est a m pilh a s) sobr e a eficiên cia
m a r gin a l do ca pit a l cor r espon den t e a o flu xo de in vest im en t os n ovos
com pa t ível com o plen o em pr ego. O ôn u s su ger ido por Gesell er a de
1 por m il sem a n a l, equ iva len t e a 5,2% a o a n o. Isso ser ia dem a sia do
a lt o n a s con dições a t u a is, m a s a cifr a cor r et a , qu e dever ia ser m odi-
fica da de t em pos a t em pos, só se a lca n ça r ia por t en t a t iva s e er r os.
A idéia em qu e se ba seia a m oeda ca r im ba da é vá lida . É possível

192 T h e N atu ral E con om ic Ord er. p. 297 et seqs.

327
OS ECON OMIS TAS

en con t r a r m eios de a plicá -la em esca la r est r it a . E la , por ém , a pr esen t a


n u m er osa s dificu lda des qu e Gesell n ã o con sider ou . E m pa r t icu la r , ele
n ã o per cebeu qu e o din h eir o n ã o é o ú n ico bem com pr opr ieda de de
leva r con sigo u m pr êm io de liqu idez, qu e a pen a s difer e em gr a u de
m u it os ou t r os, t ir a n do su a im por t â n cia do fa t o de possu ir u m pr êm io
de liqu idez m aior qu e qu a lqu er ou t r o. Dest a r t e, se a s n ot a s em cir cu -
la çã o viessem a ser isen t a s do dit o pr êm io de liqu idez pelo sist em a de
ca r im bo, diver sos t ipos de su cedâ n eos vir ia m t om a r -lh es o lu ga r —
m oeda ba n cá r ia , t ít u los à vist a , m oeda est r a n geir a , pedr a s e m et a is
pr eciosos e a ssim por dia n t e. Com o disse a n t es, h ou ve época s em qu e,
sem dú vida , o desejo de possu ir t er r a , in depen den t em en t e de seu r en -
dim en t o, con t r ibu iu pa r a m a n t er eleva da a t a xa de ju r os — em bor a ,
n o sist em a de Gesell, essa possibilida de fosse elim in a da pela n a cion a -
liza çã o da t er r a .

VII

As t eor ia s qu e exa m in a m os a n t es r efer em -se, em su bst â n cia , a o


elem en t o con st it u t ivo da dem a n da efet iva qu e depen de da su ficiên cia
do a t r a t ivo pa r a in vest ir . Nã o é n ovida de, en t r et a n t o, a t r ibu ir o de-
sem pr ego à in su ficiên cia do ou t r o elem en t o, ou seja , à in su ficiên cia da
pr open sã o a con su m ir . Ma s est a ou t r a explica çã o dos m a les econ ôm icos
a t u a is — igu a lm en t e im popu la r es com os econ om ist a s clá ssicos — r e-
pr esen t ou u m pa pel bem m en os im por t a n t e n o pen sa m en t o dos sécu los
XVI e XVII, e só a dqu ir iu for ça em época s r ela t iva m en t e r ecen t es.
E m bor a a s qu eixa s con t r a o su bcon su m o fossem u m a spect o ba s-
t a n t e secu n dá r io do pen sa m en t o m er ca n t ilist a , o pr ofessor H ecksch er
cit a n u m er osos exem plos do qu e ch a m a a “a r r a iga da cr en ça n a u t ilida de
do lu xo e n a n ocivida de da pa r cim ôn ia . A pa r cim ôn ia , de fa t o, er a
con sider a da a ca u sa do desem pr ego por du a s r a zões: pr im eir a , por se
ju lga r qu e a qu a n t ida de de m oeda qu e n ã o en t r a va n a t r oca dim in u ía
a r en da r ea l e, segu n da , por se a ch a r qu e a pou pa n ça r et ir a va din h eir o
de cir cu la çã o”.193 E m 1598 La ffem a s (L es T résors et R ich esses pou r
M ettre l’E stat en S plen d eu r) com ba t eu os a dver sá r ios do u so de seda s
fr a n cesa s, a fir m a n do qu e os com pr a dor es de a r t igos de lu xo fr a n ceses
pr opor cion a va m a os pobr es m eios de su bsist ên cia , a o pa sso qu e os
a va r en t os os fa zia m m or r er de m isér ia .194 E m 1662, P et t y ju st ifica va
“a s fest a s, os espet á cu los de ga la , os a r cos do t r iu n fo et c.”, a lega n do
qu e os seu s cu st os en t r a va m n os bolsos dos cer vejeir os, pa deir os, a l-
fa ia t es, sa pa t eir os e ou t r os. F or t r ey a pr ova va o “excesso de in du m en -
t á r ia ”. Von Sch r öt t er (1686) a t a cou os r egu la m en t os su n t u á r ios e de-
cla r ou deseja r qu e h ou vesse a in da m a is fa u st o n a s r ou pa s e n os ou t r os

193 H E CKSCH E R. Op. cit., v. II, p. 208.


194 Op. cit., v. II, p. 290.

328
KEYN ES

elem en t os de ost en t a çã o. Ba r bon (1690) escr eveu qu e a “P r odiga lida de


é u m vício pr eju dicia l a o H om em , m a s n ã o a os n egócios... a Ava r eza ,
u m Vício pr eju dicia l t a n t o a o H om em com o a os Negócios”.195 E m 1695,
Ca r y a fir m ou qu e, se t oda gen t e ga st a sse m a is, t odos obt er ia m m a ior es
r en dim en t os e “poder ia m viver com m a is a bu n dâ n cia ”.196
Ma s foi a Fable of th e B ees de Ber n a r d Ma n deville qu e m a is
con t r ibu iu pa r a vu lga r iza r a opin iã o de Ba r bon , sen do est e livr o de-
cla r a do su bver sivo pelo gr a n de jú r i de Middlesex, em 1723, e a su a
esca n da losa r epu t a çã o m a r ca -lh e u m lu ga r n a h ist ór ia da s ciên cia s
m or a is. Regist r a -se qu e a pen a s u m h om em t eve pa la vr a s de elogio a
seu r espeit o, ou seja , o dr . J oh n son , o qu a l r econ h eceu qu e a obr a ,
lon ge de o est a r r ecer , “lh e a br ir a en or m em en t e os olh os pa r a a vida
r ea l”. A n a t u r eza da m a lign ida de do livr o pode ser m elh or a pr ecia da
n o r esu m o de Leslie St eph en n o Diction ary of N ation al B iograph y:
“Ma n deville com et eu u m a gr a n de ofen sa com est e livr o, n o
qu a l u m cín ico sist em a de m or a lida de se t or n a a t r a en t e por m eio
de en gen h osos pa r a doxos... Su a dou t r in a de qu e os ga st os con -
t r ibu em m a is pa r a a pr osper ida de do qu e a pou pa n ça coin cidia
com m u it os sofism a s econ ôm icos em cu r so n essa época e qu e
a in da n ã o desa pa r ecer a m in t eir a m en t e.197 Su pon do, com os a s -
cet a s, qu e os desejos h u m a n os sã o essen cia lm en t e m a u s e, por -
t a n t o, dã o or igem a ‘vícios pr iva dos’, e a dm it in do a opin iã o com u m
de qu e a r iqu eza é ‘u m ben efício pú blico’, ele dem on st r ou fa cil-
m en t e qu e t oda a civiliza çã o im plica o desen volvim en t o de pr o-
pen sões viciosa s..."

O con t eú do da obr a Fable of th e B ees con st it u i u m poem a a legór ico


— “Os Bu r bu r in h os da Colm éia , ou os Velh a cos t r a n sfor m a dos em
h on est os” —, em qu e se descr eve a espa n t osa sit u a çã o de u m a com u -
n ida de pr ósper a , n a qu a l r epen t in a m en t e t odos os cida dã os r esolvem
r en u n cia r à vida lu xu osa e o E st a do r edu zir os a r m a m en t os n o in t er esse
da P ou pa n ça :

“Agor a n ã o é m a is qu est ã o de H on r a con sider a r ,


P a r a poder viver e dever , o qu e se t em ga st a r ,
Libr és à m ost r a n a s loja s de pen h or ;
Ca r r u a gen s a vil pr eço en t r egu es sem pu dor ;
Ven der ca va los e ca sa s de ca m po é u m a da s sa ída s,

195 Op. cit., v. II, p. 291.


196 Op. cit., v. II, p. 209.
197 E m su a obr a H istory of E n glish T h ou gh t in th e E igh teen th Cen tu ry, St eph en escr eveu (p.
297), fa la n do do ”sofism a t or n a do célebr e por Ma n deville", qu e “a su a com plet a r efu t a çã o
r eside n a dou t r in a — t ã o r a r a m en t e en t en dida qu e a su a plen a com pr een sã o é, t a lvez, a
m elh or pr ova pa r a u m econ om ist a — de qu e a dem a n da de ben s n ã o con st it u i u m a dem a n da
de t r a ba lh o”.

329
OS ECON OMIS TAS

P a r a se desfa zer da s dívida s con t r a ída s.


Os cu st os vã os e F r a u de m or a l t êm -se de evit a r ,
Qu a n do a s F or ça s já se per der a m n o Além -Ma r ;
Desden h e a E st im a dos E st r a n geir os, E a vã Glór ia con qu ist a da
por Gu er r eir os;
E les com ba t em som en t e pela P á t r ia a m a da ,
Qu a n do o Dir eit o e a Liber da de sã o r edu zidos a o n a da ".

A a lt iva Cloé

“Redu za os ga st os com esfor ço in sa n o,


E u se Vest es qu e du r em t odo o An o".

E qu a l o r esu lt a do?

“Qu em a gor a a glor iosa Colm éia con t em pla r ,


P ode o a cor do en t r e a H on est ida de e o Com ér cio exa m in a r :
Nã o h á m a is F a u st o, e o t r ist e desen la ce
É u m ou t r o E n t e, com u m a ou t r a F a ce,
P ois n ã o for a m só eles a desa pa r ecer
Após esba n ja r por a n os qu a n t ia s de est a r r ecer ;
Ma s a s Mu lt idões, cu ja vida deles depen dia ,
F a zia m o m esm o, pela for ça im pelida s, t odo o dia .
Deba lde pr ocu r a r a m ou t r a Ocu pa çã o;
P or ém de n a da va leu su a desesper a da a çã o.
E os pr eços da s Ca sa s e da Ter r a se t or n a r a m a vilt a dos;
E os sólidos Mu r os dos P a lá cios en ca n t a dos,
Com o os de Teba s, er gu idos por Ma gia ,
Vã o ser a lu ga dos...
O m ist er da Con st r u çã o a o a ba n don o r elega do,
E o Ar t esã o se en con t r a desem pr ega do;
Qu em pin t a vê su a Ar t e con den a da à Mor t e,
Qu em la vr a a pedr a e en t a lh a t em a m esm a Sor t e."

P or t a n t o, “A Mor a l” é:

“Nen h u m a Na çã o só de Vir t u de pode viver


E m E splen dor . E pa r a r en a scer
A Ida de de Ou r o h á de a ceit a r
O Vício e a Vir t u de n o m esm o lu ga r ".

As du a s pa ssa gen s ext r a ída s do com en t á r io qu e a com pa n h a m a


a legor ia m ost r a m qu e n ã o fa lt ou ba se t eór ica a o qu e foi dit o a n t es:
“Com o est a pr u den t e econ om ia , qu e a lgu m a s pessoa s ch a m a m

330
KEYN ES

Pou pan ça, é n a s fa m ília s pa r t icu la r es o m ét odo m a is cer t o de


a u m en t a r os pa t r im ôn ios, h á qu em im a gin e qu e, seja u m pa ís
est ér il ou fér t il, o m esm o m ét odo (qu e su põem pr a t icá vel) t er á
efeit os idên t icos se for segu ido por t oda a n a çã o, e qu e, por exem -
plo, os in gleses poder ia m ser m u it o m a is r icos do qu e sã o se
fossem t ã o fr u ga is com o a lgu n s dos seu s vizin h os. Ist o, n a m in h a
opin iã o, é u m er r o”.198
P elo con t r á r io, Ma n deville con clu i:
“A gr a n de a r t e pa r a t or n a r u m a n a çã o feliz, e o qu e ch a m a m os
flor escen t e, con sist e em da r a ca da u m a opor t u n ida de de est a r
em pr ega do; e, pa r a isso a lca n ça r , o pr im eir o cu ida do de u m go-
ver n o deve ser pr om over t oda a espécie de Ma n u fa t u r a s, Ar t es
e Ofícios qu e a cr ia t ivida de h u m a n a possa in ven t a r ; o segu n do,
est im u la r a Agr icu lt u r a e a P esca em t odos os seu s r a m os, a fim
de qu e a Ter r a in t eir a seja , com o o H om em , leva da a con t r ibu ir .
É por est a P olít ica , e n ã o pela fú t il r egu la m en t a çã o da P r odiga -
lida de e da F r u ga lida de, qu e se pode esper a r a gr a n deza e a
felicida de da s Na ções, por qu e, su ba ou desça o va lor do Ou r o e
da P r a t a , a sa t isfa çã o de t oda s a s Socieda des sem pr e depen der á
dos F r u t os da Ter r a e do Tr a ba lh o dos H om en s; coisa s qu e, ju n t a s,
com põem u m Tesou r o m a is fir m e, m a is in exa u r ível e m a is r ea l
qu e o Ou r o do Br a sil ou a P r a t a de P ot osi”.
Nã o é de a dm ir a r qu e sen t im en t os t ã o per ver sos t en h a m sido
do opr óbr io de dois sécu los de m or a list a s e econ om ist a s qu e se sen t ia m
m a is vir t u osos n a posse de su a a u st er a dou t r in a , segu n do a qu a l, for a
da m a is r igor osa econ om ia , t a n t o da pa r t e dos in divídu os com o do
E st a do, n ã o pode h a ver sa lva çã o. “As fest a s, os espet á cu los de ga la ,
os a r cos de t r iu n fo et c”, de P et t y, der a m lu ga r à econ om ia de vin t én s
da fin a n ça de Gla dst on e e a u m sist em a de est a do qu e “n ã o er a ca pa z
de cu st ea r ” h ospit a is, pa r qu es pú blicos ou edifícios m a jest osos, n em
sequ er con ser va r os seu s m on u m en t os a n t igos, e m u it o m en os fa vor ecer
o esplen dor da m ú sica e do t ea t r o, coisa s qu e se con fia va m à ca r ida de
pr iva da ou à liber a lida de de pa r t icu la r es im pr eviden t es.
Esta doutrina não reapareceu nos círculos respeitáveis senão ao
cabo de um século, quando na últim a fase de Malthus a noção da insu-
ficiência da dem anda efetiva assum iu lugar definido com o explicação cien-
tífica do desemprego. Visto já haver tratado deste assunto, com certa
profundidade, no meu ensaio sobre Malthus,199 será suficiente repetir
aqui uma ou duas passagens características citadas neste m eu ensaio:

198 Com pa r e-o com Ada m Sm it h , o pr ecu r sor da escola clá ssica , qu e escr eveu : “O qu e é pr u dên cia
n a con du t a de u m a fa m ília pr iva da pode ser in sen sa t ez n a de u m gr a n de r ein o” — pr ova -
velm en t e r efer in do-se à a n t er ior pa ssa gem de Ma n deville.
199 E ssays in B iograph y. pp. 139-147 [J MK, v. X., pp. 97-103].

331
OS ECON OMIS TAS

“Vem os, em qu a se t oda s a s pa r t es do m u n do, im en sa s for ça s


pr odu t iva s qu e n ã o en t r a m em a çã o, e explico est e fen ôm en o
dizen do qu e por fa lt a de u m a boa dist r ibu içã o dos pr odu t os exis-
t en t es n ã o h á m ot ivos a dequ a dos pa r a con t in u a r a pr odu zir . (...)
Su st en t o, fir m em en t e, qu e o esfor ço de a cu m u la r m u it o depr essa
im plica u m a dim in u içã o con sider á vel do con su m o im pr odu t ivo e
deve, en fr a qu ecen do m u it o os m ot ivos h a bit u a is da pr odu çã o, le-
va r a u m a pr em a t u r a est a gn a çã o o pr ogr esso da r iqu eza . (...)
P or ém , se é cer t o qu e o esfor ço de a cu m u la r m u it o depr essa pr o-
voca en t r e o t r a ba lh o e o lu cr o u m a divisã o de t a l n a t u r eza qu e
fa z desa pa r ecer qu a se com plet a m en t e o m ot ivo e o m eio de en -
r iqu ecer n o fu t u r o e, con seqü en t em en t e, elim in a a possibilida de
de m a n t er e em pr ega r u m a popu la çã o cr escen t e, n ã o se deve
r econ h ecer qu e sem elh a n t e a fã de a cu m u la r , ou pou pa r dem a -
sia da m en t e, pode ser r ea lm en t e pr eju dicia l a u m pa ís?200
“A qu est ã o est á em sa ber se est a est a gn a çã o do ca pit a l, e a
su bseqü en t e est a gn a çã o da pr ocu r a de m ã o-de-obr a , devida a u m
a u m en t o da pr odu çã o n ã o a com pa n h a do de u m a u m en t o a dequ a -
do de con su m o im pr odu t ivo por pa r t e dos pr opr iet á r ios de t er r a
e dos ca pit a list a s, pode ver ifica r -se, sem ca u sa r pr eju ízo a o pa ís,
sem oca sion a r u m a dim in u içã o n o gr a u de felicida de e de r iqu eza
em r ela çã o a o qu e exist ir ia se o con su m o im pr odu t ivo dos pr o-
pr iet á r ios de t er r a e ca pit a list a s fosse t ã o bem pr opor cion a do a os
exceden t es n a t u r a is da socieda de qu e m a n t ivesse per feit a con t i-
n u ida de n os m ot ivos da pr odu çã o, evit a n do, pr im eir o, u m a pr o-
cu r a a n or m a l de t r a ba lh o e, em segu ida , u m a dim in u içã o n eces-
sá r ia e r epen t in a dessa dem a n da . P or ém , se a ssim fosse, com o
ser ia cer t o dizer qu e a pa r cim ôn ia , em bor a possivelm en t e pr eju -
dicia l a os pr odu t or es, n ã o pode ser pa r a o E st a do, ou qu e u m
a u m en t o do con su m o im pr odu t ivo dos pr opr iet á r ios de t er r a e
ca pit a list a s pode n ã o ser , à s vezes, o r em édio específico pa r a u m
est a do de coisa s em qu e fa lh em os m ot ivos qu e im pu lsion a m a
pr odu çã o?201
“Ada m Sm it h a fir m ou qu e a pa r cim ôn ia a u m en t a o ca pit a l,
qu e t odo o h om em fr u ga l é u m ben feit or pú blico e qu e o cr esci-
m en t o da r iqu eza depen de do excesso da pr odu çã o sobr e o con -
su m o. Qu e est a s pr oposições seja m , em gr a n de pa r t e, ver da deir a s,
é in discu t ível... Ma s é eviden t e qu e n ã o sã o ver da deir a s em t er m os
a bsolu t os, e qu e os pr in cípios da pou pa n ça , leva dos a o ext r em o,
dest r u ir ia m o m ot ivo pa r a a pr odu çã o. Se ca da u m se con t en t a sse
com o a lim en t o m a is sim ples, a r ou pa m a is sin gela e a ca sa m a is
h u m ilde, é cer t o qu e n ã o exist ir ia m ou t r a s espécies de a lim en t os,

200 Um a ca r t a de Ma lt h u s a Rica r do, da t a da de 7 de ju lh o de 1821.


201 Um a ca r t a de Ma lt h u s a Rica r do, da t a da de 16 de ju lh o de 1821.

332
KEYN ES

de r ou pa s e de ca sa s. (...) Os dois ext r em os sã o eviden t es; e da í


se dedu z qu e h á de exist ir a lgu m pon t o in t er m ediá r io, em bor a
os r ecu r sos da econ om ia polít ica n ã o per m it a m det er m in á -lo, em
qu e, leva da s em con t a a ca pa cida de pr odu t iva e a von t a de de
con su m ir , o m ot ivo pa r a a u m en t a r a r iqu eza é m á xim o.202
“De t oda s a s opin iões qu e en con t r ei de h om en s ca p a zes e
in t eligen t es, a de Sa y, a fir m a n do qu e u n prod u it con som m é
ou d étru it est u n d ébou ch é ferm é (I. i, ca p . 15), pa r ece-m e ser
a m a is dir et a m en t e con t r á r ia à t eor ia cer t a e a m a is u n ifor -
m em en t e em desa cor d o com a exp er iên cia . Mesm o a ssim , ela
é u m a con seqü ên cia dir et a d a n ova d ou t r in a de qu e os ben s
só devem con sider a r -se em su a s r ela ções d ir et a s m ú t u a s, e
n ã o com os con su m idor es. O qu e, per gu n t o eu , ser ia da p r ocu r a
de ben s, se t odo o con su m o, excet u a n do o do pã o e o da á gu a ,
fosse su spen so du r a n t e a pr óxim a m et a d e d e a n o? Qu e a cu -
m u la çã o de m er ca dor ia s! Qu els d ébou ch és! Qu e p r od igioso m er -
ca do fa r ia su r gir esse even t o!”203

Rica r do, n o en t a n t o, m a n t eve-se com plet a m en t e su r do à s obser -


va ções de Ma lt h u s. O der r a deir o eco da con t r ovér sia a ch a -se n a expo-
siçã o de J oh n St u a r t Mill de su a t eor ia do fu n do de sa lá r ios,204 qu e,
n o seu en t en der , foi de im por t â n cia fu n da m en t a l n a su a r ejeiçã o da
ú lt im a fa se de Ma lt h u s, fiel a os pr in cípios em qu e, n a t u r a lm en t e, se
t in h a edu ca do. Os su cessor es de Mill r ejeit a r a m a su a t eor ia do fu n do
de sa lá r ios, m a s n ã o per ceber a m o fa t o de qu e su a r efu t a çã o de Ma lt h u s
depen dia dela . O m ét odo con sist ia em a fa st a r o pr oblem a do corpu s
da econ om ia , n ã o bu sca n do su a solu çã o, m a s deixa n do de o m en cion a r .
E ele desa pa r eceu por com plet o da con t r ovér sia . Ca ir n cr oss, qu e r e-
cen t em en t e lh e pr ocu r ou vest ígios en t r e a s figu r a s secu n dá r ia s da época
vit or ia n a ,205 en con t r ou , t a lvez, m en os a in da do qu e poder ia esper a r .206
As t eor ia s do su bcon su m o lim it a r a m -se a h iber n a r a t é a a pa r içã o, em
1889, da obr a T h e Ph ysiology of In d u stry, de J . A. H obson e A. F .
Mu m m er y, o pr im eir o e o m a is sign ifica t ivo de m u it os volu m es n os
qu a is, du r a n t e cer ca de cin qü en t a a n os, o pr ofessor H obson se a t ir ou
com den odo, m a s t a m bém sem êxit o, con t r a a s h ost es da or t odoxia .

202 P r efá cio a os Prin ciples of Political E con om y de Ma lt h u s, pp. 8 e 9.


203 MALTH US. Prin ciples of Political E con om y. p. 363, n ot a de r oda pé.
204 MILL, J . S. Political E con om y. Livr o P r im eir o, ca p. V. H á u m a a n á lise m u it o a pr ofu n da da
e im por t a n t e dest a pa r t e da t eor ia de Mill em MUMME RY e H OBSON. Ph ysiology of
In d u stry. p. 38 et seq., e pa r t icu la r m en t e de su a dou t r in a de “qu e u m a dem a n da de ben s
n ã o é u m a dem a n da de t r a ba lh o” (dou t r in a qu e Ma r sh a ll pr ocu r ou r efu t a r em su a a n á lise
bem pou co sa t isfa t ór ia da t eor ia do fu n do de sa lá r ios).
205 "Th e Vict or ia n s a n d In vest im en t ". In : E con om ic H istory. 1936.
206 O opú scu lo de F u lla r t on , On th e R egu lation of Cu rren cies (1844), é a m a is in t er essa n t e de
su a s r efer ên cia s.

333
OS ECON OMIS TAS

E m bor a h oje t en h a ca ído com plet a m en t e n o esqu ecim en t o, a p u bli-


ca çã o dest e livr o m a r ca , em cer t o sen t ido, u m a época n o p en sa m en t o
econ ôm ico. 207
T h e Ph ysiology of In d u stry foi escr it o em cola bor a çã o com A.
F . Mu m m er y. H obson con t a d est e m odo com o su r giu a idéia de es-
cr ever o livr o. 208
“F oi só n os m ea dos da déca da de 1880 qu e m in h a h et er odoxia
econ ôm ica com eçou a a dqu ir ir for m a . E m bor a a ca m pa n h a de
H en r y Geor ge con t r a os va lor es da t er r a e a s pr im eir a s a git a ções
de vá r ios gr u pos socia list a s con t r a a m a n ifest a opr essã o da s cla s-
ses t r a ba lh a dor a s, u n ida s à s r evela ções dos dois Boot h s sobr e a
pobr eza em Lon dr es, ca u sa ssem pr ofu n da im pr essã o em m eu s
sen t im en t os, n ã o dest r u ír a m m in h a fé n a E con om ia P olít ica . E s-
t es sen t im en t os su r gir a m de u m en con t r o a ciden t a l. Qu a n do eu
er a pr ofessor de u m a escola em E xet er , t r a vei r ela ções com u m
h om em de n egócios ch a m a do Mu m m er y, con h ecido en t ã o e pos-
t er ior m en t e com o u m gr a n de a lpin ist a qu e descobr ir a u m a n ova
t r ilh a pa r a o t opo do m on t e Cer vin o, e qu e em 1895 m or r eu n a
t en t a t iva de esca la r a fa m osa m on t a n h a Na n ga P a r ba t do H i-
m a la ia . Min h a s r ela ções com ele n ã o se est a belecer a m , n a t u r a l-
m en t e, n est e pla n o físico. Ma s ele er a , a o m esm o t em po, u m
a lpin ist a m en t a l, dot a do de n a t u r a l a pt idã o pa r a t r ilh a r seu pr ó-
pr io ca m in h o e de u m a su blim e in difer en ça pela a u t or ida de in -
t elect u a l. E sse h om em a r r a st ou -se a u m a discu ssã o sobr e a pou -
pa n ça excessiva , qu e ele con sider a va r espon sá vel pelo su bem pr e-
go de ca pit a l e de m ã o-de-obr a em per íodos de cr ise com er cia l.
P or m u it o t em po t en t ei com ba t er seu s a r gu m en t os em pr ega n do
a s a r m a s da econ om ia or t odoxa . Ma s por fim ele a ca bou con ven -
cen do-m e, e ju n t ei-m e a ele pa r a ela bor a r o con ceit o do excesso
de pou pa n ça n u m livr o in t it u la do T h e Ph ysiology of In d u stry,
pu blica do em 1889. F oi est e o pr im eir o pa sso efet ivo qu e dei n a
m in h a ca r r eir a de h er ét ico, e est a va lon ge de su speit a r su a s con -
seqü ên cia s. J u st a m en t e n essa a lt u r a a ca ba va de a ba n don a r m eu
post o de m est r e de escola e in icia va u m n ovo t r a ba lh o com o pr o-
fessor de E xt en sã o Un iver sit á r ia em E con om ia e Lit er a t u r a . O
prim eiro choque veio do Conselho de Extensão de Londres, recusando
dar-me permissão para ministrar cursos de Economia P olít ica . Ist o
se deveu , con for m e ch egou a o m eu con h ecim en t o, à in t er ven çã o

207 ROBE RTSON, J . M. T h e Fallacy of S avin g. Obr a pu blica da em 1892, su st en t a a h er esia


de Mu m m er y e H obson . P or ém , n ã o é u m a obr a de gr a n de va lor ou im por t â n cia , ca r ecen do
in t eir a m en t e da s pen et r a n t es in t u ições de T h e Ph ysiology of In d u stry.
208 De u m a con fer ên cia in t it u la da “Con fession s of a n E con om ic H er et ic”, pr on u n cia da per a n t e
a Lon don E t h ica l Societ y, em Con wa y H a ll, n o dom in go, 14 de ju lh o de 1935. Tr a n scr evo-a
a qu i com a devida per m issã o de H obson .

334
KEYN ES

de u m pr ofessor de E con om ia qu e ler a o m eu livr o e o con sider a va ,


com o r a ciocín io, equ iva len t e a u m a t en t a t iva pa r a dem on st r a r
qu e a t er r a é pla n a . Com o poder ia h a ver lim it es pa r a o m on t a n t e
da pou pa n ça ú t il, qu a n do t odo o a t o de pou pa r con t r ibu ía pa r a
a u m en t a r a est r u t u r a do ca pit a l e o fu n do dest in a do a o pa ga m en t o
de sa lá r ios? Os econ om ist a s sen sa t os n ã o podia m deixa r de en -
ca r a r com h or r or u m a r gu m en t o qu e pr ocu r a va im pedir a fon t e
de t odo o pr ogr esso in du st r ia l.209 Ou t r a exper iên cia in t er essa n t e
a ju dou -m e a con ceber a ext en sã o de m in h a in iqü ida de. Apesa r
de m e pr oibir em de en sin a r E con om ia em Lon dr es, fu i a u t or iza do,
gr a ça s à ext r em a liber a lida de do Movim en t o de E xt en sã o Un i-
ver sit á r ia de Oxfor d, a fa zer con fer ên cia s n a s P r ovín cia s, lim i-
t a n do-m e a pr oblem a s pr á t icos sobr e a vida da cla sse oper á r ia .
Su cedeu , en t ã o, qu e a Ch a r it y Or ga n iza t ion Societ y pr ojet a va
u m a ca m pa n h a com o in t u it o de a bor da r a ssu n t os econ ôm icos e
con vid ou -m e a pr epa r a r u m cu r so. E u expr essei m in h a dispo-
siçã o a em pr een der esse n ovo t r a ba lh o, qu a n do br u sca m en t e,
sem explica çã o a lgu m a , m e foi r et ir a do o con vit e. J u st a m en t e
n a qu ela oca siã o m e foi difícil com pr een der qu e, a o p ôr em dú -
vida a excelên cia d a fr u ga lida de ilim it a da , eu com et er a u m
peca d o im per doá vel."
E m su a obr a in icia l, H obson e seu cola bor a dor expr essa r a m -se
fa zen do r efer ên cia m a is dir et a à econ om ia clá ssica (n a qu a l H obson
h a via sido edu ca do) do qu e em seu s escr it os post er ior es; por est a r a zã o,
e t a m bém pelo fa t o de ser a pr im eir a exposiçã o de su a t eor ia , ext r a í
u m a cit a çã o dessa obr a pa r a m ost r a r o qu a n t o t in h a m de sign ifica t iva s
e de bem fu n da da s a s cr ít ica s e a s in t u ições desses a u t or es. Com o se
vê em segu ida , eles dest a ca r a m , em seu pr efá cio, a n a t u r eza da s con -
clu sões qu e for a m a lvo de seu a t a qu e:

“A pou pa n ça en r iqu ece e os ga st os em pobr ecem a com u n ida de


a o m esm o t em po qu e o in divídu o, e pode-se a fir m a r , de m a n eir a
ger a l, qu e o a pego efet ivo a o din h eir o é a or igem de t odo o bem -
est a r econ ôm ico. Nã o só en r iqu ece o in divídu o pa r cim on ioso, com o
t a m bém fa z su bir os sa lá r ios, pr opor cion a t r a ba lh o a os desem -
pr ega dos e espa lh a por t oda pa r t e os seu s ben efícios. Desde os
jor n a is diá r ios a t é os m a is r ecen t es t r a t a dos de econ om ia , desde
os pú lpit os a t é a Câ m a r a dos Com u n s, est a a fir m a çã o se r en ova ,
de m odo qu e se t or n ou qu a se u m a h er esia du vida r dela . Nã o

209 H obson escr eveu ir r ever en t em en t e em T h e Ph ysiology of In d u stry, p. 26: ”A pa r cim ôn ia é


a fon t e da r iqu eza n a cion a l e, qu a n t o m a is fr u ga l for u m a n a çã o, m a is r ica se t or n a . Ist o
é o qu e com u m en t e en sin a m qu a se t odos os econ om ist a s, m u it os dos qu a is em pr ega m u m
t om de a lt a dign ida de m or a l a o defen der o in fin it o va lor da pou pa n ça ; é est a a ú n ica n ot a
qu e ca t ivou , n os seu s fa st idiosos ca n t os, a fa vor do ou vido pú blico".

335
OS ECON OMIS TAS

obst a n t e, a t é a pu blica çã o da obr a de Rica r do, a ca m a da in st r u ída


da popu la çã o, a poia da pela m a ior ia dos pen sa dor es econ ôm icos,
r efu t a va en er gica m en t e est a dou t r in a , e su a a ceit a çã o só se deveu ,
exclu siva m en t e e em ú lt im a a n á lise, à su a in ca pa cida de pa r a
en fr en t a r a h oje desa cr edit a da dou t r in a do fu n do de sa lá r ios. Só
a a u t or ida de in discu t ível dos em in en t es espír it os qu e a su st en -
t a r a m pode explica r , com a exclu sã o de qu a lqu er ou t r a h ipót ese,
o fa t o de ela t er sobr evivido a o r a ciocín io em qu e se a poia va su a
ba se lógica . A cr ít ica econ ôm ica a in da se a ven t u r ou a a t a ca r cer t os
det a lh es da t eor ia , m a s r ecu ou a ssu st a da a n t es de ch ega r a su a s
con clu sões pr in cipa is. Nosso pr opósit o é dem on st r a r qu e essa s
con clu sões sã o in defen sá veis, qu e é possível h a ver u m a pr á t ica
exa ger a da do h á bit o de pou pa r , e qu e sem elh a n t e h á bit o em po-
br ece a Com u n ida de, pr iva os t r a ba lh a dor es de seu s em pr egos,
pr ovoca a ba ixa dos sa lá r ios e espa lh a n o m u n do dos n egócios a
est a gn a çã o e o desâ n im o, con h ecidos pelo n om e de Depr essã o
E con ôm ica . (...)
“O objet ivo da pr odu çã o é for n ecer a os con su m idor es ‘u t ili-
da des e com odida des’, e o pr ocesso segu e seu flu xo con t ín u o,
desde a s p r im eir a s m a n ipu la ções da m a t ér ia -pr im a a t é o m o-
m en t o em qu e est a é con su m id a sob a for m a de u m a u t ilid a de
ou de u m a con ven iên cia . Sen d o a ú n ica fu n çã o do Ca pit a l fa -
cilit a r a pr odu çã o dessa s u t ilida d es e con ven iên cia s, seu t ot a l
a em pr ega r va r ia r á , n ecessa r ia m en t e, com a qu a n t ida de da s
u t ilida des e da s con ven iên cia s qu e se con som em diá r ia e se-
m a n a lm en t e. Or a , a pou pa n ça , a o m esm o t em p o qu e a u m en t a
o est oqu e a gr ega do d e Ca pit a l, r edu z o volu m e da s u t ilid a des
e da s con ven iên cia s con su m id a s; qu a lqu er p r á t ica exa ger a da
dest e h á bit o leva r á , por t a n t o, a u m a a cu m u la çã o de Ca pit a l
su p er ior à qu ela qu e se n ecessit a , e o exceden t e ir á m a n ifes-
t a r -se sob a for m a de su per pr odu çã o ger a l”. 210

A or igem do er r o de H obson a pa r ece n a ú lt im a fr a se dest e t r ech o,


ou seja , ele su põe qu e a con seqü ên cia de u m a pou pa n ça é u m a a cu -
m u la çã o real de ca pit a l su per ior à s n ecessida des, qu a n do n a r ea lida de
se t r a t a de u m m a l secu n dá r io, u n ica m en t e devido a pr evisões m a l
feit a s, sen do qu e o m a l pr im or dia l r eside n a pr open sã o a pou pa r , em
con dições de plen o em pr ego, som a s su per ior es a o va lor do ca pit a l r e-
qu er ido, o qu e im pede a r ea liza çã o do plen o em pr ego, excet u a n do o
ca so de er r o de pr evisã o. Con t u do, u m a ou du a s pá gin a s a dia n t e, ele
expõe m et a de do pr oblem a com u m a pr ecisã o, n o m eu m odo de ver ,
a bsolu t a , em bor a esqu ecen do a in da o possível pa pel da s va r ia ções n a

210 H OBSON e MUMME RY. Ph isiology of In d u stry. pp. III/V.

336
KEYN ES

t a xa de ju r os e o est a do de con fia n ça dos n egócios, fa t or es qu e, pr o-


va velm en t e, ele su põe com o da dos:
“Ch ega m os, a ssim , à con clu sã o de qu e a s ba ses n a s qu a is se
a ssen t ou o en sin o econ ôm ico desde Ada m Sm it h , a sa ber , qu e o
volu m e da pr odu çã o a n u a l se det er m in a pela s qu a n t ida des a gr e-
ga da s dispon íveis de Agen t es Na t u r a is, Ca pit a l e Tr a ba lh o, est ã o
er r a da s, e qu e, pelo con t r á r io, sem poder u lt r a pa ssa r o lim it e
im post o por essa s qu a n t ida des a gr ega da s, o volu m e da pr odu çã o
a n u a l pode ser m a n t ido, e de fa t o se m a n t ém , a ba ixo do m á xim o
pelo obst á cu lo qu e opõem à pr odu çã o a pou pa n ça excessiva e a
su bseqü en t e a cu m u la çã o de exceden t es da ofer t a ; ist o é, n o est a do
n or m a l da s Com u n ida des in du st r ia is m oder n a s, é o con su m o qu e
lim it a a pr odu çã o e n ã o a pr odu çã o qu e lim it a o con su m o”.211

F in a lm en t e, ele obser va a posiçã o de su a t eor ia r ela t iva m en t e à


va lidez dos a r gu m en t os do livr e-com ér cio or t odoxo:
“Not a m os, t a m bém , qu e a a cu sa çã o de im becilida de com er cia l
t ã o fr eqü en t em en t e a r r em essa da pelos econ om ist a s or t odoxos
con t r a os n ossos pr im os a m er ica n os e ou t r a s Com u n ida des P r o-
t ecion ist a s n ã o pode m a is a poia r -se n os a r gu m en t os do Livr e-co-
m ér cio a du zidos a t é a gor a , vist o qu e t odos se ba seia m n a h ipót ese
da im possibilida de do excesso da ofer t a ”.212

O a r gu m en t o su bseqü en t e é, a bem dizer , in com plet o. Tr a t a -se,


por ém , da pr im eir a decla r a çã o explícit a do fa t o de qu e o ca pit a l se
for m a n ã o pela pr open sã o a pou pa r , m a s com o r espost a à pr ocu r a
r esu lt a n t e do con su m o r ea l e pr ová vel. As cit a ções espa r sa s segu in t es
in dica m a lin h a do r a ciocín io:
“Deve fica r cla r o qu e n ã o pode h a ver va n t a gem n o a u m en t o
do ca pit a l de u m a com u n ida de sem o cr escim en t o su bseqü en t e
do con su m o de m er ca dor ia s... Ca da a u m en t o da pou pa n ça e do
ca pit a l r equ er , pa r a ser efica z, u m a eleva çã o cor r espon den t e n o
con su m o im edia t a m en t e fu t u r o...213 E qu a n do fa la m os de con su m o
n ã o qu er em os dizer den t r o de dez, vin t e ou cin qü en t a a n os, m a s
n u m fu t u r o m u it o pou co a fa st a do do pr esen t e... Se o a u m en t o
da pa r cim ôn ia ou da pr eca u çã o in du zir os in divídu os a pou pa r
m a is n o pr esen t e, eles t êm de con cor da r em con su m ir m a is n o
fu t u r o...214 Nã o pode exist ir econ om ica m en t e m a is ca pit a l em
qu a lqu er m om en t o do pr ocesso pr odu t ivo qu e o exigido pa r a pr o-

211 H OBSON e MUMME RY. Ph ysiology of In d u stry. p. VI.


212 Op. cit., p. IX.
213 Op. cit., p. 27.
214 Op. cit., pp. 50-51.

337
OS ECON OMIS TAS

por cion a r ben s n o n ível cor r en t e de con su m o...215 É eviden t e qu e


m in h a pa r cim ôn ia em n a da a fet a a pa r cim ôn ia econ ôm ica t ot a l
da com u n ida de, a pen a s det er m in a n do se u m a pa r t e específica
da pa r cim ôn ia t ot a l ser á pr a t ica da por m im ou por a lgu m ou t r o.
Most r a r em os com o a pa r cim ôn ia de u m a pa r t e da com u n ida de
pode for ça r a ou t r a pa r t e a ga st a r m a is pa r a viver do qu e per -
m it em seu s r en dim en t os.216 A m a ior pa r t e dos econ om ist a s m o-
der n os n ega qu e o con su m o possa , em qu a lqu er cir cu n st â n cia ,
ser in su ficien t e. P odem os descobr ir a lgu m a for ça econ ôm ica ca pa z
de in cit a r u m a com u n ida de a est e excesso e, se t a l for ça exist ir ,
o m eca n ism o do com ér cio n ã o for n ecer á m eios efica zes de r es-
t r in gi-la . Dem on st r a r em os, em pr im eir o lu ga r , qu e em t oda so-
cieda de in du st r ia l bem or ga n iza da h á , em fu n cion a m en t o con s-
t a n t e, u m a for ça qu e in du z n a t u r a lm en t e a u m excesso de pa r -
cim ôn ia e, em segu n do lu ga r , qu e os obst á cu los qu e su post a m en t e
cr ia o m eca n ism o do com ér cio sã o com plet a m en t e in oper a n t es ou
in a dequ a dos pa r a evit a r gr a ves da n os com er cia is...217 A con cisa
r espost a de Rica r do a os a r gu m en t os de Ma lt h u s e Ch a lm er s pa -
r ece t er sido a ceit a pela m a ior ia dos econ om ist a s de t em pos m a is
r ecen t es. ‘A pr odu çã o com pr a -se sem pr e com pr odu çã o ou com
ser viços; a m oeda é a pen a s o m eio u t iliza do pa r a efet u a r a t r oca .
Con seqü en t em en t e, sen do u m a u m en t o de pr odu çã o a com pa n h a -
do sem pr e de u m a u m en t o cor r espon den t e do poder de a qu isiçã o
e de con su m o, n ã o r est a possibilida de de Su per pr odu çã o.’” (Ri-
ca r do, Prin . of Pol. E con ., p. 362.)218

H obson e Mu m m er y sa bia m qu e o ju r o n ã o pa ssa de u m pa ga -


m en t o pelo u so do din h eir o.219 Sa bia m t a m bém per feit a m en t e qu e os
seu s oposit or es a lega r ia m qu e h a ver ia “t ã o n ot á vel r edu çã o n a t a xa
de ju r os (ou do lu cr o), su ficien t e pa r a desest im u la r a pou pa n ça e r es-
t a u r a r a r ela çã o pr ópr ia en t r e a pr odu çã o e o con su m o”.220 E m r espost a
a isso, obser va m qu e “a qu eda do Lu cr o só pode in du zir a s pessoa s a
pou pa r m en os de du a s m a n eir a s: in du zin do-a s a ga st a r m a is ou in du -
zin do-a s a pr odu zir m en os”.221 No qu e r espeit a à pr im eir a , su st en t a m
qu e, qu a n do os lu cr os ba ixa m , a r en da a gr ega da da com u n ida de se
r edu z, e “n ã o podem os su por qu e, qu a n do a r en da m édia dim in u i, os
in divídu os seja m in du zidos a a u m en t a r o r it m o de seu con su m o pelo

215 Op. cit., p. 69.


216 Op. cit., p. 113.
217 Op. cit., p. 100.
218 Op. cit., p. 101.
219 Op. cit., p. 79.
220 Op. cit., p. 117.
221 Op. cit., p. 130.

338
KEYN ES

fa t o de qu e t a m bém o pr êm io à pa r cim ôn ia dim in u i de for m a cor r es-


pon den t e”; qu a n t o à segu n da m a n eir a , “est á m u it o lon ge de n ossa in -
t en çã o n ega r qu e u m decr éscim o do lu cr o, devido a o excesso de ofer t a ,
possa ser u m obst á cu lo à pr odu çã o; qu e o r econ h ecim en t o do pa pel
dest e obst á cu lo con st it u a a pr ópr ia ba se do n osso r a ciocín io”.222 E n -
t r et a n t o, su a t ese n ã o ch egou a ser com plet a , essen cia lm en t e por lh e
fa lt a r u m a t eor ia in depen den t e da t a xa de ju r os, com o r esu lt a do de
qu e H obson põe dem a sia da ên fa se (n ot a da m en t e em seu s ú lt im os livr os)
n o su bcon su m o qu e leva a o su per in vest im en t o, n o sen t ido de in vest i-
m en t os desva n t a josos, em vez de explica r qu e u m a pr open sã o r ela t i-
va m en t e fr a ca a con su m ir con t r ibu i pa r a ca u sa r o desem pr ego; isso
por qu e t a l pr open sã o dever ia ser a com pa n h a da , e por qu e n ão r ecebe
esse a com pa n h a m en t o, de u m volu m e com pen sa dor de n ovo in vest i-
m en t o, o qu a l, em bor a a lgu m a s vezes ocor r en do t em por a r ia m en t e em
con seqü ên cia de er r os de ot im ism o, é ger a lm en t e im pedido pela ba ixa
do lu cr o esper a do a u m n ível in fer ior a o fixa do pela t a xa de ju r os.
A pa r t ir da gu er r a h ou ve u m dilú vio de t eor ia s h er ét ica s de su b-
con su m o, da s qu a is a s m a is fa m osa s sã o a s do m a jor Dou gla s. A for ça
de a r gu m en t a çã o do m a jor Dou gla s pr ovém , a liá s, em gr a n de pa r t e
do fa t o de a or t odoxia n ã o t er r espost a vá lida pa r a m u it a s de su a s
cr ít ica s dest r u t iva s. P or ou t r o la do, os det a lh es de seu dia gn óst ico, em
pa r t icu la r o t eor em a ch a m a do A + B , con t ém gr a n de pa r t e de pu r a
m ist ifica çã o. Se o m a jor Dou gla s h ou vesse lim it a do a ca t egor ia B à s
r eser va s fin a n ceir a s dos em pr esá r ios a qu e n ã o cor r espon dem despesa s
cor r en t es com su bst it u ições ou r en ova ções, est a r ia bem m a is per t o da
ver da de. Mesm o n esse ca so, por ém , é n ecessá r io leva r em con t a qu e
essa s r eser va s podem ser con t r a ba la n ça da s t a n t o por in vest im en t os
n ovos em ou t r os set or es, com o por a u m en t o dos ga st os de con su m o. O
Ma jor Dou gla s fa z ju s, a o con t r á r io de a lgu n s de seu s oposit or es or -
t odoxos, pelo m en os a o m ér it o de n ã o h a ver esqu ecido t ot a lm en t e o
pr oblem a essen cia l do n osso sist em a econ ôm ico. E m t odo o ca so, n ã o
se lh e pode da r a m esm a gr a du a çã o — solda do r a so, t a lvez, m a s n ã o
m a jor do va lor oso exér cit o dos h er ét icos — qu e a Ma n deville, Ma lt h u s,
Gesell e H obson , os qu a is, fiéis a su a s in t u ições, pr efer ir a m a ceit a r a
ver da de de for m a obscu r a e im per feit a do qu e su st en t a r u m er r o, ba -
sea do, sem dú vida , em u m a lógica sim ples, cla r a e con sist en t e, m a s
a licer ça da em h ipót eses in com pa t íveis com os fa t os.

222 H OBSON e MUMME RY. Ph ysiology of In d u stry. p. 131.

339
C AP ÍTU LO 24
N o ta s F in a is S o bre a F ilo s o fia S o c ia l a qu e
P o d e ria Le v a r a Te o ria Ge ra l

O s pr in cipa is defeit os da socieda de econ ôm ica em qu e vivem os


sã o a su a in ca pa cida de pa r a pr opor cion a r o plen o em pr ego e a su a
a r bit r á r ia e desigu a l dist r ibu içã o da r iqu eza e da s r en da s. A r ela çã o
da t eor ia a n t er ior m en t e expost a com o pr im eir o defeit o é óbvia . Ma s
h á t a m bém dois pon t os im por t a n t es em qu e ela é r eleva n t e pa r a o
segu n do.
Desde o fim do sécu lo XIX, a t r ibu t a çã o dir et a — im post o sobr e
a r en da e sobr et a xa s, e im post os sobr e a s h er a n ça s — vem con segu in do
r ea liza r , especia lm en t e n a Gr ã -Br et a n h a , con sider á vel pr ogr esso n a
dim in u içã o da s gr a n des desigu a lda des de r iqu eza e de r en da . Mu it os
deseja r ia m qu e est e pr ocesso fosse leva do bem m a is a dia n t e, m a s vêem -
se im pedidos por du a s con sider a ções; em pa r t e, pelo r eceio de t or n a r
a s eva sões bem u r dida s dem a sia do va n t a josa s e, t a m bém , pelo de en -
fr a qu ecer excessiva m en t e o in cen t ivo de cor r er r iscos; por ém o qu e, n a
m in h a opin iã o, sobr et u do os det ém é a idéia de qu e o a u m en t o do
ca pit a l depen de do vigor dos m ot ivos qu e im pelem à pou pa n ça , e de
qu e u m a gr a n de pr opor çã o desse cr escim en t o depen de da s pou pa n ça s
dos r icos a pa r t ir do qu e lh es é su pér flu o. Nossa a r gu m en t a çã o n ã o
a fet a a pr im eir a dest a s con sider a ções. Ma s pode m odifica r con sider a -
velm en t e o n osso pon t o de vist a sobr e a segu n da , pois já vim os qu e,
den t r o dos lim it es da exist ên cia do plen o em pr ego, o cr escim en t o do
ca pit a l n ã o depen de a bsolu t a m en t e de u m a ba ixa pr open sã o a con su -
m ir , m a s é, a o con t r á r io, r epr im ido pela m esm a , e qu e a pen a s em
con dições de plen o em pr ego pode u m a ba ixa pr open sã o a con su m ir
leva r a o cr escim en t o do ca pit a l. Adem a is, a exper iên cia en sin a qu e,
n a s con dições exist en t es, a pou pa n ça por m eio de in st it u ições e de
fu n dos de a m or t iza çã o é m a is qu e a dequ a da , e qu e a s m edida s dest i-

341
OS ECON OMIS TAS

n a da s a r edist r ibu ir a r en da n o sen t ido de a u m en t a r a pr open sã o a


con su m ir podem ser m u it o fa vor á veis a o cr escim en t o do ca pit a l.
A cr en ça t ã o gen er a liza da de qu e os im post os sobr e h er a n ça s sã o
r espon sá veis pela r edu çã o da r iqu eza de ca pit a l de u m pa ís r eflet e a
con fu sã o qu e r ein a en t r e o pú blico n est e a spect o. Su pon do qu e o E st a do
a pliqu e o pr odu t o dest es im post os em su a s despesa s com u n s, de m odo
qu e os im post os sobr e a r en da e o con su m o se r edu za m ou a n u lem
cor r espon den t em en t e, é n a t u r a lm en t e in egá vel qu e u m a polít ica fisca l
de a lt os im post os sobr e h er a n ça s fa z a u m en t a r a pr open sã o da com u -
n ida de a con su m ir . Ma s, com o u m a u m en t o da pr open sã o h a bit u a l a
con su m ir con t r ibu i, em ger a l (ist o é, excet u a n do a s con dições de plen o
em pr ego), pa r a eleva r o in cen t ivo a o in vest im en t o, a con clu sã o qu e da í
se t ir a é qu a se sem pr e opost a à ver da de.
O n osso r a ciocín io leva -n os, desse m odo, à con clu sã o de qu e, n a s
con dições con t em por â n ea s, a a bst in ên cia dos r icos m a is pr ova velm en t e
t olh e do qu e fa vor ece o cr escim en t o da r iqu eza . F ica a ssim in va lida da
u m a da s pr in cipa is ju st ifica t iva s socia is da gr a n de desigu a lda de da
r iqu eza . Nã o qu er o dizer qu e h a ja ou t r a s r a zões, in depen den t es da
n ossa t eor ia , ca pa zes de ju st ifica r cer t a desigu a lda de em det er m in a da s
cir cu n st â n cia s, por ém n ossa t ese elim in a cer t a m en t e a r a zã o m a is im -
por t a n t e qu e a t é a gor a vem sen do o m ot ivo de pen sa r m os n a con ve-
n iên cia de a gir com m oder a çã o. Ist o a fet a pa r t icu la r m en t e n osso m odo
de en ca r a r os im post os sobr e h er a n ça s, pois h á cer t a s ju st ifica t iva s da
desigu a lda de da s r en da s qu e n ã o podem a plica r -se à desigu a lda de da s
h er a n ça s.
Do m eu pon t o de vist a , cr eio h a ver ju st ifica t iva socia l e psicológica
pa r a gr a n des desigu a lda des n a s r en da s e n a r iqu eza , em bor a n ã o pa r a
a s gr a n des dispa r ida des exist en t es n a a t u a lida de. E xist em va liosa s
a t ivida des h u m a n a s qu e r equ er em o m ot ivo do lu cr o e a a t m osfer a da
pr opr ieda de pr iva da de r iqu eza pa r a qu e possa m da r os seu s fr u t os.
Além disso, a possibilida de de ga n h a r din h eir o e fa zer for t u n a pode
or ien t a r cer t a s in clin a ções per igosa s da n a t u r eza h u m a n a pa r a ca m i-
n h os on de ela s se t or n em r ela t iva m en t e in ofen siva s e, n ã o sen do sa -
t isfeit a s desse m odo, possa m ela s bu sca r u m a sa ída n a cr u elda de, n a
desen fr ea da a m biçã o de poder e de a u t or ida de e a in da em ou t r a s for m a s
de en gr a n decim en t o pessoa l. É pr efer ível qu e a lgu ém t ir a n ize seu sa ldo
n o ba n co do qu e os seu s con cida dã os e, em bor a o pr im eir o ca so seja
a lgu m a s vezes u m m eio de leva r a o segu n do, em cer t os ca sos é pelo
m en os u m a a lt er n a t iva . Toda via , n ã o é n ecessá r io, pa r a est im u la r essa s
a t ivida des e sa t isfa zer essa s in clin a ções, qu e o jogo seja feit o com a pos-
t a s t ã o a lt a s com o a gor a . Apost a s m en or es leva r ia m igu a lm en t e a o
m esm o r esu lt a do, desde qu e os joga dor es se h a bit u a ssem a ela s. A
t a r efa de m odifica r a n a t u r eza h u m a n a n ã o deve ser con fu n dida com
a de a dm in ist r á -la . E m bor a n a com u n ida de idea l os h om en s possa m
ser a cost u m a dos, in spir a dos ou en sin a dos a desin t er essa r -se do jogo,

342
KEYN ES

a sa bedor ia e a pr u dên cia da a r t e polít ica devem per m it ir a pr á t ica


do jogo, em bor a sob cer t a s r egr a s e lim it a ções, em se con sider a n do
qu e o h om em com u m , ou m esm o u m a fr a çã o im por t a n t e da com u n ida de,
é a lt a m en t e in clin a do à pa ixã o pelo lu cr o.
II

H á , con t u do, u m segu n do a spect o do n osso a r gu m en t o cu ja s con -


seqü ên cia s sã o m u it o m a is im por t a n t es pa r a o fu t u r o da s desigu a lda des
de r iqu eza , a sa ber , a n ossa t eor ia da t a xa de ju r os. A ju st ifica t iva de
u m a t a xa de ju r os m oder a da m en t e eleva da foi en con t r a da , a t é a qu i,
n a n ecessida de de pr opor cion a r est ím u lo su ficien t e à pou pa n ça . De-
m on st r a m os, por ém , qu e a ext en sã o da pou pa n ça efet iva é r igor osa -
m en t e det er m in a da pelo m on t a n t e de in vest im en t o, e qu e est e m on -
t a n t e cr esce por efeit o de u m a t a xa de ju r os baixa, desde qu e n ã o
t en t em os levá -lo por esse ca m in h o a lém do n ível qu e cor r espon de a o
plen o em pr ego. Assim sen do, o qu e m a is n os con vém é r edu zir a t a xa
de ju r os a t é o n ível em qu e, em r ela çã o à cu r va da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l, se r ea lize o plen o em pr ego.
Nã o pode h a ver dú vida de qu e est e cr it ér io ser vir á pa r a fa zer
ba ixa r a t a xa de ju r os m u it o a lém do n ível qu e a t é a gor a t em vigor a do;
e, à m edida qu e se possa m est im a r os va lor es da eficiên cia m a r gin a l
do ca pit a l qu e cor r espon dem a qu a n t ida des cr escen t es de volu m es de
ca pit a l, é possível qu e a t a xa de ju r os ca ia u n ifor m em en t e, ca so seja
exeqü ível m a n t er a s con dições m a is ou m en os con t ín u a s de plen o em -
pr ego — sa lvo, n a t u r a lm en t e, se h ou ver u m a m odifica çã o con sider á vel
n a pr open sã o a gr ega da a con su m ir (in clu in do o E st a do).
E st ou con ven cido de qu e a pr ocu r a de ca pit a l é est r it a m en t e li-
m it a da , n o sen t ido de qu e n ã o ser ia difícil a u m en t a r o est oqu e de
ca pit a l a t é qu e su a eficiên cia m a r gin a l a t in ja u m a cifr a m u it o ba ixa .
Nã o qu er ist o dizer qu e o u so dos ben s de ca pit a l pa sse a cu st a r qu a se
n a da , m a s a pen a s qu e a su a r et r ibu içã o cu br a u m pou co m a is do qu e
a depr ecia çã o devida a o desga st e e à obsolescên cia , a o m esm o t em po
qu e deixe u m a cer t a m a r gem dest in a da a com pen sa r os r iscos e o
exer cício da h a bilida de e do ju lga m en t o. E m r esu m o, o r en dim en t o
a gr ega do dos ben s du r á veis du r a n t e t oda a su a vida cobr ir ia ju st a -
m en t e, com o n o ca so dos ben s de cu r t a du r a çã o, o cu st o de t r a ba lh o
n ecessá r io pa r a os pr odu zir , m ais u m a m a r gem cor r espon den t e a o r isco
e a o cu st o da h a bilida de e da su per visã o.
Or a , em bor a est e est a do de coisa s seja per feit a m en t e com pa t ível
com cer t o gr a u de in dividu a lism o, a in da a ssim leva r ia à eu t a n á sia do
ren tier e, con seqü en t em en t e, à eu t a n á sia do poder cu m u la t ivo de opr es-
sã o do ca pit a list a em explor a r o va lor de esca ssez do ca pit a l. A t a xa
de ju r os a t u a l n ã o com pen sa n en h u m ver da deir o sa cr ifício, do m esm o
m odo qu e n ã o o fa z a r en da da t er r a . O det en t or do ca pit a l pode con -
segu ir ju r os por qu e o ca pit a l é esca sso, a ssim com o o don o da t er r a

343
OS ECON OMIS TAS

pode obt er u m a r en da por qu e a t er r a é esca ssa . Ma s, en qu a n t o h ou ver


r a zões in t r ín seca s pa r a a esca ssez da t er r a , n ã o h á r a zões in t r ín seca s
pa r a a esca ssez do ca pit a l. Um a r a zã o in t r ín seca pa r a sem elh a n t e
esca ssez, n o sen t ido de u m ver da deir o sa cr ifício qu e só a ofer t a de
u m a r ecom pen sa em for m a de ju r os fizesse su r gir , n ã o poder ia exist ir
de m a n eir a du r á vel, a m en os qu e a pr open sã o in dividu a l a con su m ir
fosse de t a l n a t u r eza qu e a pou pa n ça líqu ida , em sit u a çã o de plen o
em pr ego, deixa sse de exist ir a n t es de o ca pit a l ch ega r a ser su ficien -
t em en t e a bu n da n t e. Mesm o a ssim , o E st a do a in da t er ia o r ecu r so de
m a n t er u m a pou pa n ça a gr ega da a u m n ível qu e per m it isse o cr esci-
m en t o do ca pit a l a t é qu e su a esca ssez desa pa r ecesse.
Con seqü en t em en t e, eu con sider o o a spect o do ren tier do ca pit a -
lism o com o sen do u m a fa se t r a n sit ór ia , qu e desa pa r ecer á logo qu e t en h a
desem pen h a do su a fu n çã o. E com o desa pa r ecim en t o dest e a spect o
m u it a s ou t r a s t r a n sfor m a ções dever ã o ocor r er . Além disso, u m a gr a n de
va n t a gem n a or dem dos a con t ecim en t os qu e pr econ izo con sist e em qu e
a eu t a n á sia do ren tier, do in vest idor sem fu n çã o, n a da t er á de r epen t in o,
m a s ser á m er a m en t e u m a con t in u a çã o gr a du a l e pr olon ga da do qu e
vim os obser va n do r ecen t em en t e n a Gr ã -Br et a n h a , sem ca r ecer de qu a l-
qu er r evolu çã o.
Na pr á t ica , por t a n t o, o n osso objet ivo dever ia ser con segu ir (e
ist o n a da t em de ir r ea lizá vel) u m a u m en t o n o volu m e de ca pit a l a t é
qu e ele deixe de ser esca sso, de m odo qu e o in vest idor sem fu n çã o
deixe de r eceber qu a lqu er ben efício, e depois cr ia r u m sist em a de t r i-
bu t a çã o dir et a qu e per m it a a in t eligên cia , a det er m in a çã o, a h a bilida de
execu t iva do fin a n cist a , do em pr esá r io et h oc gen u s om n e (cer t a m en t e
t ã o or gu lh osos de su a s fu n ções qu e poder ia obt er -se o seu t r a ba lh o
m u it o m a is ba r a t o qu e a gor a ) a dedica r -se a t iva m en t e à com u n ida de
em con dições r a zoá veis de r em u n er a çã o.
Ao m esm o t em po t em os de r econ h ecer qu e só a exper iên cia pode
m ost r a r a t é qu e pon t o con vém or ien t a r a von t a de popu la r , in cor por a da
n a polít ica do E st a do, n o sen t ido de a u m en t a r e su plem en t a r o in cen t ivo
a in vest ir , e a t é qu e pon t o con vém est im u la r a pr open sã o m édia a
con su m ir , sem a ba n don a r o n osso objet ivo de pr iva r o ca pit a l de seu
va lor de esca ssez em u m a ou du a s ger a ções. P ode a con t ecer qu e a
pr open sã o a con su m ir se for t a leça sem m a ior es dificu lda des por efeit o
de u m a t a xa de ju r os decr escen t e, de t a l m odo qu e o plen o em pr ego
se a lca n ce com u m flu xo de a cu m u la çã o pou co m a ior qu e o a t u a l. Nesse
ca so, u m pla n o pa r a cobr a r im post os m a is eleva dos da s gr a n des r en da s
e h er a n ça s poder ia t er o in con ven ien t e de con du zir a o plen o em pr ego
com u m a t a xa de a cu m u la çã o ba st a n t e in fer ior a o n ível cor r en t e. Nã o
se deve im a gin a r qu e n ego a possibilida de ou m esm o a pr oba bilida de
dest e r esu lt a do, pois, em a ssu n t os dest a n a t u r eza , ser ia t em er á r io pr e-
ver com o r ea gir ia o h om em m édio em fa ce de u m a m u da n ça de m ét odo.
Con t u do, se fosse fá cil con segu ir u m a a pr oxim a çã o do plen o em pr ego

344
KEYN ES

com u m a t a xa de a cu m u la çã o n ã o m u it o m a ior qu e a pr esen t e, pelo


m en os t er -se-ia r esolvido u m pr oblem a de m á xim a im por t â n cia . F ica r ia
pa r a decidir , em sepa r a do, em qu e pr opor çã o e por qu e m eios ser ia
ju st o e r a zoá vel in voca r a ger a çã o a t u a l a r edu zir seu con su m o, pa r a
qu e os seu s descen den t es possa m goza r , n o devido t em po, de u m est a do
de plen o in vest im en t o.
III

As im plica ções da t eor ia expost a n a s pá gin a s pr eceden t es sã o, a


ou t r os r espeit os, r a zoa velm en t e con ser va dor a s. E m bor a essa t eor ia in -
diqu e ser de im por t â n cia vit a l o est a belecim en t o de cer t os con t r oles
sobr e a t ivida des qu e h oje sã o con fia da s, em su a m a ior ia , à in icia t iva
pr iva da , h á m u it a s ou t r a s á r ea s qu e per m a n ecem sem in t er fer ên cia .
O E st a do dever á exer cer u m a in flu ên cia or ien t a dor a sobr e a pr open sã o
a con su m ir , em pa r t e a t r a vés de seu sist em a de t r ibu t a çã o, em pa r t e
por m eio da fixa çã o da t a xa de ju r os e, em pa r t e, t a lvez, r ecor r en do
a ou t r a s m edida s. P or ou t r o la do, pa r ece im pr ová vel qu e a in flu ên cia
da polít ica ba n cá r ia sobr e a t a xa de ju r os seja su ficien t e por si m esm a
pa r a det er m in a r u m volu m e de in vest im en t o ót im o. E u en t en do, por -
t a n t o, qu e u m a socia liza çã o a lgo a m pla dos in vest im en t os ser á o ú n ico
m eio de a ssegu r a r u m a sit u a çã o a pr oxim a da de plen o em pr ego, em bor a
isso n ã o im pliqu e a n ecessida de de exclu ir a ju st es e fór m u la s de t oda
a espécie qu e per m it a m a o E st a do cooper a r com a in icia t iva pr iva da .
Ma s, for a disso, n ã o se vê n en h u m a r a zã o eviden t e qu e ju st ifiqu e u m
socia lism o do E st a do a br a n gen do a m a ior pa r t e da vida econ ôm ica da
n a çã o. Nã o é a pr opr ieda de dos m eios de pr odu çã o qu e con vém a o
E st a do a ssu m ir . Se o E st a do for ca pa z de det er m in a r o m on t a n t e a gr e-
ga do dos r ecu r sos dest in a dos a a u m en t a r esses m eios e a t a xa bá sica
de r em u n er a çã o a os seu s det en t or es, t er á r ea liza do o qu e lh e com pet e.
Adem a is, a s m edida s n ecessá r ia s de socia liza çã o podem ser in t r odu -
zida s gr a du a lm en t e sem a fet a r a s t r a dições gen er a liza da s da socieda de.
Nossa cr ít ica à t eor ia econ ôm ica clá ssica ger a lm en t e a ceit a con -
sist iu m en os em r evela r os defeit os lógicos de su a a n á lise do qu e em
a ssin a la r o fa t o de qu e a s su a s h ipót eses t á cit a s n u n ca ou qu a se n u n ca
sã o sa t isfeit a s, com a con seqü ên cia de qu e ela se m ost r a in ca pa z de
r esolver os pr oblem a s econ ôm icos do m u n do r ea l. E n t r et a n t o, se os
n ossos con t r oles cen t r a is logr a r em est a belecer u m volu m e de pr odu çã o
a gr ega do cor r espon den t e o m a is a pr oxim a da m en t e possível a o plen o
em pr ego, a t eor ia clá ssica r et om a r á , da í em dia n t e, a su a devida po-
siçã o. Se con sider a r m os da do o volu m e da pr odu çã o, ist o é, se o su -
pu ser m os det er m in a do por for ça s a lh eia s à con cepçã o da escola clá ssica ,
n a da h á a opor à a n á lise clá ssica con cer n en t e à m a n eir a com o o in -
t er esse pessoa l det er m in a r á o qu e se pr odu z especifica m en t e, em qu e
pr opor çã o se a ssocia r ã o os fa t or es pa r a t a l fim e com o se dist r ibu ir á
en t r e eles o va lor da pr odu çã o obt ida . P a r a r eit er a r a n ossa opin iã o,

345
OS ECON OMIS TAS

o fa t o de t er m os t r a t a do de m a n eir a difer en t e do pr oblem a da pa r ci-


m ôn ia n ã o sign ifica qu e h a ja a lgo a objet a r à t eor ia clá ssica m oder n a
qu a n t o a o gr a u de con cilia çã o en t r e a s va n t a gen s pú blica s e pa r t icu -
la r es, t a n t o em r egim e de con cor r ên cia per feit a qu a n t o em r egim e de
con cor r ên cia im per feit a . Assim sen do, for a a n ecessida de de u m con t r ole
cen t r a l pa r a m a n t er o a ju st e en t r e a pr open sã o a con su m ir e o est ím u lo
pa r a in vest ir , n ã o h á m a is r a zã o do qu e a n t es pa r a socia liza r a vida
econ ôm ica .
P a r a coloca r a qu est ã o n u m pla n o con cr et o, n ã o vejo por qu e o
sist em a exist en t e fa r ia m a u u so dos fa t or es de pr odu çã o u t iliza dos.
Com et em -se, n a t u r a lm en t e, er r os de pr evisã o, qu e a liá s n ã o se evit a -
r ia m , cen t r a liza n do a s decisões. Qu a n do sobr e 10 m ilh ões de h om en s
desejosos e ca pa zes de t r a ba lh a r h á 9 m ilh ões em pr ega dos, n a da per -
m it e a fir m a r qu e o t r a ba lh o desses 9 m ilh ões de h om en s seja m a l
or ien t a do. A qu eixa con t r a o sist em a pr esen t e n ã o con sist e em qu e
esses 9 m ilh ões dever ia m ser em pr ega dos em t a r efa s difer en t es, sen ã o
em qu e dever ia h a ver t r a ba lh o dispon ível pa r a o r est a n t e 1 m ilh ã o de
h om en s. É o volu m e e n ã o a dir eçã o do em pr ego efet ivo o r espon sá vel
pelo cola pso do sist em a a t u a l.
P or isso con cor do com Gessell em qu e o pr een ch im en t o da s la -
cu n a s da t eor ia clá ssica n ã o leva a a ba n don a r o “Sist em a de Ma n ch es-
t er ”, m a s a in dica r a n a t u r eza do m eio qu e exige o livr e jogo da s for ça s
econ ôm ica s pa r a ser ca pa z de r ea liza r t oda a pot en cia lida de da pr o-
du çã o. Os con t r oles cen t r a is n ecessá r ios pa r a a ssegu r a r o plen o em -
pr ego exigir ã o, n a t u r a lm en t e, u m a con sider á vel ext en sã o da s fu n ções
t r a dicion a is de gover n o. A pa r disso, a pr ópr ia t eor ia clá ssica m oder n a
ch a m ou a a t en çã o sobr e a s vá r ia s con dições em qu e pode ser n ecessá r io
r efr ea r ou gu ia r o livr e jogo da s for ça s econ ôm ica s. Toda via , su bsist ir á
a in da u m a gr a n de a m plit u de, qu e per m it a o exer cício da in icia t iva e
r espon sa bilida de pr iva da s. Nesse dom ín io, a s va n t a gen s t r a dicion a is
do in dividu a lism o con t in u a r ã o a in da sen do vá lida s.
P a r em os u m m om en t o pa r a r ecor da r essa s va n t a gen s. E m pa r t e
sã o va n t a gen s de eficiên cia — a s va n t a gen s da descen t r a liza çã o e do
jogo do in t er esse pessoa l. Do pon t o de vist a da eficiên cia , a s va n t a gen s
da descen t r a liza çã o da s decisões e da r espon sa bilida de in dividu a l sã o
t a lvez m a ior es do qu e ju lgou o sécu lo XIX, e a r ea çã o con t r a o a t r a t ivo
do in t er esse pessoa l t a lvez t en h a ido dem a sia do lon ge. P or ém , a cim a
de t u do, o in dividu a lism o, se pu der ser pu r ga do de seu s defeit os e
a bu sos, é a m elh or sa lva gu a r da da liber da de pessoa l, n o sen t ido de
qu e a m plia m a is do qu e qu a lqu er ou t r o sist em a o ca m po pa r a o exer cício
da s escolh a s pessoa is. É t a m bém a m elh or sa lva gu a r da da va r ieda de
da vida , qu e desa br och a ju st a m en t e desse ext en so ca m po da s escolh a s
pessoa is, e cu ja per da é a m a is sen sível de t oda s a s qu e a ca r r et a o
E st a do h om ogên eo ou t ot a lit á r io. E ssa va r ieda de pr eser va a s t r a dições
qu e en cer r a m o qu e de m a is segu r o e a u spicioso r eu n ir a m a s ger a ções

346
KEYN ES

pa ssa da s, dá cor a o pr esen t e com os diver sos m a t izes de su a fa n t a sia ,


e ser vin do a exper iên cia , bem com o a t r a diçã o e a im a gin a çã o, é o
m a is poder oso in st r u m en t o pa r a con du zir à m elh or ia do fu t u r o.
P or isso, en qu a n t o a a m plia çã o da s fu n ções do gover n o, qu e su põe
a t a r efa de a ju st a r a pr open sã o a con su m ir com o in cen t ivo pa r a in -
vest ir , poder ia pa r ecer a u m pu blicist a do sécu lo XIX ou a u m fin a n cist a
a m er ica n o con t em por â n eo u m a t er r ível t r a n sgr essã o do in dividu a lism o,
eu a defen do, a o con t r á r io, com o o ú n ico m eio exeqü ível de evit a r a
dest r u içã o t ot a l da s in st it u ições econ ôm ica s a t u a is e com o con diçã o de
u m bem -su cedido exer cício da in icia t iva in dividu a l.
Se a dem a n da efet iva se m ost r a deficien t e, n ã o só o desper dício
de r ecu r sos ca u sa n o pú blico u m escâ n da lo in t oler á vel, com o t a m bém
o em pr een dedor in dividu a l qu e t en t a pô-los em a çã o joga u m jogo com
ca r t a s m a r ca da s con t r a si. O jogo de qu e pa r t icipa con t ém m u it os zer os,
de m odo qu e os joga dor es em con ju n to a ca ba r ã o per den do se t iver em
ba st a n t e en er gia e con fia n ça pa r a joga r t oda s a s ca r t a s. O cr escim en t o
da r iqu eza m u n dia l t em sido m en or , a t é a gor a , qu e o volu m e a gr ega do
da s pou pa n ça s in dividu a is, e a difer en ça cor r espon de à s per da s sofr ida s
por a qu eles cu ja cor a gem e in icia t iva n ã o for a m su plem en t a da s por
u m a h a bilida de excepcion a l ou por u m a sor t e for a do com u m . Se a
dem a n da efet iva for a dequ a da , por ém , ser ã o su ficien t es a pen a s h a bi-
lida de e sor t e n or m a is. Os r egim es a u t or it á r ios con t em por â n eos pa r e-
cem r esolver o pr oblem a do desem pr ego à cu st a da eficiên cia e da
liber da de. É cer t o qu e o m u n do n ã o t oler a r á por m u it o m a is t em po o
desem pr ego qu e, à pa r t e cu r t os in t er va los de excit a çã o, é u m a con se-
qü ên cia — e n a m in h a opin iã o u m a con seqü ên cia in evit á vel — do
ca pit a lism o in dividu a list a do n osso t em po. Ma s pode ser possível cu r a r
o m a l por m eio de u m a a n á lise cor r et a do pr oblem a , pr eser va n do a o
m esm o t em po a eficiên cia e a liber da de.
IV
Obser vei, de pa ssa gem , qu e o n ovo sist em a poder ia ser m a is fa -
vor á vel à pa z do qu e a n t igo. Va le a pen a r epet ir e en fa t iza r est e pon t o.
A gu er r a t em diver sa s ca u sa s. Os dit a dor es e pessoa s sem elh a n -
t es, a os qu a is a gu er r a ofer ece, pelo m en os em expect a t iva , u m a ex-
cit a çã o deleit á vel, n ã o en con t r a m dificu lda de em fom en t a r a n a t u r a l
belicosida de de seu s povos. P or ém , a lém disso, fa cilit a n do seu t r a ba lh o
de in su fla r a s ch a m a s do en t u sia sm o do povo, a pa r ecem a s ca u sa s
econ ôm ica s da gu er r a , ou seja , a s pr essões da popu la çã o e a lu t a a cir -
r a da pelos m er ca dos. E st e segu n do fa t or , qu e desem pen h ou n o sécu lo
XIX, e t a lvez ven h a a desem pen h a r a in da , u m pa pel essen cia l, t em
est r eit a r ela çã o com o n osso a ssu n t o.
Assin a lei n o ca pít u lo a n t er ior qu e, sob o r egim e de laissez-faire
in t er n o e de pa dr ã o de ou r o in t er n a cion a l, com o er a o cor r et o n a se-
gu n da m et a de do sécu lo XIX, n ã o h a via qu a lqu er ou t r o m eio dispon ível

347
OS ECON OMIS TAS

a u m gover n o pa r a a livia r a m isér ia econ ôm ica in t er n a a n ã o ser lu t a r


pela con qu ist a de m er ca dos ext er n os. Isso por qu e t odos os r em édios
efica zes pa r a o desem pego cr ôn ico ou in t er m it en t e est a va m exclu ídos,
à exceçã o da s m edida s dest in a da s a m elh or a r o ba la n ço de pa ga m en t os
em con t a cor r en t e.
Desse m odo, en qu a n t o os econ om ist a s est a va m a cost u m a dos a
a pla u dir o sist em a in t er n a cion a l exist en t e por qu e ele pr opor cion a va
os fr u t os da divisã o in t er n a cion a l do t r a ba lh o e, a o m esm o t em po,
con cilia va os in t er esses da s difer en t es n a ções, fu r t a va à vist a u m a
con seqü ên cia m en os ben éfica ; e da va m pr ova s de bom sen so e de u m a
ju st a com pr een sã o do ver da deir o cu r so dos a con t ecim en t os os est a dist a s
qu e a cr edit a va m qu e, se u m pa ís a n t igo e r ico a ba n don a sse a lu t a
pelos m er ca dos, ver ia su a pr osper ida de ca ir e desa pa r ecer . Ma s se a s
n a ções podem a pr en der a m a n t er o plen o em pr ego a pen a s por m eio
de su a polít ica in t er n a (e t a m bém , devem os a cr escen t a r , se logr a m
a lca n ça r o equ ilíbr io n a t en dên cia de cr escim en t o de su a s popu la ções),
n ã o dever ia m a is h a ver a n ecessida de de for ça s econ ôm ica s im por t a n t es
dest in a da s a pr edispor u m pa ís con t r a os seu s vizin h os. H a ver ia o
lu ga r pa r a a divisã o in t er n a cion a l do t r a ba lh o e pa r a o cr édit o in t er -
n a cion a l em con dições a dequ a da s, m a s deixa r ia de exist ir m ot ivo pr e-
m en t e pa r a qu e u m pa ís n ecessit a sse im por su a s m er ca dor ia s a ou t r o
ou r ecu sa r a s ofer t a s de seu s vizin h os, n ã o por qu e ist o seja in dispen -
sá vel pa r a ca pa cit á -lo a pa ga r o qu e deseja a dqu ir ir n o est r a n geir o,
m a s por ca u sa do objet ivo expr esso de a lt er a r o equ ilíbr io de pa ga -
m en t os, a fim de cr ia r u m a ba la n ça com er cia l qu e lh e seja fa vor á vel.
O com ér cio in t er n a cion a l deixa r ia de ser o qu e é, u m expedien t e de-
sesper a do pa r a m a n t er o em pr ego in t er n o, for ça n do a s ven da s n os
m er ca dos ext er n os e r est r in gin do a s com pr a s, o qu e, se t ivesse êxit o,
sim plesm ente deslocaria o problem a do desemprego para o vizinho que
levasse desvantagem na luta, e se converteria num livre e desim pedido
intercâm bio de m ercadorias e serviços em condições de vantagens mútuas.
V

Ser á u m a esper a n ça vision á r ia con fia r qu e est a s idéia s se con -


cr et izem ? Têm ela s r a ízes in su ficien t es n os m ot ivos qu e gover n a m a
evolu çã o da s socieda des polít ica s? Sã o os in t er esses a qu e ela s se opõem
m a is for t es e m a is m a n ifest os do qu e os qu e fa vor ecem ?
Nã o m e ca be r espon der a qu i a essa s per gu n t a s. Ser ia n ecessá r io
u m livr o de n a t u r eza bem difer en t e dest e pa r a in dica r , m esm o em
lin h a s ger a is, a s m edida s pr á t ica s qu e poder ia m da r cor po a t a is idéia s.
Con t u do, se a s idéia s sã o cor r et a s — h ipót ese n a qu a l o pr ópr io a u t or
t em de ba sea r o qu e escr eve —, ser ia u m er r o, segu n do m in h a pr evisã o,
ign or a r a for ça qu e com o t em po ela s vir ã o a a dqu ir ir . P r esen t em en t e,
h á u m a expect a t iva in com u m de u m dia gn óst ico m a is bem fu n da m en -
t a do; m a is do qu e n u n ca t odos est ã o pr on t os a a ceit á -lo e desejosos

348
KEYN ES

de o exper im en t a r , desde qu e ele seja pelo m en os pla u sível. Ma s, à


pa r t e est a disposiçã o de espír it o pecu lia r à época , a s idéia s dos eco-
n om ist a s e dos filósofos polít icos, est eja m ela s cer t a s ou er r a da s, t êm
m a is im por t â n cia do qu e ger a lm en t e se per cebe. De fa t o, o m u n do é
gover n a do por pou co m a is do qu e isso. Os h om en s objet ivos qu e se
ju lga m livr es de qu a lqu er in flu ên cia in t elect u a l sã o, em ger a l, escr a vos
de a lgu m econ om ist a defu n t o. Os in sen sa t os, qu e ocu pa m posições de
a u t or ida de, qu e ou vem vozes n o a r , dest ila m seu s a r r eba t a m en t os in s-
pir a dos em a lgu m escr iba a ca dêm ico de cer t os a n os a t r á s. E st ou con -
ven cido de qu e a for ça dos in t er esses escu sos se exa ger a m u it o em
com pa r a çã o com a fir m e pen et r a çã o da s idéia s. É n a t u r a l qu e ela s n ã o
a t u em de m a n eir a im edia t a , m a s só depois de cer t o in t er va lo; isso
por qu e, n o dom ín io da filosofia econ ôm ica e polít ica , r a r os sã o os h om en s
de m a is de vin t e e cin co ou t r in t a a n os qu e sã o in flu en cia dos por
t eor ia s n ova s, de m odo qu e a s idéia s qu e os fu n cion á r ios pú blicos, os
polít icos e m esm o os a git a dor es a plica m a os a con t ecim en t os a t u a is
t êm pou ca pr oba bilida de de ser a s m a is r ecen t es. P or ém , cedo ou t a r de,
sã o a s idéia s, e n ã o os in t er esses escu sos, qu e r epr esen t a m u m per igo,
seja pa r a o bem ou pa r a o m a l.

349
Í N D ICE

Apr esen t a çã o de Adr oa ldo Mou r a da Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

A TE ORIA GE RAL DO E MP RE GO, DO J URO E DA MOE DA

P r efá cio ................................................ 27


P r efá cio à E diçã o Alem ã . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
P r efá cio à E diçã o J a pon esa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
P r efá cio à E diçã o F r a n cesa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

LIVRO P RIME IRO — In t r odu çã o

CAP . 1 — A Teor ia Ger a l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43


CAP . 2 — Os P ost u la dos da E con om ia Clá ssica . . . . . . . . . . . . . . 45
CAP . 3 — O P r in cípio da Dem a n da E fet iva . . . . . . . . . . . . . . . . . 59

LIVRO SE GUNDO — Defin ições e Idéia s

CAP . 4 — A E scolh a da s Un ida des . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69


CAP . 5 — A E xpect a t iva com o E lem en t o Det er m in a n t e do
P r odu t o e do E m pr ego . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
CAP . 6 — Defin içã o de Ren da , P ou pa n ça e In vest im en t o . . . . . . 83
I. Ren da . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
II. P ou pa n ça e In vest im en t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
AP Ê NDICE Sobr e o Cu st o de Uso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
CAP . 7 — Ma ior es Con sider a ções Sobr e o Sign ifica do de P ou pa n ça
e de In vest im en t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

LIVRO TE RCE IRO — A P r open sã o a Con su m ir

CAP . 8 — A P r open sã o a Con su m ir : I. Os F a t or es


Objet ivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113

351
OS ECON OMIS TAS

CAP . 9 — A P r open sã o a Con su m ir : II. Os F a t or es


Su bjet ivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127
CAP . 10 — A P r open sã o Ma r gin a l a Con su m ir e o
Mu lt iplica dor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133

LIVRO QUARTO — O In cen t ivo a In vest ir

CAP . 11 — A E ficiên cia Ma r gin a l do Ca pit a l . . . . . . . . . . . . . . . . 149


CAP . 12 — O E st a do da E xpect a t iva a Lon go P r a zo . . . . . . . . . . 159
CAP . 13 — A Teor ia Ger a l da Ta xa de J u r os . . . . . . . . . . . . . . . . 173
CAP . 14 — A Teor ia Clá ssica da Ta xa de J u r os . . . . . . . . . . . . . 181
AP Ê NDICE AO CAP . 14 — Apên dice Sobr e a Ta xa de J u r os
em Prin ciples of E con om ics de Ma r sh a ll, em Prin ciples of
Political E con om y de Rica r do e em Ou t r a s Obr a s . . . . . . . 189
CAP . 15 — Os In cen t ivos P sicológicos e E m pr esa r ia is pa r a a
Liqu idez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 197
CAP . 16 — Obser va ções Diver sa s Sobr e a Na t u r eza do
Ca pit a l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209
CAP . 17 — As P r opr ieda des E ssen cia is dos J u r os e do
Din h eir o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219
CAP . 18 — Novo E n u n cia do da Teor ia Ger a l do E m pr ego . . . . . 237

LIVRO QUINTO — Sa lá r ios Nom in a is e P r eços

CAP . 19 — Va r ia ções n os Sa lá r ios Nom in a is . . . . . . . . . . . . . . . . 247


AP Ê NDICE AO CAP . 19 — A T h eory of Un em ploym en t do
P r ofessor P igou . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 259
CAP . 20 — A F u n çã o de E m pr ego . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 267
CAP . 21 — A Teor ia dos P r eços . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 277

LIVRO SE XTO — Br eves Not a s Su ger ida s pela Teor ia Ger a l

CAP . 22 — Not a s Sobr e o Ciclo E con ôm ico . . . . . . . . . . . . . . . . . . 293


CAP . 23 — Not a s Sobr e o Mer ca n t ilism o, a s Leis Con t r a a
Usu r a , o Din h eir o Ca r im ba do e a s Teor ia s do
Su bcon su m o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 309
CAP . 24 — Not a s F in a is Sobr e a F ilosofia Socia l a qu e P oder ia
Leva r a Teor ia Ger a l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 341

352

Você também pode gostar