Você está na página 1de 229

Rex Sto u t

Brin c a n d o
co m a Mort e

Tra d u çã o de
M ARIA H ELENA P IRES
Tí tul o ori gi n a l :
THE MOTHER HU N T

© 19 6 3 , by Rex Sto u t
All righ t s res e r v e d

Dire i t o s de edi çã o da obra e m l í ng u a port u g u e s a ,


no Bra s i l, adq u ir i d o s pel a
EDITORA NOVA FRONTEIRA S/A
Rua Maria Ang é lica, 16 8 — Lago a — CEP: 22 4 6 1 — Tel.: 28 6 -
78 2 2
End e r e ç o Tel e g r á fic o: NEOFRO N T — Tel ex: 34 6 9 5 ENFS BR
Rio de Jane ir o , RJ

Proib i d a a ven d a e m Port u g a l e pa í se s afric a n o s de l í ng u a


port u g u e s a .

Revi s ã o
EDILSO N CHAVES CANTALICE
URANGA
WANIA ANDRADE

htt p:// g r o u p s . g o o g l e . c o m / g r o u p / d i g i t a l s o u r c e

CIP- Bra s i l . Catal o g a çã o- na- fon t e


Sin d i c a t o Na c i o n a l dos Editor e s de Livro s , RJ.

Sto u t , Rex, 18 8 6 —
S8 8 8 b Brin c a n d o co m a mor t e / Rex Sto u t ;
trad u çã o
de Maria Hel e n a Pire s . — Rio de Janeir o : Nova
Fron t e i r a , 19 8 4 .

1. Fic çã o poli c i a l e de mi s t é rio (Lite r a t u r a


est a d u n i de n s e ) 2. Ro m a n c e est a d u n i d e n s e I.
Tí tul o
CDD — 81 3 . 0 8 7 2
81 3 . 5
84- 08 0 2 CDU —
82 0 ( 7 3 ) - 34
CONTRA CAPA
Os ori g i n a i s bo t õ es ar t e s a n a i s con s t i t u e m a ú nica pis t a
de qu e di s p õ e Ne r o W olf e , o fa m o s o de t e t i v e par t i c u l a r de 15 0
quil o s , par a de s c o b r i r a ori g e m de u m be b ê deix a d o à po r t a de
u m a rica vi ú va co m u m bil h e t e insi n u a n d o se r ele filh o de se u
marid o. Ne r o Wol f e e se u as s i s t e n t e , o na m o r a d o r Arc h i e
Goo d w i n , en v o l v e m - se, a par t i r de s s a pis t a , nu m a de su a s m a i s
emocion a n t e s e movi m e n t a d a s av e n t u r a s , qu e obr i g a m o
re q u i n t a d o sh e r l o q u e a deix a r su a cas a — coi s a qu e rar a m e n t e
faz — du r a n t e v á rio s dia s , aba n d o n a n d o ta m b é m o m o r d o m o -
co z i n h e i r o qu e lh e pr e p a r a as lau t a s e re q u i n t a d a s ref e i çõ es.
Ma s a ar g ú cia de Ne r o Wol f e e de se u s auxili a r e s aca b a por
de s v e n d a r , a par t i r de u m im p l a c á vel raci o c í nio l ó gic o , es s e
nov o mi s t é rio.

ORELHAS DO LIVRO
Brin c a n d o co m a m ort e
U m be b ê é deix a d o à por t a de u m a rica vi ú va, co m u m
bil h e t e insi n u a n d o ser ele filh o do se u m a r i d o . Su a s rou p a s
n ã o tr a z i a m qu a l q u e r eti q u e t a qu e en c e r r a s s e alg u m a pis t a e
ap e n a s u m de t a l h e n ã o es c a p o u à ob s e r v a çã o mi n u c i o s a de
Ner o W olf e e de se u as s i s t e n t e Arc h i e Goo d w i n : os bo t õ es
ext r e m a m e n t e ori g i n a i s , de con f e c çã o art e s a n a l .
Par t i n d o de s s a pis t a , o gor d o de t e t i v e de 15 0 quil o s , e
qu e rar a m e n t e sai de cas a , en v o l v e - se nu m a de su a s mais
fas c i n a n t e s ave n t u r a s , qu e o obri g a at é mes m o a pa s s a r
alg u n s dia s for a de sua ele g a n t e m a n s ã o, lon g e do m o r d o m o -
co z i n h e i r o qu e lh e pr e p a r a as lau t a s e re q u i n t a d a s ref e i çõ es.
Tra t a - se, por t a n t o , de u m do s m a i s m o v i m e n t a d o s cas o s do
po p u l a r de t e t i v e par t i c u l a r e de u m a da s his t ó ria s m a i s be m
con s t r u ída s de Rex Sto u t , au t o r qu e se de s t a c o u se m p r e pel a s
sua s tra m a s be m ela b o r a d a s , pel o re q u i n t e de se u s
pe r s o n a g e n s e pe l o hu m o r ir ô nic o .
Em Bri n c a n d o co m a mor t e o rit m o da a çã o vai se
int e n s i f i c a n d o à m e d i d a qu e as v á rias lin h a s de inv e s t i g a çã o
se de s e n v o l v e m , e o mi s t é rio do s bo t õ es e da cri a n ç a enj e i t a d a
vai rev e l a n d o con o t a çõ es a pri n c ípio ins u s p e i t a d a s e qu e
tor n a m o cas o ain d a m a i s es t r a n h o : as inv e s t i g a çõ es, e m lu g a r
de sol u c i o n á -lo, par e c e m at é m e s m o co m p l i c á -lo.
Ma s a ar g ú cia de Ne r o Wol f e , as s i s t i d o por se u efici e n t e
auxili a r , o na m o r a d o r Arc h i e Goo d w i n , aca b a por de s v e n d a r , a
par t i r de u m im p l a c á vel raci o c ínio l ó gic o , es s e nov o mi s t é rio.
Um livr o par a os apr e c i a d o r e s da ver d a d e i r a ar t e da
nov e l a poli c i a l .
Capa: Vict or Burt o n
Ilu s t r a çã o: Ingri d Von St e u r e r /G i l b e r t o Zavar e z z i
1

Qua n d o a ca m p a i n h a toc o u , naq u e l a ter ç a- feira de


ma n h ã , no prin c í pio de jun h o , pou c o dep o i s das onz e
hor a s , fui at é à port a da fre n t e e olh e i atrav é s do vidro da
porta , que s ó per m i t e visi bili d a d e de de n t r o para fora. Vi
o qu e , ou qu e m , es p e r a v a ver: um rost o um pou c o estr e i t o
de m a i s , olh o s cinz e n t o s um pou c o gra n d e s de m a i s e um
corp o um tant o fino de m a i s para ter boa s curva s . Sabi a
qu e m era porq u e , na se g u n d a - feira de tard e , ela
tel e f o n a r a e mar c a r a hora para um a entr e v i s t a . Con h e c i a
se u rost o porq u e já a vira alg u m a s vez e s e m tea tr o s e
res t a u r a n t e s .
Sabi a o sufi c i e n t e a res p e i t o dela para co n t a r a Ner o
Wolf e se m ter de faz e r ne n h u m a pe s q u i s a : um a part e era
do do m ínio p ú blic o e outr a part e m ex e r i c o . Era a vi ú va de
Ric h a r d Valdo n , um ro m a n c i s t a qu e morr e r a h á nov e
me s e s , afo g a d o na pis c i n a de alg u é m e m We s t c h e s t e r .
Com o qua tr o de se u s livro s fora m be s t - sell e r s e um del e s ,
Nu n c a m ai s son h e , ven d e r a mai s de um mil h ã o de ex e m -
plar e s a 5 d ó lar e s e 95 ce n t a v o s , ela n ã o teria probl e m a
para pag a r a co n t a de um det e t i v e parti c u l a r , se e qua n d o
qui s e s s e um. H á sei s ano s , ao ler Nu n c a mais so n h e ,
Wolf e livrar a- se do livro doa n d o - o a um a bibli o t e c a ma s
col o c o u e m sua es t a n t e um outr o intit u l a d o Sua pr ó pri a
im a g e m , qu e ac h o u be m m e l h o r . Talve z por es s e mo ti v o
tev e o trab a l h o de leva n t a r se u corp a n z i l da cad e i r a ,
qua n d o a ma n d e i entr ar no es c r i t ó rio, e de co n t i n u a r de
p é at é qu e ela se se n t a s s e na poltr o n a ver m e l h a pert o da
sua es c r iv a n i n h a . Ao se n t a r - m e à min h a es c r iv a n i n h a ,
n ã o est a v a an si o s o . Ela dis s e r a pel o tel e f o n e qu e qu e r i a
con s u l t a r Wolf e sobr e um as s u n t o pe s s o a l e con f i d e n c i a l ,
ma s sua apar ê nci a n ã o de n o t a v a qual q u e r sofri m e n t o .
Devi a ser alg u m a coi s a roti n e i r a , co m o um a cart a an ô -
ni m a ou um par e n t e qu e su m i r a .
Colo c o u a bol s a na m e s i n h a ao lado da poltr o n a ,
olh o u ao red or , fixo u os olh o s gra n d e s e cinz e n t o s em
mi m dura n t e meio se g u n d o e, volta n d o - se para Wolf e ,
dis s e :
— Me u mari d o teria go s t a d o de s t a sala.
— Hu m — fez Wolf e . — Gos t e i de um dos livro s del e ,
ma s co m res e r v a s . Qua n t o s ano s el e tin h a qua n d o
morr e u ?
— Quar e n t a e doi s .
— E qual a su a idad e ?
Est a ú lti m a per g u n t a era para mi m . Acre d i t a v a e m
tr ê s coi s a s : qu e (a) su a atit u d e para co m as mu l h e r e s
fazia co m qu e lhe fos s e imp o s s í vel julg a r qual q u e r um a
dela s; qu e (b) eu s ó pre c i s a v a de um a hora co m qual q u e r
mu l h e r no mu n d o para cla s s i f i c á -la; e qu e (c) ele podi a
ajud ar faz e n d o per g u n t a s imp e r t i n e n t e s e indi s c r e t a s , e
sua favorit a era lhe s per g u n t a r a idad e . Era in ú til te n t a r
mo s t r a r - lhe a atit u d e corr e t a .
Pel o se u m é tod o , o mo d o co m o Lucy Vald o n rea g i u já
era um a pis t a , pois sorri u e dis s e :
— Já te n h o idad e sufi c i e n t e , m ai s do que sufi c i e n t e .
Ten h o 26 an o s , o bas t a n t e para sab e r qua n d o pre c i s o de
ajud a, e aqui es t o u . É sobr e . . . é ext r e m a m e n t e con f i -
de n c i a l — dis s e , olh a n d o - m e de rela n c e .
Wolf e ac e n o u : — Em ger al , é . Qua n d o se trat a de
as s u n t o s profi s s i o n a i s , meus ouvid o s per t e n c e m ao Sr.
Good w i n , e os del e a mi m . Qua n t o a ser con fi d e n c i a l ,
crei o qu e a se n h o r a n ã o co m e t e u ne n h u m a falta capi t a l ,
n ã o?
Sorri u de novo . O se u sorri s o sur g i a e de s a p a r e c i a
de pr e s s a , ma s era sin c e r o .
— N ã o teria cora g e m . N ã o, n ã o é cri m e . Quer o qu e o
se n h o r en c o n t r e alg u é m para mi m .
“Hu m , hu m ” , pe n s e i , “aqui vam o s n ó s. A pri m a
Mildr e d est á de s a p a r e c i d a e a tia Ama n d a pedi u à
sobri n h a rica para con t r a t a r um det e t i v e . ” Mas ela
con t i n u o u :
— É um pou c o . . . be m , é m e i o fant á sti c o . Est o u co m
um be b ê e que r o sab e r qu e m é a m ã e. Com o já dis s e , é
con f i d e n c i a l , ma s na reali d a d e n ã o é se g r e d o . A e m p r e -
gad a e a cozi n h e i r a sab e m a res p e i t o dis s o , be m co m o
me u advo g a d o e dua s ami g a s mi n h a s , ma s é s ó , poi s n ã o
sei se qu e r o ficar co m el e .. . co m o beb ê , qu e r o diz er .
Wolf e est a v a de te s t a fran z i d a , e n ão era para
me n o s :
— N ã o sirvo para juiz de beb ê s, mi n h a se n h o r a .
— É clar o qu e n ã o. O qu e qu e r o . . . ma s deix e - m e
con t a r - lh e. H á dua s se m a n a s qu e es t o u co m a cria n ç a. H á
dua s se m a n a s , no do m i n g o , dia 20 de mai o , o tel e f o n e
toc o u , at e n d i e um a voz dis s e que havia alg u m a coi s a no
me u ves t í bul o. -Fui olh ar , e lá es t av a el e no ch ã o,
embrulh a d o nu m cob e r t o r . Levei- o para de n t r o e
en c o n t r e i um ped a ç o de pap e l pre s o à cob e r t a por um
alfi n e t e . — Apan h o u a bol s a da m e s i n h a ao lad o, abri u- a
e, as s i m qu e tiro u o pap e l , eu já es t av a ao se u lad o para
rec e b ê -lo. Ba s t o u um olh ar de rela n c e para ler o que
es t av a es c r i t o , ma s , e m lug a r de en tr e g á -lo a Wolf e por
cim a da es c r iv a nin h a , dei a volta ao red or del e para ler
mai s um a vez. Era um pe d a ç o de pap e l ordi n á rio de 12
por 18 ce n t ím e tros e a m e n s a g e m , e m cin c o lin h a s tort a s ,
impr e s s a co m um de s s e s conj u n t o s de borra c h a para
cria n ç a, era cur t a e dizia o es s e n c i a l :

S RA . R ICHARD V ALDON
ESTE BEBÊ É PARA A SEN H O RA

PORQUE UM MENI N O DEVE

VIVER NA CASA

DE SEU PAI

Havia doi s furo s de alfin e t e nu m can t o . Wolf e col o -


cou - o e m ci m a da es c r iv a n i n h a , virou - se para ela e per -
gu n t o u :
— É verd a d e ?
— N ã o sei — res p o n d e u ela. — É clar o qu e n ã o sei.
Mas pod e r i a ser verd a d e .
— É prov á vel ou ape n a s pos s ível?
— Creio qu e é prov á vel. — Fe c h o u a bol s a e col o co u- a
outr a vez na me s i n h a . — Quer o diz e r, é prov á vel que
pos s a ter aco n t e c i d o .
Fez um ge s t o co m a m ã o ond e havia um a alia n ç a de
cas a m e n t o . Se u s olh o s me fitar a m e volt ar a m - se para
Wolf e .
— É clar o qu e iss o é co n fi d e n c i a l , o se n h o r en te n d e .
— Si m .
— Be m . . . já qu e est o u lhe co n t a n d o tud o , é m e l h o r
qu e co m p r e e n d a . Dic k e eu no s cas a m o s h á dois an o s . . .
faria doi s ano s no m ê s qu e ve m. Est á vam o s apaix o n a d o s ,
clar o qu e es t á vam o s , ma s ad m i t o qu e , no qu e m e con c e r -
ne, ta m b é m tin h a imp or t â nci a el e ser um ho m e m fam o s o ,
e que eu seria a Sra. Ric h a r d Valdo n . E para ele havia
me u . . . be m , qu e m eu era ent ã o, um a Arm s t e a d . N ão
so u b e o qua n t o iss o sig n i f i c a v a para el e at é qu e estiv é s -
se m o s ca s a d o s , qua n d o ele de s c o b r i u qu e eu es t av a
can s a d a de ser um a Arm s t e a d .
Re s p i r o u fund o e con t i n u o u : — Ante s de se cas ar
co m i g o , tin h a um a rep u t a çã o de Don Juan, ma s devi a ser
exa g e r o , co m o e m ger a l aco n t e c e . Dura n t e doi s m e s e s
fo m o s co m p l e t a m e n t e . . . — Par o u e se u s olh o s fec h a r a m .
Abriu- os qua s e e m se g u i d a . — Para mi m , nad a exi s t i a a
n ã o ser n ó s doi s , e ac h o qu e para ele ta m b é m. Ten h o
cer t e z a . De p o i s , co m sin c e r i d a d e , n ã o sei. S ó sei qu e n ã o
era a m e s m a coi s a . Dur a n t e es t e ano, o ú lti m o an o de sua
vida, pod e ter tido um a mul h e r , ou dua s , ou um a d ú zia...
si m p l e s m e n t e , n ã o sei. Sei qu e ele po d e ter tido. Por iss o
o be b ê ... co m o foi qu e eu dis s e ? É prov á vel que pud e s s e
Ler aco n t e c i d o , co m p r e e n d e ?
Wolf e con c o r d o u : — At é es t e pon t o , si m . E se u
probl e m a ?
— O probl e m a é o be b ê , é clar o . Pre t e n d i a ter um,
doi s ou tr ê s, so u sin c e r a ao diz ê -lo, e Dic k ta m b é m, ma s
eu qu er i a es p e r a r um pou c o . Adiei. Qua n d o el e morr e u , o
mai s duro, talv e z a part e mai s dif ícil, foi isto: el e qu e r i a
qu e eu tive s s e um beb ê e eu adi e i . Agor a h á um be b ê , qu e
es t á co m i g o . — Apo n t o u para o ped a ç o de pap e l na me s a
de Wolf e . — Acho qu e o qu e est á es c r i t o a í é corr e t o . Um
me n i n o dev e viver na cas a do pai e, é clar o , dev e ter o
no m e do pai. Mas o probl e m a é o se g u i n t e : Ric h ar d
Vald o n era o pai de s s a cria n ç a? Pro n t o , já fale i !
Wolf e res m u n g o u : — Bob a g e m , nu n c a ser á sol u -
cio n a d o e a se n h o r a sab e . Ho m e r o já dis s e : “Ne n h u m
ho m e m pod e sab e r qu e m era se u pai.” Sha k e s p e a r e dis s e :
“O ho m e m s á bio é o qu e con h e c e se u pr ó prio filh o . ” N ã o
pos s o ajud á -la, min h a se n h o r a . Nin g u é m pod e .
Ela sorri u: — Tam b é m pos s o diz e r: “bob a g e m ” . É
clar o qu e pod e m e ajud ar. Sei qu e n ã o pod e provar qu e
Dic k era o pai, ma s pod e de s c o b r i r qu e m p ô s o be b ê no
me u ves t í bul o, qu e m é a m ã e, e a í pod e m o s . . . Olh e .
Abriu a bol s a e pe g o u outr o ped a ç o de pap e l , n ã o do
me s m o tipo ou ta m a n h o :
— Já calc u l e i tud o . O m é dic o dis s e qu e o beb ê tin h a
quatr o me s e s no dia e m qu e ch e g o u , 20 de mai o , por iss o
us e i es t a data. — Olh o u o pap e l . — Log o , nas c e u pert o do
dia 20 de jane ir o e port a n t o dev e ter sid o con c e bid o mai s
ou m e n o s no dia 20 de abril do an o pas s a d o . Qua n d o
de s c o b r i r qu e m é a m ã e, pod e averi g u a r a res peit o dela e
de Dick, se é verd a d e , ou en t ã o quai s as prob a b i l i d a d e s
de qu e estiv e s s e m junt o s naq u e l a é poc a . É clar o qu e iss o
n ã o provar á qu e o beb ê é filh o del e , ma s pod e sig n i f i c a r
qu e a prob a b i l i d a d e é gra n d e . Al é m do mai s , se for
ape n a s um a arti m a n h a , se Dick n ã o fos s e o pai e n ã o
hou v e s s e pos s i b i l i d a d e de o ser e o se n h o r de s cobri s s e
iss o , ta m b é m me ajud ar i a , n ão é verd a d e ? Ent ã o, a
pri m e i r a coi s a é de s c o b r i r qu e m o deix o u no m e u ves t í-
bul o e, dep o i s , qu e m é a m ã e. Aí ent ã o talv e z eu m e s m a
qu e ir a lhe faz e r um a s per g u n t a s , ma s n ã o... Be m , ve -
re m o s .
Wolf e rec o s t a r a - se, olh a n d o - a de car a fe c h a d a . Esta -
va co m e ç and o a par e c e r o tip o de trab al h o qu e s ó pod e r i a
rec u s a r co m um a de s c u l p a fin g i d a , e el e det e s t a v a trab a -
lhar. Al é m dis s o , o sald o ban c á rio est av a be m gor d o .
— A se n h o r a es t á pre s u m i n d o qu e eu pos s a faz er
tud o iss o — dis s e , leva n t a n d o um a obje çã o. — N ã o so u
m á gic o . Sra. Vald o n .
— É clar o qu e n ã o. Mas o se n h o r é o me l h o r de t e tive
do mu n d o , n ã o é ?
— É prov á vel que n ã o. Talve z o m e l h o r det e t i v e do
mu n d o seja um suje i t o gro s s e i r o , co m um voc a b u l á rio
limi t a d o . A se n h o r a dis s e qu e se u advo g a d o sab e a res -
peit o da cria n ç a. Sab e ta m b é m qu e a se n h o r a vei o me
con s u l t a r ?
— Si m , ma s n ã o apr ov a. Acha qu e é toli c e qu er e r
fic ar co m a cria n ç a. H á lei s a res p e i t o , e provid e n c i o u
para qu e pos s a ficar co m o be b ê te m p o r a r i a m e n t e ,
porq u e insi s t i: e m b o r a el e seja co n t r a a id é ia de te n t a r
ach a r a m ã e. Mas iss o é as s u n t o m e u . Se u ne g ó cio é a lei.
Se m que ela per c e b e s s e , atin g i u o alvo. O pr ó prio
Wolf e n ã o pod e r i a ter de s c r i t o melh or a sua pr ó pria
atit u d e e m rela çã o a advo g a d o s , co m tod o o voc a b u l á rio
qu e tin h a . Sua cara fec h a d a me l h o r o u um pou c o .
— Duvid o — dis s e el e — qu e já te n h a me d i d o be m as
con s e q üê ncia s . A bus c a seri a, co m cert e z a , be m de m o -
rada, trab a l h o s a , cara e pos s i v e l m e n t e n ã o levari a a nad a .
— Si m . Eu dis s e qu e sabi a que o se n h o r n ão é
m á gic o .
— Pod e arc ar co m as de s p e s a s ? Me u s hon o r á rios n ã o
s ã o baix o s .
— Sei dis s o . Ten h o um a her a n ç a da min h a av ó e os
ren d i m e n t o s dos livro s de m e u mari d o . Ten h o cas a pr ó -
pria. — De u um sorri s o . — Se qui s e r ver um a c ó pia do
me u imp o s t o de ren d a , est á co m me u advo g a d o .
— N ã o ser á ne c e s s á rio. Pod e levar u m a se m a n a , um
m ê s, um ano.
— Est á be m . Me u advo g a d o dis s e - m e qu e , para eu
fic ar co m o beb ê te m p o r a r i a m e n t e , pod e faz er um a pror -
rog a çã o m ê s a m ê s.
Wolf e apa n h o u o ped a ç o de pap e l , olh o u - o de cara
feia, col o c o u - o outr a vez na m e s a e olh o u para ela ta m -
b é m de cara feia.
— Já qu e é as s i m , dev e r i a ter m e proc u r a d o mai s
ce d o .
— S ó to m e i a de c i s ã o de proc u r á -lo ont e m .
— Talve z seja tard e de m a i s . Já se pas s a r a m 16 dias
de s d e do m i n g o , 20 de mai o . O tel e f o n e m a foi dad o du -
rant e o dia?
— N ã o, à noit e . Um pou c o dep o i s das dez hor a s .
— Ho m e m ou mul h e r ?
— N ã o te n h o cert e z a . Acho qu e era um ho m e m te n -
tan d o imit a r voz de mul h e r , ou um a mul h e r te n t a n d o
imit ar voz de ho m e m , n ã o sei be m .
— E se tive s s e de dar um palpi t e ?
Aban o u a cab e ç a: — N ã o pod e r i a .
— O qu e foi dit o? Palavr a por palavr a .
— Estav a sozi n h a e m cas a , pois a e m p r e g a d a havia
sa í do. Qua n d o at e n d i o tel e f o n e , dis s e : “Da cas a da Sra.
Vald o n . ” A voz per g u n t o u : “É a Sra. Valdo n ?” Re s p o n d i
qu e si m , e a voz retr u c o u : “V á ao ves t íbulo , h á alg o para a
se n h o r a l á ”, e de s li g o u . Qua n d o vi qu e era um beb ê e que
es t av a vivo, leve i- o para de n tr o , cha m e i o m é dic o e...
— Um mo m e n t o , por favor. Pas s o u o dia tod o e a
noit e e m cas a ?
— N ã o. Tin h a ido pas s a r o fim de se m a n a no ca m po.
Che g u e i em ca s a por volta das oit o hor a s da noit e .
De t e s t o o tr á fe g o de do m i n g o à noit e .
— No ca m p o ond e ?
— Pert o de Wes t p o r t . Na cas a de Julia n Haft, qu e é
qu e m publi c a os livro s de me u mari d o .
— Ond e é Wes t p o r t ?
Arre g a l o u os olh o s , sur pr e s a . Eu, n ã o. O qu e ele
ign o r a sobr e a á rea m e t r o p o l i t a n a daria para en c h e r um
atla s .
— Ora, e m Con n e c t i c u t — res p o n d e u . — Con d a d o de
Fairfi e l d .
— A qu e hor a s sai u de l á ?
— Pou c o dep o i s das sei s da tard e .
— De carr o? Se u pr ó prio carro?
— Si m .
— Com um mot o r i s t a ?
— N ã o. N ã o te n h o mot o r i s t a .
— Vinh a alg u é m junt o no carro?
— N ã o, vim sozi n h a . — A m ã o co m a alia n ç a fez um
ge s t o para o lad o. — É clar o qu e o se n h o r é qu e é o
de t e t i v e , Sr. Wolf e , e n ã o eu, ma s n ã o vejo qual a final i -
dad e dis s o .
— Ent ã o a se n h o r a n ã o us o u o c é rebr o. — Virou- se
para mi m . — Cont e para ela, Archi e .
Est av a se n d o ins u l t u o s o . N ã o qu e r e n d o se oc u p a r de
alg o t ã o ó bvio, pas s o u para mi m . Fiz o qu e ped i a .
— A se n h o r a provav e l m e n t e te m and a d o mui t o
oc u p a d a co m o be b ê para pe n s a r no as s u n t o . Dig a m o s
qu e tive s s e sid o eu. Colo q u e i o be b ê no ves t í bul o ant e s de
lhe tel e f o n a r . N ã o teria feit o iss o se n ã o so u b e s s e qu e a
se n h o r a es t av a l á , qu e alg u é m ate n d e r i a o tel e f o n e . Pod e
ser qu e tive s s e fica d o por l á at é vê -la voltar ou at é ver
um a luz na cas a , ma s é prov á vel aind a qu e sou b e s s e qu e a
se n h o r a pas s a r i a o fim de se m a n a fora e ch e g a r i a em
cas a dep o i s do anoi t e c e r . Talve z at é so u b e s s e a qu e hora s
sai u de We s t p o r t . Volt e m o s à ú lti m a per g u n t a : alg u é m
mai s est a v a no carr o? Ess e seria o mo d o mai s si m p l e s e
se g u r o de sab e r a qu e hor a s a se n h o r a iria ch e g a r , se
es tiv e s s e no m e s m o carr o. Cas o tive s s e res p o n did o qu e
si m , a per g u n t a se g u i n t e seri a: qu e m ?
— De u s do c é u! — Olhav a- m e at ô nit a. — Algu é m que
eu co n h e ç a bas t a n t e para...
Deix o u a fras e no m e i o e virou - se para Wolf e:
— Est á be m . Per g u n t e o que qui s e r .
Wolf e de u um gru n h i d o : — N ã o o qu e eu qui s e r . O
qu e devo per g u n t a r . . . se ac e i t a r o trab al h o . Dis s e qu e a
cas a é pr ó pria. Ond e fica?
— Na Rua 11 pert o da Quin t a Aveni d a . Her d e i - a, foi
me u bis av ô qu e m a co n s t r u i u . Qua n d o dis s e qu e es t a va
can s a d a de ser um a Arm s t e a d , n ã o est a v a ape n a s fala n d o
por falar. Falo s é rio, ma s go s t o da cas a , e Dic k a am av a .
— Divid e a cas a co m alg u é m? Te m inq ui l i n o s ?
— N ã o. Agor a eu... n ã o sei.
— A e m p r e g a d a e a coz i n h e i r a mor a m l á ?
— Si m .
— Mai s alg u é m?
— Para dor m i r , n ã o. Um a mu l h e r ve m cin c o dia s por
se m a n a para ajud ar.
— A diari s t a ou a cozi n h e i r a pod e r i a ter tido um filh o
e m jan e ir o ?
Sorri u: — A cozi n h e i r a , de jeit o ne n h u m . Ne m a
diari s t a . Est á co m i g o h á qua s e doi s an o s . N ã o, ela n ã o
tev e um beb ê .
— Ent ã o um a par e n t a del a s . Talve z um a irm ã . Um a
sit u a çã o ide a l para um sobri n h o inc o n v e n i e n t e .
Wolf e afas t o u a id é ia co m um ge s t o .
— Iss o é de roti n a . — Bat e u co m o de d o no pe d a ç o de
pap e l . — As mar c a s de alfin e t e . Era um alfin e t e de
se g u r a n ç a?
— N ã o, n ã o era. Era um alfi n e t e co m u m .
— É mes m o? — Levan t o u as sobr a n c e l h a s . — A
se n h o r a dis s e de n t r o do cob e r t o r . Ond e ? Per t o de qu e
part e do beb ê : p é s, barri g a , cab e ç a?
— Ach o que pert o dos p é s, ma s n ã o te n h o cert e z a . Já
tin h a tirad o o beb ê para fora do cob e r t o r qua n d o vi o
pap e l .
Wolf e gir o u a cad e i r a:
— Archi e , voc ê go s t a de dar opi n i õ es e m ter m o s de
prob a b i l i d a d e s . Quai s as prob a b i l i d a d e s de um a mu l h e r
exp or u m beb ê de s s a for m a a um alfi n e t e co m u m ?
Leve i tr ê s se g u n d o s para res p o n d e r : — N ã o te n h o
dad o s sufi c i e n t e s . Ond e es t av a exat a m e n t e o alfin e t e ? O
qu e é qu e o beb ê es t av a usa n d o ? Por alto, diria dez
con t r a um , ma s iss o n ã o sig n i f i c a qu e era um ho m e m .
N ã o apo s t o .
— N ã o pe di qu e apo s t a s s e . — Torn o u a girar a
cad e i r a e m dire çã o a ela. — N ã o crei o qu e , de n t r o do
cob e r t o r , es tiv e s s e nu.
— Ah, n ã o. Estav a ves t i d o at é de m a i s : su é ter; um
cha p é u de velu d o cot e l ê ; ma c a c ã o, ta m b é m de velu d o
cot e l ê ; um a ca m i s e t a de mal h a; um a ca m i s a ; cal ç a pl á s -
tic a e frald a . Ah, e boti n h a s . Est av a ves t i d o me s m o .
— Algu m alfin e t e de se g u r a n ç a?
— É clar o , na frald a .
— A frald a est av a . . . h ã ... lim p a ?
— N ã o, es t av a im u n d a . Provav e l m e n t e fico u co m a
me s m a frald a vá rias hora s . Mud e i a frald a ant e s qu e o
m é dic o ch e g a s s e , ma s tive de usar um a fron h a .
Int e rr o m p i : — Já qu e pedi u a min h a opi n i ã o, vou
faz e r um a apo s t a: um con t r a 20 qu e se foi um a mul h e r
qu e pre n d e u o bilh e t e no cob e r t o r n ã o foi a m e s m a que
ves t i u o be b ê .
N ã o ho uv e co m e n t á rios. Ele viro u a cab e ç a para
olh ar o rel ó gio de par e d e . Faltav a um a hor a para o alm o -
ç o. Aspir o u pel o nariz tod o o ar a qu e tin h a dire it o , e que
era mui t o , e exp e l i u - o pela boc a . Aí viro u- se para ela:
— Ser á ne c e s s á rio obt e r mai s infor m a çõ es da se -
nh or a , mui t a s mai s , e o Sr. Good w i n pod e faz e r iss o t ã o
be m qua n t o eu. Me u co m p r o m i s s o seri a de s c o b r i r a ide n -
tida d e da m ã e e prov á -la de um mo d o qu e a sati s f a ç a, e
de m o n s t r a r o gra u de prob a b i l i d a d e de se u mari d o ser o
pai, se m ne n h u m a gar a n t i a de su c e s s o . É iss o ?
— Ora... si m. Se o se n h o r . . . N ã o, s ó dire i si m .
— Muit o be m . Res t a a for m a l i d a d e de um sin a l .
— É clar o . — Apan h o u a bol s a . — Qua n t o ?
— N ã o imp o r t a . — Emp u r r o u a cad e i r a e leva n tou- se.
— Tant o pod e ser e m d ó lar, co m o ce m ou mil. O Sr.
Good w i n te m mui t a s per g u n t a s a lh e faz e r. De s c u l p e - m e ,
por favor.
Enc a m i n h o u - se para a porta e no corr e d o r virou à
es q u e r d a , e m dir e çã o à cozi n h a . Para o al m o ç o ter íam o s
ca ç arola de ova s de peix e , um dos pou c o s prat o s sobr e o
qual el e e Fritz tin h a m opi ni õ es difer e n t e s qu e nu n c a
fora m sol u c i o n a d a s . Con c o r d a v a m a res p e i t o da gor d u r a ,
da ma n t e i g a de anc h o v a , cer e f ó lio, ce b o l i n h a , sal s a ,
lour o , pim e n t a , ma nj e r o n a e cre m e , ma s dis c u t i a m
qua n t o à ce bola. Fritz era a favor, ma s Wolf e era
tota l m e n t e co n tr a . Talve z , ao dis c u t i r , alt e a s s e m as voz e s ,
por iss o fec h e i a port a, qu e era à prova de so m , ant e s de
apa n h a r me u cad e r n o . Ao voltar à min h a es c r iv a n i n h a ,
ela m e de u um ch e q u e no valor de mil d ó lare s .

Naq u e l a tard e , à s qui n z e para as cin c o , eu es t av a na cozi -


nha da cas a de Lucy Vald o n na Rua 11 Oes t e . Estav a de
p é , en c o s t a d o à ge l a d e i r a , se g u r a n d o um cop o de leit e . A
cozi n h e i r a , a Sra. Vera Dow d , qu e , pel a apar ê nci a, co m i a
um a boa part e do qu e cozi n h a v a , est a v a se n t a d a na
cad e i r a . A meu pedi d o , der a- m e o leit e . A Srta. Mari e
Foltz , a diari s t a , de unif o r m e , qu e h á dez an o s dev e r i a ter
sid o be m int e r e s s a n t e e ain d a n ã o era de se jogar fora,
es t av a à min h a fre n t e , en c o s t a d a na pia.
— Pre c i s o de ajud a — dis s e eu, to m a n d o um gol e de
leit e .
N ã o es t o u pas s a n d o por ci m a de mi n h a entr e v i s t a
co m a cli e n t e ant e s do alm o ç o s ó para es c o n d e r alg u m a
coi s a , ma s n ã o h á mo t iv o para rep e t i r tud o qu e ano t e i no
cad e r n o . Aqui vã o alg u m a s am o s t r a s , se é qu e pod e m o s
acr e d i t a r nel a:
Nin g u é m a det e s t a v a ou lhe qu er i a mal o sufi c i e n t e
para pre g a r - lh e um a pe ç a suja co m o aqu e l a , deixa n d o - lhe
um a cria n ç a qu e nin g u é m sabi a qu e m era, incl u i n d o sua
fam ília. Se u pai e sua m ã e es t av a m no Hava í , de ond e
iria m dar a volta ao mu n d o ; se u irm ã o cas a d o mor av a e m
Bo s t o n e sua irm ã cas a d a e m Was h i n g t o n . Sua m e l h o r
ami g a , Lena Guthr i e , um a das tr ê s pe s s o a s a que m mo s -
trara o pap e l qu e vier a pre s o ao cob e r t o r , se n d o qu e as
outr a s dua s era m o m é dic o e o advo g a d o , ac h av a que o
be b ê se par e c i a co m Dic k, ma s ela, Lucy, aind a n ã o dera
sua opi n i ã o. N ã o ia dar ne n h u m no m e ao be b ê a n ã o ser
qu e de c i d i s s e ficar co m ele . Talve z ela o ch a m a s s e de
Moi s é s, já qu e nin g u é m sabi a ao cert o que m era o pai de
Moi s é s, ma s de u um sorri s o ao diz e r iss o . E as s i m por
dia n t e . Forn e c e u , ta m b é m, cer c a de um a d ú zia de no m e s ;
os no m e s dos convi d a d o s na cas a de Haft, e m We s t p o r t ,
no dia 20 de mai o; os no m e s de qua tr o mul h e r e s , qu e tive
de arra n c a r del a, co m qu e m Dic k talv e z pud e s s e ter tido
alg u m rela c i o n a m e n t o e m abril de 19 6 1 , e um a list a de
no m e s , a mai or part e del e s de ho m e m , qu e talv e z
so u b e s s e m mai s sobr e os diver t i m e n t o s pe s s o a i s de Dic k
do qu e sua vi ú va. Tr ê s de s s e s par e c i a m ser os mai s pro -
mi s s o r e s : Leo Bin g h a m , prod u t o r de tel e v i s ã o; Willi s
Kru g, ag e n t e lit er á rio, e Julia n Haft, edit o r , o ch e f e da
Part h e n o n Pre s s . E já era o bas t a n t e .
Est av a co nv e r s a n d o co m a Sra. Dow d e a Srta. Foltz
na cozi n h a porq u e é mai s f á cil faz e r co m qu e as pe s s o a s
fale m nu m loc al on d e est ã o ac o s t u m a d a s a falar. Qua n d o
lhe s dis s e qu e pre c i s a v a de ajud a, a Sra. Dow d fito u - m e
co m os olh o s fran z i d o s e a Srta. Foltz lan ç ou- me um olh ar
c é tic o.
— É sobr e o beb ê — dis s e eu, to m a n d o mai s um gol e
de leit e . — A Sra. Vald o n levo u - m e l á e m cim a para v ê -lo.
Ach e i- o gor d o de m a i s , um pou c o se b o s o e o nariz é s ó
um a bol o t a , ma s é clar o qu e sou ape n a s um ho m e m .
A Srta. Foltz cruz o u os bra ç os. A Sra. Dow d dis s e :
— O be b ê es t á mui t o be m .
— Crei o qu e si m . Par e c e qu e a pe s s o a qu e o deix o u
no ves t íbulo ac h o u qu e a Sra. Vald o n fos s e fic ar co m el e.
Fica n d o ou n ã o fic a n d o co m o beb ê , é clar o qu e ela qu e r
sab e r de on d e el e veio, por iss o con t r a t o u um det e tive
para de s c o b r i r . O no m e é Ner o Wolf e . Talve z já te n h a m
ouvid o falar del e .
— Ele apar e c e na tev ê ? — per g u n t o u a Srta. Foltz.
— N ã o seja tola — dis s e - lhe a Sra. Dow d . — Com o
pod e r i a apar e c e r ? Ele é de verd a d e .
Virou- se para mi m: — É clar o qu e já ouvi falar del e , e
do se n h o r ta m b é m. Vi se u retr a t o no jorn al h á um ano.
Esq u e c i o se u pri m e i r o no m e . . . n ã o, n ã o es q u e c i . Archi e .
Archi e Good w i n . Dev e r i a ter me le m b r a d o qua n d o a Sra.
Vald o n dis s e Good w i n . Ten h o boa m e m ó ria para no m e s e
rost o s .
— E te m me s m o — dis s e eu, beb e n d o m e u leit e . —
Vou diz e r por que pre c i s o de ajud a . Nu m cas o de s s e s , do
qu e é qu e um det e t i v e se le m b r a r i a e m pri m e i r o lug a r?
Achari a qu e dev e hav e r um a raz ã o para o be b ê ter sid o
deix a d o aqui e m vez de outr o lug a r , e qual seri a a raz ã o?
Be m , um bo m mo ti v o pod e r i a ser que alg u é m que vive
aqui go s t a r i a qu e o be b ê ta m b é m fica s s e . Ent ã o, o Sr.
Wolf e per g u n t o u à Sra. Vald o n qu e m vive aqui al é m dela,
e ela dis s e : a Sra. Vera Dow d e a Srta. Mari e Foltz. De poi s
ele per g u n t o u se alg u m a del a s pod e r i a ter um filh o h á
quatr o m e s e s e ela res p o n d e u . . .
Amba s me int e r r o m p e r a m . Levan t e i a m ã o, co m a
pal m a para fora.
— Agor a es t ã o ven d o — fale i, se m leva n t a r a voz —,
es t ã o ven d o por qu e pre c i s o de ajud a. Foi s ó diz e r qu e um
de t e t i v e per g u n t o u um a coi s a corriq u e i r a e nat u ral e as
dua s se exalt a m . Tent e m ser det e t i v e s , pel o m e no s u m a
vez. É clar o qu e a Sra. Vald o n expli c o u qu e ne n h u m a das
dua s pod e r i a ter tido um filh o h á qua tr o mes e s, e a
per g u n t a se g u i n t e foi: alg u m a das dua s teria um a
par e n t a , um a irm ã talv e z , qu e tive s s e um filh o qu e n ã o
pod e r i a ficar co m ela? Iss o é mai s dif ícil de res p o n der.
Teria de pe s q u i s a r . Teria de de s c o b r i r se u s par e n t e s e
ami g o s , faz er um a por çã o de per g u n t a s , sei qu e levari a
mu i t o te m p o e cu s t a r i a car o, ma s é cer t o qu e con s e g u i r i a
a res p o s t a .
— Pod e co n s e g u i r a res p o s t a ag or a m e s m o — dis s e a
Sra. Dow d .
Ace n e i co m a cab e ç a: — Quer o e sei qu e pos s o . O
cas o é qu e n ã o qu er o qu e fiqu e m aborr e c i d a s co m ã Sra.
Vald o n por ela ter- lhe s pe di d o qu e co nv e r s a s s e m co m i g o .
Qua n d o alg u é m con t r a t a um det e t i v e , te m de dei xar que
ele inve s t i g u e . Ou ela me per m i t i a int e rr o g á -las ou
de s p e d i a Ner o Wolf e . Se um a das dua s sab e de ond e o
be b ê veio, e qu e r qu e alg u é m to m e con t a del e , é s ó diz e r .
A Sra. Vald o n talve z n ã o fiqu e co m el e , ma s provid e n c i a r á
para qu e vá para um a boa cas a e nin g u é m sab e r á de nad a
qu e n ã o qu e ir a m qu e saib a . A alt e r n a t i v a é co m e ç ar a
inve s t i g a r , proc u r a r se u s par e n t e s e ami g o s e de s c o b r i r . . .
— O se n h o r n ã o pre c i s a ver m e u s par e n t e s e ami g o s
— dis s e a Sra. Dow d co m ê nfa s e .
— Ne m os m e u s — de c l a r o u a Srta. Foltz.
Sabi a qu e n ã o pre c i s a v a . É clar o qu e ne m se m p r e se
con s e g u e um a res p o s t a defi n i t i v a s ó ao olh ar um ros t o ,
ma s alg u m a s vez e s iss o é pos s í vel, e eu con s e g u i ra.
Ne n h u m dos dois ros t o s es c o n d i a o probl e m a : ou
con s i d e r a r a ofer t a da Sra. Vald o n ou m e deix ar faz er a
inve s t i g a çã o. Admi t i iss o para ela s . Ao ter m i n a r o cop o de
leit e , co nv e r s e i sobr e fisi o n o m i a s e o qu e reve l a v a m , e
lhe s dis s e qu e gara n t i r a à Sra. Vald o n qu e bas t a v a ter
um a con v e r s a co m ela s para m e as s e g u r a r dis s o , o qu e
era m e n t i r a . Nu n c a se sab e o que um a co nv e r s a vai de c i -
dir, at é qu e se te n h a realiz a d o , m e s m o qua n d o seja voc ê
pr ó prio a falar o te m p o , tod o . Sep a r a m o - nos mai s ou
me n o s ami g o s .
Havia um elev a d o r , mai s suav e e sil e n c i o s o do que o
da velh a cas a de tijol o s de Wolf e , na Rua 35 Oe s t e , ma s
era ap e n a s um and ar aci m a daq u e l e ond e a Sra. Vald o n
dis s e qu e es t ar i a , e por iss o sub i a p é . Era um a sala
gra n d e , mai o r do qu e o no s s o es c r i t ó rio e sala da fre n t e
junt o s , se m nad a de mo d e r n o , exc e t o o car p e t e e a
tel e vi s ã o no fun d o . Tud o o mai s era anti g o , ma s n ão
ent e n d o mui t o dis s o . A clie n t e est a v a nu m sof á , co m um a
revi s t a , e pert o dela havia u m bar port á til qu e n ã o est a v a
ali h á um a hor a. Mud a r a de rou p a outr a vez. Ao se
en c o n t r a r co m Wolf e us av a um ter n o be g e co m list a s
marr o n s ; ao ch e g a r es t a v a co m um ves t i d o cinz e n t o qu e
co m b i n a v a mai s co m a cor de se u s olh o s do qu e o be g e .
Agor a es t av a co m um ves t i d o se m ma n g a s , be m de c o t a d o ,
azul- clar o, apar e n t e m e n t e de se d a , ma s nu n c a se te m cer -
tez a. Ao me aproxi m a r , abaix o u a revi s t a:
— Tud o cert o — fale i. — Pod e tir á -las da list a .
— Te m cert e z a ?
— Abs ol u t a .
Su a cab e ç a es t av a incli n a d a para tr á s.
— O se n h o r n ã o de m o r o u mui t o . Com o foi que fez?
— É se g r e d o profi s s i o n a l . Nad a devo diz e r a u m a
cli e n t e at é ter feit o m e u rela t ó rio ao Sr. Wolf e . Mas ela s
rea g i r a m be m . Se tiver m o s alg u m a id é ia nova, tel e f o n a rei
pela ma n h ã .
— Vou to m a r um mar ti n i . N ã o qu e r? Ou pref e r e
outr a coi s a ?
Ao deix ar a coz i n h a co n s u l t a r a o rel ó gio, e le m b r a ra-
me qu e Wolf e fic ari a na es t u f a das orq u í de a s at é as sei s
hor a s e que um a das min h a s fun çõ es é ent e n d e r qual q u e r
mu l h e r co m qu e m es tiv e r m o s lida n d o e; vist o qu e o gi m
era Folla n s b e e , pe n s e i qu e era me l h o r ser be m soc i á vel.
Ofer e c i - m e para faz e r a be bi d a , diz e n d o que a prop o r çã o
qu e eu pref e r i a era cin c o por um, e ela con c o r dou. De p o i s
qu e pre p a r e i o mart i n i , servi e se n t e i - me no sof á ao se u
lad o. Prova m o s a bebi d a e ela dis s e :
— Vam o s exp e r i m e n t a r um a coi s a ? Voc ê to m a um
gol e do me u e eu to m o um gol e do se u . Voc ê se imp o r t a ?
É clar o qu e eu n ã o m e imp o r t a v a , já qu e devia ten t a r
ent e n d ê -la. Se g u r o u o cop o para qu e eu de s s e um gol e , e
se g u r e i o m e u para qu e ela prova s s e .
— Real m e n t e , est e gi m bo m es t á de s p e r d i ç ado —
dis s e eu. — Acab e i de to m a r um cop o de leit e .
Ela ne m m e ouvi u . N e m sabi a qu e eu tin h a falad o .
Olhav a para mi m , ma s n ã o m e via. Com o podi a ent e n d e r
iss o? Com o n ã o qu er i a ficar co m os olh o s fito s nel a, olh e i
o se u om b r o , qu e nad a tin h a de ma g r o .
— Ne m sei por qu e qui s faz e r iss o , as s i m de rep e n t e
— dis s e . — De s d e qu e Dic k morr e u qu e n ã o o fa ç o. De
rep e n t e sou b e qu e tin h a de faz ê -lo, n ã o sei por qu ê .
Ach e i m e l h o r co n s e r v a r a coi s a no pla n o profi s s i o -
nal, e o m e l h o r mo d o era traz e r Wolf e para a co nv e r s a :
— O Sr. Wolf e diz qu e nu n c a nin g u é m sab e por qu e
real m e n t e faz alg u m a coi s a .
Ela sorri u: — E l á e m cim a , qua n d o voc ê olh av a o
be b ê , qua s e o cha m e i de Archi e . N ã o est o u te n t a n d o
flert ar co m voc ê . N ã o sei flert ar . N ã o crei o qu e . . . Voc ê
n ã o é hip n o t i z a d o r , é ?
Tom e i um gol e do mar ti n i .
— Que diab o — dis s e . — Relax e . Provar bebi d a um do
outr o é um anti g o co s t u m e per s a . Qua n t o a m e cha m a r de
Archi e , é o me u no m e mes m o . N ão me ch a m e de
Sve n g a l l i . Qua n t o a flert ar , vam o s dis c u t i r iss o . Ho m e n s e
mu l h e r e s fler t a m . Caval o s fler t a m . Os periq u i t o s flert a m .
Se m d ú vida as os tr a s ta m b é m flert a m , ma s dev e m ter
alg u m mo d o es p e c i a l . . .
Par e i porq u e ela es t av a and a n d o . Sa íra do sof á , col o -
cara o cop o , aind a me i o ch e i o , no bar e dis s e , ao sair: —
N ã o se es q u e ç a de levar a mal a qua n d o for e m b o r a .
Leve i alg u m te m p o para ent e n d e r . Se n t e i - m e e
pe n s e i no as s u n t o , un s qua tr o ou cin c o min u t o s ,
en q u a n t o be bi a o mar ti n i . Levan t e i - me , pu s m e u cop o no
bar, toc a n d o o dela para mo s t r a r qu e ent e n d e r a , o qu e
n ã o era verd a d e , e sa í . Emb a i x o , na entr a d a , ao sair,
pe g u e i a valis e qu e ela m e ajud ar a a faz e r.
Pe g a r um t á xi à qu e l a hora, naq u e l a part e da cid a d e ,
é co m o es p e r a r con s e g u i r um dez qua n d o se te m na m ã o
um oit o, nov e , vale t e e da m a . Era m s ó 24 quar t e i r õ es
pe q u e n o s e qua tr o gra n d e s e a valis e era leve . De qual -
qu e r mo d o , so u um and a r il h o . Queri a ch e g a r ant e s de
Wolf e de s c e r para o es c r i t ó rio e co n s e g u i ; era m cin c o
hor a s e cinq ü en t a e qua tr o mi n u t o s qua n d o subi os de -
gra u s da velh a cas a de tijol o s apar e n t e s , abri a port a co m
a min h a chav e , en tr e i , fui ao es c r i t ó rio, col o q u e i a valis e
na cad e i r a , abri- a e retir e i o qu e havia de n t r o . Qua n d o
ouvi o bar ul h o do elev a d o r , tod o s os obje t o s est av a m na
es c r iv a n i n h a de Wolf e , cobri n d o - a qua s e por int e ir o e,
qua n d o ele en tr o u , eu est a v a na mi n h a m e s a , oc u p a d o
co m os jornai s . Qua n d o par o u e de u um gru n h i d o , gir e i
mi n h a cad e ir a .
— O qu e é iss o ? — per g u n t o u .
Levan t e i - me e apo n t e i : — Su é ter, ch a p é u, ma c a c ã o,
ca m i s e t a de mal h a , cob e r t o r , boti n h a s , cal ç a imp e r m e á -
vel, frald a . Te m qu e se dar cr é dit o a ela por co n s e r v a r a
frald a . A empre g a d a não es t av a e só arra nj o u um a
enf e r m e i r a no dia se g u i n t e . Dev e ter lavad o a frald a ela
me s m a . N ã o h á mar c a s de lava n d e r i a ou de loja s. O
su é ter, ch a p é u, ma c a c ã o e as boti n h a s t ê m mar c a s da
fá bric a, ma s duvid o qu e sirva m para alg u m a coi s a . H á
um a coi s a e m um dos obje t o s qu e talve z ajud e . Se voc ê
n ã o o rec o n h e c e r , talv e z n ã o valh a a pe n a m e n c i o n á -lo.
Foi para sua cad e ir a feit a sob m e d i d a , e se n t o u - se:
— E qua n t o à cozi n h e i r a e à diari s t a ?
— N ó s já co nv e r s a m o s . Est ã o de fora. Quer sab e r
palavr a por palavr a da co nv e r s a ?
— Se fic o u sati s f e i t o co m as res p o s t a s , n ã o.
— Est o u . É clar o qu e , se n ã o de s c o b r i r m o s nad a,
pod e m o s verifi c a r a his t ó ria del a s .
— O qu e mai s ?
— Pri m e i r o , h á um beb ê vivo. Eu o vi. Ela n ão
so n h o u . N ã o h á nad a fora do co m u m co m o ves t í bul o; a
porta n ã o te m fec h a d u r a e s ã o s ó quatr o de gr a u s , qual -
qu e r pe s s o a pod e r i a subir e de s c e r rapid a m e n t e ; te n t a r
de s c o b r i r alg u é m que viu qu e m fez iss o h á 17 dias , no
es c u r o , seri a um a perd a de m e u te m p o e do din h e i r o da
cli e n t e . N ã o incl u í a faxin e i r a no int e r r o g a t ó rio porq u e ,
se o beb ê fos s e del a, teria outr a cor, e n ã o incl u í a
enf e r m e i r a porq u e foi co n t r a t a d a atrav é s de um a ag ê n -
cia, no dia se g u i n t e . H á um boni t o tap e t e . Tekk e no
quart o de cria n ç a, qu e era ant e s um quart o de h ó sp e d e s .
Voc ê sab e qu e apr e n d i sobr e tap e t e s co m voc ê , e sobr e
qua dr o s co m a Sra. Row a n . H á um Re n o i r na sala de
es t ar , e cre i o qu e um Cé zan n e . A clie n t e beb e gi m
Folla n s be e . N ã o es t o u e m su a s boa s gra ç as, por q u e m e
es q u e c i qu e ela era um a Arm s t e a d e fui irrev e r e n t e .
Qua n d o ac or d a r es t ar á be m .
— Por qu e a irrev e r ê ncia?
— Ela bala n ç ou m e u bra ç o e derr a m e i gi m nas mi -
nha s cal ç as.
Olh o u - me de n t r o dos olh o s : — É me l h o r faz er um
rela t o text u a l .
— N ã o é ne c e s s á rio. Esto u sati s f e i t o .
— Se m d ú vida alg u m a . Te m alg u m a su g e s t ã o?
— Sim , se n h o r . Par e c e se m es p e r a n ç as. Se não
con s e g u i r m o s nad a de n tr o de dua s se m a n a s , pod e diz er -
lhe qu e de s c o b r i u qu e o beb ê é m e u , qu e o col o q u e i no
ves t í bul o e qu e se qui s e r cas a r co m i g o pod e ficar co m
ele . Pos s o si m p l e s m e n t e . . .
— Cale a boc a .
De qual q u e r mo d o , ain d a n ã o tin h a de c i d i d o co m o
sol u c i o n a r a qu e s t ã o da m ã e. Apan h o u o su é ter e ins p e -
cio n o u - o. N ã o o viro u do ave s s o porq u e era um a ins pe çã o
rá pida e aind a voltari a a exa m i n á -lo. Larg o u - o e apa n h o u
o cha p é u. Qua n d o ch e g o u ao ma c a c ã o fiqu e i olh a n d o o
se u rost o , ma s n ã o vi sin a l de ter repar a d o em coi s a
alg u m a , ent ã o gir e i a cad e i r a para apa n h a r o cat á log o
tel e f ô nic o P á gin a s Amar e l a s de Man h a t t a n , que an te s era
P á gin a s Ver m e l h a s . Sob o t í tul o: “Rou p a s de Be b ê e
Crian ç a — Fab. e Atac.”, que en c h i a qua tr o p á gin a s e
me i a , en c o n t r e i o qu e qu e ri a . Leve i a m ã o ao tel e f o n e ,
ma s trou x e - a de volt a. Talve z ele o not a s s e ao exa m i n a r a
rou p a pel a se g u n d a vez, ma s dev e r i a ter um a op or t u -
nida d e se m qu e eu lhe de s s e um a pis t a . Levan t e i - me , fui
at é o corr e d o r , sub i os doi s and ar e s at é m e u quar t o , e
dis q u e i o n ú me r o no tel e f o n e da m e s i n h a - de- cab e c e i r a .
Mas , co m o era de es p e r a r naq u e l a hor a do dia, n ã o tive
res p o s t a . Tent e i outr o n ú me r o , o de um a mo ç a qu e co -
nh e c i a e qu e tin h a tr ê s filh o s , ma s ela n ã o p ô de me aju -
dar; dis s e qu e s ó ven d o o ma c a c ã o. Ent ã o tin h a de es p e -
rar pel a ma n h ã se g u i n t e . De s c i de nov o para o es c r i t ó rio.
Wolf e volt ar a para a sua cad e i r a e est a v a se g u r a n d o
o ma c a c ã o para qu e a luz o ilu m i n a s s e be m , e na outr a
m ã o est a v a sua mai or len t e de au m e n t o . Exa m i n a v a um
bot ã o. Anda n d o e m sua dire çã o, per g u n t e i :
— Enc o n t r o u alg u m a coi s a ?
Giro u a cad e i r a e col o c o u a len t e na m e s a: — Talve z .
Os bot õ es de s t a rou p a . Quatr o del e s .
— O qu e é qu e h á co m ele s ?
— N ã o me par e c e m ade q u a d o s . Ess a s roup a s dev e m
ser feita s aos mil h a r e s , incl u i n d o os bot õ es. Mas é clar o
qu e est e s bot õ es n ã o fora m prod u z i d o s e m s é rie. O mat e -
rial par e c e te ci d o de crin a bra n c a , e m b o r a pos s a ser um a
fibra sin t é tic a. Mas h á gra n d e dif er e n ç a de ta m a n h o e
feiti o . N ã o h á pos s i b i l i d a d e de ter e m sid o feit o s em
gra n d e qua n t i d a d e por um a m á qui n a .
— Iss o é mu i t o int e r e s s a n t e . Para b é ns — dis s e ,
se n t a n d o - m e.
— Su g ir o qu e os exa m i n e .
— Já exa m i n e i , e m b o r a n ã o co m um a len t e . É clar o
qu e not o u qu e a mar c a da f á bric a é Quer u b i m . Ess a mar -
ca é feit a por Re s n i c k e Spir o , Rua 37 Oes t e , 34 0 . Acab e i
de falar para l á ma s n ã o obtiv e res p o s t a , já qu e pas s a m
das sei s da tard e . Fica a cin c o min u t o s de dist â nci a
daq u i. Irei am a n h ã de ma n h ã , a n ã o ser qu e voc ê qu e ir a
qu e eu en c o n t r e o Sr. Re s n i c k ou o Sr. Spir o ag or a .
— De ma n h ã es t á be m . Devo pedir de s c u l p a s por
tirar um pou c o dos se u s lour o s ?
— N ó s os repar t ir e m o s — res p o n d i , e leva n t e i - m e
para apa n h a r o ma c a c ã o e a le nt e .

O dis tri t o de ves t u á rio de Man h a t t a n te m de tud o , de s d e


pal á cio s de m á rm or e de 30 and a r e s at é es c r i t ó rios m íni -
mo s . N ã o é lug ar para se pas s e a r a p é , poi s se pas s a a
mai or part e do te m p o fora da cal ç ada, dan d o a volt a e m
ca m i n h õ es qu e es t ã o rec u a n d o ou entr a n d o , ma s é ó tim o
co m o loc al de trei n o para pular e se de s vi a r , e para
apri m o r a r os refl e x o s . Se, de p o i s de um a hor a na s rua s
qu e cruz a m as Rua s 30, voc ê sair int e ir o , es t a r á se g u r o
e m qual q u e r part e do mu n d o . Ent ã o ach e i qu e con s e g u i r a
alg u m a coi s a , qua n d o ch e g u e i à entr a d a da Rua 37 Oes t e ,
34 0 , à s dez hora s da ma n h ã de quart a - feira.
Mas a í fic o u co m p l i c a d o . Ten t e i expli c a r o m e l h o r
qu e pud e , pri m e i r o para um a jove m nu m gui c h ê no pri -
me ir o and ar e dep o i s a um rapa z na sala de es p e r a no
quart o and ar, ma s n ã o co n s e g u i r a m ent e n d e r por qu e , se
n ã o qu er i a ven d e r ou co m p r a r alg u m a coi s a ne m est av a
proc u r a n d o e m p r e g o , eu est a v a no pr é dio. Afinal , co n s e -
gui ch e g a r at é um ho m e m de mai s vis ã o, se n t a d o nu m a
es c r iv a n i n h a . É clar o qu e n ã o con s e g u i a ent e n d e r por qu e
a per g u n t a “os bot õ es fora m pos t o s ne s t e ma c a c ã o por
Re s n i c k e Spir o?” era sufi c i e n t e m e n t e imp or t a n t e para
qu e eu tive s s e de atrav e s s a r a Rua 37 a fim de con s e g u i r
a res p o s t a , ma s est a v a oc u p a d o de m a i s para co m e n t a r
iss o . S ó o fato de um ho m e m ter tido tan t o trab a l h o para
lhe faz e r um a per g u n t a já me r e c i a um a res pos t a . Dep o i s
de um olh ar r á pid o, dis s e - m e que Re s n i c k e Spir o jam ai s
tin h a m usa d o um bot ã o de s s e tipo e nun c a usari a m .
Usav a m qua s e excl u s i v a m e n t e pl á sti c o . Dev ol veu- m e o
ma c a c ã o.
— Muit o obri g a d o — repli q u e i . — N ã o lhe int e -
res s a r i a sab e r por qu e es t o u lhe inc o m o d a n d o co m iss o ,
ma s n ã o é si m p l e s curi o s i d a d e . Con h e c e alg u m a fir m a
qu e fabri c a bot õ es igu a i s a es s e ?
Ele aba n o u a cab e ç a: — N ã o te n h o a m e n o r id é ia.
— Algu m a vez já viu bot õ es de s s e tipo?
— Nu n c a .
— Pod e m e diz e r de qu e s ã o feit o s ?
Incli n o u - se para olh ar m e l h o r:
— Creio qu e s ã o sin t é tic o s , ma s de qu e mat e r i a l s ó
De u s sab e . — De rep e n t e de u um sorri s o si m p á tic o ,
hu m a n o e ch e i o de hu m o r . — Ou ent ã o o imp e r a d o r do
Jap ã o. Ten t e per g u n t a r - lh e. Daq u i a pou c o , tud o vir á de
lá .
Agrad e c i , rec o l o q u e i o ma c a c ã o no sac o de pap e l e
fui e m b o r a . Com o su s p e i t a s s e qu e n ã o con s e g u i r i a nad a
mai s de Re s n i c k e Spir o, ter ç a- feira à noit e detiv e - m e
um a hor a nas qua tr o p á gin a s e m e i a intit u l a d a s “Bot õ es”
das P á gin a s Amar e l a s , e no m e u cad e r n i n h o de bols o ha -
via o no m e de 15 fir m a s , nu m per ím e t r o de cin c o quar -
teir õ es de ond e es t av a . Um del e s ficava a 50 pas s o s dali e
diri gi- m e para l á .
De p o i s de 90 mi n u t o s , ten d o ido a qua tr o fir m a s
difer e n t e s , sabi a um pou c o mai s sobr e bot õ es e m ger a l,
ma s nad a es p e c ífic o sobr e os do ma c a c ã o. Um a das
fir m a s fazia bot õ es cob e r t o s , outr a de poli é st e r e acr ílic o,
outr a us av a ma dr e p é rola, outr a ban h a v a - os de our o e
prat a. Nin g u é m tin h a a m íni m a id é ia de qu e m fiz er a o
me u , ou de qu e era m feit o s , e nin g u é m se imp or t a v a .
Par e c i a que s ó ia rec e b e r um a col e çã o de ne g a t i v a s , o
qu e , de um cer t o mo d o , est av a cert o . Enc a m i n h e i - m e pel o
cor red or no sext o and ar de um pr é dio na Rua 39 at é um a
porta ond e es t av a es c ri t o: CIA . DE BOTÕE S EXCLUSIVOS —
NOVIDA DE S .
Se so u b e s s e , seri a o pri m e i r o lug a r aon d e teria ido.
Um a mu l h e r , qu e sabi a exat a m e n t e o qu e eu qu er i a ant e s
qu e eu dis s e s s e dez palavr a s , levo u - m e a um a sal a int e r n a
se m prat e l e i r a s na s par e d e s e ne m um bot ã o à vist a . Um
velh o t e , co m gra n d e s orel h a s e cab e l o s bran c o s , se n t a d o
a um a me s a olh a n d o um a pas t a , n ã o leva n t o u os olh o s at é
qu e eu es tiv e s s e ao se u lad o e puxa s s e o ma c a c ã o da
pas t a . Qua n d o m e x e u os olh o s , viu um dos bot õ es. Pux o u
o ma c a c ã o de min h a m ã o, olh o u co m at e n çã o cad a um
dos bot õ es, os doi s na gol a e os dois do lad o, leva n t o u os
olh o s e per g u n t o u :
— De ond e vier a m es s e s bot õ es?
Dei um a risa d a . Talve z voc ê n ã o ac h e gra ç a, ma s h á
mai s de dua s hor a s qu e vinh a trab a l h a n d o para obt e r
es s a res p o s t a . Havia um a cad e i r a e se n t e i - me nel a.
— Est o u rind o de mi m , n ã o do se n h o r — expli qu e i-
lhe . — Um a res p o s t a defi n i t i v a a es s a per g u n t a vale 10 0
d ó lar e s , em din h e i r o , a qu e m forn e c ê -la. N ã o vou lh e
expli c a r por qu e , é mu i t o co m p l i c a d o . O se n h o r pod e dar-
me a res p o s t a ?
— O se n h o r é um ho m e m de bot õ es?
— N ã o.
— Que m é o se n h o r ?
Apan h e i a cart e i r a de doc u m e n t o s do bol s o e dei- lh e
me u cart ã o. Ele o apa n h o u e leu- o, ap er t a n d o os olh o s :
— É um de t e t i v e parti c u l a r ?
— Iss o m e s m o .
— Ond e con s e g u i u es s e s bot õ es?
— Ou ç a — res p o n d i —, qu e r o ape n a s . . .
— Ou ç a voc ê , me u jove m . Sei mai s sobr e bot õ es do
qu e qual q u e r outr o ho m e m no mu n d o . Rec e b o - os de toda
a part e . Ten h o a m e l h o r e mai s abra n g e n t e col e çã o do
mu n d o . Tam b é m os ven d o . Já ven d i 1. 0 0 0 d ú zias de
bot õ es nu m s ó lot e por 40 ce n t a v o s a d ú zia, e ven di
quatr o bot õ es por 6. 0 0 0 d ó lar e s . Já ven d i bot õ es para a
duq u e s a de Wind s o r , para a rain h a Eliz a b e t h e para a
Srta. Be t t e Davi s . Já dei bot õ es para nov e mu s e u s
difer e n t e s e m cin c o pa íse s . Sei qu e , e m hip ó te s e alg u m a ,
um ho m e m pod e r i a m e mo s t r a r u m bot ã o qu e eu n ã o
pud e s s e ide n t i f i c a r , ma s voc ê p ô de. Ond e os co n s e g u i u ?
— Est á be m — res p o n d i . — Ou ç a, ag or a é a sua vez.
Sei me n o s a res p e i t o de bot õ es do qu e qual q u e r outr o
ho m e m no mu n d o . Pre c i s o sab e r de ond e veio es t e ma -
cac ã o, porq u e es t á lig a d o a um cas o e m qu e es t o u trab a -
lha n d o . Com o s ã o um prod u t o - padr ã o, ven di d o e m tod a
part e , n ã o con s i g o sab e r de ond e viera m , ma s m e par e c e u
qu e os bot õ es n ã o s ã o padr o n i z a d o s e sua ori g e m po d e
ser de s c o b e r t a . É iss o qu e est o u ten t a n d o de s c o b r i r , de
ond e viera m . É clar o qu e o se n h o r n ã o pod e .
— Admi t o qu e n ã o pos s o !
— Est á be m . É ó bvio qu e o se n h o r co n h e c e bot õ es
fora do co m u m , bot õ es raro s . Sab e ta m b é m a res p e i t o de
bot õ es co m u n s , co m e r c i a i s ?
— Sei tud o sobr e bot õ es!
— E nu n c a viu ou ouvi u falar de bot õ es co m o es t e s ?
— N ã o! Já ad m i t i iss o !
— Ótim o . — Apan h e i min h a cart e i r a de din h e i r o , tir ei
cin c o not a s de 20 d ó lar e s e col o q u e i - as na m e s a . — O
se n h o r n ã o res p o n d e u à mi n h a per g u n t a , ma s aju dou
bas t a n t e . Ser á qu e , de alg u m mo d o , es s e s bot õ es fora m
feit o s a m á qui n a ?
— N ã o. Imp o s s í vel. Algu é m levo u vá rias hora s para
faz ê -los. É um a t é cni c a que nu n c a vi.
— De qu e s ã o feit o s ? Qual o mat e r i a l ?
— Iss o talv e z seja dif ícil. Vai levar alg u m te m p o .
Talve z pos s a diz e r- lhe alg u m a coi s a am a n h ã à tard e .
— N ã o pos s o es p e r a r tan t o te m p o .
Pux e i o ma c a c ã o, ma s el e n ã o o solt o u .
— Prefir o ficar co m os bot õ es do qu e co m o di nh e ir o
— falo u . — Ou pel o m e n o s co m um s ó . O se n h o r não
pre c i s a de tod o s os qua tr o .
Tive de puxar para qu e solt a s s e o ma c a c ã o. Colo -
qu e i- o na bol s a e m e leva n t e i .
— O se n h o r m e pou p o u mui t o te m p o e trab a l h o —
dis s e - lhe —, e go s t o de mo s t r a r co m o es t o u agra d e cid o.
Se e qua n d o eu tiver ter m i n a d o co m os bot õ es, doar e i um
ou mai s de um para a su a col e çã o, e lh e dir ei de on d e
vier a m . Pel o m e n o s , é o qu e es p e r o .
Leve i cin c o mi n u t o s para sair. N ã o qu e r i a ser gro s -
seir o . Ele era co m cert e z a o ú nic o fan á tic o por bot õ es na
Am é rica e tiver a sort e de en c o n t r á -lo ant e s do alm o ç o.
Pe n s a v a no alm o ç o ao deixar o pr é dio. Era m e i o - dia
e dez min u t o s . Ser á qu e Nat h a n Hirs h al m o ç ava ced o ou
tard e ? De c i d i n ã o perd e r te m p o e m tel e f o n a r , e tive sort e
de nov o. Qua n d o en tr e i na sal a de es p e r a dos Labo -
rat ó rios Hirs h , no d é ci m o and ar de um pr é dio na Rua 43,
o pr ó prio Hirs h ta m b é m l á est a v a , pron t o para sair.
Qua n do lhe dis s e qu e tro ux e r a um a coi s a da part e de
Ner o Wolf e e qu e n ã o podi a es p e r a r , levo u - m e outr a vez
para de n t r o , pel o corr e d o r , at é a sua sal a. A publi c i d a d e
e m tor n o do se u te s t e m u n h o e m ju í zo, h á un s ano s , nu m
dos cas o s de Wolf e , n ão prej u d i c a r a em nad a se u s
ne g ó cio s , pel o con t r á rio.
Mo s t r e i o ma c a c ã o e per g u n t e i :
— S ó um a per g u n t i n h a si m p l e s . De qu e s ã o feit o s os
bot õ es?
Foi at é sua es c r iv a n i n h a , apa n h o u um a len t e e ins -
pe c i o n o u um del e s :
— N ã o é t ã o si m p l e s , co m tant o tipo de mat e r i a l qu e
h á por a í . Par e c e te c i d o de crin a , ma s para ter m o s
cert e z a ter e m o s qu e cort ar um del e s e m ped a ç os.
— Qua n t o te m p o vai levar?
— De vint e mi n u t o s at é cin c o hor a s .
Dis s e - lhe qu e qua n t o mai s ce d o m el h o r e que ele
sabi a o n ú m e r o de no s s o tel e f o n e .
Che g u e i na Rua 35 e entr e i e m cas a no mo m e n t o
exat o e m qu e Wolf e cruz a v a o corr e d o r para ir à sala de
jant ar . Com o n ã o se pod e falar de ne g ó cio s à m e s a , paro u
na sol e i r a e per g u n t o u :
— E ent ã o?
— At é agor a tud o be m — res p o n d i . — Na ver dad e ,
perf e i t o . Um ho m e m qu e sab e tan t o sobr e bot õ es co m o
voc ê sobr e co m i d a nun c a viu nad a igu a l. Algu é m levo u
hor a s a faz ê -los. N ã o con s e g u i u ide n t i f i c a r o ma terial ,
por iss o leve i - os a Hirs h . Far á se u rela t ó rio hoje à tard e .
Re s p o n d e u qu e era sati s f a t ó rio e en c a m i n h o u - se pa -
ra a m e s a . Fui lavar as m ã os ant e s de faz e r- lh e co m p a -
nhia .
Com tod o s os tipo s de ma q u i n i n h a s qu e já inve n -
tara m , talv e z haja um a qu e se pud e s s e col o c a r e m Wolf e
e e m mi m para de s c o b r i r se el e m e irrita mai s do qu e eu
a el e ou vic e- vers a , ma s , co m o tal m á qui n a n ã o exis t e ,
n ã o sei. Admi t o qu e h á oc a s i õ es qu e n ã o h á nad a a faz e r
exc e t o es p e r a r , ma s co m o es p e r a r é qu e é a qu e s t ã o. Na -
qu e l e dia, de p o i s do alm o ç o, no es c r i t ó rio, eu aborr e c i
Wolf e ao olh ar o rel ó gio a cad a doi s mi n u t o s , en q u a n t o
ditava um a lon g a cart a a um col e c i o n a d o r de orq u íde a s
e m Hon d u r a s , e de p o i s foi ele qu e m impli c o u co m i g o ao
se se n t a r , be m à vont a d e , len d o Viaja n d o co m Cha r l e y , de
John St e i n b e c k . Que diab o , ele tin h a um servi ç o a faz e r.
Se qu e r i a ler um livro, por que n ã o ler Su a pr ó pria
im a g e m , de Ric h a r d Valdo n , qu e es t a v a na es t a n t e ? Tal -
vez fos s e alg u m tip o de ins i n u a çã o, n ã o sei.
O tel e f o n e m a de Hir s h foi à s tr ê s e quar e n t a e tr ê s.
Me u cad e r n o de ano t a çõ es est av a à m ã o, cas o fos s e co m -
plic a d o , co m palavr a s cie n t ífica s gra n d e s , ma s fora m s ó
palavr a s co m u n s e n ã o era m mui t a s . De s l i g u e i e gir e i a
cad e i r a , e Wolf e ch e g o u a tirar os olh o s do livro.
— Teci d o de crin a — dis s e eu. — Se m tint u r a , verni z
ou qual q u e r outr a coi s a , ape n a s crin a tec i d a , se m
ne n h u m a alt e r a çã o.
De u um gru n h i d o : — H á te m p o para um an ú nci o no s
jornai s de am a n h ã ? Ti m e s , Ne w s e Gaz e t t e .
— Ti m e s e Ne w s , talv e z , Gaz e t t e , si m .
— Apan h e o cad e r n o de ano t a çõ es. Em dua s col u nas ,
mai s ou m e n o s dez ce n t í me tr o s . Em ci m a , ne g r i t o , corp o
30 ou mai or: 10 0 d ó lare s , em n ú meros. Mais abaix o ,
corp o 14, ta m b é m ne g r i t o: Pa g a m o s e m din h e i r o qual -
qu e r infor m a çã o a res p e i t o do fabri c a n t e , v í rgul a , ou
ent ã o da ori g e m , ví rgul a , de bot õ es de crin a bra n c o s fei -
tos à m ã o. Pon t o . Bot õ es de qual q u e r feiti o ou ta m a n h o
para ser e m usa d o s e m roup a s . Pon t o . N ã o qu e r o sab e r
qu e m pod e faz e r es s e s bot õ es, vírgul a , ma s qu e m
real m e n te os fez. Pon t o . Os 10 0 d ó lar e s ser ã o pag o s
ape n a s à pe s s o a qu e forn e c e r a pri m e i r a infor m a çã o.
Emb a i x o , pon h a m e u no m e , end e r e ç o e tel e f o n e .
— Em ne g r i t o ?
— N ã o. Tam a n h o padr ã o, co n d e n s e d .
Ao virar- m e para a m á qui n a de es c r e v e r , daria um a
d ú zia de bot õ es de poli é ste r para sab e r se ele plan e j a r a
iss o ao ditar as cart a s ou enq u a n t o lia Viaja n d o co m
Char l e y .

É clar o qu e as re gr a s da velh a cas a de tijol o s apar e n t e s


da Rua 35 Oes t e s ã o feit a s por Wolf e , poi s a cas a é del e ,
ma s quai s q u e r varia çõ es na roti n a mat i n a l ger a l m e n t e
part e m de mi m . Wolf e co n s e r v a se u hor á rio pe s s o a l : à s
oit o e quin z e da ma n h ã to m a caf é no quar t o do se g u n d o
and ar , nu m a ban d e j a qu e Fritz leva; à s nov e hor a s en tr a
no el ev a d o r , vai para a est u f a aci m a e à s onz e de s c e para
o es c r i t ó rio. Me u hor á rio dep e n d e do qu e est á
aco n t e c e n d o e da hor a e m qu e fui deit ar . Pre c i s o dor m ir
oit o hor a s co m p l e t a s , e à noit e aju s t o o rel ó gio na min h a
me s i n h a - de- cab e c e i r a para de s p e r t a r oit o hor a s de p o i s .
Com o naq u e l a noit e de quar t a- feira fui ao teat r o , dep o i s
ao Fla m i n g o co m um a ami g a , e s ó volt e i para cas a de p o i s
de um a hor a, re g u l e i o de s p e r t a d o r para as nov e e me i a .
Mas quin t a - feira de ma n h ã n ã o foi o radi orr e l ó gio
qu e m e ac or d o u . Qua n d o ac o n t e c e u , fec h e i aind a mai s os
olh o s te n t a n d o de s c o b r i r o que era. N ã o era o tel e f o n e ,
poi s de s li g a r a min h a ext e n s ã o, e de qual q u e r ma n e i r a o
bar ul h o n ã o era sufi c i e n t e m e n t e alto. Era um a ab e l h a , e
qu e diab o s es t av a um a abe l h a zuni n d o na Rua 35 no m e i o
da noit e ? Ou talv e z o sol já tive s s e apar e c i d o . Fiz for ç a
para abrir os olh o s e olh e i o rel ó gio: falt av a m sei s
mi n u t o s para as nov e hora s . E era o tel e f o n e int e r n o , é
clar o. Dev e r i a sab e r . Estiq u e i - m e e apa n h e i - o.
— Quar t o de Archi e Good w i n . Sr. Good w i n ao
tel e f o n e .
— De s c u l p e , Archi e . — Era Fritz. — Mas ela in sis t e . . .
— Que m ?
— Um a mul h e r no tel e f o n e . Algu m a coi s a a res peit o
de bot õ es. Ela dis s e . . .
— Est á be m , eu ate n d o . — Girei o int e r r u p t o r da
ext e n s ã o e apa n h e i o tel e f o n e : — Sim ? Archi e Good w i n
fal...
— Quer o falar co m Ner o Wolf e e es t o u co m pre s s a !
— Ele n ã o pod e falar. Se é a res p e i t o do an ú nci o . . .
— É. Vi o an ú nci o no Ne w s . Con h e ç o alg u n s bot õ es
de s s e tipo e que r o ser a pri m e i r a . . .
— E é . Se u no m e , por favor?
— Be a t r i c e Epps . E- P- P- S. So u a pri m e i r a ?
— Se est iv e r cert a , é . Sra. Epp s , ou se n h o r i t a ?
— Srta. Be a t r i c e Epp s. N ã o pos s o lhe diz e r ag or a . . .
— Ond e est á ?
— Est o u nu m a cabi n e tel e f ô nic a na Esta çã o Gran d
Centr a l . Est o u a ca m i n h o do trab al h o e ten h o de es t a r l á
à s nov e hor a s , por iss o n ã o pos s o lhe falar ag or a , ma s
qu e r i a ser a pri m e i r a .
— Claro. Muit o se n s a t o de sua part e . Ond e tra balh a ?
— Na Quin n e Colli n s , no Edif í cio Chan i n . Corr e tor e s
de im ó veis. Mas não vá lá , não go s t a r i a m dis s o .
Tel e f o n a r e i de nov o na hor a do alm o ç o.
— A qu e hor a s ?
— Mei o- dia e m e i a .
— Est á be m , es t a r e i na ban c a de jornai s do Edif ício
Cha ni n m e i o - dia e m e i a e lhe pag a r e i o al m o ç o. Levar e i
um a orq u í de a pe q u e n a na lap e l a , bra n c a e verd e , e te rei
10 0 . . .
— Est o u atra s a d a , pre c i s o ir e m b o r a .
A liga çã o foi int e r r o m p i d a . Ca í nos trav e s s e i r o s , vi
qu e es t a v a ac or d a d o de m a i s para ficar mai s m e i a hor a na
ca m a , virei- m e e pus os p é s no ch ã o.
Às dez hora s est av a na cozi n h a , à m e s a , col o c a n d o
a çú car ma s c a v o nu m boli n h o de gr el h a , feit o co m coa -
lhad a , e co m o Ti m e s , nu m a ar m a çã o na mi n h a fre n t e .
Fritz, ao m e u lad o, per g u n t o u :
— Se m can e l a ?
— N ã o. — res p o n d i co m fir m e z a . — De s c o b r i qu e
can e l a é um afro di s íac o.
— Ent ã o para voc ê seri a. .. co m o se diz? Chov e r e m
alg u m a coi s a ?
— Chov e r no mol h a d o . N ã o é be m iss o , ma s voc ê est á
be m - int e n c i o n a d o e lhe agr a d e ç o.
— Se m p r e est o u be m - int e n c i o n a d o .
Vend o qu e eu já est a v a na se g u n d a mor d i d a , foi para
o fog ã o faz e r mai s boli n h o s .
— Vi o an ú nci o . Tam b é m vi na sua me s a o qu e voc ê
trou x e na vali s e . Ouvi diz er qu e o cas o mai s peri go s o para
um det e t i v e é rapt o .
— Talve z si m e talv e z n ã o. De p e n d e .
— Em tod o s os ano s e m qu e trab al h o para ele é o
pri m e i r o cas o de rapt o qu e ac e i t a .
Be b i um gol e de caf é : — Lá ve m voc ê de nov o, Fritz,
dan d o volta s . Voc ê podi a per g u n t a r : “é um cas o de
rapt o?”, e eu diria qu e n ã o. Por q u e n ã o é . É clar o qu e
tiro u es s a id é ia ven d o as roup a s de beb ê . Mas c á entr e
n ó s, mu i t o con fi d e n c i a l m e n t e , as rou p a s de be b ê
pert e n c e m a ele . Ainda n ã o es t á de c i d i d o qua n d o o be b ê
vir á para aqui, e duvi d o que a m ã e ven h a alg u m dia, ma s
ouvi diz er qu e ela é um a boa cozi n h e i r a , e se voc ê for
tirar um a s f é rias prol o n g a d a s . . .
Ele est a v a ao p é de mi m co m o boli n h o e apa n h e i a
ge l é ia de to m a t e e lim ã o. Se pu n h a gel é ia n ã o us av a
ma n t e i g a .
Ele retr u c o u : — Voc ê é um verda d e i r o ami g o , Archi e .
— N ã o exis t e m el h o r .
— Vrai m e n t . Est o u co n t e n t e qu e ten h a me dito iss o ,
para qu e eu pos s a co m p r a r o que for ne c e s s á rio. É um
me n i n o ?
— Si m . E par e c e - se co m el e .
— Ótim o . Sab e o qu e vou faz er ? — Volto u para o
fog ã o e ac e n o u co m a m ã o, e m p u n h a n d o um a es p á tula. —
Vou p ô r can e l a e m tud o !
N ã o con c o r d e i e dis c u t i m o s o as s u n t o .
Ao inv é s de es p e r a r at é Wolf e de s c e r , para co m u -
nic ar o qu e ac o n t e c e r a , su bi os tr ê s and a r e s at é a est u f a ,
de p o i s de ter exe c u t a d o mi n h a tare f a mat i n a l no es c ri -
t ó rio: abrir a corr e s p o n d ê ncia, tirar a po e ir a , esva z i a r as
ce s t a s de pap e l , tirar as folh a s dos cal e n d á rios de m e s a ,
col o c a r á gu a fre s c a na jarra da me s a de Wolf e . Junh o n ã o
é o m e l h o r m ê s para mo s t r a r um a col e çã o de orq u í de a s ,
em es p e c i a l uma co m o a de Wolf e , co m mai s de 20 0
vari e d a d e s . A pri m e i r a sal a, a tropi c a l , s ó tin h a al gu m a s
pin c e l a d a s de cor e s ; a se g u i n t e , a int e r m e d i á ria, era mai s
col or i d a , ma s n ã o se co m p a r a v a co m o m ê s de mar ç o; a
terc e i r a , a fre s c a , te m mai s flor e s , ma s n ão s ão tão
col or i d a s . Na ú lti m a , na sala dos cac o s de pla n t a , Wolf e
es t av a se n t a d o nu m ban c o co m The o d o r e Hor s t ma n n ,
ins p e c i o n a n d o as prot u b e r â ncia s de um ps e u d o - bulb o . Ao
me apr oxi m a r , virou a cab e ç a e gru n h i u : — Que é qu e h á ?
Ele s ó dev e ser int e rr o m p i d o l á e m ci m a e m cas o de
e m e r g ê nci a.
— Nad a de ur g e n t e — res p o n d i . — Est o u s ó lhe
avis a n d o que vou apa n h a r um a Cyp r i p e d i u m
law r e n c e a n u m hy e a n u m , para us ar . Um a mul h e r me
tel e f o n o u a res p e i t o de bot õ es e qua n d o eu a en c o n t r a r
ao m e i o - dia e m e i a , a flor servir á para ide n t i f i c a çã o.
— A qu e hor a s vai sair?
— Um pou c o ant e s do m e i o - dia. Na ida, vou parar no
ban c o para dep o s i t a r um ch e q u e .
— Muit o be m .
Conti n u o u a su a ins p e çã o. Estav a oc u p a d o de m a i s
para per g u n t a s . Apan h e i a flor e de s c i . Ao de s c e r , à s onz e
hor a s , pe di u - me qu e fiz e s s e um relat ó rio text u a l , qu e eu
for n e c i , e s ó fez um a per g u n t a :
— E ela, qu e tal?
Re s p o n d i qu e sabi a tan t o qua n t o ele qu e havia um a
cha n c e e m dez de ela sab e r alg u m a coi s a , e qua n d o dis s e
qu e era m e l h o r sair ant e s , pas s a r por Hirs h , apa n h a r o
ma c a c ã o para t ê -lo co m i g o , ele con c o r d o u .
Por iss o , es t av a co m um a sac o l a de pap e l , qua n d o
ch e g u e i à ban c a de jornal na entr a d a do Edif í cio Chan i n ,
um pou c o ant e s da hor a. Pel o cat á log o tel e f ô nic o , vira
qu e Quin n e Colli n s ficav a m no no n o and ar . Est e tipo de
es p e r a é difer e n t e , te n d o qu e vigi ar tod o s os tipo s de
rost o s , ind o e vind o , ho m e m e mu l h e r , velh o e nov o, firm e
e enr u g a d o . Cerc a de me t a d e del e s par e c i a qu e pre c i s a v a
de um m é dic o , um advo g a d o ou um det e t i v e , incl u s i v e a
qu e par o u na mi n h a fre n t e co m a cab e ç a virad a para tr á s.
Qua n d o per g u n t e i . Srta. Epp s? — ela co n c o r d o u .
— So u Archi e Good w i n . Vam o s de s c e r ? Re s e r v e i um a
me s a .
Aban o u a cab e ç a: — Se m p r e al m o ç o sozi n h a .
Quer o ser just o , ma s ta m b é m ac h o just o diz e r qu e
ela provav e l m e n t e tin h a pou q u íssi m o s con vi t e s para o
alm o ç o, se é qu e tin h a alg u m . Se u nariz era ch a t o e tin h a
o dobr o do qu e ix o de qu e pre c i s a v a . Sua idad e po deri a
es t ar entr e 30 e 50 ano s .
— Pod e m o s conv e r s a r aqui m e s m o — dis s e ela.
— Pel o m e n o s pod e m o s co m e ç ar aqui — retr u q u e i . —
O qu e sab e sobr e bot õ es bran c o s de crin a ?
— Sei qu e já vi alg u n s . Mas ant e s de lhe co n t a r . . .
co m o sab e r e i qu e m e pag a r á ?
— N ã o sab e . — Se g u r e i se u cot o v e l o e no s afa s ta m o s
do tr á fe g o . — Mas eu sei. — Tirei um cart ã o do bol s o e lhe
dei. — Nat u r a l m e n t e , ter e i de verifi c a r o qu e m e dis s e r , e
ter á qu e ser alg o pr á tic o. Voc ê pod e me diz e r qu e
con h e c i a um ho m e m e m Cin g a p u r a qu e fazi a bot õ es de
crin a , ma s qu e es t á mor t o .
— Nu n c a es tiv e e m Cin g a p u r a . N ã o é nad a dis s o .
— Ótim o . Com o é ent ã o?
— Vi- os aqui m e s m o . N e s t e pr é dio.
— Qua n d o ?
— No ver ã o pas s a d o — he s i t o u e co n t i n u o u —,
dura n t e um m ê s, um a mo ç a no es c r i t ó rio es t a v a sub s t i -
tui n d o outr a nas f é rias, e um dia vi os bot õ es de sua
blu s a . Dis s e - lhe qu e nun c a vira bot õ es as si m e ela
res p o n de u que pou c a s pe s s o a s tin h a m vist o . Per g u n t e i -
lhe ond e podi a con s e g u i r alg u n s e res p o n d e u qu e em
lug a r ne n h u m . Dis s e qu e sua tia os fazia de crin a , e
levav a um dia int e i r o para faz er um bot ã o, por iss o n ã o os
fazia para ven d e r , s ó co m o ho b b y .
— Os bot õ es era m bra n c o s ?
— Si m .
— Qua n t o s havia na sua blu s a ?
— N ã o me le m b r o . Ach o qu e cin c o .
No Labor a t ó rio Hirs h , de c i d i n d o qu e seri a m e l h o r
n ã o mo s t r a r o ma c a c ã o, eu retir ar a um dos bot õ es, um
dos tr ê s ain d a inta c t o s . Tirei- o do bols o e mo s t r e i - o.
— Par e c i d o co m es t e ?
Ela olh o u co m ate n çã o: — Exata m e n t e co m o es s e , se
me le m b r o , ma s é clar o qu e foi h á um ano atr á s. O
ta m a n h o ta m b é m era o m e s m o .
Pe g u e i o bot ã o de volta.
— Par e c e qu e iss o vai ajud ar . Srta. Epp s. Qual o
no m e da mo ç a?
— Creio qu e ten h o de lh e co n t a r — he s i t o u .
— É clar o qu e te m .
— N ã o qu e r o criar prob l e m a s para nin g u é m. Ner o
Wolf e é um de t e t i v e e o se n h o r ta m b é m.
— N ã o qu e r o criar prob l e m a para nin g u é m, a n ã o ser
qu e ele s pr ó prio s é qu e o ten h a m cria d o . De qual q u e r
mo d o , seria fac í lim o en c o n t r á -la, dep o i s do qu e já m e
con t o u . Qual o no m e dela?
— Ten z e r . Ann e Ten z e r .
— Qual o no m e de su a tia?
— N ã o sei. Ela n ã o dis s e , ne m eu per g u n t e i .
— Viu- a alg u m a vez de s d e o ver ã o pas s a d o ?
— N ã o.
— Sab e se Quin n e Colli n s arra njar a m se u s ser vi ç os
atrav é s de um a ag ê nci a?
— Si m , foi iss o . Servi ç o de Empr e g o de Em e r g ê n cia.
— Qua n t o s ano s ela te m ?
— Oh, m e n o s de 30.
— É cas a d a ?
— N ã o. Pel o m e n o s qu e eu saib a , n ã o.
— Qual sua apar ê nci a?
— É mai s ou m e n o s do m e u ta m a n h o . É lour a , ou
pel o me n o s era, no ver ã o pas s a d o . Ela se ac h a atra e n te, e
crei o qu e é . Sup o n h o qu e o se n h o r ta m b é m ac h ar i a .
— Vou ver qua n d o en c o n t r á -la. É clar o qu e n ã o dire i
o se u no m e .
Tirei min h a cart e i r a de din h e i r o: — As ins tr u çõ es
qu e rec e b i do Sr. Wolf e foi s ó lhe pa g a r de p o i s qu e veri -
fic a s s e sua s infor m a çõ es, ma s el e n ã o a viu e ne m ouvi u a
sua his t ó ria, e eu ouvi. — Apan h e i dua s not a s de 20 e um a
de dez. — Aqui est á me t a d e , con t a n t o qu e n ã o dig a nad a
dis s o a nin g u é m. A impr e s s ã o qu e m e d á é qu e pod e fic ar
de boc a fe c h a d a .
— E pos s o .
— N ã o dig a na d a a nin g u é m. Certo?
— N ã o dir ei. — Colo c o u as not a s na bol s a . — Qua n do
rec e b e r e i o res t o ?
— De n t r o e m brev e . Pod e ser qu e a veja de novo ,
ma s , se n ã o for ne c e s s á rio, ma n d a r e i o din h e i r o pel o
corr e i o . Pod e m e dar o en d e r e ç o e o tel e f o n e da su a cas a ?
Ela m e de u o en d e r e ç o Rua 16 9 Oes t e . Ia falar mai s
alg u m a coi s a , de c i d i u n ã o falar e virou - se para ir e m b o r a .
Aco m p a n h e i - a co m os olh o s at é sair. Sua s per n a s n ão
tin h a m agili d a d e . A rela çã o entr e um ros t o de mul h e r e o
mo d o co m o ca m i n h a to m a r i a tod o um cap ítulo nu m livro
qu e nun c a es c r e v e r e i .
Com o tin h a m e s a res e r v a d a no res t a u r a n t e e m b a i x o ,
de s c i e pe di um en s o p a d o de mari s c o s , que Fritz nun c a
faz, e que foi s ó o qu e de s e j e i co m e r de p o i s de um caf é
tardi o . Par e i no ca m i n h o para ver o end e r e ç o do Ser vi ç o
de Empr e g o de Em e r g ê ncia: Ave ni d a Lexin g t o n , 49 3 . Mas
o mo d o de lidar co m ele tin h a qu e ser pe n s a d o , pois: (1)
ag ê ncia s s ã o de s c o n f i a d a s qua n d o se trat a de en d e r e ç os
do se u pe s s o a l ; (2) se Ann e Tenz e r era a m ã e do be b ê ,
ter í am o s de lidar co m ela co m cuid a d o . Pref e r i n ão
tel e f o n a r para Wolf e . T ính a m o s co m b i n a d o qu e , qua n d o
eu es tiv e s s e de s e m p e n h a n d o um a tar ef a , us ar i a a
int e l i g ê nci a gui a d a pela exp e r i ê nci a (era o mo d o co m o
ele dizia ) , sig n i f i c a n d o mi n h a int e l i g ê nci a, n ã o a del e .
O res u l t a d o foi qu e , dep o i s das dua s hora s , fiqu e i
se n t a d o na ant e - sala da Cia. de Bot õ es Excl u s i v o s — No -
vida d e s es p e r a n d o um tel e f o n e m a , ou m e l h o r , na es p e -
ran ç a qu e ho uv e s s e um a lig a çã o. Fize r a um ac or d o co m o
Sr. Nic h o l a s Los s e f f , o ma n íac o de bot õ es, en q u a n t o ele
es t av a se n t a d o à sua m e s a co m e n d o sala m e , p ã o pre t o ,
qu e ij o e picl e s . Ele ga n h a r a o bot ã o qu e retir e i do ma -
cac ã o e um a pro m e s s a de co n t a r - lh e tud o , qua n d o as
circ u n s t â ncia s o per m i t i s s e m . Eu con s e g u i r a per m i s s ã o
de dar um tel e f o n e m a e es p e r a r ali at é rec e b e r a lig a çã o
de volta, n ã o imp o r t a qua n t o te m p o leva s s e , e us ar se u
es c r i t ó rio para um a entr e v i s t a , se fos s e ne c e s s á rio. O
tel e fon e m a fora para o Servi ç o de Empr e g o de
Em e r g ê ncia. Com o dis s e ant e s , sabi a qu e talv e z tive s s e
mu i t o te m p o livr e, parar a no ca m i n h o para co m p r a r
quatr o revis t a s e doi s livro s de bols o , se n d o um del e s Su a
pr ó pri a im a g e m , de Ric h a r d Vald o n .
Nu n c a ch e g u e i a ler Sua pr ó pri a im a g e m , ma s as
revi s t a s fora m be m lida s e já est a v a na m e t a d e do outr o
livro de bols o , um a s é rie de his t ó rias sobr e a Guerr a Civil,
qua n d o o ch a m a d o ch e g o u às cin c o hor a s e quin z e
mi n u t o s . A mo ç a à m e s a , qu e na quar t a- feira pas s a d a
so u b e r a o qu e eu qu e ri a ant e s qu e lhe dis s e s s e , sai u de
sua cad e i r a para qu e m e se n t a s s e , ma s pref e r i ficar de
pé .
— Good w i n fala n d o .
— Aqui é Ann e Tenz e r . Re c e b i um rec a d o para
cha m a r a Cia. de Bot õ es Exclu s i v o s — Novi d a d e s e falar
co m o Sr. Good w i n .
— Cert o . So u Good w i n . — Su a voz era be m fe m i nin a ,
por iss o deix e i a mi n h a be m ma s c u l i n a . — Gos t ar i a mui t o
de vê -la, para co n s e g u i r alg u m a infor m a çã o, se pos s í vel.
Creio qu e a se n h o r i t a talv e z saib a alg u m a coi s a sobr e
bot õ es.
— Eu? N ã o sei nad a sobr e bot õ es.
— Sobr e es s e tipo det e r m i n a d o de bot ã o crei o que
sab e r i a . É de crin a bran c a feit o à m ã o.
— Oh! — Ho uv e um a pau s a . — Ora, co m o . . . qu e r
diz e r , o se n h o r te m um?
— Si m . Pos s o per g u n t a r ond e se en c o n t r a ?
— Est o u nu m a cabi n e tel e f ô nic a na es q u i n a da Ma -
dis o n co m a Rua 49.
Pre s u m i , pel a sua voz, qu e mi n h a voz es t a v a dan d o
res u l t a d o .
— Ent ã o n ã o pos s o es p e r a r qu e ven h a ao m e u es c r i -
t ó rio, na Rua 39 e do outr o lado da cida d e . Que tal o
sa g u ã o do Chur c h i l l ? A se n h o r i t a es t á pert o del e . Pos s o
ch e g a r l á e m vint e min u t o s . Pod e m o s to m a r um drinq u e e
dis c u t i r bot õ es.
— Quer diz e r qu e o se n h o r vai falar sobr e bot õ es.
— Est á be m . So u bo m nis s o . Con h e c e a Alcova Azul,
no Hot e l Chur c h i l l ?
— Si m .
— Estar e i l á e m vint e min u t o s , se m cha p é u, co m um
sac o de pap e l na m ã o e um a orqu í de a bran c a e verd e na
lap e l a .
— Um a or q u í de a! N ã o! Ho m e n s n ã o usa m orq u í de a s .
— Eu us o e sou ho m e m . A se n h o r i t a se imp o r t a ?
— S ó sab e r e i dis s o de p o i s de v ê -lo.
— É as s i m qu e se fala. Est á be m , es t o u de sa ída.

Nu m a m e s a en c o s t a d a à par e d e no Bar do Almir a n t a d o no


Chur c h i l l não há mui t a luz, ma s no sa g u ã o havia.
Be a t r i c e Epps est av a cer t a , qua n d o dis s e qu e Ann e
Ten z e r era do se u ta m a n h o , ma s a se m e l h a n ç a parav a a í .
Era f á cil de ima g i n a r qu e a Srta. Tenz e r tive s s e
de s p e r t a d o e m alg u m ho m e m , talv e z e m Ric h a r d Valdo n ,
o tipo de rea çã o qu e é um fat or imp o r t a n t e na
prop a g a çã o da es p é cie; na verda d e , em mai s de um
ho m e m . Aind a era lour a , ma s não exa g e r a v a ; ne m
pre c i s a v a . Tom av a um blo o d y m a r y co m o se tan t o fize s s e
to m á -lo ou n ã o.
Tí nha m o s de c i d i d o o as s u n t o do bot ã o e m dez mi -
nut o s . Expliq u e i qu e a Cia. de Bot õ es Excl u s i v o s — Novi -
dad e s es p e c i a l i z a v a - se e m bot õ es raro s e fam o s o s , e qu e
alg u é m, nu m dos lug ar e s on d e trab al h a r a , m e dis s e r a qu e
vira os bot õ es e m su a blu s a , per g u n t a r a sobr e el e s e a
res p o s t a fora qu e havia m sid o feit o s à m ã o, de crin a
bran c a . Re s p o n d e u qu e era iss o m e s m o , dur a n t e an o s sua
tia os fiz er a co m o dis tr a çã o e lh e der a sei s co m o pre s e n t e
de aniv e r s á rio. Aind a os tin h a , cin c o nu m a blu s a e um
guar d a d o e m alg u m lug ar . N ã o m e le m b r o u de qu e , ao
tel e f o n e , eu dis s e r a qu e tin h a um. Per g u n t e i se ac h a v a
qu e su a tia teria vá rios del e s para ven d e r . Re s p o n d e u - m e
qu e n ã o sabi a , ma s ac h av a qu e ela n ã o teria mui t o s , poi s
levav a um dia int e ir o para faz e r um. Per g u n t e i se n ã o se
imp o r t a r i a cas o eu fos s e ver a sua tia para lh e falar, ela
dis s e “clar o qu e n ã o” e m e de u o no m e e en d e r e ç o: Srta.
Elle n Tenz e r , Estr a d a Rural 2, Mah o p a c , Nova Iorq u e .
De u- me ta m b é m o tel e f o n e .
Já te n d o de s c o b e r t o ond e en c o n t r a r a tia, a forn e -
ce d o r a dos bot õ es, de c i d i te n t a r um atal h o peri g o s o co m
a sobr i n h a . Claro qu e era arris c a d o , ma s talv e z si m p l i fi -
cas s e bas t a n t e as coi s a s . Dei um sorri s o be m ma s c u l i n o e
dis s e :
— N ã o lhe con t e i tud o , Srta. Tenz e r . Ouvi falar dos
bot õ es, já vi alg u n s del e s , es t ã o aqui co m i g o .
Colo q u e i o sac o de pap e l na m e s a e retir e i o ma -
cac ã o.
— Havia qua tr o , ma s tirei doi s para ins p e c i o n á -los.
Est á ven d o ?
A sua rea çã o servi u para conf ir m a r tud o . N ã o pro -
vava qu e nu n c a tiver a um beb ê , ou de qu e n ã o deix ar a um
no ves t íbulo da cas a de Lucy Vald o n , ma s provav a qu e ,
me s m o qu e ela pr ó pria o tive s s e deixa d o l á , n ã o sabi a qu e
o be b ê est a v a usa n d o ma c a c ã o de velu d o co tel ê azul co m
bot õ es bran c o s de crin a , coi s a mu i t o pou c o prov á vel.
Apan h o u o ma c a c ã o, olh o u os bot õ es e de u- m e de
volta:
— S ã o me s m o feit o s por tia Elle n . Ou s ã o um a
imit a çã o mu i t o boa. N ã o me dig a que alg u é m lhe co n t o u
qu e est av a usa n d o iss o e m alg u m lu g a r on d e trab a l h e i .
N ã o cab e e m mi m .
— Iss o é ó bvio — co n c o r d e i . — S ó lhe mo s t r e i por qu e
a se n h o r i t a foi mu i t o pre s t a t i v a e pe n s e i qu e pud e s se m
diver t i- la. Se es tiv e r curi o s a , dir- lh e- ei ond e o co n se g u i .
Ela aba n o u a cab e ç a: — N ã o se pre o c u p e . Ess e é um
dos m e u s mui t o s def e i t o s . Nu n c a sou curi o s a a res peit o
do que não te m imp o r t â ncia. Quer o diz e r , é se m
imp o r t â ncia para mi m . Talve z o se n h o r ta m b é m seja
curi o s o s ó a res p e i t o de bot õ es. Já n ã o ch e g a de falar e m
bot õ es?
— Acho que si m . — Colo q u e i o ma c a c ã o outr a vez no
sac o . — Sou co m o a se n h o r i t a , curi o s o ape n a s sobr e as
coi s a s qu e me int e r e s s a m . Agor a es t o u curi o s o a se u
res p e i t o . Que tipo de trab al h o de es c r i t ó rio faz?
— Oh, so u mui t o es p e c i a l . Se c r e t á ria de alto n í vel.
Qua n d o um a se c r e t á ria parti c u l a r se cas a , sai de f é rias ou
é de s p e d i d a pel a mul h e r do ch e f e e n ã o h á nin g u é m por
pert o para sub s t i t u í-la, l á vou eu. O se n h o r te m um a
se c r e t á ria?
— É clar o . Te m 80 ano s , nu n c a tira f é rias, rec u s a
tod a s as prop o s t a s de cas a m e n t o e n ã o te n h o es p o s a para
de s p e d i - la. Te m um marid o ?
— N ã o. Tive dura n t e um ano, e foi de m a i s . N ã o olh e i
ant e s de pul ar e nu n c a mai s pular e i .
— Talve z est e j a nu m a rotin a , servi n d o de se c r e t á ria
para ho m e n s imp o r t a n t e s em es c r i t ó rios . Talve z deva
variar um pou c o , cie n t i s t a s ou pre s i d e n t e s de fa culd a d e s
ou aut or e s . Talve z fos s e int e r e s s a n t e trab al h a r para um
es c r i t o r fam o s o . Nu n c a pe n s o u e m ten t a r ?
— N ã o, nu n c a . Su p o n h o qu e ten h a m se c r e t á rias.
— É clar o qu e si m .
— Con h e c e alg u m ?
— Con h e ç o um ho m e m qu e es c r e v e u um livro sobr e
bot õ es, ma s n ã o é mui t o fam o s o . Vam o s to m a r outr o
drin q u e ?
Est av a dis p o s t a . Eu n ã o es t av a , ma s n ã o dis s e nad a .
Com o n ã o es p e r a v a obt e r mai s nad a del a naq u e l e mo -
me n t o , qu er i a ir- m e embora, ma s talv e z fos s e ú til no
fut ur o , e de qual q u e r mo d o lhe der a a ent e n d e r que m e
impr e s s i o n a r a , port a n t o , n ã o podi a de rep e n t e m e le m -
brar qu e es t av a atra s a d o para outr o co m p r o m i s s o . To -
mari a pel o m e n o s mai s um: ela era agr a d á vel de se olh ar
e boa de con v e r s a , e se sua int e l i g ê nci a dev e se gui ar por
exp e r i ê ncia, é pre c i s o se ter exp e r i ê ncia. Tud o indi cava
qu e , se a co nvi d a s s e para jant ar, ac e i t a r i a , ma s a í teria de
pas s a r a noi t e tod a e iria cu s t a r a Lucy Vald o n un s 20
d ó lar e s .
Che g u e i e m cas a um pou c o de p o i s das se t e da noit e
e verifiq u e i qu e devi a um a de s c u l p a a Wolf e . Lia Sua
pr ó pri a im a g e m . Ter m i n o u o par á graf o e, co m o es t a v a
pert o da hora do jantar , col o c o u o mar c a d o r de p á gin a s e
p ô s o livro na m e s a . Nu n c a dobr a o can t o da p á gin a de
um livro qu e m er e ç a lug ar na est a n t e . Já o vi mui t a s
vez e s co m e ç ar usa n d o o mar c a d o r de p á gin a s e no m e i o
co m e ç ar a dobr ar a pon t a da p á gin a .
A per g u n t a est a v a es c r i t a no se u ros t o e res p o n d i . S ó
go s t a de um relat ó rio text u a l qua n d o nad a mai s é
sufi c i e n t e , porta n t o ape n a s dei- lhe os fat o s , incl u i n d o , é
clar o, a rea çã o de Ann e Tenz e r ao ma c a c ã o. Qua n d o
ter m i n e i , ob s e r v o u :
— Sati s f a t ó rio. — De c i d i u en t ã o qu e era pou c o e
acr e s c e n t o u : — Muit o sati s f a t ó rio.
— Si m , se n h o r — con c o r d e i . — Um au m e n t o seria
ó tim o .
— Se m d ú vida. É clar o qu e pe n s o u na pos s i b i l i dad e
de ela ter vist o o an ú nci o, sabi a qu e es t a v a fin g i n d o e
res o lv e u en g a n á -lo.
Con c o r d e i . — Apo s t o o qu e qui s e r co m o ela n ã o viu o
an ú nci o . N ã o te n t o u jogar verd e e n ã o é burr a.
— Ond e fica Mah o p a c ?
— Con d a d o de Put n a m , 16 0 quil ô m e t r o s ao nor t e .
Pos s o co m e r alg u m a coi s a na cozi n h a e est ar l á à s nov e
hor a s .
— N ã o, de ma n h ã serv e . Voc ê é imp e t u o s o . — Olh o u
o rel ó gio de par e d e . A qual q u e r mo m e n t o Fritz entr ar i a
para anu n c i a r o jant ar. — Pod e entr ar e m co n tat o co m
Saul ag or a ?
— Por qu ê ? — per g u n t e i . — N ão dis s e qu e me
de m i t ir i a se n ã o co n s e g u i s s e um au m e n t o . Dis s e ape n a s
qu e um au m e n t o ajud ar i a .
Ele de u um gru n h i d o : — Eu dis s e que se m d ú vida.
Voc ê vai a Mah o p a c de ma n h ã . Enq u a n t o iss o , Saul vai
de s c o b r i r o qu e a Srta. Tenz e r , a sobr i n h a , fazia e m jan e i -
ro. Podi a ter tid o um filh o? Voc ê ac h a qu e n ã o, ma s é
bo m ter cert e z a . Saul pod e faz e r iss o se m . . . — Virou a
cab e ç a. Fritz es t a v a na port a.
Já qu e fala m o s e m Sau l, é bo m qu e o apr e s e n t e . Dos
tr ê s ope r a d o r e s fre e - lan c e r qu e cha m a m o s , qua n d o
pre c i s a m o s de ajud a , Saul Pan z e r é o m e l h o r . Me s m o se
incl u i r m o s tod o s os da á rea m e t r o p o l i t a n a , ele ser á o
me l h o r . É por iss o que , embora cobr e 10 d ó lar e s por
hor a, rec u s a cin c o vez e s o n ú me r o de trab al h o s qu e
ac e i t a . Se e qua n d o pre c i s a r de um det e t i v e , e s ó serv e o
se g u n d o da list a , veja se o co n s e g u e . O m e l h o r de tod o s é
Ner o Wolf e , ma s es s e é cer c a de 10 d ó lare s por mi n u t o .
Assi m , sext a - feir a pela ma n h ã , um a boni t a e clara
ma n h ã me s m o para prin c í pio s de junh o , en q u a n t o se g u i a
de s p r e o c u p a d o pela Estr a d a Saw m i l l River diri gi n d o o
se d a n Her o n qu e pert e n c e a Wolf e , ma s é usa d o por mi m ,
Saul verifi c a v a a his t ó ria de Ann e Ten z e r . Cas o fos s e
ne c e s s á rio, de s c o b r i r i a ond e e qua n d o alm o ç ou no dia 17
de jan e ir o , qu er alg u é m se le m b r a s s e qu er n ã o, se m qu e
nin g u é m fica s s e curi o s o e se m leva n t a r pis t a s . Iss o
par e c e imp o s s í vel, e é , ma s se m d ú vida ele é um s é tim o
filh o ou coi s a as s i m .
Às dez e trint a e cin c o entr e i nu m pos t o de ga s o l i n a
pert o de Mah o p a c , par e i o carr o, salt e i , fui at é pert o de
um cara qu e lim p a v a o p á ra- bris a de um fre g u ê s e per -
gu n t e i se sabi a ond e a Srta. Elle n Tenz e r mor av a . Dis s e
qu e n ã o sabi a , ma s talv e z o patr ã o so u b e s s e . Foi l á de n tro
e en c o n t r o u o ch e f e , que tin h a cer c a de m e t a d e da idad e
de se u ajud a n t e . Sabi a exat a m e n t e ond e Elle n Ten zer
mor av a e de u - m e as expli c a çõ es para ch e g a r l á . Pel o se u
mo d o e to m de voz, era ó bvio que n ã o havia qua s e nad a
qu e n ã o so u b e s s e , co m tod a a prob a b i l i d a d e pod e r i a ter
res p o n d i d o a per g u n t a s sobr e ela, ma s n ã o fiz ne n h u ma.
Limit a r as per g u n t a s ao qu e na reali d a d e é ne c e s s á rio é
um bo m h á bito.
Outr o cap ítulo do livro qu e nun c a es c r e v e r e i seria
sobr e co m o ch e g a r a u m lu g a r . Era f á cil ac er t a r ao virar à
dir ei t a na igr ej a, ma s cer c a de um quil ô me tr o e meio
de p o i s havia um a bifur c a çã o qu e n ã o m e n c i o n a r a . Par e i o
carr o, tire i um a mo e d a , olh e i - a, era cor o a , e virei à
es q u e r d a . De s s e mo d o n ã o se fica res p o n s á vel por um
palpi t e erra d o . A mo e d a ac e r t o u , por q u e dep o i s de mai s
outr o quil ô m e t r o e m e i o ch e g u e i à pon t e qu e m e n c i o n a r a
e, mai s adia n t e , ao be c o se m sa ída, on d e virei à dir ei t a .
Pou c o dep o i s aca b o u o asf al t o e es t av a na terr a, aos
pul o s , co m bos q u e s de am b o s os lad o s , e uns quin h e n t o s
me tr o s dep o i s vi sua caixa de corr e i o , à es q u e r d a . Virei e
entr e i nu m ca m i n h o ap er t a d o , ch e i o de ra í ze s; fui
deva g a r para n ã o bat e r na s á rvor e s , e ch e g u e i ao lu g a r de
orig e m dos bot õ es bran c o s de crin a . Qua n d o salt e i , deix e i
o sac o de pap e l co m o ma c a c ã o no port a- luva s do carro.
Podi a ser qu e eu qui s e s s e o ma c a c ã o, podi a ser qu e n ã o.
Olh e i e m volta. Árvor e s por tod o s os lad o s . Para m e u
go s t o , havia á rvor e s de m a i s , e mui t o pr ó xim a s de cas a . A
clar e ir a tin h a ape n a s trint a m e t r o s de co m p r i me n t o por
quar e n t a de lar g u r a , e ond e se ma n o brava o carr o mal se
podi a faz e r um a curva. A port a da gar a g e m , ond e s ó cabi a
um carro, es t a v a aber t a e l á es t av a um se d ã Ram b l e r . A
gara g e m era liga d a à cas a , de um s ó and ar , co m t á bua s
col o c a d a s verti c a l m e n t e , pint a d a de bran c o . A pint u r a
par e c i a ser nova, e tud o es t av a lim p o e arru m a d o ,
incl u i n d o os can t e i r o s de flor e s . Diri gi- m e à porta , que se
abri u ant e s de ch e g a r l á .
A de s v a n t a g e m de n ã o us ar cha p é u é qu e n ã o se
pod e tir á -lo qua n d o se en c o n t r a um a se n h o r a mi ú da, de
me i a - idad e , talv e z mai s ido s a do qu e de m e i a- idad e , co m
cab e l o gris a l h o e m coq u e , e os olh o s cin z e n t o s clar o s e
vivo s . Qua n d o per g u n t e i : — Srta. Elle n Tenz e r ? — ela
con c o r d o u e dis s e : — Ess e é o me u no m e .
— O meu no m e é Good w i n . Creio qu e dev e r i a ter
tel e f o n a d o , ma s go s t o de ter um a de s c u l p a para diri g ir no
ca m p o nu m dia bon i t o co m o est e . Est o u no ne g ó cio de
bot õ es, e cre i o qu e , de cert o mo d o , a se n h o r a ta m b é m
es t á ... be m , n ã o no ne g ó cio. Est o u int e r e s s a d o no s bot õ es
de crin a qu e a se n h o r a faz. Pos s o entr ar?
— Por qu e est á int e r e s s a d o ?
Iss o m e par e c e u um pou c o estr a n h o . Teria sid o na -
tural per g u n t a r : co m o sab e qu e fa ç o bot õ es de crin a ? Ou:
qu e m lhe dis s e qu e fa ç o bot õ es de crin a ?
— Be m — dis s e eu —, ach o qu e go s t a r i a mai s de mi m
se fin g i s s e qu e go s t o de art e ape n a s pela art e , ma s , co m o
dis s e , est o u no ne g ó cio de bot õ es e me es p e c i a l i z o em
bot õ es qu e s ã o dif er e n t e s . Pe n s e i qu e es t a r i a dis p o s t a a
me ven d e r alg u n s . Pa g ar i a um bo m din h e i r o , à vist a.
Olh o u o Her o n e de nov o para mi m:
— S ó te n h o pou c o s . S ó 17.
Aind a n ã o mo s t r a v a curi o s i d a d e a re s p e i t o de ond e
ouvir a falar nel e s . Talve z , co m o a sobr i n h a , s ó fos s e
curi o s a a res p e i t o das coi s a s qu e lhe int e r e s s a s s e m .
— Para co m e ç ar, já ch e g a v a — dis s e eu. — Seri a
mu i t o inc ô mo d o se lhe pe di s s e um pou c o de á gu a?
— Ora... n ã o.
Assi m qu e se afas t o u e de s o c u p o u a port a , entr e i e,
qua n d o ela pas s o u por outr a port a à es q u e r d a , adia n tei-
me e olh e i e m volt a. Me u s olh o s s ã o bas t a n t e per s p i caz e s
e sufi c i e n t e m e n t e bon s para rec o n h e c e r a um a dis t â nci a
de sei s m e t r o s um obje t o qu e vira ant e s . . . ou m e lhor, um
igu a l . Est av a nu m a mesa en tr e dua s jan e l a s na par e d e
opo s t a , e mu d a v a tod a a sit u a çã o pel o me n o s no qu e dizia
res p e i t o a Elle n Tenz e r . At é en t ã o, eu acr e d i t a v a na
pos s i b i l i d a d e , be m prov á vel, de qu e os bot õ es do ma cac ã o
tive s s e m sid o dad o s a alg u é m, talv e z h á mui t o s ano s , ma s
ag or a já n ã o pe n s a v a as si m . Iss o tor n o u - se um a hip ó te s e
re m o t a , dian t e do qu e vira.
Com o n ã o qu er i a qu e sou b e s s e qu e eu de s c o b r i r a ,
to m e i a dire çã o da port a por ond e pas s a r a e fui at é a
cozi n h a . Na pia, co m a tor n e i r a ab er t a , en c h e u um cop o e
me ofer e c e u . Apan h e i - o e beb i a á gu a.
— Boa á gu a. Um po ç o fun d o ? — dis s e - lhe.
N ã o res p o n d e u . Talv e z n ã o tive s s e ouvid o a per -
gu n t a , já qu e es t a v a co m um a na cab e ç a, e qu e ag or a
for m u l o u :
— Com o de s c o b r i u qu e fa ç o bot õ es?
As palavr a s fora m mal col o c a d a s e dita s tard e de -
mai s . Se tive s s e feit o a per g u n t a mai s ce d o , e eu n ã o
tive s s e vist o o obje t o na m e s a , teria de res p o n d e r co m o
ima g i n a r a inic i a l m e n t e . Esvaz i e i o cop o , col o q u e i - o na pia
e res p o n d i:
— Muit o obri g a d o . Águ a ó tim a . Com o de s c o b r i é
mu i t o co m p l i c a d o e n ã o te m imp o r t â ncia, te m ? Pos s o ver
alg u n s del e s ?
— Com o lhe dis s e , s ó te n h o 17.
— Sei, ma s se n ã o se imp o r t a . . .
— Com o é me s m o se u no m e ?
— Good w i n . Archi e Good w i n .
— Est á be m , já be b e u sua á gu a, ag or a pod e ir e m -
bora.
— Mas , Srta. Tenz e r , viaje i 96 quil ô m e t r o s s ó para...
— N ã o me int e r e s s a se viajo u mil quil ô me tr o s . N ã o
vou lh e mo s t r a r ne n h u m bot ã o e n ã o vou falar sobr e el e s .
Iss o m e co nvi n h a , ma s n ã o dis s e nad a . Para mi m ,
seri a be m mai s int e r e s s a n t e qu e alg u m dia, nu m fut ur o
pr ó xim o , os fat o s fiz e s s e m ela falar à vont a d e sobr e bo -
t õ es, ma s seri a um err o te n t a r ac u á -la para de s c o b r i r
mai s coi s a s . Para ma n t e r as apar ê nci a s , ain d a insi s t i um
pou c o , ma s n ã o me ouvi u . Agrad e c i pel a á gu a e sa í . Ao
ma n o b r a r o se d ã Her o n e sair, ia pe n s a n d o qu e , se tive s s e
o eq ui p a me n t o no carr o, e se es tiv e s s e es c u r o , iria vigi ar
se u tel e fon e , ist o é : se est iv e s s e disp o s t o a me arris c a r a
ir para a cad e i a .
Pre c i s a v a de um tel e f o n e , urg e n t e . Vira um, um a
cabi n e ext e r n a , dep o i s de um pos t o de ga s o l i n a , ao virar à
dir ei t a , ap ó s a igr eja. Cinc o min u t o s dep o i s de deixar
Elle n Ten z e r , eu est av a ao tel e f o n e dan d o à tel e f o n i s t a
um n ú me r o que eu já sabi a de cor. Já pas s a v a das onz e
hor a s , port a n t o Wolf e provav e l m e n t e ate n d e r i a .
E foi el e m e s m o : — Sim ? — nu n c a so u b e ate n d e r um
tel e f o n e e nu n c a sab e r á .
— So u eu. Est o u nu m a cabi n a e m Mah o p a c . Sau l já
tel e f o n o u ?
— N ã o.
— Ent ã o vai tel e f o n a r ao m e i o - dia. Su g i r o qu e o
ma n d e aqui. A sobri n h a pod e es p e r a r . A tia sab e qu e m
p ô s o ma c a c ã o no beb ê .
— É m e s m o ? Ela lhe con t o u ?
— N ã o. H á tr ê s por m e n o r e s : pri m e i r o , n ã o fez a
per g u n t a cert a; se g u n d o , fic o u nerv o s a e me ma n d o u
sair; ter c e i r o , o Ti m e s de ont e m est a v a l á nu m a m e s a .
Mas n ã o sab e qu e eu o vi. Estav a dobr a d o , co m um a
frut e i r a em ci m a , ma s na cab e ç a da p á gin a à mo s t r a
es t av a um a ma n ch e t e co m as palavr a s : “ JENSE N SE RECUSA ”.

O no s s o an ú nci o est a v a naq u e l a p á gin a . Ent ã o ela viu o


an ú nci o , ma s qua n d o ch e g u e i e dis s e qu e es t av a
int e r e s s a d o nos bot õ es de crin a qu e ela fazia, n ã o falo u
nel e . Qua n d o ch e g o u a faz e r a per g u n t a que dev e r i a ter
feit o , us o u as palavr a s errad a s . Per g u n t o u co m o de s c o b r i
qu e fazia bo t õ es. Era a m e s m a coi s a qu e per g u n t a r co m o
Ner o Wolf e co n s e g u i r a res p o s t a tão rá pida ao se u
an ú nci o . Aí viu que n ã o es t av a agi n d o dire i t o e m e p ô s
para fora. Eu apo s t o 20 co n tr a um que n ã o é a m ã e. Se
n ã o tiver 60 ano s , es t á pert o dis s o . Mas apo s t o 40 co n tr a
um qu e sab e o qu e o be b ê est a v a us a n d o , é o m í ni m o qu e
sab e . Est o u se n d o imp e t u o s o ?
— N ã o. Quer que Saul to m e co n t a del a?
— N ã o, n ã o qu e r o . Se ele pod e ma n e j á -la, ta m b é m
pos s o . Ach o qu e , ant e s de sab e r m o s mai s coi s a s a se u
res p e i t o , nin g u é m pod e faz e r nad a . Talve z ag or a m e s m o
es t e j a tel e f o n a n d o para alg u é m, ma s n ã o pod e m o s im -
pe di- la. Vou voltar e ficar vigi a n d o . Pod e m o s vigi á -la o
te m p o tod o , se voc ê ma n d a r Fred e Orrie. Vai ma n d a r
Saul?
— Si m .
— Ele vai pre c i s a r de ins tr u çõ es sobr e co m o ch e g a r
aqui e voc ê pre c i s a de um l á pis.
— Já te n h o um .
— Est á be m . — Dei- lhe as ins tr u çõ es, se m m e es -
qu e c e r da bifur c a çã o na estr a d a . — A partir da estr a d a de
terra, cer c a de 40 0 m e t r o s , h á um lug ar lar g o ond e pod e
es t a c i o n a r e ficar es p e r a n d o no carr o. Se eu n ã o apar e c e r
de n t r o de u m a hora é por q u e n ã o est o u por per t o , é
porq u e ela sai u e eu a se g u i , ma s ne s s e cas o Sau l dev e
proc u r a r um tel e f o n e para lh e per g u n t a r se deix e i alg u m
rec a d o . Pri m e i r o , pod e r i a ir at é à cas a de Elle n Tenz e r
dar um a olh a d a . Talve z eu est ej a co m a cab e ç a para
de n t r o de u m a jane l a pro c u r a n d o es c u t a r o que ela co n -
vers a co m alg u m a visit a . Te m alg u m a su g e s t ã o?
— N ã o. Vou ch a m a r Fre d e Orrie. Qua n d o é qu e vai
co m e r ?
Re s p o n d i - lhe qu e talv e z no dia se g u i n t e . Ao entr ar
de volta no Her o n , de c i d i que , ao corr e r do dia, talve z n ã o
ach a s s e tan t a gra ç a e m ficar se m co m e r , ent ã o fui para a
Rua Prin c i p a l , ac h e i um m er c a d o ond e co m p r e i tabl e t e s
de ch o c o l a t e , ban a n a s e um a caixa de leit e . De veria ter
dito a Wolf e que arra nj ar i a co m i d a . N ã o sup o r t a a id é ia
de alg u é m pular um a ref e i çã o.
Na volta, vim pe n s a n d o ond e deixar i a o carr o. N ã o
mu i t o lon g e da caixa do corr e i o havia lug ar e s ond e podi a
es c o n d ê -lo entr e as á rvor e s , ma s se ela sa í ss e teria de p ô -
lo na estr a d a de pr e s s a , poi s talv e z ela to m a s s e a dire çã o
opo s t a e eu n ã o sabi a qual a dire çã o da estr a d a de terra
de p o i s da coli n a . De c i d i qu e col o c a r o carr o be m de n t r o
do bos q u e , at é qu e fica s s e es c o n d i d o , est av a fora de co g i -
ta çã o, porta n t o seri a me l h o r col o c á -lo nu m lug a r be m à
m ã o. De qual q u e r mo d o , ela já con h e c i a o m e u carr o, e
qua n d o eu a se g u i s s e , cas o eu a se g u i s s e e m ple n a luz do
dia, sab e r i a qu e era eu. Min h a ú nic a es p e r a n ç a era qu e
n ã o sa íss e at é qu e Sau l vie s s e co m um ve í cul o qu e ela
ain d a n ã o tive s s e vist o . Deix e i o Her o n e m lug a r aber t o , a
me n o s de 10 0 m e t r o s da caixa do corr e i o , ond e en tr e as
á rvor e s havia es p a ç o sufi c i e n t e , e entr e i no bos q u e . N ã o
so u í ndi o ne m es c o t e i r o , ma s , se ela es tiv e s s e es p i a n d o
de um a jan e l a , n ã o teria m e vist o qua n d o me es g u e i r e i
at é um lug a r de ond e pod e r i a ver a gar a ge m e a cas a por
de tr á s de um a moi t a .
A gar a g e m es t av a vazia.
A situ a çã o exi g i a un s palavr õ es e xin g u e i e m voz
alta. N ã o pe ç o de s c u l p a s ne m pel o s palavr õ es ne m pel a
sit u a çã o. Na s m e s m a s circ u n s t â ncia s , teria feit o a me s ma
coi s a outr a vez. Se f ô ss e m o s ma n t e r Elle n Ten z e r vigi a d a ,
mai s ce d o ou mai s tard e teria de m e afas t a r para dar um
tel e f o n e m a e, se eu o fiz e s s e exat a m e n t e no mo m e n t o e m
qu e ela avaliav a a sit u a çã o en q u a n t o de c i d i a o qu e faz e r ,
n ã o seri a ape n a s um a boa oc a s i ã o, ma s a m e l h o r — at é
qu e a gar a g e m vazia mo s t r o u - m e qu e fora a pior op çã o.
Est á be m , est av a se m sort e . Esq u iv e i - m e entr e as
á rvor e s at é a clar e ir a , atrav e s s e i - a, fui at é à port a e bati.
Talve z ho uv e s s e mai s alg u é m e m cas a , e m b o r a , qua n d o
es tiv e r a l á , n ã o tive s s e vist o nin g u é m. Esp e r e i m e i o mi -
nut o e bati de nov o, co m mai s for ç a.
— H á alg u é m aqui? — grit e i .
Ap ó s me i o mi n u t o exp e r i m e n t e i a ma ç an e t a . A porta
es t av a tran c a d a . À dir ei t a , havia dua s jan e l a s e fui exp e -
rim e n t á -las: ta m b é m tran c a d a s . Dei a volta, to m a n d o cui -
dad o para n ã o pis ar no s can t e i r o s de flor e s , o qu e , ne s s a s
circ u n s t â ncia s , mo s t r a v a mui t a ed u c a çã o, e en c o n t r e i
um a jan e l a tod a abe r t a . Ela sa íra às pre s s a s . Ne m
pre c i s e i toc a r na jan e l a . Tud o qu e pre c i s e i faz e r foi p ô r
um a per n a de n t r o , col o c a r me u s qua dr i s no peit o r i l e p ô r
a outr a per n a de n tr o de cas a , e o arro m b a m e n t o est a v a
feit o .
Est av a nu m quar t o . Grit e i, be m alto: — Ei, a cas a
es t á pe g a n d o fog o ! — e es p e r e i . Ne m um ru í do, ma s para
me cer tifi c a r exa m i n e i - a rapid a m e n t e : dois quar t o s , ba -
nh e i r o , sala e coz i n h a . Nin g u é m, ne m m e s m o um gat o .
Talve z tive s s e ido ape n a s à far m á cia co m p r a r um a
aspiri n a e volta s s e a qual q u e r mo m e n t o . Se as s i m fos s e ,
de c i d i , deixar i a que me en c o n t r a s s e de n t r o de cas a . Eu a
enfr e n t a r i a . Era qua s e cert o que fos s e c ú mpli c e de
alg u m a coi s a . N ã o co n h e ç o de cor tod o s os es t a t u t o s de
Nov a Iorq u e , ma s dev e hav e r um a lei sobr e deixar beb ê s
no s ves t í bul o s das pe s s o a s , port a n t o , n ão iria ficar
pre s t a n d o ate n çã o ao bar ul h o de um carr o sub i n d o a
coli n a .
Com e c e i pela sala porq u e havia mai o r prob a b i l i dad e
de se en c o n t r a r cart a s , n ú me r o s de tel e f o n e ou talv e z um
di á rio. O Ti m e s ain d a es t av a na m e s a , sob um a frut e i r a .
De s d o b r e i - o para ver se rec o r t a r a o an ú nci o , ma s es t av a
int a c t o . N ã o tin h a es c r iv a n i n h a , ma s na m e s a havia um a
gav e t a e, na mesinh a do tel e f o n e , a um can t o , tr ê s
gav e t a s . Nu m a dela s , en c o n t r e i um cart ã o co m cer c a de
me i a d ú zia de n ú meros de tel e f o n e , ma s era m tod o s
loc a i s . Nu m a das par e d e s , alg u m a s prat e l e i r a s co m livro s ,
outr a s co m revis t a s e enf e i t e s . Leva mui t o te m p o exa m i -
nar livro s , por iss o deix e i para dep o i s e fui para o quar t o ,
qu e obvia m e n t e era o del a.
Foi l á qu e de s c o b r i , na gav e t a de baixo de um a
c ô mo d a . Um a bus c a rá pida n ã o é mu i t o perf e i t a , e qua s e
n ã o o not e i; ma s no fun d o , deb a ix o de um a pe s a d a ca m i -
sola de inver n o , l á es t av a — ou ant e s , l á est a v a m . N ã o era
um s ó , era m doi s ma c a c õ es de velu d o cot e l ê azul, cad a
qual co m quat r o bot õ es bran c o s de crin a . Do m e s m o
ta m a n h o daq u e l e qu e est av a no porta- luva s do Her o n .
Nu n c a pe n s a r i a , um a se m a n a atr á s, qu e teria tant o
praz e r e m ver rou p a de cria n ç a. De p o i s de um mi n u t o
int e ir o de sati s f a çã o, col o q u e i - os de volta na gav e t a e fui
abrir a port a do ar m á rio. Queri a mai s coi s a s .
Con s e g u i , afin a l , mai s alg u m a coi s a , ma s n ã o no
ar m á rio. Ne m m e s m o na cas a , para falar e m ter m o s exa -
tos ma s no por ã o. Era um por ã o de verd a d e , n ã o ape n a s
um’ bur a c o para um aqu e c e d o r a ó leo. O lug a r do aqu e -
ce d o r es t av a cer c a d o , se p a r a d a m e n t e , e o res t o era o qu e
um por ã o dev e r i a ser: ar m á rios e prat e l e i r a s co m co m i d a
enl a t a d a . Tinh a at é um a es t a n t e co m garr af a s de vin h o .
Nu m can t o , en c o s t a d o à par e d e , havia pe d a ç os de m e t a l ,
qu e n ã o era ne c e s s á rio ar m ar para sab e r que era m um
ber ç o de be b ê . Havia ta m b é m tr ê s mal e t a s e dua s mal a s
gra n d e s e em um a del a s en c o n t r e i : frald a s ; cal ç a
imp e r m e á vel; bab a d o r e s ; ch o c a l h o s ; bal õ es (vazi o s ) ;
ca m i s e t a s ; ca m i s a s de mal h a; su é ter e s ; outr a s pe ç as de
rou p a e vá rios obje t o s .
Ten d o sati s f e i t o por co m p l e t o min h a vont a d e de ver
rou p a s de beb ê e co m o Elle n Tenz e r n ã o tin h a volta d o ,
rec o m e c e i a pro c u r a r na sala. Em alg u m lug a r dev e r i a
exis t ir alg u m a coi s a qu e me de s s e um a indi c a çã o de
qu e m era o be b ê e de ond e tin h a vind o . Mas n ã o havia. S ó
co m e n t a r e i a m e i a hor a se g u i n t e para diz er qu e sei pro -
cur ar alg u m a coi s a es c o n d i d a e foi o qu e fiz naq u e l a cas a .
Qua n d o se qu e r deixar as coi s a s co m o es t av a m , de m o r a
mai s ; ma s proc u r e i e m tod o s os lug ar e s . Ao ter m i n a r ,
tud o o que con s e g u i fora m un s no m e s e en d e r e ç os, prov e -
nie n t e s de cart a s e env e l o p e s nu m a gav e t a no quar t o , e
alg u n s n ú m e r o s de tel e f o n e , e ne n h u m del e s par e c i a pro -
mi s s o r .
Est av a co m fo m e , ma s co m o es t av a ali se m ser co n -
vida d o , teri a sid o vul g a r co m e r de sua co m i d a . Al é m
dis s o , faltav a m vint e mi n u t o s para as tr ê s hor a s e Saul
provav e l m e n t e já devia ter ch e g a d o h á alg u m te m p o , por
iss o sa í pela jan e l a por ond e entr ar a , fui pela entr a d a de
aut o m ó vel at é a es tr a d a e virei à dire i t a . Ao faz e r a curva,
vi o carr o de Saul, fora da estr a d a , no pon t o mai s larg o .
Ao m e ver, deix o u - se cair no as s e n t o e, qua n d o ch e g u e i ,
já est a v a ron c a n d o . Já n ã o é boni t o , te m nariz gra n d e ,
qu e i x o qua dr a d o e te s t a gra n d e incli n a d a e, dor min d o de
boc a aber t a , est a v a horr í vel. Pu s a m ã o pela jan e l a e
tor ci- lh e o nariz e, nu m mili o n é si m o de se g u n d o , es t av a
tor c e n d o m e u pul s o . Est á ven d o ? Sabi a o qu e eu iria faz er
co m o se u nariz ant e s m e s m o qu e eu fiz e s s e .
— Che g a — dis s e eu.
— Que dia é hoj e? — per g u n t o u , solt a n d o m e u pul s o
e se n t a n d o - se.
— Hoje é dia de Nat a l. H á qua n t o te m p o es t á aqui?
— H á um a hor a e vint e mi n u t o s .
— Ent ã o dev e r i a ter ido e m b o r a h á vint e min u t o s .
Sig a as ins tr u çõ es.
— Sou um de t e t i v e . Vi o Her o n . Gost a r i a de co m e r
um sa n d u í ch e , bolo de pas s a s e leit e ? Já to m e i o m e u .
— Se go s t a r i a ? — apa n h e i e abri um a caixa qu e
es t av a no as s e n t o de tr á s. Doi s sa n d u ích e s de p ã o de
ce n t e i o co m cor n e d be e f . Ao de s e m b r u l h a r um, fale i: —
Ela parti u en q u a n t o fui tel e f o n a r para pe dir qu e voc ê
vie s s e . Já se foi h á mai s de tr ê s hor a s . — Dei um a mor -
dida.
— A vida é as s i m me s m o . H á mai s alg u é m l á ?
— N ã o.
— Enc o n t r o u alg u m a coi s a ?
N ã o per g u n t o u se eu en tr e i na cas a , já era de se
prev e r . En g o l i e apa n h e i a caixa de leit e:
— Se qual q u e r um a de sua s ami g a s tiver filh o s g ê -
me o s , nu m a mal a gra n d e no por ã o h á coi s a s sufi c i e n t e s
para am b o s . E nu m a gav e t a l á e m cim a h á dois ma c a c õ es
azui s co m bot õ es bran c o s de crin a . É clar o qu e n ã o es t ã o
na mal a por cau s a dos bot õ es. No por ã o ta m b é m est á o
ber ç o ond e o beb ê dor m i a .
Na qui n t a - feira à noit e , qua n d o lhe expli c a r a a si -
tua çã o, con t a r a - lh e tud o . Qua s e se m p r e faz e m o s iss o , no
cas o del e . Dura n t e un s 30 se g u n d o s con s i d e r o u as
impli c a çõ es do qu e eu dis s e r a :
— Pod e r i a hav er um a expli c a çã o para as rou p a s , ma s
o ber ç o res o lv e a qu e s t ã o.
— Si m — res p o n d i , co m a boc a ch e i a .
— Ent ã o o be b ê est e v e aqui e ela sab e a res p o s t a .
Talve z n ã o saib a qu e m é a m ã e, ma s sab e o bas t a n t e . Ela
é um a pe s s o a irre d u t ível?
— É do tipo qu e talv e z o sur pr e e n d a . Eu ach o qu e ela
iria tran c a r a boc a . Se ch e g a s s e e m e en c o n t r a s s e l á , iria
enfr e n t á -la, ma s ag or a n ã o sei. Se u palpi t e vale tan t o
qua n t o o m e u . Talve z a m e l h o r coi s a fos s e vigi á -la du -
rant e un s doi s dias .
— Ent ã o, n ã o dev e r í am o s est ar aqui se n t a d o s . Ela já
con h e c e o se u carr o, n ã o con h e c e ?
Con c o r d e i , en q u a n t o bebi a um gol e de leit e . Pus o
leit e e o res t o do san d u í ch e na caix a:
— Est á be m , vou ter m i n a r es t e lan c h e , qu e es t á me
salva n d o a vida, no Her o n . Esc o n d a se u carr o no bos q u e e
ven h a para o m e u . Se ela vier ant e s de eu sair, es c o n d a -
se. Irei para cas a faz e r me u rela t ó rio. Se Wolf e ach a r qu e
dev e ser vigi a d a , Fre d ou Orrie es t ar ã o aqui à s nov e hor a s
da ma n h ã . Voc ê de c i d e co m o de s e j a qu e fa ç a o co n t a t o e
me diz. Se el e de c i d i r qu e qu e r traz ê -la para ele m e s m o
int e r r o g á -la, virei, em vez de Fred ou Orrie, e talv e z
pre c i s e de su a ajud a.
Salt e i do carr o, co m a caixa. Saul per g u n t o u :
— E se ela voltar ant e s de m e en c o n t r a r co m voc ê ?
— Fiqu e no carro qu e o en c o n t r a r e i . Fui ca m i n h a n d o
pela estr a d a .
6

Saul Panz e r , Fred Durki n e Orrie Cath e r , em tur n o s ,


tin h a m ma n t i d o a cas a de Elle n Ten z e r , ou o ca m i n h o qu e
levav a a ela, sob vigil â ncia dura n t e vint e hor a s . Sau l, das
tr ê s hor a s da tard e at é as nov e da noit e , na sext a - feira;
Fred, das nov e da noit e de sext a- feira at é as sei s da
ma n h ã de s á bad o; Orrie, de sei s da ma n h ã at é as onz e , no
s á bad o . E n ã o apar e c e u nin g u é m.
No s á bad o pel a ma n h ã , à s onz e hora s , qua n d o Wol fe
de s c e u para o es c r i t ó rio, bas t o u olh ar para o m e u ros t o
para ter a res p o s t a , ant e s que fiz e s s e a per g u n t a . N ão
havia novid a d e s . Na m ã o trazi a , co m o se m p r e , a orq u í de a
qu e es c o l h e r a para ter a ho nr a de pas s a r um dia e m se u
es c r i t ó rio. Colo c o u - a em um vas o na es c r iv a n i n h a ,
aju s t o u se u corp o volu m o s o na cad e i r a e de u um a olh a d a
na cor res p o n d ê ncia mat i n a l , qu e eu abrir a. Ao ver qu e
n ã o con tin h a nad a int e r e s s a n t e , ou ú til, e m p u r r o u - a para
um lado e en c a r o u - m e de car a am arr a d a .
— Que diab o s ! — gru n h i u — aqu e l a mul h e r de u no
p é . N ã o foi?
Apan h e i um a mo e d a no bol s o , virei- a sobr e mi n h a
me s a e olh e i para ela: — Cara — dis s e . — N ã o, n ã o foi.
— Ora, eu qu e r o um a opin i ã o.
— N ã o, n ã o qu er . S ó um idio t a co m p l e t o te m um a
opin i ã o qua n d o n ã o te m nad a para su b s t a n c i á -la, e voc ê
sab e dis s o . Voc ê s ó est á me le m b r a n d o qu e , se eu tive s s e
fic a d o l á e m vez de lhe tel e f o n a r , es t a r i a na pist a dela.
— N ã o era iss o o que pe n s e i .
— É o qu e pe n s o . Foi azar, já sei, ma s a sor t e der rota
o me l h o r c é rebr o . O fato de ter entr a d o na cas a e
en c o n t r a d o as coi s a s n ã o co n s e r t a nad a . Ter í am o s ap e n a s
qu e faz e r per g u n t a s para sab e r qu e ho s p e d o u u m beb ê
de n t r o de cas a . De t e s t o azar. Sau l tel e f o n o u .
— Qua n d o ?
— H á meia hor a. A sobr i n h a n ã o tev e filh o em
dez e m b r o , jane ir o ou fev er e i r o . Já pe s q u i s o u es s e per íodo
e vai faz e r um rela t ó rio co m os det a l h e s . Agor a est á te n -
tan d o de s c o b r i r se a tia foi ao apar t a m e n t o da sobri n h a
de s d e ont e m ao me i o - dia. É ó tim o ter c é rebr o e sort e . Vai
tel e f o n a r l á para o m e i o - dia para per g u n t a r se dev e
sub s t i t u i r Orrie e...
O tel e f o n e toc o u e gir e i a cad e i r a para ate n d e r :
— Escrit ó rio de Ner o . . .
— É Orrie Cath e r . Est o u nu m a cabi n e e m Mah o p a c .
— E da í ?
— N ã o es t á nad a bo m . Às dez e cin q ü ent a e cin c o
ch e g o u um carr o da pol í cia est a d u a l e entr o u . Sa íram
tr ê s ho m e n s , um da pol í cia est a d u a l , um outr o qu e su p o -
nh o ser um del e g a d o do con d a d o e Purl e y St e b b i n s . Expe -
rim e n t a r a m a port a e a í der a m a volta à cas a e o del e gad o
entr o u pel a jan e l a ab er t a . St e b b i n s e o patr u l h e i r o
voltar a m para a port a, que log o foi abe r t a e entr ar a m .
Ach e i que n ã o ajud ar i a nad a es t ar ali e por iss o vim
e m b o r a . Quer que eu volt e ?
— Te m cert e z a qu e era Purl e y?
— Ora, bola s , n ã o dis s e qu e pe n s e i que era Purl e y,
dis s e qu e era. Est o u rela t a n d o o fato.
— Est á me s m o . Ven h a para c á .
— Se volta s s e talv e z . . .
— Que diab o s , volt e para c á !
Colo q u e i o tel e f o n e no ga n c h o co m deli c a d e z a , res -
pir ei fun d o e virei- m e:
— Era Orrie Cath e r , fala n d o de um a cabi n e em
Mah o p a c . Dis s e para vir para c á porq u e a tia n ã o vai
voltar para cas a . Est á mor t a . Tr ê s ho m e n s , e m um carr o
da pol í cia es t a d u a l , fora m para a cas a dela ag or a , e u m
del e s é Purl e y Ste b b i n s . N ã o pre c i s o de sort e ou c é rebr o
para sab e r qu e um sar g e n t o do De p ar t a m e n t o de Ho m i -
c ídio s de Nov a Iorq u e n ã o vai ao con d a d o de Put n a m para
proc u r a r bot õ es bran c o s de crin a .
Os l á bio s de Wolf e est a v a m t ã o ape r t a d o s qu e era
co m o se n ã o os tive s s e . Abriu- os de leve para diz e r:
— Um palpit e n ã o é cer t e z a .
— Pos s o es c l a r e c e r iss o ag o r a .
Virei- m e , apa n h e i o tel e f o n e e disq u e i o n ú m e r o do
Gaz e t t e , e Wolf e , ao ouvir- m e pedir para falar co m Lon
Coh e n , pe g o u o se u tel e f o n e e fic o u ta m b é m na lin h a . A
me t a d e do te m p o de Lon é ga s t a e m falar e m um de se u s
tel e f o n e s , e e m ger a l te m que se es p e r a r ou deix ar u m
rec a d o , ma s pe g u e i - o en tr e tel e f o n e m a s e log o conv e r -
sa m o s . Per g u n t e i - lhe se ain d a tin h a alg u m sald o de
cr é dit o e ele res p o n d e u qu e em p ô qu e r n ã o, ma s em
indi c a çõ es sobr e os aco n t e c i m e n t o s , si m .
— N ã o é be m um a indi c a çã o de s s a vez — con t e i - lhe.
— Est o u verifi c a n d o um ru m o r que aca b e i de ouvir. Sab e
de alg u m a coi s a sobr e um a mu l h e r cha m a d a Tenz e r ?
Elle n Ten z e r ?
— Elle n Tenz e r .
— Cert o .
— Talve z te n h a m o s . N ã o te n t e ser t ã o ch e i o de
rod e i o s , Archi e . Se qu e r sab e r ond e es t a m o s nu m cas o de
as s a s s i n a t o , ent ã o dig a iss o .
— Iss o .
— Assi m é qu e se fala. Aind a n ã o de s c o b r i m o s mui t a
coi s a a n ã o ser qu e ten h a m apar e c i d o fato s ne s t a ú lti m a
hor a. Hoje de ma n h ã , à s sei s hor a s , um poli c i a l olh o u
para de n t r o de um carr o, um se d ã Ram b l e r , es t a cio n a d o
na Rua 38, per t o da Terc e i r a Aveni d a , e viu um a mul h e r
no ch ã o, atr á s. Fora es tr a n g u l a d a co m um pe d a ç o de
cord a qu e aind a es t av a e m se u pe s c o ç o. Estav a mor t a h á
cin c o ou sei s hor a s . Foi ide n t i f i c a d a , ma s se m
con f ir m a çã o, co m o Elle n Tenz e r , de Mah o p a c , Nova Ior -
qu e . É tud o . Pos s o lig ar l á para baix o e pe dir as ú lti m a s
novid a d e s e lhe ch a m a r de volta, se é t ã o imp o r t a n t e .
Re s p o n d i qu e n ã o era e agr a d e c i , de s li g a n d o . Wolf e
ta m b é m de s l i g o u . Olho u - m e zan g a d o , e olh e i- o ta m b é m.
— Iss o torn a tud o mui t o bo m — fale i. — Pod e falar
no s se.
— É ine fi c a z — dis s e Wolf e , aba n a n d o a cab e ç a.
— H á um se es p e c i a l . Se eu tive s s e fica d o e fala d o
co m ela naq u e l a hor a, talv e z se abri s s e co m i g o e agor a
es t ar i a aqui e est ar íam o s sol u c i o n a n d o o cas o . Que v á
para o inf e r n o a int e l i g ê ncia gui a d a pel a exp e r i ê nci a.
— É in ú til.
— E ag or a , o que n ã o é ? N ã o se podi a qu er e r nad a
me l h o r do qu e bot õ es bran c o s de crin a , e ag or a n ão
te m o s nad a , e al é m do mai s St e b b i n s e Cram e r v ã o se
pe n d u r a r e m nos s o s pe s c o ç os. A Rua 38 pert e n c e à á rea
da Ho m i c ídio Sul.
— Ho m i c í dio é probl e m a del e s , n ã o no s s o .
— Dig a iss o a ele s . A sobri n h a vai lh e s con t a r que um
co m e r c i a n t e de bot õ es, cha m a d o Archi e Good w i n ,
con s e g u i u o en d e r e ç o de sua tia na quin t a - feira à tard e . O
suj e i t o no pos t o de ga s o l i n a vai de s c r e v e r o car a qu e
pe di u infor m a çõ es para ch e g a r à cas a dela na sext a- feira
pela ma n h ã . Enc o n t r a r ã o mil h a r e s de impr e s s õ es digit a i s
mi n h a s na cas a tod a , incl u s i v e no por ã o, be m fre s c a s e
n í tida s . É me l h o r tel e f o n a r log o para o Park e r ag or a e
diz e r- lhe para ficar pron t o para co n s e g u i r fian ç a qua n d o
eu for aut u a d o co m o te s t e m u n h a .
Wolf e de u um gru n h i d o : — Voc ê n ã o pod e forn e c e r
ne n h u m a infor m a çã o qu e seja rel e v a n t e .
Olh e i- o fixa m e n t e : — É clar o qu e pos s o .
— Acho que n ã o. Vam o s con s i d e r a r tud o . — Re -
cos t o u - se e fe c h o u os olh o s , ma s os l á bio s n ã o co m e ç a -
ram co m a roti n a para de n t r o e para fora. Iss o era s ó para
probl e m a s dif ícei s de fato.
Nu m mi n u t o abri u os olh o s e end ir e i t o u - se:
— É mui t o si m p l e s . Um a mul h e r ch e g o u co m o
ma c a c ã o e m e co n t r a t o u para verifi c a r de ond e vier a m os
bot õ es, e pu s o an ú nci o. Be a tr i c e Epp s res p o n d e u ao
anu n c i o , e lhe co n t o u sobr e Ann e Tenz e r , que por su a vez
lhe falo u da tia e voc ê foi at é Mah o p a c . Com o a tia est á
mor t a , o res t o fica int e ir a m e n t e por sua con t a . Nin gu é m
pod e lhe de n u n c i a r . Vou dar um a su g e s t ã o: ela dis s e qu e
ia sair para um en c o n t r o e, ap ó s co nv e r s a r e m um pou c o ,
voc ê pe di u per m i s s ã o para es p e r á -la voltar, e a per m i s s ã o
foi co n c e d i d a . Ela dis s e qu e n ã o sabi a qua n t o te m p o
de m o r a r i a . Enc o n t r a n d o - se sozi n h o , e curi o s o so bre a
imp o r t â ncia, para no s s o cli e n t e , dos bot õ es bran c o s de
crin a , e co m te m p o de sobr a, voc ê fez um a expl o r a çã o da
cas a . Iss o dev e bas t a r .
— Se m dar o no m e do clie n t e .
— É clar o qu e n ã o.
— Ent ã o n ã o seria um a te s t e m u n h a . Seria es c o n d e r
prova s . Ela fez os bot õ es sobr e os quai s a cli e n t e qu e ri a
infor m a çõ es, e foi l á per g u n t a r sobr e os bot õ es, e ela
entr o u e m co n t a t o co m alg u é m que te m con e x ã o co m
bot õ es, port a n t o vã o qu e r e r faz e r per g u n t a s à cli e n t e ,
ent ã o dir- lhe s - ei se u no m e ou enfr e n t o as con s e q üê nci a s .
— Voc ê te m um a res p o s t a . A clie n t e nad a sabi a sobr e
Elle n Ten z e r; con t r a t o u - m e para de s c o b r i r de ond e os
bot õ es viera m . Port a n t o , é pou c o prov á vel qu e Elle n
Ten z e r so u b e s s e sobr e nos s a clie n t e . N ão te m o s
obri g a çã o de divul g a r o no m e de um a clie n t e ape n a s
porq u e a pol ícia go s t a r i a de verifi c a r um a vag a su s p e i t a .
Exa m i n e i a id é ia por alg u m te m p o e co n c o r d e i :
— Talve z pos s a m o s no s safar co m es s a vers ã o. Se
voc ê ag ü ent ar , eu ag ü ent o . Qua n t o à sua vers ã o, voc ê n ã o
me n c i o n o u a oca s i ã o e m qu e fui lhe tel e f o n a r e co m p r a r o
me u al m o ç o, ma s , se de s c o b r i r e m , pos s o diz e r qu e foi
de p o i s qu e ela sai u . Entr e t a n t o , te n h o alg u m a s per g u n t a s
a lhe faz er , talv e z tr ê s. N ã o é prov á vel que Elle n Tenz e r
ain d a es tiv e s s e viva se voc ê n ã o tive s s e ac e i t a d o est e
trab a l h o , col o c a d o o an ú nci o e m e ma n dad o l á ?
— Mai s do qu e prov á vel.
— Ent ã o n ã o seri a mai s prov á vel que os tira s pe -
ga s s e m o car a qu e a mat o u se so u b e s s e m o que sab e m o s ,
es p e c i a l m e n t e sobr e o beb ê ?
— Cert a m e n t e .
— Est á be m . Voc ê dis s e : “Ho m i c ídio é probl e m a
del e s , n ã o no s s o . ” Se for co m es s a id é ia at é o fim, iss o vai
me pre o c u p a r . Talve z per c a at é o son o . Eu a vi, est iv e e m
sua cas a e conv e r s e i co m ela, e de u- m e um cop o d’ á gu a.
So u a favor de prot e g e r os int e r e s s e s dos clie n t e s , so u
con t r a a id é ia de Lucy Vald o n ser mol e s t a d a pela pol í cia,
al é m dis s o m e de u um mar ti n i , ma s pel o me n o s aind a
es t á viva.
— Archi e , mi n h a obri g a çã o é de s c o b r i r a ide n t i dad e
da m ãe e es t a b e l e c e r iss o at é qu e o clie n t e fiqu e
con v e n c i d o , e de m o n s t r a r o gra u de prob a b i l i d a d e de se u
mari d o ser o pai. Voc ê ac h a qu e pos s o faz er iss o se m
de s c o b r i r ta m b é m qu e m mat o u aqu e l a se n h o r a ?
— N ã o.
— Ent ã o n ã o me am o l e . Já est á be m rui m se m voc ê
me am o l a r .
Esti c o u - se para ap er t a r a ca m p a i n h a e pedir cerv ej a.

Fiqu e i e m cu s t ó dia de s d e tr ê s hor a s e quar e n t a e doi s


mi n u t o s da tard e de do m i n g o , qua n d o o ins p e t o r Cram e r
me levo u , at é as onz e hora s e cin q ü ent a e oito mi n u t o s da
ma n h ã de se g u n d a , qua n d o Nat h a n i e l Park e r , o advo gad o
qu e Wolf e cha m a ap e n a s qua n d o a pol í cia int e rv é m,
ch e g o u ao es c r i t ó rio do pro m o t o r p ú blic o co m u m pap e l
as s i n a d o por um juiz, qu e fixar a a fian ç a e m 20 mil
d ó lar e s . Com o a fian ç a co m u m para te s t e m u n h a s em
cas o s de as s a s s i n a t o e m Nova Iorq u e é de cer c a de 8 mil
d ó lar e s , iss o m e col o c a v a nu m a faixa es p e c i a l e apr e c i e i o
elo g i o .
A cus t ó dia n ã o foi dur a, e ne m dif ícil, exc e t o pel a
perd a de so n o , por n ã o co m e r dua s refe i çõ es feit a s por
Fritz e por n ã o pod e r es c o v a r os de n t e s . Se g u i n d o a
su g e s t ã o de Wolf e , co m alg u n s melhora m e n t o s , con t e i
pri m e i r o min h a his t ó ria ao ins p e t o r Cra m e r , no
es c r i t ó rio, co m Wolf e pre s e n t e e, de p o i s dis s o , co m o
pro m o t o r p ú blic o as si s t e n t e , cha m a d o Man d e i , a qu e m já
con h e c i a , um pun h a d o de tira s do Dep a r t a m e n t o de
Ho m i c ídio s e, nu m a cert a hor a, ao pr ó prio pro m o t o r .
Tud o qu e tin h a a faz e r era se g u i r em fre n t e . Wolf e
mar c o u o to m , no do m i n g o à tard e , dura n t e o en c o n t r o
co m Cram e r , es p e cial m e n t e no final, dep o i s de es t e se ter
leva n t a d o para ir e m b o r a .
Wolf e tiver a qu e incli n a r a cab e ç a para tr á s, o qu e o
faz ficar cha t e a d o .
— N ã o lhe devo nad a — dis s e el e. — N ã o es t o u
agra d e c i d o por sua le ni ê ncia. O se n h o r sab e qu e seri a
in ú til me levar junt o co m o Sr. Good w i n , já qu e eu ficar i a
mu d o , e o ú nic o res u l t a d o seri a que , no fut ur o , qua n d o eu
tive s s e alg u m a su g e s t ã o a faz e r, nu n c a a faria ao se n h o r .
— Um dos res u l t a d o s — dis s e Cram e r , co m irri ta çã o
— seri a qu e se pas s a r i a mu i t o te m p o ant e s de o se n h o r
pod e r faz e r um a su g e s t ã o.
— Tolic e . Se pe n s a s s e qu e iss o fos s e verd a d e , o
se n h o r m e levari a ta m b é m. No se u bol s o , o se n h o r te m
um a de c l ar a çã o, as s i n a d a por mi m , diz e n d o qu e . n ã o te -
nh o co n h e c i m e n t o alg u m da ide n t i d a d e do ass a s s i n o de
Elle n Tenz e r e te n h o bas e s se g u r a s para acr e d i t a r qu e
me u cli e n t e ta m b é m n ã o te m . Qua n t o à sua am e a ç a de
me tirar a lic e n ç a, pref e r i a dor m i r deb a i x o de um a pon t e
e co m e r res t o s de co m i d a qu e rev el a r o no m e de um
cli e n t e para suj ei t á -lo a int e r r o g a t ó rios e m b a r a ç os o s .
Cra m e r aba n o u a cab e ç a:
— Voc ê co m e n d o res t o s ! Me u De u s ! Vam o s ,
Good w i n .
N ã o t í nha m o s ne n h u m palpit e sobr e a ide n t i d a d e da
m ã e, e nad a t í nha m o s co m o bas e para de s c o b r i r , e m b o r a
n ã o tiv é ss e m o s fica d o para d o s . Dis p e n s á ram o s Sau l, Fre d
e Orrie. Lê ram o s os jornai s . Fo m o s falar co m Lon Coh e n ,
para lhe per g u n t a r se a Gaz e t t e tin h a qual q u e r coi s a qu e
n ã o publi c a r a . Tam b é m m e envi ar a m para falar co m a
cli e n t e . Man d á ram o s pel o corr e i o 50 d ó lare s para Be a -
tric e Epp s . Ate n d ê ram o s ao tel e f o n e , se n d o doi s tel e f o -
ne m a s de Ann e Tenz e r e Nic h o l a s Los s e f f .
Admi t o qu e seri a de s p e r d i ç ar din h e i r o da cli e n t e
faz e r co m qu e Sau l, Fred e Orrie inve s t i g a s s e m o cas o
Elle n Ten z e r , já qu e os jornali s t a s e fun c i o n á rios da po -
lí cia vinh a m faz e n d o iss o . Atrav é s dos jornai s e de Lon
Coh e n t ính a m o s mai s fat o s do que no s int e r e s s a v a m ou
qu e pod íam o s utiliz a r . Elle n Tenz e r era enf e r m e i r a re gi s -
trad a , ma s parar a de trab a l h a r nis s o h á dez ano s , qua n do
sua m ã e morr e r a e ela her d ar a a cas a e m Mah o p a c e um
pou c o de din h e i r o qu e dava para viver. Nu n c a se cas a r a ,
ma s par e c i a go s t a r de be b ê s, pois dura n t e dez ano s
abri g a r a mai s de um a d ú zia, um de cad a vez. De ond e
vier a m e para ond e fora m nin g u é m sabi a . Sobr e o ú lti m o
be b ê nin g u é m sabi a nad a a n ã o ser qu e era um m e n i n o ,
tin h a um m ê s de idad e qua n d o ch e g a r a , e m mar ç o, ela o
cha m a v a de Bu s t e r e fora embora h á cer c a de tr ê s
se m a n a s . Se alg u é m o visit ar a , nin g u é m vira. A m e l h o r
fon t e de infor m a çõ es a res p e i t o dos be b ê s, o m é dic o loc a l
qu e era ch a m a d o qua n d o ne c e s s á rio, sabi a ma n t e r a boc a
fec h a d a . Lon duvid a v a qu e me s m o Purl e y St e b b i n s tive s s e
con s e g u i d o alg u m a coi s a del e .
Al é m da sobri n h a , Ann e , os ú nic o s par e n t e s vivos
era m um irm ã o e sua mu l h e r , os pai s de Ann e , qu e mo -
rava m na Calif ó rnia. Ann e rec u s a v a - se a falar co m os
rep ó rter e s , ma s Lon m e dis s e qu e apar e n t e m e n t e ela n ã o
en c o n t r a v a mu i t o a tia e sabi a pou q u í ssi m o a se u
res p e i t o .
Ao m e leva n t a r para ir e m b o r a , Lon per g u n t a r a :
— Est á cer t o , dei tud o e n ã o rec e b i nad a , por é m
ain d a te m um sald o . Mas pos s o faz e r um a per g u n t a ?
Ach o u os bot õ es? Si m ou n ã o?
Com o jog ar a mui t o p ô qu e r co m el e , já tin h a bas tan t e
pr á tic a de ma n t e r meu ros t o se m expr e s s ã o e m sua
pre s e n ç a.
— Se voc ê tive s s e um a m e n t e trei n a d a co m o a mi nh a
— res p o n d i —, n ã o faria iss o . Pus e m o s aqu e l e an ú n cio, e
ag or a qu e r e m o s sab e r not ícia s sobr e Elle n Tenz e r , es s e é
o mo t iv o por qu e voc ê ach a qu e h á um a co n e x ã o. N ã o h á
ne n h u m a . Wolf e go s t a de bot õ es bran c o s de crin a em
sua s cal ç as.
— Pa g o para ver.
— No s su s p e n s ó rios — dis s e eu, sai n d o .
O tel e f o n e m a de Nic h o l a s Los s e f f veio no s á bad o à
tard e . Estav a à es p e r a , já qu e nat u r a l m e n t e Ann e Ten zer
dis s e r a à pol í cia qu e Archi e Good w i n era da Cia. de
Bot õ es Excl u s i v o s — Novi d a d e s , e iria m v ê -lo, e nin g u é m
go s t a de falar co m tira s do Dep ar t a m e n t o de Ho m i c í dio s .
Pe n s e i qu e es tiv e s s e aborr e c i d o . Mas n ã o es t av a . S ó qu e -
ria sab e r se de s c o b r i r a de ond e vinh a m os bot õ es.
Per g u n tei se rec e b e r a visit a s ofici a i s , res p o n d e u - m e qu e
si m , iss o porq u e pe n s o u qu e talv e z eu tive s s e novid a d e s
para el e . Dis s e - lhe qu e tin h a rec e i o de nu n c a ter novi -
dad e s , e a í fic o u aborr e c i d o . Se alg u m a vez me viciar e m
alg u m a coi s a , co m o el e, n ã o ser á e m bot õ es.
Ann e Tenz e r tel e f o n o u do m i n g o de ma n h ã . Estav a
es p e r a n d o por iss o ta m b é m, já qu e se u no m e est a v a no s
jornai s liga d o ao cas o qu e o Ne w s ch a m a v a do as s a s sin a t o
da ba b y - sit t e r . Um jornal dizia que eu era as sis t e n t e de
Ner o Wolf e e outr o dizia qu e era se u mo ç o de rec a d o s .
N ã o sei qual del e s Ann e Tenz e r vira. Est a v a aborr e c i d a ,
ma s n ã o sabi a ao cert o por qu ê . N ã o se res s e n t i a de eu
fin g ir ser um ho m e m que trab al h a v a co m bot õ es, ne m m e
culp a v a do qu e ac o n t e c e r a à sua tia. Qua n d o de s l i g a m o s ,
lev e i um mi n u t o pe n s a n d o no cas o e ach e i qu e es t a v a
aborr e c i d a por q u e est av a me tel e f o nan d o . Talve z me
de s s e a fals a impr e s s ã o de qu e qu e ri a ouvir min h a voz de
novo. Era a impr e s s ã o qu e m e dava. Me s m o leva n d o e m
con t a que a impr e s s ã o era fals a , devia ter de c i d i d o , ant e s
de ligar, o qu e a es t a v a aborr e c e n d o .
Nin g u é m nun c a é t ã o fam o s o co m o pe n s a qu e é,
incl u s i v e eu. Apert e i a ca m p a i n h a do ves t íbulo da Rua 11
Oes t e , no do m i n g o de ma n h ã , co m p a r e c e n d o a um
co m p r o m i s s o qu e mar c a r a pel o tel e f o n e , e Mari e Foltz
deix o u - m e entr ar , ma s n ã o havia ne m sin al de qu e vira
me u no m e no s jornai s . Eu era ap e n a s um a int e rr u p çã o no
qu e est av a faz e n d o . E qua n d o entr e i na sala en o r m e no
pri m e i r o and ar e aproxi m e i - me de no s s a cli e n t e , ela
es t av a toc a n d o pian o . Ter m i n o u de toc a r ant e s de se virar
no ban c o e m e per g u n t a r , co m deli c a d e z a :
— Bo m dia. Sup o n h o que de s c o b r i u alg u m a coi s a ?
Min h a l í ng u a es t av a co m vont a d e de per g u n t a r se
ter min a r a o mar ti n i , ma s eu de c i d i co n t r a .
— Algu m a coi s a . — Dis s e eu. — Se leu os jornai s da
ma n h ã ...
— Já o vi, ma s n ã o o li. Nu n c a leio.
— Ent ã o vou lhe p ô r a par. — Apan h e i um a ca deir a,
col o q u e i - a a um a boa dist â nci a e se n t e i - m e: — Se nu n c a
lê os jornai s , crei o qu e n ã o viu o an ú nci o do Sr. Wolf e na
qui n t a - feira.
— N ã o. Um an ú nci o ?
— É. Talve z se le m b r e de qu e pe n s e i qu e os bot õ es
no ma c a c ã o era m fora do co m u m , e el e ta m b é m pe n s o u
as s i m . O an ú nci o ofer e c i a um a rec o m p e n s a a qu e m de s s e
infor m a çõ es sobr e bot õ es bran c o s de crin a , e co n s e g u i -
mo s res p o s t a . De p o i s de pas s o s qu e n ã o s ã o de int e r e s s e ,
fui a Mah o p a c sext a - feira de ma n h ã . Sab e ond e fic a
Mah o p a c ?
— Claro.
— Fui visit ar um a se n h o r a cha m a d a Elle n Tenz e r ,
poi s de s c o b r i que fazia bot õ es bran c o s de crin a . Agora já
de s c o b r i m o s mai s coi s a s a se u res p e i t o , ma s n ã o atra vé s
dela. Foi qu e m fez os bot õ es do ma c a c ã o da cria n ç a. E o
be b ê veio da cas a del a. É um a cas a peq u e n a , vivia sozi n h a
lá , co m o be b ê . Fic o u l á cer c a de tr ê s m e s e s .
— Ent ã o ela é a m ã e.
— N ã o. H á vá rias boa s raz õ es para sab e r qu e n ã o. Eu
n ã o...
— Mas ela sab e que m é a m ã e do be b ê !
— Ach o que sabi a . Pel o m e n o s sabi a ond e o co n s e -
gui u e de que m . Mas n ã o pod e res p o n d e r por q u e es t á
mor t a . Foi...
— Mor t a ?
— É o qu e est o u lh e co n t a n d o . Ap ó s con v e r s a r m o s
rapid a m e n t e na sext a - feira de ma n h ã , sa í para dar um
tel e f o n e m a e pe dir ajud a e, qua n d o volt e i para a cas a , se u
carr o n ã o est a v a mai s l á , ne m ela. Est o u lhe co n tan d o
ape n a s os det a l h e s ne c e s s á rios para ent e n d e r a sit u a çã o.
Elle n Tenz e r nu n c a volt o u para cas a . Ont e m de ma n h ã , à s
sei s hor a s , um tira en c o n t r o u um a mul h e r mor t a de n t r o
de um carr o es t a c i o n a d o aqui e m Man h a t t a n , na Rua 38,
pert o da Terc e i r a Aven i d a . Foi estr a n g u l a d a co m um
pe d a ç o de cord a . Era Elle n Tenz e r e o carro era o del a. Se
le s s e os jornai s , sab e r i a do cas o . Agora, ela n ã o pod e nos
diz e r nad a.
Se u s olh o s es t a v a m arre g a l a d o s : — Quer diz er .. . foi
as s a s s i n a d a ?
— Foi.
— Mas o que . .. É horr ível.
— É. Est o u de s c r e v e n d o a sit u a çã o. Se a pol í cia n ã o
sab e aind a qu e est iv e l á e exa m i n e i a ca s a , incl u i n d o o
por ã o, vai sab e r log o . Vã o sab e r que , log o dep o i s de
ter m o s con v e r s a d o , foi- se e m b o r a no se u carr o, e qu e
cer c a de quat o r z e hora s dep o i s foi as s a s s i n a d a . V ã o qu e -
rer sab e r por qu e fui v ê -la e sobr e o qu e co nv e r s a m o s . A
res p e i t o dis s o n ã o h á probl e m a , pois est á vam o s s ó s e es t á
mor t a , ma s por qu e fui v ê -la é mai s dif í cil. Vã o sab e r qu e
fui lh e per g u n t a r sobr e os bot õ es, ma s por qu ê ? Que m
tin h a tan t a curi o s i d a d e ac e r c a de bot õ es a pon t o de
con t r a t a r Ner o Wolf e ? Vã o qu e r e r o no m e do cli e n t e , na
verd a d e vã o exi g ir e, se co n s e g u i r e m , a se n h o r a vai ser
con vi d a d a a ir ao es c r i t ó rio do pro m o t o r p ú blic o
res p o n d e r a um a s per g u n t a s . Aí vã o inve n t a r te or i a s e,
provav e l m e n t e , um a das te ori a s ser á qu e o beb ê n ã o foi
pos t o e m se u ves t íbulo , iss o é ape n a s a his t ó ria qu e a
se n h o r a arra nj o u para justifi c a r o beb ê est a r e m sua cas a .
Ser á fac í lim o inve s t i g a r es s a teor i a . Se u s ami g o s v ã o se
diver t ir mui t o . O fat o é qu e . ..
— N ã o!
— N ã o, o qu ê ?
— N ã o... O se n h o r es t á ind o depr e s s a de m a i s . —
Estav a co m a te s t a fran z i d a , con c e n t r a n d o - se. — N ã o é
um a his t ó ria. O be b ê foi mes m o de ix a d o no meu
ves t í bul o.
— Claro, ma s a te or i a n ã o é m á . Já co n h e c i pior e s . O
cas o é qu e , se der m o s o no m e da clie n t e , a se n h o r a vai
ter um pou c o de aborr e c i m e n t o , m e s m o qu e n ã o ado te m
es s a det e r m i n a d a te or i a . E se rec u s a r m o s . . .
— Esp e r e um min u t o . . . — A te s t a ain d a est a v a
franz i d a .
Esp e r e i mai s do qu e um min u t o , en q u a n t o pun h a
sua s id é ias e m ord e m .
— Creio qu e es t o u con f u s a — dis s e . — Quer diz e r qu e
a mul h e r foi ass a s s i n a d a por cau s a de... por qu e o se n h o r
foi vê -la? Devi d o ao qu e dis s e ou coi s a as s i m ?
Bal a n c e i a cab e ç a, ne g a n d o :
— N ã o é as s i m qu e dev e col o c a r as coi s a s . Dig a mo s
qu e é pos s ível que te n h a sid o as s a s s i n a d a , co m to d a
pr o b a b i l i d a d e , por q u e alg u é m n ã o qu er i a qu e ela fize s s e
alg o ou co n t a s s e alg u m a coi s a sobr e o be b ê qu e foi dei -
xad o aqui. Dig a m o s que , se n ã o fos s e inic i a d a um a inve s -
tig a çã o sobr e o beb ê , n ã o teria sid o as s a s s i n a d a .
— O se n h o r es t á diz e n d o qu e so u res p o n s á vel por um
as s a s s i n a t o .
— N ã o es t o u . Iss o é toli c e . Que m qu e r qu e ten h a
pos t o o be b ê e m se u ves t í bul o co m aqu e l a me n s a g e m
pre s a por alfin e t e devi a sab e r qu e a se n h o r a te n t a r i a
de s c o b r i r de ond e veio. A re s p o n s a b i l i d a d e pel o as s a s -
sin a t o cab e a ele , port a n t o , n ã o te n t e diz e r qu e é sua.
— Det e s t o iss o . — Est av a agarr a n d o a bord a do
ban c o co m for ç a. — De t e s t o . Ass a s s i n a t o . O se n h o r dis se-
me qu e seri a co n v i d a d a a ir ao gab i n e t e do pro m o t o r
p ú blic o . As per g u n t a s , o m ex e r i c o . . .
— Havia um se, Sra. Valdo n . Se der m o s o no m e da
cli e n t e . Com e c e i a diz er ...
— Por qu e n ã o m e ch a m a de Lucy?
— Dig a- m e por es c r i t o e fare i as s i m . A se n h o r a é
mu i t o vol ú vel para um a mo ç a qu e n ã o sab e flert a r. Co -
me c e i a diz er qu e , se rec u s a r m o s a dar o no m e da cli e n t e ,
talv e z n ó s fiqu e m o s en c r e n c a d o s , ma s iss o é probl e m a
no s s o . Pref e r i m o s n ã o dar se u no m e , e n ã o o dar e m o s , se
a se n h o r a me s m a n ã o for n e c e r se u pr ó prio no m e .
— Mas .. . por que faria iss o ?
— N ã o dev e , ma s talv e z já o te n h a feit o . Tr ê s pe s soa s
sab e m qu e co n tr a t o u Ner o Wolf e: sua criad a , sua
cozi n h e i r a e se u advo g a d o . Que m mai s ?
— Nin g u é m. N ã o co n t e i a nin g u é m.
— Te m cert e z a ?
— Si m .
— Ent ã o n ã o con t e . A nin g u é m, abs o l u t a m e n t e nin -
gu é m. Nem me s m o à sua m el h o r ami g a . As pe s s o a s
fala m , e se a pol ícia ouvir alg u m falat ó rio sobr e o fat o de
ter co n t r a t a d o Ner o Wolf e , a í pron t o . Os advo g a d o s n ã o
dev e m falar, ma s a mai o r part e del e s fala, ma s te m o s que
con f i ar nel e , na criad a e na coz i n h e i r a . N ã o dig a para n ã o
falar e m , qua s e nu n c a dá cer t o . As pe s s o a s s ão tão
es tr a n h a s que , se dis s e r a ela s qu e n ão me n c i o n e m
alg u m a coi s a , a í é qu e qu e r e m falar. Iss o n ã o se apli c a à
se n h o r a , por qu e te m alg u m a coi s a a perd e r fala n d o . Vai
fic ar mu d a ?
— Si m . Mas o se n h o r . . . o qu e vai faz er?
— N ã o sei. O Sr. Wolf e é o c é rebr o, so u o mo ç o de
rec a d o s . — Levan t e i - me . — O probl e m a im e d i a t o é ma n t ê -
la fora dis s o , foi es s e o mot iv o por qu e vim. Aind a n ã o
vier a m falar con o s c o , e m b o r a de s c o b r i s s e m mil h a r e s de
impr e s s õ es digi t a i s mi n h a s naq u e l a cas a e, co m o det e tive
re gi s t r a d o , as min h a s impr e s s õ es es t ã o arqu iv a d a s .
Ent ã o, es t ã o se n d o en g r a ç adin h o s . Por exe m p l o , seri a
en g r a ç adin h o m e se g u i r at é aqui. Ao sair n ã o m e pre o -
cup e i e m ver se es t a v a se n d o se g u i d o , iss o leva te m p o se
o cara for bo m . Vim a p é e certifi q u e i - m e de qu e o
de s p i s t a r a , se es tiv e s s e m e se g u i n d o — Virei- m e e tor n e i
a fic ar e m su a dire çã o. — Se ac h a qu e lhe dev e m o s um a
de s c u l p a pel o fat o de deix ar a bu s c a por um a m ãe
ter m i n a r e m as s a s s i n a t o , aqui vai ela.
— Eu é qu e lhe devo um a de s c u l p a — afa s t o u - se do
ban c o — por ter sid o gro s s e i r a naq u e l e dia. — De u um
pas s o . — Já vai?
— Claro, já fiz o qu e m e ma n d a r a m . E se fui se g u i do,
ele pod e es t a r se n t a d o no s de g r a u s es p e r a n d o para m e
per g u n t a r ond e est iv e .
Ele n ã o es t av a . Mas qua s e m e i a hor a dep o i s de ter
ch e g a d o e m cas a , Cra m e r ch e g o u e co m e ç am o s a dis -
cu s s ã o qu e final m e n t e ter m i n o u à s tr ê s hor a s e quar e n t a
e doi s mi n u t o s , qua n d o me levo u .
Na se g u n d a - feir a, pou c o dep o i s do me i o - dia, ao ch e -
gar e m cas a , de p o i s de Park e r ter pag o a fian ç a e m e
dad o um a car o n a at é a Rua 35, fiqu e i co n t e n t e de ver, ao
entr ar no es c r i t ó rio, qu e Wolf e es tiv e r a oc u p a d o dura n t e
a min h a au s ê nci a. Com e ç ara a ler outr o livro, Pri m a v e r a
sil e n c i o s a , de Rac h e l Cars o n , e es t a v a adia n t a d o . Fiqu e i
de p é at é ter m i n a r o par á graf o , fec h a r o livro co m o ded o
mar c a n d o o lu g a r e faz e r um a per g u n t a co m os olh o s :
— Vint e mil — res p o n d i . — O pro m o t o r p ú blic o
qu e r i a 50 mil, port a n t o est o u ind o alto. Um dos tira s era
be m bo m , qua s e me pôs para es c a n t e i o faz e n d o
per g u n t a s sobr e o ma c a c ã o, ma s con s e g u i me safar. N ã o
falar a m e m Sau l, Fred ou Orrie, ent ã o nad a so u b e r a m
sobr e el e s e ag or a provav e l m e n t e n ã o sab e r ã o. Assi n e i
dua s de c l a ra çõ es difer e n t e s , co m dez hor a s entr e cad a
um a , ma s pod e m ficar co m ela s . O st a t u qu o e m nad a se
mo d if i cou . Se n ã o h á nad a urg e n t e , vou subir e cuid a r de
mi m . Dor m i s ó um a hor a, co m um tira de p é ao m e u lad o.
Qua n t o a co m e r , o qu e h á para o al m o ç o?
— Miol o s co m mol h o be c h a m e l , trufa s e cer of ó lio.
Sala d a de bet e r r a b a e agri ã o. Que ij o Bri e .
— Se tiver bas t a n t e , pod e co m e r um pou c o . — To m e i
a dire çã o da es c a d a .
Pod e r i a dar cin c o boa s raz õ es para já ter lar g a d o
es s e trab a l h o h á mu i t o te m p o , ma s daria sei s , igu a l m e n t e
boa s , para n ã o o ter feit o , co m o , por outr o lad o, daria
doi s mo t iv o s , talv e z tr ê s, para Wolf e m e de s p e d i r e dez
para qu e n ã o o fiz e s s e , e n ã o o faz. Das dez, a prin c i p a l é
qu e , se eu n ã o est iv e s s e por pert o , ele talve z es tiv e s s e
dor m i n d o e m b a i x o de um a pon t e e co m e n d o res t o s , poi s
de t e s t a trab a l h a r . N e n h u m de n ó s dois dis s e ab er t a m e n t e
qu e pel o meno s metad e do sal á rio qu e rec e b o é para
ins t i g á -lo, ma s n ã o pre c i s a ser dito.
Qua n d o o es p i c a ç o bas t a n t e , por é m, per g u n t a se te -
nh o alg u m a su g e s t ã o. Na se g u n d a - feir a à tard e , de p o i s do
alm o ç o, qua n d o volt a m o s ao es c r i t ó rio, abri u o livro para
ler e eu n ã o dei um a palavr a . Cas o o ins t i g a s s e ao pon t o
de me per g u n t a r se tin h a su g e s t õ es, teria de res p o n d e r
qu e n ã o. Nu n c a vira um cas o tão se m sa í da. De s -
cobr í ram o s de ond e viera o beb ê e es t á vam o s pior do qu e
qua n d o co m e ç am o s . Já se tin h a m pas s a d o tr ê s m e s e s
de s d e qu e o beb ê ch e g a r a na cas a de Elle n Ten z e r , por -
tan t o nad a se podi a faz e r. Qua n t o aos no m e s , end e r e ç os e
n ú me r o s de tel e f o n e s qu e apa n h a r a na cas a , pas s a r a
hor a s a exa m i n á -los no s á bad o à tard e e ne n h u m del e s
servi a para nad a. De qual q u e r jeito , os tira s tin h a m os
no m e s ag or a e es t a v a m trab a l h a n d o nu m as s a s s i n a t o . Se
alg u m coi s a ú til fos s e de s c o b e r t a ao inve s t i g a r e m Elle n
Ten z e r ou o be b ê , os tira s é qu e iria m en c o n t r a r . Era
provav e l m e n t e o qu e Wolf e ima g i n a v a , ao se se n t a r co m a
cara enfi a d a nu m livro. Se de s c o b r i s s e m o as s a s s i n o ,
pod e ria partir dali para en c o n t r a r a m ã e. É clar o qu e , se
de s c o bris s e m alg u é m qu e fos s e o as s a s s i n o e a m ã e, teri a
qu e cobr ar pou c o da cli e n t e , ma s pou p a r - lhe- ia mu i t o
trab a lho. Admit o qu e seria um a per d a de din h e i r o da Sra.
Vald o n — qu er o diz er Lucy — ma n d a r Saul, Fre d e Orrie
fic ar per a m b u l a n d o pel o co n d a d o de Put n a m .
Por iss o n ã o o ins t i g u e i e el e n ã o trab a l h o u — pel o
me n o s , pe n s e i qu e n ã o. Mas qua n d o fec h o u o livro e col o -
cou - o na m e s a à s tr ê s hor a s e cin q ü ent a e cin c o mi n u t o s ,
e m p u r r o u a cad e i r a , leva n t o u - se para ir para o ele v a d o r
ver as orq u í de a s e dis s e :
— A Sra. Vald o n pod e est a r aqui à s sei s hor a s ?
Devia ter de c i d i d o iss o h á hor a s , talv e z ant e s do
alm o ç o, por q u e n ã o de c i d e nad a en q u a n t o est á len d o .
Mas evitar a as s u m i r qual q u e r co m p r o m i s s o at é o ú lti m o
mi n u t o . N ã o ape n a s teria de trab a l h a r , teri a qu e falar
co m um a mul h e r .
— Pos s o de s c o b r i r — res p o n d i .
— Fa ç a iss o , por favor. Se n ã o pud e r ser à s sei s
hor a s , ent ã o à s nov e . Com o talv e z es t e j a m vigia n d o no s s a
porta , é m e l h o r qu e entr e pel o s fun d o s . — Sai u da sala e
virei- m e para tel e f o n a r .

8
Entr ar na no s s a cas a pel o s fun d o s é um pou c o mai s co m -
plic a d o do qu e pel a port a da fre n t e , ma s n ã o mui t o . Na
Rua 34 entr a- se nu m a pas s a g e m es tr e i t a , entr e doi s pr é -
dio s , qu e ter m i n a nu m port ã o de ma d e i r a ma c i ç a de doi s
me tr o s de alt ur a . N ã o h á ma ç an e t a , trin c o ou ca m p a i n h a
para aper t a r e, se voc ê n ã o tiver a chav e para a fe c h a d u r a
Hot c h k i s s e n ã o tiver sid o co nvi d a d o , vai pre c i s a r de um a
ferra m e n t a , dig a m o s um ma c h a d o fort e . Mas se est iv e r
se n d o es p e r a d o e bat e r no port ã o, ele se abrir á , co m o se
abri u para Lucy Vald o n à s sei s hor a s e dez mi n u t o s na -
qu e l a se g u n d a - feir a à tard e . Cami n h a - se por um a pas s a -
ge m de tijol o s entr e fileir a s de erva s , de s c e - se quatr o
de gr a u s , co n t i n u a - se e sob e - se um a es c a d a de 12
de gr a u s . Em ci m a , vira- se à dir ei t a para a cozi n h a ou à
es q u e r d a para o es c r i t ó rio ou para a fre n t e da cas a .
Leve i Lucy para o es c r i t ó rio. Ao entr ar m o s , Wolf e
mal a cu m p r i m e n t o u co m a cab e ç a, aper t o u os l á bio s e
fic o u a olh á -la se m ne n h u m ent u s i a s m o en q u a n t o se se n -
tava na poltr o n a ver m e l h a , col o c a v a a bol s a na m e s i n h a
ao lad o e pu n h a se u abri g o , de zib e l i n a ou outr a pel e ,
para tr á s.
— Já dis s e a Archi e que sint o es t a r um pou c o atra -
sad a — dis s e Lucy. — N ã o ima g i n e i qu e ele tive s s e de
es p e r a r por mi m l á fora.
Foi um ma u co m e ç o. Com o jam a i s um cli e n t e o
cha m o u de Ner o , ne m o ch a m a r á , o “Arch i e ” sig n i f i c a v a
para el e qu e , ou ela est a v a to m a n d o lib er d a d e s , ou eu já
as to m a r a . Olho u - me rapid a m e n t e , viro u- se para ela e
res p ir o u fun d o:
— N ã o go s t o dis s o . N ã o é um pro c e d i m e n t o nor mal,
de mi n h a part e , pe dir ajud a a um cli e n t e . Qua n d o ac e i t o
um trab a l h o , o trab al h o é m e u . Mas so u obri g a d o pel a s
circ u n s t â ncia s . Ont e m pel a ma n h ã o Sr. Good w i n lh e
de s c r e v e u a sit u a çã o.
Ela fez qu e si m co m a cab e ç a.
Ten d o de c i d i d o es s e as s u n t o , te n d o feit o co m qu e ela
ad m i t i s s e , ao ac e n a r , qu e o m e u no m e era Sr. Good w i n ,
rec o s t o u - se:
— Mas talv e z n ã o te n h a tor n a d o a sit u a çã o bas t a n te
clar a. Est a m o s e m apur o s . Era ó bvio qu e o mo d o mai s
si m p l e s de exe c u t a r o trab al h o seri a de s c o b r i r de ond e
vier a o be b ê ; log o qu e so u b é ss e m o s iss o , o res t o seri a
fá cil. Muit o be m , foi o qu e fiz e m o s ; sab e m o s de ond e veio
o be b ê , e es t a m o s se m sa í da. Elle n Tenz e r es t á mor t a , e a
lin h a de sin d i c â nci a co m p l e t a m e n t e obs tru ída. A se n h o r a
es t á ent e n d e n d o ?
— Ora... si m.
— Se aind a te m id é ias sobr e iss o , é m e l h o r de s i s t i r .
Seri a idiot i c e ten t a r de s c o b r i r co m o , de on d e e qu e m
trou x e o be b ê at é Elle n Ten z e r . Um trab a l h o de s s e s é
para a pol ícia, co m se u ex é rcit o de ho m e n s trei n a d o s ,
alg u n s co m p e t e n t e s , e co m se u sta t u s ofic i a l . N ã o é para
o Sr. Good w i n e para mi m . É de se pre s u m i r qu e es t e j a m
trab a l h a n d o nis s o por ser rele v a n t e para sua inve s t i g a çã o
de as s a s s i n a t o . Por es s e mot iv o , por ag or a , deixar e m o s
Elle n Ten z e r para a pol í cia, poi s é o qu e dev e m o s faz e r ,
co m um a obs e r v a çã o: sab e m o s qu e ela n ã o col o c o u o
be b ê e m se u ves t í bul o. Mas n ó s...
— Com o sab e m o s dis s o ? — Lucy es t av a co m a te s t a
franz i d a .
— Por de d u çã o. N ã o foi ela que m col o c o u um pe da ç o
de pap e l pre s o no cob e r t o r co m um alfi n e t e co m u m e
enr o l o u o cob e r t o r e m volta da cria n ç a. O Sr. Good w i n
en c o n t r o u um a vasil h a qua s e ch e i a de alfin e t e s de se g u -
ran ç a na cas a dela. Mas n ã o en c o n t r o u ne n h u m es t oj o de
cari m b o s de borra c h a e alm o f a d a para cari m b o , qu e é o
qu e foi us a d o na m e n s a g e m no pap e l . A de d u çã o n ã o é
con c l u s i v a , ma s é vá lida. Acre d i t o qu e no dia 20 de mai o
Elle n Ten z e r entr e g o u o beb ê para alg u é m, ou e m sua
cas a ou, mai s provav e l m e n t e , nu m pon t o de en c o n t r o e m
outr o lu g a r . Talve z n ã o de s c o n f i a s s e qu e o de s t i n o do
be b ê era se u ves t íbulo . Duvid o qu e so u b e s s e . Mas sabi a
de m a i s sobr e a his t ó ria do be b ê e su a ori g e m , e por iss o
foi mor t a .
— Ent ã o acr e d i t a nis s o ? — As m ã os de Lucy es t a vam
cris p a d a s , os ded o s torc i d o s . — Que foi as s a s s i n a d a
porq u e sabi a de m a i s ?
— N ã o. Mas seri a es t u p i d e z n ã o ad m i t ir tal hip ó te s e .
Outra sup o s i çã o: Elle n Tenz e r n ã o ape n a s n ã o dei xou o
be b ê no se u ves t íbulo co m o ne m sabi a qu e es s e era o se u
de s t i n o ; ela ne m ao m e n o s sabi a qu e seri a lar g a d o de
for m a qu e sua ori g e m per m a n e c e s s e de s c o n h e c i d a e n ã o
pud e s s e ser de s c o b e r t a . Pois se ima g i n a s s e iss o nu n c a
teria col o c a d o no be b ê aqu e l e ma c a c ã o. Sabi a qu e aqu e -
le s bot õ es era m es p e c i a i s e qu e u m a inve s t i g a çã o levari a
at é a sua ori g e m . O que qu er qu e ela...
— Esp e r e um mo m e n t o . — Lucy es t av a de te s t a
franz i d a , con c e n t r a n d o - se. Wolf e es p e r o u . Ela log o con -
tin u o u : — Talve z ela qui s e s s e qu e fos s e de s c o b e r t o .
Wolf e aba n o u a cab e ç a: — N ã o. Ne s s e cas o , qua n d o
de s c o b r i s s e que os bot õ es tin h a m sid o en c o n t r a d o s , rec e -
beri a o Sr. Good w i n de for m a difer e n t e . N ã o. N ã o im porta
o qu e sou b e s s e e m rela çã o ao pas s a d o do beb ê , n ã o sabi a
nad a a res p e i t o do fut ur o qu e lhe pret e n d i a m dar. Seja
qu e m for qu e o deix o u e m se u ves t íbulo dev e r i a est ar
se g u r o de qu e ne n h u m a rou p a trazi a pis t a alg u m a sobr e
sua s orig e n s , port a n t o n ão con h e c i a sufi c i e n t e m e n t e
rou p a de cria n ç a para ver qu e os bot õ es era m difer e n t e s ,
at é m e s m o raro s , e podi a m dar um a pis t a . Mas o Sr.
Good w i n de s c o b r i u iss o e eu ta m b é m.
— Eu n ã o.
Olh o u - a zan g a d o : — Iss o s ó for n e c e infor m a çõ es a
se u res p e i t o ape n a s , mad a m e , n ã o sobr e o prob l e m a . Mi -
nha pre o c u p a çã o é o probl e m a , e ag or a n ã o ape n a s te n h o
de faz e r um trab a l h o qu e ac e i t e i , pre c i s o ta m b é m evit ar
ser ac u s a d o , junt a m e n t e co m o Sr. Good w i n , de co m e t e r
um cri m e . Se Elle n Tenz e r foi mor t a a fim de qu e n ã o
pud e s s e reve l a r fat o s sobr e o beb ê deixa n d o em se u
ves t í bul o, e é qua s e cer t o qu e é por es s e mot iv o qu e foi
as s a s s i n a d a , o Sr. Good w i n e eu es t a m o s am b o s es c o n -
de n d o prova s a re s p e i t o de um ho m i c ídio, e, co m o dis s e ,
es t a m o s e m apur o s . N ã o qu er o dar à pol í cia se u no m e e a
infor m a çã o qu e me forn e c e u co n fi d e n c i a l m e n t e . A se -
nh or a seri a per t u r b a d a e per s e g u i d a e, co m tod a prob a -
bilid a d e , ator m e n t a d a ; a se n h o r a é mi n h a clie n t e , por
iss o m e u am o r - pr ó prio ficari a ferid o . Orgu l h o - me de s ó
me exp o r a recl a m a çõ es dos outr o s , nu n c a de mi m
me s m o . Mas se o Sr. Good w i n e eu evit ar m o s me n c i o n a r
se u no m e e o qu e a se n h o r a nos co n t o u , n ã o bas t a r á
ape n a s cu m p r i r no s s a obri g a çã o co m a se n h o r a e deixar o
ho m i c í dio para a pol í cia; al é m de en c o n t r a r a m ã e,
pre c i s a m o s de s c o b r i r o as s a s s i n o ou es t a b e l e c e r de que
n ã o h á ne n h u ma liga çã o en tr e a mor t e de Elle n Tenz e r e
sua liga çã o co m o be b ê deix a d o no se u ves t íbulo . Com o é
mu i t o pro vá vel qu e haja um a con e x ã o, es t ar e i na pist a de
um as sas s i n o para a se n h o r a e à s sua s cus t a s . Fui clar o?
Os olh o s de Lucy vier a m e m mi n h a dire çã o: — Eu lhe
dis s e qu e de t e s t o iss o .
Con c o r d e i: — O probl e m a é qu e voc ê n ã o pod e sair
de ce n a . Se de s i s t i r , n ã o é mai s cli e n t e del e e ter e m o s de
con t a r tud o; eu, pel o m e n o s , ter e i . Sou um a pe s s o a mui t o
imp o r t a n t e porq u e fui o ú lti m o a ver Elle n Ten z e r co m
vida. Aí ter á de enfr e n t a r a pol ícia. Agor a est á co n o s c o ,
Sra. Vald o n , ter á qu e faz e r su a es c o l h a .
Ela abri u a boc a e fe c h o u - a de novo . Virou- se, apa -
nh o u a bol s a na me s i n h a , abri u- a, tiro u um pe d a ç o de
pap e l , leva n t o u - se, ca m i n h o u e m mi n h a dire çã o e de u- m e
o pap e l . Se g u r e i - o e li, es c r i t o à m ã o, co m tint a:

Se g u n d a - feir a
Para Archi e Good w i n :
Cha m e - m e de Lucy.
Lucy Vald o n

Ima g i n e a ce n a: no es c r i t ó rio de Wolf e , na su a pre -


se n ç a, sua cli e n t e m e d á um bilh e t e qu e dev e sab e r qu e
eu pref e r i n ã o mo s t r a r a ele . Tinh a qu e faz e r um a ma n o -
bra. Leva n t e i um a sobr a n c e l h a l á em ci m a , coi s a qu e
se m p r e o aborr e c e por q u e n ã o o con s e g u e ; pu s o pap e l no
bol s o e olh e i , co m a cab e ç a incli n a d a para ela, qu e se
se n t o u de nov o na poltr o n a ver m e l h a .
— N ã o, se n ã o for mai s um a cli e n t e — dis s e - lhe eu.
— Mas eu sou . Det e s t o co m o as coi s a s est ã o, ma s é
clar o qu e so u .
Olh e i para Wolf e e en c a r e i - o nos olh o s .
— A Sra. Vald o n no s pref e r e à pol ícia. Iss o é bo m
para no s s o am or- pr ó prio.
Ela falo u co m ele: — Foi o mo d o co m o col o c o u as
coi s a s , per s e g u i r um as s a s s i n o por mi m . Quer diz e r ...
pre c i s a faz er iss o pri m e i r o ?
— N ã o — dis s e , se c a m e n t e . Ela n ã o era ap e n a s um a
mu l h e r , era um a criat u r a qu e me pas s a r a um bilh e te
parti c u l a r e m fre n t e ao s se u s olh o s . — Iss o é eve n t u a l ,
ma s pre c i s a ser feit o . Ent ã o pos s o co n t i n u a r ?
— Si m .
— Ent ã o vai ter de ajud ar . No mo m e n t o , deixa m o s
Elle n Tenz e r para a pol ícia e co m e ç am o s na outr a extr e -
mid a d e — o na s c i m e n t o do be b ê , e sua co n c e p çã o. Na
ter ç a- feira a se n h o r a forn e c e u ao Sr. Good w i n , co m relu -
t â nci a, os no m e s de qua tr o mul h e r e s . Pre c i s a m o s de mai s
no m e s . Quer e m o s os no m e s de toda s as mu l h e r e s qu e
es ti vera m ou pud e s s e m ter est a d o e m co n t a t o co m se u
mari d o , e m b o r a por pou c o te m p o , na pri m a v e r a do ano
pas s a d o . Toda s ela s .
— Mas iss o é imp o s s ível. N ã o podi a dar o no m e de
tod a s . — Fez um ge s t o co m a m ã o da alia n ç a. — Me u
mari d o en c o n t r a v a ce n t e n a s de pe s s o a s que eu ne m
con h e cia. Por exe m p l o , qua s e nu n c a íam o s junt o s aos
coq u e t é is lit er á rios. Ficava ent e d i a d a , e de qual q u e r
mo d o ele diver ti a - se mai s se eu n ã o est iv e s s e l á .
Wolf e de u um gru n h i d o :
— N ã o duvid o . A se n h o r a dar á ao Sr. Good w i n tod o s
os no m e s qu e con h e c e , se m exc e çã o. Ess a s pe s s o a s n ã o
ser ã o imp o r t u n a d a s , já qu e as pe s q u i s a s a se u res p e i t o se
res tr i n g i r ã o a um ú nic o pon t o: ond e es t av a m na é poc a
qu e o beb ê nas c e u . É um a vant a g e m um a mul h e r n ão
pod e r fic ar gr á vida e ter o beb ê se m int e rr o m p e r a sua
roti n a . Pou q u íssi m a s dela s ser ã o int e r r o g a d a s dire t a m e n -
te, talv e z ne n h u m a . N ã o omi t a um ú nic o no m e .
— Est á be m , n ã o omi t ir e i .
— A se n h o r a ta m b é m de u ao Sr. Good w i n os no m e s
de alg u n s ho m e n s , e ag or a ire m o s utiliz á -los, pel o m e n o s
alg u n s del e s , ma s para iss o pre c i s a m o s de sua ajud a . Po -
de m o s co m e ç ar co m un s pou c o s , dig a m o s tr ê s ou qua tr o ,
e con t i n u a r co m os outr o s se pre c i s a r m o s . Quer o v ê -los, e
vir ã o aqui, já qu e nu n c a sai o de mi n h a cas a a ne g ó cio s .
N ã o pre c i s o vê -los se p a r a d a m e n t e , pos s o v ê -los e m gru p o .
A se n h o r a far á os arra nj o s , ap ó s ter e m sid o es c o l h i d o s .
— O se n h o r qu er diz e r que lhe s pedir e i para vir v ê -
lo?
— Si m .
— Mas que lhe s dire i?
— Que m e co n tr a t o u para faz er um a inv e s t i g a çã o
para a se n h o r a , e qu e pre c i s o falar co m ele s .
-— Mas ent ã o... — sua te s t a es t a v a fran zi d a . — Archi e
me dis s e para n ã o con t a r a nin g u é m, ne m mes m o à
mi n h a m e l h o r ami g a .
— O Sr. Good w i n est av a ob e d e c e n d o mi n h a s ins tr u -
çõ es. Pe n s a n d o be m , co n c l u í qu e pre c i s o ac e i t a r o risc o .
A se n h o r a m e dis s e qu e se u mari d o en c o n t r a v a ce n t e n a s
de pe s s o a s qu e nu n c a con h e c e u . Esp e r o qu e “ce n t e n a s ”
seja ape n a s um exa g e r o , ma s se h á d ú zia s pre c i s o sab e r
do no m e de tod a s . A se n h o r a diz det e s t a r o mo d o co m o as
coi s a s est ã o. Que diab o s , mad a m e , eu ta m b é m. Se
so u b e s s e qu e o cas o iria se de s e n v o l v e r de s s a for m a —
um as s a s s i n a t o , me u env o lvi m e n t o e pe s c a r infor m a çõ es
de roti n a nu m mar se m fim —, nu n c a teria ac e i t a d o o
cas o . Pre c i s o ver os tr ê s ou quatr o ho m e n s qu e estiv e r e m
mai s qualifi c a d o s para co m p l e t a r a list a dos con h e c i d o s
do se u mari d o , e para m e forn e c e r as infor m a çõ es qu e a
se n h o r a n ã o te m sobr e el e . Ap ó s a sel e çã o feit a pel a se -
nh or a e pel o Sr. Good w i n , qu e r faz e r o favor de traz ê -los
aqui?
Cada vez mai s ela det e s t a v a tud o: — O qu e devo diz e r
qua n d o me per g u n t a r e m o qu e es t á inve s t i g a n d o para
mi m ?
— Dig a qu e expli c a r e i tud o . É clar o qu e ser á deli -
cad o . É cer t o qu e n ã o m e n c i o n a r e i o be b ê qu e foi deix a d o
no se u ves t íbulo co m aqu e l a me n s a g e m . Com tod a
prob a b i l i d a d e , sab e - se mai s a res p e i t o de u m beb ê e m sua
cas a do qu e a se n h o r a su s p e i t a , ma s se um del e s ou
vá rios m e per g u n t a r e m sobr e o be b ê , dire i qu e n ã o ve m
ao cas o . Qua n d o eu de c i d i r co m cert e z a o qu e lhe s diz e r ,
a se n h o r a ser á inf or m a d a , ant e s de v ê -los, e se a se n h o r a
tiver alg u m a s obje çõ es, est a s ser ã o leva d a s em
con s i d e r a çã o. — Giro u a cad e i r a para olh ar o rel ó gio.
Falt av a m e i a hor a at é o jant ar. Giro u a cad e i r a de volta. —
Esta noit e , a se n h o r a e o Sr. Good w i n de c i d i r ã o quai s
ser ã o os tr ê s ou qua tr o ho m e n s a ser e m es c o l h i d o s
de n t r e os ami g o s de se u marid o . Gost ar i a de v ê -los ou
am a n h ã de ma n h ã à s onz e hor a s ou à s nov e hor a s da
noit e . Por favor, pre p a r e ta m b é m a list a de no m e s de
mu l h e r e s . Mas deix e - m e faz e r- lhe um a per g u n t a : pod e
faz e r o favor de m e diz e r ond e est av a sext a- feira? Dep o i s
das oit o hora s da noit e ?
— Sext a - feira? — ela arre g a l o u os olh o s .
Ele fez sin a l qu e si m: — N ã o te n h o mo t iv o s , ma da m e ,
para duvid ar da sua boa f é . Mas ag or a te n h o de lidar co m
alg u é m qu e n ã o he s i t a e m as s a s s i n a r , e n ã o é tota l m e n t e
inc o n c e b ível qu e a se n h o r a seja um a Jeze b e l . Elle n
Ten z e r foi mor t a sext a - feira, mai s ou m e n o s à m e i a - noit e .
Ond e est a v a a se n h o r a ?
Lucy fito u - o: — Mas o se n h o r n ã o pod e . . . n ã o pe n s a . . .
— É mui t o impr o v á vel, ma s é con c e b ível. A se n h o r a
dev e r i a es t ar sati s f e i t a qu e pos s a ima g i n a r qu e m e en g a -
nou co m um a ó tim a exibi çã o de l á bia e es p e r t e z a .
Tent o u sorrir: — O se n h o r te m um a id é ia es tr a n h a
das coi s a s qu e agra d a m as pe s s o a s . — Olho u para mi m . —
Por qu e n ã o m e per g u n t o u iss o ont e m ?
— Eu ia per g u n t a r , ma s es q u e c i .
— Est á fala n d o s é rio?
— N ã o, ma s el e te m raz ã o, é um elo g i o . Pe n s e co m o
tin h a qu e ser es p e r t a para en g a n a r a el e e a mi m . Ond e
es t av a sext a - feira à noit e ?
— Est á be m . Sext a - feira. — De m o r o u alg u m te m p o
para res p o n d e r : — Sa í para jant ar no apar t a m e n t o de um a
ami g a , Lena Guthr i e , ma s ch e g u e i e m cas a a te m p o da
ma m a d a das dez hora s do beb ê . A enf e r m e i r a est a v a l á ,
ma s em ger al go s t o de es t a r pre s e n t e ta m b é m. Ent ã o
de s c i e toq u e i pian o dura n t e alg u m te m p o , e de p o i s fui
para a ca m a . — Virou- se para Wolf e . — Iss o é toli c e !
— N ã o — res m u n g o u el e . — Nad a qu e se rela c i o n e as
exc e n t r i c i d a d e s da con d u t a hu m a n a é toli c e . Se hoj e a
noit e a enf e r m e i r a es tiv e r l á , o Sr. Good w i n vai lhe faz e r
per g u n t a s a re s p e i t o de sext a- feira.

No dia se g u i n t e , ter ç a- feira, havia tr ê s ho m e n s con o s c o


no es c r i t ó rio ao m e i o - dia, ma s n ã o era m ami g o s do fale -
cid o Ric h a r d Valdo n . Sau l Pan z e r es t a v a na poltr o n a de
cou r o ver m e l h a . Na s dua s cad e i r a s am ar e l a s na fre n t e da
es c r iv a n i n h a de Wolf e es t av a m Fred Durki n , um m e tro e
se t e n t a e se t e ce n t ím e t r o s , nov e n t a e cin c o quil o s , car e c a
e cor p u l e n t o , e Orrie Cath e r , um metro e oit e n t a
ce n t í me tr o s , nov e n t a quil o s , be m - prop o r c i o n a d o dos p é s
à cab e ç a. Cada um se g u r a v a nas m ã os un s cart õ es de dez
ce n t í me tr o s por set e nos quai s a inf or m a çã o forn e c i d a
pela cli e n t e fora datil o g r a f a d a e, nas cart e i r a s , tin h a m al -
gu m a s not a s usa d a s de cin c o e dez d ó lare s retir a d a s do
cofr e .
Os olh o s de Wolf e se fixava m e m Orrie e Fred, o qu e
se m p r e ac o n t e c e qua n d o d á ord e n s ao trio. Ele sab e que
Saul en t e n d e tud o .
— N ã o dev e hav e r dific u l d a d e s ne m co m p l i c a çõ es —
dizia el e. — É mu i t o si m p l e s . No co m e ç o de s t e ano, ou
talv e z no fim do ano pas s a d o , um a mul h e r de u à luz um
be b ê . Quer o en c o n t r á -la. Mas a mi s s ã o de voc ê s, por
en q u a n t o , se res tr i n g e a eli m i n a çõ es. Com res p e i t o a
cad a um a das mul h e r e s cujo s no m e s est ã o no cart ã o,
voc ê s s ó t ê m que res p o n d e r a um a per g u n t a : ela pod e r i a
ter tido um filh o naq u e l a é poc a ? Qua n d o en c o n t r a r
alg u é m qu e se pos s a excl u i r o no m e co m facili d a d e , cujo
de s t i n o e movi m e n t o s dura n t e es t e per íodo pre c i s e m de
um a pe s qui s a mai s elab o r a d a , nad a fa ç am se m me
con s u l t a r . Fui * be m clar o?
— N ã o mu i t o — dis s e Orrie. — At é qu e pon t o vai o
excl u i r co m facili d a d e ?
— Iss o é iner e n t e ao m é tod o de apr oxi m a çã o qu e
su g ir o , o qual foi elab o r a d o por mi m e Archi e . S ó se
diri gir ã o à mul h e r e m si se pre c i s a r e m . Na mai o r i a dos
cas o s talv e z e m tod o s , pod e m obt e r infor m a çã o sufi cie n t e
de outr a s pe s s o a s : empre g a d o s dos apar t a m e n t o s ,
ven d e d o r e s , corr e i o , voc ê s con h e c e m a rotin a . Usar ã o
se u s pr ó prio s no m e s e as per g u n t a s ser ã o feit a s e m no m e
da Dolp h i n Corp or a t i o n , propri e t á ria e op e r a d o r a de
Dol p h i n Cotta g e s , Clear w a t e r , Fl ó rida. Um a mul h e r es t á
proc e s s a n d o a cor p o r a çã o por dan o s , por um a gra n d e
qua n t i a , m e i o mil h ã o de d ó lare s , por feri m e n t o s qu e tev e
no dia 6 de jan e ir o , s á bad o , de s t e ano, ao sair do cai s
para um bar c o , Ela afir m a qu e o empre g a d o da
corp o r a çã o qu e ma n o b r a v a o barc o deix o u qu e es s e se
mov e s s e e se u s feri m e n t o s fora m oc a s i o n a d o s por sua
ne g l i g ê ncia. O cas o vir á log o a julg a m e n t o e a cor p o r a çã o
qu e r o te s t e m u n h o de um a cert a Jane Do e (u m no m e de
um de se u s cart õ es ) . Jane Do e era inq u il i n a de um a das
cas i n h a s da corp o r a çã o de 10 de dez e m b r o a 12 de feve -
reir o; es t av a no cais qua n d o ac o n t e c e u o acid e n t e e
con t o u ao ger e n t e das cas a s qu e o barc o n ã o se m e x e u e o
barq u e i r o não tev e culp a . Est o u se n d o mui t o
circ u n s t a n c i a l ?
— N ã o — res p o n d e u Fred. Se sabi a ou n ã o o qu e era
“cir c u n s t a n c i a l ” não imp o r t a v a , ma s provav e l m e n t e
ach a v a qu e Wolf e n ã o podi a ser exa g e r a d o e m nad a .
— O res t o é ó bvio. N ã o exis t e ne n h u m a Jane Do e , e
nu n c a exis t i u , no end e r e ç o qu e de u à Dol p h i n Corp or a -
tio n , e voc ê s est ã o te n t a n d o en c o n t r á -la Seria ela a Jane
Do e do se u cart ã o? Ela es t a v a na Fl ó rida de 10 de dez e m -
bro a 10 de fev er e i r o ? N ã o? Ond e es t av a ela? Mas voc ê s
n ã o pre c i s a m de su g e s t õ es de co m o se cert ifi c a r . Ser á um
proc e s s o ape n a s eli m i n a t ó rio. Est á clar o?
— Para mi m , n ã o — dis s e Orrie, leva n t a n d o os olh o s
da cad e r n e t a ond e es c r e v i a . — Se a ú nic a coi s a ne c e s s á ria
é se ela tev e um beb ê , por q u e falar e m Fl ó rida, delfi n s e
um pro c e s s o le g a l ? — O se u to m de voz agr e s s i v o ve m do
fato de qu e acr e d i t a qu e tod o s os ho m e n s s ã o cria d o s
igu a i s , es p e c i a l m e n t e el e e Ner o Wolf e .
Wolf e virou a cab e ç a: — D ê -lhe a res p o s t a , Saul.
A cad e r n e t a de not a s de Saul es t av a já no bol s o ,
junt o co m os cart õ es. Olho u para Orrie co m o para um
igu a l , coi s a qu e el e n ã o era.
— É evid e n t e qu e as prob a b i l i d a d e s s ã o de qu e o
be b ê seja ile g ítim o e qu e a m ã e se au s e n t a s s e para t ê -lo,
porta n t o , per g u n t a m o s se est a v a aus e n t e . Se n ã o est a v a ,
a ú nic a coi s a qu e qual q u e r pe s s o a sab e r i a sobr e o qu e
um a mul h e r fazia h á cin c o mes e s atr á s era se es t a v a
te n d o um be b ê ou n ã o. Ess e ne g ó cio a res p e i t o da Fl ó rida
é s ó para co m e ç ar a co nv e r s a .
O mo d o co m o Wolf e proc e d e u n ã o era dire i t o , poi s
Saul já sabi a de tud o h á cin c o dia s , ma s a id é ia era en s i -
nar bon s mo d o s a Orrie, e é clar o qu e Saul tin h a de
ban c a r o es p e r t o . Dep o i s qu e tod o s se fora m e eu volt e i
ao es c r i t ó rio, dis s e a Wolf e:
— Sab e de um a coi s a ? Se exa g e r a r e der a Orrie um
co m p l e x o de infe r i o r i d a d e , vai ser p é ssi m o , e um ó ti mo
ope r a d o r es t ar á es tr a g a d o .
Ele buf o u : — Tolic e . Inc o n c e b í vel. — Apan h o u o livro
Pri m a v e r a sil e n c i o s a e ajus t o u - se con f o r t a v e l m e n t e Aí
leva n t o u o qu e i x o e dis s e , am á vel: — Voc ê já per c e b e u
qu e n ã o vou lh e per g u n t a r o qu e est a v a no pap e l que
aqu e l a mul h e r lh e de u ont e m .
Aban e i a cab e ç a: — Sabi a qu e mai s ced o ou mai s
tard e seri a co m e n t a d o . Se fos s e alg u m a coi s a a ver co m
me u servi ç o, é clar o qu e con t a r i a . De qual q u e r mo d o , vou
con t a r . Estav a es c r i t o à m ã o: “Qu er i d o Archi e , Lizzi e
Bor d e n apa n h o u o ma c h a d o e de u 40 ma c h a d a d a s na
m ã e. De su a qu e r i d a Lucy.” Cas o qu e ir a .
— Cale a boc a — dis s e abrin d o o livro.
Aind a n ã o sab íam o s qua n t o s iria m co m p a r e c e r à
reu n i ã o dos ho m e n s naq u e l a noit e , e s ó no fim da tard e
Lucy tel e f o n o u para diz er qu e tod o s os qua tr o viria m .
Qua n d o Wolf e de s c e u da est u f a à s sei s hor a s , as not a s
qu e eu datil o g r a f a r a est av a m e m su a me s a . Era m:
MAN U EL UPTO N: Cerc a de 50 ano s . Editor da
Dis t a f f , a “revi s t a para tod a e qual q u e r mu l h e r ” , circ u l a -
çã o aci m a de 8 mil h õ es. Foi qu e m col o c o u Ric h ar d Val -
don no ca m i n h o da fam a e da fort u n a h á dez an o s , ao
publi c a r vá rios de se u s pe q u e n o s con t o s e fize r a seri a do
de dua s nov e l a s sua s . Casa d o , a mul h e r est á viva, tr ê s
filh o s cre s c i d o s . Mora nu m apar t a m e n t o da Park Aven u e .
JULIAN HAFT: Cerc a de 50 an o s . Pre s i d e n t e da
Part h e n o n Pre s s , qu e publi c a os livro s de Vald o n . Ele e
Vald o n fora m ami g o s í nti m o s dura n t e os ú lti m o s cin c o
ano s da vida de Valdo n . Vi ú vo, dois filh o s cre s c i d o s . Mor a
nu m a su íte na Torre Chur c h i l l .
LEO BING HA M: Cerc a de 40 an o s . Prod u t o r de
tel e vi s ã o. N ã o tin h a ne g ó cio s co m Vald o n , ma s era se u
ami g o mai s anti g o e mai s ch e g a d o . Solt e i r o . Tipo
fes t e i r o . Mora nu m dupl e x na Rua 38 Lest e .
WILLIS KRUG: Tam b é m te m cer c a de 40 an o s .
Age n t e lite r á rio. Vald o n era se u clie n t e h á se t e ano s .
Vi ú vo; cas a d o e divor c i a d o . N ã o te m filh o s . Mor a nu m
apar t a m e n t o na Rua Perry, no Villa g e .
Se m p r e qu e es p e r a m o s v á rios co nvi d a d o s de p o i s do
jant ar , Wolf e , ap ó s deix ar a m e s a , n ã o volta para a sua
cad e i r a favorit a no es c r i t ó rio. Vai para a cozi n h a , ond e h á
um a cad e i r a se m bra ç os qu e ag ü ent a se u pe s o de mai s de
ce n t o e quar e n t a quil o s , sobr a n d o ape n a s um pou c o dos
lad o s . A ú nic a vez qu e n ã o foi ob e d e c i d o , e m mat é ria de
mo b í lia, foi qua n d o co m p r o u um a poltr o n a ta m a n h o
extr a g r a n d e para a cozi n h a e Fritz foi con t r a . A poltr o n a
foi entr e g u e e, um a cert a ma n h ã , ele se se n t o u nel a
dura n t e m e i a hor a ao dis c u t i r sop a de nab o co m Fritz,
ma s qua n d o volt o u da es t u f a à s sei s hor a s , a cad e i r a
havia su m i d o . Se ele ou Fritz alg u m a vez m e n c i o n a r a m o
fato nova m e n t e , foi e m parti c u l a r .
Com o ne n h u m dos quatr o co nvi d a d o s podi a ser a
m ã e que est á vam o s pro c u r a n d o , e n ã o havia raz ã o para
sup o r qu e um dos quatr o fos s e o as s a s s i n o , foi s ó por
for ç a do h á bit o qu e os exa m i n e i qua n d o a ca m p a i n h a
toc o u e abri- lhe s a porta . Willi s Kru g, o ag e n t e lite r á rio,
ch e g o u pri m e i r o , um pou c o ce d o , era um car a alto e
os s u d o , co m um a cab e ç a co m p r i d a e ore l h a s gru d a d a s na
cab e ç a. Enc a m i n h o u - se para a poltr o n a ver m e l h a , ma s
mo s t r e i - lhe outr a cad e ir a , pois de c i d i r a qu e Bin g h a m , o
me l h o r e o mai s anti g o ami g o de Valdo n , era qu e m devi a
se n t a r ali. Ele foi o pr ó xim o a ch e g a r , à s nov e hor a s e m
pon t o . Leo Bin g h a m , o prod u t o r de tel e vi s ã o. Alto, gra ú do
e boni t o , co m um sorri s o gra n d e , qu e apar e cia e
de s a p a r e c i a , co m o um an ú nci o a g á s ne o n . Julia n Haft, o
edit o r , qu e ch e g o u a se g u i r , era um a barric a dos qua d ri s
para ci m a e tin h a um par de palit o s dos qua d ri s para
baixo , era car e c a no top o da cab e ç a, e usav a un s ó cul o s
de aro s red o n d o s . Man u e l Upt o n , edit o r de Dis t a f f , foi o
ú lti m o a ch e g a r , e, ao olh á -lo, es p a n t e i - m e que tive s se
con s e g u i d o ch e g a r . Mi ú do, olh o s tris t e s e tod o am ar -
rota d o , om br o s ca ídos e resf o l e g a n d o por ter sub i d o os
de gr a u s . Fiqu e i pe n a l i z a d o de n ã o ter- lhe gu ar d a d o a
poltr o n a ver m e l h a . De p o i s de se n t a r - se na poltr o n a am a -
rela, s ã o, e m b o r a talv e z n ã o salv o, fui at é mi n h a es c r iv a -
nin h a e ch a m e i a cozi n h a no int e rf o n e .
Wolf e entr o u . Tr ê s dos co nvi d a d o s se leva n t a r a m .
Man u e l Upt o n , qu e era o qu e m e n o s tin h a qu e leva n t a r ,
fic o u se n t a d o . Wolf e , qu e n ã o go s t a de ap er t a r m ã os, foi
at é sua es c r iv a n i n h a e es p e r o u at é eu lhe diz e r os no m e s ,
dan d o a tod o s um ac e n o co m a cab e ç a, de pel o m e n o s um
ce n t í me tr o . Se n t o u - se, per c o r r e u - os co m os olh o s da
dir ei t a para a es q u e r d a , olh o u - os outr a vez e m se n t i d o
con t r á rio, e dis s e :
— N ã o lhe s agra d e ç o por vire m aqui, se n h o r e s , poi s
es t ã o faz e n d o u m favor à Sra. Valdo n , n ã o a mi m . Mas
apr e c i o o qu e faz e m . S ã o tod o s ho m e n s oc u p a d o s , dep o i s
de um dia de trab al h o . Quer e m be b e r alg u m a coi s a ? N ã o
h á nad a e m sua fre n t e , pois iss o res tr i n g e a es c o l h a , ma s
te m o s um sorti m e n t o à m ã o. Quer e m alg u m a coi s a ?
Willi s Kru g aba n o u a cab e ç a. Julia n Haft de c li n o u ,
agra d e c e n d o . Leo Bin g h a m ped i u co n h a q u e . Man u e l
Upt o n pe di u um cop o d á gu a, se m gel o . Pedi sc o t c h co m
á gu a. Wolf e aper t o u a ca m p a i n h a e Fritz apar e c e u .
Fize m o s o ped i d o , incl u i n d o cerv ej a para Wolf e .
Bin g h a m de u um sorri s o para Wolf e:
— Tive praz e r em vir. Gos t e i da opor t u n i d a d e de
con h e c ê -lo. — Su a voz de bar í ton o co m b i n a v a be m co m o
sorri s o . — Já pe n s e i , diver s a s vez e s , na en or m e pos s i -
bilid a d e qu e teria na tel e v i s ã o, e ag or a qu e o vi, e ouvi
sua voz... me u De u s , seri a es t u p e n d o ! Virei outr o dia
con v e r s a r a res p e i t o . — Man u e l Upt o n bala n ç ou a ca be ç a
vag ar o s a m e n t e para a es q u e r d a e para a dir ei t a .
— Talve z o Sr. Wolf e n ã o o ent e n d a , Leo. — Sua voz
fan h o s a co m b i n a v a co m o res t o del e . — Talve z pe n s e que
“en or m e ” e “est u p e n d o ” é um a ref e r ê ncia pe s s o a l .
— N ã o co m e c e m voc ê s dois ag or a — dis s e Willi s
Kru g. — Devi a m alu g a r o Madi s o n Sq u a r e Gard e n e
dis p u t a r l á .
— So m o s inc o m p a t íveis — dis s e Bin g h a m . — Tod o s
os ho m e n s de revi s t a det e s t a m tel e v i s ã o por q u e es t á
tira n do tod o o se u lucr o . De n t r o de dez an o s n ã o hav e r á
revi s tas, exc e t o um a: gui a de te v ê . Na reali d a d e , eu o
am o , Man n y . Gra ç as a De u s qu e voc ê ir á rec e b e r pe n s ã o
do Esta d o .
Julia n Haft falo u para Wolf e: — É as s i m qu e ac o n -
te c e , Sr. Wolf e . Cult ur a de ma s s a s . — Se u te n o r fin o
har m o n i z a v a - se be m co m su a s per n a s , ma s n ã o co m o
tor s o . — Ouvi diz er qu e l ê mu i t o . Gra ç as a De u s qu e livro s
n ã o pre c i s a m de prop a g a n d a . Já es c r e v e u alg u m livro.
Dev e r i a . Talve z n ã o fos s e en o r m e ou est u p e n d o , ma s
cert a m e n t e daria um a boa leit ur a , e go s t a r i a mu i t o de
publi c á -lo. Se o Sr. Bin g h a m pod e ped ir, eu ta m b é m
pos s o .
Wolf e de u um gru n h i d o : — Ne m pe n s a r nis s o , Sr.
Haft. É dif ícil ma n t e r a int e g r i d a d e co m o um det e t i v e
parti c u l a r; pre s e r v á -la dur a n t e as 10 0 mil palavr a s de um
livro seri a imp o s s ível para mi m , co m o o foi para tan t o s
outr o s . Nad a corr o m p e um ho m e m de mo d o t ã o prof u n d o
co m o es c r e v e r um livro; as te n t a çõ es inu m e r á veis s ã o de
es t ar r e c e r . N ã o ou s a r i a . . .
Fritz entr o u co m a ban d e j a . Pri m e i r o a cerv ej a para
Wolf e , de p o i s o co n h a q u e para Bin g h a m , a á gua para
Upt o n , e o sc o t c h co m á gua para mi m . Upt o n puxo u um a
caixa de p í lula s do bols o , tiro u um a e col o c o u - a na boc a ,
be b e n d o a á gua . Bin g h a m to m o u um gol e do co n h a q u e ,
par e c e u sur pr e s o , to m o u outr o gol e , ret e v e - o na boc a ,
fic o u at ô nit o, en g o l i u , dis s e :
— Pos s o ? — Leva n t o u - se, foi at é à m e s a de Wolf e
para olh ar o r ó tulo da garraf a . — Nu n c a ouvi falar nel e —
dis s e a Wolf e — e pe n s e i qu e con h e c i a con h a q u e . Incr ível,
servi- lo as s i m , a um es tr a n h o . Ond e o con s e g u i u , pel o
am o r de De u s ?
— De um ho m e m para qu e m fiz um servi ç o. Na
mi n h a cas a um co nvi d a d o é um con vi d a d o , seja ou n ã o
es tr a n h o . N ã o fa ç a ec o n o m i a ; te n h o qua s e tr ê s caixa s . —
Wolf e beb e u a cerv ej a , lam b e u os l á bio s e rec o s t o u - se.
— Com o já dis s e , se n h o r e s , apr e c i o ter e m se dad o ao
trab a l h o de vir aqui, e n ã o os det e r e i mai s do qu e o
ne c e s s á rio. Min h a clie n t e , a Sra. Vald o n , dis s e qu e deix a -
ria a m e u car g o expli c a r para qu e m e con t r a t o u , e ser e i o
mai s brev e pos s í vel. Entr e t a n t o , pri m e i r o qu e r o qu e en -
te n d a m que tud o qua n t o for dito aqui, pel o s se n h o r e s ou
por mi m , é con f i d e n c i a l . Con c o r d a m ?
Tod o s dis s e r a m qu e si m .
— Muit o be m . Me u se g r e d o é profi s s i o n a l e ape n a s
um a obri g a çã o co m min h a cli e n t e ; a dos se n h o r e s é pe s -
soal, um favor a um a ami g a . A sit u a çã o é est a: no m ê s
pas s a d o , a Sra. Valdo n rec e b e u tr ê s carta s an ô ni m a s qu e
es t ã o no’ m e u cofr e . N ã o vou mo s t r á -las, ne m diz e r o se u
con t e ú do, ma s faz e m cert a s acu s a çõ es ao se u mari d o , já
fale c i d o , Ric h a r d Vald o n , e faz e m exi g ê ncia s es p e c í fic a s .
A letr a, a tint a , es t á disf ar ç ada, ma s n ã o h á d ú vida sobr e
o sex o de que m as es c r e v e u . O con t e ú do das cart a s tor n a
clar o qu e fora m es c ri t a s por u m a mul h e r . Me u co m p r o -
mi s s o co m a Sra. Valdo n é ide n t i f i c á -la, falar co m ela, e
ver sua s exi g ê ncia s .
Incli n o u - se para apa n h a r o cop o , to m o u um gol e de
cerv ej a e rec o s t o u - se de nov o.
— É um a te n t a t i v a de cha n t a g e m , ma s se as ac u s a -
çõ es for e m verd a d e i r a s a Sra. Vald o n est a r á incli n a d a a
ate n d e r à s exi g ê nci a s , co m res e r v a s . Qua n d o en c o n t r a r
qu e m as es c r e v e u , a pe s s o a n ão ser á de s m a s c a r a d a ,
acu s a da ou co m p e l i d a a de s i s t i r de se u pedi d o , a n ã o ser
qu e as ac u s a çõ es seja m fals a s . Pri m e i r o é pre c i s o
en c o n t r á -la e a í est á a dific u l d a d e . O arra nj o qu e fez para
qu e sati s fa ç am se u pedi d o é de m a s i a d o en g e n h o s o , nad a
t ã o si m p l e s co m o deixar um pac o t e de not a s e m alg u m
lug a r . Vou su g e r i r a nat ur e z a do arra nj o. Os se n h o r e s s ã o
tod o s ho m e n s de ne g ó cio s . Sr. Haft, se alg u é m lhe
dis s e s s e , ano n i m a m e n t e , sob am e a ç a de co n t a r tud o a
res p e i t o de um se g r e d o qu e de s e j a s s e pre s e r v a r , para
de p o s i t a r um a so m a de din h e i r o a cr é dit o de um a con t a ,
s ó ide n t i f i c a d a por um n ú m e r o , nu m ban c o na Su íç a? O
qu e faria?
— Me u De u s , n ã o sei — dis s e Haft.
Kru g dis s e : — Os ban c o s su íç os t ê m um a s re gr a s
en g r a ç ada s .
Wolf e con c o r d o u : — O arra nj o de qu e m es c r e v e u a
cart a ain d a é mai s h á bil. N ã o ape n a s n ã o h á risc o de
con t a t o ; n ã o h á pos s i b i l i d a d e de hav e r um a aproxi m a çã o.
Mas pre c i s a m o s en c o n t r á -la, e pe n s e i e m doi s mo d o s . Um
seri a mu i t o car o e talv e z leva s s e mui t o s m e s e s . O outr o
ne c e s s i t a r i a da coo p e r a çã o de ho m e n s qu e fora m ami g o s
ínti m o s ou as s o c i a d o s do Sr. Vald o n . Sel e c i o n a m o s
quatr o no m e s , de n t r e os qu e a Sra. Vald o n su g e r i u : os
se u s . Em no m e dela, pe ç o a cad a um dos se n h o r e s qu e
fa ç a um a list a dos no m e s de tod a s as mu l h e r e s co m as
quai s , pel o qu e saib a m , Ric h a r d Vald o n ma n t e v e co n t a t o
du rant e os me s e s de mar ç o, abril e mai o de 19 6 1 . O ano
pas s a d o . To d a s as mul h e r e s , m e s m o qu e o con t a t o te n h a
sid o brev e e n ã o obs t a n t e sua nat u r e z a . Pod e m m e for n e -
cer log o es s a list a? Dig a m o s , am a n h ã à noit e ?
Tr ê s falar a m ao me s m o te m p o , ma s a voz de bar í ton o
de Leo Bin g h a m abaf o u a dos outr o s :
— É um pe di d o dif ícil — dis s e el e. — Dick Valdo n
pas s e a v a mui t o .
— N ã o ape n a s is s o — dis s e Julia n Haft —, pre cis a m o s
sab e r co m o pro c e d e r . H á oito ou nov e mul h e res e mo ç as
no m e u es c r i t ó rio co m qu e m Dic k ma n t i n h a alg u m tip o
de con t a t o . O que vai faz er co m os no m e s qu e
for n e c e r m o s ?
— H á qua tr o no m e u es c r i t ó rio — dis s e Willi s Kru g.
— Olh e — res m u n g o u Man u e l Upt o n . — Vai ter qu e
no s diz e r quai s s ã o as acu s a çõ es.
Wolf e est a v a beb e n d o cerv eja . P ô s o cop o vazi o e m
cim a da m e s a . — Para a final i d a d e que as que r o — dis s e
ele —, as list a s dev e m incl u ir tod o mu n d o . Ser ã o us a d a s
co m dis c ri çã o. Nin g u é m ser á pert u r b a d o ; n ã o ofe n d e r e -
mo s nin g u é m; n ã o hav e r á boat o s ; n ã o de s p e r t a r e m o s
curi o s i d a d e . Pou q u íssi m a s pe s s o a s das list a s ser ã o abor -
dad a s . Pel a s indi c a çõ es na cart a retir e i dad o s qu e
limi t a m o â mbi t o das pos s i b i l i d a d e s . Ass e g u r o - lhe s qu e
n ã o ter ã o mo t iv o s para se arr e p e n d e r de ter e m feit o es s e
favor para a Sra. Vald o n , co m es t a ú nic a res s a l v a: se
de s c o b r i r m o s qu e que m es c r e v e u as cart a s é alg u m a
pe s s o a por qu e m t ê m es ti m a , é clar o qu e ela se se n t i r á
con t r a r i a d a e pos s i vel m e n t e frus tr a d a . Ess e ser á o ú nic o
ris c o qu e corr e m . Tom e mai s co n h a q u e , Sr. Bin g h a m .
Bin g h a m leva n t o u - se e apa n h o u a garraf a .
— Su b o r n o — dis s e , col o c a n d o con h a q u e no cop o .
Tom o u um gol e . — Mas que sub o r n o ! — De u um gra n d e
sorri s o .
— Quer o sab e r as ale g a çõ es — falo u Upt o n .
Wolf e aba n o u a cab e ç a: — Iss o violari a a gar a n t i a
qu e dei à mi n h a cli e n t e . N ã o dis c u t i r e i iss o .
— Ela é min h a cli e n t e ta m b é m — dis s e Kru g . — Fui
ag e n t e de Dick, e ag or a so u dela, já qu e os dire i t o s
aut or a i s lhe pert e n c e m . So u ta m b é m se u ami g o , e so u
con t r a qu e m ma n d a cart a s an ô ni m a s , n ã o imp o r t a qu e m
seja. Man d a r - lhe - ei a list a am a n h ã .
— Diab o s , est o u vicia d o — dis s e Leo Bin g h a m . Estav a
de p é , gira n d o o co n h a q u e no cop o . — Fui su b o r nad o . —
Virou- se para Wolf e . — Que tal um a prop o s ta? Se ela vir
de mi n h a list a, ga n h o um a garr af a de s t a s .
— N ã o, se n h o r . N ã o pos s o m e co m p r o m e t e r . Com o
um ge s t o de apr e c i a çã o, talv e z .
Julia n Haft re m o v e r a os ó cul o s de aro red o n d o e
brin c a v a co m as ha s t e s .
— As cart a s — per g u n t o u el e — fora m pos t a s no
corr e i o e m Nova Iorq u e ? Na cida d e ?
— Si m , se n h o r .
— Ent ã o es t á co m os env e l o p e s ?
— Si m , se n h o r .
— Pod e m o s vê -los? S ó os env e l o p e s ? O se n h o r dis se
qu e a letr a es t á disf ar ç ada, ma s é pos s í vel... um de n ó s
podi a ter um palpit e ao v ê -la.
Wolf e con c o r d o u : — Port a n t o , n ã o seri a de bo m
alvitr e mo s t r á -lo aos se n h o r e s . Um dos se n h o r e s podi a
real m e n t e ter um palpi t e sobr e a ide n t i d a d e de qu e m a
es c r e v e u , ma s n ã o diz er nad a , en t ã o tor n ar i a o probl e m a
mai s co m p l i c a d o para mi m .
— Quer o faz e r um a per g u n t a — dis s e Man u e l Upt o n .
— Ouvi diz e r qu e na cas a da Sra. Vald o n h á um beb ê e
um a enf e r m e i r a to m a n d o co n t a . Nad a sei a res peit o , ma s
a pe s s o a qu e m e co n t o u n ã o é fofo q u e i r a . H á alg u m a
liga çã o en tr e o beb ê e as cart a s ?
Wolf e o co n t e m p l a v a co m a te s t a fran z i d a:
— Um be b ê ? O be b ê da Sra. Vald o n ?
— N ã o dis s e qu e o be b ê era del a. Dis s e qu e h á um
be b ê na cas a dela.
— É mes m o? Vou per g u n t a r - lhe , Sr. Upt o n . Se
hou v e r alg u m a liga çã o co m as carta s , ela dev e est a r a
par. Por falar nis s o , dis s e - lhe qu e n ã o m e n c i o n a s s e as
cart a s para nin g u é m. Se m exc e çã o. Com o os se n h o r e s
sab e m , n ã o as me n c i o n o u aos se n h o r e s . O as s u n t o es t á
e m min h a s m ã os.
— Est á be m , to m e con t a dis s o — dis s e Upt o n le -
vant a n d o - se. Se u pe s o era cer c a de m e t a d e do de Wolf e ,
ma s pel o esf o r ç o qu e tev e de faz e r para se leva n t a r par e -
cia justa m e n t e o opo s t o . — Do mo d o co m o o se n h o r es t á
te n t a n d o no s ma n o b r a r , ac h o que vai es tr a g a r tud o . N ã o
devo nad a a Lucy Vald o n . Se qui s e r qu e lhe fa ç a um favor,
ela m e s m a pod e me pe dir .
Ele to m o u a dir e çã o da port a , e m p u r r a n d o o cot o velo
de Leo Bin g h a m ao pas s a r , e a outr a m ã o de Bin g h a m
apar e c e u de rep e n t e e de u- lhe um e m p u r r ã o. Com o um
con vi d a d o é um con vi d a d o , e porq u e duvid av a qu e ele
tive s s e en e r g i a para fe c h a r a port a , leva n t e i - me , ultr a -
pas s e i - o no corr e d o r e leve i- o à porta . Qua n d o volt e i ,
Julia n Haft es t av a fala n d o :
— ...m a s ant e s de faz e r iss o qu e r o conv e r s a r co m a
Sra. Vald o n . N ã o con c o r d o co m o Sr. Upt o n , n ã o dig o que
es t e j a agi n d o mal, ma s o qu e ped e é um pou c o . . . h ã ... fora
do co m u m . — Colo c o u outr a vez os ó cul o s e virou - se: — É
clar o qu e co n c o r d o co m voc ê , Willi s , sobr e pe s s o a s qu e
ma n d a m carta s an ô ni m a s . Sup o n h o qu e pe n sa qu e es t o u
se n d o cau t e l o s o de m a i s .
— Iss o é privil é gio se u — res p o n d e u Krug .
— Ao diab o co m o privil é gio — dis s e Bin g h a m . De u
se u gra n d e sorri s o para Haft. — Eu n ã o diria cau t e los o
de m a i s , eu diria cuid a d o s o . Voc ê já nas c e u co m me d o ,
Julia n .
É pre c i s o dar- se de s c o n t o . Com p r a d o r e s e ven d e d o -
res. Para um ag e n t e lite r á rio um edit o r é um cli e n t e , ma s
para um prod u t o r de tel e vi s ã o é ape n a s mai s um
ven d e d o r .

10

Ten h o à min h a fre n t e um a c ó pia das de s p e s a s do cas o , no


arqu iv o , na letr a V de Vald o n . O se g u n d o est á gio, para
trab a l h a r m o s no s no m e s das list a s for n e c i d a s por Willi s
Kru g, Leo Bin g h a m , Julia n Haft e a cli e n t e (nu n c a
rec e b e m o s a list a de Man u e l Upt o n ) , dur o u 26 dias , de 10
de junh o a 7 de julh o , e cu s t o u à cli e n t e 8. 6 7 4 . 3 0 d ó lare s ,
se m incl u ir qual q u e r part e do m e u sal á rio, qu e é pa g o
pel o s ho n o r á rios e nu n c a é parc e l a d o .
A list a de Lucy tin h a 47 no m e s , a de Haft, 81, a de
Bin g h a m , 10 6 e a de Kru g , 55. Um a das filh a s de Upt o n ,
cas a d a , est a v a na list a de Haft e na de Bin g h a m , ma s n ã o
na de Kru g. A filh a cas a d a de Haft est a v a na list a de Lucy
ma s e m ne n h u m a outr a . Um a cert a ami g a de Bin g ha m
n ã o es t av a na list a de mai s nin g u é m; Orrie de s c o briu o
no m e dela no m e i o da pe s q u i s a . É clar o qu e havia m ui t a s
dupli c a t a s nas qua tr o list a s , ma s havi a 14 8 no m e s
difer e n t e s , a se g u i r:

Se çã o N ú mero Esta d o Civil


A 57 Solt e i r a
B 52 Casa d a , vive n d o co m o
mari d o
C 18 Divor c i a d a
D 11 Vi ú va
E 10 Cas a d a , se p a r a d a

Outr a est a t í sti c a , daq u e l a s e m cad a se çã o qu e tive -


ram filh o s entr e 1. ° de dez e m b r o e 28 de jan e ir o de 19 6 2 :

Se çã o N ú mero

A 1
B 2
C 0
D 1
E 0

A da Se çã o A (sol t e i r a ) qu e tiver a um beb ê trab al h a -


va no es c r i t ó rio de Kru g, ma s tod o s sabi a m a res p e i t o da
cria n ç a e es t a fora dada le g a l m e n t e (ou ven d i d a ) a um
servi ç o de ado çã o. Sau l levo u qua s e dua s se m a n a s para se
certi fi c a r de qu e o beb ê não tin h a ido ter m i n a r no
ves t í bul o da Sra. Vald o n . A da Se çã o D (vi ú va) talv e z fos s e
um probl e m a para se u s ami g o s e ini m i g o s , ma s n ã o para
n ó s. O mari d o morr e r a doi s ano s ant e s de o be b ê nas c e r ,
ma s ficar a co m o beb ê e n ã o se imp o r t a v a co m qu e m
so u b e s s e . Eu o vi.
Os doi s be b ê s da Se çã o B (ca s a d a , vive n d o co m o
mari d o ) era m , na reali d a d e , tr ê s; um del e s era g ê m e o .
Estav a m tod o s mor a n d o co m os pai s. Fred viu os g ê m e o s
e Orrie viu o outr o .
Al é m das m ã es, dua s mo ç as na Se çã o A, dua s mu -
lhe r e s na B, dua s na C e um a na D tin h a m est a d o lon g e
de cas a e/o u trab al h o dura n t e um a part e ou tod o o
per íodo. Orrie tev e de to m a r u m avi ã o para ir à Fran ç a,
na Rivier a , para con f ir m a r um del e s , e Fre d tev e de voar
at é o Arizo n a para es c l a r e c e r outr o cas o .
Nu n c a ho uv e um a op e r a çã o mai s be m - feit a de s d e
qu e voc ê s sab e m Que m es p a l h o u a po e ir a no ch ã o do
te m p l o . Abs ol u t a m e n t e se m falh a s . Orrie foi leva d o a um
pr é dio de apar t a m e n t o s cujo su p e r i n t e n d e n t e era um
port e i r o , ma s foi culp a sua, e Fred foi pos t o para fora das
coxia s de um tea tr o , ma s iss o faz part e de um dia de
trab a l h o . Foi um trab a l h o perf e i t o , co m o exe m p l o de
ó tim a bis bi l h o t i c e . E qua n d o Saul tel e f o n o u à s tr ê s hor a s
e trin t a min u t o s no s á bad o à tard e , dia 7 de junh o , para
diz e r qu e unir a o elo qu e falt av a na ado çã o e que vira
real me n t e o beb ê , es t á vam o s no m e s m o pon t o de on d e
par t í ram o s no dia 12 de jun h o , h á 26 dia s .
Entr e t a n t o , havi a um a dif er e n ç a. Sur g i r a m alg u m a s
novid a d e s , ma s n ã o fom o s n ó s qu e as de s c o b r i m o s . Um a,
a me n o r dela s , era qu e eu n ã o era mai s a ú lti m a pe s s o a a
ter vist o Elle n Tenz e r viva. Naq u e l a sext a - feira à tard e
fora à cas a de um a cer t a Sra. Jam e s R. N e s b i t t , na Rua 68
Les t e , um a ex- pac i e n t e dos te m p o s e m qu e prati c a v a en -
fer m a g e m . A Sra. N e s b i t t s ó co n t a r a o fato de p o i s de dua s
se m a n a s , pois n ã o qu e r i a ter o no m e env o lvi d o nu m
as s a s s i n a t o , ma s afin a l de c i d ir a qu e dev e r i a co n tar.
Talve z o pro m o t o r p ú blic o lhe pro m e t e s s e qu e se u no m e
n ã o apar e c e r i a , ma s alg u m jornal i s t a , de alg u ma for m a ,
con s e g u i r a o se u no m e , e viva a lib er d a d e de impr e n s a !
Real m e n t e , a Sra. Ne s b i t t n ã o ajud o u gra n d e coi s a . Elle n
Ten z e r dis s e r a ape n a s qu e pre c i s a v a de co n sel h o de um
advo g a d o , e pedir a à Sra Ne s b i t t qu e lhe de s s e o no m e de
alg u m e m que pud e s s e conf i a r . Iss o fora feit o , e mar c a r a
hor a nu m advo g a d o . Mas Elle n Tenz e r n ã o co m p a r e c e r a
ao en c o n t r o . N ã o dis s e r a à Sra. Ne s b i t t por qu e pre c i s a v a
de um advo g a d o . S ó para no s certif i c a r m o s , col o c á ram o s
o se u no m e na list a de Saul, ma s h á dez ano s n ã o tin h a
be b ê e su a filh a de 20 an o s nun c a tiver a um filh o .
O outr o ac o n t e c i m e n t o , o prin c i p a l , foi qu e a cli e n t e
qua s e de s i s t i r a . Tele f o n a r a na se g u n d a - feira, dia 2 de
julh o , à s qua tr o hor a s e qui n z e mi n u t o s . É clar o qu e se m -
pre es tiv e r a e m co n t a t o co m ela: qua n d o se es t á ga s t a n d o
mai s de 30 0 d ó lar e s por dia do din h e i r o de um clie n t e , e
n ã o con s e g u i n d o nad a , o m í ni m o qu e se pod e faz er é lhe
tel e f o n a r , ou pas s a r na sua cas a e diz e r: “al ô , o dia est á
boni t o , ma s o int e r i o r pre c i s a de ch uv a . ” Um a vez ela
es t av a dan d o a ma m a d e i r a ao beb ê , de outr a vez eu
alm o ç ara co m ela, jantar a dua s vez e s , en s i n a r a - a a jogar
pin o c l e e, no total , ouvir a- a toc ar pian o dura n t e sei s
hor a s . Tam b é m dan çá ram o s um pou c o , na sala de jant ar ,
ao so m de dis c o s , nu m lug ar se m tap e t e . Dan ç ava mu i t o
be m , e me r e c i a um a noit e no Fla m i n g o ou no Gillo ti, ma s
iss o teria de es p e r a r , poi s t í nha m o s que ma n t e r o
se g r e d o . Se voc ê me per g u n t a s s e teria tant o trab al h o
para ma n t e r um a clie n t e sati s f e i t a , se ela fos s e ves g a ou
de tor n o z e l o s gro s s o s ? , a res p o s t a seri a n ã o.
Ao at e n d e r ao tel e f o n e à s qua tr o hor a s e qui n z e mi -
nut o s no dia 2 de julh o e co m e ç ar a res p o n d e r co m o
habi t u a l: — Escrit ó rio de Ner o . . . — ela int e rr o m p e u :
— Archi e , pod e vir aqu i? Agor a m e s m o ?
— É clar o qu e pos s o . Por qu ê ?
— Um ho m e m es t e v e aqui, um poli c i a l . Acab o u de
sair. Per g u n t o u - m e se eu con t r a t a r a Ner o Wolf e e per -
gu n t o u a res p e i t o do beb ê . Voc ê pod e vir?
— O qu e é qu e voc ê res p o n d e u ?
— Nad a , é l ó gic o . Dis s e qu e n ã o tin h a dir ei t o de
per g u n t a r sobr e m e u s as s u n t o s parti c u l a r e s . Foi iss o qu e
voc ê me dis s e para res p o n d e r .
— Cert o . Le m b r a- se do no m e ?
— Ele m e dis s e o no m e , ma s es t av a t ã o... n ã o sei.
— Era Cra m e r ?
— Cram e r . . . n ã o.
— Row c l if f?
— N ã o.
—- St e b b i n s ?
— Par e c e qu e é es s e , St e b b i n s . É, ac h o qu e é .
— Gran d e , fort e co m um nariz larg o e um a boc a
gra n d e , faz e n d o for ç a para ser deli c a d o ?
— É.
— Est á be m . É m e u poli c i a l favorit o . Fiqu e cal m a .
Toqu e pian o . Estar e i a í de n t r o de 20 mi n u t o s , já qu e n ã o
pre c i s o me pre o c u p a r e m ser se g u i d o .
— Voc ê ve m para c á ?
— Ló gic o .
De s l i g u e i , cha m e i a es t u f a no int e rf o n e e dep o i s de
es p e r a r um pou c o a voz de N er o Wolf e dis s e :
— Si m?
— A Sra. Vald o n tel e f o n o u . Purl e y St e b b i n s es t e v e l á
e lhe fez per g u n t a s sobr e voc ê e o be b ê . Ela n ã o co n t o u
nad a. Quer qu e eu v á l á e já es t o u de sa í da. Algu ma
ins tr u çã o?
— N ã o. Que am o l a çã o!
— Si m , se n h o r . Trag o - a para c á ?
— S ó se for abs o l u t a m e n t e ne c e s s á rio. — De s li g o u .
Fui à cozi n h a diz e r a Fritz qu e o tel e f o n e e a port a
da rua era m de sua res p o n s a b i l i d a d e at é qu e eu volt a s s e ,
e sa í . Ao de s c e r os de gr a u s at é a cal ç ada e virar na dir e -
çã o les t e , aut o m a t i c a m e n t e olh e i e m volta, ma s na reali -
dad e n ã o me imp o r t a v a o fato de alg u é m m e se g u i r ou
n ã o. Era qua s e cert o qu e ho uv e s s e alg u é m de vigil â nci a
na resi d ê ncia dos Vald o n .
Fui a p é . Os cin c o mi n u t o s ec o n o m i z a d o s nu m t á xi
n ã o iria m adia n t a r nad a, e mi n h a s per n a s go s t a m de
se n t i r qu e es t ã o ajud a n d o . Ao virar na Rua 11 e me
aproxi m a r da cas a , olh e i e m volta outr a vez, ma s de nov o
n ã o fazia dife r e n ç a. O as s u n t o pular a da frigi d e i r a para o
fog o , e ag or a era evit ar sair qu e i m a d o . Subi os tr ê s
de gr a u s at é o ves t í bul o, ma s não pre c i s e i toc ar a
ca m p a i n h a , pois a port a es t a v a ab er t a e Lucy l á est a v a .
N ã o dis s e um a palavr a . Ao cruz a r a sol e i r a , fec h o u a
porta , virou- se e to m o u a dir e çã o da es c a d a . Eu a se g u i .
Apar e n t e m e n t e , es q u e c e r a - se do pro gr e s s o qu e hav íam o s
feit o e m nos s o rela c i o n a m e n t o . No and ar de ci m a entr o u
no sal ã o, fe ch o u a port a de p o i s qu e entr e i , virou- se para
mi m e dis s e :
— Ele m e per g u n t o u se eu con h e c i a Elle n Tenz e r .
— Ló gic o . É nat ur a l .
— Voc ê fic a a í de p é e diz qu e é nat u r a l! Jamai s
aco n t e c e r i a . . . se n ã o tive s s e pro c u r a d o Ner o Wolf e . . . voc ê
sab e dis s o , Archi e !
— Cha m e - m e de Sr. Good w i n .
Se u s olh o s , gra n d e s e cin z e n t o s , arre g a l a r a m - se.
— O cas o é qu e — dis s e eu — mis t u r a r rela çõ es
pe s s o a i s e de ne g ó cio s é rui m para n ó s doi s . Se qui s e r
fic ar de m ã os dad a s , ó tim o . Se qui s e r ser um a cli e n t e
ofe n d i d a , est á be m . Mas n ã o é just o que um a cli e n te
ofe n d i d a m e ch a m e de Archi e .
— N ã o es t o u ofe n d i d a !
— Est á be m , ranzi n z a .
— N ã o so u ranzi n z a . Voc ê sab e qu e é verd a d e , qu e se
eu n ã o tive s s e pro c u r a d o Ner o Wolf e e voc ê n ã o tive s se
de s c o b e r t o aqu e l a mul h e r , n ã o a teria m as s a s s i n a d o .
De t e s t o iss o ! E ag or a sab e m sobr e Ner o Wolf e e o beb ê .
Vou con t a r tud o . Foi por iss o que pe di qu e vie s s e : para
qu e m e dis s e s s e aon d e ir e a qu e m co n t a r . Ao pro m o t o r
p ú blic o ? E qu e ri a lhe ped ir... qu e r ir co m i g o ?
— N ã o. Pos s o usar se u tel e f o n e ?
— Ora, pod e , se... Para qu ê ?
— Para diz e r ao Sr. Wolf e qu e es t á de s p e d i d o , para
qu e pos s a . . .
— N ã o dis s e qu e es t á de s p e d i d o !
Levan t e i as sobr a n c e l h a s .
— A se n h o r a es t á co n f u s a , Sra. Vald o n . Já dis c u t i mo s
a es s e res p e i t o diver s a s vez e s , o qu e aco n t e c e r i a se
vie s s e m at é aqui e lhe fala s s e m . O qu e co m b i n a m o s é qu e
ag ü en t a r í am o s at é qu e a sit u a çã o fica s s e dif ícil de mai s , e
qu e voc ê no s deix ar i a de c i d i r o se e qua n d o . Queri a qu e
lhe expli c a s s e as re gr a s sobr e supr e s s ã o de prova s e
obs t r u çã o da justi ç a etc . e expli q u e i . Foi be m clar o qu e ,
se e qua n d o o cas o fos s e aba n d o n a d o , o Sr. Wolf e é qu e m
de c i d i r i a . Agor a voc ê de c i d e aba n d o n a r tud o , port a n t o ,
vou lh e tel e f o n a r e dire i que vá em fre n t e . Qua n t o a
de s p e d i - lo, vam o s cha m a r de outr a for m a , se pref e r e . . .
dig a qu e o es t á lib er a n d o de sua s obri g a çõ es. Soa me l h o r .
Usar e i o tel e f o n e l á de baixo .
Virei- m e para sair. Pre n d e u meu bra ç o co m os
de d o s :
— Archi e .
Volt e i- m e: — Ou ç a — fale i. — N ã o es t o u repr e s e n -
tan d o . Mas n ã o pe n s e qu e vou me abaix ar , tirar se u s
sap a t o s e esfr e g a r se u s p é s ge l a d o s de m e d o .
Pas s o u os bra ç os e m volta do m e u pe s c o ç o e agar -
rou- m e .
Por iss o qui n z e min u t o s de p o i s , ou talv e z vint e mi -
nut o s , es t á vam o s se n t a d o s no sof á co m mar ti n i s e ela
es t av a fala n d o :
— Voc ê sab e , é toli c e aquil o qu e voc ê dizia sobr e
mi s t u r a r rela çõ es pe s s o a i s co m rela çõ es de ne g ó cio. H á
um m ê s qu e a ge n t e faz iss o , e aind a est a m o s aqui. Fui eu
qu e m co m e ç ou, da pri m e i r a vez qu e es t e v e aqui, di zen d o -
lhe qu e n ã o est a v a te n t a n d o flert a r co m voc ê . Por qu e
n ã o riu de mi m ?
— Mas foi o qu e fiz. Eu lh e dis s e qu e as ostr a s
flert a m e voc ê leva n t o u - se e foi e m b o r a .
Ela sorri u: — Pre c i s o ad m i t i r um a coi s a .
— Ótim o . Cada um a fala de um a vez.
— Qua n d o eu dis s e aquil o , ho n e s t a m e n t e pe n s a v a
qu e n ã o est a v a te n t a n d o flert a r co m voc ê . Com o é qu e
con s e g u e su p o r t a r um a mul h e r as s i m t ã o burra?
— N ã o con s i g o e ne m con s e g u i r i a .
— O qu ê ? — Franz i u a te s t a . — Oh, mui t o obri gad a ,
ma s sou burra m e s m a . Enq u a n t o voc ê falava co m Ner o
Wolf e , é clar o qu e eu dev e r i a pe n s a r sobr e o qu e iria
aco n t e c e r , se dev e r i a pe dir- lhe para n ã o faz er iss o , o que
eu iria faz er a res p e i t o de tud o , ma s o qu e real me n t e
es t av a me pre o c u p a n d o era: nu n c a mai s me beijar á .
Se m p r e so u b e qu e n ão era mu i t o int e l i g e n t e . Por
exe m p l o , qua n d o voc ê me per g u n t o u ag or a se aqu e l e
ho m e m dei xara per c e b e r alg u m a pist a qu e no s dis s e s s e
co m o de s c o brira que eu co n tr a t a r a N er o Wolf e , eu teria
con s e g u i d o alg u m a infor m a çã o da part e del e , se fos s e
int e l i g e n t e , n ã o?
— N ã o. De Purl e y St e b b i n s , n ã o. Às vez e s se atra -
palh a sobr e o qu e vai diz e r e m se g u i d a , ma s se m p r e sab e
o qu e n ã o diz e r . — Tom e i um gol e de bebi d a e con t i n u e i :
— Agor a qu e es t a m o s ac er t a d o s , vam o s es c l a r e c e r tud o .
Talve z eu ten h a tid o um a fals a impr e s s ã o. Voc ê aind a é
no s s a clie n t e ?
— Si m .
— Te m cert e z a abs o l u t a de qu e qu e r con t i n u a r at é o
fim?
— Aper t e aqui.
Est e n d e u a m ã o e ap er t e i - a. Foi as s i m qu e no s s o
rela c i o n a m e n t o cordi a l co m e ç ou, há tr ê s se m a n a s ,
qua n d o pas s a r a um a lon g a noit e co m ela, faz e n d o a list a
e es c o lhe n d o os qua tr o ho m e n s qu e ir í am o s co nvi d a r
para ajud ar . Qua n d o um ape r t o de m ão pas s a um
se g u n d o qu e seja al é m da rotin a , é um te s t e . Se amb o s
de c i d e m parar ao m e s m o te m p o , tud o be m . Mas se ela
ter m i n a r ant e s de voc ê , ou vic e- vers a , cuid a d o . Voc ê s n ã o
co m bin a m . De s d e a pri m e i r a vez n ó s fo m o s si m u l t â ne o s .
E de s t a vez ta m b é m fom o s .
— Ok — dis s e eu. — Esta m o s e m gra n d e s aper t o s .
Mas n ã o pre c i s o diz e r , voc ê sab e t ã o be m qua n t o eu. Sua
part e pod e ser dif í cil ma s é si m p l e s . Voc ê ape n a s n ã o diz
nad a, e n ã o res p o n d e a ne n h u m a per g u n t a , qual q u e r qu e
seja, n ã o imp o r t a que m a fa ç a. Cert o?
— Cert o .
— Se lhe con vi d a r e m a ir ao es c ri t ó rio do pro m o t o r
p ú blic o , rec u s e . Se St e b b i n s ou mai s alg u é m vier aqui,
rec e b a - o ou n ã o, co m o pref e r i r, ma s n ã o lhe dig a nad a, e
ne m te n t e tirar alg u m a coi s a del e . Com o de s c o b r i r a m
sobr e a co n t r a t a çã o de Ner o Wolf e e sobr e o beb ê n ã o im -
porta . Me u palpit e e de qu e foi atrav é s de Man u e l Upt o n ,
ma s n ã o daria um n íqu e l para sab e r se est o u cer t o . Se foi
Upt o n , alg u m a s das per g u n t a s qu e n ã o vai re s p o n d e r se -
rã o sobr e cart a s an ô ni m a s . Pod e r ã o ser as part e s mai s
dif í cei s para o Sr. Wolf e e para mi m , ma s sab íam o s dis s o .
Ele con t o u para os quatr o ho m e n s qu e as cart a s es t av a m
no se u cofr e . Se a Cort e der um a ord e m para qu e as
apr e s e n t e , e ele dis s e r qu e nu n c a exi s t ir a m , pod e m o s ser
acu s a d o s de de s t r u i r prova s e, o qu e é pior, de es c o n d ê -
las. Iss o ser á mui t o en g r a ç ado e pre c i s o m e le m b r a r de
rir.
— Archi e .
— Si m?
— H á sei s se m a n a s eu ap e n a s exi s t i a . N ã o havia beb ê
lá e m cim a , nu n c a o vira, ne m so n h a v a qu e pod e r i a ser...
as s i m . Qua n d o dig o qu e det e s t o tud o , voc ê en te n d e , n ã o?
— Ló gic o que ent e n d o . — Dei um a olh a d a no re l ó gio,
ter m i n e i meu mar ti n i , col o q u e i o cop o na m e s a e me
leva n t e i . — É me l h o r ir e m b o r a .
— Por qu e n ã o fica para o jant ar? Pre c i s a ir m e s m o ?
— N ã o ou s o ficar. S ã o cin c o hora s e trint a mi n u t o s .
Apos t o o me s m o din h e i r o qu e Ste b b i n s ou o ins p e t o r
Cra m e r vã o apar e c e r à s sei s hor a s ou log o ap ó s, e pre c i s o
es t ar l á .
Enc o l h e u os om b r o s , de p o i s relax o u - os, e leva n t o u -
se do sof á :
— E tud o qu e ten h o a faz e r é n ã o diz e r nad a . — Fico u
co m a cab e ç a leva n t a d a . — Ent ã o volt e mai s tard e e m e
con t e . Rela çõ es co m e r c i a i s .
N ã o sei se foi o qu e ela dis s e ou a for m a co m o o
dis s e , ou alg u m a coi s a no s se u s olh o s . Fos s e o qu e fos s e ,
sorri e dep o i s dei um a ris a d a , e a í ela riu ta m b é m. Meia
hor a ant e s n ã o se pod e r i a sup o r qu e log o est a r íam o s
rind o junt o s . É ó bvio qu e era um bo m mo d o de ter m i n a r
um a co nv e r s a , por iss o virei- m e e sa í .
Faltav a m doi s mi n u t o s para as sei s hor a s , qua n d o
us e i min h a chav e para abrir a port a da velh a cas a de
tijolo . Fui à cozi n h a diz e r a Fritz qu e já volt ar a e fui para
o es c r i t ó rio. Me s m o as pe s s o a s qu e s ã o es p e r t a s faz e m
um a por çã o de per g u n t a s de s n e c e s s á rias; por exe m plo:
per g u n t e i a Fritz se ho uv e r a alg u m tel e f o n e m a . Em
pri m e i r o lug a r , teri a m e dito se m pre c i s a r lh e per g u n t a r ,
e, e m se g u n d o lug ar , Cra m e r ou St e b b i n s rara m e n t e tel e -
fon a m . Vê m dire t o , e qua s e se m p r e à s onz e hor a s da
ma n h ã , ou cer c a de dua s hora s e trint a min u t o s de p o i s do
alm o ç o, ou à s sei s hor a s da tard e , poi s con h e c e m o
hor á rio de Wolf e . Ao entr ar no es c r i t ó rio ouvi o ru ído do
ele v a d o r de s c e n d o .
Wolf e en tr o u . Em ger al vai para sua es c r iv a n i n h a
ant e s de per g u n t a r alg u m a coi s a , ou de faz e r a per g u n t a
co m os olh o s , ma s daq u e l a vez paro u ant e s de l á ch e g a r e
res m u n g o u :
— E ent ã o?
— Tud o be m — res p o n d i . — O qu e se pod e r i a es p e r a r .
Esp e r a r tra m b o l h ã o é um a coi s a , rec e b ê -lo é outr a be m
difer e n t e . Ela es t av a um pou c o sobr e s s a l t a d a . Queri a um a
gara n t i a de que voc ê pod e do m i n a r a situ a çã o, e lh e dei
es s a gar a n t i a . Ela ent e n d e por qu e n ão dev e faz er
ne n h u m a exc e çã o ao n ã o res p o n d e r à s per g u n t a s . Purl e y
lhe per g u n t o u se co n h e c i a Elle n Tenz e r . Pre s u m o qu e
ma n t e r e m o s a m e s m a posi çã o qu e ant e s .
— Si m .
Foi at é a est a n t e e fic o u olh a n d o os t í tul o s . H á mui t o
te m p o qu e deixar a de ficar nerv o s o qua n d o se u s olh o s se
fiava m nas dua s prat e l e i r a s sup e r i o r e s . Se de c i dis s e
apa n h a r um dos livro s fora do alc a n c e da m ã o, apa n h a r i a
a es c a d a , subiri a o n ú me r o de de gr a u s ne c e s s á rios, e
de s c e r i a se m ne m bala n ç ar, qua n t o mai s tro pe ç ar. De s t a
vez ne n h u m t ítulo, no alto ou embaixo, ch a m o u su a
ate n çã o e foi na dire çã o do glo b o e co m e ç ou a gir á -lo
deva g a r . Talve z es tiv e s s e pro c u r a n d o um lug ar ond e a
m ã e de um beb ê aba n d o n a d o pud e s s e es c o n d e r - se, ou
talv e z pro c u r a n d o aon d e pud e s s e ir qua n d o tive s s e de
fu gir da cida d e .
At é a hor a do jant ar n ã o havia apar e c i d o nin g u é m. O
tel e f o n e toc o u dua s vez e s , ma s nad a sobr e ne g ó cio s
ofic i a i s . Um tel e f o n e m a foi de Saul, diz e n d o qu e mai s
doi s no m e s tin h a m sid o eli m i n a d o s , e o outr o foi de Orrie .
Elim i n a r a mai s um e s ó sobr av a m dois . Fred est a v a no
Arizo n a . Já t ính a m o s qua s e ch e g a d o ao fim da linh a .
Na m e s a , ap ó s Wolf e ter ter m i n a d o se u s mor a n g o s à
Ro m a n o f f , us a d o o gu ar d a n a p o e empurrado a cad e i r a
para tr á s, leva n t e i - me e dis s e :
— N ã o vou to m a r caf é co m voc ê . Ele s nu n c a vê m
de p o i s do jant ar, a n ã o ser qu e seja urg e n t e , e te n h o um a
es p é cie de en c o n t r o .
Re s m u n g o u : — Pos s o lhe falar, se pre c i s a r ?
— Claro. Na cas a da Sra. Valdo n . Est á no cart ã o.
Olh o u para mi m: — É alg u m a tolic e ? Voc ê dis s e que
es t av a sobr e s s a l t a d a , ma s qu e voc ê lhe de u fir m e z a .
Agor a est á e m d ú vida?
— N ã o, se n h o r . Ela ag or a te m cert e z a . Mas pod e ter
me d o de qu e o se n h o r caia fora. Pe di u qu e fos s e falar
co m ela dep o i s de ter lh e falad o .
— Bob a g e m .
— Si m , ma s ela n ã o o con h e c e t ã o be m qua n t o eu.
Voc ê ta m b é m n ã o a co n h e c e t ã o be m co m o eu.
Deix e i o gu ar d a n a p o na m e s a e parti.
11

Cra m e r veio à s 11 hor a s e qui n z e min u t o s da ma n h ã , na


ter ç a- feira, dia 3 de julh o . Qua n d o a ca m p a i n h a toc o u , eu
es t av a ao tel e f o n e , trat a n d o de um as s u n t o pe s s o a l . Em
mai o ac e i t a r a um co nvi t e para pas s a r um fim de se m a n a
de cin c o dias , para ter m i n a r no dia 4 de julh o , na cas a de
um ami g o e m We s t c h e s t e r . A mar a t o n a e m bu s c a da m ã e
me for ç ara a can c e l a r o co nvi t e , e o tel e fon e m a era do
me u ami g o , para diz e r que se eu fos s e para l á de carr o,
no dia 4 de julh o , en c o n t r a r i a um a caixa de fog o s de
artif ício e um can h ã o de brinq u e d o à min h a es p e r a .
Qua n d o a ca m p a i n h a toc o u , dis s e :
— Voc ê sab e qu e eu go s t a r i a de ir, ma s um ins p e t o r
de pol ícia, talv e z um sar g e n t o , est á l á fora ag or a , es p e -
rand o para entr ar . Talve z eu pas s e a noit e na cad e i a . V ê -
lo- ei no trib u n a l .
Ao de s l i g a r , a ca m p a i n h a toc o u outr a vez. Fui at é o
corr e d o r para dar um a es p i a d a atrav é s do vidro qu e s ó
per m i t e visibili d a d e de de n t r o para fora e qua n d o dis s e a
Wolf e qu e era Cram e r , ape r t o u os l á bio s . Fui abrir a port a
e dis s e :
— Com o vai? O Sr. Wolf e est á um pou c o aborr e cid o ,
poi s o es p e r a v a ont e m .
Crei o qu e n ã o ouvi u nad a, pois já dera as cos t a s e
en c a m i n h a v a - se para o es c r i t ó rio. Eu o se g u i . Cra m e r
tiro u o velh o cha p é u de feltr o qu e us a no inver n o e no
ver ã o, co m sol ou ch uv a , se n t o u - se na poltr o n a ver m e l h a ,
se m pre s s a , p ô s o ch a p é u na m e s i n h a ao lad o e olh o u
para Wolf e . Wolf e en c a r o u - o de volt a. Ficar a m as s i m un s
cin c o se g u n d o s , s ó olh a n d o . N ã o era um te s t e para ver
qu e m ag ü ent av a mai s; ne n h u m dos dois tin h a id é ia de
qu e su s t e n t a r i a o olh ar mai s do qu e o outr o , est a v a m
ape n a s se pre p a r a n d o .
Cra m e r falo u pri m e i r o :
— Já se pas s a r a m 23 dia s .
Est av a rou c o , o qu e era fora do co m u m . Em ger a l , s ó
de p o i s de dez mi n u t o s , ou mai s , co m Wolf e é qu e ficava
rou c o . Tam b é m o se u ros t o ver m e l h o est av a um pou c o
mai s aver m e l h a d o do qu e de co s t u m e , ma s podi a ser
devi d o ao cal or de julh o .
— Vint e e cin c o — dis s e Wolf e . — Elle n Ten z e r
morr e u na noit e de 8 de junh o .
— Vint e e tr ê s dias de s d e qu e estiv e aqui. — Cra me r
rec o s t o u - se na cad e i r a . — O qu e é qu e ho uv e ? N ã o sab e o
qu e faz e r , es t á se m sa ída?
— É iss o .
— Duvid o qu e n ã o saib a . Que m ou o qu e o est á
imp e d i n d o ?
Um can t o da boc a de Wolf e leva n t o u - se un s tr ê s
mil í me tr o s . — N ã o pod e r i a lh e res p o n d e r se m lhe diz e r o
qu e est o u proc u r a n d o .
— Sei qu e n ã o pod e r i a . Est o u ouvi n d o .
Wolf e aba n o u a cab e ç a:
— Sr. Cra m e r , est o u no m e s m o pon t o ond e est a v a h á
23 dia s . N ã o te n h o ne n h u m a infor m a çã o para lhe dar.
— É dif í cil de acr e d i t a r . Nu n c a vi o se n h o r mar c a r
pas s o dur a n t e tr ê s se m a n a s . Sab e qu e m mat o u Elle n
Ten z e r ?
— Ess a eu pos s o res p o n d e r : n ã o.
— Ach o que sab e . Te m alg u m a outr a clie n t e ag or a
al é m da Sra. Ric h a r d Vald o n ?
— Tam b é m pos s o re s p o n d e r a iss o: n ã o.
— Ent ã o ach o qu e sab e qu e m mat o u Elle n Tenz e r . E
ó bvio que h á um a liga çã o en tr e se u as s a s s i n a t o e para o
qu e qu e r que seja qu e a Sra. Vald o n o con t r a t o u . N ã o h á
ne c e s s i d a d e de expli c a r tud o: os bot õ es; Ann e Tenz e r ; o
ma c a c ã o; o beb ê qu e es t a v a ho s p e d a d o co m Elle n Tenz e r;
o be b ê na cas a da Sra. Vald o n; a ida de Good w i n para
Mah o p a c para ver Elle n Ten z e r; sua partid a s ú bita de p o i s
qu e falo u co m ele . O se n h o r ne g a qu e h á um a con e x ã o
dir e t a en tr e a visit a de Good w i n a Elle n Tenz e r e o
as s a s s i n a t o ?
— N ã o. Tam b é m n ã o afir m o . N ã o sei. O se n h o r
ta m b é m n ã o sab e .
— Tolic e . — Cram e r es t a v a mai s rou c o . — Pod e
junt ar os fat o s t ã o be m qua n t o eu. Se que r diz e r qu e
ne n h u m de n ó s pod e prov á -lo, es t á be m , ma s o se n h o r
pre t e n d e faz er iss o . N ã o sei para que a Sra. Vald o n o
con t r a t o u , ma s sei mui t o be m qu e pre t e n d e de s c o b r i r o
as s a s s i n o , con t a n t o qu e n ã o te n h a sid o ela. N ã o cre i o qu e
fos s e ela por q u e ac h o qu e o se n h o r sab e qu e m foi e, se
fos s e ela, já teria larg a d o es t e cas o . Pos s o lh e diz e r por
qu e pe n s o qu e sab e qu e m é o as s a s s i n o ?
— Por favor, dig a.
— Ten h o cer t e z a qu e go s t a r i a de sab e r . O se n h o r
ne g a iss o ?
— Com o hip ó te s e , pos s o con c o r d a r .
— Est á be m . Est á ga s t a n d o o din h e i r o da Sra. Val don
co m o se fos s e á gua . Panz e r , Durki n e Cath e r es t ã o
trab a l h a n d o nis s o h á tr ê s se m a n a s . Vê m aqui tod o s os
dia s , à s vez e s dua s vez e s ao dia. N ã o sei o qu e es t ã o
faz e n d o , ma s sei o qu e n ã o es t ã o faz e n d o , e Good w i n
ta m b é m. Est ã o ign o r a n d o tot al m e n t e Elle n Tenz e r .
Ne n h u m del e s foi a Mah o p a c , ne m foi ver a Sra. N e s b i t t ,
ne m Ann e Tenz e r , ne m verifi c o u a vida de Elle n Tenz e r ,
int e r r o g o u se u s ami g o s ou vizin h o s ou fez con t a t o co m
qual q u e r dos me u s ho m e n s . N ã o mo s t r a r a m o m íni m o
int e r e s s e nel a, incl u s i v e Good w i n . Mas voc ê go s t a r i a de
sab e r que m a mat o u . Port a n t o , a mi n h a co n c l u s ã o é qu e
voc ê já sab e .
Wolf e res m u n g o u : — Iss o é mui t o cap c i o s o , ma s
aba n d o n e es s e raci o c ínio. Dou- lhe mi n h a palavr a de qu e
n ã o te n h o a m e n o r id é ia de qu e m mat o u Elle n Tenz e r .
Cra m e r en c a r o u - o: — Sua palavr a?
— Si m , se n h o r .
Be m , iss o de c i d i a tud o . Por exp e r i ê ncia pr ó pria,
Cra m e r sabi a qu e Wolf e , qua n d o dava sua palavr a, falava
s é rio e n ã o proc u r a v a en g a n a r . Per g u n t o u :
— Ent ã o qu e diab o s Pan z e r , Durki n e Cath e r es t ã o
faz e n d o ? E Good w i n ?
Wolf e aba n o u a cab e ç a.
— N ã o, se n h o r . O se n h o r aca b o u de diz er qu e sab e o
qu e n ã o est ã o faz e n d o . N ã o es t ã o se intr o m e t e n d o em
se u s ne g ó cio s . N ã o es t ã o inve s t i g a n d o um ho m i c ídio.
Ne m o Sr. Good w i n . Ne m eu.
Cra m e r viro u os olh o s e m min h a dir e çã o: — Voc ê
es t á sob fian ç a.
Con c o r d e i , diz e n d o : — O se n h o r dev e sab e r dis s o .
— Fico u a noit e pas s a d a na cas a da Sra. Vald o n .
Levan t e i um a sobr a n c e l h a : — H á dua s coi s a s erra das
co m es s a de c l a r a çã o. Pri m e i r o , n ã o é verd a d e . Se gu n d o ,
me s m o qu e fos s e verd a d e , o qu e is s o teri a a ver co m o
ho m i c í dio?
— A qu e hor a s sai u .
— N ã o sa í . Aind a est o u l á .
Fez u m ge s t o co m a m ã o, viran d o a pal m a para ci m a:
— Olh e , Good w i n . Voc ê sab e qu e te n h o de dep e n der
de rela t ó rios . O ho m e m qu e vigia das oito à s dua s hor a s
dis s e qu e voc ê ch e g o u à s nov e hor a s e vint e e cin c o
mi n u t o s e n ã o sai u . O ho m e m das dua s à s oit o hor a s dis s e
qu e voc ê n ã o sai u. Quer o sab e r qual dos doi s n ã o o viu
sair. A qu e hor a s sai u ?
— Estav a ima g i n a n d o o qu e o tro ux e aqui — dis s e eu.
— Sabi a qu e n ã o podi a ser ho m i c ídio, pel o mo d o co m o
fala. Ent ã o voc ê es t á ch e c a n d o os rapa z e s . Ótim o . A Sra.
Vald o n e eu es t á vam o s um pou c o alto s à um a e quar e n t a
e cin c o , e res o lv e m o s dan ç ar na cal ç ada nu m a noit e de
ver ã o. Às dua s e qui n z e ela entr o u e vim e m b o r a . Por es s a
raz ã o amb o s n ã o me vira m . Tam b é m, é clar o .. .
— Voc ê é palh a ç o e m e n t i r o s o . — Leva n t o u a m ão
deva g a r e ap er t o u o nariz . Olho u para Wolf e . Apan h o u um
char u t o do bols o , olh o u - o co m raiva, enr o l o u - o entr e as
pal m a s das m ã os, col o c o u - o na boc a e ap er t o u os de n t e s
nel e . — É s ó tel e f o n a r para Alba ny que co n s i g o tirar- lhe s
a lic e n ç a.
— Se m d ú vida — co n c o r d o u Wolf e .
— Mas s ã o t ã o tei m o s o s . — Tiro u o char u t o da boc a .
— Sab e m qu e pos s o lhe s tirar a lic e n ç a. Sab e m qu e pos s o
lev á -los para a ce n t r a l e fic h á -los co m o te s t e mu n h a s .
Sab e m qu e es t a r ã o vuln e r á veis a um a ac u s a çã o de delit o
grav e se n ã o res o l v e r e m o cas o . Mas s ã o t ã o tei m o s o s qu e
n ã o vou per d e r m e u te m p o te n t a n d o faz ê -los falar.
— Iss o faz se n t i d o .
— Sei. Mas o se n h o r te m um a clie n t e . A Sra. Ri char d
Vald o n . Al é m de est ar e m es c o n d e n d o prova s , Good w i n e o
se n h o r ac o n s e l h a r a m - na a es c o n d ê -las ta m b é m.
— Foi iss o que ela dis s e ?
— N ã o pre c i s a diz e r. N ã o ban q u e o ino c e n t e . É clar o
qu e o se n h o r a ins tr u i u . É sua cli e n t e e est á de boc a
cala d a . O pro m o t o r p ú blic o ped i u qu e fos s e ao es c r i t ó rio
e ela n ã o qu er ir. Por iss o a levar e m o s l á .
— N ã o ach a um pou c o arris c a d o ? Nu m a cida d ã co m
se u s ant e c e d e n t e s e se u lug ar de de s t a q u e na co m u -
nida d e ?
— N ã o é arris c a d o , e m vist a do qu e sab e m o s qu e ela
sab e . Good w i n foi ver Elle n Tenz e r por cau s a dos bot õ es
do ma c a c ã o. O ma c a c ã o es t av a no beb ê qu e a Sra. Vald o n
diz qu e foi deix a d o e m se u ves t í bul o e es t á agor a na cas a
dela. Port a n t o . . .
— O se n h o r dis s e qu e a Sra. Vald o n est á mu d a .
— Ela co n t o u a pel o m e n o s dua s pe s s o a s qu e o be b ê
foi lar g a d o e m se u ves t í bul o. .. qua n d o est av a so zin h a e m
cas a . N ã o no s con t o u nad a , ma s se tiver um pou c o de
ju í zo, co n t a r á , se n ã o tiver feit o nad a errad o . Se es tiv e r
ino c e n t e no s con t a r á tud o , incl u s i v e por qu e mo t iv o os
con t r a t o u e o que os se n h o r e s já fiz er a m . N ã o ac h o qu e
fos s e nad a s é rio co m o um rapt o , porq u e co n s e g u i u qu e o
advo g a d o le g a l i z a s s e tud o , nu m a bas e te m p o r á ria. Mas
te n h o cert e z a abs o l u t a de qu e o beb ê da sua cas a é o qu e
Elle n Ten z e r tin h a na cas a de l a at é cer c a do dia 20 de
mai o . Havia doi s ma c a c õ es na ca s a de Elle n Tenz e r ,
exat a m e n t e igu a i s ao qu e Good w i n mo s tro u a Ann e
Ten z e r , co m bot õ es do me s m o tipo. Ess e s mal d i t o s
bot õ es!
A mi m m e par e c i a qu e n ã o tin h a a m e n o r imp o r -
t â nci a el e es t ar t ã o aborr e c i d o co m bot õ es, ma s talv e z
tive s s e tido um a entr e v i s t a co m Nic h o l a s Los s e f f . Ele
con t i n u o u :
— Ent ã o qu e r o sab e r o qu e a Sra. Valdo n e os
se n h o r e s sab e m a res p e i t o daq u e l e beb ê . O pro m o t o r
p ú blic o n ã o pod e con s e g u i r nad a atrav é s de se u advo gad o
ou de se u m é dic o, é ló gic o que a infor m a çã o del e s é
con f i d e n c i a l . A enf e r m e i r a , a diari s t a e a cozi n h e i r a n ã o
tê m privil é gio s , ma s , se sab e m alg u m a coi s a , fora m
arrol a d a s . A enf e r m e i r a diz qu e a ú nic a coi s a qu e sab e é
qu e é um me n i n o , es t á co m sa ú de e te m aproxi m a d a -
me n t e cin c o a set e mes e s de idad e . Port a n t o , a Sra.
Vald o n n ã o é a m ã e del e . Ela n ã o tev e um beb ê e m
dez e m b r o ou jan e ir o .
— Já lhe dei mi n h a palavr a — dis s e Wolf e — qu e n ã o
sei qu e m mat o u Elle n Ten z e r .
— Eu ouvi.
— Agor a lhe dou mi n h a palavr a que n ã o sei mai s do
qu e o se n h o r sobr e es s e beb ê : n ã o sei qu e m s ã o se u s pai s,
de ond e veio ne m qu e m o col o c o u no ves t í bul o da Sra.
Vald o n .
— N ã o acr e d i t o .
— Tolic e . É clar o qu e acr e d i t a . Sab e mu i t o be m qu e
eu nu n c a de s o n r a r i a es s a fras e .
Cra m e r en c a r o u - o aborr e c i d o : — Ent ã o, e m no m e de
De u s , o qu e é qu e sab e ? Para qu e é qu e foi con t r a tad o?
Por qu e a ma n t e v e es c o n d i d a ? Por que dis s e para ela
fic ar de bic o cala d o ?
— Fui con s u l t a d o em con f i a n ç a, para ma n t e r se -
gre d o . Por que m e ne g a m um privil é gio qu e é dad o a
advo g a d o s e m é dic o s , m e s m o à qu e l e s qu e n ã o s ã o dig n o s
dis s o ? Ela n ã o viol o u ne n h u m a lei, n ã o fez nad a que
tive s s e de pre s t a r co n t a s , n ã o tin h a con h e c i m e n t o de
ne n h u m a ofe n s a qu e s t i o n á vel. N ã o havia. ..
— Ela o co n t r a t o u para faz e r o qu ê ?
Wolf e co n c o r d o u : — Aí es t á o pon t o . Se lhe con t a r ,
co m tod o s os det a l h e s , ou se ela lh e con t a r , ser á alvo de
tod a s as ate n çõ es p ú blic a s . Qua n d o deixar a m o beb ê no
se u ves t íbulo , est a v a e m b r u l h a d o nu m cob e r t o r , e de n tr o ,
pre s o ao cob e r t o r co m um alfin e t e co m u m , de cab e ç a,
es t av a um pe d a ç o de pap e l co m um a me n s a g e m . A m e n -
sa g e m fora impr e s s a co m cari m b o s de borra c h a — um
de s s e s co nj u n t o s qu e s ã o us a d o s qua s e s ó por cria n ç as.
Porta n t o . . .
— O qu e o bilh e t e dizia?
— O se n h o r es t á int e rr o m p e n d o . Port a n t o , co m o
pis t a , era in ú til. Foi a m e n s a g e m qu e obri g o u a Sra.
Vald o n a m e proc u r a r . Se eu...
— Ond e est á ela?
— Se lhe dis s e s s e o que a m e n s a g e m trazia , a mi n h a
cli e n t e est a r i a suje i t a a um a publi c i d a d e vulg a r . E...
— Quer o aqu e l a m e n s a g e m e qu e r o ag or a !
— O se n h o r já m e int e rr o m p e u qua tr o vez e s , Sr.
Cra m e r . Min h a tol er â ncia n ã o é infi n i t a . É clar o qu e o
se n h o r diria, de boa f é , nat u r a l m e n t e , qu e a m e n s a g e m
n ã o seria publi c a d a , ma s sua boa f é n ã o é o bas t a n t e .
Ten h o cer t e z a de qu e as s e g u r a r a m à Sra. Ne s b i t t qu e se u
no m e n ã o se torn a r i a p ú blic o , ma s se tor n o u . Por iss o ,
guar d o a m e n s a g e m . Eu ia diz e n d o qu e iss o n ã o o ajud a -
ria a en c o n t r a r o as s a s s i n o . Exc e t o por es s e ú nic o det a l h e
se m imp or t â ncia, o se n h o r sab e tud o qu e sei, ag or a qu e
en c o n t r o u min h a cli e n t e . Qua n t o ao fato de a Sra. Vald o n
ter m e con t r a t a d o , crei o qu e est á evid e n t e . Tent e i de s c o -
brir a m ã e do be b ê . H á tr ê s se m a n a s qu e ele s pro c u r a m
iss o , e s ó iss o: o Sr. Good w i n , Sr. Panz e r , Sr. Durki n e Sr.
Cath e r . Per g u n t o u se est o u se m sa ída. Est o u . N ã o sei
mai s o qu e faz e r .
— Apos t o qu e es t á . — Os olh o s de Cra m e r es t av a m
qua s e cerr a d o s . — Se n ã o qu e r diz er o text o da me n s a -
ge m , por qu e m e falo u a res p e i t o del a?
— Para expli c a r por que a Sra. Vald o n es t á te n d o
tan t o trab a l h o co m um be b ê qu e foi deix a d o em se u
ves t í bul o. Para evit ar que a am o l a s s e m , tive qu e lhe con -
tar qu e ela m e con t r a t o u , e diz e n d o - lh e iss o , tin h a qu e
expli c a r o porq u ê .
— É clar o qu e o se n h o r est á co m a m e n s a g e m .
— Talve z est e j a . Se te m id é ia de arra njar um a or de m
judic i a l para apr e s e n t á -la, não est a r á disp o n ível. É
me l h o r n ã o ter es s e trab a l h o .
— N ã o ter e i . — Cram e r leva n t o u - se. De u um pas s o ,
jog o u o ch ar u t o na mi n h a ce s t a de pap é is, ma s erro u ,
co m o de h á bit o. Olh o u para Wolf e: — N ã o acr e d i t o qu e
hou v e s s e um a m e n s a g e m . Rep ar e i qu e n ã o us o u aqu e l a
fras e fam o s a . Quer o a verd a d e i r a raz ã o por qu e a Sra.
Vald o n est á ga s t a n d o um a fort u n a nu m be b ê qu e apa -
rec e u n ã o se sab e de ond e , e es t á co m o bic o cal a d o , e se
n ã o co n s e g u i r a res p o s t a co m o se n h o r , juro por De u s ,
vou con s e g u i r co m ela. E se havia um a me n s a g e m , vou
con s e g u i r iss o ta m b é m.
Wolf e bat e u na m e s a co m o pun h o :
— Dep o i s de tud o iss o ! — rugi u ele . — De p o i s de ter
feit o o pos s í vel para agr a d á -lo! Dep o i s de lh e ter dad o
mi n h a palavr a no s doi s pon t o s es s e n c i a i s ! O se n h o r iria
mol e s t a r min h a cli e n t e !
— E pod e jurar qu e vou!
Cra m e r de u um pas s o e m dire çã o à port a, le m b r o u -
se do ch a p é u, esti c o u - se por cim a da poltr o n a ver m e l h a
para apa n h á -lo e saiu . Fui at é o corr e d o r para ter cert e z a
de qu e sa í ra m e s m o , ao bat e r a porta . Qua n d o volt e i ,
Wolf e me falo u:
— N ã o me n c i o n o u cart a s an ô ni m a s . Seria um es -
trata g e m a ?
— N ã o. Do jeit o qu e est á se se n t i n d o , us ari a qual -
qu e r arm a qu e tive s s e . Por iss o n ã o foi Upt o n . N ã o qu e
iss o ten h a imp o r t â nci a. Havia um a d ú zia de pist a s qu e
levav a m at é ela.
Ele aspir o u o ar prof u n d a m e n t e pel o nariz e dei xou- o
es c a p a r pel a boc a .
— Ela n ã o sab e nad a qu e el e n ã o saib a , exc e çã o feit a
à m e n s a g e m . Ser á qu e voc ê dev e r i a aco n s e l h á -la a falar,
s ó n ã o diz e n d o iss o ?
— N ã o. Se res p o n d e r a dez per g u n t a s , el e s far ã o
mai s um mil h ã o de outr a s . Vou l á lhe diz e r o qu e es p e r a r ,
e l á es t ar e i qua n d o ch e g a r e m co m a ord e m judic i a l . Su -
gir o que tel e f o n e para Park e r . Ama n h ã é dia 4 de julh o e
arranj ar fian ç a nu m feria d o à s vez e s se tor n a u m pro -
ble m a .
— Que mi s e r á vel! — res m u n g o u e, ao m e en c a mi n h a r
para a port a da rua, es t av a ima g i n a n d o a qu e m el e se
ref e r i a , se ao Cra m e r ou à cli e n t e .

12

Qua n d o Saul Panz e r tel e f o n o u à s tr ê s e m e i a no s á bad o à


tard e , dia 7 de julh o , para diz er qu e inve s t i g a r a o ú lti m o
elo da list a de ado çã o e, port a n t o , exc l u íra a gar o t a que
trab a l h a v a no es c r i t ó rio de Willi s Kru g, est a v a ter m i n a d o
o se g u n d o est á gio em bu s c a da m ã e. N ó s cin c o (poi s
ta m b é m podi a incl u ir Wolf e ) t í nha m o s exe c u t a d o um
ma g n í fic o trab al h o , inve s t i g á ram o s 14 8 mul h e r e s e
mo c a s e as excl u í ram o s se m qu e nin g u é m se aborr e c e s s e .
Muit o sati s f a t ó rio. Be s t e i r a . Dis s e a Sau l qu e era s ó por
ag or a , ma s qu e talv e z houv e s s e mai s trab al h o mai s tard e .
Fred e Orrie já tin h a m sid o dis p e n s a d o s .
Wolf e es t av a se n t a d o e olh av a aborr e c i d o para qual -
qu e r coi s a qu e se u s olh o s foc a li z a s s e m . Per g u n t e i se
tin h a alg u m a tar ef a para mi m e, qua n d o m e lan ç ou um
olh ar qu e a sit u a çã o m e r e c i a , ma s eu n ã o, dis s e que ia à
praia to m a r um ban h o de mar e volt ar i a do m i n g o à noit e .
Ne m me per g u n t o u on d e pod e r i a me en c o n t r a r , ma s ,
ant e s de sair, deix e i um pap e l sobr e a mesa co m o
n ú me r o de tel e f o n e qu e pert e n c i a à cas i n h a em Lon g
Isla n d que Lucy Vald o n alu g a r a para vera n e i o .
O latid o de Cram e r fora pior do que a mor d i d a do
pro m o t o r p ú blic o . O no m e dela n ã o sai u ne m no s jornai s .
Ter ç a- feir a ao m e i o - dia, ao ch e g a r na Rua 11 lhe diz e r
qu e m viria, tev e um peq u e n o ataq u e de m e d o e qua s e n ã o
alm o ç ou. Mas qua n d o um tira do Dep ar t a m e n t o de
Ho m i c ídio s ch e g o u , cer c a das tr ê s hor a s , n ã o trazi a ne m
um ma n d a d o . S ó um pe di d o por es c r i t o , as s i n a d o pel o
pr ó prio pro m o t o r p ú blic o . Quatr o hor a s mai s tard e ,
qua n d o tel e f o n o u , já est a v a e m cas a . O capit ã o en c a r r e -
gad o do De p ar t a m e n t o e doi s pro m o t o r e s as s i s t e n t e s
tin h a m - na int e rr o g a d o , cad a qual por sua vez, e um del e s
fora bas t a n t e sev e r o , ma s n ã o perd e r a a cal m a . Qua n d o
se en c o n t r a alg u é m qu e n ã o qu e r falar, s ó res t a um a
op çã o: se n t a r - se e olh ar para ela ou pre n d ê -la. Ela era
um a Arms t e a d , tin h a um a cas a , mu i t o s ami g o s e a pos s i -
bilid a d e de ter as s a s s i n a d o Elle n Tenz e r , ou de sab e r
qu e m o fiz er a, era um a e m dez mil h õ es. Assi m , ela pas s o u
o 4 de julh o na cas a da praia co m o beb ê , a enf e r m e i r a , a
cria d a e a cozi n h e i r a . A cas a tin h a cin c o quar t o s e sei s
ban h e i r o s . O qu e ac o n t e c e r i a se tod o s os ban h e i r o s es ti -
ves s e m oc u p a d o s e um tira do Dep a r t a m e n t o de
Ho m i c ídio s apar e c e s s e e quis e s s e to m a r ban h o ? Te m o s
qu e est ar pre p a r a d o s para tod a s as eve n t u a l i d a d e s .
Em ger a l , qua n d o m e afas t o , m e es q u e ç o do es c r i -
t ó rio e do trab a l h o e m and a m e n t o , cas o haja alg u m , e e m
es p e c i a l es q u e ç o- m e de Wolf e . Mas , naq u e l e do m i n g o na
praia, mi n h a anfitri ã era a clie n t e , e qua n d o ela est a v a l á
de n t r o dan d o co m i d a ao be b ê , deit e i - m e na arei a ,
en q u a n t o exa m i n a v a a sit u a çã o. Um a tris t e z a tot al,
abs o l u t a . Nu m trab al h o , é co m u m ac o n t e c e r qu e , à pri -
me ir a vista , par e ç a n ã o hav e r lu g a r on d e co m e ç ar, ma s
se m p r e se en c o n t r a alg u m a coi s a ond e beli s c a r . Ess e era
difer e n t e . H á qua s e cin c o se m a n a s qu e trab al h á vam o s no
cas o , se g u íram o s dua s pist a s e am b a s as vez e s
ch e g á ram o s a um be c o se m sa í da e não co n s e g u i a
ima g i n a r ne n h u m a outr a pist a . Estav a qua s e pron t o a
ac e i t a r a id é ia de qu e Ric h a r d Vald o n n ã o era o pai do
be b ê , qu e nun c a en c o n trara a mo ç a qu e era a m ã e do
be b ê , e qu e ela era alg u m a lou c a . Provav e l m e n t e lera
se u s livro s ou o vira na tel e v i s ã o, e ao ter um be b ê qu e
n ã o podi a ma n t e r ao se u lado , de c i d i r a arra njar um jeit o
de qu e se ch a m a s s e Val don. Se fos s e um a lou c u r a de s s e
tip o, seri a co m o pro curar um a ag u l h a nu m palh e i r o , e
no s s a ú nic a es p e r a n ç a era es q u e c e r a m ãe e ten t a r
de s c o b r i r o as s a s s i n o , o qu e os tira s vinh a m ten t a n d o h á
um m ê s. Era pel o me n o s 99% de trist e z a . Deit a d o de
cos t a s na arei a, me u s olh o s fec h a dos , dis s e alt o um
palavr ã o, e ouvi a voz de Lucy:
— Archi e ! Ach o qu e dev e r i a ter feit o alg u m bar u lho
para avis ar que es t a v a aqui.
Levan t e i - me à s pre s s a s e fo m o s para a á gua .
E na se g u n d a - feira de ma n h ã , à s onz e hor a s , Wolf e
entr o u no es c r i t ó rio co m o se fos s e a um lug a r det e r m i -
nad o , p ô s as orq u íde a s no vas o e, se m olh ar para a
corr e s pon d ê ncia, dis s e :
— Se u cad e r n o de ano t a çõ es.
Assi m co m e ç ou o ter c e i r o est á gio.
Na hora do alm o ç o, já dis c u t í ram o s o ú lti m o det a l h e
do proj e t o e s ó res t av a lev á -lo avan t e , o qu e era de min h a
res p o n s a b i l i d a d e . S ó lev e i tr ê s dias para arru m a r tud o ,
ma s aind a de m o r o u un s qua tr o dias at é qu e as coi s a s
co m e ç as s e m a aco n t e c e r , porq u e a Gaz e t t e de do m i n g o s ó
sai aos do m i n g o s . Me u s tr ê s dia s fora m pas sad o s da
se g u i n t e for m a:
SEGU N D A - FEIRA À TARDE : Volt e i à praia para ne g o c i a r a
id é ia co m a clie n t e ; ela n ã o ac e i t o u , ent ã o fiqu e i para o
jant ar . N ã o era tan t o pel o fato de voltar à cida d e qu e ela
n ã o apr ov av a , era a prop a g a n d a , e se eu n ã o tive s s e
mi s t u r a d o o rela c i o n a m e n t o pe s s o a l co m o profi s s i o n a l
n ã o teria con s e g u i d o su a apr ov a çã o. Qua n d o parti, ela já
me pro m e t e r a es t a r de volta à Rua 11 at é o me i o - dia de
quart a - feira, e fic ar qua n t o te m p o fos s e ne c e s s á rio.
TER ÇA - FEIRA DE MAN H Ã : Fui falar co m Al Pos n e r , co-
propri e t á rio da Pos a r t Cam e r a Exc h a n g e , na Rua 47, a
fim de per s u a d i - lo a ir me ajud ar a co m p r a r u m car rin h o
de be b ê . De p o i s de voltar à sua loja co m ela, deix e i - o co m
a tar ef a de es c o l h e r as c â m e r a s e ins t a l á -las, de p o i s de
expli c a r co m o seri a m us a d a s . Pro m e t e u qu e teria tud o
pron t o at é quar t a- feira ao m e i o - dia.
TER ÇA - FEIRA À TARDE : Fui ao es c r i t ó rio de Lon Co he n ,
no 20. ° and ar do Pr é dio da Gaz e t t e . Se Lon te m um t ítulo,
n ã o sei qual é . Na port a da sal e t a , a se g u n d a port a no
corr e d o r de qu e m ve m do gra n d e es c r i t ó rio de can t o do
edit o r , s ó apar e c e se u no m e . No de c o r r e r dos ano s , já
es tiv e l á mai s de 10 0 vez e s e, e m pel o m e n o s 70 del a s ,
es t av a nu m dos tr ê s tel e f o n e s na sua m e s a qua n d o entr e i .
Naq u e l a ter ç a- feira ta m b é m est av a . Se n t e i - me na
poltr o n a ao lad o da m e s a e es p e r e i .
De s l i g o u , pas s o u a m ã o no se u cab e l o es c u r o , lis o,
gir o u a cad e i r a e m e en c a r o u , fixan d o se u s olh o s pre t o s e
es p e r t o s e m mi m:
Ond e fic o u as s i m qu e i m a d o de sol?
— Eu n ã o me qu e i m o . Voc ê n ã o en t e n d e nad a de
cor e s . — Bati leve m e n t e no m e u rost o: — Mor e n o cas -
tan h o - aver m e l h a d o .
Ao de c i d ir es s e as s u n t o , ou melhor, n ã o de c i d ir ,
cruz e i min h a s per n a s : — Voc ê é um suje i t o de sor t e . S ó
porq u e eu go s t o de voc ê , de n t r o dos limi t e s , é clar o ,
entr o aqui e lhe dou um a his t ó ria excl u s i v a , qu e qual q u e r
jornal na cida d e daria 1. 0 0 0 d ó lar e s para ter.
— N ã o acr e d i t o .
— Iss o n ã o é um caval o dad o , qu e n ã o se pod e olh ar
os de n t e s . Já ouvi u falar e m Lucy Valdo n ? A vi ú va de
Ric h a r d Vald o n , o es c r i t o r ?
— Já .
— Ser á um a edi çã o de do m i n g o , p á gin a int e ir a , a
mai or part e co m fot o g r a f i a s . Um t í tul o be m su g e s t i v o ,
as s i m co m o : AS MULHER E S GOSTAM DE BEB ÊS . Se ho uv e r text o ,
ser á pe q u e n o , feit o por um de se u s artis t a s da palavr a .
Vai diz er qu e a Sra. Vald o n , jove m , boni t a , rica, vi ú va de
um ho m e m fam o s o , n ã o te n d o filh o s , troux e um beb ê
para sua cas a luxu o s a e est á cuid a n d o del e
cari n h o s a m e n t e . Contr a t o u um a enf e r m e i r a , mui t o exp e -
rie n t e , qu e é mui t o dev o t a d a ao gar o t i n h o , qu e es t á
apr e n de n d o a and ar ... n ã o, ele ain d a n ã o and a. Talve z
dev e s s e diz e r anjin h o ou um beb ê ino c e n t e . N ã o so u eu
qu e vou es c r e v e r . A enf e r m e i r a leva- o para pas s e a r dua s
vez e s ao dia, e m um carri n h o mui t o car o, das dez à s onz e
da ma n h ã e de quat r o às cin c o da tard e , na Pra ç a
Was h i n g ton, para qu e ele pos s a apr e c i a r as mar avil h a s da
nat u r e z a : á rvor e s , gra m a e as s i m por dian t e .
Agit e i as m ã os: — Que po e m a ! Se tiver um poe t a na
folh a de pa g a m e n t o , ó tim o , ma s te m qu e incl u i r tod o s os
de t a l h e s . As foto g r a f i a s fica m a se u crit é rio: a Sra.
Vald o n ali m e n t a n d o o beb ê , ou dan d o ban h o nel e , se
go s t a de nu s; ma s um a foto g r a f i a te m que apar e c e r : a da
enf e r m e i r a co m o carri n h o de beb ê na Pra ç a Was h i n g ton.
Nis s o eu insi s t o . Tam b é m vai ter qu e sair no pr ó xim o
do m i n g o . As foto g r a f i a s pod e m ser tirad a s am a n h ã à
tard e . Pod e m e agr a d e c e r qua n d o qui s e r . Algu m a per -
gu n t a ?
Qua n d o abri u a boc a , pela sua expr e s s ã o, vi qu e n ã o
era para me agr a d e c e r , ma s um dos tel e f o n e s toc o u .
Ate n d e u o tel e f o n e verd e , ouvi u e falo u , ma s prin c i p a l -
me n t e ouvi u e de s li g o u .
— Voc ê te m a ou s a d i a de um ho m e m de um a per n a
s ó nu m a conv e n çã o de ch u t e s no rabo — dis s e - me .
— Iss o n ã o ape n a s é irrel e v a n t e — dis s e eu —, é
vul g a r .
— N ã o é , n ã o. Talve z voc ê se le m b r e de qu e um dia,
h á um m ê s, qua n d o est e v e aqui faz e n d o per g u n t a s sobr e
Elle n Ten z e r , lhe per g u n t e i se en c o n t r a r a os bot õ es.
— Agor a qu e m e n c i o n o u , me le m b r e i .
— E voc ê evit o u o as s u n t o . OK, ma s ag or a ou ç a o qu e
qu e r . Voc ê sab e mai s sobr e os bot õ es do qu e eu, ma s sei
um a coi s a: es s e s bot õ es fora m feit o s por Elle n Tenz e r e
usa d o s na roup a do beb ê qu e es t á co m Lucy Vald o n e sei
qu e fora m en c o n t r a d o s alg u n s bot õ es igu a i s em
ma c a c õ es de beb ê gu ar d a d o s na cas a de Elle n Tenz e r ,
qu e já es t e v e co m um beb ê e m sua co m p a n h i a . Ela foi
as s a s s i n a d a na noit e se g u i n t e e m qu e voc ê a viu. E ag or a
voc ê ch e g a co m es s a his t ó ria sobr e Lucy Vald o n e um
be b ê , e m e per g u n t a se te n h o alg u m a d ú vida. Ten h o . O
be b ê qu e es t á na cas a de Lucy Vald o n é o me s m o que
es t av a na cas a de Elle n Tenz e r ?
É clar o qu e eu sabi a que iss o ia ac o n t e c e r . Res pon d i:
— Confi d e n c i a l m e n t e ?
— Est á be m .
— At é lhe diz e r que pod e falar. Eu dis s e qu e
con c o r d a v a .
— Ent ã o, si m .
— Lucy Valdo n é a m ã e del e ?
— N ã o.
— N ã o per g u n t o se é cli e n t e de Wolf e , por q u e iss o é
ó bvio. Se n ã o fos s e , voc ê n ã o a teria es c o l h i d o para es s a
co m é dia. Qua n t o à palh a ç ada, disp e n s o . N ã o d á .
— N ã o aco n t e c e r á nad a, Lon. Ela vai as s i n a r co n -
cord a n d o .
Ele aba n o u a cab e ç a:
— Iss o n ã o ajud ar i a e m nad a se alg u é m joga s s e um a
bo m b a . É qua s e cer t o qu e Elle n Tenz e r foi as s a s sin a d a
por cau s a do beb ê . Ess e be b ê é peri g o s o , n ã o sei por qu e ,
ma s é . Voc ê est á me pe di n d o para cha m a r a ate n çã o
sobr e ele , n ã o s ó a res p e i t o de ond e mor a, ma s ond e pod e
ser vist o na rua dua s vez e s por dia. Seri a for m i d á vel. A
Gaz e t t e d á a not í cia, e no dia se g u i n t e rapt a m o beb ê , ou
o atr o p e l a m e mat a m , ou De u s sab e o qu ê . Nad a feit o ,
Archi e . Obri g a d o pela visit a .
— Pos s o lhe gara n t i r , co m tod a a cer t e z a , qu e n ã o
hav e r á es s e ris c o . Ne n h u m ris c o , me s m o .
— N ã o é sufi c i e n t e .
De s c r u z e i as per n a s : — Tud o que dis s e r m o s é co n -
fid e n c i a l .
— Claro.
— Ent ã o es t a m o s ent e n d i d o s . Apo s t o um co n tr a mil
de qu e n ã o hav e r á rapt o ou qual q u e r outr a en c r e n c a . H á
cin c o se m a n a s , a Sra. Vald o n co n t r a t o u Ner o Wolf e para
de s c o b r i r qu e m é a m ã e do be b ê . Algu é m o deix ar a no
ves t í bul o de su a cas a , e ela nad a sabi a a se u res p e i t o e
ain d a n ã o sab e . Gast a m o s bas t a n t e do din h e i r o dela e
mu i t o do nos s o te m p o e en e r g i a e m bus c a da m ã e, e
nad a. Aind a est a m o s proc u r a n d o . Est a te n t a t i v a é ba -
se a d a na te or i a de que um a mul h e r qu e tev e um beb ê h á
sei s me s e s e larg o u - o e m qual q u e r lug ar , n ã o imp o r t a por
qu e mot iv o , go s t a r i a de ver a cari n h a del e . Ver á a p á gin a
na Gaz e t t e , ir á à Pra ç a Was h i n g t o n , rec o n h e c e r á a
enf e r m e i r a e o carri n h o do beb ê pela fot o g r a f i a e vai dar
um a olh a d a .
A cab e ç a de Lon incli n a v a - se para um lad o:
— E se n ã o so u b e r qu e o beb ê dela est á co m a Sra.
Vald o n ?
— Pro v a v e l m e n t e sab e . Se não so u b e r , es t a m o s
ga s t a n d o mai s te m p o , en e r g i a e din h e i r o .
— A circ u l a çã o da Gaz e t t e é de cer c a de dois mi -
lh õ es. Se con t a r m o s a his t ó ria, no dia se g u i n t e hav e r i a
um a mu l t i d ã o de mul h e r e s e m volt a do carri n h o do be b ê .
E a í?
— Esp e r o qu e não seja um a mul t i d ã o. Algu m a s
mu l h e r e s , si m . A enf e r m e i r a ser á um a det e t i v e , a m e l h o r
ope r a d o r a fe m i n i n a que h á por a í. Talve z te n h a ouvid o
falar nel a: Sally Corb e t t .
— Já ouvi.
— Saul Panz e r , Fred Durki n e Orrie Cath e r est ar ã o
por pert o , ao alc a n c e da voz. O carri n h o do beb ê ter á tr ê s
c â meras foto g r á fic a s es c o n d i d a s , e a enf e r m e i r a sab e
co m o us á -las. Vai fot o g r a f a r tod a s as pe s s o a s qu e se
apro xim ar e m para olh ar o beb ê , e os retra t o s vã o ser
mo s t r a dos à Sra. Valdo n . Com o o be b ê foi deix a d o no
ves t í bul o del a, talv e z a m ã e seja alg u é m qu e ela pos s a
rec o n h e c e r . Vam o s ta m b é m mo s t r a r as fot o g r a f i a s para
outr a s pe s soa s , cujo no m e n ã o pre c i s a sab e r . É clar o qu e
tud o is s o de p e n d e de um a d ú zia de pos s i b i l i d a d e s , ma s o
qu e é qu e n ã o de p e n d e ? Se voc ê atrav e s s a r a rua co m o
sin a l verd e talv e z ch e g u e vivo e m cas a . Se sab e o qu e é
bo m para se u jornal, vai agarr a r es s a mat é ria excl u s i v a .
Se publi c á -la e der cer t o , talv e z pos s a m o s lhe dar o
retr at o da m ã e e a his t ó ria de co m o o co n s e g u i m o s .
— Iss o tud o é s é rio, Archi e ?
— Tã o s é rio co m o um á s, rei, da m a , vale t e e dez.
— Que m mat o u Elle n Tenz e r ?
— Com o diab o s vou sab e r ? Per g u n t e aos tira s ou ao
pro m o t o r p ú blic o .
— Voc ê dis s e qu e Pan z e r , Durki n e Cath e r est a r ã o
por pert o . E voc ê ?
— N ã o. Algu é m podi a me rec o n h e c e r . So u um a
cel e b r i d a d e . A Gaz e t t e publi c o u mi n h a fot o g r a f i a tr ê s
vez e s no s ú lti m o s quatr o ano s .
Abaixo u a cab e ç a dura n t e cin c o se g u n d o s , en q u a n to
esfr e g a v a o qu e ix o co m a pon t a de um ded o . En caro u - me:
— Est á be m . As foto g r a f i a s t ê m qu e est a r pro n t a s at é
qui n t a - feira à s oit o da ma n h ã para pod e r e m sair no
do m i n g o .
Leva m o s u m a hora para de c i d i r tod o s os det a l h e s
porq u e fo m o s int e r r o m p i d o s por quatr o tel e f o n e m a s .
CONTI N U AÇÃO DE TERÇA - FEIRA À TARDE : Fui ao es c r i t ó rio
de Dol (Th e o d o l i n d a ) Bo n n e r , na Rua 45, a um en c o n t r o
qu e tin h a mar c a d o co m Sally Corb e t t , naq u e l a ma n h ã
pel o tel e f o n e . Há sei s ano s , Dol e Sally fora m
res p o n s á veis pel a mi n h a mu d a n ç a de atit u d e e m rela çã o
à s op e r a d o r a s fe m i n i n a s , e iss o me fazia ficar co n tr a ela s ,
as s i m co m o Wolf e era con t r a Jane Aust e n por for çá -lo a
ad m i t ir qu e um a mul h e r podi a es c r e v e r um a boa nov e l a .
Naq u e l a tard e Sally m e provo u , mai s um a vez, qu e tin h a
me s m o de mu d a r de id é ia. S ó to m o u not a do qu e era
ne c e s s á rio, ma s se u s olh o s de cor azul- es c u r a mo s t r a v a m
curi o s i d a d e , e fez ap e n a s as per g u n t a s qu e pre c i s a v a .
Com b i n a m o s nos en c o n t r a r na ma n h ã se g u i n t e na Pos a r t
Cam e r a Exc h a n g e .
QUARTA - FEIRA DE MAN H Ã : Sally e eu pas s a m o s mai s de
dua s hor a s nu m a sala no s fund o s da loja Pos ar t Cam e r a
Exc h a n g e co m dois m e c â nic o s , ven d o co m o ins t a l a v a m e
te s t a v a m as c â meras. Se fos s e co m p r á -las, a cli e n t e
ga s t a r i a 1. 6 0 0 d ó lar e s , ma s Al Pos n e r alu g a r a - as para
mi m por um a se m a n a . Mos t r a r a m a Sally co m o lidar co m
as c â me r a s , ma s mai s tard e expli c a r i a m tud o melhor.
Levei- a para alm o ç ar no Rus t e r m a n .
QUARTA - FEIRA À TARDE : Fui à cas a dos Valdo n co m Sally.
Lucy volt ar a da praia na ter ç a- feir a à noit e . Já co m b i n a r a
co m a enf e r m e i r a qu e dur a n t e mai s ou meno s um a
se m a n a outr a pe s s o a levari a o be b ê para pas s e a r , as s i m ,
a enf e r m e i r a pod e r i a de s c a n s a r um pou c o . Tam b é m
ac e r t a r a tud o co m a e m pr e g a d a e co m a cozi n h e i r a . N ã o
sei co m o expli c o u o carri n h o de be b ê tod o incr e m e n t a d o ,
qu e ch e g a r a um pou c o ant e s de n ó s. Qua n d o o pe s s o a l da
Gaz e t t e ch e g o u , um pou c o ant e s das tr ê s hor a s — um a
jornali s t a , um fot ó graf o e o ajud a n t e — Sally já est a v a de
unif o r m e , a enf e r m e i r a já partir a co m a tard e de fol g a , o
carri n h o est av a tod o eq u i p a d o e Lucy pre c i s a v a de um
drin q u e .
Fot ó graf o s de jornal trab a l h a m r á pid o, e à s tr ê s
hor a s e trin t a mi n u t o s ter m i n a r a m de tirar os retr a t o s de
Lucy e Sally, no quar t o do be b ê . Fui junt o at é à Pra ç a
Was h i n g t o n , para ver co m o Sally se sa ía co m um car rinh o
de be b ê . Nu n c a fize r a um est u d o a es s e res p e i t o , ma s
ach e i que se sai u be m , arra s t a n d o um pou c o os p é s e co m
os om b r o s ca ídos . Qua n d o volt e i para a cas a de Lucy, a
jornali s t a aind a es t av a l á co m ela, ma s foi log o e m b o r a e
fiz os mar ti n i s .
QUIN TA - FEIRA , SEXTA - FEIRA E SÁBADO : Fui à Gaz e t t e de
ma n h ã ced o para ver tud o . A foto g r a f i a qu e havia m
es c o l h i d o , de Sally co m o carri n h o e o be b ê , na pra ç a, era
perf e i t a . As outr a s dua s , no quar t o do be b ê , um a de Lucy
co m o be b ê no col o e um a de Sally es c o v a n d o o cab e l i n h o
do beb ê en q u a n t o Lucy obs e r v a v a , era m boa s foto g r a f i a s ;
ma s Lucy n ã o tin h a a apar ê nci a de um a m ã e cor uj a.
Par e c i a um a mul h e r ten t a n d o sorrir ap e s a r de um a dor
de de n t e s . Lon dis s e qu e as outr a s foto s aind a es t av a m
pior e s . N ão vi mot iv o para publi c a r um retra t o qu e
tirar a m na fre n t e da cas a , ma s n ã o fiz obje çõ es. Lon
aprov o u as quat r o mo d i f i c a çõ es qu e fiz no text o .
Sally levo u o be b ê no carri n h o para a Pra ç a
Was h i n g t o n para dar um pas s e i o dua s vez e s ao dia,
dura n t e tr ê s dia s . Mas prati c o u co m a c â me r a de n t r o de
cas a , no quart o gra n d e do se g u n d o and ar , co m Al Pos n e r ,
Lucy e eu. Pre c i s a v a m de Lucy porq u e era dez e s s e t e
ce n t í me tr o s mai s baixa do que eu e t í nha m o s que cobrir
tod o s os â ng u l o s . Dua s c â me r a s est av a m es c o n d i d a s nos
enf e i t e s nas extr e m i d a d e s das barra s por ond e se
empurrava o carri n h o , e a outr a es t a v a nu m a caixa
es tr e i t a na fre n t e do carri n h o , co m um ch o c a l h o e outr o s
brin q u e d o s . Ess a ú lti m a op e r a v a - se por con t r o l e re m o t o .
Dura n t e aqu e l e s tr ê s dia s tirara m m e u retr a t o um a s mil
vez e s , pel o meno s. Os de qui n t a - feira es t a v a m , na
mai or i a , fora de foc o , os de sext a- feira est a v a m m e l h o r e s ,
ma s no s á bad o pela ma n h ã Sally ac e r t a r a tud o direi ti n h o .
Qual q u e r pe s s o a qu e se aproxi m a s s e a um a dist â nci a de 6
me tr o s ou m e n o s do be b ê ia ser be m foto g r a f a d a .
Sau l, Fred e Orrie est iv e r a m na velh a cas a de tijol o s
no s á bad o à noit e at é de p o i s da m e i a- noit e . A pri m e i r a
me i a hor a foi no es c r i t ó rio, rec e b e n d o ins tr u çõ es (Sa u l é
qu e m ia de c i d i r ond e tod o s ficari a m na pra ç a de ma n h ã )
e as ú lti m a s tr ê s hor a s fora m pas s a d a s na sala de jant ar
co m i g o , joga n d o pin o c l e e be b e n d o alg u m a coi s a .
DOMI N GO DE MAN H Ã : Tom e i caf é na cozi n h a à s nov e
hor a s e trin t a min u t o s . Às dez hora s , no mo m e n t o e m qu e
Sally entr ar i a na pra ç a e m p u r r a n d o o carri n h o , eu es t av a
co m e n d o m e u ter c e i r o boli n h o de cre m e , enq u a n t o co m a
m ão es q u e r d a se g u r a v a a Gaz e t t e aber t a na p á gin a
int e ir a co m a entr e v i s t a : AS MULHERE S ADORAM BEB ÊS . É um a
qu e s t ã o de go s t o . Na mi n h a opi ni ã o, seri a mai s sutil
diz e r: AS MULHER E S GOSTAM DE BEB ÊS .

13

Qua n d o Lon Coh e n dis s e que hav e r i a um a mu l t i d ã o, ach e i


qu e talv e z est iv e s s e exa g e r a n d o alg o , pos s i v e l m e n t e o
ef e i t o cau s a d o pel a Gaz e t t e . No do m i n g o con s e g u i m o s 26
retr at o s : set e de ma n h ã e 19 de tard e . Eu es t av a na cas a
qua n d o Sally volt o u co m o carri n h o e se u co n t e ú do pou c o
de p o i s das cin c o hor a s , e ajud e i - a a retir ar os fil m e s . A
c â m e r a na caix a da fre n t e do carri n h o do be b ê s ó tirar a
dua s fot o s , ma s enr o l a m o s o fil m e e o retir a m o s . Do mo d o
co m o ga s t á vam o s o din h e i r o da cli e n t e , mai s alg u n s
d ó lar e s n ã o era nad a .
Vint e e qua tr o hor a s de p o i s ain d a n ã o sab íam o s se
hav í am o s con s e g u i d o ou n ã o um retr a t o da m ã e. A ú nic a
coi s a qu e sab í am o s é qu e Lucy n ã o rec o n h e c e r a ne n h u m a
das 26 pe s s o a s , e Julia n Haft, Leo Bin g h a m e Willi s Kru g
dis s e r a m que ta m b é m n ã o. De ma n h ã , Wolf e falar a ao
tel e f o n e co m cad a um del e s , pedir a- lh e s que olh a s s e m
alg u m a s fot o g r a f i a s , se m expli c a r co m o as
con s e g u íram o s . Qua n d o Wolf e rec e b e r a sei s c ó pia s de
cad a ma n d a d a s por Al Pos n e r , ao m e i o - dia, ma n d a r a as
fot o s para el e s por um m e n s a g e i r o . Às cin c o hor a s tod o s
já havia m tel e fon a d o . Todo s os tr ê s n ã o rec o n h e c e r a m
nin g u é m. Levei um co nj u n t o para Lucy e ela exa m i n o u - o
be m . N ã o es t av a cert a sobr e um a del a s , ma s a mu l h e r
qu e talv e z fos s e co n h e c i d a es t av a na sua list a e a
pos s i b i l i d a d e de ela ser a m ã e fora eli m i n a d a por Saul.
Convid o u - me para ficar l á at é qu e Sally volt a s s e do
pas s e i o da tard e co m o be b ê e retir a s s e o rolo de fil m e s
do dia. Mas qu er i a es t ar na Rua 35 para rec e b e r os
rela t ó rios de Kru g, Haft e Bin gh a m .
Às qua tr o hor a s e vint e mi n u t o s Haft e Bin g h a m já
havia m tel e f o n a d o , ma s Kru g n ã o, e qua n d o o tel e f o n e
toc o u pe n s e i qu e fos s e ele . Mas log o ao co m e ç ar a diz e r
as palavr a s de roti n a , fui int e r r o m p i d o .
— É Sau l, Archi e . Est o u nu m a cabi n e na Pra ç a da
Univ e r s i d a d e .
— E...?
— Talve z te n h a m o s alg u m a coi s a . Algu m a coi s a qu e
pe n s a m o s qu e pud e s s e ac o n t e c e r . Às qua tr o hor a s e
quatr o mi n u t o s um t á xi paro u no lad o nor t e da pra ç a, e m
es t a c i o n a m e n t o dupl o , e um a mu l h e r sai u. Atrav e s s o u a
rua e olh o u em volta. O t á xi fic o u para d o . Ela viu o
carri n h o do outr o lad o da pra ç a, diri g i u - se para ele e
ch e g o u be m per t o . N ã o se incli n o u ne m p ô s a m ã o no
carri n h o ou de n t r o del e , ma s falo u co m Sally. Fic o u de p é
a fit á -lo m e n o s de um min u t o — quar e n t a se g u n d o s . O
carr o de Orrie es t av a log o dep o i s da es q u i n a , ma s co m o
t á xi es p e r a n d o n ã o ia adia n t a r . Volt o u para o t á xi e foi
embora. Era um Para g o n . Quer qu e fiqu e aqui at é à s
cin c o hor a s ?
— N ã o. Enc o n t r e aqu e l e t á xi.
— Quer o n ú me r o ?
— Claro. Algu é m pod e atr o p e l á -lo ou alg o as si m .
De u- m e ent ã o o n ú me r o de re gi s t r o do t á xi, ano t e i - o
e dis s e qu e est ar i a na rua das qua tr o hor a s e quar e n t a e
cin c o mi n u t o s at é à s sei s hor a s apa n h a n d o os fil m e s co m
Sally e leva n d o - os para Al Pos n e r . Ao de s l i g a r fiqu e i
se n t a d o por um min u t o , res pir a n d o , mai s sati s f e i t o do
qu e vinh a m e se n t i n d o h á se m a n a s . Ent ã o toq u e i o int e r -
fon e para a es t u f a .
— Si m?
— Para b é ns. Sua teori a de qu e um a mu l h e r qu e tev e
um be b ê h á sei s mes e s go s t a r i a de ver co m qu e m se
par e c e era vá lida. A id é ia de ter os ho m e n s e as c â me r a s
ta m b é m foi vá lida. Vou sair de n t r o de 10 min u t o s e ac h e i
qu e go s t a r i a de sab e r . Dois con t r a um qu e ac h a m o s a
m ã e. Apo s t o tr ê s con t r a um.
— Favor faz er se u relat ó rio.
— Com praz e r . — E expli q u e i tud o o que suc e d e u . —
Se ela é a m ã e, já a pe g a m o s . De s c o b r i r ond e o t á xi a
levo u talv e z n ã o ajud e mui t o , ma s é clar o qu e Saul sab e r á
qual é a fot o g r a f i a . Parab é ns.
— É sati s f a t ó rio — dis s e ele e de s li g o u .
Kru g tel e f o n o u un s min u t o s dep o i s — qua n d o eu já
es t av a de sa ída — para diz e r qu e n ã o rec o n h e c i a nin g u é m
na s foto s qu e lh e ma n d a r a , ma s talve z ten h a fica d o
sur pr e s o ao not ar qu e eu es t av a t ã o ale g r e .
As foto g r a f i a s de se g u n d a - feir a fora m o dobr o das de
do m i n g o . Sally mu d a r a os fil m e s ao m e i o - dia, por tan t o ,
havia sei s rolo s . Ao tod o 54 foto s e um a dela s valia se u
pe s o e m rubi s . Levei- as para a Rua 47 ant e s das sei s
hor a s , ma s Al n ã o podi a reve l á -las naq u e l a noit e : doi s
e m p r e g a d o s est a v a m de f é rias, um est a v a e m cas a doe n t e
e es t a v a ch e i o de servi ç o. Acab e i co n s e g u i n d o co nv e n c ê -
lo a abrir e m e deixar entr ar à s oit o hor a s da ma n h ã , e
lev e i os film e s para cas a co m i g o . Qua n d o es t á vam o s à
me s a do jant ar, Saul tel e f o n o u . O no m e do mot o rist a do
t á xi era Sid n e y Ber g m a n e ac e i t a r a be m os 5 d ó lar e s .
Apan h a r a a pas s a g e i r a na Aveni d a Madi s o n , entr e a Rua
52 e a Rua 53, levar a- a dire t o à pra ç a, e na volt a deixar a -
a na Rua 52 es q u i n a co m a Park. Nu n c a a havia vist o
ant e s e nad a sabi a sobr e ela. Dis s e a Sau l para ficar de
olh o s ab er t o s na pra ç a pel a ma n h ã — talv e z a mul h e r
volta s s e para dar mai s um a olh a d a — e vir de p o i s para o
es c r i t ó rio e me es p e r a r .
S ó ch e g u e i ao es c r i t ó rio co m as fot o g r a f i a s na ter ç a-
feira, qua n d o falt av a m qui n z e min u t o s para o m e i o - dia.
Podi a ter ch e g a d o m e i a hora mai s ce d o , ma s fiqu e i no
Pos a r t Cam e r a Exc h a n g e e m b r u l h a n d o fot o s para Al ma n -
dar para Kru g, Haft e Bin g h a m . Se Lucy n ã o a co n h e -
ce s s e , talv e z um del e s so u b e s s e qu e m era. Wolf e est a v a à
es c r iv a n i n h a beb e n d o cerv ej a, e Saul, na poltr o n a ver -
me l h a , beb e n d o vinh o . Na me s i n h a ao se u lado es t a v a
um a garr af a de Cort o n Charl e m a g n e . Apar e n t e m e n t e es -
tava m dis c u t i n d o lit er a t u r a ; havia tr ê s livro s na es c r iv a -
nin h a de Wolf e e um aber t o na sua m ã o. Entr e i , se n t e i e
fiqu e i ouvi n d o . Era liter a t u r a . Leva n t e i - m e para sair e fui
int e r r o m p i d o pel a voz de Wolf e:
— Si m , Archi e ?
Virei- m e .
— Det e s t o int e rr o m p e r . — Che g u e i pert o de Sau l. —
Quer co m p r a r retr a t o s sujo s , se n h o r ? — Entr e g u e i - os a
ele .
— Ela n ã o apar e c e u hoj e de ma n h ã — dis s e el e. As
m ã os era m t ã o á gei s co m as fot o s co m o co m as cart a s do
jog o de p ô qu er . Bas t a v a um olh ar de rela n c e e m cad a
um a at é qu e ch e g o u qua s e no m ei o , qua n d o incli n o u um a
para ver m e l h o r , à luz, bala n ç ou a cab e ç a e es t e n d e u - a:
— É ela.
Apan h e i o retr a t o . Era um a foto be m n í tida, ven d o - se
tr ê s quar t o s do ros t o , de um â ng u l o de baixo para cim a ,
co m o a mai or i a das outr a s fot o g r a f i a s . Test a larg a , olh o s
be m dist a n c i a d o s , nariz um pou c o es tr e i t o , boc a um tan t o
gra n d e , o qu e ix o um pou c o pon t u d o . Os olh o s est av a m
fixo s , foc al i z a d o s à dire i t a , co n c e n t r a d o s .
— Ela pod e ser atra e n t e — dis s e eu.
— E é — dis s e Saul. — Te m um jeit o de and ar mui t o
alta n e i r o e deli c a d o .
— E co m o é ?
— Te m um m e t r o e se t e n t a e pe s a un s se t e n t a qui los.
Mai s de 30 ano s .
— O env e l o p e , por favor. — Dev olv e u - me o env e lop e e
pus a fot o g r a f i a co m as outr a s e o env e l o p e no m e u bols o .
— De s c u l p e ter int e r r o m p i d o os se n h o r e s . Ten h o um
as s u n t o para tratar . Se pre c i s a r e m de mi m , sab e m o
n ú me r o da Sra. Valdo n . — Virei- m e e sa í .
As rela çõ es de Lucy co m i g o , de s d e do m i n g o , es t a vam
um pou c o estr e m e c i d a s . N ã o, n ã o era be m as s i m . Era a
sua rela çã o co m o mu n d o qu e es t av a estr e m e c i d a , e era
eu qu e es t a v a por pert o . Se u advo g a d o lhe tel e fon ar a no
do m i n g o à noit e , sobr e o arti g o da Gaz e t t e , e na se g u n d a -
feira viera at é sua cas a para con v e r s a r . -Ach av a qu e ela
es t av a se arris c a n d o e era co n t r a iss o . Sua m e l h o r ami g a ,
Len a Guthri e , de s a p r o v a v a aind a mai s , e rec e b e r a cer c a
de um a d ú zia de tel e f o n e m a s de outr o s ami g o s , para n ã o
me n c i o n a r os dos ini m i g o s , e devid o a um co m e n t á rio qu e
fez na se g u n d a - feira à tard e , calc u l e i qu e Leo Bin g h a m
fora um del e s .
Assi m , a at m o s f e r a est av a te n s a , e qua n d o ch e g u e i
na ter ç a- feira e Mari e Foltz me ma n d o u su bir para o
se g u n d o and ar , fiqu e i qua s e m e i a hor a soz i n h o na sala
en o r m e . Qua n d o a cli e n t e final m e n t e apar e c e u , par o u a
tr ê s pas s o s de dis t â nci a e per g u n t o u :
— Algu m a coi s a de novo , Archi e ?
— S ó as fot o g r a f i a s de ont e m — res p o n d i .
— Ah! Qua n t a s s ã o?
— S ã o 54.
— Est o u co m dor de cab e ç a. Pre c i s o vê -las ag or a ?
— Talve z n ã o. — Tirei o env e l o p e do me u bols o ,
proc u r e i en tr e as fot o g r a f i a s e dei- lh e um a para ver. —
Veja es s a . É es p e c i a l .
Ela de u um a olh a d a r á pida: — O qu e h á de es p e c i a l
nel a?
— Apos t o tr ê s co n tr a um qu e ela é a m ã e. Veio nu m
t á xi e ma n d o u - o es p e r a r en q u a n t o loc a li z a v a o car rinh o
de be b ê , foi l á , de u um a boa olh a d a , de qua s e um min u t o ,
e volt o u para o t á xi. Voc ê a con h e c e ?
Outr o olh ar rá pid o: — N ã o.
— Voc ê se imp o r t a r i a de lev á -la at é à luz e olhar be m
para ter cert e z a ?
— N ã o... Est á be m . — Foi at é à lâ mp a d a da m e s a ,
ac e n d e u - a e fixo u os olh o s , fran z i n d o as sobr a n c e l h a s .
Virou- se: — Talve z já a te n h a vist o e m alg u m lug ar .
— Ent ã o es q u e ç a- se da dor de cab e ç a, de tod a s as
dor e s de cab e ç a, e olh e be m outr a vez. É clar o qu e , mai s
ce d o ou mai s tard e , ire m o s en c o n t r á -la, ma s hoje faz sei s
se m a n a s qu e co n t r a t o u Ner o Wolf e para en c o n trar a m ã e
do beb ê , e já ga s t a m o s um boc a d o do se u din h e i r o , e voc ê
tev e bas t a n t e de s g o s t o s . Cas o co n s i g a ide n t i f i c á -la, vai
ec o n o m i z a r te m p o , din h e i r o e evit ar aborr e c i m e n t o s .
Se n t e - se per t o da l â mp a d a , es t á be m ?
Fec h o u os olh o s , esfr e g o u a te s t a co m a m ã o e se n -
tou- se. N ã o olh o u a fot o g r a f i a de nov o, s ó fez se n t a r - se e
fic ar olh a n d o para lon g e , te s t a fran zi d a , l á bio s ap er t a d o s .
De rep e n t e , virou a cab e ç a rá pid o e m mi n h a dire çã o e
dis s e :
— É clar o . Carol Mard u s .
Dei um a risa d a: — Sab e , dur a n t e es s a s sei s se m a n a s
já a vi de s d e ale g r e at é tris t e , ma s nu n c a a vi real m e n t e
abat i d a co m o ag or a . Ri- m e porq u e é en g r a ç ado.
— N ã o ach o gra ç a.
— Eu ac h o . Sin t o - m e ó tim o . Te m cer t e z a de qu e é
Carol Mard u s ?
— Si m . Claro. N ã o devi a ter cu s t a d o tan t o a le m brar-
me .
— Que m é e o que faz?
— Foi ela qu e m ajud o u Dick no co m e ç o. Era que m lia
os livro s para Dis t a f f , e co nv e n c e u Man n y Upt o n a ac e i t a r
as his t ó rias de Dic k. Mais tard e , col o c o u - a co m o edit o r a
de fic çã o. O qu e é at é hoje .
— Edit or a de fic çã o da Dis t a f f?
— Si m .
— N ã o es t av a na sua list a?
— N ã o. Ne m pe n s e i nel a. S ó a vi dua s ou tr ê s vez e s .
— C- A- R - O - L M - A- R - D - I - S ?

— U -S .

— Cas a d a ?
— N ã o pel o qu e eu sai b a . Foi cas a d a co m Willia m
Kru g e divor c i o u - se.
Levan t e i as sobr a n c e l h a s .
— Iss o é int e r e s s a n t e . N ã o es t av a na list a del e . H á
qua n t o te m p o se divor c i a r a m ?
— N ã o sei ao cert o . Crei o qu e h á qua tr o ou cin c o
ano s . S ó a con h e c i ap ó s ter cas a d o co m Dic k, as s i m co m o
a Willi s .
— Ten h o de lhe faz e r um a per g u n t a . Se ela é a m ã e,
e ag or a apo s t o dez co n t r a um, qual a pos s i b i l i d a d e . . . n ã o,
pos s i b i l i d a d e , n ã o. At é qu e pon t o é vero s s ímil o fato de
Dic k ser o pai?
— N ã o sei. Já lhe co n t e i sobr e Dic k, Archi e , Sei qu e
fora m be m ínti m o s , h á mu i t o s ano s . . . n ã o, n ã o sei, na
verd a d e , ma s alg u é m m e con t o u . Mas se ela é a m ã e... —
De rep e n t e leva n t o u - se. — Vou vê -la. Vou lhe faz er um a s
per g u n t a s .
— Agor a n ã o. — Ia se g u r á -la pel o bra ç o, ma s pa rei.
S ó se dev e mis t u r a r rela çõ es pe s s o a i s co m as profi s -
sio n a i s cas o seja ne c e s s á rio. — Vou- lhe dar um a ord e m .
Já fiz alg u n s ped i d o s e su g e s t õ es, e lhe con v e n c i a faz er
alg u m a s coi s a s , ma s nu n c a lh e dei um a ord e m . Agor a vou
dar. N ã o m e n c i o n e Carol Mard u s a nin g u é m, nin gu é m
me s m o , at é qu e eu per m i t a . N ão vai vê -la ne m lh e
tel e f o n a r . Est á be m ?
Ela sorri u: — De s d e qu e m e u pai morr e u , nin g u é m
me de u um a ord e m .
— Ent ã o já n ã o é se m te m p o . Vai faz er o qu e
ma n d e i ?
— Aper t e aqui. — Esti c o u a m ã o e eu a ap er t e i .
A at m o s f e r a se nor m a l i z o u outr a vez, ma s havia tra -
balh o para faz er . — Com o clie n t e , voc ê é o cr è m e de la
cr è m e . Pre c i s o dar um tel e f o n e m a de ne g ó cio s .
Na extr e m i d a d e da sal a havia um tel e f o n e de n t r o de
um arm á rio. Fui at é l á , abri a porti n h a e disq u e i . N ã o
fic ari a sur pr e s o se Fritz ate n d e s s e , poi s est a v a m tão
im e r s o s e m lit er a t u r a , ma s qu e m at e n d e u foi Saul. Dis se-
lhe qu e seri a mai s r á pid o se eu pud e s s e falar co m Wolf e ,
qu e log o at e n d e u :
— Si m?
— Est o u na cas a da Sra. Vald o n . Ela co n h e c e a
mu l h e r , ma s não mu i t o be m . O no m e dela é Carol
Mard u s . — Sol e t r e i - o. — É a edit o r a de fic çã o da revis t a
Dis t a f f . O pr é dio da Dis t a f f fica na Aveni d a Madi s o n na
Rua 52. H á alg u n s ano s foi í nti m a de Vald o n . De p o i s
ma n dar e i mai s det a l h e s . Para b é ns de nov o. Se n ã o é a
m ã e do be b ê en t ã o dev e sab e r qu e m é , co m cer t e z a . Vou
ag or a sair para de s c o b r i r o qu e fazia e m jan e ir o .
— N ã o — dis s e Wolf e . — Sau l vai.
— Esp e r e um ins t a n t e , fui de s c u i d a d o . — Virei- m e
para Lucy. — Dis s e qu e já a viu um a s dua s ou tr ê s vez e s .
Viu- a no ú lti m o inve r n o ?
Aban o u a cab e ç a: — Estav a pe n s a n d o nis s o . N ã o a vi
de s d e qu e Dic k morr e u .
Virei- m e para o tel e f o n e : — Saul? A Sra. Vald o n n ã o
a vê de s d e set e m b r o . N ã o se aproxi m e mu i t o dela, talv e z
ela es tr a n g u l e da mes m a for m a qu e and a: ma c i a e
corr e t a m e n t e . Era cas a d a co m Willi s Kru g , ma s se
se p a r a r a m h á quatr o ou cin c o ano s . Voc ê pod e co m e ç ar
co m ele , ma s talve z n ã o valh a a pe n a . Talve z n ã o qu e ir a
qu e alg u é m lhe fale a es s e re s p e i t o já qu e ne m a col o c o u
na list a. Ten h o um a su g e s t ã o a faz er .
— Qual é ? — dis s e Wolf e .
— O ch e f e del a é Man u e l Upt o n . H á cin c o se m a n a s
ele dis s e qu e se a Sra. Vald o n quis e s s e um favor, era s ó
pe dir. Ela podi a tel e f o n a r e per g u n t a r se Carol Mard u s
es t av a por aqu i no inve r n o pas s a d o . Mas ao inv é s de
si m p l i f i c a r as coi s a s , talv e z pos s a co m p l i c á -las.
— É mes m o . Saul se g u i r á a roti n a . Dig a à Sra.
Vald o n para n ã o me n c i o n a r Carol Mard u s a nin g u é m.
— Já dis s e .
— Dig a de nov o. Fiqu e co m ela. Distr a i a - a. N ã o a
per c a de vista . — Cliqu e , de s l i g o u .
Colo q u e i o fon e no ga n c h o , fec h e i a port a do m ó vel,
e virei- m e para Lucy:
— Sau l vai inve s t i g a r Carol Mard u s . Voc ê es t á sob
mi n h a res p o n s a b i l i d a d e . Devo con s e r v á -la sob vigil â nci a
con s t a n t e . O Sr. Wolf e co m p r e e n d e , sab e que voc ê qu e r i a
de s c o b r i r a m ã e para lh e puxar o cab e l o . Se voc ê sair de
cas a , dev o se g u i - la.
Ela te n t o u sorrir: — Est o u exa u s t a , Archi e — dis s e . —
Carol Mard u s !
— Aind a n ã o é cer t e z a , s ó dez a um — res p o n d i .

14
Doi s dias mai s tard e t ính a m o s cer t e z a , à s dez hor a s e
vint e min u t o s da noit e de quin t a - feira, qua n d o Sau l de u
se u ú lti m o tel e f o n e m a da Fl ó rida.
É clar o qu e o ass a s s i n a t o de Elle n Ten z e r é qu e
co m p l i c a v a tud o . Se o as s u n t o fos s e s ó a bu s c a da m ã e,
eu si m p l e s m e n t e pod e r i a ir ver Carol Mard u s , mo s t r a r a
fot o g r a f i a e lhe per g u n t a r co m o e ond e pas s a r a o ú lti m o
inver n o , e se ela te n t a s s e fin g ir dir- lhe - ia qu e era f á cil
de s c o b r i r se est iv e r a gr á vida e se tiver a um filh o e, res -
pon d e n d o à s per g u n t a s ela me ec o n o m i z a r i a te m p o e tra -
balh o . Mas era qua s e cert o qu e , se era a m ã e, ou as s a s s i -
nara Elle n Tenz e r , ou sabi a qu e m o fize r a , ou su s p e i t a v a
porta n t o , n ã o era t ã o f á cil.
Ign or e i as ins tr u çõ es de Wolf e sobr e ficar de olh o na
cli e n t e , já qu e ele pr ó prio ad m i t e qu e mu l h e r é a ú nic a
coi s a que co n h e ç o mai s do qu e ele , e fui sub s t i tuir Saul
na Pra ç a Was h i n g t o n . Ao ch e g a r ao es c r i t ó rio, no fim da
tard e de ter ç a- feira, ap ó s ter leva d o os fil m e s para Al
Pos n e r , já havia novid a d e s . Willi s Kru g , Julia n Haft e Leo
Bin g h a m tin h a m tel e f o n a d o para diz e r qu e n ão
rec o n h e c i a m ne n h u m dos ros t o s na s 54 fot o g r a f i a s , coi s a
qu e , no ca s o de Kru g , era sur pr e e n d e n t e , já qu e fora
cas a d o co m um a del a s . Saul já tel e f o n a r a dua s vez e s , a
pri m e i r a ant e s das qua tr o hor a s , para falar co m Wolf e
ant e s que subi s s e para a es t u f a , de c l ar a n d o qu e Carol
Mard u s se au s e n t a r a de se u e m p r e g o na Dis t a f f dura n t e
qua s e sei s m e s e s , de s d e o Dia do Trabal h o at é o final de
fev er e i r o . Tel e f o n a r a outr a vez ap ó s as sei s hor a s para
diz e r qu e ela ta m b é m n ã o es tiv e r a e m cas a , um apar t a -
me n t o na Rua 83 Les t e , e o apart a m e n t o n ão fora
sub l o c a d o . Iss o au m e n t a v a as prob a b i l i d a d e s para 50
con t r a um . Wolf e apr e c i o u o jant ar mai s do qu e o fize r a
na s ú lti m a s se m a n a s , e eu ta m b é m.
Um pou c o ant e s das onz e hor a s a ca m p a i n h a toc o u e
era Saul. Tom o u a mi n h a fre n t e , en c a m i n h a n d o - se para o
es c r i t ó rio e dis s e :
— Acab e i de faz e r um coi s a qu e feliz m e n t e m e u pai
nu n c a sab e r á . Jurei alg u m a coi s a , co m a m ã o no Nov o
Tes t a m e n t o . A B íblia est a v a de cab e ç a para baix o.
Wolf e de u um gru n h i d o : — Era inevit á vel?
— Era. Ess a pe s s o a é me i o pan c a d a . Ele ou ela est a v a
rec e b e n d o 50 ma n g o s para me diz er um a coi s a qu e tin h a
pro m e t i d o nu n c a diz e r a nin g u é m. Iss o n ã o foi se n s a t o . E
se o m e u pre ç o para co n t a r tud o fos s e s ó 60 ma n g o s ? De
qual q u e r jeit o, co n s e g u i o en d e r e ç o. — Tiro u a cad e r n e t a
de not a s do bols o e abri u- a. — Aos cuid a d o s da Sra.
Arth ur P. Jorda n , Sun s e t Drive , 14 2 4 , Praia s do Lido,
Sara s o t a , Fl ó rida. As coi s a s qu e fora m ma n d a d a s para l á
para Carol Mar d u s , no out o n o , fora m - lhe entr e g u e s . Ele
ou ela n ã o juro u na B í blia, ma s acr e dit e i e pa g u e i pela
infor m a çã o.
— Sati s f a t ó rio — dis s e Wolf e . — Talve z .
— É clar o qu e aind a é talv e z — co n c o r d o u Saul. — H á
um avi ã o qu e sai de Idle w i l d para Tam p a à s tr ê s hor a s e
vint e e cin c o mi n u t o s da ma dr u g a d a .
Wolf e fez um a car e t a: — Crei o qu e si m .
Ele det e s t a avi õ es. Su g e r i apa n h a r o se d ã Her o n e
levar Sau l at é Idle w i l d , ma s Wolf e dis s e qu e n ã o, por qu e
eu pre c i s a v a est a r na Pra ç a Was h i n g t o n à s dez hora s da
ma n h ã . Sab e o qua n t o boc e j o se dur m o pou c o .
Sau l tel e f o n o u qua tr o vez e s da Fl ó rida. Quart a- feira
à tard e , dis s e qu e Su n s e t Drive , 14 2 4 era a resi d ê ncia do
Sr. e Sra. Arth u r P. Jorda n , e Carol Mard u s fora h ó sp e d e
del e s dura n t e o out o n o e o inve r n o . Na se g u n d a - feira à
noit i n h a , tel e f o n o u para diz er qu e Carol Mard u s es tiv e r a
gr á vida, co m tod a a cert e z a , e m nov e m b r o e dez e m b r o .
Quin t a - feira à tard e tel e f o n o u diz e n d o qu e no dia 16 de
jan e ir o ela fora levad a ao Ho s p i t a l Geral de Sara s o t a e
naq u e l a noit e tiver a um m e n i n o . Na qui n t a - feir a à noit e ,
à s dez hora s e vint e min u t o s co m u n i c o u qu e es t a v a no
Aero p o r t o Int er n a c i o n a l de Tam p a , qu e Clara Waldr o n ,
co m um beb ê , to m a r a um avi ã o de l á para Nov a Iorq u e no
dia 5 de feve r e i r o , e qu e e m tr ê s hor a s el e faria o m e s m o .
Wolf e e eu de s l i g a m o s . A ca ç ada ter m i n a r a: 45 dia s .
Ele olh o u para mi m:
— Qua n t o já ga s t a m o s do din h e i r o dela?
— Cerc a de 1. 4 0 0 d ó lar e s .
— Bob a g e m . Dig a a Fred e Orrie que n ã o pre c i s a mo s
mai s del e s . E ta m b é m à Srta. Cob e r t t . Dig a à Sra. Valdo n
qu e pod e voltar para a cas a da praia. Dev olv a as c â me r a s .
— Si m , se n h o r .
— Que ch a t o ! Seri a tud o t ã o si m p l e s , se n ã o fos s e
por aqu e l a mul h e r !
— A as s a s s i n a d a . Seri a, si m .
— Mas ela lh e de u um cop o de á gua .
— Tolic e . Se dis s é ss e m o s tud o a Cra m e r ag or a ,
incl u i n d o a m e n s a g e m , o ú nic o probl e m a seria qu e n ó s
go s t a r í am o s que ho uv e s s e doi s julg a m e n t o s se p a r a d o s .
N ã o ape n a s n ó s doi s , ma s a clie n t e ta m b é m go s t a r i a .
Pos s o tel e f o n a r para Park e r e lhe per g u n t a r o que é pior,
es c o n d e r prova s ou te n t a r imp e d i r a justi ç a.
Aper t o u os l á bio s , res pir o u fun d o um a vez, de p o i s
outr a:
— Te m alg u m a su g e s t ã o?
Ten h o um a d ú zia. Há dois dias qu e voc ê e eu
sab e m o s qu e ter íam o s de enfr e n t a r iss o . Pod e m o s falar
co m Carol Mard u s ap e n a s sobr e o beb ê , se m me n c i o n a r
Elle n Tenz e r , s ó per g u n t a r o qu e fez do be b ê , para ver o
qu e ac o n t e c e . É re m o t a m e n t e pos s í vel, ma s ain d a as s i m
exis t e a pos s i b i l i d a d e de qu e ela si m p l e s m e n t e te n h a se
livrad o do be b ê , coi s a que n ã o é dif í cil de con s e g u i r , que
n ã o so u b e s s e ond e ele est a v a , e ten d o lido o arti g o na
Gaz e t t e a res p e i t o da Sra. Vald o n , fica s s e curi o s a , ou
de s c o n f i a d a . Se g u n d a su g e s t ã o: pod íam o s te n t a r res o lv e r
o res t o do co m p r o m i s s o as s u m i d o co m a cli e n t e . Voc ê
dev e r i a de s c o b r i r a ide n t i d a d e da m ã e. Iss o foi feit o . Voc ê
tin h a ta m b é m qu e de m o n s t r a r o gra u de prob a b i lidad e de
Vald o n ser o pai. Ant e s de enfr e n t a r m o s Carol Mard u s
pod í am o s faz e r um a inve s t i g a çã o de roti n a a res p e i t o de
Vald o n e ela na pri m a v e r a do ano pas s a d o .
Ele aba n o u a cab e ç a: — Levari a te m p o e ga s t a r í a mo s
mai s din h e i r o . Voc ê ir á falar co m Carol Mard u s .
— N ã o, se n h o r — res p o n d i , enf a t i c a m e n t e —, voc ê é
qu e vai. Já fui ver Elle n Tenz e r . Fui ver a Sra. Vald o n 20
vez e s en q u a n t o voc ê a viu ap e n a s dua s vez e s . Exe c u t o as
tar e f a s , ma s voc ê é qu e é o res p o n s á vel. Quer vê -la de
ma n h ã ?
Olh o u - me aborr e c i d o . Outra mul h e r co m qu e m con -
vers ar ! Mas n ã o podi a ne g a r qu e eu tin h a raz ã o. De p o i s
de de c i d i d o o as s u n t o , dei outr a su g e s t ã o: que n ã o havia
pre s s a e m diz e r à cli e n t e qu e a bus c a da m ã e ter m i n a r a
defi n i t i v a m e n t e ; seri a m e l h o r es p e r a r at é qu e tiv é ss e mo s
con v e r s a d o co m a pr ó pria m ã e do be b ê .
Ante s de ir deit ar , tel e f o n e i para Fred Durki n , Orrie
Cath e r e Sally Corb e t t , a fim de lhe s diz e r que o cas o fora
en c e r r a d o , do pon t o de vista de Wolf e , para n ã o falar no
me u . Tam b é m pe n s e i e m ligar para o apar t a m e n to de
Carol Mar d u s na Rua 83, a fim de co nvi d á -la para no s
visit ar no dia se g u i n t e de ma n h ã , ma s ac h e i m e l h o r n ã o
per m i t i r que tive s s e a noit e tod a para pe n s a r no as s u n t o .
De s c o b r i , na sext a- feira de ma n h ã , qu e na realid a d e
tiver a a noit e tod a para pe n s a r . Plan e j e i lig ar para se u
es c r i t ó rio l á pel a s dez hora s , ma s à s dez para as nov e ,
qua n d o es t av a na cozi n h a co m e n d o ba c o n e boli n h o s de
mil h o co m m e l , o tel e f o n e toc o u . Ate n d i na cozi n h a e
dis s e as palavr a s habi t u a i s . Um a voz de mul h e r dis s e qu e
go s t a r i a de falar co m Ner o Wolf e . Re s p o n d i qu e iss o s ó
seri a pos s í vel dep o i s das onz e hora s , qu e eu era se u
as s i s t e n t e co n fi d e n c i a l e talv e z pud e s s e ajud ar .
— O se n h o r é Archi e Good w i n ? — per g u n t o u ela.
— So u .
— Talve z já te n h a ouvid o m e u no m e . Carol Mard u s
— Si m , Srta. Mard u s , já ouvi.
— Est o u tel e f o n a n d o para per g u n t a r . . . — fez um a
pau s a . — So u b e qu e est ã o faz e n d o per g u n t a s a m e u res -
peit o . Aqui e m Nova Iorq u e e ta m b é m na Fl ó rida. Sab e
alg u m a coi s a a res p e i t o ?
— Sim . As per g u n t a s fora m feit a s a pe di d o do Sr.
Wolf e .
— Por qu e . . . — fez outr a pau s a — por qu ê ?
— Ond e est á , Srta. Mard u s ?
— Nu m a cabi n e tel e f ô nic a. Est o u ind o para o
es c r i t ó rio. Iss o te m imp o r t â nci a?
— Talve z te n h a . E m e s m o qu e es t e j a nu m a cabi n e
fec h a d a , pref e r i a n ã o dis c u t i r o as s u n t o por tel e f o n e . Su -
pon h o qu e a se n h o r i t a ta m b é m n ã o dev e go s t a r . Tom o u
mu i t o cuid a d o e fez mui t a de s p e s a para que o be b ê
fic a s s e e m se g r e d o .
— Que be b ê ?
Ora, vam o s . É mui t o tard e para iss o . Mas se insi s t e
e m obt e r um a res p o s t a , o Sr. Wolf e pod e r á ate n de- la à s
onz e hor a s , aqui no es c r i t ó rio del e .
Um a pau s a mai o r: — Pos s o ir ao m e i o - dia.
Assi m seri a ó tim o . Fala n d o por mi m , Srta. Mar du s,
es t o u ag u a r d a n d o sua visit a co m praz e r .
Ao de s l i g a r e volt ar para os boli n h o s de mil h o , ia
pe n s a n d o : “Est o u m e s m o ! Qua n t o te m p o lev e i para ach á -
la.”
Ao ter m i n a r a se g u n d a x ícara de caf é , fui ao es c r i -
t ó rio e fiz mi n h a s tare f a s . Tel e f o n e i para a es t u f a pel o
int e r f o n e . Se nad a lhe co m u n i c a s s e , Wolf e est a r i a cer t o
de qu e iria v ê -la na poltr o n a ver m e l h a qua n d o de s c e s s e ,
poi s me dera ins tr u çõ es para traz ê -la ao es c r i t ó rio à s
onz e hora s , e ficari a sati s f e i t o ao sab e r qu e teria um
int e r v a l o de um a hor a ant e s de pre c i s a r trab al h a r .
Qua n d o lhe co n t e i que ela lhe pou p a r a un s n í qu e i s ao no s
cha m a r , e qu e aqui es t ar i a ao m e i o - dia, res p o n d e u :
— Bo m !
O int e rv a l o seri a ó tim o para mi m ta m b é m. Dis s e a
Fritz que ia sair. Fui at é à Rua 11, dis s e a Lucy qu e
t ính a m o s su s p e n d i d o a farra na Pra ç a Was h i n g t o n e qu e
mai s tard e co n t a r i a tud o , tirei as c â m e r a s do carri n h o do
be b ê , lev e i- as de volt a para Al Pos n e r e dis s e - lhe qu e
ma n d a s s e a co n t a .
Qua n d o a ca m p a i n h a da rua toc o u à s doz e hora s e
dez mi n u t o s , fui at é a porta e vi, afin a l , a m ã e e m pe s s o a ;
mi n h a pri m e i r a impr e s s ã o foi que , se Ric h a r d Vald o n se
dis tr a í a co m iss o qua n d o tin h a Lucy, era lou c o . Se fos s e
20 ano s mai s velh a , n ã o seri a exa g e r o cha m á -la de brux a.
Mas ap ó s lev á -la ao es c r i t ó rio e se n t a r - m e na min h a pol -
tron a , enq u a n t o ela se aco m o d a v a na poltr o n a ver m e l h a ,
fiqu e i a en c a r á -la. O rost o virad o para Wolf e era tot al -
me n t e dif er e n t e : era um ros t o doc e e pic a n t e , agra d á vel
— talv e z agr a d á vel n ã o seja a palavr a cert a . Ape n a s ela
n ã o mo s t r a r a es s a fac e t a a qu e m lhe abrir a a porta . Al é m
dis s o , sua voz n ã o est a v a doc e qua n d o dis s e a Wolf e co m o
es t av a co n t e n t e e m est ar e m sua cas a e co n h e c ê -lo. Era
ó bvio qu e a ous a d i a qu e sua voz e olh o s tran s m i t i a m n ã o
era fin g i d a ; era nat u r a l , na s c e r a co m ela.
Wolf e rec o s t a r a - se, en c a r a n d o - a:
— Pos s o lhe devo lv e r o cu m p r i m e n t o , ma d a m e —
res p o n d e u ele —, te n h o mu i t o praz e r e m co n h e c ê -la. H á
sei s se m a n a s qu e a pro c u r o .
— Proc u r a r - m e ? A mi m ? Me u no m e est á no cat á lo go.
Na revis t a Dis t a f f , m e u no m e est á no cab e ç alh o . — Sua
voz e olh ar dava m a en t e n d e r qu e teria ador a d o falar co m
ele .
Wolf e ac e n o u : — Mas eu n ã o sabi a dis s o . Sabi a
ape n a s qu e tiver a um filh o e livrara- se del e . Tive de...
— O se n h o r n ã o sabi a qu e eu tive um filh o . N ão
podi a sab e r .
— Agor a sei. Enq u a n t o es t av a gr á vida, dura n t e os
ú lti m o s qua tr o m e s e s , es t e v e hos p e d a d a na cas a da Sra.
Arth ur P. Jorda n e m Sara s o t a , Fl ó rida. De u en tr a d a no
Ho s p i t a l Geral de Sara s o t a no dia 16 de jan e ir o , co m o
Clara Waldr o n , e o beb ê nas c e u naq u e l a noit e . No dia 5
de feve r e i r o , qua n d o to m o u um avi ã o e m Tam p a para
Nov a Iorq u e , aind a co m o Clara Waldr o n , o beb ê es t av a
co m a se n h o r a . O qu e fez co m el e e ond e el e es t á agor a ?
Ela de m o r o u a res p o n d e r , ma s a voz era qu a s e a
me s m a :
— N ã o vim at é aqui para res p o n d e r a per g u n t a s . Vim
faz e r alg u m a s . O se n h o r ma n d o u um ho m e m faz er
per g u n t a s a m e u res p e i t o aqui e m Nov a Iorq u e e na Fl ó -
rida. Por qu ê ?
Wolf e aper t o u os l á bio s .
— N ã o h á raz ã o mai s para es c o n d e r iss o — con c o r -
dou el e . — O retr a t o , Archi e .
Tirei a fot o g r a f i a de de n t r o da gav e t a e dei- a para
ela. Ela olh o u para o retr a t o , para mi m , nova m e n t e para a
fot o g r a f i a e para Wolf e .
— Nu n c a vi iss o ant e s . Ond e a tiro u ?
— No carri n h o do be b ê havia c â m e r a s fot o g r á fica s ,
lá na Pra ç a Was h i n g t o n .
Iss o a con f u n d i u . Abriu a boc a , deix o u - a as si m alg u m
te m p o e dep o i s fec h o u - a. Olho u de novo a foto g r a f i a ,
se g u r o u - a entr e o pol e g a r e o indi c a d o r , ras g o u - a, tor n o u
a ras g a r e col o c o u os pe d a c i n h o s na m e s i n h a ao se u lado.
— N ó s te m o s mai s — dis s e Wolf e — se qui s e r levar de
le m b r a n ç a.
Torn o u a abrir e fec h a r a boc a , ma s n ã o emitiu
ne n h u m so m . .
— No total — co n t i n u o u Wolf e — tirar a m retr a t o de
mai s de 10 0 pe s s o a s , ma s o se u me r e c e u um de s t a q u e
es p e c i a l porq u e a se n h o r a ch e g o u à pra ç a de t á xi, co m o
ú nic o obje t iv o de olh ar o beb ê naq u e l e det e r m i n a d o
carri n h o , poi s vira o retr a t o del e e da enf e r m e i r a nu m
jornal. A se n h o r a dis s e . . .
— Me u De u s — dis s e final m e n t e —, foi por es s e
mo t iv o que ela fez iss o . O se n h o r foi o cul p a d o .
— Eu su g e r i . A se n h o r a dis s e qu e n ã o veio res p o n der
à s per g u n t a s , ma s si m p l i fi c a r á tud o se fize r o qu e pe ç o.
Con h e c e o Sr. Leo Bin g h a m ?
— O se n h o r sab e qu e si m , já and o u m e inve s t i g a n d o .
— Con h e c e o Sr. Julia n Haft?
— Si m .
— Con h e c e o Sr. Willi s Kru g , já qu e foi cas a d a co m
ele . Tod o s os retr a t o s tirad o s por aqu e l a s c â m e r a s fora m
mo s t r a d o s a es s e s tr ê s ho m e n s . Alg u m del e s é o pai de
se u be b ê ?
— N ã o!
— O pai era Ric h a r d Vald o n ?
Ne n h u m a res p o s t a .
— Quer faz e r o favor de res p o n d e r , mad a m e ?
— N ã o.
— N ã o qu e r res p o n d e r , ou el e n ã o era o pai.
— N ã o vou res p o n d e r .
— Eu a ac o n s e l h o a res p o n d e r . Já se sab e qu e anti -
ga m e n t e a se n h o r a tev e lig a çõ es í nti m a s co m Ric h a r d
Val don . Se con t i n u a r m o s a inve s t i g a r , ficar e m o s sab e n d o
se ren o v o u es s a s lig a çõ es na pri m a v e r a do an o pas s a d o .
Ne n h u m co m e n t á rio.
— Quer res p o n d e r ?
— N ã o.
— Nu m a data pos t e r i o r , a se n h o r a deix o u o beb ê no
ves t í bul o da cas a da Sra. Vald o n na Rua 11?
Ne n h u m a res p o s t a .
— Quer faz e r o favor de res p o n d e r ?
— N ã o.
— A se n h o r a es c r e v e u a m e n s a g e m qu e es t av a pre sa
co m um alfi n e t e no cob e r t o r do be b ê , qua n d o el e foi
col o c a d o no ves t í bul o da Sra. Vald o n ? Quer faz e r o favor
de res p o n d e r ?
— N ã o.
— Rec o m e n d o - lh e qu e res p o n d a a est a per g u n t a ,
mad a m e . Com o sabi a qu e o be b ê qu e a Sra. Vald o n tin h a
e m cas a , co nf o r m e foi dito no arti g o de jornal, era o se u
be b ê ?
Ne n h u m a res p o s t a .
— Por favor, re s p o n d a .
— N ã o.
— Ond e a se n h o r a est e v e na noit e de do m i n g o , 20 de
mai o ? Por favor, res p o n d a .
— N ã o.
— Ond e a se n h o r a est e v e na noit e de sext a - feira, 8 de
junh o ? Por favor, res p o n d a .
Ela leva n t o u - se, sai u , e, para ser just o , ca m i n h o u
alta n e i r a e suav e m e n t e . Teria de and ar r á pid o se quis e s s e
ch e g a r à port a da fre n t e ant e s del a, port a n t o , fui ape n a s
at é o corr e d o r . Dep o i s qu e sai u e fec h e i a port a , en tr e i no
es c r i t ó rio, volt e i para mi n h a es c r iv a n i n h a , se n t e i - me e
olh e i para Wolf e . Ele olh o u de volt a para mi m .
— Grrr — dis s e ele .
— Aqu e l a ú lti m a per g u n t a . . . — fale i.
— Que é qu e te m ?
— Talve z fos s e um pou c o . . . h ã ... pre m a t u r a . É
pos s ível, ma s é um a hip ó te s e re m o t a , qu e nad a saib a a
res p e i t o de Elle n Ten z e r . Se a id é ia era faz er co m qu e ela
co m e ç as s e a inve s t i g a r , n ã o dev e r í am o s ter Sau l de pron -
tid ã o? Ou tod o s os tr ê s?
— Bob a g e m . Ser á qu e ela é tola?
— N ã o.
— Ent ã o at é o pr ó prio Saul podi a se g u i - la?
— É prov á vel que n ã o. Ent ã o por qu e lh e per g u n tou
sobr e o dia 8 de jun h o ?
— Ela veio aqui para de s c o b r i r o qua n t o sab e m o s .
Vale u a pe n a ter dito a ela qu e nos s o int e r e s s e n ã o se
res tr i n g e s ó ao be b ê e se u s pai s, que es t a m o s ta m b é m
pre o c u p a d o s , m e s m o qu e ape n a s de pas s a g e m , co m o as -
sas s i n a t o de Elle n Ten z e r .
— OK. — Duvid a v a qu e tud o es tiv e s s e be m , ma s n ã o
adia n t a v a fic ar insi s t i n d o . — E o qu e far e m o s a se g u i r ?
— N ã o sei. — Olho u - me , zan g a d o . — Que diab o , n ã o
so u um rel â mp a g o . Vou pe n s a r . Provav e l m e n t e vou
qu e r e r ver o Sr. Bin g h a m , o Sr. Haft e o Sr. Kru g, para
lhe s per g u n t a r por qu e n ã o a rec o n h e c e r a m , ma s pod e
ser qu e is s o n ã o te n h a imp o r t â ncia. Vou pe n s a r . Ser á qu e
ela vai falar co m a Sra. Vald o n ? Ser á qu e est á ind o para
lá ag or a ?
— N ã o. Pod e apo s t a r o qu e qui s e r .
— Ser á qu e a Sra. Vald o n ou o be b ê es t ã o e m peri g o ?
Pe n s e i dur a n t e cin c o se g u n d o s e aba n e i a cab e ç a:
— Creio qu e n ã o.
— Eu ta m b é m. Vá falar co m ela e dig a qu e volt e para
a praia. Vá co m ela, ac o m p a n h e - a. Volt e es s a noit e . Se
fic ar aqui vai me am o l a r e vam o s aca b a r brig a n d o .
Ama n h ã fare m o s alg u m a coi s a . S ó n ã o sei o qu ê .
— A Sra. Vald o n vai qu e r e r ficar co m se u pr ó prio
carr o na prai a — prot e s t e i . — Dep o i s de lhe con t a r tud o ,
ter e i tod a a tard e e a noiti n h a para verifi c a r o que Carol
Mard u s fez no dia 20 de mai o .
— N ã o! — De u um murr o na m e s a . — Um idio t a
pod e r i a faz e r iss o . Ser á qu e n ã o te n h o ima g i n a çã o? N ã o
so u es p e r t o ? So u um idio t a ?
Levan t e i - me: — N ã o me per g u n t e porq u e re s p o n d o .
Be m que eu pos s o . Dig a a Fritz para gu ar d a r um pou c o de
lag o s t a para mi m qua n d o eu voltar hoj e à noit e . A co m i d a
na praia dev e r á ser pou c a .
E sa í , te n d o pri m e i r o sub i d o para ves t ir um a ca m i s a
lim p a .
De s s e mo d o , cin c o hora s mai s tard e es t av a est i c a d o
na arei a, à beir a do Atl â ntic o . Se es ti c a s s e o bra ç o, m e u s
de d o s toc ar i a m na clie n t e . Sua rea çã o ao rela t ó rio fora
t ípic a de um a mul h e r . Quer i a sab e r o que Carol Mard u s
dis s e r a , palavr a por palavr a , qual era a su a apar ê ncia e o
qu e ves t i a . Dava a ent e n d e r qu e o mo d o co m o se ves t i a
tin h a um a influ ê nci a dire t a na res p o s t a à per g u n t a :
“Ric h a r d Valdo n era o pai do be b ê ?”, ma s é clar o qu e ne m
lig u e i para iss o . N e n h u m ho m e m co m um pou c o de ju í zo
pod e sup o r qu e as palavr a s de um a mul h e r te n h a m ,
exat a m e n t e , o m e s m o sig n i f i c a d o para am b o s .
É clar o qu e que r i a sab e r o qu e ir í am o s faz e r ag or a .
Re s p o n d i qu e , se sou b e s s e , n ã o es t ar i a ag or a naq u e l e mo -
me n t o co m ela, est a r i a e m outr o lug a r a exe c u t á -lo.
— A dific u l d a d e — dis s e eu — é qu e o Sr. Wolf e é um
g ê nio. Um g ê nio n ã o se pre o c u p a co m o trab a l h o nor m a l ,
co m o ma n d a r se g u i r alg u é m. Te m qu e faz e r acr o b a c i a s ,
to m a r o ca m i n h o mai s curt o . Qual q u e r pe s s o a pod e tirar
um co e l h o do ch a p é u, ent ã o ele te m de tirar o ch a p é u do
co e l h o . Esta noit e ficar á se n t a d o no es c r i t ó rio, rec o s t a d o ,
os olh o s fec h a d o s , mov e n d o os l á bio s para de n t r o e para
fora, para de n t r o e para fora. Talve z te n h a sid o de s s e
mo d o qu e Newto n de s c o b r i u a lei da gravi d a d e ,
rec o s t a d o , de olh o s fec h a d o s e mov e n d o os l á bio s .
— N ã o foi as s i m . Foi um a ma çã qu e cai u.
— Claro. Estav a de olh o s fec h a d o s e a ma çã bat e u no
nariz del e .
Pou c o dep o i s da me i a- noit e , ao voltar para a velh a
cas a de tijolo s , es p e r a v a en c o n t r a r e m mi n h a m e s a um
rec a d o diz e n d o qu e fos s e ao quar t o de Wolf e à s oit o
hor a s e quin z e mi n u t o s da ma n h ã , ma s n ã o havia nad a .
Evid e n t e m e n t e sua ima g i n a çã o e es p e r t e z a n ã o tin h a m
prod u z i d o nad a . Mas as de Fritz tin h a m . Havia na coz i nh a
um prat o de lag o s t a à la Card e a l e um pir e s co m qu e ij o
par m e s ã o ralad o . Colo q u e i o qu e ij o por ci m a e pus no
for n o , beb i leit e e fiz caf é en q u a n t o o prat o grati n a v a .
Enq u a n t o iss o , pe n s a v a qu e , qua n d o Fritz de s c e s s e ap ó s
ter lhe leva d o a ban d e j a de caf é , talv e z tro ux e s s e ins tr u -
çõ es para eu subir e rec e b e r ord e n s . Agor a qu e de s c o b r í -
ram o s a m ã e, pre c i s á vam o s de s c o b r i r um rev ó lver.
Nad a feit o . Qua n d o Fritz volt o u à cozi n h a no s á bad o
de ma n h ã , à s oit o hor a s e vint e mi n u t o s n ã o dis s e nad a . E
eu qu e s ó dor m i r a sei s hor a s para es t ar ac or d a d o a
te m p o ! De c i d i provo c á -lo um pou c o , seri a m e l h o r v ê -lo no
quart o ant e s de sub ir para ver as orqu íde a s . Ent ã o co m i
de pr e s s a os ovo s es c a l d a d o s à la Cre ol e e os p ã ezi n h o s
torra d o s , de s i s t i da se g u n d a x í cara de caf é e es t av a
empurran d o a cad e i r a para m e leva n t a r qua n d o o tel e -
fon e toc o u .
Era Saul . Per g u n t o u se ouvir a o noti c i á rio das oit o
hor a s e trin t a min u t o s e res p o n d i qu e n ã o, est a v a pe n -
san d o .
— Ent ã o tra g o m á s not í cia s — dis s e . — H á cer c a de
tr ê s hor a s , um tira en c o n t r o u um cad á ver, nu m a rue l a
qu e d á e m Perry Str e e t , qu e foi ide n t i f i c a d o co m o Carol
Mard u s . Ela foi es tr a n g u l a d a .
Tent e i falar alg u m a coi s a , ma s o so m n ã o sa ía. Mi -
nha gar g a n t a est av a ent u p i d a . Pig arr e e i : — Mais alg u m a
coi s a ?
— N ã o, foi s ó iss o .
— Obri g a d o . N ã o pre c i s o lhe diz e r para ficar de bic o
cala d o .
— É clar o .
— E ag u a r d e . — De s li g u e i .
Olh e i o rel ó gio: faltav a m oito mi n u t o s para as nov e
hor a s . Fui at é o corr e d o r , sub i um and ar , en c o n t r e i a
porta ab er t a e en tr e i . Wolf e ter m i n a r a o caf é e es t av a de
p é , e m ma n g a s de ca m i s a , co m o pal e t ó na m ã o.
— O qu e foi? — per g u n t o u .
— Sau l aca b a de tel e f o n a r dan d o um a not í cia qu e foi
dad a ag or a no noti c i á rio das oit o hor a s e trint a mi n u tos.
O cor p o de Carol Mard u s foi en c o n t r a d o nu m a ruel a por
um tira. Estr a n g u l a d a .
Su a cara fic o u fer oz: — N ã o!
— Si m .
Atiro u o pal e t ó para mi m .
Pas s o u por pert o , ma s n ã o o apa n h e i , poi s es t av a
ator d o a d o . Ne m acr e d i t a v a qu e ele tive s s e feit o iss o .
Enq u a n t o ficav a im ó vel, s ó a olh á -lo, ele foi at é o tel e fon e
int e r n o , qu e ficav a nu m a m e s a per t o da jan e l a , aper tou o
bot ã o, leva n t o u o fon e e dis s e , nu m a voz ch e i a de raiva:
— Bo m dia, The o d o r e . N ã o irei vê -lo est a ma n h ã .
Colo c o u o fon e no ga n c h o e co m e ç ou a and ar de um
lad o para o outr o . Jamai s fize r a is s o . De p o i s de m e i a
d ú zia de volta s , apa n h o u o pal e t ó , ves t i u - o e diri gi u - se
para a port a.
— Para ond e vai? — per g u n t e i .
— Para a es t u f a — dis s e , ao mes m o te m p o qu e
ca m i n h a v a para o el ev a d o r . Ele n ã o es t av a bo m da cab e -
ç a. De s c i e fui beb e r mi n h a se g u n d a x í cara de caf é .

15

Qua n d o Wolf e en tr o u no es c ri t ó rio, às onz e hor a s ,


pre s u m i n d o - se qu e tive s s e se g u i d o a roti n a habi t u a l ,
en c o n tro u na sua m e s a um rec a d o qu e dizi a:

9h 22 mi n — Est o u indo para a praia. Já tel e f o n e i para a Sra.


Val don co m u n i c a n d o - lhe que ia. Se ela ouvir o noti c i á rio pod e
ficar t ã o pert u r b a d a co m o voc ê e faz e r alg u m a toli c e . Crei o
que con t i n u a re m o s a agir e dire i is s o a ela. Dev o est a r de volt a
para o al m o ç o. O tel ef o n e da cas a del a es t á no cart ã o.
AG

Na reali d a d e , o n ú me r o de tel e f o n e seri a in ú til, se


tive s s e qual q u e r coi s a ur g e n t e para me diz e r , porq u e na -
qu e l e mo m e n t o e m qu e lia o rec a d o eu es t av a no Her o n ,
co m a cli e n t e ao lad o, est a c i o n a d o sob um a á rvor e no
aco s t a m e n t o da es tr a d a . Com o havia doi s con vi d a d o s
para o fim de se m a n a na cas a , al é m da e m p r e g a d a , da
cozi nh e i r a e da arru m a d e i r a , n ã o dava para se ter um a
con vers a parti c u l a r , port a n t o tro ux e r a Lucy no carr o
ant e s de lhe con t a r a not í cia. Agor a, es t a c i o n a d o , podi a
dar- lhe tod a a min h a at e n çã o, e be m qu e ela pre c i s a v a
dis s o . Se g u r a v a meu bra ç o co m for ç a e se u s de n t e s
es t av a m crava d o s no l á bio.
— Est á be m — dis s e eu —, é dif í cil, é mu i t o dif ícil.
Todo s es t e s se: se voc ê n ã o tive s s e co n tr a t a d o Ner o
Wolf e , eu n ã o teria en c o n t r a d o Elle n Tenz e r e, se n ã o a
tive s s e en c o n t r a d o , n ã o teria sid o as s a s s i n a d a . Se voc ê
n ã o tive s s e ajud a d o co m aqu e l e arti g o no jorn al, e co m o
carri n h o do be b ê , n ã o ter íam o s en c o n t r a d o Carol Mar dus
e, se n ã o a tiv é ss e m o s en c o n t r a d o , ela n ã o teria sid o
as s a s s i n a d a . Mas voc ê te m qu e . . .
— Mas voc ê sab e m e s m o se iss o é verd a d e , Archi e ?
— N ã o. Sei o qu e Saul m e con t o u e o qu e ouvi no
rá dio ao vir para c á . Ape n a s o qu e lhe co n t e i . Mas apo s t o
um mil h ã o con t r a um qu e é por iss o qu e ela morr e u . Voc ê
si m p l e s m e n t e te m qu e ign o r a r os se. Se qui s e r parar por
cau s a dos ris c o s qu e ter á de enfr e n t a r se con t i n u a r ,
talv e z seja um a coi s a se n s a t a . . .
— N ã o qu e r o parar.
— N ã o qu e r? — cre i o qu e olh e i - a est u p e f a t o .
— N ã o. Quer o qu e N er o Wolf e o de s c u b r a . Apa nh e - o.
O ho m e m qu e . . . o as s a s s i n o , el e mat o u tod a s as dua s , n ã o
mat o u ?
— Si m .
— Ele p ô s o be b ê no m e u ves t í bul o, n ã o foi?
— Foi. Iss o é qua s e cert o .
— Ent ã o qu e r o qu e Ner o Wolf e o apa n h e .
— Os tira s vã o apa n h á -lo, mai s ced o ou mai s tard e .
— Quer o qu e Ner o Wolf e o apa n h e .
Pe n s e i co m i g o me s m o , a ge n t e nun c a sab e co m o as
coi s a s vã o ser. Perd e r a m e u te m p o co m os se, ma s ele s
n ã o mai s a inc o m o d a v a m . Talve z fos s e ap e n a s um a qu e s -
t ã o de qua n t i d a d e , podi a se n t i r- se res p o n s á vel por um
as s a s s i n a t o , ma s n ã o por dois . De qual q u e r mo d o , min h a
tar e f a tor n a r a - se co m p l e t a m e n t e dif er e n t e do qu e eu
es p e rara.
— É clar o qu e o Sr. Wolf e go s t a r i a de apa n h á -lo —
res p o n d i . — Eu ta m b é m. Mas voc ê é cli e n t e del e e pre c i s a
co m p r e e n d e r qu e iss o mu d a toda a sit u a çã o. No cas o de
Elle n Ten z e r , pod í am o s diz e r qu e ne n h u m a co n e x ã o fora
feit a entr e sua mor t e e o trab a l h o para o qual o Sr. Wolf e
fora con t r a t a d o , e, provav e l m e n t e , teria m qu e ac e i t a r o
qu e dis s e m o s . Mas co m Carol Mard u s o cas o mu d a por
co m p l e t o . Se n ã o dis s e r m o s o qu e sab e m o s sobr e ela, iss o
incl u i voc ê ta m b é m, est ar í am o s defi n i t i vam e n t e
es c o n d e n d o prova s imp o r t a n t e s nu m cas o de ho m i c ídio e
n ã o pod e m o s diz e r que n ã o sab í am o s que era prova
imp o r t a n t e . É clar o qu e sab e m o s . Ent ã o se n ã o co n t a r m o s
e a pol ícia de s c o b r i r e apa n h a r o as s a s s i n o ant e s de n ó s,
es t a m o s per di d o s . N ó s, o Sr. Wolf e e eu, n ã o ape n a s
perd e r í am o s no s s a s lic e n ç as, pod e r íam o s ser pre s o s por
um a ac u s a çã o de delit o grav e . Voc ê n ã o te m . . .
— Archi e , n ã o...
— Deix e - m e ter m i n a r . Voc ê n ã o te m um a lic e n ç a a
perd e r , ma s voc ê ta m b é m pod e r i a ser ac u s a d a de delit o
grav e . Duvid o mui t o qu e fize s s e m a ac u s a çã o, ma s voc ê
es t ar i a vuln e r á vel. Quer o deixar iss o be m clar o ant e s de
voc ê de c i d i r o qu e faz e r .
— Mas voc ê qu er diz e r ... voc ê iria para a cad e i a ?
— É pos s í vel.
— Est á be m .
— Est á be m o qu ê ?
— De s i s t o .
— Que diab o s , Lucy, ou voc ê tor c e u tud o ou ent ã o fui
eu. N ã o qu e r e m o s qu e voc ê de s i s t a . Mas n ã o qu e r e mo s
m e s m o . O Sr. Wolf e es t á lí vido de raiva. Fic o u abor reci d o
co m o fato de Elle n Tenz e r ter sid o as s a s s i n a d a porq u e
ma n d o u vê -la, ma s iss o n ã o foi nad a co m p a r a d o co m
ag or a . Se el e n ã o apa n h a r o ho m e m qu e mat o u Carol
Mard u s , n ã o vai con s e g u i r co m e r dura n t e um ano. S ó
qu e r i a deix ar clar o a qu e voc ê se exp õ e, se con t i n u a r .
— Mas voc ê pod e ir para a cad e i a !
— Iss o é probl e m a meu. É meu ne g ó cio, so u um
de t e t i v e . Deix e iss o co n o s c o . Os tira s n ã o sab e m que h á
um a con e x ã o entr e Carol Mard u s e Elle n Tenz e r e voc ê e
n ó s e, se tiver m o s um pou c o de sort e , n ã o sab e r ã o at é
qu e ten h a m o s apa n h a d o o as s a s s i n o , a í n ã o ter á mai s
imp o r t â ncia. Voc ê me n c i o n o u o no m e de Carol Mar d u s a
alg u é m?
— N ã o.
— Te m cert e z a ?
— Ten h o . Voc ê de u ord e m para n ã o falar.
— E dei m e s m o . Agor a vou lh e diz e r: es q u e ç a- se do
Sr. Wolf e e de mi m e pe n s e s ó e m voc ê . Conti n u a ou
de s i s t e ?
Agarr o u nova m e n t e o me u bra ç o. Se u s ded o s era m
mai s fort e s do qu e era de se es p e r a r:
— Dig a- m e co m sin c e r i d a d e , Archi e . Quer qu e eu
con t i n u e ? Pe n s a n d o s ó e m voc ê ?
— Quer o .
— Ent ã o eu co n t i n u o . Me d á um beijo.
— Est á par e c e n d o um a ord e m .
— E é.
Vint e min u t o s mai s tard e entr e i co m o Her o n no
ca m i n h o de sua cas a , dei a volta e par e i na port a da cas a .
N ã o se via nin g u é m. Todo s est av a m no lad o da praia.
Dis s e a Lucy, en q u a n t o sa ía do carro:
— Acab e i de ter um a id é ia. S ó te n h o um a por ano.
Talve z eu pas s e por sua cas a e ten h a vont a d e de entr a r .
Pod e m e dar um a ch av e ?
Arre g a l o u os olh o s . Em mil mu l h e r e s , do mo d o co m o
no s s o rela c i o n a m e n t o es t av a , 99 9 per g u n t a r i a m “Nat u -
ral m e n t e , ma s por qu ê ?”. Ela dis s e ape n a s : “Nat u r a l -
me n t e ” , fec h o u a port a do carro e en tr o u . Dois min u t o s
de p o i s es t av a de volt a. De u- m e a chav e .
— Nin g u é m lh e tel e f o n o u — dis s e faz e n d o for ç a para
sorrir. Apert e i o pe d a l e parti.
Se n t a r à me s a para alm o ç ar co m Wolf e era um dos
proje t o s para o fut ur o qu e n ã o me agra d a v a m . Seri a
dolor o s o . Ele se m p r e con v e r s a v a à m e s a , e um a das dua s
coi s a s pod e r i a m ac o n t e c e r : ou pas s a r i a o te m p o tod o se m
ao me n o s ten t a r falar no as s u n t o , ou, pior aind a , es c o l h e -
ria alg u m a coi s a o mai s dis t a n t e pos s í vel de beb ê s ou
as s a s s i n a t o s , por exe m p l o , a infl u ê nci a de Fre u d no
do g m a te ol ó gic o e lutar i a co m es s e te m a at é o fim. A
sit u a çã o já est a v a bas t a n t e rui m se m iss o . Ent ã o par e i
nu m res t a u rant e no ca m i n h o e co m i pat o co m um mol h o
qu e teria feit o Fritz virar a cara. Qua n d o deix e i o Her o n
na gar a ge m , log o de p o i s da es q u i n a , subi os de gr a u s e
us e i a chav e para entr ar , faltav a m cin c o mi n u t o s para as
dua s hor a s .
Wolf e dev e r i a es t a r ter m i n a n d o o al m o ç o. Mas n ã o
es t av a . Ne m es t av a na sala de jant ar. Atrav e s s e i o corr e -
dor e fui at é à port a do es c r i t ó rio dar um a olh a d a . Tam -
b é m n ã o es t av a l á , ma s havia outr a s pe s s o a s : Leo Bin g -
ha m , na poltr o n a ver m e l h a e Julia n Haft, nu m a das am a -
rela s . Virara m a cab e ç a e m mi n h a dir e çã o, e os ros t o s
não de m o n s t r a v a m ne n h u m a ani m a çã o. Fui corr e n d o
para a cozi n h a e l á est a v a Wolf e na mi n h a m e s a de caf é ,
co m e n d o qu e ij o , bola c h a e caf é . Levan t o u o rost o , de u um
gru n h i d o e co n t i n u o u ma s t i g a n d o .
— O pat o es t á qu e n t e , Archi e . O mol h o é de az ei ton a
fla m e n g a — dis s e Fritz.
Juro qu e n ã o sabi a qu e havia pat o para o alm o ç o
qua n d o pedi no res t a u r a n t e .
— Comi qual q u e r coi s a na praia — dis s e eu, m e n -
tin d o . Virei- m e para Wolf e: — A Sra. Vald o n qu e r qu e
voc ê pe g u e o as s a s s i n o . Dis s e a ela que , mai s ce d o ou
mai s tard e , se ela qui s e s s e de s i s t i r , os tira s o
apa n h a r i a m , ma s res p o n d e u - me text u a l m e n t e : “Qu er o
qu e Ner o Wolf e o apa n h e . ”
— Voc ê sab e mu i t o be m qu e es s e mo d o de falar é
horr í vel — res m u n g o u .
— Eu m e sint o horr í vel. Sab e qu e te m visit a s ?
— Si m . O Sr. Bin g h a m ch e g o u h á me i a hor a. Est a va
alm o ç and o , aind a n ã o fale i co m ele . Por int e r m é dio de
Fritz, dis s e a ele qu e n ã o o veria a n ã o ser qu e ele
cha m a s s e o Sr. Haft e o Sr. Kru g e ele foi para o tel e f o n e .
-— Est av a col o c a n d o Brie nu m cre a m crac k e r . — Por qu e
de m o r o u tan t o ? Ela es t av a dif í cil?
— N ã o, de m o r e i de prop ó sit o. Estav a co m me d o de
alm o ç ar co m voc ê . Pe n s e i que voc ê talv e z m e atir a s s e o
prat o na car a. Kru g ta m b é m ve m?
— N ã o sei.
— Voc ê real m e n t e n ã o falari a co m Bin g h a m , se se
rec u s a s s e a cha m a r os outr o s ?
— É clar o qu e falari a, ma s teria de es p e r a r at é eu
ter m i n a r o alm o ç o e as si m seri a ó tim o se co n s e g u i s s e
cha m a r os outr o s . — Apon t o u - m e um ded o . — Archi e ,
es t o u faz e n d o um esf o r ç o para me con t r o l a r . Acon s e l h o - o
a faz e r o m e s m o . Sei qu e a prov o c a çã o é t ã o ins u p o r t á vel
para voc ê co m o . . .
A ca m p a i n h a toc o u . Fiz um movi m e n t o , ma s Wolf e
dis s e :
— N ã o. Fritz vai. Com a um pe d a ç o de qu e ij o . Caf é ?
Apan h e um a x ícara.
Fritz já fora. Apan h e i um a x í cara e de s p e j e i caf é , e
col o q u e i Brie nu m a bola c h a . Eu es t a v a m e con t r o l a n d o .
Podi a ser Willi s Kru g na port a , ma s podi a ta m b é m ser o
ins p e t o r Cra m e r e, se fos s e , hav er i a um a ce n a . Mas,
qua n d o Fritz volt o u , dis s e qu e mo s t r a r a ao Sr. Kru g o
ca m i n h o do es c r i t ó rio, e por iss o beb i um gra n d e gol e de
caf é e qu e i m e i a l í ng u a . Wolf e pe g o u outr a bola c h a e
qu e ij o, e dep o i s mai s outr a. Afinal per g u n t o u - me ,
am av e l m e n t e , se eu qu e r i a mai s , empurrou a cad e i r a ,
leva n tou- se, agr a d e c e u a Fritz pel a ref e i çã o, co m o
se m p r e , e foi ind o. Eu o se g u i .
Ao entr ar m o s no es c ri t ó rio, Leo Bin g h a m pulo u da
poltr o n a ver m e l h a e rugi u:
— Que m diab o s voc ê pe n s a qu e é ?
Wolf e de u a volta ao red or del e . Me u ca m i n h o era
entr e a m e s a de Wolf e e os outr o s doi s . Wolf e se n t o u - se e
dis s e :
— Se n t e - se, Sr. Bin g h a m .
— Por De u s , se voc ê ...
— Se n t e - se! — grit o u Wolf e .
— Eu qu e r o . . .
— Se n t e - se!
Bin g h a m se n t o u - se. Wolf e en c a r o u - o:
— Na min h a cas a qu e m grita so u eu. O se n h o r ve m
me ver, se m ser co nvi d a d o . O que qu e r?
— Eu fui co nvi d a d o — dis s e Julia n Haft. — O qu e é
qu e o se n h o r qu er ? — Su a voz de te n o r fin o era qua s e u m
gui n c h o .
— N ã o vim aqui para falar na fre n t e de tod o s — dis s e
Bin g h a m . — O se n h o r qu er i a Kru g e Haft, aqui est ã o el e s .
Qua n d o tiver ter m i n a d o co m el e s , falar e i co m o se n h o r
e m parti c u l a r .
Wolf e viro u a cab e ç a vagar o s a m e n t e para a direi t a ,
leva n d o os olh o s de Haft para Krug , o mai s pr ó xim o a
mi m , e de novo para a es q u e r d a .
— Pou p a te m p o ter os tr ê s aqui, porq u e qu e r o faz er
a me s m a per g u n t a aos tr ê s. E, se m d ú vida, cad a um dos
se n h o r e s que r m e faz e r a m e s m a per g u n t a . A per g u n t a
dos se n h o r e s seri a: “por qu e um a fot o g r a f i a de Carol
Mard u s est a v a entr e as qu e lhe s ma n d e i na ter ç a- feir a?”
A mi n h a per g u n t a é : por qu e ne n h u m dos se n h o r e s a
ide n t i f i c o u ?
— O se n h o r ma n d o u para el e s ta m b é m? — Bin g ha m
per g u n t o u de rep e n t e .
— Man d e i .
— Ond e a co n s e g u i u ?
— Vou lh e s diz e r, ma s vou faz er um lon g o pre â m -
bul o. Pri m e i r o para deix ar tud o be m clar o , pre c i s o lh e s
diz e r qu e o qu e lhe s con t e i ne s t a sal a h á qua s e sei s se m a -
na s era pur a inve n çã o. A Sra. Vald o n n ã o rec e b e r a ne -
nh u m a cart a an ô ni m a .
Bin g h a m e Kru g res m u n g a r a m qual q u e r coi s a . Haft
aju s t o u se u s ó cul o s de aro co m borra c h a a fim de Ver
me l h o r .
Wolf e ign o r o u os ru í dos.
— A Sra. Vald o n n ã o me proc u r o u sobr e cart a s
an ô ni m a s . Foi sobr e um be b ê qu e fora deix a d o no se u
ves t í bul o. Contr a t o u - m e para de s c o b r i r qu e m o deixar a l á
e que m era a m ã e e o pai. Falh e i tota l m e n t e . Ap ó s um a
se m a n a de esf or ç o infru t ífero, de c i d i verifi c a r a hip ó te s e
de qu e o fale c i d o mari d o da Sra. Vald o n era o pai, e ped i
a ela para soli c i t a r a co o p e r a çã o de tr ê s ou quatr o das
pe s s o a s mai s pr ó xim a s a el e . Os se n h o r e s sab e m qual foi
o res u l t a d o . O Sr. Upt o n rec u s o u - se a faz er o qu e eu
pe dir a. Cada um dos outr o s tr ê s de u- m e um a list a de
no m e s de mul h e r e s qu e es tiv e r a m e m con t a to co m o Sr.
Vald o n na pri m a v e r a do ano pas s a d o , o per í odo e m que o
be b ê foi co n c e b i d o . Pre c i s o diz e r qu e o no m e de Carol
Mard u s n ã o est a v a e m ne n h u m a das list a s .
— Ela es t á mor t a — dis s e rep e n t i n a m e n t e Bin g h a m .
— Est á me s m o . É clar o qu e- fiz iss o para de s c o b r i r se
alg u m a s das mu l h e r e s nas list a s tiver a m um be b ê na
é poc a indi c a d a . Quatr o dela s tin h a m tido filh o, ma s tod o s
os be b ê s est a v a m co m ela s . Ess e esf o r ç o, ta m b é m infru -
t ífero, levo u qua s e quatr o se m a n a s . Já qua s e
de s e s p e r a d o , ten t e i outr a sup o s i çã o, qu e a m ã e do be b ê
go s t a r i a de vê -lo e co n s e g u i que publi c a s s e m . . . talv e z
te n h a m vist o a p á gin a na Gaz e t t e sobr e a Sra. Vald o n ?
Tod o s tin h a m vist o .
— De u res u l t a d o . Colo c a m o s c â meras foto g r á fic a s
es c o n d i d a s no carri n h o de be b ê e tira m o s retr a t o s de
tod o s qu e parar a m para olh ar . Ess a foi a orig e m das
fot o g r a f i a s qu e ma n d a m o s a cad a um dos se n h o r e s na
se g u n d a e ter ç a- feir a. Cada um dos se n h o r e s dis s e qu e
n ã o rec o n h e c i a nin g u é m, ma s a Sra. Vald o n rec o n h e c e u
Carol Mar d u s e de u- me o no m e . A inve s t i g a çã o prov o u
qu e fora para a Fl ó rida e m se t e m b r o , ficar a l á dura n t e o
inver n o , entr ar a nu m ho s p i t a l no dia 16 de jan e i r o , sob
um no m e fals o , e dera à luz um beb ê . Voltar a a Nova
Iorq u e no dia 5 de fev e r e i r o co m o beb ê . Obvia m e n t e , eu
en c o n t r a r a a m ã e do be b ê deix a d o no ves t íbulo da Sra.
Vald o n , já qu e o arti g o de jornal a levar a at é à Pra ç a
Was h i n g t o n para v ê -lo. E clar o qu e eu qu er i a v ê -la, e,
ont e m de ma n h ã , o Sr. Good w i n ia lhe tel e f o n a r , ma s ela
se ant e c i p o u . Tel e fon o u . . . qua n d o , Archi e ?
— Às oit o hor a s e cin q ü en t a mi n u t o s .
— E veio log o de p o i s do m ei o - dia. Ela tin h a . . .
— Ela veio aq u i? — per g u n t o u Leo Bin g h a m .
— Sim , se n h o r . De s c o b r i r a qu e fiz é ram o s inve s t i -
ga çõ es a se u res p e i t o , e qu er i a sab e r por qu ê . Eu lhe
dis s e e lhe fiz um a s per g u n t a s , ma s s ó res p o n d e u tr ê s
dela s: qu e co n h e c i a o Sr. Bin g h a m , e o Sr. Haft, e qu e
ne n h u m dos se n h o r e s , ne m o Sr. Kru g, se u ex- mari d o , era
o pai do be b ê . Se n t o u - se ali — apo n t o u para Bin g h a m na
pol tron a ver m e l h a — en q u a n t o eu lhe fazia v á rias outr a s
per gu n t a s , ma s n ã o res p o n d e u a ne n h u m a , leva n t o u - se
rep e n tina m e n t e e sai u . E agor a est á mor t a .
Nin g u é m falo u . Bin g h a m es t av a incli n a d o para a
fre n t e , os cot ov e l o s nos bra ç os da poltr o n a , a ma n d íbula
cerra d a , os olh o s fixo s em Wolf e . Os olh o s de Kru g
es t av a m fec h a d o s . De perfil, se u ros t o os s u d o e co m p r i d o
par e c i a ain d a mai s co m p r i d o . Haft es t av a co m a boc a
ape r t a d a , pis c a n d o os olh o s . Pel o lado, eu via as pe s t a n a s
por tr á s dos ó cul o s .
— Ent ã o é por iss o que ela... — Dis s e Kru g, se m
ter m i n a r .
— O se n h o r ad m i t i u qu e é um m e n t i r o s o — falo u
Bin g h a m .
— Dis s e que ela n ã o res p o n d e u à s sua s per g u n t a s —
falo u Haft. — Ent ã o n ã o dis s e qu e era a m ã e do be b ê .
— N ã o e m palavr a s . Mas deix o u sub e n t e n d i d o . Est o u
diz e n d o o que sei. Com o es t á mor t a , e o Sr. Good win
es t av a pre s e n t e , pod e r íam o s diz er o qu e qui s é ss e m o s .
Est o u rela t a n d o tud o . N ã o h á d ú vida de que Carol Mar dus
era a m ã e do be b ê col o c a d o no ves t í bul o da Sra. Vald o n , e
qu e fic o u mui t o pre o c u p a d a qua n d o de s c o b r i u qu e eu
sabi a e podi a provar. É qua s e cert o qu e outr a pe s s o a , X,
es t av a , de alg u m a for m a , prof u n d a m e n t e env o l vida, qu e
ela con t o u a X da conv e r s a que tev e co m i g o , e qu e X, co m
me d o de qu e ela con t a s s e o se u env o lvi m e n t o , a mat o u .
Vou en c o n t r a r X e ac u s á -lo.
— Iss o é ... fant á sti c o — dis s e Kru g.
— Talve z fal e a verd a d e — falo u Haft — ma s me
par e c e qu e . . . qu e tipo de env ol vi m e n t o ? Mat o u - a só
porq u e es t a v a env ol vi d o em deix ar um beb ê nu m ves -
t íbulo?
— N ã o. O no m e de Elle n Tenz e r lhe diz alg u m a coi s a ,
Sr. Haft?
— N ã o.
— E para o se n h o r , Sr. Krug?
— Elle n Tenz e r ? N ã o.
— N ã o é es s e o no m e da mu l h e r cujo corp o foi
en c o n t r a d o nu m carr o? Estr a n g u l a d a ? ? H á alg u m a s se -
ma n a s ? — per g u n t o u Bin g h a m .
— É. Era enf e r m e i r a apo s e n t a d a . O be b ê do ves t íbulo
da Sra. Vald o n ficar a co m ela. O Sr. Good w i n de s cobri u ,
falo u co m ela, e X a mat o u . A am e a ç a qu e Carol Mard u s
repr e s e n t a v a n ã o era ap e n a s qu e ela de n u n c i a r i a se u
env o lvi m e n t o co m o beb ê , fos s e qual fos s e , ma s que ela
sabi a qu e el e as s a s s i n a r a Elle n Tenz e r .
— Com o sabi a dis s o ? — per g u n t o u Haft.
— Provav e l m e n t e por ded u çã o. Pod e m o s pre s u m i r
qu e sabi a qu e o se u be b ê est a v a sob os cuid a d o s de Elle n
Ten z e r . Provav e l m e n t e lia os jornai s , so u b e o qu e aco n -
te c e u co m Elle n Tenz e r e qu e o Sr. Good w i n fora lhe
per g u n t a r sobr e un s bot õ es no ma c a c ã o de um be b ê e
so u b e ta m b é m qu e a pol í cia est av a faz e n d o inve s t i g a çõ es
ac e r c a de um beb ê qu e rec e n t e m e n t e es tiv e r a hos p e d a d o
co m ela. Com o pod e m ver, es t o u se n d o fran c o . Podi a
si m p l e s m e n t e diz er qu e Carol Mar d u s ad m i t i u iss o ou
aquil o , e o Sr. Good w i n co n f ir m a r i a . Prefir o con t a r tud o ,
poi s pre c i s o da ajud a dos se n h o r e s .
— Est á con t a n d o tu d o ? — per g u n t o u Bin g h a m .
— Si m .
— Tud o ist o é verd a d e : o be b ê , Lucy Valdo n , Carol
ont e m aqui, Elle n Tenz e r ?
— É.
— Já co n t o u à pol í cia?
— N ã o. Est o u . . .
— Por qu e n ã o?
— Já ia entr ar ne s s e as s u n t o . — Wolf e virou os olh o s
para a dir ei t a e para a es q u e r d a . — Ten h o um a prop o s t a a
faz e r aos se n h o r e s . Pre s u m o qu e ta m b é m de seja m qu e o
as s a s s i n o de Carol Mard u s seja julg a d o . Se eu con t a r à
pol ícia o qu e sei, vou co n t a r tu d o o qu e sei. Vou lh e s
con t a r sobr e a list a de no m e s qu e os se n h o r e s me
for n e c e r a m , é clar o qu e incl u i n d o o de t a l h e qu e o Sr.
Upt o n rec u s o u - se a d á -la e qu e o no m e de Carol Mar du s
não apar e c i a em ne n h u m a list a. Dir- lhe s - ei sobr e as
fot o g r a f i a s qu e lhe s fora m envia d a s para ser e m ide n t i f i -
cad a s , e que cad a um dos se n h o r e s de c l a r o u n ã o rec o -
nh e c e r nin g u é m, e m b o r a a fot o g r a f i a de Carol Mar d u s
es tiv e s s e be m n ítida. Iss o tor n ar á as coi s a s de s a g r a d á veis
para os se n h o r e s , pos s i v e l m e n t e at é pe n o s a s . A pol ícia
n ã o te m int e n çã o de ser es p iri t u o s a ; sab e qu e cad a um
dos se n h o r e s tin h a um a raz ã o pe s s o a l para n ã o co n t a r ,
ma s iss o n ã o é do int e r e s s e da inve s t i g a çã o del e s ; ma s
sab e r á ta m b é m qu e , se u m dos se n h o r e s es tiv e s s e env o l -
vido co m Carol Mard u s a res p e i t o do beb ê , e qu e se
hou v e s s e mat a d o Elle n Ten z e r , é clar o qu e om it ir i a o
no m e da list a e n ã o ide n t i f i c a r i a a fot o g r a f i a . Por iss o ,
ser á impl a c á vel co m tod o s .
— Par e c e - me qu e o se n h o r qu er diz er qu e n ão
con t o u nad a dist o à pol ícia por co n s i d e r a çã o para con o s -
co — dis s e Kru g se c a m e n t e .
Wolf e aba n o u a cab e ç a:
— N ã o é nad a dis s o . N ã o lhe s dev o ne n h u m a co n -
sid e r a çã o, da m e s m a for m a qu e os se n h o r e s ta m b é m n ã o
me dev e m ne n h u m a . Mas talv e z pos s a m o s no s ajud ar mu -
tua m e n t e . Eu pref e r i a n ã o ajud ar a pol í cia a apa n h a r o
as s a s s i n o porq u e qu e r o pe g á -lo eu m e s m o e pret e n d o
faz e r iss o . Ele m e de s a f i o u co m um a pat e n t e de s f a ç ate z .
Min h a cli e n t e , a Sra. Vald o n , de u- me um a infor m a çã o e m
con fian ç a, e s ó irei reve l á -la se for obri g a d o a iss o .
Haft re m o v e r a os ó cul o s e brin c a v a co m as ha s t e s :
— O se n h o r dis s e qu e tin h a um a prop o s t a .
— Sim . Pos s o pou p a r - lh e s mui t o aborr e c i m e n t o n ã o
diz e n d o à pol í cia o qu e sei. Em troc a , os se n h o r e s res -
pon d e r ã o a alg u m a s per g u n t a s . Mui t a s per g u n t a s . Pod e m
se rec u s a r a res p o n d e r a alg u m a es p e c ífica, ma s e m ger a l
um a rec u s a for n e c e mai s infor m a çõ es do qu e um a res -
pos t a . O cas o é qu e tod o s ficar ã o at é eu te r ter m i n a d o .
Talve z lev e hor a s . N ã o es p e r o co n s e g u i r tud o qu e os
se n h o r e s co n s e r v a m na cab e ç a e na m e m ó ria sobr e Carol
Mard u s , ma s vou con s e g u i r o qu e pud e r .
— O se n h o r provav e l m e n t e co n s e g u i r i a mai s se no s
int e r r o g a s s e e m se p a r a d o — dis s e Kru g .
Wolf e aba n o u a cab e ç a: — Assi m é m e l h o r . O qu e um
omi t ir o outr o pod e co m p l e t a r . E é mai s se g u r o , já qu e
dev e m ser tod o s ou nin g u é m. Se alg u m dos se n h o r e s
pref e r ir falar co m a pol ícia e m vez de falar co m i g o , eu
retir o a prop o s t a . O qu e ac h a , Sr. Kru g?
— De qual q u e r for m a ter e i de falar co m a pol í cia.
So u o mari d o divor c i a d o de Carol. É clar o qu e a list a e a
fot o g r a f i a torn a r i a m as coi s a s pior e s . E se o se n h o r for
t ã o bo m qua n t o sua rep u t a çã o... fic o co m o se n h o r .
Re s p o n d e r e i à s sua s per g u n t a s .
— Si m . Bin g h a m ?
— Con c o r d o . Talve z pos s a res p o n d e r à s sua s per -
gu n t a s .
— Sr. Haft?
Ele já col o c a r a os ó cul o s outr a vez no lu g a r .
— Iss o m e par e c e unil a t e r a l . O se n h o r pod e con t a r a
pol ícia sobr e as list a s e as fot o g r a f i a s qua n d o qui s e r .
É verd a d e . É um ris c o que corr e m . Sei qu e n ã o dir ei ,
se tod o s ac e i t a r e m min h a prop o s t a , ma s os se n h o r e s n ã o
sab e m . Tê m qu e es c o l h e r entr e um a cert e z a e um a
pos s i b i l i d a d e .
— Muit o be m . Aceit o a prop o s t a .
Wolf e gir o u a cad e i r a para olh ar o rel ó gio. Dua s
hor a s e cinq ü en t a mi n u t o s . Ade u s , hor á rio. N ã o havia
pos s i b i l i d a d e de co n s e g u i r .
— Vai levar alg u m te m p o — dis s e . — Quer e m beb e r
alg u m a coi s a ?
Tod o s qu er i a m e Wolf e toc o u a ca m p a i n h a cha m a n -
do Fritz. Haft que r i a sc o t c h co m sod a , bo u r b o n e á gua
para Kru g; Bin g h a m qu e r i a co n h a q u e co m á gu a se p a r a -
dos, eu, leit e , e Wolf e , cerv eja . Rec o s t o u - se e fec h o u os
olh o s . Haft leva n t o u - se, foi at é às est a n t e s e fic o u
olh a n d o os t ítulo s . Bin g h a m ped i u para us ar o tel e f o n e e
de p o i s de s i s t i u . Kru g n ã o parav a, olh a n d o para aqui e
para ali, pre n d e n d o e solt a n d o os de d o s . Qua n d o se u
bo u r b o n co m á gu a ch e g o u , beb e u um pou c o , tev e
dific u l d a d e e m en g o l i r e qua s e en g a s g o u . Wolf e abriu a
garr af a de cer veja, jog o u a ta m p a na gav e t a — se m p r e as
col o c a l á para sab e r qua n t a s to m a —, de s p e j o u no cop o ,
es p e r o u at é a es p u m a baixar e en t ã o be b e u .
Lam b e u os l á bio s e en c a r o u o mari d o divor c i a d o :
— Ten h o um a su g e s t ã o a faz er , Sr. Kru g. Fale- nos
sobr e Carol Mard u s , sua as s o c i a çã o co m ela, sua as s o c i a -
çã o co m os outr o s , qual q u e r coi s a qu e o se n h o r ac h e qu e
int e r e s s e . S ó int e r r o m p e r e i co m per g u n t a s se ach a r qu e
devo .

16

Willi e Kru g de m o r o u um pou c o . Olho u para Haft, de m o -


rada m e n t e , dep o i s para Bin g h a m e de p o i s para se u cop o ,
qu e est av a sobr e se u joel h o co m amb a s as m ã os e m volta
del e . Ao falar, se u s olh o s fitava m o cop o .
— H á pe s s o a s , vá rias del a s , qu e provav e l m e n t e po -
de m lhe con t a r a res p e i t o de Carol e eu tan t o qua n t o eu
pos s o . Talve z at é mai s sobr e ela do qu e eu. Estiv e m o s
cas a d o s exat a m e n t e 14 m e s e s . Eu n ã o pas s a r i a por iss o
tud o de novo ne m . . . — Leva n t o u os olh o s para Wolf e: — O
se n h o r sab e qu e eu era o ag e n t e de Dic k Vald o n .
Wolf e ac e n o u qu e si m.
— Carol ma n d o u - o para mi m . Nu n c a a vira ne m ou -
vira falar del a. Ela lia para a Dis t a f f e per s u a d i r a Man n y
Upt o n a ac e i t a r tr ê s his t ó rias de Dic k, e ac h o u que el e de -
veria ter um ag e n t e e ma n d o u - o para mi m . Con h e c i - a por
int e r m é dio de Dic k e um ano dep o i s no s cas a m o s . Sabi a
qu e ela e Dic k tin h a m tido.. . um rela c i o n a m e n t o . Tod o s
sabi a m . Tam b é m já tiver a co m Man n y Upt o n . Todo s
sabi a m ta m b é m. N ã o es t o u fala n d o mal dos mor t o s . Se
ela estiv e s s e se n t a d a aqui, n ã o ac h ar i a qu e est a v a fala n d o
mal del a. Cas o u - se co m i g o por q u e fora no m e a d a edit o r a
de fic çã o da Dis t a f f , um trab al h o imp or t a n t e , e qu er i a . . .
be m , usar e i sua s pr ó pria s palavr a s . Dis s e qu e qu e r i a ficar
do m e s t i c a d a . Sabi a usar as palavr a s . Pod e r i a ter sid o
es c r i t o r a .
Be b e u um pou c o de bo u r b o n co m á gu a e to m o u cui -
dad o ao en g o l i r .
— Acre d i t o que fic o u do m e s t i c a d a tr ê s ou qua tr o
me s e s , ma s n ã o sei co m cert e z a . Log o de s c o b r i qu e , co m
ela, nun c a se sab e r i a real m e n t e . N ã o vou citar no m e s
por qu e o que ac o n t e c e u foi h á mai s de cin c o ano s , e nad a
te m a ver co m o per íodo no qual o se n h o r es t á int e r e s s a -
do. N ã o qu er o diz er qu e eu n ã o est ej a int e r e s s a d o . Esto u .
Ho uv e um a é poc a e m qu e eu m e s m o pod e r i a t ê -la estr a n -
gul a d o . . . se fos s e de s s e tipo. Mas foi h á mui t o te m p o .
O se n h o r dis s e qu e que r apa n h a r o as s a s s i n o . . . est á
be m , qu e r o que apa n h e , é clar o qu e que r o . S ó é dif í cil de
acr e ditar qu e ten h a tido um filh o . Do mo d o co m o con t o u ,
dev e ter tido. Ela fez um abor t o qua n d o es t e v e cas a d a
co m i g o . Se tev e um beb ê , Dic k Vald o n dev e ter sid o o pai.
Ten h o cer t e z a dis s o . Ne n h u m outr o ho m e m sig n i f i cou
para ela tant o qua n t o Dic k. De u s sab e qu e eu n ão
sig n i f i c a v a . O se n h o r te m cert e z a sobr e o beb ê ? De qu e
foi para a Fl ó rida e tev e um be b ê ?
— Si m .
— Ent ã o Dic k Valdo n era o pai.
— Sou - lhe mui t o grat o , se n h o r , e m no m e da mi n h a
cli e n t e — dis s e Wolf e . — É clar o qu e a ide n t i d a d e do pai
lhe int e r e s s a . Cont i n u e .
— É s ó iss o .
— Ten h o cer t e z a de qu e n ã o é . Qua n d o foi o di -
vó rcio?
— Em 19 5 7 .
— E de s d e ent ã o? Esp e c i a l m e n t e dura n t e os ú lti m o s
16 me s e s ?
— N ã o pos s o ajud á -lo ne s s a part e . Dura n t e os ú lti -
mo s doi s an o s s ó vi Carol um a s cin c o ou sei s vez e s , e m
fes t a s ou lu g a r e s as s i m . Corr e s p o n d i - m e co m ela e fal ei-
lhe ao tel e f o n e co m cert a freq üê nci a, ma s s ó sobr e ne g ó -
cio s , ma n u s c r i t o s que lhe ma n d e i ou qu e r i a ma n d a r . É
clar o qu e ouvi falat ó rio a se u res p e i t o . H á pe s s o a s qu e
s ã o cap a z e s de diz er a um ho m e m : “So u b e qu e sua ex-
mu l h e r est á te n d o um cas o co m Fula n o . ” Iss o n ã o qu er
diz e r nad a. Nad a do qu e es s a s pe s s o a s diz e m vale alg u m a
coi s a .
— O se n h o r es t á errad o , Sr. Kru g. Cada palavr a dita
de s d e qu e o ho m e m inve n t o u as palavr a s faz part e de um
re gi s t r o , e m b o r a n ã o con s e r v a d o . Con c o r d o qu e . fofo c a s
e m ger al s ã o vazia s . Deix e - me faz e r um a per g u n t a : se su a
as s o c i a çã o co m sua ex- mul h e r foi s ó fortu i t a de s d e o
div ó rcio, por qu e omi t i u o no m e dela da list a qu e me de u ,
e por que n ã o ide n t i f i c o u a foto g r a f i a ?
Kru g ac e n o u : — Nat ur a l m e n t e . — Um a pau s a . —
Fran c a m e n t e , n ã o sei.
— Tolic e .
— Talve z seja toli c e , ma s n ã o sei. É fá cil de ent e n der
o por q u ê de n ã o col o c a r se u no m e na list a. . . — Paro u . Fez
um a pau s a mai o r . — N ã o, n ã o vou m e es q u i var. N ã o te m
imp o r t â ncia co m o te n h a justifi c a d o iss o
con s c i e n t e m e n t e . N ã o pod e m o s con t r o l a r nos s o inc o n s -
cie n t e , ma s à s vez e s sab e m o s o que ele es t á faz e n d o .
Inc o n s c i e n t e m e n t e eu me rec u s a v a a ac e i t a r a
pos s i b i l i d a d e de Carol ter ma n d a d o cart a s an ô ni m a s para
Lucy Vald o n , ent ã o n ã o a col o q u e i na list a e ras g u e i a
fot o grafi a. É o m e l h o r qu e pos s o res p o n d e r para o se n h o r
ou para a pol í cia.
— A pol í cia nu n c a lhe per g u n t a r i a iss o . É clar o qu e
iria m lh e per g u n t a r o se g u i n t e , en t ã o ta m b é m pos s o lh e
per g u n t a r : o se n h o r mat o u Carol Mard u s ?
— Oh, pel o am o r de De u s , n ã o!
— Qua n d o e co m o sou b e de sua mor t e ?
— Fui pas s a r o fim de se m a n a no ca m p o . Ten h o um a
cas i n h a e m Pou n d Rid g e . Man n y Upt o n tel e f o n o u qua n d o
eu to m a v a o caf é , be m tard e . A pol í cia lhe noti fic ar a e lh e
pe dir a para ide n t i f i c a r o corp o . Carol n ã o tin h a par e n t e s
e m Nov a Iorq u e . Fui de carro para a ci dad e e fui para o
me u es c r i t ó rio, e ch e g a r a h á pou c o s mi n u t o s qua n d o Leo
Bin g h a m tel e f o n o u e me pe di u para vir aqui.
— Pas s o u a noit e no ca m p o ?
— Si m .
— A pol í cia vai qu er e r por m e n o r e s , já qu e é se u ex-
mari d o , ma s deix o iss o co m el e s . Mai s um a per g u n t a
hip o t é tic a: se Carol Mard u s tev e um beb ê de Ric h a r d
Vald o n , con c e b i d o e m abril do ano pas s a d o , qu e na s c e u
e m jan e ir o , qua tr o m e s e s ap ó s a mor t e de Vald o n , e se X
sabi a e ajud o u - a a livrar- se del e e, mai s tard e , movi d o por
inveja, ci ú m e ou de s p e i t o , apa n h o u - o e col o c o u - o no
ves t í bul o da Sra. Vald o n , qu e m é X? Dos ho m e n s na
órbit a de Carol Mar d u s , qual del e s se aju s t a à es p e c i f i c a -
çã o? N ã o es t o u ped i n d o qu e fa ç a acu s a çõ es, s ó su g e s t õ es.
— N ã o pos s o — dis s e Kru g . — Já lhe dis s e , nad a sei
sobr e ela ne s s e s ú lti m o s doi s an o s .
Wolf e col o c o u cerv ej a no cop o , esva z i a n d o a garr a fa,
es p e r o u at é a es p u m a ch e g a r no n ível corr e t o , be b e u ,
lam b e u a es p u m a dos l á bio s , p ô s o cop o na m e s a e gir o u
a cad e i r a para ficar de fre n t e para a poltr o n a ver m e l h a .
— O se n h o r ouvi u a per g u n t a hip o t é tic a. Te m alg u -
ma su g e s t ã o?
— Eu n ã o es t av a ouvi n d o — dis s e Bin g h a m . — Estav a
pe n s a n d o a se u res p e i t o . Est o u fica n d o b ê bad o co m o se u
con h a q u e . Est o u de c i d i n d o se devo ou n ã o acr e d i t a r no
se n h o r , a res p e i t o de co m o con s e g u i u aqu e l a foto g r a f i a .
O se n h o r é mui t o fin ó rio.
— Tolic e . Acre d i t e ou n ã o, co m o qui s e r . O se n h o r
ac e i t o u a prop o s t a . O qu e te m a diz er sobr e Carol
Mard u s ?
Bin g h a m n ã o tin h a tido te m p o para ficar b ê bad o ,
ma s es t a v a te n t a n d o . Fritz deix ar a a garr af a de con h a q u e
na m e s i n h a , e a se g u n d a dos e de Bin g h a m fora be m ge n e -
ros a. Se u sorri s o de g á s ne o n ain d a n ã o apar e c e r a ne m
um a vez, n ã o fiz er a a barb a e o n ó de sua grava t a est av a
de s l o c a d o .
— Carol Mard u s — dis s e . — Carol Mard u s era u m a
vag a b u n d a fas c i n a n t e , aris t o c r á tic a e el e g a n t e . —
Leva n t o u o cop o . — Um brin d e a Carol! — Tom o u um
gol e .
Wolf e per g u n t o u : — O se n h o r a mat o u ?
— Claro. — Esvaz i o u o cop o e col o c o u na m e s a . —
Est á be m , vam o s falar s é rio. Eu a co n h e c i a h á mui t o s
ano s , e era s ó es t a l a r os ded o s que eu era del a, ma s havi a
dua s dific u l d a d e s . Eu es t av a qu e b r a d o e vive n d o de mi -
gal h a s , e ela pert e n c i a ao m e u m e l h o r ami g o , Dic k Val -
don. Pert e n c i a é o ter m o erra d o porq u e ela nu n c a pert e n -
ce u a nin g u é m, ma s ela era de Dic k naq u e l e pri m e i r o
ano. Dep o i s foi de outr a pe s s o a , e as s i m por dian t e .
Man n y Upt o n , aqu e l e peix e . Com o sab e , es t e v e cas a d a
dura n t e alg u m te m p o co m Willi s Kru g. — Olho u para
Kru g. — Voc ê não é ne n h u m peix e . Voc ê real m e n t e
acr e d i t o u qu e es t av a do m e s t i c a d a ?
N ã o hou v e res p o s t a .
— N ã o acr e d i t o u . N ã o podi a . — Bin g h a m volt o u - se
para Wolf e . — Us e i outr a palavr a erra d a . Carol n ã o era
um a vaga b u n d a . N ã o era um a cab e ç a oc a. Um a cab e ç a
oc a lar g a r i a um bo m e m p r e g o dura n t e sei s m e s e s para
ter um filh o?
— Mas o se n h o r aind a n ã o se de c i d i u a acr e d i t a r e m
mi m .
— Diab o , acr e d i t o . Acre di t o porq u e se en c a i x a di -
reiti n h o e m Carol. Kru g te m raz ã o: Dic k era o pai. Dick
es t av a mor t o , ent ã o ela podi a ter o filh o . Per c e b e u ? N ã o
hav e ri a um ho m e m a qu e m o be b ê pert e n c e s s e , seri a s ó
dela. Aí , de p o i s qu e o beb ê ch e g o u , viu qu e n ã o o qu e r i a .
N ã o qu er i a ficar am ar r a d a a um ho m e m , ma s seri a a
me s m a coi s a ficar am ar r a d a a um beb ê , ma s s ó viu iss o
de p o i s qu e el e nas c e u . Ent ã o eu acr e d i t o , en c a i x a dire i -
tin h o . Admi t o que n ã o go s t o de um a coi s a . O se n h o r dis s e
qu e alg u é m a ajud o u a livrar- se do be b ê , en t ã o, ela dev e
ter- lhe pe di d o . Por qu e n ã o me pe di u ? Iss o m e ma g o a .
Falo s é rio, ma g o a .
Pe g o u a garraf a co m um a m ã o e o cop o co m a outr a ,
de s p e j o u co n h a q u e e beb e u um bo m gol e . N ã o es t av a
apr e c i a n d o o co n h a q u e , s ó est a v a a be b ê -lo.
— Que diab o , ela devi a ter- m e pedi d o .
— Talve z pref e r i s s e pedir a um a mu l h e r .
— Ne m e m son h o s . Pod e de s i s t i r de s s a id é ia. Carol,
nu n c a . N ã o tin h a qu e ser ma n t i d o e m se g r e d o ?
— Si m .
Ela n ã o co n fi a r i a e m mul h e r alg u m a para gu ar dar
qua l q u e r se g r e d o . N ão teria co nf i a n ç a em mu l h e r
ne n h u m a .
— O se n h o r es t á ma g o a d o porq u e ela n ã o lhe pe di u ,
porq u e não lhe pref e r i u às outr a s alt e r n a t i v a s
dis p o n í veis . Port a n t o , dev e ter um a id é ia de qu e m era m
as outr a s alt e r n a t i v a s . A per g u n t a n ã o é hip o t é tic a: é
clar o qu e pedi u a alg u é m para ajud á -la a livrar- se do
be b ê . A qu e m pedi u , se n ã o foi o se n h o r ?
— N ã o sei.
— É clar o qu e n ã o sab e . Mas e m qu e m ela pod e r i a
ter co n f i a d o nu m as s u n t o t ã o deli c a d o , pref e r i n d o - o ao
se n h o r ?
— Sab e , é um a id é ia. — Bin g h a m levo u o cop o ao s
lá bio s e deix o u - os l á . Tom o u um gol e pe q u e n o . — A pri -
me ir a pe s s o a qu e eu diria seri a se u ex- mari d o , Willi s
Kru g.
— O Sr. Kru g dis s e qu e sua ú nic a as s o c i a çã o rec e n te
co m ela foi de ne g ó cio s . Duvid a dis s o ?
— N ã o. S ó est o u res p o n d e n d o à sua per g u n t a . É um a
per g u n t a mui t o boa. Sei co m o Carol se se n t i a sobr e Kru g:
go s t a v a del e . Sabi a que podi a conf i a r nel e , podi a co n t a r
co m ele . Mas se diz qu e n ã o foi ele , ent ã o prova vel m e n t e
n ã o foi. Min h a se g u n d a es c o l h a seri a Julia n Haft.
— O se n h o r es t á ape n a s dan d o os no m e s das pe s soa s
pre s e n t e s — prot e s t o u Wolf e . — Est á faz e n d o pa lha ç ada.
— N ã o es t o u . Carol ac h av a qu e Haft era o m á xim o .
Pe n s a v a qu e nin g u é m se lh e co m p a r a v a co m o um juiz de
es c r i t o r e s e dizia iss o . Era o ú nic o ho m e m co m qu e m
sa í a. para jantar e dep o i s ia para cas a ler ma n u s c r i t o s .
Um a outr a raz ã o por qu e vag a b u n d a é a palavr a erra d a
para cha m á -la é porq u e go s t a v a de se u trab al h o e era boa
no que fazia. Pos s o faz e r pal h a ç ada, ma s não est o u
faz e n d o palh a ç ada ag or a . N ã o dev e r i a ter falad o e m Kru g
pri me ir o . Esq u e c i - m e de Man n y Upt o n , dev e r i a t ê -lo
col o c a do e m pri m e i r o lu g a r .
— O patr ã o del a.
— Be m , o ch e f e . É por iss o que dev e ser o pri m e i r o .
Deix o u - a sair por sei s m e s e s e volt ar para o se u lug a r .
Dev e r i a sab e r por qu e ela sai u . Ela co n t o u aos ami g o s , a
mi m incl u s i v e , qu e ia tirar um a s lon g a s f é rias, ma s dev e
ter dito a verd a d e a Man n y . Diab o s , iss o é ó bvio. Se o
se n h o r for qua s e t ã o bo m co m o diz e m ser... é evid e n t e .
— É, real m e n t e . Mas s ó ont e m à tard e é qu e ela
es t e v e se n t a d a na cad e i r a qu e o se n h o r est á oc u p a n d o .
Me s m o que o Sr. Upt o n seja a alt e r n a t i v a mai s prov á vel,
h á alg u m a outr a? Al é m do Sr. Haft e do Sr. Kru g?
— N ã o. — Bin g h a m to m o u um gol e de co n h a q u e . —
N ã o, a n ã o ser qu e houv e s s e alg u é m qu e eu n ã o co -
nh e c e s s e , por é m n ã o acr e d i t o qu e ho uv e s s e . Carol go s t a -
va de me co n t a r as coi s a s . Gost a v a do mo d o co m o as
ac e i t a v a .
— Ach o que lhe per g u n t e i se a mat o u .
— E eu res p o n d i . Certa m e n t e qu e n ã o, foi o qu e qui s
diz e r . O se n h o r n ã o m e per g u n t o u on d e est iv e na noit e
pas s a d a , co m o e qua n d o so u b e de sua mor t e . Pas s e i a
noit e e m cas a na ca m a , sozi n h o , e es t a v a no es t ú dio ant e s
das nov e hor a s , trab a l h a n d o . Est o u pre p a r a n d o um a
sin o p s e para um gra n d e sh o w no out o n o , e já est o u atra -
sad o um m ê s. Algu é m no est ú dio ouvi u a not ícia no rá dio
e m e co n t o u . Na pilh a de retra t o s qu e o se n h o r me ma n -
dara na ter ç a- feir a, havia um del a. Log o qu e pud e , vim
lhe ver e lh e per g u n t a r sobr e a fot o g r a f i a . Sabi a mui t o
be m que o se n h o r dev e r i a sab e r de alg u m a coi s a .
— Ent ã o rec o n h e c e u a fot o g r a f i a .
— É clar o qu e si m . O mo t iv o pel o qual n ã o dis s e
nad a, e n ã o a pus na list a, foi o m e s m o de Kru g, s ó qu e
ele dis s e qu e agi u inc o n s c i e n t e m e n t e e eu, n ã o. O se n h o r
no s dis s e r a qu e es t av a proc u r a n d o por alg u é m qu e ma n -
dara cart a s an ô ni m a s para Lucy Vald o n . Carol Mard u s
nu n c a ma n d a r i a , e m hip ó te s e alg u m a , cart a s an ô ni m a s
para nin g u é m. N ã o pre c i s a v a qu e m e u inc o n s c i e n t e me
dis s e s s e iss o .
— Mas era ínti m o del a, Sr. Bin g h a m ?
— Be s t e i r a . N ã o, nu n c a no s fal á vam o s . Us á vam o s
sin a i s de fu m a ç a. — Olho u o rel ó gio. — Pre c i s o volt ar ao
es t ú dio.
— Dev e m o s ter m i n a r log o . — Wolf e apa n h o u o cop o ,
esv a z i o u - o e col o c o u - o na m e s a . — Sr. Haft, na list a de
alt e r n a t i v a s do Sr. Bin g h a m , o se n h o r se sobr e s sai. Fa ç a
se u s co m e n t á rios .
Haft es t a v a lar g a d o na cad e i r a , co m su a s per n a s
ma g r a s es ti c a d a s para a fre n t e . Algu n s ho m e n s fica m
be m as si m lar g a d o s , ma s ele n ã o tin h a corp o para iss o .
Ter m i n o u se u sc o t c h co m sod a e p ô s o cop o na m e s a de
Wolf e .
— Sup o n h o qu e dev e s s e m e se n t ir org u l h o s o — dis s e
ele . Sua voz fina de te n o r co n tr a s t a v a co m o bar í ton o de
Bin g h a m . Virou a cab e ç a para Bin g h a m . — Leo, apr e c i o
sua co n s i d e r a çã o de ima g i n a r qu e Carol me jul ga s s e
dig n o de sua co n fi a n ç a nu m as s u n t o t ã o deli c a d o . Me s m o
te n d o - m e pos t o e m ú lti m o lug ar , co m Man n y Upt o n e m
pri m e i r o . — Virou- se para Wolf e . — Com o Bin g h a m já
de s c r e v e u co m pre c i s ã o a nat u r e z a de me u
rela c i o n a m e n t o co m a Srta. Mard u s , par e c e - m e qu e nad a
res t a a diz e r, a n ã o ser a res p e i t o da list a e da fot o g r a f i a .
Mas at é nel a s já falar a m ant e s . S ó pos s o rep e t ir o me s m o ,
co m o um pap a g a i o . A Srta. Mard u s n ã o pod e r i a nu n c a ser
culp a d a de ma n d a r cart a s an ô ni m a s . Creio que . .. n ã o, o
se n h o r m e per g u n t o u sobr e a noit e pas s a d a . Habi t u a l -
me n t e , pas s o os fin s de se m a n a na mi n h a cas a e m We s t -
port, ma s um de m e u s aut o r e s mai s imp or t a n t e s , pel o
me n o s para mi m , ch e g a hoje à tard e da Ingl a t e r r a , e vou
lev á -lo para jantar e ao tea tr o es t a noit e . Dor m i e m mi nha
su í te na Torr e Chur c h i l l , e es t av a l á qua n d o Bin g h a m m e
tel e f o n o u . S ó sou b e sobr e a Srta. Mard u s qua n d o me
tel e f o n o u . — Re c o l h e u as per n a s . — Mai s alg u m a
per g u n t a ?
— Qual é o no m e do aut or imp o r t a n t e ? — Wolf e
en c a r a v a - o co m a te s t a franz i d a .
— Luk e Che a t h a m .
— Escr e v e u Ne n h u m luar hoj e .
— Si m .
— O se n h o r o publi c a ?
— Si m .
— Por favor, d ê -lhe m e u s cu m p r i m e n t o s .
— Com tod o o praz e r . É clar o .
Wolf e olh o u o rel ó gio. Falt av a m doz e min u t o s para
as quatr o hor a s . Havia te m p o bas t a n t e para um peq u e n o
dis c u r s o . Olho u e m volt a:
— Se n h o r e s — dis s e el e —, talv e z n ã o co n fi e m o s un s
no s outr o s , ma s te m o s um int e r e s s e m ú tuo. A raz ã o por
qu e omi t ir a m o no m e de Carol Mard u s de su a s list a s , e
evit ar a m ide n t i f i c a r se u retr a t o , talv e z me sati s f i z e s s e ,
ma s é cer t o qu e n ã o sati s f a r i a a pol ícia. Su s p e i t a r i a m
qu e , para um dos se n h o r e s , o mo t iv o era fals o e nin g u é m
pod e provar qu e o mo ti v o fos s e verda d e i r o . Por iss o ne m
os se n h o r e s e ne m eu qu er e m o s qu e sai b a m o qu e foi dit o
aqui ou m e s m o qu e est iv e r a m aqui. No s s o int e r e s s e é
m ú tuo. Qua n t o aos res u l t a d o s , ver e m o s . É inevi t á vel que
o ho m e m qu e mat o u Elle n Tenz e r e Carol Mard u s seja
acu s a d o . Já dei aos se n h o r e s a raz ã o pela qual qu e r o ser o
ins tr u m e n t o de su a de s g r a ç a. Com um pou c o de sort e ,
ser e i .
Levan t o u - se. — De qual q u e r mo d o , agr a d e ç o a tod o s ,
e m no m e de mi n h a clie n t e .
Enc a m i n h o u - se para o corr e d o r , cin c o mi n u t o s ant e s
do hor á rio. Leo Bin g h a m olh o u para a garr af a de con h a -
qu e , dep o i s para o rel ó gio, leva n t o u - se r á pid o e foi ta m -
b é m. Eu os se g u i . No corr e d o r , Wolf e entr av a no el ev a -
dor. Bin g h a m ch e g o u à porta da rua na mi n h a fre n t e , e
ma n t i v e - a abe r t a por q u e os outr o s dois já vinh a m . Cu m -
pri m e n t a r a m - m e ao pas s a r . Fiqu e i de p é na sol e i r a e vi- os
de s c e r os de gr a u s ant e s de voltar ao es c r i t ó rio.
Havia diver s a s coi s a s para se pe n s a r , ma s nat ur a l -
me n t e as prin c i p a i s era m as alt e r n a t i v a s de Bin g h a m . Se
era t ã o í nti m o de Carol Mar d u s co m o dis s e r a , s ó havia
quatr o can d i d a t o s . Me s m o que el e a houv e s s e mat a d o ,
daria o no m e daq u e l e s que ela provav e l m e n t e es c o l h e r i a ,
se n ã o o es c o l h e s s e , ent ã o era mui t o prov á vel que fos s e
um dos qua tr o . Olh e i pel a jan e l a , se n t e i - m e à es c r iv a n i -
nha, fiqu e i outr a vez de p é , tud o iss o en q u a n t o pe n s a v a
nel e s . Qual del e s ? Ess e é o pior tipo de jog o qu e h á , e
tod o s n ó s o joga m o s , te n t a n d o de s c o b r i r um as s a s s i n o no
me i o de gru p o , pel o qu e dis s e r a , pel o qu e fize r a e at é por
sua apar ê ncia, a n ã o ser qu e se pos s a per c e b e r alg u m a
coi s a qu e na reali d a d e fa ç a se n t i d o . Eu n ã o co n s e g u i .
O probl e m a é qu e n ã o sab íam o s qua n t o te m p o t í-
nha m o s : um m ê s, um a se m a n a , um dia. Ou um a hor a.
Todo s os pon t o s sobr e Carol Mard u s seri a m verifi c a d o s
pel o Dep a r t a m e n t o de Ho m i c í dio s , qu e entr e v i s t a r i a to -
dos el e s e os int e rr o g a r i a . Provav e l m e n t e Willis Kru g
seri a o pri m e i r o , e u m del e s podi a co n t a r tud o . Se o fiz e s -
se, est á vam o s enr a s c a d o s . H á um a gra n d e dife r e n ç a entr e
n ã o for n e c e r infor m a çã o sobr e a qual n ã o se fez per g u n -
tas, e n ã o co m u n i c á -la, ou falsifi c á -la, qua n d o as per -
gu n t a s s ã o feit a s . Tud o o qu e Cra m e r pre c i s a v a era de
um a lev e su s p e i t a de qu e havia um a con e x ã o entr e Carol
Mard u s e o beb ê , ou m e s m o o si m p l e s fato de qu e vier a
falar co m N er o Wolf e , qual q u e r coi s a qu e lhe per m i t i s s e
ch e g a r , entr ar no es c r i t ó rio e per g u n t a r a Wolf e se já
ouvir a falar de Carol Mard u s . S ó iss o bas t a v a . Nu n c a
t ính a m o s no s arris c a d o tant o . Tive de ir para a coz i n h a
con v e r s a r co m Fritz para n ã o ir l á e m cim a , na es t u f a ,
diz e r a Wolf e qu e , já qu e n ã o me con s u l t a r a ant e s de
con t a r tud o para Kru g, Haft e Bin g h a m , n ã o iria lhe
per g u n t a r qua n d o eu pod e r i a co n t a r tud o . Ele podi a m e
de s p e d i r ou parar de brin c a r co m aqu e l a s mal d i t a s orq u í -
de a s ou faz e r qual q u e r coi s a . De c i d i es p e r a r at é qu e de s -
ce s s e e, se m e per g u n t a s s e se tin h a um a su g e s t ã o, joga -
ria qual q u e r coi s a nel e .
Mas n ã o iria m e en c o n t r a r se n t a d i n h o no es c r i t ó rio,
co m o um ladr ã o na cad e i a . Estari a no corr e d o r e ele
podi a ouvir tud o de p é . N ã o iria es p i c a çá -lo, seri a co m o
um so c o na barri g a . Por iss o , qua n d o ouvi o baru l h o do
ele v a d o r , fui para a fre n t e da port a. Qua n d o o el ev a d o r
paro u e a port a se abriu , el e saiu e de u de car a co m i g o . Ia
abri n d o a boc a qua n d o a ca m p a i n h a toc o u , e n ó s dois
vira m o s a cab e ç a para ver qu e m era, pel o vidro qu e s ó se
vê de de n t r o para fora. Era o ins p e t o r Cram e r .

17

No s s a s cab e ç as volt ar a m à pos i çã o inic i a l e no s s o s olh o s


se en c o n t r a r a m . Falo u baixi n h o :
— Ven h a .
Enc a m i n h o u - se para os fun d o s , e eu o se g u i . Na
cozi n h a , Fritz est a v a na pia, joga n d o á gu a ge l a d a no
agri ã o. Olho u - no s rá pid o, viu a car a de Wolf e e virou - se.
— O Sr. Cram e r est á à port a — dis s e Wolf e . — Archi e
e eu es t a m o s sai n d o pel o s fund o s e n ã o sab e m o s qua n d o
es t ar e m o s de volta, ma s n ã o voltar e m o s es s a noit e , co m
cert e z a . N ã o o deix e entr ar . Pon h a a corr e n t e . Dig a
ape n a s qu e n ã o est a m o s aqui e mai s nad a . Nad a . Se
voltar co m um ma n d a d o de bu s c a , deix e - o entr ar , ma s
n ã o lhe dig a nad a. Voc ê n ã o sab e qua n d o sa í mo s .
A ca m p a i n h a toc o u .
— Ent e n d e u ?
— Si m , ma s . . .
— Vá .
Fritz foi. Wolf e m e per g u n t o u :
— Pija m a s e es c o v a de de n t e s ?
— N ã o h á te m p o . Se St e b b i n s est iv e r junt o , vai
ma n d á -lo à Rua 34 im e d i a t a m e n t e .
— Troux e din h e i r o ?
— N ã o o sufi c i e n t e . Vou apa n h a r mai s .
Fui rá pid o. Mas Fritz est av a abri n d o a porta da
fre n t e , o pou c o per m i t i d o pela corr e n t e , port a n t o , fui na
pon t a dos p é s at é o es c r i t ó rio, abri o cofr e , apa n h e i a
gra n a na gav e t a , fec h e i a port a do cofr e e gir e i o se g r e d o .
Volt e i na pon t a dos p é s at é o corr e d o r . Wolf e est a v a l á ,
de s c e n d o as es c a d a s . Ao ch e g a r m o s embaixo, to m e i a
fre n t e , sub i m o s os quatr o de g r a u s e fom o s pela pas s a g e m
at é o port ã o co m a fec h a d u r a Hot c h k i s s . Dali ch e g a m o s à
Rua 34. N ã o adia n t a v a parar para dar um a olh a d a; n ã o
era prov á vel qu e Cram e r pus e s s e um ho m e m de gu ar d a
ali, ma s se tive s s e col o c a d o , log o sab e r í am o s . Vira m o s à
es q u e r d a . N ão se podi a sup o r que um ho m e m que
ca m i n h a t ã o pou c o co m o Wolf e pud e s s e es ti c a r tan t o as
per n a s se m faz e r for ç a, ma s co n s e g u i a . P ô de at é falar:
— Esta m o s se n d o se g u i d o s ?
— Duvid o . Nu n c a fiz e m o s iss o ant e s . De qual q u e r
mo d o , n ã o no s se g u i r i a m , nos parari a m .
Havia mai s ge n t e and a n d o na cal ç ada do qu e é us u a l
nu m s á bad o à tard e , e m julh o. Tive m o s de nos se p a r a r
para deixar pas s a r um cara qu e and av a e m lin h a reta,
co m os bra ç os bala n ç and o , e dep o i s nos uni m o s de nov o.
Wolf e per g u n t o u :
— Pre c i s a m o s ir para um hot e l ?
— N ã o. Se u retra t o já sai u mui t o no s jorn ai s . De poi s
de virar m o s a es q u i n a , pod e m o s ir mai s deva g a r . Vou dar
um a su g e s t ã o. Hoje pel a ma n h ã , na praia, pe n s e i qu e
talv e z pre c i s á ss e m o s de um es c o n d e r ij o , e pedi à Sra.
Vald o n um a ch av e da cas a . Est á no m e u bol s o .
— N ã o es t á sob vigil â ncia?
— Por qu e es t ar i a ? Fora m para a praia ont e m . N ã o
h á nin g u é m l á .
Na es q u i n a , es p e r a m o s o sin a l abrir, atrav e s s a m o s a
Rua 34 e to m a m o s a dire çã o da No n a Aveni d a . Já
and á vam o s mai s deva g a r . Dis s e eu:
— É m e n o s do qu e tr ê s quil ô m e t r o s . O exer c í cio ao
ar livre faz co m qu e o corp o fiqu e dis p o s t o e a me n t e
aler t a . Mot or i s t a s de t á xi fala m mui t o . Por exe m p l o ,
qua n d o um del e s fos s e to m a r um prat o de sop a nu m a
lan c h o n e t e , diria: “Ne r o Wolf e sai u. Acab e i de lev á -lo
naq u e l a cas a na Rua 11, ond e aqu e l a mu l h e r es t á co m a
cria n ç a.” De n t r o de um a hora a cida d e int e ir a sab e r i a .
Pod e m o s parar nu m bar para to m a r um a cerv ej a. Dig a
qua n d o qui s e r .
— Voc ê é qu e fala de m a i s . Voc ê já me viu ca m i nhar
por vale s e mo n t a n h a s dura n t e dias .
— Si m , nu n c a m e es q u e c e r e i dis s o .
Real m e n t e para m o s no ca m i n h o , nu m a lojin h a na
Sext a Aven i d a co m a Rua 12, e, ao entr ar m o s no ves t í bul o
qu e um dia abri g a r a um be b ê nu m cob e r t o r , es t á vam o s
ch e i o s de co m i d a . Pre s u n t o , cor n e d be e f , caviar,
anc h o v a s , alfa c e , raba n e t e s , ceb o l i n h a , pepi n o s , lara nj a s ,
lim õ es, p ê ss e g o s , am e i x a s , tr ê s tipo s de bola c h a s , caf é ,
ma n t e i g a , leit e , cre m e , qua tr o tip o s de qu e ij o , ovo s ,
picl e s , aze i t o n a s e 12 garraf a s de cerv eja . N ã o tro ux e m o s
p ã o. Se Fritz morr e r , Wolf e provav e l m e n t e nun c a mai s
co m e r á p ã o. Na cozi n h a , qua n d o afin a l con s e g u i esva z i a r
um pou c o o bra ç o para olh ar o rel ó gio, era m se t e hor a s e
dez mi n u t o s e só às se t e hor a s e quar e n t a e cin c o
mi n u t o s ter m i n e i de guar d a r tud o e Wolf e pus e r a o jant ar
na m e s a da coz i n h a .
O mol h o da sala d a , feit o co m os in gr e d i e n t e s en -
con t r a d o s no arm á rio, n ã o est a v a t ã o bo m qua n t o o de
Fritz, ma s é clar o qu e n ã o tin h a os me s m o s ingr e d i e n t e s .
Lavei os prat o s e el e os enx u g o u .
Agor a n ã o havia raz ã o para es p i c a çá -lo ou m e s m o
cut u c á -lo. Estav a exil a d o da cas a , da est u f a , da sua pol -
tron a e da sua sala de jant ar, e s ó havia um jeit o de voltar
se m ser co m o rabo en tr e as per n a s . É clar o qu e n ã o me
podi a ma n d a r faz e r nad a, já qu e eu ta m b é m es t a v a
exila d o , ma s havi a Saul, Fred e Orrie , e pod e m o s
pre s u m i r qu e pe n s a v a nel e s , on d e pod e r i a m co m e ç ar a
inve s t i g a r , qua n d o sa í mo s da cozi n h a . Mas per g u n t o u - m e
ond e era o quar t o do beb ê . Re s p o n d i qu e duvid av a qu e
ach a s s e qual q u e r pis t a l á .
— O tap e t e — res p o n d e u . — Voc ê dis s e qu e h á um
Tekk e m ui t o bo m .
Ele n ã o ape n a s ins p e c i o n o u o Tekk e , exa m i n o u to dos
os tap e t e s da cas a . Perf e i t a m e n t e nat u r a l . Gos t a de
tap e t e s bon s e sab e mui t a coi s a a res p e i t o del e s , e qua s e
nu n c a te m a op or t u n i d a d e de ver outr o qu e n ã o seja o
del e . Dep o i s dis s o , pas s o u me i a hora exa m i n a n d o o
ele v a d o r e faz e n d o - o fun c i o n a r , para ci m a e para baixo ,
en q u a n t o eu sol u c i o n a v a o prob l e m a de ca m a . Um a noit e
mu i t o agra d á vel, ma s n ã o adia n t a v a cut u c á -lo. Afinal,
fo m o s no s deit ar , no s doi s quart o s de h ó sp e d e s do quar t o
and ar . No quar t o havia um bo m tap e t e , qu e dis s e ser um
Fera g h a n do s é cul o XVIII.
Um ch e i r o m e fez ac or d a r no do m i n g o de ma n h ã ,
pel o m e n o s foi a pri m e i r a coi s a de qu e to m e i con h e c i -
me n t o , um ch e i r o qu e co n h e ç o mu i t o be m . Era mui t o
lev e , ma s eu o rec o n h e c i . Levan t e i - m e e fui at é a es c a d a e
ch e i r e i; não havia d ú vida. De s c i tr ê s and a r e s at é a
cozi n h a e l á est a v a el e , to m a n d o se u caf é e m ma n g a s de
ca m i s a : ovo s au be u r r e noir . Ele est a v a brin c a n d o de
cas i n h a .
De u- m e bo m - dia e dis s e :
— Avis e - m e vint e min u t o s ant e s de es t ar pro n t o .
— Claro. Vina g r e bran c o , n ã o é ?
Con c o r d o u : — N ã o é mu i t o bo m , ma s serv e .
Su bi de novo .
Um a hor a e m e i a mai s tard e , ap ó s to m a r caf é e lavar
tud o , en c o n t r e i - o na sal a gra n d e do se g u n d o and ar , nu m a
cad e i r a gra n d e qu e puxar a para pert o da jan e l a , len d o um
livro. Est av a de c i d i d o a n ã o es p i c a çá -lo. Per g u n t e i , co m
deli c a d e z a :
— Quer qu e eu saia e v á co m p r a r o jornal?
— Com o qu e ir a . Se ac h ar qu e é se g u r o .
N ã o est a v a brin c a n d o de cas i n h a , es t av a aca m p a n d o .
Qua n d o se aca m p a , n ã o se pre c i s a de jorn ai s .
— Talve z fos s e m e l h o r tel e f o n a r para a Sra. Vald o n e
diz e r- lhe ond e est a m o s .
— Seri a bo m .
Min h a vá lvul a es t o u r o u : — Ou ç a, se n h o r . Há
oc a s i õ es e m qu e pod e ser exc ê ntric o e oc a s i õ es e m qu e
n ã o pod e . Talve z pos s a ser ag or a , ma s eu n ã o. De s i s t o .
Abaixo u o livro deva g a r .
— É um do m i n g o de ver ã o, Archi e . Ond e est ã o as
pe s s o a s ? Esp e c i f i c a m e n t e , ond e est á o Sr. Upt o n ? Esta -
mo s pre s o s aqui. Quer se dar ao trab a l h o de en c o n t r a r o
Sr. Upt o n , us a n d o o tel e f o n e , e co nv e n c ê -lo a vir aqui
con v e r s a r co m i g o ? Me s m o su p o n d o que con s i g a , seri a
prud e n t e ?
— N ã o, ma s n ã o é a ú nic a pist a qu e no s res t a . Que m
falo u co m os tira s ? Talve z co n s i g a de s c o b r i r pel o tel e -
fon e . Seria m e n o s um e m qu e m trab al h a r .
— N ã o te m o s te m p o para agir as si m . N ã o pod e m o s
faz e r a barb a, n ã o pod e m o s tro c a r de ca m i s a , m e i a ou
cu e c a . Qua n d o for co m p r a r o jornal , co m p r e es c o v a s de
de n t e s . Pre c i s o ver o Sr. Upt o n . Estiv e pe n s a n d o na Sra.
Vald o n . Qua n d o lhe tel e f o n a r , pe ç a- lh e para vir aqui est a
noit e , ao es c u r e c e r , soz i n h a . Ser á qu e ve m?
— Ve m.
Outr o pon t o e m qu e es tiv e pe n s a n d o . N ã o h á pre s s a ,
ma s co m o voc ê es t á furio s o . . . pod e falar co m Sau l?
— Si m , lig o para o servi ç o de rec a d o s .
— Pe ç a para qu e ven h a am a n h ã de ma n h ã . Estiv e
pe n s a n d o e m Ann e , a sobri n h a de Elle n Tenz e r .
— Si m .
— Se en t e n d i dire i t o se u trab al h o , ela sub s t i t u i
e m p r e g a d a s de es c r i t ó rio que pre c i s a m se au s e n t a r ?
— Cert o. — Levan t e i as sobr a n c e l h a s . — Mac a c o s m e
mor d a m ! É clar o . Ló gic o que é pos s í vel. Devi a ter
pe n s a d o nis s o eu m e s m o .
— Voc ê est a v a oc u p a d o de m a i s em ficar furio s o .
Fala n d o e m furio s o , o est u rj ã o est á mu i t o bo m e pe n s e i
e m faz ê -lo fu m é à la Mu s c o v i t e . Qua n d o for apa n h a r o
jornal, pod e co m p r a r erva- doc e , lour o , ce b o l i n h a , sal s a ,
ce b o l a s peq u e n a s e extr a t o de to m a t e ?
— Nu m a loja, no do m i n g o de ma n h ã ? N ã o.
— Que pe n a ! Ent ã o tra g a as erva s qu e con s e g u i r .
Um de t e t i v e parti c u l a r lic e n c i a d o e ne m sabi a o qu e
se pod e en c o n t r a r nu m a de li c a t e s s e n .
Port a n t o o do m i n g o pas s o u de for m a agr a d á vel —
jornai s , livro s , tel e vi s ã o, tud o que se pod e qu er e r . O
es t u rj ã o fic o u bo m , mes m o hav e n d o erva s qu e fora m
sub s t i t u ídas. Qua n d o tel e f o n e i para Lucy e lhe co n t e i qu e
tin h a h ó sp e d e s e qu e es t av a co nvi d a d a a vir pas s a r a
noit e con o s c o , se u pri m e i r o pe n s a m e n t o foi para os
len çó is. Havia len çó is na s ca m a s ? Ao lhe diz e r que si m ,
fic o u t ã o alivia d a qu e ne m se imp o r t o u mu i t o co m o fato
de ser m o s fugi t iv o s da lei. Saul tel e f o n o u l á pela s nov e
hor a s , ao rec e b e r a me n s a g e m do servi ç o de rec a d o s , e eu
lhe dis s e on d e devia vir de ma n h ã . Tel e f o n a r a para o
es c r i t ó rio s á bad o à noit e e do m i n g o de ma n h ã ta m b é m,
ao ouvir diz e r o qu e ac o n t e c e r a co m Carol Mard u s , e
qua n d o Fritz lhe dis s e r a qu e n ã o est á vam o s l á e qu e n ã o
sabi a de mai s nad a , é clar o qu e fic ar a um pou c o irrita d o ,
sab e n d o qu e , qua n d o Wolf e ficav a mui t o aborr e c i d o ,
top av a qual q u e r tipo de risc o .
Com o n ã o sabi a se Lucy tin h a outr a ch av e , fiqu e i na
cozi n h a , ap ó s o jant ar , co m um a s revi s t a s , pro n t o para
ate n d e r à ca m p a i n h a , ma s um pou c o de p o i s das dez hora s
ouvi a port a abrir e fec h a r e fui at é à entr a d a para lhe
falar. Com o pre c i s a v a de dua s m ã os, ou bra ç os, para um
cu m p r i m e n t o ade q u a d o entr e de t e t i v e e cli e n t e , deix o u a
bol s a cair ao ch ã o. De p o i s de cu m p r i m e n t á -la, apa n h e i a
bol s a .
— Sei por qu e es t ã o aqui — dis s e ela. Est av a mui t o
ele g a n t e nu m ves t i d o de ver ã o verd e - clar o co m um
cas a q u i n h o verd e - es c u r o . Um a pel e be m bro n z e a d a é
mai s atra e n t e na cida d e do qu e na praia. Apan h o u a
bol s a . — Pe n s o u qu e eu não fos s e . . . dis cr e t a . É
con v e n c i d o , ma s go s t o de voc ê as s i m mes m o . Falo u a
verd a d e ao tel e f o n e ? Voc ê e N er o Wolf e est ã o me s m o
es c o n d i d o s ?
Expliq u e i o sufi c i e n t e para qu e ent e n d e s s e a sit u a -
çã o, inc l u s i v e o qu e Kru g e Bin g h a m tin h a m dito sobr e
Dic k ser o pai do beb ê .
— Por iss o — fale i — já es t á ter m i n a d o o trab al h o
para o qual co n tr a t o u o Sr. Wolf e . Agor a s ó res t a m doi s
as s a s s i n a t o s , e se qui s e r que a ge n t e saia de su a cas a ,
bas t a pe g a r o tel e f o n e . O pro m o t o r p ú blic o go s t a r i a de
ma n d a r um carr o para no s apa n h a r . Foi um praz e r co -
nh e c ê -la. Se eu so u co nv e n c i d o , a cul p a é sua. Mas ant e s
o Sr. Wolf e qu e r lh e faz e r um a s per g u n t a s .
— Dig a- m e a verd a d e , Archi e . Voc ê ach a qu e real -
me n t e pos s o ?
— É clar o . Voc ê n ã o lhe dev e nad a. Qua n t o a mi m ,
n ã o so u t ã o co nv e n c i d o as s i m . Na reali d a d e , n ã o so u nad a
con v e n c i d o . Ape n a s ac h o qu e faz se n t i d o go s t a r de mi m
me s m o .
Ela sorri u: — Ond e ele est á ?
— No and ar log o aci m a .
Qua n d o entr a m o s na sala, Wolf e leva n t o u - se. Em -
bora n ã o fos s e con vi d a d o , podi a ser ed u c a d o . Ap ó s cu m -
pri m e n t á -lo, ela olh o u e m volta, talv e z surpr e s a de n ã o
es t ar tud o de s a r r u m a d o , já qu e dois ho m e n s tin h a m
pas s a d o a noi t e ali. A se g u i r , dis s e a Wolf e qu e es p e r a v a
qu e tive s s e fica d o con f o r t á vel.
— Nu n c a es tiv e mai s inc o n f o r t á vel na mi n h a vida —
res m u n g o u el e. — Com iss o , n ã o es t o u de s f a z e n d o de su a
ho s p i t a l i d a d e . Agrad e ç o- lhe pel o abri g o , ma s so u um c ã o
de fila, n ã o um a lebr e . O Sr. Good w i n já lhe de s crev e u a
sit u a çã o? Archi e , veja cad e ir a s .
Já est a v a traz e n d o dua s cad e i r a s , sab e n d o qu e co n -
tin u a r i a se n t a d o na mai o r , pert o da l â mp a d a . Se n t a m o -
no s . Wolf e virou - se para ela:
— Est a m o s em apur o s . Per g u n t o - lh e clar a m e n t e ,
mad a m e , pod e ag ü ent ar fir m e ?
Franz i u a te s t a: — Se per g u n t a se pos s o ficar cala d a ,
si m , pos s o . Ont e m , dis s e a Archi e qu e podi a .
— A pol ícia vai pre s s i o n á -la, ag or a qu e co n s e g u i ram
es t a b e l e c e r um a co n e x ã o entr e Carol Mard u s e eu e,
porta n t o , co m a se n h o r a , e eu fu gi. A se n h o r a é mi n h a
cli e n t e e dev e r i a prot e g ê -la, ma s , ao inv é s, a se n h o r a é
qu e m e prot e g e . E ao Sr. Good w i n . Ele m e s m o pod e lhe
agra d e c e r pel o se u lad o, o qu e far á , se m d ú vida; qua n t o a
mi m , es t o u sin c e r a m e n t e agr a d e c i d o e dev o lhe ped ir
para faz e r mai s um a coi s a . Pre c i s o ver Man u e l Upt o n o
mai s ce d o pos s í vel. Pod e traz ê -lo aqui am a n h ã de ma n h ã ?
— Ora, clar o .. . se pud e r .
— Se m lhe diz e r qu e es t o u aqui. Um a vez ele me
dis s e qu e , se a se n h o r a qui s e s s e um favor del e , pod e r i a
lhe pe dir. Muit o be m , pe ç a qu e ven h a vê -la.
— E se vier, o qu e dig o ?
— Nad a . Ba s t a traz ê -lo aqui. Se eu n ã o pud e r ma n t ê -
lo aqui co m palavr a s , os m ú sc u l o s do Sr. Good w i n o
ma n t e r ã o. Gost a de ovo s ?
Ela de u um a risa d a . Olho u para mi m , ent ã o ta m b é m
ri.
Wolf e fran z i u a te s t a: — Que diab o s , qu e gra ç a h á
e m ovo s ? A se n h o r a sab e faz er ovo s me x i d o s , Sra. Vald o n ?
— Si m , é clar o .
— Para us ar um a das fras e s favorit a s do Sr. Good win,
apo s t o um co n t r a dez co m o n ã o sab e . Vou faz er ovo s
me x i d o s para o caf é e ver e m o s . Avis e - m e quar e n t a
mi n u t o s ant e s de es t a r pro n t a .
Ela arre g a l o u os olh o s : — Quar e n t a min u t o s ?
— Si m . Ima g i n e i qu e n ã o sabi a faz e r.

18

Man u e l Upt o n ch e g o u na se g u n d a de ma n h ã , à s onz e


hor a s e quar e n t a e cin c o mi n u t o s .
Enq u a n t o iss o , ac o n t e c e r a m alg u m a s coi s a s . A cli e n -
te ad m i t i r a a Wolf e , e m min h a pre s e n ç a, qu e n ã o sabi a
faz e r ovo s me xi d o s . Eu ad m i t ir a a Wolf e , na pre s e n ç a
dela, qu e os ovo s me xi d o s qu e ac a b a r a de co m e r era m
dig n o s dos me l h o r e s feit o s por Fritz. Ele ad m i t i r a a ela,
na min h a pre s e n ç a, qu e quar e n t a min u t o s era te m p o
de m a i s para qu e um a don a - de- cas a ga s t a s s e ape n a s a
faz e r ovo s me xi d o s , ma s ac h a v a que era imp o s s í vel faz ê -
los co m perf e i çã o e m me n o s te m p o , para qu e tod o s os
pe d a c i n h o s fica s s e m fir m e s , ma c i o s e ú mid o s .
O jornal Ne w s , qu e sa íra para co m p r a r , de c l a r a v a
qu e a fale c i d a Carol Mard u s fora, h á alg u m te m p o , ami g a
ínti m a de Ric h a r d Valdo n , nov e l i s t a fam o s o , ma s n ão
havia ne n h u m a insi n u a çã o de qu e nad a mai s era do qu e
um as s u n t o int e r e s s a n t e , qu e o p ú blic o tin h a o dire it o de
sab e r .
Sau l ch e g a r a às nov e hor a s e trint a mi n u t o s ,
con f o r m e o co m b i n a d o , e já rec e b e r a ins tr u çõ es sobr e
Ann e Tenz e r . Cont o u qu e tel e f o n a r a para Fritz à s oit o
hor a s , qu e lh e dis s e r a qu e os tira s do Dep a r t a m e n t o de
Ho m i c í dio s vigi av a m o es c r i t ó rio noit e e dia, e m turn o s ,
poi s tin h a m ma n d a d o de bus c a , e qu e um del e s es t a v a a
es cut á -los pel o tel e f o n e . Saul res p o n d e r a qu e est a v a
tel e f o n a n d o s ó para diz er qu e nad a de s c o b r i r a e que se
Wolf e qui s e s s e alg u m a coi s a , est a v a dis p o n ível. Cont o u -
no s , ta m b é m, qu e ouvir a de um a font e fid e d i g n a — ne m a
n ó s qui s dar o no m e — qu e fora en c o n t r a d o no es c r i t ó rio
de Carol Mard u s um ped a c i n h o de pap e l co m o n ú m e r o
de tel e f o n e de Wolf e . Se n d o ass i m , talve z nin gu é m tive s s e
bati d o co m a l í ng u a no s de n t e s . Talve z Cra m e r fos s e l á
per g u n t a r ap e n a s se Wolf e já vira ou ouvir a falar de Carol
Mard u s , ma s iss o seri a o bas t a n t e para ac e n d e r o pavi o.
De m o s a Sau l 30 0 d ó lare s , e m not a s de 10 e 20 d ó lare s .
Talve z Ann e Ten z e r es tiv e s s e se m din h e i r o e go s t a s s e de
rec e b ê -los.
Pre p a r a m o s um a rec e p çã o si m p l e s para Upt o n . De
qual q u e r mo d o , que m ate n d i a a porta era Lucy, já qu e
alg u é m da pol ícia pod e r i a pro c u r á -la. Man d o u - o entr ar ,
levo u - o ao se g u n d o and ar , para a sal a gra n d e . A cad e i r a
mai s co n f o r t á vel es t a v a per t o do sof á , e Wolf e es t a v a
se n t a d o nel a. Eu es t a v a de p é . Upt o n en tr o u , no s viu e
paro u . Virou- se para Lucy, ma s ela n ã o es t av a l á . Sa í ra e
fec h a r a a port a, con f o r m e co m b i n a d o .
Upt o n tor n o u a se virar para ficar de fre n t e para
Wolf e . Era t ã o mi ú do qu e , es t a n d o Wolf e se n t a d o e el e
e m p é , se u s olh o s est a v a m qua s e na m e s m a altur a . Pa -
reci a aind a me n o r do qu e m e le m b r a v a .
— Se u pal h a ç o gor d o — gra s n o u . De u m e i a - volt a e
diri gi u - se para a port a, ma s en c o n t r o u - me no ca m i n h o e
paro u .
— De s c u l p e — dis s e eu —, sa ída fec h a d a .
Tin h a ju í zo de m a i s para dis c u t i r qua n d o era evi de n t e
qu e , co m um a s ó m ã o, pod e r i a imp e d i - lo. De u- m e as
cos t a s : — Iss o é abs u r d o — recl a m o u . — Iss o é Nova
Iorq u e , n ã o é Mo n t e n e g r o .
“Ent ã o é con t r a Mo n t e n e g r o ” , pe n s e i . N ã o fale i, s ó
pe n s e i , port a n t o n ã o col o q u e i no m e u di á rio.
— É melhor se n t a r , Sr. Upt o n . Vam o s co nv e r s a r
bas t a n t e . — Wolf e mo s t r o u - lh e um a cad e i r a . — Se ach a
qu e é abs u r d o ma n t ê -lo aqui con t r a sua pr ó pria vont a d e ,
n ã o é , n ã o. H á tr ê s pe s s o a s aqui qu e refu t a r i a m qual q u e r
acu s a çã o qu e fize s s e . O se u ta m a n h o evit a qu e se co m e t a
viol ê ncia; o Sr. Good w i n pod e r i a leva n t á -lo co m o um a
mari o n e t e . Se n t e - se.
Upt o n es t av a co m o que ix o er g u i d o : — Conv e r s a r e i
co m a Sra. Valdo n .
— Talve z mai s tard e . Dep o i s de ter- m e co n t a d o tud o
qu e sab e a res p e i t o de Carol Mard u s .
— Carol Mard u s ?
— Si m .
— Ent e n d o . Quer diz er , n ã o en t e n d o . Por que . .. —
Paro u . De p o i s dis s e : — O se n h o r es t á na cas a de Lucy
Vald o n . Por iss o aind a est á co m ela. Conv e n c e u - a de qu e
Carol Mar d u s foi qu e m lhe ma n d o u as carta s an ô ni m a s ?
Agor a qu e es t á mor t a ?
— N ã o havia cart a s an ô ni m a s .
Upt o n en c a r o u - o es p a n t a d o . A cad e i r a es t av a mai s
pert o do qu e o sof á , ma s foi se se n t a r no sof á .
— N ã o vai se livrar as s i m — falo u . — Qua n d o o
se n h o r falo u sobr e as cart a s an ô ni m a s , havia mai s tr ê s
ho m e n s l á .
— Já fale i co m tod o s outr a vez, ant e o n t e m , s á bad o a
tard e — Wolf e con c o r d o u — e lh e s con t e i qu e as cart a s
an ô ni m a s era m si m p l e s inve n çõ es min h a s , para justifi c a r
o pe di d o das list a s de no m e s . As list a s n ã o ajud ar a m e m
nad a, ma s ter m i n e i o trab al h o para o qual fui con t r a t a d o
pela Sra. Valdo n . N ã o pre c i s a mai s de mi m; es t o u e m sua
cas a ape n a s porq u e o per m i t i u . Agora es t o u atr á s de um
as s a s s i n o . No s á bad o à tard e , dura n t e a con v e r s a co m os
outr o s tr ê s ho m e n s , foi leva n t a d a a hip ó te s e de qu e o
se n h o r mat a r a Carol Mard u s . É iss o qu e qu er o dis c u t i r
co m o se n h o r , a pos s i b i l i d a d e de o se n h o r ser um
as s a s s i n o .
— Ba h! — Upt o n incli n o u a cab e ç a. — Sab e , devo
ad m i t ir . O se n h o r con s t r u i u sua rep u t a çã o à cu s t a do se u
de s c a r a m e n t o . Tam b é m é m e n t i r o s o . Nin g u é m dis s e qu e
eu mat a r a Carol Mard u s . Ele dis s e por qu e a mat e i ? O
qu e é qu e o se n h o r es t á pro c u r a n d o na reali d a d e ? Por
qu e ped i u a Lucy Valdo n para m e traz e r aqui?
— Para con s e g u i r um a s infor m a çõ es de qu e pre c i s o
co m ur g ê ncia. Qua n d o so u b e qu e Carol Mard u s veio m e
ver na sext a- feira?
— Tolic e . N ã o pe n s e i qu e te n t a r i a us ar es s e velh o
truq u e , ela foi v ê -lo, con t o u - lhe qual q u e r coi s a e es t á
mor t a . Sup o n h o qu e lhe con t o u qu e eu am e a c e i mat á -la.
É qual q u e r coi s a de s s e g ê ner o ?
— N ã o. — Wolf e re m e x e u - se na cad e i r a . O es p a l dar
n ã o é sufi c i e n t e m e n t e alto para que pos s a se rec o s t a r
be m co m o faz e m cas a . — Se vam o s co nv e r s a r dire i t o , vou
lhe expli c a r . Pro m e t i à Sra. Vald o n de s c o b r i r a m ã e do
be b ê qu e deixar a m no ves t íbulo de sua cas a . Con s e g u i
iss o , dep o i s de mui t a de s p e s a e perd a de te m p o . Era
Carol Mar d u s . Ela foi m e proc u r a r na sext a- feira, para
de s c o brir o qu e eu sabi a , e lh e co n t e i . Para se livrar do
be b ê , qua n d o volt o u co m el e da Fl ó rida, pedir a ajud a a
um ami g o . Vam o s ch a m á -lo de X.
— Vam o s cha m á -lo de Z. X já est á mu i t o batid o .
Wolf e ign o r o u - o. — Havia qua tr o ho m e n s a qu e m a
Srta. Mard u s pod e r i a ter pedi d o ajud a nu m as s u n t o
de s s e s : Willi s Kru g, Julia n Haft, Leo Bin g h a m e o se n h o r .
O probl e m a de livrar- se do be b ê foi log o res o lv i d o ; foi
col o c a d o aos cuid a d o s de um a tal Elle n Tenz e r , um a en -
fer m e i r a apo s e n t a d a , qu e mor av a soz i n h a e m su a pr ó pria
cas a e m Mah o p a c . Mas a Srta. Mard u s dis s e a X qu e
Ric h a r d Valdo n era o pai do be b ê e iss o foi um err o. Por
dua s raz õ es. A Srta. Mard u s n ã o levar a e m con s i d e ra çã o
doi s fat o s sobr e X: um a qu e ela se m p r e lhe ne g a r a o
praz e r de se u s favor e s ínti m o s e iss o o aborr e c i a ; dua s ,
qu e el e tin h a a alm a de um diabr e t e . Diabr e t e
sig n i f i c a n d o um es p írito mali g n o . Com o o se n h o r é
edit o r , te m bo m voc a b u l á rio.
Upt o n nad a dis s e .
— Por iss o , qua n d o o be b ê tin h a quatr o m e s e s , e as
de s p e s a s para o ma n t e r fazia m co m qu e pe n s a s s e m e m se
livrar del e de outr a for m a per m a n e n t e , X res o lv e u se
dis tr a ir co m o qu e el e se m d ú vida en c a r a v a ap e n a s co m o
um a brin c a d e i r a . Esc o l h e n d o um do m i n g o de mai o ,
qua n d o sabi a qu e a Sra. Vald o n est a r i a e m cas a sozi n h a ,
apa n h o u o be b ê co m Elle n Tenz e r , pre n d e u um ped a ç o de
pap e l no qual impri m i r a um a m e n s a g e m co m um alfi ne t e
no cob e r t o r , col o c o u - o no ves t íbulo da cas a da Sra.
Vald o n e tel e f o n o u co m u n i c a n d o qu e havia qual q u e r
coi s a no se u ves t í bul o. A me n s a g e m es t á no m e u cofr e .
Dizia... sua m e m ó ria é m e l h o r do qu e a min h a , Archi e .
Eu est a v a se n t a d o na cad e ir a qu e Upt o n n ã o qui s e r a .
Fal ei:
— O bilh e t e dizia: “Sra. Ric h a r d Vald o n , est e be b ê é
se u por q u e um a cria n ç a dev e viver na cas a do se u pai.”
— Repi t a — pe di u Upt o n .
Rep e t i .
— Um es p í rito mali g n o — dis s e Wolf e . — Ele n ã o
ape n a s tev e o praz e r de pert u r b a r a Sra. Vald o n; tev e
ain d a o praz e r adic i o n a l de co n t a r à Srta. Mard u s o que
fiz er a. Mas a Sra. Vald o n veio m e pro c u r a r , e e m tr ê s dias
ape n a s o Sr. Good w i n e eu de s c o b r i m o s qu e o beb ê
es tiv e r a sob os cuid a d o s de Elle n Ten z e r . O Sr. Good w i n
foi vê -la e falo u co m ela, qu e fic o u alar m a d a . Duvid o qu e
so u b e s s e co m o tin h a m se livrad o do beb ê ; é prov á vel que
n ã o so u b e s s e qu e m era a m ã e, ma s sabi a qu e su a ori g e m
dev e r i a ser um se g r e d o qu e nu n c a dev e r i a ser reve l a d o .
Com u n i c o u - se co m X, e en c o n t r a r a m - se naq u e la noit e . A
alm a de um diabr e t e é um fen ô me n o estr a n h o . Ela o
levar a a faz er um a diabr ur a inof e n s i v a , ma s a am e a ç a de
ser de s c o b e r t o era into l e r á vel. Per m i t i a - se faz e r , ma s n ã o
podi a ser de s c o b e r t o . Est av a no carr o co m Elle n Ten z e r e
n ã o a estr a n g u l o u por um imp u l s o rep e n t i n o , poi s devi a
es t ar co m a cord a .
Upt o n m ex e u - se no sof á . Ouvia co m os doi s olh o s e
os dois ouvid o s .
— Daria qual q u e r coi s a para sab e r qua n t o do qu e m e
dis s e é inve n çã o. Tud o?
— N ã o. Já pod e m o s provar qua s e tud o . Algu m a s
pou c a s coi s a s s ã o sup o s i çõ es bas e a d a s em evid ê nci a s .
Daq u i por dian t e é sup o s i çã o, pois a Srta. Mard u s n ã o m e
dis s e qua n d o ou se su s p e i t a v a qu e X mat a r a Elle n Ten z e r .
Talve z su s p e i t a s s e , se so u b e s s e qu e se u beb ê es tava na
cas a de Elle n Tenz e r , ma s talv e z n ã o so u b e s s e dis s o . Ela
lia os jornai s ?
— O qu ê ?
— A Srta. Mar d u s lia os jornai s ?
— É clar o .
— Ent ã o n ã o pre c i s a m o s sup o r que , ap ó s co nv e r s a r
co m i g o , ela su s p e i t o u qu e X mat a r a Elle n Tenz e r . Mai s do
qu e su s p e i t a . Os jorn ai s falar a m sobr e a visit a do Sr.
Good w i n a Elle n Tenz e r . Pre c i s o expli c a r mai s ?
— N ã o.
— Ent ã o o res t o est á clar o. Dep o i s de con v e r s a r
co m i g o , a Srta. Mard u s fez o qu e Elle n Ten z e r fiz er a ap ó s
con v e r s a r co m o Sr. Good w i n: co m u n i c o u - se co m X. En -
con t r a r a m - se naq u e l a noit e , e ele tin h a um pe d a ç o de
cord a no bol s o . Pel a s de s c r i çõ es, n ã o o m e s m o tipo de
cord a que us ar a e m Elle n Tenz e r . Um a pre c a u çã o per s -
pic a z . A am e a ç a ag or a n ã o era ap e n a s co n t a r um a brin c a -
deir a de s a g r a d á vel, ma s um as s a s s i n a t o . Ele a
es tr a n g u l o u — talv e z , no se u pr ó prio carr o — e jog o u o
corp o nu m a ruel a , a rua Perry, a me n o s de um quart e i r ã o
ond e Willi s Kru g mor a . Devo lv e n d o - a para se u anti g o
mari d o ? Não é sup o s i çã o, ape n a s co m e n t á rio. Seria
bas t a n t e diab ó lic o, n ã o?
— Ter m i n e — gru n h i u Upt o n . — Conj e c t u r e qu e m é
X.
— É arris c a d o , Sr. Upt o n . Pod e ser cal ú nia.
— Sim , talv e z pos s a . O es c r i t ó rio do pro m o t o r p ú -
blic o , apar e n t e m e n t e , nad a sab e a re s p e i t o dis s o . Pas s e i a
mai or part e do dia de ont e m l á . O se n h o r n ã o lhe s devia
con t a r ?
— Devia, si m . Ainda n ã o co n t e i . Cont a r e i qua n d o
lhe s pud e r dar o no m e de X.
— Ent ã o es t á es c o n d e n d o prova s ?
— Est o u faz e n d o alg o mui t o pior; es t o u con s p i r a n do
para obs t r u i r a justi ç a. Assi m co m o a Sra. Vald o n e o Sr.
Good w i n . É por es s e mot iv o qu e pre c i s o ma n t ê -lo aqui at é
qu e eu pos s a diz e r qu e m é X.
— O se n h o r fica a í se n t a d o co m tan t a cal m a . . . —
Upt o n deix o u o as s u n t o pe n d e n t e . — É ina c r e d i t á vel. Por
qu e est á m e con t a n d o ?
— Pre c i s a v a dis c u t i r iss o co m o se n h o r . Conv e r s e i
co m Bin g h a m , Kru g e Haft no s á bad o e qu e ri a conv e r s a r
co m o se n h o r . Est á impl ícit o na opi n i ã o qu e um del e s
emitiu que o se n h o r mat ar a Carol Mard u s . Dava co m o
expli c a çã o o fato de qu e o se n h o r n ã o a deix ari a tirar sei s
me s e s de f é rias, a n ã o ser qu e lhe tive s s e con t a d o a raz ã o
qu e a levav a a faz er iss o; qu e o se n h o r sabi a qu e ela
es t av a gr á vida, e qu e port a n t o é prov á vel qu e o se n h o r a
ajud ar a a livrar- se do be b ê . Da í a co n c l u s ã o de qu e o
se n h o r era X. N ã o é um a con c l u s ã o levia n a . Qua n do dis s e
qu e que r i a dis c u t i r a pos s i b i l i d a d e de o se n h o r ser um
as s a s s i n o , o se n h o r dis s e “bah”. N ã o crei o qu e ag or a
pos s a agir da m e s m a for m a .
— Aind a dig o bah. N ã o vou co n s p i r a r para obs tru çã o
da justi ç a. — Leva n t o u - se. — Vou ver se o se n h o r na
reali d a d e . . . — dis s e en c a m i n h a n d o - se para a porta .
Com o n ã o tin h a vont a d e de leva n t á -lo, ch e g u e i na
porta ant e s del e e en c o s t e i - m e nel a . Tent o u se g u r a r m e u
bra ç o, ma s err o u e se g u r o u a part e da fre n t e do me u
pal e t ó e co m e ç ou a puxar . Iss o n ã o é bo m para pal e t ó s
e m es p e c i a l os mai s lev e s , de ver ã o, en t ã o pe g u e i se u s
pul s o s e os tor ci, talv e z co m um pou c o mai s de for ç a do
qu e ne c e s s á rio. Ele m e solt o u e eu ta m b é m o solt e i , ma s
o idiot a leva n t o u o bra ç o para me bat e r . De s vi e i - m e,
gir e i- o, pre n d i se u s bra ç os atr á s, e m p u r r e i - o at é um a
cad e i r a e col o q u e i - o nel a . Aqu e l a cad e i r a era m e s m o para
ele . Ao m e en c a m i n h a r para a min h a , a ca m p a i n h a do
tel e f o n e no ar m á rio do outr o lado da sala toc o u , ma s ne m
lig u e i .
— Est á be m — Wolf e falo u co m asp e r e z a — já
de m o n s t r o u que es t á aqui obri g a d o . Port a n t o , n ã o es t á
con s p i r a n d o . Vam o s pre s u m i r de qu e n ã o é X. Mas é clar o
qu e a Srta. Mar d u s lhe dis s e por qu e pre c i s a v a de sei s
me s e s de lic e n ç a. O se n h o r sabi a qu e est a v a gr á vida e ia
ter um filh o. N ã o lhe con t o u , mai s tard e , qua n d o volt o u ,
qu e m a ajud ar a a livrar- se da cria n ç a? Veja, Sr. Upt o n ,
es s a per g u n t a o se n h o r pre c i s a res p o n d e r .
Re s p i r a v a co m dific u l d a d e e olh av a - m e aborr e c i d o .
Aí tran s f e r i u o olh ar para Wolf e .
— Re s p o n d e r e i a que m tiver o dire i t o de per g u n t a r .
E o se n h o r ter á mu i t o a qu e res p o n d e r . — Paro u para
res p ir a r . — N ã o fale i do be b ê à pol í cia porq u e n ã o sabi a
qu e tive s s e alg u m a coi s a a ver co m o as s a s s i n a t o , e ain d a
n ã o es t o u cer t o se te m . Cont e i - lhe s sobr e as cart a s an ô -
ni m a s e qu e o se n h o r qu e ri a list a s das mu l h e r e s que
con h e c i a m Dic k Vald o n , qu e é prov á vel que te n h a con s e -
gui d o as list a s de Kru g, Haft e Bin g h a m . Se pe n s a qu e
vou rast e j a r .. .
Bat e r a m à porta , e abri- a o sufi c i e n t e para ver qu e m
era. Lucy est a v a l á . Su s s u r r o u :
— Sau l Panz e r . — Fiz sin a l qu e si m , fec h e i a porta e
dis s e para Wolf e:
— Tel e f o n e para voc ê . — Ele se leva n t o u e veio. Abri
a port a e fe c h e i - a log o que pas s o u , volt e i para a mi n h a
cad e i r a e m e se n t e i .
— O se n h o r foi int e rr o m p i d o . Est av a fala n d o qual -
qu e r coi s a sobr e rast ej ar . Se qui s e r co n t i n u a r , ter e i
praz e r e m lhe es c u t a r .
Apar e n t e m e n t e , n ã o qu er i a . Ne m m e olh ar zan g a d o
qu e r i a , e eu sabi a o porq u ê . Se u s pul s o s do í am, ma s n ã o
me qu e r i a dar a sati s f a çã o de vê -lo esfr e g a n d o os pul s o s e
pre c i s a v a se con c e n t r a r . Qua n d o a ge n t e torc e um pul s o
de s s e jeit o, d ó i dura n t e alg u m te m p o . Lem b r e i - m e qu e
havia um tub o de po m a d a nu m arm á rio l á e m ci m a qu e
aliviar i a , ma s n ã o ia lev á -lo l á . A cas a n ã o era min h a e,
al é m dis s o , n ã o devi a ter puxa d o meu pal e t ó daq u e l a
for m a . Ele qu e sofr e s s e . Foi o qu e fez, dur a n t e un s quin z e
mi n u t o s .
A port a se abri u e Lucy entr o u , se g u i d a por Wolf e .
Ela par o u e ele con t i n u o u . Upt o n leva n t o u - se e co m e ç ou a
falar, ma s Wolf e int e rr o m p e u :
— Fiqu e se n t a d o . A Sra. Vald o n vai faz e r um a cha -
mad a tel e f ô nic a, e é bo m qu e ou ç a. — Virou- se para mi m .
— Dig a a ela qual é o n ú me r o do Sr. Cra m e r .
Dit e i o n ú m e r o , ela o rep e t i u e en c a m i n h o u - se para o
ar m á rio do outr o lado da sala. Upt o n foi na mes m a
dir e çã o, ma s top o u co m i g o . Dis s e que Wolf e era um
me n t i r o s o , um ch arl a t ã o e as s i m por dian t e . Qua n d o ela
con s e g u i u falar, ele cal o u - se e ouvi u . Eu ta m b é m. Pela
dific u l d a d e que tev e e m co n s e g u i r falar co m Cram e r , cal -
cul e i qu e era o te n e n t e Row c l if f na lin h a . . . Nu n c a irei
ent e n d e r por qu e Cram e r per m i t e que ele fiqu e por per t o .
Mas , afin a l, Lucy co n s e g u i u .
— Ins p e t o r Cram e r ? Si m, Lucy Vald o n . Esto u em
cas a , na Rua 11. De c i d i lhe con t a r alg u m a s coi s a s sobr e o
be b ê e Carol Mard u s . . . Si m , Carol Mard u s . . . N ã o, n ã o
qu e r o co n t a r ao pro m o t o r p ú blic o , qu e r o con t a r ao
se n h o r . . . N ã o, n ã o sei on d e Ner o Wolf e es t á . De c i d i qu e
pre c i s o lhe co n t a r , ma s vou faz e r iss o à min h a ma neir a.
Quer o co n t a r a outr a s pe s s o a s ta m b é m, na mes m a
oc a s i ã o... Willi s Kru g, Leo Bin g h a m e Julia n Haft e qu e r o
qu e o se n h o r os tra g a ou fa ç a co m qu e ven h a m . . . é
me s m o . . . N ã o, n ã o vou faz e r iss o , qu e r o qu e el e s ou ç am o
qu e vou lhe diz e r .. . N ã o, n ã o fare i e pos s o ser tei m o s a , o
se n h o r já sab e , el e s pre c i s a m est a r aqui co m o se n h o r . . .
N ã o, Man u e l Upt o n es t á aqui co m i g o ag or a . . . Est á be m ,
es t o u be m . . . Si m , sei exat a m e n t e o qu e es t o u faz e n d o . . . É
clar o, pod e vir log o , se qui s e r , ma s n ã o lhe dire i nad a at é
qu e tod o s est ej a m aqui.. . Si m , é clar o .. . Est á be m , n ã o
far ei.
De s l i g o u e viro u- se: — Tud o be m ?
— N ã o — dis s e Wolf e . — N ã o dev e r i a ter dit o qu e o
Sr. Upt o n es t á aqui. Che g a r á pri m e i r o e vai que r e r v ê -lo.
N ã o te m imp o r t â nci a; a se n h o r a dir á qu e já foi e m bora.
Archi e , lev e - o para o quar t o and ar e ma n t e n h a - o qui e t o .

19

Em tod o s es s e s ano s e m qu e trab al h o para Ner o Wolf e ,


es s a foi, qu e eu saib a , a pri m e i r a e ú nic a vez e m qu e
fic o u sozi n h o co m um a mul h e r nu m quar t o de dor m ir .
Ficav a no quar t o and a r, on d e dor m i r a , e a mu l h e r era
Ann e Tenz e r . Só es t o u relat a n d o o fato, n ão es t o u
faz e n d o insi n u a çõ es; a porta do quart o es t av a ab er t a é
n ã o mui t o lon g e havi a outr a port a aber t a , a do quar t o
ond e eu ma n tin h a Man u e l Upt o n qui e t o . Dito as s i m cau s a
m á impr e s s ã o. Ele est a v a me s m o qui e t o , se m qu e eu
fiz e s s e nad a . Ap ó s ouvir Lucy co nvi d a r o ins p e t o r Cram e r
para ir l á , n ã o dis s e r a mai s do qu e 20 palavr a s , e a
me t a d e dela s foi para rec u s a r a ofer t a de um san d u ích e
de pre s u n t o e de um cop o de leit e , qu e Wolf e trou x e r a . Eu
ac e i t a r a . Ovos m ex i d o s , qua n d o m ui t o be m - feit o s , s ã o um
bo m prat o , ma s dig e r e m r á pid o.
Sau l Pan z e r est a v a lá embaixo, ajud a n d o Lucy a
rec e b e r e mo s t r a r os lug a r e s ao s co nvi d a d o s , se g u i n d o as
ins tr u çõ es de Wolf e qua n t o aos lu g a r e s . Cont o u - me
de p o i s qu e Leo Bin g h a m , que veio por ú lti m o , foi qu e m
atra s o u tud o . Faltav a m 20 mi n u t o s para as dua s hora s
qua n d o ouvi pas s o s e vi Saul na port a do outr o quar t o .
Falo u co m Wolf e , virou - se para mi m e dis s e :
— Tud o pron t o .
De s c e u as es c a d a s . Log o qu e col o q u e i Upt o n no
ele v a d o r , Wolf e e Ann e Tenz e r entr ar a m . Aind a hav e ri a
lug a r para mai s um cas a l , se n ã o fos s e m do ta m a n h o de
Wolf e . Ele pr ó prio ape r t o u o bot ã o e incli n o u a cab e ç a,
te n t a n d o ouvir um ran g i d o ou est a l o , ma s nad a ouvi m o s .
De s c o n f i e i qu e de n t r o e m brev e m e pediri a para de s c o -
brir qua n t o cu s t a v a um elev a d o r daq u e l e s .
Jamai s ac h e i , e ain d a n ã o ach o , qu e o ins p e t o r Cra -
me r fos s e um tro ux a . Por exe m p l o , obs e r v e m o s a rea çã o
del e qua n d o viro u a cab e ç a e no s viu entr a r. De u um
pul o, abri u a boc a e fec h o u - a de nov o. Raci o c i n o u log o
qu e Wolf e n ã o ou s a r i a faz e r est a reu n i ã o se n ã o est iv e s s e
cert o do que fazia, e, se perd e s s e a cab e ç a na fre n t e de
te s t e m u n h a s , torn a r i a o suc e s s o de Wolf e aind a mai o r . Ao
no s diri gir m o s ao gru p o , se u ros t o fico u mai s ver me l h o e
sua boc a mai s ap er t a d a , ma s n ã o de u um pio.
Sau l os col o c a r a co n f o r m e as ins tr u çõ es. Lucy est a v a
à es q u e r d a e pert o dela est a v a um a cad e i r a para Ann e
Ten z e r . Willis Kru g e Julia n Haft es t av a m no sof á , e Leo
Bin g h a m es t av a nu m a cad e i r a ao lad o direi t o do sof á . A
cad e i r a de Cra m e r est av a e m fre n t e ao sof á , e Saul es t av a
à sua es q u e r d a . A cad e i r a mai or , para Wolf e , es tava on d e
a col o c a r a ant e s , na extr e m i d a d e es q u e r d a do sof á , ond e
havia lug a r para Upt o n e para mi m , es t a n d o Upt o n ao
lad o de Haft e eu per t o de Wolf e .
Mas Upt o n tin h a outr a s id é ias. Ao ch e g a r m o s ao
sof á , e m vez de se se n t a r , virou- se para Cra m e r:
— Quer o faz e r um a ac u s a çã o, ins p e t o r — dis s e el e. —
Contr a N er o Wolf e e Archi e Good w i n . Man t iv e r a m - m e
aqui à for ç a, for ç a f ísic a . Good w i n me ata c o u . So u
Man u e l Upt o n . N ã o sei exat a m e n t e qual seri a a ac u s a çã o,
ma s o se n h o r sab e . Quer o qu e o se n h o r os pre n d a .
Cra m e r já tin h a bas t a n t e co m o qu e se pre o c u p a r
se m pre c i s a r ain d a dis s o . Enc ar o u - o e dis s e :
— Ele s est ã o enfr e n t a n d o u m a ac u s a çã o aind a mai s
grav e . — Olho u para Wolf e , já se n t a d o . — Que me diz
de s s a ?
Wolf e fez um a car e t a: — O Sr. Good w i n , a Sra.
Vald o n e eu ne m da m o s imp o r t â ncia. Su g i r o qu e deix e
para mai s tard e . Te m o s ag or a um as s u n t o mai s s é rio a
tratar ... co m o o se n h o r já sab e , pois é ó bvio que o
tel e f o n e m a da Sra. Vald o n foi dad o sob ins tr u çõ es
mi n h a s ,
— Qua n d o veio para c á ?
— S á bad o . Ante o n t e m .
— Est á aqui de s d e s á bad o?
— Si m .
— Good w i n ta m b é m?
— Si m . N ã o qu er se se n t a r ? N ã o go s t o de es ti c a r o
pe s c o ç o.
— Pre n d a - os — gra s n o u Upt o n . — Iss o é um pe did o
for m a l . Pre n d a - os.
— N ã o seja idiot a — dis s e - lhe Wolf e . — Vou diz e r
qu e m é o as s a s s i n o , e o Sr. Cram e r sab e dis s o . De outr a
for m a , log o qu e me viu, teri a me pre n d i d o , ma s n ão
devi d o à sua ac u s a çã o.
Olh o u para a dire i t a e dep o i s para a es q u e r d a . Cra -
me r se n t o u - se. Eu m e se n t e i . Com iss o , o ú nic o e m p é era
Upt o n , qu e aca b o u se n t a n d o - se ta m b é m, entr e Haft e eu
no sof á .
— N ã o sei o qua n t o sab e — Wolf e olh o u para Cra m e r
— ma s pod e m o s pre e n c h e r as lac u n a s mai s tard e . Ess e
as s a s s i n o é um a de s s a s criat u r a s infe li z e s qu e n ã o s ã o
de s t i n a d o s ne m pr ó prio s para es s e pap e l es p e t a c u l a r e se
en c o n t r a m . . .
— Deix e iss o para dep o i s — dis s e Cra m e r .
— É um a intr o d u çã o ne c e s s á ria: en c o n t r a m - se
abr u p t a m e n t e lan ç ado s nel e . H á un s set e m e s e s , Carol
Mard u s pe di u - lhe ajud a para livrar- se de um beb ê qu e ela
n ã o qu er i a co n s e r v a r , e ele a ajud o u . Se, naq u e l a oca s i ã o,
alg u é m lhe dis s e s s e qu e , co m o res u l t a d o de s t e favor
ca m a r a d a a um a ami g a , el e teria co m e t i d o um dupl o
as s a s s i n a t o de n t r o de um an o, ele pe n s a r i a qu e es s e
alg u é m es t a v a lou c o . O pas s o se g u i n t e , e m b o r a n ã o fos s e
ca m a r a d a , n ã o era fatal, era ape n a s um a trav e s s u r a .
Com o sabi a qu e Ric h a r d Vald o n era o pai da cria n ç a,
ent ã o pe g o u . . .
— Aí h á um int e rv a l o mui t o gra n d e . Era o beb ê qu e
es t av a na cas a de Elle n Tenz e r ?
— Si m . Já vi qu e as s i m n ã o serv e . Pre c i s o dar o no m e
del e . Con h e c e a mo ç a qu e entr o u na sal a co m i g o ?
— N ã o.
— Ela é Ann e Tenz e r , a sobr i n h a de Elle n Tenz e r . É
clar o qu e foi int e r r o g a d a dura n t e a inve s t i g a çã o sobr e a
mor t e da tia, ma s apar e n t e m e n t e n ã o foi o se n h o r qu e m a
int e r r o g o u . — Wolf e virou- se. — Srta. Tenz e r , qu er faz er o
favor de diz e r ao Sr. Cram e r qual o se u trab al h o ?
Ann e pig arr e o u . Aind a era lour a, e se per g u n t a s s e a
dez ho m e n s qual das mul h e r e s ali se n t a d a s era a mai s
atra e n t e , ela ou Lucy, é prov á vel qu e un s se t e del e s dis -
se s s e m qu e era ela. Ao entr ar no elev a d o r , qua n d o me
viu, dis s e r a ap e n a s um a palavr a , al ô , be m dist a n t e . Al ô
n ã o é ô i.
Se u s olh o s frio s e co m p e t e n t e s diri gi r a m - se a Cra -
me r: — Sou se c r e t á ria. Trab al h o para o Servi ç o de Em -
pre g o de Em er g ê nci a. N ó s sub s t i t u í mo s as pe s s o a s de
fé rias, ou e m au s ê ncia te m p o r á ria. Est o u no n ível de
exe c u t i v a - s ê nior.
— Ent ã o trab a l h o u para mu i t a s fir m a s dife r e n t e s ? —
per g u n t o u Wolf e .
— Trab al h e i e m mu i t a s fir m a s dife r e n t e s . Me u pa -
tr ã o é o Servi ç o de Empr e g o de Em er g ê ncia. Ten h o um a
m é dia de 15 trab a l h o s por ano.
— Já trab al h o u para alg u é m aqui ne s t a sala?
— Si m .
— E o rec o n h e c e ?
— Claro. Julia n Haft, pre s i d e n t e da Pat h e r n o n Pre s s .
— Qua n d o trab al h o u para ele ?
— N ã o sei a data cert a , ma s foi no prin c ípio do ver ã o
pas s a d o . Crei o qu e fora m as dua s ú lti m a s se m a n a s de
junh o e a pri m e i r a se m a n a de julh o .
— No se u trab al h o , a se n h o r i t a es t av a e m con t a t o
freq ü en t e co m o Sr. Haft?
— Sim . Estav a su b s t i t u i n d o sua se c r e t á ria parti cular,
qu e est av a de f é rias.
— Ao conv e r s a r co m el e , alg u m a vez o no m e de sua
tia, Elle n Ten z e r , foi m e n c i o n a d o ?
— Sim . Dito u um a cart a sobr e um livro, um ma n u s -
crit o , es c r i t o por um a mul h e r qu e fora enf e r m e i r a , e
me n c i o n e i qu e tin h a um a tia qu e fora enf e r m e i r a , e con -
vers a m o s um pou c o sobr e ela. Devo ter m e n c i o n a d o qu e ,
de vez e m qua n d o , ela ho s p e d a v a beb ê s e m sua cas a ,
porq u e , qua n d o m e tel e f o n o u , pe di u . . .
— Um mo m e n t o , por favor. Qua n d o el e lh e tel e -
fon o u ?
— Algu n s mes e s de p o i s , no inver n o . Crei o qu e era
jan e ir o . Tele f o n o u para o Servi ç o de Empr e g o de Em er -
g ê ncia e deix o u um rec a d o , e eu lig u e i para ele .
Per g u n t o u se mi n h a tia ain d a hos p e d a v a be b ê s, e eu dis s e
qu e ac h av a qu e si m , e pedi u se u no m e e en d e r e ç o.
— E a se n h o r i t a de u? O no m e e en d e r e ç o?
— Si m .
— Já es t e v e . . .
— Um mo m e n t o . — Cra m e r en c a r a v a - a zan g a d o . —
Por qu e n ã o dis s e iss o qua n d o foi int e rr o g a d a na é po ca
da mor t e de sua tia?
— Porq u e es q u e c i . . . n ã o, n ã o tin h a es q u e c i d o , ma s
ne m pe n s e i nis s o . Por qu e dev e r i a ?
— E por qu e se le m b r o u agor a ?
— Um ho m e m vei o me per g u n t a r . — Fez um sin a l na
dir e çã o de Saul. — Aqu e l e ho m e m . Dis s e o no m e de
alg u n s ho m e n s , quatr o , e per g u n t o u se alg u m a vez co -
nh e c e r a alg u m del e s . Dis s e - lhe qu e con h e c i a Julia n Haft,
qu e trab a l h a r a para ele , e per g u n t o u se eu tin h a alg u m
mo t iv o qu e me leva s s e a pe n s a r que el e ouvir a falar de
mi n h a tia. Aí eu me le m b r e i e lhe co n t e i . Ele dis s e qu e
talv e z ajud a s s e a de s c o b r i r qu e m as s a s s i n a r a mi n h a tia, e
ent ã o lhe con t e i tud o .
— Com el e ajud a n d o a se le m b r a r ?
— N ã o sei o qu e qu e r diz e r co m a palavr a “aju -
dan d o ” . Le m b r o - m e de tud o sozi n h a . Com o el e m e podi a
ajud ar a le m b r a r ?
— Podi a faz e r su g e s t õ es. Podi a su g e r i r qu e a se n h o -
rita dis s e r a ao Sr. Haft que su a tia ho s p e d a v a be b ê s.
Podi a su g e r i r a res p e i t o do tel e f o n e m a qu e a se n h o r i t a
dis s e qu e rec e b e u e m jane ir o .
— Talve z pud e s s e , ma s n ã o o fez. N ã o su g e r i u nad a,
só fez per g u n t a s . O se n h o r é qu e m est á faz e n d o
su g e s t õ es. Esto u faz e n d o um a coi s a qu e n ã o dev e r i a
faz e r, e nu n c a fiz iss o ant e s . No tip o de trab a l h o que fa ç o,
para mu i t o s ho m e n s dife r e n t e s , imp o r t a n t e s , n ã o devo
falar do que fa ç o para nin g u é m, e nu n c a falo. Est o u
co m e n t a n d o a res p e i t o dis s o porq u e nad a te m a ver co m
me u trab al h o ; e sobr e mi n h a tia e ela foi as s a s s i n a d a .
— Est e ho m e m pag o u pel a infor m a çã o qu e lhe de u ?
— N ã o. — Os olh o s de Ann e fais c a r a m e leva n t o u o
qu e i x o . — Ach o qu e o se n h o r dev e r i a ter ver g o n h a de si
me s m o . Min h a tia foi as s a s s i n a d a h á mai s de sei s se -
ma n a s , o se n h o r é o ins p e t o r en c a r r e g a d o do cas o , e n ã o
pre n d e u nin g u é m, e qua n d o alg u é m ten t a faz e r alg u m a
coi s a , e es t á evid e n t e qu e ele fe z alg u m a coi s a , o se n h o r o
acu s a de m e sub o r n a r . Devia ter ver g o n h a .
— N ã o es t o u ac u s a n d o nin g u é m, Srta. Tenz e r —
Cra m e r n ã o par e c i a env e r g o n h a d o . — Est o u faz e n d o o
me s m o qu e es s e ho m e m fez: ap e n a s per g u n t a s . Pro m e t e u
pa g a r - lh e qual q u e r coi s a ?
— N ã o!
— De c l a r a r i a sob jura m e n t o o qu e aca b o u de diz e r
aqui?
— É clar o .
— Já en c o n t r o u ou viu qual q u e r dos outr o s ho m e n s
ne s t a sala? Al é m do Sr. Haft?
— N ã o.
— N ã o? Na de c l a r a çã o qu e as s i n o u há alg u m a s
se m a n a s , n ã o falo u sobr e um a con v e r s a qu e tev e co m um
del e s ?
Ela olh o u e m volt a: — Oh! Archi e Good w i n . Sim .
— Viu Good w i n ou falo u co m , ele de s d e a co nv e r s a
rela t a d a na de c l ar a çã o?
— N ã o.
— Qua n d o foi qu e Panz e r falo u co m a se n h o r a e lhe
fez per g u n t a s ?
— Hoje de ma n h ã .
— Nin g u é m lh e fiz er a ne n h u m a per g u n t a sobr e es s e
as s u n t o ant e s de hoje?
— N ã o. Quer o diz er , si m , nin g u é m fez.
Os olh o s de Cram e r fixar a m - se e m Sau l:
— Pan z e r , co nf ir m a tud o o qu e a Srta. Tenz e r dis s e ?
— Con c o r d a co m tud o o qu e sei — con c o r d o u ele .
— Foi vê -la por ord e m de Ner o Wolf e ?
— Fui.
— Qua n d o e ond e ele lhe de u es s a s ins t r u çõ es?
— Per g u n t e a ele .
— Est o u per g u n t a n d o a voc ê .
— Tolic e — dis s e Wolf e . — Re s p o n d a , Saul.
— Na cozi n h a hoje pela ma n h ã — dis s e Saul. — Cerc a
de nov e hor a s e trint a mi n u t o s de hoje .
Cra m e r viro u- se para Wolf e:
— Com o foi qu e tev e es s a id é ia sobr e Ann e Tenz e r de
rep e n t e ?
Wolf e aba n o u a cab e ç a: — N ã o foi de rep e n t e , foi
tardi a. Ne m foi, para falar a verd a d e , um a id é ia; foi te n tar
de tud o . — Olh o u para Julia n Haft. — Pre s u m o qu e se
le m b r a das oca s i õ es rela t a d a s pela Srta. Tenz e r , Sr. Haft?
No ú lti m o ver ã o, h á um ano, qua n d o ela lhe con tou a
res p e i t o de sua tia, e no inver n o pas s a d o , qua n d o
tel e f o n o u pedi n d o se u no m e e end e r e ç o?
Haft ain d a n ã o de c i d i r a co m o agir. Devi a est a r pe n -
san d o no ass u n t o de s d e qu e vira Ann e Tenz e r en tr a r co m
Wolf e , ma s já tirara os ó cul o s tr ê s vez e s e os col o c a r a de
novo ta m b é m tr ê s vez e s e, se n ã o con s e g u i a de c i d ir o qu e
faz e r co m as m ã os, é clar o qu e ta m b é m n ã o sabi a o qu e
faz e r co m a l íng u a . Por iss o , falo u de mo d o bru s c o :
— N ã o, n ã o m e le m b r o .
— N ã o se rec o r d a de s s a s oc a s i õ es?
— N ã o.
— Est á a co n tr a d i z ê -la? Est á diz e n d o qu e ela me n t e ?
Lam b e u os l á bio s: — N ã o dig o que es t e j a m e n tin d o .
Dig o qu e est á en g a n a d a . Dev e est ar m e con f u n din d o co m
outr a pe s s o a .
— Est á se n d o irrefl e t i d o . Mai s , es t á se n d o pu e ril . O
se n h o r devi a ou ac e i t a r os fat o s que ela relat a e duvid a r
de sua impli c a çã o ou cha m á -la de m e n t i r o s a . Mas é clar o
qu e e um tol o. O se n h o r ch a m o u at e n çã o sobr e si m e s m o ,
de um a for m a tola, aqu e l e dia no m e u es c r i t ó rio, e m
junh o , qua n d o con t e i ao se n h o r e aos outr o s sobr e as
cart a s an ô ni m a s . Re si s t i u ao meu pe di d o da list a de
no m e s e fico u relu t a n d o e m forn e c ê -la, ma s m e pedi u
para ver os env e l o p e s , diz e n d o qu e alg u n s dos se n h o r e s
podi a m ter u m palpi t e ven d o a letra. Iss o de u lug a r a um a
con ject ur a . N ã o à conj e c t u r a de qu e o se n h o r tive s s e
alg u m a bas e de su s p e i t a e m rela çã o à s carta s , poi s n ã o
havia cart a s , ma s por q u e o se n h o r sabi a qu e n ã o havia
cart a s e, se o se n h o r sabi a qu e n ão havia cart a s
an ô ni m a s , o se n h o r . . .
Cra m e r int e rr o m p e u : — O se n h o r es t á diz e n d o qu e
n ã o havia cart a s an ô ni m a s ?
— Est o u .
— Que foi tud o fals o ?
— Foi um a ma n o b r a . Eu já lhe dis s e que pre e n c h o as
lac u n a s dep o i s . — Wolf e volt o u - se para Haft. — Se sabi a
qu e não havia cart a s an ô ni m a s , e não dis s e nad a ,
provav e l m e n t e sabi a por qu e a Sra. Vald o n m e co n tr a tara.
Com o já dis s e , cha m o u at e n çã o sobr e si m e s m o de u m a
for m a tola, ma s n ã o corri a ne n h u m verd a d e i r o pe rig o, já
qu e eli m i n a r a su a lig a çã o co m o peri g o eli m i n a n d o Elle n
Ten z e r . Seria .. .
— É m e n t i r a . Dig o qu e o se n h o r é m e n t i r o s o .
— É clar o . Me s m o um ver m e teria qu e diz er iss o , e,
por defi n i çã o, o se n h o r é um ho m e m . O se n h o r nad a mai s
te m a te m e r de mi m , Sr. Haft. N ã o pos s o provar qu e
mat o u Elle n Tenz e r e Carol Mar d u s ; s ó pos s o de clar ar
qu e o fez. Est o u sati s f e i t o . Com p l e t e i o trab al h o qu e a
Sra. Vald o n me co n tr a t o u para faz er h á doi s dia s , e
nin g u é m pod e es p e r a r que ela m e pag u e para faz er o
pap e l de N ê me s i s . Agor a qu e del a t e i sua culp a e sua
de s f a ç ate z , pos s o lhe dar um con s e l h o . Saia daq u i im e -
diat a m e n t e e vá pre p a r a r sua def e s a . Dev e hav e r ves t ígio s
de um a op e r a çã o tão ext e n s a : cart a s ou tel e g r a m a s ;
can h o t o s de ch e q u e s e ch e q u e s can c e l a d o s , se pag o u
Elle n Tenz e r; um rolo de cor d a , o n ú m e r o do tel e f o n e de
Elle n Ten z e r ano t a d o e m alg u m lug a r; o es t oj o de letr a s
de borra c h a qu e us o u para impri m i r a m e n s a g e m pre s a
no cob e r t o r da cria n ç a; um cab e l o da cab e ç a de Carol
Mar du s no se u carr o; um cab e l o se u no carro de Elle n
Ten zer; as pos s i b i l i d a d e s s ã o inu m e r á veis , ag or a qu e
sab e mo s que foi o se n h o r . H á ta m b é m, é clar o, os fat o s
qu e n ã o pod e apa g a r , tais co m o o us o de um carr o, se u ou
de outr a pe s s o a , na noit e de sext a - feira. O se n h o r te m
mu i t o trab a l h o à sua fre n t e e dev e co m e ç ar log o . O
se n h o r n ã o vai?
Leo Bin g h a m falo u baix o: — De u s do c é u, iss o é
brut a l !
— O se n h o r sab e mui t o be m qu e el e n ã o vai — falo u
Cra m e r co m asp e r e z a . — Nin g u é m vai a lug ar ne nh u m . —
Leva n t o u - se: — Ond e h á um tel e f o n e ?
Wolf e es ti c o u o pe s c o ç o: — Vou dar um a su g e s t ã o.
H á dua s hor a s fiz u m a per g u n t a ao Sr. Upt o n , qu e ele se
rec u s o u a res p o n d e r . Dis s e qu e s ó a res p o n d e r i a a que m
tive s s e o dir ei t o de faz ê -la. Pre s u m o qu e el e con cord a r i a
qu e o se n h o r te m es s e dire i t o . Su g ir o qu e per gu n t e a el e
se Carol Mard u s lh e dis s e r a qu e m a ajud ar a a livrar- se da
cria n ç a.
Cra m e r olh o u para Upt o n co m um olh ar zan g a d o : —
Ela lh e dis s e ?
— Si m — res p o n d e u Upt o n .
— E por qu e o se n h o r n ã o dis s e iss o ont e m ?
— Nin g u é m me per g u n t o u . N ã o sabi a o qu e sei
ag or a . Repit o m e u pedi d o for m a l , qu e pre n d a Ner o Wol fe
e Archi e Good w i n devi d o à min h a qu e i x a . Mas res p o n -
der e i à sua per g u n t a . Carol Mar d u s m e dis s e qu e Julia n
Haft fora es p e r á -la no aer o p o r t o , ou log o ap ó s, e levo u o
be b ê .
Virou- se para Haft, que est a v a ao se u lad o:
— Julia n, voc ê n ã o pod e es p e r a r qu e . ..
Ne m ter m i n o u . Haft est av a ten t a n d o tirar os ó cul o s
e su a s m ã os tre m i a m tan t o qu e n ã o est a v a con s e g u i n d o .
Cra m e r per g u n t o u à Sra. Valdo n: — Ond e est á o
tel e f o n e ?
Ela apo n t o u : — Ali.
Enc a m i n h o u - se na dire çã o del e , ma s paro u e virou-
se, ord e n a n d o : — Fiqu e m ond e es t ã o, tod o s voc ê s. Vou
ma n d a r pe dir un s carr o s e vou levar tod o s para o es c r i -
t ó rio do pro m o t o r p ú blic o .
Fixo u o olh ar e m Wolf e: — Incl u s i v e voc ê . Nu n c a sai
de cas a , he m ? Agor a qu e sai u, s ó vai volt ar qua n d o eu lhe
der per m i s s ã o.
Enc a m i n h o u - se para o ar m á rio on d e es t av a o tel e -
fon e .
Wolf e virou- se para nos s a cli e n t e :
— Sra. Vald o n , a se n h o r a fez o qu e lhe ped i e So u- lhe
grat o . Su g ir o qu e saia de s t a sala. Sub a e tran q u e a porta .
No est a d o de es p í rito qu e o ins p e t o r Cra m e r se en c o n t r a ,
vai insi s t i r para a se n h o r a ir e n ã o h á raz ã o para qu e deva
ir. Vá , por favor.
Lucy leva n t o u - se e sai u . H á exat a m e n t e 48 dias ela
se leva n t a r a e me deixar a s ó ne s t a m e s m a sala.

20

Se n t a d o à m e s a de caf é na cozi n h a e m um a ma n h ã da
se m a n a pas s a d a , o tip o de ma n h ã fria e co m nev e de
jan e ir o , qua n d o é agr a d á vel ficar na jan e l a a olh ar para
fora, ma s t i g u e i deva g a r m e u ter c e i r o ped a ç o de pan q u e c a
co m car n e de por c o , en g o l i - o e dis s e para Fritz:
— Est á cria n d o de novo?
Ele de u um sorri s o : — Est á apr e n d e n d o a ter pala -
dar, Archi e . A dis t i n g u i r . Daq u i a dez an o s voc ê ter á
pala d a r . Sab e o qu e fiz?
— É clar o qu e n ã o. Mas fez alg u m a coi s a . O qu ê ?
— Di mi n u í um pou c o a s á lvia e pu s um pou c o mai s
de or é ga n o . O que é qu e voc ê ac h a?
— Ach o que voc ê é um g ê nio. Dois g ê nio s na m e s ma
cas a e um del e s é fá cil de se co nviv e r . Voc ê pod e con t a r
para o outr o o qu e aca b e i de diz er .
Comi mai s u m pou c o de pan q u e c a , se m ba c o n . Em
ger a l eu co m o ba c o n de p o i s de co m e r dua s ou tr ê s
garf a d a s de pan q u e c a , ma s que r i a de s e n v o l v e r meu
pala d a r .
— Fala n d o nel e , leu o jornal da ma n h ã ?
— Sim . Aqu e l e as s a s s i n o , Haft, ne g a r a m sua ap e -
la çã o.
— Ele vai te n t a r de novo. Ten d o din h e i r o para pa gar
o advo g a d o , pod e - se faz e r m ui t a coi s a . Ess a é um a das
de s v a n t a g e n s de ser pobr e , n ã o se pod e mat a r nin gu é m.
Ele es t av a ao fog ã o, viran d o a nova roda d a de pan -
qu e c a s .
— De s c u l p e t ê -lo feit o es p e r a r , Archi e , ma s a gr e l h a
es t av a fria. S ó pe n s e i qu e de s c e s s e mai s tard e . Voc ê dis s e
qu e ia ao Fla m i n g o .
Eng o l i pan q u e c a co m ba c o n .
— Lá est á voc ê faz e n d o rod e i o s de nov o. Voc ê po dia
ape n a s per g u n t a r por qu e n ã o fui ao Fla m i n g o , e, se fui,
por qu e volt e i para ca s a ced o .
— Bie n . Est o u per g u n t a n d o .
-— Ótim o . Eu res p o n d o . Pri m e i r o , fui. Se g u n d o ,
volt e i para cas a ce d o porq u e sa í mo s ced o . Terc e ir o , sa í -
mo s ce d o por q u e o beb ê es t av a co m febr e e min h a ami g a
es t av a pre o c u p a d a . Um a mu l h e r pre o c u p a d a n ã o dev e r i a
es t ar dan ç and o . Iss o abra n g e tud o ?
— Si m .
Veio apa n h a r o m e u prat o e log o volt o u co m pan -
qu e c a s .
— Ele ta m b é m es t á pre o c u p a d o , Archi e . Est á ac h a n -
do qu e h á peri g o de voc ê se cas a r co m ela.
— Sei dis s o , ma s para mi m é ó tim o . Nu m m ê s ou dois
pos s o pedir um au m e n t o .
Comi um pou c o de pan q u e c a co m or é ga n o .
Est a obra foi digi t a l i z a d a e revis a d a pel o gru p o Digi t a l So ur c e para
prop o r c i o n a r , de ma n e i r a tot al m e n t e grat u i t a , o be n e f í c i o de sua
leit u r a àqu e l e s qu e não pod e m co m p r á - la ou àqu e l e s qu e
ne c e s s i t a m de m e i o s el e tr ô n i c o s para ler. De s s a for m a , a ven d a
des t e e- boo k ou até mes m o a sua troc a por qual q u e r
co n t r a p r e s t a ç ã o é total m e n t e co n d e n á v e l em qual q u e r
circ u n s t â n c i a . A ge n e r o s i d a d e e a hu m i l d a d e é a mar c a da
dis tri b u i ç ã o , port a n t o dis tri b u a es t e livro livr e m e n t e .
Após sua leit u r a co n s i d e r e seri a m e n t e a pos s i b i l i d a d e de adq u i ri r o
ori gi n a l , poi s as s i m voc ê est a r á inc e n t i v a n d o o aut or e a publi c a ç ã o
de nova s obra s .
Se qui s e r outr o s títul o s nos pro c u r e :
http:// g r o u p s . g o o g l e . c o m / g r o u p / V i c i a d o s _ e m _Livr o s , ser á um praz e r
rec e b ê - lo em no s s o gru p o .

htt p:// g r o u p s . g o o g l e . c o m / g r o u p / V i c i a d o s _ e m _Livr o s


htt p:// g r o u p s . g o o g l e . c o m / g r o u p / d i g i t a l s o u r c e

ESTA OBRA FOI COMPO STA


PELA GABARITO ARTE & TEXTO
S/C LTDA. E IMPRE S S A NA
ARTES GR ÁFICAS GUARU S.A.,
PARA A EDITORA NOVA
FRONTEIRA S.A.,E M
DEZEM B R O DE MIL
NOVECE N T O S E OITENTA E
QUATRO.
N ã o en c o n t r a n d o es t e livr o nas livr a r i a s , pe d i r pe l o
Re e m b o l s o
Pos t a l à EDITO R A NOVA FRO N T E I R A S.A. — Rua Mar i a
Ang é lic a, 16 8 — Lag o a — CEP 22. 4 6 1 — Rio de Jane i r o .

Você também pode gostar