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t'm erro na tradueçào do sexto capitulo do Genesisdeu exis-
tencia ao seguinte vcrsiculo:— e aconteceu que os iillios de |)cu>
• «

viram as filhas dos homens e ;is acharam heIJas, o escolheram


para suas mulheres aqueJIas dentre as que lhes agradaram.
Baseados n’este engano, dois poetas ingleses, Byron o Thomaz
.Moore, escreveram cada um o seu poema: o de lord Byron. in­
titulado— O Cèo e a terra—. licou incompleto, mas nào assim o
de Thomaz Moore. que. com a denominação <l«*— Os amores dos
anjos—, é muito mereeidamente applaudido. O visconde de Al­
meida Garrett, soecorrendo-se ã mesma fonte. escreveu o—Anjo
p a princesa— , delicado poemelto como os sabia conceber e
executar talento de tào lino gosto <• tão poderosa aptidão paia
o cultivo litterario.
A Eloá do mnrlt; Altredo de Vigny nílda lem üe coiimmni nem
com o i.*rro da versào da üiblia. nem com o modo de tractar o
assumpto. que se observa nas produccòcs de j£i_i*on,j^£oro ou
G arrett; mas, evidentemente prende-se ã mesma ordem deideias.

sendo como que d’ellas uma caprichosa inspiração.


ICloá não é lillia do homem, mas de Deus: formou-se de unia
lagrima de Jesus Christo chorada sobre o cadaver de Lazare.
(>

Conduzida ao roi», «relie st.*- ausentou. indo ai» encontro de L u ­


cifer. que a seduziu e perdeu.
D'entre os poemas, que a musa elegante do condo^Allïedu île
Vigny legou a apreciação <l<»ï> que o leem. admirando a suave
•• perfeita organisaçâo arlislira de tão delirado esrriptor. <> que
sempre mais intimamente me agradou foi <» de tpie estou trae-
tando.
Ensiuou-mc a Ilie ronherer as bellesas uni amigo e eompa-
nheiro de estudos, que tive.Ti-aiano Gaivà<> de Carvalho, «pie
jã deixou de pertencer à communhão dos vivos, mas que p«>r
sua não vulgar intelligencia e nohre eharaeter está sempre na
lembrança dos«u e tiveram a fortuna de o conhecer.
Trajano Galvâo de Carvalho fallou-me uma vez na traducçãn
da Elaá, <pie por elle fora eiiiprehendida. se por acaso conhe­
cesse em si mais aptidão para a boa execução do trabalho; o
acrescentou que o poema trasladado á nossa lingoa seria «>
mais bello mimo de noivas. que alguém podéra fazer.
Ninguém ponde nunca ven cer a excessiva modéstia., qu e era
a teiçao characteristica de sua indole. e por am or d ’ e lla ficam os
privados d'esto como dc m uitos on tros trabalhos com qu e p o ­
deria enriquecer as nossas lettras.

Gravou-se-uie na memória a communicação. que me foi feita,


e <> desejo <• o jivi/.o n ella contidos. Bem que muito menos apto
para a realisação do trabalho, resolvi tenta-lo em 18(>2. deixan­
do-o logo em começo. Este anno impuz a mim mosxno o dever
o adiantar e o concluir, c agora o entrego ã luz da publici­
dade.
/

Sc outro lòra o traductor, quo não ou, o poema do c o n d o r -


fredo do^jííny havia d<* ohter carta do naturalisacão portiigu*-
sa: mas. imperfeito •* incorrecto. ainda assim diz-mr mn^-ipn-
cia que os quo Irrem a tradnccão lirarão tondo cm Hovadt
conta o distincto poeta franc«*z conl»*mporam*o. caso não eonti»*-
çam ainda as suas hcllissimas composicròes em prosa •* veiM-.
m

1SC7.

F la v io R r im a r .
A ' .M E N IN A

M A IIIA R A R B A R A ÜE SOUSA ANDRADE.

%
O FFE R E C IM E N TO .

D o u r a - t o a f r o n t e da b e lle s a a a u ré o la ,
b r il h a n o s o lh o s te u s lu z d e b on d a d e,
o o m e ig o r i s o d o s e m b la n t e a n g é lic o
t r a n s p ir a fe lic id a d e .

P e r p a s s a s e n tre nós a g b rin c o edeneo


d 'e s s a id a d e in fa n til g r a c i o s a e hella.
corno u m a n jo , <juo a m ã o du a r tis ta -g e n io
d e i x o u v i v o na tóla.

U m c õ r u do alï'eiçoes i*uras e v a r i a s
c e r c a - t e a v id a . o a v o z do a m o r te e n s in a
•le p a i e m ã e n a m o n o d ia e th e r e a .
oh, c â n d id a m e n in a !

Dá (| u e c u atue ta m b é m ;i lia r p u ris s im a


d e tão f o r m o s a e p la e id a e x is t e n c ja .
«luo s a g r e o b r a n c o a lt a r a o d o e e e lfU iv io
<le <fue te a d o r n a a tim ida m n p çen oíu .
1-2

T o n s 110 m o u p e i t o e r g u i d o u m t e m p l o c a n d i d o
o n d e um c a n to d e a m o r con stan te: sô a ,
v o z de uni h y m n e , ta lv e z , c a r m e d u lc is s im o ,
q u e d i z q u e é s m eigra e b o a .

Q u a n d o c o n te m p lo de teo ro s to o v i v i d o
a lv o r e c e r da in fâ n c ia e m g r o ç a e riso .
triste r e c o r d a ç ã o m o le v a o e s p ir ito
ao ceo, ao p a ra ís o .

D o is a n jo s, q u e p ô rd i, ã e s p lie r a r u tila
ascen deram , vo a n d o m an sam en te,
e m e d e ix a ra m só. se n tin d o a s m a g o a s
.I n s a u d a d e p u n g e n t e .

A m b o s tra n q u illo s n o viv ei* e p h e m e ro ,


q u e o led o e n g a n o m e e n fe it o u d e a m o r e s ,
d a n d o p e rfu m e e n e c t a r a o s m e u s la b io s.
c o n v e r tid o s d e p o is e m ta n ta s d o re s .

F ic a e n tro nós; s e u m d ia a o d iv o g r ê m io
quiseres regressa r pu ra e sau dosa,
pede q u e v a m o s a n te s d 'o s io e x ilio
a b rin d o -te o c a m in h o , oh, flo r m im o s a !
E lla <li*se q u e fo i a s e r p e n te a q u ë m o u v iu
qu e a enganou;
0i;KK5lK.
E L O A , '

o-e-

C ANTO PR IM E IR O .

n a s c im e n to .

N o te m p o cm que Jesus v iv e u no m undo


para sa lva r do peccado a hum anidade,
nasceu na terra um anjo, sem segundo
na uraca, na bellesa e na bonda*le.
C ercado do s o c e g o o m ais profundo
tinha .1 'sus deixado com humildade
os m u ros do Béthania; e desterrado
trasia a turba a cam in h a r-lh e ao lado.
10

C o m le n to p a s s o o c a m p o a t r a v e s s a v a ,
o r a o s u s t e u d o p a ra c o n s o l o e p r e c e ;
p o s t o á b e ir a d a e s t r a d a , a 11i t o m a v a
p o r s y m b o lo o ca m p o e a m adu ra m esse.
O u s e n t e n ç a s d iz ia e l i c o ô e s d a v a .
qu al a d o m áo p a stor, q u e n o s o fie r e c o
e x e m p lo s c o m o a o v e lh a d e s g a rra d a ,
0 1 1 d o S a m á r io a n a r r a ç ã o pensada.

P ro s e g u in d o d e p o is if e s s a c o n q u is ta ,
q u e lo i só m a n s i d ã o e s ó b r a n d u r a ,
J esu s a o s c e g o s lh e s fo i d a n d o v is ta
e ao le p ro s o sa u d e e fo rm o s u ra .
Á filh a d e C a n a n , q u e s e c o n t r i s t a ,
o u v iu - a n o s p e d i d o s d e a m a r g u r a ;
a in fa n c ia a b e n ç o o u e a c e r t a e s t r a d a
e n s in o u á q u e d ’ e l l a o r a a fa s t a d a .

I o d o s, d a n d o -lh e p ra n to e m d e s p e d id a ,
iam a p ó s si d e i x a n d o e s s e s l o g a r e s
on d e em d e s te rro , p e n a im m e r e c id a ,
fic a v a a q u e l l e a q u e m s e e r g u e u a lt a r e s .
E r a filh o d o h o m e m e b e m c u m p r i d a
17
toi a ordem de edietos regalares;
sahido d ’en tre os seus, a prophecia
em nada, sim, em nada não mentia.

Os am igos de Christo na Judéa


ora viam da vida o fnn chegado,
fim , que elle liavia na sublim e ideia
p o r uma e muitas veses retardado.
Perdeu Lazaro a vida, que inda cheia
era de a m o r e. fraternal cuidado;
mas, o amigo de Christo não morria,
tendo clic mais poder que a m orte fria.

Partiu Jesus á noite e loi seguido


pelas irmans do morto, a cujo abrigo
deveu elle o descanso permittido
a quem foge da trama do inimigo.
T u d o para as irmans era perdido;
Christo em vão lhes disia:— dorm e o amigo!
Elle, o filho de Deus, vendo o sudario.
chorou tambem da m orte no sacrario.

3
18

Km s ig n a l d e a m is a d e alli v e r t id a ,
e s ta la g r im a santa d e r r a m a d a
n à o loi c h o ra d a e m v à o , n ã o foi p e r d id a ,
m as, na urna d o s a n jo s r e s g u a r d a d a
:\ v is ta d o s m o r ta e s , n ’e lla c a h id a ,
c o m o o o r v a lh o d e fr e s c a m a d r u g a d a ;
e ao c e o le v a d a toi a m a r a v ilh a ,
q u e e n t r e as lu ses d o e m p y r e o in d a m a i s b r i l h a .

D o P a d r e E te r n o a v is ta c o m p a s s iv a
à la g r im a d eu lu z, a c r à o a o p r a n t o ;
deu alm a e v id a â q u e l l a e s s e n e ia d iv a
o p od er, qu e p erten ce ao K s p irito -S a m to .
Qual o in c e n s o , q u e a r d e á fo r ç a v i v a
d o s ra io s corn q u e o sol a d o r n a o m a n t o ,
se tra n s fo r m a e c o u v e r t e e m l o g o a r d e n t e ,
p u r o , v e r m e l l i o , lin d o e r e s p l e n d e n t e ,

assim d o tu n d o da u rn a d ia m a n tin a
v iu - s e uma v i r g e m b r a n c a le v a n t a r - s e ,
b ella , m im o s a , pu ra, a lv a e d iv in a ,
p o u c o a p o u c o nas fo r m a s a u g m e n t a r - s e ;
o u v iu -s e d e u m a v o z q u a l d e m e n in a
10

o nome, que á bellesa -aprouve dar-se:


era— Eloá!— ; e o anjo, que surgia,
— aqui estou!— m eigamente respondia.

Em rico adorno para Deus caminha


com o a noiva, que ao templo é condusida;
a fronte é bel la o pura qual florinha,
que do nom e do lvrio é conhecida.
Cobre-a ceruleo veo, que bem se alinha
aos contornos da fronte émbellecida,
e as linas dobras vào-se alevantando.
mui levem ente os ares agitando.

São seus cabellos louros repartidos


em m olles crespos, que, no ar brincando,
somei ham brandos raios espargidos
por um astro, que á noite vai errando.
Rosa verm elha aos lumes despedidos
d'alva, que em ceo azul vem despontando,
não tem do rosto do gentil archanjo
o pudor virginal, proprio «le um anjo.

»
20

fo rm o s o s o lh o s a d o ç u r a
M..;, <ine a b ra n d a lu z d a Lua,

O .seio, q u e se a g ita e é v is to a p e n a s ,
os c o n to rn o s le v a n ta d o t e c id o
ce les te a o n d e ás c ò r e s m a is a m e n a s
v è - s e o li no tra b a lh o r e u n id o .
M ulher e an jo nas f e iç õ e s s e r e n a s ,
linda c o m o no c é o n ã o t e m h a v i d o ,
unindo á p u ra e s s e n c ia d o s a m o r e s
p rim o r d ivin o o da boi lesa as flo r e s .

Quando á terra b a ix o u e m t e m p o s i d o s
o archanjo R a p h a ë l, a n jo b o n d o s o ,
contou a q u e m lh e d e u c r e n t e s o u v i d o s
este m y s te r io e caso m u i f o r m o s o ;
ao ceo o n d e só m o r a m b e m - q u e r i d o s
2\

ninguém lcvon maior praser e gòso,


ninguém, nenhuma d’essas fôrmas bellas,
que Deus aos anjos deu o-amar e vé-las.

Nas azas d’ouro envolvidos,


cobertos de tenue véo,
curvaram frontes humildes
os puros anjos do ceo.
K as virgens, n’este cortejo,
aos anjos foram-se unir,
como em torno de alva lua
nuvens de roseo fulgir.

Correm todas de mãos dadas,


porque ao anjo querem ver;
harpas d’ouro eram pendentes
das cincturas innocentes
em longo e frouxo pender;
flores no ceo desbrochadas,
como orvalhos a cahir,
chovem das mãos delicadas,
quaes nunca em patria dos homens
sm

te rra ingrata viu florir.

Cantava o c ò ro divin o:

« F e liz o m undo será,


« q u e p o r guia p e r e g r in o
« tiv e r a linda Eloá.
«C o n s o lo d os in felizes
«b o n d o s o o an jo ha de sei*;
«m a s , cjue g lo b o e m seus in atises
« h a d e ufano o r e c e b e r ?
« q u e s e e l o , q u e t e m p o o es p e ra ?
«n o v o s ceos, em ou tra era ,
« p o r que os reja, h ã o d e de n a s c e r ? »

Um d i a . . . (Q u e m lhe dar o n o m e o u s á r a
ao q u e não tem futuro e ja m a is v o lta ?
a lingua h um ana é de e x p r e s s õ e s a va ra ;
ve la -s e a etern id a d e á m e n t e e n v ò lt a
no lim ite cru el, q u e em v ã o se aclara.
23

e , se um instante de si desprende ou solta,


preciso é v e r um nome que, sabido,
torn e-o <le nós no tempo conhecido).

t'm dia os anjos do immortal império,


nào prudentes outr’ora. assim faltaram:
«Cuidado em vós, formoso anjo. sidereo.
«q u e muitos d ’este em pvreo já tombaram.
« A o mais hei Io de nós, ao mais ethereo,
«ju stas penas de exilio castigaram:
«á q u e lle cjue na graça primitiva
«e ra o que em si trasia a luz tào viva.

«Ia m sem pre com elle o amor e a vida


«o n d e fosse levar a voz divina;
«t à o form oso que a terra embevecida
«p o z - lh e o nom e na estrella matutina;
«t ã o lindo que na fronte enrubecida,
«e n tr e os cabellos de ouro e seda lina,
« o sol o collocou como diadema,
«u fano d’este enfeite de tal &emma.

«Mas, hoje tem perdida a vivaz eoróa,


« g e m e sósinho a ausoucia dos a m o re s ;
« d e mo crim e a n egrid â o am ostra e cùa
« p ê z o e som b ra oui seus o lh o s, não fu lg o re s .
«D 'e s te v e rb o do c e o já Nie não sôa
«n a vo z a phrase d e h arm on ia e. flo re s;
«falia na m orte, q u e im a <juanto a vista ,
«tu d o o em q u e toca m u rc h a e se c o n tris ta .

«N en h u m le v e s e n tir n ’a im a lhe m o r a ,
«n e m p ra ser das d e sg ra ç a s o b ra sua;
«p e rtu rb a -s e es te e c o , se o c o m m é m o r a ,
«c o m o lym pha <fue o fo g o faz q u e e s tú a ;
«n en h u m anjo, q u e a D eu s e s tim a e a d o r a ,
« q u e en tre nós m an so e m a n so a qu i llu c tu a ,
« d ’elle a historia dirá, e n e n h u m sa n e to
«fa lla r d ’elle uma v e z ou sá ra t a n t o ! »

N ão m aldisse-o Eloá; fe ic ò e s d e m e d o
ninguém viu no seu rosto s o c e g a d o .
Máo presagio no ceo lo g o , b e m c e d o ,
houve p o rq u e do a rc h a n jo d e s t h r o n a d o
o triste caso d e o rg u lh o s o e n r e d o
‘ *111 desejo de auxilio loi t o r n a d o ’
2;;

na q u e o ouviu enj ptocida bondade,


não tom ada de h o n or, mas ,Je piedade.

D eu lo g a r em seus labios á tristes*


a d e sg ra ç a offereoida á sua ideia;
corneçou de scism ar scisma defesa,
p ertu rb a d a a corar, de pudor cheia,
tu rb a n d o , e m lim , dos olhos a bellesa
uma la grim a , q u e a palpebra roseia.
F e liz o co ra çã o, que d ’esta sorte
d e si lança a prim eira antes da morte!

T e e m os anjos os tedios, que nós tem os,


p o b r e s na terra ou nobres na grandesa;
mas, nos proprios festins ás vezes vem os
iso la r-se o q u e g e m e e ama a tristesa.
\'oz, que ern seu coração produz extrem os,
nem de forte nação, nem da réalésa
ao r u g ir do v iv e r , ruido incessante,
('* capaz de extinguir-se um só instante.

4
20

Ksl a v e is s e m p o d e r , h a r p a s d i v i n a s ,
c a r r o s d o g l o r i a liiu la e n t r e f u l g o r e s !
A d o r n o s d o S e n h o r , b a n d e ir a s lin a s ,
v iv a , craden te est r e lia d o s p a s t o r e s
,las m ã o s d e D eu s e t e r n a s , p e r e g r i n a s ;
ou ro do oeo, d o c y n a m o m o o d o r e s ,
d e lic ia s d o N e b e l , p e d r a s f o r m o s a s
d o s v a s o s d e r e s in a s o l o r o s a s ,

vosso e s p le n d o r, p e r fu m e e c a n to a m e n o
n ã o, s o lV rè -lo s n ão p ò d e u m a r c h a n j o l.r is le ;
o c â n t ic o s a g r a d o lh e é v e n e n o ,
q u e p e r t u r b a o s c i s m a r , q u e n 'e l l e e x i s l e .
N à o v è no ca n to o so m g r a to e s e r e n o ,
q u e r e s p o n d e á t e r n u r a e lh e r e s i s t e ,
quan do o e s p irito busca e m v à o d e s e jo
g u a r d a r d o OOcullo a m o r o c a s t o p e j o .

Q u e r Deus, c h a m a n d o o s a n j o s , d e s v e n d a s s e
a graiid & sa intinita a o s s e u s o l h a r e s ,
ou n os e e o s , b e r ç o e t e r n o , lh e m o s t r a s s e
g lo r ia e p o d e r eu» r u t ilo s a lt a r e s ;
q u e r o g r u p o d o s a n jo s s e a p r e s ta s s e
27

para es ta n c a r-lh e n’aima os mâos pezares,


exlrib in d o o v iv e r de .lesus-Ghristo
d e m o d o e. n u m scénario nunca visio,

o p r e s e p io aos reis m agos ofïerecido,


no d e s e rto a familia, e dos pastores
;i sancta saudação, nào distrahido
o a n jo, a linda Kloá, d'estes actores
aftustando-se triste e oom m ovido,
foi p ro c u ra r das nuvens os pallores
a cu ja som b ra, posto cm liberdade,
s cism a r podesse an grado «la vontade.

lia noit(îs là no ceo; ha tonte pura,


q u e lava a agua brilhante eut rubra areià.
S r uni a o jo u bebe a<> saibu du Iroscina,
a lym ph a, que alli co rre cm linda veia,
la-lo d o rm ir mu som no île doçura
tão grata, de taes sonhos sem pre cheia,
q u e o mais amado amante d este mundo
bem qu isera-o d o rm ir longo e profundo.
28

Mas, e m ba Ide E loá d ’e l l a b e b ia ,


n en h u m s o m n o lh e cò a <> e s q u e c i m e n t o :
d e n o ite «'m s o n h o a im a g e m lh e .su rgia
d e um a n jo , q u e i m p l o r a v a a l g u m a l e n t o .
O g r u p o v ir g in a l, q u e p r é s e n t ia
da o c c u lta d ò r o t r is t e p e n s a m e n t o ,
c a n ta n d o , p e r g u n t a v a a o a n jo b e l l o :
s e n o c e o não e s ta v a o seu an b e l o ,

se ali e r a p e q u e n a a f e l i c i d a d e ,
se a lg u m d o s s é r a p h i n s n ã o lh e p o d i a
m u d a r a p e n a e m r is o s d e b o n d a d e .
A taes v o z e s E lô a r e s p o n d i a ,
ch eia a p h r a s é d e a m o r e a m e n i d a d e :
«n e n h u m d o seu c o n s o l o c a r e c i a ,
« e x c e p t o um i n f e l i z . . . » O g r u p o a s in h a ,
c a la n d o o n o m e , d e ix a - a s ó s in h a .

Das v ir g e n s a c o m p a n h e i r a
u m d ia , d e ix a n d o o c e o ,
s ò , m e d r o s a , a r ir fa g u e ir a ,
s o lta n d o as azas, d e s c e u ,
buscando a terra querida,
aslro deserto, sem lux,
1 10 espaço imuienso perdida,

vaeuo que ao anjo seduz.

Lá île Luizauia beila na tloresta


brilhante beija-llor, tendo rompido
a casca d ’ aureo ovo, que o sol cresta,
deixan do o berço nos bambus tecido,
sai do ninho llorido em chilro e festa,
d e azul couraça o peito revestido,
v e r d e es m erald a a fron te lhe enteitando.
nas tào purpureas asas se librando.

Vòa ás luctas do ar, e á luz brilhante


as plumas de coral ledo espaneja;
espanta o pombo e na palmeira ovante
pousa de leve em rapida peleja»
A c h a o plaino oloroso tatigante,
vai de uma a rv o re á outra e a tlòr lhes beija,
cren do en con trar d'este testejo agi est»3
o g òso no palniisla ou no eypreste.
30

M as, o b o s q u e é t a m a n h o e e l l e é p e q u e n o ,
e d o b e r ç o o p e r fu m e a lli n ã o s e n t e ;
d esce á v e rd e savana em v ô o a m e n o ,
b u s c a n d o o a r o m a , q u e o fa r á c o n t e n t e ;
m enos tem e da s e rp e a g ro v e n e n o
,pie; a tr is te s a d o b o s q u e h ú m i d o , a r d e n t e ;
b e ija o ja s m im d a s F l o r i d a s p r o v i n d o
a OS d o c e s II I I d o s d e um a s p e c t o l in d o .

Ig u a l a o b e ija -tl«»r. fcJóii, ;• h e ila .


f o r le d«*s q u e n a s c e u , d ’aza «* \ p e r im e n t ;»
o mágico m olor, <pic lhe re v e la
podei* itiiiiic iis n , i|ue a v o n t a d e a u g m e n t a .

P o r q u e possa e n c o n t r a r s e r e s n a s c id o :»
«m m o u tr o s a s tro s , «*m d i v e r s o s m u n d o s .
c h e g o u sô sin h a e m v ô o s e x t e n d i d o s
aos e x t r e m o s d o s e c o s , q u e s â o p r o f u n d o s .

depois que a via laetea atravessando,


•.'oiijuncto de mil fogos sernpre ardentes.
31

p o r r im a rios planetas so librando,


p o z os pós nos co m eta s transparentes.

|)o r e o á som lira tiiinirha


na 1 1 1 1 1 1 p rin c ip io tom
i.lo a b y s m o a densa tenebra
posta tios c r os aquem ,
d e g r á o s e m gráos o éthern
na escala a st* esLrntlrr
o ccu p a o espaço indom ito,
(p ie v a i-se alem p c n lr r .

S c um .•1 1 ij<» desce trepido*

d e ix a n d o t» azul d<> re o ,
uns ares m onos vividos
e n r o n lr a o tjiie d rsrru .
V a p ores, n u vrn s lelricas.
te rrív e is lu ra rõ rs
passam , vo lteia m rubidos,
sop/antlo ásperos sons.

Mas, sob a zona esplendida


da fo r t e lu z s o la r ,
s o l» a s c a m a d a s d u b i a s
d e v id a , lu z e a r ,
e m c u jo e s tr e ito â m b ito
p o d em o s to d o s ver
e s ta s e s p h e r a s n ítid a s
o espaço a p ercorrer,

ha o d e s e r to fr ig id o ,
im m e n s o e serp e& d o
d e u m tu rb ilh ã o h o r r is o n o
p e z a rio a s e a r r a s ta r ;
h a lu z d e u m d i a p a l l i d o
n as n u v e n s s e p u lta d o ,
d e b a i x o o c a b o s t e r r i tic o
e a n o ite a n e ^ r e ja r .

K q u a n d o o a r d e n te a n h e lito
do ven to em f o g o ajeita
d o a b y s m o <> s e i o tà ir ji'id o ,
p r o fu n d o a m a is nao ser,
, » mmo r> a lo a v è l v a c u o .
33
sem cor, sem luz, sem termino
cornéça a apparecer.

Nunca nenhum Espirito


chegou do abysm o ao fim;
jam ais p o r estes circulos
perdeu -se um cherubim.
Os anjos, que sào validos,
tem em que o impuro ar
debaixo da asa candida
alli venha a faltar.

De mais receiam pavidos


voar, cahir, descer
áquelle ca lios mephitico
do fundo a escurecer.
Que sorte n’este ex ilio
teria o cherubim?
do riso máo, satanico,
a offensa má, sem fim -

o
34

O u , e m p e r i g o m á x im o ,
uni c a n t o s e d u e t o r ,
s a u d o s o , 1er n o e m á g i c o ,
c h e io d e m u it o a m o r ,
q u e o a t t r a h is s e t iin id o
q u e a lli fic a s s e a a m a r ,
s e m da c e l e s t e p a tria
p o d e r - s e m a is l e m b r a r .

o is á a z u l a b ó b a d a
o o u i ra v e z s u b ir ,
m o s t r a n d o á lu z d o e m p y r e o
eabiiplos a c a liir ,
* e s p a r s o s e n â o ni ti d o s ,
as a za s s e m t e r c o r ,
os b ra e o s nús, e lla c c id o
m il o o sem fu lg o r.

a fr o n te , a f r o n t e pa Ilid a ,
n os o lh o s r o x id à o ,
sign a l d o c h õ r o a n g é l i c o
n’ a q u e lla s o lid ã o ,
e t»s \>»'*s n e g r o s o m ó r b i d o s
3S

d o lo g o , i|iic os queim ou,


tudo e n t r e os an jos plácidos,
q u e o c e o s e m p r e adorou.

Kis p o r q u e os anjos tímidos,


sa b io s, pru dentes sâo,
d ’es te s triston h os silios
fu g in d o á soliclào!

Kra n ’a q u e lla so m b ra vaporosa


q u e E lò a, a b ella, so cega d a estava,
sem m e d o se librando descuidosa
no c u rio s o e n le v o em q u e se achava.
Mus, c o m a presença candida o formosa
os b c n ciic io s n ovos, que causava,
e o p o d er, q u e em si tinha e conhecia,
d a v a m -lh e agitação, m eiga alegria.

A lg u n s m undos punidos pareciam


co n so la d o s da pena em q u e jaseram :
36

se o võ<> «m o n o d ’ella ao lo n g o o u v ia m .
logo os astros 11 0 ar parados e r a m ;
nos p crigrin o s g lo b o s , q u e c o rria m
pelo vacuo sem íim o n d e n a sc era m ,
b re v e mudança logo se o p e ra v a ,
se a ponta <la asa d o an jo lh e s tocava.

Mudava-se o p e za r e m s e n tir led o,


vin ga tivos rivaes faziam pazes;
vib rad os os punhaes p o r o d io tr e d o
do m ais le v e fe r ir n ão são ca p a zes;
liv re o e a p tiv o estava se m t e r m e d o
das a lgem a s cru en ta s e m in a ze s;
o p ro s crip to v o lta v a aos p á trio s la re s ,
e a lei ergu ia o im p é rio c m seu s a lta res.

N ão mais a iu som nia a p resa d e v o r a v a ,


e a d o r e o pranto em riso s se fu n d ia m ,
c tu, sin cero a m o r, ao p a r, q u e e s ta v a
desu nido a s o llre r, aos q u e g e m ia m
da saudade, q u e os p e ito s in a llra c ta v a ,
<|uc d e lam entos vãos só s e n u tria m ,
tu, puro a m o r, a todos c o n s o la n d o ,
ias dicta ni o gra to d e r ra m a n d o .
CANTO SEGUNDO.

SEOU CCAO

E ntre os m ontes erguidos sobre a terra,


dom inando a planície, muitas vezes
um poço natural abre-se e encerra,
profundo «* solitário, sobre as lez^s
do tolhi<;o, «pie n e l l e apodreceu,
a agoa limpa, que cahiu do ceo.
N ’ella, com o se espelho escuro fosse,
as est relias da noite, retleetindo
nas horas dc ahno dia a luz tà<» docc.
no dubiu scintillai* estão fulgiodu.
:*8

Q u a n d o a lli j u n c t o a o p o ç o ;• c a m p o n e s a ,
s o lt a n d o a c o r d a , v è n a l y i n p h a p u ra
i 11)11101*30 «> b a ld o o p á r a . á b o r d a p r o s a ,
c o n te m p la n d o n o q u a d r o a fo r m o s u r a
d o s lin d o s a s t r o s d o um b r i l h a r s o m b r i o .
C ode á v a i d a d e e m fr á g il d e s v a r i o .
K s u p p ò e q u e dOs a s t r o s a g r i n a l d a
lh e a d o r n a ;i ro s c a f r o n t e i n n o c e n t i n l i a ,
o o r ò a fe ita p o r m ã o s d e a l g u m a fa d a ,
d e q u e fo s s e i n v e j o s a u m a r a in h a .

A s s i m d o c h á o s 1 1 0 f u n d o bÜòa, a b e l l a ,
in c lin a d a a m i r a r , i n g ê n u a c r i a
v è r o u t r o s o c o s e o u t r a a l g u m a e s t r e l la .
q u e m ui d is t a n t e , a o l o n g e l h e s o r r i a ,
l ’ o r ir m u m e r o s s o e s s e n d o o í f u s c a d o s ,
seu s o lh o s á p r i n c i p i o d i v i s a v a m
a b y s in o s o m b r a , 1< » t r a n s ifo r m a d o s
e m fo g o s , q u e na c ò r s e a s s e m e l h a v a m
ás c e n t e l h a s d o s f r i g i d o s p a u e s ,
v a r ia s , e r r a n t e s e n o b r i l h o a z u c s .

l u g i i u n , v in h a m , o u t r a v e z fu g ia m ;
:tí>
••

cada estrella seguia um meteoro;


do anjo os bellos olhos perseguiam
os astros n ’este g y ro em ciroulo d’ouro.
K p a rec eu -lh e então <pie uma harmonia,
pura <* grata de um astro a outro unido,
nos p e re g rin o s sons d'elles saliia,
c o m o a v o z clara do rrystal pendido,
q u e o v e n to em seu cam inho removeu,
v o z q u e da Italia a filha adormeceu.

Este lo n g in q u o som mudou-se em canto,


q u e m ais distincto foi-se logo ouvindo,
os inconstantes fogos por encanto
uns aos ou tros se foram reunindo;
e rosea autfora appareceu por íim
c o m o se fòra em ceo de alvo selim.
K ao m im oso clarão nuvem aromada,
no ar v e r m e lh o em espiraes subindo,
acamou len tam ente uma almotada
igual ao d ’ Azia frouxa divan lindo.

K sobre ella assentada, com o um anjo


triste •* fo rm o s o , vagam ente viu
40

unia form a celeste o b e llo a rch a n jo,


e um som con fu so le v e m e n te ouviu.

l)o a lyi-e sp m n eo C lyd e o filh o ou sado


c o rre , saltando o n eb u loso m o n te ,
ás vezes, p ersegu in d o agil v e a d o ,
M*ie aos sons da tro m p a em su stos fo g e in son te
dos n e v o e iro s do Crona aos d u ro s g e l os
do A rv e n , q u e os p ossu e c o m o c a b e llo s .
0

, V
Galga a rocha m usgosa, a b y s m o s salta,
cai s e g u ro no ch ào, passa-a c o r r e n t e
nos em balos d e uma a r v o r e m ais alta,
abre cam inho e c h e g a a fo u ta m e n te
até juncto da n e ve não pizada
antes d ’elle na rapida caçada.

Mas, no m eio das nu ven s posto erra n te ,


busca o trilh o en c o b e rto aos seos o lh a r e s ;
e alli, se á luz do iris viu b rilh a n te,
coroando ;>s ajioas, na a m p lid ã o dos ares.
4!

nas n u vens perpassar o veo ligeiro


d e uma escosseza, aman le de uin guerreiro*

se o u v iu -lh e a v o z nos echos ir morrendo,


pára en ca n ta d o, porqu e julga em sonhos
q u e seus olh o s a legres estão vendo
a irm an d e seus avós, e nos risonhos
casos de a m o r a som bra va porosa
vih ra r as co rd as d ’ harpa melodiosa.

Instando com a m em ória, elle procura


le m b ra r o n om e, q u e Ossiano dera
áquella fe m in il, bella figura
de tran sparen tes dedos de alva cera,
e, so b re a rocha altivo, em pé, proclama
o n o m e de vir-C om a: assim se chama.

N ão m en os bella e m enos duvidosa


d o ten e b ro so archanjo a lórm a rara
ao lo n g e appareceu , vaga e tonnosa,

o
e ás delicias d o e n c a n to se aj u n e tara.

Com o o cy s n e a d o r m i r lo n g e d a m a r g e m
vai levado da o n d a fu g itiv a ,
do j o v e m se fir m a v a a ig n o t a im a g e m
n ’a qu elle a é re o leito p e n s a tiv a ,
v e n d o os tê n u e s v a p o r e s , q u e fu g ia m
á pressão, q u e os seus b r a ç o s e x e r c i a m .

Era purpurea a v e s t e , q u e o c o b r i a ,
e., umas veses sem b r ilh o , o u t r a s lu z e n t e ,
em m eig o en ca n to o s o lh o s d is tr a h ia
na c ô r da lactea o p a la t r a n s p a r e n t e .
N eg ro s c a b e llo s n’ u m a fa c h a u n id o s
eoino orn è r ’oa s o b e r b a e s tã o m e t t i d o s .

D ’e lla o ou ro b rilh a n te e ra tão v i v o


''O '110 as centelhas iriysticas, a r d e n t e s
do circu la n te fogo- a c e e s o e a c t iv o
nos vaso# dos arom as r e c e n d e n t e s :
43

t i nha a s a/.as c o l h i d a s c ò r «la bru m a,

(juo a tarde a ennoitecer «loco reçuma.

D ebaixo de seus pés, que um cire’lo do ouro


a bran ge e feicha, innumoros diamantes
resplendem com o fulge o meteoro
com graça a derram ar fogos errantes:
nos braços tem aimeis, que a vista offendcm.
e os dedos nos anneis lambem se prendem.

A m ão agita, d’aureo sceptro armada,


r*oino um rei, que de um monte rege os passo>
dos va ries esquadrões, e. por um nada
m andando, in ove impaciente os braços;
11 a fronte a inquietação vè-se-lhe impressa,

e os olhos baixos, timida a cabeça.

Baixa o olhar por ventura conhecendo


o rnagico poder, que n’elle abriga,
pouco a pouco dos raios seus quuendi
mostrar a carinhosa força antiga,
ou porqu e tema revelar sua alma
44

na cham m a v iv a , q u e lh e a l i e r a a ca lin a .

Qual brisa m atin a l, q u e na flo r e s t a


co m e ç a a c ic ia r no ruiclo i n c e r t o
e acorda a terra e m r is o s d e a lm a testa
e m o v e a on d a d o m a r n o a m p l o d e s e r t o ,
assim da tr e v a o a n jo l e n t a m e n t e ,
e rg u e n d o a v o z p ro fu n d a , d o c e e t r is te ,
disse á li lha d e D eu s, a n jo i n n o c e n t e ,
estas folias d o a m o r , q u e n ’e l l e e x is t e :

« D ’o n d e vens, o h , m e u a n jo f o r m o s o ?
« o n d e vás? qual a s e n d a q u e t r ilh a s
« i i ’esse a d e jo a r o m a d o e m im osc»
« d a aza a r g e n te a a m o v e r - s e n o ar?
« V a s d o c e n tro d e um sol e m p r o c u r a ,
« le it o farto d c m il m a r a v ilh a s ,
« d o n d e possas c o m a m o r e b r a n d u r a
« rubro o e ix o d o c ir c u lo g u ia r ?

«o u , turban do d c m e d o os a m a n t e s ,
45

«a m o s tr a r -lh e s por noite sombria


« n o horisonte e nas nuvens distantes
« d 'alva aurora o suave clarão?
«d iv id in d o no calix das flores
«b r a n c o orva lh o em celeste magia,
« o u do iris as rutilas cores
«s o b r e os mont.es, <|iie erguidos estão?

« D e v e la r so b re as almas insontes,
«d 'in s p ir a r terno am or ás donzellas,
« c o m o um sonho nas candidas frontes,
« v in d o á noite em seus braços pousar,
« d e g e r a r-lh e s um filho n’ um beijo
«n ã o sào taes n’algu m mundo entre estrellas
«t e u s cuidados, teu puro desejo,
« m e ig o archanjo de plácido olhar?

«O h , q u e são, se á bel lesa, que ostentas,


« s e da g lo ria ás centelhas divinas,
« s e á doçura ideiaJ, que apresentas,
«m in h a crença fiel posso unir!
«M as, talvez sejas novo inimigo,
«ed u ca d o nas falsas doutrinas
vu

«c\o r i v a l , q u e c o n v i v e e o i n t i g o .
IVo a q u i p o s t o ha d o v ir.

« T a l v e z v e n h a s , n a o lV e n s a a m i m m esm o,
« p r o c u r a r o s p a g a o s , q u o in c a d o i a m ,
« o le v a -lo s e m tu rm as e a è s m o
v.do b a p t i s m o á c r u e l p e r d i ç ã o ,
v p o rq u e s e m p re o in im ig o p o te n te
« n o s t r iu m p h o s * q u e a f r o n t e l h e d o u r a m ,
« v o z d a in fa n c ia ou o l h a r i n n o c e n t e
« m e o ffe r e c e e m tin g id o p e r d ã o .

« S o u t a lv e z o i n f e l i z e x i l a d o
« a q u e m tu c u id a d o s a b u & e a v a s ;
« m a s te r o g o , e a c o n s e l h o o c u i d a d o ,
«q u e com D eus d e v e s te r e g u a r d a r .
« S e h o je e s to u d e s g r a ç a d o p r e c i t o ,
« l o i p o r d a r s a lv a ç ã o á s e s c r a v a s
« t r is t e s a lm a s , q u e o a m o r i n i i n i l o
«t in h a e n t r e g u e a t e r r í v e l p e n a r .

« A n j o ca sto! v e n s tu p o r v e n t u r a
\1

«dar-me pena ou consolo anceiadoV


«vens do ceo, que me deu a tortura,
«mas, tâo meiga te vejo, anjo meu,
«<j 11c não sei porque vens impiedosa
«rnaltractar este pobre exilado.

«cujo crime é manter orgulhosa
«regia a fronte aos dictâmes du ceo!»

Assim l'ai Ion o Espirito.


Da voz ao máo carinho
contra a formosa victima
usado com fervor,
d’este artificio mágico
ao bello desalinho
do ceo a filha candida
cobriu-se de pudor.

Knvolta na aza rutila,


subia a aerca estrada,
ch *ia de eslivllas ni tidas,
querendo se alTastar,
qual nos cannicos roriilos.
48

f u g i n d o d e a s s u s ta d a ,
c o r r e a m en in a trép id a
d e a lg u ém , q u e v io nadar

nas a g o a s , q u e s ã o p r ó x i m a s
d o s itio ein q u e eJla e s t a v a ,
e n t r e g u e a o seu d e s c u i d o ,
n a ly rn p h a a se i m m e r g i r .
Em vã o, p o re m , dos círcu los,
q u e a n u v e m alli f o r m a v a ,
seus pés bu scavam trê m u lo s
c.om r a p i d e z fu g ir.

V ò a m a is p r o m p t a c r a p id a
a p o m b a in n ò c e n t in h a
d e A l e p o ao lin d o s itio
a o qual m a n d o u - a a l g u é m ,
l e v a n d o e m si a e p ís t o la
do a m o r d e u m a r a in h a ,
sultana m e i g a e f é r v i d a ,
que olh ar form oso tem .

Á c h a m m a d o c e e v iv id a
49

do olhar do arehanjo impuro


cedeu de Klùa timida
.1 voz do coração,
e logo que a viu credu Ia,
da presa alii seguro,
fuilou dc novo licto
nos cantos da paixão.

«Ku sou aquelle a quem nrnguem conhece,


«mas a (piem Iodos amam. Meu império
«sobro o homem fundei, que a ohamma aqueee,
«nos desejos do amor. n’esse mysterio
« 1 1«>s sonhos d’ahna, na formosa messe
«dos thesoin os do sangue, e no sidereo
«brilho de um puro ollvar, no laço estreito,
«que prende o corpo ao corpo, o peito ao peito.

« Ku sou quem dá no sonho a casta espo.->a


«accentos d’alma voz; quem á menina,
«tão pudibunda e bella como a rosa,
«feliz menl ira docemente ensina;
«quet» noites lhe eonceüe em que repousa
7
no
« e ganha o quo p erd eu , triple e mofina,
unas longas horas de anojado dia
« s e m luz. som v o z «le a m o r , som alegria.

«E u sou <> o m i l l o rei d ’esses a m o r e s ,


« q u e se nulrem no g r o m i o d o s e g r e d o ;
« u n o dois eoraooes, q u e b r o os rigores
«d a s cadeias, q u e incu tem n ’aim a o m ed o .
«q u a l borb oleta le v e a le v a r IIores
«á relva posla á s o m b r a do a r v o r e d o ,
« crasando a re lv a á llò r sem n e n lm m pranto
« s e m p e r ig o nen hum no d o e e encan Io.

«R o u b e i ao p ró prio Deus a oreatura,


ue com e lle partilho a naturesa;
« r o d i - l h e o o r g id h o IVaco de á luz pura
«<do sol. que o e x c e d e e veu oe em roalosa,
tulos astros occu lta r a form osura,
« p o i s tenho a s o m b ra rmula, e a terça presa
• ã volúpia das noites, qu e lhe hei dado
«fio prazer do m ys le rio alvoroçado.

«Y ie s te lá dos eoos êom alguns anjos


« v e r <» deleite «IVslas noiles minhas’?
«Dos Inu'hrosos, rulilos archanjos
«as vigílias sosinhas
«maravilham <1<* amor, e <»s meus Ihesouro.-
«correm á llux cios varios meteoros.

«(.Iiiando, embalado abaixo *W» Iiorísonle.


«pallido a desmaiar do liomeni & vista,
«deixa o sol de dourar do alto monto
« a tão soberba e tão relvosa crista,
«eu, dirigindo espíritos formosos,
«v ô o nas sombras, recumando aroma,
«dos escuros cabellos tão sedosos
. «sacudindo no ar a altiva coma;

«cheiroso o orvalho lentamente chora,


«gottejante de amor, sobre a Uu.mlha,
«a rosa, O lyrto até yüe a linda aurora,
«acordando no ceo, mimosa brilha.
« Ã s leis do império meu attenta e grata
« m e acolhe a naluresa em testa (
«respira o meu inlluxo e m e idolatra.
«convertida cm brilhante paraiso.

«D'ella to in o -ju c a aima, e logo e v ô c o


« o s .subdiLos lieis, que aos meus inlenlos
« laceis prestam-se quaudo o fuudo eu Lôco
«d o s abundantes, varies e le m en to s ;
«c o n v iv a acostumado á a le g re lesta,
«u m p or um cada qual abi v e m cantando,
« e cuidadoso á v o z do m ando apresla
« d o c e encanto, q u e n ’elle está brincando.

« N o org u lh o d o seu v ò o sai p rim eiro


«saudoso o rouxinol, ao ce o subindo;
« á n u vem , terra- e onda e i-Io fagueiro
«d is e n d o a m o r e s no g o r g e i o lindo.
«Canta em m eu e lo g io ao pé das llores,
« e , c o m o arauto harm onico, a n m m c ia
« a minha vinda ás aves multicòres,
« q u e os ollios alu em sob a m oita iria.

«<> insecto reluIgente em si reilccte


« d o firmamento a c ò r viva e brilhante,
«quando em meio «Ias inurtas se inlronieltc.
« sol tand<> a luz da Ironie »l«• diamante;
«n ad accd e no brilho ao meteoro,
«que sobro as agoas corre e <> logo apaga,
(«ni <I» »s panes á eslrella cm traço louro,
«que minha mão no ar desprende e alaga.

«Quando, fraca os deveres quebrando,


«a menina, que a mãi protegia,
«virgem deixa ao amante buscando
«nos arroubos de férvido amor,
«estos fachos do ceo, <jue eu accendo,
«bem lhe servem nas luzes de guia
«sob ós passos, quo move tremendo,
«guia cerl.o, que nunca é traidor.

«<s)uando sente nos labios a sêde


«e vem juncto da praia arenosa
« e á profunda conchinha alli pede
«uma taca em que possa beber,
«leve a agua se agita e suspira,
« e ás areias e aos pés cor de rosa
«id o re in en te de Von lis a lira
«hc'Ila a c o u c h a no lo ve m o v e r .

« E n t r e os b osques de rosa a r o m a d o s
,«os m eus anjos lhe m o s t r a m r i d c n l e s
« m a r a v i l h a s nos llocos t r a n ç a d o s
« d o lierva e nm rta e c h e ir o s o j a s m i m .
«
« v e n d u mais a bellesa das Mores,
« q u e só aliretn por noites si le n ies,
« e <|no, am antes c o m o ella. das c o r e s
« a o sol p e rd e m m im o s o o s e lim .

«S e g u o -a se m p re o silen cio m e d r o s o ;
« d o r m e tudo em descanso p r o f u n d o ;
« o u v e a som bra um nrysterio e x t r e m o s o
« c o m suave e calada atten e ão;
«b r a n d o o vento a s o p ra r d e lic a d o
« o mais puro perfume do m u n d o
« t r a z aò leito de folhas fo r m a d o ,
« o n d e am ores deitados estão.

«Lindas vozes inunuuium c u m i n s ,


«qun «Io bosque o repouso quebrantain.
« e os dois seres e as almas amigas
«lá no abrigo, que a murla lhes dá,
«ouvem hymuos de amor e ternura
«nus gorgeios, que as aves descanlam,
ai Tesse Irino de maga doçura,
«que lambem lias de ouvir, Kloá.

<A volúpia eslremeee nos ares,


«ergue voz.es «» arbusto vieoso,
«hvnm o augusto «*s relvosos allares
«m ejgo entoam no puro cantar;
«do regato nas margens doridas
«gemebundo a correr vagaroso
«pousa a pomba, o nas voses dorida>
«laz-se ouvida no seu lamenlar.

*<|)o «-rande m a ll’e i l o r a o b ra e esta.


r> • v
« e s t e a n - lia n jo d o m al là o a re u s a d o .
«mpesla.
<(l|<4 <|U d i s e m q u e ao p r o p r i o v i e i o <

« s ó d e s p r e n d i ' d e si « o u s o la e â o :
ás pena-
Umíi o e s e r a v o e o livra e o salva
«d o que o .uno II 1 0 d<‘i 1 m is e r o e s ta d o ,
«(Miil)al;md()-o d.1 a m o r nas canI i lenas,
«deslem brado da sua posição. »

ISmquanto o escutou, dc E lô a o r o s t o
por 1 res vezes c o b r iu -s e d c p u d o r ,
e, em lueta contra <> o lh a r tão d e s c o m p o s l o ,
seus olhos dc um azul de linda <*or
por 1res vezes fe c h a r a m -s e in n o c e n t e s
sul» «1 pèzo das pálpebras a r d e n l c s .
CANTO TE R C E IR O .

QUÊ DA.

l>Vmde .vens, oli, pudor, mvsterio lindo,


augusta timidez <la torra filha,
cjuandu a infancia lhe dava em riso iníindo
os ma lises da florea maravilha*?
Mimosa llòr dos tempos primitivos,
<|ne entre nós germinando te engrnndeees.
«•osa paraisal de nromas vivos,
de <|uo lo*xar, do alto, oh, pudor, desces?
s
r> 8

Só lu pódes ainda da in n ocen eia


occupar o logar eni q u e ella e s te ve ,
bem que ao v ed a d o p o m o a existencia
tua d e v e -lh e o r ig e m , a m o r lhe devo.
O teu encanto iguala o da v irtu d e ,
se uno o e x c e d e nas purpu reas rosas,
bem que d ’ellas o mal o b rilh o m u d e
em desbotadas folhas não form osas.

'Peu seio virginal tímido enfeita


o vestuário casto da bellesa,
«le que não se adornou Eva, a perfeita,
antes de tè-la a serpe eivada e presa.
Mas, se o v é o puro a tua fronte adorna,
<* se m p re um véo, é s e m p r e cobertura
pois quê o crim e também d ’elle se orna,
mostrando a que nà<» tem consciência pura.

I m nada te perturba, <• logo encerras


•i palp<*|>ra ao olhar mais innocente,
‘•<>mo as 11ores das nossas primaveras
•" » raio fes tiva l d o sol a r d e n t e .
Mais ingênua a criança, nada lem e.
não se assunta, nciii còra ou balbueia,
nada encobre do céo á luz extreme
,1 0 franco e/bel Io riso da alegria.

Deste novo poder submettida,


sentindo o rosto de pudor corado,
já se a Virgem curvava enfraquecida,
já caliia nas azas do peccado.
Sob o jugo do espirito sombrio,
desce, sobe, e na sombra outra vez desce,
como se entregue a fraco desvario
cada vez mais subjeita se conhece.

Assim vè-se a perdiz, que roda e paira


sobre a quebrada espiga da campina,
querendo aproveita-la, e se desvaira,
da prole ouvindo a voz, que aspera triua.
Se o vôo arrisca, pára, que não póde
nos esforços, que faz, furtar-se á vista
do cào, que a orelha lixa não sacode,
c prompto e vivo a não perder-lhe a pista.
00

Como é bel Io o delírio dos instantes,


(|ue amor nos dá, se rapide suspira!
lie s ponde ni-se um ao outro os d ois a m a n te s ,
como ao vento responde o s o m du lyra.
O jovem, lindo interprete, adorado,
explica a sensação, <|ue elle inspirara,
e do outro ser formoso o delicado,
vencendo do pudor a expressão chara.

envolvendo em seus braços a fra qu esa


da virgem, que lhe entrega a vida inteira,
quasi triuniphador da insonte prèsa,
ehrio da esperança, que lhe luz fagueira,
iepete as juras, que em sentida e n d eixa
lhe tez ao coração rubra a menina,
voz repassada no langor da queixa,
Iraca, celestial, quasi divina.

'W ''" d° mà0 a,cl‘u" j ° u vete oppressa


‘•xpheava na insiOia carinhosa
U* ■ “ « que c o „ , e wl
- f e c o l H í r a iaeia deleitoSa -

’ ''eCülhÍaa e jã Uisia
61

«111o Ioda inteira ao anjo se enlrej-iuva.


r. n rei d<» mal na Ireva tào sombria,
julgaudo-a sua, assim lhe replicava:

«Sou teu, sejas minha; 110 laço fraterno


«sejamos unidos, arehanjo extremoso:
«m erero-te em |>aga do amor lido e terno,
«que a ti mo tem preso nas scismas do goso.
«110 tempo, «pie passa depois <iu<‘ le v ‘ -

«J)o ar entre os filhos confuso o perdido,


«velado, encoberto qual sol entre brumas,
«a putria azulada do povo querido.
« paiz inelVavel, roseira entre espumas,
«um dia, meu anjo, brilhante en a \i.

«Não tive pesares .te haver me alastado


« dos sítios luzentes, edeneos logares.
«nos quaes sempre mora do medo o utiidadi.
«a tímida ideia de Deus nos altares,
«mais bella, mais pura depois que le vi.
62

« T u só le mostravas quai nitida estrella,


«q u e rompe o veo puro da noit.e azulacla,
cfulgiudo a meus olhos, sorrindo tào bella,
«q u e a aurora de amores loi logo lormada,
«depois, meiga estrella, que eu loueo te vi.

« T u só l'oste a imagem do bem desejado,


(«fortuna, que o homem constante procura
v nas sombras da vida perdido, empenhado,
«buscando apossar-se da maga ventura,
«Guino eu suspiroso depois que te vi.

« T u só foste a imagem «1») Deus, que prescruta


«profundo o mysterio das sortes felises;
<•rainha, que espera meu throno, que escuta
«d a voz de meus labios os sons nos malises,
« q u e ii deusa harmonia me deu juncto a ti.

«Emlim, por teu porte no ar magestoso,


«presença formosa, bondosa, divina,
«p o r todo esse encanto discreto e mimoso
03

<ano roi revelado, gentil pereprina.


«que arnnr ou poclia depois (pu* l.- vi. >

«Quer teus olbos encobertos


*de 11 ma sombra de trist«>sa
«os meus vissem sempiv ab^rlos
«em te v£r e procurar,
<upier a origem «lo leu berço,
«tendo a tua singellesa,
«mais perto de mim te désse
«patria, mundo ou divo altar,

« é certo «pie eu tenho eri«l«s


«desde a hora em que naseesie.
« v e r - t e <>m ttiflo, anjo qiieri.lo ,

«e m iu«t“ tc «’ «*idiceer.
v. 1res veses passei chorando
«pelo \i ni verso celeste,
<. ppr toda parte buscando
«•«mconlrar-te •* assim !«• m i.

..Dos ares im snpro ardent -.


(i'i

«n*um raio da branca lua,


«n o asl.ro do coo cadente,
(«no arco-iris do ceo,
«n o leilo brando e macio
«da neve gelida e nua,
«eu respirava o perfume
«dos traros do vôo heu.

«Km vão lormulei perguntas


«aos glohos do immense espaço,
«dos astros por vezes muitas
«a luz do carro obumbrei:
«para attrahir teus olhares
«tornei-lhes o fulgor bani.
« e as aureas cordas da lyra
«celeste vibrar ousei.

" Mas, nada ouvisle, sim, nada,


««* r.à > mc viste tão pouco:
«voltei á terra agitada,
e irninho posto a andar,
«dos liome ís por »•111r.• u abrigo,
« impiielo ,• (juasi louco,
05

«son» quo me visse comtigo,


tsem te poder encontrar.

«Julguei achar-te sósinha


«juneto de uni berco embalado,
«protegendo a innoceniinha
«criança meiga a dormir,
«sòpro amigo lhe expirando
«n o rosto tão socegado,
«roseos lábios lhe beijando,
«ambos n'uni leve sorrir.

«Ou com as azas reiulgentes,


«com o em cortina extendidn,
«em horas magas, silentes,
«contra mim a resguardar
« o somno da virgem pura
«ao lado da irman (|uerida,
«que, scismando, com doçura
«tem-na ao peito a apertar.

«Mas, ao meu reino formoso


y
60

« v o lt e i sò, triste, chorando,


« g e m e n d o em to m lamentoso,
« a t é o instante feliz
« e m que o som do teu adejo
afe z - m e tr e m e r c o m m o v id o
«q u a l sacerdote, esperando
«n v o z de Deus, que o bem d iz . »

Foi assim que fallou o archanjo tredo;


<* logo, qual se fosse uma rainha,
q u e córa de prazer ingênuo e ledo,
de soberana ouvindo o n o m e asinha,
e aos súbditos lieis dirige ufana
cheio de graça o gesto, e encantadora
os enleva no olhar de soberana
e os transporta que d'elles é senhora,

Klòa, erguendo «» veo da fronte linda,


dispòe-se a lhe fallar com doce riso;
deseo mais perto d ’elle, desce ainda,
e iv m lo chegar de amor ao paruiso.
Curva, inclinada, em languidez formosa,
07

du amante, que a seduz, contempla o rosto,


oheia de uma expansão viva, orgulhosa,
,1e um meigo effluvio de prazer composto.

Como a vaga du mar, que sobre a areia


morre, batendo e levantando a espuma,
seu bello seio, (juc palpita e anccia,
do- a rom a do suspiro se perfuma.
Como o Ivrio suspenso sobre o lago,
seu braço sem receio se aproxima,
ex tend ido cm procura de uni aiago,
<iue á pouco e pouco a sua voz anima.

A perfumada bocca se entreabrindo


parece desbrochar pura e mimosa
como ao encanto da aurora meigo c lindo
obve-se a bella e puchbunda rosa,
quando a manhan derrama sobre as Il ores
o Iresco orvallio cm gottas espargido,
e um raio, que do sol rellecte as eores,
Ihés penetra no seio adormecido.

A doce voz dos labios seus parece


os
gru ta h a rm o n ia a re s o a r n os aros,
‘ lu e a o m e s m o te m p o a le g ra e e n tris te c e ,
u n in d o o s s o n s cio s b o s q u e s e cios m a r e s .
Som de um a 11a u t a n a s o i d ã o s o p r a d a ,
a v e q u e ix o s a a g o r g e ia r s o s in h a ,
o n d a , ({u e e x p ir a e m p ra ia s o c e g a c la
aos pés do s c is m a d o r tris te , á ta rd in lia ;

ven to , qu e passa e b r i n c a cie c o n t e n t e ,


b e ija n d o o s in o frio c ie u m a i g r e j a ,
e, n a s b o rd a s zu n in d o fro u x a m e n te ,
l e v e c a n ç ã o c ie u m s a n e io ru m o re ja ,
ou q u e a g ita d o ju n c o a e r g u id a c o rô a ,
quando l l i e f o g e a o p é l í m p i d a a ag.u a,
(| u e d e c o r r e d o u m rio ou d e la g ò a
n a v o z fra q u in h a d e s e n tid a m a g u a .

«J á q u e te n s ta n ta b e lle s a ,
« h a s d e sei- b o m c e r t a m e n t e ;
«(ju a n d o d e u m a a lm a a p u res a
«t o m a o c a m in h o c io c e o ,
«v e m o s q u e a s a n e ia b o n d a d e ,
00

«Í c o m o u m v e s t i d o i n n o c e n t e ,
« d a bel l e s a a e t e r n i d a d e
« l h e dá n o f u l g i d o v e o .

«M as, p o r q u e in e c a u s a m m e d o
« o s teus d is c u r s o s d e a m o r e s ?
«e m teu rosto qu e segredo
« i m p r i m e Larnanha d o r ?
«C o m o d esceste, d e ix a n d o
« o c e o , q u e é p a t r i a d e lu z ?
«c o m o v iv es m e adorando,
«s e nào a m a s a Jesu s?»

Do o lh a r a t i m i d e z g r a t a e d e c e n t e
clava r e a l c e á v o z d a v i r g e m b ella ,
hnnc c o m o o p e n sa r m a is in n ocen te,
que d e c o n t i n u o e s t a v a a p r o t é g é - ia.
ra tão d o c e a v o z , tà o m e i g a e p u r a
,l lhe c a h i r d o s i a b i o s n a c a r a d o s
01,10 n o ^ ÿ n v e r n o s o b r e a e n c o s t a e s c u r a
a* a n e v e nos flo c o s d e lic a d o s .
70

P o r q u e o s a n jo s, no a m o r d a e s s e n c ia d iva
n u trid o s e fo r m a d o s c o m o fo ra m ,
g u a r d a m n o p e ito e n ’a im a a lu z a c tiv a
c o m q u e tudo illu m in a m e tu d o d ou ram ,
e in q u a n t o e lla fa llo u d a s a s a s lin d as,
d o s e i o e b r a ç o s o c l a r ã o c H v in o
nas c e n te lh a s , q u e são d o c c o p ro vin d a s,
d ilT u n d iu -se b r ilh a n t e e p e r e g r in o .

T a l n o m e i o d a s s o m b r a s Iu z o b r i l h a
d o d ia m a n te a cla ra m a ra v ilh a .

K n ch cu -se d e te m o r o a rc h a n jo ired o ,
e aos d eslu m b ra d o s o lh o s u m a b rig o
sob os c a b ello s n eg ro s, p e lo m e d o
gu ia d o, p ro c u ro u lo g o c o m s ig o .
Ic2 p e n s o u q u e p o r í i m , s é c u l o s c o r r i d o s ,
lh e e r a p reciso v è r a D eu s d e fren te,
e u n i s ó tio s s e u s o l h a r e s d e s p a r g i d o s
p o d ia a n n iq u ila -lo d e re p e n te .

E. l e m b r o u - s e t a m b é m d o s o íV r im e n t o
7 I

, oh s im , c ru e l, p o r q u e h a p a s s a .»..,

a ^ d J h a v o r com fa .s o e d u r o in U m lo

no d e s e r t o a J®sus te n ta r o u s a d o .

E tremeu, o c o b r i u c o m a a s a . . r . r n e n s a
o negro c o r a ç ã o , q u e o i n f e r n o a g i t a ,
chamando s o b r e si a s o m b r a d e n s a
,1o manto, q u e d o s t e o m b r o s p r e c i p i t a .

Quiz f u g i r q u e o t e r r o r l h e d e s p e r t a r a
a lem b ran ça d o s i n a l e s , q u e cau sara.

Sobre a n e v e d o s m o n t e s s o b r a n c e i r o s
pelo e s p a n h o l o u s a d o f o i f e r i d o
O condor, q u e o r e b a n h o d e c a r n e i r o s
ameaçava a o l o n g e e s p a v o r i d o .

I er,a ° v ò a , e o sa n g u e vai d e ita n d o ,

A cóm Ce° t 0 ln P a p id e z > q u e ig u a la

........... ..
16 Jrasa a s s im q u e e s ta la
7 2

O lh a m u i fix a m e n te o sol d o u r a d o ,
e p ro cu ra a sp ira -lo o b ic o a b r in d o ,
su p p ò n d o q u e da v id a o s ò p r o a m a d o
ha d e l h e v i r d o s o l t ã o c l a r o e l i n d o .

N um au reo flu id o com p u ja n ç a a d c ja


i* p o r m o m e n t o s l i b r a - s e n o e s p a ç o ;
m as, o h o m e m feriu -o na p e le ja
c o m m fio c e r t e i r a e c o m s e g u r o b r a ç o .

Sente o c o n d o r q u e o c h u m b o s e lh e e n t r a n h a
nas p a l p i t a n t e s c a r n e s m u i f e r i d a s ;
e a dor, q u e o m ata, é a fílic çã o ta m a n h a ,
que o eo m p elle a grasn ar q u e ix a s d o r id a s .

S o l t a m - s e d*aza as p e n n u s , e u m a n t i l l i a ,
q u e lh e a d o r n a v a o p e i t o l o n g a m e n t e ,
vòa co m o u m a p lu m a , e já n ã o b r ilh a
aos ra io s, q u e d e r r a m a o s o l a r d e n U».

Do a r c a h m d o , o pey.o o p r e c i p i t a
sobre a n e v e cios m on tes sobranceiros;
n’ella e n te rra d o o c o r p o inda palpita
nos arrancos da m o r t e derradeiros.

E com pezaclo soinno os olhos cerra


ao pujante c o n d o r dos A n d es filho
o gêlo accu m u lad o aqui na terra,
privando-os d o cie o u tr ’ora intenso brilho.

Semelhante ao c o n d o r, o anjo maldicto,


ilos males, q u e causou, tendo a lembrança, j
curvou :i negra c om a, e, d»' eontrieto,
como quem no q u e ix u m e allivio alcança,
pezaroso e o m s ig o assim tallou:

« T r ste a m o r do peccado! vis desejos


«de mal fazer atrozes, sem motivo!
«omnisciencia audaz, fatuos lampejos
«de orgulho inchado c de aridez altivo,
uo vosso louco ardor me desthronou!
«Maldicto o instante seja e m q u e eu, ou sa do,
« d e Deus q u i* aferir a ofrm rp oten cia !
«d a ílor «Ia in g e n u id a d e ora p r iv a d o ,
«p e r d id o o « r a t o e fílu v io da in n o e e n c ia ,
«sin to crestado e m o r to o c o r a ç ã o .

« T r e i n o em tua p re s e n ç a , m a s te a d o r o ,
«saneia s im p lic id a d e, oli, ttòr q u e r id a !
«a m o - t e ainda e o teu p e r d ã o i m p l o r o ;
« p o r a m a r -te <> m e r e ç o ; e d ’esta vida
«q u e b r a o t o r m e n t o , d a n d o - m e o p e r d à o .

«C e r to não v o lta rá s , hu.icando a b r i g o


« n ’este peito m y r r h a d o , frio e ò e o ;
« é tão grandi* « le m im p ara c o m i g o
« a distancia e n t r e o a n jo e o p o b r e lo u c o
« q u e já não sei qual fui, n e m o q u e sou.

« N ã o sei mais o q u e d iz v o z di* i n n o c c n c ia ,


« e n’este e x ilio s o flro a g r o t o r m e n t o ;
««*, pelo mal c u r v a d o s e m c l o m e n c i a ,
« m in h 'a lm a da v ir tu d e ao c la r o a s s e n to
75

«não p õ d e m a is s u b i r , t u n to b u ix o u .

«O uc fui ieito <le v o s , c e l e s t e s d ia s,


« t ã o r e p l e t o s cie p a z e a m e n i d a d e .
« q u u n d ô e u ia 110 c o r o d e h a rm o n ia s ,
«p rim eiro d 'e n t r e o s a n jo s s e m v a id a d e,
« c u r v o o j o e l h o , a D e u s p r e c e s e r g u e r '/

« I n t e i r a a fé m e d o m i n a v a a i d e i a ,
«o com o a p a tria e te r n a era fo rm o s a !
«ra io s 11 a f r o n t e , a m ã o d e 11ores c h e i a ,
«n a I jo c c a o r i s o , n o s e m b l a n t e a r o s a ___
« t a l v e z p o d e s s e a m a r <* a m a d o s e r ! »

n arch an jo t e n t a d o r q u a s i e n c a n t a d o
£§tuva e n t ã o , e o l v i d a d o h a v i a
a i ti., v i c t i m a , c r i m e , e s o e e g a d o
n° p e i t o o c o r a ç ã o l h e a d o r m e c i a ;
1 1,11 *Mix a v o z , p e n d i d a a f r o n t e a l t i v a
‘ C a s m ãos, rep etia e s le c o n c e ito :
76

« s e v o s ou c o n h e c e s s e , e s s e n c ia . c liv a ,
«la grim a hum ana a b o r r ifa r - m e o p e i t o ! »

S e a V i r g e m n ’a q u e l l e i n s t a n t e
podesse o u v ir - lh e o s q u eix u n ies..
se a m â o e e l e s t e , q u e o u s a s s e
m e i g a o b o a llte e s t e n d e r ,
o to ca sse a r r e p e n d i d o ,
subir a o c e o d e s e j a n d o ,
q u e m s a b e 4? t a l v e z d e i x a s s e
<» m;d d e e x i s t e n e i a t e r .

Mas, l o g o q u e v i u f l u e n t e
sobre a fron te pensa! iva
a <lòr triste e c o n v u l s i v a
do sentim ento in fe rn a l,
trem u la , a t t o n it a , o s o l h o s
e rg u e u c o m a v i v a l e m b r a n e a ,
mais q u e n u n ca, da p u r e s a
d o v i v e r c e lestia l.

l>as azas b r a n c a s o a d e j o
en s a io u , a b r in d o o s la b io s
roseos, p u r o s , p e r fu m a d o s
p a ia u m g e m ic lo s o lta r ,
com o a c ria n ç a , segu ra
àos c a rm iç o s r e c u r v a d o s ,
o i- ít o s l r a c o s s o l t a e m an c ia s
sob a a g o a , a s e a fo g a r .

Da t r e v a o a n jo a v iu p restes
a d e ix a -lo , a o s c e o s v o lta n d o ;
e, c o m o u m t i g r e d e s p e r t o ,
s a lt a n o a r d e n t e a r e i a l ,
e m si d e p r o m p t o e n c o n t r a n d o ,
m a is p u j a n t e e m seu im p é rio ,
a q u e lle e s p ir it o v á l i d o , .
negra p o tê n c ia d o m a l,

Muo s e n ã o c u r v a , nem dobra,


lu e s o i r r i t a a n t e a in n o c e n o ia
' °rou de h a v e r d u v id a d o
Cl° s e u ' ' « f e r n a l poder;
c Paz na fu lg id a fr o n t e
res ta b e le c e u p rom p ta m en te.
78

e a a u d a cia d o s o lh o s b e l l e s
poz-se lojço a d e s p r e n d e r .

I>or lo i 1 ^ 0 te m p o e m s ile n c io
co n te m p lo u , p lh a n d o -a e v c n d o ,
do c eo a v ic tim a c a n d id a ,
q u e d estin a ao t e m p l o s e u ,
co m o p ro v a r-llie «[u ere n d o
iju c e m v ã o r e s is t ir - lI ie p ó d c
e «lu e ao d i v o o l l i a r d a \ i r g c m
m a i s <-.*11<* s<* endunMMMi.

S e i n a m o r , s o n » 1er i v n i n r s o s .
í^elido o p e i l o , c o g i t a
dos g o lp e s coni q u e p ro cu ra
leri-la o m e lh o r lo g a r ;
o, s e m e l h a n t e a o g u e r r e i r o ,
q u e nas falh as d a a r m a d u r a
tra n q u ille o terro e n c a m in h a ,
en sa ia ao a n jo e n g a n a r .

A r e vo z, o porte o o g c s lo ,
tu t io a l t e r a e m u d a r a p i t l o ;
fali a z p r a n t o , q u e não m a na
do s e n tir d o c o ra n ã o ,
n o s l a c r y r n a e s s e a p f g l o m c ‘.ra
sú b ito e m g r a n d e a l >1 m d a 1 i c i a ,
com o um s ig n a l ou protesLo
de dor, de m agn a a fllic e a o .

A V irg e m no eeo não l in lia


vis to o p r a n to e m fa ce a lg u m a
e pára; u m s u s p ir o a u g m e n ta
a corn m o ç ã o , q u e a tom ou ;
«•orno u m p r o s c r i p t o , < ju e c h o i
ou v iu v a , q u e la m e n ta
a m orte d o filh o am ado,
«» a n j o m án s o lu ç o u .

H olto s o s n e g r o s c a h e l l o s ,
esparsos e s tã o p e n d e n te s ;
nada im p e d e o liv r e c u r s o
t io s s u s p i r o s q u e e l l e d á .
^ h g e i n d e s e n <* o p r o c u r a
* f'h o r t i ; e o a n j o l h e f a l i a
80

m is c a n n e s d e a i n o r t â o b o l l o s ,
e assim Ihé fa 11a K loa.

« Q u e tens? q u e m a l te fi//> e i s - . n o a q u i p r o m p t a . »
__ Tu procuras d e ix a r-m e aqui s ô s iu h o ,
p a r a s e m p r e t a lv e z .
C o in q u e r i g o r e s p u n e s a tranqu es;*
d e te h ã v e r d e s c o b e r t o o m e u p a s s a d o
d e a u d a c ia e d e a l t i v e z ! —

« C o m m ais a g r a d o j i m e t o a ti tic a r a ;
m as, o S e n h o r m e e s p e r a , e n o c e o a lt o
eu q u e r o e m teu f a v o r
rogar, i n t e r c e d e r ; d ’e l l e a b o n d a d e
mnitas v e z e s a t t e n d e á p r e c e h u m i l d e
da p ie d a d e e a m o r . »

— D o S d n lio r d e Israë l a o n m i p o t e n c i a
nfio m e alcanç.a e n e m t o c a ; o m o u destin*-)
n in g u é m a lte r a , não.
T u só tons <> p o d e r île ao tr is t e a r c j i a n j o .
81

salvar d ’e s t e m a r t y r i o c m q u o o j ^ s c n i m ,
a n ia r , d a r - l l i e o p o r d à o .

«Que te p ó s s o f a z e r ? ijucivs que ou ii<|u«\'*


__p o s c e até o n d e e s t o u , s i m , q u o n à o p o s s o
d ’aijui s u b i r , p a s s a r . —
« Mas, q u e d a d i v a q u e r e s ? » — A m a i s b«*lla,
que és tu; v e m . — « I ) « i c e o p u r o
p reciso ó m e e x i l a i ? »

Que i m p o r t a , s e tu m e a m a s ? t o m a , a p e r t a
esta m ao, q u e te o i l e r e ç o ; d e n t r o c m p o u r-o
c m uni d e s p r e s o i g u a l
eonlundirem os a m b o s n a l o m b r a n c a ,
no raciocínio f r i o o b e m f e c u n d o
e o m a is f e c u n d o m a l . __

Usa ^ 68 <|Ue Útí e n ° a » t o s , q u e p r n z c r c s


qUem COlllH ° « u a r d a o a l h . - i o p r a n t o
» o p e it o a Sü Il.o a b r i r !
■ fortuna i* n o t u e b e . . a ,
(I
8^

Muè sò eu t e d a r e i, p o n d o - a e m lua alm a


inteira a m e sorrir.

__ C o m o a au rora d o c e o , c a m e i g a lua
no p o e n te posta os ra io s s eu s c o n fu n d e ...
antes d o o sol s e e r g u e r ,
ou c o m o O o r v a lh o a ja neta e m a m a p e r o lu
duas lagrim as suas, q u e das flo r es ,
o aroma q u e r b eber;

c o m o dois c y r io s n’ u m a luz m is tu r a m
as duas c h a m m a s , q u e a r d e m , n o ssa s a lm a s
mui justas se u n ir ã o .—
.«•Amo-te o desço. Mas, tio e c o lu^ida,
perdida n’ este a b y s m o ;« s ó s c o m t i g o ,
os anjos que dirão*?»

"*r
A o lo n ge n’ este m o m e n t o
l assou, cantando nos ares,
levad o na aza do v e n to ,
um côvo celestial;
8 :t

entro Louvores e r g u id o s
a D e u s d o c e o n o s altares,
os a n jo s e n te rn e c id o s,
puros na voz d iv in a l,

d isian i: « p e r e n n e g lo ria ,
«s ò e n os s é c u lo s , 1 1 0 m undo,
«co m o um la u re l d e V ic to ria
«g a n lio e m p ú b lic a o v a ç ã o .
« á q u e lle q u e se c a p tiv a
«a o s a c rifíc io fe c u n d o
«d e p e r d e r a e s s e n c ia d iv a
«p o r ex tra n h a s a lv a ç ã o .»

N ’e s t e can to m e lo d io s o
p a re c ia o c e o fa lla r,
o a o a n jo c a s to e m edroso
am or, v id a c fo rç a dar.

1'o r d u a s v e z e s a i n d a
a V ir g e m p u d ica e bella.
8 't

e r g u e n d o a p a lp e b r a lin d a ,
ir r é s o lu ta n o o lh a r ,
os e e o s p ro c u ro u d is ta n tes ,
o o b r i l h o d e a l g u m a e s t r e i la;
eeo s e astros fu lg u ra n te s
já n ã o m a i s p ò d o e n c o n t r a r .

< )s a n j o s , q u e a o c a b o s d e s c i a m ,
c u m p r in d o as o rd e n s d e D eu s,
v a g o s te r ro re s s e n tia m
lo n g e da te rra o d o s e e o s .

K v ira m no p la in o im m e n s o
«Io t o g o u m a n u v em c h e ia
ro m p e r-s e no b rilh o in te n s o ,
s e r p e ja n t e , e s c u r a o teia .

N as ch a m m a s se c o n lu n d ia m
c ru eis p h ra zes, tris te v o z
ile q u e ix u m e s , qu o se o u v ia m
n ’ u m batei* d ' a s a s v e l o z .

« B e l l o a r e b a n j o , o n d e m e le v a s ?
— Vem c o m ig o , sem p re; v e m .—
« Q u e v o z triste! s o m d e trevas
« e s s e te u d i s c u r s o t e m .

« A h ! n ã o s o u a p u r a K lò a ,
« q u e as c a d e ia s te ro m p e u ,
«s a lva n d o -te m e ig a e b oa ?»
— Não; q u em te a r r a s t a sou eu.

«S e a n o ssa u n ião perdura,


« p o u ;o m e i m p o r i a o l o g a r
«c m q u e u n id o s á v e n tu r a
«lr u á m o s g o s o s s e m par.
8 0

__ Ës minha, v i c t i m a ; v o u - m e
c o m t i g o , iilha d o s c e o s . *

«Q u anta bon dade sorria


« n a tua face f o r m o s a !
« Q u e iiz eu"?»
— U n i c r i m e ; e a r d ia
pur v è r - t e a ssim c r i m i n o s a . —

« M a i s fe liz s e r a s a g o r a ,
« o u ao in e n o s m a is c o n t e n t e '? »
— Não; m in h a fron te d esco ra ;
mais tristesa o p e i t o s e n t e . —

« Q u e m é s tu4?»
— Sal au sou e u . —
A i, p o b r e filha d o c e o !
ALFREDO DE V I G N Y ,

Da Illm tra ç ã o Franceza de 3 do outubro de 1863ex-


trahimos a seguinte noticia sobre o auctor da Eloá:
«0 conde Alfredo de Vigny, fallecido ha poucos dias
na idade de sessenta e dois annos, descendia de unia
família de militares. Nos primeiros annos de sua vida
revelou inclinação á carreira das armas, inclinação esla
que encheu de sustos á sua mãe. Contando apenas
cleseseis annos, quando houve em França a primeira
restauração, entrou no batalhão dos mosqueteiros ver­
melhos da casa do rei e acompanhou Luiz 18 a Garni.
Retido em Amiens durante os Cem dias, loi admittido
em 1816 no corpo de artilharia da guarda e conseguiu
° m 1823 tomar parte na expedição da Espanha. Tendo.
P'H'eni, o seu regimento aquartelado nos Pyreneus, o
.KAoin official, que não podia combater, dedicou ao e>-
e ao cultivo da poesia as suas horas de lazer eoi -
strangido.
Em 1813 tinha Alfredo de Vigny escripto dois poe-
imiu.dos de Theocrito: <* Drgade e Synu'ta.lAn
Publicou um volume de poemas; e d»' 18W 24 a I c - >
rmanl, ad °s ;l lume os seus Poemas antigos r mo( *')-
’s? entre os qua.es o mais delicado é o que s e dono-
ss
• nina E l o à . Ksta c o m p o s i e ã o d o u l o g o g r a n d e vo«.-,
p o e la c o c o l l o c o u e m u m «lus p r i m e i r o s lo g a r e s m i * n
chola I il! era ria n a s e e n l e e n t ã o . N ã o s e r i a t c m o r ií h T "
,, affirmai* q u e A l f r e d o d e \ i g n y foi o p r i m e i r o escrin ’
rotn a n lic o. Km 182(>, s e n d o a i n d a o f f i c i a l , p o n , „ ! . i”
e m 1828 foi q u e p e d iu a s u a d e m i s s ã o , A l f r e d o de Vion'.
p ublicou o C i r u { - \ l o r s , um d o s p r i m e i r o s r o m a n c e s his
to r ic o s d o s é c u lo . Km '1832 p u b l i c o u o S t e l l o e e m 1x:^r
o v o lu m e in titu la d o S e r r i d à o e g r a a d e z a m i l i t a r , <m,!
é c o n s id e r a d o a sua o b r a d ê p r i m o r .
A l f r e d o d e V i g n y e s c r e v e u t a m b é m p a r a o theatro, e
d e ix o u - n o s o O t h e l l o , a M a rr.clu d a d ' A n c r e , C h a t t er t o n
o o lindo p r o v é r b i o J J a U l e /toar l a peta-, <) Chatt ert on
foi e s t r o n d o s a m e n t e a p p l a u d i d o .
A l f r e d o d e V i g n y p u b l i c o u a i n d a o s l ' o e t a a s Plt flo-
sophicoè, na Ftevista tIoè d o i s m u n d o s , e as Consultas
<{o D o u t o r N e g r o .
Foi e le it o m e m b r o d a A c a d e m i a F r a n c e s a e m 1845 na
v a g a do a u c l o r d a J o c o n d e .
O n o m e d e A l f r e d o d e Y i g n v ó s e m c o n t e s t a cão nni
( y •< •»

d o s mais b r ilh a n t e s d a n o s s a é p ò e h a . A p a i x o n a d o pela


arte, a m i g o da s o l i d ã o e d o r e c o l h i m e n t o , d e d ic o u -s e
e x c lu s iv a m e n te ao c u l t i v o d a p o e s ia .
A e le g â n c ia , a d d i c a d e s a , o e n c a n t o d o p e n s a m e n to ,
o a m o r da o b r a e n i p r e h e n d i d a s ã o as p r i n c i p a e s quali­
dades d ’e s t e e s e r i p l o r , q u a l i d a d e s t a n t o m a is a p r e c ia ­
das quanto são raras, h o je e n t ã o . A l f r e d o d e V ig n y v o ­
tava s in c e ro a m o r á m o c i d a d e . M u it o s c s c r i p toros loram
p o r e lle a n im a d o s o s u s t e n t a d o s ; e s e m p r e deu o p lim o s
con selh os aos seu s j o v e n s a m i g o s , n ã o n a q u a lid a d e de
mestro, para o q u e tin h a i n c o n t e s t á v e l d i r e i t o , mas lia
de irm ã o niais v e l h o . K, t o d a v i a , s ó q u a r e n t a pessoa^
no níaxin 1 0 a c o m p a n h a r a m a o s n u u l t i m o j a z i g o o c orp o
de um 11<unem , q u e foi tão a m a v e l , e c u j o n o m e é l>»°
brilhante d e glorias! Kst.o f a c t o m u i t o m a i s n o s surpn)**
henderia, se nào nos r e c o r d á s s e m o s d e q u e , no sa lu­
men to d e uni o u tro p o e t a c é l e b r e , s ó c i n c o e n t a e duas
pessoas acoin p an liaram o c a i x ã o d e A l f r e d o d o Musset.
K «pie íi 1* rança nem s e n u o r sabe. f a z e r <> e n t e r r o doí-
seus hom ens i llu s lr e s . »

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