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VOZES EM DEFESA DA FÉ

CADERN O

PUBLI CAÇÃO DO SECRETARI ADO


NACI ONAL DE DEFESA DA FÉ
M A R T IN H O L U T E R O
VOZES EM DEFESA DA FÉ
C a d e r n o 12

JO H N A. 0 ’B R IEN

MARTINHO LUTERO
O Sacerdote que fundou o Protestantismo

PU B L IC A Ç Ã O D O
S E C R E T A R IA D O N A C IO N A L D E D E F E S A DA F E '
E D IT O R A V O Z ES L IM ITA D A
1959
T ítu lo do o rig in a l in g lê s: M a rtin L u th er, th e P rie s t w h o
fo u n d ed P ro te sta n tism .
C o p y rig h t b y T h e P a u lis t P re ss, 401 W e st 5 9 th S tre e t,
N ew Y o rk 19, N. Y. U. S. A.

P e la g r a ç a de D eus, p o s s a
F re i M a rtin h o L u te ro c e s s a r d e
s e r um a fo n te d e d iv isã o e n tre
o s C ris tã o s e to rn a r-s e um a
p o n te lig a n d o a s n o s s a s d i­
v e rg ê n c ia s, lev an d o a u m a C ris-
ta n d a d e n o v a m e n te u n id a — o
só re b a n h o e o só p a s to r tã o
a rd e n te m e n te d e se ja d o p o r N o s­
so S en h o r e S a lv a d o r Je su s
C risto .

I M P R I M A T U R
POR C O M IS S Ã O E S P E C IA L DO EXM O.
E REVM O . SR. DOM M A NU EL PED R O
DA CUNHA C IN T R A , B IS P O DE PE-
T R Ó P O L IS . FREI D E S ID E R IO KALVER-
K A M P , O . F . M . P E T R Ó P O L IS , 2 -III-1 9 5 9 .

TODOS OS D I R E IT O S RESER V A D O S
Frei Martinho Lutero
E lev an d o -se m uito acim a de to do s os o u tro s chefes
na g ra n d e conv ulsão relig iosa do século dezesseis, es­
tá a fig u ra v ig o ro sa do descalço m o nge ag o stin ian o
de W itte n b e rg , M artin ho Lutero. A su a in fla m ad a d e­
n ún cia dos ab u so s rein a n tes na Ig re ja do seu tem po,
e o seu to n itru an te clam o r p o r u m a refo rm a, p o r m ui­
to tem po fo ram tem as fav o rito s p a ra escrito res. A sua
ação tem p estu o sa em cin dir a u n id a d e h istó rica do
C ristian ism o fo rm u lan d o os p rin cíp io s b ásico s que es­
tavam d estin ad o s a tra z e r à ex istê n cia n ão som ente o
L u teran ism o m as tam b ém m u itas o u tra s seitas, g ra n -
je aram p a ra êle o títu lo d e F u n d a d o r do P ro te s ta n ­
tism o.
E ’ êle um a d a s fig u ras m ais co n tro v ertid as na h is­
tó ria. P o r m u ito s P ro te sta n te s êle é sa u d a d o como
um intim o rato cam p eão d a lib erd a d e relig io sa, como
um in trép id o refo rm ad o r que levou a B íblia ao povo
c to rn ou C risto , de p referê n cia à Ig re ja , cen tral na
v id a do povo alem ão . Êle é p in ta d o com o um hom em
de v id a irrep reen sív el, consum ido p ela p aix ã o d a
v erd ad e e d a ju s tiça . Em sum a, é o m aio r herói e o
san to m ais p erfeito do P ro te sta n tism o .
E m b o ra co ncedend o q u e os clam o res dêle ace le ra ­
ram os esfo rço s p ela reform a, o s C ató licos têm -n o
g eralm en te co n sid e ra d o com o um m o n g e rebelde, g ro s­
seiro, v u lg a r e b e b e rrão , com o um o p o rtu n ista in es-
cru p u lo so q u e o b tev e su cesso ex p lo ra n d o a cob iça de

M a r tin h o — 2 5
p rín c ip e s se cu la re s e esp ecialm ente a d e s e n fre a d a co n ­
c u p is c e n d a do seu p rincip esco p ro te to r F ilip e, o
L a n d g ra v e d e H esse. Êle é p in ta d o com o o rg u lh o s o ,
teim o so e em otiv am en te versátil, com o um s a c e rd o te
q u e escan d a lizo u a C rista n d ad e ca lc an d o a o s p é s o s
seu s v o to s p a ra se c a sa r com u m a fre ira d e s e rto ra ,
sa c e rd o te que so lapo u a m o ra lid a d e fa z e n d o a sa l­
v a çã o d e p en d e r ex clusiv am en te d a fé, sem lig a r ne­
n h u m a im p o rtân cia à p ra v id a d e d a v id a in d iv id u a l.
L utero é g eralm en te co n sid e ra d o p elo s C a tó lic o s co­
m o um estra n h o m isto de o rg u lh o , lu x ú ria, in so b rie -
d a d e e h eresia — a m aio r c a tá s tro fe a a flig ir a C ris­
ta n d a d e d esd e o estab elecim en to d es ta . S u s c ita n d o o
cism a qu e a fa sto u m ilhões de h om ens d a a n tig a Fé,
êle é co n sid erad o u m a espécie de có p ia h u m a n a de
Lúcifer reb eld e levando p a ra o in fern o in c o n táv e is
m ultidões de anjo s.

Curando Velhas Feridas


Q u an d o dois v ered icto s diferem tão ra d ic a lm e n te , o
• leito r im p arcial d ificilm ente p o d e d e ix a r de p e rg u n ­
ta r-se se am bo s os lad o s n ão tro u x e ra m ao e s tu d o do
caso os seus p ró p rio s p o n to s de v ista , se n tim e n to s e
an tag o n ism o s, p a ra a a p rec ia çã o d a ev id ên cia e fo r­
m u lação d a con clusão. P o r q u a tro sécu lo s a d isc u ssão
so b re L utero c a ra c te riz o u -se pelo aze d u m e, p elo ódio
e p e la d iscó rd ia, serv in d o la rg a m e n te p a r a a p ro fu n ­
d a r a b rech a n a u n id a d e cristã. C e rtam en te , ch eg a d o
é o tem p o d e a b o rd a r o as su n to de m a n e ira calm a,
p a c ífic a e d es a p a ix o n a d a , p a r a v er se um e s tu d o ob­
jetiv o d a v id a e d a o b ra dêle p o d e le v ar pelo m enos
a u m a a p re c ia ç ã o m ais a c u ra d a e a um p o ssív el p a s s o no
se n tid o d a reaproximação, e m esm o d a reu n iã o final.
O im p ac to de d u a s g u e rra s m u n d iais, a elevação
ao p o d e r de u m N azism o p a g ã o , e a a m e a ç a d e tra -

6
g am en to pelo ateísm o ag ressiv o dos C o m u n istas a c a ­
b ara m p o r fa z e r ver ao s L u teran o s e a o s C ató licos
d a A lem an h a o trá g ic o preço q ue êles p a g a ra m p o r
n ão terem sid o ca p a ze s de fo rm ar um círculo fec h a­
do p o r trá s d a C ruz de C risto . E ssa v erificação o ca ­
sionou u m a nova reaproximação, e as d u as g ra n d e s
co rp o raçõ es de C ristã o s estão a g o ra reza n d o d ià ria -
m ente p a ra q u e d en tro em breve po ssam cu m p rir a
prece de C risto , “ q ue êles sejam um, como tu, P ai,
em mim e eu em ti!”
O p ro g re sso do m ovim ento ecum ênico atrav és da
E u ro p a e d a A m érica a testa, adem ais, o p ro g resso d a
conv icção de q ue a d ivisão e a d iscó rd ia privaram o
C ristian ism o do seu p o d er de faz e r fren te à am eaça
de o u tra g u e rra m un dial, e lhe dim inu íram a capaci­
d a d e de tr a ta r to d os os p ro b lem as de ca rá te r univer­
sal. H á u m a crescente co m p reensão de que a nossa
d esu n ião p ro d u ziu m ilhões de p esso as ind iferen tes e
sem ig reja, e fêz o jo g o n as m ãos dos no ssos inimi­
g o s co m u n s. T u d o q u an to s a ra r as ferid a s no Corpo
M ístico de C risto e levar seus filhos de h á muito se­
p a ra d o s a reza rem e a tra b a lh arem p ela unidade, é
im en sam en te m ais fru tu o so do que um a renovação de
velhos a g ra v o s e inim izad es.

Ligando as nossas Divergências

C risto d isse ao s seu s d iscíp u los: “ P o r isto con h e­


ce rã o to d o s q u e sois m eu s d iscípu lo s, p o r vos a m a r­
d es u n s ao s o u tro s ” . O s p rim eiro s cristão s es cu ta ram
tã o realm e n te essa in jun ção, q ue os p a g ã o s co stu m a­
v am e x c la m a r: “ V êde com o êsses c ris tã o s se am am
u n s ao s o u tro s !” Em c o n tra ste com essa a m o ro sa u n i­
d a d e d o s c ris tã o s p rim itiv os, u m a c ris ta n d a d e fra g m e n ­
ta d a vem esc a n d a liz a n d o o m un do com a s u a d is­

2* 7
sid ên cia e d isc ó rd ia d u ra n te séculos, d e m odo que os
p a g ã o s m o d e rn o s freq ü en tem e n te exclam am : “ V ede
q u ão p o u co êsse s cris tã o s se am am uns ao s o u tro s!”
P o rta n to , n ão p a ra reviver os irad o s e am arg o s
a n ta g o n is m o s a te a d o s p elo cataclism o religioso do sé ­
culo X VI, m as sim p a r a c u ra r velhas ferid as, é q ue
em p re en d em o s este b reve reexam e e reap rec iaçã o de
M a rtin h o L utero e d a su a o b ra. Em vez de fonte de
divisão , p o ssa êle vir a se r um a p o n te lig an d o as n o s­
sa s d iv e rg ên cias, u m a fo rça qu e leve a u m a união de
m en tes n a fé. P o d e esta últim a m eta p a re c e r lo n g ín ­
q u a, p orém a jo rn a d a m ais lo n g a com eça com um
sim p les p asso . B o a v o n tad e, am izad e, am o r e o ra ­
ção p od em , com a g ra ç a de D eus, o p e ra r m arav ilh as.
S é u m a sim p les p a la v ra ou fras e ferir a sen sib ili­
d ad e dos n o ssos irm ão s m ão católico s, a sse g u ra m o s-
lhes ter sid o um lap so d a p en a, e n ão do co raç ão ou
d a v o ntade. N ão p ro cu ra re m o s in o c en tar a Ig reja m e­
dieval, d im in uir ou a g ra v id a d e ou a ex ten são do s
ab u so s q u e a d e sfig u rav am , ou e x cu lp ar m esm o a
C ú ria R o m ana d a v en alid ad e e d a cu lp a com qu e deve
ela a rc a r p e ra n te o trib u n a l d a h istó ria. N em tão pouco
d eix a rem o s de a p o n ta r os ex cesso s, d esatin o s e fr a ­
q u ez a s q u e n ão ra ro d e sfig u ra ra m o zêlo re fo rm a d o r
do tem p estu o so fra d e de W itte n b e rg . P a r a a evid ên ­
cia d êstes últim os citarem o s exclu siv am en te h is to ria ­
d o res p ro te sta n te s, cujo sa b e r é u n iv ersalm en te re­
co n hecid o.

Primeiros Anos

M artin h o L utero n asceu a 10 de n ov em b ro d e 1483,


em E isleb en , A lem an h a. P rim e iro d o s sete filhos n a s ­
cid o s d e H an s L u th er e M a rg a re t Z ieg ler, êle foi b a ­
tiza d o n o d ia seg u in te , fe s ta de S. M artin h o , cu jo n o ­
m e recebeu. S eis m eses m ais ta rd e a fam ília m u d o u -

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se p a ra a v izin h a cid ad e de M ansfeld, on d e o p ai in­
g resso u n a m in eração . Aqui M artin h o freq ü en to u a
escola até que, ao s q u a to rz e an o s de idade, foi p a ra
a esco la d a ca te d ral em M ag d eb u rg o e, um ano d e­
pois, p a ra a esco la G re g o ria n a em E isenach .
Em 1501, ao s d ezoito an os, foi p a ra a vizinha U n i­
v ersid a d e de E rfu rt, p a ra s a tisfa z e r o d esejo de seu
pai e e stu d a r D ireito. E ra costum e, naqu ele tem po,
p re p a ra r o estu d o de D ireito pelo estu d o d a fi­
losofia, e assim M artin ho freqü en to u as au la s de
T ru tv e tte r e A rnoldi, ex p oentes do nom inalism o en ­
tão d o m in an te em E rfu rt. N a fe sta d a E p ifan ia em
1505, recebeu o g rau de M estre de A rtes, fig u ran d o
em seg u n d o lu g ar num a classe de dezessete.
Em m aio do m esm o ano, com eçou M artinho o es­
tudo de D ireito. N o d ia 2 de julho, um q uente d om in­
go, êle e um am igo v o ltav am p a ra E rfu rt, q u an d o um a
v iolen ta tem p estad e os colheu p erto da ald eia de S o t-
terheim . Um raio m ato u o com panh eiro ao lado de
L utero. P re so de terro r, êle clam o u: “ S a n fA n a , aju -
d ai-m e! F ar-m e-e i m o n g e !”
Q uinze d ia s d ep o is, com 22 an os d e idade, êle foi
ju n ta r-s e ao s ere m ita s de S a n to A g o stinh o em E rfu rt.
O p as so foi d a d o co n tra os d esejo s de seu pai, a quem
êle ex plico u ter sid o ch am ad o ao cla u stro “ p o r um a
terrific an te m a n ifestaç ão do céu ” . M artin ho e ra um
m oço sério , im pulsivo e alg o m elancólico, e é p ro v á­
vel q ue m u itas v êzes h ou vesse co g itad o de in g re ssa r
n a v id a religiosa, m as h esitasse p o r c au sa d a o p o si­
ção do pai. O in cid en te sim p lesm ente lhe fo rn e­
ceu fu n d a m e n to s p a ra p ô r em ex ec u ção o seu p lan o,
p o r h av er êle co m p reen d id o q ue o p as so devia refle­
tir a su a p ró p ria lib erd ad e e o seu reso lu to a sse n ti­
m ento.

9
A Ordenação de Lutero.

T a is fo ra m os m otivos que im p eliram L u tero a d a r


o seu sú b ito e in esp e ra d o p as so , co n fo rm e ex p o sto
p o r m u ito s en ten d id o s, inclusive os seu s c o n te m p o râ ­
n eos M elanch tho n e C och laeus. P o rém m esm o aqui as
o p in iõ es div ergem , e o p ró p rio te stem u n h o de L u te­
ro co n tend e. N u m a c a rta escrita, m uitos an o s depo is,
ao p ai, ex p lican d o a su a d efecção d a Ig re ja , êle
escrev e: “ Q u a n d o fiqu ei a te rro riz a d o e o prim id o pelo
m êdo d a m orte im inente, fiz um voto inv o lu n tário e
fo rç a d o ” . 1
M as em o u tro lu g a r êle d e sig n a m otivo d iferen te.
D escrev en d o a ex trem a sev erid a d e d a su a v id a d o ­
m éstica, n a q u al v irtu alm en te as a le g ria s d a in fân c ia
lhe fo ram d escon h ecid as, êle diz com o seu pai
ce rta vez lhe b ateu tão im p ied o sam en te, qu e fu ­
giu d e ca sa, e ficou tã o “p rev enid o c o n tra êle, q ue
êle teve d e m e g a n h a r p a ra si o u tra v ez” .2 S u a m ãe,
“ p o r c a u sa de um a in sig n ifican te noz b ateu -m e até
esco rrer san g u e , e essa d u rez a e sev erid a d e d a v id a
p a s s a d a com êles foi q ue su b se q ü en te m e n te m e fo rço u a
fu g ir p a ra um co nven to e fa ze r-m e m o n g e” . 3
C o m p letad o o seu n ov iciad o em 1506, L u tero fêz
a su a p ro fissão e, ap ó s ap e n a s um an o de estu d o te o ­
ló gico, foi o rd e n a d o sa cerd o te . N o o u to n o de 1508 foi
en viad o p a ra a rec é m -fu n d a d a U n iv e rsid a d e de W it-
te n b erg , o nd e ensin o u filo so fia e d ialé tica e co n ti­
nu ou os seu s estu d o s teológ icos, o b ten d o o b a ­
c h a re la to em te o lo g ia a 9 de m arço de 1509. E n tã o
foi ch am ad o d e v o lta a E rfu rt, p a ra en sin ar no m o s­
teiro .

J) D e W e tte , Dr. Martin L u th efs Briefe, II, B erlin 1825, 101.


*) T is c h re d e n , F r a n k fo rt,' 1567, foi. 314’.
’) Ib idem .

:io
P o r trá s d esse desen vo lvim ento a p are n tem e n te n o r­
mal e p acífico houve g rav es b a ta lh a s interio res, u m a
m olesta o b sessão de p ro fu n d a p ec am in o sid ad e e co r­
rup ção, e um te rro r do ju ízo de D eus. P a ra v encer es­
ta s d ificu ld ad es e alca n ç ar perfeição, Lu tero reco rreu
a u m a m o rtificação excessiva, a v ig ílias, o raçõ es e je ­
ju ns. Em ce rtas o casiões êle te ria je ju ad o trê s d ias
seg u id os, sem eng olir u m a m ig alh a. Às vêzes, te r-se -
ia d esvencilh ad o d as co b ertas q ue lhe eram p erm iti­
d as, até q u ase g elar. P orém a inq u ietação interior, a
d eso lação e o p ânico ele v aram -se até a um sen tim en­
to de d esesp ero, q ue se orig ino u d a convicção de não
p o d er êle ven cer em si m esm o o sen so do pecado .

Escrupuloso e Melancólico

N ão q u e r isso d izer q u e L utero fo sse pecam inoso


ou lu ta sse com h áb ito s p ecam in o so s c o n tra íd o s no p a s ­
sad o , ou q ue fo sse m esm o m un d an o . O s an o s d a su a
ju v en tu d e tinh am sido p a ssa d o s nu m a v ida sé ria e
lim pa, d e m odo q u e êle n ão e x p erim en ta ra conflitos
sex u ais fo ra d os com uns a q u alq u er moço. O qu e o
to rtu rav a com o um sen tim ento de p eca m in o sid a d e era
a o p o sição in terio r do homem d ecaíd o , o n erad o do
p ecad o o rig in al, c o n tra a lei de D eus, e a fa lta de
h arm o n ia in terio r e de se g u ra n ç a do seu p erfeito am or
a D eus e d a su a salv ação .
Êle so fria de u m a ex trem a escru p u lo sid a d e, a g ra ­
v a d a pelo sen tim en to d e a b a n d o n o p o r D eus, o q ual
lhe a c a rre ta v a as te rrív eis to rtu ra s do d esesp êro es­
p iritu al. “ E ssa s to rtu ra s ” , escreveu Lu tero, “ eram tão
g ra n d e s e tã o in fern ais, q u e n en h u m a lín g u a p o d e d es­
cre v ê -la s” . 4 D u ra n te êsses p erío d o s de a n g ú stia es­
p iritu a l, L u tero fre q ü e n ta ria o co n fessio n ário de S ta u -

4) W e im a r E d iç ão , I, 557 f.; ed ição E rla n g e n , II, 180 f.


p itz, co n fes san d o -se d u ran te seis h o ras n um a só o ca ­
sião . C an sad o do intérm ino req uisitório , S ta u p itz te-
ria ex clam ad o : “ H om em , D eus n ão está z a n g a d o com
o sr. O sr. é q u e e stá z an g a d o com D eus. O sr. não
sa b e q u e D eu s lhe m an d a te r e s p e ra n ç a ? ”
C om o tô d a s as v ítim as do escrú pu lo , L u tero n ão
se con ten to u com seg u ir com con fian ça e p az o s á ­
bio con selho do seu co nfessor. E xcog ito u no vas p e­
n itên cias, n ão raro de c a rá te r extrem o , as q u a is só
fizeram au m en ta r-lh e a ag o n ia. P o r vêzes ele teria
d e scu rad o rec ita r o seu O fício d iário , o b rig aç ão q ue
lig av a sob p e n a de p ecad o m o rtal, p a ra con ced er tem ­
po m ais am plo ao estu d o . E então , num p aro x ism o
de rem o rso , te r-se -ia tran c ad o n a su a cela, a b s te n d o -
se de co m er e de b eb er, e to rtu ra n d o -se e m o rtifica n -
d o -se d e tal fo rm a, que n ão só o fez v ítim a de in sô ­
nia p o r cinco se m an a s, u m a vez, com o tam b ém o a m ea ­
çou de lo u cura. ‘
In c ap a z ou in d esejo so de h a u rir co n fia n ça in fa n ­
til n a p e rd o a d o ra m ise ricó rd ia de D eus, L u tero p en ­
sou em lhe a p la c a r a ira p ela “su a p ró p ria re tid ã o ”
è p ela “ eficácia d a s o b ra s serv is” . T al p ro ced im en to
a c a rre to u -lh e um d esân im o sem e sp eran ça e u m a d e s­
co n fian ça ta citu rn a , cria n d o u m a co n d ição em q u e êle
rea lm e n te “ o d ia v a a D eu s e esta v a z a n g a d o com êle ” ,
em q u e b la sfe m av a c o n tra D eu s e a té la stim a v a te r
n ascid o . S em elh an te ascetism o h ip o c o n d ría co p ro d u ­
ziu néle u m a m elan co lia cism ad o ra e u m a d e p re ssã o
físic a e es p iritu al. A nos m ais ta rd e , p o r um cu rio so
p ro ce sso d e racio cín io , êle atrib u iu isso ao en sin o d a
Ig re ja co n ce rn en te às b o as o b ras , c o n q u an to to d o o
tem p o v iv esse em d ire ta o p o sição ao có d ig o d o u trin a i
e d iscip lin a r d e ssa m esm a Ig reja .

#) S eck en d o rf, Ausführliche Historie des Lutherthums,


L eip zig , 1714, I, foi. 2 1 b .

12
Origem do Complexo

O n orm al e sad io d esenvo lv im ento d a vida relig io ­


sa de Lutero foi, assim , esto rv ad o p o r um p ro n u n cia ­
do com plexo de escru p u lo sid ad e, a g ra v a d o p o r m elan ­
co lia e d esesp ero. Q ual foi a orig em d êsse com p le­
x o ? E ssa co nd ição n eu ró tica ou p sic o p ática p arec e­
ría lig ar-se à su a v id a d o m éstica excessiv am en te a u s­
te ra e rig o ro sa, e à su a p rim itiva v id a esco lar, d u ­
ran te a q ual re la ta ele h av er sid o m u itas vêzes b a ti­
do. As d e sc o b e rtas d a p siq u ia tria m o d ern a revelam a
p e rso n alid ad e fen did a, as cicatrizes p síq u ic as e as
d eso rd en s em o cion ais que se o rigin am de u m a in fâ n ­
cia p riv ad a de am o r e de um sen so de seg u ran ça e
de ser n ecessário .
Em ad itam e n to a esses fa to re s circu n d a n te s h avia
ev id en tem ente ten d ên cias in a ta s p a ra in stab ilid ad e
em o tiva e p a ra m elancolia. Em v ário s lu g ares, L utero
m enciona q ue a su a in clinação p a ra a m elan co lia e ra
in ata. “A su a d escrição (d a s su a s to rtu ra s ín tim as)
a ju sta -se tão bem a um recon hecido tipo d e do en ça
m e n tal” , diz o p ro te sta n te R. H. B ain to n, “ q ue a g en ­
te é te n ta d o de se p e rg u n ta r se o seu d istú rb io deve­
ria ser co n sid e ra d o com o p ro ven ien te de au tê n tic as
d ificu ld ad es relig io sas, de d eficiên cias g á s tric a s o u
g la n d u la re s” . ‘
A pós u m a v iagem a R om a em 1510 p a ra tra to de
negócios d a su a O rdem , L utero reg resso u a E rfu rt.
O seu S u p erio r religioso, S tau p itz, m a n d o u -o en tã o
p a ra W itte n b e rg , o n d e êle obtev e o d o u to rad o em teo ­
lo g ia no ano seg u in te. Com o S ta u p itz fo sse o b rig ad o
a em p re en d er v á ria s v iag en s em lig ação com a ad m i­
n istra çã o d a O rd em , tra n sfe riu a L u tero o seu p ro fe s-
so rad o em E scritu ra.

•) Here I Stand, A b in g d o n -C o k e sb u ry P re s s , N. Y., 1950.

13
N u m a rea ç ão c o n tra as su as a n tig a s te n ta tiv as de
a lc a n ç a r a p e rfeição pelo p o d e r do seu p ró p rio livre-
a rb ítrio com o uso de m eios de salv aç ão extern o s,
L u tèro foi ao ex trem o op o sto. C onvicto d a com pleta
co rru p ç ã o d a n a tu re z a h u m an a pelo p ecad o, e d a n a ­
tu re z a in su peráv el d a co ncup iscência, q ue ele en te n ­
d ia no se n tid o d a o b stin a ção n atu ra l, concluiu que
to d o s os ato s h um ano s, p o r m elho res q ue p areçam ,
n a re alid ad e são p ecad o s m o rtais. Isto é o resu ltad o
do p e ca d o o rig in al, alo jad o no hom em com o um a d i­
reção p ec am in o sa d a v on tad e, q ue o p ren d e ao mal
e o to rn a in ca p az de q u alq u e r coisa realm en te boa.

A Descoberta de Lutero

Com es sa so m b ria convicção in s ta u ra d a em si, m ais


clam o ro sa se to rn ou a q u e stã o : O n d e ach arei um
Deus^ m iserico rd io so ? E stu d a n d o a E p ísto la ao s R o ­
m an os, n o s m eses de inv erno de 1512 a 1513, ele
p enso u te r ach a d o a res p o sta . E sta v a es ta no v ersí­
culo d ezessete do c a p ítu lo p rim eiro , o n d e S. P a u lo
d e c la ra : “ O ju sto vive d a fé ” . A qui e sta v a a chave
q u e reso lv ería to d a a su a a n g ú stia ín tim a e to d a s
as su a s q u estõ e s to rtu ra n te s. E ssa ch av e e ra : ju stifL
caç ão p o r m eio de D eu s p ela fé. E ssa sim p les fra se
de S. P au lo to rn o u -se p a ra L u tero , com o ele o faz n o ­
ta r, “ a p o rta p a ra o p a ra ís o ” .
Isto veio a ser o fu n d am en to p a ra a su a n ova teo ­
ria d a salv a ç ão , a p e d ra a n g u la r d a no v a relig ião q u e
êle ia estab elece r. O hom em p o d e ser salvo p ela fé
a p e n a s. A ju stific a ç ã o é c o n fe rid a a o hom em p ela g r a ­
ça d e D eus. In ca p a z de fa z e r o q u e r q u e se ja p a ra
co o p era r, o hom em p o d e a p e n a s su b m eter-se , n u m a
fé co n fian te, à m ão de D eu s, e d e ix a r o am o r de D eu s
in u n d a r-lh e a alm a. E s s a fé in fa n til n a in fin ita b o n ­

14
d ad e e m isericó rd ia de D eu s é q ue p erm ite a D eu s o p e­
ra r livrem ente n a alm a: é essa a coisa q ue u n icam en­
te ju stific a o hom em .
E ’ a fé em C risto que to rn a n o sso s o s m éritos d ê-
le, q ue nos envolve n a v este d a ju stiça e co m p en sa
p o r c ad a defeito. “ S eja p ec ad o r e pequ e fo rte m en te ” ,
d ec la ra v a L utero, “ m as ten h a fé ain d a m ais fo rte e
ale g re -se em C risto , q u e é o vencedo r do p ecad o , d a
m o rte e do m undo. N em p o r um m om ento im ag ine
q ue e s ta v id a é o lu g a r de h ab itaç ão d a ju stiça : o
p ecad o deve ser com etido. P a ra vós deve ser su fi­
ciente que reco nh eçais o C ord eiro q ue tira os p ecad o s
do m u n d o ; o p ecad o n ão p o d e s e p a ra r-v o s dêle, m es­
mo que co m etais ad u ltério cem vezes ao d ia e com e­
tais o u tro s ta n to s m o rtic ín io s” . 7

Solução do Conflito

E ssa n o v a d o u trin a de L utero fo rn eceu u m a so lu ­


ção p a ra o conflito in terio r q ue lhe estiv era ca u san ­
do in ten sa a n g ú stia e o tro u x e ra às p ro fu n d ez as do
d esesp êro e m esm o às p ró p ria s b o rd a s d a lo ucura.
R ejeitan d o p erem p tó ria e com pletam en te a im p o rtân ­
cia q u e o u tro ra lig a ra às su as a to rm e n ta d o ra s m o r­
tificações, p en itên cias e b o as o b ras n o p ro ce sso d a
ju stific aç ão , a g o ra êle ach a a le g ria n a convicção de
ser salvo p ela sim p les o p era çã o de D eus. “ T a l con ­
fia n ç a e con hecim ento d a g ra ç a d iv in a” , d eclaro u êle
ju b ilo sam e n te, “ to rn a u m a p e sso a aleg re, o u s a d a e
jo vial p a ra com D eus e p a ra com to d a a criação . Is­
to é o q u e o S an to E v an g e lh o faz p ela fé ” .*
Aqui es ta v a a ru p tu ra d as p en o sa s ca d eias d a q u e ­
le com plex o de escru p u lo sid a d e qu e p o r ta n to tem p o

T) E n d e rs, Briefwcchsel, III, 208.


3) E d iç ão E rla n g e n , LX III, 125.

15
o e n g o lfa ra em cism ad o ra m elancolia, em tem o r o b si­
d en te e em p ro fu n d o te rro r. A g o ra lá se fo ra a n e­
c es sid ad e d os je ju n s, d os aço ites e de o u tra s p en i­
tê n cias q ue h av iam feito d a su a v id a esp iritu a l um
p esad e lo . N a fé infan tilm ente co n fian te em D eu s a
su a salv aç ão es ta v a a sse g u ra d a . Q u an d o a su a teo ­
ria incidiu em te m erária colisão com a afirm açã o de
S. T ia g o d e q u e “assim com o o corp o sem o e sp íri­
to é m orto, assim tam b ém a fé sem as o b ras é m o r­
t a ” / logo ele cham ou a essa ep ísto la “ um a v erd ad e i­
ra ep ísto la de p a lh a ” e re je ito u -a de tod o.
F o caliza n d o a su a aten ç ão n a salv aç ão d as alm as
in d iv id u ais p o r m eio d a fé no R edento r, L u tero d es­
den ho u o p ap el p o d e ro so a ser d esem p en h ad o p ela
Ig re ja n a cristian iz aç ão do m un do . P a r a ele a Ig re ja
to rn o u -se alg o de invisível, a co n g reg a çã o d aq u eles
q ue ex p erim en ta ram a salv aç ão em si m esm os. U m a
vez q u e D eu s d irig e p o r si m esm o to d a s a s co isas e
o p e ra im ed iatam en te no in te rio r do s ho m ens, n ão há
n ece ssid a d e de u m a co m u n id a d e visível, com g u ias
visíveis e m e d ia d o res v isíveis en tre D eu s e o hom em .
“ N e s ta a titu d e fu n d am e n ta l de L u tero ” , a ssin a la
K o n rad A lg erm issen, “ ach a m o s os m o tivo s p a ra a
s u a terrív el b a ta lh a co n tra a h ie ra rq u ia d a Ig re ja e p a ­
ra o s seu s d es te m p erad o s in su lto s ao P a p a . N ã o eram
ta n to s o s ab u s o s eclesiástico s do seu tem po q ue o im p e­
liam a co m b a te r a a u to rid a d e eclesiástica. O seu o lh ar,
d irig id o to ta lm e n te p a r a a su a p ró p ria v id a in terio r, a
p rin cíp io n ã o se p reo cu p o u m uito com êsses ab u so s. A
su a co nv icção d a ex clu siv a o p e ro sid a d e de D eu s no h o ­
m em , a q u al fez a d o u trin a d a co o p era çã o do hom em
n a s u a p ró p ria salv aç ão a p a re c e r com o alg o de b la s- •)

•) II, X X V I.

16
fem o, deve te r v isto n a d o u trin a d a Ig re ja com o m eio
estabelecido de sa lv ação e m e d iad o ra d a s g ra ç a s alg o
q ue ch eirav a a a n ti-C ris to e a a n ti-D e u s ” .1'

ódio ao Papa

Isto exp lica a raz ão pela q u al êle co n sid erav a o


p a p a d o como u m a invenção do d iabo, e o P a p a co­
mo v erd ad e iro an ti-C risto . S o bre o P a p a êle v om ita
to d a a v u lg arid a d e d a zo m b aria e do escárn io d ita ­
d a p ela su a n atu re za de g ro sseiro cam p o nês alem ão
e p ela su a im p etu o sid ad e ap aix o n a d a. “ O E v an g e lh o ” ,
ex clam a êle, “ não tem inim igos m ais violentos ou m ais
raivo so s do que o P a p a com seus p a d re s e su as u ni­
v ersid ad e s” .*11 P o rta n to , o seu ódio ao P a p a o rig in a-
v a-se n ão sòm en te d a su a p o ste rio r ex co m u n hão p o r
êle, m as tam bém d a s p ro fu n d as m olas do seu credo
religioso. “A taquei o en sin o ” , d eclara v a êle, “ e a rra n -
quei com os d entes o co ração do P a p a . N ão acredito
q ue o P a p a ren asça. O artig o so b re a ju stificação
arran co u p ela raiz o fu lg o r do P a p a ” .13
Em vez d a Ig reja com seu P a p a , seus b isp o s e seu s
p a d re s, a ú n ica coisa n ec essá ria é o conveniente
anú n cio d a d o u trin a d a ju stific aç ão p ela fé. Po rém
to d a p e sso a rem id a em C risto é ch am ad a a e sta o b ra :
c a d a um é, ig ualm ente, ch am ad o ao sacerd ó cio de
C risto. H á sòm ente êste sacerd ó cio g eral.
D e a c o rd o com L utero, a p a la v ra de D eus que con ­
fere a fé é o meio essencial d a g ra ç a e d a salvação .
O ato cen tral no culto divino n ão é o S acrifício E u -
carístico , e sim o serm ão . D aí to m ar o p ú lp ito o lu­
g a r até en tã o o cu p ad o p ela E u ca ristia .

,0) Christian Denominations, B. H e rd e r B oo k Co., St. L ouis,


1946, p . 747.
11) K o n rad A lg erm issen , ibidcm , p. 748.
,a ) Ibidem , p. 748.

17
J á q u e os sa cram en to s n ão p as sam de confirm ações
visíveis d a ju stific aç ão qu e foi e fe tu a d a p ela p alav ra
de D eu s em fé, p od em êles ser la rg a m en te d is p en sa­
dos. A p rin cíp io L u tero só ad m itia três sac ram en to s:
o b atism o , a p en itên cia e a E u ca ristia . M ais ta rd e
ad m itiu sò m en te o b atism o e a E u c a ris tia como o cum ­
p rim en to , no N ovo T estam en to , d aqu ilo que fo ra sim -
b ò licam e n te p re fig u ra d o n a circu n cisão e n a m a n d u ca -
ção do co rd eiro p ascal.
E ssa s fo ram a s id éias b ásica s que se d e sta c a ra m
com crescen te cla re z a no novo m un do de cren ç a de
L utero d esd e o inverno de 1512. N as su as a u las êle
v e n tila ra a su a crescente rep u g n ân c ia a m eios e x te r­
no s d e salv ação , nos q u a is n ão a c h a ra alívio p a ra a s
su a s p ró p ria s n ecessid ad es. C riticav a a b erta m en te as
su p erstiçõ e s lig ad as à v en eração dos sa n to s, ao ex ­
cessivo n úm ero d e in d u lg ên cias e de d ias de fe sta ,
à ab u n d â n c ia d e cerim ô n ias e de jeju m com pu lsó rio.
A su a crítica este n d e u -se a o p re p a ro de p a d re s e de
m on g es, à in u tilid a d e d o s es tu d o s filo só ficos esco lás-
ticos, e a R om a. Já g ra n je a ra êle um co n sid erável
séq uito.
A p resen ta m o s alg o ex te n sa m en te os desenv olvim en­
to s n a v ida e sp iritu a l de L u tero e no m u ndo d as su a s
idéias. Só a tra v é s d êsse s co nh ecim en tos p ro fu n d o s é
q u e p o d em o s e s p e ra r co m p re en d er as fo rç a s q ue o
m o veram a n o v as e m o m en to sas decisõ es q u a n d o
m ais ta rd e a luz foi fo c a liz a d a so b re êle. A qui vem os,
de relan ce, os m o tivo s o cu lto s e a s convicçõ es ín tim as q ue
deviam im peli-lo e su ste n tá -lo , p a sso a p asso , n a g ra n ­
de reb elião em q u e êle devia d es em p e n h ar o p ap e l
p rin c ip al. O p a lc o ^ e sta v a a rm a d o e o p an o trem u la n -
te e sp erav a a p e n a s o sin al p a r a se r lev an ta d o .

18
A Revolta Principia

Êsse sinal foi d ad o p ela p re g a ç ã o de ind ulg ên cias


p o r T etzel. Leão X esta v a le v an tan d o fu n d o s p a ra a
co n stru ç ão d a nova b asílica de S. P ed ro , e ren o v a ra
u m a B ula d e In d u lg ên cias d e stin a d a a es tim u la r os
d on ativ o s p a ra essa o b ra. D esd e a g o sto de 1513 A l­
b erto de B ran d e n b u rg o , o filho m ais velho, de vinte
c trê s an os, do G ra n d e E leito r de B ran d en b u rg o , João
C ícero, era A rceb ispo de M ag d eb u rg o e tam b ém , d es­
de setem b ro do m esm o ano^ ad m in istra d o r d a Sé de
H alb ersta d t. Em m arço seg uinte, p o r m o rte do A r­
cebispo de M ogúncia, foi êle escolhido p a ra essa Sé
trad icio n al, en tão a m ais influente na A lem an h a.15
O P a p a Leão X e a C úria reje ita ram essa indeco-
ro sa acum u lação d e b en efícios e de a lta s fu nções ecle­
siá stica s n as m ãos de um p rín cip e tão m oço. M as o
irm ão de A lberto, o E leito r Jo aqu im de B ran d en b u r­
go, ex erceu g ran d e p ressã o em Rom a p a ra co nsegu ir
a co n firm ação do P a p a à eleição de seu irm ão como
A rcebisp o de M ogún cia. O seu intento era p uram en te
p olítico. C o n cen tran d o todo êsse p o d er na casa de
B ran d e n b u rg o , êle p e n sav a que êles seriam cap a zes
de rep rim ir a p re p o n d erân c ia po lítica do E leito rado
de S ax ô n ia.
Em ad itam e n to a v á ria s o u tras p ressõ es ex ercid as
p o r Jo aq u im so b re a C ú ria em R om a es ta v a o o fere­
cim en to d e u m a ta x a e x tra o rd in á ria de 10.000 d u ­
c a d o s ,14 além d a con firm ação legal de um a g ra tifi­
cação de q u a se 14.000 d u cad o s. D epo is de m uitos
p ro te sto s e de p ro lo n g a d a resistên cia, R om a fin alm en -

,a) N o d e a lb a r d a R e fo rm a, d ez o ito b is p a d o s e arce b is-


p a d o s n a A len ian h a fo ram o c u p a d o s p o r filh o s d e p rín c ip e s,
m u ito s d o s q u a is in felizm en te e ra m m u n d a n iz a d o s e p o u q u ís ­
sim o zêlo tin h a m p e la s alm as.
1*) U m d u c a d o v a lia c ê rc a d e 2,30 d ó la re s.

19
te ced eu . Em ag o sto de 1514, Leão X confirm ou o jo ­
vem p rín c ip e com o A rcebisp o de M o gú ncia e de M ag -
d eb u rg o , e com o a d m in is tra d o r de H alb ersta d t. Al-
•berto tom ou d e esp réstim o a im p o rtân c ia in teira à
c a sa b a n c á ria de F u g g e r em A u g sb u rg o .
P a r a a ju d á -lo a liq u id ar es sa d ívid a, a C ú ria co n ­
cedeu -lhe, p o r oito ano s, privilégio exclusivo de p re ­
g a r a ind u lg ên cia p a ra a co n stru çã o da b asílica de
S. P ed ro em R om a n os d om ínios do s seus trê s b is p a ­
d o s e d a c a sa de B ra n d en b u rg o . D u ran te êsse p e río ­
do to d a s a s o u tra s in d u lg ên cias naq u eles te rritó rio s
fo ram rescin d id as. A p ós a d ed u ção das d esp esas, m e­
ta d e d o s fu n d o s co letad o s tinh am de ir p a ra R om a
p a ra a co n stru çã o d a b asílica de S. P ed ro , e m etad e
p a ra A lb erto liq u id ar a su a d ívida.

Mistura Infeliz

H av ia aí u m a infeliz m istu ra de religião e de ne­


gócio, a q ual era certo q u e su sc ita ria crítica e c ria ­
ria g rav e escân d alo . O escâ n d alo foi au m en ta d o p ela
m an eira com o as in d u lg ên cias eram p re g a d a s, sen d o
a im p o rtân cia do fa z e r esm o las e x ag e rad am e n te en ­
ca re cid a. U m calm o ex am e d a coisa to d a m o stra q ue
a c e n su ra recai sô b re am bo s, C úria e H o h en zo llern s,
em b o ra êste s ú ltim o s devam s u p o rta r o q u in h ão m aior,
de vez q ue ta n to a p res são com o a s ex ig ên c ia s se
o rig in a ra m dêles. N o fim , o p lan o p ro v o u -se um m i­
seráv el fra c a sso , co n seg u in d o A lb erto a p e n a s cêrca
de 5 .0 0 0 d u c ad o s, ju sta m e n te cêrca d e um q u in to d a
so m a to ta l a se r p a g a .
T alv ez n en h u m a d o u trin a d a Ig re ja se ja m ais m al
e n te n d id a do q u e a d a s in d u lg ên c ias. C o n trà riam e n te
à im p re ssã o de m u ito s, u m a in d u lg ên cia n ão sig n ifi­
ca um p e rd ã o p a ra o p eca d o , e m u ito m enos u m a li­

20
cença p a ra com eter o p ecad o . E la é sim plesm en te a
rem issão, no to do ou em p a rte , d a p en a tem p o ral a
ser so frid a n esta vida ou no p u rg a tó rio , d epo is que
a culpa foi rem ovida m ediante um a co n fissão co n tri­
ta. A o ferta de um a esm ola p a ra um a ca u sa d ig n a,
p re sc rita ap en a s como u m a b o a o b ra su p lem en tar
p a ra o g an h o de u m a in d ulg ên cia, d u ran te o p e río ­
do d a p ré-R efo rm a não ra ra s vêzes foi su p e ren ca -
recida.
D aí n asceu um g ru p o de trafic an te s de in d u lg ên cias
q ue pouco ou nenhum interesse tinham em o b te r as
n ece ssá ria s condições interio res de p e sa r e em end a,
e que só se p reo cu p av am com recolher q u an to m ais
dinh eiro pu dessem . N ão faltav am , en tre tan to , na Ig re­
ja , hom ens sério s que co nd en avam êsses ab u so s. Ja
m uito an tes, em 1513, o C ard ea l X im enes os p ro ib ira
na E sp an h a . Do m esm o m odo Jo rg e de S ax ô n ia p ro i­
b iu -o s no seu territó rio .
A ssim , um a vez que as in d u lg ên cias n ão eram an u n ­
ciad as n a S axô n ia, m uita g en te p ro ced en te de W it-
ten b e rg v in ha à v izinh a cid ad e de Ju eterb o g p a ra ou ­
vir os serm õ es de T etzel e g a n h a r in du lg ên cia. E,
q u an d o alg u n s d êsses fo ram co n fes sar-se com Lute-
ro e lhe m o stra ram as c a rta s de in du lg ência q ue h a ­
viam recebido , foi q u e êle decidiu ag ir. N a v ésp era
d a fe sta p atro n a l d a ig re ja de T o d o s os S a n to s em
W itte n b e rg , o sáb ad o 31 de o u tu b ro de 1517, Lu tero
p reg o u n as p o rta s d es ta ig re ja , que era tam bém a
ig reja d a co rte e d a u n iv ersid ad e, n ov en ta e cinco te ­
ses la tin as con cern en tes ao p ecad o, à p en itência, à in­
d u lg ên cia e ao p u rg a tó rio , p a ra o fim de in citar a um a
d iscu ssã o oficial.
Êrro Fatal
A p o rta d e ssa ig re ja serv ia com o q u a d ro de avisos
d a u n iv ersid ad e, no q u al eram a fix a d a s n o tícia s de

21
d iscu ssõ es e fu n çõ es aca d êm icas. D a í n ão ser n a d a
fo ra do com um a açã o de L utero. As su a s p ro p o si­
çõ es se riam d iscu tid a s e reso lv id as p o r m onges e e ru ­
d ito s, de aco rd o com o co stu m e d a época. M as o re s­
se n tim en to so b re os ab u so s lig ad o s com a p re g aç ão
d a s in d u lg ên cia s estav a en tão tão d ifun dido, q ue a
açã o de L utero a tra iu um a aten ç ão in u sitad a m e n te
am p la . R ealm ente ela p ro v o u se r a fa g u lh a que
ateo u as ch am as d a p o d e ro sa co n fla g raç ão qu e v ir­
tu a lm en te devia p ro p a g a r-s e a to d a a E u ro p a.
Q u an d o um m erc ad o r ofereceu à v en d a em W it-
te n b e rg a s an tite ses de T etzel, foi v aiad o p elo s e s­
tu d a n te s, q u e incen d iaram na p ra ç a p ú b lica o seu es­
to q u e d e 8 0 0 exem p lares. Em vez d e resp o n d er a T etzel
e de assim lim itar a co n tro v érsia ao fo ro acadêm ico,
L u tero lev o u-a à a re n a p ú b lica, p u b lican d o em v er­
n áculo o seu Sermão sôbre as Indulgências e a Graça.
Foi êste um êrro fa ta l, p o is n ão se tra ta v a de a p e ­
lação p a ra um trib u n al co m p eten te o n d e o caso fo sse
d ecid id o à b a se dos seu s m érito s teológ icos, m as o n ­
de g a n h a ria o v ered icto o p a rtid o qu e ex citav a as p a i­
x õ es d a s m a ssa s e atiç av a a s ch am as dos recé m -ace -
so s sen tim en to s de n acion alism o.
E m o u tro estu d o , A Reforma," esb o çam os com a l­
g u m a m in ú cia o p ro g res so do m ovim ento atra v é s dos
p a íse s d a E u ro p a, e tra ç a m o s-lh e as c a u sa s e as co n-
seq ü ên c ias. A qui lim itarem o s o n osso tra ta d o g ra n ­
d em e n te a L utero e ao estab elecim en to d a su a nova
relig ião .
Recusa Retratar-se

O s D o m in ican o s d a S a x ô n ia en v iaram a R o m a ac u ­
sa çõ e s c o n tra o m o n g e ag o stin ia n o . Em ju n h o d e 1518,

1#) The Reformation, Jo h n A. 0 ’B rien , T h e F a u lis t P re ss,


N ew Y o rk 19, N . Y., 1943, 64 p p .

22
o p ro cu ra d o r p a p a l in stau ro u o p ro cesso c o n tra L u-
tero p o r su sp e ita d e p ro p a g a r h eresia. Em o u tu b ro
L u tero com pareceu , em A u g sb u rg o , p e ra n te o leg ad o
p ap al, o sáb io C a rd eal C aje tan o , m as recusou re tra ­
ta r-se . A en tre g a de L utero, re q u is ita d a p o r C a je ta ­
no, foi rec u sad a p o r F red erico d a S ax ô n ia, p rín cip e
territo ria l de Lutero. D u ran te a d is p u ta de L eip zig
em 1519, q u an d o p en so u em vir em aux ílio do seu
am igo C arlsta d t c o n tra Eck, L utero nego u o p rim ad o
e a au to rid ad e do P a p a .
As a lte rn a d a s d ispo sições de relax am en to e de m o r­
tificação in ten sa que L u tero ex p erim en tara no m ostei­
ro, an tes do seu d esco brim en to d a d o u trin a d a sal­
vação p o r meio d a fé so zin h a, têm o seu p aralelo nas
su as a lte rn a d a s a titu d es p a ra com a S a n ta Sé. A s­
sim , a 3 de m arço de 1519 L utero escreve a Leão X:
“ P e ra n te D eus e to d a s a s su as cria tu ra s dou te ste ­
m unho de q u e nem d esejei nem desejo to car, ou po r
in trig a so la p a r, a a u to rid a d e d a Ig re ja R o m ana e a
de V o ssa S a n tid a d e ” .1* D o is d ias dep ois, escreve a
S p a la tin : “ N u n ca foi m in ha intenção d e se rta r d a cá­
te d ra ap o stó lic a ” .17 D ez d ias m ais ta rd e escreve ao
m esm o: “ N ã o atin o sa b e r se o P a p a é o an ti-C risto
ou o ap ó sto lo d e C risto ” .1*
E sta s são am o stra s sim plesm en te típ ica s d a s su a s
ex p ressõ es c o n tra d itó ria s p a ra com a S a n ta Sé d u ­
ra n te esse p erío d o . D ep ois de ver o ato leiro
de co n trad içõ es em q u e as p ró p ria s p alav ras de
L utero o envolvem n e ste e n o u tro s assu n to s, o
h is to ria d o r B ay n e o b se rv a: “ P ro v a r a co erên cia de
L utero , ju stific a r o seu p roced im en to em tod o s os
p o n to s, com o sem fa lh a ta n to em v era c id ad e com o

ia) D e W e tte , 1, 234.


,T) Ib id em , I, 236.
" ) Ib id em , I, 239.

23
em c o ra g e m , so b e sta s circ u n stâ n cias, isto po de ser
d e ix ad o a sim p ló rio s fa b ric a n te s de m ito s” .”
D e sd e 1520 u m a m u d a n ça a ss in a la d a na m an eira
e n a v id a de L utero é d iscern ív el. A su a a n tig a es-
cru p u lo sid a d e tra n s fo rm a -se num a con fian te se g u ra n ­
ça d e si q u a n d o ele m a n d a às u rtig a s a d iscrição e
a ta c a d o u trin a sô b re d o u trin a, com tem erário pouco
caso . D e ju n h o de 1520 em d ian te, Lutero cham ou p u -
b lica m e n te o P a p a de an ti-C risto . N o seu Memorial à
Nobreza Germânica p u b licad o em ag o sto de 1520, ele
p ed e a o s p rín cip es g erm ân ico s que convoquem um
co ncilio e ex ige a ab olição do celib ato, d as m issas p e­
los d efu n to s, d a s p ereg rin açõ es, dos d ia s de fe sta e
de jeju m , e d os trib u to s a Rom a.

Roma Age

N o seu o p ú sculo Sobre o Cativeiro Babilônico da


Igreja, p u b licad o em o u tu b ro , êle rejeita a C o m un hão
so b u m a só espécie, o c a rá te r sa crifical d a M issa, a
tra n su b sta n c ia ç ã o , a con firm ação , as s a g ra d a s o rd en s,
a ex tre m a-u n çã o e o m atrim ôn io com o sacra m en to s.
A 10 de d ezem b ro de 1520, êle queim ou p üb licam en te
a b u la de Leão X Exsurge Domine, q ue co n d en a v a
q u a re n ta e um d os seu s erro s e o am ea ça v a de ex co­
m u n h ão . Em fac e d esse p ú blico d esafio, o p on tífice
n ão teve o u tra alte rn ativ a se n ão ex co m u n g ar o fra d e
reb eld e e o s seu s a d e p to s. F ê-lo a 3 de ja n eiro de 1521.
O s seq u az e s de L u tero vieram d as fileiras do s q ue
estav am d e sg o s to so s com os a b u so s eclesiástic o s d a
ép o ca, e q u e p en sav am v er nêle um v e rd a d e iro re fo r­
m a d o r. P o rém m u itíssim o m ais v ieram d a s file iras dos
fra d e s e fre ira s a n tice lib atário s, do s cav aleiro s em ­
p o b rec id o s, d os h u m a n ista s an ticleric ais e do s p rín -

I#) Martin Luther, I, 457.

24
cipes m u n d an o s. N u m ero so s m ovim entos e excesso s
fan ático s m a n ifestaram -se , to do s ap elan d o p a ra a
B íb lia com o a su a au to rid a d e . O s cam p o neses, com ­
p reen d en d o mal as fala s de L utero acerca d a lib er­
d ad e dos filho s de D eus, le v an ta ram -se em rebelião.
C en ten as de m osteiros, co nv en to s e castelo s fo ram re­
d uzid o s a p ó e cinzas.
Com selvagem cru eld ad e Lu tero v olto u -se co n tra
êsses cam po neses, cu ja s exig ên cias eram u m a rep eti­
ção p arcial d as su as p ró p ria s p alav ra s. Incitou os no ­
b res a m atarem êsses “ filhos do d ia b o ” e a acu á-lo s
com o a cães. O seu conselho foi seg u id o ao p é d a le­
tra . M ilh ares d aq ueles p o b res cam pô nios fo ram m or­
tos com atro z cru eld ad e. E rasm o o rça o núm ero dos
m o rto s em 1 0 0 .0 0 0 .a*
Longe de la m en ta r u m a tal o rg ia d e im perdoável
m a tan ça , L utero g a b o u -se d ela d izen d o : “ Eu, M arti-
nho L utero, m atei tod o s os cam p on eses n a rebelião,
p o r h av er d ito q ue êles deviam ser m o rto s; to do o
san g u e d êles es tá so b re a m in ha cabeça. M as eu o lan ­
ço so b re o S en h o r D eus, que assim me m an do u fa la r” .21

A Censura de Osiander

A cru eld a d e q u e L u tero incitou os p rín cip es a am o n ­


to a r so b re os cam p o n eses a rra n c o u do seu co m p a­
n heiro de refo rm a O sian d er a se g u in te ce n su ra : “Ai!
P o b res cam p o neses, q u e L utero a d u la e a fa g a q u a n ­
do êles ata c a m som ente os b isp o s e os p a d re s ; m as,
q u an d o , rin d o d a B u la dêle, os in su rrec to s am eaçam
a êle e ao s seu s p rín cip es, en tão êle ex p ed e o u tra B u -

a#) E ra sm u s, Epist. 803.


ai) Werke, E d iç ão E rla n g e n LIX , p. 284, Table Talk; ve­
ja tam b ém G ris a r, vol. III, p. 213.

25
Ia d e c re ta n d o a m a ta n ç a dêles q u ais o u tro s ta n to s
an im a is se lv a g e n s” .2*
C om o res u lta d o de tr a ta r os cam po neses d a m a ­
n eira b ru ta l reco m en d ad a p o r L utero, o in sig n e h is­
to ria d o r p ro te s ta n te A. F. P o lla rd afirm a que, “ pelo
fim do século d ezoito, o s cam p o neses g erm â n ico s
co n tin u av a m sen d o os m ais d es g ra ç a d o s d a E u ro p a .
A serv id ão v ig o ro u ali p o r m ais tem po do q u e em
q u a lq u e r o u tro p aís civilizado exceto a R ú ssia, e a
m a ssa do povo e ra efetiv am ente a f a s ta d a d a e sfe ra
d a aç ão p o lítica. O s com eços d a d em o cracia fo ram
es m a g a d o s n as c id a d e s” .22
A 3 d e ju n h o de 1525, no meio d e to d o o d e sa sso s-
sêg o , m iséria e aflição co n seq ü en tes à G u e rra do s C am ­
p on eses, L u tero ca so u -se com um a fre ira -c is te rc ie n -
se, C a ta rin a de B ora, q u e d e ix a ra o seu con vento co­
m o res u ltad o d os en sin a m en to s dêle. A esse tem po
tin h a ela v inte e sete an o s e L u tero q u a re n ta e três.
Seu coleg a, o m o n ge C a rlsta d t, en tão com q u a re n ta e
um , ren u n cio u ao s seu s v o tos p a ra c a s a r-s e com u m a
m en in a de q uinze, com o cord ial en d o sso de L utero.
M uito s o u tro s, m on g es e freira s, seg u ira m o exem plo
do e x -fra d e a g o stin ian o .
L utero co n s ta n tem e n te req u esto u o fav o r do s p rín ­
cip es ex a lta n d o -lh e s a a u to rid a d e em assu n to s e s p i­
ritu a is e in c en tiv a n d o -o s a in v a d ir o do m ínio d a Ig re ­
ja . Foi o ap o io d os n o b res secu la res qu e asseg u ro u
o êx ito d a rev o lta de L u tero . Ê ste fa to é fran ca m en te
reco n h ecid o p e la Encyciopedia Britanica, q u e d iz :
“ N ã o h o u v essem o s p rín cip es g erm â n ic o s ach a d o j d o
seu in te rês se re fo rç a r o s p rin cíp io s dêle, e êle n u n ca
te ria p a s s a d o d e g u ia d e u m a seita m ística o b sc u ra.
A d em ais, êle n ã o e ra e s ta d is ta . E ra atre v id am en te im -

SI) P a rs o n s , Sfudies in Church History, vol. III, p. 315.


’ •) Cambridge Modern History, II, 191.

26
p etu o so no tem p eram en to , g ro sse iro e g ran d em en te
su persticio so de aco rd o com as n o rm a s m o d e rn a s” .34

Sanciona a Bigamia

T ev e êle, porém , de p a g a r um alto p reço p o r êsse


apo io , e, às vêzes, um preço verg on ho so. A ssim , p a ­
ra co n seg u ir o apo io co n tin u ad o de Filipe, L an d g ra v e
de H esse, L utero lan ço u -se ao repú dio do en sin am en ­
to de C risto con cernente à u n id a d e e in d isso lü b ilid a-
de do m atrim ô nio, e p erm itiu a F ilipe to m ar u m a se ­
g u n d a m ulher en q u an to co n tin u av a a viver tam bém
com a p rim eira. C ristin a já lhe d e ra sete filhos q u a n ­
do a Filipe lhe deu n a cab e ça q u erer c a sa r-se com
M a rg a rid a von d er S aal, um a c ria d a de q u arto de
d ezessete an os. No seu p ed id o a Lu tero e ao s seu s
co leg as p a ra to m ar u m a se g u n d a m ulher, m esm o in­
d icand o a su a intenção de co n tin u a r a viver tam bém
com a atu al, F ilip e ace n a an te os olhos deles com a
p e ita d a s te rra s do m osteiro se êles aquiescerem ao
seu p ed ido . D i r ê l e : “ Se êles aten d erem , pois, ao meu
p e d i d o .. . tu d o o q ue fô r ju sto e razoáv el, até mes­
mo a propriedade dos mosteiros, e coisas assim, eu
lhes concedere?’
Q u an d o p ed id o alg o sem elh an te foi a p re se n ta d o po r
H en riq u e V III d a In g la te rra ao P a p a C lem ente V II,
este d efend eu a lei de C risto ain d a que isto sig n ifi­
casse a d efecção , p a ra com a a n tig a fé, do luxu rioso
m o n a rc a e de q u as e to d o s d a In g la te rra. M as L utero,
sem co n sid era ção n enh u m a p ela solene in jun ção de
C risto c o n tra a b ig am ia, p erm ite ao L an d g ra v e to m ar
a c ria d a de d e zessete an o s com o se g u n d a m u lher, re-
co m en d an d o -lh e, con tu d o , m a n te r isso em seg red o . *53

2A) Vol. 23, p. 11.


35) P a rs o n s , R., Studies in Church Hisiory, P u s te t & Co.
N. Y., 1896, vol. III, p. 322.

27
As b o d a s fo ram rea liza d a s, na p resen ça de B u cer
e d e M elanch tho n , pelo am ig o de L utero, M eland er,
q u e tin h a trê s viúv as vivas. Q u a n d o a n otícia do c a ­
sam e n to tran sp iro u , seg u iu -se um a sen sa ção nacion al
de escâ n d a lo . L u tero se revelou com o um m ero o p o r­
tu n ista, train d o a s a g ra d a lei de C risto p o r trin ta m o e­
d a s d e p r a ta n a fo rm a do ap o io de um p rín cip e tem-,
p o ral. “ M elanch th o n, diz a Cambridge Modern History,
q u a se m orreu d e v erg o n h a, m as L utero d esejo u d e­
fen d e r im p ud entem ente a co isa com um a m e n tira” .1*

“Toda essa Confusão e r a . . . ”


À m ed id a q u e L utero foi fican d o m ais velho, a su a
irascib ilid ad e au m en to u , e êle v irtu alm e n te b rig o u com
c a d a um d o s seu s co leg as, v o m itan d o so b re eles u m a
o n d a d e v itu p ério s. O b serv an d o o ac irrad o d e sp o tis­
mo d os n o sso s g o v ern an tes, as in térm in as co n te n d as
en tre os seu s seq u a ze s, as incu ráv eis ferid a s ín tim as
d a n o v a Ig re ja com o p rin cíp io d a d ivisão a lhe m o r­
d er com o um câ n c er o p ró p rio co raç ão , êle se to rce
de a n g ú stia . O vício e a im o ralid ad e cam peiam , e
n ão h á cô rte d e ap e la çã o fin al p a ra p ô r fim às rix as
d o s p re g a d o re s, c a d a um d o s q u a is coloca a su a in­
te rp re ta ç ã o p a rtic u la r d a B íb lia acim a de q u alq u er
côrte.
O s te rrív eis re su lta d o s d a su a o b ra e stã o d es p o n ­
ta n d o so b re êle. O s d em ô nios, d iz -n o s êle, es tã o -n o
a s s a lta n d o tão fe ro zm en te q u e lhe “ n ão d ã o d es ca n ­
so seq u er um só d ia ” . D e to d o s os a ssa lto s, “ n enh um
foi m ais se v ero o u m a io r do q u e o ac ê rc a d a m in h a
p re g a ç ã o , a c u d in d o -m e à m ente êste p en sam e n to :
Toda essa confusão foi causada por você” ” Aí es-
2ê) Vol. II, 241.
aT) Saemtliche W erke . LIX , 2 96; LX, 45, 46, 108, 109, 111;
L X II, 494.

28
tav a a voz cie um a con sciência p e rtu rb a d a fala n d o a
ele. No seu últim o serm ão em W itte n b e rg , êle d en u n ­
cia a razã o como “ o o rg u lh o do d ia b o ” e com o um a
' ‘p etu la n te p ro s titu ta ” .
P o r o casião de u m a v isita a E isleben, su a cid ad e
n atal, êle foi aco m etid o de um a d o en ç a fata l, ali m or­
ren do a 18 de fev ereiro de 1546. A su a o b ra de divi­
são da g ran d e com u n id ad e do C ristian ism o em fa c ­
ções q u e se g u erreiam havia m uito fo ra realiza d a , e
a su a m o rte causo u ap e n a s u m a p eq u en a ru g a no
oceano de d iscó rd ia q ue en tão lavrav a.
N a D ieta de A u g sb u rg o , em 1555, fêz-se um es­
forço p a ra co n seg u ir u m a fo rm a de p az b a se a d a em
com p ro m isso. Foi ad o ta d o o p rin cíp io cujus regio ejus
religio, de aco rd o com o q ual a relig ião do g ov ernan te
devia to rn a r-se a religião oficial do te rritó rio . “ L ib erd ad e
de con sciên cia” , diz a Encyclopedia Britanica, “ foi
assim estab e lecid a so m ente p a ra os p ríncipes, e o
p o d er d êstes to rn o u -se su p re m o em m a térias tan to
relig io sas com o sec u la res ” .21 Aqui tem os o com êço
d aq u ilo a q ue o D r. H. E. F osd ick ch am a a co n stru ­
ção d a relig ião em to rn o do E sta d o , to rn an d o êste o
cen tro d a fid elid ad e do hom em e o o bjeto d a au to ri­
d a d e su p rem a.

( Feroz Intolerância

L u tero m u itas vêzes é fig u rad o com o um cam peão


d a lib erd ad e relig io sa. C o ntu do , lon ge de o ferecerem
ap o io a tal p rete n sã o , os fa to s d a h istó ria m o stram
q u e o o p o sto é q u e é v e rd ad e iro . P o u co s chefes, se
os houve, n a h istó ria do p en sa m e n to religioso, fo ram
tão in to le ran te s com as d iv erg ên cia s com o êle. O h is­
to ria d o r p ro te sta n te H allam reflete o ju ízo de to d o s

” ) Vol. 23, p. 15.

29
os en ten d id o s im p arciais q u an d o escrev e: “ Um d o g -
m atism o ilim itad o, rep o u san d o , p ràtic am en te, num a
a b s o lu ta co n fia n ça n a in falib ilid a d e do seu ju ízo , p e r­
m eia os seu s escrito s; n en h u m a co n d escen d ên cia é
m o stra d a , n en hu m a p a u s a é co n ce d id a ao h e sitan te ;
tu d o q u an to se erg u e no cam inh o d as su as d ecisõ es,
os P a d re s d a Ig reja , os h om ens de esco la e os filó ­
so fo s, os cân o n es e os con cílio s, tu do é v arrid o n u ­
m a to rre n te de im p etu o sa d ec la m a ção ; e, com o, se ­
g u n d o L u tero, tu do o qu e se contém na E sc ritu ra é
fácil d e en ten d er, e só p o d e se r en ten d id o no se n ­
tido dele, to do desvio d a d o u trin a in corre o an á te m a
d a p erd içã o . Q u e os zw in g lian o s, ta n to com o to d a a
Ig re ja d e R om a e os A n ab atista s, p o r ca u sa dos seu s
d o g m a s fo ram exclu íd o s d a sa lv ação , isto é m ais do
q ue in sin u ad o em n u m e ro sas p a ssa g e n s dos escrito s
d e L u te ro ” .5,1
D e m a n eira se m elh an te o h is to ria d o r p ro te sta n te
E d w a rd M. H ulm e, fala n d o de L u tero e dos co leg as
d êste, d iz: “ O s re fo rm a d o re s v ieram a co n sid era r a
in to le râ n c ia u m a lei de au to p re se rv aç ão . L u tero a n a -
tem atizo u to do aq u ele cu ja cren ç a d iv erg isse d a dêle.
“ A quele q u e n ão crê n a m in h a d o u trin a ” , d isse êle
u m a vez, “ es tá se g u ro de ser c o n d en a d o ” .*0
P o u c o tem p o a n tes d a su a m o rte, L utero escreveu
d o is p a n fle to s trem en d a m en te in sultu o so s. Um e ra
Contra o Papado, fundado pelo Diabo em Roma , e o
o u tro e ra c o n tra o s ju d e u s. O fro n te sp íc io no p rim ei­
ro p a n fle to e ra u m a fig u ra ch o can tem en te v u lg a r de
um a se n tin a com o co n teú d o . E s s a p ro d u çã o o h is to ­
ria d o r alem ão D õ llin g er deno m ino u de “ d ocu m en to

2t) H a lla m , Literature of Europe , vo l. I, p . 372.


,0) E d w a rd M aslin H u lm e, The Protestant Revolution and
the Catholic Reformation in Continental Europe , C e n tu ry ,
N. Y., 1915, p . 363.

30
cu ja o rigem dificilm en te p o d e se r ex p lica d a a n ão ser
su p o n d o q ue L u tero h a ja escrito a m aio r p a rte dêle
sob a in flu ên cia de b eb id a in to x ica n te” .31
O seu ataq u e c o n tra o s Ju d eu s é eriçad o de vis ep í-
tetos, tais com o “jo ven s d iab o s co n d en ad o s ao in­
fern o ” . £ le intim ou os seus seq u aze s n a A lem anha a
incen d iarem a s esco las e sin a g o g a s ju d a ic as , e a jo ­
g a r piche e en x o fre n a s ch a m as; a ihes d es tru ir as
c a sa s; a lhes co n fiscar o dinh eiro em espécie, de o u ­
ro e de p ra ta ; a lhes to m ar os Livros sag rad o s, até
m esm o a B íb lia in teira ; a lhes p ro ib ir celebrarem
q u aisq u er ofícios religiosos, sob p en a de m o rte; e, se
isso n ão a d ian ta sse, a en x o tá-lo s p a ra fo ra do p aís
com o cães raiv o so s” .31 N este e sp írito de a m a rg a h o s­
tilid a d e e in to lerân cia p a ra com to d o s os que
su ste n ta sse m um só p o n to de v ista teológico d iferente
do seu foi que L utero p ersistiu até cair o p an o final.

Interpretação Privada

E m b o ra L u tero d e se ja sse res trin g ir o p rincípio da


in te rp reta çã o p riv ad a d a E sc ritu ra ao seu uso p ró ­
prio , e faz e r a su a in te rp re ta çã o p essoal o b rig ar a
tod o s, o seu exem p lo p ro v o u -se m ais con tag io so do
q ue o seu p receito. O s seu s se g u id o res reclam aram
o m esm o d ireito, e logo com eçaram a d a r in te rp re ta ­
ções d iv e rg en tes ao s m ais sim ples textos. A ssim , em
In g o lsta d t, em 1577, C ristó v ão R as p erg e r citav a d u -
ze n ta s in te rp re ta çõ es d iferen tes d as q u atro sim ples p a ­
la v ra s d a c o n sag ra çã o , “ Isto é o m eu C o rp o ” , in ter­
p reta çõ es s u ste n ta d a s p elo s seq u aze s do s R eform a­
d o re s .*
33

31) Dõllinger, L u th e r, p. 48.


33) Luther*s Works, vol. X X , pp . 2230-2632.
3J) The Faith of Millions, J. A. 0 ’B rien , Our Sunday Vi-
sitor, H u n tin g to n , Ind. 1938, p. 227.

31
L u tero com eçou d e claran d o q ue a B íblia p o d ia se r
in te rp re ta d a p o r q u alq u er um “ até m esm o p ela h u ­
m ilde c ria d a do m oleiro ; an tes, até p o r um a cria n ça de
nove a n o s” . M ais tard e, no en tan to , q u an d o os A n a-
b a tis ta s, Z w in g lian o s e o u tro s c o n tra ria ra m as su as
v ista s, a B íblia to rn o u -se p a ra ele “ um livro de he­
re s ia ” , m uito o b scu ro e difícil de enten d er.

Um P rin c íp io D iv isó rio

P o r isto, em 1525 ele d ep lo ra v a tristem e n te a a n a r­


q u ia relig io sa a q u e o seu p ró p rio p rin cíp io d a in te r­
p re ta ç ã o p riv a d a d a E sc ritu ra d e ra n ascim en to : “ H á
ta n ta s se itas e cren ç as q u a n ta s cab e ças. U m n ão te rá
n a d a a fa z e r com o B a tism o ; o u tro n eg a o S a c ra ­
m ento ; um terceiro a c re d ita q u e h á o u tro m un do en ­
tre este e o últim o d ia. A lgu n s en sin am q ue C risto n ão
é D eu s; u ns dizem isto , o u tro s dizem aq uilo. N ão h á
rú stico , p o r m ais ru d e q u e seja, que, se s o n h a r ou fa n ­
ta sia r alg u m a coisa, isto n ão deva ser o su ssu rro do
E sp írito S an to , e êle p ró p rio um p ro fe ta ” .54
As ce n ten as d e se ita s litig a n te s, tô d a s p ro c la m a n -
d o -se b a s e a d a s n a B íb lia, oferecem terrív el evidência
d a d iv isão e d is sen são q u e o p rin c íp io d a in te rp re ta ­
ção p riv a d a tro u x e ao m u ndo . N a v erd ad e , o C en so
R elig io so d o s E s ta d o s U n id o s p a r a 1936, o últim o
levado a efeito p elo g o v êrn o fed era l, re g is ta n a d a m e­
nos do q u e vin te d ivisõ es d en tro d a p ró p ria d eno m i­
n a çã o lu teran a. Ê sse p rin cíp io d a in te rp re ta ç ã o p a r ­
ticu lar, q u e im p la n to u ta l d iv isão no m u nd o relig io so
do seu tem p o , foi q u e levou L utero a c o n fes sar tris ­
tem en te h av e r “ q u a se ta n ta s se ita s q u a n ta s c a b e ç a s” .
O novo p rin c íp io d e L u tero , d a sa lv aç ão p e la fé
so zin h a , p arec eu tã o d es tru tiv o no cam p o d a m oral

84) G ris a r, Luther, IV, 3 86-407, B. H e rd e r, St. L ouis, 1917.

32
q u an to o seu novo p rin cíp io do ju íz o p riv ad o foi d i­
visório em m a téria de cred o . P o r isto o P ro fe sso r E.
M. H ulm e d iz: “ Em o p o sição à salv aç ão cató lica p e­
las b o as o b ras, a rev olução p rec o n iza ra a sa lv ação
pela fc so zin h a. A lguns do s lu teran o s ex tre m a d o s ch e­
g aram a as sev erar que as b o a s o b ra s eram p re ju d i­
ciais à salv ação . Assim faze n d o , êles esv aziav am a
fé d a su a essência e d eix av am -n a com o p ouco m ais
do q u e um a m era aceitação do s d o g m as d a su a ig reja.
Jaco b A n dreae, cô neg o e chanceler de T ü b in g en , d is­
se que, “ com a p re g a ç ão d a d o u trin a d a ju stific aç ão
p ela fé so zin h a, as a n tig as v irtu d es d esap a rec era m e
u m a m ultid ão de novos vícios ap a receu no m u n d o ” .
B ucer, q ue aju d o u a estab ele ce r o p ro testan tism o em
E stra sb u rg o , d isse que “ a co rru p çã o d á ca d a dia n o ­
vos la rg o s p asso s n a Ig reja E v a n g é lic a” . M elanchthon
assev ero u q u e “ to d a s as ág u a s do E lb a não seriam
su ficien tes p a ra eu ch o rar so b re os m ales d a R efor­
m a” . E fin alm ente o p ró p rio L utero d isse que “ não
há um só dos n o ssos evangélicos q ue não seja sete
vêzes p ior do q ue an te s de p erte n ce r a n ó s” ."
S im ilar é o testem u n ho do em inente h isto riad o r H al-
lam , filho p ro te sta n te de um clérig o p ro te sta n te : “ S u s­
te n ta n d o q u e a salv aç ão d ep en d e d a fé com o con dição
única, ele n ão so m en te n egou a im p o rtân cia, em se n ­
tido religioso, de u m a v ida v irtu o sa, m as afirm ou q ue
to do aq uele que sen tisse d en tro d e si m esm o p lena
se g u ra n ç a de q ue seus p eca d o s lhe eram p e rd o ad o s
to rn a v a -se ab so lu ta m e n te in cap az de p ecar, ou pelo
m enos de p e rd e r o fav o r de D eus en q u an to , m as só
en q u a n to , a se g u ra n ç a c o n tin u as se” ."

” ) The Protestant Revolution and the Catholic Reforma -


tion in Continental Europe , p. 366.
■•) Litterature of Europe, P a r t. I, p. 303.

33
R ealm ente, no seu Cativeiro Babilônico, L utero e s ­
crev eu : “A ssim v ed es com o é rico o cristã o b atiza d o ,
já que, m esm o q u e o d eseja sse , n ão p o d e p e rd e r a
salv aç ão , p eq u e q u a n ta s vêzes p ecar, a m enos q ue re­
cu se crer. O s p ec ad o s, p o r m ais n u m ero sos e. g rav es
q ue sejam , n ã o po dem co n d en á-lo se ap e n a s êle se
a g a r r a r à fé ” .,T

Juízo sobre Lutero

A p re sen tam o s os asp e cto s g erais d a vida, e n sin a ­


m en to s e c a rá te r de L utero, n ão com o p en sam e n to
de g a n h a r u m a v itó ria polêm ica, m as sim plesm ente
p a ra q ue o leitor p o s sa ver o L u tero real com o d es­
crito p o r em inentes h isto riad o re s p ro te sta n te s, e n ão
a cria tu ra im ag in ad a p o r alg u n s do s seu s a rd o ­
ro so s se g u id o res, n a su a p ie d o sa im ag in ação . N ão
d esejam o s ferir os se n tim en to s nem m esm o d estes úl­
tim os, m as crem o s q u e os in te rêsse s d a u n id ad e cris­
tã só po dem se r serv id o s com a a p re se n ta ç ã o d a v er­
d ad e h istó rica. R e tra ta r L u tero com o um b rilh an te s a n ­
to, e co o n es ta r-lh e a s fra q u e z a s e os d efeito s, é fa ­
ze r z o m b a ria d a h istó ria e r e ta rd a r a c a u sa d a reu ­
nião. Foi p o r isto q u e os B ispo s d a Ig re ja E v an g é li­
ca U n id a n a A lem anh a, d ep o is de verem o film e am e­
rican o Martinho Lutero , im ed iatam en te d issera m q ue
ce rtas cen as d ev iam se r m u d a d as.
P o r o u tro lad o , ig u a lm en te e rra d o é d e p rec ia r-lh e
as b o a s q u a lid a d e s, a su a se rie d a d e m o ral ao m enos
no com êço, a su a p ie d a d e p ro fu n d a , a su a co rag em

a7) P a r a o c a s o d e p o d e r alg u é m d u v id a r d e q u e um ” le a d e r“
re lig io so fize sse se m e lh a n te a fir m a ç ã o , c ita m o s a s e x a ta s p a ­
la v ra s d e L u te ro em L atim : “ Ita v id e s q u a m d iv e s s it h om o
C h ristia n u s e t b a p tiz a tu s , q ui etia m v o le n s no n p o te s t p e r ­
d e re sa lu te m su a m q u a n tisc u m q u e p e c c a tis, nisi n o lit c r e ­
d e re . N u lla en im p e c c a ta eum p o s s u n t d a m n a re n isi so la in­
c r e d u lita s ” .

34
e a su a indefectível fé em D eus. Só D eus p o d e ju l­
g a r d a su a b o a fé em ro m p e r,c o m a Ig reja d a q u al
era um sa cerd o te o rd en ad o , e em c a lc a r ao s pés os
seus votos m o n á stico s; m elh or faria m os h um an o s su s­
p en d en d o o seu ju ízo . Além disto, só D eus sab e a ex ­
ten sã o d a influência q u e tiveram so b re o seu p e n sa ­
m ento e sô b re a su a co n d u ta as cicatrizes p síq u ic as
e d eso rd en s em o cion ais o riu n d as d as su as p erió d icas
d ispo sições de m elancolia e de d esesp êro q ue o le­
v aram q u ase às p o rta s d a lou cu ra. Só D eus, q u e co­
nhece os seg red o s de ca d a coração , e stá no caso de
faz e r um ju ízo p erfeito, e nós podem o s d eix a r o fra ­
de de W itte n b e rg en treg u e à su a infinita m isericór­
dia e ilim itad o am or.
Em vez de sim p lesm ente co n d en arm o s Lu tero co ­
mo um g ro sseiro , v u lg ar e lux u rio so m onge ap ó sta ta ,
m ovido p o r iu t T d esejo de es c a p a r à d isciplin a d a vi­
d a m o n ástica, m elh or é, p a ra nós, lem brarm o -n os de
que, com o Frei M artin h o Lu tero, ele foi elevado ao
sacerd ó cio eterno d e Jesu s C risto e d everia te r um
lu g a r p a ra sem p re n as n o ssa s o rações. E ’ co n fo rtad o r
rec o rd ar q u e ele foi co n fes sar-se ao seu am igo B u -
g en h ag e n já pelo fim d a su a vida. “ H á m uito tem po
q ue eu d everia ter sid o estran g u lad o pelo dem ônio” ,
co n fe ssa ele, “ se n ão tivesse sid o su ste n ta d o p ela
co n fissão p a rtic u la r” . E ’ bom le m b rar que L utero usou
o h áb ito de m onge p o r um to tal de dezenove ano s d a
su a v ida, co n tin u an d o a faz ê -lo p o r três an o s ap ó s a
su a excom un h ão , e q u e êle n un ca se co n sid ero u re a l­
m ente fo ra do reb an h o d a Ig re ja C ató lica h istó rica.

Reunião — o nosso Alvo


O p ro b lem a q ue hoje em d ia in te re ssa a to d os nó s
é o do restab elecim en to d a u n id ad e cris tã . A tacan d o
com ra z ã o os ab u so s d a su a épo ca, mui prováv el é

35
q u e L utero n ão tivesse o p en sam en to de cind ir a u n i­
d a d e d a Ig reja , a d esp eito d as n ov as idéias que, m es­
mo en tão , se ag itav a m no seu céreb ro feb ril. Ê sses
ab u s o s há m uito q ue fo ram co rrig id o s. O refo rm ad o r
C oncilio d e T re n to e x tirp o u -o s pela raiz. “ Se Lu tero
v o ltasse h o je ” , d isse recen tem en te o h is to ria d o r ev an ­
gélico K arl A u g u st M eissing er, “ p a ra seu esp an to a c h a ­
ria u m a Ig re ja C ató lica q ue ele n u n ca teria a ta c a d o
no seu p resen te a s p e c t o .. . A cim a de tu d o êle v e r i a . . .
q ue n ão p e rsiste em existên cia nenhu m do s ab u so s
q u e fo ram o casiã o atu a l do seu ro m p im ento com
R o m a ” ."
Em co n ex ão com isto, bom é lem b rar que os a b u ­
so s n u n ca to c ara m n en h u m a d a s d o u trin a s d a fé. A
Ig re ja fu n d a d a p o r C risto ja m ais cessou d e en sin ar
o co rp o d e v e rd ad e s d iv inam ente rev elad a s e o có d i­
g o de m o ral cristã , m esm o se alg u n s d o s seus m em bros,
e m esm o alg u n s d o s seu s o ficiais, eram falh o s n a su a
m oral. C risto n u n ca p ro m eteu a nenh u m dos seu s
A p ó sto lo s ou d isc íp u lo s a im p ecab ilid ad e, p o is isso os
p riv a ria do seu livre arb ítrio . O fa to de um dos seus
p ró p rio s d oze esco lh ido s h av ê-lo tra íd o d everia co n s­
titu ir u m a c o n sta n te a d v ertê n cia de deverem os seu s
seg u id o res e s ta r sem p re p re p a ra d o s p a ra e s p e ra r a
fra g ilid a d e en tre os fra c o s m o rtais q u e C risto esco ­
lheu p a ra serem seu s m in istro s.
S e L utero p u d esse te r g u a rd a d o cla ra m en te de m e­
m ó ria /e sta crucial e im p o rta n tís sim a d istin çã o en tre
a Ig re ja e os seu s m em b ro s in d ig n o s, e te r lu tad o

s*) K a rl A dam , One and Holy, S h e ed a n d W a rd , N . Y. 1951,


p. 57. E ste e sp lê n d id o liv rin h o d o e ru d ito p ro fe s s o r d a U n i­
v e rs id a d e d e T ü b in g e n , e sc rito com c ris tã s im p a tia e am o r,
é u m a n o tá v e l c o n tr ib u iç ã o p a r a a c a u s a d a re u n iã o , e p o d e
s e r re c o m e n d a d o d e c o ra ç ã o ta n to a p r o te s ta n te s co m o a
ca tó lic o s.' E* u m a p e q u e n a o b ra -p rim a q u e in flu e n cio u c o n si-
d e rà v e lm e n te o n o ss o p ró p rio p e n sa m e n to , e e sp e ra m o s te r
re fle tid o a lg o d o seu e sp ír ito d e sim p a tia e de am o r.

36
co n tra os a b u so s d êstes últim o s com to do o zêlo d a
su a n a tu re z a im p etu o sa e ap aix o n ad a, p erm a n ecen d o
ele um sac erd o te hum ilde, p u ro e d ed icad o, h oje em
d ia êle se ria h o n rad o com o um g ra n d e herói e sa n to
d a Ig reja . M as, in fo rtu n ad a m e n te, êle p erm itiu q ue os
esp írito s b elicosos o levassem a a ta c a r n ão sô m en te
os ab u so s, m as tam bém a au to rid a d e d a S a n ta Sé —
colun a v erte b ral do o rg an ism o d a Ig reja . A ssim fa ­
zendo, êle com eteu aqu ilo a qu e S a n to A g ostinh o ch a­
m a o m aio r p ecad o q u e um cristão p o d e p e rp e tra r:
le v an tar a lta r co n tra a ltar, e ra s g a r em p e d a ç o s o C or­
po único de C risto . N isto resid e a tra g é d ia de Frei
M artinh o L utero e d a R eform a.
U m a vez qu e esta v erd ad e cen tral se ja p o r to d o s
p erc eb id a e ad m itid a, as p ersp ectiv as p a ra a reu n ião
to rn am -se im en su ràvelm en te m ais b rilh an te s. L u tero
to rn a -se e n tão um a p on te ligan d o as n o ssa s d iv er­
g ências, em vez de um ab ism o a nos dividir. O s no s­
sos irm ãos lu teran o s con serv aram m uitas d as v erd a­
des cen trais d a Fé h istó rica, com o, é certo, o fizeram
v irtu alm en te to do s os credo s p ro testa n tes. O p asso
se g u in te é rec u p e ra r to d a s aq u e la s q ue fo ram incon-
sid erad a m en te p erd id a s no g ra n d e cataclism o do sé­
culo dezesseis, e assim c u ra r as fe rid a s no C orpo
M ístico de C risto.

A Porta Aberta

A o r a ç ã o ’ de C risto p ela u n id ad e: “ Q u e êles sejam


um com o T u , P ai, em mim e eu em ti!” , deve a c h a r
ig u alm en te um lu g a r n as n o ssa s p reces. M elhor do
q ue d iscu ssã o é a o raçã o hum ilde. O cam inho p o d e
p arec er longo, m as a o raçã o p o d e en cu rtá-lo e a p re s­
sa r-n o s nêle. A o raçã o g e ra am or, e o nde e s tá o am o r
aí es tá tam b ém D eus. Se am arm o s to d o s os n o sso s

37
irm ã o s se p a ra d o s com o am o r de C risto, eles n ão ta r­
d a rã o a d e sc o b rir q ue nós n ão p ro cu ra m o s v itó ria p o ­
lêm ica, m as sim p lesm ente p a rtilh a r com eles o C ris­
to to tal, o to d o do seu C o rpo M ístico, a Ig reja.
O v ersícu lo d a s o raçõ es qu e sã o rec ita d as d u ra n te
a O ita v a d a U n id a d e d a Ig reja , de 18 a 25 de ja n eiro ,
deve eco ar n a s n o ssa s o raçõ e s o ano inteiro. Como
se ria ad m irável se a o raçã o ex p res sa em p ró d a reu -
iiião p o r KarI A d am no seu livrinho Una e Santa p u ­
d esse to rn a r-s e o g rito de to d a a c ris ta n d a d e : “ Le-
v an tai-v o s, ó S en h o r, ilum inai a s n o ssa s m en tes e in­
flam ai os n o sso s coraçõ es, p a ra q ue to d o s os o b stá ­
culos d este m un do p o ssa m cair, p a ra q u e p o ssam o s
a b rir os n o sso s co raç õ es u n s ao s o u tro s e ir ao en ­
co n tro u n s d o s o u tro s. H á um só lu g a r o n de nos p o s­
sam o s a c h a r u n s ao s o u tro s: o C o ração de Jesu s. O
cam in ho p a ra a u n id a d e n ão é de P ed ro p a r a C risto , m as
de Cristo para Pedro, n ão de fo ra p a ra d en tro , m as
de d en tro p a r a fo ra ” .*’
D u ra n te a im p ressio n a n te cerim ô n ia d a a b e rtu ra d a
P ô rta S a n ta em R om a, no A no S a n to , o S a n to P a d re p r o ­
feriu u m a com o ven te e in q u ieta n te sú p lica p a r a q ue
to d o s os seg u id o res de C risto voltem ao h istó rico cen ­
tro d a u n id a d e c ristã , a sse g u ra n d o a to d o s o cálido
e co rd ial aco lh im en to do M agn o P a s to r d a C ris ta n ­
d ad e. N ã o h á raz ã o , assin a lo u S u a S an tid ad e, p a ra
p e rp e tu a r v elh as b re c h a s: ch eg a d o é o tem p o, p a ra
to d o s n ós, d e re aliz arm o s aq u ela u n id a d e de fé e de
culto tã o c a ra ao co raç ão de C risto n o sso R ed en to r.
Foi n o e sp írito d ê sse ap elo co m o v ed o r q u e este e s ­
tu d o foi escrito .
O testem u n h o d e lu te ra n o s q u e tra n sp u se ra m o a b is­
mo q u e n os s e p a ra m o stra q ue o seu p eq u en o s a c ri-

■•) P . 105.

38
fício tro u x e u m a g ran d e co m p en sação em p a z e am o r
e felicidade. T íp ico do testem u nh o de m ilh ares q u e
v o ltaram ao reb an h o é o de G ertru d von Z ezsch w itz,
es crito ra cu ja sin cerid ad e p ro fu n d a é a p re c ia d a p o r
to do s os lu terano s. No seu leito de m orte, em ja n eiro
de 1946, ela escrev eu:
“A Ig reja C ató lica vale q u alq u er sacrifício . Em v in te
e sete anos ela me tem in d enizad o de to d o s e c ad a
um deles, e até o meu últim o alen to c o n tin u a rá a fo r-
talecer-m e e con solar-m e. Só quem p erte n ce à Ig re ja
C atólica e p ro g red iu d ireito nela é q ue p o d e a v a liá-
la com a c ê r t o .. . Com to d a a su a h u m an id ad e, ela
n ão d esm en te a su a origem divina, e assim tem p o ­
dido su p e ra r os seus p erío d o s de declínio e p ro sse ­
g u ir dêles ren o v ad a” . A este testem u nh o F ràu lein
Z ezsch w itz jun to u a seg u in te p rece lu te ra n a de g r a ­
ça s: “A ssim eu fico sem p re con tigo , m eu D eus. P o r­
q ue tu me se g u ras com a tu a m ão d ireita. G u ias-m e
com o teu c o n s e lh o .. . Se eu n ão tiver sen ão a ti, n a ­
d a p ro cu rarei no céu ou n a te rra ” .
C o m en tan d o êsse belo m isto de devoção e o ração ,
K arl A dam o b se rv a que “ a p ie d ad e b íb lica lu te ran a
e a fé n a Ig re ja C atólica e stã o m uito in tim am ente uni­
d as n esse testam e n to de m orte. N a V erd ad e, êlas são
u m a só. Aqui vem os u m a no v a m o d alid a d e em que a
u n id a d e se ex prim e p o r si m e sm a” .49 E n tre o s m uitos
b isp o s q u e n a A lem an h a tra b a lh a m e rezam p ela reu ­
n ião está o B ispo B u ch b erg e r, de R eg en sb erg , o q u al
diz com co n fia n ça : “ U m dia serem o s ouvidos, um d ia
h av erá n ov am en te um só reb an h o e um só p a s to r” .
Ê ste esp írito de es p era n ça , de fé e de otim ism o d e­
v eria ser igu alm en te o nosso .

4#) Ibidem , p. 128.

39
Um só Senhor, uma só Fé
0 m ais an tig o d ocum en to litú rgico c ristã o q ue che­
g o u a té n ó s é o Didaché, no q ual o fiel, p e n s an d o no
P ã o celestial p re p a ra d o sô b re o alta r, p ro fe re a se­
g u in te o ra ç ã o : “A ssim com o este p ão foi e sp a lh a d o
sô b re a s m o n ta n h as e a g o ra foi reunido , assim ta m ­
bém p o ssa a tu a Ig re ja se r reu n id a do s con fin s d a te r­
ra p a ra d e n tro do teu reino. P o is tu a é a g ló ria e teu
é o p o d er, a tra v é s de Jes u s C risto, p o r todo o sem p re” .
E s ta o raç ã o d o s p rim eiro s cristão s, com o K arl A dam
a ssin ala, d ev eria se r a o raç ã o de to d o s o s cris tã o s ho ­
je em d ia. Já q u e C risto p ro m eteu q ue tu d o q u a n to
p ed íssem o s ao P a i em nòm e do S a lv a d o r n o s se ria
con cedido, n ão p o d em o s d u v id a r de q ue D eus e s c u ta rá
êste g rito sa íd o d os láb io s de to d o s o s cris tã o s a tr a ­
vés d e u m a c ris ta n d a d e trà g ic a m e n te d iv id id a.
A to d o s o s c ris tã o s a com oven te ex o rta ç ã o de S.
P a u lo ch eg a h o je com p ec u liar sig n ificad o e n o v a u r­
g ên cia. D iz o A p ó sto lo : “ R o g o -v o s, p ois, eu p ris io ­
n eiro no S en h o r, q u e an d eis de m o do d ig n ò d a v o ca­
ção a q u e fô ste s ch am ad o s, com tô d a h u m ild ad e e
m a n sid ão , com p aciên c ia, su p o rta n d o -v o s u n s ao s o u ­
tro s em ca rid a d e . S o líc ito s em g u a rd a r a u n id a d e do
E sp írito no v ín culo d a p az . U m só co rp o e um só
e sp írito , ta l co m o fô ste s ch am ad o s n u m a só e s p e ra n ­
ça d a v o ssa v o caç ão . U m só S e n h o r, u m a só fé, um
só b atism o . U m só D eu s e P a i d e to d o s, q u e e s tá aci­
m a d e to d o s, e a g e em tô d a s a s co isas e res id e em to ­
d o s n ó s ” ( E f 4 , 1 -7 ).
Q u eira D eu s p o ssa m o s to d o s o b ed ec er à in ju n ção
d e S. P au lo , d e m o do q u e em b rev e h a ja um só re b a ­
n h o e u m só p a s to r, um só S e n h o r, u m a só fé, um só
b atism o , um só D eu s e P a i d e to d o s n ós!
Aqui finda a leitura dêste livrinho.
Que êle viva, pois!

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