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O pensamento do antropólogo Darcy Ribeiro em sua obra “O Povo

Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil”, servirá de base para adentrarmos


ao campo da construção étnica brasileira e as diferenças entre os povos
originários.

Na visão do autor, a combinação cultural e até mesmo biológica se inicia


com a chegada dos primeiros portugueses ao continente americano. No Brasil,
essa fusão permeia todo o período colonial e a miscigenação era vista como
favorável tanto por parte dos europeus, quanto no lado dos ameríndios.

Considerava-se que os portugueses recém-chegados apresentavam um


perfil atrevido e um ímpeto de recriar um novo mundo através da mescla racial.
Pensamento esse, que se assemelha ao do autor Gilberto Freyre (1900-1987)
que evidenciava a propensão dos povos ibéricos em promover a mistura racial
com outros povos. A diferença está no fato de que Darcy Ribeiro pontua que
em situações com ausência de mulheres brancas, o europeu não evitava o
intercurso sexual inter-racial, ao contrário, em todo o lugar onde os povos de
diferentes raças entravam em contato era gerada uma camada mestiça, seja
ela em maior ou menor proporção.

Dentro da instituição indígena existia a prática do cunhadismo, que


fornecia uma moça índia como esposa e propiciava a ligação do indivíduo
estrangeiro com os membros do grupo. Assim, a mestiçagem ganha impulso e
faz surgir uma numerosa civilização nas regiões onde Europeus se situavam. É
importante destacar que o primeiro e principal centro de desenvolvimento
desse conceito foi na região de São Paulo, onde índios foram capturados para
servirem como mão de obra escravo. Com a formação dos mamelucos, tem-se
a criação de uma forte peça na construção étnica brasileira.

Com facilidade identificamos a predileção do autor na escolha do índio


como fonte potencializadora da composição étnica brasileira. Contudo, o negro
também é destacado como agente de formação, porém, de menor importância.

Apesar do seu papel como agente cultural ter sido mais passivo que
ativo, o negro teve uma importância crucial, tanto por sua presença
como massa trabalhadora que produziu quase tudo que aqui se fez,
como por sua introdução sorrateira, mas tenaz e continuada, que
remarcou o amálgama racial e cultural brasileiro com suas cores mais
fortes (RIBEIRO, 2006).

A condição de menor impacto dos povos africanos na cultura brasileira é


defendida pelo autor através dos argumentos de que apesar da diversidade
linguística e cultural trazida da África, a hostilidade e a não concentração de
povos oriundos de mesma etnia dentro da mesma propriedade, foram
condições que desfavoreceram a criação de núcleos solidários capazes de
reter o patrimônio cultural africano. Entende-se que a cultura negra
instaurada está presente principalmente nas vertentes ideológicas, através
das crenças religiosas e heranças rítmicas e musicais, além da culinária.

O autor então, faz um breve e memorável resumo acerca da


contribuição de cada um desses povos na construção da cultura brasileira:

O indígena contribuiu, principalmente, na qualidade de matriz genética e


de agente cultural que transmite sua experiência milenar de adaptação
ecológica às terras recém-conquistadas. O negro, também como matriz
genética, mas principalmente na qualidade de força de trabalho
geradora da maior parte dos bens produzidos e da riqueza que se
acumulou e se exportou e, ainda, como agente da europeização, que
assegurou às áreas onde predominava uma completa hegemonia
linguística e cultural europeia. O branco teve papel de promotor da
façanha colonizadora, de reprodutor capaz de multiplicar-se
prodigiosamente, de implantador das instituições ordenadoras da vida
social; e, sobretudo, de agente da expansão cultural que criou nas
Américas vastíssimas réplicas de suas pátrias de origem, linguística e
culturalmente muito mais homogêneas que elas próprias (RIBEIRO,
2006).

Dessa forma, Darcy Ribeiro destaca claramente o surgimento de um povo


novo que parte do entrelaçamento de três matrizes raciais adversas, com maior
grau de participação do mameluco, mestiço de índio com branco. A
contribuição do negro também é vista como imprescindível, mesmo que
desraizado de seu passado africano e agente da europeização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
SOUZA, Jessé. Gilberto Freyre e a singularidade cultural brasileira. Tempo
Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 12(1): 69-100, maio de 2000.
RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 2006.

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