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ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOS DE CABINE - Aula 8

UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
INSTITUTO DO AR
CURSO DE CIÊNCIAS AERONÁUTICAS
DISCIPLINA: ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOS DE CABINE
PROFESSORA: SELMA LEAL DE OLIVEIRA RIBEIRO

ESTRESSE NA ATIVIDADE AÉREA1

Estresse, segundo Hans Selye (1984), é definido como “uma reação não específica do organismo a qualquer
exigência que lhe seja feita (a seu equilíbrio interno)”. A intensidade dessa reação dependerá da percepção do indivíduo
sobre a gravidade da situação. A principal tarefa do homem é tentar buscar níveis aceitáveis de pressão e estresse que
contribuam para o seu desempenho e suas realizações e que não ameacem a seu bem-estar físico e emocional.
Albrecht (1988) coloca que “estresse” pode ser considerado como um conjunto específico de condições
bioquímicas do corpo da pessoa que surge na tentativa de fazer o ajuste à situação, desta forma, o estresse constitui-se
em uma função fisiológica normal do corpo humano, que, embora possa ser causado por estressantes físicos (ferimentos
ou bactérias), na maioria das vezes tem sua origem na ansiedade. Difere do termo “pressão”, pois este refere-se às
características de uma situação que podem ser problemáticas para o indivíduo e que eqüivalem às exigências de uma
espécie de adaptação.
Para Gaillard (1993)), o estresse pode ser considerado como “um estado no qual o sistema psicológico está
desorganizado, o que resulta em uma redução do bem estar, problemas de sono, queixas psicossomáticas e aumento dos
riscos à saúde”.
Muitos autores relacionam a reação de estresse à ansiedade, alguns chegando até a utilizar os dois termos como
sinônimos. Desta forma, ansiedade pode ser um estado de desorganização do organismo (Bleger, 1984), reação emocional
que provoca uma sensação desagradável que surge quando o indivíduo não consegue adaptar-se a uma nova situação
(Wolff, 1973).
Albrecht (1988), quando classifica o estresse de origem emocional, define os seus diferentes tipos como sendo
uma reação ou sensação de ansiedade que o indivíduo vivência diante de situações reais ou futuras que julga como
desagradáveis, ou seja, a origem deste tipo de estresse está nos próprios processos de pensamento de uma pessoa, sem
qualquer estressante físico em contato com o corpo.
Gaillard (1993), em seu trabalho onde compara os conceitos de carga mental e estresse relacionado ao trabalho,
revela a larga variedade de significados que o conceito de estresse apresenta, ou seja, ele pode ser considerado como: (a)
um estímulo variável atribuído às exigências do ambiente no qual a distinção é feita entre o estressor (barulho, perda do
sono, drogas, etc)) e as fatores relacionados ao trabalho, tais como o ritmo e pressões do trabalho; (b) uma resposta que se
refere às reações comportamentais (subjetivas) e fisiológicas que são produzidas sob tensão; (c) um estado no qual nos
sentimos tensos e ameaçados com base na avaliação subjetiva de situações; (d) estresse refere-se também a um processo:
um dia de trabalho pesado pode não ocasionai reações de estresse, sintomas de estresse desenvolvem-se vagarosamente
ao longo de semanas, este processo é freqüentemente difícil de ser interrompido, mesmo quando o fator que o iniciou é
excluído.
Como sendo um estímulo ele pode ser classificado pelo tipo de agente que atinge o organismo, ou seja físico, que
seria proveniente de uma perturbação direta no corpo provocado pelo ambiente imediato, ou emocional, causado pelos
próprios processos de pensamento de uma pessoa (Albrecht, 1988).

1Referência: RIBEIRO, S.L.O et. al. Relatório do projeto de levantamento do estresse laborativo dos aeronautas da aviação brasileira –
segmento comandantes. NUICAF: Rio de Janeiro, 1994 (Relatório Final de Projeto).
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No que se refere ao significado que o define como uma resposta, o estresse é identificado pelo tipo de efeito que
ele ocasiona. Sendo assim ele pode apresentar efeitos fisiológicos, na saúde, comportamentais, cognitivos e subjetivos
(Green et al., 1991).
Ao ser apresentado como um estado ele se confunde com a definição de ansiedade que caracteriza-se pela
“sensação de desorganização interna provocada pela dificuldade de adaptação”, que por sua vez quando não é muito
intensa e não ultrapassa determinado limiar, constitui-se em um elemento altamente positivo enquanto serve como sinal de
alarme, como sinal de previsão ou antecipação, que mobiliza e prepara o organismo para um perigo próximo ou futuro
(Wolff, 1973).
Finalmente, ao ser tratado como um processo, pode-se dizer que o estresse não é algo que deva ser
visto de forma isolada, mas sim de maneira sistêmica, pois irá envolver o indivíduo em sua totalidade, levando em
consideração não só o tipo de agente que o atinge e a forma como vai se manifestar mas também, e
principalmente, a percepção subjetiva que este mesmo indivíduo tem sobre os estímulos que o estão atingindo,
que obviamente irá envolver aspectos tais como experiência anterior em lidar como situações semelhantes e a
aprendizagem e desenvolvimento de estratégias adequadas para superar o estresse (Albrecht, 1988; Wolff,
1973).
Com relação à atividade funcional, o estresse pode estar ligado tanto às situações diretamente vinculadas à função
quanto às diversas relações estabelecidas com o ambiente. No caso do piloto, por exemplo, o posto de pilotagem conta não
só com suas tarefas mas, também, com vivências que envolvem relacionamentos variados (colegas, passageiros, direção
etc), estressores ambientais (temperatura, umidade, vibração, fusos, alimentação, etc) e também as experiências voltadas
para os aspectos domésticos e de saúde. As características próprias de cada pessoa e as diferentes aprendizagens pelas
quais passou determinarão o grau de resistência e a forma pela qual o desgaste irá se manifestar.

Referências Bibliográficas:
ALBRECHT, K. O gerente e o estresse. Rio de Janeiro. Jorge Zahar, 1988. P.291.
BLEGER, José. Psicologia da Conduta. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984.
GAILLARD, A.W.K. Comparing the concepts of mental load and stress. Ergonomics, Hants, v.36, n. 9, p.991-1005, 1993.
GREEN, Roger.G., MUIR, Helen, JAMES, Melanie, et al. Human factors for pilots. Hants, Avebury Techinical, 1991.
SELYE, Hans. The stress of life. New York, Mc Graw Hill, 1984.
WOLFF, W. Fundamentos de Psicologia. São Paulo: Mestre Jou, 1973.
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A FADIGA NA ATIVIDADE AÉREA


FATORES PSICOLÓGICOS E A SUA RELAÇÃO COM A FADIGA NA ATIVIDADE AÉREA2

Psic. Selma L. O. Ribeiro

INTRODUÇÃO
No dia 18 de agosto de 1993, por volta das 17:00 h local, um DC-8 cargueiro caiu próximo à base
naval americana de Guantanamo Bay, em Cuba. A investigação, conduzida pelo National
Transportation Safety Board (NTSB), e, posteriormente, complementada com recomendações da
NASA Ames Research Center, pela primeira vez, citou a fadiga como causa provável do acidente.

Analisando os fatores presumíveis para o desastre, o grupo do Programa de Contramedidas de Fadiga da NASA
identificou e examinou quatro deles: 1) déficit agudo de falta de sono ou sono cumulativo; 2) horas contínuas sem dormir; 3)
hora do dia / efeitos circadianos; e 4) presença de desordens de sono.
Tais fatores, embora de caráter eminentemente fisiológico, acarretaram conseqüências de ordem cognitiva,
psíquica e psicomotora sobre a atuação dos tripulantes. O NTSB inferiu que a provável causa desse acidente incluiu a
deterioração das capacidades de julgamento e de tomada de decisão, e das habilidades de vôo, do comandante e dos
tripulantes, devido aos efeitos da fadiga (ROSEKIND et al., 1997).
ASPECTOS PSICOLÓGICOS NA ATIVIDADE AÉREA E FADIGA
Para que possamos realizar adequadamente determinada atividade, um nível ótimo de estado de alerta torna-se
necessário. Se menor do que o requerido, o comportamento poderá não atender aos objetivos da tarefa; se excessivo,
resultar na desintegração de competências e na degradação do desempenho (EDWARDS, 1991).
Os estímulos externos que promovem esse estado de alerta afetam, de modo diferente, as pessoas, ficando difícil
estabelecer-se esse nível ótimo. Além disso, elas possuem limites variados de resistência aos agentes estressores que
atuam sobre seus comportamentos.
Há, ainda, a quantidade de carga de trabalho empregada em uma determinada atividade que, funcionando como
fator subjetivo, revela-se variável de profunda importância para o bom andamento de uma tarefa.
GAILLARD (1993) define carga de trabalho como “a inter-relação entre as exigências da tarefa e do ambiente
funcional e a capacidade do operador para enfrentá-las”. Sob esse ponto de vista, a carga de trabalho total resultaria da
combinação das pressões física, cognitiva e psíquica.
A atividade aérea, em si, possui uma preponderância cognitiva, que, por sua vez, se evidencia como a mais
afetada quando ocorre um excesso de situações estressoras por um período muito longo de tempo, podendo desencadear
um estado elevado de fadiga crônica, que se acentua, em geral, no fim das jornadas. Estudos apontam que os sintomas a
ela relacionados pioram com o decorrer do vôo. O decréscimo da capacidade de manter a atenção, a diminuição do tempo
de reação e as falhas de memória constituem alguns dos citados pelos aeronautas. (RIBEIRO et al., 1997).
A Fig. 1 aponta para a relação entre as exigências da tarefa e as capacidades do piloto em um vôo (JENSEN,
1995; EDWARDS, 1990). Nela nota-se que a margem de segurança se estreita à medida que a fase de pouso se aproxima.

2
RIBEIRO, S.L.O. Fatores psicológicos e a sua relação com a fadiga na atividade aérea. In: PEREIRA, M. C. e
RIBEIRO, S. L. O. Os vôos da Psicologia no Brasil: estudos e práticas na aviação. Rio de Janeiro:
NUICAF, DAC, 2001.
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12

CAPACIDADES DO PILOTO
10

6 MARGEM DE SEGURANÇA

2
EXIGÊNCIAS DA
0
P R É- V ÔO T A XI D EC O LA GE M C R UZ EIR O A P R O X ./ P O US O T A XI

Fig. 1: Relação entre as exigências da tarefa e as capacidades do piloto em um vôo.


Por isso, observa-se que 62% dos acidentes aéreos acontecem nesse período ou, no caso de etapas sucessivas,
na decolagem, já que as habilidades se restringem gradativamente (Fig. 2). As falhas humanas passíveis de ocorrência,
nesses instantes, resultariam da associação de uma alta carga de trabalho com o estresse cumulativo do dia.

Fig. 2: Distribuição percentual de acidentes por fase de vôo


(Fontes: Flight Safety Foundation e Boeing Commercial Airplane Group)

Nas investigações sobre acidentes com aeronaves da aviação civil, constata-se que o item "deficiente julgamento"
(Fig. 3) surge em mais de 65% deles, ressaltando a importância desse aspecto, entre outros, para a segurança da atividade
aérea (BRASIL, 2000).
Essa elevada incidência deve-se à diminuição das capacidades de julgamento e de tomada de decisão tendo em
vista que o sistema humano de processamento das informações que vêm do ambiente se submete a vários filtros, os quais,
por sua vez, se limitam na proporção em que o corpo se mostra mais fatigado.
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INDISCIPLINA DE VÔO
8
DEFICIENTE
15 MANUTENÇÃO
20 CONDIÇÕES
METEOROLÓGICAS
25
DEFICIENTE INSTRUÇÃO
40
45 DEFICIENTE SUPERVISÃO

68 POUCA EXPERIÊNCIA

DEFICIENTE JULGAMENTO
0 20 40 60 80

Fig. 3: Distribuição percentual dos principais aspectos operacionais envolvidos nos acidentes com a aviação
geral (Fonte: www. dac.gov.br)

A Fig. 4, apresentada por JENSEN (1995), ilustra uma visão genérica de tal sistema, no qual verifica-se como a
informação se processa e algumas razões do porquê as pessoas tendem a cometer erros.

Fig. 4: Visão geral, esquemática, do sistema humano de processamento da informação.


O ser humano capta as informações do ambiente a uma velocidade muito grande, por intermédio dos órgãos dos
sentidos (pele, olhos, ouvidos, nariz, etc.), ou elas advêm de estímulos emitidos pelo próprio corpo.
Considerando-se que o cérebro não tem condição de processar os estímulos na mesma rapidez em que são
detectados, mecanismos, chamados de filtros, desenvolvem-se, com o objetivo de reduzir sua quantidade a um número
possível de ser gerenciado.
O primeiro deles surge ao nível dos órgãos dos sentidos. Isso explica, por exemplo, o fenômeno denominado de
“estreitamento da atenção” ou “visão de túnel”: tende-se a focalizar a atenção para os estímulos percebidos como exigência
primária na situação vivenciada.
Tal momento, portanto, pode estabelecer-se como a primeira fonte de erro no processo, visto que as informações
de origem diversas, e talvez importantes para a solução de um problema, porém situadas em pontos periféricos, se perdem.
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A segunda localiza-se no sistema perceptivo, quando este procura recuperar o dado perdido, através da memória
funcional, ou de curta duração, pegando a informação (incompleta) e tentando preenchê-la com as que ele acha que
deveriam estar lá, promovendo distorções na captada anteriormente.
A terceira ocorre no canal de decisão, muito limitado, pois realiza duas tarefas: escolher a informação prioritária e o
modo de trabalhá-la. Trata-se de um estágio predominantemente cognitivo e envolve a combinação de dados recém-
processados com outros retidos na memória de longo prazo.
Identifica-se o estágio final como o de resposta. Nele também existe um certo potencial para a ocorrência de erro.
Entretanto, quando se assimilam, automatizam ou condicionam determinadas atividades, as respostas podem acontecer
sem que se utilizem todos os filtros e processos de decisão: elas seguem padrões aprendidos (hábitos), podendo ser muito
precisas. Isso se constitui como o objetivo do treinamento.
MINIMIZANDO OS EFEITOS DA FADIGA

Como foi visto, são muitos os estímulos advindos do ambiente, quer sejam eles provenientes das condições
físicas, das situações do dia-a-dia pessoal ou funcional, ou inerentes ao próprio indivíduo, devido às suas características de
personalidade, de suas motivações ou de seus pensamentos.
Eliminar todos estes estímulos da vida é impossível. Porém, alguns deles podem ser gerenciados para que não se
tornem agentes provocadores de estresse e, conseqüentemente, levem à fadiga.
Para que o piloto e demais integrantes da tripulação possam ter condições adequadas para fazer frente às
exigências da atividade aérea, alguns aspectos tornam-se imprescindíveis.
É bem certo que todos aqueles que escolheram se envolver com uma atividade tão complexa quanto o vôo
buscam nela a satisfação de uma série de necessidades. Tais necessidades podem variar desde as mais básicas até as
mais elevadas.
As primeiras, as necessidades básicas, referem-se a aspectos relativos à manutenção da própria pessoa e
daqueles que estão mais próximos como: alimentar-se, ter uma habitação que possa abrigar a si e a sua família, dar
qualidade de vida aos seus entes queridos etc.
As outras, que surgem como conseqüência da satisfação destas primárias, são, por ex: pertencer a um grupo
diferenciado dentro da sociedade e, conseqüentemente, ser respeitado pelo seu papel social, buscar o crescimento
profissional através de aprendizados cada vez mais complexos, ser aceito e respeitado entre seus pares, superiores e
subordinados, entre outras.
Com relação à necessidade de segurança, que, segundo Maslow, é a que se segue às necessidades básicas,
pode-se dizer que seus limites ultrapassam a questão de se manter um emprego, podendo assim prover o sustento de si
próprio e de sua família. A segurança tem um enfoque mais amplo. Ela refere-se também à questão de se sentir seguro no
próprio desempenho da atividade profissional que foi escolhida.
A fadiga, tanto de caráter fisiológico quanto psicológico, é negativa para as habilidades do vôo e contribui
significativamente para um estado interno de insegurança. Ela dificulta todo o processo de fluidez normal das informações
que vêm do ambiente e que são extremamente necessárias para a precisa tomada de decisão.
Além dos cuidados fisiológicos necessários para que se esteja em estado de alerta ótimo, aspectos da vida
psíquica também são de extrema importância e irão formar os pilares para que um desempenho adequado aos objetivos da
tarefa seja obtido.
Tais aspectos referem-se às condições mínimas presentes no ambiente de trabalho e que terão influência direta
sobre o desempenho geral.
O treinamento contínuo é uma das formas de se manter a proficiência técnica e as habilidades de vôo em dia,
promovendo, assim, um estado interno de segurança, que se refletirá na percepção correta, análise adequada e
comportamentos precisos no desempenho das suas atividades.
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A constância do vôo, obtida encurtando-se os períodos de interrupção da atividade aérea, oferece a quantidade de
horas necessárias para a manutenção da operacionalidade e, também, promove o refinamento qualitativo das habilidades
psicomotoras e cognitivas exigidas.
A manutenção dos períodos destinados ao descanso e ao lazer faz parte da saúde psíquica no trabalho, pois estes
se mostram responsáveis pela reposição energética necessária para que o estado de fadiga não se instale.
Além de incrementar as habilidades técnicas, as oportunidades de vôo favorecem o estabelecimento e a
manutenção de relacionamentos interpessoais mais estreitos e funcionalmente mais produtivos, tendo em vista que o
perfeito entrosamento da equipe de vôo entre si e, ainda, com todos aqueles que, direta ou indiretamente, estão ligados à
atividade aérea, como os mecânicos e os controladores de tráfego aéreo, por ex., é uma condição necessária para o êxito
da missão e o alcance do objetivo.
O piloto em sua formação básica é treinado e incentivado, em geral, a tomar decisões sozinho, tendo como
parâmetros os ensinamentos que recebeu e os dados do momento que, em muitas das vezes, tornam-se incompletos pelas
próprias restrições do seu canal de captação das informações, restrições estas que podem ser agravadas pelas pressões
fisiológicas e psicológicas pelas quais ele estiver passando.
O aproveitamento de todos os recursos disponíveis, dentro e fora da cabine, faz com que as informações
importantes para o processo decisório, que por alguma limitação circunstancial, foram perdidas ou ficaram retidas em um
dos filtros do sistema humano de processamento da informação, possam ser recuperadas a tempo para serem utilizadas.
Uma forma de aperfeiçoar também sua capacidade para tomar decisões em conjunto, utilizando as informações
dos demais integrantes da tripulação, é através do uso das ferramentas oferecidas pelo treinamento em Gerenciamento de
Recursos da Cabine (em inglês: Cockpit Resourse Management - C.R.M.).
Este treinamento busca exercitar habilidades de liderança, análise de informações, julgamento e tomada de
decisão, com ênfase acentuada na comunicação interpessoal.
A utilização eficaz dos instrumentos oferecidos pelo C.R.M. promove um incremento da consciência situacional
(Situational Awareness), individual e da equipe, favorecendo, sobremaneira, a tomada de decisão.
No nível pessoal, é importante, também, que cada tripulante desenvolva mecanismos de identificação das
situações do dia-a-dia profissional que possam ser geradoras de estresse, bem como as reações de seu organismo a tais
situações. Compreendendo esta relação, ele poderá antecipar-se em alguns casos e procurar saídas positivas para o alívio
do estresse e evitar que a fadiga se instale.
CONCLUSÃO

O estresse e a fadiga configuram-se como fatores contribuintes preponderantes para a ocorrência de acidentes.
Quando presentes, as capacidades de julgamento e de tomada de decisão mostram-se muito afetadas, já que o sistema de
captação e de processamento das informações se encontra debilitado.
Para que o processo de fadiga não se desenvolva, cuidados nos níveis individual e organizacional são
extremamente importantes. Cada tripulante tem o dever de zelar pelo seu estado pessoal de bem estar físico e mental,
assim como cabe à organização oferecer os meios para que cada um possa mantê-lo. Desta forma, cada uma das partes
poderá compartilhar, de modo saudável, a responsabilidade pela segurança de vôo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Comando da Aeronáutica. Departamento de Aviação Civil. Estatísticas de acidentes aeronáuticos: fatores
contribuintes nos acidentes aeronáuticos. Rio de Janeiro: [2000] http://www.dac.gov.br/servicos/estat3.htm
EDWARDS, D.C. Pilot: mental and physical performance. Ames: Iowa State University Press, 1990.
EDWARDS, M. Dealing with stress in aircraft cabin. Cabin Crew Safety, Arlington, v.26, n. 4, Jul./Aug., 1991.
GAILLARD, A. W. K. Comparing the concepts of mental load and stress. Ergonomics, Hants, v. 36, n. 9, p.991-1005, 1993,
JENSEN, R. S. Pilot judgement and crew resource management. Aldershot, Hants: Avebury Aviation, 1995
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RIBEIRO, S. L. O. et al. Analysis of mental stress in captains of Brazilian Civil Aviation. In: International Symposium on
Aviation Psychology, 9, Columbus, 1997. Proceedings... v.1, p. 824-829.
ROSEKIND, M.R. et al. Crew factors in the Guantanamo Bay aviation accident. 1997.
http://olias.arc.nasa.gov/publications/rosekind/GB/GB.Abstract.html

GERENCIAMENTO DA CARGA DE TRABALHO, DO ESTRESSE E DA FADIGA3

INTRODUÇÃO
Geralmente as pessoas associam o estresse a aspectos negativos, mas o estresse em si não é bom ou ruim, é um
fenômeno necessário à sobrevivência humana. Eliminar completamente o estresse de nossas vidas é impossível e
fisiologicamente eqüivaleria à morte. O importante é que as pessoas desenvolvam suas habilidades para administrar melhor
os estressores do cotidiano, de modo que o estresse não seja um empecilho ao desempenho pessoal, saúde e bem estar.
Administrar o estresse significa melhorar física e mentalmente nossa resistência ao estresse, bem como eliminar o estresse
desnecessário de nossas vidas. Conhecer o estresse, suas causas, sinais e sintomas é de fundamental importância para
aprendermos a lidar com ele.
ESTRESSORES NO TRABALHO
Tanto a falta com o excesso de estímulos no ambiente de trabalho podem resultar em estresse. Para a maioria das
pessoas existe um nível ótimo de estresse no qual se obtêm uma maior produtividade e qualidade em termos de
desempenho. Níveis menores podem causar monotonia e níveis maiores podem causar fadiga, sendo que em ambos os
casos ocorrem a queda de rendimento.
Como afirmam França e Rodrigues (199): “Na situação particular, do estresse relacionado ao trabalho, ele é
definido como as situações em que a pessoa percebe seu ambiente de trabalho como ameaçador a suas
necessidades de realização pessoal e profissional e/ou à saúde física ou mental, prejudicando a interação desta com o
trabalho e com o ambiente de trabalho, a medida que esse ambiente contém demandas excessivas a ela, ou que ela não
contém recursos adequados para enfrentar tais situações”.
Os estressores no ambiente de trabalho são diversificados. A seguir apresentamos uma classificação que não
pretende esgotá-los, mas que abrange os mais relevantes.
1 Em vôo

Durante a realização de um vôo, a tripulação está exposta a uma série de agentes estressores, os quais podem ser
subdivididos em:
a) Próprios do Vôo

Estímulos específicos do ambiente interno e externo, os quais podem provocar alterações no organismo, tais
como: acelerações, vibrações, ruídos, mudanças climáticas (temperatura, humildade, luminosidade), fusos horários.
b) Eventuais

Referem-se a aspectos que podem estar presentes durante a realização de uma missão, e que podem ser
percebidos como ameaças, tento em vista o aumento do potencial de risco ou de ansiedade que acarretam: ocorrência de
emergências, vôo a baixa altura, vôo noturno, rota desconhecida, condições meteorológicas adversas, deficiências de apoio
(controle de tráfego aéreo, solo, aeródromo), problemas de relacionamento (entre os tripulantes, com controlador ou
passageiros).

3IPA. COMAER. Gerenciamento do Estresse. Aula do Programa de Prevenção de Acidentes do COMAER, Rio
de Janeiro: autor, 2001.
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2 Condições de Trabalho

Neste item englobamos aspectos relacionados ao ambiente físico em que as tarefas são executadas (dimensões,
arranjo dos equipamentos e utensílios, ventilação, ruído, iluminação, etc.); à adequação, estado de conservação e
quantidade de equipamentos e ferramentas; à qualidade de recursos de apoio (manuais, publicações, etc), bem como
ao potencial de risco para a segurança de pessoas, equipamentos, instalações e meio-ambiente.
3 Organização do trabalho
Este tópico refere-se à forma como as atividades são desenvolvidas, destacando-se: a sobrecarga de trabalho,
decorrente do acúmulo de cargos ou funções, do volume de trabalho em relação aos prazos ou de falta de pessoal; sub-
carga decorrente da escassez de solicitações e estímulos, resultando em tédio e monotonia; tarefas repetitivas e
desinteressantes, destituídas de significado ou gratificação; trabalho em turnos, acarretando em alterações nos períodos
de sono e dificuldade em participar de atividades familiares e sociais.
4 Responsabilidade

Atividades que envolvem a responsabilidade pela vida de pessoas, integridade de equipamentos e instalações,
bem como do meio ambiente, geram um nível maior de ansiedade nos indivíduos, devido às conseqüências que podem
advir de erros cometidos.
5 Complexidade de tarefa x preparo para executá-la

Indivíduos que devem executar tarefas para as quais não possuem as habilidades e os conhecimentos necessários
têm seu nível de ansiedade aumentado. Por outro lado, podem se sentir desestimulados quando possuem uma qualificação
superior àquelas exigida pela tarefa.
6 Sociais

Neste item agrupamos os aspectos de relacionamento no ambiente de trabalho, entre pessoas, entre pessoas e
grupos e entre grupos, destacando-se estilo de liderança, comunicação, conflitos, etc.
7 Mudanças constantes

As mudanças normalmente geram insegurança e resistências: novas chefias, regras, equipamentos,


procedimentos, etc.
8 Perspectivas profissionais

Perspectivas otimistas em relação à carreira, promoções, desenvolvimento técnico, etc, constituem-se em


motivações que aliviam as tensões do cotidiano. A falta de perspectivas gera insegurança, desmotivação e mesmo medo,
sentimentos que contribuem para o processo de estresse.
9 Clima Organizacional

A falta de políticas claras e bem definidas, o fluxo de comunicação deficiente, a indefinição de papéis, dentre
outros, são aspectos do clima organizacional que tendem a criar tensões no ambiente de trabalho.
10 Pessoais

Além dos estressores específicos do ambiente de trabalho devemos considerar, também, a influência daqueles
relacionados à vida pessoal. Problemas de relacionamento familiar, financeiros, de saúde, dependendo de sua gravidade,
poderão somar-se aos estressores profissionais, prejudicando o desempenho no trabalho.
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11 Estratégias para Administrar o Estresse

Considerando que a situação de estresse é composta pelos estímulos estressores e pela percepção e resposta
que o indivíduo apresenta frente a esses estressores, as atividades que visem o gerenciamento do estresse no ambiente de
trabalho devem abordar duas vertentes: a organizacional e a individual.
12 Nível organizacional

No nível organizacional destaca-se a aplicação de conhecimentos técnicos específicos no sentido de remover,


prevenir e/ou minimizar os agentes estressores. Dependendo dos tipos de estressores identificados no ambiente de
trabalho, podem ser desenvolvidas atividades tais como: desenvolvimento organizacional, desenvolvimento gerencial e de
equipes, projetos ergonômicos, etc.
13 Nível individual

A administração do estresse no nível individual envolve:


• a ampliação do auto-conhecimento visando a identificação dos estressores internos e externos e de nosso
padrão de reação;
• a eliminação de agente estressores que não sejam indispensáveis;
• a modificação da atitude pessoal diante do meio, através de processo terapêuticos;
• o aprendizado de técnicas para desmobilizar a reação do estresse e melhorar nossa resistência ao mesmo
(ioga, meditação, relaxamento, exercícios físicos).
• a adoção de um estilo de vida saudável e restaurador, proporcionando, dentre outras possibilidades, palestras
informativas, aconselhamento e programas e de exercícios físicos e de nutrição.
14 Outras medidas:

A Regulamentação Profissional do Aeronauta (Lei 7183 de abril/84) apresenta alguns limites para o exercício da
atividade aérea como por exemplo:
• duração das jornadas
• limites de vôo e de pouso
• período de repouso
• número de folgas
Entretanto, outras medidas devem ser seguidas para que o processo de estresse e fadiga não se instale, dentro
eles pode-se citar:
• não ultrapassar os limites regulamentares
• reconhecer o conjunto “sinais e sintomas” pessoais (exercício)
• atenção às condições de repouso e alimentação
• desenvolver estratégias que melhorem a qualidade do sono
• treinamento operacional sistemático
• decisões compartilhadas (C.R.M.)

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