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PSICOLOGIA APLICADA - Sandra Haerter Armoa

8 ª Aula

ESTRESSE COMO
DOENÇA DO TRABALHO
E TRANSTORNOS DE
ADAPTAÇÃO
Finalmente!

Chegamos à última aula e considerando todos os conteúdos apresentados,


acreditamos que esta disciplina poderá ser muito útil em sua atuação profis-
sional. Para iniciarmos a aula, peço que façam uma reflexão sobre: o que você
sabe sobre estresse? Quais são seus sintomas? Quando estes sintomas ocor-
rem?
Vamos, agora, conhecendo os objetivos propostos e os conteúdos que serão
abordados nesta aula.

Boa leitura!

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

Ao término desta aula vocês serão capazes de:

• conceituar estresse;
• descrever os sintomas;
• compreender a diferença entre Burnout e estresse.
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SEÇÕES DE ESTUDO

Seção 1. Classificação do estresse


Seção 2. Estresse e condições de trabalho
Seção 3. Síndrome de Burnout ou síndrome do esgotamento profissional

SEÇÃO 01 Classificação do estresse

O estresse é classificado pela CID-10 na categoria F43: “reação a estresse grave e


transtornos de ajustamento e tem sido apontado como um dos riscos mais sérios ao bem-estar
psicossocial do indivíduo” (ROSSI, 2005, p. 9) e um dos principais fatores de redução da
qualidade de vida no trabalho (CRUZ, 2008, p. 17).
Para a classificação F43.0 da CID-10 está registrado um transtorno transitório de
gravidade significativa, o qual se desenvolve em um indivíduo (usualmente, aparecem den-
tro de minutos do impacto do estímulo ou evento estressante) sem qualquer outro transtorno
mental aparente em resposta à excepcional estresse físico e/ou mental e, usualmente, diminui
dentro de horas (frequentemente) ou dias (dois ou três dias).
Nesse caso de estresse agudo, o evento estressor pode ser uma experiência traumáti-
ca esmagadora, envolvendo séria ameaça à segurança ou integridade física do paciente ou de
pessoa por ele amada (por exemplo, acidente de trabalho), bem como pode ser considerada
uma mudança inusualmente súbita e ameaçadora na posição social e/ou relações do indiví-
duo (por exemplo, ameaças de desemprego ou rebaixamento de função com redução salarial)
(CID-10, 1993, p. 144).
Nesse caso, a vulnerabilidade do indivíduo e A capacidade de adaptação desempe-
nham um papel na ocorrência e gravidade das reações agudas a estresse (CID-10, p. 144). Po-
rém, não se pode olvidar o que já foi registrado acima, no sentido de que o evento estressante
é fator causal e determinante do transtorno. Portanto, se esse evento ocorre no ambiente do
trabalho possui clara relação de causalidade com o transtorno depressivo, independentemen-
te da estrutura de personalidade do trabalhador. Isso porque estudos têm demonstrados que
trabalhadores expostos a uma combinação de alta pressão com pouca autonomia ou controle
e que tenham pouco orgulho pelo trabalho, conflito com supervisores, subordinados e cole-
gas etc., possuem três vezes mais chances de ter problemas de hipertensão e alteração nos
músculos cardíacos que muitas vezes precedem enfartes (PAPALIA E OLDS, 2000, p. 455).
As diretrizes diagnósticas incluem conexão temporal imediata e clara entre o im-
pacto do evento estressor e o início dos sintomas, os quais, em adição ao estado inicial de
atordoamento, mostram depressão, ansiedade, raiva, desespero, hiperatividade e retraimento

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(CID-10, p. 144-145). Eis aqui um dos elementos a serem considerados para definição do
nexo de causalidade entre o transtorno e o trabalho, ou seja, a presença de um evento estres-
sante ou experiência traumática, bem como uma mudança súbita e ameaçadora no trabalho
pode ser considerado um fator etiológico no desencadeamento dessa patologia e, portanto,
estar relacionada ao trabalho.
Segundo Hans Selye (apud LIMONGE FRANÇA; RODRIGUES, 1998, p. 29), o
estresse é o termo utilizado para denominar o “conjunto de reações que um organismo desen-
volve ao ser submetido a uma situação que exige esforço de adaptação”, mas não é sempre
negativo. Pelo contrário, há o estresse positivo (eustresse) que nos motiva a sobreviver, de-
senvolver habilidades, buscar alternativas, reagir e mudar. E há, também, o estresse que, em
excesso, pode ser desagradável, nocivo, ameaçador e que pode romper o equilíbrio biopsicos-
social, prejudicando a saúde do trabalhador (distresse) (JEX, 1999; LIMONGE FRANÇA,
RODRIGUES, 1998, p. 31; TAMAYO, 2000, p. 333; BENEVIDES-PEREIRA, 1999, p. 30).
Para Selye (1994), o estresse é o conjunto de reações fisiológicas e hormonais que se
produzem no organismo como resposta a uma agressão ou emergência, de forma a adaptar-se
às novas circunstâncias, podendo variar em três níveis, desde o estresse como mero alarme
para a luta ou fuga, passando para a resistência e, por fim, para a exaustão, ou seja, a patolo-
gia (BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 29).
A primeira fase acima referida é a reação de alarme; a segunda, a de resistência e a
terceira, a de exaustão. A reação de alarme é a preparação para luta ou fuga, na qual ocorreu
um aumento de frequência cardíaca e da pressão arterial. A atividade adrenal e as funções
cardiovascular e respiratória aumentam rapidamente. Ocorre nessa fase aumento da frequ-
ência cardíaca, da pressão arterial, da frequência respiratória, da concentração de glóbulos
vermelhos, da concentração de açúcar no sangue, redistribuição do sangue, dilatação dos brô-
nquios, da pupila e ansiedade (STRAUB, 2005; LIMONGE FRANÇA, RODRIGUES, 2007).
Na segunda fase, da resistência, ocorre caso o agente estressor mantenha sua ação, a
excitação fisiológica permanece alta, ocorrendo um decréscimo na capacidade do indivíduo
de enfrentar eventos e problemas cotidianos. As pessoas ficam irritadas, impacientes e cada
vez mais vulneráveis a problemas de saúde. Nessa fase, pode ocorrer ulcerações no aparelho
digestivo, irritabilidade, insônia, mudanças de humor, diminuição do desejo sexual e atrofia
de algumas estruturas relacionadas à produção de células do sangue (STRAUB, 2005; LI-
MONGE FRANÇA, RODRIGUES, 2007).
Por fim, na terceira fase, a de exaustão, pode ocorrer falha dos mecanismos de adap-
tação, esgotamento por sobrecarga fisiológica e morte do organismo. Maior suscetibilidade às
doenças, reações alérgicas, hipertensão, resfriados comuns e doenças mais sérias causas por
deficiências imunológicas (STRAUB, 2005; LIMONGE FRANÇA, RODRIGUES, 2007).

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SEÇÃO 02 Estresse e condições de trabalho

Segundo Straub (2005), numerosos estudos reforçam a ideia básica de Hans Selye
de que o estresse prolongado causa problemas para o corpo. Podem surgir problemas físicos,
tais como: músculos tensos ou rígidos, dores de cabeça, erupções de pele, cansaço, vômitos,
fragilidade, hipertensão, perda ou ganho de peso, suores, problemas estomacais, náuseas e
reações alérgicas; problemas psicológicos, tais como: ansiedade, dificuldades de memória,
ressentimento, raiva, fadiga, incapacidade de relaxar, depressão, raiva ou pouca concentra-
ção; podem surgir, também, problemas comportamentais, tais como: inquietação, proble-
mas para dormir, mudanças em hábitos alimentares, choro, punhos cerrados, temperamento
agressivo, fuga de tarefas, consumo de substâncias entorpecentes ou fuga de relacionamentos
(STRAUB, 2005, p. 105).
Jex (2000, p. 105), complementa ainda que o estresse pode causar consequências
fisiológicas (risco aumentado de doenças cardiovasculares, insônia, sintomas psicossomáti-
cos), psicológicas (frustração, ansiedade, atitudes negativas em relação ao trabalho) e com-
portamentais (absenteísmo, comportamentos contraproducentes, uso de drogas e álcool), bem
como pode disparar uma série de reações ao sistema nervoso, endócrino, imunológico e sis-
tema límbico (LIMONGE FRANÇA; RODRIGUES,2005 p. 33).
É certo que essas condições não representam condições inevitáveis ao estresse e nem
a presença desses sintomas indica que o estresse seja a causa. Todavia, são elementos a serem
considerados na avaliação das condições de trabalho e no exame pericial para reconhecimen-
to da existência ou da inexistência do nexo de causalidade entre o estresse e o trabalho.
De acordo com Roberto Moraes Cruz (2008, p. 17), o termo estresse no trabalho se
refere ao produto de reações fisiológicas e psicológicas do indivíduo em situações de traba-
lho, vivenciadas pelo trabalhador como desagradável e ameaçadoras ao seu bem-estar, segu-
rança e estima. É uma manifestação da tensão nos ambientes organizacionais. Os estressores
do ambiente do trabalho (já referidos no tópico referente aos impactos da organização do
trabalho sobre a saúde do trabalhador), se persistentes, criam um campo favorável à elabo-
ração de doenças ocupacionais e processos de afastamento do trabalho (CRUZ, 2008, p. 18).
Assmar e Ferreira (2008), também se referem ao estresse laboral como um processo
e, também, como o conjunto de reações físicas e psíquicas provocadas pela vivência de con-
dições adversas no ambiente organizacional.
Para Magnólia Mendes (2008, p. 166), o estresse é um

[...] fenômeno resultante de uma tensão acumulada em função do contínuo e intenso


esforço do indivíduo para adaptar-se às demandas internas ou externas que lhes são
impostas pelas dimensões da organização, das condições e das relações sociais de
trabalho.

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Segundo Straub (2005, p. 116-117), a palavra estresse pode ser entendida como
estímulo (por exemplo: sobrecarga de trabalho) ou como resposta a uma situação (diante da
sobrecarga o trabalhador fica estressado), ou seja, é definida como um processo pelo qual
alguém percebe e responde a eventos que são julgados como desafiadores ou ameaçadores.
Há, portanto, que se distinguir os estímulos estressantes do próprio estresse. Aqueles são
elementos que vêm interferir no equilíbrio homeostático do organismo. O estresse, por sua
vez, é a resposta a esse estímulo, isto é, necessidade de se aumentar o ajusta adaptativo para
retornar ao estado de equilíbrio.

Os agentes agressores, segundo Benevides-Pereira (2002, p. 27) podem ser:

a) físicos: ruído, frio ou calor intenso e/ou persistente, acidentes, fome, dor etc.;
b) cognitivos: iminência ou vivência de um assalto, discussão, seleção a um empre-
go etc.;
c) emocionais: perda, medo, ira ou acontecimentos em que o componente afetivo se
faça mais proeminente.

Quando se trata de um ambiente organizacional agressivo, sem justiça organizacio-


nal, cultura da organização prejudicial à estima dos trabalhadores, baixo poder de controle
sobre o trabalho, ambiente físico agressivo (barulho excessivo, vibrações, temperaturas bai-
xas etc.), sobrecarga de trabalho, conflito e ambiguidade de papéis, sabotagens, castigos,
humilhações e sendo essas condições permanentes no ambiente laboral, tratam-se de tensões
externas que requerem do indivíduo um esforço contínuo para adaptação, razão pela qual
poderá estar sujeito às consequências desse processo que pode ser o adoecimento físico e
mental. O intenso e contínuo esforço para adaptar-se às persistentes condições agressivas da
organização do trabalho é que poderá conduzir (processo) o trabalhador à incapacitação la-
borativa, decorrente da depressão grave, configurando-se a doença do trabalho. Conforme foi
dito no início desse trabalho, “o ser humano é capaz de adaptar-se ao meio ambiente desfavo-
rável, mas esta adaptação não acontece impunemente” (LENNART LEVY apud LIMENGE
FRANÇA, RODRIGUES, 2007, p. 41). O esforço para essa adaptação, com vistas a suportar
o ambiente estressante da organização do trabalho, pode conduzir o trabalhador a um estado
de estresse que poderá afetar sua saúde e seu bem estar físico, mental ou social, afetando,
inclusive, sua relação familiar.
Assmar e Ferreira (2008), apontam um minucioso estudo sobre as fontes de estresse
ocupacional. Conforme esses autores, o ambiente físico pode ter as seguintes características
estressoras: barulho excessivo, ambiente pouco ou excessivamente iluminado, locais sujeitos
a vibrações, temperaturas muito altas ou baixas, trabalho que oferecem riscos à própria segu-
rança do trabalhador.
Como sobrecarga do trabalho, apontaram: excesso ou falta de trabalho, tempo ina-
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dequado para completar o trabalho, turnos longos de trabalho, poucos períodos de descanso e
trabalho pesado. No controle sobre o trabalho, destaca: ausência de autoridade para tomar de-
cisões sobre suas próprias tarefas. Os conflitos de papéis também são fatores estressores, ou
seja, obrigação de seguir ordens, obrigação de desempenhar ao mesmo tempo várias funções.
Ambiguidade de papéis é a ausência de uma descrição clara do trabalho a ser re-
alizado, falta de clareza sobre o alcance de suas responsabilidades e sobre os objetivos da
função. Apontaram ainda como fontes de estresse a falta de oportunidades de expor seus
problemas, falta de apoio dos colegas, superiores e subordinados, falta de tempo para dedi-
cação à família por causa do trabalho, falta de segurança no emprego, pouca estabilidade e
falta de oportunidades. Sobre as características da organização, indicaram como estressores
a não participação na tomada de decisões, regras e procedimentos muito formalizados, falta
de reconhecimento e valorização no emprego, ausência de recompensas, uso do poder para
satisfação de interesses pessoais, sabotagem dos colegas em benefício próprio (FERREIRA;
ASSMAR, 2008, p. 25; 34; 49).
Segundo Tamayo (2008, p. 367), numerosas pesquisas mostram que uma das fon-
tes mais frequente e poderosa de estresse ocupacional é a falta de autonomia do trabalhador
no exercício de suas funções. Também apontou esse mesmo autor que os valores organiza-
cionais influenciam no estresse dos trabalhadores. Organizações que adotam valores como
autonomia, preocupação com a coletividade e realização, tiveram trabalhadores com menor
nível de estresse. Pelo contrário, as organizações que enfatizam a conformidade como valor
possuem trabalhadores com maior nível de estresse.
Um exemplo de como a organização pode afetar a saúde do trabalhador, dentre ou-
tros, foi citado por Ferreira e Assmar (2008) ao indicaram o caso de Joaquim, que é um:

vendedor de uma cadeia de lojas de departamento, que adotou recentemente a prática


de relatórios trimestrais de produtividade como parte de sua política de promoções,
o que tem levado seus antigos colegas a fazer de tudo para “passar por cima dos
outros” e, assim, obter melhores índices de produtividade, de modo a garantir suas
promoções. Os empregados que, como Joaquim, não conseguem conviver com esse
nível de competição, já começam a sentir os primeiros sintomas de estresse, tais
como dores de cabeça, insônia, falta de vontade de ir para o trabalho (FERREIRA;
ASSMAR, 2008).

Este caso deixa claro que fatores da organização do trabalho influenciam à saúde
mental e física do trabalhador.
É verdade que, segundo Abrahão e Cruz (2008, p. 110), é raro encontrar uma relação
unívoca entre causas e efeitos e que o estresse também se refere à percepção que o indivíduo
tem de um estressor e, dependendo da resposta do indivíduo, um mesmo estímulo estressor
poderá ser visto como um distress (processo adaptativo inadequado) ou como um eustress
(indivíduo reage bem ao estímulo estressante) (LIMONGE FRANÇA; RODRIGUES, 2005,
p. 32). Nessa hipótese, o ambiente de trabalho e sua organização não teria nenhuma responsa-
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bilidade sobre a patologia daí surgida, pois o que vale é a interpretação que cada um tem dos
eventos da vida, ainda que estressantes. Entretanto, não é menos certo que alguns estímulos
estressantes, relacionados ao trabalho, são vistos como agressivos por um número elevado de
pessoas e a ciência tem reconhecido como causadores de desequilíbrios psicológicos, com-
portamentais e físicos.
É o caso do exemplo de Joaquim acima citado e, também, das organizações do tra-
balho em que ocorram, por exemplo, sobrecarga do trabalho, jornadas exaustivas, ameaças de
desemprego, enfim, circunstâncias relativas às condições de trabalho já referidas nos tópicos
precedentes. Ora, no exemplo citado de Joaquim e nos ambientes de trabalhos em que este-
jam presentes esses estímulos estressores, não se pode deixar de responsabilizar o ambiente
de trabalho e suas condições como responsáveis pelos transtornos daí decorrentes, pois, como
se viu acima, o evento estressante ou contínuo desprazer é fator causal primário e determi-
nante e o transtorno não teria ocorrido sem seu impacto.
Além disso, como se viu no tópico referente à proteção à saúde dos trabalhadores,
cabe ao empregador adaptar o trabalho às condições psicofísicas de seus trabalhadores e ado-
tar medidas individuais e coletivas de proteção à saúde e à segurança do trabalhador. Portan-
to, ainda que alguns trabalhadores submetidos às mesmas condições laborais não adoeçam,
nada impede que, por força legislativa, se reconheça como doença do trabalho aquelas doen-
ças mentais adquiridas pelos trabalhadores no ambiente laboral, pois o mesmo ocorre com as
doenças do sistema musculoesquelético. Nem todos trabalhadores submetidos a trabalho mo-
nótono, repetitivo, sem pausas para descanso, sem revezamento de funções, adquirem essas
doenças musculoesqueléticas, mas aqueles que sofrem desses transtornos têm reconhecida a
relação de causalidade e a responsabilidade civil do empregador pelos danos daí decorrentes,
se for o caso.
Em conclusão, portanto, se pode afirmar que uma vez presentes certas condições
(ou circunstâncias, como diz a CID-10 e Decreto n.º 3.048/99) especiais relativas ao traba-
lho, ou seja, se constatadas a presença dos fatores etiológicos relacionados ao estresse acima
relatados, essas condições ou esses fatores podem ser elementos etiológicos para o desenca-
deamento da depressão nos trabalhadores, com reconhecimento do nexo de causalidade entre
o trabalho e o transtorno mental, independentemente dessas condições não estarem expressa-
mente previstas nos Anexos ao Decreto n.º 3.048/90 e ainda que não estejam relacionadas às
substâncias físicas normalmente vinculadas a esse transtorno, pois, como já se disse mais de
uma vez, o Brasil adotou o sistema “misto”, de cláusulas abertas, que não impede a inclusão,
como doença do trabalho, de outras doenças não relacionadas no anexo I do referido decreto.
Isso porque a Lista B, do Anexo I, do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, no
Grupo V, da CID-10, relacionado aos transtornos mentais e do comportamento relacionados
com o trabalho, aponta como doença do trabalho as reações ao stress grave e transtornos de
adaptação (F43.-), apontando como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocu-
pacional “outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho: reações após
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acidente do trabalho grave ou catastrófico, ou após assalto no trabalho (Z56.6), bem como
circunstância relativa às condições de trabalho (Y96)”. O item da CID-10 Z56, por exemplo,
refere-se aos problemas relacionados a emprego e desemprego e o item Y96, da CID-10, diz
respeito às circunstâncias relativas às condições de trabalho.
Veja-se que a própria norma já aponta aspectos acima relacionados que são tidos
como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional, razão pela qual, tam-
bém com base na norma regulamentar, se pode reconhecer a existência de nexo de causali-
dade entre esses fatores e o trabalho, pois nada mais são do que circunstâncias relativas às
condições de trabalho prejudiciais à saúde física e mental do trabalhador.

2.1 Estresse pós-traumático (F43.1)

O Anexo II – Lista B, do Decreto n.º 3.048/99, elenca como doença relacionada ao


trabalho o estado de stress pós-traumático (F43.1), apontando como agentes etiológicos ou
fatores de risco de natureza ocupacional “outras dificuldades físicas e mentais relacionadas
com o trabalho: reação após acidente do trabalho grave ou catastrófico, ou após assalto no
trabalho (Z56.6)” e “circunstância relativa às condições de trabalho (Y96)”.
O evento pós-traumático surge como resposta tardia e/ou protraída a um evento ou
situação estressante (de curta ou longa duração) de uma natureza excepcionalmente ameaça-
dora ou catastrófica, a qual provavelmente causa angústia invasiva em quase todas as pesso-
as (exemplo: desastre natural ou feito pelo homem, combate, acidente sério, testemunhar a
morte violenta de outros ou ser vítima de tortura, terrorismo, estupro ou outro crime). Fatores
predisponentes, tais como traços de personalidade ou história prévia de doença neurótica, po-
dem baixar o limiar para o desenvolvimento da síndrome ou agravar seu curso, mas não são
necessários nem suficientes para explicar sua ocorrência (CID-10, p. 145).
Registra-se desde já que, segundo a ciência médica, já indicada pela Classificação
de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10 e, portanto, já adotada pela nossa
legislação (Decreto n.º 3.048/99 que cita essa classificação) os fatores predisponentes (tal
como traço de personalidade, trauma na infância, mudanças de vida recente, consumo re-
cente e excessivo de álcool) não são necessários nem suficientes para explicar a ocorrência
do estresse pós-traumático, mas apenas podem exercer influência no seu desenvolvimento
(KAPLAN, 1980, p. 575).
Já Seligmann-Silva (1998, p. 1165), afirma que Dejours considera que esta síndro-
me seria o único quadro psicopatológico, especificamente, originado pelo trabalho, isto é, o
único que apenas pode ser causado pelo trabalho.
O transtorno pós-traumático não requer fatores predisponentes para seu desenvolvi-
mento, pois o evento é fator primário e determinante para o transtorno e não teria acontecido
sem sua ocorrência.

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Síndrome de Burnout ou síndrome do esgotamento


SEÇÃO 03
profissional

O Anexo II, do Decreto n.º 3.048/99, no Grupo V, da CID-10 – Transtornos Mentais


e do Comportamento Relacionados com o Trabalho, elenca como doença mental, no item
XII, a Sensação de Estar Acabado ou “Síndrome de Burn-Out”, também conhecida como
Síndrome do Esgotamento Profissional. Nesse item, o legislador regulamentar apontou como
agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional o ritmo de trabalho peno-
so (Z56.3) e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho (Z56.6). Na
classificação dos Transtornos Mentais e do Comportamento (CID-10), o item Z73, refere-se
a “problemas relacionados a dificuldades de gerenciamento da própria vida”, tendo como
subitens:

Z73.0 – Sensação de estar “acabado”;


Z73.1 – Acentuação de traços de personalidade, inclui padrão de comportamento
tipo A;
Z73.2 – Falta de descanso ou lazer;
Z73.3 – Estresse, não classificado em outros locais;
Z73.4 – Habilidades sociais inadequadas, não classificadas em outros locais;
Z73.5 – Conflito de papel social, não classificado em outros locais.

Para a classificação Z56 (indicada como agente etiológico ou fator de risco de natu-
reza ocupacional para a síndrome de burnout), a CID-10 refere-se a problemas relacionados
com o emprego e com o desemprego, apontando como subitens os seguintes:

Z56.0 – desemprego não especificado;


Z56.1 – mudança de emprego;
Z56.2 – ameaça de perda de emprego;
Z56.3 – ritmo de trabalho penoso;
Z56.4 – desacordo com patrão e colegas de trabalho;
Z56.5 – má adaptação ao trabalho – condições difíceis de trabalho;
Z56.6 – outras dificuldades físicas e mentais relacionadas ao trabalho;
Z56.7 – outros problemas e os não especificados relacionados com o emprego.

Portanto, para caracterização da síndrome de Burn-out ou simplesmente Burnout


(BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 21), como doença do trabalho, é necessário verificar se
estão presentes ritmo de trabalho penoso e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas
ao trabalho.
Para se elucidar sobre o termo é necessário constar que se trata de um termo de ori-
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gem inglesa que se refere àquilo ou aquele, que se deixou de funcionar por absoluta falta de
energia e não tem mais condições de desempenho físico ou mental (BENEVIDES-PEREIRA,
2002, p. 21). Significa queimar-se ou destruir-se pelo fogo, pois pretende transmitir a ideia
de que as pessoas acometidas por esse transtorno podem sentir-se consumidas ou queimadas
pelo seu trabalho (TAMAYO, 2002, p. 76). Segundo Maslach (2005, p. 41), o burnout é
uma síndrome psicológica que envolve uma reação prolongada aos estressores interpessoais
crônicos e possuem três dimensões: exaustão avassaladora; sensação de ceticismo e desliga-
mento do trabalho; e sensação de ineficácia e falta de realização.
Os exemplos relacionados à síndrome de burnout sempre relacionam a fadiga ex-
trema, perda do idealismo e da paixão pelo próprio trabalho, estado de indiferença, cinismo,
desilusão, exaustão, humor depressivo, dureza e distanciamento, especialmente com pacien-
tes (TAMAYO, 2002, p. 77).
Segundo Ana Maria T. Benevides-Pereira (2002), a adoção desse vocábulo foi utili-
zada por Schaufeli Brandley, em 1969, ao propor nova estrutura organizacional a fim de con-
ter o fenômeno psicológico que acomete trabalhadores assistenciais, tendo se referido a staff
Burnout. Portanto, ao contrário do que sustentado por alguns doutrinadores, não foi Herbert
J. Freundenberger o primeiro a utilizar esse termo, porém, não se deixa de se creditar a este
a propagação e o interesse que se seguiu no meio científico a partir de seus escritos em 1970
(BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 21). Esse pesquisador observou que, após o primeiro ano
de serviço, o comportamento de um grupo de voluntários se caracterizava pela diminuição
gradual da energia e pela perda de motivação e do comprometimento, além de sintomas psí-
quicos e físicos: sensação de exaustão e fadiga, raiva, irritação, frustração, tremor, falta de ar,
dores de cabeça, distúrbios gastrointestinais, entre outros (BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p.
77).
Essa síndrome inicialmente foi atribuída aos profissionais de serviços humanos (en-
fermeiros, médicos, psiquiatras, assistentes sociais, advogados, psicólogos, professores, pro-
fissões religiosas), por isso, foi também chamado de Síndrome do Assistente Desassistido ou
Síndrome do Cuidador Desassistido (BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 33; MAGNÓLIA,
MENDES, CRUZ, 2004, p. 46; MASLACH, 2005, p. 42; SELIGMANN-SILVA, 2005, p.
1163). A maior parte dos estudos diz respeito a pessoas que, ao longo de anos de profissão,
persistiram em tentar a solução de problemas humanos (dor, sofrimento em geral, miséria,
injustiça), atuando com grande empenho, de forma geralmente intensiva e autoexigente, sa-
crificando a vida pessoal (SELIGMANN-SILVA, 2005, p. 1163).
A sintomatologia do burnout subdivide-se em: físicos, comportamentais, psíquicos e
defensivos. Os sintomas físicos são: fadiga constante e progressiva, distúrbios do sono, dores
musculares e osteomusculares, cefaleias, enxaquecas, perturbações gastrointestinais, imuno-
deficiência, transtornos cardiovasculares, distúrbios do sistema respiratório, disfunções sexu-
ais e alterações menstruais nas mulheres. Os sintomas psíquicos podem apresentar: falta de
atenção e concentração, alterações da memória, lentificação do pensamento, sentimento de
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alienação, sentimento de solidão, impaciência, sentimento de insuficiência, baixa autoestima,


labilidade emocional, desânimo, depressão, desconfiança, paranoia.
Os sintomas comportamentais podem ser: negligência ou excesso de escrúpulo, irri-
tabilidade, incremento da agressividade, incapacidade para relaxar, dificuldade de aceitação
de mudanças, perda de iniciativa, aumento do consumo de substâncias, comportamento de
alto risco e suicídio. Os sintomas defensivos são: tendência ao isolamento, sentimento de im-
potência, perda do interesse pelo trabalho (ou até pelo lazer), absenteísmo, ironia e cinismo
(BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 44).
Para Seligmann-Silva (2005, p. 1163), o trabalhador com síndrome de burnout sente
como se tivesse sido atingido um estado de saturação emocional na qual não é mais possível
suportar o encontro com a necessidade de outra pessoa, pois agora é o próprio profissional
quem está num estado que, muitas vezes, é de desespero.
As variáveis responsáveis pelo burnout abrangem características pessoais, caracte-
rísticas do trabalho, organizacionais e sociais. Para se diagnosticar essa síndrome, portanto,
é necessário que o perito judicial observe as características pessoais do trabalhador, ou seja,
sua idade, sexo, nível educacional, existência de filhos, personalidade, motivação e idealis-
mo, por exemplo. Também é necessário observar as características do trabalho em relação ao
tipo de ocupação, profissão, tempo na instituição, sobrecarga de trabalho, turnos, conflito e
ambiguidade de papéis, controle, pressão, possibilidade de progresso etc. Os aspectos orga-
nizacionais também são imprescindíveis, como já se disse e são: o ambiente físico, mudanças
organizacionais, normas, clima, burocracia, autonomia, recompensas e segurança. Por fim,
também devem ser consideradas as características sociais, ou seja, a existência ou não de su-
porte social e familiar, a cultura e o prestígio (BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 69).
Embora o surgimento do burnout deva-se, em grande parte, à natureza do trabalho e
não às características individuais do funcionário (MASLACH, 2005, p. 2007), pode-se afir-
mar, contudo, que há variáveis pessoais e situacionais que determinam o burnout. Segundo
Maslach (2005), há seis domínios principais relativos aos fatores de risco organizacionais,
quais sejam: carga de trabalho, controle, recompensa, comunidade, justiça e valores. Esses
aspectos também já foram abordados nos tópicos anteriores, referente às influências da or-
ganização do trabalho na saúde dos trabalhadores. Basta acrescentar que há um desequilíbrio
ou incompatibilidade clara entre as exigências do trabalho e a capacidade do indivíduo de
atender essas exigências. Isso ocorre pelas consequências do mundo contemporâneo, que em
razão das novas tecnologias, capitalismo selvagem e globalização, cada vez mais são majora-
das as exigências sobre o desempenho e produtividade dos trabalhadores (MASLACH, 2005;
ASSMAR, FERREIRA, p. 281).
A falta de controle indica que os trabalhadores não possuem arbítrio pessoal e au-
tonomia em seu trabalho, mas não responsabilizados por algo sobre o que não têm controle.
Recompensas insuficientes ocorrem quando os trabalhadores não recebem reconhe-
cimento e apreciação pelo que estão fazendo, ou seja, eles não têm nenhum retorno sobre seus
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PSICOLOGIA APLICADA - Sandra Haerter Armoa

esforços.
A ruptura na comunidade ocorre justamente quando os trabalhadores mais precisam,
pois somente são reconhecidos quando produzem. Ao contrário, quando adoecem são igno-
rados e não recebem apoio social. A percepção de que não há justiça e igualdade no local de
trabalho também é um fator de risco organizacional para o burnout. Sentimento de injustiça e
tratamento desigual podem gerar emoções intensas e ter uma grande importância psicológica
(MASLACH, 2005; ASSMAR, FERREIRA, p. 281).
Por fim, Maslach (2005), também aponta como fator de risco organizacional para o
burnout os conflitos de valor, que ocorrem quando as pessoas trabalham em uma situação na
qual há um conflito entre os valores pessoais e da organização. Por exemplo, pessoas cujos
valores pessoas dizem que é errado mentir podem se encontrar em um emprego onde mentir
torne-se necessário para o sucesso. Os conflitos psicológicos daí decorrentes, permitirão fa-
cilmente a instalação da síndrome de burnout (MASLACH, 2005, p. 50).
Para avaliação dos danos decorrentes da síndrome de burnout também se devem
considerar as consequências daí advindas, que podem ser prejuízos não só no trabalho, mas,
também, sociais e organizacionais. Podem ocorrer isolamentos e divórcio, pois nem sempre
a família suporta o incremento dos sintomas já descritos (BENEVIDES-PEREIRA, 2002,
p. 70-71). Além disso, os trabalhadores que sofrem de burnout foram avaliados por seus
cônjuges de forma mais negativa, sendo que eles próprios relataram que seu trabalho tinha
um impacto negativo sobre sua família e seu casamento fora avaliado de forma insatisfatória
(MASLACH, 2005, p. 45). Portanto, para avaliação das consequências da síndrome de bur-
nout sobre a saúde do trabalhador não se poderá considerar aspectos apenas físicos e mentais,
mas, também, sociais, pois tal patologia interfere na relação familiar.
Interessante registrar que ocorre uma unanimidade entre os pesquisadores ao assi-
nalarem a influência direta do mundo do trabalho como condição para determinação desta
síndrome. Ana Maria Benevides-Pereira, cita a seguinte afirmação de Malasch (2005, p. 33):
“Burnout é uma experiência individual específica do contexto do trabalho”. Christina Mas-
lach (2005, p. 47) também afirmou que a conclusão de vários estudos quanto aos fatores de
risco para a síndrome de burnout é a de que esse transtorno se deve, em grande parte, à natu-
reza do trabalho e não às características do funcionário individual.
Portanto, resta que uma vez constatada a síndrome do esgotamento profissional (Bur-
nout), esta estará configurada a existência de nexo de causalidade entre o trabalho e a psico-
patologia, ou seja, o burnout não é um problema do indivíduo, mas, sim, do lugar onde ele
trabalha (MAGNÓLIA; MENDES; CRUZ, 2004, p. 47 apud MASLACH; LEITER, 2005).
A diferença entre estresse e burnout tem sido objeto de controvérsias. Alguns – re-
ducionistas – sustentam que se trata do mesmo fenômeno, pois a exaustão emocional também
faz parte do estresse, que envolve desgaste, cansaço e falta de energia. Porém, os defensores
da diferenciação entre estresse e burnout sustentam que esta síndrome abrange componentes
de esgotamento (exaustão) e, também, aspectos atitudinais (despersonalização ou cinismo) e
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PSICOLOGIA APLICADA - Sandra Haerter Armoa

de autoavaliação (baixa realização pessoal ou ineficácia) (TAMAYO, 2005, p. 98).


Vejamos um exemplo típico de burnout, citado por Limonge-França e Rodrigues
(2007, p. 55):

Sinto-me impotente ao lidar com os alunos, pois é algo semelhante a remar contra a
maré. Às vezes é possível observar algum esforço por parte de alguns, mas não há
retorno, pois as deficiências de aprendizagem e as barreiras são muito grandes. No
total de alunos, 50% são totalmente apáticos, os outros 50% até têm esforço, mas
não possuem base, não absorvem. Não vejo resultado em meu trabalho, sendo que os
alunos da noite conseguem ser ainda piores. Estou sendo muito sincera, não consigo
encontrar nenhum tipo de satisfação no magistério. Ao sair para o trabalho, consigo
perceber apenas o sentimento de obrigação, é como o gado que sai para pastar e de-
pois volta para casa.

Para Benevides-Pereira (2002, p. 45), o burnout é a resposta a um estado prolongado


de estresse, que ocorre pela cronificação deste. Ao contrário do estresse, que pode apresentar
aspectos positivos ou negativos, o burnout tem sempre aspecto negativo (distresse). Além
disso, ao contrário das reações agudas ao estresse, que se desenvolvem em resposta a inci-
dentes críticos específicos, o burnout é uma reação cumulativa a estressores ocupacionais
contínuos (MASLACH, 2005, p. 42).
A exaustão emocional se refere à sensação de esgotamento tanto físico quanto men-
tal, ao sentimento de não dispor de mais energia para absolutamente nada. O trabalhador
torna-se pouco generoso, insensível aos problemas. Demonstra pessimismo e sensação de ter
chagado ao limite das possibilidades, ficando pouco tolerantes, facilmente irritáveis, “nervo-
sos”, “amargos”, no ambiente do trabalho e até mesmo fora dele, como familiares e amigos.
As principais fontes desta exaustão são a sobrecarga de trabalho e o conflito pessoal
no trabalho. A despersonalização é o desenvolvimento do distanciamento emocional que se
identifica de maneira exacerbada. Não significa que o indivíduo deixou de ter sua persona-
lidade, mas que esta sofreu ou vem sofrendo alterações, levando o profissional a um contato
frio e impessoal com os usuários de seus serviços (alunos, pacientes, clientes etc.), passando
a denotar atitudes negativas, de cinismo e de ironia em relação às pessoas e indiferença ao
que pode vir a acontecer aos demais, ou seja, perde os aspectos humanitários na interação
interpessoal.
Com a despersonalização o trabalhador perde a capacidade de identificação e de
empatia, passando a tratar as pessoas como “coisas” ou “objetos”. O trabalhador deixa de
tentar fazer o seu melhor para fazer apenas o “mínimo necessário”. A reduzida realização
profissional evidencia o sentimento de insatisfação com as atividades laborais que vem rea-
lizando, sentimento de insuficiência, baixa autoestima, fracasso profissional, desmotivação,
revelando baixa eficiência no trabalho. Passam a ter uma consideração negativa de si mesmos
e dos outros (BENEVIDES-PEREIRA, 2002, p. 35; LIMONGE-FRANÇA; RODRIGUES, p.
53-54; MASLACH, 2005, p. 42).
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PSICOLOGIA APLICADA - Sandra Haerter Armoa

RETOMANDO A AULA

Chegamos, assim, ao final da última aula. Espera-se que ago-


ra tenha ficado mais claro o entendimento de vocês sobre o
estresse como doença do trabalho. Vamos, então, recordar?

SEÇÃO 1. CLASSIFICAÇÃO DO ESTRESSE

As estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) ressaltam que os transtor-


nos mentais menores acometem, aproximadamente, 30% dos trabalhadores ocupados e os
transtornos mentais graves, entre 5 e 10%. No Brasil, dados do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS) referentes à concessão de benefícios previdenciários de auxílio-doença, por
incapacidade para o trabalho superiores a 15 dias e de aposentadoria por invalidez ou incapa-
cidade definitiva para o trabalho, demonstram que os transtornos mentais ocupam o terceiro
lugar entre as causas dessas ocorrências (Brasil, 2002).

SEÇÃO 2. ESTRESSE E CONDIÇÕES DE TRABALHO

Para Straub (2005, p. 133), são fatores estressantes relacionados com o trabalho, a
sobrecarga de trabalho, a sobrecarga de papéis, o esgotamento, a falta de controle sobre o
trabalho, ambiguidade de papéis (ocorre quando os trabalhadores não têm certeza sobre o
seu trabalho ou dos padrões utilizados para avaliar seu desempenho), turno de revezamento,
perda do emprego e assédio sexual.

SEÇÃO 3. SÍNDROME DE BURNOUT OU SÍNDROME DO ESGOTA-


MENTO PROFISSIONAL

A diferença entre estresse e burnout tem sido objeto de controvérsias. Alguns – re-
ducionistas – sustentam que se trata do mesmo fenômeno, pois a exaustão emocional também
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PSICOLOGIA APLICADA - Sandra Haerter Armoa

faz parte do estresse, que envolve desgaste, cansaço e falta de energia. Porém, os defensores
da diferenciação entre estresse e burnout sustentam que esta síndrome abrange componentes
de esgotamento (exaustão) e, também, aspectos atitudinais (despersonalização ou cinismo) e
de autoavaliação (baixa realização pessoal ou ineficácia) (TAMAYO, 2005, p. 98).

SUGESTÕES DE LEITURAS, SITES E FILMES:

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em: https://doi.org/10.1590/S1414-98931999000300005. Acesso em: 20 jul. 2020.

SITE

Site: https://traumaeestresse.wordpress.com/category/filme/.

ASSISTIR

Uma longa viagem.

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MINHAS ANOTAÇÕES:

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