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Serviço social na

educação

Rodrigo Eduardo Zambon


Amanda Boza Gonçalves Carvalho
© 2016 por Editora e Distribuidora Educacional S.A.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Zambon, Rodrigo Eduardo


Z786s Serviço social na educação / Rodrigo Eduardo Zambon,
Amanda Boza Gonçalves Carvalho. – Londrina : Editora e
Distribuidora Educacional S.A., 2016.
176 p.

ISBN 978-85-8482-372-7

1. Serviço social - Brasil. 2. Formação profissional. 3.


Serviço social – Aspectos sociais. I. Carvalho, Amanda Boza
Gonçalves. II. Título.

CDD 770

2016
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CEP: 86041-100 — Londrina — PR
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Sumário

Unidade 1 | O papel da escola pública para a formação da cidadania


popular 7

Seção 1 - Concepção de Cidadania Popular e a Função Social da


Escola Pública 9
1.2 | A função social da escola pública 24

Seção 2 - A cidadania popular no contexto escolar 32

Unidade 2 | Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 41

Seção 1 - Concepção acerca do desenvolvimento humano e


processos mentais 44

Seção 2 - A consciência crítica e suas implicações na ação social 57

Seção 3 - Metodologia da Problematização como uma proposta


de caminho para o saber e aprender com base na consciência
crítica 66
3.1 Introdução à Metodologia da Problematização com o Arco de
Maguerez 66
3.2 Etapas da Metodologia da Problematização com o Arco de
Maguerez 73

Unidade 3 | A atuação do serviço social na política de educação 87

Seção 1 - Premissas básicas: conhecer e questionar 90

Seção 2 - Serviço Social na educação: um olhar sobre a trajetória


histórica e os processos atuais 93

Seção 3 - O Serviço Social na escola: uma inserção necessária 104

Seção 4 - A dimensão técnico-operativa do Assistente Social na


Escola: um olhar a partir do Parecer Jurídico 23/2000 111

Unidade 4 | Compreender a importância do serviço social nos diversos


níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como
manifestação da questão social 139

Seção 1 - Um viés acerca da atual conjuntura do ensino universitário


no país 142
1.1 Docência no ensino superior: dilemas e perspectivas 147

Seção 2 - A importância do serviço social nos diversos níveis


de ensino 155
Apresentação
A disciplina Serviço Social na Educação tem a finalidade de
proporcionar a você, aluno(a), uma imersão no debate acerca dos
processos de trabalho do Serviço Social na Política de Educação.
Falar sobre o Serviço Social na Educação não significa reduzir o
debate ao espaço escolar somente, sendo este um dos campos
de atuação profissional na Política de Educação. Trata-se de um
assunto importante e atual para profissionais e estudantes de
Serviço Social.

Objetivos da Disciplina:

• Possibilitar a compressão da disciplina Serviço Social na


Educação.

• Viabilizar uma fonte bibliográfica de qualidade que possa


contribuir para a análise sobre o Serviço Social na Educação e,
consequentemente, para aprofundamento teórico dos alunos
nessa área.

• Oportunizar atividades por meio das quais o aluno possa


desenvolver conhecimentos específicos na área do Serviço Social
na Educação.

Conteúdo Programático

Unidade 1: O papel da escola pública para a formação da


cidadania popular.

Unidade 2: Saber pensar e aprender com base na consciência


crítica.

Unidade 3: A atuação do Serviço Social na política de educação.

Unidade 4: Compreender a importância do Serviço Social nos


diversos níveis de ensino, observando as instituições formadoras
como manifestação da questão social.
Metodologia

Os conteúdos programáticos ofertados nessa disciplina serão


desenvolvidos por meio de teleaulas, de forma expositiva e interativa
(chat – tira dúvidas em tempo real), de aula atividade (por chat, para
aprofundamento e reflexão) e webaulas, disponíveis no Ambiente
Colaborar, compostas de conteúdos de aprofundamento, reflexão e
atividades de aplicação dos conteúdos e avaliação. Serão realizadas,
também, atividades de acompanhamento tutorial, participação em
Fórum, atividades práticas e estudos independentes (autoestudo),
além do Material Didático da disciplina.

Habilidades e Competências

Espera-se que, ao final das unidades, o aluno possa compreender


os conceitos básicos relacionados ao Serviço Social na Educação
e os processos de trabalho nessa área.

Avaliação

O sistema de avaliação da disciplina compreende assistir às


teleaulas, participação no fórum, produção textual interdisciplinar
em grupo, realização das avaliações virtuais e avaliação presencial
embasada no material didático, webaula e material complementar.
Unidade 1

O papel da escola pública


para a formação da cidadania
popular
Rodrigo Eduardo Zambon

Objetivos de aprendizagem

• Nesta Unidade, você vai ser levado a compreender os


conceitos de Cidadania Popular, Educação, Educação Popular.
• Irá conhecer qual é a Função Social da escola pública e
analisar os seus desdobramentos no cenário atual
• Refletir acerca da articulação entre Cidadania Popular e
escola pública.

Seção 1 | Concepção de cidadania popular e a função social da escola


Pública
Na seção 1, você conhecerá os conceitos de Cidadania Popular, Educação, Educação
Popular, bem como a Função Social da escola pública e seus desdobramentos no
cenário atual. É notório entre os educadores o desejo de buscar uma articulação
entre cidadania e educação e tal disposição, muitas vezes, está pautada na concepção
errônea de que cidadão é a pessoa portadora de direitos e cumpridora de deveres.
Refletir sobre o conceito de Cidadania e sua efetiva contribuição em ambiente escolar
tornou-se, então, uma necessidade. Alguns estudiosos defendem que a escola deve
ser espaço promotor da cidadania, por isso abordar todos esses conceitos irá favorecer
o seu entendimento de Cidadania Popular e sua relação com a escola pública.

Seção 2 | A cidadania popular no contexto escolar


Na seção 2, será abordada a articulação entre Cidadania Popular e escola. No bojo
das definições apresentadas está sempre presente o desejo de assegurar a formação
ou o desenvolvimento humano, pois a escola é capaz de modificar comportamentos
ou atitudes visando a uma sociedade mais justa, igualitária, democrática, que respeita
as diferenças e em que todos os direitos fundamentais são assegurados. Esse é o
papel social que a escola deveria desempenhar. Em nossa apresentação, você terá
acesso ao aparato legislativo que ampara a função social da escola pública, bem
como algumas sugestões de autores que tratam de práticas promotoras da Cidadania

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 7


Introdução à unidade
Na presente unidade, você conhecerá um pouco mais sobre
as demandas educacionais do mundo moderno e suas exigências.
Você sabia que, cada vez mais, os conhecimentos e a autonomia
dos educandos são promovidos como forma de capacitação ou
inserção nas diferentes atividades pedagógicas e sociais? Nesse
sentido, busca-se que todo aluno, que já é considerado um cidadão,
independente da faixa etária, possa cumprir seus deveres sem esperar
que outras pessoas indiquem ou ordenem, que apresente criticidade
e flexibilidade diante dos desafios que permeiam a aprendizagem e
que possua conhecimento acerca dos seus direitos. Partindo desse
pressuposto, você irá conhecer a temática cidadania popular na
educação escolar, enfatizando a relevância social acerca do tema. A
análise perpassa pela definição dos conceitos cidadania popular, pela
função social da escola pública e pelo aparato legislativo educacional
vigente. Sabe-se que uma das tarefas da escola contemporânea
é promover ações que favoreçam a formação de cidadãos mais
críticos, capazes de transformar a realidade em que vivem. Na atual
conjuntura, os desafios enfrentados para a prática de tal teoria são
imensos. Não obstante, em todo o país, há boas ações ocorrendo nas
escolas, algumas têm por objetivo fomentar uma prática pedagógica
pautada em princípios de Cidadania Popular.
Bom estudo!

8 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Seção 1
Concepção de Cidadania Popular e a Função
Social da Escola Pública
Introdução à seção

Parece simples definir Cidadania, não é mesmo? Porém, esse


conceito é permeado de vários entendimentos, por isso, a princípio,
faz-se necessário apresentar a definição que adotaremos para nosso
estudo. Antes de iniciarmos nosso diálogo acerca do processo
de construção do conceito de cidadania propriamente dito, é
importante salientarmos que “[...] a palavra é o fenômeno ideológico
por excelência” (BAKHTIN, 1997, p. 36) e os conceitos se encontram
atualmente num jogo de disputa de interesses, conforme podemos
verificar na citação do autor a seguir.

[...] Classe social e comunidade semiótica não se


confundem. Pelo segundo termo entendemos a
comunidade que utiliza um único e mesmo código
ideológico de Comunicação. Assim, classes sociais
diferentes servem-se de uma só e mesma língua.
Consequentemente, em todo signo ideológico
confrontam-se índices de valor contraditórios. O signo
se torna a arena onde se desenvolve a luta de classe.
(BAKHTIN, 1997, p. 47)

Por isso, além de nominar os conceitos utilizados ao longo do


texto, também será exposto, sinteticamente, o que pensamos acerca
deles a partir dos referenciais teóricos que iremos utilizar, porque
o processo de construção do conceito e do contexto simbólico e
social da cidadania pode estar tanto para o favorecimento da classe
dominante quanto da classe dominada.

Após o Renascimento, a história trabalhou uma nova concepção


de cidadania, articulando-a à democracia. O conceito de
democracia é sintetizado pelo autor como soberania popular, em
outras palavras, ter participação ativa na formação do governo e no
controle da vida social configura a ação do cidadão. “[...] E é a mais

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 9


exitosa tentativa até hoje inventada de superar a alienação na esfera
política.” (COUTINHO, 2005, p. 1)

Uma das ideias que melhor expressam a democracia é


precisamente o conceito de cidadania.

[...] Cidadania é a capacidade conquistada por alguns


indivíduos, ou (no caso de uma democracia efetiva)
por todos os indivíduos, de se apropriarem dos
bens socialmente criados, de atualizarem todas as
potencialidades de realização humana abertas pela vida
social em cada contexto historicamente determinado.
(COUTINHO, 2005, p. 2)

Soberania popular, democracia e cidadania são expressões que,


em última instância, sintetizam a mesma coisa, e devem ser pensadas
como processos históricos de conquistas de novas determinações
e não como algo dado, que vem de cima para baixo (COUTINHO,
2000).

Questão para reflexão


No Brasil, vivemos uma soberania popular?

A noção de cidadania não surgiu nos tempos modernos, mas


sim na Grécia clássica, antes da era cristã, quando os gregos
estabeleceram relações em que os cidadãos tinham direitos políticos
e contribuíam para a formação do governo. Porém, não eram
considerados cidadãos: escravos, mulheres e estrangeiros, esses
grupos constituíam mais de três quartos da população ateniense
adulta.

[...] E foi precisamente com base nisso que Aristóteles


definiu o cidadão: para ele, cidadão era todo aquele que
tinha o direito (e, consequentemente, também o dever)
de contribuir para a formação do governo, participando
ativamente das assembleias onde se tomavam as decisões
que envolviam a coletividade e exercendo os cargos que
executavam essas decisões. (COUTINHO, 2005, p. 3)

10 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Ainda segundo Coutinho (2005, p. 3), citando John Locke, “[...] no
mundo moderno, a noção e a realidade da cidadania também estão
organicamente ligadas à ideia de direitos, mas, num primeiro momento,
ao contrário dos gregos, precisamente à ideia de direitos individuais
ou civis”. Locke baseia seu pensamento na afirmação de que os seres
humanos têm direitos naturais, independente da organização social em
que vivem.
Coutinho (2005) explica que, para Locke, a função fundamental do
Estado é a de garantir esses direitos. Um dos direitos inalienáveis que
Locke preconizava era à propriedade – inclusive o direito do proprietário
aos bens produzidos pelo trabalhador assalariado –, na versão liberal, o
Jusnaturalismo veio a favorecer a classe burguesa contra o absolutismo
e na institucionalização da exploração do capital com relação ao
trabalhador.
De acordo com Coutinho (2005, p. 6), apesar de alguns limites da
obra do sociólogo britânico T. H. Marshall, foi muito “[...] importante sua
contribuição para a compreensão da dimensão histórica da cidadania
quando [...] definiu três níveis de direitos de cidadania [...] (civil, político
e social) e também de insistir na dimensão histórica, processual, do
conceito e da prática da cidadania na modernidade”.
Nesta configuração, podemos exemplificar esses direitos da seguinte
forma:
Civis: relativos ao direito à vida, à liberdade, à segurança pessoal, entre
outros.
Políticos: dizem respeito à deliberação do homem sobre sua vida, ao
direito de ter livre expressão do pensamento, direito à prática política, de
representação direta e indireta, entre outros.
Sociais: referem-se às necessidades humanas básicas como o direito
à alimentação, habitação, saúde, educação, direito ao trabalho, entre
outros.

Para saber mais


Leia o livro do sociólogo T. H. Marshall acerca dessa
configuração da cidadania. Um clássico!
MARSHALL, T. H. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1967.

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 11


Concordando com Hegel, Coutinho (2005) afirma que a
cidadania é um fenômeno histórico e que os direitos naturais não
existem. Os direitos são fenômenos sociais, resultados históricos de
conquistas. Não obstante, o autor concorda que os direitos naturais
têm algo de verdadeiro no que diz respeito às expectativas de
direitos em dado momento histórico.

Sendo a cidadania um processo histórico, o autor discorda da


tese de que exista "democracia burguesa" e "democracia proletária"
(tese principalmente advinda de Lênin). “Segundo essa visão redutiva,
só seria ‘proletária’ a democracia direta, participativa, baseada
nos conselhos ou sovietes” (COUTINHO, 2005, p. 11). E isto, para
Coutinho (2005), descaracterizaria o processo de conquistas de
ampliação da democracia pelos trabalhadores frente ao liberalismo
burguês originário.

Assim, Coutinho (2005, p. 12) afirma que “[...] a ampliação da


cidadania – esse processo progressivo e permanente de construção
dos direitos democráticos que caracteriza a modernidade – termina
por se chocar com a lógica do capital”. Ou seja, no limite, a cidadania
plena (democracia, soberania popular) só existiria numa sociedade
sem classes (fora do sistema capitalista).

Baseando-se em Gramsci, Coutinho (2005) argumenta que a


realização da cidadania plena, o que também seria a superação do
sistema capitalista, dá-se, principalmente, pela conquista de novos
espaços na esfera pública. A correlação de forças entre a burguesia e
a classe subalterna acontece, principalmente, na nova configuração
do Estado, e que através de estratégias a classe trabalhadora pode
conseguir a hegemonia neste espaço e realizar seu projeto de
emancipação e construção de uma nova sociedade.

Para situar o leitor sobre a tese de Gramsci, citamos a síntese de


Peruzzo:

[...] Sociedade civil é o mundo da ideologia, da


hegemonia, da cultura ou da ‘direção intelectual e moral’,
situando-se, junto com a sociedade política (Estado),
no nível da superestrutura. Esta incorpora, assim, dois
planos: ‘o que pode ser chamado sociedade civil (isto é,

12 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


os organismos comumente chamados de privados) e o
da sociedade política ou Estado’, e corresponde à função
de ‘hegemonia’ que o grupo dominante exerce em toda
sociedade e àquela de ‘domínio direto’ ou comando, que
se expressa no Estado e no governo jurídico’. O grupo
dominante, por seus intelectuais orgânicos, age no seio
da superestrutura, orientando a vida social com base no
consenso da população ou então na coerção, por meio
do aparato de repressão estatal que assegura legalmente
a disciplina dos grupos que discordam. (PERUZZO, 1998,
p. 49, grifo do autor)

Não obstante, torna-se importante salientar que, segundo


Tonet (2007), este tipo de emancipação refere-se apenas à
emancipação política, pois esta pertence à superestrutura. É no
campo da infraestrutura que acontece realmente a emancipação
plena, com a instalação do trabalho associado e a superação do
sistema capitalista.

Contudo, entendemos que se torna estratégica a conquista


da cidadania plena, principalmente baseando-nos na teoria de
hegemonia de Gramsci, pois, conseguindo a hegemonia no
campo político, têm-se ferramentas poderosas para conquistar
hegemonia em outros campos, até mesmo no da infraestrutura. É
o que defende Peruzzo (1998, p. 50):

[...] Em determinados momentos, a supremacia do grupo


dirigente pode entrar em crise. Isto se dá quando, embora se
mantenha a dominação, desaparece a capacidade dirigente;
quando a classe que detém o poder político não sabe mais
verdadeiramente dirigir, resolver os problemas da coletividade;
quando a concepção do mundo que ela conseguia afirmar
passa a ser rechaçada. A classe social até então subalterna
pode tornar-se dirigente, por sua vez, quando indicar de
modo correto a solução para os problemas, quando tiver uma
concepção do mundo que conquista novos aderentes, que
unifica o alinhamento que se forma em torno dela. É essa a
concepção gramsciana da hegemonia.

Segundo Carvalho (2001), uma das dificuldades para a consolidação


de uma cidadania plena no Brasil é a inversão cronológica de sua

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 13


construção no país. No Brasil, a pirâmide dos direitos divulgada por
Marshall foi apresentada de cabeça para baixo. Enquanto o Executivo
praticou uma política paternalista de empregos e favores, nossas
liberdades civis foram historicamente suprimidas.
Ainda conforme o autor, entre as consequências que esta inversão
gerou na população brasileira, em contraste com a cidadania, foi a
instituição de uma cultura de “estadania”, ou seja, uma valorização
excessiva no Poder Executivo e a não utilização de verdadeiras
representações políticas na sociedade civil, ficando, assim, a população à
espera de um “messias político”.
Outra consequência foi a de “[...] uma visão corporativista dos
interesses coletivos” (CARVALHO, 2001, p. 223). Ou seja, cada grupo
procura negociar com o Governo ou com os legisladores (por troca de
voto) seus benefícios particulares: funcionários públicos, professores,
banqueiros, empresários, centrais operárias etc. Não há uma luta
consensual.
Segundo Pereira (2005), no Brasil-Colônia (1500-1822), não existia
um padrão de cidadania (direitos civis, políticos e sociais). Era um país
colonizado, escravocrata e agroexportador. De acordo com Carvalho
(2001), a identidade nacional foi marcada, desde a colonização, por
uma visão edênica de cidadania (orgulho de ser brasileiro por causa das
belezas naturais e artísticas do país e não pela construção de um Estado
de direitos). Os momentos de crise no país foram sempre de negociações
(exemplo disto foi a nossa Proclamação da Independência).
Com a Proclamação da República, em 1889, os direitos continuaram
cerceados devido à era do coronelismo. O movimento de luta por direitos
no país só começa a tomar certa forma com a vinda dos imigrantes
europeus, principalmente entre o período de 1884 e 1920. O Ideário
anarquista europeu serviu de base para que os operários reivindicassem
por direitos trabalhistas.
De acordo com Pereira (2005), a partir de 1930 o populismo de
Vargas criava um sentimento de cidadania baseado em benefícios
sociais e trabalhistas. Foi nessa época a criação da Legião Brasileira de
Assistência (LBA), que existiu com uma enorme estrutura assistencial até
os anos de 1995.
Ainda conforme Pereira (2005, p. 2), no período de 1945/64 – Período
Nacional desenvolvimentista e populismo –, houve o “[...] alargamento
dos direitos civis e políticos (maior participação política e urbanização) e

14 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


congelamento dos direitos e das políticas sociais. Manteve-se o modelo
de ‘cidadania regulada’ e a herança deixada pelo período Vargas”.
Conforme Pereira (2005, p. 1), no período de 1964/1985 – Ditadura
Militar –, houve uma “[...] modernização do país no quadro geral do
capitalismo monopolista”. Nessa época houve a supressão dos direitos
civis e políticos e expansão dos direitos sociais, criou-se o FGTS/PIS/
PASEP e o FUNRURAL.
Com o golpe de 64 quase não havia lugar na sociedade civil para
associações livres. Através das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs),
a Igreja Católica era praticamente um dos únicos lugares em que
a população podia se reunir para dialogar sobre as dificuldades do
cotidiano.
Na área acadêmica, um espaço aberto à crítica foi constituído pela
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) com seus
imensos congressos anuais. “Na sociedade faziam-se presentes a Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI)
e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)” (SOUZA, 1997, p.
78 apud ZAMBON, 2004, p. 28).
Com a posse do general Ernesto Geisel, em 1974, teve início o lento
retorno à democracia, com a chamada “abertura” política. O auge da
mobilização popular foi a campanha pelas eleições diretas em 1984.
Houve vários comícios pelo Brasil todo, começando em Goiânia, com
cinco mil participantes e chegando a reunir 1 milhão de pessoas em São
Paulo.
Mesmo com a derrota da campanha “Diretas Já”, a era militar acabara
com a eleição de um civil para a Presidência da República após 21
anos de dominação militar. O período de 1985/1988 foi um período
de redemocratização. Em 1986, foi formada uma Assembleia Nacional
Constituinte e, em 1988, promulgada a nova Constituição brasileira,
assegurando aos cidadãos brasileiros os direitos de cidadania.
No seu artigo primeiro estão os fundamentos da Carta Magna:

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela


união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e
tem como fundamentos:
I - a soberania; II - a cidadania;

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 15


III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V -
o pluralismo político.
Parágrafo único - Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição. (BRASIL, 1988)

Entre os direitos civis estabelecidos:

[...] todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à
propriedade. (BRASIL, 1988)

Conforme o Artigo 6º da Constituição Federal de 1988, ficaram


assegurados, entre outras regulamentações, os seguintes direitos
sociais: a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância e a assistência aos desamparados.

No campo dos direitos políticos, ficou garantida a soberania


popular por meio dos seguintes avanços: sufrágio universal; voto
direto e secreto; direito ao plebiscito, referendo e iniciativa popular;
entre outras regulamentações.

Outra importante mudança na nova Constituição foi seu cunho


descentralizador, que abriu novos espaços de participação política
para a população, através de conselhos e conferências. A população
passa a ter canais abertos para a criação, gestão e controle das
políticas públicas. São espaços que permitem a participação ativa
da população, além da mera participação eleitoral, onde se pode
tomar decisões sobre as políticas públicas, deliberar prioridades,
fiscalizar estas deliberações e garantir o uso dos recursos públicos
de acordo com as prioridades estabelecidas pela população.

Entre os espaços de participação instituídos na nova


Constituição, há também o referendo e o plebiscito. São
espaços que não ficaram muito bem assegurados devido à sua

16 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


burocratização. Estes espaços deveriam servir para que a população
tivesse um acesso fácil às medidas legislativas e assuntos de
interesse da população.

Questão para reflexão


Você já conhecia esses e os outros direitos da CF de 1988?
Você procura exercê-los, participando de alguma forma da
vida social do país?

Segundo Pereira (2005), apesar dos direitos adquiridos por


meio da nova Constituição, a década de 90 – Governos Collor e
FHC – foi marcada pelo avanço do neoliberalismo. Os direitos civis
foram ameaçados e houve esvaziamento dos direitos políticos
e desarticulação dos movimentos sociais. O campo dos direitos
sociais também foi afetado. Conforme Behring e Boschetti (2008,
p. 165), “[...] os recursos permanecem extremamente concentrados
e centralizados, contrariando a orientação constitucional da
descentralização”.

A ofensiva neoliberal, no campo das políticas sociais, procura


transferir as políticas públicas para a esfera privada. Contudo, esse
“enxugamento do Estado” só é incisivo aos direitos dos cidadãos;
pois, com relação ao capital, o Estado pratica uma política de
proteção e de financiamento, exaltando o mercado. O cidadão fica
reduzido à condição de consumidor e a questão social se agrava.

A questão social apreendida aqui diz respeito a:

[...] Como o conjunto das expressões das desigualdades


da sociedade capitalista madura tem uma raiz comum: a
produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-
se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos
seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma
parte da sociedade. (IAMAMOTO, 2003, p. 27)

[...] Atílio Borón, sociólogo argentino, sustenta serem


as políticas neoliberais presididas por uma dupla
articulação. Por um lado, a satanização do Estado; o

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 17


Estado é tido como o diabo, responsável por todas
as desgraças e infortúnios que afetam a sociedade
capitalista. Por outro lado, a exaltação e a santificação
do mercado e da iniciativa privada, vista como a esfera
da eficiência, da probidade e da austeridade, justificando
a política das privatizações. O resultado é um Estado
cada vez mais submetido aos interesses econômicos e
políticos dominantes, renunciando a importantes graus
de soberania nacional, em um contexto no qual há ampla
prevalência do capital financeiro, ou uma ‘financeirização
da economia’, nas palavras de Mattoso. (IAMAMOTO,
2003, p. 35, grifo do autor)

Conforme Carvalho (2001), no Brasil, o conceito de cidadania


apresenta uma sensação de incompletude em função do drama
da desigualdade social no país. Infelizmente, a instituição da Carta
Constituinte de 88 não significou a efetivação desses direitos para o
cidadão. O Brasil apresenta um dos maiores índices de desigualdade
do mundo, quaisquer que sejam as medidas utilizadas.

Omitindo muitas outras questões sociais que poderíamos


abordar, tais como os graves problemas nas áreas de habitação,
saúde, segurança pública, discriminação por raça e gênero, vamos
nos deter em apontar a situação da educação no país, por ser esse
o nosso tema.

De acordo com IBGE (2009), o acesso das crianças brasileiras


de 7 a 14 anos de idade ao Ensino Fundamental é de 97,9%, baseado
nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de
2008 (PNAD). No entanto, apesar da aparente inclusão social desta
política, quando se examina a sua qualidade é que se tem uma
visão melhor da realidade. É o que podemos verificar na citação
a seguir, extraída de Radar Social 2006, do Instituto de Pesquisas
Aplicadas (IPEA):

[...] Variados fatores, internos e externos à escola,


condicionam a precária qualidade do ensino no
país: infraestrutura física deficiente; professores
mal remunerados e, por vezes, desestimulados e

18 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


pouco qualificados para a intervenção pedagógica
junto a grupos e contextos sociais desfavorecidos;
necessidade da criança de ingressar no mercado de
trabalho para complementar a renda familiar; falta de
suporte educacional dos pais e de acesso aos meios
de comunicação e veiculação do conhecimento. (IPEA,
2006, p. 46)

Tais informações, especialmente por virem de um órgão oficial


do governo brasileiro, demonstram a precariedade da educação no
país, máxima por ser esta uma política pública fundamental para o
desenvolvimento do ser humano e da coletividade como um todo, já
que o conhecimento vai possibilitar aos sujeitos a capacidade crítica
e criativa para se organizarem e atuarem em busca de uma nova
sociedade. E os dados não param por aí.

Um dos grandes desafios apontados em relação à educação no


Brasil refere-se à realidade do Ensino Médio, apontado como essencial
para a inserção do indivíduo no mercado de trabalho. Segundo o IBGE
(2009), como dificuldades encontramos as relacionadas ao acesso, à
permanência, ao desempenho e à conclusão do curso pelos alunos.
É de 84,1 % a média geral da taxa de frequência dos adolescentes de
15 a 17 anos de idade da população em geral.

No entanto, quando essa média é relacionada à renda da


população, a desigualdade social é gritante. Enquanto os 20% mais
ricos têm taxa de frequência de 78,4%, os 20% mais pobres têm
apenas 30,5%. A segmentação continua quando analisamos o status
da escolaridade no país, medida pelo total de anos de estudo das
pessoas com 25 anos de idade ou mais. A média do tempo de estudo
dos 20% mais ricos é 10,3 anos de estudo, enquanto os 20% mais
pobres têm uma média de estudo de 4,3 anos.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP


– divulgou recentemente o Censo da Educação 2010. Segundo este
órgão, o número de estudantes atendidos em 2010 na Educação
Básica pública e privada, contemplada pela Educação Infantil, Ensino
Fundamental 1 e 2 e Ensino Médio; além das modalidades: Educação
Especial, Educação Profissional, Educação de Jovens e Adultos e
Indígenas foi de 51,5 milhões, conforme aponta o Censo escolar

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 19


2010. Desse total, 43,9 milhões estudam nas redes públicas, (85,4%) e
7,5 milhões em redes particulares, (14,6%).

Porém, esse ainda é um índice insatisfatório, porque, para atender


100% das crianças, adolescentes e jovens em idade escolar, o número
de matrículas foi menor que o ano anterior, 52,5 milhões de crianças
atendidas na educação básica.

• DICA DE FILME

Júlio César (diretor Joseph L. Makiewicz). Você pode compreender


o processo de construção da cidadania romana por meio desse filme.

• ATENÇÃO

O aparato legislativo deve ser conhecido por todos a fim de ser


efetivado na busca por práticas sociais pautadas no conceito de
Cidadania visto até o momento. Não fique de fora!

Todos esses avanços são significativos, porém, não são suficientes


para que efetivamente a educação cidadã ocorra. Embora o aparato
legislativo seja de suma importância tanto para a escola quanto para
a sociedade, e considerando que se configura em um instrumento
necessário para os interessados e envolvidos com a educação cidadã,
muitos estudiosos afirmam que, apesar de o Brasil possuir uma das
melhores legislações do mundo, não há efetivação prática. Entende-
se que um texto bem escrito não é garantia de prática efetiva da lei, é
a chamada cidadania de papel, como classifica Sacristan (2000, p. 41),
“garantida nos papéis, mas não existe de verdade”. Ainda conforme o
autor:

[...] Para eliminar a distância entre os direitos garantidos


no papel e o efetivamente praticado, todos os envolvidos
com a temática da Cidadania têm a missão de fomentar
ideias práticas para que esse aparato não seja mais
um apanhado de belas palavras que ora ou outra são
consultadas, mas que seja um norteador para o exercício
da cidadania em nosso país. (SACRISTAN, 2000, p. 41)

20 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


• DICA DE LEITURA:

Você não pode deixar de ler esse livro: O Cidadão de Papel -


DIMENSTEIN, Gilberto.

Acesse o link e leia essa importante referência.

Disponível em: <http://sites.aticascipione.com.br/cidadaodepapel/


atualidade. asp?ID=140>. Acesso em: 14 fev. 2016. O livro trará
contribuições significativas para a nossa reflexão.

Daremos início à exploração do conceito de Educação Popular.


Concebida de várias maneiras, tanto histórica quanto teoricamente:
há concepções folclóricas, de massa, anarquista, comunista, de
inclusão social, de desenvolvimento de cidadania, educação para o
trabalho, atos de propagandas, de informação, entre outras.

Não significa que a Educação Popular não possa agregar estes itens
elencados. Mas, em suma, a Educação Popular deve ser aquela que
promove o comprometimento das pessoas e a participação destas
no exercício do poder, na esfera pública ou privada, com autonomia
e informação. A manipulação e a cooptação descaracterizam e
desestimulam a participação livre e ativa dos sujeitos, que têm a
capacidade de transformar.

[...] Somente um ser que é capaz de sair de seu contexto, de


‘distanciar-se’ dele para ficar com ele; capaz de admirá-lo
para, objetivando-o, transformá-lo e, transformando-o,
saber- se transformado pela sua própria criação; um ser
que é e está sendo no tempo que é o seu, um ser histórico,
somente este é capaz, por tudo isto, de comprometer-se.
(FREIRE, 1983, p.17)

Ainda conforme o autor, esta ação-reflexão faz do homem um


ser da práxis. O homem se desenvolve na sua relação (ação-reflexão)
com o mundo (realidade, meio). Quando um homem comprometido
com uma responsabilidade histórica, com a humanização, que está
engajado na transformação da realidade é impedido de atuar, este
estado de frustração causa nele um sentimento de superação.

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 21


Segundo Freire (1983, p. 19), o comprometimento com a
humanização e o compromisso com a solidariedade não podem
compactuar com a neutralidade. O posicionamento neutro é
impossível, porque ou nos comprometemos com a humanização,
ou com a desumanização, “que é desumanizar-se também”. O
humanismo é um compromisso radical com o homem concreto, que
se orienta no sentido de transformação de qualquer situação objetiva
na qual o homem concreto esteja sendo impedido de ser mais.

Ainda, o homem não pode estar fora de um contexto


histórico- social em que as inter-relações constroem seu
eu, é um ser autenticamente comprometido, falsamente
“comprometido” ou impedido de se comprometer
verdadeiramente. O alienado, seja profissional ou não,
pouco importa, não distingue o ano do calendário do ano
histórico. (FREIRE, 1983:19-20.24)

De acordo com Freire (1983, p. 28), o homem busca a Educação


porque sabe que é um ser inacabado, ele quer ser mais; porém, essa
busca não pode ser solitária, necessita ser mais com os outros, senão –
sozinho – busca-se ter mais e ser menos. A partir da proposta libertadora
de Paulo Freire, a Educação Popular deve ser pautada pela valorização
dos saberes entre educador e educando, tendo como objetivo principal
a transformação social.

• PARA REFLETIR
De acordo com a leitura, ficou claro que o homem deve ser o sujeito
de sua própria Educação. Não pode ser o objeto dela. Mas, afinal, o que
isso significa na prática?
Pode-se afirmar que é necessário que haja troca de saberes entre
o educador (saber formal) e o educando (saber informal), e que deve
ser promovida a interação entre ambos no processo de ensino e
aprendizagem. Neste tipo de Educação, é preciso quebrar a postura
unilateral de que o saber formal é mais importante e que o educando
nada sabe. Todo sujeito carrega consigo uma gama de conhecimentos
específicos, uma realidade subjetiva (seu mundo interior), que adquire
por meio da cultura e da história.

22 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Trabalhar com a Educação das singularidades, ou seja, do ser próprio
de cada um, envolve conflitos, pois cada um tende a conservar seu
modo de ser, sua realidade subjetiva. Não obstante, fomentar a Educação
Popular em indivíduos que se encontram na fase da socialização
secundária torna-se um trabalho árduo, visto que o indivíduo procura
preservar o que apreendeu na socialização primária1.
Os processos formais da socialização secundária são determinados
por seu principal problema, a suposição da presença de um processo
precedente de socialização primária, isto é, deve tratar com uma
personalidade já formada e um mundo já interiorizado. Não é possível
construir a realidade subjetiva ex nihilo. Configura-se em problema porque
a interiorização da realidade tende a persistir, independe dos novos
conteúdos, pois os processos da socialização secundária precisam, de
certo modo, sobrepor-se a esta realidade já presente. Há, portanto, um
problema de coerência entre as interiorizações primitivas e as novas. O
problema pode ser de solução mais ou menos difícil, conforme o caso
(BERGER; LUCKMANN, 2001, p. 187).
O autor argumenta ainda que, para modificar as crenças do mundo
interior de alguém, na fase secundária, exige-se um trabalho árduo
e paciente. São necessários graves choques no curso da vida para
desintegrar a maciça realidade interiorizada na primeira infância. É preciso
muito menos para destruir as realidades interiorizadas mais tarde... O tom
de realidade do conhecimento interiorizado na socialização primária é
dado quase automaticamente. Na socialização secundária, tem de ser
reforçado por técnicas pedagógicas específicas, “provadas” ao indivíduo
(BERGER; LUCKMANN, s/d, p. 191).
Nessa perspectiva de uma Educação Popular em colaboração para
a transformação social, a Comunicação exerce um papel fundamental.
A continuidade de ações de Comunicação Popular e Comunitária
ajuda a manter um processo dialético de construção de identidade
na comunidade, fortalecendo o desprendimento de um pensamento
burguês. “Estar em sociedade já acarreta um contínuo processo de
modificação da realidade subjetiva” (BERGER; LUCKMANN, s/d, p. 207).
Sendo assim, torna-se necessário atentar para as ações de
Comunicação Popular e Comunitária, pois:

Nota-se que socialização primária é a adquirida, no contexto escolar, na Educação Infantil e Ensino Fundamental 1 (1º ao
1

5º ano) e socialização secundária no fundamental 2 (6º ao 9º ano).

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 23


[...] Ao mesmo tempo em que o aparelho de conversa mantém
continuamente a realidade, também continuamente
a modifica. Certos pontos são abandonados e outros
acrescentados, enfraquecendo alguns setores daquilo que
ainda é considerado como evidente e reforçando outro.
(BERGER; LUCKMANN, s/d, p. 203)

Considera-se como referência para essa intervenção a Educação em


uma perspectiva libertadora, pautada na direção ético-política e teórico-
metodológica. E aqui, considerando a própria concepção de Educação
de Paulo Freire, não deve haver uma Educação bancária, muito menos
autoritária ou pretensa à neutralidade.

1.2 A função social da escola pública


A palavra educação é derivada do latim educare, o termo é composto
pela junção do prefixo ex, que significa “fora”, educere, “conduzir” ou
“levar”, logo, traduzida como conduzir e/ou levar para fora. A educação
sempre esteve no cerne das relações sociais. Como preconiza Brandão
(2007, p.7), "ninguém escapa da educação", ela perpassou pelo mundo
social. No começo, nas sociedades primitivas, a educação existia sem a
escola, ocorria no bojo familiar e comunitário, sem livros, professores,
métodos pedagógicos e salas de aulas, existia livremente, estava em tudo
e em todos. Conforme o autor, a educação pode ser traduzida como
aquilo que é comunitário, que torna comum uma ideia, saber ou crença,
podendo existir como forma de coerção social, e ainda o ato humano
de educar existe tanto no trabalho pedagógico que ensina na escola
quanto no ato político que luta na rua por outro tipo de escola, por outro
tipo de mundo (BRANDÃO, 2007, p. 110).
Nas comunidades primitivas, o significado do termo “direcionar
para fora” era empregado no sentido de preparar as pessoas para a
vida em sociedade, com vistas a conduzi-las para fora de si. Haviam as
comunas primitivas em que se dividia tudo entre os grupos e o lema era
aprender fazendo. Os valores agregados para criar as futuras gerações
e os saberes eram acumulados e transmitidos de geração em geração.
Nesse período, os professores eram os mais velhos, os chefes de
família, que visavam à garantia de que a tradição fosse mantida a fim de
assegurar a sobrevivência do grupo, e a prática educativa ocorria com

24 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


a aquisição de instrumentos de trabalho e na interiorização de valores
e comportamentos, enquanto o meio ambiente, em seu conjunto, era
contexto permanente de formação. Em outras palavras, o objetivo era
ajustar a criança ao seu ambiente físico e social, por meio da aquisição
das experiências.
A partir da Idade Média a educação tornou-se um produto da escola,
surge a escola da nobreza, onde o clero dominava e passava seus
ensinamentos para as elites (a educação escolar destinava-se àqueles
que não precisavam trabalhar). A função da escola fundamentou-se
na relação de transmissão do saber. Na época antiga e medieval, a
escola se constituía numa estrutura simples, limitada à relação de um
mestre com seus discípulos, entretanto, a função supervisora se fazia
presente nas relações (mestre/criança). A função desse educador era a
de vigiar, controlar, punir, enfim, supervisionar todos os atos da criança,
diferentemente do que ocorria nas comunidades primitivas, onde não
havia esse contexto de supervisão.
Com o advento da Revolução Industrial, houve uma transformação
social. Vivenciou-se o ápice da desunião em que a única preocupação
era com a produção de bens de consumo e o acúmulo do capital. A
escola teve que se modernizar, surgiram as disciplinas científicas que
ensinavam o mínimo necessário para o indivíduo se preparar para o
trabalho e tornar-se um bom cidadão. Nesse momento, a função social
da escola era apenas formar seus alunos para atender as exigências do
mercado a fim de alavancar a economia

• PARA REFLETIR
De acordo com seus conhecimentos sobre educação contemporânea
e a partir do que você leu até o momento, existem semelhanças entre a
educação vivenciada por você e a educação primitiva?
Na atualidade, segundo Garcia (1993), a escola desempenha um papel
importante, ela existe para a socialização e a produção do conhecimento
humano. Deve ser garantida a todas as crianças a condição de sujeitos
do próprio conhecimento, criando para elas a oportunidade de
validarem os conhecimentos que já trazem sobre o mundo, sobre as
relações e sobre si mesmas, ampliando e aprofundando ao máximo
esses conhecimentos, iniciando na educação infantil e no decorrer de
toda a escolaridade. Outra contribuição importante para a definição de

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 25


educação advém de Freire (1979, p. 77), “[...] é comunicação, é diálogo, é
um encontro de sujeitos interlocutores que procuram a significação dos
significados".
No que tange à função social da escola, Vygotsky (1997) afirma que
socializar o saber sistematizado, tornando-o instrumento para as classes
populares na aquisição de conhecimentos e habilidades para a luta
contra as desigualdades sociais e para a participação no processo de
transformação social, deve ser a prioridade. Uma outra definição muito
pertinente é de Freire (1983):

[...] Enquanto a prática “bancária” enfatiza, direta ou


indiretamente, a percepção fatalista que estejam tendo
os homens de sua situação, a prática problematizadora,
ao contrário, propõe aos homens sua situação como
problema. Propõe a eles sua situação como incidência
de seu ato cognoscente, através do qual será possível
a superação da percepção mágica ou ingênua que dela
tenham. A percepção ingênua ou mágica da realidade
da qual resultava a postura fatalista cede seu lugar a
uma percepção que é capaz de perceber-se. E porque
é capaz de perceber-se enquanto percebe a realidade
que lhe parecia em si inexorável, é capaz de objetivá-la.
Desta forma, aprofundando a tomada de consciência da
situação, os homens se “apropriam” dela como realidade
histórica, por isto mesmo, capaz de ser transformada por
eles. O fatalismo cede, então, seu lugar ao ímpeto de
transformação e de busca, de que os homens se sentem
sujeitos. (FREIRE, 1983, p. 85)

Desta forma, a escola torna-se a práxis que comporta a ação e a


reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo, e os estudantes
não se sentem marionetes/controlados por uma educação bancária, a
ação torna-se mais criativa e transformadora sobre o mundo.

Para saber mais


Acessando o site: <http://www.paulofreire.org>, você
conhecerá um pouco mais sobre o mais célebre educador
brasileiro: Paulo Freire (1921- 1997). Conhecido e reconhecido
internacionalmente, principalmente pelo método de

26 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


alfabetização de adultos, ele desenvolveu um pensamento
pedagógico assumidamente político. Para ele, o objetivo maior
da educação é conscientizar o aluno, o que implica conduzi-
lo ao entendimento da sua situação de oprimido e a ação a
favor da própria libertação. Entre seus principais trabalhos está
Pedagogia do Oprimido (um resumo de sua obra).

No cerne das definições apresentadas está sempre presente o desejo


de assegurar a formação ou o desenvolvimento humano, pois a escola é
capaz de modificar comportamentos e atitudes visando a uma sociedade
mais justa, igualitária, democrática, que respeita as diferenças e em que
todos os direitos fundamentais são assegurados. Esse é o papel social
que a escola deveria desempenhar.
Já a função da escola pública é a de possibilitar acesso à emancipação
humana e à transformação social por meio da transmissão de saberes
historicamente sistematizados pela humanidade. Nesse contexto, cabe à
comunidade escolar garantir que o conhecimento científico e filosófico
seja oferecido com qualidade a fim de que possam ser transformados
em fazeres e saberes para a emancipação intelectual do aluno e que
venham a estimular o domínio de conteúdos que ganharão significação,
tanto para educador como para educando.
Em relação ao ensino público brasileiro, destaca-se no aparato
legislativo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei nº 9.394/96.
Conforme a lei, a educação não pode ser apenas transmitida, deve
estar vinculada ao mundo do trabalho e à prática social. A educação
abarca diferentes vieses de formação do ser humano: o trabalho, as
manifestações culturais, o aprendizado na escola e na universidade,
entre outros, conforme apontado na sequência:

Dos Princípios e Fins da Educação Nacional


Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada
nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade
humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do
educando, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho.
Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes
princípios:

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 27


I - igualdade de condições para o acesso e permanência
na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a
cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tolerância;
V - coexistência de instituições públicas e privadas
de ensino; VI - gratuidade do ensino público em
estabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da educação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma
desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extraescolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
práticas sociais. (BRASIL, 1996, p. 53)

E ainda, preconiza no art. 4º que é dever do Estado garantir:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro)


aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte
forma:
a) pré-escola; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013).
b) ensino fundamental; (Incluído pela Lei nº 12.796, de
2013).
c) ensino médio; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013).
II - educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco)
anos de idade; (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013).
III - atendimento educacional especializado gratuito
aos educandos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação,
transversal a todos os níveis, etapas e modalidades,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - acesso público e gratuito aos ensinos fundamental
e médio para todos os que não os concluíram na idade
própria; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino,
da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade
de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às
condições do educando;
VII – oferta de educação escolar regular para jovens e
adultos, com características e modalidades adequadas

28 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se
aos que forem trabalhadores as condições de acesso e
permanência na escola;
VIII - atendimento ao educando, em todas as etapas da
educação básica, por meio de programas suplementares
de material didático-escolar, transporte, alimentação e
assistência à saúde;
IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos
como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de
insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo
de ensino- aprendizagem;
X – vaga na escola pública de educação infantil ou de
ensino fundamental mais próxima de sua residência a
toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro)
anos de idade.
Art. 5º O acesso à educação básica obrigatória é direito
público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de
cidadãos, associação comunitária, organização sindical,
entidade de classe ou outra legalmente constituída e,
ainda, o Ministério Público, acionar o poder público para
exigi-lo.
§ 2º Em todas as esferas administrativas, o poder público
assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino
obrigatório, nos termos deste artigo, contemplando
em seguida os demais níveis e modalidades de ensino,
conforme as prioridades constitucionais e legais.
§ 5º Para garantir o cumprimento da obrigatoriedade
de ensino, o poder público criará formas alternativas
de acesso aos diferentes níveis de ensino,
independentemente da escolarização anterior. Art. 6º É
dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das
crianças na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos
de idade.

Nota-se que, legalmente, há um esforço em garantir o acesso


e a permanência do indivíduo na escola desde a infância até a
universidade. Muito embora, estar no ambiente escolar não é
certeza de aprendizagem. Entre os inúmeros problemas que
permeiam o contexto escolar, está a desmotivação dos professores
para aprender e, principalmente, para ensinar, logo, um dos
grandes desafios da escola pública consiste em encontrar um
profissional altamente qualificado, voltado à pesquisa e à reflexão
de sua prática pedagógica, que contribua com a função escolar

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 29


de ensinar conteúdos curriculares concomitantes ao processo
pautado em princípio da cidadania popular.
Importante esclarecer que não se deve culpabilizar o professor
por tal ação, porque há uma série de fatores que podem influenciar
e cooperar para a baixa qualidade motivacional dos estudantes:
a obrigatoriedade da frequência à escola; conteúdos curriculares
dissociados da realidade; atividades pouco ou nada desafiadoras;
precariedades na infraestrutura; escassez de recursos tecnológicos,
entre outros. Acrescenta-se a esse conjunto a preocupação
dos estudantes em focalizar atenção sobre as exigências que
devem ser atendidas com êxito, além de satisfazer aos interesses
familiares e sociais (BROOPY, 1987). Tais situações despertam
grande apreensão em todos os envolvidos com a aprendizagem (e,
obviamente, sobretudo nos alunos), acarretando desmotivação – e
aluno desmotivado não aprende tudo que pode e não desenvolve
sua capacidade ao máximo (STERNBERG, 1998).
Sabe-se que, na escola, o aluno necessita se adequar ou se
adaptar a normas e condições (muitas vezes precárias, quer na
estrutura física, quer na pedagógica) a fim de aprender o mínimo
esperado para o seu ano escolar, porém, é patente que os fatores
elencados anteriormente colaboram para a baixa qualidade
motivacional dos estudantes. Todavia, a culpa não deve recair
sobre os professores, já que toda a comunidade escolar deve
trabalhar para evitar e/ou combater as situações inadequadas ao
ambiente saudável de aprendizagem.
O desenvolvimento de um clima favorável contribui muito para
que haja a valorização da atividade em si, para a contemplação
das necessidades dos estudantes (de competência, autonomia e
pertencimento) e, assim, para o desenvolvimento de uma motivação
intrínseca ou ao menos autodeterminada (DURÃO, 2011). E tal
ação acredita-se estar ao alcance de todos os envolvidos com a
educação escolar.

Atividades de aprendizagem
1. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei nº 9.394/96
- preconiza que a educação não é uma mera transmissão de conhecimentos
e deve estar vinculada ao mundo do trabalho e à prática social. Em outras

30 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


palavras, a educação abarca diferentes vieses da formação do ser humano:
o trabalho, as manifestações culturais, o aprendizado na escola e na
universidade, entre outros. Sendo assim, assinale a alternativa correta:
a) A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho.
b) A educação, dever do Estado, inspirada nos princípios de liberdade
e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho.
c) A educação, dever da família, inspirada nos princípios de liberdade
e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho.
d) A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade a
qualificação para o trabalho.
e) A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de
liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

2. Quanto à função social da escola, Vygotsky (1997) define que


socializar o saber sistematizado, tornando-o instrumento para as classes
populares na aquisição de conhecimentos e habilidades para a luta
contra as desigualdades sociais e para a participação no processo de
transformação social, deve ser a prioridade. Como efetivamente a escola
pode instrumentalizar seus alunos para amenizar ou excluir as diferenças
sociais?

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 31


Seção 2

A cidadania popular no contexto escolar


Introdução à seção

É notório que, na atualidade, o conceito de Cidadania se insere


em qualquer meio social, contudo, ao apresentá-lo atrelado ao
contexto escolar, podemos cometer alguns equívocos. O primeiro
deles é defender a ideia de que conscientizando o educando
ao cumprimento de direitos e deveres estamos assegurando
uma educação de qualidade e humanista. Outra questão é não
promover práticas educativas fomentadoras de reflexão, ou ainda
descontextualizadas do conteúdo formal. Em outras palavras,
o ensino tradicional, com foco no professor, na transmissão
de conteúdos, conceitos, memorização e em boas notas,
paulatinamente contribui para uma educação não promotora de
liberdade. Acredita-se que a educação pautada em práticas
cidadãs é voltada para a libertação das injustiças e discriminações
de classe, gênero e raça, levando o aluno a intervir criticamente no
mundo, por meio da participação consciente e ativa. Tal educação
promove o desenvolvimento de educandos livres, conscientes e
comprometidos com a transformação da sociedade.

Práticas de Cidadania Popular em nosso país não são recorrentes,


embora, temos alcançado muitas conquistas após o fim do regime
militar (1964-1985), principalmente no âmbito dos direitos. Sabe-
se que a cidadania está muito distante da maioria da população
brasileira, pois a conquista dos direitos políticos, sociais e civis não
afastou a miséria, os altos índices de desemprego, de analfabetismo
e o drama nacional das vítimas da violência particular e oficial.

• DICA DE FILMES

1. A escola da vida.

2. Entre os muros da escola.

32 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Ambos contribuem para ampliar seus conhecimentos acerca da
formação para cidadania no contexto escolar.

Atividades de aprendizagem
1. Após a análise prática do tema cidadania exercida na escola, proponho
que você aponte uma nova alternativa de ação, envolvendo a comunidade
escolar em prol da cidadania popular.

2. Mesmo que timidamente, pode-se afirmar que, atualmente, lutar para


que as práticas de Cidadania sejam vivenciadas em ambiente escolar
equivale a lutar pela construção de um mundo cada vez mais justo e livre.
Para tanto, a torna-se uma ferramenta poderosa no contexto escolar.
a) Escolarização.
b) Conscientização.
c) Libertação.
d) Aprendizagem.
e) Luta.

Fique ligado
• Caro aluno, nesta unidade você teve acesso a importantes
conceitos de educação, cidadania popular e escola pública. Caso
ainda tenha dúvidas, procure ler as referências apresentadas ao longo
da unidade. Solicito atenção especial para a leitura da Lei de Diretrizes
e Bases da Educação e Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da
Educação Básica, que consolidam a legislação sobre a educação
brasileira.

TOME NOTA:
• A educação é um ato antigo e que passou por inúmeras
transformações até chegar ao modelo atual.
• A sua função social, atualmente, é garantir condições de equidade
a todos os alunos atendidos por esse nível de ensino.
• Cidadania é a capacidade conquistada por alguns indivíduos, ou

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 33


(no caso de uma democracia efetiva) por todos os indivíduos, de se
apropriarem dos bens socialmente criados, de atuarem em todas as
potencialidades de realização humana abertas pela vida social em
cada contexto historicamente determinado (COUTINHO, 2005, p. 2).
• O conceito de cidadania popular está pautado em uma tomada
de consciência que pode ocorrer por meio de uma mediação
adequada da aprendizagem.

Para concluir o estudo da unidade


Ao abordar o conceito de Cidadania atrelado ao âmbito escolar,
logo se submete à ideia de que, conscientizando o educando ao
cumprimento de direitos e deveres estamos assegurando a ele
uma educação de qualidade e humanista. Contudo, acredita-se que
educação pautada em práticas cidadãs vai além. Prioriza a verdade
absoluta, é voltada para a libertação das injustiças e discriminações de
classe, gênero e raça, levando-o a intervir criticamente no mundo, por
meio da participação consciente e ativa.
Ao fomentar uma reflexão acerca da temática Cidadania em
contexto escolar, objetiva-se manter a luta por uma sociedade
mais justa e democrática. O que em última análise significaria o
desenvolvimento de um educando cada vez mais livre, consciente e
comprometido com a transformação dessa sociedade.
Todavia, o ensino tradicional com foco no professor, na
transmissão de conteúdos, conceitos, memorização e em boas notas,
paulatinamente está cedendo lugar a uma abordagem mais dinâmica
de ensino, voltada para a construção do conhecimento, em que as
interações dialógicas professor-aluno, em sala de aula, são condições
para que ocorra um desenvolvimento saudável da aprendizagem.
Compreendendo a importância da escola, especialmente na
construção de valores morais e éticos, pergunta-se: nossa prática
está assegurando uma educação que prima pela conscientização?
Partimos da hipótese de que ainda não estamos promovendo uma
educação totalmente pautada em princípio de Cidadania, muito
embora as questões relacionadas à Cidadania fundamentam as
concepções presentes nos PPPs das escolas, mesmo que não tão
explícitas.

34 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Pretende-se com essa reflexão, mesmo que minimamente,
chamar a atenção dos leitores para a importância de explicitar e
difundir a cultura da cidadania nas práticas de ensino. Propõe-se que
essa prática educativa, “que não pode tudo, porém, pode alguma
coisa” (FREIRE, 1997, p. 32) seja considerada na formação de todos
os educadores a fim de assegurar o pleno desenvolvimento do ser
humano.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Podemos afirmar que cidadão é todo indivíduo que conhece e entende
os seus deveres e direitos na sociedade, sabendo reivindicá-los quando
necessário, exercendo a cidadania de forma ética, solidária e responsável.
Em outras palavras, ser cidadão é:
a) Ser ético em todas as suas ações.
b) Ser político, atuante no cenário econômico.
c) Ser trabalhador honesto.
d) Atuar na sociedade de modo consciente, democrático e não excludente.
e) Respeitar as leis e conhecer seus direitos.

2. Profissional encarregado de ministrar aulas de diversas disciplinas


incentivando o raciocínio e aguçando a curiosidade das pessoas às quais
deve ensinar. Estamos nos referindo ao:
a) Professor.
b) Psicólogo.
c) Assistente Social.
d) Educador físico.
e) Jornalista.

3. No âmbito escolar, é necessário garantir a todas as crianças a condição


de sujeitos do conhecimento, criando a oportunidade de validar os
conhecimentos que já trazem sobre o mundo, sobre as relações e
sobre elas mesmas, bem como ampliar e aprofundar ao máximo esses
conhecimentos, iniciando na Educação Infantil e no decorrer de toda sua
escolaridade. Pode-se afirmar que, atualmente, a escola tem a incumbência
de:
Assinale a sequência verdadeira:
(.....) Preparar para o mercado de trabalho.
(.....) Promover o diálogo, um encontro de sujeitos interlocutores que
procuram a significação dos significados.

U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular 35


(.....) Transmitir os saberes e ensinar aos alunos a se colocarem no lugar
dos outros.
(.....) Apenas de socialização e a produção do conhecimento humano.
(.....) Tem como meta a aprendizagem.
a) V - V - V - V - F.
b) F - F - F - V - V.
c) F - V - V - F - V.
d) F - V - V - V - V.
e) F - V - F - V - V.

4. O conceito de Comunicação Popular e Comunitária apropria-se


do cunho político da Comunicação Popular e o de comunidade da
Comunicação Comunitária, visando criar um meio de comunicação
que contribua para a construção de uma nova ordem societária mais
democrática. Confira, na sequência, algumas possibilidades para a prática
da Comunicação Popular e Comunitária:
I. Diversificação dos instrumentos, apropriação de meios e técnicas,
reelaboração de valores, formação das identidades, mentalidade de
serviço, preservação da memória.
II. Mentalidade de serviço, preservação da memória, democratização dos
meios e conquista da cidadania.
III. Autonomia institucional, articulação da cultura.
IV. Conquista de espaços, conteúdo crítico. Estão corretas as alternativas:
a) II e IV.
b) I, II, III, IV.
c) Apenas I.
d) Apenas III.
e) I e IV.

5. A escola contemporânea deve (re) pensar sua maneira de ensinar os


conteúdos e demais práticas que fundamentam o trabalho escolar,
principalmente para garantir o que consta nas leis, que define como função
da educação básica o fomento de ações para desenvolver o educando,
assegurando-lhe a formação comum indispensável para o exercício
da cidadania e fornecendo-lhe meios para progredir no trabalho e em
estudos posteriores. De que modo a escola pode articular os conteúdos
dos currículos com a prática de cidadania?

36 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


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40 U1 - O papel da escola pública para a formação da cidadania popular


Unidade 2

Saber pensar e aprender com


base na consciência crítica
Rodrigo Eduardo Zambon

Objetivos de aprendizagem
• Nesta Unidade, você vai ser levado a compreender como
se dá o desenvolvimento humano à luz de uma teoria específica.

• Irá conhecer qual é a importância do ambiente para a


construção do desenvolvimento humano.

• Compreenderá como o ser humano aprende a pensar.

• Refletirá acerca das ações que permeiam a formação do


assistente social, com enfoque na atuação da consciência crítica.

Seção 1 | Concepção acerca do desenvolvimento humano e processos


mentais
Na seção 1, você conhecerá o funcionamento do desenvolvimento humano
e do processo mental da aprendizagem à luz das teorias: Bioecológica
do Desenvolvimento Humano – TBDH, de Urie Bronfenbrenner (1979), e
Sociocognitivista, de Lev Vygotsky (1896-1934).

Seção 2 | A consciência crítica e suas implicações na ação social


Na seção 2, o esforço irá ocorrer no sentido de apresentar um panorama da
formação do assistente social e da defesa de uma atividade teórico-prática de
ensino e aprendizagem que tem no estágio supervisionado a possibilidade de
promover uma formação de qualidade, abarcando as dimensões teórico-
metodológica, ético-política e técnico-operativa da profissão. Também,
perpassamos nossa reflexão pela educação escolar, apresentada aqui como
prática libertadora e fomentadora da consciência crítica.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 41


Seção 3 | Metodologia da Problematização como uma proposta de
caminho para o saber e aprender com base na consciência crítica
Na seção 3, vamos estudar a Metodologia da Problematização com o Arco
de Maguerez, uma proposta de caminho para o saber e aprender com base
na consciência crítica. Apresentaremos um breve esboço de seus aspectos
históricos e teórico-metodológicos.

42 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Introdução à unidade
Vivemos em um tempo de incertezas, em um mundo no qual
cresce o conhecimento e a capacidade de produzir riquezas,
mas também em que se aumenta a insegurança sobre a própria
formação humana. Sob esse viés, nos perguntamos: que tipo de
homem pretendemos formar? Para qual sociedade? É notório que
a sociedade passou e ainda passa por grandes transformações, e
essas mudanças que ocorrem em todos os setores da sociedade
têm propiciado um novo modo de ser e de estar inserido nesta
realidade, alterando a noção de como ensinar com vistas a
fomentar um processo de conscientização. Pode-se visualizar que,
apesar desse processo acelerado de transformação estar posto no
bojo social, pouco se discute acerca do modo como ele ocorre. E
é isso que vamos discutir agora, ao refletirmos sobre o processo do
desenvolvimento humano e a capacidade de pensar criticamente.

Bom estudo!

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 43


Seção 1
Concepção acerca do desenvolvimento humano
e processos mentais
Introdução à seção

Falar sobre o desenvolvimento do ser humano pode parecer


fácil, mas não é. Sabe por quê? O conjunto ou o processo de
desenvolvimento estão muito relacionados com o contato que
estabelecemos com o mundo em que vivemos. Por isso, o conceito
de desenvolvimento pode sofrer alterações de uma pessoa para
outra, tendo em vista que é na interação com o meio social e físico
que iniciamos o nosso processo de desenvolvimento de maneira
maior e eficiente, logo, as crenças e toda a bagagem cultural que
envolve esse processo pode alterar as concepções de cada indivíduo.

Isso quer dizer que, para uns, o desenvolvimento começa quando


se estabelece o envolvimento com seu meio social, vários processos
internos de desenvolvimento são desencadeados de modo a permitir
um novo grau de desenvolvimento. Para outros, começa por meio
da observação, imitação e experimentação das instruções de pessoas
mais experientes. Vivenciamos desde a primeira infância diversas
experiências físicas e culturais que contribuíram para a construção do
conhecimento a respeito do mundo em que estamos inseridos.

• PARA REFLETIR

"O ser humano se diferencia dos outros animais por ter seu encéfalo
altamente desenvolvido, por ter polegar opositor e por ser livre. Livre
é o estado daquele que tem liberdade. Liberdade é a palavra que o
sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém
que não entenda". Essa descrição foi retirada do documentário de
Jorge Furtado, denominado Ilha das Flores, disponível em: <https://
www.youtube. com/watch?v=KAzhAXjUG28> Acesso em: 21 mar.
2016. Após assistir ao vídeo, vale questionar: Que desenvolvimento
é esse?

44 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Considerando a ampla gama de definições que o conceito
pode abarcar, cabe apresentar, para analisarmos as questões
relacionadas ao desenvolvimento humano, a Teoria Bioecológica
do Desenvolvimento Humano (TBDH), que tem Urie Bronfenbrenner
(1979; 1994; 1996), como seu principal proponente. Para ele, o
desenvolvimento humano é concebido a partir de um conjunto
sistêmico que pode ser chamado de conceitos-chave da teoria, que
são: Processos, Pessoa, Contexto e Tempo, muito embora o foco
esteja nos processos e interações que o indivíduo estabelece com o
contexto vivido (símbolos, culturas etc.).

Com a evolução da teoria, os seus conceitos principais foram


sendo revisados principalmente quanto à sua importância e relevância
para a compreensão do desenvolvimento humano. O foco entre
1979 e 1996 estava no ambiente, no contexto em que o indivíduo
estava inserido e na forma como ele o percebia, ou seja, o significado
que ele atribuía às suas ações era fundamental para compreender o
desenvolvimento.

Somente em meados dos anos 90 foi que Bronfenbrenner


denominou suas proposições da Teoria dos Sistemas Ecológicos
contemplando, de forma mais detalhada, os aspectos do
desenvolvimento vinculados à Pessoa, tais alterações resultaram na
Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano, que passou a
entender o indivíduo como um ser ativo de seu desenvolvimento.

Como o novo Modelo Bioecológico propõe que o desenvolvimento


humano seja estudado a partir do conjunto sistêmico composto por
Processo, Pessoa, Contexto e Tempo – PPTC, é importante apresentá-
los de forma mais detalhada.

Processo foi concebido como sinônimo de movimento e


constructo, cerne da teoria. São formas particulares de aproximação
entre ambiente e pessoa dentro de um determinado tempo,
“envolvem também interações progressivamente mais complexas da
pessoa em desenvolvimento com os objetos e símbolos, daí que as
atividades podem continuar a ser conduzidas mesmo na ausência de
outras pessoas. ” (LISBOA; KOLLER, 2004, p. 54).

Nos Processos Proximais, o ser humano é visto como um ser


ativo, capaz de modificar e ser modificado pelo seu ambiente, tais

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 45


processos produzem dois tipos de efeito: de competência (aquisição
e desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e capacidades
para conduzir e direcionar seu próprio comportamento) e disfunção
(manifestação recorrente da dificuldade de manter o controle
e a integração do comportamento em diferentes domínios do
desenvolvimento).

Nesse contexto, é necessário e pertinente apontar o que é fator


de risco e proteção a fim de facilitar a compreensão da resiliência no
âmbito da teoria em análise.

Os fatores protetivos são produzidos a partir dos efeitos de


competência, oriundos das produções históricas e culturais que
permeiam toda a vida humana, e isso significa que as características
da família e do entorno em que o indivíduo vive podem constituir- se
em fatores protetivos. O indivíduo tem à sua disposição uma rede
de proteção ou de apoio, que deve oferecer condições para a sua
proteção, além de colaborar com o processo do seu desenvolvimento.
As principais redes são: escola, família e igreja, mas também “está
relacionada a um conjunto de locais e pessoas no qual as famílias
buscam algum tipo de apoio e auxílio, seja emocional, moral ou
financeiro” (DE ANTONI; KOLLER, 2005), as chamadas ONGs e
instituições de caridade.

O apoio social também compõe a rede de proteção e, ainda,


segundo Brito e Koller (1999), refere-se a um conjunto de sistemas
ou de pessoas significativas que fazem parte de uma rede de
relacionamentos. Para que a competência se configure em fatores
protetivos é imprescindível que “o indivíduo possua um conjunto de
recursos que o capacite a atuar com eficiência nos mais diversos
contextos que constituem sua rede social” (COPEETTI; KREBS,
2008). Ainda, segundo os autores, é necessário atrelar aos recursos
a disposição pessoal para reorganizar as ações que trarão, como
consequência, maior engajamento.

Já o fator de risco é compreendido a partir de um contexto


social que pode ou não produzi-lo; também, é entendido como algo
dinâmico, que não é estático, e um dos seus efeitos é a disfunção.

É importante delinear que tanto o fator protetivo como o fator


de risco são fomentadores da resiliência (recurso interno do sujeito,

46 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


presente ao longo da vida, que é solicitado para ser utilizado em
determinados momentos); também, pode ser entendida como a
capacidade de enfrentamento que se manifesta perante os riscos,
para alguns teóricos, todo ser humano deve desenvolver-se em
situação de resiliência.

Para Carvalho:

[...] Falar de resiliência não é, portanto, falar de um


atributo próprio do indivíduo e, sim, de processos que
ocorrem no decorrer da vida a partir da interação de
qualidades do indivíduo, do ambiente familiar e do seu
entorno, quando exposto às adversidades significativas.”
(CARVALHO, 2013, p. 16)

Quando o indivíduo se desenvolve em situação de resiliência, ele


apresenta maiores condições de adaptar-se frente às dificuldades,
buscando estratégias para sanar os problemas tornando-se mais forte
ao final, embora, durante esse processo, o indivíduo necessita estar
consciente das suas ações e consequências.

Para ilustrar e facilitar a compreensão da resiliência:

• DICA DE FILME

Citamos o romance do escritor português José Saramago,


publicado em 2001 e traduzido para diversas línguas, o qual se tornou
filme em 2008: “Ensaio Sobre a Cegueira”.

Esse romance retrata uma inexplicável epidemia de cegueira


que acomete moradores de um grande centro urbano (médicos,
engenheiros, crianças, prostitutas, vendedores etc.). Grande parte
da história se passa dentro de uma estrutura de confinamento que,
forçadamente, tornou-se local de convivência dos que perderam a
visão.

A situação vivenciada pelos personagens enquanto estão


isolados retrata como o homem consegue agir de forma instintiva
em determinadas circunstâncias, revela que quando se encontra
desprovido de qualquer parâmetro social, o homem perde totalmente

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 47


as referências e apresenta conduta imoral (rouba, mata e estupra),
quase se igualando a um animal que busca saciar seus apetites mais
primitivos.

Imersos em situações de risco, os sujeitos vivenciam: estupro


coletivo, imundície física e psicológica, completo descaso público,
fome, entre outras, porém, por meio de um processo de identificação,
alguns dos personagens criam uma rede de relações, que acaba se
configurando em fator protetivo, tendo na esposa do médico (a única
a enxergar) sua líder.

É importante destacar essa personagem, pois ela, ao observar a


degradação humana, consegue suportar a situação e encontrar forças
para lutar pela sobrevivência pessoal e do grupo, ou seja, apresenta-se
resiliente.

Apesar de estarem inseridos no mesmo contexto, os processos


vivenciados pelos envolvidos eram diferentes; um dos grupos parecia
estar mais comprometido com o bem comum, enquanto o outro se
pautava no individualismo e usava estratégias abusivas para manter a
sobrevivência.

Assim, observam-se dois tipos de liderança: a liderança positiva e a


negativa. A primeira apresenta ações protetivas, já a segunda, ações de
risco. Ao longo da trama, evidencia-se como essas lideranças afetam
os processos proximais (formas duradoras de interação no ambiente
imediato), tanto de um grupo como do outro.

A relação doentia que o líder de práticas individualistas e negativas


estabelecia com os componentes de seu grupo (que se deixam
conduzir, talvez pautados pela garantia da sobrevivência) configura-
se em fatores de proteção, já as ações desse líder para com o outro
grupo configuravam-se em fator de risco. Já a relação que a líder
positiva estabelecia com o seu grupo era a de total proteção.

No processo de reestruturação social e pessoal, os sujeitos


confinados são obrigados a ressignificar o vivido, ou seja, precisam
aprender a viver desprovidos da visão. Fora do confinamento,
novamente os sujeitos tiveram que se reestruturar para adequar-se a
condição atual (cegueira).

48 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Nesse momento, destaque para a resiliência, já que em um
contexto considerado de risco os sujeitos tiveram acesso a uma
rede de proteção (rede de relações pautadas no cuidado, zelo,
acolhimento e uma líder que enxergava e que promovia estratégias de
sobrevivência) que facilitou o uso das estratégias para permanecerem
na luta.

Entende-se que, diante do risco, a resiliência foi solicitada. Infere-


se, por meio desse romance, que as pessoas no extremo da luta pela
sobrevivência podem sucumbir ou criar estratégias de enfrentamento,
aí reside a resiliência.

Após essa pequena ilustração, apresenta-se o segundo


componente do Modelo PPCT, a Pessoa, definida por Bronfenbrenner
(2005 apud KOLLER, 2008) como um ser biológico e psicológico
capaz de interagir constantemente com seu contexto tornando-se
produto desse processo de interação que ocorre com outras pessoas,
e também com os símbolos e contextos desses.

Para que o desenvolvimento humano ocorra é necessário que


haja a “inter-ação” no “inter-jogo” de constante troca com os outros e
com o ambiente, tal interação se dá pelos processos e relações entre
variáveis que estão em constante alteração, e não com elementos
isolados.

As três características da Pessoa, capazes de atuar no


desenvolvimento e influenciar os Processos Proximais, são: Força,
Recursos e Demandas, abaixo definidas a partir de Koller (2005).

A Força refere-se a duas características ou disposições


comportamentais ativas, chamadas de geradoras (resumida
pela capacidade de engajamento nas atividades individuais ou
compartilhadas) e desorganizadoras (dificuldade em manter controle
sobre comportamentos ou emoções), ambas podem tanto colocar os
processos proximais em desenvolvimento e sustentar sua operação
quanto colocar obstáculos ou mesmo impedir que ocorram, ora
configuram-se em risco, ora em fator protetivo.

Os Recursos Biopsicológicos envolvem experiências, habilidades


e conhecimentos necessários ao funcionamento dos processos
proximais ao longo dos estágios do desenvolvimento humano.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 49


A terceira característica é a Demanda, aspecto capaz de estimular
ou desencorajar as reações do ambiente social, podendo favorecer
ou não o estabelecimento dos processos proximais. Ainda segundo
Koller, “o potencial genético, considerado como atributos da Pessoa
para predisposição a manifestações de competência e/ou disfunção,
também têm importante influência sobre o desenvolvimento ao
longo do ciclo vital”.

Outro componente do Modelo PPCT é o Contexto, compreendido


em termos físicos, sociais e culturais, atua como fonte de informações
com a qual a Pessoa interage em vários níveis de complexidade, logo o
ambiente tem papel decisivo no desenvolvimento. Esse componente
foi subdividido em quatro níveis de interação que, interligados,
constituem a Pessoa e influenciam no seu desenvolvimento:

Microssistema, Mesossistema, Exossistema e Macrossistema.

O Microssistema são as interações face a face, aquelas pautadas


na proximidade do contato cotidiano. Tais interações são pautadas
na frequência, duração e intensidade dos encontros que, devido a
essa intensidade, é capaz de modificar e alterar a pessoa. As relações
são marcadas pelo significado, um exemplo é a família (pessoas que
vivem juntas) e colegas de trabalho.

Já o Mesossistema agrega diferentes níveis que são ampliados


quando a pessoa passa a frequentar outro ambiente, não são
interações estáticas, a pessoa influencia e é influenciada, como
exemplo, na igreja.

No Exossistema, o contexto envolve os ambientes que a pessoa não


frequenta como participante ativo, mas que também desempenham
influência indireta sobre o seu desenvolvimento, como exemplo, os
clubes e as associações de bairro.

O Macrossistema é o último e também o mais amplo conjunto


do sistema, engloba cultura, crenças, religiões, formas de governo e
subculturas presentes no cotidiano das pessoas, como exemplo, a
política e a economia.

Ressalta-se, após essa breve apresentação dos conjuntos que


compõem o Contexto, que o mais importante é considerar que,

50 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


mesmo inserido nesses conjuntos, cada pessoa atribui um significado
ao vivido, e conforme foi explicado, as atribuições são frutos das
produções sociais e culturais em que o indivíduo está exposto.

O quarto e último componente do Modelo Bioecológico éo


Tempo, um organizador social e cultural que exerce uma função
fundamental no desenvolvimento, pois retrata os acontecimentos
e mudanças que ocorrem ao longo da vida. “O tempo, portanto, é
um elemento fundamental na análise e constituição de processos
proximais” (KOLLER, 2008). O Tempo é analisado em três níveis do
Modelo Bioecológico: Microtempo, Mesotempo e Macrotempo.

O Microtempo refere-se à continuidade e descontinuidade


observadas dentro de pequenos episódios dos processos proximais,
necessita de certa regularidade. O Mesotempo indica a periodicidade
dos episódios dos processos proximais por meio de intervalos maiores
de tempo, seus efeitos podem produzir resultados significativos
no desenvolvimento. O Macrotempo “abarca as expectativas e os
eventos em mudanças dentro da sociedade através de gerações”.
(KOLLER, 2006, p. 59)

Com essa breve reflexão acerca dos pressupostos teóricos, pode-


se afirmar que tal teoria é de suma importância e relevância frente aos
estudos e às pesquisas do desenvolvimento humano. Ao considerar o
imbricamento dos componentes do Modelo PPCT como relevantes
para os processos de desenvolvimento e aprendizagem de qualquer
indivíduo ao longo da vida, Bronfenbrenner promove uma visão mais
integrada do ser humano, pautada no equilíbrio entre o ambiente e
o ser.

Não se pode negar a genética e a influência que ela exerce sobre


nossas ações, muito embora sejamos seres totalmente modificáveis,
o que significa que a diversidade cultural e social em que estamos
inseridos contribui e muito para o pleno desenvolvimento humano,
auxiliando-nos a ser como somos. Se uma criança pobre, que reside
na favela, filha de pais analfabetos, tiver contato com o mínimo de
informação e recurso, ela pode modificar sua realidade, tornar-se
autônoma.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 51


Questão para reflexão
Será que agora você consegue responder qual é a importância
do ambiente para a construção do desenvolvimento humano?

Outra questão norteará a discussão seguinte: Como o ser humano


aprende a pensar? Inúmeras teorias uniram esforços a fim de responder
tal questão. Para a teoria da Psicologia Cognitiva Interacionista Sócio-
Histórica, desenvolvida pelo advogado, professor e filósofo soviético
Lev Semenovich Vygotsky (1896 – 1934), o indivíduo é determinado
por fatores exógenos (ambientais). Esse teórico visa à caracterização
de aspectos tipicamente humanos do comportamento e elabora
hipóteses de como essas características se formaram ao longo da
história humana e de como se desenvolvem durante a vida de um
indivíduo.

Baseado no Materialismo Dialético do filósofo alemão Karl Marx


(1818-1883), que preconiza que o homem é produto da relação
dialética entre as ferramentas do seu trabalho e o meio material em
que vive, Vygotsky afirma que as características humanas resultam
da interação dialética do homem e seu meio sociocultural, ou seja,
o homem transforma o meio e também é transformado por ele.
As funções psicológicas humanas se originam nas relações entre
o indivíduo e seu contexto cultural e social, sendo o cérebro um
substrato material com um sistema aberto de grande plasticidade,
com estrutura e modos de funcionamento moldados ao longo da
história da espécie e do desenvolvimento individual.

Já a relação do homem com o mundo não é uma relação direta,


mas mediada por ferramentas culturais e instrumentos psicológicos
por ele denominados linguagem e signos (verbais, numéricos, musicais,
gráficos, gestuais etc.). Esses signos são construídos socialmente de
modo arbitrário e agregam significados culturais históricos, por isso
são compartilhados por todos.

Questão para reflexão


Então, podemos afirmar que cada indivíduo APRENDE a ser um
homem?

52 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Para tentarmos responder a essa questão, emprestamos as ideias
de Vygotsky (1993), que aponta a cultura como fator de humanização
do indivíduo. Para ele, nossa humanização perpassa pelo acúmulo
cultural transmitido de geração em geração. Duarte complementa:
"[...] Ora, justamente uma das características que distingue o
ser humano dos animais, isto é, sua capacidade de acumular e
transmitir experiência! O indivíduo se faz humano apropriando-se da
humanidade produzida" (DUARTE, 1996, p. 34). Em outras palavras, o
ser humano é histórico e, portanto, sujeito às especificidades do seu
contexto cultural.

De acordo com Duarte (1996), o conceito de Zona de


Desenvolvimento Próximo foi apresentado por Vygotsky (1993) em
meio à análise das relações entre ensino e desenvolvimento intelectual
em idade escolar. O conceito consiste:

[...] Na existência de dois níveis de desenvolvimento: o nível


de desenvolvimento atual e a zona de desenvolvimento
próximo. O desenvolvimento atual de uma criança é aquele
que pode ser verificado através de testes nos quais a criança
resolve problemas de forma independente, autônoma. Já a
zona de desenvolvimento próximo abarca tudo aquilo que
a criança não faz sozinha, mas consegue fazer imitando o
adulto. (VYGOTSKY, 1996 apud DUARTE, 1996, p. 38)

Em outras palavras, a zona de desenvolvimento atual é aquilo que a


criança faz sozinha e a zona de desenvolvimento próximo é o que ela
faz com a colaboração de outras pessoas. A cada nível alcançado,
abre-se outra Zona (segundo nível do desenvolvimento). O indivíduo
tem diversas zonas para diferentes âmbitos de desenvolvimento,
tarefas e conteúdos. Aprendizagem e Desenvolvimento têm relação
complexa e dinâmica, interativa. Diante de um conceito sistematizado
desconhecido a criança busca significá-lo por meio de aproximação
com outros já conhecidos, já elaborados e internalizados. Ela busca
enraíza-lo na experiência concreta.

Nesse contexto, a escola exerce um papel fundamental, que é o de


ensinar os conteúdos formais fomentando a reflexão e estimulando
a autonomia. Vale ressaltar que para atingir esse objetivo é necessário
oferecer meios para que os alunos se

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 53


tornem paulatinamente mais autônomos e se esforcem para
superarem a espera pelo conteúdo pronto/dado e que auxiliem
no processo de aquisição desse conhecimento que pode ser
transformado para ser vivenciado e/ou aplicado no meio social.

• DICA DE LEITURA

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei nº 9.394/96.

A grande ênfase nesta Lei é a educação para a cidadania. Educar


para a conquista da cidadania plena, para a busca da justiça social, do
bem comum e da realização pessoal do indivíduo.

A escola trabalha com conceitos que podem ser definidos por


um sistema de relações e generalizações contidas nas palavras. Já
os conceitos cotidianos são os construídos a partir da observação,
manipulação e vivência direta da criança com o seu meio. Os conceitos
científicos são conhecimentos sistematizados, adquiridos na escola,
que é a responsável pela ampliação dos conceitos cotidianos, porém
de modo formal. Aprender um conceito exige recepção de dados e
intensa atividade mental.

Para Vygotsky (1979), o único ensino bom é o que se antecipa


ao desenvolvimento, o ensino direto de conceitos é impossível e
infrutífero, porque os conceitos são construídos, não dados. Cabe
ao meio desafiar, exigir e estimular o intelecto. O conhecimento
científico (escolar), por envolver operações que exigem consciência,
permite ainda que a criança se conscientize de seu próprio processo
mental. Esse processo metacognitivo é entendido como:

[...] É visto como um conjunto de crenças pessoais sobre


todos os possíveis aspectos da atividade cognitiva. Isto
é, as informações armazenadas são passíveis de controle
pelo sujeito que, consequentemente, também controla o
conhecimento referente às ações concretas que ele vai
realizar no mundo. Outro aspecto importante do processo
metacognitivo é a conceitualização metacognitiva de
uma tarefa, que consiste na reflexão metacognitiva
presente no momento em que se inicia uma tarefa ou
durante sua execução. (ANDREATTA, 2010, p. 8)

54 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Ainda segundo Andreatta (2010, p. 13), "o indivíduo experimenta
diversas estratégias de aprendizagem desde criança, tendendo
sempre a repetir aquela com a qual obteve maior eficácia. Assim,
cada um tem uma estratégia que funciona melhor para si" Sendo o
processo metacognitivo diferente para cada um, torna-se necessário
que o professor seja um facilitador no desenvolvimento de estratégias
metacognitivas, "se há dissonância nessa relação, a aprendizagem
torna-se dificultada" (p.13).

Em outras palavras, as estratégias de estudo e aprendizagem devem


ser incentivadoras do pensar, os alunos devem ser esclarecidos acerca
dos seus estilos, das estratégias de estudo que são mais adequadas
para cada estilo, e ainda, devem ser incentivados a pensar sobre o que
objetivam com os seus estudos e a avaliar a qualidade das atividades.

Para saber mais


BORUCHOVITCH, E. Estratégias de aprendizagem e
desempenho escolar: considerações para a prática profissional.
Reflexão e Crítica, 1999. p. 361-376.

Retomamos os apontamentos realizados por Vygotsky a fim de


concluir, temporariamente, essa reflexão. Os achados desse teórico
ressaltam o papel da escola no desenvolvimento mental das crianças,
embora ele também atribuía um papel preponderante às relações
sociais em todo o processo, por isso apresentamos a Teoria do
Desenvolvimento Bioecológico concomitantemente à sua teoria

Atividades de aprendizagem
1. Para a teoria da Psicologia Cognitiva Interacionista Sócio- Histórica, de
Lev Semenovich Vygotsky (1896 – 1934), o indivíduo é determinado por
fatores exógenos (ambientais). Como se dá o processo de desenvolvimento
no contexto escolar?

2. O indivíduo tem diversas zonas para diferentes âmbitos de


desenvolvimento, tarefas e conteúdos. Assinale a alternativa que contempla
o conceito de zona de desenvolvimento atual.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 55


a) É aquilo que a criança faz sozinha.
b) É o que a criança faz com a colaboração de outras pessoas.
c) Têm relação complexa, dinâmica e interativa.
d) É aquilo que já está enraizado na experiência concreta.

Aprofundando o conhecimento

Leia as obras que retratam o pensamento de Vygotsky.

1. A Formação Social da Mente (1988).


2. Pensamento e Linguagem (1993).
3. Teoria e método em psicologia (1996).

56 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Seção 2
A consciência crítica e suas implicações na ação
social
Introdução à seção

Iniciamos essa seção com algumas inquietações: será que


existe diferença entre saber e pensar? Seria coerente, em pleno
século XXI, conceber a ideia de formar indivíduos que simplesmente
reproduzam conceitos e atitudes transmitidos por outros? Qual é o
papel da escola diante da questão sobre a formação da consciência
crítica? A escola tem o dever de formar cidadãos conscientes, ativos,
criativos, questionadores e, acima de tudo, sensíveis para com seus
semelhantes e responsáveis por suas atitudes?

Apresentar em poucas linhas todas as respostas para questões


tão complexas seria inviável, muito embora tentaremos esboçar
caminhos que podem nos orientar na busca por tais respostas.
Iniciaremos perpassando pelo contexto escolar.

No cerne do Projeto Político Pedagógico - PPP - das escolas


brasileiras constam os objetivos que regem a rotina escolar, que, de
modo geral, são muito semelhantes: formar cidadãos com consciência
crítica capazes de transformar a realidade; instrumentalizar os jovens
para participar da cultura, das relações sociais e políticas, considerando
as expectativas dos alunos, dos pais, dos membros da comunidade,
dos professores e enfim, dos envolvidos diretamente no processo
educativo; resgatar a autoestima, a permanência do aluno na escola,
o sucesso escolar e a aplicabilidade dos conteúdos no exercício da
cidadania.

Os objetivos elencados evidenciam uma grande preocupação com


o futuro dos alunos. Preocupação reforçada pelo questionamento:
“Como queremos que os alunos atuem socialmente, já crescidos,
profissionais e pais de família, no enfrentamento das diversas tarefas
que a vida irá impor?”. Logo, encontramos um terreno fértil para
fomentar a prática do saber e aprender com base na consciência
crítica.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 57


Percebemos que não basta ao educador envolver-se com as
causas educacionais emergentes, ele precisa comprometer-se com
uma educação pautada nos princípios e práticas voltadas a atender
as diferentes realidades que a permeiam. Concordamos que estar
comprometido com essa prática significa ir além de um “faz de conta
pedagógico”.

Acreditamos que cabe ao educador mediar o conhecimento de


modo a auxiliar os alunos a se descobrirem como protagonistas no
processo de ensino-aprendizagem, por meio do desvelamento da
sua realidade. Tal ação perpassa por uma reflexão crítica, promovida
cotidianamente.

Para que a escola favoreça esse desvelamento e reflexão crítica


deve apresentar as características da Escola Cidadã, "escola que não
pode ser jamais licenciosa nem jamais autoritária. É uma escola que
vive a experiência tensa da democracia" (PADILHA, 2001).

Uma Educação com tais características requer uma didática


compatível, que facilite o processo de desalienação e contribua para o
desenvolvimento de um ser reflexivo e crítico, comprometido com a
humanização. Para isso, concordamos com Luckesi, que nos aponta
compromissos políticos, pedagógicos e profissionais necessários à
ação didática. Em relação aos compromissos políticos da didática,
Luckesi (1987, p. 12) enfatiza que esta deve estar “[...] direcionada por
fins determinados, por compromissos políticos claros e explícitos”, e
não condicionada a apenas práticas burocráticas e aspectos técnicos
com um “pano de fundo” de pretenso caráter neutro e a-histórico.

Já o compromisso pedagógico da didática tem a ver com “[...]


seu objetivo primeiro que é oferecer condições de aprendizagem da
maneira mais fácil e mais rica possível. ” (LUCKESI, 1987, p. 13), esse
objetivo contém três pontos básicos:

1. Compromisso com a formalização da mente: processo


de educação intencional que visa proporcionar formas criativas
de apropriação, análise e compreensão “concreta” das “múltiplas
determinações” da realidade por meio de intensa disciplina
metodológica e mental.

2. Compromisso com os conteúdos: leva em conta os

58 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


conteúdos de forma indireta, que são absorvidos na vida cotidiana
(em contato com o mundo), e a apreensão do conhecimento
acumulado historicamente, agregando cultura e saber às camadas
populares, colaborando para que estas também construam novos
conhecimentos.

3. Compromisso com o método de abordagem da realidade,


direta ou indiretamente: constitui-se na utilização de forma direta ou
indireta do método dialético, proporcionando aos educandos uma
leitura de mundo capaz de identificar seu processo dialético e intervir
com uma ação transformadora mais efetiva.

No tocante ao compromisso profissional da didática, Luckesi


(1987) destaca que educadores e educandos devem ter muito claros
seus objetivos e, sem significar tristeza, necessitam empreender muito
esforço e disciplina para alcançar bons resultados, que, no caso desta
proposta didática, conclui-se em transformação social.

Por fim, defendemos uma práxis pedagógica que seja conduzida


por relações sociais horizontais e sem opressão. Que promova uma
ação didática crítica e criativa, capaz de humanizar a formação da
consciência de seus educandos, colaborando para a construção de
sujeitos comprometidos com uma nova sociedade, justa e solidária.

Aprofundando o assunto

Para saber mais sobre o currículo do Serviço Social, leia: GUERRA,


Yolanda. O potencial do ensino teórico-prático no novo currículo:
elementos para o debate. Revista Katalysis, Florianópolis, v. 8, n.2.
p.147-154, jul/dez. 2005.

Nesse texto, a autora faz considerações acerca do currículo para o


Serviço Social e do seu potencial teórico-prático.

Segundo Guerra (2005), a formatação do novo currículo dos


profissionais do Serviço Social é fruto de um trabalho coletivo da
profissão, não permite a dicotomia entre ensino teórico e ensino
prático, mas sim sua articulação. Considerando a natureza da profissão,
o autor parte do pressuposto da lógica curricular das atuais diretrizes,
que determinam a direção e o perfil de formação do assistente social
segundo o projeto ético-político do Serviço Social, buscando, assim,

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 59


a formação de um profissional crítico. Sua afirmação é pautada pela
reflexão de três pontos articulados em si, que são:

a. As determinações da prática profissional: apesar do cotidiano


profissional lidar com as questões imediatas, que requerem ações
imediatas, essas extrapolam a “imediaticidade” em razão de suas
determinantes maiores, decorrentes das relações sociais produzidas
pelo sistema capitalista. Todavia, entender a gênese da questão social
específica com a qual o assistente social se depara no cotidiano, requer
um conhecimento teórico-prático. Nesse intuito, o assistente social
necessita agir como um ser da práxis, dominando conhecimentos
que lhe propiciem não apenas o como fazer seu trabalho, mas o que
fazer e por que fazer.

b. Concepção de ensino e sua direção estratégica: ensinar não


é mera transmissão de conhecimento, “[...] capacitar para o exercício
da ação consciente, é tornar os indivíduos sujeitos da sua história,
o que implica uma via de mão dupla entre o conteúdo do ensino
e aquele sujeito que dele se apropria” (GUERRA, 2005, p. 150). O
processo de ensino e aprendizagem envolve as dimensões: técnico-
instrumental (relacionada ao ensino do domínio das competências
instrumentais); teórico-intelectual (relacionada ao ensino de sólido
referencial teórico-metodológico, do saber pensar, do saber crítico
e criativo); investigativa (relacionada ao ensino da atitude investigativa
e problematizadora da realidade); ético-política (relacionada ao
ensino da reflexão e materialização de estratégias dos princípios e
valores do projeto ético-político da profissão nas ações do assistente
social); formativa ou pedagógica (relacionada ao ensino da atuação
profissional na área da formação de opinião, na área da docência e
supervisão acadêmica e de campo).

c. Mediações privilegiadas entre ensino e prática no Serviço


Social: a relação entre ensino e prática tem lugar privilegiado no
método e na cultura profissional, “[...] devendo ser uma preocupação
de todas as disciplinas e de todos os docentes” (GUERRA, 2005, p. 152),
com vistas a capacitar os alunos para investigar, analisar, problematizar,
argumentar, atuar em equipe, em suma, a apreenderem o arcabouço
do conhecimento acumulado teórica e historicamente (método,
técnicas, instrumentais etc.) pelas ciências sociais e pela profissão,
relacionando-os com a prática profissional.

60 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Dessa forma, o espaço acadêmico se torna o lugar privilegiado
para a formação de profissionais competentes e comprometidos
com o projeto ético-político do Serviço Social. Como sugestão, e
situando o ensino da prática no núcleo de formação do trabalho
profissional nas atuais diretrizes, Guerra (2005) aponta algumas
sugestões estratégicas, quais sejam:

[...] Garantir que o conteúdo dessas disciplinas vislumbre


uma análise crítica do Serviço Social como totalidade:
sua natureza, seus fundamentos históricos e teórico-
metodológicos, as múltiplas dimensões e articulações,
seus objetos de intervenção e espaços ocupacionais;
trabalhar a relação dialética entre as esferas universal/
particular/singular no âmbito das análises teóricas
macroscópicas, iluminando o cotidiano profissional;
Reconhecer nas disciplinas do núcleo de formação do
trabalho profissional o local para se equacionar o papel
e o lugar do instrumental técnico tradicional, bem como
para a construção de novos, para a criação/recriação
de estratégias políticas para a ação, desenvolvimento e
aquisição de valores, atitudes e habilidades. (GUERRA,
2005, p. 153)

Com o objetivo de avaliar como os estudantes e professores dos


cursos de Serviço Social de cinco IES do estado do Rio de Janeiro
concebem a profissão, por entender que eles são protagonistas
privilegiados do processo de formação e da imagem social da
profissão, Guerra et al. (2010) constataram que 19% dos discentes
de 1° e 8° períodos ainda vinculam o Serviço Social às práticas de
ajuda, o que, apesar do baixo percentual, demonstra que eles não
se apropriaram, em seu processo de formação, do atual projeto
profissional, mantendo as características tradicionais do profissional
caritativo.

Algumas pistas são dadas por Faustini et al. (2007) como


contribuição para a qualidade do ensino no Serviço Social:
definição clara da mediação docente numa perspectiva crítica e
o protagonismo do aluno; construção coletiva pelos docentes e
discentes dos planos de aula e programas das disciplinas; construção
coletiva entre os docentes dos conteúdos, objetivos, procedimentos
metodológicos e avaliativos; noção clara acerca do que seja uma

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 61


relação dialógica de ensino; construção de espaços e estratégias
lúdicas de aprendizagem, articulando-se conhecimento à realidade do
aluno e propiciando a discussão de temáticas referentes à formação;
capacitação pedagógica docente de forma continuada, alinhada ao
projeto profissional.

Portanto, percebemos que o ensino no Serviço Social aponta


alguns avanços em relação a sua compreensão de forma mais
sistematizada, no entanto, até pela dificuldade de encontrarmos na
literatura mais pesquisas sobre esse tema, parece- nos adequado
apontar a necessidade de maiores investigações sobre como está
ocorrendo o processo de ensino e aprendizagem na formação
do assistente social porque, pelo visto, não há clareza quanto
à profissionalização docente, que deve ser pautada por uma
interlocução mais intensa com o campo da Educação. Trataremos
do Estágio como parte do processo de ensino e aprendizagem e
espaço/tempo, utilizado como experimento no processo de ensino
de alunos de um curso de Serviço Social, e o seu papel na formação
do assistente social.

Fique sabendo

O Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, realizado em 2010,


aprovou uma Agenda Política para o estágio no Serviço Social, que
inclui as seguintes recomendações:
- Fortalecer o debate sobre estágio estimulando a criação
de Fóruns de supervisores nos estados, investindo também na
consolidação dos já existentes, garantindo a permanente articulação
entre os diferentes sujeitos envolvidos no processo de estágio.
- Estimular a criação de coordenações de estágio nas unidades
de formação acadêmicas, conforme preconiza a PNE.
- Atualizar a avaliação da implementação das Diretrizes
Curriculares a partir das diversas pesquisas realizadas no âmbito das
unidades de formação acadêmicas, consolidando um banco de
dados sobre o tema.
- Intensificar a fiscalização do trabalho profissional relacionado
à formação nas UFAs, com ênfase nos cursos EAD, observando as
condições de trabalho docente e a supervisão de estágio.

62 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Verificamos que tal agenda busca cumprir as demandas
contemporâneas postas à profissão, a efetivação das legislações
vigentes e das teses que defendem o estágio em Serviço Social
como fator essencial para a formação do assistente social, conforme
abordamos anteriormente. Essas metas devem ser perseguidas por
toda a categoria, conforme cabe a cada um, sob o risco de não se
avançar na discussão e concretização de uma formação e atuação
de qualidade, e conforme está definido no Projeto Profissional
do Serviço Social. Sendo assim, cabe aos assistentes sociais,
principalmente aqueles envolvidos diretamente no processo de
ensino e aprendizagem, prover meios políticos e pedagógicos para
que o estágio proporcione aos educandos uma formação segundo
suas prerrogativas.

Questão para reflexão


Pudemos perceber que a profissionalização docente referente
ao Serviço Social ainda se encontra em um estágio de
amadurecimento. Consideramos que há carência de uma
maior quantidade de pesquisas nesta área, prejudicando a
formação de qualidade que se pretende, visto que há pouco
acúmulo teórico capaz de iluminar os processos de ensino
e aprendizagem dos assistentes sociais docentes, bem
como avaliar a qualidade dos cursos de Serviço Social e dos
profissionais que estão sendo formados, seja em instituições
públicas, privadas, na modalidade presencial ou à distância, a
não ser as “avaliações” realizadas pelo Governo brasileiro que,
sabemos, tem seus limites.

Como atividade teórico-prática de ensino-aprendizagem, o


estágio supervisionado deve promover uma formação de qualidade,
abarcando as dimensões teórico- metodológica, ético-política e
técnico-operativa da profissão. Esse momento da vida acadêmica é
considerado um trabalho coletivo de ensino/aprendizagem que deve
ocorrer de forma sistematizada e comprometida entre instituições
acadêmicas e de campo, supervisores acadêmicos, supervisores
de campo e discentes, período durante o qual se buscará o
desenvolvimento profissional destes últimos, cada qual com suas
atribuições específicas.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 63


Dentre as pesquisas realizadas na área, destacamos as contribuições
de Melo (2010), que constatou que apenas cerca da metade dos
supervisores de campo receberam algum tipo de formação para
a atividade de supervisão de estágio. Conhecemos o trabalho de
Barbosa (2004), que enfatizou a necessidade de maior aproximação
entre instituições de ensino e campos de estágio, principalmente no
estabelecimento dos planos de supervisão e programas de estágio e
no debate e reflexão sobre esse processo. Essa é também apontada
por Ribeiro (2008), que enfatiza ainda a “[...] fragmentação teoria-
prática, a subutilização e a exploração das estagiárias como força de
trabalho [...]” (RIBEIRO, 2008, p. 248).

Além desses trabalhos aqui mencionados, apresentamos,


na sequência, os desafios da categoria em relação ao estágio
supervisionado, apontados pelo Relatório do VI Seminário de
Capacitação das Comissões de Orientação e Fiscalização do
conjunto CFESS/CRESS, publicado em julho de 2010. Devido à
quantidade de informações, não listaremos novamente o que já
demonstramos no item sobre Estágio, apenas destacamos que,
entre as revelações desse documento somadas às reflexões trazidas
por Guerra e Braga (2010) e pela Agenda Política para o estágio no
Serviço Social criada pelo recente Congresso Brasileiro de Assistentes
Sociais, realizado em 2010, é preciso que se dê especial atenção à
formação de profissionais capacitados para trabalharem com estágio
supervisionado em Serviço Social.

Portanto, fica evidente a discrepância entre o Projeto Profissional


do Serviço Social e a realidade imposta pelo capital em todos os planos
da vida social e, em específico, no campo da formação profissional,
objeto deste trabalho, na condução da política educacional brasileira.
No “interior” da categoria, em relação à formação do assistente social,
a falta de profissionalidade e a precarização do trabalho docente, a
escassez de pesquisas científicas no campo didático-pedagógico
e o não-preparo do assistente social para trabalhar com o estágio
supervisionado, são fatores que põem em risco a formação de
profissionais com o perfil traçado pelas Diretrizes Curriculares e
demais documentos associados. Disso, estão cientes alguns teóricos
e instituições representativas. Agora é necessário intensificar as
pesquisas e pôr em prática uma ação coletiva de superação desse
quadro.

64 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Atividades de aprendizagem
1. Como atividade teórico-prática de ensino-aprendizagem, o estágio
supervisionado deve ser promotor de uma formação de qualidade,
abarcando as dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-
operativa da profissão. Você concorda com tal afirmação?

2. O espaço acadêmico se torna o lugar privilegiado para a formação


de profissionais competentes e comprometidos com o projeto ético-
político do Serviço Social. Guerra (2005, p. 153) aponta algumas sugestões
estratégicas. Discorra acerca de uma delas.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 65


Seção 3
Metodologia da Problematização como uma
proposta de caminho para o saber e aprender com
base na consciência crítica
3.1 Introdução à Metodologia da Problematização com o Arco
de Maguerez
A Metodologia da Problematização com o Arco de Maguerez é
o nome atribuído por Berbel para essa metodologia. A autora teve
seu primeiro contato com o Arco de Maguerez por meio do livro
"Estratégias de ensino aprendizagem", de Juan Diaz Bordenave e
Adair Martins Pereira (1977). Sua primeira experiência prática com a
Metodologia da Problematização (MP) como “caminho metodológico”
foi em um projeto especial de ensino do qual participou em 1992, na
área da saúde, na Universidade Estadual de Londrina - UEL (BERBEL,
2011).
A partir desse primeiro trabalho, Berbel passou a utilizar e divulgar
a MP como uma metodologia para o ensino de alunos de cursos de
licenciatura e de mestrado de diversas áreas. Além do ensino, Berbel
passou a organizar projetos de pesquisa e orientações de dissertação,
iniciação científica, trabalho de conclusão de curso, entre outros,
pautados pela MP e/ou sobre esta metodologia como caminho de
ensino com pesquisa ou de pesquisa propriamente dita (BERBEL,
2011). Toda essa experiência tem sido sistematizada e publicada por
meio de livros, artigos, teses, dissertações, entre outras publicações
próprias, de seus orientandos e outros colaboradores.
Esses trabalhos publicados revelam a seriedade em refletir
constantemente sobre os fundamentos teóricos e a aplicação da MP
como caminho metodológico para o estudo, o ensino, o trabalho
profissional, a pesquisa e a extensão acadêmica. Seguindo esta lógica
de reflexão, em seu pós-doutoramento, Berbel sentiu a necessidade
de um maior aprofundamento epistemológico acerca da MP, tendo
como objetivo geral “[...] analisar características do Esquema do Arco
de Maguerez utilizado na Metodologia da Problematização, de modo
a identificar Teorias da Educação e pressupostos epistemológicos

66 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


com os quais se relacionam” (BERBEL, 2011, p. 9).
No relato histórico do contato com o Arco de Maguerez, a
pesquisadora explica como se deu seu conhecimento de fontes
publicadas sobre o tema, a saber, a de Maguerez e a de Bordenave.
No entanto, tais contatos ocorreram com certo espaçamento de
tempo e não de acordo com a cronologia das obras, isso devido à
dificuldade de informações sobre as primeiras. Sendo assim, desde
seu primeiro contato com o Arco até o momento atual, Berbel (2011)
necessitou “caminhar” com algumas nuances explicativas sobre o
Arco, buscando aprimorá-los a partir de sua práxis. Dessa forma, ela
relata que há três maneiras de explicar o Arco: a de Maguerez, a de
Bordenave e a sua própria.
De acordo com a pesquisadora, a versão do Arco de Maguerez a
partir de seu próprio idealizador, Charlez Maguerez, foi analisada com
base nas duas obras publicadas e referidas nesse trabalho, conforme
a tabela de cronologia de contato com o Arco. Nessa análise, Berbel
(2011) descreve que a obra de Maguerez, publicada em 1966, trata
de uma sistematização da experiência do autor com a alfabetização
de imigrantes adultos de países da África. Já o relatório de Maguerez,
publicado em 1970, trata de uma consultoria realizada no Brasil, nesse
mesmo período, a técnicos agrícolas do estado de São Paulo, a fim
de que estes utilizassem o Arco para o treinamento de um grande
contingente de agricultores.
Charlez Maguerez, segundo Berbel (2011), era engenheiro
consultor de formação, tendo sido diplomado pelo Instituto Nacional
de Estudos do Trabalho e da Orientação Profissional em Paris -
França, e atuado como diretor adjunto da Sociedade Europeia de
Equipamento e de Aconselhamento – EUROQUIP na formação de
imigrantes adultos da África para países recém-independentes ou em
processo de desenvolvimento que necessitavam aprender conteúdos
profissionais, linguísticos e culturais do idioma das empresas em que
estavam trabalhando, fora de seus países de origem. Tal atuação
fez com que Maguerez criasse uma metodologia inovadora para
a formação profissional associada à alfabetização “escolar” desse
público, visto serem os métodos tradicionais aplicados ineficazes em
resultado e em curto espaço de tempo.
Com o objetivo de formar profissionalmente analfabetos adultos,
Maguerez analisa as falhas nos métodos tradicionais até então

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 67


aplicados e os traços característicos dos adultos analfabetos nos
países em via de desenvolvimento, elaborando seu método com base
em algumas hipóteses e princípios, os quais acreditava tornar possível
melhores resultados, com uma dinâmica de aprendizagem, como
expõe Berbel (2011), caracterizada pelas seguintes etapas:
1. Observação da realidade (OR);
2. Observação de uma maquete – simplificando e simbolizando a
realidade (OM);
3. Discussão sobre esquemas (de conteúdos) permitindo uma
generalização (DS);
4. Execução sobre maquete, permitindo dar imediatamente um
valor aos símbolos (EM); 5. Execução na realidade (ER).
Tal sequência é representada na forma de um arco:

Figura 2.1 | Esquema de progressão pedagógica (Arco)

Fonte: Maguerez apud Berbel (2011).

Como podemos perceber, a imagem figurativa e as denominações


das etapas do Arco por Maguerez não são iguais às que apresentamos
e utilizamos nesta investigação, adotadas por Berbel a partir do que
foi elaborado por Bordenave (desde 1977). No entanto, as diferenças
não se findam por aí. Berbel (2011) afirma que, apesar dos resultados
alcançados e do valor dessa metodologia, a proposta do método
de Maguerez não faz “[...] menção à formulação de problemas no
processo com os grupos, seja pelos monitores ou pelos aprendizes”;
afirma também que “[...] as decisões todas eram centradas nos
elaboradores da proposta pedagógica de transferência de tecnologia”
(BERBEL, 2011, p. 27), o que difere de sua proposta de utilização.

Sobre o trabalho realizado no Brasil, Berbel (2011) observa que


Charles Maguerez traz uma modificação na apresentação estética da

68 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


figura do Arco e na descrição das suas etapas, mesmo passando a
trabalhar com a palavra “problema”, ou melhor, para a solução deste.
Contudo, ainda permanece a centralidade no técnico (monitor) que
irá conduzir o método do Arco com o público-alvo, caracterizado
mais pela reprodução do que pela reflexão, concepção esta que difere
da qual Berbel tem utilizado, e que descreveremos mais adiante.

Relatamos agora uma segunda versão para o Arco de Maguerez,


a elaborada por Bordenave e Pereira, fonte com a qual Berbel teve
contato antes da versão de Maguerez. De acordo com Berbel (2011),
o objetivo de Bordenave era apresentar um método para que os
professores (seu público-alvo) pudessem ensinar sem “coisificar” seus
alunos, optando por uma educação libertadora ou problematizadora.
A primeira figura para o Arco, apresentada pelos autores, difere
da apresentada originalmente por Maguerez, com substituições
significativas na nomenclatura de duas etapas e também no modo de
condução do método, como apresentado na figura a seguir:

Figura 2.2 | Arco de Maguerez, segundo Bordenave e Pereira

Fonte: Bordenave e Pereira (1982).

Conforme expõe a pesquisadora, há uma leitura do Arco pelos


autores, diferente da proposta de Maguerez,

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 69


[...] quando explica que ‘o professor deve escolher dentre
os vários caminhos ou inventar um caminho novo’. Pelas
características, por nós comentadas, dos dois textos de
Maguerez, não nos pareceu haver neles a manifestação
dessa abertura de opções ou criação de novas alternativas
pelos aprendizes. Portanto, é novo em Bordenave e
Pereira esse aspecto referente ao trabalho realizado
conforme o Arco de Maguerez. (BERBEL, 2011, p. 33)

Ainda, segundo Berbel (2011), devido ao uso flexível de palavras


e conceitos, Bordenave e Pereira estimularam a criatividade na
utilização e “reinvenção” do “Esquema do Arco”, talvez até por eles
próprios terem realizado tal feito, tanto em sua primeira publicação
quanto posteriormente, com novas contribuições. Isso possibilitou
que a autora, por este motivo e também pelas lacunas deixadas,
realizasse novas leituras e interpretações em relação às etapas do
Arco. Fato este que desencadeou a terceira versão do Arco.

Segundo Berbel (2011, p. 41), os pontos comuns entre


Maguerez e Bordenave se concentram na “[...] preocupação com
o desenvolvimento de esquemas de pensamento e raciocínio
pelos aprendizes; os métodos ativos para o desenvolvimento das
aprendizagens; as repetições para garantir certos aprendizados”,
e na preocupação com as demandas societárias de formação de
profissionais de qualidade, seja na proposta de Maguerez, com
vistas a qualificar adultos analfabetos para trabalharem em empresas
estrangeiras, seja na proposta de Bordenave e Pereira, no intuito de
qualificar professores para a atuação no ensino superior.

A terceira versão para o Arco de Maguerez, criada por Berbel e


(re) nominada como Metodologia da Problematização com o Arco
de Maguerez, tomou um caminho diferente das outras duas versões.
Na versão original, não se constata claramente que Maguerez
utilizasse em sua metodologia a problematização da realidade, seja
pelos monitores ou pelos aprendizes. Outra diferença entre a versão
primeira e a de Berbel é que Maguerez centrava as ações/decisões
nos técnicos ou monitores, descaracterizando a pesquisa dos sujeitos
da aprendizagem, pesquisa que Berbel defende como essencial para
a construção do conhecimento.

70 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Tendo como base histórica a versão de Bordenave e Pereira,
Berbel manteve a versão original sobre os princípios de participação
ativa dos sujeitos e diálogo constante entre eles; os três momentos da
proposta apresentada por Maguerez, a síncrese, a análise e a síntese,
apesar de diferentes nomenclaturas desses termos; e ainda, apesar de
não contextualizada de forma explícita, as duas versões (Maguerez e
Bordenave e Pereira) trazem algumas características progressistas de
educação, tais como “[...] a ideia de partir do concreto, caminhar para
o abstrato e retornar ao concreto” (BERBEL, 2011, p. 75).

De acordo com a pesquisadora, outra diferença em relação à


versão de Maguerez está na 4ª etapa, pois em Maguerez se observa
a “Execução da Maquete”, que consiste em confrontar o esquema
de ação e os dados da realidade resumidos e escolhidos no nível da
maquete; e em Berbel, “Hipóteses de Solução”, que procura estimular
“[...] a elaboração criativa do maior número de possibilidades,
de alternativas, de hipóteses de solução, dentre as quais serão
selecionadas as que vão ser aplicadas à realidade na última etapa”
(BERBEL, 2011, p. 77).

Como podemos perceber, Berbel se distancia da versão inicial


do Arco de Maguerez, interpretando-a a partir das fontes com as
quais teve contato e de suas experiências de utilização do Arco
e de reflexões dele. Na versão de Berbel, que não nega as outras
versões como importantes fontes inspiradoras, a MP tem o papel de
proporcionar aos participantes o protagonismo na problematização
e transformação da realidade, cabendo ao professor ou orientador
papel central na condução metodológica do processo de ensino e
pesquisa, mas não como detentor do conhecimento e das decisões,
conforme podemos conferir em suas palavras:

[...] Nas ações de cada etapa a ênfase está no trabalho


ativo do participante, posicionado como protagonista
principal de todo o processo, desde a observação da
parcela da realidade e definição do problema de estudo
até a realização de algum grau de intervenção naquela
parcela da realidade, a fim de contribuir para a sua
transformação, como resultado do novo entendimento
do problema pelo (s) sujeito (s) do estudo. (BERBEL, 2011,
p. 77)

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 71


Em relação aos fundamentos teóricos sobre o Arco de Maguerez,
pelo fato de não haver notícia de tal explicação dada por seu idealizador,
mas apenas algumas nuances apresentadas por Bordenave e Pereira,
Berbel se sentiu movida e motivada a buscar essas respostas,
acreditava que era necessária tal reflexão. Assim, durante seu percurso
histórico de utilização e da reflexão acerca da MP, ela passou a “[...]
fazer associações de suas etapas e de seu sentido com o conceito de
práxis, depois com os ensinamentos de Paulo Freire e também com
características da dialética” (BERBEL, 2011, p. 8).

Nesse processo de construção e reconstrução dos fundamentos


teóricos da MP, em um de seus primeiros escritos sobre o assunto,
Berbel explica as diferenças entre o Método de Solução de Problemas
(PBL), que tem como principal referência o filósofo e educador John
Dewey, e a MP. O primeiro diz respeito a “[...] um dos métodos mais
característicos da Escola Ativa ou Escola Nova, ao lado do Método de
Projeto, do Método da Descoberta e do Estudo do Meio” (BERBEL,
2011, p. 51). A autora explica que este método e a MP têm semelhanças
e diferenças, mas não são iguais, principalmente em relação ao ponto
de partida e de chegada de cada um. Isso porque o PBL não parte da
observação da realidade, já vem formulado por um facilitador, e não
contempla uma ação concreta na realidade, tal como a MP o faz.

Epistemologicamente, Berbel esclarece, ainda, que a


fundamentação teórica do PBL está relacionada à educação liberal,
que “[...] reforça a posição de que os indivíduos têm as mesmas
oportunidades e se desenvolvem segundo suas capacidades,
pressuposto já amplamente debatido por seguidores de linhas mais
críticas” (BERBEL, 2011, p. 51). Ou seja, a proposta do PBL parte de
uma concepção de educação diferente da adotada por Berbel para a
MP, sendo a primeira proposta pautada pela escola liberal, e a segunda
com base numa visão de educação libertadora (como uma de suas
hipóteses), que tem uma posição política definida de transformação
social da realidade.

Optando por este tipo de educação em seus estudos, Berbel


relaciona, também, as etapas do Arco com o conceito de práxis,
fundamentada na obra de Adolfo Sánchez Vásquez (1977),
caracterizando assim a MP a partir de fundamentos do materialismo
histórico. Pois, enquanto opção ético-política, a MP aponta para a

72 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


ação concreta do homem na transformação social da realidade, com
o compromisso de humanização dessa ação. E do ponto de vista
teórico-metodológico e técnico-operativo, ou seja, em seu caminho
de entender a realidade e atuar nela, a MP propõe que o sujeito que a
utiliza supere o entendimento da realidade dada, desvelando-a, e que
retorne a ela com uma intervenção que a transforme em algum grau.

Em um constante caminho de construção e reconstrução


dos fundamentos teóricos da MP, Berbel, a partir dos primeiros
apontamentos realizados por Bordenave e Pereira, faz uma reflexão
acerca dessa metodologia e dos pensamentos de Paulo Freire, que
pregava que a educação tem um compromisso com a libertação
do homem. “Que tipo de libertação? Libertação da ignorância, da
escravidão, da dependência, da submissão, da passividade; libertação
de diversas formas de opressão” (BERBEL, 2011, p. 63), proporcionando-
lhe a oportunidade de obter conhecimento e ampliar cada vez mais a
consciência de si mesmo, transformando- se, e a consciência sobre a
realidade, transformando-a.

Dessa forma, Berbel distancia-se, em alguns aspectos, das outras


duas versões de explicação do Arco, a de Maguerez e a de Bordenave
e Pereira, tanto em relação a sua utilização prática, quanto em sua
fundamentação teórica. Suas escolhas, realizadas a partir do estudo
de educadores e pensadores brasileiros como Paulo Freire, Demerval
Saviani, José Carlos Libâneo, Cipriano Carlos Luckesi e outros, leva a
autora a aproximar a MP de teorias críticas e histórico-crítica, o que
lhe permite diferir das outras duas versões, pautadas mais por uma
concepção conservadora de educação, principalmente no que tange
ao compromisso de transformação social da realidade. O estudo
epistemológico da MP é continuado por Berbel (2011), e aguarda a
sua conclusão.

3.2 Etapas da Metodologia da Problematização com o


Arco de Maguerez
Neste item, passamos a detalhar um pouco mais as etapas do
Arco de Maguerez, segundo a versão de Berbel (2011), já brevemente
descritas na opção metodológica deste trabalho. A figura a seguir
ilustra a dinâmica do Arco com suas cinco etapas: Observação da

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 73


realidade e definição do problema, Pontos-chave, Teorização,
Hipóteses de Solução e Aplicação à Realidade.

Figura 2.3 | Arco de Maguerez - 2011

Fonte: Berbel (2011).

Conforme podemos observar na figura, as “setas” do Arco indicam


um movimento que parte da realidade, percorre as etapas do Arco e
retorna a ela com um novo olhar e com uma proposta de intervenção
visando transformá-la em algum grau. Tal caminho percorrido provoca
um “novo” Arco, que, por sua vez, ocasionará outro, e assim por diante.
Isso porque se parte do princípio de que a realidade não é estática,
ou seja, sempre temos uma visão parcial e provisória da realidade, e
a metodologia, que foca em um recorte dessa realidade, acompanha
seu movimento dialético (tese, antítese e síntese), podendo identificar
novos problemas e iniciar um novo movimento. Dessa forma, podemos
compreender o Arco como parte de um movimento espiral constante.

Sendo a realidade esse movimento constante e dialético, e tendo


como opção o método do materialismo histórico e o conceito de
práxis como um de seus desdobramentos teórico-metodológicos, a
MP se apresenta como uma opção, dentre outras, para que o sujeito
possa realizar uma leitura e intervenção na realidade. Utilizando-se da
MP, o participante é provocado a realizar uma ação-reflexão do recorte
da realidade partindo do concreto para o abstrato e retornando ao
concreto1.

1
Para uma melhor compreensão acerca da MP e a práxis, favor consultar Berbel (2006; 2011).

74 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Na primeira etapa, “Observação da realidade e definição do
problema”, é o momento em que o sujeito que utiliza a metodologia
dará início a um “olhar” crítico sobre o enfoque da realidade escolhida a
partir de seus saberes existenciais atuais, “[...] conhecimentos, crenças,
competências, habilidades, que são incorporados e adquiridos de
fontes diversas (história de vida, na escola, experiência do trabalho,
etc.) ” (COLOMBO; BERBEL, 2007, p. 132). Para isso, percebe que não
é possível realizar uma leitura mais criteriosa a partir de uma “simples”
observação e que necessita, portanto, apropriar-se de técnicas e
instrumentos de caráter científico para a coleta, análise e sistematização
das informações que o cercam.
O aspecto primeiro da MP é, então, “[...] a realidade vivida, aquela
parcela da realidade em que o tema que está sendo ou será trabalhado
está acontecendo na vida real” (BERBEL, 1999, p. 3), com os saberes
atuais. No entanto, esta observação não deve ser realizada com um olhar
comum, como fazemos cotidianamente ao não concordarmos com
certas ocasiões e desferimos opiniões sem um mínimo de reflexão.
Nesse momento da primeira etapa, necessitamos problematizá-la,
procurando identificar o que nesta parcela da realidade é inconsistente,
contraditório, precário, incoerente, enfim, uma situação problemática.
Contudo, de acordo com Berbel (2005), problematizar a realidade
e definir um problema tem sido verificado como o momento mais
difícil de ser executado pelos sujeitos que utilizam a MP. Um dos
motivos dessa dificuldade pode estar na insegurança em problematizar
a realidade, herança de nossa formação escolar que acostumou a
responder aos problemas formulados pelos professores, não a formulá-
los. Não estamos falando daquelas situações cotidianas contra as quais
reclamamos, que “criticamos”, e nas quais vemos defeitos, enfim, “[...]
formular um problema de estudo constitui um nível de elaboração que
requer uma atenção especial” (BERBEL, 2005, p. 2).
Para definirmos um problema, que pode ser formulado a partir
de uma pergunta, de uma afirmação que o justifique ou da negação
de algo, é necessário fazermos um questionamento para questões
que ainda não tenham uma resposta dada, nem do senso comum,
nem filosófica, nem científica. Trata-se de uma questão que necessita
de investigação, no caso da MP, em nível científico, e com rigor
metodológico que leve à sua compreensão, por mais simples que seja.
É o que nos alerta Berbel.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 75


[...] Problematizar a realidade é muito diferente de
formular um problema no sentido abstrato. Problematizar
a realidade vai demandar estudos de diferentes aspectos
que, conjugados, permitirão elaborar as hipóteses
de solução. Isso porque a realidade é complexa, é
multidimensional. (BERBEL, 2002, p. 2)

Como a definição do problema é a etapa em que os participantes


vêm sentindo mais dificuldade, entendemos ser importante
acrescentarmos a este assunto uma orientação a mais, suficiente
para demostrarmos que essa tarefa, apesar de difícil, é possível com
o empenho do participante:

[...] Os conhecimentos anteriores dos participantes e


sua observação atenta da realidade contribuirão para
distinguirem quando estarão diante de um verdadeiro
problema para se resolver. Além disso, o desenvolvimento
do processo de estudo sinalizará se ainda há algo a
corrigir na formulação. A sensibilidade e o compromisso
com a realidade se encarregarão de completar essa
clareza. (BERBEL, 2005, p. 4-5)

Em síntese, segundo Colombo e Berbel (2007), o participante de


um processo que utiliza a MP é levado a realizar as seguintes ações
na 1ª etapa: identifica o recorte de realidade a ser observado; elege
a forma de observação; realiza a observação (no formato definido
ou possível); registra as observações; analisa o registrado, em seu
conteúdo, problematizando-o; elege o foco do estudo a partir de
um critério; redigeo problema; justifica a escolha do problema.

Definido o problema da pesquisa, iniciamos a 2ª etapa da MP,


“Definição dos Pontos-chave”, que consiste em dois momentos
principais. No primeiro, o participante reflete sobre os possíveis
fatores associados e determinantes maiores acerca do problema,
a partir dos seus saberes atuais. Ou seja, deve-se perguntar por que
existe tal problema, sendo que os “fatores associados” referem-
se às questões mais diretas, locais, específicas daquele recorte da
realidade. Já as possíveis “determinantes maiores” são obtidas por
meio de reflexões mais gerais, universais, contextuais, globais. De

76 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


certa forma, trata-se de exercitar a reflexão partindo do particular
para o universal ou do mais próximo para o mais distante, e vice-
versa, para saber o porquê da existência do problema definido.

Após refletir e redigir os possíveis fatores associados e


determinantes maiores do problema, o momento seguinte
da segunda etapa da MP é a definição dos pontos-chave, que
são os pontos de estudo eleitos com critérios, para um maior
aprofundamento teórico do problema. “[...] é o momento de definir
os aspectos que precisam ser conhecidos e melhor compreendidos
a fim de se buscar uma resposta para esse problema” (BERBEL, 1999,
p. 4).

Em síntese, segundo Colombo e Berbel (2007), o participante de


um processo que utiliza a MP é levado a realizar as seguintes ações
na 2ª etapa: reflete a respeito do problema; identifica possíveis
fatores associados ao problema; identifica possíveis determinantes
maiores do problema; redige toda essa reflexão, extraindo o seu
sentido para o estudo, pelas possíveis explicações da existência do
problema; analisa a reflexão, captando os vários aspectos envolvidos
no problema; elege, com critérios, aqueles aspectos que serão
estudados na etapa seguinte; redige os pontos-chave.

A 3ª etapa, a da “Teorização”, é o momento de estudo, de


investigação e de aprofundamento teórico. É hora de escolher
a forma de estudar e as fontes de estudo, conforme bem ilustra
Berbel:

[...] Vamos buscar informações na biblioteca, nos


livros, nas revistas, nos relatórios de pesquisa, com
especialistas, com professores que entendem do assunto,
com a população, com outros colegas, etc. Vamos aplicar
questionários, realizar entrevistas, solicitar depoimentos,
etc. Enfim, aqui se define a metodologia para realizar
o estudo propriamente dito, na etapa da Teorização.
(BERBEL, 1999, p. 4)

Os dados coletados devem ser tratados e analisados. Essa etapa


permite que o participante, agora com seus conhecimentos mais
aprofundados em relação ao problema, busque solucioná-los.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 77


É o momento de confrontar a primeira impressão que ele tinha
sobre as possíveis soluções para o problema, realizada na reflexão
dos possíveis fatores associados e determinantes maiores, com o
saber acumulado na teorização; reforçando ou contrapondo as
afirmações anteriores, com maior propriedade (BERBEL, 2006;
BERBEL, 1999; COLOMBO; BERBEL, 2007).

Segundo Colombo e Berbel (2007), o participante de um


processo que utiliza a MP é levado a realizar as seguintes ações
na 3ª etapa: elege a forma de estudar cada ponto-chave; prepara
os instrumentos de coleta de informação; testa os instrumentos;
organiza as condições para a aplicação dos instrumentos; coleta
as informações (aplicação dos procedimentos e instrumentos)
definidos; trata as informações; analisa e discute as informações;
estabelece relações entre as diferentes informações; conclui
em função do problema, verificando se as hipóteses explicativas
iniciais foram confirmadas, negadas ou não foram consideradas na
teorização; registra toda a teorização.

Na 4ª etapa, “Hipóteses de Solução”, é possivelmente o momento


de maior estímulo à criatividade do participante. É nesse momento
que, diante das respostas encontradas para analisar o recorte da
realidade, ele deve pensar em ações que poderiam colaborar para a
resolução total ou parcial do problema, ainda que as possíveis ações
não estejam acessíveis diretamente à intervenção do sujeito que
está utilizando a MP, por dependerem de outras pessoas, instâncias,
níveis, hierarquias etc. O importante é que ele registre tudo e o
justifique, produzindo novas ações capazes de dar uma melhor
resposta ao problema identificado (BERBEL, 2006; BERBEL, 1999;
COLOMBO; BERBEL, 2007). Em suma,

[...] tem-se o problema sempre presente e as informações


do contexto de onde foi identificado; têm-se os possíveis
fatores e os determinantes contextuais a ele associados
inicialmente e todo o corpo de informações empíricas e
científicas obtidas durante a teorização, para conjugar,
relacionar, questionar etc. A partir daí, são elaboradas as
propostas de superação do problema central em estudo
ou as Hipóteses de solução”. (BERBEL, 2006, p. 3332)

78 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Conforme Colombo e Berbel (2007), o participante de um
processo que utiliza a MP é levado a realizar as seguintes ações na 4ª
etapa: elabora as hipóteses de solução para o problema com base
na Teorização e etapas anteriores; abrange diferentes instâncias ou
níveis de ação visando à transformação daquela parcela de realidade
estudada; usa criatividade para encontrar ações novas; explica/
argumenta as hipóteses elaboradas; registra toda a elaboração.

Por fim, a 5ª e última etapa da MP, “Aplicação à Realidade”,


é o momento da prática, da ação concreta, política, social
e transformadora, proporcionada por esta metodologia. O
participante irá analisar as possíveis hipóteses de solução que
podem ser aplicadas, de acordo com “[...] a exequibilidade, a
urgência, a prioridade etc., visando eleger aquelas que poderão
ser realizadas e atingir mais diretamente o problema, contribuindo
para a transformação da realidade estudada” (COLOMBO; BERBEL,
2007, p. 136). Este momento da metodologia é muito rico, pois há
dois componentes extraordinários presentes, a relação entre teoria
e prática e o compromisso com uma nova sociedade, conforme
relata Berbel:

[...] Esse exercício final da Metodologia da Problematização


antecede uma ação concreta dos participantes, que são
também cidadãos que se preparam para uma atuação
social (profissional, política, familiar etc.) cada vez mais
informada e mais consciente. Além disso, a orientação de
todo o trabalho se dá pensando-se sempre na construção
de uma sociedade cada vez mais justa e com condições
de vida cada vez mais dignas para a maioria da população,
seja por meio da educação, da saúde, da cultura, seja de
outras instâncias sociais. (BERBEL, 2006, p. 3333)

De acordo com Colombo e Berbel (2007), o participante de um


processo que utiliza a MP é levado a realizar as seguintes ações na
5ª etapa: analisa a aplicabilidade das hipóteses; elege, com critérios
(exequibilidade, urgência, prioridade etc.), as que julga poder
colocar em prática; planeja a execução das ações com as quais
se compromete; coloca-as em prática; registra todo o processo,
analisando os resultados, quando possível.

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 79


Antes de finalizarmos a explicação das etapas e da dinâmica do
Arco, acreditamos que cabe um parêntese para salientarmos que,
caso a utilização da metodologia seja feita em grupo (projetos de
pesquisa, de extensão, trabalhos acadêmicos ou profissionais, não
importa), é importante ressaltar a riqueza que é agregada ao trabalho,
pois, além de todos os fatores explicitados no caminho do Arco,
há ainda o fator das relações sociais. Tal fator proporcionará um
“confronto” de ideias entre os participantes. “É desse modo que os
saberes do sujeito, quando trabalha em grupo, são compartilhados,
colocados em dúvida, e novos saberes são construídos em interação
como os outros” (COLOMBO; BERBEL, 2007, p. 132).

Outro ponto que queremos salientar é a transformação dos


próprios sujeitos que utilizam a MP, em relação à sua práxis
como cidadãos, em menor ou maior grau, verifica-se alguma “[...]
mobilização intelectual, afetiva, política e social dos participantes, e
que lhes acrescenta ainda, em seu conjunto de saberes, um método
de estudo e de leitura da realidade [...]” (BERBEL, 2006, p. 3333).

A MP caracteriza-se como uma metodologia crítica, em cujas


etapas há um processo metodológico dinâmico que permite
desvelar a aparência posta pela realidade, em busca de sua essência.
Ainda, propõe-se uma ação concreta sobre essa realidade, cuja
consequência é a sua possível transformação social em algum
grau, articulando-se teoria e prática. Também, qualificam-se a ação
e a reflexão, que devem se basear no conhecimento científico,
entre outros; evitando, assim, o improviso, o achismo e a falta de
planejamento.

Vídeo:

Clique no link: <https://www.youtube.com/watch?v=thHeDB_


tZKg> (Acesso em: 21 mar. 2016), e assista a um trecho do filme
“The Matrix”, refletindo acerca da necessidade de problematizarmos
a realidade, pois o real não se apresenta em sua essência, apenas
em sua aparência. Por isso, nossos educandos precisam aprender a
problematizar a realidade para desvendá-la em sua essência.

80 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Para saber mais
Apesar de poder ser utilizada a partir de diversas matrizes
teórico- metodológicas, a MP configura-se como uma
importante metodologia de ensino crítica, capaz de auxiliar
o pesquisador/estudante/profissional a desvelar a realidade e
intervir nesta.

Atividades de aprendizagem
1. Elabore um resumo acerca do Arco de Maguerez.

2. Aponte quais são os benefícios do trabalho realizado com a Metodologia


da Problematização para o profissional em formação.

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade você pôde conhecer o processo de
desenvolvimento humano. Dentre as inúmeras teorias que tratam
da temática, escolhemos uma que concebe o ser humano a partir
de um conjunto sistêmico. Para explicar o funcionamento do pensar
e aprender elegemos uma teoria que aponta a cultura como fator
de humanização do indivíduo, pois nossa humanização perpassa
pelo acúmulo cultural transmitido de geração em geração. À luz
dessa teoria formulamos algumas ideias com vistas a fomentar o
pensar e aprender com criticidade.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. No Modelo Bioecológico, o Tempo é um organizador social e cultural
que exerce uma função fundamental no desenvolvimento, pois retrata
os acontecimentos e as mudanças que ocorrem ao longo da vida. Ele é
analisado a partir de três níveis. Faça a associação correta.
(A) Microtempo
(B) Mesotempo
(C) Macrotempo

U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica 81


(.....) Refere-se à continuidade e descontinuidade reservadas dentro
de pequenos episódios dos processos proximais, necessita de certa
regularidade.
(.....) Abarca as expectativas e os eventos e mudanças dentro da sociedade
por meio das gerações.
(.....) Diz respeito à periodicidade dos episódios dos processos proximais
por meio de intervalos maiores de tempo. Seus efeitos podem produzir
resultados significativos no desenvolvimento.

2. Baseado em Vygotsky, podemos afirmar que as características humanas


resultam da interação dialética do homem e seu meio sociocultural, ou
seja, o homem transforma o meio e também é transformado por ele. Logo,
as funções psicológicas humanas se originam nas relações entre o ...............
................. e seu contexto ................................. e .............................. .
a) O meio, escolar e cultural.
b) O sujeito, histórico e familiar.
c) O meio, escolar e social.
d) O meio, histórico e social.
e) O indivíduo, cultural e social.

3. Tudo o que um indivíduo faz hoje em conjunto com outros poderá


fazer sozinho amanhã. Essa afirmação pode ser encontrada no conceito
difundido por Vygotsky e denominado:
a) Zona de Desenvolvimento Atual.
b) Teoria Cognitiva.
c) Modelo Bioecológico.
d) Zona de Desenvolvimento Proximal.
e) Teoria da Psicogênese.

4. As nossas capacidades, como a inteligência, dependem exclusivamente


de nosso mapa genético, ou podem modificar-se em determinadas
condições ambientais?

5. Fomentar pensamento crítico, principalmente em indivíduos em


formação, pode contribuir para compensar diferenças entre seres
humanos?

82 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Referências
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psicossocial: redes de apoio social e fatores pessoais de proteção.
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86 U2 - Saber pensar e aprender com base na consciência crítica


Unidade 3

A atuação do serviço social


na política de educação

Amanda Boza Gonçalves Carvalho

Objetivos de aprendizagem
Nesta unidade, temos como objetivo o aprofundamento
reflexivo sobre a atuação do Serviço Social na Política de
Educação, dando enfoque principal à escola enquanto espaço
sócio-ocupacional do Assistente Social.

Seção 1 | Premissas básicas: conhecer e questionar


Quando falamos sobre o Serviço Social na educação, precisamos, inicialmente,
esclarecer alguns pontos básicos de entendimento sobre a temática. Dessa forma,
a proposta na seção 1 é apresentar esses pontos básicos, como a nomenclatura
a ser utilizada, se a política de educação é um campo novo de trabalho e como
devemos olhar para a inserção do Assistente Social nesse espaço.

Seção 2 | Serviço Social na educação: trajetória histórica e os processos


atuais
Na segunda seção, temos como proposta a aproximação com o contexto
histórico do Serviço Social na Política de Educação. A trajetória histórica do
Serviço Social no espaço sócio-ocupacional assumiu as características próprias
que a profissão desenvolveu ao longo do tempo. A visão teórico-metodológica
do Serviço Social nessa área evoluiu na medida em que a própria categoria
profissional também foi adquirindo novas roupagens teóricas.

Seção 3 | O Serviço Social na escola: uma inserção necessária


Na terceira seção, o objetivo é dar início a um debate acerca da inserção do
Assistente Social no espaço da escola, resgatando alguns pontos imprescindíveis
para pensar o fazer profissional. A referida seção também iniciará a apresentação
dos tópicos elencados no Parecer CFESS 23/2000.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 87


Seção 4 | A dimensão técnico-operativa do Assistente Social na Escola:
um olhar a partir do Parecer Jurídico 23/2000
Na quarta e última seção desta unidade, iremos debater sobre algumas das
possíveis atribuições do Assistente Social na escola, com base no Parecer Jurídico
CFESS 23/2000. Afinal, o que o Assistente Social pode fazer em uma escola?
Queremos elucidar as possíveis propostas, mas sabendo que elas não devem se
esgotar em alguns tópicos de um Parecer Jurídico.

88 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Introdução à unidade
Caro leitor, nesta unidade falaremos sobre o Serviço Social na
Política de Educação. Faremos um resgate da trajetória histórica da
profissão, apresentaremos algumas premissas básicas de discussão
e, por fim, abordaremos alguns pontos importantes com relação à
prática profissional na escola.

O Serviço Social na educação pode ser considerado um novo


espaço de trabalho profissional? Atualmente, temos Assistentes
Sociais trabalhando na área da educação? E quando falamos em
educação, entendemos que a escolar seria esse espaço? Quais
são as atribuições do Assistente Social em uma escola? Essas
são algumas dúvidas que podemos ter ao iniciarmos os estudos
sobre a atuação do Serviço Social na área da educação. Por mais
que possa parecer, não se trata de uma nova área de trabalho
para o Assistente Social, e esse questionamento também não é
uma especulação por mais postos de trabalho, trata-se de um
campo para atuação profissional que a cada dia mais vem sendo
problematizado, debatido, pesquisado e publicizado. É necessária
a atuação do Assistente Social em uma escola, como também nos
demais espaços vinculados à política de educação.

A proposta desta unidade, em sua primeira e segunda seções,


é apresentar alguns pontos-chave e introdutórios sobre o Serviço
Social na educação, esclarecer termos, discorrer sobre o processo
histórico e apresentar a possibilidade de atuação na área na
atualidade. A terceira e quarta seções estão dedicadas ao debate
acerca da atuação do Assistente Social no espaço da escola,
especificamente. Apresentaremos algumas possíveis demandas
de trabalho e detalharemos as atribuições elencadas no Parecer
Jurídico 23/2000.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 89


Seção 1
Premissas básicas: conhecer e questionar
Introdução à seção

Engana-se quem afirma que a área da educação é um recente


espaço de trabalho para os profissionais da área de Serviço Social!
Por mais que essa temática tenha sido mais debatida nos últimos 10
anos, não se trata de uma nova área de trabalho profissional. O que
podemos chamar de recente é o aumento significativo de debates e
publicações sobre o Serviço Social na área da educação.

Antes de traçarmos a linha histórica sobre a atuação do assistente


social nessa área, é importante esclarecer, logo de início, um termo
que algumas pessoas ainda confundem. Devemos utilizar o termo
Serviço Social escolar ou Serviço Social na educação? A priori, os
dois termos podem parecer sinônimos, mas eles têm uma grande
diferença. Estamos falando, portanto, da inserção do Assistente Social
na política de educação, não o restringindo à escola. A política de
educação não é composta somente pela escola! Essa, por sua vez,
deve ser vista como um dos espaços sócio-ocupacionais do Serviço
Social. Portanto, se o assunto trabalhado não for unicamente o da
escola, o ideal é utilizar o termo Serviço Social na educação. Além
da escola de educação básica pública e privada, com a oferta de
educação infantil, ensino fundamental e médio, o assistente social
também pode estar inserido na educação de jovens e adultos, na
educação especial, na educação superior, na educação profissional,
bem como na composição de equipes gestoras nas secretarias de
educação municipais e estaduais, por exemplo. Logo, não estamos
falando somente da escola básica, estamos falando de uma política
de educação mais ampla.

Agora que os termos estão devidamente esclarecidos, partimos


para outra consideração primordial: não devemos encarar a inserção
do assistente social na área da educação como uma simples
possibilidade de abertura de mais campos de trabalho profissional.
Mas sim, como a luta desses profissionais pela inscrição na educação

90 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


enquanto política social. Ao olhar com esse enfoque, percebemos
que se trata de um objetivo bem maior do que a abertura de campos
de trabalho.

Já que falamos sobre campo de trabalho, outra premissa básica


dessa discussão está atrelada à necessidade do Assistente Social
de romper com uma visão endógena da profissão, conforme
referenciado por Martins:

O Assistente Social deve estar atento para não realizar


uma análise endógena, reducionista, fragmentada,
individualista, do ambiente educacional, mas situá-lo
no contexto mais amplo, da própria dinâmica societária,
analisando as mediações presentes no tecido social.
(MARTINS, 2007, p. 42).

A visão endógena da profissão faz com que caiamos em uma


armadilha: a de olhar a profissão dentro dos seus muros, pessoalizando,
individualizando análises e dificultando uma visão que vai além do
aparente, do fenômeno. Devemos buscar analisar a complexidade do
contexto social no qual estamos inseridos. Não podemos olhar para
as situações que vivenciamos no cotidiano de trabalho descolando-
as do seu contexto mais amplo, distanciando-as de uma análise de
conjuntura mais completa. A partir dessa ótica, devemos olhar para
o campo da educação não somente como mais um espaço de
trabalho para o Assistente Social, mas analisá-lo a partir da posição
estratégica que ocupa, tanto nos processos políticos, econômicos,
como também nos sociais e culturais.

Diante disso, vamos fazer um exercício de análise: qual é o papel


da educação hoje? Se pensarmos na educação escolar, poderíamos
dizer que o papel dela é ensinar conteúdos relativos às grades
curriculares, como álgebra, literatura, química orgânica, história do
Brasil, por exemplo? Sim, essa troca de saberes faz parte da proposta da
educação, afinal, é muito importante passar por inúmeras experiências
de aprendizado entre as quatro paredes de uma sala de aula! Todavia, a
educação pode ser vista como um dos mais complexos constitutivos
da vida social e, considerando sua dimensão, “como um instrumento
de elevação cultural das massas, possibilitando-lhes conhecer
e dominar os mecanismos de reprodução global da formação

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 91


socioeconômica, que são passíveis de transformação” (MARTINS,
2007, p. 24). Pensando sob esse aspecto, podemos compreender que
a política de educação acaba sendo um meio estratégico para manter
a hegemonia do capital.

Questão para reflexão


Qual é a distinção entre os termos Serviço Social escolar e
Serviço Social na educação?

Atividades de aprendizagem
1. Ao falarmos sobre a inserção do Serviço Social na Política de Educação,
acabamos lendo/ouvindo/falando termos que não estão de acordo com
essa temática. Dessa forma, qual seria o termo correto para fazermos tal
menção?

2. O que significa ter uma visão endógena da profissão?

92 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Seção 2
Serviço Social na educação: um olhar sobre a
trajetória histórica e os processos atuais
Introdução à seção

Os primeiros registros sobre o Serviço Social na educação são


datados em 1907, nos Estados Unidos. Naquela época, os Assistentes
Sociais eram visitadoras que tinham como atribuição identificar o motivo
pelo qual as famílias não estavam enviando seus filhos à escola ou até
mesmo para identificar motivos relacionados ao não aproveitamento
ou adaptação escolar. A Europa também contou com profissionais
nessa área, mas estavam mais vinculados ao setor de saúde e seus
problemas de aprendizagem. Na Europa, o trabalho do Assistente
Social na escola estava vinculado aos problemas de aprendizagem, sob
um olhar individual e também familiar. Na América Latina, por sua vez,
o trabalho do Assistente Social também era focado na tríade escola –
família e comunidade.

O surgimento do Serviço Social no Brasil, bem como a sua


institucionalização na década de 1930, não deve ser compreendido
como um acontecimento natural ou até mesmo isolado. Ele está
situado em um complexo quadro conjuntural que caracterizava o
país naquele momento. A compreensão em relação à legitimação da
profissão deve estar atrelada às condições sócio-históricas da época.
Estamos falando de uma emergente sociedade urbana industrial,
posicionada em um momento peculiar do desenvolvimento capitalista,
marcado pelo movimento dos trabalhadores em suas reivindicações
contra a exploração do trabalho e em defesa dos direitos de cidadania.

Em termos sintéticos, a profissão surge das necessidades e


urgências oriundas do conjunto das expressões de desigualdade social,
econômica e cultural. Com os problemas resultantes do capitalismo
e com as mudanças da expansão da comunicação no mundo, o
antagonismo entre capital e trabalho foi acentuado. O processo de
exploração desmedida do capital evidenciou diversas expressões
de cunho social, gerando, por sua vez, um descontentamento

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 93


e consequente manifestação por parte dos trabalhadores, em
discordância à conjuntura da época. Diante de tais inquietações, o
Estado viu-se pressionado a apresentar propostas concretas em relação
à “resolutividade” das manifestações sociais.

Pensar no período de gênese do Serviço Social no Brasil é também


pensar na inserção do Assistente Social no espaço da escola. Tal
inserção é datada de 1930, mas não em grandes proporções. Nessa
época, o Governo do Estado de Pernambuco deferiu um ato que
apresentava os Assistentes Sociais como “agentes de ligação entre o lar
e a escola” (PINHEIRO, 1985, p. 46). A atividade estava relacionada ao
acompanhamento de famílias com baixos rendimentos. Vale lembrar
que se trata de uma época em que os profissionais atuavam em uma
perspectiva moralizante e individualizadora.

O estado do Rio Grande do Sul também foi um dos pioneiros a


atrelar o trabalho do Assistente Social à Educação. Os profissionais de
Serviço Social eram chamados à intervenção em situações no ambiente
escolar que eram consideradas desviantes, como uma anormalidade
social (AMARO, 1997). Na década de 1950, em Porto Alegre, um evento
foi realizado para debater a intervenção do profissional nesse espaço.

O projeto tradicional conservador da profissão continuou


hegemônico por mais alguns anos, começou a ser questionado entre
1950 e 1960, em um período marcado por mudanças econômicas,
políticas, sociais e culturais no contexto brasileiro, período do governo
desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek, como também no
contexto mundial, em que a expansão do capitalismo era preponderante.
Nesse momento histórico, a profissão gesta inquietações sobre o
projeto tradicional conservador que, por sua vez, culminaram com
a identificação da necessidade de haver para a profissão um projeto
efetivamente comprometido com as demandas da classe subalterna e,
consequentemente, um novo projeto profissional.

Considerando tais aspectos, na época em que as refrações da


questão social foram mais evidentes, novos debates acerca da prática
profissional na educação foram gestados em Congressos do Serviço
Social e no interior das universidades.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 (LDB) apresentou


em seu Título XI a proposta “Da Assistência Social Escolar”, a qual atestou

94 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


a necessidade de um acompanhamento na área social, conforme
vemos abaixo:

Art. 90 – Em cooperação com outros ou não, incumbe


aos sistemas de ensino, técnica e administrativamente,
prever, bem como orientar, fiscalizar e estimular os
serviços de assistência social, médico-odontológico e de
enfermagem aos alunos.
Art. 91 – A assistência social escolar será prestada nas
escolas, sob a orientação dos respectivos diretores,
através de serviços que atendam ao tratamento dos
casos individuais, à aplicação de técnicas de grupo e à
organização social da comunidade (BRASIL. Lei nº 4.024,
de 20 dezembro de 1961).

Esses e outros artigos foram revogados pela Lei nº 9.394, de


1996. Já em 1973, foi promulgado o Decreto nº 72.846, o qual
regulamentou a profissão de Orientador Educacional. Tal legislação
foi causadora de um incômodo por parte dos Assistentes Sociais,
todavia, acabou influenciando a inclusão dos profissionais de Serviço
Social em equipes multiprofissionais. Vejamos um fragmento do
Decreto citado:

Art. 1º Constitui o objeto da Orientação Educacional


a assistência ao educando, individualmente ou em
grupo, no âmbito do ensino de 1º e 2º graus, visando
o desenvolvimento integral e harmonioso de sua
personalidade, ordenando e integrando os elementos
que exercem influência em sua formação e preparando-o
para o exercício das opções básicas. Art. 2º O exercício da
profissão de Orientador Educacional é privativo:
I - Dos licenciados em pedagogia, habilitados em
orientação educacional, possuidores de diplomas
expedidos por estabelecimentos de ensino superior oficiais
ou reconhecidos. II - Dos portadores de diplomas ou
certificados de orientador educacional obtidos em cursos
de pós-graduação, ministrados por estabelecimentos
oficiais ou reconhecidos, devidamente credenciados pelo
Conselho Federal de Educação.
III - Dos diplomados em orientação educacional por
escolas estrangeiras, cujos títulos sejam revalidados na

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 95


forma da legislação em vigor.
Art. 3º É assegurado ainda o direito de exercer a profissão
de Orientador Educacional:
I - Aos formados que tenham ingressado no curso antes da
vigência da Lei nº 5.692-71, na forma do art. 63, da Lei nº
4.024-61, em todo o ensino 1º e 2º graus.
II - Aos formados que tenham ingressado no curso antes
da vigência da Lei nº 5.692-71 na forma do artigo 64, da
Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, até a 4º série do
ensino de 1º grau.
Art. 4º Os profissionais, de que tratam os artigos anteriores,
somente poderão exercer a profissão após satisfazerem os
seguintes requisitos:
I - Registro dos diplomas ou certificados no Ministério da
Educação e Cultura;
II - Registro profissional no órgão competente do
Ministério da Educação e Cultura.
Art. 5º A Profissão de Orientador Educacional, observadas
as condições previstas neste regulamento, se exerce na
órbita pública ou privada, por meio de planejamento,
coordenação, upervisão, execução, aconselhamento e
acompanhamento relativos às atividades de orientação
educacional, bem como por meio de estudos, pesquisas,
análises, pareceres compreendidos no seu campo
profissional.
(…) Art. 7º É obrigatório a citação do número do registro
de Orientador Educacional em todos os documentos que
levam sua assinatura.
Art. 8º São atribuições privativas do Orientador
Educacional:
a) Planejar e coordenar a implantação e funcionamento do
Serviço de Orientação Educacional em nível de:
1 - Escola;
2 - Comunidade.
b) Planejar e coordenar a implantação e funcionamento do
Serviço de Orientação Educacional dos órgãos do Serviço
Público Federal, Municipal e Autárquico; das Sociedades de
Economia Mista Empresas Estatais, Paraestatais e Privadas.
c) Coordenar a orientação vocacional do educando,
incorporando-o ao processo educativo global.
d) Coordenar o processo de sondagem de interesses,
aptidões e habilidades do educando.
e) Coordenar o processo de informação educacional e
profissional com vista à orientação vocacional.

96 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


f) Sistematizar o processo de intercâmbio das informações
necessárias ao conhecimento global do educando.
g) Sistematizar o processo de acompanhamento dos
alunos, encaminhando a outros especialistas aqueles que
exigirem assistência especial.
h) Coordenar o acompanhamento pós-escolar.
i) Ministrar disciplinas de Teoria e Prática da Orientação
Educacional, satisfeitas as exigências da legislação
específica do ensino.
j) Supervisionar estágios na área da Orientação
Educacional.
l) Emitir pareceres sobre matéria concernente à Orientação
Educacional.
Art. 9º Compete, ainda, ao Orientador Educacional as
seguintes atribuições:
a) Participar no processo de identificação das características
básicas da comunidade;
b) Participar no processo de caracterização da clientela
escolar;
c) Participar no processo de elaboração do currículo pleno
da escola;
d).Participarnacomposiçãodecaracterizaçãoeacompanha
mento de turmas e grupos;
e) Participar do processo de avaliação e recuperação dos
alunos;
f) Participar do processo de encaminhamento dos alunos
estagiários;
g) Participar no processo de integração escola-família-
comunidade;
h) Realizar estudos e pesquisas na área da Orientação
Educacional. (BRASIL. Decreto nº 72.846, de 26 de
setembro de 1973).

Até aqui, é possível perceber o quanto o Serviço Social foi ganhando


espaço na política de educação, não somente pelas legislações outrora
promulgadas, como também pelo crescimento dos debates profissionais
sobre essa área. Contudo, tal cenário começou a mudar na década de
1980. O aumento da oferta de emprego em áreas distintas da educação,
como a política de saúde, por exemplo, cuja proposta salarial era mais
significativa, somada à precarização do trabalho na área da educação,
fizeram com que houvesse uma redução expressiva de Assistentes
Sociais na política de educação.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 97


Essa também foi uma época em que os assistentes sociais, movidos
pela inquietude e pela não concordância com o tradicionalismo, iniciaram
um processo de questionamentos sobre a conjuntura da época e sobre
o papel profissional que desempenhavam. Desse processo, surge o
chamado Movimento de Reconceituação na América Latina. O objetivo
era conceituar as bases teóricas, metodológicas, éticas e políticas.
Aproximaram-se das Ciências Sociais e de outras áreas do conhecimento,
as quais proporcionaram uma análise crítica da sociedade de classes
latino-americana. Os modelos de atuação profissional, importados do
Estados Unidos e Europa, foram colocados em cheque. É oportuno
lembrar que o Brasil passava pelo período de ditadura militar e isso fez
com que o Movimento de Reconceituação no país tivesse características
mais brandas.

A partir desse novo olhar do Serviço Social, na década de 1990, a


discussão sobre a inclusão do Assistente Sociais no quadro funcional das
escolas permaneceu. Projetos de Lei vinculados a essa proposta foram
elaborados e as Universidades formadoras de Assistentes Sociais, junto
ao Conselho representativo da profissão, se articularam com o intuito de
se aproximarem da temática e lutar por tal inserção. Todavia, a revogação
doa artigos 90 e 91, da LDB de 1961, colaboraram ainda mais com o
processo de distanciamento da profissão da política de educação.

Apesar de tais fatos, o debate sobre a inserção do Serviço Social


na política de educação sempre esteve presente no meio profissional.
Tivemos um aumento considerável no número de pesquisas e
publicações sobre o tema. Além disso, outros projetos de lei foram
elaborados, por exemplo:

- Projeto de Lei nº 837/2003, de autoria de Durval Orlato (PT/SP),


que dispõe sobre a participação de assistentes sociais e psicólogos na
estrutura funcional das escolas:

Art. 1º As escolas de educação básica, públicas e privadas,


terão em sua estrutura funcional uma equipe profissional
de atendimento e orientação aos alunos, constituída por
assistentes sociais e psicólogos.
Parágrafo Único. A participação de profissionais de
psicologia e de assistência social no corpo técnico das
escolas de educação básica, tem por objetivo contribuir

98 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


para a melhoria do desempenho escolar dos alunos e sua
inserção na escola, na família e na comunidade.
Art. 2º A equipe de atendimento e orientação será
constituída de acordo com as seguintes distribuições:
referidas; assistentes sociais; no inciso II.
I – até 200 alunos, um profissional de cada uma das áreas;
II – acima de 200 e até 600 alunos, um psicólogo e dois
Assistentes Sociais;
III – acima de 600 alunos, manter a proporção
estabelecida. Art. 3º No primeiro ano após vigência desta
lei, até a realização de concursos para as escolas públicas,
poderá ser feita contratação provisória de profissionais de
psicologia e assistência social para o início imediato do
funcionamento das equipes de atendimento e orientação
aos alunos.

O referido projeto foi arquivado na Câmara dos Deputados em


12/09/2007. A seguir, vemos as últimas tramitações dessa proposta:

Quadro 3.1 | Tramitações do projeto de lei

Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )


Desarquivado nos termos do Artigo 105 do RICD,
22/03/2007 em conformidade com o despacho exarado no REQ-
108/2007.
DCD 23 03 07 PAG 11938 COL 01. Inteiro teor
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Apresentação do REQUERIMENTO N.º 643, DE 2007,
29/03/2007
pelo Deputado(a) João Paulo Cunha, que solicita o
desarquivamento de proposição.
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Devido a desarquivamento desta proposição em
09/04/2007 requerimento anterior, foi declarada prejudicada
a solicitação de desarquivamento constante do
REQ-225/2007. DCD de 10 04 07 PÁG 15046 COL 01.
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Devido a desarquivamento desta proposição em
16/04/2007 requerimento anterior, foi declarada prejudicada
a solicitação de desarquivamento constante do
REQ-309/2007. DCD 17 04 07 PAG 16678 COL 01.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 99


Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Devido a desarquivamento desta proposição em
03/05/2007 requerimento anterior, foi declarada prejudicada
a solicitação de desarquivamento constante do
REQ-571/2007. DCD 04 05 07 PAG 20852 COL 02.
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Devido a desarquivamento desta proposição em
requerimento anterior, foi declarada prejudicada
08/05/2007
a solicitação de desarquivamento constante do
REQ-643/2007 => PL-7039/2006. DCD de 09 05 07 PÁG
21722 COL 01.
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
13/07/2007 Desapensação do PL nº 1674/03, apensado, em face do
seu arquivamento, nos termos do artigo 133 do RICD.
Mesa Diretora da Câmara dos Deputados ( MESA )
Arquivado nos termos do artigo 163 c/c 164, § 4º, do
12/09/2007
RICD.
DCD de 13/09/07 PÁG 46307 COL 01.
Fonte: Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=112943>.
Acesso em: 3 mar. 2016.

Aproveitando o destaque nesse texto sobre o referido projeto,


vale fazer uma ressalva sobre a proposta, que não tem relação
direta com o Serviço Social e educação, mas sim sobre um
erro que comumente lemos ou ouvimos. Vocês identificaram o
equívoco com a nomenclatura dada ao profissional nesse projeto?
O deputado chama os Assistentes Sociais de profissionais de
Assistência Social! Caros leitores, devemos sempre nos atentar
para não cometermos esse erro. Serviço Social é uma profissão,
Assistência Social é uma política, são coisas totalmente distintas.
A política de Assistência Social é uma das áreas de trabalho do
Assistente Social.

Retomando a apresentação acerca dos projetos relacionados


ao Serviço Social na educação, também devemos destacar o
Projeto de Lei nº 060/2007, de autoria do Deputado José Carlos
Elias (PTB/ES), segundo a ementa:

100 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Determina que o Poder Público deva assegurar
atendimento psicológico e de assistência social aos
alunos da rede pública de educação básica; o serviço
será prestado por psicólogos vinculados ao SUS e por
assistentes sociais vinculados aos serviços públicos de
assistência social; os sistemas de ensino, saúde e de
assistência social disporão de 1 (um) ano, a partir da
publicação da lei, para cumprir suas disposições.

O projeto encontra-se com tramitação encerrada, conforme


quadro abaixo:
Quadro 3.2 | Projeto de Lei n° 060/2007

Disponível em: <http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/82215>. Acesso em: 3 mar. 2016.

Sobre o referido projeto de Lei, o CFESS (Conselho Federal de


Serviço Social) promoveu algumas ações muito importantes, cujos
relatos estão disponíveis no portal: <www.cfess.org.br>. Acesso em:
03 mar. 2016. São elas:

o Articulação com o Conselho Federal de Psicologia,


propondo alterações ao texto original que previa o
atendimento aos educandos por profissionais de saúde
pelo SUS e por meio da política de assistência social, não
garantindo as equipes multiprofissionais nas escolas.
o Discussão com o relator, senador Flávio Arns, que acatou
e apresentou um substitutivo que teve aprovação na CAS,
no qual ficou estabelecida a obrigatoriedade dos serviços
de psicologia e serviço social na própria rede pública de
educação básica.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 101


o Além disso, foi proposto pelo CFESS e acatado pelo relator
a substituição do termo “profissionais de assistência social”
(que constava no texto original) por “profissionais de serviço
social”, o que garantirá a contratação de assistentes sociais.
o Informes atualizados no site, pelo mailing e para os CRESS,
solicitando a mobilização e manifestação da categoria e
das entidades junto aos parlamentares para aprovação da
matéria. o Comparecimento às sessões das Comissões
quando a matéria foi votada e ao Plenário em algumas
sessões em que a matéria seria discutida.
o Aprovação de Moções de Apoio ao PLC nos Encontros
Nacionais CFESS/ CRESS e no Seminário da Virada,
encaminhadas ao Senado.
o No período de realização do XIII CBAS, a defesa do PLC
060 fez parte das reivindicações da categoria no Ato Político
realizado pelas/os participantes do evento em Brasília, em
3/8/2010.
o Gestões junto à presidência da CSSF para inclusão do
Parecer do relator na pauta da comissão.
o Reunião com a deputada relatora, juntamente com o CFP,
solicitando seu parecer favorável ao PL.
o Mobilização junto aos CRESS, assistentes sociais e
estudantes para participação na audiência pública, em
6/12/12. Estiveram presentes os CRESS AL, BA, DF, GO, RJ,
RN, SP e TO, além de diversos assistentes sociais da base
(DF), estudantes e docentes UnB, que lotaram o Plenário
Florestan Fernandes.
o CFESS foi representado na mesa de debate pela conselheira
Maria Elisa Santos Braga, tendo ainda a participação de
Carlos Felipe Nunes Moreira, representando o GT Educação
do Conjunto CFESS/ CRESS, conselheiro do CRESS-RJ.
Participou também o CFP e outras entidades convidadas
pela relatora do PL. Divulgação de matéria no site do CFESS
(CFESS, 2013).
Disponível.em:.<http://www.cfess.org.br/arquivos/
acompanhamento-PLs-2013-marco>. Acesso em: 3 mar. 2016.

A partir dessas ações, podemos dizer que a categoria profissional


não ficou alheia aos acontecimentos. Cabe aos Assistentes Sociais
e estudantes continuarem acompanhando o processo e ir “dando
caldo” a essa luta, que é de todos.

102 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Para saber mais
Quer aprender um pouco mais sobre o processo histórico do
Serviço Social na Educação? Leia a tese: A trajetória sócio-
histórica do Serviço Social no espaço da escola, de Ilda Lopes
Witiuk, disponível em: <http:// cress-sc.org.br/material-gt-
educacao/>, site do CRESS de SC. Acesso em: 3 mar. 2016.

Atividades de aprendizagem
1. Diante do que acabou de ler na Seção 2, assinale V para verdadeiro e
F para falso:
(.....) Os primeiros registros sobre o Serviço Social na educação são datados
de 1907, nos Estados Unidos.
(.....) A Europa também contou com profissionais na área da educação,
mas estes estavam mais vinculados ao setor de saúde e seus problemas
de aprendizagem.
(.....) No Brasil, a inserção do Serviço Social na educação está vinculada ao
Movimento de Reconceituação da profissão.
Respectivamente, as afirmativas são:
a) V - V - F.
b) V - F - V.
c) F - F - V.
d) F - F - F.
e) V - V - V.

2. “A participação de profissionais de psicologia e de assistência social


no corpo técnico das escolas de educação básica tem por objetivo
contribuir para a melhoria do desempenho escolar dos alunos e sua
inserção na escola, na família e na comunidade.” (PL 837/2003).
Um termo constante na referida citação está incorreto, de qual termo se
trata e por quê?

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 103


Seção 3
O Serviço Social na escola: uma inserção
necessária
Introdução à seção

O Serviço Social, profissão regulamentada pela Lei nº 8.662, de


1993, está inserida na divisão sociotécnica do trabalho, que tem
suas atribuições profissionais desenvolvidas no ambiente público e
privado, como políticas públicas das mais várias áreas, terceiro setor
e empresas, por exemplo. Sobre a atuação profissional, Filho ressalta:

O Serviço Social atua na área das relações sociais, mas


sua especificidade deve ser buscada nos objetivos
profissionais tendo estes que serem adequadamente
formulados guardando estreita relação com o objeto.
Essa formulação dos objetivos nos garante, em parte,
a especificidade de uma profissão. Em consequência,
um corpo de conhecimentos teóricos, método de
investigação e intervenção e um sistema de valores e
concepções ideológicas conformariam a especificidade
e integridade de uma profissão. O Serviço Social é uma
prática, um processo de atuação que se alimenta por uma
teoria e volta à prática para transformá-la, um contínuo ir
e vir iniciado na prática dos homens face aos desafios de
sua realidade. (FILHO, 2002, p. 56)

À luz dessa ótica, podemos acrescentar que o objeto de ação


profissional é a questão social e suas mais diversas expressões. O
Assistente Social atua no enfrentamento dessas refrações. A prática
profissional aponta os caminhos da legitimidade de cada profissão, ou
seja, o reconhecimento de que essa profissão apresenta respostas às
demandas. Elencamos, dessa forma, três dimensões que compõem
o todo da prática profissional.

A dimensão teórico-metodológica é definida como o modo


pelo qual damos significado aos fenômenos vinculados à profissão.

104 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


É necessário um intenso rigor teórico-metodológico, a fim de que
o profissional enxergue a dinâmica da sociedade para além dos
fenômenos aparentes, buscando apreender sua essência, seu
movimento e as oportunidades de construção de novas possibilidades
profissionais. Tal perspectiva direciona a ampliação da visão acerca do
movimento das classes sociais e do Estado, bem como suas relações
com a sociedade, pois a atual conjuntura, ou até mesmo a construção
histórica da realidade, não se configura como um pano de fundo da
prática profissional, muito pelo contrário, ela faz parte da teia que tece
o cotidiano profissional, afetando diretamente a sua demanda.

Na dimensão ético-política, entendemos que o profissional em sua


prática social não deve ser neutro, mas sim ter um posicionamento
político frente às questões sociais, para que possa ter clareza de qual é
a direção a ser tomada na sua prática. Além disso, ressaltamos algumas
orientações que as próprias categorias profissionais tecem, como é o
caso do Código de Ética dos Assistentes Sociais ou psicólogos, ou até
mesmo o Projeto Ético-político do Serviço Social, por exemplo. Trata-
se de aspectos valorativos que dão um norte à prática profissional e
que expressam o compromisso dos profissionais com a defesa dos
direitos da população, da efetiva cidadania e justiça social, de uma
democracia participativa e não somente representativa. Em suma, é
buscar alcançar uma sociedade mais justa e igualitária.

A dimensão técnico-operativa requer conhecimento e


apropriação de um conjunto de habilidades técnicas que permitam
o desenvolvimento de suas atribuições profissionais. Isso garante um
desempenho qualificado na instituição empregadora, por responder
coerentemente às demandas postas no mercado de trabalho.

Nesse prisma, nenhuma das dimensões deve ser desenvolvida


separadamente para que a prática profissional não se torne
fragmentada, neutra e vazia de aspectos teóricos e operativos. Toda
prática deve estar aliada a uma teoria, para que se construa uma
prática reinventada, uma práxis.

A prática é tudo o que o ser humano faz, nenhuma prática é neutra.


Já a teoria é a abstração mental, ou seja, a prática na sua dimensão
abstrata. A práxis, por sua vez, é a reunião da prática com a teoria.
A partir do momento que aliamos esses dois conceitos, temos a

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 105


catarse, enquanto passagem de um nível menor para um nível maior
de conhecimento. “Aquilo que eu sabia, agora continuo sabendo de
uma forma melhor”. Após o aprendizado, olhar para o lado que já era
conhecido, entretanto, a partir de um olhar diferenciado.

É diante desse contexto que situamos a prática social às nossas


discussões, que nada mais é do que o saber acumulado pelo ser
humano sobre sua história. O mundo material social está em constante
processo de movimento para organização ou reorganização. Os
seres humanos, grupos, indivíduos ou classes sociais, enquanto seres
sociais, realizam atividades práticas de transformação da natureza, da
sociedade. A opção ideológica de cada um tem uma força significativa
na escolha por um projeto societário.

Toda a atividade do ser humano, independente se individual ou


coletiva, é realizada considerando sempre as suas necessidades,
os seus interesses, ou seja, essas ações implicam sempre em
um determinado projeto que nada mais é do que a intenção de
determinadas finalidades as quais se quer chegar. Isso ocorre a partir
da invocação de valores que vêm legitimar determinados meios para
alcançar essas ações. Assim, os projetos societários são projetos
coletivos, que apresentam uma visão de sociedade a ser construída.
Para justificar essa imagem, os projetos afirmam determinados valores
e privilegiam alguns meios que consideram necessários, como o
material e o cultural, a fim de concretizá-la.

Podemos dizer que a gênese dos projetos societários acontece por


meio de projetos macroscópicos, que trazem em seu bojo propostas
para o conjunto da sociedade. Dessa forma, o projeto societário é o
único que apresenta a característica da amplitude e inclusividade, o
que não acontece no caso do projeto profissional, por exemplo.

Ao olharmos para a nossa sociedade, podemos afirmar que os


projetos societários acabam sendo projetos de classe simultaneamente.
Com o estado neoliberal essa situação se objetivou cada vez mais,
prorrogando a consecução dos antagonismos. Podemos dizer que
os projetos societários assumem duas configurações, podendo ter
a roupagem de uma delas somente. Ou eles são transformadores ou
conservadores. A disputa entre os distintos projetos societários vem
determinar, na sua última instância, a conservação ou transformação

106 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


da ordem social vigente. A partir dessa reflexão, podemos perguntar:
qual sociedade queremos? Qual política de educação queremos?

O Serviço Social e a educação possuem uma proposta de atuação


voltada para a construção de uma ordem societária com justiça social,
com igualdade e com democracia, por exemplo.

Os assistentes sociais devem, ao mesmo tempo tomar


a política educacional como um modo historicamente
determinado de oferta e regulação dos serviços
educacionais que organiza diferentes formas de
trabalho coletivo e modalidades de cooperação entre os
profissionais que atuam nesta área, como considerar a
educação como um fenômeno social, cujas práticas e seus
sujeitos envolvem processos que embora se relacionem
com a política educacional a ela não necessariamente
se inscrevem. Pensar a educação para além da política
educacional é, deste modo, uma outra exigência posta aos
assistentes sociais e que requer um olhar sobre a própria
dimensão educativa de sua intervenção como constitutiva
desses processos mais amplos e não necessariamente
vinculada a essa área de atuação do Estado via política
social. (ALMEIDA, 2004, p. 2)

O ato de viver em sociedade tem relação com a educação. Isso


porque estamos envoltos em um processo educacional que não
deve ser vislumbrado de uma única forma. Não devemos olhar para
a escola como único local no qual esse processo se desenvolve e o
docente como o único responsável por isso, embora algumas pessoas
“terceirizarem” a educação dos filhos delegando-as unicamente à
escola.

Para Almeida, a educação, enquanto um espaço sócio-ocupacional


para o Assistente Social, pode ser vista como:

A inserção dos assistentes sociais nos estabelecimentos


educacionais, em particular nas escolas do ensino
fundamental, tem representado, na atualidade, não apenas
o desejo dessa categoria profissional e o resultado de sua
atuação política e profissional na defesa dos direitos sociais
e humanos, mas uma necessidade socioinstitucional cada

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 107


vez mais reconhecida no âmbito do poder legislativo de
diferentes estados e municípios. A presença dos assistentes
sociais, sobretudo nas escolas, tem sido tomada como
presença de um profissional que possa contribuir com a
ampliação do processo educacional em sentido amplo,
ou seja, contribuindo para o acesso e permanência das
crianças e jovens na educação escolarizada, assim como
para a extensão dessa convivência para outros membros
da família, que por raízes sociais diversas não concluíram
ou experimentaram plenamente essa oportunidade.
(ALMEIDA, 2005, p. 17)

Sob essa ótica, podemos compreender que o Assistente Social


auxilia a escola no alcance dos objetivos, atuando significativamente
na tríade escola-família- comunidade. A intervenção profissional está
voltada para o público interno e externo. Mas como planejar uma
atuação profissional sem conhecer tal público? Uma análise real da
instituição, do território e do público atendido é muito importante
para que possam ser planejadas ações eficazes.

A escola pública, enquanto um espaço sócio-ocupacional do


Assistente Social, deve contar com dispositivos legais a fim de garantir
tal prática. Na escola, tanto pública quanto privada, as contradições
da sociedade são expressas de forma mais intensa. Por exemplo,
precarização das condições de trabalho dos docentes; gravidez na
adolescência; existência de vítimas de violências (física, psicológica,
sexual, negligência); expansão do voluntariado no campo educacional
e a consequente desprofissionalização daqueles que atuam nas
escolas; dependência química; prática do narcotráfico no ambiente
escolar; insubordinação dos alunos aos limites e regras da escola;
perda do atrativo da educação como um meio de ascensão social e
demais situações de vulnerabilidade social (GONÇALVES, 2009).

O Conselho Federal de Serviço Social afirma o seguinte:

O baixo rendimento, desinteresse pelo aprendizado e


evasão escolar, dentre outros, têm sido citados como
as grandes dificuldades de avanço destes alunos. As
mais diferentes literaturas têm demonstrado que estes
indicadores não se constituem em fatores exclusivamente

108 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


relativos à escola, e sim fatores que estão aliados a outras
formas de expressão dos problemas de âmbitos social
enfrentados pelo educando e sua família. (CFESS, 2001,
p.11)

Sob o pano de fundo dessa realidade, é preciso que a escola


identifique quais são suas possibilidades, potencialidades, limites e
fraquezas. O Assistente Social, por sua vez, deve apreender tal realidade,
para que consiga apresentar propostas de intervenção eficazes e focadas,
que tenha conhecimento do seu instrumental técnico-operativo,
que coloque em prática sua habilidade criativa para apresentar novas
propostas, caso necessário, que possa monitorar e avaliar sua postura e
resultados profissionais, bem como suas atitudes éticas.

Em 22 de outubro de 2000, a assessora jurídica do CFESS (Conselho


Federal de Serviço Social), Dra. Sylvia Terra, emitiu um Parecer Jurídico
sobre a implantação do Serviço Social nas escolas. Nele, Terra apresenta
as possíveis atividades a serem desenvolvidas pelo Assistente Social no
espaço da escola, conforme segue:

- Pesquisa de natureza socioeconômica e familiar para


caracterização da população escolar;
- Elaboração e execução de programas de orientação
sociofamiliar, visando prevenir a evasão escolar e melhorar o
desempenho e rendimento do aluno e sua formação para o
exercício da cidadania;
- Participação, em equipe multidisciplinar, da elaboração
de programas que visem prevenir a violência; o uso de
drogas e o alcoolismo, bem como que visem a prestação
de esclarecimentos e informações sobre doenças
infectocontagiosas e demais questões de saúde pública;
- Articulação com instituições públicas, privadas, assistenciais
e organizações comunitárias locais, com vistas ao
encaminhamento de pais e alunos para atendimento de suas
necessidades;
- Realização de visitas sociais com o objetivo de ampliar
o conhecimento acerca da realidade sociofamiliar do
aluno, de forma a possibilitar assisti-lo e encaminhá-lo
adequadamente;
- Elaboração e desenvolvimento de programas específicos
nas escolas onde existam classes especiais;

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 109


- Empreender e executar as demais atividades pertinentes
ao Serviço Social, previstas pelos artigos 4 e 5 da Lei de
Regulamentação da profissão. (CFESS, 2000)

Na próxima seção, abordaremos cada tópico para maior


aproximação com a proposta técnico-operativa para o Serviço Social
na Escola.

Atividades de aprendizagem
1. “Tal perspectiva direciona a ampliação da visão acerca do movimento
das classes sociais e do Estado, bem como suas relações com a sociedade,
pois a atual conjuntura, ou até mesmo a construção histórica da realidade,
não se configura como um pano de fundo da prática profissional, muito
pelo contrário, ela faz parte da teia que tece o cotidiano profissional,
afetando diretamente a sua demanda. ”
A citação faz menção ao conceito de qual dimensão?
A) Ético-política.
B) Teórico-metodológica.
C) Técnico-operativa.
D) Político-ideológica.

2. Analise as afirmativas a seguir:


I – A inserção dos assistentes sociais nos estabelecimentos educacionais
tem representado uma necessidade socioinstitucional cada vez mais
reconhecida no âmbito do poder legislativo de diferentes estados e
municípios.
II - A presença dos assistentes sociais, sobretudo nas escolas, tem sido
entendida como participação de um profissional que pode contribuir com
a ampliação do processo educacional em sentido amplo.
III – A presença do Assistente Social no espaço da escola é necessária.
O profissional deve compreender as dimensões teórico-metodológicas,
ético-políticas e técnico-operativas para viabilizar uma atuação
competente e eficaz.
Está correto o que se afirma em:
A) I e II.
B) II e III.
C) I e III.
D) I, II e III.

110 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Seção 4
A dimensão técnico-operativa do Assistente Social
na Escola: um olhar a partir do Parecer Jurídico
23/2000
Introdução à seção
Agora vamos, abordar um pouco mais cada ponto elencado
com a proposta do referido Parecer! O primeiro item propõe uma
“pesquisa de natureza socioeconômica e familiar para caracterização
da população escolar”. Essa orientação é importante não somente
para o Assistente Social que iniciará o trabalho em uma escola, por
exemplo, mas também para qualquer área. É necessário conhecer
a instituição na qual atua e também o público atendido. Somente
com essa visão será possível propor uma intervenção direcionada
e mais assertiva. Sabemos que, em muitos espaços de trabalho,
as atribuições do Assistente Social (e de outros cargos também)
já estão previamente estabelecidas, uma vez que a instituição se
organizou para a criação do cargo e contratação. O profissional
precisa conhecer, compreender e analisar como será a ação a
partir da descrição já elencada. Para isso, a pesquisa de natureza
socioeconômica e familiar para caracterização da população
escolar é de suma importância.

Como o profissional poderá colocar essa pesquisa em prática?


Primeira coisa a fazer é identificar quais resultados de pesquisa a
instituição já tem. Por exemplo: se a instituição utiliza um sistema no
qual faz todas as matrículas e lá constam algumas informações como
endereços, responsáveis, profissão, dentre outras informações,
o profissional já conseguirá obter alguns resultados. Se o sistema
permite a extração de dados, caso já não tenha sido feita, é possível
fazê-la por meio da tabulação e análise dos dados disponíveis.
Com isso, o Assistente Social poderá identificar o território, por
exemplo, contatar a rede de serviços socioassistenciais para verificar
a existência de um diagnóstico territorial ou a possibilidade de fazê-
lo em rede; poderá identificar dados importantes sobre matrículas,
abandono e evasão escolar etc. Provavelmente, a instituição já

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 111


tenha dados importantes tabulados, cabe ao profissional identificá-
los e complementar essa pesquisa com aquilo que for necessário.

Outro meio para operacionalizar tal pesquisa é identificar aquilo


que já foi produzido pelo Assistente Social, caso a instituição já tenha
tido um. Vale lembrar que o profissional faz muitos atendimentos
individuais e em grupo, portanto, muitas informações importantes
para tal caracterização do público atendido podem ser extraídas
desses registros. É por isso que o Assistente Social precisa sempre
registrar suas intervenções. Além dos instrumentos tradicionais,
como relatórios, por exemplo, também sugiro a utilização de
aplicativos que, posteriormente, possam ser utilizados para tabulação
e análise dos dados por meio de um editor de planilhas eletrônicas.
A partir do momento que o profissional alimenta várias informações
em planilhas, ele consegue transformá-las, posteriormente, em
dados que podem servir de base para o monitoramento e avaliação
do trabalho desenvolvido, bem como para análise de futuras
intervenções. Existem algumas opções de planilhas disponíveis e
acessíveis para sua utilização, pesquise os vários tipos e comece a
utilizá-las, pois elas serão muito úteis e um diferencial na sua prática
profissional.

Além de tudo isso, quando falamos em pesquisa, em conhecer a


população atendida, em caracterizar e analisar dados, estamos falando
de uma das mais importantes dimensões do trabalho profissional,
a investigativa. A Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em
Serviço Social emitiu, em 1996, as Diretrizes Curriculares Gerais para
o Serviço Social. Um dos princípios fundamentais que compõem as
diretrizes trata da dimensão investigativa e interventiva como ponto-
chave na formação profissional. A construção do conhecimento
no Serviço Social deve ser feita pela via da investigação e, diante
disso, a pesquisa é colocada em um patamar de necessidade para
o desenvolvimento da profissão. Quanto mais se pesquisa, mais se
aperfeiçoa, conhece, propõe.

A pesquisa vem ganhando cada vez mais espaço no cenário


profissional. A consequência disso é o significativo aumento da
produção de conhecimento sobre a área. Essa expansão ganhou
mais evidência a partir dos anos 80 e, até então, só tem crescido.
A investigação não deve estar somente no meio acadêmico, em

112 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


projetos de pesquisa para monografias, dissertações, teses, entre
outros, mas também no próprio cotidiano profissional. Aliás, a
pesquisa tornou-se pré-requisito para o desenvolvimento do
trabalho profissional.

Quando falamos em trabalho profissional e dimensão


investigativa, devemos ter em mente que ambas não caminham
sozinhas, mas sim em consonância com a dimensão teórico-
metodológica, ético-política e técnico-operativa do Assistente Social.
A base teórico-metodológica do Serviço Social foi desenvolvida
a partir do arcabouço de representações teóricas resgatadas das
ciências sociais e, principalmente, da tradição marxista, a qual afirma
que devemos buscar uma visão da totalidade. Nesse caso, o ato de
investigar pode ser entendido também como a busca por olhar o
que tem atrás da cortina do real. Nesse processo, o profissional deve
não somente analisar o motivo e o “como” dos acontecimentos,
mas também conseguir visualizá-los criticamente, além de optar por
determinado tipo de intervenção.

As refrações da questão social são configuradas como objeto


de trabalho profissional. A profunda compreensão desse objeto,
enquanto uma totalidade histórica, colabora para que o Assistente
Social possa construir alternativas de intervenção (novas ou já
praticadas), que visem à transformação de uma dada ordem vigente.
Nesse aspecto, a atitude investigativa é colocada como exigência
para a intervenção profissional.

A busca pela descoberta nos faz conhecer ainda mais aquilo


que está além da aparência, do imediato. A Teoria Social de
Marx referenda essa busca pelo real por meio da perspectiva de
totalidades concretas. Analisar a realidade por essa perspectiva
significa compreender que ela é articulada por totalidades parciais,
que é a síntese das determinações sociais, políticas, ideológicas,
econômicas, por exemplo. A realidade vai se desvelando na medida
em que essas totalidades parciais se inserem em totalidades mais
amplas. A concepção de totalidade justifica a análise, a priori, pelas
parcialidades, imediaticidades, pelas relações empíricas. Esse é o
ponto de partida.

A aparência imediata de algo não proporciona a compreensão

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 113


do todo, mas é ela o ponto de partida para a reflexão, ou seja, o
fato, como se mostra empiricamente, é o primeiro momento para
a compreensão da concretude. É oportuno salientar que a empiria
pode revelar algo, mas também pode ocultar. Podemos chamar
esse momento, do aparente imediato, de abstração. A partir do
momento que negamos dialeticamente (para dar sentido crítico à
nossa ação) essa empiria, passamos para uma fase de reconstrução
do objeto, tornando-o concreto pensado. Para Marx, o concreto é
concreto por ser a síntese de muitas determinações, a unidade do
diverso é a totalidade concreta, a junção das totalidades diversas,
da unidade do diverso. As totalidades parciais não se dão de forma
igualitária, umas podem ter mais influências que as outras. Para
caracterizar esse ponto, utilizamos o termo hegemonia. Em outras
palavras, mesmo havendo uma diversidade (totalidades parciais), há
uma que influencia mais que as outras.

Diante desse contexto, quando o Assistente Social decide


assumir essa linha teórica, acaba tendo clareza de que a realidade
não se coloca imediatamente à sua compreensão. Trabalhamos
cotidianamente com fatos que, em sua concretude, são muito mais
complexos do que aquilo que se apresenta na sua aparência. E
como podemos apreender esse objeto? Por meio de aproximações
sucessivas da realidade. A cada aproximação algo se mostra, se
clarifica. Essa é a processualidade de uma investigação, a cada
momento um novo patamar se descortina. Talvez essa pesquisa
nunca leve o pesquisador à realidade em sua concretude, entretanto,
o processo de aproximação nos ensina algo novo a cada patamar
que chegamos.

Como podemos operacionalizar esse processo? Devemos


estar munidos de instrumentais teórico-metodológicos e técnico-
operativos. O conhecimento, oriundo dessa razão dialética, vai
captar o movimento do objeto e a sua lógica de constituição. Em
Marx, trata-se da elevação do abstrato ao concreto pensado.

Esse movimento de investigação é de extrema relevância para


o processo de conhecimento do Assistente Social. Segundo Demo
(1997, p. 36), a “pesquisa pode significar condição de consciência
crítica e cabe como componente necessário de toda proposta
emancipatória. É preciso efetivar a necessidade de construir novos

114 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


caminhos”. Quando temos uma nova teoria, quando chegamos ao
concreto pensado, este não se torna somente algo contemplativo,
mas serve como base para a busca de uma mudança efetiva, como
da ideia sobre a realidade empírica, por exemplo. Dessa forma,
a dimensão investigativa transforma os elementos percebidos
na sua imediaticidade, em conceitos, teorias e até proposições.
Diante dos aspectos apresentados, não podemos entender como
verdade absoluta somente a realidade aparente, imediata. Com
isso, o Assistente Social é convidado a analisar, ontologicamente,
possibilidades de novas teorias e sociabilidade.

A atitude investigativa do Serviço Social deve estar presente no


seu cotidiano e não somente na academia, afinal, em hipótese
alguma devemos fazer uma separação entre aqueles que “pensam”
(academia) e aqueles que atuam (profissionais dos campos de
trabalho). Nesse aspecto, a dimensão investigativa se torna um
fator preponderante para a eficácia profissional, por superar a
análise teórico-metodológica via senso comum. Um dos resultados
dessa iniciativa é a possibilidade de construir novas formas de ação
profissional.

Diante da afirmativa supracitada, vale pensarmos sobre a


seguinte questão: o Assistente Social que não desenvolve sua
atividade profissional instrumentalizada na ação investigativa nada
faz? Trabalha erroneamente? A resposta é não! No entanto, a ação
profissional que não é sustentada por uma dimensão investigativa
tem um alcance mais limitado tanto no pensamento como na
prática. Corre-se o risco da visão acerca do objeto profissional ficar
restrita a uma apreensão mais imediatista. Assim, podemos afirmar
que é importante para a categoria profissional criar uma cultura
profissional que valorize essa dimensão investigativa.

Por outro lado, de que adianta a pesquisa se o profissional não


sistematiza a ação? A investigação sem uma sistematização pode
cair no risco de não atingir os resultados esperados ou proporcionar
uma análise equivocada da totalidade concreta.

Atingindo esses preceitos, entendemos que a pesquisa possibilita


desenvolver competências profissionais em três níveis:

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 115


No âmbito das competências teórico-metodológicas,
desenvolve-se a capacidade de o Assistente Social
compreender o seu papel profissional no contexto das
relações sociais, como foi dito, numa perspectiva de
totalidade social.
No âmbito das competências políticas, a pesquisa
permite que apreenda a sociedade como um espaço
de contradições.
No nível das competências técnico-operativas, a
pesquisa desenvolve nossa capacidade de investigar as
instituições, seus usuários, as demandas profissionais,
os recursos institucionais. Permite preparar respostas
qualificadas às demandas institucionais. Pela via da
pesquisa é facultado ao profissional que, não apenas
atendam as demandas, mas que, compreendendo
o conteúdo político delas, possa reconstruí-las
criticamente. (GUERRA, 2009, p. 714)

Para colocar em prática uma investigação é fundamental que o


profissional tenha preparo, formação teórica sobre essa ação, bem
como habilidade para execução. O ato de pesquisar exige que o
profissional tenha conhecimento sobre técnicas apropriadas para
tal, procedimentos metodológicos, rigor e ética, por exemplo.

Agora que sabemos o quanto a dimensão investigativa


profissional é importante, bem como a pesquisa para caracterização
do público atendido, vamos ao segundo tópico elencado no
Parecer Jurídico do CFESS: “Elaboração e execução de programas
de orientação sociofamiliar, visando prevenir a evasão escolar e
melhorar o desempenho e rendimento do aluno e sua formação
para o exercício da cidadania".

Para falar desse tópico, primeiramente, é necessário esclarecer


alguns termos. O referido tópico fala da “elaboração e execução de
programas”, mas você sabe o conceito de programa e a diferença
dele para os planos e projetos? Os documentos expressam o registro
da atividade de planejamento, dependendo do nível decisório a que
se relaciona, de seu âmbito e de seu grau de agregação de variáveis e
detalhamento. O plano é quando o documento se refere ao sistema
compreendido por inteiro. Contorna as linhas gerais do sistema,

116 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


corresponde às grandes linhas políticas, suas estratégias, suas
diretrizes e direciona as responsabilidades. No plano são tomadas as
referências para a formulação de programas e projetos para estudos
setoriais e/ou regionais. Tem maior âmbito de abrangência e menor
nível de detalhamento. O programa é o documento que detalha
o plano por setor, a política, diretrizes e medidas instrumentais.
Configura-se num desdobramento do plano, no qual os seus
objetivos setoriais serão os objetivos gerais do programa. Destina-se
a um setor ou a uma área do sistema. O projeto é a unidade elementar
do processo de tomada de decisões. Detém-se no detalhamento
das alternativas de intervenção escolhidas. No projeto, é menor o
âmbito de abrangência e maior o nível de detalhamento. Assim, a
elaboração e execução de programas de orientação sociofamiliar
podem ser também de projetos, dependendo da sua extensão.

Agora com os termos devidamente esclarecidos, voltaremos ao


referido tópico. Primeiramente, é necessário que se tenha domínio
sobre a elaboração de programas e projetos. Como devo elaborar
um projeto? Tenho conhecimento do que deve ser abordado?
Para elaborar uma proposta com o objetivo de “prevenir a evasão
escolar e melhorar o desempenho e rendimento do aluno e sua
formação para o exercício da cidadania” é preciso, em primeiro lugar,
conhecer os dados referentes a esse assunto. Por exemplo: qual o
índice de evasão escolar da instituição? Seja ela escola de educação
básica, de jovens e adultos, profissional, especial ou superior. Além
do índice, eu conheço os motivos da evasão escolar? O que leva
os alunos a abandonarem os estudos? Os motivos são variados e,
muitas vezes, complexos.

O que leva um adolescente a sair da escola? Muitas


tentativas foram feitas no sentido de responder a esta
questão. Grande parte da evidência empírica mostra
que a evasão escolar e pobreza são, intimamente,
ligadas e que trabalho infantil prejudica a obtenção de
melhores níveis educacionais. Pode-se argumentar que a
indisponibilidade de serviços educacionais de qualidade
e a falta de percepção acerca dos retornos futuros
levem o aluno ao trabalho precoce e aos baixos níveis
educacionais. Outros estudos privilegiam os efeitos de
restrições de renda e de crédito como causas de desvios

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 117


da trajetória individual ótima de longo prazo. Uma linha
de investigação que não vem sendo explorada devido
à falta de dados é composta de perguntas diretas aos
jovens que saíram da escola sobre as suas respectivas
motivações: seria a necessidade imediata de geração
de renda ou seriam os baixos retornos futuros, tal como
percebidos por eles ou pelos gestores públicos? (NERI,
s/d, p. 21).

Quando entendemos os motivos, conseguimos pensar em


propostas mais assertivas para prevenir tal problemática. Como a
instituição tem essas informações registradas? É possível partir desse
ponto para começar a compreender essa questão. Dados da esfera
municipal, estadual e federal também devem ser caracterizados.
O índice de evasão escolar na instituição na qual atuo tem índices
similares a de outras? Sem dúvida, a evasão escolar é um grande
problema que precisa ser combatido. Portanto, elabore uma boa
análise sobre o tema, com dados empíricos, gráficos e compreenda
plenamente o assunto, só assim será possível propor ações de
prevenção eficazes.

E quanto ao rendimento escolar do aluno? O Assistente Social


pode auxiliar na análise dessa questão, mas vale destacar que tal
ponto é um assunto que os pedagogos têm amplo conhecimento,
diferente dos Assistentes Sociais. Assim, trata-se de uma proposta de
trabalho em conjunto.

O ideal é que a elaboração desse projeto ou programa fique a


cargo de uma equipe interdisciplinar! Japiassú (1976, p. 82) diz que
“a atitude interdisciplinar nos ajuda a viver o drama da incerteza e
da insegurança. Possibilita-nos darmos um passo no processo de
libertação do mito do porto seguro. Sabemos o quanto é doloroso
descobrirmos os limites de nosso pensamento, mas é preciso que
façamos”. O autor também afirma que a interdisciplinaridade se efetiva
por meio da troca entre especialistas, bem como pela integração
das disciplinas envolvidas em um mesmo projeto, pois nenhuma
profissão é absoluta. E, para que esse objetivo seja alcançado, é
necessária uma nova espécie de cientista, o interdisciplinar, aquele
que é partícipe da comunicação. Esse caráter decorre do próprio

118 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


homem, enquanto ser social, um sujeito e objeto do conhecimento
social. Sobre esse aspecto, reiteramos que:

A metodologia interdisciplinar em seu exercício


requer como pressuposto uma atitude especial ante o
conhecimento, que se evidencia no reconhecimento das
competências, incompetências, possibilidades e limites
da própria disciplina e de seus agentes, no conhecimento
e na valorização suficientes das demais disciplinas e dos
que a sustentam. Nesse sentido, torna-se fundamental
haver indivíduos capacitados para a escolha da
melhor forma e sentido da participação e sobretudo
no reconhecimento da provisoriedade das posições
assumidas, no procedimento de questionar. Tal atitude
conduzirá, evidentemente, à criação de expectativas de
prosseguimento e abertura a novos enfoques ou aportes
(FAZENDA, 1994, p. 69).

Trata-se de um trabalho de troca, de diálogo e também um


processo de planejamento. É necessário que se tenha uma postura
de humildade diante dos limites do conhecimento individual e,
em alguns momentos, ter que desconstruir algumas verdades
fragmentadas, romper com paradigmas em virtude de uma visão da
totalidade. Nesse cenário, o conhecimento específico/especializado
é de fundamental importância para compor esse processo de
construção. Trata-se de uma atitude coletiva de integração das
disciplinas, com um objetivo específico, imerso no cotidiano
profissional e acadêmico.

A perspectiva interdisciplinar não fere a especificidade


das profissões e tampouco seus campos de especialidade.
Muito pelo contrário, requer a originalidade e a
diversidade dos conhecimentos que produzem
e sistematizam acerca de determinado objeto,
de determinada prática, permitindo a pluralidade
de contribuições para compreensões mais
consistentes deste mesmo objeto, desta mesma
prática (MARTINELLI; RODRIGUES; MUCHAIL, 1995,
p. 157).

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 119


Nessa conjuntura, falar da interdisciplinaridade é focar
também o campo das diferenças. Somos pessoas diferentes, com
conhecimentos diferentes, cotidianos diferentes e formação humana
diferente. Nem sempre lidar com o diferente é uma tarefa fácil,
portanto, para colocar em prática uma efetiva interdisciplinaridade é
necessária uma postura profissional capaz de lidar com o diferente,
que nem sempre é como nós queremos ou somos.

Outro ponto importante do tópico “Elaboração e execução de


programas de orientação sociofamiliar, visando prevenir a evasão
escolar e melhorar o desempenho e rendimento do aluno e sua
formação para o exercício da cidadania” é o foco dado à formação
para o exercício da cidadania. Mas o que podemos chamar de
cidadania? Segundo Geisler:

Podemos distinguir dois tipos de cidadania: a cidadania


individual e a cidadania coletiva. Quando a cidadania
mantém seu caráter universal, buscando a extensão de
direitos e deveres a todas as camadas da população,
estamos diante de sua expressão coletiva. Todavia,
frente aos limites que as noções de igualdade e liberdade
adquirem na concepção liberal burguesa, a noção e
a prática da cidadania vêm-se distinguindo em sua
contradição característica: referir-se ao universal e
voltar-se para o particular. Nesse contexto, em geral
é a cidadania individual que se ergue como pretexto
para atender ainda mais à necessidade de exploração
do capital, constituindo-se como um conceito formal
vinculado à ideia de propriedade (GEISLER, 2006, p. 356).

Diante dessa afirmativa, podemos identificar a ligação entre o


conceito de cidadania e o atual sistema, bem como a necessidade
de exploração do capital. É importante buscarmos desenvolver,
cada vez mais, essa visão coletiva, não individualizando as situações
que são postas por indivíduos. Também vale destacar que:

Em síntese, intrinsecamente relacionada à sua construção


no regime democrático burguês, a história do conceito de
cidadania revela-se a partir da luta pela aquisição de um
certo conjunto de direitos e dos interesses em jogo no

120 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


cenário capitalista. Mais do que lutar pelo cumprimento
dos direitos sociais, inclusive no campo da saúde e da
educação, é necessário rediscutir a noção de cidadania
(GEISLER, 2006, p. 357).

Falar da cidadania é resgatar o conceito em sua dimensão


histórica. Compreende- la a partir dos meandros capitalistas torna-se
fundamental. O fenômeno histórico- social denominado cidadania
deve ser analisado em sua disputa, considerando as contradições
do sistema capitalista em garantir a universalização dos direitos
(GEISLER, 2006, p. 356).

Portanto, quais programas ou projetos voltados à formação


para o exercício da cidadania queremos? Cabe a cada um pensar e
estudar! Muitas instituições de ensino já colocam em prática ótimos
projetos voltados a essa temática, uma pesquisa de instituições que
compartilharam essa prática poderá auxiliar na elaboração dessa
proposta.

Para saber mais


Para conhecer experiências inovadoras na área da educação.
Disponível em: <http://www.porvir.org>. Acesso em: 3 mar. 2016.

O terceiro tópico indicado no Parecer Jurídico de 2000


é: “Participação, em equipe multidisciplinar, da elaboração de
programas que visem prevenir a violência, o uso de drogas e
o alcoolismo, bem como a prestação de esclarecimentos e
informações sobre doenças infectocontagiosas e demais questões
de saúde pública”.

Já abordamos aqui a questão da elaboração de programas


e esclarecemos o que é plano, programa e projeto. Falamos
também do trabalho interdisciplinar. Entretanto, o que podemos
considerar como trabalho multidisciplinar? A multidisciplinaridade
é um trabalho que se efetiva de forma mais isolada. A troca e
cooperação entre as disciplinas do saber acontece em menor
intensidade. Segundo Silva:

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 121


A multidisciplinaridade trata da integração de diferentes
conteúdos de uma mesma disciplina, porém sem nenhuma
preocupação de seus temas comuns sob sua própria
ótica, articulando algumas vezes bibliografia, técnicas de
ensino e procedimentos de avaliação de conteúdos. (...)
Na Multidisciplinaridade, recorremos a informações de
várias matérias para estudar um determinado elemento,
sem a preocupação de interligar as disciplinas entre si.
Neste caso, cada matéria contribui com suas informações
pertinentes ao seu campo de conhecimento, sem que
houvesse uma real integração entre elas. Essa forma de
relacionamento entre as disciplinas é a menos eficaz para
a transferência de conhecimentos para os alunos. (SILVA,
2004, p. 3).

Dessa forma, como a proposta do tópico é o trabalho de temas


distintos, o ideal realmente é um trabalho multidisciplinar. São
elencados três assuntos muito importantes nesse ponto do Parecer
Jurídico: a violência, o uso de drogas e alcoolismo, bem como
esclarecimento sobre doenças infectocontagiosas. Para abordar
qualquer um deles é preciso estudo! Não podemos correr o risco
de transmitir informações incorretas sobre temas tão relevantes.
O primeiro deles, a violência, é algo que está presente em toda a
sociedade. Qual violência será abordada nesse programa? A física, a
psicológica, a sexual, a negligência? O bullying também é um tema
extremamente atual e relacionado à realidade de alunos. A escola
deve ser um espaço de proteção e não de violência!

A violência nas escolas e demais instituições de educação não é


nova. Esse fenômeno já foi tema de estudos, nos Estados Unidos,
desde a década de 1950, por exemplo. Hoje, podemos considerá-la
como um problema social. Segundo Abramovay:

Para entender o fenômeno da violência nas escolas,


é preciso levar em conta fatores externos e internos à
instituição de ensino. No aspecto externo, influem as
questões de gênero, as relações raciais, os meios de
comunicação e o espaço social no qual a escola está
inserida. Entre os fatores internos, deve-se levar em
consideração a idade e a série ou o nível de escolaridade

122 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


dos estudantes, as regras e a disciplina dos projetos
pedagógicos das escolas, assim como o impacto do
sistema de punições e o comportamento dos professores
em relação aos alunos (e vice-versa) e a prática
educacional em geral. (ABRAMOVAY, s/d, p. 31).

Nessa ótica, devemos analisar os fatores internos e externos


à instituição que influenciam diretamente os comportamentos
violentos no cenário escolar. A autora também destaca que por mais
que os fatores externos tenham um significativo impacto e exerçam
influência sobre a violência escolar, “é preciso reconhecer que dentro
da própria escola existem possibilidades de lidar com as diferentes
modalidades de violência e de construir alternativas de paz, adotando
estratégias e capital próprios” (ABRAMOVAY, s/d, p. 31).

Quanto ao uso de substâncias psicoativas, também podemos


dizer que se trata de um tema primordial e que afeta diretamente o
público atendido. Não é intenção, nesse estudo, esmiuçar o assunto
drogas. Até mesmo porque, da mesma forma que a violência, a
temática “drogas” tem uma intensa gama de bibliografias que podem
auxiliar o estudo, promovendo um aperfeiçoamento do profissional
que integrará a equipe multidisciplinar. É oportuno lembrar que o
ideal seria que algum profissional da área da saúde também pudesse
integrar essa equipe multidisciplinar, para elaboração e execução
desse programa. Caso a instituição não tenha profissionais da área da
saúde, deixamos aqui a sugestão desse programa para ser debatido
na reunião de rede do território no qual a instituição está inserida,
para que profissionais da UBS (Unidade Básica de Saúde), do CAPS
AD (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas), ou de outro
estabelecimento que atue nessa temática, possam colaborar com a
sua construção e execução.

Para saber mais


A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD), do
Ministério da Justiça, oferece gratuitamente, por meio de
parceria com a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),
um curso na modalidade EaD chamado SUPERA (Sistema
para detecção do uso abusivo e dependência de substâncias

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 123


psicoativas: encaminhamento, internação breve, reinserção
social e acompanhamento).
O curso é parte integrante do “Plano Integrado de
Enfrentamento ao Crack e outras Drogas”. Para acompanhar
a abertura das inscrições para o curso é necessário acessar
o portal disponível em:<http://www.supera. senad.gov.br>.
Acesso em: 3 mar. 2016.
Não perca essa chance!

Outro ponto importante a ser destacado nesse tópico trata-


se da forma como devemos abordar esses temas com os alunos.
Sabemos da existência de vários recursos que podem facilitar
esse processo. Não devemos ficar presos somente ao modelo
“palestra”, por exemplo. Estratégias devem ser pensadas para
garantir a eficiência do processo, a fim de atingir resultados mais
assertivos. Sugerimos também que os resultados desse trabalho
sejam de alguma forma avaliados, só assim saberão se estão no
caminho certo.

O quarto tópico do Parecer Jurídico a ser destacado trata da


“articulação com instituições públicas, privadas, assistenciais e
organizações comunitárias locais, com vistas ao encaminhamento
de pais e alunos para atendimento de suas necessidades”. Um bom
Assistente Social conhece a rede de serviços do seu município ou
região. Como o profissional poderá encaminhar pais e alunos que
precisam de atendimento se não conhece os locais de destino
desse encaminhamento? A participação nas reuniões de rede
do município, bem como nos Conselhos Municipais afetos à
área, pode auxiliar nesse processo de aproximação com a rede
de serviços. Outra sugestão é fazer uma visita institucional aos
locais para os quais comumente se encaminham pais ou alunos,
como o CRAS do território, a UBS, o CAPS infantil, Programas de
Economia Solidária, entre outras instituições públicas ou privadas
que possam receber esses encaminhamentos. Não se esqueça que
o encaminhamento deve ser formal, por meio de um instrumento
por escrito. Alguns locais também solicitam um prévio contato
telefônico.

124 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Se possível, conheça os profissionais das instituições para
as quais fará o encaminhamento, agende estudos de casos, se
necessário, dê retorno dos resultados de trabalhos que fizeram
juntos e sistematize essas ações profissionais. O trabalho em rede
é uma importante parceria que deve ser criada e alimentada. O
aluno foi encaminhado para o CAPS infantil e está sendo atendido?
Sempre que possível, faça contatos para saber como está esse
processo, demonstre parceria nesse trabalho.

O tópico elencado também demonstra uma atribuição


primordial do Assistente Social na escola: o atendimento a pais e
alunos. Dessa forma, o trabalho não fica restrito aos alunos, mas
se estende ao núcleo familiar, ou seja, a relação família- escola
também será mediatizada pelo Assistente Social.

O quinto ponto elencado no Parecer Jurídico tem intrínseca


relação com o tópico anterior. A proposta é de “realização
de visitas sociais com o objetivo de ampliar o conhecimento
acerca da realidade sociofamiliar do aluno, de forma a assisti-lo
e encaminhá-lo adequadamente”. Vamos falar agora de um dos
instrumentos mais conhecidos e utilizados pelo Assistente Social: a
visita domiciliar! Tal instrumento percorreu um contexto histórico,
junto ao desenvolvimento da própria profissão:

No Brasil, desde o início do Serviço Social enquanto


profissão, utilizava-se o instrumento da Visita Social
Domiciliar para monitorar o comportamento das famílias,
especialmente a serviço do capitalismo, como estratégia
disciplinadora dos operários para assimilarem os valores
da burguesia. O esforço visava manter os padrões
harmônicos familiares de que as mulheres cuidam da
educação dos filhos e da casa e os homens são provedores
e sustentam a família (CARDOSO, 2008, p. 59).

É notório que as atribuições dos Assistentes Sociais nessa época


tinham total relação com a formação e orientação da própria
categoria profissional nesse momento histórico. Independente do
objetivo para o qual utilizavam a visita domiciliar, ela já era considerada
um dos principais meios para ação profissional. A visita domiciliar na
contemporaneidade está estritamente relacionada ao processo de

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 125


conhecimento de uma dada realidade social que envolve um ou
mais usuários, e também das perspectivas de superação e de acesso
à inclusão social. Assim, as visitas domiciliares “têm como objetivo
conhecer as condições (residência, bairro) em que vivem tais sujeitos
e apreender aspectos do cotidiano das suas relações, aspectos esses
que geralmente escapam às entrevistas de gabinete” (MIOTO, 2001,
p.148).

A visita domiciliar é um processo educativo. Por meio da entrevista


e da observação, em uma visita domiciliar temos uma aproximação
maior entre a realidade do usuário com a Instituição que o atende.
Proporciona ao profissional o conhecimento de vida, o conhecimento
sobre o sujeito, o contexto de vida e meio ambiente, caracteriza as
condições habitacionais, a relação afetivo-social entre os membros
da família, caracteriza fatores importantes a serem identificados para
a prestação da assistência necessária.

Ao fazer uma visita domiciliar, é importante que o Assistente


Social tenha clareza sobre o motivo da realização da visita (por que)
e qual o momento adequado (quando). Os profissionais devem ter
conhecimento suficiente sobre o assunto a ser abordado e o roteiro
a ser utilizado, além disso, devem ter a consciência de que estão
entrando na vida privada de uma determinada pessoa ou família.
O respeito, cautela e o sigilo são de fundamental importância! O
Assistente Social deve aceitar as condições que serão oferecidas no
momento da visita, como o local que lhe é destinado para sentar ou
ficar em pé. A visita domiciliar não deve ser agendada em horário que
possa atrapalhar a dinâmica da família, como o momento em que os
pais precisam levar os filhos à escola, por exemplo.

Ao pensarmos em um plano de visita domiciliar, podemos elencar


cinco tópicos:

I – Identificação: dados relacionados à identificação pessoal,


endereço (localização da residência) e o profissional responsável.

II – Antecedentes: breve histórico da situação apresentada. III –


Objetivo: finalidade da ação a ser realizada.

IV - Assuntos: as questões a serem tratadas devem ser previamente


estabelecidas.

126 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


V – Avaliação: número e qualidade das informações prestadas.
Receptividade com a proposta de ação. Nível de interesse manifestado.

Vale ressaltar que após uma visita domiciliar devemos elaborar


o registro das informações obtidas. O detalhamento desse
procedimento será feito ainda nesse capítulo.

Outrossim, não devemos surpreender o usuário, bem como seus


familiares, com uma visita domiciliar surpresa. Isso pode constranger
a família, expor a situação aos vizinhos, além de não corresponder
a um comportamento ético. Caso o profissional identifique algo
incoerente, ele deve conversar com o usuário, não agindo de
forma policialesca, autoritária ou fiscalizadora. E se, mesmo sendo
combinado previamente, no ato da visita o usuário não autorizar a
entrada do Assistente Social? Nesse caso, o profissional deve deixar
claro o motivo pelo qual a entrevista deve acontecer.

Cabe ao empregador (Instituição) garantir as condições de


realização dessa visita, providenciando transporte e, quando
necessário, um motorista, por exemplo.

Outros profissionais podem fazer visita domiciliar? Sim! Cada um


com o seu propósito técnico. O Assistente Social tem a obrigação de
fazer com que uma visita domiciliar não seja uma simples constatação.
A visita domiciliar é um instrumento de apreensão da realidade social.

O sexto tópico a ser estudado trata da “elaboração e


desenvolvimento de programas específicos nas escolas em que
existam classes especiais”. Já abordamos aqui o tema sobre a
elaboração de planos, programas e projetos. O ponto elencado
trata também de uma possível proposição e intervenção em escolas
que tenham classes especiais. O Ministério da Educação fala sobre
a inclusão de alunos com deficiência em escolas de ensino regular:

Na perspectiva da educação inclusiva, ofoconão é a


deficiência do aluno e sim os espaços, os ambientes,
os recursos que devem ser acessíveis e responder à
especificidade de cada aluno. Portanto, a acessibilidade dos
materiais pedagógicos, arquitetônicos e nas comunicações,
bem como o investimento no desenvolvimento profissional,
criam condições que asseguram a participação dos alunos

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 127


com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades/superdotação. Vivemos um tempo de
transformação de referências curriculares, que indicam
que não cabe ao aluno se adaptar à escola tal como foi
construída; a escola é que deve se reconstruir para atender
a toda a sua comunidade, da qual fazem parte pessoas
com e sem deficiência. Portanto, são necessárias as
adaptações nos espaços e nos recursos e principalmente
uma mudança de atitude, que já reflitam a concepção de
desenho universal, não só na estrutura física das escolas,
como também no desenvolvimento das práticas de ensino
e aprendizagem e nas relações humanas. (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO).
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/component/
content/.article?id=112:como-esta-sendo-feita-a-
inclusao-de-alunos-.com-deficiencia-que-nunca-
t i v e r a m - c o n t a t o - c o m - a s - c l a s s e s - .r e g u l a r e s - e -
necessario-algum-tipo-de-adaptacao>. Acesso em: 01 de
mar. 2016.

Devemos aproveitar o momento para esclarecer um termo


muito importante. Se prestarmos atenção, podemos ver que muitos
locais e pessoas utilizam as mais variadas nomenclaturas, como:
portador de deficiência, pessoas com deficiências diferentes, portador
de necessidades especiais, pessoas especiais e pessoa portadora de
deficiência, por exemplo. A Convenção Internacional para Proteção
e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência
indica a utilização do termo pessoa com deficiência, conforme
Portaria nº 2.334, de 2010. Não devemos utilizar a palavra “portar” uma
deficiência, uma vez que as pessoas têm a deficiência e não portam,
não carregam. Para abordarmos alguma deficiência específica
devemos dizer: pessoa com deficiência física, pessoa com deficiência
visual, pessoa com deficiência auditiva, pessoa com deficiência
intelectual ou déficit cognitivo, entre outros. Outro ponto importante,
em se tratando de comparações, não fale “pessoa normal”, mas sim
pessoa sem deficiência, não use “sala de aula normal”, mas sim sala
de aula comum. Também sugerimos a não utilização de siglas, como
PCD, para não identificar seres humanos por meio de siglas.

Mais uma vez lembramos que, para pensar, planejar e executar


ações voltadas para pessoas com deficiência, também é necessário

128 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


ter conhecimento teórico sobre o assunto. Muitas pesquisas estão
sendo feitas no tocante a essa temática, cabe a cada profissional a
especialização no assunto.

Para saber mais


Documento subsidiário à política de inclusão disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/
docsubsidiariopoliticadei nclusao.pdf>. Acesso em: 3 mar.
2016.

O último tópico elencado no Parecer Jurídico trata da ação de


“empreender e executar as demais atividades pertinentes ao Serviço
Social, previstas nos artigos 4 e 5 da Lei de Regulamentação da
profissão”. A Lei de Regulamentação da Profissão (Lei nº 8.662, de
1993) delimita, no artigo 4, as competências do Assistente Social,
conforme segue:

Art. 4º Constituem competências do Assistente Social:


I - elaborar, implementar, executar e avaliar políticas
sociais junto a órgãos da administração pública, direta ou
indireta, empresas, entidades e organizações populares;
II - elaborar, coordenar, executar e avaliar planos,
programas e projetos que sejam do âmbito de atuação
do Serviço Social com participação da sociedade civil;
III - encaminhar providências, e prestar orientação social
a indivíduos, grupos e à população;
IV - (Vetado);
V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos
sociais no sentido de identificar recursos e de fazer uso
dos mesmos no atendimento e na defesa de seus direitos;
VI - planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços
Sociais;
VII - planejar, executar e avaliar pesquisas que possam
contribuir para a análise da realidade social e para
subsidiar ações profissionais;
VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da
administração pública direta e indireta, empresas privadas
e outras entidades, com relação às matérias relacionadas
no inciso II deste artigo; IX - prestar assessoria e apoio
aos movimentos sociais em matéria relacionada às

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 129


políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos
civis, políticos e sociais da coletividade;
X - planejamento, organização e administração de
Serviços Sociais e de Unidade de Serviço Social;
XI - realizar estudos socioeconômicos com os usuários
para fins de benefícios e serviços sociais juntoa órgãos
da administração pública direta e indireta, empresas
privadas e outras entidades.

As competências elencadas no artigo não são exclusivas do


Assistente Social, ou seja, outros profissionais também podem
executá-la. Por exemplo, a avaliação de políticas sociais não é uma
tarefa exclusiva do Assistente Social, outras áreas do saber também o
fazem. Planejar e executar pesquisas que contribuam com a análise
da realidade social, também é algo que não compete somente ao
profissional de Serviço Social, da mesma forma os demais incisos.

O inciso I fala da elaboração, implementação, execução e avaliação


de políticas sociais. Os Assistentes Sociais não são, exclusivamente,
executores terminais de políticas sociais. Ao atuar em uma escola, o
profissional precisará ter o conhecimento sobre a política de educação.
À luz desse inciso, devemos, cada vez mais, nos apropriarmos das
possibilidades de pensar e propor políticas sociais. A complexidade
dessa ação é ampla e exige do profissional um grande conhecimento
teórico-prático. Tão importante quanto a elaboração é, também, a
avaliação das políticas sociais. Como avaliar os resultados? Como
estabelecer indicadores de monitoramento e avaliação? O conteúdo
desse inciso daria alguns livros, dada a importância e complexidade da
temática. Não é o objetivo deste livro-texto abordar minuciosamente
tais questões, mas pelo menos nos fazer refletir, uma vez que tais
competências também são desempenhadas na política de educação.
O terceiro inciso do artigo 4º fala da orientação social a indivíduos,
grupos e comunidades. A orientação social é muito praticada pelos
Assistentes Sociais, independente da área em que atuam. Pode ser um
meio muito importante para colocar na prática a dimensão educativa
profissional.

Já o artigo 5º, da Lei de Regulamentação da Profissão, apresenta


as atribuições privativas do Assistente Social, conforme segue:

130 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Art. 5º Constituem atribuições privativas do Assistente
Social: I - coordenar, elaborar, executar, supervisionar e
avaliar estudos, pesquisas, planos, programas e projetos
na área de Serviço Social;
II - planejar, organizar e administrar programas e projetos
em Unidade de Serviço Social;
III - assessoria e consultoria e órgãos da Administração
Pública direta e indireta, empresas privadas e outras
entidades, em matéria de Serviço Social;
IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais,
informações e pareceres sobre a matéria de Serviço
Social;
V - assumir, no magistério de Serviço Social tanto a
nível de graduação como pós-graduação, disciplinas e
funções que exijam conhecimentos próprios e adquiridos
em curso de formação regular;
VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de
estagiários de Serviço Social;
VII - dirigir e coordenar Unidades de Ensino e Cursos de
Serviço Social, de graduação e pós-graduação;
VIII - dirigir e coordenar associações, núcleos, centros de
estudo e de pesquisa em Serviço Social;
IX - elaborar provas, presidir e compor bancas de exames
e comissões julgadoras de concursos ou outras formas de
seleção para Assistentes Sociais, ou onde sejam aferidos
conhecimentos inerentes ao Serviço Social;
X - coordenar seminários, encontros, congressos e
eventos assemelhados sobre assuntos de Serviço Social;
XI - fiscalizar o exercício profissional através dos
Conselhos Federal e Regionais;
XII - dirigir serviços técnicos de Serviço Social em
entidades públicas ou privadas;
XIII - ocupar cargos e funções de direção e fiscalização da
gestão financeira em órgãos e entidades representativas
da categoria profissional.

Diferente das competências profissionais, as atribuições privativas


podem ser exercidas somente pelos Assistentes Sociais. Na esfera da
atuação profissional, devemos compreender que o local de trabalho
não é exclusivo do profissional de Serviço Social, pelo contrário, nesse
local se fazem presentes as relações de poder e a competição entre
membros da equipe, por exemplo. Não podemos balizar com exatidão
todos os campos de trabalho do Assistente Social que são divididos

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 131


com outras profissões. De fato, o profissional de Serviço Social lida no
seu dia a dia com desafios que exigem o mínimo de conhecimento,
para que se possa analisar a situação, decifrar determinada realidade
e o melhor instrumento a ser empregado. Percebi que não tenho
domínio sobre algo afeto ao Serviço Social e fui questionada sobre
isso? Informe que não sabe e pesquise sobre o assunto. Afinal, não
somos obrigados a saber tudo.

Independente do espaço sócio-ocupacional em que esteja,


uma coisa não deve ser esquecida nunca: é necessário abandonar
qualquer tipo de prática conservadora e discursos moralizantes.

Atividades de aprendizagem
1. Quando o documento se refere ao sistema compreendido por inteiro.
Contorna as linhas gerais do sistema, corresponde às grandes linhas
políticas, suas estratégias, suas diretrizes e direciona as responsabilidades.
II - Unidade elementar do processo de tomada de decisões. Detém-se
no detalhamento das alternativas de intervenção escolhidas. É menor o
âmbito de abrangência e maior o nível de detalhamento.
III - Documento que detalha o plano por setor, política, diretrizes e medidas
instrumentais. Destina-se a um setor ou a uma área do sistema.
As assertivas estão relacionadas ao conceito de:
a) I – projeto; II – programa; III – plano.
b) I – plano; II – projeto; III – programa.
c) I – programa; II – plano; III – projeto.
d) I – plano; II – programa; III – projeto.

2. “Por meio da entrevista e da observação, .....................................................


... temos uma aproximação maior entre a realidade do usuário com a
Instituição que o atende. Proporciona ao profissional o conhecimento de
vida, o conhecimento sobre o sujeito, o contexto de vida e meio ambiente,
caracteriza as condições habitacionais, a relação afetivo-social entre os
membros da família, caracteriza fatores importantes a serem identificados
para a prestação da assistência necessária. ”
O termo que preenche corretamente a lacuna é:
a) Em um estudo social.
b) Em uma perícia social.
c) Em uma visita domiciliar.
d) Em uma reunião de grupo.

132 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


Fique ligado
Caro aluno(a), vamos lembrar aqui os principais assuntos tratados
nesta unidade:
• Tópicos introdutórios sobre o Serviço Social na Educação, com o
esclarecimento sobre o termo a ser empregado, a abertura de novos
campos de trabalho e a visão endógena da profissão.
• A trajetória histórica da inserção do Assistente Social na Educação.
• Exemplos de Projetos de Lei cujo objetivo é a inserção do
Assistente Social e do Psicólogo no espaço da escola.
• As dimensões ético-política, teórico-metodológica e técnico-
operativa do Assistente Social.
• Atribuições do Assistente Social no espaço escolar.

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade, você pôde se aprofundar um pouco mais sobre um
tema que vem ocupando cada vez mais os objetivos das produções
científicas dos Assistentes Sociais. O Serviço Social não é um novo
campo de trabalho, pelo contrário, é um campo antigo e que foi
perdendo espaço com o decorrer do tempo e dos fatos. O Conselho
Federal de Serviço Social tem acompanhado e incentivado a categoria
profissional a se unir na luta pela aprovação do Projeto de Lei que visa
à inclusão de profissionais de Serviço Social e Psicologia nas escolas.
Sabendo da importância, cabe a nós também nos unirmos a essa luta.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. A Lei nº 8.662, de 1993, regulamenta a profissão de Serviço Social e
apresenta as competências e atribuições privativas do Assistente Social.
Analise as afirmativas a seguir:
Planejar, organizar e administrar programas e projetos em Unidade de
Serviço Social.
II - Dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades públicas ou
privadas.
III - Assessoria e consultoria a órgãos da Administração Pública direta e

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 133


indireta, empresas privadas e outras entidades, em matéria de Serviço
Social.
São atribuições privativas o que se afirma em:
a) I e II.
b) I.
c) II e III.
d) I e III.
e) I, II e III.

2. Analise a citação abaixo:


“Em síntese, intrinsecamente relacionada à sua construção no regime
democrático burguês, a história do conceito de ............................................
.......... revela-se a partir da luta pela aquisição de um certo conjunto de
direitos e dos interesses em jogo no cenário capitalista. Mais do que lutar
pelo cumprimento dos direitos sociais, inclusive no campo da saúde e da
educação, é necessário rediscutir a noção de ........................................... . ”
(GEISLER, 2006, p. 357).
Os termos que preenchem corretamente a lacuna são, respectivamente:
a) Cidadania; Política.
b) Direitos; Política.
c) Educação; Emancipação.
d) Cidadania; Cidadania.
e) Ética; Ética.

3. (Fundação Carlos Chagas, 2009, adaptada). Quando o Assistente Social


realiza alguma intervenção profissional que proporciona a visão e análise
das relações entre os sujeitos envolvidos, bem como a sua relação com a
instituição, o profissional deve considerar que:

(A) Na intervenção social, há o significado político, ideológico, ou seja, um


conjunto de ideias, atitudes e pautas culturais que têm forte influência no
comportamento.
(B) O aspecto mais importante a ser considerado em uma intervenção
profissional é a renda per capita e as condições da instituição atender o
usuário.
(C) A avaliação e a medição quantitativa dos fatos sociais que envolvem a
vida dos indivíduos são os fatores preponderantes nesta ação.
(D) As raízes históricas e ideológicas não exercem grande influência nas
condições de vida atual.
E) A perspectiva individual é o começo e o fim da análise profissional em
uma intervenção.

134 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


4. Em 22 de outubro de 2000, a assessora jurídica do CFESS (Conselho
Federal de Serviço Social), Dra. Sylvia Terra, emitiu um Parecer Jurídico
sobre a implantação do Serviço Social nas escolas. Nele apresenta as
possíveis atividades a serem desenvolvidas pelo Assistente Social no espaço
da escola. Analise as afirmativas a seguir e assinale V (verdadeiro), para
possíveis atividades de acordo com o Parecer, e F (falso), para atividades
não elencadas pelo Parecer:
(.....) Pesquisa de natureza socioeconômica e familiar para caracterização
da população escolar.
(.....) Elaboração do plano pedagógico da Ludoteca da instituição escolar.
(.....) Participação, em equipe multidisciplinar, da elaboração de programas
que visem prevenir a violência.
(.....) Articulação com instituições públicas, privadas, assistenciais e
organizações comunitárias locais.
A afirmativa que representa, respectivamente, as afirmativas é:
a) V - V - V - F.
b) F - F - V - V.
c) V - F - V - V.
d) V - V - V - V.

5. Leia o trecho abaixo:


Na dimensão ..................................................... , entendemos que o profissional
em sua prática social não deve ser neutro, mas sim ter um posicionamento
político frente às questões sociais, para que possa ter clareza de qual é a
direção a ser tomada na sua prática.
O termo que preenche corretamente a lacuna é:
a) Teórico-prática.
b) Técnico-operativa.
c) Ético-política.
d) Teórico-metodológica.

U3 - A atuação do serviço social na política de educação 135


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regulares? É necessário algum tipo de adaptação? Disponível em: <http://
portal.mec.gov.br/component/ content/article?id=112:como-esta-sendo-
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136 U3 - A atuação do serviço social na política de educação


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U3 - A atuação do serviço social na política de educação 137


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Unidade 4

Compreender a importância
do serviço social nos diversos
níveis de ensino, observando
as Instituições formadoras
como manifestação da
questão social
Rodrigo Eduardo Zambon

Objetivos de aprendizagem
Nesta unidade, queremos fomentar uma reflexão acerca
de importantes conceitos que levarão você a compreender
a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino,
privilegiaremos as manifestações da questão social.

• Aqui, você vai ser levado a compreender a prática do


Assistente Social e os desafios inerentes à função.

• Irá conhecer qual é a atual conjuntura da formação do


Assistente Social.

• Refletir acerca da articulação entre ensino e a prática


profissional.

Seção 1 | Um viés acerca da atual conjuntura do ensino universitáro no


país
Na seção 1, você conhecerá alguns impasses referentes ao profissionalismo
do docente de ensino superior a partir dos condicionantes sociais, políticos e
econômicos. Essa reflexão perpassa pelos dilemas e perspectivas desse nível de
ensino. Partiremos de uma breve contextualização tomando como base o que
preconiza a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB - sobre a divisão do
ensino nacional básico e superior.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 139
Seção 2 | A importância do serviço social nos diversos níveis de ensino
Na seção 2, será apresentada a organização nacional do ensino, pois
consideramos que a educação perpassa pela vida do indivíduo desde os seus
primeiros contatos com o mundo. Dessa forma, será ampliada nossa reflexão
acerca do Serviço Social e suas implicações e contribuições para a educação.

140 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Introdução à unidade
Na presente unidade, você conhecerá um pouco mais sobre
as demandas educacionais do mundo moderno e suas exigências.
Você sabia que os conhecimentos, assim como a autonomia dos
futuros profissionais, cada vez mais são promovidos como forma
de capacitação ou inserção nas diferentes atividades pedagógicas
e sociais? Assim sendo, nossa reflexão perpassa pela docência no
ensino superior e fornece um panorama atual sobre docência e
universidade. Buscaremos, ainda, analisar alguns impasses que
dizem respeito ao profissionalismo do docente no Serviço Social
a partir dos condicionantes sociais, políticos e econômicos.
Para tanto, faz-se recurso, especialmente, os estudos de Cunha
(2003) e Isaia (2005), que tratam do profissionalismo docente na
universidade.

Essa leitura possibilitará um entendimento mais aprofundado


sobre as debilidades que cercam a docência superior com foco
no estágio. A perspectiva de docência e a profissionalidade do
Assistente Social alinham-se nessa reflexão.

Bom estudo!

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 141
Seção 1
Um viés acerca da atual conjuntura do ensino
universitário no país
Introdução à seção
É notório que em nossa sociedade cresce o conhecimento
e a capacidade de produzir riquezas, mas também aumenta a
insegurança sobre a própria formação humana. Sob este viés,
nós, profissionais do serviço social, nos perguntamos: que tipo de
atendimento queremos oferecer? Para qual sociedade? Assim, nesta
unidade, a principal referência de análise é a incerteza do trabalho.
Dessa forma, a questão que se coloca é como pensar a formação
profissional em uma realidade em que a situação de trabalho é cada
vez mais incerta.

No plano analítico, estudos revelam a necessidade de uma


mudança estrutural nos cursos de formação docente (CUNHA,
2003; ISAIA, 2006; TARDIF, 2008). No plano da realidade social
nos deparamos com profissionais que encontram dificuldade
em desempenhar suas profissionalidades. Apesar desses autores
discursarem especificamente para o público da educação, pensamos
ser válida a reflexão também para analisarmos nosso contexto de
formação.

Assim sendo, pode-se visualizar que as políticas públicas


direcionadas ao campo educacional alteram diretamente as
práticas educacionais, exigindo dos profissionais da educação
novos saberes (CUNHA, 2003). Sob este ponto de vista, buscaremos
enfatizar a formação do professor universitário, com enfoque
nos condicionantes sociais, políticos e econômicos. À luz desse
contexto, de acordo com Estevão, temos que considerar que:

[...] A formação como uma prática social específica e


como uma verdadeira instituição que cumpre certas
funções sociais relacionadas com a reprodução,
regulação e legitimação do sistema social. Lembra que

142 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
a formação, ao mesmo tempo, celebra determinados
valores, por vezes contraditórios, ligados quer ao mundo
empresarial e gerencialista, quer ao mundo cívico e da
cidadania (ESTEVÃO apud CUNHA, 2003, p. 69).

A educação perpassa pela vida do indivíduo desde os seus


primeiros contatos com o mundo. Dessa forma, pautados na Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 – LDB,
nosso país dividiu o ensino em dois níveis: Básico e Ensino Superior,
tendo por finalidade: [...] Art. 22. “A educação básica desenvolver
o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável
para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir
no trabalho e em estudos posteriores”. A educação básica está
subdividida em diferentes etapas: Educação Infantil (0 a 3 anos),
Pré-escola (4 a 5 anos), Ensino Fundamental I (4 a 10 anos), Ensino
Fundamental II (11 a 14 anos) e Ensino Médio (15 a 17 anos), cada uma
delas possui objetivos próprios e formas de organização diversas.

Na modalidade Educação Infantil, o objetivo da aprendizagem está


pautado no desenvolvimento físico, psicológico, intelectual e social
da criança. As atividades realizadas devem ser um complemento à
ação das famílias e das comunidades. Crianças de zero a três anos
podem frequentar as creches ou instituições equivalentes. Estas não
podem se omitir dessa responsabilidade, uma vez que é aí que a
criança passa grande parte do seu tempo e tem a experiência de
participar efetivamente de um grupo social organizado.

Para o público entre quatro e cinco anos, o ensino é realizado


em pré-escolas, e neste ano de 2016, inicia-se a inclusão dessa
modalidade no Ensino Fundamental I. O currículo da Educação
Infantil, bem como das outras modalidades:

[...] Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino


fundamental e do ensino médio devem ter base nacional
comum, a ser complementada, em cada sistema de
ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma
parte diversificada, exigida pelas características regionais
e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos
educandos (LDB,1996, p. 365).

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 143
Para saber mais
Por meio de uma emenda constitucional, aprovada pelo
Congresso Nacional em 2009, foi determinado que os
pais devem matricular seus filhos na escola quando estes
completarem quatro anos e não mais a partir dos seis anos de
idade. Também ficou definido que estados e municípios têm
até 2016 (este ano) para ofertar vagas na rede pública de ensino
para crianças dessa faixa etária. Além da obrigatoriedade da
matrícula de crianças a partir dos quatro anos nas escolas, a
emenda constitucional também definiu uma carga horária
mínima anual na educação infantil (de 800 horas) e controle
de frequência dos alunos de pré-escolas (60%). Disponível
em: <http://www.brasil.gov.br/educacao/2012/04/etapas-
do- ensino-asseguram-cidadania-para-criancas-e-jovens>.
Acesso em: 31 mar.2016.

Quanto ao Ensino Fundamental, cabe ao Estado oferecê-lo de


forma gratuita e universal. A obrigatoriedade do Ensino Fundamental
também implica reconhecê-lo como a formação mínima que deve
ser garantida a todos os brasileiros, de qualquer idade. Tem por
meta de aprendizagem ensinar ao estudante o domínio da leitura,
da escrita e do cálculo. Outro objetivo desta etapa é desenvolver a
capacidade de compreender o ambiente natural e social, o sistema
político, a tecnologia, as artes e os valores básicos da sociedade e da
família. No artigo 32 da LDB, encontramos maiores detalhes acerca
dessa etapa:

[...] I – o desenvolvimento da capacidade de aprender,


tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da
escrita e do cálculo;
II – a compreensão do ambiente natural e social, do
sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em
que se fundamenta a sociedade;
III – o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem,
tendo em vista a aquisição de conhecimentos e
habilidades e a formação de atitudes e valores;
IV – o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços
de solidariedade humana e de tolerância recíproca em
que se assenta a vida social.

144 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o
ensino fundamental em ciclos.
§ 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão regular
por série podem adotar no ensino fundamental o regime
de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação
do processo de ensino-aprendizagem, observadas as
normas do respectivo sistema de ensino.
§ 3º O ensino fundamental regular será ministrado em
língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas
a utilização de suas línguas maternas e processos próprios
de aprendizagem (LDB, 1996, p. 366).

Para a última etapa da Educação Básica, Ensino Médio, a LDB


preconiza:

[...] I – a consolidação e o aprofundamento dos


conhecimentos adquiridos no ensino fundamental,
possibilitando o prosseguimento de estudos;
II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do
educando, para continuar aprendendo, de modo a ser
capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições
de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;
III – o aprimoramento do educando como pessoa
humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento
da autonomia intelectual e do pensamento crítico;
IV – a compreensão dos fundamentos científico-
tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a
teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.
Art. 36. O currículo do ensino médio observará o disposto
na seção I deste capítulo e as seguintes diretrizes:
I – destacará a educação tecnológica básica, a
compreensão do significado da ciência, das letras e das
artes; o processo histórico de transformação da sociedade
e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de
comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da
cidadania;
II – adotará metodologias de ensino e de avaliação que
estimulem a iniciativa dos estudantes;
III – será incluída uma língua estrangeira moderna,
como disciplina obrigatória, escolhida pela comunidade
escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das
disponibilidades da instituição;

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 145
IV – serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como
disciplinas obrigatórias em todas as séries do ensino
médio. (Incluído pela Lei nº 11.684, de 2008)
§ 1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de
avaliação serão organizados de tal forma que ao final do
ensino médio o educando demonstre:
I – domínio dos princípios científicos e tecnológicos que
presidem a produção moderna;
II – conhecimento das formas contemporâneas de
linguagem. (LDB, 1996, 369).

Leia mais! Disponível em:.<http://www.cpt.com.br/ldb/dos-


niveis-e-das- modalidades-de-educacao-e-ensino#ixzz42AJxsznj>.
Acesso em: 31.mar 2016.

De modo geral, a educação básica poderá organizar-se em


séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de
períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, na
competência, entre outros critérios.

Esse nível de ensino ainda abarca a Educação de Jovens e Adultos


(EJA) e o Ensino Profissionalizante. Acerca da EJA, preconiza a LDB:

[...] Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada


àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de
estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente
aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os
estudos na idade regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do aluno,
seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante
cursos e exames.
§ 2º O poder público viabilizará e estimulará o acesso e a
permanência do trabalhador na escola, mediante ações
integradas e complementares entre si.
§ 3º A educação de jovens e adultos deverá articular-
se, preferencialmente, com a educação profissional, na
forma do regulamento.
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames
supletivos, que compreenderão a base nacional comum
do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos
em caráter regular.

146 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
I – no nível de conclusão do ensino fundamental, para os
maiores de quinze anos;
II – no nível de conclusão do ensino médio, para os
maiores de dezoito anos.
§ 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos
pelos educandos por meios informais serão aferidos e
reconhecidos mediante exames.

Sobre o Ensino profissionalizante, consta no art. 39 que a


educação profissional e tecnológica, “integra-se aos diferentes
níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da
ciência e da tecnologia, os cursos poderão ser organizados por eixos
tecnológicos, possibilitando a construção de diferentes itinerários
formativos, observadas as normas do respectivo sistema e nível de
ensino.

O Ensino Superior, por sua vez, é ofertado por universidades,


centros universitários, faculdades, institutos superiores e centros de
educação tecnológica. O indivíduo opta entre três tipos de graduação:
bacharelado, licenciatura ou formação tecnológica. Os cursos de pós-
graduação são divididos entre lato sensu (especializações e MBAs) e
stricto sensu (mestrados e doutorados).

Questão para reflexão


A partir desses pressupostos depreendem-se alguns
questionamentos acerca dos aspectos que circundam a
realidade da docência universitária. Quais são os conhecimentos
necessários ao professor universitário? Quais são as condições
deliberadas pelas agências de fomento a estes docentes? De
que forma o programa de formação stricto sensu contribui
para a formação docente?

1.1 Docência no ensino superior: dilemas e perspectivas


Há uma ampla gama de incertezas que invadem o cenário
educacional, não só do ponto de vista institucional, mas também do
ponto de vista da construção da identidade profissional dos professores.
Assim, busca-se, de acordo com o apresentado anteriormente,

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 147
contextualizar a formação do docente universitário dentro do atual
período histórico. Isso significa pensar as transformações sociopolíticas
e econômicas e sua relação com o contexto educacional a partir de
dois componentes dessa organização, isto é, sujeito (professor) e
instituição (universidade).

Isaia (2006), em um de seus estudos acerca da docência no ensino


superior, contribui de modo significativo para esse entendimento.
Desse modo, entre as principais mudanças no panorama universitário,
a autora destaca com propriedade uma das mais expressivas:

[...] de um bem cultural, a universidade passou a ser um bem


econômico; de um lugar reservado a poucos, tornou- se
um lugar para o maior número de pessoas; de um bem
direcionado ao aprimoramento de indivíduos, tornou-se um
bem cujo beneficiário é o conjunto da sociedade; e, ainda,
transformou-se em mais um recurso do desenvolvimento
social e econômico dos países, submetendo-se às mesmas
leis políticas e econômicas; faz parte das dinâmicas sociais e
está sujeita aos mesmos processos e às mesmas incertezas
do âmbito político, econômico ou cultural que afetam todas
as instituições sociais. (ISAIA, 2006, p. 64).

Ao considerarmos esses pressupostos, precisamos repensar e


conduzir a reflexão a partir das dimensões a serem ponderadas no
processo de construção da trajetória docente quanto aos aspectos:
pessoal, profissional e institucional. Estas categorias estão, por
sua vez, se constituindo e movimentando-se dentro da sociedade
capitalista, que se exprime por meio de contradições, particularidade
esta que lhe é inerente.

Questão para reflexão


Ao compartilharmos das mesmas indagações de Cunha (2003
p. 69): “Formação para quê? Com que sentido? ”, que tipo de
homem pretende-se formar? Para qual sociedade? Tornamos
relevante pensá-las a partir do contexto que as materializa,
ou seja, o da sociedade capitalista, que ideologicamente cria
caminhos para a sustentação de seus ideais hegemônicos.
Você concorda?

148 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Já falamos que a sociedade passou e ainda passa por grandes
transformações. Essas mudanças que ocorrem em todos os setores
da sociedade têm propiciado um novo modo de ser e estar inserido
na realidade presente, alterando a noção de tempo e espaço, a
concepção de homem e de mundo.

As características básicas dessa sociedade são as inúmeras


possibilidades que trazem as dúvidas, a inexatidão, os valores voláteis,
o individualismo. Sendo assim, em que medida esses pressupostos
interferem na formação do professor universitário e na própria
constituição do espaço acadêmico? Nestas circunstâncias, Borba
aponta para algumas das contradições que se apresentam a partir
deste contexto:

[...] De um lado estão as mudanças que visam à adaptação


da universidade às premissas do modelo hegemônico e
à crescente mercantilização da docência e da pesquisa.
De outro, a compreensão equivocada da maioria dos
professores de que, para exercer a profissão no ensino
superior, é suficiente o domínio técnico da área de
conhecimento específico na qual atua, o que contribui
para forjar um caráter reducionista e tecnicista da
profissionalização docente, obliterando condições
fundamentais da formação de pessoas e de profissionais,
tais como as das dimensões éticas e epistêmicas (BORBA,
2006, p. 205).

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 149
Constantemente, surgem novos paradigmas conceituais que
paulatinamente afetam o projeto pedagógico acadêmico, instalando
certa crise para a docência no ensino superior. Os cursos de formação
docente perdem a riqueza de explorar a unilateralidade da formação
humana, traço significativo da educação que visa a emancipação do
homem, toda vez que busca reduzir o conhecimento do professor à
dimensão do saber específico e técnico.

Também consideramos, conforme expõe Maurice Tardif (2008,


p.18), que “[...] o saber dos professores é plural, compósito, heterogêneo,
porque envolve o próprio exercício do trabalho, conhecimentos
e um saber-fazer bastante diverso, proveniente de fontes variadas
e, provavelmente, de natureza diferente”. O saber necessário à
categoria docente necessita ultrapassar a dimensão técnico-científica,
contemplando elementos éticos e políticos dos conhecimentos
sistematizados historicamente. Sob o viés metodológico devemos
ainda pensar em formas mais adequadas de difusão (CUNHA, 2003).

Todavia, “para ser professor universitário, o importante é o domínio


do conhecimento de sua especialidade e das formas acadêmicas de
sua produção” (CUNHA, 2003, p. 73). Embora, o quadro de crise do
profissionalismo docente revele alguns elementos de desvalorização
da pedagogia universitária, para Cunha (2003) e Isaia (2006) há fatores
mais expressivos. O primeiro é o desprestígio da didática enquanto
fonte de conhecimento pedagógico, há um entendimento de que os
conhecimentos pedagógicos servem apenas como instrumento, ou
como normas e prescrições. O resultado seria o entendimento de que
a formação do professor universitário dependeria, apenas, da dimensão
científica. Dessa forma, dissemina- se na cultura contemporânea que
o fundamental é o domínio de códigos (o conhecimento específico),
desencadeando ações pedagógicas que desprestigiam a didática
nos cursos de licenciatura “[...] Os docentes universitários ensinam
geralmente como foram ensinados, garantindo, pela sua prática, uma
transmissão mais ou menos eficiente de saberes e uma socialização
idêntica àquela de que eles próprios foram objeto” (CUNHA, 2003, p.
73).

A falta de conhecimento pedagógico, bem como a banalização dos


pressupostos didáticos, são fatores relevantes para a discussão acerca
da estruturação da formação docente. Vale ponderar que se trata de

150 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
um legado cultural que permeia o contexto escolar e universitário,
transitando de geração a geração. Cunha (2003) afirma que tal situação
constitui-se como um hábito que “não pode ser interpretado apenas
como sinônimo de uma memória sedimentada e imutável; é também
um sistema de disposições construído continuamente, aberto e
constantemente sujeito a novas experiências” (SETTON, 2002, p. 65).

A construção da identidade profissional dos professores deve


ocorrer por meio de uma formação contínua que se inicia pela fase
de opção pela profissão, perpassando pela formação inicial até os
diferentes espaços institucionais (formais e não formais) no qual a
profissão acontece, abarcando neste movimento o espaço-tempo em
que cada um permanece produzindo sua maneira de ser professor
(CUNHA, 2003).

Desse modo, a questão posta não é a ausência de conhecimento


específico, mas sim de conhecimento pedagógico para o exercício
da docência. Para Isaia (2006, p. 65), os professores ‘pecam’ ao
considerar que “[...] o conhecimento específico desenvolvido nos anos
de formação inicial e/ ou ao longo da carreira e também o exercício
profissional bastassem para assegurar um bom desempenho docente”.

Outro fator refere-se à desvalorização do conhecimento


pedagógico enquanto ciência e o distanciamento dos conhecimentos
pedagógicos do espaço universitário. Uma vez que, no princípio, o
foco principal da pedagogia era a criança, trazendo consigo a herança
de ser um campo feminino, decorrente da vocação natural da mulher
para educar (CUNHA, 2003).

Para saber mais


Fique sabendo
A defesa do predomínio de vocação está associada ao possível
fato de que as pessoas possuem dons naturais e predisposição
para desempenhar determinadas funções. Logo, cuidar da
socialização da criança é uma função geralmente vista como
natural da mulher. Deste argumento se apropria a lógica de
que a mulher é propensa ao sentimento, dedicação, carisma,
paciência, entre outros atributos que as levam a escolher

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 151
profissões menos valorizadas socialmente. Esta seria, no
entanto, uma concepção que permeia a história da formação
docente, deixando marcas profundas nas relações concretas
de trabalho docente nos dias atuais.

Pode-se acrescer ainda outro item que evidencia a falta de


prestígio do docente universitário: critérios de seleção e progressão
funcional adotados pelas Instituições de Ensino Superior e pelas
políticas voltadas para a educação superior que privilegiam titulação
e a produção científico-acadêmica em detrimento da formação
pedagógica, uma formação que acreditamos ser mais comprometida
com uma educação pautada em saberes emancipatórios. Com base
no exposto, Isaia (2006) denuncia que: nas políticas institucionais
e nos órgãos reguladores e/ou de fomento como o MEC, a
Capes e o CNPq não se encontram dispositivos que valorizem o
aprimoramento da docência.

Para saber mais


• CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior. Disponível em: <www.capes.gov.br>. Acesso
em: 4 abr. 2016.
• CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico. Disponível em: <www.cnpq.br>. Acesso em:
4 abr. 2016.
• MEC - Ministério da Educação, Disponível em: <www.portal.
mec.gov. br>. Acesso em: 4 abr. 2016.

Em contrapartida, estudos demonstram que a partir da década


de 90 a educação passou a ser vista com outros enfoques,
considerando as ações desempenhadas pelo professorado como
complexa, pois tem papel importante na construção de saberes.
Nesse sentido, pode-se afirmar a existência de uma epistemologia
prática, que consiste na importância da reflexão sobre a prática, além
de uma autoanálise sobre os saberes iniciais do docente, incluindo aí
a didática (GRILLO, 2000 apud VAGULA, 2005).

152 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Assim, duas visões quanto à educação são ressaltadas.
Primeiramente, a visão tradicional, que tem o professor como
transmissor do conhecimento, especializado em uma única
disciplina - a de sua responsabilidade – traduzindo os conhecimentos
de forma fragmentada, seguindo o paradigma cartesiano de Ciência,
de forma repetitiva e pragmática, além de ter uma prática pouco
valorizada.

Já a visão atual considera o docente como mediador do


conhecimento, produtor de saberes – que devem ser considerados
e provenientes de sua experiência profissional. Desta forma, pode-se
afirmar que, segundo Tardif (2002 apud VAGULA, 2005), o professor
interage diretamente no processo de ensino-aprendizagem, uma
vez que esse conjunto de saberes orienta sua prática. Todavia,
não se pode esquecer que estes saberes são influenciados pela
organização institucional, seja por meio de currículos, programas,
regimentos, projetos, entre outras diretrizes, podendo levar ao
afastamento da reflexão prática docente versus formação inicial e/
ou continuada.

Deve-se estar atento com a relação teoria/prática, ou seja, a práxis


pedagógica, que engloba a reflexão assídua dos saberes adquiridos
e construídos paralelamente à prática desenvolvida na instituição
escolar. Tal reflexão permite ao professor obter certa criticidade
quanto às suas ações, não se inserindo no sistema tradicional de
reproduções e técnicas.

De acordo com Tardif (2002, p. 106), “após vinte anos de


pesquisa, conclui-se que os saberes dos professores se baseiam em
suas experiências na profissão e em suas próprias competências
e habilidades individuais”. Disto convém dizer que a prática
docente está baseada no saber-fazer, vivenciado e experimentado
como profissional e até como aluno. Desse modo, sugere-se a
transformação da escola em um espaço de desenvolvimento social,
a fim de instigar o docente a ser produtor de múltiplos saberes ao
invés de reprodutor de técnicas, visto que este está inserido em um
contexto histórico-cultural, e suas ações pessoais e profissionais não
são apenas de ordem individual.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 153
Atividades de aprendizagem
1. Após a análise da atual conjuntura da formação acadêmica no país, você
consegue dizer como podemos instigar o docente do ensino superior a ser
produtor de múltiplos saberes em vez de reprodutor de técnicas?

2. A prática docente está baseada, vivenciado e experimentado como


profissional e até como aluno.
A) Na relação teoria e prática.
B) No ser político, atuante no cenário econômico.
C) No saber fazer.
D) No respeito às leis e aos direitos.
E) No respeito à teoria política.

154 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Seção 2
A importância do serviço social nos diversos níveis
de ensino

Introdução à seção

Em meio às inúmeras questões inerentes ao fazer do Assistente


Social, está em pauta a preocupação em aproximar o Serviço Social
e a Política de Educação. Nesse interim, uniram esforços:

[...] Grupos de pesquisa e extensão, equipes e coletivos


de profissionais com diferentes inserções no campo
das políticas sociais e, sobretudo, aqueles que
cotidianamente constroem esta relação em função de
uma atividade laborativa inserida nos estabelecimentos
que implementam a Política de Educação, ou que requer
uma articulação com os mesmos (CFESS, 2013, p. 15).

Essa aproximação tem ocorrido em todas as regiões do país,


sobretudo aqueles que se desdobram das iniciativas coordenadas
pelo Conselho Federal de Serviço Social e pelos Conselhos Regionais
de Serviço Social.

Realmente, configura-se em desafio para o Assistente Social


atuar profissionalmente com o objetivo de criar ações favoráveis
ao enfrentamento da “questão social”, mediatas ou imediatas, além
de garantir e ampliar os direitos e colaborar com a construção de
uma sociedade mais justa (inerente à práxis comprometida com o
Projeto Ético-político profissional do Serviço Social). Isso implica
conhecer a realidade, analisá-la, tanto em nível macrossocial como
microssocial, e utilizar uma metodologia libertadora para atingir tais
objetivos.

Podemos verificar na citação a seguir que o desafio de vincular o


Serviço Social com a Política de Educação é fruto de reflexão desde
os primórdios da profissão,

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 155
[...] como parte de um processo de requisições postas
pelas classes dominantes quanto à formação técnica,
intelectual e moral da classe trabalhadora, a partir de
um padrão de escolarização necessário às condições de
reprodução do capital em diferentes ciclos de expansão
e de crise (CFESS, 2013, p. 16).

Ainda, devendo ocorrer tanto no ensino formal (estabelecimentos


educacionais oficiais) como nas instituições do poder judiciário
(empresas, instituições de qualificação da força de trabalho juvenil e
adulta, movimentos sociais, entre outras).

Conforme está posto em CFESS (2013), a educação é:

[...] um complexo constitutivo da vida social, que tem uma


função social importante na dinâmica da reprodução
social, ou seja, nas formas de reprodução do ser social, e
que numa sociedade organizada a partir da contradição
básica entre aqueles que produzem a riqueza social e
aqueles que exploram os seus produtores e expropriam sua
produção. Este complexo assume predominantemente
o caráter de assegurar a reprodução dos contextos
sociais, das formas de apreensão do real, do conjunto
de habilidades técnicas, das formas de produção e de
socialização do conhecimento científico que reponham
contínua e ampliadamente as desigualdades entre
as classes fundamentais e as condições necessárias
à acumulação incessante. Integra, junto com outras
dimensões da vida social, o conjunto de práticas sociais
necessárias à continuidade de um modo de ser, às formas
de sociabilidade que particularizam uma determinada
sociedade. Sua função social, portanto, é marcada pelas
contradições, pelos projetos e pelas lutas societárias
e não se esgota nas instituições educacionais, embora
tenha nelas um espaço privilegiado de objetivação
(CFESS, 2013, p. 16).

Questão para reflexão


Qual é o significado de educação como dimensão da vida
social?

156 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Para responder a tal questão, sugiro a leitura de Karl Marx (1968),
que fez uma análise a partir da sua relação com o trabalho,
apontando-o como fundamento ontológico do ser social.

A educação nacional está dividida em dois níveis, com funções


específicas. A inserção de assistentes sociais na Política de Educação
responde:

[...] às requisições socioinstitucionais de ampliação das


condições de acesso e de permanência da população
nos diferentes níveis e modalidades de educação, a partir
da mediação de programas governamentais instituídos
mediante as pressões de sujeitos políticos que atuam no
âmbito da sociedade civil (CFESS, 2013, p. 37).

Dessa forma, ao conceber a educação como dimensão da


vida social, encerram-se as contradições que particularizam a vida
social, mesmo que ainda se configurem em desafio à profissão, é
necessário compreender o alcance das estratégias educacionais
fomentadas sob a hegemonia do capital financeiro e reorientar a
direção política de sua atuação.

[...] Não se trata de uma tarefa que traga resultados


imediatos e que atenue as tensões, conflitos e
inquietações que consomem o cotidiano profissional de
milhares de assistentes sociais, mas significa a afirmação
de uma clara direção política, a articulação de um
conjunto de referências teóricas que subsidiem a atuação
profissional na Política de Educação, contribuindo para
desvelar suas particularidades a partir de uma concepção
de educação que esteja sintonizada ao projeto ético-
político do serviço social e que, por isso, não pode ser
tomada de forma abstrata, vazia de significado político
e desvinculada da perspectiva da classe trabalhadora
(CFESS, 2013, p. 19).

Nota-se que aproximar o Assistente Social da Política de Educação


expressa um esforço para compreender a própria educação em

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 157
uma dimensão integral, coparticipativa das diferentes dimensões da
vida social que envolvem processos socioinstitucionais e as relações
sociais, familiares e comunitárias.

Conforme destacado no documento citado, a educação


configura-se como pedra fundamental na construção de uma
sociedade justa e igualitária. Todavia, tem sido historicamente
reproduzida a fim de manter a ordem hegemônica do capital,
contudo, pode também fomentar estratégia para possibilitar a
contra-hegemonia, e é nesse contexto que o Serviço Social encontra
os elementos para desenvolver sua práxis profissional, que, pode
contribuir para o enfrentamento da desigualdade social.

Por esta razão, a educação emancipadora, ao mesmo tempo em


que não prescinde da educação escolarizada, não se limita de forma
alguma a ela. Qual o significado então da educação escolarizada e
da política educacional neste percurso?

Significa que, sendo o Assistente Social um sujeito histórico,


participa e é afetado pelas consequências da mundialização do
capital e da realidade brasileira, mas torna- se profissional a partir de
um processo de formação crítica.

As determinações históricas na formação desse profissional estão


permeadas de opções político-pedagógicas pessoais e societárias.
Podendo, assim, apresentar posturas nada emancipatórias. O fato
de serem pessoas militantes no campo ético- político, não significa
que sua atuação pedagógica seja, da mesma forma, a de um
profissional transformador, no sentido freiriano1 do termo. Ou seja,
uma opção pessoal de defesa pela emancipação do ser humano
não é sinônimo de relações sociais horizontais na prática, inclusive
no campo da educação.

Por outro lado, transformador ou não, o assistente social também


sofre das expressões da “questão social” da sociedade capitalista em
sua profissionalidade. As condições de trabalho são condicionadas
de diversas formas, sendo elas: pelas transformações no mundo do
trabalho; pela política educacional do país, pela instituição, pelas

1
Para maiores informações ver: FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

158 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
unidades menores, como o departamento etc.; pela formatação das
relações sociais de cada tempo; enfim, por um complexo conjunto
de fatores que condicionam nossa vida.

Esse complexo processo de formação imbuído de tensões


e relacionado tanto à graduação quanto à formação continuada,
em nosso entendimento é fundamental para a formação literal do
profissional. É ele quem dará, ou não, suporte teórico- metodológico,
ético-político e técnico-operacional ao futuro assistente social, para
que este tenha condições de fazer uma correta leitura do movimento
histórico e intervir com qualidade na luta pela construção coletiva
de uma nova ordem societária

Para realizarmos esse debate, num primeiro momento,


delimitamos nossa concepção de educação, tendo em vista
seus meios e fins. Também, mesmo que brevemente, situamos o
contexto da formação do assistente social na contemporaneidade,
bem como suas condições de atuação profissional, principalmente
no que diz respeito à sua dimensão educativa.

Nossa intenção neste momento é relacionar questões referentes


ao Serviço Social com as discussões acerca da Educação, para isso,
iremos nos pautar em autores que nos auxiliarão nessa reflexão. A
nova proposta de Diretrizes Gerais para os cursos de Serviço Social,
elaborada na década de 1980, trouxe avanços quanto ao processo
de formação em Serviço Social.

No entanto, Iamamoto afirma que ainda perduram alguns


impasses: o “distanciamento entre o trabalho intelectual, de cunho
teórico-metodológico, e o exercício da prática profissional cotidiana”,
profundamente questionada por profissionais e estudantes. Outro
fator é a falta de mediações entre “as bases teóricas já acumuladas e
a operatividade do trabalho profissional”. A autora expõe

[...] O grande desafio na atualidade é, pois, transitar


da bagagem teórica acumulada ao enraizamento da
profissão na realidade, atribuindo, ao mesmo tempo,
uma maior atenção às estratégias, táticas e técnicas do
trabalho profissional, em função das particularidades dos
temas que são objetos de estudo e ação do assistente
social (IAMAMOTO, 2003, p. 52).

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 159
Em outras palavras, ainda se configura desafiante a articulação
entre realidade e profissão. Atuar de forma capaz de realizar um
bom processo de leitura e intervenção na realidade, ainda não é uma
ação recorrente dos Assistentes Sociais, por isso, Iamamoto (2003)
pondera ser necessário romper com o teoricismo, o militantismo
e o tecnicismo e apostar na formação voltada para o domínio e
utilização da pesquisa no exercício profissional cotidiano, bem
como a incorporação do “espírito indagativo”:

[...] O que se reivindica, hoje, é que a pesquisa se afirme


como uma dimensão integrante do exercício profissional
visto ser uma condição para se formular respostas
capazes de impulsionar a formulação de propostas
profissionais que tenham efetividade e permitam atribuir
materialidade aos princípios ético-políticos norteadores
do projeto profissional (IAMAMOTO, 2003, p. 56).

Questão para reflexão


Você concorda com Iamamoto (2003) quando esta afirma
que é urgente a necessidade de estabelecer novas estratégias
para a reconstrução do projeto de formação profissional do
assistente social? E quais estratégias poderiam ser adotadas?

Na tentativa de responder a tais questionamentos, Iamamoto


(2003) aponta ser necessário que o Serviço Social se atenha ao
processo social na sua contrariedade, levando em conta todo
o complexo sistema societário e comprometendo-se com a
formulação de programáticas, atuando atentamente no campo
das políticas sociais, do mundo do trabalho e de seu mercado, na
cultura universal e da classe subalterna.

É necessário, também, que, em apoio à classe subalterna, se


decifre seu “bom senso”, nos termos de Gramsci, “[...] do sentido de
classe, imiscuído no senso comum, desenvolvendo-o na direção
do deciframento do presente na direção da construção prática de
uma nova qualidade de vida em sociedade” (IAMAMOTO, 2003, p.
196).

160 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Para saber mais
A Associação Brasileira de Pesquisa e Ensino em Serviço Social
(ABEPSS) elaborou uma proposta de currículo mínimo para
os cursos de Serviço Social. Para saber mais, acesse, <www.
abepss.org.br>. Acesso em: 4 abr. 2016.

O trabalho do Assistente Social está arraigado em uma função


pedagógica, ou seja, seu trabalho possui uma dimensão educativa.
Para Iamamoto (2007), devemos analisar tal dimensão mediada
pelas políticas públicas – em especial a assistência social – e pelos
processos organizativos e lutas das classes subalternas, inscrita nos
processos de organização da cultura por parte das classes sociais.
Para que a dimensão educativa da atuação do assistente social possa
ter resultados positivos, em vista de uma atuação transformadora,
há a necessidade que o mesmo seja dotado de condições para tal
propósito, pois o bacharel em Serviço Social é:

[...] o profissional que atua nas expressões da questão social,


formulando e implementando propostas de intervenção
para seu enfrentamento, com capacidade de promover
o exercício pleno da cidadania e a inserção criativa e
propositiva dos usuários do Serviço Social no conjunto das
relações sociais e no mercado de trabalho (BRASIL, 2002).

Consideramos que a formação profissional em Serviço Social tem


sido fortemente ameaçada com a nova direção política da educação
superior no Brasil, não é o caso isolado da profissão, não obstante, há um
descaso no que tange esse nível de ensino. Todavia, ainda há grandes
esforços das entidades de representação da categoria no sentido de
garantir uma direção sólida na formação, com compromisso ético,
político e ideológico dos futuros profissionais.

Ao tratarmos de educação e formação profissional, entramos no


terreno do “ensinar” a ser assistente social e isso carece de tempo,
investimento e condições de trabalho. As mesmas dimensões
pedagógicas do trabalho profissional que apresentamos aos acadêmicos,
temos como compromisso desenvolvê-las também em nosso cotidiano
profissional.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 161
Falar de emancipação e educação em sua relação com o Serviço Social
é acreditar que na construção coletiva de luta outra sociedade é possível,
principalmente se houver no bojo acadêmico comprometimento com
uma atuação profissional humanizadora e competente, atrelado às
habilidades teórico-metodológicas, ético- políticas e técnico-operativas
do assistente social.

Todas as competências e/ou atribuições profissionais que devem ser


observadas e respeitadas pelos profissionais, quanto pelas instituições
empregadoras da educação ou de qualquer outro espaço sócio-
ocupacional, são norteadas pelos princípios, direitos e deveres inscritos
no Código de Ética Profissional de 1993 - CEP, na Lei de Regulamentação
da Profissão, Lei nº 8.662/1993, bem como nas Diretrizes Curriculares da
ABEPSS (1996). Para Iamamoto (2002) essas competências configuram-
se em [...] “funções privativas do Assistente Social, isto é, suas prerrogativas
exclusivas” (IAMAMOTO, 2002, p. 16).

De acordo com informações contidas no CFESS (2013), são exigidas


do profissional competências gerais e fundamentais à compreensão do
contexto sócio-histórico em que se situa sua intervenção, a saber:

[...] - apreensão crítica dos processos sociais de produção


e reprodução das relações sociais numa perspectiva de
totalidade;
- análise do movimento histórico da sociedade brasileira,
apreendendo as particularidades do desenvolvimento do
capitalismo no país e as particularidades regionais;
- compreensão do significado social da profissão e
de seu desenvolvimento sócio-histórico, no cenário
internacional e nacional, desvelando as possibilidades de
ação contidas na realidade;
- identificação das demandas presentes na sociedade,
visando formular respostas profissionais para o
enfrentamento da questão social, considerando as novas
articulações entre o público e o privado (CFESS, 2013. p.
26).

Constituem competências do Assistente Social:

162 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
[...] I - elaborar, implementar, executar e avaliar políticas
sociais junto a órgãos da administração pública, direta ou
indireta, empresas, entidades e organizações populares;
II - elaborar, coordenar, executar e avaliar planos,
programas e projetos que sejam do âmbito de atuação
do Serviço Social com participação da sociedade civil;
III - encaminhar providências, e prestar orientação social
a indivíduos, grupos e à população;
IV - (Vetado);
V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos
sociais no sentido de identificar recursos e de fazer uso
dos mesmos no atendimento e na defesa de seus direitos;
VI - planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços
Sociais;
VII - planejar, executar e avaliar pesquisas que possam
contribuir para a análise da realidade social e para
subsidiar ações profissionais;
VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da
administração pública direta e indireta, empresas privadas
e outras entidades, com relação às matérias relacionadas
no inciso II deste artigo; IX - prestar assessoria e apoio
aos movimentos sociais em matéria relacionada às
políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos
civis, políticos e sociais da coletividade;
X - planejamento, organização e administração de
Serviços Sociais e de Unidade de Serviço Social;
XI - realizar estudos socioeconômicos com os usuários
para fins de benefícios e serviços sociais junto a órgãos
da administração pública direta e indireta, empresas
privadas e outras entidades. (LEI DE REGULAMENTAÇÃO
DA PROFISSÃO, nº 8.662/1993, p.28-29).

A inserção dos Assistentes Sociais na Política de Educação atende:

[...] às requisições socioinstitucionais de ampliação das


condições de acesso e de permanência da população
nos diferentes níveis e modalidades de educação, a partir
da mediação de programas governamentais instituídos
mediante as pressões de sujeitos políticos que atuam no
âmbito da sociedade civil. Desse modo, se por um lado
resulta da histórica pauta de luta dos movimentos sociais
em defesa da universalização da educação pública, por

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 163
outro se subordina à agenda e aos diagnósticos dos
organismos multilaterais, fortemente sintonizados às
exigências do capital, quanto à formação e qualificação
da força de trabalho. Inscreve- se, portanto, na
dinâmica contraditória das lutas societárias em torno
dos processos de democratização e qualidade da
educação, cujo resultado mais efetivo tem se traduzido
na expansão das condições de acesso e permanência, a
partir do incremento de programas assistenciais, o que
caracterizou a intervenção do Estado no campo das
políticas sociais na primeira década deste século (CFESS,
2013, p. 38).

Pode-se afirmar que o aparato legislativo contribui para que


a atuação profissional na Política de Educação se efetive em
consonância com o fortalecimento do projeto ético-político do
serviço social e de luta por uma educação pública, laica, gratuita,
presencial e de qualidade. Muito embora, a atuação profissional
voltada para a garantia do acesso à educação escolarizada necessita
ser compreendida para além dos discursos de defesa da importância
do direito social que se configura o aprender.

[...] Uma vez que as formas concretas assumidas pelas


estratégias governamentais e não governamentais
transpõem o cerne do problema do campo das
desigualdades sociais que particularizam o processo de
hegemonia do capital financeiro para o do enfrentamento
da pobreza, da exclusão social e da falta de oportunidades
e de mão de obra qualificada. As estratégias de ampliação
do acesso à educação escolarizada, em todos os níveis
da política educacional, ainda não configuram um efetivo
processo de universalização do acesso a esta política,
mas uma ampliação desigual em sua escala e, sobretudo,
em sua dimensão pública. (CFESS, 2013, p. 38).

Para saber mais


O documento intitulado: Conselho Federal de Serviço Social
– CFESS, para a Atuação de Assistentes Sociais na Política de

164 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Educação compõe a série Trabalho e Projeto Profissional nas
Políticas Sociais, e tem como objetivo aprofundar a reflexão
sobre a educação e o trabalho do Assistente Social nessa área.
O documento na íntegra pode ser encontrado como: CFESS
para a atuação dos assistentes sociais na política de educação.
Brasília: CFESS, 2013.

Em relação a práxis específica dos assistentes sociais na Política


de Educação, o CFESS (2013) traz um rol de dimensões que elucida
sobremaneira tal atividade. E por isso, as trazemos na íntegra, devido
à sua importância e clareza. As dimensões são as seguintes:

[...] 1- Uma das dimensões que tem sido mais acionada


e atravessada por polêmicas, em relação ao seu peso no
conjunto das ações realizadas pelos/as assistentes sociais
na Política de Educação, são as abordagens individuais e
junto às famílias dos/as estudantes e/ou trabalhadores e
trabalhadoras da Política de Educação. Não se trata de
um questionamento quanto à importância deste tipo de
abordagem com relação à viabilização do acesso aos
direitos sociais, humanos e à educação em particular. Deve
ser observado, no entanto, a tendência que caracteriza
muitas ações nos estabelecimentos de educação, com
relação ao desenvolvimento de abordagens orientadas a
partir da restrita identificação da ação profissional com
a política de assistência social. Além do equívoco com
relação à definição de profissão, esta pouco contribui
para a construção de ações intersetoriais necessárias
à afirmação da educação como direito social. Também
se requer atenção neste caso com relação ao fato de
que, em muitas experiências profissionais, a abordagem
individual se constitui na única forma de atuação dos/
as assistentes sociais, o que restringe significativamente
o alcance de seu trabalho. As abordagens individuais e
a atuação junto às famílias são bastante necessárias e
estratégicas ao trabalho profissional, visto que delas
dependem muito a capacidade de enfrentamento das
situações de ameaça, violação e não acesso aos direitos
sociais, humanos e à própria educação, como também de
sua maior visibilidade no âmbito da política educacional,
mas não devem constituir na única modalidade de
intervenção profissional.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 165
2- Outra dimensão importante é a de intervenção
coletiva junto aos movimentos sociais como condição
fundamental de constituição e reconhecimento dos
sujeitos coletivos frente aos processos de ampliação
dos direitos sociais e, em particular, do direito a uma
educação pública, laica e de qualidade, a partir dos
interesses da classe trabalhadora. Observa-se, no
entanto, uma diferenciação importante nas formas de
atuação profissional entre os/as assistentes sociais que
desenvolvem suas ações nos estabelecimentos formais
de educação e aqueles/as que as desenvolvem no campo
da educação popular. Nitidamente há no segundo caso
melhores condições de promover esta atuação em virtude
da natureza da própria área. O investimento que merece
ser feito em maior escala quanto à inserção e atuação
dos/as assistentes sociais na Política de Educação em seus
diferentes níveis e modalidades deve ser efetivamente
este: o de articulação com os movimentos sociais. O
que possibilitaria a ampliação dos horizontes de atuação
profissional em defesa de uma educação pública e de
incorporação de novos conteúdos ao cotidiano dos
estabelecimentos, relativos aos modos de apreensão da
realidade produzidos na dinâmica das lutas sociais.
3- A dimensão investigativa que particulariza o exercício
profissional não deve estar desvinculada das demais
dimensões do trabalho profissional. Ela contribui para
a compreensão das condições de vida, de trabalho e
de educação da população com a qual atua e requer a
adoção de procedimentos sistemáticos de apreensão da
realidade social, para além da empiria e de sua aparência
e previamente pensados, constando do projeto de
intervenção profissional. Muito embora as principais
requisições
na Política de Educação recaiam sobre a realização dos
estudos socioeconômicos vinculados às políticas de
assistência estudantil, concessão de bolsas e definição das
condições de acesso a determinados estabelecimentos
educacionais, essa dimensão do trabalho profissional não
deve se restringir nem a esta demanda nem tampouco
aos procedimentos já institucionalizados. Trata-se de
uma dimensão fundamental para a análise da Política
de Educação em sentido mais amplo que apenas o da
verificação do alcance das metas relativas ao acesso e
à permanência, contribuindo para a definição de novas

166 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
estratégias de ação profissional e dos sujeitos singulares
e coletivos, a partir do desvelamento de como a Política
de Educação se inscreve nos processos de reprodução
das desigualdades sociais.
4- A dimensão do trabalho profissional relativa à inserção
dos/as assistentes sociais nos espaços democráticos de
controle social e a construção de estratégias de fomento
à participação dos estudantes, famílias, professores e
professoras, trabalhadores e trabalhadoras da educação
nas conferências e conselhos desta política e de outras
adquire uma particularidade diante da predominante
estruturação verticalizada e muito pouco democrática
destes espaços na Política de Educação. Neste sentido,
a atuação profissional deve também estar voltada para
os processos de discussão e modificação das formas de
composição e funcionamento destas instâncias. Além
de reconhecer e tecer aproximações com os demais
conselhos existentes na Política de Educação, e que
são fundamentais para a democratização dos processos
de gestão desta política. 5- A dimensão pedagógico-
interpretativa e socializadora das informações e
conhecimentos no campo dos direitos sociais e humanos,
das políticas sociais, de sua rede de serviços e da legislação
social que caracteriza o trabalho do/a assistente social
reveste-se de um significado importante no campo
da educação, pois representa um dos elementos que
justificam a inserção desse/a profissional na dinâmica
de funcionamento dos estabelecimentos educacionais,
assim como em instâncias de gestão e/ou coordenação
nas esferas locais. Contudo, contraditoriamente, trata-
se também de um dos focos de resistência à presença
de assistentes sociais, pela aproximação de algumas de
suas abordagens ao trabalho já realizado por outros/as
profissionais, em particular por pedagogos/as. Uma das
constantes preocupações nas ações desenvolvidas pelo
GT Nacional foi exatamente a de fomentar e qualificar o
debate sobre este tema, sem conduzir para a delimitação
de ações que diferenciem normativamente o trabalho
profissional, visto que esta não era a sua tarefa. Parte das
tensões presentes nesta dimensão tende a avançar com a
compreensão mais precisa das possibilidades de atuação
profissional dos/as assistentes sociais, ao reconhecerem
a necessidade de articulação das diferentes dimensões
que particularizam seu trabalho.
6- A dimensão de gerenciamento, planejamento e

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 167
execução direta de bens e serviços, no âmbito da
Política de Educação, por assistentes sociais tem sido
atravessada tanto pela compreensão equivocada de
sua relação com a política de assistência social, quanto
pela institucionalização dos programas governamentais
e dos projetos sociais que particularizam a atuação de
assistentes sociais nos estabelecimentos educacionais
privados. Observa-se uma maior solicitação institucional
no tocante à execução e um investimento político-
profissional, por parte dos/as assistentes sociais, de
maior participação não só deles/ as, mas dos demais
trabalhadores e trabalhadoras da política educacional
e inclusive dos/as estudantes nas instâncias de gestão.
Trata-se de uma dimensão do trabalho profissional que,
se não tem sido demandada institucionalmente e até
encontra grandes resistências neste sentido, coloca-
se hoje como uma clara intenção de construção de
possibilidades de atuação profissional, sobretudo com
a intenção de se assegurarem processos de gestão
democráticos e participativos e trabalhos interdisciplinares
e potencializadores de ações intersetoriais. (CFESS, 2013,
p. 51-56).

Por fim, o CFESS (2013) lista uma agenda de lutas e trabalhos


ainda a serem enfrentados por toda a categoria para consolidação
do serviço social na Política de Educação:

- Continuar a incidir fortemente para a elaboração e


aprovação de projetos de lei (PL) que versem sobre a
inserção profissional na educação consonante com o
projeto profissional;
- Divulgar e debater com os/as assistentes sociais
e demais trabalhadores e trabalhadoras da área da
educação o conjunto dos documentos construídos
pelo GT Nacional Serviço Social na Educação, por meio
de reuniões das comissões, GTs, núcleos, câmaras
temáticas audiências públicas, dentre outros;
- Ampliar a participação da categoria de assistentes
sociais nos fóruns de controle social da Política
de Educação, como os conselhos de educação,
as conferências municipais, estaduais e federal de

168 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
educação, bem como a articulação em espaços de
organização política dos trabalhadores e trabalhadoras
da educação, como os sindicatos, movimentos sociais,
dentre outros;
- Articular e problematizar, com os/as demais
profissionais da área da educação e com a sociedade,
a importância e legitimidade do trabalho de assistentes
sociais nesta política;
- Aprofundar a discussão acerca das particularidades
da atuação dos/das assistentes sociais na Política
de Educação, considerando que as atribuições e
competências da categoria nos diversos espaços sócio-
ocupacionais são orientadas e norteadas por direitos e
deveres constantes no atual Código de Ética Profissional
e na Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8662/93),
que devem ser observados e respeitados tanto por
profissionais quanto pelas instituições empregadoras;
- Construir fóruns de discussão e realizar debates
por meio de oficinas, encontros, seminários locais e
regionais, dentre outros, aprofundando as reflexões
sobre as possibilidades e limites da atuação do/a
assistente social nessa política;
- Estimular a criação de espaços sistemáticos de
discussão sobre o trabalho do/a assistente social na
educação, no âmbito dos CRESS;
- Fortalecer a participação da categoria nas comissões
de educação, GTs, núcleos, câmaras temáticas e demais
espaços de discussão existentes nos CRESS, que tratem
da atuação do/a assistente social na educação;
- Articular com a ABEPSS para que o debate em torno da
inserção do serviço social na educação seja contemplado
na formação profissional;
- Discutir as particularidades e as diferentes
compreensões sobre a atuação dos/as assistentes
sociais que se inserem no âmbito da educação superior,
para que se reconheçam como assistentes sociais
(conforme a Lei 8662/93) e como profissionais da
Política de Educação;
- Problematizar junto aos/às assistentes sociais que
atuam na área da educação acerca das particularidades
da educação popular, na perspectiva do aprofundamento
teórico político e da sistematização das experiências;
- Fortalecer as ações em torno da realização de
concursos públicos para assistentes sociais na Política

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 169
de Educação, bem como para os demais trabalhadores e
trabalhadoras dessa política;
- Problematizar junto à categoria sobre as
particularidades das suas formas de inserção nos
estabelecimentos públicos e privados que executam a
política educacional, visando a assegurar as condições
éticas e técnicas do trabalho profissional;
- Aprofundar as discussões sobre o significado político,
teórico e ideológico das propostas de educação
inclusiva;
- Fomentar a discussão acerca da educação voltada para
povos e comunidades indígenas, quilombolas e demais
populações tradicionais, bem como sobre as formas de
atuação profissional dos/as assistentes sociais;
- Aprofundar a discussão, no âmbito da atuação dos/
as assistentes sociais na educação, para a garantia do
respeito à diversidade humana, como direitos humanos,
considerando a livre orientação e expressão sexual,
livre identidade de gênero com vistas a consolidar uma
educação não sexista, não racista, não homofóbica/
lesbofóbica/transfóbica;
- Articular junto aos/às estudantes, trabalhadores
e trabalhadoras da Política de Educação espaços
de discussão sobre a política/ programas/ações de
assistência estudantil e as particularidades da atuação
do/a assistente social;
- Intensificar a articulação junto a outras categorias
profissionais e sujeitos coletivos, na luta por uma
educação pública, gratuita, laica, presencial, de
qualidade e com real investimento do fundo público
(CEFESS, 2013, p. 59-62).

A guisa de conclusão, verifica-se que a Política de Educação,


assim como as demais políticas sociais, passa por um momento de
quebra de direitos devido ao “ataque” neoliberal em que vivemos.
Que a inserção do assistente social nesta política é essencial e
demanda um aporte de conhecimentos teórico-metodológicos,
ético-políticos e técnico-operativos para sua consolidação. Cabe
à categoria o aprofundamento contínuo da pesquisa e práxis
profissional.

170 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
Atividades de aprendizagem
1. Para você, qual a importância da pesquisa no trabalho desenvolvido
pela Assistente Social?

2. Aponte duas competências do Assistente Social quanto à


sua atuação.

Para concluir o estudo da unidade


Você pode perceber que o profissionalismo do docente no
Serviço Social perpassa por condicionantes sociais, políticos e
econômicos. Também verificou que a organização nacional do
ensino visa assegurar processos educativos ao longo da vida do
indivíduo, também pode entender um pouco mais sobre a Política
Pública de Educação e sua articulação com o Serviço Social.
Ficou sabendo que essa aproximação não é recente, desde a sua
institucionalização a profissão está tanto inserida nos espaços
escolares (ainda que de início voltada para a prática assistencialista)
como participando das discussões e movimentos para elaboração,
implementação e execução da referida política. Contudo, somente
em meados dos anos 2010 que o Serviço Social passa a discutir
de forma mais efetiva a inserção profissional do assistente social
na política pública de educação. Foi possível apontar avanços
significativos na reflexão que a categoria profissional de assistentes
sociais vem construindo acerca da inserção nessa política pública.
Todavia, é preciso ressaltar que a trajetória de consolidação da
educação, enquanto política pública, é ainda repleta de avanços e
retrocessos. É nessa trajetória de conquistas e limitações da política
de educação que se insere a discussão acerca do enfrentamento
da desigualdade racial e o trabalho do assistente social. Pensar
essa construção é, portanto, necessidade da sociedade brasileira
pela forma como está constituída na contemporaneidade e que,
por isso, deve estar presente nas propostas que se relacionam com
a política pública de educação.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 171
Fique ligado
Tome nota
Caro aluno, nesta unidade você teve acesso a importantes
conceitos, como:
• A divisão do ensino nacional. Há dois níveis: básico e superior.
• Conforme a LDB (1996), a função social do ensino é fomentar o
pleno desenvolvimento do ser humano com a sua preparação para o
mercado de trabalho.
• As competências e habilidades do Assistente Social estão em
consonância com as determinações da Lei nº 8.662, 07/06/1993,
CRESS 2003, que regulamenta a profissão.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. A organização do ensino brasileiro se dá em dois níveis, a saber:
a) Educação Básica e Ensino Superior.
b) Educação Infantil e Ensino Fundamental.
c) Educação Básica e Ensino Profissional.
d) Educação Profissional e Ensino de Jovens e Adultos.
e) Educação superior e técnica.

2. A educação básica é subdividida em diferentes etapas: Educação Infantil


e Pré-escola, Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II e Ensino Médio,
cada uma delas possui objetivos próprios e formas de organização diversas.
Discorra sobre uma dessas modalidades e sua função.

3. Como você definiria o profissional: assistente social?

4. Os estudos acerca da docência no ensino superior evidenciam os


desafios postos a este nível de ensino. Elenque alguns desafios a serem
enfrentados.

5. Assinale a sequência verdadeira quanto às incumbências do Assistente


Social:
(.....) O assistente social atua nas expressões da questão social.
(.....) Promove o diálogo, um encontro de sujeitos interlocutores que
procuram a significação dos significados.

172 U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social
(.....) Transmite os saberes e ensina aos usuários sobre direitos e deveres.
(.....) Profissional comprometido com os valores e princípios norteadores
do Código de Ética do Assistente Social.
a) V - V - V - V.
b) F - F - F - V.
c) F - V - F - V.
d) V - V - V - F.
e) V - F - F - V.

U4 - Compreender a importância do serviço social nos diversos níveis de ensino, observando as Instituições formadoras como manifestação da questão social 173
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Anotações

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