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Geni Helena Altenhofer1

PARECER TÉCNICO JURÍDICO

EMENTA:

PARECER JURÍDICO. ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA.


DOENÇA DEGENERATIVA. PACIENTE. GRAU AVANÇADO. EUTANASIA.
IMPOSSIBILIDADE.

RELATÓRIO

Trata-se de consulta formulada pela senhora Maria das Graças, brasileira,


casada, 42 (quarenta e dois) anos de idade, professora/pedagoga, com doença
esclerose lateral amiotrófica (ELA) em grau avançado, em pleno gozo de suas
faculdades mentais, residente e domiciliada na rua “tal”, bairro “tal”, na cidade de
São Miguel do Iguaçu/PR, endereço eletrônico “xxxx”.
ELA é uma doença que causa a degeneração progressiva dos neurônios
motores, fazendo com que o doente perca os movimentos gradativamente e sinta
muita dor.
A Sra Maria das Graças possui essa doença a mais de dez anos. Não
movimenta mais os membros inferiores, possui poucos e limitados movimentos
dos membros superiores. Com muita dificuldade consegue digitar no computador,
com utilização de adaptador. Sente muitas e fortes dores.
Em síntese, a consulente requer a verificação da possibilidade da prática
da eutanásia. Pelo fato de a doença não ter cura, ser progressiva e causar muitas
dores. Maria das Graças objetiva com a eutanásia abreviar seu sofrimento. Para
1
Especialista em Educação Especial pela ABRASCE, graduada em Pedagogia pela ULBRA, formação técnica
em Saúde e Segurança do Trabalho pela UTF/PR, graduanda em Direito pela Uniguaçu faculdade de São
Miguel do Iguaçu/PR.
tanto conta com o apoio de seu esposo e seu único filho, que aceitam sua
vontade pois sabem que seus sofrimentos só aumentarão à medida que irá
perdendo também os movimentos dos membros superiores e consequentemente
haverá o aumento da intensidade das dores.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

A eutanásia conhecida como “a boa morte” ou “morte assistida” consiste


em um tratamento específico, normalmente injetável intravenosa, para provocar a
morte de uma pessoa com doença incurável, em estágio terminal, com o intuito de
abreviar seu sofrimento.
No ordenamento jurídico brasileiro não há lei que autorize tal prática. Não
obstante não haver autorização legal para a prática da eutanásia, há que se
salientar que, tirar a vida de uma pessoa é crime previsto no art. 121 do Código
Penal - CP - (matar alguém). E o auxílio ou a facilitação para que a pessoa tire
sua própria vida pode ser considerado como crime de auxílio ao suicídio, previsto
no art. 122 CP.
Posto isso, citemos, sem discorrer, alguns países nos quais a “morte
assistida” é legalizada, Suíça, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Canadá, em alguns
estados dos Estados Unidos, e o país mais próximo ao Brasil, a Colômbia. 2
E mesmo nos países onde há a legalização dessa prática verifica-se que
há um grande clamor em torno do tema. Como pudemos acompanhar, pelos
meios de comunicação, no início desse mês, na Colômbia, onde uma mulher de
51 (cinquenta e um) anos de idade com ELA, que obteve autorização legal para
realizar a eutanásia, teve o procedimento suspenso pela clínica que o realizaria,
haja vista, a paciente não estar em estágio terminal, e estar envolto a um
acalorado debate de relevante valor social e moral quanto a sua realização. Nas
palavras de Heidy de Avila Cabrera (2010, p. 133): 3
2
CASTRO, Marina Parreiras Reis de, et al. Eutanásia e suicídio assistido em países
ocidentais: revisão sistemática. Disponível em scielo.br/j/bioet/a

3
CABRERA, Heidy de Avila. Eutanásia: Direito de morrer dignamente. Dissertação (Mestrado
em Direitos Fundamentais), Centro Universitário FIEO – UNIFIEO. Osasco/SP. Quantidade de
Portanto, é cediça a necessidade de decisões políticas a respeito da
eutanásia. Faz-se necessário um estudo minucioso para que a
comunidade possa decidir até que ponto será permitido aos cidadãos
que optem pela morte, e quais as circunstâncias em que isso seria
permitido.

No Brasil, a Resolução nº 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina –


CMF - em seu art. 1º dispõe:

É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos


que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade
grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu
representante legal.

Ao médico, como a qualquer pessoa, não é permitido tirar a vida do


paciente. No entanto é permitido limitar ou suspender tratamentos que
prolonguem a vida de doentes que se encontram em fase terminal, respeitando-se
a vontade do enfermo ou de seu representante legal. E observando a Resolução
nº 1.995/2012 do CFM que dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos
pacientes no que concerne ao tratamento. Embora não seja eutanásia, é uma
forma de respeitar a vontade do doente e de evitar o prolongamento da vida,
respeitando a dignidade da pessoa humana, consoante ao art. 1º, inciso III da
Constituição Federal – CF. Em interpretação teleológica da norma, ou seja, que
busca o sentido funcional e o alcance da norma em atendimento as exigências
sociais, respeitar a dignidade da pessoa humana abrange não submetê-la a
tratamentos que prolonguem seus sofrimentos, se sabendo ser a doença
degenerativa, incurável e progressiva fazendo com que a pessoa definhe
progressivamente e adentre em estado vegetativo, ciente de que não há cura
para sua enfermidade.
Por fim, discorrendo sobre o art. 5º da CF que assegura a todos “a
inviolabilidade do direito à vida”, ainda em interpretação teleológica vejamos,
“direito à vida” implica em direito de nascer e viver a vida em sua plenitude. Não
havendo o que se evocar quando a pessoa em estágio terminal, em grande

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sofrimento de dor, manifesta expressamente o interesse em abreviar seu
sofrimento, usufruindo de seu direito “à liberdade” de escolha.

CONCLUSÃO

Por todo o exposto, opino no sentido de que a consulente manifeste de


forma expressa sua vontade, com base no princípio da dignidade da pessoa
humana, e utilizando de sua liberdade de escolha, em relação a cuidados e
tratamentos que quer ou não receber, com fulcros na Resolução nº 1.995/2012 do
Conselho Federal de Medicina - CFM, e na Resolução nº 1.805/2006 CFM.
Impossibilidade da prática da eutanásia por não haver no ordenamento
jurídico brasileiro norma que autorize e regulamente tal prática.
É o parecer.

São Miguel do Iguaçu/PR, 31 de outubro de 2021.


Geni Helena Altenhofer
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