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TERAPIA BIOENERGÉTICA

AULA 2

Profª Nathalie Pailo Perozin


CONVERSA INICIAL

Nesta aula, vamos nos aprofundar em mais alguns conceitos da disciplina


que pouco a pouco darão forma ao entendimento da bioenergética como um todo
e nos tornarão aptos para a aplicação da terapia bioenergética na prática.
Os conceitos que estudaremos nesta aula são a respeito da carga
energética, fases de desenvolvimento emocional e mecanismos de defesa. Esse
conhecimento nos dará base para investigação e análise da história de vida do
paciente e de como as experiências vivenciadas por estes em cada fase podem
impactar em sua vida e sua saúde.

TEMA 1 – CARGA ENERGÉTICA

Para iniciar esta aula, vamos aprofundar um pouco mais sobre o conceito
de energia e a sua importância dentro da visão das abordagens corporais.
Segundo Volpi e Volpi (2008), na Psicologia Corporal compreende-se o indivíduo
como uma unidade de energia que rege e contém em si dois processos
paralelos: o psiquismo (mente) e o soma (corpo). A seguir, veremos uma figura
que deixa esse conceito mais claro.

Figura 1 – Processos energéticos

Fonte: Lowen, 2017, p. 120.

Pode-se perceber, portanto, que a energia é a base responsável pelo


estado de saúde do indivíduo. Costumamos enxergar cada um desses aspectos
do organismo separadamente, como se fossem independentes um do outro,

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porém, na visão das abordagens corporais, não há como separá-los quando
buscamos um estado de saúde integral. Todo trabalho feito para cada um dos
aspectos separadamente é válido, porém por trás deve ser mantida a visão do
todo.
O primeiro conceito importante de considerarmos a respeito da energia
existente em cada organismo é o conceito de carga energética. Segundo a teoria
a psicologia corporal, essa carga começa a se formar desde o momento da
concepção e vai se somando a outras forças energéticas de vida com o passar
do tempo, porém a carga energética dessa primeira fase é essencial para
determinar as características energéticas basais do indivíduo.
Segundo Navarro (1996), o encontro espermatozoide-óvulo é uma junção
de duas células, que pode ocorrer de forma diferente em cada caso, de acordo
com sua densidade energética. Ainda de acordo com o autor (Navarro, 1996, p.
17), “a fusão energética é, então, um elemento basilar para o crescimento do
embrião, assim como é importante o campo energético no qual irá se
desenvolver”.
Visto que o indivíduo é uma unidade de energia, que dá base para seus
aspectos psíquico e somático, podemos concluir a importância que a carga, a
circulação e a pulsação energética tem em nossas vidas.
Estudos conduzidos por Reich baseados em testes de sangue permitiram
definir quatro estruturas de classificação energética dos indivíduos. Veremos
detalhes dessas estruturas no capítulo a seguir.

TEMA 2 – ESTRUTURAS ENERGÉTICAS

As estruturas apresentadas a seguir serão base para a continuação de


nossos estudos quando entrarmos nos conceitos de estruturas de caráter e
couraças musculares. Cada uma dessas estruturas energéticas costuma estar
presente em estruturas de caráter específicas. Reconhecer isso pode nos
auxiliar a compreender a situação do paciente e definir o projeto terapêutico
adequadamente.
Antes mesmo de iniciarmos esse estudo, é importante destacar que
Lowen propõe uma visão mais simplificada das estruturas energéticas,
definindo-as como de subcarga, carga ou sobrecarga. Porém, como a teoria
reichiana se aprofunda bastante nesse conteúdo, vamos utilizá-la como base
para o início de nosso estudo.
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2.1 Estrutura hipo-orgonótica-desorgonótica

O termo hipo-orgonótico indica que o indivíduo portador dessa estrutura


energética tem disponível em seu organismo uma carga energética baixa.
Conforme vimos anteriormente, Reich deu o nome de orgone para a energia que
identificou no interior e no exterior do organismo, por isso a união do termo hipo
e orgonótico dá origem a essa estrutura.
Observando um indivíduo com essa estrutura energética, pode-se
perceber que, normalmente, este não costuma ter muita disposição para
atividades que exijam muito do organismo (seja física ou mentalmente), muitas
vezes é mais quieto e costuma sentir cansaço constante e facilmente. Em geral,
percebe-se que é um indivíduo com menos energia circulando e menos energia
disponível. Movimentos mais contidos e menos expansivos também são
indicadores dessa estrutura.
O termo desorgonótico indica que, mesmo tendo pouca energia, a energia
que tem é mal distribuída. Normalmente o indivíduo com essa estrutura
energética terá a energia mais concentrada na cabeça e menos no corpo. Por
isso, possui padrões de comportamento mais racionais – costuma ser bastante
pensante, calculista, não demonstra muito as emoções, não costuma se
relacionar muito com os outros, é mais reservado.
Quando pensamos em práticas terapêuticas indicadas para indivíduos
com essa estrutura, podemos considerar aquelas que o auxiliem a se desligar
do racional e a se conectar com suas emoções. Podemos considerar também
práticas que estimulem um aumento de carga energética, para que haja mais
energia circulando e disponível para uso.
Na teoria da bioenergética, essa estrutura poderia ser considerada como
do tipo de subcarga.

2.2 Estrutura desorgonótica

Essa estrutura se refere ao indivíduo que possui uma boa carga


energética disponível, porém mal distribuída. Ao observar um indivíduo com essa
estrutura, pode-se perceber que este costuma ser expressivo, tem energia para
se movimentar e tem disposição. Porém, não há harmonia na distribuição dessa
energia, ou seja, percebe-se que há um excesso de energia em algumas regiões

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do corpo e nos comportamentos relacionados a estas e pouca energia em outras
regiões.
Vamos ver a seguir um exemplo de como poderia ser o comportamento
de um indivíduo com essa estrutura: pode ser muito comunicativo, falar bastante
e com tom de voz alto, o que indica que tem energia na área da boca, que se
expressa em um comportamento relacionado a essa área, no caso, a
comunicação. Por outro lado, esse mesmo indivíduo pode ser muito distraído e
não gostar de praticar atividades físicas, o que indica baixa energia na área
mental e nas áreas relacionadas a mobilidade, por exemplo, as pernas e o tórax,
relacionado à respiração.
Ao pensarmos em práticas indicadas para indivíduos com essa estrutura
energética, podemos considerar aquelas que estimulem a melhor circulação da
energia por todo o corpo, para que haja uma melhor distribuição desta. Além
disso, podemos considerar também práticas que auxiliem o indivíduo a
administrar melhor a sua energia, considerando os processos de carga,
circulação e descarga energética.
Na teoria da bioenergética, essa estrutura poderia ser considerada como
sendo do tipo que varia entre carga e subcarga.

2.3 Estrutura hiperorgonótica-desorgonótica

O termo hiperorgonótico significa que o indivíduo com essa estrutura


possui uma carga energética excessiva, conforme o prefixo hiper indica, e
maldistribuída, conforme o termo desorgonótica indica.
Ao observar um indivíduo com essa estrutura energética, pode-se
perceber que este costuma ter energia para realizar as tarefas do dia a dia (como
trabalhar, socializar, se movimentar, estudar), porém essa disponibilidade
energética costuma estar acompanhada de agitação e/ou ansiedade. O
sofrimento nesse caso decorre da dificuldade do indivíduo em organizar a
energia e descarregar parte dessa carga energética excessiva.
É possível observar também algumas tendências de comportamento, por
exemplo, dificuldade em definir limites saudáveis para si mesmo (muitas vezes
se sobrecarrega, não consegue dizer “não” e não sabe equilibrar os momentos
de trabalho com o descanso) ou um comportamento muito rígido e metódico
(com autocobrança exagerada) como uma forma de tentar conter e organizar a

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energia. Em geral, o indivíduo com essa estrutura costuma vivenciar muita
tensão e ansiedade.
Quando pensamos em práticas terapêuticas indicadas para indivíduos
com essa estrutura, podemos considerar aquelas que auxiliam na circulação e
na liberação de energia (descarga), na expressividade, na capacidade de soltar
o que está contido, assim como aquelas que estimulam a redução da
autocobrança e auxiliam o indivíduo a relaxar.
Na teoria da bioenergética, essa estrutura poderia ser considerada como
sendo do tipo de sobrecarga.

2.4 Estrutura hiperorgonótica

O indivíduo de estrutura hiperorgonótica tem carga energética bem


distribuída, porém em excesso. Devido a isso, pode-se observar que essa
pessoa costuma ter bastante disposição para as tarefas do dia a dia, e o seu
corpo, os seus movimentos e sua postura têm aparência harmoniosa. Porém, o
sofrimento da pessoa com essa estrutura vem da dificuldade em descarregar a
energia, proveniente do medo de se entregar ao amor, à sexualidade e à
vulnerabilidade.
A respeito do comportamento desse indivíduo, pode-se observar que
costuma ser autoconfiante, realizador, tem facilidade de comunicação, preza
pela sua imagem pessoal e gosta de chamar atenção, e pode muitas vezes usar
a sedução como forma de se relacionar com o outro e com o mundo. Costuma
colocar seu foco na realização pessoal e evita se conectar com as emoções e
situações que possam ativar sua vulnerabilidade.
Com relação às práticas indicadas para indivíduos com essa estrutura,
podemos considerar aquelas que buscam dissolver o medo de entrega,
estimulam o contato com as emoções e a vulnerabilidade, assim como
proporcionam descarga energética.
Segundo Volpi (2008), são indicadas práticas que o estimulem a sair do
papel de ator e a se conectar com o papel de autor da sua vida. Ou seja, que
auxiliem a pessoa a parar de atuar e se esforçar para manter uma imagem, e no
lugar disso, aprendam a se soltar, entregar-se e expressar-se verdadeiramente.
Na teoria da bioenergética, essa estrutura poderia ser considerada como
do tipo de sobrecarga.

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2.5 Estrutura de carga e distribuição energética equilibradas

Além das 4 estruturas apresentadas acima, podemos considerar uma


categoria à parte, que seria aquela dos indivíduos com carga, distribuição e
circulação energética equilibradas. Esse indivíduo seria considerado de “caráter
genital”, conceito que veremos mais à frente.
A seguir, continuaremos nossos estudos aprendendo a respeito das fases
de desenvolvimento emocional, mais um dos conceitos essenciais da psicologia
corporal para a atuação do terapeuta bioenergético.

TEMA 3 – DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL

A teoria do desenvolvimento emocional se refere às etapas de


crescimento, maturação e desenvolvimento que todos os indivíduos passam,
desde o momento da concepção/fecundação até a adolescência. Apesar de
continuarmos nos desenvolvendo após essa fase, a psicologia corporal
considera que são as vivências desse período de vida que dão origem aos traços
(ou estruturas) de caráter. As vivências ocorridas após esse período podem
agravar ou atenuar algum traço adquirido, mas não serão mais responsáveis
pela formação ou extinção deles.
De acordo com Volpi e Volpi (2008), o desenvolvimento emocional é
objeto de estudo de diversas teorias psicológicas, porém o diferencial proposto
pela corporal é a concepção de que as experiências vivenciadas em cada etapa
de desenvolvimento poderão impactar positiva ou negativamente a circulação da
energia no organismo, o que, por sua vez, impactará o corpo e psiquismo do
indivíduo, deixando marcas que formarão mais tarde o seu caráter.
Compreender as etapas do desenvolvimento emocional é essencial para
o terapeuta corporal. Segundo Volpi e Volpi (2008), é com base na compreensão
dessas etapas que se encontra a criança interior do paciente, com os bloqueios
resultantes das dificuldades enfrentadas na infância, o que nos possibilita
trabalhar terapeuticamente o crescimento e a maturação caracterológica do
mesmo.
Quando temos o conhecimento das fases do desenvolvimento e o que
elas representam na formação do caráter do paciente, nos tornamos capacitados
a compreender a origem dos padrões apresentados por este (mentais,

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emocionais, comportamentais, corporais e energéticos) e a definir um projeto
terapêutico adequado para cada caso.
Veremos no capítulo a seguir o detalhamento das etapas de
desenvolvimento consideradas pela psicologia corporal e como as dificuldades
vivenciadas em cada uma delas impactarão a formação do caráter. É importante
destacar que, mesmo que alguns indivíduos vivenciem as mesmas experiências,
não apresentarão exatamente os mesmos comprometimentos, pois isso irá
depender da etapa em que ocorreu o estresse, sua intensidade, sua frequência,
a resistência de cada organismo ao estresse, o funcionamento fisiológico de
cada um, entre outros fatores (Volpi; Volpi, 2008).

TEMA 4 – ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL

A psicologia corporal considera 5 etapas principais de desenvolvimento


emocional do indivíduo. A descrição dessas etapas foi sistematizada por José
Henrique Volpi e Sandra Mara Volpi, do Centro Reichiano, com base em estudos
dos principais autores da abordagem, como Reich, Lowen, Navarro e outros. De
acordo com Volpi e Volpi (2017, p. 119), “Cada etapa é caracterizada por
fenômenos específicos que desde o início trazem consigo, na bagagem genética
da célula, valores biofisiológicos, emocionais-afetivos e intelectivos”.
Considera-se que todos os seres humanos passam pelas mesmas etapas
de desenvolvimento emocional, independentemente de onde vivem, sua cultura
ou sua história. A única variação possível dentro dessa teoria é a respeito das
idades cronológicas correspondentes a cada etapa, pois pode haver uma
diferença no tempo que cada indivíduo leva para atingir a maturidade fisiológica
e emocional características de cada fase (Volpi e Volpi, 2008). É importante
destacar também que a transição de uma etapa para outra não é imediata.
Enquanto o indivíduo está entrando em uma nova etapa, a anterior ainda está
em processo de encerramento, por um tempo ambas caminham em paralelo.
No conteúdo a seguir utilizaremos em vários momentos o termo mãe,
referindo-nos à importância da figura materna no processo do desenvolvimento
emocional, porém, considerando que nem todos os indivíduos são cuidados
diretamente pela mãe biológica (seja por uma situação emocional ou profissional
da mãe ou por uma adoção, por exemplo), ao ler esse termo, você pode
substituí-lo, na maior parte das vezes, por cuidador, o qual, nesse caso, se refere

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à pessoa mais próxima à criança, que é responsável por seus cuidados e pelo
acompanhamento de seu desenvolvimento.
Veremos a seguir o detalhamento de cada etapa de desenvolvimento.

4.1 Etapa de sustentação

A etapa de sustentação ocorre desde a concepção / fecundação até o 10°


dia de vida após o nascimento. Essa etapa se caracteriza, principalmente, por
ser aquela na qual o bebê está no útero da mãe, sendo gestado, e depende da
relação mãe-bebê para ser sustentado, tanto física quanto emocional e
energeticamente.
As emoções vivenciadas nessa fase pela mãe e pelas pessoas mais
próximas serão importantes para a formação do caráter do indivíduo. Quanto
mais tranquila for a experiência da gestação (emocionalmente, fisicamente e
socialmente), melhor será para o bebê. Já se a gestação for conturbada, por
emoções e experiências negativas da mãe ou das pessoas e situações do
entorno, mais comprometimentos isso pode gerar na formação do caráter do
indivíduo que está sendo gestado.
Algumas das emoções negativas mais comuns nessa fase são, por
exemplo, medo, dúvida, angústia e incertezas. Isso pode ocorrer no caso de uma
gravidez desejada ou indesejada, quando pode haver um agravante que seria o
desejo, pensamentos ou tentativas de aborto, que podem gerar no bebê um
registro emocional de medo e rejeição, por exemplo.
Essa fase é bastante determinante na formação da estrutura energética
do indivíduo e o que vai determinar esta estrutura é a qualidade energética dos
pais no momento da concepção, assim como a qualidade energética da mãe,
seu corpo e suas emoções durante toda a fase de gestação.
Os indivíduos com comprometimentos relevantes nessa fase costumam
apresentar estrutura energética hipo-orgonótica desorgonótica (ou subcarga) e
estrutura de caráter esquizoide. Veremos mais detalhes a respeito das estruturas
de caráter nas próximas aulas, mas aqui já podemos começar a visualizar a
relação que existe entre dos conceitos que estão sendo estudados.

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4.2 Etapa de incorporação

A etapa de incorporação ocorre desde o momento do nascimento até o


desmame que, normalmente, ocorre entre 9 e 18 meses de vida. Nessa etapa,
as experiências mais relevantes na formação do caráter do indivíduo são o afeto,
a amamentação e o desmame.
A respeito do afeto, é importante que o bebê tenha momentos de contato
com o corpo da mãe, seja no momento da amamentação ou em momentos de
carinho, e que se sinta também bem-vindo e acolhido. Ter experiências positivas
nesse sentido constroem registros de segurança, proteção, carinho e uma boa
relação com o aspecto do toque físico. Situações de falta de afeto podem gerar
sensações de vazio, falta e carência, que mais tarde se expressarão na vida do
indivíduo.
A respeito da amamentação, o ideal é que esta ocorra no seio desde o
nascimento até a idade aproximada indicada anteriormente (9 a 18 meses).
Porém, sabemos que nem sempre isso é possível e, nesses casos, pode-se
contornar a situação dando de mamar para o bebê na mamadeira, por exemplo,
mas com muito carinho e em um contexto amoroso e receptivo. É importante
também que a quantidade de leite e a quantidade de vezes que o bebê mama
sejam conduzidas conforme a demanda do próprio bebê. Existem muitas linhas
de pensamentos que indicam que a mãe controle ou limite a amamentação, mas
na visão da corporal, o bebê está desenvolvendo sua capacidade de
autorregulação e solicitará os cuidados dos quais precisar, normalmente por
meio do choro, gemidos etc. É claro que os pais devem estar atentos para
excesso ou deficiência na amamentação, o aprendizado a respeito do ritmo da
relação pais-bebê está em formação, mas considerando um contexto saudável,
as demandas do bebê devem ser respeitadas. Uma amamentação insatisfatória
pode gerar no indivíduo padrões como a dependência, distúrbios alimentares,
insatisfação constante, entre outros.
A respeito do desmame, é de igual importância que este ocorra da forma
mais harmoniosa possível. Um desmame precoce ou brusco pode ter impactos
negativos na formação do caráter do indivíduo gerando padrões de
comportamento como raiva, ruminação das emoções, ressentimentos, entre
outros.

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É importante reforçar novamente a importância de respeitar os processos
de autorregulação do bebê nessa fase para que ele desenvolva a confiança em
si mesmo e nas necessidades que seu organismo indica. Na vida adulta isso
resultará em mais independência e capacidade de autossustentação. Os pais
devem buscar um equilíbrio saudável entre atender às demandas do bebê e dar
limites. Os limites devem ser aplicados com cautela e amorosidade, mas também
são importantes, pois auxiliam na construção do senso de realidade do bebê, ou
seja, no aprendizado de que ao fazer parte do mundo e da sociedade haverá
frustrações e nem sempre todas suas necessidades serão atendidas.
Os indivíduos com comprometimentos relevantes nessa fase costumam
apresentar estrutura energética desorgonótica (ou variável entre carga e
subcarga) e estrutura de caráter oral.

4.3 Etapa de produção

A etapa de produção ocorre desde o momento do desmame (entre 9 e 18


meses) até o final do terceiro ano de vida, podendo variar um pouco de um
indivíduo para outro. Essa etapa está relacionada à conquista da autonomia por
parte da criança e do controle dos esfíncteres.
Nesta fase é bem importante considerar a forma como os cuidadores irão
conduzir essa conquista de independência da criança e também o processo de
desfralde.
Em relação ao desfralde, é importante que não seja exigido da criança
extrema limpeza e controle das necessidades fisiológicas básicas antes do
tempo, além também de não expor a criança a punições caso não consiga conter
os excrementos, por exemplo. Cada criança tem um tempo para desenvolver o
controle dos esfíncteres, e apressar esse processo pode gerar tensão
emocional, além de estimular contrações musculares antes que essa capacidade
muscular tenha alcançado seu pleno desenvolvimento. Exigências excessivas a
esse respeito podem, posteriormente, dar origem a comportamentos muito
rígidos, de autoexigência, perfeccionismo, assim como rigidez corporal.
A respeito da conquista da autonomia e independência da criança, é
necessário um equilíbrio entre liberdade – para se expressar espontaneamente
e desenvolver seus gostos, opiniões e tomadas de decisão – e limites. A
repressão extrema da autoexpressão da criança pode gerar sensações de
submissão e frustração, assim como padrões de autopunição. Porém, a falta de
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limites também não é benéfica, pois a criança não tem capacidade de se
autogerir completamente nessa fase, sendo o adulto responsável por dar essa
base e oferecer um “contorno” para a criança.
Os indivíduos com comprometimentos relevantes nessa fase costumam
ter estrutura energética hiperorgonótica desorgonótica (de sobrecarga) e
estrutura de caráter masoquista ou psicopático, porém com ressalvas para este
segundo que, de acordo com Lowen (2017), recebe influências também de
fixações das fases de incorporação e de identificação.

4.4 Etapa de identificação

A etapa de identificação inicia a partir dos 4 anos e vai até os 5 ou 6 anos,


aproximadamente. Esta etapa está relacionada à descoberta dos genitais, à
percepção das diferenças entre o corpo do menino e da menina, e a identificação
com o gênero ao qual o indivíduo pertence. Ocorre nessa fase também uma
maior independência da criança, que busca ficar longe dos pais em alguns
momentos, gosta de brincar sozinha e começa a se relacionar mais com o meio
social onde está inserida.
As situações que podem gerar comprometimentos nessa fase estão
relacionadas às repressões ou punições a respeito do desenvolvimento sexual
da criança e também na sua busca por independência e socialização.
A respeito da sexualidade, é importante que a descoberta dos genitais e
da energia sexual por parte da criança seja respeitada. Não há malícia ou
erotismo nesta fase, mas a criança começa a perceber que a região dos genitais
gera prazer, e pode, inclusive, buscar movimentos de masturbação para
estimular a região. Segundo Volpi e Volpi (2008), esse comportamento deve ser
encarado com naturalidade e não deve ser punido. O que os pais ou cuidadores
podem fazer é direcionar a criança a respeito de não ser adequado fazer isso
em locais públicos, entre outros cuidados, no sentido de proteger a própria
criança. Comprometimentos nesse sentido podem gerar nos indivíduos a
necessidade extrema de autoafirmação e/ou de controle, formas que encontra
para redirecionar a energia sexual que foi reprimida.
A respeito da independência e socialização, é importante que os pais
respeitem essa busca da criança, deixando que ela desenvolva seu senso de
autonomia e amplie seu campo social. Muitas vezes os pais sofrem com a quebra
da simbiose entre eles e a criança, mas devem compreender a importância
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dessa quebra. Devem apoiar a criança nesse movimento, estando presentes
para conduzi-la de forma segura nesse processo. Forçar a continuidade da
simbiose pode gerar indivíduos com dificuldade de exercer sua autonomia e
independência, mantendo-os presos aos pais e sem capacidade de gerar seus
próprios vínculos amorosos, sexuais, profissionais, entre outros.
Os indivíduos com comprometimentos relevantes nessa fase costumam
ter estrutura energética hiperorgonótica (de sobrecarga) e estrutura de caráter
rígida.

4.5 Formação do caráter

A etapa de formação do caráter ocorre dos 5 anos até a puberdade e


podemos considerar esta é uma extensão da etapa de identificação, pois está
relacionada ainda ao processo do desenvolvimento da sexualidade e da
independência. Porém agora o reconhecimento da individualidade e o
desenvolvimento da sexualidade se concretizam ainda mais.
Tendo identificado seu órgão genital e seu gênero, a criança passa a se
identificar com o genitor do mesmo sexo. O menino vai se espelhar no pai e a
menina na mãe. Começarão a construir os comportamentos que consideram
adequados e inerentes àquele gênero com o qual se identificam.
A masturbação poderá ficar mais evidente nesta fase, devendo ser
conduzida da mesma forma abordada anteriormente.
A socialização e a individualidade ganham mais destaque nessa fase
também, a criança começa a receber mais influências externas, da escola, dos
amiguinhos, do meio e da sociedade onde vive.
Ao final dessa fase, a estrutura de caráter básica do indivíduo, que o
acompanhará em sua vida adulta, se forma. Dependendo dos
comprometimentos ocorridos em cada fase, este poderá ser um indivíduo mais
ou menos saudável. Reich definia os indivíduos totalmente autorregulados como
de “caráter genital” e aqueles com bloqueios e fixações decorrentes das fases
de desenvolvimento de “neuróticos”. Veremos esses conceitos nas próximas
aulas, quando estudarmos cada uma das estruturas de caráter.

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TEMA 5 – MECANISMOS DE DEFESA

Para finalizar a parte teórica desta aula, estudaremos a respeito dos


mecanismos de defesa. Este é um conceito bastante importante nas abordagens
corporais e utilizaremos como base para nosso estudo a visão de Alexander
Lowen sobre o tema.
Segundo Lowen (2017), o coração é o órgão mais sensível do nosso
corpo, que reage emitindo ondas de ansiedade a qualquer alteração em sua
atividade normal, portanto as defesas se constroem, desde o início de nossas
vidas, com o objetivo de proteger nosso coração de todo e qualquer perigo que
possa ocorrer. O autor destaca que, com o tempo, essas defesas formam
barreiras contra qualquer risco de o coração ser tocado.
Veremos a seguir uma figura que demonstra as camadas de defesa que
se formam entorno do coração.

Figura 2 – Camadas de defesa

De acordo com Lowen (2017), a primeira camada, do ego, é a mais


aparente na personalidade e se refere às defesas psíquicas. Os padrões típicos
de defesa dessa camada são: negar, desconfiar, culpar, projetar e/ou
racionalizar e intelectualizar. O autor destaca que algumas abordagens

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terapêuticas se concentram nessa primeira camada e utilizam para isso o
trabalho verbal, porém, pela ótica da corporal, apesar de esta prática levar o
paciente à conscientização das suas defesas egoicas, não liberará as tensões
musculares ou os sentimentos reprimidos e, com isso, alguma outra defesa do
ego continuará atuando. Considerando uma situação ideal, na qual o ego
atuasse a favor do indivíduo e não contra ele, os padrões negativos
apresentados acima dariam lugar para padrões positivos e funcionais do ego,
como autopercepção, autodomínio e assertividade.
A segunda camada, de defesa muscular, se refere às tensões
musculares, ou couraças musculares, que apoiam e justificam as defesas do ego
ao mesmo tempo em que impedem que os sentimentos reprimidos apareçam
(Lowen, 2017). É o trabalho terapêutico nessa camada que possibilita o mais
profundo crescimento do indivíduo, pois ela é o elo de ligação entre a primeira e
a terceira camada. É com base nas emoções e nos pensamentos advindos da
prática corporal que poderemos explorar como cada defesa atua e qual sua
origem (quais sentimentos desperta e por que havia sido preciso reprimi-los).
Considerando essa camada em um estado de saúde, as tensões musculares,
antes limitantes, dariam lugar para uma ação corporal e muscular eficaz,
harmônica e graciosa (Lowen, 2017).
Ainda de acordo com o autor, a terceira camada, emocional, se refere às
emoções reprimidas, como raiva, medo, tristeza e dor. Um dos principais
objetivos das terapias corporais ou não verbais é liberar esses sentimentos
reprimidos. Para que a expressão desses sentimentos ocorra de forma saudável
e não destrutiva e para que possa ser integrada ao ego do indivíduo, o ideal é
que ocorra em um contexto terapêutico, no qual poderá ser trabalhada após sua
liberação. Descarregar tais sentimentos disponibiliza a energia necessária para
o processo de mudança. O autor destaca, mais uma vez, a importância de
trabalhar as 3 camadas para se obter um resultado permanente – os efeitos
catárticos provenientes da liberação dos sentimentos deixarão a primeira e
segunda camada inoperantes por um tempo, mas sem o trabalho com as demais
camadas logo elas restabelecerão suas defesas. Considerando essa camada
em um estado de saúde, as emoções negativas como medo, dor, tristeza e raiva
coexistiram com as emoções positivas como prazer, alegria e contentamento, a
diferença seria que a expressão dessas emoções não estaria bloqueada e

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ocorreria conforme as situações vivenciadas as ativassem genuinamente.
(Lowen, 2017).
A quarta camada, do coração, se refere aos sentimentos de amar e ser
amado. Enquanto as outras camadas atuam de forma defensiva em torno do
coração, essas capacidades ficam parcialmente bloqueadas, rígidas,
congeladas. Considerando uma situação ideal, na qual as três primeiras
camadas deixassem de executar uma função defensiva e passassem a ter uma
ação funcional, todos os impulsos do indivíduo fluiriam do coração, suas reações
emocionais seriam genuínas e não reprimidas, seus movimentos fluidos e
graciosos, suas decisões corretas e harmônicas (Lowen, 2017).
Podemos concluir então, que o objetivo da terapia bioenergética, é
trabalhar nas três primeiras camadas de defesa, de forma a flexibilizá-las, para
que o coração possa vibrar e comandar os impulsos do indivíduo,
proporcionando para este mais saúde e felicidade. Apesar de não ser possível
alcançarmos completamente o cenário ideal apresentado, Lowen (2017) defende
que o coração deve sentir felicidade ao ganhar mais liberdade, mesmo que esta
não seja total.

NA PRÁTICA

Veremos a seguir como utilizar na prática os conteúdos estudados nesta


aula.
Conforme vimos, na visão da psicologia corporal, o indivíduo é uma
unidade energética que contém e rege outros dois aspectos, corpo e mente.
Sempre que formos trabalhar com a bioenergética, precisamos ter isso em
mente: precisamos enxergar o nosso paciente como essa unidade energia-
corpo-mente. Ao avaliar um distúrbio em qualquer um desses aspectos,
precisamos considerar que os demais aspectos também estão impactando e/ou
sendo impactados pelo distúrbio identificado.
Ao atender um paciente com algum desequilíbrio físico, por exemplo, é
necessário ter o olhar voltado também para seu emocional e sua energia. Assim
como, ao atender um paciente com algum desequilíbrio emocional, o olhar deve
estar voltado também para o corpo e a energia. E assim segue.
Conhecer os tipos de carga energética e os possíveis comportamentos
atrelados a elas nos ajudam a ter um olhar mais abrangente a respeito do estado
de saúde do paciente. Ao atender alguém, além de considerar o que a pessoa
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fala ou o problema que ela apresenta, o terapeuta deve observar qual é o seu
comportamento em geral e a qualidade energética da pessoa, ou seja, deve
observar quanta energia ela tem disponível e como está a circulação dessa
energia. Essa informação, junto aos demais conceitos que estudaremos, ajudará
o terapeuta a compreender as estruturas de caráter do indivíduo, suas couraças
musculares e o projeto terapêutico adequado para ele.
O conhecimento a respeito das fases de desenvolvimento é igualmente
importante. Ao atender um paciente, é interessante que o terapeuta possa
conhecer um pouco mais sobre a história deste, dentro do possível. As marcas
deixadas em cada fase do desenvolvimento serão determinantes na formação
da estrutura energética, estrutura de caráter e couraças musculares do indivíduo.
Ao conhecer essas informações, o terapeuta tem dicas de qual é o perfil do
paciente e qual é o caminho terapêutico mais adequado.
É muito importante reforçar aqui que, ao identificar traumas na história do
paciente, o terapeuta não deve encarar os responsáveis por esses traumas como
culpados, muito menos apontá-los como culpados para o paciente. Isso é muito
importante! O terapeuta deve, inclusive, ser muito cuidadoso para conduzir esse
tema com o paciente, para que não pareça que está buscando culpados. Caso
o paciente pergunte o porquê de perguntas sobre o tema ou ele próprio comece
a culpar as pessoas, o terapeuta pode explicar, por exemplo, que os
acontecimentos ocorridos durante as fases do desenvolvimento são importantes
e podem deixar marcas sim, porém nossos cuidadores não são perfeitos e isso
é comum na vida de todos nós. Pode complementar dizendo também que são
informações importantes para que ele conheça mais sobre a vida do paciente e
possa auxiliá-lo ainda melhor. Estimular o paciente a apontar culpados por seus
problemas não ajudará no seu autodesenvolvimento e na sua recuperação,
podendo até mesmo prejudicá-la, gerando mais mágoas, ressentimentos e
emoções negativas.
A respeito dos mecanismos de defesa, pudemos compreender sua função
e a forma pela qual se apresentam – divididos em 4 camadas. Para nossa
atuação prática como terapeutas, precisamos ter em mente a importância de
trabalhar, sempre que possível, com todas as camadas de defesa, para que
possa ocorrer uma transformação genuína e permanente na vida do paciente.
Lowen (2017) destaca que o trabalho corporal é a base da terapia bioenergética,
pois é por meio dele que teremos informações profundas e genuínas a respeito

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dos sentimentos reprimidos e as razões pelas quais estes foram reprimidos (que
é uma ação do ego).
Nas próximas aulas nos aprofundaremos nos conceitos a respeito das
couraças musculares, segmentos de couraça e práticas corporais, que darão
base para a realização deste trabalho.
É importante destacar que, dependendo da situação de trabalho,
podemos ou não conseguir trabalhar com todas essas camadas. Em um contexto
de atendimento individual e dedicado, a probabilidade de conseguirmos realizar
esse trabalho completo é maior. Já em um contexto de trabalho em grupo,
costumamos ficar mais limitados, pois não temos a oportunidade de nos
aprofundar na situação de vida de cada indivíduo. De toda forma, em ambos os
contextos a bioenergética pode ser aplicada e trará benefícios, é importante
apenas saber dessa diferença de cenário e avaliar como conduzir o trabalho em
cada caso.
No caso dos grupos, é importante ter mais cautela com as práticas a
serem aplicadas e temas a serem trabalhados. Como você não terá a
possibilidade de dar assistência para cada um dos participantes individualmente
caso estes acessem dores profundas, o indicado é trabalhar com práticas e
temas mais suaves, reflexivos, de relaxamento, entre outros. Você pode focar
em práticas que trabalhem, por exemplo, a vitalidade, a respiração, a circulação
de energia, a liberação de tensões, a percepção do corpo e das sensações, entre
outros.

FINALIZANDO

Iniciamos esta aula estudando a respeito do conceito de carga energética.


Aprendemos que o indivíduo é uma unidade energética, que rege e contém em
si outros dois aspectos, corpo e mente. Na psicologia corporal, teremos sempre
a visão do indivíduo como essa unidade energia-corpo-mente.
Estudamos também as possíveis cargas energéticas e como elas
impactam no comportamento do indivíduo. Ao final de cada estrutura, vimos
quais práticas são mais indicadas para cada estrutura.
Em seguida, estudamos as fases do desenvolvimento emocional,
compreendendo a idade cronológica e as experiências mais relevantes de cada
fase. Vimos também exemplos de experiências positivas e negativas que podem
ocorrer em cada fase e quais marcas negativas estas podem gerar. Este
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conhecimento é muito importante para o terapeuta corporal, pois dará base para
compreender os desequilíbrios do paciente (energéticos, corporais e
emocionais).
Encerramos a teoria estudando a respeito dos mecanismos de defesa.
Com o objetivo de proteger o coração de qualquer alteração que possa gerar
ansiedade, se formam entorno deste três camadas defensivas, do ego, muscular
e emocional. Vimos que um dos objetivos da terapia bioenergética é trabalhar na
flexibilização destas três camadas para que essas funções (ego, músculo/corpo
e emoções) atuem de forma equilibrada e a favor do indivíduo.
Por fim, foram apresentadas as aplicações práticas do conhecimento
adquirido na aula de hoje, ou seja, como utilizar esses conhecimentos no
momento de um atendimento.

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REFERÊNCIAS

LOWEN, A. Bioenergética. São Paulo: Summus, 2017.

NAVARRO, F. Somatopsicopatologia. São Paulo: Summus, 1996.

VOLPI, J. H. Caracterologia pós-reichiana. Curitiba: Centro Reichiano, 2008.

VOLPI, J. H.; VOLPI, S. M. Crescer é uma aventura! Desenvolvimento


emocional segundo a Psicologia Corporal. Curitiba: Centro Reichiano, 2008.

_____. Etapas do desenvolvimento emocional – Apostila do curso de


Especialização em Psicologia Corporal. Curitiba: Centro Reichiano, 2017.

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