Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
autor
FRANCISCO CARLOS MALTA
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2019
Conselho editorial roberto paes e gisele lima
Revisão de conteúdo sidney nicolau venturi filho, regina lúcia napolitano felício
félix batista e guilherme dutra g. jaime
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2019.
isbn: 978-85-5548-687-6.
A criação de um personagem 13
Ficha do personagem 19
A figura do herói 23
Criando a história 24
Storyline 31
Desenvolvendo o argumento 38
Apresentação da trama 41
Desenvolvimento do jogo 42
Escaleta 43
Sequência e cena 58
Esboço do jogo 67
GDD-dez páginas 67
Seguindo as dicas 69
Os tipos de roteiros 71
A adaptação em si 76
Os produtos licenciados 78
Apropriações ou transformações? 79
Mundos transmídia 95
Gráfico de ritmos 96
Prefácio
Prezados(as) alunos(as),
Bons estudos!
5
1
Da criação aos
personagens
Da criação aos personagens
O ato de contar uma história é uma das mais velhas formas de comunicação
humana. Faz parte do indivíduo a predisposição para ouvir ou contar histórias.
O tecer narrativo em si ocorre no encadear das ideias e nos elementos que vão se
construindo com os personagens até chegar ao seu desfecho. Ao longo dos séculos,
as formas de se contar histórias foram se sofisticando, se antes tínhamos as foguei-
ras, hoje temos as redes sociais e lá também são contadas histórias.
Mudam-se as ferramentas, mas prevalecem as formas. Do entorno das foguei-
ras aos jogos de games, são muitas tramas diferentes em seu processo criativo. Por
ora, alguns personagens nos conduzem a mundos fantásticos, por outra, perso-
nagens nos permitem salvar o planeta, viver um romance perigoso, conhecer o
mundo, ser dono de grandes empresas e viver tudo aquilo que não podemos viver
no mundo real, mas que no processo de imersão de uma história será possível, pois
o que nos interessa no fundo de toda trama é como contar.
Qual a melhor forma de se comunicar com o público? Lembre-se, história é his-
tória e você pode encontrá-la em uma música, em um noticiário de TV, no capítulo
do seriado ou da telenovela, em uma notícia de jornal, ou talvez em um comercial
de Publicidade. Quem sabe em um poema? Outra coisa: não tente reinventar a roda.
Uma boa história é clássica, com começo, meio e fim. O máximo que você pode
fazer para subverter a técnica é conhecendo a técnica e seus tipos de narrativas. Mas
isso é um assunto para outro capítulo. Pelo momento, o nosso foco é este: como
contar uma história? Eis aí algo que um roteirista precisa ter: foco.
Ao pensar a escrita de um roteiro original, o principal objetivo é transfor-
mar palavras em imagens. Todo escrito será construído visando a um público de
cinema, sendo essa a primeira etapa para a realização de um filme. O roteiro é
o elemento-chave para a produção e criação artística, portanto, toda construção
cinematográfica que se pretende abordar, no que tange à história, surge pelo mes-
mo processo.
Diferente da criação de um romance, o roteiro cinematográfico não é consi-
derado texto literário, embora narre uma história, apresente personagens e diálo-
gos. São diversos os elementos implicadores dessa discussão. Em comum com o
romance, o roteiro narra a história, descreve lugares e ambientes, mas difere da
criação de um livro, pois não se preocupa com a expressão de uma língua nem
com figuras de linguagens, recursos esses destinados à literatura. Por outro lado,
seu processo de escrita apresenta os efeitos visuais, indica trilha sonora, cortes e
posição de câmera; elementos estes exclusivos do audiovisual.
capítulo 1 •8
OBJETIVOS
• Compreender o conceito de narrativa audiovisual;
• Identificar os elementos que compõem a narrativa audiovisual;
• Reconhecer as etapas do processo criativo do roteiro;
• Ordenar os fatos cronologicamente, segundo a sua ocorrência na linha narrativa;
• Diferenciar os diferentes roteiros para cinema, TV ou games;
• Aprender o processo de construção dos personagens.
Conceito de roteiro
capítulo 1 •9
Antes de tudo, precisamos entender: o que é um roteiro? Syd Field, respeitado
roteirista americano, apresenta sua definição:
O que é um roteiro? Um guia, um projeto para um filme? Uma planta baixa ou diagra-
ma? Uma série de imagens, cenas e sequências enfeixadas com diálogo e descrições,
como uma penca de peras? O cenário de um sonho? Uma coleção de ideias? O que
é um roteiro? Bem, não é um romance e certamente não é uma peça de teatro. Se
você olha um romance e tenta definir sua natureza essencial, nota que a ação dra-
mática, o enredo, geralmente acontece na mente do personagem principal. Privamos,
entre outras coisas, de pensamentos, sentimentos, palavras, ações, memórias, sonhos,
esperanças, ambições e opiniões do personagem. Se outros personagens entram na
história, o enredo incorpora também seu ponto de vista, mas a ação sempre retorna
ao personagem principal. Em um romance, a ação acontece na mente do personagem,
dentro do universo mental da ação dramática. Em uma peça de teatro, a ação, ou en-
redo, ocorre no palco, sob o arco do proscênio, e a plateia torna-se a quarta parede,
espreitando as vidas dos personagens. Eles falam sobre suas esperanças e seus so-
nhos, passado e planos futuros, discutem suas necessidades e seus desejos, medos
e conflitos. Neste caso, a ação da peça ocorre na linguagem da ação dramática; que é
falada, em palavras. (FIELD, 1982, p.11)
capítulo 1 • 10
contada em imagens, com diálogos e descrições, localizada dentro do contexto da
estrutura dramática. Estrutura é o fundamento de todo roteiro – é a espinha, o
esqueleto que ‘mantém’ tudo coeso.” (FIELD, 1982, p. 17)
No momento em que um escritor define sua história, seja para o cinema,
televisão ou literatura, o cuidado com o desenrolar da narrativa é o mesmo. A
preocupação com a linguagem, com a estrutura da trama e o perfil dos persona-
gens é a mesma. São dois tipos de pensamentos que atendem a uma mudança de
formato, exigências essas de cada ofício. O fato é que, se consideramos o roteiro
cinematográfico como literatura ou autoral, especificamente no caso de um filme,
vai se abrir outro debate: quem é o autor do filme? O roteiro é uma ferramenta de
suma importância, mas até o corte final, muitos outros elementos contribuíram
para contar essa história. Isso já o difere do romance, em que toda construção e
responsabilidade recai no escritor da obra. Kaufman aponta que o termo autor
“surgiu exatamente para chamar atenção do público para o fato de que um filme é
feito da orquestração de diversos elementos visuais e sonoros, e não da fidelidade a
um texto – essa sim autoritária e limitativa.” (KAUFMAN, 2008, p. 27)
Vamos exemplificar algumas situações, para um avanço na discussão. Segundo
as regras dos roteiristas, um bom roteiro é aquele em que o roteirista interfere o
mínimo possível no trabalho do diretor, ou seja, o roteirista precisa se concentrar
na história, na trama e suas subtramas e não em querer determinar situações téc-
nicas, como onde a câmera deve ser usada ou qual o plano a ser filmado. Em um
roteiro, cada sequência aparece enumerada e com sua descrição de efeitos, indica-
ção de lugar, cenários, trilha e uma formatação muito peculiar, hoje cada vez mais
sofisticada com as novas tecnologias no que tange à formatação deste texto. Abaixo
um cabeçalho do roteiro de Earth e Beyond , um NPC. A narrativa explora os
perigos e benefícios de um novo planeta diferentes da terra.
capítulo 1 • 11
Loric
Deixa para lá. Por que imitar os antigos e seus s celestiais se você pode ficar
na Estação Terra, tomar uma Coca e entediar-se mortalmente? Por que sonhar se
você pode se desligar? Você sabe? Você acha que de Winter está fazendo alguma
coisa com o ar daqui?
Jogador
Não sei.
Loric
Respire fundo. Vá em frente. Parece que há alguma coisa nele. É como se ela
estivesse desesperada para que nos achássemos maravilhoso. Ela é dona do ar, você
sabe. (NOVAK, 2011, p.178)
Diferenças de roteiro
capítulo 1 • 12
A prática documental é bem diferente da ficção, visto que estamos trabalhan-
do com personagem real. A maioria dos documentários trabalha com práticas
que estão associadas à ficção, como roteirização, encenação, reconstituição, ensaio,
interpretação, marcação de luz. Bill Nichols afirma que a “tradição do documentá-
rio está profundamente enraizada na capacidade de transmitir uma impressão de
autenticidade.” (NICHOLS, 2016, p. 19). Documentários contam histórias sobre
o que acontece no mundo real. Nesse campo de investigação, a linha principal
começa pela pesquisa sobre o tema e os personagens, somente a partir disso que
será elaborado um roteiro.
A criação de um personagem
Para se contar uma narrativa é preciso ter um narrador, elemento este que vai
ser apresentado por um personagem, o qual irá conduzir a trama, o enredo prin-
cipal e as tramas secundárias. São os personagens que vivem fatos ocorridos em
determinado tempo e espaço, contados por alguém: o narrador. Este personagem
é alguém com o qual o leitor/telespectador precisa se identificar, portanto necessi-
ta de uma empatia que desperte amor ou raiva, e até mesmo uma dubiedade para
deixá-lo mais humano. Nessa força centralizadora, reside o protagonista, aquele
que vai dar rumo à história e seu antagonista, quem fará força oposta. Segundo
David Howard “mesmo nas histórias com muitos personagens, e com estrutu-
ra diferente, cada subenredo dentro da história principal tem seu protagonista.”
(HOWARD e MABLEY, 1996, p. 58). Lembrando ainda que o conflito do pro-
tagonista pode ser interno (psicológico) ou externo.
Para Mckee, a chave da verdadeira personagem é o desejo. Em suas palavras,
“o verdadeiro personagem só pode ser expresso por meio de uma escolha em um
dilema. Como a pessoa escolhe agir sob pressão é quem ela é – quanto maior a
pressão, mais verdadeira e profunda a escolha do personagem.” (MCKEE, 2006,
p. 351). O conflito vivenciado pelo personagem pode ser de cunho social, religio-
so, econômico e psicológico. Eis o ponto de partida.
Protagonista vem do grego prôtos (“primeiro”) e agonistés (“combatente”), essa
é a definição apresentada por Flávio de Campos, que ainda esclarece sobre a esco-
lha do personagem principal. Para Campos a seleção de personagem principal da
narrativa “segue a mesma demanda da seleção do principal ponto de vista do seu
narrador, estabelecer uma referência a partir da qual a narrativa será composta e,
mais tarde, recebida pelo espectador – e assim, dar unidade e facilitar composição
e recepção.” (CAMPOS, 2007, p. 108)
capítulo 1 • 13
A escolha do protagonista pelo senso comum pede um antagonista. Campos
(2007) afirma que o que define o antagonista não é o seu perfil e sim sua função
de antagonizar, e esclarece que por sua definição relativa, o antagonista “existe
apenas em relação ao personagem que ele antagoniza –, um antagonista tanto
pode ser personagem redondo, quanto um tipo ou um arquétipo. (CAMPOS,
2007, p. 151)
O autor reforça também que um personagem pode antagonizar outro na his-
tória toda, em um incidente, em uma cena, em um segmento de cena ou apenas
em uma fala, em um gesto.
Aristóteles, em sua obra Poética, no capítulo cinco, destaca que assim como
na composição da narrativa, “a composição dos personagens também deve seguir
o necessário ou o provável, de modo que, como as ações se desdobram segundo a
necessidade ou a probabilidade”. (ARISTÓTELES, 1984, p. 56). Nesta linha de
construção, um personagem de determinado caráter fala e age segundo a necessi-
dade ou a probabilidade.
Muito se discute hoje sobre o novo jeito de escrever um personagem.
Personagens de seriados, como: Família Soprano, Revenge e BreakingBad, La casa
de papel chamaram a atenção por trazerem para a narrativa um protagonista criado
com atitudes politicamente incorretas e isso de fato humanizou o personagem e
fez o público se identificar. Mesmo as telenovelas brasileiras que fazem sucesso no
Brasil e no exterior se adequaram a este caminho, procurando apresentar persona-
gens críveis. Podemos destacar José Alfredo de Medeiros, protagonista da novela
Império, de Aguinaldo Silva, e interpretado por Alexandre Nero. A novela ganhou
o Emmy Internacional em 2015. Como não se lembrar de Carminha, interpre-
tada por Adriana Esteves em Avenida Brasil? (2012). E os personagens de Game
of Thrones? Todos em busca do trono de ferro e por este motivo provocam erros
absolutamente humanos.
Não podemos esquecer que se a televisão procurou trazer personagens mais na
linha do politicamente correto, já a literatura e o cinema apresentavam personagens
mais complexos há muito tempo. Podemos destacar O poderoso chefão, de Francis
Ford Coppola (1972), e o romance Ligações Perigosas, de Choderlos de Laclos
(1782), que na ocasião foi considerada pelos críticos como uma obra diabólica.
O personagem criado deve ter uma ficha como um indivíduo, afinal, você
acredita nele como ser da sua história e para tanto o mesmo deve ter todas as ca-
racterísticas completas que são pautadas pelas características físicas e psicológicas.
capítulo 1 • 14
Mais do que isso, ao construir um personagem você deve elencar todos os ele-
mentos possíveis, desde a data do seu nascimento a um segredo do passado. Para
Comparato, “Personagem vem a ser algo como personalidade e se aplica às pes-
soas com um caráter definido que aparece na narração.” (COMPARATO, 2009,
p. 26). Para o autor, a linha de construção de um personagem deve ter as mesmas
necessidades de um ser, e completa: “temos as mesmas necessidades, os mesmos
quereres, os mesmos medos e inseguranças; queremos ser amados, ter pessoas
como nós, ter sucesso, sermos felizes e saudáveis. Somos o mesmo, sob a pele.”
(COMPARATO, 2009, p. 27)
O roteirista americano Syd Field nos ensina a construção das personagens pela
teoria dos três P’s: privado, profissional e pessoal. Vale acrescentar o quarto P: o
passado. Em especial pelas narrativas de seriado ou games, o passado sempre pode
nos trazer algum desdobramento na narrativa.
capítulo 1 • 15
quem? Mudou de identidade? O que ele esconde ou de quem se esconde? Que
tipo de segredo não pode ser revelado? São muitas as nuances que podemos explo-
rar com o passado de um personagem.
A criação de um personagem é um dos pontos mais importantes dentro de
uma história, afinal, nós acompanhamos as histórias pelos personagens e, portan-
to, é importante que ele tenha traços de humanidade. Eu leitor, ou telespectador
preciso acreditar neste personagem para seguir a trama. A escolha do protagonista
é crucial para a estrutura narrativa, um protagonista mal escrito gera o afasta-
mento do público e consequentemente não será sucesso. Mesmo em um game,
a delineação do personagem protagonista é de suma importância, pois o jogador
precisa ser motivado a entrar no jogo e vivenciar aquela trama.
Um bom exemplo é de The Last Of Us. No game, acompanhamos a saga de
Joel e Ellie em um mundo pós-apocalíptico e completamente devastado. O se-
gredo da narrativa é o fio de esperança dizendo que há espaço para humanidade.
O processo de criação de um personagem é a escrita e a prática e, claro, a sua
observação cotidiana. Repare as pessoas nas ruas, em casa, na universidade, ônibus
ou no metrô. Todos são seres completamente diferentes e protagonistas de suas vi-
das. Cada um ali carrega consigo uma história, uma dor, um objetivo e um sonho.
Qual será o segredo desta pessoa? E o jeito que ela fala e por que se comunica assim?
O cabelo foge ao usual? A maquiagem é pesada? Qual a mensagem por trás disso?
Personagem é pergunta e resposta, e ao longo da sua construção, irão sempre
surgir perguntas, respostas e dúvidas, principalmente, as dúvidas. E em determi-
nado momento, o seu personagem vai dizer, “eu jamais faria isso” ou “essa atitude
não combina comigo”. Conviva muito tempo com os personagens e saberá o que
estou dizendo. Personagem manda recado nos sonhos e às vezes o chama na rua.
Uma boa dica para começar essa construção é fazer uma ficha cadastral bem bási-
ca, mas com intuito de atender essa sua primeira demanda, que é conhecer a sua
criação. Revele seu personagem.
Vamos explorar as diferenças de roteiro.
A construção da narrativa de um capítulo de ficção seriada exige uma lin-
guagem simples, sem nenhum rebuscamento. Isso não quer dizer que o público
precisa ser negligenciado. A telenovela é um folhetim eletrônico e visa se comu-
nicar com o máximo de público possível. Em uma vertente semelhante, não que
a literatura não pretenda isso, mas a linguagem em si e o estilo de cada escritor já
capítulo 1 • 16
define o seu público. Pensando sobre a autoria cinematográfica, o diretor e rotei-
rista Charlie Kaufman analisa o termo “autor”. Segundo Kaufman o termo “tem
também um sentido simbólico, pois ele indica a presença de um ser pensante que
se expressa por meio do filme, o que, por sua vez, atribui ao trabalho um valor
artístico.” (KAUFMAN apud SAYAD, 2008, p. 28). O processo criativo sempre
apresenta especulações, mas o que define o estilo narrativo é o que a imagem re-
vela, seja no enquadramento, nos movimentos de câmera ou na montagem final.
Diferente da criação de um romance, o roteiro cinematográfico não é consi-
derado texto literário, embora narre uma história, apresente personagens e diálo-
gos. São diversos os elementos implicadores dessa discussão. Em comum com o
romance, o roteiro narra a história, descreve lugares e ambientes, mas difere da
criação de um livro, pois não se preocupa com a expressão de uma língua nem
com figuras de linguagens, recursos esses destinados à literatura.
Por outro lado, seu processo de escrita apresenta os efeitos visuais, indica trilha
sonora, cortes, posição de câmera, elementos estes exclusivos do audiovisual.
O parâmetro de discussão da construção do roteiro cinematográfico ser litera-
tura ou não deixa transparecer sempre algum grau de subserviência aos cânones.
É importante observar que o registro escrito, seja para o roteiro ou romance e
depois o filme ou game, resume-se ao fato de que ambos são narrativas. O escopo
semântico atende a necessidade de contar uma trama, sugerindo e descrevendo
cena a cena. O filme em si é a ampliação do registro dessa leitura e escrita. Na linha
de apresentação, o roteiro é construído para um leitor especializado, visto que é
um preparatório antes das filmagens e nesse texto são possíveis muitas versões até
chegar a um resultado satisfatório.
A tentativa de associar roteiro cinematográfico à literatura é uma vontade de
afirmar o potencial do texto, esquecendo que essa proposta é outra linguagem.
Hoje, o trabalho de um roteirista ganhou mais visibilidade, disputando espaço
que era sempre dedicado aos diretores da indústria cinematográfica. Brett Martin
fala da figura do chamado: showrunner, “termo utilizado nos Estados Unidos para
designar a pessoa responsável pela série de televisão, que assume um controle cada
vez maior na criação e execução do produto.” (MARTIN, 2014, p. 25). No Brasil,
são os nossos respeitados novelistas, que a TV Globo enobrece como uma grife
para cada horário. No universo de criação de game, é comum também o trabalho
do roteirista ser direcionado por um showrunner.
capítulo 1 • 17
É importante ressaltar que algumas correntes teóricas querem mostrar o rotei-
ro cinematográfico como literatura fragmentada, não reconhecendo sua diferença
de estilo. Há claramente uma confusão com a literatura moderna, o que não vem
ao caso nesse contexto. Se, por um lado, no início do século, o roteiro buscava
uma apresentação, como cinema de autor por uma via literária, por outro lado,
esse diálogo não condiz hoje com a indústria do cinema, que se ampliou e tem a
seu favor a tecnologia.
Barthes teceu considerações importantes em A morte do autor (1968). Para o
filósofo, cada leitor atribuía à obra um significado diverso, que pode ser determi-
nado pelo contexto histórico, político ou social em que o leitor se encontra. Em
outras palavras, quem define o significado da obra é o leitor, e é, portanto, variável.
O que o audiovisual oferece, propicia ao telespectador outro mundo a ser
descoberto, porém, com a imagem já definida. O diretor e roteirista Jorge Furtado
é quem apresenta uma melhor definição para a discussão: roteiro versus literatura.
Para Furtado:
Como se pode notar são duas linguagens ricas que ora se coadunam, ora se
afastam, mas mantêm a criação em sua infinita possibilidade. O mesmo ocorre
com os jogos que são adaptados para o cinema, os quais serão estudados mais
à frente.
No fundo, o que todo roteirista quer é contar uma boa história, que prenda
atenção do público, que instigue a imaginação, que o envolva e o deixe transbor-
dando de emoção, em que a ponta do novelo inicial se junte à ponta final e, juntas,
tornem-se uma só. Boas histórias são lembranças, bons personagens são inesque-
cíveis. Fernando Pessoa, um dos maiores poetas da língua portuguesa já dizia que
“Nada se sabe, tudo se imagina.”
Em acordo com Barthes podemos, por tudo que foi exposto, perceber que a
escrita cinematográfica obedece a outro registro e não existe o compromisso de
fazer literatura nem pensar no leitor. O trabalho do roteirista é pensar em imagens.
Como traduzir melhor uma ideia em imagens? Ao passo que, o trabalho com a pa-
lavra escrita, exige outros elementos em um contexto puramente argumentativo.
capítulo 1 • 18
São duas propostas que se aproximam, mas cada uma dentro de uma vertente. Se
for para enquadrá-lo em um gênero, o roteiro merece outra catalogação. Agora
vamos criar um personagem. Que tal começar pela sua ficha? A seguir, temos uma
ficha com diferentes sugestões e você pode acrescentar outras.
Ficha do personagem
Nome:
Data de nascimento:
Signo:
País:
Onde mora?
Com quem mora?
Estado civil?
Como ele é fisicamente?
Como ele fala?
Possui algum tique nervoso?
Como ele se relaciona com a família?
Como ele se relaciona com os vizinhos e amigos?
Quando está sozinho em que ele pensa?
Possui algum trauma de infância?
Esconde algum segredo do passado?
Quais seus hobbies?
Possui algum desequilíbrio emocional?
É bem resolvido sexualmente?
Como ele lida com a pressão? É explosivo, calmo ou mediano?
Qual seu medo?
Qual seu grande objetivo na vida?
capítulo 1 • 19
©© LUNATICTM | SHUTTERSTOCK.COM
Jon snow
Jovem e destemido, é o filho bastardo de Ned
Stark. Possui traços fortes, estatura alta e magra,
rosto longo, cabelos longos e escuros que ressalta
seu ar de guerreiro. Seu sobrenome Snow foi dado
pela sua origem que são as crianças ilegítimas do
Norte. É desprezado pela madrasta, mas se dá mui-
to bem com os irmãos. Bastardo é a palavra que
mais usam para referir a ele. Seu pai Ned Stark o
trata como intruso na família, mas isso só deixou
Snow mais forte e com isso ele se tornou mais inde-
pendente e sabe se defender de todas as ciladas.
Sabendo que suas pretensões de vida são limitadas pela sua condição de filho
bastardo, Jon se junta à Patrulha da Noite, que guarda as fronteiras norte do rei-
no dos Selvagens, um povo que vive além da muralha. Quando a família Stark
encontra uma grande adversidade, Jon permanece na Patrulha em nome de seu
juramento e sua honra. Ao longo de sua trajetória, ele adota um lobo albino de
olhos avermelhados. A seguir, vamos falar do perfil de Cersei Lannister.
©© CHRISTIAN BERTRAND | SHUTTERSTOCK.COM
Cersei lannister
Ambição é a palavra que a define melhor. Estatura mediana, magra, branca,
loira e com cabelos longos. Na trama, Cersei Lannister, a rainha dos Sete Reinos
de Westeros, é a esposa do rei Robert Baratheon. Seu casamento foi arrumado pelo
pai. Bonita e sedutora, ela usa de todas as armas para conseguir o que deseja. Não
joga para perder e faz tudo em nome da sua família. Esconde um grande segredo
com seu irmão.
capítulo 1 • 20
Daenerys targaryen
Jovem de estatura mediana possui cabelos loiro-platinados, olhos violeta e
com uma beleza incomum. Sofreu com a tirania do irmão que sempre a ame-
drontou. Determinada, busca justiça e põe fim à escravidão no reino. Ao longo da
trama, ela entra na pira ardente e emerge ilesa com três dragões recém-nascidos, os
quais ela nomeia: Drogon, Viserion e Rhaegal.
Como você pôde perceber, não é tão difícil escrever o perfil de um persona-
gem em forma resumida, mas não deixando de esclarecer seus principais pontos
de conflito.
Para games, temos algumas categorias que são especiais e tornam-se necessá-
rios estes esclarecimentos. No processo de elaboração de um game, os personagens
dividem-se em personagens de jogador e personagens não jogadores, ou como
explica Jeannie Novak (2010), são aqueles personagens também conhecidos como
NPCS, uma abreviação de non-player characters. Às vezes, um único jogador pode
controlar vários personagens jogador, como se fosse uma equipe esportiva ou em
tropas militares. Evidentemente, alguns games não contem personagens. É o que
acontece com a maioria dos games de quebra-cabeça, nos quais o jogador interage
apenas com o quebra-cabeça e não assume o papel de um personagem.
O avanço da tecnologia cada vez mais oferece suporte para ampliação das
narrativas. Hoje, um autor dificilmente se limita a criar um único universo em
uma obra, os criadores procuram construir ambientes atraentes e que não se esgo-
tem em uma única mídia. O universo é maior do que o filme, maior até do que a
franquia e, como ensinou Jenkins, “as especulações e elaborações dos fãs também
expandem o universo em várias direções.” (JENKINS, 2009, p. 162). Na constru-
ção de personagens de game, Jeannie Novak defende:
capítulo 1 • 21
controla apenas um personagem, este é chamado de avatar.” (NOVAK, 2010, p.
154). A conexão direta entre ambos ocasionalmente pode resultar na atribuição
pelo jogador de uma identidade pessoal ao avatar. Isso pode ser mais pronunciado
se o avatar exibir características e ações realistas. Quando joga um game, você
sente que realmente assumiu o papel do personagem? Você, às vezes, se reconhece
no personagem? E os tipos de personagens em game? Jeannie Novak nos apresenta
cinco categorias. Vamos a elas.
• Animais: Sonic the Hedgehog é um exemplo de personagem animal. Segundo
Novak “esses personagens, comuns nos games comercializados para famílias ou
crianças, frequentemente têm características humanas.” (NOVAK, 2010, p. 156).
Um exemplo disso são os tênis de Sonic para aumentar a identificação entre joga-
dor e personagem. Os protagonistas animais foram popularizados nos desenhos
animais, como Pernalonga e Mickey Mouse.
• Fictícios: personagens que não têm equivalentes no mundo real enqua-
dram-se na categoria dos personagens fictícios. Para Novak “essa categoria abrange
qualquer personagem que tenha sido criado especificamente para um game, e não
licenciado a partir de um personagem preexistente.” (NOVAK, 2010, p. 156).
São exemplos Mario, Luigi, Wario (o rival de Mario), Lara Croft, Duke Nukem
e Pac Man
• Históricos: Novak define como sendo “os personagens históricos que têm
equivantes distintos no mundo real, frequentemente do passado. “(NOVAK,
2010, p. 156). Os games políticos e militares voltados para eventos do mundo
real utilizam personagens históricos, inclusive Benjamin Wallace, em games como
Allys Adventure e Medieval: Total War.
• Licenciados: um personagem licenciado também existe no mundo real,
mas em uma mídia preexistente. Esses personagens geralmente são fictícios, mas
segundo Novak “com uma identidade reconhecida na literatura, nas histórias em
quadrinhos, no cinema ou na televisão.” (NOVAK, 2010, p. 156). Exemplos são:
James Bond, Frodo (Senhor dos anéis), Neo (Matrix), Harry Potter e Bart Simpson
são exemplos dessa categoria de personagens. É importante ter em mente que
personagens licenciados só podem aparecer em games mediante permissão do de-
tentor da licença, o que geralmente custa muito caro. Quando licenciam persona-
gens preexistentes, os desenvolvedores de games não precisam começar do zero no
desenvolvimento visual, verbal ou da personalidade do personagem.
capítulo 1 • 22
• Míticos: Novak afirma que “os personagens da categoria mítica têm equi-
valentes na mitologia de todo o mundo.” (NOVAK, 2010, p. 156). Muitos RPGs,
como Neverwinter Nights e Everquest, usam personagens míticos convencionais
como ogros e trolls. Age of Mitlology, um game de estratégia voltado especifica-
mente para a mitologia, contém ciclopes, a Medusa e outros personagens das mi-
tologias gregas, egípcia e nórdica.
A figura do herói
capítulo 1 • 23
Criando a história
Estes cinco pontos apresentados vão servir para ser como guia na criação da
sua história. O primeiro item é o tema, escreva diversos temas em seu bloco de
anotações e depois escolha quais deles você gostaria de trabalhar e, principalmen-
te, que tipo de personagem o seu tema vai permitir ser trabalhado na história.
O segundo item é a ideia. Qual a ideia que você teve para desenvolver o tema
e costurar com personagens? Procure direcionar para uma ou duas ideias e deixe as
outras ali do lado, pois mais a frente poderá usá-las.
Personagens é o nosso terceiro item. Quem vai guiar a sua história? É um
homem? Uma mulher? Um menino? Um avatar? Seja lá quem for, é o mais im-
portante, pois o público precisa acreditar nele para seguir a sua jornada. A escolha
de um personagem diz muito sobre a história e o que ela se propõe. É preciso
credibilidade para superar os obstáculos e o público não gosta de ser enganado.
capítulo 1 • 24
A trama é o desenrolar físico dos acontecimentos, são os pontos de virada e
todos os obstáculos que vamos enfrentar ao longo da narrativa.
A história é o desenvolvimento emocional destes acontecimentos. Aqui se en-
contram todos os elementos reunidos e principalmente o conflito que foi estabe-
lecido. Sem conflito não há história. Sempre pense em história e procure associar
o conflito ao tema, assim os elementos por si só irão encadeando e deixando uma
gama de opções para o seu tecer narrativo. Aqui na história é preciso delinear qual
será o clímax? O clímax é onde o conflito atinge o seu grau máximo e assim tere-
mos o desfecho da história em seguida. Para Newton Cannito, clímax :
capítulo 1 • 25
ATIVIDADES
01. Vamos trabalhar com um conto de fadas para exercitar. O conto escolhido será Chapeu-
zinho Vermelho. A história foi escrita pela primeira vez pelo francês Charles Perrault e depois
pelos Irmãos Grimm. A história clássica oferece todos os elementos para virar um videogame.
Leia o conto novamente, descreva os personagens e faça suas escolhas para os jogos.
CONEXÃO
Leia a entrevista de Ricky Cambier,Lead Game Designer de The Last of Us, da Naughty
Dog. Disponível em: <http://rubberchickengames.com/2013/05/23/entrevista-the-last-o-
f-us-a-inspiracao-para-ellie-veio-de-uncharted-2>. Acesso em: mai. 2018.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CESAR, C. Como criar personagens. São Paulo: Europa, 2015.
HUIZINGA, J. Homo Ludens. O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo: Perspectiva, 2017.
MANTOVI, P. Roteiros & criação de personagens – Série Aprenda e Faça. São Paulo: Criativo,
2014.
Referências complementares
CHANDLER, H. Manual de Produção de Jogos Digitais. São Paulo: Bookman, 2012.
MCGONNIGAL, J. A Realidade em Jogo. São Paulo: Best Seller, 2012.
MUSBURGER, Robert. Roteiro para mídia eletrônica. 1. ed. São Paulo: Campus, 2008.
RABIGER, Michael. Direçâo de cinema: Técnicas e Estética. 1. ed. São Paulo: Campus.
SCHUYTEMA, Paul. Design de Games – Uma Abordagem Prática. 1. ed. São Paulo: Cengage
Learning, 2008.
Referências sugeridas
ARISTÓTELES. Poética. São Paulo: Nova Cultural, 1984. (Coleção Os Pensadores)
CAMPOS, Flávio de. Roteiro de cinema e televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro. Rio de Janeiro: Rocco, 1995.
FIELD, Syd. Como resolver problemas de roteiro. São Paulo: Objetiva, 2002.
capítulo 1 • 26
FURTADO, Jorge. A adaptação literária para cinema e televisão. Palestra na Jornada Nacional de
Literatura. Passo Fundo-RS, 2003.
JENKINS, H. A cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2009.
HUTCHEON, Linda. Uma teoria da adaptação. Santa Catarina: Editora UFSC, 2010.
MACIEL, Luiz Carlos. O poder do clímax: fundamentos do roteiro de cinema e TV. Rio de Janeiro:
São Paulo: Record, 2003.
MARTIN, Brett. Homens difíceis. Rio de Janeiro: Editora Aleph, 2014.
MCKEE, Robert. Story. Curitiba: Arte e Letra, 2006.
NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus, 2016.
NOVAK, Jeannie. Desenvolvimento de Games. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
ROGERS, Scott. Level UP: um guia para o design de grandes jogos. São Paulo: Blucher, 2012.
SARAIVA, Leandro e CANNITO, Newton. Manual de roteiro ou Manuel, o primo pobre dos
manuais de cinema e TV. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2009.
SAYAD, Cecilia. O jogo da reinvenção. Charlie Kaufman no cinema. São Paulo: Alameda, 2008.
Referências games
Game of Thrones. Galápagos jogos.
The Last of Us, Naughty Dog (PlayStation 3 e 4)
capítulo 1 • 27
capítulo 1 • 28
2
Argumento:
a criação e o
desenvolvimento da
história
Argumento: a criação e o desenvolvimento da
história
OBJETIVOS
• Elaborar uma Storyline;
• Conhecer a Escaleta e suas implicações no desenvolvimento do roteiro;
• Identificar a divisão de atos;
• Formular o desenvolvimento de um argumento cinematográfico.
Criando a história
capítulo 2 • 30
sua história mude ao desenvolver as cenas e não há nenhum problema que isso
aconteça.
Sem dúvida que a elaboração do argumento é uma das partes mais impor-
tantes no seu processo de criação, visto que é com base no argumento que uma
produtora irá comprar ou não o seu projeto. Só por essa razão, é já indispensável
dizer o quão importante é essa etapa do projeto de roteiro, pois aqui você estará
literalmente vendendo o seu filme ou jogo e, para que isso aconteça, alguém do
outro lado, na figura de um produtor, precisa enxergar na sua história um poten-
cial para que seu projeto saia do papel para a realidade.
O argumento em si deve conter absolutamente tudo sobre a história, desde
o personagem principal, os personagens coadjuvantes, assim como os cenários
que você irá utilizar e a divisão de atos completos da história. É com base nesse
argumento que o produtor pode pedir para você desenvolver o roteiro ou não, e
também pode sugerir modificações para atender o orçamento da produção.
Escolha bem qual personagem irá protagonizar uma história. É com base no
seu protagonista que todo argumento deve ser escrito. No argumento não existe
espaço para histórias banais, o espaço é pequeno e, portanto, o foco deve ficar na
trama principal e no máximo em personagens secundários que tenham alguma
ligação com o protagonista e o contexto abordado. Vamos trabalhar algumas fer-
ramentas que serão bastante utilizadas na construção da história.
Storyline
Vinte anos após uma epidemia ter transformado a nossa civilização, os humanos afeta-
dos tornaram-se selvagens e os sobreviventes estão matando uns aos outros por comi-
da, armas... Joel, um sobrevivente violento, é contratado para retirar uma garota de 14
anos, Ellie, de dentro de uma zona de quarentena militar opressora, porém, o que começa
como um pequeno trabalho, logo se transforma em uma jornada brutal pelos EUA.
capítulo 2 • 31
Figura 2.1 – Fonte: Sony Playstation.
Argumento, ou sinopse, é a storyline desenvolvida sob a forma de texto. Uma vez que
o conflito matriz se apresenta na storyline, o segundo passo é conseguir personagens
para viver uma história, que não é senão o conflito matriz desenvolvido. O texto de uma
sinopse diz apenas como serão transportadas para a tela as personagens por meio de
uma história. É um texto que quer ser transformado em imagens e diálogos. A sinopse
é a primeira forma textual de um roteiro. É preciso que especifique de maneira clara
e concreta os acontecimentos da história. Uma boa sinopse é o guia perfeito para se
obter o roteiro. Por vezes, uma sinopse escrita por um autor pode ser roteirizada por ou-
tro. É mais uma razão para serem claras e explícitas todas as indicações que definam
os principais elementos da história e das personagens. (COMPARATO, 2009, p. 68)
capítulo 2 • 32
Para o escritor inglês Rudyard Kiplong a escrita de um argumento deve
atender ao mesmo conceito do lead que o jornalista trabalha. O lead se divide
em “quem?”, “o quê?”, “onde?”, “quando?”, “por quê?”, “para quê?” e “como?”.
Especialmente em um roteiro de documentário, o roteirista deve se preocupar em
responder a essas perguntas, e no argumento de ficção, elas irão nos ajudar a cons-
truir um norte para a história. Segundo Flavio de Campos, essa é reformulação
dos sete loci da retórica clássica: “quis, quid, ubi, quando, cur, quibus, auxiliis, qui-
mono.” (CAMPOS, 2007, p .21). Vamos entender melhor cada um desses termos
na narrativa.
• Quem?: são os personagens da história. Aqueles que você escolheu para
protagonizarem a narrativa. São os personagens principais e os secundários.
• O quê?: são os incidentes da trama e dizem respeito ao assunto e seus des-
dobramentos, assim como sua curva dramática.
• Onde?: especifica o lugar. Aqui você irá apontar os cenários e as locações, o
espaço onde acontecerá a trama.
• Por quê?: de acordo com Flavio de Campos (2007), são motivações dos
personagens, as causas dos incidentes.
• Para quê?: Campos define como “os objetivos das ações dos personagens e
as consequências dos incidentes.” (CAMPOS, 2007, p. 25)
• Quando?: o tempo abordado na narrativa.
• Como?: o ponto de vista de quem conta a história, sua estrutura discursiva
e abordagem.
É comum que alguns editais para cinema ou games peçam sinopse ou ar-
gumento. Não existe uma definição exclusiva. Em geral, os editais da Ancine1
costumam solicitar que um argumento para longa-metragem tenha o mínimo de
dez páginas, ao passo que uma sinopse para televisão não terá menos do que 50
páginas. Já para o Game, o GDD (Game Design Document) pode ter 300 páginas,
mas sobre o GDD vamos estudar mais à frente. No universo televisivo, a sinopse
de uma telenovela do horário das 21 horas costuma ter entre 100 a 300 páginas,
pois isso vai depender de cada autor e o nível de detalhe que o mesmo vai deixar
na trama. Quais são os elementos que não podem faltar em uma história?
• O gênero; • Design dos atos;
• O incidente incitante; • Personagens bem construídos;
• O conflito; • Crise, clímax e desfecho.
capítulo 2 • 33
Uma vez que definimos o tema, elaboramos a ideia e escolhemos o persona-
gem que irá protagonizar a história, é hora de começar a amarrar todas as pontas
e puxar o fio do novelo que vai nos trazer o norte da história e irá nos guiar na
jornada do protagonista da trama. E qual é a relação entre estrutura e gênero?
Para Robert Mckee (2006), cada gênero impõe convenções no design da história:
“carga de valores convencionais no clímax como o final negativo na trama de de-
silusão, ambientações convencionais como nos faroestes, eventos convencionais
como garoto encontra garota em uma história de amor.” (MCKEE, 2006, p. 93).
Para Mckee, o público conhece essas convenções e espera vê-las na tela.
Para Flavio de Campos (2007) tanto o cinema como a televisão costumam
classificar as histórias em dois grandes gêneros, são eles: drama e comédia, e estes,
por sua vez, ganham subdivisões. Campos explica: “Drama: romance, melodra-
ma, aventura, terror, crime e mistério. Comédia: comédia de situação ou sitcom,
comédia de costumes, farsa e paródia.” (CAMPOS, 2007, p. 65). “Em uma nar-
rativa, posso ler algumas cenas como momentos dramáticos, cômicos, líricos ou
mesmo épicos”. Robert Mckee (2006) apresenta o sistema de gêneros e subgêneros
que evoluiu da prática e não da teoria e que, segundo Mckee, muda de acordo com
a diversidade de assuntos, ambientes, papéis, eventos e valores. Lembrando que
este estudo realizado pelo autor é em relação ao cinema.
• História de amor: seu subgênero, salvação de amigo, substitui o amor ro-
mântico pela amizade. Ex.: Caminhos perigosos, Tudo pela vida, Romy e Michele.
• Filme de terror: esse subgênero divide-se em três subgêneros: o mistério,
no qual a fonte do terror é assombrosa, porém sujeita a explicações racionais,
como seres de outros planetas, monstros criados pela ciência, ou um maníaco; o
sobrenatural, no qual a fonte do terror é um fenômeno irracional, como do rei-
no dos espíritos; e o supermistério, no qual o público tenta adivinhar a fonte do
terror entre as duas possibilidades apresentadas. Ex.: O inquilino, A hora do lobo e
O Iluminado.
• Épico moderno: o indivíduo contra o estado. Ex.: Spartacus, A mulher faz
o homem, Viva Zapata, 1984 e O povo contra Larry Flint.
• Faroeste: a evolução desse gênero e seus subgêneros é brilhantemente traça-
da em Six and Society, de Will Wright.
• Filme de guerra: apesar de a guerra ser frequentemente pano de fundo para
outro gênero, como a história de amor, o filme de guerra é essencialmente sobre o
combate. Pró-Guerra e contra Antiguerra são seus subgêneros primários.
capítulo 2 • 34
O incidente incitante é um conceito trabalhado pelo americano Robert
Mckee. Para Mckee, “quando um incidente ocorre, ele deve ser um evento di-
nâmico, totalmente desenvolvido. O incidente incitante desarranja radicalmente
o equilíbrio de forças na vida do protagonista.” (MCKEE, 2006, p. 183). Assim
que a história começa, o protagonista encontra-se no seu universo habitual, leva
uma vida pacata, ele pode ter altos e baixos, mas faz parte do mundo de todas
essas fases, porém, algo maior está por vir e aí sim, o protagonista precisa reagir
ao incidente.
Mckee nos auxilia com um exemplo. Vamos trabalhar com um faroeste que
pode ser para cinema ou game: “Os bandidos chegam à cidade atirando e matam o
xerife. O povo da cidade se junta e vai a um estábulo, onde trabalha Matt, um pis-
toleiro aposentado que fez um juramento de jamais matar novamente.” (MCKEE,
2006, p. 185). Então, vamos lá... Matt estava em seu mundo comum e habitual,
seguia sua rotina, porém, algo aconteceu e vai tirá-lo dessa inércia. Mas isso só não
basta, existem dois conflitos nesse enredo envolvendo o protagonista.
O conflito é o motor de todas as histórias, seja em qual plataforma for. Algo
precisa acontecer, uma situação desestabilizadora para avançar a narrativa. Sem
conflito não há história. Howard pontua que “não se cria conflito com histrionices
ou comportamentos exagerados e sim com um personagem querendo algo que é
difícil de obter ou conseguir.” (HOWARD, 2011, p. 83)
Vamos analisar o conflito de Matt. O primeiro é o conflito interno, pois ele fez
um juramento sagrado que não voltaria a matar novamente e este acontecimen-
to irá movimentar toda sua vida e obrigá-lo a rever seus conceitos. Em seguida,
temos outro conflito e podemos dizer que este seja o externo, visto que envolve a
comunidade em que ele vive, e a própria comunidade irá pressioná-lo para resolver
essa situação. A pressão no protagonista deve ser forte e Mckee assim nos ensina:
O mesmo ocorre em The last of us. Joel ao encontrar Ellie, uma menina de 14
anos, lembra de Sara, a filha que ele perdeu. O fato das duas personagens terem
uma proximidade nas idades faz com que Joel veja em Ellie o espelho da filha,
então ele fará de tudo para salvá-la, mesmo sendo Ellie uma guerreira como ele.
capítulo 2 • 35
Ainda para o desenvolvimento da história é preciso pensar o design dos atos,
ou a divisão dos atos. Comparato faz a seguinte orientação:
Primeiro ato:
– Exposição do problema
e/ou – situação desestabilizadora
e/ou – uma promessa, uma expectativa
e/ou – antecipação de problemas
Aparece o conflito
Segundo ato:
– Complicação do problema
e/ou – piorar a situação
e/ou – tentativa de normalização, levando a ação ao limite
Crise
Terceiro ato:
– Clímax (ou alteração das expectativas)
Resolução (COMPARATO, 2009, p.133)
É preciso ter ciência que cada ponto de virada nos leva para a curva dramática
da história. Outra boa narrativa é em Final Fantasy, por exemplo, na maioria dos
títulos as histórias são individuais com personagens e mundos diferentes, eles têm
elementos idênticos que definem a franquia. Vale destacar que a história apresenta
elementos recorrentes que incluem temas de enredo, nomes de personagens e me-
cânicas de jogo. Em relação ao enredo, ele está centrado em um grupo de heróis
lutando contra um grande mal, enquanto ao mesmo tempo estão explorando as
lutas internas e relações dos personagens.
©© CHARNSITR | SHUTTERSTOCK.COM
capítulo 2 • 36
Em relação aos personagens e à sua construção, já discutimos no capítulo
anterior, mas vale reforçar alguns pontos. Em acordo com Mckee (2006), para o
seu protagonista é importante frisar que ele responde pela mudança súbita, nega-
tiva ou positiva, em seu mundo, de qualquer maneira que seja apropriada para o
personagem e para o mundo. Uma recusa em agir, porém não pode durar muito
tempo. No entendimento de Mckee, “a chave do verdadeiro personagem é o dese-
jo.” (MCKEE, 2006, p. 351). Por meio do desejo está a motivação. Mckee com-
pleta: “o público entende seu personagem de diversas maneiras: a imagem física
e o ambiente dizem muito, mas o público sabe que a aparência não é realidade e
caracterização não é o verdadeiro personagem.” (MCKEE, 2006, p. 352). Mesmo
assim, a máscara de um personagem é uma pista importante que pode ser revelada.
capítulo 2 • 37
Desse ponto em diante, você pode viver grandes aventuras em um jogo de
ação, por exemplo a perseguição ao vilão. E lembre-se que Bond não toma uma
decisão substancial, simplesmente escolhe que métodos utilizar na busca.
E o desfecho naturalmente está relacionado à resolução do conflito e o desen-
rolar dos fatos, podendo o seu protagonista ter vencido ou não. Uma boa trama
costura o incidente incitante com o desfecho, ou seja, liga os pontos de virada.
Outra observação importante antes de concluirmos essa etapa é o caso do roteiris-
ta-diretor, como Tarantino, Wood Allen, Almodóvar, entre outros grandes direto-
res. Os roteiros deles não nos servem de parâmetros, visto que nos casos deles, eles
mesmos costumam ser os seus respectivos produtor, autor e diretor. A nossa base
de ensino é de acordo com a exigência do mercado.
Desenvolvendo o argumento
capítulo 2 • 38
A saída é tentar viajar por vias marítimas, mas a essa altura a família de Julieta já
está à sua procura e juntos e eles iniciam um novo plano de fuga.
Uma dúvida que sempre ocorre também durante o desenvolvimento do ar-
gumento é a seguinte: posso fazer indicação de diálogo no argumento? A resposta
é sim. Sim, você pode, mas não faça disso um escudo para o seu trabalho. Você
poderá fazer indicação desde que seja bastante necessário ao entendimento da
história e principalmente para revelar o personagem. É importante deixar claro o
tom do personagem, visto que essas informações serão o alicerce de trabalho dos
atores e do diretor. É preciso se perguntar, como roteirista, se aquelas palavras
estão sendo ditas na linguagem do personagem.
E, mais do que isso, se o telespectador quer algo em relação ao protagonista,
se deseja o desfecho da tensão principal, como lembra Rabiger.
Na linha de pesquisa de Rabiger (2007), o mesmo destaca que toda regra tem
sua exceção e os dramaturgos concordam com uma delas: um personagem que
mostre algum grau de crescimento ou mudança para que a história não se perca.
Para o desenvolvimento do seu protagonista, o autor nos sugere algumas dicas:
pegue um momento ativo em cena e faça as seguintes perguntas:
capítulo 2 • 39
Argumento para jogos
Para Scott Rogers (2010), alguns jogos nem mesmo têm histórias. É o caso de
Tetris ou Bejeweled, não precisam envolver um jogador. Mas Rogers lembra que
eles geram uma narrativa, o que significa literalmente uma ordem de eventos. O
autor frisa que “cada vez que um jogador joga um jogo, ele cria uma narrativa. Há
um número infinito de narrativas que um jogador pode criar.” (ROGERS, 2010,
p. 66). Segundo a teoria apresentada por Rogers, quando estiver desenvolvendo a
história de um jogo, você descobrirá três tipos diferentes de pessoas no seu público.
• Jogadores que estão ligados na sua história como ela acontece;
• Jogadores que querem se ligar na sua história em profundidade;
• Jogadores que não estão nem aí em relação à história.
©© NATALI LI | SHUTTERSTOCK.COM
capítulo 2 • 40
Outra sugestão de Rogers (2010) é começar sua história dentro da ação tão
tarde quanto possível. Pode ser no meio de uma luta de boss, no fim de um nível ou
durante uma perseguição com carros. O autor salienta que isso funciona melhor
para jogos com histórias tradicionais. Não seria uma boa ideia começar um jogo
tipo quebra-cabeça, como Tetris, com dezenas de peças chovendo no jogador.
E para finalizar, sempre mantenha sua história animada e em movimento.
Roteiristas profissionais introduzirão uma mudança na trama ou ação a cada 15
minutos. Mesmo com jogos sem história, as sessões de jogo estão se tornando
pequenas, então elas são pequenas o bastante se apreciar em pequenas doses. Estes
conceitos também são bastante utilizados pelo cinema, visto que a ideia é prender
a atenção do telespectador. Em tempos de redes sociais, o roteirista precisa se ar-
mar com todas as ferramentas para garantir a atenção do seu público.
The Last of Us
The Last of Us foi vencedor de vários prêmios e foi remasterizado para os siste-
mas Playstation. Toda sua narrativa tem diálogo com a linguagem cinematográfi-
ca, mas o que nos interessa no jogo é jogar, e nessa história você irá controlar Joel,
um homem comum que tinha um lar, uma família, até perder tudo isso e ter sua
vida virada pelo avesso. O enredo principal começa quando vinte anos após uma
epidemia ter transformado a nossa civilização, os humanos afetados tornaram-se
selvagens e os sobreviventes estão matando uns aos outros por comida, armas...
Joel, um sobrevivente violento, é contratado para retirar uma garota de 14 anos,
Ellie, de dentro de uma zona de quarentena militar opressora, porém, o que co-
meça como um pequeno trabalho, logo se transforma em uma jornada brutal
pelos EUA.
Apresentação da trama
capítulo 2 • 41
Nesse ponto do jogo ocorre a primeira interação do jogador, pois o mesmo
deve procurar Joel no quarto dele, então andamos pela casa e podemos perceber
a rua agitada com sirenes, gritos, latidos de cachorro, quebradeira. Um barulho
estrondoso nos leva para cozinha, onde encontramos Joel enfrentando seu vizinho
infectado e agora um zumbi. Joel o acaba matando com um tiro na testa. Sarah
fica em pânico, pois há vários zumbis chegando e eles precisam fugir.
Continuamos o jogo com Sarah. Joel então encontra o irmão. Eles pegam o
carro e saem em fuga. Do ponto de vista de dentro do carro, podemos ver o pânico
e o caos espalhados pelas ruas. De repente, outro carro bate no carro de Joel e o
veículo capota. Os infectados se aproximam.
Desenvolvimento do jogo
capítulo 2 • 42
Na linha dos criadores Naughty Dog, um aspecto desafiador para os jogadores
é a própria degradação e a qualidade dos armamentos já que irão se desgastando à
medida que o jogador os utiliza e, claro, não será possível sair correndo e atirando
para todos os lados sem tomar nenhum cuidado, pois a saúde dos personagens não
se regenera, forçando-os a serem cautelosos em cada movimento.
Mais uma ferramenta importante para o trabalho do roteirista na construção
do roteiro é a Escaleta. Vamos entender melhor esse conceito de grande utilidade
e planejamento da história e perceber como você pode colocá-lo a seu favor no
momento em que estiver elaborando os passos de seu protagonista.
Escaleta
capítulo 2 • 43
guiar o roteiro, ou seja, um jeito de ajudar o roteirista a não se perder na história.
Importante salientar que nem todos os roteiristas gostam de usar escaleta. Cada
um tem sua forma de trabalhar, porém, em um trabalho de equipe, como a escrita
para seriado ou televisão, a construção da escaleta é fundamental.
A novelista Glória Perez em diversas entrevistas afirma que não usa escaleta,
pois gosta de se surpreender em cada cena. Já outros autores de televisão, como
Sílvio de Abreu e Aguinaldo Silva, afirmam não abrir mão da escaleta, por oferecer
um domínio maior em cada capítulo. Como percebemos, a escaleta nos guia para
evitar um retrabalho.
Mais do que isso é importante ressaltar que o trabalho em equipe, como é
comum no universo de criação dos games, seriados e telenovelas torna-se im-
prescindível o uso da escaleta, pois as cenas são dividas para agilizar o processo de
escrita e, para um roteirista continuar a cena, é preciso ter conhecimento do que
houve antes, caso contrário a unidade dramática se perde.
Dicas
A elaboração de um roteiro exige dedicação, empenho e, principalmente,
muita criatividade, mas isso não impede que você se arme com todas as ferra-
mentas para angariar o máximo de público possível. Como o roteiro é parte de
um projeto, é importante lembrar sempre que ele é somente uma parte da histó-
ria. Outras funções irão contribuir com seu trabalho para desenvolver o filme ou
game, então não fique divagando, preocupado em produzir texto literário, pois
roteiro não é texto literário. Rabiger nos oferta algumas sugestões de melhora de
escrita. Um bom roteiro:
capítulo 2 • 44
E, para finalizar, vale ressaltar que um bom roteiro usa linguagem breve e
evocativa, sempre que o leitor precise visualizar algo.
Ah! Não confunda história com gameplay, pois quase tudo pode ser transfor-
mado em gameplay e, principalmente, nunca, mas nunca se esqueça de criar um
mundo em que um jogador queira entrar, e ele voltará para jogar.
RECORDANDO
No capítulo 1, vimos sobre a construção do personagem, assim como os principais con-
ceitos no que tange ao fazer do roteiro. Já neste capítulo aprendemos três ferramentas im-
portantes: storyline, escaleta e argumento. Para o desenvolvimento de um roteiro, todos os
elementos trabalham juntos e é fundamental este entendimento. No próximo capítulo, vamos
estudar sobre monomito, os arquétipos e a jornada do herói, muito difundida por Vogler e
bem presente nos jogos que envolvem narrativas. São novas ferramentas que irão ajudar no
processo de criação da história.
CONEXÃO
Leia a entrevista de Tim Schafer, criador de jogos como The Secret of Monkey
Island. Disponível em: <https://link.estadao.com.br/noticias/games,tim-schafer-quando-
era-crianca-achava-que-so-gente-incrivel-fazia-games,70001739871>. Acesso em: jun.
2018
ATIVIDADES
01. Vamos trabalhar com o filme O poderoso chefão em uma proposta de transformá-lo
em jogo. A storyline do filme é: a saga de uma família mafiosa que luta para estabelecer
sua supremacia na América depois da Segunda Guerra Mundial. Uma tentativa de assas-
sinato deixa Vito Corleone incapacitado e força os filhos, Michael e Sonny, a assumirem
os negócios.
capítulo 2 • 45
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CESAR, C. Como criar personagens. São Paulo: Europa, 2015.
HUIZINGA, J. Homo Ludens. O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo: Perspectiva, 2017.
MANTOVI, P. Roteiros & Criação de Personagens – Série Aprenda e Faça. São Paulo: Criativo, 2014.
Referências complementares
CHANDLER, H. Manual de Produção de Jogos Digitais. São Paulo: Bookman, 2012.
MCGONNIGAL, J. A Realidade em Jogo. São Paulo: Best Seller, 2012.
MUSBURGER, Robert. Roteiro para mídia eletrônica. 1. ed. São Paulo: Campus, 2008.
RABIGER, Michael. Direção de cinema: Técnicas e Estética. 1. ed. São Paulo: Campus.
SCHUYTEMA, Paul. Design de Games - Uma Abordagem Prática. 1. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2008.
Referências de games
Bioshocke Batman: Arkham Asylum
Final Fantasy
Tetris, Philiphs
The Last of Us, Naughty Dog (PlayStation 3 e 4)
The Secret of Monkey Island
capítulo 2 • 46
3
Roteirizando: dos
formatos clássicos
aos games
Roteirizando: dos formatos clássicos aos
games
capítulo 3 • 48
Christopher Vogler, na década de 1980, era funcionário dos estúdios de Walt
Disney. Foi um período ruim de captação de público para animação, enquanto o
estúdio almejava sucesso com Bambi. Para sair da crise, foi elaborada uma propos-
ta para as equipes desenvolverem ideias de criação para angariar um novo sucesso.
Vogler, já havia feito faculdade de cinema e tinha admiração pelo trabalho de
Joseph Campell. Com base na teoria do monomito, elencou uma gama de erros
que poderiam ser evitados na elaboração de um roteiro. A ideia se deu pelo “ciclo
do herói” ligada à estrutura da mitologia humana.
O que o ser humano tem em comum se revela nos mitos na visão de Campbell.
Os mitos são histórias de nossas vidas, da busca da verdade, da busca do sentido
de estarmos vivos, da inquietação do artista, da busca para preencher esse vazio.
Mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana, daquilo que
somos capazes de descobrir e vivenciar internamente.
Embora a teoria queira estabelecer quase uma fórmula de contar uma história,
não há como ignorá-la e não reconhecer o seu valor. Em A jornada do escritor,
Christopher Vogler, enumera etapas de construção e situações para desenvolver
uma narrativa. Em sua obra O herói de mil faces, Joseph Campbell resgata os con-
tos de heróis de todas as eras, envolvendo religião e cultura e procurando tra-
çar os pontos em comum na história de vida do indivíduo, indiferentemente de
sua cultura.
OBJETIVOS
• Identificar os arquétipos na construção de personagens;
• Estruturar a teoria do monomito;
• Construir o passo a passo da jornada do herói;
• Elaborar diálogos e conhecer suas funções.
Arquétipos
capítulo 3 • 49
Segundo Jung, pode existir um inconsciente coletivo que seja semelhante ao
inconsciente individual. Para o psicanalista, há tipos recorrentes de personagens e
suas relações, tais como: herói que parte em busca de alguma coisa, arautos que os
chamam à aventura. Jung (2002) apontou que os contos de fadas e os mitos seriam
como o sonho de uma cultura inteira. Essa visão constitui a base da nossa conexão
com certos tipos de personagens universais.
Como esclarece Jeannie Novak, “esses arquétipos são usados em todos os
meios de entretenimento para reforçar a conexão do público com a história.”
(NOVAK, 2011, p. 157). Com o desenvolvimento da narrativa, o conceito de
arquétipo passou a ser utilizado na construção dos personagens. Vogler pontua:
“Se você descobrir qual a função do arquétipo que determinado personagem está
expressando, isso pode lhe ajudar a determinar se o personagem está jogando todo
o seu peso na história.” (VOGLER, 2006, p. 70). Neste aspecto você deve criar
uma marca do personagem e buscar este elemento universal.
Mentor Camaleão
HERÓI
Aliados Guardiões
de limiar
Arauto Picaro
Sombra
capítulo 3 • 50
sacrificar em benefício dos outros. Esse arquétipo deve ter qualidades universais.
Vogler destaca que há dois tipos de heróis:
1. Os decididos, ativos, loucos por aventuras, que não têm dúvidas, do tipo sempre-em-
-frente, automotivados. 2. Os pouco dispostos, cheios de dúvidas e hesitações, passi-
vos, que precisam ser motivados ou empurrados por forças externas para se lançarem
em uma aventura. Os dois tipos são capazes de garantir histórias muito divertidas,
embora um herói mais passivo no decorrer de toda a narrativa possa ser responsável
por uma experiência dramática sem muito envolvimento. Geralmente, é melhor que um
herói pouco disposto mude em algum ponto da história, e se torne ligado à aventura
depois que lhe é fornecida alguma motivação necessária. (VOGLER, 2006, p. 83)
Uma das maneiras mais eficaz de lidar com um Guardião de Limiar é “entrar na pele”
dele, assim, como um caçador procura entrar na mente de um animal perseguido. Os
índios das planícies usavam peles de búfalo para se aproximar da manada de bisões em
uma distância que lhes permitisse atirar com o arco. O herói pode conseguir ultrapassar
um Guardião de Limiar penetrando no seu espirito ou adquirindo sua aparência. Um
bom exemplo ocorre no segundo ato de O mágico de Oz, quando o homem de Lata, o
Leão Medroso e o Espantalho vão ao castelo da Bruxa salvar Dorothy, que fora raptada.
capítulo 3 • 51
A situação parece sem esperanças: Dorothy está dentro de um castelo fortificado,
defendido por um regimento de soldados de aspecto ameaçador que marcham de um
lado para o outro, cantando. Não há possibilidade de que os três amigos consigam
derrotar uma força dessas. Contudo, nossos heróis são emboscados por três sentine-
las e, no entanto, os derrotam e se apossam dos uniformes e das armas. Disfarçados
de soldados, juntam-se ao final de uma coluna em marcha, e assim entram no castelo.
Transformaram um ataque em uma vantagem. (VOGLER, 2006, p. 105)
O arauto pode entrar em cena em praticamente qualquer ponto da história, mas é em-
pregado com frequência no primeiro ato, para ajudar a impelir o herói à aventura. Seja
um chamado interior, um desenvolvimento externo ou um personagem com notícias de
mudanças, a energia do Arauto é necessária em quase toda história. (VOGLER, 2006,
p. 113)
É um dos arquétipos mais flexíveis e serve a uma variedade protética de funções nas
histórias modernas. É encontrado, geralmente, nas relações entre homem e mulher,
mas pode ser muito útil também em outras situações, quando se deseja retratar perso-
nagens cuja aparência ou comportamento se alteram para satisfazer às necessidades
da história. (VOGLER, 2006, p. 121)
capítulo 3 • 52
Nesse arquétipo é importante deixar claro que ele não precisa aparecer neces-
sariamente como um personagem. Um exemplo ocorre em The Last of Us, em que
a praga imersa que vai se alastrando provoca também outro tipo de vilania. Ou no
caso do filme Filadélfia (1991), no qual o maior vilão é a doença do protagonista.
• Pícaro: é um arquétipo muito popular no folclore e nos contos de fadas.
Surge, em geral, como palhaço ou uma manifestação cômica na narrativa. Vogler
(2006) elucida que os pícaros cumprem várias funções psicológicas importantes,
pois podam os egos grandes demais e ainda trazem heróis e plateias para a reali-
dade. Para Vogler:
Os heróis da comédia, de Carlitos aos irmãos Marx, são pícaros que subvertem o status
quo e nos fazem rir de nós mesmos. Os heróis de outros gêneros, muitas vezes, têm
que usar a máscara do Pícaro para enganar uma Sombra ou passar por um Guardião
de Limiar. (VOGLER, 2006, p. 133)
capítulo 3 • 53
próprio, início, meio e fim. O autor desenvolve vários pontos cruciais para que a
direção do herói seja desviada, procurando estabelecer uma nova meta. No con-
ceito de monomito, um padrão narrativo específico é compartilhado por lendas
e mitos de todas as culturas do mundo. Na releitura de Vogler, todas as histórias
consistem em alguns elementos estruturais comuns, encontrados universalmente
em mitos, contos de fadas, sonhos e filmes.
Em relação à aplicabilidade desta ferramenta ao universo dos games, há quem
afirme que os jogadores devem aprender a usar os controles para estabelecer co-
nexão com personagens antes que o problema seja introduzido. Jeannie Novak
salienta que em um game, “todo o tempo do mundo está disponível para introdu-
ção de tramas paralelas, surpresas, reviravoltas e outros truques que ajudam a criar
tanto a ilusão de liberdade para o jogador como a aparência de um mundo mais
realista que oferece experiências ilimitadas.” (NOVAK, 2010, p. 126). Reforçando
que em um game, os jogadores têm a opção de escolher diferentes caminhos, o que
enriquece ainda mais a experiência do jogo.
A estrutura da jornada do herói pode ser percebida pelo gráfico a seguir, no qual
podemos acompanhar o passo a passo e os pontos cruciais ao longo da narrativa.
O ventre da baleia
Provação suprema (testes, aliados e inimigos)
Aproximação da
caverna oculta
Com base nos estudos de Vogler, vamos buscar entender a jornada do herói
passo a passo.
Na jornada do herói proposta por Vogler, o primeiro passo é o “mundo co-
mum”, no qual o protagonista é apresentado em sua rotina. Segundo o estudioso,
é necessário “mostrá-lo neste mundo comum para poder criar contraste nítido
capítulo 3 • 54
com o estranho mundo novo em que ele vai entrar.” (VOGLER, 2006, p. 54).
Em Final Fantasy, a apresentação ao mundo comum já aparece na primeira frase
“Era um dia como outro qualquer”. Este é um exemplo como o clássico se mistura
ao contemporâneo, visto que o próprio termo “era” nos remete às histórias de
contos de fadas e não há nenhum demérito nisso. A linguagem dos games é uma
linguagem moderna, porém se coaduna com o mérito, que é contar uma história.
O advento da tecnologia nos trouxe diferentes benefícios, mas nunca, em ne-
nhuma hipótese podemos perder de vista o essencial a que nos propomos quando
montamos uma história: o entretenimento. E dentro desta visão o público vai
comparecer com suas leituras e expectativas, de diferentes idades, pois as gerações
vão passando e assim vão surgindo outros modelos narrativos. No entanto, a linha-
gem clássica, essa nunca sai de moda, pois os sentimentos universais nos conectam
em qualquer lugar do planeta, assim como nos ensinaram Jung e Campbell.
©© CHARNSITR | SHUTTERSTOCK.COM
capítulo 3 • 55
O quarto passo da jornada vem pelo “mentor”, um dos temas mais comuns na
mitologia grega, como salienta Vogler (2006). Para ele, “a função de um mentor é
preparar o herói para enfrentar o desconhecido.” (VOGLER, 2006, p. 57). O jogo
The Last of Us, Game of Thones e Days Gone são exemplos.
Já no quinto passo, temos a “travessia do primeiro limiar. “É o momento em
que a personagem entra plenamente no Mundo Especial. Vogler reforça que “O
primeiro limiar marca a passagem do primeiro para o segundo ato. Tendo domi-
nado o seu medo, o herói resolveu enfrentar o problema e partir para ação. Acaba
de partir em sua jornada, e não pode mais voltar atrás.” (VOGLER, 2006, p. 58).
O jogo Days Gone ilustra bem essa passagem.
O sexto passo é a oportunidade de o herói aprender as regras do Mundo
Especial. São “testes, aliados e inimigos”. Aqui a determinação do herói é testada
por diferentes desafios. Em geral, essa parte corresponde ao início do segundo
ato em uma história. Para este passo, os melhores exemplos estão em The Walking
Dead e Game of Thones.
O sétimo passo é a “aproximação da caverna oculta”. Vogler nos diz: “final-
mente, o herói chega à fronteira de um lugar perigoso, às vezes subterrâneo e
profundo, onde está escondido o objeto de sua busca.” (VOGLER, 2006, p. 60).
Days Gone leva o jogador ao delírio nesta etapa.
O oitavo passo é “a provação”, na qual tudo fica indefinido pelo herói. Sua
vida está em jogo e a sorte no ar. Para Vogler, o herói “enfrenta a possibilidade da
morte e é levado ao extremo numa batalha contra uma força hostil.” (VOGLER,
2006, p.60). Na visão de Vogler, todo herói precisa se confrontar com o peri-
go mortal e vivenciar essa experiência de vida-morte. Podemos perceber isso em
Logan, Super homem e Kriptonita.
O nono passo é a “recompensa”, pois o herói fez jus ao título por ter corrido
riscos em prol de um bem maior. Aqui corresponde ao final do segundo ato da
história.
O décimo passo: “caminho de volta”. Vogler explica: “essa fase marca a decisão
de voltar ao Mundo Comum. O herói compreende que, em algum momento, vai
ter que deixar para trás o Mundo Especial, e que ainda há perigos, tentações e
testes à sua frente.” (VOGLER, 2006, p. 64)
O décimo primeiro passo é a “ressureição”. Vogler reforça que “a força do des-
tino oferece uma série mais complexa de testes finais, e o herói enfrenta a morte
de variadas maneiras.” (VOGLER, 2006, p. 65)
capítulo 3 • 56
O décimo segundo e último passo é o “retorno com o elixir”. Para Vogler “o
herói retorna ao Mundo Comum, mas a jornada não tem sentido se ele não trou-
xer de volta um elixir, tesouro ou lição do Mundo Especial.” (VOGLER, 2006, p.
66). Os valores da jornada do herói é que são importantes, sentenciou o pesquisa-
dor (2006), afinal, o herói volta transformado na jornada. No jogo Half-life, o
personagem principal, Gordon Freeman, está prestes a escapar quando é abordado
pelo “homem de preto”, que lhe propõe uma difícil escolha.
Jeannie Novak chama atenção para a diferença na construção narrativa dos
games. Segundo Novak, “em um game, todo o tempo do mundo está disponível
para introdução de tramas paralelas, surpresas, revi-
ravoltas e outros truques que ajudam a criar tanto a
ilusão de liberdade para o jogador como a aparência
de um mundo mais realista que oferece experiências
limitadas.” (NOVAK, 2011, p. 126)
Outro fato a ser levado em consideração é que
os jogadores também têm a opção de escolher dife-
rentes caminhos em um game e isso enriquece mais
a experiência com o mesmo. Outra sugestão em
que podemos aplicar a jornada do herói é a série
Legacy of Kain, o enredo tem muitas reviravoltas,
além das questões filosóficas.
capítulo 3 • 57
O diálogo deve ter a função de revelar o personagem, ou seja, o texto do diá-
logo deve refletir o vocabulário específico e a escolha do personagem. Novak frisa
que “o diálogo deve revelar o histórico do personagem, inclusive suas caracterís-
ticas físicas, sociais e sua personalidade.” (NOVAK, 2010, p. 176). Um exemplo
é o Kain, da série Legacy of Kain, ele é a encarnação do anti-herói e como não se
lembrar do Homem-Aranha?
O diálogo deve revelar emoções e pode refletir mágoa, alegria, raiva. Para
Novak, “um personagem impaciente está sempre impaciente, como você mudaria
seu tom de voz para indicar que ele está furioso ou extremamente impaciente?”
(NOVAK, 2010, p. 176). Cada personagem tem sua maneira de se expressar, as-
sim como cada um de nós.
O diálogo apresenta a função de avançar a trama. O enredo do game pode
evoluir por meio de conversações entre os personagens. Para Novak, “o método
preferencial para avançar a trama é a narração. Uma alternativa melhor pode ser o
uso de texto escrito ou de um narrador para manter os jogadores informados sobre
o enredo.” (NOVAK, 2010, p. 176). Claro que alguns diálogos bem escritos entre
os personagens podem ajudar a avançar o enredo.
Ele também pode revelar conflitos. Um diálogo pode revelar o conflito por
meio de um embate, entretanto, Novak (2010) diz que uma maneira melhor de
lidar com os conflitos é expressá-los por meio das ações dos personagens.
E por fim, o diálogo também pode ter a função de estabelecer relacionamen-
tos. Exemplo: “Lembre-se, você é meu pai...” ou “Primo Matt...”
Sequência e cena
capítulo 3 • 58
A sequência de um casamento, por exemplo, pode ser formada pelas cenas do pedido
do casamento em um restaurante, a cena da mulher em uma loja comprando o vestido
de noiva, em casa provando o vestido, o noivo em um bar na festa de despedida de
solteiro, o noivo esperando na igreja, a noiva chegando, a cerimônia do casamento,
a saída na porta da igreja, terminando com o carro partindo com os noivos. (RODRI-
GUES, 2007, p. 26)
capítulo 3 • 59
Se o jogador responder:
Jogador
Esqueça.
Loric
Só quero ir a algum lugar que não pertença a ninguém ou onde nem tudo foi
comprado e vendido. O que são dez créditos para você?
Se o jogador responder:
Jogador
Acho que dez créditos não vão me fazer falta...
Loric
Você fez a escolha certa. Seja generoso com os aventureiros, pois você nunca
sabe quando também será um.
Loric
Quando chegar lá, eu me lembrarei de você. Lembrei-me de você e de outras
pessoas como você. Lá serei diferente. Tenho certeza. (NOVAK, 2011, p. 178)
capítulo 3 • 60
A pesquisadora propõe uma reflexão sobre o futuro dos games diante o avanço
da tecnologia. Será que há algum outro segmento da indústria prestes a emergir?
E os consumidores? Eles optarão pela portabilidade ou pela experiência cinemato-
gráfica dos games de console em estilo de home theatre?
Dicas
• Um jogo é uma atividade com regras e condição de vitória ou derrota;
• Faça a morte ter importância;
• Nomes de personagens devem ser curtos e descritivos;
• Dê ao seu jogador o valor de seu dinheiro;
• Use o personagem do jogador para determinar as métricas do jogo;
• Nomeie seus heróis de maneira apropriada;
• Dê a seus personagens, formas, silhuetas, cores e texturas distintas;
• Use o personagem do jogador para refletir as condições do jogo.
RESUMO
Neste capítulo aprendemos sobre o uso dos arquétipos na construção dos personagens
e também sobre a jornada do herói. Já no próximo capítulo vamos trabalhar com a função do
game designer, que tem como missão de definir as interações possíveis entre o jogador e
o cenário do jogo. Isso inclui pensar e descrever em detalhes quais interações do tipo clicar
em itens possíveis, sob quais condições e quais as consequências de cada uma delas. O
game designer deverá colocar tudo isso no documento de game design, dando destaque
às interações mais importantes, ou seja, aquelas que provavelmente ocorrerão mais vezes
dentro da partida. Ah! Você não sabe o que é um documento de game design? Então, leia o
próximo capítulo.
ATIVIDADES
01. Escolha um jogo de gameplay e tente aplicar o que estudamos neste capítulo. Você pode
optar por A era do gelo ou Tartarugas Ninja.
capítulo 3 • 61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CESAR, C. Como criar personagens. São Paulo: Europa, 2015.
HUIZINGA, J. Homo Ludens. O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo: Perspectiva, 2017.
MANTOVI, P. Roteiros & Criação de Personagens – Série Aprenda e Faça. São Paulo: Criativo, 2014.
Referências complementares
CHANDLER, H. Manual de Produção de Jogos Digitais. São Paulo: Bookman, 2012.
MCGONNIGAL, J. A realidade em jogo. São Paulo: Best Seller, 2012.
MUSBURGER, Robert. Roteiro para mídia eletrônica. 1. ed. São Paulo: Campus, 2008.
RABIGER, Michael. Direção de cinema: Técnicas e Estética. 1. ed. São Paulo: Campus.
SCHUYTEMA, Paul. Design de Games - Uma Abordagem Prática. 1. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2008.
Referências sugeridas
ARISTÓTELES. Poética. São Paulo: Nova Cultural, 1984. (Coleção Os Pensadores)
CAMPOS, Flávio de. Roteiro de cinema e televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro. Rio de Janeiro: Summus Editorial, 2009.
FIELD, Syd. Como resolver problemas de roteiro. São Paulo: Objetiva, 2002.
FURTADO, Jorge. A adaptação literária para cinema e televisão. Palestra na Jornada Nacional de
Literatura. Passo Fundo-RS, 2003.
JENKINS, H. A cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2009.
HUTCHEON, Linda. Uma teoria da adaptação. Santa Catarina: Editora UFSC, 2010.
MACIEL, Luiz Carlos. O poder do clímax: fundamentos do roteiro de cinema e TV. Rio de Janeiro: São
Paulo: Record, 2003.
MARTIN, Brett. Homens difíceis. Rio de Janeiro: Editora Aleph, 2014.
MCKEE, Robert. Story. Curitiba: Arte e Letra, 2006.
NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus, 2016.
NOVAK, Jeannie. Desenvolvimento de Games. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
ROGERS, Scott. Level UP: um guia para o design de grandes jogos. São Paulo: Blucher, 2012.
SARAIVA, Leandro e CANNITO, Newton. Manual de roteiro ou Manuel, o primo pobre dos
manuais de cinema e TV. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2009.
SAYAD, Cecilia. O jogo da reinvenção. Charlie Kaufman no cinema. São Paulo: Alameda, 2008.
Referências games
Tetris, Philiphs
The Last of Us, Naughty Dog (PlayStation 3 e 4)
capítulo 3 • 62
4
Storyboard e tipos
de roteiros
Storyboard e tipos de roteiros
Ao pensar em uma história, a primeira ideia que surge é: do que ela se trata?
Seja para literatura, games ou para o cinema, este é apenas um ponto de partida
para inúmeras indagações. Quando a filmografia passa pela adaptação literária,
novos tópicos ganham discussão. Mas um elemento que sempre chama atenção no
que tange ao audiovisual é o trabalho do adaptador que às vezes não é lembrado, e
na grande maioria, não chega sequer a ser mencionado nos créditos de divulgação
do filme.
No caso de jogos, entra a questão dos produtos licenciados. O cinema surgiu
como forma inovadora de contar uma história. Para tanto, a construção cinemato-
gráfica de uma trama pede um roteiro, objeto este escrito e posteriormente trans-
formado para as telas. O processo de adaptação dos games para as telas também
obedece ao mesmo princípio, levando em conta suas particularidades. O processo
de criação de um texto escrito para cinema, games ou literatura também pode ser
escrito de forma linear e não linear. A resposta a essa indagação implica o estudo
de diversos fatores.
Diferente em sua criação, o roteiro cinematográfico não é considerado texto
literário, embora narre uma história, apresente personagens e diálogos. São di-
versos os elementos implicadores dessa vertente. Em comum com a literatura, o
roteiro narra a história, descreve lugares e ambientes, mas difere da criação de um
livro, pois não se preocupa com a expressão de uma língua nem com figuras de
linguagens, recursos esses destinados à literatura. Da mesma forma é o roteiro para
games. Por outro lado, seu processo de escrita apresenta os efeitos visuais, indica
trilha sonora, cortes, posição de câmera, elementos estes exclusivos do audiovisual.
O parâmetro de discussão da construção do roteiro cinematográfico ser litera-
tura ou não deixa transparecer sempre algum grau de subserviência aos cânones,
como apontou Robert Stam (2009). É importante observar que o registro escrito,
seja para o roteiro ou romance e depois o filme, resume-se ao fato que ambos são
narrativas. O escopo semântico atende à necessidade de contar uma trama, suge-
rindo e descrevendo cena a cena. O filme em si é a ampliação do registro dessa
leitura e escrita. Na linha de apresentação, o roteiro é construído para um leitor
especializado, visto que é um preparatório antes das filmagens e nesse texto são
possíveis muitas versões até chegar a um resultado satisfatório. Uma vez definidas
essas questões, vem a construção do storyboard, no qual vamos podemos visualizar
tudo o que foi planejado no roteiro.
capítulo 4 • 64
OBJETIVOS
• Aplicar o conceito de Game Design Document;
• Construir um Game Design Document;
• Categorizar os tipos de roteiros;
• Abordar o processo de adaptação literária dos jogos para o cinema;
• Ilustrar o conceito de storyboard e suas implicações no jogo eletrônico;
• Abordar planos e enquadramentos usados no cinema e como podemos utilizar na constru-
ção de técnicas de storyboard.
capítulo 4 • 65
são emitidas por entidades estrangeiras reguladoras, passa a ser reconhecida pelo
Ministério da Justiça como pré-requisito a autoclassificação nacional. Como não
há equivalência entre as faixas de classificação adotadas pelos dois sistemas (ESRB
e PEGI) e as seis faixas de classificação de uso obrigatório no Brasil, o desenvol-
vedor ou detentor dos direitos do produto deverá atribuir a classificação brasi-
leira mais adequada, para o que poderá utilizar o Guia Prático de Classificação
Indicativa. (ROGERS, 2012, p. 84)
Existem seis faixas de classificação que podem ser atribuídas pela ESRB:
eC (EarlyChilhood) (primeira infância): não contém nenhum material que
os pais possam achar inapropriado.
E (everyone) (todos): pode conter fantasia, cartum ou violência moderada e
uso não frequente de linguagem moderada.
E10 (Everyone 10+) (todos acima de 10 anos): pode conter fantasia, cartum
ou violência moderada e o uso não frequente de linguagem forte.
M (Mature 17+) (maduro, maiores de 17 anos): pode conter violência in-
tensa, sangue, conteúdo sexual e linguagem forte.
Ao (Adultsonly 18+) (somente adultos maiores de 18 anos): inadequado
para pessoas com menos de 18 anos – pode conter cenas prolongadas de violência
intensa, conteúdo pornográfico e de nudez. (ROGERS, 2012, p. 85)
O velho MacDonald tem uma fazenda... e aqueles animais estão fartos! Cansados de
serem explorados, os animais constroem armaduras cibernéticas mortais e atacam! O
fazendeiro MacDonald deve lutar contra ondas enfurecidas de vacas assassinas, ove-
lhas sinistras e galinhas enlouquecidas para proteger sua produção. Venda sua colheita
para melhorar a fazenda e comprar armas! Cultive tanto quanto lute, senão você vai
“comprar a fazenda”. (ROGERS, 2012, p. 436)
Uma dica: inclua o começo, o meio e o fim da história do jogo, dê uma indi-
cação do estilo de jogo, dos objetivos do jogador e dos elementos.
capítulo 4 • 66
Esboço do jogo
Aqui você não precisa entrar em muitos detalhes e sim contar como será o
processo em si.
Os jogadores criam e mantêm uma fazenda básica, plantam e cuidam da colheita du-
rante a Rodada de Cultivo. Inimigos, atacam durante a Rodada de Batalha. Colha e
venda a produção remanescente durante a Rodada de Venda. Use os lucros para com-
prar novas sementes, reconstruir sua fazenda e melhorar suas armas na Rodada de
Compras. Após (4 conjuntos de 4 rodadas), o jogador luta com um boss para progredir
para nova estação. As últimas estações apresentarão clima que afetará as rodadas de
colheita, venda e batalha. (ROGERS, 2012, p. 436)
Nos diferenciais de vendas, você pode acrescenta, por exemplo: construa e crie
fazendas, armas e colheitas únicas. Diferentes combinações ou múltiplos finais
para o jogo com base no desempenho do jogador. Em produto concorrente, um
similar seria: Tower Defense
GDD-dez páginas
capítulo 4 • 67
seu projeto, então faça-o bem interessante para que o seu leitor queira continuar
lendo. Scott Rogers nos ensina algumas dicas de como podemos direcionar a in-
formação das dez páginas para cada tipo de público.
Para Rogers (2012), se for para uma equipe de produção, você deve fornecer
diagramas claros de gameplay, usar sentenças curtas e enérgicas, assim como ter-
minologia específica para que sua intenção seja entendida e depois comparar o
gameplay como jogos apropriados, mesmo título vintage.
Agora, se sua apresentação for para o departamento de marketing ou para
executivo, o pesquisador Rogers (2012), nos dá outras dicas, como: mostrar
imagens conceituais que sejam emocionantes, usar texto na forma de tópi-
cos, usar exemplos descritivos e por fim usar jogos modernos e bem-sucedidos
como comparação.
No esboço das dez páginas o que não pode faltar, segundo Scott Rogers
(2012). A primeira página deve ter: título do jogo, plataformas (game systems)
pretendidos, idade target dos jogadores, classificação ESRB pretendida e data de
lançamento projetada. Já na página 2 você fará um rascunho do jogo em que
deve conter o resumo da história do jogo e o fluxo dele. O resumo da história
você já sabe, pois equivale ao storyline. Agora, no fluxo do jogo você deve des-
crever brevemente o fluxo de ação, no contexto das locações em que o jogador
irá se encontrar.
A título de exemplificação no jogo Tomb Raider: Legend temos um jogo de
ação e aventura na terceira pessoa no qual temos a protagonista Lara Croft pro-
curando, desde as selvas da Bolívia até as montanhas do Tibete, pela misteriosa
chave Ghalali, um artefato que pode ser a chave para encontrar a própria mãe
de Lara há muito desaparecida. Para Scott Rogers, outras questões no fluxo de
jogo incluem:
Quais são os desafios que o jogador enfrentará e os métodos pelos quais ele pode
superá-los.
Como funciona o sistema de progressão/recompensa? Como o jogador evolui en-
quanto os desafios aumentam?
Como o gameplay se amarra na história? O jogador encontrará quebra-cabeças que
garantem acesso a novas áreas quando resolvidos? Os jogadores terão de lutar com
bosses que barram sua progressão?
Qual a condição de vitória para o jogador? Salvar o universo? Matar todos os inimigos?
Colecionar 100 estrelas? Todas as anteriores? (ROGERS, 2012, p. 89)
capítulo 4 • 68
Seguindo as dicas
Na página três você deve falar dos seus personagens principais e o foco é dire-
cionado ao protagonista. Apresente um mapa básico dos controles do personagem.
Na página quatro fale sobre o gameplay. Importante detalhar como a sequên-
cia do jogo será apresentada. A trama traz múltiplos capítulos? Ou o jogo é divi-
dido em níveis ou rounds?
Na página cinco é onde você deve apresentar o mundo do jogo. Procure listar
os ambientes mencionados na trama, fornecendo descrições curtas que esbocem o
que o jogador irá encontrar.
Na página seis você deve falar sobre a experiência do jogo. Qual a sensação
que o seu jogador terá? O seu jogo é de humor? Terror? Será eletrizante? Existem
modos ou interfaces para o seu gameplay? Rogers (2012) nos oferta como exemplo
o “ataque-cóptero” em Call of Duty 4: Modern warfare ou o modo fúria de Rubi
em Wet. Scott Rogers propõe responder algumas questões sobre a experiência de
jogo que você deve responder.
capítulo 4 • 69
Na página nove vem cena de corte. O jogo tem filmes ou cenas de corte?
Rogers (2012) orienta a descrever o método pelo qual elas serão criadas incluindo
a computação gráfica (CG), animação em flash, show de fantoches.
E finalmente a página dez. Aqui temos materiais de bônus. Nesta etapa,
Rogers (2012) sugere falar sobre qualquer material de bônus ou destraváveis que
encorajarão o jogador a praticar novamente. Dê alguns exemplos de coisas que os
jogadores serão capazes de destravar.
Para Chris Rodrigues (2007), o plano geral é o que engloba um grande es-
paço no qual os personagens não podem ser identificados, é pouco utilizado em
jogos, ao menos durante a fase em que se está interagindo. Nas introduções ou
apresentações pode e muitas vezes o plano geral é por conta da apresentação do
universo e do contexto geral.
Plano conjunto “é o plano em que enquadramos dois atores com a mesma
função dramática.” (RODRIGUES, 2007, p. 31). No caso de jogos 2D, um plano
de conjunto é bastante utilizado, mostrando o personagem sendo guiado e o am-
biente a seu redor. Isso ocorre com The Last of Us, por exemplo.
Já o plano médio “é onde o personagem é enquadrado da cintura para cima. É
muito usado para mostrar o movimento das mãos do personagem.” (RODRIGUES,
2007, p. 29). Ao passo que o plano americano é onde “o personagem é mostrado
capítulo 4 • 70
do joelho para cima, tendo sua origem nos westerns americanos, com a função
de mostrar a cartucheira do revólver na cintura.” (RODRIGUES, 2007, p. 29).
Já o plano detalhe “mostra parte do corpo, como detalhes da boca, da mão etc.”
(RODRIGUES, 2007, p. 30). É usado também para mostrar objetos.
O primeiro plano é “onde o personagem é enquadrado do busto para cima,
dando maior evidência ao ator, servindo para mostrar características, intenções e
atitudes do personagem.” (RODRIGUES, 2007, p. 29). Já na visão subjetiva ou
câmera subjetiva é quando “o espectador ou o ator tem o ponto de vista da câme-
ra, ou se move no lugar dela.” (RODRIGUES, 2007, p. 33). Muito utilizada em
cenas de deslocamento do ator, em que a câmera na mão do operador assume o
ponto de vista do ator em movimento.
Em 3D você pode criar várias possibilidades de plano em um mesmo mo-
mento, em que o jogador pode controlar sua visão por meio de determinadas
teclas de atalho. Você pode, entretanto, amarrar a visualização do jogador em
um plano médio um pouco mais afastado visto de costas, assim o jogador pode
ver o personagem e suas ações. Outra visão muito utilizada, que dá uma melhor
visualização e controle ao jogador é a visão subjetiva, na qual o jogador visualiza
o universo do jogo pelos olhos do personagem, vendo inclusive as armas que ele
carrega e mirando nos alvos à sua frente. No caso de se ter várias possibilidades,
o storyboard deve dar exemplos em cada plano, e se torna um pouco mais com-
plicado, mas terá que ser associado a um estudo em planta baixa das sequências
e dos ambientes a serem criados. A seguir, há um exemplo de storyboard para jo-
gos, retirado do site, disponível em: <http://finegamedesign.com/script/index.
html>. Acesso em: jul. 2018.
Os tipos de roteiros
capítulo 4 • 71
este se aventure por outras vias que não uma única oferecida pelo autor. Então,
resumidamente a narrativa linear é quando as ações são apresentadas na ordem
cronológica dos acontecimentos, seguindo começo, meio e fim. O que também
chamamos de uma forma clássica de contar uma história.
Esta linearidade proposta pela escrita e assimilada tão bem pelo homem se
fez presente também nos meios de comunicação, que a partir dela construíram
suas mensagens por meio de roteiros lineares, que obedeciam a uma lógica tem-
poral e linear. Um grande exemplo disso é a televisão, que tem o conteúdo de
cada canal construído por roteiros temporalmente sequenciados; novelas, pro-
gramas humorísticos, séries e filmes que obedecem até hoje este mesmo preceito
– guiado pela forma linear de se narrar os fatos. Importante notar que a TV de
hoje procura levar interatividade ao telespectador, buscando sua participação
via chats ou ligações ao vivo. O universo das redes sociais, como as páginas do
Facebook e Instagram deram outro movimento a essa rede tão ampla de comu-
nicação. Isso é uma prova dos novos tempos, em que o telespectador possui o
poder de interação.
Já os roteiros não lineares estão ligados em geral à questão da interatividade,
em que o espectador pode mudar a história e o curso de ação. Mas também po-
demos ter roteiros para filmes em que a ordem e sequência dos fatos apresentados
não estão em ordem cronológica, e sim de ação. A partir do início da revolução
digital, a comunicação entre os homens tem sofrido inúmeras transformações,
desde a criação de novos canais comunicacionais, até mudanças nas linguagens
de alguns meios preexistentes. Estas interferências ocorrem devido aos diversos
fatores intrínsecos ao meio digital.
A narrativa não linear é apresentada por descontinuidade, não obedece à
cronologia dos fatos da trama. Pode ter rupturas, cortes abruptos ou mesmo
antecipações de cenas. Como exemplo, temos a trilogia de Alejandro González
Iñarritu: Amores Perros, 21 gramas e Babel. Quando falamos de interatividade e
novas mídias, normalmente falamos de roteiros não lineares. Em relação aos ga-
mes, Jeannie Novak elucida que “Os games não precisam adotar uma narrativa
linear. Isso está vinculado à aparente liberdade de escolha atribuída aos jogado-
res, que podem seguir diferentes caminhos durante o jogo.” (KOVAK, 2010, p.
140). É exatamente este poder de escolha que oferta a diferença ao jogador e ao
universo interativo.
capítulo 4 • 72
Adaptação de roteiros à estrutura de jogos
Para Rabiger (2007) existe relação entre palavras e imagens e propõe al-
guns questionamentos:
O autor
capítulo 4 • 73
É importante ressaltar que algumas correntes teóricas querem mostrar o rotei-
ro cinematográfico como literatura fragmentada, não reconhecendo sua diferença
de estilo. Há claramente uma confusão com a literatura moderna, o que não vem
ao caso nesse contexto. Se por um lado, no início do século, o roteiro buscava uma
apresentação, como cinema de autor por uma via literária, esse diálogo não condiz
hoje com a indústria do cinema, que se ampliou e tem a seu favor a tecnologia. É
exatamente neste ponto que se aproxima dos games, visto que os mesmos buscam
maior participação do espectador.
A relação entre texto e imagem acompanha o caminho literário desde a Arte poé-
tica de Aristóteles (1984), por meio da expressão ut picutura poesis, ou seja, pintura é
poesia. A linguagem poética é apresentada também como imagem. Segundo François
Jost “o cinema mantém laços profundos com a pintura, menos pelo paralelismo destes
efeitos, quadro, cores, luz, menos pela analogia de seu dispositivo, em uma palavra:
por sua relação ao olho, à vista e à visão, do que por sua relação à mão na qual se deve
buscar o estatuto do autor de filme.” (JOST apud SERAFIM, 2009, p. 15)
Na linha de transcodificação da página para tela, cabe ao roteirista não se
deixar influenciar pelo já proposto e aproveitar as habilidades e truques da escrita
cinematográfica para expandir o universo da trama literária. Encontrar a voz que
conta a história, o fio condutor é o primeiro dos desafios em meio a tantos outros,
enquanto o trabalho do romancista é encontrar uma voz que irá alcançar o leitor.
Podemos elencar alguns games que foram adaptados para as telas e com grande
sucesso de público e crítica. Liderando Lara Croft – Tomb Raider (2001) e Mortal
Kombat, em 1994.
capítulo 4 • 74
Tal como um romance, o roteiro de um filme ou game ganha delineamento
de personagens pelo entrecruzar de tramas, apresentadas nas ideias e no enredo
principal. É por um personagem condutor que vamos entrar no mundo desco-
nhecido, seja no filme, game ou romance e conhecer seus desdobramentos, assim
como a ideologia do autor e sua visão de mundo. Para Walter Benjamin “contar
histórias é sempre a arte de repetir histórias.” (BENJAMIN, 1992, p. 90). Porém,
para repeti-las é preciso uma roupagem e isso traz em si o processo de criação. Em
se tratando da sétima arte, uma história nunca surge sozinha, visto que o trabalho
de feitura do filme é sempre em equipe. Para avançar na discussão, o teórico e ro-
teirista americano Syd Field (2002) pontua que ao adaptar um romance, você está
trocando uma forma pela outra, ou seja, você está escrevendo uma obra original.
Field explica:
capítulo 4 • 75
A adaptação em si
capítulo 4 • 76
Em um texto narrativo, o leitor é obrigado a optar o tempo todo. (...) E essa liberdade é
possível precisamente porque – graças a uma tradição milenar, que abrange narrativas
que vão desde os mitos primitivos até o moderno romance policial – os leitores se
dispõem a fazer suas escolhas no bosque da narrativa acreditando que algumas delas
serão mais razoáveis que outras. (ECO, 1986, p. 185)
capítulo 4 • 77
à formação de roteiristas, embora o mercado seja cada vez mais amplo. Noventa por
cento dos profissionais são autodidatas; essa falha na formação profissional é uma la-
cuna que sempre prejudica o resultado final. O roteiro está todo para o audiovisual,
o cinema, o rádio, a televisão, o teatro, a publicidade. Para Syd Field “Um roteiro é
uma história contada em imagens, com diálogos e descrições, localizada dentro do
contexto da estrutura dramática. Estrutura é o fundamento de todo roteiro – é a
espinha, o esqueleto que ‘mantém’ tudo coeso.” (FIELD, 2002, p. 17)
Entende-se por uma divisão dos fatos que a trama apresenta e que seja mostra-
do ao público dessa forma, pautando sempre o melhor entendimento da narrativa.
Outro elemento de suma importância é traçar o perfil dos personagens: isso deve
acontecer antes da escaleta. Para Field (2002), há três elementos fundamentais do
roteiro: cabeçalho da cena (deve conter interior ou exterior, localidade e tempo),
descrição visual do que é visto ou ouvido, quando está assistindo ao filme e diálo-
gos (falas e pensamentos dos personagens).
No roteiro, o diálogo é escrito no centro da folha, com as margens mais estreitas
e o nome do personagem todo em maiúsculo. Quase todos os roteiros para cinema
são escritos no formato americano “master scenes”, que defende uma página de ro-
teiro para cada minuto de filme. Esse tempo “página/minuto” requer um pouco de
prática, mas não conseguir alcançá-lo não interfere na qualidade do enredo.
Ao explorar outro campo narrativo, o escritor tem como tarefa apresentar sua
estória. No campo do cinema, abre-se uma vasta possibilidade de atingir um pú-
blico e isso é altamente sedutor, em voga pelo advento da internet. A elaboração
desse signo linguístico, que será transformado em outro código, visto que as exi-
gências do meio cada vez atraem mais autores. A título de exemplificação, temos
atualmente o escritor George R. R. Martin, responsável pelo livro: As crônicas de
gelo e fogo, adaptado para seriado pela HBO como “Game of Thrones”. Por razões
contratuais, a cada temporada um episódio é escrito pelo próprio autor.
Os produtos licenciados
capítulo 4 • 78
os direitos, ou você não tenha a credibilidade necessária para convencer o detentor
dos direitos autorais de que criará algo à altura do original, ou simplesmente não
esteja interessado em vendê-los para ninguém.
A New Line cinema é um exemplo de licenciador, tendo cedido à Eletronic
Arts os direitos do filme O senhor dos anéis, por exemplo. A vantagem quando se
trabalha com a licença é que você tem a oportunidade de transpor um mundo
criativo já estabelecido, rico em detalhes e em histórias, para um novo meio. Sua
tarefa é reimaginá-lo de maneira que permaneça algo do original.
Apropriações ou transformações?
O termo para adaptação enquanto “leitura” da fonte do romance, sugere que, assim
como qualquer texto pode gerar uma infinidade de leituras, qualquer romance pode
gerar um número infinito de leituras para adaptação, que serão inevitavelmente par-
ciais, pessoais, conjunturais, com interesses específicos. A metáfora da tradução, simi-
larmente, sugere um esforço íntegro de transposição intersemiótica, com as inevitáveis
perdas e os ganhos típicos de qualquer tradução. (STAM, 2006, p. 9)
capítulo 4 • 79
Ao entrarmos nesse mundo da realidade virtual, o filme torna-se uma anima-
ção em 3D e é então onde temos uma combinação de planos. Após um plano geral
do ambiente, temos um plano de sequência que mostra o percurso do personagem
nesse universo e que logo acaba se tornando um plano conjunto quando o perso-
nagem encontra um conhecido dentro do jogo. Segundo Novak:
A realidade virtual faz parte de uma nova linguagem hoje nos cinemas e
Spielberg explorou essa vertente. Dentro da realidade virtual, há um momento em
que ocorre uma corrida de carro. Foi nessa cena que se apresentaram vários takes
na primeira pessoa, mostrando a visão do personagem durante a corrida.
O que torna crível, pois é exatamente assim a visão que temos ao jogar um
jogo de corrida. Outro ponto de destaque é a introdução dos adversários durante a
corrida, o King Kong e um T-Rex, cujo CGI é igual ao do filme Jurassic Park, tam-
bém dirigido por Steven Spielberg. Tendo esses dois adversários na pista, temos o
plano contra-plongée que dá a sensação de superioridade aos monstros perseguindo
os carros. No mundo real, não há tanta combinação de planos.
O uso da computação gráfica para criar a realidade virtual no filme está muito
realista, mas com um tom de animação para podermos ver que não é real. Como pode-
mos notar, este foi um caminho trilhado com a aproximação da linguagem dos games.
RECORDANDO
Em relação à estrutura da história no roteiro, já sabemos que o primeiro ato determina
a estrutura (personagens, relacionamentos, situação e o principal problema enfrentado pelo
personagem ou pelos personagens principais). No segundo ato, desenvolvemos as compli-
cações nos relacionamentos enquanto o personagem principal luta contra os obstáculos que
o impedem de resolver o problema principal. Já no terceiro ato, intensificamos a situação e
resolvemos, quase sempre com um clímax, o que satisfaz emocionalmente. Essa é uma nar-
rativa clássica e linear, porém, você pode montar uma narrativa não linear invertendo todas
as ordens. Solte sua criatividade!
capítulo 4 • 80
Fique atento nestas dicas de Scott Rogers (2012)
ATIVIDADES
O exercício a seguir vem sugerido por Scott Rogers (2012).
01. Você deve criar um jogo em que é o rei de uma colina e vive em guerra com reino vizinho.
A batalha vai começar e alguns dos seus soldados podem ser traidores. Vence quem conse-
gue atravessar o reino e capturar a bandeira.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CESAR, C. Como criar personagens. São Paulo: Europa, 2015.
HUIZINGA, J. Homo Ludens. O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo: Perspectiva, 2017.
MANTOVI, P. Roteiros & Criação de Personagens – Série Aprenda e Faça. São Paulo: Criativo,
2014.
Referências complementares
CHANDLER, H. Manual de Produção de Jogos Digitais. São Paulo: Bookman, 2012.
MCGONNIGAL, J. A realidade em jogo. São Paulo: Best Seller, 2012.
MUSBURGER, Robert. Roteiro para mídia eletrônica. 1. ed. São Paulo: Campus, 2008.
capítulo 4 • 81
RABIGER, Michael. Direção de cinema: Técnicas e Estética. 1. ed. São Paulo: Campus, 2007.
SCHUYTEMA, Paul. Design de Games – Uma Abordagem Prática. 1. ed. São Paulo: Cengage
Learning, 2008.
Referências de games
Call of Duty 4: Modern Warfare
Game of Thrones
The Last of Us
Tower Defense
Tomb Raider
The Walking Dead
capítulo 4 • 82
5
Jogos eletrônicos e
jogabilidade
Jogos eletrônicos e jogabilidade
A gramática cinematográfica propõe uma história a ser contada por imagens,
na qual temos enquadramentos, sons, planos e movimentos de câmeras. Os ga-
mes, por sua vez, oferecem a oportunidade da imersão na história, sem dizer que
outras narrativas tradicionais também se associaram ao meio dos games, como os
efeitos sonoros, legendas de diálogos e o bate-papo entre jogadores. Se as lingua-
gens se coadunam, nos resta discutir o que as une e o que as separa. O que desta
interatividade pode ser aplicada à narrativa e principalmente como vamos aplicar
ao roteiro?
Em um mundo em constante transformação, as múltiplas formas de se con-
tar uma história vão se ampliando. A tecnologia nos oferece novas ferramentas e
possibilidades com recursos modernos, mas o principal, em meio a tantas opções,
continua sendo o fazer e o contar uma história. Modificam-se os meios, mas o ser
humano permanece o mesmo e as histórias escritas, são construídas para refletirem
a natureza humana, seja pela óptica dos games, a literatura ou o cinema.
OBJETIVOS
• Compreender a função do ato de narrar;
• Compreender os conceitos de transmídia aplicados à narrativa dos games;
• Identificar o gráfico de ritmo na narrativa de game;
• Selecionar fatos/versões e vocábulos que imprimam ao texto a função persuasiva;
• Compreender a importância da narrativa embutida e o processo de adaptação dos jogos
para o cinema.
capítulo 5 • 84
Desenrola-se por meio de múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contri-
buindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa transmídia,
cada meio faz o que faz de melhor – a fim de que uma história possa ser introduzida em
um filme, ser expandida pela televisão, por romances e quadrinhos, seu universo possa
ser explorado em games ou experimentado como atração em um parque de diversões.
(JENKINS, 2009, p. 138)
Na visão de Jenkins, uma obra transmidiática abre espaço para ser preenchido
pelo público no vazio da narrativa. A abertura deste espaço deve aparecer no rotei-
ro pelo subtexto que o roteirista propõe no direcionamento da história. O design
narrativo busca ampliar a trama, aplicando a qualquer mídia, reconfigurando seu
objeto de uso para interação. Os artefatos digitais como tablets, smartphones, apps,
e e-book funcionam como artefato interativo e midiático, trazendo como caracte-
rísticas lúdicas o design de games. Enquanto a narrativa clássica da literatura pro-
põe ao leitor criar seu mundo imaginário, os artefatos digitais apresentam mundos
construídos e suas possibilidades de interação e recriação.
Na concepção dos elementos narrativos nos games, Jeannie Novak diz que
“existem vários elementos narrativos que são específicos dos games, muitos dos
quais diferem dos elementos narrativos tradicionais. Esses elementos incluem a
interatividade, a não linearidade, o controle pelo jogador, a colaboração e a imer-
são.” (NOVAK, 2011, p. 139). Essa ruptura com o clássico não significa um for-
mato definitivo e sim uma modificação, afinal, o mundo muda constantemente
e cabe aos criadores a percepção nas diferentes formas de se contar uma história.
Os jogos bidimensionais (2D) são aqueles nos quais não podemos mover a
câmera em movimentos circulares, ao passo que os jogos tridimensionais (3D)
podemos mover a câmera e assim observar todas as dimensões de um objeto tri-
dimensional. Como exemplo, em game 2D, temos a franquia Mario e Mortal
Kombat. O pesquisador Gabriel Cavalcanti define as diferenças entre os jogos. Nos
bidimensionais “o personagem pode se movimentar apenas em dois sentidos, para
frente e para trás e tem apenas visão lateral.” (CAVALCANTI, 2015, p. 24). Já os
jogos tridimensionais, “são aqueles nos quais podemos nos movimentar no jogo
em todas as direções, não só apenas para frente e para trás e podemos ver o objeto
nos três eixos X, Y e Z, ou seja, em suas três dimensões, por isso objetos tridimen-
sionais.” (CAVALCANTI, 2015, p. 24). Vamos entender como isso funciona.
capítulo 5 • 85
O cinema tem linguagem própria e o advento das novas tecnologias trouxe
vasta ampliação na forma de contar uma história e os jogos bidimensionais sur-
gem incorporando essa linguagem. Em sua obra Design de Games: Uma aborda-
gem Prática, Paul Schutema, apresenta todas as etapas de desenvolvimento de um
jogo digital, da pré-produção a pós-produção. Schutema é quem define o que é o
jogo digital:
Um game é uma atividade lúdica composta por uma série de ações e decisões, limitado
por regras e pelo universo do game, que resultam em uma condição final. As regras
e o universo do game são apresentados por meios eletrônicos e controlados por um
programa digital. As regras e o universo dos games existem para proporcionar uma
estrutura e um contexto para as ações de um jogador. As regras também existem para
criar situações interessantes com o objetivo de desafiar e se contrapor ao jogador. As
ações do jogador, suas decisões, escolhas e oportunidades, na verdade, sua jornada,
tudo isso compõem a “alma do game”. A riqueza do contexto, o desafio, a emoção, e a
diversão da jornada de um jogador, e não simplesmente a obtenção da condição final,
é que determinam o sucesso do game. (SCHUYTEMA, 2008, p. 7)
Em acordo com Schuytema (2008), podemos dizer que o que difere o game
das demais narrativas é o aspecto da jogabilidade e o poder de escolha que é ofe-
recido ao jogador.
capítulo 5 • 86
desempenhar em provações físicas e espirituais semelhantes.” (JENKINS, 2009,
p. 173)
A estrutura da jornada do herói, o qual Jenkins nos remete pode ser identifi-
cada em jogos como The Last of Us e Life is Stranger. Para o americano, essa fami-
liaridade com a estrutura básica do enredo permite ao roteirista omitir sequências
transicionais jogando o público direto no centro da ação. Já para Jeannie Novak
(2010) dentro da narrativa de game, o papel do narrador nem sempre é ocupado
por aqueles que os criaram. Segundo a autora “os próprios jogadores desempe-
nham papel importante no processo narrativo. Sabendo disso, é importante que
os desenvolvedores de games evitem roteirizar excessivamente a história.”
(NOVAK, 2010, p. 142). Um exemplo, os jogadores não precisam de diálogos ou
narrativas adicionais que quebrem o ritmo do game e impeçam sua plena partici-
pação na história.
Um exemplo desse universo do entretenimento
em que temos cinema e game é filme Matrix. O
mesmo foi construído para a era da convergên-
cia, conforme pontuam muitos críticos, procu-
rando integrar múltiplos textos para criar uma
narrativa tão ampla que não podia ser contida
somente em uma mídia. Criado pelos irmãos
Wachowski, o jogo transmídia logo se estabele-
ceu. Primeiro exibiram o filme original, depois
alguns quadrinhos na internet para instigar mais
a curiosidade do público. Para a sequência do
segundo filme, foi lançado um game para com-
putador, o que provocou mais curiosidade e ade-
Figura 5.1 – Fonte: Adorocinema. rência dos fãs. Matrix Reloaded obteve U$134
milhões de lucro nos primeiros quatro dias após o lançamento.
Em uma ampliação da leitura e interpretação de Matrix, podemos dizer que é uma
obra que faz referência aos arquétipos de gêneros populares (o hacker, os misteriosos
homens de preto etc.) e às fontes da mitologia (Morfeu, Perseféfone, o Oráculo).
Se protagonistas e antagonistas são arquétipos óbvios, e não personagens indi-
vidualizados, romanescos ou complexos, são imediatamente reconhecíveis, obser-
vou Jenkins. O mesmo pontua:
capítulo 5 • 87
Essa dependência de personagens recorrentes é especialmente importante no caso
dos games, cujos manuais de instruções e cenas iniciais os jogadores muitas vezes
ignoram, concedendo pouco tempo para explicações antes de agarrarem o controle e
tentarem navegar pelo universo do jogo. Críticos de cinema muitas vezes comparam
os personagens de Matrix a personagens de videogame. Roger Ebert, por exemplo,
sugere que avaliava sua preocupação com Neo, em Revolutions, menos em termos
de afeição pelo personagem e “mais como a pontuação de um videogame. Dá para
imaginar o programa se reiniciando e, depois, todos aqueles pequenos zeros e uns se
reorganizando para começar o jogo outra vez. (JENKINS, 2009, p. 174)
capítulo 5 • 88
Construindo contextos: o processo de adaptação
Podemos por um lado vincular a autoria ao viés formal/estético da obra e ao seu cará-
ter original e criativo. Podemos também pensar do ponto de vista jurídico e do mercado
onde essas obras circulam, e do direito autoral, e nesse caso o termo autor é destinado
a qualquer pessoa que tenha realizado uma obra, no caso audiovisual, e que terá em
decorrência desse fato direito – financeiros – sobre ela. (SERAFIM, 2009, p. 15)
capítulo 5 • 89
Na linha de transcodificação da página para tela, cabe ao roteirista não se
deixar influenciar pelo já proposto e aproveitar as habilidades e os truques da
escrita cinematográfica para expandir o universo da trama. Encontrar a voz que
conta a história, o fio condutor é o primeiro dos desafios em meio a tantos outros,
enquanto o trabalho do romancista é encontrar uma voz que irá alcançar o leitor.
Diante do levantamento proposto, como definir o conceito de autor e autoria
para o audiovisual, em um universo cada vez mais interativo?
O cinema frequentemente lança luzes para os jogos de apelo popular e acaba
por levar essa história para o cinema. A título de destaque podemos relacionar
Tomb Raider: a origem (2018), do diretor Roar Uthaug. Vamos acompanhar a
busca da heroína Lara Croft para encontrar o pai. Já em o Jogador número 1, de
Spielberg, é uma adaptação do romance de Ernest Cline. A principal jornada
de Wade é decifrar um quebra-cabeça deixado por James Halliday, criador do
game, sendo o filme uma caça aos easter-eggs para o espectador. A cada cena, a
cada quadro, em algumas sequências, o olhar do espectador é atraído por uma
referência à cultura pop/geek. O início da corrida é uma daquelas cenas em que o
olhar “se perde” e não se consegue guiá-lo em apenas uma direção. O carro-chefe
de o Jogador Número 1 é a grandiosa mise-en-scène, um êxtase já no primeiro ato.
Uma imersão nostálgica e emotiva, uma viagem no tempo. Na corrida, temos o
De Lorean de De volta para o futuro, a Van de Esquadrão Classe A, a moto de Akira
com rodas de Tron, o clássico carro de Speed Race, Ryu, o Batmóvel de Adam West,
Christine, Mad Max, King Kong no topo do Empire State, T-Rex de Jurassic Park e
infinitas referências. Ainda no cinema, Curtindo a Vida Adoidado, Clube dos 5, O
Iluminado, dentre outros. Musicalmente, ouvimos Bee Gees, Tears for Fears, A-ha,
Joan Jett e Van Halen.
capítulo 5 • 90
Spielberg, indiscutivelmente, quebra o recorde de referências em um único
filme, envolvendo os fãs de games, animes e da cultura pop oitentista, quadro
a quadro. Com uma estrutura sutil, o roteiro foi escrito por Spielberg e Ernest
Cline, autor do livro homônimo, o cinema de Spielberg volta com força, trazendo
o melhor do diretor, e unindo o universo cinematográfico ao mundo dos games e
ao universo tecnológico.
A questão da autoria é bastante controversa e polêmica no cenário contem-
porâneo. Para Lev Manovich (2004), vivemos a “Era do remix”, ou seja, o que
predomina são colagens e fusões. Não há como ignorar as diferenças notáveis
no processo de construção literária e cinematográfica. O conceito de “Autoria”
surge desde os gregos, com Homero, passando por Platão, Aristóteles, entre ou-
tros. Segundo Flávio Campos, “os dramaturgos da Grécia Antiga escreveram suas
tragédias a partir de mitos fornecidos pela tradição, Homero compôs a Ilíada
e a Odisseia a partir de mitos fornecidos pela tradição e de relatos de batalha.”
(CAMPOS, 2007, p. 293)
O avanço da tecnologia e suas transformações nos fizeram mudar a forma
de ver a escrita e a leitura e, consequentemente, transformaram o jeito de perce-
bermos a questão da autoria e a concepção de autor. Para Manovich, “se o pós-
-modernismo define a década de 1980, o remix definitivamente está dominando
o começo deste século (2000) e provavelmente continuará na próxima década.”
(MANOVICH, 2004, p. 253). Com base na assertiva de Manovich, como pode-
mos aplicar o conceito de autoria, tão em voga pela velocidade da internet, em
um processo de adaptação para o cinema? É preciso trazer para a discussão alguns
conceitos e confrontá-los.
O conceito de autoria no âmbito da literatura passou a ter visibilidade, com
o surgimento da Filosofia. A recombinação de códigos é uma prática antiga na
humanidade, seja pela reformulação de estilos ou linguagens. Manovich exem-
plifica que “a Roma Antiga remixou a Grécia Antiga, o Renascimento remixou a
Antiguidade.” (MANOVICH, 2004, p. 253). Já Regina Zilberman entende que
“a escrita ocidental apareceu durante o século VII a.C. Sua utilização para registro
de obras individuais teve de esperar alguns séculos, ocorrendo a partir da épo-
ca em que Platão redigiu seus diálogos e foram fixados os textos das epopeias.”
(ZILBERMAN, 2001, p. 1). Uma vez legitimada a forma escrita, a identificação
do autor tornou-se necessária.
capítulo 5 • 91
Assim, seria uma adaptação para o audiovisual somente um remix? O filósofo
Walter Benjamin (1994) já havia apontado que as obras da reprodutibilidade téc-
nica chegavam a lugares e pessoas em que as obras originais não poderiam chegar,
e mesmo o livro impresso não podia atingir tal público, e isso democratizava o
acesso às obras. Em diálogo com uma adaptação literária, uma vez que o livro é
transposto para o cinema ou para a televisão, essa última com um vasto público, a
possibilidade de futuramente alcançar mais leitores é infinitamente maior.
Dentro do contexto da cultura da convergência, o escritor Bruce Sterling fala
sobre o filme Matrix, considerado um marco na narrativa transmídia e em suas
diferentes adaptações.
Em primeiro lugar, o filme tem elementos de atração pop. Todos os tipos de elemen-
tos: ataques suicidas por forças especiais de elite, choque entre helicópteros, artes
marciais, uma inocente, mas apaixonada história de amor predestinado, monstros com
olhos esbugalhados absolutamente de primeira qualidade, roupas de fetiche, cativeiro
e tortura e resgate ousado, além de submarinos muito estranhos e bem legais... Há
exegese cristã, um mito redentor, morte e renascimento, um herói em autodescobri-
mento. A Odisseia, Jean Baudrillard (muito Baudrillard, a melhor parte do filme), to-
ques antológicos de ficção cientifica, da escola de Philip K. Dick, Nabucodosor, Buda,
taoísmo, misticismo de artes marciais, profecia oracular, telecinesia, do tipo que entorta
colheres, shows de mágica de Houdini, Joseph Campbell e metafísica matemática go-
deliana. (JENKINS, 2009, p. 141)
capítulo 5 • 92
Em relação aos games, Jeannie Novak, acrescenta: “o cenário ou contexto re-
presenta o mundo que está sendo explorado pelo público, pelos personagens ou
pelo jogador. Ao criar uma história para um game, pense no mundo em que seus
personagens deverão viver e interagir.” (NOVAK, 2011, p. 133)
Questões de adaptação e relações intertextuais, entre outras expressões ar-
tísticas, como a literatura e os meios audiovisuais, fazem parte do próprio de-
senvolvimento da linguagem audiovisual. Para Linda Hutcheon (2011), com o
surgimento das novas tecnologias e a convergência das mídias, a autoria passa
obrigatoriamente pela adaptação. A pesquisadora lembra que ao dizermos que a
obra é uma adaptação, anunciamos abertamente sua relação declarada com outra
(s) obra (s).
É isso que Gerard Genette entende “por um texto em ‘segundo grau’, criado e
então recebido em conexão com um texto anterior”. (GENETTE, 1982, p. 5). Eis
o motivo pelo qual os estudos de adaptação são frequentemente estudos compa-
rados. Para Hutcheon (2011), isso é bem diferente de dizer que as adaptações não
são trabalhos autônomos e que não podem ser interpretadas como tais, conforme
vários teóricos têm insistido, elas obviamente o são.
capítulo 5 • 93
Para Mckee, a chave da verdadeira personagem é o desejo. Em suas palavras “a
verdadeira personagem só pode ser expressa através de uma escolha em um dilema.
Como a pessoa escolhe agir sob pressão é quem ela é – quanto maior a pressão,
mais verdadeira e profunda a escolha da personagem.” (MCKEE, 2006, p. 351).
O conflito vivenciado pelo personagem pode ser de cunho social, religioso, eco-
nômico e psicológico. Eis o ponto de partida. Aqui podemos trazer outros perso-
nagens como os que habitam o universo de The Walking Dead, Game of Thrones e
Life is Strange.
Como estudamos no capítulo 1, a palavra “protagonista” vem do grego prôtos
(“primeiro”) e agonistés (“combatente”), essa é a definição apresentada por Flávio de
Campos, que ainda esclarece sobre a escolha do personagem principal. Para Campos
“a seleção de personagem principal da narrativa segue a mesma demanda da seleção
do principal ponto de vista do seu narrador, estabelecer uma referência a partir da
qual a narrativa será composta e, mais tarde, recebida pelo espectador – e assim, dar
unidade e facilitar composição e recepção.” (CAMPOS, 2007, p. 108). A escolha
do protagonista pelo senso comum pede um antagonista. Campos (2007) afirma
que o que define o antagonista não é o seu perfil e sim sua função de antagonizar,
e esclarece que “Por sua definição relativa – o antagonista existe apenas em relação
ao personagem que ele antagoniza –, um antagonista tanto pode ser personagem
redondo, quanto um tipo ou um arquétipo. E um personagem pode antagonizar
outro na história toda, em um incidente, em uma cena, em um segmento de cena
ou apenas em uma fala, em um gesto.” (CAMPOS, 2007, p. 151)
O avanço da tecnologia cada vez mais oferece suporte para ampliação das
narrativas. Hoje, um autor dificilmente se limita a criar um único universo em
uma obra, os criadores procuram construir ambientes atraentes e que não se esgo-
tem em uma única mídia. O universo é maior do que o filme, maior até do que a
franquia e, como ensinou Jenkins, “as especulações e elaborações dos fãs também
expandem o universo em várias direções.” (JENKINS, 2009, p. 162). Essa asserti-
va vai ao encontro do que a pesquisadora Jeannie Novak propõe na construção de
personagens de game. Ela defende:
capítulo 5 • 94
Uma vez que ressaltamos o universo dos personagens, agora vamos conhecer
os mundos em que eles podem habitar.
Mundos transmídia
Uma história transmídia desenrola-se por meio de múltiplas plataformas de mídia, com
cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal
de narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor – a fim de que uma história
possa ser introduzida em um filme, ser expandida pela televisão, por romances e qua-
drinhos, seu universo possa ser explorado em games ou experimentando como atração
de um parque de diversões. Cada acesso à franquia deve ser autônomo, para que não
seja necessário ver o filme para gostar do game e vice-versa. Cada produto determina-
do é um ponto de acesso à franquia como um todo. (JENKINS, 2009, p. 138)
capítulo 5 • 95
Cannito (2010) tenha não somente uma narrativa, mas um universo que incentive
rituais e, principalmente, favoreça a formação de comunidades. Importante des-
tacar que essa ideia da interatividade é uma prerrogativa da linguagem dos games.
Um exemplo, que podemos destacar é o caso do seriado Lost. Segundo
Cannito, em Lost “a narrativa é aparentemente tradicional, mas inova ao se ex-
pandir por outras mídias. O sucesso da série está relacionado às estratégias inte-
rativas.” (CANNITO, 2010, p. 193). O planejamento de interatividade levou o
seriado muito além da televisão.
Gráfico de ritmos
O jogador começa do marco zero (ou nível 1) sem habilidades, equipamento e capa-
cidade. O jogador tem muitas habilidades que são apresentadas a ele no começo do
jogo, mas têm que ser destravadas com o tempo. O mecanismo de destravamento
pode ser experiência dinheiro ou outro fator. O jogador tem muitas habilidades, mas
não tem conhecimento de como usá-las... O jogador tem poder significativo que poderá
usar imediatamente... somente para ter de “começar do zero”, conforme a história do
jogo é estruturada como flashback. (ROGERS, 2012, p. 100)
Agora, vamos ao gráfico de ritmo. Cada gráfico necessita dos seguintes ele-
mentos. Rogers (2012) assim os classifica:
• Nome do nível/ambiente;
• Nome do arquivo (designação de nível/ambiente);
• Hora do dia (no contexto do jogo);
• Elementos da história para o nível;
• Progressão: foco do gameplay no nível;
• Tempo de jogo estimado do nível;
• Esquema de cor do nível/ambiente;
• Inimigos/bosses introduzidos e usados;
• Mecânicas introduzidas e usadas;
• Perigos introduzidos e usados;
capítulo 5 • 96
• Power-ups encontrados no nível/ambiente;
• Novas habilidades, armas, ou equipamentos introduzidos/destravados;
• Quantidade e tipos de tesouro que o jogador pode encontrar;
• Material de bônus encontrado no nível /ambiente;
• Trilha musical (ou ilhas) a serem usadas nesse nível/ambiente.
Nível 1-1
Nome: grave perigo (cemitério).
Hora do dia: noite.
História: máximo entra no cemitério, abrindo
caminho entre criaturas mortas-vivas que barram
sua passagem.
Progressão: o jogador sabe movimentos básicos, Figura 5.3 – Fonte: Amazon..
de combate e defesa. O jogador aprende habilidade de coletar e mapear.
Tempo de jogo estimado: 15 minutos.
Mapa de cores: verdes (árvores), marrom (árvores, rochas), roxos (lápides).
Inimigos: esqueletos (básico), esqueleto de espada (vermelho), esqueleto (ma-
chado), fantasma, zumbi (básico), caixão de madeira, imitação de arca.
Mecânicas: solo sagrado, lápides quebráveis, tocha quebrável, tampa de cripta
quebrável, cadeado, portal (porta), portal (cova), arca escondida, pedestal final.
Perigos: solo profano, estátua de Achille, chão com buraco, torre de caveira,
ponte móvel, água profunda, poça de lava.
capítulo 5 • 97
Inimigos: esqueletos (básico), esqueleto (machado), esqueleto de espada (verme-
lho), esqueleto de espada (azul), esqueleto (guardião), zumbi (básico), corvo, fantasma.
Mecânicas: solo sagrado, lápides quebráveis, tocha quebrável, tampa de cripta
quebrável, estátua de chave, cadeado, portal (porta), caixão de inimigo, platafor-
ma flutuante, roda de prêmios, arca de tesouro, arca trancada, arca escondida,
pedestal final.
Perigos: solo profano, portão oscilante, torre de caveira, jato de fogo, poça
de lava.
Para Scott Rogers (2012), quando você compara duas ou mais colunas de um
gráfico de ritmo, “certos padrões começam a emergir a respeito da introdução
de novos inimigos, mecânicas, itens e habilidades. Você pode então, identificar
deficiências no design e começar a mover os elementos.” (ROGERS, 2012, p.
102). Rogers traz algumas pontuações que são importantes de serem observadas
ao longo da criação do jogo, tais como: aglomeração, ou seja, introduzir novos
inimigos e mecânicas de uma vez. Sair da “mesmice”, aqui você deve evitar que as
combinações de inimigos e mecânicas sejam idênticas. Ainda procure alternar as
cores e trilhas musicais.
A respeito dos efeitos sonoros eles devem ser desenvolvidos conforme você
desenvolve o conjunto de movimentos de seus personagens e inimigos. Rogers
sugere uma catalogação destes efeitos sonoros. Eis as sugestões:
capítulo 5 • 98
Como podemos perceber, o gráfico de ritmo é de suma importância para o
avanço da narrativa e principalmente para que o protagonista cumpra sua jornada
com ação.
ATIVIDADES
Neste capítulo, a atividade proposta vem sugerida por Jeannie Novak em seu livro refe-
renciado neste capítulo. (NOVAK, 2010, p. 210)
01. Você é imune a uma doença imortal que provoca o envelhecimento rápido dos seres hu-
manos. Cabe a você encontrar a cura. Use seus poderes de dedução para descobrir a origem
da doença e encontrar o antídoto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CESAR, C. Como criar personagens. São Paulo: Europa, 2015.
HUIZINGA, J. Homo Ludens. O Jogo Como Elemento da Cultura. São Paulo: Perspectiva, 2017.
MANTOVI, P. Roteiros & Criação de Personagens – Série Aprenda e Faça. São Paulo: Criativo,
2014.
Referências complementares
CHANDLER, H. Manual de Produção de Jogos Digitais. São Paulo: Bookman, 2012.
MCGONNIGAL, J. A Realidade em Jogo. 1. São Paulo: Best Seller, 2012. 1.
MUSBURGER, Robert. Roteiro para mídia eletrônica. 1. ed. São Paulo: Campus, 2008.
RABIGER, Michael. Direção de cinema: Técnicas e Estética. 1. ed. São Paulo: Campus, 2007.
SCHUYTEMA, Paul. Design de Games – Uma Abordagem Prática. 1. ed. São Paulo: Cengage
Learning, 2008.
capítulo 5 • 99
GENETTE, Gérard. O discurso da narrativa. Lisboa: Vega, 1982.
HUTCHEON, Linda. Uma teoria da adaptação. Santa Catarina: Editora UFSC, 2010.
JENKINS, H. A cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2009.
MARTIN, Brett. Homens difíceis. Rio de Janeiro: Editora Aleph, 2014.
MANOVICH, Lev. Quem é o autor? Sampleamento/Remixagem/Código aberto. In: BRASIL, André et al
(Org.). Cultura em fluxo: novas mediações em rede. Belo Horizonte: PUC Minas, 2004.
MCKEE, Robert. Story. Curitiba: Arte e Letra, 2006.
NOVAK, Jeannie. Desenvolvimento de Games. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
SARAIVA, Leandro; CANNITO, Newton. Manual de roteiro ou Manuel, o primo pobre dos manuais
de cinema e TV. São Paulo: Conrad, 2009.
SERAFIM, José Francisco (Org.). Autor e autoria no cinema e na televisão. Salvador: EDUFBA,
2009.
ROGERS, Scott. Level UP: um guia para o design de grandes jogos. São Paulo: Blucher, 2012.
ZILBERMAN, Regina. Institucionalização da autoria e reificação do escritor. Fameco, Minas
Gerais, v. 4, n. 1, p. 1-10, jan/jun.2001.
Referências de games
Call of Duty 4: Modern Warfare
Game of Thrones
Mario
Máximo: Ghost to Glory
Matrix
The Last of Us
Tower Defense
Tomb Raider
The Walking Dead
Life is Strange
GABARITO
Capítulo 1
01. O gabarito oferecido é composto na leitura de Scott Rogers que se encontra na nos-
sa bibliografia.
capítulo 5 • 100
– Chapeuzinho Vermelho caminha pela floresta até a casa da Vovó (clássico jogo de
exploração). Dê a Chapeuzinho algumas prendas para coletar, a fim de encher sua cesta de
piquenique (sistema de inventário) e faça com que ela pule um ou dois troncos caídos em
seu caminho.
– Chapeuzinho encontra o Lobo Mau – o jogador tem seu primeiro encontro com o
inimigo. Naturalmente, você ainda não pode matar o Lobo (a menos que os inimigos sejam
lobinhos lacaios).
– Carregando um conjunto completo de prendas (sistema portal), Chapeuzinho encontra
a casa da vovó (próximo nível), onde ela encontra a vovó esperando na cama.
– Chapeuzinho questiona a verdadeira identidade da Vovó (que grandes olhos você
tem!). Isso pode ser feito em forma de um questionário, de um quebra-cabeça, ou até mesmo
de um jogo de ritmo. (ROGERS, 2010, p. 67)
Capítulo 2
01. Nesta narrativa de O poderoso chefão, de Francis Ford Coppola, você tem muitas trilhas
para montar. Vamos às sugestões:
I. Você pode colocar um dos irmãos para assumir o posto de grande chefe da máfia.
II. Levar a família para um mundo legítimo, longe de tudo e de todos.
III. Estabelecer um código de lealdade com a máfia.
IV. Quais são seus territórios?
V. Quais são seus inimigos?
Vejam que com estes cinco pontos, vocês já têm material suficiente para produzir um jogo.
Capítulo 3
01. Comece com o gameplay e detalhe como a sequência de jogo é apresentada. Existirão
múltiplos capítulos na história? A história se aplica à jornada do herói? O jogo está dividido
em níveis ou rounds? Há cenários legais, como dirigir enquanto atira ou fugir de uma pedra
gigante? E para construção dos personagens, em qual arquétipo você se apoiaria apara
deixar a sua história mais crível? Lembre-se de que a personalidade e as ações de seu per-
sonagem devem determinar sua aparência. Então, dê a seus personagens formas, silhuetas,
cores e texturas distintas, assim procure nomear seus heróis de maneira apropriada. Em
seguida, use o personagem do jogador para determinar as métricas do jogo. Também use o
personagem do jogador para refletir sobre as condições do jogo e principalmente, divirta-se
capítulo 5 • 101
no seu processo de criação. Liberte-se e deixe a inspiração te pegar. Se for bom para você,
com toda certeza será para quem for jogar sua história.
Capítulo 4
Capítulo 5
capítulo 5 • 102
ANOTAÇÕES
capítulo 5 • 103
ANOTAÇÕES
capítulo 5 • 104