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Classe

309

Jessica Batista






Jessica Batista
Classe 309

Copyright © Jessica Batista 2020 Arte de capa: Letícia Reis
Diagramação: E.A. Capas & Diagramação


Batista, Jessica Batista

Classe 309/Jessica Batista

1ª edição - Nova Iguaçu, Rj, Edição Independente, 2020

632p;23cm

ISBN 978-65-86251-41-8
Batista, Jessica Batista

Classe 309/Jessica Batista

1ª edição - Nova Iguaçu, Rj, Edição Independente, 2020

632p;23cm

ISBN 978-65-86251-41-8



“(...) Ya me vestí a conciencia para verte Que no se asuste nadie si
nos miran
Y ven que nos miramos diferente.”


- De Tu Ojos; Vanesa Martín

Sumário
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48




Capítulo 1

Jennifer Meireles é uma jovem de dezoito anos que cursa o terceiro ano
do ensino médio em um colégio que exerce o estilo americano de ensino. Apesar
de sua pouca idade, Jennifer é extremamente responsável e madura. Ela possui
uma enorme dedicação aos estudos e adora praticar boxe em seu tempo livre. Por
estudar no período da tarde, faz seus treinos de boxe às manhãs de segunda,
quarta e sexta. Meireles tem a pele clara, olhos verdes feito esmeraldas, corpo
atlético e definido por consequência da luta, e um lindo cabelo loiro de ondas
largas de tamanho mediano. Jennifer é filha única e possui pais separados,
morando apenas com sua mãe Morgana Meireles.

— Oh, não..., mas já? — Resmungou Jennifer, de sua cama, assim que
o alarme do celular iniciou. Eram oito horas da manhã de uma segunda feira.
Jennifer levantou-se de sua cama, cuidou de sua higiene pessoal, tomou
um leve café da manhã e seguiu para o treino. Por morar longe do local onde
praticava sua luta, e por depender de transporte público, a jovem sempre saía de
casa com antecedência. Chegar atrasada aos locais era algo que a loira evitava ao
máximo. Pontualidade era seu segundo nome.


Acomodada à mesa em sua sala de jantar, Regina Vianna almoçava
tranquilamente enquanto aguardava o horário de seu expediente. Regina é
professora de história em um renomado colégio de ensino médio. Ela abrange
quase todas as turmas da instituição; lecionando no período da manhã e também
da tarde. Contudo, às segundas e quintas trabalha apenas no período da tarde. E
visto que hoje era segunda-feira, poderia almoçar no sossego de seu lar enquanto
aguardava seu horário de expediente.
Regina é uma linda mulher de trinta e três anos. É dona de um intenso,
intimidador e penetrante par de olhos castanhos. Sua pele possui uma atraente
tonalidade oliva. Seu cabelo é curto, acima dos ombros, de coloração castanho
escuro. A morena é filha de mãe italiana e de pai porto-riquenho. Regina não se
interessou em aprender a fundo o idioma da mãe. Porém, o do pai, fala com
fluência. Inclusive, dá aulas particulares de espanhol em suas horas vagas.

— Não, essa não é a sua comida, Bóris — disse Regina enquanto
tentava esquivar seu prato. Bóris é seu animal de estimação. É um gato de
coloração preta, sem raça definida, de quatro anos de idade. — Vamos lá, que eu
vou colocar sua ração. — Regina levantou-se da mesa e caminhou até a cozinha
sendo seguida por Bóris, que miava ao mesmo tempo em que roçava entre suas
pernas. A morena abriu o reservatório de ração e despejou uma considerável
quantia no pequeno bol. de inox de Bóris. Após isso, terminou de se arrumar,
recolheu as chaves do carro e seguiu para o trabalho. Ela se encontrava um
pouco ansiosa, pois era início do ano letivo e teria uma nova leva de turmas.


— Oh, droga! — Resmungou Jennifer ao voltar da luta e constatar que
já era meio dia. Ela havia se deparado com um inesperado engarrafamento a
caminho de casa. Visto que precisava estar em sala de aula à uma da tarde,
precisou apressar suas tarefas.
A jovem retirou seu uniforme do boxe, tomou uma rápida chuveirada e
vestiu seu uniforme escolar, que era constituído por uma calça jeans e blusa pólo
de coloração branca com detalhes em vermelho e azul marinho na gola e no
brasão da escola, que se localizava no lado esquerdo do peito. O uniforme de
Jennifer sofria algumas variações. Além da versão saia e calça, também havia o
short para as aulas esportivas.

Ao chegar ao colégio, subiu as escadas às pressas, parando apenas
quando encontrou sua melhor amiga, Beatriz.
— Jennifer! — Gritou Beatriz ao avistar a loira no corredor.
— Bea! — Respondeu animada. Ela caminhou até sua amiga e a
cumprimentou com um abraço. — Que saudades eu estava de você!
— Nem fala! Eu também senti sua falta— respondeu. A amiga de
Jennifer havia passado as férias escolares em outra cidade com a família.
— Quero muito que você me conte como foi a viagem, mas antes
preciso saber em qual sala estou alocada — disse Jennifer enquanto passeava
seus olhos pelas paredes do corredor à procura da listagem de nomes.
— Espero que tenhamos ficado na mesma turma. Seria um saco passar
justo o nosso último ano escolar afastadas.
— Achei! — Exclamou Meireles ao mesmo tempo em que manteve
seus olhos fixos ao papel disposto na parede. — Estamos alocadas juntas na
turma trezentos e nove.
— Ufa! Estou aliviada — disse Beatriz. — Agora vamos procurar nossa
sala e entrar, pois já está em cima da hora!

Assim que Jennifer e sua amiga entraram na sala de aula, logo foram se
atualizando sobre os ocorridos nas férias uma da outra. Beatriz contava com
empolgação sobre todos os novos lugares que havia conhecido, enquanto a loira
falava sobre as poucas novidades de umas férias em casa. Meireles também
explicou sobre como havia sido sem graça seu aniversário sem a presença de sua
melhor amiga. Ela havia completado dezoito anos há poucas semanas.
— Sinto muito não ter estado com você, Jen — lamentou Beatriz. —
Mas me conta, onde passou seu aniversário?
— Em casa. Recebi alguns colegas e familiares. Minha mãe fez um bolo
e pediu algumas pizzas.
— Hummm, os bolos da dona Morgana Meireles são de lamber os
beiços. — Sorriu.
— Verdade! — Concordou sorrindo. — Você já sabe os horários das
disciplinas?
— Ainda não. Assim que tivermos nosso intervalo, a gente se informa
sobre isso.
— Ok.

Jennifer e Beatriz acomodaram-se em suas mesas. As duas haviam
tomado os primeiros dois lugares disponíveis, lado a lado, na fileira central da
sala de aula, localizados em frente a grande mesa dos professores. As duas
amigas mantinham o hábito de sentarem-se nessa localização desde o primeiro
ano no colégio.
As duas primeiras aulas foram de matemática; matéria favorita de
Beatriz e odiada por Jennifer. A matéria seguinte foi química, e logo após deu-se
início ao intervalo de quinze minutos. Meireles e sua amiga aproveitaram esse
pequeno espaço de tempo para lancharem e reverem alguns amigos.
— Dois tempos de matemática seguidos em plena segunda feira é o fim!
— Reclamou Jennifer enquanto se servia de seu suco de maçã. — E justo nos
dois primeiros horários! — Exclamou irritada.
— Para de reclamar, Jen! Matemática é uma delícia, vai! — Disse
Beatriz enquanto tentava conter uma risada que teimava em sair por conta das
expressões que a loira esboçava.
— Você precisa rever seu conceito de delícia, Beatriz. — Riu.
— Jennifer! Bea! — Uma voz masculina soou ao fundo.
— Kevin! — As duas garotas responderam quase em uníssono. O rapaz
era um dos amigos das jovens.
— Você está em qual turma? — perguntou Jen.
— Na trezentos e cinco, primeiro andar. E vocês?
— Trezentos e nove, segundo piso — respondeu Beatriz. A voz da
garota saiu como um lamento. Ela nutria uma espécie de amor platônico por
Kevin desde o primeiro ano.
— Que pena! — disse ele. A pequena conversa entre os três foi
interrompida quando o alarme ecoou por todo o colégio, indicando o fim do
intervalo. — A gente se esbarra por aí, meninas! — Kevin acenou com a mão e
caminhou em outra direção.
— Ele fica mais lindo a cada ano que passa — disse Beatriz em meio a
um suspiro.
Meireles apenas revirou os olhos e arrastou sua amiga para fora dali.
— Vamos, ainda precisamos anotar os horários das aulas — lembrou.
— Jen, relaxa! Hoje ainda é o primeiro dia!
— E daí? Você sabe que gosto de me organizar. Gosto de tudo certo.
Preciso saber quais aulas terei e em quais dias da semana para poder me
localizar.
— Okay, okay. Vamos até a secretaria tentar conseguir essa
informação.

Pouco mais de cinco minutos haviam se passado, Jennifer e Beatriz já
estavam novamente em seus lugares. Ambas conferiam a grade de matérias que
conseguira há pouco, enquanto aguardavam o professor seguinte entrar em sala
de aula. No instante em que liam a listagem, as duas amigas perceberam que
mais da metade dos professores seriam os mesmos dos anos anteriores. A
mudança havia sido mínima. Apenas os nomes referentes ao professor de e
atividade física e à professora de história eram desconhecidos por elas. Armando
Soares seria o professor de educação física, e Regina Vianna seria a nova
professora de história.
— Pelo que consta na grade iremos conhecer essa tal de Regina ainda
hoje — comentou Beatriz ao observar os horários. — A última aula será a dela.
— Ótimo! Ao menos a última matéria dessa segunda-feira será a minha
favorita. Poderei ir pra casa em paz — riu, arrancando uma risada de sua amiga.
— Shhi, agora silêncio porque a aula vai começar — disse assim que o professor
entrou em sala.

Duas aulas mais haviam se passado quando finalmente o último horário
chegou, trazendo consigo a tão adorada matéria de Meireles. Um pequeno
aglomerado de alunos conversava ao fundo da sala de aula, enquanto outro tanto
se agrupou na porta. Todos estavam distraídos até a chegada da imponente
Regina. Assim que a figura séria da professora entrou em sala de aula,
instantaneamente todos os alunos tomaram seus lugares. Quando já estavam
devidamente alocados em suas mesas, Regina fechou a porta e se posicionou em
frente ao quadro, virada para seus alunos.

— Boa tarde, classe! — disse educadamente. — Me chamo Regina
Vianna e serei a professora de história de vocês. — A morena passeou
rapidamente e aleatoriamente seu olhar pelo rosto de alguns alunos presentes. —
Vejo que alguns de vocês eu já conheço. Mas também observei muitos rostos
novos. — Ela caminhou até o quadro, escreveu a data de hoje, sua disciplina e
seu nome. Em seguida, voltou a se posicionar de frente à classe. Regina Vianna
era uma excelente professora. Todavia, a morena tinha fama de ser
extremamente rígida com seus alunos. Com ela não havia meio termo. Por
consequência de sua postura séria, chegava a ser temida por alguns estudantes.
Contudo, se soubessem lidar com seu gênio forte e sua personalidade autoritária,
descobririam a grande pessoa que ela poderia ser.

Quando a professora entrou no ambiente, os olhos de Jennifer Meireles
automaticamente caíram sobre ela. Jennifer a seguiu com o olhar desde a porta
até o centro da sala. E assim que o par de esmeraldas da loira cruzou com o
penetrante olhar de Regina, a jovem entrou em um breve transe. Jennifer
desviava seu olhar dos castanhos da professora apenas para poder observá-la dos
pés à cabeça. Regina vestia uma justa e preta calça jeans de cintura alta e uma
blusa social de coloração azul claro devidamente ensacada. Em seus pés havia
um sapato preto fechado de salto alto com a sola vermelha, combinando com o
intenso vermelho do batom que habitava em seus lábios. A jovem, com o olhar,
traçou cada detalhe da mulher à sua frente. Incluindo os óculos de grau com a
armação preta que dava todo um charme à mulher.

— Jennifer, você está bem? — murmurou Beatriz ao perceber o quão
compenetrada sua amiga estava. Meireles apenas assentiu positivamente com a
cabeça e continuou a manter a atenção na mulher à sua frente.
— Visto que a turma está um pouco vazia por ser o primeiro dia de
aula, não irei iniciar a matéria hoje. Usarei o tempo para apresentação pessoal.
Quero que nos conheçamos o mínimo possível para, assim, desenvolvermos um
bom relacionamento até o final do ano letivo. Ok? — disse Regina, e todos
assentiram. Enquanto a morena falava e gesticulava, ela esporadicamente
cruzava seu olhar com o da jovem Jennifer. E sempre que o fazia, sentia-se
brevemente presa àquela situação.

— Odeio apresentação pessoal — murmurou Beatriz à sua amiga. —
Nunca sei o que falar sobre mim.
— Também não acho confortável — disse a loira. — Mas precisamos
aprender a lidar com esse tipo de coisa.
— Verdade.
— Irei escrever algumas questões pessoais no quadro. Quero que vocês
copiem, respondam e me entreguem. — Regina pegou uma caneta preta e
começou a escrever as perguntas no quadro branco.
— Ufa, pelo menos não será oral — comentou Beatriz em tom de
alívio.

Regina era dona de uma linda e legível caligrafia. Sua escrita era fina,
alongada, e as letras possuíam uma sutil inclinação para a direita. Enquanto
escrevia, alguns murmúrios vindos do fundo da sala se fizeram ouvidos por ela.
Os murmúrios vinham de um grupo de rapazes que comentavam sobre o quão
deslumbrante a professora era. A professora, desconfortável com a situação,
emitiu um chiado, fazendo com que o grupo de alunos se calasse.
— Esses meninos são uns babacas — comentou Jennifer.
— Concordo. Mas essa professora realmente é belíssima.
— Não é pra tanto, vai — disse ao demonstrar um pequeno desdém.

Regina aplicou o questionário com o objetivo de conhecer sua classe. E,
mais do que conhecê-los, queria saber o olhar que cada um tem sobre si mesmo.
Ao terminar de escrever, sentou-se elegantemente em sua cadeira, cruzou as
pernas e retomou o diálogo com a turma. Ao mesmo tempo em que os alunos
iam respondendo ao questionário, ela foi passando-lhes informações sobre sua
forma de avaliação. A professora informou sobre como funcionava seus testes,
provas e trabalhos. E, por fim, pediu-lhes que trouxessem um determinado livro
para a aula seguinte.
Por ser o primeiro dia de aula e por não ter aplicado matéria, a morena
permitiu que seus alunos conversassem entre si conforme fossem respondendo às
perguntas. Porém, futuramente em suas aulas, conversas paralelas fora de hora
era algo que não iria tolerar.
— Ainda não recebi meu diário de classe, então irei passar uma folha
com o número da turma e a data de hoje. Peço que vocês, por favor, assinem —
disse ao levantar-se de seu lugar, caminhar até próximo a porta e depositar a
folha sobre a mesa do primeiro aluno da fileira encostada à parede.
Conforme os minutos foram se passando, Regina permitiu que os
estudantes que já tivessem respondido ao questionário e assinado a lista fossem
embora. Ao final, restou apenas Jennifer e sua amiga. Beatriz assinou seu nome,
depositou o questionário na mesa da professora e caminhou rapidamente para
fora da sala. A amiga da loira saiu às pressas, pois havia acabado de avistar
Kevin passando no corredor.
Jennifer, por sua vez, concluiu a atividade, guardou seu material dentro
da mochila e aproximou-se da mesa da professora.
— Aqui está — disse ela. A loira entregou as folhas diretamente nas
mãos da morena.
— Obrigada, senhorita...— Regina fez uma breve pausa em sua fala,
depositou o olhar sobre a temporária folha de chamada e verificou qual havia
sido o último nome assinado na listagem. — Meireles? — concluiu, incerta.
Depositando, agora, seu olhar em Jennifer.
— Isso. Jennifer Meireles — confirmou a loira. Ela esboçou um
pequeno e rápido sorriso ao responder. Ter o penetrante olhar da morena cruzado
com o seu estava deixando-a intimidada. — Até a próxima aula — se despediu,
segundos antes de deixar o lugar.

— Por que você não me esperou? — reclamou ao reencontrar sua amiga
em frente ao portão de saída.
— Desculpe, avistei Kevin no corredor e fui conversar com ele.
— Hum... E sobre o que conversaram? — perguntou curiosa.
— Nada demais. Nossa conversa praticamente se resumiu sobre como
foi o primeiro dia de aula — respondeu ao mesmo tempo em que caminhava
com a amiga para o ponto de ônibus.
— Eu acho que você deveria contar a ele sobre seus sentimentos —
sugeriu Jennifer.
— Pra quê? Não quero perder a amizade dele.
— E se ele corresponder? Você não sabe.
— E se não? Prefiro não correr esse risco.
— Você quem sabe, mas o não você já tem. Poderia arriscar algo
melhor.
— Tenho medo que nossa amizade mude e ele se distancie.
— Caso ele não corresponda, realmente isso pode vir a acontecer. Mas
você não acha que a possível recompensa vale o risco? Afinal, já faz dois anos
que você vem nutrindo esses sentimentos por ele. Se quer um conselho, Bea,
arrisque ou tente se livrar desse sentimento. Não dá pra passar o resto da vida
amando sozinha.
— Verdade...— respondeu perdida em seus pensamentos.
— Nosso ônibus. Vamos!


Ao chegar em casa, Regina entrou no imóvel pela porta dos fundos
referente à área de serviço. Ela livrou-se de seus saltos altos e os depositou
alinhadamente ao lado de alguns outros calçados usados que havia no local. Ela
possuía certa obsessão por arrumação. Tudo o que fosse de seu convívio deveria
sempre permanecer na mais perfeita ordem.
— Oi, meu amor — disse ao ser recebida pelas carícias de Bóris em
suas pernas. A morena tomou aquela animada bolinha felpuda em seus braços e
seguiu para o quarto.
A professora livrou-se de suas roupas e caminhou até o banheiro que
havia dentro do cômodo. Ao entrar debaixo do chuveiro, sentiu o jato morno de
água entrar em contato com sua pele, proporcionando uma gostosa sensação de
relaxamento. Para ela não havia nada mais revigorante que passar longos
minutos em um banho após um dia cansativo. Ao concluir, vestiu-se com um
pijama de seda azul marinho e direcionou-se com sua bolsa para o pequeno
escritório pessoal que possuía dentro de casa. Lá era o local onde Regina fazia o
planejamento de suas aulas, assim como correção de provas, trabalhos e tudo
mais que fizesse parte do âmbito profissional. Nele havia diversas estantes e
prateleiras de madeira abarrotadas de livros. Todos muito bem organizados e
enfileirados por tipo e ordem alfabética. No escritório também havia uma rústica
mesa executiva de madeira contendo um computador e uma impressora. Todo o
ambiente era disposto de uma decoração antiga, completamente diferenciada de
todo o resto da casa, que possuía uma decoração e uma arquitetura
completamente modernas. Em meio aos livros também havia alguns objetos
decorativos. Eram itens que ela trazia de suas viagens para fora do país.
Regina apoiou sua bolsa em cima da mesa, foi até a cozinha e voltou
com uma xícara de chá de maçã; seu preferido. A mulher apoiou a bebida em
cima da mesa e retirou um maço de folhas de papel de dentro da bolsa. Se
tratava do questionário de perguntas pessoais que havia aplicado nas classes
trezentos e nove e trezentos e cinco. Apenas estas turmas, por terem um número
baixo de alunos presentes, receberam essa atividade. A professora, então,
começou a folheá-las e a ler o que cada uma dizia.
Regina ria, balançava a cabeça negativamente e sorria conforme ia
lendo algumas respostas de seus alunos. Algumas chegavam a ser surreais. Entre
uma folha e outra, um gole e outro em seu chá, chegou ao questionário de
Jennifer Meireles. Sua aluna possuía uma caligrafia grossa, bonita e legível.
Todo seu questionário estava respondido com letras de forma.
Questionário - Classe 309.

1- Qual o seu nome? Jennifer Meireles.

2- Quantos anos teria se você não soubesse a idade que tem? Algo entre
os 20 e 25.

3- O que você, como aluno(a), poderia melhorar na escola? Poderia
opinar minhas ideias e trazer um novo olhar para a escola. Mas, para isso ser
possível, a instituição precisa dar voz aos alunos.

4- Será que você quebraria a lei para salvar uma pessoa amada? Sim. Pois
o que é a lei quando existe amor? Amar deveria ser a lei.

5- Se você tivesse que se mudar para um país além do que você vive no
momento, para onde você iria e por quê? Difícil escolher apenas um. Tenho
interesse pela Espanha, Itália e França. Tenho certo fascínio por toda a Europa,
na verdade. Escolheria a Espanha pelo idioma, a Itália pela arquitetura
medieval, e a França por todo o romantismo.

6- Será que é possível saber a verdade sem desafiá-la primeiro? Acho que
só se conhece verdadeiramente o que se vive. Então, não.

7- . Qual é a diferença entre estar vivo e realmente viver? Estar vivo é
existir de maneira mecânica. Viver é sentir.

8- Se aprendemos com os nossos erros, por que estamos sempre com
medo de cometer um? Porque embora haja aprendizado, também há dor e
perdas. E poucos são os que estão dispostos a pagar esse preço.

9- Quando foi a última vez que notou o som da sua própria respiração?
Você me fez notar nesse momento.
10- Fale um pouco sobre você.

Me chamo Jennifer Meireles, tenho dezoito anos e sou estudante do
terceiro ano do ensino médio. Poderia passar dias escrevendo sobre mim e
ainda assim você não saberia quem sou eu. Essas linhas apenas transmitiriam a
parte mais rudimentar de quem sou, nada que me diferenciasse dos demais
estudantes. A parte que realmente importa sobre mim... Só conhece quem eu
permito que leia.
Regina sentiu-se um pouco surpresa com as extensas respostas de
Jennifer, visto que mais da metade de seus alunos responderam o mais
simplificado possível, não fazendo questão de fugir do óbvio. Meireles, por sua
vez, fez questão de explicar-se até mesmo nas questões onde cabia um simples
“sim” ou “não.” — E, mais que surpresa pela elaboração das respostas, a morena
identificou-se com boa parte delas. Sendo assim, Regina sentiu a necessidade de
escrever uma pequena observação próxima ao rodapé da folha de Jennifer.

Ps.: Acabei de sentir uma sensação familiar com suas respostas, senhorita
Meireles. Obrigada por conseguir me entreter por breves minutos.


Capítulo 2

— E se eu me arrumasse um pouco mais pra vir à escola? Eu poderia me
maquiar. Talvez dessa forma Kevin me notasse — disse Beatriz. O segundo dia
de aula havia começado e as duas amigas estavam sentadas no limite final da
escadaria do segundo andar enquanto aproveitavam o intervalo.
— Bea, para com isso, não vejo necessidade. Kevin tem que enxergar
você e te gostar exatamente do jeito que você é.
— Você diz isso porque além de linda, tem a aparência bem mais
madura. Já é uma mulher e tanto! Eu ainda sou tão menininha.
— Beatriz, você é linda! Além disso, é doce, meiga, delicada — disse
suavemente. — E eu não sou uma mulher e tanto, só aparento ser mais velha que
você.
— Ok, ok, vou parar com esses pensamentos nada a ver. Se ele não me
notou nesses dois anos, não será um penteado novo ou um batom que irá mudar
a situação. — Lamentou, esboçando uma triste expressão.
— Não fique triste, por favor. Quero ver um largo sorriso nesses lábios.
Anda, sorria pra mim!
— Não quero — respondeu emburrada.
Jennifer começou a fazer inúmeras caretas em frente ao rosto da amiga,
até que esta não se aguentou e caiu na gargalhada.
— Como você é idiota! — Exclamou em meio ao riso.
— Sou! Mas pelo menos te fiz sorrir.
— Verdade...
— Você sabe o que tem no terceiro piso? — Perguntou Meireles,
desviando o assunto. Ela e sua amiga olhavam atentamente para a grade atrás de
seus corpos. Ela separava o segundo e o terceiro andar.
— Além do auditório, não. Acho que apenas algumas salas vazias,
inutilizáveis. Vez ou outra a gente fica sabendo de alguns estudantes que roubam
a chave e invadem esse andar pra namorarem nas salas desocupadas.
— Wow, adrenalina pura!
— Pois é.— Riu. — Você já comprou o livro que a professora Vianna
pediu ontem?
— Já, comprei ontem mesmo antes de chegar em casa. E você?
— Ainda não. Hoje eu até entrei em uma livraria a caminho da escola,
mas estava em falta.
— Bom, se precisarmos usá-lo hoje, divido com você.
— Obrigada! A propósito... O que achou dela?
— Da professora Vianna?
— Não. Do Papa! Claro que é da professora Vianna!
— Não achei nada. A aula passou tão rápido que não tive tempo de
fazer uma avaliação. Mas ela me pareceu uma professora que leva seu trabalho a
sério.
— Confesso que chegou a me dar medo e causar arrepios. Séria demais
— disse Beatriz. — Você ouviu os comentários dos meninos da nossa sala?
— Uns idiotas! — Jennifer exclamou. — Não sabem respeitar. O que
eles pensam? Que ela vai corresponder a todas aquelas gracinhas? Babacas!
— Eles ainda são muito infantis. — Respondeu sacudindo
negativamente a cabeça.
— Eu nunca a tinha visto pela escola — disse a loira enquanto forçava
sua memória na tentativa de lembrar-se da figura de Regina por aqueles
corredores.
— Nem eu. Deve ser porque quase nunca passamos o intervalo fora da
classe. Ou quando fazemos, estamos sempre nos locais mais isolados, como
agora.
— Pode ser...
— Por falar em Regina, vamos voltar pra sala. A próxima aula será a
dela e o sinal já tocou há alguns minutos.

Cada turma da instituição possuía em sua grade de horários cinco
tempos diários de aulas com matérias distintas, podendo haver repetição de uma
mesma matéria no dia. História, por sua vez, era uma disciplina presente em três
tempos semanais. A turma de Jennifer Meireles, por exemplo, teria aulas de
história três vezes por semana; segunda-feira no último horário, terça após o
intervalo e sexta-feira, também, no último tempo de aula. Cada aula possuía uma
hora de duração.

Regina entrou e fechou a porta da sala para que ninguém mais entrasse.
Depois que ela já estivesse dentro e sua aula iniciado, não tolerava alunos
atrasados interrompendo seu trabalho, o que era bastante comum de acontecer,
pois sempre ocorria de alunos voltarem do intervalo fora de seu horário. A
professora só permitia a entrada daqueles que lhe davam uma ótima justificativa.
A morena depositou sua bolsa e uma pequena pilha de livros,
perfeitamente alinhados, sobre a mesa e cumprimentou a classe com uma
educada “boa tarde” —, obtendo as mesmas duas palavras em resposta.
— Todos conseguiram o livro que mencionei na aula anterior?
— Ainda não. — Um grupo de alunos respondeu.
— Já! — Responderam alguns outros. A minoria havia levado o livro
didático pedido por ela. Por ser tão recente, muitos sequer haviam buscado por
ele.
— Eu não sabia que hoje já teríamos aula de história novamente —
comentou um dos alunos.
— Eu imaginei que a maioria não fosse trazer. Até porque muitos não
estavam presentes na aula de ontem — disse Regina ao observar a quão cheia a
turma estava hoje. — Não tem problema, eu trouxe alguns e vou emprestá-los a
vocês. Se arrumem em dupla, pois não terá o suficiente para todo mundo.
Após as palavras da professora, instantaneamente todos foram
arrumando-se e se ajeitando em dupla. Alguns se juntaram com quem já possuía
o livro, enquanto outros apenas uniam as mesas. Enquanto Regina iniciava sua
matéria no quadro, um pequeno fluxo de estudantes começou a se movimentar
dentro do ambiente para ir até a mesa da professora pegar o livro. Alguns
minutos depois, ela pediu para que todos parassem temporariamente de copiar,
pois iria começar a explicação da matéria escrita.

Assim como na aula passada, Meireles manteve total atenção na mulher
à sua frente. Ela traçava com o olhar cada detalhe de Regina. A mais velha usava
os mesmos saltos de ontem. Porém, hoje, usava uma saia social preta um pouco
acima dos joelhos. A saia era justa, proporcionando uma significante dimensão
de suas curvas. Na parte de cima ela vestia uma camisa de manga comprida,
também social, de coloração branca. E em seus lábios havia um batom com uma
forte coloração vermelha. Era um vermelho ainda mais intenso que o de ontem.
Ao mesmo tempo em que Regina falava, se movimentava e gesticulava com as
mãos, seus cabelos mexiam-se sutilmente em um balanço que estava
desnorteando Jennifer. Esta, vez ou outra, precisava piscar seus olhos
rapidamente e sacudir sutilmente a cabeça para voltar a dar atenção apenas ao
que sua professora dizia.
Regina Vianna sempre gostava de manter total contato visual com seus
alunos enquanto direcionava sua fala a eles. Sendo assim, sempre passeava o
olhar pela classe, buscando olhar o maior número de estudantes nos olhos. Seus
alunos sentiam-se intimidados com os olhos penetrantes da mulher. E sempre
que algum deles deixava o olhar cair, Regina seguia para o próximo. Contudo,
com Jennifer Meireles estava sendo diferente. Todas as vezes em que os
castanhos de Regina cruzavam com aqueles verdes, a loira sustentava a troca de
olhares até o fim. Pois por mais que Jennifer também se sentisse intimidada pelo
olhar da morena, ela também se sentia presa a ele.
— Restou alguma dúvida? — Perguntou ao finalizar sua explicação. Os
alunos balançaram a cabeça negativamente. — Certo. Então abram o livro na
página trinta e cinco e respondam ao questionário. — Regina sentou-se em sua
mesa, abriu o diário de classe e iniciou a chamada. A aula seguiu no mais
absoluto silêncio. Alguns de seus alunos, vez ou outra, iam até sua mesa
esclarecer algumas dúvidas. Quando faltaram quinze minutos para o término da
aula, corrigiu os exercícios no quadro e despediu-se da classe.
— Senhorita Meireles, poderia me ajudar a levar esses livros até a
biblioteca? — Pediu educadamente.
Jennifer levantou-se de seu lugar e tomou em seus braços um pouco
mais da metade dos livros empilhados sobre a mesa. Regina, por sua vez, pegou
o que sobrou e ambas seguiram juntas rumo à biblioteca que se localizava no
final do corredor do andar onde estavam. As duas mulheres caminhavam lado a
lado sem trocar uma palavra, até que a mais velha quebrou o silêncio entre elas.
— Você tem interesse pelos países da Europa?
Jennifer, surpresa, hesitou respondê-la por breves segundos. A loira
surpreendeu-se com a pergunta repentina da professora.
— Tenho bastante — respondeu, algum tempo depois. — Como sabe?
— Perguntou. Ela e Regina olhavam para frente enquanto caminhavam a passos
lentos pelo longo corredor.
— Seu questionário de perguntas pessoais.
— Ah sim! — Disse a loira ao recordar. — Tenho muita vontade de
conhecer os países que citei.
— Eu também adoro a Europa. Minha mãe nasceu na Itália.
— Wow, que máximo! Você deve ter bastante influência do país por
conta disso. Certo? — Perguntou com curiosidade.
— Apenas na culinária. Adoro comida italiana. Mas em relação ao
idioma eu me interessei pelo o do meu pai. Sou professora de espanhol nas horas
vagas.
— Você deve estar brincando comigo! — Disse a mais nova,
empolgada. — Adoro esse idioma!
— Eu sei. Por isso resolvi comentar com você. — As duas já estavam se
aproximando da porta de entrada da biblioteca.
— Seu pai é da Espanha?
— Porto Rico. — A professora aproximou-se da moça que tomava
conta da biblioteca e preencheu uma pequena ficha alegando quais livros estava
devolvendo. — Se não for abusar muito de você, senhorita Meireles, poderia me
ajudar a coletar alguns livros de primeiro ano? Tenho certeza que eles também
não trouxeram os livros que pedi.
— Claro! — Aceitou. E então as duas mulheres passearam por entre as
largas e altas estantes lotadas de livros. Naquele momento, por ser horário de
aula, a biblioteca encontrava-se quase vazia.
— Estou aqui tomando seu tempo e acabei esquecendo que você tem
aula. Vou avisar ao seu professor que você estava comigo, tudo bem? Assim não
será impedida de entrar.
Jennifer assentiu positivamente com a cabeça e as duas mulheres
começaram a recolher alguns livros e os depositar sobre a mesa mais próxima a
elas. Meireles estava a uma distância mínima de Regina. A proximidade
permitiu que a jovem sentisse o doce aroma do perfume de sua professora.
Jennifer respirou fundo e aspirou aquele cheiro para dentro de seus pulmões. A
loira jurava a si própria jamais ter sentido um perfume tão agradável.
— Acredito que esses sejam suficientes — disse a mais velha ao
depositar um último livro no topo da pequena pilha que ela e sua aluna haviam
formado.
Quando Jennifer deu um passo adiante e esticou os braços pra recolher
alguns livros da pilha, sentiu Regina tocar a gola de sua camisa pólo. Ela
também sentiu a mão da mulher encostar sutilmente em seu pescoço enquanto
mexia no tecido.
— Estava torta — explicou ao deslizar a mão para fora da gola da
camisa da loira. — Não resisti em arrumá-la. Tenho um pequeno problema com
isso, desculpe. — Explicou por fim.
— Tudo bem — sorriu de maneira tímida.
— Vamos? Já demoramos tempo demais aqui.

Por falta de assunto, o caminho de volta foi feito em total silêncio.
Fizeram uma pequena pausa na turma cento e seis para se desfazerem dos livros
e seguiram em retorno para a trezentos e nove. Assim que chegaram, Regina deu
de cara com Arthur. Arthur era um dos professores de geografia do colégio e,
também, amigo de Regina desde os tempos de faculdade.
— Precisei roubar sua aluna por alguns minutos — explicou a mulher.
— Vou começar a roubar os seus também, Regina — disse o homem,
sorrindo. — Pode entrar — disse à Jennifer.
— Não seja vingativo! Não tirei pedaço dela — brincou. — Agora
preciso ir, tenho dois tempos seguidos com a turma cento e seis. Nos falamos
depois.
— Até!

— Como foi com a senhorita Vianna? — Perguntou Beatriz, curiosa,
assim que sua amiga retornou ao lugar.
— Normal. Por quê?
— Por nada. É que ela me intimida. Se tivesse chamado a mim para
acompanhá-la, eu certamente teria me tremido inteira.
— Não é pra tanto, Bea. — Respondeu, e ambas direcionaram a atenção
para a aula que acabara de iniciar.
Quando a última aula do dia finalmente havia chegado ao fim, Jennifer
recolheu seu material e retirou-se da sala. Enquanto a loira caminhava pelo
primeiro piso do colégio, pôde avistar a professora Vianna conversando ao longe
com a diretora da escola. Meireles perguntou-se internamente como nunca havia
se dado conta da presença de Regina naquela instituição. Afinal, a morena era
dona de uma beleza exuberante.
— Senhorita Meireles, posso falar com você? — Perguntou em um tom
de voz um pouco elevado ao avistar a jovem passar por ela.
Jennifer estacionou os passos, olhou pra trás e, posteriormente, olhou
para Beatriz, que depositava sobre ela um olhar apressado.
— Vou te esperar na saída — disse a amiga da loira.
— Ok. — Respondeu. Jennifer deu meia volta e caminhou em direção à
Regina. A loira se perguntava o que a mulher estaria querendo falar com ela.
— Pode me acompanhar até a sala dos professores? — Disse séria.
Jennifer assentiu e ambas subiram para o segundo andar.
A sala dos professores possuía uma extensa mesa rodeada de cadeiras,
muitos armários individuais com cadeado, e uma estante com alguns livros e
materiais didáticos. No local também havia uma pequena mesa executiva que
dispunha de um computador para uso exclusivo dos professores. Meireles, ao
entrar, notou que o ambiente estava praticamente vazio. Além dela e Regina,
apenas o professor Arthur estava presente.
— Voltou a sequestrar minha aluna, Regina? Acho que vou precisar dar
queixa sua.
— É apenas um sequestro relâmpago. Prometo que ela não sofrerá
grandes danos — brincou, arrancando uma pequena e baixa risada de sua aluna.
— Ok. Agora deixa eu me retirar, pois não quero ser cúmplice desse
crime — disse ele, segundos antes de recolher seus pertences. — Até depois,
meninas. Não deixe que ela judie muito de você, ok? — Murmurou ao passar por
Jennifer. Arthur era o típico cara palhaço.
A mais nova sorriu e caminhou até o lado da professora. Ela observava
com atenção a morena retirar uma papelada de sua bolsa que estava apoiada
sobre a mesa. Jennifer manteve seus olhos fixos no maço até que pôde identificar
do que se tratava.
— Eu não costumo devolver essa folha de apresentação pessoal aos
meus alunos. Mas quero que fique com a sua. — Ela retirou o questionário de
Jennifer de entre os demais e o entregou nas mãos da loira. — Fiz uma pequena
observação no rodapé — disse ao alcançar os olhos de sua aluna. Regina não
conseguia explicar o porquê, mas o olhar da jovem lhe parecia profundamente
familiar. E por algum motivo desconhecido, sentia-se presa a ele.
Jennifer, um pouco confusa, pegou a folha das mãos da mulher e se
permitiu perder-se na profundidade daquelas írises castanhas à sua frente.
— Hum... Ok. — Respondeu. Ela olhou rapidamente para a borda da
folha e confirmou que, de fato, a professora havia anotado algo. — Mais alguma
coisa? — Perguntou, voltando a encarar a mulher nos olhos.
Regina manteve seu olhar compenetrado no de Jennifer por breves
segundos e, então, respondeu.
— Não. Era só isso — disse séria, saindo do pequeno devaneio que
aquelas esmeraldas lhe provocaram.
Meireles despediu-se da professora e foi de encontro à Beatriz, que a
esperava no portão de saída.
— Vamos?
— O que a senhorita Vianna queria com você novamente? — Perguntou
enquanto conversavam sentadas dentro do ônibus
— Ela veio me entregar isto — disse ao mostrar o papel à sua amiga.
— Por que ela te entregou?
— Acho que por causa dessa anotação. — Jennifer leu em voz volta a
pequena observação que Regina deixara.
— Huuuum, pelo visto você já se tornou a queridinha dela.
— Eu? Nada a ver, Beatriz! Não inventa.
— Tudo a ver! Olha a anotação que ela deixou!
— Ela apenas deve ter gostado de algo que eu escrevi, nada demais.
Isso não fará de mim sua aluna favorita.
— Sei...
— E sabe mesmo! Agora vamos deixar de conversa fiada.


Ao chegar em casa, Jennifer subiu para o quarto, jogou sua mochila em
um canto qualquer, tomou um banho e desceu para a cozinha. A loira vestia
apenas uma camiseta cinza de algodão e uma calcinha preta.
— Booooa noite, Jen! — Disse Morgana ao avistar a filha entrando no
cômodo.
— O que temos para a janta, hum? — Perguntou, segundos antes de
depositar um beijo no topo da cabeça de sua mãe.
— Estou preparando uma salada de macarrão.
— Quer ajuda?
— Seria ótimo! Como vai à escola? — As duas conversavam
tranquilamente enquanto aproveitavam aquele pequeno momento entre mãe e
filha.
— Está tudo bem, o de sempre — respondeu calmamente.
— E os namorados, Jen? Até eu namoro, mas você não.
— Ah não, mãe! Novamente com isso? Eu já avisei que não tenho
interesse em nenhum dos meninos. Nem os da escola, nem os do boxe e nem os
da rua. Estou bem sozinha. — Disse com seriedade. Jennifer nunca havia
comentado com sua mãe sobre sua orientação sexual. Morgana enfartaria se
soubesse sobre a homossexualidade da filha.
— Não é possível que nenhum dos rapazes te desperte interesse, filha.
— Pois acredite! — Respondeu irritada. — Agora vamos mudar de
assunto e jantar, por favor?
Quando o jantar se findou a jovem escovou os dentes, subiu para o
quarto e ligou a televisão em um canal onde estava passando um programa de
artes marciais mistas. Ela jogou-se em sua cama e ficou assistindo ao programa
até ser arrebatada por um sono profundo.

Assim que o alarme soou e alguns raios de sol da manhã invadiram o
quarto de Jennifer, a loira piscou lentamente seus olhos e levantou-se da cama. A
jovem cuidou de sua higiene matinal, como de costume, recolheu a mochila que
usava para o treino e dirigiu-se para a academia. Ao chegar ao local, vestiu uma
bermuda e um top que faziam parte de um dos seus uniformes. Antes de começar
o treinamento fez quinze minutos de alongamento e aquecimento rápido. Logo
após, enrolou as bandagens em suas mãos e punhos, pôs o par de luvas e
direcionou-se para frente de um saco de pancadas leve, de modo a treinar sua
agilidade. Em seguida, trocou para o mais pesado, de modo a treinar força e
resistência.

— Estou gostando de ver! Está com garra hoje, hein, Jen? — Disse o
treinador.
— Eu sempre estou! — Respondeu sorrindo.
Jennifer é extremamente dedicada ao boxe, assim como a tudo o que
gosta. Ela treina desde os doze anos de idade, e com o passar dos anos seus
treinamentos foram ficando cada vez mais intensos e pesados. Meireles possui
um condicionamento físico invejável e um corpo de arrancar suspiros. Sem
mencionar sua imensurável força.
— Então vamos pro ringue hoje? — Sugeriu ele.
— Agora!

Naquela mesma manhã, horas mais tarde, Jennifer retornou do treino.
A loira tomou uma ducha gelada, almoçou e dirigiu-se para o quarto. Meireles
abriu a agenda e conferiu quais aulas teria naquela quarta-feira. Feito isso,
arrumou sua mochila de acordo com as disciplinas correspondentes ao dia.
Quando retirou seu livro de História de dentro, uma folha de papel
dobrada de caiu ao chão. Ela agachou-se e tomou o pequeno papel em mãos,
abrindo-o posteriormente. Jennifer observou por longos instantes a linda
caligrafia da mulher. Ela releu a anotação que Regina fizera no rodapé de seu
questionário e, no mesmo momento, um pequeno sorriso nasceu em seus lábios.
Contudo, logo tratou de sacudir a cabeça e sair de seus devaneios se não quisesse
chegar atrasada na aula.


Capítulo 3

Um mês havia se passado desde o início do ano letivo e Jennifer estava
cada vez mais envolvida em seus estudos. Afinal, era seu último ano escolar e
ela logo precisaria estar ciente de qual carreira seguir. Contudo, havia algo em
especial que lhe estava chamando ainda mais a atenção: as aulas de história com
Regina Vianna.

— Minha mãe voltou a tocar naquele assunto, Bea. Não sei qual a
necessidade dela em me ver namorando — disse à sua amiga. Era sexta-feira e
ambas conversavam baixinho no último tempo de aula enquanto Regina se
mantinha concentrada escrevendo algo em um caderno de capa dura.
— Talvez ela esteja desconfiando de algo. As mães costumam saber
esse tipo de coisa — murmurou.
— Não acredito nessa possibilidade. Ela já teria vindo conversar
comigo sobre o assunto. E certamente a conversa não seria muito boa.
— Será? — Indagou. — Mas cá entre nós, Jen, é bem esquisito uma
garota da sua idade estar sempre sozinha. Entendo que você não se interesse por
homens, mas nunca te vejo nem com mulher!
— Shhhh... Silêncio, meninas. — Se manifestou Regina ao olhá-las
sobre os óculos.
— Desculpe, professora — disseram juntas.

Regina interrompeu sua escrita, levantou-se de seu lugar e caminhou até
o quadro.
— Vou passar um trabalho sobre guerras civis para ser entregue na
próxima aula. Não deixem de fazer, a menos que queiram perder dois pontos de
avaliação — disse séria. A morena descreveu o tema e quais os parâmetros
gostaria de encontrar na elaboração desses trabalhos. Por fim, fez a chamada e
aguardou os minutos finais de sua aula. — Estão liberados! — Disse ao soar do
alarme. Ainda em sala de aula, enquanto recolhia seus pertences, alternava o
olhar entre seus objetos e sua aluna. O olhar que a morena lançava era tão
intenso e constante, que Jennifer percebeu.
A mais nova recolhia seu material no ritmo quase igual ao da
professora. E, enquanto o fazia, sentiu que estava sendo observada.
— Oh, droga! — Resmungou, nervosa, ao derrubar o estojo no chão e
apanhá-lo posteriormente. Era a última coisa que faltava para se retirar com Bea.
Jennifer permitiu que sua amiga caminhasse à sua frente e andou a passos lentos
logo atrás. Antes de cruzar a porta da sala, sentiu a presença de Regina. A loira
estacionou os passos e deixou que a professora tomasse sua frente.
No momento em que a mulher passou por Jennifer, os olhares de ambas
se procuraram. Regina não apenas cruzou a porta, ela também cruzou seus
castanhos com os verdes mais familiares que ela já vira em sua vida. E quando o
fez, depositou intensidade. Intensidade essa, que Jennifer fez questão de
absorver. A loira sustentou o olhar com o da mulher até que a professora
cruzasse o limite entre ela e a porta, deixando pra trás seu delicioso perfume.
— Jennifer? O que você ainda faz aí atrás? — Perguntou Bea ao
estacionar os passos.
— Nada...— respondeu baixo, quase que pra si, ao mesmo tempo em
que observava a professora caminhar à sua frente, quase virando o corredor.
— Anda! Vamos logo! Quero tentar encontrar o Kevin na saída.
— Ainda com essa história de Kevin? — Comentou ao revirar os olhos
em um nítido gesto de reprovação.
— Sim! Pelo menos tenho interesse em alguém, não vivo apenas para
os estudos.
— Vou te poupar da minha resposta, ok? Não quero que briguemos.
— Nem eu. Mas eu realmente me preocupo com sua vida amorosa, seu
lado pessoal. Queria ver você envolvida numa paixão. Daquelas de tirar o ar,
sabe? Não sente falta disso? De sentir o sangue correndo nas veias. Sentir-se
viva?
— Eu já sinto tudo isso quando estou no boxe. Agora vamos deixar de
papo furado e sair daqui.

Quando Jennifer e sua amiga estavam descendo as escadas que davam
acesso ao primeiro piso, Meireles avistou um pequeno caderno caído no chão.
— O que será isso? — Indagou ao recolhê-lo. A loira o folheava
rapidamente enquanto caminhavam para o portão de saída.
— Já descobriu do que se trata?
— Parece um caderno de poemas — respondeu, ainda o folheando. —
Vou entregá-lo na secretaria e já volto.
— E voltar isso tudo? Nem pensar! Segunda você entrega. Vamos
embora — disse, arrastando a loira para fora do portão escolar.
— Meninas! — Acenou Kevin do outro lado da calçada, fazendo as
duas amigas atravessarem ao seu encontro. — Vou juntar com uma galera mais
tarde na praia. Faremos um luau. Juntem-se a nós! — Convidou alegremente. —
Levaremos algumas bebidas.
— Sem chances — respondeu Jennifer.
— Ah, não. Vamos, Jen! Vai ser divertido — pediu Bea.
— Vamos, Meireles. Anime-se! — Disse Kevin.
— Desculpem, mas não tenho nenhum interesse em me juntar a vários
jovens inconsequentes no meio de uma praia à noite. E ainda mais portando
bebida alcoólica.
— Deixa de ser careta, Jennifer. Além do mais, até parece que você não
bebe — comentou Bea.
— Não é caretice, apenas não tenho saco para essas reuniões. Eu bebo,
sim. Mas não à toa.
— Ih, você está chata hoje, hein? — Sua amiga retrucou.
— Pelo menos você vai, Bea? — Perguntou Kevin, arrancando um
bobo sorriso da jovem.
— Se a Jen topar dizer aos meus pais que passarei a noite na casa dela,
sim.
— Tudo bem. Mas tome cuidado, ok? — Aconselhou.
— Tomarei! Obrigada! — Sorriu.
— Por nada. Já estou indo, me acompanha?
— Sim, vamos. — As duas despediram-se de Kevin e partiram.


— Como andam as coisas, Regina? Nunca mais saímos juntos. Sinto
tanta falta dos nossos tempos de faculdade. Os rebeldes sem causa! — Disse
Arthur, rindo. O carro da morena estava no conserto, sendo assim, o homem o
havia oferecido uma carona até em casa.
— Tudo vai bem — respondeu a mulher. — Eu também sinto falta das
nossas saídas. Mas a vida anda tão corrida...
— Verdade. Mas sempre devemos arrumar um tempo para fazer o que
gostamos.
— Você tem razão. Que tal sairmos esse final de semana pra
relembrarmos os velhos tempos? — Ela sugeriu.
— Se o seu namorado não for se importar, eu adoraria. A propósito,
como vocês estão?
— Robson não é meu namorado, Arthur. Quantas vezes vou precisar
dizer isso? Nós apenas temos uma relação descompromissada.
— Ok. Então como anda essa relação descompromissada? — Riu. —
Você sabe que Robson é louco por você. Sempre foi! Ele até casaria se você
quisesse.
— Deus me livre! Não consigo imaginar uma ideia dessa — disse ela,
arrancando algumas risadas de Arthur. — Nós estamos bem. Eu adoro o Robson,
de verdade. Mas não consigo me comprometer a nada com ele. Não sinto que
seja a pessoa ideal pra mim.
— E por que você mantém essa relação?
— Porque não temos compromisso um com o outro. Isso torna tudo
mais fácil. Aproveitamos apenas os momentos bons, se é que me entende.
— Me poupe desses detalhes, Regina! — Riu. — Você não sente nada
por ele?
— Não. E eu não o iludo, Arthur. Eu sei o que ele sente por mim e
deixo tudo claro. E apesar disso, ele e eu nos afastamos um pouco. Nos
encontramos raramente agora.
— Entendi... E você não pensa em buscar alguém que a complete?
— Eu já sou completa — respondeu prontamente. — Essa pessoa teria
que me transbordar.
— Uau! — Disse ao arregalar os olhos. — Quem será a pessoa a
conseguir tal feito? Missão quase impossível, hum?
— Deixa de ser bobo. Não é tão difícil assim.
— Claro que é. Até hoje eu nunca te vi cair de amores por alguém.
Quais as características do homem ideal? — Perguntou. — Ou eu deveria dizer...
Mulher ideal?
— Pessoa ideal soaria melhor. — Riu. — Não precisa ter uma
característica específica, mas eu quero alguém que me faça perder o chão, que
me enlouqueça — disse séria enquanto parecia refletir sobre o assunto. — No
bom sentido, claro. — Tornou a rir. Arrancando, também, uma risada de seu
amigo.
— Chegamos! — Disse o homem, algum tempo depois. — Foi um
prazer ter estado esses minutos com você. Espero que realmente possamos nos
encontrar nesse final de semana.
— Obrigada pela carona, Arthur. Eu confirmo com você, tudo bem? —
Regina despediu-se de seu amigo com um beijo no rosto e saltou para fora do
carro.


— Jennifer, vou sair com o Diogo. Não volto pra casa hoje, tudo bem?
— Disse Morgana. Ela e Diogo mantinham um namoro de três anos.
— Ok. Diga a ele que enviei um abraço.
— Digo! Cuide-se, filha. Tranque todas as portas e não vá dormir tão
tarde.
— Não sou criança, dona Morgana Meireles — disse com ironia ao
revirar os olhos. — Consigo ser mais responsável que você.
— Ok, senhorita gente grande. Até amanhã! — Morgana despediu-se da
filha com um carinhoso beijo em sua testa.

Jennifer ligou para a pizzaria e em seguida entrou debaixo do chuveiro
enquanto aguardava a entrega. Ao sair do banho vestiu-se com roupas largas e
confortáveis e caminhou até a porta para atendê-la. Meireles subiu para o quarto,
ligou a televisão em um canal qualquer e sentou-se em sua cama com a
embalagem de pizza na mão. Entre uma fatia e outra, lembrou-se do pequeno
caderno que encontrara mais cedo na escola. Sendo assim, foi até sua mochila, o
pegou e começou a folheá-lo lentamente enquanto lia. Era um caderno de
tamanho mediano e capa dura de coloração azul marinho. Algumas de suas
folhas estavam preenchidas com poemas escritos a uma linda e fina caligrafia.
Jennifer diminuiu o volume da tv e manteve-se inteiramente
concentrada ao que lia. E, conforme o fazia, sentia-se cada vez mais mergulhada
na intensidade daquelas linhas. Nenhum daqueles poemas era conhecido por
Meireles. Visto isso, logo julgou que fossem poemas autorais, originais. Mas
quem seria o dono daquelas obras tão profundas e intensas? Era o que a jovem se
perguntava mentalmente.
— R.V— Jennifer soletrou para si mesma. Todos os poemas estavam
assinados com tais iniciais. A loira entregou-se tão plenamente à leitura, que
nada mais era ouvido por ela, nem mesmo o som da televisão. As palavras
daquele caderno a levaram para outro plano. E quanto mais Jennifer lia, maior
era a vontade de prosseguir.
Quando já havia folheado dezenas de páginas, uma gostosa sensação
habitou seu peito. Além de sentir-se mergulhada no universo e na alma do autor,
ela também se sentiu lida e invadida. Era como se cada um daqueles versos
falasse diretamente com ela. Pelo menos era assim que ela se sentia. Os poemas
eram de uma sensibilidade e intensidade absurdas. Jennifer praticamente
devorou cada palavra e linha, e quando chegou ao último, lamentou.

A jovem visitou aqueles poemas durante todo o final de semana. Ela os
leu, releu e anotou um ou outro que mais lhe agradou. Eles basicamente falavam
sobre paixão e a arte de viver. Os poemas eram líricos, os preferidos de Jennifer.
Expressavam sentimentos, emoções e desejos. Eram a visão de mundo do autor.
A loira pegava-se suspirando vez ou outra. Eles a faziam desejar viver boa parte
do que estava escrito.
Mais uma segunda-feira havia se iniciado. Jennifer havia acabado de
tomar um banho pós treino quando se surpreendeu com o que viu. Enquanto
enxugava-se em seu quarto, seu olhar caiu sobre a folha recebida por Regina
semana passada. A loira havia a deixado sobre a mesa de seu quarto, aberta, sob
um peso de papel. Assim que seus olhos caíram sobre a escrita do rodapé, uma
pequena luz acendeu em sua mente.
— Não pode ser... — Murmurou ao tomar a folha em mãos e apoiá-la
sobre o caderno aberto que achara na sexta-feira. — Claro! R.V de Regina
Vianna! — Disse sozinha. — Sem dúvidas isso é dela...— murmurou baixinho,
pensativa. Quando tomou consciência de que aquelas palavras eram de sua
professora, um pequeno flashback passou em sua cabeça lhe trazendo a figura
dos olhos da mulher. Mas não foi qualquer figura, foi exatamente a imagem
daquele par de olhos bem próximos aos seus. Meireles havia relembrando o
último instante com Regina, quando as írises castanhas da morena a invadiram
com a mesma intensidade daqueles poemas.
Jennifer rapidamente fechou o caderno e o enfiou dentro da mochila.
Em seguida, apressou-se em se arrumar e praticamente voou até a escola. A loira
não tinha lembranças de já ter saído tão apressada de casa antes, a única certeza
que possuía naquele instante era que precisava rever Regina.
Os tempos de aula pareceram se arrastar naquela tarde. A jovem não
saberia explicar, mas a necessidade de reencontrá-la estava se fazendo muito
presente. Ela precisava olhar novamente nos olhos da dona de tão lindas poesias.
— Jennifer, você está com algum problema? — Perguntou Beatriz ao
notar a quão ansiosa ela parecia.
— Não. Por quê?
— Está aérea o dia inteiro.
— Estou? Putz, Bea. Me desculpe. Nem me dei conta.
— Tudo bem. Você pelo menos ouviu quando falei sobre o luau?
— Sim. E fico feliz que tenha dado tudo certo.
— Pois é. Obrigada por ter confirmado que eu estava na sua casa.
— Amigas são para isso. Mas não se acostume — piscou. A conversa
entre elas foi interrompida pela presença da professora Vianna na sala de aula.
— Boa tarde, classe! — Disse ela, recebendo vários “boa tarde “em
resposta.
Regina recolheu os trabalhos, explicou a matéria do dia, aplicou alguns
exercícios e sentou-se de pernas cruzadas em sua cadeira, mostrando-se
totalmente acessível caso seus alunos precisassem esclarecer dúvidas sobre a
matéria.
Enquanto Jennifer respondia aos exercícios aplicados pela professora,
vez ou outra olhava para frente e se pegava admirando os traços dela. Sua mesa
era próxima o suficiente para que sua visão captasse muitos dos detalhes da
morena. Hoje Regina usava um batom vermelho carmesim, a mesma cor que
habitava em suas unhas. Detalhe que não passou despercebido pela loira, que
não saberia dizer quanto tempo perdeu copiando os traços da mulher à sua
frente. Mas, que ela não esperava era que a mais velha fosse, também, buscá-la
com o olhar.
Regina, ao sentir que estava sendo observada, olhou para frente e
deparou-se com os olhos de Jennifer que a olhavam com curiosidade. E mais
uma vez aconteceu o que ela não esperava; manteve-se presa àquele olhar
familiar. As duas mulheres se encararam fixamente por longos instantes, até que
a mais nova precisou quebrar o contato visual e continuar estudando. Contudo,
Meireles não conseguia concentrar-se inteiramente em seus exercícios, a
curiosidade em Regina era mais forte. Ambas tentaram evitar, mas acabaram
cruzando seus olhares algumas vezes durante todo o período de aula.

Quando o sinal ecoou e todos os alunos começaram a se retirar do
ambiente, Jennifer avisou para sua amiga que precisava esclarecer algumas
coisas com a professora Vianna antes de ir, e que a deixava livre para ir embora
se assim ela preferisse. Visto isso, Beatriz despediu-se de Meireles e partiu.
— Senhorita Vianna, posso falar com você? — Disse em seu lugar ao
terminar de guardar o material. Ela aguardou até que o último aluno deixasse a
sala de aula para então caminhar até a mesa da professora.
— Pois não? — Respondeu. A morena já estava de pé ao lado da mesa.
— Acho que isso é seu. — Jennifer abriu a mochila, pegou o caderno de
poemas e o mostrou.
— Você o achou! — Disse em um misto de surpresa e alegria. A
professora o pegou sutilmente das mãos de Jennifer. — Como soube que era
meu?
— De início eu não soube, e até peço desculpas por ter me atrevido a ler
algo tão pessoal. Não imaginei que encontraria o dono e jamais imaginei que
fosse seu. Mas acabei reconhecendo a letra depois de um tempo. Sem mencionar
o R.V que liguei a seu nome.
— Obrigada por devolvê-lo. Sei que é bobagem, mas ele tem
importância pra mim.
— Bobagem? Eu particularmente adorei seus poemas. São tão...
Profundos. — Jennifer concluiu a frase olhando nos olhos da mulher.
— Você foi a primeira pessoa que os leu. Eu não os mostro a ninguém,
são muito pessoais.
— Desculpe. Eu não sabi-
— Tudo bem — disse com seriedade e firmeza na voz ao interromper a
fala da jovem. — Só espero que não os tenha mostrado a alguém ou divulgado
em algum lugar.
— Não. Apenas copiei pra mim o que mais gostei.
— Mesmo? — Indagou a morena, surpresa. — Então você realmente
gostou.
— Sim — confirmou com suavidade na voz. Apesar de estar sentindo-
se intimidada pelo olhar de Regina, não conseguia desviar seus olhos dele.
Quando um silêncio constrangedor se instalou entre elas, Meireles
lembrou-se de comentar sobre a observação que a professora fizera em seu
questionário há aproximadamente um mês.
— É... — Tentou. As palavras saíam com certa dificuldade devido ao
pequeno nervosismo que aos poucos se instalava dentro dela. — Adorei o que
você escreveu pra mim. — Soltou, enfim.
— O que eu escrevi pra você? — Indagou confusa. — Até onde sei, não
te escrevi poemas, senhorita Meireles — brincou, arrancando um pequeno
sorriso dos lábios de sua aluna. Sorriso esse, que Regina fez questão de admirar.
Os lábios finos e rosados de Jennifer se curvavam de uma maneira angelical e ao
mesmo tempo maliciosa, deixando à mostra alguns de seus dentes sutilmente
tortos que, para Regina, eram de uma graciosidade única.
— Me refiro ao questionário pessoal que você aplicou no primeiro dia
de aula — explicou. — Como sou idiota, claro que você nem lembra mais.
— Ah, sim... — comentou ao recordar. — Eu não disse nada demais,
mas fico feliz que tenha gostado.
— Dessa vez foi você quem me entreteve por algum tempo. — Jennifer
comentou.
— É difícil algo entretê-la, senhorita? — Perguntou enquanto olhava
fixamente para o par de olhos à sua frente.
A jovem, mais uma vez, absorveu toda a intensidade daqueles olhos
castanhos enquanto sentia os efeitos dessa invasão em seu corpo. Porque, ter o
olhar de Regina penetrando o seu era de tirar o fôlego.
— Da maneira como você faz, sim — respondeu sem pensar.
O cérebro de Regina demorou algum tempo para anexar as últimas
palavras de Jennifer. Nesse curto intervalo, apenas manteve-se olhando para sua
aluna ao mesmo tempo em que se perguntava como ela havia conseguido deixá-
la sem uma resposta.
— Então vou entretê-la um pouco mais — respondeu. — Tenho mais
um caderno com alguns escritos. Ao contrário deste, o outro já está com todas as
páginas preenchidas. Você se interessaria em ler? — Regina nunca havia
cogitado a ideia de mostrar seu universo particular a alguém antes. Mas, Jennifer
lhe despertava algo tão familiar, que o fez.
— Eu vou adorar! — Sorriu. — Gostaria de ter algo pra compartilhar
com você também, mas não sei escrever poemas. O que eu sei fazer de melhor
não tenho como dividir com você — disse calmamente enquanto sustentava o
olhar da mais velha. No entanto, quando se deu conta da incógnita que foi sua
última frase, explicou-se. — Eu sou lutadora de boxe. Então... A menos que
você queira receber alguns roxos no corpo, não posso dividir com você —
brincou.
Assim que Regina ouviu Jennifer dizer que praticava boxe,
automaticamente seu olhar caiu sobre os braços da loira, avistando o quão
definidos eles eram.
— Então eu fiz bem em tê-la chamado para carregar aqueles livros pra
mim outro dia. Aposto que você tem força de sobra.
— Bastante!
— Ótimo saber disso. Irei chamá-la sempre! — Disse, compartilhando
uma gostosa risada com sua aluna.
— Não vejo problema. Apenas não abuse deles! — Riu.
— Tarde demais. Adoro abusar de tudo o que eu gosto — disse de
maneira inocente, fazendo a expressão risonha de Jennifer tornar-se séria.
— Putz, me dei mal! — Comentou alguns segundos depois,
restabelecendo o clima divertido entre elas.
— Só um pouquinho — respondeu a mais velha. — Bom, acho que já
passamos bastante do nosso horário. Vamos?
A jovem assentiu e ambas as mulheres deixaram a sala de aula. Aluna e
professora caminharam lado a lado durante todo o percurso, se separando apenas
quando a morena precisou entrar na sala dos professores para guardar alguns
materiais. Antes de entrar, Regina tornou a agradecer Jennifer pelo retorno do
livro e, então, despediram-se.
Ao chegar no portão de saída, a mais nova olhou para todos os lados na
esperança de avistar Bea. Ao dar-se conta de que sua amiga não mais estava,
caminhou até o ponto, tomou o ônibus e foi embora. Sentada em seu lugar no
banco, apoiou a cabeça contra o vidro da janela e observou alguns pingos de
chuva através do feixe de luz de um poste na calçada. Assim que o vidro
começou a molhar e tornar-se embaçado, a loira fechou seus olhos e deixou sua
mente vagar para onde quisesse. Jennifer começou pensando em como aquele
último ano letivo seria decisivo para sua vida acadêmica e no quanto sentiria
falta daquele lugar, de seus colegas e de alguns professores. Quando pensou em
professores, a imagem de Regina surgiu inevitavelmente em sua mente. O doce
perfume, os traços marcantes, o olhar penetrante e a voz da mulher invadiram
seus pensamentos como uma forte presença. E a partir dali, tudo o que Jennifer
conseguia pensar era no quão interessante ela era.


Capítulo 4


— O Kevin acabou de passar! Vamos aproveitar o intervalo com ele e
os amigos hoje? — Sugeriu Beatriz. Ela e Jennifer terminavam de guardar o
material para começarem a aproveitar o tempo livre.
— Bea, sinto muito, mas não quero passar meus quinze minutos vendo
você ir atrás do Kevin. Ou você se declara pra ele, ou esquece essa história.
— O que deu em você, Jennifer? Já foi mais parceira — reclamou.
— E continuo sendo. Apenas não tenho paciência pra ver você correndo
atrás dele. Já sabe o que penso sobre isso — comentou suavemente para não
magoar sua amiga.
— Tudo bem. Vou indo nessa — disse séria e seca.
— Bea, não faz assim... — Essas foram as últimas palavras de Jennifer
antes de sua amiga retirar-se da sala a fortes passos. — Droga! — Resmungou.
A loira desceu até a cantina da escola, fez um rápido lanche e retornou para o
segundo piso do colégio. A jovem cumprimentou alguns colegas no corredor e
em seguida caminhou para a biblioteca. Havia decidido que passaria os minutos
finais do intervalo entre a tranquilidade dos livros. Afinal, a biblioteca era o
local mais silencioso de toda a instituição. Embora os livros tivessem muito a
dizer, diziam em silêncio.
Jennifer entrou, escolheu um livro sobre mitologia grega e acomodou-se
em uma mesa localizada no fundo da biblioteca; completamente isolada e
distante da porta. A loira folheava calmamente as folhas, observando com
atenção e sem pressa todas as gravuras impressas. Ela era uma garota detalhista e
focada quando o assunto era de seu interesse. Todavia, sua atenção foi desviada
quando percebeu quem era a pessoa sentada em uma mesa há poucos metros da
dela. Sua professora Regina mantinha total atenção em alguns papéis. A morena
os lia e escrevia sobre eles. Ela esboçava uma séria expressão, parecendo
inteiramente compenetrada em sua tarefa. Jennifer pensou na possibilidade de ir
até ela, mas preferiu não o fazer por medo de vir a atrapalhá-la e/ou incomodá-
la. Sendo assim, apenas permaneceu a observá-la de longe.
A jovem tentou concentrar-se novamente em seu livro, mas a presença
da professora estava deixando tudo em segundo plano. Quando menos esperou,
seu olhar já estava passeando por Regina. Ele passeou pelos cabelos, olhos e
boca da mulher. Jennifer apenas lamentou estar a uma distância que não lhe
permitia ver os traços da morena com clareza. Hoje Regina usava um lindo
vestido azul marinho centímetros acima do joelho, e em seus pés havia saltos,
como de costume. Ela estava sentada de maneira elegante com suas pernas
cruzadas. Pernas essas, que Jennifer fez questão de admirar. Sua professora
conseguia ser extremamente sensual mesmo quando não tinha a intenção.
Algum tempo depois quando o alarme indicando o término do intervalo
ecoou, Meireles saiu de seus devaneios e percebeu que havia duas medianas
pilhas de livros presentes sobre a mesa onde Regina se encontrava. A loira
rapidamente fechou o livro que pegara pra ler, o devolveu para a prateleira e
caminhou até a professora.
— Precisa de ajuda?
Ao ouvir aquela doce voz, Regina ergueu a cabeça e sorriu ao deparar-
se com o rosto de Jennifer.
— Adoraria — respondeu. — Mas onde fica a parte em que eu não
posso abusar de seus braços? — Brincou, arrancando de sua aluna um gracioso
sorriso.
— Hoje eu te dou permissão.
— Ótimo você ter aparecido, pois eu já estava pra ir atrás de algum
aluno que pudesse me ajudar.
— Para que são esses livros? — Perguntou ao mesmo tempo em que
tomou um em mãos e percebeu que não era o livro didático usual.
— Preciso deles para complementar a aula do dia. O livro que vocês
usam não se aprofunda no tema da matéria de hoje.
— Hum... Entendi — disse enquanto recolhia uma parte dos livros. —
Tem muitos, vamos precisar fazer duas viagens — comentou, e assim fizeram,
retornaram à biblioteca duas vezes.

— Quero que todos arrumem suas mesas e as deixem devidamente
enfileiradas. Não consigo trabalhar com essa desordem — disse Regina com
autoridade no tom de voz. Em menos de cinco minutos todas as mesas já
estavam impecavelmente alinhadas em pares enfileirados. Aquilo foi como um
colírio para os olhos da mulher, por conta de seu problema com arrumação e
simetria das coisas.
Devido ao fato de os alunos terem acabado de voltar do intervalo,
encontravam-se com os ânimos alterados, causando inúmeras conversas
paralelas durante a aula. Tal acontecimento deixou a professora de história
completamente irritada. E por mais que a morena pedisse silêncio, este não era
obtido. Ela precisou ser enérgica. Porém, devido a isso, um de seus alunos
resolveu bater de frente. O bate boca entre os dois foi tão grande, que uma veia
na testa da mulher começou a saltar.
Era a primeira vez que Meireles presenciava a professora irritada. A
postura autoritária, a voz elevada e os movimentos que Regina fazia com as
mãos a deixava inteiramente sexy. A loira pôde sentir seu ar indo embora cada
vez que a mulher batia seus saltos fortemente contra o chão. A discussão chegou
ao fim apenas quando a mais velha pediu para que o aluno se retirasse da classe.

No decorrer da última hora a sala manteve-se em silêncio absoluto.
Jennifer não puxou nenhum assunto com Beatriz e evitou ao máximo olhar para
Regina. Quando a aula chegou ao fim, apenas ajudou a professora a devolver os
livros para a biblioteca. Tudo foi feito em total silêncio. Contudo, ainda na
biblioteca, quando a segunda leva de livros foi devolvida, Regina quebrou o
silêncio.
— Obrigada.
— Chame sempre que precisar — respondeu receosa. Antes de deixar o
lugar, a voz da morena a fez parar.
— Eu trouxe o caderno — iniciou. — Mas o esqueci no carro —
explicou. — Me espere na hora da saída.
— Ok. Até depois...

Os últimos dois tempos de aula que se sucederam pareceram se arrastar.
Jennifer, por um motivo ainda desconhecido, sentia-se ansiosa para ir embora. E
quando o último sinal tocou, guardou o material às pressas e se retirou. Sua
amiga já não mais estava no colégio, ela havia ido embora ao final da aula de
história, pois tinha consulta com o dentista. Sendo assim, Jennifer pôde esperar
por Regina tranquilamente. A loira parou em frente à sala dos professores e
aguardou que a morena saísse.
— Vamos?— disse a mais velha. Ela e sua aluna caminharam em
silêncio até chegarem ao estacionamento da escola. Regina abriu a porta de seu
carro preto e pegou o livro de dentro do porta-luvas. — Essa droga está
emperrando desde que trouxe o carro do conserto. Abre quando quer, fecha
quando quer. Está assim — reclamou. — Mas aqui está — disse ao entregar o
caderno nas mãos da loira.
— Vou devorar cada poema desses hoje à noite!— comentou com
empolgação enquanto folheava rapidamente o caderno.
— Você gosta tanto assim de poemas?— perguntou curiosa.
— Gosto de tudo que expresse a emoção humana. Seja em poema,
música ou até mesmo na dança.
— Eu também...— respondeu. Regina permitiu-se olhar para Jennifer
sem pressa. A jovem estudante a intrigava ao se mostrar tão madura e diferente
da maioria de seus alunos. Seus gostos e os de Jennifer eram bastante similares,
sem mencionar a beleza da jovem. Jennifer Meireles era linda, e isso Regina já
havia notado desde o momento em que seus olhos caíram sobre ela pela primeira
vez. A loira possuía graciosidade no olhar e alguma malícia no sorriso. Sua
beleza conseguia ser a junção de duas coisas completamente distintas: o profano
e o sagrado.
— Você tem filhos?— questionou-a aleatoriamente, na tentativa de não
deixar a conversa morrer.
— Não.— Ela e sua aluna conversavam de frente. A distância era curta
o suficiente para que pudessem sentir o perfume da outra. — Por quê?
— Por causa daquilo.— Apontou para alguns brinquedos que havia no
retrovisor e painel do carro.
— Oh, sim! São do meu sobrinho Henrique — explicou. — Às vezes
minha irmã vem me visitar e o traz.
— Eu adoro crianças.— Sorriu.
— Então você iria adorá-lo. Não é porque é meu sobrinho, mas ele é
encantador!
— Quando você decidiu cursar a faculdade de história?
— Acho que desde sempre. História sempre foi minha disciplina
favorita, então sempre tive em mente que gostaria de levar isso para os meus
dias. Por quê? Está em dúvida sobre qual carreira seguir?
— Sim. E sinto uma pressão muito grande sobre mim em relação a isso.
Eu mesma estou me cobrando.
— Não se cobre, tudo tem seu momento. Se ainda não tem certeza do
que quer, não faça nada sob pressão. Isso nunca dá certo. Cada pessoa tem seu
próprio tempo.
— Vou tentar...
— Certo. Agora preciso ir. Tenho uma enorme bola de pelos me
esperando em casa. Ainda preciso comprar ração no caminho. Se eu deixá-lo por
muito tempo sozinho e sem comida, capaz de eu nem ter mais casa quando
chegar!
— Seu cachorro?
— Gato, Bóris. Vou te mostrar uma foto dele.— Regina tirou o celular
da bolsa, desbloqueou a tela, acessou a galeria e mostrou à Jennifer uma foto de
Bóris deitado sobre a cama de barriga pra cima.
— Ele é colossal!— exclamou, surpresa com o tamanho do animal. —
Lindo!
— O que tem de lindo, tem de ansioso. Revira a casa inteira à minha
espera. Mas é um amor.— Regina possuía doçura na fala ao se referir ao gato.
— Não quero mais tomar o seu tempo. Chega de perguntas!— Sorriu
sem jeito. — Vou começar a ler seus poemas ainda hoje.
— Ok, espero que goste. Até mais, senhorita.
— Até.— Jennifer acenou para Regina, que acabara de entrar no carro,
e se manteve no mesmo lugar até que o automóvel da morena fugisse de seu
campo de visão.


Mais um final de semana iniciara. Embora Jennifer adorasse ficar em
casa lendo ou assistindo algo na televisão, também gostava de aproveitar o
mundo lá fora. Ela muito apreciava entrar em contato com a natureza, e por
possuir uma postura atleta, fazer caminhadas e corrida na orla da praia era algo
que muito lhe agradava. Visto isso, vestiu uma bermuda esportiva, um tênis,
regata preta, boné e seguiu rumo à praia.
Jennifer tirou os tênis e correu na areia por aproximadamente meia hora.
Após isso, tornou a calçá-los e, desta vez, fez meia hora de corrida no calçadão.
Quando resolveu parar em um quiosque local para fazer uma breve pausa
enquanto se hidratava com uma água de coco, foi surpreendida por duas
presenças.
— Senhorita Meireles?— indagou ao tocar o ombro da loira.
— Oi, professor!— disse ela, surpresa.
— Aproveitando o sabadão ensolarado?— Ele perguntou.
— Sim. Não dá pra ficar trancada dentro de casa em um dia lindo como
esse — respondeu sorridente. — Olá, senhorita Vianna.— Cumprimentou ao
desviar sua atenção de Arthur para Regina. A morena usava uma justa calça
preta de ginástica, tênis esportivo, regata preta, óculos de sol e um chapéu.
— Olá!— respondeu sorridente. — Também viemos nos reidratar um
pouco — comentou ao observar a água de coco de Jennifer.
Arthur e Regina pediram dois cocos gelados para beberem enquanto
conversam com a aluna. Os três trocaram algumas poucas palavras sobre o
colégio e o quão lindo estava o dia. A pequena conversa durou aproximadamente
dez minutos, e então o professor de geografia precisou despedir-se.
— Meninas, o papo está bom, mas preciso ir. Vim apenas fazer uma
caminhada de uma hora pra tentar perder essa barriga de cerveja, mas o
compromisso me chama!— disse o homem. — Vai ficar mais um pouco ou vai
embora comigo, Regina?
— Ficarei um pouco mais.
— Ok. Nos vemos semana que vem no trabalho.— Arthur depositou um
beijo no rosto de sua amiga, apertou a mão da jovem e retirou-se do lugar,
deixando as duas a sós sentadas lado a lado em dois bancos no quiosque.
— Você costuma correr aqui todos os finais de semana?
— Não, muito raramente. Hoje eu vim por insistência do Arthur. Mas
foi bom, entrar em contato com a natureza me faz bem.
— Eu adoro! Me traz paz.
— Você mantém o hábito de vir?
— Não exatamente aqui. Mas sempre que posso faço corrida em algum
ambiente mais... Natural.— Encontrou a palavra.
— Por isso tem esse físico impecável.— disse Regina, sorrindo, ao
depositar seu olhar sobre Meireles. A morena tirou os óculos de sol, o prendeu
na gola da camisa e passeou os olhos pelos ombros e braços da jovem.
— Não é pra tanto — respondeu timidamente. — Na verdade é o boxe
que ajuda bastante. Pratico desde os doze anos.
— Ah! Isso explica muita coisa!— Riu, compartilhando uma risada
com sua aluna.
— Não terminei com seus poemas, por isso ainda não devolvi seu
caderno. Tudo bem?— explicou.
— Claro, sem problemas. Não tenha pressa. O quê você está achando
desses?
— Quentes!— riu. — Esses têm uma pegada mais erótica.
— Sim, eles têm. Nem sei se deveria tê-los mostrado a você.
— Por quê? Eles não têm nada demais. Quer dizer, eles têm, são
maravilhosos, mas não há nada explícito. O erotismo está bem disfarçado. A sua
capacidade de escrita é fascinante. E mesmo que tivesse algo mais escancarado,
qual seria o problema?
— Não sei. Você é minha aluna e é tão nova...
— Senhorita Vianna, eu não sou criança. E o fato de eu ser sua aluna
não é empecilho para que você divida comigo algo tão poético.
— Sei que você não é criança — disse séria. — De toda forma estou
feliz que esteja gostando.
— Estou adorando!— Jennifer buscou os olhos de Regina com os dela e
iniciou uma profunda troca de olhares com a mulher. — Eles são tão intensos.
Possuem a mesma intensidade do seu olhar — comentou com seriedade na voz
ao mesmo tempo em que encarava aquelas íris castanhas à sua frente.
— Você acha o meu olhar intenso?— questionou sem desviar seus
olhos dos de Jennifer.
— Intenso e intimidador — respondeu, alternando seu olhar entre os
olhos da professora.
— Se ele te intimida, por que você permanece olhando?
— Porque eu não consigo parar... — disse, causando um enorme
silêncio entre elas.
Mesmo surpresa com a resposta de sua aluna, ela permaneceu olhando-a
nos olhos enquanto um silêncio se instalava. Era como se cada vez que seus
olhos encontrassem os da jovem, acontecesse algum tipo de reconhecimento.
Jennifer era de uma familiaridade absurda, e por mais que Regina soubesse que
não era inteiramente certo permanecer na atmosfera que as últimas palavras da
menina criou, ela não conseguia sair.
— Já terminei minha água de coco. Vou correr mais um pouco. Me
acompanha?— perguntou ao sair do transe.
— Será que você consegue acompanhar meu ritmo, senhorita Vianna?
— Jennifer incitou.
— Não duvide da minha capacidade, Meireles.
Jennifer jogou o coco dentro do lixo e correu em direção à areia da
praia, chamando-a. Regina balançou a cabeça negativamente e sorriu com a
atitude moleca da loira.
— Correr na areia? Pegou pesado!— retrucou a professora enquanto
tentava alcançá-la.
— Me mostre do que você é capaz!— gritou Jennifer, risonha, enquanto
corria. Quando a loira percebeu que a professora jamais a alcançaria, diminuiu o
ritmo.
— Isso vai ter troco, mocinha. Lembre-se de que os testes estão
chegando.— Regina, enfim, a alcançou. As duas tiraram os sapatos e iniciaram
uma lenta caminhada, lado a lado, próximas ao local onde as ondas da praia
quebravam na areia.
— Isso foi uma ameaça?
— Entenda como quiser.
— Wow, acho melhor eu começar a me redimir — brincou. O sol
estava fraco naquele dia e o mar estava tão gelado, que Jennifer notava a pele de
Regina arrepiar-se cada vez que as águas conseguiam alcançar seus pés.
— Eu também acho — respondeu. Durante toda caminhada a mulher se
pegava olhando para Jennifer. E cada vez que o fazia, descobria uma nova
graciosidade na jovem.
— Estou com desejo de comer hambúrguer — comentou aleatoriamente
enquanto andavam para fora da areia.
— Após caminhar e correr você pensa em hambúrguer?
— Já está na hora do almoço. Estou com fome — disse ao consultar seu
relógio de pulso. — Provavelmente você não come esse tipo de coisa, mas...—
Jennifer deu uma pausa em suas palavras e em seguida desistiu de concluir o
pensamento. — Nada.
— Mas? Pode dizer, eu não mordo.
— Ia perguntar se você pode e quer me acompanhar.
Regina hesitou em sua resposta por alguns instantes enquanto pensava
se uma atitude daquelas seria apropriada.
— Desculpa, deixa pra lá — disse Jennifer ao deduzir que a resposta
seria negativa.
— Não, tudo bem. Eu quero. Só não posso demorar.
As duas mulheres limparam alguns vestígios de areia de suas roupas,
calçaram seus tênis e caminharam até a lanchonete mais próxima. Após pedirem
os lanches, sentaram-se lado a lado no assento junto à parede e retomaram a
conversa. No início, ambas sentiam-se um pouco desconfortáveis com a
situação. Afinal, estavam acostumadas apenas com as formalidades do dia a dia
no colégio.
Enquanto comiam e conversavam de assuntos aleatórios, vez ou outra
seus braços se esbarravam sobre a mesa devido a proximidade em que ambas se
encontravam. Cada vez que isso acontecia, as duas mulheres sentiam uma
prazerosa sensação percorrer seus corpos.
— O quê foi?— perguntou Jennifer ao sentir a professora distante. Mal
sabia ela que a última coisa que Regina estava naquele momento era distante.
— Não é nada...— respondeu vagamente. Ela não disse, mas passou os
últimos minutos reparando em algumas diferenças físicas existentes entre ela e
sua aluna.
Não era apenas Jennifer que era observadora e detalhista, Regina
Vianna também. E naquele momento, naquela mesa, sentada ao lado de Jennifer,
ela observava cada pequeno traço da jovem. Quando o braço da loira se
posicionava ao lado do seu, por exemplo, ela observava a diferença na
tonalidade de suas peles. Regina possuía uma pele oliva e Jennifer era quase tão
branca quanto a neve. Aquele contraste de cores era algo que ela muito
apreciava.
Jennifer era tão clara que possuía pelos naturalmente loiros pelo braço;
quase tão loiros quanto os fios de sua cabeça. Até mesmo esse detalhe Regina
observou. Meireles era fisicamente seu oposto. Enquanto os cabelos de Jennifer
eram compridos e loiros, os de Regina eram curtos e escuros. Os de Jennifer
possuíam ondas definidas, os de Regina eram lisos com uma sutil inclinação em
suas pontas. Meireles possuía olhos claros, verdes, leves. Regina possuía a
intensidade do castanho. E até mesmo a estatura era diferenciada; Jennifer era
alguns centímetros mais alta. Os dentes da professora eram perfeitamente
alinhados, enquanto os de Jennifer eram sutilmente tortos. Pequeno detalhe que
Regina achava uma graça.
A morena embarcou naquela viagem traçando cada parte de Jennifer
que seus olhos podiam alcançar. E cada vez que percebia o forte contraste
existente entre elas, se atraía. Ela precisou barrar seu olhar quando cada músculo
existente nos braços de Meireles começou a chamar sua atenção mais que o
necessário.
— Você é tão delicada.— disse a loira, tirando Regina de seus
devaneios e a trazendo de volta. — Estava observando você durante todo o dia.
Você é tão feminina, a começar por suas mãos.— A loira tocou e segurou a mão
esquerda de Regina com a dela. Era a primeira vez que suas mãos se
encostavam.
A professora espantou-se com o comentário que a mais nova fizera. Era
como se Jennifer tivesse tido a mesma atitude observadora que a sua.
— Isso é bom ou ruim?— perguntou, sem jeito, enquanto sentia a
textura daquela mão na dela.
— Bom — afirmou prontamente. E por um breve instante deixou-se
envolver pela beleza de Regina. — Você é tão... Mulher.— Soltou a frase em um
impulso.
As palavras de Jennifer, seguidas de seu olhar curioso em cima de
Regina, surtiram efeito sobre a mulher. Ela pensou em levantar-se da mesa e ir
embora, porém, era habilidosa o suficiente para contornar qualquer situação.
— Mas você também é mulher, Meireles.— disse ela ao deslizar a mão
para fora do contato com Jennifer. — Agora vamos terminar esses hambúrgueres
antes que esfriem — desconversou.


Horas mais tarde, em casa, Regina livrou-se de seus tênis cheios de
areia deixando-nos na área de serviço. Alimentou Bóris, tomou um banho
relaxante e caminhou para o escritório. Enquanto planejava os testes de suas
turmas de primeiro, segundo e terceiro ano, foi servindo-se de seu chá de maçã.
Entre um pensamento e outro, o sorriso de sua aluna surgiu em sua mente. A
loira estava tão radiante e cheia de vida naquela manhã, que fez com que Regina
se sentisse mais leve. A sensação de bem estar que a jovem lhe trouxera, seguida
de algo mais que não conseguia ou não queria decifrar, fez com que ela
desviasse os pensamentos para longe. Ela não queria pensar nas sensações que
tivera mais cedo, e embora ainda não soubesse como agir, de uma coisa estava
certa: as coisas não poderiam continuar tomando esse rumo.
A professora foi tirada de seus devaneios ao ouvir o toque de seu
celular; era Robson. Ele ligara para dizer que havia voltado de viagem, estava na
cidade e queria vê-la. A morena passou toda a tarde concluindo suas tarefas e
quando a noite finalmente chegara, arrumou-se deslumbrantemente e foi
encontrá-lo.


Capítulo 5

Uma nova semana havia iniciado, trazendo consigo novas atividades
escolares para Jennifer. A jovem estava mergulhada entre testes e trabalhos.
Enquanto Beatriz corria atrás de Kevin, a loira arrancava olhares e sorrisos de
garotos e garotas nos corredores da instituição. Seu charme e simpatia
combinados ao seu corpo atlético faziam com que muitos a desejassem.
Contudo, Meireles não se deixava levar pelos inúmeros elogios e propostas que
recebia.

— Fiquei sabendo que os horários de sexta-feira mudaram. A aula de
história será no primeiro tempo e a de física caiu para o último — disse Beatriz
enquanto as duas conversavam na aula de matemática. — Precisaremos tomar
todo o cuidado do mundo pra não chegarmos atrasadas, ou a senhorita Vianna
arrancará nossas cabeças de nossos pescoços.
— Eu quase nunca me atraso, mas vou tomar ainda mais cuidado —
comentou. — Só que você exagera, ela não é esse diabo que você pinta.
— Claro que é.
— Não é.
— Como você sabe?
— Apenas sei — respondeu sem muitas explicações.
Quando o intervalo iniciou, Jennifer foi abordada no corredor por sua
colega Estela. Estela possuía um forte interesse na loira desde o primeiro ano.
Elas já haviam trocado alguns beijos durante o baile de primavera do ano
passado, mas nunca havia passado disso.
— Oi, Jennifer!— disse a garota. Estela tinha a mesma idade que
Jennifer, possuía um metro e sessenta de altura, era morena e seus cabelos eram
longos e anelados. — Oi, Bea!
— E ai, Estela. Tudo bem?— Jennifer respondeu.
— Oi Estela!— Foi a vez de Beatriz cumprimentá-la.
— Para onde vocês estão indo?— perguntou a moça.
— Para a biblioteca. Vamos pegar alguns livros de física emprestados
pra ajudar no trabalho — respondeu Beatriz.
— Posso acompanhar vocês?— perguntou a moça, receosa. — Já estão
com o grupo fechado? Se não, posso entrar?
— Claro que pode! Vamos?— respondeu Jennifer.
Ao chegarem à biblioteca, as três alunas selecionaram alguns livros de
física e começaram a folheá-los rapidamente com o intuito de descobrir se eles
abrangiam o tema que elas precisavam.
— Detesto essas fórmulas de física! Coisa chata esse negócio de
velocidade inicial, movimento uniforme, velocidade constante, massa. Um saco!
— resmungou Meireles ao sentar-se na mesa com alguns livros.
— Você detesta tudo e qualquer coisa que envolva números e cálculos,
Jennifer — comentou Beatriz ao tomar um lugar de frente para sua amiga. Estela
sentou-se e riu da cara de desgosto de Jennifer ao comentário que Bea fizera.
A raivosa expressão que a loira esboçava rapidamente se desfez quando
viu sua professora de história entrar no local. Ao que tudo indicava, Regina
Vianna passava todo o tempo livre isolada na biblioteca. Contudo, dessa vez,
não estava sozinha. Arthur, o professor de geografia, a estava acompanhando. A
forte presença da mulher foi o suficiente para distrair Jennifer. Todos aqueles
livros, assim como o que Beatriz e Estela diziam, tornaram-se plano de fundo.
Ao sentar-se com seu amigo Arthur para conversar enquanto corrigia
algumas provas de espanhol que trouxera de casa, Regina comentou sobre como
havia sido seu encontro com Robson no sábado à noite.
— Ele é sempre muito atencioso. Jantamos e passamos o resto da noite
jogando cartas enquanto ele me contava sobre a última viagem.
Robson tem trinta e oito anos e é historiador. A professora e ele se
conheceram em um congresso de arqueologia.
— Mas...? Por essa sua cara já sei que tem um porém — disse o
homem.
— É aquela coisa morna de sempre — respondeu descontente. Ela
parou de falar quando ouviu vozes vindo de uma mesa à frente. A morena logo
constatou que se tratava de Jennifer e algumas amigas. A partir dali, dividiu sua
atenção entre Arthur, os testes e Meireles. Sua aluna lhe chamava a atenção de
uma forma única. Regina tentava, mas não conseguia evitar direcionar o olhar
para onde ela estava.
— Já te ocorreu de se interessar por uma de suas alunas, Arthur?—
perguntou ela de maneira repentina ao mudar por completo o assunto da
conversa.
— Que pergunta mais aleatória, Regina. Por quê?
— Por nada. Apenas me veio à cabeça.
— Já fiquei bastante balançado por uma na faculdade onde leciono.
— O que você fez a respeito?
— Um sexo bem animal — murmurou o homem em meio a risos.
— Por Deus, Arthur! Me poupe saber dessas coisas.
— Mas foi você que perguntou, mulher!
— Não imaginei que a resposta seria essa.
— Ah não, Regina, pode ir parando. Fala como se não gostasse de sexo.
Eu te conheço muito bem, então não me vem com essa.
— Arthur, quantos anos tinha essa moça?— perguntou ao ignorar por
completo o comentário que o homem fizera.
— Acho que vinte e cinco.
— Ah, ela já era maior de idade. Menos mal.
— Claro que era. Não sou pedófilo, Regina. Mas por que tantas
perguntas? Não me diga que está interessada por um aluno?— sussurrou a última
frase.
— Claro que não. Tenho ética profissional — respondeu com seriedade
excessiva. — Apenas li outro dia no jornal sobre um caso assim e resolvi
conversar com você sobre o assunto.
— Eu também tenho ética profissional. Mas esse tipo de coisa pode vir
a acontecer, sabemos disso. Nós lidamos com centenas de alunos diariamente.
Não é porque são alunos que deixam de ser pessoas com suas qualidades e
atrativos. Mas realmente é algo que devemos evitar até o último, comigo
aconteceu apenas essa vez. Atrapalha muito, os papéis se tornam confusos.
— É um assunto bastante polêmico. Mas devemos sempre olhar todas
as nuances desse tema.— Ela comentou. — Enfim, deixemos esse assunto pra lá.
— Regina concentrou-se nos papéis sobre a mesa, porém, vez ou outra, seu
olhar, sem pedir permissão, flutuava até onde a loira estava.
Os olhares de Jennifer e da mulher se buscavam naquela grande
biblioteca que se tornava pequena cada vez que aqueles pares de olhos se
cruzavam. Era uma busca involuntária, como se existisse algum magnetismo as
puxando. A constante troca de olhares era silenciosa, mas tinha muito a dizer.
O alarme que indicava o término do intervalo logo tocou. Todos, aos
poucos, foram deixando o ambiente. Regina e Arthur fora os primeiros a
deixarem o lugar, Jennifer e suas amigas demoraram um pouco mais, pois
necessitaram preencher ficha indicando quais livros haviam sido pegos. Na sala
de aula, Estela mudou-se de lugar e sentou-se na fileira correspondente ao lado
esquerdo de Jennifer. Agora Meireles estava, basicamente, entre as duas amigas.
As três mantiveram uma conversar durante as duas aulas que se sucederam.
Estela, sempre que podia, tentava flertar com Jennifer. Mas, a loira sempre
cortava sutilmente as investidas.

Assim que o último tempo de aula iniciou, o silêncio reinou sobre a
sala. Regina mantinha uma expressão séria, mais que o de costume. Explicou a
matéria, aplicou um questionário, marcou a data do teste e sentou-se em sua
mesa. Em momento algum direcionou seu olhar à Jennifer. Essa atitude causou
estranheza em Meireles, contudo, a loira ignorou. Focou sua inteira atenção no
estudo e só.
Quando a hora de ir embora chegou, Jennifer pediu para que suas
amigas a esperassem no portão de saída e procurou Regina pela escola. Por
sorte, encontrou a mulher saindo da sala dos professores.
— Senhorita Vianna, posso falar com você um instante?
— Estou com um pouco de pressa agora — respondeu um pouco ríspida
na tentativa de evitar a loira.
— Não quero tomar o seu tempo, apenas vim lhe entregar isso.—
Jennifer retirou o caderno de Regina da mochila e o entregou na mão da mulher.
— Obrigada. Eu adorei.
— Mais alguma coisa, senhorita Meireles?— perguntou. Ela esboçava
uma séria expressão e suas palavras soavam frias e secas.
— Nada mais — respondeu com receio. — Quer dizer... Está tudo bem?
Você estava diferente na aula de hoje. Desculpe a intromissão.
— Diferente como?— perguntou com firmeza em sua voz.
— Não saberia dizer, mas estava.
Jennifer e Regina esperaram alguns professores e alunos deixarem o
segundo piso para, então, aproximarem-se uma da outra. No meio disso a
conversa de ambas estava sendo interrompida por pessoas que passavam e
falavam com elas.
As duas mulheres encurtaram a distância de tal maneira, que seus
perfumes estavam sendo sentidos uma pela outra. A claridade das luzes do
corredor era tão intensa e forte, que a mais velha conseguia perceber a pupila de
Jennifer dilatando.
— Eu estava e estou sendo a de sempre — respondeu com seriedade. A
gola da camisa polo de Jennifer estava novamente torta, e Regina estava
tentando conter sua compulsão para não ajeitá-la. Contudo, estava difícil evitar o
olhar.
Quando a mais nova se deu conta dos constantes olhares para a região
de seu pescoço, ela mesma identificou o problema e tentou arrumá-lo. No
entanto, ainda assim não ficou do gosto de Regina. Sendo assim, a morena
guardou o caderno na bolsa e deu um passo adiante, aproximando-se ainda mais
de Meireles. Regina depositou suas mãos sobre a gola e a arrumou. Em seguida,
sem tirar suas mãos dali, buscou o olhar de sua aluna.
Jennifer sustentou uma intensa troca de olhares enquanto sentia,
eventualmente, a mão da professora encostando-se a seu pescoço sem querer. A
loira tinha Regina tão próxima; bem ali, paradas, juntas, naquele corredor,
sentindo todo o cheiro doce e até mesmo sensual que os poros da mulher
exalavam. Na verdade, para Jennifer, tudo em Regina Vianna era sensual. O
perfume, os lábios carnudos sempre pintados de vermelho, o curto cabelo que,
vez ou outra, dependendo do movimento, exibia parte de sua nuca. Sem
mencionar os fiéis saltos que a morena sempre usava e que dava a ela toda uma
elegância. Saltos esses, que a deixavam exatamente da mesma altura de Jennifer,
fazendo com que olhos e bocas se encontrassem na mesma linear, como agora.
— Faz isso com todos os seus alunos?— indagou.
— Não. Apenas você não sabe ajeitar a gola da camisa — respondeu
enfatizando o “você”.
— Eu sei ajeitar, mas não tenho culpa se bagunça. E não tenho culpa se
você não consegue evitar me tocar.
Ao ouvir as palavras de Jennifer, Regina automaticamente deslizou as
mãos para fora do contato com ela.
— Não tenho culpa se você se veste irritantemente bagunçada a ponto
de me causar um incômodo tão grande — rebateu.
— O quê deu em você hoje? Sábado eu fiz algo que te desagradou?—
disse ao retomar o assunto. A loira estava disposta a entender o porquê da
mulher ter permanecido distante na aula de hoje e, agora, estar se comportando
de maneira ríspida.
— Talvez você tenha feito algo — respondeu de maneira séria enquanto
invadia o olhar de Jennifer.
— O quê eu fiz?— perguntou, ao mesmo tempo em que se deixava
penetrar por aquelas íris misteriosas. O olhar de Regina estava tão forte sobre o
seu, que Jennifer quase recuou. Quase.
Regina esboçou um pequeno e cínico sorriso e sacudiu sutilmente a
cabeça em negação consigo mesma, desacreditando no que estava acontecendo.
— Nada. Até mais, senhorita — disse por fim, deixando para trás uma
Jennifer cheia de interrogações.


Os dias foram se passando normalmente. O clima entre elas começou a
entrar em uma atmosfera diferente. No início, Regina se mostrava super aberta à
Jennifer e às semelhanças que ambas compartilhavam. No entanto, atualmente o
quadro havia mudado. Regina começou a estabelecer uma distância entre ela e
sua aluna. Os assuntos passaram a ser exclusivamente escolares. A morena, vez
ou outra, chegava a se comportar de maneira grosseira e autoritária com
Meireles. Apenas uma coisa permanecia a mesma desde o primeiro dia de aula:
as incontroláveis e intensas trocas de olhares. Pois embora as atitudes da
professora tivessem mudado, isso aconteceu apenas externamente. Por dentro ela
ainda se interessava por questões relacionadas à garota.


Jennifer fez uma pequena pausa na aula de educação física para se
hidratar. Após dois turnos seguidos de vôlei a loira deixou a quadra e seguiu até
o bebedouro que havia no primeiro piso. Ao constatar que a água não estava
gelada o suficiente, decidiu buscar o bebedouro do andar de cima. Ela sabia que
era estritamente proibido vagar pelo segundo piso com a vestimenta de educação
física. Mas, apesar disso, resolveu arriscar. A jovem usava uma regata branca de
algodão, calça justa de ginástica na cor azul marinho e tênis esportivo. Seu
cabelo estava preso em um alto rabo de cavalo.
Enquanto Meireles aproveitava a gostosa água gelada do bebedouro,
ouviu passos. Pelo som emitido, logo constatou que era barulho de saltos contra
o chão. Os passos já estavam tão próximos, que não ousou deixar o lugar. Seria
tarde demais.
— Senhorita Meireles?— soou a voz que vinha de trás.
— É...Oi.— respondeu ao virar-se e dar de cara com sua professora.
— O quê faz aqui no segundo andar usando essas roupas?— perguntou
séria enquanto tentava evitar olhar para o corpo da jovem. — Você sabe que é
proibido, não sabe?
— Eu precisava beber água. O bebedouro lá de baixo estava quente —
explicou-se.
— Você deve obedecer as regras da instituição independente de
qualquer coisa.
— Você queria que eu bebesse água quente?— retrucou com
indignação.
— Não quero nada. Apenas estou alertando você — disse com
seriedade. O dia estava quente. Devido aos exercícios físicos da aula, Jennifer
estava com o rosto inteiramente vermelho. Sua face possuía algumas gotas de
suor, enquanto sua blusa branca estava parcialmente molhada com o suor de seu
corpo.
— Ok, já entendi — bufou.
— E não adianta esboçar essa cara. Sabe que está errada.
— Até com a minha cara você quer implicar? Quando foi que se tornou
assim? Está com uma implicância...
— Não me tornei nada, senhorita Meireles.
— Se tornou, sim. Você mudou comigo. Está amarga — comentou. —
Não que você já tenha sido doce — continuou dizendo. — Bem que todos
comentam sobre o quão rígida e seca você é. Estão certos. A única coisa doce
em você é esse seu perfume.
Regina aproximou-se propositalmente de Jennifer a ponto de ver a
pupila da jovem se dilatando com a proximidade.
— Algum problema com meu perfume?— perguntou ao arquear uma de
suas sobrancelhas.
— Nenhum, até gosto. E ultimamente está contrastando bastante com
sua acidez — continuou a falar. As duas mulheres tiveram a conversa cortada
quando o inspetor escolar surgiu no local.
— Senhorita Meireles, o que faz aqui vestida com esses trajes?— disse
sério e em tom de autoridade. — Devo anotar uma advertência na sua carteira
escolar?
— Não — disse Regina ao tomar a frente de Jennifer na resposta. — Eu
a chamei aqui, assumo a culpa.
— Ok, mas a senhorita Meireles terá poucos minutos para deixar o
recinto — disse o homem com seriedade, segundos antes de descer para o andar
de baixo.
— Essa é a parte que você diz “eu te avisei”?
— Deveria ser, mas não farei isso.
— Não precisava ter me protegido. Eu estava disposta a assumir as
consequências. Sempre estou.
— Estou vendo que minha acidez passou pra você.
— Pois é. Você é uma ótima professora — disse de maneira sarcástica.
— E você é uma excelente aluna. Gosto assim.— A mais velha rebateu.
— Assim como? Me diz, como você gosta?— Meireles provocou,
modificando a atmosfera local.
— Eu ensinando e você aprendendo. Eu mandando e você obedecendo.
Agora desça, Meireles. Não quero que arrume problemas.
— Ok. Mas saiba que vou descer porque eu quero, não porque você está
mandando.
— Não estou mandando, estou pedindo. Quando for uma ordem você
saberá.
— O quê você quer dizer com isso?
— Senhorita Meireles, preciso trabalhar. Até outra hora.— Regina deu
as costas para a loira e retornou para a turma de segundo ano onde estava dando
dois tempos seguidos de aula. A morena havia feito uma breve pausa para ir ao
banheiro quando encontrou Meireles no corredor.
Jennifer voltou para a quadra sem entender a conversa que tivera há
pouco. Era como se a morena, por vezes, falasse por enigma. Porém, seja o lá o
que tivesse acontecendo, procuraria entender em outra ocasião. Agora ela
precisava focar em sua educação física.


Era uma chuvosa manhã de sexta-feira quando Jennifer retornava de
seu treino de boxe. A chuva caía forte na cidade, ocasionando em um inesperado
engarrafamento. A loira consultava seu relógio de pulso a cada dez minutos
enquanto temia atrasar-se para o colégio. Quando finalmente chegou em casa,
viu que já estava em cima da hora. Ela gastava uma média de quarenta minutos
de sua casa até o colégio, e este era exatamente o tempo que ela tinha para tomar
banho, arrumar-se e enfrentar mais algum possível trânsito.
Tomou uma ducha rápida, vestiu o uniforme correndo e optou por ir de
metrô. Embora a estação de destino ficasse um pouco longe da instituição, ainda
assim pouparia tempo. Visto isso, pegou o metrô e partiu. Assim que chegou na
estação desejada, olhou para seu relógio e constatou que já estava cinco minutos
atrasadas.
— Oh, droga!— reclamou enquanto corria para fora da estação. Jennifer
quase nunca chegava atrasada em seus compromissos, mas justo essa semana em
que os horários no colégio haviam mudado e ela teria aula de história no
primeiro tempo, atrasou-se.

Ao entrar na classe trezentos e nove, Regina automaticamente lançou
seu olhar sobre o local onde Jennifer sempre sentava. A morena estranhou sua
ausência. Afinal, em dois meses de aula era a primeira vez que ela não
comparecia. A professora perguntou-se internamente o que poderia ter
acontecido. Contudo, com muito pesar, precisou fechar a porta e iniciar sua
matéria.
— Aconteceu alguma coisa com sua amiga?— perguntou à Beatriz.
— Não sei. Estranho ela não ter vindo, não é?
— Sim, ela nunca falta.
Quinze minutos haviam se passado desde o início de sua aula. Regina
estava de pé em frente a classe explicando a matéria quando algumas batidas
foram ouvidas na porta. A morena interrompeu sua fala e caminhou até a porta
para atendê-la.
— Professora Vianna, desculpe o atraso, posso entrar?
Regina saiu da sala fechando a porta atrás de si.
— Senhorita Meireles, você sabe muito bem que não permito que
entrem na minha aula após o horário. Posso saber o motivo do atraso?
— Eu sei, mas peguei muito engarrafamento voltando do boxe. Está um
temporal horrível lá fora — explicou-se.
— O quê as minhas aulas têm a ver com seu treino de boxe? Você
precisa ter responsabilidade.
— Eu tenho responsabilidade, meus treinos nunca me impediram de
estar aqui na hora certa, hoje foi um dia atípico. Mas se não quer me deixar
entrar, tudo bem.— Quando Meireles deu as costas, ouviu a voz rouca da mulher
pedindo que esperasse.
— Ei, espere — iniciou. — Deixarei você entrar. Mas eu espero que
isso não volte a acontecer. Odeio ser interrompida enquanto trabalho.
Jennifer assentiu, entrou na sala e tomou o lugar próximo à Beatriz.
Assim que a loira sentou em seu lugar e Regina entrou logo em seguida, alguns
resmungos foram ouvidos na classe. Alguns aluno que, por vezes, foram
barrados pela professora por chegarem atrasados, começaram a se manifestar.
— Por que a Jennifer pode entrar?— comentou um dos estudantes.
— Privilégio para a loirinha dos olhos de esmeralda?— Outro aluno
questionou.
— Não estou dando privilégios para a senhorita Meireles. Ela é uma
aluna de notas excelentes e nunca chegou atrasada em minhas aulas. Diferente
de vocês dois que quase sempre estão fora do horário. Então eu peço que
guardem esses comentários maldosos pra vocês — disse com firmeza e
autoridade. — Agora silêncio que preciso prosseguir com a aula.
— Uhhhh!— exclamou um grupo de alunos.
— Poderiam ter dormido sem essa — disse Estela aos dois.
— Shhhh, silêncio!— ordenou Regina.
Quando a aula de história chegou ao fim, Jennifer e Beatriz iniciaram
uma conversa.
— Você está maluca de se atrasar justo na aula dessa mulher?
— Não tive culpa, Bea, peguei muito engarrafamento ao voltar do
treino.
— Toma cuidado na próxima sexta — disse a menina. — A senhorita
Vianna veio me perguntar se eu sabia o que havia acontecido com você. Ela
parecia preocupada.
— Sério?— indagou surpresa.
— Seríssimo — confirmou. — Talvez no fundo ela não seja assim tão
má.
— Ela não é má, Bea. Apenas muito séria e profissional até o último fio
daquele cabelo impecável que ela tem — disse, compartilhando uma risada com
a amiga.
— Pior que tudo nessa bicha é impecável mesmo. Do salto até o último
fio de cabelo. Não há nada fora do lugar. Procuro defeito, mas não encontro.
Jennifer riu do comentário que sua amiga fizera.
— Pior que eu preciso concordar.
— Estou pensando em matar os últimos dois tempos de aula. Vou
embora no intervalo. Vem comigo?— perguntou ao mudar de assunto.
— Não posso, Bea. Não posso vacilar e deixar minhas notas caírem. Se
isso acontecer eu perco minha bolsa — respondeu. Jennifer possuía bolsa
integral de estudo devido à nota máxima que obteve na prova que fizera para
entrar na instituição.
— Eu entendo. Mas eu vou nessa, tudo bem? Hoje é sexta e estou um
pouco sem saco pra continuar aqui.
— Sem problemas. Vou me isolar na biblioteca — comentou em um
triste tom de voz.
— Chama a Estela pra te fazer companhia. Aposto que ela vai adorar —
piscou.
— Deixa de ser boba!— Sorriu.
— Ué, só disse a verdade — sorriu de volta.
Quando o intervalo deu-se início, Beatriz conseguiu deixar a instituição
infiltrando-se em uma turma de segundo ano que havia sido dispensada mais
cedo. Jennifer, como havia dito, foi passar seus quinze minutos na sala de livros.
Ao chegar ao local e tomar um lugar, deparou-se com a figura de Regina Vianna
sentada ao fundo. Ela acabou tendo certeza de que sua professora sempre
passava o tempo vago ali.
A loira sentiu uma grande vontade de ir até ela. Mas, como sempre, o
medo de incomodá-la falava mais alto. Contudo, queria entender o porquê da
mudança repentina da professora. Visto isso, levantou-se de seu lugar e foi até
ela.
— Posso te fazer companhia?— perguntou a mais nova.
Regina levantou o olhar e avistou o rosto de Jennifer por cima dos
óculos. Em seguida, o ajeitou.
— Não vejo porque não. Sente-se.
— Você passa todos seus intervalos aqui?— perguntou ao tomar um
lugar próximo à professora.
— Boa parte deles.— A morena respondeu. — Adoro a calmaria daqui.
— Agora que a Beatriz tem me deixado um pouco de lado eu também
tenho gostado de passar o curto tempo que tenho, aqui.
— Por que sua amiga tem te deixado de lado?— perguntou ao mesmo
tempo em que fechou o livro que estava lendo para dar atenção à loira. As duas
mulheres conversam em uma das últimas mesas que havia na biblioteca. Ela
ficava praticamente escondida por altas e largas estantes de livros.
Meireles depositou rapidamente seu olhar sobre a capa do livro que
Regina fechara, constatando que era um livro de contos eróticos. Regina
provavelmente o trouxera de casa, visto que não havia aquela temática na
instituição, — pensou Jennifer.
— Meninos — respondeu, simplificando, ao revirar os olhos.
— E por que você não faz o mesmo?
— Porque eu tenho mais o que fazer.
— Tipo passar seus únicos minutos livres com uma professora seca e
chata?— perguntou, buscando resposta no belo par de olhos verdes que a
encaravam.
— Tipo isso. Muito mais interessante, não?
Nas últimas semanas Regina estava esforçando-se para tratar a loira
assim como tratava todos os seus alunos. Mas, esta parecia estar sendo uma
tarefa difícil, uma vez que Jennifer Meireles possuía um forte magnetismo.
— Não sei, senhorita. Isso é você quem tem que me dizer. É?
— Infinitamente mais.— respondeu, ao mesmo tempo em que passeou
rapidamente o olhar pelos cabelos e rosto da professora. — Contos eróticos, é?
— comentou.
— Você é observadora assim sempre?
— Apenas com coisas que me interessam.
— Sim, são contos eróticos. Por quê?
— Por nada.— Jennifer ficou sem resposta. — Posso dar uma olhada?
— Nem pensar. Isso aqui é para adulto, mocinha — implicou.
— Não tem problema, adoro o mundo dos adultos — ironizou. —
Agora deixa eu ver.
— Sem chance — disse ao guardar o livro na bolsa, fazendo a loira
revirar os olhos com sua atitude.
— Posso te fazer uma pergunta?
— Já fez.
— Não, é sério. Posso?
— Pode.
— Por que você vem se comportando de maneira estranha comigo? E
não adianta dizer que não está, pois está.
— Como venho me comportando?
— Distante e seca.
— E isso te incomoda?— perguntou sem desviar a atenção da face de
Jennifer.
— Muito...
— Por quê?
A loira se manteve em silêncio por breves segundos enquanto buscava
dentro de si a resposta para aquela pergunta.
— Eu não sei... — respondeu. A mais nova sustentava o olhar de
Regina ao mesmo tempo em que enviava para a mulher um mesmo olhar
intenso. Um silêncio que muito tinha a dizer instalou-se entre as duas enquanto
uma curiosa busca de olhares acontecia. Algo estava despertando dentro e entre
elas.
— Precisamos ir — disse Regina ao ouvir o sinal tocar.
— Mas já?— resmungou. — Esses quinze minutos parecem cada vez
mais curtos.
— Realmente — concordou.
A professora recolheu seus pertences da mesa, pôs a cadeira no lugar —
pois Regina era uma viciada em arrumação— , e retirou-se da biblioteca junto
com Jennifer.


Ao final daquele mesmo dia Regina concluiu sua jornada de trabalho,
despediu-se de alguns colegas, tomou seu carro e dirigiu para fora da instituição.
Enquanto dava a volta no quarteirão para, então, tomar a rua principal,
observava o quão feio o clima estava. O fim de tarde trouxe consigo um céu
completamente negro. Uma forte tempestade ainda assolava a cidade.
— Droga! Levarei o dobro do tempo pra chegar em casa com esse
engarrafamento — resmungou sozinha dentro do veículo quando finalmente
conseguiu chegar na rua que precisava. Regina ligou o rádio em um volume
baixo e aguardou até que o tráfego fluísse.
Assim que a morena dirigiu um pouco mais, avistou uma figura
conhecida parada em um ponto de ônibus logo à frente. Ela dirigiu lentamente
próximo ao meio fio enquanto ia se aproximando do lugar. Quando a morena
finalmente chegou, soube de quem se tratava. Sua aluna Jennifer Meireles estava
sozinha em um ponto deserto naquele escuro fim de tarde. A loira estava
encolhida de braços cruzados enquanto possivelmente aguardava o ônibus. Do
jeito que estava o trânsito, sua condução não chegaria tão cedo, pensou Regina.
— Senhorita Meireles?— disse ao encostar o carro e abrir a janela.
Devido ao grande barulho do temporal, a loira não ouvira. — Senhorita
Meireles!— exclamou, obtendo a atenção da jovem posteriormente. — O que
faz sozinha nesse ponto? É perigoso. Vem, entre no carro.
Regina sabia que não era adequado dar carona a algum de seus alunos.
Ela nunca o fizera. Porém, ainda mais errado seria deixar Jennifer sozinha
naquela situação.
— Agradeço, mas eu prefiro aguardar meu ônibus. Não deve demorar.
— Meireles, entre logo. Não vou permitir que fique sozinha nesse lugar.
Sua condução vai demorar, o trânsito está péssimo. Levei um enorme tempo pra
conseguir tomar essa rua. Vem, entra!— Regina precisou aumentar sua voz
devido ao barulho da chuva.
— Não se preocupe comigo. Não irá acontecer nada.— Jennifer
respondeu. A jovem estava sem jeito de aceitar a carona oferecida.
— Ô garota teimosa!— reclamou enquanto saía do carro, recebendo
pancadas de chuva sobre seu corpo. — Está satisfeita agora? Estou toda
molhada!
Jennifer conteve uma gargalhada enquanto observava a mulher
sacudindo os braços na tentativa de livrar-se de alguns vestígios d’água.
— Se afasta do meio fio, você vai continuar se molhando. Vem!—
Jennifer segurou a mão de Regina e puxou a mulher para debaixo da cobertura
que o ponto de ônibus oferecia. A mais velha havia recebido chuva em seus
cabelos, braços e roupa.
— O que eu preciso fazer pra te convencer a entrar naquele carro?
— Não quero te dar trabalho, moro um pouco longe daqui. Vou te
atrasar e Bóris irá destruir toda a casa — comentou e expressou um pequeno
riso.
Assim que Jennifer sorriu, Regina lamentou estarem em um local com
baixa iluminação, pois ela adorava observar o sorriso travesso e até mesmo
cafajeste que a loira expressava involuntariamente.
— Prefiro que minha casa seja colocada a baixo do que saber que você
está sozinha aqui. Agora anda, entra no carro. E dessa vez é uma ordem — disse
séria.
Jennifer sentiu um arrepio percorrendo seu corpo. E não era decorrente
da chuva, não. Mas sim da rouca voz da professora e seu tom autoritário.
— Aqui fora você não me dá ordens — implicou na tentativa de instigar
a morena a se comportar de maneira ditatorial.
Regina aproximou-se da aluna como se quisesse fuzilar a jovem com o
olhar. Ela detestava ser contrariada.
— Sim, eu dou — disse, segundos antes de dar as costas para Jennifer e
sair da cobertura onde se encontrava. Regina ficou tomando chuva por breves
segundos, até a jovem se render.
— Ok. Você venceu! Agora sai dessa chuva!— comentou ao se dar por
vencida. — Você está toda encharcada! Droga!— disse após entrar no veículo.
— Não sou de açúcar, Meireles. Não se preocupe — comentou
enquanto trancava as portas do veículo.
— Doce realmente não é um adjetivo pra você.
— Vou ignorar esse seu comentário.
Antes de Regina dar partida no carro, sentiu a mão de Jennifer tocando
sutilmente seu rosto. A jovem secou algumas gotas de água que escorriam pela
face da morena e deslizou o contato para os cabelos. Jennifer, sem pensar muito
sobre sua atitude, mexeu naqueles fios castanhos com suavidade. Ela tirou
alguns fios que cobriam a face de Regina e arrumou alguns outros que estavam
desalinhados pela chuva. Nesse curto período de tempo ela observava o quão
linda e sexy era aquela mulher de cabelo molhado.
Regina permitiu que os dedos de Jennifer passeassem por entre seu
cabelo. Aquele contato mais íntimo com a loira estava proporcionando uma
deliciosa sensação. Ela virou o rosto de modo que pudesse encarar a face da loira
e vê-la com mais clareza. Regina e a mais nova iniciaram uma intensa troca de
olhares. Se olhavam como se quisessem dizer algo uma à outra. Seus olhares
estavam cravados até o momento em que o olhar de Jennifer caiu para os lábios
de Regina. Nesse instante a professora cortou o clima que se instalara e
questionou-a sobre seu endereço.
— Sei onde fica esse bairro, não é tão longe — comentou. — Mas com
esse engarrafamento levaremos uma hora pra chegar — completou.
— Vou atrapalhar você, não é?
— Não, não vai. Te deixarei em casa e depois faço um retorno pra
minha. Vamos?

A maior parte da viagem seguiu em silêncio. O único som a ser
escutado era o das músicas que estavam de fundo no rádio do carro. Enquanto a
morena se mantinha concentrada no trânsito, Jennifer mexia em alguns
brinquedos do sobrinho de Regina que havia no carro. A loira esboçava
pequenos sorrisos ao imaginar como seria um sobrinho da mulher e se ele se
pareceria com ela em algum aspecto.
Após algum tempo o tráfego entre os carros começou a melhorar. As
duas chegaram até a rua de Jennifer antes do previsto.
— Obrigada por ter me trazido até aqui. Desculpe qualquer incômodo.
— Não precisa agradecer. Dormirei tranquila sabendo que você estará
bem.— Sorriu. Aquele sorriso, seguido de tais palavras, foi o suficiente para
fazer Jennifer desmanchar-se por dentro.
— Boa noite, Vianna.
— Boa noite.


Capítulo 6

Era uma ensolarada tarde de sábado quando Regina voltava de um
passeio com sua irmã Malena e seu sobrinho Henrique. Eles haviam chegado
para visitá-la na manhã daquele mesmo dia. O céu estava tão limpo, que nem
parecia o mesmo do dia anterior quando uma enorme tempestade tomou conta da
cidade.
— Henrique adora vir te visitar — comentou Malena ao entrar no carro.
Os três estavam deixando o estacionamento de um shopping.
— Deveria trazê-lo mais vezes. Vocês quase não vêm me ver.
— Não é por mal, Regina, é a falta de tempo.
— Sei...
— Tia Regina, você pode fazer aquela torta de maçã pra mim?—
perguntou Henrique do banco de trás. Henrique era um menino de nove anos.
Sua pele era clara, seus olhos avelãs e seus cabelos da mesma tonalidade dos
cabelos de Regina. Suas características físicas eram totalmente opostas à de sua
mãe; Malena era ruiva de olhos claros. O menino havia puxado totalmente ao
pai.
— Claro, meu amor. Assim que chegarmos em casa, ok?
— Ok!— exclamou ele. — Posso te ajudar pra ficar pronto mais
rápido?
— Pode!
— Henrique, acabamos de lanchar! Já está pensando em comida de
novo? Sua tia irá pensar que não te alimento.
— Relaxa! Deixa o menino — disse ao dar partida no carro.

Poucos minutos haviam se passado quando Malena sentiu que estava
pisando em algo. Quando a ruiva abaixou para ver o que era, deparou-se com
uma carteira.
— O que é isso?— comentou Regina ao notar a movimentação da irmã.
— Você deveria saber, está no seu carro — respondeu a ruiva. Assim
que Malena abriu a carteira, constatou que havia algumas notas de dinheiro,
recibos, documentos e uma carteira escolar. — Trazendo aluna pra dentro do
carro, irmãzinha? Não sabia desse seu lado — disse ironicamente ao puxar a
carteira escolar para fora. — Jennifer Meireles — leu pausadamente.
Regina arregalou os olhos surpresa com o que vira; pensando que,
certamente, sua aluna deixara cair na chuvosa noite do dia anterior.
— Qual lado, Malena?— indagou.
— Pegadora de alunos.
— Deixa de dizer absurdos! Ontem precisei dar carona a ela porque caía
uma forte chuva. A menina estava sozinha em um ponto de ônibus deserto.
— E por que está nervosa como se estivesse devendo, Gina?—
implicou.
— Não estou nervosa, apenas me expliquei.
— Aham... Está certo. Mas ela é bem bonitinha, hein? Você precisa
confessar — comentou enquanto olhava para a foto que havia na carteirinha.
— Malena! Fecha essa carteira e para de mexer nas coisas dos outros —
repreendeu-a.
— Uh, não precisa se irritar. E disfarça esse seu nervosismo, pois ficou
bem evidente.— A ruiva fechou a carteira e a guardou no porta luvas.
Regina fingiu não escutar as palavras que sua irmã dissera e iniciou uma
conversa com Henrique até chegarem em casa.

— Antes de tudo você precisa lavar suas mãos — disse a morena antes
de começarem a preparar a torta.
Henrique lavou as mãos, voltou para o lado de sua tia e começou a
seguir suas instruções.
— Essa receita vai dar pra muitos pedaços?— perguntou o menino
enquanto ajudava.
— Dará uma torta bem grande, com direito a muitos pedaços.— Ela
respondeu.
— Oba! Eu aguento comer muitos!
— Será mesmo, Henrique?— disse ao olhá-lo de lado. A morena
carregava um lindo sorriso nos lábios. Henrique era um alguém muito querido
por ela.
— Sim! Você quer apostar?
— Do jeito que vi você comendo hoje no shopping? Não mesmo! Não
duvido que essa pancinha redonda seja um buraco negro.
— Pancinha? Você está sendo gentil, Regina.— Malena se manifestou
na conversa, arrancando uma risada de todos.
Quando a torta ficou pronta, todos se reuniram à mesa. Regina e Malena
comeram um pequeno pedaço, enquanto Henrique devorou três. Após a refeição,
todos foram para a sala. Henrique ficou se distraindo enquanto brincava com
Bóris. O menino era apaixonado por felinos, assim como sua tia, mas Malena
não permitia que ele tivesse um animal. Ela não o julgava responsável o
suficiente. Sendo assim, ele aproveitava ao máximo quando estava na casa de
Regina.
Enquanto ele e Bóris corriam pela casa, as duas irmãs conversavam no
sofá. A ruiva estava deitada com a cabeça apoiada no colo da irmã.
— Como vai a escola? Pegou muitas turmas esse ano?
— Bastante. Estou trabalhando todos os dias, manhã e tarde. Mas às
segundas e quintas eu trabalho apenas no período da tarde.
— E as aulas de espanhol? Ainda tem dado?
— Tenho. Às vezes atendo aos finais de semana, e às vezes nas manhãs
desses dois dias que só preciso trabalhar à tarde. Mas tem alguns clientes que só
podem ter aula comigo à noite, então varia muito. Mas atualmente estou apenas
com dois alunos. O colégio tem consumido bastante do meu tempo — explicou.
— Entendi... E como vai Robson? Nunca mais o vi.
— Ele está ótimo.
— Quando o vir diga que mandei um beijo.
— Direi.
— Vocês continuam na mesma?— questionou-a com curiosidade.
— Sim. Na verdade estamos um pouco mais afastados que de costume.
Ele tem viajado muito.
— Que pena. Pensei que vocês fossem dar um primo à Henrique.
— Ai, Malena. Vira essa boca pra lá. Nem pensar! Não quero ter um
filho com Robson. Nem sei se quero ter filhos um dia, aliás.
— Mas vocês têm praticado?— A ruiva implicou.
— Sempre que possível. Praticar é maravilhoso.— Riu.
— Cara de pau!— disse ao levantar-se do colo e olhar para a irmã. —
Você é muito safada mesmo, viu.
— Só um pouquinho — respondeu com um pequeno sorriso malicioso
nos lábios.
— Um pouquinho, Regina? Sei. Conheço você perfeitamente.
— O que você quer dizer com isso?
— Que eu sei muito bem do seu apetite sexual.
— Eu não sou de me entregar facilmente, mas quando estou com
alguém, admito que gosto de ter um bom sexo. Você não?
— Lógico que sim! Estou casada com o pai de Henrique há anos, mas
faço o possível pra que as coisas entre nós não esfrie. Não quero ser daquelas
mulheres insatisfeitas que transam por obrigação. Não que um relacionamento se
resuma a isso, mas uma boa noite de sexo faz um bem danado.
— Ô se faz!— respondeu, compartilhando uma gostosa gargalhada com
sua irmã.
— Você ainda tem se relacionado com mulheres?
— Desde que estou com o Robson, não. Sei que não temos nenhum
compromisso e eu estou livre pra me relacionar com outras pessoas, mas não o
fiz.
— Por quê?
— Porque não encontrei alguém que me despertasse interesse. Sexo por
sexo eu já tenho o Robson. Ele é um bom cara, tenho um grande carinho por ele,
só não o amo. Não sinto que ele seja a pessoa ideal pra mim, não temos conexão.
E pra eu me prender a alguém terá que me despertar algo muito intenso —
explicou.
— Você não sente falta de estar com uma mulher?— perguntou a ruiva.
Malena sempre falava abertamente sobre o assunto com sua irmã. Regina
assumiu a bissexualidade para a família na adolescência e foi muito bem aceita
por ela e por seus pais.
— Na verdade eu sinto falta de estar com alguém que me transborde de
sentimentos, independente de ser homem ou mulher. Mas se está se referindo a
sexo, sim. Sinto falta. Transar com mulher é muito mais prazeroso pra mim.
— Você está nessa situação porque quer, aposto que chove pretendentes
pra você. Deveria dar uma oportunidade a alguém. Vai que numa dessas você
encontra a mulher dos seus sonhos?
— Eu não consigo me relacionar com alguém e esperar que cresça uma
paixão. Nunca dá certo. É gostoso quando simplesmente acontece.
— Regina, você é muito cheia de coisa. Vai morrer sozinha!
— Obrigada por me dizer isso — comentou ao esboçar um sorriso
irônico.
— Estou com sono...— disse Henrique ao se aproximar das duas. A
viagem havia sido cansativa e, desde que chegara, não parou um momento.
— Preparei um quarto pra você. Vamos subir comigo?— Regina
ofereceu. A morena o acompanhou até o quarto de hóspede e cantou lindas
canções de ninar espanholas para ele. Ela mantinha esse mesmo hábito desde
que Henrique era um bebê.
— Por isso ele te ama tanto. Você o mima demais — comentou Malena
enquanto os olhava com ternura, da porta.
Regina depositou um beijo na bochecha do sobrinho e deixou o
cômodo.
— E sempre irei mimar — disse ao reencontrar com a ruiva no
corredor.
— Vocês são lindos juntos. Quem vê até pensa que a mãe é você —
disse enquanto caminhavam de volta para a sala. — E aquela... Como é mesmo o
nome? Jennifer! Acho que é isso!
— O que tem a senhorita Meireles? Não começa, Malena.
— Não vou começar nada, Regina. Calma. Só toma cuidado, ok?
— Com o quê?— perguntou confusa.
— Não sei... Essa carona pode soar esquisito se as pessoas souberem.
— Eu sei disso. Mas foi o correto a se fazer — respondeu prontamente.
Regina se manteve pensativa por alguns instantes. Alguns pensamentos
relacionados à Jennifer passavam em sua mente, foi então que decidiu
compartilhar com sua irmã. — Malena, queria te contar algo.— Ela iniciou.
— Conte.
Regina pensou, repensou e desistiu.
— Não é nada importante. Deixa. Loucura da minha cabeça.
— Fala, Regina! Agora eu quero saber. Continue essa loucura aqui fora.
— Não é nada. Eram coisas do trabalho, mas é melhor esquecermos.
Me acompanha em um uísque?
— Sempre.


Após um final de semana com sua família, Regina Vianna começou a
semana renovada. Atendeu um cliente de espanhol na parte da manhã e à tarde
seguiu para a escola. A morena deu dois tempos seguidos de aula em uma turma
de primeiro ano e, posteriormente, aplicou um tempo em uma turma de terceiro.
Quando o momento do intervalo chegou, caminhou para a biblioteca como de
costume, sentou-se, retirou uma maçã embrulhada da bolsa e pegou seu celular.
Regina sentiu uma forte presença invadir o local. Quando olhou para
frente, deparou-se com Jennifer. Era como se a morena a tivesse sentido.
— Boa tarde — disse a jovem ao passar por ela.
A professora apenas sorriu e manteve-se onde estava. Enquanto olhava
em seu celular as fotos que tirara com Henrique e Malena no final de semana,
lembrou-se que havia trazido a carteira de Jennifer consigo. Ao lembrar-se,
julgou que aquele seria o momento ideal para devolvê-la. Afinal, ela não ia
querer testemunhas. Pois como explicaria a carteira de uma aluna em seu carro?
Sendo assim, levantou-se de seu lugar e caminhou até a mesa onde a loira se
encontrava sozinha.
— Com licença, senhorita Meireles. Posso me sentar?
Ao ouvir aquela voz completamente familiar, Jennifer ergueu a cabeça
com um lindo sorriso estampado nos lábios.
— Fique à vontade.
A professora tomou um lugar próximo a ela e logo retirou a carteira da
jovem de dentro de sua bolsa.
— Isso aqui é seu — disse ao depositar sobre a mesa.
— Não acredito! Revirei a casa inteira atrás dela.— Jennifer pegou a
carteira e a guardou dentro do bolso de sua calça jeans. — Onde você a achou?
— Estava dentro do meu carro. Pode abrir e conferir o que tem dentro,
não mexi em nada.
— Não preciso fazer isso. Eu confio em você.
— Você mal me conhece, como pode confiar?
— Não sei. Apenas confio — disse suavemente.
— Eu soube que era sua porque minha irmã a abriu e pôs sua carteirinha
escolar pra fora. Foi ela quem achou, na verdade. Mas imediatamente eu pedi
que ela a fechasse.
— Não acredito que você viu aquela minha foto horrorosa!— comentou
ao cobrir o rosto com as mãos.
— Vi. E não tinha nada de horroroso ali.
— Claro que tinha! Ou melhor, tem! Que mico!
— Sente vergonha de mim?
— Sinto vergonha de qualquer ser humano que veja aquela foto!— riu,
compartilhando uma risada com sua professora. — Mas sinto ainda mais de
você...— Meireles usou seriedade na voz ao proferir a última frase, fazendo com
que a atmosfera entre elas rapidamente mudasse.
— Não precisa sentir. Todos nós ficamos meio estranhos nas fotos três
por quatro. Mas você estava ótima na sua.— Sorriu.
— Obrigada.— Jennifer retribuiu o sorriso e permitiu perder-se
brevemente no olhar à sua frente. — Sua irmã esteve com você? Então eu
presumo que seu sobrinho também, certo?— perguntou com interesse.
— Sim. Ambos passaram o final de semana comigo. Vou te mostrar
algumas fotos dele.— Regina aproximou sua cadeira de modo a ficar bem
próxima à Jennifer. Ela abriu a galeria do celular e mostrou com empolgação
algumas imagens de Henrique.
— Que menino mais lindo!— disse a loira. Ela estava encantada com
tamanha graciosidade.
— Olha essa.— Regina abriu uma foto onde Henrique e Bóris estavam
adormecidos, juntos, no sofá. Jennifer quase derreteu-se ao ver tamanha fofura, e
Regina fez o mesmo. A foto, inclusive, havia virado papel de parede de seu
celular.
— Adorei as fotos. Obrigada por compartilhá-las comigo.— Sorriu.
— Imagina — retribuiu o sorriso. — Bom, vou me retirar. Vim apenas
entregar sua carteira e acabei tomando seu tempo com essas fotos. É que quando
se trata de Henrique eu sou bem boba. Parece até que ele é meu filho.
Quando Regina fez menção de levantar, Jennifer a segurou pelo pulso.
— Fica...— disse suavemente ao mesmo tempo em que buscou o olhar
da mulher.
— Preciso ir. Daqui a pouco termina o intervalo — respondeu,
observando que sua aluna ainda a segurava.
— Precisa ou quer ir?
— Eu preciso — tornou a dizer.
— E se eu te pedir pra ficar?
— Por que quer que eu fique?
— Porque gosto da sua companhia — respondeu sem rodeios. Jennifer
soltou o pulso de Regina e deslizou tão lentamente a mão para fora, que as
pontas de seus dedos praticamente acariciaram a pele da mulher.
— Já terá que me aturar por uma hora em seu último horário de aula
hoje. Você é a única entre os meus alunos que quer passar um tempo extra
comigo — comentou, fingindo não perceber do que realmente se tratava tudo
aquilo.
— Uma hora três vezes por semana é muito pouco. Vou pedir pra
diminuírem os tempos excessivos de matemática e acrescentarem história.
Aposto que todos vão adorar. Quase ninguém suporta matemática.
— Não gosta de matemática?— perguntou. A morena adorava conhecer
um pouco daquela jovem que tanto a intrigava.
— Detesto! Será que algum ser humano normal gosta?
— Me pergunto a mesma coisa.
— Você também não gosta?
— Não detesto como você. Mas há matérias mais amáveis, confesso.
— Por falar em matérias, eu preciso te pedir algo.— Jennifer iniciou. —
Minha prima estava querendo fazer curso de idioma. Mas, como sei da sua
excelência como professora, sugeri que ela tivesse aulas particulares de espanhol
com você. Se tiver algum tempo livre, claro.
— Atualmente eu tenho apenas dois alunos, pois estou com pouco
tempo sobrando. Teria que ver com sua prima quais os dias e os horários
possíveis pra ela, para que eu pudesse tentar encaixá-la.
— Você tem algum cartão que eu possa entregar?
Regina carregava alguns cartões em sua bolsa. Porém, negou. Ela não
gostava que alunos tivessem seu número telefônico. E visto que as coisas entre
ela e Meireles estavam meio confusas, evitou.
— Não. Mas você pode me passar o número dela que eu entro em
contato ainda hoje.
— Ok.
Jennifer passou o número e a mais velha o salvou na agenda de seu
celular. Logo em seguida o alarme ecoou pela escola fazendo com que ambas as
mulheres deixassem a biblioteca e seguissem rumos diferentes.


A aula de história havia iniciado na classe trezentos e nove. Jennifer
olhava para a postura imponente de Regina em aula e só conseguia pensar no
quão diferente a professora era fora dali. Não que a mulher perdesse a postura
quando fora de seu trabalho, não. Mas quando estavam fora de classe, ela
conseguia enxergar uma Regina além de toda aquela seriedade.
— Bea, você conseguiu compreender a questão cinco?
— Não, estou pulando várias.
— Vou pedir explicação a ela. Achei a pergunta meio confusa e não
consegui entender alguns pontos da matéria de hoje. Já volto.— Jennifer
levantou-se de seu lugar, contornou a mesa de Regina, apoiou seu livro de
história e uma folha de fichário com as questões sobre a mesa, e agachou-se
próxima à mulher. — Professora Vianna, poderia me explicar melhor esse
parágrafo? Estou com dificuldade em responder algumas questões.
— Posso, qual foi exatamente a sua dúvida?
Jennifer puxou uma cadeira e a colocou ao lado de Regina. Ela releu
uma parte do texto e apontou com precisão onde exatamente não havia
compreendido. A mais velha, com toda tranquilidade do mundo, leu algumas
passagens do livro para a loira enquanto explicava minuciosamente o que cada
frase queria dizer. Por fim, leu junto com Jennifer as perguntas que causaram
dúvidas na jovem e a orientou em suas respostas.
Receber as explicações de Regina de maneira tão próxima e até mesmo
pessoal estava provocando maravilhosas sensações em Jennifer. Ela passaria
horas ali se fosse possível. A morena era inteligente e direta em suas
explicações; demonstrando total conhecimento sobre o assunto. Toda aquela
postura intelectual estava atraindo Jennifer a cada novo instante que se passava.
Manter a concentração apenas ao que a professora dizia estava sendo uma tarefa
extremamente difícil. Em alguns momentos Meireles se via perdida entre a rouca
voz, o doce perfume e os lábios da mulher que se mexiam de maneira
provocante.
Ao mesmo tempo em que Regina esclarecia as dúvidas, ela observava o
quão atenta sua aluna estava a tudo o que dizia. Debater aquelas questões com a
loira estava sendo uma atividade muito prazerosa. O interesse de Jennifer pela
matéria deixava a morena ainda mais empolgada para explicá-la.
As duas mulheres passaram longos minutos debatendo aquelas questões
e quando se deram conta já estavam falando de algo muito além.
— Mas isso é assunto pra outro dia. Ensinarei isso a vocês apenas no
segundo bimestre — disse Regina ao puxar a conversa de volta para o tema
inicial.
— Acho que nos empolgamos um pouco — comentou Meireles,
sorrindo.
Regina depositou seu olhar na boca naturalmente rosada da aluna e
admirou o lindo sorriso moleca que ela acabara de esboçar. No entanto, não
foram apenas os lábios de Jennifer que sorriram, os olhos de Regina também, ao
contemplar aquele sorriso que ela tanto gostava. Aquele contato estava
agradando tanto a mais velha, que ela precisou cortá-lo antes que a classe
percebesse os olhares que lutavam para serem discretos.
— Mais alguma coisa, Meireles?— perguntou com seriedade.
— Não. Obrigada!— Jennifer arrastou a cadeira e voltou para seu lugar
de origem. A loira explicou o que havia entendido para Beatriz e, juntas,
concluíram os exercícios do dia.
Quando a aula chegou ao fim, Jennifer pediu pra que Regina a
aguardasse, pois gostaria de esclarecer mais uma dúvida. Meireles enrolou ao
máximo para terminar de guardar seu material, até que Beatriz cansou de esperar
em sala e decidiu esperá-la na frente da escola enquanto conversava com alguns
colegas.
Assim que todos os estudantes deixaram o lugar, a jovem caminhou até
Regina e as duas mulheres iniciaram um diálogo.
— Você não tem mais dúvida alguma pra esclarecer comigo, não é?—
disse assim que Jennifer aproximou-se de sua mesa. A professora já havia
entendido que a jovem apenas inventou uma desculpa pra ficarem a sós.
— Não — respondeu timidamente ao mesmo tempo em que esboçou
um fraco sorriso.
— Por que pediu que eu a esperasse?— perguntou a encarando.
— Por que esperou se já sabia que eu não tinha uma nova pergunta?—
rebateu ao manter seu olhar em Regina.
— Por que inventou que tinha uma dúvida pra me fazer ficar?
— Exatamente pra isso. Pra te fazer ficar...— Jennifer deslizou as
pontas dos dedos pela lisa superfície da mesa até que eles encontrassem a mão
de Regina que estava apoiada sobre o móvel. Ela tocou levemente a mão da
mulher com a ponta de seus dedos, mas logo os deslizou para fora, quebrando o
contato. A porta estava aberta e ela jamais arriscaria que alguém visse algo
inapropriado entre elas, embora a vontade de tocá-la estivesse absurdamente
grande.
Sentir as pontas dos dedos de Jennifer sobre a pele de sua mão causou
um leve arrepio no braço da mais velha. Por um impulso ela quase segurou a
mão da jovem para impedir que a loira quebrasse o contato. Porém, a razão falou
mais alto e ela manteve-se parada.
— Estou aqui. E então?
— Você sente como se tivesse algo acontecendo?— perguntou.
— Não sei a quê se refere, senhorita Meireles.
— Tem certeza que não sabe?— Jennifer se controlava a cada minuto
para não aproximar-se de Regina e tocá-la.
— Tenho — respondeu séria. Ela sabia exatamente a quê sua aluna se
referia, apenas não queria alimentar ainda mais aquela conversa. Contudo, já
estava começando a cansar de atuar.
— Ok...— Jennifer foi até a própria mesa, recolheu a mochila,
caminhou em direção a porta de saída e se foi.
Regina respirou fundo, sentou-se, passou a mão nos cabelos de modo a
jogá-los para trás, retirou os óculos e se permitiu ficar na sala de aula por mais
algum tempo. Sua mente não parava de pensar no acontecido de poucos minutos
atrás. Ela tinha absoluta certeza de que algo havia se instalado entre elas.

Ao chegar em casa, Regina dedicou certo tempo a Bóris. Ela passou
alguns minutos em uma gostosa brincadeira onde seu gato corria atrás da luz
vermelha que vinha do laser que ela segurava. A morena repetia aquela atividade
todas as noites com ele, pois esta era uma forma de fazer com que seu gato
queimasse um pouco de calorias. Após alguns momentos de diversão, o
alimentou com ração nova e em seguida seguiu para o quarto. Antes de ir para o
banho, fazer seu chá de maçã de todas as noites e isolar-se por algumas horas em
seu escritório, decidiu ligar para o número que Jennifer havia lhe dado mais
cedo. Ela optou fazer a ligação antes de iniciar suas tarefas noturnas para que
não ficasse muito tarde.
Ao tirar o celular da bolsa, discou para o número e aguardou que
alguém atendesse a chamada.

— Alô?— disse a voz do outro lado da linha.
— Boa noite. Me chamo Regina Vianna, com quem eu falo?—
apresentou-se, recebendo longos segundos de silêncio. — Alô? Alguém?—
insistiu. Regina ouviu um longo suspiro e, logo em seguida, uma voz bastante
familiar a respondeu.
— Oi. É a Jennifer...
— Meireles?


Capítulo 7

— Oi... É a Jennifer.
— Meireles?
Um silêncio instalou-se na ligação. O único som a ser escutado por
Regina era o da respiração de Jennifer. E antes que a morena pudesse dizer algo,
a chamada foi encerrada. Regina caminhou para o banheiro e enquanto sentia a
morna água do chuveiro tocar sua pele, os pensamentos em Jennifer se faziam
presentes. Ela pensava em como aquela jovem estava infiltrando-se dentro dela.
Naquela noite a professora trocou o rotineiro chá de maçã por uma dose
de uísque. E após corrigir alguns trabalhos, isolou-se em seu quarto e começou a
leitura de um livro de Elizabeth Bishop, sua poetisa preferida. Contudo,
concentrar-se na leitura estava sendo uma tarefa não muito fácil. Vez ou outra a
mulher se via perdida entre as páginas do livro e o sorriso de Meireles. Jennifer,
sem dúvida, era o poema mais lindo que Regina lutava para não ler.


No dia seguinte, assim que se encontrou com Jennifer em mais um
intervalo passado dentro da biblioteca, ela questionou a jovem sobre o ocorrido
da noite passada. Regina foi direta, sem rodeios.
— Não sabia que sua prima se chamava Jennifer e possuía a voz
idêntica a sua, senhorita Meireles — disse séria, enquanto mantinha uma
conversa com a jovem. As duas mulheres conversavam de pé em frente a uma
larga estante de livros. Regina estava lá apenas para passar o tempo, e Jennifer
escolhia alguns livros que a ajudassem em um trabalho.
— Desculpe ter inventado aquela história.— A loira sentia-se um pouco
envergonhada pelo que fizera.
— Por que o fez?
A mais nova hesitou por breves instantes enquanto pensava em uma
resposta para dar.
— Porque... Porque eu queria ter seu número.
— E por que gostaria de ter o meu número?
— Pra ter mais contato com você. Quando pedi seu cartão e se recusou
a me dar, o que eu já imaginava que aconteceria, resolvi te dar meu número.
Dessa forma, assim que você me ligasse eu teria o seu.
— Muito esperta você, hum? E por qual motivo quer mais contato
comigo? Já nos vemos semanalmente por vários dias.
— Não sei... Me parece pouco o tempo que a vejo aqui.— Jennifer
interrompeu a busca pelos livros e aproximou-se de Regina, fazendo a professora
recuar. Meireles insistiu e investiu mais um passo. Dessa vez a mais velha
manteve-se no mesmo lugar. — Você às vezes é tão séria, misteriosa. Tem dias
que está acessível, mas depois se fecha novamente. Isso me intriga e me faz
querer saber mais sobre você.
— Não há nada de interessante em mim que você gostaria de saber. E
peço, por favor, que não divulgue meu número.
— Jamais o divulgaria. É apenas pra mim.
— Ótimo — disse séria. — O que você procura entre esses livros?—
perguntou ao perceber que Jennifer buscava algo específico.
— Preciso entregar um trabalho sobre genética na semana que vem.
Estou procurando alguns que abordem esse tema. Gosto de buscar várias fontes,
e não gosto de usar a internet pra isso. Nunca sei quando a matéria é confiável.
— Você sempre foi dedicada aos estudos dessa forma?— perguntou a
professora. Regina admirava o quão esforçada Jennifer soava.
— Sempre gostei de estudar e aprender coisas novas. Mas confesso que
estou mais dedicada nos últimos três anos, pois tenho bolsa integral e não posso
correr o risco de perdê-la.
— Isso é bom. Se todos na sua idade já tivessem esse senso de
responsabilidade ganhariam muito tempo na vida.
— Não sou tão responsável assim. Afinal, eu só tenho dezoito anos.
Tenho meus momentos inconsequentes.— Riu. — Mas eu trato com seriedade
assuntos que precisam ser tratados assim.
— Todos temos momentos onde nos comportamos de maneira
inconsequente. E convenhamos, são os melhores. Mas realmente em algumas
questões precisamos ter bom senso.
— E quando precisamos ter, mas não conseguimos?— Jennifer fazia
contato direto com os olhos castanhos enquanto falava. As palavras pareciam
querer saltar de sua boca.
Com Regina não acontecia diferente. Ela sentia como se houvesse um
recipiente cheio de palavras dentro de si, que pedia para ser transbordado.
— Há uma diferença entre não conseguir e não querer. O não conseguir
é perigoso demais.
Jennifer tocou sutilmente a mão da mulher com a ponta de seu indicador
e traçou um perigoso caminho pela mão e braço da professora. Ela subia e descia
com a sutil carícia ao mesmo tempo em que conversava com ela. Meireles era
imensamente cautelosa e sabia que na localidade onde estavam não havia
ninguém. Mas, ela também sabia que não havia nada que impedisse a chegada de
alguém, o que tornava o momento profundamente excitante para ela.
— É perigoso, mas é involuntário. Há coisas que não podem ser
barradas...— comentou a loira.
Regina deu um passo em direção à sua aluna e a deixou encurralada
entre a estante e seu corpo.
— Assim como há coisas que simplesmente não queremos barrar —
disse em resposta ao aproximar seus lábios do ouvido de Jennifer — , mas
devemos.— concluiu a frase em um sussurro que fez Meireles arrepiar-se.
Jennifer fez menção em dizer algo, mas a presença de Regina tão
próxima de seu corpo a deixou sem reação. Era a primeira vez que a professora
tomava uma atitude como essa, a pegando totalmente desprevenida.
— Algum problema, Jen-ni-fer?— disse ao encarar a aluna de frente.
Regina copiava cada traço do rosto da jovem enquanto observava a expressão da
loira mudar de surpresa para desafiadora. — Ou o gato comeu sua língua?—
provocou.
Meireles abriu um largo sorriso sacana ao ouvir seu nome sair dos
lábios de Regina em um tom profundamente provocante. A loira captou toda a
malícia que aquela rouca voz oferecia, ao mesmo tempo em que sentiu seu corpo
aquecer.
— O problema é que eu não quero barrar.— Ela respondeu.
Essas foram as últimas palavras ditas antes do sinal tocar. Regina
afastou-se de sua aluna e foi a primeira a deixar o ambiente. A partir desse dia a
professora passou a não mais frequentar a biblioteca, a menos que fosse
extremamente necessário. Ela estava disposta a evitar que momentos como esse
voltassem a acontecer.

As semanas foram passando normalmente. Jennifer, por sua
inteligência, determinação, responsabilidade e pontualidade acabou sendo eleita
a representante de classe pelo segundo ano consecutivo. A jovem adorava ser a
responsável pelas questões que envolviam a turma. Dessa forma, conseguia ter
um pouco de voz ativa dentro da escola.
— Está animada para a festa?— perguntou Beatriz enquanto caminhava
com sua amiga pelos corredores da escola. O aniversário de vinte e cinco anos
da instituição estava chegando. Jennifer, assim como os demais representantes
de turma, estava encarregada de ajudar a direção escolar a organizar o que era
considerado a maior festa da escola. Perdendo apenas para o baile de formatura.
— Muito! E você?— disse com empolgação.
— Demais! Esse colégio está precisando de um agito!
— Concordo! Estou ficando um pouco cansada, pois preciso vir à
escola alguns dias na parte da manhã pra ajudar a adiantar as coisas. Mas valerá
à pena. Sempre vale.
— Falta muita coisa?
— Bastante. Temos apenas uma semana pra conseguir finalizar tudo.—
Suspirou. — Amanhã não terei boxe, então estarei aqui pela manhã pra adiantar
algumas coisas.
— Se eu pudesse viria te ajudar, mas o colégio só deixa quem é
representante — lamentou a amiga.
— Eles fazem isso pra não virar bagunça. Eles precisam ter o controle
do número de alunos que está na instituição fora de seu turno de aula e tal. Essas
normalidades...
— Eu entendo. Você já sabe que roupa vai usar? E Estela? Será que vai
grudar em você nessa festa, hum?— disse ao mesmo tempo em que cutucou o
ombro da loira.
— Beatriz, para!— reclamou ao empurrar a amiga sutilmente enquanto
fingia ter se irritado. — Ainda não sei o que usar, pensarei nisso depois. E
Kevin? Já conversou com você sobre a festa?
— Sim. Ontem ele me ligou e falamos a respeito.
— Te ligou? Hum... Já estão assim, é?— comentou com malícia em sua
voz e olhar.
— Quem dera se já estivéssemos assim. Mas ultimamente andamos
mais próximos, confesso. De toda forma não estou forçando nada. Se tiver de
ser, será.
— Assim que se fala! Agora vamos apressar os passos, pois acabei de
avistar a professora de matemática entrando na sala.
— Vamos.


Regina Vianna se via em um conflito interno diário quando se tratava de
Jennifer Meireles. Por mais que a professora buscasse não se envolver com sua
aluna de uma maneira que não fosse apenas a profissional, o destino parecia
estar querendo fazer um jogo com ela.
— Senhorita Vianna, vejo que está com dois tempos livres essa manhã.
Poderia acompanhar a aluna Jennifer Meireles até o centro comercial se não for
incômodo?— perguntou Elizabeth, diretora escolar. — Quero que a auxilie no
transporte de alguns itens decorativos para a festa de aniversário da instituição.
— Só pode ser brincadeira...— sussurrou Regina em um resmungo para
si.
— Disse algo?— perguntou a diretora.
— Acompanharei a aluna Meireles.— respondeu, esboçando um
pequeno sorriso forçado.
Jennifer, de seu lugar, tentava conter um sorriso de satisfação. Passar
um tempo com Regina longe daquele ambiente escolar era tudo o que ela estava
almejando naquele momento.

— Comporte-se, senhorita Meireles — disse ao entrar no carro junto
com sua aluna.
— O que você quer dizer com “comporte-se”?— perguntou curiosa.
— Quero dizer que você está sob minha responsabilidade. Fique perto
de mim, evite se perder, ande com atenção pelas ruas. Estamos entendidas? Não
tenho como pagar outra filha para os seus pais.
— Eu não preciso de uma babá, ok?— retrucou. — Mas se quiser
segurar minha mão, não irei me importar.— Riu.
— Você é uma moleca, Jennifer — comentou ao sacudir a cabeça
negativamente. Ela tentou, mas foi impossível não sorrir com o jeito espontâneo
e um pouco travesso da jovem.
Ao chegarem ao local de destino, Regina estacionou o carro e ambas as
mulheres começaram a passear juntas por entre as ruas. Elas visitaram algumas
lojas de artigos pra festa à procura de alguns itens citados em uma lista que
Meireles carregava.
— Você participará da festa?— perguntou com interesse. As duas
mantinham um diálogo enquanto escolhiam o que levar.
— Talvez.
— Acho que deveria participar.
— Por quê?
— Por nada. Só acho que será divertido. E seria bom você estar lá pra
prestigiar a escola.
— Vou pensar a respeito — respondeu vagamente. — Gostei desse, o
que achou?— perguntou ao mostrar alguns enfeites de teto. Jennifer segurou um
em suas mãos e aprovou. O valor estava dentro do orçamento estabelecido pela
instituição.
— O que acha de um belo arco de balões na entrada? Pode ser efeito de
acordo com a coloração do brasão do colégio.
— Acredito que vários arcos ficam ainda mais bonito.— Regina
sugeriu. — Mas pra isso precisamos encontrar uma estrutura de pvc apropriada.
— Concordo! Sabe o que eu também gostaria? Que tivesse bastante
luzes espalhadas pela escola. Mas não luzes comum, luzes decorativas. Talvez
luzes natalinas. Aqueles pisca-pisca, sabe?
— Ótima idéia! As luzes natalinas ficariam lindas nas árvores do
jardim. Principalmente quando anoitecesse. Podemos ir atrás de tudo isso, mas
precisaremos nos apressar. Vamos?
Após aproximadamente uma hora vagando por entre ruas e lojas,
alternando entre idas e vindas do carro para as lojas para que as sacolas fossem
guardadas, as duas mulheres finalmente haviam conseguido encontrar boa parte
do que pedia na listagem. Esse pequeno tempo juntas, longe de todo aquele
ambiente escolar, fez com que desenvolvessem um pouco de intimidade e
pudessem ser elas mesmas com mais liberdade. Contudo, ainda tentando
respeitar o limite entre aluna e professora.
— Meus saltos estão me matando. Se eu soubesse que precisaria vir à
rua hoje não os teria colocado.
— Como você consegue usá-los sempre?
— Me acostumei, não me incomodam. Mas certamente não são feitos
para caminhada.
— Com toda certeza não — disse enquanto tentava conter um riso. —
Você fica linda com eles. — Sorriu.
— Obrigada.— Regina sorriu e perdeu-se por curtos segundos nos
olhos à sua frente. Jennifer a olhava com encanto. — Vamos comer algo antes de
ir?— sugeriu, interrompendo que um clima se instalasse entre elas.
— Eu não trouxe dinheiro, apenas o da escola. E preciso prestar contas
quando voltar.
— Eu estou convidando. É por minha conta.
— Não precisa se incomodar, eu como algo quando retornar ao colégio.
— Nem pensar! Vem, vamos ali pedir algo.
Sem qualquer chance de escolha, Jennifer foi arrastada pela mais velha
e a acompanhou até uma lanchonete. O estabelecimento estava muito cheio,
então ambas fizeram os pedidos e o levaram para comer dentro do carro.
— Os seus tacos parecem deliciosos. Me arrependi de ter escolhido
sanduíche — comentou ao depositar os olhos no que sua professora comia.
— Eu ainda perguntei se você tinha certeza sobre sua escolha — disse
suavemente. — Mas vem, eu divido com você.— Regina, de seu lugar no banco,
virou seu corpo no sentido de Jennifer ficando parcialmente de frente para a loira
de modo que pudesse levar o taco até sua boca.
Meireles, por sua vez, inclinou-se sutilmente pra frente e mordeu um
pedaço do alimento.
— Está delicioso. Eu amo taco mexicano!— disse ao terminar de
mastigá-lo. — Estou ainda mais arrependida — lamentou.
— Podemos voltar lá e comprar uns pra você.
— Não, não. De forma alguma. A fila ainda deve estar imensa, vai nos
atrasar.
— Realmente deve estar — concordou a mais velha. — Vem, pega mais
um pedaço.— Regina levou novamente o taco até a boca de Jennifer e sorriu
com o momento que compartilhavam. A morena se via encantada com a
graciosidade da jovem. Jennifer Meireles tinha o equilíbrio perfeito. Ela era
madura, mas sem perder o espírito jovial. Sabia ser uma garota, mas sem
abandonar suas responsabilidades. Jennifer era inteligente e irresistivelmente
bela. A começar por seus olhos que faziam Regina nadar e querer mergulhar
cada vez mais fundo.
— O quê foi?— perguntou com suavidade em sua voz ao dar-se conta
de que a morena a olhava com insistência. Meireles não obteve resposta; não em
palavras. Quando menos esperou foi surpreendida pela mão da professora em
seu rosto, acariciando-o.
Em poucos instantes um clima instalou-se entre elas. Ocorria com
frequência quando estavam juntas. Por mais que houvesse certa resistência da
parte de Regina, era praticamente inevitável não embarcar naquela atmosfera.
Bastavam algumas poucas palavras e trocas de olhares para que uma forte tensão
se fizesse presente.
Regina, por uma pequena parcela de tempo, esqueceu o mundo lá fora.
Esqueceu o que ela e Jennifer eram uma para outra fora dali e acariciou o rosto
da jovem como se há muito tempo esperasse por aquilo. Ela alternava seu olhar
penetrante entre os olhos e a boca. E embora não dissesse em palavras, seu corpo
entregava o quão atraída por Jennifer ela estava. Regina estava começando a
desejá-la, começando a precisar daquilo; daquele contato mais íntimo.
Jennifer mal pôde acreditar que a mulher a estava tocando daquela
maneira. Embora tivesse ficado surpresa com a atitude da mais velha, ela estava
gostando. O toque de Regina em sua face era macio, porém, muito preciso. Os
olhos castanhos da mulher pareciam querer invadi-la. E tudo o que Jennifer mais
desejava era ser preenchida por toda aquela intensidade que habitava o olhar à
sua frente.
Assim como Regina, Meireles também não ousou dizer uma palavra. A
profunda troca de olhares já dizia coisas que nem mesmo as palavras poderiam
expressar, pelo menos não por enquanto. Jennifer, inevitavelmente, deixou o
olhar cair para os lábios definidos de Regina. Foi quando um desejo enorme de
sentir a textura deles se fez presente. Naquele momento ela morria de sede por
tomá-los, por sentir não apenas a textura dos lábios, mas também o gosto da
boca.
Regina, aos poucos, foi tomando consciência do que estava acontecendo
e deslizou sua mão para fora do contato com o rosto de Jennifer. Ela não queria
se permitir sentir todas aquelas coisas por sua aluna. Não queria e não podia
sentir.
— Já estou atrasada — disse na tentativa de cortar aquele clima o mais
rápido possível. — Tenho que estar dando aula em menos de trinta minutos.
Então vamos?
— Vamos. Mas antes eu gostaria de fazer um convite a você.— Jennifer
se remexeu no banco até que sua mão conseguisse puxar um papel de dentro do
bolso de sua calça jeans. — Vou estar participando de um campeonato de boxe
sábado. Adoraria que você fosse me ver lutar. E torcer por mim, claro.— Sorriu.
— Isso se você já não tiver um compromisso.
Regina pegou o papel e o abriu. Se tratava de um flyer informativo
explicando sobre o campeonato, data, horários e endereço.
— Agradeço o convite, mas...
— Não precisa responder.— Jennifer a interrompeu. — Pense. Apenas
vá, ou não — continuou. — Não convidei ninguém da escola, não precisa se
preocupar.
— Ok. Pensarei a respeito — respondeu suavemente.
— Obrigada.— Sorriu.
Regina guardou dentro da bolsa o papel que recebera de sua aluna,
ofereceu à ela alguns tacos inteiros, ligou o carro e seguiu para longe dali. Ao
chegar ao estacionamento da escola, ela e Meireles trocaram mais algumas
palavras antes de deixarem o veículo.
— Chegamos. — comentou ao estacionar o carro em uma das vagas
disponíveis.
— Até que não foi tão ruim, viu? Me comportei — brincou.
— Pro seu bem você se comportou. Do contrário eu seria capaz de te
colocar uma coleira.
— O pior é que eu não duvido!— disse a loira, arrancando uma gostosa
risada da mulher.
— Não é pra duvidar mesmo, sou capaz dessas coisas. Em ocasiões
específicas, claro.
— E quais ocasiões seriam essas?— perguntou de modo a instigar
Regina.
— Quando a brincadeira pede — disse séria ao mesmo tempo em que
observava as reações de Jennifer sob efeito de suas palavras.
— Você gosta de brincar?— continuou instigando a mais velha que, por
sua vez, não recuou.
— Eu adoro brincar, Jennifer. Principalmente dessa brincadeira —
respondeu com sua rouca voz.
Jennifer esboçou um pequeno sorriso malicioso ao ouvir a professora
pronunciar seu nome com aquela naturalmente rouca e sedutora voz. Contudo,
antes que pudesse responder, Regina prosseguiu falando.
— Mas agora preciso brincar de trabalhar. Afinal, a economia desse
país não se alimenta sozinha.— Regina destravou as portas do carro e deslizou
para fora do veículo junto com sua aluna. As duas esvaziaram o porta malas e
levaram a mercadoria comprada até a direção. Feito isso, despediram-se e cada
uma seguiu para um lado.
Jennifer e Regina passaram o resto do dia pensando uma na outra e nos
momentos que compartilharam juntas hoje. E sempre que o pensamento se fazia
presente, um sorriso habitava os lábios dessas duas mulheres. O sorriso sempre
vinha acompanhado de reações físicas em seus corpos. Um forte desejo de um
contato maior começou a crescer. Concentrar-se nas tarefas diárias, por mais
simples que fossem, estava ficando difícil. Ambas sabiam que precisavam de um
contato de pele.


Capítulo 8

Jennifer levantou-se da cama e iniciou o dia com energia. Visto que
hoje participaria de um campeonato de boxe, começou o dia cuidando de sua
alimentação logo pela manhã. Após a primeira refeição, adiantou alguns
trabalhos escolares e cuidou das tarefas da casa. Em seguida, alongou os
músculos de seu corpo por aproximadamente quinze minutos e saiu para fazer
meia hora de corrida pelas ruas de seu bairro.
Hoje era um dia muito importante para Jennifer. E pra fazer uma boa
luta, seu corpo precisaria estar apto. Sendo assim, passou todo o dia
alimentando-se de maneira devida e bebendo bastante água para manter-se
hidratada.
Sua mãe, Morgana Meireles, sempre a acompanhava nos campeonatos.
Porém, dessa vez, por motivo de trabalho, não iria estar presente. Morgana é
jornalista e estaria viajando durante todo o final de semana. Jennifer adorava ter
sua mãe e amigos a prestigiando em seus campeonatos. Mas, por um motivo
especial, dessa vez se sentiu aliviada em saber que sua mãe não poderia estar
presente.
O sol começara a se pôr quando recolheu alguns de seus pertences, os
guardou na mochila da academia e seguiu para o ginásio. Meireles pegou um
taxi, sentou-se, tomou seu celular em mãos e ficou a olhar o número de Regina
em sua lista de contatos. A loira pensou na hipótese de telefonar e perguntar se
ela iria comparecer, mas acabou desistindo da ideia. Ela gostaria que Regina
fosse por livre e espontânea vontade, não por pressão de sua parte.

Em sua casa, Regina passou o dia com seus pensamentos divididos
entre ir ou não ao campeonato de sua aluna. Vez ou outra ela tomava o flyer em
mãos e o relia enquanto tentava tomar uma decisão.
Quando a tarde começou a cair, a morena decidiu que não iria. Ela sabia
em seu interior que precisava evitar a jovem antes que as coisas piorassem. Visto
isso, tomou um banho, vestiu um pijama confortável e isolou-se dentro do
escritório com seus livros e Bóris, seu fiel companheiro. O gato de Regina
deitou-se sobre a mesa de madeira enquanto a observava escrever em seu
caderno de capa azul. Regina percorreu a galeria de áudio de seu celular e
deixou uma lenta música tocando ao fundo enquanto abria sua mente e deixava
os pensamentos fluírem e saírem em forma de palavras.


Após um pouco de aquecimento Meireles foi até o vestiário se
preparar. Ela vestiu uma camiseta branca, um calção feminino preto com uma
faixa branca nas laterais, tênis apropriado, protetor bucal e luvas. Seu cabelo
estava suspenso em um perfeito rabo de cavalo. O campeonato era de boxe
profissional, não o olímpico, então não se fazia necessário o uso de protetor
facial.
O ginásio já estava quase cheio, seus assentos já quase todos ocupados.
Jennifer aguardou o momento certo e entrou. Para subir na plataforma do ringue
ela usou uma das três escadas e o seu oponente a outra. Meireles enfrentaria uma
mulher bem mais alta que ela.
A luta possui rounds. Jennifer precisa acertar o maior número possível
de golpes contundentes em sua adversária e defender-se para não ser atacada.
Vence quem somar o maior número de golpes perfeitos ou provocar o nocaute
do oponente. Além de avaliarem a qualidade dos golpes, os juízes também
avaliam qual lutador se manteve a maior parte do tempo no centro do ringue.
Antes da luta dar-se início, o árbitro fez uma conferência nos detalhes
do ringue e em seguida se certificou de que Jennifer e sua oponente estavam
devidamente trajadas e protegidas. Após analisar esses detalhes, o árbitro
verificou se os juízes, cronometristas e equipe médica estavam a postos. Feito
isso, lançou um olhar para o diretor técnico e o combate começou.
Segundos antes de dedicar total atenção ao combate, Jennifer passeou
rapidamente seu olhar à procura de Regina, mas ela não estava. A loira soltou
um profundo suspiro e iniciou a luta.
Do lado de fora do local onde acontecia o campeonato, a professora
Vianna estava com seu carro estacionado próximo à entrada do evento. Ela havia
decidido ir vê-la, mas ainda estava em processo de decisão entre continuar no
carro ou entrar. Já fazia aproximadamente dez minutos desde que havia chegado
ao local. Sabia que a essa hora Meireles possivelmente já estaria lutando.
Jennifer já estava indo para o terceiro round com sua adversária. Ela
conseguia executar golpes com perfeição e se mantinha no centro do ringue por
mais tempo que sua oponente. No entanto, em alguns momentos, ela era acertada
pela adversária que também lutava com muita maestria.
Após muito pensar, Regina decidiu entrar. A vontade de ver Jennifer foi
maior que qualquer dúvida pairando sobre sua cabeça. A morena caminhou a
passos lentos por entre as pessoas que assistiam ao campeonato, e quando
finalmente conseguiu ter uma boa visão do ringue, avistou Jennifer. Seus olhos
brilharam ao vê-la sobre aquela plataforma trajando seu uniforme de boxe. Por
sorte a morena conseguiu um lugar na frente onde pudesse ter uma boa visão de
tudo o que acontecia no ringue.
Jennifer estava completamente concentrada na luta e não viu quando
Regina entrou. A morena estava com seus olhos vidrados em cada movimento
que a loira fazia. E toda vez que Meireles era acertada por algum golpe, o
coração de Regina parecia querer saltar pra fora do peito. Ela vibrava, torcia e se
angustiava com o que via. Assistir à Jennifer lutando estava lhe causando um
turbilhão de emoções.
A adversária da jovem a acertou com um golpe perfeitamente executado
e preciso, fazendo Meireles ir ao chão. O árbitro aproximou-se e começou a
contagem. Regina, nessa hora, batia o pé contra o chão em um gesto de
nervosismo. Quando a contagem chegou a cinco, Jennifer levantou-se com
impulso, fazendo a luta continuar. Regina, de onde estava, respirou aliviada e
continuou a torcer.
Meireles voltou com tudo, derrubou sua adversária duas vezes no
mesmo assalto, deixando-a completamente vulnerável para uma terceira queda.
E assim Jennifer o fez; levou sua oponente a nocaute. O árbitro fez a contagem
de dez segundos e, ao final, deu a vitória para Jennifer Meireles.
A loira desceu da plataforma e recebeu ajuda de um auxiliar pra retirar
suas luvas. Quando ia se direcionar para o vestiário, surpreendeu-se com a
imagem mais linda que seus olhos podiam ver naquela noite; Regina Vianna
estava de pé e a olhava com um lindo sorriso nos lábios. Foi então que Meireles
livrou-se de seu protetor bucal, adiou a ida ao vestiário e caminhou até ela.
— Você veio!— disse sorrindo ao aproximar-se. — Há quanto tempo
estava aqui?
— Acho que desde a metade de sua luta — respondeu suavemente.
Hoje Regina vestiu-se de forma mais casual, combinando com o evento
esportivo. Usava uma calça jeans de lavagem clara, camiseta preta básica,
jaqueta da mesma coloração e um sapatênis. — Você fez uma ótima luta.
Parabéns pela vitória.— Sorriu, alternando o olhar entre o par de olhos à sua
frente.
— Obrigada — respondeu com um brilhante sorriso nos lábios. A
felicidade habitava seu peito por ter a presença da mulher em algo que era de
exuma importância pra ela. — Você pode me acompanhar até o vestiário? Aqui
está muito barulho, não dá pra conversarmos direito — disse, elevando sua voz
para que a professora pudesse escutá-la.
Ao chegarem ao vestiário, Jennifer fechou a porta para que o barulho de
fora não invadisse o lugar, pendurou as luvas em um local específico e iniciou
uma conversa com Regina ao mesmo tempo em que ia desenrolando as
bandagens de suas mãos.
— O quê achou?— Jennifer perguntou. A loira estava com o rosto
vermelho devido ao grande esforço físico. Sua camiseta branca estava
parcialmente úmida por conta do suor em seu corpo, assim como seus cabelos na
região da nuca.
— Achei que você foi maravilhosa, mas fiquei preocupada todas as
vezes em que sua adversária te acertou.
— Não precisava ter se preocupado, é natural e recorrente, estou
acostumada. Mas agradeço sua preocupação.— Sorriu.
Regina aproximou-se de Jennifer e tocou em suas mãos.
— Deixa eu te ajudar.— Se ofereceu ao mesmo tempo em que começou
a ajudá-la a desenrolar as ataduras da mão. A cada volta que a morena desfazia,
ela observava as mãos e os braços da loira. Os braços da jovem estavam com os
músculos sutilmente saltados, assim como as veias que havia neles.
Meireles esboçou um pequeno sorriso de lado ao perceber que a morena
olhava com certo interesse para seus braços. Regina demonstrava gostar do que
via.
— Você ganha algo quando vence?
— Sim. Normalmente o prêmio é em dinheiro.
— Seus pais devem se orgulhar de você — disse, terminando de dar a
última volta na bandagem.
— A minha mãe, sim. No início ela se preocupava muito, mas depois se
acostumou. Meu pai eu quase não o vejo. Desde que ele e minha mãe se
separaram as coisas mudaram, ele se distanciou.
— Uma pena. Quem perde é ele de aproveitar a filha maravilhosa que
tem.
— Obrigada...— Sorriu timidamente.
— Meus pais ainda vivem juntos, mas eu quase não os vejo. Moram na
Itália.
— Você os visita?— perguntou com interesse. Ela adorava saber
sobre Regina.
— Apenas anualmente.
— Que sorte! A Itália é um país lindo — disse com nítido entusiasmo.
A loira se afastou e caminhou até o armário para separar sua roupa de voltar pra
casa.
— É sim. E tem uma maravilhosa gastronomia. Você já viajou até lá?
— perguntou enquanto a observava.
— Nunca. Mas um dia eu ainda quero viajar pela Europa — disse ao
caminhar em retorno à mulher. — Bom, agora preciso tomar um banho antes de
ir embora. Estou em péssimo estado.— Riu. — Você pode me esperar?
Regina sentou-se em um dos bancos que havia no vestiário e aguardou
até que a loira terminasse. Havia um chuveiro lá mesmo onde estavam, então, as
duas trocaram algumas palavras enquanto Jennifer tomava o banho.
Meireles saiu do box completamente vestida e com seus cabelos soltos
e molhados. Eles exalavam um gostoso cheiro de shampoo. Ela aproximou-se do
extenso espelho que havia no lugar e penteou suas ondas douradas. Ao terminar,
virou-se de frente para Regina e caminhou até ela.
Quando Jennifer se aproximou, a mais velha notou que no canto
esquerdo da boca da loira havia um pequeno corte ocasionado pelo combate de
há pouco.
— Ai...— resmungou baixinho ao sentir a ponta do dedo de Regina
tocar seu machucado.
— Machucaram você... — comentou a morena com pesar, soltando um
suspiro de lamentação ao ver que a jovem havia sido ferida.
— Acontece, não foi nada. Já fiquei bem mais machucada que isso —
disse naturalmente. — Você precisa ver como irá ficar meus braços e costas
amanhã. Vários hematomas roxos. — Jennifer relatava tudo na maior
naturalidade, enquanto Regina ficava repleta de preocupação.
— Tome cuidado nesses combates, tudo bem?
— Pode ficar tranquila. Sou boa no que eu faço.— Piscou.
— E convencida também, não?— disse ao lançar um olhar sobre a loira
ao mesmo tempo em que arqueou uma de suas sobrancelhas.
— Não. Apenas sou realmente boa em tudo o que eu faço — disse séria
ao invadir a mais velha com o olhar.
— Será mesmo, Jennifer?
Meireles elevou a mão até a lateral do rosto da mulher e segurou
próximo a seu maxilar.
— Posso mostrar a você se quiser — respondeu, deslizando o polegar
pela maçã do rosto de Regina até chegar aos lábios avermelhados da mulher.
Jennifer passeou a ponta do dedo pelos lábios e sentiu toda a textura daquela
região.
Uma forte tensão sexual instalou-se entre as duas mulheres. Regina, por
um momento, desligou sua mente sobre o que é certo e errado enquanto sentia o
prazeroso toque do dedo de Jennifer em seus lábios de modo a excitá-la. Ela
alternava seu olhar penetrante entre os olhos e a boca da loira ao mesmo tempo
em que sentia seu corpo pedindo para conhecer não apenas os toques de Jennifer,
mas também seu gosto.
— Regina...— disse a mais nova em um murmúrio. Era a primeira vez
que ela chamava a professora pelo nome. No entanto, antes que pudesse
continuar com sua frase, um falatório se fez ouvido vindo da porta de entrada do
vestiário.
A mais velha tocou a mão de Jennifer que estava em seus lábios e a
tirou no momento em que alguns atletas adentraram o local. Após isso, um
pequeno alvoroço começou no vestiário enquanto essas pessoas conversavam
entre si. Foi então que as duas mulheres sentiram que era o momento de
deixarem o ambiente.

— Você não pensa em comemorar sua vitória?— perguntou Regina.
Nesse momento ela e Jennifer conversavam do lado de fora encostadas no carro
da professora.
— Sozinha? Não mesmo. Minha mãe viajou a trabalho. E pra você
poder vir, não convidei nenhum dos meus amigos. Mas se quiser comemorar
comigo...
— Eu não posso — respondeu com sérias expressões, contrariando
inteiramente suas verdadeiras vontades.
— Por quê?— perguntou na tentativa de obter uma resposta satisfatória,
uma vez que a boca de Regina dizia uma coisa, mas seu olhar pedia por outra. —
Estamos fora do colégio, pensei que do portão para fora cada um vivesse sua
vida e não devesse satisfação.
— Porque tem algo acontecendo entre nós — iniciou — , e precisa ser
parado.— Regina dessa vez foi clara e direta em suas palavras. Já não dava pra
negar que algo havia crescido entre elas.
Jennifer deu um passo adiante e chegou mais perto da mulher. A lua
estava com um brilho intenso naquela noite, banhando os corpos de ambas. Com
a proximidade, pôde ver com clareza os detalhes do rosto da morena. Sua
vontade era de tocá-la e beijá-la. Essa vontade vinha sendo nutrida a cada dia e
aumentava a cada minuto que passava com Regina sob aquele luar.
— Tem?— questionou-a, fingindo inocência. — O quê?— instigou-a a
dizer.
Dessa vez foi Regina quem se aproximou da jovem. Seu carro estava
estacionado no final de uma rua sem saída. O lugar se encontrava
completamente vazio, oferecendo bastante privacidade a elas.
— Tem — confirmou a morena. Regina aproximou seu rosto de tal
maneira que suas respirações se misturaram por um curto momento, até que ela o
afundou no pescoço de Jennifer e murmurou ao pé de seu ouvido. — Uma louca
vontade de ter você.
Meireles sentiu a pele de seu corpo arrepiando-se na lateral
correspondente ao ouvido que Regina sussurrara. Ela sentia-se confusa, afinal, a
morena pedia para que aquilo que compartilhavam fosse barrado, mas suas
atitudes não estavam ajudando isso a acontecer. Ela estaria jogando? Pensava
Jennifer.
— Então não barra essa vontade, Regina.— pediu, buscando os olhos
castanhos à sua frente.
— Não podemos. Eu não posso fazer isso — disse suavemente, quase
em um lamento para si própria e para a loira. — Você é minha aluna, e olha a
sua idade...
— Eu não sou criança, você sabe disso. Eu já tenho dezoito anos. O fato
de eu ser bem mais nova que você é um detalhe tão insignificante. Não sabia que
você carregava esse tipo de preconceito. E quanto a ser sua aluna, bom, não
posso fazer nada a respeito. Mas torna tudo ainda mais excitante, não?—
Jennifer esboçou um sorriso sacana ao proferir a última frase.
Pela primeira vez as duas mulheres falavam abertamente sobre o que
vinha acontecendo há algum tempo. Já não dava pra negar com palavras o que
seus corpos gritavam.
— O que eu faço com você, garota?— A voz da morena saiu levemente
arrastada. Naquele momento ela lutava com cada parte de seu corpo para não
ceder.
Meireles esboçou um largo sorriso sacana ao ouvir sua professora lhe
chamando de garota. Sua mente encheu-se de pensamentos profanos com
Regina. Tudo o que Jennifer desejava era ser daquela deslumbrante mulher. Mas
ela também desejava poder mostrar à ela o quão mulher também sabia ser.
— Garota, é?— instigou.
— Sim. Uma garotinha — implicou.
— E você gosta de garotinhas?— provocou. Jennifer não conseguia
destravar seu olhar daqueles castanhos que a olhavam com desejo; o mesmo
desejo que habitava suas esmeraldas.
— Apenas das boas.
— Então nós temos um sério problema, pois eu sou uma garotinha bem
má — se manteve provocando-a.
Regina era uma mulher séria, reservada e difícil de ser conquistada. Era
uma professora extremamente profissional, que nunca permitiu relacionar-se de
maneira íntima com alunos. Mas, quando se tratava de Jennifer Meireles, todas
suas certezas se abalavam. Ela já estava à beira de perder o controle. Os
pensamentos mais insanos faziam moradia em sua mente naquela hora. Meireles
mexia com sua mente e corpo em uma intensidade absurda.
— Garotas más merecem ser castigadas. Mas não hoje. Hoje você foi
brilhante naquele ringue. Isso merece ser comemorado.— Regina sempre
conseguia encontrar uma maneira de desvencilhar-se. Ela só não sabia até
quando conseguiria tal feito.
Jennifer decidiu não insistir, respeitaria os limites de Regina. Contudo,
sabia que ambas não conseguiriam manter seus desejos velados para sempre. E
quanto mais os reprimissem, mais aumentariam. Porém, por hora, aproveitaria a
prazerosa companhia da mulher.
— Queria alguma bebida alcoólica. Vamos virar alguns shots de tequila
juntas?
— Jennifer! Olha minha cara de quem leva uma aluna para se
embebedar! Sem chance.
— Qual é, Regina? Vamos esquecer por essa noite que sou sua aluna?
Estamos fora do colégio. Por favor?— pediu suavemente. — E você acha
mesmo que eu não bebo? Não me diga que na minha idade você não bebia. Não
irei acreditar.
— Sim, eu bebia. Mas ainda assim não serei eu a oferecer bebida a
você. Muito menos te levar para um bar.
— Regina, eu já tenho dezoito anos! — relembrou-a. — Não
precisamos nos embebedar e nem irmos a um bar. Podemos fazer isso dentro do
seu carro. Hum? Por favor?— A loira, naquele momento, expressava um
brilhante olhar de criança levada. Regina achava incrível a forma rápida como
Jennifer passava do sensual para o angelical. Ela sabia a dosagem e a hora
correta entre ser mulher e menina.
— Ok, menina de ouro — disse, fazendo referência ao filme de boxe.
Regina possuía em Jennifer uma confiança que nem ela mesma sabia de onde
vinha. Mas sabia que a loira tinha maturidade e merecia um voto de confiança.
Beber tequila com uma aluna não soava tão louco assim. Não com Jennifer
Meireles.
As duas mulheres entraram no carro e deixaram o lugar. A professora
pediu que a jovem permanecesse no automóvel enquanto ela providenciava o
necessário. Algum tempo depois, retornou ao veículo com uma sacola em mãos.
A morena trouxera uma garrafa de tequila, copo descartável, alguns sachês de sal
e um limão em fatias dentro de uma pequena embalagem descartável.
— Onde conseguiu tudo isso?— perguntou, observando Regina retirar
os itens da embalagem.
— O dono daquele bar é meu amigo. Comprei a garrafa e pedi pra que
me conseguisse o resto — disse ao apontar pela janela para um requintado
estabelecimento que havia do outro lado da calçada. A morena fechou as janelas
e ligou o rádio do carro. Algumas músicas começaram a tocar aleatoriamente
enquanto elas conversavam.
— Não quero que vire muitas doses, ok? Não quero que se embebede.
— Alertou-a e lhe passou as condições enquanto pegava um álcool em gel de
dentro do porta luvas. A morena higienizou as mãos e ofereceu para que Jennifer
fizesse o mesmo se assim preferisse.
— Não é como se eu tivesse treze anos, Regina. Relaxa!
— Estou apenas cuidando de você — explicou. — Sabe como fazer?
— Eu sei muitas coisas.— Jennifer lambeu brevemente a pele entre o
polegar e o indicador de modo a umedecer o local para que o sal ficasse preso
ali. Regina, por sua vez, abriu a garrafa e preencheu dois copos com uma
quantidade razoável de tequila, chegando o mais próximo possível da dosagem
correta se estivessem tomando através do copo apropriado.
Meireles lambeu o sal da área há pouco umedecida, jogou a cabeça pra
trás e virou o copo de uma vez, tomando todo o líquido. Em seguida, pegou uma
fatia de limão e a chupou. A loira esboçou uma pequena careta.
— Sua vez!— Sorriu.
Regina admirou por breves segundos a boca da loira. Ela não cansava
de observar a graciosidade da curvatura daqueles lábios rosados ao sorrirem.
— Ok, lá vai!— A morena repetiu o mesmo processo de Meireles e
virou uma dose de tequila de uma só vez, fazendo Jennifer sorrir e bater palma
tamanha era sua empolgação.
— O que você acha de jogarmos algo pra ficar mais divertido? Podemos
brincar de eu nunca. Cada vez que uma de nós já tiver feito a atividade, bebe um
shot.
— Então eu vou sair daqui trocando os passos, pois já fiz de um tudo
nessa vida — brincou, fazendo Jennifer abrir sutilmente a boca em um gesto
surpreso.
— Isso é um sim?
— Seria, mas não posso ficar bêbada. Estou dirigindo, lembra?
— Putz, verdade. Não havia pensado nisso — lamentou, esboçando
uma expressão de frustração.
— Podemos fazer o seguinte... Combinamos um limite máximo de shots
a ser tomado, de modo a não ficarmos bêbadas — sugeriu a mais velha após ver
a expressão de desapontamento de sua aluna.
— Ótimo!— Sorriu em animação. — Você começa!
— Certo, vamos lá. Eu nunca usei drogas — afirmou Regina. Visto que
Jennifer também não, não precisou tomar.
— Eu nunca fui algemada — disse Jennifer. Para a surpresa da loira,
Regina virou uma dose. — Já foi algemada?— perguntou com curiosidade.
— Se eu bebi é porque já.— respondeu enquanto tentava conter um
riso. — Uma pessoa pode ser algemada por muitos motivos e de muitas maneira
— explicou, piscando sutilmente para a jovem que, de imediato, entendeu. —
Minha vez!— exclamou a mais velha. — Eu nunca nadei pelada — disse. A
loira instantaneamente virou uma dose, e Regina também. Pois combinaram que
a autora da frase também precisaria virar se já tivesse praticado a ação.
— Eu nunca me relacionei com alguém do mesmo sexo — disse
Jennifer. Regina ignorou o sal e foi direto para a tequila, virando mais um shot.
Jennifer sorriu e posteriormente encheu seu copo e também virou. Afinal, ambas
já haviam praticado tal ação.
Meireles expressava cômicas caretas cada vez que precisava tomar o
líquido. Regina, de seu lugar, sorria e deleitava-se com a cena. Pouquíssimo
tempo havia se passado e ambas as mulheres já estavam um pouco alteradas.
Jennifer em um grau mais elevado, tendo em vista que não possuía o costume de
consumir álcool.
— Acho que chegou o momento de pararmos.— Regina se pronunciou.
— Ah não...— resmungou com a fala arrastada.
— Ah sim. Já não tenho condições de continuar. Não quero causar um
acidente no trânsito. Além do mais, você já está ficando bêbada.
— Tudo bem, eu entendo.— Lamentou ao fechar a garrafa da tequila.
— Agora vou deixar você em casa. Chega por essa noite.
Regina deu partida no carro e seguiu rumo à casa de sua aluna. Assim
que chegaram ao local, ambas as mulheres deixaram o veículo e caminharam
juntas em direção a entrada da casa. Havia uma extensa varanda antes da porta
principal. Ela era decorada com lindas plantas que Morgana fazia questão de
cultivar. Na varanda também havia dois bancos de madeira pintados de branco, e
uma rede.
— Está entregue.— As duas mulheres conversavam de pé dentro da
varanda.
— Quer entrar um pouco?— Educadamente, ofereceu Jennifer. Embora
estivesse com os sentidos um pouco alterados, ainda conseguia ver claramente
aquele par de olhos castanhos que a encaravam com desejo.
— Não, querida. Não acho que seja apropriado — recusou sutilmente e
com educação. — Mas agradeço o convite.
— Tudo bem. Mas eu não queria ter que me despedir agora.— Jennifer
aproximou-se da mais velha e tocou em sua mão. No momento que o fez, sua
pele e a da mulher arrepiaram-se juntas.
Regina estava contendo-se para não se entregar às vontades. Estar perto
de Jennifer havia se tornado algo perigoso. A atração que sentia por sua aluna
estava ficando incontrolável. Tão incontrolável, que seu corpo moveu-se
involuntariamente no sentido de Meireles, encurtando ainda mais a distância.
Regina, assim como Jennifer, sentia a pele de seu corpo queimar tamanha era a
proximidade em que se encontravam.
— E o que você gostaria?— perguntou a mais velha.
Meireles olhou fixamente para os lábios de Regina antes de dar sua
resposta.
— Quero ter mais de você — respondeu sem rodeios ao subir o olhar e
encontrar o da morena.
Regina segurou a cintura de Jennifer e sentiu a jovem deslizar as mãos
por seus braços e em seguida apertá-los. Com a mão livre, entrelaçou os dedos
nos cabelos da loira na região da nuca e os puxou moderadamente. Regina os
segurou com força, com desejo, proporcionando uma sutil e prazerosa dor em
Jennifer, que surpreendeu-se com a maneira um pouco agressiva da mulher.
— Regina...— A voz saiu em um murmúrio. A loira havia ficado
completamente excitada com a atitude da mais velha. Sua vontade era que
Regina puxasse ainda mais seus cabelos.
— É delicioso ouvir sua voz dizer meu nome — disse sensualmente
enquanto depositava mais força nos cabelos de Jennifer. — Aposto que tem
outras coisas deliciosas vindas de você — continuou a se pronunciar. O álcool
havia liberado suas reais vontades. — E eu estou completamente louca pra
provar todas elas.— Regina foi direta, fazendo Jennifer tornar-se ofegante com
suas palavras. — Mas se eu quiser que minha razão ainda tenha voz ativa essa
noite, preciso que nos separemos agora.
Jennifer permanecia segurando os braços da mulher que estavam em seu
quadril. E quando a morena proferiu as últimas palavras, Meireles cravou as
curtas unhas naquela pele cor de oliva. Foi um reflexo involuntário, fruto do
desejo que percorria seu corpo naquele momento. Ela arranhou os braços de
Regina e quando pensou em dizer algo, sentiu os lábios da mulher beijarem o
pequeno corte que havia no canto de sua boca.
— Cuide bem dele — disse ao afastar os lábios para fora do
machucado. — Até segunda, Jennifer.
Meireles manteve-se estagnada e extasiada na varanda até Regina entrar
no veículo e partir. A loira entrou em casa com um brilhante sorriso nos lábios.
Seu corpo e sua mente estavam a mil. Ela jogou-se contra o sofá, fechou os
olhos e levou a mão até o pequeno corte que havia em sua boca, relembrando
que há poucos minutos teve os lábios de Regina bem ali. O ferimento ardia um
pouco, mas nada comparado à vontade de ter Regina em seus braços. Essa
vontade, sim, ardia e queimava.
Em seu carro, a caminho de casa, Regina observava os vestígios do
momento com Jennifer. Ela olhava para a garrafa de tequila e para o pote que
continha alguns pedaços de limão e só conseguia sorrir às lembranças. A
presença de Jennifer havia sido maravilhosa. A jovem sabia, como ninguém,
encher seu peito de alegria e deixar seu corpo inteiro em chamas. Ela possuía
plena consciência que depois de hoje, após terem aberto o jogo uma pra outra,
ela já não conseguiria ter tanta resistência.
Assim que chegou à garagem de casa e desligou o rádio do carro, uma
notificação soou em seu celular. Ao desbloquear a tela do aparelho constatou
que era uma mensagem de sua aluna. Meireles, pela primeira vez, havia tido a
audácia de enviar algo para seu telefone.

“Queria que você esquecesse o que te fez parar e ir. O que me resta essa
noite é imaginar qual seria o gosto do seu beijo.”

Aquela mensagem desnorteou Regina. Apenas ela sabia o quanto
precisou conter-se pra não tomar os lábios de Jennifer aquela noite. Mas,
felizmente ou infelizmente, a última gota de sanidade não a fez avançar. Como
ela poderia se envolver com sua aluna dessa forma? Não, ela não poderia. Mas
como ela faria para não ceder ao desejo? Como não se envolver com alguém tão
jovem se ela encantava-se com cada detalhe? Estas eram algumas questões que
habitavam a mente da professora há algum tempo.
Regina optou por não responder a mensagem. De toda forma, sabia que
quando a segunda feira chegasse, tudo entre ela e sua aluna estaria ainda mais
intenso e incontrolável.


Capítulo 9

Uma nova semana havia iniciado. O fluxo de alunos entre os
corredores estava intenso. Jennifer, Beatriz e Estela haviam acabado de sair do
laboratório de ciências quando encontraram com Kevin e Rose prestes a
entrarem. Rose estudava na mesma turma que Kevin, ela era uma amiga em
comum do grupo. Sua pele era branca e seus cabelos eram loiros assim como os
de Jennifer.
— Vocês já fizeram a prova de história?— perguntou Jennifer à dupla.
— Sim, no primeiro tempo de aula.— Kevin respondeu.
— E como foi?— perguntou Beatriz, curiosa.
— Muito difícil!— respondeu Rose.
— As questões possuíam muitas pegadinhas — explicou Kevin — , e a
senhorita Vianna ficava em cima. Chances zero de colar.
— A prova era discursiva ou de múltipla escolha?— Jennifer
questionou.
— Discursiva.— Rose respondeu.
— Fodeu! Vou tirar zero — comentou Estela, preocupada.
— Eu prefiro as discursivas. Dá pra dar uma enrolada quando não se
sabe a resposta — disse Beatriz.
— Eu também prefiro assim — comentou Jennifer.
— Eu prefiro quando é múltipla escolha, gasta menos tempo, é só ir por
eliminação. Mas se tratando da senhorita Vianna... Já era de se imaginar que não
facilitaria — disse Rose.
— Verdade...— Estela concordou.
— Agora deixa a gente ir, o professor já está nos olhando feio —
comentou Rose, da porta, segundos antes de entrar no laboratório com Kevin.
— Nos vemos!— disse Kevin, acenando.
— E os preparativos da festa, Jen?— perguntou Estela. A menina
olhava para Meireles com total encantamento. Ela não conseguia esconder os
sentimentos que carregava por ela.
— A minha parte já está quase toda pronta. Sábado terei que vir à
escola durante a parte da manhã pra ajudar na decoração.— As três estudantes
percorriam o corredor do segundo piso ao mesmo tempo em que conversavam.
— Tem um pessoal talentoso encarregado pela música. Um dos meninos será o
DJ, e há um grupo que se apresentará ao vivo. Só a parte do buffet que não sei
informar como está caminhando.
— Justo a parte mais importante?— disse Estela, arrancando uma
risada de Beatriz e Jennifer.
— Vou me informar a respeito e te aviso, ok?
— Por favor!— Riu.
Quando estavam prestes a passar na frente da porta da sala dos
professores, Jennifer e suas amigas avistaram a professora Vianna saindo. Nesse
dia Regina usava uma saia social de cintura alta na coloração cinza. A saia
possuía uma extensa abertura na região da coxa esquerda que só ficava evidente
quando a mulher se mexia, deixando-a completamente sexy. Em seus pés havia
elegantes sapatos pretos de salto alto. Na parte superior do corpo usava uma
blusa preta de tecido fino e mangas compridas. Em seu pescoço havia uma
gargantilha fina, dourada, e em seus lábios o habitual batom vermelho.
O olhar de Jennifer percorreu a figura da mulher à sua frente de cima a
baixo. A loira não sabia dizer se era coisa de sua cabeça, mas, Regina parecia
ainda mais deslumbrante aquele dia. Sem mencionar o habitual óculos preto que
a deixava inteiramente sedutora e intelectual. Era como se ela, hoje,
propositalmente, tivesse caprichado um pouco mais.
— Puuuta que pariu — soltou Jennifer, pausadamente, ao vê-la passar.
Regina caminhava a uma curta distância de suas alunas. Seu andar
elegante era visto e admirado por todas. E seu perfume ia deixando um doce
rastro para trás, no ar.
— O que houve, Jennifer?— perguntou Beatriz, confusa.
— Nada. Estava pensando numas coisas — disfarçou. Meireles ainda
não sentia-se segura pra falar com sua amiga sobre seu interesse pela professora,
e jamais comentaria esse assunto na frente de Estela ou de qualquer outra pessoa
que não fosse Beatriz.
Regina caminhava à frente das meninas com a sensação de que estava
sendo observada. E, de fato, estava. Meireles não conseguia desviar o olhar de
seu espontâneo rebolado. Quando finalmente chegou em sua sala de destino,
entrou e virou-se no sentido do corredor a tempo de ver Jennifer passar. A
morena esboçou um discreto sorriso assim que a loira virou o rosto em sua
direção e buscou seu olhar. Apenas ambas as mulheres compartilharam aquela
singela troca. Apenas elas souberam o que aqueles olhares e sorrisos
significaram. Se buscaram até que Regina, enfim, fechou a porta.
— Jen?
— Oi, Estela. Disse algo?— Jennifer estava voltando dos devaneios
provocados por Regina.
— Perguntei se podemos fazer algo diferente no intervalo de hoje. Mas
você parece estar em outro mundo.
— Oh, desculpe, vamos sim. Que tal nos juntarmos à Rose e Kevin?
Podemos falar sobre a festa.
— Por mim, tudo bem.
— Por mim também.— Beatriz afirmou.
— Ótimo!


Jennifer, Beatriz, Kevin, Rose e Estela sentaram em círculo em um
canto no pátio do colégio. Eles comiam, ouviam música e conversavam sobre a
tão esperada festa do final de semana.
— Animados?— perguntou Jennifer.
— Eu estou!— Rose respondeu.
— Eu também — disse Beatriz e Estela quase em uníssono.
— Eu tenho uma pequena surpresa pra esse ano — se pronunciou
Kevin, fazendo suspense.
— Qual surpresa?— indagou Rose.
— Se eu disser, deixará de ser. Na hora da festa vocês saberão.
— Sério, Kevin?— Jennifer revirou os olhos. — Deixará todos
curiosos?— reclamou.
— Eu sei que vocês sobreviverão até lá.— Piscou, ao mesmo tempo em
que esboçou um sorriso de lado. — Qual é mesmo o horário da festa?
— Às sete da noite.— Meireles respondeu.
— Então vou passar pra buscar você um pouco antes desse horário, Bea
— disse ele ao direcionar o olhar para a menina.
Beatriz, de seu lugar, esboçou um bobo sorriso apaixonado. Ela
acreditava que agora as coisas entre ela e Kevin, finalmente, iriam pra frente.
— Ok — respondeu.
— Vocês pretendem chegar em qual horário, meninas?— perguntou
Estela. — Não quero chegar muito cedo e ficar sozinha.
— Eu pretendo chegar por volta das sete. Não quero perder nada —
respondeu Rose.
— Eu estarei aqui por volta de umas sete e meia — disse Meireles.
— Ah, então beleza. Chegarei aproximadamente nesse horário também.
— Perfeito!— exclamou Beatriz.
— Garotas, agora vou deixar vocês pra falar com uns amigos meus lá na
quadra. Nos falamos depois, tudo bem?— disse Kevin ao levantar-se.
— Claro. Vai lá. Até depois!— Se despediu Estela.
— Até!— disseram as outras meninas.
— Agora nos conte tudo, Bea! Que história é essa de Kevin ir te buscar
em casa? Qual parte dessa história eu não estou sabendo?— disse Jennifer,
curiosa. — Anda! Põe pra fora. As outras garotas também querem saber.
Beatriz olhou rapidamente no rosto de cada uma delas e começou a
explicar.
— Então, meninas. Não tenho muito o que contar. Ele tem me
telefonado com frequência e estamos ficando mais próximos. Partiu dele a
iniciativa de irmos à festa juntos. Vamos ver no que vai dar, né? Estou ansiosa. É
agora ou nunca!
— Huuum, agora ou nunca! Senti firmeza!— disse Rose com animação.
Jennifer e suas amigas passaram os momentos finais do intervalo
ouvindo Beatriz falar sobre Kevin. A menina falava com empolgação sobre ele,
aparentando felicidade. Meireles e as demais apenas ouviram-na e sentiram-se
felizes por sua alegria.


O último tempo de aula daquele dia finalmente chegara; trazendo
consigo a prova bimestral de história. Metade da classe temia o conteúdo, assim
como temiam Regina Vianna. A postura extremamente séria da professora era
bastante intimidadora, e por mais que ela não se mostrasse uma megera, ainda
assim alguns a temiam.
Ela fez uma breve explicação sobre a prova, informando que havia a
prova A e B, e que elas seriam entregues de maneira alternada entre eles. A
professora também informou que apenas respostas à caneta seriam aceitas, e que
não aceitaria reclamações posteriores. Ao final, informou-os que se pegasse
alguém colando, esta pessoa automaticamente perderia o direito de continuar o
exame.
— Quem prestou atenção nas minhas aulas certamente fará uma boa
prova. As questões não estão difíceis, apenas exigem bastante atenção. No mais,
desejo uma ótima prova a todos! — Portando os papéis em seus braços,
caminhou por entre as fileiras e depositou um por um na mesa de cada aluno. —
Vocês já podem começar a fazer. Não precisa esperar que todos recebam —
disse ela ao mesmo tempo em que continuou distribuindo. A professora deixou a
fileira na qual Jennifer fazia parte para o final, fazendo com que Meireles fosse a
última a receber. Dessa forma, teria todos ocupados e entretidos em suas provas
enquanto ela tomava a liberdade de tocá-la na mão.
Sentada em seu lugar, Jennifer observou atentamente Regina depositar a
prova sobre sua mesa.
— Obrigada — agradeceu ao recebê-la. Instantes depois, a loira sentiu a
mão da mulher pousando sobre a sua. Era um toque leve, suave, macio. Jennifer
automaticamente elevou o olhar e avistou aqueles tão profundos olhos castanhos
a encarando. O calor que irradiava da mão de Regina para a dela a perturbava.
— Boa prova — sussurrou a mais velha. Seu sussurro foi tão inaudível,
que Jennifer praticamente apenas leu seus lábios. Regina deslizou a mão para
fora do contato e caminhou até a mesa, sentando-se.
Jennifer questionou-se internamente se a professora de fato queria que
ela fizesse uma boa prova, visto que aquele quente contato de mãos a havia
desorientado. Contudo, com muito esforço, saiu de seus devaneios e concentrou-
se inteiramente em sua prova.
De seu lugar, Regina observava toda a classe com atenção. E sempre
que seu olhar pairava sobre Jennifer, dedicava um momento a mais ali. Meireles
estava tão compenetrada em sua prova, que não percebia a professora
admirando-a. Regina não se deu conta, mas expressava um pequeno sorriso
enquanto a olhava. Ela observava cada minucioso gesto da loira. Para Regina,
era lindo ver a expressão séria que habitava o rosto da jovem naquele momento;
assim como era lindo observá-la ajeitar uma mecha de cabelo que teimava cair
sobre seu rosto. Meireles possuía lindas ondas douradas. Pelo menos na maioria
dos dias, sim. Raras eram as vezes em que suas ondas estavam desmanchadas.
Seu cabelo era volumoso; o que lhe proporcionava um charme sem igual,
principalmente quando ela o jogava de lado como estava fazendo agora.
Trinta minutos haviam se passado quando os primeiros alunos
começaram a entregar suas provas finalizadas. Visto que era o último tempo de
aula, Regina permitiu que fossem embora conforme fossem terminando.
Jennifer, propositalmente, enrolou o máximo que conseguiu para ser a
última a entregar. Ela sabia que eram mínimas as oportunidades de estar sozinha
com Regina, sendo assim, não poderia desperdiçá-las.
Quando o último aluno cruzou a porta da sala de aula, a mais nova
levantou-se com sua prova e a depositou sobre a mesa da professora.
— Terminei — disse ao depositar. Quando o fez, notou a morena
observando as manchas roxas que havia em seu braço por consequência do
combate de sábado. — Eu te avisei que ficaria assim — comentou com
suavidade na voz. — Estou com algumas nas costas também.
— Era de se imaginar. Sua pele é bem branca — disse enquanto
permanecia observando os hematomas.
— Sim. Eu fico roxa muito facilmente.
Regina aproximou a mão e tocou em um dos braços da jovem, fazendo-
a se arrepiar ao seu toque. Ela primeiramente acariciou uma das manchas com a
ponta de seu polegar, mas aquele singelo gesto não estava sendo o suficiente,
precisava sentir um pouco mais de Jennifer. Sendo assim, espalmou a mão
inteira contra o antebraço da loira e o apertou.
— Ai...— resmungou Jennifer, baixinho. — Está um pouco dolorido.
— Oh, desculpe...— disse ao soltar o braço.
— Não precisava ter soltado, foi uma dorzinha prazerosa. Se eu te
pedisse pra me apertar mais, você o faria?— Jennifer aproximou-se e começou a
brincar com um dos botões da camisa de Regina. — Hum?
— Jennifer... Não me provoca assim. Aqui não. — Regina soltou um
suspiro pesado e, de maneira relutante, afastou-se da loira. Ela organizou as
provas dos alunos e as guardou dentro da bolsa enquanto esperava seu corpo
acalmar-se para não cometer uma loucura.
Ao aproximar-se da porta de saída, sentiu o calor do corpo de Jennifer
por trás do seu. A loira havia se encostado sutilmente e apoiado a mão sobre a de
Regina assim que a professora tocou e girou a maçaneta da porta para abri-la.
— Não paro de pensar sobre a noite de sábado. Sabia?— A voz de
Jennifer saiu como um murmúrio próximo ao pé do ouvido da mais velha, que
hesitou por alguns segundos, respirou fundo, fechou a porta com força e virou-se
de frente pra ela.
— Não, senhorita Meireles. Eu não sabia — respondeu séria, porém,
visivelmente alterada, para o triunfo de sua aluna. Regina começou a caminhar e
guiar Jennifer com o corpo até encurralá-la contra a mesa. — Eu não sei o que
pensar, eu não sei o que sentir. Eu só sei que minha vontade agora é jogar você
nessa mesa e multiplicar essas marcas roxas que você tem pelo corpo — disse
em um só fôlego. Sua voz estava carregada de luxúria.
Meireles sentiu toda sua pele queimar às palavras que saíram dos lábios
vermelhos de Regina. Aquele ar autoritário da mulher a enlouquecia. E cada vez
que ela as imaginava sobre aquela mesa, sua intimidade umedecia na calcinha.
Enquanto Jennifer tentava se recompor dos efeitos causados pelas
palavras da mais velha, escutou alguém batendo na porta. Ao direcionar seu
olhar, constatou que se tratava do professor Arthur.
— Regina?— disse o homem ao abrir a porta. — O que ainda faz aqui?
Estava te esperando, mas quando vi que não chegava nunca, resolvi vir conferir
o que havia acontecido.
— Oh, Arthur. Me desculpe. Tive um contratempo com a senhorita
Meireles — explicou.
— Olá, Meireles!— Acenou o professor ao avistá-la. Ele as observava
de maneira suspeita.
— Olá, professor. Eu já estava de saída.— Jennifer desencostou-se da
mesa, esboçou um sorriso tímido para Arthur e se foi.
— Regina, o que estava acontecendo aqui?— murmurou de maneira
apressada. Seus olhos estavam sutilmente arregalados, assustados. Ele usou um
tom de censura em sua voz.
— Longa história, meu amigo. Acho que estou bastante encrencada.
Vamos tomar algo juntos e eu te conto.

A semana passou lentamente. Os dias que se sucederam desde o último


ocorrido na sala de aula foram difíceis. As trocas de olhares eram intensas e
constantes. Partes do corpo, vez ou outra, se esbarravam pelos corredores e sala
de aula. Regina já não sabia como conter aquele desejo por Jennifer. No entanto,
agora ela tinha com quem compartilhar aquela loucura. Pelo menos era assim
que Arthur denominava o que estava acontecendo: loucura.
— Se afasta dela, Regina. Essa história não vai acabar bem —
aconselhou Arthur. Ele e Regina conversavam sentados no sofá da casa da
professora após um dia de trabalho.
— Eu sei que isso é o correto a se fazer, mas eu não consigo. Cada vez
que tento evitá-la, parece inútil. Eu não sei o que tem acontecido comigo,
Arthur. Jennifer tem se infiltrado cada vez mais em meus pensamentos. Estou
ficando louca.
— E até onde você vai com isso? Você já parou pra pensar no escândalo
quando a escola descobrir? E os pais dessa garota? Eles aceitariam isso?
— Não há o que ser descoberto, pois nada aconteceu.
— Nada aconteceu ainda, Regina. Ainda.
A morena deixou Arthur falando sozinho e manteve-se em silêncio
enquanto sua mente divagava. Ela já seguia para sua segunda taça de vinho
daquela noite. Degustava lentamente a bebida ao mesmo tempo em que sentia
sua boca clamar pelo gosto de Jennifer. Regina estava enlouquecendo com a
simples ideia de tomar os finos e rosados lábios da loira para si. Qual gosto teria
o beijo de Meireles? Ela se perguntava. Seria um beijo doce, quente, selvagem?
Talvez fosse úmido, fresco e lento.
O pensamento em Jennifer se fez tão forte que, na mesma noite,
Meireles também pensava nela. Não que ela já não pensasse em Regina com
frequência. No entanto, hoje os pensamentos se faziam ainda mais fortes. Assim
como Regina, ela também imaginava qual o sabor daquela boca tão
perfeitamente desenhada que a professora possuía. Jennifer ansiava por prová-la.


Após uma semana repleta de provas, o tão esperado dia da grande festa
finalmente havia chegado. Alunos, professores e outros funcionários da
instituição começaram a chegar e a preencher o espaço. A festa acontecia no
primeiro piso, tomando todo ele. Na entrada principal havia um pequeno
corredor feito por arcos de bolas. Ao passar por ele, uma enorme faixa com o
dizer “Bem vindos ao Colégio Brooke” estava pendurada no pátio da instituição.
Todo o primeiro piso estava impecavelmente decorado em seus mínimos
detalhes. Luzes, balões e enfeites de teto estavam espalhados por todo o
ambiente. O Brooke era uma renomada escola de ensino médio e suas festas de
aniversário sempre eram bem produzidas.
Havia uma enorme mesa principal que dispunha de doces, petiscos e
objetos decorativos, tais como: arranjos de flores e porta guardanapos
personalizados com o brasão da escola. Todo o ambiente estava decorado com as
cores correspondentes ao colégio. Havia azul marinho, vermelho, branco e
alguns detalhes em bronze que representavam o leão do brasão. Havia, também,
uma grande pista de dança com direito a um globo giratório.
— Alguém sabe se a Jennifer já chegou?— perguntou Rose ao encontrar
com Beatriz, Kevin e Estela.
— Ela me enviou uma mensagem há pouco dizendo que já estava
quase chegando.— Beatriz respondeu.
— Olha ela ali!— exclamou Estela. — Jen! Estamos aqui!— Acenou a
menina.
Ao avistar seus amigos no centro do pátio, Jennifer sorriu e caminhou
em direção a eles. Ela usava uma calça jeans skinny de cintura alta na cor preta,
contrastando com sua blusa bege, sem manga, de tecido fino. Nos pés havia um
salto alto fechado que lhe proporcionava elegância e uma incrível feminilidade.
Seus cabelos estavam soltos e em seu rosto havia uma leve maquiagem. Jennifer
havia abusado apenas do batom; este era de uma intensa cor vermelho carmesim.
— Uau!— exclamou Beatriz ao vê-la. — Essa produção toda é pra
quem, hein?
— Que mulherão! Se eu não fosse hétero, te pegava agora — brincou
Rose.
— Você está linda, Jen — disse Estela ao cumprimentá-la com um beijo
em sua face.
— Obrigada, gente. Mas vocês estão exagerando — respondeu sem
jeito.
— Não precisa ser modesta, garota! Agora vem. Vamos dançar!— Rose
puxou Meireles para a pista, sendo seguidas pelo restante do grupo. Os cinco
amigos começaram a dançar ao mesmo tempo em que conversavam e soltavam
altas gargalhadas.
— Adoro essa música!— exclamou Beatriz assim que um pop começou
a tocar.
O volume das canções ainda era baixo, pois a festa só começava
verdadeiramente após o pronunciamento da diretora. E assim ela o fez. Quando o
salão já estava demasiadamente cheio, aproximou-se do pequeno palanque que
haviam montado no pátio, pediu para que pausassem a música e deu seu
pronunciamento.
— Boa noite, alunos e funcionários do colégio Brooke!
— Boa noite!— responderam em massa.
— Serei breve, pois sei que vocês estão empolgados pra curtirem a
festa.— Sorriu. — É com muito orgulho que hoje realizamos o vigésimo quinto
aniversário desta instituição. Quero agradecer a todos os envolvidos que
tornaram esse evento possível. Obrigada a cada aluno e funcionário por tamanha
dedicação. Aproveitem! Essa festa é inteiramente pra vocês!
Elizabeth recebeu inúmeros aplausos e assobios dos jovens presentes, e
então a festa verdadeiramente se deu início.
— Kevin, estamos todas curiosas pra saber do que se trata sua surpresa!
— comentou Estela.
O garoto esboçou um sorriso de quem estava prestes a aprontar algo e,
então, retirou uma garrafa de vodka de dentro da jaqueta.
— Vou batizar o ponche!
— Eu aprovo!— exclamou Rose ao erguer a mão. Não era à toa que a
menina era melhor amiga de Kevin, ela era a versão masculina do rapaz. Ambos
eram igualmente inconsequentes e aventureiros.
— Você está maluco? E se descobrirem?— disse Jennifer.
— Relaxa, Jen! Ninguém vai descobrir. Farei isso sorrateiramente. Já
volto.— Em menos de dez minutos Kevin foi até o ponche, tornou toda a garrafa
de vodka e retornou. — Feito! Agora sim a festa vai ficar boa!— disse aos risos.
— Vamos lá nos servir, galera?— Sugeriu Rose, fazendo todos a
acompanharem.
Jennifer estava inquieta. Alternava entre sorver a bebida de seu copo e
passear o olhar pela escola. A festa estava animada e ela estava apreciando cada
momento que passava na companhia de seus amigos, principalmente de Kevin,
que era um palhaço. Inconsequente, mas muito divertido. Contudo, a loira não se
sentia inteiramente ali. Era como se o mais importante estivesse faltando. E de
fato estava.
— Alguém sabe se a professora Vianna veio?— Sem conseguir se
conter, perguntou.
— Eu não a vi, Jen — respondeu Beatriz. — Provavelmente não. Ela
não faz muito o tipo de que gosta de estar em festas com alunos e tal.
— É...— O semblante de Jennifer automaticamente tornou-se triste. Ela
encheu mais um copo de ponche e chamou seus amigos para petiscarem algo.
Enquanto todos conversavam sobre coisas aleatórias, sentiu uma forte vontade
de olhar para a entrada principal. Ao fazê-lo, foi surpreendida pela ilustre
imagem da professora Vianna que fez seus lábios instantaneamente se curvaram
em um largo sorriso. Como era bom ter a visão preenchida por tão bela vista.
A jovem sentiu uma intensa vontade de ir até a mulher e cumprimentá-
la. Mas, optou por não fazê-lo. A vodka inserida no ponche já estava começando
a fazer efeito e ela não poderia dar bandeira. Afinal, Jennifer jamais iria querer
colocar sua professora em maus lençóis.
— Regina! Estou feliz que tenha vindo. Você está...— Arthur olhou
para a morena de cima a baixo antes de completar sua frase. — Deslumbrante.
— São os seus olhos, querido — respondeu educadamente em meio um
sorriso. Regina usava um justo vestido preto, alguns centímetros acima dos
joelhos, com detalhes em renda na região do seio. Em seus pés havia uma
delicada sandália preta de salto alto agulha. No rosto, maquiagem pesada
acompanhada de seu marcante óculos de armação preta e um batom vermelho
sangue. Suas unhas estavam pintadas com um esmalte de coloração café. — A
decoração está linda — disse ela, lembrando-se de quando saiu com Jennifer
para escolher alguns dos artigos decorativos.
— A comida está ainda melhor!— afirmou Arthur, compartilhando uma
risada com sua amiga. — Vem, vamos nos juntar aos outros professores.
Ele e Regina afastaram-se da mesa principal e foram de encontro a seus
amigos de trabalho que conversavam reunidos em volta de uma mesa. Ao tomar
um lugar pra si, Regina olhou pra frente e avistou Jennifer Meireles na
companhia de seus amigos. Devido a distância em que se encontravam, Regina
não conseguia vê-la com clareza, mas percebeu quando uma colega da loira
sentou-se em seu colo de maneira provocante. Tratava-se de Estela. Para o
desagrado da professora, a garota estava cercando Jennifer de todas as formas
possíveis. De seu lugar, apenas cerrou os punhos e tentou não olhar para o que
acontecia do outro lado. Ela não estava suportando a maneira atirada de Estela
para cima de Jennifer.
— Você está bem, Regina?— perguntou Evelyn, uma de suas colegas
de trabalho.
— Sim, estou ótima. Por que não estaria?— questionou-a suavemente.
— Parece aflita, nervosa. Como se estivesse incomodada com algo.
— Impressão sua, querida.
Após aproximadamente uma hora e meia de festa, Jennifer e suas
amigas se deram conta de que Beatriz e Kevin já não estavam presentes.
— Hum, safadinhos. Devem estar se pegando em algum canto por aí —
comentou Rose maliciosamente. — Acho melhor eu ir dançar. Não quero servir
de vela pra vocês duas também.
— Nada a ver, Rose. Você não está sendo vela. Estela e eu não temos
nada.
— Apenas porque você não quer, Jen.— Estela se pronunciou. A
menina tocou-a na face e acariciou. Meireles esboçou um forçado sorriso e nada
comentou a respeito.
— Vocês podem ir dançar se quiserem. Eu vou dar uma volta pelo
colégio — disse ela na tentativa de sair daquela situação. Regina, de onde estava,
observava tudo com atenção.
— Ok. Como você preferir — respondeu Estela, descontente.
Assim que as duas garotas afastaram-se e seguiram para a pista de
dança, Jennifer jogou o copo descartável em que bebia o ponche no lixo e
iniciou uma caminhada pelo lugar. A loira cumprimentou alguns colegas pelo
caminho e contemplou um pouco da decoração do ambiente enquanto pensava se
deveria ir ou não falar com Regina. Visto que o álcool presente no ponche já
havia lhe surtido efeito, acabou decidindo ir até a mulher. Mas, antes disso,
afastou-se de onde ocorria a festa e foi até seu armário. Por sorte o armário de
Jennifer não necessitava de chave para ser aberto, ele possuía um cadeado de
segredo. Sendo assim, ela apenas precisou colocar a sequência correta do código.
Ao abri-lo, retirou de dentro um chaveiro que continha uma única
chave. Por ser representante de turma e por ter estado envolvida na organização
da festa, ela havia ganhado posse dessa chave para que com ela tivesse acesso ao
terceiro piso do colégio. Era lá onde todo o material temporariamente inativo da
escola se encontrava. Durante as duas últimas semanas de aula precisou acessá-
lo algumas vezes para levar e trazer materiais da festa.
Após guardar a chave no bolso de seu jeans, retornou para a festa e
aproximou-se da mesa onde a professora Vianna se encontrava.
— Boa noite!— disse ela, sorrindo, a todos os professores presentes.
— Boa noite, senhorita Meireles!— responderam alguns professores
que a conheciam.
— Boa noite — disseram alguns outros.
— Boa noite, senhorita Meireles — respondeu Regina ao erguer a
cabeça e olhá-la. A morena pôde, finalmente, ver Jennifer de perto. A garota
estava linda, muito bem vestida. Suas roupas estavam lhe proporcionando uma
aparência ainda mais adulta.
— Com licença, professora Vianna, eu poderia conversar com você? Sei
que hoje é dia de festa, não quero atrapalhar seu momento, mas preciso
esclarecer uma dúvida urgente sobre o trabalho a ser entregue na segunda —
mentiu, inventando uma desculpa qualquer para tirar a professora dali sem
levantar suspeitas.
Regina olhou para Arthur, que a lançou um olhar em represália.
— Já volto — disse ao homem, segundos antes de pedir licença a todos e
levantar de seu lugar.
— Você está linda — murmurou Jennifer assim que a professora parou
ao seu lado. — Estava louca pra te dizer isso. — Sorriu.
— Não há trabalho algum pra ser entregue, então eu acho que já posso
perguntar do que isso se trata — comentou Regina enquanto caminhavam pela
festa e se deixava ser guiada para longe dali.
— Preciso de um momento com você. Me acompanha até o terceiro
piso?
— Mas lá permanece trancado. Os alunos não podem ter acesso.
— Mas eu posso. Temporariamente, pelo menos — explicou. —
Prometo que não vamos demorar. Eu só quero ficar um pouco com você. Sem
máscaras.
— Vou me arrepender disso, mas tudo bem.
Ao chegarem ao terceiro piso entraram em uma das últimas salas do
andar. Ela era exatamente como uma sala de aula dos outros andares, porém,
possuía cadeiras e mesas empilhadas ao fundo. Regina aproximou-se da extensa
mesa de madeira que havia próxima ao centro e encostou-se contra ela. Jennifer,
ao fechar a porta, caminhou em direção à professora e posicionou-se de frente.
— Como é bom estar assim, próxima a você, podendo admirar os seus
detalhes — comentou a mais nova. A distância entre seu corpo e o de Regina era
mínima. — Não sabe o quanto eu esperei pra poder falar com você hoje.—
Jennifer olhava para o rosto da professora com contemplação enquanto
conversavam. — Você não?— Sua voz saiu suave e arrastada.
Regina observava a beleza de Jennifer enquanto a ouvia falar. Ela
parecia tão mulher naquela noite. Apesar de que, por baixo de toda aquela
produção, ela ainda conseguia enxergar a garota que enfeitava sua sala de aula e
os corredores da escola vestida em sua calça jeans e camisa polo com a gola
eventualmente bagunçada. A morena quase sorriu com seus pensamentos.
Jennifer olhava de maneira curiosa para os olhos castanhos de Regina
enquanto aguardava uma resposta. A professora lhe lançava o mesmo profundo e
penetrante olhar de quando se conheceram. Meireles adorava toda essa
intensidade que dela emanava. E estava gostando ainda mais de como a
professora a despia com os olhos.
Quando o silêncio se fez presente por muito tempo, Jennifer foi
arrebatada pela suave e rouca voz da mulher.
— Sim...— respondeu. — A noite não seria a mesma se eu não pudesse
te tocar.— Regina buscou a mão de Jennifer com a dela e a segurou
carinhosamente. — Isso tudo é tão incerto, tão perigoso.
— Mas também muito excitante.— Jennifer rebateu. A jovem
pressionou o corpo contra o da mais velha, de modo a fazê-la se inclinar
sutilmente para trás e apoiar-se com as duas mãos sobre a mesa.
A loira se aproximou e as deixou à uma distância perigosa. Regina,
nesse momento, sentia o delicioso perfume da pele e dos cabelos da jovem que,
eventualmente, encostavam-se a seu rosto. Seu corpo inteiro estava quente.
Sentia-se febril tamanha era sua atração por ela.
— Eu já disse como você fica sexy usando esses óculos?— Jennifer
instigou. O álcool havia lhe despertado uma coragem absurda. — Já contei que
você me desconserta cada vez que entra naquela classe vestindo suas roupas
sociais e caminhando sobre esses saltos?— Ela roçou lentamente o próprio salto
contra o de Regina para provocá-la. Quando o fez, sua perna e a da mulher se
buscaram e se alisaram de maneira quase involuntária. Foi então que Meireles
aproveitou o momento para encaixar a perna esquerda entre as pernas da mulher,
junto a deliciosos movimentos e roçadas, fazendo o vestido da professora sair do
lugar.
Regina sentia o jeans da calça da loira proporcionando um prazeroso
atrito ao entrar em contato com a pele de sua coxa que acabara de ficar exposta.
Aqueles sutis movimentos estavam deixando-a excitada.
— Não... Eu não disse nada disso... Eu sei...— Jennifer prosseguiu. A
jovem aproximou os lábios do ouvido de Regina e em um sussurro, disse: assim
como não contei que estou louca pra saber o que você tem por baixo desse
vestido.
— Jennifer, por favor, já chega — disse com muito custo na tentativa de
fazê-la parar.
— Por quê?— perguntou em um murmúrio. A mais nova arrastou os
lábios por toda extensão do pescoço de Regina; começando pela curva dele e
parando ao chegar ao lóbulo da orelha. — Por que, se eu sei que você quer tanto
quanto eu...— Jennifer mordeu o lóbulo de Regina e o puxou, soltando-o
posteriormente. — Eu sei que você está completamente louca pra sentir meus
braços tomando seu corpo.
Regina respirou fundo, a segurou pela gola da camisa e bruscamente a
puxou para si, as fazendo ficar cara a cara.
— Jennifer, aqui não. E muito menos com você alcoolizada.— A
proximidade era tanta, que Regina já havia sentido o cheiro de álcool no hálito
da jovem.
— Desculpe, Regina. Me deixei levar.— A loira soltou um longo e
pesado suspiro antes de se afastar.
Enquanto se recompunha, a mais velha passou a mão pelos cabelos e se
afastou da mesa. Ela sabia que o único motivo pelo qual não havia beijado
Jennifer há poucos instantes era o fato da jovem estar sob efeito de álcool. A
professora queimava de desejos por Jennifer, sim. Mas seu respeito por ela era
ainda maior. Quando o momento chegasse, e Regina sabia que chegaria, ela
gostaria que Meireles estivesse plenamente consciente de seus atos.
As duas mulheres permaneceram se olhando enquanto suas respirações,
aos poucos, se normalizavam. Quando sentiram-se aptas a voltar, a mais velha
sugeriu ir na frente para evitar possíveis problemas.

— Está tudo bem, Regina?— perguntou Arthur assim que sua amiga
retornou para a mesa. A professora estava visivelmente alterada.
— Sim, eu acho que sim...

Após o ocorrido, ambas tentaram prosseguir na festa de maneira mais
natural possível. Contudo, era extremamente difícil evitar que seus olhares se
buscassem. Estes, se procuraram a noite inteira.


Era o primeiro dia de aula após a festa do final de semana. Jennifer e
Regina ainda não haviam se visto após o último corrido. As duas passaram todo
o final de semana sendo invadidas pelas lembranças de sábado à noite.
— Me conte tudo, Bea!— disse Jennifer, referindo-se ao período em
que sua amiga e Kevin desapareceram da festa.
— Nós ficamos!— respondeu animada. Beatriz era a alegria em pessoa.
Seus olhos brilhavam e seu sorriso ia de orelha a orelha.
— Nós ficamos é muito vago. Quero detalhes!
— Vamos nos sentar na escada, que eu te conto tudo.
As duas amigas sentaram-se nos degraus da escada que dava acesso ao
terceiro piso. De onde estavam conseguiam ver o fluxo de alunos que passava
por uma parte do corredor.
— Então, enquanto dançávamos Kevin murmurou no meu ouvido e
perguntou se eu queria sair da pista. Eu respondi que sim, então ele e eu fomos
pra quadra da escola. Conversamos um pouco sobre alguns assuntos aleatórios,
até que começou a rolar um clima e ele me beijou.
— Huuum!
— Para Jen, vai me deixar sem graça!
— Não estou fazendo nada!— disse erguendo as mãos para o alto. —
Nem preciso perguntar se você está feliz. Está estampado na sua cara.
— Pois é!— concordou a menina. — Hoje ele me chamou pra sair após
a aula, então não poderei ir embora com você, tudo bem?
— Ih, vai começar a namorar e esquecer de mim.
— Claro que não, Jen! Jamais. Eu só preciso de um momento com ele.
— Eu sei, Bea. Estou implicando com você.— Sorriu.
— Mas vem cá, me fala sobre você. Ficou com a Estela?
— Não. Ela até tentou, mas eu não quis.
— Por quê? Você está solteira, ela também.
— Porque eu não gosto dela, Beatriz. Não romanticamente, claro —
explicou-se. — E você sabe que eu não vejo graça em ficar com alguém apenas
por ficar. Preciso que tenha algum sentimento. Preciso que me desperte algo,
nem que seja uma forte atração. E ela não me desperta nem uma coisa e nem
outra.
— Mas vocês já ficaram.
— Sim, mas isso foi ano passado, e foram apenas alguns beijos. Não foi
ruim, mas não é o que quero pra mim e nem pra ela. A Estela gosta de mim, já
me disse isso várias vezes. Então eu não quero magoá-la. Se eu tivesse ficado
com ela ontem só teria servido pra alimentar falsas esperanças.
— Entendo. Fico feliz por você pensar assim, por se preocupar com os
sentimentos das pessoas.
— Pois é...
Quando faltavam poucos minutos para o final do intervalo, Meireles
sentiu o coração bater descompassado dentro de seu peito. Regina havia acabado
de passar pelo corredor na companhia de um homem. Ambos estavam de mãos
dadas.
— Jennifer, o quê aconteceu? Sua cara está péssima.
— Não é nada. Você pode me aguardar aqui? Vou beber uma água e já
volto.— A loira inventou uma desculpa qualquer para ir averiguar do que aquilo
se tratava. Aproximou-se do bebedouro próximo a sala dos professores e
simulou beber água enquanto observava Regina e o tal homem parados em frente
a porta. Um gosto amargo tomou sua boca quando viu a forma íntima com a qual
o rapaz tratava Regina. Ele acariciava as mãos e os cabelos da morena ao mesmo
tempo em que a dirigia um olhar apaixonado. Quando os dois despediram-se
com um braço, a jovem automaticamente afastou-se de lá para não ser vista pela
mais velha.
As últimas horas que se sucederam foram péssimas para Jennifer. Ela,
inclusive, não assistiu ao último tempo de aula com Regina naquele dia. Preferiu
se esconder e isolar-se em um canto qualquer na escola até que a hora da saída
chegasse. Sozinha, sentia um peso tomando conta de seu peito. Ela não
conseguia entender por que ver Regina na companhia daquele homem havia
mexido tanto com ela.
Quando o sinal finalmente tocou, saiu de onde estava e foi até a direção
para entregar a chave de acesso ao terceiro piso. Chegando lá, Elizabeth pediu
para que ela, por favor, antes de ir embora, levasse uma caixa com alguns
últimos itens decorativos da festa que haviam ficado pra trás e a guardasse em
uma das salas do terceiro andar. Sendo assim, deixou sua mochila na direção e
subiu para guardar a caixa em questão.
Ainda no terceiro andar, após ter cumprido sua tarefa, Jennifer ouviu
alguns passos ecoando pelo ambiente. Antes que pudesse se perguntar quem era,
avistou a professora Regina virando a escada.
— O quê faz aqui?— questionou assim que ambas se aproximaram.
— Vim procurar minha pulseira. A perdi na noite da festa e tinha quase
certeza que ainda estava com ela quando subi aqui. E você, o que faz nesse
andar?
— A diretora me pediu para guardar umas coisas. Quer que eu te ajude
a procurá-la?
Regina assentiu positivamente e ambas caminharam juntas até o final
daquele deserto corredor, olhando atentamente para o chão à procura do
acessório. Tomando ciência de que a pulseira não estava por onde haviam
acabado de passar, resolveram entrar na sala em que estiveram na noite de
sábado e procurar. Contudo, as coisas entre elas não estavam muito pacíficas,
fator que estava dificultando a busca.
— Essa pulseira deve ter um significado muito grande pra você. Quem
te deu? Aquele rapaz com quem esteve mais cedo?
Regina parou imediatamente o que estava fazendo e olhou para sua
aluna.
— Estava me espionando?
— Eu? Não precisei fazer isso. Vocês passaram desfilando — disse de
maneira seca e séria enquanto a encarava. Era a primeira vez que Regina via esse
comportamento ríspido em Jennifer.
— É muita petulância de sua parte afirmar algo. Em primeiro lugar, nós
não passamos desfilando. Robson apenas veio, educadamente, me trazer até
aqui. Em segundo lugar, a pulseira é sim importante pra mim, pois é herança da
minha avó.
— Então quer dizer que ele se chama Robson? Hum.— Jennifer
permanecia séria e rude em suas palavras.
— Sim. Por quê? Gostou do nome? Mais bonito do que Estela, eu
suponho — comentou ao alfinetá-la. — A propósito. Seja mais discreta nas
festas escolares. Ninguém é obrigado a ver você e sua namorada de showzinho.
— O quê?— incrédula, exclamou. A jovem parou a procura e virou-se
inteiramente na direção da professora. Ambas, nesse momento, conversavam de
frente. — Quê showzinho, Regina? Estela e eu não somos namoradas.
— Ah não? Então você deixa qualquer uma sentar em seu colo?— A
morena estava visivelmente irritada e não conseguia disfarçar.
— Estava me espionando? Seu namoradinho sabe disso?
— Te espionando? Eu tenho mais o que fazer.
— Oh, certamente tem mesmo, desfilar com ele pela escola.
— Cala a boca! Você não sabe de nada, Jennifer.— Sem perceber, a
cada instante que passava ela dava um passo em direção à aluna. Agora, ela e
Jennifer estavam a uma mínima distância.
Ao mesmo tempo em que discutiam, seus olhares alternavam entre
olhos e bocas. Naquele momento, ambas eram um misto de raiva e desejo.
— Sei do que vi! Aliás, onde estava seu profissionalismo mais cedo,
hein?
— Jennifer, eu já mandei você calar essa boca!— disse pausadamente e
com firmeza na voz.
Meireles elevou o tom e permaneceu tentando atingir Regina com suas
palavras enquanto sentia o ciúme pesando em seu peito.
— A professora certinha tirou o dia pra trocar carícias em público?
O corpo de Regina estava em brasas. Ele queimava de raiva e de desejo
por Jennifer. Ela buscava respostas para tudo aquilo e não as encontrava. A
garota à sua frente mexia com cada parte de seu corpo. Naquele instante, seu
olhar faiscava travando uma batalha com aquele vibrante par de esmeraldas que
a desafiava.
— O que houve, Regina? O gato comeu a su--
Antes que Jennifer pudesse concluir a fala, a impulsividade de Regina a
fez segurá-la na nuca e silenciá-la com um beijo.
— Calada — disse em murmúrio, segundos antes de tomar aqueles
lábios de Jennifer com intensidade.
A jovem sentiu a mão de Regina unindo seus cabelos na região da nuca
ao mesmo tempo em que fazia força corporal contra seu corpo. Ela se permitiu
ser guiada por ela e só parou quando sentiu seu quadril chocando-se contra uma
mesa de madeira.
Regina segurava forte nos cabelos de Jennifer enquanto tomava sua
boca. O beijo era intenso, voraz, carregado de desejo e luxúria. Regina, assim
como Meireles, há muito esperava por ele.
— Você adora falar, não é? Mas eu encontrei uma maneira deliciosa de
calar essa sua boca — disse, instantes antes de voltar a tomar os lábios de
Jennifer com os seus.
O beijo era quente e úmido. Suas bocas se roçavam enquanto suas
línguas macias se acariciavam e se provavam em uma deliciosa batalha que
pedia passagem para o domínio. O beijo, que já havia começado intenso, tomou
uma profundidade ainda maior. As bocas se devoravam cada vez mais na
tentativa de findar todo aquele desejo. No entanto, o calor entre elas parecia
aumentar cada vez que suas línguas se alisavam e se enroscavam numa sincronia
rapidamente encontrada. Elas precisavam, mas não conseguiam parar. Não,
ainda não.
Jennifer se encontrava inteiramente encurralada entre Regina e a borda
da mesa. A morena fez uma pequena pausa no beijo para puxar um pouco mais
os cabelos da jovem na região da nuca, fazendo-a inclinar a cabeça de modo que
seu pescoço ficasse evidente. Meireles estava enlouquecendo com a forma voraz
de Regina. E quando a professora chegou a seu pescoço, sentiu cada centímetro
de seu corpo se arrepiar. A morena lambia, mordia e chupava aquela pele com
tanta intensidade, que a estava levando à loucura.
Regina deslizou os lábios pelo pescoço de Jennifer e voltou a tomar sua
boca. Finalmente estava descobrindo o gosto que a boca da jovem possuía, e
estava se embriagando nela.
— Você gosta disso, não gosta?— comentou com autoridade na voz ao
segurar forte nos cabelos de Jennifer.
— Sim — respondeu com a voz ofegante. — Não para...
Regina esboçou um meio sorriso sacana, mordeu o lábio inferior da
loira e voltou a beijá-la. O beijo permanecia agitado e carregado de desejo. Os
braços de Jennifer começaram a percorrer o corpo de Regina até envolver a
cintura da mulher, fazendo-a gemer baixinho contra sua boca. As duas travavam
uma batalha de lábios, línguas e mãos que ansiavam por explorar cantos distintos
uma da outra. Quando a mais nova sentiu que já estava perdendo o controle,
cravou as curtas unhas nas costas da professora e começou a arranhá-la por cima
da blusa. Elas se desejavam, se buscavam e se precisavam. Era uma força que já
não podia ser contida.
Assim que respirar se fez extremamente necessário, Jennifer e Regina
interromperam lentamente o beijo contra suas vontades. Seus cabelos estavam
bagunçados e suas respirações completamente alteradas. Elas respiravam rápido
ao mesmo tempo em que sentiam o coração querer saltar de seus peitos. Ao
abrirem os olhos, seus olhares se buscaram e se questionaram sobre o que havia
acabado de acontecer.



Capítulo 10
Regina e Jennifer olhavam-se como se não acreditassem no que
acabara de acontecer. Suas respirações foram, aos poucos, voltando ao normal.
A loira olhava pra a mais velha e contemplava aquele lindo rosto à sua frente.
Por tantos dias ela pensou qual seria a textura daqueles lábios sempre pintados
de vermelho. Por tantas noites ela imaginou qual o gosto daquela boca que,
quando sorria, enchia seu peito de luz. Agora, pela primeira vez, Jennifer poderia
parar de imaginar e começar a recordar, pois os quentes beijos trocados com a
mulher eram uma viva e verdadeira lembrança.
A mais velha ainda estava um pouco confusa sobre o acontecido. Era a
primeira vez que havia tido um contato íntimo com um de seus alunos, e era a
primeira vez que havia agido de maneira impulsiva com alguém. Assim como,
também, era a primeira vez que alguém lhe despertava um interesse e desejo
quase impossíveis de ser barrados. Ela olhava para Jennifer e só conseguia ver a
garota que habitava seus pensamentos há tempos. A olhava e via a dona do olhar
mais intrigante que ela jamais vira igual. Regina nunca se esqueceu da
familiaridade que viu naqueles verdes olhos desde que os avistou pela primeira
vez. Até hoje ela sentia um sentimento de lar, de casa, quando os mirava.
— Acho que devemos ir... — disse Regina, sem jeito, com suavidade
em sua voz.
— Quer ir na frente?— De maneira tímida, Jennifer sugeriu. Ambas
estavam um pouco confusas sobre como se comportarem.
— Não. Vamos juntas — respondeu prontamente. Ao cruzarem a porta
de saída, Regina acabou encontrando a pulseira que tanto estimava. Estava caída
próxima à entrada.
As duas mulheres caminharam por todo o corredor em total silêncio. Ao
chegarem ao segundo piso, a morena entrou na sala dos professores e Jennifer
seguiu para outra direção. A jovem entregou a chave de acesso, recolheu a
mochila e seguiu para o ponto de ônibus.

— Boa noite!— disse Morgana ao avistar a filha cruzando a porta de
entrada.
— Boa noite!— Jennifer colocou a mochila encostada ao pé do sofá e
tomou um lugar ao lado da mãe. — Como foi seu dia?
— Cansativo. Preciso de umas férias urgentes. E o seu, meu amor?
— O de sempre. Aulas, deveres, conversas com os amigos, essas coisas.
— Esse já é seu último ano escolar. Já sabe qual curso irá cursar ano
que vem?
— Ainda não, tenho estado bastante confusa quanto a isso. Não quero
escolher qualquer coisa apenas pra ter um diploma. Deus me livre passar o resto
da minha vida presa a algo que não gosto.
— Então pense em algo que te dê prazer. Mas não deixe passar muito
tempo.
— Eu sei...
— Convidei Diogo pra vir jantar conosco hoje. Tudo bem pra você?
— Claro, mãe. É sempre maravilhoso tê-lo aqui em casa. Eu o adoro,
você sabe.
— Sei. E fico muito feliz em ver o quão bem vocês se dão.— Morgana
tocou a mão da filha e acariciou-a.
— Bom, agora deixa eu subir pra tomar um banho. Mais tarde eu desço
quando ele chegar.
Meireles levantou-se do sofá, recolheu a mochila e subiu para o quarto.
Após um banho quente, prendeu o cabelo em um rabo de cavalo e vestiu um
conjunto cinza de moletom. A noite estava gélida.


— Olá, amigão!— disse Arthur ao entrar na casa de Regina e ser
recebido por Bóris roçando em sua perna. — O quê sua mãe tem te dado para
comer, hein? Você está enorme de gordo!
Bóris expressou um baixo miado como se entendesse o que homem
dizia. Regina, de seu lugar, apenas ria da pequena interação entre eles.
— Bóris está dieta. Mudei a ração dele para uma mais light, e agora
ofereço em menos quantidade. Já perdeu alguns gramas.
— Não consigo imaginá-lo ainda mais gordo que isso.
— Ei! Não fique chamando meu gato de gordo — retrucou, arrancando
uma risada do amigo. Ela preencheu a tigela de Bóris com ração, trocou sua água
por uma fresca e isolou-se na sala de estar com Arthur. — Quer beber algo?
— Aceitaria um café.
— Ok. Vou preparar um café pra você e um chá de maçã com canela
pra mim e já volto. Com açúcar ou adoçante?
— Sem nada, por favor.
— Certo.
Poucos minutos depois retornou com uma bandeja contendo seu chá,
alguns biscoitos e uma xícara de café para seu amigo.
— E então, Regina, planos para o feriado de sexta-feira?
— Sim, corrigir inúmeras provas.
— Muito trabalho acumulado?
— Bastante. Tenho provas de todas as turmas pra corrigir. E visto que o
bimestre está chegando ao fim, preciso fazer o somatório de todas as notas dos
alunos e lançá-las no diário de classe. E você sabe quantos alunos eu tenho? Não
queira imaginar!
— Eu posso imaginar. Você pega quase todas as turmas do turno da
manhã e da tarde. São centenas e centenas de alunos.
— Pois é. Mas não reclamo, não. Eu adoro meu trabalho. Só lamento
não estar com tempo pra dar aulas de espanhol. Eu estava com dois alunos fixos.
Um deles já não precisa das minhas aulas. Estou apenas com um que ainda está
aprendendo o básico. Não pretendo encaixar outro tão cedo.— Suspirou. — Mas
e você, o que pretende fazer no feriado?
— Vou viajar pra visitar minha mãe. Ela não está muito bem de saúde.
— Oh, meu amigo, se tiver algo que eu possa fazer pra ajudar.—
Regina apoiou a mão sobre a de Arthur de maneira gentil.
— Minha mãe já está velha. São problemas decorrentes da idade
avançada. Mas agradeço sua gentileza e preocupação.— Sorriu. — E como anda
a história com a aluna Jennifer Meireles?— Arthur sentiu a amiga um pouco
hesitante quanto a sua pergunta.
— Hum... Diria que está difícil controlar essa situação.
— O que você quer dizer com isso?— perguntou o homem, curioso,
enquanto tomava mais um gole de seu café.
— Quero dizer que eu não estou conseguindo dar um fim nisso. Não
saberia te dizer em qual momento me vi envolvida por ela. Aconteceu de uma
forma tão natural, que eu não consigo encontrar a ponta inicial pra cortá-la.
— Não consegue ou não quer, Regina?— Ele a olhou de maneira
desconfiada.
— Droga! Não consigo te dar essa resposta.— Regina bateu a xícara de
chá contra o vidro da mesa de centro e em seguida passou a mão pelos cabelos,
jogando-os para trás em um visível gesto de nervosismo.
— O que está acontecendo com você, Regina? Sempre foi tão centrada
e dona de suas ações.
— Ainda sou. Mas devo confessar que Jennifer tem mexido comigo de
uma forma especial.
— Regina, Regina...— disse sério, arrastando as palavras.
— Eu sei, Arthur. Eu sei...— Respondeu pensativa.


— Que saudades eu estava de você, Jen!— disse Diogo ao envolvê-la
em um abraço. — Nunca mais apareceu lá em casa!
— Tenho estado bastante ocupada, esse último ano escolar tem pedido
bastante de mim. Sem mencionar o boxe — explicou ela.
— Assim que der, apareça. É sempre um prazer ter você por lá. Está me
devendo uma partida de vídeo game.
— Aparecerei sim.— Sorriu. — Se prepara para perder!
— Isso é o que veremos!
— Vamos jantar antes que a comida esfrie?— Morgana se pronunciou.
— Fiz yakissoba.
— Adoro yakissoba!— Diogo comentou. — Jen, eu preciso me casar
com essa mulher!— brincou, fazendo Jennifer e Morgana sorrirem.
— Já tem a minha permissão!— disse a loira.
Os três reuniram-se à mesa e enquanto degustavam do maravilhoso
yakissoba feito por Morgana, conversavam aleatoriamente sobre assuntos
triviais. Diogo e Morgana possuíam uma conexão incrível. Jennifer sentia-se
imensamente feliz ao vê-los. Afinal, sua mãe merecia ser feliz após o
relacionamento com seu pai não ter seguido adiante. Embora dificilmente
admitisse, Meireles sentia saudade de seu pai. Em contrapartida, Morgana era
uma mãe tão inteira e presente, que a saudade que sentia acabava se tornando
pequena. Ela desempenhava com êxito os dois papéis.
— Agora vou deixá-los a sós e subir pro meu quarto.
— Mas já?— lamentou Diogo.
— Preciso estudar. Essa semana terei algumas provas. Fim de bimestre,
você sabe...
— Que pena, filha. Queria que aproveitasse um pouco mais com a
gente.
— Também. Mas eu realmente preciso estudar agora. Não posso
vacilar.
— Tudo bem, Jen. A gente entende. Continue dedicada aos estudos, que
você terá um futuro brilhante — disse Diogo. — Boa noite. Bom estudo!
— Boa noite, gente.— A jovem acenou para os dois e subiu para seu
quarto.
Jennifer abriu o livro de química e começou a folhear as páginas
enquanto tentava manter sua atenção no que lia. Porém, estudar estava sendo
uma tarefa difícil naquela noite. Como concentrar-se nas linhas daquelas páginas
se seus pensamentos ainda estavam todos voltados ao momento que tivera com
sua professora em certa sala do terceiro piso? O gosto dos lábios de Regina ainda
se fazia presente em sua boca. A jovem deitou-se na cama, fechou seus olhos e
começou a reviver o momento. Ela levou a mão até a nuca e lembrou-se de
quando a mão da morena esteve ali. O toque de Regina havia sido tão forte e
preciso, que a simples lembrança estava lhe proporcionando arrepios.


Regina despediu-se de seu amigo, tomou um banho quente e relaxante,
vestiu uma camisola branca, dedicou um momento a Bóris e posteriormente
subiu para seu quarto com uma taça de vinho na mão. Seria a primeira vez,
depois de um longo dia, que ela estaria sozinha com seus pensamentos sobre
Jennifer e o ocorrido de mais cedo. A morena apoiou a taça com a bebida sobre
o criado mudo, arrumou algumas almofadas na cabeceira da cama e em seguida
encostou-se contra elas.


Ponto de vista de Regina

Enquanto eu sorvia o líquido da taça e o sentia descendo por minha
garganta, os pensamentos em Jennifer Meireles se faziam fortes. A lembrança
do momento mais íntimo que eu tivera com ela era tão vívida, que eu ainda
conseguia sentir seus lábios finos roçando contra os meus. Por tantas noites eu
havia desejado e imaginado qual seria o gosto daquela boca que era dona de
um sorriso encantador, e agora eu sabia. O beijo de Meireles é levemente doce.
Seus lábios são macios e suaves. A textura deles de encontro com a minha fez a
minha sede por tomá-los aumentar a cada instante que se passava. Ter os seus
lábios nos meus me fez sentir, por um momento, que o certo e o errado não
existiam. O que existia era o ali, o agora, e o desejo que compartilhávamos.
Quando a beijei senti a pele do meu corpo queimar em desejo. Tentei
não ser tão impulsiva para não assustá-la, mas não contive a vontade de
segurar em seus cabelos com força de modo a fazê-la sentir o desejo que corria
em meu corpo. Havia sido a segunda vez que minha mão encontrava aqueles
fios dourados daquela maneira mais agressiva. Ah, Jennifer... Se você soubesse
como mexe comigo. Você tem a capacidade de mexer com meu corpo e minha
mente de uma maneira descomunal.
Desde a primeira vez em que meu olhar cruzou com aquele lindo e
brilhante par de olhos verdes, senti que havia algo diferente e a mais ali. Ele
sempre me prendeu. Durante as aulas eu senti a necessidade de buscá-lo.
Sempre me pareceu familiar. É como se através deles eu pudesse ver a alma de
Jennifer. É como se eu já conhecesse essa alma. Eu busquei evitá-la de todas as
formas possíveis. Só eu sei. Se fosse apenas algo físico eu teria conseguido
contornar a situação. Mas o que Jennifer me desperta vai além de uma pele
queimando em desejo. Eu por inteira queimo e chamo por ela. Meireles carrega
a alegria do verão no sorriso e a beleza da primavera nos cabelos.
Principalmente quando os solta e os deixa cair como cascatas.
Por hora eu preciso parar de pensar nos sentimentos que ela vem
despertando dentro de mim. Preciso dar atenção a esse desejo incontrolável de
possuí-la corporalmente. Hoje não fui capaz de conter a vontade que há tempo
se instalou dentro de mim. Foi a primeira vez que tive um contato íntimo com
um aluno. Eu, que sempre mantive relacionamentos estritamente profissionais
com eles, me vi tomando com voracidade os lábios de Jennifer; minha aluna.
Eu devo estar louca. Mas a quem devo culpar? Ela? Não. Apesar do
seu interesse nítido, ela sempre respeitou meus limites. Apenas eu sou
responsável pelo ocorrido. O pior é que não me arrependo. Pior ou melhor?
Acho que a segunda opção. Arrependimento não faz parte da minha
personalidade. E eu jamais me arrependeria por essa loucura tão prazerosa.


Ponto de vista de Jennifer

Fechei os livros, guardei meu material na mochila e deitei em minha
quente e confortável cama. Eu ainda estava muito eufórica pelo o que aconteceu
entre mim e Regina. Confesso que ela me pegou de surpresa. Eu pude perceber
uma pequena pitada de ciúmes quando mencionou Estela, e devo dizer que
adorei isso. Regina Vianna irritada é algo incrivelmente sexy. Não consigo
esquecer o momento em que aqueles lábios tomaram os meus em um delicioso
impulso. Eu podia jurar que havia certa fúria naquele beijo. Na verdade, ele foi
um misto de raiva e desejo. Contudo, o desejo reinava. O ciúme tornou-se nada
diante da vontade que estávamos de nos possuirmos.
O beijo de Regina foi tão quente e voraz, diria até que bastante
selvagem. Eu adoro beijos lentos, mas confesso que não havia espaço para eles
mais cedo. Nós precisávamos nos provar com urgência. Foi o beijo animalesco
mais delicioso que já provei na vida. Nossas línguas se acariciavam e
guerreavam por prazer. E quando Regina puxou meus cabelos, cada centímetro
do meu corpo arrepiou e vibrou de prazer e desejo. Céus! Como essa mulher é
quente e selvagem.
Não consigo parar de pensar sobre como as coisas ficarão daqui pra
frente. Eu procuro sempre respeitá-la. Respeito seus limites e também busco não
comprometê-la em seu trabalho. Mas eu também preciso respeitar o meu limite
e o que estou sentindo. Sim, o que estou sentindo, aqui, bem dentro do meu
peito. O que fazer com o frio na barriga que sinto cada vez que ouço o som de
seus saltos quando ela entra em sala de aula? Como evitar sorrir feito uma
criança cada vez que ela se direciona a mim? Como não me perder no balançar
de seus curtos cabelos cada vez que ela gesticula explicando algo? Antes de
Regina tocar meus lábios, ela tocou algo bem mais valioso.
Eu nunca me apaixonei por alguém. Não sei como essas coisas
funcionam. Dizem que apaixonar-se é uma das maiores loucuras da vida. Não
sei se estou apaixonada por Regina, como entender sobre algo que nunca senti?
Existe uma regra ou um padrão para a paixão? Também não sei. O que sei é
que Regina faz moradia em meus pensamentos e também tem habitado as mais
belas canções. Se fecho os olhos, vejo seus lábios sorrirem pra mim. Se os abro,
a imagem de seus penetrantes olhos castanhos surge em minha mente. Depois de
hoje, eu sinto cada centímetro do meu corpo chamar por ela. E tudo que mais
desejo é gozar na sua poesia.


— Acho que fui péssima, Jen.— disse Beatriz ao deixar a sala de aula
após uma prova. — Provavelmente ficarei de recuperação — lamentou. —
Como você acha que se saiu?
— Acho que fui bem. Razoável, na verdade. Química não é meu forte, e
eu estudei pouco ontem. Mas acho que consigo ficar acima da média.
— Se por acaso eu ficar de recuperação, pode estudar comigo e me
ensinar o que você souber?
— Claro, Bea!
— Obrigada.— Suspirou aliviada.
— Vou lanchar e ir pra biblioteca, pois daqui a pouco já será o
intervalo. Vai ficar com Kevin e os amigos?
— Não. Hoje quero ficar com você.
— Ok, então vamos.
As duas amigas fizeram um rápido lanche e se direcionaram para a
biblioteca. Beatriz, já suspeitando que ficaria de recuperação, aproveitou a
ocasião pra pegar alguns livros de química emprestados. Ambas conversaram
sobre assuntos aleatórios e Beatriz atualizou Jennifer sobre sua situação com
Kevin. Os dois continuavam ficando. Ela era a personificação da felicidade.
— Estou muito feliz por você, Bea. De verdade! Espero que ele saiba
valorizar a garota incrível que você é.— A loira apoiou a mão sobre a de sua
amiga e acariciou-a.
— Obrigada, Jen.— Sorriu. — Mas e você? Ninguém penetrando nesse
coraçãozinho de pedra?— brincou ao cutucá-la no ombro.
— Na verdade tem algo que eu preciso te contar — iniciou. No entanto,
logo interrompeu a fala quando avistou a figura da professora Vianna entrando
no local. Seu coração, de imediato, entrou em um leve descompasso.
— O que você quer me contar?— perguntou curiosa.
— Em outro momento eu conto.
— Ah não, Jennifer. Começou, termina! Vai me deixar curiosa?
— É um assunto muito delicado.
— É sobre o quê?
Jennifer direcionou seu olhar à Regina e ergueu uma de suas
sobrancelhas indicando sobre quem se tratava.
— A professora Vianna?— perguntou Beatriz, confusa. — Como
assim?
— Depois eu te explico tudo. Prometo. Você pode me esperar um
instante? Preciso ir falar com ela.— disse ao perceber que Regina já estava se
retirando. A mulher apenas havia trocado algumas palavras com a moça
responsável pela sala, e sequer havia notado a presença de Jennifer ali.
— Ok, mas não demore.
— Já volto.— Meireles levantou-se de seu lugar e caminhou a passos
rápidos até sua professora, alcançando-a quando a morena acabara de cruzar a
porta. — Oi... — disse ao tocá-la no ombro.
— Oi, Meireles — respondeu educadamente ao virar-se. Um pequeno
sorriso de lado formou-se em seus lábios pintados de vermelho. — Está em
tempo vago?
— Não. Acabei uma prova recentemente e pude sair. Daqui a pouco
começa o intervalo, então já pretendo ficar aqui de uma vez.
— E fez boa prova?— perguntou com interesse.
— Na medida do possível. Ontem tive dificuldade em me concentrar
nos estudos.
— Por quê?
— Porque meus pensamentos estavam longe — respondeu, travando
seu olhar nos castanhos à sua frente. — Não consigo parar de pensar sobre...
Você sabe.— Jennifer usou um baixo tom de voz ao falar.
— Não, eu não sei. Sobre o quê?— A mais velha instigou. Por mais que
soubesse que precisava evitar esse assunto naquele ambiente, a vontade de ouvir
dos lábios de Jennifer era maior e muito excitante. Regina precisava e queria
ouvir daquela boca.
Com a ponta do dedo indicador, Jennifer tocou o pulso de Regina
suavemente, fazendo suaves movimentos pra cima e pra baixo enquanto
acariciava a pele macia daquela região.
— Sobre o gosto do seu beijo — respondeu baixinho, alguns instantes
após verificar se havia alguém por perto, arrancando de Regina um pequeno
sorriso de lado.
— Posso te levar pra casa hoje?— Regina ofereceu, ainda mantendo um
baixo tom de voz.
— Você pode o que quiser comigo.
— Posso? Cuidado, você não sabe o que está dizendo — disse em um
falso tom ameaçador enquanto mantinha o olhar fixo nas esmeraldas de
Meireles.
— Eu sei exatamente o que estou dizendo — rebateu prontamente,
mantendo firmeza em sua voz.
— Certo. De toda forma, eu não mordo. A menos que você peça, claro.
Jennifer manteve-se calada após as últimas palavras proferidas por
Regina. Seu olhar permanecia fixo sobre ela. Sempre que uma atmosfera
sedutora tomava conta do ambiente, a professora dizia algo de conotação sexual
agressiva, fazendo a pele de Meireles esquentar como se estivesse com febre. A
mente da loira viajava ao imaginá-la inteiramente dominadora na cama.
— Minha amiga Beatriz quase sempre vai embora comigo. Tem algum
problema se ela for junto? Não tenho uma desculpa pra não ir com ela —
perguntou após sair de seus devaneios.
— Problema algum. Eu só quero poder passar um tempo a mais com
você.— Sorriu. — Deixarei ela em casa primeiro.
— Ok.
— Eu só vou pedir algo a você. Preciso que me esperem no ponto de
ônibus onde encontrei você no dia da chuva. Tudo bem? Quero evitar quaisquer
falatórios aqui dentro. Seria ruim pra nós duas.
— Sem problemas.
— Ótimo. Até já, senhorita. Nossa aula começa em...— fez uma pausa
na fala e olhou para seu relógio de pulso. — Vinte minutos.
— Até, senhorita Vianna.
Ao voltar para a biblioteca, a jovem tentou controlar o sorriso que
teimava em se formar em seus lábios. Ela contou à sua amiga que a professora
Vianna havia oferecido uma carona pra casa. Beatriz ficou incrédula, pois jamais
imaginou uma atitude como essa vindo de Regina. Jennifer, por sua vez, disse
que quando chegassem em casa telefonaria e contaria a ela sobre o que estava
acontecendo.


Na sala de aula, após o intervalo, todos os alunos arrumaram suas
mesas perfeitamente enfileiradas para quando Regina entrasse. Todos já estavam
habituados ao jeito de ser da professora. As conversas paralelas foram, aos
poucos, diminuindo até o momento em que a mulher adentrou o lugar. Nessa
hora, após o boa tarde, o silêncio tornou-se quase absoluto.
Sempre que a aula de história estava pra começar, a ansiedade tomava
conta de Jennifer. Para ela, nenhum som era mais prazeroso que o barulho dos
saltos de Regina cada vez que ela entrava no ambiente.
Após a morena entrar e cumprimentar a classe, seu olhar e o da loira se
procuraram juntos, cruzando-se. Ali, naquela troca, elas sabiam que o
cumprimento era pessoal.
— Quero que abram o livro na página setenta e quatro e iniciem a
leitura que se estenderá até a página setenta e sete. Feito isso, irei fazer alguns
comentários sobre o texto lido — disse ela, momentos antes de sentar-se e iniciar
a chamada.
De seu lugar, Jennifer alternava entre a leitura e observá-la. Ela sentia-
se hipnotizada com a beleza e elegância da mulher. Ao mesmo tempo em que a
olhava, pensava em como Regina se mostrava voraz quando não estava
desempenhando seu trabalho. Por trás daquela aparência séria e até mesmo
certinha, existia uma leoa que Jennifer ansiava por domar e ser domada.
Quando a aula findou-se, a mais nova começou a contar o tempo. O
horário da saída parecia estar cada vez mais longe. Ela era um misto de
ansiedade e nervosismo. Ansiava estar a sós com Regina. Mas o nervosismo
começou a tornar-se excessivo. Jennifer não fazia ideia sobre como seriam as
coisas com ela depois do que rolou. Ainda possuía receios sobre como se
comportar. Contudo, sabia que quando estava na presença da mais velha as
coisas fluíam tão naturalmente, que seria perda de tempo tentar imaginar ou até
mesmo planejar alguma atitude.


Jennifer e Beatriz já estavam no ponto à espera de Regina. A amiga da
loira estava achando aquela situação bem inusitada, porém, decidiu não
comentar. Mais tarde, ao telefone, esclareceria suas dúvidas com ela.
Regina aproximou-se com o carro e liberou as portas traseiras pra que
ambas entrassem. Ela as cumprimentou educadamente e em seguida perguntou
onde ficava o endereço de Beatriz, alegando que a levaria primeiro.
— Já sabem qual curso prestar quando concluírem o colegial?—
perguntou enquanto dirigia. As três mantinham conversas aleatórias e triviais.
— Eu tenho vontade de lecionar, adoraria ser professora de matemática.
Sou apaixonada por números e adoro o ambiente escolar. Não quero me
desprender dele — respondeu Beatriz, convicta.
— Louca! Você é louca, Bea! Deus me livre ter que trabalhar com
números!
— Dá licença, Jen? É a minha escolha! Caladinha aí. Rum!— retrucou.
— Pior você que nem decidiu nada.
— Ainda não decidi mesmo. Algum problema? Não quero escolher com
pressa pra depois me arrepender. É a minha vida, o meu futuro que estará
comprometido.
— Mas o tempo corre. Lembre-se disso.
— Nossa, parece que ouvi minha mãe falando agora. Sai pra lá, espírito
de Morgana Meireles — brincou, arrancando um riso de Regina e Beatriz.
— É importante decidir bem. Mas caso se arrependa da escolha, é só
mudar — disse Regina, serenamente. — O único problema é que se levará mais
tempo até alcançar o que realmente almeja.
— Às vezes tenho medo de nunca conseguir me decidir — comentou
com pesar em sua voz.
— Conseguirá. Em algum momento descobrirá algo que gosta muito e
que adoraria passar a vida fazendo.
— Eu espero que sim...
Após aproximadamente vinte minutos de conversa, Regina chegou ao
local dito por Beatriz. Ela e Jennifer despediram-se da jovem e seguiram destino
à casa de Meireles. Assim que sua amiga foi embora, a loira mudou de lugar
dentro do carro e tomou o assento de passageiro ao lado de sua professora.
— Você lembra meu endereço?
— Perfeitamente — respondeu ao dar partida no carro. Ambas estavam
envolvidas em um silêncio constrangedor, até que Regina o quebrou.
— Eu não quero saber de você se atrapalhando nos estudos por estar
com os pensamentos em outro lugar, Jennifer.
— Não costumo perder o foco tão facilmente, mas foi inevitável.
— Por quê?
— Porque... Porque você me pegou de surpresa.
— Eu precisava calar sua boca. Você estava me irritando — disse ela
enquanto mantinha total atenção no tráfego; olhando para Meireles apenas
quando parava nos sinais vermelhos.
— Então é assim que você cala a boca das pessoas?
— É assim que eu calo a boca de loirinhas que falam mentiras.
— Eu não disse mentiras. Aquele homem te olhava de um jeito
apaixonado e você o deixava acariciar seu rosto e mãos de maneira íntima. Ele
só pode ser seu namorado.
— Mas não é. Na verdade, ele e eu temos algo, sim. Ou tínhamos, na
verdade. Mas não temos compromisso um com o outro.
— Então eu não estava tão errada assim.
— Sim, estava. Como eu disse, não namoramos. E o que você viu
ontem não passou daquilo. Há pouco tempo eu comecei a cortar o que tínhamos.
Não quero mais. Mas ele ainda está em processo de aceitação.
— Você não me deve explicações, Regina.— Apesar da jovem ter
usado suavidade em sua voz, Regina conseguiu sentir certo pesar em suas
palavras.
— Mas eu quero dá-las a você — respondeu ao virar o rosto e encará-la.
Por um momento se permitiu perder-se nos traços à sua frente.
— Por que quis me dar carona hoje?
— Pelo motivo que disse mais cedo; pra poder estar um pouco mais
com você. Principalmente pra poder estar com você de verdade, inteiramente,
sem precisar disfarçar.
— Disfarçar o quê?— perguntou, instigando a mulher a lhe dar uma
resposta satisfatória. Ela não queria ter que ler nas entrelinhas. Não nesse
momento.
Regina estacionou o automóvel em uma rua que antecedia a rua onde
Jennifer morava, desligou o rádio do carro e virou seu rosto em direção à ela; lhe
dando sua total atenção.
— Disfarçar a vontade constante que tenho de te olhar e tocar —
respondeu. Regina se mexeu no banco, aproximou-se de Jennifer e a tocou no
rosto. — Eu quero poder te olhar sem pressa — disse ao encarar os olhos à sua
frente. — Quero te tocar sem tempo de ir embora.
— E o que mais você quer?— A mais nova instigou.
— Apenas isso.
Jennifer não conseguia sustentar o olhar sem deixá-lo cair para a boca
da mulher. Por mais que houvesse negações verbais, ambas sabiam que aqueles
instantes em silêncio velava uma forte vontade de provarem, novamente, o gosto
que a outra oferecia. No entanto, desejavam que fosse lentamente dessa vez.
Um silêncio carregado de tensão cresceu entre elas. As duas alternavam
seus olhares carregados de vontades entre olhos e boca uma da outra. Seus rostos
foram aproximando-se devagar, sem pressa, e então seus lábios começaram a se
roçar lentamente. Diferente do outro beijo, este era calmo. Suas bocas se
roçavam no tempo ideal para que as texturas dos lábios ficassem marcadas em
suas memórias. Regina inclinou seu corpo sutilmente sobre o dela e recebeu as
mãos da loira em sua cintura. A morena sentia tanto desejo por Meireles, que
aquele simples gesto foi o suficiente para excitá-la.
O beijo seguia calmo, até que Regina deslizou a língua pelos lábios de
Jennifer e os circundou em um pedido de passagem para um beijo mais intenso.
Foi então que a jovem deu espaço e entreabriu os lábios para que a morena
pudesse explorar sua boca um pouco mais. A boca de Regina era quente, assim
como seu beijo. Seus movimentos com os lábios e línguas eram tão precisos e
prazerosos, que estavam fazendo Jennifer desejá-la entre suas pernas.
Respirar começou a se tornar preciso, no entanto, nenhuma das
mulheres queria interromper aquele momento repleto de emoção e prazer.
Ambas, entre os beijos, tomaram um curto fôlego e permaneceram naquela
entrega. O coração de Jennifer batia em um forte descompasso dentro de seu
peito. Ela sentia como se a qualquer momento ele fosse saltar para fora. A
sintonia era perfeita. Aquela troca representava todo o desejo que há muito se
acumulara entre elas.
Uma das mãos de Regina percorreu pela gola de Jennifer e mergulhou
pra seu interior. Ela acariciava todo o pescoço, nuca e colo da loira. Queria
decorar cada deliciosa sensação que sentia quando estava nos seus braços.
Ansiava lembrar-se do cheiro do pescoço, do perfume dos cabelos, da textura
dos lábios e do gosto da boca.
As investidas de Regina eram tantas, que Jennifer não se conteve e a
envolveu pela cintura com seus braços, apertando-a. Ela queria senti-la presa a
si, queria o calor daquele corpo contra o seu. Alternava entre deslizar as mãos
pelas costas de Regina, subindo e descendo por cima da blusa, e apertar o corpo
da mulher com seus braços. Jennifer possuía bastante força e a apertava com
pressão, excitando-a.
— Gosta quando te aperto assim?— sussurrou durante o beijo, fazendo
Regina esboçar um sorriso sacana em confirmação. Quanto mais Jennifer
apertava, mais ela se excitava. Estar presa nos braços musculosos e definidos da
mais nova era de tirar o ar.
Regina prendeu o lábio inferior da loira contra seus dentes e o mordeu,
fazendo-a soltar um baixo gemido de dor e prazer. A mais velha sentia vontade
de tratar Jennifer de maneira mais bruta, contudo, o fazia com cautela. Ela lia
com atenção as mensagens corporais da jovem e jamais faria algo que não fosse
de seu agrado. Então, visto que a loira demonstrou gostar, tornou a mordê-la no
lábio. Dessa vez, usando mais força.
— Ai...— murmurou.
— Machuquei você?— perguntou preocupada.
— Não. Tenho muita tolerância à dor. Não é uma mordidinha dessa que
vai me machucar.
— Oh, quase esqueci que você é a menina de ouro. Acho que vai me
dar muito trabalho — brincou. — Vou adorar saber até aonde você aguenta.
— Eu te disse que sou uma garota má.
— Ai, Jennifer... O que eu faço com você?
— Que tal tentar me domar?
Aquela frase de Jennifer soou como música para os ouvidos de Regina.
Agora ela sentia como se tivesse carta branca em relação a ela. E aproveitaria
esse consentimento.
— Você não faz mesmo ideia do que está dizendo, não é? Não me
provoque se não for dar conta.— disse sensualmente, com uma rouca voz que
levava Jennifer à loucura.
— Eu já disse o quanto sua a voz mexe comigo?— perguntou, ao
mesmo tempo em que levou a mão até os cabelos de Regina e começou a
acariciá-los.
— Não. Acho que nós temos muitas coisas pra dizer uma à outra. Eu
nunca disse, por exemplo, o quanto me encanto com esses seus dentes sutilmente
tortos.
— Ah não, Regina. Eles são horríveis!
— São lindos. Assim como outras coisas em você.— Regina aproximou
o rosto da curva do pescoço de Jennifer e distribuiu beijos naquela região. Ela
beijou da curva até o lóbulo da orelha. — Tem sido cada vez mais difícil ser
indiferente a nós — murmurou.
Jennifer se perguntou internamente se a mais velha pretendia
enlouquecê-la ali, agora, dentro daquele carro. Pois carícias no pescoço
acompanhadas de murmúrios ao pé do ouvido eram golpes baixos, e estavam
mexendo com seus hormônios.
— Regina...— O sussurro foi quase um gemido.
— Que delícia ouvir sua voz chamando meu nome, Jennifer. — Regina
parecia saber exatamente o que dizer pra enlouquecê-la. A loira sentiu uma forte
carga tomando conta do vão entre suas pernas. O carro estava tornando-se
pequeno e quente demais para as duas.
Antes que Jennifer pudesse responder ou fazer algo, seu celular
começou a tocar. Ela cogitou não atendê-lo, pois nem de longe gostaria que
aquele momento fosse interrompido. Mas lembrou-se que sua mãe havia
esquecido as chaves em casa. Provavelmente seria ela ao telefone.
— Preciso atendê-lo — disse sem jeito. Meireles tirou o celular do
bolso e constatou que era, de fato, uma chamada perdida de Morgana. — Droga!
Preciso ir. Minha mãe deve estar na porta querendo entrar. Está sem chave.— Se
explicou.
— Tudo bem, querida. Vou te deixar mais próxima de casa.— Regina
deu partida no carro e o encostou em uma calçada próxima à casa da mais nova.
— Está entregue.— Sorriu.
— Obrigada pela carona.— Um bobo sorriso habitava os finos lábios
rosados de Jennifer. Ela estava lutando para conseguir ir embora e deixar aquela
mulher para trás. Essa simples tarefa parecia imensamente difícil quando se tinha
um penetrante par de olhos lhe encarando.
Regina não conseguia parar de admirar os lábios de Jennifer. Ter aquela
boca na sua era imensamente prazeroso, no entanto, ter a visão daqueles lábios
curvados em um lindo sorriso conseguia ser ainda melhor. Meireles, sem dúvida,
estava infiltrando-se mansamente.
— Não precisa agradecer. É sempre um prazer estar com você.
— Eu ia dizer até amanhã, mas não sei se irei vê-la em algum momento.
Quando não é o dia da sua aula eu raramente te encontro. E visto que sexta-feira
é feriado, acho que agora só nos veremos com certeza na próxima semana.—
Lamentou com uma triste expressão em sua face.
— Eu adoraria voltar a frequentar a biblioteca nos intervalos, mas temo
que alguém comece a perceber. Ainda não sei como proceder em relação a isso.
— É compreensível.— Jennifer respondeu. — Eu sinto falta dos
singelos momentos que compartilhávamos lá. E sabe outra necessidade que
tenho sentido?
— Qual?
— A de ler seus poemas — disse ela, arrancando um sorriso de sua
professora.
— Já que você gostou tanto assim, posso fazer uma cópia deles pra
você.
— Eu adoraria. Consigo te sentir em cada linha deles.
— Certo, então depois eu te entrego. Vou escolher os que mais gosto.
— Está bem. Obrigada! Agora realmente preciso ir.— Jennifer
aproximou-se, depositou um beijo no canto dos lábios da mulher e se foi.


Capítulo 11

— Que sorriso bobo nos lábios é esse, Jennifer? Parece que viu
passarinho azul — comentou Morgana enquanto esperava a filha abrir a porta de
casa.
— Sorriso nenhum, mãe.
— Claro que tem. E eu conheço muito bem o que um sorriso desses
significa. Estava com alguém?
— Sim, com a Beatriz. A gente quase sempre volta pra casa juntas, você
sabe — disse ela, desconversando. Meireles jogou a mochila no sofá e
direcionou-se para a cozinha, sendo seguida por sua mãe.
— Jen, você sabe exatamente o que eu quis dizer.
— Ai, mãe, para! Você está sendo invasiva. Eu não estava com
ninguém. E não existe um responsável por esse sorriso, ok?— Jennifer se sentia
incomodada por ter que esconder a verdade de sua mãe. Mas ela sabia que seria
ainda pior se contasse. Antes de qualquer coisa teria que tomar coragem para
falar sobre sua sexualidade. Ela só não sabia como, pois os comentários de
Morgana sobre o tema nunca foram muito agradáveis.
— Certo, Jennifer. Não insistirei. Vou subir pro meu quarto, tomar um
banho e deitar pra relaxar. Sinta-se à vontade pra ir até lá me fazer companhia.—
Morgana depositou um beijo na testa da filha e subiu.
Meireles preparou um lanche e o levou pra comer lá em cima. Ela
estava ansiosa pra fazer a ligação à Beatriz. Ao entrar no quarto, fechou a porta,
ligou a televisão para que o som de sua voz não ficasse tão evidente e em
seguida ligou para a amiga.
Beatriz ouvia incrédula tudo o que Jennifer lhe dizia. Meireles abriu
jogo com sua melhor amiga e contou tudo o que aconteceu até o presente
momento. Ocultando apenas os detalhes mais íntimos, claro. De resto, abriu-se
por inteira.
— Jennifer, não estou acreditando! Você e a professora Vianna? Pelos
deuses, esse é o babado do século!— disse a menina do outro lado da linha.
— Pelo amor de Deus, Bea, estou confiando em você. Não conte a
ninguém.
— Você nem precisava estar me pedindo isso, Jennifer! Sabe que
jamais contaria a alguém. Mas olha, confesso que estou chocada em três idiomas
diferentes.
— Queria poder ver sua cara agora.— Riu. — Eu precisava desabafar
isso com você. Eu já não estava conseguindo guardar e carregar sozinha.
— Obrigada pela confiança. Mas me conta, o que vocês pretendem
fazer? Viverão um romance escondido?
— Não sei o que vai acontecer, não sei o que se passa na cabeça da
Regina. Ainda não conversamos a respeito, é tudo muito recente. Confesso que
estou um pouco receosa.
— Não é pra menos! Olha só onde você está metida, mulher! Ah não,
espera aí que vou passar na sua casa pra você me contar essa história direito.
— Ok. Estarei te esperando.— Meireles desligou o telefone, concluiu
seu lanche e caminhou até o quarto de sua mãe, informando à ela que Beatriz
estava pra chegar. Morgana ficou contente, ela adorava a presença da menina.
— Quando Beatriz chegar me avise, quero dar um abraço nela.
— Aviso sim.
Em aproximadamente vinte minutos a campainha tocou. Beatriz morava
razoavelmente próximo.
— Jennifer, me conta isso!— exclamou a menina ao entrar.
— Shhh, fala baixo — repreendeu. — Vem, vamos lá pra cima. Minha
mãe quer te ver.
— Boa noite, dona Morgana — disse Beatriz ao entrar lentamente no
quarto da mãe de Jennifer.
— Beatriz, querida! Que bom revê-la. Nunca mais veio visitar.— A
mais velha levantou-se e cumprimentou a jovem com um terno abraço. — Da
próxima vez avise com antecedência pra que eu possa te preparar um bolo.—
Sorriu.
— Esse ano as coisas andam muito corridas na escola, mas prometo vir
mais vezes.
— Vou cobrar, viu?
— Pode cobrar.— Sorriu.
— Agora vamos para o quarto, Bea?— sugeriu Jennifer, aflita. Estava
ansiosa para desabafar logo sobre o assunto.
— Vamos sim — respondeu ao direcionar o olhar para ela, notando seu
nervosismo evidente. — Até mais, dona Morgana. Antes de ir embora eu passo
aqui pra me despedir.
— Ok. Estarei esperando!


— Como você está se sentindo em relação a isso? Vai levar adiante? E
ela? Está te levando a sério? Não quero que você seja um passatempo na vida
dela, Jen. Toma cuidado, por favor.
As duas amigas conversavam sentadas sobre a cama.
— Estou vivendo o momento, não quero pensar no futuro. Nem sei se
teremos um. Apenas quero aproveitar toda essa atração animal que está rolando.
Eu juro pra você, Beatriz, ninguém nunca me despertou um desejo tão grande
quanto ela. Regina tem despertado um lado meu que até então eu desconhecia.
Ou pelo menos não o conhecia totalmente.
— E quais seus receios, exatamente?
— Temo não ser o bastante pra ela.
— Em qual sentido?— perguntou confusa.
— No momento, sexualmente falando.
Beatriz arregalou os olhos com a declaração de sua amiga.
— Então você está pensando em...? Com ela?
— Não tenho como não pensar nisso, essa mulher parece que é banhada
na luxúria. Deve ter algum afrodisíaco correndo naquelas veias.
— Nossa, é nesse nível?
— Sim, é nesse nível. Regina é uma camaleoa, Bea. Em um momento
está toda séria, distante, padronizada. De repente se torna altamente solta,
dominadora, sensual. Uma hora está falando sobre poesias, em outra, sobre
algemas.
— Uma linda camaleoa, devo admitir.
— A mais bela de todas — afirmou Jennifer. — O cheiro dela... Meus
Deus, é envolvente demais. Mas voltando ao assunto... Então, eu acredito que
aconteça, sim. E eu tenho medo de não estar à altura. Afinal, ela já é uma mulher
madura. Deve ter tido muitas experiências na vida. E eu? Apenas uma parceira, e
muito mal.
— Eu não sei o que te dizer sobre isso. Eu ainda sou virgem, você sabe.
Mas vendo a coisa como um todo, eu acho o seguinte. Se ela quer... Ela quer,
não é?
— Tudo indica que sim.
— Então, continuando. Se ela quer, ela sabe onde está se metendo. Sabe
que você tem dezoito anos e que provavelmente não tem muita experiência
sexual. Ela vai embarcar nessa sabendo, Jen. Então relaxa, que tudo vai dar
certo. Mas uma coisa precisa ser dita... Aquilo lá é um mulherão! Se prepara!
— E você acha que já não reparei que ela é um mulherão?— disse em
meio ao riso. — Quando estou com ela é tão natural, que eu sinto saber
exatamente o que fazer, dizer. Apenas flui. Mas eu tenho receios, confesso.
— Você tem fantasiado com ela?
— Todos os dias, noites, horas, minutos. Minha pele aquece só com a
memória da voz rouca que ela tem.
— E o que você mais tem fantasiado?— Beatriz demonstrava
empolgação e curiosidade.
— Pra quê quer saber? Deixa de ser pervertida, vai?— Jennifer lançou
um travesseiro sobre a amiga e riu.
— Eu pervertida? Pervertidas são vocês duas, pelas coisas que você me
contou. Eu apenas sou curiosa. Agora vai, conta! O que você mais fantasia com
ela?— Beatriz acomodou o travesseiro sobre o colo e se manteve olhando para a
loira.
— Ai que vergonha. Mas vamos lá!— Jennifer estava levemente
ruborizada. — Eu sempre imagino que estou sentada em uma poltrona e a vejo
caminhar em minha direção sobre um belo par de saltos. Nesse meu pensamento
ela está usando saia e camisa social, como de costume. Ela se aproxima e
deposita um dos pés sobre meu peito, me pisando com aqueles saltos.—
Conforme ia contando sobre a fantasia para a amiga, sua pele começou a
arrepiar. Essa era uma fantasia que a loira muito desejava que acontecesse.
— Oh, meu Deus!— exclamou Beatriz com as mãos em ambos os lados
da face.
— Agora chega, ok? Os detalhes mais sórdidos vou guardar pra mim —
disse, compartilhando uma boa risada com sua amiga. — Eu estou rindo, mas o
assunto é delicado. Tenho tanto medo de colocar a Regina em uma situação
difícil no colégio. Não quero de forma alguma ser um problema na vida dela.
— Eu não sei até onde vocês duas pretendem chegar com tudo isso.
Mas seja lá até onde for, tomem cuidado. Tudo bem? Estão embarcando em algo
perigoso. Não sei o que pode acontecer com ela se isso chegar à direção da
escola. E se sua mãe descobrir? Já pensou nisso?
— Já. Infelizmente a Regina seria a mais prejudicada. Eu penso muito
nisso, não pense que não. Vou tomar todo o cuidado necessário, principalmente
por ela. Quero ser o motivo para os lábios dela se curvarem naquele lindo sorriso
largo e brilhante que ela tem. Me mataria ser o motivo de qualquer tristeza.
— Você está gostando dela, não está?
— Hã? O quê? Não. E nem quero pensar nisso agora.
— Não é questão de querer pensar ou não, Jennifer. O sentimento
apenas se infiltra e se instala. Não é algo que se possa controlar.
— Vamos mudar de assunto? Não quero mais falar sobre ela — pediu
com delicadeza.
— Tudo bem.
As duas passaram um longo tempo conversando sobre a escola, Kevin,
futuro profissional, boxe da Jennifer, dentre outras coisas. Quando o relógio de
cabeceira já marcava quase dez horas da noite, Beatriz despediu-se de sua amiga,
de Morgana e foi para casa. Meireles ofereceu para que ela dormisse em sua
casa, mas Beatriz recusou. Outro dia, quando fosse preparada, portando seus
pertences pessoais, aceitaria.
Quando Beatriz se foi, a loira desejou uma boa noite para sua mãe e
dirigiu-se para o quarto. Assim que foi tirar o uniforme escolar para, então,
tomar um banho relaxante, sentiu o perfume de Regina impregnado em sua blusa
polo. A jovem a tirou e a pressionou levemente contra o rosto de modo que
pudesse aspirar aquele perfume doce e sedutor. Jennifer fechou seus olhos e
deixou que aquele cheiro a guiasse para longe.


Regina ligou a televisão de seu quarto e a deixou em um canal onde
estava sendo exibido um documentário sobre a Segunda Guerra Mundial. A
morena jogou-se sobre as almofadas que havia próximas ao espelho de sua
cama, pegou os óculos e começou a assisti-lo. Na mesa de cabeceira havia um
pires e uma xícara que continha seu habitual chá de maçã com canela. Ela se
servia da bebida paulatinamente enquanto assistia ao documentário. Regina era
uma pessoa solitária por opção. Prezava seus momentos a sós; apenas na
presença de seu gato, seus livros e uma boa bebida. Raros eram os momentos em
que gostava de socializar.
A morena estava inteiramente compenetrada ao que assistia quando, de
repente, seu celular tocou e vibrou sobre o criado mudo. Ao tomá-lo em mãos
constatou que se tratava de uma chamada de Robson. Ela desativou o som do
aparelho e o devolveu para o móvel. O que menos queria naquela noite era entrar
em uma conversa com ele. Feito isso, voltou sua atenção para a televisão. Menos
de dez minutos haviam se passado quando o celular voltou a vibrar. Porém,
dessa vez vibrou de maneira rápida, indicando que não se tratava de uma
chamada. Regina voltou a pegar o aparelho julgando ter recebido uma
mensagem de Robson na caixa postal. Mas, ao constatar, deparou-se com o
inesperado. Ela havia acabado de receber uma mensagem de texto de sua aluna.

Oi.

Regina franziu o cenho ao lê-la. O que sua aluna estaria querendo com
ela naquele horário? Como das outras vezes, resolveu ignorar e não dar
continuidade para aquilo. No entanto, alguns minutos mais se passaram, e outra
mensagem chegou.

Estava estudando sua matéria há pouco. Pensar em você foi inevitável.

Um sorriso formou-se nos lábios da professora com a segunda
mensagem. Ela deixou o celular ao lado de sua perna e prosseguiu com o
documentário. Mas, diferente de poucos minutos atrás, sua mente já não estava
inteiramente focada no que assistia. Jennifer deu continuidade com as
mensagens, e quando a professora menos esperou -ou não- recebeu uma terceira
e uma quarta notificação com um intervalo de dez minutos entre elas.

Adoraria invadir seu país.

Será que vou precisar decifrar o teu silêncio, Regina?

A professora leu e releu a última mensagem ao mesmo tempo em que
decidia entre respondê-la ou não.
— Acho que tem alguém com insônia essa noite — disse ela, ao gato,
referindo-se à sua aluna. Bóris estava deitado sobre suas pernas e a olhava como
se compreendesse tudo.
Após muito pensar, Regina decidiu redigir uma resposta para Meireles.

O sol nasce todas as manhãs em silêncio. E é em silêncio que ele aquece
a sua pele branca e ilumina seu cabelo quando reflete na graciosidade dessas
suas ondas douradas. Então, peço: ouça-me. Meu silêncio muito tem a dizer.

Quando o documentário chegou ao fim, Regina desligou a televisão e
desceu até a cozinha para levar a xícara e o pires. Ela sentia pavor em deixar
qualquer objeto fora do lugar pela casa. A morena lavou a pequena louça, cuidou
de sua higiene noturna e voltou para a cama. Ao pegar o celular para constatar se
o alarme estava ativado, percebeu que Jennifer não havia lhe enviado mais
mensagens. Era como se ela, mais uma vez, tivesse silenciado a boca da jovem.


Quarta feira foi totalmente maçante para Jennifer Meireles. Além de o
dia ter sido recheado por matérias desinteressantes para ela, não avistou Regina
um momento que fosse pela escola. A quinta feira seguiu quase no mesmo estilo;
com a exceção de que algumas aulas eram do gosto da jovem.
Quando o dia escolar findou-se e Jennifer se lamentou por não ter visto
sua professora de história novamente, uma deliciosa e familiar voz se fez ouvida
na escada que dava acesso ao primeiro piso. Regina Vianna conversava com a
coordenadora escolar enquanto descia e caminhava em direção ao
estacionamento.
Jennifer esperou até que a mulher estivesse sozinha e pediu licença à
Beatriz para ir até ela, alegando que logo estaria de volta.
— Professora Vianna?— chamou.
Ao ouvir a suave voz da loira, Regina interrompeu os passos e virou-se,
avistando-a.
— Olá, Meireles.— respondeu esboçando um pequeno sorriso.
A mais nova manteve-se calada por alguns segundos enquanto se perdia
na beleza da mulher a sua frente. Regina estava linda, como sempre. E
sustentava um maravilhoso sorriso em seus lábios perfeitamente desenhados e
pintados de vermelho.
— Como você está?— perguntou timidamente. Ela, por muitas vezes,
sentia-se incerta sobre como tratar a professora.
— Estou ótima, meu bem. E você?
— Tô bem, mas eu ficaria ainda melhor se você dissesse sim ao convite
que vou fazer.
— Então faça e nós saberemos se você ficará melhor.
— Ok.— Sorriu timidamente. Os castanhos de Regina a encaravam com
tanta intensidade à espera da pergunta, que um nervosismo começou a se instalar
em Jennifer. Em contrapartida, ela muito apreciava aquela gostosa sensação.
Adorava ser invadida e despida até a alma por aquela mulher. — Lá vai!
— Hum?— Regina arqueou uma de suas sobrancelhas enquanto
aguardava a pergunta.
— Amanhã é feriado, você sabe, mas mesmo assim eu terei treino de
boxe pela manhã. Então eu queria convidá-la pra ir assisti-lo.
— E por que eu teria interesse em ir vê-la treinando boxe, senhorita
Meireles?— disse séria, assustando-a.
— Desculpe, foi um convite idiota...— comentou ao expressar um triste
semblante.
Regina balançou a cabeça negativamente enquanto soltava uma longa
risada.
— Do quê está rindo?
— Da sua cara de desapontada — respondeu. — Eu adoraria vê-la
treinando, moça. Estava apenas brincando com você.
— Ai, Regina. Não teve graça!— retrucou.
— Pois pra mim teve muita — disse enquanto ia parando de rir. — Eu
só não quero que saibam ou que me vejam lá.
— Não precisa se preocupar, eu não a convidaria se não fosse seguro.
Não é minha intenção prejudicar você.
— Certo.
— Então isso foi um sim?
— Sim, Jennifer. Isso foi um sim.
Na frente da professora a loira conteve a felicidade que sentiu com a
resposta. Mas em seu interior soltava fogos de artifício por todos os cantos.
— Vou te passar o endereço da minha academia por mensagem, tudo
bem?— Regina assentiu positivamente e, então, Jennifer continuou. — Então,
até amanhã...
— Até... — se arrastou e prolongou-se na palavra.
As duas permaneceram estáticas por uma pequena parcela de tempo
enquanto cruzavam seus olhares. Elas sentiam em seus interiores uma forte
vontade de se tocarem. Infelizmente, para a insatisfação de ambas, sabiam que
não era apropriado. Havia uma grande censura que as rodeava. Sendo assim,
apenas se olharam por mais alguns longos instantes antes de cada uma seguir
para seu destino.


O feriado havia chegado. Regina despertou após alguns miados de
Bóris próximos a seu rosto.
— Bom dia, meu amor — disse ela, sonolenta. A morena dedicou
alguns minutos ao felino e em seguida verificou a hora em seu celular. Era
exatamente oito da manhã. Regina tomou um leve café da manhã e direcionou-se
para o banheiro. Após um delicioso banho morno, saiu enrolada em um roupão
branco e caminhou em direção ao seu guarda roupa à procura do que vestir para
a ocasião.
Quando já estava devidamente vestida e maquiada, despediu-se de Bóris
e seguiu para o endereço que sua aluna lhe passara via mensagem de texto na
noite passada. Regina deixou o carro no estacionamento mais próximo e seguiu
para a academia. Ao adentrar o local, identificou-se na recepção e entrou. Ela
mantinha os olhos atentos em tudo à sua volta e lançava olhares curiosos à
procura da jovem. Após algum tempo procurando, encontrou em qual área
aconteciam os treinamentos de boxe e se direcionou para lá. Quando chegou,
parou na porta e deparou-se com Jennifer em um de seus uniformes. Hoje ela
usava um top preto que deixava todo seu abdômen milimetricamente definido à
mostra, e na região de baixo vestia uma justa calça de ginástica, também de
coloração preta. Seu cabelo estava preso em um alto e apertado rabo de cavalo.
Regina não emitiu nenhum barulho, e também não a chamou. Ela queria poder
olhar a espontaneidade de Jennifer por um tempo sem que a loira soubesse que
estava a observá-la.
Meireles treinava em dupla com um rapaz que Regina logo julgou ser
seu treinador. A loira soltava alguns pequenos gritos enquanto tentava reproduzir
a sequência de golpes que o orientador pedia. Jennifer estava inteiramente
entregue e compenetrada, e Regina a observava com contemplação. A morena
admirava a forma com a qual ela se entregava e se dedicava a tudo o que era de
seu interesse.

Alguns minutos mais se passaram e Jennifer sentiu uma presença a
observando. Ao olhar para a porta, distante, avistou a figura estática de Regina
olhando-a.
— Um momento, por favor — disse ao rapaz. Meireles afastou-se de
seu treinador e caminhou em direção à mulher. — Oi!— A cumprimentou
sorrindo ao aproximar-se. — Por que não entrou?— perguntou suavemente,
ainda mantendo um bobo sorriso nos lábios.
— Você estava tão empenhada, que não quis atrapalhar ou cortar seu
momento.
— Não me importaria se o fizesse — respondeu. — Estou feliz que
tenha vindo. Vem, entra...— Jennifer a envolveu pela cintura e a guiou para
dentro. A jovem apresentou a morena para seu professor de luta e em seguida
pediu para que se sentasse e a observasse até que seu treinamento chegasse ao
fim.
De seu lugar, Regina a observava com total atenção. Seus olhos
castanhos passeavam por cada parte do corpo da loira e capturava todos os
movimentos. Meireles, por sua vez, se mantinha atenta ao que fazia. Contudo,
vez ou outra virava a cabeça para que seu olhar encontrasse Regina. Sempre que
o fazia, seus olhos e boca sorriam para ela.
— Uh, terminei!— disse ofegante ao tomar um lugar ao lado de Regina.
Hoje Jennifer aproveitou que não teria aula para praticar algumas horas a mais. E
visto que era um feriado em plena sexta-feira, a academia estava quase vazia.
Provavelmente muitos dos integrantes aproveitaram a oportunidade para viajar.
Jennifer adorava quando isso acontecia. Quanto menos gente tivesse, mais ela
conseguia aproveitar os treinos. — Pode me ajudar a tirá-la?— perguntou,
referindo-se às suas luvas.
Ao mesmo tempo em que Regina a ajudava, ela conversava e ia
observando detalhes de seu corpo. Não deixando passar despercebido por seus
olhos o quão definido era o abdômen da jovem. O conjunto de braços, pernas e
abdômen era desnorteante.
— Te fiz acordar cedo em plena folga, não foi? — comentou a mais
nova enquanto a observava desfazer suas bandagens. — Eu mereço um castigo
por isso — brincou em meio um pequeno riso.
— Você não aguentaria meus métodos de punição.
— Talvez sim, ou... Talvez não — respondeu a mais jovem. — O que
achou do treino?
— Achei que você sabe exatamente o que faz. E exerce com êxito.
— Oh, obrigada! Assim eu vou ficar me achando.— Sorriu, arrancando
um olhar mais profundo da morena. A mais velha adorava aquele sorriso
travesso. Ele era um misto de inocência e malícia.
— Então é melhor eu parar. Eu não aguentaria uma garotinha
tagarelando o quanto é boa.
— Pegou pesado com o garotinha — retrucou descontente.
— E você não é uma garotinha?— implicou.
Jennifer estava incomodada por Regina tê-la chamado de garotinha, mas
não deixou transparecer. Preferiu entrar no jogo.
— Posso ser uma se você quiser. Aliás, gosta de garotinhas, Regina?
— De você, sim — respondeu sem delongas, e logo desviou o rumo da
conversa. Ela precisava ser cautelosa para não se deixar envolver naquele
perigoso querer. — Eu reescrevi alguns dos meus poemas e os trouxe pra você,
como prometido. Não são muitos, deram apenas algumas folhas. Reescrevi os
que mais gosto.
— Não acredito! Onde estão?— perguntou empolgada.
— Estão no meu carro.
— Então eu vou bem rápido ao banheiro pra lavar meu rosto e trocar de
roupa, e te acompanho até lá. Estou louca por eles!
— Ok!— Sorriu com a animação da mais nova. — Estarei te esperando
aqui.
Em aproximadamente dez minutos Meireles retornou de roupa trocada.
Ela apenas pôde lavar o rosto para livrar-se do suor, pois a academia não
oferecia ducha para os clientes. Hoje a loira estava com uma roupa
completamente despojada. Vestia uma calça jeans de lavagem clara, camiseta
básica preta por dentro, e por fora um blusão xadrez vermelho com preto. Seus
cabelos, agora, estavam soltos. E em sua cabeça havia um boné de cor preta.
— Vamos?— chamou ao aproximar-se. Regina sorriu e ambas
deixaram o lugar.
Assim que entraram no veículo a professora procurou em todos os
lugares e não encontrou as folhas. Ela jurava que as havia deixado dentro do
porta luvas. Após verificar todos os cantos possíveis, uma vaga lembrança da
papelada em cima de sua mesa do escritório se fez presente.
— Oh, droga! Acho que ficaram em cima da mesa. Na pressa eu devo
ter esquecido de trazê-las. Jurava que estavam aqui. Desculpe, Jennifer —
lamentou.
— Tudo bem...— respondeu frustrada.
Regina sentiu-se mal em ver toda a empolgação da loira descendo pelo
ralo. Foi então que decidiu fazer algo inusitado.
— Se importaria de ir até minha casa comigo?— ofereceu, não muito
certa de suas palavras.
— Até sua casa?— indagou incrédula.
— Sim, pra que eu possa entregá-los a você.
— Se minha presença não for te causar algum incômodo...
Regina quase arrependeu-se de ter feito o convite. Quase. Sua mente
começou a entrar em conflito sobre aquela situação ser correta ou não. Metade
da voz que falava em sua cabeça dizia que não havia mal algum naquele convite.
Porém, a outra metade gritava para que ela parasse onde estavam.
— Sua presença nunca é um incômodo — respondeu, ao mesmo tempo
em que mirou os olhos verde - mar à sua frente. Naquele instante ela se
perguntava para onde aquele mar iria levá-la. E se ela se perderia ou se
encontraria no vai e vem daquelas águas.

Regina estacionou o carro na garagem e convidou Jennifer para entrar.
A jovem sentia-se nervosa com o grande passo que ambas estavam dando, pois,
visto que a professora sempre mantinha relações estritamente profissionais e
acadêmicas com os alunos, aquele estava sendo, sim, um passo e tanto. Ao
mesmo tempo em que o nervosismo se instalava, um bom sentimento também se
fazia presente. Jennifer sentiu-se feliz pela confiança que Regina estava
depositando sobre ela.
— Oi, meu amor! Temos visita — disse ao entrar em casa e ser recebia
por seu gato roçando entre suas pernas. — Diga olá para a Jennifer.— Regina
pegou Bóris no colo e o aproximou da jovem.
— Ele não vai me atacar?— perguntou a loira, incerta sobre fazer ou
não carícias no felino.
— Apenas se você for uma má pessoa. Bóris tem um sexto sentido para
elas.
Jennifer, cautelosamente, levou a mão até o topo da cabeça de Bóris e o
acariciou.
— Acho que sou uma boa pessoa — disse suavemente enquanto o
acariciava.
— Eu tinha certeza que sim — comentou a morena com um satisfatório
sorriso no rosto.
Assim que Regina devolveu Bóris para o chão, ela e a mais jovem
caminharam até a cozinha para que a morena pudesse preencher o pote do
bichano com ração fresca. Durante o curto caminho a loira passeou os olhos aos
arredores; querendo observar o local para ter uma noção sobre os gostos de
Regina. E também porque, para ela, era prazeroso estar em contato com objetos
pertencentes à mulher.
— Aceita beber algo?— A mais velha ofereceu. — Nada alcoólico,
claro.— completou.
— Lá vem você com essa censura — disse a loira, revirando os olhos.
— Aceito um copo d’água.
— Quando você vai perceber que não é censura, mas sim, cuidado? —
Regina caminhou até a geladeira e voltou portando uma garrafa. Abriu o
armário, pegou um copo de vidro e ofereceu para que Meireles se servisse à
vontade.
— Obrigada — disse educadamente.
— Vou fazer um chá pra mim e em seguida nos dirigimos ao escritório,
ok? Certamente os papéis estão lá.
— Chá?— Jennifer esboçou uma expressão não muito agradável.
— Sim, chá. Não gosta?
— Detesto. Não sei como alguém consegue tomar isso.
— O meu é uma delícia. Maçã com canela. Vou fazer e você
experimenta — disse suavemente enquanto colhia os ingredientes.
— Eca! Não vou provar isso.
Regina apenas esboçou um pequeno sorriso de lado e deu continuidade
ao preparo do chá. Ela descascou a maçã, tirou as sementes e jogou meia polpa
junto com as cascas dentro da chaleira e acrescentou água. Em seguida,
depositou cravos, anis e um pouco de canela em pau. Quando ferveu, contou
mais cinco minutos em fogo baixo e desligou. Ela o coou em sua xícara
preferida e em seguida chamou Jennifer para o escritório.
Ao entrar no cômodo, Meireles olhou maravilhada para a quantidade de
livros e objetos decorativos que havia no local.
— Uau — disse ao aproximar-se de uma miniatura de torre Eiffel que
estava localizada sobre a mesa de madeira.
— Sinta-se à vontade para mexer no que quiser — comentou ao notar a
cautela e timidez de sua aluna.
— Ir à Paris é um sonho que tenho. Lá me parece tão lindo, romântico,
aconchegante.
— E de fato é. A cidade luz — comentou após depositar a xícara sobre
a mesa e caminhar até Jennifer. Regina contemplava os lindos olhos da loira que,
nesse momento, pareciam possuir um brilho mais intenso enquanto ela segurava
o pequeno enfeite de torre. — Você sabe o porquê dessa denominação?—
perguntou Regina.
— Porque ela tem muitas luzes? Muitos monumentos iluminados?
— Muitos acreditam que seja esse o motivo. Mas na verdade ela é
chamada assim porque durante séculos muitas mentes brilhantes, iluminadas, nas
diversas vertentes das artes, eram atraídas para Paris. Consequentemente, lá se
tornou o maior centro de artes do mundo.
— Então ela é denominada assim por conta das fortes influências?
— Exatamente.
— Dessa eu não sabia. Obrigada pela aula — brincou, oferecendo à
Regina o sorriso travesso que a morena tanto amava. — Tudo em Paris exala
arte e refinamento. Eu adoro isso.
— É um banho de beleza, graciosidade, cultura, história e romantismo
— comentou ao mesmo tempo em que encarou o rosto à sua frente.
— Eu imagino que sim. Quanto mais eu penso a respeito, mais a minha
vontade aumenta.
— Você ainda terá muitas oportunidades de ir até lá e conferir
pessoalmente.
— Quem sabe...— disse incerta. — São seus pais?— perguntou ao
apontar para o porta-retrato que havia em uma das prateleiras.
— Sim — respondeu a morena, suavemente.
— Você se parece bastante com seu pai.— Comentou a loira enquanto
observava a fotografia.
— Realmente tenho muito dos traços dele — confirmou. — Achei!—
exclamou ao avistar as folhas de papel. — Sabia que estavam aqui.— Regina
puxou uma cadeira para Jennifer e pediu que a jovem se sentasse ao seu lado.
— Obrigada.
A professora ofereceu um gole de seu chá para a loira, que recusou
esboçando uma feia careta. A mais velha sorriu e logo começou a folhear os
papéis.
— Adoro a sua letra — comentou Meireles ao depositar os olhos sobre
as folhas preenchidas pelos poemas escritos por Regina.
— Obrigada.— Sorriu.
— Poderia ler alguns pra mim?— pediu ao desviar seu olhar das folhas
para Regina.
— Posso, mas não vá se apaixonar, ok?— brincou, compartilhando um
pequeno e breve riso com sua aluna. Riso este, que logo deu lugar a um
constrangedor silêncio, as fazendo se olharem por alguns longos instantes, até
Regina começar a ler.
Conforme a mais velha lia alguns poemas, Jennifer deixou-se embarcar
em cada linha do que estava sendo recitado. Melhor que lê-los sozinha em seu
quarto há infinitas noites, era ter a rouca e sedutora voz da autora daquelas obras
bem próxima à seu rosto, exatamente como estava acontecendo agora. Enquanto
Regina os lia inteiramente compenetrada, Jennifer aproveitava para observar
suas feições. A loira se perdia entre palavras, frases, voz, cheiros e traços. Todos
pertencentes à Regina. Seus sentidos estavam unindo aquele momento e o
transformando na mais bela poesia viva.
Um clima leve, harmonioso e romântico foi instalando-se entre elas aos
poucos. Regina, entre uma leitura e outra, olhava para Meireles. E sempre que
seu olhar e o da jovem se cruzavam, inevitavelmente seus lábios e os dela
curvavam-se em sorrisos bobos. Elas estavam se apaixonando pelo silêncio dos
olhares, pela graciosidade dos sorrisos e pela proximidade de suas respirações.
Embora Regina tivesse uma postura imponente no seu dia a dia e nas
suas relações interpessoais, na sua essência ela era uma pessoa extremamente
sensível. Seus poemas mostravam muito disso, e diziam muito sobre ela, que
valorizava e apreciava os detalhes do mundo à sua volta. O pequeno, o
escondido e o esquecido pela maioria das pessoas era o que a encantava. Quando
ela olhava para Jennifer, por exemplo, conseguia ver mais que um corpo
impecável ou um radiante par de olhos verdes. Regina via uma garota inteligente
e madura. Enxergava malícia, mas também ingenuidade. Sentia uma forte
vontade de possuí-la, mas também sentia necessidade de cuidá-la. Seu interior
estava preenchido por sentimentos e sensações distintas, antagônicas, mas que
juntas tornavam-se algo grande e inteiro.
O singelo momento entre elas foi interrompido quando o celular da
professora começou a tocar. Ela pediu um instante para Jennifer, levantou-se e o
atendeu. Enquanto a morena falava ao telefone, Meireles permaneceu sentada
folheando os poemas. Porém, logo, algo lhe chamou a atenção; Regina falava em
espanhol em sua conversa ao telefone.
Jennifer era uma grande fã do idioma. Desde criança sempre foi
apaixonada por canções em espanhol, principalmente as que falavam de amor.
Embora ela não tivesse domínio do idioma, conseguia entender algumas palavras
soltas. Para ela, melhor do que ouvir aquela língua que tanto gostava, era ouvir
Regina a pronunciando. Visto isso, deixou os poemas de lado e,
disfarçadamente, direcionou sua atenção para a conversa. Jennifer não sabia
como isso era possível, mas Regina conseguiu ficar ainda mais sedutora falando
em espanhol.
— Desculpe a interrupção, era meu pai ao telefone — comentou ao
aproximar-se da mesa.
Jennifer tirou o boné, o apoiou sobre o móvel, levantou-se e caminhou
até a mais velha.
— Não se preocupe — disse suavemente. — Adorei o fato de ele ter
ligado.
— Por quê?— perguntou, confusa, enquanto olhava para a jovem.
— Porque foi maravilhoso ouvir você falando em espanhol — disse
sorrindo.
— Foi a primeira vez que você ouviu?
— Sim! E gostei muito. Foi... — Jennifer caminhou lentamente para
mais perto de Regina ao mesmo tempo em que carregava um sorriso sacana nos
lábios. — Sexy — finalizou. A doce Jennifer de poucos minutos atrás estava
dando lugar a uma Jennifer repleta de malícia. A loira aproximou-se e encurtou a
distância de tal forma, que o perfume da mulher começou a ser sentido e
absorvido por suas narinas. — Adoraria poder te ouvir falando em espanhol pra
mim — disse no mesmo instante em que procurou a mão da professora com a
dela.
— Ah é?— Regina encurtou ainda mais a distância e encostou seu
corpo no de Jennifer. — O que mais você adoraria?
Meireles passou um dos braços sobre ombro da mulher e entrelaçou os
dedos nos cabelos de Regina próximos a nuca, acariciando-os.
— Adoraria me perverter inteiramente em você — respondeu em um
murmúrio próximo ao ouvido, provocando um intenso arrepio na pele da mulher.
A loira pegava pesado enquanto inevitavelmente se oferecia para ela.
— Jennifer, olha o que você está me dizendo...— A voz de Regina saiu
arrastada. Ela lutava contra os efeitos em seu corpo para não perder o controle
enquanto Meireles fazia investidas sobre ele. Nesse momento a jovem alternava
entre beijos em seu pescoço e frases provocantes, transformando-a em brasa.
Apenas um objeto inanimado seria indiferente ao contato direto com alguém que
muito se quer. E embora Regina não se enquadrasse nessa categoria, ainda assim
ela relutava.
— Estou dizendo o que eu quero, e o que eu sei que você também quer.
— A mais nova deslizou a mão livre pelas costas de Regina, sobre a blusa, e
puxou sutilmente o corpo da morena para si, ficando encurralada entre a mesa e
a professora, assim como na ocasião em que se beijaram pela primeira vez.
Regina mal conseguia acreditar em como aquela loira a tirava do sério.
Quando estava com ela era como se nada mais existisse além dos cheiros, dos
toques, dos sussurros e do desejo que gritava através deu seus poros. Regina não
se conteve e segurou no quadril de Jennifer ao mesmo tempo em que uniu os
lábios aos dela.
— Adoro provar esse gosto misterioso que você tem — Jennifer
murmurou ao ser embargada pelo beijo. — E sabe o que mais eu adoro? A forma
voraz com a qual você me deseja.
— Você deve estar querendo me enlouquecer — murmurou contra
aquela boca que a provocava. A morena tomava os lábios de Jennifer com
desejo, travando uma deliciosa batalha de lábios e línguas em um beijo
inteiramente intenso, selvagem.
— Eu quero te enlouquecer, e eu quero enlouquecer com você —
respondeu em um sussurro. O corpo de Jennifer desejava tanto aquela mulher à
sua frente, que todos seus medos e inseguranças caíam para segundo plano.
— Não sou mulher de voltar atrás em nada. Então pensa muito bem
onde você está se metendo e se você vai aguentar — disse Regina, um pouco
ofegante, momentos antes de afundar seu rosto no pescoço de Jennifer e
distribuir beijos rápidos e molhados ali. As carícias tornaram-se um misto entre
beijos e mordidas leves. E cada vez que seus dentes mordiam a pele alva do
pescoço de Jennifer, a jovem soltava um gemido abafado.
— Eu posso morrer na sua boca e não me arrepender disso.
Essas foram as últimas palavras da jovem antes de Regina tornar a
beijá-la, fundindo suas bocas em uma só. Baixos gemidos e respirações
ofegantes se faziam ouvidos ao mesmo tempo em que Regina deslizou a mão
para dentro do cós da calça jeans da loira, iniciando uma provocante e deliciosa
brincadeira ali, deslizando a ponta de seus dedos de um lado a outro na parte
interior do cós. A calça que a loira usava estava apertada, isso proporcionava um
pouco de dificuldade à Regina cada vez que ela tentava mexer com seus dedos.
Jennifer estava lutando para conter a vontade de gemer que os lábios
quentes e molhados de Regina estavam lhe despertando. Sem mencionar a
dificuldade que seu jeans apertado estava proporcionando à morena, tornando o
momento extremamente excitante para ambas. Regina e nem Jennifer queriam
que aquele botão fosse aberto, não. Elas queriam continuar naquela torturante
brincadeira.
— O que aconteceria se eu o abrisse?— perguntou ao tirar a mão do cós
e depositá-la no botão da calça da loira. A voz da morena estava carregada de
luxúria.
— Não o abra — disse Jennifer, ofegante, instigando Regina com
aquele jogo.
— Quanto mais você disser que não, mais eu vou querer — respondeu
séria, com a voz mais rouca que nunca. Regina jamais faria algo sem o
consentimento de Jennifer. Jamais. Mas ela estava adorando aquele jogo, assim
como a jovem. — Me deixa passear meus dedos nas nossas vontades?— pediu ,
alguns segundos antes de morder o lóbulo da orelha de Jennifer.
— Porra... Você é deliciosamente safada, Regina.
— Sim. E você adora isso — respondeu ao arrastar os lábios pelo
maxilar da loira. Regina traçou um provocante caminho com seus lábios macios;
ela os deslizou do queixo ao pescoço, aonde começou a distribuir beijos,
mordidas e algumas chupadas sutis.
As investidas entre elas tornavam-se cada mais vez mais intensas.
Jennifer arranhava a nuca de Regina ao mesmo tempo em que sentia os delírios
que a boca da mulher provocava em seu pescoço. Regina era intensa e voraz. Ela
fazia Meireles sentir-se inteiramente desejada, dominada e possuída por aquele
envoltório de luxúria.
A força que Jennifer utilizava para arranhar a nuca da morena
aumentava gradativamente conforme ia sentindo as carícias da mulher em seu
corpo. A loira usou a mão livre para tocar a barra da blusa de Regina e
mergulhar a mão por debaixo. Pela primeira vez sentiu a pele das costas da
professora entrando em contato com a ponta de seus dedos. Foi uma sensação
prazerosa e única poder dedilhar a pele da mulher que era dona de seus
pensamentos. Ela acariciou e percorreu a extensão das costas até onde pôde
alcançar. E após mapeá-la a dedo, fincou suas unhas ali e a arranhou de cima a
baixo. Precisava senti-la com força, vontade e desejo.
Sem interromper as intensas investidas no pescoço de Jennifer, Regina
depositou suas mãos no botão do jeans da loira e o abriu. Quando o fez, um
lapso de consciência passou em sua mente. Era inegável o fato que ela desejava
tomá-la para si, porém, gostaria que a loira estivesse inteiramente certa do que
estavam fazendo. Regina, mesmo sem dar-se conta, estava desejando Meireles
além do físico, e se importava verdadeiramente com as emoções da loira. Ela
sequer sabia se Jennifer já havia se relacionado sexualmente com alguém antes.
Foi então que decidiu conter o impulso.
— Você já...?— perguntou ao mirar as esmeraldas que, naquele
momento, possuíam um brilho ainda mais intenso.
Jennifer sorriu internamente após a pergunta da mais velha, achando de
uma delicadeza imensa ela ter contido os próprios desejos para colocá-la à
frente. A loira apenas assentiu positivamente, dando passagem para que Regina
continuasse. Ambas estavam ofegantes e compartilhavam uma cúmplice troca de
olhares. A capacidade que tinham de se comunicar através do olhar era quase
mágica. Era como se houvesse uma espécie de cordão emocional ligando a
intensidade dos castanhos na calmaria do verde-mar.
Regina sorriu e tomou aqueles lábios rosados enquanto suas mãos
percorreram a blusa xadrez, arrancando-a. Ela queria sentir o calor da pele da
loira, queria o beijo, o toque e o desejo de Jennifer para si. Regina queria ser
dela e fazê-la sua.
Ambas estavam tão entregues aos beijos e carícias, que levaram certo
tempo até perceberem o som da campainha. Ao se darem conta, ignoraram e
prosseguiram com a quente troca de carícias. Contudo, a insistência era tanta,
que Jennifer se preocupou.
— Não seria melhor você ir atender? Pode ser importante — disse
ofegante, entre o beijo.
— Não — murmurou. Regina não tinha a menor intenção de
interromper aquele momento. No entanto, a insistência na campainha foi tanta,
que resolveu ir ver de quem se tratava. — Droga. Já volto.— Regina passou a
mão nos cabelos e desamassou a roupa no percurso que fez até a porta para
atendê-la.
— Surpresa!
— O que faz aqui?— perguntou surpresa.
— Nossa! Que recepção, hein? Olá pra você também, Regina.


Capítulo 12


— Surpresa!
— O que faz aqui?— perguntou ao ser pega desprevenida.
— Que recepção, hein? Olá pra você também, Regina.
— Tia Reginaaaaaa! — disse Henrique ao entrar e jogar-se contra sua
tia.
— Oi, meu amor!— Regina envolveu seu sobrinho em um delicioso
abraço. — Desculpe minha reação, Malena, é que você me pegou de surpresa —
comentou ao direcionar sua atenção para a irmã.
— Resolvemos passar o feriado com você — disse a ruiva ao entrar. —
Espero não estar incomodando. Desculpe não avisar, é que Henrique queria fazer
surpresa.
— Sem nenhum problema, sabe que são sempre bem vindos —
respondeu após fechar a porta. Regina estava visivelmente incomodada e
nervosa. Esse detalhe não passou despercebido por sua irmã.
— Está acontecendo algo, Regina? Você me parece estranha.
— Não. Impressão sua.— Sorriu. — É... Bom, estou com uma visita.
Pode me aguardar um instante?
— Quem está aqui com você? Robson?
— Não — respondeu suavemente. — Pode subir para acomodar suas
coisas se quiser. Eu já volto.
— Ok — respondeu. — Vem, Henrique. Vamos guardar nossas coisas e
nos trocar.


— Desculpe a interrupção, Jennifer. Era minha irmã com meu sobrinho.
Vieram passar o feriado e o final de semana comigo — explicou ao retornar e
aproximar-se da loira.
— Não precisa se desculpar — disse com suavidade na fala. — Mas e
agora? O que faremos?
— Minha irmã vai perceber na hora o que está acontecendo —
comentou ao passar a mão pelos cabelos em um nítido gesto de apreensão.
— Regina, não quero causar problemas na sua vida. Podemos inventar
alguma história. E se dissermos que você me dá aulas particulares de espanhol?
— Malena sabe que não tenho o hábito de atender na minha residência.
Sem contar que ela vai reconhecer você da carteira escolar que achou no meu
carro. Além do mais, não quero mentiras. Vou te apresentar normalmente como
minha aluna. E quando eu estiver a sós com ela, serei sincera.
— Estou nervosa — admitiu.
— Oh Jennifer, desculpe colocá-la nessa situação. Jamais imaginaria
que minha irmã viria me visitar hoje. Ela nunca vem sem avisar.
— Tudo bem, não se preocupe. Acho que é um nervosismo natural.
— Vem cá...— Regina envolveu Jennifer e a aconchegou em seu
abraço, permitindo que a jovem apoiasse a cabeça em seu peito. Era a primeira
vez que ambas compartilhavam um contato íntimo, terno e despretensioso de
qualquer conotação sexual. — Não precisa sentir-se assim, nada vai acontecer —
disse suavemente ao afagar os cabelos de Meireles. — Mas você e eu precisamos
ter uma conversa importante sobre o que está acontecendo entre nós.
— Sim, eu sei...— disse ao afastar-se lentamente de Regina e encará-la
nos olhos.
— Agora vamos? Você precisa conhecer Henrique!— Sorriu.
Assim que ambas chegaram à sala avistaram o garoto e Bóris brincando.
O sobrinho de Regina havia encontrado o chaveiro de laser sobre a mesa de
centro e o estava usando pra fazer o felino correr loucamente pelo cômodo.
— Jennifer, esse é meu sobrinho — disse a morena. — Henrique, quero
que conheça a Jennifer Meireles. Ela é uma de minhas alunas.
O sobrinho de Regina fez uma pausa na brincadeira e caminhou até as
duas mulheres.
— Olá, Jennifer — disse ele. — Você já usou isso nele?— perguntou,
referindo-se ao laser. — É muito divertido!— disse com empolgação.
— Ainda não. Me empresta um instante?— Meireles pegou o chaveiro e
direcionou o laser para a parede. Assim que Bóris avistou a luz vermelha, correu
e saltou em direção a ela, praticamente escalando a parede. Henrique, assim
como Jennifer, caiu na gargalhada.
— Bóris adora isso!— comentou Regina, sorrindo.
— Ouço os risos de vocês aqui de cima. Posso participar?— A voz da
ruiva ecoou vindo das escadas.
— Jennifer, essa é Malena, minha irmã.
— Olá — disse a loira. Meireles estava completamente sem jeito. Ela
não sabia o que podia ou não dizer. Naquele momento sentia dificuldade até em
encontrar um lugar para por suas mãos. Por sorte sua calça jeans possuía bolsos
dianteiros.
— Olá! Você é a...?— perguntou a ruiva, confusa.
— É aluna da tia Regina.— Henrique respondeu, incluindo-se na
conversa.
— Aluna?— indagou, no mesmo instante em que lançou a censura de
um olhar recriminante e interrogativo sobre a irmã.
— Sim — respondeu Regina, séria. — É a senhorita Meireles.
— A dona da carteira que achei em seu carro?
— Sim, Malena, essa mesma. Não vai cumprimentá-la?
— Oh, desculpe! É que eu ainda estava processando a informação em
meu cérebro — respondeu um pouco atrapalhada com seus pensamentos. —
Prazer, senhorita Meireles. Me chamo Malena Vianna, sou irmã de Regina,
como já sabe.— A ruiva esticou o braço e a cumprimentou educadamente.
Posteriormente, um silêncio constrangedor instalou-se no local.
— Foi um prazer conhecê-los — disse Jennifer ao quebrar o silêncio. —
Mas eu preciso ir.
— Já? De forma alguma. Adoraria que almoçasse conosco — sugeriu
Regina.
— Agradeço o convite, Regina, mas vai ficar para outro dia. Eu
realmente preciso ir.
— Uma pena, Jennifer — lamentou. — Levarei você em casa.
— Não precisa se incomodar, eu pego um táxi — disse suavemente.
— De maneira alguma, faço questão de acompanhá-la.— A morena
insistiu. — Malena, estarei de volta em uma hora, ok? Vou apenas deixar a
senhorita Meireles em casa.
— Quer que eu adiante algo para o almoço nesse intervalo?
— Não será necessário. Pedirei algo pronto hoje.
— Ok, então até daqui a pouco. Foi um prazer, Meireles. Até qualquer
dia!— disse com um pequeno sorriso nos lábios ao direcionar sua atenção para a
loira.
— O prazer foi todo meu — respondeu educadamente. — Tchau,
Henrique!— disse, recebendo um aceno de mão do menino em resposta. Logo
após, foi até o escritório recolher os poemas e em seguida retirou-se da casa com
Regina.

— Desculpe ter recusado o convite e resolvido ir embora tão de repente.
Sua irmã vai me achar uma mal educada — lamentou. — Mas eu estava um
pouco desconfortável com a situação — disse, minutos depois de entrar no carro
da professora.
— Não precisa se desculpar. Mas confesso que teria adorado ter sua
companhia — comentou ao repousar sua mão sobre a de Jennifer.
— Mesmo?— perguntou enquanto sentia a maciez daquela mão sobre a
sua.
— Sim, eu adoro sua presença.— Sorriu. — O que achou de Henrique?
— Lindo demais! Infelizmente não tive como passar um tempo com ele.
— Você iria adorar se o fizesse. É um encanto de criança.
— Eu imagino que sim.— Sorriu. — Você aparenta gostar muito dele.
Sempre o menciona com ternura.
— Eu o amo imensamente. Temos uma relação muito boa desde sempre
— disse ao esboçar um bobo sorriso nos lábios. — O que houve?— perguntou
ao notar que Jennifer lhe direcionava um olhar fixo.
— Não houve nada — respondeu suavemente.
— Claro que houve, está me olhando de um jeito diferente.
— Por acaso você conhece meus jeitos de olhar, Regina?— respondeu,
tentando conter um riso.
— Alguns deles, sim — afirmou a morena. — Anda, diz o que houve.
— Anda, não. Tem que pedir com educação — implicou.
— Já pedi com educação, mas você parece gostar de receber ordens.
— As suas eu adoraria receber, mesmo — respondeu prontamente. —
Bem, vou dizer. Eu apenas estava reparando nas expressões faciais que você
esboçava ao falar de Henrique. Seu sorriso é encantador, eu me perco...
Após ouvir as palavras de Jennifer, voltar a sorrir foi inevitável. Mas,
desta vez o riso veio acompanhado de um leve rubor em sua face.
— Obrigada — respondeu de maneira tímida. — Acho melhor nós
irmos. Daqui a pouco minha irmã aparece aqui para querer saber o que ainda
fazemos nessa garagem.
Ao chegar ao bairro de Jennifer, Regina parou com seu carro algumas
casas antes da casa da jovem. Elas eram cautelosas quanto a serem vistas pela
mãe de Meireles.
— Malena e meu sobrinho irão embora amanhã à noite ou domingo pela
manhã. Domingo é o aniversário do pai de Henrique e os três farão um passeio
juntos. Eu gostaria de aproveitar o domingo pra ver você. Se você puder e
quiser, claro. Pois nós duas precisamos conversar sobre o que vem acontecendo
entre nós, e eu não quero que tenhamos essa conversa na escola. Não seria
apropriado. Preciso preservar minha imagem e também a sua — disse Regina,
serenamente, enquanto direcionava o olhar à loira.
— Verei se tem um lugar pra você na minha agenda, senhorita Vianna
— brincou, esboçando um largo sorriso moleca para o contemplo de Regina. —
Obrigada por tê-los reescritos pra mim.— Comentou, referindo-se aos poemas
que havia nas folhas em que segurava.
— Foi um prazer. Espero que consiga apreciá-los novamente.
— Com certeza irei. E agora será ainda melhor, pois recordarei da sua
voz os recitando.
— Gosta da minha voz?— iniciou, instigando Jennifer a falar. Se havia
algo extremamente prazeroso para ela, era ouvir Meireles explicando-se e
detalhando suas sensações.
— Gosto de muitas coisas em você — disse ao apoiar a mão sobre a
perna de Regina.
— Poderia detalhá-las pra mim?— Regina alternou o olhar entre a mão
de Jennifer sobre sua coxa e os seus olhos, que a olhavam com fixação.
— Eu gosto da intensidade do seu olhar que me desnuda até a alma.
Gosto, também, do seu cheiro. Mas não apenas o cheiro do seu perfume, gosto
do cheiro natural da sua pele quando te tenho junto a mim. Adoro a forma dos
seus cabelos e da maneira que eles se mexem quando você gesticula. Gosto,
também, do calor que emana da sua boca quando a tenho próxima à minha.
Regina inclinou-se sutilmente sobre Jennifer e murmurou com os lábios
quase unidos aos da loira.
— Assim?— provocou.
— Isso, assim...— sussurrou em resposta, mantendo os olhos fechados
enquanto se deixava envolver pelo hálito quente de Regina, seguido pelo
inebriante perfume que era sentido devido a curta distância que havia entre elas.
— O quê mais você gosta?— perguntou sensualmente ao roçar os lábios
contra os dela. Quando estava na presença da loira, Regina sentia como se
houvesse uma força invisível que a puxava cada vez mais para perto. Meireles a
deixava quase irracional.
— Gosto de correr minhas mãos em você e te sentir em detalhes —
respondeu ao percorrer as mãos pela lateral do corpo de Regina.
— E você sabe do que eu gosto, Jennifer?— murmurou, ainda nos
lábios de Meireles. — Eu gosto disso.— Regina deslizou a mão pela nuca de
Jennifer e segurou firme nos cabelos da loira localizados próximos àquela
região, puxando-os devagar. — E disso.— Ela percorreu os lábios pelo pescoço
e orelha da jovem, distribuindo beijos e mordidas. — E gosto ainda mais de ver
que você se desmancha quando eu faço.
Naquele momento, Jennifer era um misto de emoções e sensações. Ela
sentia cada parte de seu corpo reagindo às investidas. Ninguém nunca havia
conseguido mexer com seu corpo e mente como Regina fazia. Sua vontade era
de gritar pra que ela continuasse, para que não parasse. Ela queria verbalizar o
quanto seu corpo gritava para ser dela.
— Eu adoro fantasiar com você, pois acredito que somos do tamanho
dos nossos pensamentos. Porém, mais do que fantasiar eu quero viver, e eu
quero fazer — disse ao fincar as curtas unhas em um dos braços de Jennifer,
arranhando aquela região de modo a arrancar da loira baixos gemidos abafados,
de prazer. Regina sempre foi altamente erótica e voraz, porém, Jennifer estava
elevando seu lado sexual consideravelmente. Regina precisava lutar a cada
instante para não ser tão impulsiva, embora ela já houvesse percebido que
Jennifer adorava seus momentos não pensados. — Mas por hora eu preciso
deixar você sair desse carro — disse afastando-se lentamente. Antes que a
morena pudesse voltar à sua posição inicial no banco, sentiu a mão da loira
tornando a tocar sua coxa.
— Você parece adorar me provocar e instigar, mas eu ainda vou te levar
a nocaute, Regina. Essas foram as últimas palavras de Jennifer antes de sair do
veículo, deixando a professora surpresa e extasiada.

Ao retornar para casa, Regina degustou um maravilhoso almoço na


companhia de Malena e Henrique. A ruiva lançava diversos olhares sobre ela
durante a refeição, e não via a hora em que o momento de estar a sós com sua
irmã chegasse. Ela estava inquieta para esclarecer a história sobre Jennifer
Meireles.
— A Jennifer é uma boa aluna?— perguntou Henrique, aleatoriamente,
à mesa, enquanto almoçavam.
— É sim. Bastante dedicada. Por quê?
— Porque a mamãe diz que é importante ser um bom aluno e tirar boas
notas. A mãe da Jennifer deve estar orgulhosa.
— Provavelmente, sim — respondeu suavemente.
— Você já pegou ela colando?— perguntou, arrancando uma pequena
risada das duas mulheres.
— Não, meu amor, nunca — respondeu em meio o riso. — Mais
alguma pergunta, detetive?
— Por enquanto, não.
Assim que a família Vianna findou a refeição, Henrique pegou um
carro de controle remoto que havia trazido na mochila e começou a brincar com
ele pela casa. Enquanto brincava e se distraía, Regina e sua mãe recolheram a
louça do almoço e se dirigiram à cozinha. Malena havia contado os minutos para
aquele momento.
— O quê está acontecendo, Regina? Ou melhor, o que estava
acontecendo quando cheguei aqui?— perguntou assim que ambas entraram na
cozinha e começaram a organizar a bagunça do almoço. Malena estava com o
tom de voz um pouco elevado. Ela estava aflita, ansiando por respostas.
— Eu ainda não sei se arranco seu coração ou se te dou um beijo nos
lábios por você ter chegado naquela hora — brincou, na tentativa de aliviar a
tensão que o assunto lhe proporcionava. Ao mesmo tempo em que arrumava a
cozinha, a morena ia abrindo o jogo para a irmã. Ela contou à ruiva tudo o que
aconteceu desde o instante em que conheceu Jennifer. — Se você não tivesse me
feito essa surpresa hoje, provavelmente ela e eu teríamos nos entregado ao
momento.
— Por Deus, Regina! E eu achava que a louca da família era eu!—
disse em voz alta. — Você tem consciência de onde você foi se meter?
— O que menos estou precisando agora é de sermão, Malena. Mas
respondendo a sua pergunta... Sim, tenho total consciência.
— Pois não parece! O caso está pior do que eu pensava — comentou ao
levar a mão ao rosto em um nítido gesto de desespero. — Eu não quero saber de
Henrique indo visitar tia na cadeia, Regina. Olha lá o que você vai arrumar pra
sua vida!
— Porra, Malena! Você está me deixando ainda pior. Não é como se eu
fosse uma criminosa por me envolver com uma aluna! Já estou o suficiente cheia
com meus próprios pensamentos.
— Eu sei que não, Regina. Mas muitas pessoas irão julgar e apedrejar
você. Sabe por quê? A começar por ser uma relação homossexual. Depois
porque Jennifer é sua aluna. E ainda tem o fato de vocês possuírem uma
diferença de quinze anos de idade. Ainda irão alegar que você a seduziu.
— E se eu te disser que foi Jennifer que me seduziu? Quer dizer, me
encantou. Encantar é uma palavra mais apropriada. Foi um envolvimento
natural.
— Regina do céu, como você foi deixar isso acontecer?
— Simplesmente aconteceu, não foi algo que eu pudesse controlar. Eu
sinto algo diferente em tudo o que a envolve. É como se existisse uma força
invisível que nos une. Infelizmente nosso cenário não está ajudando nessa união.
Mas, pra mim, não importa muito se ela é minha aluna e se tem quinze anos a
menos que eu. O que me importa é o que ela me desperta. Claro que minha razão
me diz todos os dias que eu estou embarcando em uma viagem perigosa. Porém,
quando a desejo, eu desejo a pessoa que me tira o sono, que me infiltra os
pensamentos, que faz meu corpo queimar feito brasa. Eu a desejo sem rótulos,
Malena. Eu não vejo a Jennifer Meireles minha aluna de dezoito anos. Eu a vejo
por dentro, eu a quero por dentro, eu enxergo aquela que está me levando à uma
deliciosa loucura— Regina fez uma pausa em sua fala, soltou um longo suspiro e
continuou. — Antes de qualquer coisa eu desejo aquela alma e todas as
sensações que me proporciona quando em contato com a minha.
— Mas infelizmente o cenário não está nem um pouco a seu favor.
— É isso que tem me preocupado. Mas não quero pensar nisso agora.
No momento eu quero me permitir sentir tudo o que estou sentindo.
— Tudo bem, como você preferir. Mas tome cuidado, ok? Eu sei o
quanto você preza por sua imagem em seu ambiente de trabalho. Seja cautelosa.
— Estou fazendo o possível — respondeu suavemente.
— Certo. Agora que já te dei um sermão, me responde uma coisa?
— Lá vem bomba — disse, já ciente das loucuras que se passam na
mente de sua irmã. — Hum?
— O que teria acontecido entre vocês se eu não tivesse interrompido?
Pois nem adianta você negar que não estava rolando nada, eu percebi. Seu batom
estava borrado e sua respiração completamente ofegante quando abriu a porta.
Sem mencionar a roupa toda amassada. Você nunca se veste assim. Suas roupas
estão sempre perfeitamente passadas.
— Acredito que teria acontecido exatamente o que está passando na sua
cabeça.
— Meu Deus... Você deve estar querendo me matar do coração!—
exclamou enquanto terminava de ajudá-la a secar a louça.
— Metade de mim queria muito ter continuado. Mas foi melhor assim.
Acho que não era o momento certo.
— Isso quer dizer que vocês ainda não fizeram, né?
— Correto. Confesso que há um forte desejo entre nós, e que está muito
difícil de ser controlado. Mas não somos apenas isso. Existe algo mais entre mim
e ela, posso sentir, e acredito que ela também. E é esse algo que não me deixa
dar um fim nisso.
— Você gosta dessa garota e está se apaixonando por ela — afirmou
Malena, fazendo Regina arregalar os olhos.
— Nada a ver! Você está viajando mais que de costume — respondeu.
Aquela afirmação da ruiva fizera seu coração bater em um ritmo um pouco mais
acelerado.
— Pode negar o quanto quiser, mas lembre-se que a pior mentira é a
que contamos a nós mesmos.
— Não estou contando mentiras a ninguém. Apenas... Apenas não parei
pra pensar a respeito — disse em meio a um vago pensamento. — Acho que vou
enlouquecer — comentou ao retirar-se da cozinha e caminhar até a sala com sua
irmã. — Você não imagina o quão difícil tem sido controlar cada palavra, cada
olhar e cada simples movimento do meu corpo quando estamos juntas dentro do
colégio. Eu preciso preservar a minha imagem e a dela, mas tem sido uma luta
diária ser indiferente lá dentro.
— Eu não gostaria de estar na sua pele.
— Não queira mesmo.
A conversa entre as irmãs foi interrompida quando Henrique apareceu
correndo e gritando pela sala. O menino estava usando o boné preto esquecido
por Jennifer.
— Onde conseguiu esse boné?— perguntou sua mãe. — Não fique
mexendo nas coisas de sua tia sem permissão.
— Estava em cima da mesa.
— É da Jennifer — disse Regina à sua irmã.
— Posso ficar com ele?— perguntou o menino às duas mulheres.
— Você não pode ficar com o que não te pertence, Henrique.—
Malena o respondeu. — Quando formos pra casa a gente passa em uma loja e eu
compro um pra você, tudo bem?
— Mas eu gostei desse.— Ele insistiu.
— Mas esse não é seu. Agora vem cá e tira isso antes que você manche
ou estrague de alguma forma — disse a ruiva.
Quando Henrique se aproximou, Regina retirou o celular do bolso da
própria calça e tirou uma graciosa fotografia do menino usando o boné. Ela tinha
a intenção de mostrá-la à Meireles futuramente. Assim que Henrique, a contra
gosto, tirou o acessório e o depositou sobre a mesa de centro, Regina o tomou
em mãos e sorriu ao lembrar-se da loira o usando.

Ponto de Vista de Jennifer

Tomei um refrescante banho gelado e vesti roupas confortáveis e
limpas. Elas ainda preservavam aquele gostoso perfume de amaciante. Eu
adorava usar peças leves e velhas quando estava em casa. Adorava a sensação
de conforto e bem estar que me proporcionavam.
Enquanto eu preparava algo para comer, os pensamentos em Regina se
fizeram intensamente presentes, seguidos das impressões deixadas em meu
corpo. Se fechasse os olhos, facilmente sentia suas mãos tateando a pele dos
meus braços. Eu ainda conseguia, também, sentir seu hálito quente em minha
nuca enquanto me sussurrava todas as suas vontades e depravações. Hoje nós
estivemos a um passo de nos entregarmos aos desejos que há tempos passeia
por nossas peles, lábios, olhares e tudo mais que nos compõe. Confesso que a
vontade de ser dela gritava dentro de mim. Não há sensação mais prazerosa que
sentir-se prisioneira dos beijos e carícias de Regina. Contudo, sinto-me bem que
não tenha acontecido. Acredito que antes de essa entrega tão íntima precisamos
definir com a razão o que será de nós duas. Torço para que o encontro de
domingo seja bastante decisivo e promissor.
Hoje Regina me perguntou se poderia passear seus dedos nas nossas
vontades. Na hora eu senti meu corpo estremecer e aclamar por seus toques
físicos. Mas agora, com mais calma, eu consigo ouvir a voz dentro de mim
pedindo por algo mais. Meu corpo, definitivamente, anseia por seus toques. Mas
a minha alma também. Minha atração por ela nunca foi inteiramente física. Eu
não consigo desejar alguém que não me desperte qualquer sentimento. E visto
que desejo Regina além do mensurável, isso significa que a carga emocional
que carrego por ela é grande.
Eu apenas tive um namoro sério, ela se chamava Rachel. Isso ocorreu
no ano passado quando eu tinha dezessete anos e ela recém completado dezoito.
Nosso relacionamento durou apenas oito meses, mas foram oito meses de
aprendizados. Eu gostava de Rachel e a desejava. Não com a intensidade na
qual desejo Regina, mas a desejava. Rachel era uma boa pessoa, sempre
envolvida com projetos sociais. Ela me passava confiança e sempre demonstrou
gostar verdadeiramente de mim. Com ela tive minha primeira relação sexual.
Ela foi minha primeira e única parceira. Quando Regina me questionou de
maneira sutil se eu já havia me relacionado sexualmente antes, eu afirmei. Mas
a verdade é que me sinto um pouco virgem quando estou sob suas carícias.
Minha experiência é mínima e meu desejo por ela é o mesmo de alguém que
anseia por descobrir os primeiros prazeres da carne.
Eu sei que todas as estradas que temos que percorrer são tortuosas,
mas não eu não me importo em tentar percorrê-las milhares de vezes se eu
souber que no final terá Regina. Regina é como o sol. Ela ilumina, aquece e
queima. E eu sou como um campo de flores que sorri com seu acalento. A única
diferença de mim para as flores é que não me importo em queimar.


Regina, Henrique e Malena tiveram um prazeroso feriado em família.
A tia e o sobrinho cozinharam algumas sobremesas juntos. O menino adorava
essa atividade ao lado de sua tia, era sempre seguida de muitas risadas e guerras
de ingredientes. Malena sempre se questionava internamente sobre qual dos dois
era o mais infantil, pois Regina se convertia a uma grande criança quando na
companhia de Henrique.
A morena aproveitou o tempo que passaria ao lado dele para ensiná-lo
um pouco de espanhol. Esta era outra atividade que ambos adoravam
compartilhar juntos. Malena não sabia nada sobre o idioma e nunca fez questão
de aprender, mas Henrique adorava e sempre pedia para Regina e/ou seu avô lhe
ensinarem.

Após um dia inteiro completamente aproveitado ao lado de Henrique, a
morena reservou a noite apenas para apreciar a companhia de Malena. Seria a
noite das irmãs. Então, quando o menino adormeceu após um dia repleto de
atividades ao lado de sua tia, Malena e Regina desceram para a cozinha com a
intenção de prepararem algo de teor alcoólico para beberem.

— Hoje eu quero encher a cara!— disse Malena assim que ambas
entraram na cozinha. — O que você tem de bebida aqui?
— Tenho vinho, uísque e vodka.
— Nada de cerveja?
— Não. Não é uma bebida que eu tome com frequência. Se tivesse me
avisado que vinha, eu teria providenciado.
— Então... Que tal criarmos alguns drinks?— sugeriu ao caminhar para
frente da geladeira e abri-la. — Hum... Com o que você tem aqui dá pra
fazermos o sex on the beach. Gosta?
— Não sei, nunca transei na praia — brincou.
— Ai, que idiota!— disse ao revirar os olhos em meio ao riso.
— Eu gosto, sim. É um dos meus preferidos, aliás.— Vamos preparar?
— Agora!— respondeu Malena, empolgada, colhendo os ingredientes
da geladeira. O sex on the beach é feito a partir de uma dose de vodka, licor de
pêssego, suco de laranja, cranberry e bastante gelo.
Após despejarem os ingredientes na coqueteleira e sacudirem bem,
coaram e encheram dois copos escandinavos, enfeitando-os na borda com fatias
de laranja.
— Eu também sei fazer um drink maravilhoso à base de uísque e suco
de laranja. Vou fazer a garrafa inteira pra nós — comentou a ruiva.
— Vamos dar conta de beber tudo isso?
— Temos a noite inteira, Regina. Vamos aproveitar o feriado e
desestressar um pouquinho — respondeu enquanto ia começando a prepará-lo.
Enquanto Malena cuidava do preparativo para o segundo drink, Regina
usou o tempo para montar uma tábua de petiscos para elas. Ao final, recolheram
tudo e seguiram para a sala de estar. Apenas uma parte das bebidas foi levada, a
outra permaneceu na geladeira para que não perdesse o frescor. Regina fechou a
porta de modo a isolar os ruídos. Nem ela e nem Malena queriam que o barulho
ecoasse para o segundo andar e acordasse Henrique. Feito isso, ligaram o rádio e
deixaram uma lista de músicas tocando enquanto bebiam, comiam e
conversavam sobre assuntos aleatórios.
— Você lembra aquela vez em que esperei você dormir e coloquei
chiclete no seu cabelo?
— Como esquecer, Regina? Precisei cortar meu cabelo, pois aquilo não
desgrudou por nada!
— Desculpa, Ma — disse ao conter o riso.— Eu não conseguia entender
por que só você possuía aquele cabelo lindo e diferente, mesmo o papai
explicando sobre herança genética, etc. Coisa de criança.
— Tudo bem, eu já te perdoei. Aprontei muito com você depois disso!
Já está pago — disse aos risos, lembrando-se de todas as vezes em que colocou
Regina em maus lençóis.
— Lembro bem! Você era péssima comigo. Vivia me entregando para
os nossos pais — retrucou. — Lembra quando escondi uma carteira de cigarros
na minha gaveta e você achou?
— Como esquecer? Te fiz fazer minhas tarefas de casa por um mês se
por acaso quisesse meu silêncio.— Riu. — Meu Deus, eu era horrível!
— Pelo menos admite!
— Ai, para! Eu também fiz coisas maravilhosas por você. E todas as
vezes em que encobri seus encontros para o papai não saber? Pois você sabe o
ciúmes que ele tinha de nós. Nunca achava que alguém era bom o suficiente pra
nós e vetava todos os nossos parceiros.
— Verdade. Devo a você muitos beijos na boca que dei.
— De nada, Regina!— comentou ao bater palmas a si própria. O álcool
já estava fazendo efeito sobre seu corpo. — Será que vou precisar encobrir seu
caso com a loirinha dos olhos de esmeralda? Olha que pra algo assim meu cachê
vai ter que ser bem alto, hein?— brincou.
— Deixa de ser ridícula, Malena. E para de brincar com coisa séria!—
A morena revirou os olhos em um nítido gesto de desaprovação.
— Deixa de ser chata, Regina! Relaxa um pouco. Vem, vamos dançar.
— A ruiva aumentou o volume da música e puxou sua irmã para o centro da
sala. Ambas começaram a cantar e dançar conforme a canção.
— Eu tenho uma playlist muito boa no meu notebook. Vou buscá-lo e já
volto — comentou, segundos antes de ir até seu escritório buscar o aparelho. Ao
adentrar o cômodo, ligou o notebook e abriu a lista de músicas desejada. A
primeira música que começou a tocar foi Waiting Game - Banks. Regina a
deixou rolando enquanto procurava o cabo do aparelho para evitar que o mesmo
se desligasse futuramente. Enquanto vasculhava, encontrou a camisa xadrez de
Jennifer caída ao chão. Regina agachou-se, tomou a blusa em mãos e a levou até
o rosto. O cheiro de Meireles ainda habitava no tecido. Instantaneamente as
lembranças das trocas íntimas de carícias vividas com a loira naquela manhã se
fizeram presentes em sua mente, a fazendo soltar um longo e profundo suspiro.
— Anda logo, Regina!— gritou Malena, da sala.
— Estou indo!— Regina olhou novamente nas gavetas e encontrou o
cabo. Logo após, o conectou ao notebook e retornou para a sala. A morena
desligou o rádio e deixou que apenas as músicas do notebook fossem ouvidas.
Ela repetiu a música Waiting Game, aumentou o volume e começou a vestir a
blusa de Jennifer que trouxera do escritório. Regina a vestia lentamente,
apreciando o contato do tecido com sua pele. O atrito, seguido do perfume da
garota que ali residia, a estavam fazendo imaginá-la próxima a si. — Essa
camisa ainda tem o cheiro dela — disse ao aproximar-se de sua irmã.
— De quem?
— Jennifer — respondeu. Regina pegou o copo com o drink que estava
sobre a mesa de centro e começou a bebê-lo enquanto dançava aquela canção.
Ela aspirava o cheiro da roupa e desejava mais que nunca a presença da jovem
bem ali.
— I don’t wanna say your love is a waiting game — cantou. O
pensamento em Meireles se fazia cada vez mais forte conforme o álcool
começava a agir sobre seu corpo.
— Puta que pariu, Regina. Você realmente está gostando dessa garota
— comentou ao observá-la.
— Estou — admitiu. — Me dá isso aqui, pois agora quem quer se
embebedar sou eu — disse ao pegar o copo de Malena com o drink de uísque e
laranja. Regina começou a tomar as duas bebidas alternadamente.
— Não me diga que quer beber pra esquecê-la?— perguntou, incrédula,
pois esse nunca foi o feitio de sua irmã.
— Não — respondeu prontamente. — Quero beber justamente para
lembrá-la, pra senti-la mais junto a mim. O efeito do álcool é o mesmo causado
por Jennifer. Quero sentir ele queimando e aquecendo meu corpo da maneira que
ela faz. Quero perder a lucidez e ser dominada pelo insano desejo que apenas o
álcool e ela me despertam.
— Socorro. A coisa é pior do que eu pensava.
— Não. É melhor do que qualquer coisa que você possa imaginar —
respondeu com um malicioso sorriso nos lábios. O álcool já estava tomando
conta do seu organismo e proporcionando tudo o que ela buscava sentir. Regina
sentia-se elevada e sorria de maneira quase incessante.
Malena foi até a cozinha e voltou com o restante das bebidas. Ela
encheu os dois copos de sua irmã e serviu a si própria. Regina, por sua vez,
gargalhava e falava algumas coisas desconexas. O nome Jennifer Meireles não
saia de seus lábios. A morena sentia a pele arder enquanto a vontade de se afogar
na mais nova aumentava.
— Vou ligar pra Jennifer — disse de uma hora pra outra.
— Você está louca? Regina, já é madrugada. Provavelmente ela está
dormindo. Não acho que seja uma boa ideia.
— Eu quero ligar. Eu preciso dizer a ela. Já não dá pra esconder.
— Dizer o quê?
— Que eu quero devorá-la até que não possamos mais nos lembrar
quem somos. Eu quero e preciso romper todas as barreiras que nos impedem.
— Uou! Se eu não fosse sua irmã e heterossexual, desejaria ser essa
Jennifer nesse exato momento — brincou. — Bom, você pode dizer o que quiser
a ela. Mas não agora, e muito menos bêbada — aconselhou. — Ei, o que está
fazendo?
— Procurando meu celular — respondeu ao agachar-se em frente à
mesa de centro. — Aqui está.
— Regina, me dá isso!— exclamou enquanto tentava puxar o aparelho
da mão de sua irmã. Regina, por sua vez, gargalhava incessantemente. — Estou
começando a achar que quem tem dezoito anos nessa história é você, não ela!
— Deixa de ser chata! É apenas uma ligação — retrucou ao suspender o
celular e lamentar-se mentalmente por ser mais baixa que ela.
— Estou poupando você de ter uma overdose de arrependimentos
amanhã ao acordar. Agora me dá isso!
Regina selecionou o número de Jennifer na agenda, mas antes de discá-
lo teve o aparelho tomado de suas mãos.
— Que saco! Deixa que eu me responsabilize pelas consequências dos
meus atos. E eu não estou bêbada, apenas um pouco alterada.
— Claro que você está bêbada! De maneira alguma se comportaria
dessa forma se estivesse em sua consciência. Mas acho bom você se
responsabilizar mesmo, pois agora vou beber meus drinks e dançar. Não vou
ficar de guarda a noite inteira.— Malena guardou o celular de sua irmã dentro do
bolso da calça que usava e jogou-se na dança, sendo seguida por Regina, que
aproximou-se de seu corpo e acompanhou seus movimentos corporais; seguindo
sempre o ritmo das batidas das canções.
Malena começou a ficar alta, elevada. Ela e a irmã já estavam há horas
bebendo e dançando quase sem interrupção. A ruiva tirou o celular de Regina do
bolso e pediu que a morena o desbloqueasse. Feito isso, abriu a câmera frontal e
tirou algumas sequências de fotos com ela. As duas mulheres cantavam,
gargalhavam e se fotografavam divertidamente. Nesse momento o álcool já as
dominava quase por inteiras.
— Vou enviar uma foto nua pro meu marido.
— Não com o meu celular!— disse ao puxar o aparelho das mãos de
sua irmã.
— Me deixa usar o seu, não sei onde enfiei o meu.
— Se vira. Vai ver se está lá em cima. Meu celular não será cúmplice
disso.
— Ai, ok!— retrucou. Malena, com muito esforço, subiu as escadas e se
dirigiu para o quarto.
Regina, enquanto a esperava, olhava na galeria as fotos tiradas há
pouco. Sua visão estava um pouco turva por conta da bebida e pela ausência de
óculos. Mas apesar das circunstâncias, conseguiu dar boas risadas do pouco que
conseguiu enxergar.
Um longo tempo se passou, até que a morena perguntou-se
internamente se Malena estava fazendo um book completo para o marido, foi
então que decidiu subir até o quarto para chamá-la. Chegando lá, deparou-se
com a ruiva completamente apagada sobre a cama.
— Oh sério, Malena?— resmungou baixinho para si mesma ao mesmo
tempo em que a olhava dormir. Regina retirou-se do quarto, fechou a porta e
retornou para a sala de estar. No caminho, devido a falta de equilíbrio, entornou
sobre si metade do líquido que estava no copo que carregava. — Oh, droga!—
reclamou. Ela havia manchado a barra da camisa e um pedaço da calça. Por
sorte, a blusa xadrez de Jennifer estava desabotoada em seu corpo e escapou
ilesa.
Regina desceu as escadas em meio a resmungos. Ao chegar ao piso de
baixo, caminhou até a cozinha e preencheu seu copo com um novo líquido. Ao
retornar para a sala diminuiu o volume do notebook, mas permaneceu dançando.
Dessa vez, sozinha. Poucos minutos se passaram e logo sentiu-se incomodada
com a roupa úmida. Visto isso, resolveu tirá-la e se manter apenas de calcinha,
sutiã e a blusa de Meireles, que fez questão de voltar a vestir em seu corpo.
Com seus sentidos completamente alterados e exausta de dançar, jogou-
se de maneira pesada contra o sofá. Seu corpo estava quente e sua cabeça girava
suavemente. Enquanto deixava seu corpo relaxar contra a maciez do estofado,
esticou a perna até alcançar o celular sobre a mesa de centro e o puxou para si.
Ao desbloquear a tela pensou em Jennifer. Regina ficou tentada em ligar para
ela. A vontade de ouvir a doce voz da loira ecoando em seus ouvidos era imensa.
Contudo, decidiu apenas lhe enviar uma mensagem de texto.

Oi.

Regina enviou a mensagem, fechou o visor do celular, apoiou o
aparelho sobre a barriga desnuda e fechou os olhos, deixando a música do
ambiente se infiltrar em sua mente e disputar espaço com Jennifer. Quando a
morena já estava distraída e quase cochilando, despertou com o vibrar do
aparelho. Meireles havia lhe respondido.

Regina? Que surpresa.

O relógio no visor do celular indicava que já se passava das duas horas
da manhã. A mais velha se perguntou internamente o que sua aluna estaria
fazendo ainda acordada.

Surpresa boa, eu espero.

Digitou em resposta, não muito certa se suas palavras estavam
corretamente digitadas, visto que sua visão permanecia turva.

Se tratando de você, ótima.

Jennifer respondeu. Regina sorriu com a resposta e, forçando a visão,
digitou outra mensagem para ela.

Nesse momento estou com algo que te pertence bem aqui comigo.

Que me pertence? O quê?

Algo que tirei do seu corpo hoje.

A minha alma? Brincadeira! Acreditaria se eu dissesse que só me dei
conta da ausência da blusa agora porque você comentou? Aliás, o que você faz
com ela a essa hora?

Estou com ela vestida na tentativa de te sentir mais perto.

Regina, é você mesmo?

Sim. Quem mais seria?

Não sei. Você me parece... Diferente.

Diferente como, Meireles?

Você nunca me envia mensagem. Raramente responde as que eu mando.
Muito menos em um horário como esse. E... Bom, esse ‘te sentir mais perto’
também me surpreendeu.

Eu posso te provar que sou eu. Quer?

Quero. Como?

Eu tenho duas maneiras perigosas de te provar. O primeiro caminho seria
ligando pra você. O segundo seria te enviando uma foto minha de agora. Qual
deles você escolhe?

Não posso escolher os dois?

Não se pode tomar dois caminhos ao mesmo tempo. Então, não.

A resposta da loira demorou alguns minutos para chegar, fazendo Regina
esboçar um malicioso sorriso de lado ao imaginar a imagem de Meireles indecisa
sobre qual caminho tomar.

Eu quero a foto.

O sorriso sacana que habitava os lábios de Regina tomou uma
proporção ainda maior após a resposta da loira. Ela levantou-se do sofá, sentou-
se sobre ele e arrumou a camisa de Jennifer em seu corpo. A morena fechou
alguns botões de modo a cobrir parcialmente o branco sutiã que usava. Feito
isso, voltou a deitar-se sobre o estofado.
Regina ligou a câmera frontal de seu celular e tirou uma foto que
alcançou a parte de cima de seu corpo, apenas. Nela era possível enxergar sua
peça íntima entre uma das casas desabotoadas da blusa. Seu cabelo estava
sutilmente bagunçado e seu rosto livre de qualquer maquiagem. Devido a turva
visão causada pelo álcool, não conseguiu ver a foto com clareza, mas a enviou
mesmo assim. A resposta de Meireles, mais uma vez, demorou a chegar. No
entanto, quando veio, a fez morder o lábio inferior ao lê-la.

Você conseguiu ficar ainda mais irresistível ao natural. Usar essa blusa
nunca mais será a mesma coisa após saber que boa parte da sua pele esteve em
contato com ela. O que eu preciso fazer pra que você abra todos esses botões pra
mim?

Precisa ser uma garota obediente

E se eu não obedecer você?

Terei que te castigar deliciosamente.

Sente vontade de me castigar, Regina Vianna?

Sinto vontade de muitas coisas com você, Jennifer Meireles.

Eu sei que suas intenções são más. E eu quero cada uma delas sobre
mim.

Regina sentiu seu corpo aquecer como se estivesse em estado febril.
Jennifer lhe despertava um desejo inexplicável. A jovem era capaz de responder
todas as suas provocações à altura, fazendo com que seu interesse por ela
aumentasse cada vez mais. Jennifer Meireles sabia ser a garota dos seus olhos e
a mulher dos seus desejos.

Eu tenho boas e más intenções. Mas confesso que as más são muito mais
interessantes. Em outro momento eu deixo você conhecê-las. Agora eu acho
melhor nós irmos dormir. Não estou cem por cento sóbria, e quando se trata de
você eu gosto de estar, para ser responsável e pra poder aproveitar
integralmente o tempo ao seu lado e cada palavra que você dirige a mim. Não
gosto de esquecer os detalhes, pois são eles que mais aprecio.
Boa noite, menina de ouro.

Acho que após essa sua mensagem você conseguiu um lugar na minha
agenda no domingo. Estarei esperando ansiosamente pra encher nosso dia com
esses detalhes.
Boa noite, Regina.


Ponto de Vista de Regina

Abri meus olhos com dificuldade. Senti minha cabeça rodar ao mesmo
tempo em que meu estômago não me enviava um bom sinal. Não lembro como
vim parar no meu quarto e muito menos o que aconteceu com minhas roupas.
Eu estava nua sobre a cama com as lembranças da última coisa da qual me
recordo: ter dialogado com Jennifer.
Uma forte tempestade caía lá fora, a temperatura estava baixa. Dei-me
conta quando senti a pele do braço arrepiando. Enrolei-me no lençol com a
intenção de me aquecer e busquei meu celular com urgência. Eu precisava
tomar ciência do que havia conversado com aquela garota.
Ao abrir as mensagens, o espanto. Perguntei-me internamente onde eu
estava com a cabeça quando a procurei às duas da madrugada completamente
alcoolizada. Quanto mais eu rolava a conversa, mais surpresa eu ficava. Quer
dizer, nem tão surpresa assim. Não disse mentira alguma para Jennifer, eu
apenas não deveria ter dito aquelas coisas na ocasião em questão.
Após ler toda a nossa conversa, abri a galeria de imagem e deparei-me
com a foto enviada para ela. Por Deus, Regina! Qual era a localidade do seu
juízo quando você a tirou? Essa pergunta pairava sobre mim. Contudo, o que
me restava era rir da situação e me desculpar com Meireles quando domingo
chegasse.
— Quando domingo chegasse — repeti a mim mesma. Confesso que
estou ansiosa para ver Jennifer. Para- literalmente- vê-la. Meireles é tão doce
de olhar e tão leve de escutar. Eu me sinto encantada por todas as nossas
diferenças. Não as de gosto, pois somos bastante similares nesse quesito. Mas,
nas físicas e nas de personalidade. Eu sou um vulcão na calmaria de Meireles.
Eu queimo como o fogo, Jennifer é brisa fresca. Eu sou uma melodia espanhola,
Jennifer é o gargalhar de crianças brincando no parque em um lindo domingo
ensolarado. Eu não conheço o meio-termo, mas Jennifer sabe ser equilíbrio. Eu
vou de um extremo a outro enquanto a vejo ser menina e mulher. Eu sou os
olhos que tudo observa. Ela é o sorriso que a tudo encanta. Eu sou a mão que
preenche as linhas de um papel em branco, enquanto ela é a poesia que nele
está sendo escrita. Eu sou o inteiro e Jennifer Meireles me transborda.


Capítulo 13

Ao amanhecer, Jennifer acordou e abriu lentamente os olhos enquanto
lembranças da madrugada passada começaram a se fazer presentes. Há algum
tempo Regina havia se tornado o primeiro e o último pensamento de seu dia. A
loira olhou para o lado e avistou seu celular sobre a cama. Ao pegá-lo, a primeira
coisa que fez foi procurar a fotografia que a morena lhe enviara. Jennifer queria
ter certeza que não havia sido um sonho.
Sorrir foi inevitável para Meireles. Regina estava bem ali,
completamente à vontade em uma fotografia tirada exclusivamente para ela.
Jennifer perdeu longos minutos na cama observando aquela imagem que mais
parecia uma obra de arte do museu do Louvre. Tocou a tela do celular e traçou
Regina com a ponta do dedo ao mesmo tempo em que sentia seu coração
aquecendo e se desmanchando. A jovem estava, inevitavelmente, se
apaixonando por Regina.
Após longos minutos contemplado a imagem da professora, levantou-se
com o celular na mão e se dirigiu para a cozinha à procura de algo para seu café
da manhã. Chegando lá, colocou uma lista de música do seu celular para tocar e
apoiou o aparelho sobre a mesa da cozinha.
— Bom dia, Jennifer!— disse Morgana ao entrar.
— Bom dia, mãe. Já tomou café da manhã?
— Já. Você sabe que horas são? Está quase na hora do almoço.
— É... Hoje acordei bem tarde.
— Aposto que ficou acordada até tarde na noite passada.
— Só um pouco — respondeu, direcionando-se para a mesa com os
ingredientes para seu café da manhã.
— Me empresta seu celular?— disse ao pegar o aparelho da filha que
estava sobre a mesa. — Preciso ligar pra Diogo, mas não encontro o meu.
A loira assentiu positivamente com a cabeça e prosseguiu com seu café
da manhã. Contudo, no momento em que foi levar o copo de leite à boca,
lembrou-se da foto de sua professora. O que sua mãe diria se visse a fotografia
de uma mulher com a camisa parcialmente fechada em seu celular? Partes do
sutiã branco que Regina usava estavam evidentes na imagem. Ao lembrar-se,
Jennifer começou a ficar tensa. Permaneceu em alerta, observando cada
movimento de sua mãe em seu aparelho. No momento Morgana o tinha no
ouvido, aguardando Diogo atender sua chamada.
— Ele não atende. Vou tentar novamente mais tarde — disse ela. —
Posso levar seu celular comigo lá pra cima?
— Não!— exclamou sem pensar. — Quer dizer, não, pois estou
esperando uma chamada da Beatriz.— Meireles levantou-se da mesa com a
xícara na mão e aproximou-se de sua mãe. — Tenta novamente — disse ao
rondar sua mãe e o celular.
— Vou tentar mais uma vez.— Morgana discou o número novamente,
mas não obteve sucesso. — Acho que vou enviar uma mensagem de texto e
pedir pra ele me retornar assim que puder — disse ela ao abrir a área de sms.
Meireles arregalou os olhos ao lembrar-se das mensagens trocadas com
Regina.
— Deixa que eu digito pra você!— comentou ao tomar o celular das
mãos de sua mãe às pressas.
— Jennifer, eu tenho dedos para digitar. Termina de tomar seu café da
manhã — disse, tornando a pegar o aparelho das mãos de sua filha. — Por acaso
tem algo nesse celular que não posso ver?
— Não, mãe. É que você fica uma eternidade pra digitar. Eu apenas
queria facilitar pra você — disse disfarçando, enquanto sentia o nervosismo
crescer em seu interior.
— Obrigada, mas não precisa.— Assim que Morgana abriu a opção de
mensagens, o aparelho de Meireles começou a tocar. Era Diogo retornando a
ligação. De seu lugar, Jennifer respirou aliviada.
— Tudo resolvido?— perguntou a loira assim que sua mãe encerrou a
ligação.
— Sim. Diogo te mandou um beijo.
— Ah, manda outro pra ele quando se falarem novamente.— Sorriu. —
Ainda vai usar?— perguntou ao apontar pro celular.
— Não, filha. Obrigada — respondeu ao entregá-lo na mão da jovem.
— Isso está muito estranho...— comentou ao semicerrar os olhos.
— O quê está estranho?
— Essa sua agonia para pegar o celular de volta.
— Agonia nenhuma! Apenas não quero perder a ligação da Beatriz. A
propósito... Vou passar o dia com ela amanhã, tudo bem?— disse ela, mentindo.
A loira detestava ter que mentir para Morgana, mas não via outra opção no
momento. Afinal, sua mãe enfartaria se soubesse com quem ela realmente iria
estar.
— Claro, Jen. Diga a ela que enviei lembranças e que espero seu
retorno. Quero fazer um daqueles bolos que ela adora — disse suavemente com
um pequeno sorriso nos lábios.
— Passarei o recado — respondeu sem jeito, sentindo o nervosismo
tomando conta de si. Meireles sentia como se estivesse escrito em sua testa a sua
mentira. Ela odiava essa sensação de estar enganando alguém.
Assim que Morgana deixou a cozinha, Jennifer digitou uma mensagem
para sua amiga deixando tudo combinado. Ela avisou que sairia com Regina no
dia seguinte e que Beatriz precisava, por favor, confirmar que estariam juntas. A
amiga da loira quase enfartou quando soube que sua amiga iria sair com a
professora Vianna. Beatriz alertou Meireles lembrando-a que ela e Regina
estavam embarcando em algo perigoso, e pediu que sua amiga tomasse cuidado.
Porém, por fim, desejou que ela se divertisse e tivesse um lindo domingo.


— Você o quê?— exclamou Malena ao arregalar os olhos. Ela e Regina
conversavam na cozinha enquanto tomavam um café da manhã juntas. Henrique,
por sua vez, havia pegado uma tigela de cereal com leite e ido comê-la em frente
à televisão enquanto assistia a um de seus desenhos favoritos.
— Mandei mensagem e foto para Jennifer. Quantas vezes vou precisar
repetir, Ma?
— Quantas vezes for preciso até eu acreditar — respondeu a ruiva. —
Regina, o que deu em você? Me deixa ver a tal foto?
Regina desbloqueou a tela do celular e abriu a imagem na galeria.
— Foi esta — disse ao virar a tela para sua irmã.
— Tanto alvoroço por conta disso? Pensei que tivesse sido uma foto
nua. Fala sério, Regina, se é pra fazer besteira tem que ser bem feito — disse a
ruiva enquanto tentava conter um riso.— Se você tivesse aberto mais alguns
botões, a imagem ficaria bem mais interessante. Aposto que Jennifer concorda.
— Ela me pediu exatamente isso; pra que eu abrisse todos os botões pra
ela — disse a morena, ainda sem jeito pelo o que fez.
— Está vendo só? Essa garota é das minhas. Já que você bebeu e foi
fazer besteira, deveria ter feito direito. Por que não enviou uma foto sem
calcinha e sem sutiã, apenas com essa blusa por cima? Ficaria extremamente
provocante. Não que essa foto não esteja, claro.
— Por Deus, Malena! Você é completamente louca! Uma hora você me
aconselha e não me deixa tocar no celular de modo a me impedir de fazer
besteira. Outra hora está aqui perguntando por que não mandei foto nua?
— Regina, entenda bem... O correto seria você nunca ter se relacionado
com essa garota, pois eu tenho certeza que isso ainda renderá problemas. Mas já
que aconteceu, então faça as coisas direito. Se era pra mandar foto, então que
mandasse logo a que você queria mandar e a que ela estava louca pra ver. É o
que eu penso.
— E quem disse que eu queria mandar foto nua, Malena?— questionou-
a incrédula com tudo o que sua irmã estava lhe jogando na cara. — Você sabe
que eu não sou de fazer essas coisas. Prefiro agir e lidar pessoalmente com as
minhas questões. Eu realmente não sei no que estava pensando quando a enviei.
— Pode culpar a bebida, eu deixo — disse em tom provocativo, rindo,
entre um gole e outro de café. — Você havia comentado algo comigo sobre
encontrá-la amanhã. Como assim?— questionou.
— Eu a convidei pra passar o domingo comigo. Ou parte dele, pelo
menos. Precisamos desse tempo a sós pra conversarmos sobre nós.
— Vocês realmente precisam esclarecer e definir o que estão vivendo.
Só tomem cuidado, tudo bem? Há muita coisa envolvida.
— Sim, eu sei...— disse a morena segundos antes de soltar um longo
suspiro. — Obrigada por ter sido meus ouvidos esses dias.— Regina apoiou
delicadamente a cabeça sobre o ombro de Malena.
— Não precisa agradecer. Eu amo você, coisinha chata.
O sábado de Regina foi inteiramente preenchido por atividades feitas
com Malena e Henrique. Na parte da manhã os três jogaram um pouco de
basquete na área externa da casa após um pedido do menino. Há alguns meses
Regina havia montado a cesta no jardim para que Henrique pudesse se divertir
sempre que viesse visitá-la. A parte da tarde foi preenchida por alguns filmes e
bastante pipoca. E quando a noite caiu, Regina isolou-se no escritório para
adiantar parte de seu trabalho. Ela possuía pilhas e mais pilhas de provas e
trabalhos a serem corrigidos.


Era domingo de manhã. Malena e Henrique despediram-se da morena
bem cedo e retornaram para casa. Eles queriam aproveitar todo o domingo
comemorando o aniversário do marido de Malena, pai de Henrique. Tendo em
vista que ainda era muito cedo, Regina despediu-se dos dois e voltou a dormir,
acordando apenas quando seu despertador tocou. Era exatamente nove e vinte
cinco da manhã. Regina e Jennifer haviam combinado de se encontrarem às onze
horas em um ponto conhecido por ambas.
Regina tomou um leve café da manhã, cuidou de Bóris e direcionou-se
para o banheiro. Após um banho morno vestiu-se com um casual vestido azul
marinho. A peça era completamente justa na região do busto e cintura, e
sutilmente frouxa na região da saia. Em seus pés calçou uma sandália de salto de
coloração preta, em seu rosto optou usar maquiagem leve; porém, sem abrir mão
do marcante batom vermelho.
Antes de sair de casa, conferiu se estava tudo certo, recolheu a chave do
carro, uma jaqueta jeans se porventura o tempo resolvesse esfriar, e seu óculos
de sol. Visto que não faltava nada mais, despediu-se de Bóris com um carinhoso
afago e saiu.
A morena dirigiu todo o percurso sentindo um gostoso frio na barriga.
Ela contava os instantes para que seus olhos pudessem mirar Jennifer Meireles.
Ao mesmo tempo em que contava o tempo, sentia um pequeno nervosismo
preenchendo seu interior. Regina sentia-se como uma adolescente no primeiro
encontro.
Ao chegar ao ponto de encontro combinado com a jovem, Regina
passeou o olhar por todo o lugar à procura dela. No momento em que seus olhos
avistaram Jennifer caminhando graciosamente pela rua, seus lábios se curvaram
em um grandioso sorriso. Meireles usava um casual vestido cinza, sutilmente
folgado, e uma jaqueta jeans com todos os botões abertos. Nos seus pés havia
um tênis all star de coloração vermelha que dava um ar completamente
despojado para sua roupa. Jennifer usava óculos escuros e seu cabelo estava
preso em um alto rabo de cavalo.
Regina estacionou seu automóvel no meio fio e caminhou de encontro à
jovem. Jennifer, ao vê-la, esboçou um gracioso sorriso. Contudo, não foram
apenas os lábios de Jennifer que sorriram; seus olhos também. Eles ficaram bem
pequenos em contraste com seu grande e brilhante sorriso.
— Bom dia...— disse Regina ao aproximar-se e depositar um beijo no
rosto de Jennifer.
— Bom dia, Regina. Você está... Linda.— Sorriu.
— Obrigada. Tomei a liberdade de decidir qual será nosso passeio,
espero que não se importe. Mas se preferir, podemos escolher algo juntas —
comentou ela enquanto caminhavam em direção ao carro.
— Tenho certeza que irei gostar da sua escolha. Pra onde iremos?—
perguntou empolgada.
— Quero te levar em um evento cultural que está ocorrendo um pouco
longe daqui. Levaremos aproximadamente uma hora pra chegar. Mas, pelo que
pesquisei, vale muito à pena. É sobre a Europa. Reúne música, gastronomia,
dentre outras coisas. Você gostaria de ir? Pensei que dessa forma eu pudesse
trazer um pouco de lá até você.
— Nossa, Regina, eu adorei a idéia! Tenho certeza que irei me encantar
por tudo o que tiver lá — disse com um sorriso no rosto.
— Espero que sim — comentou a morena, sorrindo.
Ao entrarem no carro, Regina ligou o rádio e deixou uma música
ambiente tocando ao fundo em volume baixo. A morena certificou-se de fechar
portas e janelas, e em seguida direcionou sua atenção para Jennifer.
— É bom ver você.
Jennifer esboçou um pequeno sorriso tímido após ouvir o que sua
professora dissera.
— E é maravilhoso ver você, Regina — respondeu, ao mesmo em que
tirou os óculos escuros para que pudesse enxergá-la em suas cores reais.
— Estou louca pra fazer algo — disse a mais velha.
— O quê?
Regina aproximou seu rosto ao de Jennifer e roçou seus lábios contra os
da jovem segundos antes de pressioná-los aos dela em um doce beijo.
— Isso..— murmurou, mantendo sua boca próxima à da loira.
— Saudade do seu beijo — murmurou Jennifer em resposta enquanto
sentia o hálito quente da professora.
— Então vem...— sussurrou ao deslizar o lábio inferior por entre os
lábios de Jennifer, instigando-a. — Me beija...
Meireles inclinou-se sobre Regina e tomou os lábios oferecidos da
mulher com voracidade; iniciando com ela um beijo quente, intenso, carregado
de desejos e saudades. Os beijos de Jennifer e Regina quase sempre iniciavam
assim. Elas possuíam uma enorme vontade de se provarem com urgência.
Jennifer alternava entre beijar os lábios e o pescoço de Regina,
passeando sua boca quente e úmida por toda a curva do pescoço da mulher.
— Saudade do seu cheiro — murmurou ao aspirar a região por trás da
orelha de Regina, próxima ao lóbulo. — Saudade da sua pele — disse ao deslizar
a lateral do rosto contra a lateral do rosto da morena. — Saudade do seu gosto —
disse, segundos antes de traçar um caminho com a língua pelo pescoço de
Regina até encontrar a boca da mulher e voltar a beijá-la.
— Saudade de senti-la tão perto — disse em resposta ao depositar a
mão sobre a coxa de Jennifer e apertá-la de maneira maliciosa por cima do
vestido.
— Por que você faz assim, Regina?— disse entre o beijo ao sentir a
mão da mulher apertando sua coxa.
— Porque eu quero e porque eu sei que você gosta — respondeu, no
mesmo instante em que apertou a coxa de Jennifer com mais força, fazendo a
loira desejar sua mão macia e quente incendiando dentro do seu vestido.
— Quem disse que eu gosto?— provocou.
— Seu corpo inteiro diz.
— Você pode estar fazendo uma leitura completamente errada — disse
a mais nova enquanto se afastava e ajeitava-se em seu banco.
— Veremos...— Respondeu ao dar partida no carro e tirá-las de lá.
Jennifer e Regina passaram todo o caminho conversando sobre assuntos
distintos ao mesmo tempo em que, vez ou outra, cantavam juntas algumas
músicas que tocavam na rádio. Elas conversaram sobre a escola, sobre seus
gostos gastronômicos e musicais, sobre seus familiares e sobre os planos que
têm para a vida. O papo entre elas fluía na mais perfeita harmonia. Ambas
possuíam uma sintonia invejável.
— Que vista incrível!— exclamou assim que Regina abriu as janelas e
elas passaram pela orla da praia. — Eu adoro o mar.
— Eu também gosto muito. Quando estou em contato com ele me sinto
pertencente a toda essa imensidão que é o universo.
— Eu me sinto diferente. Quando estou em contato com o movimento
das águas, sinto que sou capaz de enfrentar qualquer coisa. É como se a força do
mar fosse transmitida pra mim e se tornasse a minha força. É difícil de explicar.
Me sinto conectada.
— Acho que compreendo o que você quer dizer. Mar é energia, assim
como o céu — comentou Regina. — Podemos fazer uma parada na praia quando
voltarmos, o que você acha?
— Eu adoraria.— Jennifer respondeu. — Eu gosto muito de admirar a
linha do horizonte. É o único momento em que o céu e o mar visualmente se
encontram.
— É o encontro de duas imensidões distintas — comentou Regina
— Sim. Não é maravilhoso?— disse a jovem.
— É lindo demais. Traz um forte sentimento de amplidão. Eu gosto do
mar à noite. Gosto de ver a luz da lua refletindo sobre ele. É como se ela o
acalentasse.
— Verdade. É como se o céu sempre encontrasse uma forma de estar
com o mar. Mesmo de longe, mesmo parecendo impossível, mesmo com todas
as suas diferenças — comentou Meireles ao olhar para Regina com
contemplação.
— Exatamente isso.
Após mais algum tempo de conversa admirando a paisagem no
caminho, as duas mulheres finalmente chegaram ao lugar de destino. Regina
estacionou o carro e ambas seguiram caminhando para o local onde acontecia o
evento cultural. Era um extenso espaço a céu aberto que dispunha de inúmeras
atrações e uma vasta variedade de barracas gastronômicas. Havia, também,
pequenos palcos com música ao vivo, apresentações de danças de diversos
países da Europa e oficinas de artes plásticas. Tudo era voltado para o continente
Europeu e a particularidade cultural de cada país.
Meireles passeava o olhar à sua volta na tentativa de absorver o maior
número de informação possível. Ela possuía um intenso brilho no olhar. Regina,
por sua vez, olhava para Jennifer com encantamento, achando graciosa toda a
empolgação da jovem com o lugar.
— Regina, olha!— disse ao tocar a mão da professora e puxá-la
sutilmente para perto de uma espécie de tenda onde vendia algumas miniaturas
de objetos decorativos. — Olha que cofre lindo!— comentou ao tomar em mãos
um cofre que simulava uma cabine telefônica em Londres.
Regina, junto a Jennifer, olhou um por um dos objetos à venda. A
professora adorava esses itens decorativos. Sempre que viajava para fora trazia
algo de suas viagens como recordação.
— Escolhe algo pra você — ofereceu Regina ao sorrir.
— Ah não...
— Por que não? Quero te dar de presente.
— Obrigada.— Sorriu. — Mas não precisa se importar, eu mesma pago.
— disse suavemente para não soar indelicada. Ela não queria ver Regina se
incomodando ou gastando com ela.
— Deixa de bobeira, quero que você tenha algo pra lembrar-se do dia
de hoje. Escolhe, por favor? Hum?— pediu suavemente.
— Ok, você venceu. Então quero este... — disse ao apontar para uma
miniatura da torre de Pisa.
— Um desse, por favor — pediu Regina, educadamente, à vendedora.
— Aqui está — disse ao entregar a sacola com o presente para Jennifer.
— Obrigada, Regina. Vou deixar enfeitando minha mesa de estudos. —
Sorriu; aquele sorriso travesso que desmanchava a mais velha. — Você já
passeou naqueles canais de Veneza?
— Já. Uma vez só, se não me engano.— Respondeu. Ela e Jennifer
caminhavam a passos lentos observando o lugar.
— Dizem que só é bonito e romântico por foto e vídeo, mas que
pessoalmente tem um cheiro muito desagradável.
— Também ouço dizerem isso. Mas na vez em que fui não havia odor
algum. Eu gostei muito. E realmente é muito romântico.
— Você foi acompanhada?— perguntou ao sentir uma pontada de
ciúmes com a possível resposta.
— Sim, minha mãe estava junto. Por quê?— perguntou enquanto
observava as expressões faciais que a loira esboçava.
— Curiosidade...
As duas mulheres caminharam conferindo cada uma das tendas que
exibiam maravilhosos objetos decorativos. Havia, inclusive, alguns itens
artesanais. Após olharem boa parte dos enfeites, decidiram se aproximar de um
local onde estava acontecendo apresentações de danças típicas. Regina e Jennifer
tomaram um lugar em uma espécie de quiosque de culinária italiana que dava
total visão para as apresentações. Dessa forma, podiam apreciar a comida local
enquanto observavam os dançarinos.
Regina pediu um calzone integral de frango com palmito e Jennifer
decidiu por uma fatia de pizza margherita. Ambas as mulheres beberam
Chinotto, um refrigerante agridoce típico da Itália. Regina é uma grande
apreciadora da culinária italiana e conhece uma vasta variedade de pratos.
Jennifer, por sua vez, provava o Chinotto pela primeira vez.
— Gostou?— perguntou Regina.
— É diferente — respondeu ao provar.
— Eu sei cozinhar uma gama de pratos italianos. Aprendi com minha
mãe.
— Adoro essa sua diversidade cultural.
— E sei preparar algumas bebidas também. Adoraria cozinhar algo pra
nós em algum momento — disse ao depositar sua mão suavemente sobre a de
Jennifer. Ambas estavam sentadas lado a lado.
— Nós?— frisou. Ela expressava um pequeno sorriso enquanto sentia o
toque macio da professora em sua mão. Regina havia iniciado uma brincadeira
com a fina pulseira de tecido cor azul que havia em seu pulso.
— Sim. Eu queria tanto que você e eu se tornasse nós... — respondeu
enquanto permanecia mexendo delicadamente na pulseira. Regina alternava o
olhar entre o acessório e os olhos de Meireles.
Jennifer sentia o coração batendo descompassadamente dentro de seu
peito. Suas mãos estavam frias. Aquelas palavras de Regina lhe trouxera um
grande nervosismo.
— Eu adoraria que isso acontecesse — comentou enquanto sentia o
forte e intenso olhar da mulher lhe penetrando todas as camadas do ser. — Como
faço pra te ter mais?
— Eu ainda não sei como faremos pra nos ter. Há tantos empecilhos...
— Suspirou. — Mas não dá pra negar isso que está acontecendo. Ainda não
encontro uma denominação, mas é intenso demais.
— Você também sente a dimensão da intensidade?— perguntou
Jennifer. — Sente isso?— disse ela ao deslizar a ponta do dedo sobre a pele do
braço de Regina, observando a morena arrepiar-se instantaneamente.
— Sinto. É deliciosamente enlouquecedor. Sexta-feira eu senti em um
grau mais elevado e perdi o controle. Me desculpe se eu avancei demais.
— Não há motivos pra pedir desculpas, Regina. O descontrole ocorreu
de ambas as partes. Eu preciso comentar que adorei quando você conteve seus
desejos para se certificar se eu já havia feito antes.
— Era o mínimo que eu poderia fazer, Jennifer — disse com suavidade
na voz. — Jamais tentaria algo sem me certificar antes. Principalmente me
conhecendo como conheço. Sei que sou meio voraz nesse quesito. Eu assustaria
você.
— Eu adoro essa sua intensidade. Gosto da maneira como deseja as
coisas com vontade. Você realmente sente e vive. Nunca estive com alguém
assim.— A mais nova comentou. — Não é como se eu já tivesse estado com
muitas pessoas, claro. Até porque eu só tive um namoro sério e me relacionei
sexualmente apenas com essa pessoa — explicou-se.
— Eu realmente sou muito intensa. E você eleva meu lado sexual ao
extremo, devo admitir. Eu gosto muito de você, Jennifer. Eu te gosto com calma
e leveza. Mas quando te desejo é com desespero e urgência.
— Está me desejando agora?— perguntou ao depositar a mão sobre a
coxa de Regina e acariciá-la.
— Eu sempre estou desejando você.— respondeu, fazendo-a excitar-se
com sua resposta direta. — Agora vamos terminar nossa comida antes que
esfrie?
— Vamos — concordou enquanto tentava conter um sorriso que
teimava em formar-se em seus lábios. A loira suspirava na companhia de
Regina. Ela achava incrível a maneira como tudo fluía bem quando estava com
ela. Os diálogos subiam e desciam a temperatura a todo tempo.
— O que você está fazendo?— questionou ao observar Regina mexer
em alguns sachês de molhos ali dispostos.
— Arrumando-os! Eles já estavam me incomodando desde o momento
em que sentamos aqui — disse ela enquanto terminava de enfileirá-los.
— Você tem um sério problema com coisas fora do lugar, não é?—
comentou a loira ao mesmo tempo em que começou a arrumar os sachês no porta
sachê junto com Regina.
— Sim, infelizmente. Já se tornou uma obsessão. Eu não posso ver nada
fora do lugar ou coisas desalinhadas, pois me tiram do sério. Gosto de tudo em
ordem, sincronia e alinhamento. Quando Henrique vai me visitar eu fico louca,
pois ele muda meus objetos decorativos de posição para brincar. Então sempre
que eu vejo, eu passo voltando tudo pra posição correta. É uma loucura.— Riu.
— Deve ser mentalmente cansativo.
— Às vezes, sim. Mas hoje em dia eu me controlo bem. Antes eu não
podia avistar nada que me desagradasse aos olhos, que já corria pra arrumar.
— Eu também tenho algumas manias excessivas. Eu conto passos, por
exemplo.
— Como assim você conta passos?— perguntou curiosa.
Jennifer riu e começou a se explicar.
— Então, é bem louco, eu costumo contar meus passos de um lugar a
outro. Eu conto, por exemplo, os passos que dou de casa até o supermercado.
Mas não faço isso sempre. Eu só faço quando estou sozinha e não tenho nada pra
me distrair até chegar ao local de destino.
— Você os conta em voz alta?
— Não, mentalmente. Na verdade eu tenho mania de contar coisas.
Sempre que existe muitos do mesmo, eu conto. Conto as portas de um móvel,
gavetas, quantidade de escovas em um pote. Enfim, tudo o que tiver em
quantidade e for da mesma espécie.
— Que diferente. Acho que somos bem estranhas, Jennifer — disse,
compartilhando uma gostosa risada com ela.
— Como diz o ditado: de médico e louco todo mundo tem um pouco.
— É verdade. E eu gosto disso, adoro as particularidades de alguém.
— Eu também. Principalmente se forem as suas.— Sorriu.
A conversa das duas mulheres foi invadida por um alto som de
aplausos. O grupo de dança havia acabado de encerrar uma apresentação de
dança espanhola. Agora, um novo grupo estava prestes a se apresentar.
— Vamos olhar outras coisas?— sugeriu Jennifer. Regina assentiu e
ambas as mulheres deixaram o local.
Enquanto caminhavam juntas, lado a lado, observando todo o lugar,
uma forte vontade de segurar a mão de Regina se fez presente em Jennifer.
Porém, ao mesmo tempo em que desejava tocar a mão da professora, ela tinha
receios. Meireles não sabia qual seria a reação da morena ao estar em um contato
mais íntimo em público. Talvez ela não quisesse ser vista assim, pensou
Jennifer. Foi então que a jovem segurou sua vontade e desistiu.
As duas passaram por alguns palcos de música ao vivo. Em cada um
deles havia um cantor ou banda tocando um estilo de música diferente.
Decidiram continuar caminhando até que encontraram um espaço mais
reservado e menos povoado. Havia uma lona que recobria um pequeno e baixo
palco. Nele havia um homem se apresentando com uma pequena banda musical.
Ele estava sentado em um banco simples, e à sua frente havia um teclado e um
tripé com microfone.
— O que ele disse?— perguntou Jennifer, referindo-se à fala do homem
sentado ao teclado.
— Não sei — respondeu Regina. — Não consigo compreender italiano.
Mas acredito que ele esteja falando sobre alguma canção ou algo referente ao
público que está assistindo.
Alguns instantes se passaram para logo o rapaz iniciar uma bela canção
italiana junto com sua banda. A melodia que iniciara era doce e leve. Tão leve
quanto a brisa que acariciava os rostos e os cabelos de Jennifer e Regina naquele
momento.
O lugar estava preenchido por poucas pessoas de faixa etária distintas.
Havia crianças correndo e brincando pelo lugar, assim como havia alguns jovens
casais de namorados e alguns idosos sentados apreciando a boa música. O
ambiente estava tomado por uma bela harmonia.
— Vem, dança comigo?— pediu Regina ao unir sua mão à de Jennifer e
puxá-la sutilmente para mais perto de onde havia outras pessoas dançando.
Jennifer depositou a sacola com o presente que ganhara sobre um banco
que havia próximo a elas de modo a ficar com suas mãos vazias para, então,
segurar a cintura de Regina. A professora, por sua vez, envolveu o pescoço da
loira com seus braços e deixou que a melodia conduzisse seus corpos
lentamente. Alguns olhares curiosos começaram a recair sobre elas, porém, o
momento que compartilhavam era especial demais para que se importassem com
algo além daquela prazerosa dança.
Pelo fato de Jennifer estar de tênis e Regina de salto, ambas estavam da
mesma altura, com seus olhos e boca na mesma linear. Elas permaneciam
caladas enquanto seus corpos se moviam e conversavam ao ritmo da canção. As
trocas de olhares eram doces. Sorrisos floresciam de seus lábios. A alegria que
habitava em seus peitos era a mesma de um pássaro em busca do verão.
— Adoro ter seu olhar direcionado ao meu. Ainda mais assim tão
próximo — comentou Jennifer após alguns minutos de dança. — Ele é sempre
tão intimidador, intenso e invasivo.
— E eu gosto da calmaria do seu. É como se eu pudesse descansar o
meu sobre ele — respondeu Regina enquanto sentia o calor que emanava do
corpo de Jennifer passar para o seu.
— E você pode — afirmou Meireles. — Sabia que eu sempre senti
dessa forma? Sempre me senti absorvendo essa intensidade dos seus castanhos.
E é tão difícil não buscar você com meu olhar. Não sei como vou conseguir agir
indiferente cada vez que nos encontrarmos na escola.
— Nós precisamos ser racionais, Jennifer.
— Eu não consigo ser inteiramente racional quando se trata de você.
Está cada vez mais difícil não te tocar. Eu não vou conseguir.
— Você vai precisar me ajudar a nos ajudarmos. Sem provocações lá
dentro, ok?
— Mas você gosta delas.— A loira esboçou um pequeno sorriso
carregado de más intenções.
— Oh droga, sim, eu adoro elas — disse rindo, segundos antes de
morder o próprio lábio com as lembranças. — Mas não é adequado que
aconteça.
Quando a música chegou ao fim, a mais velha segurou a mão de
Jennifer, elevou o braço da jovem e a girou lentamente, puxando-a de volta para
si mansamente logo em seguida. As duas compartilharam uma gostosa risada ao
final.
Ao término da dança, Jennifer recolheu seu presente do banco e as duas
caminharam para longe dali. Enquanto andavam e conferiam mais algumas
atrações, iam provando alguns petiscos vendidos nas barracas que cercavam todo
o lugar. Após conferirem boa parte do que havia na área externa, descobriram
que havia um pequeno espaço fechado onde estava sendo exibida uma pequena
exposição com réplicas de obras pertencentes ao museu do Louvre, na França.
As duas mulheres ficaram encantadas com o que viram. Regina ainda
mais, pois para ela era muito prazeroso passear por exposições. Ela sentia como
se estivesse dando um giro na história e, de certa forma, vivendo o momento de
cada obra de arte. Jennifer e Regina possuíam gostos muito similares. Dessa
forma, desfrutavam juntas e com a mesma intensidade tudo o que aquele passeio
oferecia. Meireles, apesar da pouca idade, tinha gostos muito refinados. Ela,
assim como Regina, era amante das artes.
Após incontáveis risadas, doces e intensas trocas de olhares e
prazerosas conversas, as duas mulheres deram-se conta de que o fim de tarde
estava próximo. Ambas já haviam aproveitado tudo o que o evento cultural tinha
a oferecer, sendo assim, decidiram fazer o retorno para casa. No caminho,
enquanto Regina dirigia, tornaram a passar pela praia. Foi então que Jennifer
sugeriu que elas fizessem uma pequena pausa e fossem aproveitar aquele fim de
tarde de frente ao mar.
As duas sentiam a brisa leve soprando em seus cabelos enquanto
caminhavam pela calçada do lugar. Ambas optaram por não irem pela areia.
Caminharam até encontrar um lugar calmo e vazio onde pudessem ficar a sós
naquele lindo cair da tarde.
— Que paisagem linda — comentou Jennifer ao sentar-se em um banco
na calçada de frente para a praia. O mar estava longe, mas ainda assim avistável.
— Podemos tirar uma foto juntas?— pediu docemente.
— Podemos. Mas cuidado com ela, tudo bem?— alertou Regina,
tomando um lugar ao lado da loira.
— Não se preocupe, deixarei em uma pasta com senha junto com a que
você me enviou sexta à noite.
— Ah não... Não me lembra disso!
— Por que não? Eu adorei o fato de você ter me procurado naquela
noite. Fiquei surpresa.
— Eu fui inconsequente, estava alcoolizada.
— Adorei a sua inconsequência. Se depender de mim, pode repetir mais
vezes — disse a jovem enquanto pegava o celular de dentro do bolso de sua
jaqueta. As duas mulheres uniram a lateral de seus corpos e registraram aquele
singelo momento em uma bela fotografia. — Vou namorar essa foto a noite
inteira pra não esquecer como é estar com você.— comentou Jennifer com
ternura.
— Se você esquecer, eu te faço lembrar — murmurou Regina ao pé do
ouvido. — Gostaria de compartilhar algo com você.
— O quê?
— Uma música. A minha canção favorita.— Regina pegou o celular de
dentro da bolsa, colocou um lado do fone de ouvido e ofereceu o outro para que
Meireles usasse. Feito isso, escolheu uma música na galeria e a colocou para
tocar.
Jennifer chegou com seu corpo para mais perto e depositou uma de suas
pernas sobre a da morena enquanto se deixava envolver pela melodia. Regina,
por sua vez, buscou a face de Meireles e começou a cantar baixinho ao mesmo
tempo em que a olhava nos olhos. Jennifer esboçou um pequeno sorriso ao
constatar que se tratava de uma romântica canção em espanhol. Ela já pudera
imaginar que a música preferida de Regina seria algo assim.
Meireles sentiu vontade de fechar os olhos para sentir a música se
misturando com a voz de Regina e o barulho de mar. No entanto, a vontade de
olhar sua professora de frente, nos olhos, se fez ainda maior. Sendo assim,
travou seu olhar ao dela e deixou ser envolvida pela energia que habitava o
universo daqueles olhos.
Regina tocou suavemente no pulso de Meireles e começou a brincar
com a pulseira da jovem da mesma forma que fizera mais cedo. Ela mexia no nó
e nas pontas do tecido ao mesmo tempo em que mantinha seu olhar no de
Jennifer e cantava docemente para ela.
A mais velha cantava uma canção que falava sobre um relacionamento
que enfrentava dificuldades e sobre a necessidade de uma pausa em meio ao
caos. Em uma das passagens da canção havia uma frase onde dizia que um dia os
amantes sairiam nas notícias da tarde por terem conseguido se amar e sair ilesos
do desastre quando ninguém mais soube.
Regina alternava os movimentos entre brincar com a pulseira e acariciar
a pele macia do pulso de Jennifer. E quando a canção terminou, a loira percebeu
que respirar já não era uma fácil tarefa. Regina havia conseguido tirar seu fôlego
sem ao menos tocá-la. Aquela voz rouca havia a deixado extasiada. Antes que
Jennifer pudesse ter a oportunidade de dizer algo, Regina adiantou-se e começou
a falar.
— Em uma das respostas do seu questionário pessoal você disse que a
parte que realmente importa sobre você, só conhece quem você permita que leia.
— A morena deslizou as carícias do pulso para a mão de Jennifer, tocando
delicadamente em cada dedo da jovem. — Eu adoraria poder ler você, Meireles.
E fazer do seu corpo o meu poema favorito.
Jennifer olhou para os lados e se certificou de que não havia ninguém
na região onde estavam. Após isso, inclinou-se sutilmente sobre Regina e
começou a murmurar próximo aos lábios da mulher.
— Você pode. Pode me escrever, me ler...— dizia com a voz arrastada
— , e me transformar no que quiser; desde que seja feito nos seus braços.
— Não me provoca assim, Jennifer... Não aqui — disse com a voz,
também, arrastada.
— Não estou provocando você — respondeu ao fingir inocência.
— Você sabe que está, e sabe a vontade louca que tenho de ter você.
— Não, eu não sei. Por que você não me conta?— instigou.
— Eu conto. Mas só se você não tiver medo de se trancar comigo no
carro, agora.
Jennifer sentiu sua intimidade se contrair às palavras de Regina. Sua
professora, quando provocada, conseguia ser deliciosamente safada, e Jennifer
adorava isso. Ela adorava a maneira voraz e insana com a qual a morena lhe
desejava.
— Só se você prometer não morder — provocou-a
— Isso eu não posso prometer. Mas eu afirmo não fazer nada que você
não queira — respondeu, segundos antes de levantar-se e ser seguida por
Jennifer, que era um misto de ansiedade e nervosismo a respeito do que
aconteceria a seguir.
Ao entrarem no carro, Regina trancou as portas e manteve as janelas
fechadas. Ela queria total privacidade para aproveitar cada prazeroso momento
ao lado de sua aluna. Jennifer, por sua vez, sentiu o nervosismo crescendo dentro
de si. Suas mãos estavam suando frio e suas pernas tremiam suavemente. Estes
efeitos estavam sendo causados pelo desejo que habitava o olhar de Regina, e
pela euforia do momento.
Um profundo silêncio que muito tinha a dizer reinava dentro do veículo.
As duas mulheres se encaravam com curiosidade e desejo. Seus olhares eram
penetrantes; eles faiscavam ao se chocarem. Jennifer e Regina se encontravam e
se perdiam naquela entrega, naquela troca mútua, naquele irrefreável calor de
suas íris em brasa.
Meireles sentia o coração batendo em um ritmo mais acelerado que o
normal. Ela tinha receios que Regina estivesse ouvindo suas batidas, tendo em
vista que estavam envolvidas em um silêncio absoluto. A loira não sabia explicar
o que estava acontecendo, era como se a atmosfera que as envolvia naquele
instante estivesse mais tensa e sexual que nunca antes estivera. Elas não
trocavam palavras, mas seus corpos conversavam em uma linguagem conhecida
por elas; a da paixão e do desejo explícito injetado em suas veias, fazendo arder
e queimar por onde passava.
A tarde caiu para que a noite levantasse. O sol se foi e deu passagem
para que a lua surgisse no céu com toda sua magnitude. O veículo perdeu a
claridade natural do dia e ficou parcialmente escuro com a noite. Isso fez com
que Regina acendesse a luz do teto do carro para poder enxergar todos os
detalhes de Jennifer com clareza. O clima estava quente. O calor que emanava
das duas mulheres era demasiadamente grande, fazendo Jennifer livrar-se da
própria jaqueta e posteriormente vesti-la no banco do carro.
A morena olhou para os braços desnudos de Meireles e desejou tocá-los
e tomá-los para si. Eles eram tão definidos, fortes e firmes, que Regina daria
tudo para marcá-los com suas unhas e boca. Após observá-los por um curto
período de tempo, teve a ousadia de tocar naquele que estava mais próximo.
Primeiramente, o acariciou com as costas de sua mão. Ela deslizava a pele de sua
mão contra a pele macia do braço, subindo e descendo, sentindo todas as
ondulações dos músculos e veia evidentes. Feito isso, virou a mão e o segurou,
arrastando suas unhas por todo ele, subindo e descendo lentamente.
Jennifer começou a respirar ofegante ao sentir as unhas de Regina lhe
arranhando levemente. Ela muito apreciava a sensação de sentir-se uma presa
perante as investidas da mulher.
— Regina...
— Hum?
— Mais...
Regina esticou-se e se inclinou sobre Jennifer. Ela apoiou o braço sobre
o banco da jovem, por cima, e usou a mão livre para tocar o outro braço da loira.
— Assim?— murmurou com rouquidão em sua voz ao aumentar o
ritmo e a intensidade dos arranhões.
— Isso, assim...— A loira envolveu a cintura de Regina com o braço
que estava sob as carícias da morena e a puxou para mais perto de seu corpo.
Regina estava se deliciando ao fincar as unhas naquele braço tão
desejável por ela. Quanto mais ela cravava e arranhava, mais Meireles gostava.
Regina depositava força, proporcionando um ardor inebriante para Jennifer. A
professora aproveitou a proximidade e afundou o rosto na curva do pescoço,
aspirando o cheiro daquela região.
— Seu cheiro é tão gostoso, Jennifer — sussurrou. — Ele me embriaga
e enlouquece.— Regina arrastou os lábios lentamente pelo pescoço da jovem até
chegar a seu maxilar. Ela deu uma pequena mordida no queixo da loira e em
seguida a beijou nos lábios. As duas ansiaram por aquele beijo durante todo o
passeio.
Jennifer separou sutilmente os lábios e deu passagem para que a língua
de Regina deslizasse sobre a sua em um encontro úmido e quente. Não demorou
muito para que a morena estivesse inteiramente inclinada sobre o corpo da
jovem. Logo, mãos começaram a explorar corpos com a mesma vontade em que
as línguas exploravam as bocas.
Regina prendeu o lábio inferior de Jennifer entre os seus e o chupou
eroticamente, soltando-o logo em seguida, arrancando da loira um malicioso
sorriso. Regina retribuiu o sorriso sacana e voltou a tomar aquele lábio para si.
Porém, dessa vez, o prendeu entre os dentes e o mordeu.
— Ai...— O murmúrio de Jennifer foi quase um gemido de prazer.
— Você adora quando provoco pequenas dores em você, não é?—
murmurou a morena entre o beijo.
— Sim, adoro te sentir me tomando. Queria me deixasse marcas. Quero
te sentir na minha pele; ardendo, queimando e doendo. Isso faz eu me sentir viva
e muito humana.
— Porra Jennifer... Você é a minha loucura mais deliciosa —
murmurou. Regina estava admirada ao constatar as semelhanças entre a loira e
ela.
— E você fica ainda mais sexy quando xinga. Adoro a maneira como
você perde a pose e o refinamento em poucos instantes.
— Eu posso ser uma vadia quando eu quero — disse ao encarar os
verdes olhos à sua frente. — Você quer que eu seja uma vadia com você?—
perguntou em meio aos beijos que distribuía pelo pescoço e colo da mais nova.
— É o que mais quero. Quero te ver sugando todos os meus pudores —
disse ao deslizar a jaqueta de Regina para fora do corpo.
Regina esboçou um pequeno sorriso sacana ao ouvir Jennifer proferindo
tais palavras. A vontade de ver a loira desmanchando-se sob suas carícias era
gritante. O certo e o errado já não existiam entre elas. Apenas uma louca vontade
de se provarem. Regina já não aguentava permanecer onde estava, ela precisava
de mais contato de pele. Foi quando saiu de seu lugar e sentou-se sobre o colo de
Jennifer com uma perna de cada lado.
Jennifer entreabriu os lábios ao ser surpreendida pela mulher em seu
colo. Suas mãos suaram ainda mais e seu coração já não queria permanecer no
peito. A loira havia ficado nervosa com a atitude repentina da professora, pois
nunca antes estivera em um momento tão intenso e quente. Regina a estava
fazendo conhecer o ápice do que era desejar alguém.
— Está tudo bem, Jennifer?— preocupada, averiguou.
Meireles assentiu positivamente com a cabeça, suspirou e depositou
suas mãos sobre as coxas de Regina. Porém, quando o fez, foi surpreendida pelas
mãos da mulher sobre as suas em um gesto para que ela parasse.
— Não me toque — ordenou ao deslizar as mãos de Jennifer para fora
de seu contato.
— Você só pode estar brincando — comentou ao tentar tocá-la
novamente.
— Não me to-que — repetiu pausadamente. A morena segurou os
pulsos da loira e ergueu seus braços, os pressionando para trás e contra o banco.
— Não acredito que você vai me torturar dessa forma.
— Shhh, calada — disse Regina em tom autoritário. A professora se
manteve segurando os pulsos de Meireles enquanto avançava em seu pescoço,
distribuindo beijos e mordidas por toda extensão daquela pele alva, deixando
marcas vermelhas que eram fruto de seu desejo e de sua voracidade.
— Não faz assim, Regina — resmungou ao mesmo tempo em que ia se
inebriando sob as carícias da professora. Ela estava adorando aquele jogo da
mais velha. Era demasiadamente excitante.
— Ca-la-da.— Regina desceu as carícias para o colo e beijou o espaço
entre os seios da jovem coberto pelo tecido do vestido. Em seguida, ergueu a
cabeça e avistou o olhar ardente de Jennifer para suas ações. — Se você
prometer se comportar, eu solto seus braços — disse, segundos antes de beijá-la
em um dos ombros. — Vai se comportar?
Tendo em vista que não podia falar, Meireles apenas sacudiu a cabeça
positivamente. Feito isso, Regina soltou seus braços e começou a percorrer as
mãos por seu corpo. Ela acariciava os braços e a lateral do corpo de Jennifer
enquanto a beijava com ardor. Enquanto isso, Meireles controlava-se a cada
segundo para não agarrá-la.
Regina interrompeu brevemente o beijo para depositar a ponta de seu
dedo indicador sobre os lábios rosados de Jennifer. Ela o deslizou por todo eles,
registrando na ponta do dedo aquela textura que tanto gostava. A morena
introduziu lentamente a ponta do dedo na boca de Jennifer e o sentiu entrando
em contato com a língua quente e úmida da loira. Meireles expressou um sorriso
carregado de malícia e prendeu o dedo de Regina entre seus dentes, mordendo-o
de leve ao mesmo tempo em que esboçava uma expressão sacana.
Regina mordeu o próprio lábio inferior ao avistar as expressões que a
loira esboçava. Um gemido abafado tornou-se inevitável, foi quando Meireles
percebeu que a mais velha também gostava de receber carícias mais intensas.
Sendo assim, Jennifer depositou um pouco mais de força em sua mordida e se
deliciou com a cara de safada que Regina esboçou.
— Porra... — disse Regina com a voz carregada de desejo ao puxar o
dedo lentamente para fora do contato. Ela deslizou a ponta úmida de seu
indicador pelo pescoço de Jennifer e em seguida afundou o rosto naquele
pescoço. Regina alternava entre beijos, mordidas e leves chupadas naquela
região enquanto suas mãos desciam para as coxas da jovem. A morena
mergulhou as mãos para dentro do vestido e começou a apertar aquelas coxas
definidas e grossas que ela possuía.
O corpo inteiro de Jennifer arrepiava-se sob os lábios da morena em sua
pele. E quando Regina encontrou e envolveu suas coxas, Jennifer sentiu seu sexo
pulsar tamanha era a vontade de ter Regina bem ali. Sua mente já não
raciocinava e seu corpo pedia por sua professora cada vez mais. Foi quando suas
coxas se abriram em um oferecimento para Regina.
— Assim eu não consigo me conter, Jennifer...— sussurrou ao deslizar
uma das mãos pela região interna daquelas coxas, arrancando da loira um baixo
gemido de desejo. — Você sabe o quanto eu quero te tocar?— perguntou ao
massagear e apertar aquela região. — O quanto eu quero te provar?— provocou
ao acariciar a virilha.
— Regina...— gemeu com os lábios próximos aos da mulher. As
provocações da mais velha a estavam enlouquecendo.
— Que delícia você gemendo meu nome. Essa é a única coisa que eu te
permito dizer enquanto brincamos.— Essas foram as últimas palavras de Regina
antes de tocar o sexo de Jennifer com as pontas de seus dedos. Ela o pressionou
e começou a massageá-lo por cima da calcinha. — Você é tão deliciosa, Jennifer
— disse enquanto preenchia sua mão com o sexo da loira.
Jennifer estava indo à loucura com tudo o que estava acontecendo. Era
imensuravelmente prazeroso tê-la em seu colo sussurrando algumas palavras ao
mesmo tempo em que acariciava entre suas pernas e a proibia de se manifestar.
Era sadicamente prazerosa toda aquela tortura de não poder falar ou tocar. Isso
fazia com que seu desejo aumentasse ainda mais.
— Eu adoraria arrastar você pro banco de trás e te sentir por dentro
dessa calcinha — comentou ao diminuir gradativamente o ritmo dos movimentos
que fazia no sexo de Jennifer. — Mas eu não quero que nossa primeira vez seja
assim e aqui. Eu quero sem pressa pra podermos aproveitar e fazer com a outra
tudo o que quisermos. E eu quero poder dormir com você após te ter. Mas está
tão difícil parar o que estou fazendo...
— Nós não precisamos parar agora.— Jennifer ousou dizer. — Eu
quero mais dessa deliciosa tortura. Vem?— Jennifer segurou a nuca de Regina e
puxou a mulher um pouco mais para si, fazendo-a inclinar-se inteiramente sobre
seu corpo. As duas permaneceram naquela intensa troca de carícias por um
longo período de tempo. Suas bocas se buscavam e se provavam com urgência e
desejo; devorando-se. Suas mãos alternavam entre carícias pelo corpo e
enroscadas nos cabelos. Tudo entre elas era intenso. Estavam testando os limites
da resistência e do controle pessoal. Elas adoravam toda aquela tortura de deixar
seus corpos à beira de entrarem em erupção, para em seguida esfriarem. Era um
sobe e desce torturante, enlouquecedor e completamente masoquista.
Quando perceberam que já não aguentariam permanecer apenas
naquelas intensas trocas de carícias e que já haviam chegado ao limite do
autocontrole, foram gradualmente diminuindo o ritmo dos beijos e das mãos que
passeavam por áreas distintas dos corpos. Suas respirações foram, aos poucos, se
estabilizando e voltando ao normal.
Regina e Jennifer se olharam questionando-se sobre o que acabara de
acontecer, e sobre o quão prazeroso havia sido aquele contato mais íntimo. Foi
então que uma gostosa risada acompanhada por um sentimento de cumplicidade
foi compartilhado entre elas. Ambas estavam felizes mesmo sabendo que depois
de todo um dia juntas seria imensamente difícil esconder esse romance proibido.
E que depois de tantas provocações, seria quase impossível se resistirem dentro
do mesmo ambiente.


Capítulo 14

— Você o quê?— exclamou Arthur. Era o momento do intervalo, ele e
Regina conversavam em uma lanchonete próxima ao colégio. — É só eu passar
um final de semana longe, que você enlouquece, Regina?
— Arthur! Fala baixo!— repreendeu ao olhar à sua volta.
— Desculpe, Regina. Mas estou bastante surpreso como as coisas
evoluíram em poucos dias.
— Na verdade, veio evoluindo gradativamente — disse enquanto
mantinha sua atenção no homem. — Mas após passarmos esse tempo juntas,
saltou — confessou ela.
— Eu quero só ver até onde você vai com essa história — retrucou.
— Lembra o que eu disse a você no dia em que me deu carona? Eu
disse que queria alguém que me enlouquecesse e me transbordasse. Essa pessoa
é ela.
— Não poderia ser um alguém mais acessível? Uma relação menos
complicada?
— Poderia, mas não foi. Eu não procurei por isso, Arthur. Não mesmo.
Você me conhece há anos. Simplesmente aconteceu. Estou muito envolvida por
ela.
— Você não vai mesmo dar um fim nisso, não é?
— Nem se eu quisesse, poderia. Eu gosto muito daquela garota.
— Quanto você gosta dela?
— O suficiente pra não desistir.
— E você pensa em viver essa relação às escondidas até quando? E os
pais dessa menina? A escola? Você já parou pra pensar nisso tudo? Não estou
querendo te desanimar, Regina. Você sabe que sempre sou a primeira pessoa a te
apoiar e a querer vê-la feliz. Mas eu estou realmente preocupado com essa
situação. E a ética profissional? O colégio não vai perdoar.
— Eu penso em tudo isso, Arthur. Dia e noite. Mas a vontade de estar
com Jennifer é maior. Já tentei ser indiferente, não pense que não, mas parece
que existe algo que nos liga. Somos inevitáveis uma para outra. Nossa relação
vai precisar ficar em segredo por um tempo. Pelo menos até Jennifer concluir o
ensino médio e se desvincular da instituição.
— Então tomem cuidado, evitem contato dentro do colégio, e se
resolverem se encontrar fora, dobrem a atenção. Evitem lugares públicos. Nunca
se sabe quando há um conhecido por perto.
— Dessa forma vamos precisar marcar nossos encontros em Saturno —
comentou Regina — , pois existe perigo em toda parte.
— É o preço que se paga por viver algo assim.
— Não me importo. Vou fazer dos anéis de Saturno a nossa cama.
Adoro transar em lugares exóticos — disse ela, rindo.
— Você não tem jeito, Regina!— comentou ao compartilhar uma risada
com sua amiga.

— Estou pensando em conversar com minha mãe sobre minha


sexualidade — disse Jennifer em uma conversa com Beatriz. Ela já havia
informado sua amiga sobre os últimos acontecimentos com Regina. — Eu
preciso aliviar um pouco o peso dos meus ombros. Já terei que esconder meu
caso com a professora Vianna de todo o mundo. Se eu puder, pelo menos, ser eu
mesma em casa, será um grande alívio.
— Mas você pretende contar à sua mãe sobre sua relação com ela?
— Não, isso não. Esse segredo precisarei manter até o final do ano. Mas
eu quero pelo menos aliviar o outro lado, entende? Não aguento mais ter que
negar quem sou dentro da minha própria casa.
— Eu entendo... Te desejo sorte, Jen. De verdade.
— Obrigada, vou precisar. Dona Morgana Meireles não é fácil.
— E como ficarão as coisas com a senhorita Vianna? Permanecerão se
encontrando?
— Sim. Por enquanto tudo será em segredo — explicou Jennifer. —
Sabe, Beatriz... Eu nunca tive pressa de crescer. Nunca desejei pular os anos,
sempre vivi cada fase da minha vida como deveria ser vivida. Números nunca
significaram nada pra mim. O amadurecimento é mental. Mas, pela primeira vez
estou desejando que esse ano letivo termine. Apenas assim Regina e eu seremos
um pouco mais aceitáveis perante a sociedade.
— Eu entendo, Jen. É bem difícil viver nessa sociedade hipócrita e
ditadora de regras, onde cada um quer dizer como devemos viver as nossas
vidas, mas nem eles próprios sabem qual rumo tomar para a deles.
— Pois é. Mas não deixarei que convencionalismo algum me impeça de
viver isso com Regina.
— Se vocês realmente estão se gostando, vale à pena tentar. Mas pelo
amor de Deus, cuidado!
— É mais que um simples gostar, Bea. É uma força muito intensa que
nos puxa, eu posso sentir. Minha mente e meu corpo a desejam com o mesmo
querer. Mesmo sem intenção ela tem me revelado partes minhas que até então eu
desconhecia. Eu tenho me conhecido com ela e não quero ter que transferir esse
sentimento pra ninguém mais.
— É notável. Suas expressões faciais se modificam automaticamente
quando você fala dela, ou quando ela está por perto.
— É tão evidente assim?— perguntou ao franzir o cenho.
— Totalmente. Você precisar disfarçar mais.
— Eu não consigo. Sequer percebo o que estou fazendo — disse a loira.
— Oh merda, eu estou bastante encrencada mesmo — comentou ao depositar a
mão contra a testa, deslizando-a para trás e pelos cabelos.
— Nosso último tempo de aula será com a professora Vianna. Acho
bom você já ir treinando.— Beatriz levantou-se do chão do pátio e estendeu o
braço para que Jennifer também se levantasse. O intervalo acabara de chegar ao
fim.


Ponto de Vista de Regina

O sinal ecoou pelos corredores do Colégio Brooke. Ele indicava que
meu último horário naquela instituição se iniciara. Conclui minha aula na
classe cento e um e em seguida me dirigi para a sala dos professores. Chegando
lá, troquei o material didático e segui em direção à última turma na qual eu
daria aula naquele dia.
Caminhei a passos lentos por todo o corredor do segundo andar. Meus
saltos produziam um baixo som quando em contato com o chão. Durante o
caminhar, alguns poucos estudantes localizados no corredor e nas portas das
salas de aula acenaram pra mim. O número de alunos que chegava até mim fora
do horário de aula era extremamente baixo. A maioria não ousava me
direcionar a palavra. Talvez minhas expressões sempre sérias os intimidassem.
Conforme eu caminhava, alguns assobios se faziam audíveis. Estes
vinham de estudantes que, na maioria das vezes, não eram meus alunos. Eu
fazia questão de ignorar. Embora eu entendesse que nesta idade os hormônios
estivessem à flor da pele, eles precisavam aprender a serem respeitosos.
Permaneci séria, olhando para frente e caminhando com firmeza em cada
passo. Minha postura imponente estava mais erguida que nunca.
Após mais alguns passos, deparei-me com a porta que possuía a
numeração 309 em vermelho. Era a classe de Jennifer. Respirei fundo e girei a
maçaneta. Ao entrar, meus olhos subitamente buscaram por Meireles. Ela
estava linda, usava um dos conjuntos alternativos de uniforme, o mais formal.
Era a primeira vez que a via dessa forma. Jennifer usava uma camisa social
branca de manga comprida e uma saia azul marinho de pregas sutis. Quando
questionei-me internamente sobre o porquê de tais vestes, visto que Jennifer
sempre deu preferência para a camisa pólo e calça jeans, lembrei-me que hoje
era o dia em que as turmas de terceiro ano seriam fotografadas, e o colégio
exigia que todos usassem essa variação de uniforme. Ao concluir o pensamento,
olhei para o restante da turma e constatei que todas as garotas vestiam-se da
mesma forma.
Passeei meus olhos por Meireles rapidamente e segurei-me para não
retribuir ao meio sorriso que acabara de formar-se nos lábios da jovem. Entrei,
cumprimentei a classe e dei minha aula normalmente. Logo após explicar a
matéria e aplicar alguns exercícios no quadro, sentei-me de pernas cruzadas em
minha cadeira e iniciei a chamada no diário de classe.

Ponto de vista de Jennifer

Sempre que eu direcionava meu olhar para o quadro à minha frente
com a intenção de copiar os exercícios passados por Regina, ele fazia uma
pequena parada em minha professora, dividindo minha atenção entre os dois.
Lembranças do passeio de domingo misturavam-se com a grande vontade de
admirar a mulher sentada bem à minha frente. Regina Vianna estava linda. Ela
usava camisa social de manga 3/4 de coloração azul claro, saia lápis de cor
preta e saltos fechados da mesma cor da saia. Hoje havia um diferencial em sua
roupa. Ela usava meia calça escura, preta, que lhe proporcionava um ar ainda
mais sério e sedutor. Eu olhava para Regina e o único pensamento que povoava
minha mente era a vontade insana que eu estava de ir até ela e rasgar aquelas
meias. Por Deus! Eu precisava me controlar.
Respirei fundo, passei a mão em meus cabelos e comecei a bater o topo
do lápis contra minha mesa na tentativa inútil de fazer aqueles pensamentos
irem embora. Regina Vianna exalava sensualidade. Eu não conseguia
permanecer sem olhá-la por muito tempo. Eu sabia que no ambiente escolar era
quando eu mais necessitaria disfarçar e me comportar com indiferença. Porém,
era justamente naquele ambiente, dentro da sala de aula e sentada naquela
cadeira da maneira como ela estava fazendo agora, inteiramente compenetrada
em suas tarefas, que Regina Vianna me atraía ainda mais. Oh céus, onde fui me
meter?


Ponto de Vista de Regina

Após a chamada comecei a corrigir alguns trabalhos acumulados. A
sala permanecia em silêncio absoluto. Eu estava relutante para permanecer
concentrada em minhas tarefas e não ousar direcionar meu olhar para Jennifer.
Contudo, minha atenção foi desviada quando meu celular começou a vibrar em
minha mesa. Para minha surpresa, era uma mensagem de Jennifer.

Não poderia deixar de dizer o quão linda você está hoje, professora
Vianna. Confesso que está tirando minha concentração.

Precisei conter o sorriso que teimava em se formar no canto dos meus
lábios. Fechei o visor do celular sem direcionar meu olhar à Meireles e dei
continuidade ao meu trabalho. Todavia, sabia que estava sendo observada por
ela, e sabia que ela não sossegaria até possuir meu olhar direcionado ao dela.
Poucos minutos se passaram e meu celular voltou a vibrar. Como
previsto, outra mensagem de Jennifer.

Gostaria de saber os pensamentos sujos que estou tendo com você
agora?

Balancei a cabeça negativamente ao mesmo tempo em que eu ria por
dentro. Eu adorava a ousadia de Jennifer e iria gostar ainda mais de saber até
onde toda essa ousadia seria capaz de chegar. No entanto, ali não era o
momento para tais atitudes. Visto isso, apenas direcionei meu olhar a ela por
cima de meus óculos, sorri e desliguei o celular sem respondê-la.
Quando eu já havia terminado de corrigir o restante dos trabalhos, abri
o meu mais recente caderno de poemas e comecei a escrever um novo. Ao
mesmo tempo em que eu o escrevia, eu sentia a presença do olhar de Jennifer
sobre mim. A presença era forte, intensa e me chamava. Quando a energia que
emanava daquelas esmeraldas se fez forte o suficiente, ergui minha cabeça e
olhei para Meireles. Cruzamos nossos olhares por alguns segundos que mais me
pareceram eternidades. E antes que eu pudesse retomar à escrita, Jennifer me
surpreendeu. A jovem prendeu meu olhar em seu movimento de pernas. Jennifer,
disfarçadamente, separou suas pernas de maneira lenta, sensual e torturante,
para em seguida depositar uma por cima da outra, cruzando-as. Nesse momento
ela não me olhava, não. Ela mantinha o olhar sobre seu caderno. Contudo, eu a
conhecia o suficiente para saber que aquilo era apenas disfarce. Eu sabia que
seu interior vibrava em saber que estava me enlouquecendo.
Tentei voltar minha atenção para o poema, mas, novamente entrei no
transe dos movimentos de Jennifer. Meireles possuía o par de pernas mais lindo
e bem torneado que eu já conhecera. Passei os dedos entre meus cabelos,
jogando-os para trás em um nítido gesto de inquietude. Quando Meireles repetiu
os movimentos anteriores, desta vez, cruzando a perna para o outro lado, seu
olhar veio de encontro ao meu. Seu olhar veio seguido de um pequeno sorriso
carregado de malícia. Ela estava jogando. Me provocava apenas para me
torturar, tendo em vista que no ambiente onde estávamos eu estava totalmente
desarmada e impedida de tomar alguma atitude.
Abri os dois primeiros botões de minha camisa de modo a amenizar o
calor que me arrebatara. Fechei meu caderno, levantei-me da cadeira e me
posicionei de frente ao quadro. Era o momento de corrigir os exercícios junto à
classe e tentar me livrar dos pensamentos sórdidos que habitavam minha mente.
Eu precisava esquecer aquelas pernas se movimentando maliciosamente para
mim.


Regina corrigiu os exercícios e comunicou a turma sobre um passeio
que ocorrerá na semana seguinte. Por ser a professora de história da classe, ela
foi a escalada para levá-los ao Museu Histórico Nacional. Feito o comunicado,
Regina fez a entrega dos trabalhos corrigidos, encerrou a aula e se retirou.
— Até que minha nota foi boa — disse Beatriz ao conferir seu trabalho.
— A minha também — comentou Jennifer. Junto ao trabalho da loira
havia um papel dobrado e anexado com um clipe. Papel este, que Jennifer fez
questão de retirar e guardar em sua mochila instantaneamente.
— Olá, meninas. Posso ir embora com vocês hoje?— perguntou Estela
ao se enfiar entre Jennifer e Beatriz. Os pais de Estela eram pessoas riquíssimas.
A morena sempre ia embora com o motorista da família. Porém, a vontade de
estar mais próxima à Meireles a fez dispensá-lo por hoje.
— Claro — respondeu Beatriz. Jennifer apenas sorriu sem jeito.
As três estudantes caminhavam pelo corredor quando a loira lembrou-se
que precisava falar com a diretora Elizabeth. Por ser representante de turma, vez
ou outra ela tinha alguns assuntos pra resolver na direção.
— Já volto. Me esperem aqui — disse ela ao deixar suas amigas
próximas a entrada do lugar. Ao entrar, foi surpreendida pela imagem de Regina
sentada de pernas cruzadas em um dos dois sofás que havia na sala da direção. O
ambiente era pequeno, mas possuía uma elegante decoração.
— Precisa de algo, senhorita Meireles?— perguntou Regina ao vê-la,
erguendo uma de suas sobrancelhas.
— Vim falar com a diretora sobre a locação da sala de vídeo. Alguns
amigos e eu precisamos dela pra fazer a apresentação de um trabalho de biologia
— explicou a loira.
— Ela já está vindo.
Para elas, era profundamente estranho se tratarem de maneira tão
impessoal. Mas, visto que não possuíam outra opção, era o que restava ser feito.
Se quisessem permanecer juntas, o mínimo que poderiam fazer era agir com
racionalidade. Contudo, como conseguir ser apenas razão se seus corpos se
buscavam?
— Senhorita Meireles!— disse Elizabeth ao entrar — A que devo sua
visita?
Jennifer explicou toda a situação para a mulher e conseguiu a
autorização para a locação. Quando a loira já estava indo embora, Elizabeth a
chamou e fez um comunicado.
— Semana que vem a professora Vianna irá guiá-los a um passeio,
então peço que você, como representante de turma, seja o apoio dela. Ajude-a na
organização e monitoramento dos alunos.
— Ok.— Jennifer assentiu. Ela e Regina trocaram um olhar de
desespero. — Mais alguma coisa?
— Não, querida. E obrigada — respondeu Elizabeth.
— Então até outra hora. Obrigada pelo consentimento— disse
educadamente à diretora, recebendo um aceno de cabeça como resposta. — Até
mais, senhorita Vianna.
— Até, Meireles — respondeu Regina.
No caminho de volta para casa, Jennifer e suas amigas sentaram-se
juntas na parte traseira do ônibus. Tendo em vista que por conta da presença de
Estela não poderia mexer no papel que sua professora lhe dera, Jennifer estava
ansiosa para chegar em casa e saber do que ele se tratava.
— Meninas, meus pais irão viajar nesse final de semana. Casa liberada!
Estava pensando em chamar alguns amigos e fazer uma social. Gostaria muito
que vocês fossem. Podemos assistir filmes, beber alguma coisa, fazer
brincadeiras, essas coisas. O que acham?
— Eu adoraria!— respondeu Beatriz, empolgada.
— E você, Jennifer?
— Não sei... Depende de quem você for chamar. Não me sinto muito
confortável no meio de desconhecidos.
— Pensei em convidar vocês, Kevin, Rose e mais uma amiga minha. Só
a gente mesmo, os amigos próximos.
— Ah, ok. Então eu vou — respondeu — Que horas?
— Vou consultar todo mundo primeiro e ver um horário em que todos
possam.
— Ok.— Beatriz e Jennifer responderam quase em uníssono.
Enquanto conversava com suas amigas, Meireles sentiu o celular
vibrando dentro do bolso. Ao pegá-lo, constatou que havia recebido um sms de
Regina. A loira, disfarçadamente, abriu a mensagem e a leu.

Eu adoraria saber os pensamentos sujos que povoavam sua mente na
aula de hoje.

Tarde demais.
Jennifer respondeu. A resposta da professora veio logo em seguida.

Não seja uma menina má e me conte.

Agora eu só conto pessoalmente.
Meireles aguardou alguns instantes, mas não recebeu mensagem de
Regina em resposta. Sendo assim, devolveu o aparelho para a mochila e voltou a
conversar com suas amigas.
— Como você e Kevin estão?— perguntou Estela.
— Bem. Cada vez melhor. Mas...
— Mas?— questionou Jennifer. Beatriz parecia aflita.
— Meus encontros com ele estão ficando cada vez mais quentes. Sinto
que ele está querendo... Bom, vocês sabem.
— Transar?— Estela foi direta.
— É — respondeu ruborizada.
— E como você está se sentindo em relação a isso? Você quer? Ele está
te pressionando?— perguntou Jennifer, preocupada.
— O meu corpo quer, mas eu não sei se estou pronta, tenho um pouco
de medo. O Kevin não me pressiona, mas quando o clima esquenta, ele não
corta. Ele vai dando continuidade e aprofundando nossos amassos cada vez
mais. Sou eu que sempre interrompo.
— Você não deve fazer nada contra sua vontade apenas para agradá-lo.
Se ele gostar mesmo de você, saberá esperar — disse Estela.
— Eu sei. Não pretendo fazer nada para agradá-lo, e ele jamais tentou
forçar algo, pelo contrário. Quando eu interrompo, ele pede desculpas por ter
ultrapassado. O problema é que eu estou sentindo muita vontade, mas não sei
como proceder. Estou insegura.
— Essa sua insegurança talvez seja um sinal de que você não esteja
pronta — comentou Jennifer. — Espera mais um pouco pra ver se essas questões
esclarecem um pouco mais na sua mente. Não faça nada às pressas, na incerteza.
— O difícil é controlar o desejo. Kevin tem uma pegada tão boa, nossa.
A vontade é grande.— Riu. — Mas quando sinto que vamos ultrapassar, eu
travo. Sinto medo e não dou continuidade. Me sinto uma idiota.— Suspirou.
— Não há motivos pra se sentir assim. É normal ter medo do
desconhecido.
— Estela está certa. Você não é uma idiota por isso, sua reação é a mais
natural do mundo. Agora tenta relaxar e não ficar pensando nisso. E se você
sentir que Kevin é a pessoa certa pra esse momento, e sentir que chegou a sua
hora, deixe que tudo flua naturalmente e permita-se.
— Vou esperar um pouco e ver o que acontece — disse Beatriz. —
Agora preciso descer. Até amanhã, meninas. E obrigada pela conversa.
Beatriz foi a primeira a deixar o ônibus. Algum tempo depois, Jennifer.
Estela era a que morava mais longe.
Ao chegar em casa, Meireles subiu as escadas e direcionou-se para o
quarto. Ela abriu a mochila e logo procurou pelo papel que Regina deixara
anexado em seu trabalho.
— Onde está?— murmurou para si mesma enquanto procurava. —
Achei.— Jennifer sentou-se na cadeira próxima a seu computador e desdobrou o
papel lentamente. Quando seus olhos caíram nas linhas preenchidas pela letra de
Regina, um sorriso floresceu em seus lábios rosados. Ela mal pudera acreditar,
Regina Vianna havia lhe escrito um poema.


“Com você eu descubro todos os dias que nem toda poesia é escrita
Ela pode tomar a forma das tuas esmeraldas, por exemplo
Ou até mesmo das tuas ondas douradas,
que me fazem querer fazer moradia em cada curva

A poesia tem muitas casas
Muitas formas, cores e gostos
Ela está infiltrada no aroma da tua pele quando eu o respiro
Está no gosto da tua boca cada vez que eu o provo do teu beijo, do nosso
beijo
Ela passeia nas linhas bem traçadas de seu rosto
E faz moradia nos momentos que compartilhamos juntas

E quando me imagino entre suas pernas, Jennifer, a nossa poesia goza”



Capítulo 15

O sorriso ainda florescia nos lábios de Jennifer. Já era a quinta vez que
ela relia o poema de Regina. Ele era romântico e ao mesmo tempo possuía uma
pitada ideal de erotismo, assim como sua autora. Afinal, um poema vindo de
Regina não podia ser diferente. Sentada em sua cadeira, Jennifer olhava para o
pequeno enfeite que a mulher lhe dera no encontro de domingo. Enquanto o
observava, as palavras daquele poema dançavam em sua mente e coração.
Naquele momento, Meireles apenas conseguia pensar no quão cativante e
apaixonante era Regina.
Após longos instantes lendo e relendo o papel, o guardou dentro de um
livro e em seguida direcionou-se para o banho. Logo após, quando já estava
vestindo-se para descer, ouviu o barulho da porta principal batendo, indicando
que Morgana havia chegado. Ao mesmo tempo em que terminava de vestir o
pijama, ela murmurava para si mesma todo o diálogo que havia criado em sua
mente para ter com sua mãe. Ela havia tomado coragem para, finalmente, contar
a ela sobre sua sexualidade.
— Boa noite, mãe — disse ao aproximar-se de Morgana na cozinha.
— Boa noite, filha. Já jantou? Ou vai jantar comigo?— perguntou, ao
mesmo tempo em que vasculhava a geladeira.
— Ainda não. Vou jantar com você — respondeu ao se aproximar do
armário e recolher algumas louças. — Há algo que preciso te contar.— A voz de
Jennifer saiu cortada.
— Também tenho algo pra contar a você — disse Morgana, sorrindo, ao
se sentar.
— O quê?— A loira tomou um lugar à mesa enquanto sentia a coragem
começando a lhe deixar.
— Diogo me pediu em casamento!— Deu a notícia com empolgação ao
exibir seu anel de noivado.
— Mãe, isso é maravilhoso!— disse ao envolvê-la em um terno abraço
— Quando foi isso?
— Ontem! Ele me levou pra jantar e fez a proposta — disse sorrindo.
— Pensei em te contar assim que cheguei em casa, mas era madrugada e não
quis te acordar. E como saio muito cedo para trabalhar, não havia tido a
oportunidade. Mas saiba que você é a primeira a saber!
— Estou imensamente feliz por vocês, mãe, de verdade! E quando será
o casamento?
— Vamos com calma, Jennifer.— Riu. — Devemos ficar noivos por
pelo menos um ano até organizarmos tudo. Eu estou tão feliz...— Suspirou. — E
o que você tem pra me contar?
Jennifer olhava para a felicidade que estampava a face de sua mãe, ao
mesmo tempo em que via a oportunidade de conversar sobre sua sexualidade se
desfazendo. Ela sabia o quão chateada Morgana ficaria com a notícia, e tudo o
que menos desejava era estragar aquele momento tão especial.
— Nada demais...— disse sem jeito. — Semana que vem iremos ao
Museu Nacional com a escola. Nossa professora de história ficou encarregada de
levar minha turma.
— Que legal, Jennifer. Eu sei o quanto você gosta desse tipo de passeio
— disse docemente.
— Sim, verdade. Gosto muito — comentou. — Acredito que será bem
legal, pois seremos guiados por essa professora. Ela é maravilhosa, mãe. É tão
inteligente e leciona tão bem. Sempre que trocamos algumas palavras fora da
sala de aula eu aprendo algo novo. A sabedoria dela me encanta — disse
Meireles. Ela estava sentindo uma enorme necessidade de falar com sua mãe
sobre Regina, mesmo que de maneira um pouco impessoal. Ela queria que
Morgana, pelo menos, soubesse da existência dessa mulher tão querida por ela.
— Fico feliz em vê-la animada com o passeio e com a escola de uma
forma geral. Qual o nome dessa professora?
— Regina Vianna. Eu gosto tanto dela, mãe. Sabia que a mãe dela é
italiana e o pai de Porto Rico? Ela me disse que anualmente viaja pra Itália. Ela
dá aulas de espanhol no tempo livre, e ela é fã da Europa assim como eu — disse
em um só fôlego.
— Uou, vocês têm bastante coisa em comum — comentou Morgana. —
Me apresente a ela qualquer dia.
— Assim que possível — disse Jennifer ao sorrir. Embora ela não
tivesse conversado com sua mãe da maneira que esperava, sentiu-se mais leve
em ter conseguido, pelo menos, falar um pouco sobre Regina. De agora em
diante, sempre que pudesse, tentaria incluir a professora nas conversas.


Regina jantava tranquilamente em sua sala de jantar. Bóris era sua
companhia da noite, como de costume. Ele estava deitado em uma das cadeiras.
Com seus olhos cor de âmbar, a olhava com inteira atenção, observando cada
movimento de sua dona.
— O que foi, meu amor? Não há nada aqui que você queira ou possa
comer — disse ela suavemente. — Olha, é apenas comida da mamãe.— Com o
garfo, Regina pegou uma pequena porção de comida e levou até Bóris. Ele
levantou-se, se espreguiçou e começou a cheirar o alimento.
— Viu?— disse ao observar o gato voltar à sua posição anterior.
Quase todas as noites de Regina eram iguais. Ela mantinha uma rotina
quase fixa, e no meio de todas as atividades noturnas, sempre conversava e
interagia com Bóris. Estes eram os únicos momentos, com exceção do final de
semana, que os dois podiam compartilhar juntos. Sendo assim, fazia questão de
interagir com ele até mesmo na hora do jantar. Contudo, aquela noite pretendia
ser diferente. A pequena interação com Bóris foi interrompida quando a
campainha começou a tocar.
— Recebemos visita a essa hora? Em plena segunda feira?— disse ela
ao gato — Quem será?— perguntou retoricamente, observando que Bóris a
olhava com atenção. Regina apoiou os talheres sobre a mesa e levantou-se. O
felino, por sua vez, saltou da cadeira e foi caminhando atrás dela.
Ao abrir a porta, foi surpreendida pela inesperada visita de Robson. Ela
e o homem não se falavam há algum tempo, e ele jamais havia aparecido antes
em sua casa sem aviso prévio. Regina, de fato, se surpreendeu.
— Robson? Que surpresa. O que faz aqui?
— Surpresa boa, eu espero — disse ele ao sorrir — Não vai me
convidar para entrar?
— Oh claro, me desculpe — disse sem jeito. — Eu estava jantando.
Aceita se juntar a mim?— Por educação, ofereceu.
— Oh não, Regina. Obrigado! Mas te faço companhia.
Os dois caminharam até a sala de jantar. Regina, por fim, acabou
desistindo de dar continuidade à sua refeição e levou o prato com as sobras até a
cozinha. Na volta, convidou Robson até a sala de estar aonde os dois iniciaram
um diálogo.
— A que devo sua visita tão repentina?
— Saudades de você — disse ele. — Notei seu afastamento e gostaria
de saber o que aconteceu. Sinto sua falta, Regina.
— Desculpe o afastamento tão repentino. Desde que nos falamos pela
última vez eu não consegui me expressar corretamente com você e peço
desculpas — iniciou ela. — Eu gosto muito de você, nossa amizade sempre me
fez bem durante todo esse tempo. Mas nós nunca fomos apenas amigos, você
sabe.
— Sim, eu sei. E mesmo sendo completamente louco por você, sempre
aprendi a aceitar as coisas como são. Você sempre foi bastante transparente
comigo.
— Exatamente. Só que durante esse tempo em que mantivemos essa
relação de amigos com benefícios, se assim posso chamar — riu — eu estive
apenas com você. Não que nós dois tivéssemos algum compromisso um com
outro, não. Mas porque eu nunca vi sentido em procurar outro alguém. Diversão
eu já tinha com você, certo? Se fosse para eu estar com outra pessoa, teria que
ser por apego emocional.
— Eu posso entender — disse Robson enquanto a observava com
atenção. — Eu me comportei diferente. Embora eu sempre tenha gostado de
você, estive com outras mulheres e sempre te contei isso. Eu estive fisicamente e
tentei me envolver emocionalmente pra esquecer você.
— Eu sei disso. Deve chover mulheres sobre você nessas viagens que
faz. Você é um homem muito bonito e tem consciência disso.
— Mas infelizmente beleza não conquista o mais importante — disse
ele, referindo-se ao sentimento nunca correspondido por Regina. — Enfim...
Estou sentindo que você tem algo pra me dizer e já posso imaginar o que seja.
— Sim. Eu conheci alguém e estou cada vez mais envolvida com essa
pessoa. Ainda não definimos nossa relação, mas há envolvimento sentimental e
eu não quero estar com outra pessoa além dela.— Regina se sentia mal por estar,
de certa forma, ferindo os sentimentos de Robson. Mas eles sempre souberam
que esse momento iria chegar, e embora nunca tivessem tido um relacionamento
de verdade, Regina sentia em seu íntimo que devia a ele essa explicação.
— Não vou dizer a você que estou feliz com essa notícia. É até egoísmo
de minha parte, eu sei. Eu deveria estar feliz por você. Mas agradeço sua
honestidade e esclarecimento.
— Eu ia procurá-lo pra poder dar toda essa explicação. Eu só estava
esperando minha mente assimilar algumas coisas que vieram acontecendo.
— É uma mulher?— perguntou ele de maneira repentina.
— Isso faz alguma diferença pra você?
— Me responda, por favor.
— Sim, é.— Assim que o respondeu, Regina notou o semblante de
Robson se transformar. Ele estava visivelmente irritado.
— Eu não acredito que você vai me trocar por uma mulher!— Soltou
ele, fazendo Regina se alterar.
— E eu não acredito que você disse isso!— disse ela, incrédula. —
Você tem consciência do que disse, Robson? Que frase mais machista!—
exclamou.
— Eu não estou suportando saber que uma mulher foi capaz de te
despertar algo que eu não pude por todo esse tempo.
— Por quê? Simplesmente por ser uma mulher? Você está nos
diminuindo e nos desmerecendo com esse seu discurso.
— Ela foi melhor que eu em quê? Me diz?— perguntou ele ao alterar o
tom de voz. O diálogo que se iniciara de forma pacífica, estava tomando um
rumo completamente diferente. O Robson maduro, desconstruído e sensato que
Regina julgava conhecer, estava dando lugar a um homem completamente
antiquado, preconceituoso e machista.
— Robson, essa conversa termina aqui. Não quero que entremos em um
nível de ofensas — disse ao se levantar.
Robson saiu de seu lugar no sofá, levantou-se e aproximou-se da
professora.
— Regina, ela nunca vai te dar o que você gosta e só eu posso te
oferecer — disse ao tocar o ombro da morena. — Apenas eu posso satisfazer
você na cama. Vem, fica comigo...— Robson segurou a nuca de Regina e tentou
beijá-la.
— Você está louco? O que deu em você?— gritou ela ao empurrá-lo.
— Medo de te perder! Mas eu sei que você vai se arrepender e voltar
atrás. Esse tipo de relacionamento não dura.
— A gente não perde o que nunca teve, Robson. Impressionante como
em poucos instantes você desfez toda a boa imagem que eu tinha de você.—
Regina se aproximou da porta da sala de estar e a abriu. — Saia. Eu não quero
mais ouvir uma palavra da sua boca.
— Regina, eu... eu..
Ignorando por completo tudo o que saía da boca de Robson, a morena
caminhou pela sala principal e se direcionou para a porta de saída da casa.
— Não me faça repetir a noite inteira. Saia — disse de maneira séria,
seca e fria.
Sem dizer mais uma palavra que fosse, Robson deixou a casa da
professora furioso. Embora ele soubesse que a morena nunca havia sido dele, ele
não estava pronto para tê-la exclusivamente como amiga. E o fato de Regina ter
se envolvido sentimentalmente com uma mulher feriu seu ego demasiadamente,
fazendo-o cuspir todas aquelas barbaridades.
Após toda aquela agitação inesperada, Regina subiu para o quarto e em
seguida direcionou-se para o banheiro. Ela se permitiu permanecer longos
minutos em um relaxante banho morno, deixando que a água levasse embora
todo o peso que há pouco habitara em seus ombros.
Ao deixar o banheiro, vestiu-se com uma calça de pijama cinza e uma
blusa branca de algodão. Enquanto secava os curtos cabelos com o secador,
ouviu seu celular tocar e vibrar sobre o criado mudo. Ao atender a chamada,
sentiu como se todos os problemas tivessem desaparecido. Era como se o mundo
inteiro parasse para ouvir aquela doce e suave voz.
— Mais bonito que aquele poema... Somente seu olhar direcionado ao
meu — disse Jennifer assim que Regina atendeu sua chamada. — Olhar esse,
que por sinal, recebi tão pouco hoje.
— Fico feliz que tenha gostado do poema. Ele expressa um pouco a
maneira como vejo você e como nos vejo — explicou. — Sobre hoje, desculpe.
Tentei ser o mais indiferente que pude. Infelizmente é necessário — explicou
ela, referindo-se ao fato de ter evitado olhá-la durante toda a aula.
— Eu sei que é necessário, mas é inevitável não desejar mais de você.
— A voz de Jennifer estava suave e um tanto arrastada, fazendo com que Regina
imaginasse suas expressões do outro lado da linha.— Hoje foi tão difícil não te
tocar. Principalmente após ter passado um domingo tão lindo ao seu lado.
— Eu compreendo. Pra mim também não foi tão fácil, ainda mais com
suas provocações. Mas através daquele poema eu quis te agradecer pelo dia de
ontem e te mostrar que você tem significado pra mim.
— Quais provocações?— perguntou Jennifer, fingindo inocência. — Eu
adorei. Obrigada por ele. Assim se torna inevitável me apaixonar por você...
— Então apaixone-se...— Assim que Regina proferiu tais palavras, os
únicos sons a serem escutados por elas eram os de suas respirações. Os silêncios
que se instalavam entre elas sempre vinham carregados de significados; eles
gritavam desejos e sentimentos que apenas dois amantes tão cúmplices e
conectados podiam decifrar.
— Quais provocações? Você ainda pergunta, senhorita Meireles?—
disse Regina ao quebrar o silêncio.
— Você diz isso como se o seu poema também não tivesse sido uma
provocação.— Jennifer rebateu sabiamente. — Como conseguir continuar
dissimulando na aula de amanhã após ler que você se imagina entre minhas
pernas?
— Da mesma forma que fiz hoje quando vi você movimentar as pernas
em um abre e fecha enlouquecedor.
— Ok, Regina Vianna. Ponto pra você!— disse a loira, compartilhando
uma pequena risada com a mais velha. — Agora preciso desligar. Liguei apenas
pra te agradecer pelo poema e pra que você soubesse o quão difícil foi ser
indiferente.
— Adorei sua ligação, ela fez toda a diferença na minha noite.
— É bom saber... — disse Jennifer quase suspirando. — Então até
amanhã.
— Boa noite, Jennifer. Até amanhã.
— Boa noite...


Mais um dia iniciara no Colégio Brooke. Beatriz não havia
comparecido às aulas de hoje, pois amanheceu repleta de cólica. Sendo assim,
Meireles passou todo o período do intervalo isolada na biblioteca. A loira acabou
sendo surpreendida pela presença de Regina no local. Há muito tempo ela e a
professora não se esbarravam por lá, ambas vinham evitando frequentarem o
mesmo ambiente.
Cada uma tomou um lugar em uma mesa não muito distante da outra.
Seus olhares eram curiosos, eles se buscavam vez ou outra quando a vontade
gritava. Meireles era a mais inquieta. Para ela era um desafio descomunal estar
no mesmo ambiente que Regina sem poder olhá-la ou tocá-la.
— Posso me sentar ao seu lado, professora Vianna?— disse Jennifer ao
aproximar-se. A jovem não havia aguentado permanecer apenas olhando-a de
longe.
— Fique à vontade, senhorita — respondeu ao depositar seu olhar sobre
a loira.
— Precisando de alguma ajuda com livros hoje?
— Não. Mas agradeço.— Sorriu.
— Que pena — disse a jovem. — Adoraria um pretexto pra passar mais
tempo com você.— Jennifer usou um baixo tom de voz ao falar. Porém, ainda
assim, Regina olhou para os lados certificando-se de que ninguém as escutava.
Por sorte, a biblioteca era um ambiente quase sempre vazio.
— Por que gostaria de passar mais tempo comigo, senhorita Meireles?
— perguntou a professora. Ela adorava ouvir Jennifer explicando-se.
— Porque te olhar é incansável.— respondeu, provocando um breve
silêncio entre elas.
O silêncio era apenas sonoro, pois seus olhares conversavam
abertamente um com o outro. Suas mãos, sobre a mesa, se mantinham relutantes
para permanecerem onde estavam, uma vez que a vontade de sentirem a maciez
e o calor uma da outra era grande.
Estar na presença de Regina sem poder tocá-la fazia Jennifer morrer aos
poucos. Contudo, esta era uma morte que ela não se importava em ter.
— Confesso que adoro certas torturas, mas essa já está passando dos
limites — disse Regina. — Não sei como vou suportar conviver no mesmo
ambiente que você até o término do ano letivo. É extremamente difícil ter que
policiar movimentos quase involuntários.
— E o proibido nos faz querer ainda mais — comentou Jennifer ao
completar o pensamento de Regina. — Onde tiver uma placa de “não olhe”,
“não toque e “não coma”, nós vamos querer fazer justamente essas três coisas.
— É exatamente assim que acontece. Dizem que desejamos com ainda
mais vontade aquilo que não podemos ter — concordou Regina. — Mas se fosse
apenas por teimosia seria mais fácil de ser resolvido. No entanto, tem algo mais
que está tornando tudo mais difícil.
— O quê?
— Quando minha mão quer ir de encontro a sua, por exemplo, não é por
teimosia, é por necessidade. E quando minha boca reclama por seu beijo, como
agora...— Regina aproximou os lábios do ouvido de Jennifer de modo a
sussurrar o mais baixo possível. — É porque quero te dizer mil coisas em
silêncio.
Jennifer sentiu o coração acelerar às palavras de Regina. Ela não
conseguia compreender por que simples palavras vindas daquela mulher lhe
causavam um efeito tão grande. Seu peito aqueceu ao mesmo tempo em que sua
pele arrepiou-se, sentindo um forte desejo despertando.
— Como eu queria poder ouvir essas mil coisas agora — disse Jennifer,
baixinho. A jovem levou a mão até a da professora e acariciou-a.
Regina permitiu que Jennifer tocasse sua mão e permanecesse ali. O
toque suave da jovem era tão prazeroso, que ela não conseguiu interromper.
Meireles usava a mesma pulseira azul do dia em que saíram juntas. E assim
como no domingo do passeio, Regina iniciou uma brincadeira com ela. A
morena mexia na pulseira ao mesmo tempo em que conversava com a loira.
Eram movimentos quase involuntários.
As duas mulheres permaneceram entregues àquela conversa enquanto
suas mãos se tocavam. Porém, algo inesperado aconteceu. Estela apareceu
repentinamente no local.
— Jennifer, você está aí!— disse ao se aproximar. O olhar de Estela
caiu instantaneamente sobre as mãos de Jennifer e Regina, que rapidamente se
afastaram, quebrando o contato. — Te procurei pela escola inteira!
— Às vezes eu gosto de me isolar aqui — respondeu a loira.
— Oi, professora Vianna.— Educadamente, disse Estela.
— Olá — respondeu a mais velha.
— Você vai continuar aqui ou quer se juntar a mim e Rose no pátio?
Estamos combinando algumas coisa sobre sábado.
— O intervalo já vai terminar daqui a pouco, vou ficar por aqui mesmo.
Depois você me atualiza melhor sobre o que vai rolar, tudo bem?— Jennifer
respondeu.
— Tudo bem — disse Estela, visivelmente descontente. — Vou nessa
então. Até depois.
— Algumas coisas sobre sábado?— indagou Regina assim que sua
outra aluna se foi.
— Estela vai fazer um encontro com alguns amigos nossos e me
convidou.— A mais nova explicou.
— E você vai?
— Pretendo ir, sim — respondeu suavemente.
— Vocês já tiveram algo?
— Não. Não exatamente, quer dizer. Trocamos alguns beijos uma vez,
só isso. Mas ela gosta de mim — explicou.
— Hum... Ok.— Regina sentiu uma pontada de ciúme, mas guardou
para si. — Posso te levar pra casa hoje?— perguntou baixinho ao desviar o
assunto.
— Eu vou adorar.— Sorriu.
— Certo. Eu busco você no mesmo local, ok?
— Ok.
— Agora eu preciso ir, já passamos tempo demais juntas, é melhor
evitarmos. Até depois, Jennifer.
— Até...


Naquele mesmo dia, tempos mais tarde, Estela e Meireles terminavam
de guardar o material após o último horário de aula.
— Você e a senhorita Vianna se dão super bem, não é?— comentou a
menina.
— Um pouco. Temos algumas coisas em comum — respondeu. A loira
começou a questionar-se internamente se Estela havia percebido algo quando as
viu na biblioteca.
— Sabe me dizer se ela é casada e se tem filhos?
— Não, não é casada e não tem filhos.
— Estranho, não acha? Quantos anos será que ela tem? Mais de trinta,
acredito.
— Nem todas as mulheres têm a necessidade de casar e ter filho. Além
de quê, cada uma tem o seu tempo pra isso.
— Realmente...— respondeu pensativa. — Jen, podemos ir embora
juntas hoje?
— Hoje não vai ter como. Não estou indo pra casa, então farei outro
caminho.
— Poxa, que pena. Fica pra um outro dia, então — lamentou. — Bom,
vou indo nessa. Nos vemos amanhã!— Estela depositou um beijo na face de
Jennifer e foi embora.
Meireles caminhou por algumas ruas até chegar ao local combinado
com Regina. Ao avistar o carro da professora à sua espera, acenou e entrou.
Assim que se sentou no banco, Regina a cumprimentou e dirigiu para longe dali.
As duas mulheres foram conversando durante todo o caminho, e quando
finalmente estavam se aproximando da casa de Meireles, Regina encostou com o
carro.
— Posso ter alguns minutos de você pra mim?— perguntou Regina. A
morena lançava sobre Jennifer seu habitual olhar penetrante.
— Me daria horas a você se pudéssemos.— respondeu prontamente,
para a surpresa de Regina, que se admirava com as respostas à altura.— Valorizo
muito o pouco tempo que posso passar ao seu lado. Pena ser tão pouco —
lamentou a jovem.
— Sua mãe permite que você durma fora de casa?
— Sim, mas desde que ela saiba exatamente aonde irei dormir. Por quê?
— Porque eu tenho um convite a fazer. Ainda não poso dar detalhes,
mas inclui você passar a noite comigo. Quero te sequestrar durante um final de
semana inteiro — disse ao sorrir.
— Eu teria que inventar alguma mentira pra ela. É uma droga já ter
dezoito anos, mas morar sob o teto de mãe. Tenho que viver sob as regras dela.
— Eu não gosto de saber que você precisa mentir para sua mãe pra
poder estar comigo. Me sinto mal com essa situação. Eu adoraria poder
conversar com ela sobre nós.
— Mas não pode. Não ainda. Minha mãe sequer sabe sobre minha
sexualidade. Se ela ficasse ciente que sou homossexual, que estou me
relacionando com uma mulher bem mais velha que eu e que ainda é minha
professora, ela nos mataria.— Riu. — A propósito... Quantos anos você tem?
Sem querer ser indelicada.
— Tenho trinta e três — respondeu Regina.
— Então isso te faz... Quinze anos mais velha.— Jennifer observou.
— Sim — afirmou Regina. — O que você acha disso?
— Acho maravilhoso saber que conseguimos nos relacionar e nos
encontrar em diversos sentidos mesmo com essa diferença. E você?
— É novo pra mim. Novo e muito interessante, confesso. Estou
adorando ver as coisas que gosto sob um novo olhar e perspectiva, através do
seu ponto de vista.
— Não me acha uma criança pra você?
Regina repousou a mão sobre a de Jennifer e a acariciou enquanto a
respondia.
— Isso é algo que você definitivamente não é. Em nenhum sentido. Se
achasse que fosse, não estaria com você.
— Fico mais aliviada ouvindo isso — disse Jennifer. A jovem levou
uma das mãos até os cabelos de Regina e arrumou algumas mexas atrás da
orelha.
— Eu te acho mulher o suficiente pra mim, Jennifer — comentou ao
acariciar a face da loira. — E eu... Sou o suficiente pra você?
— Mais que o suficiente. Meu caminhão vai precisar fazer duas viagens
— brincou, arrancando da mulher uma gostosa gargalhada. — O tempo que
passamos juntas que não é. Eu queria poder te olhar e te tocar sem pressa e sem
medo de sermos descobertas.
— Eu compreendo, tem sido uma agonia diária. Além de haver a
necessidade de estarmos próximas, é péssimo passar os dias com a sensação de
que estamos cometendo algum crime.
— Pois é. Acho que o sentimento entre duas pessoas não deveria
depender de tantas regras sociais.
— Concordo plenamente. Mas podemos aproveitar o momento de
agora.— Regina mergulhou os próprios dedos entre os dedos de Jennifer,
entrelaçando-os. — Quero decorar cada traço seu e cada prazerosa sensação que
é estar ao seu lado.
— Quanto mais eu tenho de você, mais eu quero — afirmou Jennifer ao
mexer os dedos entre os dedos de Regina. Eles deslizavam e se entrelaçavam
entre os da professora.
— E o que você mais quer agora?— Regina a olhava fixamente.
— Seus lábios pressionados nos meus — murmurou ao levar o rosto ao
de Regina. — Me beija — pediu em um sussurro.
Regina roçou os lábios contra os dela ao mesmo tempo em que aspirou
o perfume que emanava daquela pele. Aquele cheiro acompanhado da textura
dos lábios a inebriava.
As duas mulheres iniciaram um beijo lento, provando uma à outra sem
pressa. Elas se entregavam e embarcavam em uma prazerosa viagem de sabores
e desejos. Seus lábios se moviam em sincronia e se encaixavam como se
tivessem sido moldados para se pertencer. Suas línguas, quentes, úmidas e
precisas, deslizavam sobre a outra e se enroscavam de uma maneira tão
prazerosa, que baixos gemidos se faziam audíveis.
— Acho que eu preciso ir — murmurou a mais nova entre o beijo.
— Por quê?
— Antes que as coisas esquentem demais.
Regina soltou uma pequena risada e interrompeu o beijo para poder
olhá-la nos olhos.
— Infelizmente eu preciso dizer que se as coisas esquentarem como da
última vez, senhorita Meireles, eu não sei se dou conta de me segurar. Mas eu
não gostaria que você fosse embora agora.
Jennifer sorriu e buscou os castanhos de sua professora, olhando-a bem
ao fundo dos olhos.
— Então me peça pra ficar.
Regina acariciou a face de Meireles com ternura enquanto se permitia
perder-se naquele olhar tão mar, tão universo, tão Jennifer.
— Fica um pouco mais comigo?— pediu suavemente. — Fica e deixa o
tempo se arrastar.
A loira deu à Regina aquele sorriso travesso que ela tanto gostava. Era
um sorriso brilhante, com seus dentes sutilmente tortos, que faziam a morena
derreter-se tamanha a graciosidade. Aquele sorriso de Jennifer era o reflexo de
sua alma, que também sorria para Regina.
A morena aconchegou Meireles em seu peito e envolveu parcialmente o
corpo da jovem com ternura e carinho. Ela acariciava os braços de Meireles ao
mesmo tempo em que conseguia aspirar o gostoso perfume que emanava das
ondas douradas da loira.
Jennifer, na posição onde estava, conseguia ouvir as rápidas batidas do
coração de Regina enquanto se deliciava com os carinhos que recebia. As duas
mulheres estavam sentimentalmente entregues e pensando no quão bom era
repousar uma na outra.
— Provavelmente só voltaremos a nos ver na aula de sexta — comentou
Jennifer ao afastar a cabeça do colo de Regina. — Mas amanhã eu tenho treino
de boxe pela manhã. Seria maravilhoso se uma certa professora aparecesse por
lá.
— Essa professora precisaria ser convencida a isso.
— O que essa aluna aqui poderia fazer pra convencê-la, hum?—
perguntou com malícia em sua voz.
— Não me faz uma pergunta dessa, pois eu tenho uma lista de respostas
pra te dar.
Meireles inclinou-se sutilmente sobre ela e começou a desabotoar
lentamente os primeiros botões da blusa social que a professora usava.
— É só você pedir que eu faço — murmurou.
— Não faz assim...— pediu Regina. A voz da morena estava arrastada.
Ela começara a excitar-se com a imagem de Jennifer abrindo sua camisa.
— Você quer que eu pare?— perguntou, segundos antes de abrir o
terceiro botão; deixando à mostra uma parte da renda do sutiã preto que Regina
usava.
— Sim — respondeu, indo contra todas as forças contrárias que
gritavam para que Jennifer continuasse.
— Então diz que vai me ver.— Meireles deslizou os lábios pela curva
do pescoço de Regina ao mesmo tempo em que desceu sua mão pela coxa da
mulher. — Diz. Essa é a única forma de me fazer parar.— Jennifer deslizou uma
de suas mãos para dentro da saia da mais velha enquanto usava a outra para
brincar com os botões da camisa.
— Não me tortura assim...— disse ao segurar o pulso de Jennifer.
— Você acha mesmo que tem força pra mim, Regina?— Jennifer sorriu
e desvencilhou-se da mão da mulher. Logo após, mergulhou sua mão ainda mais.
Dessa vez, alcançando a lateral da calcinha que a morena usava, constatando que
se tratava de uma minúscula peça. — Você quer saber os pensamentos sujos que
habitavam minha mente na aula de ontem?
— Jennifer...
— Eu só conseguia imaginar minhas mãos em suas pernas, arranhando
e puxando toda aquela meia calça preta até rasgá-la e tirá-la do seu corpo.
Depois, imaginei minhas mãos brincando na minúscula calcinha que você estaria
usando, assim como essa — disse ao deslizar o dedo pela alça. — Me imaginei
sentando no seu colo e abrindo todos os botões da sua blusa.
Quanto mais Jennifer falava, mais a pele de Regina esquentava. A
morena estava em brasa, controlando-se para não avançar sobre a loira. Todavia,
estava imensamente difícil fingir indiferença.
— Depois eu...
— Shhh. Depois você ficaria quietinha seguindo minhas ordens —
disse Regina ao interrompê-la. — Eu ditaria cada coisa que você iria fazer, e
você me obedeceria por prazer — disse com seriedade e rouquidão em sua voz.
— Por que você acha que eu iria te obedecer, Regina?— provocou.
— Porque na cama quem manda sou eu — respondeu com a voz
carregada de luxúria. — Se eu quiser que você tire minha roupa, você vai tirar.
Se eu quiser suas mãos quentes passeando em meu corpo, você vai fazer. Mas se
eu quiser sentir sua umidade nos meus dedos, eu vou sentir. Sabe por que,
Jennifer?— Regina aproximou-se do ouvido da loira e sussurrou — Porque nada
vai te dar mais prazer que me sentir dentro de você.
Naquele momento, Jennifer já não lembrava como era respirar. Puta que
pariu eram as únicas palavras que se repetiam em sua mente.
— Agora você vai fechar cada botão desses que abriu e vai me dar o
prazer de te ver me obedecendo.
Jennifer, ainda sob o efeito físico das palavras, sorriu de maneira sacana
e fechou um por um dos botões. Ela nunca havia recebido ordens de teor sexual.
Toda aquela posição de submissão a estava enlouquecendo.
— Nos vemos amanhã, senhorita Meireles.— Sorriu; aquele meio
sorriso de lado carregado de más intenções.
— Estarei te esperando...


Capítulo 16

Era a manhã de uma quarta-feira e Meireles havia acabado de chegar à
academia. A jovem vestiu seu uniforme de treino, prendeu o cabelo em um alto
rabo de cavalo e juntou-se a seu treinador. Vez ou outra, em meio ao treino,
olhava para a porta na expectativa de ver Regina.
— Bom dia, menina de ouro.— A voz rouca da morena soou próxima à
nuca da jovem. Meireles estava tão concentrada, que não a vira entrar.
— Regina!— disse com alegria, virando-se. — Você veio!
— Eu sempre cumpro o que digo — sorriu. — Olá, bom dia — disse
ela, educadamente, ao orientador da mais nova.
— Bom dia!— respondeu o homem. — Deixarei vocês a sós — disse
ele, segundos antes de se retirar.
— Não vou cumprimentá-la porque estou toda suada.
— Eu não me importo — disse Regina ao aproximar-se, depositando
um beijo na face rosada de Meireles, fruto do esforço físico. — Adoro ver você
treinando.
— Toda suada, vermelha e descabelada?— perguntou a loira, rindo.
— Linda e à vontade. Inteiramente compenetrada no que gosta —
respondeu suavemente. — Adoro observá-la assim.
— Você é louca, Regina.
A jovem estava levemente ruborizada por conta dos elogios da mulher.
— Talvez eu seja — disse ela. — Mas, você realmente fica uma graça.
— Sorriu.
— Vamos até ali comigo?— comentou ao apontar em direção aos sacos
de pancada. Regina assentiu e as duas caminharam juntas até lá.
— Eles são bem pesados — constatou a morena ao tocá-los e empurrá-
los.
— Sim. Eles simulam uma pessoa — explicou Jennifer. — São
utilizados na aplicação de socos para melhorar a força, técnica e combinações de
golpes. Esses ficam amarrados no teto, mas também tem aqueles ali.— Meireles
apontou para as torres de pancada. — Porém, hoje ficarei apenas com esses.
Regina a observava com atenção. Ela adorava saber sobre todas as
coisas que faziam parte do universo da loira.
— Eu posso te ensinar algumas coisas se você quiser. Mas pra isso você
precisaria vir com outro tipo de roupa, claro.— Disse Jennifer, rindo,
observando Regina em seu vestido vermelho e saltos pretos.
— Oh! — riu de si mesma — Eu não voltarei em casa, daqui já vou me
direcionar para o trabalho, por isso estou vestida assim — explicou-se — Mas
certamente eu adoraria aprender algumas coisas com você em outro momento.
— Acho que temos muito que aprender uma com a outra — disse ao
buscar o olhar da mais velha.
— Pode apostar que sim — respondeu séria, perdendo-se por um
momento no par de olhos à sua frente.
— Bom, vou voltar ao treino agora. Você pode sentar-se naquelas
cadeiras ali ou ficar próxima a mim.
— Acho que vou ficar por aqui. Não quero correr o risco de ser acertada
por um de seus socos — brincou, arrancando uma risada de Jennifer.
Meireles direcionou-se para frente de um dos sacos de pancada e
começou a acertá-los. Regina, de onde estava, observava cada golpe da loira
com total atenção. A morena ficava hipnotizada com o físico impecável que ela
possuía. Após algum tempo, não se contendo em apenas olhá-la de longe,
levantou-se e foi até ela.
— Eu tirarei sua concentração se ficar aqui?
— Totalmente. Mas eu não me importo — respondeu Jennifer ao
esboçar um sorriso de lado.
A cada golpe que Meireles dava no saco, Regina observava os
músculos e veias dos braços ficando em evidência. Aqueles detalhes eram
imensamente atraentes para ela. Regina sentia seu corpo aquecer ao imaginar o
tamanho da força que a loira possuía. E embora ela adorasse um domínio, ser
dominada também lhe apetecia. Mas, não por qualquer pessoa. Apenas por ela:
Jennifer Meireles.
As duas mulheres mantinham um longo diálogo durante o treino.
Falavam sobre assuntos aleatórios, mas, principalmente, sobre Jennifer e o boxe.
Regina não conseguia disfarçar a forte atração que estava sentindo pela
jovem. Atração essa, que Jennifer percebera e se aproveitaria.
— Acho que já chega por hoje — comentou ao livrar-se das luvas e se
aproximar de Regina. — Vou encerrar mais cedo pra aproveitar sua companhia.
— A mais nova envolveu a fina cintura de Regina com um de seus braços e
olhou a mulher bem no fundo dos olhos.
— Jennifer, não na frente de todos — falou baixinho, referindo-se a
algumas poucas pessoas presentes no local.
— Ninguém está prestando atenção em nós — respondeu ao fechar um
pouco mais seu braço na cintura da morena.
— Você vai nos colocar em maus lençóis, garota.
— Garota não, por favor...
— Mas você é uma garota — implicou Regina.
Jennifer ignorou o que a morena dissera e a convidou para juntar-se a
ela no vestiário. Chegando lá, trancou a porta, pegou sua branca toalha de banho,
colocando-a sobre os ombros, e em seguida aproximou-se da mais velha.
— Repete o que você disse lá fora — disse seriamente.
— Eu disse muitas coisas lá fora.
— Sabe exatamente ao que me refiro.
— Que você é uma garota?— disse Regina enquanto tentava conter o
riso. — Você é uma garota, Jennifer — repetiu. A morena adorava implicar com
ela.
— Mas eu também posso ser uma mulher — respondeu ao guiá-la com
seu corpo até encostá-la contra a extensa pia de mármore que havia no vestiário.
— Você quer que eu seja uma mulher pra você, agora?
— Você sempre é uma mulher pra mim — afirmou ao penetrar seu
olhar no par de olhos verdes à sua frente. — Agora preciso que você desencoste,
não quero chegar com meu vestido amassado no trabalho — disse enquanto
tentava desvencilhar-se.
— Não.— A loira respondeu séria ao segurar sua professora, a
impedindo de sair. — Aqui dentro é o meu território.— Meireles puxou a toalha
que estava sobre seus ombros e a forrou na pia. — E quem dá as ordens sou eu.
— Completou. A loira segurou Regina pela cintura e a suspendeu, fazendo-a
sentar-se sobre a toalha.
— Meireles, não.
— Então diz que não quer, diz?— Jennifer encaixou-se entre as pernas
de Regina, apoiou as mãos sobre a pia e inclinou-se sutilmente sobre a morena.
Ela estava completamente suada, e fez questão que Regina sentisse. Jennifer
pegou a mão da mais velha e a colocou dentro de sua camisa, por baixo, fazendo
Regina sentir seu abdômen e o suor que escorria sobre ele.
Regina deslizou as pontas de seus dedos por toda extensão daquela pele
suada, deliciando-se com a sensação úmida e macia. Enquanto o prazer físico ia
tomando conta de seu corpo, sua mente imaginava incontáveis situações eróticas
com a loira. Meireles, sem dúvida, a tirava do eixo.
— Você sabe que eu quero. Eu nunca vou negar — respondeu ao
arranhar sutilmente a pele do abdômen da loira. — Mas daqui a pouco preciso ir
trabalhar.
— Eu não quero saber — disse com firmeza ao deslizar o rosto suado
pela curva do pescoço de Regina. — Eu preciso de você, já estou enlouquecendo
— murmurou ao morder o lóbulo da orelha da mulher.
Sentir a pele suada de Jennifer estava excitando-a. Os poros da jovem
exalavam um perfume único; era um cheiro que a morena muito desejava ter
impregnado em sua pele.
— Quanto precisa?— instigou-a.
— Muito, Regina. Já não consigo ficar sem provar seus beijos, seus
toques, sua voz rouca me dizendo mil depravações ao ouvido.
— Você adora minhas depravações, não é?
— Totalmente.
— Você é uma safada, Jennifer!— disse ao expressar um sorriso de
lado.
— Você tem me feito assim.
— Não tenho nada a ver com isso, eu não te fiz assim. Aliás, eu ainda
não fiz nada com você. Mas estou louca pra fazer — murmurou em tom
provocativo.
— E o que você está louca pra fazer comigo?— perguntou ao deslizar
as mãos pela coxa da mulher; subindo sutilmente o vestido vermelho.
— Eu quero devorar cada parte do seu corpo.
— Meu Deus, Regina...— murmurou a jovem ao sentir as pernas
fraquejarem.
— Deus?— Riu. — Nem Deus te salva de mim.
— E quem disse que eu quero ser salva?— Meireles segurou as pernas
de Regina e as prendeu em sua cintura. Logo após, inclinou-se ainda mais sobre
a mulher e a beijou com fervor.
Regina segurou em seus cabelos com força e correspondeu ao beijo. Ela
enlaçava suas pernas na cintura da jovem com precisão e a puxava para perto de
si.
As duas mulheres rapidamente foram ficando ofegantes. Meireles fez
questão de percorrer as coxas e a lateral do corpo de Regina com as mãos;
registrando cada pedaço da mulher por quem havia se apaixonado.
Regina, por sua vez, se deliciava com o toque preciso de Jennifer em
seu corpo. Ter a loira completamente suada e vermelha para si era de tirar o
fôlego.
— Eu já não aguento essa vontade de ter você — sussurrou Regina
entre o beijo, sentindo o braço de Jennifer envolvendo cada vez mais sua cintura.
— Eu quero você na minha cama — murmurou ao mesmo tempo em que sentia
partes suadas daquela pele branca roçando contra sua pele.
— E eu quero você entre as minhas pernas.— Jennifer respondeu em
um sussurro. — Quero você dentro de mim do jeito que eu sei que só você pode
fazer.
— Com força?— comentou Regina.
— Sim, com força — respondeu em um murmúrio.
— Ótimo... Pois é exatamente assim que quero mergulhar em você —
sussurrou a mais velha.
— Porra, Regina...— disse Jennifer com a voz arrastada e carregada de
desejo. A loira afastou-se da mais velha para conseguir tomar um pouco de ar.
As últimas palavras de Regina haviam conseguido desnorteá-la. — Não dá mais
pra permanecer no mesmo ambiente que você por muito tempo — disse
enquanto tentava voltar a si.
Regina desceu da pia esboçando um pequeno sorriso sacana e vitorioso.
— É só você não me provocar, que a gente consegue — disse ela ao
sorrir, percebendo o efeito que suas palavras haviam provocado na loira.
Meireles aproximou-se da pia, lavou o rosto e o secou. Ela ainda
possuía a respiração alterada, e seu coração batia como se fosse saltar de seu
peito.
— Quer lanchar comigo? Eu costumo almoçar ao chegar em casa, mas
hoje eu gostaria de comer ao seu lado.
— Nem fizemos nada e você já sentiu fome? — brincou, fazendo-a rir.
— Eu adoraria — respondeu, por fim.
As duas mulheres se dirigiram para a lanchonete da academia e
compraram dois sanduíches. Ambas escolheram sanduíche de frango. Meireles
pediu um suco de laranja e Regina optou por uma garrafa de mate. Conforme
foram comendo e conversando, os ânimos foram voltando ao normal.
— É muito bom ter você aqui — disse Jennifer, sorrindo, ao observar
sua professora. — Eu gosto tanto de você, Regina...
— E eu de você — respondeu com um sorriso nos lábios ao repousar a
mão sobre a da loira.
— O que você faria se eu dissesse que me apaixonei por você?—
perguntou Jennifer ao buscar os castanhos à sua frente.
Regina hesitou por alguns instantes enquanto se aconchegava no
acolhimento e morada daquele olhar. Ela deslizou a mão sobre a da jovem até
alcançar a pulseira que ela sempre usava, e que Regina conhecia bem o caminho
até ela. Então, sem desviar os olhos das esmeraldas que a olhavam esperando
ansiosamente uma resposta, Regina soltou um longo suspiro e a respondeu.
— Eu diria que o sentimento é recíproco.— Sorriu.
— Eu me apaixonei por você, Regina — disse com suavidade e doçura
em sua voz. A loira esboçou um largo e brilhante sorriso ao expressar aquele
sentimento tão sincero.
— E eu estou apaixonada por você há tempos, Jen. Completamente...
Jennifer segurou a face de Regina com as duas mãos e a puxou para
próximo de seu rosto, roçando lentamente seu nariz contra o dela .
— Não desiste de nós...— pediu com ternura.
— Eu jamais prenderia essa paixão dentro de mim.— A resposta de
Regina fora o suficiente para fazer os lábios de Jennifer se curvarem. — Eu
adoro quando seu sorriso sorri pro meu — comentou. — Com todos esses
dentinhos tortos que você tem — completou.
— Ai Regina, para! Esquece meus dentes — retrucou.
— Não paro, não. Eles são apenas sutilmente tortos, Jennifer. Nada
demais. São uma graça. Fazem parte dos seus detalhes, e eu amo cada um deles.
Meireles soltou um longo suspiro ao ouvir as últimas palavras ditas por
Regina. Para ela, era quase impossível acreditar que compartilhava daquele
momento tão simples, mas ao mesmo tempo tão carregado de significado com
Regina.
— O peso do mundo parece uma pena quando estou com você.
— Assim como a pena de um cisne?
— Assim como a pena de um cisne — afirmou a jovem.
— Sabe, Jennifer... Eu não acredito em almas gêmeas ou em pessoas
que chegam pra nos completarem, pois todos somos completos e
autossuficientes. As pessoas têm que vir pra somar e transbordar o que já é
inteiro. Mas eu acredito em conexões de almas. Acredito em pessoas que se
conectam facilmente e que dançam com suas almas em sintonia. Mas se elas
ficarão juntas ou não, não depende do destino. Depende apenas delas e do
quanto elas querem fazer isso dar certo.— Regina falava de maneira serena
enquanto permanecia mexendo na pulseira de Meireles. — Eu senti algo
diferente ao mergulhar no seu olhar pela primeira vez. E me sinto ligada a ele e a
você desde então. Pela primeira vez sinto alguém transbordando meu físico e
meu psicológico, e eu não quero desistir disso. Tudo o que você me desperta, me
enlouquece. E eu adoro essa sensação de estar fora de órbita.
— Nossa... Às vezes você me deixa sem palavras — disse Jennifer. —
Eu penso bastante parecido com você, e eu não busco uma relação perfeita. Na
verdade eu não estava buscando nada, mas você apareceu e me despertou tantas
coisas. Agora tudo o que quero é um alguém pra onde eu possa voltar, pra onde
eu possa repousar minha cabeça enquanto conversamos sobre a vida. E eu queria
que esse alguém fosse você.
— Eu ia perguntar quais coisas foram essas que despertei em você, mas
é melhor não entrarmos em determinados assuntos agora, não sei se dou conta —
disse Regina, compartilhando uma risada com a mais nova. — Eu também
gostaria que fosse você — continuou a falar. — Apenas você...— sussurrou
próximo aos lábios da loira, provocando um arrepio em toda aquela pele branca.
— Não sussurra assim, que me desperta as tais coisas.
Regina soltou uma pequena risada e se afastou.
— Certo. Mas só porque estamos em local público — comentou. — E
porque eu já preciso ir. Aliás, precisamos — disse ao conferir a hora em seu
relógio de pulso.
— Então vou ao vestiário me trocar e já volto.
— Você trouxe seu uniforme?
— Não, eu sempre passo em casa pra tomar um banho e me arrumar —
respondeu.
— Então eu te deixo em casa antes de ir.
— Não precisa se incomodar, Regina. Eu pego um ônibus.
— Não é incômodo, Jennifer. Agora vai lá pra não nos atrasarmos.
— Ok.— Sorriu.
Assim que Jennifer retornou, seguiram juntas até a rua da casa da mais
nova. Regina despediu-se da loira com um beijo e, antes de abrir a porta do carro
para ela, sentiu as mãos de Meireles tocarem seu braço.
— Para que não me esqueça — disse Jennifer ao amarrar sua pulseira
azul no pulso de Regina. — Até.
Um sorriso bobo habitou os lábios de Regina após aquele simples gesto.
Para ela, era surpreendente a forma como aquela garota mexia com seus
sentimentos. Ela permaneceu dentro do carro observando-a até que sumisse de
seu campo de vista.


O final de semana havia iniciado. Jennifer, Kevin, Beatriz e Rose
estavam todos reunidos na casa de Estela. A anfitriã havia preparado pipoca
doce e salgada, e todos estavam reunidos na sala terminando de assistir a um
filme de terror. Estela havia convidado, também, sua amiga Rafaela. Rafaela
tinha dezessete anos e cursava o segundo ano. Ela era magra, alta e possuía
cabelos anelados e avermelhados.
— Não sei por que aceitei assistir a esse filme. Vou me tremer de medo
quando precisar ir sozinha ao banheiro à noite — comentou Beatriz ao agarrar-se
em Kevin.
— Deixa de ser medrosa, Bea! Isso é tudo ficção. Nenhum espírito
maligno irá aparecer no seu quarto — disse Jennifer enquanto tentava conter o
riso.
Quando o filme chegou ao fim, Beatriz sugeriu que todos fossem fazer
algo divertido para que as lembranças do filme deixassem sua mente.
— Podemos brincar de verdade ou desafio. O que acham?— sugeriu
Rose.
— Ótima ideia!— Respondeu Rafaela. A ruiva não conseguia desgrudar
os olhos de Rose.
O grupo de amigos se reuniu em uma roda no chão e depositaram uma
garrafa de vidro no centro. A ordem, em sentido horário, era: Rose, Beatriz,
Jennifer, Kevin, Rafaela e Estela.
— Vocês querem cerveja?— ofereceu Estela.
— Eu quero!— disse Kevin.
— Eu também — respondeu Rafaela.
— E vocês?— perguntou Estela, referindo-se a Beatriz, Jennifer e
Rafaela.
— Não, obrigada — disse Jennifer educadamente.
— Eu também não — respondeu Rafaela.
— Acho que vou querer, sim — comentou Beatriz.
Estela foi até a cozinha, voltou com algumas latas de cerveja, ligou o
aparelho de som e retornou a seu lugar na roda.
— Todos prontos?— perguntou Rose.
— Sim!— responderam quase em uníssono.
Visto que a ideia foi de Rose, ela foi a primeira a girar a garrafa.
— Jennifer e Kevin! Disse Rose ao constatar que os extremos da garrafa
apontaram para eles dois. A boca da garrafa, escolhida para ser o lado de quem
fazia as perguntas, parou em Kevin. Sendo assim, ele pediu para que Meireles
escolhesse entre verdade ou desafio.
— Verdade.— Ela escolheu.
— Vamos lá!— disse Kevin ao esfregar as mãos.— É verdade que você
já ficou com alguém dessa roda?
— Sim — respondeu Jennifer ao olhar para Estela. Agora, foi a vez da
loira rodar a garrafa. — Beatriz e Rafaela!
— Verdade ou desafio?— perguntou Rafaela.
— Verdade — escolheu Beatriz.
— É verdade que você já mandou foto semi nua?— Rafaela perguntou.
— Não vale mentir, eu sei a verdade!— disse Jennifer, rindo.
— Que sem graça você, Jennifer Meireles. Só pra me matar de
vergonha, não é? Sua vez chegará!— disse Beatriz. — Sim, é verdade —
respondeu.
— Huuuum!— disse Rose ao olhar para Kevin, pré julgando que as
fotos nuas foram enviadas a ele.
— Não sei de nada!— respondeu ele, rindo, ao lançar as mãos pra cima.
Consequentemente, todos na roda caíram na gargalhada.
Beatriz girou a garrafa e dessa vez os apontados foram Kevin e Rose.
— Verdade ou desafio?— perguntou Kevin.
— Desafio — escolheu Rose.
— Eu te desafio a mudar o status das suas redes sociais para
namorando.
— Essa é fácil! Todos vão estranhar, pois nunca namorei, mas vamos
lá.— Rose pegou o celular e modificou o status de relacionamento. — Agora é
só aguardar os comentários do tipo “amém”, “milagres acontecem.” — Riu.
Rose girou a garrafa e os apontados, dessa vez, foram Jennifer e Rafaela.
— Verdade ou desafio?— perguntou Rafaela.
— Verdade — escolheu Jennifer.
— Eu posso fazer qualquer pergunta e esperar que a resposta seja
verdadeira, ou obrigatoriamente eu preciso dizer uma afirmação e esperar o sim
ou não?— perguntou Rafaela aos participantes.
— Pode ser qualquer pergunta, fica até mais interessante assim. Mas
todos precisam ser honestos em suas respostas — disse Rose.
— Ok, então lá vai...— disse Rafaela.
— Lá vem bomba — comentou Jennifer, arrancando uma risada dos
demais.
— Você já ficou muito excitada ao beijar alguém?— perguntou
Rafaela.
Pensar em Regina foi inevitável nessa hora. A loira soltou uma pequena
risada segundos antes de responder.
— Sim, com toda certeza.
— Uuuui!— exclamou Rose.
— Com toda certeza.— Kevin repetiu.
— Ai gente, parem!— disse Jennifer, sem jeito. — Vou rodar! Prestem
atenção!— disse ela, instantes antes de girar a garrafa. — Rose e Rafaela!
— Verdade ou desafio?— perguntou Rose.
— Verdade — escolheu Rafaela.
— Quem você levaria dessa roda para uma ilha deserta?— Rose
perguntou.
— Você.— Rafaela foi direta em sua resposta, deixando Rose
completamente sem reação.
— Acho que você se arrependeria da escolha. Não sou uma boa
companhia — disse Rose ao sentir suas bochechas queimarem.
— Acho pouco provável me arrepender — respondeu Rafaela ao sorrir.
— Jennifer e Estela — disse a ruiva após girar a garrafa.
— Verdade ou desafio, Jennifer?— perguntou Estela ao olhar nos
fundos dos olhos de Meireles.
— Desafio — escolheu.
— Então te desafio a me beijar — disse Estela, fazendo Meireles
arregalar os olhos.
— Beija! Beija! Beija!— dizia Rose ao bater palmas.
Beatriz, de seu lugar, olhava para Jennifer com aflição. Ela começou a
questionar-se internamente se Jennifer beijaria Estela ou não, tendo em vista seu
romance com Regina.
— Eu não posso — respondeu, causando um espanto em todos os
presentes.
— Jennifer, faz parte da brincadeira, e é apenas um beijo...— disse
Estela.
— Eu sei, mas eu não quero — respondeu suavemente. — Eu...—
Jennifer respirou fundo enquanto se questionava sobre falar a verdade ou não, e
acabou optando dizer uma parte do motivo. — Eu estou comprometida com
alguém.
Estela se manteve em silêncio absoluto enquanto sentia um forte ciúme
tomando conta. Beatriz, de seu lugar, também se manteve calada. Contudo,
Kevin e Rose ficaram surpresos e curiosos a respeito de quem se tratava.
— Podemos saber quem é a sortuda, Jennifer Meireles?— perguntou
Rose.
— Ta namorando e não contou pra galera, Meireles?— comentou
Kevin.
— Eu não estou namorando, mas estou com alguém, sim — respondeu.
— Não me façam perguntas a respeito, por favor.
— Por que não podemos saber quem é?— insistiu Rose.
— Em algum momento vocês saberão — disse Jennifer.
— Não acredito que você vai fazer suspense com isso — retrucou
Kevin.
— Até onde sei, tenho o direito à privacidade — respondeu séria.
— Ih...— murmurou Rafaela.
— Já que Jennifer não cumpriu o desafio e, consequentemente, quebrou
uma regra do jogo, está fora — disse Rose.
— Tudo bem, continuem sem mim, eu vou indo nessa — disse ao
levantar-se da roda. Jennifer estava chateada pelo rumo que a brincadeira havia
tomado, e também estava sentida por ver Estela naquela situação
constrangedora.
— Não vai agora não, Jen. A gente faz outra coisa — comentou Beatriz.
— Está tudo bem, não se preocupem. Continuem se divertindo. Nos
vemos semana que vem no colégio.— Meireles, ao se despedir, acenou para seus
amigos e caminhou em direção a porta de saída na companhia de Estela.
— Desculpa por hoje — disse Estela.
— Não precisa se desculpar. Afinal, não tinha como você adivinhar que
estou comprometida. Bom, vou indo nessa. Nos vemos...
— Tchau, Jen.— Estela fechou a porta e voltou a se reunir com os
demais. Contudo, sua mente não parava de se questionar sobre quem seria a
pessoa com que Jennifer está se relacionando.


— Jennifer, babado!— exclamou Beatriz ao avistar Meireles no
corredor do colégio. Uma nova semana de aula havia se iniciado.
— O que houve?— perguntou ao aproximar-se de sua amiga. Hoje era o
dia em que a classe 309 seria levada ao museu histórico nacional.
— Sábado, quando você foi embora após aquele ocorrido, nós
decidimos parar de jogar — disse Beatriz ao entrar na sala de aula com Meireles.
— A Estela colocou umas músicas pra tocar e começou a encher a cara. Acho
que estava com dor de cotovelo, sei lá. Enfim... O que quero te dizer é que a
Rose a acompanhou na bebedeira, e aquela amiga da Estela também, a Rafaela.
E adivinha?
— Não faço ideia. O quê?— perguntou enquanto dirigia sua atenção à
Beatriz.
— Rose e Rafaela deram um beijão na frente de todos!— exclamou.
— Como assim? Mas a Rose não é hétero?— disse Jennifer, incrédula.
— Até onde a gente saiba, sim. Mas ela estava muito bêbada. As três,
na verdade. Elas beberam muito. A Rafaela ficou em cima da Rose durante
muito tempo, acabou rolando.
— Que babado!
— Sim! Babadão!— disse ao compartilhar uma risada com Meireles.
— Vamos ver qual será a dela a partir de agora. Vai que ela se descobre
bissexual, não é? Nunca se sabe — comentou Jennifer.
— Verdade!
Quando todos os alunos já estavam reunidos dentro da sala, Meireles
conferiu a hora no celular e constatou que faltava poucos minutos para o horário
de partida.
— Boa tarde!— disse Regina Vianna ao entrar. — Animados para o
passeio?
— Sim!— Alguns alunos responderam.
— Boa tarde, senhorita Vianna — disse Jennifer ao vê-la entrar.
— Boa tarde, senhorita Meireles. Estamos um pouco em cima da hora,
poderia fazer a chamada pra mim?
— Claro — disse ao pegar o diário de classe. Meireles puxou uma
cadeira e sentou-se ao lado de sua professora. Enquanto fazia a chamada, Regina
ia contando o número de alunos presentes. Feito isso, ambas se direcionaram
para fora com a classe.
— Vou entrar com a turma no ônibus escolar, você poderia pegar os
convites de gratuidade na diretoria?— perguntou Regina.
Meireles assentiu e caminhou até a sala da direção. Logo após estar com
os convites em mãos, fez o retorno e subiu para o ônibus. Ao entrar, olhou para
frente e avistou quase todos os lugares preenchidos. A turma era grande. Estela e
Beatriz estavam sentadas juntas. Sendo assim, Jennifer acabou tomando um
lugar ao lado da professora Vianna.


Ponto de Vista de Jennifer

Me sentar ao lado de Regina Vianna era a última coisa que eu desejava
naquela tarde. Porém, entre viajar ao lado dela ou na companhia de algum
aluno que fosse quase um estranho pra mim, optei ir com ela e resistir às
tentações.
Assim que tomei meu lugar ao lado de Regina, seu doce perfume
invadiu minhas narinas. Regina usava um perfume profundamente sedutor. Na
verdade, tudo naquela mulher seduzia. Ao me sentar, meus olhos rapidamente
caíram sobre ela. Regina estava usando calça jeans e blusa social. Seu habitual
óculos de grau estava preso na gola de sua camisa. Assim que olhei para seu
pulso, sorrir foi inevitável. A pulseira que eu havia dado a ela estava no mesmo
lugar que a deixei.
Senti vontade de tocar aquela mão tão macia, delicada e feminina. Eu
queria sentir a textura e o calor sendo transpassado para a minha. Contudo, eu
sabia que não seria possível. Eu precisava me controlar ou as pessoas notariam.

Ponto de Vista de Regina

Era demasiadamente prazeroso ter Jennifer sentada a meu lado. Eu
conseguia sentir o aroma de seu perfume ao mesmo tempo em que nossas pernas
e braços se esbarravam involuntariamente. Todavia, a tortura também era em
demasia. Quanto mais eu sentia de seu cheiro e toque, mais a vontade de beijá-
la aumentava. Hoje eu ainda não havia sentido o gosto de sua boca e estava
louca para fazê-lo.
Eu não sabia como iria fazer para suportar uma tarde inteira ao lado
de Jennifer sem poder tocá-la ou beijá-la. E a pior parte seria fingir indiferença,
me comportando como se ela fosse apenas mais uma aluna entre todas as
outras.
A única parte fácil, se é que posso dizer que existe, era o fato de
Meireles estar se comportando. Em nenhum momento houve provocação de sua
parte. E, até o presente momento, conversávamos apenas sobre assuntos banais
ou questões que envolvessem o passeio.


Assim que o ônibus estacionou, Jennifer e Regina distribuíram os
convites para os estudantes. Meireles encarregou-se de distribuir no lado
esquerdo e Regina no direito.
Quando Regina entregou o bilhete de entrada na mão de Estela, notou
que a menina olhava fixamente para seu braço; mais precisamente para seu
pulso. A jovem observou com atenção a pulseira que havia ali.
— Obrigada — disse Estela à professora. A jovem semicerrou os olhos
e esboçou uma expressão pensativa.
Quando todos já estavam com suas entradas em mãos, Meireles voltou a
fazer a contagem de alunos e os liberou para que saíssem da condução e
entrassem no museu. A loira estava encarregada de, junto à Regina, manter a
ordem dos estudantes e manter suas atenções sobre eles, de modo a impedir que
algum aluno tomasse um rumo diferente do que foi planejado para o dia de hoje.
A exposição estava organizada em seções. No primeiro piso seria
mostrado a evolução da vida e do homem; a história da Terra e dos primeiros
seres que a povoaram. No segundo andar; culturas mediterrâneas, incluindo
artefatos antigos. E no terceiro; Egito Antigo. Fotografar era permitido, mas
desde que o flash não fosse utilizado.
O museu possuía uma linda arquitetura. As colunas e escadas eram de
mármore, enquanto o teto era inteiramente decorado com imagens que remetiam
às pinturas antigas. No hall principal havia um grande e luxuoso lustre. Lá
também havia duas grandes poltronas de bronze que mais remetiam a tronos.
— Sentem! Me deixem tirar uma foto de vocês!— disse Beatriz ao se
referir a Regina e Jennifer.
Meireles sentou-se em uma das poltronas enquanto observou Regina
sentar-se na outra. Ambas esboçaram um pequeno sorriso e olharam para a
câmera do celular de Beatriz.
— Pronto! A foto ficou linda!— comentou Bea, sorrindo.
— Depois me envia — disse Jennifer.
— Vou te enviar agora pra não esquecer.
— OK.
Jennifer e Regina permitiram que a turma inteira caminhasse na frente
enquanto elas acompanhavam-nos de trás. Dessa forma, além de conseguirem
obter um controle maior do fluxo de alunos, também conseguiam um pouco de
privacidade para conversarem.
— Você está tão linda — disse Jennifer em um baixo tom de voz.
— Não mais que você — Sorriu.
— Noite passada sonhei com você — comentou Meireles. — Sonhei
que amanhecia ao seu lado após termos passado uma noite inteira juntas.
— E o que você sentiu com esse sonho?— perguntou Regina enquanto
dividia a atenção entre Jennifer, os alunos e o que estava sendo exibido no
museu. As duas conversavam o mais baixo que conseguiam.
— Senti uma boa sensação. E também senti que preciso muito de um
momento assim com você.
Regina sorriu e se prontificou a falar.
— Acho que seu sonho está próximo de se tornar realidade — disse ela.
— Lembra que eu havia mencionado sobre roubar você pra mim por um final de
semana?
— Lembro.
— Então... Eu confirmei alguns detalhes e já posso te contar. O marido
da minha irmã Malena é sócio-proprietário de uma grande franquia de Resorts.
No próximo final de semana ocorrerá a pré-inaugurarão de um deles, e Malena
me enviou dois convites. Apenas os proprietários, familiares e alguns poucos
amigos terão acesso. Durante o dia poderemos usufruir de tudo que o ambiente
pode oferecer, e à noite terá um coquetel. Eu adoraria que você me
acompanhasse. O que acha?
— Não sei. Eu fico um pouco sem jeito...
— Por quê?
— Eu nunca frequentei algo assim. Não sei como me comportar. E
ainda terá esse coquetel.
— Não há ao que se aprender, Jennifer. É só aproveitar a piscina, o spa,
as quadras de jogos e tudo mais que você quiser. Lá é enorme, eu já vi a planta
do lugar. Tem academia, iremos poder treinar algo juntas. Malena me enviou os
convites pensando em você.
— Seria um final de semana inteiro?— perguntou a loira.
— Na verdade chegaríamos na parte da manhã pra aproveitarmos o
lugar e, à noite, após o coquetel, dormiríamos lá. No domingo de manhã eu
pretendia te levar pra minha casa, pois minha intenção seria passar todo o final
de semana ao seu lado.
— Tentador — disse Jennifer — Muito tentador.
A conversa entre as duas foi interrompida quando um dos alunos da
morena a chamou para esclarecer uma dúvida. Após isso, Jennifer também foi
chamada por suas amigas. As duas mulheres ficaram impedidas de interagirem,
até o momento em que todos resolveram fazer uma pausa para o lanche.
Enquanto toda a classe trezentos e nove se reunia na área externa do
museu para lanchar, Jennifer e Regina permaneceram dentro do lugar por
aproximadamente dez minutos a mais. Elas estavam localizadas no segundo
piso, local onde ocorria a exposição de arte e artefatos greco-romanos. O andar,
por sorte, estava completamente vazio.

— Já pensou a respeito?— perguntou Regina. — Foi tentador o
suficiente pra convencer você?— perguntou enquanto fingia observar com
interesse a exposição.
— Acho que não foi tentador o suficiente — disse Jennifer ao buscar os
castanhos de Regina. A loira tentava conter o pequeno sorriso que teimava em se
formar em seus lábios.
— Passar a noite com você é o que eu mais quero. Diz pra mim que
você também quer — murmurou Regina em um tom de voz provocante ao
mesmo tempo em que correspondia ao olhar de Jennifer.
— Quero — respondeu Meireles. — E tem outra coisa que eu também
quero.
— O quê?
— Seu beijo. Agora — sussurrou.
— Isso eu não posso dar a você. Não agora.
— Não tem ninguém aqui — disse ao tocar a cintura da professora,
puxando-a para si.
— Jennifer, aqui não — respondeu com seriedade ao se desvencilhar e
afastar-se.
— Estou com muita vontade. Estou me segurando o passeio inteiro.
Quero provar seu gosto.
— Não me diz isso. Vamos descer e nos juntarmos aos outros.
— Isso o quê? Que eu quero provar o gosto da sua boca?— provocou-a.
— Você merece uma tapa na cara pra deixar de me provocar assim.
— Então bate — murmurou Jennifer com a voz carregada de desejo. —
Seria delicioso apanhar de você.
— Gosta de apanhar na cama? Pois apenas dessa forma eu ousaria bater
em você.
— Não sei, nunca apanhei — respondeu a jovem.
— Quer experimentar?— Regina ofereceu.
— Depende. Vou poder bater em você também?— perguntou. A jovem
carregava um pequeno sorriso de lado.
— Só quando eu disser que pode. — A morena carregava o mesmo
sorriso de lado que Meireles.
— Acho que agora foi tentador o suficiente — disse, compartilhando
uma gostosa risada com a mais velha. — Você não vai mesmo deixar eu te beijar
aqui, não é?
— Sem chance. Eu ainda não perdi a sanidade — comentou com
seriedade ao cortar as gracinhas de Jennifer. — A propósito, vamos nos juntar à
classe antes que percebam nossa ausência.
— Ok.— Suspirou em um lamento.
Quando todos já haviam lanchado, as duas mulheres guiaram a turma
para a última parte da exposição. Todos estavam agitados, poucos eram os que
ainda prestavam atenção no lugar. O falatório era alto e a turma não queria
obedecer às ordens de Jennifer.
— Eu espero que vocês estejam cientes que pedirei um resumo sobre
tudo o que está sendo visto aqui hoje. — disse Regina, séria, elevando o tom de
voz com autoridade.
— Ela fica profundamente sexy quando brava — murmurou Jennifer
contra o ouvido de Beatriz, arrancando uma gargalhada da amiga.
— Então eu espero que todos estejam prestando atenção. Contará como
ponto extra — finalizou. A classe foi, aos poucos, diminuindo a agitação e
voltando a manter a atenção no museu.
Uma hora mais havia se passado, e quando todos já haviam visto tudo o
que o lugar tinha pra oferecer, Meireles voltou a contar a turma, conferindo se o
número de estudantes final batia com a quantidade da contagem inicial. Feito
isso, ela e Regina retornaram com a classe para dentro do ônibus.
— Jennifer!— gritou Estela do fundo do veículo.
— Jennifer, vem! Guardamos um lugar pra você!— exclamou Beatriz.
Meireles caminhou até o final da condução e tomou um lugar entre
Estela e Beatriz.
— Obrigada, meninas — disse educadamente.
— Livramos você da senhorita Vianna — comentou Beatriz,
disfarçando. Jennifer apenas sorriu.
Assim que Meireles sentou-se e começou a gesticular com os braços
enquanto conversava, Estela depositou o olhar sobre seu pulso e notou a
ausência da pulseira que a loira usava todos os dias desde o início das aulas.
— Jennifer, cadê aquela sua pulseira azul?— perguntou Estela de
maneira sutil.
Meireles se manteve hesitante enquanto olhava para o próprio pulso.
— Putz, acho que perdi — respondeu vagamente.

Aquela resposta de Jennifer era tudo o que Estela esperava. Agora, após
essa mentira, ela sabia exatamente o que estava acontecendo e de quem se
tratava a pessoa a qual Jennifer Meireles está envolvida.


Capítulo 17

Após o passeio ao museu, os dias no Colégio Brooke seguiram na
normalidade. Jennifer e Regina, apesar das constantes trocas de olhares,
evitaram-se ao máximo. Limitaram-se apenas a conversar sobre as aulas.
Durante toda a semana não houve nenhum encontro marcado ou ao acaso na
biblioteca.
Apesar de todo o cuidado que estava sendo tomado, Estela, que já
estava atenta à relação, conseguia identificar as trocas veladas de olhares e
sorrisos. A cada dia ela confirmava ainda mais o relacionamento de Jennifer e
Regina. Um forte ciúme seguido de um sentimento de raiva tomava conta de seu
peito. Ao mesmo tempo em que ela sentia vontade de dizer a todos o que estava
acontecendo ali, ela temia o que poderia vir a acontecer à Jennifer. Afinal, ela
nutria sentimentos pela loira e não queria prejudicá-la. E, mesmo se quisesse,
não possuía provas.

— Confesso que estou muito nervosa!— disse Jennifer. Ela e sua amiga
Beatriz estavam reunidas no quarto de Meireles. Era início de noite de uma
sexta-feira e a loira cuidava dos preparativos para passar o final de semana com
Regina. — Por sorte minha mãe só retorna pra casa segunda-feira. Ela precisou
fazer mais uma daquelas viagens rápidas de trabalho.
— Não corre o risco dela voltar antes?
— Isso nunca ocorreu. Mas caso aconteça, direi que estava na sua casa.
Pode confirmar pra mim?
— Claro, Jennifer.— Sorriu.
— Eu detesto profundamente precisar esconder algo dela, mas espero
que isso não perdure por muito tempo. Não vejo a hora de me assumir e de poder
dizer que estou com Regina.
— Como você acha que sua mãe irá reagir quando souber?
— Eu não faço a menor ideia. Mas não quero pensar nisso agora.
Vamos falar apenas sobre o final de semana. Espero sobreviver até amanhã!
Estou um poço de ansiedade e nervosismo — disse enquanto organizava seus
pertences em uma mochila.
— Não é pra menos! Passará um final de semana inteiro ao lado dela!—
comentou Beatriz com empolgação. — Já parou pra pensar que irão ter a
primeira noite juntas? Pois certamente vai rolar, ou não?
— Eu não consigo parar de pensar nisso desde o momento em que ela
fez o convite!— Sorriu com empolgação. — Sim, vai acontecer, eu acho. Mal
posso esperar pra ser dela e pra senti-la se entregando a mim. Quero muito dar
esse passo adiante. — Os olhos de Meireles transmitiam um brilho a mais
sempre que falava de Regina ou estava em contato com a mesma.
— Imagino...— disse Beatriz ao sorrir. — O que você está levando pra
lá? Já separou tudo? Cuidado pra não esquecer nada!
— Peguei alguns produtos de higiene pessoal, um conjunto de roupa de
ginástica caso a Regina queira usar a academia, uma roupa pra usar à noite no
coquetel, biquíni, calcinhas e sutiãs, essas coisas — disse Jennifer.
— Você está levando algo em especial para usar pra ela?
— Segredo!— disse ao soltar uma pequena risada.
— Nada disso! Pode ir me dizendo!— retrucou Beatriz.
Jennifer, aos poucos, foi parando de rir e mostrou à sua amiga alguns
conjuntos novos que havia separado para levar.
— Hummm! O final de semana promete!— comentou ao ver as peças
de sua amiga.
— Para! Já estou ficando sem jeito!— disse ao sentir suas bochechas
esquentarem.
— Que bobeira, Jennifer. Sou sua amiga. E você sabe que vou querer
saber todos os detalhes, não é?
— O quê?— exclamou. — Sem chance!
— Ok, não vou querer saber todos os detalhes. Mas vou querer saber
boa parte deles!
— Talvez eu te conte algumas coisas.— disse enquanto tentava conter o
riso ao observar as expressões frustradas que Beatriz esboçava.
— Péssima amiga você, Jennifer Meireles! Péssima!— retrucou,
fazendo-a cair na gargalhada.
As duas amigas se deitaram sobre a cama e permaneceram um longo
tempo conversando sobre o final de semana que Meireles teria. Jennifer não
conseguia disfarçar sua ansiedade e nervosismo. Imaginar-se a sós com Regina
Vianna lhe agradava os pensamentos e lhe trazia um inevitável frio na barriga.
Quando Beatriz despediu-se e se foi, Meireles tomou um banho morno e
aninhou-se entre as cobertas. Os pensamentos em Regina eram constantes. Ela se
sentia a mais feliz das mulheres por ter seus sentimentos correspondidos.


— Bom dia, menina de ouro — disse Regina após sair do carro. Hoje
ela havia estacionado o veículo em frente à casa de Meireles para que a loira não
precisasse carregar a mochila pesada. Jennifer, na noite anterior, havia avisado
que sua mãe não estaria em casa. Sendo assim, não haveria problema Regina
estacionar bem na frente.
— Já disse que adoro quando você me chama assim?— comentou ao
aproximar-se.
— Não, não disse. Gosta?— perguntou ao esboçar um curto sorriso de
lado.
— Muito.
— Então vou chamar mais vezes — disse Regina, com a voz aveludada,
ao acariciar os cabelos de Meireles.
Regina colocou a mochila da loira no banco de trás e em seguida abriu a
porta da frente para que ela se sentasse. Feito isso, deu a volta no carro e tomou
seu lugar no banco de motorista.
— Você está tão cheirosa — comentou Jennifer. — Adoro seu perfume.
Regina inclinou-se sutilmente sobre a loira e ofereceu o pescoço pra que
ela aspirasse melhor o seu cheiro. Meireles, por sua vez, fechou os olhos e
deixou que aquele doce perfume invadisse suas narinas. Seu coração, no mesmo
instante, acelerou. Até ele sabia que se tratava do cheiro da mulher por quem a
loira era apaixonada.
Jennifer segurou a nuca de Regina e usou os lábios para percorrer toda a
extensão do pescoço perfumado da mulher até encontrar a boca vividamente
avermelhada que ela tanto gostava.
— Há dias eu não provo o gosto dos seus lábios — sussurrou Jennifer,
segundos antes de selar os lábios nos de Regina em um beijo apaixonado. —
Que saudade eu estava — murmurou entre o beijo.
Regina entreabriu os lábios e deu passagem para que a língua da jovem
adentrasse sua boca. Nesse instante, um arrepio percorreu sua pele ao sentir o
calor e a umidade que emanava daquela língua que se enroscava deliciosamente
na sua. — Adoro seu beijo — sussurrou Regina — E o seu gosto — continuou a
sussurrar entre o beijo. — Sua boca é tão gostosa.— A voz da professora estava
ficando mais rouca que de costume. Este era um nítido sinal de excitação.
— Não começa a me dizer essas coisas... — disse Jennifer com a voz
arrastada. — Do contrário não iremos sair daqui hoje.
Regina sorriu e finalizou o beijo com uma rápida selada de lábios.
— Certo — respondeu. — Pronta pra irmos?— perguntou ao retornar a
seu lugar no banco.
— Pronta!


Ao chegarem ao Resort, Regina estacionou o carro no estacionamento
do lugar e em seguida direcionou-se com Jennifer para a recepção. Chegando lá,
apresentou os dois convites e fez um rápido check-in. Feito isso, pegou a chave
de uma suíte para casal e caminhou em sentido ao elevador mais próximo.
Quando a porta se abriu no andar desejado, Jennifer e Regina se
depararam com a imagem de Henrique e Malena no corredor. Henrique usava
apenas uma bermuda com estampa floral, e Malena usava uma canga de tecido
fino que deixava parcialmente à mostra seu biquíni laranja.
— Tia Regina!— exclamou o garoto ao vê-la. Henrique,
instantaneamente, correu para abraçá-la.
— Como você está, meu amor?— perguntou ela ao acariciar os cabelos
do menino e sorrir.
— Bem! E você, tia?
— Eu estou bem, meu amor.— Sorriu.
— E você, Jennifer?— perguntou o garoto.
— Você lembra de mim, rapaz?— perguntou ela, surpresa.
— Sim. Aluna da tia Regina!
— Isso mesmo — disse Jennifer ao sorrir. — Eu estou bem e contente
em vê-lo novamente.— Meireles caminhou até o menino e o envolveu em um
abraço carinhoso.
— Estão ansiosas para conhecer o lugar?— perguntou Malena ao
aproximar-se. A ruiva falava com empolgação. Malena era sempre uma pessoa
alto astral, bem humorada e de bem com a vida.
— Estamos!— disse Jennifer ao sorrir. — Obrigada pelos convites,
Malena.
— Imagina! Espero que vocês se divirtam!
— Vamos pra piscina com a gente?— sugeriu Henrique.
— Jennifer e eu vamos tomar café da manhã primeiro. Em seguida nós
nos encontramos por lá, tudo bem?
— Ok!— Henrique respondeu.
— Até depois, meninas — disse Malena ao se despedir e entrar no
elevador com o filho.
Ao entrar na suíte, Meireles passeou os olhos por todo o lugar. Ela
nunca vira um ambiente tão bonito e requintado. Ele era todo decorado por
objetos e móveis modernos, e pintado com cores nudes como o bege, mas
também intensas como a cor cereja. Ele dispunha de um quarto com cama king
size e uma extensa janela de vidro com vista panorâmica para todo o Resort. A
suíte possuía, também, uma pequena cozinha totalmente equipada e um ambiente
de sala de estar mobilhado com sofá-cama. Malena havia lhes reservado umas
das melhores suítes disponível no Resort.
— Uau — disse Jennifer, encantada.
A suíte incluía um banheiro com a combinação banheira e chuveiro para
o relaxamento e deleite. O lugar exalava bem estar e conforto. Ele dispunha de
alguns quadros com pinturas abstratas em sua decoração.
— Gostou?
— É lindo!
— Quero que aproveite tudo, cada instante, ok? Vamos deixar todo o
peso do mundo lá fora.— Regina acariciava os fios loiros de Jennifer ao mesmo
tempo em que a olhava no fundo de suas esmeraldas. — Quero que seja apenas
você, eu, e todas as nossas vontades.— A morena aproximou os lábios e buscou
os da jovem em um beijo calmo.
Meireles envolveu a cintura de sua professora e correspondeu ao beijo.
Seus lábios e língua se moviam em sincronia com os de Regina. A felicidade que
habitava o peito de Jennifer era tanta, que a fazia sorrir involuntariamente
durante o beijo.
Regina tinha os braços apoiados sobre os ombros de Jennifer e em volta
do pescoço da loira. Seu coração batia em um ritmo mais acelerado que de
costume. Sua pele aquecia e seu ar tornava-se escasso. Isso quase sempre ocorria
quando estava na presença da loira.
— Vamos nos trocar e tomar café da manhã?— Sugeriu Regina ao
finalizar o beijo com uma selada de lábios.
Jennifer assentiu e as duas mulheres trocaram suas roupas. Meireles
vestiu-se com um biquíni azul marinho e depositou uma saída de praia branca
por cima. Regina, por sua vez, pôs um biquíni branco e enrolou uma canga
estampada em seu corpo. Cada mulher se trocou no banheiro e retornou ao
quarto apenas quando estava pronta.
As duas fizeram uma rápida parada em uma pequena lanchonete local
para tomarem um café da manhã juntas, e em seguida caminharam de mãos
dadas pelo amplo lugar à procura de Malena e Henrique.
— Aqui é imenso!— comentou Jennifer. — E lindo!
— Sim, realmente é muito bonito. Imaginei que você fosse gostar. Eu
fiquei encantada quando vi as fotos do lugar.
— Impossível não gostar. Olha a arquitetura dessas piscinas!— disse
Jennifer ao apontar para uma das muitas piscinas que havia no local. — Cheias
de curvas!
Regina olhava para a alegria que estampava a face de Jennifer e sorria.
Para ela, nada lhe agradava mais que ver um sorriso habitando aqueles finos
lábios rosados que ela tanto amava.
— Ali estão eles!— disse a morena ao avistar sua irmã e Henrique se
divertindo dentro de uma piscina.
— Entrem!— exclamou Henrique ao avistá-las.
— Venham!— gritou Malena.
Jennifer e Regina se olharam e em seguida livraram-se dos tecidos que
cobriam seus corpos, ficando apenas de biquíni.
O olhar de Jennifer instintivamente caiu sobre o corpo de Regina. Era a
primeira vez que via a mulher com tão pouca roupa.
Regina também deixou o olhar cair sobre Jennifer. Ela admirava o
corpo milimetricamente definido que a loira possuía.
Após se olharem por alguns instantes, mergulharam, para a felicidade
de Henrique, que começou a agitar-se na água.
— Você sabe boiar, Jennifer?— perguntou o garoto.
— Sim. Você sabe?
— Eu sei. Olha!— Henrique mergulhou para dentro d’água e em
seguida reapareceu com seu corpo flutuando sobre ela.
— Ele entrou pra natação há algumas semanas. Agora, sempre que
pode, tenta nos mostrar algo — explicou Malena.
— Você viu?— perguntou ele ao voltar para a posição de antes.
— Sim, eu vi! Você sabe boiar assim?— Jennifer relaxou o corpo e o
deixou flutuar. Mas, diferente de Henrique, ela boiava com a barriga para cima.
— Assim eu ainda não sei — disse ele, cabisbaixo. — Mas vou
aprender!
— Tenho certeza que sim — respondeu ao sorrir. — Ei! Isso não se faz,
Regina!— reclamou ao ser acertada por um jato de água.
Henrique, de onde estava, caiu na gargalhada ao ver sua tia implicando
com Meireles.
— Você quer também, Henrique? Se está rindo tanto é porque quer.—
A morena uniu as mãos e as bateu contra a superfície da piscina, fazendo um jato
d’água espirrar em seu sobrinho.
— Três crianças!— exclamou Malena em meio o riso. — Oh, não, não,
não!— A ruiva tentou nadar para longe, mas acabou sendo acertada por
inúmeros jatos vindos de Jennifer, Henrique e Regina. Todos caíram na
gargalhada, por fim.
Os quatro se divertiram na piscina por aproximadamente uma hora
interrupta. Após isso, todos subiram para seus aposentos para trocar de roupa
após um banho relaxante. O dia seria curto para a quantidade de atividades que o
lugar oferecia. Contudo, eles tentariam aproveitar ao máximo.
Jennifer, Malena e Regina vestiram-se com roupas de ginástica e foram
até a academia do lugar. Henrique, para não ficar sozinho, as acompanhou.
Enquanto as três mulheres conversavam e se alongavam, ficou sentado em um
canto jogando algo no celular da mãe.
A academia possuía esteiras, aparelho de musculação, bicicletas
ergométricas, pesos, prancha de alongamento, dentre outros aparelhos.
Jennifer, além de treinar boxe, mantinha o hábito de fazer corridas e
caminhadas aos finais de semana. Regina, por sua vez, fazia apenas as corridas e
as caminhadas, principalmente na praia, local aonde ela e Meireles se
encontraram pela primeira vez, ao acaso, fora da escola.
Malena não gostava de praticar exercícios, porém, com o incentivo de
Jennifer e Regina, resolveu acompanhá-las em meia hora de esteira.
— Como anda a relação de vocês?— perguntou curiosa. — Ninguém
percebeu?
— Acredito que não — respondeu Regina.
— As pessoas realmente não prestam atenção ao mundo à sua volta. Eu
estou há poucas horas com vocês e flagrei cada troca de olhares e sorrisos.
Vocês podem até tentar, mas não conseguem disfarçar. É nítido que existe algo
— constatou.
— Você está falando sério, Malena?— perguntou sua irmã.
— Seríssimo, Regina. Vocês praticamente se despem com os olhos!
— Meu Deus...— murmurou Jennifer.
— Você está exagerando — disse a morena.
— Exagerando? Você é a pior, Regina. Deveria ver sua cara ao olhar
para a Meireles!— comentou a ruiva.
As três mulheres conversavam razoavelmente baixo por conta da
presença de Henrique no recinto.
— E qual é a minha cara, Malena?— perguntou Regina ao erguer uma
de suas sobrancelhas.
— De quem está prestes a atacar!— respondeu a ruiva, fazendo Jennifer
soltar uma pequena risada. — Você dá conta de conter a minha irmã? Porque
olha... Regina é meio insaciável e sem limites.
— Malena! Assim você vai assustá-la!
— Estou apenas dizendo a verdade. Ou não? Você já contou à ela suas
preferências?— Malena estava segurando-se para não rir da cara de Regina. Ela
adorava deixar sua irmã sem jeito.
— Dá pra parar?— retrucou a professora.
— Ok, ok. Parei!
— Se depender de mim você pode falar o quiser. Tudo bem — disse
Jennifer suavemente.
— Jamais dê essa carta branca à minha irmã. Você não faz ideia das
loucuras que habitam essa cabeça ruiva dela.
— Também não é assim, Regina. Eu apenas sou sincera!— retrucou.
As últimas horas foram preenchidas por muita conversa e risadas. Após
a academia, seguiram para o SPA e, posteriormente, se reuniram no restaurante
local.

Quando o fim de tarde começou a cair, Jennifer e Regina subiram à
suíte para que pudessem tomar um banho e se arrumarem para o coquetel de
logo mais.
— A Malena é um pouco inconveniente, mas eu garanto a você que é
uma boa pessoa — disse enquanto se secava dentro do banheiro.
— Eu não me importo nem um pouco com as coisas que ela diz. Não se
preocupe. Eu até gosto da espontaneidade dela.— Jennifer respondeu. A loira
estava no quarto terminando de se arrumar.
— Tem certeza que você não se importa?— perguntou Regina ao abrir a
porta do banheiro. A morena apareceu vestida em um roupão branco.
Quando Jennifer avistou a mulher, as palavras começaram a fugir de sua
boca. A loira começou a questionar-se sobre Regina estar ou não vestida por
baixo.
— Não, eu não me importo — respondeu após algum esforço.
— Que bom — disse ao se aproximar. A mais velha envolveu Jennifer
por trás e olhou sua face através do espelho. — Você está linda — murmurou
próximo ao ouvido de Meireles, lhe depositando um doce beijo em sua
bochecha.
Jennifer sentiu um arrepio percorrer a linha de sua coluna com a
proximidade da mulher.
— Obrigada — respondeu ao sorrir. Jennifer usava um longo e elegante
vestido florido. Seu cabelo estava solto, naturalmente ondulado e volumoso,
exatamente como Regina gostava. — O quê Malena quis dizer sobre você ter
contado suas preferências a mim?— perguntou ao virar-se.
Regina esboçou um pequeno e sacana sorriso de lado ao ouvir o que
Jennifer perguntara.
— Nada que você já não conheça. Acho que ela se referia ao meu lado
intenso.
— E eu já o conheço?— perguntou ao mudar suas expressões faciais.
Agora, ela esboçava um pequeno sorriso malicioso.
— Teoricamente, sim.
— Eu adoraria conhecer na prática.
— Nós temos todo tempo do mundo pra que eu possa te mostrar —
murmurou, segundos antes de se afastar e recolher o vestido que estava estirado
sobre a cama. Regina trancou-se no banheiro por longos minutos e retornou ao
quarto quando já estava vestida e maquiada. Ela usava um longo vestido preto,
justo, com uma extensa abertura lateral que deixava uma de suas pernas
parcialmente à mostra.
— Uau...— murmurou Jennifer para si mesma ao avistá-la retornando
ao quarto. Os saltos da mulher ressoavam contra o piso do lugar conforme
caminhava. Esse som excitava Jennifer. Ela sempre fantasiava com os saltos de
Regina. — Linda — disse ao olhá-la dos pés à cabeça. — Você é tão... Mulher.
— Não mais que você — respondeu ao depositar um beijo nos lábios da
loira. — Já está pronta pra descermos?
— Sim. Vamos?
— Quero fazer algo antes.
— O quê?— perguntou confusa.
Regina guiou Jennifer com o corpo e a encurralou contra um móvel de
madeira que havia dentro do quarto. Feito isso, usou as duas mãos para subir
parcialmente e lentamente o vestido da loira.
— O que você está fazendo?— perguntou ao sentir as mãos quentes e
macias de Regina em suas coxas.
— Você vai descobrir.— Regina subiu as mãos pelas coxas até
encontrar as laterais da calcinha que a jovem usava. — Quero você sem ela —
disse ao deslizar a peça da jovem para baixo e tirá-la.
Jennifer surpreendeu-se e espantou-se com a atitude da mais velha.
Mas, ao mesmo tempo excitou-se ao sentir sua calcinha sendo tirada.
— Regina, o coquetel é daqui a pouco. Me devolve — comentou ao
tentar pegar a peça de volta.
— Não — respondeu ao lançar a calcinha para longe, sobre a cama. —
Você vai me dar a deliciosa tortura de te imaginar a noite inteira sem ela — disse
com rouquidão em sua voz. — Saiba que vou passar todo o coquetel excitada
com esse pensamento.
— Você é o demônio, Regina.
— Sim, eu sou. E depois que conheci você, perdi qualquer chance de
salvação — respondeu ao beijar o pescoço da loira. — Resta saber se você quer
vir para o lado escuro comigo — murmurou ao pé de ouvido de Jennifer,
fazendo-a se arrepiar.
— Seu lado escuro parece o paraíso pra mim.
— É porque somos exatamente iguais — constatou ao esboçar um
sorriso sacana. — Agora vamos?


O coquetel acontecia na parte de baixo do Resort. Alguns empresários
importantes se reuniam enquanto amigos e parentes apreciavam a música e
degustavam do buffet. Havia, também, pessoas se divertindo à beira da piscina e
dentro dela.
— Regina! Há quanto tempo não nos víamos!— disse Edgar ao
envolver a cunhada em um terno abraço.
— É verdade! Você precisa acompanhar Malena e Henrique quando me
visitarem, e eu preciso visitá-los com maior freqüência — respondeu a morena.
— O lugar é um espetáculo. Parabéns por mais essa conquista.
— Obrigado, Regina!— Sorriu. — Essa deve ser a...?
— Jennifer — disse a loira.
— Isso! Malena havia me falado que você seria a acompanhante de
Regina. Muito prazer, senhorita. Sou o pai de Henrique.
— Muito prazer!— disse ela ao estender a mão e cumprimentá-lo.
— Quando Regina for nos visitar, sinta-se convidada a ir também.
Assim poderemos nos conhecer melhor — comentou Edgar, educadamente, ao
sorrir. — Agora, se me dão licença, eu preciso resolver algumas coisas com
alguns empresários presentes. Não tenho como fugir!— Riu. — Mas, fiquem à
vontade! Aproveitem a noite!
— Obrigada!— disseram Jennifer e Regina quase em uníssono.
— Você contou sobre a Jennifer a ele?— perguntou Regina assim que
Edgar se distanciou.
— Sim. Quer dizer, não. Bom, ele não sabe que ela é sua aluna, mas
sabe que está se relacionando com você. Mas podem ficar tranquilas. Mesmo se
ele soubesse que Jennifer é sua aluna, não encrencaria com isso. Você sabe o
quão tranquilo e cabeça aberta ele é — explicou a ruiva.
— Eu sei. Não perguntei por achar um incômodo o fato dele ter
conhecimento a respeito. Apenas porque eu quero saber como me comportar. Se
não vou precisar esconder nada, ótimo — respondeu Regina.
— Onde está Henrique?— perguntou Meireles.
— No quarto, dormindo. Ele estava esgotado do sol e da piscina. O
deixei descansando pra irmos embora mais tarde — explicou Malena.
— Não passarão a noite aqui?— Jennifer perguntou.
— Não. Assim que Edgar marcar presença e resolver alguns assuntos
importantes para a empresa, nós vamos embora. Mas vocês podem aproveitar à
vontade — disse ela. — Vou deixá-las sozinhas agora e me juntar a ele. Boa
noite, meninas!
— Boa noite, Malena. Dê um beijo em Henrique por mim, caso não nos
vejamos mais até o fim da noite — disse Jennifer.
— Dou sim. Obrigada pela companhia, foi maravilhoso passar o dia
com vocês.
— Pra nós também — disse Regina suavemente. — Boa noite!

Assim que Malena se afastou, Regina e Jennifer começaram a caminhar
por todo o lugar. Além de um excelente buffet, havia uma boa iluminação. Sem
mencionar a boa música de fundo.
— Ei, nem pense nisso — disse Regina ao avistar Jennifer olhando
para os drinks alcoólicos que estavam sendo servidos.
— Não me diga que vai me proibir de beber?
— Não tenho o direito de te proibir nada, só não gostaria que se
embebedasse. Eu quero estar sóbria essa noite e gostaria que você também
estivesse.
— Prometo não me embebedar. Só queria provar alguns. Me sinto tão
feliz! Bebe um pouquinho comigo hoje, hum?— pediu a loira.
Regina olhou para a expressão da jovem e decidiu acompanhá-la em
uma bebida.
— Ok, nada nos impede de tomarmos um. Mas, apenas um!— Regina
aproximou-se de um garçom que passava por elas e pegou duas taças que
continham drink de morango. As taças vieram decoradas com um morango preso
à borda.
— Você gosta?— perguntou Regina ao desprender a fruta do copo.
— Adoro morango.
Regina abriu um pequeno sorriso e levou a fruta até a boca de Meireles,
maravilhando-se com a imagem da loira mordendo um pedaço do morango
oferecido.
— Dessa forma você me fará gostar ainda mais — comentou a jovem.
— Gosta que eu ofereça na sua boca?
— Gosto de tudo que você faz.
— E se eu fizer assim?— Regina mordeu a metade restante da fruta e a
levou com os lábios até a boca de Jennifer.
— Aí eu não me importaria em passar o resto da vida comendo
morangos — respondeu após engolir o pequeno pedaço.
— Que bom, pois eu pretendo fazer dessa forma incontáveis vezes —
murmurou.
— Você tem medo que algum conhecido esteja aqui presente e nos
veja?— perguntou Jennifer ao encará-la nos olhos.
— Um pouco. Mas eu não vou deixar de aproveitar com você por causa
disso. Além de quê, seria muita falta de sorte a nossa se isso acontecesse.— Riu
ao imaginar a própria desgraça.
— Verdade — respondeu ao compartilhar uma risada com Regina. —
Bom, se você não pretende deixar de aproveitar, então não vai se importar se eu
fizer isso.— Jennifer envolveu a cintura de Regina e colou seu corpo ao da
mulher. Em seguida, roçou lentamente os lábios contra os dela e a beijou.
— Estaremos muito encrencadas se tiver algum conhecido na festa —
sussurrou Regina entre o beijo. — Mas beijar você vale qualquer risco — disse
ela ao sorrir entre o contato de lábios.
— Confesso que provar o gosto da sua boca está ainda melhor com todo
esse perigo.— Jennifer murmurou.
— Sabe o que, pra mim, está tornando tudo melhor?— perguntou
Regina.
— O quê?
— Saber que você está sem calcinha — murmurou.
— Você não tem jeito, Regina. É uma sem vergonha!— disse ao sorrir e
balançar negativamente a cabeça.
Meireles segurou a mão da mulher e a convidou para dar uma volta por
outras áreas do Resort. Ambas terminavam de beber o drink ao mesmo tempo
em que aproveitavam a vista local e a baixa música de fundo que envolvia o
ambiente.
— Eu queria tanto contar sobre você pra minha mãe — disse Jennifer
ao sentar-se com ela em um banco afastado das demais pessoas. — Eu queria
que ela soubesse o quão feliz eu me sinto quando estou com você. Não queria ter
que mentir ou esconder algo que é tão bom. Mas eu tenho medo que ela não
aceite você. Na verdade, temo até que ela não me aceite.
— Você tem uma boa relação com ela?
— Sim, uma ótima relação, eu diria.
— Então eu suponho que ela te aceitará. No início pode ser um choque
pra ela, mas depois acabará aceitando ou pelo menos respeitando quem você é.
Tenho certeza que ela te ama muito, Jennifer — disse ao apoiar a mão sobre a da
jovem. — Eu estou com você pra te ajudar a superar essa situação. E quando
você decidir que é o momento de contar, terá meu apoio incondicional.
— Obrigada pelas palavras, Regina.— Jennifer entrelaçou os dedos
entre os dedos da mais velha e ficou observando cada detalhe da mão de Regina
enquanto conversavam. Ela muito apreciava decorar cada traço daquela mulher.
— Não precisa agradecer — disse suavemente. — Quero conversar com
sua mãe assim que você autorizar.
— É arriscado, Regina. Tenho medo que ela faça um escândalo e você
perca o emprego. Não quero, de forma alguma, te prejudicar.
— Eu sei que é arriscado. Tenho total consciência que tudo é arriscado
desde o momento que beijei você e cruzamos uma linha que não podíamos.
— E mesmo assim você quer arriscar?
— Sim. Me sinto no dever de conversar com ela. Não quero tratar nossa
relação como um caso qualquer às escondidas.
— Você gosta de mim a tal ponto?
— Pra ter chegado com você ao ponto que cheguei, você pode ter
certeza que sim.— Sorriu.
— Você realmente não se importa que eu seja tão mais nova que você?
— Não, e confesso que isso até tem me agradado. É uma experiência
nova pra mim. Você me mostra as coisas com outro olhar, com o seu olhar. E eu
adoro ver o mundo através dos seus olhos. Sem contar que você carrega a
vitalidade da juventude. Me renova as energias estar com você.
— Você diz isso como se fosse velha, mas não é. Trinta e três anos
ainda é muito jovem, Regina.
— Eu sei. Mas mesmo assim há uma diferença notável. Os anos nos
fazem perder um pouco o brilho, mas você ainda o possui, e eu acho muito
bonito de ver. Gosto de olhar para trás e ver um pouco do caminho por onde
passei.
— Entendi... — Sorriu. — No meu caso eu não posso olhar para frente,
mas consigo aprender um pouco com sua experiência de vida.
— É uma boa troca. — A mais velha sorriu e buscou a mão da mais
nova para si.
— Regina...
— Sim?
— Eu quero muito o que está pra acontecer entre nós.
— Tem certeza? Porque eu também quero muito.
— Tenho. Eu gosto muito de você. Não é como fosse um fetiche porque
você é minha professora, não. Eu realmente gosto. Aconteceu. Começou pela
admiração e agora já está muito além disso.
— Não se preocupe, eu jamais vi o que temos como fetiche. Eu não
seria caprichosa a tal ponto. Eu também gosto demais de você, garota. — Sorriu.
— Eu sei que já disse isso, mas você está tão linda hoje, que não posso
deixar de repetir.— Jennifer apoiou a mão sobre a coxa pertencente à fenda do
vestido e alisou a pele exposta da morena naquela região.
— Você não imagina o quanto imaginar seu toque mais a fundo me
desperta.
Jennifer, mais uma vez, estava sob o efeito das palavras de sua
professora. Regina parecia ter seu manual de instruções. Ela sabia exatamente o
que dizer para lhe desestruturar. E Meireles adorava isso. Adorava sentir o ar lhe
faltando enquanto suas pernas fraquejavam. Para ela, era demasiadamente
enlouquecedor e prazeroso sentir o vão entre suas pernas gritando por aquela
mulher
— Por que você faz isso comigo?
— Porque eu quero — respondeu Regina. — Mas, principalmente
porque eu sei que você gosta. E eu adoro observar como você se desmonta
comigo — murmurou próximo ao ouvido da loira.
— Eu não me desmonto sozinha, Regina — disse Jennifer em resposta.
— Eu sei que você se desestrutura tanto quanto eu — murmurou.
— Sim, e eu não nego. Todos os dias eu monto e me desmonto por
você, Jennifer.— Enquanto falava, Regina deslizava a mão pelo corpo de
Jennifer. A mão que, antes, estava sobre o joelho, percorreu a coxa e a cintura da
jovem. — Desejar você está me consumindo viva.— Regina entrelaçou os dedos
no cabelo de Meireles, na região da nuca, e os puxou eroticamente enquanto
murmurava para a loira. — Eu estou emocionalmente de joelhos pra você. Mas
hoje quem irá se ajoelhar pra mim vai ser você. E não será emocionalmente.
Meireles mordeu o próprio lábio e soltou um suspiro longo e pesado.
Regina havia lhe desnorteado mais uma vez.
— É... Bom, vamos nos reaproximar das pessoas?— disse com
dificuldade, quase gaguejando.
Regina sorriu por ter conseguido, mais uma vez, deixar a jovem sem
palavras.
— Vamos. Estou morrendo de fome — disse ao levantar-se.
Meireles segurou a mão da morena e retornou para o ambiente mais
populoso da festa. Chegando lá, comeram alguns canapés de tomate seco, os
preferidos de Regina, e beberam alguns sucos naturais.
O coquetel durou apenas três horas. Nesse curto período elas
conversaram e dançaram juntas. Gargalhadas e conversas indecentes não
faltaram. Jennifer sempre instigava e Regina entrava em seu jogo.
Quando o coquetel chegou ao fim, mais da metade dos presentes
deixaram o Resort. Os poucos que permaneceram, dividiram-se. Alguns subiram
para suas instalações, enquanto tantos outros resolveram entrar nas piscinas e
aproveitar o restante da noite.
— Você tem coragem de pular de roupa?— perguntou Jennifer. Ela e
sua professora haviam se isolado em um local onde não havia ninguém.
Regina desceu dos saltos e aproximou-se da borda da piscina.
— Tenho. Vamos?
Meireles livrou-se dos próprios calçados e tomou um lugar ao lado da
mulher.
— No três?
— No três! Um... Dois...
— Três!— gritou Jennifer, segundos antes de pular dentro d’água.
Regina deu um mergulho profundo e apareceu na superfície com os
cabelos completamente molhados, atraindo a total atenção de sua aluna.
— Você consegue ficar ainda mais atraente molhada.
Regina nadou em direção à loira e a encurralou entre ela e a borda da
piscina.
— Você acha?
— Acho...— respondeu suavemente enquanto mexia nos cabelos
úmidos da mulher. Meireles entrelaçava os dedos nos fios castanhos de Regina e
os deslizava até as pontas repetidas vezes.
— Seu toque é tão suave...— disse Regina ao fechar os olhos e se
deixar levar pelo carinho de Jennifer.
— Gosta dele?
— Gosto de tudo que vem de você.— respondeu ao abrir os olhos e
encontrar as esmeraldas à sua frente. — Quero seu beijo — murmurou Regina ao
roçar os lábios contra os de Jennifer. — Quero tocar em você, quero seu corpo,
quero seu desejo...— Regina pressionou o corpo contra o da loira e sentiu a pele
molhada da jovem roçar contra a sua. Por conta da água, ambas tinham a
sensibilidade aumentada.
Meireles entreabriu os lábios e buscou os de Regina. As duas iniciaram
um beijo lento, erótico, carregado de desejo e paixão. As mãos de Regina se
enroscavam nos cabelos de Jennifer ao mesmo tempo em que as mãos da jovem
deslizavam em sua cintura. O amasso na borda da piscina começou a tomar
grandes proporções.
— Acho melhor irmos pro quarto — sussurrou Regina entre o beijo.
Jennifer sorriu e saiu da água com ela, deixando pra trás os calçados à
beira da piscina. Após passarem pela recepção, chamaram o elevador e entraram.
Assim que a porta se fechou, Regina lançou um intenso olhar sobre
Meireles e tomou os lábios rosados da loira com desejo.
— Eu sou capaz de transar com você nesse elevador se ele não chegar
logo — comentou Regina com rouquidão em sua voz ao deslizar os beijos dos
lábios para o pescoço de Jennifer.
Meireles se viu encurralada entre a parede do elevador e Regina, que
lhe beijava, lambia e mordia o pescoço como se existisse apenas aquele instante
e o desejo que há tempos lhe enlouqueciam.
— Regina...— murmurou a loira. Seu murmúrio foi quase um gemido.
— Dessa vez não para — pediu ao segurar os cabelos castanhos da mulher com
suas duas mãos.
— Não vou parar — respondeu. — Hoje vamos até o fim.
Quando a porta do elevador se abriu, Jennifer e Regina entraram na
suíte aos beijos. Suas roupas, seus cabelos e seus corpos estavam completamente
úmidos da piscina. Regina aproveitou-se desse fato e conduziu a loira para
dentro do box. A mais velha abriu o chuveiro, tomou Jennifer pela cintura e
deixou que a água banhasse seus corpos.
— Hoje é apenas você e eu, Jennifer. Eu vou devorar o seu corpo e
despi-lo de qualquer regra.— Regina virou a loira de costas e a encostou contra
o azulejo do banheiro. O desejo que percorria seu corpo era tão forte que, em vez
de deslizar o zíper do vestido de Jennifer até embaixo, Regina abriu apenas o
início e puxou o restante com as duas mãos, o rasgando propositalmente.
Ao deslizar a peça até o chão, Regina expôs o corpo parcialmente nu de
Jennifer. Ela deixou que seu olhar caísse para as pernas torneadas e fosse
subindo, passando pela bunda completamente despida e finalizando nas costas
de Meireles. Ela sorriu ao avistar as pequenas pintas que havia nas costas da
mais nova. Pintas estas, que aos seus olhos mais pareciam constelações.
Meireles virou-se para Regina e esboçou um pequeno sorriso sacana ao
observar as expressões que a morena carregava em seu rosto.
— Gosta do que vê?— instigou ao aproximar-se da mais velha, deixando
seus corpos a uma distância mínima e perigosa.
Regina percorreu as mãos pelas costas da loira até encontrar o feixe do
sutiã que ela usava e o abriu, deixando à mostra os seios de Meireles. Eles eram
pequenos e firmes.
— Você é tão gostosa, Jennifer — disse ao espalmar uma de suas mãos
sobre o seio da loira e apertá-lo.
Sentir a mão macia de Regina em seu seio fez a pele de Jennifer
arrepiar-se. Ela não saberia dizer o quão excitante era ter Regina Vianna
massageando seu seio ao mesmo tempo em que parecia querer devorá-la com a
intensidade daqueles olhos castanhos.
Jennifer estava completamente despida, e agora ela queria guardar para
ela a imagem do corpo nu de Regina. Ela precisava, também, descobrir qual a
sensação de ter aquele corpo ao seu. Sendo assim, tateou as costas da mulher à
procura do zíper de seu vestido e o abriu. Enquanto ela deslizava a peça para
baixo, observava cada parte daquele corpo que estava sendo exibida. E para a
surpresa da jovem, Regina estava sem sutiã.
Assim que a morena estava livre de seu vestido, Meireles colou
inteiramente o corpo nu ao dela pela primeira vez e deliciou-se com a sensação
de sentir a pele molhada de Regina em contato com a sua. Seus seios e os dela
estavam quase na mesma linear, e seus mamilos, já enrijecidos, roçavam-se
deliciosamente.
Regina segurou os cabelos de Jennifer para trás e os puxou para baixo
com força moderada, fazendo a jovem inclinar a cabeça e deixar seu pescoço e
colo completamente à mercê de suas vontades.
— Você sabe o quanto me enlouquece?— perguntou ao apertar aqueles
cabelos com força e traçar um caminho com a língua por toda extensão do
pescoço da jovem.
— Não. O quanto te enlouqueço?— perguntou Jennifer. A voz da loira
estava arrastada. Seu corpo queimava feito brasa, e cada vez que Regina
depositava mais força em seus cabelos, Jennifer sentia seu sexo pulsar. Ela
adorava a forma sexualmente agressiva de sua professora.
— Muito, Jennifer. Desmedidamente.— Regina arrastou as carícias do
pescoço para o colo de Meireles, passando a língua no vale entre os seios
enquanto sentia a água do chuveiro percorrer aquela região. Posteriormente, fez
o caminho reverso e tomou a boca da loira com a sua, iniciando um beijo
agressivo, quente, selvagem e urgente.
Suas bocas alternavam entre beijos nos lábios e pescoço. Suas línguas
se acariciavam e guerreavam pelo domínio do prazer. Alguns baixos gemidos
eram emitidos por ambas as mulheres. E apesar de se buscarem com urgência,
elas sabiam que teriam a noite inteira de entrega.
Meireles percorreu a lateral do corpo de Regina com as mãos até
alcançar a pequena calcinha de renda branca que ela usava. Ao tocar a peça,
sentiu as mãos da mais velha sobre a sua, a interrompendo.
— Sem me tocar — disse pausadamente, ordenando. Regina tirou as
mãos de Jennifer de sua calcinha, a segurou pelos pulsos e a encurralou contra o
azulejo do banheiro.
Jennifer tentou se soltar, mas foi vencida pela boca quente de Regina
em seus seios. Com a língua úmida e quente, a morena circundava os mamilos e
brincava com os bicos que enrijeciam cada vez mais em sua boca.
— Regina... — murmurou. A mais velha tomava seus seios com
maestria. Ela os sugava com pressão e os lambia igualmente, sempre alternando
entre os dois.
— Adoro ouvir meu nome saindo dos seus lábios — comentou após
interromper as investidas nos seios de Jennifer. — E gostaria ainda mais se você
o gemesse pra mim.— Regina depositou a coxa entre as pernas de torneadas à
sua frente, separando-as sutilmente, e em seguida a movimentou ali,
pressionando o sexo quente da jovem.
Meireles segurou-se para não gemer. Mas, Regina roçava a perna tão
deliciosamente contra seu sexo, que o pequeno estímulo estava lhe
enlouquecendo. Contudo, ela não daria o que Regina queria. Ainda não.
Jennifer desvencilhou-se das investidas da mulher e a guiou com o
corpo contra uma das paredes do banheiro. Meireles possuía uma força duas
vezes maior que a da morena, sendo assim, Regina não conseguia livrar-se de
suas mãos.
— Você não é capaz de me domar — disse Jennifer em tom
provocativo ao levantá-la pelo quadril e encurralá-la contra a parede. Jennifer
segurou as pernas da mulher e a fez cruzá-las em sua cintura.
As costas de Regina se chocaram contra o azulejo úmido e gelado. A
professora surpreendeu-se com a atitude ousada de Jennifer. Mas, apesar de não
ter força física o suficiente para ela, ainda assim ela mostraria de quem era o
controle.
— Jennifer, me solta — ordenou.
— Não.— Meireles a mantinha suspensa contra a parede ao mesmo
tempo em que lambia e beijava o pescoço e colo exposto da mulher.
Regina segurou o rosto de Jennifer, mais precisamente em seu maxilar,
e a fez olhar dentro de seus olhos.
— Não seja uma garota má e me solte.
— Por que? Você vai me punir?— provocou. — Vai em frente.
A provocação de Jennifer deixou Regina em êxtase, preenchendo-a de
desejo. Foi quando a morena espalmou a mão contra a face da loira e depositou
uma leve tapa ali.
— Você gosta de bater, Regina? Então bate!— disse ao expressar um
sorriso cafajeste.
Regina depositou outra tapa na face de Jennifer. Dessa vez, com mais
força, fazendo a loira gemer de dor e prazer.
— Bate!
Quanto mais Jennifer pedia, mais Regina batia, e cada vez mais forte,
deixando o rosto da loira preenchido por marcas vermelhas.
— Você é uma vadia, Jennifer — disse Regina, segundos antes de
morder o lóbulo da orelha da jovem. — Agora seja uma vadia obediente e me
deixe sair. Eu sei que você quer me dar o prazer de te ver me obedecendo.
Jennifer mordeu o próprio lábio em excitação ao ouvir as palavras sujas
da mulher. Ela, aos poucos, afastou-se de Regina e permitiu que a morena se
desvencilhasse de seus braços.
Regina fechou o registro do chuveiro e deixou o box, sendo seguida por
Jennifer. A morena vestiu-se com um roupão branco de banho e ofereceu o outro
para que Meireles pudesse fazer ao mesmo. Ao entrarem no quarto, deixou a
iluminação à meia luz para que o ambiente ficasse mais sedutor e ligou o
aparelho de som, deixando uma baixa música ao fundo. Feito isso, caminhou até
seus pertences e retornou de lá com um lenço vermelho de seda.
Jennifer a olhava com curiosidade e ansiedade. Ela questionava-se
internamente sobre o que Regina estava prestes a fazer.
— Isso é tudo o que eu quero agora, sabia?— murmurou Regina ao se
aproximar e tocar a faixa que envolvia o roupão de Jennifer. — Eu em você —
sussurrou.
— Você em mim.— Jennifer sussurrou em resposta ao sentir Regina
desamarrando e abrindo seu roupão.
— Você me quer em você, Jennifer?— perguntou ao segurar a nuca da
loira e sussurrar em seu ouvido.
— Quero.— Disse em resposta com a voz um pouco ofegante.
Regina amarrou o tecido vermelho temporariamente na própria coxa de
modo a obter as mãos livres para tocar Meireles.
— De que forma você me quer, hum?— instigou, ao mesmo tempo em
que conduziu Jennifer com seu corpo, fazendo a jovem se chocar contra a parede
mais próxima.
— Entre as minhas pernas — respondeu a loira ao envolver o pescoço
da mais velha com os braços.
— Fodendo você?— perguntou Regina. A morena murmurava tão
próximo aos lábios de Jennifer, que a loira conseguia sentir seu hálito quente.
— Sim — respondeu ofegante. — Quero sentir seus dedos me
invadindo, entrando e saindo da forma que eu sei que você está louca pra fazer.
— Então abre suas pernas pra mim. Me deixa matar nossa vontade.
Jennifer se deixou envolver pelas palavras quentes de Regina e separou
as coxas em uma libidinosa sedução, permitindo que a mais velha segurasse uma
de suas pernas na altura da própria cintura.
— Quero te sentir por dentro, Jennifer. Vou mergulhar fundo em você
até quebrarmos nossos limites.— Regina desceu a mão livre pelo abdômen da
loira até chegar ao centro quente, úmido e pulsante. — Tão macia...—
Murmurou ao acariciar superficialmente a intimidade da mais nova.
Meireles sentia a pele queimar sob as digitais de Regina. Seu sexo
pulsava e gritava para ser preenchido pela mulher que era dona de seus desejos e
vontades. Ela agarrou os curtos cabelos de Regina com uma de suas mãos
enquanto usou a outra para percorrer as costas da mulher, riscando
moderadamente aquela pele oliva com as unhas.
Regina mantinha a perna de Jennifer suspensa em sua cintura enquanto
distribuía beijos e algumas chupadas pelo pescoço da jovem. Com a mão livre,
estimulava o sexo de Jennifer, o deixando cada vez mais molhado de excitação.
Regina alternava entre circundar e massagear aquela intimidade em uma gostosa
brincadeira, ameaçando deslizar o dedo para baixo a cada instante.
— Hoje vou ser uma vadia com você — disse ao levar dois dedos à
boca de Jennifer, deslizando-os por entre os lábios da jovem.
Jennifer separou os lábios e depositou sua boca quente e úmida nos
dedos oferecidos por Regina. Ela os lambia e os chupava eroticamente, os
deixando entrar inteiramente em sua boca e sair repetidas vezes.
Regina começou a emitir baixos gemidos ao sentir sua garota sugando
seus dedos com intensidade. Seus gemidos a faziam chupá-los ainda mais.
Quando seus dois dedos já estavam inteiramente molhados, Regina tornou a
levá-los até o sexo de Jennifer. Não que a loira precisasse de alguma
lubrificação. Mas, para Regina, depositar os dedos lubrificados por ela tornava o
momento ainda mais excitante.
Meireles suspendeu um pouco mais sua perna para que Regina lhe
penetrasse. Ela sentiu os dois dedos da mulher forçando seu caminho e pedindo
passagem para entrar. Quanto mais Regina forçava, Meireles gemia. A princípio,
Regina se mergulhava dentro de Jennifer devagar, permitindo que a loira a
sentisse lhe preenchendo aos poucos. Enquanto isso, aproveitava a deliciosa
sensação de ter seus dedos sendo englobados lentamente.
— Mais...— sussurrou Jennifer, pedindo que Regina os penetrasse até o
final.
Quando Regina os mergulhou por completo, Meireles emitiu um longo
e arrastado gemido de prazer. A morena os manteve parados até que Jennifer se
acostumasse com a presença deles dentro dela; o que não demorou muito tempo.
Logo, Meireles começou a mexer o quadril em um gesto para que Regina os
movimentasse.
— Porra Jennifer...Você é tão gostosa — disse ao iniciar os movimentos
de vai e vem dentro dela. — Eu sou capaz de foder você a noite inteira.—
Regina enroscou os dedos nos cabelos ainda úmidos da loira e os segurou com
força, equilibrando as puxadas com as investidas que dava em seu sexo. Ela
começou a entrar e sair de Jennifer com tanta força, que o corpo da jovem
começou a chocar contra a parede do quarto.
— Mais forte, Regina... Mais...Vai — pedia Jennifer, gemendo,
enquanto sentia os dedos da mulher lhe devorarem com rapidez e força.
Quanto mais fundo e mais rápido Regina mergulhava, mais Jennifer
gemia e precisava de mais. A loira tentou conter os gemidos, mas os
movimentos da mais velha eram tão prazerosos, que tornou-se impossível não
gemer alto de prazer.
— Pode gemer e gritar. Deixe que todos saibam o quanto nos
desejamos.— Após proferir essas palavras, Regina virou Jennifer contra a parede
com rapidez e voracidade, a encurralando de costas e voltando a penetrá-la
enquanto depositava beijos e pequenas mordidas em sua nuca.
Jennifer tentou cravar as unhas na parede bege do quarto tamanho era o
prazer que a mão de Regina estava lhe proporcionando. Além de beijar e dar
leves mordidas em sua nuca, Regina usava a mão livre para apertar seus seios
por trás.
— Regina...— gemeu ela ao riscar de cima para baixo a parede do lugar
com o esmalte vermelho que soltava de suas unhas.
— Porra Jennifer, adoro quando você geme meu nome com essa voz
doce que você tem — comentou. — Você quer sentir o quanto seu gemido me
excita?— perguntou ao mesmo tempo em que foi diminuindo as investidas no
sexo de Jennifer.
Meireles tomou alguns segundos de fôlego e virou-se de frente para ela,
sendo recebida pelo olhar penetrante e intimidador da mulher. Jennifer adorava a
sensação que aqueles castanhos lhe causavam. Se dependesse exclusivamente
dela, passaria a vida sendo despida por eles.
— Quero. Me mostra o quanto eu te excito — respondeu ao se
aproximar de Regina sem cortar o contato visual.
Regina pegou a mão da jovem e a colocou dentro de seu roupão. Em
seguida fez Jennifer mergulhar para dentro de sua calcinha e sentir toda a
umidade que inundava entre suas pernas.
— Que delícia, Regina — murmurou. — Me deixa brincar com você
agora...— Sua voz estava embriagada de desejo.
— Você quer brincar comigo?— disse a mais velha ao esboçar um curto
sorriso de lado. Jennifer podia jurar que havia um demônio sob aqueles lábios
vermelhos e bem definidos. — Então nós vamos brincar.— A morena
desamarrou o lenço vermelho de seda que estava em sua coxa todo esse tempo e
se aproximou de Jennifer. — Primeiro preciso saber se você me deixa te vendar.
— Eu confio em você.— Sorriu. Jennifer olhou para o tecido vermelho
com atenção e ficou na expectativa.
— Ótimo. Agora eu vou te privar da sua visão e quero que você
aproveite os momentos vendada para explorar os outros sentidos — instruiu ao
se posicionar por trás de Meireles e levar a fita até os olhos da loira. — Pronto!
Agora eu quero que você se guie pela minha voz, venha até mim, tire minha
roupa, se ajoelhe e mostre a mulher que eu sei que você é.
Jennifer caminhou em direção à Regina e parou ao sentir o corpo da
morena encostando contra o seu. Visto que não conseguia enxergar nada, usou as
mãos para tatear o corpo à sua frente. Meireles deslizou as mãos pelos ombros,
costas, seios e bunda de Regina; registrando em sua memória tátil cada
ondulação do corpo daquela mulher por quem tanto era apaixonada.
— Acho que não será por aqui que você irá conseguir abrir meu roupão,
Jennifer — comentou ao sentir as mãos de Jennifer apertando sua bunda com
insistência.
— Sorry — disse ao rir do comentário que Regina fizera. A loira,
enfim, encontrou a faixa do roupão e o abriu. Em seguida deslizou a peça para
fora do corpo da mulher. Jennifer muito desejava poder ver o corpo inteiramente
nu de Regina. Mas, tendo em vista que ainda não podia, aproveitou para aspirar
o perfume da pele enquanto percorria os lábios pelo pescoço, ombros e abdômen
da morena. — Seu cheiro é tão sedutor, Regina. Me apaixono cada vez mais por
você sempre que o aspiro — murmurou. E mesmo que não visse, ela podia sentir
que Regina sorrira ao seu comentário.
Após tirar a roupa de Regina, foi questão de segundos para que a loira
arrastasse a calcinha da morena para fora de seu corpo. Agora, a mais velha
estava inteiramente nua à sua frente. Jennifer sabia que já havia obedecido cada
pequena ordem da mulher e estava prestes a ajoelhar-se. Quando o fez, sabia
exatamente do que se tratava. Ela se ajoelharia, sim, mas quem rezaria pelo
prazer seria Regina.
Meireles deslizou a ponta do nariz e os lábios repetidas vezes sobre o
sexo de Regina para sentir a textura ao mesmo tempo em que sentia o aroma
feminino que exalava daquela região. Regina, por sua vez, soltava baixos
gemidos enquanto aguardava um contato maior.
— Eu vou te chupar sem cerimônia e só vou parar quando você gozar.
— Essas foram as últimas palavras de Jennifer antes de tomar aquela região com
volúpia, fazendo a morena soltar um alto gemido repentino ao ser surpreendida
pela sua boca quente e úmida.
Jennifer segurou nas coxas de Regina como forma de apoio e lambeu o
sexo da mulher por fora, de baixo pra cima, de cima para baixo e o beijou.
Quando o fez, ouviu a morena soltar um baixo gemido. A loira sorriu ao
perceber que estava no caminho certo e introduziu lentamente a língua pela
fenda de Regina em uma gostosa exploração com a língua, que se movia
lentamente, conhecendo e provando cada pedaço do íntimo da mulher.
Aos poucos Jennifer foi descobrindo os pontos que mais davam prazer à
Regina e os explorou com mais atenção. Regina gostava que deslizasse a língua
devagar, mas que chupasse com força. E assim Jennifer o fez; ela lambia sua
mulher de maneira lenta e a chupava com intensidade, fazendo-a gemer e pedir
por mais.
— Isso... Assim — dizia Regina ao segurar os cabelos da loira e guiá-la
a continuar. — Porra Jennifer... Que delícia você me chupando — disse
roucamente com a voz arrastada e embriagada de prazer. — Não se atreva a
parar.
Meireles permaneceu lambendo e chupando Regina; dando total atenção
ao ponto completamente enrijecido da mulher, que ela a fazia questão de brincar
com a ponta da língua.
Os gemidos de Regina tornaram-se cada vez mais altos e frequentes.
Jennifer percebeu que a mulher estava à beira de ter um orgasmo. A morena
largou os cabelos da loira no momento em que sentiu uma forte carga
acumulando-se em seu baixo ventre. Foi então que suas pernas fraquejaram e
Regina atingiu seu primeiro orgasmo da noite.
Jennifer tirou a venda e se ergueu. A jovem passeou o olhar por cada
curva definida de Regina ao mesmo tempo em que sentiu o próprio sexo molhar.
Regina Vianna nua era, sem dúvida, a imagem mais sexy que seus olhos já
viram. Após admirar a mulher à sua frente, aproximou-se e beijou seus lábios.
— Quero que você prove o gosto maravilhoso que tem — murmurou
entre o beijo.
Regina correspondeu e invadiu a boca de Jennifer com sua língua em
um beijo puramente erótico.
— Que morte deliciosa você me deu, garota.
Jennifer, pela primeira vez, não se importou em ser chamada de garota
por Regina. Pelo contrário, naquele momento ela até achou excitante.
— Leva sua garota pra cama?
— Não. Eu vou levar a minha mulher para a cama.— Regina segurou
em cada ponta da fita vermelha, enlaçou Meireles pelo pescoço e a conduziu até
a cama. Ao sentar-se, guiou-a para que ela sentasse em seu colo.
Ao sentar no colo de Regina, de frente, Jennifer envolveu a cintura da
mulher com suas pernas e começou a distribuir beijos e mordidas pelo maxilar e
pescoço da mais velha. Os beijos de Jennifer eram arrastados e provocantes. Ela
roçava os mamilos contra o peitoral de Regina e rebolava lentamente no colo da
mulher.
— Eu disse que seria capaz de foder você a noite inteira — iniciou
Regina. — E com você rebolando assim no meu colo eu serei levada a cumprir
— continuou dizendo. — Você aguenta?
Jennifer, inicialmente, nada disse. Não em palavras. Ela segurou a mão
de Regina com a dela e a levou até o próprio sexo.
— Com força e sem parar. — Foi sua resposta.
Regina mordeu o lábio inferior da boca de Jennifer e a penetrou sem
cerimônia. Para seu deleite, a loira estava completamente úmida e quente.
— É tão gostoso estar dentro de você — disse ao senti-la começando a
rebolar em seus dedos.

Ponto de vista de Jennifer

Eu não sabia se segurava os cabelos de Regina ou se fincava minhas
unhas em suas costas e a arranhava na tentativa de conter o prazer que ela
estava me proporcionando. Eu me sentia completamente extasiada. Me vi
envolta à uma atmosfera carregada de luxúria, e tudo o que eu mais queria era
que aquela mulher acabasse comigo naquela noite. Eu precisava, e sabia que
ela também, sucumbir a todo aquele desejo que nos dominava e nos fazia
queimar feito brasa. Eu sentia o suor da minha pele se misturar ao suor de
Regina ao mesmo tempo em que eu conseguia inalar o cheiro que vinha dos
cabelos e corpo daquela mulher. Tudo era propício a me enlouquecer.
Regina entrava e saía de dentro de mim em um ir e ir vir forte,
constante, selvagem. Eu conseguia sentir seus dedos me preenchendo, me
explorando, me esvaziando e voltando a me invadir. Regina não parava. Ela ia
cada vez mais forte, cada vez mais fundo, cada vez mais dentro. Naquele
momento, meu corpo e o dela estavam inteiramente despidos de qualquer regra
e completamente entregues ao prazer.

Ponto de vista de Regina

Eu segurava e puxava os cabelos longos e macios de Jennifer ao mesmo
tempo em que invadia seu sexo. Quanto mais fundo eu ia, mais seus cabelos eu
puxava. Meireles rebolava em meu colo e eu podia sentir sua intimidade
pedindo sempre por mais. Jennifer gemia meu nome com uma voz tão doce e
manhosa, que eu estava prestes a ter outro orgasmo só em ouvi-la.
Meireles gostava que eu entrasse e saísse com rapidez e força, e assim
eu fazia. Eu a sentia englobando meus dedos deliciosamente enquanto eu a
devorava. Não demorou muito para que eu sentisse suas paredes internas se
contraírem em meus dedos em um sinal de que ela havia atingido o clímax.
Diminui o ritmo da penetração para dar tempo de Jennifer se recompor. Não
demorando muito, voltei a preenchê-la e iniciamos novamente aquela gostosa
brincadeira.
Meu sexo implorava e eu ansiava para ter a mão de Jennifer entre
minhas pernas. Mas, antes disso acontecer, eu faria Jennifer Meireles sair de
órbita.

Capítulo 18

Jennifer permanecia rebolando nos dedos de Regina enquanto sentia a
mais velha lhe invadindo. Os movimentos da professora tornaram-se tão
intensos, que a loira começou a subir e descer no colo da mulher com rapidez e
força para acompanhar seu ritmo. O corpo de Jennifer se cobriu de suor,
enquanto sua respiração tornou-se apressada. A loira estava demasiadamente
ofegante.
— Não vou conseguir esquecer essa sensação — disse Regina ao
apertar a bunda de Jennifer e puxá-la ainda mais para frente, fazendo seu dedo ir
ainda mais fundo na loira. — Vou lembrar de você rebolando em mim em cada
uma daquelas malditas aulas que ainda teremos juntas.
— E o que você pretende fazer sempre que lembrar?
— Não sei. Só sei o que eu quero agora.— Regina empurrou Jennifer
para trás e a fez se chocar contra o colchão. Em seguida, quase
instantaneamente, lançou-se sobre ela e se deitou sobre aquele corpo suado e
deliciosamente definido. — Todas as vezes em que vi você suada naquele
uniforme de boxe eu desejei te sentir assim — confessou Regina ao roçar as
pernas entre e contra as pernas de Jennifer; fazendo seu corpo e o da jovem se
enroscarem. — Você é tão gostosa, Jennifer. Hoje eu vou provar cada pedaço
seu.— Regina deslizou para a beirada da cama, segurou uma das pernas da
jovem e começou a distribuir beijos pelo seu pé e perna.
A morena arrastou os lábios pelas coxas até chegar ao abdômen de
Meireles, local onde beijou e passeou a língua, provando o gosto daquela pele
suada.
— Você não imagina a quantidade de vezes em que precisei me segurar
enquanto meu corpo pedia para lamber toda sua pele — confessou novamente
após retornar para cima e deslizar a língua pela extensão do pescoço da mais
nova, deixando um rastro úmido no local. — Quando você apareceu de saia na
minha aula e me provocou com aqueles movimentos de pernas eu desejei poder
ir até você, tirar sua calcinha e te chupar ali mesmo.
— Regina...
— Shhh, cala a boca. Agora você vai saber o que fazia comigo.—
Regina segurou os punhos de Jennifer contra o colchão e começou a murmurar
de maneira provocante próximo ao ouvido da loira. — Você estava
enlouquecedora e me tirando do sério naquele dia.— Regina mordeu o próprio
lábio ao lembrar-se. — Vou te mostrar de que forma eu teria chupado você.— A
morena traçou um caminho de beijos por todo o corpo de Jennifer até chegar
próximo ao sexo da loira. Ela deslizou a língua pela virilha da mulher e deu uma
leve mordida no local.
Meireles começou a se contorcer sutilmente na cama à procura de um
contato maior com Regina. A loira estava na expectativa de sentir a boca da mais
velha aquecendo sua intimidade.
Regina abriu passagem e percorreu a ponta da língua pelo sexo da loira.
A mais velha alternava entre movimentos giratórios e de cima para baixo,
deliciando-se com a maciez e o gosto que Jennifer oferecia.
A loira começou a agarrar os lençóis da cama quando Regina iniciou
fortes chupadas. A boca da mulher estava quente e úmida. Ela sugava sua
intimidade com força enquanto, vez ou outra, lhe dava algumas mordidas na
região externa.
Meireles fechou as pernas no pescoço de Regina e começou a arquear o
corpo de prazer. Ela queria e precisava ser sugada por toda aquela intensidade.
A mais velha começou a diminuir o ritmo como se quisesse castigar
Jennifer. Ela a lambia e sugava devagar. E quando o gemido de Jennifer se
tornava um lamento, ela voltava a chupá-la com força.
Regina interrompeu os estímulos que fazia com a língua e começou a
masturbar Jennifer com os dedos. Ela massageava o ponto de prazer da loira ao
mesmo tempo em que ameaçava penetrá-la com o dedo médio, excitando-a.
— Estou completamente molhada, Regina. Por que parou?— perguntou
assim que a mais velha interrompeu as carícias.
— Porque agora eu quero você de quatro pra mim — disse séria ao virar
abruptamente o corpo de Jennifer na cama. — E isso não é um pedido.
Meireles mordeu o próprio lábio inferior e sorriu ao ser virada de
maneira brusca.
— Vai me tratar feito uma cachorra?— perguntou ao se apoiar sobre os
cotovelos. Regina não conseguia vê-la, mas, nesse momento, Jennifer
expressava um sorriso bem sacana.
— Sim. E você vai adorar ser tratada como uma cachorra por mim.—
Regina segurou nas pernas da loira e puxou o corpo da jovem, fazendo-o deslizar
para mais próximo da beirada da cama. Em seguida, com Jennifer ainda de
costas, envolveu sua cintura com os braços e fez o corpo da loira se erguer até
atingir sua altura. — Agora você vai gritar de tão gostoso que eu estarei fodendo
você — disse, instantes antes de morder o pescoço de Jennifer e apertar os dois
seios da mulher com força.
Meireles virou parcialmente o rosto e buscou os lábios da morena. As
duas iniciaram um beijo rápido, quente e carregado de paixão.
— Eu adoraria ter uma coleira pra colocar em você agora — murmurou.
— Mas já que não tenho... Vou transformar seu cabelo em uma.— Regina
enrolou o cabelo ondulado de Jennifer em sua mão e o puxou, fazendo Meireles
inclinar sutilmente a cabeça pra trás.
A morena depositou a mão livre nas costas de Meireles e a fez abaixar a
parte da frente de seu corpo. Agora, Jennifer estava de quatro e completamente a
mercê de suas vontades.
A mais velha alternava entre puxar o cabelo para trás e depositar tapas
em sua bunda. E, sempre que o fazia, ouvia Meireles gemer alto pelo prazer que
a dor daquele ato estava lhe proporcionando.
— Bate, Regina!— Os gritos de Jennifer se misturavam ao seu próprio
gemido. Ter Regina apertando e batendo forte em sua bunda era
imensuravelmente excitante. — Me faz sua...— murmurou.
Algum tempo depois, Regina soltou os cabelos da jovem para que sua
mão pudesse estar livre para que ela separasse as pernas de Jennifer. E assim o
fez, afastou as pernas de Meireles até que o sexo da loira fosse exposto. A
morena ficou completamente excitada. Aquela posição vulnerável e de
submissão na qual Jennifer Meireles se encontrava a enlouquecia. Sendo assim,
sem muita cerimônia, deslizou a língua sobre aquele sexo à sua frente e o
chupou.
Regina chupou até sentir que o corpo de Jennifer estava começando a
fraquejar. Foi quando parou, se posicionou um pouco mais acima e voltou a
segurá-la pelos cabelos.
— Se ficar desconfortável, me avisa que eu paro, tudo bem?— disse
Regina. Ela sabia que aquela posição poderia causar algum incômodo, e ela não
queria que Jennifer se sentisse desconfortável. Pelo contrário, ela buscava lhe
oferecer apenas prazer.
A mais jovem assentiu e Regina começou a introduzir um dedo em seu
interior. Jennifer se mexeu lentamente enquanto buscava o melhor encaixe. Para
ela, estava sendo uma nova experiência toda aquela sensação. E ela se alegrava
por estar vivendo aquele momento com Regina.
Quando o sexo de Jennifer começou a se acostumar, Regina introduziu
o segundo dedo e iniciou violentos movimentos de entra e sai, fazendo Jennifer
agarrar os lençóis na tentativa de conter a forte corrente que tomava seu corpo.
Regina entrava e saía com tanta força, que proporcionava um leve
ardor. Ardor esse, que excitava Meireles ainda mais. Ela adorava saber que
Regina a devorava com desejo, fome e vontade.
— Está gostando?— Se certificou a mais velha. Seus impulsos não a
impediam de ter cautela com a loira.
Jennifer não conseguiu formular palavras para respondê-la. Ela apenas
conseguia gemer cada vez mais alto enquanto se agarrava ao lençol.
O gemido de Meireles era a melhor resposta que Regina poderia ouvir.
Visto que Jennifer estava gostando, envolveu a cintura da jovem e puxou o corpo
da mulher para mais perto de si, fazendo seus dedos irem mais fundo.
— Diz pra mim quem é que manda.
— Você... Você — dizia Jennifer com a voz fraca e cortante.
— Quem fode você tão bem que te faz gritar?
— Você, Regina...— Jennifer respondia ao mesmo tempo em que pedia
para a mais velha não parar. — Mais forte... Não para.
Regina aumentou o ritmo dos movimentos e começou a ir cada vez mais
rápido e fundo, fazendo Jennifer gritar de prazer com suas fortes estocadas e
puxadas de cabelo. Não demorou muito e o corpo da loira estremeceu ao ser
atingido por mais um orgasmo. Regina deslizou os dedos para fora lentamente e
deixou que o corpo de Jennifer repousasse sobre o colchão.
Enquanto Jennifer recuperava as energias, a mais velha deitou-se ao
seu lado e começou a acariciá-la nos cabelos. Meireles fechou os olhos e se
permitiu sentir aquele terno afago. A morena alisava e acariciava aqueles fios
que há pouco fora deliciosamente maltratados por ela.
— Eu queria poder viver eternamente nesse quarto com você —
comentou Jennifer enquanto sentia as carícias em seus cabelos.
— Não temos a eternidade, mas temos a noite inteira...— disse com
suavidade na voz, fazendo a loira sorrir. Regina fez um percurso carinhoso com
a ponta do dedo indicador, deslizando-o da testa até o queixo de Jen.
— Queria beber algo. Você me deixou seca — comentou Jennifer.
— Vou até a geladeira pra ver o que tem. Me acompanha?— Regina se
enrolou no lençol, levantou e caminhou até a cozinha sendo acompanhada por
Jennifer, que optou por vestir o roupão branco.
Dentro da geladeira havia garrafas de água mineral, cerveja, algumas
latas de refrigerante, caixas de suco e uma garrafa de vinho.
— Quero o vinho — escolheu Jennifer — E não adianta me negar.—
Meireles pegou a garrafa de dentro da geladeira e a abriu com um saca-rolha que
estava pendurado em um gancho na parede. Feito isso, pegou duas taças e as
preencheu com o líquido.
Regina pegou a taça oferecida por ela e sorveu a bebida. Em seguida,
encostou-se à bancada e gesticulou com a mão para que a loira se aproximasse.
Jennifer uniu o corpo ao de dela e envolveu os braços em seu pescoço. As duas
mulheres começaram a conversar enquanto provavam da bebida.
— Posso provar o gosto dos seus lábios úmidos de vinho, senhorita
Vianna?
— Você pode provar o que quiser aqui.
Jennifer fechou os olhos e roçou os lábios lentamente contra os de
Regina para ter tempo de registrar aquela textura que tanto lhe agradava. O
cheiro de álcool que vinha do hálito da mais velha lhe excitava. Não demorou
muito para que seus lábios buscassem um contato maior. Ela queria provar o
gosto de toda aquela sensualidade em sua boca.
Meireles depositou a taça sobre a bancada e começou a enroscar os
dedos nos curtos cabelos de Regina enquanto a beijava. Ela alternava entre
arranhar a nuca da mulher e puxar carinhosamente os cabelos.
Seus lábios e os de Regina se entreabriam e suas línguas úmidas se
enroscaram e acariciaram em um ritmo já conhecido por elas. O beijo lento foi
dando lugar a um beijo mais urgente. As mãos de Jennifer, que antes estavam na
nuca e cabelo de Regina, foram descendo pela lateral do corpo da mulher e
estacionaram em sua bunda.
Regina soltava baixos gemidos guturais ao sentir a jovem acariciando e
apertando aquela região de seu corpo. Sua pele começou a esquentar e ela foi se
deixando entregar às carícias que recebia.
— Quero você, Regina — murmurou ao distribuir beijos pelo pescoço
da mais velha. — Quero cada pedaço de quem você é — continuou a murmurar
ao mesmo tempo em que foi desenrolando o branco lençol que cobria sua
professora, deixando todo o corpo da morena à mostra.
A clara e boa iluminação que havia na cozinha permitiu que ambas as
mulheres conectassem seus olhares. Elas se olhavam fixamente como se
estivessem hipnotizadas. E sem quebrar o magnetismo que as rodeava, Regina
desamarrou o roupão que a loira vestira ao deixarem a cama e o abriu, deixando
aquele corpo parcialmente exposto.
Jennifer encurralou Regina ainda mais contra a bancada e sentiu a
morena erguer e dobrar uma das pernas, dando passagem para que a loira se
encaixasse ali. Meireles dedicou algum tempo apertando os dois seios pequenos
e firmes de Regina. Ela os massageava e prendia os mamilos entre o polegar e o
dedo indicador, arrancando baixos gemidos da mulher.
Cada movimento era feito sem a quebra do contato visual. Seus olhares
se sugavam com a mesma intensidade que as mãos de Jennifer deslizavam pelo
corpo de Regina; apertando cada centímetro daquela pele macia que se arrepiava
sob seus toques.
Quando a mão de Jennifer encontrou a intimidade quente, a mais velha
abriu parcialmente a boca e soltou um gemido arrastado. Jennifer expressou um
pequeno sorriso e começou a estimulá-la enquanto observava suas expressões de
prazer.
Meireles forçou um dedo e logo o sentiu deslizar para dentro com
facilidade devido a enorme lubrificação da morena. Naquele momento, Jennifer
sentiu as próprias pernas bambearem enquanto seu coração batia como se
quisesse saltar de seu peito. A loira sentiu um pequeno nervosismo querendo
tomar conta. Ela, por um momento, temeu não ser o suficiente para dar prazer à
Regina. No entanto, logo esses pensamentos foram deixados de lado ao sentir as
curtas unhas da mulher fincando em suas costas em um nítido gesto de prazer.
Meireles, aos poucos, relaxou, tomou confiança e se entregou ao momento. Estar
dentro de Regina Vianna estava sendo fisicamente e psicologicamente delicioso.
Quando Jennifer deslizou o segundo dedo, ouviu um gemido ainda mais
forte e mais alto.
— Isso, Jennifer... Assim...— disse com a voz fraca.
— Você gosta que eu entre com fúria, Regina?— instigou, aumentando
o ritmo dos movimentos.
— Oh sim, por favor... — respondeu em meio aos gemidos.
Jennifer segurou a perna suspensa de Regina e começou a chocar o
corpo contra o da mulher para que suas investidas tomassem uma pressão ainda
maior. Os dedos da loira entravam e saíam tão deliciosamente, que a morena
começou a puxá-la pra frente enquanto cravava e arranhava as unhas em suas
costas por dentro do roupão.
Regina riscava as costas de Jennifer sem pena, deixando a pele branca
da loira completamente vermelha e com um delicioso ardor proporcionado por
suas unhas famintas por arranhá-la.
— Você gosta de me sentir dentro de você, não gosta, senhorita
Vianna?— Jennifer provocou. — Gosta de ser fodida por sua garota?
— Sim! Me enlouquece você dentro de mim — disse, segundos antes
de tirar o roupão de Jennifer com urgência e distribuir mordidas pelos ombros da
loira.
— Porra Regina... Você é uma vadia deliciosa, sabia?— comentou
enquanto sentia as mãos da mulher descerem para seus braços. A morena
começou a apertá-los e arranhá-los com força e intensidade. — Você gosta deles,
não gosta? Saiba que eles e eu estamos aqui pra te servir.
Quando Meireles terminou de proferir tais palavras, Regina parou de
olhá-la nos olhos e deixou que seu olhar caísse para aqueles fortes braços; mais
especificamente para o braço correspondente à mão que habitava seu centro. A
mais velha foi ficando cada vez mais excitada ao ver os músculos da loira
tornando-se cada vez mais evidentes conforme ela mexia seu braço ali. Regina
gemia e mordia o próprio lábio com a cena.
— Goza pra nós?— sussurrou Jennifer. A loira penetrou o mais fundo
que alcançou e deslizou para fora lentamente enquanto sentia o sexo de Regina
se contraindo e apertando seus dedos. Ela sorriu de satisfação ao ver a mais
velha amolecendo em seus braços.
Entre uma taça de vinho e outra, as duas amantes passaram horas
naquela entrega. Regina sorvia o vinho enquanto lançava seus discursos quentes
e depravados sobre Jennifer. A loira, por sua vez, se deixava envolver por toda a
sensualidade de Regina e a provocava ao último. E quando deram-se conta já
haviam bebido toda a garrafa.
— Oh Deus, não devíamos ter bebido tanto — comentou a mais velha
ao levar a mão até a testa após observar a garrafa vazia sobre a bancada.
— Não devíamos ter feito tanta coisa, Regina, mas fizemos. A começar
por nos apaixonarmos. Você se arrepende?
— Não. Eu faria tudo de novo. O que é certo e errado? A partir do
ponto de vista de quem?— respondeu ao aproximar-se de Jennifer e colar seu
corpo ao dela. — Aliás... Eu vou fazer tudo novo — murmurou contra o ouvido
da loira enquanto a conduzia de volta para o quarto. — De novo, de novo e de
novo...


A noite estendeu-se para Jennifer e Regina. Contudo, houve um
momento em que seus corpos esgotaram-se de tanto receber e oferecer prazer.
Nessa hora as duas amantes buscaram o conforto dos braços e aninharam-se em
um sono profundo.
Quando o dia amanheceu naquela suíte, Regina foi a primeira a acordar.
Ela abriu os olhos lentamente e olhou para o lado, avistando Meireles dormindo
de costas para ela. Lembranças da noite passada foram, aos poucos, se fazendo
presentes. Trazendo consigo um gostoso sorriso para os lábios.
A mais velha virou-se e foi de encontro a Jennifer. A loira parecia estar
tendo um sono tão gostoso, que Regina não ousou acordá-la. Todavia, não
conteve a vontade de acariciar aquelas costas parcialmente nuas, coberta apenas
por um pedaço do lençol.
Regina depositou levemente sua mão sobre a pele de Jennifer e
começou a alisar as costas da loira com a ponta dos dedos. Ela os passava sobre
os pequenos arranhões que havia ali; todos frutos de suas unhas. Regina sorriu
com o que vira e logo desviou a atenção para outro detalhe: as pequenas pintas
que havia na pele de Jennifer.
Regina foi contando uma por uma daquelas pintas enquanto traçava
caminhos com os dedos. Ela estava encantada por mais aquela graciosidade de
Jennifer.
Após dedicar longos minutos namorando as costas de Meireles, decidiu
levantar, ligar para o serviço de quarto e pedir um café da manhã. Porém,
quando ia fazê-lo, mudou de ideia. Decidiu se trocar, pegar o carro e procurar o
supermercado mais próximo. Regina queria preparar algo com as próprias mãos
e tornar o momento ainda mais especial. Queria que Jennifer se sentisse querida
e valorizada. Ela queria mostrar que era sim uma vadia, mas que esse título
ficava apenas na cama, porque fora dela, ela era apenas uma mulher apaixonada.


Jennifer foi despertando lentamente. Ao abrir os olhos, virou-se e
buscou Regina instintivamente. A loira franziu o cenho ao perceber que não
havia despertado ao lado da mulher.
— Regina?— chamou. Mas tudo que recebeu de volta foi o silêncio do
quarto.
Ao levantar-se da cama sentiu seus músculos levemente doloridos.
Logo, lembranças da noite passada foram se fazendo vívidas. A cabeça de
Jennifer doía um pouco e seu corpo estava mole. Ela não sabia se era efeito do
vinho, do sexo que sugou suas energias ou de ambos.
Caminhou até um amplo espelho que havia na parede do quarto e
começou a analisar os estragos que Regina fizera. Seus cabelos estavam
bagunçados e a pele branca de seus braços estava marcada por de dedos e unhas.
Ela não lembrava com clareza em que momento aquelas marcas tinham sido
feitas, mas, sorriu ao ver seu corpo deliciosamente maltratado pelo desejo de
Regina.
Após olhar-se no espelho, caminhou por toda a suíte à procura da
mulher. Quando se deu conta que Regina não estava, suspirou e retornou para o
quarto. Jennifer sentou-se na beirada da cama e olhou para o lado
correspondente ao que a morena dormira. Ela acariciou o lençol e inclinou-se
para cheirar o travesseiro. Por sorte, havia resquícios do cheiro de Regina ali.
Um bobo sorriso apaixonado não abandonava seus lábios. Jennifer
contava cada instante para reviver os momentos da noite passada e construir
alguns novos. Ela mal acordara e já desejava sentir o toque de Regina e o cheiro
de sua pele.
Tendo em vista que a morena não se encontrava na suíte, Jennifer
enrolou-se no lençol e começou a buscar seu celular pelo quarto para tentar uma
futura comunicação com ela. No meio dessa busca encontrou seu aparelho sobre
o móvel de cabeceira acompanhado por dois bilhetes. Jennifer sorriu ao perceber
que se tratava da fina caligrafia de Regina.

“Bom dia, menina de ouro. Desculpe não estar presente para vê-la
abrindo os olhos. Você dormia tão tranquilamente, que não ousei acordá-la.
Desci à procura de um supermercado, mas volto logo.
Infinitos beijos.”

— Infinitos beijos.— Jennifer repetiu a frase final algumas vezes em
sua mente, e logo lembrou-se que havia um segundo bilhete deixado pela
mulher. Sendo assim, se apressou em lê-lo.

“As pintas do seu corpo me parecem constelações
Sinto vontade de beijar cada pequena estrela sua, Jennifer, até me
perder nesse seu céu particular
Desejar você me faz querer gritar enquanto viajo por todas as órbitas
Mas, sem esquecer que a melhor viagem acontece quando olho para o
universo contido nas órbitas dos seus olhos”

- Regina.

Capítulo 19

Após muito ler e suspirar com os dois bilhetes deixados por Regina,
Jennifer separou um conjunto de roupa e se direcionou para o banho. Minutos
depois, ao sair do banheiro, ouviu alguns ruídos vindos da cozinha e caminhou
até lá. Ao chegar, deparou-se com Regina preparando o café da manhã com suas
próprias mãos.
— Bom dia!— disse Jennifer, arrastando as palavras, ao se aproximar
da mulher e envolvê-la pela cintura, por trás. — Queria ter encontrado você
quando acordei — disse a jovem após depositar um beijo na nuca da morena.
— Desculpe não esperá-la acordar. Quis te preparar um café da manhã
com minhas próprias mãos — explicou ao virar-se. — Deixei avisado no bilhete.
Você viu?
— Vi — respondeu com um sorriso nos lábios. — Me encantei pelo
poema que me deixou. Você sabe que eu adoro a forma como escreve, não sabe?
Sempre gostei de seus poemas antes mesmo de saber que eram seus. Estou ainda
mais apaixonada por esse e pelo outro que escreveu pra mim. Obrigada — disse
carinhosamente ao beijar os lábios de Regina.
— Eu que preciso agradecer. Você tem me inspirado — disse
suavemente. Regina acariciou os cabelos da loira e devolveu o beijo em seus
lábios. — Eu te escrevo todos os dias quando fecho os olhos e penso em você.
Meireles sorriu e deixou que seu olhar se perdesse nos castanhos de
Regina por longos instantes. As duas se olharam e conversaram em silêncio
como sempre faziam quando seus olhares se conectavam, até que Regina
interrompeu a conexão e desviou a atenção para as marcas que haviam nos
braços da loira.
— Maltratei muito você ontem à noite?— perguntou ao acariciar os
braços de Jennifer. A loira possuía a pele tão branca, que facilmente se marcava.
— Só um pouquinho — respondeu ao esboçar um pequeno sorriso de
lado. — A propósito... Obrigada por ontem. Foi tão bom me sentir sua.
— Eu também gostei. Cada momento passado com você foi
maravilhoso. Te sentir minha foi uma sensação deliciosa, e me fazer sua foi tão
bom quanto — respondeu. — Sabe o quê mais a noite de ontem proporcionou?
— O quê?
— Muita fome!— exclamou Regina, arrancando uma gostosa risada da
jovem.
— Também estou morrendo de fome! O que você preparou pra nós?—
perguntou ao se afastar-se de Regina e se aproximar da bancada.
— Eu trouxe pães, torradas e preparei waffles. Gosta?
— Muito! Principalmente com geleia de morango.
— Ótimo! Pois eu também a trouxe — disse ela. — O que você quer
beber? Tem suco na geladeira, mas eu posso preparar um café pra nós.
— Acho que vou preferir o café só porque será feito pelas suas mãos —
respondeu, fazendo Regina esboçar um sorriso.
— Certo. Então te acompanharei no café.
As duas mulheres sentaram-se lado a lado e iniciaram um diálogo
enquanto faziam a refeição. Elas conversavam sobre a noite de ontem e sobre
seus sentimentos. Jennifer, vez ou outra, acariciava os cabelos curtos de Regina.
A morena, por sua vez, se deixava envolver pelo largo sorriso da jovem.
— Gostaria de te levar pra minha casa hoje — comentou Regina. —
Mas se você preferir aproveitar mais um pouco do Resort, a gente fica.
— O Resort está maravilhoso. O lugar tem uma vista incrível e oferece
muitas formas de entretenimento. Mas eu prefiro aproveitar o tempo que nos
resta indo pra sua casa. Estar entre suas coisas é importante pra mim.— Sorriu.
— Ok. Então vamos terminar o café da manhã e ir?— Sugeriu.
Ambas concluíram a refeição, fizeram o check out no Resort e se
dirigiram para a casa da mais velha. Chegando lá, foram recebidas por Bóris, que
muito miou ao ver sua dona chegar.
— Sentiu saudades da mamãe, meu amor?— disse ela, carinhosamente,
ao pegá-lo no colo.
Jennifer sorriu ao ver sua professora modificar a voz ao se dirigir ao
gato. Sua voz estava fina e manhosa; totalmente oposta ao que sempre era. E
Meireles adorava isso; adorava conhecer Regina Vianna além da sala de aula.
— Mamãe chegou com visita. Você se lembra da Jennifer?
Bóris apenas ronronava e esfregava o topo da cabeça contra seu rosto.
— Posso pegá-lo?
— Claro!— respondeu ao sorrir. — Vai no colo da Jennifer, vai..—
disse ao entregá-lo.
— Ele é muito lindão!— comentou Jennifer. — E pesado!— Riu. —
Parece estar ainda mais gordo que da última vez que o vi.
— Ele estava de dieta, mas andei dando uns petiscos extras a ele.
Provavelmente aumentou de peso — explicou. — Bom, vou à área de serviço
deixar meus calçados e já volto.
— Eu vou com você.
Regina tirou os saltos ao entrar e os depositou de maneira alinhada no
chão. Jennifer, por sua vez, retirou seus tênis e os deixou próximos aos calçados
da morena. Contudo, logo em seguida, Meireles observou a mais velha mexendo
em seus tênis e os organizando de maneira alinhada ao lado de seus saltos.
— Desculpe, é o pequeno problema que tenho.— Regina se explicou.
— Oh, tudo bem. Da próxima vez os colocarei perfeitamente alinhados
ao lado dos seus.
— Eu sou insuportável com essas minhas obsessões. Você irá me
aguentar?— perguntou Regina ao se retirar da área de serviço com ela.
— Eu não me importo, Regina, sério. E adoraria tentar te ajudar com
isso.
— Obrigada, Jen. Mas acho muito difícil você conseguir fazer essas
minhas compulsões diminuírem.
— Eu posso tentar. Não posso?
— E qual seria seu método de tratamento?
— Bom, eu poderia voltar àquela área e bagunçar nossos calçados.
Você ficaria louca querendo arrumá-los, mas aí eu envolveria você pelo pescoço
dessa maneira e desviaria sua atenção.— Meireles enlaçou o pescoço de Regina
e começou a distribuir beijos na região. — Te beijaria incontáveis vezes até você
esquecer — murmurou.
— Hum... Estou começando a gostar dessa idéia — comentou ao sorrir.
— Vou te levar pra conhecer todos os cômodos da casa, quer? Na vez em que
esteve aqui quase não tivemos tempo.
— Eu vou adorar conhecer tudo o que quiser me mostrar.— Meireles
carregava um intenso brilho no olhar enquanto interagia com Regina. Ela olhava
para a mulher com entusiasmo e admiração.
Regina mostrou todos os cômodos e espaços que havia no primeiro
piso e em seguida se direcionou com Jennifer para o segundo andar. Lá havia
apenas seu quarto com banheiro, um cômodo ocupado por pertences antigos e
dois quartos de hóspedes com banheiro em cada um deles.
O quarto de Regina era espaçoso, mas não possuía muitos móveis. Ela
muito apreciava ter um ambiente clean. Em seu quarto havia apenas o essencial:
uma cama espaçosa, um extenso guarda roupa embutido na parede, uma poltrona
de coloração vermelha, sua cor preferida, e um criado mudo. No cômodo
também havia uma televisão na parede para que ela pudesse assistir alguns
documentários antes de dormir.
Ao entrar no quarto, Meireles sentiu um pequeno nervosismo, era como
se ela estivesse ainda mais entrelaçada com a mulher. Sua intimidade com a
professora aumentava de acordo com o estreitamento de seus laços.
— Seu quarto é, definitivamente, a sua cara — constatou após observar
o lugar.
O cômodo era limpo e milimetricamente organizado. Não havia
absolutamente nada fora do lugar. Era perceptível que todos os objetos estavam
dispostos em seus lugares com simetria. Todos eles seguiam algum padrão; seja
este de cor ou formato. Alguns livros de História e poemas também foram
avistados por Jennifer. Alguns sobre o criado mudo, e outros sobre uma pequena
prateleira que havia no lugar. Regina amava leitura.
Bóris acompanhou as duas mulheres por todos os lados. E quando
chegaram ao quarto de Regina, que era sua parte preferida da casa, pulou sobre a
cama e deitou-se. Agora ele era uma redonda mancha preta contrastando com os
brancos lençóis.
— Bóris está super à vontade com você aqui — comentou a mais velha.
— Aposto que ele está tão feliz quanto eu.— Sorriu. — Estou ansiosa pra ter
você preenchendo o outro lado da cama essa noite.
— Muito ansiosa?— perguntou Jennifer com um bobo sorriso nos
lábios.
— Imensamente ansiosa — respondeu — Que horas você vai precisar
estar em casa amanhã?
— Umas oito da manhã, no máximo. Pois tenho treino.
— Então a gente acorda bem cedo e eu levo você até em casa. Tudo
bem?
— Perfeito.— Sorriu.
— Lembra quando eu disse que adoraria cozinhar algo pra nós? Farei
isso hoje. Vou te preparar um prato italiano que sei executar com excelência.
— Huuuum. Vou conhecer suas habilidades culinárias?— perguntou ao
envolver a cintura de Regina com os braços; fazendo o corpo da morena unir-se
ao seu.
— Sim. E irá se encantar por mais essa habilidade — comentou a mais
velha. Regina tentava conter o pequeno sorriso que teimava em formar-se no
canto de seus lábios.
— Por mais essa?— indagou Jennifer. — E quais são as outras
habilidades das quais eu já sou encantada, senhorita Vianna?
Regina esboçou um sorriso malicioso e murmurou ao pé do ouvido da
loira.
— Mais tarde eu refresco sua memória quando estivermos na cama.
— Você me quer muito na sua cama?— murmurou Jennifer, em
resposta.
— Sim, eu quero muito te levar pra minha cama — respondeu com
rouquidão em sua voz, fazendo Jennifer excitar-se. — Mas agora eu vou
preparar nosso almoço.
As duas mulheres deixaram o quarto e se direcionaram até a cozinha. A
morena pediu para que Jennifer se sentasse e apenas a observasse cozinhar. No
meio disso, Meireles, vez ou outra, se levantava e caminhava até a mulher. Ela a
abraçava por trás de modo a tirar sua concentração. A mais velha, após algumas
prazerosas interrupções de Jennifer, conseguiu finalizar o prato.
Regina levou a comida e a louça até a sala de jantar e organizou a mesa
com todos os utensílios necessários. Feito isso, pediu que Jennifer se sentasse e
caminhou até a cozinha, retornando de lá com duas taças de vidro e uma garrafa
de vinho já aberta.
— O cheiro está maravilhoso. Qual o nome desse prato?
— Se chama Gnochi alla copresse. Espero que goste. Você é a primeira
pessoa pra quem cozinho.
— Sinto-me lisonjeada.— A loira apoiou a mão sobre a de Regina e
acariciou-a. — Obrigada. Não apenas pelo almoço, por tudo. Esse está sendo o
melhor final de semana que já tive.
— Não existe nada melhor que ser a responsável por esse sorriso nos
seus lábios — comentou Regina. — Fico feliz por estarmos aproveitando, e por
termos deixado todos nossos problemas lá fora.
— Eu também estou. Mas... Como será amanhã? Como será tudo a
partir de agora?
— Mais tarde conversaremos sobre isso. Agora abre a boquinha pra
mim?— Regina pegou determinada quantia de comida com o garfo e o levou até
a boca de Jennifer, fazendo a loira experimentar o gnochi antes que esfriasse. —
O que achou?
Jennifer revirou os olhos de um lado a outro enquanto fazia suspense
antes de dar sua opinião.
— Delicioso! Passaria a vida almoçando isso!
— Certamente você enjoaria — comentou Regina, rindo. — Mas eu
posso cozinhar outros pratos tão bons quanto, ou posso variar os sabores. O meu
preferido é de rúcula com tomate seco.
— Se importaria em me ensinar tudo o que conhece da culinária
italiana?
— Eu posso ser sua professora no quesito que você preferir —
respondeu ao depositar seu intenso olhar nos fundos das esmeraldas que a
encaravam.
Jennifer sentiu uma forte carga percorrer seu corpo. Ela tinha absoluta
certeza que aquela frase da mulher estava carregada de más intenções.
Quando concluíram o almoço, ambas retiraram a mesa e se
direcionaram para a cozinha. Regina lavou todos os utensílios, pois detestava
louça suja na pia, e Jennifer os secou.
— Você gosta de pêssego com chantilly?— perguntou ao tirar uma lata
de pêssegos em calda do armário.
— Gosto de quase todas as frutas com chantilly — respondeu a loira.
Regina pegou uma lata de chantilly em spray na geladeira e depositou
uma pequena porção em um prato de sobremesa. Em seguida, abriu a lata de
pêssego, cortou pequenos pedaços da fruta e os depositou no prato ao lado do
creme
— Acho que você vai gostar ainda mais a partir de agora.— A mais
velha pegou um pedaço do pêssego com a ponta dos dedos e o passou sobre o
creme de chantilly. Logo após, levou até a boca de Jennifer e a lambuzou.
Meireles entreabriu os lábios e capturou a fruta oferecida. Esse gesto
repetiu-se algumas vezes, e quando a morena chegou ao quarto pedaço, Meireles
lambeu sutilmente as pontas de seus dedos melados do creme.
— Acho que também vou gostar um pouco mais a partir de agora —
comentou Regina ao sentir a língua úmida entrando em contato com a ponta de
seus dedos.
Jennifer sorriu ao comentário e levou um pedaço da fruta até a boca de
Regina. As duas mulheres permaneceram nessa entrega até nada mais restar
sobre o prato.


— Essa daqui sou eu aos sete anos — disse a mais velha. Ela e a loira
estavam no quarto há pouco mais de uma hora vendo álbuns antigos. Regina
queria incluir Jennifer em sua história; começando por levá-la a fazer uma
viagem ao seu passado.
— Você tinha cara de professora de história desde cedo. Incrível!—
comentou ao observar uma foto de Regina criança. Na fotografia a morena já
usava óculos de armação grossa e estava sentada no sofá inteiramente
compenetrada em uma leitura.
— Eu odiava usar esses óculos. Sempre chorava e perguntava aos meus
pais por que eu não era como a maioria dos meus amigos. Até hoje não me
agrada usá-los, na verdade.
— Mas você fica tão linda com eles.
— Acho que me envelhecem.
— Acho que me enlouquecem.— Jennifer respondeu prontamente. —
Adoraria transar com você usando eles.
— Fetiche, Jennifer?
— Um dos...— A loira respondeu. — Eu tenho muitas fantasias com
você.
— Posso realizar uma a uma — respondeu com sensualidade em sua
voz. A morena inclinou o corpo sobre o dela e a mordeu em seu lábio inferior.
— Mas você também terá que realizar todas as minhas — murmurou.
— O que você quiser.— Jennifer murmurou em resposta enquanto
deixava o corpo de Regina cair sobre o seu. — Quando você quiser — continuou
murmurando. — E onde você quiser.
— Que delícia te sentir assim tão entregue — disse ao deitar-se sobre
ela na cama.
Meireles afastou sutilmente as pernas e deu passagem para que a
morena se encaixasse ali.
— Você gosta de estar no comando, não gosta?— perguntou ao segurar
a nuca de Regina.
— Gosto. Adoro estar no controle. Me enlouquece, assim como você.
— Porra Regina...— disse de forma arrastada.
— Isso... Xinga... Diz o meu nome.— Regina mordeu o lóbulo da
orelha de Jennifer e em seguida traçou um úmido caminho com a língua pelo
pescoço da jovem. Em poucos instantes ela já havia conseguido excitá-la. A loira
julgava ser impossível resistir à voz, ao cheiro, ao toque e aos discursos
indecentes de Regina.
O clima entre as duas mulheres começou a esquentar de maneira rápida.
Regina roçava seu sexo contra o da jovem ao mesmo tempo em que a beijava
nos lábios. Os álbuns de fotografia foram, aos poucos, caindo ao chão. E a cama
foi dando espaço para aqueles dois corpos que se procuravam.
Elas teriam transado naquele instante se Bóris não tivesse aberto a porta
ao pular sobre a maçaneta de forma abrupta; fazendo Jennifer e Regina se
assustarem.
— Oh sério?— retrucou a morena ao sentir o gato pular sobre elas na
cama.
— Filhos!— brincou Jennifer, compartilhando uma gostosa risada com
sua professora. Ela e Regina iniciaram uma divertida brincadeira com o felino.
— Como você se atreve a atrapalhar o namoro da mamãe, hein?—
comentou Regina ao fingir irritação — Sofrerá as consequências!— Ela o virou
de barriga pra cima e começou a apertá-lo de maneira sutil nessa região.
Enquanto Regina apertava, Jennifer tentava distribuir beijos naquela
barriga peluda, macia e gostosa que Bóris possuía.
— Que vontade de morder ele todo!— disse Jennifer. A loira estava
completamente encantada com a graciosidade do gato.
Visto que Bóris havia cortado todo o clima, Regina aproveitou que a
jovem estava se divertindo com ele e decidiu adiantar seu trabalho acumulado.
— Jennifer, você se importaria em me dar meia hora? Lembrei que
preciso corrigir alguns trabalhos que serão entregues amanhã.
— De forma alguma, vai lá. Não quero atrapalhar. Ficarei aqui
brincando com esse gostoso enquanto isso. Não é, Bóris?
— Obrigada. Realmente é inadiável. Mas prometo não demorar.—
Regina depositou um beijo nos lábios de Jennifer e desceu para o escritório.
— É, amigão... Agora é apenas você e eu!— comentou a mais nova.
Bóris a olhava com atenção. Ele observava cada movimento da jovem e
se comportava como se entendesse tudo o que ela dizia.
De repente, em um movimento rápido e repentino, Bóris levantou-se e
começou a correr pelo quarto como se estivesse chamando Jennifer para brincar.
A loira, ao vê-lo assim, deixou a cama e começou a segui-lo pelo cômodo, até
que Bóris correu e se escondeu dentro do guarda roupa de Regina, que se
encontrava entreaberto.
— Bóriiiiis! Psss pssss... Volta aqui!— dizia ela enquanto tentava
encontrá-lo dentro do guarda-roupa.
Jennifer não pôde evitar percorrer os olhos pelos pertences expostos no
closet. Ela observou que todas as peças de roupas eram organizadas por cores e
modelos, assim como os cintos pendurados no cabideiro. O cheiro de amaciante
era muito agradável e ela fez questão de aspirá-lo para dentro dos pulmões.
Após muito observar, assustou-se com o gato saltando para fora do
armário.
— Agora eu peguei você!— disse ela ao segurá-lo no colo. Jennifer
depositou alguns afagos no animal e em seguida o colocou de volta na cama.
Tendo em vista que muitos minutos já haviam se passado, Meireles
deixou Bóris de lado e resolveu ir de encontro a Regina. Durante o caminho do
quarto ao escritório, não parava de pensar no quão gracioso eram os pertences de
Regina bem organizados. Muito diferente dos dela, a propósito, que era uma
grande bagunça.

Regina estava compenetrada em sua atividade quando sentiu que estava
sendo observada. Ao olhar para a porta, avistou a garota encostada.
— Já estava sentindo minha falta, senhorita?— disse ao olhá-la por
cima dos óculos.
Jennifer caminhou a passos lentos com as mãos dentro dos bolsos de
sua calça jeans e aproximou-se da mulher.
— Um pouquinho — respondeu ao agachar-se ao lado da morena.
Regina juntou a papelada, guardou dentro da gaveta e girou a cadeira no
sentido da loira.
— O que significa esse risinho nos seus lábios?— Por estar em uma
posição mais alta que Jennifer, Regina precisava direcionar o olhar para baixo.
— Nada...— respondeu vagamente. — Você está tão séria e intelectual
sentada aí, no meio desses livros, de óculos e caneta na mão.
— Você gosta desse estereótipo?
— Muito.
— Então por que não vem aqui e se senta no meu colo?— convidou. A
mais velha tirou o óculos, o apoiou sobre a mesa de madeira e gesticulou para
que a loira se levantasse.
Jennifer sentou-se no colo de Regina com uma perna pra cada lado e em
seguida pegou o óculos da mulher que estava sobre a mesa.
— Assim. Gosto de você com eles — disse ao encaixá-lo novamente na
face de Regina.
Regina sorriu ao gesto e, por cima do jeans, percorreu as mãos pelas
coxas da loira e as apertou. Tanto ela quanto a jovem sentiram uma corrente
eletrizante quando seus corpos entraram em contato.
— Por que não terminamos agora o que começamos lá em cima,
professora Vianna?— provocou.
— Apenas se me deixar assumir o controle sobre você — disse ao
segurar o maxilar de Jennifer com precisão.
Bastou um olhar fixo e intenso para que Meireles se rendesse ao charme
daquela mulher.
— Enquanto eu permito... O controle é todo seu — murmurou em
resposta, segundos antes de sentir a boca de Regina indo de encontro a sua sem
pedir permissão.
A mais velha chupava os lábios e a língua de Jennifer com erotismo,
depositando algumas mordidas doídas entre as carícias.
— Eu adoro a maneira como você me faz sentir, Jennifer— disse com
rouquidão. — Como se eu não mais tivesse domínio sobre mim — continuou a
dizer entre o beijo intenso que compartilhavam. — Com você eu me sinto a beira
de perder o controle a qualquer momento, e eu adoro isso.
Regina levantou-se da cadeira e encurralou a jovem contra a mesa. Ela
segurou na barra da camiseta da loira e a deslizou para fora, deixando seu
abdômen nu. Meireles começou a ficar ofegante quando Regina inclinou-se para
baixo e começou a distribuir beijos e mordidas por toda extensão de sua barriga.
Seu corpo era um labirinto quente onde Regina adorava se perder.
— Quando estamos juntas eu me sinto constantemente tentada a perder
o controle — disse Regina ao beijá-la no pescoço. Ela sussurrava contra o
ouvido da loira ao mesmo tempo em que suas mãos abriam a calça jeans da
jovem. — E perder o controle é tão bom, tão humano.
— Gosto quando você não resiste — comentou Jennifer — Quando
você esquece o que somos e se entrega.
— Você sente prazer em me fazer perder a cabeça, não sente?—
perguntou Regina ao abrir o botão da calça e descer o zíper.
— Prazer eu sinto quando você está dentro de mim — respondeu. —
Mas te fazer perder a cabeça também é bom — confessou. — E no fundo você
sabe que você e eu somos tudo o que você não pode controlar.
— Cala a boca — disse Regina com a voz carregada de desejo. Ela
selou os lábios de Jennifer com um beijo e, cada vez que a loira tentava dizer
algo, ela a beijava agressivamente. — Shh, calada.— Regina a encurralou ainda
mais contra a mesa e deslizou sua mão para dentro da calcinha. — Porra... Você
está tão molhada, tão gostosa — sussurrou enquanto massageava o sexo de
Jennifer, masturbando-a. — Que vontade de foder você agora.
— Então vem brincar...— A loira atiçou.
Regina segurou Jennifer com força pelo pescoço ao mesmo tempo em
que aumentou a fricção na intimidade da loira. Ela deslizava os dedos de cima a
baixo, os fazendo molhar com a umidade de Jennifer.
Meireles começou a se mexer à procura de mais contato. Regina a
masturbava tão bem, que se tornou impossível não gemer e pedir por mais.
— Que delícia...— sussurrou ao segurar a nuca da mais velha. Jennifer
afastou as pernas e deu passagem para que Regina a explorasse ainda mais.
A morena interrompeu as carícias por um curto espaço de tempo até que
fosse possível descer e deslizar a calça de Jennifer para fora.
— Bem melhor — comentou ao observar a calcinha de renda preta que
a jovem usava. — Vem... Senta sobre mim.— Regina caminhou até a cadeira e
sentou-se.
Quando Jennifer sentou-se de frente em seu colo, Regina colocou a
calcinha da loira para o lado e voltou a estimulá-la com massagens em sua
intimidade.
— Não me tortura, Regina...— disse ao movimentar-se sobre o colo da
mulher.
— Por que eu deveria parar, se é tão gostoso brincar com você?—
Quanto mais Regina falava e movimentava os dedos, mais excitada Jennifer
ficava. — Tão gostoso te sentir assim toda melada — provocou.
— Por favor, Regina. Quero te sentir dentro.— A voz de Jennifer estava
embriagada.
Regina usou a mão livre para abrir o feixe do sutiã da loira e deixar os
arredondados seios expostos. — Adoro senti-los na minha boca — comentou,
segundos antes de tomá-los um a um e chupá-los.
Jennifer começou a soltar altos gemidos. Regina estava lhe
proporcionando prazerosas sensações de uma só vez. Ela acariciava seu sexo ao
mesmo tempo em que chupava seus seios e apertava seu pescoço com força.
Meireles já não conseguia suportar aquela tortura. Ela precisava de sua
mulher lhe invadindo o mais rápido possível. Sendo assim, segurou a mão de
Regina que estava em seu sexo e a guiou para a entrada de sua intimidade.
Jennifer pulsava de tanto desejo.
— Me fode bem gostoso e me faz enlouquecer nos seus dedos — pediu
em um quase sussurro.
Aquelas palavras de Jennifer serviram como uma descarga elétrica. Sem
pensar em nada mais, Regina levantou-se da cadeira guiando a jovem com seu
corpo, lançou tudo o que havia sobre a mesa no chão, e a deitou bem ali.
— Isso, Regina... Vem!— disse ofegante.
— Você gosta quando eu faço com força, não é?— comentou ao abrir
as pernas de Jennifer com rapidez e forçar dois dedos em sua intimidade úmida.
— É assim que você gosta?— perguntou ao penetrá-la com força.
Meireles cruzou as pernas na cintura de Regina e começou a arranhar as
costas da mulher por cima da blusa.
— Sim, Regina, com força...— gemeu ao sentir os dedos lhe invadindo
com movimentos fortes e intensos. Regina não perdia o ritmo.
— Porra, que gostosa — comentou ao sentir aquele sexo quente e
molhado englobando seus dedos. — Adoro me sentir dentro de você.
Quanto mais fundo Regina ia, mais prazer Jennifer sentia. Ela agarrava
forte nos cabelos castanhos e pedia por mais.
Regina chocava o corpo contra o de Jennifer conforme a penetrava,
fazendo seus dedos curvarem e deslizarem fundo na jovem. Ela entrava e saia
com deliciosos movimentos de vai vem, fazendo o corpo de Meireles mexer para
cima e para baixo, sobre a mesa, tamanha era a pressão.
— Regina, eu não aguento mais segurar...— murmurou com a voz
fraca. Jennifer sentia que o orgasmo estava próximo.
Regina esboçou um sorriso malicioso e continuou devorando o sexo de
Jennifer por um longo tempo ao mesmo tempo em que ouvia os gemidos da
jovem se misturarem ao barulho que a mesa fazia.
— Eu só vou parar quando você se desmanchar nos meus dedos.—
Regina uniu os dois pulsos da loira acima da cabeça da jovem e os pressionou
contra a mesa, deixando-a inteiramente vulnerável. — Vamos lá, Jennifer...
Vem pra mim.
A mais nova fechou os olhos e pouco tempo depois sentiu sua mente e
corpo se elevarem. Era como se Regina a tivesse feito entrar em outro plano. Por
alguns segundos tudo à sua volta silenciou; foi quando a erótica poesia de
Regina lhe invadiu e a faz estremecer.
A mais velha aguardou alguns instante para recuperar o fôlego, beijou
a boca da loira e afastou-se. Ela sentou-se na cadeira, jogou seus cabelos
parcialmente úmidos de suor para trás e desabotoou os primeiros botões de sua
camisa social, que também estava parcialmente molhada.
— Agora se me dá licença, senhorita Meireles. Ainda tenho alguns
trabalhos a corrigir.

Capítulo 20

Jennifer sacudiu a cabeça como se não tivesse acreditado no que Regina
dissera.
— Não quero que você continue trabalhando hoje — disse ao
aproximar-se e sentar-se no colo da mulher. — Por que não deixa tudo pra
depois e vem tomar um banho comigo?— Meireles depositou as mãos sobre a
camisa de Regina e abriu o restante dos botões. — Você está tão suada. Vamos
subir, que eu quero relaxar você.
— Não senta assim no meu colo, que me desconcentra.— Regina olhou
para os seios nus de Jennifer e em seguida sentiu sua pele aquecer. Seria
impossível concluir qualquer tarefa, uma vez que sua mente estava preenchida
por pensamentos impuros. — Tudo bem — disse ela ao se render.
Jennifer recolheu a blusa, o sutiã e a calça jeans que estava no chão e
subiu para o segundo andar com Regina. Ao entrarem no banheiro, Jennifer
livrou-se da própria calcinha, deslizou a camisa da mais velha para fora do corpo
e a despiu de todas as outras peças restantes. Quando já estavam inteiramente
nuas, entraram no box entre beijos e carícias.


Após concluírem o banho, Regina vestiu-se com uma camisola preta de
tecido fino e começou a secar seus curtos cabelos com o secador que sempre
deixava no banheiro. Enquanto os secava, conversava com Jennifer, que estava
no quarto terminando de se vestir.
— Estou me sentindo esgotada — comentou a loira — Nem o treino me
deixa nesse estado — continuou a dizer.
— Pensei que a velha aqui fosse eu.— A morena esboçava um pequeno
sorriso triunfante. — Estou me sentindo leve, completamente disposta — disse
ao desligar o secador e voltar para o quarto.
— Meu Deus, Regina. Você é insaciável!— comentou aos risos. —
Acabamos de transar no banho e você já quer mais?
— Eu estou sempre querendo mais — respondeu com seriedade na voz
após aproximar-se de Jennifer e segurá-la pela nuca. — E algo me diz que você
também quer.
Por mais que Meireles se sentisse saciada, bastava ser tocada por
Regina, ou até mesmo ouvir suas provocações, que o desejo já se fazia presente
novamente. Ela sabia que desejar Regina acabaria se tornando um ciclo vicioso.
E por mais que ambas tentassem saciar a urgência de suas vontades, nunca
parecia ser o suficiente.
— Por que você mexe tanto comigo?
— Estou no mesmo dilema em relação a você.— Regina soltou um
longo e pesado suspiro. Por alguns instantes a realidade dessa relação veio à sua
mente. Todavia, tentou não deixar transparecer sua preocupação. — Vamos
deitar e assistir algo juntas?— sugeriu.
As duas mulheres se aninharam confortavelmente na cama. Regina
ligou a televisão do quarto e colocou em um canal onde estava prestes a começar
um filme de comédia. Ambas permaneceram no conforto que o calor, a pele e o
cheiro da outra proporcionavam. Elas riram juntas e também trocaram algumas
carícias sem qualquer conotação sexual durante o filme. Aquele era um
momento apenas de entrega sentimental.
Regina sentia seu carinho por Jennifer aumentar cada vez que a
gargalhada da jovem adentrava seus ouvidos ou ressoava pelo quarto. Jennifer,
por sua vez, suspirava cada vez mais quando o cheiro natural da pele da mulher
infiltrava em seus pulmões.
— Eu tenho medo de perder você — comentou Jennifer, aleatoriamente,
quando os créditos finais do filme começaram a subir.
Regina desmanchou-se por dentro ao ouvir aquela afirmação.
— O que te leva a pensar isso?— perguntou após desligar a tv. Regina
virou o corpo de lado e direcionou sua atenção para a loira.
— De verdade? Eu tenho medo que você acabe enjoando de mim...—
respondeu de forma triste. — Ou que perceba que sou muito jovem pra você —
continuou a dizer. — Ou que ache nosso relacionamento complicado demais e
desista.
— Bom, vamos por partes. Eu jamais enjoaria de você. Enjoar é algo
muito feio para se sentir por alguém. Não se enjoa das pessoas que se gosta.
Acho que ainda não percebeu o quanto gosto de você e o quanto me transborda.
Eu nunca, jamais, em hipótese alguma infringiria minha ética profissional por
alguém que me atraísse apenas fisicamente. Você precisa sentir o quanto eu
gosto de você e te quero.
— Desculpa por minha insegurança.
— Não precisa se desculpar por sentir algo. Eu compreendo. Eu só
queria ser capaz de te fazer sentir o que se passa aqui dentro.
— Eu sinto, você demonstra de todas as formas possíveis. Mas eu sou
tão insegura quando se trata de você...
— Eu não me importo com sua idade, Jennifer. Pelo menos não de
forma pessoal. Eu apenas fico receosa, pois eu sei que o fato de você ser quinze
anos mais nova desperta preconceitos em muitas pessoas. Mas eu me apaixonei
pela Jennifer Meireles independente dela ser minha aluna ou de ter dezoito anos.
O meu carinho por você não vê idade ou posição social. O nosso relacionamento
é muito delicado, sim. Mas vamos viver um dia por vez. Por favor?— disse
suavemente.
Jennifer procurou pela mão de Regina sobre o lençol e a tocou. Ela e a
mais velha conseguiam sentir uma forte vibração sempre que suas mãos se
encontravam daquela forma.
— Como devemos nos tratar amanhã?— Jennifer questionou. — Ou
melhor, de qual forma conseguiremos nos comportar?
— Precisamos entender com a razão e sentir com a emoção — disse
Regina. — Eu vou querer te tocar e te sentir nos meus braços cada vez que eu
avistar esse lindo sorriso moleca que você tem. Mas, fingir indiferença será
essencial. Serei levada a te tratar como mais uma aluna entre muitas. Espero que
entenda o teatro.
— Minha mente irá entender. Meu coração, não.— As esmeraldas de
Jennifer estavam escuras e seu semblante, triste.
— O que seu coração diz?— perguntou a mais velha ao entrelaçar os
dedos nos dedos de Jennifer.
— Ele pede você...
Um silêncio se instalou entre elas após as últimas palavras ditas pela
jovem. Regina, sem nada dizer, tocou a face da loira com a mão livre e a
acariciou com delicadeza. Meireles estava frágil e emocionalmente vulnerável
como Regina jamais a vira.
— Eu estou aqui pro seu coração. Estou aqui pra você — disse Regina,
quebrando o silêncio e a confortando com suas palavras. — Eu quero todas as
suas angústias, seus medos, seus desejos e suas cores.— A professora falava ao
mesmo tempo em que mantinha os olhos fixos nos de Jennifer. — Estou aqui
para todas as nuances de quem você é.
— Estou completamente apaixonada por você — disse Jennifer ao,
também, tocar a face da mulher. — Por seu olhar, seus lábios, seus toques, seus
traços...— Suspirou. — E por tudo que você me desperta.
— Se dependesse de mim, nós entraríamos de mãos dadas naquele
colégio amanhã. E eu contaria a todos o quanto essa professora aqui se encantou
por você — disse, fazendo um gracioso sorriso florir nos finos lábios de
Jennifer. — Infelizmente eu não posso fazer isso. Mas, o importante é que você
saiba tudo o que sinto.
— Vamos fugir pra Saturno e deixar tudo pra trás?— comentou
Jennifer, aleatoriamente, fazendo a mais velha cair na gargalhada. — Por que
está rindo?— perguntou confusa.
— Porque em uma conversa com Arthur sobre você eu mencionei te
levar pra Saturno e fazer dos anéis a nossa cama.
— Então minha ideia não é tão absurda assim, senhorita Vianna.
— Não, não é. Pra quando compraremos as passagens?— brincou.
— Para o mais rápido possível — respondeu. — Mas enquanto a gente
não faz a viagem, o que faremos por aqui?
Regina virou o corpo sobre o da loira e enroscou suas pernas entre as
dela.
— Besarnos hasta desgastarnos nuestros lábios — sussurrou
sensualmente em resposta.
— E o que seria isso?— Jennifer questionou.
— Significa exatamente isso...— Regina cobriu o corpo dela e o de
Jennifer por completo e iniciou um beijo apaixonado debaixo do lençol. Ela
roçava os lábios contra os de Meireles e a beijava sem pausa.
— Acho que gostei da idéia — murmurou a mais nova entre o beijo. —
Sugere que façamos algo mais?
— Isso vai depender da sua disposição, senhorita atleta.
— Total.
— Então a noite vai ser longa...


Após outra prazerosa noite de entrega, o dia novamente acordou. Ele
amanheceu ainda mais lindo para Regina, que, ao despertar, sentiu o corpo nu de
Jennifer colado ao seu em forma de concha. Meireles estava de costas e as mãos
da morena passavam pela lateral de seu corpo; abraçando-a.
Regina consultou a hora no celular que estava localizado sobre o criado
mudo e constatou que o alarme que ela habilitara estava prestes a tocar. Ela o
cancelou, devolveu o aparelho para o móvel e se curvou sutilmente sobre
Jennifer.
— Hora de acordar...— disse, suavemente, em um baixo tom de voz. A
morena começou a acariciar os cabelos da jovem de maneira sutil enquanto a
observava despertar lentamente.
Jennifer esboçou um largo sorriso ao sentir o corpo de Regina
aquecendo suas costas. Ela não conseguia encontrar palavras que descrevessem
o quão bom estava sendo despertar ao lado daquela mulher.
— Só mais um pouquinho?— respondeu com a voz arrastada ao virar-
se para a mais velha.
— Acho que ainda temos mais alguns minutinhos — murmurou,
segundos antes de selar os lábios de Jennifer em um beijo carinhoso. — Como
passou a noite? Teve um sono tranquilo?
— Bem. Dormi a noite inteira, sem interrupção — disse suavemente.
Jennifer carregava um pequeno sorriso em seus lábios. — E você?
— Melhor impossível.— Sorriu. — É uma sensação muito boa dormir
sentindo o cheiro e o calor da sua pele. Me trouxe uma paz muito grande.
Adoraria que pudéssemos fazer isso mais vezes.
— Eu também. Mas será um pouco complicado. Não terei desculpas pra
ficar dando à minha mãe.
— Eu sei...— lamentou. — Agora acho melhor levantarmos. Não quero
que se atrase para o treino.— Regina distribuiu alguns beijos carinhosos na face
de Jennifer e em seguida as descobriu.
Ambas cuidaram da higiene pessoal e tomaram um rápido café da
manhã juntas. Quando a loira estava conferindo se sua mochila estava completa,
Regina a devolveu o boné e a blusa xadrez que ela esquecera em sua casa outro
dia. Feito isso, se dirigiram para a casa de Meireles. Por medo de Morgan já ter
chegado de viagem, estacionaram o carro há poucas ruas de distância.
— Está entregue sã, salva e inteira — disse Regina ao estacionar o
carro, arrancando uma pequena risada da jovem.
— Não estou muito certa sobre esse inteira — brincou. — Obrigada
pelo final de semana. Cada momento ao seu lado foi maravilhoso.
— Obrigada por ter aceito meu convite — disse ao segurar o rosto de
Jennifer e acariciá-lo com a ponta do polegar. — Adorei sua companhia, dentre
outras coisas — disse ao aprofundar o olhar nos verdes que a olhavam com
atenção.
— Dentre outras coisas — repetiu Jennifer. — Você gostou dessas...
Outras coisas?— perguntou, sentindo um leve rubor esquentar sua face.
A mais velha inclinou-se e murmurou contra o ouvido da loira, fazendo
sua pele arrepiar-se.
— Repetiria todos os dias.
— Hum...
— Agora vou deixar você ir antes que se atrase — disse ao retomar sua
postura inicial.
— Podemos nos ver na biblioteca?— perguntou Jennifer na esperança
que a mais velha dissesse sim.
— Não acho apropriado — respondeu. — Lembra da conversa que
tivemos ontem à noite? Precisamos ser discretas.
— Terei que me contentar em vê-la apenas no último tempo de aula?
Que difícil, Regina...
— Que difícil, Regina — repetiu a mais velha ao tentar imitar o timbre
de voz de Jennifer. — Meu nome saindo dos seus lábios é a coisa mais linda que
há — comentou de maneira apaixonada.
— Regina, estou falando sério!
— Eu também estou falando sério. Mas, respondendo à sua pergunta...
Sim. Uma hora encarando a chata professora de história é o suficiente, não?
— Não. A minha vontade era que aumentassem a grade de história —
disse Meireles com certo mau humor em sua face.
— Ei, não fica assim. Encontraremos um jeito, tudo bem?
— Ok — respondeu incerta. — Agora eu realmente preciso correr pra
não me atrasar.— Jennifer selou os lábios nos de Regina, mas foi surpreendida
pela mão da professora segurando sua nuca e a puxando para um beijo longo.



— Jennifer! Conta tudo! Quando eu digo tudo, é tudo!— disse Beatriz
ao encontrá-la no pátio do colégio.
— Meu Deus! Fala baixo!— repreendeu ao colar em sua amiga. —
Quando chegarmos à sala de aula eu conto.

Assim que tomaram seus lugares, Beatriz voltou a perguntar como
havia sido o final de semana com Regina. Ainda estava muito cedo e,
consequentemente, a sala de aula ainda estava vazia. Sendo assim, Meireles
aproveitou o momento e, sem citar nome, atualizou sua amiga sobre os últimos
acontecimentos.
— Uaaaau!— exclamou Beatriz após ouvir tudo o que Jennifer lhe
dissera. — Você deve estar nas nuvens!
— Estou no céu — respondeu. — Ela é incrível em todos os sentidos.
Todos eles.
— Eu estou muito feliz por vocês, Jen. De verdade!
— Obrigada!— Sorriu.
— Você conseguiu saciar o desejo?
— Na hora, sim. Mas agora eu sinto que aumentou. Não consigo parar
de pensar nela, em seu cheiro, seus toques, seus beijos...
— Ai, meu Deus. Você precisa se controlar!— Riu. — E sua mãe, já
esteve com ela?
— Sim. Quando cheguei do treino ela já estava em casa. Me perguntou
como foi o final de semana, e eu disse que foi ótimo. Pra poder justificar a
vermelhidão da minha pele e a marca do biquíni, eu contei que você e eu fomos
à praia. Não invente de aparecer lá em casa esses dias, ok? Ela pode perceber
que você não tem bronzeado algum.
— Pode deixar.
Conforme o horário da aula foi se aproximando, os alunos foram
chegando e entrando na sala. Entre eles estava Estela, que logo notou o sutil
bronzeado de Meireles.
— Foi à praia e não me convidou, Jennifer?— disse ao sentar-se ao lado
de Beatriz. A menina havia decidido permanecer ali durante as aulas de hoje. Ela
sempre alternava entre sentar no fundo e sentar-se próximo à Meireles e Bea.
— Pois é, decidi de última hora — respondeu com um sorriso sem graça
nos lábios.
— Quando for novamente, me chama. Se quiser, claro. Adoro praia.
— Pode deixar.
— Prontas para mais uma semana de aula?— perguntou Beatriz, logo
tratando de desviar o assunto.
— Nunca estou, mas fazer o quê — disse Estela com desânimo.
— Shhh, agora vamos fazer silêncio. A aula vai começar — finalizou
Jennifer.


— Regina, eu desisto de você!— exclamou Arthur. Ele e a professora
conversavam na lanchonete onde eventualmente tiravam a hora do intervalo. —
Como você me vai pra cama com uma aluna tão nova? Definitivamente não é a
Regina que conheço!
— É questão de meses pra que ela deixe de ser minha aluna. E
convenhamos, Arthur, a questão da idade não é um problema de fato. Ela não é
uma criança e você sabe. Não estou aqui pra ouvir você me censurar. Estou
cansada. Talvez eu realmente não seja a Regina que você conhece. Talvez eu
não queira algumas regras sociais interferindo na minha alegria e na forma como
eu conduzo a minha vida!
— Ela não é criança, mas ainda mora com a mãe, pelo que sei. Não tem
autonomia sobre a vida enquanto estiver lá. Não é minha intenção te censurar,
apenas me preocupo com você.
— Mas falta apenas alguns meses para que uma parte desse quadro
mude e ela deixe de ser minha aluna — argumentou. — Arthur, eu não sou
louca. Eu sei onde estou me metendo. Sei o escândalo que vai ser quando a mãe
dela souber. Mas eu me apaixonei por Jennifer de verdade. Isso não é uma
brincadeira. Não vou jogar tudo fora por causa desses últimos meses. Que
inferno! — Se exaltou.
— Calma, Regina. O que eu posso fazer a não ser te desejar sorte e
pedir que tome cuidado até lá?— disse suavemente. — Volto a repetir: eu apenas
me preocupo. Sabe que não tenho nenhum tipo de preconceito. A mim pouco
importa se você está se relacionando com uma mulher. E eu também não acho
ruim que ela seja tão mais nova que você. Pelo contrário, eu super apoio casais
com faixa etária diferente. É uma experiência muito boa. Há uma grande troca
de conhecimento e visão de mundo. O único problema é o cenário onde esse
relacionamento de vocês está enquadrado.
— Eu sei, mas fugiu ao meu controle. Jamais imaginei que após tantos
anos de magistério isso aconteceria comigo.
— Olha, Regina... Eu vou deixar de fazer o papel de chato, pois já
percebi que nada do que eu disser irá fazer você mudar de ideia e esquecer essa
história. Então me conta, como tem sido estar com ela? Nem preciso perguntar
se está feliz, pois isso é notório.
— Estar com Jennifer é único e inexplicável. Eu passaria horas falando
de todas as gostosas sensações de estar em sua presença. Poucos minutos com
ela já é o suficiente pra que eu me sinta mais leve.
— Nunca te vi tão empolgada a respeito de alguém — observou Arthur.
— Nem eu...


O último horário de aula finalmente chegara. Jennifer estava nervosa e
ansiosa para ver Regina entrar. Ela ainda não sabia como as coisas funcionariam
a partir de agora, e muito menos como seria seu comportamento e o da mulher.
Contudo, sabia que precisaria disfarçar o máximo que conseguisse. Difícil seria
colocar isso em prática
— Boa tarde, classe! — disse Regina ao entrar. Seu olhar foi de
encontro à Jennifer logo em seguida. — Boa tarde, meninas.— Voltou a dizer,
em um tom mais baixo dessa vez, ao se sentar, referindo-se à Jennifer, Beatriz e
Estela que estavam sentadas próximas à sua mesa.
— Pelo visto seu final de semana também foi de praia, professora
Vianna — comentou Estela ao notar que Regina também estava bronzeada.
A professora estava com as bochechas e o nariz avermelhados do sol,
assim como Meireles, e sua blusa parcialmente aberta deixava à mostra um
pedaço da marca do biquíni.
— Sim. Fez um lindo final de semana ensolarado. Alguém foi capaz de
não aproveitá-lo?— disfarçou. Em seguida, começou a fechar os botões de sua
camisa.

Regina começou a aplicar a matéria no quadro enquanto sua mente não
parava de trabalhar. Ela se questionava internamente sobre Estela estar
desconfiada de algo ou não. Enquanto escrevia, também se perguntava se
Jennifer a estaria olhando.
Quando Regina decidiu virar de frente para a classe, encontrou os
brilhantes olhos verdes da loira a encarando. Ela tentou evitá-los, mas acabou se
perdendo ali por alguns instantes.
Meireles observava cada mínimo movimento que a mais velha fazia.
Seus olhos a seguiam por toda sala de aula. Naquele dia, concentrar-se na
matéria parecia uma missão quase impossível, uma vez que seus pensamentos
viajavam e a levavam para o final de semana que tivera com Regina.
Além de pensar nos momentos vividos com a mais velha, Jennifer
também não parava de observar o quão linda sua professora estava. Ela traçava
cada pequeno detalhe da mulher à sua frente.
— Professora Vianna, acho que tem algo errado no enunciado da
questão três — disse um aluno ao fundo.
Regina olhou para o quadro, releu a questão e constatou que realmente
havia um erro. Ela precisava conseguir evitar olhar para Jennifer, do contrário
seria difícil trabalhar naquela turma.
— Realmente há um erro. Obrigada por avisar.— Após corrigir o
enunciado, fez a chamada em seu diário de classe e caminhou em direção a
porta, onde se manteve de pé, alternando entre olhar para o pequeno fluxo de
estudantes no corredor e Jennifer.
As duas mulheres iniciaram uma constante, intensa e inevitável troca de
olhares. Seus olhares conversavam, sorriam, chamavam e se desejavam. Elas
sentiam como se a sala de aula estivesse ficando cada vez menor e quente
demais para permanecerem ali.
Meireles não se conteve em ficar quieta em seu lugar; levantou-se e
caminhou até a lixeira que estava localizada ao lado da porta. A jovem começou
a apontar o lápis ao mesmo tempo em que olhava Regina mais de perto. Quando
percebeu que já estava tempo demais ali, decidiu fazer outra coisa. Jennifer
enfiou o lápis no bolso, se posicionou de frente para a professora e avisou que
estava indo beber água. Ao passar pela mulher, na porta, roçou lentamente seu
braço contra o dela e se foi.
Jennifer levou mais tempo que deveria lá fora. Quando retornou, um
pequeno sorriso habitava seus lábios. Regina, sem compreender, voltou a sentar
em seu lugar e permaneceu aguardando a classe concluir a atividade do dia.
— Você está tão linda hoje, senhorita Vianna — comentou Estela. A
menina decidira brincar com Jennifer e Regina para ver até onde elas
sustentariam aquelas máscaras. — Esse bronzeado te deixou profundamente
sexy.
— Obrigada — respondeu sem jeito.
— A senhora tem marido ou namorado? Deve dar trabalho ter uma
mulher como você.
— Sim, eu tenho alguém. E não vejo um motivo aparente para dar
trabalho ao meu parceiro — respondeu séria.
— É que você é naturalmente provocante. Chega a ser difícil não perder
a concentração na sua presença. Não é, Jennifer?
— A professora Vianna realmente é muito bonita — respondeu a loira,
sem jeito.
— Bonita? Bonita é a professora de biologia, Meireles. A Vianna é
deslumbrante.
Jennifer começou a sentir o sangue de seu corpo esquentar.
— Onde está seu respeito? A professora Vianna acabou de dizer que é
comprometida — disse com o tom de voz elevado.
— Não faz diferença. Infelizmente ela não daria mole para nenhuma de
nós mesmo — comentou Estela, ainda provocando.
— Além do mais...— continuou Jennifer. — Ela é sua professora. Você
a deve ainda mais respeito.
— Sim, ela é nossa professora. Mas isso não seria um problema, seria?
— Estela possuía um sorriso cínico em seus lábios.
Jennifer cerrou os punhos, e quando fez menção de batê-los contra a
mesa, Regina se manifestou.
— Meninas, já chega!— disse com o tom de voz elevado. A morena
levantou-se da mesa e antecipou a correção dos exercícios.
Uma forte tensão pairou sobre a sala até o término da aula. Enquanto
Beatriz, Regina e Jennifer se mantiveram tensas, Estela sentiu um forte
sentimento de vitória.

Quando o último alarme do dia tocou, todos os alunos guardaram seus
materiais e foram deixando o local gradativamente. Jennifer, antes de se retirar,
depositou um bilhete sobre a mesa de Regina e saiu. A professora, por sua vez,
aguardou que todos deixassem o recinto para poder abrir o pequeno papel que
dizia:

“Precisamos conversar. Estarei te esperando no terceiro piso.”

Regina cogitou a ideia de não comparecer, porém, não quis deixar
Meireles esperando inutilmente.

A morena permaneceu algum tempo na sala dos professores guardando
o material didático. Esse pequeno tempo foi o suficiente para que quase todos os
estudantes deixassem o colégio. Ao olhar para a hora de seu celular e constatar
que já havia passado vinte minutos desde o término das aulas, decidiu subir.
Ao chegar ao terceiro piso, avistou Meireles encostada na parede
daquele extenso corredor vazio.
— Como conseguiu destrancar esse andar?
— Assim — respondeu ao tirar uma chave do bolso. — Dessa vez eu a
roubei.
— Você perdeu o juízo?
— Ninguém vai notar. Amanhã eu devolvo.
— O que quer conversar comigo?
— Nada.— Jennifer respondeu. — Eu quero tocar em você.— Meireles
segurou a mão de Regina com a sua.
— Jennifer, fiquei preocupada, pensei que fosse algo sério!
— Tocar em você é sério e urgente — respondeu a loira. — Na verdade
eu queria falar sobre a Estela. Mas isso eu posso fazer por telefone mais tarde.
Agora eu quero outra coisa...— Meireles segurou a cintura de Regina com as
mãos e colou o corpo ao dela.
— Jennifer, não — disse ao se desvencilhar do contato com a loira.
— Eu passei a aula inteira querendo te tocar. Não me impeça, por
favor...
— Você sabe que aqui não é lugar. É o meu local de trabalho — disse
com firmeza na voz.
— Eu sei. Mas eu não estou conseguindo resistir. Eu não paro de pensar
em você, nas nossas noites. E ninguém mandou você vir dar aula assim tão
gostosa.
— Não torne tudo mais difícil do que já é — Permaneceu a falar com
seriedade.
— Diz pra mim que você também quer — falou baixinho, próximo a
ela. — Confessa que está louca pra me sentir, que passou a aula inteira pensando
em quando transaríamos de novo. Porque se você não pensou, saiba que eu
pensei. Muito.
— Você sabe que aqui tem câmeras, não sabe? — repreendeu-a.
— Nós duas sabemos muito bem que elas não funcionam.
— Porra Jennifer, eu não sou de ferro.
— Já disse que você fica ainda mais irresistível quando xinga?
Regina balançou a cabeça negativamente e não conseguiu conter um
pequeno riso.
— Até depois, Jennifer.
A mais velha despediu-se e saiu andando de maneira elegante sobre
seus saltos; deixando para trás uma Jennifer completamente frustrada.


Naquele mesmo dia, horas mais tarde, Meireles chegou em casa e logo
foi recebida por sua mãe a esperando furiosa.
— Onde você esteve nesse final de semana?— Essas foram as
primeiras palavras de Morgana ao avistar a filha.
— Como assim, mãe? Você sabe que estive com a Bea. Já te contei isso
— respondeu nervosa.
— Jennifer, não minta pra mim! Hoje encontrei ocasionalmente com a
mãe da Beatriz e fiquei sabendo que elas passaram o final de semana fora. E ela
ainda mencionou que faz tempo que não vê você por lá — disse séria. — Agora
me diga onde você realmente esteve.


Capítulo 21

— Anda, Jennifer. Estou esperando uma resposta.
A loira estava suando frio. Suas mãos gelaram ao mesmo tempo em que
suas pernas bambearam, ameaçando fraquejar. Ela não podia dizer que estava
com Regina, não. Jennifer não iria expor sua relação com a professora dessa
forma.
— Desculpa, eu menti — disse cabisbaixa ao se aproximar de Morgana.
— Eu estava com uma pessoa, mãe — respondeu.
— Que pessoa, Jennifer?— perguntou. Morgana esboçava uma
expressão de raiva.
— Você não conhece. É um alguém com quem estou saindo, lance
novo, mas nada sério — disfarçou.
— E por que não me disse a verdade? Se escondeu, é porque tem algo
errado.
— Eu só não te contei porque fiquei envergonhada. Você sabe, nunca
namorei, nunca apresentei ninguém a você. Não sei lidar com esse tipo de coisa.
Mas peço desculpas pela mentira.
— Deveria se envergonhar é de mentir pra sua mãe! Eu quero conhecer
essa pessoa.
— Fala sério, mãe! Nós mal saímos e já vou ter que apresentar pra
você? Que mico! Não é um namoro. É apenas um lance.
— Não me interessa se é namoro, lance ou seja lá qual nome você quer
dar pra isso. Fiquei muito chateada por essa mentira. Onde fica a confiança? E o
bom relacionamento que sempre tivemos?
Jennifer não conseguia encarar Morgana nos olhos. Um sentimento
ruim, de tristeza, preencheu seu peito. Seus olhos estavam marejados. Ela não
queria que a relação de confiança com sua mãe fosse quebrada.
— Desculpa...— Suspirou. — Eu apresento você a essa pessoa assim que
possível. Só me dá um pouco mais de tempo, por favor?
— Tudo bem. Vou te dar mais esse voto de confiança.
— Obrigada. Já posso subir? Não estou muito bem.
Morgana assentiu com a cabeça e Jennifer subiu para se isolar em seu
quarto.


— Eu sinto muito que isso tenha acontecido — disse Regina, horas mais
tarde, ao telefone com Jennifer. — Queria poder estar com você agora. Daria
tudo pra estar ao seu lado e te oferecer o meu colo.
— Não se preocupe, é culpa minha. Inventei uma mentira estúpida, fácil
de ser descoberta. Eu deveria imaginar que ela encontraria com a mãe da Beatriz
em algum momento.
— Nós precisamos tomar mais cuidado.
— Sim. Hoje eu tomei um choque de realidade — respondeu. — Peço
desculpas por ter colocado você naquela situação difícil hoje. Eu realmente agi
por impulso, não voltará a acontecer. Essa não sou eu.
— Tudo bem — respondeu suavemente. — Eu adoro suas provocações,
você sabe. Mas lá não é ambiente pra isso. É o meu trabalho, além de ser
bastante arriscado pra nossa relação. Atitudes como a de hoje podem arruinar
tudo — explicou serenamente.
— Eu entendo, Regina. E concordo plenamente com você. Nossa
relação deve acontecer do portão para fora.
— Você ouviu com atenção tudo o que aquela sua colega de classe
disse? Ela já sabe sobre nós. E se sabe é porque deixamos transparecer. Isso não
pode continuar acontecendo.
— Eu estou com muita raiva daquela menina. Ela só está fazendo isso
porque está com ciúmes!
— Nós não podemos continuar dando conteúdo para os espetáculos
dela.
— Sim. Mas prestar atenção até nos nossos bronzeados foi além do
limite. Que garota ridícula!— Jennifer estava com a voz exaltada.
— Ela já deve ter descoberto sobre nós há algum tempo. Tudo o que ela
deve fazer agora é nos analisar até nos mínimos detalhes.
— É muita falta do que fazer!— exclamou a loira.
— Ei, não fica assim. Vamos esquecer os ocorridos de hoje, ok? Mas
vamos tomar algumas atitudes pra que não se repitam.
— Tudo bem...— respondeu suavemente.
Regina sabia que Jennifer ainda levaria tempo até aprender a lidar com
aquele relacionamento delicado. Entretanto, ela também sabia a garota
inteligente e sensata que a loira era. Isso acalmava um pouco os seus
pensamentos e seu coração.
— Eu queria pedir pra te levar até em casa amanhã, mas temo que sua
mãe nos veja. Não quero arrumar um problema pra você.
— Realmente não é uma boa idéia — lamentou Jennifer. — Não
podemos ficar próximas no colégio e você não já não pode me trazer aqui. Como
faremos pra ficarmos juntas? Sinto como se de repente o circo tivesse se
fechado.
— Não se desespere. Nós podemos marcar um esquema de agendas —
disse Regina.— Nós podemos passar algumas manhãs juntas se soubermos
combinar os horários. Seu boxe é apenas três vezes por semana, certo?
— Sim.
— Então. Não são todos os dias que dou aula na parte da manhã.
Podemos usar esse tempo pra ficarmos juntas. Eu posso, também, ir até a
academia sempre que eu puder.
— É tão pouco tempo...
— Mas é o que teremos no momento.
— Eu queria ter você agora. Estou tão chateada — disse com tristeza
em sua voz.
— Eu também. Sabia que meu travesseiro está com seu perfume? E
ainda encontrei alguns fios de seu cabelo sobre a cama.
— Que inveja — respondeu a jovem. — Adoraria ter um pedacinho de
você aqui também. Será que um dia também poderei ter você na minha cama?
Entre minhas coisas?
— Eu espero que sim. Eu adoraria me sentir rodeada de tudo que é seu
— disse, fazendo um sorriso florescer nos lábios de Jennifer. — Amanhã eu teria
uma aula particular pra dar, mas meu aluno ligou desmarcando. Vem ficar
comigo?— pediu. — Eu adoraria poder te buscar, mas isso nos atrasaria. É
preferível que você venha, caso aceite, claro. Ganhamos tempo. Vem de táxi,
que eu pago quando chegar aqui.
— Obrigada, mas não precisa — recusou suavemente. — Tem estação
de metrô por aqui. Fica ainda mais rápido.
— Ótimo. Estarei esperando você.
— Qual horário?
— Às nove está bom?— perguntou a mais velha.
— Sim. Às nove em ponto estarei na sua porta.


Após uma noite não muito boa de sono, Jennifer despertou com o
barulho do alarme e logo em seguida se direcionou para o banho. Ela estava
ansiosa para encontrar Regina e poder ter alguns momentos tranquilos com ela.
Meireles ficou em dúvida sobre qual roupa vestir. Ela não sabia se já
iria uniformizada, ou se guardaria o uniforme em sua mochila e vestiria uma
roupa comum. Por fim, acabou optando pela segunda opção. Decidiu arrumar-se
o máximo que lhe fosse permitido, lembrando que a roupa precisaria caber na
mochila quando retornasse para casa. Sendo assim, manteve a calça jeans e o
tênis do colégio, mas trocou a blusa e ainda acrescentou uma jaqueta preta por
cima.
Ao final, borrifou uma pequena quantidade de seu perfume no pescoço
e pulsos, olhou-se no espelho e saiu.
Ao descer na estação correspondente ao bairro de Regina, precisou
caminhar por alguns minutos e logo já estava em frente à porta da casa da mais
velha. Após algumas batidas, a morena abriu.
— Bom dia, menina de ouro — disse com um largo sorriso nos lábios.
A morena ainda estava de camisola.
— Bom dia, professora Vianna.— Jennifer esboçou um pequeno e
tímido sorriso no canto dos lábios.
— Professora Vianna? Ah não — disse ao puxá-la para dentro e tocar
em seu rosto. — Pra você eu sou apenas Regina — murmurou. — Já tomou café
da manhã? Espero que não. Estava te esperando pra comermos juntas —
comentou com alegria.
— Jamais perderia a oportunidade de compartilhar mais um momento
assim com você. Se eu já tivesse comido, comeria de novo! — respondeu
Meireles, segundos antes de se direcionar para a cozinha com ela.
— Queria poder te roubar pra mim todas as manhãs, todas as tardes e
todas as noites — disse Regina enquanto observava a loira tomar seu café da
manhã.
— Por que não rouba?
— Porque sua mãe faria a polícia bater na minha porta e me acusaria de
sequestro. Não quero lecionar na cadeia, senhorita Meireles — disse a mais
velha, arrancando uma adorável risada da loira.
— Meu Deus, que tragédia seria!— comentou aos risos.
— Você ri, não é? Ai ai ... O que eu faço com você, garota?
— Você sente prazer em me chamar de garota, não sente?
— Totalmente — respondeu — Você é muito madura, mas lá no fundo
eu ainda consigo ver uma pequena inocência sobre a vida, sobre a dureza dela.
— Não acho que eu ainda tenha alguma.
— Ah... Você tem. Não no sentido sexual, mas no quesito vida mesmo.
Ela ainda não arrancou seu brilho, e isso me encanta. Eu olho pra você e consigo
ver um equilíbrio perfeito de tudo.
— Quando eu olho pra você, a última coisa que vejo é inocência. Você
é um poço de luxúria, Regina.
— A minha mente é completamente suja, sim. Mas meu coração ainda
tem inocência. Principalmente quando se trata de você. E você sabe que não era
a isso que me referia, engraçadinha.
— Seu coração?— indagou a mais nova.
— É. Você não tem habitado apenas minha mente. É espaçosa demais
— brincou, arrancando um brilhante sorriso de Jennifer.
— O que você mais gosta em mim?— perguntou enquanto olhava
fixamente para os castanhos de Regina.
— O caminho que faço entre seus olhos e seus lábios. Me sinto
completamente presa a isso — respondeu sem quebrar o contato visual com os
olhos de Jennifer. — E admiro sua inteligência, maturidade e a forma como você
transita de garota para mulher como se estivesse brincando. É bastante
intrigante.
— Hum... Eu desperto sua curiosidade?
— Muito. E o que você mais gosta em mim?
— Fisicamente; esse olhar penetrante e intimidador que você tem. E na
personalidade eu gosto de como você é altamente sexual e ao mesmo tempo um
poço de sensibilidade. Você é a mulher ideal, a qual todos sonham.
— Os outros não importam. A mim basta ser a mulher ideal apenas pra
você.
A última frase de Regina fez um doce sorriso florescer nos lábios
rosados da jovem. Quando Jennifer pensava que já não era possível apaixonar-se
ainda mais por aquela mulher, Regina lhe mostrava o contrário.
Após concluírem a refeição, ambas permaneceram conversando na
cozinha por um longo tempo, e quando se deram conta do tempo gasto ali,
resolveram ir até um lugar mais confortável. Sendo assim, caminharam até a
sala, sendo seguidas por Bóris, que miava à procura de atenção.
— Ele é um grude em você!— comentou Jennifer ao mesmo tempo em
que babava sobre a graciosidade do felino.
— E pelo visto grudará em você também — constatou ao observá-lo se
esfregar nas pernas de Meireles.
— Ele é um lindo! Posso levá-lo pra mim?
— Apenas se levar a dona junto — comentou ao sentar-se no sofá.
— Essa seria a melhor parte — piscou ao tomar um lugar ao lado da
morena. — Queria poder levar você lá em casa — disse com pesar em sua voz.
— Adoraria apresentá-la à minha mãe. Como seria bom ter você sentada à mesa
conosco enquanto ela ensina suas receitas de sobremesas. É triste não poder
viver momentos tão simples, mas ao mesmo tempo tão grandiosos com você. E
eu temo que nunca seja possível.— Suspirou. — Acho que ninguém entenderá
nossa relação.
— As pessoas não estão dentro de nós pra compreenderem o que
sentimos. Nosso relacionamento exige a quebra de muitos padrões e
preconceitos. Mas eu tenho esperanças em conseguir pelo menos o respeito.
Jennifer escutou a mais velha com atenção e em seguida se pronunciou.
— Eu jamais faria algo pra te prejudicar. Você sabe, não sabe? Eu
morreria se atrapalhasse a sua vida. Eu só te quero bem.— Jennifer tocou a face
de Regina com a mão e a acariciou. — Eu sou louca por você — disse
suavemente.
Regina sentiu a carícia em sua face e foi aproximando o rosto
lentamente até que seus lábios começassem a roçar nos dela.
— Eu também sou louca por você — murmurou. — Você está tão
cheirosa — disse com rouquidão ao percorrer o nariz pelo pescoço de Jennifer.
— E tão gostosa...— sussurrou instantes após umedecer a pele do pescoço da
jovem com sua língua. — Me apetece sentir seu gosto na minha boca.
— Gostoso é sentir sua língua assim, em contato com minha pele —
comentou em resposta. — É tão quente, tão úmida...
— Gosta?— A mais velha instigou. — Então me deixa lamber seu
corpo?— pediu, ao mesmo tempo em que deslizou a jaqueta de Jennifer para
fora. — Quero sentir a textura da sua pele enquanto provo várias partes de você
— murmurou ao inclinar o corpo contra o de Jennifer e fazê-la deitar no sofá.
— Puta que pariu, Regina. Por que você pega tão pesado?
— Você ainda não respondeu minha pergunta — disse ao segurar os
punhos de Meireles contra o sofá. — Me deixa lamber você?— Voltou a
perguntar. — Me deixa te fazer sentir o quanto eu te desejo...
— Porra, você é o demônio mais persuasivo que eu já conheci.
— E a sua boca anda muito suja, sabia? Com quem você anda
aprendendo?
— Com a melhor professora nessa categoria — respondeu prontamente
em um tom provocante.
— Então ela tem ensinado muito bem — respondeu. — Eu adoro te
ouvir com essa boca suja. Mas só pode usar comigo. Não quero que saibam que
estou te levando para o mau caminho — brincou descontraidamente.
— Você me gosta com a boca suja? Pensei que gostasse apenas das
boas meninas.— Jennifer não ficava muito atrás de Regina quando o quesito era
provocação.
— Sim, adoro você com essa boca suja. Gosto de você bem malcriada e
completamente safada. Boas meninas não gemem meu nome como você faz.
Agora tira a blusa pra mim...
— Por que você mesma não a tira?— murmurou.
— Porque quero me deliciar com a imagem de você a despindo —
respondeu aos soltar os punhos da loira.
Meireles mordeu sutilmente o lábio inferior e livrou-se da camiseta
branca que usava, deixando à mostra seu sutiã preto.
Regina olhou para o pequeno volume dos seios de Jennifer e mordeu o
próprio lábio em um gesto de excitação. Posteriormente, encostou os lábios no
abdômen da jovem e traçou um caminho com sua língua até o vale entre os
seios.
— Eu adoro o gosto da sua pele — disse Regina ao percorrer novos
caminhos com a língua.
Jennifer fechou os olhos e concentrou-se apenas na sensação que a boca
quente da morena provocava em sua pele. A mais velha começou a lamber e a
chupar a área exposta de seus seios até deixar marcas avermelhadas. Em seguida,
subiu as carícias e investiu em seu pescoço. Regina o lambia de baixo a cima de
maneira lenta, e o chupava devagar para não deixar evidências ali.
— Você me faz tão viva — sussurrou ao entrelaçar os dedos nos fios
loiros de Jennifer. — Você desperta de maneira intensa todos os meus sentidos
— continuou a dizer ao segurar aqueles cabelos com força. — Você me deixa
sem barreiras. — Regina deslizou a mão para o feixe do sutiã da jovem e o abriu,
jogando a peça pro chão logo em seguida. — O pior de tudo é que eu gosto de
toda essa adrenalina.— A morena falava ao mesmo tempo em que investia suas
carícias em Jennifer. Carícias essas, que ficavam mais intensas a cada instante.
— Adoro não ter limites pra você.
— Você me enlouquece com essa sua forma tão voraz de me querer —
comentou ao deslizar as alças da camisola de Regina para baixo.
Regina deslizou as mãos para o botão e zíper da calça jeans de Jennifer
e começou a abri-los de maneira lenta para torturá-la
— Eu sei que você gosta... E eu também sei que você está louca pra me
sentir entre suas pernas agora.
— Sim...— A voz de Jennifer saiu arrastada. — Quero te sentir em
mim, faz...
Regina abriu a calça da loira e a deslizou por suas pernas, deixando-a
apenas de calcinha.
Quando a mais velha retornou à posição anterior, Meireles aproveitou
para segurar em sua camisola e deslizá-la para cima e para fora. Agora, Regina
também estava apenas de calcinha.
— Nosso tempo é tão curto pra grande vontade que estou de te foder
bem gostoso. Quando começo, eu não paro. E você também não vai querer me
deixar parar.— Regina falava ao mesmo tempo em que massageava a intimidade
de Jennifer por cima da calcinha.
Meireles a praguejou mentalmente por suas provocações. A morena
sabia o impacto de suas palavras e ações sobre ela e se aproveitava disso para
deixá-la no limite. Contudo, Meireles também se aproveitaria de algo; ela usaria
toda a luxúria da morena contra ela mesma; aproveitando-se do seu insano
desejo. Sendo assim, a loira usou a força física que possuía, que por sinal era
bem maior que a de Regina, e trocou de posição; ficando por cima da
professora.
— Nós vamos fazer bem rapidinho e será bom do mesmo jeito —
murmurou Jennifer ao descer a calcinha de Regina para baixo, assumindo o
controle. Em seguida, livrou-se da própria peça e se encaixou entre as pernas da
mulher.
Regina soltou um baixo gemido ao sentir o sexo quente e úmido de
Jennifer colando ao seu.
— Você é tão gostosa — murmurou a morena assim que a jovem
começou a se mexer sobre ela; fazendo suas intimidades se roçarem
prazerosamente.
— Você me acha gostosa, Vianna?— instigou verbalmente ao mesmo
tempo em que aumentou o ritmo da fricção contra o centro de Regina.
— Muito gostosa — respondeu com rouquidão ao deslizar as mãos para
a bunda de Jennifer e segurá-la com força nessa região.
Meireles esfregava o próprio sexo contra o de Regina de uma maneira
imensamente prazerosa para ambas. Regina, ao mesmo tempo em que deixava
baixos gemidos saírem de seus lábios, se mexia debaixo de Jennifer de modo a
conseguir uma melhor posição.
— Você gosta, Regina? Gosta quando sua mulher se esfrega em você?
— provocou. Jennifer afastou e suspendeu umas das pernas de Regina para que
pudesse se encaixar com perfeição entre ela. Dessa forma, conseguiu
proporcionar a ambas um maior contato entre seus sexos.
— Oh porra...— disse de maneira arrastada ao sentir a umidade de
Jennifer se misturando com sua própria umidade.
Meireles lançou a cabeça para trás e, dessa forma, fez seus cabelos
caírem sobre suas costas. Segundos depois, os fios loiros começaram a retornar
para frente de seu rosto em forma de cascatas. Regina, de onde estava, admirou a
cena. Ela adorava observar os cabelos volumosos e ondulados de Jennifer, que
pareciam assumir vida própria. A morena apreciava ainda mais quando estavam
assim: bagunçados. Da mesma forma que Regina admirava toda aquela juba
dourada, ela também babava sobre todo o conjunto da imagem de Jennifer nua
sobre si, e com os convidativos seios à mostra.
A mais nova voltou a lançar os cabelos para trás ao mesmo tempo em
que aumentou o ritmo da fricção. Ambos os sexos já estavam tão molhados, que
toda aquela esfregação tornou-se audível; fazendo Regina excitar-se com o som
produzido.
— Hoje quando você estiver sentada em sua cadeira no meio da aula,
saiba que é dessa forma que eu gostaria de estar sobre você — disse Jennifer ao
inclinar o corpo para baixo e sussurrar contra o ouvido da morena.
Regina, de maneira abrupta, virou o corpo sobre o de Jennifer e
encurralou a loira contra o estofado. Agora, Meireles estava com a cabeça e
ombros contra o braço do sofá e o restante do corpo repousado sobre o assento.
— Se sua intenção é me enlouquecer...— disse com firmeza. — ...
Saiba que você vai perder a sanidade junto comigo. Sabe por quê?— perguntou,
recebendo um aceno negativo da loira em resposta. — Porque não vai ter um
momento do seu dia aonde você não irá me imaginar abrindo as suas pernas.—
Regina falou ao mesmo tempo em que separou as pernas de Jennifer com força e
rapidez. — Você irá desejar que eu entre em você assim, do jeito que apenas eu
sei fazer — disse com firmeza na fala no mesmo instante em que penetrou um
dedo na jovem sem cerimônia.
— Ah...— gemeu Jennifer ao sentir o gesto bruto de Regina.
A mais velha deitou-se sobre ela, encaixou o corpo entre as pernas da
jovem e usou a mão livre para agarrar seus volumosos fios loiros.
— Você gosta quando entro em você dessa forma, não gosta? —
comentou, excitada, ao sentir seus dedos sendo comprimidos.
— Gosto Regina. Assim...— disse com a voz carregada de luxúria.
Jennifer agarrou os cabelos de Regina com as duas mãos e começou a
puxá-los na tentativa de conter toda a prazerosa corrente que os movimentos da
mulher estavam lhe proporcionando. A mais velha entrava e saía com rapidez e
força, fazendo Jennifer se sentir totalmente dominada e desejada. E a loira
adorava isso, adorava perder as forças e sentir-se entregue à Regina. Gostava de
sentir-se dela.
— Eu sei que você gosta — afirmou a mais velha com um sorriso
sacana nos lábios. — Você é tão safada quanto eu.— Regina começou a
distribuir mordidas e intensos beijos no pescoço conforme segurava com força
em seus cabelos e a penetrava sem cerimônia.
— Não para.— Jennifer gemia. A loira enlaçou as pernas na cintura de
Regina e começou a arranhar as costas da mulher.
— Não vou parar. Eu vou fazer até você não aguentar mais.— Regina
entrava e saía com seus dedos em prazerosos movimentos; arrancando de
Jennifer gemidos altos e constantes. Ela se deliciava ao ver sua garota perdendo
o controle sob suas investidas. — Eu espero que você pense duas vezes antes de
me provocar, porque eu não sou de perdoar — murmurou sensualmente.
— Então não perdoe e me dê o que eu quero. Ou melhor, faça o que
você também quer.
— O que eu quero é bater nessa cara que você faz quando está comigo.
— Então bate!— pediu Jennifer com o sorriso mais sacana e diabólico
de todos. Assim como a morena, ela também se transformava.
Regina usou a mão que estava nos cabelos da loira para espalmar contra
a face da mesma, fazendo Jennifer gemer e esboçar um excitante sorriso safado.
— Tão safada... Tão gostosa...— disse ao depositar outro tapa contra a
face de Jennifer, a deixando vermelha. Regina era tão fascinada por Meireles,
que não conteve a forte vontade de tomar aqueles lábios rosados para si em um
beijo apaixonado.
As duas mulheres beijavam-se imersas em todo aquele envoltório de
luxúria. Regina se movimentava repetidas vezes enquanto a ouvia gemer seu
nome com aquela doce voz que a levava à loucura. O sofá, logo, tornou-se
pequeno e apertado. Contudo, toda aquela falta de espaço as excitava ainda mais.
Para Regina, era imensamente satisfatório ter Jennifer encurralada, dominada,
sem chance de fuga. E para Meireles, era excitante estar nas garras da mais
velha, sentindo-a ir fundo em seu interior.
— Oh droga!— resmungou Regina ao ouvir o alarme de seu celular
tocar sobre o móvel localizado próximo ao sofá.
A professora possuía diversos alarmes em seu aparelho; um deles
tocava sempre que faltavam trinta minutos para que ela saísse de casa. Esse era
um controle para nunca se atrasar.
— Eu vou jogar essa porra no inferno, mas não interrompo meu
momento com você!— A morena esticou um dos braços e tateou a mão sobre o
móvel até encontrar o celular. Encontrando, interrompeu o alarme e o lançou em
direção ao outro sofá que havia na sala.
Quando o silêncio voltou a fazer parte do ambiente, Regina prosseguiu.
Ela deslizou os dedos para fora da intimidade de Jennifer e uniu o próprio sexo
ao da loira. Ela se esfregava contra ela com voracidade e maestria, mexendo o
quadril de uma maneira tão habilidosa, que fez seu corpo e o dela explodirem
simultaneamente de prazer.

— Uh...— disse Jennifer, sem fôlego, ao receber o corpo suado de
Regina que acabara de desabar sobre o seu.
— Droga. Por alguns minutos esqueci que nosso tempo era curto —
comentou Regina. — Adoraria poder continuar — disse, instantes antes de
depositar um beijo carinhoso na testa de Meireles.
— Eu também. — resmungou. — O tempo passa rápido demais quando
estamos juntas — comentou a loira, ainda ofegante.
— Infelizmente — lamentou. — Bom, agora eu preciso tomar um
banho rápido pra não nos atrasarmos. A última coisa que precisamos é
chegarmos atrasadas juntas.
— Verdade. A Estela perguntaria se estávamos no motel — disse aos
risos. — Estou rindo, mas sei que o assunto é sério.— Suspirou. — Posso ir pro
banho com você?
Regina assentiu positivamente com a cabeça e ambas subiram para o
banheiro.


— Acho que esse foi o banho mais rápido que já tomei — comentou
Regina, no quarto, enquanto se trocava junto à Jennifer.
Meireles, de onde estava, observou a morena vestir uma pequena
calcinha rosa claro por debaixo da saia preta de cintura alta. Por fim, a viu fechar
os botões da camisa, de coloração vinho, e caminhar até o armário, tirando de lá
um par de scarpin preto.
— Por que você tem que estar sempre tão impecavelmente linda?—
disse a loira ao se aproximar e envolvê-la pela cintura. — Você é uma mulher e
tanto. Em todos os sentidos.
— Não, eu não sou. Mas você, sim. É encantadora. Você tem algo no
olhar e na maneira de se comportar que instiga e cativa — comentou a mais
velha ao mesmo tempo em que contornava os lábios de Jennifer com a ponta do
polegar. — Eu sinto tanta vontade de você, de conhecê-la cada vez mais a
fundo...
— Você pode conhecer sempre mais. Apenas... Apenas não desista de
nós — disse ao segurar a nuca de Regina. — Não me deixe sem você —
murmurou em um pedido.
Regina fechou os olhos e aspirou o perfume dos cabelos de Jennifer por
breves segundos.
— Eu estou aqui...— respondeu suavemente ao voltar a abrir os olhos.
Jennifer depositou um beijo naqueles lábios vermelhos e se afastou. Ela
ainda precisava pentear os cabelos antes de irem. Entretanto, quando foi abrir
uma das gavetas da cômoda à procura de um pente, ouviu Regina pedir, de
maneira nervosa, que não a abrisse. Contudo, já era tarde demais.
— Você fuma?— perguntou Jennifer, confusa, ao avistar uma carteira
de cigarro dentro da gaveta.
— Droga — sussurrou para si mesma. — Não — respondeu. — Bom,
não mais — disse ao se aproximar e fechar a gaveta.
— Por que não queria que eu visse?
— Porque não é algo de se orgulhar. E eu não quero ser uma má
influência na sua vida.
— Não precisava temer que eu visse. Quero que você sempre possa se
sentir a vontade pra falar sobre o que quiser comigo, Regina. Principalmente de
assuntos relacionados a você. Eu jamais te julgaria por algo. E não me
influenciaria a fumar, se era esse seu medo.— As duas mulheres conversavam
frente a frente. — Por que você guarda essa carteira se já não fuma?—
perguntou com curiosidade. — Se quiser responder, claro.
Regina hesitou por alguns instantes, mas resolveu se abrir.
— Porque às vezes eu sofro algumas recaídas. Mas são raras. Apenas
quando passo por alguma situação muito ruim — explicou.
— Eu nunca senti qualquer cheiro de cigarro em você.— Jennifer
comentou.
— É porque não fumo há muitos meses.
Jennifer aproximou-se da mais velha e segurou sua mão.
— Como disse, não julgaria você por nada. Mas me faria feliz saber que
você não precisará abrir aquela caixa de cigarro.
— Você se preocupa comigo?
— Você não imagina o quanto.
Regina esboçou um pequeno sorriso e apertou a mão da mais nova.
— Obrigada por isso — disse com delicadeza. — Não posso prometer
não abrir aquela caixa, mas eu vou tentar.
— Já é um começo — respondeu com um sorriso.
— Por falar em caixa... Eu tenho um presente pra você.— Regina
afastou-se de Jennifer e caminhou até o guarda roupa. Ao deslizar uma das
portas, pegou uma embalagem preta que estava decorada com uma fita de cetim
vermelha em forma de laço, e caminhou com ela até a loira.
— Pra mim? Regina, não precisava — disse sem desgrudar os olhos da
embalagem.
— Oh, certamente precisava — respondeu com um sorriso sacana nos
lábios, causando uma interrogação em Jennifer.
— Do que se trata?— perguntou a jovem.
— Acho que você só saberá quando abrir.
Quando Meireles fez menção em desfazer o laço, foi barrada pela mão
de Regina sobre a dela.
— Não. Quero que você faça isso apenas em casa. Eu comprei uma
roupa que eu gostaria de te ver usando pra mim — disse ao fixar seu olhar em
Jennifer.
— De qual tipo?— perguntou, ainda confusa.
— Você só saberá quando abrir a embalagem.
— Não acredito que vou precisar ficar na curiosidade até o fim do dia
— reclamou.
Regina deu mais um passo adiante e colou o corpo ao de Jennifer,
fazendo a mais nova sentir seu calor.
— Eu quero que você analise bem e só use se gostar e sentir à vontade
para fazê-lo.
— E se eu não gostar e não quiser usar?
— Não use. Mas terá me feito perder os trezentos reais que dei nessa
roupa — disse a morena ao rir. — Não quero que se sinta influenciada a aceitar
absolutamente nada. Quero que use apenas se sentir vontade. Eu iria odiar que
você fizesse algo forçado. Mas o presente está dado. E não vou mentir que me
deixaria louca te ver nessa roupa.
— Estou passando mal de curiosidade!
— Não é nada demais, Jen. Mas se recusar, não haverá problema. Tudo
bem?—
Jennifer assentiu. — Vou deixar a embalagem no meu carro e
arrumamos um jeito de eu te entregá-la na saída. Podemos nos encontrar no
mesmo lugar onde eu te buscava pra levá-la até em casa. Lembra?
— Por mim tudo bem. Depois dou um jeito de entrar com ela em casa
sem que me minha mãe a veja.
— Certo.— Sorriu. — Agora vamos? Já estamos em cima da hora.
— Vou levar seu pente pra arrumar o cabelo quando estiver a caminho
— comentou Jennifer ao encontrar o objeto sobre a cômoda; arrancando uma
risada de Regina.
— Ok.— Riu. — Levarei você de carro até um pouco mais da metade
do caminho. Após isso, você pega um táxi. Tudo bem? Não podemos ser vistas
chegando juntas.— A professora abriu a carteira e pegou algumas notas para
Jennifer. — Esse dinheiro deve dar pra pagar a condução.
— Regina, não precisa. Eu pego um ônibus — recusou suavemente.
— Claro que precisa! Dessa forma chegará bem mais rápido. Agora
quero que aceite — disse ao encostar as notas na mão da loira. — Não seja
teimosa, Jennifer. Por favor?
— Não me sinto bem com você querendo me pagar as coisas, Regina.
— Jennifer, é apenas uma corrida de táxi. Já estamos em cima da hora.
Aceita, por favor?
Após muito relutar, Meireles acabou aceitando.
— Você é muito insistente — resmungou.
— E você muito teimosa!— disse em resposta. — Agora podemos ir,
senhorita Meireles?
Jennifer sacudiu a cabeça ao mesmo tempo em que riu ao ser chamada
ironicamente de senhorita Meireles.
— Sim, podemos, minha majestade — brincou ao inclinar-se em
reverência.



Capítulo 22

— E esse sorriso de orelha à orelha, Jennifer? Já devo imaginar quem
seja o motivo — comentou Beatriz enquanto caminhava ao lado da amiga em
direção à sala de aula.
— Nós tivemos uma manhã tão boa juntas — disse ao sorrir. — Queria
poder repetir com mais frequência.
— Passaram a manhã juntas? Wow!— comentou Bea, surpresa. —
Você dormiu lá?
— Não, fui até a casa dela pela manhã — explicou. — Foi tão bom. Na
verdade, é sempre bom estar com ela.
— Vocês estão cada vez mais envolvidas. Não têm medo que
descubram?— perguntou.
— Nós temos. Mas somos inevitáveis uma para a outra. Esse algo que
nos atrai pra perto é mais forte que qualquer medo. Mas não vou negar que tenho
muito.
— Você precisa contar logo à sua mãe sobre sua sexualidade, Jennifer.
Ela poderia ser uma grande aliada.
— Sim, eu sei. Se ela vir a descobrir por terceiros será tudo pior. Mas
eu me sinto tão covarde pra chegar até ela e abrir o jogo. Temo que tudo se torne
ainda mais difícil.
— Infelizmente é um risco que você precisa correr.
— Eu vou tentar tomar coragem e conversar com ela. Mas agora me
conta, como está seu relacionamento com Kevin?— perguntou animada.
— De vento em polpa!— respondeu sorridente. — Minha mãe já soube
sobre nossa relação e não encrencou. Esqueci de te contar!
— Que bom, Beatriz! Fico muito feliz por vocês!
— Obrigada! Hoje vou dormir na casa dele. Acho que agora rola...
— Sente que é o momento?
— Sim.
— Então aproveita cada instante dessa noite. Espero que seja
positivamente inesquecível pra você — disse docemente. — E não se esqueça da
prevenção!
— Pode deixar, mamãe!— disse aos risos ao entrar na sala com a
amiga.


Naquela mesma tarde, horas depois, Regina e Arthur conversavam
enquanto terminavam de guardar seus pertences no armário localizado na sala
dos professores.
— Vai sair pra comer algo?— perguntou ele.
— Não. Vou comer apenas a fruta que trouxe.
— Espero que não esteja de dieta, você sabe que não precisa. Está linda
como sempre — disse ele, completamente livre de segundas intenções. Arthur
via Regina apenas com bons olhos de amigo.
Regina fechou a porta do armário e caminhou até o homem com um
pequeno sorriso nos lábios.
— Obrigada — disse suavemente. — Não, não estou de dieta. Apenas
sem fome.
— Ok, mas ao contrário de você, estou morto de fome. Vou dar uma
saída pra comer algo. Gostaria que eu lhe trouxesse alguma coisa?
— Não, meu amigo. Obrigada novamente. Vou me isolar na biblioteca e
ler um bom livro até o final do intervalo.
— Você terá aula com a classe trezentos e nove hoje?— perguntou ele.
— Sim. Após o intervalo, inclusive. Então você já imagina, não é?
Preciso relaxar e vestir a máscara — disse séria.
— Então... Boa sorte! Até depois!— despediu-se.

Regina recolheu um livro de dentro de sua bolsa e, também, uma maçã
embrulhada em papel alumínio. Feito isso, direcionou-se para a biblioteca. Ela
sabia que não era permitido comer no local, mas sentaria em uma mesa ao fundo
para que tal feito não fosse percebido. Além do mais, quando se tratava de frutas
a bibliotecária sempre fazia vista grossa, o que era um alívio.
Ao adentrar o local e se direcionar para a mesa de destino, avistou sua
aluna Jennifer sentada sozinha no lugar. Sorrir foi inevitável. A loira estava tão
concentrada na leitura, que não percebera sua chegada.
— Olá, senhorita Meireles. Combinamos?— disse enquanto tentava
conter um sorriso.
— Parece que sim — respondeu ao surpreender-se com a presença da
mais velha. Há meses ela e a professora não se cruzavam naquele local.
— É seguro sentar ao seu lado?— perguntou Regina em um tom de
brincadeira. Visto que há tempos ela e Meireles não eram vistas juntas ali, julgou
que não haveria problema juntar-se a ela. Entretanto, manteria um diálogo
despido de qualquer assunto que pudesse incriminá-las.
— Totalmente seguro — respondeu Jennifer ao sorrir. Assim que
Regina sentou-se a seu lado, seu doce perfume preencheu o ambiente, fazendo
seu coração acelerar. Meireles era inteiramente apaixonada por aquele aroma tão
envolvente.
— O que você está lendo?— perguntou Regina ao direcionar o olhar para
o livro aberto sobre a mesa.
— Heróis, Deuses e Monstros da Mitologia Grega — disse ao mostrar
a capa.
— Não é a primeira vez que vejo você lendo sobre mitologia grega —
comentou a mais velha.
— Eu gosto muito — respondeu a loira. — Isso que dizer que você
presta atenção em mim?
— Sempre...— disse com um curto sorriso. — Vamos ver se você sabe
essa!— comentou Regina com certa empolgação. — De onde se origina o nome
Europa?
— Hum... Europa é atribuída às palavras gregas Eurys, que significa
largo, e Ops, que significa face. Então é face larga! Acertei?
— De certa forma, sim. Esse seria o significado literal do nome —
explicou. — Mas tem uma parte ainda mais interessante nessa história. O nome
desse continente é derivado da mitologia grega. Europa foi uma ninfa muito bela
que despertou o amor de Zeus. E, arrebatado pela paixão, ele transformou-se em
touro branco e raptou-a — contava Regina, suavemente, enquanto mantinha
contato visual com os olhos de Jennifer.
— Que interessante! Dessa parte eu realmente não sabia — disse
Jennifer, encantada com o que aprendera. — Você também gosta de mitologia
grega?
— Gosto de história de uma forma geral — respondeu. — Você já leu
A Divina Comédia?
— Não! Do que se trata?— perguntou curiosa.
— É um poema com estruturas filosóficas. Ele é épico e teológico. Foi
escrito pelo poeta italiano Dante Alighieri e é dividido entre inferno, purgatório
e paraíso. É um poema narrativo rigorosamente simétrico. Estou com ele aqui,
inclusive.— Regina pegou o livro e o entregou nas mãos de Jennifer.
— Parece interessante...— disse enquanto folheava as páginas. — Posso
levá-lo emprestado?
— Claro! Depois me diz o que achou.
— Ok!— Sorriu. — Adoro conversar com você sobre esses gostos e
interesses que temos em comum.
— Eu também gosto muito — comentou. — Eu fico impressionada por
seus interesses. A maioria das garotas da sua idade têm outros gostos e outras
formas de pensar. Mas você é diferente. É única...— disse ao penetrar o olhar no
par de olhos à sua frente. — Você desperta meu total interesse — sussurrou o
mais baixo que conseguiu.
— Nunca vou entender o que você viu em mim — disse Jennifer em um
baixo tom de voz.
— Uma pena não poder te colocar aqui dentro e te mostrar tudo o que vi
e vejo. Você é incrível — respondeu suavemente. — Agora vamos desviar o
assunto, por favor.
— Tudo bem. Me aguarda um instante?
— Aonde você vai?— perguntou Regina ao vê-la levantar.
— Não demoro!— respondeu ao longe.

Alguns poucos minutos se passaram e Jennifer retornou para a mesa
com as duas mãos preenchidas por alguns bombons de chocolate comprados na
cantina do colégio. Ao sentar-se, Meireles pegou alguns bombons redondos e os
levou até as mãos de Regina sem dizer uma palavra.
A morena, por sua vez, sorriu àquele gesto simples, porém, carregado
de significado. Ao pegar o chocolate, sentiu o toque suave da mão de Jennifer
contra a sua ao mesmo tempo em que sentiu seu coração acelerar. Ela jamais
entenderia como a jovem conseguia lhe despertar sentimentos e vontades tão
distintas.
— Obrigada — respondeu suavemente sem desviar o olhar.
As duas mulheres permaneceram se olhando em silêncio enquanto
lutavam para não fazerem contato físico com as mãos. Suas trocas de olhares
eram intensas e alternavam entre olhos e bocas. Ambas sabiam que o vinha
crescendo dentro transcendia o físico. No entanto, ainda não possuíam dimensão
do tamanho desse gostar.
— Acho que esse é momento de ir embora — disse Regina, sem jeito,
ao quebrar o contato visual.
— Não vai, Regina — pediu Jennifer, suavemente, restabelecendo o
contato visual.
— Não podemos entrar nessa atmosfera aqui. E eu já não sou forte o
suficiente pra disfarçar.
— Eu não vou fazer nada, você sabe — comentou na tentativa de fazê-
la ficar um pouco mais.
— Eu sei. Mas os nossos olhares entregam tudo — respondeu. — Até
depois, senhorita. E obrigada pelos chocolates — piscou ao dizer as duas últimas
frases em voz alta e se retirar do lugar.


Ponto de Vista de Regina

Caminhei a passos lentos em direção à sala correspondente à classe de
Jennifer. Ao entrar, notei que todos os alunos foram tomando seus respectivos
lugares. Notei, também, que um aglomerado de outros estudantes que estavam
ao fundo da sala automaticamente se cutucaram ao perceber minha presença.
Esse comportamento seria considerado completamente normal diante a
entrada de um professor em sala de aula. Porém, me ative a um fato importante,
e que fez toda a diferença; assim que entrei, estes mesmos alunos olharam para
mim e em seguida todos depositaram seus olhares sobre as costas de Jennifer,
que já estava acomodada em seu assento. Feito isso, voltaram novamente seus
olhares para mim, como se estivessem esperando alguma reação
comprometedora de minha parte ou dela. Por sorte, Meireles se manteve quieta
e não direcionou seu olhar para mim.
Quando todos já estavam em seus lugares, pedi que Beatriz, a amiga de
Jennifer, fizesse a chamada. Pela expressão que Meireles esboçou, notei sua
estranheza à minha mudança. Afinal, era sempre ela a encarregada pela
chamada quando eu precisava. Contudo, eu sabia que ela entenderia minha
nova atitude.
Enquanto Beatriz depositava sua atenção no diário de classe, caminhei
até o quadro e comecei a aplicar minha matéria. Entretanto, aquele estava
sendo um dia atípico na classe trezentos e nove. A turma que sempre manteve
uma boa postura em minhas aulas, hoje, estava se comportando de maneira
estranha e inquieta. Alguns murmúrios eram audíveis vindos do fundo, e eu
poderia jurar que meu nome e o de Jennifer Meireles estavam sendo
pronunciados.
Quando me sentei à mesa para aguardar que todos copiassem o resumo
do dia e, posteriormente, dar continuidade à explicação da matéria, aproveitei
para olhar Jennifer de maneira discreta e notei que sua postura estava tensa.
Ela, vez ou outra, olhava para trás como se algo também a estivesse
incomodando.
Algum tempo depois, voltei a me direcionar para frente do quadro. Ao
verificar que todos já haviam copiado e lido a matéria, resolvi fazer uma
pergunta.
— Alguém poderia dizer com suas próprias palavras o que foi o
nazifascismo? — Ao lançar a pergunta, todos se mantiveram em silêncio. —
Ninguém sabe responder?— Voltei a perguntar.
Poucos minutos se passaram e logo notei uma nova movimentação ao
fundo da sala. Estela cutucou o rapaz sentado ao seu lado, o fazendo levantar o
braço.
— Pois não, Gustavo. Diga-nos o que foi o nazi-fascismo.
— Por que você não pergunta à Jennifer, professora?— disse ele em
um tom de riso.
— Por que a senhorita Meireles saberia a resposta? E por que você
levantou o braço se não tinha a intenção de responder?— perguntei com
seriedade.
— Ué, ela presta tanta atenção em você, em suas aulas, então com
certeza ela sabe dar essa resposta.
A voz daquele aluno estava carregada de ironia. Estela certamente
andou falando mais do que devia. Após o ocorrido entre ela, Jennifer e eu, todos
na sala de aula já deviam estar em alerta. Eu precisava e iria tomar alguma
atitude futuramente.
— Sim?— perguntei ao avistar Beatriz levantar o braço.
— Foi uma doutrina política que se desenvolveu, principalmente, na
Itália e Alemanha e que deu continuidade até a Segunda Guerra Mundial. É
uma junção do fascismo de Mussolini e o nazismo de Hitler. Foi um regime
totalitário e antidemocrático.
— Obrigada por sua explicação, Beatriz. Agora vou dar continuidade
à aula.
Após ouvir a resposta de Beatriz, direcionei meu olhar à Jennifer e
percebi que a mesma estava com os punhos cerrados sobre a mesa e seu rosto
possuía um leve rubor. Toda aquela situação havia sido demasiadamente
constrangedora, e eu lamentei internamente por vê-la ter que passar por isso.


Ao final daquela tarde, Regina Vianna concluiu seu expediente e enviou
uma mensagem para Jennifer dando a nova localização de onde deveriam se
encontrar. A morena julgou o antigo ponto de encontro perigoso demais e
decidiu direcionar-se para um lugar mais seguro.
Feito isso, encontrou-se com a loira em uma rua a uma considerável
distância do colégio.
— Desculpe a demora, precisei pegar alguns livros na biblioteca antes
de sair. Tenho uma pesquisa pra fazer e o professor não aceita apenas um tipo de
fonte. É o professor Arthur, inclusive — comentou Jennifer após entrar no carro.
— Ele é exatamente assim — disse Regina.
— Vocês são amigos há muito tempo?— perguntou com curiosidade.
— Oh, sim! Estudamos na mesma faculdade.
— Ele sabe sobre nós?— perguntou curiosa. — Pois notei que há um
tempo ele vem me olhando de maneira diferente, como se me analisasse.
— Sim, eu contei. Arthur é meu melhor amigo e é de total confiança.
Eu precisava ter alguém pra desabafar essa história. Malena mora longe, eu
precisava de uma pessoa mais presente — explicou-se. — Incomoda a você o
fato dele saber?— perguntou suavemente.
— Não. Se você diz que ele é de confiança, eu não vejo problema. Só
perguntei porque realmente percebi um olhar diferente vindo da parte dele. O
que eu não estou gostando nem um pouco é o fato da Estela estar se metendo no
que não diz respeito a ela. Com certeza ela contou pra metade da turma sobre
nós!
— Sim. Ela certamente fez comentários maldosos. Eu sinto muito que
você esteja passando por isso, Jennifer. Quando olhei pra você eu percebi o quão
incomodada você estava com aquelas indiretas. Afinal, são seus colegas de
classe. O ambiente acabará se tornando pesado.
— O que realmente me incomodou foi não poder levantar da minha
mesa e colocá-los no lugar deles. E em relação à Estela, a minha vontade é de
quebrar a cara dessa menina. Ela só está se comportando dessa forma porque me
pediu um beijo e eu neguei na frente de todos.
— Como assim a Estela pediu um beijo a você?— perguntou Regina ao
erguer uma de suas sobrancelhas.
— Isso faz algum tempo. Aconteceu na pequena social que rolou na
casa dela daquela vez, lembra? Estávamos todos jogando a brincadeira da
garrafa e ela me desafiou a beijá-la.
— Muito ousada essa tal de Estela — comentou com acidez na voz
enquanto tentava esconder o ciúme que lhe acometera.
— Muito.— Jennifer respondeu. — Eu neguei, certamente, e disse que
estava comprometida com uma pessoa. Acredito que a partir desse momento ela
dedicou a vida a descobrir quem era.
— E você realmente se sente dessa forma?
— Comprometida? Bom... Sim — disse de maneira tímida ao sentir
suas bochechas corarem. — Eu sei que não temos nenhum compromisso, ou pelo
menos nunca falamos a respeito. Mas eu sinto que não quero estar com outro
alguém que não seja você — confessou.
— Eu também me sinto da mesma forma em relação a você. Desde que
nos envolvemos eu não estive com ninguém mais. E há tempos eu tive uma
conversa final com Robson — comentou. — Quando te beijei pela primeira vez,
desejei poder repetir aquele momento incontáveis vezes com você.
Jennifer tentou conter o sorriso bobo que teimava em formar-se em seus
lábios para não transparecer uma boba apaixonada.
— Eu nunca vou esquecer a tarde em que nos beijamos, e de tudo que
senti. Foi tão bom poder provar seu beijo, seu gosto, e sentir que eu não estava
sozinha, pois você também me queria.
— Eu também não vou esquecer. Foi a primeira vez que pude sentir sua
pele, seu calor e seu cheiro tão próximos. Eu quero poder continuar sentindo
tudo isso todos os dias.— Regina alternou o olhar entre os lábios e olhos de
Jennifer ao mesmo tempo em que foi aproximando seu rosto até que sua boca
roçasse suavemente contra a da jovem segundos antes de beijá-la.
Regina a beijou sem pressa, iniciando um beijo calmo e lento. Sua mão
encontrou os cabelos de Jennifer na região da nuca com calma, ao mesmo tempo
em que sua língua úmida foi de encontro a língua da jovem. Elas se enroscavam
e se acariciando enquanto sentiam o gosto que cada uma tinha a oferecer.
Seus rostos se inclinavam para lados distintos na tentativa de conseguir
um contato cada vez maior. Os beijos, que sempre se tornavam mais vorazes;
dessa vez permaneceram calmos, tranquilos e lentos. Suas bocas se provavam de
maneira tão lenta, que possivelmente estavam decorando cada pequena gostosa
sensação daqueles beijos.
— Não me deixe — sussurrou Jennifer entre o beijo. — Não desista...—
Voltou a sussurrar.
— Como eu posso desistir daquilo que eu mais quero?— sussurrou em
resposta, segundos antes de finalizar o beijo. — Você lembra uma conversa que
tivemos no dia em que fomos ao evento cultural? Sobre o céu e o mar?
— Lembro.
— Então, você me disse que o céu sempre encontrava uma forma de
estar com o mar. Mesmo distantes, mesmo parecendo impossível.
— Sim, eu lembro de quando comentei isso.
— Eu quero que sejamos assim: o céu e o mar. E assim como eles,
quero que façamos o possível pra estarmos juntas mesmo com as forças
contrárias. Mas eu preciso pedir algo a você.
— O quê?
— Não quero, de forma alguma, pressioná-la a nada. Mas o quanto
antes você conseguir contar à sua mãe sobre sua sexualidade, melhor. Eu estou
inteiramente disposta a assumir pra ela o que temos.
— Eu sei que você está certa. Com o apoio dela tudo seria muito fácil.
Eu quero contar sobre mim, mas estou com tanto medo da rejeição.
— Infelizmente eu não posso ajudá-la nessa questão. Apenas você pode
ter essa conversa verdadeira com ela. Mas eu vou estar aqui pra qualquer que
seja o resultado.
— Obrigada, Regina. Você nem imagina o quão importante será o seu
apoio — disse ao depositar a mão sobre a da morena. — Mas e você? E quanto à
escola?
Regina suspirou fundo e começou a falar.
— Lá nós precisamos continuar escondendo. Episódios como o de hoje
não podem continuar se repetindo na sala de aula. Eu preciso tomar uma atitude.
— O que pretende fazer?
— Mudar radicalmente meu comportamento com você quando
estivermos lá. E quando digo radicalmente, é radicalmente. Eu tenho algo em
mente e preciso da sua ajuda pra executar.
— É só me pedir.
— Mais tarde ao telefone eu explico tudo com calma a você, tudo bem?
Me dê um sinal quando eu puder te ligar
— Ok — respondeu suavemente. — O que você acha que aconteceria
se o que temos se espalhasse por toda a escola?— perguntou receosa.
— A instituição não iria perdoar. Certamente eu seria demitida.
— Você está com medo?
— Estou. Não vou mentir pra você — respondeu séria.
— Eu vou matar aquela Estela por toda essa palhaçada!— disse ao
elevar o tom de voz.
— Ei, ei... Calma — disse ao tocar a face da jovem na tentativa de
acalmá-la. — Nós somos as responsáveis por nossos atos, não ela. E violência
não leva ninguém a nada. Agora vamos tentar esquecer esse assunto e viver um
dia por vez.
— Eu não consigo ser tão pacífica quanto você, mas vou tentar me
controlar o suficiente pra não aplicar uns golpes na cara dela — disse Jennifer,
arrancando uma pequena risada da professora. — Você ri, é?
— Sim! Você fica muito engraçada quando está irritada — constatou.
— Eu só não vou retrucar você porque eu não posso me demorar mais
aqui. Estou tentando não dar motivos pra dona Morgana Meireles desconfiar de
mim.
— Que pena, adoraria passar horas com você retrucando — implicou.
Regina inclinou-se para o banco de trás até alcançar a embalagem de presente e a
entregou nas mãos de Jennifer. — Cuidado ao entrar com isso em casa.
— Pode ficar tranquila — respondeu ao segurá-la.
— Já que não posso te deixar em casa... Cuidado na rua, tudo bem? E
me avise assim que chegar.
— Aviso sim.— Meireles depositou um beijo nos lábios de Regina e
desceu.


Era quase onze horas da noite quando Jennifer saiu do banho, vestiu
uma calcinha e uma camiseta básica de pijama e sentou-se sobre sua cama com o
presente que recebera. A loira desfez o grande laço vermelho lentamente ao
mesmo tempo em que pensou em inúmeras opções de itens preenchendo aquele
interior.
Ao abrir, afastou as folhas de seda e arregalou os olhos ao avistar o
conteúdo daquela embalagem.
— Uou...— disse a si própria.
No conteúdo havia um pen drive, uma provocante lingerie preta e um
cartão com a marca vermelha da boca de Regina.
Após analisar a peça íntima, Jennifer pegou o pen drive e o conectou ao
computador. Nele havia apenas um arquivo de áudio e nada mais. Ao por aquele
arquivo para reproduzir, constatou que se tratava da mesma música que Regina
pôs para tocar na primeira vez em que passaram a noite juntas.
Meireles deixou a canção tocando ao fundo, de modo a envolver o
ambiente de seu quarto, e decidiu ligar para a mais velha.
— Alô?— disse Regina ao atender a ligação.
— Você está querendo me matar?— comentou Jennifer prontamente.
— Oh, vejo que já abriu o presente — disse Regina, rindo.
— Meu Deus, Regina... Eu não sei nem o que te dizer.
— Não precisa dizer nada. Leve o tempo que quiser. Quando se sentir à
vontade para usá-la, apenas venha até mim.


Capítulo 23

Ponto de Vista de Jennifer

Após quase uma hora ao telefone com Regina, desligamos. Tanto ela
quanto eu precisávamos dormir para iniciar o dia bem cedo amanhã. Contudo,
quem disse que consegui adormecer tão facilmente após ter recebido aquele
presente? Impossível. Minha mente começou a criar incontáveis situações com
aquela roupa.
Caminhei até o extenso espelho que havia em meu quarto e me olhei
bem próximo a ele por alguns instantes. Analisei cada traço de meu rosto e
também algumas partes do meu corpo. Comecei a questionar-me sobre ser o
suficiente para Regina ou não. Afinal, eu olhava para meu reflexo e via apenas
uma garota comum como qualquer outra.
Voltei para minha cama e resolvi experimentar a maravilhosa lingerie
com a qual ela me presenteara. Após vesti-la peça por peça, incluindo a cinta
liga, caminhei em retorno ao espelho. Chegando lá, soltei meus cabelos e os
observei cair em forma de cascata enquanto eu tornava a me autoanalisar.
Era a primeira vez que vestia algo tão ousado. À primeira vista,
confesso que me senti estranha, desconfortável. Porém, com o passar dos
minutos, comecei a me observar com novos olhos. Aquela roupa acabara me
deixando com uma aparência mais adulta; diria até que mais mulher. Talvez
pela primeira vez eu tenha me dado conta de que realmente havia crescido. Pelo
menos foi dessa forma que me senti. Gostei da imagem refletida. Aquela lingerie
me deu, inclusive, certo poder. E um pouco mais de autoconfiança.
Após muito me observar, comecei a pensar sobre o que passava na
cabeça de Regina enquanto escolhia essa roupa pra mim. Será que ela fantasiou
comigo? Quantas vezes já me imaginara vestida dessa forma? Estas eram
algumas perguntas que pairavam sobre minha cabeça. E devo confessar que tais
pensamentos me excitavam. Me excitava saber que aquela mulher pensava em
mim e me desejava.
Ao sentar novamente sobre a cama, voltei a mexer na embalagem e nas
folhas de sedas que nela havia. Senti que cada mínimo detalhe fora escolhido
minuciosamente por ela. Suspirei ao tomar o cartão com a marca de seus lábios.
Senti-me um pouco confusa. Ao mesmo tempo em que me agradava a
idéia de me vestir tão provocante para ela, esta mesma ideia me despertava
inúmeras inseguranças. Afinal, eu sabia que tudo que vinha de Regina era
intenso, e aquelas peças me davam uma responsabilidade muito grande,
precisaria estar à altura de satisfazê-la e conseguir, também, a minha
satisfação.
Ao mesmo tempo em que Regina deixou seu grande interesse à mostra,
ela também me deixou livre para tomar minha decisão. Não me sinto
diretamente pressionada por sua proposta, mas confesso que pensar em negar
tal pedido desperta em mim um sentimento ruim; como se eu fosse desapontá-la.
Entretanto, conheço Regina o suficiente pra saber que seus sentimentos por mim
são reais, e que ela jamais se sentiria à vontade se soubesse que aceitei algo
pelo simples fato de agradá-la. E também sei que, mesmo se minha resposta for
negativa, nada entre nós irá mudar. Isso me serve de alívio. Dessa maneira
posso pensar sem pressa ou medo da rejeição. — Vamos lá, Jennifer. É apenas
uma lingerie! — pensei comigo.


Ponto de Vista de Regina

— Ao encerrar a ligação, concluí meu chá de todas as noites e me
recolhi em minha cama. Bóris, ao me ver deitar, veio até mim e aninhou-se na
lateral de meu corpo.
— Boa noite, meu amor — disse carinhosamente ao afagar o topo de
sua cabeça.
Apaguei a luminária que havia em cima do criado mudo e relaxei meu
corpo sobre o colchão. Ao fechar os olhos, a imagem da face de Jennifer
sorrindo preencheu meus pensamentos. Em seguida, lembrei do que ela dissera
minutos atrás referente a seu presente.
Espero que Jennifer não se sinta pressionada a nada. A presenteei com
aquelas peças porque a imaginei dentro delas assim que as vi. Me manterei
quieta a respeito. Apenas falarei sobre o assunto quando ela puxá-lo. Torço
para que Meireles saiba o tamanho do meu carinho por ela, e que independente
de sua resposta, saiba que nada irá mudar.
Entretanto, devo admitir que não paro de imaginá-la vestida com o
conjunto de calcinha, espartilho, meias e cinta liga desde o momento em que fiz
a compra.
Oh céus, seria minha morte tê-la vestida assim e completamente a
mercê de minhas vontades. Também me enlouquece a ideia de me imaginar
prendendo uma coleira em seu pescoço. É um sentimento de posse e domínio
muito grande. Eleva meu desejo sexual até o último grau. Eu quero fazê-la
excitar-se ao submeter-se a mim, enquanto eu estiver explodindo de desejo ao
transformar todas as nossas vontades em prazer.
Cada peça foi escolhida com desejo, mas também com carinho. Eu
sinto vontade de me fundir em Jennifer de todas as formas possíveis. Quanto
mais a gosto, mais a desejo. E quero que esse desejo seja sem regras, sem
pudores, sem amarras morais. A quero inteira e desejo me doar na mesma
totalidade.
Quando seguro firme em seus longos fios dourados e a digo todas as
depravações que se passam em minha mente, essa é uma das minhas formas de
dizer o quanto a gosto, o quanto a quero. Eu a seguro com força, assim como a
beijo com a mesma intensidade. E quando lhe digo a grande vontade que estou
de invadi-la, também estou dizendo o tamanho do meu querer por ela.
O meu gostar e o meu desejo caminham lado a lado. O segundo não se
eleva se o primeiro não seguir os mesmos passos.
O relógio de meu celular já marca 1:15 da madrugada e os
pensamentos em Jennifer ainda se fazem presentes. Olho para o lado e encontro
o vazio da cama que poderia estar sendo preenchido por ela. Oh droga! Por que
as coisas precisam ser tão complicadas?


Três dias se passaram. Durante esse curto período de tempo não houve
uma noite em que Jennifer não abrisse a embalagem e analisasse peça por peça
novamente. Estava se tornando um hábito.

— Professora Vianna, posso entrar?— perguntou a loira ao abrir
sutilmente a porta de sua turma.
— Você sabe que horas são, senhorita Meireles?
— Sim. Desculpe o atraso, peguei um engarrafamento inesperado.
— O quê minha aula tem a ver com seu imprevisto?— disse Regina de
maneira seca. — Você sabe que não permito atrasos. Não deveria ter pedido seu
tempo vindo até aqui.
— Mas você sabe que não tenho esse costume. Quantas vezes já me
atrasei para as aulas desde o início do ano? Uma!
— Senhorita Meireles, a mim não importa a quantidade de vezes que
você já se atrasou. Não irá entrar — disse a última frase pausadamente e com
firmeza em sua voz.
— Qual é, Regina! Não acredito que você está fazendo isso comigo. Eu
não posso perder essa aula!— insistiu Jennifer. A essa altura, todos da classe
olhavam com atenção para o bate boca que se iniciara na porta.
— Regina? Não lembro de ter dado a você intimidade o suficiente para
me chamar assim. De toda forma, fim da discussão. Não vai entrar e ponto final.
Agora se me dá licença, senhorita Meireles, preciso continuar minha aula.
Após as últimas palavras da mais velha, Jennifer fechou a porta da sala
com força e saiu pisando firme pelo corredor enquanto alguns alunos olhavam
espantados para a professora Vianna.
— Desculpem a interrupção. Onde paramos?— disse a morena para a
classe.
Beatriz a olhava com um enorme sinal de interrogação povoando sua
mente. O que teria acontecido entre sua amiga e a professora para terem se
comportado de maneira tão agressiva? Futuramente ela esclareceria essa dúvida.


Quando o horário de aula na classe trezentos e nove chegou ao fim,
Regina recolheu seus pertences e se retirou. Ao caminhar pelo corredor avistou
Meireles ao fundo. A loira estava de pé encostada contra uma das paredes.
Seu olhar e o de Jennifer se cruzaram por breves segundos. O pequeno
espaço de tempo foi curto, mas foi o suficiente para que pudesse ver um pouco
de tristeza habitando aquelas órbitas.

— Jennifer! O que aconteceu?— perguntou Beatriz assim que sua
amigou entrou para o segundo tempo de aula. — Que confusão foi aquela?
— A senhorita Vianna é uma babaca. Me impediu de entrar por conta
de um mísero atraso!— disse alto e em bom tom, segundos antes de gesticular
para que sua amiga olhasse para a folha de seu fichário.
Jennifer tirou uma caneta de dentro do estojo e logo em seguida
escreveu um bilhete para Beatriz.

“A discussão foi uma farsa, já estava tudo combinado com a Regina.
Fizemos isso pra tentar desviar a atenção da turma sobre nós.”

“Ah, ok! Vocês quase me mataram de susto! Fiquei sem entender nada!’
Respondeu Beatriz, logo a baixo.

“Desculpe! Esqueci de te avisar.”

— Sua cara não me parece muito boa, Bea. Aconteceu alguma coisa?
Ou tudo isso ainda é efeito do susto?
— Não, não. O susto já passou. Estou assim por conta do que aconteceu
com Kevin.— Beatriz se referia à noite que passara com ele. Ela já havia
comentado com Jennifer todo o ocorrido. — Eu ainda estou muito chateada por
não ter conseguido. E morta de vergonha!
— Não fique assim, Bea. Já se passaram alguns dias. Aposto que Kevin
nem está pensando nisso. Além do mais, não tem que se envergonhar por não ter
conseguido. É super normal! Talvez o nervosismo tenha atrapalhado.
— Sim, eu sei. Acho que foi exatamente isso. Eu simplesmente travei,
fiquei muito tensa e não o deixei fazer nada. Mas, essa noite vamos tentar mais
uma vez.
— Então! Fica tranquila que vai dar tudo certo, ok? E se não der, nada
estará perdido. Vocês terão muitas outras oportunidades de tentar.
— Ok...— disse Beatriz não muito certa.


— Você acha que conseguimos convencer alguém?— perguntou
Jennifer ao entrar no carro da professora. Ela e a mais velha se encontraram no
mesmo local de terça-feira após o término das aulas.
— Talvez não os tenhamos convencido, mas acredito que conseguimos
deixá-los confusos.
— Beatriz eu sei que ficou bastante confusa.
— Sim, ela me olhou de maneira estranha durante toda a aula.— Riu.
— Espero que eles nos esqueçam um pouco. Estela eu acredito não ter
caído nessa, mas o restante da turma, sim — disse Jennifer.
— Eu também espero — respondeu a morena.
— Mudando de assunto... Eu quero te fazer um convite — comentou a
loira com certa empolgação. — Minha mãe vai sair com o noivo hoje e
provavelmente vai chegar bem tarde. Ou seja, não terá ninguém na minha casa
até a o início da madrugada. Sendo assim... Gostaria muito que você fosse pra lá
comigo agora. Quero te mostrar meu canto, minhas coisas e aonde me deito
todas as noites quando penso em você.
— Tão lindo isso que você disse no final — comentou Regina com
doçura em sua voz. — Mas infelizmente não posso aceitar seu convite.—
Suspirou.
— Por quê?— perguntou a loira sem entender. — Seria a ocasião
perfeita!
— Espero que não me compreenda mal, mas eu não me sentiria bem
nessa situação. No dia em que eu for entrar na sua casa, quero que seja da
melhor maneira possível. Quero ser inteiramente bem vinda lá. Não gostaria de
entrar às escondidas, como uma criminosa.
— É importante pra você que seja dessa forma?
— Sim.
— Tudo bem...— respondeu tristemente.
— Me desculpa frustrar você.
— Não, tudo bem, você está certa. É que eu tinha tecido planos durante
todo o dia. Criei um cenário na minha mente com você sentada sobre minha
cama, por exemplo. Eu sou uma boba.
— Ei, você não é uma boba — disse ao segurar o queixo de Jennifer
suavemente. — Foi lindo o motivo do seu convite, de verdade. E nada me faria
mais feliz que aceitá-lo. Mas eu quero fazer as coisas o mais corretas possíveis
entre nós.
— Eu entendo. Fazer o quê? Fica para uma próxima. Vou te fantasiar
por lá por mais um tempo — disse ao esboçar um fraco sorriso.
— Que tal mudarmos um pouco esse cenário triste e aproveitarmos esse
tempo lá em casa? Bóris está com saudades de te ver.
— Apenas Bóris?
— Não, eu também estou cheia de saudades — disse ao acariciar a mão
de Jennifer com a sua.
— Ok, então eu vou enfeitar um pouco a sua casa com minha presença
— brincou, fazendo Regina sorrir.


Assim que Jennifer entrou na casa de Regina, automaticamente se
direcionou para a área de serviço com a mulher e deixou seu par de tênis ao lado
dos saltos da morena. Regina, por sua vez, sorriu ao que vira.
— Não acredito que vou te infectar com minhas loucuras — comentou.
— Não é loucura, é uma condição, e eu não me importo de entrar no seu
ritmo e tornar as coisas mais fáceis pra você — disse suavemente.
— Obrigada por isso — comentou a mais velha ao sorrir.
— Onde está Bóris?
— Provavelmente dormindo em algum lugar. Apenas por esse motivo
ele não me recebe na porta — explicou. — Você já está com fome? Pensei em
pedir uma pizza pra nós hoje. Já é sexta-feira à noite, então está permitido.—
Riu.
— Ah é? Então quer dizer que durante a semana não se pode comer
pizzas na casa da senhorita Vianna?
— Claro que pode, mas eu procuro evitar besteiras durante a semana. E
convenhamos, se torna muito mais prazeroso comer apenas de vez em quando.
Todo dia, ou com muita frequência, enjoa.
— Hum... Não sei se concordo. Eu tenho vontade de provar todos os
dias as coisas que gosto.
— Jennifer!— exclamou ao notar malícia no que a jovem acabara de
dizer.
— O quê? Eu só disse a verdade — comentou ao dar de ombros. — Eu
acabei de ter uma idéia. Você sabe fazer pizza? A massa? Poderíamos fazê-la
juntas. O que acha? Adoraria ter esse momento na cozinha com você.
— Você está falando com uma filha de italiana, esqueceu?
— Uuui, rainha da gastronomia! Não está mais aqui quem perguntou!—
brincou, arrancando um largo sorriso da mais velha.
— Eu achei a ideia maravilhosa! Por sorte tenho os ingredientes em
casa.
Ao entrarem na cozinha, Regina e Jennifer fizeram a separação de todos
os ingredientes necessários para a produção da massa e do recheio e os
depositaram de maneira ordenada sobre o balcão.
Certo tempo depois, quando o disco de pizza já estava pronto, se
puseram a trabalhar sobre os ingredientes que usariam para cobri-la.
— Vamos fazer meio a meio?— perguntou Jennifer.
— Acho uma boa idéia — respondeu Regina. — Você gosta da
margherita?
— Sim!
— Certo! Então posso fazer uma metade desse sabor?
Jennifer assentiu positivamente, e enquanto Regina trabalhava em um
lado, ela começou a rechear o outro.
— Que raio de sabor é esse que você está fazendo, Jennifer?—
perguntou, certo tempo depois, ao observar a loira preencher a pizza com uma
vasta variedade de ingredientes.
— Não sei. Um misto de ingredientes que acho gostosos — respondeu
ao olhar para Regina.
A metade produzida pela jovem estava composta de maneira não
harmoniosa por ingredientes que não possuíam quaisquer ligações.
— Oh céus!— disse Regina ao rir e balançar a cabeça negativamente.
— O quê? Vai criticar minha obra de arte? Olha lá, hein, Regina. Não
deixarei você comer um pedaço que seja do meu lado.
— E quem disse que eu vou querer comer isso?— implicou, contendo-
se para segurar o riso. — Essa sua obra de arte parece que foi atropelada quando
ainda estava fresca.
— A aparência pode não estar muito boa, eu confesso. Mas o que vale é
o sabor, ok? — retrucou ao entortar a cara.
Regina parou o que estava fazendo, virou seu corpo de frente para o da
loira e aproximou-se.
— Pois saiba você que um alimento bem apresentável é fundamental. E
que a degustação começa a ser feita pelos olhos.
— Hum... Isso você sabe fazer muito bem, não sabe?— perguntou ao
fixar seu olhar nos castanhos que a encaravam.
— Comer com os olhos?— perguntou com seriedade na voz ao alternar
o olhar entre as esmeraldas da jovem.
— Sim — afirmou enquanto encarava toda aquela energia que vinha
dos olhos de Regina.
— Sei — respondeu ao dar um passo adiante e encostar seu corpo no de
Jennifer. — Mas não é apenas com os olhos que eu sei fazer isso — murmurou,
fazendo a loira esbarrar a mão e derrubar um recipiente que continha tomate
picado em cubos.
— Oh, droga!— resmungou a mais nova ao agachar-se para recolher.
Regina retomou seu lugar aos risos, sentindo-se vitoriosa pelo êxito em
deixá-la nervosa.
— Já posso levar ao forno ou falta algo mais na sua obra?
— Eu quero ver se vai continuar me zoando quando provar a gostosura
que isso vai ficar — retrucou enquanto terminava de limpar o chão que sujara.
— Mas, sim. Já terminei.
Após levar a pizza ao forno, Regina e Jennifer recolheram-se para o
escritório da mais velha enquanto aguardavam os minutos necessários.
— Eu adoro essa nossa foto — disse ao mostrar à Regina uma das
poucas fotos delas juntas que estava na galeria de seu celular.
— Eu não a tenho — comentou ao segurar o aparelho da loira em mãos.
— Na verdade eu não tenho nenhuma dessas fotos — constatou ao conferir o
restante.
As fotos eram todas referentes ao final de semana que passaram juntas
no Resort.
— Então vou descarregá-las no seu notebook. Posso?
— Claro, Jen. Enquanto você faz isso eu vou procurar Bóris.
— Ok.
Jennifer sentou-se, ligou o notebook, conectou seu celular e iniciou a
transferência de arquivos. Enquanto as fotos eram passadas, levantou-se,
caminhou até as estantes de livros e começou a percorrer o olhar pela pequena
biblioteca particular da professora.
— Olha quem eu encontrei dormindo no banheiro — disse Regina ao
retornar com Bóris no colo. — Estava enroladinho dentro da pia.
— Own... Ele ainda está todo mole de sono — comentou a loira,
docemente, ao segurá-lo nos braços. — Me empresta seu celular? Quero tirar
uma foto com essa bola gostosa de pelos!
Meireles segurou o aparelho de Regina, abriu a câmera frontal e
começou a tirar algumas sequências de fotos. Regina, ao vê-los juntos,
desmanchou-se. Ela achava de uma graciosidade tamanha a maneira como
Meireles se comportava com seu gato.
— Será que as fotos já transferiram?— perguntou ao sentar-se em frente
o notebook e constatar que sim.
Regina convidou a loira a tomar um lugar a seu lado e, juntas,
começaram a ver cada uma daquelas fotografias. Bóris, que permaneceu no colo
de Jennifer, também participou do momento.
— Não acredito que você me fotografou enquanto eu estava distraída!
— disse a mais velha ao abrir uma imagem onde ela estava se maquiando para o
coquetel.
— Pois saiba você que fiz isso muitas vezes! São as melhores fotos que
tenho. Adoro te observar quando você não está olhando.
— Posso saber por quê, Jennifer Meireles?— perguntou ao erguer uma
de suas sobrancelhas.
— Porque é o seu eu mais natural — respondeu ao sorrir.
— Essa daqui ficou linda!— disse Regina, referindo-se a uma foto dela
com Jennifer em frente ao espelho.
— E o quê você me diz dessa?— Meireles abriu a foto de um momento
onde ela e a professora trocavam um beijo.
— Em que momento foi tirada? Não me recordo dela — perguntou
Regina, confusa, ao mesmo tempo em que admirava a fotografia.
— Quando estávamos bebendo vinho na cozinha. Foi minutos após...
É... Você sabe.
— Verdade... Acho que estou me lembrando de você pegando o celular
sobre a bancada pra nos fotografar.
— Aquela noite foi tão boa. Senti tantas coisas novas.
— Foi boa pra mim também, além de muito especial — comentou a
mais velha. — A noite que se sucedeu também foi maravilhosa. Queria muito
poder dormir com você novamente.
— Eu também — disse a loira com suavidade na voz. — A pizza
começou a cheirar!— Jennifer alarmou. — Vou correr pra dar uma olhada.
— Ok!

Regina permaneceu por um tempo admirando as fotos. E quando
percebeu que Meireles estava demorando demais, chegou à conclusão de que a
pizza já havia ficado pronta. Sendo assim, deixou o escritório e caminhou em
direção à cozinha.
Conforme foi se aproximando do lugar, ouviu um som de música
acompanhado da voz de Jennifer. Ao encostar na porta, avistou-a dançando e
cantando a canção que tocava na rádio enquanto cortava a pizza para elas.
Quando Jennifer deu-se conta da presença de Regina, deixou a pizza de
lado e andou em direção à mulher com um sorriso travesso nos lábios. A loira
envolveu a mais velha pelo pescoço e voltou a cantar enquanto mexia seu corpo
para ela no ritmo da canção.

— Suddenly, I’m a fiend and you are all I need, all I need — cantou
Jennifer.

— Eu também sou uma viciada em você, sabia?— comentou Regina ao
colocar o cabelo de Jennifer para o lado e murmurar contra seu ouvido.
A mais nova sorriu ao comentário e continuou a dançar. Aos poucos foi
sentindo o corpo da professora se mexendo de acordo com o seu, e quando
menos esperou, estavam envolvidas naquela melodia.
Meireles ajeitou os cabelos de Regina para trás das orelhas de modo a
poder enxergar o rosto da mulher com mais clareza e totalidade. Feito isso,
encarou-a nos olhos e cantou o refrão sem deixar o olhar cair.
Regina segurou a cintura de Jennifer com uma de suas mãos e usou a
outra para tocar sua face com carinho. Sem quebrar a conexão de olhares entre
elas, Regina também começou a cantar. Ela cantou a frase daquele refrão
enquanto mergulhava naquele par de olhos tão oceânico.
Quando Regina cantou, Jennifer sentiu algo diferente naquelas
palavras. Ela sentiu como se a mulher à sua frente não a tivesse cantado de
maneira solta e despretensiosa, não. Ela sentiu veracidade; a mesma usada por
ela quando a cantou para Regina.
— Você consegue sentir isso?— perguntou Jennifer, referindo-se à
prazerosa atmosfera na qual estavam envolvidas.
— Consigo. Tem outra coisa que também estou conseguindo sentir.
— O quê?
— Seu coração batendo de maneira acelerada contra meu peito —
respondeu. — Você está nervosa?
— Um pouco — afirmou Jennifer. A jovem começou a sentir o ar
deixando seus pulmões. Não era a primeira vez que a morena a fazia sentir-se
dessa forma; no entanto, havia algo mais. Algo que não estava lá das outras
vezes.
— Por que está nervosa? Sou eu... — disse de maneira suave.
— É justamente por ser você.— Jennifer a respondeu. Logo em seguida
a música chegou ao fim, mas o diálogo permaneceu.
— É um nervosismo ruim?
— Não, mas é diferente. Eu não conseguiria explicar, vamos deixar pra
lá.
— Por que você não tenta, hum? Eu adoraria te ouvir.— Regina
segurou a mão de Jennifer e a apoiou próxima a seu peito.
— Ai Regina, eu não consigo por em palavras. Mas é que... Você me
desperta tantas coisas, e é tudo tão intenso. Eu nunca senti isso antes. É um
montante de sensações e sentimentos que estão levando meu ar. Não está
cabendo dentro de mim.
— Se não está cabendo aí, então por que não despeja sobre mim? Eu
estou aqui toda pra você.
Jennifer não conseguiu dizer palavra alguma. Apenas tomou Regina
lentamente pela cintura, a envolveu e pressionou os lábios contra os dela,
provando cada deliciosa sensação que a boca da mulher podia oferecer.
— Apaixonada pelo jeito que eu me movo, é?— sussurrou Jennifer
entre o beijo, desviando o assunto, referindo-se sobre a música de há pouco.
— Oh, sim. Completamente apaixonada — murmurou em resposta ao
guiar o corpo da loira com o seu até que o quadril de Jennifer se chocasse contra
a bancada da cozinha, as fazendo parar.
— Ai meu Deus, vamos derrubar a pizza — comentou a loira, rindo, ao
depositar as mãos para trás e tatear a superfície da bancada.
— Eu não me importo com ela agora — disse ao descer as mãos para o
botão da calça jeans que a jovem usava. — Eu me importo com outra coisa —
comentou ao abrir o botão e esboçar um sorriso sacana.
— Regina, a pizza vai esfriar... — disse com a voz arrastada. — Vamos
parar.
— Por que parar?— Regina beijou o pescoço de Jennifer e abriu o zíper
da calça.
— Porque agora não é o momento — respondeu. Meireles já estava
ficando ofegante com os beijos recebidos em seu pescoço.
— Sempre é o momento — murmurou ao deslizar uma das mãos
lentamente para dentro da calça. — Basta querermos.
Jennifer conteve-se para não soltar um gemido ao sentir a mão da
morena encostando em seu sexo por cima da calcinha. Por mais que ela quisesse
se entregar à Regina ali e agora, ela não o faria. A intenção de Jennifer era
apenas provocá-la.
— Não, Regina. Agora não — disse ao tentar desvencilhar-se das
prazerosas carícias da mulher.
— Agora sim, vamos...— A mais velha pressionou o dedo do meio
contra a intimidade de Jennifer e começou a movimentá-lo de modo a excitá-la.
Ela o deslizava para cima e para baixo por cima da calcinha.
A loira tentava, com muita dificuldade, fingir indiferença, mas parecia
inútil. Os movimentos que a professora fazia com a mão dentro de sua calça era
demasiadamente bom.
— Estou com tanta vontade de foder você agora — provocou, fazendo
intensos movimentos circulares no ponto sensível de Jennifer.
Meireles afastou sutilmente as pernas para que Regina conseguisse um
contato maior e levou a mão até a nuca da morena, arranhando-a levemente para
instigá-la ainda mais.
— Adoro quando você me arranha assim — disse Regina com
rouquidão em sua voz.
A calça de Jennifer estava apertava; o que dificultava as ações da mais
velha. Entretanto, essa mesma dificuldade servia de estímulo para ela.
— Regina...— A voz da mais nova saiu ofegante quando sentiu os
dedos da morena entrarem em contato direto com seu sexo.
Regina começou a movimentar seus dedos na região externa da
intimidade de Jennifer enquanto os sentia molhar. Ela os deslizava lentamente
para cima e em seguida fazia o caminho contrário.
Meireles permitiu que Regina brincasse entre suas pernas por um
pequeno espaço de tempo. Tempo o suficiente para fazer a mulher desejar um
contato ainda maior. Porém, quando a mais velha tentou deslizar um dedo para
dentro, foi interrompida pela mão da jovem a impedindo.
— Chega! Vamos comer a pizza — disse, segundos antes de tirar a mão
de Regina e virar-se de frente para a bancada.
— Sério que você vai fazer isso comigo, Jennifer?— comentou,
ofegante, ao jogar os cabelos para trás.
Jennifer, de costas, terminava de cortar a pizza ao mesmo tempo em que
esboçava um sorriso de vitória.


— Abre a boca pra você experimentar — disse Jennifer ao levar o garfo
com um pedaço de pizza até a boca de Regina. Ela e a mais velha já estavam à
mesa iniciando a refeição.
— Hum... Até que não está ruim.
— Viu? E você pré julgando!
— Mas eu também não disse que está bom!— implicou. — Qual sabor
você dará a ela?
— Não sei, não há definição — respondeu Jennifer.
— Mas você precisa nomear essa obra única e exclusivamente sua —
brincou a mais velha. — Que tal chamá-la de Meireles? Já pensou se fica
famosa? Alô, uma pizza família sabor Jennifer Meireles sem cebola, por favor.
— Como você é boba, Regina!— comentou aos risos, depositando uma
leve tapa nos ombros da morena. — Nem de longe você parece ser a mesma
Regina Vianna professora de história. No trabalho você é tão séria!
— Eu preciso ser. É uma forma de impor mais respeito. Sem mencionar
o fato de que poucas pessoas conseguem me fazer sentir à vontade o suficiente
para ser eu mesma — respondeu. — Mas e então? Já decidiu o nome?
— Você está falando sério?— indagou Jennifer.
— Claro que estou! Esse sabor exclusivo precisa receber um nome —
disse a morena em tom de brincadeira.
— Okay! Okay!— exclamou Jennifer. — Você já assistiu ao programa
de TV, Chaves?
— Sim. O quê tem?
— Lembra daquele desenho indecifrável que o próprio Chaves
desenhou e o nomeou de Chinforinfola? Pois então! Será esse o nome da minha
pizza.
— Eu não estou ouvindo isso, Jennifer!— disse Regina aos risos. — Eu
nunca mais vou assistir a esse episódio sem lembrar de você — comentou. —
Aliás, nunca mais farei muitas coisas sem lembrar de você. Inclusive, pizzas.—
Sorriu.
Alguns minutos depois, quando haviam terminado de lanchar em meio a
risos, conversas e carícias, ambas subiram para o quarto de Regina à procura de
um momento mais aconchegante e relaxado antes de Jennifer precisar ir para
casa.

— Eu não consigo esquecer a história da pizza — comentou Regina
enquanto ligava a função rádio da televisão; deixando em volume baixo para que
as melodias envolvessem o ambiente de maneira sutil.
— Eu não consigo esquecer outra coisa — disse Jennifer, prontamente,
ao observar Regina andando pelo quarto. A jovem estava sentada completamente
à vontade na poltrona.
— O quê?— perguntou a morena ao aproximar-se.
— O presente que você me deu essa semana.
Regina aproximou-se da poltrona e parou em frente a loira.
— O que tem pensado a respeito?
— Muitas coisas. Confesso que já sonhei comigo usando aquela roupa
pra você.
— E como foi o sonho?— perguntou ao sentar-se de lado sobre uma das
coxas de Jennifer.
— Não vou dizer. Prefiro que fique na curiosidade.
— Não acredito que você vai fazer isso comigo!— reclamou. Regina
saiu do colo da jovem, caminhou até a cama, sentou-se na beirada e começou a
deslizar sua meia calça preta para baixo enquanto conversava com ela. — Agora
serei obrigada a imaginar você a usando pelo resto do dia.
— O que não será ruim. Não é?— Riu. A loira observava atentamente
Regina deslizar a meia calça para baixo. — Você fica tão linda com essas roupas
sociais. Chega a ser um fetiche pra mim.
— Ah é?— disse ao erguer uma de suas sobrancelhas. — Então eu devo
concluir que em todas as nossas aulas juntas você fica fantasiando comigo —
comentou ao caminhar a passos lentos em retorno à Jennifer.
— Você pode apostar que sim. Se torna bem difícil manter a
concentração na matéria quando se tem você como professora, sabia? Não sei
como consigo manter minhas notas elevadas — disse Jennifer em tom de
brincadeira. A loira aproveitou a proximidade de Regina e a olhou de cima a
baixo.
— O quê você tanto olha?— perguntou, fingindo inocência.
— O quão gostosa você é — respondeu ao esboçar um sorriso cafajeste.
Regina depositou o pé entre os seios de Jennifer e esboçou uma
expressão de superioridade.
— Mais respeito ao falar com sua professora — brincou.
— Respeito é a última coisa que me vem à cabeça — respondeu ao
observar a perna da mulher que estava erguida.
— Você é muito abusada — disse Regina ao pressionar o pé contra o
peitoral de Jennifer.
— E você se torna ainda mais desejável ao me pisar assim. Adoro ser
usada por você.
Regina esboçou um sorriso sacana e pressionou o pé com força, fazendo
o corpo de Jennifer inclinar para trás e as costas se chocarem contra as costas da
poltrona. Em seguida, montou no colo da jovem com os joelhos dobrados e uma
perna para cada lado.
— Adora ser usada por mim, senhorita Meireles?— murmurou ao
depositar uma das mãos por dentro da gola da camisa da jovem.
— Muito. Mas hoje quem será usada vai ser você — afirmou ao
depositar as duas mãos sobre as coxas de Regina. — E a melhor parte é que você
irá gostar — murmurou ao deslizar as mãos por dentro da saia da mulher.
— Com quem você está aprendendo essas coisas?— comentou ao sentir
as mãos de Jennifer subindo pela região interna de suas coxas.
Meireles sorriu ao comentário e começou a massagear o sexo de Regina
por cima da calcinha com uma das mãos, enquanto usou a outra para apertar a
bunda da mulher, arrancando dela baixos gemidos abafados.
Regina abriu os botões da própria camisa, mas não a tirou. Ela deu à
Jennifer a visão de seus seios preenchendo um delicado sutiã branco. A loira, por
sua vez, depositou o rosto entre eles e começou a alternar entre beijos e leves
chupadas nas regiões que estavam parcialmente expostas.
Região olhou para baixo e notou que algumas marcas vermelhas
estavam sendo deixadas em seus seios. Esse fato foi o suficiente para deixá-la
ainda mais excitada. Sendo assim, segurou os cabelos de Jennifer e pressionou o
rosto da jovem ainda mais contra seus seios em um gesto de oferecimento.
Sem deixar de massagear a intimidade de Regina, Jennifer deslizou a
outra mão para cima e puxou a parte de bojo do sutiã para o lado, deixando um
dos mamilos de Regina à mostra e ao alcance de sua boca. Jennifer o lambeu e o
chupou até que ficasse enrijecido em sua boca.
— Você gosta quando me sirvo de você dessa forma?— murmurou
Jennifer, recebendo como resposta apenas um aceno positivo de cabeça. —
Gosta de me sentir chupando você?— provocou.
— Sim...— Regina livrou-se da camisa que cobria parcialmente seu
corpo enquanto sentia Jennifer abrindo seu sutiã e o jogando no chão. Agora ela
estava sentada no colo da jovem apenas com a veste de baixo.
Jennifer deliciou-se com a imagem dos seios nus e posteriormente
começou a apertar um deles com força enquanto chupava o outro. A jovem
alternava entre circundar a língua e dar leves mordidas.
Regina agarrou os cabelos da mais nova com força e começou a rebolar
em seu colo enquanto sentia a boca quente, macia e úmida da garota brincando
em seus seios. A loira sugava com tanta intensidade, que Regina sentia como se
estivesse sendo devorada. E ela adorava essa sensação. Adorava a intensidade
que emanava entre elas; seja esta física ou sentimental.
— Quero sentir você entre minhas pernas — pediu Regina contra o
ouvido de Jennifer.
— Entrando e saindo de você?— Jennifer instigou.
— Sim, entrando e saindo — murmurou.
Jennifer afastou a calcinha de Regina para o lado e iniciou lentos
movimentos no sexo da mulher de modo a excitá-la ainda mais. Ela subia e
descia o dedo por toda a região molhada enquanto a sentia rebolar sobre seu
colo.
Regina liberou alguns gemidos ao sentir o dedo da loira começando a
penetrá-la. Gemidos esses, que fizeram o desejo de Jennifer aumentar.
— Adoro ouvir a mudança da sua voz quando estamos assim. Ela fica
rouca e ao mesmo tempo tão manhosa — comentou Jennifer.
A loira penetrou Regina devagar, curvando seu dedo de maneira lenta
para que a mais velha pudesse senti-lo lhe invadido desde o princípio.
Regina rebolava para frente e para trás acompanhando o ritmo dos
movimentos de Jennifer quando foi surpreendida pelos braços fortes da jovem a
segurando pela bunda e suspendendo.
Meireles levantou-se com a professora em seu colo e a fez cruzar as
pernas em sua cintura.
— Eu tenho força o suficiente pra te manter suspensa — comentou. —
Agora me diz... Você quer na cama ou de pé?— perguntou ao beijar o pescoço
de Regina, que surpreendeu-se com a atitude e força da mais nova.
— Benditos sejam seus treinos de boxe — comentou, fazendo-a sorrir.
— Eu quero de pé. Quero que me mostre sua força.
Sem dizer uma palavra, Meireles caminhou com Regina no colo até a
parede mais próxima e fez as costas da professora se chocarem contra ela. Feito
isso, mergulhou a mão para dentro da saia e foi de encontro ao sexo quente que a
esperava.
Regina envolveu o pescoço alvo e alternou entre arranhadas na nuca e
puxões nos cabelos enquanto a sentia lhe invadindo com dois dedos. Meireles
penetrava com força e rapidez, fazendo o corpo de Regina subir e descer, além
de chocar-se constantemente contra a fria parede.
— Você está tão gostosa, tão entregue...— Jennifer sussurrou. —
Vamos ver se você não sacia.— A loira imobilizou as mãos de Regina acima da
cabeça da mulher, contra a parede, e pressionou seu corpo contra o dela de modo
a deixá-la ainda mais presa naquela posição.
Regina estava tão excitada, que Jennifer conseguia entrar e sair com
facilidade. A morena não tinha lembrança da última vez que desejou alguém da
mesma forma que desejava Jennifer. Ela nunca havia sentido tanta necessidade
de sentir alguém lhe invadido tão a fundo.
— Jennifer, não para. Mais forte!— pediu. E assim Jennifer o fez.
A jovem curvou seus dedos com mais força e ainda mais fundo,
sentindo as paredes de Regina se pressionarem contra seus dedos de uma
maneira enlouquecedora.
— Porra Regina, você é muito gostosa — dizia ao penetrá-la de maneira
incessante, sem permitir que a professora descesse de seu colo.
A mais velha se livrou da mão que prendia seus braços contra a parede e
agarrou-se em Jennifer para se equilibrar. Seus gemidos eram altos e constantes.
Ela muito gostava de obter o domínio no sexo, mas, sentir-se naquela posição
também estava sendo deliciosamente prazeroso.
— É tão gostoso foder você, Regina. E eu vou fazer isso até você
esquecer seu nome.— Jennifer afastou a mulher da parede e a jogou de maneira
brusca contra a cama; abrindo suas pernas e posicionando-se entre elas logo em
seguida. — Meus dedos estão loucos por te provar, e eles não têm a menor
intenção de parar.— Meireles voltou a entrar em Regina sem cerimônia,
deliciando-se com a umidade da mulher molhando seus dedos.
— Que delícia...— gemeu Regina.
A morena buscou a face de Jennifer e observou o quão vermelha e
suada ela estava. A jovem se movia com força em um ritmo intenso e prazeroso.
Regina precisou fincar as unhas nas costas de Jennifer, por dentro da blusa, para
conseguir conter o tamanho do prazer que estava sentindo. Meireles ia cada vez
mais longe, a fazendo quase delirar de prazer. Naquele instante, ambas se
sentiam inteiramente conectadas.
— Você gosta de ser vadia, Regina Vianna?— murmurou ao encostar
os lábios contra o ouvido dela. — Então seja uma vadia bem gostosa e senta no
meu rosto.
Regina sentiu sua intimidade contrair intensamente às palavras de
Jennifer. Ela começou a questionar-se sobre a origem dos ingredientes que
estavam na pizza. Certamente havia algo muito afrodisíaco ali.
Sem cerimônias, a mais velha deslizou a calcinha por entre as pernas,
subiu sutilmente a saia e sentou com as pernas abertas sobre o rosto de Jennifer,
oferecendo-se. A morena apoiou as mãos sobre a cabeceira da cama e começou a
mexer o quadril lentamente enquanto sentia os lábios e a língua da loira em sua
intimidade.
— Eu não vou conseguir segurar por muito mais tempo — disse com a
voz ofegante.
Jennifer segurou as coxas da mulher com força e chupou aquele sexo
encharcado com ainda mais intensidade, fazendo a mais velha soltar uma rápida
sequência de gemidos segundos antes de estremecer sobre seus lábios.
— O quê deu em você?— disse Regina, ofegante, ao deitar-se ao lado
dela. — Estou sem forças — comentou ao sentir as pernas trêmulas.
Jennifer sorriu e virou de lado, depositando metade do corpo sobre o da
professora.
— O de sempre... Vontade de você — respondeu, segundos antes de
pressionar os lábios contra os de Regina. — Sem contar que da última vez em
que estivemos juntas, seu alarme me deixou na vontade. Desde então, estive
louca pra te tocar.
— Oh, está explicado!— Riu.
— Por falar em alarme... Que horas são?
— Não sei. Você já precisa ir?— perguntou com pesar em sua voz.
— Eu não posso correr o risco da dona Morgana Meireles chegar mais
cedo e não me pegar em casa — comentou enquanto acariciava os cabelos de
Regina úmidos de suor. — Eu adoraria ficar mais, você sabe. Ficaria a noite
inteira ao seu lado se pudesse.
— Mas eu ainda nem brinquei com você.
— Dessa vez você ficará na vontade.
— Isso é um perigo. Não me deixa assim, que eu fico insana.
— Ótimo! Vou adorar cair nos seus braços quando estiver assim —
piscou. — Mas agora realmente é melhor eu me preparar pra ir.
— Posso levar você em casa?— perguntou ao tocar a mão de Jennifer.
— Acho que hoje não tem perigo.
Após alguns beijos, as duas mulheres levantaram-se da cama e se
arrumaram para partir. Ao chegarem ao andar de baixo, Regina lembrou
Meireles de pegar o celular que estava no escritório e a alertou sobre aquelas
fotos ainda estarem em seu celular. Jennifer, por sua vez, respondeu que faria a
transferência para o computador ainda naquele final de semana.
Regina estacionou o carro em uma rua próxima à casa de Jennifer e
desceu do veículo junto com a jovem. Jennifer havia lhe feito esse pedido ao
perceber o quão estrelada estava aquela noite.
— Você acha que o universo seria capaz de nos separar?— perguntou a
loira ao encostar-se no carro e olhar para o céu.
— Não. O universo sempre quer unir o que se pertence — respondeu
Regina ao, também, olhar para o céu. — Apenas nós mesmas temos a
capacidade de fazer isso.
— Eu tenho medo, Regina. O que temos é bom demais e parece que
será destruído a qualquer momento.
— Você tem coragem o suficiente pra não me soltar?— perguntou. A
morena começou a sentir um pressentimento ruim, mas decidiu omitir de
Jennifer para não preocupá-la.
— Eu soltaria você apenas se eu percebesse ter me tornado um peso. Eu
morreria se atrapalhasse sua vida.
— Não fala dessa maneira, por favor.— disse ao se posicionar de frente
para a loira. — Você nunca será um peso pra mim, minha menina.
Regina pronunciou o ‘menina’ de uma forma tão carinhosa e emotiva,
que Jennifer não importou-se em ser chamada daquela maneira.
— Você está chorando?— perguntou suavemente ao perceber que os
olhos da professora estavam marejados.
Regina olhou para baixo e tentou disfarçar o impacto que as palavras de
Jennifer lhe causaram. Pela primeira vez ela sentiu o gosto amargo da possível
ausência da jovem em sua vida.
— Não — respondeu séria.
— Acredito conhecer você o suficiente pra saber que está mentindo —
disse Jennifer. A loira segurou o queixo de Regina, mas não ousou levantar o
rosto da mulher. Deu liberdade para que a mesma o fizesse sozinha. — Eu gosto
de você, Regina. Gosto muito. Mais do que imaginei que fosse gostar. E esse
sentimento é tão imenso, tão universo, que me dói imaginar que um dia isso
possa ser quebrado. E o pior, que seja quebrado por você ou por mim. Mas eu te
gosto o suficiente para me quebrar em mil pedaços antes de fazer mal a você.—
A voz de Jennifer saiu cortada. Dessa vez era ela quem possuía lágrimas nos
olhos.
— Acho que nos envolvemos além do esperado — disse ao tocar a face
de Jennifer com suavidade.
— Isso é ruim?— perguntou ao encarar os olhos castanhos.
— Não, é maravilhoso. Pelo menos pra mim, sim. Te gostar é muito
bom — respondeu ao acariciar aquela pele macia. — Mas agora podemos deixar
essa conversa tensa de lado e observar esse céu lindo que nos banha?—
perguntou com suavidade na voz. Regina lutava pra ignorar a angústia que se
instalara em seu peito.
— Ok, podemos!— disse ao envolver a cintura de Regina e unir a
lateral do corpo à lateral do corpo da mulher. — Domingo eu vou participar de
outro campeonato de boxe. Você poderia ir me assistir? Beatriz e minha mãe
estarão lá, mas podemos dar um jeito pra que minha mãe não descubra quem
você é.
— Outro campeonato? Jennifer, isso é maravilhoso! Por que não me
contou antes?— disse com empolgação.
— Eu quis te fazer surpresa!— Sorriu. — Você poderá ir? Será no
mesmo lugar que o anterior.
— Claro, Jennifer. Eu cancelaria qualquer compromisso pra ir prestigiá-
la.
— Obrigada! Sua presença será importante pra mim — disse ao tocar a
mão da morena com a sua. — Minha mãe não sabe quem é você, então não
precisamos nos preocupar. Ao final do campeonato eu dou um jeito de despistá-
la pra que possamos nos falar. E quanto à Beatriz, bom, ela sabe sobre nós e é de
confiança. Então está tudo certo.
— Eu não irei me aproximar de você até que me diga estar seguro, tudo
bem?— comentou a mais velha, recebendo um aceno positivo de Jennifer como
resposta. — Estou muito feliz com esse convite. Ficarei ansiosa até domingo!
— Precisamos conseguir um tempo pra que eu te ensine algumas coisas.
Aposto que deve ser bem legal ver você aplicando alguns golpes.— Sorriu.
— Ah, deve sim, e como deve. Deve ser um desastre, Jennifer! Isso sim
— disse, compartilhando uma risada com a loira.
— Regina Vianna com uniforme de boxe executando alguns
movimentos? Sem chance de ser um desastre, minha cara!— comentou ao
expressar uma pequena risada. — Bom, agora eu preciso ir. Obrigada pelas
horas que passamos juntas.
— É um prazer ter sua companhia — respondeu Regina, alguns
instantes antes de depositar um beijo carinhoso na testa da loira. — Cuide-se,
Jen. — disse ao acariciar a face da jovem mais uma vez. Um pressentimento
ruim ainda habitava seu peito.
Regina entrou no carro e dirigiu em velocidade baixa para que pudesse
acompanhar os passos de Jennifer pela rua. Ela foi embora apenas quando
certificou-se que Meireles havia cruzado a porta de casa.


Jennifer passou todo o dia de sábado se preparando para a competição
de domingo. Ela mudou a alimentação, fez caminhadas e correu no quarteirão de
seu bairro. A mente da jovem estava a mil por hora. Além da preocupação com o
campeonato, havia toda a adrenalina de saber que Regina e sua mãe estariam
juntas no mesmo local pela primeira vez.

Ao contrário de Jennifer, que estava tendo um sábado super agitado, o
de Regina seguia na mais perfeita calmaria. Ela dedicou todo o dia para fazer o
planejamento de suas aulas de história e corrigir um amontoado de trabalhos.
Regina também aproveitou o sábado para assistir algumas palestras online pelo
computador.
Contudo, mesmo preenchendo seu dia de atividades, não conseguia
livrar-se do peso que habitava seu peito. Ela sentia como se a qualquer momento
fosse ser noticiada de algum acontecimento ruim.

Quando o domingo finalmente chegara, trazendo consigo um dia
ensolarado e de calor, Meireles levantou da cama aos cantos. A loira exalava
alegria e vitalidade. Após dar bom dia à Morgana e Diogo, que dormira em sua
casa noite passada, os acompanhou no café da manhã.
— Animada para hoje, Jennifer?— perguntou o homem. Ele, Meireles e
Morgana estavam sentados juntos à mesa.
— Estou a todo vapor!
— É isso aí, garota!— disse Diogo ao estalar a mão contra a de
Jennifer. — Já sente o gosto da vitória? Sua mãe me disse que você nunca
perdeu uma luta!
— E é verdade. Mas não, não sinto o gosto da vitória. Não consigo ser
convencida. Tenho total consciência que posso ser superada a qualquer
momento. Eu sou boa, mas sei que tem muita gente tão boa quanto ou mais que
eu por aí.
— Humildade é tudo, filha — comentou Morgana com orgulho.
— Você também vai estar lá me prestigiando?— perguntou a Diogo.
— Com certeza! Não posso perder — respondeu com empolgação.
— Ótimo! O campeonato será mais cedo dessa vez, então deixa eu ir me
adiantando pra não me atrasar.
Jennifer retirou-se da mesa e subiu para o quarto. Chegando lá, checou
o celular e constatou que havia uma mensagem de Regina.

Bom dia! Ansiosa pra ver minha menina de ouro brilhar.

Bom dia, Regina. Não sei se irei brilhar. Mas, meus olhos sim, ao te
avistarem. Até mais tarde. Beijos!

Antes de se direcionar para o banho, lembrou que precisava descarregar
em seu computador as fotos com Regina. Sendo assim, ligou o dispositivo,
conectou o celular e deixou as fotos sendo transferidas enquanto tomava banho.


— Eu tenho um sobrinho que iria adorar assistir a luta. Ele é fascinado
por boxe!
— O Eduardo?— perguntou Morgana.
— Ele mesmo! Atualmente está com dez anos, mas já pediu pra mãe
colocá-lo no boxe. Ele também gosta bastante de Jiu Jitsu — disse Diogo.
— Convida ele pra ir conosco! Primeiro deixa eu perguntar à Jennifer se
ela ainda tem algum convite ou ingresso com ela, ou se ainda terá disponível na
bilheteria. Já volto!
Morgana deixou a mesa da cozinha e subiu para o quarto da filha.
— Jennifer?— chamou ao bater na porta. — Jennifer? Filha?—
continuou a chamar.
Sem obter resposta, girou a maçaneta e entrou. Ao adentrar no cômodo,
a mãe de Meireles notou que a porta que dava acesso ao banheiro estava
fechada, e escutou o barulho do chuveiro aberto. Logo, constatando que Jennifer
estava no banho.
Morgana sentou-se sobre a cama da jovem e começou a vagar seu olhar
de maneira despretensiosa pelo quarto enquanto aguardava. Visto que a loira
estava demorando e que o computador estava ligado, resolveu entrar no site de
busca e pesquisar por si própria se havia ingressos à venda para o campeonato
em questão.
No entanto, assim que sentou, percebeu que uma transferência de
arquivos seria finalizada em poucos segundos. Quando a transferência chegou ao
fim, os olhos de Morgana automaticamente caíram sobre as imagens
pertencentes à pasta. Ao abrir a foto que mais lhe chamara a atenção, constatou
que se tratava de uma fotografia de Jennifer beijando uma mulher.
Morgana, nervosa, abriu todos os arquivos de imagens e percebeu que
existiam algumas outras fotos íntimas de sua filha com a mesma mulher.
— Mãe?— chamou Jennifer, fazendo a mulher se sobressaltar.
Quando Morgana se virou, Meireles pôde avistar no monitor uma foto
dela com Regina em tela cheia. Naquele momento seus olhos arregalaram-se e
suas pernas pareciam querer perder o equilíbrio. Ela sabia que não haveria
quaisquer desculpas que justificassem aquelas fotografias.


Capítulo 24

As mãos de Jennifer suavam em um grande gesto de nervosismo. As
pernas fraquejavam como se fossem perder a força e o sustento de seu corpo a
qualquer momento. Sua mente estava confusa com o choque de ver sua mãe em
frente a todas aquelas fotos. Meireles podia jurar que havia trancado a porta ao
entrar. Ela se praguejava mentalmente por ter sido tão falha.
— Mãe, eu... Eu...— A jovem permanecia estática enquanto buscava as
melhores palavras.
— Jennifer, o que significa isso?— exclamou Morgana. — Melhor! Eu
não vou te perguntar o que essas fotos significam, pois está bem claro!— disse
de maneira raivosa. Os pensamentos de Morgana estavam envolvidos por uma
névoa. Ela sabia exatamente o que tudo aquilo significava, contudo, não
conseguia pensar com clareza. — Não pode ser. Isso não pode estar
acontecendo!
— Mãe, eu planejava contar a você, eu juro!— disse com a voz trêmula
ao aproximar-se da mãe.
— Quando, Jennifer Meireles? Quando todos já soubessem? Há quanto
tempo essa pouca vergonha está acontecendo nas minhas costas?
— Não fala dessa forma, por favor.— Os olhos de Jennifer começaram
a marejar.
— E como você quer que eu fale? Olha essa fotos, Jennifer!— disse ao
apontar para o monitor. Morgana possuía fúria em sua voz. — Quem é essa
mulher?— perguntou com a voz firme e elevada. — Eu fiz uma pergunta. Me
responda.— disse de maneira seca ao perceber que Meireles se mantinha calada.
— Quem é essa mulher que está corrompendo você?
— Ninguém está me corrompendo! Não vou permitir que você dê a ela
uma culpa que não a pertence! Eu sempre fui assim, sou dessa forma desde que
me entendo por gente.
— Você ainda vai me afrontar?— perguntou com indignação.
— Não estou afrontando você. Eu só quero uma oportunidade de me
explicar.
— Explicar o quê? Que você tem se esfregado com outra mulher? Isso
está nítido!
As palavras de Morgana Meireles estavam amargas e afiadas. Elas
invadiam o peito de Jennifer e a feriam no lugar onde mais doía.
— Olha essas suas palavras, mãe! Por que está sendo tão ofensiva
comigo? Me deixa explicar, por favor. Não é porque eu gosto de mulheres, que
deixei de ser a mesma Jennifer de sempre. Sua filha! Eu sei que deveria ter
conversado com você e evitado que descobrisse dessa maneira. Eu entendo seu
lado, entendo o seu choque. Mas te peço, por favor, que me dê uma oportunidade
de explicar como tudo funciona.
— Eu não quero que me explique nada! Aliás, eu quero sim. Quero que
me diga quem é essa mulher e onde a conheceu!
— Pra você é mais importante saber quem ela é, do que saber quem eu
sou?— perguntou com lágrimas nos olhos e tristeza em sua fala. — Então eu
vou te dizer. Ela é uma pessoa maravilhosa que eu tenho o prazer de ter
conhecido. E ao contrário do que você diz, ela não me corrompeu. Eu fui atrás
dela. Eu insisti pra que ficássemos juntas. Em momento algum ela me induziu a
algo que eu não quisesse.
— Eu não acredito nessas suas palavras. Eu não acredito em nada mais
do que você me disser! Olha a idade dessa mulher, Jennifer! Ela poderia ser sua
mãe! Ela não tem vergonha de seduzir uma garota?
— Mãe, as coisas não foram dessa forma!
— Cala a boca! Você não sabe o que está dizendo. Com certeza essa
mulher fez a sua cabeça!
— Mãe, para! Me escuta, por favor! Eu gosto tanto dela...
— Escutar o quê? Você espera que eu aceite? Não perca seu tempo!—
Morgana começou a andar de um lado para o outro enquanto gritava duras
palavras para a filha. A mãe de Jennifer também possuía lágrimas em seus olhos.
— Eu não vou aceitar esse tipo de relacionamento! E eu não aceito ter uma filha
assim!
— Desculpa se eu não sou o que você esperava — disse em um baixo
tom de voz enquanto um fio de lágrima escorria em seu rosto.
— Eu estou tão decepcionada com você, Jennifer. Ainda não consigo
acreditar que você foi capaz de mentir pra mim. E o pior! Mentia pra ir se
encontrar com essa... Com essa... Eu não tenho nem palavras pra descrever essa
mulher!
— Durante a minha vida inteira eu nunca menti pra você. A única
mentira que contei foi quando fingi estar com a Beatriz. Eu fiz isso porque eu
tive medo de dizer a verdade. Eu tive medo de ser tratada como estou sendo
agora. Será que isso é tão errado assim?— As pernas de Jennifer não mais
suportaram. A loira sentou e desabou a chorar.
— E de qual forma você gostaria de ser tratada após uma descoberta
como essa? Eu conheço você, sei que não é assim. Mal conheceu essa mulher e
começou a mentir pra mim. É ela quem está te levando a esse caminho sujo.
— Não, mãe. Você não me conhece. Se me conhecesse saberia que
nada mudou. Porém, de mim você pode dizer o que quiser. Mas eu não permito
que a ofenda.— Meireles falava em meio à lágrimas. — Ela por muitas vezes me
disse que eu deveria conversar com você sobre minha sexualidade e sempre
esteve disposta a dar a cara e vir se apresentar a você. Ela é muito honrada,
nunca ousou entrar aqui sem sua permissão e jamais quis viver algo às
escondidas comigo. A responsabilidade é apenas minha de ter mantido esse
segredo.
— Cala a boca! Eu não quero ouvir você defendendo essa mulher! Nada
do que disser vai me fazer aceitar uma vírgula dessa história. Não perca seu
tempo — disse de maneira fria e seca. — Eu só quero saber aonde você a
conheceu.
— Isso não vem ao acaso — respondeu. Mesmo em meio a toda aquela
confusão, ela pouparia a imagem de Regina.
— Ainda vai protegê-la? Realmente eu não devo conhecer a garota à
minha frente — disse ao balançar negativamente a cabeça. — Eu não quero que
volte a ver essa mulher, você está me entendendo? Espero que me obedeça e não
me dê outro desgosto.
— Você acha que dessa forma vai fazer eu mudar quem sou?—
perguntou. Meireles sempre acreditou que Morgana não aceitaria sua
sexualidade tão facilmente, porém, jamais imaginaria que o julgamento seria tão
pesado. — Escutou quando eu disse que sempre fui assim? Não foi ela que me
transformou em lésbica, mãe. Eu nasci dessa maneira! Eu sempre soube!
— Não, você não nasceu assim! Isso não é algo natural!
— Me escuta!
— Eu não quero escutar nada mais sobre essa história! E você vai se
afastar dessa mulher!— Morgana caminhou até o computador e pegou o
aparelho da filha que estava conectado a ele. — Sem celular. Da escola para
casa, você está me ouvindo?
— Eu não acredito que você vai fazer isso comigo. Está me tratando
como uma criança. — Jennifer se desmanchava em lágrimas enquanto tentava
argumentar com Morgana.
— Eu não acredito que você fez isso comigo, Jennifer — disse, dando
ênfase ao você.
— O quê está acontecendo aqui? Ouço os gritos lá de baixo!—
perguntou Diogo, preocupado, ao colocar a cabeça na porta.
— Isso está acontecendo aqui!— Morgana girou o monitor no sentido
da porta e mostrou ao noivo uma fotografia de Jennifer beijando Regina nos
lábios.
— Amor, calma...— disse o homem ao entrar no quarto e se aproximar
de Morgana. — Tentem se acalmar e depois vocês conversam sobre o que está
acontecendo.
— Ela não quer me ouvir, Diogo...— disse Jennifer em meio ao choro.
— Ela não para de defender essa mulher! E ainda fala comigo como se
fosse normal algo assim!
— Amor, por favor, tenta se acalmar! Cuidado com as palavras, pois
uma vez lançadas, não têm volta — disse ele enquanto a segurava suavemente
pelos ombros e tentava acalmá-la.
Jennifer estava triste e ferida demais para conseguir prosseguir com os
argumentos. Ela apenas recolheu a mochila do treino, a carteira, e deixou o
quarto às pressas.
— Amor, tenta ficar calma. Eu sei que essa descoberta deve ter sido um
grande susto pra você, mas tenta não perder o raciocínio — disse Diogo. Ele e
Morgana conversavam sentados sobre a cama de Jennifer.
— Como você me pede pra ficar calma? Minha filha, minha única filha
está sendo seduzida por uma mulher que deve ter quase o dobro da idade dela!—
Os olhos de Morgana estavam sendo habitados por lágrimas. Ao mesmo tempo
em que eles expressavam raiva, também expressavam uma enorme tristeza.
— As coisas podem não ser como você as deduziu. Por que não
conversa com Jennifer em outro momento quando estiverem mais calmas?
— Pra ouvir ela defender essa mulher? Pra ouvi-la me dizer que sempre
foi dessa forma? Não! Eu não quero! E eu não aceito que ela seja assim.
— Por quê? O que mudaria se Jennifer realmente tem essa preferência?
Sexualidade não define o caráter de ninguém, amor. Aposto que ela é a sua
menina de sempre.
— Você vai ficar do lado dela e defender essa pouca vergonha?—
perguntou ao exaltar a voz.
— Não estou do lado de ninguém, amor. Apenas acho injusto julgar
alguém pela sexualidade.
— Eu não acredito que você vai compactuar com isso, Diogo! Me deixa
sozinha, por favor!
Diogo sabia o quão cabeça dura Morgana poderia ser. E também sabia
que, em momentos como esse, o melhor era deixá-la esfriar a cabeça para um
possível futuro diálogo.
— Tudo bem, eu vou embora. Mas não hesite em me chamar quando
precisar de alguém pra conversar — Diogo depositou um beijo na face da noiva
e a deixou sozinha com seus pensamentos.


Jennifer sentou-se na calçada em frente à própria casa enquanto tentava
se acalmar. Ao mesmo tempo em que as lágrimas escorriam pela pele branca de
seu rosto, a voz de sua mãe gritava e ecoava por sua mente. Ela sentiu como se
boa parte de seu mundo tivesse desabado de uma hora para a outra.
Ao olhar para o relógio de seu pulso, constatou que faltava pouco tempo
para o início do campeonato. Mesmo estando destruída emocionalmente, sabia
que tinha um compromisso a cumprir. Muitos esperavam por ela, não podia
desapontá-los. Visto isso, levantou-se e se dirigiu para o telefone público mais
próximo. Por sorte, o número correspondente ao de Regina estava gravado em
sua memória. Ela precisava avisar a morena sobre o acontecido de poucos
minutos. E precisava alertá-la sobre Morgana. Afinal, agora a mãe de Jennifer já
sabia seu rosto.
Após incontáveis tentativas, desistiu. Regina não atendia suas
chamadas. A jovem cogitou a ideia de ir até a casa da professora, contudo, já
estava em cima da hora e ela não conseguiria chegar a tempo para lutar. Sendo
assim, dirigiu-se para o local do campeonato e rezou para que o pior não
acontecesse.
Ao chegar, Meireles cumprimentou algumas pessoas, que notaram seu
semblante triste, e logo em seguida correu para fazer um aquecimento rápido.
Jennifer muito prezava a importância de um bom aquecimento antes das lutas.
Mas, tendo em vista que já estava em cima da hora, precisou se apressar.


— Boa tarde, professora Vianna!— disse Beatriz ao encontrar Regina
procurando um local para sentar na pequena arquibancada.
— Boa tarde, senhorita!— disse a mais velha ao cumprimentar Beatriz.
— Posso tomar um lugar a seu lado?— perguntou a garota.
— Claro!— respondeu Regina, sorrindo. — Você conseguiu falar com
Jennifer hoje? Estou ligando para o número dela, mas ninguém atende.
— Eu também tentei e não consegui. Mas a essa hora ela já deve estar
pronta no vestiário.
— Estou um pouco preocupada. Não estou com um bom pressentimento
há algum tempo — comentou Regina.
— Não se preocupe, a Jennifer deve estar bem. Ela só deve estar
ocupada, por isso não nos atende — disse suavemente.
— Vou tentar me tranqüilizar — respondeu de maneira vaga.
Ao ajeitar-se ao lado de Regina, Beatriz olhou discretamente para a
mulher e tentou puxar algum assunto.
— Jennifer vai ficar muito feliz com nossa presença. Isso aqui é muito
importante pra ela — comentou a mais nova.
— Eu sei que sim. Já a vi treinar algumas vezes e também assisti ao
último campeonato que participou. O empenho e a dedicação que deposita são
notáveis. Ela transmite muito amor quando fala disso aqui — disse suavemente
ao olhar para Beatriz.
— Jennifer se dedica a tudo que se propõe a fazer. Ela sempre busca dar
seu melhor.
— Sim, é verdade, e eu admiro muito isso nela.— Sorriu.
As duas mulheres finalizaram o diálogo e depositaram seus olhares no
ringue. A primeira luta estava prestes a começar.
Beatriz e Regina compartilharam algumas emoções enquanto assistiram
aquelas lutas que antecederam a de Jennifer. Elas gritaram, torceram e ficaram
aflitas em diversos momentos.
— Eu sempre penso que a pessoa vai levantar em algum momento
quando o árbitro está contando — comentou Beatriz.
— Eu também. Dá uma enorme aflição!— disse Regina.
— Olha lá! Agora é a Jennifer!— exclamou empolgada ao apontar para
a amiga que acabara de aparecer.

Jennifer subiu no ringue não muito certa de suas ações. Seu físico
estava ali, mas sua mente parecia ter parado no momento vivido com sua mãe
dentro do quarto. As palavras de Morgana não paravam de ecoar em sua cabeça.
Meireles olhou para a arquibancada e logo avistou Regina e Beatriz
sentadas lado a lado. Ambas estavam muito próximas do ringue. Após isso, a
jovem começou a percorrer o olhar por todo o lugar à procura da presença de
Morgana. Como se não bastasse a grande tristeza que estava sentindo, um grande
medo e nervosismo também começou a consumir Jennifer. Ela temia que
Morgana encontrasse Regina e a reconhecesse no meio da multidão.
Jennifer estava sentindo-se com os pés e mãos atados. A sensação de
impotência a consumia. Ela queria gritar para que Regina saísse de lá. Queria
poder alertá-la e avisá-la sobre tudo o que havia acontecido.

Quando Meireles subiu no ringue e buscou Regina com o olhar, a
morena imediatamente percebeu que havia algo errado. Jennifer a olhou com
tristeza e preocupação. E mesmo tendo esboçado um sorriso, não foi o mesmo
sorriso aberto que Regina conhecia.
Conforme a luta foi prosseguindo, Regina observou grandes diferenças
no desempenho de Jennifer. A jovem exercia muito esforço em seus
movimentos, e parecia desnorteada na maior parte do tempo. Nem de longe era a
mesma Jennifer Meireles dos treinos e da luta assistida pela professora.
— Tem algo errado com a Jennifer — comentou Regina.
— O quê?— perguntou Beatriz. A jovem estava com dificuldade de
audição devido ao grande barulho no local.
— Alguma coisa está acontecendo com Jennifer. Ela está muito
desconcentrada!— disse em um alto tom de voz.
— Realmente ela está diferente — respondeu Beatriz. — Está aérea!
Regina se sentia aflita e angustiada. Ela arregalava os olhos em algumas
ocasiões enquanto se perguntava o que estava acontecendo com a loira.
— Vamos lá, Jennifer. O que está acontecendo com você...—
murmurava a si mesma enquanto a observava.

Alguns minutos de luta haviam se passado e Jennifer foi se mostrando
cada vez mais em desvantagem. A falta de concentração da jovem foi tamanha,
que sua adversária conseguiu acertá-la. Após o primeiro golpe recebido, a loira
pareceu perder o pouco do controle que ainda lhe restava. Sendo assim, para o
desespero de Regina, Jennifer baixou a guarda e perdeu a confiança em si
própria.
O coração de Regina começou a bater em um ritmo acelerado. Uma
grande inquietação começou a tomar conta da professora. Ela não estava
suportando ver sua garota apanhar diante dos seus olhos sem poder tomar
qualquer atitude.
— Professora Vianna! Aonde você vai?— perguntou Beatriz ao ver a
mais velha se direcionando para perto do ringue.
Quando a morena chegou o mais próximo que pôde de Jennifer,
conseguiu enxergar alguns pequenos machucados na loira. No canto dos lábios
da jovem escorria um pequeno fio de sangue.
— Vamos lá, Jennifer. Eu estou aqui com você. Estou aqui. Vamos lá,
vamos lá.— Regina repetia essas palavras incontáveis vezes enquanto sentia seu
coração querendo sair pela boca. E quando a adversária de Jennifer a levou ao
chão, as emoções de Regina foram juntas.

Quando o árbitro fez a contagem de dez segundos e não obteve uma
reação de Jennifer Meireles, automaticamente a vitória foi para sua oponente.
Contudo, o que preocupou Regina não foi a derrota, mas, o fato da jovem
permanecer ao chão sem esboçar qualquer movimento.
O desespero começou a tomar conta de Regina quando os paramédicos
locais aproximaram-se do ringue e levaram Meireles embora em uma maca.
— Com licença — disse Regina, educadamente, ao aproximar-se da
porta aonde Jennifer havia sido levada. — Eu gostaria de ver a participante que
acabou de entrar.
— Me desculpe, senhora. A entrada é permitida apenas para
funcionários — disse o segurança.
— Mas eu preciso vê-la. Eu sou da família — insistiu.
— Desculpe, mas não posso permitir. São ordens dos superiores.
— Como assim vocês não permitem que familiares entrem? A senhorita
Meireles entrou machucada. Eu exijo poder vê-la!
— A senhora é a mãe?— perguntou o rapaz ao olhá-la; possuindo quase
certeza de que a resposta seria negativa.
— Não.
— Então eu não posso fazer nada pela senhora.
— Isso é um absurdo!— exclamou. — Onde está o responsável?
O segurança passou algumas informações para Regina e a mesma foi
até o responsável para tentar conseguir uma autorização de entrada.
— O quê aconteceu?— perguntou Beatriz ao aproximar-se.
— Estava tentando conseguir autorização pra ver Jennifer, mas não
querem me deixar entrar! Acabei de falar com o responsável e ele me negou!—
Regina estava visivelmente irritada. Ela andava de um lado para o outro em um
nítido gesto de irritação e nervosismo.
— Que droga. O jeito vai ser esperarmos — disse Beatriz com
chateação.
— Que inferno! Eu não estou acreditando nisso!— Regina saiu pisando
firme. Ela tomou um lugar próximo à sala de primeiros socorros e lá permaneceu
aguardando até que Jennifer fosse liberada.
Beatriz fez companhia à professora e tentou tranquilizá-la até que
Meireles aparecesse; o que não demorou muito. Jennifer saiu da sala com um
curativo no nariz e uma bolsa térmica gelada na testa.
— Jen!— disse Regina ao avistá-la. A morena correu no sentido da
jovem e a segurou no rosto com as duas mãos. — Como você está?— perguntou
ao acariciar a face da jovem e observar se em seu corpo havia algum machucado.
— Péssima — respondeu com lágrimas nos olhos. — Minha mãe
descobriu tudo, Regina — disse com voz de choro ao se jogar nos braços da
mais velha e agarrá-la pela cintura. Jennifer tremia.
— Oh, meu bem... Eu sinto tanto — disse de maneira suave e carinhosa
ao acomodar a loira em seus braços.
Regina depositou a mão sobre os cabelos de Jennifer, que já estavam
soltos, e começou a acariciá-los enquanto tentava compreender tudo o que estava
acontecendo.
Beatriz, por sua vez, depositou um beijo na testa da amiga e gesticulou
para Regina indicando que estaria esperando em outro lugar. Ela sabia que esse
era um momento delicado e que precisava deixá-las a sós.
— Eu estou muito mal, Regina. A reação dela foi péssima. Disse que
não iria me aceitar, que não aceitaria essa relação e que isso não é normal.—
Jennifer falava de maneira nervosa, atropelando as palavras. — Eu fui uma
idiota! Eu deveria ter conversado com ela antes, assim como você havia me
orientado. Era óbvio que ela descobriria. Eu fui muito inocente em achar que
poderia esconder algo assim.
— Se você não contou, como ela descobriu?— perguntou suavemente.
A morena havia se sentado com Jennifer e permanecia acariciando os fios
ondulados da loira.
— Você se lembra das nossas fotos que estavam no meu celular? Eu as
deixei passando pro computador nessa manhã e fui tomar banho. Eu tinha quase
certeza que havia fechado a porta, mas não o fiz. Ela entrou no meu quarto e viu
tudo. Todas as fotos! Ela ficou uma fera!
— E não é pra menos. Ela descobriu de uma forma péssima —
lamentou Regina. — Eu vou até sua casa hoje conversar com sua mãe.
— Você está maluca? Não! Regina, não! Eu não contei quem é você.
Isso pioraria tudo.
— Jennifer, sua mãe precisa saber o resto da história. Eu não vou ficar
me escondendo, isso é atitude de gente covarde e canalha.
— Eu sei, Regina. Mas não acho que seja uma atitude inteligente contar
o resto da história pra ela hoje. Você tinha que ter visto como ela estava. Aposto
que seria capaz de avançar sobre você.
— Você está certa. É muita informação pra ela digerir de uma só vez.
Mas semana que vem eu vou conversar com ela e me apresentar. Já fizemos as
coisas a seu modo, agora te peço que seja do meu. Tudo bem?
Meireles assentiu positivamente e afundou a cabeça no peito de Regina.
— Me perdoa, Regina — disse em meio ao choro. — Eu queria que
fôssemos parceiras de um crime perfeito, mas eu fiz tudo errado. Eu não fui
capaz de conseguir omitir. E o pior: decepcionei você, minha mãe e a todos que
esperavam uma boa performance de mim hoje.
— Jennifer, ei, ei...— disse Regina ao tocá-la no queixo e suspender o
seu rosto com delicadeza. — Você não deve desculpas alguma. Essas coisas
estão sujeitas a acontecerem.
— Eu sinto muito por não ter conseguido fazer as coisas certas. Eu sei
que decepcionei a todos. Eu não tenho nem cara pra olhar pra você.
— Não diz essas coisas, por favor. Eu não tenho motivo algum para
estar decepcionada com você. Sabíamos desde sempre que momentos como esse
chegariam mais cedo ou mais tarde. Não pense essas coisas, por favor.— A
professora acariciou a face de Jennifer e a ajudou a colocar a bolsa térmica sobre
o inchaço da testa
— Ai...
— Desculpe — disse ao pressionar a bolsa de um jeito mais suave. — O
que aconteceu ao seu nariz?
— Ele sofreu uma contusão devido a pancada.
— Eu fiquei com o coração na mão ao vê-la apanhar daquela forma.—
Regina alternava as carícias entre a face e os cabelos de Jennifer enquanto
segurava a bolsa contra a testa. — Olha só como está seu rosto, Jen...
— Os machucados físicos são o de menos, pode acreditar — disse com
tristeza. — Ah, ainda tem mais uma coisa, minha mãe tomou meu celular. Eu
quis te avisar sobre o ocorrido, mas não tive como. Te liguei de um telefone
público, mas você não atendeu. Fiquei com medo de você esbarrar com ela aqui,
estando desprevenida. Mas pelo visto ela não veio...— disse com ainda mais
tristeza.
— Eu sinto tanto que esteja passando por tudo isso. Se eu pudesse tirar
todas as suas dores e tristeza e depositá-las em mim, eu o faria.
— Não diga isso, Regina.
— Digo. Digo porque é verdade. Me dói ver você assim.— Os
castanhos de Regina estavam cheios d’água.
— Essas dores são minhas, eu preciso passar por tudo isso. É
necessário para minha evolução. Aprendemos muito com a dor — disse Jennifer.
— Mas confesso que esse seria o momento ideal pra fazer aquela viagem a
Saturno.
— Não posso te levar até lá, mas posso te oferecer o aconchego dos
meus braços. Serve?
— Não há melhor lugar para estar — respondeu ao envolver a cintura
da mulher. — Onde está Beatriz?
— Está ali — disse ao apontar para o longe. — Se distanciou para nos
dar um pouco de privacidade. Vamos até ela? Ela também ficou preocupada com
você.
— Vamos.
As duas mulheres levantaram-se da cadeira e caminharam de encontro à
Beatriz. Jennifer ainda vestia o uniforme de luta, e Regina usava uma calça jeans
básica, camiseta cinza e jaqueta preta de couro.
Assim que Jennifer atualizou a amiga sobre os últimos acontecimentos,
ela preencheu uma obrigatória papelada do evento e aguardou a liberação. Logo
após, as três deixaram o lugar. Regina deu carona para Beatriz até em casa e em
seguida foi para casa junto com Jennifer.
Meireles tirou o uniforme, tomou um banho na casa de Regina e se
trocou com a muda de roupa que estava em sua mochila. Feito isso, sentou-se no
sofá da sala com a mulher.
— Se eu pudesse passaria a noite aqui com você e Bóris. Não estou
pronta pra encarar o olhar de reprovação da minha mãe novamente.— Bastou
pensar em Morgana para os olhos de Jennifer voltarem a se encher de lágrimas.
— Ela me odeia, Regina.
— Ela não te odeia, Jennifer. Apenas precisa de um tempo pra digerir
essa história. O amor dela por você permanece lá.
— Será? Não foi isso que vi naqueles olhos.
— Eu acredito que sim. Você é filha dela e ela ama você. Só não espere
que aceite nosso relacionamento tão facilmente. Isso eu acho que não irá
acontecer. Mas eu estou disposta a fazê-la entender que não quero brincar com a
filha dela ou apenas passar o meu tempo. Quero que ela saiba o quanto eu gosto
de você, me importo e levo o que temos a sério.
— E se a minha mãe não nos aceitar?— perguntou ao encarar o fundo
daqueles intensos olhos castanhos.
— Eu não sei...— respondeu com preocupação.
— Estou pensando em procurar um emprego — disse de maneira
repentina.
— Um emprego? Mas como? E a escola? E seus treinos?
— Posso procurar algo que seja meio período. Um estágio, por
exemplo. E se preciso for eu abro mão dos treinos de boxe.
— Jennifer, nem pensar! Você ama estar no ringue!
— Mas eu também amo estar com você. E eu estou sentindo que as
coisas lá em casa irão se complicar. Preciso de uma renda, Regina. Preciso
começar a juntar dinheiro para alugar um lugar pra mim.
— Você não precisa pensar nisso agora, e eu jamais aceitaria que você
abrisse mão dos seus treinos para trabalhar.
— Eu posso trabalhar à noite.
— Você iria se esgotar, Jennifer.
— Mas eu preciso, Regina. Preciso começar a pensar na minha
independência financeira, na minha vida adulta. A minha mãe não vai nos
aceitar, ela não vai!
— Calma. Vamos viver um dia por vez, tudo bem?
— Eu tenho uma conta no banco que meus pais abriram na minha
infância. Eu posso usá-la para-
— Para os seus estudos — completou Regina. — É assim que você
deverá usar esse dinheiro. Ei... Não se preocupe com moradia. Eu estou aqui,
Jennifer. Estou aqui para o que você precisar. Minha casa estará sempre aberta
pra você.
— Obrigada, mas eu preciso aprender a caminhar sozinha, Regina.
— Caminhar sozinha não significa não aceitar ajuda — respondeu a
morena. — Mas não vamos pensar nessas coisas agora, tudo bem? Melhor não
nos precipitarmos.
— Eu vou tentar. Mas minha mente está a mil!— disse ao levar a mão à
testa.
— E o seu estômago, como está? Se alimentou corretamente hoje?
— Não consigo pensar em comida.
— Mas você precisa se alimentar, se esforçou muito no campeonato.
Vem, vamos até a cozinha.

Jennifer recusou todos os alimentos oferecidos por Regina. Seu
estômago estava fechado e a vontade de comer era nula. Entretanto, após muita
insistência da parte da morena, Meireles aceitou beber uma vitamina.

— O quê você está olhando?— perguntou a mais nova enquanto bebia o
conteúdo do copo.
— O quanto você é graciosa. E o quanto eu sou louca por você —
respondeu ao aproximar-se e depositar uma mecha do cabelo de Jennifer para
trás da orelha.
— Você deve estar me achando uma criançona que está na sua casa te
dando trabalho após uma discussão com a mãe. Logo vai enjoar de mim.
— Não. Eu te acho uma grande mulher, que foi forte o suficiente para
subir naquele ringue e cumprir com as obrigações mesmo com o interior
desabando. Você é forte, Jennifer. Forte, responsável e determinada. E eu sinto
muito orgulho de você.
— Promete que não vai enjoar de mim? Promete que não vai deixar que
minha idade seja um peso?— perguntou a jovem. Todas as inseguranças batiam
à sua porta naquele dia.
— Sabe, Jennifer... Eu não sou uma pessoa de fazer promessas. O
futuro é muito volátil e eu não gosto de prometer algo baseado em situações que
fogem ao meu controle. Mas, se tratando dessa pergunta eu posso prometer. Eu
não enjoaria de você, e sua idade nem de longe é ou se tornará um peso pra mim.
Jennifer esboçou um curto e frágil sorriso e permaneceu olhando o par
de olhos que a encarava.
— O quê você sente por mim?— perguntou ao tocar a mão da morena.
O toque de Jennifer foi tão suave, que fez Regina soltar um pequeno
suspiro. Ela olhou para baixo e avistou a branca mão da jovem em contraste com
a dela e sorriu ao lembrar-se do dia em que sentiu essa mesma prazerosa
sensação pela primeira vez.
Havia acontecido há meses, quando ela e Jennifer se encontraram fora
da escola, ao acaso, pela primeira vez. Regina se lembra de como observava
cada detalhe e do quanto suas diferenças físicas eram gritantes e até mesmo
atraentes.
Hoje, Regina olhava para suas mãos juntas e pensava no longo caminho
que já havia sido percorrido desde então, e em como as coisas entre elas haviam
mudado e evoluído. Entretanto, a evolução não havia sido apenas a de seus
corpos; que agora tinham permissão para se tocarem. Mas, também, e
principalmente, a evolução de sentimentos.
Quando Regina avistou sua garota tão frágil naquele ringue, seu coração
bateu acelerado como jamais batera por alguém. E Regina sabia que aquela
dança ele só fazia por Jennifer, e ela sabia exatamente qual era a melodia que seu
coração dançava: a melodia de amor.
Contudo, apesar de ter consciência de seus sentimentos por Meireles,
ela não os revelaria. Não agora, não em um momento tão turbulento. Em outra
ocasião Jennifer saberia que Regina estava começando a amá-la.
— O que eu sinto?— indagou. — Bom, eu sinto algo forte o suficiente
que me faz arriscar coisas importantes por você.
— Se refere ao trabalho?
— Sim. Eu sei que me envolver com uma aluna não é algo permitido e
mesmo assim eu o fiz. E sabe por que eu o fiz? Porque o que você me desperta é
intenso e foge ao meu controle. Porque eu gosto de você, Jennifer. E não é
apenas o meu corpo que perde o controle na sua presença.
— Eu não me sentiria bem em vê-la arriscando algo tão importante por
mim.
— Desculpa, mas essa é uma decisão minha. E eu já a tomei quando
permiti que você entrasse.
— Você faria algo diferente se pudesse? — A mais nova permanecia
acariciando a mão de Regina. Ela alternava entre olhar para os castanhos da
mulher e a mão que estava sendo acariciada. Meireles muito apreciava decorar
os traços da mais velha com os olhos e com o tato.
— Não faria nada diferente porque se o pior acontecer eu posso
encontrar centenas de outras escolas para lecionar, mas, você eu não encontraria
em nenhum outro lugar.
Jennifer deixou o copo na bancada, levantou-se e se posicionou de pé
em frente a Regina.
— Eu nunca vou entender o que você viu em mim, mas eu fico feliz que
tenha visto algo — disse ao apoiar uma das mãos sobre o peitoral da mulher e
segurá-la na nuca com a outra. Meireles depositou um beijo carinhoso no canto
da face da professora e aproveitou a proximidade para murmurar contra o ouvido
da mulher. — Obrigada por me segurar nos braços quando o chão fugiu dos
meus pés.
— Pelo menos emocionalmente eu consigo te segurar nos braços —
brincou, referindo-se a não possuir força física o bastante para erguer Jennifer,
assim como a loira fazia.
— Só você pra me fazer rir em um momento como esse — disse ao
balançar a cabeça negativamente enquanto sorria.
— Você acha que é de graça? Nada disso. Quero alguns beijos como
pagamento. Aliás, hoje ainda não recebi um beijo seu.
— E como você quer ser beijada?— perguntou ao acariciar a face da
professora com as costas de sua mão.
— Da maneira que você achar que eu mereço ser.
Meireles olhou fundo nas íris à sua frente e sorriu; um sorriso que foi
além dos lábios.
— Hum... Então será com todo o carinho que tenho por você.
Jennifer fechou os olhos e roçou os lábios contra os de Regina ao
mesmo tempo em que inalava o cheiro da mulher. Sua língua e a dela se
acariciavam em um encontro que transcendia o físico. Era uma mistura de
gostos, texturas e aromas que acalentavam seus corações e as fazia entregarem-
se cada vez mais.
Mesmo estando envolvidas por uma atmosfera pesada decorrente ao
ocorrido com Jennifer, não deixaram de aproveitar o momento juntas. Havia
certa malícia durante a troca de beijo. Todavia, era uma malícia branda, que
servia apenas para dizer-lhes o quanto se gostavam.
Na tristeza ou na cama, entre lágrimas ou lençóis, as duas amantes eram
lindas na poesia de seus encontros.

— Acho que já vou indo, Regina — disse após finalizar o beijo com
uma última selada de lábios. — Preciso encarar minha nova realidade. Não
quero demorar a voltar pra casa. Minha mãe agora me proibiu de sair. Ainda tem
isso.
— Tudo bem, vou levar você pra casa — respondeu ao deslizar a mão
pelas ondas douradas da jovem.
— Melhor não, ela pode te ver.
— Não me importo, jamais deixaria você ir sozinha pra casa nesse
estado — disse suavemente.
Jennifer estava fragilizada demais para negar e acabou aceitando.



— Jennifer, o quê aconteceu? Que machucados são esses?— perguntou
Morgana, sobressaltada, assim que a filha cruzou a porta da sala. — E onde você
estava até essa hora?
— Você saberia se tivesse ido ao campeonato — respondeu de forma
fria e seca.
Meireles caminhou até as escadas e subiu correndo para o quarto,
trancando-se nele. Ela depositou a mochila em um canto qualquer, jogou-se na
cama e começou a chorar. Jennifer não conseguia acreditar em como seu mundo
havia virado de ponta à cabeça em poucas horas.

Em casa, Regina organizou a cozinha e pôs cada utensílio em seu lugar.
Agora que já não possuía a paz da presença de Jennifer, uma sensação de
angústia e nervosismo começou a habitar seu peito. Ela muito lamentava saber
que Meireles começaria a viver momentos difíceis. Gostaria, mais do que nunca,
poder estar perto.
Ao sentir o celular vibrar em seu bolso e constatar que se tratava de uma
mensagem da operadora, Regina soltou um profundo suspiro de lamentação. Ela
suspirou porque sabia que era inútil esperar pelo contato da loira.
Ao abrir a gaveta da cozinha para guardar um último item que havia
ficado para fora, avistou a pequena embalagem de cigarro. Regina olhou para
aquela caixa por longos segundos e sentiu-se tentada a abri-la. Contudo, apesar
da grande vontade que começara a tomar conta, ela não o fez. Apenas fechou a
gaveta com força e retirou-se do local.


Capítulo 25

Jennifer terminava de cuidar dos pequenos machucados que havia em
seu rosto quando escutou a porta de seu quarto ser aberta.

— Você realmente não vai me dizer o que aconteceu e onde esteve?—
perguntou Morgana ao entrar. — E esses machucados em seu rosto?
— Eu perdi a luta.— Jennifer respondeu. — Por isso essas marcas —
continuou a dizer. — Você realmente quer saber onde eu estava? Eu vou dizer,
pois não quero mais mentir ou esconder nada de você. Não tenho mais motivos
pra isso. O pior você já sabe.— Jennifer lutava para impedir que lágrimas se
formassem em seus olhos. Ela fazia o possível para evitar o olhar de Morgana.
— Eu estava com ela.
— Com aquela mulher? Não é possível!— exclamou Morgana. — E
você ainda me diz isso na maior naturalidade do mundo?
— Como você gostaria que eu dissesse? Eu não quero esconder nada de
você, mãe. E ela também não. A Regina quer vir conversar.
— Regina? Então é esse o nome da mulher que está te desvirtuando!
Meireles sentiu-se nervosa após dizer o nome de Regina, lembrando-se
que já havia comentando com sua mãe sobre ela. No entanto, por sorte, Morgana
não fez ligação com os nomes. Ela sequer lembrava o nome de sua professora.
— Quantas vezes vou precisar dizer que ela não está me desvirtuando,
mãe?
— Não está? Então como você explica o fato dela estar envolvida com
uma garota de dezoito anos?
— Eu não sou mais criança, mãe. Você tinha menos idade que eu
quando conheceu o papai.
— Mas essa mulher é muito mais velha que você, e ainda é uma
mulher! Eu não posso aprovar esse tipo de envolvimento.
— Isso é um duplo preconceito de sua parte. Preconceito por ela ser
uma mulher e por ser bem mais velha que eu. Mas, a mim pouco importa a idade
dela. O que importa é o carinho que compartilhamos.
— É inútil dialogar com você. Está cega!
— Eu estou aqui completamente disposta a conversar, mas é você quem
está com sete pedras na mão — disse ao sentar-se sobre a cama.
— Enquanto você mantiver essa loucura na cabeça eu vou me manter na
ofensiva, sim!— exclamou Morgana. — Amanhã eu quero você do boxe para a
escola e da escola para casa. Estamos entendidas, Jennifer?
— Sim — respondeu a loira, cabisbaixa. — E quanto à Regina vir
conversar com você?
— Eu não quero conversar com essa mulher. Eu não quero sequer olhar
para a cara dela!— exclamou. — Ou melhor, eu quero sim. Quero lhe dizer
umas verdades!
— Eu não vou permitir que ela venha aqui para que você a destrate.
Onde está a mãe compreensiva e paciente que você sempre foi? Eu só queria que
vocês tivessem uma conversa civilizada.— Suspirou.
— Você está pedindo algo que não posso oferecer — comentou
Morgana. — O que aconteceu ao seu nariz?— perguntou ao desviar o assunto.
A cabeça de Morgana estava a mil. Ainda era tudo muito recente para
ela. A maneira como havia descoberto a sexualidade da filha havia sido
traumática. Era muita informação de uma só vez para ser digerida.
— Sofri uma contusão. Minha oponente me acertou em cheio.
— Oh... Não se esqueça de fazer compressas com gelo — disse ao olhar
para os machucados da filha.
— Pode deixar.

O clima entre Jennifer e sua mãe estava pesado. Meireles não conseguia
buscar o olhar de Morgana e a mais velha não sabia como se comportar. Ao
mesmo tempo em que Morgana estava tomada pela raiva, ela também queria
tomar a filha nos braços e cuidar de cada machucado que habitava em sua face.
Entretanto, o desapontamento falou mais alto e não permitiu a aproximação.
— Boa noite — disse Morgana de maneira fria e seca antes de se dirigir
para a porta.
— Boa noite.
Assim que despediu-se de sua mãe, Jennifer se direcionou para a sala e
ligou para sua amiga Beatriz através do telefone fixo. Ela desabafou a respeito
de tudo o que havia acontecido naquela noite e desculpou-se por ter sido uma
amiga ausente, que sequer havia se lembrado de perguntá-la sobre a noite com
Kevin.
A amiga de Jennifer se mostrou compreensiva e disse que Meireles de
nada precisava desculpar-se, pois ela imaginava o quão sua cabeça devia estar
preenchida com todos aqueles problemas. Após isso, a loira passou os próximos
minutos ouvindo a respeito da noite entre sua amiga e o namorado. Aquela
conversa foi de grande ajuda para fazê-la esquecer de seus problemas
temporariamente.


— Obrigada por vir, Arthur. Não estou nada bem — disse Regina. Ela e
o amigo conversavam na sala de estar da professora.
— Eu sinto muito que as coisas já estejam tomando esse rumo, Regina.
De verdade — disse o homem.
— Eu perdi as contas de quantas vezes tentei fumar hoje e desisti. Não
quero decepcionar Jennifer.
— Você precisa ser forte. Por você e por ela, que ainda é tão jovem.
Mas lembre-se que fraquejar é humano e totalmente compreensível.
— Eu sei...— respondeu de forma vaga. — É tão ruim estar aqui sem
notícias, sem saber como se passam as coisas na casa dela. Estou tão inquieta.
— Tenta se acalmar, Regina. Infelizmente não há nada que você possa
fazer. Pelo menos não agora — disse Arthur na tentativa de confortá-la.
— Essa semana eu pretendo ir conversar com a mãe dela. Quero que ela
me conheça, saiba quem sou e quais minhas intenções com a filha dela. Se eu
estivesse no lugar de Morgana gostaria de saber.
— Não acha que irá piorar as coisas? Eu acharia melhor que você
esperasse um pouco. Está tudo recente demais — disse o homem enquanto
mantinha sua atenção em Regina, que mexia de maneira impaciente nos objetos
que haviam sobre a mesa de centro.
— Esperar. Esperar. Estou cansada disso!— Regina levantou-se do sofá
e iniciou alguns passos de um lado para o outro. Por ter descendência italiana,
gesticulava mais que a maioria das pessoas ao falar.
— Eu imagino que você deva estar cansada e impaciente. Mas tomar
uma decisão às pressas não irá trazer bons resultados — aconselhou ele. — E se
a mãe dela resolver entregar você no trabalho? Já pensou nisso?
— Em relação ao meu trabalho eu já tomei uma decisão — disse ao
parar de caminhar de um lado a outro. — Eu vou me demitir.
— Você perdeu o juízo, Regina?— exclamou ao levantar-se e se
posicionar de frente para a amiga. — Você só pode estar brincando comigo! Vai
jogar todos os seus anos de magistério fora?
— Eu nunca falei tão sério, Arthur — respondeu ao buscar o olhar do
amigo. Algumas lágrimas começaram a se formar nos olhos de Regina. Não
seria uma fácil tarefa abrir mão do que ela intitulava como segunda casa. —
Com a minha demissão as coisas se tornarão menos difíceis. Sem mencionar o
peso que estou carregando por estar sendo antiética na minha profissão. Você
acha que isso não me afeta? Eu sei que não é correto se relacionar com uma
aluna.
— Mas agora já foi, Regina! Não é como se você fosse manter isso por
anos, não! Falta apenas alguns meses pra que você e ela deixem de ter um
vínculo estudantil.
— Até o final do ano é tempo demais, não posso continuar assim.—
Regina estava visivelmente nervosa. — Mas antes de qualquer coisa eu terei
uma conversa com a mãe da Jennifer. E quando as coisas se acalmarem um
pouco, eu peço a demissão. Tentarei resolver um assunto por vez.
— Me Deus, essa mulher vai te matar.— Arthur, assim como Regina,
também estava nervoso com essa situação. Ele temia que o pior pudesse
acontecer à sua amiga.
— Provavelmente — concordou Regina ao sentar-se no sofá. A morena
entrelaçou os dedos nos fios de seus cabelos e os jogou para trás enquanto
pensava na melhor maneira de resolver essa situação.
— E você já sabe o que irá dizer a essa mulher?— perguntou Arthur,
preocupado.
— Se ela me der a oportunidade de falar?— disse Regina. — Vou me
apresentar e contar como tudo aconteceu entre Jennifer e eu. Não quero que ela
pense que eu me aproveitei da filha dela e a seduzi. Quero fazê-la compreender
que aconteceu naturalmente sem que eu mesma me desse conta, e que eu gosto
verdadeiramente da Jennifer. Estar com ela nunca foi um passatempo. Eu não
sou do tipo de professora que dá brecha para aluno ou que coleciona casinhos.
Me envolvi com Jennifer porque realmente me senti conectada a ela.
— Eu vou torcer muito pra que você consiga ter uma conversa
civilizada com essa mulher.— Arthur sentou-se ao lado da amiga e a envolveu
com seu braço, confortando-a.
— Obrigada. E obrigada por estar aqui me apoiando. Sua amizade é
muito importante pra mim.— Regina apoiou a cabeça na curva do pescoço de
Arthur, o abraçou pela cintura e se permitiu desfrutar daquele abraço
confortante.


Duas semanas se passaram. O clima na casa de Jennifer não era dos
mais agradáveis. Morgana Meireles permanecia tratando-a com indiferença e
não cansava de repetir que não aceitaria a sexualidade da filha. Contudo, as
brigas e discussões foram se tornando mais brandas. Meireles evitava tocar no
assunto e Morgana fingia que o mesmo não existia. Era uma falsa calmaria.
A loira ainda permanecia impedida de praticar alguma atividade além
dos treinos de boxe e de ir à escola. E seu celular ainda estava retido com sua
mãe. Morgana julgou que dessa forma o contato da filha com a mulher mais
velha se tornaria mais difícil de acontecer.
Durante essas duas semanas, Jennifer teve um árduo trabalho para
convencer Regina a permanecer calada e esperar que as coisas em sua casa
esfriassem um pouco. Se dependesse da mais velha, Morgana já estaria sabendo
de tudo há tempos. Contudo, duas semanas foi o prazo máximo que a loira havia
obtido.

— É tão ruim olhar pra minha mãe e receber um olhar vazio em retorno.
Sinto que ela nunca irá me aceitar, Regina. Acho que sempre serei uma decepção
para ela — disse Jennifer. Ela e a morena conversavam dentro do carro da
professora após mais um dia de aula. — Nos primeiros dias ela foi muito
agressiva comigo. Mas, atualmente ela finge que nada está acontecendo. Eu não
sei o que é pior.
— Sua mãe está na fase de negar a si mesma a verdade. Talvez ela
pense que tudo isso é uma passageira fase ruim.
— Eu acho que sim — respondeu. — Hoje vou chamá-la pra conversar
e contar o restante da história. Vou dizer quem você é. Sei que isso irá acender
outra chama de fúria dentro dela, mas a verdade precisa ser dita. Não posso
esconder nossa relação a vida inteira, e nem posso deixar que ela pense que tudo
isso é uma fase. Eu quero reconhecimento, aceitação ou pelo menos respeito por
quem sou. Isso de ter que viver da escola pra casa ou de ter o celular apreendido
é horrível, Regina. Me sinto uma criminosa em prisão domiciliar.
— Às vezes seus pensamentos são tão maduros que me assustam —
comentou enquanto mantinha os olhos no par de esmeraldas à sua frente.
— Eu sou um pouco diferente, eu sei. Desde criança sempre tive uma
maturidade à frente. Talvez eu deva isso à minha criação. Minha mãe é jornalista
e sempre precisou estar muito conectada ao mundo. Então desde sempre eu tive
acesso a muitos livros e mídias digitais. Quando criança eu passava horas
ajudando ela com o trabalho. Na verdade eu atrapalhava mais que ajudava —
disse ao expressar um curto sorriso ao lembrar-se da infância e dos bons
momentos compartilhados com Morgana. — Mas o que quero dizer é que desde
sempre tive acesso a informações. E os livros me fizeram crescer muito.
— Eu também fui uma criança que lia com muita frequência. Mas
confesso que fui uma adolescente muito fundo de garagem com amigos de banda
de rock.— A morena esboçou um pequeno sorriso ao lembrar-se dos velhos
tempos. — Mas apesar de toda fase louca que vivi, a Regina responsável e
centrada sempre esteve aqui.
— Sabe que é difícil imaginar uma Regina Vianna fundo de garagem?
— comentou Jennifer ao rir.
— Pois acredite! Essa Regina toda tradicional, formatada, professora de
história com livros debaixo do braço não se formou da noite para o dia.
— É muito bom saber um pouco mais sobre você — comentou ao olhá-
la com admiração. — É como se eu me sentisse parte da sua história desde
sempre.— Sorriu.
— Que saudade de te ver assim, sorrindo — comentou ao admirar o
sorriso que Meireles expressara. — Você sorri com os lábios e com os olhos, que
se curvam e tornam-se bem pequenos. Eu daria qualquer coisa pra não ver
tristeza dentro deles nunca mais.
— Desculpe pela tristeza dos últimos dias. Além de estar enfrentando
um clima ruim em casa, meu tempo e contato com você se tornaram ainda
menores. Fico triste em poder te ver apenas nas aulas ou de maneira rápida aqui
no carro. E quando é em aula eu preciso estar fingindo indiferença.
— Não se desculpe, eu compreendo perfeitamente — disse suavemente
ao tocar a mão da loira.
— Sinto tanta falta de estar com você, dos nossos diálogos e das nossas
carícias — comentou enquanto sentia o contato da morena com sua mão.
— E eu sinto saudades de tocar você e te contornar sem pressa.— Ao
mesmo tempo em que falava, Regina deslizava a ponta do polegar por todo o
lábio da jovem. — Seu cheiro, seu toque e seu gosto me fazem tanta falta,
Jennifer.
— A mim também. É uma tortura não ter suas palavras, quem dirá seus
carinhos.— A loira inclinou a cabeça para baixo e soltou um pequeno suspiro de
lamentação. E enquanto olhava para baixo, mirou o braço de Regina e sorriu ao
perceber que a pulseira permanecia no pulso da mulher. — Você ainda a usa —
disse ao tocá-la.
— Sempre, todos os dias. É um pouco de você que carrego comigo.—
Sorriu, aquele sorriso único que preenchia o peito da jovem de felicidade.
— Você é linda, Regina. Por dentro e por fora. E eu não poderia me
apaixonar por alguém mais ideal pra mim que não fosse você.— Meireles
inclinou-se parcialmente sobre a morena e a tomou nos lábios de maneira
inesperada, prendendo o lábio inferior de Regina com força entre os dentes e o
mordendo.
— Hum... Com quem você anda aprendendo essas coisas?— comentou
a morena ao esboçar um sorriso de lado.
— Ei, você não sente dor?— resmungou a loira ao perceber que Regina
se comportou como se nada tivesse acontecido.
— Com você mordendo meu lábio a única coisa que sinto é prazer,
Jennifer — murmurou, causando um arrepio por toda pele da mais nova.
— Você é uma safada, Regina!— exclamou, fingindo indignação, ao
dar uma leve tapa no ombro da mulher.
— Sou. Sou muito safada e você adora. Gosta porque é tão safada
quanto eu.
— Que mentira!
— Acho que a mentirosa aqui não sou eu, loirinha.
— Me chama de mentirosa e ainda se refere a mim como loirinha? Isso
é um absurdo! Não estou valendo nada mesmo!— brincou, contendo-se para não
rir.
— Falta acrescentar algo mais: tagarela. Você é muito tagarela, Jennifer
Meireles — implicou a morena.
— Então por que você não me cala daquele jeito tão bom?— murmurou
contra o ouvido da mulher.
Regina roçou os lábios vermelhos de batom contra os finos e
naturalmente rosados lábios de Jennifer ao mesmo tempo em que se permitia
sentir o agradável perfume que os poros da mais nova exalavam.
— E qual jeito seria esse?— sussurrou contra os lábios de Jennifer.
— Você sabe exatamente a quê me refiro — disse em resposta.
Meireles entreabriu os lábios e deu passagem para que a língua de
Regina entrasse lentamente em sua boca, lhe proporcionando uma prazerosa
sensação. A loira segurou firme nos cabelos castanhos da mais velha e permitiu
que o beijo se aprofundasse. O mundo poderia estar prestes a desabafar, porém,
ali dentro, naquele momento, ela queria deixar todos os problemas do lado de
fora e desfrutar do bem estar oferecido pela boca, carícias e sussurros que
vinham da mulher por quem estava apaixonada.
As duas amantes possuíam plena consciência da fragilidade do que
compartilhavam; pois embora fosse forte o sentimento que habitava em seus
peitos, sabiam que o mundo lá fora era regado de preconceitos e que dificilmente
abraçariam esse amor. Um amor que não crescia apenas em Regina; Jennifer
também era hospedeira desse sentimento único, nobre e, até o presente
momento, indecifrável por ela. Meireles amava aquela mulher sem ao menos
dar-se conta. Sua alma estava desnuda para Regina.
— Jennifer, você tem certeza que não quer minha presença?—
perguntou ao finalizar o beijo.
— Eu acho melhor não. Minha mãe sequer me aceita, com qual cara eu
iria apresentar você a ela e ainda dizer que é minha professora? Não. Ela sofreria
um ataque cardíaco ao te ver lá!— explicou. — Eu preciso desse momento a sós
com ela. Preciso conversar com calma, da forma que eu deveria ter feito a
respeito da minha sexualidade.
— Tudo bem, eu entendo — disse com pesar em sua voz. — Já que não
podemos nos falar pelo celular, darei meu e-mail a você. Me deixe informada
sobre a situação, ok? Estarei verificando a noite inteira.
— Pode deixar. Sei que não será nada fácil, mas infelizmente eu vou ter
que contar. Deus me livre correr o risco dela ir à escola de uma hora pra outra e
descobrir sobre você novamente de uma forma traumática. Eu preciso
reconstruir a confiança que tínhamos. Isso é muito importante pra mim.
— Estarei torcendo para que tudo ocorra da melhor forma possível. Ou
da maneira menos dolorosa — comentou ao acariciar as mãos da loira.
— Obrigada...


— Eu não consigo encontrar onde foi que errei com a Jennifer. Não é
possível um comportamento desses, Diogo.
Morgana e o noivo conversavam no sofá da casa da mulher. Diogo a
havia buscado no serviço ao final da tarde daquela sexta-feira e passaria a noite
por lá.
— A orientação sexual da Jennifer nada tem a ver com educação,
Morgana. Você não errou em nada e Jennifer também não — explicou ele
calmamente.
— Vai continuar defendendo ela?
— Amor, escuta...— Diogo respirou fundo e começou a falar. — Eu
acho compreensível você estar irritada pela mentira. Por mais que saibamos que
conversar com os pais sobre a sexualidade seja difícil, a sua descoberta foi
bastante traumática. Você tem toda a razão e o direito de ter se chateado com
isso. Porém, julgar Jennifer pela condição sexual eu não acho correto. Eu sou um
homem livre de preconceitos.
— Então você acha normal que ela esteja envolvida com uma mulher?
E que ainda aparenta ter quase o dobro da idade?— disse ao alterar o tom de
voz.
— O fato de ser uma mulher não é um problema pra mim. E em relação
à idade, bom, isso é a Jennifer quem deve decidir. Ela já é maior de idade e tem
o direito de escolher como quer direcionar a vida. Se ela se interessa por pessoas
mais velhas, qual o problema? É uma questão de gosto, amor. Não é um crime.
— Eu não acredito que estou ouvindo essas coisas! Você fala isso
porque ela não é a sua filha.
— Alto lá! Jennifer pode não ser minha filha de sangue, mas tenho um
carinho enorme por ela. Eu no seu lugar estaria mais preocupado em conhecer
essa mulher e saber a respeito de sua índole. Idade, pra mim, não é um problema.
Se a Jennifer estivesse se relacionando com uma pessoa do sexo oposto e que
fosse da idade dela, não descartaria a possibilidade de ser um canalha. O que não
falta são garotos jovens querendo se aproveitar das meninas por aí.
— Você não vai me convencer com esses seus argumentos.
— Não estou tentando te convencer de algo, Morgana. Eu só quero que
você não seja tão pesada com a sua filha. Ela não está cometendo crime algum.
Jennifer não merece receber ofensas porque você não consegue aceitá-la como é.
— Ela é só uma menina e precisa me obedecer.
— No seu coração ela sempre será a sua menina. Mas fora dele Jennifer
já é uma mulher. Não perca sua filha para a intolerância. Logo mais ela poderá
querer sair cedo de casa. É isso que você quer?
Diogo era a personificação da calmaria. Ele era um homem sensato,
coerente e de bem com a vida. Ele sabia que a noiva ficaria chateada por suas
palavras tão diretas e ideias contrárias às que ela pensava, contudo, não deixaria
de expor o que ele acreditava ser o justo e o correto.

— Olá — disse Jennifer, aos dois, assim que cruzou a porta e os
encontrou juntos no sofá. — Tudo bom, Diogo?— disse ao cumprimentar o
homem com um beijo em sua face.
— Estou bem, Jennifer. E você, como anda?
— Levando...— respondeu com desânimo. — Vai passar o final de
semana por aqui?
— Sim! Você vai estar por aqui ou tem outros planos?
— Estou em cárcere privado agora, lembra? Só me resta saber qual
crime eu cometi.
— Você sabe exatamente o motivo, Jennifer!— disse Morgana,
manifestando-se.
— Não. Sinceramente eu não sei, mãe. Mas não quero discutir. Eu
preciso conversar algo importante com você.
— Seria sobre o quê?— perguntou a mais velha.
— Sobre a Regina.
— Você ainda tem se encontrado com essa mulher?— perguntou em
um tom de voz elevado.
— Sim, mãe. Não vou negar. Não quero mais mentir ou esconder algo
de você. Lembra? Então, por favor, vamos conversar?
— Deixarei vocês a sós — disse Diogo. O homem levantou-se de seu
lugar e se dirigiu para o andar de cima.
— O quê você tem pra me falar sobre essa mulher?— perguntou
Morgana, agitada.
Jennifer tomou um lugar ao lado da mãe e buscou as palavras que
melhor explicassem toda aquela situação.
— Então...— iniciou. Sua voz estava cortada e seu coração batia em um
grande descompasso. — Eu não quero me afastar da Regina, mas eu também não
quero ter que me encontrar às escondidas com ela. Quero ser inteiramente
transparente com você, mãe. E se você não puder me compreender e aceitar,
peço que pelo menos respeite.— Meireles fez uma pequena pausa em suas
palavras, suspirou enchendo o peito de coragem e prosseguiu. — A Regina tem
quinze anos a mais que eu. Sei que pra você isso soa de maneira ruim e parece
um absurdo. Mas, pra mim, a idade é apenas um detalhe e eu gostaria que você
respeitasse isso. A mim não faz diferença a idade que ela tem, mas sim o que ela
despertou em mim. Eu consigo me encontrar no mundo dela, coisa que não
acontece quando estou com pessoas mais novas. Minha mente funciona um
pouco diferente se comparada à maioria dos jovens da minha idade. Meus gostos
e visão de mundo não se encaixam com os deles. Mas eu consigo encontrar um
encaixe maravilhoso quando estou com ela.
Jennifer naquele momento estava emocionalmente desnuda perante sua
mãe. Ela se abriria para Morgana como jamais fizera, mesmo que toda aquela
sinceridade e transparência recebessem uma resposta negativa.
Morgana, por sua vez, prestava atenção em cada palavra que saía da
boca da filha. Ela não conseguia compreender no que Meireles havia se
transformado, ou talvez não quisesse aceitar quem Jennifer sempre foi. Vendar
os olhos para a realidade à sua frente foi a opção menos dolorosa que encontrou
nas duas últimas semanas para conseguir lidar com o problema que lhe foi
apresentado.
— É muito doloroso ouvir essas suas palavras. Eu tinha outros planos
pra você.
— Quais eram esses planos? Ver eu me formar? Arrumar um bom
emprego? Casar? Te dar netos? Mãe, eu ainda posso fazer tudo isso!
— Ao lado de uma mulher, Jennifer?
— Ao lado de alguém que eu ame. E esse alguém será uma mulher, sim
— respondeu suavemente.
— Eu não sei o que fazer com você, honestamente — disse ao levar a
mão até a testa. — Quem é essa mulher? Onde você a conheceu?— Tendo em
vista que não poderia permanecer fugindo ao assunto, Morgana resolveu encará-
lo de uma vez.
— É justamente sobre isso que quero conversar com você. Bom, eu...
Eu a conheci na escola.
— Como assim você a conheceu na escola?— perguntou confusa.
— Lembra quando comentei com você sobre minha nova professora de
história? Então...— O coração de Jennifer pulsava tão rápido dentro de seu peito,
que a loira poderia jurar que enfartaria se sua mãe não a matasse antes.
— Isso não pode estar acontecendo.— Morgana murmurou a si mesma
ao levantar-se de maneira repentina do sofá — Que absurdo é esse que você está
me contando, Jennifer Meireles?— exclamou ao fulminar a loira com o olhar. —
Você está se relacionando com sua professora? É isso? — gritou. — Que pouca
vergonha é essa? Onde está a boa educação que eu te dei?— continuou a gritar.
— E essa mulher? Ela não tem escrúpulos? Ela não se envergonha em manter
esses casos sujos com alunos? Cadê a ética?
Morgana estava furiosa. Ela andava de um lado para outro ao mesmo
tempo em que olhava para a filha e lhe apontava o dedo.
— Mãe, calma, não é como você está pensando.— Meireles falava de
maneira descontrolada. Algumas lágrimas, logo, começaram a escorrer por sua
face. — Regina nunca se envolveu com alunos antes. Nunca! E ela não aprova
esse tipo de conduta. Mas aconteceu, mãe. Fugiu ao nosso controle. Nos
apaixonamos! E agora tudo o que ela mais quer, e eu também, é que esse ano
logo termine pra que possamos nos desvincular desse rótulo.
— Eu quero falar com essa mulher a-go-ra!— gritou Morgana. — Onde
ela está? Está na escola? Pois eu vou lá atrás dela!— Morgana afastou-se da filha
e começou a procurar as chaves do carro pela sala.
— Mãe, não faz isso, por favor!— dizia Jennifer, aos prantos, enquanto
a seguia pela sala. — Regina jamais se envolveria comigo se fosse apenas pra
satisfazer o físico. Nós duas nos conectamos e nos gostamos de verdade. Por
favor, me escuta!— Jennifer tentava argumentar, mas era inútil. Morgana já não
mais a escutava. Tudo o que sua mãe almejava naquele momento era ir atrás de
Regina Vianna. — Você não vai encontrá-la na escola agora.
— Então me passe o endereço dela — ordenou Morgana. — Agora!
— Eu não lembro o endereço .
— Não tem problema. Vou consegui-lo na escola!
Meireles não possuía o nome da rua de Regina em sua memória, mas
ela sabia exatamente como chegar até a casa da mulher. E por temer que sua mãe
arrumasse confusão no trabalho da morena, ofereceu levá-la.
— Não sei o endereço de cor, mas consigo levar você até a casa dela.—
Suspirou. O semblante de Jennifer era triste e seus olhos estavam cobertos por
lágrimas que embaçavam sua visão.


Em sua casa, Regina estava recolhida em seu escritório particular
limpando e ordenando alguns de seus muitos livros. Ela aproveitou o momento
para separar alguns exemplares que não lia há algum tempo, mas que eram
interessantes demais para ficarem esquecidos em uma prateleira. Sendo assim, os
deixou separados sobre a mesa para apresentá-los à Meireles e ver se eram de
seu agrado.
Regina fez uma pausa em sua atividade assim que ouviu a campainha de
sua casa tocar de maneira rápida e insistente.
— Temos visita?— indagou ao direcionar seu olhar para Bóris, que lhe
observava com atenção deitado sobre a mesa. — Acho que temos visita. E pelo
visto se trata de alguém que quer ser atendido com urgência.
A professora deixou tudo o que estava fazendo de lado e caminhou em
direção a porta de entrada. Bóris, curioso como só ele, saltou da mesa para o
chão e caminhou logo atrás.
Assim que Regina abriu a porta foi surpreendida pela imagem de
Jennifer acompanhada por uma mulher anos mais velha. A morena sequer teve a
oportunidade de dizer algo, pois logo sentiu a lateral de sua face arder e pesar ao
sentir a tapa que acabara de receber.
— Como você se atreve a seduzir minha filha?— exclamou Morgana,
segundos após depositar a tapa no rosto de Regina.
— Mãe! Não!— gritou Jennifer ao presenciar a cena. — Regina, me
desculpe, eu não tive como evitar. Eu sabia que isso ia acontecer!— dizia ela,
sem parar, de maneira nervosa.
Com a mão sobre a face atingida, Regina tentou argumentar.
— Vamos manter a calma, não é o que você está pensando!— disse em
voz alta. — Entre, vamos conversar — ofereceu. Em qualquer outra situação
Regina teria devolvido aquele tapa. Mas, se tratando da mãe de Jennifer e
daquela ocasião, sabia que precisaria aceitar quieta.
— Eu não tenho nada pra conversar com você! Eu só quero que se
afaste da minha filha!— gritou. — Como você foi capaz de se envolver com
uma de suas alunas? Onde está a sua ética?
— Mãe! Para! Por favor! Vamos pra casa, você precisa se acalmar!—
dizia Jennifer ao puxá-la.
— Me solta! Essa mulher precisa ouvir umas verdades!
— Senhorita Meireles, eu entendo sua raiva e compreendo que queira
proteger sua filha. Mas as coisas não são dessa forma. Eu gosto da Jennifer, de
verdade — disse de forma apressada. — Eu não a seduzi, e eu nunca me envolvi
com um de meus alunos antes. Essa está sendo a primeira vez. Não pense que
me orgulho de ter quebrado minha ética profissional, mas o que sinto por
Jennifer é único.
— Eu não quero ouvir esse seu discurso pré fabricado! E volto a dizer:
se afaste da minha filha! Do contrário eu vou fazer um escândalo naquela escola!
E eu não sei se a Jennifer já avisou, mas eu sou jornalista. Então é melhor que
você tome cuidado — ameaçou.
— Eu não estou acreditando que você está fazendo isso, mãe! Que
atitude intolerante! Agora sou eu que pergunto onde está sua educação. O que
custa conversar civilizadamente com ela? Você está vendada pelo preconceito e
intolerância!
— Senhorita Morgana Meireles, por favor, vamos conversar. Não
precisamos levar as coisas aos extremos! Eu só peço a você uma oportunidade,
apenas uma, pra mostrar quem sou.
— Pra mim já está mais do que claro quem você é — disse séria.
— Desculpe, mas não está.— Regina rebateu sutilmente. — Eu sei que
sou professora da Jennifer e que uma relação como essa não é bem aceita. Eu
tenho total consciência disso. Mas eu gosto tanto da sua filha, que se preciso for
eu me desvinculo da escola.
Jennifer arregalou os olhos ao ouvir as últimas palavras proferidas por
Regina. A loira começou a questionar-se sobre os sentimentos da mulher serem
tão fortes, que a faria largar o emprego por ela.
— Regina, não fala isso. Eu não permitiria — disse ela ao se manifestar.
— Nada mudará o fato — respondeu Morgana. — Além do mais... Olha
a sua idade e olha a dela! Não se envergonha em se envolver com uma garota?
— Me desculpe, mas Jennifer já é uma mulher. E não digo apenas pela
idade, me refiro aos pensamentos dela. Já conheci pessoas com a minha idade
que não têm o amadurecimento da sua filha.
— Eu não aguento mais você falando que sou muito jovem e se
direcionando a mim como se eu fosse uma criança incapaz de tomar as rédeas da
minha vida!— Jennifer se manifestou novamente. — O problema é a minha
idade? Tenho certeza que não. O problema é o seu preconceito, mãe! Se a
Regina já não fosse minha professora e eu me sentasse naquela calçada agora e
esperasse os anos passarem, você permitiria que eu ficasse com ela? Não! E sabe
por quê? Porque a Regina é uma mulher! Apenas por isso!— Jennifer
verbalizava ao mesmo tempo em que as lágrimas escorriam por sua face. — Eu
estou aqui disposta a ser inteiramente transparente com você e a senhorita
Vianna também, pois a última coisa que a gente quis foi viver um
relacionamento às escondidas. Eu só quero ser aceita e respeitada!— exclamou.
Meireles tinha a atenção de Morgana e de Regina, que a olhava de
maneira fixa nos olhos. Morgana Meireles estava estática e Regina se
emocionava com o discurso sincero e carregado de emoção.
— Eu só quero...— Jennifer secou as lágrimas que escorriam em sua face
ao mesmo tempo em que tentou conter o choro em sua garganta. Seu coração
batia acelerado e sua cabeça latejava de dor. Entretanto, o que mais estava lhe
doendo não era a dor física. O que lhe doía era ver tanta raiva no olhar de sua
mãe e tanta melancolia nos castanhos de Regina, que sempre fora tão intensos e
agora pareciam desvanecidos. — Eu só quero...— Meireles buscou força
emocional em seu interior e continuou a falar. — Eu só quero poder viver algo
límpido ao lado dessa mulher que eu amo.— Jennifer finalizou a frase com seu
olhar direcionado à Regina. Seus olhos estavam vermelhos por consequência do
choro.
Regina não recordava de já ter se sentindo tão mal e impotente em sua
vida. A pessoa que amava havia acabado de declarar-se da maneira mais sincera
que seus olhos e ouvidos já puderam presenciar, e ela estava completamente
proibida de se manifestar e tomá-la nos braços.
— Jennifer...— Sua voz saiu como um murmúrio ao mirar
melancolicamente aquelas esmeraldas banhadas em água.
Quando Regina fez menção em aproximar-se de Jennifer, a loira
balançou sutilmente a cabeça em um pedido para que ela não se aproximasse. A
última coisa que queria era piorar toda aquela situação. Sendo assim, apenas deu
as costas para as duas mulheres e deu alguns passos rápidos e longos para longe
dali.
— Jennifer, volta aqui! Jennifer!— gritou Morgana ao correr atrás da
filha. Quando a alcançou, ambas entraram no carro e se dirigiram para casa.

Meireles, durante todo o caminho, lutava para que as lágrimas de
tristeza não escorressem por sua face. Porém, apesar de toda dor sentida naquela
noite, uma fagulha de alegria tentava sobreviver em meio a toda tristeza que
habitava seu peito. E essa pequena alegria ainda existia porque ela havia
decifrado seus sentimentos por Regina. Agora, a única coisa que a loira
lamentava era ter descoberto o amor através da dor; em um mundo rodeado de
tanto falso moralismo e preconceito.


Regina entrou em casa com a certeza do fracasso. Seus ombros pesavam
e seus olhos não mais puderam suportar e inundaram-se de lágrimas. Ela sabia
que o mundo não seria capaz de abrigar aquele amor.
Naquela noite Regina estava desarmada. Pela primeira vez em sua vida
se viu sem saber qual atitude tomar. Amar Jennifer era uma certeza. Porém, nada
poderia fazer com aquele amor enquanto aquela história não se resolvesse.
Regina caminhou até a cozinha e sua primeira ação foi abrir a gaveta do
armário e depositar a carteira de cigarro sobre a bancada. Feito isso, trocou o
rotineiro chá da noite por uma dose de uísque e se direcionou para o escritório.
Quanto mais Regina se lembrava das últimas palavras de Jennifer, mais
a vontade de chorar lhe atingia. O álcool descia queimando em sua garganta.
Mas, nada lhe queimava tanto quanto aquela situação dolorosa. Amanhã seria
um novo dia para ela, para elas, ela sabia. Mas hoje, apenas hoje, então somente
hoje, fumaria um por um daqueles cigarros.


Capítulo 26

Ao chegar em casa, Jennifer dirigiu-se correndo para o quarto e se
trancou. Em meio a lágrimas tomou um banho morno, um analgésico e sentou-se
de frente para seu computador. Meireles abriu uma fotografia de Regina e a
contemplou. Por um momento se viu acariciando a tela do monitor ao mesmo
tempo em que sentia lágrimas escorrendo por sua face.
Jennifer vivia algo novo. Seus pensamentos e emoções buscavam
encontrar um equilíbrio dentre toda aquela bagunça em que sua vida havia se
transformado. A descoberta do amor, a rejeição, o medo da perda e a
necessidade de tomar um posicionamento ainda a assustavam.
A noite não havia se arrastado apenas para Regina. Jennifer também a
passou quase inteiramente em claro. Contudo, não foi apenas a noite que se
prolongou; o sábado também. Morgana e Jennifer não trocaram palavras durante
todo o dia. Meireles se sentia magoada demais para dizer algo e sua mãe preferiu
ignorar a situação momentaneamente. Entretanto, a ideia de Morgana
permanecia fixa: ela queria a filha longe de Regina Vianna.

— Eu preciso muito vê-la, Diogo. Não vou aguentar passar todo esse
final de semana nessa agonia. Ontem não tivemos oportunidade de conversar e
eu tenho tanto a dizer a ela — comentou Jennifer. Enquanto Morgana estava no
banho, a loira pediu ajuda ao homem para conseguir uma oportunidade de
encontrar Regina.
— Jennifer, eu sinto muito por toda essa situação. Mas não tinha uma
relação menos complicada pra você se meter não, hein? Sua mãe está uma fera!
— Eu sei, eu sei. Mas o que posso fazer se é justamente dela que eu
gosto? Me ajuda, Diogo. Por favor!— pediu. — Não quero passar outra noite
como a de ontem.
— Tudo bem. Sua mãe vai querer me matar se souber que eu ajudei
você, mas eu me viro — disse ele. — Vou chamá-la pra jantar em um
restaurante um pouco longe daqui e tentarei me prolongar por lá o máximo que
eu puder. Seja rápida, ok? Não vou conseguir passar de três horas.
— Obrigada, Diogo. Muito obrigada! Eu nunca vou esquecer essa ajuda
— disse ao abraçá-lo com força.
— Juízo, Jennifer. Não faça eu me arrepender de tê-la ajudado. E volte
o mais rápido que puder.
— Pode deixar.
Meireles subiu para o quarto e se manteve lá até o início da noite, que
foi quando Diogo a gritou e se despediu, de modo a avisá-la que estavam saindo.
Após isso a jovem se trocou e vestiu a roupa que já estava separada sobre a
cama. A loira vestiu uma calça jeans, camiseta básica na cor preta e calçou um
par de tênis. Seus cabelos estavam soltos e perfeitamente ondulados.
A jovem recolheu a carteira, a chave de casa, uma jaqueta e telefonou
para a professora através do telefone fixo, avisando-a sobre sua visita.
Jennifer pegou um táxi e seguiu rumo à casa de Regina. Dentro do
veículo sua mente era uma bagunça. Ela sentia-se mal por ter colocado a morena
naquela situação. Sem mencionar o medo que habitava seu peito. Ela temia que
Regina não mais a quisesse, que julgasse toda aquela situação difícil demais e
desistisse. Meireles começou a sentir-se pequena demais e questionou-se sobre o
que ela teria para oferecer àquela relação.

Assim que Jennifer bateu à porta de Regina, a morena abriu e a tomou
nos braços como se a jovem fosse seu bem mais precioso. Se o mundo lá fora
estivesse desmoronando e as portas da esperança se fechando, ela mostraria à
Jennifer que seus braços sempre estariam abertos para recebê-la.
— Me perdoa, Regina. Me perdoa!— disse com os olhos banhados
d'água ao abraçá-la. Meireles apoiou a cabeça sobre o ombro da mais velha
enquanto sentiu as mãos da mulher acariciarem seu cabelo. — Me desculpa por
ontem. Eu não tive como evitar a vinda dela. Ela teria ido à escola se eu não a
tivesse trazido aqui. Você deve estar me odiando e com razão...
— Ei... Não fala assim. Você não precisa se desculpar por nada. Você
foi tão corajosa, Jennifer. E eu tenho tanto orgulho de você.— Regina tocou a
face da loira com a mão e acariciou, fazendo a jovem olhar para seus olhos. —
Mas eu temo por você. O que faz aqui se sua mãe a proibiu de sair?
— Ela e o noivo saíram e irão demorar algumas horas até voltarem.
— Jennifer, você precisa respeitá-la, ela é sua mãe.
— Eu sempre a respeitei, Regina. Mas ela não está tendo o mínimo de
respeito por mim agora. E eu precisava encontrar você. Precisava me desculpar,
ter notícias suas. A noite de ontem foi horrível.
— A noite de ontem é pra ser esquecida — comentou a mais velha com
tristeza. — Foi tudo doloroso demais.
Regina segurou a mão de Jennifer e a levou para o quarto para que
pudessem ter um conforto maior enquanto conversavam. Ambas sentaram-se na
beirada da cama e deram continuidade à conversa.
— A minha mãe foi terrível com você — disse ao levar a mão até a face
de Regina que fora atingida. — Ela não é assim, nunca foi assim. Não sei o que
está acontecendo. Peço desculpas por ela — comentou enquanto acariciava o
rosto da mulher.
— Tudo bem, já passou — disse suavemente enquanto sentia as carícias
da jovem na sua pele.
— Eu sou uma idiota. Eu arruinei tudo quando vacilei com aquelas
fotos. Ela nunca irá nos aceitar! E agora o que será de nós?— perguntou
preocupada.
— Eu não sei o que será de nós, eu não posso obrigar sua mãe a nos
aceitar. E pelo fato de você ainda ser dependente dela, não há muito que se fazer.
Ainda tem o colégio... Esses sete meses que faltam para o fim das aulas é um
abismo entre você e eu.
— Eu sei — lamentou. — Eu vou tentar fazer algo a respeito. Estou
decidida a procurar um trabalho e buscar minha independência. Sei que isso não
irá fazer os meses passarem mais rápido, mas estarei mais preparada pra quando
o dia chegar.
— Eu não gostaria que você se sobrecarregasse assim.
— A partir do momento em que minha mãe rejeitou quem sou, Regina,
tornou-se necessário.
— Eu sinto tanto, Jen. Eu não sei a dor que você está sentindo, pois eu
nunca vi a rejeição no olhar dos meus pais, eles sempre aceitaram esse meu lado.
Mas eu posso imaginar o quão doloroso seja.
— É péssimo.— Jennifer suspirou, baixou a cabeça e mirou seu olhar
em um canto qualquer. Porém, ao fazê-lo, avistou uma carteira de cigarros aberta
sobre o móvel ao lado da cama.
Regina percebeu que a loira olhava fixamente para o móvel e logo
constatou que ela avistava seus cigarros. Visto isso, a morena esticou o braço e
tomou a caixa em mãos. Não orgulhosa do que fizera, começou a falar.
— Não pense que voltei a velhos hábitos. Eu, isso.... É...
— Ei, ei... Você não precisa me explicar nada se não quiser — disse
Jennifer ao envolver as mãos de Regina que seguravam a caixa. — Eu nunca vou
te julgar. Não quero estar na sua vida pra questioná-la.
— Desculpa por ter sido fraca — disse com os olhos marejados.
Meireles pegou o maço da mão de Regina e constatou que a mulher
havia fumado a metade.
— Eu lamento tanto por ter feito isso com você, meu amor.— Jennifer
segurou a nuca de Regina e acomodou a cabeça da mulher em seu peito. Foi a
primeira vez que ela presenciou a mulher que amava em toda sua fragilidade.
Regina havia desabado em seus braços.
— Ontem foi tão doloroso te ouvir dizer que me ama e não poder dizer
ou fazer algo a respeito — disse Regina, emocionada, enquanto permanecia
aninhada no aconchego de Jennifer. — Eu não pude suportar a impotência diante
àquela situação.
— Mas eu estou aqui agora. Estou aqui pra dar a você o meu amor.— A
voz de Jennifer soou doce, suave e emocionada.
Regina levantou o rosto e buscou os olhos de Meireles. Seus castanhos
intensos penetraram o olhar à sua frente com uma intensidade única, como
jamais o fizera. Seus lábios curvaram-se em um sorriso pequeno, contido,
tímido, mas inteiramente sincero. O ar havia se tornado leve e o silêncio tornou-
se a melodia que precisavam. Ambas sabiam decifrar aquele silêncio que era tão
delas.
Regina aproximou-se do rosto de Jennifer, fechou os olhos e roçou seu
nariz e lateral da face contra a da jovem ao mesmo tempo em que se permitiu
aspirar seu cheiro suave. Ela usou de suas mãos para depositar o cabelo da loira
para trás de modo a deixar seu pescoço à mostra e à mercê de seus lábios, que
percorreram a curva ali presente com delicadeza.
Regina, que sempre mostrou-se voraz e animalesca em suas carícias;
hoje, era a personificação da delicadeza e suavidade. Ela queria sentir, provar,
aspirar, registrar e percorrer Jennifer com toda suavidade que seu toque
permitisse.
As últimas semanas de contato restrito fora o suficiente para fazer o
corpo das duas mulheres gritarem de saudade. Era saudade do contato de peles,
de aromas e de sons que emanavam quando submersas ao prazer da entrega.
— Faz amor comigo, Jennifer?— murmurou com seus lábios próximos
ao ouvido da mais nova. — Faz amor comigo...— sussurrou. — Me deixa te
amar, meu amor — disse, segundos antes de voltar a procurar os olhos de
Meireles.
Jennifer deu à Regina o sorriso que ela tanto gostava; aquele de alegria,
carregado com a graciosidade de seus dentes sutilmente tortos e seus olhos que
se curvavam juntos.
Sem pronunciar uma palavra com os lábios, Jennifer deslizou a própria
camiseta para cima ao mesmo tempo em que conversava com Regina pelo olhar.
Seus olhos diziam que sim, que ela iria fazer amor com ela, que se permitiria ser
amada.
Jennifer se livrava das peças de roupa de seu corpo ao mesmo tempo em
que observava o fascínio no olhar de Regina. Hoje, todas as páginas do livro de
Jennifer estavam abertas, e elas deixariam as luzes acesas para que Regina
pudesse lê-las e acrescentar sua poesia ali.
Regina também livrou-se das próprias roupas e as jogou no chão. Junto
com as peças ela jogou alguns medos, as fraquezas, angústias e seus naufrágios
para que pudesse receber o corpo de Jennifer com pureza. Hoje elas respirariam
apenas o que lhes restavam; a esperança e a certeza do que compartilhavam.
Os dedos de Regina brincavam entre as pernas de Jennifer e entravam
com desejo, sim, mas também com amor. O cuidado sempre pertenceu a elas,
mas hoje havia algo diferente naquele sexo. A poesia de Regina nunca aqueceu
tanto Jennifer Meireles como agora.
Quando elas se olhavam, se beijavam e declaravam-se, as estrelas se
calavam para ouvi-las. Eram as mesmas estrelas que habitavam a pele de
Jennifer, que nesse momento estava sob as carícias de Regina, que percorria todo
seu corpo com ardor.

Ponto de Vista de Jennifer

As mãos macias e quentes de Regina percorriam cada curva de meu
corpo com delicadeza. Seus toques eram precisos e firmes mesmo na suavidade.
Com o corpo inteiramente desnudo, me sentei em seu colo e cruzei minhas
pernas em sua cintura ao mesmo tempo em que senti seus braços me
envolvendo. Um sentimento de lar, de casa e de amparo se fez muito presente no
momento daquele enlaço. O aperto daqueles braços e mãos em minhas costas
fez eu me sentir tão dela como jamais antes sentira.
O corpo de Regina recebeu o meu e nos encaixamos deliciosamente
como sempre acontecia. Sua cabeça estava sutilmente erguida de modo que seus
olhos tivessem visão do meu rosto. Usei a ponta do meu polegar para contornar
aquela boca carnuda que eu tanto gostava de beijar e de ver sorrir. Quando
menos esperei, senti a ponta de meu dedo umedecendo; Regina o havia beijado e
envolvido com seus lábios quentes e úmidos.
Inclinei sutilmente minha cabeça para trás quando seu rosto
aproximou-se de meu colo. Sua boca deslizou e percorreu por toda extensão do
meu pescoço até estacionar no vale de meus seios. Sua língua circundava um de
meus mamilos e seus lábios o chupava, alternadamente, causando um sutil
formigamento entre as minhas pernas, que ansiava por aquela brincadeira
úmida, macia e quente.
Regina deslizou as carícias para cima, alcançou o lóbulo da minha
orelha e o mordeu. Quando me dei conta, alguns murmúrios depravados e
roucos estavam sendo ditos contra meu ouvido. Regina sabia o poder que
exercia sobre mim e o quão louca seu palavreado baixo me deixava. Ela se
aproveitava disso.
Eu estava profundamente relaxada em seus braços, abraço, enlaço.
Minha mente desligou-se e eu não conseguia pensar em nada que não fosse ela,
seus toques e seu cheiro misturando-se ao meu.
Suas mãos percorreram lentamente minhas costas, braços, quadril e
coxas. Senti como se Regina quisesse registrar cada pedaço de mim em suas
digitais. Ela estava tão delicada e carinhosa naquela noite, que eu pude sentir
seu amor em cada percurso que suas mãos faziam sobre meu corpo.
Quando senti sua mão alcançando meu sexo, seu olhar diretamente se
direcionou ao meu. Seus castanhos estavam vívidos, intensos e faiscantes.
Regina sempre fazia questão de manter contato visual comigo quando
transávamos. E eu adorava ver suas expressões de prazer enquanto seus dedos
me invadiam.
Segurei firme nos curtos cabelos de Regina, que atualmente estavam
um pouco maiores se comparados ao dia em que a conheci, e fixei meu olhar ao
dela. Seus dedos estimularam meu centro até inundaram-se com minha umidade
aumentada. Eu conseguia ver o desejo nos olhos dela; eles me mostravam o
quão ansiosa ela estava para sentir-se dentro de mim novamente.
Eu adoro o sexo quente e voraz que compartilhamos, mas hoje eu
estava adorando conhecer o outro lado que nós podíamos ser. Regina entrou em
mim delicadamente e me permitiu sentir aquele preenchimento sem pressa, com
toda sua totalidade. Era mágico ter a mulher que eu amava indo tão fundo em
mim.


Ponto de Vista de Regina

Sentir a pele macia de Jennifer era uma das minhas definições de
felicidade. Meus lábios acariciavam seu pescoço enquanto minha mão livre se
entrelaçava em sua juba dourada, que tanto lhe proporcionava poder. Tê-la
entregue em meus braços fazia com que o céu voltasse a ser azul. E tudo o que
eu queria naquela noite era tocá-la em cada canto de seu corpo e lhe mostrar
todo meu amor.
Meireles movia-se sobre meu colo e fazia meus dedos deslizarem
facilmente dentro de sua intimidade. Jennifer era tão gostosa, que eu precisava
me controlar a todo o momento para não tomá-la de maneira descontrolada.
Seu corpo subia e descia ao mesmo tempo em que seus cabelos mexiam-
se e teimavam em cobrir parcialmente seu rosto. Seu olhar sobre mim era
intenso, apaixonado e carregado de malícia. Eu adorava a forma como nos
parecíamos em muitos quesitos. Eu nunca havia me conectado tão perfeitamente
a alguém como eu me conectava a Jennifer.
Meireles era ardente, travessa, doce, menina, mulher, felina. Talvez
Jennifer não soubesse, mas eu amava todas as versões de quem era. Eu nascia e
renascia todos os dias com ela. Nossas conversas sempre me envolveram; sejam
estas na biblioteca da escola ou murmuradas ao ouvido. Eu amava a Jennifer
Meireles que acariciava os cabelos de minha nuca e se via hipnotizada pela
intensidade de meu olhar, mas, eu também amava a garota que subia no ringue
cheia de gana e que se afundava nos livros com dedicação.
Há uma canção que fala sobre o universo ser visto através dos olhos da
pessoa amada, e é justamente dessa maneira que eu quero passar os meus dias;
olhando para o mundo através dos olhos de Jennifer; olhos esses, que agora me
olhavam fixamente enquanto eu a preenchia.
Deitei com Jen entre meus lençóis quando mudamos de posição. Meu
corpo e o dela uniram-se com tanto querer, que por um momento nos tornamos
uma só. Meu peito repousou sobre o dela assim como a minha alma. Nossas
pernas, entrelaçadas, roçavam-se à procura de um contato maior. Nossas bocas
se buscavam e se provavam ao mesmo tempo em que meus dedos ainda sentiam
o seu interior.
— Te amo — sussurrei contra seus lábios; recebendo um gracioso
sorriso em resposta.
Deitada sobre Jennifer eu sentia que podia protegê-la de todos os
males que teimavam em lhe afligir. Sei que esse sentir era ilusório e que
infelizmente eu não possuía escudos à prova de dor. Mas eu estava plenamente
disposta a lutar e resistir para intitulá-la minha mulher. Não no sentido de
posse, não. Eu sou um espírito livre, assim como Jennifer. E quero que sempre
sejamos dessa maneira. Não quero amarras para nós, apenas na cama. Fora
dela eu quero laços. Quero que Meireles esteja comigo, somente comigo, porque
assim deseja. Quando digo que quero intitulá-la minha mulher é através dos
sentimentos. A quero como a dona do meu querer.
Percorri meus lábios pelo pescoço, seios e abdômen até chegar em seu
centro, onde depositei minha boca, que ansiava por sentir aquele gosto tão
único e pertencente a Jennifer. Minha língua quente lambia Meireles de cima
para baixo e o caminho inverso também. Minha boca chupava e se deliciava
com seu sexo ao mesmo tempo em que meus ouvidos a ouviam gemer e pedir por
mais. Meireles pedia e implorava pra que eu não parasse, pra que eu a provasse
cada vez mais. Jennifer adorava quando eu a chupava com força. Ela agarrava
forte em meus cabelos e me impulsionava a continuar.
— Regina...— ouvi sua doce voz gemendo de maneira fraca. Jennifer
me enlouquecia quando me chamava pelo primeiro nome. Enlouquecia-me de
tal maneira, que meu sexo molhava ao seu chamado.
— Regina...— ela voltou a dizer.
Comecei a pensar que me provocava propositalmente. Talvez Jennifer
quisesse me enlouquecer, ou talvez desejasse despertar meu lado sujo, mas que
tanto a agradava. Se essa era sua intenção, concluiu com êxito. Faríamos amor,
sim. Mas faríamos ao modo Regina Vianna.


— Você me enlouquece quando me chama pelo nome — disse ao
deslizar-se para cima.
— Você gosta tanto assim?— perguntou Jennifer ao esboçar um curto
sorriso de lado.
— Gosto. É delicioso esse nome saindo da sua boca. São não é mais
gostoso que você, Jennifer — murmurou. — Que saudade estava de ter você na
minha cama e te provar entre os meus lençóis.
— Adoraria poder dar a você todo o tempo necessário pra matar essa
vontade. Uma pena nosso tempo ser tão limitado.
— Verdade. Mas isso não impede que façamos gostoso do mesmo jeito
— disse ao deslizar-se com ela para fora da cama.
A mais velha guiou a loira com seu corpo e a fez chocar-se contra o
vidro da janela que havia em seu quarto. Quando o fez, Regina observou alguns
arrepios naquela pele branca se misturando às muitas pintas que ali havia. A
maior concentração de pintas era nas costas de Meireles, mas seus braços e
pernas também possuíam algumas.
— Você gosta de fazer rapidinho, Regina?— instigou ao percorrer a
lateral do corpo da mulher com as mãos.
— Sim — respondeu ao morder o próprio lábio ao mesmo tempo em
que seus olhos contemplavam o corpo de Jennifer. — Eu adoro fazer bem
rapidinho — murmurou ao direcionar sua mão para entre as pernas da loira.
Regina mergulhava para dentro de Jennifer ao mesmo tempo em que
pressionava o próprio corpo contra o da jovem, fazendo as costas da loira grudar
contra o vidro da janela.
— Porra, que saudade eu senti disso — disse Jennifer ao agarrar os
cabelos de Regina com pressa enquanto sentia os dedos da mulher lhe
preenchendo com rapidez.
Regina sorriu ao comentário que a loira fizera e depositou algumas
mordidas em seu queixo e maxilar.
— Saudades da sua boca suja quando estamos nos amando —
murmurou em meio às mordidas.
As duas mulheres trocaram de posição em meio à toda euforia do
momento. A loira arrastou a morena para longe da janela e a fez chocar-se contra
o móvel de madeira que havia no quarto. Regina, de maneira rápida, jogou todos
os objetos para o chão e sentou-se sobre a beirada da cômoda. Ela abriu as
pernas em um oferecimento para Jennifer, que agora mergulhava os dedos dentro
dela.
Regina mexeu-se até acomodar Meireles dentro de seu corpo. Em
seguida, cruzou as pernas na cintura da loira e a puxou para frente, fazendo-a
mergulhar mais profundamente dentro dela.
Cada vez que Meireles deslizava os dedos lentamente para fora, um
gemido de lamentação saía dos lábios de Regina. Ela precisava ser preenchida
cada vez mais. Sendo assim, enlaçou as pernas no quadril de Jennifer com ainda
mais força.
— Isso Jennifer... Não para...— gemeu ao sentir que a loira devorava
sua intimidade cada vez mais rápido.
Meireles começou a enlouquecer ao sentir o sexo de Regina se
contraindo e apertando seus dedos. Ela adorava o prazer sensorial que aquele ato
lhe proporcionava, mas ela também muito apreciava o bem estar psicológico.
Estar dentro de Regina transcendia todos os limites do prazer.
— Eu não vou parar até você se desmanchar nos meus dedos — disse
em resposta ao sentir a mais velha alternando mordidas entre seus ombros e
pescoço na tentativa de conter o prazer.
— Então continua fazendo gostoso assim, que eu dou o que você quer
— comentou com rouquidão em sua voz, despertando ainda mais o desejo de
Jennifer.
— Você não imagina o quanto eu gosto de estar dentro de você — disse
ao executar movimentos de entra e sai.
— E você não imagina o quanto eu gosto de abrir minhas pernas pra
você — respondeu ao penetrar os olhos de Jennifer com a intensidade de seus
castanhos.
— Gosta?— instigou. A loira começou a penetrar apenas a ponta dos
dedos de modo a provocá-la ao extremo. — O que mais você gosta, Regina
Vianna?— Meireles deslizou os lábios pelos seios e barriga de Regina e desceu
as carícias até alcançar o centro da mulher.
— Eu gosto de você ajoelhada entre as minhas pernas — respondeu
com segurança e autoridade na voz.
A mais nova, em um gesto de obediência, agachou-se perante Regina e
posicionou o rosto na mesma linear do sexo da mulher. De baixo, ela olhava para
cima e avistava a figura imponente da professora.
— O quê mais?— perguntou enquanto ainda brincava com as pontas
dos dedos naquela umidade quente.
Regina mordeu o lábio em desejo ao visualizar Jennifer aos seus pés.
Aquele antagonismo de posições muito lhe excitava.
— Gosto quando sua boca me prova.— respondeu ao separar as pernas
lentamente, mostrando-se um pouco mais para ela.
O corpo de Jennifer parecia entrar em estado febril sempre que a mais
velha mexia as pernas sensualmente. Ela olhou para o sexo convidativo de
Regina e esfregou os dedos por toda aquela fenda molhada enquanto pensava em
como aquela mulher a enlouquecia.
— Eu quero muito chupar você — comentou com desejo.
— Então faz... Prova a sua mulher.
Antes de Regina concluir a última palavra, Jennifer já estava com os
lábios sugando toda a extensão de seu sexo. A loira a chupava ao mesmo tempo
em que a penetrava com o dedo do meio; provocando na mulher um misto
prazer.
— Que delícia...— Regina gemeu. Sua mente só conseguia pensar no
quão gostosa e prazerosa era a boca de Jennifer. Em meio a gemidos ela
ordenava que Meireles não parasse. Ela precisava de um pouco mais daquela
língua macia que a lambia com total maestria.
— Jennifer...— Soltou um gemido rápido e fraco. Seu corpo já não
conseguia conter a grande carga de desejo provocada pelos movimentos entre
suas pernas. — Jennifer... Jennifer...— gemeu ofegante, segundos antes de
fechar as pernas no rosto da loira ao atingir um dos orgasmos mais deliciosos já
oferecidos pela sua mulher.
— Você estava tão gostosa — murmurou a mais nova contra os lábios
de Regina após se erguer. — Olha como me deixou.— Meireles segurou a mão
de Regina e a levou até seu centro; mostrando a ela o mar que habitava entre
suas pernas.
— Porra... Que delícia te sentir tão molhada — comentou Regina. A
mais velha desceu da cômoda, contornou Meireles com o corpo e se posicionou
por trás. Feito isso, fez Jennifer se inclinar e apoiar as duas mãos sobre a
superfície do móvel. — Completamente molhada e pronta pra mim — sussurrou
ao pé do ouvido ao mesmo tempo em que deslizou a mão pela bunda de Jennifer
e a apertou.
— Não me tortura, por favor. Eu já estou quase explodindo.
— Shhh... Eu não vou te torturar — respondeu ao enroscar os cabelos
de Jennifer com uma mão enquanto deslizava a outra para o sexo da jovem. —
Eu só quero entrar bem gostoso em você.
Com Jennifer de costas, Regina curvava um dedo para dentro de seu
sexo ao mesmo tempo em que a mordia na nuca.
Com a mão de Regina segurando firme em seus cabelos e a boca
mordendo e beijando sua nuca, Jennifer não resistiu por muito tempo. Aquele
hálito quente próximo ao seu ouvido tornou-se tão excitante quanto o dedo que
lhe invadiu devagar.

Naquela mesma noite, alguns minutos mais tarde, Regina ofereceu levar
Jennifer para casa e ambas aproveitaram o caminho para conversarem um pouco
mais sobre a delicada situação que as envolvia.

— E agora, Regina? O que vai ser?
— Estou incerta de tudo. Não faço a menor ideia de como será segunda-
feira na escola.
— Aquela história sobre você pedir demissão... Você não está pensando
nisso, está?
Regina soltou um longo e suspiro e a respondeu.
— Eu adoro aquele lugar e não gostaria de precisar pedir demissão. Lá é
uma segunda casa pra mim, mas as coisas mudaram, Jennifer. E eu preciso
dançar a nova música. Como vou trabalhar em paz sabendo que a qualquer
momento a direção irá me chamar pra falar sobre o que está acontecendo? Não
consigo viver debaixo de uma mentira. Não quero passar os meus dias naquela
instituição temendo que sua mãe apareça e faça um escândalo.
— Eu sei, Regina, eu sei. E você não imagina como me sinto culpada
por isso. Mas eu vou conversar com minha mãe. Se ela quiser foder com a minha
vida, ok. Mas ela não tem o direito de fazer o mesmo com a sua.
— Jennifer, me ouça. A culpa não é sua. Você e eu, principalmente eu,
assumimos esse risco quando nos envolvemos. Eu não vou bater de frente com a
sua mãe e nem você deveria fazer isso, pois não vai adiantar. Ela precisa de um
momento de reflexão agora.
— Eu sei que nesse momento nada irá mudar os pensamentos dela, mas
eu preciso intervir. Ela não pode querer se meter tanto na minha vida assim,
Regina. Chega a ser desrespeitoso!
Regina sentia-se entre a cruz e a espada. Por mais que ela não
concordasse com as atitudes de Morgana Meireles, ela não queria precisar se
manifestar contra ela. Para ela, seria horrível e deselegante falar mal da mãe para
a filha. Sendo assim, buscava ser o mais neutra e imparcial possível.
— Eu sei. Mas enquanto você viver debaixo do mesmo teto que ela,
será dessa forma. É sempre assim.
— Por isso vou começar a tomar as rédeas da minha vida. Não quero
viver sob ameaças, sob olhares de represália. Isso dói, me angustia.
— Você tem meu apoio. Sempre terá. Se acha que é o momento, estarei
aqui para apoiá-la. Só não esqueça que antes de qualquer coisa ela é sua mãe. E
pelo o que você me conta, sempre foi uma super mãe pra você. Talvez ela só
precise de um tempo para assimilar tudo. Não feche as portas para o
relacionamento de vocês.
— Eu não vou fechar, Regina. Não se preocupe. Sempre estarei disposta
a conversar quando ela se dispor a me ouvir — disse suavemente. — Você não
existe, sabia? Me pergunto como consegue ser tão completa.
— Por que diz isso?
— Porque além de ser uma mulher deslumbrante por fora, por dentro
consegue ser tão linda quanto. Eu acho você muito íntegra. Busca sempre o
caminho correto de tudo.
— Eu estou longe de ser íntegra, Jen. Mas eu tenho meus princípios e
tento ser fiel a eles — respondeu suavemente.
— Você tem bons princípios. Te admiro muito, Regina. E essa
admiração foi um dos caminhos que me levaram a te amar.
— Você está querendo me deixar emotiva?— comentou com suavidade
em sua voz. A morena alcançou o rosto de Meireles com uma de suas mãos e o
acariciou como sempre fazia. — Eu sou tão encantada por você, Jen. Eu desejo
muito que possamos continuar nesse caminho juntas.
Regina aproveitou a música que começou a tocar no rádio do carro e
cantou um pequeno trecho para a jovem.
— Você cantando em espanhol é pra me deixar de quatro, Regina. Eu
vou até sair desse carro antes de me apaixonar um pouco mais por você —
brincou.
— Mas eu ainda nem cantei ao pé do seu ouvido.
— Não me faça imaginar uma situação como essa agora — disse ao
sentir um arrepio percorrer sua coluna. — Obrigada por me trazer até em casa.
Se eu tiver sorte eles ainda não voltaram.
Meireles depositou um beijo nos lábios de Regina e foi surpreendida
pela mão da mulher segurando sua nuca e aprofundando o beijo. Os dedos da
morena arranhavam sua nuca de uma forma tão prazerosa, que Jennifer se
permitiu permanecer naquela carícia por alguns minutos mais.


A temida segunda-feira havia chegado. Jennifer havia aproveitado o
pequeno intervalo entre a penúltima e a última aula para conversar com toda a
classe. Por ser a representante de turma, era a encarregada da organização da
classe para o baile de formatura que ocorreria no final do ano letivo. Tendo em
vista que já era quase meado do ano, precisava agilizar.
— Todos sabem que a escola banca os custos total da formatura. Não
sabem? Porém, eles oferecem uma comemoração apenas dentro da escola. Se
quisermos que algo seja desenvolvido fora do ambiente escolar, ficará por nossa
conta os gastos extras. Sendo assim, quero que todos me entreguem um papel até
o final da semana dizendo aonde gostariam que a festa acontecesse e quanto
poderiam contribuir mensalmente para que possamos tornar possível. Feito isso,
chegaremos a um acordo sobre onde realizar a festa e eu apresentarei a sugestão
na direção da escola pra tentarmos uma autorização.
— Autorização de quê, senhorita Meireles?— A voz de Regina ecoou
nas costas de Jennifer, fazendo-a sobressaltar.
— Boa tarde, professora Vianna. Estava conversando com a classe
sobre a formatura de final do ano — explicou.
— Estão pretendendo comemorar em algum ambiente específico?
— É exatamente sobre isso que estava falando com eles. Vamos chegar
a uma conclusão e ver o que a diretoria acha.
— Normalmente a instituição não se opõe muito aos lugares, mas sim
ao conteúdo programático da festa. Não havendo bebida alcoólica eles não têm
muito porquê não autorizar — disse a professora.
— Faltam poucas semanas para as férias escolares, eu quero deixar tudo
decidido antes disso.— Jennifer comentou.
— É recomendável — disse Regina. — O tempo passa voando, quando
piscarem os olhos já estarão se formando — comentou ao sentar-se em sua mesa.
— Estou contando com isso — respondeu Jennifer ao, também, sentar-
se em seu lugar.
Durante a aula, a loira verificava a hora em seu celular a cada dez
minutos. O tempo ia passando e o nervosismo crescia em seu interior. Ela sabia
que naquela faixa de horário sua mãe já estava livre do serviço e poderia
aparecer na escola a qualquer momento. Se concentrar na aula estava se
tornando uma árdua tarefa.
De seu lugar, Regina tentava manter-se calma. Ela olhava para um
ponto fixo qualquer enquanto sua mente vagava. Ela possuía total consciência de
que seu cargo naquela instituição estava por um fio. Pedir demissão não seria
algo que pretendia fazer de imediato. Atitudes impulsivas e impensantes não
faziam seu perfil. Contudo, sabia que o afastamento seria inevitável. De um jeito
ou de outro.
Em meio aos pensamentos turbulentos daquele fim de tarde, Jennifer e
Regina se buscavam e se comunicavam com o olhar. Eram olhares intensos,
carregados de palavras que não podiam ser verbalizadas naquele momento. Não
que palavras se fizessem essenciais entre elas, pois quando se olhavam, sabiam
exatamente o que se passava dentro. E sabiam, também, que aqueles últimos
meses poderiam ser esmagadores.




Capítulo 27

— Bom dia, menina de ouro — disse Regina ao surpreender Jennifer em
seu treino de boxe. A professora estava com sua manhã livre e resolveu fazer
uma pequena surpresa para a ela.
Jennifer havia acabado de sair do vestiário e ainda se aquecia quando
uma prazerosa voz, vinda de trás, sussurrou ao pé de seu ouvido, a fazendo
sorrir. Além de reconhecer aquela rouca voz, apenas Regina a chamava daquela
maneira.
— Regina! Que surpresa maravilhosa!— respondeu ao envolver a
morena em um abraço carinhoso, conseguindo sentir um cheiro fraco e sutil de
cigarro ao fundo.
— Estava com a manhã livre e resolvi vir encontrar você. Paguei uma
diária na academia pra cumprirmos aquela promessa de treinarmos juntas —
disse ela, sorrindo, após desmanchar o abraço.
— Obrigada por estar aqui. Vai ser ótimo dividir esse momento com
você. Vamos? Te acompanho ao vestiário.— Jennifer a segurou na mão e
caminharam juntas até o local.— Oh God...— murmurou ao avistar Regina se
trocando. A professora vestiu-se com um conjunto de top e short de coloração
preta. Ambas as peças inteiramente ligadas ao corpo da mulher.
— O que você tanto olha, senhorita Meireles?— perguntou ao fingir
inocência.
— Nada...— respondeu vagamente ao aproximar-se. — É que às vezes
eu me pergunto se você é real.— Meireles tocou a face de Regina com a mão e a
acariciou.
— Pensei já ter mostrado a você o quanto sou real, garota.— Regina
conduziu lentamente o corpo da jovem e a fez encostar-se sutilmente contra a
extensa pia de mármore.
— Garota? Ah não, Regina. Voltamos com isso?— reclamou ao segurar
a cintura da morena com as duas mãos.
— Eu estou brincando, Jennifer — riu. — Você sabe que é uma mulher
pra mim.— Sorriu. — Eu adorei nossa última noite, aliás — comentou ao
aprofundar os castanhos nos olhos que a encaravam. — Ainda não havia tido
oportunidade de dizer isso a você.
— Eu também gostei muito — respondeu ao sustentar o olhar da
professora. — Foi diferente.
— Sim, foi ainda mais gostoso. É cada vez mais delicioso estar com
você — murmurou.
— Meu Deus, Regina... Nem começamos a treinar e eu já estou ficando
quente. Assim eu não dou conta — disse ao sentir seu corpo reagindo às palavras
da mais velha.
— Eu sei que você dá conta. Você sempre dá — provocou ao depositar
uma das pernas entre as pernas da loira, encaixando-se ali. Regina pressionou
sua coxa contra o sexo de Jennifer e começou a roçar de modo a excitá-la.
— Regina, não faz assim, está me deixando louca de vontade.
— Vontade de quê? Diz pra mim — instigou, depositando os lábios
sobre a pele alva do pescoço, onde traçou um caminho da curva até o pé do
ouvido. — Vontade de me deixar ... — Regina concluiu a frase em um murmúrio
contra o ouvido de Meireles.
— Puta que pariu.— Disse Jennifer, eufórica, ao passar a mão pela
própria testa.
— O que você tomou essa manhã?— perguntou. — Não que eu esteja
reclamando.
Meireles sentia a pele de seu corpo aquecendo ao mesmo tempo em que
suas pernas pareciam querer bambear. Era sempre assim quando estava com
Regina. E ela se questionava internamente se seu corpo algum dia se
acostumaria a toda essa intensidade que a morena emanava. No fundo, torcia
para que não. A jovem muito desfrutava desse desnorteio que lhe arrebatava.
— Tomei um cappuccino — respondeu a mais velha. — Mas devo
confessar que amanheci ainda mais louca por você. Talvez tenha me visitado em
sonhos.
— Suponho que tenha sido um sonho erótico.
— Oh... Certamente foi — disse ao esboçar um sorriso sacana. — Você
quer que eu me controle?
— O quê você acha?— perguntou Jennifer ao separar sutilmente as
pernas para que Regina pressionasse ainda mais sua intimidade com a coxa.
— Eu acho que você não tem a menor intenção de me barrar. Você quer
tanto quanto eu. Sempre.
Jennifer estava se segurando para não gemer às investidas da morena
em sua intimidade. Ela se perguntava se Regina estaria sentindo sua umidade
transpassando de sua calça para a coxa da mulher.
— Vamos sair daqui.— Jennifer sussurrou. — Me leva pro seu carro.
As duas mulheres desceram de maneira discreta para o estacionamento
da academia e entraram no veículo através das portas traseiras para que
pudessem obter mais espaço usando os bancos de trás.
— Você é tão gostosa. Eu tenho vontade de arrancar pedaços seus.—
Disse Regina. A morena estava deitada sobre a loira nos bancos de trás e
distribuía algumas mordidas em seu pescoço.
Jennifer se sentia refém das carícias de Regina. E ela adoraria passar
seus dias sendo prisioneira daquela mulher. Meireles era inteiramente viciada em
tudo o que ela lhe despertava. Imaginar-se na ausência contínua daquela voz,
daquele cheiro, daquela pele e de todos os carinhos oferecidos pela mais velha a
entristecia. Entretanto, aquele não era o momento para deixar que sentimentos
ruins tomassem conta.
— Você pode o que quiser comigo.— Jennifer respondeu.
— Não, meu amor. Infelizmente eu não posso — disse Regina. Seus
pensamentos por um momento afastaram-se dali e a atual situação de seu
relacionamento com Jennifer passou em sua mente feito um cometa. A morena
queria, de fato, poder fazer o que quisesse com Meireles. Ela queria poder amá-
la sem quaisquer barreiras.
— Sim, você pode — respondeu a loira ao tocá-la no rosto com suas
duas mãos, a fazendo voltar de seus devaneios. — Isso não pode ser tão errado,
Regina. Você e eu — disse ao buscar o par de olhos da mulher. Ela sabia
exatamente o que rodeava os pensamentos da mais velha.
Regina fechou os olhos por breves segundos e tornou a abri-los,
mirando Meireles debaixo de seu corpo; mirando a pessoa que a transbordava
como ela sempre quis e necessitou. Em algum lugar dentro dela uma voz dizia
que seu tempo com Jennifer estava se esgotando. Todavia, desligaria aquela voz
e desfrutaria com Jennifer do que poderia ser a última vez.
— Não. Não pode ser tão errado — respondeu ao arrastar os lábios pelo
maxilar de Jennifer e beijá-lo. — E se for errado, deixa ser. Eu não consigo nos
barrar. Eu não consigo e não quero me parar.— Regina mergulhou uma de suas
mãos por dentro do top que a loira usava e a espalmou no seio de Jennifer,
apertando-o.
— Adoro quando você o aperta assim — comentou a loira ao expressar
um sorriso sacana, fazendo a mais velha apertá-los ainda mais.
— O quê mais você gosta?
— Gosto quando se alimenta deles — respondeu prontamente.
Regina sorriu maliciosamente, deslizou a peça da jovem para fora e
levou os lábios até os seios, sugando os mamilos de maneira alternada. Ela
circundava a língua úmida no local e também depositava algumas mordidas.
Meireles fechou os olhos e desfrutou da boca macia, quente e molhada
de Regina em contato com seus mamilos. Ela enlouquecia cada vez que a
morena a sugava com força como se fosse lhe levar um pedaço. As mordidas
também muito agradavam Meireles. Regina sabia o limite ideal entre dor e
prazer.
Em sociedade Regina se comportava como uma perfeita dama. Classe e
elegância eram duas coisas que muito esbanjava. Porém, entre quatro paredes, ou
entre as quatro portas de um carro, Regina perdia toda sua compostura.
— Adoraria brincar entre suas pernas e permitir que meus dedos
molhassem com todo seu prazer.
Jennifer não desgrudava os olhos de Regina, isso tornava todo o
erotismo ainda maior. Ela sabia que um dia aquela mulher à sua frente ainda a
levaria à loucura.
— Como você se encontra?— perguntou a mais velha.
— Molhada, quente, precisando que você me preencha.
— E o quê eu quero fazer, Jen?
— Você quer me invadir lentamente — respondeu.
— Sim. Eu quero entrar bem devagar em você.
— Você vai me enlouquecer.
— Não mais do que você já está me enlouquecendo.
Regina afastou-se de Jennifer e deslizou o short e a calcinha da jovem
para fora. Em seguida, tornou-se a deitar-se sobre ela e a tocá-la em seu centro.
Meireles não resistiu e soltou um gemido. Ter a mão ágil de Regina entre suas
pernas era insubstituível. A morena, por sua vez, esfregou o sexo da loira e
lubrificou os dedos antes de deslizá-lo por sua entrada.
— Você vai me matar de desejo, Jennifer — comentou. Regina deslizou
os dedos para fora, os esfregou no ponto de prazer de Jennifer, estimulando-a, e
em seguida voltou a preenchê-la.
— Oh porra...— Xingou ao senti-la invadindo cada vez mais fundo. —
Isso... Regina... Mais forte.
— Porque eu deveria ir mais forte?— instigou.
— Porque você está louca pra me sentir contraindo em seus dedos.
Regina esboçou um grande sorriso cafajeste e preencheu a face de
Jennifer com beijos. Ela não poderia ter encontrado um alguém tão compatível
quanto Meireles. Elas eram o encaixe perfeito. E ainda falando em encaixe, as
duas trocaram de posição e Regina sentou-se sobre o colo da mais nova.
A morena tocou uma das mãos de Jennifer e a pôs dentro da própria
calcinha em um gesto para que a jovem a estimulasse enquanto ela voltava a
penetrá-la fortemente.
Meireles sorriu maliciosamente à atitude de Regina e começou a
massagear o sexo da morena com a ponta de seus dois dedos ao mesmo tempo
em que sentia as investidas fortes da mulher entre suas pernas. Com a mão livre,
apertava a bunda de Regina e a puxava para frente, a fazendo mover-se em seus
dedos.
— Você gosta quando sua mulher senta sobre você?— perguntou de
maneira sensual enquanto preenchia e era preenchida por Jennifer
simultaneamente, ditando a frequência de ambas as investidas. Ela se movia no
colo da jovem de acordo com o ritmo que lhe agradava.
— Amo. Amo quando minha mulher vem para o meu colo...— Meireles
deslizou a mão para fora do contato com a bunda de Regina, segurou em sua
nuca e a beijou com urgência enquanto se invadiam e se provavam cada vez
mais rápido, fundo e apertado. Regina movia-se e rebolava em um ritmo
alucinante.
O tempo que desfrutaram dentro do carro foi curto, mas, o suficiente
para satisfazerem seus desejos mais urgentes e carnais.


— Não seria nada mal poder iniciar minhas manhãs de treino dessa
forma — comentou Jennifer após retornarem para a academia.
— Eu gostaria de terminar um dia exaustivo de trabalho assim. Seriam
ótimas noites — disse Regina.
— Então seria pela manhã e à noite? Teríamos que chegar a um acordo!
— comentou Meireles aos risos. — Você teria essa disposição?— perguntou ao
olhá-la. As duas estavam lado a lado arrumando alguns equipamentos de
ginástica.
— Está me chamando de velha, Jennifer Meireles?— exclamou ao
erguer uma de suas sobrancelhas.
— Eu? Jamais. Mas você sabe, já não é nenhuma novinha — implicou.
— Não me faça dar a resposta que você merece — respondeu com
firmeza na voz. — Agora vamos nos alongar
Meireles abriu um largo sorriso e iniciou alguns minutos de
alongamento com Regina para que em seguida pudesse começar a ensinar a
mulher algumas primeiras noções de boxe.
— Eu tenho uma surpresa pra contar a você — comentou em meio ao
aquecimento.
— Qual?
— Eu consegui um emprego!— respondeu animada. — Ia contar assim
que você chegou, mas acabamos nos ocupando com outros assuntos.
— Como assim arrumou um emprego, Jennifer? E a escola? O boxe?
— Não se preocupe, não irá atrapalhar meus estudos. Vou trabalhar
aqui na academia como recepcionista aos finais de semana. Essa vaga estava
disponível há semanas, pois a moça da recepção vai entrar de licença a
maternidade e não pretende voltar tão cedo. Conversei com os responsáveis e me
aceitaram. Isso não é ótimo? O salário não é uma maravilha, mas eu preciso
começar de algum lugar.
— Você tem certeza que isso não irá atrapalhar seus estudos? E nos dias
em que você precisar estudar para as provas?
— Terei o tempo da noite pra isso e as manhãs dos dias em que não
tenho treino — comentou. — Pensei que fosse ficar orgulhosa de mim.
Regina pôde sentir tristeza naquela voz
— E eu estou! Estou cheia de orgulho de você, meu amor.— A mais
velha tocou o rosto de Jennifer na região do maxilar e uniu por breves segundos
sua testa à dela. — Apenas me preocupo com seu bem estar físico e psicológico.
— Eu vou saber levar. De toda forma agradeço sua preocupação —
disse suavemente. — Minha mãe não me deu outra escolha. Meus dias estão
insuportáveis. Tudo o que faço é motivo para que ela transforme em uma
confusão. Estou cansada!
— Eu sinto muito, Jen. Se você aceitasse eu a convidaria pra morar
comigo. Ou alugaria um apartamento pra você se assim preferisse. Me dói saber
que precisa viver seus dias dessa forma.
— Eu jamais aceitaria uma situação como essa, Regina. Você sabe.
Nem uma e nem a outra. Preciso aprender a caminhar com as próprias pernas.
Isso me fará bem.
— Eu sei. Mas saiba que pode contar comigo pra tudo o que você
precisar.
— Obrigada.— Sorriu. — Mês que vem acontecerá um campeonato
muito importante que ocorre anualmente pra nós. É a primeira vez que irei
participar, pois nos anteriores eu ainda não possuía a idade mínima obrigatória.
Vou me empenhar pra ser a campeã. O prêmio será em dinheiro e o valor é
bastante considerável.
— Jennifer, isso é ótimo! Tenho certeza que irá vencer. Eu admiro
muito a sua determinação.
— Obrigada. Pode ter certeza que dessa vez darei o meu melhor. E com
o prêmio eu poderei levar você pra jantar no melhor restaurante desse país!—
brincou. — Quer dizer, conseguirei levar em muitos melhores restaurantes desse
país!
— Você é uma boba, Jen!— disse ao sorrir, oferecendo à jovem o
sorriso largo que ela tanto gostava de admirar. — Eu já ficaria satisfeita apenas
com alguns tacos.
— Oh, então eu a levarei pra comer tacos!— Sorriu. — Agora vem, vou
te ensinar a enrolar a bandagem nas mãos antes de por as luvas. Depois eu
explico a você um pouco mais sobre esse campeonato.


— Você fica uma graça com esse boné!— Regina elogiou. Ela e a loira
já haviam trocado de roupa, deixado a academia e a mais velha dirigia no sentido
da casa de Jennifer.
— Obrigada!— respondeu ao sorrir. Meireles usava uma calça jeans de
lavagem clara, camiseta branca e uma blusa xadrez vermelha, aberta. — Não
consigo imaginar você usando um. Nosso estilo é tão diferente.— Jennifer
comentou. — Você é feminina até o último fio de cabelo. Eu já sou mais moleca
mesmo.
— Eu adoro seu estilo. É uma graça — comentou, expressando um
pequeno sorriso. — Mas eu ainda tenho as lembranças de você no coquetel do
Resort e também na festa do colégio. Estava linda e super feminina! Aliás, você
é linda, Jennifer. De todas as formas que alguém pode ser.
— É, eu tenho meus momentos mais femininos. Mas apenas em
ocasiões especiais.
Na metade do trajeto até a casa de Jennifer, as duas mulheres avistaram
a vitrine de uma loja de equipamentos e itens para praticantes de todos os estilos
de luta.
— Será que podemos nos atrasar alguns minutos?— perguntou
Meireles. — Eu nunca havia notado a existência dessa loja. Deve ser nova!
Regina sorriu à empolgação da jovem e concordou em gastar algum
tempo olhando tudo o que a loja oferecia. Porém, visto que já estavam em cima
da hora e que em pouco tempo precisariam estar no colégio, não se demoraram
no local.
— De todas as coisas que vimos, o quê você mais gostou?— perguntou
Regina.
— Do par de luvas douradas!— respondeu prontamente.
— Então elas serão suas!— disse ao sorrir.
— Regina, não inventa!— retrucou. A jovem sempre se sentia
desconfortável quando a mais velha lhe queria custear algo.
— Não começa, Jennifer. Vou comprar e ponto final. Onde já se viu eu
não poder presentear a minha namorada?— disse naturalmente, arrancando
alguns olhares de pessoas próximas.
— Como assim... Namorada?— indagou Meireles, confusa.
— Pensei que isso já estivesse claro entre nós.
— Não. Quer dizer, sim! Não... É que...— Jennifer atrapalhou-se nas
palavras. — Nunca rolou um pedido oficial entre nós, então eu não tinha certeza.
É que, você sabe, as pessoas da minha idade costumam fazer esse pedido. Mas
eu não sei como os mais velhos lidam com isso.— Meireles estava visivelmente
envergonhada. Suas bochechas estavam tão vermelhas quanto tomates.
— É a segunda vez que você me chama de velha hoje, senhorita!—
brincou, fingindo irritação. A morena entrelaçou os dedos nos dedos de Jennifer
e a fez olhar em sua face. — Se você precisa de um pedido oficial, eu o faço.—
Regina levou os lábios até o ouvido da jovem e soltou um murmúrio que fez a
pele da loira arrepiar. — Me deixa namorar você?
— Deixo. Todos os dias que nos forem permitidos...— respondeu em
meio um sorriso, segundos antes de depositar um beijo no canto dos lábios de
Regina. Nesse momento, alguns curiosos observaram e até sussurraram entre si.
Minutos mais tarde, após Regina ter conseguido convencê-la a aceitar o
presente, as duas já estavam estacionadas em frente a casa da mais nova.
— Obrigada pelas luvas de boxe. Vou usá-las em homenagem a você
mês que vem no meu campeonato mais importante.
— Me sentirei lisonjeada.— Sorriu. — Agora preciso ir e também
preciso deixar você entrar para se arrumar. Já estamos atrasadas.
A loira despediu-se de Regina com um beijo em seus lábios e deixou o
veículo.


— Boa tarde, Jennifer!— disse Estela ao avistá-la cruzando o portão
interno do colégio. Por coincidência, Regina também o cruzava. Ambas haviam
chegado no mesmo horário.
— Boa tarde — respondeu seca.
— Impressão minha ou você e a professora Vianna chegaram juntinhas?
— comentou em voz alta para que Regina e alguns presentes também pudessem
escutar. Ela estava carregada de ironias.
— O quê você está querendo insinuar dessa vez, Estela? Seja mais
direta, por favor.
— Eu não estou insinuando nada. Estou dizendo. Com certeza vocês
passaram a manhã juntas.
— Cala essa boca, garota! Você não sabe o que está dizendo — disse
Jennifer. A loira subiu e prosseguiu caminhando pelo corredor do segundo piso
na tentativa falha de ignorar Estela, que a seguiu.
— Qual foi, Jennifer? Todos sabem que você trepa com a professora
Vianna!— provocou, fazendo-a interromper os passos e olhar para trás.
— Quer saber? Vai se foder!— gritou Jennifer, irritada.
— Não. Isso eu deixo pra você e ela fazerem juntas — rebateu.
Há meses Meireles respirava fundo e tentava ignorar todas as
provocações de Estela. Contudo, hoje a menina havia passado dos limites. Seu
sangue esquentou até um nível onde não mais conseguiu controlar-se. Então,
avançou sobre Estela e depositou um soco em sua face.
— Você está ficando louca?— gritou Estela com a mão sobre o rosto.
Sua boca estava aberta e seus olhos arregalados. O soco de Jennifer havia sido
tão forte, que fez seu nariz sangrar.
— A única louca aqui é você!
— O quê está acontecendo aqui?— exclamou a diretora ao sair de
dentro da sala dos professores.
— Jennifer...— disse Regina ao, também, sair da sala.
— Se prestasse mais atenção no colégio saberia exatamente o que se
passa aqui — disse Estela com seriedade ao alternar o olhar entre Jennifer,
Regina e Elizabeth. Feito isso, a menina deu as costas e deixou o ambiente.
— O quê ela quis dizer com isso?— A diretora questionou.
— Precisamos conversar — disse Regina à Elizabeth.
— Não foi nada! Ela está com ciúmes do namorado comigo —
disfarçou a loira.
— Senhorita Meireles, eu não vou permitir agressão nessa instituição.
Receberá uma advertência na caderneta escolar.
— Mas foi ela que começou com as provocações!— rebateu.
— Ela também receberá a dela — disse com seriedade. — E você,
senhorita Vianna?— comentou ao direcionar o olhar para a morena. — Vamos
entrar pra você me dizer o quê quer?
— Desculpe atrapalhá-las, mas eu preciso esclarecer uma dúvida
urgente com a professora Vianna.— Meireles se meteu. Ela não permitiria que
Regina contasse.
— Então nos falamos depois, Regina — disse Elizabeth, segundos antes
de descer para o primeiro piso.
— Você não está pensando em abrir o jogo, está?— sussurrou a loira,
nervosa.
— Ela machucou você?— perguntou Regina. A preocupação era
evidente em sua voz e expressões faciais.
— Você não respondeu minha pergunta.
— Sim. Eu pretendo dar um fim nessa confusa. Vou tomar uma atitude.
Não posso mais prosseguir dessa forma. Agora me diga se ela machucou você.
— Não machucou. Mas eu sim a acertei em cheio. Desculpe, Regina,
mas ela passou dos limites. Estava gritando no corredor que você e eu temos ido
pra cama. Eu já estou vivendo um inferno dentro de casa, não vou permitir que
ela torne a minha vida aqui dentro um inferno também.
— Quanta falta de respeito e bom senso dessa menina. Não posso
permitir que as coisas continuem tomando esse rumo. Darei um fim nisso hoje.
— Regina, não faça isso — murmurou com os olhos arregalados. A
mais nova estava visivelmente aflita. — Eu me sentiria péssima ao saber que fui
a culpada da sua demissão. Eu jamais me perdoaria. Não me causa essa dor, por
favor. Só faltam duas semanas para as férias escolares — pediu. Os olhos verdes
estavam banhados em água.
— Não posso prometer nada a você, mas vá tranquila para sua aula. Por
hoje eu não conversarei nada com ela.


— Eu estou péssima, Beatriz. Péssima.— Meireles e sua amiga
conversavam juntas no ônibus ao final de mais um dia de aula. — Minhas notas
nesse bimestre despencaram, hoje pela manhã senti cheiro de cigarro na Regina
e na hora do intervalo a vi fumando do lado de fora do portão. Eu não sei mais o
que fazer. Me parte o coração saber que ela está assim, saber que possivelmente
irá pedir demissão por minha causa. Eu a estou fazendo mal.
— Eu não sei nem o que te dizer, amiga. A situação de vocês é
complicada demais.
— Não precisa dizer nada. Você já faz muito em me ouvir —
respondeu. — Algo dentro de mim diz que meu tempo com ela está chegando ao
fim. Eu sou apenas uma garota. Não tenho nada a oferecê-la, Bea. Nada. Apenas
trouxe problemas para a vida dela.— Por conta do choro entalado na garganta, a
voz de Jennifer saía cortada. — Acho que seria muito egoísmo da minha parte
prendê-la a mim. Mas uma coisa eu digo a você: eu vou me transformar na
pessoa que ela merece. Vou trabalhar e buscar minha independência o mais
rápido que eu puder; por ela e por mim. Sei que vai demorar algum tempo, mas
eu me tornarei a mulher que ela precisa ao lado.
— Mas você já é essa pessoa, Jen!
— Não. Eu não sou. Ainda não.


Ao chegar em casa, Jennifer foi surpreendida com seu aparelho celular
sobre a cama. A loira questionou-se sobre o que poderia ter acontecido para que
sua mãe voltasse atrás na decisão de apreendê-lo.
Alguns minutos se passaram e Meireles começou a ouvir vozes que a
chamavam; era Diogo e Morgana que a aguardavam na cozinha para que
jantassem juntos.
— Resolveu devolver meu celular? Algo mudou?— questionou. A jovem
estava sentada à mesa junto a Diogo e sua mãe.
Quanto mais a data do casamento se aproximava, ainda mais presente
Diogo se mostrava. Meireles estava adorando tê-lo com mais frequência em sua
casa. Pois além de ser uma companhia adorável, ele a ajudava quando o assunto
era sua mãe.
— Resolvi devolvê-lo porque não quero que você e eu fiquemos nesse
clima ruim. E também está liberada para voltar a sair, até porque não faz sentido
privar você desse tipo de coisa se o perigo convive com você todos os dias
naquela instituição.
— Morgana!— Diogo repreendeu.
— Deixa, Diogo — disse Jennifer ao tocar o braço do homem. — Eu já
estava estranhando um bom ato vindo dela — comentou a loira.
— Jennifer, eu não quero continuar brigando. Não quero sentir que a
cada dia que passa você está mais longe de mim. Devolvi seu celular e também
não vou mais impedi-la de ir pra onde desejar. Mas uma coisa eu peço a você.
— E o quê seria?
— Quero que termine tudo o que você tiver com essa mulher.
— Então você pode ficar com esse celular e eu permanecerei trancada
nessa casa, pois isso eu não irei fazer!— disse ao levantar-se da mesa.
— Estou tentando ficar de bem com você. Mas você também precisa me
ajudar!
— Você chama isso de ficar de bem? Continua negando quem eu sou!
Continua me tirando o direito de escolher com quem eu quero estar e quem eu
devo amar!
— Isso não é amor!— Morgana gritou. — Mas saiba você que se ainda
não apareci naquela escola foi porque eu quero te dar a oportunidade de por um
fim nisso sem maiores estragos.
— Oh! E eu devo agradecer? Obrigada, mamãe, por ainda não ter
terminado de estragar a minha vida!— ironizou.
— Jennifer, não fale comigo nesse tom de voz!
— Se acalmem, por favor! Será que não se pode ter uma refeição em
paz nessa casa?— Diogo se pronunciou.
— Podem terminar o jantar em paz. Estou subindo para o meu quarto.
Perdi completamente o apetite.— Jennifer jogou o guardanapo sobre a mesa e
caminhou em direção a escada de acesso ao segundo piso. Porém, antes de subir,
pausou seus passos ao ouvir as últimas duras palavras vindas de Morgana.
— Você vai terminar com essa mulher, ou eu aparecerei na sua escola e
colocarei eu mesma um fim nisso.
Tentando não deixar que as lágrimas que habitavam seus olhos
escorressem, Meireles lançou um último olhar sobre Morgana e subiu para o
quarto; desabando sobre a cama logo em seguida.
— Você vai perder a sua filha! E não será para essa Regina, não. Será pra
você mesma!— Diogo levantou-se agressivamente da mesa e subiu até o quarto
de Jennifer que, após algumas batidas na porta, a abriu.
— Eu já não sei o que fazer, Diogo — disse em meio ao choro
silencioso. — Me sinto tão perdida e desamparada por aquela que deveria ser
meu amparo.— Meireles o envolveu na cintura com seus braços e desmanchou-
se em lágrimas no colo do homem.
— Eu não tenho nem coragem de pedir que você releve as palavras de
sua mãe. Morgana magoou não apenas a você, mas também a mim. Eu
desaprovo por completo essa atitude dela.
— Ela nem ao menos dá uma oportunidade para Regina. E eu sonhei
tanto com o momento em que iria apresentá-las. Idealizei tanto a Regina sendo
bem recebida e jantando conosco naquela mesa. Tanto...
— Eu não posso prometer que isso um dia será possível, mas eu
adoraria conhecer essa mulher. E se ela quiser, estou totalmente disposto a isso.
Não será um jantar em família como você gostaria e tanto desejou, mas poderia
ser um lanche em algum lugar entre ela, você e eu.
— Faria isso por mim? Seria muito importante saber que pelo menos
alguém da minha família a conheceu e a aceitou.
— Você me considera sua família?— perguntou com um sorriso nos
lábios.
— Sim. Eu adoraria ter tido um pai como você.
— Quem sabe você e eu não fomos pai e filha em uma outra vida? Em
uma outra realidade?— disse ele, suavemente, enquanto acariciava os cabelos de
Jennifer e a confortava em seus braços.
— É, quem sabe...


O relógio sobre a mesa do escritório de Regina marcava exatamente
23:15. Com um cigarro entre seus dedos e uma caneta na mão oposta, terminava
de concluir as provas finais de seus alunos. O segundo bimestre de aula estava
sendo encerrado.
Ao chegar na prova de Jennifer, um turbilhão de pensamentos e
sensações começaram a povoar sua mente e corpo. As respostas da loira
começaram a se embaralhar entre os pensamentos inquietos da professora.
Regina tentava sorrir à lembrança dos momentos que tivera com a jovem mais
cedo, porém, o ocorrido na escola parecia ser mais forte e manchava com tristeza
e preocupação a alegria da manhã que compartilharam.
A sensação de impotência estava consumindo Regina aos poucos. O
querer e não poder corroía seu peito mais rápido que o cigarro em sua mão.
Como se não bastasse toda a complexidade da situação na qual se
encontrava, Robson resolveu voltar a procurá-la. Havia três ligações perdidas do
homem em seu celular.
Por hora o cigarro estava sendo o melhor companheiro de Regina. Ela
buscava nele o relaxamento que precisava para conseguir suportar toda aquela
situação. Seu vício estava voltando com força, assim como todos seus
transtornos obsessivos compulsivos. Na manhã que passara com Jennifer
depositou as mãos na camisa da jovem incontáveis vezes para arrumar as
mangas e a gola. Sem mencionar a insistência em mexer nos equipamentos da
academia e deixá-los todos simetricamente alinhados. A morena agradecia à
Jennifer internamente pela paciência de aturar essas suas questões.
Se passaram alguns minutos e o celular da professora notificou sobre a
mesa, a fazendo depositar o cigarro no cinzeiro e tomar o aparelho em sua mão.
Se tratava de uma agradável mensagem de Jennifer.

Estou novamente com meu celular! Nossos finais de noite não precisam
mais ser tão tristes.

Que maravilhosa surpresa! Estava nesse momento pensando em você.

Eu também estava pensando em você. Gostaria de poder estar aí.

Seria ótimo se você estivesse. Mas não poderia querer fuçar minhas
provas! Acabei de corrigir a sua, inclusive.

E qual foi a minha nota?

Você acha mesmo que irei dizer, Jennifer? Sem chance.

Droga! Qual a vantagem de namorar a professora se não posso nem
saber minha nota antecipadamente?

Oh, então é pra isso que você me quer? Sempre suspeitei que houvesse
algum interesse por trás dessa história.

Oh droga! Fui descoberta!— brincou.

O que eu não daria pra ver você me dizendo isso agora? Sua voz ecoou
na minha mente e eu imaginei a exata expressão que você esboçaria. Eu amo
esse seu jeito moleca.

E eu amo você inteira.

Eu também amo você.

Você é meu primeiro amor, Regina. E dizem que o primeiro amor a
gente nunca esquece. Mas também dizem que nós nunca conseguimos ter um
futuro com a primeira pessoa que amamos.

Quando conheci você, Jen, seu par de olhos me pareceram tão
familiares como eu jamais consegui explicar. E quando eu estava em casa,
justamente na cadeira onde me encontro agora, e tive o primeiro contato com
seus pensamentos escritos naquela folha, eu senti algo. Você sempre se destacou
de todo o resto. E a maneira como nos aproximamos foi tão natural e ao mesmo
tempo tão intensa, que eu acredito que exista alguma força sobre nós que nos
quer juntas. Eu acredito muito no cosmos, na força do universo e também a do
querer. E por mais que tudo aparente estar contra nós, tem uma força que nos
atravessa. Mas eu também acredito fielmente no tempo e no momento certo para
que tudo flua. E eu sinto que estou tentando atropelar esse tempo.

Eu sinto algo parecido. Sinto que você e eu deveríamos acontecer, mas
quanto mais eu tento correr até você, mãos invisíveis parecem me puxar para
trás. Nosso amor se mostra pra mim como o certo, mas...

Mas não é a hora. Não é?

A resposta de Jennifer demorou longos minutos para chegar. Seus olhos
estavam inteiramente marejados e sua mente não estava preparada para pensar
sobre aquilo.

Eu gostaria de fazer uma pergunta a você. Mas precisa ser
pessoalmente. Não é algo que deva ser dito por mensagem. E eu quero estar
olhando nos seus olhos quando ouvir a resposta.

Vamos tentar conseguir um momento a sós e você me faz.

Ok. Vou tentar dormir agora. Não vá dormir muito tarde.

Devo permanecer acordada um pouco mais. Ainda tenho provas de mais
duas turmas para corrigir.
Boa noite, Jen. Sinta-se beijada em cada parte do seu corpo.

Boa noite, Regina. Espero sonhar com você. Ao menos dessa forma eu
posso fingir que esteve comigo durante toda a noite.



Capítulo 28

Era a manhã de mais um dia. Regina, por ausência de sono, havia
levantado da cama mais cedo que o habitual. Sendo assim, para aproveitar o
tempo livre a mais, resolveu gastá-lo limpando e arrumando alguns cômodos de
sua casa.
Entre uma arrastada de móvel aqui, uma transferência de objetos de lá,
Regina nunca conseguia manter-se satisfeita. Era como se cada coisa em sua
casa não se encaixasse em lugar algum.
— Por quê me olha assim?— perguntou ao avistar Bóris deitado sobre o
tapete da sala. — Não está gostando da arrumação?— O questionou, recebendo
um baixo miado em resposta. — Confesso que também não. Por mais que eu
arrume e coloque tudo no lugar, nunca é o suficiente. Parece sempre bagunçado
pra mim.— Suspirou. — Acho que o problema sou eu, meu amor. Sua mamãe
não tem estado nada bem.
Regina já havia mexido na posição dos quadros de sua casa incontáveis
vezes naquela manhã, e ela sempre julgava ainda permanecerem tortos. Era
como se a desordem em sua mente estivesse refletindo diretamente em seu lar.
— Eu preciso relaxar — disse a Bóris.
Ela daria aula particular de espanhol naquela manhã e precisava manter
a tranquilidade de sua mente se quisesse desempenhar um bom trabalho. Sendo
assim, parou de lutar com os móveis e objetos da casa, preparou seu chá favorito
de maçã com canela e tomou um relaxante banho morno.
O decorrer de todo aquele dia foi angustiante para a morena. Além de
lidar com a incerteza de sempre a respeito de Morgana aparecer ou não no
colégio, ela também precisou controlar a ansiedade que lhe acometera desde que
Jennifer a convidou, por ligação na noite anterior, para conhecer Diogo. E tendo
em vista que esse encontro aconteceria ao final da tarde de hoje, Regina era uma
pilha de nervos.


— Você vai adorá-la, Diogo!— disse Jennifer ao encontrar o homem na
saída do colégio. Diogo havia largado do trabalho e passado para buscá-la antes
de irem de encontro à Regina.
— Ela aceitou me encontrar por livre e espontânea vontade ou você
insistiu? Até porque, ela deve estar traumatizada desde o encontro trágico com
sua mãe — comentou ao entrar no carro com Meireles. Os três haviam
combinado de se encontrarem em um aconchegante café bistrô localizado
próximo à casa da professora.
— Nem me lembra da minha mãe — comentou com tristeza. — A
Regina não apenas aceitou, como adorou a ideia. Se tem algo que ela não quer é
precisar mentir ou esconder nosso relacionamento.
— Ótimo. Então vamos logo, que estou ansioso para conhecê-la!—
disse, segundos antes de dar partida no carro e dirigir para longe dali.
Ao adentrarem a lanchonete, Meireles rapidamente avistou Regina
sentada ao longe em umas das mesas dispostas no lugar. O local possuía uma
decoração rústica com piso e mesas de madeira, cadeiras de ferro na cor preta,
luminárias de teto e alguns livros dispostos em prateleiras espalhadas em todo o
lugar para que os clientes pudessem desfrutar de uma boa leitura enquanto
permanecessem por lá, se assim preferissem.
O ambiente era silencioso, pouco movimentando, com arquitetura e
decoração visualmente sérias. Não era à toa que se tratava do estabelecimento
favorito de Regina.
— Ali está ela — murmurou Jennifer ao apontar para a mais velha.
Ao avistar Regina, que usava camisa social branca de manga comprida,
calça social preta de cintura alta e um sobretudo cinza, aberto, por cima da
roupa, Diogo não pôde deixar de observar a elegância e a beleza que a mulher
exalava. O habitual óculos de armação preta também estava presente em Regina.
— Oi!— disse a loira ao aproximar-se da mesa. Meireles carregava um
grande sorriso nos lábios.
Regina levantou o olhar, avistou Jennifer ao lado do homem e
automaticamente julgou se tratar de Diogo.
— Olá!— disse educadamente ao levantar-se da cadeira.
— Olá Regina..?
— Vianna — disse ao estender a mão para Diogo. A professora alterava
o olhar entre a loira e o homem.
— Prazer, Regina Vianna. Me chamo Diogo, sou o futuro padrasto de
Jennifer.
Feitas as apresentações, os três tomaram um lugar à mesa e começaram
a dialogar. Em sua cadeira, Meireles sentia-se nervosa. Ela temia que por algum
motivo Diogo também rejeitasse Regina; principalmente pelo fato da mulher ter
quinze anos a mais.
— Primeiramente eu gostaria de pedir desculpas pela Morgana.
Gostaria que você soubesse que eu desaprovo inteiramente essa atitude dela. O
que tem feito com Jennifer tem sido péssimo. E a forma como chegou até você
também não foi nada racional. A Morgana nunca foi de se comportar dessa
forma. Eu não sei o que está acontecendo.
— Eu disse isso à Regina, Diogo. Minha mãe surpreendeu
negativamente todos nós.
— Eu imagino que para um pai e uma mãe preconceituosos não deva
ser nada fácil descobrir sobre a homossexualidade de um filho da forma como
ela descobriu. E saber que a filha está envolvida justamente com a professora
ajuda a agravar a situação. Mas nada justifica as atitudes extremas da Morgana
— disse ele.
— Eu adoraria poder ter a oportunidade de mostrar à mãe da Jennifer
que amo verdadeiramente a filha dela, e que nunca foi uma brincadeira o que
compartilhamos — disse Regina com seriedade ao manter contato visual com
Diogo. — Sei que a partir do momento em que me envolvi com ela eu quebrei
minha ética profissional. Mas a Jennifer é tão incrível, que eu não a perderia por
isso. O quê é essa ética perto do que eu sinto por ela?— disse, fazendo a jovem
expressar um sorriso enquanto a observava falar.
— Eu não me importo que a Regina seja quinze anos mais velha que eu.
Por que isso é um problema tão grande pra minha mãe? Eu não a entendo —
comentou Jennifer ao alternar seu olhar entre os dois. — Ela tem me tratado
como uma pessoa incapaz de tomar decisões sobre a própria vida. Mas pra má
sorte dela, em janeiro estarei livre pra seguir meu caminho. Eu nunca desejei sair
cedo de casa, nunca. Mas agora isso tornou-se minha prioridade. Não posso
dividir o mesmo teto com uma pessoa que me julga com o olhar vinte e quatro
horas no dia.
— Isso é tão triste — comentou Diogo. — Eu já avisei a ela que vai
acabar perdendo você. Não sei quanto tempo vai levar pra que tome essa
consciência. A Morgana ama você, Jennifer. E ela está sofrendo com tudo isso
também. Mas a intolerância não a deixa enxergar um palmo à frente. Eu venho
argumentado da maneira que posso.
— Eu estou muito magoada, Diogo. Talvez já seja tarde demais.
— Jennifer, não fale assim, ela é sua mãe — disse Regina com
suavidade na voz.
— Será mesmo? Acho que já não sou uma filha pra ela.
— Você continua sendo a pessoa que ela mais ama no mundo — disse
Diogo. — Morgana apenas precisa compreender essa nova realidade que se
mostrou a ela.
— E enquanto isso ela acha que pode sair magoando as pessoas? Não
mesmo — disse a loira. — Ontem no jantar você a ouviu dizer que eu.. —
Meireles interrompeu a própria fala e desistiu de concluí-la. Ela ainda não tinha
certeza se queria que Regina ficasse sabendo da ameaça que recebeu. — Não
importa — concluiu.
— A situação de vocês realmente é complicada. Se Morgana não aceita,
não há muito que se fazer.
— Eu iria até ela e tentaria uma conversa amigável se ela permitisse —
comentou Regina com pesar em sua voz.
— Não!— exclamou Jennifer. — Nem pense nisso.
— De fato não seria uma boa ideia. Bater de frente com ela só pioraria
as coisas — comentou Diogo. O homem estava verdadeiramente preocupado
com aquela situação.
— Sim, entendo perfeitamente. Eu só o faria se ela me desse esse
espaço — explicou a morena.
Os três conversaram por alguns minutos mais e quando todos já haviam
concluído os lanches pedidos individualmente, Diogo olhou a hora em seu
relógio de pulso e constatou que era o momento de partir.
— Desculpe o tempo curto, Regina. Mas preciso levar Jennifer embora.
Morgana deve estar se perguntando por que ainda não chegamos. Combinei com
ela de ir pra lá assim que saísse do trabalho — explicou-se.
— Oh, tudo bem. Eu compreendo. Obrigada por esse momento juntos.
Foi um prazer conhecer alguém que é importante na vida de Jennifer.
— O prazer foi todo meu — respondeu ao esboçar um pequeno sorriso.
— Diogo, você pode me dar alguns minutos a mais com Regina?—
pediu a jovem. — Por favor?
— Hum... Ok. Mas não demore, certo? Estarei esperando no carro.— O
homem levantou-se da cadeira, estendeu a mão em cumprimento para Regina,
depositou um beijo na face da mulher e deixou o ambiente.
— E então, o quê achou dele?— perguntou ao puxar a cadeira para mais
próximo da namorada.
— Adorável! Me sinto um pouco mais aliviada ao saber que você o tem
em sua vida.
— É. Mas infelizmente ele ainda não mora conosco — lamentou a
jovem. — Você o ouviu, não é? Minha mãe está inflexível.
— Sim, eu sinto muito que ela esteja vendada pela intolerância —
respondeu com seriedade na voz. — Ontem você havia me dito que gostaria de
me fazer uma pergunta...— Lembrou Regina. A morena repousou delicadamente
a mão sobre a de Jennifer na mesa.
— Eu não sei como fazer essa pergunta — disse Jennifer, nervosa. —
Eu não queria ter que fazê-la essa. Essa que é a verdade.
— Qual pergunta seria essa que aflige você?
Meireles dedicou alguns minutos a admirar os traços da mulher à sua
frente antes de lhe fazer a pergunta. Ela sabia que as palavras que sairiam de
seus lábios seriam de grande poder, e que possivelmente mudariam as coisas
entre elas.
— Eu... Eu queria saber se você esperaria por mim.
— Esperar? Em qual sentido?— perguntou, confusa.
— No sentido de esperar para me ter com você — respondeu Jennifer.
Sua mão começou a suar sob a mão da professora. — É a minha mãe, Regina —
confessou em um só fôlego. — Ela quer ir até a escola. Não me quer com você
de forma alguma!— disse de maneira rápida em um nítido gesto de nervosismo.
— E eu não vou permitir que ela faça um escândalo. Eu... Eu...— Meireles
lutava para que lágrimas não preenchessem seus olhos.
— Jennifer, não... Não termina essa frase — disse ao puxar a mão para
a fora do contato com a jovem. A mais velha sabia exatamente o que habitava os
pensamentos da loira.
— Regina, eu preciso...— A voz de Jennifer saía com dificuldade. —
Eu não posso ser egoísta e continuar prendendo você a mim. Ela destruiria sua
vida.
— Deixa que sobre a minha vida decido eu — respondeu com seriedade
em um tom ríspido.
— Se eu permanecer com você, quem decidirá sobre sua vida será ela.
Minha mãe está disposta a fazer o que for preciso pra não me ver com você.
Lembre-se que ela é jornalista. E eu não duvido que ela seja capaz de qualquer
coisa.
— E você vai dar o que ela quer?
— Pra proteger você? Sim. Um dia eu disse que me quebraria em mil
pedaços antes de te fazer mal. Acho que o momento chegou.
— Jennifer, para! Você não sabe o que está dizendo!— disse ao alterar
o tom de voz. A mais velha sentia como se houvesse um trator passando sobre
seu peito.
— Você sabe que no fundo eu estou certa, Regina. Ontem mesmo você
me disse sentir como se estivesse atropelando o tempo.
— E eu estou — respondeu. Regina tentava manter uma postura séria,
como se as palavras de Jennifer não tivessem lhe causando dor. — É tudo muito
difícil pra mim e às vezes eu sinto como se estivesse inutilmente batendo na
mesma tecla, é verdade. Mas eu jamais abriria mão de você.
— E eu jamais abriria mão de você, meu amor. E eu estou aqui
justamente querendo saber se você esperaria por mim, se esperaria esses meses
passarem, se esperaria por mim até que eu pudesse ser a mulher livre que você
precisa. Pois você é livre pra ser minha, Regina. Mas eu não posso ser sua. Eu
sequer posso ser minha no momento.
Regina entrelaçou os dedos nos fios do próprio cabelo e os jogou para
trás.
— O pior de tudo é admitir que você está certa.— A morena respirou
fundo, deslizou as pontas dos dedos abaixo dos olhos na tentativa de evitar que
as lágrimas escorressem e continuou a falar.— Eu aplaudiria sua atitude agora se
eu não estivesse no chão — respondeu ao tentar manter firmeza na voz. — Eu
não gostaria que tivéssemos esse tipo de conversa aqui.
— Nem eu. Mas foi o único momento do nosso dia em que pude estar a
sós com você. E eu não faço ideia de quando poderemos novamente.
— Sabe, Jennifer... Eu nunca precisei passar por isso de ter lugar e hora
marcados pra estar com alguém. Assim como nunca desejei estar com alguém
como desejo você — disse Regina ao encarar o par marejado de olhos à sua
frente.
— Esse querer e não poder tem destruído você.— Jennifer comentou.
— Eu não estou feliz em te ver aflita, nervosa, sentindo-se impotente, Regina.
Como você acha que tenho me sentido ao perceber que a cada dia que passa seu
vício se amplia?
— Jennifer...
— Sim, Regina, eu tenho visto você saindo pra fumar. Eu tenho
percebido o quão nervosa você tem estado. Isso me desmorona por dentro.
— Não se preocupe comigo. Eu me entendo bem com meus vícios. Não
ocupe sua cabeça com isso.
— É claro que eu me preocupo — disse ao segurar o rosto da mulher
com as duas mãos. — Sempre vou me preocupar — comentou ao sentir uma
lágrima descendo lentamente em sua face. — Eu amo você, Regina. Eu amo
tanto. Eu só não posso ser a sua garota agora...— A loira fechou os olhos e uniu
os lábios ao da professora, que correspondeu ao beijo sem se importar com o
ambiente onde estavam.
O beijo era triste e desesperado. Suas bocas se buscavam e beijavam-se
em uma súplica para que o elo entre elas não fosse rompido. Aquela simples
troca de carinho serviu de palco para alguns curiosos ali presentes. Alguns
olhavam com rejeição, mas havia uma parcela que aplaudia com o olhar aquele
amor quase palpável.
— Eu queria que meus beijos fossem o suficiente pra calar sua boca
agora — sussurrou Regina. — Pra não ter que ouvir as coisas feias que você está
me dizendo — completou ao depositar mechas do cabelo de Jennifer atrás da
orelha da jovem.
— Não torna esse momento ainda mais difícil, Regina. Por favor...
Você não imagina o quanto está me doendo não encontrar outra solução — disse
com suavidade na voz.
— Eu não vou tornar.
— Você ainda não respondeu se esperaria por mim — disse a loira. —
Eu só te peço que me dê esses sete meses, que na verdade são apenas seis agora,
para que eu possa por minha vida no lugar, pra que minha mãe não seja um
empecilho tão grande nas nossas vidas. Eu quero juntar dinheiro com meu
trabalho aos finais de semana, quero me dedicar pra ganhar esse campeonato,
pois o prêmio é muito alto e me ajudaria a conseguir sair de casa. Final do ano
eu concluo a escola e em janeiro estarei inteiramente livre de tudo,
principalmente do fardo de ser a sua aluna. Eu vou poder encontrar um emprego
integral — disse com os olhos banhados d'água. — Sei que é egoísmo meu pedir
que me espere, mas eu não quero perder você.— Meireles era um misto de
tristeza e nervosismo. — Mas se não quiser ou não puder me esperar eu vou
enten—
— Shhh... Eu passei a vida esperando você — disse ao depositar o
polegar sobre os finos, delicados e rosados lábios de Jennifer, interrompendo-a.
— Você chegou com um atraso de quinze anos, mas chegou. E eu não te
perderia justo agora.
Mesmo com a dor que sentia na alma, Jennifer conseguiu expressar um
pequeno sorriso ao ouvir as palavras proferidas pela mulher.
— Essa é a nossa melhor chance, você sabe, não sabe?
— Eu sei, meu amor. Está sendo duro admitir, mas eu sei...
As duas mulheres deixaram a cafeteria de mãos dadas e caminharam até
a porta do lugar, onde se despediram.
— Nesse final de semana eu vou trabalhar os dois turnos, com um
intervalo muito curto entre eles. Mas no próximo final de semana trabalharei no
período diurno no sábado e pegarei o noturno domingo, pois a academia
funciona até meia noite. Então vou tentar passar os turnos livres com você —
comentou Jennifer. — Precisamos conversar com mais tranquilidade.
— Certamente precisamos. Eu tenho tanto pra dizer a você — comentou
Regina ao olhá-la com ternura. — Acho que merecemos uma despedida digna.
Queria dormir com você, te ver amanhecer nos meus braços. Só fizemos isso no
único final de semana que passamos juntas.
— Eu vou dar isso a você e a mim. Quero que a gente faça nesses dois
dias incompletos o que a gente nunca pôde fazer ao longo desses meses — disse
ao acariciar a mão da mais velha.
— E a sua mãe?
— Bom, eu estou dando a ela o que ela quer, certo? Mas eu vou exigir
dela esse momento final com você.
— Ok.
— Agora vou ir, que o Diogo não para de me olhar e chamar de dentro
do carro.— Jennifer depositou um beijo no canto dos lábios de Regina, que
durou alguns longos segundos, e murmurou com a boca quase unida à da
mulher.. — Tudo vai ficar bem. Não vai?
— Tem que ficar — respondeu ao conectar o olhar ao de Jennifer.


— Boa noite!— disse Morgana ao avistar Diogo e a filha chegando
juntos. — Onde estavam? — perguntou suavemente ao depositar um beijo nos
lábios do noivo. Contudo, quando foi beijar a testa de Jennifer, a jovem
desvencilhou-se.
— Diogo me fez uma surpresa e me buscou na escola — respondeu,
prontamente, antes que o homem se manifestasse e dissesse a verdade. — Em
seguida me levou pra lanchar, pois eu estava morrendo de fome.
— Uma pena. Fiz lasanha de frango para o lanche da noite.
— Não estou com o menor apetite — respondeu com seriedade.
Meireles caminhou em direção às escadas e, antes de subir, virou-se e deu à
Morgana um comunicado. — Ah, em relação à Regina... Terminamos. Está
feliz? Espero que a deixe em paz agora.— Feito isso, subiu e trancou-se no
quarto.



Ponto de Vista de Regina

Um precipício se abriu aos meus pés e eu estava prestes a me jogar. O
correto nunca me pareceu tão errado, e o errado nunca se mostrou tão certo pra
mim. Jennifer, mais uma vez, se mostrou uma grande mulher. Sacrificar-se por
mim foi de longe o gesto mais lindo e corajoso. Eu não poderia ter me
apaixonado por alguém mais lindo de corpo e espírito. Eu a teria contestado até
o final se o único motivo do nosso afastamento fosse meu cargo na instituição.
Mas, infelizmente, há todo um resto entre nós. Infelizmente não posso obrigar a
mãe de Jennifer a me aceitar, e também não seria justo de minha parte deixar
Meireles vivendo um inferno diário em casa por estar junto a mim.
Da última vez que verifiquei minha vida amorosa eu me encontrava em
uma relação afetivamente vazia, onde entregava meu corpo apenas para a
satisfação do físico. No entanto, a vontade de ser transbordada por alguém
sempre esteve presente. E hoje, fazendo uma nova leitura do meu coração, o
encontro preenchido pelos mais lindos sentimentos.
Hoje eu me vejo entregando o físico por prazer, mas também por
satisfação da alma. Nunca foi tão bom levar alguém para alcançar o ápice do
prazer comigo.
Todavia, a dor que sinto é tamanha, que eu queria poder fragmentá-la -
a dor- e escondê-la em lugares onde eu não mais tivesse acesso. A ausência do
cheiro, do contato de pele e do doce sorriso de Jennifer me causará uma tristeza
sem fim. Ela e eu temos tanto em comum, que me atrevo a dizer que Meireles é
uma versão infinitamente melhor de mim.
Entretanto, mesmo sabendo que irei mergulhar em um mar de
melancolia, tomarei o caminho mais nobre. Aceitarei dar o tempo que Jennifer
precisa e que nosso relacionamento necessita. Irei compreender que esse não é
o momento pra nós duas. Não permanecerei nadando contra a corrente, não.
Mas isso não significa que desistirei de lutar por nós. Apenas tomarei um novo
caminho por essas águas. Meus pensamentos e principalmente meu coração
permanecerão ligados e pertencentes a ela.
Minha racionalidade permite ter consciência de que, hoje, apenas o
nosso amor não será capaz de nos salvar do naufrágio. Mas, apenas ele será
capaz de nos trazer à superfície.


Ponto de vista de Jennifer

Eu sei que devo sair da vida da Regina antes que minha coragem
enfraqueça. Mas somente eu sei a dor que estou sentindo ao machucá-la e me
ferir duplamente com isso. Porque pior que quebrar meu coração, é ver os
fragmentos do coração de alguém que amamos sendo expostos pelos olhos,
assim como vi hoje no olhar de Regina. Aqueles olhos castanhos, sempre tão
intensos, me mostraram uma tristeza quase palpável.
Sinto que estou morrendo um pouco mais desde que fui levada a tomar
essa decisão. Eu sou apenas uma garota de dezoito anos sentindo que já não
consegue mais carregar tanto peso assim. No entanto, hoje eu vou me permitir
chorar, hoje eu vou me permitir ser humana e só por hoje vou desistir de todo o
mundo lá fora.
Eu não queria uma realidade fácil de se viver, mas, uma onde o mundo
fosse menos cruel para nós. De toda forma, como poderia julgá-los? Afinal, eles
não veem o tamanho e a profundidade do que compartilhamos. Eles não veem a
Regina cantando pra mim enquanto meu peito é preenchido de felicidade. E
mais, eles não sabem que apenas a minha Regina lê a rota das estrelas que
habitam em minhas costas.
Algumas horas se passaram e lembrei que ainda precisava redigir um
resumo a respeito de um filme que Regina havia passado para a turma. Oh
Deus, será uma grande luta interna conviver com ela três vezes por semana no
colégio e olhá-la como se eu não carregasse sentimento algum.
Ao sentar em minha cadeira, tomei uma folha de fichário e uma caneta
em mãos e mantive brevemente meu olhar fixo no enfeite de torre sobre a mesa.
Quando me dei conta, minha mente havia me levado para o dia em que recebi
aquele mimo de Regina.

Fui tirada de minhas prazerosas lembranças sobre o final daquele
passeio quando meu celular vibrou sobre a mesa. Se tratava de uma longa
mensagem de Regina. Era como se ela sempre sentisse quando eu estava
pensando nela. Ao ler aquela mensagem constatei que se tratava da letra de
uma música. Foi então que tomei ainda mais consciência do quão triste seria
meu último final de semana com ela.




Capítulo 29

Era o início da noite de sábado. Regina havia recém chegado do
supermercado e terminava de guardar suas compras no armário quando ouviu a
campainha tocar. Ao atender a porta, deparou-se com uma agradável surpresa.
— Boa noite, senhorita Vianna. Será que haveria um lugar na sua cama
para mim essa noite?
— Jennifer!— disse ao esboçar um largo sorriso. — Você veio!
— Eu disse que encontraria uma forma de passar esse último final de
semana ao seu lado, não disse?— respondeu suavemente. Meireles carregava um
doce sorriso nos lábios. — Minha mãe esbravejou um pouco, mas não tentou me
impedir — explicou.
— Vem, entre!— disse ao segurar a mão da mais nova e puxá-la para
dentro do imóvel. — Obrigada por estar aqui.— A morena segurou
delicadamente a face da loira com as duas mãos e colou a testa na dela por
alguns instantes. — Acho que Bóris também está feliz por vê-la!— comentou ao
senti-lo passear entre suas pernas e as da mais nova.
— Olá, amigão! Há quanto tempo não nos víamos?— disse ao agachar-
se e tomá-lo nos braços. — Wow, parece ainda mais pesado do que eu me
recordava!— comentou, fazendo Regina soltar um riso baixo.
— O nome disso é gula e preguiça! Procuro por Bóris e só o encontro
dormindo em algum canto. A ração para gatos castrados o está engordando da
mesma forma, e eu sinto muita pena de precisar racioná-la. Acabo deixando à
vontade no pote.
— Será que vou precisar levar você pra treinar comigo, hein?— disse
Jennifer ao gato, que a olhava fixamente com seus olhos de âmbar.
— Ele está prestando atenção em você. Parece até que entende o que
está sendo dito — comentou Regina. — E essa mochila?— Questionou ao
perceber que Meireles carregava uma. — Posso levá-la pro quarto?— ofereceu.
A mais nova depositou Bóris no sofá e tirou a mochila de suas costas.
— Não precisa se incomodar, eu levo — disse suavemente. — Meu
uniforme de trabalho está aqui, e eu também trouxe algumas roupas e coisas de
uso pessoal.
— Por falar em trabalho... Como tem sido? Não tive a oportunidade de
questioná-la a respeito. Quero saber de tudo!— disse com empolgação.
— Comecei semana passada mesmo. Eu estou gostando, embora esteja
sendo cansativo conciliar tudo — explicou enquanto subiam para o quarto da
mais velha.
— Sentiu-se nervosa por ser seu primeiro emprego?
— Um pouco. Mas como o ambiente já é muito familiar pra mim, então
me tranquilizei facilmente.
— Me sinto muito feliz em saber disso.— Sorriu. Regina caminhou até
próximo de Jennifer, tirou o boné preto que a loira usava, arrumou os fios
dourados da jovem, que haviam sido amassados pelo acessório, e a envolveu
pelo pescoço com seus braços. — De qual maneira você quer começar nossa
noite?
— Hum... Deixa eu pensar — respondeu ao esboçar uma expressão
pensativa. — Quero fazer coisas simples de casal; algo que nunca havíamos tido
a oportunidade de fazer — disse ao apoiar as mãos na cintura de Regina.
— Humm... E se formos ao cinema?— sugeriu a mais velha.
— Eu adoraria ir ao cinema, mas hoje eu prefiro ficar em casa. Se você
não se importar, claro. Nosso tempo será tão curto, que eu não gostaria de dividir
você com o mundo lá fora hoje.
— Tudo bem. Não me importo.— Sorriu. — Podemos transferir o
cinema para o meu quarto. Nós assistimos a um filme aqui enquanto comemos
pipoca e eu acaricio seus cabelos.
— Com direito a brigadeiro?— perguntou ao esboçar um pequeno
sorriso.
— Com direito ao que você quiser — respondeu ao guiar a jovem com
o corpo, fazendo-a deitar-se sobre sua cama.
— O que eu quiser? Você tem certeza disso, senhorita Vianna?— disse
ao depositar as mãos no quadril de Regina. A professora estava posicionada
sobre ela com uma perna para cada lado.
— Sim, o que você quiser. É só me pedir — disse sensualmente ao
manter seu olhar fixado nos olhos de Jennifer.
— Lembrarei disso mais tarde. Mas por hora eu adoraria ganhar um
beijo.
— E onde você quer ser beijada?
— Onde você achar que eu mereço ser.
— Hum... Se for assim eu serei levada a beijar todo o seu corpo —
murmurou. — De cima a baixo, e o caminho inverso também.
Jennifer sentia-se uma feliz refém das carícias de Regina. No entanto,
não era apenas a alegria que habitava seu peito. Ter consciência de que aqueles
momentos com ela seriam os últimos a entristecia.
— O que houve?— perguntou com suavidade na voz ao acariciar a face
da mais nova.
— Não é nada.— Tentou disfarçar.
— Eu conheço você, Jen. Esses seus olhos me dizem o contrário.
— É que...— Meireles virou sutilmente o rosto para o lado de modo a
desviar o olhar. — Já estou com saudades — disse baixinho. — Sequer nos
despedimos e eu já sinto sua falta, Regina.
— Oh, meu amor... Eu também já sinto a sua — disse carinhosamente.
— Sei que é quase impossível não pensar na despedida, mas vamos tentar
aproveitar esses momentos juntas da melhor forma possível?— disse a morena,
recebendo um positivo aceno de cabeça em resposta.
— Eu vou tomar um banho agora pra me sentir mais confortável e
relaxada, tudo bem?
— Ok. Estarei te esperando na cozinha. Vou começar a preparar a
sobremesa, pois ainda vai precisar gelar.


Regina estava distraída na cozinha quando sentiu um agradável perfume
invadir o local. Jennifer havia entrado descalça sem emitir qualquer som, mas o
cheiro de sabonete acabou anunciando sua chegada.
— Puta que pariu, Jennifer — disse ao passear o olhar por todo o corpo
da jovem, contemplando-a. Meireles havia surgido na cozinha vestindo apenas
uma calcinha e camiseta de alça fina. A peça íntima da loira era tão pequena, que
Regina possuía certeza absoluta de que Jennifer havia vestido para provocá-la.
— Shhh, cuidado com a boca suja — disse a loira, de maneira
provocante, ao aproximar-se.
— Por que, se você adora?— respondeu ao depositar as mãos no quadril
da mais nova.
— Justamente por eu adorar — disse ao envolver o pescoço da morena
com seus braços. — Não vai querer me tirar do sério agora, vai?— comentou,
segundos antes de morder o lóbulo de Regina, fazendo os pêlos do corpo da
mulher se eriçarem.
— Não. Mas sinto que sua intenção comigo é essa. A começar por essa
calcinha tão pequena.— Regina deslizou as mãos que estavam no quadril de
Jennifer e as depositou sobre a bunda da jovem, englobando-a. Em seguida,
subiu apenas uma das mãos e a depositou nos cabelos de Meireles de modo a
segurá-los com firmeza. — Você está deliciosa nela — murmurou contra o
ouvido da loira..— Mas ficaria ainda mais gostosa se me deixasse tirá-la.
— Ai...— O resmungo de Jennifer foi quase um gemido ao sentir a
pressão da mão de Regina em seus fios. Meireles adorava sentir o quanto era
desejada por aquela mulher. — Não vou deixar tirá-la — respondeu a muito
custo. — Mas você poderia me deixar despir você.
— E se eu não permitir?
Meireles depositou as mãos nos óculos de Regina e os retirou da face da
mulher.
— Eu posso encontrar alguns meios de convencê-la — respondeu ao
prender o acessório da professora na gola da própria camiseta.
— O pior é que eu sei que você pode, garota — respondeu com
rouquidão na voz ao sentir as mãos de Jennifer brincando com os botões de sua
camisa jeans de lavagem clara.
— A sua garota pode?— provocou ao abrir os primeiros botões da blusa
de Regina e deslizar os lábios pela parcela do colo da mulher que ficou exposta.
— A minha garota pode o que ela quiser — respondeu ao sentir os
lábios macios da jovem em sua pele. — Mas apenas quando eu disser que pode
— disse ao segurar o maxilar de Jennifer e fazê-la encarar seus olhos castanhos.
— E agora... Eu não digo que pode.
— Oh porra...— resmungou ao se afastar sutilmente. — Estava bom
demais pra ser verdade — comentou enquanto observava Regina pegar os óculos
de volta e depositá-lo na face. — O brigadeiro já está pronto?— perguntou ao
passear o olhar pelo fogão.
— Sim, acabei de desligar o fogo — respondeu ao observar Meireles
indo até o fogão e voltando com a panela em mãos. — Vou derramar em um
pote e levar ao congelador pra ver se gela até o final do filme, pelo menos.
— Me deixa roubar uma colherzinha antes!— Meireles pegou uma
colher dentro da gaveta do armário da cozinha e serviu-se com uma pequena
porção do doce.
— Cuidado, ainda está muito quente — alertou Regina.
— Eu não me importo. Estou acostumada com coisas quentes.
A resposta de Jennifer soou como uma provocação para Regina, que se
aproximou a passos lentos, tomou de maneira delicada a colher e entornou uma
pequena porção do chocolate quente sobre a pele branca do braço de Jennifer. O
doce não havia atingido a temperatura ideal pelo tempo necessário quando foi ao
fogo, sendo assim, a consistência estava propícia de ser despejada sobre algo, ou
sobre alguém; o que facilitou para a mais velha.
— Você gosta do que sente?
— Oh porra...— disse Jennifer ao sentir os lábios e a língua de Regina
percorrendo a pequena área de seu braço que fora coberta pelo brigadeiro.
Como se não bastasse limpar a pele da loira com a língua, Regina
aproveitou para percorrer todo o restante do braço malhado da jovem com ela.
Regina adorava lamber partes distintas do corpo de Jennifer e sentir o gosto da
jovem em sua boca. E tendo em vista que os braços eram sua maior tara, não
importou-se em se demorar ali.
Regina traçou um úmido caminho pelo braço, sentindo a veia sutilmente
saltada de Jennifer em sua língua durante o trajeto. E quando já estava alta o
suficiente, mordeu o ombro da jovem com sensualidade e foi aproximando os
lábios de seu ouvido enquanto sussurrava a canção que estava tocando na
primeira vez em que transaram; Pray- JRY.
— Eu ouço essa música diariamente desde que você me enviou a caixa
com o pen drive — murmurou próxima à boca de Regina. Meireles, naquele
instante, sentia seu coração batendo em um ritmo mais rápido que o habitual.
— E o que você sente quando a escuta?— murmurou em resposta.
Regina , de maneira lenta, ia unindo seu corpo ao dela e, assim, permitindo que o
calor de seus corpos se misturassem.
— Posso ser completamente sincera?— perguntou. O olhar que recebia
da professora era tão intenso, que começou a deixá-la sem fôlego.
— Você deve — respondeu, ainda com sua boca a uma distância
mínima dos lábios rosados de Jennifer.
— Eu sinto um forte desejo. As lembranças da noite no Resort povoam
minha mente e fazem meu corpo inteiro gritar pra ser seu — respondeu. Quanto
mais a loira falava, mais rápido seu coração batia e ainda mais rapidamente o ar
fugia de seus pulmões. — Essa música sempre me remete a você e eu na cama.
— Foi exatamente com esse intuito que a acrescentei naquele presente.
Pois sempre que eu também a ouço, penso em como é gostoso transar com você.
— Você me enlouquece, Regina...— disse ao sentir sua intimidade se
manifestando e proporcionando inquietude entre as pernas. — Ainda não havia
comentando, mas quero que saiba que eu quero muito usar aquela roupa pra
você.
Regina não conteve o sorriso sacana que formou-se em seus lábios.
— Então quando tudo isso passar eu quero você na minha porta com
ela.
Jennifer depositou a mão no braço da professora e, dessa vez, foi ela
quem brincou com a pulseira azul no pulso da mulher. Ela contornava
internamente as cordas da pulseira fazendo a morena sentir a ponta de seu dedo
médio e indicador contra a pele. Os movimentos que Meireles fazia com os
dedos eram quase eróticos e Regina estava captando a mensagem.
— Vou estar na sua porta e na sua cama.— Jennifer respondeu. Dessa
vez foi o centro de Regina que se manifestou rapidamente.
— Na minha porta, na minha cama, na minha escada, na minha mesa e
onde mais eu desejar.
— E se eu não obedecer?— instigou.
— Terei que ser bem severa na punição.
— Isso é uma ameaça, Regina Vianna?
— Sim, isso é uma ameaça — disse com seriedade sem cortar o contato
visual.
— Acho que vou adorar desobedecer você — comentou, arrancando
uma pequena risada da mais velha.
— Você é uma cachorra, Jennifer!
— Só me falta a coleira — brincou.
— Se você soubesse a quantidade de vezes em que imaginei você
usando uma pra mim...
— Você não tem pudores!
— Na cama? Bem poucos. Fora dela eu tenho muitos — respondeu. —
Agora me deixa colocar esse doce pra gelar, pois do contrário a gente não come
ele hoje! E eu não quero perder a oportunidade de fazer esse clichezão com
você.
Meireles abriu um largo sorriso ao ouvir as últimas palavras proferidas
por Regina. Para ela, a morena possuía o equilíbrio perfeito entre a luxúria e o
sentimentalismo; pois ao mesmo tempo em que Regina demonstrava o quanto a
desejava, ela não a deixava sentir-se menos que amada.


Regina tomou um banho morno, vestiu uma camisola, se direcionou
para a cama e juntou-se a Jennifer, que a esperava com uma enorme tigela de
pipoca e dois copos de refrigerante apoiados sobre o criado mudo.
Com as pernas enroscadas e os pés que, vez ou outra, se acariciavam
quando se encontravam, as duas mulheres, aninhadas debaixo da coberta,
começaram a assistir ao filme escolhido; se tratava de uma comédia romântica.
Regina mantinha a cabeça apoiada próxima ao ombro de Jennifer e
recebia os melhores cafunés de sua vida enquanto prestava atenção na televisão.
E para não trocar de posição e perder os carinhos recebidos por Jennifer, ela
evitou mover-se para alcançar a pipoca. Entretanto, Meireles, ao dar-se conta,
começou a depositar os caroços de pipoca na boca da mulher.
— Esse filme é muito mentiroso!— comentou Jennifer, algumas horas
depois, quando o filme chegou ao fim. — Como assim o cara não percebe que
tem algo muito estranho acontecendo ao segurar a calcinha gigantesca da
mulher, por exemplo? Tendo em vista que ela é super magra!
— Ele estava tão focado em vê-la se despir, que ignorou esse detalhe —
brincou Regina, rindo.
— E a quantidade de comida que ela ingeria? Os números grandes das
roupas que comprava? Sem mencionar os outros fatos!— comentou Jennifer,
compartilhando gostosas risadas com a mais velha ao lembrar-se das cenas
cômicas.
— Esse filme foi muito surreal mesmo. Mas eu adorei! Gostei ainda
mais da mensagem que ele transmitiu.
— Eu também. E fico feliz pela boa mudança que o cara sofreu. Ele
aprendeu que a beleza interior é a mais importante.
— Sim. Agora ele enxerga a todos com um novo olhar. E mais do quê
valorizar o que há dentro, acho que ele também aprendeu a ver beleza até mesmo
no que está fora dos padrões impostos.
— É verdade — concordou a mais nova. Meireles moveu-se sob os
lençóis, depositou um beijou na testa de Regina e levantou-se da cama.
— Onde você está indo?— Questionou Regina, não obtendo resposta.
Mas, quando menos esperou, avistou a loira retornando ao quarto com a tigela de
brigadeiro em mãos. — Deu tempo de gelar?
— Não tanto quanto deveria, mas está bom da mesma forma —
respondeu ao prová-lo com uma colher de sobremesa.
— Me deixa experimentar?
— Deixo!— Meireles sentou-se de pernas cruzadas sobre a cama e
pediu para Regina, que também se encontrava sentada na mesma posição, abrir a
boca.
Se existisse um terceiro elemento no quarto, certamente essa pessoa se
derreteria com a graciosidade da cena. A mais nova elevava sutilmente a colher
até a boca da morena ao mesmo tempo em que carregava um largo sorriso nos
lábios.
— Eu poderia me acostumar facilmente com isso — comentou Regina.
— Eu não me importaria se você se acostumasse.— Meireles
respondeu. — Passaria todos meus dias servindo você dessa forma e... De outras.
— Ah é?— respondeu ao erguer uma de suas sobrancelhas. — E de
quais outras formas seriam?— perguntou ao pegar um pouco de chocolate com a
ponta do polegar e depositá-lo nos lábios de Jennifer, contornando-os.
Meireles passou a língua nos próprios lábios de modo a provar do
chocolate e a respondeu.
— Assim.— Jennifer engatinhou com o corpo sobre o de Regina e fez
com que a mulher se deitasse.
— Jennifer, você não vai...— Antes que a mais velha pudesse concluir a
frase sentiu as mãos da loira afastando sua calcinha por debaixo da camisola e,
posteriormente, sentiu a temperatura fria do chocolate entrando em contato com
sua intimidade.
— Sim, eu vou.— Jennifer respondeu. — Encontrei uma forma de te
deixar ainda mais gostosa.
Regina desceu o olhar e avistou a malícia nos olhos de Jennifer.
— Então tira minha calcinha — disse com a voz embargada de desejo. —
Me prova e me mostra como sua boca também consegue ser deliciosa.
Não foi apenas a calcinha que Jennifer tirou, ela despiu Regina por
inteira. Ela queria uma despedida digna, onde pudesse beijar e sentir cada
milímetro do labirinto quente das curvas da mulher que amava.
Quando o calor que percorria todas as áreas de seu corpo tornou-se
quase enlouquecedor, Regina precisou segurar a face de Jennifer e puxá-la para
um beijo que demonstrasse toda a luxúria que fora despertada após aquela doce
brincadeira entre suas pernas.
Regina rolou por cima de Meireles, deslizou a camiseta da loira para
fora e escorregou pelo corpo de Jennifer até alcançar os pés; onde distribuiu
alguns beijos. A mais velha não beijou apenas os pés de Jennifer, mas também
suas pernas, coxas e virilha; fazendo a loira arfar com a sutil mordida que
recebeu em seu sexo ainda coberto pela calcinha.
Ao retornar para cima, Regina mordeu algumas áreas do abdômen
definido de Meireles e posteriormente sentou-se sobre ele, dando à Jennifer a
imagem de seus seios nus e cabelos sutilmente bagunçados.
A mais nova olhou para cima e contemplou o espetáculo que era ter
Regina Vianna sentada sobre ela; aproveitando-se da posição para deslizar as
costas da mão contra a barriga macia da professora e, posteriormente, apertar os
convidativos seios pequenos e firmes que ela possuía. Meireles muito apreciava
ter suas mãos preenchidas por eles enquanto alternava entre circundadas nos
mamilos enrijecidos.
— Você é tão linda...— disse ao subir um pouco mais o olhar e admirar
o rosto de Regina ao natural, sem quaisquer vestígios de maquiagem.
A mais velha sorriu ao elogio, tocou a mão de Jennifer com a dela e a
levou até o próprio sexo. E quando o teve estimulado, iniciou movimentos com o
quadril de modo a ditar a intensidade das carícias.
Ao sentir seus dedos inteiramente molhados pela umidade, Jennifer
introduziu o do meio e o sentiu deslizar facilmente para dentro, fazendo Regina
gemer ao prazer sentido. Entretanto, não era apenas Regina que gemia; Jennifer
também, ao sentir e visualizar a morena rebolando sobre ela e para ela.
As posições novamente voltaram a mudar. Jennifer rolou por cima de
Regina para assumir o controle, mas foi quebrada pela morena, que lutou pela
liderança. As duas mulheres guerrearam na cama e levaram a batalha para fora
dela quando Meireles levantou-se com a esposa nos braços.
— Pra onde você está me levando?— questionou com as pernas
enlaçadas na cintura de Jennifer.
Meireles, sem dizer uma palavra, desceu com a morena nos braços, a
levou para o escritório e a sentou sobre a mesa de madeira.
— Então, professora Vianna... Acho que esse ambiente é muito parecido
com o que convivemos — disse ao puxar uma cadeira e sentar-se de frente para
a mesa.
Regina, ao entender o recado, desceu da mesa e caminhou até uma
segunda cadeira, onde sentou-se. Ela abriu a gaveta embutida no imóvel e de lá
tirou um de seus óculos. Este possuía armação na coloração vinho.
— É um ambiente bastante parecido, mas sem os mesmos perigos —
disse com seriedade ao depositar o acessório na face.
— Talvez o único perigo seja você.— Jennifer levantou-se da cadeira e
caminhou até Regina a passos lentos. — Você e essas expressões safadas que
esboça sempre que estamos juntas — completou.
— E quais expressões seriam essas?
— Você sabe... Como se estivesse me despindo.
— Talvez eu esteja mesmo despindo você sempre que a olho dessa
maneira. Mas talvez eu esteja fazendo algo ainda mais prazeroso.
— E o que seria? Hum?— perguntou ao acariciar eroticamente a nuca
de Regina.
— Senta no meu colo, que eu mostro a você — respondeu enquanto se
deliciava com as carícias de Jennifer na nuca. — Mas... Sem calcinha —
ordenou ao avistar que a mais nova ainda usava uma.
Meireles deslizou a única peça que ainda estava em seu corpo para
baixo e sentou-se no colo de Regina com uma perna para cada lado.
— Assim?— perguntou ao envolver o pescoço da mulher com os
braços.
— Isso... Assim — respondeu ao receber o corpo de Jennifer e percorrer
as mãos pelas coxas e quadril da mais nova. — A paixão é como uma chama,
Jennifer. Ela nos queima. E é tão prazeroso queimar em você.
— Você... Suas palavras...— murmurou Jennifer ao sentir a mão de
Regina estimulando sua intimidade. — Me enlouquecem.... Me enlouquecem.
Regina se deslizou suavemente para dentro de Jennifer ao mesmo tempo
em que prosseguiu com as palavras. Palavras essas, que fazia o centro da jovem
gritar.
— Você que me enlouquece, Jennifer. Eu apenas reajo ao que você me
desperta.—
A mais velha alternava entre beijar os lábios, o maxilar, o pescoço e o
colo da loira. Ela desejava poder multiplicar-se para alcançar em vez única cada
pedaço daquele corpo. A intensidade era um traço marcante em sua
personalidade.
Os movimentos de Regina começaram a se tornar mais agressivos. Ela
ajeitou a loira em seu colo, deslizou a cadeira para frente e fez a lombar de
Meireles chocar-se contra a borda da mesa. Jennifer, agora, estava encurralada
entre ela e o imóvel. A limitação de movimentos era algo que excitava a ambas.
Os gemidos de Jennifer ecoavam no silêncio do escritório. Ela tentava
controlar-se, mas era inevitável não reagir ao delicioso trabalho que estava sendo
feito entre suas pernas.
— Gosta assim, no meu colo?— perguntou Regina, recebendo em
resposta um sorriso sacana. — Estou fazendo uma pergunta, senhorita Meireles
— disse ao segurar o maxilar de Jennifer com a mão livre.
Quanto mais Regina falava, ainda mais excitada a jovem ficava. Porém,
ela se manteria em silêncio e brincaria um pouco mais com a mulher.
— Eu não gosto de garotas desobedientes. E você está sendo uma.
— Pelo contrário, é dessa desobediência que você gosta. Diz pra mim,
Regina... Ou melhor, me mostra o prazer que você sente ao me domar e me
colocar de joelhos .
— Puta que pariu!— Essas três palavras saíram carregadas de luxúria
da boca de Regina. A morena agarrou forte no pescoço de Jennifer e levantou-se
da cadeira junto com ela. A última frase da loira havia descarregado uma forte
carga por seu corpo.
Regina usou a mão livre para vasculhar rapidamente as duas gavetas
embutidas na mesa à procura de algo, mas não obteve sucesso. Contudo, olhou
para a mesa e avistou a calcinha de Jennifer sobre ela. Sem pensar duas vezes,
pegou a peça e a envolveu no pescoço alvo de Meireles; dessa forma,
conseguindo apoio para puxá-la. E assim o fez; a puxou até a parede mais
próxima e a fez chocar-se contra ela. Posteriormente, segurou a peça fazendo
força para baixo de modo que Jennifer abaixasse e ajoelha-se.
Ao ver a imagem da jovem agachada na frente da parede branca, Regina
tomou uma curta distância e depositou um dos pés próximos ao ombro da jovem.
Jennifer, por sua vez, não conteve-se e distribuiu alguns beijos no pé delicado de
Regina, a deixando ainda mais excitada.
Sem quebrar a conexão visual, a mais velha aproximou-se, afastou
sutilmente as próprias pernas, entrelaçou os dedos nos cabelos da loira e a
conduziu a estimular seu sexo com a boca.
Jennifer acariciava as pernas de Regina ao mesmo tempo em que
provava o gosto que a mulher oferecia. E quando os gemidos da morena
tornaram-se mais fortes e contínuos, Meireles a fez apoiar uma das pernas sobre
seus ombros de modo a deixá-la mais confortável para quando o orgasmo a
atingisse.
Regina inclinou-se e apoiou as mãos contra a parede atrás de Jennifer.
Sua respiração começou a se tornar cada vez mais rápida e ofegante.
— Jennifer...— disse de maneira manhosa ao sentir o dedo da loira
trabalhando em conjunto com a língua. Por ter sido provocada desde a cozinha, o
corpo da mulher não resistiu por muito tempo e foi invadido por uma enorme
carga de prazer que a deixou com o coração batendo enlouquecidamente.
— Que boca gostosa — murmurou, ofegante, após fazer Jennifer
levantar-se e unir o corpo ao dela. — Mas eu ainda não ouvi dela a minha
resposta.
— Se é no seu colo, deitada, em pé, na cama ou no carro pouco me
importa. Eu só quero sentir você dentro de mim.
— É uma delícia quando você me pede.— Regina prendeu uma das
pernas de Jennifer em sua cintura e usou a mão livre para introduzir dois dedos
na loira. Elas os curvava até o final e os retirava instantaneamente, repetidas
vezes, em prazerosos movimentos de entra e sai.
Meireles gemia e arranhava suas costas com intensidade na falha
tentativa de conseguir conter a carga que se acumulava em seu baixo ventre. Ter
a mulher que amava lhe possuindo ao íntimo era a melhor sensação já provada
por ela.
— Jennifer... Não me deixe.
Esse foi o último sussurro que ouviu segundos antes de sentir seu corpo
explodindo de prazer. O clímax atingido fora tão intenso, que Meireles
permaneceu levemente tonta por breves segundos.
— Amor, está tudo bem?— perguntou Regina ao tocar a face da jovem.
— Está sim. É que foi... Forte — respondeu. A respiração de Jennifer
ainda permanecia ofegante.
— Isso é ótimo — comentou a morena, sorrindo.
— Sim, maravilhoso — respondeu a loira ao sorrir em resposta.
Ao subirem para o quarto de Regina, Meireles notou que a morena
parecia inquieta. Ela sacudia a perna de maneira repetitiva enquanto
demonstrava estar com sua mente longe dali.
— Aconteceu algo, meu amor? Não gostou de alguma coisa?—
perguntou ao tocá-la no ombro.
— Pelo contrário. Foi tudo tão bom, que por alguns instantes eu lembrei
que não mais terei você e na falta que irá me fazer. Eu te amo tanto, Jen.— disse
suavemente.
— Eu sinto tanto que a gente precise passar por isso. Mas vamos tentar
não pensar nisso agora, assim como você havia me dito mais cedo. Quero que a
gente consiga aproveitar esses momentos plenamente — disse com suavidade na
voz enquanto acariciava os fios castanhos da mulher. — Eu também amo você,
Regina. Talvez mais do que você possa imaginar.
Regina depositou um beijo nos lábios da loira, levantou-se da beirada da
cama e enrolou-se em um fino roupão de seda. Feito isso, abriu a gaveta do
criado mudo e de lá tirou um isqueiro e um cigarro. A mais velha sempre evitou
dar exemplos ruins para Jennifer e nunca havia fumado na sua frente; pelo
menos não intencionalmente. Entretanto, hoje, além de estar aflita com a
situação que lhes rondava, o sexo com Jennifer havia lhe despertado ainda mais
a vontade de fumar.
— Isso tem sido um hábito diário?— Jennifer questionou ao vê-la
caminhar em direção à janela do quarto.
— Quase — respondeu ao apoiar-se na janela e acendê-lo.
— Pensei que você tivesse relaxado após o amor que fizemos. Pois eu
estou — comentou Jennifer, olhando para o cigarro, ao se posicionar ao lado da
morena.
— Mas eu estou relaxada.— Regina se posicionou na parte traseira da
jovem e a abraçou por trás com seu braço livre. — Foi tão gostoso, que eu
precisei acendê-lo — respondeu em um murmúrio.
— Sabe, Regina... Eu nunca vou julgá-la por algo. Mas eu também não
gosto de te ver envolvida com essas coisas que fazem mal. Eu sempre vou querer
o melhor pra você.
— Eu sei. Mas no momento tem sido mais forte que eu. Desculpe por
essa fraqueza.
— Não há motivos para pedir desculpas. Eu só queria que me
prometesse tentar parar com isso.— Meireles virou-se de frente para ela e
depositou as duas mãos no quadril da mulher.
— Eu não posso prometer isso a você. Não faço promessas que não
dependem exclusivamente de mim — respondeu. — Eu não tenho tentado e não
sei se conseguirei tão cedo.— Regina deu um trago no cigarro e virou o rosto
para soltar a fumaça.
— Tudo bem...— disse com desânimo.
— Decepcionei você? Ainda vai querer estar comigo ao ver os piores
lados de quem eu sou?
— Não fala bobeira! Eu sempre vou querer abraçar todos os lados de
quem você é. Apenas não quero ver você se afundar nessas coisas, então...—
Meireles pegou o cigarro da mão da professora e o lançou pela janela. — Vou
ocupar você com coisas muito mais prazerosas.
— E quais coisas seriam essas?
— Com meus beijos...— disse ao distribuir beijos pela face da mulher.
— Meus carinhos...— Jennifer guiou a mais velha com o corpo e lançou contra o
colchão. — E algumas cócegas!— exclamou, depositando as mãos por dentro do
roupão e apertando a barriga da mulher.
— Não! Cócegas não!— gritava enquanto gargalhava e se contorcia sob
as mãos da mais nova.


Quando o dia amanheceu, Jennifer e Regina se desenroscaram debaixo
dos lençóis após um bom dia regado de beijos e inocentes carícias. E antes de
levantarem-se da cama, se encararam por longos minutos para que pudessem
decorar cada traço da face uma da outra. Elas sabiam que cada minuto daquele
dia seria melancólico e tudo agora se tratava de uma luta contra o tempo.
— Vou fazer um chá pra mim. Costumo bebê-lo à noite, mas como
comi muita besteira ontem, hoje quero começar o dia com algo leve — disse
Regina enquanto separava os ingredientes na cozinha.
— Maçã com canela?— Jennifer perguntou, recebendo um aceno
positivo em resposta. — Posso preparar pra você? Você me orienta e eu faço.
Quero saber fazer seu chá favorito.— Sorriu.
— Eu só ensino se você aceitar prová-lo!
— Ah não, amor! Você sabe que eu detesto chá!— disse ao expressar
uma careta de nojo.
— Mas esse você precisa ao menos experimentar — insistiu.
— Mesmo?
— Mesmo.
— Oh Deus... Tudo bem.
Jennifer descascou a maçã e acrescentou todos os ingredientes na
chaleira seguindo as medidas ditadas por Regina.
— Faltou anis — alertou a mais velha.
Após cinco minutos de fervura, desligou o fogo e coou o chá dentro de
uma caneca. E quando a temperatura do líquido já não estava tão quente, o
experimentou.
— E então?— perguntou Regina ao observá-la.
— Dá pra tomar.
— Dá pra tomar? Ah não! Me dá isso! Não vou deixar que fale assim
do meu chá!— disse ao tomar a caneca para si, arrancando uma gostosa risada
de Jennifer.
— Pois pode ficar com ele! Prefiro meu leite e minha tigela de cereal!
— Acho que temos um problema aqui. Eu não tenho cereal em casa.
— Como assim você recebe sua garota em casa sem cereal?— Jennifer
implicou, fingindo indignação.
— Oh, desculpe se eu não sabia que fazia parte da sua estrita
alimentação matinal — respondeu. — Da próxima vez comprarei o estoque
inteiro pra você, satisfeita?
— Não aceitarei menos que isso como pedido de desculpas!— brincou,
fazendo Regina soltar uma risada e envolver seu pescoço com os braços.
— Me sinto leve quando estou com você. Obrigada por isso.— Sorriu.
— Agora vamos tomar nosso café da manhã, pois nosso dia será curto. Você
precisará ir embora em qual horário?
— No máximo às duas da tarde. Hoje o segundo turno é meu.
— Bom, ainda é dez da manhã. Se nos apressarmos eu consigo levar
você a um lugar.
— Onde?— perguntou curiosa.
— Surpresa!


— Fazia muito tempo que eu não comia algodão doce — comentou
Regina. Ela e Meireles caminhavam de mãos dadas em um parque localizado a
quinze minutos da casa da mais velha.
— Eu também! Já nem lembrava que era essa a textura — disse Jennifer
enquanto levava alguns gomos para dentro da boca.
— Que textura, Jennifer? Isso não tem uma. Eu nem o sinto na boca.
— Isso porque você pega uma quantidade muito pequena! Toma,
experimenta mastigar esse.— Meireles puxou uma enorme quantidade do
próprio algodão doce e o depositou na boca de Regina.
— Nossa, Jen! Que enjoativo comer assim! Como você consegue?
— Melhor que comer de tão poucas porções igual a você. Não dá nem
pra sentir na boca!
— Você é hilária! Sabia?— comentou ao sacudir a cabeça
negativamente. Ela carregava um brilhante sorriso nos lábios.
As duas mulheres tiveram um lindo momento juntas enquanto comiam
algodão doce e caminhavam de mãos unidas pelo parque. Seus corações
aqueciam ao observar crianças que corriam e sorriam ao se divertirem na
companhia de seus pais. O passeio era simples, mas possuía uma grande
significância para as duas. Afinal, o que elas não dariam para conseguirem a
liberdade de estarem sempre juntas em uma tarde de domingo?
— Já desejou ter filhos?— Jennifer perguntou.
— Henrique me despertou essa vontade algumas vezes.
— Deve ser muito gostoso poder ter um momento como aquele, por
exemplo — comentou, referindo-se ao casal que brincava na grama com o filho
que aparentava ter dois anos de idade.
— Certamente sim. Deve ser muito prazeroso ver uma vida crescer na
companhia de alguém que verdadeiramente amamos.— Sem dar-se conta,
Regina apertou a mão de Jennifer com ainda mais força ao dizer a última frase.
— Deve ser uma grande e gostosa satisfação.— Jennifer respondeu,
ainda mantendo o olhar na brincadeira da família.
— Já andou de pedalinho?— perguntou Regina ao avistar os grandes
pedalinhos em formato de cisne que estavam atracados na doca do pequeno lago
que havia no parque.
— Nunca!
— Então vamos? Podemos encerrar nosso passeio sobre as águas
calmas daquele lago.
Meireles deslizou os óculos de sol que estava em seus cabelos para os
olhos e subiu no pedalinho junto com Regina. De lá, contemplaram toda a bela
paisagem que as cercavam enquanto uma gostosa brisa batia em seus rostos e
fazia seus cabelos voarem.
— Já sinto sua falta...— disse a loira, baixinho, enquanto olhava o
horizonte. — Eu mentiria pra minha mãe e diria que terminei com você, mas...
— Mas nós queremos ser aceitas pela verdade do que somos. Não pela
mentira que contamos — disse ao completar a frase da mais nova.
— Exatamente...
— Você criou seu lugar em mim, Jennifer. Um lugar lindo e iluminado
assim como o seu olhar. E será pra ele que vou recorrer quando a saudade
apertar.
— Promete não esquecer de mim?
— Nem se eu quisesse.— Regina acariciou os cabelos loiros e sorriu.
— Eu estava pensando em não ir à escola na próxima semana. Seria
duro te encontrar por lá. E visto que será a última semana antes das férias, não
haverá muita necessidade.
— Não tome faltas por causa disso, Jennifer. É importante que você vá
e conclua seu segundo bimestre com êxito — disse com tristeza na voz. Regina
tentava demonstrar uma postura resistente enquanto sentia seu interior
desmoronar.
— Eu vou pensar a respeito. Não consigo saber o que seria menos duro
entre ver você ou não mais te ver até que as férias terminem.— Suspirou. — Eu
acabei não te contando, mas a minha mãe havia cogitado a ideia de me transferir
de escola. Acredita? Mas por fim desistiu. Ela não quis atrapalhar meu ano
letivo.
— Ao menos ela teve essa coerência.
— Verdade — concordou. — Já está quase na hora de voltarmos. Posso
tirar uma última foto nossa?— pediu.
— Claro que sim, Jen.— Sorriu.
Meireles abriu o modo câmera frontal de seu aparelho, ajeitou-se por
trás de Regina dentro do pedalinho e abraçou a mulher pelas costas.
— Agora diga xis com o sorrisão lindo que você tem — pediu a mais
nova.
Regina abriu um largo sorriso espontâneo ao rir do pedido de Jennifer.
A jovem, por sua vez, aproveitou-se do momento para fotografá-las e capturar
aquele mais belo sorriso que seus olhos já avistaram. Mal sabiam elas, ou talvez
soubessem, que aqueles sorrisos registrados na fotografia seriam os últimos em
um longo período de tempo.

O momento da despedida havia chegado depressa. Jennifer havia
terminado de recolher seus pertences, despedido-se de Bóris e agora estava
posicionada na porta de saída. Tendo em vista que ela e Regina se afastariam por
completo a partir de agora, negou a carona até o trabalho.
Entre lágrimas que insistiam em percorrer suas faces e suspiros de
tristeza, as duas mulheres diziam adeus com a esperança de ser um até breve.
— Eu não tenho o que dizer. Não quero prolongar isso — comentou
Regina com o choro preso na garganta.
— Eu posso pedir um último beijo?— pediu Jennifer. A loira fechou os
olhos e sentiu o doce perfume de Regina aproximando-se de suas narinas. E
quando se deu conta, a textura daqueles lábios que tanto gostava já estava em
contato com sua boca.
Seus lábios se roçavam devagar e suas línguas se acariciavam
lentamente enquanto buscavam registrar os gostos pertencentes a cada uma.
— Eu amo você.— Regina sussurrou ao envolvê-la em um forte abraço
como se tentasse prendê-la e guardá-la ali para sempre.


A última semana de aula que antecedia as férias escolares se iniciou. Os
dias seguiram cinzas, tristes e vazios. Jennifer havia apagado o número de
Regina de seu celular para não fraquejar e procurá-la no meio da noite. Regina,
por sua vez, acabou aderindo ao mesmo comportamento. Encararem-se nos
corredores do colégio havia se tornado uma tarefa difícil. Um cumprimento
educado era o máximo que direcionavam uma à outra e logo baixavam seus
olhares e seguiam seus rumos.
Os momentos em que precisavam conviver por aproximadamente uma
hora dentro da sala de aula eram os mais dolorosos. Meireles não suportava
levantar o olhar e encontrar os castanhos de Regina sem brilho, foscos, e lembrar
que eles já foram tão vívidos e intensos.

Era uma sexta-feira quando o último dia de aula daquele semestre havia
finalmente chegado. Jennifer teria aula de história no primeiro tempo e não
parava de pensar nos longos vinte dias que passaria sem ter o menor contato com
Regina. Ela não sabia se a distância seria melhor ou pior em relação aos tristes
sentimentos que habitavam seu peito.
Quando Regina chegou à classe e cumprimentou a turma, ela, pela
primeira vez em uma semana, direcionou o olhar à Jennifer ao entrar. Seus
olhares se buscaram tristes e se sustentaram por alguns instantes até que os olhos
da mais nova encheram-se d’água. Meireles não suportou tanta melancolia e
deixou a sala de aula aos prantos. Dividir o mesmo espaço com a mulher que
amava, sabendo que não poderia mais tê-la, causava uma dor que ela já não
conseguia suportar.
O coração de Regina quebrou-se em mil pedaços, se é que ainda havia
possibilidade dele fragmentar-se ainda mais, quando viu a jovem deixar o
ambiente daquela maneira. Ela respirou fundo, engoliu a vontade de chorar,
ignorou a dor que se alastrava em seu corpo e deu continuidade a aula. Regina
não iria atrás de Jennifer, não, ela respeitaria a decisão tomada pela mais nova. E
ela seria profissional o suficiente para concluir seu dia de trabalho mesmo
sabendo que era apenas o seu físico que ainda permanecia ali.

Quando as férias escolares começaram, Jennifer iniciou uma luta diária
para não ir até a casa de Regina, jogar-se em seus braços e pedir a ela para que
desistissem de toda aquela ideia de afastamento. A mais velha, por sua vez,
estacionava o carro quase todos os dias em frente a academia em que a mais
nova treinava e a observava por curtos instantes entrar no local. Ela não
conseguia controlar a vontade de vê-la, entretanto, sabia que precisaria tomar
uma atitude drástica, do contrário acabaria não resistindo e procurando por ela.

Três semanas se passaram. Três semanas de palavras não ditas por
Jennifer, que todos os dias abria o e-mail, digitava uma mensagem para a
professora e, ao fim, não enviava. Foram três semanas de olhares silenciosos
vindos de Regina, que observava a mulher que amava através da solidão e da fria
janela de seu carro.


— Senhorita Vianna, estou esperando você em minha sala — disse
Elizabeth, diretora escolar, com grande seriedade na voz e nas expressões de seu
rosto. A volta às aulas estava trazendo consigo uma grande mudança.
— Pois não?— Se manifestou Regina ao entrar na diretoria. A morena
carregava algo em sua mão.
— Essa semana uma informação chegou até mim e eu gostaria de ouvir
de você uma resposta e até mesmo um posicionamento.
— Qual informação seria essa?
— Soube que você e uma aluna desta instituição estão amorosamente
envolvidas. E a aluna em questão se trata da senhorita Meireles. Jennifer
Meireles. O que você tem a me dizer a respeito?
— A informação está correta — respondeu. Ela sabia que cedo ou tarde
esse momento chegaria.
— Está correta?— exclamou Elizabeth, incrédula. A diretora esboçou
uma expressão surpresa. — Eu achei que fosse me dizer que isso não passava de
boatos. Como você foi deixar isso acontecer, senhorita Vianna?
— Eu não tenho essa resposta. Simplesmente aconteceu. Eu não vou me
desculpar pelo que sinto por ela, mas peço desculpas por não ter sido a
profissional que você esperava.
— Em dez anos de magistério você sempre foi uma profissional
excelente! Eu nunca recebi uma queixa a seu respeito. Você é a melhor
professora que temos. Eu não estou acreditando que isso foi acontecer!— disse
exaltada ao apoiar as mãos sobre a mesa.
— Eu não tenho justificativas para dar e não tentarei argumentar. Sei o
que fiz e assumo o meu ato.— Regina demonstrava seriedade, mas em seu
interior ela sabia a falta que aquele trabalho lhe causaria. Aquela instituição era
sua segunda casa. Havia sido muitos anos de dedicação e entrega.
— Apesar de sua conduta impecável ao longo desses dez anos eu não
posso permitir uma situação como essa aqui dentro. Serei obrigada a pedir seu
afastamento dessa instituição.
— Não será necessário.— Regina pegou o envelope que estava em sua
mão e o depositou sobre a mesa da diretora. Quando o fez, seus olhos
marejaram. Apenas ela sabia o quão duro havia sido redigir o conteúdo que
havia ali. — Aqui está a minha carta de demissão.


Capítulo 30

— Você prometeu!— gritou Jennifer. — Disse que se eu me afastasse
da Regina não iria prejudicá-la no trabalho!— Meireles entrou em casa pisando
forte e cuspindo algumas palavras sobre a mãe. Seu coração estava a mil, suas
mãos tremiam e sua cabeça parecia querer explodir a qualquer momento.
— Jennifer, do quê você está falando? Se acalme — disse Morgana,
confusa.
— Você foi ao colégio, mãe. Não negue! Entregou a Regina à diretoria!
— Eu realmente não sei ao quê você se refere. Em momento algum
estive lá.
— Não mente pra mim, mãe. Eu não aguento mais essa situação!
— Eu não estou mentindo pra você, Jennifer. Acredite em mim. Eu não
quero você com aquela mulher e isso eu digo na sua cara. Não faço nada pelas
suas costas. Você me deu sua palavra de que terminou com ela e eu acreditei.
Não havia motivos para ir até sua escola.
— Então foi... Estela.— Jennifer murmurou para si mesma ao olhar
para baixo e cerrar os punhos. — Não é possível, não é possível!— gritou. — Eu
vou matar aquela garota!


— Regina?— disse Arthur, surpreso, ao receber a morena na porta de
sua casa. A professora lhe havia feito uma visita repentina.
— Posso entrar?— perguntou com tristeza na voz.
— Claro, entre!— disse ao dar passagem. — Procurei você na hora da
saída e não a encontrei. Aconteceu alguma coisa?— Arthur demonstrava
preocupação em sua fala.
— Fui demitida e pedi demissão — respondeu ao sentar-se no sofá,
fazendo os olhos de seu amigo quase saltarem da face.
— Você o quê?— exclamou. — Como? Quando? Por quê?—
questionou ao sentar-se ao lado da amiga.
— Exatamente o que você ouviu.— Ela respondeu. — Hoje fui
chamada na diretoria. Descobriram meu envolvimento com Jennifer.
— De qual maneira?
— Não sei. Mas isso é o menos relevante agora. De toda forma eu já
iria pedir demissão. Minha carta já estava escrita há semanas. Tomei a decisão
durante o período de férias.
— E o quê a levou a uma decisão tão radical como essa, Regina?
— Já não havia clima para permanecer ali, Arthur. Principalmente após
meu término com Jennifer. A última semana de aula que antecedeu as férias
reforçou o que eu já sabia. Foi doloroso demais vê-la triste pelos corredores e
não poder dar meu abraço a ela. Foi ainda pior vê-la cair em lágrimas na minha
frente e deixar a sala de aula. Eu nunca vi os olhos de Jennifer tão tristes e vazios
como naquele dia. Eu não quero isso para ela e nem para mim, que precisei me
comportar feito uma máquina enquanto via a mulher que amo fragmentar-se.
— Meu Deus, Regina... Quanta dor — disse com tristeza na voz ao
acariciar o ombro da amiga.
— Pra quê permanecer em uma tortura diária? Nós já não aguentamos
mais, Arthur. Cada dia que se passa é como se um pedaço a mais de mim fosse
consumido pela tristeza. O que seria de nós em meses? Sendo obrigadas a fingir
indiferença e a nos comportar como se não houvesse um coração aqui dentro que
clama pela outra. Sem mencionar o fato de que essa situação me incomodava
muito. Eu não me sentia profissionalmente e moralmente confortável há tempos.
— Eu compreendo você. No seu lugar também teria tomado essa
decisão. Ao menos agora é uma coisa a menos no caminho de vocês. Pretende
voltar com ela?
— Não. Meu cargo no colégio não era a única coisa que nos separava.
Existe a mãe de Jennifer que faz da vida dela um inferno. Ela não me aceita e eu
não irei voltar a bater nessa mesma tecla, não por agora. Não vou permitir que
ela sofra represálias ou até mesmo humilhações por estar comigo, entende?
Apesar de ser uma garota com grande senso de responsabilidade e uma
maturidade elevada, ela só tem dezoito anos. Não quero vê-la carregar pesos tão
grandes com tão pouca idade. Quero que ela tenha paz em casa e também na
escola. Quero que possa respirar tranquilamente pelos corredores e em sala de
aula sem precisar ouvir indiretas. Não quero que sinta como se a vida fosse ruim.
Sem mencionar o fato de que já estamos feridas e magoadas demais pelo cenário
onde nosso amor está abrigado. Não dá, Arthur. Agora não dá. Ela e eu
realmente precisamos de um tempo. Precisamos agir com cautela para não nos
machucarmos ainda mais.
— Você realmente a ama, não é?
— Com todo o meu coração. E é por amá-la tanto, tanto, que eu abri
mão do meu cargo para que seus dias sejam menos cruéis, para que olhar nos
meus olhos não seja motivo de tantas lágrimas. Eu não posso apresentar um
mundo tão cruel para Jennifer, não posso. Eu me sinto no dever de dar a ela uma
realidade que combine com o lindo sorriso que ela tem e que há tempos foi
roubado.
— Eu estou sem palavras, Regina. Me fez sentir a profundidade e a
amplidão do que habita aí dentro.
— Eu só desejo que a Jennifer compreenda minha decisão. Espero que
ela não pense que nosso afastamento foi e está sendo em vão porque me demiti.
Quero que seja capaz de compreender toda a complexidade da situação.
— Ela entenderá. Pelo que você veio me atualizando sobre a história,
ela própria sabe a amarração na qual vocês estão envolvidas — disse ele. O
homem ainda permanecia fazendo carinhos em Regina. — Já conversou com
ela? Ela já sabe sobre a demissão?
— Sim, avisei rapidamente antes de ir embora. Mas ainda não tivemos
oportunidade para conversar. E tendo em vista que não posso ligar pra ela por
causa da mãe, mesmo sabendo o número dela de cor, só me resta esperar uma
oportunidade. Acho que enviarei um e-mail antes de dormir e irei torcer pra que
veja.
— Estarei na torcida junto com você!
— Obrigada, meu amigo. Tem algo mais que preciso contar a você.
— Sou todo ouvidos — disse ao depositar a mão sobre a de Regina.
— Estou pensando em viajar, em passar um tempo fora para equilibrar
meu emocional. Se eu permanecer aqui não conseguirei continuar respeitando o
tempo que Jennifer pediu. Nesse um mês que passamos distantes foi uma árdua
tarefa me conter para não procurá-la. Mas ainda assim eu não evitei ir até a
academia e observá-la de longe. Você percebe o quão triste isso pode ser,
Arthur?
— Claro, eu percebo. Tem sido um desgaste emocional e psicológico
muito grande pra você. Acredito que para ela também. E pra onde pretende ir?
Quanto tempo ficará fora?
— Estava pensando em ir para a Itália visitar meus pais. Os braços da
dona Carmem Vianna cairiam tão bem agora — disse com suavidade e tristeza
na voz. — Eu ficaria fora por alguns meses. Cinco, talvez. Mas voltaria a tempo
para a formatura da Jennifer.
— Se você acha que precisa dessa distância, vá. Morrerei de saudades,
mas entenderei que é para o seu bem. Cuide da sua saúde mental, Regina. E
procure se livrar dos antigos vícios que se transformaram em novos.
— Eu farei isso, pode ficar despreocupado.— Regina deu a Arthur um
fraco sorriso e acariciou a mão do homem em um gesto de gratidão pela atenção,
preocupação e cuidados recebidos.
— Já comunicou a Jennifer?
— Ainda não. No final dessa semana acontecerá um campeonato de
boxe que é de extrema importância para ela, não quero desestruturá-la com a
notícia.
— Ela vai ficar devastada.
— Imagino que sim, e eu também. Mas prefiro isso a passar os dias nos
desgastando aos poucos. Conheço a Jennifer, sei que todos os dias ela também
tem lutado para não entrar em contato comigo. E se permanecermos assim,
acabaremos cedendo ao que não devemos.— Enquanto proferia suas palavras,
Regina sentia como se algo esmagasse seu peito e lhe tirasse o ar. — Mas eu não
vou embora em um ato de adeus. Pretendo mostrar à Jennifer que a levarei
comigo, e que enquanto eu estiver longe... Estarei buscando meu caminho de
volta para ela. Um caminho mais claro, mais limpo e mais digno para nós duas.
Arthur ouviu cada palavra dita com atenção antes de se manifestar.
— Sempre fui relutante quanto ao seu envolvimento com essa aluna, mas
hoje eu consigo sentir o quanto você a ama. Eu nunca te vi assim por alguém
antes, Regina. Não deixa esse sentimento tão bonito escapar da sua vida. Vá!
Faça o que for preciso, fique bem e volte para tomá-la.


Jennifer e Beatriz conversavam na varanda da casa de Meireles. A loira
havia contatado a amiga e a chamado na tentativa de conseguir algum amparo.
Jennifer sentia-se indignada pelo ocorrido com Regina, além de possuir um forte
sentimento de culpa habitando seu peito.
— Jennifer, tenta se acalmar. Não vai adiantar nada você partir pra
agressão física com a Estela. Você sequer tem certeza se foi ela. Pode ter sido
qualquer outra pessoa.
— Quem? Impossível não ter sido ela, Beatriz! Mas eu vou descobrir.
Ah, mas eu vou! Amanhã na escola o olhar dela vai entregar. E do jeito que é
cínica, tenho certeza que não fará questão de esconder.
— O quê você pretende fazer? Digo, em relação à Regina? Vai voltar
com ela?
— Quem me dera, Bea. Voltar pra ela ainda me parece um sonho
distante. Minha mãe não a aceita, e você sabe que ela é jornalista, não sabe? Eu
não gosto nem de imaginar as mentiras que ela poderia inventar e jogar para os
ombros da Regina.
— Você acha que ela poderia tentar colocá-la na cadeia?
— Oh não, cadeia não. Até porque Regina não cometeu crime algum.
Mas aquela mulher que está lá dentro é capaz de qualquer coisa. Aposto que
tentaria pelo menos afundar a carreira da Regina. Lecionar é uma das coisas que
ela mais ama fazer, Beatriz. Imagina se minha mãe mancha a imagem dela e a
faz perder isso? Eu acho que meu coração não resistiria.
— Nossa, é verdade. Não havia pensando nisso, amiga. Apenas pensei
que com a demissão da professora Vianna vocês pudessem ficar juntas. Não
pensei amplamente.— Lamentou Beatriz. — E como será no seu campeonato? É
nesse domingo, não é? Como fará pra conciliar a Regina e sua mãe no mesmo
ambiente?
— Eu não sei nem se a Regina irá. Nós estamos completamente
afastadas há um mês. Só nos falamos hoje rapidamente porque ela veio me
avisar que foi demitida.
— Poxa, Jen... Que triste tudo isso.
— Você não imagina o quanto.


Naquele mesmo dia, momentos mais tarde, quando Beatriz se foi,
Meireles deitou-se na rede que havia na varanda de sua casa e olhou para a
pequena parcela do céu que conseguia enxergar de onde estava. Ela lembrou-se
da conversa que tivera com Regina há algum tempo e escutou uma voz em seu
interior dizendo que tudo aquilo iria passar, pois havia uma força lá em cima
servindo de auxílio.
Em meio a tantos devaneios, sentiu uma forte vontade de abrir o e-mail
e digitar algo para Regina. Essa vontade lhe invadia os dias desde o momento
em que beijou a mulher pela última vez. Contudo, hoje, Meireles não deixaria
essa vontade passar. Ela precisava de mais detalhes sobre o ocorrido de mais
cedo na escola.
Sendo assim, abriu a caixa de e-mail pelo navegador do celular
inteiramente decidida sobre o que faria a seguir. O que ela não esperava era que
Regina tivesse se adiantando e lhe enviando uma mensagem meia hora atrás.

Boa noite, Jennifer.
Esse foi o caminho mais seguro para me comunicar com você. Espero
que leia esse meu e-mail em algum momento.
Tenho algumas coisas para esclarecer sobre o ocorrido de hoje e acredito
que você também tenha algo a me dizer. De antemão eu já peço que não se sinta
culpada. Há males que vêm para bem. Quando posso ter alguns minutos do seu
tempo para conversarmos? Algumas coisas precisam ser ditas com a verdade do
olhar.

Boa noite, meu amor.
Digitou Jennifer. Mas, logo se arrependeu e reformulou o e-mail.

Boa noite, Regina.
Com a proximidade do campeonato eu tenho treinado todos os dias. Você
poderia passar na academia amanhã no período da manhã? Caso não veja meu e-
mail a tempo, pode ir até lá qualquer dia dessa semana no período matinal.

É inevitável não me sentir culpada, desculpe.

Ao enviar a mensagem, Meireles deslogou da sua conta de e-mail e
apagou o histórico de seu celular. A última coisa que ela precisava era de sua
mãe fuçando e descobrindo coisas indevidas.


Um novo dia havia se iniciado. Jennifer levantou-se cedo, conferiu o e-
mail e constatou que não havia uma resposta da mais velha. Feito isso, tomou
seu café da manhã, recolheu a mochila e seguiu para a academia. Tendo em vista
que o campeonato mais importante de sua vida estava quase chegando, os treinos
da loira estavam cada vez mais intensificados.
Meireles canalizou a tristeza, a dor, a saudade, as mágoas e as
transformou em força e perseverança durante os treinos; direcionando toda
aquela energia negativa para os aparelhos da academia. Os sacos de pancada
foram os que mais sofreram o efeito. Jennifer estava determinada a vencer o
campeonato que abriria grandes possibilidades em sua vida. Sendo assim, usou
até mesmo os sentimentos negativos a seu favor. Tudo serviria de combustível
para alimentar sua gana por vitória.
— Woow, vai com calma aí, garota!— disse o treinador ao receber
enorme pressão contra as luvas de foco que segurava.
— Arrrgh, não me peça pra ter calma!— gritou ao continuar
depositando socos cada vez mais fortes. O rosto da loira estava completamente
vermelho e gotículas de suor escorriam por sua pele.
Quando o treino do dia chegou ao fim, lavou seu rosto na pia do
banheiro, trocou de roupa, comprou um shake da academia para se refrescar e
saiu. Assim que cruzou a roleta e a porta de saída, deparou-se com a presença de
Regina. O coração de Jennifer bateu descompassadamente com a figura da
mulher na sua frente. Se seu rosto estava avermelhado minutos atrás, certamente
estaria mais branco que papel agora.
— Desculpe o atraso — disse Regina ao vê-la. — Não imaginei que
fosse ver meu e-mail ontem mesmo. Hoje quando vi sua resposta já estava em
cima da hora. Por sorte você ainda está aqui.
— Que bom que você veio — disse Jennifer de maneira tímida, não
sabendo como se comportar.
As duas mulheres entraram no carro da mais velha, que estava
estacionado em frente a academia, e tentaram iniciar um diálogo.
— Eu não pretendo tomar muito do seu tempo. Sei que precisa ir
embora pra não atrasar-se para a aula.
— Tome o tempo que precisar, Regina.— O coração de Jennifer
permanecia em um grande descompasso, e seu estômago se comportava como se
centenas de borboletas batessem as asas ao mesmo tempo. — Como você está?
— Triste. E você?
— Da mesma maneira — respondeu com suavidade na voz. — Eu sinto
muito pela sua demissão. Falei com a minha mãe e ela me deu a palavra de que
não foi ela, mas não deixo de me sentir culpada.
— Você não tem culpa de nada, Jennifer — respondeu suavemente. —
Ontem eu não tive oportunidade de conversar com você sobre isso, então não
pude dizer que ontem mesmo eu já ia apresentar minha carta de demissão.
— Carta de demissão? Como assim?
— Eu já havia escrito uma carta pedindo para que me desvinculassem
da instituição. O fiz durante as férias. Já não dava pra permanecer naquele
ambiente.
— Mas... Mas...— dizia Jennifer, confusa. — Você ama aquele lugar.
— Mas eu amo muito mais a você — disse com serenidade ao mesmo
tempo em que sentiu o próprio coração mexendo dentro do peito. — Dizem que
nós nunca sabemos o valor de algo até perder, mas eu sempre soube o seu valor
na minha vida. Eu posso encontrar outro lugar para lecionar e aprender a gostar
de lá também. Isso é fácil. Mas se eu olhar em todas as ruas e bibliotecas... Eu
nunca vou te encontrar.
— Não fala nada mais se não quiser me ver chorando aqui mesmo.
— Desculpe, essa não é minha intenção. Apenas quero explicar a você
os meus motivos. Não quero que pense que o nosso afastamento foi em vão. Eu
realmente não podia permitir prolongar aquele sofrimento. Ver você sair aos
prantos por não conseguir olhar nos meus olhos foi o fim. E no final, acho que
foi mais íntegro pedir demissão.
— Eu entendo...— disse com os olhos já marejados. — Eu não
conseguiria continuar tendo aulas com você. Acho que eu pediria transferência
de turma.
— Eu não iria permitir. Você merece concluir seu ensino médio da
melhor forma possível; em um ambiente harmonioso e ao lado dos seus amigos.
— Mas agora não terei você nem ao menos no colégio.
— Você já não iria me ter e nem eu a você, Jennifer — disse com
suavidade. — Nós apenas teríamos a imagem triste uma da outra. Teríamos uma
Jennifer e uma Regina de mentira, que estariam ali sofrendo por serem obrigadas
a representar.
— Sim, é verdade...— Suspirou cabisbaixa.
— Você acredita em nós?— perguntou Regina ao segurá-la no queixo
com carinho.
— Muito, Regina — disse ao buscar o par de olhos castanhos que a
encarava. — Eu tenho esperança de que tudo vai dar certo no final.
— Ótimo. Tudo o que precisamos é de esperança — disse ao esboçar
um sorriso fraco. — Eu quero que todos os dias você respire fundo e busque
tranquilidade. Se dedique a seus estudos e ao seu boxe também, pois sei o quanto
ele faz bem a você. E nunca, jamais, esqueça que eu te amo. Não importa o que
aconteça, não importa o tempo que leve, nunca desistirei de você. Me ouviu
bem?
Jennifer, com os olhos banhados d’água, apenas assentiu positivamente
com a cabeça.
— Você vai assistir a minha luta?— perguntou incerta.
— Não perderia por nada.— Sorriu.
— Obrigada. Hoje fiquei sabendo pelo meu treinador que será lugar
marcado dessa vez. Darei a você um convite com a cadeira do lado oposto ao da
minha mãe. Mas toma cuidado ao entrar e ao sair, tudo bem? Não quero que ela
veja você, pois pode pensar que ainda estamos juntas.
— Não se preocupe, tomarei cuidado.
— Ok. Assim que eu tiver os convites em mãos eu comunico a você.
— Se puder deixá-lo com o Arthur eu acharia melhor. É... Você sabe...
Evitar contato — disse com pesar.
— Tudo bem...
— Agora vou deixar você ir pra não se atrasar. Cuide-se, Jennifer. Faça
por você o que eu adoraria fazer e não posso.
— Eu vou tentar...


Naquele mesmo dia, assim que entrou na sala de aula, Meireles sentou-
se no seu lugar de costume e olhou de maneira triste para a mesa à sua frente. O
afastamento de Regina havia sido feito de maneira instantânea e agora todos
teriam que lidar com um possível substituto.
Alguns minutos se passaram e a loira desligou a mente do mundo que a
cercava. Seus olhos se fixaram em um ponto qualquer e seus pensamentos a
levaram para o dia em que conheceu Regina. A memória era vívida na mente de
Jennifer. Ela recordava como se tivesse sido ontem o dia em que viu Regina
Vianna entrando naquela sala pela primeira vez.
Quem iria dizer que o amor se apresentaria a ela naquele ambiente tão
inusitado? Em qual momento da vida Jennifer imaginaria conseguir conquistar o
coração de uma mulher como Regina?
O que Meireles não sabia, ou talvez tivesse descoberto há pouco, era
que o amor não fazia distinção de classe social, faixa etária, religião ou
quaisquer que fossem as categorias em que uma pessoa fosse socialmente
classificada. Ele tampouco escolhia um lugar pra nascer. O amor é suscetível de
crescer até mesmo nos tempos de guerra. E o colégio Brooke foi apenas o ponto
de encontro para o início daquela que seria uma linda história de amor.

A loira foi tirada de seus devaneios ao ouvir a desagradável voz de
Estela ecoando no corredor. Ela, automaticamente, cerrou os punhos e
direcionou seu olhar até a porta.
— Boa tarde, Jennifer!— comentou a morena. — Impressão minha ou o
ar dessa escola me parece mais puro?
— Sua idiota! Eu tinha certeza que havia sido você!— Jennifer
levantou-se em um impulso de fúria e partiu pra cima de Estela.
— Oh, vejam só! Isso é uma confissão, Meireles?— retrucou ao sentir
as mãos da loira na gola de sua camisa pólo.
— Qual é a sua, garota?— gritou a loira.
— Jennifer! O que está fazendo? Para!— gritou Beatriz. A jovem
caminhava ao longe e resolveu correr ao perceber a confusão que iniciara na
porta da sala de aula.
— Foi essa idiota que entregou tudo, Beatriz!— gritou. — E tudo isso
porque não foi capaz de aceitar uma rejeição!
— Não arrume outra confusão, Jennifer, por favor. É isso que ela quer.
Lembre que você é bolsista, não pode se prejudicar por quem não vale à pena.
— Pode deixar, Bea. Não vou sujar minhas mãos com essa daí.— disse
ao soltar a camisa de Estela. — De mim a única coisa que ela terá é a pena. Pena
por ser uma criatura tão pequena, que pra sobreviver precisa alimentar-se da
desgraça do outro. Gente assim cai sozinha.— Meireles afastou-se de Estela e
voltou a entrar. Contudo, quando ia sentar-se novamente na cadeira, foi chamada
na direção.

— Vou tomar outra advertência por causa dessa garota?— Jennifer
retrucou.
— Não, senhorita Meireles. A chamei aqui por outro motivo. Quero
comentar sobre o ocorrido com a professora Vianna.
— Oh droga — murmurou a si própria.
— Provavelmente você não sabe, mas recebi sua mãe nessa manhã.
— Minha mãe?— perguntou ao arregalar os olhos.
— Sim. Uma vez que você é aluna dessa instituição, foi minha
responsabilidade chamar seu responsável para conversar sobre seu envolvimento
com uma de nossas funcionárias — disse Elizabeth.
— Se você me chamou para me dar sermão a respeito da minha
sexualidade eu estou fora. Já ouvi o bastante em casa. E eu também não quero
ser julgada por estar com uma mulher de trinta e três anos se eu apenas tenho
dezoito. Não admito ser tratada como uma criminosa por causa disso!
— Jennifer, se acalme. Não estou aqui para julgar suas razões pessoais,
até porque isso seria hipocrisia da minha parte. Com menos da sua idade, aos
dezessete, por descuido, eu já estava grávida do meu primeiro filho. Engravidei
no meu último ano do ensino médio.
Jennifer ouvia as palavras de Elizabeth com atenção.
— Por sorte eu estava em um relacionamento estável ao lado de um
homem que eu amava e que sentia o mesmo por mim. E eu tinha o apoio da
minha família. Porém, só eu sei como foi difícil conciliar a criança com meus
estudos. Mas eu consegui e me formei. Na época meu marido tinha vinte e
quatro anos e estava concluindo a faculdade. Por sorte ele conseguiu
rapidamente um emprego.
— Nossa, deve ter sido difícil pra vocês.
— Muito. Foi errado eu engravidar aos dezessete? Talvez sim, talvez
não. Depende do ponto de vista de cada um. Certamente é preferível que
adiemos esse momento para quando formos mais maduros e tivermos
estabilidade financeira. Mas eu não me arrependo. O deslize, se assim eu posso
chamar, me trouxe um dos maiores presentes da minha vida que foi o meu filho.
E por coincidência do destino ele nasceu no meu aniversário de dezoito anos. Na
época eu sofri muitos preconceitos por estar grávida aos dezessete;
principalmente dentro da escola.— Por alguns momentos não era a profissional
Elizabeth que estava de frente para Jennifer, mas, uma mãe, uma esposa, uma
mulher, um ser humano que é suscetível a errar e a acertar enquanto enfrenta os
grandes obstáculos da vida. Pois ninguém tem o manual de como viver.
— As pessoas adoram nos julgar por tudo. Se engravidamos aos
dezessete dizem que vai atrapalhar os nossos estudos. Se engravidamos após os
vinte e cinco dizem que vai atrapalhar nossa carreira profissional. Mas se
deixamos para ter filhos aos quarenta, eles simplesmente dizem: não acha que
está velha demais? Pode ser perigoso. Por que não teve antes?— Jennifer
comentou.
— É exatamente assim, Meireles. As pessoas sempre irão encontrar
motivos para nos criticar. Mas a vida não é uma receita de bolo. Cada um tem o
seu tempo. Por isso não estou aqui para julgar sua conduta em nível de caráter
pessoal. As pessoas não precisam ser julgadas, elas precisam ser orientadas —
disse com seriedade na voz. — Mas voltando ao assunto, você não é uma
criança, eu sei. Estou aqui apenas para fazer o meu trabalho. E como diretora
dessa instituição eu não posso permitir esse tipo de relacionamento. Existe uma
ética a ser seguida, do contrário vira uma grande bagunça!
— Eu compreendo — disse cabisbaixa. — O que minha mãe disse a
você?
— A senhorita Morgana me disse já estar ciente de tudo. O que para
mim foi um alívio, confesso.
— Ok. Mas e agora? O que irá me acontecer?
— Suspensão de uma semana.
— Oh droga...— resmungou.
— Você sempre foi uma aluna excelente e de conduta impecável.
Sempre gostei de você, Jennifer, e não pense que estou feliz com essa punição.
Eu ficaria ainda menos contente em tomar a sua bolsa de estudos. Então eu peço
que, por favor, conclua seu último ano sem quaisquer novos conflitos.
Jennifer usou a semana em que estaria suspensa em casa para dedicar-se
ainda mais ao campeonato. E pediu para que sua amiga Beatriz, todos os dias,
lhe passasse tudo o que havia sido dado em aula para que ao dias longe da escola
não a prejudicasse.

A semana foi chegando ao fim. Regina deu entrada em algumas
situações burocráticas para seu afastamento integral da instituição e começou a
tentar solucionar um assunto ainda mais burocrático: conseguir uma autorização
para que Bóris pudesse ser levado para fora do país.
A viagem para a Itália era quase uma certeza na sua vida. Mas ela só
compraria a passagem após comunicar o desejo para Jennifer.


O grande dia havia chegado. Jennifer ainda estava na academia em suas
últimas horas de treino. Tendo em vista que hoje era o dia de um compromisso
importante, foi dispensada de cumprir sua jornada de trabalho.
Por treinar de maneira excessiva nos últimos sete dias, ao desenrolar as
bandagens de uma de suas mãos a loira pôde perceber que havia alguns
machucados próximos a articulação de sua mão.
— Droga...— resmungou ao ver os leves ferimentos.
Meireles cumpriu o ritual de costume na academia e logo em seguida
foi para casa. Sua mente estava um turbilhão. Ela sabia o tamanho da
importância que teria a sua vitória na disputa de hoje.
— Olá — disse ao entrar em casa e avistar Morgana e Diogo.
— Olá, Jennifer! Ansiosa para hoje à noite?— perguntou o homem.
— Você não imagina o quanto.— A jovem respondeu.
Ao subir para o quarto, Jennifer desfez a mochila que levava sempre
para a academia e a preencheu com coisas novas. Dentro dela depositou seu
novo uniforme de disputa, alguns protetores bucais e o par de luvas douradas que
havia sido presente de Regina. Seu coração apertou ao lembrar-se do dia em que
as recebeu; ela mal havia sido oficialmente pedida em namoro pela mulher e
logo precisou afastar-se. A vida conseguia ser muito cruel quando queria —
pensou ela.


Arthur caminhava pelas ruas do centro comercial quando avistou sua
amiga Regina saindo de uma joalheria portando uma pequena embalagem em
mão.
— Regina!— chamou o homem.
— Arthur!— disse ela ao sorrir e aproximar-se do amigo.
— Como você está?— perguntou ele, segundos após depositar um beijo
no rosto da morena.
— Na medida do possível.— Ela respondeu. — E você?
— Sentindo sua falta no colégio. Com quem vou passar meus intervalos
agora?
— Oh Arthur, mas você tem outros amigos.
— Lá eu tenho colegas de trabalho. A única amiga era você — disse
suavemente. — Será que teria alguns minutos pra tomar um café comigo?
— Sempre.— Sorriu.

— E então, Regina. Como andam os preparativos para a viagem?—
perguntou o homem já sentado à mesa.
— Já comuniquei aos meus pais. Minha mãe quase enfartou de alegria,
mas perguntou como irei viajar se tenho a escola.
— E o que você disse a ela?
— Eu disse a verdade. Bom, parte dela. Mencionei que pedi demissão,
mas não expliquei os motivos. Prefiro explicá-los pessoalmente.
— Entendi... E quanto a Jennifer? Quando pretende contar?
— Em breve. Talvez semana que vem. Droga... Eu nem sei como fazer
isso sem nos magoarmos ainda mais.
— Ela sofrerá, e sei que você também, mas compreenderá que será o
melhor para todos — disse ao acariciar a mão da amiga.
— Hoje irei vê-la na disputa.
— Oh, é mesmo! Havia me esquecido que seria nesse final de semana.
Ansiosa?
— Sim! E ainda mais ansiosa pra ver a felicidade que estampará sua
face após a vitória. Jennifer merece. Estarei enviando a ela as melhores e mais
positivas energias.


Jennifer havia chegado ao local do campeonato com algumas horas de
antecedência. O lugar ainda estava fechado para o público, contando apenas com
a presença dos funcionários e alguns atletas seguidos de seus treinadores.
Meireles havia chegado com seu orientador e professor responsável e estava se
trocando em uma área exclusiva para as lutadoras do sexo feminino.

— Estou feliz em saber que você irá usá-las.
Meireles ouviu uma voz inteiramente familiar soando da porta. Ao
virar-se, a imagem de uma linda mulher preencheu seu campo de visão.
— Regina!— Sorriu. — Eu não poderia deixar de usá-las em um
momento como hoje. Tenho certeza que irão me trazer sorte — respondeu,
referindo-se ao par de luvas douradas. — Mas... Como você conseguiu entrar
aqui?
— Anteciparam o horário de abertura. E tendo em vista que cheguei
bem cedo, fui uma das primeiras a entrar. Deve haver uma meia dúzia de pessoas
sentadas em seus lugares — explicou. — Feito isso eu apresentei o convite
fornecido por você e me permitiram vir até aqui te dizer um oi.
— Estou feliz que esteja aqui. Vem, entra!— chamou em meio a um
bobo sorriso.
Regina cumprimentou algumas mulheres que, assim como Jennifer,
terminavam de se arrumar e de se preparem para a luta, e caminhou até próximo
da jovem.
— Eu não vou me demorar — começou dizendo. — Apenas vim dizer
que estou com você, sempre. E que acredito na sua vitória.
— Obrigada pela grande confiança que deposita em mim. Mas... E se eu
não vencer? E se eu perder novamente? Você sabe, já aconteceu uma vez.
— Se isso acontecer, a derrota será apenas no ringue. Fora dele você
ainda terá oportunidades de continuar tentando. Parece clichê o que vou dizer
agora, mas a vida é construída de momentos distintos. E até mesmo as derrotas
nos servem como aprendizados.
— Mas eu quero tanto ganhar...
— Eu também quero que você vença e acredito nessa conquista. Mas se
o oposto acontecer, não desanime. Pelo menos não por um longo período de
tempo. Use como impulso, como incentivo pra que da próxima vez você consiga
superar a você mesma.
— Tentarei lembrar dessas palavras.
— Chegar no topo é maravilhoso, Jennifer. Todos almejamos — disse
ao tocar as duas mãos cobertas pelas luvas. — Mas não podemos esquecer que o
mais importante é a trajeto até lá. O que importa são os amigos que
conquistamos no caminho, a vista que apreciamos e as lições que aprendemos.
Essas são as verdadeiras conquistas.
— Oh Regina... Você sempre tem uma palavra de conforto. Obrigada
por isso — disse docemente. Ela envolveu a mais velha em um carinhoso abraço
e sentiu um sentimento similar a uma despedida invadir seu peito.
— Agora eu preciso ir — comentou ao desfazer o abraço. — Estarei
exatamente na cadeira cinquenta e sete, escolhida por você, te vendo brilhar. —
Regina depositou um beijo carinhoso na testa de Jennifer e se foi.


Todos já estavam em seus lugares. Regina permanecia quieta em sua
cadeira ao mesmo tempo em que avistava Morgana e Diogo sentados no extremo
oposto.
O ambiente estava populoso, com quase todas as cadeiras preenchidas,
quando uma forte iluminação pairou sobre o ringue e os primeiros lutadores
daquela noite foram anunciados. A morena era uma pilha de nervos, assim como
Morgana e Diogo. Todos estavam ansiosos e eufóricos para quando a vez de
Jennifer chegasse.
— É a sua hora, Jennifer!— comentou o orientador da jovem. —
Lembre-se de respirar corretamente e manter a concentração na sua adversária.
Esqueça a plateia! — orientou o homem.
Meireles corria sem sair do lugar, aquecendo-se, durante os minutos que
antecediam sua entrada. E enquanto se aquecia, as palavras de seu professor se
fundiam com as ouvidas por Regina horas atrás.
— Foco, Jennifer! Foco!— exclamou, segundos antes de tocar as costas
da loira e vê-la correr para dentro do ringue.
— Jennifer — murmurou Regina a si mesma quando a avistou entrando
no ringue.
A jovem foi anunciada pelo locutor, assim como sua adversária, e logo
em seguida deu-se início ao primeiro round.
Enquanto Jennifer e sua adversária lutavam, três juízes observavam de
maneira atenciosa, minuciosa e cautelosa todos os golpes que estavam sendo
executados. Presentes também estavam: o árbitro, o cronometrista, diretor
técnico, os assistentes de cada adversário e uma equipe médica.
Jennifer executou um golpe na lateral da cabeça de sua oponente e
posteriormente recebeu um golpe em seu abdômen como resposta. Nesse
momento o coração de Regina quase saltou da arquibancada.
O coração da morena ameaçou saltar do peito muitas vezes naquela
noite. Meireles já estava entrando no terceiro round e a disputa parecia bastante
acirrada para ela.
Meireles havia treinado com a alma nos últimos sete dias. Seus reflexos
estavam perfeitos e os golpes bem executados, porém, partes distintas de seu
corpo doíam como se estivessem esgotadas. Sem mencionar suas mãos
machucadas pelo treino excessivo.
— Não é possível! Não é possível!— exclamou Diogo, nervoso, ao
levantar-se da cadeira. A loira havia sido nocauteada e precisou apoiar-se nas
cordas.
— Vamos, Jennifer...— murmurou Morgana, aflita.
— Vamos, garota... Vamos! Você consegue!— Diogo dizia repetidas
vezes. O homem estava eufórico e preocupado. Meireles havia começado a
entrar em desvantagem.
Jennifer lançou-se novamente de volta para o centro do ringue antes que
o árbitro continuasse com a contagem. Seus ombros doíam excessivamente e
seus punhos seguiam o mesmo caminho. Ela sabia que as repetições indevidas
de alguns movimentos nas horas em que estendeu o treino acabariam
acarretando em dores.
A loira começou a mover-se de maneira mais rápida sobre o ringue para
que o foco de sua adversária ficasse prejudicado. E quando sentiu que havia
abertura executou um uppercut, que consiste em um golpe no sentido de baixo
para cima contra o queixo do outro lutador.
— Eu acredito em você, Jen — murmurou Regina de onde estava.

Meireles e sua adversária de nome Melissa, também de dezoito anos,
iniciaram o décimo segundo assalto. Ambas estavam visivelmente cansadas.
No meio da disputa, Jennifer lembrou-se das palavras de seu orientador
a respeito de não direcionar o olhar para a plateia. Contudo, a curiosidade falou
mais alto. Ela olhou rapidamente para cima e para os dois lados e avistou
Regina, Morgana e Diogo. A imagem dos três reunidos despertou uma vasta
variedade de sentimentos dentro de Jennifer, e ela os usou como combustíveis
para os minutos finais.
A rapidez e a quantidade de golpes executados sobre Melissa em tão
pouco intervalo de tempo foram quase inacreditáveis. Era como se algum botão
tivesse sido apertado dentro da loira. Ela usou a raiva pela incompreensão de
Morgana, a tristeza pelo rompimento com Regina e a necessidade de possuir
liberdade como gás para vencer a luta.
Os danos sobre a adversária de Jennifer estavam sendo tantos, que os
juízes declararam nocaute técnico, pois Melissa já não possuía condições físicas
de prosseguir. Melissa estava cansada, dominada por Jennifer e incapaz de
contra-atacar. Sendo assim, seu treinador pediu para que parassem a luta, dando
a vitória por T.K.O a Jennifer Meireles.

Morgana e Diogo se abraçaram e vibraram na plateia assim que se
deram conta da vitória da garota. Regina, por sua vez, sentiu o peito explodir de
alegria. Sua vontade era de tomar a jovem nos braços, beijá-la, abraçá-la e
parabenizá-la pela maravilhosa luta de hoje. Ela queria que Meireles soubesse
que existia um alguém que sempre acreditou em sua capacidade.
Uma nova categoria do boxe iria iniciar em poucos minutos. Regina
cogitou a ideia de permanecer no local para assistir, mas decidiu ir embora.
Entretanto, antes de partir, caminhou até próximo a entrada da sala onde
permaneciam os atletas e se escondeu. Ela viu Morgana e Diogo se direcionando
para onde Jennifer estava e pôde avistar o enorme sorriso da loira ao recebê-los
na entrada.
O coração de Regina apertou e ela desejou poder ir até lá e participar da
comemoração junto a eles. No entanto, aceitou sua realidade e se retirou antes
que fosse vista por Morgana. A morena não se perdoaria se estragasse a grande
noite de Jennifer.


Ao chegar em casa Regina tomou um banho morno, vestiu uma
camisola e se direcionou para a cozinha sendo seguida por seu fiel companheiro
de quatro patas. Uma intensa vontade de fumar levou a morena a acender um
cigarro. Mas, em consideração a vitória de Jennifer, o apagou. Ela sabia que se a
jovem estivesse lá gostaria de vê-la resistindo ao vício.
— Sem cigarros por hoje — disse a si mesma ao jogá-lo na lixeira.
Para sentir a presença de Jennifer ao seu lado naquela noite, preparou
seu habitual chá de maçã com canela, subiu para o quarto e começou a assistir ao
filme que vira com ela na última vez em que a loira esteve em sua casa.
Contudo, o que ela não esperava era que as lembranças fossem lhe
causar desconforto. Ao invés de rir com as cenas cômicas do filme, ela chorou.
Chorou pela ausência das gargalhadas da jovem ecoando por seu quarto.
Um lado de Regina se sentia feliz pela vitória de Jennifer. Mas também
existia uma parte que sofria pela distância e se entristecia por não poder dividir
com ela um momento tão único e especial como o de hoje. E tendo em vista que
não possuía a menor pretensão de fumar naquela noite, resolveu desabafar e
esvaziar-se fazendo umas das coisas que mais lhe agradava: escrever.

Não importa se nós temos cinco anos de idade ou oitenta. Quando nosso
coração se rompe por alguma razão, a dor se alastra da mesma maneira.
Dói quando uma criança vê seu melhor amigo mudar de escola ou até
mesmo de cidade, assim como dói o coração da mãe que perdeu o filho ao nascer
Não estou comparando dores, isso seria um pecado para aqueles que a
sentiram de alguma maneira. Somente quero dizer que a dor do outro não merece
ser diminuída por não ser a mesma que a sua
Hoje o meu peito dói. E a minha dor não é a de cinco anos de idade,
tampouco a dos oitenta. Ele não dói pela perda de um filho, e agradeço aos céus
por isso. O motivo da minha dor é a saudade. Saudade da minha poesia favorita,
que agora eu vou falar um pouco a respeito

A minha poesia tem os mais belos cabelos anelados, que me fazem
gastar horas a fio brincando de enrolá-los ainda mais
Tem o olhar de inocência, que me renova as esperanças em acreditar em
um futuro bom para todos, para nós
A minha poesia favorita é dona de um sorriso que me faz querer mover
montanhas. E embora ela o julgue feio pela particularidade de seus dentes
sutilmente tortos, mal sabe ela que lá mora toda sua beleza

Infelizmente, hoje a saudade entristece minha poesia, fazendo me restar
apenas recordações.
Recordações dos dias em que sorríamos e fazíamos amor enquanto
fingíamos sermos livres.

Regina Vianna .


Capítulo 31


Ponto de Vista de Jennifer

Deixei minha mãe na companhia de Diogo enquanto resolvia algumas
questões burocráticas a respeito do campeonato de hoje. Assinei alguns
documentos necessários para que liberassem meu prêmio diretamente na minha
conta bancária.
O valor em dinheiro não é exuberante, mas é uma quantia considerável.
Agora eu tenho um pequeno fundo de auxílio para quando sair de casa.
Somado a esse dinheiro estará meu salário mensal da academia. Não
ganho muito por lá, mas tendo em vista que não possuo quaisquer gastos dentro
de casa, esse pouco que recebo terá um bom rendimento.
Ao me afastar da minha mãe e de Diogo, corri todo o lugar à procura de
Regina. Eu estava imensamente feliz pela vitória e queria agradecê-la por nunca
deixar de acreditar em mim. No entanto, tudo o que encontrei foi sua cadeira
vazia. Não havia um vestígio dela.
Um sentimento de vazio e solidão começou a me abraçar. A vitória já
não me deixava tão feliz se eu não podia comemorá-la com ela. A ausência de
Regina era algo do qual eu nunca me acostumaria.
Naquela mesma noite minha mãe me chamou para comemorar a vitória
em algum lugar que fosse de minha escolha. Recusei, claro. Não entendo como
ela ainda pode achar que eu gostaria de estar na presença dela para seja lá o que
fosse. Dela eu só pedi compreensão e aceitação, mas não obtive sequer o
respeito. Então, agora, não espero nada mais. E ela não tem o menor direito de
cobrar alguma atenção ou carinho de minha parte.
Escutei coisas horríveis da pessoa que eu mais amava no mundo.
Conheci um lado intolerante, preconceituoso e desprezível da mulher que eu
sempre tomei como exemplo pra mim. Se ela acha que fui e sou uma grande
decepção na vida dela, espero que esteja consciente de que ela também tem sido
uma decepção pra mim. No entanto, meu coração e meus braços sempre estarão
abertos para recebê-la se algum dia estiver disposta a me aceitar como sou. Do
contrário, seguirei meu caminho de cabeça erguida com a certeza de que estou
no caminho certo do meu coração.
Após ter negado a proposta, decidi ir diretamente para casa. Meu estado
de espírito não era o de uma pessoa que acabara de vencer um campeonato
importante.
Tomei um banho e me vesti com um pijama confortável ao mesmo
tempo em que meus pensamentos estavam direcionados à Regina. Eu poderia
passar dias, meses, anos ou até mesmo vidas inteiras tentando explicar a vocês o
tamanho do meu amor por aquela mulher.
Regina é intensidade e serenidade. E eu só queria poder me perder em
toda a profundidade dessa mulher; pois essa, sem dúvida, sempre será a melhor
maneira de me encontrar.
Nos últimos dias tenho sentido como se eu não pudesse mais aguentar.
Há um mês eu não tenho o calor daqueles braços ou da voz deliciosamente rouca
murmurada ao meu ouvido.
E o que dizer dos nossos encontros ao acaso, ou talvez nem tão ao acaso
assim, na biblioteca? Quanta falta me faz. Eu namorava Regina com o olhar, ao
mesmo tempo em que procurava uma oportunidade para encostá-la. Nessa época
nossos lábios ainda não haviam se tocado, mas Regina já era capaz de me levar
até a lua.
No último final de semana em que estive com ela aproveitei para
memorizar cada trejeito. Ela adora cantarolar canções em espanhol e tem uma
persistente mania de aproximar as duas mãos e ficar tocando os próprios dedos.
Seu olhar carrega o mesmo mistério que o oceano, e o sorriso é tão
grande quanto seu amor por Bóris. E por falar em amor, Regina ama quando
traço caminhos com as pontas dos meus dedos por toda a pele de seu braço.
Sempre me considerei uma garota de coragem. Mas, hoje posso dizer
que o medo rodeia meus dias. Eu temo que o tempo que pedi a Regina acabe nos
distanciando. Temo que nesse período ela conheça um alguém livre e muito
melhor que eu. Droga... Não sei se suportaria perdê-la.


Os dias seguiam tristes, silenciosos e sem cor para Jennifer Meireles. E
embora Morgana já não controlasse seus passos e também não mais lhe
direcionasse olhares vazios, ainda assim sabia que tudo se tratava de uma falsa
calmaria, pois no interior de Morgana ela só estava feliz porque sabia que sua
filha já não estava com Regina. E também sabia da demissão da professora.
Na escola era onde Meireles mais sentia a ausência de Regina. As
escadas, os corredores e a biblioteca tornaram-se cinzas e sem vida. Era como se
tudo à sua volta não passasse de uma triste melodia.
Jennifer, em todas as aulas de história, se sentava em sua cadeira e
mantinha o olhar fixo na porta da sala de aula à espera dela. Em seu interior
existia uma doce ilusão de que a morena fosse voltar e aparecer em uma espécie
de mágica. Porém, quando a dura realidade se fazia presente, os olhos da loira se
preenchiam de lágrimas.
O coração da jovem apertou um pouco mais quando precisou ir à
direção entregar o valor mensal arrecadado para a formatura e deparou-se com
um mural que continha as fotos de todos os funcionários aniversariantes do atual
mês; agosto.
Em um momento melancólico, Jennifer depositou delicadamente a mão
sobre a fotografia de Regina como se acariciasse verdadeiramente a mulher.
Meireles olhou para os lados de modo a se certificar de que ninguém a via e
arrancou a foto, tomando-a para si.
Ao analisar o cenário da fotografia, Jennifer constatou que se tratava do
auditório do colégio. Na imagem Regina estava nitidamente distraída enquanto
mexia em seus próprios cabelos. Ela usava um conjunto de roupa social, como
de costume, e em sua face portava seus óculos de grau. Chorar e ao mesmo
tempo sorrir foi inevitável para a jovem. O amor que sentia por aquela mulher
palpitava em seu peito.


Os dias e semanas continuaram passando. No meio de toda a solidão
Regina começou a receber mensagens de texto vindas de Jennifer em seu celular.
Mensagens estas, que foram todas ignoradas pela mais velha. Ela não podia
fraquejar, não. Precisava ser forte por ela e pela loira. Sendo assim, mesmo com
o coração despedaçado e gritando para responder às constantes mensagens, não o
fez.
Entretanto, houve um sms em especial que tocou de maneira intensa seu
emocional e a deixou a um passo de responder.

O brilho da sua menina de ouro desvanece um pouco mais a cada dia da
sua ausência e do seu silêncio. A rota das minhas constelações também está se
apagando, enquanto isso eu temo que você não consiga enxergar o caminho de
volta.

— Jennifer...— murmurou para si mesma com o celular ainda em mãos.
A morena cogitou fortemente a ideia de respondê-la, mas sua racionalidade falou
mais alto. Sendo assim, depositou o aparelho sobre o criado mudo e deu
continuidade ao que estava fazendo.
Há uma semana Regina havia entrado em contato com os alunos
particulares de espanhol e lhes notificado sobre sua viagem à Itália. Todos
ficaram tristes, pois muito prezavam as aulas com a mulher. No entanto, os
avisou que a viagem seria temporária e que enquanto estivesse fora deixaria uma
conhecida de confiança dando continuidade às aulas, se assim eles preferissem.


Era fim de tarde de um sábado chuvoso quando Regina, na presença de
Bóris, separava algumas roupas e objetos pessoais para compor suas malas.
A chuva era intensa e ventava forte lá fora, fazendo alguns galhos da
árvore do quintal chocarem-se contra o vidro da janela do quarto. O tempo
estava cinza e o céu havia escurecido mais rápido que de costume.
Regina escolhia e dobrava roupa por roupa e as guardava dentro das
malas. Cada peça era depositada sobre a outra seguindo o mesmo padrão de
cores e tipos; calça sobre calça, camisetas brancas sobre camisetas brancas.
Enquanto escolhia minuciosamente o que levar, teve a sutil impressão
de ouvir a voz de Jennifer chamando por seu nome. A princípio pensou estar
imaginando coisas, mas, logo percebeu que de fato Meireles a chamava.
Ao descer as escarradas às pressas e abrir a porta principal, deparou-se
com a imagem da loira parcialmente encharcada pela chuva.
— Jennifer — disse surpresa, segundos antes de sentir o corpo da mais
nova contra o seu.
A loira, sem dizer quaisquer palavras, lançou-se sobre o corpo da
mulher à sua frente e a tomou nos lábios como se aquele ato fosse o último de
sua vida. Um de seus braços contornou a cintura de Regina ao mesmo tempo em
que a mão livre segurava sua nuca.
Regina foi pega desprevenida pelo beijo e toques impulsivos. Ela
permitiu que o braço da loira envolvesse e apertasse sua cintura, ao mesmo
tempo em que sentia a maciez daqueles lábios sendo pressionados contra o seu.
Meireles pediu passagem com a língua e quase soltou um gemido ao
senti-la em contato com a de Regina enquanto provava uma vez mais de sua
boca. O beijo que compartilhavam era intenso, ardente, apaixonado, urgente e
cheio de saudades. As duas mãos de Regina se enroscaram nos cabelos úmidos
de Jennifer e posteriormente desceram para os ombros e braços, tateando-os.
— Jennifer... Jennifer...— murmurou ofegante enquanto lutava para não
continuar cedendo. — Não... Não podemos.
— Podemos. Eu não aguento mais ficar sem você — respondeu ao
depositar os lábios no pescoço de Regina.
As duas mulheres se beijavam e se tateavam com voracidade enquanto
deixavam seus corpos serem conduzidos para o interior do imóvel; parando de
andar apenas quando Regina se chocou contra as costas do sofá.
— Jennifer, para... Por favor — disse relutante ao sentir os persistentes
beijos da jovem em seu pescoço.
— Não me rejeita, meu amor...— murmurou ao pé do ouvido, fazendo a
mais velha arrepiar-se.
Cada parte do corpo de Regina gritava para ceder às carícias. Sua
respiração tornou-se ofegante e seu coração batia cada vez mais acelerado ao
sentir o cheiro e a textura da pele de Jennifer novamente. Sem mencionar a doce
voz tão próxima de seu ouvido.
— Não estou rejeitando você. Apenas... Não podemos — respondeu ao
desvencilhar-se das investidas.
— Você não pode ser tão forte assim, Regina. Não pode — disse ao
tomar os lábios da mulher uma vez mais. — Diz que você me quer. Diz que você
ainda me quer.— Meireles tentava fazer Regina fraquejar junto com ela. Sua
voz, cortada, era um misto de desejo e de dor. Seus olhos lutavam para não
marejarem. — Me diz que ainda sou a garota dos seus olhos — disse ao beijá-la
no maxilar e em toda a região do pescoço. — Diz que quer me jogar nesse sofá e
fazer amor comigo até nossos corpos se esgotarem. Diz!— gritou.
— Você continua sendo o que eu mais quero nessa vida — respondeu
ao tomar o rosto de Jennifer com as duas mãos, a fazendo olhar em seus olhos
castanhos. — Mas nós não podemos continuar nos magoando assim —
continuou a dizer. — Precisamos respeitar esse tempo — disse com dificuldade.
Ela lutava para que seus olhos não se banhassem d’água.
— Eu sei que fui eu que pedi esse afastamento, e sei que não temos
outra escolha. Mas eu não suporto mais ficar sem você nos meus dias.— Jennifer
desabou a chorar e foi amparada pelos braços de Regina. — Saí do trabalho e
não pude evitar vir aqui ver você. Estive lutando durante todo esse tempo, mas
hoje eu não consegui, me desculpa — se explicou em meio ao choro.
Regina não sabia se deveria manter-se séria ou demonstrar as reais
emoções. Mas optou por ser verdadeira.
— Oh meu amor, eu sinto tanto por tudo isso — respondeu suavemente
ao acariciar os cabelos da loira. — Eu não quero que nosso amor faça mal a
você.
— Ele não faz. A sua ausência faz. No seu coração é o melhor lugar pra
que eu possa desembarcar e ancorar.
Regina não sabia ao certo o que dizer. Como ela poderia abrigar
Meireles se o seu cais estava em pedaços?
— Eu quero sempre ser um bom lugar pra você, Jennifer. Mas no
momento precisamos aprender a respeitar esse tempo. Você e eu.
— Não vou dizer tudo bem, pois não está e não vai ficar. Mas vou
continuar tentando — respondeu com seriedade ao secar as lágrimas. — Bom,
acho que devo ir agora — disse envergonhada.
Regina observou por alguns instantes os olhos avermelhados de Jennifer
enquanto tomava força para dar a notícia. Ela sabia que apagaria o último
vestígio de brilho daquele olhar.
— Tem algo que preciso contar a você — comentou ao buscar a mão
da jovem.
— O quê?
Regina hesitou por longos segundos antes de começar a falar.
— Você e eu precisamos encontrar a maneira menos dolorosa de
enfrentar esse afastamento. E se continuarmos do jeito que estamos, será
impossível. Dói saber que você está tão perto e tão longe de mim ao mesmo
tempo, assim como sei que também dói em você.
— Sim — concordou a mais nova.
— Eu não posso ligar pra você, eu não posso ver você, eu não posso
saber se acordou bem ou se teve uma boa noite de sono — disse de maneira
rápida. — Eu não posso pegar meu carro, ir buscá-la no trabalho e trazê-la pra
aproveitar o final de semana ao meu lado. Eu sequer pude dar meu abraço a você
pela sua vitória!— continuou a dizer. — Eu não estou podendo ser nada na sua
vida, Jennifer. Isso me entristece.
— Eu sei. Eu sinto muito por isso. Você não imagina o que eu daria pra
poder ser uma pessoa livre pra você.
— Eu não quero que você e eu tenhamos essas recaídas que não irão
resolver nossos problemas. Eu não quero beijar você agora, fazer amor e te ver
sair por aquela porta deixando para trás e levando consigo uma saudade ainda
maior. Sendo assim, acabei tomando uma decisão que irá favorecer a nós duas.
— Qual decisão?
— Estou indo viajar.
— Viajar? Pra onde? Por quanto tempo?— perguntou com aflição ao
sentir o coração palpitando dentro do peito.
— Para a casa dos meus pais. Pretendo passar alguns meses por lá.
— Mas isso é... Na Itália — disse incrédula.
— Sim.
— Regina... Não... Não! Você não pode ir pra tão longe de mim assim
— comentou assustada.
— Apenas meu físico estará longe, meu amor. Assim evitaremos essa
luta constante de não ceder. E dessa forma teremos espaço pra equilibrar nossas
emoções enquanto colocamos tudo no lugar. Eu sei que se continuar aqui
permaneceremos nessa dor, andando em círculo.
— Você está desistindo de mim? Está me deixando de vez?
— Não. Jennifer, não! Eu só quero tornar as coisas menos dolorosas.
— Desaparecendo da minha vida? Indo embora? Que bela maneira!
— Eu não estou desaparecendo da sua vida. Jennifer, me escuta, por
favor.
— Eu não quero continuar ouvindo isso!
— Entenda que distantes nós já estamos. O fato de eu viajar não muda
tanta coisa assim no sentido físico. Mas no psicológico será uma grande
mudança pra nós. Eu estarei respeitando o seu tempo, o nosso tempo.
— Eu vou embora, não quero mais te ouvir!— gritou com seriedade ao
dar as costas para Regina.
— Jennifer!— A mais velha segurou o pulso da loira e a fez parar. —
Vamos conversar, por favor!
— Eu não quero conversar!— exclamou. — Eu sei que não tinha o
direito de pedir que você esperasse por mim, mas eu pensei que...— Jennifer
hesitou por alguns instantes antes de prosseguir. — Nada, deixa pra lá.
Meireles tentou desvencilhar-se de Regina, mas foi envolvida pelos
braços da mulher.
— Eu não vou deixar você ir embora assim! Você precisa me ouvir.
Não estou deixando você, eu irei voltar!
— O que você quer que eu pense?— Jennifer gritou. — Ignorou todas
as minhas mensagens, rejeitou meus beijos e agora me diz que está indo embora,
Regina! Qual garantia eu tenho de que você vai mesmo voltar?
— A do meu amor por você.— Regina respondeu. — Pensei que isso
bastasse — disse ao soltar a loira dos seus braços.
— Eu tenho medo — comentou com tristeza em sua voz. — Muitos
medos. Eu não sei o que pensar.
— Me deixa saber quais são esses medos?— comentou suavemente.
— Medo que você possa conhecer alguém melhor, medo que você se
acostume com minha ausência e me esqueça.
— Você realmente não sabe o quanto eu gosto de você, garota.— A voz
de Regina soava triste. — Eu não gostaria de viajar e deixar um clima ruim entre
nós.
— Quando você vai?
— Ainda não comprei a passagem. Pretendia conversar com você
primeiro.
— Não sei o que pensar, não sei o que dizer. Eu só quero que esse
sentimento ruim vá embora — comentou ao baixar a cabeça e levar as mãos até
a testa. Meireles estava angustiada, sentia como se existisse um peso
pressionando seu peito e lhe tomando o ar.
— Eu não estou feliz com os últimos acontecimentos. Não quero que
pense que pra mim está sendo fácil, pois não está. Apenas eu sei o quão duro
será não poder mais vê-la. Mas agora eu preciso ser coerente e tomar uma
atitude.
— Estou me sentindo tão frágil, tão desamparada — comentou com
lágrimas em seus olhos. — Eu não vou suportar toda essa distância, Regina. Não
viaja, por favor.— Meireles tomou as duas mãos da morena e sentiu o calor que
delas emanava.
— Não me peça isso, Jen, por favor...— dizia relutante. — Vamos
tentar enxergar essa viagem com um novo olhar.
— Como, meu amor?— perguntou com lágrimas nos olhos. — Eu sou
tão apaixonada por você, Regina. Está doendo demais.
— Nós precisamos ser fortes. Eu não posso dizer que será fácil, mas
posso afirmar que estarei com você até o final.— Regina deslizou a mão pelos
cabelos e a estacionou próxima à nuca e o maxilar da mais nova.
— Posso enviar e-mails a você?— perguntou ao mesmo tempo em que
encarou o par de olhos castanhos à sua frente.
— Todos os dias. Quero que me deixe informada sobre os
acontecimentos em relação a você. Não quero perder suas conquistas, tampouco
quero que nos tornemos duas estranhas.
— Me envia fotos sempre que você puder, ta?— pediu, recebendo um
aceno positivo em resposta. Jennifer possuía o semblante triste. — Acho que vou
indo embora agora. Eu preciso ficar sozinha, preciso digerir tudo o que
aconteceu e o que ainda vai acontecer.
— Tudo bem — respondeu a mais velha. Regina também estava
visivelmente desolada — Eu vou trazer uma jaqueta seca pra você.
— Não precisa se incomodar.
— Eu não vou nem te responder!— disse, segundos antes de subir até o
quarto e retornar com uma jaqueta jeans.
Ao vestir a peça, Jennifer pôde sentir o gostoso aroma pertencente às
roupas de Regina. Foi então que um sorriso tímido, fraco e pequeno nasceu no
canto de seus lábios.
— Obrigada — disse suavemente. — Me avisa quando comprar as
passagens? Quero ir até o aeroporto com você.
— Aviso, sim. Mas prefiro embarcar sem uma grande despedida, se
possível. Não quero tornar o momento ainda mais triste.
— Tudo bem...— lamentou.
Meireles direcionou-se até a porta de saída e despediu-se de Regina
com uma olhar vazio. Ninguém ousou um abraço, tampouco um beijo de
despedida. Ambas estavam tristes e sentidas demais para qualquer coisa. Jennifer
foi embora carregando o medo de passar o resto dos dias sem Regina. Enquanto
isso, a mais velha tentava se convencer de que ficaria tudo bem. Ela
transbordava de pensamentos sobre o que aconteceria a partir de agora.
No entanto, em meio a toda aquela turbulência emocional, as duas
amantes compartilhavam um pensamento em comum: acreditavam fielmente
que o amor não podia ser contido.

Jennifer deixou que a água morna do chuveiro se misturasse às suas
lágrimas e escorresse por seu corpo. A tristeza era tamanha, que a fez perder a
noção do tempo. Quando se deu conta, percebeu que as pontas de seus dedos já
estavam enrugadas.
A loira saiu do banho, se vestiu e depositou a jaqueta de Regina por
cima do pijama na tentativa de senti-la mais perto. Logo, pensamentos a respeito
dos momentos vividos com ela há poucas horas se fizeram presentes em sua
mente. O gosto dos lábios da mulher ainda estava em sua boca. Lábios esses, que
há tempos não provava, e que muito apreciou matar um pouco da saudade.
Jennifer julgava o beijo de Regina a droga mais gostosa e perigosa.


— Não queria acreditar nisso, mas acho que ela vai me deixar, Beatriz.
— O quê? Para de dizer besteira, Jennifer!— respondeu. Ela e
Meireles conversavam na escada durante um tempo vago de aula.
— Eu estou falando sério. Capaz de não mais voltar — disse
tristemente. — O tempo é traiçoeiro. Ele conduz, mas também separa.
— Você está viajando. Ela ama você. Ela já não disse isso?
— Disse, mas sei lá. Eu estou muito insegura. Ela vai estar tão longe de
mim. E se conhecer um alguém melhor? Uma mulher de verdade? Uma daquelas
italianas cheia de charme? Eu tenho tanto medo que ela comece a achar que eu
não sou o bastante. Quais motivos ela teria pra voltar a uma garota com a
situação tão complicada como a minha?
— Cadê a Jennifer confiante que eu conhecia? Para de dizer essas
merdas! Para de se colocar pra baixo! Eu sei que a situação é difícil e não nego
que estaria insegura também. Mas você precisa confiar no amor dessa mulher
por você. Cara, ela pediu demissão! Ela arriscou a carreira dela nessa escola por
você. Isso deveria bastar pra que soubesse que ela voltará.
— Você está certa. Mas... E se ela estiver cansada de perder coisas pra
estar comigo?— Suspirou.
— Olha Jennifer... É você quem está se relacionando com ela. É você
que recebe as declarações de amor e os olhares apaixonados. Então, apenas você
poderá encontrar essa resposta.
— Regina não é o tipo de mulher que mente. Eu a conheço e acredito
nela. O meu medo é o tempo.
— Nada de ruim irá acontecer nesses meses. Não pense nisso. Ela sabe
o que quer, você também. Não sabem?
— Sim.
— Então pronto! Agora vamos para a aula, que o sinal já vai tocar.

Os dias passavam e a aflição de Jennifer aumentava. Ela era um misto
de saudade, medo, inseguranças. Por dias ela ansiou um contato de Regina.
Entretanto, por dias ela o evitou. Meireles era um antagonismo de sentimentos e
vontades, pois ao mesmo tempo em que gostaria de falar com a mulher, ela sabia
que a ligação lhe traria más notícias.


— Tia, não vai embora!— pediu Henrique ao abraçá-la pela cintura. Era
a véspera da viagem. Regina havia visitado Malena e o sobrinho para uma
despedida.
— Oh meu amor, eu voltarei. Os meses passarão voando! Quando
piscar, estarei de volta — disse docemente, porém, com a voz cortada. A morena
possuía um nó em sua garganta.
— Sentiremos sua falta, minha irmã. Essa viagem é mesmo necessária?
— perguntou Malena.
— Sim. Eu quero ocupar minha mente e o tempo ocioso da espera. Se
eu permanecer aqui, sei que nos machucaremos continuamente.
— Se refere a recaídas?
— Principalmente. E sei que as recaídas se tornariam cada vez mais
constantes, até que chegaríamos ao ponto em que estávamos — explicou. —
Jennifer precisa respirar, precisa de paz dentro de casa. E eu preciso aprender a
esperar o tempo certo para tê-la da forma que eu gostaria.
— Jennifer? Aquela sua aluna?— perguntou Henrique ao se intrometer
na conversa. O menino estava de orelha em pé.
— Henrique, meu amor, vá brincar. Permita que sua tia e eu
conversemos.
— Por que eu não posso participar? Estão falando da Jennifer, e eu
gostei dela, mãe — comentou enquanto recordava da brincadeira que
compartilharam na piscina. — Quero ver a Jennifer de novo.
Malena direcionou à irmã um pedido de desculpas com o olhar.
— Por um bom tempo não será possível vê-la de novo — explicou
Regina com suavidade na voz. — Mas eu prometo marcar um passeio entre nós
quando voltar de viagem. Combinado?— disse ao oferecer a palma da mão para
o menino.
— Combinado!— respondeu ao bater a palma da mão contra a de sua
tia.
— Agora nos deixe conversar, Henrique. Por favor — disse a ruiva. O
menino, a contra gosto, deu as costas e se retirou.
— Agora me conta, como está se sentindo com tudo isso?— perguntou
ao direcionar a atenção para a Regina.
— Eu apenas lamento — respondeu com seriedade. — É uma lástima
precisar me afastar dela porque a mãe não nos aceita. Por um tempo eu fechei
meus olhos para não ver a realidade cruel que nos envolvia, mas agora não dá
mais.
— Eu sinto tanto, minha irmã. Mas era de se imaginar que a situação se
complicaria.
— Verdade. Mas ela e eu tentamos adiar ao máximo que o pior
acontecesse. De toda forma, esse não é o fim. Na verdade, é o preparativo para
um novo começo. Não estou desistindo da Jennifer, pelo contrário, decidi por
essa viagem justamente porque quero nos preservar. Quero dar ao universo o
tempo que ele precisa. E não haverá um dia sob o céu de Toscana que eu não
estarei pensando nela.


— Até amanhã, Jennifer!
— Até amanhã, galera! Nos vemos!
Jennifer concluiu sua jornada de trabalho, despediu-se de seus colegas e
começou a caminhar em direção ao ponto de ônibus. Era uma fria noite de
sábado. Ela usava uma calça jeans justa, camiseta básica, jaqueta de couro
vermelha e um par de tênis. Em sua cabeça havia uma touca preta, que usava na
tentativa de aquecer-se do frio.
Ao sentar-se no banco do ônibus, sentiu o celular vibrar no bolso
traseiro de seu jeans. Ao tomá-lo em mãos, constatou que se tratava de um
telefonema de Regina. Ela não mais possuía o número da mulher entre seus
contatos, mas reconheceu aquela sequência de algarismos. Sendo assim, mesmo
com o coração acelerado e as mãos geladas, tomou coragem e a atendeu.
— Alô?
— Jen? Sou eu. Está podendo falar agora?— certificou-se Regina.
— Oi, eu posso sim. Acabei de sair do trabalho e estou indo pra casa.
— Eu posso encontrar você em algum lugar? Precisa ser agora.
— Aconteceu alguma coisa?— perguntou nervosa. — Sim, sim, eu
posso.
— Ainda não aconteceu, mas está prestes a acontecer.
— Regina, o quê houve?
— Eu viajo hoje — respondeu, recebendo um longo silêncio na linha.
— Jennifer, você está aí?
Meireles manteve-se calada por mais alguns instantes, dando à Regina
apenas o som de sua respiração. Aquela frase da mais velha havia surtido o
mesmo efeito de uma espada entrando em seu peito.
— Oi, eu estou aqui — respondeu com a voz fraca. — Seu vôo sairá em
qual horário?
— Às nove horas.
Meireles olhou rapidamente para a hora em seu celular e constatou que
era quase cinco da tarde. Sua mente estava confusa e seus pensamentos
conturbados.
— Vou em casa pegar algo e encontro você logo em seguida. Qual seria
o melhor lugar?
— Onde for melhor pra você.
— Poderia ser naquela sua cafeteria favorita?
— Perfeito.

Ao combinar o lugar, Jennifer desejou que o ônibus fosse voando para
casa. Ela julgou que quanto antes encontrasse Regina, mais rápido toda aquela
agonia passaria.
Chegando em casa recolheu uma embalagem que estava escondida em
seu guarda roupa e seguiu rumo à cafeteria. Porém, antes de cruzar a porta de
saída, foi abordada por Morgana, que a perguntou aonde ia com tanta pressa.
Contudo, dos lábios de Jennifer não saiu uma palavra, ela apenas bateu a porta
com força e se foi.
Assim que começou a se aproximar da fachada de vidro do
estabelecimento, avistou a morena sentada em uma mesa próxima à entrada.
Regina estava rodeada com algumas malas, e Bóris estava depositado em seu
colo numa espécie de bolsa de transporte.
O coração de Jennifer apertou e seus olhos instantaneamente ficaram
úmidos. Aquela imagem havia lhe doído mais do que ela imaginaria.
— Oi...— disse suavemente após tomar coragem para entrar, fazendo
Regina levantar o olhar ao escutar sua doce voz.
— Jennifer — disse com um meio sorriso nos lábios.
Meireles sentou-se em uma cadeira de frente para a morena e se
manteve calada.
— Quer tomar alguma coisa?— ofereceu, quebrando o silêncio.
Jennifer apenas balançou a cabeça negativamente. — Ok. Eu também não vou
tomar nada — continuou a falar. — Bom, eu não vou arrastar esse momento tão
doloroso, mas preciso dizer algumas coisas a você.
— Não precisa dizer nada. Ou melhor, não me diz nada, me deixa
apenas te olhar — disse Jennifer, emocionada. — Me deixa tocar você.—
Meireles atravessou a mesa com suas mãos até encontrar as mãos de Regina do
outro lado.
A mais velha não pôde deixar de notar o quão geladas as mãos de
Jennifer estavam. Ela questionou-se internamente se era por conta do frio ou
algum fator emocional.
— Eu preciso dizer algumas coisas antes de ir — respondeu ao englobar
os dedos pálidos da loira na tentativa de aquecê-los.
— Bóris poderá ir na cabine com você?— perguntou ao desviar o
assunto. Ela não queria ouvir as despedidas.
— Sim, o peso dele permite que vá comigo, o que pra mim foi um
alívio, não gostaria de imaginá-lo indo no porão.
— Você enfrentou muita dificuldade pra conseguir autorização de levá-
lo?
— Bastante, principalmente porque resolvi tudo em cima da hora. Por
sorte todas as vacinas e o vermífugo do Bóris estavam em dia. Então, peguei um
certificado de saúde no veterinário e apliquei um microchip nele. O maior
problema enfrentado foi no exame de sorologia da raiva, pois leva tempo até sair
o resultado e ainda precisava de prazo pra poder viajar. É algo muito
burocrático, mas por sorte eu tenho alguns conhecidos que burlaram algumas
coisas pra mim.
— Fico feliz por isso — respondeu com seriedade. O semblante de
Jennifer estava péssimo, o quê fragmentava ainda mais o coração de Regina. —
Você disse que não iria se prolongar e que não queria uma longa despedida,
então eu vou entregar o que trouxe pra você e ir embora. Eu também não consigo
arrastar isso aqui.— Ela lutava com as palavras para não chorar.
— Jennifer, não precisava ter se incomodado em me dar algo —
comentou com suavidade ao observar a mais nova pegar uma sacola que estava
apoiada próxima às suas pernas e apoiá-la sobre a mesa. — Mas eu agradeço a
lembrança. Posso abrir?
— Não. Prefiro que abra quando não estiver mais aqui. Espero que
goste.— A mais nova esboçou um pequeno sorriso.
— Tenho certeza que vou amar.— Sorriu. — Também tenho algo pra
você.— A mais velha abriu sua bolsa e tirou uma embalagem de dentro. —
Quero que abra quando estiver sozinha em casa. Tem uma carta junto ao
presente. Peço que a leia antes de abri-lo, pois é extremamente esclarecedora.
Nela eu escrevi o que eu não conseguiria dizer a você agora sem desmoronar por
isso.
— Obrigada! Já estou nervosa antes de ler.
— E eu estarei nervosa até que você leia — disse Regina. — Bom,
agora eu preciso ir.
— Eu não quero me despedir — disse Jennifer com convicção.
— Então a gente não se despede, tudo bem?— respondeu com
suavidade na voz, recebendo um sutil aceno de cabeça.
A mais velha levantou-se da cadeira e, com a ajuda de Jennifer, levou
as malas e Bóris para a o lado de fora do estabelecimento. Enquanto o táxi não
chegava, as duas mulheres trocaram mais algumas palavras.

— Não deixe de ler a carta, ok?
— Não deixarei — respondeu com os olhos banhados d’água.
— Não chora, meu amor, por favor — disse carinhosamente ao notar
que uma lágrima solitária escorria pela face da jovem.
— Volta pra mim, Regina — pediu ao desmoronar. Ela segurara o
choro o máximo que pôde.
— Oh meu amor...— Regina a acolheu e a envolveu com amor
enquanto a sentia soluçar de tanto chorar em seus braços. — Eu voltarei pra você
— murmurou contra o ouvido da loira.
Jennifer buscou a boca de Regina e pressionou os lábios fortemente
contra os dela. Ela precisava sentir aquela textura e maciez uma vez mais.
— Estarei te esperando — sussurrou.
Quando o taxista estacionou e fez sinal, Regina tomou as mãos de
Jennifer e as beijou com ternura antes de pronunciar suas últimas palavras.
— Ainda levarei você pra Europa comigo, e cada país será paisagem para
o nosso amor.

Meireles sentiu que morreu um pouco mais quando a viu entrar no
veículo e partir. A imagem de uma Regina triste através de um vidro gelado foi a
última coisa que seus olhos registraram.


Dentro do avião, sentada em sua poltrona ao lado da janela, Regina
sentiu um forte sentimento de solidão lhe invadir. Seu olhar estava distante e sua
mente a levava para os últimos momentos vividos com Jennifer. Ela não
conseguia esquecer-se das gélidas mãos da jovem e do som de seu pranto.
Naquela cabine fria e quase vazia, só lhe restava a companhia de Bóris e
o presente recebido por Jennifer. Presente este, que a morena começou a abrir
lentamente.
A mais nova a havia presenteado com uma caixa de chocolate meio
amargo, o preferido da mulher, um livro para que ela pudesse se distrair durante
a viagem e uma foto com dedicatória.
O coração de Regina se aqueceu quando ela segurou a fotografia. Se
tratava de uma foto antiga da loira usando um vestido azul bebê e sorrindo
alegremente para a câmera. O sorriso de Jennifer estava largo, moleca, com
grande parcela dos dentes à mostra, e seus olhos estavam pequenos, apertados,
exatamente da maneira que fica quando ela sorri abertamente.
Ao olhar pela data marcada na fotografia Regina chegou à conclusão de
que Jennifer possuía dois anos e meio quando a foto foi tirada. Sem dúvida,
dentre os três presentes recebidos, aquele havia sido o que mais lhe agradou. Ela
conseguiu sentir-se um pouco pertencente à história de Meireles.
Jennifer sempre contou à Regina que adoraria tê-la em sua casa para
que pudesse lhe mostrar suas fotos, seus pertences e tudo mais que a envolvia. E
a morena sempre lamentou nunca poder ir. No entanto, agora, de certa forma,
Regina possuía um pequeno pedaço do passado da mais nova em sua mão. Um
pequenino, gracioso, sorridente e loiro passado.

Jennifer tentou acalmar-se durante o caminho de volta, mas foi


inevitável. Acabou entrando em casa aos prantos e foi acolhida pelos braços de
Diogo, que a recebeu sem questionamentos.
— Ela se foi, ela se foi — dizia em meio ao pranto.
— Aquela mulher de novo, Jennifer?— indagou Morgana com a voz
alterada.
— Morgana, agora não — comentou Diogo, acenando para que a mãe
de Jennifer não se manifestasse.
— Regina foi embora pra Itália. Ela se foi...
— Oh... Eu sinto muito, meu amor — disse ele de maneira carinhosa ao
acariciar os cabelos da jovem.
Morgana se manteve calada. Embora ela não gostasse de ver a filha
falando sobre Regina, vê-la naquele estado estava lhe causando um grande
desconforto.
— Eu preciso ficar sozinha. Eu só... Preciso ficar sozinha — disse de
maneira incerta, confusa, segundos antes de desvencilhar-se do abraço de Diogo
e subir correndo as escadas.
Meireles se sentia covarde demais para abrir o presente recebido. Ela
encarou a embalagem por incontáveis minutos ao mesmo tempo em que uma
nuvem carregada com os mais distintos pensamentos pairou sobre sua cabeça.
Ela temia chorar ainda mais por ter em mãos um presente dado pela mulher,
além de temer o conteúdo da carta.
Todavia, começou a pensar que nada a deixaria mais triste que a partida
de Regina. Foi então que, sentada no chão e de costas coladas na cama, uniu
forças e abriu o presente.
Jennifer começou pelo envelope de carta, assim como Regina lhe
orientou. Seu coração batia de maneira acelerada a cada linha que fora escrita a
punho pela mulher.

“Jen...

Não sei em qual momento você estará lendo essa carta, mas
provavelmente eu já terei embarcado.
Prometo não me prolongar nessas linhas, assim como não me arrastei
na nossa despedida.
Sei que nada do que eu disser irá mudar a dor da saudade. Porém,
talvez eu possa tornar a espera um pouco menos triste.
Você e eu éramos lindas na poesia dos nossos encontros, e embora
nossa despedida não aparente beleza, ainda assim seremos lindas no
reencontro.
Quando voltar pra você vai ser como se não tivesse passado um dia,
porque o que temos nunca foi apenas físico. Nunca. E não importa a distância
geográfica que nos separe, o fio que nos une permanecerá intacto. O que serão
cinco meses ao lado da vida que eu quero ter com você?
Quando me pediu um tempo eu respeitei sua decisão e nós nos
afastamos. Mas, eu gostaria que soubesse que dentro de mim eu apenas estava
aceitando que não podia mais tocar você. No entanto, o meu compromisso de
amor permaneceu e permanece o mesmo. Ainda que eu não possa tocá-la, eu te
namoro todos os dias.
Em relação ao presente; pensei em entregá-lo a você quando eu
voltasse. No entanto, acho que esse é o momento mais oportuno. Ele não teria
tanto significado e importância como agora.
Eu, que nunca fiz promessas, estou indo embora com a promessa de que
vou voltar. Sei que não posso te levar a Saturno, Jennifer, mas eu posso te dar
os anéis. Nesse caso, o anel. E um dia desafiaremos a gravidade.”

— O anel?— Jennifer murmurou a si mesma. Seu coração transbordava
com as palavras escritas na carta. — O anel?— Voltou a questionar-se. Quando
a ficha finalmente caiu, buscou com desespero o presente contido na
embalagem. Em meio às folhas de seda havia uma pequena caixa recoberta por
veludo de coloração vermelha. Ao abri-la, seus olhos se depararam-se com o
inimaginável.
— Regina, eu não acredito...— murmurou ao avistar uma fina aliança
de ouro que reafirmaria o compromisso de namoro entre elas.



Capítulo 32

Uma pequena luz se fez presente em meio a toda escuridão que rondava
os dias de Jennifer. E embora ela soubesse que a dor da saudade ainda
aumentaria a cada instante, aquele anel de compromisso era uma certeza a plano
físico de que a tormenta passaria. Ele serviria para lembrá-la diariamente do
quão amada ela é, e do quão compromissada Regina se sentia.
Ao encaixar a aliança em seu dedo, notou que a peça lhe coubera
perfeitamente. Ela aproveitou o momento para fotografar a mão direita e enviar a
imagem como arquivo anexado em um e-mail para Regina.

Oi! Acabei de abrir o presente! O anel de Saturno! Regina, você é
incrível! Estou encantada! Nem nos meus sonhos mais românticos com você eu
imaginaria algo desse tipo. Muito obrigada por essa demonstração de carinho,
significou muito pra mim. Mas estou com uma dúvida enorme: como sabia a
circunferência do meu dedo? Me coube perfeitamente!

Você já chegou na Itália? Ocorreu tudo bem no seu vôo? Me deixe
informada, por favor.

Com amor, Jen.

Ps: aceito desafiar a gravidade.

Meireles estava nas nuvens. Ela deitou-se com as costas coladas na
cama, ergueu o braço e olhou sua mão contra a luz, de modo a admirar a
delicada aliança em seu dedo. A jovem passou longos minutos contemplando a
peça, até que se deu conta de que precisava encontrar uma maneira de escondê-
la, do contrário precisaria inventar uma boa desculpa para sua mãe.
Não fazia parte dos planos de Jennifer não a usar a aliança. Sendo
assim, após pensar em uma solução, chegou à conclusão de que a levaria consigo
como pingente; de preferência debaixo da roupa.
Em meio a seus pertences a jovem encontrou uma fina corrente dourada
que serviu exatamente para o que ela tinha em mente. Agora ela carregaria
aquela aliança para todos os lugares sem levantar as suspeitas de Morgana.



Florença, Itália

Considerada o berço do Renascimento italiano e uma das cidades mais
belas do mundo, Florença é capital e maior cidade da região da Toscana. É um
lugar onde há cultura em cada esquina, beco, rua e praça. Passear por Florença
ou Firenze, em italiano, é dedicar todo o tempo ao prazer da contemplação. É
caminhar por ruas e ter uma deliciosa aula de história a cada passo.
Estar em Florença é sentir o cheiro de cravo, de orvalho e grama nas
mais belas manhãs ensolaradas de Toscana.


Após algumas horas de voo, Regina e Bóris finalmente desembarcaram.
A morena contou com a ajuda de um funcionário para recolher e transportar suas
bagagens, e logo em seguida avistou seus pais.
— Regina!— exclamou Carmen Vianna, sua mãe, com alegria.
— Filha!— disse Henrique, emocionado. O pai de Regina possuía o
mesmo nome do neto.
A morena apressou os passos e deu a eles um abraço grupal.
— Mal posso acreditar que estou aqui — disse carinhosamente
enquanto era envolvida pelo terno abraço de seus pais.
— Você está linda!— disse Carmen ao segurar a mão da filha e
observá-la. — Mas me aparenta um pouco mais magra. Você está se
alimentando bem, mocinha?
— Siempre tan hermosa — comentou Henrique com um sorriso nos
lábios ao contemplar a filha.
— Gracias, papá — respondeu carinhosamente, segundos antes de
direcionar sua atenção para Carmen. — Realmente perdi alguns quilos, mãe, mas
depois eu explico tudo a você — respondeu suavemente.
— Sem pressa, minha filha — disse Carmen. — Temos companhia?—
comentou a mais velha ao observar a presença de Bóris em sua caixa de
transporte no chão.
— Oh, sim! Trouxe Bóris nessa viagem. Pretendo passar muitos meses
aqui e jamais me distanciaria dele por tanto tempo — explicou.
— Então vamos todos pra casa!— exclamou Henrique, sorrindo.
Durante o trajeto de carro Regina observava toda a paisagem local. Ela
morou por pouquíssimas temporadas na Itália, pois além de ter nascido no Rio
de Janeiro - Brasil, seus pais sempre foram muito viajantes. Sua infância foi
vivida em países distintos, o que lhe proporcionou um vasto conhecimento
cultural. E quando atingiu a maioridade, retornou para a cidade natal.
— Chegamos!— exclamou Henrique assim que todos adentraram o
grande imóvel.
Por conta do fuso-horário, a diferença que separava Jennifer e Regina
era de quatro horas. Sendo assim, somando essa questão às horas de voo, era
uma linda manhã para a mais velha enquanto para a loira ainda era final de
madrugada. Itália está quatro horas à frente do Rio de Janeiro, Brasil.
— Presumo que esteja com fome, Regina. Vou pôr a mesa de café da
manhã enquanto você se acomoda — comentou Carmen, segundos antes de se
direcionar para a cozinha.
— E eu vou ajudar com as malas!— disse Henrique. E assim, pai e filha
subiram para o andar de cima.
— Estou muito preocupada com Bóris, papá. Ele dificilmente se
acostumará com o novo ambiente.— Regina aparentava preocupação em sua
fala. — Eu trouxe alguns pertences dele e uma peça minha de roupa usada. Ah, e
também trouxe o último lençol onde estávamos dormindo. Talvez dessa maneira
ele possa se sentir mais acolhido ao reconhecer o cheiro já familiar.
— ¡Oh si! Yo espero que se acostumbre — disse o mais velho.
Regina e Henrique sempre trocavam alguns diálogos no idioma nativo
de seu pai.
— Yo también.
Regina forrou o lençol que trouxera sobre a cama, distribuiu os
pertences de Bóris por todo o quarto, abriu a pequena caixa de transporte e
permitiu que o gato saísse por livre e espontânea vontade.
— Acho que levará tempo até que ele saía dessa caixa — comentou seu
pai.
— Acho que sim.— confirmou a morena ao observar Bóris arredio. —
Enquanto ele toma coragem, vou tomar um banho e em seguida desço pra
comermos, tudo bem?
— Claro, Regina! Te espero lá!

Devido a seu grande problema com arrumação, Regina não conseguiu
esperar para desfazer as malas em um momento mais tarde. Sendo assim, tomou
um longo tempo dando um lugar para cada peça e objeto que havia trazido. Ao
final, quando tudo já estava impecavelmente em seu lugar, tomou um banho
morno, vestiu-se com roupas confortáveis e desceu para a cozinha.
— Pensei que tivesse cochilado — comentou Carmen.
— Desculpe, estava desfazendo minhas malas — explicou ao sentar-se
de frente para seus pais. — Hummmm, brioche!— exclamou ao ver a porção
sobre uma cesta de palha, na mesa. — Deliciosos como eu me lembrava!— disse
ao provar um dos brioches feitos por Carmen.
— Foi uma bela surpresa essa sua visita inesperada, Regina —
comentou Henrique ao observar a filha.
— Eu precisava de um tempo longe de tudo. Algumas coisas na minha
vida precisam encontrar o rumo certo.
— Pode falar conosco sobre o que quiser, Regina — disse Carmen ao
buscar a mão da morena sobre a mesa.
— Obrigada, mãe. Realmente estou precisando desabafar.
— Eu reconheço esse olhar. Há tristeza nele.— Henrique comentou.
— Há mais do que tristeza, pai — respondeu.
Assim que a família Vianna concluiu o café da manhã, Regina chamou
os pais para acompanhá-la até o quarto e lhes entregou alguns presentes trazidos
na viagem. Regina usava sempre o mesmo quarto quando visitava seus pais. Ele
possuía o dobro do tamanho de seu quarto no Brasil e dispunha de uma
decoração mais antiga e requintada.
Após a entrega de presentes, os três se acomodaram no sofá e poltrona
presentes no quarto; ficando Carmen e Regina no sofá de dois lugares e
Henrique na poltrona.
A filha do casal os atualizou sobre os últimos acontecimentos de sua
vida, sem esconder detalhes, e aguardou que eles se pronunciassem a respeito.
— Por Deus, Regina! Você perdeu o seu juízo? Como chegou a esse
ponto com uma aluna?
— Eu me apaixonei de uma maneira arrebatadora por Jennifer, mãe. E
mais que me apaixonar, eu me permiti amá-la. Sei que essa história soa como
uma loucura, mas vocês precisam conhecê-la. Jennifer é uma pessoa ímpar!
— As histórias de amor das boas sempre pareceram uma grande loucura
— comentou Henrique. O pai de Regina era um romântico incurável.
— Você se meteu em uma grande confusão, Regina — iniciou Carmen
— Conhecendo você eu não tenho dúvidas do caráter dessa garota. Sei que você
jamais arriscaria tanta coisa se ela, no mínimo, não fosse um alguém de bom
coração.
— Jennifer é o ser humano mais gracioso e encantador do mundo. Nós
temos quinze primaveras que nos separam, mas ainda assim conhecemos e
gostamos das mesmas flores.
Um pequeno sorriso formou-se nos lábios de Henrique. Seu coração
sempre se aquecia ao ouvir a forma poética de Regina se expressar.
— Eu quero muito conhecer essa Jennifer Meireles — disse ele. —
Preciso saber quem é a pessoa que conquistou o coração da minha menina dessa
maneira.
— Você a incentiva? Oh, mio Dio!— retrucou Carmen.
— Embora eu sempre vá chamar Regina de minha menina, sei que ela
já é uma mulher. Uma grande mulher! E tenho confiança em suas escolhas —
disse o homem ao alternar o olhar entre ambas as mulheres que o olhavam.
— Compartilhamos a mesma opinião — afirmou Carmen. — Mas, se
eu pudesse a protegeria do mundo lá fora. Fragmenta meu coração vê-la numa
situação como essa.
— Eu também o faria se pudesse. Foi difícil vê-la sair do ninho.
— Olá? Eu ainda estou aqui. Podem falar diretamente comigo —
comentou Regina, fazendo o casal soltar uma risada em conjunto.
— Perdôname, mi hija.
— Seu pai e eu gastamos horas a fio recordando de quando você e
Malena eram pequenas. Por vezes acabamos nos perdendo em nossos
pensamentos. Coisa de velho!— explicou-se. — Ainda acho toda essa história
uma loucura, minha mente ainda digere essa situação. Mas eu preciso dizer que
tem todo meu apoio para seguir firme na decisão que escolher tomar, além de
um colo macio pra reconfortá-la.— Sorriu.
Regina retribuiu ao sorriso recebido por Carmen e deitou a cabeça no
colo de sua mãe a fim de receber algum cafuné em seus cabelos.
A mais velha, por sua vez, recebeu a filha carinhosamente em seu colo e
lhe acariciou os fios castanhos ao mesmo tempo em que se lembrou de quando
Regina teve o coração quebrado pela primeira vez.
O senhor Henrique, de onde estava, contemplava a imagem dos amores
de sua vida em um grande momento de entrega e cumplicidade. Se Henrique
tivesse o poder, sacrificaria a própria vida pra que Malena, Regina e Carmen
jamais soubessem o que é sofrer.


Algumas horas mais tarde, quando Carmen e Henrique já haviam
deixado o quarto, Regina sentou-se de pernas cruzadas sobre a cama e ligou o
notebook que trouxera com a bagagem. Quando o fez, sentiu a presença de Bóris
avançando lentamente, fazendo-a sorrir.
Assim que o aparelho ligou, instantaneamente a morena abriu o e-mail e
deparou-se com a mensagem de Jennifer. Seu coração apertava a cada palavra
lida. A voz de Meireles quase se fazia audível aos ouvidos de Regina através
daquelas linhas.
Ao visualizar o arquivo anexado, caminhou até a bolsa e voltou de lá
com o celular e o segundo anel em mãos. Ela pôs a fina peça dourada em sua
mão direita, assim como Jennifer, a fotografou e transferiu a imagem para o
notebook. Ela também a anexaria no e-mail que seria encaminhado para a jovem.

Tão bom entrar aqui e já ter uma mensagem sua. Cheguei à Itália pela
manhã. Se não me engano há um fuso-horário de quatro horas que nos separa.
Não sei se já havia mencionado a você, mas os meus pais moram em
Florença. Eu sempre me esqueço do quão lindo é esse lugar. A cidade é um
museu ambulante. Adoraria ter você aqui pra vivenciarmos uma aula de história
em meio a tantas obras de arte.
Hoje Bóris me deu um grande susto. Ele estava, no sentido literal da
frase, tremendo de medo dentro da casa de transporte. E quando finalmente saiu,
teve uma crise de ansiedade e começou a lamber-se compulsivamente. Não
demorou muito e encontrei uma bola de pêlos no chão do quarto.
Mas agora eu adoraria saber como você está, minha menina. Não paro
de lembrar da frieza das suas mãos e do som do seu pranto. Às vezes eu me
odeio por ser tão relutante quando quero fazer a coisa certa. Por um momento
pensei em desistir e ficar nos seus braços.
No entanto, de toda maneira, saiba que meu coração ficou com você.

Regina.

Ps: acha que eu não saberia a circunferência do seu dedo?

Regina encaminhou o e-mail, fechou o notebook e deitou-se na cama
para descansar a viagem. Ao fechar os olhos, uma curta lembrança povoou sua
mente em um delicioso flashback antes de adormecer.
— Senhorita Meireles, poderia me ajudar a levar esses livros de volta
para a biblioteca?— pediu Regina.
Jennifer acenou positivamente com a cabeça e tomou em seus braços
um pouco mais da metade da pilha.
— Não lembro se já disse, mas eu adoro quando você me pede pra
ajudá-la — comentou a loira enquanto caminhava lado a lado com a professora
pelo corredor do segundo andar. O barulho dos saltos de Regina contrastava com
o baixo som que o tênis de Meireles emitia quando em contato com o piso.
— Ah é? Por quê?— Regina questionou.
— Porque sim.
— Porque sim não é uma resposta válida, senhorita Meireles.
Jennifer se manteve calada, pensativa, enquanto escolhia as melhores
palavras para dar à professora.
— Bom, basicamente é porque posso passar um tempo a sós com você
— respondeu suavemente.
Ao chegarem à biblioteca vazia, contando apenas com a presença da
funcionária responsável pelo lugar, Regina assinou uma ficha de devolução,
depositou os livros sobre o balcão e pediu para que Jennifer lhe ajudasse a
escolher uma nova pilha de livros para a turma de primeiro ano.
— Qual seria o prazer em passar um tempo a sós comigo?— comentou
enquanto mexia nos livros dispostos na prateleira.
Jennifer adorava a sensação de estar próxima a Regina. Ela apreciava o
nervosismo que tomava conta de seu corpo sempre que acontecia. E não negava
a si mesma o quão atraente a mulher era.
— Poder conhecer você um pouco mais e compartilhar um momento
juntas. É sempre diferente quando estamos na classe de quando estamos sozinhas
— respondeu.
— Devo confessar que também aprecio esses pequenos momentos —
admitiu, compartilhando com Jennifer um pequeno sorriso.
— Há quanto tempo dá aulas aqui? Eu não me lembro de ter visto você
por aqui antes, e eu não me esqueceria de uma mulher como você — disse
Jennifer enquanto pegava os novos livros das mãos de Regina e os organizava
sobre a mesa.
— Há nove anos e meio — respondeu. — Mas nos últimos dois anos eu
peguei apenas as turmas da manhã. Se você estudou apenas à tarde, então foi por
isso que nunca tivemos aulas juntas.
— Sim, eu sempre estudei à tarde. Uma pena! Adoraria que tivesse sido
minha professora no primeiro e segundo ano também — lamentou.
— Talvez por algum motivo tenhamos nos conhecido apenas agora —
respondeu ao virar-se e direcionar o olhar à jovem. — Mas o quê você quis dizer
ao comentar que não esqueceria uma mulher como eu?

— Senhorita Vianna, preciso me ausentar por alguns instantes e por
conta disso terei de fechar a sala. Mas estou vendo que você está ocupada e
precisa dos livros. Bom, não irei demorar mais que dez minutos. Posso trancá-las
aqui? Ou prefere retornar após esse tempo?— perguntou a moça responsável
pela biblioteca.
Jennifer e Regina se olharam, e então a mais velha se pronunciou.
— Se quiser pode ir, Meireles. Eu fico aqui e termino sozinha. Ainda
vou precisar separar alguns mapas para a turma.
— Ah não, eu prefiro ficar e te fazer companhia. Depois eu explico ao
professor Arthur que estava ajudando você.
— Ótimo então! Eu mesma posso falar com ele, temos uma boa relação
— disse suavemente ao sorrir. — Permaneceremos aqui até que você volte!—
respondeu ao direcionar o olhar para a moça, que aguardava uma resposta.
— Ok, não irei demorar!— respondeu, segundos antes de dar as costas,
trancar a biblioteca e deixar as duas a sós.

Assim que a bibliotecária se foi, as duas mulheres restabeleceram o
diálogo perdido.
— Wow! Estamos trancadas! Isso soa tão perigoso!— disse Jennifer. —
E se ela nos esquecesse aqui e não retornasse? O que você faria?
— Eu entraria em contato com alguém pra que abrisse pra nós —
respondeu a mais velha.
— Pois eu, não! Seria muito legal permanecer horas presa aqui com
você. A única parte ruim seria quando eu sentisse fome — disse, arrancando da
professora uma pequena gargalhada.
— Oh céus!— Riu. — Pensou justo na comida? Acho que eu colocaria
outras necessidades básicas à frente. Dormir sobre essas mesas não me agradaria
nem um pouco, por exemplo.
— E quem disse que eu a deixaria dormir? Sem chance! Usaria a
situação para aproveitar sua companhia ao máximo — respondeu. Meireles
mantinha um curto sorriso nos lábios. — Maaaas, voltando desse devaneio, vou
responder a sua pergunta — disse ela com uma pitada de seriedade na fala. —
Quando disse que me lembraria de uma mulher como você, me referia ao fato de
ser tão atraente. E não estou me referindo apenas ao fator físico.
— Obrigada, senhorita Meireles. Eu também me recordaria de uma
aluna como você.— respondeu superficialmente, de modo a não aprofundar-se
naquele assunto. — Acho que essa quantidade de livros está ótima!
— E eu acho que você está... Fugindo do assunto — disse Jennifer em
uma atitude impulsiva. O nervosismo e a euforia a impediam de falar com mais
racionalidade.
— Estou? Por quê? O quê gostaria que eu dissesse a você?
— Não sei. O que você gostaria de dizer a mim?— perguntou ao dar
alguns passos lentos em direção a professora, se colocando a uma curta e
perigosa distância.
— Eu gostaria que você não me colocasse nessa posição tão difícil —
respondeu Regina. A mais nova estava a uma distância tão mínima, que seu
perfume podia ser sentido pela morena.
— Se você permanecer me olhando da maneira intensa como está agora,
eu não terei como fazer o contrário.— Jennifer respondeu. A biblioteca estava
tão silenciosa, que a forte respiração de Regina se fazia ouvida.
— Com você assim tão próxima, eu não tenho como dar outro olhar,
senhorita Meireles — disse com seriedade na voz ao depositar a mão sobre o
ombro de Jennifer. O gesto da mulher fora um pedido sutil para que a loira não
se aproximasse ainda mais.
— Então estamos presas em um grande impasse, pois eu não quero e
não consigo estar menos próxima que isso — respondeu ao sentir a mão de
Regina repousada sobre seu ombro. Jennifer olhava para os lábios vermelho
carmesim da mulher à sua frente e só conseguia imaginar qual gosto aquela boca
poderia oferecer. E, por alguns instantes, pensou se algum dia a beijaria.
— Impasse?— indagou a morena com um pequeno sorriso irônico nos
lábios. Ela deslizou a mão que estava sobre o ombro da mais nova e a direcionou
para a gola de seu uniforme, arrumando-a. — Oh, eu acho que não — respondeu
ao afastar-se. A professora lutava contra o sorriso que teimava em formar-se em
seus lábios. No fundo, ela apreciava a ousadia de Jennifer.
Quando Regina deu as costas e retornou para sua atividade anterior,
sentiu a mão de Jennifer repousar sobre a dela, que estava apoiada sobre a pilha
de livro. Ao olhar para baixo, avistou Meireles deslizando e entrelaçando
lentamente os dedos contra os seus. A sensação daqueles dedos passeando ali
proporcionou prazerosas sensações à Regina. Ao mesmo tempo em que ela
queria e precisava dar uma freada em Jennifer, ela também queria poder
aproveitar aquele momento tão magnético do contato entre suas mãos.
— Você é uma peste, garota — disse de maneira descontraída ao
balançar negativamente a cabeça; quebrando a tensão que se instalara e
arrancando da jovem uma gostosa gargalhada.

Em meio ao riso compartilhado, as duas mulheres concluíram a
atividade e se direcionaram juntas para a porta ao ouvi-la sendo aberta. Elas
saíram aos risos, deixando uma incógnita na cabeça da bibliotecária.


Ao acordar, Jennifer nem bem abriu os olhos e já se direcionou para o
computador à procura de uma possível resposta de Regina. Seus lábios se
curvaram de um canto a outro ao visualizar o arquivo de imagem com a delicada
mão da mulher portando a fina aliança. Imediatamente ela abriu a corrente de
seu pescoço, pegou o anel que ali estava e o depositou novamente em seu dedo.
Feito isso, depositou a mão sobre o monitor, precisamente sobre a imagem
recebida pela morena, e imaginou por alguns instantes que suas mãos estavam,
de fato, unidas.

Regina! Como é bom ter notícias suas! Woow, quatro horas de
diferença? Então você está no futuro! Hahahaha.
Não, você não havia mencionado que era em Florença. Esse lugar
parece ser um sonho! Adoraria pode estar aí com você agora. É a cidade natal de
Dante Alighieri, não é? O autor do livro que você me emprestou, e que por sinal
eu já concluí e gostei muito!
Poxa... Eu sinto muito pelo Bóris! Espero que ele se acostume a viver
aí. Se pra nós é ruim ter que se adaptar em um novo lugar, imagina para um gato,
não é? Deve ser algo bem complicado!
Em relação a como eu estou... Bom, eu não saberia te responder essa
pergunta. Ontem dormi mais tranquila após abrir o presente. Mas hoje será o
primeiro de muitos dias em que estarei drasticamente longe de você. No
momento eu só posso dizer que já sinto muito a sua falta e que não sei como
suportarei a esses meses.

Ps: eu não acredito que você maldou a minha pergunta, Regina!

A loira enviou o e-mail portando um sorriso nos lábios e desceu para a
cozinha, dando de cara com Morgana logo em seguida.

— Bom dia, Jennifer.
— Bom dia — respondeu ao se direcionar para a geladeira e pegar uma
caixa de leite.
— Sua cara está péssima — comentou Morgana. — O que aconteceu
ontem, que a deixou naquele estado?
— Nada que você se importaria — respondeu com frieza enquanto
jogava o leite em uma tigela de cereal.
— É dessa maneira que você se dirige à sua mãe?— repreendeu a mais
velha.
— Sim, é dessa maneira!— disse ao elevar o tom de voz.
— Olha como você fala comigo, Jennifer!— gritou.
— Qual foi agora?— A loira gritou em resposta. — Depois de tudo,
você ainda quer que eu a trate com carinho? Com educação? Acho que você
precisa cair na real.
— A única pessoa que precisa cair na real aqui é você! Ou esqueceu que
vive sob meu teto? E enquanto for assim, obedecerá as minhas vontades.
— Pois fique você sabendo que está muito próximo do dia em que isso
vai mudar — disse ela. — E você gostando ou não da minha relação com a
Regina, será obrigada a aceitar. E eu espero muito que até lá ela ainda me queira.
— Meireles recolheu a tigela de cereal e subiu correndo para o quarto, onde se
trancou.
— Vocês brigaram novamente?— comentou Diogo ao chegar à
cozinha.
— Essa menina agora deu pra me desafiar!
— Morgana, deixa sua filha em paz. Não percebe que ela está sofrendo?
Não viu o estado em que chegou ontem? Pelo que me dei conta a mulher que ela
gosta foi embora, viajou, ou algo do tipo. A Jennifer deve estar arrasada. Onde
está o seu coração de mãe?

Pela primeira vez a mãe de Jennifer sentiu-se um pouco tocada pelas
palavras. Ela cogitou a idéia de ir até o quarto da filha para conversar, mas optou
por se manter em silêncio absoluto durante todo o restante da manhã.


Ao final daquele mesmo dia, Meireles recebeu uma ligação de Beatriz a
convidando para uma pequena social em sua casa. Chegando lá, o encontro
contava com a presença de Kevin e Rose.

— Eu fiquei surpresíssima quando soube que você estava com a
professora Vianna, Jennifer! Que babado!— disse Rose. — Seu gosto é
maravilhoso, hein? Nossa senhora!
— Por isso você estava tão misteriosa!— comentou Kevin.
— Pois é — respondeu Jennifer, sem jeito. — Era muito particular. Mas
agora todo o colégio já sabe — lamentou.
— Eu sinto muito, Jen — disse Beatriz. Os quatro jovens estavam
reunidos na sala ouvindo música enquanto comiam alguns petiscos e bebiam
refrigerantes.
— Eu também sinto muito — disse Rose ao depositar a mão sobre o
ombro da amiga.
— Obrigada.— Sorriu ao apoiar a cabeça sobre Rose. — Sabe... É tudo
tão estranho. Minha vida mudou de uma hora pra outra. Ganhei e perdi tanta
coisa. Me sinto feliz e liberta por não ter mais segredos com a minha mãe a
respeito da minha sexualidade, e me sinto feliz por ter encontrado um alguém
como a Regina.— Meireles alternava o olhar entre todos os presentes enquanto
discursava. — Estar indo atrás da minha independência também é algo bom.
Mas ao mesmo tempo eu sinto que perdi.
— Como assim?— Beatriz perguntou.
— Não sei. É como se minha luta tivesse sido em vão, entendem? Não
tenho minha namorada aqui comigo, não tenho minha professora na escola, não
tenho a mãe que me compreendia, não tenho qualquer rédea sobre minha vida.
Me sinto como uma perdedora.
— Jennifer! Você está longe de ser uma perdedora!— disse Beatriz ao
segurar as mãos da amiga. — Você foi e está sendo muito corajosa por enfrentar
tudo isso.
— É verdade, Meireles.— Foi a vez de Kevin se pronunciar. —
Infelizmente tudo parece um problema agora, mas todas as suas lutas irão trazer
bons resultados.
— Dê tempo ao tempo — comentou Rose com suavidade em sua fala.
— Regina vai voltar, você vai encontrar sua independência e se transformar em
uma grande mulher. Mais do que já é! E um dia sua mãe irá reconhecer o quanto
errou com você.
— Você é uma garota boa, Jennifer. Boa filha, boa amiga e um ser
humano maravilhoso que está sempre disposto a ajudar, a perdoar e a dar carinho
pra quem te procura. A vida devolverá tudo em dobro pra você — disse Beatriz
com um pequeno sorriso nos lábios enquanto tentava confortar a amiga. —
Parece discurso feito, mas é a mais pura verdade. O universo devolve o que a
gente envia. E você só emana coisas boas. Ainda será muito feliz ao lado da
pessoa que escolher, rodeada de filhos, netos, amigos, um cachorro, um gato,
alguns pássaros, uma tartaruga, talvez alguns peixes. Regina gosta de cobra?—
perguntou pensativa ao depositar a mão sobre o queixo.
— Ei, vamos com calma aí!— disse Jennifer em meio a uma pequena
gargalhada.
— Desculpe! Eu adoro criar histórias para as pessoas.
— Percebi!— disse Jennifer, rindo. — Me contentaria com apenas um
filho e um gato. Essa espécie de cadeia alimentar que você criou não daria muito
certo — brincou, arrancando uma gargalhada de todos.
— Ok, confesso que exagerei um pouco quanto aos bichos! Pelo menos
você achou engraçado e riu.
— É, é verdade...— murmurou. — Obrigada por isso. Obrigada a todos
vocês, na verdade.— A loira sorriu e envolveu a todos em um abraço grupal.
— Agora vamos parar com esse clima meloso e falar sobre o que vamos
aprontar na formatura!— disse Kevin de maneira aleatória. — Preparadas para o
ponche batizado novamente?
— Siiiiim!— As três gritaram em uníssono.


Quando os primeiros raios de sol entraram pela janela aberta do quarto,
Regina abriu os olhos lentamente e espantou-se ao dar-se conta de que dormira
profundamente desde o fim de tarde do dia anterior. A viagem havia sido
demasiadamente cansativa. Ao levantar-se da cama conferiu o e-mail recebido
por Jennifer e desceu para o primeiro piso.
— Feliz aniversário!
— Mãe? O que significa tudo isso?— perguntou a morena ao deparar-
se com o grande número de sacolas espalhadas pela cozinha.
— Você acha mesmo que eu deixaria a data de hoje passar em branco?
— respondeu ao envolver a filha em um terno abraço. — Fui ao supermercado
bem cedo e comprei algumas coisas para o seu aniversário!— disse com um
sorriso nos lábios. — Alguns parentes e amigos seus querem vê-la, Regina.
Estou planejando uma pequena comemoração para o fim do dia.
— Oh mãe, eu agradeço. Mas acho que não estou no clima para festas.
— Esse é mais um motivo pra que essa comemoração aconteça! Vamos
lá, Regina! Animação! Hoje é o seu dia, meu amor.
— Tudo bem. Mas só porque você já gastou comprando todas essas
coisas — disse ao passear o olhar sobre as sacolas. — Onde está o meu pai?
— Chamando por mim?— disse o senhor Henrique ao adentrar a
cozinha. — Feliz aniversário, meu amor.— O pai de Regina tocou
delicadamente a face da morena e a beijou no topo da cabeça. — Pra você —
disse ao depositar uma embalagem de presente nas mãos da filha.
Pelo formato anatômico do presente, ela logo constatou que se tratava
de uma garrafa. Ao abrir, deparou-se com um de seus vinhos favoritos.
— Gracias, papá! Levarei pra casa, preciso dividir essa preciosidade
com Jennifer.— Sorriu.
Henrique Vianna e Carmen já eram aposentados. Entretanto, quando
jovens, Carmen era professora de música, enquanto Henrique trabalhava no setor
de finanças de uma grande franquia de vinhos.
— Estava pensando em passar uma manhã com você. O quê acha de
reviver alguns momentos e matar um pouco da saudade desse seu velho pai
aqui?— sugeriu Henrique.
— Vá com ele!— disse Carmen ao receber um olhar de sua filha. — Eu
dou conta de tudo por aqui.— Sorriu.
— Ok. Vou me trocar e já volto!

Regina e seu pai aproveitaram juntos algumas horas daquela ensolarada
manhã. Os dois passearam por alguns pontos turísticos e refizeram passos que há
tempo não reviviam. A morena, em diversos momentos, lembrou-se de como era
bom o aconchego e a proteção da companhia de seu pai.
— Ainda vou mostrar toda a beleza desse lugar a ela.
— Você a ama muito. Não ama?
— Mais do que achei que poderia — respondeu enquanto mirava o
olhar em um ponto qualquer.
Henrique e Regina caminhavam a passos lentos em direção a entrada de
uma das vinícolas que havia em Florença. Além de provarem dos melhores
vinhos da região, almoçariam a excelente culinária oferecida pelo lugar.
— A vida só vale a pena se vivida com amor, Regina. Mas ela não nos
dá tantas chances de vivê-lo, além de ser extremamente raro encontrá-lo. Então
eu sugiro que você agarre todas as oportunidades que ela apresentar a você.
— Não incomoda saber que ela é minha ex aluna e que nossa diferença
de idade é grande?— perguntou ao olhar pra seu pai.
— O que me incomoda nesse mundo, minha filha, é o desamor — disse
ele. — O fio da vida é curto e frágil. Seria tolice se prender a detalhes tão
insignificantes quanto esses.
Regina sorriu à resposta do pai e depositou suavemente a mão sobre a
dele.
— Obrigada por me entender.
Após o satisfatório almoço, os dois deram algumas voltas por Florença
enquanto a morena capturava algumas imagens do lugar através da câmera de
seu celular; em um momento futuro ela as mostraria para Meireles.
Antes de retornar para casa, Regina avisou para Henrique que precisava
passar algum tempo aproveitando a natureza. Sendo assim, ela e seu pai foram
visitar algumas encostas de ciprestes, vinhedos, oliveiras e um vasto campo de
girassóis. Regina também queria visitar o campo de lavanda que, por sinal, era
seu favorito. Porém, o único que ela conhecia ficava próximo a Roma. E tendo
em vista que a primavera já havia acabado, ela não possuía certeza de que
encontraria. Sendo assim, deixou esse passeio para outra vez.
A caminho de volta pra casa havia um lago rodeado por um baixo muro
de rocha e muitas árvores presentes. O céu estava azul e havia uma luz dourada
na linha do horizonte.
— Acho que ficarei um tempo por aqui — comentou ela.
Henrique percebeu que a filha precisava de um tempo sozinha e
despediu-se dela ali. Mais tarde eles se reencontrariam novamente antes da
pequena festa iniciar.

A professora aproximou-se do lago, fechou os olhos e permitiu sentir a
suave brisa que tocava seu rosto e fazia seus fios castanhos balançarem. Ela
respirou fundo e absorveu toda a leveza e o frescor do ambiente. Regina, desde
criança, sempre gostou do contato com a natureza. Ela muito apreciava refletir
sobre a vida ao mesmo tempo em que fazia uma conexão com a água, as árvores
e o som da revoada de pássaros que corta o céu.
Ao mesmo tempo em que olhava para o lago, o pensamento em Jennifer
se fazia forte. Ela se perguntava sobre o que fazer com a falta que a jovem fazia.
Apenas um dia havia se passado e a saudade que sentia já era de uma década.
Ainda na beira do lago ela acessou o e-mail através do celular para
responder ao último que recebera de Jennifer. No entanto, ao abrir a caixa de
entrada percebeu que havia uma nova mensagem da loira. Nesta, ela a
parabenizava pelo aniversário de trinta e quatro anos.



Ponto de vista de Regina

Estava sendo uma noite quente de verão aqui na Itália. Me vesti com um
justo vestido vermelho, calcei um par de saltos pretos, fiz uma maquiagem leve
no rosto, mantive meus cabelos úmidos, penteados para trás, e me aproximei da
janela do meu quarto portando um cigarro aceso em mão. Eu o tragava ao
mesmo tempo em que olhava pra baixo e observava algumas pessoas que
chegavam para o meu aniversário.
Eu não me sentia contente. Pela primeira vez minha viagem à Florença
não havia sido por um motivo feliz. No entanto eu sabia que todas aquelas
pessoas estavam ali para me ver, e eu daria a elas os sorrisos que esperavam.
Apoiei meu caderno de poemas sobre a pequena mesa que havia
naquele imenso quarto e me sentei por alguns instantes enquanto terminava de
tragar aquele cigarro. Escrever sempre me aliviava. Visto isso, comecei pelo
cabeçalho.

Florença, Itália. 20 de agosto.

Vícios sempre são intitulados como ruins
Mas eu possuo alguns dos quais não faço a menor questão de me livrar
Infelizmente tudo o que os alimenta foi tirado de mim
E eu me encontro como uma drogada da sua abstinência

Não sei quantas noites frias passarei em tremor na ausência do seu corpo
Não sei quantos cigarros serão necessários para suprir o gosto da sua
língua em minha boca
Assim como também não sei quantas doses de uísque serão capazes de
embriagar a falta das suas palavras

Era tão lindo quando me sorrias, Jennifer
Mas nesse momento você é apenas um poema na página mais triste do
meu caderno.

Fechei as páginas, apaguei o cigarro no cinzeiro e desci. Quando cheguei
à sala me deparei com uma grande faixa de boas vindas. Sorrir foi inevitável ao
ver as expressões felizes daqueles que esperavam por mim.
— Feliz aniversário, Regina!— Todos gritaram.


Capítulo 33

— Feliz aniversário, Regina!— Todos gritaram.

Com um pequeno sorriso nos lábios, caminhou em direção aos
convidados e os cumprimentou individualmente. Não havia muitas pessoas,
apenas uma dezena delas. A pequena comemoração contava com a presença de
alguns primos da morena que residiam na Itália e alguns amigos íntimos da
família.
— Obrigada a todos por estarem aqui — disse educadamente. — Está
sendo a primeira vez que comemoro meu aniversário na Itália e me sinto grata
por ter pessoas tão queridas aqui presentes.
— É sempre um prazer muito grande tê-la por aqui, Regina.— Se
manifestou Pedro, um grande amigo da família, principalmente do pai de
Regina.
— Não podíamos deixar de prestigiá-la!— disse Virgínia, tia da morena
por parte de mãe.
— Eu queria saber o que você usa pra manter essa aparência impecável.
Está ainda mais bela do que eu me recordava — comentou Laura, sua prima
mais chegada.
— Genética, minha querida, genética!— respondeu Carmen ao se
intrometer na conversa e acariciar o rosto da filha. — Basta olhar para mim e
terá a resposta — brincou, arrancando risos de alguns convidados.
— Devo admitir que a minha esposa não está errada — disse Henrique
ao sorrir.
— Ah não, eu não aguento você babando na tia Carmen!— disse Laura.
— Ô casalzinho perfeito e irritante — comentou ao fingir irritação.
— Eu encomendei algumas pizzas maravilhosas! Vou servi-las antes
que esfriem — disse Carmen ao se direcionar para a sala de jantar e orientar os
convidados a segui-la. A mãe de Regina sabia que quase todos precisariam
acordar cedo no dia seguinte e por esse motivo não arrastaria a comemoração
para muito tarde.
— Ano passado fiquei um pouco chateada por não estar aqui quando
você veio, Gina. Senti sua falta!— disse Laura ao tomar um lugar ao lado da
prima na enorme mesa de madeira com superfície de vidro.
— Acho que você estava em viagem com seu namorado, se não me
engano — respondeu. — Também senti sua falta.— Sorriu.
— Estou feliz que tenha vindo antes de dezembro dessa vez — disse ao
retribuir o sorriso da morena.
— Pedi pizza diavola, marguerita e capricciosa. Sirvam-se com o sabor
que preferirem!— disse Carmen aos convidados.
Todos se serviram com uma taça de vinho e começaram a degustar o
alimento enquanto conversavam entre si. Ao fundo tocava algumas canções
escolhidas pela prima de Regina minutos antes da morena descer.
— Gostaria que Malena e meu neto pudessem estar aqui conosco essa
noite — disse o marido de Carmen.
— Henrique está um garoto tão lindo! Vocês precisam ir nos fazer uma
visita.
— Realmente precisamos. Não vejo meu neto há algum tempo. Estou
cheia de saudades — completou Carmen.
Assim que todos concluíram a refeição, Carmen os reuniu na sala de
estar para que pudessem assistir, juntos, uma pequena homenagem feita para
Regina. Ela havia convertido para dvd algumas fitas antigas de vídeo onde
continha momentos da vida da filha e algumas fotos antigas que haviam sido
escaneadas há alguns anos.
— Mãe, eu não acredito!— comentou a morena ao sentar-se na poltrona
com sua taça de vinho. Regina estava visivelmente emocionada.
Alguns convidados sentaram-se no sofá, enquanto alguns outros
preferiram se unir no chão. Todos os presentes eram pessoas muito especiais e
queridas pela família Vianna.
— Nessa foto Regina tinha pouco mais de seis meses. Foi quando os
primeiros dentes começaram a nascer. Me lembro que foi uma loucura! Regina
ficou muito irritada, não queria comer e nem dormir. Foram noites de muito
pouco sono — explicou Carmen assim que a primeira foto surgiu na televisão.
— Que coisinha mais fofa!— exclamou uma das convidadas.
— Aqui foi quando ela começou a dar os primeiros passos. Regina
adorava segurar na barra do meu vestido ou na calça do pai antes de erguer-se do
chão e se sustentar sobre as próprias pernas.
— Onde essas preciosidades estavam escondidas, Gina?— perguntou
Laura.
— Não sei. Há tempos não via essas fotos — respondeu enquanto
olhava fixamente para o monitor da televisão. — Mas confesso que estou
adorando — disse ao expressar um sorriso em seus lábios.
— Esse dia eu me recordo bem! Foi quando dei à minha filha sua
primeira bicicleta e a levei para dar uma volta — disse Henrique ao visualizar
um vídeo de baixa qualidade entre ele e Regina se divertindo juntos.
— Eu tenho lembranças desse dia — comentou a morena com um
sorriso ainda maior nos lábios. Ela estava apreciando reviver todos aqueles
momentos. — Ventava muito e eu estava incomodada com os cabelos batendo
no meu rosto.
— Sim. Nesse dia você chegou em casa e pediu pra que eu cortasse seus
cabelos — disse Carmen. — Eu sugeri que os prendesse da próxima vez, mas
ainda assim você passou um longo tempo me pedindo pra cortá-los.
— Regina nunca gostou de ter cabelo grande — lembrou Henrique.
— Verdade! Me lembro que Gina e eu passamos umas férias juntas na
adolescência, quando vocês moravam no Brasil, e ela me pediu pra cortar o
cabelo dela bem curto. Tínhamos uns quinze anos. Você lembra, Gina?—
perguntou ao direcionar o olhar para a prima.
— Como esquecer? Meu cabelo ficou horrível! Precisei ir ao salão no
mesmo dia pra consertar o desastre.— respondeu, compartilhando com Laura e
os convidados uma gostosa risada. — Mas eu lembro que desde então nunca
mais os deixei crescer. Realmente nunca gostei de usar cabelo longo. Me sinto
livre e a vontade com eles assim — comentou ao passar a mão na ponta dos fios
ainda úmidos.
— Qual foi a primeira palavra que Regina aprendeu a falar?—
perguntou Virgínia.
— Papa.— Respondeu Carmen, prontamente. — Henrique ficou todo
alegre e convencido achando que ela havia dito ‘papai’ em espanhol. Mas assim
que Regina repetiu algumas vezes, percebemos que não era ‘papá’, mas sim,
‘papa’, que significa batata.
— Desculpe a decepção, pai. Mas eu amo batatas — comentou ao soltar
uma risada.
— Depois ela ficou repetindo patata, patata, papa, que significa a
mesma coisa — explicou Henrique.
— Nós sempre viajamos muito para fora do país, então Regina sempre
aprendia alguma coisa do idioma local. Quando ela realmente começou a falar,
foi uma grande loucura! Às vezes misturava alguns idiomas.— Carmen
explicou.
As fotos e os vídeos continuaram a passar. Todos faziam comentários
sobre os momentos em questão e em seguida engatavam em outros assuntos.
Regina se sentia feliz em poder recordar e compartilhar aqueles momentos de
sua vida com todas aquelas pessoas. Contudo, a ausência de Jennifer ainda era
gritante. A morena olhava para todos os rostos daquela sala e suspirava por não
encontrar a face da loira entre eles.
— Aconteceu alguma coisa?— perguntou Laura com suavidade na voz
ao aproximar-se da poltrona de sua prima.
— Longa história.
— Adoro longas histórias. Anda, me conte!— disse ao se sentar no
braço do estofado.
— Mais tarde, tudo bem?
— Certo!
Quando o dvd chegou ao fim, todas as luzes foram apagadas e Henrique
apareceu segurando um bolo coberto por velas acesas, fazendo todos levantarem
e rodearem Regina e ele. O pedaço do bolo foi servido assim que todos bateram
parabéns e a morena assoprou as velas. Havia, também, alguns canapés de queijo
com tomate seco, os prediletos de Regina, para quem quisesse se servir.
— Vamos dançar, Regina! Aproveita o seu momento!— disse Laura ao
aumentar o volume da música de fundo e puxar a prima para o meio da sala.
— Deixa eu terminar de beber essa taça de vinho pra esquentar o motor
— comentou Regina, segundos antes de virar a bebida de uma só vez.
Enquanto Regina e Laura dançavam, os outros convidados se divertiam
em meio a conversas e risadas. Todos provavam dos canapés quando a mãe da
professora chegou com uma bandeja de drinks feitos por Henrique.
— Rossini!— exclamou ele ao passar por entre os convidados com a
bandeja.
Rossini é um cocktail de origem veneziana feito com purê de morangos
frescos e champagne. A bebida recebeu esse nome em homenagem ao
compositor de ópera Gioachino Rossini.
— É hoje que eu vou me alcoolizar!— disse Laura ao avistar as
bebidas. — Tio Henrique, traz aqui!— pediu ela, acenando. Regina aproveitou a
ocasião e também pegou uma taça.
— Você me lembra muito a Malena. Nunca vou deixar de comentar isso
— disse Regina. — E não é por causa dos cabelos ruivos, é pelo modo de ser.
Até parece que as irmãs são vocês.
Laura possuía anelados fios acobreados assim como Malena. Herança
genética da família. A probabilidade de nascer um ruivo entre eles era baixa,
porém, não nula.
— Talvez nossos papais tenham pulado a cerca — brincou Laura. —
Mas vai, me conta! E essa aliança aí no seu dedo, senhorita Vianna? Notei a
presença dela assim que te vi.
— Oh céus, acho que você é ainda mais louca que Malena.— Riu. —
Essa aliança faz parte da longa história.
— Hum... Você está muito misteriosa com essa história — disse ao
semicerrar os olhos para a morena.
— Não estou misteriosa. Só que... É complicado — respondeu ao parar
a dança. — Eu conheci um alguém.
— Conheci um alguém — repetiu Laura. — Mulher? Aposto!
— Bingo!
— Ai meu caralho, Regina! Já vi que a história é das boas. Vou até
acender um cigarro!— disse ao tirar um isqueiro e um maço do bolso de sua
calça jeans. — Se importa se formos pra sacada? Não quero fumar aqui dentro.
Regina assentiu e ambas as mulheres caminharam em direção ao lado
de fora da casa. As duas se posicionaram lado a lado e apoiaram os cotovelos
sobre a parede baixa da sacada. Quando Laura acendeu o cigarro e começou a
fumar, despertou em sua prima a mesma vontade. Foi então que Regina pediu
um cigarro e a acompanhou.
— Bom, vou fazer um resumo pra você. Me envolvi com uma aluna —
disse prontamente.
— Como é que é?— exclamou com os olhos arregalados. — Jesus
Cristo! Por essa eu não esperava.— Riu. — Justo você, Regina?
— Sim, justo eu.
— Mas e aí, me conta! O que aconteceu? Quem é essa aluna? Do
colégio? Aluna particular de espanhol?
— Do colégio. Era da minha turma de terceiro ano. Nos apaixonamos e
o negócio foi bem sério.
— Puta merda, Regina! E aí?
— E aí que nós ficamos juntas por um tempo, até que a mãe dela
descobriu sobre a sexualidade da filha e em seguida Jennifer contou sobre nós. A
mulher não aceitou, certamente. Algum tempo depois a direção da escola
descobriu tudo, eu pedi demissão e o resto você já deve imaginar.
— Nossa! Quanta adrenalina. E por que você veio pra cá, exatamente?
— Porque estávamos andando em círculo e nos machucando. A mãe
não aceita nossa relação. E por Jennifer ainda morar com ela, eu preciso
respeitar.
— Puta merda de novo, prima. Quantos anos ela tem?
— Dezoito. Em janeiro completará dezenove.
— Ufa, menos mal. Ela é já é maior de idade e pode sair da casa dos
pais. Por que não moram juntas de uma vez?
— Porque ela quer andar com as próprias pernas e não quer apressar as
coisas. Me sinto inteiramente de mãos e pés atados enquanto ela estiver sob o
teto da mãe.
— Eu posso imaginar. Mas, e a aliança?
— Então... — iniciou. — Não dava pra viver um romance escondido e
não tínhamos liberdade pra estarmos juntas. Sendo assim, em meio a todo esse
caos, nós terminamos. Porém, Jennifer e eu temos algo muito forte, estamos
sempre nos atraindo. Nós não estávamos conseguindo manter aquele término,
mas também sabíamos que não adiantaria voltarmos.
— Foi aí que você resolveu viajar pra evitar as recaídas e,
consequentemente, que tudo desandasse de vez.
— Exatamente — confirmou. — Mas eu não quis vir embora como se
tivesse dizendo adeus. Eu não estava desistindo dela, pelo contrário. Estava
querendo dar uma chance pra nós. E sabia que essa seria a forma menos
dolorosa, mesmo que a princípio parecesse o contrário. Pois doeria muito mais
estar perto e não poder estar com ela de verdade.
— E qual seria o significado dessa aliança?
— Significa que eu a amo, que ainda quero manter esse elo e que vou
voltar pra ela.
— Caramba, Regina... Que história! Ainda vou querer ouvi-la
detalhadamente.
— Bom, passarei alguns longos meses aqui. Terei tempo de contar a
você — disse ao soltar um curto riso de desespero ao lembrar-se do tempo que
ainda as separava. — Nós só queríamos ter sido parceiras de um crime perfeito.
Queríamos esperar Jennifer terminar a escola pra assumirmos. Mas tudo deu
errado.— Regina deu uma tragada no cigarro e posteriormente soltou a fumaça
para cima. Ela aproveitou o momento para observar o céu estrelado daquela
noite. — Talvez agora estejamos finalmente fazendo da forma correta —
concluiu ao voltar a atenção para Laura.
— Acredito que sim. As coisas seguirão o rumo certo agora. Você vai
voltar pra ela no tempo certo e poderá lutar por esse sentimento sem tantos
empecilhos no caminho.
— Oh... Você pode apostar que sim. Eu ainda farei um filho naquela
mulher.
— Isso eu já não tenho certeza se você vai conseguir. É, você sabe, falta
a peça principal.— disse ao apontar para entre as pernas da morena.
— Você não duvide de mim, ok?— respondeu ao erguer uma de suas
sobrancelhas.
— Não está mais aqui quem falou, rainha — respondeu ao suspender as
duas mãos. — O coração bate forte no peito por ela, não bate? Posso sentir o
quanto você a ama.
— Bate. Ele bate forte bem no meio das pernas também.
— Ai meu Deus! Acho que o álcool já esquentou seu motor —
comentou Laura aos risos. — Você é uma depravada, Regina!— disse ao fingir
indignação.
— Não preciso de álcool pra isso. Mas acho que as taças de vinho e o
drink estão fazendo efeito, sim.— Riu. — Eu não posso negar que Jennifer me
enlouquece nesse sentido também.
— E você vai aguentar todos esses meses sem sexo?
— Aguentar? Eu diria que vou sobreviver!— disse, arrancando uma
enorme gargalhada de Laura.
No meio da conversa as duas mulheres perceberam certa movimentação
vindo da sala. Chegando lá, constataram que se tratava dos convidados que se
despediam.
— Foi muito bom revê-la, Regina — disse sua tia. — Espero que
possamos estar juntas mais vezes até o dia do seu retorno pra casa.
— Ah, claro que sim! Vou tirar algum momento pra ir visitá-la — disse
educadamente.
Regina agradeceu a presença de todos e despediu-se de cada um
individualmente.
— O quê você está fazendo?— Laura questionou ao vê-la organizando
as cadeiras no lugar.
— Minha mente não ficaria em paz se eu as deixasse assim —
respondeu enquanto terminava de encaixá-las de volta na mesa.
— Regina Vianna sendo Regina Vianna — comentou a ruiva ao sacudir
a cabeça negativamente.
Minutos após Regina organizar cada cadeira em seu lugar, a morena
subiu para o quarto com Laura e mostrou a ela algumas fotos de Meireles.
— Ela é linda, Regina. Tem um rosto tão angelical — comentou a ruiva.
— Ela é muito graciosa. Extremamente inteligente e carinhosa.—
Sorriu. — E tem uma força física incrível. Jennifer luta boxe desde os doze anos.
— Eu posso imaginar. Olha esses braços!— disse Laura ao apontar para
a tela do celular. — Acho bom você andar na linha com essa loira. Do contrário
sentirá o estrago que esses braços podem causar — brincou a ruiva.
— Mas eu adoro o estrago que esses braços podem causar — disse
portando um pequeno sorriso sacana nos lábios.
— O pior é que eu sei que sim.— Riu.
— E o seu namorado? Continua com ele?— perguntou Regina.
— Não. Mandei passear faz tempo. Gostava de ditar o que eu ia vestir e
tinha ciúmes até da minha sombra. Eu jamais vou aceitar uma relação que me
sufoque.
— E não deve mesmo! Ninguém tem o direito de exercer domínio sobre
o parceiro — respondeu ao encará-la nos olhos. — Por isso muitos
relacionamentos afundam. As pessoas querem se tornar donas umas das outras.
— Pois é. Pois comigo se dá mal, eu coloco a fila pra andar!
— Está certa. É triste saber que muitas pessoas se submetem a isso e a
coisas muito piores. Respeitar uma relação não é ser escrava das vontades do
parceiro. Isso é opressão.
— Sim! O pior é que a pessoa acaba perdendo o parceiro pra ela mesma
e não percebe.
— Exatamente — concordou a morena. — Entre mim e Jennifer, por
exemplo, eu sei que existe uma considerável diferença de idade e que
provavelmente a maioria das amizades dela não será a minha. Mas eu jamais iria
proibi-la de estar com eles. Tal atitude me envergonharia. Nós somos duas
pessoas com necessidades individuais. Quero mais é vê-la feliz fazendo o que
gosta, e não infeliz dentro da minha gaiola.
— Com certeza! Até porque ninguém merece o fardo de viver apenas
para o outro. Isso não é saudável, pra mim.
— Não mesmo.
Laura visualizou algumas fotos mais de Jennifer e em seguida avisou
para a prima que estava indo embora.
— Obrigada pela conversa dessa noite — agradeceu Regina. — É bom
saber que não importa o tempo que passe, ainda mantemos o mesmo bom
relacionamento e a mesma intimidade.
— Oh Regina, eu quem agradeço! Você sabe que é como uma irmã pra
mim.— Sorriu. — Agora vou indo nessa antes que fique tarde demais. Amanhã
tenho trabalho!— Laura levantou-se, abraçou a morena com força e depositou
um beijo em sua face. — Mas... Antes de ir eu preciso passar na cozinha e pedir
um pedaço de bolo pra dona Carmen, pois eu sou dessas! Nunca vou embora
sem levar um pedaço — disse, arrancando uma grande gargalhada da morena.


— Obrigada por hoje. Sou muito grata por ter seu carinho e atenção —
disse Regina. Ela e sua mãe conversavam juntas enquanto organizavam a
cozinha.
— Mas eu não fiz nada demais. O mínimo que poderia fazer era reunir
pessoas que se importam com você pra comemorar a data de hoje.
— Isso é muito pra mim.— Sorriu. — Hoje pela manhã passei
agradáveis momentos com meu pai. Amanhã gostaria que fosse com você. O que
sugere?
— Acho que deveríamos fazer compras e irmos ao salão de beleza.
Conheço um lugar maravilhoso pra se fazer as unhas. Eles aplicam umas unhas
postiças incríveis!— A mãe de Regina era vaidosa, assim como a filha. Porém,
diferente da mais nova, Carmen era extremamente perua.
— Vou adorar fazer compras com você. Mas eu dispenso as unhas
postiças.— Riu.
— Eu sei que você não usa grande, mas sua namorada não está aqui
com você agora. Aproveite a temporada pra experimentar algo novo!
— Oh meu Deus! O que você está insinuando, mãe? Não. Espera! É
melhor que nem responda.— Regina podia jurar que suas bochechas estavam
ruborizadas naquele momento.
— Você não vai querer fazer a inocente com sua mãe, vai?— Ela se
segurava para não gargalhar da expressão que a filha esboçava. — Você sabe
que não precisa tratar nenhum assunto como tabu quando se trata de mim.
— Eu sei — respondeu com suavidade na voz.
Carmen preparou um drink para elas e a chamou para lhe fazer
companhia na sala de estar.
— Notei que você quase não comeu hoje — comentou ao sentar-se no
sofá. — Está mais magra, Regina. O que se passa?
— Sexo emagrece, dona Carmen — respondeu ao esboçar um pequeno
sorriso quando a taça chegou em sua boca. — O quê foi?— perguntou ao avistar
a cara de espanto da mais velha. — Foi você quem começou.
— Se você emagreceu praticando essa atividade eu fico feliz.
Regina soltou uma baixa risada e a respondeu.
— Na verdade eu ando um pouco sem apetite desde que esses
problemas surgiram. Mas não é nada preocupante, perdi apenas dois quilos, nem
sei como você percebeu. Me sinto até melhor assim. Estava mesmo querendo
perdê-los.
— Eu percebo tudo que envolve as minhas crias — respondeu. — Eu
não vou pedir para que você não se entristeça com esses problemas, pois esse é o
pior conselho que podemos dar a alguém. Pedir pra que a pessoa fique bem não
resolve nada, não existe um botão de sentimentos que liga e desliga aí dentro.
Mas eu gostaria que você soubesse que tem a mim, ao meu amor, e que farei os
dias se tornarem menos ruins até que essa má fase vá embora.
— Oh mãe... Eu não tenho palavras pra explicar o quão reconfortantes
são as suas palavras. Obrigada.— Regina acariciou a face de Carmen por breves
segundos e depositou um beijo bem ali.
— Mas vamos mudar de assunto, pois hoje é um dia de alegria. Não
quero que seu fim de noite seja melancólico — disse Carmen ao modificar a
atmosfera. — Eu ainda não te entreguei meu presente.
A mãe de Regina depositou a taça sobre a mesa de centro, subiu para o
segundo andar da casa e retornou de lá com duas embalagens. A mais nova
olhou para as bolsas com um olhar curioso a respeito do que havia ali dentro.
— Abra — disse com um sorriso nos lábios.
Regina pôs o drink na mesa, de modo a deixar as mãos livres, e abriu
uma das embalagens.
— Oh! É lindo!— exclamou ao constatar que se tratava de um lindo par
de saltos agulha de coloração preta, um de seus preferidos, assim como o meia-
pata — Obrigada!— disse enquanto abria a segunda embalagem, deparando-se
com uma camisola sensual de coloração vermelha. — Oh porra...— murmurou.
— Não tenho como evitar pensamentos impróprios se minha própria mãe me
presenteia com essas coisas.
— É apenas uma simples camisola. A maldade está na sua mente —
disse Carmen de maneira dissimulada. — Feliz aniversário, Regina.


Jennifer caminhava a passos lentos pela rua correspondente à
localização de seu colégio. Era um início de tarde morno, assim como todos os
dias longe de Regina. Desde que conheceu a morena, Meireles passou a não
gostar de coisas mornas. Para ela, ou era gélido como um metal, ou quente feito
brasa. Viver a vida sem usufruir de grandes extremos era o mesmo que estar em
constante estado vegetativo.
A loira olhava para as pontas de seu all star vermelho ao mesmo tempo
em que contava os passos que dava até chegar ao portão. Ela seguia em estado
de negação. Não queria acreditar que seu amor havia partido. A ausência da
professora levou embora a beleza e o aroma das manhãs. As tardes tornaram-se
cinzas e as noites já não traziam a tranquilidade do silêncio. Pelo contrário, era
antes de dormir que a mente de Jennifer se tornava ainda mais barulhenta. Bem
no fundo Meireles já imaginava que um momento como esse chegaria. Ela
sempre soube que seu amor por Regina não seria facilmente vivido.

— Jennifer!— gritou Beatriz ao avistá-la caminhando cabisbaixa.
Meireles levantou o olhar e apressou os passos no sentido da amiga.
— E aí, Beatriz. Tudo bem?— perguntou ao se aproximar.
— Sim. Mas você me parece tão pra baixo. Está sentindo muita falta
dela, não é?
— Demais. Eu quero tanto poder viver uma relação normal com ela. Ir
ao cinema, ou tomar um sorvete numa tarde de domingo, por exemplo. É pedir
muito?
— Não, Jen. Isso é o básico e não deveria ser negado a ninguém. Mas
tenha paciência. Os meses irão passar, você irá concluir o colégio e poderá
encontrar um emprego que não seja estágio. Dessa maneira poderá se organizar
pra sair de casa e, enfim, viver esse romance.
— É apenas nisso que penso. É o que tem me dado forças pra suportar.
Olhar para essa aliança no dedo também me conforta um pouco — comentou ao
observar a mão.

Ao entrar em sala de aula, novamente a angústia retornou ao seu peito.
Olhar para a mesa à sua frente e ter a certeza de que nunca mais veria Regina ali,
era demasiadamente castigante.
A porta estava entreaberta. Os numerais três, zero e nove pregados na
madeira da porta pareciam piscar para Jennifer. Foi então que a jovem abriu o
fichário e começou a numerar as linhas de algumas folhas. Meireles fez uma
sequência do 1 ao 309. A partir dali criou uma lista e começou a escrever cada
pequena coisa vivida com Regina desde o dia em que a viu entrar naquela classe
pela primeira vez. A loira começou a anotar tudo o que recordava. E seria assim
que ela passaria aqueles cinco meses; listando todos os momentos, todas as
lembranças e cada pequena razão que a fez se apaixonar por Regina. Jennifer
reviveria aqueles trezentos e nove momentos enquanto a saudade apertava a cada
dia.
Na linha de numeração um, iniciou descrevendo as primeiras
impressões que o olhar castanho da mulher lhe causou. Ela sabia que aquela lista
a faria retornar para a tarde em que a conheceu, e a faria viajar por cada única e
fantástica sensação provocada por Regina.

Ao final da noite, quando já estava no conforto de seu quarto, Jennifer
ligou o computador e escolheu algumas canções para deixar tocando em volume
máximo. Todas eram espanholas e a fazia lembrar-se ainda mais da mulher.
Ao deitar-se com as costas coladas no colchão, fechou os olhos e
permitiu que aquelas melodias entrassem por seu ouvido e tocassem seu coração.
Os minutos passavam e o pensamento na professora se fazia demasiadamente
forte. Ela se perguntava o que Regina estaria fazendo agora, e se também estaria
pensando nela.


As semanas começaram a passar de maneira lenta como se os dias
estivessem sendo carregados nas costas de uma tartaruga. Jennifer e Regina não
possuíam lembranças de alguma vez já terem sentido o tempo se arrastar daquela
forma. Os dias doíam, as semanas doíam e os meses também.

— Eu nem acredito que já se passaram dois meses, Rose!— disse
Jennifer no corredor da escola. — Agora falta pouco mais de dois pra minha
formatura e três para o meu aniversário. E por falar em formatura... Acho que
não conseguiremos dinheiro o suficiente e a tempo pra fazermos a festa no local
escolhido.
— Acredita se eu disser que estou contando o tempo junto com você?
Estou louca pra que a professora Vianna volte! Estou ‘shippando’ vocês duas
loucamente desde que eu soube sobre esse romance proibido!— disse a jovem
com empolgação.
— Você é louquinha, Rose!— respondeu com um sorriso nos lábios.
Apesar de estar vivendo dias cinzas, Meireles conseguia encontrar um pouco de
alegria quando estava na presença de seus amigos.
— Não disse mentira alguma!— sorriu ao dar de ombros. — Como vai
ficar o lance da formatura, então?
— Bom, terá que ser feita aqui na escola. Ou...
— Ou...?
— Ou teremos que adiá-la para o mês de janeiro pra conseguirmos
alcançar a grana.
— Se dependesse de mim eu adiaria pra janeiro. Baile de formatura
aqui no colégio seria muito chato! Você sabe, cheio de regras e tal.
— Eu vou conversar com a turma e perguntar o que eles acham, ok? Em
seguida eu questiono a escola pra saber se há algum problema em transferir a
data.
— Ok!— disse Rose, animada. — Você já sabe quando a Regina
retornará?
— Não. Ela disse que ainda não sabe a data — respondeu com certa
tristeza em sua voz. — Acho que só volta após meu aniversário — lamentou.
— Isso é uma pena — disse Rose com desânimo.
— Recentemente ela me enviou um e-mail dizendo que está dando
aulas de espanhol em uma escola de idiomas lá da Itália. É um serviço
temporário, está como professora substituta.— Jennifer explicou. — Eu sabia
que ela procuraria ocupar a mente e o tempo com algo, e eu fico feliz por isso.
Sem mencionar que Regina ama dar aulas! Eu já consigo imaginá-la circulando
pelos corredores do lugar enquanto emite sons cada vez que seus saltos vão de
encontro ao chão.
— Ela deve estar amedrontando a todos.
— Oh... Certamente está!— Riu. — Ela é muito séria quando está no
ambiente de trabalho.
Jennifer desligou a mente por alguns instantes enquanto imaginava a
imagem séria e imponente de Regina entrando na nova classe. Na imaginação da
loira a mais velha usava um de seus habituais conjuntos sociais em harmonia
com seu quase inseparável óculos de armação preta e grossa. Por um instante a
jovem suspirou àquele pensamento.
Ao final daquele dia de aula, quando Jennifer estava apenas na presença
da própria companhia, alguns sentimentos ruins começaram a querer fazer
moradia em seu interior. Ela se sentia imensamente feliz por saber que Regina
estava ocupando o tempo exercendo a profissão que tanto ama. Entretanto, havia
algo naquela história que a incomodava. Talvez fosse o fato de saber que
Regina, de certa forma, estava criando raízes na Itália.
Na tentativa de livrar-se de quaisquer pensamentos ou sentimentos
ruins, Meireles mudou a habitual rota para casa e pegou um metrô em direção à
casa de Regina. Ela precisava se sentir um pouco mais próxima da mulher de
qualquer maneira.
Feito isso, desceu no bairro da professora e caminhou até sua casa. A
loira se permitiu observar a fachada do imóvel vazio e trancado de Regina por
longos minutos. De alguma maneira aquilo acalentou um pouco o seu coração.


Algumas semanas depois, após um vitorioso campeonato de boxe,
Jennifer chegou em casa eufórica e correu para digitar um e-mail que contasse as
boas novas para Regina. Mas, antes de elaborá-lo, leu com atenção o que havia
recebido.


Jen,

preciso compartilhar algo com você. Hoje encontrei Bóris no jardim
brincando com algumas borboletas. Foi a primeira vez em dois meses que ele se
sentiu à vontade para sair do quarto e explorar o lugar. Meu coração de mãe
quase explodiu de alegria com a cena. Corri até o quarto, peguei meu celular e
fotografei o momento pra dividir com você. A imagem está anexada.
Após a captura da foto, uma delas veio e pousou no meu ombro. Eu não
sei se você conhece o simbolismo da borboleta ou se acredita em significados
espirituais. Mas ela é considerada um símbolo de transformação e de um novo
começo. É muito associada ao renascimento, além de ser beleza e leveza.
Eu sou muito energia, você sabe, e prezo muito essa troca com a
natureza. É a mesma troca prazerosa de energia de quando estou com você.
Estou com saudades, Jennifer. Muita.

Com amor, Regina.


Regina!
Quase vomitei arco íris com essa foto do Bóris! Que saudade eu estou
de vocês...
Eu não conhecia esse simbolismo, mas acho que caiu bem para essa
nossa fase de transição. E sobre a energia, eu também acredito. E além de
acreditar, eu sinto. Sinto a cada instante quando estou com você desde o
primeiro momento em que entrou na minha classe.

Acabei de chegar de um campeonato de boxe. E adivinha? Venci! Ganhei
uma pequena quantia em dinheiro, pois era um campeonato bem simples, mas
fiquei feliz da mesma forma. Senti a falta da sua presença preenchendo um lugar
da arquibancada. Na verdade, eu sinto a sua falta a cada momento. Alguns dias
são mais suportáveis, outros nem tanto.
Volta logo pra mim? Amo você mais do que as palavras podem
expressar, morena.




Capítulo 34

Era um dia comum como qualquer outro. Meireles esquentou uma
lasanha no micro-ondas e sentou-se na cozinha pra jantá-la. Havia um copo de
suco sobre a mesa, de acompanhamento.
Morgana estava presente no local. Ela organizava algumas compras no
armário e na geladeira ao mesmo tempo em que observava a filha. O silêncio era
quase absoluto, conversavam apenas o essencial. No entanto, toda aquela
distância estava aborrecendo Morgana. Há meses ela sentia que sua filha se
distanciava cada vez mais. Todo aquele afastamento estava lhe incomodando
mais que qualquer outra coisa. Ela a estava perdendo, sim, pra si própria.
A mãe de Jennifer ainda não conseguia compreender o porquê de a filha
ser como era. Contudo, toda aquela fúria inicial havia passado, dando lugar a
uma grande angústia feita pelo abismo que se instalava cada dia mais entre elas.
— Você tem certeza que é isso o que quer pra sua vida?— perguntou de
maneira repentina enquanto guardava os produtos; não ousando olhar para a
mais nova. Aquele assunto ainda lhe causava um grande desconforto.
— Hã? Isso o quê?— perguntou confusa. Ela jamais imaginaria que sua
mãe estivesse se referindo à sua sexualidade. Afinal, aquele era um assunto
quase proibido naquela casa.
— Isso. Você sabe. Gostar de meninas — explicou.
Meireles sentiu-se surpresa com o fato de Morgana ter puxado um
assunto como esse.
— Isso não é algo que alguém possa decidir se quer ou não. Apenas é
ou não é — respondeu. — Mas eu posso afirmar que sou dessa forma. Não é
uma fase, não espere que isso mude, porque não vai.
— Isso é tão estranho pra mim. É como se algo tivesse dado errado.
— É estranho porque todos nós somos levados desde sempre a achar
que apenas a relação de homem e mulher é correta e normal, pois apenas esta
nos é mostrada. Então, quando vemos algo diferente, choca.— Jennifer
respondeu. — Mas a sociedade precisa mudar. Ela precisa entender e aceitar que
existem muitos mundos dentro desse mundo.
— É muito difícil entender algo assim. Foge à minha compreensão.—
Morgana respondeu. — Você não sente a menor atração por homens?—
perguntou com receio. A mais velha estava de costas na pia lavando alguns
legumes.
— Não, mãe — disse séria.
— Você anda muito cabisbaixa nos últimos meses. Não gosto de vê-la
assim. Tem algo que gostaria de me contar?
— Acho que não tenho nada que você gostaria de ouvir.
— É sobre aquela mulher?
— Ela tem um nome. Não se pronuncie a ela dessa forma, por favor.
— Por que você se torna tão agressiva quando o assunto é ela?
— Talvez porque você tenha ido ofendê-la. Talvez porque você tenha
dado um tapa na cara dela sem permitir quaisquer chances para uma conversa
civilizada. Ou seria porque você fez ameaças, nos separou e agora eu passo meus
dias na companhia da saudade e da grande falta que ela me faz?— soltou em um
só fôlego.
— Eu fiz o que qualquer mãe no meu lugar faria — respondeu ao virar-
se e se aproximar da mesa onde Jennifer estava.
— Não. Você fez o que seu preconceito e sua intolerância pediram. Eu
só... Eu só queria saber qual o seu problema com ela.
— Jennifer, ela era sua professora! Sua relação com ela deveria ser
apenas didática. Eu me senti como se tivesse entregado você na toca do lobo
quando permiti que continuasse naquela escola.
— Inicialmente nossa relação deveria se restringir a isso, sim. Mas nos
apaixonamos, mãe. É tão difícil de compreender?
— Isso nunca daria certo, Jennifer. Essa mulher tem quase o dobro da
sua idade.
— Mãe, eu não quero ser grosseira, de verdade, mas isso não é você que
decide.
— Onde ela está? Essa Regina.
— Viajou pra Itália há alguns meses — respondeu com pesar em sua
voz.
— Pra sempre?— questionou.
Jennifer hesitou por alguns instantes enquanto decidia se dizia a verdade
ou não para sua mãe.
— Não. Apenas pra respeitar a autoridade que você ainda tem sobre
mim. Mas pretendemos ficar juntas quando isso passar.— Meireles abriu o
cordão de seu pescoço e mostrou à Morgana a aliança recebida pela morena;
colocando-a no dedo posteriormente. — Nunca foi canalhice. Realmente nos
gostamos.
Morgana nada respondeu, apenas levou as mãos até as têmporas e as
pressionou.

A rotina de Jennifer permanecia a mesma desde o dia em que Regina se
foi; ela treinava boxe nas manhãs de segunda, quarta e sexta, estudava à tarde e
trabalhava aos finais de semana. Meireles estava acumulando quase todo o
salário que recebia mensalmente enquanto contava os dias para que sua
formatura chegasse e ela pudesse ter tempo para encontrar algum trabalho de
período integral. Ela usaria todo o dinheiro ganho nos campeonatos e mais o que
estava juntando ao longo desses meses, com seu trabalho, para tentar alugar um
simples local para viver futuramente. No entanto, sabia que precisaria de um
novo emprego para conseguir se sustentar ao longo dos meses. A jovem sabia
que não seria uma fácil tarefa se sustentar sozinha, mas ela também sabia que
permanecer na casa de Morgana estava fora de cogitação, pois embora amasse
muito sua mãe, sentia que aquele lugar já não lhe cabia.
Jennifer já tinha tudo construído em sua cabeça; o dinheiro da conta
bancária iria ser usado em prol de seus estudos, seu salário mensal do futuro
emprego quitaria o valor dos aluguéis e o dinheiro que vinha acumulando das
vitórias do boxe cobriria seus gastos extras por um tempo. Ela se sentia grata por
ter conseguido ganhar o penúltimo campeonato do qual participou. O dinheiro
ganho neste jogo será a peça fundamental.

— Você já sabe com quem vai ao baile, Jennifer?— perguntou Beatriz.
— Acho que vou comprar uma boneca inflável pra ser meu par —
brincou, arrancando uma risada da amiga. — É o que me resta.
— Você é muito boba!— Riu.
— Ao menos eu te faço rir.
As duas amigas colavam alguns cartazes pelos corredores da escola
anunciando sobre a data do baile de formatura. Baile esse, que todos estavam
convidados a participar. Há algumas semanas ela havia entrado em contato com
o representante da turma do Kevin para saber como estava o andamento por lá.
Por fim, ambas as turmas chegaram à conclusão de que a festa teria que ser
adiada para janeiro. Tal decisão foi inteiramente aceita pela instituição. E por
coincidência do destino, a data escolhida cairá justamente no dia do aniversário
de Jennifer, a fazendo abraçar duas conquistas de uma só vez.


O tempo continuava a passar. Lento, mas sem pausa. Regina estava
inteiramente dedicada às suas novas turmas. Elas eram mistas, possuindo alunos
de idades distintas. Não demorou muito e o trabalho exemplar da morena logo
foi reconhecido e admirado na escola de idiomas. Visto isso, a professora
recebeu uma proposta pra tornar-se professora efetiva da instituição.

— Oh, eu me sinto muito honrada e até mesmo lisonjeada ao receber esse
convite vindo de uma instituição de grande porte como essa. Mas eu não tenho
como aceitar — disse educadamente em uma reunião com um dos donos do
lugar. — Estou vivendo apenas temporariamente aqui na Itália.
— É uma pena, senhora Vianna. Não haveria como repensar? Talvez
mudasse de ideia e escolhesse permanecer em Florença conosco.
— Realmente eu agradeço a proposta. Trabalhar aqui tem sido
imensamente prazeroso. A Itália sempre me abraça, mas não sinto que aqui seja
o meu lar — respondeu com suavidade na voz.
— Lamentável! De toda forma, as portas dessa escola sempre estarão
abertas pra você. Todavia, devo confessar que estarei torcendo pra que mude de
ideia até o dia de seu contrato expirar.
Ao final daquele mesmo dia, Regina e Laura combinaram de se
encontrarem em um bar para beberem algo e jogar um pouco de conversa fora
após o final de seus expedientes.
— Pedi dois drinks afrodisíacos pra nós — comentou a ruiva ao retornar
à mesa com os copos.
— Afrodisíacos? Você deve estar querendo me enlouquecer!— disse
Regina ao segurar o copo. — Outro dia eu estava lendo um romance erótico
antes de dormir e, oh céus, senti minha pele aquecer.
— Meu Deus, Regina! Você precisa transar!— disse em meio a uma
risada.
— Sério, Laura? Se você não tivesse dito, nem teria percebido —
ironizou. — Mas realmente estou precisando. Esses três meses longe da Jennifer
estão me enlouquecendo em todos os sentidos.
— Eu posso imaginar.
— Oh não, você não pode. Estou pensando em sexo vinte e quatro horas
do meu dia. Tenho erotizado até as folhas que encontro no chão — disse,
arrancando uma enorme gargalhada de sua prima.
— O pior é que eu te conheço, sei que deve estar exatamente assim.—
Riu.
— Após o drink de hoje, certamente vou fazer amor com Jennifer
telepaticamente — comentou ao rir de si mesma.
— Você me mata de rir, Regina!— disse a ruiva em voz alta.
— O quê posso fazer se gosto de apreciar as coisas boas da vida?—
respondeu com um sorriso sacana ao levar a bebida até os lábios. — Se vive
apenas uma vez, então quero aproveitar ao máximo minha passagem por aqui. E
se por ventura eu encarnar novamente, aproveitarei tudo de novo.
— Oh Deus! Alguém já disse o quão safada você é?
— Poucas pessoas. Ou você acha que é pra todo mundo que revelo esse
meu lado? Mas eu não diria que sou safada. Apenas sou bastante carnal, porém,
com a pessoa certa.
— Você é uma completa dama em sociedade. Impossível saber que por
trás desses seus óculos e rostinho de boa professora se esconde uma mulher
altamente sexual — comentou Laura. — Mas agora me conta! Como é a sua
relação com a Jennifer? Como vocês equilibram a diferença de idade que há?
Como se apaixonaram? Como foi o primeiro beijo? Ela te beijou ou você tomou
a iniciativa? Eu tenho muita curiosidade a respeito!
Regina esboçou um pequeno sorriso e começou a responder as
perguntas de Laura.
— Tudo ocorreu muito naturalmente. Os diálogos entre nós se deram
início através dos nossos gostos em comum. Me lembro de quando perdi um dos
meus cadernos de poemas e ela o encontrou. Jennifer leu e releu todos eles e
adorou. Quando descobriu que me pertenciam, tivemos algo a mais sobre o quê
conversar.
— E quando começaram os flertes?
— Então, toda a boa atmosfera que naturalmente se instalou entre nós
começou a se modificar. Os prazerosos momentos que compartilhávamos juntas
foi dando lugar a algo mais. Quando me dei conta do clima que estava rolando,
tentei barrar. Evitei o máximo que pude sua companhia.
— E ela?
— Ela avançou. De maneira respeitosa e sutil, mas avançou. Jennifer
sempre teve muita cautela pra que ninguém percebesse, e eu a admirava ainda
mais pelo bom senso.
— E o que você fez quando ela avançou com as investidas?
— Eu tentei ir contra. Tentei pará-la e também tentei parar a mim
mesma. Minha mente não queria permitir que aquilo acontecesse.— Ao mesmo
tempo em que conversava com Laura, Regina se servia da bebida e observava o
ambiente à sua volta. — Você não imagina a quantidade de vezes em que apoiei
a cabeça no travesseiro e pensei mil coisas quando comecei a tomar consciência
de que estava me envolvendo por uma aluna.
— Nossa, você deve ter travado uma grande batalha interna! Quando
percebeu que não dava mais pra ir contra?
— Quando a vontade de tê-la era maior que qualquer pensamento
contrário — respondeu com seriedade na voz. — Houve uma festa na escola, era
aniversário da instituição. Jennifer se alcoolizou um pouco e me chamou pra
conversar. Estávamos no terceiro piso do colégio, um local que ninguém
frequentava, quando ela tentou pela primeira vez um contato maior. Eu nunca
tinha visto Jennifer com tanta atitude. Apenas eu sei o autocontrole que exerci
ali, principalmente quando os lábios dela percorreram meu pescoço.
— Porra Regina! E você não cedeu? Te parabenizo!— disse ao bater
palmas.
— Eu não podia, eu não devia. Jennifer estava alcoolizada e eu
precisava que ela tivesse certeza de suas ações. Mas esse conflito não durou
muito mais tempo, dois dias após a festa eu a beijei. Estávamos em um bate boca
sem fundamento e eu a calei com um beijo.
— Que delícia!— exclamou Laura. — Esses beijos agitados que
acontecem no meio de uma discussão são os melhores!
— Foi maravilhoso, devo confessar.— Regina sorriu à lembrança do
ocorrido. — Eu não posso dizer a você quando eu percebi que gostava dela, pois
eu sempre gostei. Mas posso afirmar que antes de beijá-la eu já estava
apaixonada.
— Isso é tão bom, não é? Se apaixonar.
Regina assentiu positivamente e continuou respondendo as perguntas
de Laura.
— Nossa relação é bastante rica, a diferença de idade não nos pesa, nós
a usamos de maneira favorável. Eu aprendo algumas coisas com Jennifer e ela
também aprende comigo. Eu apresento o meu mundo a ela e recebo o dela nos
meus braços. É uma grande troca de conhecimento — explicou. — Gosto muito
de observá-la quando estamos próximas. Jennifer se mostra tão mulher e tão
garota. Ela sabe ser meiga, doce e possui algumas inseguranças da idade. Mas ao
mesmo tempo ela tem muita iniciativa, coragem e uma grande sensualidade. Ela
sabe sorrir como um anjo e como um demônio. É impressionante.
— E qual lado você mais gosta?
— Eu gosto de estar exatamente no meio, aproveitando o melhor dos
dois.
— Puta merda, você está muito apaixonada — comentou a ruiva ao
virar o último gole do líquido em sua boca.
— Você se importaria de não fumar aqui?— perguntou Regina ao
observar sua prima tirar a carteira de cigarro do bolso. — Estou tentando evitar
ao máximo — explicou-se.
— Oh, sem problemas. Desculpe — respondeu ao guardá-lo. — E
então, você já comprou a passagem de volta ou vai deixar pra comprar em cima
da hora? Você deve estar tão cheia de saudades.
— Ainda não comprei, mas pretendo comprar o mais rápido possível.
Não quero correr o risco de deixar pra cima da hora e não conseguir pra data que
quero. Sim, estou com muita saudade. Sinto a falta dela, da minha casa, da
minha cama, das minhas coisas.— Regina soltou um pequeno suspiro ao final
das palavras.
— Essa garota deve estar louca de saudades suas.
— Da mesma forma que estou dela — respondeu suavemente ao
visualizar a imagem de Jennifer em seus pensamentos. — Todos os dias eu
escrevo sobre ela e sempre me pergunto como estará sendo seus dias. Sei que ela
não me conta tudo. Jennifer tem uma chata mania de querer esconder os
problemas pra não me preocupar. Estou tão ansiosa pra saber como encontrarei
as coisas quando chegar. Não vou aceitar nada mais que queira nos separar.
— E quanto à sua sogra? Pois sim, agora você terá uma sogra! E pelo
que me contou, é das piores — disse ao rir da desgraça de sua prima.
— Eu não sei o que farei com essa mulher. Mas a partir do momento em
que Jennifer concluir a escola e sair de casa, ela terá que respeitar nosso
relacionamento. Espero que enxergue o quanto amo sua filha.
— Eu também espero. Do contrário você terá uma grande dor de
cabeça. Mas e quanto ao Robson? Como ficou sua situação com ele? Me lembro
bem que vocês tinham algo como uma amizade colorida.
— Nem me fala desse homem. Robson se mostrou um babaca, machista
e preconceituoso. Cuspiu coisas horríveis na minha cara quando eu disse que
queria terminar o que tínhamos.
— Nossa, sério? Eu não o conheci pessoalmente, mas ele me parecia
legal pelo que você me contava.
— Eu também pensei que ele fosse. Mas enfim, deixa esse idiota pra lá.
Hoje combinei com minha mãe de cozinhar algo especial pro jantar. É
aniversário do meu pai.
— E como assim eu não fui convidada?— retrucou.
— Está sendo agora! Mas terá que me ajudar na cozinha.
— Sem problemas!— piscou. — Não olha agora, mas tem um homem
se aproximando da nossa mesa. Esse cara estava te olhando desde o momento
em que chegamos aqui — murmurou Laura.
— Buona notte!— disse o homem educadamente ao cumprimentá-las.
— Buona notte — responderam em uníssono.
— Poderia lhes pagar uma bebida?— Ele ofereceu.
— Não acredito que ele também fala nosso idioma — resmungou
Regina para si própria. Quase todos seus parentes sabiam falar o português.
— Oh não, obrigada. Já bebemos o suficiente — respondeu Laura.
— Que pena.— Ele comentou. O homem direcionou o olhar à Regina e
a olhou por longos instantes antes de voltar a dizer algo. — Eu poderia tomar um
lugar ao seu lado?
— Não. Já estou de saída — respondeu ao expressar um sorriso sem
graça.
— Eu poderia pelo menos ter o seu número?— insistiu. Ele olhava para
a professora com deslumbre, acreditando nunca ter visto uma mulher tão bela.
— Desculpe, mas não estou interessada.— Regina levantou-se da mesa
e depositou a cadeira no lugar.
— Oh, que lástima. Adoraria ter a oportunidade de conhecer o que
existe por trás desse rosto tão belo e incomum.
— Cara, você está incomodando a minha namorada!— disse a ruiva ao
levantar-se.
— Namorada? Oh! Perdão! Eu não quis ser inconivente.
— Mas estava sendo. Agora se nos dá licença...— Laura envolveu a
morena pela cintura e retirou-se do bar com ela.
— Namoradas?
— Foi a única coisa que veio na minha mente pra livrar você daquele
cara.
— Obrigada. Mas você não devia ter mentido. Ele precisava entender
que um não é um não.
— Sim, eu concordo. Mas eles nunca aceitam de cara. Ele ficaria ali
insistindo e te cercando sabe-se lá por quanto tempo. O sujeito estava quase
babando sobre você.
— Eu percebi. Me olhava como se tivesse tirando minha roupa.
— Você pode apostar que ele estava!— Riu, deliciando-se com a
expressão indignada que Regina esboçava.

Os meses finalmente haviam passado e Jennifer concluído seu ensino


médio com êxito. Agora, cada dia a menos de espera renovava a alegria do
reencontro em seu peito.
Tendo em vista que estava livre da carga horária da escola, Jennifer
passou a fazer parte da equipe efetiva da academia. Sendo assim, foi contratada
para trabalhar de segunda à sexta. Dessa forma, o horário dos finais de semana
retornou para a antiga dona que chegara de licença- maternidade.
Meireles mal podia acreditar que faltavam poucos dias para sua tão
esperada formatura e, consequentemente, para seu aniversário. No entanto, nem
tudo era felicidade dentro dela. Há poucos dias havia sido notificada por Regina
que a mesma não iria estar presente nessa data tão especial. Infelizmente os vôos
para o dia em questão estavam todos esgotados.
Por ser um colégio com estilo americano de ensino, com exceção das
datas de início e término do ano leitivo — pois estas seguiam o estilo das escolas
brasileiras— era comum que nessa época do ano os rapazes do Brooke
convidassem as moças para o tão esperado baile. Jennifer recebeu muitos
convites durante todo o mês de dezembro. E para a sua surpresa, quase todos
vieram de meninas. Após a notícia do ocorrido entre ela e a professora Vianna
ter se espalhado no colégio, os meninos sentiram-se receosos quanto a convidá-
la. Isso explica o fato da maior parcela dos convites ter vindo do sexo feminino.
Contudo, apesar dos muitos pedidos, todos foram recusados
educadamente pela loira. Ela queria apenas uma pessoa para aquela noite; uma
pessoa quase impossível de estar com ela.

— O que achou do meu vestido, Jen?— perguntou Beatriz. A jovem
havia levado a roupa até a casa de Jennifer para que a amiga lhe desse uma
opinião.
— Eu gostei muito. Ficará lindo em você!— Sorriu.
— E você? O que vai usar?— perguntou animada.
— Comprei um conjunto social.— Ela respondeu ao levantar-se da
cama e buscar a roupa nova que estava passada e pendurada no cabide dentro do
guarda-roupa.
A roupa de formatura de Jennifer era composta por uma calça preta,
blusa de manga comprida de coloração branca e um blazer da mesma cor da
calça. A jovem havia comprado um novo par de sandálias de salto alto para
compor o visual.
— Você vai ficar linda e muito elegante!— comentou Beatriz. — E
diferente — acrescentou. — Quase todas as meninas optam por vestido —
completou.
— Obrigada — respondeu ao expressar um curto sorriso.
— Ontem Kevin me mostrou o corsage que comprou pra mim — disse
Beatriz com um sorriso nos lábios.
— Corsage?— indagou Jennifer.
— Sim! Aquela pulseira de flores que os rapazes dão ao par deles do
baile. Igual acontece nos filmes e seriados americanos.
— Ah sim! Eu não sabia que levava esse nome. Você gostou?
— Muito! Super combina com meu vestido — disse sorridente. — Mas
e você, Jen? Vai à festa sozinha mesmo? Fiquei sabendo que recusou muitos
pedidos.
— Vou sozinha, sim. Ah... Bea, eu recusei porque as pessoas esperam
um par romântico para o baile e eu só poderia oferecer uma amigável
companhia. Eu não quis estragar a noite de alguém.
— Entendo. Bom, você não estará sozinha de toda forma. Seus amigos
estarão com você — Sorriu.
Meireles devolveu o sorriso e continuou a falar.
— Sem mencionar que vou estar um pouco atarefada tomando conta de
algumas coisas. Ainda preciso concluir meu mandato de representante de turma.
— E quanto à Regina? Você deve estar louca pra que ela volte!
— Muito ansiosa! Minhas unhas já estão todas roídas, tamanha é minha
ansiedade! Estou morrendo de saudades da voz, do cheiro e do toque daquela
mulher.— Jennifer se deitou com as costas para o colchão e direcionou seu olhar
para o teto. — Eu ainda não consigo acreditar que os meses passaram e que não
morri de tristeza ao longo deles — disse ao desviar os pensamentos para Regina
e suspirar. — Ah! Eu preciso comentar algo com você!— Meireles levantou-se
em um impulso. — Há muitos meses ela me presenteou com uma lingerie. Vou
te mostrar, pois você é minha melhor amiga.— A loira caminhou até o armário,
pegou a lingerie e retornou para Beatriz. — O que achou?— perguntou ao
mostrá-la para a amiga.
— Ui, achei muito sexy! Achei ainda mais sexy o fato dela ter escolhido
algo que quisesse ver no seu corpo.
— Devo admitir que eu também. — disse ao esboçar um sorriso tímido.
— Nunca usei algo tão provocante assim, muito menos com essa cinta liga.
— Você ainda não usou pra ela?
— Não. Mas pretendo na primeira oportunidade que eu tiver quando ela
retornar. Estou ansiosa pra ver qual será sua reação.
— Ela vai enlouquecer! Seu corpo é um espetáculo, Jennifer. E tenho
certeza que ficará um mulherão nessa roupa. Eu já disse várias vezes que você e
eu nem aparentamos ter a mesma idade. Eu sou muito menos encorpada.
— Ah... Não fala assim, Bea. Seu corpo também é lindo. A única
diferença é que pratico exercícios desde a pré adolescência, isso torna meu corpo
definido e tonificado.
— Não precisa tentar me agradar — disse ao franzir os lábios.
— Ei, desfaz esse bico. Sabe que estou sendo sincera.— Jennifer
apertou o nariz da amiga, a fazendo sorrir.
Meireles devolveu o conjunto para o armário e chamou Beatriz para ir
até a cozinha. A loira havia feito o bolo preferido da amiga antes de recebê-la:
cenoura com calda de chocolate.



As semanas passaram e trouxeram com elas o dia mais esperado para a
vida de Jennifer Meireles: sua formatura.
Jennifer abriu lentamente os olhos e por alguns instantes se esqueceu de
qual dia se tratava. Ela saiu da cama, escovou os dentes, jogou uma água fria no
rosto e desceu para tomar o café da manhã como em um dia qualquer. A loira
serviu-se de um copo de leite, alguns cookies de chocolate e sentou-se à mesa.
Porém, quando ia levar a caneca de leite à boca, sua memória quase fez um
estalo; foi quando despertou realmente de seu sono e tomou consciência de que
hoje era seu aniversário e, também, formatura.
Jennifer começou a receber inúmeras mensagens e até mesmo ligações
de felicitações pela data de hoje. A loira sentiu como se de repente tudo à sua
volta tivesse ganhado cor e um brilho a mais.
— Feliz aniversário!— gritaram Diogo e Morgana ao entrarem na
cozinha. Ambos envolveram a garota em um carinhoso abraço grupal.
— Obrigada!— disse ela com um largo sorriso nos lábios.
— Nós ficamos em dúvida sobre o que dar a você de aniversário...—
disse Morgana.
Nos últimos meses a mãe de Jennifer andou evitando quaisquer tipos de
brigas ou discussões com a filha, principalmente ao perceber o quão triste e até
mesmo um pouco abatida a jovem andava. Em sua mente, Morgana ainda
reprovava o possível envolvimento dela com Regina, contudo, o fato da filha ser
homossexual estava começando a ser aceito. Afinal, ela sabia que nada do que
fizesse mudaria quem Jennifer é. E começou a se dar conta de que o que ela
chamava de “fase” não dava qualquer indício de ser passageira.
Algo estava mudando dentro de Morgana Meireles. A mudança ocorria
de maneira lenta, porém, constante e progressiva. Todos os dias ela tentava
entender que Jennifer jamais seria a projeção de suas vontades. Entretanto, a
mais velha ainda não sabia como reagiria quando Regina Vianna retornasse.
Esse ainda era um assunto que ela buscava anular em seus pensamentos.
— ... Então Diogo e eu nos unimos e resolvemos te presentear em
dinheiro. Dessa forma você escolhe a melhor maneira de gastá-lo — completou
ao depositar um envelope nas mãos da filha.
— Mas isso é muito dinheiro!— exclamou a loira ao abri-lo.
— Você merece, Jennifer. E afinal, além de seu aniversário, é a sua
formatura. É uma data muito especial — disse Diogo de maneira carinhosa.
— Obrigada aos dois.— Sorriu.
— Está empolgada para seu baile?— perguntou o homem.
— Muito! Finalmente encerrarei esse ciclo.
— E quem será seu par na noite de hoje? Aposto que não faltaram
pretendentes — perguntou ele de maneira ingênua.
— Vou sozinha — respondeu com pesar em sua fala. — Infelizmente a
companhia que eu esperava não está aqui.
— A Regina ainda não retornou da Itália?— perguntou, fazendo a feliz
expressão de Morgana se desfazer.
— Ainda não — respondeu sem jeito ao notar que o assunto
desagradava sua mãe.
— Eu sinto muito, Jen. Mas tenho certeza que sua noite será incrível da
mesma forma.
— Eu conto com isso.— Ela respondeu com um fraco sorriso nos
lábios. — Recebi uma ligação do meu pai há pouco tempo — disse ao direcionar
o olhar para sua mãe.
— Ele lembrou que tem uma filha? Finalmente!— exclamou Morgana.
— E o que ele queria? Além de parabenizar você, claro.
— Disse que está com saudade, mas sei que é da boca pra fora. Se
realmente sentisse a minha falta, me visitaria. E disse também que está viajando,
mas que quando voltar irá dar meu presente.
— Eu espero que pelo menos ele tenha a decência de dar um presente
digno a você!
— É, vamos ver...

Após o diálogo com Morgana e Diogo na cozinha, a jovem subiu para o
quarto e verificou sua caixa de entrada. Ela olhava para a tela do computador
enquanto esboçava um lindo sorriso ao se deparar com o e-mail recebido.

Bom dia, menina de ouro.
Ou deveria dizer: minha mulher de ouro? Acredito que isso não faça
diferença, pois antes da data de hoje você já era uma mulher pra mim. E mesmo
amanhã, você ainda será a minha menina.
Eu poderia preencher essa mensagem com todos aqueles desejos clichês
de aniversário, mas vou preferir dizer que a saudade de você já não cabe em
mim. Me sinto feliz e triste ao mesmo tempo. Feliz ao saber que hoje você
iniciará uma nova fase da sua vida, e triste por não poder compartilhar esse
momento ao seu lado.
Se você me perguntasse o que eu mudaria do passado, responderia que
absolutamente nada. Acredito que tudo o que aconteceu serviu de ponte pra nós
duas.
Ah! Mas tem uma coisa que eu gostaria de ter feito diferente; se eu
pudesse voltar para o início de tudo eu teria beijado seus lábios muito antes, sem
qualquer relutância. E por falar em beijá-la, você não imagina a sede que estou
da sua boca. Os meses me castigaram demais. No entanto, não quero falar do
meu desejo que está incontrolável, isso eu mostrarei pessoalmente. Estou ansiosa
pra reencontrar você, meu amor. Seu sorriso e seu olhar me fazem tanta falta...
Consegui comprar a passagem para amanhã, devo chegar durante a
madrugada. A vontade de sentir você nos meus braços está me matando. Eu não
paro de pensar em você, Jen. Bóris também sente saudades. A propósito; ele
está te desejando um feliz aniversário agora. E disse que está ansioso para
receber seus carinhos novamente.
Eu vou ficando por essas linhas e deixarei pra dizer pessoalmente toda a
importância que tem na minha vida. Que você tenha uma noite memorável ao
lado dos seus amigos. Aproveite seu baile de formatura, ele é um momento
único nas nossas vidas.

Com amor, Regina.



Ponto de Vista da Jennifer


O início de noite finalmente havia chegado. Eu mal conseguia pensar a
respeito da minha formatura desde que li o e-mail de Regina. Eu apenas queria
que as horas passassem depressa pra que eu pudesse reencontrá-la.
Terminava de me arrumar em frente ao espelho que havia em meu
quarto. Eu olhava para meu reflexo e sentia orgulho de quem eu era. Adoraria
que Regina pudesse me ver agora. Eu estava me tornando a mulher livre que ela
precisava.
Finalmente minha formatura. E por coincidência, estava um ano mais
velha. Hoje eu sentia que podia pegar o mundo nas mãos. Mas, não todo ele.
Apenas a parcela que eu precisava pra começar a guiar minha vida.
Enquanto terminava de calçar meus saltos escutei a campainha tocar.
Estranhei, afinal, eu não estava aguardando ninguém. Terminei rapidamente o
que estava fazendo, enfiei algum dinheiro e a chave de casa no bolso e me
apressei para atender a porta.

— Surpresa!
— O que vocês fazem aqui?
— Acha mesmo que seus amigos deixariam você ir sozinha? Não
mesmo!— disse Kevin.
— Viemos buscar você para ir ao baile conosco, Jen. Kevin vai levar
nós duas! E veja! Temos até um carro!— disse Beatriz, minha amiga.
— De quem vocês assaltaram esse automóvel?— perguntei ao
observar o veículo estacionado na minha calçada.
— É meu, Meireles! Ganhei do meu pai — disse ele ao sorrir com
orgulho.
Kevin ofereceu o braço esquerdo para Beatriz e o direito para mim. Eu
realmente possuía os melhores amigos que alguém poderia ter.

A festa estava acontecendo em um clube muito requisitado por todos. O
lugar era espaçoso e oferecia algumas atrações próprias da casa. Tudo havia
sido custeado pelas turmas de terceiro ano e pelo colégio.
Chegando lá, cumprimentei alguns colegas e o corpo docente da
escola. Em seguida, permiti que Kevin e Beatriz ficassem a sós e fui conferir se
toda a decoração e alimentação estavam corretas assim como havíamos
reivindicado. A iluminação estava hipnotizante!
Me aproximei da mesa principal para observar a decoração de perto e
soltei um pequeno riso ao olhar para o ponche. Certamente em poucos minutos
ele já estaria batizado por Kevin.
Enquanto permanecia olhando para a mesa e perdida em meus
pensamentos, escutei alguns sons de passos se aproximando. No mesmo instante
lembrei de Regina e de como o barulho de seus saltos sempre me causavam
arrepios.
Ainda perdida em meus devaneios, pude jurar que uma brisa havia
trazido o cheiro dela até mim. Eu só podia estar ficando louca. A vontade de tê-
la comigo era tanta, que eu a estava buscando em cada parte e detalhe daquela
festa.
No entanto, quando fui pegar um dos doces que haviam na mesa, senti
uma presença em minhas costas. Eu não tive muito tempo ou oportunidade de
me virar para conferir de quem se tratava, pois rapidamente mãos femininas
tocaram meu braço a fim de envolver uma pulseira de flores em meu pulso.

— Será que eu poderia ser seu par essa noite?

O perfume, o toque, as mãos e a voz me inundaram de uma só vez. Virei
meu corpo quase em câmera lenta e tenho certeza que minhas pupilas dilataram
naquele instante.
Ela estava lá, sim. Ela havia voltado pra mim.


Capítulo 35

— O gato comeu a sua língua, senhorita Meireles?— Regina carregava
um suave sorriso em seus lábios altamente marcados de vermelho carmesim.
As pernas de Jennifer pareciam querer fraquejar naquele momento. Seu
coração batia em um ritmo tão acelerado, que parecia querer saltar para fora de
seu peito. Respirar havia se tornado uma tarefa difícil para ela, assim como
raciocinar. Meireles não conseguia acreditar no que seu par de esmeraldas
avistavam. Sua mente ainda não compreendia que ela havia retornado.
— Regina... Eu...Eu...Eu não acredito!— As mãos de Jennifer tremiam
e seus olhos estavam banhados d’água. Ela lançou-se na mulher à sua frente e
envolveu os braços em torno de seu pescoço. — Você está aqui, você voltou pra
mim — murmurou de maneira apressada próximo ao ouvido de Regina ao
mesmo tempo em que a apertava contra seu corpo.
A mais velha a recebeu em seus braços e a envolveu de maneira
apertada pela cintura.
— Eu voltei, meu amor, eu disse que voltaria — murmurou
carinhosamente em resposta. Regina possuía muita emoção em sua fala. — Feliz
aniversário!
A mais nova apertou fortemente os braços sobre os ombros de Regina
para senti-la ainda mais. Ela se permitiu permanecer algum tempo naquele
enlaço enquanto aspirava o perfume da mulher que tanto amava. Jennifer queria
fazer sua mente acreditar que a morena realmente estava ali. A alegria lhe
transbordava.
Regina, por sua vez, buscou as mãos de Jennifer com as dela e as
segurou com força. Ela sorriu ao constatar que aquelas mãos estavam quentes;
muito diferente da frieza sentida por ela na despedida.
— É quase impossível acreditar que você está aqui — comentou ao
olhar no fundo daquele par de olhos castanhos que a encarava com intensidade.
O sorriso não largava seus lábios.
— Mas eu estou, minha garota. Eu jamais perderia o dia de hoje —
disse com suavidade ao encostar as costas da mão contra a face de Meireles. —
Você consegue sentir?— perguntou ao acariciar o rosto de Jennifer, que fechou
os olhos por breves segundos e sorriu.
— Sim... Que saudades eu senti — respondeu com leveza em sua voz.
Jennifer envolveu a cintura da professora com os braços e uniu o corpo ao dela.
Esse pequeno gesto atraiu alguns olhares curiosos de alunos. — Você se
importa?— Questionou, referindo-se às pessoas que as olhavam.
— Não. Deixe que olhem. Estou mais interessada nisso aqui; você e eu
— comentou ao alternar o olhar entre os olhos e lábios da loira.
— Ainda bem que não se incomoda, pois com toda a certeza irão nos
olhar muito hoje — respondeu ao, também, alternar o olhar entre os olhos e boca
de Regina.
— Estou com saudade do seu toque, da sua voz, do seu cheiro, do seu
beijo — murmurou com os lábios próximos ao ouvido da mais nova, voltando a
olhá-la de frente logo em seguida.
Jennifer sentiu um arrepio percorrer a pele de seu corpo com o
murmúrio recebido.
— E eu estou louca pra beijar você de novo.
Meireles pressionou os lábios contra os de Regina por longos instantes e
a sentiu pressionar os lábios contra os seus repetidas vezes. Ambas as mulheres
sorriam com os olhos e com a boca enquanto distribuíam incontáveis “selinhos”
pelos lábios e face da outra. Elas ansiavam por um contato mais íntimo de suas
bocas. Queriam e precisavam sentir novamente o gosto que a parceira oferecia.
No entanto, esperariam para quando não estivessem em público. Não que Regina
ou Jennifer devessem alguma satisfação para as pessoas ali presentes, mas sim
porque não se sentiam à vontade para dividir suas intimidades com mais alguém.
— Acho que você ainda não respondeu minha pergunta, senhorita —
comentou ao prender a pulseira de flores no pulso de Jennifer.
— Não teria outro alguém que eu quisesse como meu par hoje à noite.
— Sorriu ao observar a mais velha prender o corsage. — Agora que eu estou
caindo na real... Você não presta, Regina! Por que me enganou dizendo que só
vinha amanhã? Desde quando está aqui? Eu estava enlouquecendo de ansiedade!
— disse em um só fôlego, arrancando uma risada da mais velha. — Você ainda
ri?
— Eu não perderia a sua cara surpresa por nada nesse mundo!—
respondeu. — Cheguei logo após o almoço — explicou. — Você não imagina o
quanto me segurei pra não procurar você e estragar a surpresa. Essa pulseira eu
comprei hoje à tarde.
— Isso não se faz!— retrucou. — Como sabia o local do baile? Não me
lembro de ter mencionado em algum dos e-mails.
— Arthur.
— Oh, eu devia imaginar! Há quanto tempo programava me pegar de
surpresa assim? Meu coração poderia não ter aguentado e você morreria de
remorsos por isso — dramatizou, fingindo-se de vítima.
— Acreditaria se eu dissesse que comprei há pouco mais de um mês?
Eu não quis correr o risco de não conseguir vôo. Mas, se por ventura sua
formatura adiantasse, eu iria até o inferno pra trocá-la. Eu só não vim antes
porque eu não aguentaria estar de volta e não procurar você. Então decidi chegar
exatamente no dia. Assim só precisei me conter por algumas horas.
— Ainda está difícil de acreditar que você está aqui.— Jennifer, de
maneira aleatória, distribuía inúmeros beijos pela face e lábios de Regina
enquanto conversavam. Ela não estava conseguindo conter a felicidade que a
transbordava. Foram meses de espera e agora finalmente a tinha bem ali ao
alcance de seus braços.
— E eu nem acredito que estou aqui, finalmente, após longos meses...—
Regina tentava controlar as emoções para que seus olhos não banhassem d’água,
principalmente diante daquele sorriso que ela esperara tanto tempo para ver
novamente.
— Eu quero saber tudo sobre a viagem, cada detalhe!
— Eu vou contando tudo aos poucos, tudo bem? Mas agora eu quero
apenas matar minha saudade de você que está imensa!— Regina enlaçou a
cintura de Jennifer e a guiou com seu corpo para próximo da mesa principal.
— Muito grande mesmo?— perguntou com um sorriso bobo nos lábios.
Regina pegou uma unidade de brigadeiro que estava sobre a mesa,
ofereceu na boca da loira e depositou um beijo naqueles lábios rosados e macios
que ela tanto ama.
— Muito grande! Gigantesca!— respondeu posteriormente ao beijo.
— Será que finalmente nós vamos poder ser um casal de verdade?
Assim como todos os outros?— perguntou ao mesmo tempo em que olhava a
mais velha.
— É tudo o que eu mais quero.— Regina sorriu.
— Professora Vianna?— Indagou Beatriz ao avistá-las. A jovem estava
acompanhada da presença de Kevin e Rose.
— Olá, boa noite — respondeu ao soltar delicadamente a cintura de
Jennifer e interromper o momento carinhoso que compartilhavam.
— Regina me fez uma surpresa e retornou antes do combinado —
explicou Jennifer aos amigos que as olhavam surpresos.
— Acredito que já não haja necessidade de me chamarem de professora
— disse suavemente.
— Professora Vianna, senhorita Vianna, é... Acho que não sabemos
como chamá-la. Ainda é tudo meio estranho — comentou Kevin.
— Regina é o suficiente — ela respondeu.
— Você e a Jennifer estão namorando?— perguntou Rose enquanto
tentava conter a euforia.
— Sim, nós estamos.— Regina olhou para Jennifer e sorriu. Em
seguida, voltou a atenção para seus ex alunos.
— Já que você não é mais nossa professora, posso contar na sua frente
que trouxe bebida para misturar ao ponche. Vou fazer isso agora! Aproveitem!—
disse ele com empolgação.
— Kevin!— Beatriz repreendeu. — A senhorita Vianna vai pensar o
que de nós? Não nos queime dessa forma!
— Ah, qual foi amor? Vamos nos divertir um pouco! Será a última vez
que todos os alunos estarão reunidos assim. Vamos aproveitar nossa formatura!
— exclamou ele, segundos antes de se direcionar para a mesa portando dois
cantis de bebida alcoólica escondidos em seu terno.
— Ele sempre faz isso — disse Rose.
— Nos desculpe, professora. Quer dizer, senhorita Vianna — disse
Beatriz.
— Pelo o quê? Eu não estou sabendo de nada.— Regina piscou para as
jovens ali presentes e se direcionou para a mesa onde o ponche estava
localizado; servindo-se de um copo da bebida logo em seguida.
Beatriz, Rose e Jennifer se olharam, sorriram e também serviram-se de
um copo.
— Regina! Como senti sua falta!— Arthur, ao avistar a amiga,
caminhou em sua direção e a envolveu em um carinhoso abraço.
— Também senti sua falta, meu amigo.— Sorriu ao abraçá-lo.
— Como foi a viagem? Como está Carmen, Henrique e todos?
— A viagem foi ótima. Meus pais estão melhores que sempre!— ela
respondeu. — Minha mãe me partiu o coração na despedida, chorou muito. Há
tempos nós não passávamos tanto tempo juntas. Acho que desde quando
completei dezoito ou dezenove anos e retornei para o Brasil.
— É compreensível, ela se acostumou com sua companhia novamente.
Afinal, foram cinco meses — disse ele. — E você, Jennifer? Como está?—
perguntou o homem ao direcionar o olhar para a mais nova. — A propósito, feliz
aniversário!
— Estou ótima e você? Oh, obrigada!— respondeu, segundos antes de
receber um abraço de seu ex professor.
— Eu estou bem. Melhor agora que Regina está de volta e feliz.—
Sorriu. — Eu vim apenas cumprimentar minha amiga e felicitar você. Agora vou
me juntar aos outros e deixá-las a sós, pois tenho absoluta certeza de que vocês
têm muito que conversar e matar a saudade.
— Não deixe de experimentar o ponche. Aposto que está a seu gosto —
disse Regina ao piscar para o amigo.
— Nós também vamos dar uma volta pela festa, Jen — comentou Beatriz
e seus amigos. — Depois nos reencontramos!
Jennifer e Regina assentiram positivamente.

— A decoração está linda! — disse Regina enquanto circulava pelo
lugar de mãos dadas com a loira. — Aposto que há muitos dedos seus aqui.
— Alguns — respondeu a mais nova. — Assim como na festa da
escola, também me encarreguei de ajudar na formatura.
— Eu adorei as lanternas japonesas que estão no teto — comentou ao
direcionar o olhar para cima. — Você adora luzes, tenho certeza que também foi
ideia sua.
— Realmente foi. Você já conhece meus gostos assim?
— Mais do que você possa imaginar.— Sorriu.
As duas mulheres caminhavam de mãos dadas por todo o clube ao
mesmo tempo em que atraíam incontáveis olhares curiosos. Quase todo o
colégio, se não todo ele, soubera do romance.
— Ei! Por falar em dedos, como você sabia o tamanho da minha
aliança?
— Ainda está pensando nisso? Não acredito!— Regina soltou uma curta
risada e a respondeu. — Você esqueceu um anel no meu banheiro na última vez
em que esteve lá.
— Oh...
— Por quê? De qual outra maneira eu saberia, Jennifer?— perguntou ao
exibir um sorriso cínico nos lábios.
— Eu prefiro não comentar — respondeu, compartilhando uma
prazerosa risada com sua namorada. — Por falar em aliança... É lindo ver nossas
mãos assim, juntas — comentou ao buscar a mão de Regina que possuía o anel.
— Sabe o quê é ainda mais lindo?— Regina tocou a face de Jennifer
com a mão livre e acariciou-a enquanto aprofundava o olhar no brilhante par de
olhos verdes à sua frente.
— O quê?
— Você.— Regina olhava para a mais nova com encantamento e
admiração. — Obrigada por confiar em mim quando eu disse que retornaria.—
Os lábios da professora sorriram e tocaram os de Jennifer uma vez mais.
— Oh céus, eu preciso te beijar de verdade — murmurou Jennifer
próxima à boca da mulher. — Vem.— Meireles segurou a cintura da morena e
começou a caminhar com ela para o grande jardim que havia no clube. Porém,
durante o caminho, foram interrompidas pela presença de Elizabeth.
— Olá, senhorita Vianna — disse a diretora. — Boa noite, Meireles.—
comentou ao alternar o olhar para a loira.
— Boa noite.— Jennifer respondeu suavemente.
— Boa noite, Elizabeth. Como está?— perguntou Regina.
— Bem. Parabéns pelo trabalho, Jennifer. Essa festa não teria ficado tão
bem estruturada se não fosse você e os outros representantes — elogiou.
— Não foi nada — respondeu calmamente.
— Eu não pretendo tomar o tempo de vocês. Apenas gostaria de dizer
que Regina faz muita falta no nosso corpo docente. A sua saída foi uma lástima e
uma grande perda. Eu realmente sinto muito que as coisas tenham tomado esse
caminho.
— Eu entendo o posicionamento que o colégio tomou, e eu mesma já
havia decidido me demitir. Sinto falta, afinal, foi mais de nove anos lecionando
no mesmo lugar. No entanto, entendo que as atitudes tomadas por ambas as
partes foram corretas — disse de maneira calma e serena.
— Não sei se minha opinião pessoal serve de algo, mas gostaria que
soubessem que eu desejo felicidades a vocês.
— Obrigada!— As duas responderam quase ao mesmo tempo.
— Aproveite o baile, Jennifer. Foi um prazer ter uma aluna tão dedicada
como você entre nós. Boa noite!
— Boa noite!
— Boa noite!
— Você acha que os votos dela são verdadeiros?— perguntou a mais
nova assim que Elizabeth se foi.
— Talvez. Acho que pessoalmente ela não tem motivos pra não gostar.
Acredito que estava apenas fazendo o seu trabalho.
— Pode ser...— disse de maneira vaga. — Bom, vamos esquecê-la.
Quero focar minha atenção em você.
Jennifer guiou Regina pela mão e a levou até o jardim que se localizava
na parte de trás do clube. Ele era vasto e contava apenas com a iluminação de
algumas luzes coloridas que haviam sido colocadas ali como parte da decoração.
— Droga, já tiveram a mesma ideia que eu — resmungou ao observar
que havia um casal no ambiente.
— Deixa eles pra lá, vem...— Regina encontrou um canto onde não era
possível serem avistadas, se localizava na lateral do jardim. — Eu senti tanta
saudade, tanta...— sussurrou ao encostar o corpo de Jennifer contra uma coluna
que ali havia.
O suave e agradável cheiro das flores se misturava ao perfume que
emanava da pele das duas mulheres. Aquele aroma somado à pouca luz do
ambiente estava deixando o clima ainda mais prazeroso, sensual e romântico.
— E eu a sua...— respondeu ao sentir os lábios de Regina começando a
roçarem contra os seus.
O beijo iniciou de maneira lenta. Regina depositou uma das mãos sobre
o tórax de Jennifer e usou a outra para segurá-la na região da nuca. Meireles, por
sua vez, deslizou as duas mãos pela lateral do corpo da morena e as estacionou
no quadril.
— Que saudade do seu gosto — sussurrou Regina entre o beijo. Sua
língua entrava e saía da boca de Jennifer de maneira suave e lenta.
— Hum...— A mais nova emitiu um curto gemido abafado ao sentir a
maestria dos movimentos que os lábios da mulher exerciam contra os seus. Os
lábios de Regina eram macios e sua língua deliciosamente quente e úmida.
A mais velha apertou a nuca de Jennifer com mais pressão ao mesmo
tempo em que segurou com força em seu blazer. Meireles possuía o mesmo
gosto excitante do qual recordava.
— Tão bom provar sua boca de novo — sussurrou, segundos antes de
morder o lábio inferior de Jennifer. O coração de Regina palpitava dentro do
peito.
As mãos da loira começaram a passear por aquele corpo curvilíneo até
alcançarem a bunda.
— Você é tão gostosa...— disse ao apertar com força aquela região por
sobre o vestido.
Entre beijos lentos e mãos que exploravam simultaneamente os corpos,
o clima começou a criar uma nova atmosfera. Os lábios de Regina se arrastaram
pelo maxilar da jovem até alcançarem seu pescoço alvo, onde beijou e traçou um
curto caminho com a língua, tornando a respiração da loira ofegante.
— Oh porra, Jennifer — comentou ao sentir uma das mãos da loira
alisando a parte interna de sua coxa por dentro do vestido.
Meireles expressou um sorriso sacana e apertou a coxa da mulher com
força, a fazendo emitir um baixo gemido com os lábios próximos aos seus.
— Estou louca pra sentir você — disse a mais nova com a voz
embriagada de desejo.
— Não me provoca dessa forma. Não aqui. Eu estou no meu limite de
desejo por você — respondeu roucamente ao tocar a mão de Jennifer e tirá-la de
entre suas pernas.
— Que ótimo, Regina. Pois eu também estou no meu limite.— Jennifer
alcançou um dos seios da mulher e o apertou por cima da roupa. — Você não
quer fazer amor comigo, hum? Diz, meu amor. Estou louca pra ser sua de novo.
— Meireles provocava com as palavras ao mesmo tempo em que massageava o
seio da morena, tornando-a ofegante à sua carícia.
— Sim, eu quero muito fazer amor com você...— respondeu com
sensualidade na voz ao depositar a mão no cós da calça da loira.
— Por que não começa agora?— Meireles dobrou a perna e encostou o
pé contra a pilastra, de modo a sustentar e equilibrar o corpo. Feito isso, puxou
Regina e a acomodou entre sua perna dobrada e a que estava esticada.
— Porque eu tenho total consciência de que não é hora e nem lugar,
senhorita Jennifer. — respondeu com suavidade em sua voz.
— Oh droga, eu sei... — suspirou forte.
Tendo em vista que o lugar estava vazio e a iluminação quase nula,
Regina permitiu-se desfrutar de pequenas carícias com sua namorada. Afinal, a
saudade que sentiam não cabia em seus peitos e não podia e nem devia ser
contida. Era o reflexo dos cinco meses longe.
Meireles se viu envolvida pelo beijo de Regina. A mulher a beijava
lentamente e com ternura.
— Regina...— Jennifer segurou a nuca da mulher e começou a arranhá-
la em um impulso para conter o desejo que arrebatava seu corpo. Quanto mais
ela arranhava aquela pele com suas unhas, ainda mais excitada a mais velha
ficava.
— Eu adoro quando você morde — comentou a mais velha ao receber
uma leve mordida em seu queixo. — E gosto ainda mais de morder você.— Ela
usou a mão livre para afastar a gola da camisa de Jennifer e depositou alguns
beijos e mordidas na curva do pescoço. — Eu não consigo ficar apenas nisso.—
comentou ao mesmo tempo em que foi parando lentamente as carícias. — Se não
interrompermos agora, eu sou capaz de tirar sua roupa aqui mesmo — brincou.
— Não...— resmungou a mais nova — Esperei cinco meses pra ter você
de volta, não faz assim.
— Não faz assim... Eu estou tão louca quanto você para isso. Mas,
depois matamos melhor nossa saudade, ok? Agora vem, vamos voltar pra festa.
— Eu vou te provocar durante toda a noite pra ver até onde você aguenta.
— Você não precisa fazer isso, os meus pensamentos já são o
suficiente.— Regina passou os dedos nos lábios de modo a limpar algum
possível borrado de batom e voltou para dentro com ela.


Após o retorno ao salão, as duas amantes beliscaram um pouco da
comida servida e beberam alguns copos de drinks sem álcool. Tentavam acalmar
os ânimos a todo custo. Afinal, foram cinco meses sem qualquer contato físico.

— Vem tirar algumas fotos, Jennifer!— gritou Kevin.
Ele e alguns colegas se divertiam em um espaço do clube que era
reservado para fotografias. Havia uma cortina ao fundo, uma caixa com
acessórios divertidos; incluindo máscaras, chapéus, plaquinhas divertidas, dentre
outros.
— Vai lá com seus amigos. Registra esse momento! Vou trocar algumas
palavras com meus ex colegas de trabalho enquanto isso.
A mais velha embarcou em uma conversa que não durou mais que
quinze minutos. Ao retornar, encontrou a jovem posando para mais uma foto.
Jennifer portava um chapéu, que mais parecia uma cartola, e uma gravata.
— Vem tirar uma foto comigo, Regina!— exclamou de onde estava. —
Eu tenho o acessório ideal pra você!
A mais velha uniu-se a ela e deixou que amarrasse uma máscara de
olhos em sua face. Ela era delicada, bem trabalhada e possuía um pouco de gliter
prateado.
A loira, por sua vez, tirou a cartola e se manteve com a gravata. Gravata
esta, que Regina segurou e puxou na hora da fotografia.
— Boa noite a todos!— Uma voz soou ao microfone. — Como estão
todos vocês? Espero que se divertindo muito! Me chamo Isadora, sou estudante
do terceiro ano e agora vou anunciar um dos momentos mais esperados de hoje:
o rei e a rainha da noite!
Gritos e aplausos foram ouvidos no lugar. Quase todos ali presentes se
dirigiram para frente do pequeno palco onde aconteceria a nomeação. O rei e a
rainha do baile de formatura fazem parte de uma antiga tradição do colégio, e
por vezes é o momento mais esperado da noite, perdendo apenas para a dança
romântica com o par.
— Por que não se candidatou à rainha? Tenho certeza que ganharia em
disparada.— Sorriu, acariciando carinhosamente os fios loiros da mais nova.
— Eu? Ah não, sem chance. Esse tipo de coisa não tem nada a ver
comigo. Mas é a sua cara! Aposto que nos tempos de escola você concorreu.
— Acertou! Fui rainha por dois anos consecutivos.
— Eu sabia! Realmente consigo imaginar você em um palco como
aqueles portando uma coroa na cabeça.
— É tão a minha cara assim?— perguntou enquanto carregava um
sorriso nos lábios.
— Totalmente — disse em resposta. Meireles também expressava um
sorriso.
— Era sempre muito especial pra mim. Me sentia imensamente
prestigiada pelo colégio.
— Aposto que todos queriam um momento pra dançar com você após a
nomeação. Os meninos deviam babar!
— Alguns, confesso. Mas eu não era de dar bola. Dançava apenas com
meu par da noite e com meus amigos. Foi uma época maravilhosa.
— Está se sentindo nostálgica?
— Um pouco, o tempo passa sem que nos demos conta. Deixou uma
agradável saudade.
— Isso foi há muito tempo, não sei com ainda lembra — brincou
Jennifer. — A propósito, você aniversariou nessa viagem, ficou ainda mais
velha. Já nasceram os cabelos brancos?
Meireles mexia nos cabelos castanhos da namorada em uma falsa
procura pelos fios brancos.
— Eu não tenho cabelo branco, ok?— resmungou com uma de suas
sobrancelhas arqueadas.
— Não precisa ficar preocupada, eu ainda vou te amar mesmo quando
sua cabeça estiver lotada deles.— Jennifer entrelaçou os dedos nos fios da
mulher, os jogou para trás e os observou retornarem para frente.
— Mesmo quando eu tiver rugas?
— Sim, mesmo quando você estiver cheia de ruguinhas — disse de
maneira carinhosa. — Amarei cada uma delas.
— Sei, eu só quero ver!— Riu.
— Você quer assistir a essa nomeação de rei e rainha?— perguntou ao
alternar o olhar entre o palco e Regina.
— Não faço questão. Nós sequer estamos prestando atenção.
— Que bom! Poderíamos fazer outra coisa enquanto estão todos
entretidos nisso.
— Na verdade... Eu estava querendo ir lá fora fumar um pouco. Estou
sentindo uma vontade absurda faz alguns minutos. Meu vício diminuiu, mas
ainda não consegui me livrar.
— Oh, tudo bem. Eu acompanho você.

Jennifer e Regina se direcionaram para o lado de fora e caminharam por
alguns poucos minutos pela rua do clube até alcançarem o veículo que estava
estacionado entre tantos outros. O carro da professora era o penúltimo, quase ao
fim da rua. De lá ela tirou sua carteira de cigarros e um isqueiro.
— Agora sim...— comentou após dar a primeira tragada e soltar a
fumaça para cima. A mais velha estava encostada no automóvel e Jennifer à sua
frente.
— Eu não deveria dizer o que vou dizer agora, mas... Você fica muito
sexy fumando.
— Eu deveria tomar como um elogio?
— Acho que sim. Quer dizer, não gosto que fume, não acho legal, mas
fica ainda mais desejável — comentou ao observar atentamente Regina. — Oh
droga, o que eu estou falando?— resmungou mais pra si que pra morena.
— Jen, não se preocupe. Eu entendi!— A mais velha soltou uma risada
ao ver a loira atrapalhada em suas palavras. — Meus pais vão te adorar. Você é
uma graça! A propósito, estão loucos pra te conhecer. Falei muito a seu respeito
e mostrei fotos.
— Sério?— comentou com empolgação. — O que falou a eles sobre
mim?
— Contei nossa história, tudo o que aconteceu e o quão adorável você
é.
— Eu não sou adorável, você mentiu pra eles.
— Teria mentido se dissesse o contrário. Você é uma mulher única.
— Nunca vou entender o que você viu em mim, Regina.
— Então deveria olhar mais vezes para dentro de si mesma e perceber o
quão interessante você é. Se bem que... Olhando para o lado de fora também
encontrará algo muito interessante — riu.
— Ainda bem que você gosta.— Sorriu. Jennifer aproximou-se da mais
velha ao perceber que o cigarro já estava no fim.
— Não gosto, eu amo — disse com firmeza na voz ao mirar de perto os
olhos da mais nova.
Regina apagou a ponta do cigarro no cinzeiro de bolso que havia em seu
carro e resmungou por não ter trazido nada no veículo que camuflasse o cheiro
de cigarro em seu hálito.
— Não se preocupe, acho que tenho algo aqui.— Meireles mexeu em
seus bolsos e de lá tirou uma pastilha de hortelã. — É a minha preferida —
comentou enquanto abria a embalagem e pegava uma unidade.
Jennifer depositou a bala na própria boca, deu alguns passos adiante
para se unir ao corpo da mulher e a beijou de maneira lenta, transferindo a
pastilha para ela.
— Faz parte da provocação? Porque se faz, obteve êxito.— Regina a
segurou na nuca e a tomou em um beijo lento, molhado, daqueles que torturam e
aquecem.
Suas línguas se acariciavam e se provavam entre gemidos abafados.
Estava imensamente difícil conterem o desejo em meio a um beijo tão
perfeitamente encaixado.
Com as bocas entreabertas, Regina provocava Jennifer com a ponta de
sua língua; ameaçando introduzi-la e recuando lentamente algumas vezes
seguidas. Sorrisos não largavam seus lábios. Aqueles momentos compartilhados
iam além de uma troca física de carinho e desejo; eles significavam uma nova
fase, uma nova chance, renascimento e liberdade. A união de suas bocas
anunciava a quebra de muitas barreiras.
— Você está ouvindo?— comentou a loira ao gesticular com o dedo pra
cima, interrompendo o beijo. O som da música havia se feito presente onde
estavam.
— Estou. Acho que a nomeação acabou.
— Sim! Vão liberar toda a pista de dança agora!— disse com
empolgação.
— Então vamos dançar!— Sorrindo, Regina ofereceu o braço para que
a mais nova pudesse encaixar o dela ali.

A música estava alta. Todos os alunos e alguns convidados extras
estavam reunidos no centro do salão. Em suas cabeças, alguns globos de luz
giravam dando mais diversão ao momento. E sob seus pés acenderam-se luzes
de led colorida na pista de dança.
— Eu amo essa música!— gritou Meireles. A loira sorria abertamente, a
felicidade não cabia em seu peito e transbordava por todos os lados.
Regina também se sentia imensamente feliz, principalmente por ter a
liberdade de ter um espaço na vida de Jennifer e poder compartilhar com ela
momentos como aquele. Finalmente ela e a loira poderiam ser um casal normal.
Pela primeira vez viveriam tudo o que antes lhes foi negado.
As duas mulheres gargalhavam e se acariciavam enquanto dançavam
todas aquelas músicas agitadas. Alguns olhares estavam sendo direcionados a
elas, mas não se importaram com quaisquer julgamentos que neles pudesse
conter. Apenas queriam viver aquele momento tão feliz de suas vidas.

— Ai! Não olha por onde pisa?— Uma voz soou atrás de Jennifer.
— Desculpe — respondeu ao virar-se, deparando-se com a imagem de
Estela.
— Ora, ora... Vejam só se não é o casal sensação!— Estela possuía
cinismo em sua fala.
— Que desprazer.— Jennifer murmurou a si mesma. — Sim, somos nós
— disse com firmeza na voz.
— Qual é a sensação de pegar a professora? Acho que ainda não
entendi bem. Ela te dava pontos extras?
— Eu não vou permitir que você fale assim com Jennifer!— Regina
elevou e engrossou a voz ao se direcionar à garota.
— Ela agora é a sua mãe também, Meireles? Não sabe se defender?
— Olha aqui, Estela! Isso tudo é dor de cotovelo porque eu não quis
você? Porque se for, já está na hora de passar. Ou eu deveria dizer que você se
balançava pela professora Vianna e agora não se aguenta de ciúmes?
— Você é louca! Não sabe o que está dizendo!
— Oh, pelo seu estado alterado eu acho que acertei em cheio, não foi?
— Vai se foder, Jennifer!
— Certamente ela vai, só que mais tarde.— Regina se manifestou de
maneira debochada, fazendo Estela sair pisando forte contra o chão.
— Eu adoro a forma como você irrita as pessoas com suas respostas
sem precisar ofendê-las.
— Não vale à pena se igualar a esse tipo.
— Essa garota é uma ridícula! Eu tenho tanta raiva dela, Regina. Se
dependesse da minha vontade eu a arrebentaria todinha.
— Ei, ei...— A morena segurou o rosto de Jennifer com as duas mãos.
— Já passou. Não deixe que uma pessoa sem importância como ela estrague a
sua noite.
— Hum... Vou tentar deixá-la pra lá. Mas se cruzar meu caminho
novamente essa noite, vou partir pra agressão física.
— Que loira mais furiosa eu tenho aqui.
— Você está debochando? Cuidado, que eu posso descarregar tudo em
você.
— Não estou debochando. E se quiser descontar, vai em frente. Seria
um prazer ter você raivosa em cima de mim.
— Você gosta de mulheres raivosas sobre você?— Jennifer enlaçou a
cintura da mulher com seus braços e a olhou dentro dos olhos.
— Amo — respondeu com um sorriso sacana nos lábios.
Antes que o clima entre elas esquentasse novamente, uma nova música
começou a tocar no ambiente. Havia chegado o momento dos pares unirem seus
corpos para uma dança lenta. Era costume que todos os casais se beijassem em
algum momento antes do final da canção. Esse costumava ser o momento onde
os sentimentos e declarações vinham à tona.
A mais velha depositou os braços sobre os ombros de Jennifer e uniu
delicadamente sua testa à dela. Seu corpo e o da jovem se movia com leveza,
suavidade, seguindo o ritmo da melodia. Regina sentia o próprio coração
batendo descontroladamente dentro do peito. Era quase sempre assim quando
tinha a loira tão próxima de seus braços.
— Estou tão feliz que esteja aqui. Tão feliz...— murmurou com a boca
a poucos milímetros da boca de Regina.
Aquela noite estava proporcionando tanta felicidade, que Jennifer não
estava conseguindo conter. Ela sentia como se o seu corpo fosse explodir e se
transformar em poeira estelar.
— Não houve um dia em que eu não pensasse em você e desejasse estar
assim como agora — disse ao roçar a ponta do nariz contra o da mais nova. —
Ainda não sei como suportei a distância. Acho que meu combustível era saber
que toda a espera valeria à pena.
— Você ainda me ama do mesmo jeito de quando partiu? Não conheceu
nenhuma italiana charmosa e se encantou por ela?— Jennifer arrancou um riso
da mais velha com a última frase.
— Conheci muitas italianas charmosas, mas elas não me encantaram
como você.
— Regina!— Jennifer deu uma tapa no ombro da mulher.
— Ei! Isso machuca!— reclamou em tom de brincadeira. — Eu estou
brincando, sua boba. Não havia italianas charmosas, e eu te amo ainda mais que
antes.
— Hum... Sei.— Meireles esboçou um pequeno sorriso bobo. — Eu
quero fazer tantas coisas com você! Quero ir ao cinema, viajar, passar tardes de
domingo juntas, tirar fotos de casais naquelas cabines fotográficas, comemorar o
dia dos namorados, te fazer bolos nos aniversários, namorar debaixo das
cobertas, assistir ao pôr do sol, sair pra jantar.
— Comer uma enorme porção de algodão doce de uma só vez, inventar
sabores de pizza que não existem..
— Isso também!— Riu. — Você nunca vai esquecer esse dia da pizza,
não é?
— Não mesmo.— Sorriu.
— E você, Regina? Tem algo que queira muito fazer comigo?
— Sim! Além de te acompanhar em todas as suas lutas de boxe, quero
poder fazer muitas viagens e compartilhar vivências novas com você. Quero
experimentar um pouco de tudo ao seu lado.
— Eu também gostaria disso. Espero ser sempre o que você quer e
precisa, e que nossa diferença de idade nunca se torne um problema.
— Você sente muita insegurança por ser tão mais nova, não sente?
— Às vezes, sim. Você nunca esteve com um alguém tão mais novo,
não é?
— Nunca. As mulheres costumavam ter minha idade, e os homens
quase sempre eram mais velhos.
— Quando você cita que se relacionou com homens é engraçado. Às
vezes eu esqueço.
— Incomoda a você?— perguntou suavemente.
— Não, de maneira alguma. Eu apenas esqueço, pois você é tão...
Lésbica.— Riu.
— E o que seria ser tão lésbica pra você?— perguntou curiosa.
— É, você sabe...
— Não, eu não sei. Por que não me diz?
— Hum... É que você tem tanto desejo por mim e tem um domínio
maravilhoso na cama — respondeu. — Não era exatamente isso que eu queria
dizer, mas acho que você entendeu.— Sorriu sem jeito.
— Não sei se isso teria a ver, mas eu me sinto muito mais atraída por
mulheres — explicou. — E você? Sempre foi apenas meninas?
— Sim. Eu sempre me achei diferente e os meninos nunca me
interessaram. Eu já beijei alguns, mas nunca foi o que eu gostava.
— Cem por cento sapatão, então — brincou a mais velha, arrancando
um riso da namorada. — Adoro ver você assim, feliz. Nossa despedida foi
péssima. Passei meses com a última lembrança que tive sua.
— Foi muito difícil pra mim. Doeu tanto... — suspirou. — Não quero
me sentir daquela forma nunca mais. Espero que nosso caminho seja mais fácil a
partir de agora. Eu te amo tanto, Regina.— Jennifer apertou as mãos no quadril
da mulher e alternou o olhar entre seus castanhos e boca.
— Eu amo te ouvir dizer meu nome, soa doce e provocante ao mesmo
tempo.— Regina cruzou os braços na nuca da jovem e a puxou lentamente para
um beijo carinhoso, pressionando os lábios contra os delas muitas vezes
seguidas, parando apenas quando a música chegou ao fim. — E eu amo
imensamente você — disse por fim.
— Acho que já permanecemos tempo demais nessa festa — murmurou
Jennifer.
— Concordo plenamente.— Regina esboçou um curto sorriso de lado.
— Havia combinado com meus amigos de nos reunirmos para uma pós
festa. Mas, devido à nova situação, acredito que eles compreendam se eu
desaparecer com você.— Sorriu.

As duas mulheres saíram de mãos dadas do clube, entraram no carro e
seguiram destino à casa de Regina. Chegando ao imóvel, Meireles foi recebida
por Bóris, que roçava entre suas pernas.
— Oi, amigão! Que saudades de você!— disse de maneira carinhosa ao
tomar o gato em seus braços. — Como foi o passeio até a Itália, hein? Você está
chique, bichano! Eu nunca nem saí da cidade!— comentou enquanto interagia
com ele.
— Bóris disse que também sentiu sua falta, que os seus braços é o
melhor lugar pra se estar, e que ele não os trocaria por país algum.
— Oh, eu estou tão importante assim?— Sorriu.
As duas mulheres deixaram os saltos na área de serviço e seguiram para
a cozinha. Durante o trajeto Bóris as acompanhou com seu rabo erguido. Ele era
um gato extremamente charmoso e possuía mistério em seus olhos âmbar.
— Ignore a bagunça da casa, ainda não tive tempo de arrumá-la.
— Bagunça? Onde?— comentou ao olhar para os lados em uma falsa
procura. — Sua casa está impecável como sempre. Não tem uma agulha fora do
lugar.
— Se você observar bem irá encontrar. Tem muitas coisas fora de
ordem.
— Então espera até você ver o meu quarto, aposto que cairia pra trás.
— Você é muito bagunceira?— perguntou enquanto abria a geladeira.
— Um pouquinho.— Riu. — O que você está pegando aí? — perguntou
ao vê-la sutilmente inclinada.
— Um aniversário não é um aniversário sem um bolo, certo?—
respondeu ao tirar uma torta da geladeira. — A fiz com minhas próprias mãos —
disse ao depositar sobre a bancada da cozinha e tirar a cúpula de proteção que a
recobria. — É uma receita italiana, se chama torta caprese.
Jennifer sorriu de orelha a orelha ao observar o quão atenciosa a morena
era. Até mesmo velas ela havia comprado e depositado de forma espalhada sobre
a torta.
— Agora faça um pedido em silêncio!
— Hum...Ok!— Meireles fechou os olhos por breves segundos, pensou
em seu desejo e assoprou as velas. — Espero que se realize — comentou com
esperança.
— Você me conta o que foi quando realizar?
— Conto, sim.— Sorriu. — Agora vamos provar essa... Como é mesmo
o nome?
— Torta Caprese.
— Isso, torta Carprese! Achei muito chique.
— É Caprese, Jen — corrigiu ao soltar um pequeno riso, rindo da
graciosidade da loira ao tentar pronunciar a palavra italiana.
— Que seja — disse ao dar de ombros.
Regina partiu duas fatias e as depositou em dois pratos de sobremesa.
— O que achou?— perguntou ao observar a mais nova provar um
pedaço.
— Acho que quero passar o resto da minha vida provando as coisas que
você faz. Ta muito bom!
— Isso é um alívio. Fiquei meio receosa quanto a não ser uma receita
tradicional. Fico feliz que tenha gostado, é uma das minhas tortas favoritas.
Meireles levou mais um pedaço do doce à boca, depositou o prato sobre
a bancada e uniu o corpo ao de Regina.
— Obrigada por isso. Obrigada por ser tão carinhosa e atenciosa comigo.
Hoje é um dos dias mais felizes da minha vida. Eu não conseguiria por em
palavras tudo o que estou sentindo no dia de hoje, mas eu consigo dizer que meu
amor por você é tão grande, que eu esperaria o tempo que fosse pra te ter uma
vez mais. Nem que fosse pela última vez.
— Me esperaria nessas circunstâncias? Mesmo se só tivéssemos mais
um momento juntas? Por quê?— perguntou suavemente ao acariciar as ondas
douradas de Jennifer.
— Porque estar com você, mesmo que por poucos instantes, vale
qualquer espera. Não há preço que pague sentir seu cheiro e a sua pele.
— Dessa forma eu vou me apaixonar ainda mais por você, garota.
— Garota? Fique você sabendo que completei dezenove anos.
— Sim, garota.— A morena implicou. — Não gosta de ser a minha
garota, hum?
— Talvez. É, talvez eu goste sim de ser a sua garota. Maaaas, só um
pouquinho.— Jennifer se segurava para não sorrir. Ela detestava dar o braço a
torcer.
— Quer beber uma taça de espumante comigo?— ofereceu a mais
velha.
— Não precisa nem perguntar duas vezes.— Sorriu.
Regina estourou a garrafa de champanhe e depositou o líquido em duas
taças compridas de vidro.
— Vamos fazer um brinde a nós?— disse ao tomar uma das taças em
mãos e aproximar-se da mais velha.
— A nós!— Regina sorriu e encostou a taça contra a da namorada. — Eu
tenho presentes pra você lá em cima. Vamos subir?

A aniversariante pegou a garrafa de espumante e subiu com ela para o
quarto de Regina. Cada mulher ainda portava sua taça em mãos. Chegando lá,
Jennifer se deparou com algumas bolsas ao pé da cama.
— Comprei pra você enquanto estive na Itália.
— Meu Deus, Regina! Tudo isso?— exclamou enquanto abria as
bolsas.
— Não tem muita coisa aí, Jen. Mas espero que goste de tudo. Foi
escolhido com muito carinho — disse com ternura na voz.
A mais nova verificava todos os presentes enquanto bebia o champanhe
com Regina. Dentro das bolsas havia coisas distintas; indo de tênis esportivo
para os treinos a objetos decorativos inspirados na cultura italiana.
— E então, como fiquei?— perguntou ao experimentar um boné em
frente ao espelho que havia no quarto.
— Um charme!— respondeu com um brilhante sorriso. Ela muito
apreciava quando a loira usava esse tipo de acessório. Sendo assim, não resistiu
em trazer um de presente.
— Olha... Eu não sei se foi a bebida ou se a temperatura subiu, mas
comecei a suar de repente — comentou ao tirar o boné e devolvê-lo para uma
das bolsas.
— Você quer que eu ligue o ar condicionado?
— Oh, não precisa, o calor está agradável, diferente.
— Diferente?
— Sim. Acho que realmente foi o espumante — respondeu ao abrir os
primeiros botões de sua camisa branca e receber a atenção dos olhares da mais
velha.
Regina caminhou até a loira e depositou sutilmente as mãos sobre seu
blazer.
— Por que você não o tira, hum?
— Gostaria de me ver sem?— instigou.
— Sim. Estou há horas querendo ver você sem ele. Tira pra mim.
Meireles esboçou um pequeno sorriso sacana e deslizou o blazer para
fora de seu corpo, ficando apenas de calça e sua camisa branca parcialmente
aberta.
— Estou melhor assim?
A morena a olhou de cima a baixo e esboçou um curto sorriso de lado
ao mesmo tempo em que acenou positivamente com a cabeça.
— Comprei um top preto lindo pra você usar nos treinos. Eu não me
importaria se você o experimentasse pra mim agora.— Regina sugeriu.
— Eu faço o que você quiser, mas com uma condição.
— Qual?
— Que você me deixe sentir o gosto do champanhe na sua boca.
— Por quê?— A mais velha instigou Jennifer a falar. Ela gostava de
ouvir todos os detalhes vindos da boca da loira, a estimulava.
— Porque é muito mais gostoso assim.— Jennifer pegou uma das taças
que havia sido deixada de lado, aproximou-se de Regina e a entregou.
— Não faz assim comigo. Estou no meu limite a noite inteira.— A
professora sorveu o líquido e travou seu olhar nos olhos que a encaravam.
— O que eu mais quero é te ver perdendo esse limite.
Meireles mordeu o lábio inferior de Regina e o puxou delicadamente
para logo em seguida iniciar um beijo lento, movimentando suavemente sua
língua na boca de sua mulher e provando o gosto do álcool que ainda residia ali.
Regina não conteve um gemido abafado contra aqueles lábios. Todo seu corpo
pedia uma entrega.
— E o que eu quero é ver você na minha frente, se exibindo pra mim.—
Regina interrompeu o beijo, sentou-se na beira da cama com as pernas cruzadas
e sua taça de espumante em mão. Seu olhar sobre Jennifer estava intenso e
dominador, acompanhando cada mínimo movimento que a jovem fazia.
Sem quebrar o contato visual com Regina, a loira abriu um por um dos
botões de sua camisa e a jogou em um canto qualquer. Ela conseguia sentir a
energia que vibrava naquele par de olhos castanhos que a encarava com desejo.
A morena observou Jennifer se livrar do sutiã e vestir-se com a peça
que ganhara de presente. O top era justo e deixava todo o abdômen definido da
loira à mostra. Antes de se levantar e caminhar até a namorada, Regina deixou
uma playlist tocando em seu celular e apoiou a taça sobre o criado mudo.
— O quê achou?— perguntou ao sentir o calor do corpo da morena em
suas costas.
Regina segurou os cabelos de Jennifer com a mão esquerda e os colocou
para o lado de modo a deixar a nuca da mais nova de fora.
— Linda. Você é linda, meu amor — murmurou ao pé do ouvido,
causando arrepios naquela pele clara que tanto sentiu falta de tocar. — Acho que
devíamos começar com aquela brincadeira — comentou ao envolver a cintura de
Jennifer por trás.
A jovem pôs um dos braços pra trás e alcançou a nuca da morena.
— Qual?— perguntou ao virar sutilmente o rosto para o lado.
— Aquela onde minha mão desliza para dentro da sua calcinha —
respondeu ao mesmo tempo em que abriu o zíper da calça.
— Hum... Então agora você quer brincar disso?— comentou enquanto
sentia a mão da mais velha entrando em contato com seu sexo.
— Sim. Agora eu quero — respondeu ao depositar a mão sutilmente
entre as pernas de Jennifer e iniciar um estímulo naquela região.
— E se agora eu não quiser mais?— provocou, contendo-se para não
deixar transparecer o prazer que estava sentindo com aquela massagem.
— Então você vai ter que me pedir pra parar.— Ainda com os cabelos
de Jennifer em suas mãos, Regina começou a distribuir algumas mordidas no
pescoço, nuca e ombros. — Estou louca pra fazer amor com você de novo —
disse roucamente entre as mordidas.
— Porra Regina, você pega pesado.
— Porra Regina — disse a mais velha, repetindo o que a loira dissera.
— Falando meu nome assim, me enche ainda mais de desejo.
— Você continua suja como sempre — comentou ao virar de frente para
a mulher. A voz da loira entregava seu desejo.
— Shhh...— A morena largou os fios loiros e depositou dois dedos
sobre os lábios rosados à sua frente. — Cala a boca, pois eu sei que você gosta
— disse sensualmente.
— Não me manda calar a boca, que isso me enlouquece.— Jennifer
mordeu as pontas dos dedos de Regina e os umedeceu sutilmente com a ponta da
língua em um gesto provocativo.
— Você sabe que hoje eu vou querer sem pausa, não sabe?— comentou
ao guiar o corpo da loira e encostá-la contra um móvel de madeira.
— Então você já pode começar.— Meireles segurou a mão da mais
velha e a colocou novamente dentro da sua calcinha, pressionando.
— Como você é gostosa...— murmurou com o rosto mergulhado no
pescoço da jovem enquanto deslizava o dedo do meio por entre o sexo de
Jennifer.
— Como eu senti falta disso, você faz tão bem...— Meireles percorria
as mãos por todos os lugares que conseguia alcançar, deliciando-se com todas as
curvas do corpo da mulher.
— Eu passaria meus dias aqui, provando você com meus dedos.
Regina ajudou Meireles a livrar-se da calça, do top, e posteriormente
voltou a deslizar a mão para dentro da calcinha. Agora ela alternava entre
acariciar a intimidade da namorada e apertar um dos seios enquanto fazia
pressão com o corpo.
As mãos ágeis de Jennifer encontraram o extenso zíper que havia nas
costas do vestido da mulher e o puxou, fazendo a roupa de Regina deslizar entre
as pernas. Ela começou a perder o controle sob os estímulos da mais velha entre
suas pernas e a puxou para um beijo voraz. As bocas se buscavam, se beijavam e
se mordiam em um nítido reflexo do desejo que lhes habitava.
A vontade de se fundirem e provarem do íntimo uma da outra era tanta,
que seus corpos não conseguiam ficar parados. Elas saíram da cômoda, fizeram
uma pausa na parede e agora estavam em uma cadeira executiva que havia no
quarto. Jennifer sentou-se e recebeu o corpo de Regina de frente sobre o seu. A
morena estava com uma perna para cada lado, em um encaixe perfeito com a
parceira.
Meireles uniu os dois seios de Regina, que ainda estavam cobertos pelo
sutiã, e os beijou. Sua língua passeou entre o vão entre eles e subiu por toda pele
do pescoço da mulher, tornando Regina extremamente ofegante.
— Saudade da sua boca neles — sussurrou em um pedido para que a
jovem tirasse seu sutiã. E assim ela o fez; abriu a peça e depositou seus lábios e
língua nos mamilos já enrijecidos.
Regina segurou a parte de trás dos cabelos da loira enquanto a sentia
trabalhar em seus seios. A jovem alternava entre brincar com a língua e chupá-
los.
— Gostosa! — disse Jennifer, segundos antes de capturar os lábios de
Regina em um beijo curto.
A loira observou a mais velha sair de seu colo e ajoelhar-se à sua frente.
E antes que pudesse se perguntar o que ela faria, a sentiu afastando sua calcinha
e depositando a língua em sua intimidade.
Jennifer segurou firme nos braços da cadeira e jogou a cabeça para trás.
Os movimentos que Regina fazia a estavam levando à loucura. Ela subia e descia
com a língua por todo seu sexo, depositando alguns beijos e também mordidas
na região. E quando pediu para que Regina a chupasse, quase teve um orgasmo
com a intensidade depositada na execução.
Após dedicar-se um tempo entre as pernas de Jennifer, Regina começou
a fazer o caminho inverso. Ela desceu os lábios pela perna da loira até chegar a
seu pé. A morena o segurou e o esfregou eroticamente contra seu rosto.
Na posição em que estava, Meireles olhava para baixo e se deliciava
com a figura de Regina deslizando a língua por todo ele e beijando. Nas vezes
anteriores em que fizeram amor ela já havia observado que a morena se
demorava bastante nessa região. No entanto, hoje ela estava ainda mais
dedicada.
Jennifer sorriu, levantou-se da cadeira e depositou as mãos nas alças da
própria calcinha em um gesto de que iria retirá-la, porém, quando ia fazê-lo, foi
barrada.
— Nem pensar. Eu não vou deixar você fazer isso. — Regina a
interrompeu. — Essa parte é a mais gostosa e você não vai tirar de mim esse
prazer.— A mais velha segurou a calcinha da loira com força e ela própria a
puxou de maneira agressiva pra baixo.
— Eu não te dei permissão pra tirar — provocou.
— E desde quando eu preciso da sua autorização? — disse séria em um
tom provocante. Ela sabia o quanto suas palavras poderiam enlouquecer a
namorada.. — Sabe que eu faço o que eu quiser com você entre quatro paredes.
Jennifer adorava entrar naqueles jogos com Regina. Ela sentia que seria
capaz de atingir o orgasmo apenas com as palavras da mulher.
— Como você é cachorra, Regina.
— A cachorra aqui é você.— Regina caminhou até a cama e apoiou as
costas sobre enormes almofadas, ficando parcialmente na horizontal. — Agora
seja obediente e vem por cima de mim.

Jennifer mordeu o lábio inferior ao avistar a expressão sacana que a
morena esboçava enquanto a olhava. Ela caminhou lentamente até a cama, se
inclinou e subiu. Feito isso, obedeceu e foi até Regina com a palma das mãos e
os joelhos sobre o colchão. Quando Jennifer chegou à altura das pernas da
mulher, a mais velha a viu jogar os cabelos dourados para trás de maneira
sensual e os viu retornarem para frente formando graciosas camadas em questões
de segundos.
Assim que Meireles já estava inteiramente sobre a altura de seu corpo,
Regina deslizou a mão por todo aquele abdômen duro e alcançou o sexo da loira.
Com a mão livre, segurou-a no quadril e a fez sentar-se sobre sua mão.
— Rebola pra mim? — pediu.
Jennifer se inclinou pra frente, depositou as mãos nos ombros de Regina
e começou a rebolar de maneira provocante sobre ela. Seu quadril se
movimentava para frente e para trás. Entre um movimento e outro, ela abaixava
o rosto até a altura da face da mulher e murmurava algumas palavras para ela.
— Me deixa te sentir dentro de mim.
Assim que murmurou o pedido, Jennifer sentiu a mulher penetrá-la.
Nesse momento, gemer foi involuntário, uma vez que já estava quase explodindo
de desejo. Os movimentos sobre a mulher tornaram-se mais intensos e precisos.
Seu corpo se mexia de acordo com o vai e vem dos movimentos de Regina.
A mais velha apertava a coxa e a bunda de Jennifer enquanto a
estimulava a rebolar sobre ela. O peso da loira sobre sua mão deixava os
movimentos mais limitados, porém, não menos prazerosos. Ela não conteve a
vontade e deslizou o segundo. Agora ela sentia o sexo de Meireles molhar,
englobar e apertar seus dois dedos.
Os gemidos de Jennifer começaram a se tornar audíveis. Ela fazia
conexão visual com os castanhos de Regina ao mesmo tempo em que ia para
frente e para trás.
— Que delícia, amor — disse em uma das vezes em que alcançou a face
da mulher.
Regina esboçou um sorriso sacana e inclinou a cabeça para frente de
modo a observar o movimento de seus dedos. O prazer visual que sentiu com a
cena potencializou ainda mais seus desejos, a fazendo empurrar o corpo da loira
para trás e montar sobre ela.
— Não...— resmungou quando os dedos da mulher deslizaram pra fora.
— Shhhh. — Regina circundou os lábios de Jennifer com o polegar. —
Não acabou, eu só quero que você sinta o quanto me deixa molhada. — A
morena encaixou-se entre as pernas da jovem e uniu sua intimidade à dela.
— Regina...— gemeu ao sentir a professora colar e esfregar o sexo ao
dela.
Ambas estavam tão úmidas, que deslizavam deliciosamente uma na
outra, emitindo um baixo som que as deixava ainda mais excitadas.
— Porra, que gostosa...— murmurou ao levar os lábios até o ouvido de
Jennifer, referindo-se à intimidade macia e deslizante que ela tinha.
— Você gosta? — Jennifer a instigou.
— Gosto, me enlouquece de tão gostosa — disse com rouquidão. A voz
rouca de Regina possuía efeito afrodisíaco sobre Meireles.
— Porra, não fala assim...— A voz de Jennifer saiu manhosa. — Sou
capaz de gozar só em ouvir você.
— Então se permita. Tenho todo o tempo do mundo pra fazer você
gozar várias vezes pra mim hoje.
Ambas rolaram por cima da outra por entre os lençóis e iniciaram uma
troca agressiva de beijos, arranhões e mordidas. Regina mordia o maxilar,
pescoço e ombros de Jennifer enquanto esta arranhava sua nuca e costas com
força. Alguns puxões de cabelo também estavam inclusos na troca selvagem de
carícias.
Regina enlaçou as pernas na cintura de sua namorada e agarrou firme na
parte de trás dos cabelos loiros enquanto a sentia preenchendo seu interior. Ela
estava tão excitada, que pediu para a loira iniciar com força.
— Isso Jen, assim!— disse ofegante. Ela fechava as pernas com cada
vez mais força na cintura da jovem enquanto apertava seus cabelos. — Quero
sentir você me invadido com força.
Meireles movimentava o corpo contra o da mulher de modo a fazer seus
dedos entrarem e saírem com mais pressão.
— Você é uma vadia, Regina Vianna.
— Sou? Então me fode como uma — disse ao expressar o sorriso mais
promíscuo de todos.
— Vou fazer exatamente do jeito que eu sei que você gosta.— Jennifer
a pegou no colo, a manteve com as pernas em sua cintura e a encostou contra
uma das paredes do quarto. Essa era uma das posições favoritas da mulher.
Suspensa nos braços de Jennifer, Regina fazia contato visual com a
mais nova enquanto a sentia trabalhando entre suas pernas. A frieza da parede na
pele de suas costas serviu como um estímulo a mais para o prazer. Ela muito
apreciava os mais diversos estímulos sensoriais em sua pele.
— Não para!— exclamou ao fincar as unhas próximo ao ombro de
Jennifer, que abriu um sorriso sacana e permaneceu penetrando-a sem pausa.
Seus dedos se permitiam ir repetidas vezes até onde conseguia alcançar.
Eles já estavam inteiramente molhados da umidade de Regina, o que permitia
um deslize ainda melhor.
— Você gosta assim, hum?— perguntou ao empurrar com força,
arrancando gemidos em resposta.
Regina alternava entre pedir por mais e distribuir arranhões com
apertos, deixando-a completamente vermelha. Os movimentos tornaram-se tão
rápidos e fortes, que uma deliciosa ardência se fez sentida entre suas pernas.
Quanto mais arranhões levava, ainda mais excitada Jennifer se sentia.
Ela podia chegar ao ápice ali mesmo. Provar sua mulher ao mesmo tempo em
que sentia a pele arder àquelas unhas era extasiante.
Alguns minutos além, quando o desejo já estava lhe consumindo,
Meireles desceu a mais velha de seus braços, mas a manteve contra a parede. Ela
precisava senti-la diretamente com a boca.
— Jennifer...— gemeu ao sentir a boca da loira chupando entre suas
pernas sem quaisquer cerimônias.
Regina estava ofegante e não conseguia raciocinar com clareza. O único
pensamento que vinha em sua mente era a respeito dos prazerosos movimentos
recebidos em seu sexo. Movimentos esses, que a fazia morder os lábios de
prazer.
— Jennifer, Jen...
Assim que Meireles sentiu o corpo da mulher se tornando trêmulo,
alcançou seus lábios e a fez provar do próprio gosto, iniciando com ela um beijo
inteiramente erótico e voraz. Suas bocas se buscavam com desejo enquanto suas
mãos exploravam os corpos suados e quentes.
Jennifer e Regina percorreram pontos distintos do quarto sem
interromperem o elo do beijo. Ora a loira prendia a mais velha contra a parede,
ora Regina encurralava a jovem contra algum móvel. Objetos iam ao chão
enquanto guerreavam pelo domínio do prazer.

— Toma um banho comigo?— murmurou Regina entre o beijo.
— É apenas banho ou você quer algo mais?— perguntou ao semicerrar
os olhos.
— Na verdade é uma desculpa pra encurralar você no meu box.
— Hum... E o que você vai fazer comigo quando eu estiver lá?
— Nada que você não irá gostar.— Sorriu.

A água morna do chuveiro caía e banhava os dois corpos nus,
proporcionando a eles ainda mais sensibilidade. Seus seios roçavam-se uns nos
outros provocando arrepios por todo o corpo. O beijo era lento, assim como as
carícias que compartilhavam. Meireles depositou as mãos nos fios molhados de
Regina e os jogou para trás de modo a ter total visão do rosto da mulher.
— Você é linda — disse ela, recebendo um lindo sorriso em resposta.
Regina depositou uma mínima quantidade de sabonete líquido em sua
mão, espalhou contra a outra e começou a massagear lentamente o corpo de
Jennifer. Ela deslizou as mãos pelos ombros, braços, abdômen, coxas, bunda e
seios da jovem, demorando-se aqui. A morena depositou cada mão em um peito
e os massageou, fazendo a mais nova soltar baixos gemidos.
— Você gosta?— perguntou sensualmente.
— Sim...— respondeu ofegante.
— E quando eu faço assim?— A morena apertou com suavidade os
mamilos rígidos entre o polegar e o dedo indicador, provocando uma gostosa dor
em Jennifer, a fazendo soltar um gemido de prazer.
Quando a água caiu sobre o corpo da loira, Regina traçou um caminho
com a língua pelos seios da mulher e brincou com os mamilos molhados,
chupando-os com força.
A playlist que a mais velha colocara pra tocar ainda envolvia o
ambiente, proporcionando a elas uma atmosfera ainda mais sedutora e
envolvente. O olhar castanho se fazia forte, intenso, penetrante e vívido. E
Jennifer estava adorando absorver toda aquela energia e desejo.
Regina guiou o corpo da loira com o dela e a fez encostar contra o vidro
embaçado do box. Feito isso, uniu e ergueu os dois braços da jovem acima de
sua cabeça de modo a deixá-la imobilizada.
— Diz pra mim o que você quer eu faça.
— Eu quero você dentro de mim.
— Você me quer dentro de você? Te preenchendo em um vai e vem
gostoso? Então diz o meu nome.
— Vem, Regina — chamou ao dobrar e apoiar uma das pernas na
cintura da morena
Regina massageou o ponto de prazer de Jennifer com o polegar e em
seguida deslizou dois dedos, fazendo a loira se desmanchar em um gemido
arrastado bem próximo a seus lábios.
— Geme Jen, geme pra mim.— Ela distribuía beijos no pescoço de
Jennifer ao mesmo tempo em que mexia seus dedos com maestria dentro dela.
A loira gemia de maneira ofegante. Ela soltou-se da mais velha,
depositou as mãos em suas costas e a puxou ainda mais pra si, causando uma
sensação eletrizante com o choque de seus corpos.
— Você me fode tão gostoso, Regina.
— Vem, vem pra mim — sussurrou contra o ouvido.
A professora apertava a coxa suspensa da namorada e fazia pressão com
o corpo na tentativa de ir mais fundo e com mais força. Os dedos molhados
entravam e saíam de maneira incessante, fazendo Jennifer ir ao delírio com as
estocadas. Regina gemia de prazer ao sentir aquela intimidade se contraindo ao
redor de seus dedos.

Os gemidos da loira começaram a se tornar constantes, assim como os
de Regina, que gemia baixo e abafado ao escutá-la. Suas unhas cravaram nas
costas da mais velha com tanta força, que deixou linhas vermelhas. Meireles
estava em órbita tamanho era o prazer que sentia. Um pouco mais de força e
certamente as costas de Regina sangrariam. Controlar-se era algo que não sabia
fazer quando se tratava do sexo com aquela mulher. E Regina muito apreciava
que a loira não tivesse pudores. Bater, arranhar e gritar possuía passe livre.
A mão que apertava a coxa de Jennifer, agora, estava em seu pescoço.
Essa foi a maneira que Regina encontrou para conseguir conter a grande
excitação que tomava conta de seu corpo e mente. Estar dentro de sua mulher era
tão gostoso, que teria seu segundo orgasmo naquela noite.
Jennifer, ao sentir a mão de Regina em seu pescoço, chegou à beira de
explodir. Palavras desconexas começaram a sair de sua boca, assim como um
gemido que mais parecia um choro. A música ao fundo, a água do chuveiro, os
murmúrio de Regina, os atritos de suas peles e o aroma local se fundiram e
tornaram-se um só quando Jennifer atingiu seu limite máximo de prazer, assim
como sua parceira.
As duas se buscaram para um beijo lento e carinhoso, se dando tempo
para que recuperassem as forças antes de darem continuidade. Poucos minutos se
passaram e Regina já estava aprofundando as carícias novamente. O tempo longe
de Jennifer a deixara insaciável.
— Quero compensar todo o tempo que passamos longe — disse ao
olhar no fundo das íris verdes.
— Ainda estou com tanta saudade, Regina..
— Eu também, meu amor. Muita...— A mais velha distribuiu beijos
pelo maxilar, pescoço e ombros de Jennifer.
— A gente não quer mesmo tomar banho agora, não é?— comentou a
loira, arrancando um riso baixo da parceira.
— Não mesmo — concordou com rouquidão em sua voz.
Meireles ergueu Regina, a fez abraçar sua cintura com as pernas e a
levou para fora do banheiro, jogando-a molhada sobre a cama. Ela sentou-se
sobre a mulher com uma perna de cada lado e a segurou pelos pulsos,
imobilizando-a.
— Quer sem pausa a noite inteira? Então terá que me deixar excitada o
suficiente pra isso. — sussurrou a loira após abaixar a cabeça e morder o lóbulo
da orelha de Regina. Suas ondas douradas estavam esvoaçantes .
— Isso é um desafio, garota?
— É. Será capaz de cumprir?— Jennifer provocou.
— Hum... Não sei. Eu tenho uma posição nova pra brincar com você
hoje. Quer?
— Oh porra, já me excitou.



Capítulo 36

Era onze e trinta e cinco da manhã do dia seguinte. As duas mulheres
dormiam nuas enroscadas uma na outra e entre os lençóis quando despertaram
juntas após sentirem um movimento abrupto sobre seus corpos. Bóris
simplesmente havia entrado no quarto e saltado sobre elas.
— O que houve?— Jennifer resmungou baixinho enquanto abria os
olhos lentamente.
— Esqueci de trancar a porta do quarto. Bóris consegue saltar sobre a
maçaneta e abri-la. Provavelmente ele acha que já dormimos demais —
comentou ao observá-lo.
— Que horas são?— Meireles tateou o criado mudo até encontrar o
celular. — Caramba, já é quase meio dia! Obrigada por me acordar, bichano.
Não tenho a menor pretensão de gastar meu dia dormindo.
Bóris emitiu um miado como se tivesse entendido o que a loira dissera.
— Bom dia...— Regina virou o corpo e o depositou parcialmente sobre
o de Jennifer, apoiando a mão sobre o peito da loira.
Meireles depositou o olhar para baixo e alcançou os intensos olhos
castanhos que a encarava. Sorrir se tornou inevitável ao avistar a cara de sono de
Regina. Seus cabelos estavam bagunçados e já não havia quaisquer vestígios de
maquiagem em sua face. Jennifer muito apreciava vê-la ao natural, e apreciava
ainda mais poder amanhecer ao lado dela. Havia contado nos dedos as vezes em
que pôde presenciar um momento assim.
— Muito bom dia — disse sorrindo, com a voz arrastada, segundos
antes de alcançar e selar os lábios nos da mulher por breves segundos.
— Aconteceu alguma coisa?— perguntou a mais velha ao observar a
loira franzindo o cenho ao se mexer, como se algo a incomodasse.
— É que... Estou me sentindo um pouco dolorida.
Regina expressou um baixo riso e se pronunciou.
— Acho que foi a noite de ontem. Achei que seu corpo já fosse
acostumado, Jennifer. Afinal, você é uma boxeadora— zombou.
— Acho que foi aquela nova posição — brincou.
— Ontem você não estava reclamando.— Regina arqueou uma das
sobrancelhas ao olhar para a jovem. A mais velha possuía um sorriso contido no
canto dos lábios.
— E não estou reclamando agora, foi apenas um comentário, ok? Eu
suporto muito mais que isso — disse, arrancando um riso da morena. — Você
está cem por cento? Nem uma dorzinha no corpo?
— Eu estou toda dolorida!— Riu. — Apenas não ia admitir isso.
— Por que não? Ah! Já sei! Pra que eu não te chamasse de velha?—
implicou.
— Você está muito cheia de gracinhas, dona Jennifer.
— Eu estou feliz, é diferente.— Meireles sentou-se com as pernas
cruzadas e segurou na mão de Regina, a chamando para sentar-se em seu colo
com as pernas prezas em sua cintura.
Regina percorreu os ombros de Jennifer com as mãos e fechou os
braços em seu pescoço, assim como as pernas nas costas da jovem.
— Você acha que isso é tão errado? Nós?— perguntou ao envolver a
fina cintura da mais velha.
— Olha... Eu acho que é um amor bem bandido — disse ao segurar o
riso que teimava em sair de seus lábios.
— Sério?
— Não — respondeu suavemente ao balançar a cabeça e sorrir. — Nós
temos todo o direito de vivê-lo.
Meireles abriu um largo sorriso e puxou a mulher para um beijo. O
atrito de seus corpos quentes logo começou a despertar a vontade de algo mais.
— É... Bom, eu não consigo assim — murmurou Jennifer ao apontar o
olhar para Bóris, que as observava fixamente.
— Oh, um momento.— A morena chamou seu gato para o lado de fora,
trancou a porta e voltou a sentar no colo da loira.

Os dois corpos nus voltaram a se misturar e se tornar um só. Não se
sabia onde iniciava a pele clara de Jennifer e onde terminava a pele oliva de
Regina. Os fios loiros se embaraçavam entre os castanhos, enquanto murmúrios
e baixos gemidos saíam de suas bocas.
Jennifer e Regina se sentiam felizes como nunca antes. Seus corpos e
seus pensamentos estavam em paz. Pela primeira vez podiam sentir toda a leveza
de estar com quem se ama. Então ali, entre carícias em meio aos lençóis,
novamente forraram a cama com amor.


— O que vai querer de café da manhã? Se bem que, ao constar pela
hora, já diria que é almoço — disse Regina ao olhar para o relógio disposto na
parede da cozinha.
— Eu estou com tanta fome, que comeria até essa toalha da mesa —
respondeu, arrancando uma risada da mais velha.
— Pois bem, veja o que tenho aqui.— A professora abriu o armário de
parede e expôs algumas caixas de cereais. — Tem o tradicional de milho, bolas
de chocolate, argolas de frutas...
— Não acredito que você lembrou do cereal!— exclamou com um largo
sorriso nos lábios.
— Isso é pra você não passar na minha cara que a convido pra minha
casa sem sequer comprar cereais matinais — respondeu em um falso tom de
seriedade.
— Eu fiz isso? Quando?— Jennifer fingiu indignação.
— Não, a minha avó que deve ter feito.— Riu.
Meireles caminhou até a morena e a envolveu de costas pela cintura.
— Que namorada mais atenciosa eu tenho aqui.— Ela depositou um
beijo na nuca da mulher, que a fez arrepiar.
Regina apoiou os braços sobre os de Jennifer e segurou nas mãos da
jovem que estavam abaixo de seu peito.
— Jamais esqueceria algo que você me dissesse. Tudo o que vem de
você importa — disse com suavidade na voz ao virar-se de frente e sorrir. — E
então, qual será o de hoje?
— Hum... O tradicional e o de chocolate!
— Vai misturar os dois?— perguntou. Ela nunca vira alguém fazer isso.
— Uhum, por quê?
— Nada...— Regina depositou as caixas sobre a mesa e começou a
buscar algo para o próprio café da manhã.
— O que pretende comer?— perguntou enquanto virava cereal e leite
em uma tigela.
— Vou passar um café forte e preparar algumas torradas com requeijão.
— Então eu vou esperar, quero comer junto com você.

Poucos minutos depois, as duas mulheres se encontravam sentadas à
mesa de frente pra outra. Ambas ainda não conseguiam acreditar que estavam
juntas de novo. Em meio à refeição se buscavam com os olhos como se fosse a
primeira vez que aqueles olhares apaixonados se encontravam.
— Como foi na Itália? Ontem quase não tivemos oportunidade de falar
a respeito.
— Hum... Eu classificaria em bom e ruim.— Regina deu um gole em
seu café e continuou a falar. — Foi ótimo rever meus pais, alguns familiares que
tenho por lá e também amigos. Sem mencionar que estamos falando do belo
lugar que é a Itália. Há algum tempo eu poderia dizer que é impossível ser infeliz
na Toscana. Mas hoje eu posso afirmar que eu não estava feliz lá, não sem você.
Se fosse uma viagem curta eu a teria aproveitado, mas, cinco meses foi tempo
demais. A sua falta não permitiu.
— Eu sinto muito.
— Não sinta. É normal não conseguir aproveitar inteiramente algo por
estar longe de quem se ama. Além do mais, os motivos que me fizeram viajar
não foram os melhores.
— É verdade, mas pelo menos você estava rodeada de pessoas que te
amam, não estava?
— Oh sim, eu estava. Meus pais foram mais carinhosos que nunca
comigo. Mas e você? Como seguiu esses cinco meses? E como está a relação
com sua mãe?
— Os meses foram bastante tristes, mas procurei enfiar a cara nos livros
e descarregar um pouco no boxe. Te ver novamente era algo que eu desejava
tanto, que começou a se tornar um sonho, uma utopia, sabia? Era quase
impossível de acreditar que se realizaria. E quanto à minha mãe, bom, já não
discutimos. Ela até tem puxado conversa comigo a respeito da minha
sexualidade. Acho que está aceitando.
— Que bom, Jennifer! Já é um começo.
— Eu acho que sim. Mas quando o assunto é você, ela ainda se mostra
muito relutante.
— Pretendo tentar uma conversa com ela novamente. Afinal,
pretendemos ficar juntas agora, sem qualquer segredo, sem precisar mentir,
omitir ou temer. Não pretendo me separar de você, mesmo que ela não aceite.
Mas eu gostaria muito de poder ter um bom relacionamento com sua mãe.
— É, vamos ver como vai ser. Dona Morgana Meireles será uma sogra
som S maiúsculo.— Jennifer encheu a boca de cereal e tentou desviar os
pensamentos. Ela não queria ter que pensar nisso agora. — Eu tenho algo pra
comunicar.
— Ah é? E o que seria?— respondeu ao encontrar a mão da namorada
sobre a mesa.
— Já decidi qual faculdade cursar. Educação física!
— É a sua cara! Eu já havia pensado a respeito disso há tempos, mas
nunca comentei com você pra não influenciá-la na escolha. Tenho certeza que é
o seu curso ideal.— Regina sorria ao mesmo tempo em que acariciava a mão de
sua namorada. As alegrias de Jennifer sempre se tornavam as suas.
— Espero me sair bem!
— Se sairá.— Piscou ao sorrir.
— Quero comunicar algo mais.
— Ora, ora... Estou vendo que está cheia de novidades.
— É apenas mais essa, na verdade.— Sorriu. — Então... Assim que
fizer a matrícula na faculdade e resolver toda essa questão, quero procurar um
canto pra alugar. Você sabe, só assim poderemos viver nossa relação em paz. De
fato vou usar todo o dinheiro que meus pais acumularam na minha conta
bancária para os gastos da faculdade, mas eu tenho o dinheiro que juntei ao
longo desses meses e mais aquela bela grana que ganhei com o boxe. Eu consigo
pagar pelo menos um ano de depósito de aluguel. E agora que concluí a escola e
trabalho no período integral na academia, tenho dinheiro pra pagar minhas
contas.
Regina a observava falar com total atenção.
— Com o meu salário inteiro da academia eu consigo me manter,
levando uma vida simples, claro. Agora finalmente as coisas vão andar.
— Não sei, Jen... Tem certeza disso?
— Sair de casa? Com certeza! A gente sabe exatamente quando a casa
dos nossos pais já não nos cabe. Depois de tudo o que ouvi da minha mãe eu já
não tenho clima pra permanecer lá.
— Eu entendo. Nunca tive problema com meus pais, mas mesmo assim
decidi voar pra fora do ninho cedo. Sempre priorizei muito minha liberdade e
autonomia. Nós nunca conseguimos viver a nossa vida enquanto estamos sob o
mesmo teto que eles. Mas...
— Mas...?
— Você poderia poupar um bom dinheiro e vir morar comigo.
— Regina...
— O quê foi, Jen? Seria tão ruim assim dividir o mesmo teto comigo?—
disse ao fingir não saber quais eram os reais motivos da loira.
— Na verdade seria maravilhoso. Mas eu não quero atropelar as coisas.
Além de quê, quero me sentir capaz de me sustentar.
— Eu compreendo plenamente e apoio sua decisão. Mas não custa
tentar, não é?— Riu.
— Não, não custa.— Sorriu. — Obrigada pelo convite de vir morar
aqui, e obrigada por compreender minha recusa.— Sorriu ao depositar a mão
sobre a de Regina e acariciá-la.
— Ah, eu tenho algo mais pra dar a você!
— Mais presentes?
— Não sei se poderíamos chamar assim. Bom, é que no meu aniversário
a minha mãe exibiu um dvd com fotos e vídeos antigos meus. São momentos de
quando eu era criança até a fase adulta. Eu fiz uma cópia e trouxe pra você.
— Ah, eu não acredito! Eu quero muito! Será o melhor presente de
todos!— disse com empolgação.
— Sabia que gostaria. Quando voltarmos ao quarto eu te entrego o dvd.
— Vou assistir assim que chegar em casa!
Regina sorriu e apertou o nariz da loira entre a lateral do dedo indicador
e o dedo do meio dobrados.
— Você é uma graça. Sou louca por você — disse com os castanhos
fixos nos olhos de Jennifer, que sorriu e tentou alcançar os dedos da morena em
um movimento rápido para mordê-los.
— Eu tenho planos pra nós hoje.
— Ah é? E eu posso saber quais seriam esses planos?
— Quero te levar a um restaurante mexicano!— disse animada.
— Hum... Minha namorada quer me levar a um restaurante mexicano?
— Sorriu.
— Sim! Agora a sua namorada tem um pouco de dinheiro pra mimar
você. Eu só vou precisar passar em casa antes de ir. Tenho que pegar algum
dinheiro extra e uma roupa pra vestir. A menos que você não se importe que eu
vá com seu pijama — disse ao puxar a camiseta de algodão que estava em seu
corpo, fazendo Regina soltar um pequeno riso.
— Ok. Então eu levo você em casa e aproveito pra trocar algumas
palavras com a sua mãe. A propósito, ela não irá se preocupar com a sua demora
em voltar pra casa?—
— Oh não, antes de ir pra formatura eu havia avisado que dormiria na
casa da Beatriz. Mas, visto que os planos mudaram, antes de descer pra cozinha
eu mandei uma mensagem avisando que estava com você. Depois eu explico
melhor o que aconteceu. Mas... O que você quer conversar com ela?
— Na hora você saberá.
— Ah não, Regina! Vai mesmo me deixar nervosa até lá? Eu tenho
medo de alguma possível confusão.
— Nós não podemos fugir desse encontro com ela, amor. Esse assunto
precisa ser tratado de frente. Mas pode ficar tranquila que não terei uma longa
conversa. Não hoje. Apenas quero vê-la e trocar algumas poucas palavras.
— Tudo bem...

As duas mulheres sabiam que seus problemas não haviam desaparecido
da noite para o dia, mas tinham total convicção de que agora possuíam recursos
para lutarem. Afinal, os meses, além de trazem um pouco de compreensão por
parte de Morgana, também trouxeram a independência de Jennifer. Era questão
de pouco tempo para que a loira começasse a caminhar sozinha.
Hoje, diferente de há cinco meses, todos estavam com seus corações
mais tranquilos e suas mentes mais suscetíveis a raciocinar.


No início de noite daquele mesmo dia, Jennifer vestiu-se com o terno
que usara em seu baile de formatura e sentou-se na poltrona do quarto enquanto
aguardava Regina terminar de se arrumar dentro do banheiro. A loira se distraía
com um jogo em seu celular quando ouviu o barulho do secador sendo
silenciado.

— Você está... Linda.— Sua voz saiu quase como um murmúrio diante
a beleza de sua namorada.
Com um justo vestido preto e um de seus inseparáveis saltos, a morena
caminhou em direção a loira. A maquiagem em seu rosto estava forte, definindo
seus traços faciais, assim como o batom que contornava seus lábios. Essa noite a
professora usava um batom de coloração vinho.
— Seu cabelo já cresceu tanto desde que nos conhecemos — comentou
Jennifer após se levantar e depositar as mãos sobre aqueles fios castanhos, os
arrastando para trás dos ombros da morena.
— Verdade. Semana que vem fará um ano desde que conheci você.
— Um ano... Nossa, parece que foi ontem que tomei um lugar na
cadeira daquela turma — disse enquanto permanecia mexendo nos cabelos
castanhos perfumados de shampoo.
— Tanta coisa nos aconteceu desde então, não foi? Eu jamais
imaginaria que dobrar meu número de turmas me traria você.
— E durante esse um ano pensou em desistir em algum momento?
— Nunca passou pela minha cabeça desistir de você. Nós tivemos uma
conexão muito gostosa, eu nunca me senti tão bem com alguém como me sinto
ao seu lado.
Seus olhares se buscavam e se perdiam no outro enquanto um silêncio
se formava entre elas. As duas mulheres muito apreciavam a profundidade do
silêncio que vez ou outra se instalava. Gostavam de namorar com os olhos e com
o encontro de suas mãos ao mesmo tempo em que sentiam o coração acelerar o
ritmo.
— Adoro me perder em você.— Jennifer quebrou o silêncio. — Em
cada nota da sua voz, em cada sussurro, em cada sorriso...— dizia olhando fundo
nos castanhos intensos e vívidos. — Quero muito que saiba o quanto te amo,
Regina.— A loira desceu o olhar para baixo ao sentir que sua mão tocava em
algo no pulso da mais velha. Ela sorriu ao constatar que ainda se tratava da sua
pulseira azul que foi dada a ela meses atrás. — Sei que sou nova, mas tenho
certeza do que eu quero. Nunca pense que é apenas uma aventura ou foi um
fetiche pra mim. Quando te olho, vejo aquela que vai aquecer todos os meus
invernos.
Os olhos de Regina começaram a encher de lágrimas com aquela
declaração tão doce e sincera da jovem. Aquele olhar esmeralda sempre tão
familiar e as mãos macias contra a pele de seu pulso eram sensações que ela
podia dizer com convicção que gostaria de sempre sentir.
— Oh, meu amor... Eu sei, sei que nunca foi uma aventura, sei que tudo
sempre foi de verdade pra você, assim como pra mim. Eu conheço você,
Jennifer. E eu sempre vi tanta verdade nesses olhos.— Regina depositou o
polegar na bochecha da jovem, logo abaixo dos olhos, e a alisou.
— Sabe... Quando percebi que você me balançava, eu tentei investir.
— É, eu sei bem, até meu telefone você conseguiu. Mas você teria se
dado muito mal se eu usasse o número no privado.— Riu.
— É verdade!— Riu em conjunto. — Mas o destino estava a meu favor.
— Piscou. — Continuando, eu tentei me aproximar e ter um contato maior, mas
eu não podia imaginar que você iria me corresponder assim, com tanta
reciprocidade. Tudo bem que no início você escorregou bastante de mim, mas
quando você tomou a iniciativa de me beijar... Nossa, o meu mundo sacudiu. Eu
fui às estrelas e voltei.— Sorriu à lembrança.
— Aquele beijo foi o meu inteiro sim pra você. Entre a sua boca e a
minha, a partir dali, houve muitos segredos, muitos silêncios e ao mesmo tempo
muitos gritos.
— Eu fiquei feliz, mas também senti receio, medo de você dizer que foi
um erro. Eu já pensava tanto em você. E, bom, você é uma mulher linda,
inteligente, madura. E eu sou... Eu.
— Sim, você é você, por isso que me encanta. Não menos bela, não
menos inteligente e não menos mulher — disse suavemente, enchendo o peito da
jovem de alegria.
— Gostaria que eu tivesse a sua idade, ou gostaria de ter a minha?—
perguntou enquanto encarava o par de olhos. Suas mãos ainda se encontravam.
— Nunca pensei a respeito, mas...— Regina fez uma breve pausa e
prosseguiu. — Não. Não seríamos nós. Eu gosto assim, gosto dessa diferença,
dessa troca. Gosto do que somos.
— Eu também. Gosto muito de aprender com você.
— Eu também aprendo com você, não pense que não, aprendo todos os
dias. Com você e com nossa relação.
— Ai meu Deus, acho melhor irmos antes que eu chore aqui.
Algum tempo depois, quando Regina estacionou o carro na rua de
Jennifer, ambas respiraram fundo e deixaram o veículo.
— Se eu não receber outro tapa na cara já estarei no lucro — comentou
enquanto caminhavam lado a lado em direção à casa da loira.
— Não me diz uma coisa dessa, ela não seria capaz de algo assim
novamente. Seria? Não, não seria — disse a última frase mais pra si que pra
Regina.
Paradas em frente a porta, a mais velha pedia pra que Jennifer a abrisse.
Porém, esta protelava.
— Eu deveria ter ligado e avisado. Tenho medo de qual possa ser a
reação surpresa dela. Vamos voltar!— disse nervosa. — Mas, se voltarmos não
poderei te levar ao restaurante. Caramba, o que eu faço?— As mãos de Meireles
começaram a suar.
— Jennifer, se acalma. Se realmente não estiver em condições,
voltamos. Mas eu preferia enfrentar. Afinal, ela já sabe que você está comigo.
— Você tem razão. Vamos lá, coragem, coragem, Jennifer Meireles —
repetiu a si mesma.
Em vez de abrir a porta e entrar, decidiu tocar a campainha.
— Jennifer? Senhorita Vianna? Boa... Boa noite — disse Diogo com a
cara mais surpresa do mundo ao atender a porta.
— É, oi.— A jovem respondeu.
— Boa noite, Diogo — disse Regina.
— A minha mãe está em casa?— perguntou com nítido nervosismo em
sua voz.
— Amor? Quem é?— A voz de Morgana ecoou ao fundo.
— É a Jennifer!— O homem respondeu em voz alta.
— Essa menina não levou a chave? Quantas vezes já avisei que
qualquer dia ficará presa do lado de fora?— reclamou lá de dentro.
— É... Gostaria de entrar, Regina?— ofereceu educadamente, não muito
certo do convite que fizera.
— Melhor não. Obrigada — respondeu com sensatez.
— Você pode chamar minha mãe aqui?
Diogo assentiu com a cabeça e se ausentou. Enquanto isso, Jennifer e
Regina puderam ouvir Morgana alterando o tom de voz dentro do imóvel.
Alguns longos minutos se passaram e nada da mãe de Jennifer aparecer.
As duas mulheres já haviam chegado à conclusão de que Morgana não queria ter
que ver Regina. No entanto, antes de desistirem e partir, escutaram passos se
aproximando da porta.
— Esqueceu as chaves novamente, Jennifer?— resmungou Morgana ao
vê-la. Seu olhar encontrou o de Regina por breves segundos e automaticamente
foi desviado.
— Não mãe. Eu só não quis entrar logo de cara.
— Menos mal. Como foi o baile?— perguntou, tentando focar o olhar
na filha e ignorar por completo a existência de Regina ali. Diogo, na parte de
dentro, observava calado.
— Foi maravilhoso, um dos melhores dias da minha vida.— Sorriu
fraco. Jennifer estava nitidamente tensa.
— É... Senhora Morgana?— Regina se manifestou, recebendo um olhar
quase fuzilante sobre si. — Boa noite.
Mil pensamentos povoavam a mente de Morgana naquele instante. Ela
não conseguia acreditar que aquela mulher, como ela própria se referia, estava
ali, bem na sua porta. Mais precisamente, na varanda de sua casa.
— Oi — disse séria e com frieza na voz.
— Eu poderia ter um segundo da sua atenção?
— Já teve.
— Mãe!— Jennifer repreendeu.
— Eu não tenho nada pra falar com você.— Morgana desviou o olhar
para a filha — Vai entrar, Jennifer?
— Vou entrar pra me trocar, mas sairei em seguida.
— De novo?— disse em um tom de voz um pouco mais alto. — Não
pense que pode entrar e sair de casa a hora que bem entender.
— É sobre isso que gostaria de conversar.— Regina se manifestou
novamente. — Queria avisar que estou indo a um restaurante com ela, mas que a
trarei pra casa em segurança e não muito tarde.
Morgana nada disse a Regina, permaneceu focando sua atenção na filha.
— Hoje fiz um bolo de aniversário pra você. Tem as mãos de Diogo
nele também. Se algo não estiver bom, eu o culpo.
— Eu estou ouvindo isso!— gritou o homem da parte interior da casa.
— Oh mãe, obrigada... Eu não pretendo demorar. Apenas jantarei e
volto pra partirmos ele.— Sorriu. — Agora eu vou subir pra me trocar e já volto!
Meireles entrou pra dentro do imóvel e subiu a escada às pressas.
— Senhora Morgana...— Regina, uma vez mais, tentou se manifestar,
mas a mãe de Jennifer deu as costas e entrou como se nem a tivesse escutado.
— Desculpe. Ela ainda está processando tudo isso — comentou Diogo
ao tentar amenizar aquela situação tensa e desagradável para todos os
envolvidos.
— Não se preocupe — respondeu ao esboçar um sorriso fraco.
— É... Pode se sentar se quiser — disse ele ao apontar com o olhar para
o banco de maneira que havia na varanda. Por fim, acabou tomando um lugar ao
lado da morena. — Estou contente que esteja aqui — disse baixinho para que
Morgana não o escutasse. — Jennifer andava muito cabisbaixa.
— E eu estou feliz de estar de volta.— Sorriu.
— Estou há poucos anos na vida dela, mas foi mais que o suficiente pra
me apegar e amá-la. Jennifer é uma pessoa tão boa, tão alegre e cheia de vida.
Foi a primeira vez que a vi se entristecer daquela forma. Ela realmente tem
muitos sentimentos por você.
— Sinto tanto que Jen tenha precisado passar por isso. Eu não queria ter
ido embora, mas eu sabia que seria ainda mais triste se eu ficasse.
— Eu compreendo. A Morgana estava disposta a qualquer coisa. Ela
não dava um dia de sossego à filha. De nada adiantaria forçar ou bater de frente.
Porém, nos últimos meses algo começou a mudar. Acho que a tristeza de
Jennifer mexeu com ela e a fez começar a refletir.
— Apesar de tudo eu a entendo. Jennifer é filha única e possivelmente
todas as expectativas da senhora Morgana estavam sobre ela. Sem mencionar a
maneira como descobriu tudo. Droga, você não imagina como eu gostaria de ter
conversado com ela antes disso. Mas é aquela história... A sexualidade da
Jennifer estava em questão, e esse assunto só diz respeito a ela.
— Não se culpe, Regina. Tudo aconteceu como deveria acontecer. Eu
também compreendo a minha noiva, mesmo não concordando com suas atitudes.
Mas eu sempre busco fazê-la refletir. O que mais quero é ver paz e harmonia
entre todas vocês.— Sorriu.
— Estou pronta! Vamos?— Jennifer apareceu perfumada, cabelos
soltos, rosto sem maquiagem e com um longo vestido azul claro de estampa
floral em seu corpo.
— Obrigada pela conversa — disse Regina.
— Cuida bem dela.— O homem sussurrou enquanto piscava.

— Você está linda.— Regina elogiou ao aproximar os lábios do ouvido
de Jennifer e murmurar.
— Obrigada!— Sorriu, unindo a mão à da mulher. — Estou aliviada ao
ter te encontrado viva naquele banco.
— Ninguém está mais aliviada que eu, você pode apostar.— Riu.
— Pode me emprestar a chave do seu carro?— pediu assim que seus
corpos se aproximaram do veículo.
A mais velha entregou a chave e a olhou confusa. Ela observou
Meireles abrir a porta do automóvel e se dirigir para o lado do motorista.
— O que isso significa?
— Surpresa! Eu dirijo essa noite. Nada mais justo, não? Eu a convidei
pro jantar, então eu a levo.
— Mas... Mas... Desde quando?— perguntou confusa ao tomar um
lugar no banco do passageiro.
— Fiz auto escola há pouco tempo. Não quis contar nada por e-mail pra
poder ver essa cara que você está expressando agora.
— Wow, hoje você está uma caixinha de surpresas! Eu adorei a
novidade. Vai ser muito sexy ver você no volante pela primeira vez — piscou.
— Você confia em deixar seu carro nas minhas mãos?
— Oh garota, não pergunta duas vezes. Vamos nessa!— disse,
arrancando uma imensa gargalhada de Jennifer.


— Não acredito que você não a convidou pra entrar, amor. Que falta de
educação. Fiquei envergonhado.
— Você só pode estar brincando comigo, Diogo. Mais essa agora!
Chamar o inimigo pra dentro da minha casa!
Morgana e Diogo conversavam ao sofá após a saída de Meireles.
— Qual inimigo, Morgana? Por Deus! Aquela mulher nem de longe se
parece com um. Você deveria se dar a oportunidade de conhecê-la. Faça isso por
Jennifer. Tenho certeza que seria o melhor presente que poderia dar a ela.
— E você acha que não faço coisas pela minha filha? Acha mesmo que
eu caí naquela história de que ela e essa mulher estavam totalmente separadas?
— Morgana esboçou um pequeno sorriso irônico. — Eu sabia que não, mas eu
não disse nada porque não queria ver minha filha ainda mais triste que já estava.
Mas eu tinha absoluta certeza que algum elo ainda havia ali.
— E isso não é ótimo? Morgana, para pra pensar. Isso só mostra que
aquela mulher que estava lá fora há poucos minutos gosta verdadeiramente da
sua filha. Ou você preferia que ela simplesmente tivesse se acovardado e
desaparecido da vida da Jennifer? Você pode dizer o que quiser, mas deve
admitir que ela tem caráter.
As últimas palavras do homem deixaram Morgana pensativa, como se
alguma semente tivesse sido plantada naqueles pensamentos tortuosos.


O restaurante mais parecia um casarão se visto por fora. Ele dispunha
de uma sacada com duas grandes esculturas divertidas que simulavam dois
homens com sombreros e maracas.
Quando as duas mulheres entraram no estabelecimento,
automaticamente se sentiram transportadas para o México. O ambiente dispunha
de muita cor, grandes chapéus nas paredes, quadros de Frida Kahlo, caveiras
mexicanas e, claro, mariachis.
Ao sentarem à mesa, Regina pediu um frozen margarita de morango e
Jennifer a acompanhou.
— Que ambiente bonito e aconchegante — comentou a mais velha com
um sorriso nos lábios. — Já conhecia esse restaurante?
— Apenas de nome. Preferi deixar pra conhecê-lo com você.— Sorriu.
— O que vai querer pedir?
— Hum... Deixa eu ver — disse pensativa ao pegar o menu. — Ainda
bem que trouxe meus óculos, essas letras estão minúsculas — comentou ao
colocá-los, recebendo a atenção dos olhares de Jennifer, que a observava feito
boba apaixonada.
— O grau deles é muito forte?
— Não muito, é pra enxergar de perto. Quer experimentá-lo?—
ofereceu ao tirá-lo de sua face.
— Estou vendo tudo embaçado.— Jennifer comentou ao olhar para os
lados e para cima. — Mas então, como estou?
— Hum... Deixe-me ver...— Regina observava a loira fazer caras e
bocas enquanto ela própria esboçava uma expressão de análise. — Eu acho que
você está parecendo uma historiadora — comentou, fazendo a loira rir e emitir
novas poses. — Acho que vou querer quesadilla com camarões picantes
salteados em tequila — disse Regina ao forçar a visão. A loira ainda tinha seus
óculos na face, e agora se olhava através da câmera frontal do celular. — Me dá
aqui, deixa tirar uma foto sua — comentou suavemente ao pegar o aparelho e
fotografá-la em contraste com o plano de fundo colorido do restaurante.
Após devolver o óculos para a mais velha, Jennifer direcionou a atenção
para o menu e decidiu pedir uma porção de mini burritos.
— O que você está fazendo?— perguntou ao perceber que a mais velha
mexia nos dois pequenos arranjos de flores que havia sobre a mesa.
— Estava me dando nos nervos esses vasos com flores misturadas.
Estou colocando as vermelhas em um e as flores amarelas no outro.
— Oh céus, me lembre de nunca presenteá-la com um buquê de flores
mistas — comentou ao rir da situação.
— Por favor!— Riu em conjunto.
Meireles afastou delicadamente uma pequena mecha do cabelo de
Regina e encaixou uma flor amarela bem ali. Em seguida, inclinou o corpo sobre
a mesa e alcançou os lábios da mulher. Quando os pedidos foram entregues,
começaram a degustá-los enquanto se deixavam envolver pela agradável música
de fundo.
— Ainda não consigo acreditar que você está aqui. Acho que vou passar
um mês assim, incrédula.
— É tão bom assim estar comigo?— perguntou a mais velha. Ela ainda
estava carente de Jennifer e de suas palavras doces e carinhosas.
— É maravilhoso estar com você. Sempre foi. Alternar o olhar entre
seus castanhos tão expressivos e esse meio sorriso que você dá, é apaixonante.
Às vezes não sei pra onde olhar. Me perco demais em você.
Antes que Regina pudesse responder a declaração da mais nova, três
músicos com gigantescos sombreros encostaram na mesa do casal e se
demoraram por lá algum tempo. Eles iniciaram uma canção à mesa, as fazendo
sorrir.
A mais velha, por conhecer a música, cantou junto com eles, fazendo
com que a loira esboçasse um brilhante sorriso com a cena.
Alguns clientes localizados próximos dali também se deliciavam com a
gostosa canção que embalava o lugar. Muitos sorriam e até mesmo aplaudiam os
mariachis.
Antes de deixarem a mesa do casal e se direcionarem para outra, um dos
músicos depositou uma flor no cabelo da jovem, a fazendo sorrir. Regina
também abriu um largo sorriso ao visualizar o momento.
— Agora estamos combinando — disse a morena ao apontar com o
olhar para a flor vermelha na cabeça de Jennifer.
— Eu sempre via esses músicos com enormes sombreros nos filmes em
que assistia, mas nunca os tinha visto na vida real. São muito legais!— disse
com entusiasmo.
— Eles são muito divertidos mesmo. Quando criança eu visitava muitos
lugares distintos com meus pais e minha irmã, incluindo restaurantes. Eu
adorava quando os mariachis abordavam nossa mesa. Meu pai contou que
quando eu era bem pequena mesmo, eu erguia os braços e ficava tentando
alcançar os sombreros. Até que um dia ele me comprou um pra que eu
sossegasse.
— Confesso que imaginei você bem criança com esse chapéu enorme
na cabeça.— Jennifer não conseguia conter o riso.
— Eu tenho foto com ele. Ficava bem fofa, ok?
— Oh, eu não duvido!— Sorriu, depositando a mão sobre a de Regina e
acariciando-a. — Sabe, nesse longo tempo em que estivemos distantes eu tentei
ocupar minha mente de todas as formas possíveis. No último mês tentei aprender
algumas palavras e expressões em espanhol pra te fazer uma surpresa.
— Sério? Não acredito!— disse ao sorrir abertamente para a jovem. —
Você realmente se tornou uma caixinha de surpresas, Jennifer Meireles! Já pode
começar a pôr pra fora o que aprendeu. Vamos ver se está correto...— disse ao
erguer uma de suas sobrancelhas enquanto a olhava.
— Ok, ok! Vamos ver o que me lembro.— Meireles tossiu limpando a
garganta e iniciou. — Tu me haces falta, tengo hambre, cielo, habitación,
boluda, eres mi—
— Espera, espera, espera — disse Regina ao interrompê-la. — Boluda?
— gargalhou. — Jennifer! Qual a fonte dessas suas aulas?
— Ah, eu assisti alguns vídeos pela internet. Por quê? Eu disse algo
errado?
— Não, pelo contrário. Está corretíssimo. Mas você sabe o que tudo
isso significa?
— Na verdade... Não.— Riu. — Quer dizer, a maioria das palavras eu
apenas decorei. Algumas eu sei o que significam. Por exemplo, tu me haces falta
é o mesmo que você me faz falta. Cielo é céu. O resto eu não faço a menor ideia.
— Oh céus, então cuidado ao repetir ‘boluda’ por aí.— A mais velha se
segurava para não gargalhar alto.
— Ai meu Deus, o que isso significa?
— Podemos dizer que você está chamando alguém de idiota, babaca ou
algo do tipo. Mas se for puxar a tradução pela raiz... Bom, deixa pra lá!— Riu.
— Ah não, amor! Fala!
— Amor...— A mais velha murmurou baixinho, sentindo o coração
aquecer e acelerar. Como era bom ouvir aquela palavra saindo dos lábios da
jovem. — Vamos esquecer isso, é bobeira! Quer que eu te ensine alguns
palavrões em espanhol? Assim saberá quando estiverem falando mal de você.
— E também poderei xingar algum idiota em outro idioma.
— Bom, também!— A morena concordou. — Vamos lá... Quando
quiser dizer ‘filho da puta’, diga: hijo de puta — disse pausadamente algumas
vezes para que Meireles conseguisse compreender.
— Hijo de puta.
— Isso! ‘Que te jodan’ é o mesmo que dizer ‘foda-se você.
— Que te o quê?— Jennifer pediu que repetisse.
— Jodan. Jo-dan — disse pausadamente.
— Que te rioda?
Regina soltou uma risada e repetiu.
— Que te jodan. Jodan.
As duas mulheres se envolveram naquele divertido aprendizado por
longos minutos. Sorrisos não largavam seus lábios, assim como as gargalhadas
que se tornaram a trilha sonora daquele encontro.
— Me ensina uma expressão bem podre mesmo? Daquela que se diz
quando se está com muita raiva?
— Ok. Lá vai... La concha de tu madre — murmurou.
— E o que significa?— perguntou curiosa.
Regina inclinou o corpo sobre a loira de modo a murmurar a resposta
em seu ouvido. Ela não queria correr o risco de alguém mais escutar aquela
besteira.
— Regina! Essa foi a melhor!— gargalhou a loira. — Minha barriga já
está doendo de tanto rir!— disse, oferecendo à mulher aquele sorriso moleca que
ela tanto amava.
— Se eu soubesse que você acharia tanta graça, já teria ensinado antes
— comentou com um sorriso na face.
— Eu gostei demais! Soa ainda mais engraçado em espanhol. Vou
querer aprender um todos os dias!— disse aos risos.
— Preciso concordar com você.— Regina ainda mantinha um largo
sorriso em seus lábios.
— Vamos pedir alguma sobremesa?— comentou após olhar para o
prato da mulher e constatar que ela também já havia concluído a refeição.
— O que você sugere?
— Hum... Olhando aqui pelo menu eu vejo que eles têm churros. O que
acha?
— Acho uma boa pedida. Há anos não provo um.
Quando o garçom trouxe o pedido, as duas mulheres agradeceram e
Jennifer logo caiu em cima da porção.
— Churros del chavo!— disse ela após arrastar a cadeira para perto de
Regina, pegar uma unidade do alimento e mergulhá-lo no doce de leite, fazendo
a mais velha sorrir com sua pronúncia correta. — Abre a boquinha.— Ela pediu.
Regina sorriu, entreabriu os lábios e mordeu um pequeno pedaço do
churros.
— Eu já disse que não me importaria de passar os dias assim? Sendo
mimada por você?— Regina comentou. — Essa parte de receber coisas à boca é
fantástica.
— Eu ponho o que você quiser e pedir nos seus lábios.— Jennifer
passou o braço direito pelas costas da professora e o apoiou sobre a cadeira da
mulher.
— Colocaria os seus nos meus?
— Hum... Sim. Mas não agora. Primeiro eu gostaria que dançasse
comigo.— Jennifer segurou a mão da mais velha e a puxou para uma localidade
do restaurante onde havia três casais que dançavam conforme a melodia do
ambiente.
Regina apoiou os braços sobre o pescoço de Jennifer e a sentiu envolver
sua cintura. Aquela proximidade despertou olhares discretos e curiosos. Ainda
era uma realidade a surpresa das pessoas ao presenciarem casais do mesmo sexo.
E para elas havia um agravante; a notável diferente de idade. Sabiam que
precisariam aprender a lidar com aquela atenção recebida.

A mais velha cruzou os braços no pescoço de Jennifer e uniu a lateral
do rosto à lateral da face da jovem. Elas permitiram se envolver pela agradável
canção muito conhecida por Regina, que começou a cantá-la em um murmúrio
contra o ouvido da loira.

— Y que se entere el mundo, que de amor también se puede vivir.

Jennifer soltou um longo suspiro que pôde ser escutado pela mais velha.
Para ela, Regina se tornava ainda mais apaixonante quando murmurava palavras
ao seu ouvido. E quando estas eram em espanhol, sentia que seu coração perdia
o ritmo normal das batidas.
Com a cabeça apoiada no ombro da mulher, Meireles fechou os olhos e
permitiu que o cheiro de sua namorada se infiltrasse em seus pulmões. Era uma
agradável mistura do perfume que se fundia ao cheiro natural da pele em
competição com o aroma do cheiro de shampoo que vinha daqueles fios
castanhos.
Aos olhos de Jennifer, sua ex professora possuía todas as características
que tornava uma mulher interessante. Ela era inteligente, culta, elegante,
romântica, intensa, engraçada e incontestavelmente sacana, no sentido mais
sexual da palavra.
Regina Vianna é como uma pantera negra. Seu físico exala beleza e
elegância. Seu olhar profundo sempre intriga todos à sua volta e lhes desperta
uma grande vontade de conhecê-la ao íntimo. Ela é reservada e serena. E por trás
de toda essa misteriosa exuberância que é a sua beleza, existe um espírito livre e
inteiramente selvagem.
— Qual o grande prazer da vida?— perguntou Jennifer, de maneira
aleatória, ao mesmo tempo em que se perdia em pensamentos. Ela permanecia
com a cabeça apoiada no ombro da mulher.
— Acredito que o grande prazer da vida esteja em experimentar o
mundo. E pra você?
A jovem soltou um curto suspiro e respondeu.
— Somar momentos felizes como os de agora.— Sorriu. Se buscasse a
face da morena, a veria sorrindo também.
O casal se manteve em silêncio durante o minuto final da canção,
apenas desfrutando do calor de seus corpos unidos e do gostoso perfume que a
pele e cabelos da outra possuía. Quando a música chegou ao fim voltaram a seus
lugares, finalizaram as bebidas em meio a alguns risos e deixaram o lugar.

Para a grande surpresa de Regina e da mais nova, as duas cruzaram com
Robson na saída do restaurante. O homem chegava de mãos dadas na companhia
de uma mulher. Ele olhou de maneira fixa para a professora e em seguida
alternou entre os olhos de Jennifer e suas mãos unidas às dela. Ao final, quem
ficou mais surpreso foi ele ao saber quem era o novo par da mulher.
Por fim, sem trocarem quaisquer palavras, todos seguiram seus
caminhos.


— Está entregue — comentou ao estacionar o veículo em frente a casa
da loira. — Antes que vá eu gostaria de dizer que adorei a noite de hoje.
Obrigada pelo jantar e por tudo.
— Eu fico feliz que tenha gostado, pois pra mim foi maravilhoso poder
estar com você.— Meireles apoiou delicadamente a mão sobre a da mulher e
deslizou os dedos entre os dela em um gesto de carinho.
Regina olhou para o contato entre suas mãos, subiu o olhar e sorriu.
— Acho melhor você ir, sua mãe está na janela olhando pra cá desde
que estacionei com o carro.
— O quê?— exclamou ao virar o rosto e olhar através do vidro escuro
do veículo. — Eu não acredito nisso!— disse ao constatar que Morgana
realmente se mantinha fixa na janela do andar de cima.
— Acho que ela nunca vai me aceitar. Mas, pelo menos não me recebeu
com uma bela tapa. Já posso dizer que é um começo.— Regina soltou um
pequeno riso.
— Oh Deus!— Jennifer levou as duas mãos ao rosto. — Eu já não sei
mais o que fazer ou dizer a ela.
— Tudo ao seu tempo.
— O tempo da minha mãe parece infinito!— bufou. — Mas vamos
deixar esse assunto pra lá, melhor eu realmente entrar antes que ela pense que
estamos transando no carro.
— O que não seria uma má idéia — brincou. — Boa noite, meu amor.
— Regina aproximou-se com o rosto e tocou os lábios de Jennifer com os dela.
— Boa noite, eu amo você. — sussurrou. — Estou feliz que esteja de
volta. — Sorriu.
Assim que a jovem desceu do carro, a professora abriu as janelas e
acendeu um cigarro. Todo esse tempo ao lado de Jennifer quase a fizera esquecer
a vontade de fumar. E nos pequenos momentos em que havia sentido, tentou
enganar a vontade para que a loira não se sentisse triste com isso. Todavia,
agora, sozinha em seu automóvel, ela tragava o que seria seu primeiro e único
cigarro do dia.

Alguns minutos após Jennifer ter entrado em casa, Regina começou a
ouvir sons de palmas e algumas vozes distantes. Olhando para fora ela pôde
perceber que a janela da parte interna da varanda estava aberta, permitindo que o
som do ambiente se pusesse para fora. Regina sorriu ao constatar que se tratava
de parabéns que cantavam para a loira.
Metade dela se sentia feliz naquele momento ao saber que Jennifer,
apesar das circunstâncias, tem uma família que a ama. No entanto, outra parte se
entristecia por não estar inclusa ali. Ela sentia como se fosse apenas uma
estranha que observava ao longe.


Capítulo 37

Uma semana havia se passado desde a noite da formatura. Regina e
Arthur conversavam em uma aconchegante cafeteria no início da tarde enquanto
a morena contava detalhes importantes sobre a viagem e ele a atualizava a
respeito dos últimos acontecimentos de sua vida e do quanto sentiu saudade
daquelas conversas. Ambos se serviam de capuccino com alguns biscoitos
salgados.
— O que você esperava, Regina? Que ela te recebesse de braços
abertos?
— Não! Mas ela deveria ter tido mais educação e se comportado de
uma forma mais civilizada. Essa mulher parece me odiar!
— Parece? Aposto todas as minhas fichas que odeia.
— Arthur!
— Só estou sendo sincero — comentou ao erguer as mãos para cima. —
Não espere ser convidada para o jantar algum dia.
— Não, eu não espero...— disse pensativa ao fixar o olhar em um ponto
qualquer.
— E quanto ao seu novo emprego?— perguntou ele. Na noite passada a
morena lhe informara através de uma ligação que estava disputando vaga em
duas instituições; uma pública e outra privada.
— Estou aguardando a resposta do colégio particular e o resultado da
prova que fiz para a pública. Se tudo sair como eu espero, lecionarei nas duas.
— Isso é ótimo, Regina! Estarei na torcida!— disse com empolgação.
— Obrigada! Estou louca pra voltar a dar aulas de história. No
momento estou apenas com os alunos particulares de espanhol. Mas você sabe...
História é a minha grande paixão.
— Eu sei bem.— Sorriu. — E Jennifer, como está?
— Está bem. Inclusive, vamos nos encontrar daqui a pouco. Ela vai sair
mais cedo do trabalho pra se matricular na faculdade e eu quero estar com ela
pra compartilhar esse momento. Acabou ficando tudo pra cima da hora por conta
do atraso na formatura. Precisou correr com toda a documentação necessária —
explicou.
— E ela irá fazer qual curso?
— Educação física. Achei uma ótima escolha pra ela.
— Oh, certamente! E ela acabará fazendo uma útil junção com o boxe
que já pratica.
— Sim, eu concordo. Jen está muito empolgada! Mas confesso que
estou um pouco preocupada.
— Por quê?
— Ah, não sei... Estudar e trabalhar pode ser tão exaustivo. Sem
mencionar o fato de que ela quer morar sozinha o mais rápido possível. Será
uma mudança muito repentina. Vai precisar assumir grandes responsabilidades.
— Realmente, principalmente quando sair da casa da mãe. Não é uma
tarefa fácil ser independente.
— Pois é. Eu confio inteiramente na capacidade dela, mas não deixo de
me preocupar. O tempo para o boxe vai ficar muito escasso, e ela gosta tanto...
— Essa é a realidade da vida adulta. Infelizmente temos que viver
priorizando algumas coisas e abrindo mão de outras.
— Sim, devo concordar.— Regina olhou para o relógio em seu pulso e
constatou que já estava quase na hora de buscá-la. Sendo assim, concluiu
rapidamente o lanche e se despediu do amigo.

Quando todas as questões referentes à matrícula haviam sido


concluídas, ambas deixaram a faculdade e entraram no veículo. As aulas de
Jennifer iniciariam em uma semana.
— Está animada?
— Muito! Eu só não gostaria de precisar fazer à noite. Mas, ou era
assim, ou eu teria que sair do emprego — lamentou. — Mas tudo bem, vou me
adaptar! E você? Ansiosa pra ser chamada?
— Bastante. Embora esteja atendendo aos alunos particulares, não é a
mesma coisa. Sinto falta de estar em uma sala de aula.
— Posso imaginar...— disse suavemente. — Mas você é uma
profissional excelente, tenho certeza que até irão abrir disputa por você.
— Obrigada — respondeu ao expressar um pequeno sorriso. — Você se
importaria de me acompanhar ao cabeleireiro?— comentou ao engatar a chave
no veículo.
— Cabeleireiro?
— Sim, vou tentar me encaixar em algum horário de hoje. Preciso
cortar esse cabelo urgente, já está enorme.— Regina mantinha a atenção no
retrovisor enquanto tirava o carro da vaga e conversava com a jovem.
— Ah... Você está tão linda com eles assim — lamentou ao deslizar os
dedos entre aqueles fios castanhos.
— Oh... Obrigada, amor. Mas já faz algum tempo que está dessa forma.
Já até perdeu o corte.
— Então eu posso cortar pra você?— ofereceu enquanto a observava
dar partida no carro.
— E por acaso você sabe cortar cabelo?— perguntou enquanto
alternava o olhar entre a rua e a loira.
— E por que eu não saberia, hein? Fique você sabendo que sou eu quem
corta o da minha mãe há alguns anos — retrucou.
— Ei, não precisa ficar bravinha — disse em tom de sarcasmo para
implicar.
— Não estou bravinha.
— Pois parece.
— É que você duvida das minhas habilidades.
— Eu não duvido, pelo contrário, eu sei que você é super capaz de
muita coisa. Eu me surpreendo, sim. Mas é positivamente. Você está sempre me
mostrando o quanto pode ser mais.
— Sei...
— Sabe que é verdade — piscou. — Você tem muitas habilidades e
uma delas é me enlouquecer. No melhor sentido da frase.
— Eu posso te surpreender e enlouquecer ainda mais, coroa — brincou.
Assim como Regina, Jennifer também adorava uma implicância.
— Coroa?— exclamou indignada. — Ainda estou bem longe disso,
senhorita.
— Será mesmo? Olha, eu tenho as minhas dúvidas.— A loira se
segurava para não rir da expressão séria que a professora esboçava. — Mas é
uma coroa bem gostosa, não se preocupe — continuou a implicar. Ela podia
jurar que a mais velha voaria em seu pescoço a qualquer momento.
— Vou te poupar da resposta que merece.
— Não precisa me poupar. Vem, joga sobre mim, eu aguento qualquer
coisa.
— Aguenta qualquer coisa?— Riu de maneira irônica. — Não foi isso
que vi semana passada quando acordou resmungando de dores.
— Eu acordei resmungando?
— Sim, Jennifer. Você acordou resmungando. Não aguenta nem fazer
uma nova posição.— Agora era Regina quem implicava enquanto dirigia. —
Depois daquele dia fiquei até com medo de quebrar você.— Vianna possuía um
discreto sorriso no canto dos lábios. — Você não é páreo pra mim, garota.
— Vai mesmo ficar me provocando? Cuidado, pois eu posso descontar
tudo no seu cabelo daqui a pouco.
— Já não está aqui quem provocou!


Momentos mais tarde as duas mulheres entravam na sala quando se
depararam com a imagem de Bóris adormecido sobre a mesa de centro. Ele
estava em um sono tão profundo que além de não as escutar entrar, também não
despertou com os carinhos recebidos por Jennifer.
— Ele está apagado — comentou a loira ao se agachar próximo à mesa.
— Vou aproveitar pra encher essa pancinha de beijos.— Meireles cheirou o
pescoço e a barriga de Bóris e em seguida distribuiu alguns beijos no focinho e
abdômen do animal, se deliciando com a sensação do pelo macio em sua pele.
— Às vezes ele entra em uma espécie de transe quando dorme — disse
a morena ao se aproximar dos dois. Regina sempre apreciava a maneira
carinhosa com a qual Jennifer se dirigia a Bóris. — Adoro o cheiro das patinhas
dele — comentou ao segurar uma das patas traseiras do gato e cheirá-la.
— Você o ama muito, não ama?
— Sem medidas.
— Como o conseguiu?— perguntou curiosa.
— Eu costumo dizer que o adotei, mas na verdade foi Bóris que me
adotou. Eu voltava do trabalho em um dia frio e chuvoso como o de hoje quando
resolvi parar em uma cafeteria pra tomar um chocolate quente. De repente
escutei alguns miados e ele simplesmente surgiu na porta do lugar. Eu estava
com os dias muito corridos e atarefados naquela época, e não tinha a menor
pretensão de ter algum animal. Mas eu não resisti àquela coisinha pequena que
tinha apenas olhos e orelhas, miando e vindo até mim.
— Own... Estou conseguindo imaginar a cena. Ele aqueceu seu
coração?
— Mais que dez xícaras de chocolate quente jamais o fariam.— Sorriu
com ternura. — Eu ainda relutei por alguns minutos, pois ele era muito pequeno
e eu não sabia se teria tempo pra dar a ele a dedicação e os cuidados necessários.
Mas quando vi algumas pessoas do estabelecimento o afugentando pra fora, não
pensei duas vezes em trazê-lo pra mim. E posso afirmar que foi uma das
melhores coisas que fiz nada vida.
— Ele está com quantos anos?
— Fez cinco em dezembro. Eu conto a partir da data que o recolhi da
rua. Era noite de natal, inclusive.
— Então foi um presentão.
— Sem dúvida — disse sem desfazer o terno sorriso que carregava em
seus lábios. — Bom, eu vou molhar o cabelo agora pra você cortá-lo.

Jennifer permaneceu fazendo carinhos em Bóris enquanto aguardava a
mulher retornar. Não demorou muito para ela reaparecer com os cabelos úmidos
e uma tesoura. Regina puxou uma cadeira, sentou-se e entregou o utensílio nas
mãos da namorada.
— Quanto você quer que eu corte?— A loira perguntou ao se posicionar
por trás.
— Aproximadamente na nuca.
— Quer um pouco da nuca de fora ou cobrindo toda ela?
— Eu quero cobrindo. Quero bem na altura dela, rente.— Regina
gesticulava com a mão e mostrava onde queria que fosse cortado.
— Ok, eu vou cortar um pouco maior pra poder ajeitar as pontas caso
fique torto ou algo do tipo, tudo bem?
— Certo.— Sorriu. — Faz a frente menor, por favor — pediu
educadamente.
Jennifer penteava o cabelo de Regina ao mesmo tempo em que
conversava com ela.
— Quando te conheci seus cabelos eram bem curtos.
— Sim, realmente. Você lembra exatamente como eram?
— Impossível esquecer — disse, florescendo um sorriso em Regina.
— Então você pode cortar exatamente como se recorda. A propósito...
Sabe que dia é hoje?
Jennifer calou-se por alguns segundos, pensou e sorriu ao lembrar
exatamente de qual data se tratava.
— Ano passado nessa mesma data eu voltei às aulas. Então...
— Faz um ano desde que nos conhecemos — disseram juntas ao sorrir.
— Sabe, amor... Eu ainda me sinto tão culpada pela sua demissão —
lamentou Jennifer. Ela já havia começado a cortar algumas mechas do cabelo.
— Não se sinta.— Respondeu suavemente. — Dentre todos os motivos
que eu já citei, a demissão foi fundamental principalmente porque eu te amo.
Você vale muito mais que um emprego, Jennifer. Deveria saber disso. Eu tenho
certeza do que sinto por você.
— Eu tento enxergar de outra maneira, mas sei lá...
— Muitas vezes no amor alguns sacrifícios são necessários. E por ser
amor, esses sacrifícios acabam tomando outra aparência e não o vemos dessa
maneira — explicou a morena. — Lembra quando você quis me deixar livre
porque pensou que seria o melhor pra mim? É mais ou menos isso.
— É... O amor nos faz fazer coisas inimagináveis. Nos modifica —
comentou a loira ao mesmo tempo em que deixou a mente vagar. Ela estava
prestes a fazer uma pergunta para a mulher e temia sua resposta, embora já
imaginasse qual seria. — Regina...— iniciou ao fazer uma pausa no corte. — Já
teve alguém antes de mim?— perguntou receosa. — Quer dizer, alguém que
você já tenha amado.
A mais velha hesitou por alguns instantes enquanto pensava no passado
e logo a respondeu com suavidade em sua voz.
— Sim... Uma mulher, uma vez. Há algum tempo.
Jennifer se calou diante àquela afirmação. Um gosto amargo tomou
conta de sua boca ao mesmo tempo em que sentiu um pequeno desconforto no
peito.
— E o que aconteceu?— perguntou após alguns instantes de silêncio.
— Éramos muito incompatíveis. Não nos gostos, mas em personalidade.
Tínhamos maneiras muito opostas de enxergar a vida e isso acarretou em muitas
brigas.
— E vocês não tentaram contornar a situação? É normal ocorrer
algumas brigas entre casais. Mas os dois lados precisam ceder um pouco.
— E se eu disser a você que meu erro foi ceder demais? Eu a amava
muito e acabava me anulando pra evitar discussões. Mas esse não era o
relacionamento que eu queria pra mim. Eu gosto de ter a liberdade de ser quem
sou, e não se faz necessário pedir desculpas por isso. Ceder em alguns pontos é
fundamental, sim. Mas anular quem somos por alguém, não é saudável. Afinal,
ela amava a mim ou à figura na qual ela queria me transformar?
— Realmente. E você é tão dona de si, tão leve, tão livre de espírito. É
justamente o que me encanta. Não consigo imaginar uma Regina vivendo sob os
domínios de alguém.
— Eu vivi assim por um tempo por amá-la demais. Mas eu não sou o
tipo de pessoa que encontra felicidade dentro de uma gaiola que se intitula
perfeita. Se é gaiola, está longe de ser a perfeição.
— E quanto tempo você ficou com ela?
— Pouco mais de dois anos e meio, que foi quando as coisas pioraram
muito e eu rompi.
— Nossa, até que durou bastante tempo.
— Ela não era assim no início. Ou pelo menos não deixou transparecer.
Hoje em dia me pergunto se ela realmente me amava ou se o que sentia era uma
grande obsessão.
— Ela era ciumenta? Desculpa estar te enchendo de perguntas a
respeito, mas é que nunca conversamos sobre isso — disse ao caminhar para
frente de Regina.
— Está tudo bem, pode perguntar o que quiser — comunicou com
suavidade na voz. — Com o tempo ela se mostrou muito ciumenta, a ponto de
implicar com tudo e todos, até com minha irmã. Mas não estou contando essas
coisas como se quisesse falar mal dela. Eu acho muito feio pessoas que falam
mal dos ex parceiros, amigos ou de alguém que com quem já tenha tido algum
vínculo. Afinal, aquela pessoa já foi importante pra nós algum dia, e não é
porque deixou de ser, que se tornou motivo pra que falemos mal. O que
aconteceu entre mim e ela foi apenas incompatibilidade. Não admito que me
oprimam, muito menos por ciúmes. Mas há quem se passe pra isso.
— Eu sou um pouco ciumenta, não vou negar. Estou até sentindo
ciúmes do seu passado agora. Mas eu não acho que seja algo exagerado, e eu
jamais iria oprimir você.
— Oh Jen... Não precisa sentir ciúmes dela. Eu a amei demais, sim.
Mas isso ficou pra trás.
— Eu sei, é bobeira minha me sentir assim. Até porque eu sei que você
tem sua bagagem, seu passado e tudo o que constitui a sua história.
— Não é bobeira pra mim se te causa desconforto. Mas eu não gostaria
que tivesse motivos pra sentir ciúmes — disse delicadamente.
— Vai passar. É que eu queria ter sido única na sua vida.
— E quem disse que você não é única na minha vida? Eu amo você. E
ninguém nunca foi capaz de despertar em mim tudo o que você desperta.—
Regina expressou um sorriso amplo, completo, daqueles que fazem até os olhos
sorrirem juntos. — E não pense que não sinto ciúmes de você também. Me dá
motivos pra você ver do que sou capaz — disse em to ameaçador ao arquear
uma das sobrancelhas, arrancando um riso da jovem.
— Acho melhor eu andar na linha, não é?
— Totalmente!— Riu.
— Eu nunca amei alguém antes. E eu ainda sou tão nova, que seria
estranho se eu já tivesse ex amores. Ou não? Ah, eu não sei como isso funciona.
— Riu. — Mas você é o meu primeiro amor, você sabe. E eu queria muito que
fosse o único — disse timidamente. Ela possuía absoluta certeza de que suas
bochechas estavam coradas.
Regina a tocou na mão com delicadeza e a segurou.
— E eu adoraria ser o seu único.— Sorriu. — Nós podemos tentar todos
os dias fazer dar certo.
— Sim, podemos...— A loira retribuiu o sorriso e voltou para as costas
da professora, onde deu continuidade ao corte.
— Terminei! Vou buscar um espelho e você me diz o que achou. Onde
tem um?
— Pode pegar esse oval que está na parede da sala.
Meireles soltou o espelho da parede e o levou até a mulher, que se
encantou com o resultado final.
— Jen! Ficou ótimo!— exclamou ao depositar as mãos nos fios e
admirar o trabalho feito. — Obrigada! Adorei!
— Não foi nada. Posso ficar encarregada de cortá-los sempre agora?
— Com toda certeza!— respondeu sem desviar a atenção do próprio
reflexo.
— Toma, segura ele que eu vou tirar umas fotos suas com meu celular.
A loira deu o espelho nas mãos da morena, que o depositou sobre a
mesa de centro, e tirou o celular do bolso. Posteriormente, começou a disparar
flashes em cima de Regina.
— Jennifer, para, estou ficando sem jeito — disse com um pequeno
sorriso nos lábios enquanto tentava esconder o rosto e desviar das capturas.
— Só paro se tirar uma foto comigo! Vem, cola aqui em mim —
chamou.
— Mulher teimosa — resmungou antes de tomar uma posição ao lado
da loira.
Jennifer bagunçou os cabelos da professora com as mãos e fotografou
algumas fotos ao lado dela. Fotos estas, que ela certamente iria mandar imprimir.
Em meio às capturas, Meireles começou a soltar alguns espirros. O
clima havia esfriado fazia alguns dias. O céu estava nublado e a temperatura
havia despencado abruptamente naquele início de noite. Jennifer usava touca,
calça jeans, os tênis que havia deixado na área de serviço, camiseta e uma blusa
xadrez vermelha de manga comprida com todos seus botões fechados. Aquele
conjunto de roupas bastava apenas para aquecê-la da frieza de mais cedo. Mas
agora o clima havia se tornado gélido.
— Quer um chocolate quente?— A mais velha ofereceu. Regina estava
apenas de calça jeans, blusa preta e um pequeno lenço estampado em seu
pescoço. Ela havia retirado o sobretudo pra molhar os cabelos e agora estava
sentindo o efeito da baixa temperatura climática.
— Oh não, amor. Obrigada. Eu já estou indo pra casa.
— Mas já?— disse com a voz carregada de manha.
— Sim, vim apenas cortar seu cabelo e ficar uma horinha. Ainda tenho
algumas coisas pra fazer em casa e eu não quero chegar tarde pra dona encrenca
não ficar reclamando demais — explicou. — Ela nunca se importou com meus
horários, pois sempre teve confiança em mim, mas desde que nos envolvemos
está numa implicância terrível.
— Fazer o quê...— lamentou. — Vou buscar a chave do carro pra gente
ir.
— Ah não, não precisa se preocupar. Eu pego o metrô ou um ônibus.
Você já me buscou no trabalho e me levou pra resolver as questões da faculdade,
eu vou sozinha agora pra você não precisar voltar de novo.
— Sabe que não me importaria de dar quantas viagens fossem
necessárias, não é? Mas tudo bem. Leva um guarda-chuva, pois o tempo lá fora
está péssimo.


Após um banho morno e prolongado Regina vestiu-se com um conjunto
de moletom azul marinho na tentativa de aquecer-se daquele frio repentino. Feito
isso, isolou-se em seu quarto com uma caneca do seu chá favorito e um livro. Ao
final da leitura quando o sono começou a lhe arrebatar, escovou os dentes e
adormeceu na companhia de seu gato.
Regina tinha o hábito de acordar cedo. Ao amanhecer do dia seguinte,
em meio a um café forte com torradas, verificou se havia alguma mensagem de
Jennifer em seu celular. A loira lhe deixava uma mensagem de bom dia todas as
manhãs antes de ir para o serviço.
Estranhando não haver mensagem alguma naquele dia, se dirigiu com
sua caneca para o escritório; local onde permaneceu por algumas horas
enquanto corrigia alguns exercícios e fazia planejamentos de suas aulas de
espanhol.
Após o meio dia quando encerrou o trabalho e dirigiu-se para a cozinha
com a intenção de preparar algo leve para o almoço, recebeu uma ligação da
namorada.
— Alô?
— Oi amor.
— Jen? Está tudo bem?— perguntou ao perceber algo estranho na voz
da mais nova.
— Não muito — disse com a voz abafada e arrastada. — Amanheci
esquisita, acho que peguei uma gripe daquelas.
— O que você está sentindo?
— Dor de cabeça, moleza, nariz entupido e a garganta doendo muito.
Ontem estava chovendo muito no meu bairro quando cheguei. O guarda chuva
não deu conta de me proteger, estava ventando demais.
— Então certamente foi isso! Está no trabalho?
— Não, não consegui ir. Estava muito indisposta.
— Oh meu amor, então descanse o quanto conseguir. Já se alimentou?
Está bebendo bastante água? É fundamental para uma boa recuperação.
— Tomei apenas um copo de leite, não estou com apetite.— A voz da
jovem estava baixa e bastante abafada.
— Mas tem que se alimentar, meu amor. Queria poder estar aí pra
cuidar de você.
— E eu adoraria que estivesse aqui — lamentou do outro lado da linha.
— Vou fazer aquelas sopas instantâneas pra almoçar.
— Isso não é alimento, Jennifer.
— É a única coisa que tem por aqui. Mas não se preocupe, minha mãe
deve me preparar algo quando chegar. Ou eu mesma posso tentar fazer algo
antes disso. Vou ficar bem, viu? Só liguei pra te avisar e porque queria ouvir sua
voz.
— Oh meu amor, obrigada por telefonar, eu estou adorando ouvir a sua,
mesmo que esteja tão fraquinha e manhosa. Que vontade de cuidar de você.
— Oh céus, como eu adoraria ser cuidada por você. Mas não gostaria
que me visse nesse estado. Estou horrível.
— Ficar horrível é algo impossível pra você. Aposto que está com sua
jubinha loira bagunçada e o nariz um pouco rosado da gripe. Daria tudo pra ver
isso.
— Ai, eu estou exatamente assim! Ou seja, em péssimo estado. Você
iria perder o encanto assim que me visse.
Regina não conteve o riso ao escutar a maneira frustrada com a qual sua
namorada dizia aquelas coisas.
— Pois fique você sabendo que gosto de mulheres reais. Quanto mais
humana você se mostrar, mais interessante irá ficar.
— Sei... — disse com desconfiança na voz. — Bom, eu vou desligar
agora porque tomei um remédio e ele começou a me dar sono. Quando acordar
eu te informo sobre meu estado, tudo bem?
— Ok. Melhoras pra você, amor.
— Obrigada! E, ah, Regina...
— Sim?
— Eu te amo.


Dois dias se passaram e o estado de Meireles piorou. Além de fortes
dores de cabeça e uma intensa congestão nas vias aéreas, que só aliviava com
nebulização, a temperatura de seu corpo subiu drasticamente. Morgana faltou a
um dia de serviço e a acompanhou ao médico para que pudesse receber um
diagnóstico e assim poder iniciar as medicações corretas.
Com a mudança climática brusca que arrebatou a cidade, Jennifer havia
sido acometida por uma forte alergia respiratória. A tosse e a dor no peito
também eram alguns dos sintomas.

Por mais que Regina sempre prezasse a educação e o respeito, saber que
Jennifer estava doente e não poder fazer algo por ela a estava consumindo.
Aquele era um tipo de situação que não iria admitir passar. E se ela precisasse
bater de frente com Morgana Meireles pra poder cuidar de Jennifer, ela o faria.
Porque para Regina não existe valores que estejam acima do bem estar de quem
se ama.
A morena vestiu-se com um vestido vermelho, meia calça escura e um
sobretudo preto com todos os botões fechados para se proteger do frio que ainda
se fazia presente por lá. Enrolou um cachecol no pescoço, calçou um salto não
muito alto e se foi.

— O que faz aqui?— perguntou Morgana ao atender a porta e se deparar
com a figura de Regina. Era início de noite e ventava bastante lá fora.
— Boa noite. Eu queria saber como a Jennifer está, queria vê-la —
disse educadamente.
Morgana respirou fundo e por um momento não soube ao certo como
agir.
— Fomos ao médico, ela está com alergia respiratória, mas foi
medicada e os sintomas amenizaram. Apenas a febre que não quer cessar —
disse com seriedade na voz.
— Jennifer me contou. Estou muito preocupada com ela e passei esses
dois dias aflita por não poder estar próxima.
— Não se preocupe, tenho dado suporte.
— Eu sei que sim, mas eu gostaria de vê-la.
— Jennifer está dormindo.
— Não me importo. Eu só preciso vê-la, senti-la, mesmo que não saiba
que estou com ela.
A mãe de Jennifer cerrou os punhos, respirou fundo e a respondeu.
— Olha, eu não gosto de você e acho que isso já está mais do que claro.
Mas a minha filha está doente e sei que a sua presença vai alegrá-la. Então vem,
entre — disse seca.
Regina adentrou o imóvel a passos lentos. Ela sabia que não era bem
vinda ali, mas se sentiu feliz ao saber que Morgana estava colocando a filha à
frente de suas desavenças.
— O quarto dela fica lá em cima. É a primeira porta à esquerda —
explicou. Morgana esboçava uma séria expressão e falava com frieza na voz. Ela
evitava ao máximo encarar a face da professora.
Ao subir as escadas e virar à esquerda, Regina se deparou com uma
porta branca de madeira entreaberta. Através dela pôde avistar Meireles
encostada contra grandes almofadas e com um edredom cobrindo metade de seu
corpo. A loira estava com uma caneca na mão enquanto mexia em algo no
celular.
— Jen?— chamou ao bater sutilmente.
A mais nova direcionou o olhar para a porta e seus olhos se arregalaram
ao se depararem com a imagem da última pessoa que imaginaria ver ali.
— Regina!— disse incrédula. — O que... o quê faz aqui?— A loira era
um misto de surpresa e felicidade.
A mais velha sentiu uma sensação única ao entrar no quarto de Jennifer
pela primeira vez. Era como se cada detalhe daquele cômodo carregasse um
pedaço da jovem.
— Vim cuidar de você — respondeu ao expressar um pequeno sorriso
nos lábios.
Meireles ajeitou-se na cama, largou o celular sobre o colchão e abriu
um espaço pra que a morena se sentasse.
— Mas, mas... E a minha mãe?— perguntou confusa e assustada.
— Está tudo sob controle, não se preocupe.— Sorriu. Regina depositou
a mão sobre as ondas bagunçadas de Jennifer e começo a acariciar aqueles fios
dourados com delicadeza e ternura ao mesmo tempo em que a olhava. — Como
está se sentindo? Não parei de pensar em você. Meu coração esteve apertado
nesses dias.— Falava com suavidade e ternura na voz.
— Acordei péssima hoje de manhã, que foi quando minha mãe me
levou ao médico. Dormi durante a tarde quase toda e agora estou melhor. Estava
lendo um pouco e acabei de pegar no celular pra te enviar uma mensagem —
respondeu enquanto se deliciava com o afago que recebia em seu cabelo. A
jovem depositou a caneca de leite, o livro e o celular sobre o criado mudo. —
Mas ainda me sinto quente.
Regina depositou as costas da mão sobre a testa e o pescoço da mais
nova e constatou que ainda estava febril.
— Já tomou algum anti térmico?
— Sim, mas não está adiantando.
— Eu conheço um método muito eficaz pra quando a medicação não
funciona. Onde tem meias?
— Meias?
— Sim, vou molhá-las com água gelada e vestir os seus pés. É ótimo
pra baixar a temperatura.
— Hum... Ok. É só abrir o guarda-roupa e procurar em uma das gavetas
— apontou.
— Jennifer! Que roupas bagunçadas são essas? Não consigo sequer
achar as meias em pares!— comentou ao se deparar com a pequena desordem
que era o armário da loira.
Diferente dela, Meireles não ordenava as peças por cores e tipos. Não
possuía gavetas apenas para meias e tampouco as guardava em pares. Ficavam
todas soltas e espalhadas em gavetas distintas.
— Qual foi, Regina? Dá um desconto! Nem está tão bagunçado assim,
vai? Já esteve pior.
— Eu não consigo nem imaginar algo pior que isso — resmungou
enquanto buscava duas meias iguais.
— Eu escutei isso, senhorita arrumação.
— É bom que escute mesmo pra se envergonhar — disse, fazendo a
loira revirar os olhos. — Onde posso umedecê-las?
— Espera, vou pedir pra minha mãe fazer isso.— Meireles gritou por
Morgana, que subiu até o quarto, e pediu para que ela as molhasse com água da
geladeira.
— Tem certeza que isso vai servir, amor?
— Sim, confia em mim.— Sorriu.
As duas mulheres conversavam distraidamente enquanto aguardavam o
retorno de Morgana. Elas estavam tão entretidas na conversa que não escutaram
o retorno da mulher. Morgana subiu lentamente e parou próxima à porta a tempo
de escutar o que falavam sobre ela.
— Eu ainda não estou acreditando que minha mãe deixou você entrar.
Estou até com medo dessa atitude. Sabe nos filmes quando parece que o vilão
deu uma trégua e na verdade ele está tramando algo pior? Então.
— Oh Jennifer, não fala assim. A sua mãe não é má pessoa. Me lembro
perfeitamente de todas as vezes em que você me disse a mãe maravilhosa que ela
era.
— Sim, eu sei. Mas ela te odeia!
— Pode até ser que sim. Mas o amor dela por você está acima de
qualquer coisa. Me deixou entrar porque sabia que minha presença te faria bem.
— Não sei, estou desconfiada e com medo.
— Não fique. Não carregue jamais sentimentos ruins por ela. Eu sei que
te magoou em muitos momentos, mas não podemos esquecer que antes dela ser a
sua mãe, ela é um ser humano falho como qualquer outro. Se fez o que fez, foi
tentando acertar. Um dia, talvez, nós também sejamos mães, e vamos perceber
que nunca conseguiremos ser perfeitas. Os pais também têm o direito de errar.
— Você sempre a defende — retrucou.
— Não é verdade. Aos meus olhos o preconceito é algo feio e que torna
as pessoas pequenas. De forma alguma eu defendo isso nela. Mas eu consigo me
colocar no lugar, você me entende? Para quem não vive a nossa realidade pode
ser difícil aceitar algo assim. Ainda mais após aquele choque que ela sofreu.
Encontrar aquelas fotos foi uma péssima maneira de descobrir tudo.
— É, eu sei... Eu queria tanto ter conversado com ela antes, Regina.
Tanto...
A conversa foi interrompida quando Morgana sentiu que já estava
demorando demais para retornar e resolveu entrar.
— Aqui está — disse com uma séria expressão ao entregar as meias nas
mãos de Regina.
— Obrigada.
A morena pegou as meias já torcidas e envelopou os pés de Meireles com
elas.
— Agora é só aguardar. Talvez precise molhar novamente quando
esquentar.
— Que sensação horrível essas coisas molhadas nos pés!
— É bem desagradável mesmo — concordou ao soltar uma risada.

Morgana deixou o quarto a ponto de ouvir Regina cantando uma canção
em outro idioma para Jennifer. E por mais que ela não aprovasse aquela situação
e sentisse uma pontada de ciúmes, estava começando a reconhecer que a mulher
gostava verdadeiramente de sua filha.



— Não corta as cenouras em pedaços grandes, Jennifer não gosta.
— Sim, ela gosta. Desde que fiquem bem cozidas.
— Eu cozinho pra minha filha há anos e sei que ela não gosta.
— Na minha casa ela comeu e adorou. É só jogar na sopa e deixar
cozinhar antes das batatas pra que os pedaços não fiquem duros.
Regina e Morgana estavam na cozinha preparando uma sopa para
Meireles. Na verdade, elas mais discutiam que trabalhavam em equipe. De um
lado Regina tentava usar suas habilidades culinárias, do outro Morgana ditava a
maneira que a filha mais gostava.
Jennifer chegou na cozinha e esboçou uma expressão surpresa ao ver as
duas mulheres produzindo algo juntas. Ela começou a se questionar se a febre
não estaria lhe causando alguns delírios.
— Filha, o que faz aqui embaixo?
— Já estou me sentindo melhor. Dei uma cochilada e quando acordei
percebi que estava sozinha.
— Como está a febre?— perguntou a morena ao se aproximar e
depositar a mão em sua testa. — Pelo visto se foi.— Sorriu ao constatar.
— Meias milagrosas!— comentou a loira, rindo. — O que estão
preparando?
— Uma sopa.— Morgana se manifestou.
— Essa eu quero ver...— murmurou a si mesma ao sentar-se na cadeira
para observá-las.
— Tome cuidado com essa tigela pra não quebrá-la. Ganhei da minha
mãe como presente de casamento quando casei com o pai de Jennifer.—
Morgana implicou.
— Mãe, você nem liga pra isso! Eu mesma já quebrei quase todo o
jogo.
— Quem disse que não me importo? Fiquei muito chateada quando
você os quebrou.
— Tudo bem, eu uso outra coisa.— Regina respirou fundo, contou até
dez e pegou outro recipiente.
— Não feche a panela agora. Vai dar água demais — disse Morgana ao
depositar bruscamente a mão sobre a tampa e puxá-la.
— Não vejo problema nisso. Melhor de mais, que de menos. Preferível
diminuir um pouco do caldo que acrescentar água futuramente, pois não daria
tempo de pegar o gosto do tempero. A menos que a Jennifer goste de sopa grossa
igual uma pasta.
— Argh, não!— A loira se manifestou.
— Você quer mandar na minha forma de cozinhar?— disse Morgana
com a voz alterada.
— Não. Quem está querendo ditar coisas aqui não sou eu.
— Vocês duas parem, por favor!— Jennifer se pronunciou ao levantar-
se.
— Olha, eu vou tomar um banho e me trocar. Preciso cobrir uma
matéria essa noite.— Morgana jogou o pano de prato na bancada e subiu raivosa
para o segundo andar.
— Jennifer, sua mãe é impossível! Definitivamente essa mulher me
odeia!
— Ela não é tão chata assim — respondeu aos risos. — Está implicando
com você de propósito. Acho que está com ciúmes.
— Espero sair viva daqui essa noite — comentou, arrancando uma
risada ainda maior da namorada. — Você ri, não é? Só porque não está no meu
lugar.
Embora estivesse um pouco tensa e preocupada com tudo aquilo, a mais
nova conseguia se divertir com aquela situação. Principalmente das expressões
que a professora esboçava.
Alguns minutos se passaram e Morgana ressurgiu na cozinha.
— Jennifer, estou indo cobrir uma reportagem de última hora no
serviço. Devo chegar tarde. Você vai ficar bem?
— Sim, mãe. A Regina está aqui comigo.
— Não se preocupe, eu fico com ela até você voltar.— A morena se
manifestou.
— Mas eu devo demorar muito a chegar. Até pedirei pro meu noivo me
buscar. Pode ser perigoso você sair daqui tão tarde.
— Então a Regina pode dormir aqui...
— Nem pensar.— Morgana respondeu com autoridade.
— Pode ir trabalhar despreocupada que eu fico com Jennifer sem me
importar com a hora.
— Ok.— Morgana despediu-se da filha com um beijo em sua testa e se
foi.
Assim que Jennifer terminou de tomar a sopa, convidou Regina para
que ela pudesse conhecer sua casa. Mostrou todos os cômodos do imóvel
enquanto lhe contava suas histórias de infância vividas ali. Seu quarto foi a
parada final.
— Esse dia foi tão especial — comentou ao tocar a miniatura da torre
de Pisa que Meireles guardava sobre a mesa do computador.
— Muito. Eu guardei esse presente junto com as lembranças desse dia
com todo carinho — disse Jennifer. — Assim como guardei isso...— A loira
abriu a gaveta que havia na mesa e de lá tirou um guardanapo.
— O que significa?
— Lembra quando paramos em um quiosque pra lanchar?— Regina
assentiu positivamente. — Então, houve um momento em que você retocou o
batom e tirou o excesso com esse papel. Sem que você percebesse eu o guardei
na bolsa. Sempre quis te guardar comigo de todas as maneiras possíveis. E eu
tinha medo que em algum dia esse guardanapo fosse tudo o que me restasse de
você.
— Jennifer...
— Eu te amo há muito tempo, Regina. Mesmo que eu não tenha
percebido.
A mais velha sorriu com o canto dos lábios e deixou o olhar intenso e
apaixonado cair para a boca rosada de Jennifer.
A loira deu um passo adiante e a tocou nos curtos cabelos castanhos
com as duas mãos, os segurando para trás de modo a deixar aquele rosto
marcante à mostra. E assim, sem soltá-los, ela permitiu que seus lábios tocassem
os dela com sutileza.
Regina havia tirado o sobretudo e os saltos assim que entrou. Dessa
forma ela estava em sua altura real, que correspondia a alguns centímetros
abaixo da loira.
Durante o beijo que se fazia lento, as duas mulheres foram
movimentando os corpos e se conduzindo para a cama da loira. Regina se deitou
por baixo e recebeu o corpo de Jennifer sobre o dela.
A mais nova sorria por dentro ao ter a ex professora deitada em sua
cama pela primeira vez. Em seu interior ela torcia para que o cheiro da mulher
ficasse ali marcado.
Regina beijava e tocava Jennifer com delicadeza. Seus toques eram
sutis como nunca antes. Era um contato que transmitia amor, carinho, ternura e
cuidado. E ali, entre beijos lentos e singelas trocas de afeto, falavam sobre o
futuro que acreditavam ter.

As estradas tortuosas da vida sempre nos fazem topar com alguém. Às
vezes não o enxergamos na primeira visão, o que nos faz tomar muitos caminhos
distintos e insatisfatórios até encontrarmos o correto. No entanto, algumas vezes
o contato é imediato e os olhos da alma sorriem antes mesmo que nossos lábios
possam afirmar.
Nossas almas se conhecem e se reconhecem antes mesmo da
compreensão da razão. Não existe o tempo certo, a idade ou o cenário adequado.
A alma não tem cor, nível social, gênero e não reconhece faixa etária. Ela apenas
faz a leitura do que os olhos não enxergam.
Não importa se é na Classe trezentos e nove ou no banquinho da praça
em um domingo ensolarado. O amor vai estar lá aguardando a sua vez.

Regina Vianna


Capítulo 38

Algumas semanas haviam se passado. Regina havia recebido o
resultado e a resposta positiva das duas instituições e agora lecionava na rede
particular e também na pública. Abrangendo o turno da manhã na escola pública
e o da tarde na instituição privada. Ambas de ensino médio.
O tempo ao lado de Jennifer se tornou menor, mas muito bem
aproveitado. Diferente do ano passado, que se viam quase todos os dias no
colégio e quase não podiam interagir, agora, não se encontravam diariamente,
mas podiam passar noites juntas e se encontrarem aos finais de semana.
Morgana permanecia entortando a cara para esse relacionamento, no
entanto, não fazia proibições.

Caminhando sobre seus saltos, Regina Vianna cruzava todas as escadas
e corredores do novo local de trabalho. Ela não perdia a postura séria e
imponente que despertava arrepios, mas também impunha respeito; com exceção
de alguns poucos alunos que ainda se atreviam a assobiar para ela.
Os garotos só faltavam babar com seus maxilares quase ao chão. E as
meninas a tinham como um modelo a ser seguido. Desejavam ser belas,
elegantes e tão inteligentes quanto ela.

Parada em frente à porta entreaberta da classe onde a professora estava
dando aula naquele momento, Meireles a admirava em silêncio. Regina estava
sentada em sua mesa fazendo algumas anotações em um caderno do qual a loira
não conseguia identificar. Provavelmente se tratava do seu caderno de poemas.
A morena sempre gostou de fazer alguns rabiscos nele enquanto os alunos se
entretiam nos deveres que lhes foram passados.
Sentir um gosto nostálgico na boca seguido de um aperto no coração foi
inevitável para a loira. Em poucos instantes um flashback dos momentos vividos
em sala de aula com Regina passou em sua mente. A postura da morena era a
mesma que ela se lembrava: charmosa, firme, séria, que impunha poder.
Meireles sorriu ao lembrar que apenas ela conheceu e conhecia a
mulher por trás de todo aquele manto, e que aqueles alunos só veriam dela o que
ela quisesse mostrar.
Jennifer escondeu-se atrás da porta quando avistou a namorada
levantando. Ela se manteve quieta a observando trabalhar. Para ela, aquilo era
como se perder em um delicioso momento do passado. E enquanto Regina
ensinava sua História, Jennifer se perdia em sua fala.
Não demorou muito para que os alunos observassem a movimentação
na porta e olhassem para ela, fazendo a morena também direcionar o olhar e
avistá-la ali.

— Um momento — disse para a classe. Regina caminhou até a porta e a
fechou atrás de si, dando privacidade para ela e a namorada no corredor.
— Que vontade de voar nessa professora gostosa que eu acabei de ver
— disse brincando.
— Jennifer!— repreendeu-a baixinho, porém, adorando o comentário
recebido. — Que surpresa gostosa foi essa?— Sorriu.
— Larguei do serviço e não pude deixar de vir aqui prestigiar a minha
mulher um pouquinho.
Meireles agora trabalhava no turno de sete às quatro da tarde na
academia. Ela possuía um tempo de duas horas até o horário de entrada na
faculdade, que era às seis da noite.
— Oh, obrigada. E o que achou do que viu?
— Achei que eles são uns sortudos por terem uma professora tão
magnífica. Senti saudades dessa época e até mesmo um pouco de inveja.
— Mas você não precisa sentir inveja. No final do dia é você que me
leva pra casa — piscou ao sorrir.
— Por falar em casa... Eu queria saber se ainda está de pé irmos olhar
alguns apartamentos juntas no final de semana.
— Claro! Já falou com sua mãe a respeito?
— Ainda não. Será outra novela até ela compreender minha saída de
casa. Mas vou notificá-la hoje mesmo sobre isso.
— Certo. Espero que a reação seja a melhor possível.
— Eu também. Bom, agora vou te deixar trabalhar e ir pra faculdade.
Nos falamos mais tarde por telefone, tudo bem? Posso te ligar antes de dormir?
— Claro que pode. Estarei aguardando sua ligação.
As duas mulheres se abraçaram de maneira carinhosa e no mesmo
instante Regina fez partes distintas do corpo de Jennifer se arrepiarem após seu
sussurro ao pé do ouvido.
— Queria poder dar um beijo bem gostoso em você agora, mas vou me
contentar com a imaginação.— Após proferir o sussurro de palavras, afastou-se
e caminhou em retorno para a classe.
— Onde paramos?


Era em torno de dez e quarenta da noite quando Jennifer chegou da
faculdade e encontrou Morgana e Diogo sentados juntos na sala tecendo planos
para o casamento que estava marcado para um pouco antes do final daquele
mesmo ano. Entre sorrisos e gargalhadas, ambos pareciam felizes decidindo
detalhes como as cores das flores. Diogo era o tipo de noivo que gostava de se
mostrar presente até mesmo nesses momentos em que muitos homens jogavam
as questões para cima das noivas.

— Boa noite, pombinhos!— disse ao entrar. Jennifer jogou a mochila
na poltrona e tomou um lugar próximo aos dois. Mais precisamente, entre eles.
— O que estão vendo aí?— comentou ao olhar para a tela do notebook. —
Hum... Arranjos de flores, modelos de convites...
— Como foi seu dia?— Morgana perguntou.
— Cansativo, mas ótimo!— respondeu com um largo sorriso. Ter visto
Regina, ainda que por poucos minutos, havia lhe dado gás para concluir o dia
com alegria. — E vocês? Vejo que estão animados e felizes pensando no
casamento — comentou ela. — Confesso que estou super ansiosa como se fosse
eu a me casar.
— Estamos muito animados mesmo!— confirmou Diogo com
empolgação. — Já teve o sonho de se casar alguma vez, Jennifer? Algumas
mulheres têm esse desejo desde criança, ou estou enganado? Posso estar falando
uma besteira aqui.
— Eu me imaginava vestida de noiva desde a pré adolescência — disse
Morgana ao se manifestar. — Mas nunca vi você falar a respeito, filha —
comentou ao direcionar o olhar para Jennifer.
— Ah... Eu nunca havia pensado nisso. Acho que comigo acontece
diferente. Eu preciso que alguém desperte em mim essa vontade. Nunca sonhei
com isso de festa e vestido, embora eu pense que deva ser o máximo planejar
tudo isso com quem amamos.— Enquanto olhava todas aquelas imagens no
visor, pensar em como seria compartilhar a vida ao lado de Regina foi inevitável.
No entanto, logo tratou de afastar tais pensamentos. Afinal, ainda era muito cedo
para pensar a respeito. — Mãe, eu gostaria de te dizer algo...
— Oh céus, da última vez em que a frase começou assim não acabou
bem — disse Morgana.
— Quer que eu saia?— perguntou Diogo.
— Não precisa. Você é da família e vai se tornar ainda mais agora.
Quero que participe — respondeu a loira. — Então... É que vocês vão se casar e
serão uma família agora. Você terá ao Diogo pra te fazer companhia futuramente
e ele consequentemente terá você.— Meireles enrolava enquanto buscava as
melhores palavras a serem ditas. — Eu quero seguir com a minha vida, mãe.
Quero crescer, andar com as próprias pernas, assumir responsabilidades. E eu
preciso da minha privacidade. Em outras palavras... Quero sair de casa.— Soltou
em um fôlego.
— É o quê, Jennifer Meireles?— disse em voz alta ao se levantar do
sofá e por a mão na cintura. — Não me diga que está indo morar com aquela...
— Morgaaana!— Diogo repreendeu.
— Com a Regina.— A mãe de Jennifer concluiu.
— Não, não! Não tem nada a ver com a Regina. É um pouco de tudo o
que rolou, confesso. Nunca tive planos de sair de casa tão cedo. Se trata muito de
você e de mim. Mais precisamente de mim. Preciso muito ter a minha liberdade.
— Você tem liberdade. Entra e sai de casa a hora que quer e está com,
com, com a Regina — disse a muito custo. — Mesmo contra a minha vontade.
— Não se trata exatamente dessa liberdade. Mas sim do direito de ser
eu. Sem represálias, sem olhares tortos, entende? Eu amo você, mãe. Amo
demais. Mas eu preciso disso.
— O que eu posso fazer? Vai em frente — disse em um misto de
tristeza e raiva.


— Eu definitivamente a perdi — comentou, momentos mais tarde,
quando estava nos braços de Diogo antes de dormir.
— Você não a perdeu, amor. Ela apenas está saindo de casa. Isso
acontece mais cedo ou mais tarde. Com a Jennifer aconteceu muito cedo,
admito, mas você foi a responsável por isso, desculpa dizer. E tem sorte de não
tê-la a perdido de vez.
— Não fala isso! Eu morreria sem a minha garota — disse com tristeza
e pesar. — Assumo que peguei pesado. Assumo que ainda não me agrada a ideia
de vê-la com uma mulher, e ainda por cima tão mais velha. Mas eu estou
tentando, Diogo. Estou engolindo.
— Aí está o erro, no engolir. Você irá conseguir resgatar o que vocês
tinham quando for capaz de entender e respeitar a sua filha e as escolhas que ela
tomar pra vida. Não vou dizer o que você deve ou não fazer, amor. Isso precisa
sair do seu coração. Suas atitudes causaram alguns danos que precisam ser
reparados. Pense nisso.


Era uma manhã de sábado quando Jennifer aguardava Regina terminar a
correção de alguns trabalhos em seu escritório. Em seguida sairiam juntas para
visitarem alguns apartamentos.
A loira explorava os objetos decorativos e os livros da mais velha
enquanto aguardava. No meio disso, encontrou um globo de neve com um
pinguim de cachecol verde sobre uma das prateleiras.
— Havia um desses lá em casa quando eu era criança — comentou ela,
fazendo a mais velha dar uma pausa no que estava fazendo e olhar para o lado.
— Eu passava minutos observando e me questionando se ele não se sentia
solitário aí dentro — dizia ao manter os olhos fixos no globo. — A lembrança
está um pouco enevoada agora, eu era pequena demais pra lembrar os detalhes.
Mas recordo de me questionar se além de solitário ele não sentia muito frio. Eu
costumava levá-lo pra cama junto comigo e cobri-lo com meu cobertor —
comentou ao caminhar para perto da namorada.
— Meu Deus, que criança graciosa você devia ser!
— Todos dizem que sim.— Sorriu. — E ainda sou, não sou?
— Uma criança?— A mais velha implicou.
— Não, Regina. Graciosa!— Jennifer revirou os olhos.
— Ei, não fica brava, vem cá.— Regina segurou a mão da namorada e a
puxou para mais próximo. Ela depositou os óculos de grau sobre a mesa e
guardou a papelada na gaveta. — Você é graciosa, sim. Agora me dá um
beijinho? Estou com saudade. Faz mais de uma semana desde a última vez que
fizemos amor.
— Não está merecendo por ser uma implicante — retrucou.
— Não faz assim, vai— Regina levantou-se da cadeira e imprensou
delicadamente a loira contra a mesa.
— Se depender de mim vamos continuar sem fazer.— Jennifer
continuou a dizer.
— Por quê? Eu posso me redimir pelas implicâncias.— Regina
começou a arrastar os lábios pela pele macia do pescoço de Jennifer enquanto
murmurava frases. — Se eu te der muitos beijos você me perdoa?— A mais
velha segurou nos cabelos de Meireles na região da nuca e traçou caminhos
úmidos em seu pescoço de modo a provocá-la.
Jennifer apoiou as mãos na beirada da mesa para conseguir sustentar o
corpo e se inclinou de maneira sutil para trás conforme recebia provocantes
investidas.
— Por que você faz isso? Me sussurra essas coisas só pra me ver
enlouquecendo aos poucos.
— Porque eu enlouqueço junto.— Ela respondeu. — Adoro torturar
você até sentir o seu desejo palpável na minha mão.— Regina esboçava um
sorriso carregado de malícia, daqueles que Jennifer jurava haver um demônio
sob a pele dos lábios vermelhos bem contornados.
— Você é muito suja!— Ela exclamou.
— O que mais eu sou?— perguntou ao depositar mais força contra os
cabelos da loira.
— Você é suja e muito safada — disse com a respiração um pouco
alterada. Ela adorava quando a mais velha a segurava com força pelos cabelos.
— Então você é tão suja e safada quanto eu — disse com potência e
rouquidão na voz. — Por isso nos encaixamos tão bem. Oh porra, e como nos
encaixamos.— Regina expressou outro sorriso sacana e deixou a boca a poucos
milímetros da de Jennifer, a ponto de sentir o hálito quente da mais nova. —
Agora me diz se beijando você não é uma boa maneira de me redimir —
provocou com seu hálito quente contra o dela.
Jennifer entreabriu a boca e sentiu a língua de Regina percorrendo e
circundando lentamente seus lábios.
— Eu, eu... Vou pensar a respeito — disse ofegante ao deslizar para
fora do contato com a namorada. A loira tinha outros planos para mais tarde. —
Melhor irmos ver os apartamentos agora.

As duas mulheres passaram o restante da manhã e o início da tarde
visitando apartamentos para alugar. Meireles procurava algo pequeno e de baixo
custo, mas que fosse próximo ao seu local de trabalho.
O dia estava claro e o sol brilhava forte por toda a cidade. Elas
aproveitaram para apreciar a paisagem e tornar aquele momento um pequeno
passeio, com direito a uma pequena parada para um hambúrguer e milkshake de
almoço.
— Lembra quando comemos aqui pela primeira vez? Eu havia
encontrado você e Arthur por acaso na praia.
— Eu não esqueço de nenhum detalhe compartilhado com você —
respondeu ao sorrir. As duas lanchavam lado a lado. — Foi aqui que você tocou
minha mão pela primeira vez e disse que ela era feminina.
— E ela realmente é — disse ao puxar a mão direita da professora para
si. — Seus traços são todos delicados.— Ela comentou. — Naquele dia eu queria
ter dito o quanto você é linda, o quanto mexia comigo e como você é
interessante.
— Ao final daquele dia eu me encontrei com Robson e já não foi a
mesma coisa — confessou.
— O que você quer dizer com isso?
— Foi estranho, eu estava distante. Não conseguia estar com ele de
verdade, mesmo fazendo um tempo que não o via, pois ele tinha acabado de
chegar de viagem. Alguns flashes de você piscavam na minha cabeça. Foi
horrível.
— Hum... Eu adoraria saber que ali você já pensava em mim, nem que
fosse um pouco. Digo, que você não era inteiramente indiferente.
— Eu não poderia admitir algo assim. Nem a mim mesma. Você ainda
estava se infiltrando. Mas foi de uma forma tão sutil, que eu não consegui
identificar a tempo de impedir.
— Gostaria de ter conseguido impedir tudo o que ocorreu entre nós?
— Hoje, não. Mas antes de tudo acontecer a resposta teria sido sim. Eu
fiquei muito confusa e desesperada quando me dei conta do que estava
acontecendo entre nós.— Regina ajeitava os botões e a gola da blusa pólo
vermelha que Jennifer estava usando.
— Você nunca vai parar com isso, não é?— comentou ao senti-la
mexendo em sua roupa.
— Enquanto você estiver com a camisa de qualquer jeito, não.
— Você é hilária.— Jennifer riu. — Eu me lembro bem de quando você
ficou estranha comigo e tentou se afastar. Acho que foi na fase de negação, não
é? De dizer não e de tentar impedir. Sabe amor... Eu me preocupava com você,
com sua vida profissional, eu temia muito atrapalhar seu emprego. Tentei ser o
mais discreta possível, você sabe. Só que eu te queria tanto, que eu precisava
mostrar isso.
— Você sempre foi muito discreta, eu me lembro bem. E suas atitudes
só reafirmavam o quão interessante você era, principalmente pra uma jovem de
dezoito anos. Você chegou sorrateiramente e tinha muito senso de
responsabilidade.
— Lá no início eu não imaginava que nós fôssemos chegar tão longe, eu
só sabia que queria viver aqueles momentos, dia após dia. O fato de te ver pelos
corredores já me fazia feliz. E quando você me olhava e sorria, nossa! Eu me
sentia a garota mais feliz que já habitou esse planeta!
— Gostava tanto assim?— perguntou ao sorrir.
— O quê?— exclamou. — Você não faz ideia do que aquilo significava
pra uma garota que se resumia apenas à sua aluna e achava que jamais passaria
daquilo. Eu chego a suspirar.
Regina não conteve o sorriso de encantamento ao observar Jennifer e
suas expressões.
— Meu Deus, como você é linda! Eu morro de amores.
A loira retribuiu o sorriso apaixonado e preencheu a face da mais velha
com incontáveis beijos. Regina se sentia cheia de vida ao lado dela. Era como se
a jovem, com seu entusiasmo e vitalidade contínuos, a fizesse se sentir dez anos
mais nova, mais leve, mais apaixonada.
Olhares curiosos sempre recaíam sobre elas. E com exceção daqueles
que não eram capazes de entender um amor como aquele, todos os demais
conseguiam enxergar que elas eram uma coisa linda juntas.


Após muitas visitas, Jennifer finalmente encontrou um apartamento que
agradou aos seus olhos e a seus bolsos. Ele possuía o tamanho ideal para caber
seus sonhos.
— O que achou desse, amor? Eu gostei muito!
— Também gostei bastante!— disse a mais velha enquanto olhava em
volta.
O apartamento possuía uma sala pequena, cozinha no estilo americana,
um quarto, um banheiro e uma pequena área no fundo denominada como de
serviço.
— Quero visitar alguns outros apartamentos amanhã ou talvez na
semana que vem. Mas tenho quase certeza de que ficarei com esse. Só vou
precisar te pedir um favor, amor.
— O que você quiser.
— A minha mãe não está contente com essa ideia. E eu vou precisar de
um fiador pra poder alugá-lo. Tenho certeza que ela vai se opor, e eu não quero
meter o Diogo nisso. Não quero atrapalhar o relacionamento deles, entende?
Então poderia ser você?— pediu com receio.
— Claro, Jennifer! Normalmente o fiador precisa ter um imóvel próprio
e possuir uma renda de, pelo menos, três vezes o valor do aluguel. Eu estou
dentro dessas condições.
— Ótimo! Me sinto até aliviada.— Sorriu. — Saindo daqui eu vou
direto pra casa porque tenho umas coisas pra resolver, mas eu queria saber se
você vai estar em casa e livre mais tarde.
— Vou estar, sim. Preciso fazer um planejamento de aula, mas vou
deixar pro domingo. Até pensei que você fosse dormir comigo hoje. Mas por que
a pergunta?— Regina a olhava de maneira desconfiada. Meireles era péssima
tentando esconder algo.
— Nada em especial — respondeu ao dar de ombros enquanto tentava
esconder o sorriso. — Me espere pra dormirmos juntas.



Vestida com apenas seu branco roupão de banho, Regina terminava de
secar os cabelos ao mesmo tempo em que pensava na demora de Jennifer. Já
passava de dez horas da noite e a loira ainda não havia dado qualquer sinal.
O clima estava quente e o céu lá fora possuía a intensa iluminação da
lua, que parecia ainda mais majestosa naquela noite.
Quando pensou em pegar o celular para contatar a namorada, a
campainha tocou, a fazendo descer e caminhar em direção à porta.

— Boa noite, Regina...— A voz soou aveludada.
Sem nada dizer, os olhos castanhos da professora passearam por toda a
imagem à sua frente. Iniciando pelo salto alto preto, subindo pela meia calça de
mesma coloração, percorrendo o sobretudo fechado— também de cor preta— e
estacionando na única coisa verde que ali havia: os olhos de Jennifer Meireles.
— Boa noite...— respondeu extasiada.
Meireles havia pego o carro de Kevin emprestado naquela noite para
poder surpreender a mais velha. Nesse momento ela se encontrava em frente a
porta da mulher com a embalagem recebida por ela, meses atrás, em mãos.
O olhar da loira estava intenso e vívido, perdendo apenas para o desejo
que faiscava nos castanhos à sua frente.
Jennifer caminhou de maneira sensual para dentro do imóvel e deixou
que seus saltos soassem contra o chão da sala de Regina. Ela parou próximo à
mesa de centro, onde depositou a embalagem, e posteriormente se direcionou
para a mulher.
— Acho que alguém aqui precisa de um babador — disse ao se
posicionar frente a frente com a mais velha.
Os cabelos de Jennifer estavam soltos, volumosos e perfeitamente
ondulados. Havia uma forte maquiagem em seus olhos e lábios, que davam a ela
uma aparência mais séria e madura. Sobre aqueles saltos conseguia ficar
visivelmente mais alta que a professora, que naquele momento a olhava com
fascínio. Regina nunca vira Meireles aspirando tanto poder como naquela noite.
Quando a loira se mexeu, Regina olhou para baixo e pôde perceber por
entre a fenda do sobretudo que a meia calça da jovem terminava um pouco
acima do meio da coxa. A borda era de renda e havia uma espécie de
suspensório ali, que conseguira avistar com dificuldade.
— Puta que pariu, Jen — disse com rouquidão e potência na voz ao
depositar uma mão na cintura e a outra na nuca de Jennifer e puxá-la sutilmente
para si.
— Estou aqui inteiramente pra satisfazer todas as suas vontades.
— Todas elas?
— Todas elas — sussurrou.
— Depois dessa surpresa eu até vou tomar uma taça de vinho.
— Eu sirvo você.

Chegando à cozinha, Regina observava atentamente sua namorada
preenchendo uma taça com o líquido avermelhado. Seus pensamentos estavam
todos voltados para o quão provocante ela estava naquela noite. Regina babava,
oh sim. Ela babava na grande moleca que ela era quando se divertiam juntas
numa tarde de sábado, e na mulher que se transformava quando a noite caía.
— Não vai se servir?— questionou-a quando recebeu a taça em sua
mão, provando da bebida posteriormente.
— Não. Hoje eu prefiro sentir o vestígio deixado em sua boca.— Sem
encostar-se em Regina, Meireles apenas aproximou a face e circundou os lábios
inferiores e superiores da mulher com a ponta de sua língua.
Regina fechou lentamente os olhos por breves instantes e provou o calor
e o desejo naquela língua que ainda deslizava por seus lábios. Como ela era
apaixonada por Jennifer. Como ela amava todo aquele desejo que podia ser
visto, tocado, aspirado e degustado. Pela primeira vez havia encontrado aquela
pessoa que lhe satisfazia em todos os sentidos.
As duas mulheres se deixaram distrair pela atmosfera sensual que
envolveu o ambiente e quando se deram conta, um pouco do líquido vinho
manchou o roupão branco de Regina.
— Desculpe — comentou Jennifer ao tomar uma curta distância da mão
que segurava a taça.
— Não se preocupe, eu já estava pra me trocar.
Ao subirem para o quarto, a mais nova depositou a embalagem que
trouxera sobre a cama e manteve seus olhos fixos na morena.
— Estou completamente louca pra ver a lingerie por debaixo desse
sobretudo — disse Regina enquanto desfazia o laço do roupão de banho. — Eu
sou bastante fetichista, Jennifer, você sabe. Não que eu seja um Christian Grey
— disse, compartilhando uma risada com a namorada. — Mas eu adoro coisas
que façam a minha mente trabalhar. — A morena terminou de abrir o roupão e o
deixou cair, exibindo seu corpo curvilíneo para a loira.
Jennifer se sentia nervosa. Mas não era um nervosismo ruim, pelo
contrário. Soava mais como adrenalina, expectativa a respeito de algo novo. Ela
estava ansiosa para saber o que a morena acharia quando a visse sem a veste de
cima.
— Quero que escolha a roupa que gostaria de me ver usando pra você.
Peça por peça. Quero ser exatamente a representatividade de todas as suas
fantasias. Quero que cheguemos lá juntas. E quando digo lá, é o ponto mais alto
que alguém pode estar. E o único caminho a se tomar é através da nossa mente.
— Você vai me deixar louca — comentou Jen, mais pra si que pra
Regina, enquanto se direcionava para o extenso guarda roupa. — Posso montar
você exatamente da forma que eu quiser?
— É essa a idéia — piscou.
Meireles olhou todo o guarda-roupa da mulher por um longo período de
tempo ao mesmo tempo em que sentia o gostoso perfume daquelas roupas em
suas narinas. Nenhuma das duas precisava se apressar. A tranquilidade era a
chave para que pudessem apreciar todos os detalhes do que estava por vir.
A escolha de Jennifer foi feita de dentro pra fora; começando pelas
roupas íntimas. Meireles depositou sobre o branco lençol da cama um conjunto
de sutiã e calcinha rendados na coloração preta. Junto a ele acrescentou um par
de meia calça e cinta liga.
Feito isso, explorou outras partes do armário e sorriu ao recordar de
todos os sonhos eróticos que já tivera com ela.
Jennifer escolheu uma saia lápis preta de cintura alta e uma blusa social
branca de manga 3/4. Se tinha algo que mexia com a mente da loira era ver
Regina nesse tipo de veste. Posteriormente, abriu a área de calçados e escolheu
um sapato preto fechado e de salto. Pareciam novos, a constar que ainda estavam
guardados dentro de uma caixa.
— Pronto.
A mais velha pediu que Jennifer se sentasse na poltrona e se mantivesse
lá enquanto ela se vestia.
No ponto de vista da loira, os movimentos que Regina fazia pareciam
estar em câmera lenta. A maneira como fechava o sutiã ou deslizava a meia calça
pelas pernas era sensual, provocante e hipnotizante. Por vezes pensou em se
levantar e ir até ela, mas acabou optando por ser uma boa expectadora.
O ponto auge para Jennifer foi vê-la prender a cinta-liga. Oh céus!
Apenas ela podia saber o quão excitante era aquela morena vestida assim.
— Que delícia você assim.— Ela ousou dizer enquanto a observava.
Regina não terminou de se vestir. Se manteve séria, deu as costas para
ela e caminhou até a cama, deixando que a jovem desfrutasse da parte de trás de
seu corpo.
— O que tem nessa embalagem? — questionou ao tomá-la da cama.
— Uma surpresa pra você. — Jennifer respondeu. — Abre.
Regina abriu lentamente a embalagem e esboçou um largo sorriso ao
constatar o que dentro havia. Seus olhos quase não puderam acreditar na imagem
à sua frente. Se tratava de uma coleira de couro com guia.
— Há tempos eu estava louca pra usar uma dessa com você — disse a
mais nova ao se aproximar. — Vem, põe em mim. — Jennifer depositou os
cabelos pro lado de modo a deixar seu pescoço livre em um oferecimento para a
mulher.
— Sempre quis ver você portando uma — comentou enquanto a
fechava — Mas esperei que você própria pedisse, não quis soar como se
estivesse te obrigando a algo.
— Você sabe que entre mim e você isso não existe. Tudo o que fazemos
sempre é por livre e espontânea vontade. Sinta-se livre sempre que quiser me
oferecer coisas novas.
— Certo... Agora... Abre o sobretudo — Suas palavras foram um
sussurro contra o ouvido da namorada.
Jennifer virou de frente para Regina, abriu delicadamente cada um dos
botões e tirou a peça de roupa enquanto fazia contato visual com a face da
mulher.
O coração de Regina acelerou ao ver Jennifer vestida com a lingerie
presenteada por ela meses atrás. A calcinha era tão pequena e cavada, que ela
conseguia enxergar um pouco mais que apenas virilha ali. Não resistindo, fez
uma das mãos alcançarem aquela nua região e a acariciou.
— Você está linda...
— Obrigada.
Regina depositou um beijo nos lábios de Jennifer e envolveu a corrente
de sua coleira na mão e pulso, a fazendo caminhar para frente e sentar-se sobre
ela na cama.
Meireles enlaçou o pescoço da morena com os braços e a beijou quase
em câmera lenta enquanto sentia o desejo em seu corpo acendendo aos poucos.
— Como se sente ao estar usando uma dessa? — questionou ao
percorrer o material de couro com a ponta de seus dedos.
— Diferente. É muito excitante a sensação de estar à mercê das suas
vontades.
— Também estou à mercê das suas. Sempre.
Após algum contato, Regina levantou-se da cama, vestiu a camisa
branca escolhida por Jennifer, dobrou as mangas, fechou os botões, vestiu a saia,
deslizou o zíper traseiro para cima e em seguida colocou uma corrente fina e
dourada no pescoço. O batom vermelho foi deslizado lentamente sobre os lábios,
marcando-os.
— Ainda não está bom o suficiente pra mim. Falta a parte principal. —
Jennifer se levantou da cama, caminhou até a mulher e pegou os óculos de
armação grossa que estava sobre a cômoda.
— Você realmente me gosta com eles — comentou Regina.
A loira o encaixou lentamente na face da mulher e não pôde deixar de
fazer um comentário.
— Agora não falta nada mais. Eu seria capaz de lambê-los.
Regina deu algumas voltas na corrente da guia de Jennifer e a enrolou
em sua mão de modo a encurtá-la, fazendo com que a distância entre elas se
tornasse mínima.
— Então você já pode começar.
A mais nova aproximou o rosto lentamente e o afundou na curva do
pescoço da morena. Ela permitiu que Regina sentisse o hálito quente contra a
pele do seu pescoço para em seguida deslizar os lábios por aquela região até
encontrar o objeto de desejo.
Meireles não apenas lambeu a armação daqueles óculos em sua face,
não. Sua língua explorou e umedeceu outros cantos mais. Ela pôde ouvir a mais
velha tentando conter um gemido abafado ao sentir sua boca arrastando por seu
maxilar e descendo para seu colo.
— Você é uma droga de uma gostosa — murmurou Jennifer entre as
investidas.
— Quero sentir suas mãos abrindo minha camisa. Derrame-as em mim
lentamente.
Meireles obedeceu e depositou as mãos no primeiro botão e começou a
abrir a peça de roupa de cima para baixo, deixando que o sutiã e a barriga da
morena ficassem à mostra gradativamente.
Regina mordeu o lábio inferior ao observar as mãos da loira executando
a sua vontade. Ela muito se excitava ao vê-la naquela posição de obediência.
Jennifer possuía todo o calor que a morena precisava.
— Me pisa — disse a loira com um tom autoritário.
— Então foi por isso que escolheu esses saltos...
Regina expressou um curto sorriso no canto de sua boca vermelha e
conduziu Jennifer até a poltrona, a fazendo se sentar. Ela depositou o solado do
calçado no tórax da loira e o pressionou em um deslize para baixo, realizando a
fantasia de Jennifer, que se mantinha hipnotizada.
Com um sorriso sacana nos lábios, Meireles segurou a perna suspensa
da morena e começou a brincar com o fino material de sua meia calça, fazendo
com que alguns fios começassem a soltar.
— Você é uma perdição, Regina.
— Será que realmente sou? Acho que ainda não se olhou no espelho pra
ver o quão gostosa está nessa lingerie. Até o fim dessa noite eu preciso usar
minha boca pra te livrar dessas peças. Mas antes disso eu vou me deliciar por
horas da sua imagem com elas.
A morena levou dois dedos à boca de Jennifer e a sentiu chupá-los
lentamente. Quando já estavam inteiramente úmidos, deslizou a mão para dentro
da própria saia e depositou a calcinha para o lado. Oh sim, para o delírio de
Jennifer, Regina Vianna começou a masturbar a própria intimidade.
— Onde fica a moral e os bons costumes, senhorita Vianna?
— Aqui dentro não existe moral e bons costumes, senhorita Meireles.
Achei que já soubesse disso.
Jennifer controlou-se o máximo que seu corpo permitiu. Quando sentiu
que já estava no limite, tomou sua mulher nos braços e a arrastou para o tapete
felpudo que havia no chão do quarto. Ela se encaixou entre as pernas de Regina
e rasgou toda aquela provocante meia calça na tentativa bruta de arrancá-la. As
mãos delicadas e femininas de sua mulher brincaram na guia de sua coleira até
desprendê-la, a deixando apenas com a parte de couro. Regina a tomava pela
peça e a puxava com força ao mesmo tempo em que sentia as mãos quentes de
Jennifer trabalhando na pele de seu corpo.
Aquela noite se prolongou até que não restasse peça sobre peça. Até que
os gemidos ressoassem no ambiente e partisse junto com o desejo sanado.

Algumas horas após a entrega, ao retornarem do banho, Meireles
aninhou-se nua entre os lençóis e manteve a atenção em Regina, que enrolada no
roupão branco, mexeu na gaveta da cômoda e acendeu um cigarro.
Um gemido quase escapou dos lábios da mulher ao dar a primeira
tragada. Fumar um cigarro após aquele sexo era quase uma lei.
— Vem deitar comigo? Vai. Larga isso e vem!— pediu. Não de
maneira autoritária. Mas sim com a voz doce, suave e manhosa.
Regina deu apenas mais um trago, soltou a fumaça e atendeu ao
chamado. Ela jamais conseguiria dizer não para a expressão melosa que Jennifer
havia acabado de esboçar. No entanto, antes de tirar o roupão e unir-se a ela,
escovou os dentes para livrar-se do hálito de cigarro.
A mais velha aconchegou-se naquele corpo há pouco maltratado de
amor por ela e depositou o braço direito sobre o tórax de Jennifer. Naquele
instante mais parecia uma gata manhosa que a leoa de horas atrás.
Jennifer acariciava os fios castanhos da namorada ao mesmo tempo em
que sentia o toque suave de sua mão contra a região de seu peito. Era uma troca
mútua, terna, carregada de delicadeza.

Ali, naquela suave troca de carinho, conversavam sobre elas enquanto
sentiam os olhos pesarem cada vez mais.
Foi então que, segundos antes de apagarem em um sono profundo e
pesado, Jennifer, com seu comentário, fez Regina soltar o último pequeno riso
da noite.

— Você é uma droga de uma professora gostosa.


Capítulo 39

Um mês havia se passado e Jennifer decidido ficar com o apartamento
que gostara à primeira vista. Regina, como haviam combinado, serviu de fiadora.
O lugar era pequeno e estava parcialmente mobiliado. Nele havia um
fogão simples, um pequeno armário de cozinha antigo que se localizava na
parede, um sofá na sala, um pequeno criado mudo de madeira pintada de branco
no quarto e umas cortinas espalhadas pelas janelas do lugar.
A pintura das paredes já estava muito antiga, sendo assim, Jennifer e
Regina se encarregaram de dedicar os finais de semana indo ao imóvel pintá-lo
com suas próprias mãos. As duas mulheres levavam a atividade na brincadeira e
se divertiam muito enquanto a exercia. O resultado final era sempre o mesmo:
ambas pintadas dos pés à cabeça. Regina era a que sempre se sujava mais,
arrancando algumas gargalhadas da namorada. Por fim, tomavam um banho lá
mesmo e iam para casa.
Foi assim durante alguns finais de semana até que todas as paredes do
lugar estivessem prontas. Meireles usou o dinheiro que economizou com algum
possível pintor e o investiu em alguns móveis novos que estavam em falta para
seu apartamento.
Cada móvel e utensílio foi escolhido em comunhão com Regina. A mais
velha sentia uma imensa alegria ao ver a namorada dando um passo tão grande e
importante para sua vida. E enquanto passeavam de loja em loja, ela relembrava
de quando saiu de casa e teve seu primeiro apartamento alugado antes de
adquirir o atual imóvel próprio. Estar com Jennifer era como reviver um pouco
do próprio passado.

— Amor! Olha!— exclamou Jennifer ao parar em frente a uma vitrine
que exibia alguns eletrônicos e figuras de ação de filmes, seriados e animes. —
Eu queria ter uma prateleira no meu quarto com uma figura de ação de cada
coisa que eu gosto. Pena que essas coisas são tão caras — comentou enquanto
seus olhos brilhavam para a vitrine.
— Quais desses você mais gostaria de ter?— perguntou ao observar o
encantamento da jovem para com as miniaturas.
— Esse, esse, esse e esse — disse ao apontar para a figura do Shenlong
-Dragon Ball, Dr Emmett Brown - De Volta Pro Futuro, Pinhead- Hellraiser e a
Sailor Saturn –Sailor Moon.
— Esse aqui é assombroso — comentou Regina ao apontar para o
boneco do Pinhead, fazendo Jennifer soltar um baixo riso. — E essa aqui parece
comigo.— Apontou para a Sailor Saturn.
— Realmente parece. É a minha Sailor favorita, acho que daí veio
minha atração por você — brincou ao alternar o olhar entre a morena a seu lado
e a vitrine.
— Mas esse aqui é assustador demais — disse ao se referir novamente
ao Pinhead. — Imagina antes de dormir fechar os olhos segundos após avistá-lo
na prateleira? Deve dar até pesadelo.— Quanto mais a professora falava a
respeito, mais a loira ria.
Após suspirar e desgrudar do vidro, Meireles segurou a mão da mulher
e continuou percorrendo algumas lojas a seu lado. Suas mãos unidas e a maneira
carinhosa com a qual se tratavam despertava alguns olhares curiosos pelo lugar.
Olhares estes, que ambas já estavam se acostumando a receber.
— Regina, o quê é isso?— Indagou.
— Varal de teto pra você ter aonde estender as roupas que agora
precisará lavar.
— Eu nem estava me lembrando disso.
— Pois é, mas eu fiz uma pequena— grande — lista de coisas
essenciais que não podem faltar em uma casa — disse enquanto tirava um papel
do bolso de seu jeans e o abria. — Agora que já não terá sua mãe, terá de se virar
— a lembrou — Um bom começo é não deixar que coisas simples como um
abridor de garrafa faltem, por exemplo.
— Deixa eu ver essa lista — comentou ao pegar o papel das mãos da
namorada. — Escorredor de louça, hum... Panos de prato, fronhas, pegador de
massa. Pegador de massa? Desde quando isso é essencial, Regina?
— Claro que é. De qual maneira quer que eu sirva as macarronadas que
vou preparar pra nós?
Meireles expressou um pequeno sorriso ao imaginar a figura de Regina
cozinhando para elas em seu apartamento.
— É preferível comprar aquele que também serve pra pegar salada.
— Ok, ok... Deixarei tudo isso em suas mãos — comentou, ainda com
os lábios tomados pelo sorriso, enquanto caminhavam.
Quando retornaram para o apartamento da loira ao final da tarde
carregando imensas sacolas pesadas, Regina entrou resmungando e Jennifer a
retrucando.
— Você deveria ter comprado, sim. Aquilo é útil.
— Pra quê eu precisaria de um desentupidor, Regina? É só não jogar
comida na pia, que fica tudo certo. Se eu fosse seguir seu ritmo, compraria as
lojas inteiras!
— Você conhece alguma casa onde a pia não entupa, senhorita sabe
tudo?
— Nunca vi a lá de casa entupindo — disse enquanto depositava as
sacolas no meio da sala.
O apartamento ainda estava inabitável. Além de Jennifer ainda ter que
limpá-lo e organizá-lo, precisava aguardar a entrega de alguns eletrodomésticos
e móveis comprados hoje. Ela deixaria uma cópia da chave com o porteiro do
edifício para que ele os recebesse.
— Provavelmente sua mãe solucionava o problema antes que você
tivesse a oportunidade de ver. Mas com certeza ela já entupiu. Confia em mim,
vai precisar de um.
— Não vou — retrucou
— Vai — rebateu.
— Não, eu não vou.
— Ok. Mas no dia em que acontecer eu vou dizer que avisei.
— Não irá acontecer — disse ao fechar os olhos e arquear as
sobrancelhas.
Regina riu da expressão debochada da mais nova e mudou o assunto.
— Agora eu preciso ir. Devo ter uns quatrocentos testes pra corrigir.
— Boa sorte pra você, professora.
— Vou precisar.— Riu. — Tenho que preparar o punho e a coluna.
— Quando casarmos eu prometo te fazer uma mensagem todos os dias.
— Soltou repentinamente e sem pensar. No entanto, quando se deu conta do que
havia dito, tentou consertar. — É... Bom, quer dizer, tipo se a gente fosse
casada... com certeza eu faria.— Se atrapalhou.
— Eu sei que sim.— A mais velha respondeu enquanto se segurava
para não soltar um pequeno riso ao observar as bochechas da namorada
ruborizadas. — Agora realmente preciso ir.
— Tudo bem, eu vou ficar aqui limpando tudo e guardando algumas
coisas. Obrigada pela companhia de hoje.— Sorriu.
— É sempre um prazer.— Sorriu em retorno. Ela depositou um beijo
nos lábios da loira e se foi.
— Por que eu disse aquilo?— comentou com ela mesma assim que a
mais velha bateu a porta. — Ela vai pensar que sou louca e que já estou
pensando em casamento. Ai, Jennifer! Às vezes você dá umas mancadas —
resmungou enquanto se direcionava para os afazeres.



Duas semanas mais se passaram e os móveis e eletrodomésticos de
Meireles começaram a chegar. Cada vez que o porteiro lhe telefonava, ela
vibrava de entusiasmo e telefonava para a professora logo em seguida. Ela muito
apreciava dividir cada pequeno novo passo com a mulher que amava.
Ao entrar para a terceira semana após as compras, já não faltava nada
mais. O imóvel estava limpo, pintado e inteiramente mobiliado.
— Você tem certeza dessa sua decisão?— perguntou Morgana. Ela
estava sentada sobre a cama da filha enquanto a observava depositar algumas
roupas e objetos pessoais em malas.
Há algumas semanas Jennifer cuidava de separar as coisas mais
importantes e embalá-las para quando fosse fazer a mudança. O dia finalmente
havia chegado.
— Sim, tenho certeza — disse suavemente ao mesmo tempo em que
dobrava algumas peças de roupa nas malas.
— Você sempre poderá voltar pra cá quando quiser.
Meireles interrompeu a atividade ao notar a tristeza que havia no tom de
voz de Morgana.
— Mãe...— iniciou ao tomar um lugar ao lado da mulher. — Meu
apartamento fica a uns quarenta minutos daqui. Não é como se eu estivesse indo
para outra cidade. Já deixei o endereço com você, pode ir me visitar sempre que
quiser.
— Não será a mesma coisa que tê-la aqui todos os dias.
— Não, não será, eu sei. Mas ainda é uma opção.
Morgana hesitou por alguns momentos e se mostrou pensativa enquanto
colhia as melhores palavras para direcionar à filha.
— Aquela Regina vai morar com você?
— Oh não! Ela tem a casa dela e não estamos pretendendo morar juntas.
Queremos ir com calma e fazer tudo no tempo certo.
— Então vocês pretendem morar juntas um dia?
Dessa vez foi a jovem que hesitou por algum momento.
— Pretendemos ficar juntas, acho que essa é a melhor resposta que
posso dar agora. Eu a quero sempre na minha vida e sinto que ela também me
quer na dela. Se nós seguirmos o fluxo natural... Sim, moraremos juntas algum
dia.
— Você realmente parece amá-la...
— E eu amo, mãe.
— Hum...— Morgana fixou o olhar em um ponto qualquer. — Você já
gostou de alguém antes? Já esteve com outra...
— Mulher?
A mãe de Jennifer apenas afirmou com a cabeça.
— Já gostei, mas nunca amei e nem vivi uma paixão assim. E sim, já
estive com outras mulheres.
— Oh meu Deus.— Morgana murmurou, questionando-se internamente
de que maneira isso aconteceu sem que ela percebesse. — Desde quando isso
acontece?
— O quê exatamente?
— Isso, é, você sabe. Se relacionar com mulheres.— A última frase foi
dita tão baixo, que se tornou quase inaudível.
— Hum... Acho que beijei a primeira garota aos treze. Mas antes disso
eu já sabia. Eu sempre soube.
— Onde eu estive todo esse tempo? Como eu nunca percebi? E você?
Escondendo por anos...
— Eu sempre quis te contar. Meu peito pesava e eu me sentia péssima
em precisar omitir algo tão importante.— Meireles apoiou a mão sobre a de
Morgana. — Mas eu tinha tanto medo.— Seus olhos começaram a querer
marejar. — Medo de ser rejeitada como fui.
— Quando fiquei grávida de você eu disse a mim mesma que antes de
ser sua mãe, eu seria sua amiga. Eu queria que você sempre pudesse contar
comigo. Eu queria estar lá quando você começasse a se tornar uma garota cheia
de sonhos e sentimentos. Queria ter estado ao seu lado pra ouvir você me contar
do seu primeiro beijo, do primeiro paquera da escola e até mesmo da primeira
decepção amorosa.— Os olhos de Morgana estavam sendo preenchidos por
água. Seu coração apertava ao mesmo tempo em que a angústia começava a
fazer moradia ali dentro. — Me perdoa, Jennifer. Me perdoa por ter trazido tanta
dor desnecessária pro seu peito. Eu ainda estou tentando compreender que as
coisas são diferentes de como as idealizei.
— Tudo bem. Se você nunca puder aceitar ou compreender quem sou,
eu posso viver bem com o seu respeito.
— Eu nunca deveria ter dito as palavras horríveis que disse a você. Eu
não tinha esse direito. As minhas questões tortas são minhas, eu não tinha
porquê descontar em você algo que sou eu quem não compreendo.
— Mas agora já foi, não é?— disse suavemente. — Infelizmente eu
sempre vou me lembrar de tudo que ouvi. Mas podemos construir novas palavras
pra compensar um pouco.
— Prometo que estou tentando entender, aceitar. Mas por hora eu só
peço te pedir perdão — disse ao encarar os olhos emocionados da filha.
— Tudo bem. Vamos deixar que o tempo se encarregue do resto.
Jennifer queria poder dar um abraço na mãe e se permitir ficar ali por
algum momento. Mas, ao mesmo tempo em que sentia essa vontade, algo a
impedia. Era como se tudo o que acontecera tivesse criado alguma barreira entre
elas, principalmente por parte da mais nova. Ela não conseguia se comportar
como se tudo fosse como antes, pois não era. Haviam feridas recentes dentro
dela. Feridas que não cicatrizariam apenas com um pedido de perdão.
— Acho que a Regina chegou, vou abrir — disse a loira ao ouvir a
campainha tocar. Ela e a namorada haviam combinado de levarem o restante das
coisas e estrearem o apartamento essa noite.
Meireles cumprimentou a namorada com um beijo em seu rosto e subiu
juntamente a ela para o quarto.
— Boa noite — disse receosa ao entrar no quarto de Jennifer e se deparar
com a mulher sentada sobre a cama.
As expressões de Morgana tornaram-se sérias no mesmo momento em
que seus olhos avistaram a morena.
— Boa noite?— Riu ironicamente. — Conseguiu o que queria, tirou
minha filha de mim — disse com seriedade ao levantar-se. Quando ia se
direcionar a porta, sentiu a mão de Regina segurando seu pulso.
— Ei, espera, vamos conversar. Eu não a tirei de você, não tem
qualquer influência minha nessa decisão.
— Ela ainda estaria comigo se você não tivesse entrado em nossas vidas
— respondeu ao puxar o braço.
Meireles se mantinha calada, ouvindo.
— Jennifer ainda está com você. Ela apenas... Está também comigo
agora — disse calmamente. — Por que você não me dá uma oportunidade?
Morgana calou-se por algum momento antes de respondê-la com
rispidez.
— E eu tenho outra opção? A minha filha gosta de você de verdade e não
há nada a ser feito.
— Obrigada.— Esboçou um sorriso fraco.
— Não me agradeça. Como bem sabemos, não tenho outra opção.
— Mãe, já chega.— Jennifer se manifestou.
— Não estou fazendo nada. Uma boa noite a vocês — disse ao dar as
costas e caminhar em direção a porta.
— Por que não vem conosco?— convidou Regina.
— É, mãe! Vamos? Seria uma boa oportunidade pra você conhecer a
Regina melhor. Vem passar o final de semana com a gente e conhecer meu
apartamento. Por favor!
Morgana apenas ergueu a cabeça e a balançou negativamente como se
aquele convite tivesse sido o mais absurdo do mundo. Após isso, cruzou a saída
e fechou a porta atrás de si com força.
— Tudo isso é ciúmes, não a leve a mal — disse Jennifer. — Estávamos
conversando um assunto delicado antes de você chegar.
— Qual assunto?
— Eu te conto no caminho. Vamos? Já está tudo pronto.


As duas mulheres subiram o elevador ansiosas. Jennifer se encarregava
de levar uma mala com rodas e a mochila que estava em suas costas. Enquanto
isso, Regina tomava conta da segunda mala e de uma mochila com seus
pertences pessoais para o final de semana no apartamento da loira.
Meireles se sentia entusiasmada com a conquista. Ela mal conseguia
conter a adrenalina que corria por seu corpo. Finalmente teria as rédeas de sua
vida.
Além de estar feliz com a nova fase, também estava ansiosa pra mostrar
à namorada o resultado final de seu apartamento.
Ao depositar as malas no chão do corredor, Meireles girou
delicadamente a maçaneta da porta e surpreendeu Regina ao tomá-la em seus
braços.
— Jennifer, eu vou cair!— exclamou a morena após ser pega de
surpresa.
— Acho que você esqueceu que namora a Supergirl!— brincou. — Um,
dois, três e... Estamos dentro!— exclamou ao adentrar o imóvel com a mulher
em seus braços.
Um largo sorriso se expressou nos lábios da professora ao ver o
resultado final. O pouco que seus olhos avistaram do lugar a fez observar que ele
carregava características da dona. A começar pelo chaveiro da porta, que Regina
não deixou de notar que se tratava de miniaturas de luvas de boxe.
Jennifer desceu a namorada do colo, puxou as malas para dentro da sala
e começou a passear com ela por todos os cômodos. Todo o apartamento estava
ao seu gosto, contudo, ela também havia pensado em oferecer um lugar que
fosse confortável e acolhedor para Regina.
— Jennifer, eu não acredito...— comentou ao aproximar-se de um
pequeno espaço reservado para Bóris na sala. Havia um pequeno arranhador,
alguns ratinhos de brinquedo e duas tigelas de inox, iguais as que haviam em sua
casa.
— Para caso você queira vir com ele pra cá algum dia.— A jovem
explicou.
— Você pode ter certeza que eu vou trazê-lo!— Sorriu ao se aproximar
da mais nova e depositar os braços sobre seus ombros de modo a envolvê-la pelo
pescoço. — Eu já disse que você é uma graça?— murmurou ao esfregar a ponta
do nariz contra o dela.
— Já, mas eu não me importaria de ouvir todos os dias — respondeu
suavemente com um doce sorriso nos lábios. — Agora vem ver o que tenho no
quarto!
Meireles segurou a mão da mulher e a puxou para o cômodo. Chegando
lá, mostrou a ela uma pequena estante branca de madeira recheada com livros.
Regina deu alguns passos para perto do móvel e começou a percorrer e deslizar
os dedos sobre as ondulações de cada exemplar. Regina era apaixonava por
livros. Mais do que escrever, gostava de ler, e viajar por cada linha dos universos
contidos naquelas páginas.
— Alguns livros já eram meus, outros eu comprei pra gente ler e
conhecer juntas e alguns são os seus que eu ainda não devolvi — comentou sem
jeito ao coçar a nuca.
— Vou começar a cobrar juros diários pela ausência de devolução —
disse a mais velha enquanto mantinha os olhos fixos nos livros e lia os nomes
expostos nas lombadas de cada um. — Qual o seu preferido?
— Eu gosto desses.— Jennifer pegou a trilogia de livros da saga The
Hunger Games e mostrou à mulher.
— Do que se trata?— perguntou ao folheá-los rapidamente.
— Você não conhece os filmes? Ah não, amor! Você precisa assistir! É
de aventura e ação. É sobre uma garota de dezesseis anos, a Katniss Everdeen,
que vive em um país distópico dominado por uma metrópole que anualmente
realiza jogos vorazes com meninos e meninas entre doze e dezesseis anos que
são pertencentes aos distritos. Nesses jogos eles lutam até a morte, com direito a
apenas um vencedor.
— Livros de aventura não fazem o meu feitio, mas eu posso dar uma
chance ao filme. Gosto muito quando o enredo envolve luta de classes, de
potências e afins.
— São quatro filmes no total. É a minha saga favorita!— disse com
empolgação. — Adoraria que você assistisse comigo.
— Então podemos ver hoje à noite, o que acha?
— Eu acho ótimo! Tenho todos no meu computador.— Sorriu. — Pra
mim vai ser muito importante te apresentar algo do meu universo. Espero que
você goste.
— Vou adorar conhecer. Quero aprender um pouco mais sobre você
todos os dias — comentou, arrancando um pequeno sorriso de lado da namorada.
Enquanto permanecia analisando os livros dispostos na estante, sentiu o
olhar de Jennifer sobre si. Ao virar o rosto se deparou com a loira mirando o
celular em sua direção.
— O que está fazendo?
— Tentando fotografar você em frente a esses livros. É o cenário
perfeito pra você. Não posso deixar de registrar esse momento.
— Mas Jennifer, eu estou distraída.
— Fica ainda mais linda assim! Mas se quiser posar pra mim, não vou
reclamar — piscou.
— Ai Jennifer, só você, viu...— comentou ao sentar-se em frente
àqueles livros. A morena esticou uma das pernas e manteve a outra com o joelho
dobrado. Sua mão direita segurava um livro aberto e a esquerda estava
depositada na lateral da cabeça com o cotovelo apoiado sobre o joelho. A
posição estava tão espontânea quanto as suas expressões.
— Ai meu Deus, você está linda aí.— Meireles fez o curto comentário
enquanto enquadrava a imagem e a focava.
A morena usava calça jeans preta, blusa branca de seda com os punhos
dobrados e os dois primeiros botões desabotoados, e sapatênis preto.
Ao conferir o resultado final da foto e se agachar para mostrá-la à mais
velha, a loira não pôde deixar de pensar no quão apaixonada por aquela mulher
ela era. Seu coração ainda acelerava por Regina como se fosse a primeira vez.
Talvez, ainda mais.
— Agora vem, tira uma foto comigo!— Regina agarrou na cintura da
jovem e a fez se sentar entre suas pernas.
Jennifer usava calça jeans de lavagem clara e camiseta preta de algodão.
Agora, estando com os dois joelhos dobrados, a mais velha transpassou
uma das mãos para frente de modo a encontrar a de Jennifer que, aconchegada
entre suas pernas, tinha o braço apoiado em seu joelho. Com Regina por trás e a
mais nova na frente, registraram o momento.

Na porta da geladeira havia algumas fotografias anexadas com ímãs.
Dentre elas estava uma foto da loira com Morgana e Diogo, foto grupal com
seus amigos no dia da formatura e uma foto tirada com a professora no dia em
que ela cortou o cabelo da mulher.
— Vamos ver o que temos aqui...— Quando Regina abriu a geladeira,
surpreendeu-se, havia apenas garrafas d’água.
Meireles voltava do quarto quando se deparou com a cena da mulher
com a porta da geladeira aberta. Naquele momento sua mente deu um estalo e
ela lembrou-se que havia esquecido um detalhe importante: as compras.
— Puta merda! Eu não comprei nada pra abastecer!
— Estou vendo bem. Ou melhor, não estou vendo nada! Pretende
sobreviver de vento e ainda me coloca nessa furada?— brincou ao fechar a porta.
— Os armário estão igualmente vazios?
— Sim. Eu cuidei de todos os detalhes, mas esqueci totalmente de ir ao
supermercado. Lá em casa quem sempre fazia as compras era a minha mãe,
então eu acabei esquecendo que agora essa é mais uma das minhas obrigações.
— Me admira você esquecer justo da comida, leoazinha.
— O que você está querendo dizer com isso?— Indagou ao depositar as
duas mãos na cintura, fechar parcialmente as pálpebras e olhá-la pelo canto dos
olhos.
— Que você é uma esfomeada e esqueceu justo do que julga ser o mais
importante.
— Eu sou esfomeada, Regina? Que mentira! Desde quando?
— Desde sempre! Você é capaz de comer dois hambúrgueres quando
saímos juntas, Jennifer. Eu fico até assustada.
— Eu pratico esporte, ok? Tenho isso em minha defesa.
— Pratica esportes ou ainda não saiu da fase de crescimento? Explica
melhor — implicou.
— Muito engraçada você, nossa — resmungou.
— Tentei ser humorista, mas não deu muito certo. Percebi que me saía
melhor assustando os alunos em sala de aula.
— Você é muito boba!— exclamou ao soltar uma risada. — Mas
falando sério... Vamos ter que pedir algo pra comer. Pode ser pizza?
— Desde que não seja aquele sabor que você criou lá em casa, por mim
tudo bem.
Meireles mostrou a língua para a mulher e discou para a pizzaria.
— Qual sabor você quer?— perguntou baixinho enquanto falava ao
telefone.
— Marguerita.— A morena sussurrou em resposta.
— Uma pizza metade marguerita e metade a la Jennifer Meireles, por
favor.
— Jennifer!— exclamou ao arregalar os olhos. Ela se continha para não
rir da palhaçada da loira ao telefone.
— Desculpe, me confundi aqui. É que a minha namorada está me
desconcentrando .— disse ela ao atendente da pizzaria, recebendo uma
travesseirada da morena logo em seguida. — É metade marguerita e metade
portuguesa, por favor.— Meireles se controlava para não rir.
— Pede algo pra bebermos também — sugeriu a mais velha, sentada ao
sofá.
— Vocês têm vinho? Acrescenta uma garrafa de vinho tinto suave, por
favor.



— Eu não acredito nisso, eu não acredito nisso. É muito azar pra pouca
Jennifer — resmungou a loira ao constatar que o vinho trazido possuía uma
tampa de rolha.
Regina levou a mão à testa ao deduzir que a mais nova possuía apenas
um abridor comum em sua casa e não um saca-rolha.
— Putz, que falta de sorte! Mas espera, vou dar um jeito nisso.— A
loira pegou o celular e fez uma busca na internet a respeito de como abrir um
vinho sem saca-rolha. Feito isso, seguiu o passo a passo de um dos muitos
tutoriais e recebeu as palmas da morena ao obter sucesso.
— Eu vou ficar gorda. Só como besteira quando estou com você —
comentou Regina enquanto se servia de um pedaço de pizza.
As duas mulheres estavam sentadas lado a lado no sofá. A caixa de
pizza estava sobre a mesa de centro, assim como a garrafa de vinho e duas taças
de vidro.
— O amor nos faz engordar — disse ao olhar para a morena e sorrir.
— Estou começando a acreditar nisso.— Riram. — Como está indo na
faculdade?
— Por enquanto estou gostando — respondeu ao pegar uma fatia de
pizza com a mão e observar o queijo esticar. — Meus colegas de classe são bem
legais e os professores muito dedicados.
— A turma é muito grande?
— É enorme! E a maioria é do sexo masculino.
— Nos primeiros períodos é assim mesmo. A faculdade é como um
funil, poucos são os que chegam ao final.
— Verdade, e eu pretendo ser um desses poucos — disse confiante. —
Agora me diz você, como estão as coisas no novo trabalho?
— Tranquilas. Ainda estou me adaptando, mas tudo tem corrido bem.
Com exceção de um aluno do primeiro ano que insiste em me dar dor de cabeça.
— Regina revirou os olhos ao lembrar. — O colégio tem uma regra que permite
uma tolerância de quinze minutos de atraso, mas ele me faz a gentileza de chegar
meia hora depois. No primeiro dia eu permiti que entrasse, mas agora não mais.
Pelo menos uma semana sim e a outra não eu tenho de barrá-lo na porta.
Consequentemente o número de faltas que ele está tomando está imenso.
— Ele dá alguma explicação?
— Sempre as mesmas: não ouvi o alarme tocar, meu ônibus atrasou. E
ele ainda tem a audácia de me chamar de tia! Ah não, Jennifer... Eu não tolero
mesmo — disse com indignação.
Jennifer não conseguiu conter o riso com a frase final proferida pela
mulher. Ela conseguia visualizar perfeitamente a imagem de Regina parada no
corredor ou talvez na sala de aula com a mão na cintura e a sobrancelha
arqueada enquanto dizia alguma frase do tipo: em primeiro lugar, não sou irmã
da sua mãe ou pai.
— Você ri?— comentou ao levar a taça de vinho aos lábios.
— Desculpa, é que deve ser engraçado ver essa cena — manteve o
riso. — Aposto que o menino deve se tremer inteiro com o olhar que você dirige
a ele.
— Que nada! Ele não se intimida. Pelo contrário, me desafia. Mas ele
vai aprender que quem manda na minha sala de aula sou eu — disse com
seriedade.
A loira levava as fatias de pizza à boca enquanto observava a mais
velha comer as dela de garfo e faca.
— Como você consegue comer assim? Tira toda a diversão de comer
pizza
— Não sabia que havia uma diversão por trás de comer pizza.
— Ah, você entendeu, amor! É como se tirasse a magia ou algo do tipo.
Regina soltou um risinho baixo e comentou.
— Eu entendi, sim. Mas eu prefiro comer dessa maneira, não suja os
dedos. Com a mão é como se eu estivesse apenas comendo um pão com queijo.
É ainda pior quando a pessoa enrola ou dobra a fatia.— Regina esboçou uma
expressão de nojo.
— Nisso eu devo concordar, é nojento! Minha amiga Beatriz come
dessa forma. E por falar em amiga, eu estava pensando em convidar meus
amigos pra conhecerem o apartamento. Queria chamá-los pra vir aqui amanhã à
noite, o que você acha? Queria reuni-los e gostaria muito que você participasse.
São pessoas especiais pra mim.
— Por mim não há problema. Não sei se terei muito assunto com eles,
mas...
— Eu não quero te forçar a nada, mas seria muito legal se vocês se
dessem bem. Eles são pessoas boas e legais. Kevin é meio louco às vezes,
confesso, mas ele acaba divertindo a galera.
— Convida eles e a gente vê como eu vou me sair no meio desses
jovens — piscou.
— Ok.— Sorriu.
Ao observar que havia um resquício de ketchup no canto da boca de
Regina, a jovem pegou um guardanapo e pressionou levemente o local.
— Nunca havia comentado, mas acho um charme essa pintinha que
você tem próxima aos lábios— disse enquanto a limpava.
A mais velha apenas sorriu e sentiu os lábios da loira beijarem a área
mencionada.
— Amo tanto você — disse enquanto olhava a mulher com admiração.
Ela se perdia fácil nos traços de Regina.
— Eu também te amo. Muito.— Regina encarou os olhos de Jennifer
por alguns instantes e selou calmamente os lábios nos dela. — Vamos pra Itália
comigo?— murmurou com suas bocas a poucos milímetros de distância.
— O quê? Que pergunta é essa?— Indagou confusa ao franzir o cenho.
— Ué, eu quero saber...— Ela acariciou carinhosamente os cabelos de
Jennifer e depositou uma mecha atrás da orelha enquanto dizia. — ... Se a minha
garota quer ir à Itália comigo.
— Como assim, Regina?— indagou ainda confusa.
— Final do ano, nas nossas férias — explicou. — Você sabe que
anualmente eu viajo pra visitar meus pais. Dessa vez eu quero que você vá
comigo pra conhecê-los. Eles estão ansiosos por isso.
— Eu agradeço o convite, mas eu não vou ter dinheiro pra uma viagem
como essa.
— Ei, eu estou convidando, então será por minha conta.
— De jeeeito nenhum! Não vou deixar que gaste tanto assim comigo.
— Por que sua resposta não me surpreende?— revirou os olhos. — Para
com isso, Jen. Vai impedir que vivamos um momento como esse por conta de
orgulho? Poxa, sou eu, Regina. Não é como se eu fosse uma estranha.—
Suspirou.
— Eu sei, é só que... Não é uma situação confortável pra mim.
— Bom, não quero te forçar a algo que possa causar algum desconforto.
Mas pensa com carinho a respeito? Se você aceitar, tome como um presente de
aniversário adiantado, visto que viajaríamos em dezembro.
— Prometo que vou pensar — disse de maneira doce.
— Enquanto estiver pensando nos imagine fazendo um pequeno tour
pela Europa. Você e eu em Paris seria algo bonito de se ver.
— Regina! Assim você está apelando! Sabe que morro de vontade de
conhecer os países da Europa! Na sua companhia, então...
— Você tem nove longos meses pra pensar e imaginar. Eu no seu lugar
não perderia essa oportunidade.
Jennifer segurava o sorriso enquanto balançava a cabeça negativamente.
Ela sabia que a mulher faria de tudo durante esses meses para convencê-la.
— Vamos assistir ao filme?— disse ao mudar de assunto. — Estou
curiosa pra conhecer a história dessa garota que você gosta. Como é mesmo o
nome?
— Katniss Everdeen.

Meireles recolheu a embalagem de pizza para a cozinha ao mesmo tempo
em que a mais velha guardou a garrafa de vinho e lavou as taças. As duas
escovaram os dentes juntas, olhando uma à outra no espelho, tomaram um banho
individualmente e se encaminharam para o quarto.
Enquanto Jennifer se ocupava em ligar o computador, Regina
observava atentamente a cama forrada pela jovem. Havia um lençol branco de
elástico envelopando o colchão, um lençol salmão sobre ele e um edredom
florido por cima de todos. As fronhas que envolviam os travesseiros eram de
coloração salmão, combinando com o lençol do meio, o que proporcionou à
Regina um conforto visual e mental.
— Não vai ter medo de dormir aqui sozinha, vai?— implicou.
— Se eu tiver, ligo pra minha namorada e ela vem me fazer companhia.
— Vai fazê-la se deslocar até aqui? Olha, espero que ela seja bem
recompensada por isso.
— Será tão bem recompensada, que irá torcer todas as noites pra que eu
tenha medo.
— Wow, se você diz...
Regina se aproximou da mochila que havia trazido e de lá tirou uma
pequena embalagem.
— Quero entregar algo a você antes de deitarmos pra assistir ao filme.
— O que é isso?— perguntou curiosa ao receber a embalagem em
mãos. Instantes após desembrulhá-lha, se deparou com uma das figuras de ação
vista por ela e a mulher quando estiveram no shopping semanas atrás. — O
Shenlong!— gritou empolgada. — Eu deveria bater em você por ter gasto com
isso, ele era o mais caro! Mas estou feliz demais pra isso. Obrigada!— Jennifer
se lançou no pescoço da mais velha e a envolveu.
— De nada me adiantaria o dinheiro se eu não pudesse usá-lo pra
colocar um sorriso no seu rosto — comentou suavemente ao envolver a cintura
da jovem com os braços. — Aceite como um presente para a casa nova.
— Obrigada, obrigada, obrigada!— Jennifer encheu a face e os lábios
da professora de beijos e em seguida depositou o Shenlong entre os livros da
estante. — Agora vamos ao filme!

Jennifer caminhou lentamente da estante até a cama para que pudesse
ter tempo de olhar Regina. E antes de deitar a seu lado, sentiu algo bom no
coração; como quando escutamos melodias e canções que nos proporcionam
sensações inenarráveis.
Quando Regina partiu para a Itália, não houve um dia em que Jennifer
não sonhasse com ela. Não se passou um dia sem que a desejasse assim;
forrando sua cama até o amanhecer.


Na manhã seguinte, Meireles despertou com alguns beijos suaves em
sua nuca e pescoço. Ao virar-se, encontrou Regina com os cabelos bagunçados e
expressão de sono na face. Naquele momento ela apenas sorriu e desejou que
aquela visão estivesse sempre presente em sua vida.
Delicadamente, entrelaçou os dedos naqueles fios castanhos e os jogou
para trás de modo a deixar o rosto da professora totalmente descoberto. Feito
isso, espalmou a mão na lateral direita da face da mulher e acariciou-a na
bochecha com o polegar.
Cada movimento foi feito sem pressa e em silêncio. Elas se olhavam
sem dizer e diziam sem falar. E antes que o dia começasse fora daquela cama,
elas se permitiram se sentir tão livres quanto as estrelas.
Ao puxar Jennifer para cima de seu corpo, a mais velha abriu um largo
sorriso ao ver a pequena juba loira e encaracolada da garota sendo iluminada
pelo feixe de luz solar que entrava pela janela do quarto. Naquele momento,
Regina jurou para si mesma que nunca mais aceitaria estar onde não a
emocionasse.
Quando finalmente conseguiram se arrastar para fora da cama,
vestiram-se e foram para a rua. As duas tomaram café da manhã na padaria
próxima ao edifício e em seguida se dirigiram para o supermercado.
Ao retornarem, passaram o início da tarde aproveitando o apartamento
enquanto compartilhavam algumas atividades. Dentre estas, Meireles ensinou a
morena a jogar alguns de seus jogos de vídeo game favoritos e também
assistiram a algumas lutas de boxe pela tv. Jennifer fazia questão de comentar e
ensinar a mulher sobre cada função técnica.
— Henrique adora vídeo game. Sempre me chama pra jogar, mas eu sou
péssima! Ele iria adorar ter você de companhia. A propósito, antes de viajar ele
havia comentado comigo que queria ver você. Eu disse que quando retornasse
sairíamos todos juntos, mas os dias foram tão corridos que até então não tive
oportunidade de combinar. Henrique está me cobrando direto.
— Que gracinha! Ele lembra de mim?
— E como lembra! Sempre menciona seu feito lá na piscina.
— Durante a semana é meio complicado, mas vamos sair juntos sábado
que vem. O que acha? Você o ama tanto e ele é tão importante pra você, que eu
quero ser mais próxima dele também.
— Vou perguntar à minha irmã se posso passar o final de semana com
ele e te comunico. Henrique vai pirar! Adora ir lá pra casa, ainda mais sabendo
que terá companhia pra jogar.
— Então vamos virar horas jogando, porque quando eu começo, não
quero mais parar!
Regina sorriu e por algum momento se permitiu entrar em outro plano;
um onde apenas Jennifer existia naquela sala com ela. Onde apenas a voz e a
respiração da jovem, tão próxima, eram os únicos sons a serem escutados.

Ao final da tarde, pouco antes dos amigos da loira chegarem, Regina
fechava os botões de um folgado vestido florido enquanto se olhava no espelho
do quarto.
— Não estou parecendo muito titia para os seus amigos?
— Que pergunta é essa, meu amor?— Jennifer não conteve o riso. —
Você nunca está parecendo uma titia. Acho que seu novo aluno está te deixando
complexada.
— Nem me lembra daquela peste.— Após fechar todos os botões,
depositou uma jaqueta preta de couro por cima. — Estou muito curiosa pra saber
como a Katniss e os demais irão conseguir derrubar a Capital — comentou, se
referindo aos filmes da noite passada.
— Só saberá se assistir o final! Faltam dois filmes, mas não vale assistir
sem mim, hum?
— Não posso dar nem uma espiadinha?— comentou ao olhar para a
loira, que vestia uma calça jeans de lavagem clara com alguns rasgos na região
das coxas e joelhos.
— Não! Espera pra assistirmos juntas. Se possível, ainda hoje quando
eles forem embora. Falando neles...
A campainha começou a tocar, fazendo Jennifer vestir uma camiseta às
pressas e correr para atender.
— E aí, Jennifer?— disse Rose.
— Meireles agora é gente grande e mora sozinha!— exclamou Kevin, já
entrando.
— Boa noite, Jen — disse Beatriz ao sorrir e cumprimentar a amiga.
— E aí, gente? Fiquem à vontade!— Meireles abraçou cada um de seus
amigos e começou a mostrar o lugar para eles.
— Isso daqui é pra você — disse Rose ao depositar uma embalagem de
presente nas mãos de Jennifer. — Presentinho pra casa nova — piscou.
— Obrigada! Não precisava se incomodar — disse educadamente ao
sorrir.
— Eu trouxe cervejas e meu violão!— comentou Kevin ao apoiar o
instrumento na parede e o fardo de cerveja em cima da bancada da cozinha.
— Vou colocar no freezer!— exclamou Jennifer.
— Onde está a Regina?— questionou Rose. No entanto, antes mesmo
que a amiga pudesse responder, a morena surgiu na sala.
— Boa noite — disse com a voz aveludada, fazendo todos os presentes
pararem o que estavam fazendo e olhá-la.
— Professora Vianna!— exclamou Kevin.
— Ela não é mais nossa professora — comentou Beatriz ao cutucá-lo.
— Boa noite, senhorita Vianna.
— Boa noite!— disse Rose com um largo sorriso nos lábios.
— A chamem de Regina, gente. Podem tratá-la pelo o que ela é: minha
namorada — comentou ao se aproximar da morena e abraçá-la pela cintura.
— Ai, que lindas — disse Rose de maneira contida. Seus olhos
brilhavam ao olhá-las.
— O Kevin trouxe cerveja, amor. Mas pode ficar sossegada que são
todos maiores de idade aqui.
— Hum... Será mesmo? Então me mostrem suas identidades — brincou
ela.
— Fodeu, ela vai nos descobrir!— disse Kevin ao entrar na brincadeira.
Kevin estava trabalhando na empresa do pai, Beatriz entrou pra
faculdade e começou a cursar matemática, como sempre fora de sua vontade, e
Rose ainda estava na dúvida de qual rumo tomar na sua vida.
Todos fizeram um tour pelo apartamento da loira e retornaram para a
sala. Beatriz e Kevin se sentaram juntos no sofá e Rose sentou-se no banco que
se localizava de frente para a bancada da cozinha americana.
— Espero que vocês não me façam segurar muita vela — retrucou Rose
de onde estava. Ela era a única solteira do grupo. — Mas se a Jennifer e a
Vianna quiserem se beijar na minha frente eu não vou me importar.
— Rose!— Jennifer repreendeu. — Se comportem, eu disse pra Regina
que vocês sabem ser gente e não aqueles bichos que eram em sala de aula.
— Me inclua fora dessa, Jen. Eu sempre fui muito comportada.—
Beatriz se defendeu.
A anfitriã levou alguns petiscos e refrigerantes para a mesa de centro e
colocou uma playlist pra tocar em seu celular enquanto conversavam. Beatriz e
Kevin permaneciam no sofá, Rose sentou-se no puff e Jennifer sentou-se no
chão com Regina. Todos haviam tirado os calçados e os deixado em um canto da
sala.
No início, todos, com exceção de Kevin, estavam um pouco
constrangidos e sem saber como se comportar na presença da ex professora. No
entanto, com o passar dos minutos os diálogo foram fluindo com naturalidade.
— Regina, você não faz ideia de como a Jennifer me perturbava. Ela
ficava falando de você todos os dias no meu ouvido!— disse Beatriz, arrancando
uma risada da mais velha e recebendo uma tapa da amiga.
— Deixa de ser mentirosa. Eu evitava ao máximo falar sobre ela.
— Evitava? Imagina se não! Eu já estava ficando louca.— Beatriz
falava com exagero enquanto depositava algum drama em suas frases.
— Shhh, calada!— Meireles repreendeu.
— Ah não, agora deixa ela falar! Continue Beatriz, o que ela falava
sobre mim?— Regina se segurava ao máximo para não rir das expressões que
Jennifer esboçava.
— Dizia que você é linda, que sempre sonhava dormindo e acordada
com um beijo seu e sempre ressaltava o quão maravilhoso é o seu perfume.
— Hummm — disse Rose ao conter um riso.
— Não acredito que você está me entregando desse jeito!— bufou.
— Qual foi, Jennifer!— Rose se manifestou. — Vocês namoram agora.
Não precisa ter vergonha.
— Não é vergonha, é só que... Regina não precisava saber dos meus
surtos diários por ela.
— Ok, ok. Não vou contar a parte mais sórdida da história — disse ao
implicar um pouco mais com a amiga.
— Você nem se atreva!— disse ao segurar o riso. Ela própria começou
a querer gargalhar de si mesma.
— Será que as cervejas já gelaram?— Indagou Kevin ao levantar. —
Alguém vai querer?
— Eu!— disse Regina.
— Eu também quero — comentou Rose.
— Prefiro continuar no refrigerante.— Beatriz e Jennifer se
manifestaram.
— Você tem parentes na Itália, não é?— perguntou Rose, curiosa.
— Sim, meus pais e alguns poucos familiares moram em Florença.
— Que máximo! Nunca estive lá, mas conheço por fotos. Seria um
sonho passar uma temporada por lá.
— Diga isso à sua amiga. A convidei pra viajar comigo e ela se recusou.
— Parou a palhaçada, Jennifer Meireles! Como assim você não quer ir
para aquele paraíso ao lado dessa deusa?— Rose era sempre muito espontânea e
sincera em seus diálogos.
Kevin retornou para a sala com as cervejas e os copos, pegou o violão e
tomou um lugar ao chão.
— Não é bem assim, não é, Regina?— disse ao fuzilar a namorada com
o olhar. — Apenas não quero ser bancada.
— Mas eu já disse que seria um presente de aniversário.— Regina
pegou uma das latas de cerveja e a virou em um copo. — De toda maneira seja
livre pra recusar. Mas seria lamentável.
— Eu no seu lugar não daria esse mole, Jen. Orgulho demais atrapalha
— disse Beatriz.
— Eu vou pensar.

Enquanto conversavam, observavam Kevin afinando o violão. Ele
sempre tinha o costume de tocar algo quando estavam entre amigos.
— Manda a música, Kevin!— exclamou Rose ao virar o puff em
direção a ele.
Em questão de segundos, todos bebiam e beliscavam ao mesmo tempo
em que o observavam tocar. Após duas canções, Regina se pronunciou.
— Posso?— pediu ao gesticular para o violão, proporcionando uma
enorme expressão surpresa na face de Jennifer, que até então nunca soubera
dessa sua habilidade.
— Você sabe tocar?— perguntou, incrédula.
— E por que a expressão surpresa?— comentou suavemente ao segurar
o instrumento e esboçar um pequeno sorriso de lado. — Vamos ver se aquela
Regina fundo de garagem ainda vive em mim.
Quando a mais velha começou a adaptar uma canção para o violão, todos
sentaram no chão e mantiveram total atenção. Jennifer levava as mãos à boca em
um gesto surpresa, enquanto os demais se perguntavam onde aquela Regina
estava escondida todo esse tempo. Hoje ela parecia uma mulher totalmente
diferente daquela que conheceram em sala de aula.
Quando conseguiu se familiarizar com o violão, começou a tocar e
cantar Grease – You’re The One I Want. E para sua surpresa, todos sabiam a
letra e cantaram juntos. Era incrível como a música tinha o poder de unir as
pessoas.
Na roda que se formou, todos se deixaram envolver pela voz e pela
melodia que a morena soava com as cordas do violão. Em poucos instantes ela
teve o poder de mudar toda a atmosfera local.
Quando a primeira canção chegou ao fim, Jennifer pediu para que ela
tocasse She Will Be loved- Maroon 5. Ela sempre quisera escutar essa canção
através de sua voz. E assim Regina o fez. De pernas cruzadas e com o olhar
sendo alternado entre o violão e Jennifer, cantou.
Naquele momento, Regina sentiu a alma livre e leve. A energia de todos
aqueles jovens que cantavam junto com ela fez um sabor nostálgico invadir sua
boca. Por algum momento ela deu um giro no tempo e se sentiu no fundo da
garagem de seus amigos quinze anos atrás.
Pra finalizar, começou a tocar a terceira e última canção da noite: Lana
Del Rey- Young and Beautiful. Ela não recordava ao certo quais notas deveria
executar, mas improvisou da melhor maneira que pôde.
Primeiramente todos se calaram por não conhecerem a canção. Mas
depois se mantiveram atentos ao clima que se instalou entre ela e Meireles.
Regina cantava aquela música com tanto sentimento, que hipnotizou e
emocionou Jennifer, a fazendo entrar em um universo onde sua voz, seus olhos
castanhos e o movimento que seus lábios faziam eram as únicas coisas
existentes.
Regina cantava com os lábios tão próximos da loira, que Rose começou
a vibrar internamente para que compartilhassem um beijo na sua frente. Todos
conseguiam ver e sentir o quão apaixonadas aquelas duas eram. De um lado,
Jennifer sorria involuntariamente sem ao menos se dar conta. Do outro, Regina
quase mergulhava para dentro daquela verde imensidão que a observava.
Os aplausos vieram ao término da canção, fazendo a morena abrir um
largo sorriso.
— Seu pai é de Porto Rico, não é? — perguntou Kevin ao levantar-se do
chão, recebendo uma resposta positiva de Regina. — Então compartilhamos algo
em comum. Meus avôs também eram de lá — explicou enquanto selecionava
uma música na galeria de seu celular. — Vamos dançar?— pediu ao esticar o
braço para a mulher.
Regina, sem hesitar, tirou a jaqueta preta, deu um gole no copo de
cerveja e alcançou a mão do rapaz.
Todos se levantaram e bateram palmas no ritmo da canção enquanto os
olhavam dançar a música que se assemelhava a um merengue.
— Gostosaaa!— Soltou Jennifer ao risos, observando os movimentos que
o corpo da mulher fazia naquele vestido florido.
Regina apenas sorriu para ela e se deixou levar pela melodia e pelos
movimentos do corpo de Kevin, os acompanhando.
O rapaz segurou a mão da morena e fez o corpo dela girar, a entregando
diretamente para os braços de Jennifer, que se tornou seu novo par.
Kevin puxou a mesa de centro para o canto da sala e abriu espaço para
que todos pudessem dançar livremente. Ele, Rose e Beatriz improvisaram uma
dança tripla entre eles.
Regina se remexia, segurava a mão de Jennifer e fazia o corpo da loira
girar e retornar de encontro ao dela. Meireles, sem desfazer o enorme sorriso que
havia em seus lábios, se exibia na dança para Regina e deslizava sensualmente as
mãos pela nuca dela.
— Será que temos uma loira de origem porto riquenha aqui também?—
comentou a mais velha ao puxar a jovem pela cintura e unir suas testas enquanto
se remexiam ao ritmo da canção.
— Talvez...— respondeu ao exibir um sorriso.

Em meio a alguns giros, testas que se uniam, mãos que se encontravam
e que deslizavam ora pela nuca e ora pelos quadris, as duas se deixaram envolver
pelo ritmo quente da canção e compartilharam um beijo totalmente espontâneo.
Seus lábios se roçavam e se pressionavam com delicadeza. Em um curto
instante Jennifer conseguiu sentir o hálito de cerveja que vinha de Regina e
gostou. Em algum canto de sua mente achou que aquele aroma combinou com
ela, ou pelo menos com o momento.
A língua quente e úmida da jovem foi aos poucos pedindo passagem e
adentrando lentamente a boca de Regina à procura de seu gosto. Talvez pelo
efeito do álcool, pelo calor da dança ou os dois, a morena sentia os sentidos
aflorados e quase soltou um baixo gemido quando entreabriu os lábios e sentiu a
loira se deslizando tão deliciosamente em sua boca. Sua língua e a dela se
encontraram e se acariciaram por alguns breves instantes e logo se separaram
quando ouviram a movimentação externa. Se tratava de Rose que gritava e batia
palma em alvoroço com a cena que acabara de presenciar.
— Você é muito boba!— disse Jennifer, rindo, ao ver a empolgação da
amiga.
— Só mais um beijo! Por favor! Por favor!— pediu com as mãos
unidas.
— Beija! Beija! Beija!— gritaram Kevin e Beatriz ao entrarem no
clima.

Então ali, entre músicas, sorrisos e amigos, Meireles depositou as mãos
na face de Regina e selou carinhosamente os lábios contra os dela.


Capítulo 40

— Eu me diverti muito na noite de ontem! Tenho certeza que meus
amigos adoraram você.
As duas mulheres conversavam dentro do carro enquanto a morena a
levava para o trabalho.
— Fico feliz em saber que a noite foi boa pra você. Também gostei de
estar com eles. Confesso que em alguns momentos foi um pouco estranho, mas
depois a música nos uniu de maneira muito agradável.
— Desculpa se te forcei a estar com eles.
— Oh não, Jennifer. De forma alguma. Eu gostei, de verdade. Apenas
foi estranho e diferente em alguns momentos. Mas não foi ruim.
— Tudo bem. Se você diz...
— Ontem eu estava observando uma coisa.
— O quê?
— Seu comportamento — respondeu ao olhá-la. — Mesmo entre seus
amigos você se diferencia. Eu ainda consigo ver adolescentes quando olho pra
eles. Mas eu vejo uma mulher quando olho pra você. Sua postura é muito
diferente.
— Isso é bom ou ruim?
— Bom. Eu vejo de maneira positiva. Você não perde a boa essência da
juventude, o que é ótimo. Mas olha pra vida com um olhar maduro, responsável
e decidido. Eu teria economizado muito tempo se na sua idade eu fosse tão
centrada e estruturada como você é.
— Eu fico um pouco sem jeito quando você me elogia assim.—
Jennifer carregava um rubor sutil em suas bochechas.

Assim que chegaram à academia, Regina encostou o veículo no meio
fio, despediu-se da namorada e seguiu para o colégio.
No intervalo entre uma das aulas sentiu o celular vibrar dentro da bolsa.
Ao tomá-lo em mãos, constatou que havia recebido uma mensagem de texto de
Jennifer, que a fez sorrir pelo restante do dia sempre que aquelas palavras lhe
vinham à mente.

Se me perguntarem quando descobri o amor, eu digo que foi numa
tarde de janeiro.

Jennifer.


Os dias seguiam com normalidade e calmaria. O sentimento de satisfação
crescia em Jennifer dia após dia cada vez que ela abria os olhos e via tudo o que
havia conquistado. Para muitos aquilo poderia ser chamado de pouco. Mas, para
ela, era sua felicidade.
Em contrapartida, tendo em vista que nem tudo são flores, ela
enfrentava algumas dificuldades da vida adulta. O cansaço e as obrigações
piscando em sua mente de forma constante era uma delas.

— Bom dia, menina de ouro!

Era pouco mais de onze horas da manhã de um sábado quando Regina
passou na academia para buscar a loira em um gesto surpresa.
— Jennifer!— gritou Henrique ao correr e abraçá-la pela cintura.
— Que surpresa maravilhosa é essa?— perguntou com um brilhante
sorriso nos lábios ao alternar o olhar entre a namorada e o menino. — Queria te
dar um super abraço, mas estou suada demais, rapaz.— A jovem vestia um
conjunto de calça e top de ginástica.
— Tia Regina disse que era melhor a gente vir te fazer uma surpresa do
que ficar te esperando em casa. Ela disse que você ia gostar. Você gostou,
Jennifer?
— Oh sim! Sua tia Regina estava completamente certa.— Sorriu.
— Será que tem um espaço aí pra mim?— comentou a mais velha ao se
aproximar dos dois. — Não me incomodo nem um pouco com esse suor — disse
ao lançar um olhar maldoso para que apenas Jennifer captasse a mensagem.
— Sempre terá um espacinho pra você — respondeu ao depositar um
beijo na bochecha da mulher.
— Tia Regina disse que você manda muito bem na luta. Que você faz
pah! Pah! Pow!— Henrique reproduzia sons com a boca ao mesmo tempo em
que gesticulava com as mãos de modo a reproduzir socos no ar, fazendo a loira e
sua tia rirem de sua graciosidade.
— Preciso admitir que sou boa no boxe mesmo. Por que não pede pra
sua tia levar você pra assistir a algum campeonato meu? Aposto que ela não
recusaria — murmurou a última frase.
— Vou pedir.— Ele sussurrou em resposta ao piscar para ela.





— Ih, que perna de pau você, Henrique!— implicou Jennifer.
Ela, Regina e o menino foram passear no parque a céu aberto para
aproveitarem o lindo e ensolarado céu que se mostrou a eles. O lugar era
composto por muitas árvores, uma pequena quadra para futebol, balanços,
gangorras e mini escorregas.
— Não sou, não!— Ele gritou em resposta ao avançar sobre Jennifer na
tentativa de lhe roubar a bola.
Regina permanecia sentada os observando sobre o banco de concreto
que havia de frente para a quadra. O sorriso não deixava seus lábios. Ela estava
adorando presenciar aquela relação à sua frente.
— Consegui!— Ele gritou ao tomar a bola da loira e correr em direção
ao gol. No entanto, a alegria durou pouco, antes que pudesse chutá-la para dentro
da rede, Meireles a roubou.
— Perdeu de novo!— disse ela ao correr na direção oposta e fazer um
gol.
— Cinco a dois para Jennifer Meireles. Ela venceu — disse Regina ao
se manifestar, parando com o salto a bola que rolou em sua direção.
— Estava de juiz?— perguntou a jovem ao se aproximar e pegar uma
garrafa de água com a morena, recebendo um aceno positivo de cabeça.
— Você só ganhou porque é mais alta que eu.— Henrique retrucou ao
cruzar os braços.
— E o que isso tem a ver, amigão?
— Simples! Suas pernas são maiores e você consegue correr distâncias
mais rápido.
— Oh! Então foi por isso que eu ganhei? Apenas por isso? Aham...
Entendi — disse ironicamente ao conter um riso.
— Eu quero uma revanche!
— Só se for agora!
— Mas não no futebol. Suas pernas não me deixariam ganhar de
qualquer jeito. Quero que seja no vídeo game!
— Hum... Ok! Então que seja no vídeo game!— disse com entusiasmo.
— Quem você acha que ganha, tia Regina?
— Eu aposto todas as minhas fichas em você — disse a ele.
— Está sozinha nessa, Jennifer! Regina é do meu time.
— Sem problemas. Vou mostrar que ela está errada.— A loira jogou um
pouco da água no rosto e pescoço na tentativa de se refrescar, e prendeu o cabelo
em um rabo de cavalo.
Regina, de onde estava, a olhava com atenção. Ela adorava quando a
loira ficava vermelha após algum esforço físico. Suas bochechas pareciam
tomates, assim como as de Henrique.
— Que tal pararmos numa sorveteria pra nos refrescarmos um pouco
desse calor? Quem quer sorvete?— perguntou Regina.
— Eu!— Henrique foi o primeiro a se manifestar.
— Ótima ideia!

Sentados em volta à mesa, cada um tomava seu sorvete. Henrique e
Jennifer haviam escolhido taças gigantescas, enquanto Regina optou apenas por
uma casquinha.
— Vocês vão conseguir tomar tudo isso?
— Eu tomaria até duas taças dessa! Ou melhor, três!— disse Henrique.
— Sua tia está achando que somos fracotes iguais a ela — murmurou ao
cutucar o braço do menino com o cotovelo, o fazendo rir.
— Meu Deus, vocês são uns monstrinhos — comentou enquanto os
observava. — E saibam que eu escutei isso.— Regina quase babava ao vê-los se
dando tão bem.
— Você ainda é aluna da tia Regina?— Questionou-a enquanto ia se
servindo do creme gelado.
— Não mais. Por quê?— perguntou interessada.
— Por nada — respondeu ao dar de ombros.
As duas mulheres receberam alguns olhares do menino quando a loira
se esticou e ofereceu o canudo de biscoito na boca da professora. Desde que os
três se encontraram naquela manhã ele observava com atenção a forma carinhosa
na qual elas se tratavam.
— Tem uma menina da minha sala que tem duas mães — disse
Henrique de maneira aleatória, recebendo instantaneamente os olhares das duas
sobre si.
— É, meu amor?— comentou sua tia.
— Sim. Alguns colegas meus acham estranho. Que idiotas. Quem não
gostaria de ter duas mães?
Jennifer e Regina trocaram olhares e mexeram as sobrancelhas na
tentativa de se comunicarem a respeito do que Henrique falava.
— Infelizmente algumas pessoas não compreendem que duas mulheres
ou dois homens também podem se amar — disse Regina com suavidade na voz.
— Eu acho isso uma bobeira. O amor vem do coração. E não existe
coração de menina ou de menino, apenas existe coração. Então todos podem se
amar.— Ele respondeu, deixando Jennifer e Regina surpresas.
— Você está certíssimo, rapaz. O mundo seria um lugar muito melhor
de se viver se todos pensassem assim — disse Meireles ao acariciar os cabelos
de Henrique para trás.
Quando todos concluíram os sorvetes, deixaram o local e se dirigiram
para a casa da mais velha.




Após o banho, Henrique apareceu na sala vestindo um conjunto de
pijama listrado azul com branco e algumas embalagens de balas na mão.
— Estou pronto pra acabar com você — disse com seriedade na voz
após ligar o videogame, puxar o controle e se sentar ao lado de Jennifer.
Os dois se mantiveram concentrados na televisão enquanto mexiam os
dedos sobre os botões dos controles. Regina, sentada no sofá ao lado, os
observava com Bóris em seu colo. Eles Jogaram competição de futebol, corrida
de carro e um jogo de luta.
Henrique levou a melhor no de futebol e no de carro,
consequentemente, saindo vitorioso de sua revanche.
— Te venci! Rá!
— Bate aqui, garoto!— Regina elevou a mão e reproduziu um hifive
com o sobrinho. — Agora vou deixar você brincando com o Bóris e vou pra
cozinha preparar algo pra jantarmos.
— Eu te ajudo.— Se manifestou Meireles.
— Eu também quero ajudar!— disse o menino.
— Então vamos colocar a mão na massa!

Na cozinha, Jennifer descascava e picava alguns ingredientes como alho
e cebola enquanto a morena amaciava e temperava a carne moída crua sobre a
tábua de carne. Henrique ficou encarregado de entregar na mão da tia os
utensílios que ela precisaria usar.
— O que teremos de janta?— perguntou ele ao depositar um pote de
pimenta do reino sobre a bancada da cozinha onde Regina trabalhava.
— Macarronada com almôndegas. Gosta?
— Eu amo!— disse empolgado. — Principalmente a que você faz. A da
mamãe não fica tão boa.
— Oh, não a deixe saber disso.— Riu.
— Não vou deixar.— Ele piscou para a tia.
— Está chorando por que, Jennifer? Eu sei que é maravilhoso cozinhar
ao meu lado, mas não precisa chegar a tanto — brincou, arrancando uma
gargalhada do sobrinho.
— Eu sempre uso cebolas quando quero enganar a mamãe de que estou
doente pra não ir à escola.
— Henrique!— repreendeu Regina.
— Não faça isso com sua mãe.— Jennifer se pronunciou. — Ela deve
ficar preocupada de verdade. Isso não é legal. Além do mais, a escola é
importante e deve ser levada a sério — comentou, deixado o menino pensativo a
respeito de suas atitudes.
— Vou ser obrigada a contar isso pra Malena — disse Regina, fazendo
o sobrinho arregalar os olhos assustado.
— Não, não. Por favor, por favor, tia Regina. Ela vai me bater ou
colocar de castigo.
— Então me prometa que não mais irá enganá-la dessa forma.
— Tá bem...— disse cabisbaixo. — Eu prometo.

Minutos depois, sentados à mesa, os três dialogavam enquanto
degustavam a refeição. Henrique contava para a tia e para Jennifer os
acontecimentos da escola e natação.
— Agora eu também sei boiar de barriga pra cima igual a você,
Jennifer.— Ele explicava.
— Que máximo! Eu quero muito ver isso.
— Vou pedir pra minha mãe me levar pra piscina e chamo você e a tia
Regina.
— Combinado!
Henrique se manteve calado por aproximadamente cinco minutos.
Tempo demais para uma criança de dez anos falante e hiperativa como ele.
Parecia pensativo e reflexivo. Esse detalhe não passou despercebido pelas duas
mulheres, que o olharam, se entreolharam e aguardaram ele se manifestar.
— Jennifer...— Ele iniciou ao desviar o olhar do prato para ela.
— Sim?
— Você gosta muito da minha tia Regina, não gosta?
— Sim, eu gosto muito.
— Eu não julgo você por amá-la. Ela é demais — respondeu ao sorrir e
dar continuidade ao jantar, deixando as duas mulheres sorrindo e se olhando em
silêncio.
Henrique era um garoto muito inteligente e sabia exatamente o que
estava acontecendo ali. Ele não conseguia externar os sentimentos, mas queria
que as duas mulheres soubessem que estava tudo bem pra ele.



Já passava das onze horas da noite quando Henrique adormeceu deitado
no sofá da sala com a cabeça apoiada no colo de Jennifer. Regina retornava da
cozinha com sua xícara de chá quando se deparou com a cena. A loira acariciava
lentamente os cabelos de seu sobrinho enquanto o tinha em seu colo.
A mais velha se aproximou em silêncio e ouviu a jovem murmurar que
ia levá-lo para o quarto. E assim ela o fez, prendeu as pernas do menino em sua
cintura e subiu com ele para o andar de cima.
— Boa noite, amigão — murmurou após depositar um beijo em sua
testa.
— Vocês dois juntos quase fizeram meu coração derreter durante o dia
de hoje — disse Regina ao caminhar pelo corredor e se dirigir para o outro
quarto com a namorada. — Você daria uma mãe maravilhosa.
— Você acha?— indagou. — Acredito que não. Sou muito moleca! Eu
não saberia ter pulso firme com a criança. Mas você, sim, seria uma mãe
incrível. Educaria um filho como ninguém.
As duas mulheres se ajeitaram e sentaram encostadas contra grandes
almofadas na cama.
— Uma criança não precisa apenas de disciplina. Ser um adulto igual a
você, que tem jeito pra embarcar junto nas brincadeiras, é essencial para o
desenvolvimento emocional. Acho que você e eu temos um pouco de tudo que
uma criança precisaria. Você seria a diversão, a leveza e eu seria a que orienta,
cuida excessivamente, mas que também não deixa de dar carinho.
— Sabia que consigo imaginar perfeitamente você como mãe?
— Ah é? E como eu seria?— perguntou, segundos antes de dar um gole
em seu chá.
— Ciumenta, brava, porém, um poço de amor e bondade. Seria
daquelas que diz coisas do tipo: posso saber o que está fazendo com a televisão
ligada uma hora dessas? E essa bagunça no chão desse quarto? Você deve estar
querendo me deixar louca!— Jennifer dizia cada frase tentando imitar a voz e a
entonação de Regina.
— Ei, eu não seria uma mãe assim!
— Ah, mas você seria!— Riu da expressão de indignação que a morena
esboçava. — O que é constituir família pra você?— perguntou ao olhá-la e
observar que a fumaça que saía do chá começara a embaçar os óculos da mulher,
que precisou tirá-los.
— Hum... Acredito que seja colocá-la em primeiro lugar, fazê-la
prioridade. Não por uma obrigação, mas por ser nossa vontade maior, porque a
amamos. É construir um novo ninho, diferente do que tínhamos com nossos pais.
— Bela definição.— Sorriu. — Agora por que você não põe esse chá de
lado...— Jennifer se esticou sobre a morena, segurou a xícara e a depositou sobre
o criado-mudo — ... E vem namorar um pouquinho?— pediu ao deitar-se por
cima da mulher. — Passei o dia inteiro querendo te encher de carinho.— A loira
beijou a testa, as bochechas, o queixo e os lábios de Regina.
— Hum... Um pedido feito dessa forma, eu não tenho como negar —
disse com rouquidão em sua voz ao segurar a nuca de Jennifer e puxá-la para um
beijo.
O beijo iniciou lento, carinhoso e aos poucos foi se intensificando, se
aprofundado. Suas mãos começaram a sentir necessidade de toques mais
precisos e seus corpos iniciaram alguns movimentos sensuais.
Jennifer arrastou os lábios pelo pescoço de Regina e arrancou gemidos
abafados da boca da mulher ao adentrar com a mão dentro de sua calcinha. A
loira estimulava lentamente a intimidade de Regina enquanto a beijava
avidamente na boca. Aos poucos sentiu os dedos molharem com a umidade que
crescia entre aquelas pernas.

— Tia Regina?
— Oh não, não, não — murmurou rapidamente ao ouvir a voz do
sobrinho soando do outro lado da porta.
— Tia Regina?— Ele bateu. — Jennifer?— chamou ao virar a
maçaneta.
— Droga, eu deveria ter fechado a porta.— Meireles resmungou
rapidamente ao sair de cima da namorada às pressas.
Regina ajeitou a calcinha e a camisola de maneira apressada debaixo do
lençol enquanto Jennifer também se recompunha.
— O que aconteceu, meu amor?— A mais velha perguntou um pouco
eufórica pelo susto.
— Não tô conseguindo dormir lá. Não é minha cama — explicou com
um suspiro de lamentação. Henrique nunca havia dormido sozinho fora de casa.
Todas as vezes em que foi visitar Regina dormiu na cama com ela, ou no quarto
ao lado com Malena.
Jennifer olhou para a mais velha e posteriormente olhou para o menino
em um sinal de que estava tudo bem.
— Então vem dormir aqui com a sua tia, que eu durmo lá, ok?— Ela
ofereceu.
— Obrigada, Jen — disse ele um pouco envergonhado ao subir na cama
e tomar o lugar da loira.
— Eu já volto, tudo bem?— disse a morena ao se levantar da cama. —
Vou beber um copo d’água.
Henrique balançou a cabeça positivamente, escondeu todo o corpo, com
exceção da cabeça, debaixo do edredom e se manteve lá aguardando o retorno de
sua tia.
— Me desculpe por isso, Jennifer — disse ao pegar um copo de água na
geladeira e se direcionar para a loira.
— Sem problemas, acontece. Acho que estamos provando um pouco da
parcela do que é ser mãe.— Soltou um riso contido.
— É, tem dessas coisas...— Riu em conjunto. — Vou me recompor um
pouco aqui embaixo e daqui a pouco eu subo. Pode ir pra cama se quiser.
— Ou eu posso ficar e terminar rapidinho o que comecei lá em cima.—
Meireles envolveu lentamente a cintura de Regina com os braços.
— Nem pensar. Aqui não, Henrique pode resolver descer.— Regina
depositou as mãos sobre os braços da loira e os tirou de seu corpo. — Agora vai,
melhor você sair daqui pra que eu consiga voltar ao normal.
Jennifer abriu um sorriso sacana e avisou que deixaria a porta do quarto
aberta a noite inteira.
— Não me importaria de receber uma visita pela madrugada.— Piscou,
segundos antes de dar as costas e subir.
— O que eu faço com você, garota?— disse a si mesma ao balançar a
cabeça negativamente e sorrir.



— Ah não, mãe! Você disse que só ia me buscar mais tarde!— disse o
menino, emburrado, ao abrir a porta para Malena.
— Oi pra você, filho. Mamãe também sentiu sua falta — disse ao
entrar. — Não vou te levar pra casa agora, vim mais cedo pra dar um olá para a
Jennifer. Ou você quer essa loira apenas pra você?
— Boa tarde, Malena.— Meireles se manifestou.
— Boa tarde, Jennifer. Como você está, querida? Finalmente nos
reencontramos! Henrique deu muito trabalho?
— Estou muito bem e você?— Sorriu ao abraçá-la. — Oh não, ele é um
menino maravilhoso. Nos divertimos muito juntos. Não foi, Henrique?
— Sim! Jogamos futebol, vídeo game, assistimos desenhos,
cozinhamos! Você sabia que a Jennifer é lutadora de boxe? Me deixa assistir ela
lutando, mãe?— disse em um só fôlego.
— Vamos com calma aí, rapaz. Minha cabeça ficou até tonta agora. Eu
sabia, sim. E é claro que eu deixo você ir assisti-la. Será que vocês me levariam
junto?
— Claro, Malena. Quando Jennifer for participar de outro campeonato
eu comunico a você e todos iremos prestigiá-la — disse Regina.

As três mulheres se reuniram no sofá enquanto Henrique brincava com
Bóris pela casa. Malena estava muito curiosa a respeito daquele relacionamento.
— E então, como tem sido desde que minha irmã voltou e agora
Jennifer já mora sozinha?
— É como se estivéssemos em uma nova era — disse Regina.
— Sim. Finalmente nossa relação está fluindo de uma forma mais leve.
— Jennifer comentou.
— Agora será melhor do que antes.— A morena completou.
— Eu estou feliz demais por vocês! A Regina sabe que quando me
contou a situação eu dei uma pequena surtada. Não por qualquer preconceito,
mas sim porque eu sabia que precisariam enfrentar muitos obstáculos.
— E ainda estamos enfrentando — comentou a mais nova. — Minha
mãe ainda não aceita cem por cento, e eu sinto algum preconceito sobre nós
quando estamos trocando algum afeto em público.
— Eu imagino que as pessoas devam olhar bastante pra vocês. Mas se
você quer um conselho, Jennifer, jamais peça desculpas por sem quem é. E
nunca se arrependa de lutar pelas coisas que ama e acredita. Tenha sempre em
mente que o medo não conquista direitos. A compreensão da sua mãe virá com o
tempo.
— Obrigada pelas palavras, Malena. Eu realmente quero acreditar nisso.
— Sorriu.
— Agora me conta! Como é namorar a louca da minha irmã?
— Como é que é?— exclamou Regina. — Estava demorando...
— Ela ainda não provocou um curto circuito na sua mente com as
manias, não?
Jennifer soltava algumas risadas ao observar a namorada revirando os
olhos para a ruiva.
— Não. Eu já me acostumei — respondeu suavemente.
— Isso porque você ainda não morou com ela! Eu ficava à beira de
enlouquecer! Ela encuca com as mínimas coisas.
— Ei! Era você que me deixava à beira da loucura com toda sua
desordem!— Se defendeu.
— O problema é que pra você tudo é desordem.— Malena rebateu. —
Ela se incomoda até com a posição do pano de chão. Se não estiver esticado, ela
vai lá e o estica quantas vezes forem necessárias.
— Você vai mesmo ficar falando mal de mim pra Jennifer?
— Só um pouquinho. Ela precisa saber onde está se enfiando.— Malena
se segurava para não rir das expressões que a irmã esboçava. — Ainda bem que
você é atleta, Jennifer — comentou ao desviar o assunto.
— Por quê?— questionou de maneira inocente.
— Porque eu conheço minha irmã como a palma da minha mão.— A
ruiva soltou um pequeno riso. — É preciso preparo físico pra aguentá-la, se é
que me entende.
— Eu não estou ouvindo isso!— exclamou Regina. — Já chega,
Malena. Jennifer já ouviu o suficiente.
— Qual foi, Regina? Deixa de ser careta! Ela é sua namorada e eu sua
irmã preferida. Que mal há falarmos sobre isso?
— Até onde sei você é a única irmã que tenho — respondeu. — Pode
estar deixando a Jennifer desconfortável com suas indiscrições.
— Não se preocupe, está tudo bem. Estou me divertindo com ela —
disse a loira com calmaria na voz. Jennifer, de fato, aparentava estar gostando da
espontaneidade da ruiva. — Eu dou bastante conta dela. Pelo menos eu acho que
sim — sussurrou para a ruiva, a fazendo rir.
— Fica mesmo dando corda pra Malena. Ela não tem limites.
— Você é uma estraga prazeres!— retrucou Malena.
— Não, pelo contrário. Eu sou aquela que traz o prazer.
— Uuuui!— Malena aplaudiu. — Já disse que me jogaria na sua rede se
você não fosse minha irmã e eu gostasse de mulheres?
— Oh céus, olha o que você está dizendo. O quê usou antes de vir pra
cá?
— Nada! Sou naturalmente assim; louca e adorável.— Sorriu.
— Louca eu até concordo. Mas... Adorável? Ainda tenho minhas
dúvidas — dessa vez foi Regina que se controlou para não rir da expressão de
desaponto da irmã.

Ao final daquela tarde, Jennifer deixou o apartamento da professora e se


dirigiu para o dela. Ela alegou que precisava adiantar algumas coisas da
faculdade e finalizar tarefas pendentes em casa. Entretanto, haviam combinado
de se encontrarem novamente ao final da noite para dormirem juntas no
apartamento da mais nova.
Meireles conferiu a hora em seu celular e viu que já passava das dez.
Quando pensou em ligar para a namorada e saber se estava vindo, seu nome
piscou no visor do dispositivo.
— Amor?— disse ao atender a ligação.
— Oi Jennifer. Aqui é a Malena.
— Oi Malena! Algum problema?— perguntou, estranhando a ruiva
estar telefonando do celular da irmã.
— Sim, estou te ligando do hospital. Aconteceu algo com a Regina.


Capítulo 41

— O quê?— exclamou ao celular. A última frase da ruiva fez seu
coração começar a bater aceleradamente. — O que aconteceu com a Regina?
Onde ela está?— perguntou, nervosa, ao pensar que o pior pudesse ter
acontecido.
— Calma, Jennifer. Foi apenas um pequeno incidente. Bóris fugiu, se
meteu numa confusão com um cachorro e Regina acabou sendo arranhada de
maneira um pouco profunda na tentativa de salvá-lo. Ela está levando alguns
pontos na boca nesse momento — explicou da maneira mais serena que pôde.
— Ai, meu Deus! Eu vou para aí! Estão em qual hospital?— Os olhos
da loira estavam cheios d’água e seu coração ainda parecia querer sair pela boca,
tamanho o susto que havia tomado.
— Vou te mandar o endereço por mensagem de texto. Mas fica calma,
ela está bem.
Jennifer tirou o pijama às pressas, recolheu a chave do apartamento e
pegou um táxi até o local. Seu coração ainda estava a mil.
— Onde ela está?— Foi a primeira frase dita ao encontrar Malena e
Henrique na sala de espera.
— Oi, Jennifer — disse ao abraçar a loira. — Ela está numa sala pós
atendimento. Se identifica na recepção pra você poder entrar.
Meireles preencheu uma pequena ficha, prendeu um crachá na camiseta
e se direcionou para a sala correspondente. Ao abrir a porta, avistou Regina
sentada sobre a cama.
— Meu amor, eu fiquei tão preocupada — disse com doçura na voz
após se aproximar e tocar com suavidade a mão da mulher.
— Desculpe causar essa preocupação. Eu disse pra Malena não
telefonar, pois eu mesma o faria quando saísse daqui. Mas ela é uma teimosa.—
Regina falava com dificuldade por conta da anestesia local e o inchaço no lábio
superior.
— Ela fez bem em me ligar. Eu ficaria muito chateada se não fosse
informada. Como está se sentindo?— Jennifer acariciava os cabelos da
namorada enquanto a observava com ternura.
— Estou bem. O efeito do susto já passou, mas na hora meu coração
quase se desfez quando vi o cachorro avançando pra cima dele. Eu ia levá-lo pro
seu apartamento, já estava de saída, mas Henrique abriu a porta antes que eu
pudesse pegá-lo. Bóris não é de fazer isso, mas hoje decidiu me aprontar uma.—
Riu com dificuldade. — Por sorte os gatos são muito ágeis e ele não sofreu nada.
O cachorro era da minha vizinha. Pulou o portão quando o viu passar correndo.
— Caramba, deve ter sido um susto e tanto pra todos.
— E foi. Me meti entre eles e acabei recebendo isso — disse ao apontar
para os pontos no canto superior do lábio direito.
— Será que cicatriza mais rápido se eu der um beijinho?
— Você pode tentar.
Jennifer aproximou-se lentamente e pressionou os lábios com
suavidade.
— Agora é só aguardar.— Sorriu.

As duas seguiram para o apartamento da mais nova assim que Regina
foi liberada. A morena recebera um atestado de alguns dias para permanecer em
casa, tendo em vista que não havia a menor condição de dar aulas naquele
período de cicatrização.
— Vou faltar ao serviço amanhã pra cuidar de você.
— Nada disso, Jen! Eu estou bem. Agradeço sua boa vontade, mas não
há necessidade. Amanhã mesmo eu vou voltar pra casa.
— Por que você tem que ser tão durona?
— Eu não sou durona, amor. É que realmente não precisa.
— Ok. Mas por essa noite eu faço questão de te paparicar. A minha
vontade era a de que você nunca mais fosse embora. Não imagina a aflição que
senti quando sua irmã me telefonou. Sabe, Regina... Eu sabia que te amava, mas
não sabia a dimensão desse sentimento até hoje. O medo que senti foi
inexplicável.
— Oh, meu amor, eu sinto tanto pelo susto.— Regina pegou a mão da
jovem e envolveu entre as suas duas mãos. — Eu estou aqui pra você, estou
bem. Vazo ruim não quebra tão fácil.
— Sua boba!— Jennifer soltou uma baixa risada enquanto sentia os
olhos se enchendo d’água. — Estava pensando em algo no caminho pra cá.
— O quê?
— Sei que é extremamente cedo pra pensar nisso e eu não quero que
você me ache uma louca por isso. Mas não pude evitar...— Meireles se mostrava
reflexiva e emocionada. Regina conseguia ver um pouco de tristeza naquelas
esmeraldas. — Olhando pelo fluxo natural da vida... Você vai embora muito
antes de mim.
Jennifer conseguiu deixar Regina sem palavras. Ela sabia que não havia
um argumento contra aquilo. Sim, se a vida seguir o seu rumo natural, Regina
morrerá muitos anos antes.
— Eu poderia pedir pra que não pensasse nisso agora, mas sei que não
adiantaria de nada e você continuaria a fazê-lo, pois é uma teimosa!— disse de
maneira descontraída em uma tentativa de desfazer a atmosfera pesada que as
envolveu. — Então só posso pedir que vivamos a vida, dia após dia, e que você
aceite ir pra Itália com a mulher que ama.
— Como você joga baixo!
— Se tentar de todas as formas possíveis levar a pessoa que amo pra
fazer a viagem dos sonhos dela é jogar baixo, então eu jogo.
— Ai, ai... O que eu faço com você, Regina?
— Ei, essa frase é minha.— Sorriram.


Quinze dias haviam se passado desde o incidente com Bóris e o
cachorro. Regina, enfim, retirou os pontos e começou a aplicar pomada
cicatrizante de maneira excessiva sobre seus lábios. Os pontos lhe haviam
deixado uma pequena e esteticamente incômoda cicatriz no canto superior
direito.
— Não acredito que vou ficar com isso — reclamava ao se observar em
frente ao espelho do banheiro. Regina terminava de se maquiar enquanto
aguardava a chegada de Jennifer. Hoje ocorreria uma festa em comemoração ao
aniversário de quinze anos da academia em que a loira fazia seus treinos e
também trabalhava.
Quando a campainha tocou, apressou-se em atender.
— Uau...— disse a loira ao observar a namorada de cima a baixo e o
caminho inverso também.
Regina usava um longo vestido vermelho com abertura na lateral
esquerda de sua perna. Em seus pés, um par de scarpin preto de sola camurçada
em vermelho.
— A baba está quase caindo — comentou a mais velha, com um sorriso
nos lábios, segundos antes de apertá-la no queixo e se direcionar para a garagem.

Dentro do veículo as duas mulheres trocavam algumas palavras antes de
partirem. Regina reclamava com Jennifer a respeito da cicatriz que recebeu.
— Nem está tão profunda assim, amor — disse ao olhar para o local. —
Eu diria, inclusive, que está um charme.
— Você é louca, Jennifer! Está horrível. É que a maquiagem encobriu
um pouco.
— Então podemos dizer que sou louca, ou muito apaixonada por você,
o que não é diferente, pois apaixonar-se é uma grande loucura.
— Hum... Está filosofando agora?
— Tenho meus momentos de filósofa barata.— Riu. — Mas falando
sério, Regina... Essa marquinha aí te deixou charmosa e misteriosa. As pessoas
vão olhar e se perguntarem qual história existe por trás.
— Ai Jennifer, só você!— Regina não conteve uma pequena risada. —
O que existe por trás é uma dona preocupada ao ver seu gato em uma briga e
quinze dias de incômodo no lábio. Ah! Sem mencionar a agonia que passei em
não poder fumar.
Há algum tempo a professora se limitava a fumar apenas um cigarro
diário. No entanto, após ordens médicas, foi obrigada a passar duas longas
semanas sem ao menos levar um à boca. Essa proibição deixara a mulher
extremamente irritada e nervosa por consequência da abstinência. E agora que já
estava liberada para voltar a consumi-los, seu corpo estava descontando o atraso
de maneira um pouco agressiva. Ela estava indo para o quarto cigarro do dia.
— Eu estava tão contente em não te ver fumando assim — comentou ao
observar a mais velha abrindo a janela e acendendo o cigarro.
— Desculpa, mas hoje eu preciso tirar o atraso ou vou enlouquecer.—
Regina depositou a mão que segurava o cigarro para fora da janela enquanto
alternava entre tragá-lo e olhar para a loira ao seu lado. — Qual o endereço da
festa?


Os meses começaram a passar na vida de todos. Jennifer começou a ter
dificuldades para conciliar trabalho, estudo, boxe e casa. Principalmente por
conta da faculdade, que começou a tornar-se mais puxada e a exigir mais de sua
capacidade mental. No entanto, sempre que começava a sentir o peso em seus
ombros, Regina estava lá para ajudá-la a tornar a vida mais leve; seja com uma
ajuda nas disciplinas da faculdade ou com sua simples companhia. E, ah! A pia
de sua casa eventualmente entupiu e ela se praguejou por não ter escutado a
namorada.

A passagem dos meses trouxera para suas vidas um momento bastante
esperado. Alguém adivinha? Sim, o casamento. Mas vamos com calma, estamos
falando de Morgana Meireles e Diogo. Jennifer e Regina não pensavam em se
casar. Ainda não.

— Estou imensamente feliz por vocês, Diogo — disse Jennifer ao
reflexo do homem no espelho. Ela estava posicionada por trás ajudando-o a
arrumar a gravata. Os dois conversavam no quarto de Morgana que, por sua vez,
terminava de se arrumar na casa de uma amiga.
— Obrigado, Jen! Seremos oficialmente da mesma família agora.—
Sorriu.
Meireles retribuiu o sorriso e concluiu com a gravata.
— Eu que preciso agradecer. Você foi e é tão importante pra mim.
Sempre me apoiou e esteve aqui pra segurar meu mundo quando ele parecia
desabar.
Diogo segurou carinhosamente a mão da loira enquanto conversavam
frente a frente.
— Eu amo você, garota. Amo por ser a filha da mulher da minha vida, e
amo por ser quem você é.
— Eu também te amo.— Sorriu docemente. — Eu daria tudo pra ter
tido um pai como você.
— Em nunca vou ocupar o lugar do seu pai e não tenho a menor
pretensão de fazê-lo. Mas eu posso ser um segundo pai na sua vida, o que acha?
— Dois pais?— comentou ao esboçar uma expressão pensativa. — Isso
soa tão...
— Gay!— disseram juntos em meio a uma risada.
— Por falar em gay... Como você e a Regina estão?
— Estamos bem. Ótimas, eu diria! Cada dia me apaixono mais por
aquela mulher.
Jennifer e Diogo compartilhavam uma relação invejável. Ambos se
sentiam bem e confortáveis na presença do outro. Falavam sobre qualquer
assunto sem tratá-los como um tabu.
— Que bom, meu amor. Eu fico muito feliz em saber disso. Quando
você vai inseri-la oficialmente na família também?
— O quê?
— Pedi-la em casamento, Jennifer!— disse como se parecesse óbvio.
— Ah, sim! É, então — coçou a nuca. — Não sei. Eu queria esperar
concluir a faculdade pra poder ter algo melhor a oferecer.
— Mas isso tomaria uns quatro ou cinco anos da vida de vocês!— disse
ele como se aquilo parecesse um absurdo. — Você pode crescer
profissionalmente com ela ao seu lado, Jennifer. Não há problema algum nisso,
não acha? Ela sabe que você ainda estuda e tenho certeza que não está nem um
pouco preocupada com o tamanho do seu salário.
— É, eu sei que não está. O que ganho na academia não é muito, mas eu
consigo me sustentar sem precisar do dinheiro dela.
— Então, o que te impede? Faz o pedido! Compra um anel bem bonito
e a peça em casamento. Eu no seu lugar não a deixaria escapar.
— E se eu receber um não daqueles bem grandes no meio da minha
cara?
— Sério, Jennifer? Ela ofereceu estadia na casa dela pra você.
— Porém, um pedido formal de casamento é algo muito mais sério.
— Não saberá a resposta dela se não tentar.


Após a cerimônia nupcial dentro da igreja, todos se dirigiram para a
cobertura de um clube. Entre música alta, drinks, refrigerantes, salgadinhos,
canapés, dentre outros petiscos, os convidados conversavam e se divertiam em
conjunto. Ninguém conseguia dizer qual dos noivos parecia estar mais feliz. Os
amigos mais próximos de Jennifer também estavam no local, assim como
Arthur, que foi convidado por Jennifer, e Henrique. Todos compartilhavam o
mesmo espaço naquela grande festa.

— Felicidade aos noivos!— disse Regina, educadamente, ao
cumprimentá-los. Ela e Morgana ainda não possuíam um bom relacionamento,
mas estavam trabalhando em cima disso.
Morgana sabia que a morena era uma pessoa do bem e amava
verdadeiramente sua filha. Ela estava usando esse saber como chave para
aprender a trancar seus preconceitos enquanto ainda não conseguia destruí-los.
— Obrigada!— respondeu educadamente ao sorrir. Morgana depositou
uma mão sobre o ombro de Regina e inclinou-se para cumprimentá-la com um
beijo no ar e bochechas coladas. Ela sabia que ainda devia desculpas à morena
pelo tapa de pouco mais de um ano atrás.
Diogo agradeceu e envolveu a professora em um abraço.
— Essa família está ganhando novos membros.— Ele comentou. —
Quando será seu casamento com Jennifer?— disse de maneira descontraída para
testar as intenções futuras da morena.
— Primeiro ela precisa me pedir em casamento — disse em tom
divertido. — Isso se eu não a pedir antes — completou.
Ao final das palavras trocadas com os noivos, Regina retornou para a
mesa e encontrou a loira brincando de luta com Henrique e um sobrinho de
Diogo. Os três estavam de pé e os dois meninos tentavam acertá-la. Sorrir foi
inevitável ao observar aquela cena e ver o quão bem ela se dava com crianças.
Daria uma excelente mãe, pensou.
Ao tomar um lugar ao lado de Arthur, começou a conversar com o
amigo sobre a loira. Seu olhar ainda estava depositado na pequena brincadeira
entre os três.
— Olha... Eu tenho que aplaudi-las. É difícil acreditar que passaram por
tudo aquilo e hoje estão aqui — disse o homem ao alternar o olhar entre a amiga
e o que ela observava.
— Nem eu acredito, meu amigo. Finalmente a calmaria para os nossos
dias. A cada dia mais eu sinto as coisas se encaixando e tomando o rumo certo.
— Regina carregava um sorriso bobo nos lábios ao olhar para a cena à sua
frente; Meireles carregava Henrique nas costas e o puxava para o meio do salão.
A loira e seu sobrinho começaram a dançar ao ritmo da canção. Jennifer
usava um vestido bege que balançava conforme seus movimentos de rodopio.
Regina olhou para ela e facilmente a comparou com um dente de leão, daqueles
que o vento tira pra dançar.
— Vão jogar o buquê. Vai lá, Regina!— Arthur incentivou.
Beatriz e Rose se levantaram correndo da mesa e seguiram em direção a
Morgana. Em poucos minutos um aglomerado de garotas e mulheres com idades
um pouco mais avançadas estavam se ajeitando e procurando espaço entre si.
— Eu? Sem chance.
— Mas por quê? Jennifer está lá. Vai! Chances em dobro — disse ao
empurrar o ombro da amiga. — Daqui a pouco você fica pra titia, anda logo.
— Falou o novinho, hum? Daqui a pouco você vira tiozão.— Ela
rebateu.
— Pois fique você sabendo que eu estou conhecendo alguém, senhorita
Vianna.
— Ah é? E posso saber por que não contou isso pra sua melhor amiga?
— Porque ainda é muito recente e eu não sei se vai pra frente. Mas
espero que sim. A conheci numa cafeteria.
— Arthur! Isso é maravilhoso!— disse com animação. — Me conta
mais.
— Conto assim que você voltar. Agora vai, anda!— O homem
empurrou o corpo da amiga e praticamente a obrigou a se juntar aos demais.
— Buquê de sogra não traz azar?— Essas foram as últimas palavras
ditas pela mulher antes de unir-se às outras. Arthur, de onde estava, riu.

— Todas estão prontas?— perguntou Morgana, já de costas.
— Sim!— Um grupo gritou em resposta.
— Então será no três! Se preparem! Prometo não enganar!— exclamou.
— Vamos lá! Um...Dois e... Três!

Assim que a noiva jogou, todas olharam para cima e se alvoroçaram
entre si na tentativa de agarrá-lo. Contudo, não se sabe se por obra do destino ou
outra razão, o buquê de Morgana parou justamente nos braços de Regina. Nessa
hora, o par de olhos castanhos e os verdes se cruzaram na mais perfeita sintonia.



Capítulo 42

— Eu não acredito que o dia finalmente chegou. Férias! Liberdade!
— Como está se sentindo?
— A mais feliz das mulheres! É quase impossível de acreditar que vou
conhecer a Itália ao lado da mulher da minha vida.
Era final de dezembro. Meireles havia aceitado o convite de Regina há
alguns meses e estava com tudo pronto para embarcarem. Tendo em vista que o
semestre havia sido concluído e o trabalho aceitou a mudança de férias para o
mês em questão, nada mais prendia as amantes no país. A loira não parava de
babar sobre o passaporte e as passagens guardadas dentre as folhas.
— Diz pra mim que não estou sonhando, amor.
— Você quer um beliscão?— A morena ofereceu.
— Seus beliscões são tão fracos que não adiantariam!— implicou.
— Ah é? Então me lembre de comprar um chicote de couro nessa
viagem. Vamos ver se não resolvo o problema — provocou.
As duas mulheres fizeram o check-in, aguardaram o voo e embarcaram.
Dessa vez, tendo em vista que ficaria apenas um mês fora, a mais velha preferiu
que Bóris ficasse aos cuidados de Malena. Ela queria liberdade total para poder
passear pela Europa com sua namorada.
Regina permitiu que a loira ficasse no assento da janela. Era a primeira
vez que Meireles viajava de avião e ela não tiraria dela esse momento tão único.
A mais velha sorria feito boba apaixonada ao observar a empolgação explícita
nas expressões faciais de Jennifer e em seus movimentos com os membros do
corpo.
— Eles servem coisas gostosas aqui?
— Será que você só pensa em comer, garota?
— Na maior parte do tempo, sim.

No decorrer das horas, Jennifer alternava entre olhar pela janela e
conversar com a namorada. Ela se sentia ansiosa demais pra conseguir
adormecer. Regina, por sua vez, se permitiu apoiar a cabeça no ombro da loira e
dormir de maneira fragmentada. Após longas horas de vôo desembarcaram no
aeroporto de Florença. Carmen Vianna e Henrique as aguardavam com
ansiedade.

— Bem vinda à Toscana!— comentou Regina assim que ambas
recolheram as malas.
— Eu ainda não acredito que estou aqui! Isso até parece um sonho!—
Meireles olhava ao redor e sorria feito criança em loja de doces.
— Está pronta para conhecer os seus sogros? Pois eles estão bem ali e já
nos viram.
— O quê?— exclamou a mais nova. — Não sei se estou pronta —
comentou enquanto caminhavam em direção ao casal. — E se eles não gostarem
de mim?— disse baixinho ao passar a mão pelos cabelos, ajeitando-os.
— Saberemos agora.
— Regina!— disse Carmen com um sorriso nos lábios.
— Filha, finalmente!— comentou Henrique.
— Mãe, pai... Essa é a Jennifer Meireles, minha namorada.
— Que belíssima moça! Ainda mais linda pessoalmente que por fotos.
— Carmen elogiou ao envolvê-la em um abraço.
— Prazer, senhora Vianna.— A loira sentiu um pouco de nervosismo ao
abraçar a mais velha.
— Realmente, é uma moça muito bela.— O senhor Henrique sorriu e
envolveu a jovem em um abraço apertado. — Agora sabemos por quê nossa filha
caiu de amores.
— Por dentro ela é ainda mais bonita. Acreditem — comentou Regina
ao expressar um sorriso e observar que Jennifer estava ruborizada.
— Oh, eu não duvido que seja — disse o homem.
— Fizeram boa viagem?
— Fizemos sim, senhora Vianna. Foi tudo muito tranquilo.
— Senhora Vianna? Não precisamos dessas formalidades, querida.
Pode me chamar apenas de Carmen — disse suavemente.
— Ok, Carmen.— Sorriu. — Regina se parece bastante com você.—
Ela comentou. — Na verdade, é uma boa mistura dos dois.
— É bom que você saiba mais ou menos como ficarei daqui a alguns
anos. Ainda vai me querer?— Regina tentava conter um riso.
— Oh, com toda certeza — respondeu, arrancando uma pequena
gargalhada da família Vianna.
Todos entraram no carro e Henrique dirigiu para longe dali. Jennifer,
durante o caminho, manteve seus olhos quase grudados ao vidro do veículo. Ela
estava tão encantada com a paisagem, que não ousou dizer uma palavra. Apenas
ocupou-se em registrar através dos seus olhos curiosos aquele lugar que a fazia
sentir-se em um sonho. A professora, sentada no banco ao lado, olhava para a
mais nova com encanto. Para ela, observá-la admirada com o que via pela janela
era demasiadamente bom. Não existia beleza em Toscana que ganhasse daquilo.
Jennifer, sem dúvida, era sua paisagem favorita.
Ao chegarem à grande casa da família, as duas mulheres subiram ao
quarto para guardarem as malas e acomodarem suas coisas. Foi o primeiro
momento a sós após o encontro com Carmen e Henrique.
— O que achou deles?
— Me parecem adoráveis! Por isso você é uma mulher tão maravilhosa,
agora eu entendi. Teve duas boas influências em casa.
— A mulher maravilhosa aqui é você, garota.— Regina se aproximou
de Jennifer e a envolveu carinhosamente pela cintura. — Mas sim, eles
realmente são adoráveis.
— Mulher ou garota? Você tem que decidir — comentou suavemente
ao deslizar os braços sobre os ombros da mais velha e envolvê-la pelo pescoço.
— Por que decidir, se eu posso ter um pouquinho das duas?
— Bem pensado.— Jennifer sorriu e pressionou os lábios contra os da
mulher. — Nosso primeiro beijo na Itália — sussurrou, fazendo a namorada
sorrir contra sua boca.
— O primeiro de muitos...


Regina, Jennifer e o casal Vianna estavam reunidos à mesa da extensa
sala de jantar. Todos degustavam da deliciosa pizza feita por Carmen.
— Então quer dizer que você luta boxe?— comentou o senhor
Henrique.
— Sim, treino desde os doze anos. Me destaquei o suficiente pra
conseguir participar de alguns campeonatos.
— Será que algum dia poderemos vê-la em ação?— Carmen perguntou.
— Claro! Nos façam uma visita que eu conseguirei lugares nas cadeiras
da frente pra todos.
— Carmen e eu realmente andamos pensando em passar uma temporada
por lá. Estamos com saudades de Malena, meu neto e alguns amigos que temos.
Certamente faremos questão de prestigiá-la.
— Ótimo! Estaremos aguardando ansiosamente.— Sorriu.
— E quanto a sua mãe? Desculpe se eu estiver sendo indelicada, mas
Regina me explicou a situação entre vocês.
— Minha mãe melhorou muito. Ela tem lutado pra vencer os próprios
preconceitos. Não posso afirmar que me entende ou que adora a Regina. Mas
tem nos respeitado.
— O respeito é primordial — disse Henrique ao se manifestar. —
Ficamos felizes em saber que a situação sofreu um avanço positivo.
— Obrigada! Também me sinto feliz em ter pelo menos o respeito dela.
Ainda tenho esperança de que as coisas irão avançar ainda mais.
— Estamos com vocês — comentou Carmen ao expressar um largo
sorriso.
A campainha começou a tocar enquanto conversavam. Regina pediu
licença e se ofereceu para atendê-la. Ao retornar, sua prima Laura estava ao seu
lado. As duas mulheres estavam de braços unidos e a ruiva dialogava com
Regina em grande animação. Jennifer, de onde estava, virou o rosto e avistou a
namorada acompanhada da mulher que parecia muito íntima. Sentir uma pontada
de ciúmes foi inevitável.
— Boa noite, família! Pizza da tia Carmen e não me convidaram?
Inadmissível!— comentou ao se aproximar de todos.
— Tome um lugar à mesa e fique à vontade — disse Henrique
educadamente.
— Laura, quero apresentar alguém a você — comentou Regina ao se
aproximar da cadeira da loira, que levantou-se. — Essa é Jennifer, minha
namorada.— Sorriu.
— Boa noite, Jennifer! Você é ainda mais bonita pessoalmente.
— Foi o que dissemos — comentou Carmen de seu lugar.
— Obrigada, você também é muito bonita — disse timidamente. —
Aliás, nessa família pelo visto só tem mulheres lindas.
— Oh, obrigada!— A ruiva envolveu a mais nova em um abraço
apertado. — Me chamo Laura e sou prima da Regina.— Se apresentou.
— É um grande prazer conhecê-la, Laura.— Meireles esboçou um
sorriso e retornou para seu lugar à mesa, assim como Regina.
— E então, prima. Já fez um filho nela?— disse de maneira repentina
ao depositar uma fatia de pizza no prato.
— Que história é essa?— Indagou a morena.
— Ué, foi você que me disse ano passado. Ou estava bêbada demais pra
recordar? Pois eu me lembro muito bem de te ouvir dizer que ainda faria um
filho nela.
— Como é que é?— exclamou Jennifer. Carmen e Henrique apenas
riam da situação.
— Você é uma fofoqueira, Laura!— resmungou a morena. — Como
farei um filho nela, se ainda não casamos?
— Então adianta esse casamento aí, prima — disse a ruiva. — Não
deixa ela ficar te enrolando, Jennifer — cochichou ao direcionar a atenção para a
loira.
— Mês que vem fará dois anos desde que nos conhecemos, e pouco
mais de um ano e meio desde que nos envolvemos. É... Acho que já estou pronta
pra receber um pedido de casamento — disse Jennifer em tom de brincadeira ao
esboçar uma expressão pensativa.
— Ué, pensei que eu seria pedida em casamento — brincou a
professora.
— Espera! Temos um impasse aqui — manifestou-se Henrique em tom
divertido.
— Um sério impasse, eu diria.— Carmen reforçou.
— Está ansiosa pra conhecer a Itália, Jennifer?— perguntou Laura ao
mudar de assunto. Ela era o tipo de pessoa que falava sobre distintos assuntos
aleatoriamente.
— Eu mal posso esperar — respondeu com um sorriso estampado na
face.
— Amanhã quero levar Jennifer bem cedo pra conhecer alguns pontos
turísticos — disse Regina. — Até seria bom nos deitarmos um pouco cedo hoje.
— Sugeriu.
— Acho que não vou conseguir dormir, estou me sentindo muito
ansiosa e eufórica.
— Mas você vai precisar pelo menos tentar. Quero que esteja disposta
pra aproveitarmos o dia. Eu posso fazer um chá de camomila pra auxiliar no seu
sono, o que acha?— perguntou ao acariciar a face da jovem, fazendo com que
todos os presentes olhassem e sorrissem com a ternura.
— Chá? Que nojo, Regina! Prefiro um leite quente.
— Ok, então será um leite quente pra você.— Sorriu.

Ao final daquela noite, Henrique, Carmen, Jennifer e Regina se
reuniram no quarto onde o casal estava hospedado. Todas as malas estavam
abertas e os presentes haviam sido entregues. Carmen presenteou Jennifer com
um suéter, e deu à filha um vestido de renda. Henrique presenteou a nora com
um kit de treinar boxe em casa para que dessa forma ela não saísse do ritmo
enquanto estivesse em viagem. Meireles, com a ajuda da namorada, trouxe um
vinho francês para ele e uma colônia para Carmen.
— Nossa filha já falou tanto sobre você, que nutrimos um grande carinho
antes mesmo de conhecê-la. E pelas poucas horas que conversamos essa noite,
tenho certeza que nós teremos uma ótima relação. Henrique e eu esperamos que
fique à vontade na nossa casa. Seja muito bem vinda!
— E não precisa se envergonhar. Pode pegar o que quiser e explorar
cada canto do lugar.
— Obrigada aos dois pela hospitalidade!— Meireles envolveu os sogros
em um abraço carinhoso e se permitiu permanecer ali por longos segundos. Ela
se sentia emocionada por estar realizando o sonho de conhecer a Itália e por estar
sendo acolhida pelos pais da mulher que amava.

Ainda naquela noite, horas mais tarde, ela olhava para o teto enquanto
pensava na jornada que a levou até onde estava. E quando decidiu olhar para o
lado, avistou Regina dormindo suavemente. A luz do luar invadia o quarto e
iluminava parcialmente o corpo da morena.
— Eu te amo tanto, Regina. Tanto...— murmurou ao acariciar a testa da
mulher e depositar alguns fios do cabelo para trás. — Obrigada por isso; por me
trazer até aqui e por nunca ter desistido de mim — sussurrou, segundos antes de
depositar um beijo suave em seus lábios.


Assim que o dia amanheceu, Jennifer foi a primeira a ficar de pé.
Quando Regina acordou, deparou-se com a figura da loira já arrumada.
— Diz pra mim que você dormiu essa noite — comentou enquanto se
levantava da cama.
— Poucas horas, mas foi o suficiente. Me sinto ótima e pronta pra
conhecer tudo lá fora!— disse com um brilhante sorriso nos lábios.
Ao deslizar para fora dos lençóis, Regina depositou um beijo nos lábios
da loira e se dirigiu para o banho. Quando retornou do banheiro, já estava
devidamente vestida.
— Vamos precisar traçar um itinerário pra que nosso dia possa render —
comentou ao pegar os óculos, um bloco de anotações e uma caneta. — Ainda é
sete horas da manhã, então eu acredito que a gente consiga ver bastante coisa
hoje.
Feitas as anotações, as duas mulheres tomaram café da manhã e saíram.
O primeiro destino foi a cidade de Siena.
No percurso, Jennifer olhava pelo vidro do carro e se admirava com as
paisagens; a começar pelas vinícolas e ciprestes.

— Ciprestes são árvores que os italianos chamam de soldado —
explicou Regina. — Pois elas criam uma espécie de muralha, barreira.
— São lindas — disse a mais nova ao alternar o olhar entre a paisagem
e a professora.
Durante todos os caminhos por onde passavam, a mais velha explicava
os pontos mais marcantes de cada lugar. Ela ensinou para Meireles, inclusive,
que Florença foi a capital da Itália de 1865 a 1870.
— O que é aquele lugar? É um cemitério?
— Sim — respondeu ao diminuir a velocidade do automóvel para que a
loira pudesse observar melhor.— É o cemitério dos americanos que morreram na
segunda guerra mundial.
— Wow!— Jennifer se mostrava atenta e empolgada a tudo o que via
pelo trajeto.

Algum tempo depois, quando chegaram ao lugar de destino, Regina
precisou estacionar o carro para que seguissem a pé. Pois é proibido transitar
com automóveis nos centros históricos de várias cidades italianas.
— Pronta pra gastar as solas dos tênis, mocinha?
— Já nasci pronta!
Naquele dia as duas mulheres se limitaram a passear por Siena, San
Gimignano e Pisa. Em Siena Jennifer conheceu o banco mais velho do mundo,
fundado em 1472, o Monte dei Paschi. Lá ela também conheceu Piazza Del
Campo, a principal praça da cidade, e a majestosa Catedral de Siena.
— Essa cidade aparenta ser muito antiga. É como se eu estivesse
caminhando por um livro de História — comentou Meireles.
— Realmente é muito antiga. Se você reparar, os edifícios são
medievais.
— Incrível! Estou adorando — comentou ao entrelaçar os dedos nos de
Regina.
Após algumas horas caminhando por Siena, voltaram para o automóvel
e seguiram para San Gimignano.
— Qual a história dessas torres?— perguntou ao apontar para uma das
torres que havia em San Gimignano.
— Na época medieval acontecia competição entre as famílias. Quanto
mais alta fosse a torre, significava que mais dinheiro você tinha. Pois quanto
mais próximo do céu, mais próximo de Deus.
— Interessante...— disse pensativa. — Olha quantos buracos de
guerras!— Jennifer fazia questão de observar cada mínimo detalhe de cada lugar
por onde passavam.
— Aqui tem uma gelateria que é famosa por conter o melhor sorvete do
mundo. Que tal experimentarmos juntas?— sugeriu a mais velha.
— Vai cair muito bem nesse calor — respondeu ao sorrir.

Ambas precisaram enfrentar uma enorme fila para a compra do sorvete.
Para Jennifer valeu super à pena, tendo em vista que ela jurava nunca ter
provado algo tão bom. No entanto, para Regina não foi tão satisfatório assim.
Ela comentou que esperava mais.

A próxima e última parada do dia foi na tão esperada cidade de Pisa.
Jennifer finalmente pôde conhecer e tirar uma foto clichê simulando estar
segurando o monumento que era a inclinada torre. Meireles não apenas se
encantou com a torre, não. Ela se sentiu igualmente deslumbrada pelo Batistério:
um edifício religioso com uma transição de estilo entre o românico e o gótico.
— Não acredito que conheci tanta coisa em um único dia!— disse de
maneira animada ao cruzar a porta de entrada da casa dos Vianna quase
saltitando.
— Diga isso aos meus pés. Estou exausta! Mas o dia foi maravilhoso ao
seu lado. Valeu à pena cada calo que surgirá neles amanhã.— Riu.
— Antes de dormir eu te faço uma massagem.— A loira ofereceu. —
Obrigada pelo dia de hoje e pela incrível aula de história.— Meireles, sem
desfazer o sorriso nos lábios, envolveu a namorada pela cintura e a puxou para
um beijo carinhoso.
— Será que estou atrapalhando o casal?— pigarreou Carmen ao surgir no
ambiente, fazendo as duas mulheres rapidamente se afastarem. — Oh não, não,
continuem, continuem, finjam que não estou aqui — disse em tom divertido. —
Se divertiram?
— Muito. Eu não tenho palavras pra descrever o quanto me emocionei
com a beleza e história do lugar — comentou a mais nova ao aproximar-se da
sogra.
— Precisa conhecer Veneza. É encantadora!— Carmen carregava um
sorriso nos lábios ao recordar da última vez em que estivera por lá.
— Quero aproveitar um pouco de Florença com Jennifer no decorrer
dos dias e semana que vem tentarei levá-la a Veneza e Roma. Precisaremos
passar alguma noite por lá, pois o tempo é curto e a distância um pouco maior —
explicou.
Jennifer possuía um mês de férias. A contar com esse tempo, decidiram
que passariam duas semanas inteiras na Itália e quase duas semanas na França.
Conhecer Paris era o sonho da jovem e Regina não poderia deixar de realizar.
— Veneza exala romantismo, acho que será um ótimo passeio pra
vocês. Aproveitem essa chama inicial do namoro, é uma delícia. Me lembro de
quando conheci o pai de Regina. Ai ai...— Suspirou às lembranças.
— Nós estamos aproveitando — disse Jennifer ao sorrir.
— Pretendo levá-la em um vilarejo essa semana. Quero aproveitar um
pouco da natureza e da simplicidade da vida.
— Um vilarejo?— A loira indagou.
— Sim. Gostaria de conhecer um?— A morena perguntou. — Pois eu
adoraria me perder algumas horas com você por lá.
Carmen apenas as olhava e sorria enquanto conversavam. Ela muito
apreciava todo aquele amor e paixão quase palpáveis.
— Eu adoraria conhecer qualquer coisa que você quisesse me mostrar
— respondeu suavemente, recebendo um amplo sorriso da namorada. — Agora
se me dão licença, preciso ir ao banheiro urgente, estava apertada desde o carro.
— Riu. — Vou aproveitar e já tomar um banho, amor.
— Oh, tudo bem. Nos encontramos lá em cima ou você desce daqui a
pouco?
— Eu desço.— Meireles pediu licença à Carmen e subiu para o segundo
piso.
— Tem algo que preciso te contar, mãe — cochichou ao tocar a mão de
Carmen e puxá-la para sentar ao seu lado no sofá.
— Ao constar pela sua cara, deve ser algo sério — comentou ao
perceber que Regina aparentava nervosismo.
— Estou pensando em pedir Jennifer em casamento — disse em um
sussurro inaudível por sua mãe.
— O quê? Fala um pouco mais alto.
A professora olhou para a escada e em seguida voltou a olhar para a
mulher a seu lado.
— Vou pedir a Jennifer em casamento — repetiu baixinho.
— Uau! Em casamento?— exclamou. — Filha, isso é maravilhoso!
Quando? Como?
— Shhh, fala baixo! Não quero que ela ouça e estrague a surpresa —
repreendeu. — Pretendo pedir em breve, ainda nessa viagem. Mas...
— Mas?
— Estou com medo dela não aceitar.— Suspirou.
— Deixa de ser boba. Ela te ama, filha. Tenho certeza que irá aceitar.—
Carmen usava uma voz suave ao mesmo tempo em que acariciava a superfície
da mão da mais nova.
— Não estou muito certa disso. Como posso te explicar? É que o pedido
seria bastante... Inusitado.
— Como assim?— perguntou duvidosa.
— Você vai dizer que sou louca, mas vamos lá. Então, eu estava
pensando em...


Alguns dias haviam se passado. Regina havia tirado Jennifer bem cedo
da cama para que pudessem aproveitar o pequeno sol que se fazia presente
naquela manhã em Florença.
— Por Deus, Regina! Deixa a menina descansar. Isso são horas?—
comentou o senhor Henrique ao conferir o horário em seu dourado relógio de
pulso. — Sua mãe e eu já somos velhos, é do nosso costume dormir e acordar
com as galinhas. Mas eu tenho certeza que a Jennifer gostaria de dormir até mais
tarde.
— Se eu deixar, ela dorme até meio dia, papá. Como aproveitaríamos a
viagem dessa forma?
— Ei! Isso é mentira! Eu não durmo até meio dia.— Se manifestou a
loira. — Até onze, talvez — disse por fim, arrancando uma risada do sogro e da
morena. — Mas Regina está certa. Não sei quando terei a oportunidade de estar
aqui novamente. Quero aproveitar ao máximo.
— Então vamos logo tomar nosso café da manhã antes que o clima dê
uma virada.

Minutos mais tarde as duas namoradas entraram no automóvel da
família e seguiram juntas para longe dali. Regina havia planejado um dia simples
para elas. Simples, porém, especial. Seria apenas elas e a natureza que as
rodeava. Uma manhã leve, regada de plantas, ar puro, construções medievais e
amor. Visto que era inverno na Itália, ambas estavam devidamente agasalhadas.
Pois embora fizesse sol naquela manhã, não era o suficiente para aquecê-las.
— Aqui em Florença neva?— perguntou quando desceram do carro e
começaram a caminhar em direção a um vilarejo.
— É um espetáculo bem raro, mas às vezes acontece. Quando a neve
chega aqui, toda a península italiana já está branquinha — explicou a professora.
— Você gostaria de ver?
— Sim! Queria ter essa sorte, pois nunca vi a neve. Mas já seria pedir
demais.
Caminhavam de mãos dadas por entre ruas e becos estreitos do lugar. O
vilarejo em questão não era povoado, por esse motivo foi o escolhido pela
professora. Ela queria um momento a sós com Jennifer dentro daquele histórico
ambiente. Flores específicas do inverno cobertas por finas camadas de gelo se
faziam presentes nas ramificações que haviam nas paredes das ruínas do lugar.
Paredes estas, que Meireles fazia questão de deslizar os dedos e senti-las. O
vilarejo possuía uma estrutura medieval. Algumas casas ainda estavam muito
bem conservadas, mas havia outras tantas bastante deterioradas pelo tempo.
— O céu por aqui parece mais azul — comentou. A mão da jovem
permanecia segurando carinhosamente a da morena.
— Eu também percebo isso. E o pôr- do- sol é o mais laranja de todos.
Nos meses em que passei na Itália, sempre vinha a esse lugar.
Andavam de mãos dadas e a passos lentos por todas as escadas das
pequenas ruas e becos do vilarejo. Alternavam entre se olharem e observarem a
paisagem do ambiente. Jennifer chegava a suspirar em alguns pontos.
— Todas as vezes eu pensava em você e no quão bom seria ter a sua
presença.
— Agora que estou aqui, como se sente?— perguntou com suavidade
na voz. Jennifer carregava um pequeno sorriso no canto dos lábios.
— Não encontro adjetivos que possam descrever. Mas, feliz e plena
chegam muito próximo.— Sorriu. — Você complementa toda a paisagem.
— Ai Regina... Meu coração se desmancha dessa forma. São muitas
emoções e experiências de uma só vez.
— Desmancha nada. Seu coração ainda é jovem — disse em tom de
divertido, a fazendo sorrir.
Após alguns instantes de caminhada subindo e descendo pequenos
degraus por entre as pequenas construções medievais, chegaram a um pequeno
campo com gramas cobertas por uma fina camada de gelo e algumas flores de
inverno.
— Esse lugar é lindo na primavera — disse a professora.
Meireles agachou-se entre o gramado de estatura mediana e se pôs a
admirar a variedade de flores. Ela se perguntava internamente como elas
conseguiam sobreviver a baixas temperaturas.
— Gosto muito de entrar em contato com a natureza. Sinto uma paz
inigualável — comentou enquanto depositava suavemente a mão sobre algumas
flores e as livrava do gelo.
— Eu também. A energia vital da natureza me recarrega — afirmou ao
aproximar-se da loira, que se levantou. — Bóris iria adorar estar presente. Assim
como nós, ele também ama a natureza.
— Seria ótimo ter aquela coisinha fofa aqui — disse de maneira vaga.
Por um instante a mente de Jennifer foi para longe; tão longe e tão perto. Seu
semblante aéreo não passou despercebido pela professora, que se aproximou e a
segurou no queixo.
— Um doce por seus pensamentos.
— Apenas um? Não os vendo por tão pouco.
— Oh, que mercenária!— brincou ao apoiar a mão no peito e fingir
indignação. — Então vamos lá. Um doce e um beijo, o que acha?
— Assim está melhor. Pode pagar antecipado?
— Não. Primeiro a informação.
— Como você é durona!— reclamou. — Ok. Vamos lá. Eu estava
pensando em como seria a vida por aqui. Me parece tão mais tranquilo se
comparado ao lugar onde moramos. As crianças devem crescer mais leves e
felizes. Por um instante eu...— Jennifer hesitou e interrompeu a própria fala.
— Por um instante você...? — Regina buscou o olhar da jovem e a
encorajou a prosseguir.
— Nada. Era bobeira.— Tentou desconversar, mas a mais velha
insistiu.
— Você está com vergonha de mim?— perguntou com suavidade na
voz ao notar algum rubor nas bochechas de Jennifer. Regina segurou-se ao
máximo para não sorrir com tamanha graciosidade. — Sou eu, meu amor. Não
precisa ter vergonha de me dizer algo.— Segurou a mão direita de Jennifer com
carinho.
Meireles tentou evitar o olhar castanho, mas foi inevitável. Quando se
deu conta os mirava de maneira fixa.
— Não é bem vergonha, é que foi um pensamento totalmente fora da
nossa realidade.
— Estou ficando ainda mais curiosa.
— Olha, só vou contar porque quero muito o doce e o beijo, ok?—
Recebeu um aceno positivo e um sorriso da morena. — Então... Por um
momento pensei em um filho nosso correndo por esse campo.
— Um filho?— perguntou de maneira retórica. Um sorriso
inevitavelmente se formou em sua boca. — Então quer dizer que você pensa em
ter filhos comigo, Jennifer Meireles? — questionou ao envolvê-la pela cintura.
Por conta da baixa temperatura, Jennifer usava calça jeans, botas de
cano longo, blusa e uma jaqueta de couro vermelha. Regina, por sua vez, usava
jeans, sapato fechado, sobretudo preto e um cachecol de coloração vinho com
mostarda.
— Foi apenas um pensamento — disse ao, também, envolver a mulher
pela cintura.
— E como era o nosso filho nesse seu pensamento?
— Ele aparentava ter uns três anos e possuía cabelos castanhos como os
seus.
— Era menino, então?
— Sim.— Sorriu. — Um menino com os seus traços.
— Qual o nome?
— Não tive tempo de descobrir. Quando você ia chamá-lo e repreendê-
lo por estar correndo, fui trazida de volta.
— Oh, desculpe. Agora ficaremos nessa dúvida — comentou,
arrancando uma pequena risada da loira.

As duas mulheres estavam tão entretidas na conversa, que não
perceberam a repentina mudança climática. Um aglomerado de nuvens se fez
presente no céu, o tornando cinza. Quando se deram conta, alguns pingos d’água
caíam sobre suas cabeças.
— Precisamos buscar um abrigo. Tem uma área comercial aqui perto.
Vamos?
— Não sem antes fazer isso...— Meireles deslizou uma das mãos que
estava na cintura de Regina e a depositou na nuca da mulher.
— O quê?— A mais velha sussurrou, e logo teve seus lábios sendo
pressionados.
A chuva que antes estava fina, agora caía de maneira mais intensa. Ela
banhava aqueles dois corpos que não fizeram questão de se mover do lugar.
Durante o instante do beijo esqueceram qualquer baixa temperatura e tempo
ruim. Apenas aproveitaram a prazerosa sensação de terem suas bocas unidas em
meio àquela umidade que vinha do céu.
— Amo você.— Jennifer sussurrou entre o beijo, fazendo Regina sorrir.
— Não mais que eu a você — sussurrou em resposta, alguns segundos
antes de finalizar o contato de bocas com uma última selada de lábios. — Eu te
sinto tão dentro de mim.— Regina depositou algumas mechas do cabelo
molhado de Jennifer para trás de modo a visualizar a totalidade daquele rosto à
sua frente.
— Eu adoro saber que me sente assim. Pois não há outro lugar em que
eu e meus sentimentos por você queiramos estar.— Sorriu.
A chuva começou a cair de maneira violenta e torrencial, obrigando as
duas mulheres a saírem às pressas do lugar. Quando, enfim, chegaram a um
estabelecimento próximo dali, a mais velha agradeceu aos céus por ser
climatizado. Ela retirou o sobretudo molhado, o depositou nas costas da cadeira
e observou Meireles fazer o mesmo com a jaqueta. O ambiente era simples, no
entanto, muito aconchegante. Ambas pediram chocolate quente com alguns
biscoitos e praticamente se aninharam no colo uma da outra. Regina mantinha a
cabeça apoiada no ombro esquerdo de Jennifer enquanto a loira passava o braço
por trás de suas costas.
— Um chocolate quente e você é tudo o que eu preciso.
— Como pode me dizer isso após eu ter metido você nessa furada
chuvosa?
— Você não diria isso se soubesse que seu beijo fica ainda mais gostoso
na chuva
— Ah é? Ele fica?— perguntou com uma pintada de malícia no tom de
voz.
— Com toda certeza.— Afirmou prontamente.
— Então vamos repetir mais vezes — disse baixinho ao pé do ouvido.
Ainda com a cabeça apoiada no ombro da jovem, Regina a sentiu
buscar sua mão esquerda e acariciá-la com suavidade.
— Sei que já disse uma vez, ou talvez muitas, mas não posso deixar de
voltar a dizer o quanto gosto dela. É tão delicada e feminina. Passaria horas
assim, nesse contato — disse ao acariciar os dedos e as costas da mão de Regina.
— Ficaria ainda mais bonita se tivesse um anel bem aqui — comentou ao alisar
o dedo anelar da mulher com a ponta de seu polegar.
Um pequeno e até mesmo constrangedor silêncio se instalou após a
última frase dita por Jennifer, que acabou se sentindo mal e desconfortável por
julgar ter dito o que não devia. Mas o que ela não imaginava era que suas
palavras haviam conseguido acelerar o coração de Regina, que já pensava há
algum tempo em estreitar os laços daquela relação.
— É... Vamos tirar uma foto pra registrar o dia de hoje?— Jennifer
buscou o primeiro assunto que veio em sua mente para quebrar o estranho clima
gerado por suas palavras. Seu semblante mudou de feliz para receoso. Ela
começou a se criticar internamente por falar demais. Primeiro abordou o assunto
filho e agora havia praticamente falado em casamento.
Regina, um pouco sem jeito, uniu o rosto ao da loira e sorriu para a
câmera frontal. E enquanto Jennifer não batia a foto, ela se questionava
internamente sobre o ocorrido de poucos minutos. A morena sentiu-se mal e
culpada por não ter dado uma resposta. Contudo, preferiu o silêncio a deixar que
a jovem suspeitasse de seus planos futuros para pedi-la em casamento.
— Ficou linda. Vou mandar imprimir e criar um álbum pra nossa
primeira viagem — comentou Regina.


Quando o início de noite chegou, Jennifer e Regina desceram do quarto
trajadas com seus pijamas e se direcionaram para a sala de estar após ouvirem
alguns sons de piano invadindo o ambiente. Assim que entraram no cômodo se
depararam com o senhor Henrique deslizando os dedos sobre as teclas brancas e
negras. Ao lado dele, de pé, estava Carmen. Ela segurava uma taça de vinho na
mão enquanto se deliciava com as melodias produzidas pelo marido.
— Venham, se juntem a nós!— disse ela ao observar o casal parado na
porta.
Regina caminhou até o bar, escolheu uma taça e depositou um pouco de
vinho para acompanhar sua mãe.
— Não me diga que você também sabe tocar piano?
— Infelizmente, não. Dessa vez terei que decepcionar você. Mas desde
criança eu gosto de cantar enquanto o meu pai toca.
— Deve ser uma cena linda de se ver — comentou Jennifer, docemente.
— Vou te mostrar.— A morena caminhou até o lado do pai e murmurou
o nome de uma canção italiana ao seu ouvido. Em poucos instantes o senhor
Henrique começou a reproduzi-la ao piano e ela soltou a voz.
Jennifer e Carmen aproximaram seus corpos e se posicionaram de frente
para o piano. Elas sorriam uma para a outra ao mesmo tempo em que sentiam o
peito transbordar de amor e admiração por seus parceiros.
— Eles são uma coisa linda juntos — comentou Jennifer contra o
ouvido da sogra, que acenou a cabeça positivamente e sorriu.
— São os amores da minha vida, assim como Malena e meu neto.
— Você tem uma linda família. Infelizmente não posso dizer o mesmo
sobre a minha. A começar pelo meu pai que sequer me visita.
— Sinto muito, Jennifer.— A mais velha depositou a mão suavemente
sobre o ombro da loira e o alisava enquanto falava. — Mas saiba que aqui você
pode encontrar uma segunda família. Pra nós é um prazer te abraçar como
membro. Minha filha te ama verdadeiramente. Quando ela esteve aqui no ano
passado eu me lembro do quão mal estava. Eu nunca a vi se importando tanto
com alguém antes.
— Eu também a amo demais, Carmen. Sou muito grata à vida por ter
me presenteado com a sua filha. Ela é uma grande mulher e um grande ser
humano.
— O que as duas estão fofocando aí, hum?— perguntou Regina ao
finalizar a canção junto a seu pai.
— Que você está ficando velha! Daqui nós conseguimos avistar seus
fios brancos — implicou Jennifer.
— Está na hora de começar a pintar os cabelos, Regina. Não vai querer
aparentar idade, correto? Sei que você é vaidosa demais para isso.— Carmen deu
continuidade à implicância de Jennifer, fazendo a filha se aproximar do grande
espelho que havia na sala.
— Não tem nada aqui — comentou ao mexer nos cabelos enquanto
olhava seu reflexo. — Vocês não têm o que fazer? — disse ao virar-se e
direcionar o olhar para as duas, que riam com a mão na boca. — O pior é que eu
ainda dou corda!
— Nós nos aproveitamos da sua vaidade — comentou a loira enquanto
permanecia rindo da expressão de indignação que estampava a face da
namorada.

Naquela noite Regina e seu pai cantaram algumas músicas mais e
concluíram duas garrafas de vinho com a ajuda de Carmen. Os três muito
apreciavam momentos em família e eram todos apaixonados por aquela bebida.
Jennifer, por sua vez, limitou-se a apenas uma taça; nada que mudasse seu
humor. Diferente de Regina, que finalizou a noite completamente alterada.
— Estamos indo pra cama, meus amores.— Se pronunciou Carmen. —
Mas podem continuar aproveitando a noite.
— Sua mãe e eu já não conseguimos virar a madrugada como
antigamente, minha filha. O sono já pegou esse velho aqui — disse Henrique ao
passar o braço sobre o ombro da esposa e guiá-la para fora da sala de estar.
— Até amanhã, meninas!— Se despediu a mais velha.
— Buenas noches, mis hijas.
— Boa noite, mãe. Buenas noches, papá.
— Boa noite Carmen e senhor Henrique — disse Jennifer, por fim.

Por consequência das inúmeras taças de vinho bebidas naquela noite,
Regina estava com os sentidos e o humor alterados. Ela se sentia sutilmente
tonta, muito feliz e leve. Não estava sendo preciso muito esforço da parte de
Jennifer para fazê-la rir.
— Oh céus, acho que você passou um pouco do seu limite, morena —
comentou ao ajeitar algumas mechas dos fios castanhos da mulher para atrás da
orelha.
— Eu sou sua morena, é?— perguntou com a voz nitidamente
modificada pelo álcool.
— Oh sim, você é a minha morena. Gosta de ser?— Jennifer a envolveu
pela cintura com os braços e a uniu contra seu corpo.
— Eu gosto de ser o que você quiser que eu seja.— A voz de Regina
saiu quase como um murmúrio. Seu hálito quente, de vinho, se fazia sentido pela
loira.
Antes que Jennifer dissesse algo mais, a mais velha começou a
cantarolar She Will Be Loved e tomá-la pelo pescoço. Ela alternava entre cantar
e distribuir suaves beijos naquela região.
— Em duas semanas a sua garota fará vinte anos. Ainda me cantará essa
canção?
— Eu sempre vou te cantar essa música. Sabe por quê? Porque não
importa se você fará vinte ou trinta anos. Sempre será a minha garota.— Regina
esboçou um amplo sorriso e começou a se jogar de maneira carinhosa no colo da
jovem, que a segurava com firmeza. — Quero você — sussurrou.
— Amor, assim não, você está muito alterada — respondeu com
suavidade na voz. — Está quase caindo.
— Mas nós nunca nos importamos de fazer amor assim.— A mais velha
abriu o robe de seda e expôs a transparente camisola preta que usava por
debaixo. — Vem?— pediu com sensualidade na voz e nas expressões faciais. —
Você sabe que me tem.
Meireles segurou no próprio maxilar e o alisou enquanto olhava e
analisava a figura entregue da namorada. Em silêncio, apenas esboçava um
sorriso sacana e recordava do quão mais quente o álcool a deixava na cama.
— Cadê a minha menina de ouro?— perguntou ao erguer uma das
sobrancelhas.
Jennifer sorriu maliciosamente, alcançou as coxas da mulher e deslizou
as mãos para cima.
— Presente — respondeu ao suspendê-la em seu colo e prendê-la com
as pernas em sua cintura. Meireles sempre se rendia às carícias.
Enquanto era carregada para o quarto, Regina murmurava algumas
frases contra o ouvido da loira.
— Sabia que a lua sempre fica em silêncio pra nos escutar fazendo
amor?
— A lua eu não sei. Mas a cama eu tenho certeza.— Riu.
Jennifer desceu a morena do colo após cruzarem a porta do quarto e a
tomou nos lábios em um beijo lento enquanto suas mãos se encarregavam de
deslizar o robe para o chão. Seus lábios foram da boca à orelha, fazendo com
que um gemido rouco escapasse dos lábios de Regina.
— Então me leva até ela. Lá é onde eu mais estou te chamando agora.


Capítulo 43

Nas terras longínquas da família Vianna, Jennifer e Regina cavalgavam
juntas sobre os cavalos de estimação de Virgínia, tia da morena. Há alguns dias a
loira recebia aulas matinais com Regina, e agora que se sentia apta e segura,
corria com ela por entre os campos. Tendo em vista que era o último dia da
jovem na Itália e que viajariam para França na manhã seguinte, Jennifer queria
desfrutar inteiramente daquelas horas finais.
As duas mulheres cavalgavam paralelamente na maior parte do tempo.
Ora Regina ultrapassava Jennifer, ora a loira a ultrapassava, e em seguida
voltavam a cavalgar lado a lado. Ambas carregavam sorrisos incessantes nos
lábios, ao mesmo tempo em que os ventos tomavam seus cabelos e os jogavam
para trás. Os que mais voavam eram os fios loiros e longos de Jennifer, que
haviam se soltado do rabo de cavalo feito horas atrás. Cavalgavam com tanta
alegria e leveza, que pareciam viajar nas asas do vento.

— Ganhei!— exclamou Jennifer ao desacelerar com o cavalo próximo a
uma árvore. A loira desceu e observou a morena chegar logo em seguida.
— Só porque eu deixei ganhar!— respondeu ao descer da sela. Regina
usava calça preta de couro, chapéu de mesma coloração e um par de botas.
— Ah, claro que foi porque você me deixou ganhar. Não teria sido
porque eu superei o meu mestre não, imagina — disse de maneira irônica.
Meireles usava jeans colado, botas marrons de cano alto e um chapéu igual ao da
namorada.
— Sorte de principiante, mocinha.
— Sorte de principiante, me deixou ganhar... O que mais? Seria mais
bonito se admitisse que sou boa.
— Ok, ok, você venceu! Parabéns pelo maravilhoso galope, cowgirl.—
Regina cruzou as pernas, tirou o chapéu e fez reverência para a namorada, que
sorriu com sua atitude. — Adorei nossa manhã — comentou com um sorriso nos
lábios. — Há tempos não me sentia tão leve.
— Eu também gostei muito. Aliás, estou adorando cada dia nesse lugar.
Abrir os olhos ao acordar é como despertar para um novo sonho. É assim que me
sinto todos os dias.
Aquela manhã se mostrou para elas com um lindo céu azulado. O
ambiente estava naturalmente iluminado e um sol brando era possível de ser
sentido através de suas peles. As duas conversavam debaixo de uma majestosa
árvore enquanto seus cavalos permaneciam quietos, lado a lado.
— Em alguns momentos durante essa manhã eu olhei pra você e por um
instante não acreditei que estávamos em paz. Muitas vezes o mundo pode ser
cruel para dois amantes. Principalmente para pessoas como nós. Ele ainda não
está apto para abraçar duas mulheres que se amam e decidiram ficar juntas. As
pessoas possuem muitos preconceitos, Jennifer, e talvez nós sejamos vítimas
deles muitas vezes ao longo da vida. Amar você os incomoda. Incomoda porque
sou uma mulher, incomoda porque eles não compreendem que nossa diferença
de idade é coisa ínfima diante o sentimento que compartilhamos.
Enquanto Regina falava, uma borboleta de cor azul pousou sobre seu
ombro. Ela a tomou com delicadeza e a fez apoiar-se sobre as costas de sua mão.
Quando observou que as asas batiam rapidamente para pegar voo, a impulsionou
a voar para frente, a fazendo pousar nas costas da mão de Jennifer, que a recebeu
com um sorriso nos lábios.
— Mas se eu puder compartilhar mais manhãs como esta ao seu lado,
eu sinto que nenhuma batalha será em vão. Eu enfrento quantos preconceitos for
preciso pra ver uma borboleta voar pra nós outra vez.
Os olhos de Jennifer estavam marejados, frutos do discurso da mais
velha. Regina tinha o dom de tocá-la com as palavras como ninguém mais.
— Se a sua intenção é fazer eu me apaixonar um pouco mais por você
todos os dias, está conseguindo.— Meireles observou a borboleta tomar vôo para
longe e se aproximou de Regina. — Eu queria muito te agradecer — comentou
ao buscar a mão da mulher com a dela. — Você é minha professora de tantas
coisas, Regina. Não sei se consegue se dar conta disso, mas aprendo tanto todos
os dias. E a liberdade que conheci e experimentei com você... Vou sempre
carregar. Te amar me deu coragem de ser quem sou e lutar pelo que acredito.
— Oh, meu amor, o mérito é todo seu. Essa coragem sempre pertenceu
a você. Sempre te achei uma garota de grande potencial. Você é uma mulher que
poucas sabem ser.
— Obrigada por ver o melhor em mim — disse ao expressar um sorriso
tímido.
— Por acaso você acha que eu me apaixonaria por uma garota que não
fosse no mínimo extraordinária, senhorita Meireles?— comentou ao segurar um
sorriso no canto da boca. — Eu amo você — murmurou já com os lábios quase
colados aos de Jennifer, fazendo com que o coração da mais nova batesse
apressado dentro do peito.

O caminho em retorno para casa foi feito a pé a partir do momento em
que deixaram os cavalos no terreno da tia de Regina. Aproveitaram a ocasião
para conversarem um pouco mais sobre a vida. Quanto mais dialogavam, mais se
conheciam e mais se conquistavam.
— Quando eu tinha um pouco menos da sua idade eu sofria alguns
preconceitos. Embora eu não seja tão mais velha que você, naquela época as
coisas ainda eram muito diferentes. Quase não se via ou ouvia falar de pessoas
que não fossem heterossexuais. Não que elas não existissem, mas sim porque era
tudo muito escondido.
— Eu posso imaginar, pois até hoje muitas pessoas ainda precisam
omitir quem são.
— Há uns quinze anos escondiam ainda mais. Mas eu sempre tive
necessidade de dizer quem era e de viver o que sou. Você já pode imaginar o
quanto fui julgada e todas as barbaridades que já precisei escutar.
— Eu sinto muito por isso. As pessoas são tão babacas. Por que
simplesmente não tomam conta de suas vidas?— Meireles cerrou o punho
enquanto pensava em todas as situações difíceis pelas quais a morena já poderia
ter passado.
— Eu também gostaria de saber. Mas apesar dos pesares, sou grata por
ter tido uma família que sempre me abraçou. Fez toda a diferença.
— Eu imagino que sim. É muito duro lidar com o preconceito que vem
de dentro da nossa casa. Não foi nada fácil ouvir o que eu ouvi da minha mãe. E
eu acho que ouviria as mesmas coisas do meu pai se ele soubesse.
— Eu sinto tanto por isso, Jen. Se eu tivesse o poder, mal algum
chegaria até você.
— Está tudo bem, Regina. Faz parte da minha história. São coisas pelas
quais preciso passar pra poder crescer.
— Me admira saber que você consegue tirar boas lições até mesmo dos
momentos ruins.
— A vida se torna mais fácil assim.— Jennifer esboçou um fraco
sorriso.

Quando, enfim, chegaram à casa dos pais de Regina, as duas almoçaram
juntas ao casal e posteriormente se dirigiram para o quarto. Após fazerem as
malas, descansaram e se prepararam para a comemoração de despedida que
aconteceria logo mais à noite. Carmen havia convidado Laura e Virgínia para
uma pequena e íntima social.


— Já estou com saudade — disse o senhor Henrique. Ele, a esposa,
Regina e Jennifer já estavam no aeroporto à espera do vôo para a França.
— Voltem o mais rápido que puderem!— disse a mãe da professora.
— Assim que possível estarei de volta. E espero vocês por lá também
— comentou Jennifer com doçura na voz.
— Isso mesmo! Não deixem de nos visitar — reforçou a filha do casal.
— Até a próxima, meninas! E divirtam-se na França.— Carmen as
envolveu em um forte abraço enquanto lutava para segurar as lágrimas de
saudades da filha que já teimavam em preencher seus olhos.
— Pode apostar que nos divertiremos — disse a morena ao piscar para
sua mãe. Apenas elas sabiam o que aquela viagem proporcionaria.
— Até breve!— Henrique acenou para as duas mulheres e permaneceu
olhando-as até que desaparecessem de seu campo de visão.
— Trouxe toda a sua documentação?— perguntou Regina.
— Sim. Me certifiquei antes de sairmos de casa.
— Certo.

Dentro do avião, Regina batia incessantemente um dos saltos contra o
piso. Jennifer sabia que aquele era um nítido gesto de nervosismo.
— Está acontecendo alguma coisa?
— Não. Por quê?— respondeu suavemente.
Em alguns momentos a morena levava a mão aos cabelos, outro gesto
de nervosismo de sua parte.
— Não sei... Parece que você está inquieta.
— Oh, não é nada demais. Acho que só estou um pouco ansiosa pra
chegarmos.— Mentiu. Na verdade, seus pensamentos estavam todos voltados ao
pedido que faria à Jennifer nessa viagem.
— Também estou bastante ansiosa.— Meireles depositou a mão sobre a
da mais velha na tentativa de acalmá-la. No entanto, o que ela não sabia era que
aquele simples gesto deixara a professora ainda mais tensa.
— Você se imagina ao meu lado em um futuro distante?— indagou de
maneira aleatória. Apesar de ter certeza sobre os sentimentos da loira por ela,
estava receosa sobre a resposta da jovem ao seu pedido futuro.
Meireles franziu o cenho e estranhou a pergunta repentina de sua
namorada.
— Posso ser sincera? Eu me imagino velhinha ao seu lado. Com você
muito mais velha que eu, claro — implicou.
— Você adora zombar da minha cara, não é?— disse ao cruzar os
braços abaixo dos seios e jogar em Jennifer um olhar fulminante.
— Sim! A cara que você faz é impagável!— Riu.
— Você é uma boba, Jennifer.
— E você adora as minhas bobagens.
— Eu? Além de boba, é iludida.
— Aham, sei...— A mais nova não disfarçava o riso. — Mas voltando
ao assunto... Por que me fez aquela pergunta?
— Por nada.
— Por nada não é uma resposta satisfatória.
— Mas por hora terá de bastar.
— Ai Regina, você e esses seus mistérios — bufou.
— Shhh, você retruca demais. Vamos aproveitar a viagem.— Regina
ajeitou-se na poltrona reclinável, fechou os olhos e se manteve em silêncio. Por
fora ela externava serenidade e calmaria, mas por dentro era uma pilha de
nervos. Durante todo o vôo pensou em dezenas de possibilidades para fazer o
pedido.

Na saída do aeroporto, assim que chegaram em solo francês, a mais
velha pôde perceber que os olhos da loira estavam marejados. A emoção quase
transbordava através daquelas órbitas. Desde pequena Jennifer havia sonhado
com aquele momento, e agora finalmente ele havia chegado. Após deixar a mais
nova observar o quanto quisesse do ambiente à sua volta, chamou um táxi e
partiram para um hotel no centro de Paris, a cidade luz.
— Esse lugar é simplesmente... Maravilhoso!— comentou a mais nova
enquanto olhava cada canto da suíte reservada pela namorada. — Você deve
estar gastando muito nessa viagem, isso me deixa sem jeito.
— Relaxa, Jennifer. Nada que um cartão de crédito internacional não
resolva.— piscou. — Além do mais, me programei pra essa viagem. Está tudo
sob controle.
— Se você diz... Vou tentar não pensar a respeito. Mas...
— Mas?
— Tem um lugar que eu faço questão de te levar. E será por minha
conta!— disse enquanto acomodava alguns pertences da mala no quarto.
— E qual lugar seria esse, posso saber?— Regina observava a mais
nova ao mesmo tempo em que, também, organizava alguns pertences.
— Saberá apenas no dia!
— Sabia que essa seria a resposta. Você adora me deixar curiosa.
— Assim como você — rebateu. — Ainda está bem cedo — disse ao
conferir a hora em seu relógio de pulso. — Temos todo o dia pra aproveitar.
— Sim. Mas antes preciso tomar um banho e me livrar dessas roupas.
Quero vestir algo mais apropriado. Afinal, estamos em Paris.
Meireles soltou uma baixa risada. Ela não conseguia imaginar a mais
velha ainda mais arrumada, tendo em vista que ela sempre se vestia de maneira
elegante.
— Paris combina muito com você, sabia? Toda essa elegância e
sofisticação soa a Regina Vianna.
— Como você é boba, Jen. Eu não sou tão elegante como você fala.
— Ah, mas você é sim! Sabe que é.— A loira concluiu o que fazia,
levantou-se e se posicionou de frente para a professora. — Sofisticada, linda e
inteiramente minha — disse de maneira carinhosa ao envolvê-la pela cintura.
— Inteiramente sua?— indagou ao erguer uma de suas sobrancelhas
enquanto prendia um sorriso no canto dos lábios.
— Sim, inteiramente minha — repetiu. Dessa vez, com firmeza na voz,
fazendo Regina morder o próprio lábio inferior.
— Melhor eu ir para o banho — murmurou.— Do contrário eu vou
querer que me mostre o quanto sou sua. Já volto.— Desvencilhou-se dos braços
da jovem e seguiu para o banheiro.

Na manhã e tarde daquele mesmo dia as duas mulheres fizeram um
passeio pelo bairro onde estavam hospedadas. Visitaram praças,
estabelecimentos comerciais e alguns pequenos pontos turísticos locais. Ao
passarem em frente a uma pâtisserie, Jennifer quase grudou os olhos na vitrine
de doces. Ela podia jurar que não conhecia noventa por cento do que estava
exposto.
— Vou comprar alguns e levar pro hotel — disse enquanto entrava no
estabelecimento.
— Você parece uma formiga! Não pode ver doces.
Meireles saiu da pâtisserie com uma bolsa cheia de sobremesas em uma
mão e com um macaron envolto a um guardanapo na outra.
— Acho que nunca comi um doce tão gostoso — comentou após dar a
primeira mordida.
— Ele é um clássico francês, mas é de origem italiana.
— Você é uma enciclopédia ambulante! Eu já disse isso? Como eu
tenho vontade de dar uma lambida nesse seu cérebro!— comentou de maneira
espontânea, arrancando uma gostosa gargalhada da professora.
— Eu tinha uma resposta na ponta da língua pra dar a você. Mas deixa
pra lá.— Regina caminhava lado a lado com Jennifer enquanto segurava o riso.
— Ah não, nada de deixar pra lá. Anda! Dá a resposta! Estou preparada
pra qualquer pensamento sórdido que tenha passado nesse cérebro brilhante.
— Jennifer, são seis horas da noite — disse ao conferir a hora no celular
que estava em seu bolso. — Não acho que o horário seja apropriado.— A
morena permanecia se segurando para não rir.
— Se você sussurrar contra o meu ouvido, não haverá problema algum.
Agora vem, me conta o que posso lamber, já que o seu cérebro é impossível.
Regina levou os lábios até o ouvido de Jennifer e soltou um murmúrio:
— Deixarei a cargo da sua imaginação.
— Droga! Eu mato você!
Regina soltou uma risada e caminhou a passos largos; deixando para
trás uma Jennifer desnorteada por suas palavras.


Paris não é apenas a cidade das luzes. Ela é a cidade da alta
gastronomia, das artes e dos casais em eterna lua de mel. Além de capital da
França, é uma das cidades mais importantes e influentes do mundo.
Os dias em Paris estavam passando mais rápido do que Jennifer e
Regina imaginaram que passariam. Foi então que começaram a se dar conta de
uma questão: não eram os dias na cidade, apenas, que estavam passando
depressa. Mas sim, as suas vidas. Por um momento as duas se perguntaram se
isso era bom ou ruim. Afinal, dizem que quando estamos felizes o tempo passa
sem que nos demos conta. Em contrapartida, como estender o tempo para que se
possa viver toda essa felicidade?
— Eu passei a semana inteira tentando descobrir qual seria o lugar onde
você queria me levar! Jamais adivinharia que seria aqui. Eu fiz uma lista com
todos os pontos turísticos e cada vez que nós visitávamos algum, eu riscava. Juro
que por um momento achei que fosse o museu do Louvre, pois algumas vezes
você me disse que eu pareço uma obra pertencente a ele.
Regina possuía um sorriso de orelha a orelha desde o momento em que
entrou no Le Café Des Chats. Sim, Jennifer Meireles a havia levado em um café
de gatos. Extremamente aconchegante, o local possuía dezenas de gatos
espalhados no ambiente. Além de desfrutarem de bons pratos, os clientes ainda
podiam acariciar os bichanos.
— Pela sua expressão... Acho que acertei em cheio — comentou
Jennifer enquanto dava atenção para um gato que se esfregava contra sua perna.
— Sim, você acertou! Eu estou encantada por todos eles!— respondeu
com empolgação. Regina não sabia se olhava o ambiente, se tomava um lugar na
mesa ou se acariciava os felinos que se aproximavam.
— Olha!— Apontou para um gato preto que acabara de saltar sobre
uma das mesas. — Parece o Bóris.
— Realmente parece — disse a morena ao sorrir.
— Antes de te trazer aqui eu pesquisei sobre o lugar. Sabe o mais legal?
Todos eram gatos abandonados que foram adotados pela proprietária daqui.
— Que iniciativa incrível. Gostei ainda mais de saber disso. Se eu
pudesse também resgataria muitos animais e fundaria um espaço de proteção
para eles. Mas, já que não posso, ajudo financeiramente algumas instituições. —
Regina seguia encantada pelos bichanos. Ela era uma grande amante de felinos.
— Fico feliz que você tenha gostado da surpresa. Agora vamos lanchar?
— perguntou com um sorriso nos lábios. — Só não podemos alimentá-los, é
regra do lugar. Eles já têm sua própria dieta.
— Eu já imaginava — comentou ao puxar uma cadeira e abrir o
cardápio.

A tarde seguiu em meio a muitos risos e carícias trocadas entre elas e os
felinos, que vez ou outra apareciam e roçavam entre suas pernas.


O aniversário de vinte anos de Jennifer havia chegado. No momento,
ele simbolizava que as férias estavam chegando ao fim. Ela havia se emocionado
durante algumas horas em um concerto de um tenor italiano muito querido por
ela e também por Regina. O coral inteiramente constituído por crianças e
adolescentes fez seus olhos transbordarem de emoção. E para finalizar a noite,
jantaram em um restaurante de boa gastronomia. Meireles não poderia estar mais
feliz. Pelo menos era isso que ela pensava. A jovem sequer imaginava os planos
futuros da morena.

— Museu do Louvre, Catedral de Notre-Dame, Arco do Triunfo,
Champs-Élysées, Palácio de Versalhes...— Ao final da noite Jennifer estava
deitada no sofá com a cabeça apoiada no colo da mais velha. Ela possuía um
papel e uma caneta em mãos para riscar todos os locais já visitados por elas. —
Acho que só nos falta o mais esperado, a Torre Eiffel!
— Temos apenas mais dois dias de viagem. Essas férias passaram
voando — disse Regina com certo pesar em sua voz. Ela acariciava os cabelos
da loira que estavam esticados e caídos sobre suas pernas. — Que tal visitarmos
a torre amanhã e passarmos o dia por lá aproveitando a paisagem e os momentos
finais de Paris?
— Ah não... Não fala em final — resmungou. — Não quero voltar pra
casa nunca mais. Só em pensar na faculdade, no trabalho e nas contas que terei
de pagar me dá preguiça. Ainda preciso renovar o contrato do aluguel que já está
pra vencer.
— Oh, meu Deus... E esse biquinho de criança emburrada?— comentou
ao sorrir com as expressões que a loira esboçava. — Eu também adoraria viver
aqui. Mas o trabalho, os estudos e as contas nos perseguiriam da mesma
maneira. Não temos como fugir.
— Que mundo cruel — disse de maneira dramática ao levantar-se do
colo da professora. Jennifer sentia o corpo um pouco mole devido às taças de
vinho consumidas no jantar. Sendo assim, tomou a namorada pela mão e a
convidou a ir se deitar. O dia seguinte lhes traria grandes emoções.


Regina amanheceu uma pilha de nervos. Nunca antes alguém lhe havia
despertado a vontade de um pedido de casamento. A professora se questionava a
cada instante se saberia como fazê-lo. Era o último dia integral delas em Paris e
todos os preparativos já estavam prontos e repassados dezenas de vezes em sua
mente. Mesmo sabendo que quando o momento chegasse seria seu coração que
falaria mais alto, não pôde deixar de ensaiar algumas palavras. Rabiscos também
haviam sido feitos em folhas soltas durantes algumas noites em que o sono
demorou a chegar.
Suas mãos suaram durante todo o trajeto do hotel para a Torre Eiffel.
Ela não aceitaria nada menos que a excelência para o dia de hoje. A professora
queria que cada palavra, aroma, ou corrente de vento estivessem perfeitos na
ocasião.
Era inverno na França. Consequentemente, o dia amanhecia mais tarde
e escurecia mais cedo. Devido à baixa temperatura, se vestiram de maneira
bastante aquecida. Ambas usavam blusa de lã, calça jeans, sobretudo, cachecol,
botas e até mesmo luvas. Os únicos acessórios que as diferenciavam eram os de
suas cabeças. Regina usava uma boina e a loira uma toca.
O cenário nas redondezas da torre estava composto por árvores secas e
sem folhas que davam ao lugar um toque misterioso e charmoso. Por sorte, o céu
estava azul e sem nuvens. Regina tomou aquilo como uma homenagem da
cidade.
— Esse é o momento em que a enciclopédia Regina Vianna ataca?—
disse em tom divertido ao caminhar de mãos dadas com a namorada em direção
à torre.
— Bom, eu poderia dizer que em mil novecentos e...— Regina
interrompeu a própria fala e compartilhou uma risada com a loira.
— Você fala de mim, mas é uma boba também!— Riu. — Agora vem,
vamos tirar umas fotos clichês!— Meireles puxou a mais velha pela mão e
começou a fotografá-las diante o monumento.
Houve um momento em que a jovem abraçou as coxas de Regina,
ergueu a mulher do chão e pediu para que um dos visitantes do lugar tirasse uma
foto para elas. Todos que as olhassem conseguiam identificar que eram um casal.
Inclusive, foram alvo de alguns olhares não muito simpáticos, fazendo Jennifer
sentir-se mal. Contudo, Regina logo tratou de confortá-la com belas e sábias
palavras.
Após inúmeras fotografias e caminhadas pelas redondezas, as duas
encontraram um lugar para sentarem e se acomodarem lado a lado.
— Me empresta sua bolsa?— pediu a loira.
— Pra quê?— perguntou Regina, preocupada. Ela temia que a jovem
encontrasse algo que não devia dentro dela.
— Quero guardar as luvas e pegar o chocolate que a gente trouxe.
— Ah, pode deixar que eu pego. Também vou guardar as minhas.— A
mais velha livrou-se das próprias luvas, pegou as de Jennifer e as guardou dentro
da bolsa. Em seguida, pôs para fora uma barra de chocolate meio amargo.
— Acho que essa é uma boa despedida...— disse Jennifer com
suavidade na voz, segundos antes de morder a barra e suspirar enquanto olhava
para a torre à sua frente.
— Concordo...— Com o coração acelerado, Regina apoiou a cabeça no
ombro da namorada e contemplou a mesma paisagem que ela enquanto dividiam
o chocolate. — Preciso me exercitar quando voltarmos pra casa. Ganhei dois
quilos nessa viagem.
— Foi? Pois pra mim continua linda e gostosa do mesmo jeito.
— Você me diria isso até se eu pesasse duzentos quilos, Jennifer —
retrucou, arrancando um pequeno riso da loira, que concordou.
— Então vamos nos exercitar juntas quando voltarmos. Confesso que
estou sentindo falta dos meus treinos.
— Acho uma ótima ideia. E agora que você cursa educação física,
poderia ser minha personal trainer particular. O que acha? Só não posso garantir
que vou me concentrar nas aulas.
— Isso me soa como papéis invertidos — disse em tom divertido,
fazendo Regina sorrir. — Eu adoro esse seu riso aberto — comentou ao alternar
entre a boca e os olhos castanhos da mulher, observando-os. — Sua boca é
grande, seus lábios são devidamente carnudos e bem desenhados. Passaria horas
e horas admirando você sorrir sem me cansar. E quando gargalha? Acho que é o
meu som favorito.
— Você devidamente sabe como conquistar uma leonina — brincou
ela, fazendo Jennifer expor os dentes em um largo sorriso. — Obrigada. Ver
você sorrir também é algo que não me cansa.— Ao pegar a barra de chocolate
das mãos da loira, a mais velha notou que haviam marcas de mordidas. — Ah
não, Jen! Não acredito que você come a barra dessa forma?
— De qual forma?— perguntou confusa.
— Dessa maneira totalmente agonizante aqui, olha isso!— disse ao
mostrar e apontar as marcas dos dentes. — Por que não come um quadrado por
vez, ou arranca fileiras? Isso que você faz me dá um nervoso terrível.
— Até parece que vou perder tempo quebrando esses quadrados aí.
Prefiro dar umas boas mordidas.
— Prefere deixar o chocolate todo torto e a minha cabeça maluca, isso
sim.— reclamou. Regina quebrou alguns quadros de chocolate e deixou a barra
visualmente agradável.
— Ai, ai... Você me sai com cada uma — comentou Jennifer ao
balançar a cabeça negativamente. A expressão que Regina esboçava era tão
raivosa, que a fez rir. — Ei, senhorita estressadinha, amo você. Você e suas
loucas manias — implicou ao cutucá-la.
— Está me chamando de louca?
— Só um pouquinho — respondeu ao gesticular com a mão, usando o
polegar e o dedo indicador para demonstrar.
— Você é muito abusada, loirinha. Não tem medo de apanhar? Porque
eu não tenho nenhum pudor pra bater.
— Medo eu tenho é de te perder. Nada mais.— Jennifer olhou de
maneira fixa para os olhos da mulher e soltou um suspiro arrastado. — Olha,
acendeu...— disse ao apontar o olhar para a Torre Eiffel.
Com o passar das horas o céu, que antes estava azul, tornou-se cinza e
agora possuía uma tonalidade completamente escura com a chegada da noite. Os
dias de inverno em Paris sempre encerravam de maneira precoce.
— Vem...Vamos subir!— Regina segurou na mão gelada de Jennifer e a
guiou em direção ao monumento. Elas haviam comprado dois ingressos para
subirem até o segundo andar da torre.
Quando já estavam lá em cima puderam avistar o Rio Sena e o Champ
de Mars. Era possível dar uma volta de trezentos e sessenta graus pela torre
enquanto observavam as luzes da cidade. Toda a Paris era cenário para aquele
amor.
— Sabe, Regina...— Jennifer iniciou. Ela e a mulher estavam quase
coladas à tela de proteção. Olhavam para baixo e se deixavam encantar pelas
luzes enquanto conversavam. — Eu me entrego a você como nunca me entreguei
e sequer desejei fazer a alguém antes. E não é apenas de corpo que me refiro, é
na totalidade da frase. Você me desperta.
— Eu posso entender, pois comigo se passa o mesmo. Às vezes parece
tão louco, sabe? Me perguntei algumas vezes como pude me apaixonar dessa
forma por uma aluna. Mas a resposta é que o amor desconhece quaisquer rótulos
ou denominações geradas por nós. Não importa a ocasião, eu me apaixonaria por
você da mesma forma.
— Eu ainda me sinto mal quando lembro que você perdeu seu trabalho
e que também se demitiu por minha causa.
— Jennifer, não tem porquê. Na vida precisamos abrir mão de algumas
coisas pra conquistarmos outras. O que eu sentia por você foi prioridade ali.
Além de quê, minha ética não permitiria que eu continuasse daquela maneira.
Foi de longe a melhor decisão.
— Se você diz...— O olhar da mais nova estava longe e vagava por
entre cada luz que brilhava lá embaixo. Ela pensava no grande contraste que
seria as próximas vinte e quatro horas. Hoje ela estava no segundo andar da
Torre Eiffel em Paris e amanhã já estaria em sua cama no apartamento alugado.
Não que ela achasse a realidade ruim, pelo contrário, Jennifer apreciava tudo o
que havia conquistado. Ela apenas estava tendo uma pequena reflexão sobre a
vida. — Amanhã tudo volta ao normal — disse em tom de lamento.
— Acredito que não.— Se pronunciou Regina com sua rouca voz. Por
dentro, seu coração batia feito um louco. Por fora, era a personificação da
calmaria. — Após essa noite nada mais será como antes.
— O que você quer dizer com isso?— perguntou ao olhar para o lado.
— O que você acha que eu quero dizer com isso?— Voltou a pergunta,
depositando a atenção nas esmeraldas de Jennifer, que a olhava confusa.
— Hum, não sei. Talvez você queira dizer que as lembranças ficarão
sempre na minha memória? Ou que conhecer a França e a Itália nos modifica pra
sempre? Porque se for, eu concordo. Impossível ser a mesma depois da beleza
disso aqui.
— Não discordo com nada do que disse, mas não era a isso que me
referia.
— Então o que seria?
— Hum... O que você tem pra fazer amanhã às três e meia da tarde?
— Tão específico assim?— Riu. — Bom, desfazer as malas?
— Hum... Tenho uma ideia melhor. Que tal... Se casar comigo?—
Regina deixou que um pequeno sorriso se formasse no canto de seus lábios.
— O quê?— perguntou confusa. Mesmo sem entender do que se
tratava, o coração da mais nova disparou dentro de seu peito ao ouvir aquela
frase.
— Jennifer...— A mais velha buscou a mão gelada da loira com a dela.
— Quer casar comigo?— Sua voz saiu de maneira suave. Ela avistava o espanto,
a surpresa e a felicidade que estampava a face de sua namorada.
— Se eu quero...?— A voz da jovem saiu arrastada. Meireles estava
incrédula e ainda não possuía certeza se havia entendido corretamente o pedido.
— Sim. Amanhã. Às três e meia da tarde — explicou a morena. — Já
deixei tudo planejado antes de viajarmos. Minha intenção era de nos casarmos
aqui antes de voltarmos. Mas por razões burocráticas eu não tive como
conseguir, então decidi deixar tudo pronto por lá.— Regina abriu a bolsa que
carregava na lateral do corpo e de lá tirou uma pequena caixa que continha um
par de alianças douradas na qual segurou forte em sua mão. Sem abri-la,
procurou os olhos da mulher à sua frente e lhe disse algumas coisas. — Você
sabe as mudanças que fez em minha vida. E acredito que deva saber como é
gostosa a sua presença nos meus dias. Esses dois anos em que pude compartilhar
e vivenciar momentos ao seu lado me modificaram pra melhor. A minha garota
me mostrou que às vezes quebrar algumas regras nos faz embarcar na melhor
aventura da nossa vida. E o meu amor por você, Jen, comprou uma passagem
apenas de ida.
— Amor, eu...— Meireles estava trêmula. Suas mãos estavam gélidas e
pálidas, indo à contrapartida com seu coração que pulsava vida e se fazia
aquecido pelas palavras doces e aveludadas da mulher à sua frente. Seu olhar
não conseguia decidir se ficava na caixa que Regina possuía na mão ou se
encarava aqueles castanhos intensos que a olhavam. — Não tenho palavras pra
descrever como me sinto agora. Me casar com você é o que eu mais quero. Claro
que minha resposta é sim!— Jennifer se jogou contra o corpo de Regina e a
envolveu pelo pescoço em um abraço apertado. Em poucos segundos o choro se
fez escutado ao pé do ouvido da mais velha.
Regina acomodou o corpo de Meireles nos braços e sentiu o coração da
jovem batendo de maneira acelerada.
— É uma honra te fazer a minha mulher — murmurou contra o ouvido
de Jennifer, que chorou ainda mais. — Na cafeteria você disse que minha mão
ficaria linda com uma aliança no meu dedo anelar da mão esquerda, então por
que não faz as honras?— A voz de Regina estava suave como nunca antes
estivera. Ela abriu a pequena caixa e expôs para a jovem um par de delicadas
alianças de ouro que possuíam uma pequena pedra brilhante cravada ao centro.
— Como vou saber qual a sua?
— É só olhar o que tem escrito na parte interna.
— Não acredito que você pensou até nisso!— Meireles retirou uma das
alianças do suporte e leu as palavras internas. — Acho que peguei justamente a
que pertence a você.— Sorriu ao ler. — Adorei a homenagem — comentou
enquanto depositava o anel no dedo anelar da mão estendida de Regina. Ao ler o
que havia escrito na segunda aliança, a entregou à professora e estendeu a mão
para ela.
— Em algumas horas seremos oficialmente casadas.
— Eu ainda não estou acreditando que isso está acontecendo! Como
assim até poucos minutos éramos namoradas, agora somos noivas e amanhã eu
já serei a senhora Jennifer Meireles Vianna? Eu vou matar você! Me pegou de
surpresa só pra me ver chorar feito boba. Preciso saber como armou tudo isso
nas minhas costas!
— Depois eu explico tudo. Mas agora vem aqui e me deixa te encher de
beijos!— Regina segurou a face de Jennifer e a puxou para um beijo apaixonado
sem se importar com algum possível espectador. Suas bocas sorriam para a outra
e suas línguas se provavam de maneira calorosa. Toda a emoção e calor do
momento deu continuidade na cama do hotel.

As mãos suaves de Regina despiram lentamente todas as camadas das
roupas de Jennifer, a deixando inteiramente desnuda. Posteriormente, com o
auxílio da jovem, livrou-se das próprias peças e uniu o corpo ao dela. Na cama,
sentadas, o corpo de Jennifer foi abraçado por trás e recebeu as pernas de Regina
em volta da cintura. A morena sentia necessidade de tomá-la e aconchegá-la em
seu corpo para que Jennifer se sentisse desejada e segura. E para que o peso de
seus ombros se tornasse nulo com seus toques.
Jennifer apreciava todas as nuances de Regina entre os lençóis. A
suavidade dos lábios na pele abria passagem para pequenos arranhões feitos com
as unhas fincadas. Os gemidos, inicialmente contidos, afirmavam que as mãos
caminhavam para os lugares certos.

Nas folhas de papéis era aonde Regina costumava esvaziar os
pensamentos e emoções. Mas era na pele de Jennifer que escrevia suas carícias.


Capítulo 44

De pé, com seus corpos envelopados por lençóis, as duas mulheres
observavam as luzes da cidade através da transparência do vidro de uma grande
janela que havia no quarto. Após a troca de carícias com a promessa de uma vida
a dois quando o dia amanhecesse, aproveitavam os momentos finais naquela
cidade que foi cenário de tanta cumplicidade. Localizada ao lado de Regina,
Jennifer alternava entre acariciar as costas parcialmente expostas da mulher e
mergulhar os dedos por entre os curtos fios castanhos que possuíam algumas
mechas úmidas por consequência do calor trocado há pouco entre os lençóis.
— Eu te amo tanto...— disse a mais nova após longos instantes de
silêncio. Seu olhar em Regina era sempre de encantamento e admiração.
— Não mais que eu a você — respondeu ao sorrir de maneira doce e
tocá-la na lateral da face. — Está confiante sobre o grande passo que daremos
amanhã?— perguntou ao olhá-la nos olhos, recebendo um aceno positivo de
cabeça.
— Estou ansiosa e um pouco nervosa. Será que vou saber ser uma
esposa?
— Hum... Acho que vamos descobrir e aprender juntas.— Regina
esboçou um pequeno sorriso no canto dos lábios e envolveu Jennifer em seus
braços, a beijando no topo da cabeça com ternura.


No vôo de volta para casa, Regina explicou à noiva que havia contado
com a ajuda de Beatriz para programar toda a surpresa. A amiga da loira ficou
encarregada de conseguir a documentação original de Jennifer para que o
casamento pudesse ser marcado no cartório. Beatriz, também, assinou como
testemunha da jovem enquanto Arthur foi a testemunha por parte de Regina.
Todos os trâmites legais haviam sido feitos meses antes da viagem. Por sorte,
Regina possuía amigos influentes no cartório, o que tornou o processo menos
burocrático mesmo com a ausência de uma das noivas.
Meireles ficou incrédula com todas as afirmações. Em nenhum
momento ela desconfiou que algo tão grandioso estava sendo tramado nas suas
costas.

— Tia Regina!— gritou Henrique ao avistar a professora no aeroporto.
— Jennifer!— exclamou Morgana. A mãe da loira, Diogo, Malena,
Beatriz e Henrique estavam todos próximos e à espera do casal. No entanto,
ninguém se conhecia. Só puderam perceber que aguardavam as mesmas pessoas
quando estas chegaram.
Regina envolveu o sobrinho em um terno abraço e posteriormente
abraçou e beijou Malena. Feito isso, se dirigiu a Diogo, Morgana e Beatriz para
cumprimentá-los.
Meireles, ao se aproximar, envolveu Morgana e Diogo em um abraço
grupal, apertou Henrique contra seus braços, cumprimentou Malena e abraçou
Beatriz de maneira carinhosa. Todos estavam muito empolgados com a chegada
do casal.
— Esse é o Henrique, sobrinho da Regina. E essa é sua irmã, Malena —
disse a mais nova ao apresentá-los. — Esta é minha mãe Morgana, meu padrasto
Diogo e minha melhor amiga, Beatriz.
— Engraçado... A Jennifer é loira e o seu cabelo é castanho —
comentou o menino ao olhar para a mãe de Meireles. — Assim como minha mãe
é ruiva, mas o meu cabelo também é castanho.
— A Jennifer puxou ao lado do pai — explicou Morgana. — Assim
como eu acredito que você também — disse suavemente.
— Sim, o meu cabelo é igual ao do meu pai — confirmou ele, fazendo
Morgana esboçar um pequeno sorriso. Por vezes ela sentia falta de ter uma
criança em casa que lhe fizesse esses comentários espontâneos.
Quando já estavam devidamente apresentados, seguiram rumos
distintos. Todos estavam cientes da união oficial entre Jennifer e Regina que
ocorreria no meio da tarde. Morgana foi para o salão onde havia hora marcada,
Diogo levou as malas de Jennifer para o apartamento da jovem, Regina foi para
casa com a irmã e o sobrinho, e Jennifer se direcionou para o centro comercial
com Beatriz.

— Eu não acredito que vocês planejaram tudo às minhas costas e eu
sequer percebi!— dizia enquanto caminhava com Bea por entre as lojas à
procura de uma roupa para a importante ocasião de logo mais. Por sorte, o fuso
horário em seu país estava quatro horas atrás de Paris. Dessa forma, ainda era
muito cedo quando desembarcou com Regina. — Até minha mãe estava
sabendo?
— Sim. A Regina conversou com ela sobre o que pretendia fazer. Ela
julgou importante que sua mãe fosse avisada e eu achei linda demais essa
preocupação e o respeito dela com a Morgana.
— A Regina sempre foi assim. Desde que nos envolvemos ela pensava
muito na minha mãe. Sempre quis contar, nunca desejou que nos
escondêssemos. Mas foi a minha mãe quem complicou as coisas no passado.—
Suspirou. — Mas enfim... Vamos pensar apenas em coisas boas, pois daqui a
algumas horas eu me tornarei a senhora Vianna — disse com orgulho, deixando
um pequeno sorriso curvar seus lábios.
As duas amigas andaram por todas as ruas do centro comercial, mas
nada agradava Meireles. Ela queria a roupa perfeita. Desejava algo digno e à
altura do grande evento que seria tornar-se mulher de Regina perante a lei.
— É essa, é essa!— exclamou ao apontar para um manequim na vitrine.
Ao entrarem na loja, logo tratou de procurar as peças e verificar se
havia o seu tamanho.
— Uau! Você está linda demais, Jen!— disse Beatriz ao bater palmas
para a amiga no corredor do provador feminino.
— Obrigada!— respondeu com um brilhante sorriso nos lábios. A loira
fez uma pose e deixou que a amiga a fotografasse com as mãos nos bolsos.
Meireles havia escolhido uma calça preta social de cintura alta e corte reto. Na
parte superior optou por uma camisa social de seda com manga comprida, de
coloração azul marinho, na qual usaria ensacada dentro da calça. Em seus pés,
sapatos fechados de salto.
Ao sair da loja de roupas, Jennifer e a amiga se direcionaram para o
salão de beleza. Meireles fez as unhas dos pés e das mãos e as pintou com uma
coloração nude. Ao contrário de sua noiva, a jovem detestava precisar frequentar
esse tipo de ambiente, só o fazia quando era extremamente necessário.
— Estava pensando em alisar o cabelo, mas a Regina ama as minhas
ondas — comentou ao saírem da manicure. — Então eu acho que vou apenas
prendê-lo em um coque frouxo, porém, arrumado.
— Para a Regina bagunçá-lo mais tarde.
— Beatriz!
— Eu disse alguma mentira? Tenho certeza que à noite a cama de vocês
vai até quebrar!
— Oh Deus, eu não estou ouvindo isso — comentou ao rir e balançar a
cabeça negativamente.
— Qual é, Jennifer? Vai fazer a santa agora?— Riu. — Eu quero saber
de todos os detalhes da sua viagem com ela. Todos eles!
— E eu vou te contar sobre esse um mês maravilhoso na Europa!—
disse sorridente. — Agora vem! Vamos comigo me ajudar a escolher um
presente pra ela, que vou contando no caminho.


Na casa da professora, ela e a irmã conversavam a respeito do
casamento. A manhã estava sendo menos agitada para Regina que para Meireles,
tendo em vista que ela havia deixado tudo esquematizado antes da viagem. Até
mesmo a roupa que usaria no dia de hoje já estava comprada e passada. A
morena havia escolhido um conjunto social de calça e blazer risca de giz, e por
dentro usaria uma camisa social de coloração vinho.
— Vocês pretendem fazer uma cerimônia religiosa?
— Ainda não conversei muito com Jennifer a respeito, mas acredito que
não façamos uma comemoração tradicional. Eu gostaria de algo mais simples,
porém, não menos especial. E ela também. Nada de igreja como plano de fundo.
Preferimos a natureza, um ambiente a céu aberto com direito a gramado. Algo
pequeno, onde apenas as pessoas importantes nas nossas vidas estivessem
presentes.
— E pra quando será a festa?— perguntou com empolgação. — Eu
adoraria fazer os vestidos de vocês!— Poucas pessoas sabiam, mas Malena era
graduada em design de moda. No entanto, esse lado acabou se tornando apenas
um passatempo para a ruiva quando se casou e tomou funções administrativas na
empresa do marido.
— Preciso marcar a data em conjunto com a Jennifer. Quero para o
mais rápido possível. Já que será algo pequeno e apenas para os íntimos, o prazo
de um mês acredito ser suficiente para organizar tudo. Nosso pai disse que faz
questão de bancar toda a festa. Você sabe, ele tem aquele pensamento antigo de
quando o pai arcava com os gastos do casamento da noiva. Foi assim no seu, e
ele quer que também seja no meu.
— Então aproveita! Até porque você deve ter gastado muito nessa
viagem — comentou a ruiva. Malena possuía um grande brilho nos olhos. — Eu
vou trabalhar dia e noite na fabricação desses vestidos. Quero marcar uma
reunião com vocês pra desenhá-los ainda essa semana.
— Obrigada, Ma. Vamos adorar usar algo exclusivo.— Sorriu. —
Como está o Henrique com tudo isso? Eu nunca sentei com ele pra ter uma
conversa franca sobre o que está acontecendo.
— Relaxa, irmã. Ele sempre soube sobre vocês e nunca se incomodou.
— Eu sei, mas sinto que nos devo essa conversa. Henrique já está com
onze anos, não é mais uma criancinha que não compreende as coisas. Quero que
minha relação com ele sempre seja regada de diálogos. Não gosto da ideia de
deixar as coisas subentendidas — explicou. — Vou chamá-lo pra conversar.
Regina deixou o quarto, desceu para o primeiro piso e interrompeu o
momento de Henrique com o videogame.
— Será que esse jogo é tão mais interessante que eu?— perguntou ao
tomar um lugar ao lado do sobrinho no sofá.
— Não mesmo. Eu só não quis ficar ouvindo aquelas suas conversas
chatas com a mamãe.
— Conversas chatas?— indagou ao por a mão no próprio peito,
dramatizando. — Como tem coragem de dizer que minhas conversas são chatas?
— Apenas quando está com a mamãe. Ficam falando de roupas, dietas e
todas essas outras coisas chatas. Mas quando está apenas você e eu, eu gosto. Ou
quando estamos com a Jennifer.— Acrescentou.
— Ah é? E por que gosta quando estamos com a Jennifer?
— Porque vocês falam sobre coisas legais. Com ela os seus assuntos
são diferentes. É divertido.
— Fico feliz que você goste de estar conosco — disse suavemente ao
passar a mão pelos cabelos do menino. — E por falar em Jennifer... É sobre ela
que quero conversar.
— Sobre o casamento?— perguntou descontraidamente ao pausar o
jogo e direcionar a atenção sobre sua tia.
— Também. E eu gostaria de falar sobre o que ela é pra mim.
— Eu sei que você são namoradas, tia. Está tudo bem.
— Mas nós nunca conversamos abertamente sobre isso. Talvez por
achar você pequeno demais na época. Acho que eu temia que ficasse confuso.
Afinal, além dela ser uma mulher, era uma aluna minha.
Henrique cruzou as pernas sobre o sofá e virou inteiramente o corpo em
direção a morena.
— É errado a Jennifer ter sido sua aluna?
— Não exatamente. Mas nas profissões nós precisamos manter a ética.
Não é uma situação socialmente bem vista, entende? Devemos evitar cruzar
algumas linhas e misturar as coisas. Mas a sua tia se encantou tanto por aquela
loira, que resolveu ignorar as normas sociais.
— Você foi uma rebelde!— disse ao rir, arrancando da tia uma risada
tão grande quanto.
— É, podemos dizer que sim.— Riu um pouco mais. — Havia uma voz
aqui dentro que me dizia: é ela. E eu não podia simplesmente silenciá-la.
— Porque você a ama.
— Sim, meu amor. Porque eu a amo. E eu não quero escrever história
com outro alguém além dela.
— Foi por isso que você largou o trabalho e viajou, não foi? Na época
eu não sabia o motivo, mas agora eu consigo entender.
— Foi exatamente por isso. Às vezes o amor exige alguns sacrifícios.
Eu precisava de um tempo pra que algumas questões fossem resolvidas.
— Tô feliz em poder saber um pouco o que aconteceu. E também tô
muuuito feliz pelo seu casamento. Eu te amo e quero que seja feliz. Você e a tia
Jennifer.
Regina sorriu por dentro ao ouvir o garoto se referindo à Jennifer como
sua tia. Certamente ela contaria isso para loira em algum momento mais tarde.
— Já faz um tempão que eu saquei o lance entre vocês — disse ele ao
esboçar uma expressão sapeca. — Você olha pra ela com cara de idiota! E você
não faz isso com mais ninguém.
— Idiota? Mais respeito comigo, moleque! Não tem medo de sentir a
minha fúria?— Regina se lançou por cima do sobrinho e começou a ameaçá-lo
enquanto o enchia de cócegas na barriga e debaixo do braço.
— Não, não, não! Para!— exclamava aos risos. — Não te chamo mais
de idiota, mas para, por favor!

Malena desceu as escadas e sorriu ao se deparar com a cena da irmã e
seu filho, que a essa altura estava todo vermelho de tanto se contorcer debaixo
de Regina. Ela os observava e pensava no quão maravilhosa a morena seria
como mãe. Pois embora Regina sempre expressasse uma postura séria e fria em
sociedade, fazendo com que todos a julgassem insensível, ela era terna e doce
quando estava com aqueles que verdadeiramente amava.



As horas passaram mais rápido que de costume. Todos estavam
nervosos e ansiosos para vê-las tomando aquele passo tão importante e
significativo. De um lado, Beatriz surtava e tinha seus olhos banhados d’água
por ver sua melhor amiga entrando em uma nova etapa de vida. Do outro, Arthur
se orgulhava de Regina. Orgulhava-se da perseverança que ela carregava e do
forte sentimento de lutar por aquilo que mais se quer. Ele sabia que sua amiga
sempre foi uma mulher de grandes e intensas emoções, e que não seria diferente
agora.
Morgana também se sentia sensibilizada. Meses atrás quando Regina a
visitou e comunicou sobre a surpresa do pedido de casamento, sua reação foi um
pouco fria. No entanto, com o passar das semanas e meses ela foi possuindo
tempo para digerir a ideia. E quando sua ficha realmente caiu, emocionou-se.
Afinal, Jennifer é sua primeira e, até então, única filha. E ela sempre sonhou em
vê-la em um momento como esse. Embora Regina não fosse um homem,
Morgana estava feliz. Verdadeiramente feliz.

— Posso ter alguns minutos com você?— perguntou Morgana de
maneira educada ao se aproximar de Regina no cartório. Todos aguardavam do
lado de fora da pequena sala onde aconteceria a cerimônia.
— Claro — respondeu educadamente. — Já volto — disse baixinho
antes de se distanciar de Jennifer, que permaneceu olhando-as ao longe.
— Primeiramente eu gostaria de felicitá-la pelo dia de hoje. Faz poucos
meses que me casei com Diogo e sei o quão maravilhoso e especial esse
momento pode ser. Estou feliz que minha filha esteja usufruindo da felicidade de
estar com quem verdadeiramente ama.
— Obrigada — disse, segundos antes de esboçar um sorriso no canto de
seus lábios pintados de vermelho. — Você não sabe o peso e a importância que
as suas palavras têm pra mim no dia de hoje. Tudo o que eu sempre quis foi ver
a Jennifer feliz e ser parte dessa felicidade. Saber que você não está contra a
nossa união, não poderia me deixar mais contente.
— Que bom que você sempre se manteve muito receptiva comigo
mesmo após eu ter me comportado de maneira horrível no passado.
— Morgana...— disse a professora ao interrompê-la. — Vamos deixar
isso no passado. Você teve suas razões e eu sempre as compreendi, mesmo não
concordando. Você é mãe. E o primeiro instinto é querer proteger os filhos de
algo que se julga como ruim.
— Mas é aí que está o problema. Eu deveria ter dado a você a chance de
mostrar a boa pessoa que é. Não fui civilizada. Nem eu mesma me reconheço
quando recordo das minhas atitudes e das barbaridades que saíram da minha
boca. Espero que um dia a minha filha possa me perdoar por toda a dor
desnecessária que proporcionei, e gostaria muito que você me desculpasse.
— Morgana, está tudo bem.— Regina apoiou a mão sobre o ombro da
mulher e manteve o olhar fixo ao dela. — Essa página já está virada.— Sorriu.
— Regina, eu bati em você! Oh meu Deus, você não imagina a
vergonha que sinto.— Morgana levou a mão à testa e fechou os olhos por breves
segundos ao lembrar de sua atitude.
Jennifer, de onde estava, não desgrudava o olhar sobre elas. Tentava
fazer leitura labial para saber sobre o que conversavam. A curiosidade e
ansiedade a estavam consumindo.
— Ei... Isso já foi há tanto tempo. Pra quê se martirizar? Mas se a
minha desculpa é importante pra você, saiba que a tem. — Sorriu. — Sabe... O
passado é imutável, Morgana. Mas podemos aproveitar esse dia especial e
começar a escrever um futuro mais bonito e amigável pra nós.
— Posso te dar um abraço?— pediu a mais velha. Morgana sentia-se
verdadeiramente sensibilizada pelas palavras de Regina. Principalmente por ver
o quão generosa, receptiva e de coração aberto ela era.
A professora quase não conseguia acreditar na última frase proferida
pela mulher. Contudo, abriu os braços em um gesto para que ela se encaixasse
ali. E assim Morgana o fez; a abraçou fortemente com seus sinceros sentimentos.
Há muito Regina esperava por aquele momento.
Quando as arestas que ainda restavam entre elas foram aparadas, Regina
retornou para o lado de sua noiva.

— O que foi aquela cena que eu acabei de ver?— cochichou sobre o
ombro da morena.
— Sua mãe me pediu desculpas pelas desavenças do passado e disse
estar feliz por nós.
— Ela te pediu desculpas?— perguntou ao esboçar uma expressão
surpresa.— Inacreditável!
— Pois é. Nunca pensei que esse dia fosse realmente chegar, mas
confesso que esperava por ele — disse em um baixo tom de voz para que apenas
a loira a escutasse. — Mas, mudando de assunto... Como está se sentindo ao
saber que em poucos minutos entraremos naquela sala e sairemos de lá
oficialmente casadas?
Jennifer deixou que um sorriso florescesse em seus lábios enquanto
buscava a mão da noiva com a dela para entrelaçar seus dedos.
— Estou nervosa.
— Posso ver. Ou melhor... Sentir. Seus dedos estão gelados. Quer
desistir? Precisa de um tempo pra pensar melhor?— perguntou suavemente ao
acariciar as costas da mão de Jennifer com a ponta do polegar.
— Desistir? Apenas se eu estivesse louca. O que mais quero é sair lá de
dentro como sua mulher.— Sorriu. — Ah, e antes que eu me esqueça...—
Meireles levou os lábios até o ouvido da morena e sussurrou. — Você está linda.
— Não mais que você — sussurrou em resposta. — Chegou a hora.

Jennifer e Regina entraram de mãos unidas na pequena sala. Logo atrás
vieram Morgana, Diogo, Henrique, Malena, Beatriz e Arthur. O local
comportava um número pequeno de pessoas, e tendo em vista que futuramente
fariam uma festa e convidariam um número maior de gente, não julgaram
necessário avisar a mais alguém.
As duas mulheres compartilharam uma troca de olhares e se
posicionaram em frente à mesa do juiz, que prontamente cumprimentou a todos
os presentes e logo em seguida iniciou a leitura do termo de casamento.
Enquanto o termo estava sendo lido, todos olhavam fixamente para o
casal. E por mais inacreditável que pudesse parecer, Morgana era a que mais
estava emocionada dentre os convidados. Ela lutava arduamente contra as
lágrimas que teimavam em preencher seus olhos. Mais emocionada que ela,
apenas as noivas.
Ao mesmo tempo em que ouvia as palavras do juiz, um flashback
passava na mente de Jennifer. A mais nova pensava e recordava sobre todo o
caminho percorrido até ali. Jamais imaginaria que seu último ano letivo escolar
mudaria drasticamente a sua vida.
Ao lado dela estava Regina com os pensamentos não muito diferentes.
A professora alternava a atenção entre o juiz e a loira, e sempre que a olhava,
enxergava a garota que conheceu há dois anos. O olhar familiar, o sorriso
travesso ainda eram os mesmos. Regina sabia que não importaria os anos que
passassem, Meireles sempre seria a sua garota. Amá-la sempre fora um jogo
perigoso; o mais prazeroso de todos.
— As testemunhas gostariam de dizer algo aos noivos?— perguntou o
juiz.
— Eu!— Beatriz se pronunciou. A jovem aproximou-se das duas e
começou a dizer algumas palavras enquanto as olhava. — Eu vi esse amor
nascer e se tornar o que hoje é. Estive lá nos momentos de alegria, insegurança,
tristeza e euforia. Eu torci a cada dia para que a vida fosse boa com vocês, para
que não levasse embora a oportunidade de ver esse sentimento tão verdadeiro
crescer. E hoje estamos aqui, estamos todos aqui. E eu não poderia estar mais
contente. Desejo que a felicidade seja o prato principal na vida de vocês. E você,
dona Jennifer, dê um jeito de me arrumar um sobrinho, ok?— comentou,
fazendo com que a loira e a morena rissem juntas.
— Vamos ver o que consigo fazer .— respondeu com um sorriso nos
lábios.
— Felicidades, meninas! É o que desejo hoje e sempre.— Finalizou ao
sorrir para o casal.
— Eu também tenho algumas palavras a dizer — comentou Arthur ao
se aproximar. — Primeiramente eu gostaria de agradecer pela oportunidade de
ser testemunha dessa bela união. Assim como Beatriz, também acompanhei essa
história desde o início. Sei a respeito de todas as lutas que precisaram vencer
para que pudessem estar aqui oficializando esse amor.— Arthur olhava
docemente para o casal. Entretanto, seu olhar caía mais vezes sobre Regina. —
Eu sei o quanto as pessoas e a vida podem ser cruéis. Mas eu torço para que
todos os dias vocês encontrem uma na outra a força que precisam para seguirem
em frente. Desejo que o pra sempre seja uma conquista diária. E que o respeito,
o amor e a felicidade sejam as principais pilastras nessa nova etapa que se inicia.
— Oh, meu amigo... Muito obrigada!— Regina envolveu o homem em
um abraço carinhoso e murmurou algumas outras palavras de agradecimento em
seu ouvido.
— Obrigada Arthur — disse Jennifer ao sorrir e também abraçá-lo.
— As noivas gostariam de dizer algo uma à outra antes da troca de
alianças?
As duas mulheres cruzaram seus olhares e encontraram no olhar da
outra o mesmo querer de dois anos atrás. A mais velha possuía a mesma
intensidade nos castanhos enquanto as esmeraldas de Jennifer serviam de
recipiente. Ambas sorriram e então Regina se pronunciou.
— Eu poderia dizer que busquei dezenas de formas diferentes para te
esquecer, mas eu estaria mentindo. Tentei, sim, não te querer. Tentei vendar
meus olhos para todas as vezes em que suas palavras sábias me deixaram
admiradas, ou quando você se mostrava tão semelhante a mim e ficávamos
minutos a fio buscando compreender o magnetismo que nos envolvia. Depois me
dei conta que você e eu estávamos além de qualquer compreensão, e me permiti
te viver.— Regina pausou as próprias palavras e buscou a aliança que estava
dentro da caixa que o juiz portava enquanto as olhava. Delicadamente, segurou a
mão esquerda de Jennifer e retornou a falar. — Nós conhecemos a glória e o
desastre de viver uma paixão como a nossa. E foi pensando em tudo o que
passamos que decidi cravar na sua aliança o dizer Do caos ao Cosmos para que
você lembre todos os dias o quão resistente é o que temos. Assim como os anéis
de Saturno, que teoricamente surgiram de uma colisão e se transformaram em
um perfil belo e peculiar, o nosso amor também reinará aqui embaixo; na sua
vida e na minha.
O coração de Jennifer nunca batera tão rápido como agora. Nem mesmo
quando sentira os lábios de Regina em contato com os seus pela primeira vez. As
palavras de sua noiva a tiraram o ar e a deixaram com dificuldade de raciocínio.
Meireles estava extasiada como apenas a morena era capaz de deixá-la.
— Quero que receba esse anel como uma das provas do meu amor por
você. Que todos os dias essa aliança de compromisso seja reafirmada, e que lo
nuestro se quede nuestro.
— Não acredito que vai me fazer chorar aqui — comentou ao observar
a aliança sendo colocada em seu dedo. Meireles secou as lágrimas que estavam
prestes a escorrer por seu rosto e sentiu os lábios de Regina beijarem sua mão ao
término.
— Também tenho algumas coisas a dizer — comentou ao pegar a
segunda aliança.
— Quando nos conhecemos e eu rapidamente comecei a me apaixonar
por você, lembro de te enviar algumas mensagens na tentativa de me aproximar
um pouco mais, porém, eu só recebia o seu silêncio. Em alguns momentos eu
sentia que algo em você me correspondia, mas logo em seguida você crescia um
muro entre nós. Foi então que eu percebi que precisaria desvendar os mistérios
da sua mente. E posso dizer que esse foi um grande feito. Quando todas as suas
portas e janelas se abriram pra mim, conheci um lugar que gostaria de chamar
pra sempre de lar.— Jennifer pausou por breves segundos na tentativa de conter
a emoção que tomava conta de suas palavras. — Amo você, Regina. Amo quem
você é e tudo o que somos quando estamos juntas. Em Paris, quando li o Menina
De Ouro na aliança que pertenceria a você, eu não pude deixar de me emocionar.
Espero ser sempre merecedora desse título. Mais do que brilhar em um ringue,
eu quero ser um pouco de luz nos seus dias.— A mais nova introduziu
delicadamente o anel no dedo de Regina e beijou as costas de sua mão.
As duas mulheres, assim como as testemunhas, assinaram a certidão de
casamento e aguardaram as palavras finais do juiz. A partir de hoje, cada uma
carregaria consigo o sobrenome da outra.
— As alianças são símbolos físicos de união e compromisso. São
consideradas um círculo perfeito, sem começo nem fim — disse o juiz ao se
pronunciar após as assinaturas. — E assim, tendo testemunhado a troca de votos
diante de todos que estão aqui presentes, e também com base na certidão de
casamento que vocês acabaram de assinar, é com grande alegria e prazer que eu
as declaro casadas. A noiva já pode beijar a nova, e vice versa.— Sorriu.

Jennifer e Regina se posicionaram de frente e alternaram o olhar entre
os olhos e boca uma da outra. Um pequeno sorriso se fazia notável no canto dos
lábios rosados da jovem. E desses mesmo lábios Regina foi capaz de ouvir um
murmúrio dizendo que a amava. Seus olhares se aproximaram conforme seus
corpos encurtaram a distância entre eles. Os braços de Jennifer envolveram
lentamente a cintura de Regina, enquanto esta depositou as mãos sobre seus
ombros. Suas bocas se encontraram uma vez mais e reafirmaram o sentimento e
compromisso que carregavam e compartilhavam antes mesmo de serem
oficializados em um papel. O beijo durou breves segundos, que para elas pareceu
se estender um pouco mais. Elas sentiram como se o ambiente tivesse silenciado
e esvaziado, e não existisse nada além da significância do que compartilhavam.

— Viva as noivas!— exclamou Henrique, as fazendo despertar do
transe.
As duas mulheres caminharam em direção aos amigos e familiares com
um grande sorriso no rosto. Sem desgrudarem as mãos, se posicionaram em
frente as câmeras que Malena e Beatriz carregavam. E após alguns registros de
imagens, todos se direcionaram para um restaurante.

Regina e Jennifer se sentaram lado a lado na extensa mesa escolhida.
Elas se olhavam e sorriam para a outra a cada minuto como se ainda não
acreditassem que estavam oficialmente casadas. Suas mãos se buscavam e se
acariciavam sobre a mesa e colo uma da outra durante toda a refeição. Eram
toques singelos, sutis e carinhosos.
— Posso dormir na tia Regina hoje?— perguntou Henrique de maneira
inocente. O menino queria matar a saudade que a professora deixou nesse um
mês em que passou viajando.
— Mas nem pensar!— respondeu Malena, prontamente.
— Por quê? Prometo não fazer bagunça e não incomodar a Regina. Já
sei dormir sozinho fora de casa.
— Em outra ocasião você vai. A Regina e a Jennifer acabaram de se
casar e vão querer aproveitar a companhia uma da outra.
— Verdade. Tudo bem, eu entendo — respondeu a contragosto.
— Final de semana você passa conosco.— Se pronunciou sua tia. — O
que acha?
— Henrique apenas assentiu com a cabeça.
— Diogo e eu gostaríamos de aproveitar a ocasião pra dar um
comunicado — disse Morgana em um alto tom de voz ao apoiar a mão sobre o
colo do marido. — Hoje nossas famílias se entrelaçaram e eu desejo que essa
união não seja apenas entre Jennifer e Regina, mas sim, entre todos nós. Sendo
assim, não teria melhor hora pra anunciar que a nossa família ganhará um novo
membro.
— Como assim?— perguntou Jennifer ao olhar para a mãe com os
olhos arregalados. — Não me diga que você e Diogo...
— Sim — respondeu ao depositar a mão sobre a barriga. — Estou
grávida!
— Não acredito!— disse Jennifer com alegria ao inclinar o corpo sobre
a mãe e envolvê-la pelo pescoço.
— Morgana, que notícia maravilhosa!— comentou Regina ao se
levantar e caminhar até a sogra para abraçá-la.
— Já estão todos convidados para o chá de bebê!— disse Diogo ao
sorrir orgulhoso.
— Parabéns! Um filho é sempre uma dádiva na nossa vida — comentou
Malena de onde estava. — Está de quanto tempo?
— Nove semanas — respondeu com um sorriso no rosto.
— Isso é aproximadamente... Dois meses.— Beatriz se pronunciou.
— Eu já estou com quarenta anos, então meu obstetra disse que preciso
de um acompanhamento mais rigoroso e cuidados dobrados — disse ao informá-
los sobre sua situação. — Mas estou esperançosa. Muitas mulheres conseguem
ter uma gravidez tranquila após os quarenta. É arriscado, mas não é impossível.
— Estamos todos aqui pra te ajudar e apoiar no que precisar —
comentou Regina ao depositar a mão no ombro de Morgana e acariciá-lo.
— Obrigada — respondeu ao depositar a mão sobre a da morena.
— Eu tive muitas complicações na gravidez do Henrique, mas por sorte
estive em ótimas mãos. Se você quiser, claro, posso te passar o número de
alguns médicos de minha confiança. Toda ajuda nesse momento é muito
importante — disse a ruiva.
— Oh, claro. Vou querer, sim. Obrigada por se importar.
— Vai dar tudo certo, mãe. Tenho certeza que vai nascer mais um
Meireles cheio de saúde.— Sorriu.
— Por falar em gravidez...— Se pronunciou a professora ao retornar
para seu lugar na mesa. — Já estou com trinta e cinco anos e tenho pensado
sobre isso. Meu relógio biológico está correndo, em breve vou atingir o limite do
que seria uma gravidez sem riscos. E tendo em vista que não terei filhos da
maneira tradicional, estou pensando em pelo menos congelar meus óvulos
enquanto ainda sou considerada jovem. Ia comentar essa questão com você,
amor. Mas com toda a euforia da viagem e do casamento eu acabei não tendo
oportunidade.
— Eu acho uma ótima idéia.. Tem meu total apoio.— Sorriu ao
acariciar a bochecha da morena.
— No dia em que você for mãe, não esqueça que eu serei o padrinho —
comentou Arthur ao se pronunciar.
— Não esquecerei, pode ficar despreocupado — disse em meio ao riso.

O fim de tarde no restaurante seguiu repleto de felicidade, harmonia e
união. Jennifer não parava de acariciar a barriga de sua mãe e de cochichar
algumas palavras para seu futuro irmão. Regina, por sua vez, sentiu uma vontade
inigualável de também vivenciar um momento como aquele. No entanto, sabia
que ainda era cedo demais para elas. Antes, gostaria de aproveitar a vida a dois.
Algumas horas mais tarde Jennifer pediu para que Regina a levasse até
o apartamento antes de se dirigirem para a casa da professora. Chegando lá, a
loira preparou uma mala com alguns pertences mais urgentes e essenciais.
— Aconteceu tudo tão rápido nas últimas vinte e quatro horas, que eu
sinto como se a ficha ainda não tivesse caído — comentou enquanto depositava
algumas peças de roupa, calçados e produtos dentro da mala. — Ontem eu
estava em Paris, hoje estou aqui. Ontem éramos namoradas, hoje somos casadas.
Até poucas horas atrás eu era filha única, agora descubro que em breve terei um
irmão. Que loucura!
— A vida pode ser surpreendente.
— E como!— Meireles fechou a mala, recolheu a chave do
apartamento, caminhou até a porta e soltou um longo suspiro ao olhar para trás.
Mas não era um suspiro de tristeza. Era apenas uma despedida dos pequenos
momentos que viveu ali durante o último ano. Meireles era grata pelo que
conquistou no passado e estava sendo ainda mais grata à vida pelas conquistas
do presente.
— Pronta para irmos pra casa?— perguntou a mais velha ao esboçar um
sorriso orgulho.
— Pronta!


Ao adentrarem a casa de Regina, que agora também seria a de Jennifer,
foram recebidas por Bóris miando e roçando entre suas pernas.
— Você está sabendo que agora tem outra mamãe pra te mimar?—
comentou a mais velha enquanto caminhava para dentro do cômodo. — É, meu
amor — disse ao felino de maneira manhosa após receber um miado em
resposta. — Agora terá a Jen pra você encher as roupas claras de pêlos e
esquecer um pouco as minhas.
— Como é que é?— exclamou a loira, fazendo a mais velha rir.
Meireles subiu com a mala para o quarto e deparou-se com um caminho
de pétalas de rosas brancas que se estendia da porta até a colcha vermelha sobre
cama. A loira sorriu com tamanha graciosidade.
— Bem vinda ao seu lar, senhora Vianna — disse com a voz aveludada.
Em um impulso, Meireles ergueu a morena no colo e caminhou até a
cama, jogando-a sobre as pétalas. Seus lábios foram de encontro ao pescoço e
traçaram caminhos de beijos na região. Enquanto investia as carícias, sentia as
mãos da professora tateando suas costas por cima da blusa de seda.
— Você está tão linda — murmurou a jovem contra o ouvido. — E
também tão cheirosa...— continuou a dizer. — Hoje enquanto você caminhava
comigo pra dentro da sala eu escutei o som que seus saltos faziam contra o chão
e aquilo me deixou nervosa. Será que o som dos seus passos sempre vai fazer
meu coração disparar e me deixar louca?
— Não sei, me faço a mesma pergunta sempre que você sorri pra mim
— murmurou contra o ouvido de Jennifer, a fazendo fechar os olhos por breves
segundos enquanto sentia aquela voz arrepiar a pele de seu corpo.
— Eu tenho um presente pra você.— A mais nova saiu da cama e
caminhou até a mala.
— Amor, não precisava. Eu... Não tenho nada pra você.
— Você já me presenteou com a viagem dos meus sonhos e ainda me
deu essa linda aliança de ouro. O que tenho pra te dar não chega nem aos pés
disso.— Jennifer retirou um embrulho de presente e um envelope. Ao sentar-se
na beirada da cama com a esposa, lhe entregou em mãos.
Dentro da embalagem havia uma garrafa do vinho preferido de Regina e
uma caixa de chocolate com cereja. A morena a agradeceu e depositou um
selinho em seus lábios.
— Lembrei do dia em que você me deu alguns bombons na biblioteca
do colégio.
— Foi pra você pensar em mim enquanto os degustava. Queria que
assimilasse o gosto doce a mim.
— E você pode ter certeza que eu o fiz. Mas...— Regina abriu a caixa
do chocolate, pegou uma unidade e a levou até a boca da loira, a fazendo morder
um pequeno pedaço. — Fica ainda mais gostoso quando posso provar da sua
boca.— A voz da professora saiu com sensualidade. Ela roçou os lábios contra
os de Jennifer de maneira suave e a beijou. — Do que se trata o outro presente?
— perguntou ao final do pequeno beijo.
— Só saberá quando abrir.— Sorriu.
Regina abriu delicadamente o envelope branco e se deparou com
algumas folhas dobradas. Ao desfazê-las, visualizou uma listagem com lindos
dizeres em perfeitas descrições. Automaticamente notou que se tratava da letra
de Jennifer.
— Uau...— disse algum tempo depois enquanto seu olhar ainda caía
sobre as palavras. — Isso é... Lindo! — exclamou admirada. — Pelo pouco que
pude ler ao percorrer os olhos, vi que se trata de mim e de nós. São muitas
descrições a meu respeito e alguns momentos que compartilhamos juntas. —
Regina sorria de maneira encantada a cada frase lida.— Mas a data é de quase
um ano e meio atrás. Por que não me mostrou antes?
— Ah, não sei... Na época era pra ser algo pessoal. Quando fiz não
tinha o intuito de mostrar a você. Escrevi por outra razão.
— E qual razão seria essa?
— Pra te lembrar.
— Me lembrar?
— Exatamente. Foi assim que você viajou. Eu precisava descarregar a
saudade, então decidi registrar cada pequena coisa sua da qual me lembrava.
Incluí momentos entre nós, os que mais me marcaram. Ao ler, vai perceber que
foram os mais simples, como na vez em que comemos tacos no carro. — Sorriu.
— Escrever me ajudou a te reviver na minha mente dia após dia.
— E por que trezentos e nove?
— Porque foi lá onde você entrou na minha vida. — Jennifer
demonstrava uma forte emoção em sua voz e olhar. — Encontrei trezentos e
nove razões pra te amar ainda mais e esperar por você..
— É impressionante como você sempre encontra formas de me encantar
— disse, segundos antes de depositar um beijo nos lábios de Jennifer. — Adorei
o presente. Vou guardar com muito carinho e depois vou ler cada uma dessas
razões calmamente.— Regina juntou os presentes recebidos e se levantou.
Depositou os chocolates sobre o criado mudo, guardou o envelope em uma
gaveta e desceu com a garrafa de vinho para a cozinha. Ao retornar, trouxe uma
garrafa de tequila e um copo de dose. — Já que estamos nostálgicas hoje, que tal
relembrarmos esse dia?— perguntou ao mostrar os itens trazidos para a loira.
— Só se você deixar eu realizar uma fantasia com você.
— Ah é? Qual?
Jennifer caminhou novamente até a mala e pegou um par de algemas
metálicas idênticas àquelas usadas por policiais. A loira esboçou uma expressão
séria na face e caminhou na direção da esposa.
— Me prender?— Indagou ao sentir-se sendo encurralada aos poucos
entre Jennifer e a cômoda que havia no quarto.
— Prender? Não sei. Por acaso a prefeita aqui cometeu algum crime?
Regina esboçou um sorriso sacana no canto dos lábios e entrou na
brincadeira da mulher.
— Talvez... Me diga você, policial Meireles. Tenho cara de criminosa?
— Não. Mas é desse seu tipo que descobrimos as piores perversões.
— Então vira algumas doses comigo e vem descobrir se você está certa.
Regina retirou o blazer risca de giz, permitindo que sua camisa social
cor vinho ficasse totalmente à mostra, se guiou com Jennifer e sentou-se sobre o
carpete do chão, onde começaram a entrelaçar suas brincadeiras ao mesmo
tempo em que se provocavam.
— Quais suas intenções ao querer nos embebedar? Uma autoridade
como você deveria se manter lúcida. Ainda mais em um momento como esse
onde sua liberdade está em risco — disse a loira com seriedade e uma pitada de
provocação na voz ao depositar a algema sobre o chão.
— Nos embebedar? Oh não, você está enganada, policial. A única que
irá perder a lucidez aqui será você — rebateu em tom provocante. — A menos
que saiba exatamente o que dizer pra me fazer virar essa bebida.
— Então eu posso começar?
— Vai em frente.
— Ok.— Respirou fundo. — Eu nunca fiquei louca por algo que não
fiz.
— Nem eu. Então ninguém vira. Minha vez! Eu nunca disse Eu te amo
sem realmente amar.
— Eu nunca.— Afirmou a loira. Sendo assim, novamente ninguém
precisou beber
— Sou eu. Eu nunca me apaixonei por uma pessoa mais nova.
— Sério? Você vai apelar dessa forma com perguntas que já sabe a
resposta?
— retrucou a morena enquanto preenchia o copo com a tequila e o virava
logo em seguida. — Então segura essa... Eu nunca desejei uma professora.
— Pois eu já. Desejei feito louca — afirmou ao olhar fixamente para os
olhos castanhos à sua frente. — Esse shot eu vou virar com prazer.— Ao
depositar o líquido no copo e vira-lo, o sentiu descer queimando pela garganta.
Em meio a muitas perguntas, os minutos foram passando sem que se
dessem conta. No início Meireles foi a que mais virou doses, pois a mais velha
sabia exatamente todas as possíveis coisas que a loira já havia feito. Tendo em
vista que evitaram dizer afirmações óbvias, a jovem teve um pouco de
dificuldade para fazer Regina beber. No entanto, o quadro mudou após algum
tempo e ambas viraram quase a mesma equivalência de tequila.
— Há quanto tempo você é prefeita dessa cidade?— perguntou Jennifer
ao continuar com a fantasia de ver sua mulher como uma autoridade política.
— Há quanto tempo você é curiosa dessa maneira?
— Eu não chamaria de curiosidade, mas sim de interesse. Você me
parece uma mulher muito misteriosa. Aposto que sua sala da prefeitura esconde
muitos segredos. Se as paredes daquele local pudessem falar, o que elas me
diriam?
— Que a prefeita se sente sozinha e muito solitária por lá.
— Será que ela gostaria de receber visitas particulares?
— Acho que você poderia visitá-la de vez em quando e tirar a prova
pessoalmente. Não precisa marcar horário.
— Você está tentando me envolver e me desviar do serviço que vim
executar?
— Eu não estou tentando nada. Apenas comentei que meu escritório
está aberto pra você. Aproveita que eu adoro uma loira.— Regina proferiu
roucamente a última frase, fazendo Jennifer morder o próprio lábio inferior
disfarçadamente.
— Então temos um sério problema aqui, pois essa policial adora uma
mulher engomadinha como você.
— E o que mais essa policial adora?— perguntou em tom provocativo.
A mais velha, assim como Meireles, ainda permanecia virando algumas doses da
bebida alcoólica. Seus sentidos já não permaneciam inalterados.
— Adoro um mulher que fale sujo comigo.
Posicionada ao lado de Jennifer, Regina depositou a mão naqueles fios
loiros, desmanchou o coque da jovem e observou as ondas caírem como cascatas
pelos ombros e costas.
— O que você faria se eu colocasse as mãos por debaixo da sua camisa?
— perguntou enquanto tateava o ombro coberto da loira.
— Acho que você deveria vir descobrir.
Regina umedeceu sutilmente os próprios lábios com a ponta da língua e
depositou as mãos na camisa de Jennifer. Após desensacar a peça, levou os
dedos até a barra e os mergulhou para dentro até começar a sentir a pele macia
da barriga da jovem.
— Quanto tempo você acha que eu levo até abrir esses botões?—
perguntou enquanto ia, de maneira lenta, desabotoando um por um de baixo para
cima.
Meireles soltou um suspiro e direcionou o olhar nas mãos que abriram
sua camisa e começaram a acariciar a pele exposta de sua barriga e abdômen.
Era a primeira vez que ela se entregaria para Regina como sua esposa, e mesmo
estando com os sentidos alterados pelo álcool, esse pensamento se fazia lúcido
em sua mente.
— Então quer dizer que você gosta de loiras, prefeita?
— Me enlouquecem. Principalmente se vierem até mim na figura de
policial.— Regina inclinou parcialmente o corpo sobre o de Jennifer, iniciando
beijos lentos no pescoço enquanto sua mão ágil começou a abrir o botão e o
zíper da calça da mulher.
— Devagar...— Meireles apoiou a mão sobre a da mais velha e a
impediu de mergulhar para dentro da calça.
— Mas eu não quero ir devagar — disse com firmeza e rouquidão ao
aumentar a intensidade das carícias no pescoço. Sua língua percorria e umedecia
a pele macia, e os seus lábios chupavam com sutileza para não deixar marcas
futuras.
— Amor...— sussurrou a loira ao fechar seus olhos por breves segundos
enquanto relutava contra o desejo que a boca macia e úmida de sua mulher
estava lhe proporcionando.
Por consequência do álcool que corria em suas veias, Regina começou a
suar. Ela abriu os botões da própria camisa e expôs o sutiã inteiramente de renda.
A peça era transparente e deixava seus mamilos visíveis. Ao deslizar a camisa
para fora, olhou para Jennifer e viu que ela já percebera a transparência que ali
havia. Regina deu à loira um meio sorriso sacana e deu continuidade às carícias.
Meireles relutava para que sua mulher não avançasse. Ela adorava ver o
desejo em Regina crescer cada vez que a interrompia. Sempre que a mais velha
tentava ir além do zíper, sua mão a impedia.
— Eu sei que você quer.— A morena espalmou a mão contra o abdômen
exposto da loira e o percorreu com as pontas dos dedos. Posteriormente iniciou
uma distribuição de beijos sobre ele e o mordeu de forma provocativa.
— Porra... Você faz isso tão bem...— comentou ao sentir os beijos e as
leves mordidas que recebia na barriga e abdômen. Jennifer estava com todos os
botões da camisa abertos, mas a peça ainda estava em seu corpo. Contudo, não
permaneceu por muito tempo, logo as mãos da professora agiram sobre ela.
— Tem algumas outras coisas que eu também sei fazer muito bem.—
Regina inclinou-se e depositou o peso do corpo contra o de Jennifer, a fazendo
deitar-se no carpete.
— Eu sei... Tudo o que você faz é gostoso.— Meireles entrelaçou os
dedos nos cabelos próximos à nuca de Regina e a puxou para um beijo.
O corpo da professora se movimentava de maneira sensual e estratégica
sobre o da jovem durante o beijo. Ela se esfregava lentamente e fazia seus sexos
se roçarem pelos tecidos das calças.
Jennifer começou a se remexer de acordo com os movimentos que
recebia até entrar em sincronia com a mulher. Suas mãos percorreram os
ombros, as costas, o volume da bunda de Regina e logo voltaram a subir até
alcançar o sutiã. Sem que a morena se desse conta, o abriu. Quando veio
perceber, a peça já estava passando pelos seus braços.
— Ah é? Então diz pra mim o que eu faço gostoso em você.— Regina
abriu um espaço entre elas para que sua mão descesse e alcançasse o vão entre as
pernas de Jennifer, onde iniciou uma massagem sobre o tecido da calça.
— Você sabe...
— Mas eu quero ouvir da sua boca e com a sua voz. Sabe que me
enlouquece quando diz.
— Enlouqueço?— Jennifer depositou a mão sobre a de Regina e a
estimulou a continuar. Quanto mais a mulher apertava e massageava sua
intimidade, mais prazer ela sentia. — E o que você acha que faz comigo quando
me toca assim? Me faz te desejar cada vez mais dentro.
— É gostoso quando te toco?— A mais velha abriu o restante do zíper e
iniciou estímulos sobre a calcinha. As pontas dos seus dedos circundavam e
pressionavam de maneira precisa, fazendo com que Jennifer umedecesse
progressivamente.
A jovem começou a se contorcer à procura de um contato maior. Sua
boca percorria o pescoço da morena ao mesmo tempo em que suas mãos se
entrelaçavam naqueles fios castanhos.
Regina, ao perceber que ela ansiava por mais, depositou a calcinha para
o lado e a tocou diretamente em seu sexo. Nesse momento, gemer foi inevitável
para ambas as partes. Jennifer soltou um sussurro de prazer. Regina a beijava ao
mesmo tempo em que a acariciava externamente entre as pernas.
A mais velha usou a mão livre para abrir e tirar o sutiã de Meireles.
Dessa maneira, seus seios e os da loira estavam livres para se tocarem. As duas
se beijavam de maneira lenta e torturante, assim como as investidas que a mais
velha exercia na intimidade de Jennifer, fazendo com que o clima esquentasse
gradativamente. O que compartilhavam ia além de toques que arrepiavam; se
conectavam em todas as quatro dimensões humanas: física, emocional,
intelectual e espiritual.
— Isso é um desacato ao pudor, senhora Vianna. Não posso permitir —
disse Jennifer enquanto retirava a mão da professora de entre suas pernas. Ela
uniu os pulsos da mais velha para frente e os prendeu com a algema.
— Não sabia que proporcionar prazer à minha mulher agora tinha esse
nome.
— E desde quando eu sou a sua mulher?
— Desde quando eu te encontrei.— Sorriu ao olhá-la.
Jennifer levantou-se, ajudou Regina a fazer o mesmo e uniu seu corpo
ao dela. As mãos atadas da mais velha estavam unidas na nuca da loira enquanto
as mãos da jovem seguravam a fina cintura da professora com firmeza. A passos
lentos foram se direcionando para a beirada da cama, até que Meireles se
impulsionou sobre o corpo da esposa, a jogou contra o colchão e sentou-se sobre
ela.
Meireles inclinou-se para baixo e alcançou o lóbulo da orelha de
Regina. Ela o mordeu e desceu as carícias para o pescoço e seios da mulher.
— Não acredito que vai me manter presa...— Regina estava com os
braços sobre o ombro da loira e fazia força para frente, de modo a puxar a
cabeça de Meireles para mais perto de si. Esse era o único movimento que seus
braços conseguiam exercer.
Jennifer dedicou alguns bons instantes beijando os seios de sua esposa,
e quando o desejo de senti-los em sua boca tornou-se gritante, circundou a ponta
da língua em um dos mamilos e posteriormente o sugou. A loira se deliciava
com a textura e o sabor ao mesmo tempo em que ouvia os baixos gemidos de sua
mulher.
A boca da jovem não se limitou aos seios, ela desejava provar Regina
com totalidade. Sendo assim, abriu a calça da professora e a retirou, deixando-a
apenas com uma pequena calcinha de renda preta transparente. Essa peça não
durou muito tempo no corpo da morena; Jennifer logo tratou de segurá-la pelas
laterais e deslizá-la lentamente para baixo.
Regina começou a se contorcer nos lençóis quando os lábios úmidos e
quentes da jovem traçaram um caminho por suas pernas e coxas até chegarem a
seu sexo. Dentre todos os feitos de Jennifer na cama, este era o que mais lhe
agradava. Sua garota sabia lhe dar prazer como ninguém mais.
Os gemidos que ecoavam da morena se tornavam contínuos e
arrastados. Ela sentia de maneira literal em sua pele o quão era desejada por sua
esposa.
— Jennifer...— chamou-a com fraqueza na voz quando sentiu que não
poderia resistir por muito mais tempo se continuassem assim. A boca de
Meireles lhe alterava os sentidos como nenhum álcool era capaz de fazer.
A loira, ao escutar o chamado, livrou-se da própria calça, calcinha e
engatinhou por sobre o corpo de Regina. Nos lábios ela carregava um sorriso
sacana e o gosto de sua mulher.
— Porra, Jennifer... Você me enlouquece — disse com grande
rouquidão em sua voz após receber o corpo da mais nova sobre o seu. A
rouquidão que possuía sempre servira de gatilho para aflorar os desejos mais
impuros em Meireles. — Agora me solta e deixa eu passear as mãos no seu
corpo.
— Então pede. Mas pede com essa voz gostosa que você tem —
murmurou contra o ouvido. — Ou melhor, ordena. Faz do jeito que me deixa
louca.
— Você é muito safada — disse em meio a uma risada sensual.
— Aprendi com a melhor professora — rebateu ironicamente enquanto
deslizava lentamente o polegar sobre as manchas vermelhas de batom borrado
que contornavam a boca da mulher. — Eu adoro isso, sabia?— comentou
enquanto parecia refletir sobre algo.
— O quê? Me manter presa?— Riu.
— Também.— Riu em conjunto. — Mas eu me referia a isso... A ver o
quanto eu consigo bagunçar você.— Jennifer terminou de limpar o batom
manchado de Regina e entrelaçou os dedos nos cabelos parcialmente úmidos de
suor da mulher, os penteando para trás; permitindo que a face da professora
ficasse inteiramente exposta. — Gosto da ideia de te enlouquecer, de virar a sua
cabeça e brincar com seu corpo.— Ao mesmo tempo em que falava, sentava
sobre a mulher com os joelhos dobrados e as pernas para trás. Suas mãos foram
depositadas sobre os seios de Regina e suas ondas douradas balançavam para
frente e para trás seguindo os movimentos de seu corpo, que se movia em um
prazeroso cavalgar.
— Eu sei. A sua intenção sempre foi me tirar do sério.— A mais velha
umedeceu os lábios e fixou os intensos olhos castanhos na imagem nua de
Jennifer sentada sobre si. Tendo em vista que estava impossibilitada de mexer as
mãos, apenas apreciou o ir e voltar da mais nova. No entanto, sabia que não
conseguiria se manter apenas observando. Regina era carnal demais pra tanto
autocontrole. — Acho que você já pode me soltar, policial Meireles. Prefiro usar
outros métodos como forma de pagamento por meus crimes.
Jennifer suspendeu e afastou umas das pernas de Regina e se encaixou
entre ela de modo a unir suas intimidades. Para sua surpresa -ou não- encontrou
na professora a mesma excitação que havia entre suas pernas.
— Seus pecados vão além de qualquer punição válida para esse mundo.
As duas mulheres trocavam provocações em forma de palavras
enquanto Jennifer encaixava e deslizava o próprio sexo sobre o de Regina. Seus
movimentos se intensificavam conforme o desejo crescia em seus corpos.
— Então me solta e põe esse demônio pra brincar.— Regina forçou as
algemas em seu pulso em uma falha tentativa de soltura.
Jennifer ria e se deliciava com a imagem de sua mulher buscando por
liberdade. Ela sabia que Regina era verdadeira em suas palavras, e que a
intensidade que habitava os castanhos que a olhavam dizia que aquela mulher
ansiava por tocá-la.
— Apenas porque o seu reino é o paraíso pra mim.— Piscou. Ao se
levantar, caminhou até a mochila e retornou com a chave.

Assim que se viu livre do objeto metálico, Regina encostou-se no
espelho da cama e procurou os lábios de Jennifer. Ela a beijou com amor e
desejo. Suas mãos deslizaram para a lateral do corpo da loira e a conduziram a
sentar-se em seu colo. Meireles, por sua vez, apoiou as duas mãos no espelho do
móvel e inclinou a cabeça para trás quando sentiu uma das mãos da professora
puxar seu cabelo para baixo, tornando seu pescoço um alvo fácil.
— Me leva alto, Regina...
Ambas entraram em uma atmosfera quase mística. Suas peles, seus
aromas e suores se misturavam entre as carícias. A mais velha largou os cabelos
da loira e usou as duas mãos para arranhar toda a pele clara de suas costas. As
unhas vermelho sangue estavam fincadas e exerciam um movimento de cima
para baixo, deixando um rastro na pele. Meireles sentia o ardor e segurava com
ainda mais intensidade na cama, excitando-se com a dor sutil. Sua mulher
sempre soube o limite entre a dor e o prazer.
A troca de carícias entre elas tomou uma proporção mais voraz, quente
e barulhenta. O ruído da cama se misturava entre os gemidos que vinham de suas
gargantas. Raciocinar já não era possível. Apenas seus corpos ditavam as regras,
ou a ausência delas. O único pensamento que não lhes fugiam um segundo que
fosse, era a certeza do quanto se amavam e do quanto gostariam que aquela
entrega fosse infinita.
A cama não foi o suficiente para cessarem suas vontades. As paredes do
quarto e também alguns móveis serviram de cenário. O álcool combinado ao
desejo fez com que seus movimentos ficassem bruscos e as frases que saíam de
suas bocas cada vez mais sujas. Regina puxava o lábio de Jennifer incontáveis
vezes com mordidas enquanto sentia as mãos da mais nova apertarem sua bunda.
Quando se deram conta, haviam parado no sofá da sala.
Partes distintas da pele de Jennifer foram marcadas por vermelho.
Sejam estas marcas provocadas pelo batom que a morena usava, ou pela
voracidade de suas carícias. A cor vermelha significa paixão, energia e
excitação. Três elementos presentes no amor que compartilhavam. É uma cor
quente e está associada ao poder e ao elemento fogo. Ela sempre está presente
nos lábios e unhas de Regina Vianna. Se pudermos observar as nuances dessa
cor, também veremos que ela está presente no vinho e no chá favorito da
professora. E para Jennifer não havia resquícios de dúvida que vermelho, sim, é
a cor mais quente

— Daria tudo pra fumar um cigarro agora — comentou ao sentar de um


jeito confortável e relaxante no sofá.
— Amor, não.
— Eu não vou, meu bem. Não precisa se preocupar. Há meses eu não
ponho um sequer na boca. Não vou estragar tudo por um desejo momentâneo.
Mas confesso que a vontade está grande.
— Eu imagino. — Meireles deitou-se com a cabeça no colo da mulher e
se deliciou com os carinhos que começou a receber em sua face e cabelos após
aquele relaxante amor. — Eu te amo tanto — disse com suavidade na voz
enquanto encarava de baixo o rosto de Regina.
— E eu amo você, minha menina de ouro.— Regina acariciou o vale
entre os seios de Jennifer com suavidade no toque e sorriu para ela.
— Amo quando me chama assim. Me sinto querida, amada e especial
pra você.
— E você é.— Sorriu. Ela buscou a mão da jovem, a beijou e a chamou
para irem até a cozinha. A morena sentia uma fome descomunal sempre que
faziam amor.
Meireles buscou duas camisas grandes que trouxera na mala e ofereceu
uma para que a morena vestisse. Feito isso, a suspendeu no colo e a levou para a
cozinha. No caminho, ameaçou soltá-la no chão, o que fez Regina gritar e ao
mesmo tempo gargalhar com as bobagens da esposa.
A loira apoiou a mulher sobre a bancada da cozinha e a questionou
sobre o que ela gostaria de comer.
— Feito por você, qualquer coisa.
— Sério, amor! Escolhe! Quero preparar algo para a minha mulher. Só
me resta saber onde fica cada coisa — comentou com a mão no queixo ao
passear o olhar pelos armários.
— Hum... Pode ser sanduíche quente de queijo branco e suco de soja. A
sanduicheira está aqui na bancada, os talheres ficam naquela gaveta ali —
apontou. — E os pratos e copos lá — disse ao apontar para outro canto.
Jennifer, ao abrir cada gaveta e porta, deparou-se com uma vasta
variedade de talheres separados por tipos e cores. Os copos eram guardados em
ordem crescente e também seguiam uma ordem de formato. Sem mencionar as
caixas e embalagens de alimentos. Tudo possuía seu devido lugar.
— Isso vai me dar um trabalho...— comentou ao coçar a parte traseira
de sua cabeça.
— Logo você se acostuma. É só não misturar as louças de porcelana
com as de cerâmica e faiança.
— O quê?!— exclamou. — Você deve estar de brincadeira com a
minha cara ou seus olhos já são muito treinados pra isso. Essas louças são
exatamente iguais!
— Como assim você está igualando as minhas louças, Jennifer?— disse
ao saltar da bancada e caminhar até um dos armários. — Esse aparelho de jantar,
por exemplo, é de Limoges, da França. Percebe que a delicadeza das cores se
aliam perfeitamente à finura dos traços e das formas?
— Não percebo nada. Isso é tudo bobeira pra mim — disse ao revirar os
olhos e fazer pouco caso das louças da mulher.
— Me quebra um desses, que eu termino de quebrar os cacos na sua
cabeça.
— Quebrar como? Assim?— Meireles segurou um bule de porcelana
decorada com estampa de flores e brincou fingindo que ia derrubá-lo.
— Você é uma boba, Jennifer! Me dá isso aqui!— Regina se esticou
para alcançar o item, mas foi puxada pela cintura e beijada. — Sua idiota —
disse entre o beijo, com um sorriso nos lábios.
— Boba... Idiota. O quê mais?— Meireles curvou o braço da morena
para trás e o manteve preso às costas para que ela não pudesse se mexer.
— Loira irritante.
— E o quê mais?— Jennifer guiou o corpo de Regina com o dela,
depositou o bule sobre a bancada e a encurralou.
— E gostosa também.
— Agora eu gostei — comentou ao esboçar um sorriso sacana. Jennifer
depositou as mãos nas coxas da morena e as percorreu com firmeza — Acho que
esse seu sanduíche pode esperar uns minutos mais...


Capítulo 45

Alguns dias haviam se passado. Jennifer e Regina fizeram uma pequena
visita à Malena para que os modelos dos vestidos fossem escolhidos e as
medidas tiradas.

— Vejam só essas cinturinhas. Morro de inveja!— comentou ao anotar
no papel o resultado da medição com a fita métrica. — Me falem qual é o
segredo de vocês.
— É só trocar a macarronada da noite por uma salada — respondeu
Regina.
— Eu? Abrir mão da minha macarronada do jantar? Nem pensar!
Prefiro permanecer sem cintura fininha.
— Isso é coisa da Regina. Eu não abro mão de comer uma massa.
— Mas você ainda é jovem, Jennifer. Quero ver se ainda terá esse
comportamento daqui alguns anos — comentou a morena.
— Acho pouco provável eu mudar. Gosto muito de comer.
— O pior é que eu sei. Você detona uma caixa de cereal em dois dias!
— implicou ela, recebendo de Jennifer uma careta com a língua de fora.
— Não briguem, crianças! Vamos nos sentar, pois quero ajudá-las na
escolha dos tecidos e dos cortes dos vestidos. Já decidiram qual será a cor?
— Pensamos em usar um bege bem claro, quase alcançando o branco
— respondeu a morena. — Quero que meu corte seja do tipo sereia e que possua
um decote em V na região das costas.
— Gostaríamos que nossos vestidos possuíssem exatamente o mesmo
tom e tecido.— Se manifestou a mais nova. — Abrimos mão de qualquer detalhe
em pedras. Queremos um modelo simples, porém, elegante.
— Certo. E em relação à cauda? Com ou sem?
— Cauda curta e confortável, que toque levemente o chão — disse
Regina.
— Quarenta centímetros ao longo do chão está bom pra você?
— Excelente.— Sorriu.
— No meu eu prefiro sem a cauda, por favor — disse Jennifer.
— Okay, garotas. Vou fazer um esboço rápido de alguns modelos e
vocês me digam se aprovam. Vamos modificando quaisquer detalhes, juntas.
Após rabiscar e alterar os esboços, Malena finalmente conseguiu
reproduzir o vestido que habitava a mente de ambas as mulheres. Feito isso, lhes
mostrou algumas amostras de tecidos e por fim chegaram a uma decisão final.
— Malena, obrigada por tudo — disse Jennifer, horas mais tarde,
quando já estava cruzando a porta de saída. — Tenho certeza que o resultado
será maravilhoso!
— Por nada, querida! Pra você e minha irmã eu desejo apenas o melhor.
— Obrigada, Ma! Mas agora Jennifer e eu realmente precisamos ir, pois
temos muita coisa da festa pra adiantar. Os finais de semana estão muito
corridos.
— Sim, claro. Vão lá. E se cuidem, garotas!
— Iremos!— disseram quase em uníssono após cruzarem a porta e
acenarem para a ruiva.

Os finais de semana do mês foram inteiramente dedicados à escolha de
cada detalhe da festa. Buffet, música, locação, decoração e até mesmo as
lembranças que seriam dadas aos convidados. O convite foi enviado apenas para
as pessoas mais íntimas ainda no início do mês.
O casamento será feito a céu aberto, em um vasto jardim localizado
dentro de um dos resorts dos quais o marido de Malena é sócio-proprietário. As
cores escolhidas para a decoração foram em tons nudes como o bege, branco e
salmão, que irão contrastar com a gama de verde presente no jardim.
A decoração será discreta, no entanto, sofisticada e com um toque
vintage. O altar será composto por um arco quadrado de flores brancas e salmão,
uma cortina branca com cada um de seus lados presos para que a paisagem verde
e marrom das árvores fique à mostra, e no centro do arco terá um lustre de vidro.
O caminho até o altar será composto por um piso branco, e as cadeiras
enfileiradas nas laterais serão de madeira com estofado bege. No altar também
terá duas pequenas pilastras de mármore, uma de cada lado, com volumosos
buquês de flores.
A mesa para os convidados será comunitária. Além de deixar a
decoração mais bonita, ajudará na interação dos convidados. Elas querem que
todos se sintam como uma grande família.
Algumas plaquinhas de madeira com dizeres bonitos e harmoniosos
escritos com giz serão espalhadas nas árvores do lugar, assim como um varal de
fotos das noivas, que também estará incluso. Uma foodbike decorada com flores
também estará presente.
O evento terá dois tipos de bolos: um bolo de noiva tradicional de três
andares para as fotos, e um nakedcake de frutas vermelhas para ser servido.
Tendo em vista que a decoração do casamento era um balanceamento
entre vintage e rústica, as lembranças não poderiam seguir outro padrão. Sendo
assim, ao final da festa será distribuído mini vasos de vidro no formato de gota
compostos por mini plantas suculentas habitando seu interior. Cada um deles
terá uma etiqueta de papel reciclado com o dizer: cultive amor.
Cada mínimo detalhe foi pensado, planejado e escolhido em conjunto.
Por sorte, os gostos das duas mulheres eram bastante semelhantes.

Há algumas semanas Meireles ligou para o pai e marcou um encontro.
Ela contou a ele todos os últimos acontecimentos de sua vida e lhe entregou um
envelope com seu convite de casamento. O homem não obteve muita reação.
Tratou o assunto com indiferença como se não tivesse levado a sério o que sua
filha dissera. Jennifer sentiu-se triste, mas não surpresa. Afinal, seu pai nunca fez
questão de se envolver nos assuntos de sua vida. Ele sequer sabia a faculdade
que ela cursava.
Mesmo com o descaso e a indiferença, fez o convite e manteve a
esperança de que ele compareceria.



Faltava pouco menos de dois dias para o casamento quando Laura,
Carmen e o senhor Henrique Vianna desembarcaram no país. Os pais de Regina
e sua prima se hospedaram na casa do casal e passariam duas semanas no Brasil.
Todos estavam alvoroçados e felizes pelo acontecimento de logo mais.

— Como está sendo lidar com as manias de minha filha?— perguntou o
senhor Henrique na hora do jantar.
— Posso dizer que estou enlouquecendo a cabeça dela um pouquinho.
— Riu.
— Principalmente quando recolho a roupa e não as organizo por cores.
Ou quando mudo os objetos de lugar, ou até mesmo quando não combino as
fronhas com os lençóis.
— As fronhas e os lençóis descombinados é o ápice pra me deixar
louca!— disse a morena, fazendo todos da mesa rirem. Malena e o filho também
estavam presentes.
— Olha... Mas eu posso dizer que nesse um mês de casadas as manias
da Regina já deram uma melhorada. Ela já não se incomoda quando eu chego da
faculdade e jogo minha mochila em um canto qualquer, por exemplo. Pois antes
me fazia ir até o segundo andar e pendurar no gancho que há no quarto.
— Claro! Se eu não fizer vista grossa, enlouqueço!
— Enlouquece nada. Uma baguncinha faz bem — comentou Jennifer.
— Não é, Henrique?
— Sim!— respondeu o menino ao compartilhar uma risada com a loira.
— A tia Regina é estranha. Ela precisava de uma pessoa como você pra dar uma
agitada e uma bagunçada na vida dela.
— E no final ela vai descobrir o quanto isso é bom — piscou a loira ao
menino.
— Ah, mas vocês são muito caras de pau. Falam de mim como se eu
não estivesse aqui. Jennifer e Henrique se combinam!
— Mas é ranzinza, viu!— comentou Laura ao se manifestar.
— Confessa que você adora minha bagunça, amor. Quando chega do
trabalho e vê algo meu pela casa, aposto que pensa: que coisinha mais linda
aquela luva de boxe sobre a cama.— Jennifer usou uma voz mais fina e
infantilizada para dizer a última frase.
Regina fechou a cara e tentou não rir, mas foi inevitável.
— Talvez só um pouquinho.— Ela respondeu. — Mas só um
pouquinho mesmo.
— Eu sabia!
— Já disse pra Jennifer que ela tem um lugar garantido no céu por
aturar a minha irmã.
— É isso mesmo? Todos contra mim? Não vou dar lembrancinha de
casamento a ninguém!
— Contra você, Regina? Jamais!— disse Laura ao puxá-la pela lateral
do corpo e unir-se a ela. — Sabe que é minha prima do coração, não sabe?
— Sei que você é uma interesseira, isso sim!— retrucou.
— E os vestidos, filha? Já estão prontos?
— Sim! Ficaram deslumbrantes! A Malena tem muito talento e
agilidade, mãe.
— Obrigada, obrigada!— Se pronunciou a ruiva ao exibir uma
expressão de orgulho de si própria.
— Podemos ver?— perguntou Carmen.
— Nem pensar!— Jennifer e Regina gritaram juntas.
— Opa! Não está mais aqui quem perguntou.— Riu.

O jantar seguiu em um agradável e harmonioso clima familiar. Todos as
questionavam a respeito da festa de casamento e de como estava sendo a vida a
dois. Os risos ecoavam pela sala e reafirmavam o quão felizes todos estavam.
Finalmente a paz estava instalada.


O grande dia havia chegado. Um majestoso sol se abriu e iluminou todo
o jardim que seria cenário e palco para o especial evento na vida do casal.
Alguns presentes foram entregues no endereço da casa das duas mulheres dias
antes, e alguns outros ainda chegavam ao quarto do próprio Resort onde estavam
hospedadas e passariam o final de semana após o casamento.
Os convidados já estavam chegando e se espalhando pelo lugar.
Crianças corriam e brincavam pelo verde gramado, adultos tiravam fotos em
frente à decoração e também começavam a se servir dos canapés e drinks que
estavam sendo oferecidos.
Enquanto a festa acontecia lá fora, Jennifer e Regina terminavam de se
arrumar; cada uma em um quarto diferente do hotel. A loira foi a primeira a ficar
pronta. Sendo assim, aguardou a visita de Laura em seu quarto para anunciar que
a morena também estava pronta.

— Ai, meu Deus! Difícil dizer qual de vocês duas está mais linda!—
disse Laura ao avistar Meireles.
— Obrigada!— Sorriu. Como ela está? Tudo pronto? Ela está nervosa?
— Sim, Regina já está pronta e des-lum-bran-te! Minha prima está uma
pilha de nervos! Me disse que se sente como se estivesse casando pela segunda
vez com você. E de fato está!
— Oh Deus! Estou louca pra vê-la! Vou acabar roendo minhas unhas se
eu não sair desse quarto agora!
— Malena foi até ela avisar que você está pronta. Mas espera. Me deixa
só enviar uma mensagem dizendo que estou saindo com você.— A ruiva pegou
o celular que estava no bolso de sua calça social e digitou uma mensagem para
Malena. Em poucos instantes recebeu uma resposta. — Vamos? Sua noiva te
aguarda!



Ponto de Vista de Regina

Ao deixar o quarto, caminhei a passos lentos pela extensão do corredor
localizado no segundo andar. Eu estava em silêncio, assim como Malena, que
caminhava ao meu lado. Me sentia nervosa e eufórica demais para conseguir
proferir alguma palavra. Segurei o tecido do meu vestido na região das coxas e
o suspendi sutilmente de modo a não deixar que a cauda tocasse o chão.
Quando virei o corredor à esquerda, avistei Jennifer. Lá estava ela;
linda em seu vestido. Pode soar clichê, mas por alguns instantes eu senti como
se meu coração tivesse parado. Algumas vezes, nos meus sonhos mais doces,
sonhei que ela vinha até mim em um vestido esvoaçante. E agora, cruzando o
corredor, me deparo com uma realidade mais linda que qualquer sonho
projetado por minha mente. Minha Jennifer era a parte mais bonita da
realidade aqui fora.
No sorriso que estampava seus lábios puder ver a alegria que sentiu em
me ver. Acredito que dentro dela residia a mesma felicidade que a minha. A
minha garota — era assim que eu a chamava e sempre a chamaria—
caminhou até mim como uma pluma ao vento. Sua leveza, seu carisma e alegria
sempre renovaram minhas energias. Viver Jennifer era como acordar todos os
dias na primavera; era belo, colorido e poético.


Ponto de Vista de Jennifer

Eu não parava de falar com Laura desde que deixei o quarto do Resort.
Me sentia nervosa e tentava me esvaziar através das palavras que saíam
atropeladas de minha boca. Caminhei a passos largos e apressados pelo extenso
corredor vazio. Parei apenas quando escutei ruídos de saltos contra o piso.
Meus lábios se curvaram de um canto a outro com a certeza de quem
encontraria logo a frente.
Se eu pudesse registrar uma imagem para sempre em minha mente,
seria a do encontro que tive com Regina naquele andar. Era a primeira vez que
eu a via vestida naquele vestido, e posso afirmar com total certeza que ela
nunca estivera tão linda como agora.
Seus lábios vermelhos se curvaram uma vez mais para mim e me
fizeram sentir a mulher mais feliz da Terra. Amar Regina era viver com
borboletas no estômago. Era um dormir e acordar em eterno deslumbre.


No jardim, todos aguardavam ansiosamente a chegada das noivas.
Dentre as principais pessoas presentes, estavam: Kevin, Beatriz, Rose, Arthur e a
namorada, Morgana, David, amigos do trabalho de Jennifer e Regina, Carmen,
senhor Henrique, Henrique neto, Malena e seu marido, alguns amigos mais
íntimos da família, Laura e amigos de terceiros que foram trazidos pelos
convidados.
Algumas músicas tocavam em volume baixo enquanto o buffet ia sendo
servido. As duas piscinas que foram reservadas e privadas para a festa seriam
liberadas assim que o casal fizesse o pronunciamento em frente ao altar.

— Ali estão elas!— gritou o pequeno Henrique, atraindo a atenção de
muitos.
Malena caminhou até o microfone que estava localizado próximo ao
altar e anunciou para todos a chegada das noivas.

Jennifer e Regina estavam lado a lado e possuíam suas mãos unidas e os
dedos entrelaçados. Na mão livre de Jennifer havia um buquê de flores mistas,
porém, de tonalidades similares. E na mão de Regina estava Bóris apoiado
contra seu corpo. O gato estava um charme com sua gravata borboleta de
coloração branca.
O casal caminhou de mãos dadas até o local mais populoso do jardim.
Chegando lá, se soltaram e iniciaram o cumprimento aos convidados.
— Regina! Você está belíssima! E você também, Jennifer — disse
Arthur com um brilhante sorriso. — Essa daqui é Vivian, minha namorada.
— Olá, Vivian!— disse Jennifer ao cumprimentá-la.
— Muito prazer. Meu amigo Arthur andou me falando muito sobre você
— comentou a morena.
— Coisas boas, eu espero.
— As melhores!— Sorriu. — Aproveitem a festa e fiquem à vontade!
— Jennifer! Vocês estão maravilhosas!— gritou Rose, ao longe, ao
avistá-las.
— Estou sentindo vontade de casar desde o momento em que cheguei
aqui — disse ao se aproximar. — Está tudo tão lindo. A vibe está incrível!
— Obrigada!— respondeu a mais velha com um sorriso nos lábios.
— Tudo a seu tempo, Rose. Vou torcer para que uma pessoa especial
entre na sua vida.
— Depressa, por favor!— Riram. — Uma pessoa bem gata, assim com
a professora Vianna — brincou, as fazendo rirem ainda mais.

As duas mulheres quase não conseguiram chegar até o altar, pois foram
abordadas por todos os convidados que faziam questão de parabenizá-las e de
tirar uma fotografia.
Quando, enfim, atingiram o arco de flores, fizeram novamente a troca
de alianças sob românticas palavras. Elas sentiam como se estivessem casando
pela terceira vez, a contar pelo pedido em Paris, o casamento no civil e agora a
festa a céu aberto.
Após o indispensável beijo entre as noivas, todos levantaram-se dos
bancos e aplaudiram.

— Tem algumas palavras que eu gostaria de dizer — comentou Regina
ao segurar o microfone e se por de frente para os convidados. — Primeiramente
eu gostaria de agradecer a todos por estarem aqui. Cada um de vocês que
recebeu nosso convite é verdadeiramente importante pra nós. Depois de tudo o
que Jennifer e eu passamos, nos tornamos ainda mais criteriosas a respeito de
quem deixar entrar em nossas vidas.
Meireles aproximou-se da esposa com Bóris nos braços e se manteve
estacionada a seu lado.
— Sempre agradeço à vida pela oportunidade de viver algo tão bonito e
verdadeiro ao lado de uma mulher tão encantadora e magnífica quanto Jennifer.
Ela sabe o quanto a admiro, o quanto vibro com suas conquistas, e a satisfação
que tenho pela oportunidade de vê-la crescer como pessoa dia após dia.
A professora fez uma breve pausa em seu discurso, olhou para a loira
segurando Bóris, sorriu e voltou a encarar os convidados.
— Desejo com toda a verdade que há em mim que todos possam provar
uma parcela do amor. Que ele seja capaz de tornar esse mundo menos intolerante
e mais harmonioso. Um lugar onde as pessoas tenham o direito e a liberdade de
ser quem são e de viverem suas verdades. Um mundo onde as diferenças sejam
respeitadas e o sol possa nascer bonito pra toda a gente.
Regina recebeu alguns muitos aplausos vindos dos convidados e
posteriormente prosseguiu com sua fala. Jennifer, de onde estava, apenas a
olhava com admiração. A morena sempre fora melhor com as palavras, então a
deixou falar.
— Ontem, enquanto concluía os preparativos finais para a festa de hoje,
acabei redigindo um pequeno texto em um papel que estava próximo a mim.
Pela primeira vez resolvi dar um nome para algo que escrevo, e acredito que
vocês possam imaginar qual nome foi dado.— Sorriu ao olhar para Jennifer. —
Será pela primeira vez, também, que irei compartilhar um escrito com alguém
além de Jennifer. Então vamos lá.— A professora desdobrou e abriu uma folha
de papel que estava em sua mão e iniciou a leitura.

Sentada em minha sala eu assistia o passar dos meus dias como uma
espectadora que já estava acostumada com a programação. Eram dias comuns de
uma vida que oscilava entre momentos de felicidade e tristeza. Sempre fui e sou
uma totalidade. Nunca precisei de algo para me tornar suficiente. No entanto,
toda essa autossuficiência e o padrão que dei aos meus dias os tornaram mornos.
O anseio por algo que me gerasse questionamentos e me tirasse daquela zona de
conforto emocional sempre esteve presente. Foi então que minha sala adquiriu
um novo membro.
A princípio era apenas um intrigante par de olhos verde-mar que me
observavam como se estivessem à procura de algo, até então, abstrato. Eu era
recebida por ela três vezes semanais. Essas visitas despertavam a minha atenção,
me traziam questionamentos e também muitas certezas; a certeza do incerto e da
familiaridade que compartilhávamos.
Ondas loiras e esvoaçantes também me visitavam; assim como um
sorriso que me fazia acreditar que o mundo ainda podia ser bom. As visitas que
ela me fazia não se limitaram apenas a esta sala, não. Foram além do plano
físico. Quando me dei conta ela já ocupava um lugar no meu quarto, ou em
qualquer outro ambiente onde meus pensamentos trabalhassem. Foi então que o
antagonismo de sentimentos e emoções se elevou e me levou ao nível máximo
de questionamento interno; o que eu chamei de existência. E toda a insanidade
que me arrebatou a seguir me fez sentir a vida em um grau elevado, me fazendo
perceber que sair do eixo, às vezes, pode ser benéfico.
Hoje, as visitas que recebo dela sempre vêm acompanhadas de um bom
dia ou de um doce beijo antes do adormecer. O loiro esvoaçante e o sorriso ainda
são os mesmos. E seu verde-mar ainda me faz estremecer.

Quando Regina terminou de fazer a leitura do texto, muitos aplausos
foram recebidos. Jennifer, que estava ao seu lado, possuía os olhos marejados.
Ela entregou Bóris nos braços de Henrique e envolveu a morena em um beijo
terno, que lhe demonstrava todo o amor que dentro dela havia.
— Obrigada por ser quem é — murmurou contra o ouvido da mais
velha. Ambas estavam visivelmente emocionadas.

A festa deu-se início, de fato, quando todos os pronunciamentos foram
feitos. O ambiente estava regado de boa música e um buffet minuciosamente
escolhido por Regina. Meireles, vez ou outra, durante a festa, suspirou em
lamentação por perceber que seu pai não havia comparecido. De toda forma, não
permitiu que isso estragasse seu momento de felicidade.
O buquê que Jennifer carregou enquanto caminhava para o altar foi
dividido em dois e a outra metade entregue à sua esposa. Na hora de jogá-los,
um aglomerado de mulheres com idades distintas se amontoou próximo às
noivas. Por fim, Beatriz pegou o de Jennifer, e uma amiga de Morgana agarrou o
de Regina.
As duas mulheres posaram juntas para incontáveis fotos. O sol já estava
se pondo, alaranjado; proporcionando uma paisagem ainda mais deslumbrante ao
cenário. O gramado e as poucas árvores ao redor contrastavam com o bege claro
de seus vestidos e transmitiam uma sensação de pureza. Era o dia perfeito.

— Tia Regina! Vamos pra piscina!— pediu Henrique ao segurá-la e
puxá-la pela mão.
— Mas, mas eu estou de vestido e saltos!— respondeu enquanto era
puxada.
— Não tem problema. Eu estou de terno e vou pular. Vem!— Ele
insistiu.
A morena parou na borda da piscina e o observou pular na água.
— Vem! Vem!— Ele chamava.
— Precisa de uma mãozinha aí?— A voz de Jennifer soou por trás.
— Derruba ela, Jen!
— Não se atreva!— exclamou a professora ao desvencilhar-se dos
braços da loira.
— Vamos? Vai ser divertido!— pediu Meireles, na tentativa de
convencê-la.
— Pula com ela, tia Jennifer. Pula! Pula! Pula!
— Jennifer, me solta!— gritou ao ser suspensa nos braços da esposa.
Quando menos esperou, a loira se jogou com ela para dentro d’água. — Eu vou
matar vocês!
— Adoro irritar ela — cochichou o menino contra o ouvido de Jennifer.
— Já disse que você fica linda quando está brava?
— Nem adianta tentar me comprar com elogios.
— Ih, mas essa noiva está muito brava. O que eu posso fazer pra
desfazer esse seu bico, hum?— Jennifer aproximou-se sorrateiramente da mulher
e lhe jogou uma pequena quantidade de água na face.
— Oh céus, você é uma peste, Jennifer!— resmungou enquanto tentava
conter o riso.
Não demorou muito para que a expressão séria se tornasse leve e risonha.
Após longos minutos de diversão a três dentro d’água, Jennifer e Regina
foram até o quarto onde estavam hospedadas e se trocaram. Retornaram ao salão
com vestidos leves, confortáveis, e finalizaram a festa rodopiando e dançando
juntas a todos no meio do salão.

Ao cair da noite o casal já estava acomodado na suíte do segundo andar
após abrirem dezenas de presentes recebidos por lá. A iluminação estava amena
e uma música em volume baixo servia como fundo para o ambiente. No móvel
de cabeceira da cama havia uma garrafa de vinho quase vazia e duas taças pela
metade.
Regina, com seus cabelos úmidos e recentemente lavados, caminhou até
Jennifer vestindo apenas uma fina camisola branca. Ao aproximar o corpo,
depositou as mãos sobre as alças da peça e as fez descer por seus ombros. Os
gestos eram suaves e delicados. Seu olhar castanho jamais desviava dos olhos de
Jennifer. Sua camisola escorregou suavemente pelo corpo em um gesto de
oferecimento para a loira, que sorriu e a tomou para si.


Os dias que se sucederam foram repletos de amor e de novidades.
Ambas estavam aprendendo a viver uma vida a dois e a lidar com as diferenças
que se apresentavam no caminho. Dividiam não apenas a vida, mas também a
garagem. Pois Jennifer comprou uma moto a contragosto da morena, que logo
julgou o veículo muito perigoso. Agora Meireles possuía seu próprio transporte.
Todos os dias ia e voltava do serviço e da faculdade em sua moto. Regina, por
sua vez, ficava com o coração na mão enquanto ela não chegava.

Capítulo 46

Alguns meses haviam se passado na vida de todos. A barriga de
Morgana Meireles crescia na mesma proporção dos movimentos. Jennifer, assim
como Regina, sentia-se encantada cada vez que conseguia presenciar e sentir
algum desses movimentos. Todos estavam muito ansiosos para a chegada da
pequena Cecília. Sim, Jennifer teria uma irmã.
Assim como planejado há poucos meses, Regina congelou seus óvulos
para que no futuro pudesse implantar sua semente neste mundo. Ainda não
estava decidido entre elas quem engravidaria. No entanto, sabiam que um filho
seria muito bem vindo para selarem o amor que compartilhavam.

— Será que a professora Vianna aceita uma carona até em casa?
— Que surpresa agradável, meu amor — comentou ao cumprimentá-la
com um beijo em sua face, no corredor.
— Hoje não vou ter aula na faculdade, então saí do trabalho e decidi vir
te buscar.— Sorriu. — Até porque, seu carro está no conserto, então a carona
virá a calhar.
— Chegou bem na hora. Acabei de finalizar a última aula. Mas...
Vamos em sua moto?— indagou.
— Sim. Alguma objeção, senhora?
— Com exceção da parte em que acho muito perigoso você de moto por
aí, estou de saia.
— Já faz meses desde que a comprei, ainda não se acostumou? E em
relação à saia, bom, vai ser um pouco incômodo pra você subir.— Jennifer
conteve uma risada ao imaginar a cena da mulher tentando subir no veículo com
a saia social. — Mas eu te ajudo. Vamos?
Ao chegaram à área externa da instituição, Regina torceu a cara ao subir
no veículo. Embora já houvesse saído de moto com Jennifer em outras ocasiões,
ainda não estava acostumada.
— Amor, vai com cuidado — pediu após vestir o capacete, subir a saia
até as coxas, sentar e envolver a cintura da mais nova com os braços.
— Pode deixar, vou dobrar a atenção, jamais permitiria que se
machucasse. Além do mais, prezo muito pela minha vida. Ainda quero muitos
anos ao seu lado. Confia em mim, tudo bem?
— Ok.— Balançou positivamente a cabeça.
Jennifer cruzou as ruas da cidade debaixo de um intenso brilho de luar.
O clima estava agradável e o vento soprava contra as partes expostas de seu
cabelo. Ela sentia os braços da esposa envolvendo sua cintura com força e era
inevitável não sorrir para a estrada. Para Jennifer não existia nada mais
satisfatório que sentir a presença de sua mulher, principalmente aquecendo as
suas costas.
Regina se manteve tensa apenas nos primeiros minutos. Posteriormente,
permitiu-se relaxar e aproveitar a companhia da loira. Ela segurava de maneira
segura na cintura de Meireles ao mesmo tempo em que sentia o perfume que
dela emanava.
— Sente a noite, amor!— exclamou ao acelerar com a moto. Jennifer
sentia-se mais independente e aventureira cada vez que estava sobre o veículo
adquirido. E quando podia levar sua mulher consigo, a plenitude lhe preenchia.
Regina prestava atenção nas luzes da cidade e no fluxo de veículos
enquanto ouvia a doce voz de Jennifer conversando com ela. Ao mesmo tempo
em que a escutava, refletia. Refletia sobre como os seus dias haviam se
modificado. A morena sorria internamente com a gostosa sensação de aconchego
ao lembrar-se que todos os dias as suas noites seriam finalizadas com a
prazerosa companhia de Jennifer.
Há poucos meses ela passou a ter um alguém a esperar por ela além de
Bóris. Suas noites já não se resumiam a chá de maçã com canela e provas para
corrigir. Agora havia uma tigela de cereal ao lado de sua xícara. Seus saltos
ganharam a companhia de pares de tênis e suas bolsas eram penduradas ao lado
de luvas de boxe. A singularidade de cada uma se encontrava e se entrelaçava
em cada canto da casa. E era dessa maneira que elas torciam e desejavam que
suas vidas sempre fossem: entrelaços.
À noite, em algum canto sobre a cama, os óculos de Regina se
enroscavam entre os fones de ouvido de Jennifer, assim como suas pernas entre
as dela debaixo dos lençóis quando se buscavam para uma noite de amor, ou
para um simples aconchego.


Eu poderia dizer que era um domingo qualquer, no entanto, para
Jennifer e Regina os dias nunca eram chamados dessa forma. Após toda a
turbulência que precisaram enfrentar, os dias juntas eram sempre denominados
de dádivas.
Sentadas de pernas cruzadas no chão da sala, a professora terminava de
cantarolar She Will Be Loved em seu violão adquirido há poucas semanas. A
loira sempre pedia para que ela cantasse esta canção desde o dia em que o fez
pela primeira vez. E assim Regina fazia, em uma espécie de tributo para
Jennifer.
— O quê é felicidade pra você?— perguntou após ouvi-la tocar.
A morena, por sua vez, apoiou o violão contra uma parede próxima e
direcionou a atenção para a garota.
— A junção de momentos de alegria.— Ela respondeu. — Sou feliz
quando meus pais telefonam e dizem que estão com saudades. Sinto felicidade,
também, quando Bóris se roça entre minhas pernas, ou quando Henrique me
abraça e diz de maneira honesta e sincera, como toda criança, o quanto gosta de
ser meu sobrinho. Vivenciar momentos como esses fazem de mim uma pessoa
feliz. Não preciso ir longe pra reconhecer isso. Gosto e valorizo muito o que a
maioria das pessoas deixa passar. Enquanto algumas pessoas te olham e dizem
que você tem um belo sorriso, por exemplo, eu reparo na maneira como seus
olhos se curvam e ficam bem pequenos quando você sorri. Isso me encanta e me
faz feliz.
Meireles sorriu timidamente e desviou o olhar por breves instantes.
Mesmo após anos, ainda sentia um pouco de vergonha quando a morena a
elogiava.
— O quanto você me ama?— perguntou ao voltar a encarar a mulher.
— O suficiente pra sorrir involuntariamente ao pensar em você no meio
de uma explicação sobre a segunda guerra mundial.
— Oh, não acredito! Você fez isso?— Riu.
— Sim! Aconteceu essa semana. Estava explicando a matéria para
minha classe, mas no mesmo instante lembrei de você. Por um momento te
visualizei ocupando uma daquelas cadeiras como há dois anos. Você sempre
estava tão quieta e compenetrada nas suas atividades... Me senti nostálgica.—
Suspirou. — Lembrei de te avistar mexendo incessantemente os pés em dias de
prova. Você sempre usava um tênis all star vermelho.
— Você reparava nisso?
— Eu reparava e continuo prestando atenção em cada detalhe seu, Jen.
E assim como antes, ainda vibro por cada conquista sua. Seja esta no boxe, em
mais um semestre concluído da faculdade, ou quando consegue passar naquela
fase difícil de um jogo em seu celular.
— Eu me pergunto todos os dias se você é real. Eu sinto muito medo de
acordar e descobrir que você não passou de um sonho. Medo de abrir os olhos e
perceber que eu apenas estava tirando um cochilo na mesa da escola e sonhando
com a professora gostosa de história.
— Professora gostosa? Onde está seu respeito, senhora?— brincou ao
fingir indignação.
— Culpada!— Ergueu as mãos para o alto. — Mas realmente sempre te
achei muito gostosa.— Meireles modificou o semblante e o tornou provocativo.
— Esse seu charme natural enlouquece qualquer pessoa.— Jennifer inclinou-se
de modo a conseguir murmurar frases contra o ouvido da mulher.
— É? Mas eu não tenho a menor intenção de enlouquecer alguém além
de você — rebateu com sensualidade na voz. A atração existente entre elas
permanecia forte e incontrolável como se nunca tivessem se tocado.
— Eu sei...— disse em um murmúrio arrastado. — E você sabe
exatamente como enlouquecer essa garota aqui. Tem um lado seu que apenas eu
conheço. Um lado que me faz gritar enquanto te sinto entre as minhas pernas.—
Esse foi o último murmúrio da jovem antes de se posicionar sobre o colo de sua
mulher.
— Oh porra, Jennifer...
Regina, em um reflexo, percorreu as mãos pelas coxas expostas de sua
esposa enquanto a sentia se acomodar em seu colo. Meireles usava apenas
calcinha e uma grande blusa de algodão. A mais velha muito apreciava vê-la em
trajes tão confortáveis em casa.
— Seu cheiro... — murmurou Jennifer ao esfregar o rosto na lateral do
pescoço da mulher. Uma de suas mãos invadiu o tecido da camiseta de Regina e
começou a trabalhar sobre os seios. Meireles o massageava e apertava com
firmeza.
— Me leva para cama.— Regina sussurrou sensualmente em um
pedido.
Jennifer deslizou para fora do colo e a tomou em seus braços; soltando-
a posteriormente contra o colchão e automaticamente se deitando sobre ela. As
pernas da morena se abriram para que Jennifer se encaixasse ali e em seguida as
fechou na cintura da jovem.
Sem precisar tirar a roupa da mais velha, a loira deslizou a mão entre
seus corpos até alcançar o short e depois a calcinha. Não demorou muito para
que ela começasse a arrancar baixos gemidos de Regina.
— Você tem acabado comigo aos domingos.— Ela comentou. — Às
segundas acordo a muito custo pra dar minhas aulas. Não que eu esteja
reclamando.
— Eu tenho muita energia pra gastar com você.
— Oh, eu sei... E muita força também. Eu me desfaço facilmente nos
seus braços.
— E você adora isso.— Jennifer mordeu sensualmente o queixo de
Regina e avançou um pouco mais com as carícias entre as pernas da mulher.

As mãos da morena percorreram as costas de Jennifer por dentro da
blusa e as unhas foram fincadas na pele conforme o prazer aumentava. Foi uma
entrega rápida ao fim daquela tarde de domingo..


Os dias, as semanas e os meses pareciam passar mais rápido para elas
que para as outras pessoas. Talvez esse fosse o preço de ser feliz. O tempo voa
quando estamos distraídos sorrindo e valorizando o presente momento.

Todos estavam encantados com a chegada da pequena Cecília. Morgana
havia tido um parto com pequenas complicações, porém, nada que apresentasse
risco para ela ou para o bebê. Cecília muito se assemelhava à Jennifer quando a
mesma era recém nascida.

— Quem é a coisinha mais linda da maninha Jen, hum? Quem é? Quem
é?— Meireles estava sentada no chão, encostada na parede, com Cecília apoiada
contra suas coxas unidas. Ela a segurava e dialogava com toda a ternura que
dentro dela havia. Era a primeira vez que Jennifer havia tido a oportunidade de
ter algum contato maior com um bebê.
O coração de Regina se aqueceu ao presenciar a cena. Um sorriso não
deixava seus lábios. Para ela, aquele contato entre as duas irmãs merecia um
registro. Sendo assim, sem que a loira percebesse, as fotografou com a câmera
do celular.
— Você daria uma ótima mãe — comentou ao se aproximar e sorrir.
— Você estava aí?
— Sim, há algum tempo.
— Ela não é a coisa mais linda desse mundo, meu amor?— perguntou
ao levantar-se e oferecer Cecília para que a esposa a tomasse no colo.
— Ela é, sim.— Regina envolveu o bebê em seus braços e usou uma
voz de criança para se referir à ela. — Cadê a Cecília? Cadê a Cecília?— dizia
enquanto levava a ponta do dedo indicador ao nariz do bebê.
— Você também daria uma ótima mãe.— Sorriu.
— Será que dou conta de trocar tantas fraldas? E se nosso filho chorar
no meio da noite e eu não souber o que significa?
— Você aprenderá — disse Morgana ao entrar no quarto e ouvir a parte
final da conversa. — Aprenderão juntos: você, Jennifer e o bebê. Apenas a
experiência do convívio diário trará o conhecimento. Quando tive a Jen me
desesperei muitas vezes em diversas situações. É normal.
— Você tem razão...
— Agora vamos tomar um banho, meu amor? — disse Morgana ao se
direcionar à filha caçula.
— Se importaria se eu o desse? Você sabe... Já quero ir treinando —
perguntou a professora.
— De forma alguma, claro que pode. Vou supervisionar pra ir te dando
umas dicas.
— Certo! — Sorriu.

Os meses continuaram passando na vida de todos. Cecília crescia forte e
saudável. Seus cachos loiros, coloração herdada do pai, começaram a crescer em
sua cabeça. A cada dia se parecia mais com sua irmã.
Jennifer seguia colecionando vitórias em seus campeonatos de boxe e
em seus semestres concluídos na faculdade. No tempo livre, começou a ter aulas
de espanhol com Regina em casa. Por gostar tanto do idioma, possuía facilidade
em aprendê-lo.

Quando a vida de casada estava completamente estabilizada, Regina
começou a fazer mestrado em História. Ao término do curso, largou uma das
escolas de ensino médio onde lecionava e começou a trabalhar em uma
faculdade.

Além de conquistas, os anos trouxeram para elas novos sonhos e novas
vontades. Jennifer concluiu a faculdade de educação física e começou a trabalhar
em um clube esportivo, atuando na preparação física de atletas a fim de
promover um bom condicionamento físico e prevenir possíveis lesões.
Quando sua vida profissional estava estabilizada, ela e Regina tiveram
muitas conversas a respeito de aumentar a família. Foi então que Jennifer
começou um tratamento para engravidar. Meireles seria inseminada e fertilizada
com os óvulos congelados por Regina há cinco anos.
Vários fatores levaram as duas mulheres a tomarem essa decisão. O
primeiro deles se deu ao fato de Jennifer ser quinze anos mais nova que a esposa.
E o segundo, o mais determinante para que Meireles fosse a escolhida para
engravidar, foi o fato de os óvulos serem de Regina. Julgaram que seria mais
bonito, emocionante e compartilhado se Jennifer levasse a gestação.

Atualmente Jennifer Meireles estava com vinte e cinco anos e Regina
com quarenta. Henrique já era um lindo rapaz de dezesseis anos e Cecília era
uma linda garotinha de cinco que falava pelos cotovelos. Bóris, o gato do casal,
atingiu seus onze anos de vida. Estava mais preguiçoso e comilão a cada dia.

Faltava aproximadamente um mês para o natal quando Jennifer e
Regina receberam uma ligação que mudaria suas vidas para sempre. Se
arrumaram às pressas, entraram no carro e se dirigiram para a clínica médica.
No consultório gelado, ambas seguravam na mão um da outra em um
gesto de cuidado e preocupação. O amor que compartilhavam permanecia o
mesmo de há sete anos. Se não, maior e mais bonito. Pois agora as raízes já
haviam se espalhado. O carinho e a atenção sempre permaneceram mútuos.

— Parabéns, senhora Jennifer. Você está grávida!

Aquelas seis palavras vindas do médico ecoaram pela sala, pelos
ouvidos e pela mente de ambas as mulheres. As duas se mantiveram caladas por
longos instantes enquanto tentavam processar a informação. Elas se olhavam
extasiadas como se ainda não acreditassem no que estava acontecendo. Dentre os
dez óvulos congelados, um havia vingado. Apenas um. Elas não podiam estar
mais felizes como agora. Jennifer Meireles Vianna carregava em seu ventre o
filho de seu grande amor.
Os dias que se sucederam após a confirmação da gravidez foram
repletos de nervosismo, alegria e muita euforia. Se dedicaram a construir o
quarto da criança e a preparar todo o enxoval.

No início da gravidez de Jennifer, Bóris foi diagnosticado com
problema renal. A notícia foi um golpe para elas, principalmente para Regina,
que carregava todo o amor do mundo pelo felino. Bóris precisou de cuidados
especiais em casa e adquiriu uma rotina de ir mensalmente ao veterinário para
verificar o funcionamento de seus ruins. Em alguns dias ele se mostrava vívido e
com energia. Mas em outros se encontrava bastante prostrado.
Todos os dias Regina olhava para ele e pedia para que a vida lhe desse
tempo. Tempo para que Bóris sobrevivesse até o nascimento de seu filho. Tempo
para que a criança pudesse conhecer aquela bola de pêlos que por tantos anos
trouxera alegria à sua casa.

— Amor! Amor!— gritou Jennifer. — Vem aqui, sente isso!—
Meireles chamou por Regina às pressas e a fez por a mão em sua barriga. O bebê
havia dado os seus primeiros sinais.
Os olhos de Regina diziam tudo o que seus lábios não conseguiam
expressar naquele instante. Era um momento único em sua vida. Seus castanhos
transbordavam.
— Oi, meu amor — disse a professora em um suave tom de voz ao
conversar com a barriga. — Sabia que você já é imensamente amado? Eu e sua
outra mamãe estamos loucas para que você saia e venha nos conhecer.
Queremos muito saber como é seu rostinho e cada pequena parte do seu corpo.
Mas espera um pouco, tá bem? Ainda temos alguns meses pela frente.


Jennifer estava grávida de um menino. Todas as noites do casal se
resumiram a tecer planos e tentar chegar a uma opinião em conjunto para a
decisão do nome. Regina passava horas a fio acariciando e beijando a barriga de
Jennifer. Ela também gostava de escrever e desenhar corações com batom
vermelho sobre ela.
— Você conseguiu ficar ainda mais bonita grávida, meu amor.
— Oh Regina... Só você pra achar isso. Estou com os pés inchados e
acabei adquirindo um pouco de estria no quadril.
— Permanece linda pra mim. A grávida mais linda de todas, eu diria.
Você está com um novo brilho no olhar.
— Deve ser o amor. — Sorriram.

Mensalmente, Jennifer fazia um ensaio fotográfico da sua gestação.
Tanto ela quanto Regina queriam que cada fase desse momento fosse
devidamente registrada.
Todas as noites após o banho, a loira tirava sua roupa e se admirava na
frente do longo espelho vertical que havia no quarto. Ela se posicionava de lado
de modo a observar o crescimento constante de sua barriga com o passar dos
meses.
Meireles não teve enjoos. Mas, em contrapartida, seus desejos por
comidas distintas eram constantes. Quase todas as noites ela fazia a esposa
atravessar o bairro para lhe trazer algo específico.
As duas mamães conversavam regularmente com a barriga e cantavam
lindas canções para o bebê. Antes de deitar, Regina sempre hidratava a barriga
de Jennifer com uma loção de camomila. Era um momento único entre os três:
elas e o filho, que mesmo antes de nascer, já era imensamente amado.
A jovem teve um pequeno sangramento no meio da gravidez. Tal
acontecimento fez o coração de Regina quase sair pela boca. Meireles foi levada
às pressas para o hospital e recebeu algumas restrições médicas. Precisaria ficar
em repouso até o final da gestação para evitar alguma possível complicação.

— Está tudo bem, meu amor — disse com calmaria na voz ao segurar a
mão da professora, que se localizava sentada na beirada da cama. — Nós somos
fortes. Ele e eu.
— Desculpe... Mas eu fiquei muito assustada. Eu não posso perdê-lo.
Sequer consigo imaginar uma possibilidade dessas.
— Oh meu amor, nós não iremos perdê-lo. Nosso garoto está aqui firme
e forte graças aos seus cuidados conosco. Ele é muito grato por você ter nos
socorrido.
— Oh Jen... Não fala com essa voz doce, que eu me desmancho. Ando
muito sensível. Até parece que quem está com os hormônios modificados sou eu.
— Estamos nessa juntas.— Sorriu.
— Ontem no meu horário livre do trabalho resolvi visitar algumas lojas.
Olha só o que eu encontrei!
Regina caminhou até a cômoda do quarto e retornou de lá com um
embrulho. Ao abri-lo, revelou um pequeno macacão felpudo azul bebê com uma
pequena estampa de urso. Ela também havia comprado um par de sapatinhos.
— Ai, meu Deus. Que coisinha mais linda!— disse Jennifer ao segurar
as peças em sua mão. — Já sou capaz de ver os pequenos pezinhos dele dentro
desse calçado.
— E eu consigo imaginá-lo deitado entre nós, vestido com essa roupa.
— Sorriu.
— Como será que ele vai ser? Espero que tenha os seus olhos que eu
tanto amo.
Jennifer e Regina haviam escolhido um doador anônimo. No entanto,
optaram por um homem com as características físicas semelhantes às de Jennifer
para que a criança fosse o mais próxima possível da junção física das duas.
— Eu gostaria que ele tivesse seus cachinhos dourados, já que
infelizmente não posso escolher seu sorriso.
— E se ele vier com o seu sorriso?— A jovem indagou. — Acho que
meu coração não suportaria olhar para ele e ver seu sorriso estampado ali. É
demais pra mim, Regina.
A mais velha sorriu e acariciou delicadamente a face de Jennifer com as
costas de sua mão.
— Seu coração é forte. Sei que aguenta.— Piscou.
— Você ainda me mata.— Riu. — Amor...
— Sim?
— Está me dando uma louca vontade de comer aquele carbonara
trufado igual ao que sua mãe faz.
— Oh céus, Jennifer! Não tinha um desejo mais fácil de ser realizado?
O único restaurante italiano fica a três bairros daqui.
— Não é culpa minha. Nosso filho é quem está pedindo — disse ao dar
de ombros.
— Aham, sei...— Olhou torto. — Vou tentar encontrar os ingredientes
no supermercado para eu mesma preparar.
— Obrigada! Amamos você.— Sorriu abertamente.
— Eu também amo vocês.


O calendário marcava 20 de agosto. Oficialmente, era o aniversário de
quarenta e um anos de Regina. Sete anos atrás ela comemorava essa data na
companhia dos pais e alguns poucos familiares e amigos em Florença, na Itália.
Há sete anos, nessa mesma data, sentia-se triste e com saudades de sua menina.
Tentava abafar qualquer emoção e sentimento ruim através da ilusão
momentânea dos cigarros.
Hoje, a realidade de Regina era completamente outra. Além de ter a sua
garota, sua eterna garota, um menino também estava prestes a entrar em sua
vida. Heitor — era assim que elas já o chamavam — seria o seu menino de ouro.

— Como vai a minha grávida favorita?— perguntou Beatriz assim que
chegou na pequena comemoração ao aniversário de Regina.
— Um pouco cansada, mas nunca estive melhor!— Sorriu.
Beatriz e Kevin acariciaram a barriga da amiga e em seguida
parabenizaram Regina pelo aniversário e pela gravidez de Jennifer. Os dois já
estavam morando juntos há três anos e também planejavam uma criança para
muito em breve.
Arthur e sua namorada também estavam presentes, assim como Laura,
prima de Regina, que resolveu passar alguns meses no país por motivo de
estudos.
— Eu disse que ainda faria um filho em Jennifer, não disse?—
comentou com Laura.
— Nunca duvidei!— Riu. — Feliz aniversário, prima.— A ruiva a
abraçou carinhosamente e depositou um beijo carinhoso em seu rosto.
— Titia Gina, feliz versário!— disse Cecília ao se aproximar correndo
da morena. Ela carregava um pequeno embrulho entre suas pequenas mãos.
— Oh, meu amor. Muito obrigada! Vem aqui pra tia dar um beijo em
você.— Regina pegou a filha de Morgana em seus braços e a beijou
carinhosamente na testa. — Sabia que você se parece muito com sua irmã?— A
menina balançou a cabeça negativamente. — Depois vou te mostrar umas fotos
da Jennifer quando tinha cinco aninhos iguais a você. Vai querer ver?
— Sim!— respondeu animada.
— Então está combinado entre nós — piscou.
— Tia...— Uma voz masculina ecoou pela sala decorada por balões.
Cada detalhe da festa foi escolhido e organizado por Meireles.
— Oi Henrique!— A morena respondeu animada ao vê-lo.
O garoto cumprimentou a tia, lhe desejou um feliz aniversário e lhe
apresentou a menina que estava ao seu lado.
— Essa é a Mirella, minha namorada.
Os olhos castanhos nunca se arregalaram tanto. Como assim o seu
menino já estava namorando? Ela se perguntava sobre quando Henrique havia
crescido tanto sem que ela se desse conta.
— Prazer, Mirella. Me chamo Regina. Sou tia de Henrique.— Com uma
pontada de ciúme, a morena esticou a mão e cumprimentou a jovem à sua frente.
Mirella era dois anos mais nova que Henrique, possuía apenas quatorze anos. —
Divirtam-se!— disse, por fim.
Ao se afastar do casal, Regina caminhou às pressas até onde Jennifer
estava.
— Você não vai acreditar!— A morena se aproximou da mais nova com
a mão na cintura.
— O quê aconteceu?
— Henrique!
— O que tem ele?— perguntou confusa.
— Acabou de me aparecer com uma garota!— disse indignada.
— E qual o problema, amor?
— Como assim qual o problema? Ele é muito novo pra estar namorando
— reclamou.
— Então quer dizer que você aos dezesseis anos não pensava nessas
coisas? Sei...
— Jennifer segurava-se para não rir das expressões que a esposa
esboçava. Ela sabia que toda aquela birra da mulher era ciúmes por perceber que
seu garotinho havia crescido.
— É diferente. Henrique ainda não tem a maturidade necessária.
— Oh, meu Deus... Que tia mais ciumenta! Quero só ver quando for a
vez do nosso filho.
— O quê?— exclamou. — Você nem brinca com isso, Jennifer. Nosso
garotinho vai demorar muito a crescer. Eu conto com isso.— A última frase foi
murmurada mais pra si que para a loira.
— Ok. Vamos deixar pra nos preocuparmos quando ele nascer.— A
mais nova soltou uma baixa risada e depositou um beijo nos lábios da esposa. —
Ei, mas o quê é isso aqui— comentou ao avistar algo entre os fios castanhos de
Regina. — Sinto lhe informar, mas se trata de um fio branco! É... Acho que a
idade chegou pra você — implicou.
— Para de tentar me enganar. Sabe que já não caio nessa.
— É verdade! Dessa vez estou falando sério. Nasceu um fio branco bem
aqui — disse ao apontar para ele. Dessa vez a loira dizia a verdade.
— Eu só acredito vendo.
— Então veja!— Jennifer puxou a esposa pela mão e a levou ao espelho
que havia na parede da sala. — Viu? Está bem aqui.
— Não acredito. Não, não, não — retrucou enquanto mexia no fio. —
Que atrevido! Ainda sou nova pra receber essa visita.
— Agora eu tenho um verdadeiro motivo pra te chamar de velha —
implicou novamente. A loira se segurava para não rir da cara de Regina.
— Amanhã mesmo darei um jeito nisso.
— Ah, para... Deixa ele aí. Prometo amá-lo, assim como amarei cada
ruguinha que aparecer em seu rosto.— Meireles depositou as mãos nas laterais
da face da morena e a beijou carinhosamente na testa.

Algum tempo depois, todos se reuniram em volta da mesa para cantar
parabéns. Regina partiu o bolo e ofereceu o primeiro pedaço para Jennifer.
— Obrigada por carregar nosso filho — murmurou contra o ouvido da
mais nova antes de beijá-la delicadamente nos lábios.

O final da festa foi regado de boa conversa e de muito carinho
direcionado à grávida. Todos a paparicavam e queriam tocar em sua barriga que
já estava de nove meses.
Regina recebeu muitos presentes naquela noite. No entanto, o maior
presente daquele vinte de agosto ainda estava por vir. O nascimento do pequeno
Heitor estava programado para daqui a uma semana, mas, parece que o pequeno
resolveu se adiantar. A bolsa de Jennifer estourou no meio da festa e ela
começou a entrar em trabalho de parto. Regina, Morgana e Diogo a puseram no
carro e correram para o hospital. As cólicas e contrações estavam intensas.

— Peço que todos aguardem na sala de espera, por favor — pediu a
enfermeira.
— Eu sou a mãe do bebê. Quero estar junto quando ele chegar.
— Ok. Então venha comigo para a área de preparação. Deixe os
pertences aqui fora.
Regina seguiu todas as normas necessárias e entrou na sala de parto.
Chegando lá, se posicionou ao lado de Jennifer e a segurou na mão. A morena
tentava tranquilizar e incentivar a esposa durante todo o processo.
— Eu não vou conseguir. Eu não vou conseguir. — Jennifer dizia. Seu
rosto e seus cabelos estavam úmidos de suor devido ao esforço físico para
expelir a criança.
— Força, senhora Meireles. Força!— Um dos auxiliares médicos dizia.
— Você vai conseguir, meu amor. Eu estou aqui com você.— Regina
falava com suavidade e doçura na voz. A todo tempo se mostrava serena e
segura.
Jennifer fazia força e gritava ao mesmo tempo em que apertava a mão
da esposa. A loira estava ofegante e sentia muita dor.
— A dilatação está perfeita. Vamos, mamãe Jennifer. Você consegue!
Você consegue!— disse o médico, incentivando-a.
— Eu não estou conseguindo!— comentou ao sentir que suas forças
estavam se esgotando. Meireles apertou a mão de Regina com ainda mais força e
começou a arfar.
— Você consegue, meu amor. Não há nada que não possa fazer — disse
carinhosamente ao buscar o olhar da jovem, que correspondeu ao seu. — Força,
Jen. Traga o nosso filho pra nós.



Capítulo 47

Algum tempo depois, os gritos de Jennifer deram lugar a um pequeno
choro infantil. Após aproximadamente uma hora de esforço, nervosismo, dor e
tensão, o pequeno Heitor Meireles Vianna chegou ao mundo.
Deitada sobre a cama, Jennifer mal podia esperar para tomar o filho nos
braços e olhá-lo pela primeira vez. Ela estava embarcada em um choro forte e
emocionado, assim como sua esposa. Heitor veio ao mundo pesando três quilos e
medindo cinquenta centímetros.
Quando o cordão que o ligava à mãe foi rompido, os enfermeiros
limparam-no superficialmente e depositaram-no sobre o peito de Jennifer.
Agora, outro cordão os ligaria daqui para frente: o amor. Nesse momento,
Meireles compartilhava o contato pele a pele com seu filho após tê-lo carregado
por tantos meses dentro de si.
As duas mulheres não conseguiam conter a emoção. Riam e choravam
enquanto olhavam para a face do filho pela primeira vez.

— Olha essa mãozinha, tão pequena — comentou Jennifer ao tocá-lo.
— Meus olhos nunca avistaram algo tão belo.
Regina estava encantada com o que via. Ela alternava entre fazer
carícias nos cabelos de Jennifer e deslizar a ponta do polegar pelas bochechas de
Heitor. Constantemente precisava secar as lágrimas de felicidade que teimavam
em escorrer.
— Obrigada por ele, meu amor. Obrigada, obrigada, obrigada!— A
mais velha enchia a face da esposa com beijos enquanto a agradecia.
Meireles aqueceu o filho contra seu corpo e lhe ofereceu o primeiro
amamento. O menino, aconchegado em sua mãe, iniciou sua primeira sucção de
leite. Nesse momento ficou impossível dizer qual das duas mães era a mais
emotiva.
Algum tempo depois Heitor precisou ser levado para que as avaliações
de saúde necessárias pudessem ser feitas. Logo após, lhe foi dado um banho e
em seguida o direcionaram para a ala dos recém nascidos.
Regina se dirigiu com Morgana, Diogo e Malena para próximo ao
berçário. Todos observavam o bebê por trás de uma parede de vidro. O coração
de avó de Morgana estava aquecido. A imagem angelical de Heitor preenchia
seu peito de luz e de paz.

Quando o pequeno Heitor retornou para suas mães, foi a vez dos outros
familiares terem seu primeiro contato com ele. Morgana ficou em lágrimas ao
segurar o neto pela primeira vez. Com Malena não aconteceu muito diferente, a
ruiva emocionou-se com o sobrinho em seus braços.


A saúde de Bóris estava estabilizada. Seguindo a risca o tratamento com
fluidoterapia, medicações e os cuidados diários, a veterinária assegurou que o
bichano ainda teria alguns bons anos de vida.
Quando o casal finalmente pôde ir para casa com o filho, a primeira
atitude de Regina foi apresentar Bóris a ele. O gato sentiu-se cativado pelo bebê
desde o primeiro instante. Era como se ele sentisse a importância do menino para
suas donas.
— Eu passaria horas olhando para ele sem me cansar — comentou
Jennifer enquanto o amamentava . A loira estava sentada na poltrona que havia
no quarto do bebê.
— E eu passaria uma vida admirando a cumplicidade que vocês já
compartilham.
— Regina sorria feito boba ao acariciar mãe e filho. — Eu estou tão feliz,
Jen... Tão feliz! Está transbordando do meu peito e me tirando o ar.
— Eu me sinto da mesma forma. Nunca imaginei que um sentimento
tão puro e grandioso pudesse existir. Morreria por ele sem questionar, se assim
fosse necessário.
Quando a mais nova terminou de alimentá-lo, foi a vez de Regina
colocá-lo para arrotar. Feito isso, o aninhou em seus braços e o acalentou até que
o sono lhe arrebatasse. Próximo ao berço de Heitor havia uma cômoda com uma
babá eletrônica. A ideia surgiu da professora. A morena não dormiria tranquila
se não soubesse que está tudo bem com seu filho no decorrer de todas as noites.
— Parece um anjo...— disse Regina ao observá-lo em um sono
profundo.
— E eu acredito que ele seja...

Jennifer ganhou alguns meses de licença à maternidade, enquanto
Regina ganhou uma semana em casa. E nesta primeira semana de vida do recém
nascido, Carmen e o marido desembarcaram no país para conhecê-lo.

— Eu não sei se meu coração de avó suporta emoções tão grandiosas
como essa. Me lembro de quando Henrique nasceu. Senti algo tão forte dentro
de mim, que pensei não ser forte o suficiente para aguentar.
— Aguenta sim, mãe.— Malena se pronunciou. — Seu coração é forte
o suficiente até pra ver os filhos de Henrique quando ele os tiver.
— Ei! Eu ainda sou muito novo pra isso!— O garoto se manifestou na
sala. Todos estavam reunidos na casa do casal.
— Eu concordo! Henrique que não pense em ter filho nos próximos
quinze anos!— disse Regina, sempre ciumenta quando o assunto era seu
sobrinho.
— Vocês não acham que o Heitor se assemelha à Regina quando
nasceu?— comentou o pai da professora.
— Eu também notei a semelhança — Carmen concordou.
Heitor possuía a pele branca igual a de Jennifer, mas seus cabelos eram
castanhos assim como os de Regina. Seus olhos eram vívidos, vibrantes e ainda
possuíam uma coloração acinzentada. No entanto, tudo indicava que seriam
claros. Todos juravam que já conseguiam ver pequenos traços da professora na
face do pequeno.
Os avós de Heitor trouxeram muitas roupas, acessórios e brinquedos da
Itália. O quarto do menino já não possuía lugar para guardar tanta coisa. As mais
novas mamães, antes mesmo dele nascer, haviam feito um grande enxoval. Sem
mencionar todos os presentes ganhados ao longo dos nove meses.
— Vem para prima Laura, meu amor.
— Cuidado com meu filho, hein?— retrucou a morena. Ela dizia a
mesma frase para todos que o pegassem no colo.
Regina, diferente de Jennifer, era uma mãe cheia de paranóias. Seus
cuidados com Heitor ultrapassavam o limite do necessário. Além de coruja, era
uma leoa.

As noites do casal se resumiram a trocar fraldas, alimentar a criança e
babar sobre ela. Regina fazia questão de levantar-se todas as madrugadas com a
esposa para lhe dar suporte enquanto a via amamentar o menino. As duas
mulheres eram igualmente presentes no crescimento de Heitor.

— Eu não acredito em destino — disse Regina, aleatoriamente.
Era um início de noite comum. Ela, Jennifer e o bebê estavam deitados
juntos sobre a cama do casal. Elas mantinham esse ritual todas as noites quando
a professora chegava do trabalho. Passavam horas a fio admirando e acariciando
o menino entre elas.
— Mas quando olho para vocês, sinto que minha realidade não podia
ser diferente. É como se minha vida tivesse tomado o rumo que deveria.
— Também não acredito em destino. Não gosto de me prender a essa
limitação. Mas desde que te conheci, senti algo diferente. Foi uma conexão
instantânea.
— É curioso, não é?
— Sim. Mas sempre foi uma delícia te viver.— Sorriu.
— Acho que tem mais alguém querendo se juntar a nós — comentou ao
escutar Bóris saltando sobre a maçaneta da porta.
A professora saiu da cama por alguns segundos e deixou que o gato
entrasse e deitasse junto a eles. Bóris muito apreciava tirar sonecas ao lado de
Heitor no início de todas as tardes. Era como se um velasse pelo sono do outro.
— Que cheiro é esse?
— Ah não! De novo, filho?— A loira retrucou. — É a sua vez de trocar
a fralda, Regina. Pode ir! Senão vamos todos morrer com esse fedor.
— É, garotão... Acho que sobrou para mim dessa vez.— Riu ao
suspendê-lo e levá-lo para o fraldário de parede. — Oh céus, como pode uma
coisinha tão pequena fazer algo tão fedorento?— comentava sozinha enquanto o
limpava. Ela quase podia jurar que ele ria ao observá-la.

Todos os primeiros meses de vida foram devidamente registrados.
Mensalmente as duas mulheres contratavam fotógrafos para capturarem lindas
imagens do bebê.

No aniversário de um ano de seu filho, Jennifer e Regina se vestiram de
Minnie e fantasiaram-no de Mickey. As íris dos olhos de Heitor atingiram uma
coloração verde-mar semelhante à de Meireles. Seus cabelos castanhos estavam
sutilmente ondulados, e seu sorriso era quase idêntico ao de sua mãe Regina. O
coração de Jennifer se aquecia cada vez que ele sorria para ela.
A casa onde o casal residia ganhou novos sons. O gargalhar de Heitor se
espalhava pelo ambiente e se entrelaçava com os barulhos que ele fazia com seus
brinquedos.
As duas mulheres vibravam mês a mês com as conquistas do filho.
Sejam estas, seu primeiro dentinho, suas primeiras engatinhadas, ou suas
primeiras palavras balbuciadas. Com um ano Heitor já dava seus primeiros
passos sozinho, ainda um pouco desengonçado e tombando pelo caminho.
Há poucos meses, no meio de uma refeição, com a cara toda suja de
papinha, Heitor disse sua primeira palavra e não parou mais. Ele repetia
“mamãe” ao mesmo tempo em que sacudia e batia suas pequenas mãos na
cadeirinha.
As duas mulheres faziam questão de registrar o desenvolvimento e as
aventuras diárias do menino. Heitor estava crescendo em um lar que
transbordava amor e respeito. Respeito pela vida, pelas diferenças e pela
individualidade de cada um.

— Definitivamente não consigo acompanhar o seu ritmo!— comentou


Regina. A morena treinava boxe com o auxílio e a instrução de Meireles todos
os finais de semana.
— Oh, desculpe! Acho que peguei um pouco pesado com você hoje.—
Riu.
— Você acha?— Riu ironicamente em resposta. — Tenha em mente
que não quero me tornar uma profissional igual a você. Apenas quero manter
meu corpo em boa forma.
— Em excelente forma, eu diria — comentou ao olhar a mulher de cima
a baixo.
— Você é uma boba, Jen.
— Sim, por você.— Sorriu, aquele sorriso aberto e imensamente
apaixonado.
Ao término do treino, alimentaram-se com um shake diet e deixaram a
academia.

Um céu aberto cobria toda a cidade naquele sábado. Visto isso,
decidiram aproveitar o início de tarde no parque. Ambas, ao deixarem a
academia, passaram na casa de Morgana para buscar Heitor, que passou a manhã
brincando com Cecília. O filho do casal já estava no auge de seus três anos de
idade.
Heitor era um menino repleto de energia. Ele espalhava seus brinquedos
pela casa e tentava contar histórias com eles. Todas as noites, antes de dormir,
compartilhava um agradável momento literário com suas mães. Vez era Jennifer,
vez era Regina que lia algumas livros infantis para fazê-lo dormir.
Aos três anos ele já começava a formar pequenos traços de sua
identidade. Aproveitando-se dessa fase, suas mães faziam questão de ensiná-lo a
respeitar as diferenças. Ambas lhe davam uma educação livre de preconceitos.
Heitor já sabia distinguir muitas cores, contar até dez e dizer algumas
poucas palavras em espanhol. Ele adorava desenhar, colorir e brincar de lutinha
com sua mãe Jennifer. Regina fazia questão de comprar brinquedos que
estimulassem o desenvolvimento cognitivo e motor do filho, e não havia um dia
em que ela não dedicasse um momento às brincadeiras.

— Você lembra a primeira vez em que estivemos aqui?— comentou a
loira, referindo-se ao dia em que elas fizeram um passeio no parque antes de
romperem.
— Como esquecer? Foi um dia lindo e melancólico.
— Lembra da criança que vimos brincando com os pais na grama?
Naquele dia não tínhamos ideia de que aquela seria a nossa realidade futura.
— Verdade. A vida pode nos surpreender — comentou ao observar
Heitor se juntar à outra criança sobre o gramado. O menino possuía facilidade
em fazer amigos.
— E quando te fiz comer algodão doce da maneira correta?
— Maneira correta?— exclamou ao arregalar os olhos. — Você quase
me causou uma diabete instantânea!
— Ai que exagero, Regina!— Riu.
— Mas foi divertido. Desde então, nunca mais comi algodão doce sem
lembrar de você.— Sorriu.
A mais velha estendeu uma toalha sobre o chão de grama e deitou-se
com a cabeça apoiada nas pernas dobradas da loira. As duas permaneceram em
um diálogo regado a troca de carinhos ao mesmo tempo em que mantinham a
visão no filho. Jennifer acariciava delicadamente os cabelos castanhos da
mulher.
— Mamães, eu tenho fome — disse ao se juntar às duas.
— De novo, filho? Mas não faz nem meia hora que você comeu —
comentou a morena, fazendo Heitor esboçar um grande bico. — Você é um
comilão igual à sua mãe Jennifer!
— Não sou!— Cruzou os braços.
— Sim, você é! Já viu o tamanho da sua pancinha?— Regina levantou
parcialmente a blusa do filho e lhe apertou na barriga. — Se desenharmos um
rosto nela, ficará igual ao senhor batata — disse, arrancando do filho uma
gostosa risada.
Heitor caminhou até Jennifer e mostrou a barriga para ela.
— Mamãe Gina disse que minha barriga parece o senhor batata. Disse
que sou comilão.
— O senhor batata?— Jennifer arregalou os olhos e se mostrou
interessada. — Se a sua mãe Gina disse, então é verdade!— Sorriu.
A mais velha abriu a cesta com alimentos e deu a Heitor um copo
infantil com tampa e bico. Em seu interior havia suco de laranja, o preferido do
menino. Para comer, entregou em sua mão uma bisnaguinha com queijo branco
enrolada em um papel toalha. O menino sentou-se próximo a elas e começou a
comer vagarosamente enquanto conversava. Heitor possuía uma boa dicção e era
bastante desenvolvido para sua idade.
— Eu vou pra escolinha, mamãe?— perguntou ele. Amanhã será seu
primeiro dia numa instituição de ensino.
— Vai sim, meu amor. Terá muitas outras criancinhas iguais a você
para fazer amizade — respondeu Regina.
— Você vai aprender muitas coisas novas! Poderá colorir, desenhar e
pintar com seus novos amigos. Isso não é o máximo, filho?— Foi a vez de
Jennifer se pronunciar.
— Você e a mamãe Gina também vão?
— Não, meu amor. Suas mamães precisam ir para o trabalho. Mas ao
final do dia estaremos lá para buscar você.
— Eu quero mama Gina e mama Jennifer comigo!— disse ao expressar
um pequeno bico de insatisfação. — Sozinho não, mamães.— Sacudiu a cabeça
negativamente.
— Vem aqui. Ouve o que sua mãe tem pra te dizer.— Regina gesticulou
com a mão em um convite para que seu filho sentasse em seu colo. — Você vai
passar a tarde inteirinha brincando, aprendendo coisas legais, comendo lanches
gostosos, e ao final vai poder contar tudo para nós.— Ela acariciava os cabelos
do menino para trás enquanto usava uma voz suave para se referir a ele. —
Como você poderia contar toda a história do seu dia para as suas mães se nós
estivéssemos presentes?
— Hum...— Heitor ficou pensativo como se estivesse processando em
sua mente tudo o que Regina lhe dissera.
— A gente promete que vai ser divertido!— Jennifer se manifestou.
— Ta.— Ainda incerto, foi tudo o que ele disse.

Ao final do passeio as duas mulheres aproveitaram o restante de sol que
ainda havia no final daquele dia e iniciaram uma brincadeira molhada com
Heitor. No jardim de casa, Jennifer abriu a torneira da mangueira e iniciou uma
pequena e rápida diversão com sua família. Ambas vestiram biquíni e puseram
uma pequena sunga vermelha no menino.
— Vem ver o arco-íris, filho!— A loira chamou, fazendo com que o
pequeno garoto corresse em sua direção.
— Cadê, mamãe?
— Ele vai aparecer bem ali quando a mamãe direcionar a água que sai
da torneira na parte onde o sol alcança. Está pronto para ver a magia?
— Sim!— exclamou com seus braços elevados e um largo sorriso no
rosto. Regina, de onde estava, sorria ao avistá-los.
— Então não tire seus olhos daqui. Vamos lá?
— Sim, capitão!
— Um...Dois... e...
— Três!— gritou ele, ansioso. — Tô vendo, mamãe! Eu tô vendo!—
disse animado.
— Mamãe, vem ver. Vem ver!— chamava Regina com empolgação.
— Uau! A mamãe Jen fez um arco íris aparecer só para você, meu
amor?— comentou ao aproximar-se dos dois.
— Sim!— disse com alegria. — De novo, de novo!— Ele pediu.
E assim Jennifer o fez incontáveis vezes. Cada vez que o sol batia no
jato suspenso de água no ar, Heitor gargalhava de felicidade com as cores.
— Diz para as mamães quais cores você está vendo — perguntou a
mais velha ao estimulá-lo.
— É...Hum... Vermelho.
— Vermelho.— A morena confirmou.
— Amarelo.
— Sim, amarelo... E o quê mais?
— Verde, azul... E roxo.
— Muito bem! Palmas para o Heitor!
— Palmas!— Jennifer exclamou ao aplaudi-lo. — Agora vamos molhar
a mamãe Gina?— Meireles rapidamente direcionou a mangueira em direção à
esposa e lhe acertou um jato d’água.
— Jennifer! Você nunca perde essa mania!— resmungou enquanto
tirava o excesso de água do rosto. — Ah, mas isso vai ter troco! Dá aqui essa
mangueira!— A morena, com um sorriso no rosto, corria atrás da mais nova na
tentativa de conseguir tomar a mangueira para si.
— Pega ela, mamãe!— Heitor gritava, gargalhava e corria de um lado a
outro no meio das duas. O fim de tarde findou-se em repleta diversão.


Alguns minutos mais tarde, Meireles estava entretida na cozinha
preparando o jantar quando algo passou correndo por suas costas.
— Heitor, volta aqui! Ainda não terminei de secar você!
— Shhh, não fala pra mamãe que to aqui.— Riu ao tampar a boca com
sua pequena mão. O filho do casal se escondeu dentro de um dos armários da
cozinha, entre as panelas.
— Amor, você viu o Heitor?— perguntou Regina com a voz elevada,
fingindo não saber que provavelmente ele estava escondido por lá.
— Não vi. Para onde será que esse pestinha foi?— Meireles também
elevou o tom de voz e apontou com o olhar para o local onde o menino estava.
— Eu não faço ideia. Poxa... Vou perder um tempão procurando por
ele.
O menino, de onde estava, não conseguia conter o riso.
— Melhor você ir olhar em outra lugar, amor. Aqui ele não está.
De repente, assim que a mais velha virou-se de costas, o menino abriu
as portas do armário e se lançou para fora.
— Buuuuuuu! Mamãe não me pega!— disse ao correr.
— Ah, mas eu pego sim. E será agora!— Regina agarrou o filho por trás
e o tomou nos braços. Heitor estava sem roupa e seus cabelos permaneciam
úmidos do banho. — Agora vamos terminar de se secar, vestir um pijama e se
preparar para o jantar. Mamãe Jen está fazendo uma macarronada deliciosa para
nós!
— Quero vestir pijama de dinossauro que a vovó me deu!
— Então um pijama de dinossauro você vestirá!— Sorriu e o carregou
para o quarto.

Ao final daquela noite, quando Heitor já estava em seu oitavo sono,
Jennifer e Regina terminaram suas tarefas noturnas, prepararam a mochila do
filho para o dia seguinte e se deitaram sobre os suaves lençóis.
— Como é bom relaxar após um dia cansativo — disse a mais nova. —
E como é bom sentir o cheiro de lençóis limpos — concluiu. — Adoro quando
trocamos a roupa de cama. Me sinto no céu.— Jennifer se remexia com alegria
sobre os lençóis.
— Você está parecendo uma criança brincando na areia.— Riu ao
observá-la. — Mas devo confessar que também adoro esse cheiro de sabão e
amaciante. Só não é melhor que seu perfume deixado no travesseiro.
— Oh, gentileza de sua parte.— Sorriu timidamente.
— Gentileza? Não. Eu chamo de amor.— Sorriu em retorno. Regina
buscou o corpo de Jennifer mansamente com o dela e deitou-se por cima. —
Amo você — murmurou, instantes antes de buscar os lábios naturalmente
rosados da mais nova.
Meireles entrelaçou os dedos nos curtos fios castanhos e entregou-se ao
beijo. Ao entreabrir os lábios, permitiu que a língua úmida e quente da mulher
entrasse e se movesse em sua boca. Os beijos com Regina quase sempre
aqueciam seu corpo e pediam por um contato maior.


No dia seguinte as duas tiveram uma grande surpresa. Heitor não
relutou para entrar na escolinha, pelo contrário, foi sorridente e empenhado a ter
um dia de diversão. Ao lado de fora estava Regina com o coração na mão e os
olhos marejados por ter que de se separar do menino pela primeira vez.
— Ele está crescendo tão rápido...— comentou com Jennifer enquanto o
avistava caminhar para dentro na companhia de uma funcionária do lugar.
— Sim... Parece que foi ontem que o amamentava em meu colo. Sinto
falta de vê-lo engatinhando pela casa com aquela bundinha de fralda descartável.
— Eu também — disse com suavidade na voz e um sorriso nos lábios.
— Cada fase me encanta de um jeito único.
— A mim também. Sou tão louca por ele, por você, por nós.— Jennifer
apoiou carinhosamente a cabeça no ombro de sua esposa e suspirou. Em retorno,
sentiu a mão de sua amada buscar pela sua. — Quando olho para trás e me
lembro da censura que nosso relacionamento sofreu, sinto vontade de chorar.
— Por quê?
— Porque por algum momento minha realidade poderia não ter sido
essa, e o Heitor jamais existiria na minha vida.
— É por isso que nunca devemos deixar que outra pessoa seja o autor
da nossa história. Apenas nós sabemos o que verdadeiramente nos faz felizes.
Viver para agradar aos outros é o mesmo que condenar nossa liberdade e nos
sentenciar à infelicidade.
— Devo concordar. O meu grande foda-se para a censura, para a
heteronormatividade e para todos os padrões que duramente somos forçados a
seguir. Jamais vou me desculpar por amar você, por amar uma mulher, por amar
um alguém quinze anos mais velho como se isso fosse relevante. Nunca irão me
ouvir pedir desculpas por amar aquela que me trouxe uma vida regada de amor,
de poesia e de calor humano. Com algumas manias bem loucas, confesso — riu
ao implicar com a morena. — Mas que me deu um filho maravilhoso.
— Você adora as minhas manias, Jennifer. Confessa.
— Quando não estão me enlouquecendo, se tornam um charme a mais.
É a sua marca. Porém... Arrumar os produtos que estão fora de ordem no
supermercado já está passando dos limites, Regina.
— Ei! Quando essa conversa passou a ser sobre os meus TOC’s?
Vamos deixar eles quietos e ir embora. Tenho uma aula para dar em pouco mais
de meia hora — comentou ao conferir seu relógio de pulso.
— Já disse que sempre sentirei uma pontada de ciúmes e inveja dos
seus alunos? Ter a presença da professora Vianna em sala de aula é um
privilégio para poucos.
— Não acho que eles pensem dessa forma. Metade das classes deve me
odiar.
— É porque você pega pesado, Regina. Está sempre séria, não tolera
quaisquer tipos de atrasos e se pronuncia com uma postura tão imponente, que
arrepia todos os fios dos nossos cabelos. Quando bate os saltos no chão e ergue
uma das sobrancelhas então...
— Não é possível que eu transmita tanto medo assim.
— Eu já estive no lugar deles. Pode apostar que sim.— Riu. — Agora
realmente precisamos ir. Meu horário de almoço está quase no fim.
— Então vamos.


Capítulo 48

O relógio do tempo rodava e trazia novos desafios para a vida de
Jennifer e Regina. Todos os dias elas aprendiam a ser mãe. Todos os dias elas
precisavam saber lidar com os mistérios das novas fases de seu filho, que quando
aprendeu a ler, encantou-se pelo universo literário.
Heitor, assim como Regina, também precisou usar óculos desde a
infância. A cada ano ele se mostrava ainda mais inteligente e intelectualmente
parecido com a professora. Quando completou seis anos, pediu para entrar em
uma escola de artes maciais. Jennifer, assim como a esposa, prontamente
aceitou. Sabiam perfeitamente que artes marciais na infância auxiliam no
desenvolvimento psicomotor.

O passar dos anos trouxe muito aprendizado para a família.
Aprenderam, inclusive, a lidar com a dor de uma perda. Bóris, o gato
imensamente amado por todos naquela casa, foi rasgar sofás no paraíso quando
Heitor possuía cinco anos de idade. Foram semanas de choro incessante,
principalmente por parte de Regina. Ela sentiu como se uma parte do seu
coração tivesse partido junto. Por sorte, possuía dois seres humanos iluminados
dentro de casa, que ajudaram a tornar a dor mais amena.

Arthur casou-se com uma nova namorada que arrumou. A anterior era
ciumenta demais e implicava até com seu futebol dos finais de semana. Beatriz e
Kevin também se casaram, e agora Jennifer era madrinha de gêmeos. Bea havia
se tornado mãe de dois meninos de uma só vez. Cecília, a filha de Morgana e
Diogo, se tornava cada dia mais parecida com a irmã; fisicamente e na
personalidade. Inclusive, pediu para que Meireles lhe desse aulas de boxe
sempre que possível.

Morgana e Regina, hoje, possuíam uma boa relação. Todos os
desentendimentos se tornaram uma página rasgada do passado. O resgate da
relação de Morgana com Jennifer também fora feito. E embora a loira jamais
conseguisse esquecer certas palavras ouvidas no passado, possuía compreensão o
suficiente para entender que sua mãe apenas não soube lidar diante do novo que
se apresentou tão repentinamente em sua vida. Jennifer não guardava mágoas.
Para sua vida ela queria apenas bons sentimentos.

— Adivinha quem é faixa nova no judô?— disse Heitor ao entrar às
pressas em casa para contar a novidade à Regina.
— Esse é o meu garoto! Parabéns!— A morena ofereceu a mão e fez
um high five com o filho. Heitor já estava com oito anos.
— Acho que mereço uma pizza no jantar!— disse ele.
— Acho que você merece até duas.— Jennifer respondeu. — Mas, antes
de qualquer coisa, sobe lá pra cima e vai tomar um banho. Tem que estar limpo
ao sentar-se à mesa.
— Que saco!— resmungou ao subir as escadas.
— Sem retrucar, rapazinho.— Meireles rebateu. — Boa tarde, amor.—
Jennifer cumprimentou a esposa com beijo um em seus lábios após chegar da rua
com o garoto.
Horas mais tarde, sentados à mesa, Jennifer observava o filho com
atenção enquanto ele contava como havia sido seu dia. Ela sentia-se cada vez
mais grata à vida pelo presente que era a sua família. Vez ou outra seu coração
se aquecia durante o jantar, principalmente quando via o sorriso de Regina
retratado na face de Heitor. Era sempre assim quando o menino sorria pela casa.
Era lindo ver seu grande amor refletido na inocência de seu filho.
A mais velha sempre contemplava os momentos em que sua esposa e
Heitor interagiam. Ela muito apreciava ver a afinidade que eles compartilhavam.
Esse era o mundo que Regina sempre quis apresentar para Jennifer.



— Olha o que achei ao revirar alguns pertences antigos.
— Guardou o corsage que dei a você na formatura do ensino médio por
todos esses anos?— perguntou admirada.
— Com certeza! Foi um dia imensamente especial. Jamais vou esquecer
a sensação do seu toque e o arrepio que senti ao ouvir sua voz soando atrás de
mim.
— Foi uma noite memorável...— Regina segurou a antiga pulseira de
flores e a colocou novamente no pulso de Jennifer, assim como fizera há muitos
anos. — Aceita ser o meu par por todas as noites?— sussurrou contra o ouvido
da mais nova, lhe arrepiando a pele.
— Aceito ser seu par, sua mulher, sua companheira, sua amante.—
Jennifer depositou as mãos na cintura de Regina e uniu seus corpos.
Logo, um sabor nostálgico se fez presente quando iniciaram uma dança
sem qualquer música de fundo. Suas memórias foram capazes de reviver a
melodia que tocava na festa quando tiveram a dança em par. Regina, na época
em questão, possuía a mesma idade que Jennifer tem hoje.
Com as mãos apoiadas sobre os ombros de sua esposa, Regina dançava
de maneira lenta e sincronizada com ela. Sorrisos não deixavam de habitar as
casas de seus lábios.
— Uma vida inteira ao seu lado será tão pouco. Gostaria de muitas,
todas vividas com você — comentou Jennifer. Seus pés moviam-se devagar,
acompanhando os passos da professora.
— Na próxima vida me faça o favor de chegar mais cedo, ok?— disse
em tom divertido. — Quinze anos de atraso eu não vou mais aceitar.
— Sim, madame. Terei uma conversa bem séria com o universo.— Riu.
— Aceita tomar um vinho comigo?
— Sempre. Gosto muito quando esvaziamos a garrafa enquanto
conversamos sobre a vida. Principalmente quando terminamos na cama —
murmurou.
— Essa é a melhor parte — disse em um sussurro contra o ouvido. —
Hoje vamos de suave ou seco?— perguntou ao buscar os olhos castanhos à sua
frente.
— Suave.

Ao longo dos anos, sempre que podiam, Jennifer e Regina faziam uma
viagem à Europa para renovarem seus votos de união. O primeiro desembarque
sempre era em Florença, onde aproveitavam para fazer uma visita aos pais de
Regina. O final costumava ser na cidade luz, onde reafirmavam as juras de amor
e usufruíam de uma nova lua de mel de poucos dias. Heitor sempre estava
presente e muito desfrutava dos terrenos da família Vianna na Toscana. Andar a
cavalo era seu passatempo favorito quando estava por lá.
Os anos traziam mudanças, mas também preservavam antigos hábitos.
Regina, por exemplo, ainda bebia chá de maçã com canela quase todas as noites
antes de dormir. Documentários sobre fatos históricos ainda eram seus favoritos,
e ela ainda dava aulas particulares de espanhol nas horas vagas. Sua obsessão
por organização permanecia a mesma. Com a convivência, Jennifer acabou
aderindo a algumas de suas manias. E por falar na menina de ouro, ela ainda
participa de campeonatos de boxe, e Regina ainda vibra por cada uma de suas
conquistas no ringue.
O visual da professora de história não mudou muita coisa. A morena
ainda arrancava muitos suspiros nos ambientes onde frequentava. Suas roupas
sociais, seus saltos inseparáveis, o cabelo liso e escuro acima dos ombros, os
óculos de armação preta e o batom vermelho carmesim ainda faziam parte do
estilo que a compunha. A única diferença estava nos traços da idade em seu
rosto, que com o passar dos anos tomou uma forma ainda mais séria e madura.
O tempo era bondoso com Jennifer. A loira ainda mantinha alguns
trejeitos de quando possuía apenas dezoito anos. Regina sempre dizia que seu
sorriso ainda era travesso, e que sua vitalidade e energia permaneciam elevadas.
A graciosidade de Jennifer encantava muito a mais velha, dia após dia, assim
como sua inteligência e seu olhar sempre maduro perante a vida.

— Essa é a minha menina de ouro!— disse Regina, empolgada, ao
encontrar com a loira no vestiário ao final de uma competição de boxe. A última
de Jennifer.
— Parabéns, mãe!— disse Heitor ao abraçá-la.
— Estou completamente suada — comentou em meio um sorriso. A
loira afagou os cabelos do filho e depositou um beijo nos lábios da esposa.
— Estou orgulhosa de você — murmurou após selar os lábios
rapidamente nos de Jennifer.
— Obrigada.— Sorriu. — Quem vai ajudar a me livrar dessas luvas e
bandagens?
— Eu!— O menino se prontificou. Heitor ajudou com a luva do lado
esquerdo e Regina ficou com a da direita.
Jennifer tomou uma ducha no banheiro do local e vestiu-se com uma
calça jeans, camiseta e jaqueta. Logo após, direcionou-se com a esposa e o filho
para uma pizzaria localizada nas redondezas. Pediram uma pizza gigante de dois
sabores e taças de sorvete como sobremesa. Era dezembro, véspera de natal, a
época do ano favorita de Heitor. Pela janela do estabelecimento era possível
avistar as decorações natalinas nas fachadas dos edifícios lá fora. Havia muitas
luzes pisca-pisca nas árvores que rodeavam o bairro. Algumas delas refletiam no
vidro da janela próxima a seus assentos.
— Tem muita criança na minha escola que ainda acredita em papai
Noel. Que bobas — comentou o menino enquanto se servia de seu sorvete de
flocos.
— Não fale assim delas, filho. Lembre que um dia você também
acreditou — disse Regina.
— Mas isso foi quando eu era bem pequeno. Agora eu já tenho oito
anos e eles também. Papai Noel é coisa de criancinha.
— Oh, e você não é uma criancinha?— A morena indagou.
— Eu não! Já sou bem crescido pra essas coisas. Eu digo a eles que
papai Noel não existe, mas não acreditam.
— Oh céus, Jennifer! Nosso filho está acabando com as fantasias das
outras crianças.
— Você não acha errado dizer isso a eles, Heitor?— Jennifer se
pronunciou. — Cada pessoa tem o seu tempo. Talvez para eles ainda seja o
momento de acreditar nesse tipo de coisa.
O menino nada respondeu, mas pareceu refletir sobre o que sua mãe
dissera.
— Na minha sala tem uma menina com dois pais. Tipo você e a mamãe,
só que homens. Mas ela é adotada — disse ele, após minutos de silêncio.
— Que legal! E o que você pensa sobre isso?— perguntou a loira a fim
de sondá-lo e descobrir sobre seus pensamentos.
— Normal — disse naturalmente, segundos antes de levar uma colher
do sorvete à boca. — Seria muito legal se todas as crianças pudessem ter um lar.
— Sim. Seria maravilhoso se todas tivessem essa oportunidade —
comentou a mais velha ao acariciar os cabelos do filho. — Uma família com
pessoas que nos amem é um bem muito precioso. O amor é o que
verdadeiramente importa na vida.— Sorriu.
— Eu amo vocês, mamãe — disse de maneira sincera e espontânea ao
olhá-las.
— Nós também amamos você, meu amor.— Regina respondeu.
— Muito!— Jennifer concluiu.
Quando as taças de sorvete chegaram ao fim, os três caminharam alguns
poucos minutos até encontrarem o carro estacionado no meio fio. O
estacionamento da pizzaria estava lotado, então precisaram optar por deixá-lo na
rua. Contudo, algo inusitado aconteceu naquele início de noite natalina.
— Vocês estão ouvindo?— Heitor perguntou. — Olha, de novo!
— Parecem miados — disse a loira. — Me ajudem a identificar de onde
vem o som.
Os três se prontificaram a seguir o baixo miado e passearam o olhar por
toda a calçada. Jennifer até agachou-se para ver se o som não vinha da parte de
baixo do automóvel.
— Achei!— exclamou o menino ao apontar para alguns entulhos que
havia na calçada. — É um gatinho, mães!— disse com alegria.
Os três aproximaram-se dos entulhos e encontraram um filhote de gato
miando desesperadamente entre dois tambores de lixo.
— Podemos ficar com ele? Podemos? Podemos?— O garoto pedia.
Regina, sem nada dizer, olhou de maneira terna para o pequeno animal
à sua frente. Emocionar-se foi inevitável ao lembrar-se de Bóris e de quando o
resgatou das ruas.
— Ele deve estar faminto.— A voz de Jennifer ressoou ao fundo.
Sem qualquer objeção, Regina acatou ao pedido do filho e pôs o felino
dentro do carro. Mal sabia ela, ou talvez soubesse, que uma nova jornada de
amor e companheirismo estava prestes a começar. — Feliz natal, Regina —
sussurrou o universo.

Bóris havia partido de sua vida há alguns anos e, desde então, a morena
não havia conseguido dar lugar para que outro animal habitasse em seu peito.
Ela viveu o luto por seu gato dia após dia e disse a si mesma que não reviveria
aquela dor nunca mais. No entanto, suas barreiras haviam sido derrubadas
naquela noite. Foi quando percebeu que a ausência de Bóris se tornara apenas
uma doce saudade. E que ele, de onde estivesse, gostaria que ela salvasse outras
vidas, assim como a dele foi salva um dia.


Jennifer e Regina haviam reservado um momento apenas para elas.
Decidiram passar um dia completo rodeadas pelas boas vibrações da natureza.
As mãos da loira deslizavam suavemente os óculos da professora sobre a face da
mesma, enquanto as mãos da mais velha ajeitavam a gola de sua camisa.
— Será que você nunca vai arrumá-la corretamente?
— Será que você nunca vai deixar minhas golas em paz? — Retrucou.
Ao entrarem no carro dirigiram por uma longa estrada cercada por
árvores. O sol brilhava forte lá em cima. Um vento refrescante adentrava pelas
janelas do veículo e fazia seus cabelos dançarem. Jennifer, com o braço para
fora, imitava o movimento das ondas do mar com sua mão. Ambas cantavam
uma divertida canção enquanto aproveitavam a paisagem.

Quando a noite caiu, uma praia isolada se tornou a atração final. Suas
pernas caminhavam lado a lado enquanto sentiam a água gelada das ondas do
mar arrepiar suas peles.
Jennifer escreveu o nome de Regina na areia e em seguida a puxou,
fazendo seus corpos rolarem pelos grãos e repousarem um sobre o outro como
páginas de um livro. A água ainda acariciava seus pés enquanto suas línguas
acariciavam uma à outra em um beijo.
Entre as carícias compartilhadas, Jennifer revelou no ouvido da esposa
o desejo que fizera há muitos anos quando assoprou a vela no seu aniversário de
vinte anos em Paris. Sorrir foi inevitável para Regina, principalmente ao saber
que o desejo se tornara realidade. Jennifer havia pedido uma família feliz ao lado
dela.

Dentro daquele cenário havia beleza e tranquilidade. Havia o som das
ondas e vozes que se cruzavam. Lá, onde a noite caía e trazia as estrelas, havia
duas mulheres intensas e conectadas. Havia calor humano, beijos intermináveis e
eternos sussurros. Havia, também, uma professora de história que mentalmente
escrevia um poema cada vez que sua eterna garota lhe sorria.
No espaço entre o certo e o errado, escolheram a felicidade


Meu nome é Heitor Meireles Vianna. Não vou falar a idade que tenho
hoje, pois a história das minhas mães nunca se prendeu a números. Estou aqui
apenas para contar sobre a honra que tenho em poder vivenciar diariamente o
amor que compartilham. Elas sempre souberam o preço de viver um amor como
o delas, e sempre estiveram dispostas a pagar.

Minha mãe Regina adora escrever. Descobri que em meio aos seus
livros ela guarda um caderno. Na verdade, é como se fosse um livro de
memórias, para nunca se esquecer dos momentos vividos comigo e com a minha
outra mãe, a Jennifer.

Regina diz que a minha outra mãe ainda possui o mesmo sorriso
travesso de sempre, e que uma luz acende ainda mais forte dentro dela quando a
vê sorrir. À noite, do meu quarto, às vezes escuto a mamãe cantando para ela. É
uma canção chamada She Will Be Loved, se não me engano.

A Jennifer sempre diz que os olhos castanhos e intensos da Regina
sempre farão seu coração bater mais forte. Ela também conta que a voz da minha
mãe é capaz de transportá-la para longe, até Saturno, aonde giram os anéis.
Table of Contents
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48

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