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ÁGORA

Por Predrag Pancevski

Nos tempos da Grécia antiga, Ágora designava o anfiteatro, o local onde a cidadãos
apresentavam as peças de teatro, mas também era lá que eles debatiam, discutiam e
procuravam resolver os seus problemas do dia a dia. Foi com essa denominação que
Aristóteles se referia ao local onde ocorrem as negociações, e desde então essa
nomenclatura tem sido usada academicamente para designar o ambiente da
negociação.
Normalmente os negociadores ficam muito focados na essência do que vão negociar,
sem perceber que antes de iniciarem a negociação principal, eles terão que realizar
uma negociação menos óbvia, uma negociação sobre a negociação, uma negociação
sobre a estrutura da negociação. Na linguagem acadêmica, isso também é chamado de
“meta negociação”, cujos resultados impactam profundamente a negociação principal,
e podem ser determinantes no sucesso ou no fracasso do processo negocial.
A meta negociação é basicamente sobre a influência da Ágora, buscando obter
vantagem competitiva preliminar que garantirá um maior poder por ocasião da
negociação.
Seguem alguns dos pontos de Ágora que devem ser considerados e negociados.
Local
Território é um conceito psicológico. Todos nós temos um território pessoal que nos
cerca como se fosse um campo de força a nos proteger contra intrusões. Quando
alguém invade esse espaço sem a nossa permissão, isso nos deixa muito
desconfortáveis, o que aliás é uma das táticas mais frequentes da Estratégia de
Intimidação.
Quando a negociação é amigável, o local não deixa de ter a sua importância, mas o
efeito psicológico é limitado.
Entretanto, quando a negociação é em ambiente hostil, o local acaba ganhando uma
importância fundamental, e o efeito atua no nível subliminar. Se for negociar, que seja
no seu território, e não no território da outra parte. E como a noção do território é
psicológica, pode variar de acordo com o contexto ou a situação. Se você tiver que ter
uma conversa difícil com um colega de trabalho, que não deixa de ser uma negociação,
a sua sala, a sua baia, a sua mesa, são o seu território. Cabe à outra parte pedir licença
para sentar.
Se não puder persuadir a outra parte a vir para o seu território, que pelo menos seja
um território neutro. A sala do café, um restaurante, o lobby de um hotel.
Costumamos menosprezar a importância do território, já que o efeito psicológico é
pouco perceptível, já que atua no subconsciente. Entretanto, todos os estudos em
psicologia social comprovam o impacto que causa no processo de uma negociação.
Número de participantes
Quando se trata de negociação em ambiente hostil, número é documento. Se for uma
negociação amigável, o efeito psicológico é bem menor. Entretanto, se sabemos que
enfrentaremos uma negociação em ambiente hostil, devemos nos esforçar para que o
nosso time tenha um número de participantes pelo menos igual, mas de preferência
superior, ao da outra parte. É frequente os negociadores experientes trazerem para a
mesa de negociação pessoas alheias ao assunto tratado, só para compor número. Em
negociações sindicato x empresas, que não costumam ser nada amigáveis, as vezes o
representante da empresa vai sozinho, ou acompanhado de apenas uma pessoa, e se
surpreende quando se depara com um grupo numeroso do outro lado da mesa. Já sai
com uma desvantagem competitiva enorme, antes mesmo de iniciar a negociação. Pior
ainda se estiver no território da outra parte. O desequilíbrio nesse caso é muito
grande, e seria aconselhável para o representante da empresa tentar dar alguma
justificativa no sentido de postergar essa negociação, para que ele possa trabalhar os
fatores de Ágora a seu favor.
É importante salientar que a vantagem psicológica associada à vantagem numérica só
funciona quando as pessoas do mesmo time sentam em bloco. É o tamanho do bloco
que intimida, que faz a diferença.
Muitas pessoas, quando entram numa sala de negociação vazia, começam a se
espalhar em volta da mesa, cada um procurando um lugar mais confortável. Se for
uma negociação amigável, não tem problema. É até aconselhável, já que isso permite
uma interação maior com a outra parte.
Entretanto, se for uma negociação em ambiente hostil, devemos instruir os nossos
colegas para sentar em bloco. Obviamente, o efeito “bloco” só vai funcionar se tiver
um número de participantes suficiente para se contrapor à outra parte. Por isso faz
parte da preparação de qualquer negociação descobrir quem estará representando o
outro lado, a função, o grau de alçada, e a quantidade de participantes.
Idioma
Em negociações internacionais, um dos fatores de Ágora muito importantes é o
idioma. Se a negociação se desenrolar em ambiente amigável, tentar se comunicar no
idioma da outra parte para deixar os nossos interlocutores confortáveis, mesmo que
não tenhamos domínio nesta língua, com certeza será recompensado. Principalmente
se estivermos lidando com culturas de Alto Contexto, como uma cultura árabe por
exemplo. São culturas que valorizam muito o contexto onde a negociação se
desenvolve, e com certeza darão muito valor ao esforço visível que a outra parte
estaria fazendo para os deixar à vontade. É um gesto de gentileza, de etiqueta
negocial, que provavelmente será retribuída de alguma forma.
Entretanto, se sentirmos que a negociação será hostil, é fundamental fazer todo o
possível para que a conversa seja num idioma no qual temos domínio e que a outra
parte, de preferência, não tenha. Negociar este fator da Ágora a nosso favor se
constituiria numa enorme vantagem competitiva posteriormente. Pessoas muitas
vezes desistem de argumentar pela insuficiência de domínio no idioma. E mesmo
quando conseguem fazê-lo, parece que os argumentos não têm consistência, não têm
peso. O próprio Ethos do negociador fica profundamente afetado e,
consequentemente, a credibilidade das suas colocações. É totalmente desigual. Para
cada argumento colocado por quem não domina o idioma, o adversário coloca vários
contra-argumentos no mesmo espaço de tempo.
Se não conseguirmos negociar um idioma que nos seja favorável, devemos tentar pelo
menos um idioma neutro, no sentido de que ambas as partes o dominam no mesmo
nível de proficiência. Ou então o uso de um tradutor-interprete, que também seria
uma saída honrosa.

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