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Envelhecimento

De acordo com a OMS, a expectativa de vida dobrou. No ano de 2000, 600 milhões de
pessoas tinham idade acima de 60 anos, e estima-se que em 2025 este número suba para
1.200 bilhões. No mundo em desenvolvimento, os mais velhos (acima de 80 anos) é o
grupo que tem o mais rápido crescimento populacional.
Envelhecer é um processo natural, universal, que não escolhe pessoa e nem lugar para
acontecer, sendo um processo único que cada ser humano sofre. Este envelhecimento
trás consigo perdas progressivas de funções físicas e mentais, implicando em
transformações, aceitações e adaptações.

Conceito de envelhecimento - Velhice e pessoa idosa.


Ao longo dos anos o envelhecimento e a sua consequência natural, a velhice, têm vindo
a ser cada vez mais uma preocupação da humanidade (Netto, 2011).
Segundo Spirduso et al (2005) o envelhecimento é definido como um processo
intrínseco aos seres vivos e manifesta-se através da perda da aptidão para a adaptação e
do decréscimo da funcionalidade que se repercutem em diversas alterações com
consequências na autonomia, na saúde e na mobilidade deste grupo etário. Cada pessoa
envelhece ao seu ritmo, de acordo com a sua fisiologia, da sua genética, da sua
capacidade psicológica, tendo em conta a sociedade que a rodeia (Spirduso et al ,2005).
É importante salientar que não é igual envelhecer no feminino e no masculino, sozinho
ou junto da família, com ou sem filhos, no meio urbano ou no meio rural, ativo ou
inativo (Direção Geral da Saúde).
Já o envelhecimento biopsicológico, está relacionado com o envelhecimento
cronológico, porém não é tão rígido ao ponto de se limitar à idade, mas antes às
diferentes formas como cada pessoa experiencia o envelhecimento (passado, estilo de
vida, sociedade em que vive, género, herança psicossocial, património genético), ou
seja, cada indivíduo envelhece de uma forma singular e única (Rosa, 2012; Moura et al,
2014). O envelhecimento coletivo também destaca dois tipos de envelhecimento, o
demográfico e o societal. O envelhecimento demográfico que diz respeito a “uma
evolução particular da composição etária da população que corresponde ao aumento da
importância estatística dos idosos ou à diminuição da importância estatística dos
jovens” (Rosa, 2012:23). Por sua vez o envelhecimento societal, caracteriza-se por uma
sociedade deprimida, que vê como ameaça o seu próprio envelhecimento e com as
transformações que daí advêm. Porém o envelhecimento da população (envelhecimento
demográfico) não implica um envelhecimento da sociedade, uma vez que esta encontre
estratégias de forma a enfrentar determinados acontecimentos (Rosa, 2012).

Representação social do envelhecimento e da pessoa idosa – Passado e presente


Ao longo dos anos a definição social de velhice e pessoa idosa foi sofrendo alterações.
Nas civilizações primitivas as pessoas idosas eram desprezadas, mantidas longe do
poder e dos rituais, chegando mesmo a serem abandonadas pela tribo, dada a sua
fragilidade física. Mais tarde, “quando as tribos se sedentarizaram e se dedicaram à
agricultura, os anciãos passaram a usufruir de considerações no clã, ocupando um lugar
social elevado, chegando, por vezes, a ser eleitos chefes” (Bize e Vallier, 1985:38). Em
Esparta, 28 homens idosos compunham um conselho; na República Veneziana homens
idosos eram muitas vezes doges e no papado havia a gerontocracia (Bize e Vallier,
1985). Segundo Rodríguez (2004) podem definir-se duas visões opostas de velhice. A
primeira considera o idoso “Sábio, carregado de experiências, de alto estatuto social,
merecedor de grande respeito e com uma clara posição de influência sobre os demais”.
(Rodríguez, 2004:233). Segundo Keith (1982) esta visão está associada à família
extensa e à família extensa modificada, que reforçam os aspetos positivos do
envelhecimento. Assim as pessoas idosas eram vistas como pessoas importantes e muito
respeitadas. O aumento da população idosa (Keith, 1982); a invenção da impressora,
que fez com que a cultura, a história e as tradições passassem de geração em geração
retirando esse papel às pessoas mais velhas; e a revolução industrial que fez com que as
famílias passassem a movimentarem-se geograficamente em função do trabalho,
deixando para trás os mais idosos terminando assim com a tradicional família alargada
(Nelson, 2005), fizeram com que a primeira visão social do envelhecimento perdesse
força e surgisse assim a segunda visão. A segunda visão sobre a velhice, oposta à
primeira, encara-a como uma etapa deficitária, ou seja, segundo esta visão, o
envelhecimento acarreta perdas significativas e irreversíveis (Rodríguez, 2004).
Segundo Matras (1990), esta visão encara a pessoa idosa como física e mentalmente
diminuída, socialmente isolada e economicamente dependente.

A discriminação na velhice – A infantilização da pessoa idosa


No passado a representação social das pessoas mais velhas era “mais positiva,
destacando-se um maior respeito para com as mesmas, atribuindo-se-lhes o poder da
sabedoria e valorizando-se mais a sua experiência acumulada ao longo de toda uma
vida” (Pereira et al, 2012:93). Nas aldeias, as pessoas idosas eram vistas como sábias,
conselheiras em problemas difíceis, aquelas que conheciam várias histórias e todas as
famílias da região. “Os velhos que resistiam ao peso do tempo eram considerados seres
excecionais e inspiravam respeito pelos poderes e conhecimentos ocultos que lhes
atribuíam” (Bize e Vallier, 1985: 39). Atualmente as pessoas idosas já não têm a
importância que tinham, o respeito é agora menor. Já não ocupam o lugar de chefe que
assegura a transmissão das tradições. Tem experiência, mas esta é desvalorizada em
detrimento do conhecimento que os mais jovens possuem (Bize e Vallier, 1985), e o
saber acumulado ao longo da vida é desvalorizado (Rodríguez, 2004). “Dados
científicos têm vindo a contrariar os estereótipos sobre o declínio inevitável e
irreversível que acontece com a idade, contudo, permanecem ainda atitudes
discriminatórias e estereotipadas em relação a este grupo etário” (Moura et al,
2014:102). Tendem a generalizar os atributos da população idosa, como se esta
envelhece-se toda da mesma forma, surgindo assim os estereótipos baseados na idade.
Numa investigação realizada por Veloz, Nascimento-Schulze e Camargo (1999) no
Brasil, sobre as representações sociais do envelhecimento foi possível identificar três
tipos de representações: “uma representação doméstica e feminina em que a perda dos
laços familiares tem papel central; uma que parte da noção de atividade, conferindo ao
envelhecimento características de perda do ritmo de trabalho; e, finalmente, uma
perspectiva de cunho mais utilitarista, que destaca o envelhecimento como desgaste da
máquina humana.” (Couto et al, 2009:510).
A infantilização, um dos estereótipos mais prejudiciais para as pessoas idosas, surge da
ideia errada de que as pessoas mais velhas são como as crianças, têm a capacidade
intelectual reduzida, má audição e as funções cognitivas mais lentas (Nelson, 2006).
Neste sentido a maior parte das pessoas, movidas pela preocupação e pelo carinho
(O'Connor & Rigby, 1996), modificam o seu discurso de forma a melhorar a percepção
do mesmo por parte das pessoas idosas. Algumas pessoas idosas respondem de forma
positiva a esta atitude, porém também há quem a considere uma atitude controladora e
de falta de respeito (Ryan et al, 2000), uma vez que esta atitude incentiva a dependência
como também desvaloriza a individualidade de cada pessoa (Raina e Balodi, 2014).
Vários estudos têm demonstrado o impacto negativo que este tipo de linguagem tem
sobre quem a recebe, neste caso as pessoas idosas. Esta linguagem representa um fator
de risco uma vez que pode transmitir uma falta de respeito (Ryan et al., 1991) que tem
impacto negativo na dignidade (Draper, 2005), na identidade, na autoestima, nas
habilidades linguísticas e na percepção de autoeficácia das pessoas idosas Nussbaum et
al (2005). Lagacé, Tougas, Laplante, Neveu (2008, 2010) realizaram um estudo onde
concluíram que a percepção de comunicação idadista no local de trabalho pode levar a
pessoa idosa (trabalhador) a alterar o seu comportamento, diminuir a sua autoestima e
ter um impacto negativo no seu bem-estar.
Segundo Levy e Banaji (2002) este tipo de linguagem, é utilizada de forma
inconsciente, o que pode levar a que este tipo de discriminação social seja aceite ou
tolerada.
Segundo Gorjão e Marques (2012) são necessárias medidas que combatam esta
problemática cada vez mais acentuada de forma a evitar a disseminação deste tipo de
atitudes. Essas medidas devem promover uma alteração da imagem associada ao
envelhecimento e às pessoas idosas, promover a participação e a inclusão deste grupo
que faz parte da população de forma a potenciar as suas capacidades “conduzindo a uma
maior qualidade de vida e satisfação pessoal” (Gorjão & Marques, 2012:136). Porque a
“generalidade dos problemas das pessoas idosas, na nossa sociedade, não decorre do
processo de envelhecimento biológico, mas sim sociogênico, ou seja, dos papéis
impostos pela sociedade, quando as pessoas atingem determinada idade cronológica”
(Lima, 2010:24). Segundo Moura outro aspeto que deve ser trabalhado é a mudança de
mentalidades e de comportamentos, começando nas esferas sociais. Marques acrescenta
que deve combater-se o idadismo através de trabalho junto da população de forma a
alterar as representações associadas às pessoas idosas e à forma como se “encaram as
relações entre as diferentes categorias etárias” (Marques, 2011:95).

Idoso pode ter autonomia e não precisa ser tratado como criança
O professor e psicanalista Christian Dunker explica que essa relação é o cuidado
invertido. “Na medida que nossos pais vão envelhecendo, inverte-se a relação inicial de
cuidados”
Problemas com a autoestima e até mesmo a depressão são algumas das consequências
mais graves dessa infantilização. O sentimento de fragilidade e incapacidade gera
traumas que acabam resultando na aceleração do declínio geral da saúde do idoso, tanto
emocional quanto fisicamente. 
Independente de idade e nível de dependência, o idoso precisa ser tratado como sujeito,
com suas opiniões e vontades respeitadas. O lugar dele na família deve ser tão relevante
quanto o de qualquer outro membro, afinal, mesmo com a idade avançada ainda há
muito para viver, aprender e compartilhar com novas gerações. 

Valorizar a experiência e ouvir as necessidades dos idosos é fundamental


Velhice não é sinônimo de invalidez.  É comum que, por excesso de zelo, filhos e
cuidadores imponham uma rotina com a qual o idoso não está acostumado, mas isso
acaba tirando deles a vontade e a alegria de viver.  O papel de quem cuida de idosos
é garantir que eles estejam seguros, saudáveis e felizes. Para isso, é preciso que haja
respeito e escuta. Lembre-se que eles têm uma vasta experiência e conhecimento de
vida e valorize isso. 
Na medida do possível, caso não haja limitações, o idoso deve manter as atividades a
que está acostumado, como participar da rotina da casa ou até mesmo fora dela. 

Saúde do idoso
Entre as muitas preocupações com a saúde que podem recair sobre os idosos, o
sofrimento psicossocial é uma das mais comuns e menos discutidas. Com o
envelhecimento, surgem vários fatores que contribuem para o isolamento e a solidão,
como a morte de cônjuges e amigos íntimos, a mudança de familiares e o aparecimento
de doenças debilitantes. A própria solidão em si pode causar uma série de problemas
relacionados à saúde para os idosos, incluindo aumento de risco de mortalidade,
depressão, declínio cognitivo, demência e até o suicídio.
O Ministério da Saúde divulgou o Boletim Epidemiológico de Tentativas e Óbitos por
Suicídio no Brasil. Um dos alertas é a alta taxa de suicídio entre idosos com mais de 70
anos. Nessa faixa etária, foram registradas média de 8,9 mortes por 100 mil nos últimos
seis anos. A média nacional é 5,5 por 100 mil.
Entre os fatores de risco para o suicídio estão transtornos mentais, como depressão,
alcoolismo, esquizofrenia; questões sociodemográficas, como isolamento social;
psicológicos, como perdas recentes; e condições clínicas incapacitantes, como lesões
desfigurantes, dor crônica, neoplasias malignas.

A depressão na velhice 
Por trás do desejo de antecipar o fim da vida, estão as perdas. Perda de saúde,
autonomia, produtividade, papéis sociais. Perda de cônjuges, amigos, cuidadores e de
outras pessoas nas quais eles depositam confiança. “A depressão tem um papel muito
importante, assim como as questões de aspectos sociais da terceira idade, como a de
estar passando por mais perdas, estar passando pela aposentadoria e não se sentir mais
útil, de os filhos terem saído de casa, de ele ter mais dificuldade de se encaixar em uma
sociedade como a nossa, que não está ainda muito bem-preparada para acolher os
idosos”, destaca a psiquiatra Helena Moura, especialista em psicogeriatria pela
Universidade de São Paulo (USP).

O abandono afetivo familiar 


A família tem uma responsabilidade enorme nesse processo, afirma Denise Machado
Duran Gutierrez. “O velho não só sofre processo de migração, de deslocamento. Mas,
também, muitas vezes na própria casa, perde o quarto principal, vai para um quartinho
de fundo. Os filhos, quando o levam ao médico, falam por ele, o tratam como criança,
desautorizam no médico. O idoso vai perdendo voz, espaço”, acusa a especialista. Em
uma pesquisa sobre 51 casos de suicídio cometidos por pessoas com mais de 60 anos, a
professora da Universidade Federal do Amazonas identificou que o fator de maior
frequência por trás do ato foi o isolamento social: ao investigar com familiares das
vítimas, constatou que esse foi o motivo de 32,1% dos homens e 31,7% das mulheres.

A velhice na literatura sapiencial bíblica


Entre as modificações físicas da velhice, em determinadas circunstâncias, uma parece
gozar de certo prestígio. Os naturais cabelos brancos, segundo o livro dos Provérbios,
podem ser a manifestação de vitória contra o tempo, prêmio dos que souberam agir com
discernimento para prolongar seus anos: “Cabelos brancos são esplêndida coroa que se
encontra no caminho da justiça” (Pr16,31; Sl92,13-15). Contudo, mesmo que não haja
comparação possível com os méritos de quem ostenta cabelos brancos, a debilidade do
velho é indiretamente aludida em contraste com a força dos jovens: “Glória dos jovens é
a força deles, honra dos velhos são os cabelos brancos” (Pr20,29). A razão para a honra
dos que têm seus cabelos tingidos pelo tempo deriva da mentalidade segundo a qual o
temor de Deus, princípio da sabedoria, prolonga a vida, enquanto os maus têm seus anos
abreviados (Pr10,27; Lv19,32; Dt5,16). Contudo, não se deve generalizar, pois a
sabedoria, que é condição para a autorrealização humana, não é prerrogativa da idade,
mesmo que ela seja desejável em quem teve mais tempo para a encontrar
(Sl119,100; Ecle4,13; Jó32,6-9).É curioso notar que já o termo hebraico zaqen,
“velho” ou “ancião”, parece primariamente indicar uma categoria de pessoas em
transição de vida do ponto de vista físico.3Este aspecto é sugerido pela raiz hebraica
zqn, de onde deriva zaqan “barba”, sugerindo não apenas a passagem para a vida adulta.
(apesar da metáfora masculina, é usado também para mulheres), mas o status adquirido
com os anos. Não obstante essa aparente superioridade, o estágio da vida que
corresponde ao envelhecimento e é relacionado ao prestígio moral derivado, seja da
autoridade dos “cabelos brancos” seja da sabedoria de vida, possui fragilidades
temíveis. Afinal, apesar do caráter honroso da velhice exigir o respeito dos mais jovens
(Jó 32,6), as dificuldades persistem e quem vê se aproximar o fim pelo declínio das
forças corre o risco de viver mais de lembranças que de esperanças. Esse perigo parece
ser esconjurado pelo salmista, quando se lembra da bondade de Deus manifestada na
própria história e faz disso uma fonte de esperança que alimenta a sua prece: Tu me
instruíste ó Deus, desde a minha juventude. E até agora anúncio as tuas maravilhas
Mesmo na velhice, no declinar da vida, ó Deus, não me abandones, até que eu anuncie a
força do teu braço a toda geração que vier (Sl71,17-18). O salmista espera não ser
abandonado por Deus na velhice, para que possa anunciar suas proezas, provavelmente
porque a decrepitude o impediria. A certeza do declínio de sua vida lhe permite apenas
esperar, talvez, pelos netos, a geração a quem ele espera comunicar sua esperança em
Deus. Assim, mesmo de forma velada, o salmista faz alusão às limitações que
acompanham o velho. São elas que caracterizam mais nitidamente essa etapa da vida,
de modo a inspirar referências poéticas variadas, ricas em metáforas, como
testemunha o mais impressionante poema bíblico sobre o tema, encontrado no livro do
Eclesiastesou Coélet. O texto de Ecle11,7–12,8 oferece um riquíssimo exemplo do grau
de desenvolvimento lírico e reflexivo que alcançou a literatura sapiencial em Israel.

BEAUVOIR E A VELHICE NA SOCIEDADE ATUAL


Ao abordar o desprezo apresentado pela sociedade com os velhos, Beauvoir (1970)
atribuiu o motivo disso, entre outros, aos interesses e às metas da política de
desenvolvimento econômico traçadas pelas nações. Segundo a filósofa, a fala de espaço
que a sociedade moderna oferece aos idosos é consequência da sua condição de
desempenho físico e cognitivo, que comparativamente é inferior às pessoas jovens.
Beauvoir destacou que toda a sociedade tende a viver e sobreviver, contudo, isso estaria
fortemente ligado ao vigor e a fecundidade (juventude). Por essa razão, indivíduos
velhos seriam vistos como pessoas desgastadas e estéreis.
Em geral, a velhice está fortemente associada a marcadores ligados ao corpo, que
participam ativamente na composição de nossas identidades (LIMA; RIVEMALES,
2013).
Historicamente idosos vêm sendo associados aos termos dependência e
improdutividade, o que difere dos atributos designados aos mais jovens, considerados
como o alicerce, portanto, futuro da sociedade. Nessa perspectiva, idosos são vistos
como âncoras que podem atrasar o desenvolvimento econômico de uma nação. Em
sentido histórico, Beauvoir (1970) teceu uma interessante analogia, dizendo que antes
era função do ancião fazer chover, prever o futuro, ensinar aos jovens os segredos da
pecuária, do cultivo das plantas e da cura medicinal. Entretanto, nos tempos modernos,
esses valores já não são mais importantes porque as pessoas mais velhas teriam perdido
seus postos na sociedade (status quo), não sendo mais úteis para sobrevivência da
espécie. Por fim, Beauvoir complementa: “Ao invés de valorizarmos a experiência
sobrevinda com a idade, a “maturidade”; reduzimos e sufocamos a memória e os
projetos dos idosos, roubamos-lhes a confiança, as possibilidades de caminho e de
sentido. Também nos recusamos a nos reconhecer no velho que seremos”
(BEAUVOIR,1970, p. 221).
No capítulo IV, intitulado “A Velhice na Sociedade de Hoje”, Beauvoir faz referência a
Jean-Paul Sartre por meio de uma analogia entre adultos e velhos: O que se passa no
caso da relação o adulto com o velho é o inverso. O velho –salvo exceções –não faz
mais nada. Ele é definido por uma existe não mais por uma práxis. O tempo o conduz a
um fim –a morte –que não é o seu fim, que não foi estabelecido por um projeto. E é por
isso, que o velho aparece aos indivíduos ativos somos uma espécie “estranha”, na qual
eles não se
reconhecem. (BEAUVOIR, 1970, p. 324).
A filósofa estendeu a reflexão destacando que, de forma geral, os adultos vivem em si
próprios não conseguindo retornar ao passado, sendo incapazes de pensar como
crianças. Do mesmo modo, que sua habilidade para se imaginarem como indivíduos
velhos inexiste, vivendo assim isolados em um hiato.

O papel da Psicologia
A psicologia é das maiores virtudes para a velhice, pois essa é uma etapa do
desenvolvimento humano que exige mudanças e adaptações que não podem ser
simplesmente descartadas ou desconsideradas. Há necessariamente uma sequência de
perdas durante a vida; por isso, é importante que os idosos tenham um lugar para falar
sobre suas perdas significativas, sejam elas de origem familiar, profissional ou com
relação à saúde. Essas perdas, uma vez enxergadas e ressignificadas, podem ser mais
bem aceitas, totalmente incorporadas e, ao invés de serem origem de sofrimentos, dores
ou de doenças psicossomáticas, transformam-se em fatos da vida, em acúmulo de
experiências, em fonte de resiliência, e por aí vai. Uma forma de compreender o
processo de envelhecimento é o de uma sequência de escolhas adaptativas às condições
impostas pela realidade.
Ser idoso não significa estar sozinho, mesmo porque há uma diferença entre isolamento
e solidão. De acordo com a etimologia, “solidão” tem raiz no “solo”, enquanto
“isolamento” tem raiz etimológica em isola, ou seja, ilha, o que nos faz compreender
que “isolamento” remete à perda dos laços sociais, enquanto na solidão há a existência
de laços.
Entretanto, não podemos classificar essa população em uma única maneira, pois há uma
multiplicidade de condições que diversos idosos podem vivenciar e que podem definir
suas características.
Os idosos precisam de novos laços sociais para obter um envelhecimento saudável e um
autoconhecimento elevado, através de atividades que atendam seus repertórios de
interesses e gostos, como arte, política, história ou dança. Além disso, é importante que
os analistas se interessem pelas suas histórias, para que eles possam lidar com seus
ganhos, perdas e limitações de maneira natural.
Envelhecer bem depende de um equilíbrio favorável entre as perdas e os ganhos
trazidos pelo envelhecimento. Afinal, é preciso compreender que cada fase da vida tem
seus desafios e objetivos a serem cumpridos e isso não é diferente na velhice.

ESTEREOTIPOS SOBRE VELHICE COMO NEGAÇÃO DO PROCESSO DE


ENVELHECIMENTO Na Psicologia Junguiana, os abalos da meia idade provêm do medo
e da negação da morte. Jung, (2013, p.364), diz que “não querer viver é sinônimo de
não querer morrer”. De fato, não dá para ser eternamente jovem, tendência comum
no mundo contemporâneo, posto que a vida é movimento. Jung diz (1980, p.88), “que
é um engano supor que o sentido da vida esteja esgotado depois da fase juvenil”. O
entardecer da vida humana é tão cheio de significação quanto o período da manhã. Só
diferem quanto ao sentido e intenção. O homem tem dois tipos de objetivo. O
primeiro é o objetivo natural, a procriação dos filhos e todos os serviços referentes à
proteção da prole; para tanto, é necessário ganhar dinheiro e posição social. Alcançado
esse objetivo, começa a outra fase: a do objetivo cultural. Para atingir o primeiro
objetivo, a natureza ajuda; e, além dela, a educação. Para o segundo objetivo,
contamos com pouca ou nenhuma ajuda. Frequentemente reina um falso orgulho que
nos faz acreditar que o velho tem que ser como o moço ou, pelo menos, fingir que o é,
apesar de no íntimo não estar convencido disso. É por isso que a passagem da fase
natural para a fase cultural é tão tremendamente difícil e amarga para tanta gente;
agarram-se às ilusões da juventude ou a seus filhos para assim salvar um resquício de
juventude. (JUNG, 1980, p.67). De fato, para o segundo objetivo, que significa uma
mudança radical de perspectiva, há pouca ajuda. É uma passagem difícil e é
justamente direcionada para este momento a ocorrência desses gatilhos expressos nas
mídias sociais, que convidam para o querer sentir ainda ser jovem, “dir-se-ia que
sofremos de uma hybris da consciência que nos induz a acreditar que o tempo de
nossa vida é mera ilusão que pode ser alterada a nosso bel-prazer” (JUNG, 2013,
p.365). Jung diz que “o que a juventude encontrou e precisa encontrar fora o homem
no entardecer da vida tem que encontrar dentro de si” (JUNG, 1980, p.88). Diante do
conflito dos contrários, que representa esta passagem, podem ocorrer grandes
mudanças do rumo da vida, mas é preciso conseguir elaborar esse mergulho no
contrário, que seria vencer a ilusão da eterna juventude e assumir as novas tarefas da
descida da montanha. O velho Heráclito, que era realmente um grande sábio,
descobriu a mais fantástica de todas as leis da psicologia: a função reguladora dos
contrários. Deu-lhe o nome de enantiodromia (correr em direção contrária),
advertindo que um dia tudo reverte em seu contrário. (JUNG, 1980, p.65). E como é
difícil dar esse pulo em direção ao contrário. Poderia ser esse o motivo pelo qual
muitos enrijecem, veem o envelhecimento como ameaça, e continuam a viver os
valores da juventude, projetando-se nas mídias sociais. Esta projeção, na verdade,
representa uma regressão, uma impossibilidade de realização da função transcendente
que levaria à superação do processo num movimento de síntese. Cada vez que o
homem se encontra diante de um obstáculo aparentemente intransponível, ele recua,
faz uma regressão, para usar a expressão técnica. Recua ao tempo em que se
encontrava numa situação parecida e tentará empregar novamente os meios que
outrora lhe haviam servido. Mas o que ajudava na juventude já não tem eficácia.
Jung aborda o processo de envelhecimento e morte como parte do processo de
individuação e é no decorrer deste processo que pode ser encontrado uma
amplificação dos conteúdos imagéticos decorrentes dele. A vida é um processo
energético, como qualquer outro, mas em princípio, todo processo energético é
irreversível e, por isto, é orientado univocamente para um objetivo. E este objetivo é o
estado de repouso. No fundo, todo processo é nada mais do que, por assim dizer, a
perturbação inicial de um estado de repouso perpétuo que procura restabelecer-se
sempre. A curva da vida é como a parábola de um projétil que retorna ao estado de
repouso, depois de ter sido perturbado no seu estado de repouso inicial. (JUNG, 2013,
p.362). Na medida em que os objetivos exteriores vão diminuindo de intensidade, o
sujeito volta- se para o si mesmo. É esse contato com o mundo interior que vai
propiciar o processo de individuação, a oportunidade de experenciar a vida e a morte
como parte da vontade do cosmo. Também pode ocorrer a negação da mortalidade,
assim, ficando diante da saúde ou da patologia, do sentido da vida ou da depressão
fatal. A religiosidade, com o seu ímpeto de voltar-se para o interior, pode ser uma
porta aberta para a totalidade, conforme afirma Jung (2013, p. 356) “depois de haver
esbanjado luz e calor sobre o mundo, o Sol recolhe os seus raios para iluminar-se a si
mesmo”. Mas, não é a única procura na velhice, posto que, com o voltar-se para o
interior, encontra-se a totalidade. Na primeira metade de vida, ocupar-se das tarefas
individuais e, na segunda metade, das tarefas da coletividade. Jung (2013, p.353)
comparou o percurso do sol ao nosso processo vital. O sol nasce, eleva-se no horizonte
e encontra-se a pino no meio-dia, passando então a realizar um movimento
descendente, até que se ponha, ao fim da tarde. Jung denomina de Metanóia este
momento do meio-dia, quando, então, é iniciada a descida, com a consciência abrindo-
se para outras finalidades.
Jung (2013, p.353) diz que, “da mesma forma como antigamente ele não se libertou da
infância, assim também agora se mostra incapaz de renunciar à juventude”. Assim
surgem essas soluções míticas, essas imagens nas mídias sociais que aliviam a dor do
encontro com a morte.
A segunda metade da vida é uma grande escola, quando se tem a possibilidade de
entender a essência de viver, o sentido do trabalho, o que significa amar, relacionar-se,
dignidade, realização. É nesse momento, quando é possível ocorrer o aprendizado, que
se descobre que se faz parte de um todo maior, que se atinge o senso de totalidade,
de realização. Enquanto se estava ocupado com as ferramentas necessárias na
primeira metade da vida, não se tinha essa consciência. Neste processo podem surgir
eclosões de fenômenos típicos da meia-idade, é quando podem eclodir crises no
casamento, no trabalho, na relação com os filhos.
Todos os distúrbios neuróticos, bastante frequentes, da idade adulta tem em comum o
fato de quererem prolongar a psicologia da fase juvenil para além do limiar da
chamada idade do siso. Mas, é justamente esse processo doloroso que pode levar o
indivíduo para uma solução, para o processo de individuação. É no momento que não
se tem respostas que se encontra a solução, como a frase que Eduardo Galeano
encontrou num muro de Quito, “quando tinha todas as respostas, mudaram as
perguntas”. E na figura do poderoso arquétipo do Velho Sábio que é possível encontrar
a reconexão. A sabedoria seria nada mais do que o viver com autenticidade, a questão
é como chegar a esse momento. Uma das possibilidades seria, justamente, o
entendimento de que um novo ciclo se abre. Os próprios sinais de envelhecimento
podem levar a esta possibilidade.
A transformação, esse é o caminho que está dado, o caminho que aponta a mitologia e
o segredo seria justamente esse tempo livre na segunda metade da vida, sem as
tarefas do cotidiano que poderia levar a um salto qualitativo e descobrir a sapiência ao
redor. Uma das saídas possíveis, que daria cor e calor à segunda metade da vida, leva à
conexão com o Velho Sábio, que vem a ser a expressão do Self - Eu.
O encontro com o Velho Sábio ocorrerá quando for possível o mergulho no fundo de si
mesmo e surgir o entendimento de que o que está sendo negado é os componentes
básicos do desenvolvimento. Dessa forma, é possível integrar o valor vida à
personalidade da pessoa idosa, fazendo-o descobrir em si o arquétipo do Velho Sábio. E
fazer prosseguir numa caminhada que é o objetivo central da vida, a tarefa da Metanóia.
A busca do autoconhecimento, gerando um equilíbrio dos contrários, com a
possibilidade de se tornar uma totalidade.
O psicólogo suíço Carl Gustav Jung afirmava que deveria haver um sentido para
o envelhecimento, pois não chegaríamos a idades tão avançadas, se não houvesse um
propósito para a espécie.

Idoso e a Terapia Cognitivo-Comportamental


A TCC entende a 3ª idade através de uma perspectiva biopsicossocial, ou seja, olha o
idoso pelo aspecto do envelhecimento biológico, psicológico e social. O envelhecimento
biológico diz respeito ao que acontece no corpo, como: alteração da memória, do
sistema imunológico, da atenção, lentificação do pensamento quando sob pressão etc. O
envelhecimento pelo aspecto psicológico é o que acontece com o emocional da pessoa,
ou seja, como esta lida com o seu corpo e sua vida na velhice. Podem ser encontrados
traços de desmotivação, depressão, baixa autoestima etc. O envelhecimento pelo
aspecto social é o que acontece na relação do sujeito com o mundo, podendo resultar em
isolamento (por vontade própria ou indução de outros), perda de ideais da juventude,
sujeição à violência contra o idoso (familiares, instituições asilares e governo), perda de
projetos existenciais. Os aspectos sociais positivos também devem ser percebidos e
reforçados.
É função do Psicólogo Cognitivo-Comportamental que atua na 3ª idade, reestruturar
pensamentos disfuncionais, dando mais ênfase aos pensamentos e comportamentos
adaptativos; atuar juntamente com profissionais de outras áreas, fazendo um
acompanhamento completo deste idoso; busca encontrar juntamente com o paciente,
formas de transformar pensamentos e situações que afetam sua auto-estima e vida social
em oportunidades positivas, fazendo com que ele aprenda a lidar melhor com as
situações e com ele mesmo e, principalmente, que descubra objetivos pelos quais viver.
A melhoria da qualidade de vida é alcançada através da longevidade com saúde
biológica e mental, satisfação com a vida, competência social, atividade e produtividade
e bom desempenho cognitivo (que é o processo de aprendizagem de informações que a
pessoa registra, percebe e conclui de acordo com o que aprendeu ao longo de sua
história).

Viver é aprender a conviver com suas próprias limitações, sendo feliz e fazendo os
outros felizes, fazendo com que sua vida tenha qualidade. Se a velhice é inevitável para
quem vive, vamos aprender a viver melhor.

Vida natural é o solo em que se nutre a alma. Quem não consegue acompanhar essa
vida, permanece enrijecido e parado em pleno ar. É por isso que muitas pessoas se
petrificam na idade madura, olham para trás e se agarram ao passado, com um medo
secreto da morte no coração. Subtraem-se ao processo vital, pelo menos
psicologicamente, e por isto ficam paradas como colunas nostálgicas, com recordações
muito vividas do seu tempo de juventude, mas sem nenhuma relação vital com o
presente.  Do meio da vida em diante, só aquele que se dispõe a morrer conserva a
vitalidade, porque na hora secreta do meio-dia da vida inverte-se a parábola e nasce a
morte. (JUNG, 1984,§ 800).

http://www.psicare.com.br/idoso-e-terapia-cognitivo-comportamental/
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