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15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

Tema: “80 anos do Serviço Social no Brasil: a certeza na


frente, a história na mão”
Olinda (PE, Brasil), 5 e 9 de setembro de 2016

AS RELAÇÕES DE GÊNERO NA VELHICE: ATRIBUIÇÕES SOCIAIS DO HOMEM


IDOSO E DA MULHER IDOSA1

Maria Florência dos Santos1


Soraia Veloso Cintra2
Nanci Soares3
Vivia Santos Santana4

Resumo: O trabalho é fruto de uma pesquisa bibliográfica. O objetivo geral foi: compreender
as relações de gênero na velhice; e específicos: entender o processo de envelhecimento
biopsicossocial e identificar os papéis sociais atribuídos ao homem idoso e a mulher idosa. Na
velhice, as pessoas idosas continuam se relacionando de acordo com os papéis sociais que
foram impostos para elas durante toda a vida.
Palavras-Chave: Pessoa Idosa. Velhice. Gênero. Papéis Sociais.

Abstract: The work is the result of a literature search. The general objective was: to understand
gender relations in old age; and specific: to understand the biopsychosocial aging process and
identify the social roles assigned to the old man and the old woman. In old age, older people
remaining connected in accordance with the social roles that were imposed to them throughout
their lives.
Keywords: Elderly. Old age. Gender. Social roles.

INTRODUÇÃO

O artigo ora apresentado trata da discussão das relações de gênero na


fase da velhice. A população idosa está crescendo e segundo dados do censo
realizado pelo IBGE no ano 2000, a população de pessoas com 60 anos ou
mais de idade era de quase 15 milhões (representando 8,6% da população
brasileira), sendo que o número de mulheres idosas representava em 1991 o
equivalente a 54% da população idosa, passando em 2000 para 55,1%. Esta
realidade mostra a feminização da velhice (IBGE, 2002). Ainda segundo dados
do censo 2000 pelo IBGE (2002) 62,4% das pessoas idosas eram
responsáveis pelos domicílios brasileiros, o que representa um aumento
considerável se comparado ao ano de 1991 que era de 60,4%.

1 Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista Júlio de


Mesquita Filho. E-mail: <trabalhos@alvoeventos.com.br>.
2 Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista Júlio de

Mesquita Filho. E-mail: <trabalhos@alvoeventos.com.br>.


3 Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista Júlio de

Mesquita Filho. E-mail: <trabalhos@alvoeventos.com.br>.


4 Universidade Federal de Sergipe. E-mail: <trabalhos@alvoeventos.com.br>.
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O processo de transição demográfica modifica as taxas de mortalidade e


fecundidade/natalidade, passando assim para outro regime com essas taxas
relativamente mais baixas, processo que provoca alterações na estrutura etária
da população. Na Europa este processo ocorreu lentamente, já no Brasil foi de
forma rápida (BORGES, CAMPOS, SILVA, 2015), e isto provoca
preocupações, pois será que o país está preparado para atender as demandas
que iram surgir?

Até a década de 1950 a estrutura etária era de uma pirâmide de base


larga, com maioria de crianças e jovens, e as taxas de natalidade eram de 6
filhos por mulher, mas esta realidade vem mudando, pois em 2000 esta taxa
era de 2,5 filhos por mulher, em 2010 passou para 1,9 com estimativas para
chegar em 2030 com 1,5 filho por mulher, ou seja, a endência é que a taxa de
fecundidade continuará caindo (BORGES, CAMPOS, SILVA, 2015).

A população entre 15 a 29 anos de idade também teve uma diminuição,


pois em 2000 era de 28,2%, em 2010 caiu para 26,7% e devem alcançar em
2030 cerca de 21,0%, (BORGES, CAMPOS, SILVA, 2015). Já a população
adulta entre 30 a 59 anos de idade tem crescido, pois “Esses adultos, que
correspondiam a 59,2 milhões de pessoas em 2000, representando 33,6% da
população, devem alcançar 95,4 milhões em 2030, ou 42,7% da população”
(CAMPOS, BORGES, SILVA, 2015, p. 146).

Mas a parcela da população que mais cresce no Brasil é a idosa, e os


dados mostram que, “A população com 60 anos ou mais de idade passa de
14,2 milhões, em 2000, para 19,6 milhões, em 2010, devendo atingir 41,5
milhões, em 2030, e 73,5 milhões, em 2060. Espera-se, para os próximos 10
anos, um incremento médio de mais de 1,0 milhão de idosos anualmente”
(CAMPOS, BORGES, SILVA, 2015, p. 146). Os dados revelam que o Brasil
será um país de “velhos” num futuro próximo, assim é necessário pensar como
estão as políticas de atendimento a este segmento populacional? Também é
importante refletir acerca das relações sociais entre pessoas idosas? E quais
os papeis sociais atribuídos ao homem e a mulher idoso (a)? Quais espaços
sociais são oferecidos para ambos? Sabe-se, que historicamente foi imposto a
mulher o ambiente doméstico e privado, e ao homem o ambiente externo e

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público, embora esta realidade esteja mudando gradativamente. Mas as


pessoas idosas que estão vivenciando a fase da velhice nos dias atuais,
provavelmente na sua maioria, tiveram uma educação com costumes
tradicionais, com funções preestabelecidas para a mulher e para o homem,
ficando a primeira com a responsabilidade do cuidado da casa e dos demais
membros, e o segundo com o cargo de sustentar a família e livre para
participar no ambiente público.

Diante de todo o exposto, fica explícito a necessidade de estudos para


compreender como está ocorrendo o processo de envelhecimento e como as
pessoas idosas estão vivenciando a velhice. Assim, foi desenvolvida uma
pesquisa bibliográfica, com objetivo geral de compreender as relações de
gênero na velhice; e específicos, de entender o processo de envelhecimento
biopsicossocial e identificar os papéis sociais atribuídos ao homem idoso e a
mulher idosa. Primeiramente foi abordado de forma breve sobre o processo de
envelhecimento biológico, social e psicológico, pois sabe-se, que este processo
é experimentado de maneiras diferente por cada pessoa. Em seguida, foi
discutido sobre as relações estabelecidas e os papeis sociais exercidos pelas
pessoas idosas na velhice, que sofrem um reflexo da cultura e da educação
que esta geração, hoje de velhos (a), tiveram durante toda a vida.

O PROCESSO BIOPSOCISSOCIAL DO ENVELHECIMENTO

A expectativa de vida no Brasil aumentou significativamente, e os dados


mostram que em 2025, ele o sexto país em maior numero de pessoas idosas
(World Health Organization, 2005). Isto é um avanço para humanidade, mas é
necessário saber como estão as condições desse envelhecimento, no que se
refere as relações estabelecidas entre homens idosos e mulheres idosas. O
Envelhecimento pode ser biológico, social e psicológico, e cada indivíduo
poderá vivencia-lo de maneiras diferentes, pois irá depender do estilo de vida
que teve durante toda a vida e que permanece tendo na velhice, e também da
forma que cada indivíduo enfrenta a vida. Assim, na sociedade contemporânea,

As concepções de velhice nada mais são do que resultado de uma


construção social e temporal feita no seio de uma sociedade com
valores e princípios próprios, que são atravessados por questões
multifacetadas, multidirecionadas e contraditórias. Na época

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contemporânea, florescer do século XXI, ao mesmo tempo em que a


sociedade potencializa a longevidade, ela nega aos velhos o seu
valor e sua importância social. Vive-se em uma sociedade de
consumo na qual apenas o novo pode ser valorizado [...] Nesta dura
realidade, o velho passa a ser ultrapassado, descartado, ou já está
fora de moda. (SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008, p. 587).

A sociedade vive um momento de longevidade, mas estas pessoas que


estão envelhecendo ainda não usufruem de uma valorização, pois há uma
ênfase ao consumo, e a tudo aquilo que é novo, e ao velho descarta-se. Isto
acontece com os bens matérias e se entende as relações humanas. Assim,
percebe-se que muito ainda se tem para avançar, para conquistar uma velhice
com qualidade e dignidade. Além disso, tem a questão do gênero que precisa
ser compreendida, pois se sabe que a sociedade, possui uma cultura machista,
de valorizar o homem em detrimento da mulher. Assim pode-se observar que
“[...] a velhice não poderia ser compreendida senão em sua totalidade; ela não
é somente um fato biológico, mas também um fato cultural” (BEAUVOIR, 1990,
p. 20), desta forma cada sociedade tem uma maneira de perceber e tratar a
velhice, assim como as próprias pessoas idosas tem um modo de se relacionar
nesta fase da vida, sempre de acordo com sua cultura.

Sobre o envelhecimento biológico, é um processo continuo através de


mudanças no corpo e na mente e que se inicia antes do nascimento e se
prolonga durante toda a vida do indivíduo (SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008).
Assim este processo ocorre através de,

[...] Alterações morfofisiológicas que, paulatinamente, modificam o


organismo do indivíduo tornando-o mais sujeito a eventos
traumáticos. Entre as alterações mais significativas pode-se
relacionar: a diminuição da amplitude dos movimentos, redução da
massa óssea, diminuição da massa muscular e diminuição das
respostas neurológicas (FREITAS et al. 2014, p.72).

Assim, o organismo passa por diversos tipos de modificações


acarretando ao envelhecimento, que poderá acarretar perdas de autonomia
e/ou dificuldades para realizar determinadas tarefas, a exemplo de desenvolver
todas ou algumas das Atividades de Vida Diária e as Atividades Instrumentais
da Vida Diária2(OMS, 2005), mas isto também depende da qualidade de vida
que esta pessoa teve, pois o, “Envelhecimento ativo é o processo de
otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o

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objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais


velhas” (OMS, 2005, p.13). Esta política visa melhorar a qualidade de vida da
pessoa durante toda a vida com a adoção de práticas de cuidado com a saúde,
com a participação das pessoas nas questões econômicas, sociais e culturais
da sociedade, entre outras.

Sobre a idade social ainda segundo (SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008),


envolve “a cultura, o gênero, a classe social, o transcorrer das gerações e as
condições de vida e de trabalho” (p.590), ou seja, a idade social vai depender
daquilo que é atribuído por cada cultura para seus membros desenvolverem,
engloba a função social de cada sujeito, imposta pelo gênero, e as condições
de vida, pois aqueles que são provenientes da classe trabalhadora, que
viveram explorados pelo capital e sempre tiveram restrições para adquirir o
básico para sobreviver, terá maiores dificuldades na velhice e poderá até
apresentar questões sociais, uma vez que, já vem de um processo de lutas e
de exploração, que na velhice poderá se agravar. Assim, fica evidente que o
envelhecimento não é uma experiência igual para todos, mas um processo
heterogêneo. Que irá depender das condições de vida de cada sujeito.

Na velhice a pessoa enfrenta diversos tipos de mudanças e [...] o


envelhecimento social é aquele em que, conforme o passar dos anos vão se
transformando as relações sociais em que o idoso está inserido, a exemplo da
aposentadoria. (FUZINATTO; PESSÔA; GAVIRAGUY, 2010, p. 67). Assim
poderá haver mudanças nesse período, pois há um afastamento do ambiente
de trabalho, com a aposentadoria ocorre uma ruptura com o local que a pessoa
passou parte da sua vida, com amigos que conquistou, com o status adquirido.
Este processo poderá ser doloroso para pessoa idosa, que poderá trazer
solidão, isolamento social ou poderá ser substituída por outros espaços, como
a participação em grupos de convivência de pessoas idosas e/ou de grupos de
universidade aberta a terceira idade. Ambos oferecem atividades para esta
parcela da população.

Sobre o envelhecimento psicológico “A idade psicológica pode também


ser definida pelos padrões de comportamento adquiridos e mantidos ao longo

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da vida e tem uma influência direta na forma como as pessoas envelhecem.”


(SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008, p. 591).

AS RELAÇÕES DE GÊNERO ENTRE AS PESSOAS IDOSAS

A questão de gênero é uma temática complexa, pois a sociedade tem


uma forte herança cultural de machismo e preconceito, pois segundo Carvalho
(2011, p. 144) “A mulher, no período colonial, deveria ser preparada para o
casamento, sendo obediente ao seu marido, reverenciando-lhe, não podendo
fazer coisa alguma sem seu conselho”. Houve mudanças, as mulheres lutaram,
entraram no cenário político, reivindicaram direitos, através do movimento
feminista. Elas obtiveram muitas conquistas, mas muito ainda se tem para lutar,
pois ainda reina práticas de violência, discriminação e inferiorizarão da mulher
com relação ao homem.

Existe na sociedade contemporânea uma dificuldade de diferenciar o


sexo do gênero, pois ambos são conceituados como se fossem sinônimos,
uma vez que,

As sociedades humanas, com uma notável monotonia,


sobrevalorizam a diferenciação biológica, atribuindo aos dois sexos
funções diferentes (divididas, separadas e geralmente
hierarquizadas) no corpo social como um todo. Elas lhe aplicam uma
“gramática”: um gênero (um tipo) “feminino” é culturalmente imposto a
fêmea para que se torne uma mulher social, e um gênero “masculino”
ao macho, para que se torne um homem social (MATHIEU, 2009, p.
222).

Percebe-se assim, que a sociedade impõe uma diferença entre os sexos


e atribui funções a cada um deles. O gênero na verdade é aquilo que se
constrói socialmente independente do sexo que a pessoa nasce, seria aquilo
que a pessoa se reconhece, os lugares que ela ocupa, pois “A categoria
gênero incorpora atributos e funções - socialmente construídos - que
configuram diferenças e inter-relações entre os sexos, que vão além do
biológico” (FERNANDES, p. 706, 2009). Estudos mostram que entre a
população idosa, há uma predominância para o sexo feminino (FIGUEIREDO,
et al., 2007). E como ficaria está questão na fase da velhice? Como homens
idosos e mulheres idosas estão se relacionando na velhice? É algo para refletir,
pois esta população só tende a crescer, e [...] o homem não vive nunca em

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estado natural; na sua velhice, como em qualquer idade, seu estatuto lhe é
imposto pela sociedade á qual pertence. [...] (BEAUVOIR, 199, p. 15), são as
normas e os papeis sociais que a sociedade impõe e espera que cada um
desempenhe, envolvendo também as condições socioeconômicas.

O numero de pessoas idosas vem crescendo consideravelmente no


Brasil, diante desta realidade muitas pesquisas vem sendo desenvolvidas
sobre o envelhecimento e a velhice, assim será apresentada e discutida o
resultado de três pesquisas que foram desenvolvidas por Fernandes (2003),
Figueiredo et al (2007) e por Fernandes e Garcia (2010).

Um estudo realizado por Fernandes (2009) com seis homens e dez


mulheres participantes de um grupo de convivência de pessoas idosas, que
teve como objetivo apreender a auto e a heteropercepção de homens e
mulheres sobre os papéis sociais exercidos na velhice, os resultados
demonstraram que os participantes da pesquisa requisitam para si e para o
outro (do sexo aposto) a execução de funções estabelecidas pela sociedade
machista, incumbindo o público ao homem, e o privado a mulher. Os resultados
mostram ainda que embora tenha-se atingido algumas mudanças na
sociedade, ainda persiste ideias machistas e preconceituosas. Embora a
mulher tenha conquistado uma série de direitos sociais, em se tratando
especificamente da situação dela no Brasil, ainda necessita de muitas
transformações, pois,

[...] as mulheres apresentam maior escolaridade do que os homens,


mas predominam em atividades precárias e informais; estão
concentradas nas faixas mais baixas de renda e ganham sempre
menos do que eles, mesmo quando trabalham a mesma carga
horária em ocupação igual. Essa disparidade afeta, sobretudo, as
mulheres negras e pardas. O Estado também não tem oferecido uma
política de creche adequada, o que tem reforçado a permanência de
uma divisão desigual do trabalho doméstico. (PITANGUY; MIRANDA,
2006, p. 25).

Assim, durante toda a sua vida a mulher enfrenta diversos empecilhos


para conquistar seu espaço no meio social, como os baixos salários, cuidar dos
filhos, e se submente a uma dupla jornada de trabalho, pois realiza as
atividades domésticas, depois de enfrentar um dia exaustivo de trabalho. E na
fase da velhice continua sofrendo os reflexos dessa cultura que dita as regras

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“da mulher ser do âmbito privado”. Assim, “Para alguns autores, as mulheres
na velhice experimentariam uma situação de dupla vulnerabilidade, com o peso
somado de dois tipos de discriminação – como mulher e como idosa (...)”
(DEBEET, 1999, p. 140).

A pesquisa desenvolvida por Figueiredo et al (2007) com vinte pessoas


idosas participantes de um Programa Terceira Idade em Ação-PTIA, com
objetivo de investigar as questões de gênero que interferem na saúde e na
qualidade de vida, foi identificado que os homens adquirem uma baixa auto-
estima na velhice, devido as perdas sociais de papéis, a mudança de status, de
trabalhador passa a ser um aposentado; também foi identificado a conquista da
autonomia e da liberdade pelas mulheres idosas e o aprendizado que estas
adquirem participando do PTIA. A conclusão da pesquisa foi que estas
questões relacionadas ao gênero influenciam na saúde e qualidade de vida, na
fase da velhice de homens e mulheres.

Homens e mulheres vivenciam a velhice de maneiras diferentes. E os


papéis desempenhados pelo sexo masculino durante toda a sua vida é ser
forte, trabalhar, ser independente, chefiar a família, e na velhice poderá
apresentar doenças, desgaste físico, enfim, apresentar perdas significativas.
Além disso, quando um aposentado passa a ficar mais tempo no âmbito
doméstico, que para ele era o espaço feminino, poderá gerar situações difíceis
para o homem idoso, com relação a ocorrência destas transformações e perda
de status, que a aposentadoria poderá trazer. Já a mulher, que mesmo que
tenha ocupado cargos fora do âmbito doméstico, e que também exercia a
função de cuidar da casa e dos filhos, estando mais acostumada com estes
ambientes, poderá encarar a velhice de forma diferente. O gênero e os papéis
sociais exercidos durante toda a vida de homens e mulheres podem fazer bem
ou não quando chegam na fase da velhice. Sobre a diferença da velhice
vivenciada por homens e mulheres, Debert (1999) afirma que,

[...] A velhice feminina seria mais suave do que a masculina, na


medida em que a mulher não experimenta uma ruptura em relação ao
trabalho tão violenta como a dos homens na aposentadoria. Os
vínculos afetivos entre filhos e mães são mais intensos, e por isso os
filhos estão mais dispostos a cuidar delas do que de seus pais idosos
[...] (1999, p. 140).

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O homem passa por um processo de socialização que lhe


atribui a função de ser forte, de ter poder e de mandar, ser chefe, e
na velhice com a perda parcial ou total desse poder, as relações sociais podem
transformar-se, e seu modo de ver a vida pode ser afetado, pois,

O modelo hegemônico de masculinidade é centrado no controle da


afetividade, em trabalhar, exercer exacerbadamente a sexualidade,
não controlar riscos, e situar-se em uma cultura distante do
autocuidado. Dessa forma, esses hábitos levam o homem ao longo
de sua trajetória a um estilo de vida prejudicial à saúde, que deságua
em uma qualidade de vida precária na velhice e em uma expectativa
de vida inferior à das mulheres (NOGUEIRA, ALCÂNTARA, 2014, p.
267).

Assim, a mulher tende a se cuidar mais, a dar maior atenção a sua


saúde, fatores que podem contribuir para uma expectativa de vida maior das
mulheres. Além da dificuldade que o homem poderá apresentar em relação a
como aproveitar seu tempo após a aposentadoria, quais atividades irá
desenvolver, pois estava acostumado com o âmbito público.

Segundo Fernandes e Garcia (2010) ao desenvolverem um estudo com


dezoito mulheres idosas e onze homens idosos, participantes de um grupo de
convivência, sobre o sentido da velhice, foi identificado que os idosos se
sentem jovens, e que só a idade e a aposentadoria é que lhes fazem estar
nessa categoria de velhice, pois já não estão produzindo ativamente como
trabalhadores e a partir dos 60 anos vem a aposentadoria, pois são
considerados idosos; outros acreditam ser a velhice uma ameaça para sua
capacidade funcional e autonomia; já as idosas veem a velhice como algo
negativo, pois é uma fase de doenças, mudanças físicas, o corpo já não é o
mesmo, e a beleza aos poucos vai dando espaços as rugas, aos cabelos
brancos, mas também é vista como uma fase de liberdade, de aproveitar o que
não teve na juventude, devido o fato de terem casado muito novas,
dependerem financeiramente dos seus maridos, estes serem ciumentos, não
permitirem que elas saíssem, algumas por terem sofrido algum tipo de
violência, e por terem passado a vida no âmbito privado sob o comando do
marido, chefe da família e elas sempre submissas. Assim, para as mulheres a
velhice é vista de forma contraditória, ora de forma negativa, ora de forma
positiva.

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No que se refere a questão da beleza é imposta pela sociedade uma


cultura de juventude eterna, pois, (...) A promessa da eterna juventude é um
mecanismo fundamental de constituição de mercados de consumo (...)
(DEBERTE, 1999, p. 66). Assim, a sociedade cobra e exige, principalmente da
mulher idosa que se cuide, e estas são obrigadas a tentar amenizar os sinais
da velhice, pois existe os estereótipos da velha feia, enrugada, etc. Diante
desta realidade, pode-se observar que,

As três propostas: educação, trabalho e família – tripé onde se


assentam as ideias, valores e normas, isto é, o conjunto de
representações sobre a velhice -, formuladas pela geriatria e pela
gerontologia, estão articuladas contraditoriamente, porém, de tal
maneira que formam um todo integrado. Configuram um “modelo” a
ser utilizado pelo homem para relacionar-se com seu corpo, com os
outros homens e com a vida (HADDAD, 1986, p 53).

É imposto pela geriatria e gerontologia essa articulação de educação,


trabalho e família, para que juntos possam diminuir as sequelas do
envelhecimento, mas isto não leva em consideração a trajetória de vida desses
homens idosos e mulheres idosas. Homens que trabalharam para sustentar
suas famílias, que foram explorados pelo capital durante toda sua vida, que
tiveram que mostrar sua virilidade, seu lado macho, imposto pela cultura
dominante, que cresceram sem poder fraquejar para mostra que são machos,
mulheres que tiveram que desde muito cedo assumir responsabilidades de
serem esposas, mães, trabalhadoras, muitas vezes com duplas jornadas de
trabalho, de serem submissas as ordens do marido, e até de sofrem diversos
tipos de violência.

Nas pesquisas citadas anteriormente, fica evidente a presença de


maioria feminina nos centro de convivência. Estes espaços foram criados para,

Contudo, os programas para a terceira idade criaram um espaço


coletivo para a redefinição de formas de sociabilidade e de estilos de
vida para as mulheres que, ante as perdas indesejadas, buscam
novas formas de viver a liberdade que lhes é apresentada. Nas
associações de aposentados, homens de mais idade conquistaram
um espaço coletivo em que são chamados pelos diferentes atores
políticos para repensar o futuro do país, rever os limites políticos e
econômicos da nação, pensar e executar novas estratégias politicas.
Enfim, pôr em prática a lucidez alcançada ao longo de tantas
experiências vividas a serviço dos mais velhos e também dos mais
jovens, que começam a entender que um dia vão envelhecer
(DEBERT, 1999, p. 189).

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Estes programas são iniciativas que só crescem no Brasil e que


contribuem para o desenvolvimento das potencialidades e habilidades da
população idosa. Também dão visibilidade a velhice. A autora deixou explicito
que a participação feminina nos programas de terceira idade é majoritária, já
nas associações de aposentados tem uma maior participação dos homens, o
que envolve uma questão de gênero, de papéis sociais historicamente
atribuídos ao homem e a mulher. Assim, o Movimento dos Aposentados 3
envolve política, espaço público, que pertence historicamente ao homem, pois
isso foi ensinado a este homem, hoje idoso; e espaços de socialização, com
atividades recreativas, de lazer, de cuidado com a saúde, foram reservados
para as mulheres, pois esta foi educada para cuidar. Embora esta realidade
esteja mudando.

Pode-se ser citar, como espaços destinados as pessoas idosas, as


Universidades Aberta a Terceira Idade-UNATI’s, desenvolvidas pelas
universidades federais, estaduais e particulares. Um exemplo de universidade
que desenvolve este trabalho com UNATI’s é da Universidade Estadual
Paulista “Júlio de mesquita Filho-UNESP onde “As UNATIs estão distribuídas
em diversas unidades universitárias da UNESP, tais como Araçatuba,
Araraquara, Assis, Bauru, Botucatu, Franca [...]” (SOARES, DI GIANNI, 2008,
p. 17)”. Têm-se ainda os Centros de Convivência para Idosos-CCI’s, os
Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos da Pessoa Idosa-SCFV.
Outro espaço seria as organizações/movimentos de aposentados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As relações sociais entre homens e mulheres são construções


históricas, sociais e culturais, que podem ser diferentes de uma sociedade para
outra, além de sofrer modificações com o passar do tempo, acompanhando o
movimento da sociedade. O gênero e o sexo muitas vezes são vistos como
sendo a mesma coisa, e a sociedade atribui papéis ao homem e a mulher, a
partir da divisão entre os sexos. Mas o gênero vai além do biológico,
envolvendo a identidade e aquilo que a pessoa desenvolve e se reconhece.

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A discussão mostrou que homens e mulheres ao envelhecerem passam


a enfrentar dificuldades e/ou possibilidades de encararem a velhice como algo
positivo ou negativo, isto vai depender da sua história de vida, pois os homens
que tiveram uma educação para serem o chefe da casa, arcar com as
despesas e cuidar da família, e ser sempre forte, podem na velhice sofrer com
a aposentadoria, afastamento das atividades laborativas, e com possíveis
doenças que poderá desenvolver e/ou com o agravamento de algumas já
adquiridas ao longo da vida, além da dificuldade de se adaptarem a nova rotina
de não estar mais no mercado de trabalho e passar maior parte do seu tempo
no ambiente doméstico, que para cultura machista era um ambiente feminino.

Já para as mulheres, que foram educadas para serem esposas, mães,


donas de casa, e algumas que conseguiram ultrapassar este limite privado,
para ser também trabalhadora, a velhice poderá ser uma fase de medo das
doenças, das mudanças físicas, pois a sociedade exige que a mulher esteja
sempre bem cuidada e bonita, e impõe a regra de uma juventude eterna, mas
também poderá ser uma fase de liberdade, onde ela poderá participar de
grupos de convivência, desenvolver atividades que antes era impossibilitada,
pelo ciúme do marido, pelas atividades domésticas e pelo trabalho fora do lar, e
até pela violência que sofreu de não poder decidir a sua própria vida, sendo
privada dessa liberdade, pois ora eram os pais quem zelavam pela sua honra,
ora era o marido. Esta realidade está mudando, mas ainda é preciso muitas
lutas, pois a mulher ainda continua na sociedade contemporânea sendo
inferiorizada em relação ao homem.

REFERENCIAS

BEAUVOIR, Simone. A Velhice. Tradução Maria Helena Franco Monteiro. Rio


de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

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1 O artigo foi desenvolvido como forma de avaliação na Disciplina Gênero e Serviço Social no
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais
da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP. Campus de Franca.

2 Atividades de vida diária (AVDs) e atividades instrumentais de vida diária (AIVDs). As AVDs
incluem, por exemplo, tomar banho, comer, usar o banheiro e andar pelos cômodos da casa, e
as AIVDs incluem atividades como fazer compras, realizar trabalhos domésticos e preparar
refeições (OMS, 2005, p14).

3 COBAP - Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas fundada em 1984 que


surgiu através da organização de grupos de aposentados.

Anais do 15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

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