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Religiões do Mundo, Módulo II

Disciplina: Aula 01 Teofania  E Ser Humano

Data: Transcrição 13 02 2021

Professor: Luiz Gonzaga de Carvalho

Este texto não foi revisado pelo autor.

Antes de começar este modulo, alguém me mandou um e-mail, não lembro


quem foi, perguntando sobre uma questão que levantei em uma das aulas .
Houve um momento em que falei: Embora exista uma descontinuidade de
principio entre o limitado e o ilimitado, entre a ordem divina e a ordem
humana ou temporal, ou criada. Essas duas ordens se encontram em
inúmeras ocasiões. A ordem criada é ordenada para ordem incriada, ela
está voltada para esta ordem da natureza, porque ela deriva da ordem
incriada.

Quais são os critérios para saber, quando ocorre efetivamente um desses


encontros?
Quando um determinado fenômeno, evento ou pessoa é uma manifestação
do encontro dessas duas coisas.
 A primeira coisa é que você não tem como reconhecer todo e qualquer
encontro entre a ordem criada e incriada. Vai existir algum momento em
que a ordem criada se manifestou com a ordem incriada ou se apresentou à
ilimitada ou ordem divina. Alguns encontros você não vai reconhecer como
encontros entre a ordem divina e humana, mas para o sujeito entender
esses encontros, para ter algum critério para reconhecer o que ele puder
reconhecer vale o critério geral de reconhecimento das teofanias. Esses
encontros são propriamente manifestações ou aparições ou mostrações do
divino na ordem terrestre. A primeira coisa que acontece quando um
individuo humano encontra o divino, a primeira reação, o jeito de
reconhecer, algo que aparece é divino, é pelos efeitos que aquilo causa em
você.

O primeiro efeito é geralmente de grande temor ou insegurança. Por


definição, Deus é terrível para o homem. Uma manifestação divina só não
traz, imediatamente, como primeiro efeito um intenso sentimento de temor
ou insegurança quando anteriormente o sujeito já estava numa situação de
temor. Por exemplo, o sujeito estava diante da morte, e estava diante da
perda de qualquer coisa de grande valor para ele. Então, ele já estava
numa situação de intenso temor e aparece uma manifestação
misericordiosa ou salvífica. Ele leu alguma coisa, alguém fez algo por ele ou
aparece um anjo e alivia aquilo, nesse caso o sujeito pode não perceber a
dimensão terrifica da manifestação divina, porque ele já estava num estado
de temor antes. Nunca acontece de Deus se manifestar, e o primeiro efeito
é um efeito de alivio. Se ele estava num estado normal, um dia normal da
vida dele e alguma coisa divina aparece, ele não vai se sentir aliviado, mas
aterrorizado. Por que? porque não há nada no individuo humano que possa
fixa-lo na ordem divina. Toda vez que Deus aparece para homem, Ele está
dizendo o seguinte: "olha você está separado de mim e não há nada que
você possa fazer, para não estar separado". O primeiro sentimento que vem
na mente do sujeito diante de uma manifestação divina é a certeza de que
ele está no inferno, é certeza de que ele está fora daquilo.

Em segundo lugar, se apresenta para o sujeito claramente uma escolha,


uma adesão daquilo que ele percebe, que está diante dele ou uma rejeição
daquilo. Esse é o segundo, a escolha que aparece diante dele. Há, ou eu
faço isso ou eu faço aquilo. ou aceito isso, ou rejeito isso.

A terceira coisa, é a inteligibilidade. Quando o sujeito aceita, ele entende na


hora o que era aquilo. A inteligibilidade de uma manifestação divina pode se
dar em graus. O sujeito pode compreender mais e mais aquilo no decorrer
dos anos. Uma vez que ele aceitou, o sentido imediato ele capta.  No
individuo humano as coisas crescem de baixo par cima. O Primeiro efeito
que é responder mais rápido à uma manifestação divina é a afetividade,
depois a volitividade, depois a vontade e depois a inteligência. A única
exceção para isso são os atos da própria inteligência, mas os atos da
própria inteligência são uma espécie de manifestação divina natural para o
ser humano, quer dizer, a inteligência tem uma co-naturalidade com Deus e
entender qualquer coisa que seja é evidentemente uma manifestação
divina.

Essa ordem (8:28 min) de efeitos no sujeito, deriva da própria estrutura


do real. Um dos conceitos que temos que entender o que há de comum
entre todas as outras religiões, se te um elemento já de começo é uma
determinada estrutura cosmológica, todas elas têm uma visão estrutural do
cosmo que é mais ou menos idêntica. E segundo essa visão, a realidade, o
conjunto das coisas reais, ou seja, atuais e possíveis, se ordenam um de
quatro graus, tudo que existe, existe uma de quatro maneiras. Essa
realidade pertence à própria ordem do ilimitado, a ordem divina, ou ela
pertence a ordem do espirito, ou ela pertence a ordem psíquica, ordem da
alma, ou ordem física, corpórea.  Resumindo, a realidade tem quatro
andares.

Os três últimos andares, o espirito, psíquico e corporalidade, o três


pertencem ao que o cristianismo chama de ordem criada, ou como dizem no
hinduísmo, ordem condicionada. Todos os entes ou fenômenos que se dão
nessas três ordens estão sujeitos às determinadas condições. Nenhuma
dessas três ordens é capaz de refletir a imagem completa suficiente do que
é Deus, do que é o ilimitado. E é por isso que todo ente criado, diante de
Deus ou manifestação divina se sente, em primeiro lugar, excluído dela e o
sujeito percebe que ele não é Deus. Além disso, não existe nenhum
fenômeno criado ou objeto, que possa diante de você pôr em dúvida sua
consistência ontológica e nenhuma coisa pode deixar você firmemente
convicto de que você não existe, nada do que você veja, ouça, pense, pode
abalar sua convicção na sua própria existência. Só Deus faz isso, quando
Deus aparece diante do sujeito, ele não sabe se ele existe, ele fica na
dúvida. Porque a sua consistência existencial, sua consistência ontológica
reside N'Ele e não em você. Estar diante de uma manifestação divina, é o
como estar diante disso, e toda manifestação divina faz perceber numa
certa medida, você não é senão, aquilo que determina o que você é.
Quando Moisés Falou: "Olha, se eu falar todas essas coisas que o Senhor
está falando, o povo não vai acreditar em mim, me diga pelo menos o seu
Nome para que ao dizer Seu Nome eles possam acreditar em mim." Ele
fala: 'EU SOU'. 'Diga que EU SOU disse essas coisas.' Traduzia justamente
isso. Ah, quem está falando isso? Está falando isso Aquele que é a
consistência ontológica de todas as outras coisas. Você (Moisés) só pode
dizer Eu SOU, porque Deus quer, enquanto Ele quer.  Vocês lembram da
última aula!? A nossa identidade empírica ou nossa inulidade (13:59
min) empírica, deriva das referências que nós temos do mundo corpóreo.
Tudo o que você sabe sobre você, o que é você, deriva da sua experiência
do mundo corpóreo. Por exemplo, se você se observar todo dia, você é mais
ou menos semelhante do que era no dia anterior, você observa suas mãos,
elas são as mesmas, você ouve sua voz e vê que é a mesma, você se olha
no espelho e vê que é o mesmo sujeito parecido, acorda todos os dias no
mesmo lugar em que foi dormir etc. Por isso você sabe que você é você. Se
você perde isso de uma hora pra outra, vai passar um tempo e vai esquecer
quem você é.

A morte é senão isso. O sujeito vai perdendo as referências físicas, todas as


referências corpóreas, e, se não tiver adquirido uma identidade não
baseada na experiência corpórea, tá ferrado. No decorrer de zilhões de anos
ele terá esquecido completamente quem ele é, e ele não será mais
ninguém. Se a morte causa isso, Deus muito mais, se a experiência da
morte ou proximidade dessa experiência causa isso, a experiência do divino
causa muito mais, então essa é outra coisa importante da manifestação
divina. Vocês lembram quando Moisés vê a sarça ardente, antes d'ele se
aproximar uma voz diz: "Moisés, tire as tuas sandálias, porque você está
em solo sagrado." As sandálias aí representam dos dois lados da identidade
empírica; A Primeira sandália representa as referências externas, corpóreas,
- da identidade de Moisés- a segunda representa as referências internas ou
psíquicas. Ele diz o seguinte: " oh Moisés, esquece quem é a tua cara, quem
é você, teu nome, teus pais, o mundo em que você vive, e depois esquece
seus gostos, sentimentos e olha agora só esta realidade, neste momento
seja apenas a sua inteligência."
Porque só a sua inteligência vai poder entender o que é isso aqui, vai poder
ver isso aqui, testemunhar isto aqui.

Como nós não estamos no grau espiritual de Moisés, não temos como tirar
as sandálias, as sandálias estão como que coladas nos nossos pés.
Consequentemente, a primeira reação nossa à uma aparição celeste ou de
uma manifestação divina vai ser temor.
 
Aluno: - Medo.

Gugu: Exatamente.
É por isso tantas vezes na Bíblia, Deus é terrível. É para lembrar isso, e é
por isso também que no Novo Testamento se insiste tanto no fato de Deus
ter se revestido de homem. É uma espécie de ocultação desse carácter
terrível. Se pegar nos evangelhos, se fala mais no Filho do homem, do que
no Filho de Deus, porque se trata de uma manifestação Divina que tem que
minimizar esse aspecto terrível. Então, reconhecer uma aparição celeste
implica nisso, a aparição celeste é sempre transcendente ao indivíduo como
tal. Veja bem, uma aparição celeste não quer dizer apenas as visões
místicas. Também pode ser assim; um sujeito está preocupado com algum
problema, ele abre a bíblia pra procurar a solução para quele problema,
encontra e lê uma frase (versículo), e mesmo neste caso pode se dar uma
manifestação celeste. Qual a primeira coisa que ele vai perceber? A primeira
coisa que ele vai perceber é a descontinuidade dele enquanto indivíduo e
aquela manifestação. Já aconteceu muitas vezes comigo, de as pessoas me
perguntarem - " eu estava desesperado, li a bíblia e não ter nada a ver com
o meu problema" -, tá meu filho, meu filho, você não sabe é ler a bíblia.
Uma das manifestações da descontinuidade é justamente isso, o sujeito não
entendeu nada do que está ali, e, em outra ocasião ele poderia até entender
aquilo, mas naquela ele não entende. É muito comum entre nós a noção de
Deus como um velhinho bonzinho, qualquer coisa que falarmos com ele, ele
vai aceitar...um velhinho gagá e bonzinho, mais ou menos uma espécie de
Papai Noel caduco. 

Aluna: Só que bem grande né.

Gugu: É, mais poderoso, exatamente. É um Papai Noel anabolizado e


caduco.
Isso é Fácil de acontecer porque? Porque 'Deus' é um conceito muito
abstrato. Você capta Deus e não conhece muitas pessoas que viram Deus
como Ele é pra te explicar. Nossas referências são as Escrituras e de
testemunhos distantes. As Escrituras já é um testemunho distante, parte
mais recente da Escritura já tem mais de dois mil anos, já está morto a dois
mil anos e o testemunho já é muito indireto. E como sempre, todas
Escrituras, tem que estilizar um pouco o conceito de Deus, e acontece,
temos uma ideia muito simplifica e fácil pensamos que Deus agiria desse ou
daquele modo, nesta ou naquela circunstância e é difícil o sujeito lembrar
que; "eu não tenho a menor ideia de como é Deus e o que é Deus,
efetivamente, eu não tenho a menor ideia, e, quando eu falo 'Deus', eu não
sei o que significa essa palavra." É muito difícil lembrar disso. Para o sujeito
começar a captar o que é Deus, o que ele deve fazer? Primeiro, ele tem que
entender o que é o ‘real', o que significa uma coisa existir, o que significa a
'realidade', o que significa 'ser'. Em refração desse 'ser', do ser aos seus
princípios, até ele perceber o que dá consistência a tudo o que é, o que dá
ser a tudo o que é, todo e qualquer coisa real. Aí, ele começa a captar o que
é Deus, e, ele vai começar a entender o seguinte: Se a escritura fala de
Deus como de um homem, uma pessoa humana, um sujeito que tem
sentimentos, vontades pensamentos etc., ela faz isso porque você não pode
pensar em Deus menos do que um homem. A Escritura faz isso para você
não pensar em Deus como força natural. Se você lembrar Deus
simplesmente como principio do ser, você vai pensar N'ele como um
furacão, um terremoto. É verdade. Você vai perceber simplesmente a sua
nulidade diante daquilo, e bom, qual experiência sensível que te lembra
disso? simples, as tempestades, os terremotos, erupções vulcânicas, as
coisas mais terríveis. 

Aluna: - O que dá medo.


Gugu: O que dá medo!
Mas, essas coisas são cegas, essas coisas não atuam de modo deliberado e
Deus não é assim, Deus não é uma força natural. Os gregos tentam como
que fundir uma ideia na outra. Quando você lê na mitologia grega, vocês
encontram nos deuses, ora aparecem como mero seres humanos, ora
parecem meras forças naturais. Só sintetizando as duas coisas você vai ter
alguma ideia do que é Deus, sintetizando as duas em mais. O que há numa
força natural que serve de imagem de Deus, por um lado a imensidão, o
tamanho, a magnitude das coisas em relação a individualidade humana.
Você pode estar no meio de uma tempestade, chorar o quanto for, a
tempestade vai continuar. Primeiro lugar, Magnitude. Segundo a total
indiferença. Além da tempestade ser muito mais forte que você, ela não liga
pra você, ela não está nem aí pra você, para o que você pensa, sente e
quer.  A tempestade só faz isso porque ela não te conhece como ser
humano, a tempestade não está consciente de que a li está um individuo
humano, por que ela é só um movimento natural e cego. (26:00min)

Deus não é assim, Deus é indiferente a você porque você é realmente nada
para ele, porque esse é o único sentimento natural e apropriado, único
sentimento justo e adequado de um ser como Deus para um ser como nós.
É isso que o Cristo quer dizer quando ele fala: "O Pai não vê, senão o filho."
Por isso ele diz para os Apóstolos: " Sejam um em mim, como sou um com
o Pai, e então vocês serão um N'Ele." Já podemos distinguir duas dimensões
no conceito de Deus; Uma dimensão é Deus considerado em si mesmo, e
para Deus ser considerado em si mesmo, nós somos nada efetivamente.
Outra coisa, é Deus em relação à essas coisas que são nada; é Deus como
principio imediato delas. Veja bem, quando a bíblia fala que Deus criou as
coisas do nada, o que significa esse nada? significa que o nada era alguma
coisa? é um tipo de substancia? onde existia o nada, antes de Deus criar as
coisas? 
O nada era apenas um conceito na mente divina, o nada não têm, o nada
não é, o nada não existe, o nada só existe conceitualmente. Quando fala,
Deus criou as coisas do 'nada', está falando justamente que em relação a
Deus você é nada. Porque é nesse conceito que Ele concebeu você. Para
ele por você, te fazer existir a partir do nada conceitual dele, o que é
preciso?

É preciso que Ele pense você, conceba você N'Ele mesmo, conceba você no
nada, e aí junta uma coisa com a outra. O nada é um conceito totalmente
infrutífero, e você não pode extrair nenhum conceito a partir do conceito
nada. Primeiro ele concebeu o nada e depois Ele se concebeu no nada, e
esse conceber a si mesmo no 'nada' são as inúmeras possibilidades das
coisas. Quando Deus se concebe no nada ele olha e concebe o sistema
solar, ora concebe uma espécie de mal, ora concebe você ou eu. Esse
conceito divino D'ele no nada é o Verbo Divino, "o Pai dá tudo para o Filho,
o Pai entrega tudo para o Filho, o que é do Pai é do Filho." Deus se pensa
como se ele fosse nada e se ele fosse nada, o que eu seria? Daí ele vê
inúmeras possibilidades de ele não ser ele mesmo. De onde Deus tira o
conceito de nada? de onde você tira o conceito de nada? é simples, você
olha todas as coisas e você tira todas elas. Quais são todas as coisas antes
da criação do mundo? Era o próprio Deus. Qual a única coisa para ele
conceber o 'nada'? Para Deus o 'nada' é o não EU, o que não é EU é 'nada'.
Não tem outro conceito de 'nada' para Deus.

Aluno: Como que depois de criado, o homem pode ser nada?

Gugu: Ele continua sendo nada!


Em relação a Deus, na mente divina a realidade que cada um de nós está
contida nesse conceito 'nada'.

Aluno: Só pode estar contido como fruto do nada.

Gugu: Não! como 'nada'. Se não fosse assim, e a partir do momento que a
coisa criada, ela passa na mente divina a ser mais do que 'nada' ela não
precisa de nenhum fenômeno salvífico, ela é o próprio deus. A necessidade
de salvação deriva disso, entre nós e Deus, existe o 'nada'.

Aluno: Isso não é apenas uma convenção daquilo que Deus chama de
'nada?

Gugu: Isso não é uma convenção, isso é a verdade sobre a realidade.

Aluno: Para nós isso é muito difícil essa aceitação de que não somos 'nada',
nós somos muito vaidosos para aceitar esse conceito.

Gugu: Se EU não fosse EU, o que EU poderia ser exatamente? Daí Deus
concebeu todas as coisas reais e possíveis.

Aluno: E no meio desse nada está o homem.

Gugu: Como todas essas coisas é Não Ele, em relação a Ele todas coisas
são nada. Não é que a gente não é nada, é que na mente divina a gente é
'nada'. Metafisicamente, em última análise, a mente divina é a referência
fundamental, então, em última análise nós somos 'nada mesmo. Mas isso
não muda o fato de sermos algumas coisas neste mundo. Então Deus se
concebeu de não Ele de inúmeras maneiras e essa concepção D'Ele é o
conteúdo do Verbo Divino, o Verbo Divino é isso.

Aluno: O que você está me dizendo é que ontologicamente na escala divina


nós não fazemos parte.
Gugu: É exatamente isso
Aluno: -0,1
Gugu: -0,1, exatamente, nem no -0,1 exatamente!

É só por isso que em toda e qualquer religião ou tradição espiritual existe


um salto entre sua identidade empírica antes de entrar naquela religião e
depois, é por isso que toda e qualquer religião vai exigir que mude alguma
coisa em você. Não porque você não é um cara legal, você pode ser o
melhor cara, você pode ser o melhor sujeito e ainda assim você vai ter que
mudar algumas coisas. Se na mente divina você, por um lado, é um 'nada',
na mente do Verbo Divino, no Verbo Divino, você é um aspecto D'Ele.
Já melhorou um pouquinho né!? Veja bem, o importante aqui é o sujeito
perceber que a diferença entre 'ser' e nada é absoluta. Uma coisa ou é
alguma coisa ou não é, uma coisa é real ou não é real, ela é possível ou é
impossível. Por um lado, não há distinção o meio termo entre ser e 'nada'.
Por outro lado, isso se dá apenas na razão ser, e não em qualquer outra
razão formal no sujeito. Tudo que um sujeito é, tudo que a criatura é, é um
meio termo entre o ser e o 'nada' efetivamente.

Aluno: Qual diferença do conceito de vazio no Budismo e esse conceito de


'nada'?

Gugu: O conceito de vazio no Budismo é exatamente o contrário, ele é o


contrário do conceito de 'nada' na Escritura cristã.
Antes da criação temos aqui duas referências; Deus, EU e não EU, não EU é
nada, EU é o que é real. O conceito de vazio no Budismo corresponde para
o conceito de EU para Deus. Vazio do Budismo significa a realidade de
nenhuma coisa particular, que não pode ser definida por limites. O vazio do
Budismo é o contrário do 'nada'. Tem dois jeitos de você pensar em Deus,
por meio de imagens, por exemplo; por meio de coisas que são
semelhantes a Ele. Deus é como um sol, como um ser humano, como os
anjos, você pode fazer uma série de comparações. Ou da consciência de
que Deus não é semelhante a nenhuma outra coisa, e, em última análise
toda e qualquer semelhança de uma coisa com Deus é melhor que
dessemelhança. O que o budista quer é te livrar de limitar o conceito de
ilimitado. Vazio quer dizer aquilo que não é uma coisa particular, e quando
falo Deus pra vocês quer dizer, estou eu aqui e Deus ali. Tem duas cosas na
realidade, tem eu e tem Deus, tem essa mesa também, por exemplo. Tem
todas as coisas criadas mais Deus. Não é assim que a gente pensa? ah, tem
um zilhão de coisas criadas, logo existem um zilhão é uma coisa. O budista
quer é te livrar desse engano, olha se existe um zilhão de coisas criadas, só
existe um zilhão de coisas, Deus não é mais uma coisa que se acrescenta à
elas Ele é o fundamento ontológico desse um zilhão de coisas, Ele não é
uma coisa, Ele não é mais uma coisa. Isso é difícil de se entender, difícil de
captar é difícil não pensar Deus como uma outra coisa.
Mas ele não é uma outra coisa, ele é o fundamento das coisas que são, Ele
não se reduz pelas coisas que são, pelo contrário, as coisas que se reduzem
a Ele como possessões ou averiguações, mas Ele não é uma outra coisa. 

Se Deus fosse uma outra coisa não existira esperança de salvação, se Deus
fosse uma outra coisa toda e qualquer ligação entre o indivíduo humano e
Deus seria acidental, como a ligação de uma coisa e outra coisa. Se existem
duas coisas elas podem se separar, e se podem se separar elas vão se
separar. Pois é, com Deus não é assim. Você pode se separar até de você
mesmo, como já falei, o sujeito pode morrer e perder todas as referências
de tudo que ele era. Ele perde aquilo, mas o fundamento da realidade ele
não tem como perder. Porque o fundamento dele na realidade não é uma
coisa que ele tem é o que tem ele na realidade.

Aluna: O fundamento não é dele, ele é do fundamento.


Gugu: Exatamente!
A sua identidade divina não se perderá jamais, o que você pode perder é a
sua identidade empírica sua identidade espiritual, não se preocupe, ela está
lá para sempre. Por isso os santos padre diziam: "nossa tarefa não é ver o
espiritual, não é ver o invisível, não é ter contemplações ou visões, nossa
tarefa não é ver o incorpóreo. Nossa tarefa é encerrar o incorpóreo no
corpóreo." A tarefa do indivíduo humano não é conhecer uma identidade
espiritual ou adquirir uma identidade espiritual, mas entramar essa
identidade espiritual na sua identidade empírica para garantir a
consistência ontológica da identidade empírica, não da identidade espiritual.
Daqui alguns anos morrerei eu, mais alguns anos morrerá o Guilherme
também, uns 45 anos depois, aí eu que era um cara mau vou para o inferno
e o Guilherme que era um cara legal vai para o céu. Mas o Guilherme
gostava de mim, e quando ele chega lá no céu o que ele encontra? eu
mesmo. Ele encontra o fundamento ontológico do meu ser lá. Para ele
estarei no Paraíso, só para mim mesmo que não estarei lá.

Aluno: o que eu encontro no céu?


Gugu: O fundamento ontológico de tudo que você testemunhou aqui.
aluno: Mas não é tua alma, a alma foi pro inferno.
Gugu: Se eu fui para o inferno, não encontrará nada no Paraíso, porque não
estarei lá. Mas se eu for pro inferno e você for pro Paraíso, você me
encontra lá.
Aluno: Para você, você não tem a percepção do Paraíso, porque você está
no inferno mesmo.
Gugu: Exatamente, é o inferno mesmo. No inferno é estar no paraíso e não
ter a menor ideia disso. O inferno não deriva senão de um ato de rejeição
da sua própria identidade, você não pode rejeitar o fundamento que te dá
realidade, você não pode rejeitar você mesmo. Se fizer isso é evidente que
você parte para a inexistência. Do mesmo jeito que no decorrer do tempo,
depois que um sujeito morre aqui o corpo dele acaba se reduzindo aos
materiais do qual foi composto aquele corpo, quer dizer, o corpo dele vira
terra. Com a alma dele é a mesma coisa, e a única diferença que a escala
em relação a alma não é exatamente tempo. Você não poder dizer assim;
"ah, mais ou menos depois de uns três bilhões de anos a sua identidade
psíquica, sua alma, já se dissipou." Não! ela se dissipará indefinidamente.
(50 min). Mas para o outro sujeito que foi para o céu você estará lá, veja
bem, ir para o céu é senão permitir que a sua identidade empírica participe
da realidade fundamento metafisico do seu ser. Por exemplo, uma coisa
semelhante, mas a disparidade entre as duas ordens é muito menor e,
portanto, a evidência disso é muito menor, isto é, quando você tem um
princípio moral e você está diante de uma situação de aplicação daquele
princípio moral, e se você aplica ele o que você fez? Um princípio moral é
uma ideia na sua inteligência e uma certa disposição na sua vontade e no
momento em que você o aplica, você teve que impor os seus sentimentos
no momento e sobre o seu próprio corpo. Os seus sentimentos e o seu
corpo participaram dele. Estar no Paraíso é fazer com que sua identidade
empírica esteja participando do seu fundamento. Ora, qual era o
fundamento da decisão moral, quando você tem o princípio moral? O
princípio moral. Do mesmo jeito, cada ser tem um fundamento no real e o
Paraíso é participar deste fundamento. Se na mente divina a criatura é nada
e na mente do Verbo Divino a criatura é um aspecto dele mesmo, daí para a
criação, para a existência efetiva das criaturas depende apenas do Verbo
pensar: "Cada um desses aspectos dos seu próprio ser existindo de modo
independente dos outros." Todos os conceitos das criaturas, no verbo,
formam uma unidade que é o ser nele mesmo. Tudo que existe no Verbo,
existe como modo d'Ele ser Ele mesmo e uma coisa não pode existir sem a
outra ali. Não é como o mundo, amanhã existo e depois de amanhã não
existirei mais, e não fara a menor diferença. No Verbo as coisas já possuem
alguma realidade, a realidade D'ele mesmo e ele as pensa uma a uma, quer
dizer, Ele pensa o mundo. Esse pensamento do Verbo, essa ideia, de cada
um dos aspectos D'ele, um existindo cada um independente dos outros é o
mundo efetivamente e quando o Verbo pensa um aspecto D'ele separado
dos outros, esse aspecto é alguma coisa. Quando ele isola um aspecto D'ele
mesmo, isola conceitualmente dos outros essa coisa existiu e o existir dela
é esse ato de isolar. Sei que isso é difícil de entender porque quando a
gente fala assim, a gente tende a reduzir toda essa atividade à uma
atividade mental. Deus pensou o não EU e o não EU é o 'nada', mas quando
falo "Deus pensou", a palavra não tem o mesmo sentido quando eu pensei,
você pensou, não é nem parecido e a gente só usa isso para deixar claro
que não é uma atividade corpórea. De todas as atividades, a mais
semelhante a natureza divina é a atividade intelectiva, isso quer dizer que a
relação de qualquer criatura com o Verbo é diferente da relação daquela
mesma criatura com Deus enquanto tal. Houve em cada uma dessas coisas
uma descida de grau, Deus pensar-se com o 'nada' é menos que Ele
mesmo, Ele mesmo é ontologicamente anterior a esse pensamento. O
pensamento divino existe no ser divino e não o contrário, e, se depois Deus
pensa, este pensamento, Deus decompõe esse pensamento, as inúmeras
ideias que surgem desse pensamento e separa uma das outras esse
pensamento é ainda posterior ao primeiro pensamento. Esse segundo
pensamento é a gente. Existir como criatura é isto. Veja bem, o primeiro
pensamento é sintético, ou seja, Deus concebe todas as possibilidades de
ser, todas as possibilidades de não ser Ele, e ele as concebe sinteticamente,
isso quer dizer que o Verbo Divino contém nele mesmo todas as criaturas
atuais e possíveis, isto é, o número dessas possibilidades é ilimitado, quer
dizer, essas possibilidades são inumeráveis. Portanto, elas não podem se
efetivar isoladamente de modo completo. Sempre vai ter alguma criatura
que ficou fora desse pensamento e sempre vai ter um aspecto do próprio
Verbo que ele não pensou de modo isolado.

Esse pensamento do Verbo de Deus; se ele pensa de modo isolado, cada


um dos seus aspectos passa a ser uma criatura e há uma ordem desse
pensamento, há um critério D'ele pensar as criaturas. Ele pensa as criaturas
do modo seguinte: Quais são as criaturas que eu penso isoladamente para
eu criar uma imagem suficiente e total do próprio Deus que pensou elas
primeiro?
O Plano do universo na mente divina, o plano do universo do Verbo divino é
justamente esse; compor por meio de partes uma imagem total do que é a
própria divindade, um processo de exclusão de possibilidades. Você tem
uma ruptura como o grau anterior. Agora chegamos na parte prévia ao
estudo desse primeiro tema mesmo do problema sobre " o que é o ser
humano". 

(1:02:08) Para o verbo Divino cada ser é precioso e uma vez que ele
concebe o mundo que seja este mesmo mundo uma imagem total da
própria divindade, ele imagina neste mundo uma possibilidade que seja
uma imagem total do mundo enquanto imagem total e da divindade. Toda e
qualquer comparação aqui dificulta, pois, a gente consegue entender o que
conhecemos.
Uma pintura; você conhece uma pessoa e você a representa numa pintura,
a pintura é uma representação da pessoa, é uma imagem da pessoa. Na
nossa analogia a pessoa é Deus e a imagem é o mundo.  A ideia de imagem
na sua mente, veja bem, para você traduzir de pessoa para pintura, você
teve que conceber uma transposição. Ora, uma pessoa não é uma pintura,
uma pessoa é totalmente diferente de uma pintura - a pintura de duas
dimensões, não fala, não é viva- nisso a comparação não é muito boa,
embora o mundo seja uma imagem total da divindade ele é uma coisa
totalmente diferente da divindade. Tão diferente da divindade quanto uma
pintura é diferente de uma pessoa, no entanto, olhando uma pintura você
pode reconhecer a pessoa desde que a ideia na mente do pintor tenha sido
suficientemente adequada. Desde que a capacidade do pintor em traduzir a
pessoa em pintura seja suficiente. Pois bem, essa mente do pintor é o
Verbo Divino. 

A finalidade de Deus criar o universo foi dar ao 'nada' a grandeza do ser


D'ele. Vamos ao ponto, temos aqui, a pessoa e a pintura; pessoa é uma
coisa e pintura é outra completamente diferente. Suponha que você queira
por meio da sua arte criar um outro objeto que neste objeto esteja
sintetizado o que é ser pessoa e o que é ser pintura, que este objeto mostre
o que é ser pessoa e o que é ser pintura. Isso quer dizer um objeto que
represente as duas coisas nele mesmo, num só. Agora você quer fazer uma
outra coisa, e que essa coisa mostre o que é ser pessoa e o que é ser
pintura. Pois bem, isto é o ser humano. Depois que o Verbo pensa o mundo,
ele pensa as peças do mundo, pensa algo N'ele mesmo e, vendo aquilo,
você sabe o que era Deus e o que era o mundo. Isso quer dizer que o
homem, o ser humano, é uma imagem integral da divindade. É por isso que
se representava a terra - o homem- no centro do universo, porque, a
pintura que é o mundo, a imagem que é o mundo, não se explica por si
mesma. Deus já sabia como Ele era, pra que fazer uma pintura D'ele
mesmo e falar " poxa vida, olha eu sou assim"? Pelo contrário, Ele quer
fazer uma coisa; vai usar a pintura para entender a pessoa e a pessoa para
entender a pintura. O homem é a testemunha da obra divina, ele é
simultaneamente as duas coisas, ele sintetiza nele as duas coisas. O
homem é um microcosmos, porque ele é uma imagem completa do mundo
ao mesmo tempo que ele é uma imagem completa de Deus.

Aluno: Inadiável

Gugu: Mais para diante vamos ver que a terminologia pode variar muito de
uma tradução para outra, mas as ideias centrais, as ideias nucleares são
sempre as mesmas. Mais para diante vamos fazer esse mesmo
raciocino usando a terminologia Zen-Budista, Pensamento Zen-Budista.
Mais para diante vamos ver essa diferença, da perspectiva judaico-cristã. O
importante é captar isso aí. Primeiro você concebe, você tem duas ordens;
Deus e não Deus, não Deus é apenas uma ideia na mente divina e essa
ideia contém tudo o que pode não ser Deus e que não é impossível. Essa
ideia é o conteúdo do Verbo Divino. Segundo, você tem essa ideia
isoladamente, isolar cada um dos aspectos dessa ideia e isso é a própria
criação. Terceiro é conceber essa ideia que expresse todas essas ideias, a
ideia original de Deus, Ele mesmo, e a segunda ideia de que tudo que não é
Deus. No ser humano você vai encontrar uma síntese de todos os graus da
realidade. No universo dos seres, o que são essas ordens da existência, a
hierarquia da existência criada vocês vão perceber que o mundo criado tem
basicamente três graus que são espirito, alma e corpo na linguagem cristã.
cada um desses mundos ou ordens da criação é simplesmente um modo de
algo não ser Deus, um modo de diferença em relação a Deus, uma
categoria de diferença em relação ao ilimitado. Vocês vão perceber que o
ser humano, contém, no seu ato de ser todos esses modos de ser. Nele não
há um predomínio de um sobre o outro. O que a gente queria hoje era
localizar o homem na existência e explicar isso; o homem não é o mundo,
não é criatura nem criador é uma outra categoria. Ele é justamente a maior
teofania, o ser humano é o maior ponto de encontro dessas duas
dimensões, entre criador e criatura, e, por refletir não só o criador, mas
também a criatura. Veja bem, todas as criaturas são imagens do criador,
mas nenhuma dela é uma imagem de todas as outras coisas.

Aluna: Isso não é muita vaidade do ser humano? ser semelhante a Deus,
então o melhor de todos.

Gugu: Até seria, se a gente saísse por aí caminhando sobre as águas,


ressuscitando morto, eu ficaria muito envaidecido.

Aluna: inaudível

Gugu: Pois é, aí a vaidade já murchou. A ideia da coisa pode gerar muita


vaidade, mas, quando você tenta aplicar você percebe: “ah, menos vai”.
Isso é verdade da natureza humana e não da individualidade enquanto tal.
Eu não sou toda a humanidade, não sou tudo isso que a humanidade é. Isso
é uma segunda ordem de descontinuidade que vamos discutir depois.

Qual o passo daqui para diante? O passo daqui para diante é a gente
entender essa estrutura ternária no ser humano e entender que a estrutura
humana é uma imagem do criador e da criatura simultaneamente. Sem
entender isso aí, não dá para entender porque tem religiões, não dá pra
entender o que são as religiões e principalmente, não dá para entender
porque as religiões são diferentes umas das outras. Quem não entende isso
não sabe o porquê tem várias religiões. Parece incoerente.
Mas a raiz disso está na própria estrutura do que é o ser humano e essa
diversidade das religiões só podem ser resolvidas numa área, num
ambiente não terrestre. Deu pra entender o que é uma criatura? Uma
criatura é um pensamento do Verbo Divino isolado dos outros pensamentos,
isolados pela própria inteligência divina. Quando falamos isso, estamos
comparando pensamento divino com o nosso e nosso pensamento não é
nada, eu penso aqui e nada acontece, nada mesmo. Pois é, mas o
pensamento de Deus é a realidade das coisas, é a própria realidade das
coisas. Deus é espirito, não tem mãos para fazer uma máquina de onde sai
as criaturas. Tudo sai da inteligência dele. Entre ele pensar aquela ideia, de
modo isolado, e a coisa existir não há um salto, “ele pensa aí ele existe”,
não, ao pensar ela é existir. A gente não, nós pensamos uma coisa aí temos
que fazer. Pois bem, Deus não é assim. Em Deus pensar e ser é o mesmo.
Pensar uma coisa é existir e a existência dela é esse pensamento, não é
uma outra coisa. As Escrituras são sintéticas, elas sintetizam em poucas
palavras vários aspectos da realidade. É isso que quer dizer quando Deus
fala: "Deus criou tudo do nada". Quando você pensa em alguma coisa, para
você fazer, você precisa de um coadjuvante para o pensamento. Fazer
alguma coisa que você pensou significa que a coisa não sai do seu ser, ela
sai do seu ser em conjunção com outro ser que não é o seu ser. Deus não,
esse pensamento é o ser da coisa. Não precisa de mais nada, não precisa
do fator coadjuvante. Por exemplo, a diferença do artista e a pintura na
nossa comparação. O artista pensou a pintura e agora precisa de tinta e
tela, pinceis etc. A pintura só pode existir quando ele conjuga o pensamento
da coisa com os instrumentos ou os meios. A diferença entre a criatura e
Deus é essa aí. Em Deus, pensar é a coisa existir. Não é necessário nenhum
auxilio posterior. O nada significa isso, pensou e nada mais acontece para
coisa passar a existir.
 
Isso é muito importante porque a gente pensa, muitas vezes, que Deus está
o tempo todo se decidindo com vai ser amanhã, decidindo o que ele vai
fazer, planejando o que ele vai fazer. Mas Deus não planeja o que ele vai
fazer, ele não pensa o mundo e depois ele faz. Quando se fala que Deus
criou o mundo livremente, simplesmente quer dizer, que não há nada fora
dele que determine qual a realidade do mundo. Quer dizer também que ele
poderia não fazer o mundo. Como há inúmeros mundos que ele não fez. O
mundo, portanto, é consequência num certo sentido, a consistência do
mundo, é uma atividade intelectual livre e espontânea ao mesmo tempo. Aí
de novo vale a comparação com a arte, com o exercício de uma arte. O
exercício de uma arte é simultaneamente livre e regrado, ele é o livre
exercício de determinadas regras que são assimiladas a tal ponto que a
aplicação delas já é espontânea. Aí você exerce aquela arte livremente, mas
nunca fora das regras. Pois bem, a criação do mundo é assim também. Há
certas regras, certos princípios metafísicos que determinam isso, e Deus
exerce essa arte livremente. 

É importante lembrar que, quando Deus cria o mundo livremente não quer
dizer que é uma atividade arbitrária. Não se pode confundir liberdade com
arbitrariedade. Arbitrariedade é o seguinte; quero pintar uma pessoa, mas
não sei como se pinta, não sei as regras para traduzir a imagem da pessoa
na tela e eu simplesmente eu jogo tinta lá e mecho. Isso não é liberdade. O
sujeito que não sabe as regras da pintura, ele não é livre para pintar o
outro. Agora vou decidir: " Agora vou pintar direito e vai aparecer a pessoa
ali." A ausência de normas e regras não é liberdade, é ausência total de
liberdade. Isso é uma das coisas que vamos ter que entender nesse curso.
Entender as normas fundamentais do mundo, é saber que Deus não vai
violar essas normas só porque você quer. A gente quer todo dia, mas Ele
não vai fazer. Assim como o artista não vai pintar mau, porque o patrono
quer, porque isso seria não pintar. Então, isso é tudo que sei hoje.

Transcrição: Sexta-Feira 02 04 2021


Josmar França
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