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Unidade 1

Os fundamentos da ciência e da ciência escolar

Aula 1 Fundamentos filosóficos, históricos e metodológicos da ciência


A busca por explicações que deem um novo significado à nossa visão de mundo é o
empreendimento ciências da natureza. A humanidade, em seu processo histórico,
produziu um legado de interpretações sobre a nossa relação com a natureza, assim como
formas sistematizadas de investigar esses fenômenos.

Em uma busca nos livros, você vai encontrar que a ciência surge a partir da filosofia
grega, com a valorização do pensamento racional sobre a mitologia e formas místicas de
encarar a realidade. Essa é uma visão que vem sendo questionada, pois parece que os
gregos não inventaram todos os princípios filosóficos. O contato dos gregos com os
impérios dos continentes africano e asiático os permitiu conhecer muito de diferentes
filosofias, matemática, medicina e outros fundamentos para o que, no futuro, seria
denominado ciências da natureza.

O início oficial da ciência acontece apenas na Idade Moderna, e muitos consideram que
os trabalhos de Galileu fundaram essa nova maneira de pensar e investigar as coisas do
mundo, rompendo com a filosofia. O que havia de novo na forma de atuar de Galileu
era a realização do experimento. Para tirar conclusões sobre algo, era necessário realizar
experimentos.

O início oficial da ciência acontece apenas na Idade Moderna, e muitos consideram


que os trabalhos de Galileu fundaram essa nova maneira de pensar e investigar as
coisas do mundo, rompendo com a filosofia. O que havia de novo na forma de
atuar de Galileu era a realização do experimento. Para tirar conclusões sobre algo,
era necessário realizar experimentos.

Isaac Newton foi o maior expoente da ciência moderna, elaborando teorias


sobre o movimento dos corpos, a luz, astronomia... A química surge logo
depois, tentando responder ao dilema da substância: de que são feitos os
materiais do mundo? A busca de um método científico ideal baseado no
trabalho dos físicos e que servisse de modelo para todas as ciências era um
objetivo da ciência moderna.
Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre a filosofia e as características da ciência, leia as páginas 1 a 27 do livro:
LIPPE, E. M. (Org.) Metodologia do ensino da ciência. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2017. (Unidade 1 –
Concepção de ciência e ensino nos anos iniciais). Disponível na Biblioteca Virtual.

M
atiasDelCarmine / Shutterstock.comExpoentes da ciência: Einstein e Tesla (ciência contemporânea), Cury (uma das
poucas mulheres que puderam assumir autoria de seus trabalhos) e Newton e Galileu (ciência moderna).

Pesquise suas contribuições!

A ideia de método único para a ciência foi, aos poucos, sendo questionada, e hoje
trabalhamos com uma diversidade deles. Um dos maiores expoentes da biologia,
Charles Darwin, não realizou seus estudos da forma como os físicos o fazem. Ele não
realizava experimentos, pois considerava que a natureza já fez o experimento, então
caberia ao cientista interpretar os dados sobre os animais e plantas. É claro que nem
todos os ramos da biologia pesquisavam de forma alternativa; a fisiologia, por exemplo,
pesquisava seguindo os princípios do método científico da física.

Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre a filosofia e as características do conhecimento científico, leia as páginas
44 – 54 do livro: ARMSTRONG, Diane Lucia de Paula; BARBOSA, Liane M. Vargas. Metodologia do Ensino de
Ciências Biológicas e da Natureza. InterSaberes Dialógica, 2012. Disponível na Biblioteca Virtual.

E a ciência que trabalhamos na escola, ela é essa ciência dos


cientistas da Idade Moderna?
Não. Nem a ciência dos institutos de pesquisa feita por cientistas profissionais o é.
Atualmente, ser cientista (ou pesquisador, sinônimo) é uma atividade profissional.
Diferentemente dos homens ricos da modernidade, que investiam seu tempo na
atividade científica, na contemporaneidade, ser pesquisador é profissão. Mulheres e
homens estudam em universidades e depois vão trabalhar em centros de pesquisa
(muitos desses nas universidades) desenvolvendo estudos, sempre em grupos de
trabalho.
Uma característica importante do fazer científico é que os cientistas não trabalham
sozinhos. Um laboratório de pesquisa abriga de alguns a dezenas de pesquisadores
trabalhando juntos. Os cientistas também trabalham em colaboração com cientistas de
diferentes instituições, de diferentes países. Temos uma comunidade científica. Um
desafio para educação é desmistificar a imagem do cientista, geralmente retratada como
um homem branco, de meia idade, de jaleco, trabalhando só em um laboratório.

Conhecer pesquisadores e entrevistá-los para saber como é seu dia a dia de trabalho é
uma ótima tarefa para crianças e adolescentes que estão aprendendo ciências.
Então esses homens e mulheres que estão nos centros de pesquisa estão realizando a
mesma atividade que as crianças na escola? Não! O cientista pesquisa sobre aspectos
dos fenômenos para os quais ainda não temos respostas, investigando o novo — algo
que é novo para ele, mas também o é para toda a humanidade. A criança na escola
estuda e investiga fenômenos que já estão bem descritos e explicados pela ciência. A
criança não faz ciência, ela se apropria de conhecimentos que são parte do legado
cultural da humanidade.

A atividade escolar é uma atividade de enculturação. Como nos afirmam Carvalho et al.
(1998):
[...] não se espera que, por meio do trabalho prático, o aluno descubra
novos conhecimentos. A principal função das experiências é, com a ajuda
do professor e a partir das hipóteses e conhecimentos anteriores, ampliar
o conhecimento do aluno sobre os fenômenos naturais e fazer com que ele
as relacione a sua maneira de ver o mundo.

Confundir ciência escolar com ciência profissional foi um erro muito comum na história
da educação científica. Outro erro foi uma interpretação radical do construtivismo, de
que, no laboratório escolar, a criança poderia redescobrir tudo o que a ciência produziu.
Isso ignora que, para chegar às teorias científicas que temos hoje, foram necessários
séculos de trabalho de diversos pesquisadores. Como a criança sozinha vai redescobrir
isso tudo?

Algumas práticas pedagógicas falam em descobrir utilizando o


método científico. Isso é possível?
O primeiro problema dessa afirmação é que não existe “o método científico”, mas uma
variedade de métodos científicos. Outro problema grave é que, em geral, aparece em
materiais didáticos que o método científico consiste em: observar a natureza, formular
um problema, formular hipóteses, realizar experimento, analisar os dados do
experimento e propor uma conclusão.
Nenhum método científico começa com a observação da natureza. O cientista não
elabora seus problemas de pesquisa a partir da observação. Caso nos coloquem para
observar uma série de imagens sobre tumores ou um ecossistema, nós só conseguiremos
elaborar perguntas simples, que ou já foram respondidas ou que não fazem mais sentido.
O cientista só elabora perguntas a partir do conhecimento sobre as teorias atuais da área.
Um ecólogo olha para um ecossistema de uma forma totalmente diferente de alguém
que não estuda a área. Sua observação da natureza é guiada por teorias, pelo
conhecimento de muitas explicações científicas e pelo conhecimento das lacunas que
ainda existem na área. Isso torna impossível uma criança fazer ciência na escola.
O experimento realizado pelo cientista também difere da atividade de experimentação
escolar. Os cientistas realizam experimentos controlados, com grupos de controle
estabelecidos e grupos experimentais. Na escola, fazemos atividades de experimentação
que visam desenvolver a capacidade de observação e raciocínio. O experimento escolar
é uma provocação para o pensamento.

Ampliando o foco
E quanto ao conteúdo estudado, cientistas e estudantes estão estudando a mesma coisa? Apesar de próximo, o
conhecimento que é estudado pelo cientista difere do conhecimento estudado na escola. Chevallard propôs o modelo
da transposição transposição didática para abordar a diferença entre o conhecimento da ciência escolar e o da
ciência profissional, tendo como base a ideia de que o conhecimento científico sofre uma série de transformações
para ser tornado em conhecimento ensinável na escola.
O modelo de Chevallard é criticado por Caillot, que elabora o modelo da recontextualização didática. Nesse
modelo, o saber da ciência profissional ainda é diferente do saber escolar, porém não há uma superioridade no saber
profissional, mas sim contexto e funções sociais diferentes.

Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre transposição e recontextualização didática, leia o texto: MARANDINO,
M. Transposição ou recontextualização? ? Sobre a produção de saberes na educação em museus de
ciências. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 26, p. 95-108, 2004.

Algumas raras iniciativas aproximam a escola da ciência profissional. Programas de


iniciação científica júnior dão ajuda de custo para alguns adolescentes participarem de
laboratórios nas universidades com cientistas profissionais. Nesses projetos, os
estudantes acompanham o modo de trabalhar dos pesquisadores e os ajudam. É uma
iniciativa interessante, porém para poucos, uma vez que não é possível colocar todos
os adolescentes escolares em centros de pesquisa. Também não é o papel da escola
formar o cientista; isso será tarefa das universidades.

Ampliando o foco
Leia as páginas 65 a 70 do livro: DALZOTO, G. Fundamentos em metodologia de ensino para as ciências
biológicas. Curitiba: Intersaberes, 2014. (Capítulo – Metodologias e modalidades didáticas no ensino de ciências.
Seção – O método científico: discussão teórico-metodológica). Disponível na Biblioteca Virtual.
Aula 2
Aula 2 Curiosidade, experimentação e descrição
de fenômenos na ciência escolar

Em uma aula de ciências, uma professora conversa com os


alunos sobre o que é necessário para cantar bem. Ela mostra
o trecho de uma reportagem que afirma que o músculo
diafragma tem que ser bem treinado nos cantores. Ela
pergunta para seus alunos: “Vocês sabem onde fica o diafragma? Vocês sabem como
ele funciona?” Daí ela os divide em grupos e pede para que eles montem o modelo
didático para fazer uma atividade de experimentação.

Para visualizar a montagem do modelo, acesse o site Manual do Mundo.

Ela, então, pergunta aos seus alunos: “COMO funciona o


diafragma?”
Quantos de nós tivemos aulas de ciências que começaram assim? Quantas vezes
fizemos atividades de experimentação em nossa vida escolar? E respondíamos a
perguntas do tipo COMO?
No início dos anos 1980, o pesquisador do ensino de ciências Rodolpho Caniato
elaborou um conto para sensibilizar os professores de ciências sobre a ausência da
experimentação nas salas de aula. Nessa pequena história, ele contava o caso de
Joãozinho, um garoto que vivia na favela da Maré, no Rio de Janeiro. Apesar de não ter
bom desempenho escolar, Joãozinho era um garoto inteligente e o que alimentava essa
inteligência era a sua atitude de curiosidade:
Talvez por frequentar pouco a escola, por observar aviões e o mundo que
o rodeia, Joãozinho seja um sobrevivente de nosso sistema educacional.
Ele ainda não perdera aquela curiosidade de todas as crianças, aquela
vontade de saber os "como" e os "porquês", especialmente em relação às
coisas da natureza. O moleque ainda tinha e sentia aquele gosto de
descobrir e de saber, que se vai extinguindo, quase sempre, à medida que
se vai frequentando a escola [...].
(CANIATO, 1983)

Logo no início do conto, Caniato identifica três aspectos fundamentais para aprender
ciências: a curiosidade, as perguntas do tipo ‘como’ e as perguntas do tipo ‘por que’.
Joãozinho foi caracterizado como ‘sobrevivente’ do sistema escolar, pois as aulas de
ciências do início dos anos 1980 (e, na maioria dos casos, até hoje) não incentivam a
curiosidade e não trabalham com perguntas, apenas oferecem vários conceitos e
diversos termos novos, que muitas vezes não são compreendidos pelos estudantes e cuja
utilidade é também desconhecida.
No próprio conto de Caniato, a professora dá uma aula sobre corpo humano colocando o
título da aula no quadro e iniciando: O corpo humano se divide em três partes — a
cabeça, o tronco e os membros, os membros podem ser superiores ou inferiores... E por
aí vai a professora quebrando o corpo em mais e mais pedaços, sem se dar conta de que
ninguém perguntara sobre isso. O corpo humano virou uma ‘decoreba’, algo para ser
memorizado.

Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre os problemas do ensino de ciências e conhecer o conto Joãozinho de
Maré, assista “Um episódio na vida de Joãozinho da Maré”. Leitura do texto escrito por Rodolpho Caniato em "Ato
de fé ou conquista do conhecimento?" Disponivel em: https://www.youtube.com/watch?v=0zqi0oybxjY

A curiosidade como atitude a ser construída durante a educação científica já aparecia


nos documentos curriculares do Brasil, tal como os Parâmetros Curriculares Nacionais –
PCNs, em vigor de 1998 a 2017:
“Incentivo às atitudes de curiosidade, de respeito à diversidade de opiniões, à
persistência na busca e compreensão das informações, às provas obtidas por meio
de investigações [...]”
(BRASIL, 1996, grifo nosso).

A ideia de criar e cultivar uma cultura de curiosidade também está presente na Base
Nacional Curricular Comum – BNCC:
Assim, ao iniciar o Ensino Fundamental, qualquer aluno possui vivências,
saberes, interesses e curiosidades sobre o mundo natural e tecnológico que
devem ser valorizadas e mobilizadas. Esse deve ser o ponto de partida de
atividades que assegurem a eles construir conhecimentos sistematizados
de Ciências [...].
(BRASIL, 2017, grifo nosso)

Vimos, então, que a BNCC coloca a curiosidade como motor para a aprendizagem em
ciências da natureza e também como o ponto de partida para novas aprendizagens,
porém, além disso, o documento coloca a curiosidade também como ponto de chegada:
[...] não basta que os conhecimentos científicos sejam apresentados aos
alunos. É preciso oferecer oportunidades para que eles, de fato,
envolvam-se em processos de aprendizagem nos quais possam vivenciar
momentos de investigação que lhes possibilitem exercitar e ampliar
sua curiosidade, aperfeiçoar sua capacidade de observação, de raciocínio
lógico [...].
(BRASIL, 2017, grifo nosso)
Ao afirmar que é necessário ampliar e exercitar a curiosidade, a BNCC a coloca
também como um objetivo do ensino de ciências. Devemos encarar que as crianças (tal
como o Joãozinho do conto de Caniato) chegam à escola com curiosidade, mas que a
escola pode atuar extinguindo essa curiosidade ou ampliando-a.
Quando a prática de ensino se baseia em fornecer conceitos para serem memorizados e
esses conceitos são ‘cobrados’ em uma prova, a criança aprende que suas dúvidas sobre
o mundo, sua curiosidade, não são reconhecidas ou pontuadas na escola, logo a criança
descobre as partes do assunto que são valorizadas pelo professor e que farão parte da
avaliação. Se as leituras complementares dos livros didáticos não aparecem nas
avaliações, os alunos aprendem a não perder tempo com elas. Os alunos entendem as
regras implícitas da prática de ensino do professor e aprendem a ‘sobreviver’ nesse
sistema. Com isso, a curiosidade vai perdendo espaço na escola.

Como a curiosidade é ponto de partida, motor e ponto de chegada


(objetivo) do ensino de ciências, como podemos cultivá-la? As
atividades de experimentação são o elo que falta?
Vamos analisar algumas práticas de ensino para tentar perceber como curiosidade e
experimentação se relacionam.
Vamos retirar o primeiro caso do próprio conto Joãozinho da Maré. Houve um
episódio em que a professora estava ensinando sobre o universo. Daí ela explicou sobre
um fenômeno chamado Sol a pino. Segundo a professora, ao meio-dia, o Sol se encontra
bem acima das nossas cabeças, no topo do céu, o Sol a pino. Podemos perceber isso
porque a nossa sombra fica bem embaixo dos nossos pés, ou seja, a sombra desaparece!
Joãozinho achou isso interessantíssimo e, quando deu meio-dia, foi conferir o Sol a
pino. O problema é que, quando deu meio-dia, a sombra não encurtou, ela aumentou!
Leia o diálogo de Joãozinho com sua professora:
— Fessora, mostra pra gente esse negócio. A gente queria vê.
— Eu não tenho tempo pra isso, meninos. Tenho que sair correndo pra
dar outra aula na escola de Irajá. E tem outra coisa. Faz 15 anos que eu
dou essa aula e nunca ninguém me amolou tanto quanto você e seus
amigos, Joãozinho.
— Num tem nada não, Fessora, a gente só queríamos intende.
(CANIATO, 1983)

No segundo caso, um professor também está trabalhando com assuntos referentes ao


universo. Ele quer que os alunos entendam como acontecem as estações do ano. O
professor explica para a turma que a causa das estações é a inclinação da Terra em
relação ao seu eixo. Daí, após copiar o apontamento e ler o livro didático, o professor
pede aos alunos que prestem bastante atenção à demonstração. Ele traz um modelo
didático em isopor sobre a translação da Terra e pede que os alunos o iluminem com
uma lanterna para que notem como a incidência da luz muda a cada estação.
Vamos ao terceiro caso, que se encontra detalhado no vídeo Ensino de ciências:
métodos e técnicas – TV Unesp. A professora leva os alunos para o pátio da escola
para que eles observem a posição do Sol em relação a um poste e solicita que os alunos
desenhem o poste, a posição do Sol e também a sombra do poste. Ela leva a turma duas
vezes por semana, sempre às 8h20min, e lembra aos alunos das duas regras
fundamentais:

1. Sempre temos que vir no mesmo horário.


2. Sempre cada aluno deve se sentar exatamente no mesmo lugar.
Essas regras são interessantes, pois, se estamos verificando um ‘possível’ movimento do
Sol, então devemos sempre observá-lo na mesma hora, caso contrário não saberemos se
há uma mudança na posição do Sol ou se mudou apenas porque estamos observando em
outro horário. Sempre observar do mesmo lugar também é algo importante, afinal, para
observar um movimento, o observador tem que ficar parado. Se o observador muda de
lugar, não temos como saber se foi o Sol ou o observador que mudou de posição. A
professora pergunta aos alunos no início da sequência de aulas:

— O que vocês acham que vai acontecer? O Sol vai mudar de lugar? A sombra vai
mudar de lugar?

Os alunos relatam suas hipóteses: muitos acham que tudo vai ficar igual, e alguns
acham que vai haver mudança. A professora não conta o que vai acontecer. Ela deixa
que os alunos olhem para seus desenhos e os comparem, daí ela pergunta: “O que
aconteceu?” A comparação dos próprios desenhos leva as crianças a notarem que o Sol
não está mais na posição da primeira observação e continua mudando. A sombra
também.

Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre como produzir práticas instigantes e conhecer o trabalho sobre o
movimento aparente do Sol, assista ao vídeo Ensino de ciências: métodos e técnicas – TV Unesp.

A curiosidade se apresenta na forma de perguntas, podendo ser provocada por um


desafio lançado pelo professor.

O que podemos concluir sobre o uso da experimentação em cada


prática de ensino? E quanto à cultura da curiosidade, está sendo
incentivada?
Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre experimentação na ciência escolar, leia as páginas 83 a 89 do livro:
ESPINOZA, A. Ciências na escola: novas perspectivas para a formação dos alunos. São Paulo: Ática, 2010.
(Capítulo 3 – O experimento na escola: um instrumento de ensino). Disponível na Biblioteca Virtual (Pearson).
Leia também as páginas 27 a 37 do livro: LIPPE, E. M. (Org.) Metodologia do ensino da ciência. São Paulo:
Pearson Education do Brasil, 2017. (Unidade 2 – Atividades práticas e materiais didáticos no ensino de ciências para
crianças). Disponível na Biblioteca Virtual (Pearson).
Também confira as páginas 70 a 80 do livro: ASTOLFI, J. P.; DEVELAY, M. A didática das ciências. Campinas:
Papirus, 2007. (Capítulo 4 – Didática das ciências e processos de aprendizagem. Seção I – A iniciação metodológica
às ciências). Disponível na Biblioteca Virtual (Pearson).

No primeiro caso, a professora de Joãozinho não faz experimentação nem estimula que
seus alunos observem a natureza. A aula é puramente teórica, e não há estímulos à
curiosidade. O caso torna-se mais interessante pelo fato de não existir o fenômeno do
Sol a pino ao meio-dia. Qualquer um que parar para observar notará que, em cada época
do ano, o Sol estará em posição diferente, logo a sombra terá tamanho diferente ao
meio-dia. Portanto, a professora estava ensinando um erro conceitual e nem se deu
conta.
No segundo caso, temos a atividade de experimentação, o que é um avanço, porém a
atividade é utilizada apenas como recurso visual para reforçar algo que já havia sido
dito pelo professor, algo que os alunos já sabiam e que estavam só esperando para ver o
resultado esperado. A atividade consiste apenas em demonstração. Carvalho et al.
(1998) já afirmavam que o trabalho prático em ciências é inquestionável, porém “[...]
houve época em que os experimentos serviam apenas para demonstrar conhecimentos já
apresentados aos alunos e verificar leis plenamente estruturadas [...]” (CARVALHO et
al., 1998). Notamos que a prática desse professor segue essa tendência.
O terceiro caso apresenta uma prática que se vale da experimentação de uma forma mais
inteligente. Perceba que a professora usa a experimentação como estímulo à
curiosidade. Os alunos não sabem o que vai acontecer, pois ainda não viram a teoria.
Ela parte de um problema (“O Sol fica sempre na mesma posição no céu?”). Uma
atividade de ciência escolar parte da proposição de um problema, que é a mola-mestra
propulsora das variadas ações dos alunos: motiva, desafia, desperta o interesse
(CARVALHO et al., 1998). A professora não usa a experimentação como
demonstração, ela a usa como indutora de curiosidade e vai além. Ela trabalha de forma
eficiente com duas habilidades importantes que esperamos que os alunos, durante a
aprendizagem de ciências, desenvolvam: a capacidade de observar fenômenos e a
capacidade de descrever fenômenos.
Observar não é simplesmente olhar. É um olhar guiado, direcionado, que tenta captar o
que é importante. A professora indicou o que deve ser observado (a posição do Sol e a
sombra do poste), em relação a que (ao poste) e de que forma (no mesmo local, na
mesma hora).
A capacidade de descrever fenômenos depende da observação:

“Descrição: envolve enunciados que se referem a um sistema, objeto ou


fenômeno, em termos de seus constituintes ou dos deslocamentos espaço-
temporais desses constituintes.”
(MORTIMER; SCOTT, 2002).

Descrever é dizer como era antes e como ficou depois. É relatar o que nossos sentidos
captaram, o que foi observado. Carvalho et al. (1998) sugerem que a descrição seja
invocada por perguntas do tipo ‘COMO’ (Como a sombra do poste se comportou?
Como o Sol ficou posicionado no céu durante as semanas de observação?). As
perguntas desse devem ser respondidas a partir da observação e devem ser registradas
por escrito e por desenhos. Descrever fenômenos é uma habilidade que se desenvolverá
junto ao domínio das linguagens oral e escrita e das representações gráficas.

Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre discursos nas aulas de ciências, descrição de fenômenos e habilidade de
observação de fenômenos, leia as páginas 45 a 58 do livro: ESPINOZA, A. Ciências na escola: novas perspectivas
para a formação dos alunos. São Paulo: Ática, 2010. (Capítulo 2 – Contribuições da didática para o Ensino de
ciências). Disponível na Biblioteca Virtual (Pearson).
Aula 3
Aula 3 Explicações científicas e generalizações na ciência escolar

“Muitos termos estranhos!” “Muita coisa para decorar!”


Essas são as justificativas da maioria das pessoas que não gostam de ciências da
natureza. Porém, a aversão que essas pessoas acham que sentem pela área é, na verdade,
uma aversão às estratégias pedagógicas que são comumente utilizadas na área.

Na aula anterior, vimos a importância de iniciar as aulas com problemas, perguntas que


configuram um desafio. Imagine que um professor iniciou sua aula com o seguinte
desafio: Por que um parafuso não flutua e um navio sim?
Para dar um contexto de experimentação, o professor desafia a classe com um jogo do
flutua ou afunda com uma série de objetos. Os alunos elaboram suas hipóteses sobre o
que deve flutuar e o que deve afundar e, em seguida, testam sua teria jogando os objetos
na vasilha. É feita a observação do fenômeno.

Seguindo a recomendação da aula passada, o professor lança a pergunta “COMO


aconteceu?”. E os alunos relatam e registram quais objetos afundaram e quais flutuaram.
É feita a descrição do fenômeno! Até aqui temos um bom começo, mas ainda não
temos uma verdadeira aula de ciência, pois falta atingir o objetivo principal desta
— explicar os fenômenos.

Na aula passada, vimos uma prática pedagógica em que os alunos desenhavam a


posição do Sol. Eles foram desafiados por um problema e, então, observaram e
descreveram o fenômeno observado, mas eles ainda não sabem explicá-lo. Suas
observações são um tanto traiçoeiras, pois o Sol parece estar se movendo, quando nós
sabemos que o que se move é a Terra, e não o Sol. Como resolver esse problema?

O próximo discurso que uma aula de ciências deve trazer é o da explicação:


“Explicação: envolve importar algum modelo teórico ou mecanismo para
se referir a um fenômeno ou sistema específico.”
(MORTIMER; SCOTT, 2002).

Agora entram as teorias. Porém, estas não podem ser ensinadas como ensinamos
descrições. As descrições dependem da observação. Alguém pode descrever quais
corpos flutuam ou afundam apenas baseado em suas observações. As teorias não são
observáveis.
Ninguém consegue observar a DENSIDADE. Ela é um construto teórico, uma
ferramenta de explicação que foi elaborada por várias pessoas para explicar a flutuação.
A partir da observação, o aluno pode constatar que não é a massa que importa para
flutuar, pois objetos de muita massa (uma melancia, um navio) flutuam e objetos de
pouca massa podem afundar. Se não é pela observação, então como faremos para
ensinar teorias?

Vamos analisar algumas estratégias pedagógicas:


 Situação 1 no caderno
 Situação 2
 Situação 3
A situação 1 apresenta uma série de problemas: faltam desafios, perguntas, e o
professor explica o que ninguém perguntou. Os alunos copiam passivamente, e a
atividade prática só acontece quando todos já sabem o que vai ser visto.

A situação 2 começa bem, mas o professor explica a teoria da densidade sem uma
pergunta instigadora. Ele também toma para si a tarefa de explicar; aos alunos, só
resta ouvir e copiar.

Analisando a situação 3, vemos que a apropriação de modelos teóricos requer esforços


de quem ensina e de quem aprende. Um passo inicial é usar uma pergunta do tipo POR
QUE. Por que alguns objetos afundam e outros flutuam? Por que o Sol parece se
mover? Por que o ar entra nos pulmões quando o diafragma abaixa? A pergunta ‘por
que’ é a mais importante nas aulas de ciências. Mas como respondê-la?

Recomenda-se que os estudantes leiam sobre a nova teoria, realizem buscas na internet,
assistam a vídeos que tentam explicar o fenômeno, discutam com os colegas sobre as
leituras e os vídeos e, por fim, que o professor os ajude a sistematizar o conhecimento.
Perceba que buscamos uma postura ativa do estudante, em vez de simplesmente copiar a
explicação do professor.
Outra experimentação para trabalhar densidade: ovo colocado em água de torneira e em água
salgada.

Mas como vou saber se o aluno compreendeu a nova teoria ou


simplesmente memorizou? E todos aqueles termos novos?
Para conseguirmos a compreensão da teoria, temos que avançar a aula de ciências
para outro discurso — a generalização.
Generalização: envolve elaborar descrições ou explicações que são
independentes de um contexto específico.
(MORTIMER; SCOTT, 2002).

Generalizar é uma operação abstrata que, segundo os trabalhos de Vygotsky, ocorre na


formação mental dos conceitos científicos, extraindo da teoria que se está aprendendo
seus elementos essenciais para poder aplicá-la a diferentes exemplos ou contextos.
Generalizar é libertar-se do contexto, é sair do exemplo estudado e conseguir perceber a
teoria estudada em novos exemplos.
Quando um aluno entende por que a maçã flutua e o prego afunda, ele pode ser
desafiado com outras situações que podem ser explicadas exatamente pela mesma teoria
da densidade.

Por exemplo, o professor pode fazer um novo experimento com um barquinho de papel
cheio de moedas, que flutua, mas, quando o professor amassa o barquinho, fazendo uma
bola, esta afunda. Os alunos que já entenderam a teoria podem generalizar pensando:
“Bem, não aumentamos a massa, mas reduzimos o volume.” Então mudou a densidade!
Podemos também mostrar fotos de crianças usando boias de braço ou de cintura e
perguntar: Por que elas boiam? Por que uma pessoa quando boia tem que abrir os
braços?
Imagine agora que o professor comece a aula com um desafio. Posso guardar água em
uma garrafa furada e a água não derramar? Ele mostra a garrafa com os furos
protegidos por fita isolante. Ele pergunta: Como vai acontecer quando eu tirar as
fitas? Os alunos relatam suas hipóteses. Ele faz a experimentação e pede para que os
alunos manipulem a garrafa, solicitando que eles observem COMO acontece quando: só
um dos buracos é destampado, os dois buracos são destampados e é retirada a tampa da
garrafa.

Ampliando o foco
Incluir: Para aprofundar seus conhecimentos sobre experimentação para aulas de pressão atmosférica, leia o artigo
sobre “EXPERIMENTO SOBRE PRESSÃO ATMOSFÉRICA”

Os alunos registram como aconteceu, com base em suas observações. É uma estratégia
empolgante, mas e a teoria? Hora de lançar perguntas com POR QUE: Por que com um
furo só não derrama a água? Por que o jato d’água é mais intenso no furo mais baixo?
Por que quando abrimos a tampa o fluxo de água aumenta tanto?

Então, seguem as estratégias (pesquisa, vídeo, leitura...) para o entendimento


da explicação científica, a teoria sobre a PRESSÃO ATMOSFÉRICA. Mas como vou
saber se o aluno compreendeu ou memorizou o conceito? Partindo para a generalização,
trazendo uma série de novos contextos, tais como o experimento do balão que se
desloca. O ar no interior da bola está sob alta pressão, e aqui fora a pressão é menor.
Quando se tira o cordão da bola, o ar sai do lugar de alta para o de baixa pressão.
Ampliando o foco
Para aprofundar seus conhecimentos sobre pressão atmosférica, assista ao vídeo Teleférico de Newton –
Experimento de física.
O professor passa um trecho de um vídeo de filme de ação em que um pedaço do avião se rompe e as coisas são
jogadas para fora: POR QUE vão para fora? Dentro do avião, a pressão é mais alta que lá fora, então o ar sai da zona
de alta para a de baixa pressão.

O professor dá um texto explicando como se formam os ventos e pergunta: Por que os


ventos se formam?

O professor está ajudando os alunos a generalizar, a sair do exemplo/contexto original e


ir aplicando a teoria em outros contextos.

O esforço de generalização deve ser mais intenso nas duas últimas séries do ensino
fundamental I (4º e 5º anos), pois é a fase em que ocorre a passagem para a adolescência
e o pensamento abstrato deve se desenvolver. Os conteúdos aqui exemplificados —
DENSIDADE e PRESSÃO — também são mais abstratos e mais indicados para esses
dois anos.

Ainda resta uma pergunta: o que fazer com todos aqueles termos estranhos quando
estudamos ciências? Utilizaremos, aqui, as contribuições de Brian Brown sobre
aquisição da linguagem científica.

Aprender ciências é como adquirir uma nova linguagem, porém não podemos trazer
para as ciências os erros antigos cometidos pela didática das linguagens. Antigamente,
se você fosse aprender uma nova língua, digamos, inglês, alguém iria aconselhá-lo a
decorar o maior número de palavras possível em inglês. Acreditava-se que aprender
uma linguagem era memorizar palavras novas.

Atualmente, sabe-se que as palavras novas são realmente aprendidas se forem úteis, ou
seja, aprenderemos as palavras de uma nova linguagem se essas palavras fizerem
sentido, se pensarmos com elas. Aprendemos de forma natural. Brian Brown fez
diversas pesquisas que mostram que o excesso de termos nas aulas de ciências só
aumenta o estresse entre os estudantes e provoca seu distanciamento da disciplina.
Quando um professor de ciências inicia suas aulas colocando um glossário de termos no
quadro, os alunos ficam frustrados ao ter que decorar palavras que não entendem para
processos que não compreendem. Fica muito mais difícil aprender novos processos se
eles já vêm recheados de novas palavras que não fazem sentido. Brown testou uma série
de sequência de aulas que focam no entendimento dos processos, mesmo que os alunos
expliquem esses processos em linguagem cotidiana.

Então os alunos não aprendem os novos termos? Aprendem. Porém


apenas depois que entendem os processos.
Ao aprender os processos, surgirá a necessidade natural de explicá-los com palavras
mais apropriadas. Porém, é muito mais fácil entender palavras novas quando você
entende os processos a que elas se aplicam. Logo, dos estudos de Brown, podemos nos
beneficiar da contribuição de que o foco principal do ensino está na compreensão de
processos, e não no uso de termos. Nas séries iniciais, utilizaremos termos científicos,
porém só aqueles que são centrais para explicar um fenômeno.
Encerramento
Encerramento
É possível fazer ciências da natureza e formar o jovem cientista ainda na
educação básica?

De que forma as atividades de experimentação podem ser usadas por um


professor para alcançar os objetivos do ensino de ciências?

De que forma posso ensinar a parte teórica de ciências favorecendo a


compreensão no lugar da memorização?

NO CADERNO

Resumo da Unidade

A curiosidade é considerada fator motivador para a aprendizagem em ciências da


natureza. O professor necessita saber empregá-la como elemento que mobilize o
interesse dos estudantes e também precisa encarar que o desenvolvimento de uma
cultura de curiosidade é um dos objetivos da área de ciências. No sentido de manter a
curiosidade presente na educação básica, o professor necessita privilegiar práticas de
ensino que se valham de atividades de experimentação de forma a desenvolver o
raciocínio e as habilidades de observação, descrição de fenômenos e elaboração de
explicações para os eventos naturais. Sugerimos um modelo de prática docente baseado
em desafios, estruturado por perguntas do tipo ‘como’ e ‘por que’. É importante evitar
as práticas pedagógicas que se baseiam em memorização de termos e definições.

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