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A ESCOLHA DO MELHOR CAMINHO PARA OESTE,

Osvaldo Pilotto

O meridiano determinado pelo Papa Alexandre VI, para


estabelecer os limites de domínio que o tratado de Tordesilhas
havia de fixar, parece que, ao invés de marcar nitidamente divisão
de terras entre portugueses e hespanhois, veio provocar a cobiça,
de parte a parte, de um mais amplo domínio. De outra forma
procuravam os dois povos descobridores, uma ligação do
Atlântico com o Pacífico,
Estes dois objetivos estimularam as viagens que levaram
Solis e Caboto ao rio da Prata, o primeiro descobrindo a sua
embocadura e o segundo subindo-o até ao Paraná, bem como a
arrojada empresa de Mendoza com a exploração de rios
tributários.
Preocupara D, João III a exploração das regiões cujo domínio
Portugal precisava fixar, Daí a expedição de Martim Afonso de
Souza, partida a 3 de dezembro de 1530 da metrópole portuguesa
e que teve o seu explendor em 1532 na altura de S, Vicente, de
volta já de viagem de exploração ao Prata.
0 zelo de Portugal limitara-se, até então, na guarda da
extensa costa das terras recém descobertas, Martim Afonso
trazia, entretanto, missão mais promissora. Em face das ordens
recebidas, fundou a primeira colônia onde seria lançado o marco
das expedições que haviam de alargar as fronteiras do domínio
português.
A Aleixo Garcia foi dada a incumbência de uma expedição
para a exploração do sertão e ao mesmo tempo a de estudar, em
sua marcha, as condições de realizar a linha de ligação da costa
atlântica com terras do Pacífico. Neste afã alcançou Garcia o
Paraná e o Paraguai, rios em que os primeiros exploradores
entraram pelo Prata.
Ve-se, pois, não é dos nossos dias a questão da linha
Atlântico-Paraguai,
Da recem-fundada vila de São Vicente partiram as primeiras
monções e os bandeirantes pisaram terras, delineando para o
futuro os caminhos que haviam de preocupar expíritos de varias
gerações, até a fixação de uma linha, já no domínio da via-ferrea,
que consultasse às várias circunstâncias exigidas para a definitiva
ligação. Vimos de antes dos dias de S. Vicente aos mais recentes
estudos da questão.
Fale Moreira Garcez, com autoridade, para dizer: "A
conveniência de ser estabelecido um caminho ligando a costa
brasileira ao Paraguai data, pois de mais de 4 séculos, e esse
assunto tem sido tão amplamente proclamado e discutido que não
exagero dizendo que hoje só quem não tiver a mínima noção das
cousas do nosso País poderá desconhecer a real importância
senão a imperiosa necessidade dessa imprescindível
comunicação."
A tentativa de solução do problema vem acompanhando a
nossa história. De fato, desde o período de Colônia até aos nossos
dias, o "problema máximo da Viação Nacional" vem empolgando
todos os governos.
Assim é que, os presidentes da província do Paraná, desde
Zacarias de Góes e Vasconcelos, não se cansaram desbordar o
importante problema.
"Zacarias de Góes e Vasconcelos em 1854,Beaurepaire
Rohan em 1956, Antonio Vaz de Cavalhais em 1957, Francisco
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Liberato de Matos em 1858, José Francisco Cardoso em 1866,
Polidoro Burlamaque, em 1867, Augusto Ferraz de Abreu e
Feliciano Horta de Araujo em 1868, Ermelino de leão em 1869,
Luiz Afonso de Carvalho em 1870, Lamenha Lins em 1876 e 1877,
Jesuino Marcondes em 1878 e 1879, Augusto de Carvalho em
1882 e 1884, Alves de Araujo em 1885 e outros presidentes da
província — observa Moreira Garcez — em seus relatórios
apresentados à Assemblea provincial ou aos seus substitutos no
Governo, são unânimes em consignar as mais auspiciosas
referências a tão previlegiada região do nosso solo pátrio e
evidenciam, com as expressões mais eloquentes dos seus
conhecimentos, o real interesse que, sob o triplo ponto de vista
estratégico, comercial e político, tem sempre despertado a
importante via de comunicação terrestre para Mato Grosso,
Paraguai e Argentina".
Entre os outros presidentes a que se refere o autor da
observação acima, cumpre não esquecer o Dr, André Augusto de
Pádua Fleury que, em seu relatório de março de 1865, mostrou
compreender o alto valor da ligação com o oeste.
Ao se referir à estrada da Graciosa, escreveu:
"Ela não é meramente uma comunicação provincial, senão o
caminho interno e mais direto para as repúblicas visinhas da
Confederação Argentina e do Paraguai, e para a província de
Mato Grosso que não teria sido invadida tão facilmente se os
ensaios e explorações indicados pelo Exmo. Barão de Antonina
tivessem sido seriamente estudados, levando-se a efeito ou
levantándose mão de uma vez, de um projeto que há 20 anos
dorme em verdadeiros paliativos''.
Preocupava a esse tempo o aproveitamento dos rios de oeste
como complemento da ligação do Paraguai e entre eles o Tibagí e
o Ivaí, 0 Dr. Pádua Fleury, em memorial dirigido ao ministro da
Agricultura, focalizou o assunto, aliás já ventilado anteriormente,
pois em 1856 Beauiepaire Rohan justificara a preferência do Ivaí
ao Tibagí.
Dizia Fleury: "A decida do Tibagi, pela distância do ponto de
embarque e pelas dificuldades naturais que apresenta não tem
produzido até hoje resultado algum, ignorando-se ainda se os
seus obstáculos podem ou não ser removidos. Se, porém, foi
navegável o Ivaí com um curso de cerca de 60 léguas, será ele o
complemento da estrada da Graciosa que, depois de transpor a
serra donde recebe o nome, terá de alongar-se para o poente,
tornando-se tronco do sistema de vias de comunicação da
província. Por isso, vou socorrer-me dos conhecimentos que
existem para solicitar a V.Excia, providências no sentido de
mandar proceder os estudos hidrotécnicos neste rio com o fim de
saber se ele presta, ainda que com alguma despesa para a sua
canalização, à navegação a vapor ou mesmo a sirga, únicas, que
nas atuais circunstâncias podem merecer os esforços do
governo,''
"Antes de tudo - continua Fleury — devo mencionar uma
exploração imperfeita e acanhada que todavia, revela bastante os
bons desejos do prestativo cidadão que a empreendeu. Refiro-me
à viagem realizada em 1845 pelo sertanejo Joaquim Francisco
Lopes de ordem do Exmo, Barão de Antonina, Senador por esta
província.''
João Henrique Eliot, descrevendo a excursão a que se refere
Fleury, conclue pela facilidade de navegação do Ivaí na extensão
percorrida, apesar das corredeiras e dos baixios.
Observa ainda Fleury ser de 80 léguas a distância de
Antonina ao Tibagi, distâncias esta que poderia ser reduzida a 67
uma vez que se fizesse a passagem direta de Antonina à Colônia
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Tereza nas Margens do Ivaí, cuja extensão, quer por Curitiba quer
por Castro, seria de 50 léguas,
Pelo que se vê, as discussões em torno do assunto ficavam
sempre nos limites de um sistema misto de comunicação. O
aproveitamente da navegabilidade dos rios impunha-se.
Foi por solicitação do presidente Pádua Fleury que o ministro
da agricultura expediu instruções, em dezembro de 1864, aos
engenheiros José e Francisco Keller, para a exploração do rio Ivaí,
Assim se expressa o referido titular, ao iniciar as instruções:
"Sendo de alta conveniência política e comercial a comunicação
interna que liga a província de Mato Grosso ao litoral da província
do Paraná sendo certo que essa comunicação realizada pela
estrada da Graciosa e rio Ivaí diminui cerca de 30 léguas de
transporte terrestre, em relação à extensão da difícil via fluvial do
Tibagi, acrescendo que a linha do IVAT percorre terrenos
ubérrimos que prometem grande riqueza agrícola e facilitam o
desenvolvimento da colônia Tereza e do território central da
província do Paraná e catequese de numerosas tribus selvagens
que habitam as cercanias do Ivaí e infestam periodicamente a
população civilizada, encarrego a Vms. de estudarem o rio Ivaí
guiando-se pelas seguintes instruções:'"'
As instruções do ministro da agricultura eram orientadas no
sentido de os exploradores poderem informar a extensão do rio a
partir da Colónia Tereza até a confluência do mesmo no Paraná, o
calado máximo e natureza de barcos a usar, sondagem dos
baixios e corredeiras, pontos de alveo pétreo, volume e
velocidade, obstáculos e meios de removê-los, tempo necessário
para a navegação do Ivaí e Paraná até a Foz do Ivinheima,
Os irmãos Keller deram cumprimentos às ordens recebidas e
a 22 de julho de 1865 apresentavam importante relatório em que
davam contas de: descrição da viagem, formação geológica,
vegetação e clima do vale do Ivaí, resultados da medição
hidrográfica, meios de remover os obstáculos à navegação,
orçamento para a canalização do Ivaí, fundação de estações para
a navegação depois de canalizado o rio e comunicação por terra
entre Antonina e a colônia Tereza.
É de notar que a viagem dos engenheiros Keller foi encetada
em época de estiagem notável, o que lhes causou peripécias na
viagem ao par de facüidades nas pesquisas.
"Quando encetamos nossa viagem - relataram eles - o Ivaí
tinha tão pouca água que, na colônia, desde a sua fundação, há 17
anos, não existia memória de tamanha
seca"!
"Essa baixa extraordinária favoreceu -nos para melhor
reconhecimento dos obstáculos que se oferecem à navegação do
rio; mas opos-nos por isso mesmo maiores dificuldades à
passagem de nossas canoas, Assim, ainda que o seu calado
fosse de 0,30m,, 1,5 palmos, foi mister muitas vezes arrasta-las
por léguas nos baixios extensos, por cima de cascalho e rochedos
onde havia a produndidade de 0,20m, ou um palmo apenas,"
"Em oito lugares diferentes, nos gjandes saltos e até nas
cachoeiras tivemos de descarregá-las completamente e, depois
de havermos passado por terra carga e canoas, embarcávamos
tudo de novo,"
Segundo o relato dos irmãos Keller, foram vencidos mais de 70
de tais obstáculos até chegarem à barra do Corumbataí, a uma
distância de 46 léguas da Colônia Tereza e que fora porto da
antiga e extinta povoação espanhola de Vila Rica do Espirito
Santo, Embora sem relação direta com o assunto aqui cuidado,
julgo interessante a transcrição da rápida referência feita pelos
ilustres engenheiros a essa "povoação espanhola destruída e
abandonada há mais de duzentos anos". Dizem eles:
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"Levantamos planta das ruinas desta cidade de não pequena
importância pois chegara a contar em seu seio cerca de 3.000
habitantes,"
"Deparam-se as ruinas nas margens esquerdas de ambos os
rios, o Ivaí e o Curumbataí, no logar onde estas, elevando-se até
12 metros acima das aguas baixas, isentam-se de todos as
enchentes'",
"Cerrada mata tornou a apossar-se de terrenos onde há 230
anos se descortinavam edifícios e quintais; e de maneira o fez que
não apresenta hoje diferença das florestas virgens das
circunvisinhanças; é o mesmo arvoredo baixo de laranjas azedas
que mais acima ou mais abaixo se encontra em ambas as
margens do rio Ivaí com os gigantescos monjoleiros, perobeiras e
paus dalho como já tínhamos visto a 20 ou 30 léguas acima.
Somente alguns limoeiros, cidreiras degeneradas e bananeiras na
margem do Curumbataí restam, como vestígios de antiga cultura,
Parece que as principais plantações do povoado existiam na
margem direita do Curumbataí",
"Pelo que mostram as ruinas, fora a cidade construída
regularmente, com ruas bem alinhadas, cruzando-se em ângulos
retos",
"As casas eram, na maior parte, senão todas, feitas de taipa
(terra socada) e cobertas de telhas, de que se encontram
fragmentos alastrando o interior dos retangulos formados pelos
restos das paredes, reduzidas hoje a montes da altura de um
metro mais ou menos com taludes de terra desmoronada",
"Nos vestígios da igreja que se acham num canto da praça, no
centro da cidade, os montes de taipa têm altura dobrada dos
outros e sobre eles nasceu um enorme monjoleiro.''
"Encontram-se na entrada da cidade escorias e outros
indícios de ter havido ali uma fundição de ferro, mineral abundante
nas visinhanças",
Importantes foram os dados colhidos pelos exploradores. Os
algarismos fixadores dos elementos de ordem técnica atestam o
critério com que se houveram no cumprimento da importantíssima
missão lhes atribuída.
Dentre esses dados lembremos alguns dos mais importantes,
"Largura normal do rio na colônia Tereza 90m,
Largura normal do rio em Vila
Rica 200m. " Largura normal do rio
na barra 300m.
Nos baixios e corredeiras a largura vai até 600m."
Profundidade no talvegue, em tempo das aguas baixas, entre
0,22m. e 7m.; a mínima nos baixios e a máxima nos poços muitas
vezes bastante extensos.
Volume de água na colônia Tereza: 15m3 por segundo, no
tempo das aguas médias, onde começa a navegação, 45m3/S.
Em Vila Rica, em tempo de águas baixas, lOOm3 por
segundo.
Na Barra, em tempo de águas baixas, 20m3 por segundo e
nas enchentes 3.000 a 3.500m3.
De acordo com as cotas obtidas nos vários pontos do rio
verificaram uma queda total de 283m, desde a colônia Teresa até
a barra, sendo que o declive médio foi calculado em 1:2000.
Além de elementos desta natureza os engenheiros Keller
forneceram elementos outros propondo meios para a remoção dos
obstáculos, dados orçamentários para a canalização dos trechos
que exigiam esta medida, ideias para a fundação de estações para
a nevegação, aldeamento e estabelecimentos agrícolas no vale do
Ivaí, bem como estabeleceram as bases para o calculo de fretes
para a navegação depois do rio canalizado.

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Estudos análogos aos feitos com o rio Ivaí, os Irmãos Keller
realizaram, prosseguindo a expedição, com os rios Tibagi e
Paranapanema, e concluíram que "a diferença de altura entre as
águas baixas e altas, a qual depende do volume das águas das
enchentes, declive e secção transversal, é no Paranapanema
menor do que no Tibagi e neste ainda menor do que no Ivaí.
Quanto à profundidade encontraram para o Tibagi uma
variação de 0,20m, a 9,10m. no tempo das aguas baixas e ainda
nesta época para variação de largura, 100 a 900rn,
Não esqueceram os engenheiros Keller o item lhes proposto,
da comunicação por terra, entre Antonina e Colônia Tereza. Em o
ultimo tópico do aludido relatório assim se expressam: "Como V,
Excia. sabe, a estrada nova da serra da Graciosa está em
construção e ficará concluída em poucos anos; a que segue de
Curitiba para Ponta Grossa requer, em diferentes logares,
re-construções, sobre cuja importância e extensão, quando
tornarmos a Curitiba, reuniremos as informações necessárias''.
"Infelizmente a direção geral da picada nova entre Ponta
Grossa e a Colônia Tereza é inteiramente errada. Em vez de
acompanhar o curso dos ribeirões até o alto da vertente que divide
as aguas do Ivaí das do Tibagí, ou de descer do mesmo modo
para a Colonia Tereza no lado oposto, com o que só uma vez
galgaria a cordilheira, ela corta transversalmente grande numero
de pequenos vales dos tributarios dos dois rios, subindo e
descendo, sem necessidade e com declive de 15 a 20%, as
eminências importantes, que formam as suas vertentes
secundárias. Uma picada em semelhantes condições, apenas
poderá servir de caminho de tropas mas nunca para uma estrada
de rodagem."
Foram dos primeiros os estudos procedidos pelos
engenheiros Keller.
A essa época, com os acontecimentos do Paraguai, o
problema avultou e os técnicos tomaram interesse pela sua
solução. Foram assim surgindo os planos de ligação do Atlântico
ao Paraguai.
Quanto às finalidades ou conforme os vales julgados mais
convenientes, os projetos tomaram aspectos variados, nascendo
desta circunstância o calor na discussão do problema, mui
justamente considerado um grande problema de viação para a
nossa Pátria.
Em 1876 escrevia Monteiro Tourinho:
"Nascida, ou antes energicamente resuscitada, das dolorosas
impressões da guerra e da necessidade de premunirmo-nos
contra assaltos futuros dos nossos inquietos e belicosos visinhos,
a ideia da estrada para Mato Grosso, nos diversos planos
concebidos, fitava exclusivamente intentos militares e
estratégicos. Mas, não obstante semelhantes fins exigirem os
mais rápidos e aperfeiçoados meios de locomoção a pobreza do
país para grandes cometimentos contentava-se apenas com a
construção de uma modesta estrada de rodagem, entremeiada
com o aproveitamento da precária navegação de alguns rios''.
Este aspecto da questão fez com que fosse mandado dar
início à construção da estrada de Mato Grosso como o
prolongamento da Graciosa. O rumo visado era o Ivaí que seria
aproveitado para a navegação.
Em fins do mesmo ano em que se deram início aos trabalhos
da estrada de Mato Grosso, 1871, ao Visconde de Mauá era feita
concessão para estudos de uma linha ferroviária a Miranda e
visando aproveitar a navegação nos rios Ivaí, Paraná, Ivinheima,
Brilhante e Mondego.

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O engenheiro Cristiano Palm logo após essa concessão,
idealiza um plano de viação ligando o Atlântico à Bolívia e propõe
tal medida ao governo desse paiz nosso visinho.
Monteiro Tourinho observa que "nesse notável documento
carta dirigida ao presidente da Bolívia — o capitão Palm,
alheando-se completamente de considerações estratégicas, para
só atender a vastos e transcendentes fins comerciais de interesse
internacional, pedia ao presidente da Bolívia autorização para
proceder, nesse país às explorações de uma linha férrea que,
como prolongamento da de Miranda concedida pelo governo
brasileiro, ligasse a majestosa baía de Paranaguá, no Atlântico, ao
porto peruano de May no Pacífico"'
Um verdadeiro sonho o plano Palm firmado na ideia de uma
via férrea transcontinental. Linha que, partindo do Atlântico, de
porto paranaense atravessaria as

províncias brasileiras do Paraná e Mato Grosso, cortaria a Bolívia


e a região sul do
Peru, sem o aproveitamento da navegação dos rios. Tomava
assim o vulto de uma linha eficiente sem a dependência da
navegabilidade dos cursos fluviais,
"Para atender convenientemente o seu destino, dizia ele, a
via férrea para Mato Grosso pela província do Paraná não pode ter
melhor direção do que aquela que, de Antonina se dirige para o
ocidente, transpondo a serra do Mar até Curitiba, capital do
Paraná; deste ponto atravessará Campo Largo e Palmeira, em
direção noroeste, até encontar o vale do Ivaí, margeando este vale
desde a sua parte superior onde ainda conserva o nome do Rio
dos Patos, seguirá a mesma direção até o Paraná, Depois de
transpor este grande rio a estrada atravessará os extensos
campos da serra de Maracaju que se prestam á construção de
via-férrea, Daí em diante deixará a bacia do Paraná para penetrar
na do Paraguai e chegar à vila de Miranda, De Miranda a via férrea
para Cuiabá tomará para o norte e a estrada de ferro para a Bolívia
seguirá para oeste em rumo direito até encontrar o rio Paraguai,
em frente à cidade do Capão d'Oqueima, na Bolívia, Depois de
transpor o Paraguai, entrará a via férrea na Bolívia e continuará
com a mesma direção até a extrema do sul da fronteira Pirapetí,
atravessando regiões quase habitadas unicamente por índios, De
Pirapetí penetrará no departamento de chuguisaca e daqui
seguirá pelos mais ricos e populosos departamentos da Bolívia.
Continuará até a antiga capital — Chuquisaca ou Sucre —; deste
ponto, ao longo do vale do lago Pariá, até a cidade de Oruro,
atravessando as aldeias Sicasica e Catamarca até Carocaro.
Neste ponto encontrará a já começada estrada de ferro do
Pacífico em Islayroad sobre Arequipa e Puno até à cidade de La
Paz",
Eis o plano Palm bem caracterizado como via
transcontinental,pela continuidade, sem o aproveitamento
precário na navegação fluvial
William Lloyd estudando a ligação ao oeste tem como ponto
inicial do seu traçado, igualmente Curitiba, É, entretanto, de
caracter misto a sua linha, pois esse engenheiro preconizara o
aproveitamento dos rios Ivaí, Paraná, Ivinheima e Brilhante,
0 desenvolvimento por terra seria Curitiba, Colônia Tereza,
Pari dos Coroados, Porto das Sete Voltas, Vila Miranda, numa
extensão total de 852,229 km,, intercalada de 733 km, de
navegação,
Monteiro Tourinho, criticando o traçado Lloyd, depois de
outras ponderações, assevera não compreender porque "tendo-se
de traçar uma estrada de ferro pela margem do Ivaí (tal a do
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traçado em crítica) passou-se do Iguassu para o vale do Tibagi e
depois deste para o do Ivaí, Parece-me mais racional - continua o
critico - que se tivesse prolongado algum tanto mais a linha pelo
vale do Iguassu e que se procurasse depois passar diretamente
para a linha do Ivaí,'*
0 engenheiro Tourinho não ficou no terreno da crítica, mas
lançou também o seu plano. E foi ao iniciar a justificação da linha
que propôs, que o ilustre engenheiro olhou, preliminarmente, o
problema da travessia do Paraná, Ê quando ele opina pelo
lançamento da ponte na altura do salto Guairá, Para justificar o
seu plano, baseia-se em observações feitas pelas respectivas
comissões quando Espanha e Portugal trataram da demarcação
dos limites de seus domínios.
Tourinho transcreve a descrição feita pelo chefe da comissão
espanhola que, ao tratar do salto Guairá assim se espressa:
"Trata-se do rio Paraná, deste rio que mais abaixo toma o nome de
rio da Prata; deste rio que, ainda nesta paragem tem mais agua do
que uma multidão dos maiores rios da Europa reunidos, e que, no
mesmo momento em que se precipita tem seu estado médio muito
fundo e 2.100 toezas (4,200m.) de largura, Esta enorme largura
reduz-se subitamente a um só canal que nâo tem mais de trinta
toezas (60 metros), no qual entra toda a massa dágua,
precipitando-se comum furor tremendo,." .
Coteja esta observação com os dados colhidos pela comissão
portuguesa ao se referir a precipitação das aguas pelos
despenhadeiros, formando cascatas que concorrem todas com
sua agua em um caixão formado por dois paredões quase
perpendiculares de pedra e que tem de largo 30 toezas (60
metros); alarga-se tão* lentamente que a duas léguas mais abaixo
tem 50 toezas, São altos aqueles de 16 toezas sobre o nivel da
agua,"
"O positivo, — diz Tourinho — o que resulta da acareação
entre as narrativas dos demarcadores espanhóis e as dos
portugueses, e o perfeito acordo sobre este ponto: no princípio da
grande catadupa e no correr de algumas léguas abaixo, do rio
Paraná não tem largura superior a cem metros e suas orlas são
constituídas de rochas basálticas com altura de 16 toezas ou 32
metros, acima do nivel das águas", "Com tais circunstâncias
topográficas, nenhum milagre de ciência ou arte e a construção de
uma ponte".
E se a já grande altura de 32 metros que os paredões naturais
oferecem, acima do nivel das aguas, não for suficiente para por a
ponte a salvo das enchentes, claro é que, sendo o salto formado
pela serra de Maracaju que atravessa o rio, conseguir-se-ão
encontros ainda mais altos, espaçando-se o vão, E então, que
passe, embora, por baixo da ponte, um oceano revolto"!
Como se vê, o engenheiro Tourinho, com o entusiasmo que
vibra nas suas expressões, apoiou a estrada transcontinental, sem
o auxílio da navegação, tendo justificado com inteligência a
travessia do Paraná onde as suas aguas se apertam para
realizarem o espetáculo belíssimo da formação das Setes
Quedas.
Vimos acima que o ilustre engenheiro patrício que com tão
grande visão discutiu os problemas magnos da viação nacional,
vimos que ele estranhava a rota delineada por Lloyd, quando este
afastava sua linha do vale do Iguassu,
Tourinho corrige o defeito da linha Lloyd, dando contas da sua
em que, — como afirmou — "toma o traçado Lloyd no vale do
Iguassu; no km, 79 prolonga-se por este vale, busca depois
Guarapuava, porque reputo grave falta toda a linha que não tomar
esta importantíssima comarca por ponto de passagem; procura o
Piquiri, desce pelo vale deste rio até sua confluência no Paraná;
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pelo Paraná abaixo segue até o salto das Sete Quedas defronte
de Iguarey. Transpondo o Paraná no salto Grande, desenvolve-se
pelo vale do Iguarey, passando deste para o do Xejuí que lhe
corresponde, aproximando-se do Curuguaty, contornando a serra
de Maracaju, alcança o Ipanéguassu que acompanha até Vila
Real, Transposto o Paraguay, busca o vale do Alto Pilcomaio,
atinge Chuquisaca na Bolívia a 3.700 m, sobre o nível do mar, Daí,
procurando o vale do Desaguadero, penetra no departamento de
La Paz e, procurando descer a cordilheira ocidental dos Andes,
chega ao departamento peruano de Arequipa e atinge Tacna,
onde há já um caminho de ferro até o porto de Arica"!
Esboçou, dessa forma, o ilustre engenheiro o plano geral da
sua linha,
Deu, assim, força ao aspecto em que se firmava a questão,
qual seja a preocupação de ligação do Atlântico com o Pacífico.
Não saímos, entretanto, das primeiras idéias de rasgar o
nosso oeste por uma via
de comunicação. ------
Tanto mais importante se apresentava o problema da procura
do caminho quanto mais cresciam, a par das discussões, as
finalidades que a estrada deveria preencher. De outra parte,
surgiam as correntes de opinião quanto às regiões a percorrer, se
vales ou divisores de águas. Mais delicado se tornou o assunto
quando surgiu a possibilidade de um outro ponto da costa sul para
ser ligado diretamente ao Paraguai, que não o porto de Antonina.

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