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MINERAÇÃO

Conceitos definidos
Programa de gerenciamento de riscos define termos para diminuir erros de comunicação
Sérgio Médici de Eston, Wilson Siguemasa Iramina, Alessandra Isabella Sampaio Martins e Reginaldo Pedreira Lapa

Quando se fala em gerenciamento de sidos utilizados de modo confuso e com existe um glossário traduzindo hazard por
risco, é importante que as pessoas envol- deficiente correspondência com o signi- perigo, mas utilizando a definição de con-
vidas nesse processo entendam correta- ficado dos termos em inglês. dição com potencial de dano. Como peri-
mente os principais conceitos e definições O termo em inglês hazard, por exem- go é a exposição ao hazard, ao se traduzir
associados. É preciso que todos falem a plo, tem sido muitas vezes traduzido como hazard por perigo, perde-se o conceito de
mesma linguagem, de forma a não haver perigo. Essa tradução se iniciou na área exposição, que é essencial à higiene e à
lacunas no processo de comunicação que ambiental e se espalhou posteriormente segurança.
possam contribuir para a ocorrência de para as áreas de higiene e segurança. Com No texto “Diretrizes sobre sistemas de
um evento indesejado. isso, se perdeu o conceito fundamental gestão de Segurança e a Saúde no Traba-
No entanto, homogeneizar conceitos e em higiene e segurança relativo à exposi- lho”, Anexo B, da Organização Internacio-
definições pode se tornar uma tarefa mui- ção e à dose, tornando a tradução referi- nal do Trabalho, discute-se identificar e
to complicada, em função da variedade de da imprópria para expressar o sentido do avaliar perigos e riscos. Porém, em segui-
termos que vem sendo usada, tanto por termo original na língua portuguesa na da, como medida de controle, apresenta-
profissionais da área de meio ambiente, área de higiene e segurança. se a supressão do perigo/risco, entre ou-
quanto por aqueles que atuam direta ou Nas NRs (Normas Regulamentadoras), tras. A supressão pode ser do hazard (uma
indiretamente em atividades associadas já se têm exemplos dessas improprieda- condição do
à Segurança do Trabalho, Saúde e/ou Hi- des. Na NR 10 (Segurança em instalações ambiente
giene Ocupacional. e serviços em eletricidade) as palavras

SÍLVIO SIMÕES
No Brasil, os termos perigo e risco têm surgem com diferentes conceitos associ-
ados, mencionando-se risco de contato e
perigos de choque elétrico. Já na NR 15
Sérgio Médici de Eston - Professor titular da EPUSP (Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo), coordenador geral (Atividades e operações insalubres),
do PECE (Programa de Educação Continuada) e do curso de
gerenciamento de risco de segurança. Anexo 13 (Agentes químicos), aparece
smeston@usp.br
o conceito de danger e sua relação com
Wilson Siguemasa Iramina - Professor livre docente da
EPUSP, engenheiro de Minas e de Segurança do Trabalho, insalubridade, pois esta só se caracteriza
coordenador administrativo-financeiro do PECE.
wilsiram@usp.br se houver exposição.
Alessandra Isabella Sampaio Martins - Mestre em O termo identificação de riscos é utili-
Engenharia Química, engenheira de Segurança do Trabalho e
sócia da empresa Mérito Consultoria e Treinamento. zado pela NR 9 (Programa de Prevenção
meritoconsultoria@gmail.com
de Riscos Ambientais). No entanto, riscos
Reginaldo Pedreira Lapa - Mestre em Engenharia de Minas,
engenheiro de Segurança do Trabalho e sócio da empresa não se identificam, riscos se calculam. O
CTG Empresarial – Consultoria e Treinamento em Gestão
Ltda. que se identifica são os hazards, aos quais
reginaldo@ctgempresarial.com.br
se a eles houver exposição (danger), po-
Este é o segundo artigo de uma série em que se apresenta a de-se ter como consequência um dano
estrutura de um programa de gerenciamento de risco na
indústria mineral desenvolvido mundialmente. físico ou uma doença.
Em um texto da Cetesb (Companhia
Ambiental do Estado de São Paulo), pu-
blicado no Diário Oficial,

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DIVULGAÇÃO MINERAÇÃO
O termo accident se refere a qualquer
evento gerando lesão ou doença para o
trabalhador. Dessa forma, accident é tra-
duzido para acidente. Todo evento inde-
sejado pode ser classificado como um in-
cidente. Aquele incidente que gera lesão
ou doença é classificado como acidente.
Danger associa-se a uma condição pe-
rigosa, via contato ou exposição, com pelo
menos uma visualização dos possíveis
danos. O termo é traduzido para perigo
nesse caso.
Risk representa uma função da proba-
bilidade de ocorrência de um dado even-
to, com um especificado grau de intensi-
dade (tipo de consequência). Assim, o ris-
co varia em função da consequência. O
risco de uma pessoa cair e quebrar a per-
na é um; o risco de uma pessoa cair e ter
uma leve contusão é outro; o risco de uma
pessoa cair, bater com a cabeça no chão e
morrer é diferente dos dois primeiros e-
Determinados locais possibilitam examinar incidentes potenciais
xemplos.
de trabalho) ou do perigo (a exposição terializar em um evento indesejado (inci- Alguns explicitam o fator tempo no
ao hazard), mas risco zero não é praticá- dente). Em outras palavras, o termo ha- parâmetro probabilidade, considerando o
vel, por isso não há como suprimir com- zard pode ser traduzido como “condição evento em um dado intervalo de tempo e
pletamente o risco. ou situação inadequada”, que por exposi- associado a uma consequência. Como
Por meio desses exemplos, nota-se que ção ou contato, pode conduzir a um even- exemplo, a probabilidade de cair um me-
há uma diversidade na tradução e na apli- to indesejado. Essa “condição” ou “situa- teorito no Brasil até 2100 é de 0,001%.
cação dos diferentes termos. Por essa ra- ção” independe do contato, da exposição Nesse contexto se traduz risk por risco.
zão, a ideia desse artigo é apresentar, jun- ou da intensidade das consequências. Atualmente alguns autores incluem o
tamente com exemplos, o conceito dos Nesse contexto traduzimos hazard por termo outrage como componente da
autores, aplicados especificamente ao condição perigosa. função risco, o qual está relacionado ao
gerenciamento de risco de segurança. Es- Já o termo damage exprime uma per- componente de “percepção do risco”. En-
sa nomenclatura não pretende ser a ex- da, que pode ou não ser quantificada eco- tretanto, matematicamente, risco conti-
pressão da verdade, mas apenas reflete nomicamente, incluindo lesões físicas, nua sendo expresso como uma função
um ‘dicionário’ de termos acordados en- capacidade de trabalho, doenças, clientes, entre probabilidade de ocorrência de um
tre todos os profissionais participantes do imagem da empresa, bens materiais, lu- evento e a magnitude da sua consequência.
projeto G-MIRM. cros cessantes, diminuição da qualidade
Essa terminologia tem sido utilizada há do produto, etc. Nesse sentido traduzimos ENERGIAS
vários anos nos cursos de especialização damage por dano. Experiências com a implantação de sis-
de Engenharia de Segurança do Trabalho Qualquer evento, não planejado e não temas de gestão de Segurança e Saúde
oferecidos pelo PECE (Programa de Edu- desejado, gerando danos ou perdas, como no Trabalho e auditorias realizadas como
cação Continuada da Escola Politécnica perda de tempo, prejuízos materiais ou parte desse processo fornecem indicado-
da USP), bem como nos cursos de Gra- qualquer resultado danoso ou externo aos res de que há certa dificuldade nas orga-
duação nas disciplinas Engenharia de Saú- objetivos do empreendimento ou proces- nizações em identificar corretamente as
de Ocupacional, Gerenciamento de Risco so programado, é chamado de incident. condições perigosas e depois fazer uma
de Segurança e Ventilação de Minas, ofe- Nesse contexto traduzimos incident por associação com as consequências que
recidas aos alunos dos cursos de Enge- incidente. podem se materializar. Essa dificuldade
nharia de Minas, Engenharia de Petróleo
e Engenharia Ambiental.

TERMOS
Na língua inglesa, o termo hazard é ex-
plicado como a condition of potential
harm. Em português, isso pode ser tra-
duzido como “uma condição com poten-
cial para gerar um dano”. Ou seja, uma
característica intrínseca que pode se ma-

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ocorre porque para identificar as condi- a examinar condições de inalação, conta- tre energia, condição perigosa, perigo,
ções perigosas é preciso compreender o to ou ingestão de produtos. dano e risco para energia química (pági-
seu conceito e conhecer muito bem o sis- A energia hidráulica (pressão) exami- na 88) fornece um exemplo de correla-
tema que está sendo estudado (uma ta- na condições de sistemas pressurizados, ção entre os termos energia, condição
refa, um local, um projeto, um equipamen- tais como circuitos hidráulicos, ar com- perigosa, perigo, dano e risco, para ener-
to, etc). primido, etc. Com a energia potencial con- gia química, para auxiliar no entendimen-
Em função dessa constatação, encon- dições de trabalho com molas, entre ou- to do binômio “causa - consequência”
tra-se em algumas literaturas um concei- tros, podem ser avaliados. (condição perigosa - dano).
to que ajuda a identificar as condições pe- Condições de ruído (dose e nível) po- A foto ao lado (página 88) permite que
rigosas presentes. É o conceito de ener- dem ser examinadas com a energia sono- se aplique diversos termos definidos an-
gia. Segundo a teoria de William Haddon, ra. Já condições de calor ou frio (associa- teriormente. Por exemplo, quais as condi-
a energia em grande quantidade e fora de da a superfícies e ambientes) podem ser ções perigosas, quais as energias envolvi-
controle é a causa da maioria dos inciden- analisadas com a energia térmica. das, quais os incidentes potenciais, etc.
tes e acidentes. A energia eletromagnética (radiante)
O conhecimento das diferentes moda- verifica as condições de radiação ionizante CONCEITOS
lidades de energia é essencial para iden- e/ou radiação não ionizante. A biomecâ- Também fazem parte do processo de
tificar as condições perigosas associadas nica (mecanismos do corpo) avalia as con- gerenciamento de risco de segurança os
àquilo que se está estudando. O conceito dições de postura, fadiga, etc. Essa ener- termos controle/barreira/defesa; análise,
de energia, fragmentado em suas várias gia está associada à Ergonomia. avaliação e gerenciamento de risco.
formas, auxilia na identificação de condi- É importante frisar que essa não é uma Os conceitos de controle, barreira e de-
ções perigosas. Pensar em energia gravi- classificação perfeita de energias, mas é fesa são equivalentes e definem meios
tacional, por exemplo, possibilita exami- uma lista sugestiva de nomes para que os para se tratar o risco e reduzi-lo até um
nar condições de queda ou algo caindo funcionários de todos os níveis de uma nível considerado aceitável. Referem-se
(associado à altura). Com a energia elé- empresa possam, por intermédio dela, se- a medidas de prevenção e medidas de re-
trica há a possibilidade de analisar condi- rem ajudados a enxergar e entender as cuperação. Nesse sentido, pode-se atuar
ções de contato ou arco (associada com condições perigosas às quais estão expos- na condição perigosa, no trajeto entre a
fuga de corrente elétrica). Já a energia tos. Uma lista como a apresentada facili- fonte e o receptor ou mesmo no recep-
mecânica, também conhecida como ciné- ta a comunicação com os níveis hierárqui- tor. Nesse caso se desenvolve a análise de
tica, examina condições de partes móveis cos mais baixos. hierarquia de controles.
expostas. Pensar em energia química leva Dessa forma, o quadro Correlação en- A Análise de Risco é um processo que

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MINERAÇÃO
utiliza ferramentas específicas como, por
exemplo, HAZOP (Hazard and Operability
Studies - Estudo de condição perigosa e
operabilidade), FMECA (Failure Mode,
Effect and Criticality Analysis - Análise
de modos de falha, efeitos e criticalidade),
BTA (Bow Tie Analysis - Análise da Gra-
vata Borboleta), WRAC (Workplace Risk
Assessment and Control - Avaliação e con-
trole de risco no trabalho), entre outras.
A Análise de Risco identifica condições
perigosas e, com algumas ferramentas, es-
tima ou prioriza os riscos associados.
Já a Avaliação de Risco é um processo
que engloba a identificação de eventos in-
desejados (incidentes e acidentes), con-
siderando a Análise de Risco. Além disso,
esse processo leva em conta também a
estimativa do risco por meio de métodos
qualitativos, quantitativos ou semiquan-
titativos. Esse processo considera contro-
les/barreiras/defesas até que o risco atin-
ja um nível considerado aceitável.
O processo que engloba as etapas de representado pela figura Gerenciamento mos termos com os mesmos significa-
Análise e Avaliação de Risco, além de con- de Risco, versão modificada da AS 4360: dos. Assim, os conceitos ficam explici-
siderar o contexto e o escopo do gerencia- 2004. tados de maneira a diminuir erros de co-
mento de risco, o gerenciamento de mu- O programa de treinamento em Geren- municação ou de não compreensão da
danças, o monitoramento/verificação e a ciamento de Risco de Segurança (G- terminologia.
comunicação, é chamado de Gerencia- MIRM) define uma série de termos técni- Confira no próximo texto da sequência o Erro Humano no G-
mento de Risco. Esse processo pode ser cos, de modo que todos utilizem os mes- MIRM.

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