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ISBN 978-85-7811-290-5
CDD 341.481
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Histórico da PNI
Parte 1
CAPÍTULO 1
1 A CELEBRAÇÃO DA LEI
Aos vinte anos da Política Nacional do Idoso (PNI), lançamos um olhar às três décadas
que a antecederam, quando visionários do processo de envelhecimento do Brasil se
inquietavam, sentindo a necessidade de providências que viessem a dar conta das
questões acarretadas por esse processo que avançava célere e não tão imperceptível.
Sem paradigmas, sem a sistematização de estudos e pesquisas e, principalmente,
sem uma consciência nacional do envelhecimento da população brasileira, tudo
estava por ser criado. A inspiração e o conhecimento vinham de fora. Os pioneiros
verde-amarelos esbanjaram brasilidade no competente e criativo trabalho de integração
do conhecimento gerontológico à instigação para a novidade demográfico-epidemiológica
que revolucionaria por inteiro os padrões políticos, econômicos e culturais de um
Brasil que deixava de ser o país de jovens.
O elenco dos pioneiros tinha clareza das consequências do envelhecimento
populacional e certeza de que o amparo legal é que fundamentaria todas as ações
em extensa diversidade que urgiam aparecer no cenário demográfico brasileiro.
O instrumento legal acabou sendo muito bem feito. Aos vinte anos da lei,
cumpre então celebrá-la, recordando os heroicos pioneiros que a viabilizaram,
tecendo os fios desta história que é também a nossa, como personagens e herdeiros.
Temos a sublime função de fazer prosperar o legado de sensibilidade e conhecimento
responsável dos precursores, na defesa de um ideal coletivo que nos justifica como
profissionais e, especialmente, como seres humanos de tempos longevos.
1. Assistente social; e membro do conselho consultivo da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG).
2. Psicóloga; membro da Comissão Permanente de Cuidados Paliativos da SBGG; e orientadora de aprendizagem do
Curso de Aperfeiçoamento em Envelhecimento e Saúde da Pessoa Idosa, que faz parte do Programa de Educação a
Distância da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (EAD/ENSP/Fiocruz).
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A verdade é que a nossa entrega de cada dia, feita ato de amor, torna-se, então, ato
político e nos resgata e dignifica, como pessoa e como sociedade (Oliveira, 2014).
Ainda na busca desta definição conceitual e na exaltação do valor do ser, de
cada ser e do conjunto de seres que nos acostumamos a chamar de humanidade,
coletividade, sociedade, cidadãos, protagonistas, encontramos as palavras de Nara
Costa Rodrigues (2000, p. 67):
no meu ponto de vista, o que é fundamental para que uma política social para a
velhice seja instrumento de integração ou de marginalização social é a filosofia que
a embasa. A hipótese que levanto é a seguinte: se, nessa política, o velho é o sujeito
da ação, é o agente de sua promoção, ela será um instrumento de sua integração na
sociedade. Se ele for objeto, dirigido e, às vezes, manipulado por tecnocratas, ela será
um instrumento de marginalização social.
4 HISTÓRIA DE UM PERCURSO
5 A PRODUÇÃO NACIONAL
O grupo de desbravadores, arrojados, destemidos, uns mais preparados, mais
conhecedores que outros, mas todos igualmente gigantes, solidários, amorosos,
sim, lutadores por amor àqueles que detêm uma história, que também é nossa
história, nossos mestres, conduziram o processo de produção e construção interna.
Os contornos desse processo se vão desenhando inicialmente com a
contribuição de um movimento nacional que resultou na realização de três
seminários regionais e um nacional, os quais se apropriaram das produções e das
realizações públicas e privadas existentes no país. O seminário nacional originou o
documento Recomendações de Políticas para a Terceira Idade nos Anos 90, entregue
em maio de 1990 à então ministra da Ação Social, Margarida Procópio, por meio
da secretária nacional da Promoção Social à época, Flora Liz Spolidoro.
Por determinação do senhor presidente da República Fernando Collor, foi
constituído um grupo de trabalho integrado por representantes governamentais e
não governamentais, que, após apreciação do documento da Associação Nacional de
Gerontologia (ANG), elaborou o Plano Preliminar para a Política Nacional do Idoso.
A próxima etapa do processo definida pela Secretaria Nacional de Promoção
Social foi delegar a Nara Costa Rodrigues, então presidente do Conselho Estadual do
Idoso do Rio Grande do Sul e delegada estadual da ANG, a liderança de um grupo
que, reunido em Porto Alegre nos dias 12 e 13 de setembro de 1991, elaboraria
a minuta do projeto de lei instituindo a então Política Social do Idoso. O grupo
era constituído por dois técnicos assessores da Secretaria Nacional de Promoção
Social; dois técnicos assessores da coordenação nacional da Legião Brasileira de
Assistência (LBA); dois técnicos assessores da LBA no Rio Grande do Sul; e um
técnico assessor do Conselho Estadual do Idoso (CEI) do Rio Grande do Sul, bem
como a secretária executiva e seu adjunto.
O anteprojeto constava de 27 artigos, sendo que do 17 ao 26 dispunha sobre
o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI), sua composição, mandato,
vinculação, presidência, integrantes públicos e privados etc. A seguir traz-se um
quadro-resumo contendo os eixos propostos para nortear as ações em cada um
dos documentos citados.
A História por Trás da Lei: o histórico, as articulações de movimentos sociais e
científicos, e as lideranças políticas envolvidas no processo de constituição da
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Política Nacional do Idoso
QUADRO 1
Informações sobre os eixos propostos, por documento citado
Recomendações de Políticas para a Minuta do projeto Lei no 8.842/1994
Eixos
Terceira Idade nos Anos 90, da ANG de lei da PNI
Formação da opinião pública X X
Educação X X X
Lazer e novas aprendizagens X
Esporte e lazer X
Cultura, esporte e lazer X
Cultura X
Saúde X X X
Promoção e assistência social X X X
Habitação X X X
Justiça X
Trabalho X
Trabalho e previdência social X X
Previdência e seguridade social X
Preparação para a aposentadoria X
Criação do CNDI X X X
7 OS CINCO DEDOS
São cinco os dedos da mão que escreve, guia, ampara, protege, assegura, rege, cria.
A mão que acenou, convidou, acolheu e orientou profissionais, políticos e cidadãos
idosos nos trâmites tortuosos, tão difíceis, mas regalados de esperança da criação da
PNI. São cinco os pioneiros construtores, visionários da primeira fila, do primeiro
grito, da primeira ação, da primeira mão estrela-guia da PNI.
Uma instituição os enlaçou, a ANG, cada um, porém, com sua própria inserção
institucional anterior e para além da associação. Vinham de uma ponta a outra
do país: do Ceará (Maria José Lima de Carvalho Rocha Barroso, a Mariazinha);
ao Rio Grande do Sul (Nara Costa Rodrigues); a São Paulo (Marcelo Antônio
Salgado e Flávio da Silva Fernandes); e a Santa Catarina (Neusa Mendes Guedes).
Os cinco desdobraram-se por todo o Brasil, cultivando a boa nova, “a-nunciando,
pro-nunciando e de-nunciando” num convite-convocação que acabou por fazer
transbordar uma ciranda que se fez espiral, seguindo impetuosamente para frente
e para cima, à busca incessante de uma política pública que orientasse formas de
pensar e agir coletivamente, que fizessem valer a pena envelhecer e viver na velhice
a plenitude da cidadania.
Mais profissionais constituíam um grupo coeso, cada vez mais numeroso,
seguindo a apaixonada liderança de Mariazinha, Nara, Marcelo, Flávio e Neusa,
aguçando o olhar e levantando a voz corajosamente. Aprenderam com esses mestres
como fazer o trabalho institucional, familiar e pessoal, sim, direcionado à criação de
uma política nacional que respondesse aos anseios já prementes, mas nem sempre
conscientes, de uma sociedade que celeremente envelhecia.
E um pouco como na história dos Três Mosqueteiros, que acabaram em
quatro, aqui também se incluiu mais um, um gigante como os demais: Mário
Antônio Sayeg. Chegado ao movimento em 1996, representando a SBGG, dele
jamais se afastou e ali também se fez entrega. Os diários de Nara Costa Rodrigues
o registram e o eternizam nas inúmeras e tensas reuniões, adoçadas com a sua
ternura eterna. Mário Sayeg, ainda mais do que no processo de construção da
PNI, é arauto e correalizador incontestável da Política Nacional de Saúde da Pessoa
Idosa, que provém da primeira e busca assegurar a atenção à saúde de todos os
idosos brasileiros.
A História por Trás da Lei: o histórico, as articulações de movimentos sociais e
científicos, e as lideranças políticas envolvidas no processo de constituição da
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ouvir infinitamente, habitando a nossa memória para além da realidade física das
presenças. Salgado, em depoimento concedido às autoras deste capítulo em 29 de
novembro de 2014, é porta-voz das lideranças históricas, essas estrelas-guia que
permanecem iluminando os nossos estudos e as nossas ações na incansável luta
pela aplicação efetiva da PNI.
Nos anos 1970 aconteceram as primeiras ações de definição de uma política social
para idosos na sociedade brasileira, a partir do esforço de algumas instituições não
governamentais, profissionais e voluntários que já se dedicavam a um trabalho de
atenção a idosos.
Com a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social, no governo militar,
a questão da velhice foi incorporada no rol das políticas públicas, ainda que sofrendo
resistência de muitos setores governamentais e grupos de profissionais que não
reconheciam a evidência dessa nova questão social. A prioridade das políticas sociais
estava voltada para outros problemas sociais, notadamente da infância e juventude.
Mesmo assim, por iniciativa da Secretaria de Assistência Social daquele ministério e
sob a nossa orientação, aconteceu a primeira mobilização de que se tem notícia para
a formulação de um diagnóstico sobre a questão da velhice na sociedade brasileira e
os recursos e programas de atendimento. Foram realizados três seminários regionais
(regiões Sul, Sudeste, Norte, Nordeste e Centro-Oeste) para estudo e diagnóstico; e
um seminário nacional na cidade de Brasília, que elaborou o primeiro documento
sobre a política social para idosos no Brasil.
Os anos seguintes foram ricos em definição de políticas e ações, destacando-se os
programas de capacitação em gerontologia social, os inúmeros seminários realizados
(inclusive os eventos do Sesc-SP e da SBGG), a criação do benefício da Renda Mensal
Vitalícia, o surgimento de instituições de defesa do idoso (Movimento Pró-Idosos –
Mopi; Acepi; Associação dos Idosos do Pará – Assipa; e outras), os diversos programas
de atenção aos idosos realizados pelo Sesc (primeiramente no Sesc-SP e posteriormente
em outros departamentos regionais), pelas agências da LBA e outras instituições. As
ações e programas para idosos proliferaram: centros de convivência, grupos de idosos,
escolas abertas, programas de preparação para aposentadoria e muitos outros.
Em 1989, por iniciativa da recém-criada Associação Nacional de Gerontologia (ANG)
e apoio do governo federal e alguns governos estaduais (Maranhão, Goiás, Santa
Catarina e Distrito Federal), uma nova mobilização de estudos sobre a questão da
velhice na sociedade brasileira, com a realização de três grandes seminários regionais
e um seminário nacional, participados por representações de todos os estados da
Federação. Como resultado o documento da ANG Políticas para Terceira Idade nos
Anos 90 serviu de subsídio para o texto da Lei no 8.842 de 1994 – Política Nacional do
Idoso. Nesse movimento destaca-se a participação de Edith Motta, Flávio Fernandes,
Flora Espolidoro, Jurilza Mendonça, Marcelo Salgado, Marli Fernandes, Maria José
Barroso, Nara Rodrigues e Neusa Guedes, que assumiram a orientação dos seminários
e realizaram diversas abordagens a governos estaduais, órgãos ministeriais e a própria
Presidência da República.
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científicos, e as lideranças políticas envolvidas no processo de constituição da
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REFERÊNCIAS
ANG – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE GERONTOLOGIA. Recomendações
de políticas para a terceira idade nos anos 90. Rio de Janeiro: ANG, 1989.
BRASIL; PNUD – PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA
O DESENVOLVIMENTO. Plano de Ação Internacional para o
Envelhecimento. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos,
2003. Disponível em: <http://www.observatorionacionaldoidoso.fiocruz.br/
biblioteca/_manual/5.pdf>.
HISGAIL, F. A ética na psicanálise. Revista Brasileira de Direito
Constitucional – RBDC, n. 8, p. 367-373, jul./dez. 2006.
OLIVEIRA, J. F. A propósito da noção de política. In: SEMINÁRIO
ENVELHECIMENTO NO BRASIL – PERSPECTIVAS, 2014, Rio de Janeiro.
Anais... Rio de Janeiro: UFRJ, 2014.
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BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
MENDONÇA, J. M. B.; RAUTH, J.; RODRIGUES N. C. O idoso brasileiro
e as leis. In: FREITAS, E. V. et al. (Org.). Tratado de geriatria e gerontologia.
3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. p. 1622-1626.