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ARQUEOLOGIA E EDUCAÇÃO:
O “PASSADO EXCLUÍDO” DO BRASIL
Esta nota visa divulgar alguns trabalhos que Tais razões são verdadeiras para casos no mun
estão sendo realizados, já há algum tempo, intro do inteiro e, no Brasil, não parece ser de outra ma
duzindo o estudo do Brasil pré-cabralino no coti neira. A presente nota divulga um trabalho alterna
diano de crianças e adolescentes, por meio da cha tivo que vem sendo realizado com crianças e adoles
mada educação “informal” . Antes, porém, é opor centes do ensino fundamental e médio, inserindo
tuno chamar a atenção para a existência de um “pas no cotidiano escolar a questão do “outro” Tal ques
sado excluído” do currículo de ensino brasileiro, tão é abordada tendo como principal instrumento
apontando brevemente quais são suas principais de aprendizagem a cultura material (tanto etnográ
conseqüências. Por fim, o maior objetivo será mos fica quanto arqueológica) de culturas “diferentes”
trar um caminho que deveria ser comum aos pes que viveram e ainda vivem em nosso país.
quisadores da Arqueologia Brasileira: a divulgação Vindo de encontro à necessidade de divulgar
de seus trabalhos para além dos limites acadêmicos, esta face excluída do passado brasileiro, o CEIMAM
proporcionando uma proveitosa união entre a edu (Centro de Estudos Indígenas “Miguel A. Menén-
cação (formal e informal) e os trabalhos arqueológi dez”) realiza, desde o seu nascimento em 1982, ati
cos. vidades pedagógicas voltadas para um maior co
M ackenzie e Stone definiram o “passado ex nhecimento do passado pré-colonial brasileiro.
cluído” num sentido duplo, podendo encerrar tanto Concebido como Projeto de Referência, o CEI
um “passado pré-histórico, que é realmente ex M A M 1é um centro inter-unidades e interdeparta
cluído do currículo ao redor do mundo ” quanto mental da Universidade Estadual Paulista - UNESP.
“o passado recusado ou omitido de muitos indí É coordenado pela antropóloga ProP. DP. Sílvia
genas, minorias ou grupos oprimidos” (Macken M aria S. de Carvalho e conta com a participação
zie & Stone 1990: 2). de alunos de graduação, principalmente de Ciên
Gestada no Congresso Arqueológico M undi cias Sociais, e pós-graduação (Sociologia, Histó
al, realizado em 1986 em Southampton, Inglater ria, Arqueologia, Lingüística, entre outros), além
ra, a obra de Mackenzie & Stone (1990) reúne traba de pesquisadores de diversas áreas do conhecimen
lhos de autores do mundo inteiro, que demonstram to, numa perspectiva interdisciplinar, interessados
como o passado é encarado e ensinado nos seus em desenvolver estudos e atividades ligadas à pro
países de origem: trabalhos feitos em pontos dife blemática indígena, de forma que as questões emer
rentes do mundo, mas que, no entanto, demons gentes possam ser debatidas entre os próprios mem
tram uma uniformidade nos currículos escolares bros do centro e a comunidade local, atendendo, as
quando se trata de ensinar o passado. sim, a perspectiva acadêmica: ensino, pesquisa e
Em trabalho anterior, M ackenzie e Stone extensão comunitária.
(1989) sugeriram quatro grandes razões para exis
tir um “passado excluído” na educação. Em primei
ro lugar, os currículos escolares já estão completa
(1) Enquanto centro de pesquisa, tem com o objetivo “es
mente preenchidos, não sobrando espaço para um tudar a adaptação original das comunidades indígenas ao
novo assunto. Em segundo, é ressaltada a própria meio, a racionalidade dos seus sistem as adaptativos (de
falta de conhecimento dos professores, adicionada caça-coleta e de horticultura de floresta) e o sucesso dos
à carência de material apropriado. Terceiro, estudar m esm os na obtenção dos m eios de subsistência sem p ro
o passado é geralmente visto como exótico, não vocar desequilíbrios ecológicos. E studar os problem as
decorrentes do contato do índio com o não-índio, fa c e a
tendo relação nenhuma com a sociedade atual. Em
sua integração à sociedade nacional. Suprindo, assim, a
quarto lugar, mas não menos verdadeiro, aspectos fa lta de estudos sistem áticos das sociedades indígenas e
do passado podem ser excluídos por razões políti visando a form ação de fu tu ro s pesquisadores ” (Regim ento
cas e ideológicas. Interno, capítulo II, artigo 2o).
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N otas - Rev. do M useu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 9: 312-314, 1999.
O trabalho com alunos do ensino fundamental coleção de fragmentos cerâmicos de sítios da Ama
e médio é desenvolvido por meio de eventos, sen zônia brasileira. Além destes, conta ainda com um
do as principais atividades: acervo fotográfico auxiliar.
1) Palestras: ex-alunos e professores do CEI- As diversas exposições realizadas têm a fina
MAM abordam, em palestras, discussões relevantes lidade de apresentar ao público um pouco da his
sobre os indígenas atuais, não deixando de fazer re tória do índio brasileiro através de sua produção
ferência ao passado desses povos, tão pouco conhe material. As exposições de artefatos arqueológi
cido e geralmente mostrado ao público de forma dis cos, que despertam maior curiosidade nas crian
torcida. Aliado a esta atividade, conta, também, com ças e no público leigo em geral, exibem as provas
um trabalho de orientação e assessoria temática para de uma remota existência dos índios no Brasil, fa
continuidade das discussões nas escolas envolvidas. zendo nascer um a visão crítica da história geral
Em importante trabalho especialmente volta mente contada nos livros didáticos.
do para professores, Neves argumenta que “é uma Com o conjunto de recursos didáticos apon
verdade estabelecida para a maioria dos brasileiros tados, procura-se mostrar a diversidade cultural
que a história do país fo i inaugurada em 22 de abril existente em nosso país, semeando entre crianças
de 1.500. O que aconteceu antes disso, domínio da e adolescentes a idéia de respeito pelo diferente. E
'pré-história', seria um pouco vago e na verdade intuito, também, fazer brotar uma postura crítica
irrelevante para o posterior desenvolvimento do nos indivíduos quanto às idéias que são passadas
Brasil, m erecendo p o ucas p á ginas nos livros pelos meios de comunicação social (filmes, dese
didáticos ’’(Neves 1995:171). O autor ainda ressal nhos, músicas, propagandas, jornais e revistas), em
ta o uso do termo “descobrimento” para designar a relação aos povos indígenas.
ocupação européia, mostrando o preconceito com Dentre os principais projetos comunitários, é
relação à história dos povos indígenas do Brasil. a “Am eríndia” realizada anualmente no mês de
Nas palestras, as discussões seguem o propó abril, um dos mais significativos. Ao ser posto em
sito de desmistificar esta noção que nos é passada prática, por meio de atividades múltiplas (pales
do índio como subjugado e atualmente “acultura- tras, mesas-redondas, discussões com lideranças
d o \ bem como mostrar quão ultrapassada é a idéia indígenas e profissionais das mais diferentes áre
de não haver uma pré-história brasileira que mere as, exposições temáticas, etc.), conduz todos os
ça destaque nos currículos escolares. níveis da formação educacional escolar, além da
2) Exibição de Audiovisuais: o CEIMAM tam comunidade local, a debater e entrar em contato
bém conta com o auxílio de um acervo de vídeos e com a problemática social indígena.
slides educativos sobre a história e a atualidade in Trabalhos como o do Centro de Estudos Indí
dígenas, que colaboram para ilustrar as diferentes dis genas2 são de grande importância para a propaga
cussões. ção de um maior conhecimento sobre os índios bra
3) Exposições Temáticas temporárias e iti sileiros e sua história, tanto antes do “descobri
nerantes: o CEIMAM conta com um acervo Etno mento” do Brasil, quantoríia atualidade.
gráfico e Arqueológico com mais de 600 peças, Apesar da falta de verbas para este tipo de ati
divididas em Acervo Etnográfico (cerâmica, ces vidade, instituições como o CEIMAM, atualmente
taria/trançados, cordões e tecidos, adorno plumário, preocupadas com o caráter pedagógico que traba
instrumentos musicais, armas, objetos rituais, má lhos acadêmicos possam ter, persistem no objetivo
gicos e lúdicos, utensílios e implementos de madei de transm itir ao grande público os resultados de
ra), de povos indígenas de todas as partes do país, seus mais recentes trabalhos. É neste sentido que os
e Acervo Arqueológico, com uma coleção de arte arqueólogos têm muito a contribuir para a educa
fatos líticos (lascados e polidos) e cerâmica de sí ção formal e informal, com suas descobertas arqueo
tios do Estado de São Paulo, além de uma pequena lógicas e teorizações acerca da cultura material.
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Referências bibliográficas
Robson A. Rodrigues*
Solange Nunes de Oliveira**
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