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ABERTURA DO SER HUMANO AO TRANSCENDENTE

O ser humano é um sujeito pessoal – pertencemos ao mundo físico e biológico. Somos feitos
dos mesmos átomos que os outros seres, do mesmo tipo de componentes biológicos e de células
que os outros animais. Mas, temos capacidade de raciocino, projetamos o futuro, estamos
conscientes da nossa própria morte, construímos uma linguagem elaborada, podemos
transformar a natureza, somos dotados de consciência moral.
Há dois polos em nós – na nossa mente existe um polo objetivo e outro subjetivo.
 Polo objetivo – é o mais fácil de definir, nele passam as palavras e as frases que nós
dirigimos a nós mesmo
 Polo subjetivo – atua sempre atras de nós para nos projetar para a frente. É o lugar
dos nossos desejos, das nossas paixões, das nossas criações artísticas ou
profissionais, das nossas decisões, etc…
Abertura ao infinito – somo habitados por um desejo de “mais”, um desejo de “infinito”, de
absoluto.
O ser humano é livre para se auto determinar, ou seja, para seguir, ou não, este dinamismo de
“mais”
Liberdade – o ser humano é dotado não só de livre arbítrio, a capacidade de escolher isto ou
aquilo, mas também da capacidade de se auto determinar, de se escolher a si mesmo.
O confronto com uma decisão – seguir ou não o dinamismo de “mais” que temos em nós.
O momento de nomear deus – a nossa débil existência está em contacto com um “mistério
absoluto” que nos ultrapassa radicalmente, mas no qual, não menos misteriosamente, tocamos.
RELIGIÃO E RELIGIÕES
Religião – “é um facto humano especifico que tem a sua origem no reconhecimento, por parte
do homem, de uma realidade suprema que confere sentido último à própria existência, ao
conjunto e ao curso da história”.
Elementos essenciais da religião:
 Reconhecimento de uma realidade independente e superior ao homem, da qual se fala com
linguagem religiosa, produzindo assim livros sagrados, doutrinas e teologias.
 Uma atitude de acatamento dessa realidade suprema, que se manifesta numa vivência
interior (experiência mística) e num comportamento exterior, plasmado num culto e numa
ética especial.
 Uma comunidade daqueles que professam a mesma religião, que se concretiza numa
organização que os distingue dos outros, tornando-se assim uma sociedade, uma instituição

O CONCEITO DE DEUS

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Etimologia: A palavra Deus vem do Latim, Deus, que por sua vez remete para o termo indo-
europeu deiwo, que significa “luminoso”.

“A própria existência do homem inclui uma tendência para um absoluto em ser, sentido, verdade
e vida, que a revelação cristã descreve com o conceito de Deus.” A questão de Deus está implicada
na consciência humana.

O próprio ateísmo, ao negar a existência de Deus dá testemunho ineludível da questão de Deus.

Deus na tradição judaico-cristã:


 Existe um só Deus (monoteísmo) que é Criador, ou seja, é Deus quem dá o ser a tudo o que
existe, Deus como causa primeira. Três significados do conceito de criação: creatio
originalis, creatio continua e creatio nova.

 Justamente porque é a origem do ser de todas as criaturas. Deus é ao mesmo tempo


absolutamente transcendente, ou seja, não está ao nível de nenhuma das criaturas, e
totalmente imanente, no sentido em que não há nada mais íntimo às criaturas do que a
própria existência.

 Atributos de Deus: omnipotência, omnisciência, impassibilidade, imutabilidade, etc.

“Provas” da existência de deus - Segundo a perspetiva católica, a luz natural da razão pode
afirmar a existência de Deus. Mas só a revelação permite conhecer o que não é acessível à razão
humana.
 As provas da existência de Deus pressupõem pelo menos a vida espiritual do ser
humano. Seria ingénuo partir unicamente do facto da existência do mundo e da nossa
experiência acerca dele. As provas da existência de Deus não são contundentes para o
homem moderno. Convergência de argumentos.
 Argumentos: causalidade, contingência, teleológicos, ontológicos, morais

Linguagem sobre Deus - O Mistério de Deus está muito acima das capacidades naturais da
razão. Embora Deus não seja opaco à razão humana, esta não consegue nunca penetrar toda a
sua profundidade. Ou seja, Deus não pode ser encerrado nas nossas teorias e conceitos. Está
sempre além deles. “Se compreendeis, não é Deus”, disse Sto. Agostinho
Podemos falar de Deus, mas sempre de forma analógica, conscientes dos limites das nossas
capacidades. Como dizia a escolástica, “entre o Criador e a criatura não se pode notar uma
semelhança, sem que se deva notar entre eles uma ainda maior dissemelhança.”
[três vias da analogia: afirmação, negação e eminência.]

O CONCEITO DE REVELAÇÃO
Um Deus que se revela e dialoga

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Revelação - etimologia: «tirar o véu» a uma realidade escondida, por exemplo, a comunicação
entre duas pessoas, em que uma manifesta à outra o seu próprio mistério.
Revelação de Deus: “Deus quer revelar ao homem o mistério da sua própria vida e do seu
projeto a respeito da criatura. Para se comunicar, Ele fala, como acontece connosco. Comunica-
se para se dar, para partilhar a sua própria vida connosco.” (Sesboüé, pp. 174)
Objeções à ideia de revelação
1. A objeção racional: rejeição da noção de “mistério” (Espinosa). A revelação bíblica
mais não é que a descoberta de realidades profundas que se transmitem aos outros
apenas com a luz da razão. Verdades cristãs interpretadas racionalmente (Hegel e Kant).
Resposta: o “mistério” não é opacidade, mas luz que não pode ser vista de frente: “nem o sol
nem a lua se olham de frente”. (Pascal)
2. A história é contingente, mas Deus é necessário: “o escândalo está em fazer depender
a relação ao Absoluto de uma relação histórica, e, portanto, contingente. O dado
histórico é contingente; só o dado racional é necessário”. (Sesboüé, pp. 176-177)
“As verdades históricas contingentes não podem ser nunca a prova de um facto necessário”.
(Lessing)
3. Objeção do desenvolvimento histórico: os modernos procuraram mostra que as
noções cristãs surgiram da consciência humana através de um processo histórico que
pode ser reconstituído.
Resposta: “A Palavra de Deus deve tornar-se linguagem humana e, portanto, respeitar as leis
temporais do conhecimento humano para ser verdadeiramente recebida pelos homens.”
(Sesboüé, p. 178)
4. A objeção ética: porque é que Deus se revelou a uns povos e não a outros? “Como
podemos nós pretender que Deus, se é Pai, se queira revelar apenas a alguns e não a
outros?”
Resposta: (1) a revelação é histórica: “o Deus que se revela a Israel não é o Deus da natureza,
mas o Deus da história.” “Uma revelação que se produz na história passa necessariamente pela
particularidade de alguns homens, de um lugar, de um tempo, e de uma cultura”. (2) A
revelação judaico-cristã tem um horizonte universal: é para a salvação de todos. (Sesboüé, pp.
178-179)
Necessidade da revelação: pela revelação divina quis Deus manifestar e comunicar-se a Si
mesmo e os decretos eternos da Sua vontade a respeito da salvação dos homens, «para os fazer
participar dos bens divinos, que superam absolutamente a capacidade da inteligência humana».
(Dei verbum, 2)
Natureza da revelação: “Aprouve a Deus na sua bondade e sabedoria, revelar-se a Si mesmo e
dar a conhecer o mistério da sua vontade (cfr. Ef. 1,9), segundo o qual os homens, por meio de
Cristo, Verbo encarnado, têm acesso ao Pai no Espírito Santo e se tornam participantes da
natureza divina (cfr. Ef. 2,18; 2 Ped. 1,4). Em virtude desta revelação, Deus invisível (cfr. Col.
1,15; 1 Tim. 1,17), na riqueza do seu amor fala aos homens como amigos (cfr. Ex. 33, 11; Jo.
15,14-15) e convive com eles(cfr. Bar. 3,38), para os convidar e admitir à comunhão com Ele.
Desenvolvimento da revelação: revelação cósmica ou natural: As obras da criação são já, em
si mesmas, uma revelação de Deus.

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“Os céus proclamam a glória de Deus; o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia
passa ao outro esta mensagem e uma noite dá conhecimento à outra noite.
Não são palavras nem discursos cujo sentido se não perceba. O seu eco ressoou por toda a
terra, e a sua palavra, até aos confins do mundo”. (Sl 19, 2-5)
A lei da consciência: desde o início da história da humanidade, Deus manifestou-se na
consciência humana. «Lei [moral] natural».
Revelação histórica: Deus revela-se na história do povo de Deus, que culmina em Jesus Cristo,
o cume da revelação: Deus falou a Abraão; Deus falou por Moisés; Deus falou pelos profetas;
Deus falou pelo seu Filho, Jesus Cristo.
Cristo: mediador e plenitude da revelação: “A verdade profunda tanto a respeito de Deus
como a respeito da salvação dos homens, manifesta-se-nos, por esta revelação, em Cristo, que é,
simultaneamente, o mediador e a plenitude de toda a revelação. (Dei verbum, 2)
Depois de ter falado muitas vezes e de muitos modos pelos profetas, falou-nos Deus nestes
nossos dias, que são os últimos, através de Seu Filho (Heb. 1, 1-2). Com efeito, enviou o Seu
Filho, isto é, o Verbo eterno, que ilumina todos os homens, para habitar entre os homens e
manifestar-lhes a vida íntima de Deus (cfr. Jo. 1, 1-18). Jesus Cristo, Verbo feito carne, enviado
«como homem para os homens» (3), «fala, portanto, as palavras de Deus» (Jo. 3,34) e consuma
a obra de salvação que o Pai lhe mandou realizar (cfr. Jo. 5,36; 17,4). (Dei verbum, 4)
A fé como resposta do ser humano à revelação
A Deus que revela é devida a «obediência da fé» (Rom. 16,26; cfr. Rom. 1,5; 2 Cor. 10, 5-6);
pela fé, o homem entrega-se total e livremente a Deus oferecendo «a Deus revelador o obséquio
pleno da inteligência e da vontade» e prestando voluntário assentimento à Sua revelação. Para
prestar esta adesão da fé, são necessários a prévia e concomitante ajuda da graça divina e os
interiores auxílios do Espírito Santo, o qual move e converte a Deus o coração, abre os olhos do
entendimento, e dá «a todos a suavidade em aceitar e crer a verdade». Para que a compreensão
da revelação seja sempre mais profunda, o mesmo Espírito Santo aperfeiçoa sem cessar a fé
mediante os seus dons. (Dei verbum, 5)
Não há revelação quimicamente pura: “A palavra de Deus ao homem não caiu do céu. Ela
passa sempre pela palavra de homem a homem”. “Na revelação judeo-cristã, reconhecemos o
papel do próprio profeta: é pela mediação da sua subjetividade humana, da sua experiência de
vida, das suas qualidades de escritor que a palavra de Deus entra na humanidade”. (Sesboüé, p.
193)
Uma revelação proporcionada à capacidade do homem: “O homem, a quem a revelação é
dirigida, está sempre situado numa história, com as suas evoluções e os seus retrocessos. A
revelação toca-o aí, onde se encontra, vivendo em determinada cultura e em determinado mundo
de representações” (Sesboüé, p. 195)

Transmissão da Revelação:

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tradição

transmissão magistério da
da revelação igreja

sagrada
escritura

Pela Tradição, “a Igreja, na sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações
tudo aquilo que é e tudo aquilo em que acredita” (Dei verbum, 8)
A Bíblia
As tradições relativas acontecimentos fundadores de Israel foram progressivamente postas por
escrito sob a forma de livros dispersos e sucessivos. Os livros proféticos foram escritos pelos
próprios profetas ou por pessoas ligadas à sua escola ou tradição. Muitos dos textos bíblicos não
foram escritos de uma só vez. Vários livros resultam da composição de várias fontes. Existem
sinais claros de sucessivas edições. Isto é verdade também para os textos do Novo Testamento.
Inspiração: desde a perspetiva da fé, os livros que compõem a Sagrada Escritura são inspirados
por Deus; é o este o garante da sua “veracidade” e o fundamento da sua “autoridade”.
Como entender a inspiração das Escrituras?
Deus como autor principal das Escrituras, e escritor humano como seu instrumento.
“Na Escritura, tudo é de Deus e tudo é do homem, segundo uma cooperação que não gera
nenhuma concorrência entre si. Eles não se encontram no mesmo plano. Deus não é um
‘escritor’ e os escritores da Bíblia não são ‘secretários’ que dão forma ao pensamento um do
outro ou que transmitem ao computador um ditado”. (Sesboüé, p. 198).
A verdade nas Escrituras
Que tipo de verdade está contida nas Escrituras? Trata-se da verdade religiosa: a Bíblia diz
respeito às nossas relações com Deus. Os livros da Bíblia não são tratados históricos ou
científicos.
“A Bíblia diz-nos como se vai para o céu, não como vão os céus” (Galileu)
Vários níveis de interpretação da Sagrada Escritura: Sentido literal, o sentido espiritual, o
sentido alegórico, o sentido moral, o sentido anagógico.
“A letra ensina-te os factos (passados), a alegoria o que deves crer, a moral o que deves fazer, a
anagogia para onde deves tender” (Sto. Agostinho)

JESUS DE NAZARÉ – IDENTIDADE E MISSÃO


Jesus de Nazaré: Existência histórica

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São escassas as fontes extra-bíblicas sobre Jesus (Flávio Josefo, Tácito, Suetónio). A principal
fonte é, portanto, o Novo Testamento, em particular os quatro Evangelhos (Mateus, Marcos,
Lucas e João). Os Evangelhos não são biografias modernas, mas sim testemunhos.
Com base em alguns factos históricos, os Evangelhos dão testemunho da divindade de Jesus e
de que Deus atuou definitivamente em Jesus Cristo, revelando-se e reconciliando o mundo
consigo através dele.
Os Evangelhos são escritos no contexto de uma determinada comunidade e para uma audiência
concreta, e por isso têm enfoques e perspetivas teológicas diferentes.
Os quatro Evangelhos:
1. Marcos (60-75 dC): possivelmente escrito em Roma (para uma comunidade
perseguida).
2. Mateus (80-90 dC): provavelmente escrito em Antioquia.
3. Lucas (cerca de 85 dC): Grécia ou Síria.
4. João (80-100 dC): escrito em Éfeso ou na Síria.
Informações básicas sobre Jesus (cf. Evangelhos e fontes extra-bíblicas):
- Nasceu em Belém, durante o império de Augusto, nos últimos anos do rei Herodes (7-6 a.C.).
- Filho de Maria, esposa de um homem de nome José, da casa de David, durante a sua infância e
juventude, Jesus viveu em Nazaré, na Galileia.
- No início da sua vida pública, Jesus transferiu-se de Nazaré para Cafarnaum.
- Anunciou o Reino de Deus e fundou uma comunidade de discípulos.
- Foi condenado à morte por crucifixão, por reivindicar a dignidade e realeza divinas (30 d.C.).
A Mensagem de Jesus: O Reino de Deus
“Jesus anunciou o Reino de Deus, fazendo dele o objeto da sua pregação e a razão de todas as
suas opções. Deus está aqui e atua em nosso favor: é este o significado da expressão Reino de
Deus”. (Maggioni, p. 461)
O Reino de Deus não vem de maneira ostensiva. Ninguém poderá afirmar: ‘Ei-lo aqui’ ou ‘Ei-lo
ali’, pois o reino de Deus está entre vós. (Lc 17, 20-21)
O que é o Reino de Deus? O Reino de Deus é a presença escondida, mas poderosa de Deus em
Jesus Cristo, restaurando a integridade e a vida daqueles que o aceitam na fé.
Boa notícia (Evangelho) para os que esperam um mundo novo
Ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos
aproximaram-se dele. Então tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo:
«Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. Felizes os que choram, porque
serão consolados. Felizes os mansos, porque possuirão a terra. Felizes os que têm fome e sede
de justiça, porque serão saciados. Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. Felizes os pacificadores, porque serão
chamados filhos de Deus. Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é
o Reino do Céu. Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo
o género de calúnias contra vós, por minha causa.” (Mt 5, 1-11)
O acolhimento dos pecadores (Deus é misericórdia):

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 Banquete na Casa de Simão
 O Bom Pastor
 Regresso do Filho Pródigo
A preferência evangélica pelos pobres:
 O Bom Samaritano
 O Bom Samaritano cuida do homem ferido
Os milagres:
 A Tempestade no Mar da Galileia
 Cura do Homem Cego
 As Bodas de Caná
A paixão e morte de Jesus
Jesus reuniu à sua volta um grupo de seguidores, mas despertou também a desconfiança das
autoridades. A hostilidade foi crescendo e culminou na sua condenação à morte na cruz sob
Pôncio Pilatos.
Por que razão Jesus foi condenado? Jesus questionou a atitude com que se praticava a Lei
(que tinha 613 preceitos); acolheu os pecadores e perdoou-lhes os pecados, o que era uma
prerrogativa de Deus; expulsou os vendilhões do Templo e foi acusado de querer destruir o
Templo; foi aclamado como Messias, e reconheceu ser o Filho de Deus, o que foi considerado
uma usurpação da condição divina. (Maggioni, p. 463)
Significado da morte de Jesus
Jesus morreu como viveu, fazendo da sua morte um oferecimento a Deus e à humanidade. Jesus
viveu em total obediência ao Pai e fez de toda a sua existência um oferecimento (sacrifício) para
a salvação dos homens.
A morte de Jesus salva. Na cruz, Deus toca a humanidade onde ela está mais ferida. A morte de
Jesus dá vida. Ao entregar-se em total confiança nas mãos do Pai, Jesus devolve à humanidade a
sua vocação universal, e reconcilia a humanidade com Deus. A morte de Jesus é mais do que
um acidente da história. Jesus ofereceu-se a sua vida para que a humanidade possa ter vida. É
um gesto desmesurado, que reestabelece a relação da humanidade com Deus.
A ressurreição de Jesus
A história de Jesus não termina na cruz. Segundo os Evangelhos, algumas mulheres foram ao
sepulcro na madrugada do terceiro dia e encontraram-no vazio. Seguem-se várias aparições do
ressuscitado, primeiro às mulheres, e depois aos Apóstolos.
“O Crucificado morreu e ressuscitou”. Esta é a grande Boa Notícia que o Cristianismo tem para
oferecer ao mundo. “Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa pregação e também vã a nossa fé”,
diz S. Paulo (1 Cor 15, 14). A ressurreição de Jesus alarga o horizonte do ser humano até à
eternidade, e diz-nos que a morte e a injustiça não têm a última palavra.
Quem é Jesus de Nazaré?
Ao chegar à região de Cesareia de Filipe, Jesus fez a seguinte pergunta aos seus discípulos:
«Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?» Eles responderam: «Uns dizem que é João
Baptista; outros, que é Elias; e outros, que é Jeremias ou algum dos profetas.» Perguntou-lhes
de novo: «E vós, quem dizeis que Eu sou?» Tomando a palavra, Simão Pedro respondeu: «Tu és
o Messias, o Filho de Deus vivo.»

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Jesus disse-lhe em resposta: «És feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o
sangue que to revelou, mas o meu Pai que está no Céu. Também Eu te digo: Tu és Pedro, e
sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Abismo nada poderão contra ela. Dar-
te-ei as chaves do Reino do Céu; tudo o que ligares na terra ficará ligado no Céu e tudo o que
desligares na terra será desligado no Céu.»
Depois, ordenou aos discípulos que a ninguém dissessem que Ele era o Messias. (Mt 16, 13-20)
A partir desse momento, Jesus Cristo começou a fazer ver aos seus discípulos que tinha de ir a
Jerusalém e sofrer muito, da parte dos anciãos, dos sumos sacerdotes e dos doutores da Lei, ser
morto e, ao terceiro dia, ressuscitar. Tomando-o de parte, Pedro começou a repreendê-lo,
dizendo: «Deus te livre, Senhor! Isso nunca te há-de acontecer!» Ele, porém, voltando-se, disse
a Pedro: «Afasta-te, Satanás! Tu és para mim um estorvo, porque os teus pensamentos não são
os de Deus, mas os dos homens!» (Mt 16, 21-23)

jesus filho de
deus
jesus o servo
jesus o cristo
sofredor (isaías)

jesus é senhor

As disputas teológicas dos primeiros séculos da Igreja


A Igreja precisou, desde o início, de clarificar a sua fé em Jesus Cristo, que é verdadeiro Deus e
verdadeiro homem, e corrigir afirmações que distorciam o mistério de Cristo.
Duas etapas fundamentais: 1) afirmar a divindade e a humanidade de Cristo (Deus não pode
salvar-nos sem assumir a nossa humanidade na sua totalidade); 2) clarificar o tipo de união entra
a divindade e a humanidade de Cristo.
1. Negação da humanidade de Cristo:
Docetismo: Jesus Cristo tinha aparência humana, mas não era verdadeiramente humano.
Gnosticismo: A salvação consiste em adquirir um conhecimento privilegiado, que liberta a alma
da prisão que é o corpo. Jesus Cristo = Jesus + Cristo. A união é temporária. Um ser divino não
pode identificar-se com a matéria, muito menos sofrer e morrer.
Apolinarianismo: o Verbo substituiu a alma racional de Jesus. Ou seja, Deus não tem uma alma
humana.
2. Negação da divindade de Cristo:
Adocionismo. Jesus não é mais do que um ser humano a quem Deus adotou e a quem ofereceu
uma graça especial. Ou seja, Cristo não é realmente divino.
Arianismo: o Logos não é verdadeiramente Deus, mas uma criatura acima das outras criaturas.
Os arianos não conseguem conceber que Deus pudesse experimentar o sofrimento e a morte.
Concílio de Niceia (325): Afirma a divindade de Cristo. Jesus Cristo é consubstancial ao Pai.
Símbolo de Niceia (excerto):

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Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho Unigénito de Deus, nascido do Pai antes de todos
os séculos: Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro; gerado, não criado,
consubstancial ao Pai.
Como é que a humanidade se une à divindade?
Escola de Alexandria: Sublinha que o sujeito de cada ato do homem Jesus é o Verbo Eterno
(Logos), que nasce da Virgem Maria e sofre na cruz. A Cristologia de Alexandria coloca a
ênfase na unidade ontológica de Jesus Cristo. Tendência para não salvaguardar a humanidade de
Cristo.
Escola de Antioquia: Procura salvaguardar a humanidade de Cristo e a transcendência absoluta
do Verbo. Em vez de começarem com o Verbo Eterno, que se faz homem, estes autores
começam com a humanidade de Cristo, que é assumida pelo Verbo. Ponto fraco: incapacidade
para expressar com clareza a unidade ontológica de Cristo.
Nestório: Nega que Maria seja a “Mãe de Deus” (Theotókos). Nestório não aceitavam a ideia de
que Deus nasceu de uma mulher, sofreu e morreu. O problema estava em que Nestório tinha
uma compreensão insuficiente da unidade de Cristo, que afirma a existência de apenas um
sujeito com duas naturezas distintas (humana e divina). A posição de Nestório foi condenada no
Concílio de Éfeso (431).
Fórmula de Calcedónia (451): “[…] ensinamos unanimemente a confessar um só e mesmo
Filho, N.S. Jesus Cristo, o mesmo perfeito em divindade e perfeito em humanidade, o mesmo
verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, composto de uma alma racional e de um
corpo, consubstancial ao Pai segundo a divindade, consubstancial a nós segundo a humanidade,
"semelhante a nós em tudo com exceção do pecado"(Hb4,15); gerado do Pai antes de todos os
séculos segundo a divindade, e nesses últimos dias, para nós e para nossa salvação, nascido da
Virgem Maria, mãe de Deus, segundo a humanidade. Um só e mesmo Cristo, Senhor, Filho
Único que devemos reconhecer em duas naturezas, sem confusão, sem mudanças, sem divisão,
sem separação. A diferença das naturezas não é de modo algum suprimida pela sua união, mas
antes as propriedades de cada um são salvaguardadas e reunidas em uma só pessoa e uma só
hipóstase”. (DS 301-302).  união hipostática

O DEUS REVELADO POR E EM JESUS CRISTO


A Trindade
“O mistério da Trindade é o coração da revelação cristã, cujo ponto de partida é o evento
histórico-salvífico de Jesus Cristo, da sua Encarnação, a Morte na cruz, e a ressurreição”.
(Brambilla, “Trindade” p. 849)
“No acontecimento da Páscoa, na morte e ressurreição do Filho, revela-se o mistério de Deus,
assim como Ele é em si mesmo, e não apenas uma nova informação sobre Deus…. O lugar para
aceder ao rosto trinitário de Deus é o acontecimento da Páscoa de Cristo, como comunicação de
Deus e plenitude da história e do homem”. (p. 849)
A estrutura profunda do evento pascal é Trinitária, e só com formulações trinitárias é possível
reconhecer o mistério de Cristo na sua plenitude: “Jesus está voltado para Deus, que revela

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como Pai, manifestando, ao mesmo tempo, que ele é o Filho; e está voltado para os homens,
comunicando-lhes o seu Espírito…” (Brambilla, “Trindade” p. 849)
Reflexão trinitária na história da Igrejas: necessidade de conciliar a fé na divindade de Cristo
com a afirmação de que existe um só Deus. Foi necessário um esforço de conceptualização para
responder tanto ao monoteísmo judaico como à racionalização helénica. Esforço de precisão
com o intuito de preservar o anúncio Cristão: Deus tornou-se participante da história em Jesus
Cristo e no Espírito. (p. 151)
As heresias relativas à Trindade comprometem a novidade do Deus cristão e têm
fundamentalmente três raízes:
 A afirmação de um monoteísmo rígido e estático, que interpreta o Pai, o Filho e o
Espírito como três “modos” de um Deus que se revela a nós, mas que não se
confrontam nele (modalismo).
 A afirmação de que existem três “deuses”, que são apenas conceptualmente um único
Deus (triteísmo).
 A afirmação de que o Filho e o Espírito são criaturas especiais, subordinadas a Deus
(subordinacionismo)

O SER HUMANO À LUZ DA FÉ CRISTÃ


Para o cristianismo, quem é o homem?
“Tudo quanto existe sobre a terra deve ser ordenado em função do homem, como seu centro e
seu termo: neste ponto existe um acordo quase geral entre crentes e não-crentes. Mas, que é o
homem? Ele próprio já formulou, e continua a formular, acerca de si mesmo, inúmeras opiniões,
diferentes entre si e até contraditórias. Segundo estas, muitas vezes se exalta até se constituir
norma absoluta, outras se abate até ao desespero. Daí as suas dúvidas e angústias. A Igreja sente
profundamente estas dificuldades e, instruída pela revelação de Deus, pode dar-lhes uma
resposta que defina a verdadeira condição do homem, explique as suas fraquezas, ao mesmo
tempo que permita conhecer com exatidão a sua dignidade e vocação.” (GS 12)

1. Criado à imagem e semelhança de Deus


2. O ser humano é criado “homem e mulher”
3. Bondade da criação
4. O pecado original
5. O pecado e as suas consequências
6. Constituição do ser humano
7. Dignidade do entendimento
8. Dignidade da consciência
9. A grandeza da liberdade
10. Índole comunitária da vocação humana
11. O enigma da morte
12. A imortalidade
13. Vocação à união com Deus
14. Cristo esclarece o mistério do homem
15. Os novos céus e a nova terra

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IGREJA: IDENTIDADE, MISSÃO E HISTÓRIA
A identidade da igreja
 Do ponto de vista sociológico, a Igreja é uma instituição com quase dois mil anos
de história, com uma determinada organização, e da qual fazem parte aqueles que
professam a fé cristã.
 É habitual, embora errado, confundir a Igreja com a sua hierarquia, ou seja “o
conjunto de homens e mulheres da Igreja, isto é, o papa, os bispos e os padres, os
religiosos e as religiosas”. (Sesboüé, pp. 503-504)
 Todos os batizados, e não apenas os padres e os bispos, são membros da Igreja!
A instituição da Igreja
 No ponto de partida da Igreja, e na sua fundação, está um duplo acontecimento: (i) a
vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo; (ii) o dom do Pentecostes. (Sesboüé, p.
516)
 A Igreja é o povo nascido da cruz: a entrega de Cristo até ao fim dá início a uma
nova humanidade, uma humanidade reconciliada entre si e com Deus.
 Pelo dom do Espírito Santo, no Pentecostes, os membros da Igreja são
permanentemente conformados a Cristo e unidos entre si num só corpo.
 Cristo é o fundador e o fundamento da Igreja.
Igreja como povo de Deus
 O Concílio Vaticano II, no documento Lumen gentium, definiu a Igreja como povo
de Deus, isto é, o conjunto de todos os crentes e batizados. (Sesboüé, pp. 503-504)
 A Igreja é um povo “ordenado”: comporta uma hierarquia de diferentes ministérios,
ou sejas, formas diferentes de servir a comunidade eclesial, como por exemplo o
episcopado, o sacerdócio ministerial, o diaconado, ou os diversos ministérios
laicais.
 No AT, a noção de povo de Deus está intimamente ligada à noção de Aliança: o
povo de Deus é o povo da Aliança. Igreja = povo que nasce da nova aliança que
Cristo instituiu.

Igreja como sacramento


A Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união
com Deus e da unidade de todo os géneros humanos. (GS n. 1)
A noção de sacramento:
 Sacramento = sinal visível de uma realidade invisível
 Sacramento = sinal eficaz da graça (o sacramento realiza o que significa): “um
sacramento é o sinal simbólico, visível, de uma ação invisível de Cristo, expressa
com eficácia através de um conjunto de ritos, gestos e palavras, em favor de uma
pessoa”. (Sesboüé, pp. 520)
Os sete sacramentos:
Sacramentos da iniciação cristã:

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1. Batismo
2. Confirmação (Crisma)
3. Eucaristia
Sacramentos de cura:
4. Penitência (confissão ou reconciliação)
5. Unção dos doentes
Sacramentos ao serviço da comunhão:
6. Matrimónio
7. Ordem
Igreja como sacramento de Cristo e do Espírito Santo
A Igreja, no seu conjunto, pode ser entendida como um grande sacramento, que se expressa em
realidades sacramentais concretas (os sete sacramentos). A Igreja é o sacramento fundamental
de Cristo e do Espírito Santo. Ou seja, a Igreja torna visível a presença e a ação de Cristo e do
Espírito Santo no mundo.
Igreja como sacramento de Cristo
Da mesma maneira, podemos dizer que Cristo é o sacramento de Deus, no sentido de por meio
dele o mistério de Deus invisível se torna visível e atuante no meio da humanidade.
Igreja como sacramento de comunhão
Tal como afirma a LG, a Igreja é o sacramento, ou sinal, e instrumento, da “íntima comunhão
com Deus e da unidade de todo o género humano”. Ou seja, a Igreja prefigura, no tempo, a
comunhão plena que, no fim dos tempos, há de unir todos os homens entre si e com Deus.
Igreja como Corpo de Cristo:
 Pelo batismo, os cristãos são unidos a Cristo, como os membros ao corpo. “É neste
corpo que a vida de Cristo se difunde” (LG n.7).
 A edificação do corpo de Cristo exige diversidade de membros e funções (como num
corpo humano).
 A cabeça deste corpo é Cristo, e todos os membros se devem conformar com ele e agir
em comunhão com ele.
 É o Espírito Santo quem unifica e move o corpo inteiro.
 Cristo ama a Igreja como esposa, fazendo-se modelo do homem que ama a Igreja como
o próprio corpo.
Marcas da Igreja (ver símbolo niceno-constantinopolitano)
Una: o único fundamento da Igreja é Cristo. Existe um único corpo de Cristo, animado pelo
Espírito. A unidade da Igreja é ferida pelo pecado dos seus membros
Santa: a Igreja é Santa na cabeça, pecadora nos membros. A Igreja é santa porque tem por
fundamento Cristo e recebeu o Espírito de Santidade. Na sua manifestação histórica, a Igreja é
manchada pelos pecados dos seus membros.
Católica: A Igreja é universal, aberta a todos os povos e todas as culturas. A catolicidade
exprime a plenitude de cada Igreja particular e a sua comunhão com todas as outras.
Marcas da Igreja (símbolo niceno-constantinopolitano):

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Apostólica: a apostolicidade exprime a continuidade da Igreja através dos tempos. Uma Igreja é
apostólica no sentido em que está na continuidade da Igreja dos apóstolos. A Igreja ensina a
doutrina dos apóstolos, professa a fé que recebeu deles. A apostolicidade exprime-se na
sucessão apostólica: continuidade do ministério dos apóstolos.

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