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SEMINÁRIO PRESBITERIANO DO SUL

GUILHERME OLIVEIRA DA SILVA

RELATÓRIO DE LEITURA
“AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÔ

Campinas – SP
2021
GUILHERME OLIVEIRA DA SILVA

RELATÓRIO DE LEITURA
“AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÔ

Relatório de leitura realizado como


exigência da matéria de Teologia
Sistemática.

Professor Fernando Arantes.

Campinas – SP
2021
RELATÓRIO DE LEITURA

CALVINO, João. As Institutas. Tradução de Waldyr Carvalho Luz, Edição


Clássica, vol. 3. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006.

A Instituição da Religião Cristã é uma obra do teólogo cristão francês João


Calvino (1509-1564). Nascido em Noyon, na região da Picardia, no Norte da França,
no dia 10 de julho de 1509, Calvino foi um humanista, teólogo, pastor, pregador,
professor, escritor e uma das figuras que mais se destacou no período da Reforma
Protestante.

Até os 24 anos de idade era católico praticante, mas em 1533 converteu-se


à fé evangélica, provavelmente sob a influência do seu primo Robert Olivétan. Por
esse motivo, sob acusação de ser o coautor de um discurso simpático aos
protestantes, teve de fugir de Paris e instalou-se na Suíça, onde em 1536, publicou
sua principal obra teológica, A Instituição da Religião Cristã ou As Institutas, um
conciso e provocativo estudo da doutrina e da piedade cristã, que o colocou na
vanguarda do protestantismo europeu.

Segundo João Calvino, seu objetivo nessa obra, que se tornou a mais
importante de sua vida, era preparar e treinar estudantes de teologia para o estudo
da Palavra de Deus, para que pudessem ter um fácil ingresso no estudo das
Escrituras e fossem capazes de lhe dar continuidade sem obstáculos.

Além disso, a obra também provê uma correção para muitos erros teológicos
propagados pelo catolicismo medieval histórico, por movimentos heréticos, tais
como os anti-trinitarianos, assim como por outros movimentos teológicos
protestantes e reformadores concorrentes, presentes nas doutrinas anabatistas e
luteranas.

Na época de sua última edição, em 1559, a obra tinha oitenta capítulos e


subdividia-se em quatro livros. No terceiro livro, ao abordar assuntos como a obra do
Espírito Santo, fé, regeneração, arrependimento, negação de si mesmo, justificação,
santificação, oração, eleição e ressurreição, Calvino trata da maneira como
recebemos a graça de Cristo, bem como seus benefícios e efeitos que se seguem
após a operação do Espírito Santo na vida do crente.

“Cristo veio pela água e pelo sangue, como o Espírito testemunha a seu
respeito, para que não percamos os benefícios da salvação que ele comprou para
nós.”1

Logo de início, Calvino deixa claro que não existe salvação sem que o
Espírito Santo habite em nós e essa verdade é de grande relevância para que
possamos compreender verdadeiramente de que maneira podemos desfrutar o amor
de Deus e nos tornar possuidores do que Cristo conquistou em sua morte e
ressureição, pois, da mesma forma que a presença do Espírito vivifica o homem que
em função de seus próprios pecados foi destituído da glória de Deus, também é
verdadeiro afirmar que ela também concede uma nova vida que é própria do Reino
dos céus e que, portanto, é perfeita e eterna.

Sendo assim, e tendo em vista que o Espírito Santo é o elo pelo qual o Filho
de Deus estabelece um vínculo conosco, depositar na pessoa e obra de Cristo toda
nossa confiança em total dependência e abraçar com fé a salvação que nos foi
concedida é o caminho para que sejamos um com ele e possamos desfrutar do
amor do Pai que nos levou das trevas para sua maravilhosa luz. Por outro lado,
aqueles que não estão unidos a Cristo pelo Espírito Santo são incapazes, por si só,
de provar o paterno favor divino, e tampouco a beneficência proveniente dessa
união.

Ainda nessa questão, Calvino discorre acerca da fé mediante a qual


abraçamos a Cristo e recebemos da parte dele os benefícios da justificação, da
regeneração e do arrependimento. Segundo ele, no princípio a lei foi dada por Deus
a Adão como um pacto de obras. Antes da queda o homem estava capacitado a
obedecer a lei, afinal Deus o criou a sua imagem e semelhança e em condições
naturais de obedecê-lo. No entanto, Adão pecou e quebrou esse pacto. Por isso,
antes dotado de uma disposição natural de cumprir a lei de Deus, tanto Adão como
toda sua descendência tornaram-se incapaz de obedecê-la e é somente por meio da
fé em Jesus que o homem é libertado dessa miserável condição.

1 João Calvino, As Institutas, trad. Waldyr Carvalho Luz, Edição Clássica, vol. 3 (São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2006), 319.
Todavia, é importante destacar que a verdadeira fé não se refere apenas ao
conhecimento de proposições teológicas, pois uma vez que entendemos que cada
aspecto que faz do ser humano ser realmente quem ele é foi corrompido pelo
pecado, seu intelecto também se encontra depravado e propenso ao erro. Frente a
isso, Calvino defende a ideia de que a fé está mais relacionada com o que Cristo fez
por nós do que com o que podemos fazer a partir desse ato de graça que nos liberta
da punição da lei, do pecado e das potências do mal: a carne, Satanás e o mundo. A
questão é que, antes escravo e incapaz de fazer o bem, o homem passa a ser capaz
de rejeitar o que é pecaminoso e exercitar o bem. E isso só é possível mediante a fé,
que Calvino define como “o firme e seguro conhecimento da divina benevolência
para conosco, fundado sobre a veracidade da promessa graciosa feita em Cristo,
não só é revelado à nossa mente, mas é também selado em nosso coração
mediante o Espírito Santo.”2

Um outro assunto abordado por Calvino, principalmente no capítulo VI, diz


respeito à novidade de vida daquele que foi regenerado pelo Espírito e foi liberto do
pecado, da morte e do juízo. Essa liberdade, no entanto, não dá direito ao justo dele
fazer o que bem quiser. A tese de que “liberdade é agir conforme a consciência” é
inteiramente falsa. Cristo não libertou os eleitos de Deus para serem pessoas sem
limites e princípios, mas para a responsabilidade, para o desenvolvimento do caráter
cristão e para glorificação de Deus por meio de uma obediência filial.

Além disso, a partir do capítulo XXI, Calvino também discorre sobre a


predestinação, doutrina baseada na perspectiva de que Deus em sua misericórdia
ordenou alguns indivíduos para a vida eterna e em sua justiça ordenou outros para a
condenação eterna, o que nos leva à conclusão de que Cristo não morreu por todos
os seres humanos indiscriminadamente, mas somente por aqueles que
gratuitamente foram eleitos.

Em outras palavras, a salvação depende única e exclusivamente da


soberania de Deus e não provém da vontade humana, muito menos é um produto da
Igreja, uma vez que na condição de criaturas, os homens nada podem fazer para

2 João Calvino, As Institutas, trad. Waldyr Carvalho Luz, Edição Clássica, vol. 3 (São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2006), 331.
intervir nessa decisão, a qual é tomada pelo seu criador, mesmo antes deles
nascerem.

No entanto, surge o questionamento, afinal o que levou Deus a escolher uns


poucos e rejeitar outros? Para Calvino, “a curiosidade dos homens acerca da
predestinação a torna bastante obscura e inclusive perigosa, visto que o
entendimento humano não se pode refrear nem deter-se, por mais limites e termos
que se lhes assinale, para não extraviar-se por caminhos proibidos e elevar-se com
empenho, se fosse possível, de não deixar segredo de Deus sem revolver e
esquadrinhar.”3

Em suma, a predestinação em Calvino é absoluta, visto que é uma iniciativa


divina e é somente por conta disso que os eleitos demonstram amor para com Deus
e evidenciam ser novas criaturas, regeneradas pelo sangue de Cristo e capacitadas
por meio do Espírito Santo a obedecer aos mandamentos.

De modo geral, o autor consegue atingir o seu objetivo neste capítulo que é
evidenciar a necessidade e importância da pessoa e obra do Espírito Santo no plano
de redenção de Deus para a humanidade. De maneira clara e sucinta, Calvino leva o
leitor a compreender mais sobre os fundamentos do pensamento cristão ao instigá-
lo, por meio de uma exímia apologética, a conhecer as Escrituras para ganhar
conhecimento e poder refutar pensamentos contrários à verdade de Deus.

Um ponto a ser destacado é a consistência dos argumentos defendidos pelo


autor ao longo dos capítulos, os quais são muito bem escritos, a fim de clarear a
linha de raciocínio proposta desde o primeiro capítulo da obra.

Fica claro que o autor tem domínio dos temas que aborda e conhece bem os
pressupostos que defende, assim como aqueles os quais refuta. De modo geral, sua
mensagem é indispensável a qualquer um que queira aperfeiçoar ou adquirir novos
conhecimentos no que diz respeito ao estudo da doutrina e da teologia cristã. Trata-
se de um grande livro, muito bem escrito e embasado.

3 João Calvino, As Institutas, trad. Waldyr Carvalho Luz, Edição Clássica, vol. 3 (São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2006), 384.

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