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Análise da Variabilidade na Produção do Concreto: Estudo de Caso

Analysis of the Variability of Concrete Production - Case Study

Elton Bauer (1); Eliane Krauss (2); Ramon Saleno Yure Costa Silva (3); Abdala Carim Nabut
Neto (3)

(1) DSc, Professor Adjunto, Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília
(2) DSc, Professora Colaboradora, Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Brasília
(3) Mestrando em Estruturas e Construção Civil - UnB
Universidade de Brasília – Faculdade de Tecnologia – Campus Universitário Darcy Ribeiro – Asa Norte –
Brasília/DF – CEP: 70.910-900 – e-mail (1): elbauerlem@gmail.com

Resumo
O controle tecnológico do concreto engloba principalmente, a influência dos materiais que fazem parte da
sua composição. Algumas verificações devem ser feitas no concreto ainda sob o estado fresco, a fim de
garantir a uniformidade do mesmo neste estado. Também é obrigatório proceder ao controle da resistência
à compressão. O controle da resistência do concreto é realizado por meio de ensaios de corpos-de-prova
moldados à medida que ele é lançado na obra. A partir dos resultados desses ensaios, estima-se o valor da
resistência característica à compressão (fck) do concreto. O controle desse valor característico, bem como
os critérios de aceitação dos lotes de concreto, estão regulamentados pela NBR 12655/2006. Para a
qualidade do concreto é fundamental ter parâmetros que realmente indiquem a variabilidade de sua
produção. Nesse sentido, o desvio-padrão e o coeficiente de variação são ferramentas fundamentais na
quantificação do nível de variabilidade do processo. Os resultados mostraram que, apesar dos lotes
apresentarem uma pequena variabilidade, foram observados vários valores de fck estimado abaixo do
especificado.
Palavra-Chave: Resistência Característica, Variabilidade, Desvio Padrão.

Abstract
The technological control of concrete mainly includes the influence of the materials that make part of your
composition. Some tests must be made in the concrete still in fresh state in order to ensure uniformity of the
same during this step. It is also mandatory to proceed with the compressive strength control. The strength
control of the concrete is carried out by molding samples of concrete as it is launched in the construction site.
From the results of these tests, the values of the characteristic compression resistance (fck) of the concrete
are estimated. The control of this characteristic value, as well as the criteria for acceptance of specific lots is
regulated by NBR 12655: 2006. For good quality concrete it is necessary to have key parameters that
indicate the variability of its production. In this sense, the standard deviation and the variation coefficient are
important tools to determine the level of variability in the process. The results showed that, despite most lots
provide a small variability; some have estimated fck values below the resistance specified.
Key Words: Characteristic resistance (fck), Variability, Standard Deviation

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1 Introdução
O concreto é um material de extrema complexidade de materiais, pois envolve a utilização
de materiais variados como areia, cimento, brita, aditivos (ex. sílica ativa, tensoativos,
incorporadores de ar entre outros) que podem fazer parte de sua composição
dependendo da sua finalidade. Um dos conceitos que são importantes na produção do
concreto é a busca do alto grau de empacotamento das partículas à fim de proporcionar
uma maior resistência e menor porosidade no produto final. Uma vez otimizadas as
questões de proporcionamento dos materiais, se faz necessário que se tenha um controle
rigoroso na produção do mesmo.
A qualidade de produtos e serviços é um tema de freqüente discussão no meio técnico,
pois está intimamente ligado com a satisfação do cliente final. Isto torna a certificação, o
controle tecnológico de produção e operações de ensaio do concreto de essencial
importância para garantir que o produtor do concreto consiga produzir seu produto sem
utilizar materiais em excesso e não repassar esta despesa adicional para o cliente.
A preocupação com a qualidade do concreto que está sendo produzido reflete na
insegurança dos projetistas de estruturas de concreto fazendo com que os mesmos
utilizem valores de resistência característica do concreto mais elevado do que os que
realmente poderiam ser utilizados. Portanto, se houvesse a certeza e garantia de um
eficiente controle de produção do concreto, o cliente final poderia economizar também no
projeto estrutural sendo que quanto menor a resistência característica do concreto, menor
o valor cobrado pelas concreteiras.
No controle da resistência característica à compressão do concreto (fck), devemos
considerar os lotes que apresentem um fck estimado maior ou igual ao fck de projeto. É
importante lembrar também que a NBR 5738/2003 e NBR 5739/1994 também
regulamentam os procedimentos de moldagem e cura dos corpos de prova assim como
os ensaios de ruptura.
Os valores de resistência obtidos nos ensaios estão sujeitos à variabilidades no processo
de produção tais como: variabilidades dos materiais (cimento, quantidade de água,
agregados); variabilidades da mão de obra (tempo e procedimento de mistura); falta de
aferição de balanças e deficiência dos equipamentos de mistura; problemas nos ensaios
(coleta imprecisa, adensamento e cura inadequados, problemas de capeamento dos
corpos de prova, velocidade de carregamento e calibração da prensa).
Assim é necessário utilizar parâmetros como desvio padrão para uma correta aferição
destes resultados.
O aquecimento da economia está provocando uma queda na disponibilidade de insumos
tornando-os cada vez mais escassos. Essa escassez provoca um aumento na
variabilidade dos materiais devido a grande amplitude de fornecedores. Neste cenário de
grande variabilidade, espera-se que haja um maior comprometimento das concreteiras
para intensificação do controle de produção de seus concretos.
O presente trabalho visa então, avaliar as variabilidades existentes na produção do
concreto, e a aceitação deste, através da análise de resultados de resistência à
compressão, aos 28 dias de idade, de duas obras situadas em Brasília-DF, onde são
apresentadas as análises estatísticas dos lotes de concreto, incluindo desvio-padrão,
coeficiente de variação e controle do concreto por amostragem total.

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2 Metodologia
Na elaboração deste trabalho, foram realizadas as seguintes atividades para as duas
obras A e B:
• Coleta e análise dos resultados de resistência à compressão;
• Separação em lotes de acordo com a amostragem total da NBR 12655/2006;
• Elaboração de planilhas separadas para cálculo do desvio padrão e coeficiente de
variação da produção;
• Elaboração de cartas individuais e cálculo dos estimadores de acordo com a NBR
12655/2006;

2.1 Coleta de dados


Os dados analisados no presente trabalho foram obtidos junto ao Laboratório de Ensaios
de Materiais – LEM, da Universidade de Brasília – UnB, responsável pelas atividades de
pesquisa de qualidade e controle tecnológico do concreto utilizado pelas obras em
questão.

2.2 Separação dos lotes


A formação dos lotes obedeceu aos limites da norma NBR 12655/2006. Primeiramente os
lotes foram separados por tempo máximo de uma semana, ou seja, os valores das
resistências (fcj) foram separados para concretagens realizadas na mesma semana. Para
efeito de resumo de apresentação de dados, escolheu-se 10 lotes de lajes de cada uma
das obras A e B.
Portanto para o presente estudo enfocou-se uma amostra de valores. As obras A e B
possuem 10 lotes cada uma relativos a concretagem de lajes, obedecendo uma
sequência cronológica de concretagem conforme mostram as Tabelas 1 e 2.

Tabela 1 - Lotes referentes à obra A


Peça Número de Idade
Lote fck (Mpa)
Concretada Exemplares (dias)

10 35
L1 Laje 28
L2 Laje 10 28 35
L3 Laje 15 28 35
L4 Laje 5 28 35
L5 Laje 4 28 35
L6 Laje 15 28 35
L7 Laje 10 28 35
L8 Laje 9 28 35
L9 Laje 10 28 35
L10 Laje 10 28 35

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Tabela 2 - Lotes referentes à obra B
Peça Número de
Lote Idade (dias) fck (Mpa)
Concretada Exemplares

L1 Laje 36 28 35
L2 Laje 36 28 35
L3 Laje 40 28 35
L4 Laje 38 28 35
L5 Laje 30 28 35
L6 Laje 40 28 35
L7 Laje 38 28 35
L8 Laje 18 28 35
L9 Laje 20 28 35
L10 Laje 20 28 35

A Tabela 3 exemplifica o Lote L8 da obra B demonstrando como foram organizados e


calculados os dados para os demais lotes das obras A e B permitindo traçar a carta de
valores individuais de resistência à compressão para ambas as obras estudadas.

Tabela 3 - Lote L8 referente à obra B


Resistência aos 28 dias
fck(Mpa)
(Mpa)
30,65 35
32,30 35
35,28 35
35,61 35
36,27 35
36,93 35
36,93 35
36,93 35
Lote L8-Lajes
(Obra B) 36,93 35
38,26 35
38,59 35
38,87 35
39,42 35
39,97 35
41,90 35
41,90 35
42,18 35
43,56 35
MÉDIA 37,9

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2.3 Análises realizadas
A partir dos valores individuais de resistência à compressão aos 28 dias, foram calculados
a média, o desvio padrão e coeficiente de variação do processo de produção de cada lote.
Em seguida foram elaboradas as cartas de valores individuais e de desvio padrão do
processo de produção.
Na realização do controle de aceitação dos lotes, foram utilizados os estimadores da NBR
12655 somente para o critério de amostragem total, ou seja, o estimador adotado foi o
menor valor de cada lote de resistência em ordem crescente chamado de f1.

3 Resultados
OBRA A:
A figura 1 apresenta a carta de valores individuais, traçada com os valores individuais de
resistência, juntamente com o fck de projeto e com a média de cada lote. A partir dessa
carta podemos visualizar a variação da resistência ao longo de toda a obra.
Como já era esperado, todas as médias de resistências medidas encontraram-se acima
do fck de projeto (35MPa).
Dois lotes apresentaram problemas. No lote 8 a maioria dos valores de resistência
apresentaram valores aceitáveis, porém em dois pontos houve uma queda significante no
valor da resistência.
Já o lote L9 apresentou um valor de resistência (21 MPa) bem abaixo do fck de projeto
(35 MPa). Esses dois fatos podem ter ocorrido devido a um problema na produção do
concreto do caminhão betoneira (exemplos: excesso de água adicionada ao concreto
dentro do caminhão; excesso de umidade na areia utilizada, problemas com dosagem de
aditivo, entre outros).

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60,00

55,00

50,00

45,00
Resistência 28 dias
fc (Mpa)

40,00
fck

35,00
Resistência média

30,00

25,00

20,00

Figura 1 – Carta de valores individuais de resistência à compressão

A carta de valores de desvio padrão apresentada na figura 2 foi traçada com os valores
de desvio-padrão dos lotes e com os limites inferior e superior, conhecidos como barreiras
de advertência. Estes limites fornecem uma visualização rápida de possíveis alterações
do desvio-padrão de dosagem Sd, utilizado na escolha do traço (Helene; Terzian, 1992).
Nesta carta, observou-se que os lotes 2 e 9 apresentaram desvios maiores que o limite
superior, isso quer dizer que ocorreu uma dispersão nos valores individuais de resistência
para estes lotes. Já os lotes 1,3,4 e 6 apresentaram um desvio menor que o limite inferior,
demonstrando a uniformidade dos valores individuais de resistência destes lotes.

Figura 2 - Carta de valores de desvio- padrão do processo de produção


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A tabela 4 apresenta os valores de desvio padrão e coeficiente de variação da produção e
o estimador de amostragem total da NBR 12655.
Podemos observar que os parâmetros de produção apresentaram valores indesejáveis
em alguns lotes, constatando uma deficiência no controle de produção por parte da
concreteira.
De acordo com o estimador de amostragem total, apenas o lote 9 foi rejeitado, já que o
estimador ficou muito abaixo do fck de projeto.
Tabela 4 - Parâmetros estatísticos e valor do estimador de amostragem total
Produção Estimador
Lote fck (Mpa)
Desvio Padrão Coeficiente de Variação (NBR 12655)
L1 35 2,97 6,24 42,3
L2 35 4,18 9,02 39,5
L3 35 3,02 6,82 37,4
L4 35 1,90 4,07 45,4
L5 35 2,99 5,73 47,8
L6 35 2,76 5,93 42,0
L7 35 3,97 8,83 37,6
L8 35 3,41 7,91 38,0
L9 35 7,23 17,90 20,6
L10 35 3,19 7,56 38,3

OBRA B:
Na carta de valores individuais de resistência apresentada na figura 3, observa-se que
todas as médias de resistências medidas encontraram-se acima do fck de projeto (35
MPa).
Vale destacar que diversos valores individuais de resistências ficaram abaixo do fck de
projeto mostrando novamente possíveis falhas na produção do concreto.

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60,00

55,00

50,00

45,00
Resistência 28 dias
fc (Mpa)

40,00
fck

35,00
Resistência média

30,00

25,00

20,00

Figura 3 – Carta de valores individuais de resistência à compressão

A carta de valores de desvio padrão ilustrada na figura 4 apresenta valores de desvio


padrão acima do limite superior nos lotes 1,8 e 9 caracterizando uma dispersão nos
resultados dos valores individuais de resistência destes lotes.
Vale ressaltar que a obra B possui mais exemplares em cada lote do que a obra A.

5,00

4,00
Desvio Padrão

desvio padrão
3,00
Média Desvio
Limite Superior
Limite Inferior
2,00

1,00
LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE LOTE
L1 L2 L3 L4 L5 L6 L7 L8 L9 L10

Figura 4 - Carta de valores de desvio- padrão do processo de produção

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Podemos observar na tabela 5 que a obra B apresentou um comportamento parecido com
o da obra A no que diz respeito aos parâmetros de produção.
De acordo com o estimador de amostragem total, os lotes 1,2,7 e 8 foram rejeitados, já
que seus estimadores ficaram abaixo do fck de projeto.

Tabela 5 – Parâmetros estatísticos e valor do estimador de amostragem total


Produção Estimador
Lote fck (Mpa)
Desvio Padrão Coeficiente de Variação (NBR 12655)
L1 35 3,82 9,21 32,5
L2 35 2,66 6,61 32,6
L3 35 2,59 6,45 35,0
L4 35 2,98 7,52 35,0
L5 35 2,37 5,88 36,6
L6 35 2,17 5,35 36,6
L7 35 2,77 6,46 34,9
L8 35 3,37 8,88 30,7
L9 35 3,37 8,22 35,0
L10 35 1,98 4,84 36,6

4 Conclusões
• Os valores dos coeficientes de variação da maioria dos lotes da obra B foram
maiores do que os da obra A;
• Os lotes rejeitados em ambas as obras são indício, dentre outros fatores, da
heterogeneidade de produção do concreto. É interessante observar a existência
freqüente de valores individuais muito dispersos em um mesmo lote, o que mostra
deficiências de produção do concreto.
• As ferramentas de controle de qualidade do concreto são muito importantes, pois
elas permitem avaliar a evolução do concreto ao longo do tempo;
• Os resultados de desvio padrão estão relacionados com a variação no processo de
produção, conforme foi mostrado nas cartas de valores individuais de resistência,
onde para uma mesma concretagem, observou-se valores de resistência bem
diferentes um do outro;
• Os resultados apresentados neste trabalho são de extrema valia para a central de
concreto para uma análise nos processos produtivos e financeiros que estão
ocorrendo, e para os engenheiros da obra em questão, para poder analisar e julgar
se diferentes betonadas de concreto estão interferindo na confecção de uma peça
estrutural, ou seja, se diferentes betonadas em uma concretagem geram valores de
amostras com resistências de diferenças significativas, isso poderá gerar
diferenças na rigidez e deformações diferenciais na estrutura podendo a mesma
passar a se comportar como dois materiais diferentes devido às propriedades
serem totalmente distintas.
• Assim sendo, fica claro a necessidade de cobrar uma maior homogeneidade nos
concretos produzidos pelas centrais.

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Agradecimentos
Ao Laboratório de Ensaio de Materiais – LEM, ao Centro de Apoio ao Desenvolvimento
Tecnológico – CDT, da UNB; Ao CNPq e CAPES pela concessão de bolsa de estudos. Ao
Programa de Pós-Graduação em estruturas e Construção Civil da UnB por disponibilizar
oportunidade para discussão do tema em suas linhas de pesquisa.

5 Referências

Associação Brasileira de Normas Técnicas. (1994). Concreto – Ensaio de Compressão


de Corpos-de-Prova Cilíndricos. NBR – 5739. Rio de Janeiro: ABNT, 4p.

_____________ (2003). Concreto – Procedimento para Moldagem e Cura de Corpos-


de-Prova. NBR – 5738. Rio de Janeiro: ABNT, 6p.

_____________ (2006). Concreto de Cimento Portland – Preparo, controle e


recebimento – Procedimento. NBR – 12655. Rio de Janeiro: ABNT, 18p.

Helene, P. Terzian, P. (1992). Manual de Dosagem e Controle do Concreto. São Paulo:


PINI, 349 p.

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