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Educação Inclusiva

Denise Rodovalho Scussel

Judith Mara de Sousa Almeida

Maria Célia Borges

Mônica Corrêa Avelar

Neire Márcia da Cunha

Selma Aparecida Ferreira da Costa

Vivian Zerbinatti da Fonseca Kikuich


© 2019 by Universidade de Uberaba

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Pró-Reitor de Educação a Distância


Fernando César Marra e Silva

Coordenação de Graduação a Distância


Sílvia Denise dos Santos Bisinotto

Editoração e Arte
Produção de Materiais Didáticos-Uniube

Revisão textual
Érika Fabiana Mendes Salvador

Diagramação
Andrezza de Cássia Santos

Projeto da capa
Agência Experimental Portfólio

Edição
Universidade de Uberaba
Av. Nenê Sabino, 1801 – Bairro Universitário

Catalogação elaborada pelo Setor de Referência da Biblioteca Central Uniube

E83 Educação inclusiva / Maria Célia Borges ... [et al.]. – Uberaba:
Universidade de Uberaba, 2018.
284 p. : il.

Programa de Educação a Distância – Universidade de Uberaba.


Inclui bibliografia
ISBN

1. Educação inclusiva. 2. Educação especial. I. Borges, Maria


Célia. II. Universidade de Uberaba. Programa de Educação a
Distância. III. Título.
CDD 371.9046
Sobre as autoras
Denise Rodovalho Scussel

Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia.


Possui mestrado em Educação: Formação de Educadores pela Universidade
de Uberaba (2003), graduação em Pedagogia Especial pela Universidade
de Uberaba (2000) e graduação em Pedagogia pela Universidade de
Uberaba (1987). Supervisora pedagógica do Departamento de Educação
Inclusiva da Secretaria Municipal de Educação da cidade de Uberaba.
Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação
Pré-Escolar, atuando principalmente nos seguintes temas: pedagogia
especial, educação inclusiva, trabalho interdisciplinar, educação infantil
e formação continuada de professores.

Judith Mara de Souza Almeida

Doutora em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Uberlândia.


Mestre em Linguística pela Universidade Federal de Uberlândia (2008).
Graduada em Letras e Pedagogia; especialização em Língua Portuguesa
e Literatura; especialização em Informática para deficientes visuais e
especialização em educação de surdos. Professora de Atendimento
Educacional Especializado no Instituto Federal Catarinense -campus
de Araquari. Atuou com alunos com baixa visão, realizando Avaliação
Funcional da Visão e Estimulação Visual, no Núcleo de Tecnologias
Avançadas do CAP - Centro de Apoio Pedagógico para Atendimento às
pessoas com deficiência visual e, também, como professora formadora
na Secretaria Municipal de Educação de Uberaba, Casa do Educador.
Apresenta experiência em Atendimento Educacional Especializado na
Sala de recursos multifuncionais da rede pública de ensino e também
como professora de Português como segunda língua para alunos
surdos. Tem experiência na área de Ensino e aprendizagem de Línguas
e Educação Especial, atuando principalmente com os seguintes temas:
ensino e aprendizagem de língua materna, educação a distância,
alfabetização e letramento, leitura na perspectiva sociointeracionista,
educação especial na perspectiva da educação inclusiva, educação de
pessoas com baixa visão, cegueira e surdez, formação de professores
para a educação inclusiva e para o atendimento educacional especializado.

Maria Célia Borges

Pós-doutorado em Educação pela FEUSP, no programa do Dpto.


Filosofia da Educação e Ciências da Educação. Atualmente é Professora
ASSOCIADA na Universidade Federal de Uberlândia, FACED, em
Uberlândia-MG. Mestrado em Educação pela UFU. Doutorado pela
PUCSP no Programa de Educação/Currículo. Graduação em Pedagogia
na Faculdades Integradas de Uberaba. Especialização (lato sensu)
em Metodologia do Ensino Superior, Psicopedagogia e Fundamentos
da Educação. Tem experiência na área de Educação, com ênfase
em Formação de professores, Didática e Metodologia do Trabalho
Científico. Pesquisa e publica sobre os seguintes temas: Formação de
Professores, Políticas Educacionais, Gestão Democrática; Educação
Superior; Qualidade de Ensino e Inclusão Educacional e Social. Leciona
nos cursos de graduação, pós-graduação e extensão. Coordenadora
Institucional do PIBID/UFTM de 2009 a 2013. Participa em congressos
com apresentação de trabalhos em várias regiões do País. Desenvolve
pesquisa com projetos aprovados e financiados pela FAPEMIG e CNPQ.
Docente permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação
(Mestrado em Educação) na Universidade Federal do Triângulo Mineiro
(UFTM), Linha Formação de professores e cultura digital. Docente
Permanente no Programa de Pós-graduação Mestrado em Educação
da Universidade de Uberlândia (UFU) linha Estado, Políticas e Gestão
em Educação. Integrante do GPEFORM / Grupo de Pesquisas e Estudos
sobre Formação de Professores e GEPPOPE / Grupo de Estudos e
Pesquisas em Política, Formação Docente e Práticas Educativas.
Mônica Corrêa Avelar Puertas Zafra

Especialização em Psicopedagogia pela Universidade de Uberlândia, no


ano de 2002 ; especialização em Metodologia do Ensino Superior , pela
Faculdade do Noroeste de Minas em 2004 e especialização em Supervisão
Pedagógica pela Faculdade do Noroeste de Minas, em 2008.Graduada
em Pedagogia pela Universidade de Uberaba, UNIUBE, em 2000, com
habilatação em Educação Especial.

Selma Aparecida Feereira Costa

Doutoranda em Educação pela UNESP- Universidade Estadual Paulista Júlio


de Mesquita Filho; Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação
em Educação da UNIUBE - Universidade de Uberaba. Graduada em
Letras Português/Espanhol pela instituição FAZU- Faculdades Associadas
de Uberaba. Graduada em Pedagogia, com habilitação em Orientação,
Supervisão e Gestão escolar, pela UNIUBE. Atua como docente formadora
no Departamento de Formação de Professores da Secretaria Municipal de
Educação de Uberaba (SEMED). Atualmente realiza estudos e pesquisas
sobre os temas: educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental,
linguagens, ensino e aprendizagem, alfabetização, literatura infantil, leitura
e escrita, desenvolvimento da criança.

Vívian Zerbinatti Fonseca Kikuchi

Mestre em Educação pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro.


Possui Certificação de Proficiência para o Ensino da Língua Brasileira de
Sinais - PROLIBRAS, nível superior. Graduada em Pedagogia; habilitação
em Educação Especial e Pedagogia; habilitação em Magistério das
Séries Iniciais do Ensino Fundamental pela Universidade de Uberaba
(UNIUBE) e Graduada em Letras - Português/Inglês pela Universidade
Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Pós-graduada em Especialização
em Psicopedagogia pela Faculdade da Região dos Lagos (FERLAGOS),
Língua Brasileira de Sinais pela Faculdades Integradas de Jacarepaguá
- FIJ e Atendimento Educacional Especializado pela UNESP, Campus
Marília. Atua como professora da Rede Municipal desde 2001 e dedica-se
à educação de surdos desde 2004. Atualmente, é professora nos cursos
de Especialização em Psicopedagogia e Educação Especial/Educação
Inclusiva na Universidade de Uberaba e Intérprete de Língua de Sinais
na Escola Municipal Urbana Frei Eugênio.
Sumário
Apresentação.......................................................................................IX

Capítulo 1 A diversidade, a inclusão e as políticas educacionais......... 1


1.1 Iniciando a nossa conversa..................................................................................... 2
1.2 Princípios que orientam a prática da educação especial: normalização,
integração e inclusão............................................................................................... 7
1.2.1 O princípio da normalização........................................................................... 9
1.2.2 O princípio da integração............................................................................. 12
1.2.3 O princípio da inclusão................................................................................. 27
1.3 A inclusão e a qualidade de ensino na escola pública.......................................... 40
1.4 Inclusão: utopia ou perspectiva?........................................................................... 50
1.5 Conclusão.............................................................................................................. 57

Capítulo 2 Necessidades educacionais especiais: O que são?


Por quê? Como trabalhar?.............................................. 101
2.1 Compreendendo a história das necessidades educacionais especiais............. 103
2.1.1 Fase da fundação (1800-1930) ................................................................. 103
2.1.2 Fase de transição (1930-1936) ................................................................. 104
2.1.3 Fase de integração (1963-1980) ............................................................... 105
2.1.4 Fase contemporânea (1980-atualidade) ................................................... 106
2.2 Conceituação e descrição de dificuldade de aprendizagem, distúrbio e deficiência .....108
2.2.1 Conceituação ............................................................................................. 108
2.2.2 Descrição.....................................................................................................111
2.3 Causas................................................................................................................. 123
2.3.1 Lesão cerebral............................................................................................ 126
2.3.2 Alterações no desenvolvimento cerebral .................................................. 126
2.3.3 Desequilíbrios neuroquímicos.................................................................... 127
2.3.4 Hereditariedade ......................................................................................... 128
2.3.5 Influências ambientais ............................................................................... 128
2.4 Propostas pedagógicas ...................................................................................... 131
2.4.1 Primeiro passo ........................................................................................... 132
2.4.2 Conhecendo as necessidades fundamentais da criança na Educação
Infantil......................................................................................................... 135
2.4.3 A importância do estudo das funções cognitivas segundo Feuerstein
para a prática pedagógica ......................................................................... 139
2.4.4 O trabalho pedagógico com os distúrbios e com a deficiência intelectual..... 142
2.5 Conclusão............................................................................................................ 150
Capítulo 3 Interesses e necessidades de crianças superdotadas e
talentosas......................................................................... 155
3.1 Uma breve visão histórica da superdotação ...................................................... 158
3.2 Desmitificando conceitos..................................................................................... 160
3.2.1 Aspectos de notável desempenho e elevada potencialidade de crianças
superdotadas e talentosas ......................................................................... 163
3.2.2 Perfis individuais em relação à superdotação/talento ............................... 164
3.3 Identificando os mais capazes ........................................................................... 169
3.3.1 Testes de inteligência (Q.I.)........................................................................ 169
3.3.2 Técnica da autoidentificação ..................................................................... 171
3.3.3 Observação com base em checklist........................................................... 171
3.4 Aspectos emocionais e comportamentais das altas habilidades/superdotação...... 180
3.5 Aspectos pedagógicos das altas habilidades/superdotação e talentos ............. 183
3.5.1 Formas de atender os alunos superdotados/talentosos no contexto
educacional ................................................................................................ 184
3.5.2 Estratégias pedagógicas para a modificação do conteúdo curricular ...... 185
3.5.3 O atendimento oferecido pelas salas de Atendimento Educacional
Especializado (AEE) – salas de recurso.................................................... 191
3.6 A superdotação, os distúrbios e as dificuldades de aprendizagem ........................ 192
3.7 Como trabalhar com os alunos superdotados em sala de aula? Qual é o
papel da escola?.................................................................................................. 197
3.8 Conclusão............................................................................................................ 202

Capítulo 4 Da teoria da mediação à prática da intervenção


pedagógica....................................................................... 207
4.1 A mediação pedagógica e a aprendizagem........................................................ 208
4.2 Os processos de aprendizagem.......................................................................... 210
4.3 A função da intervenção pedagógica.................................................................. 212
4.4 Modificabilidade cognitiva estrutural.................................................................... 214
4.5 Intencionalidade da ação .................................................................................... 216
4.6 Mediação.............................................................................................................. 217
4.7 Prática pedagógica.............................................................................................. 219
4.8 Os dez mandamentos da aprendizagem............................................................ 221
4.9 Teoria e prática pedagógica................................................................................. 225
4.10 Promovendo o desenvolvimento de forma integral........................................... 231
4.10.1 Pressupostos teóricos de Wallon............................................................. 231
4.10.2 O movimento e o pensamento ................................................................ 233
4.10.3 Emoção e afetividade.............................................................................. 234
4.11 Postulado........................................................................................................... 236
4.12 Conclusão.......................................................................................................... 237
Capítulo 5 Necessidades educacionais especiais e as práticas
pedagógicas para a educação inclusiva das pessoas
com deficiências físicas e mentais.................................. 241
5.1 Marcos históricos e normativos da educação brasileira: caminhando para
uma proposta educacional inclusiva.................................................................... 243
5.2 Novo contexto educacional: um grande desafio para as escolas....................... 247
5.3 Definição, caracterização e proposta de trabalho pedagógico referente às
deficiências físicas e mentais.............................................................................. 249
5.3.1 Deficiência física........................................................................................ 249
5.3.2 Deficiência mental...................................................................................... 252
5.4 Proposta de trabalho pedagógico........................................................................ 255
5.5 Atendimento educacional especializado para pessoas com deficiência física....... 257
5.6 Atendimento educacional especializado para pessoas com deficiência mental.... 262
5.7 Conclusão............................................................................................................ 265

Capítulo 6 Necessidades educacionais especiais e as práticas


pedagógicas para a educação inclusiva das pessoas
com deficiência sensorial................................................. 271
6.1 Os sistemas sensoriais........................................................................................ 273
6.1.1 A estimulação sensorial na perspectiva inclusiva...................................... 274
6.2 Práticas pedagógicas: necessidades educacionais especiais – deficiências
sensoriais – educação inclusiva.......................................................................... 278
6.2.1 Crianças cegas e com baixa visão.....................................................................278
6.2.2 A prática pedagógica com o aluno que apresenta deficiência visual –
cegueira ..................................................................................................... 281
6.2.3 A prática pedagógica com alunos que apresentam deficiência visual –
baixa visão.................................................................................................. 285
6.2.4 A prática pedagógica com alunos que apresentam deficiência visual e
surdez – surdocegueira.............................................................................. 287
6.2.5 A prática pedagógica com alunos que apresentam surdez....................... 295
6.2.6 A prática pedagógica com o aluno que apresenta deficiências múltiplas.. 298
6.3 Educação inclusiva.............................................................................................. 299
6.4 Conclusão ........................................................................................................... 300
Apresentação
Nas últimas décadas, o nosso país tem passado por mudanças
significativas, principalmente, no que se refere à organização educacional.
Neste sentido, a universalização do ensino, a equidade de condições e a
educação de qualidade para todos têm sido um desafio constante para
toda sociedade, principalmente, para docentes e equipes pedagógicas
das instituições de ensino, requerendo, desses profissionais, a formação
pedagógica em consonância com o reconhecimento e respeito à
diversidade humana.

Neste livro discutiremos temas atuais e que muitas vezes também são
polêmicos porque inquietam os profissionais da educação que assumem
o compromisso da consolidação da educação de qualidade para todos. É
por isso que convidamos você, prezado estudante, para fazer parte deste
desafio: refletir, discutir, analisar e efetivar, na prática, a perspectiva da
educação inclusiva. Para tanto, discutiremos sobre o processo histórico
percorrido pela sociedade para compreender o caminho da inclusão e
ainda ressaltaremos a construção das políticas públicas desse segmento.
Abordaremos assuntos referentes ao ato de ensinar, de aprender e,
sobretudo, de conviver com a diversidade humana. Caracterizaremos
os alunos com necessidades educacionais especiais e alguns dos
elementos essenciais para atendê-los dentro do contexto educacional,
entre outros temas relacionados.

Iniciaremos nossas reflexões com a temática A diversidade, a inclusão e


as políticas educacionais. Nesse capítulo propomos algumas reflexões
acerca da política de educação inclusiva como um ideário a ser construído
para a conquista de mais qualidade na educação de todos. É necessária
a compreensão de conceitos, de discursos das políticas educacionais
XII UNIUBE

e das contradições que se apresentam na sua concretização. Faz-se


necessário que você perceba a relação entre a inclusão educacional e
social e o que implica a garantia de uma escola qualidade para todos.

Por isso, no capítulo Necessidades Educacionais Especiais: O que são? Por


quê? Como trabalhar?, abordamos o caminho histórico das dificuldades de
aprendizagem. Refletimos sobre as terminologias utilizadas para a descrição
de casos de dificuldade aprendizagem, distúrbios e deficiências, bem como
a diferenciação entre eles. Analisamos algumas práticas docentes, refletindo
sobre aquelas que não podem mais ser consideradas adequadas aos casos
estudados.

No capítulo, Interesses e necessidades de crianças superdotadas e


talentosas, a autora mostra os fatores inerentes ao reconhecimento,
à identificação, à compreensão, à orientação e, sobretudo, à atuação
pedagógica que tem como meta a estimulação das potencialidades, dos
talentos destes alunos. Tendo como foco, também, a formação docente
comprometida com a educação inclusiva.

No capítulo Da teoria da mediação à pratica da intervenção pedagógica,


as autoras promovem uma reflexão sobre a mediação e a intervenção
pedagógica como forma de potencializar o processo de ensino-aprendizagem
das crianças. Tendo como foco a mediação e a intervenção docente de
modo a privilegiar as potencialidades dos educandos.

O capítulo Necessidades Educacionais Especiais e as Práticas Pedagógicas


para a Educação Inclusiva das pessoas com deficiências físicas e mentais
convida você para refletir sobre as pessoas com deficiência, não com o
olhar da limitação ou incapacidade, que muitas vezes estamos habituados
a enxergar, mas por meio do olhar da possibilidade, da potencialidade.
Auxilia-o a compreender os conceitos de deficiência física e deficiência
intelectual, além de proporcionar a análise de algumas das práticas
pedagógicas existentes nesse campo de atuação.
UNIUBE XIII

Por fim, no capítulo Necessidades educacionais especiais e as práticas


pedagógicas para a educação inclusiva das pessoas com deficiência
sensorial, refletimos sobre a relação da prática pedagógica e as deficiências
sensoriais, como forma de favorecer sua formação no enfrentamento de
efetivar, na prática, a educação inclusiva. Neste capítulo, a ênfase será
dada nas reflexões sobre a relação existente entre práticas pedagógicas,
educação inclusiva e deficiências sensoriais e na utilização dos sentidos
para conhecimento e relacionamento com o mundo.

Ao tratar desses assuntos, esperamos oportunizar a compreensão da


importância da docência na concretização de uma educação inclusiva,
colaborando para o respeito e o reconhecimento da diversidade humana. E,
esperamos que você, ao final desses estudos, compreenda os princípios
da Educação Inclusiva e se utilize deles como forma de subsidiar e
sustentar a práxis pedagógica fundamentada no desenvolvimento integral
das potencialidades dos educandos.

Bons estudos!!!!

Neire Márcia da Cunha


Capítulo
A diversidade, a
inclusão e as políticas
1
educacionais

Maria Célia Borges

Introdução
Iniciaremos este componente curricular estudando a diversidade
humana e suas diferentes manifestações na Educação. Também
abordaremos o processo histórico percorrido pela sociedade para
compreender o caminho da inclusão e ainda ressaltaremos a
construção das políticas públicas desse segmento. Em seus estudos
anteriores é possível que você tenha percebido que o conceito ou
a concepção de aprendizagem é diversificada de acordo com o
pensamento, cultura e o tempo social em que a sociedade está
inserida. Para tanto, durante todo este capítulo, conversaremos
aprofundando o tema por acreditar que docentes e pedagogos
fazem parte dessa mudança de paradigma em relação à inclusão.

Objetivos
Com este capítulo, esperamos que você possa:
• compreender a diversidade humana como uma riqueza no
cotidiano das escolas e não como diferenças que rotulam e
estigmatizam os educandos;
• distinguir a diferença entre os conceitos de normalização,
integração e inclusão escolar;
• analisar criticamente os conceitos ou discursos das políticas
educacionais e as contradições que se apresentam na sua
concretização;
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• relacionar o conceito de inclusão educacional e social com a


garantia de uma escola de boa qualidade, para todos;
• formular conceitos educacionais que valorizem a potencialidade
dos alunos sem acentuar suas diferenças;
• reconhecer a política de educação inclusiva como um ideário
a ser construído para a conquista de mais qualidade na
educação de todos.

Esquema
1.1 Iniciando a nossa conversa
1.2 Princípios que orientam a prática da educação especial:
normalização, integração e inclusão
1.2.1 O princípio da normalização
1.2.2 O princípio da integração
1.2.3 O princípio da inclusão
1.3 A inclusão e a qualidade de ensino na escola pública
1.4 Inclusão: utopia ou perspectiva?
1.5 Conclusão

1.1 Iniciando a nossa conversa

Na concepção da escola tradicional o ensino era ministrado de forma


mecânica, centrado no professo, e o aluno era considerado um indivíduo
passivo.

Além disso, a escola não era democrática, e, sim, privilégio de alguns.


Nesse modelo, os educadores não tinham acesso às teorias educacionais
e psicopedagógicas e, na prática pedagógica, o ensino era o mesmo
para todos. A concepção era de que todos aprendiam no mesmo
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tempo e no mesmo espaço, com uma metodologia única. Como


consequência, a escola tornou-se seletiva e excludente. Com o avanço
do processo de industrialização, a criação de leis e a reivindicação da
população para a conquista da “escola para todos”, a escola, aos poucos,
vai se tornando mais democrática. O aumento do número de alunos tem,
como consequência, a diversidade de educandos. Diante disso, cresce o
desafio dos professores no sentido de “ensinar tudo a todos”, como disse
Comênio na Didática Magna.

SAIBA MAIS

Psicopedagógicas: aplicação dos princípios da Psicologia à Pedagogia


visando ao sucesso do aluno e mais qualidade de ensino. Relacionam
ser á busca da compreensão do desenvolvimento da criança e de suas
anormalidades, buscando alternativas que possam contribuir para o
desenvolvimento cognitivo, socioafetivo e psicomotor dela, de forma preventiva,
ou mesmo para a intervenção de dificuldades instaladas consideradas
patológicas.

Seletiva e excludente: diz-se da escola que seleciona, dando oportunidade


só para alguns, e, desse modo, exclui, permitindo a evasão escolar por meio
da expulsão da maioria dos educandos do seu direito de estudar e aprender.

Comênio na Didática Magna: o conhecimento sobre como se processa o


ensino, a aprendizagem e suas leis só ocorreu no século XVII, quando João
Amós Comênio (1592-1670) escreve a primeira obra clássica sobre Didática,
a “Didacta Magna”.

PESQUISANDO NA WEB

Caso queira saber mais sobre Comênio, sugerimos a leitura:


“Comenius”, na página : <http://pt.wikipedia.org/wiki/Comenius>.
4 UNIUBE

Assim, com a democratização do ensino escolar, temos uma diversidade


de alunos matriculados em nossas escolas. Nossa hipótese inicial é de
que a escola se abriu para atender outros grupos sociais e, para dar
conta de sua missão, precisa se abrir também para o diálogo com novos
conhecimentos.

Mas, será que esse modelo tradicional foi superado? E o que


significa essa tal diversidade?

Devemos compreender a diversidade como riqueza, e não como


diferença. Pois, entendemos por diversidade na escola as crianças
de diferentes classes sociais, gêneros, etnias e
Diversidade raças, credos e valores, culturas, histórias de vida
Qualidade do
e, consequentemente, crianças que constroem o
diverso; variedade seu aprendizado de diferentes formas, ritmos e
(em oposição
à identidade); tempos. Então, em uma classe ou turma de alunos,
multiplicidade.
o que temos é a heterogeneidade, pois não há
Heterogeneidade
como reunir pessoas iguais quando todos nós
Caráter daquilo
que é heterogêneo;
somos diferentes. Embora possamos ter algumas
diferente, diverso. características comuns, é a singularidade que nos
dá a identidade de cada um.

Por conseguinte, com o aumento do número de alunos na escola,


aumenta também o número de crianças com história de fracasso
escolar. O cotidiano da escola brasileira encontra-se marcado pelo
fracasso e pela evasão de uma parte significativa de seus alunos, os
quais são marginalizados pelo insucesso, pelas privações que sofrem
como consequência da falta de qualidade na educação como um todo.
E, ainda, “continuamos a discriminar os alunos que não damos conta
de ensinar.” (MANTOAN, 2003, p. 28). Assim, o Sistema Educacional
democratizou o acesso à escola, porém ainda não conseguiu garantir o
acesso à aprendizagem para todos.
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Em 1994 foi promulgada a Declaração de Salamanca, na Espanha.


Esse documento resultou de um encontro entre 92 governos e 25
organizações internacionais de diferentes países que se reuniram em
Salamanca e reafirmaram o compromisso para com a Educação para
Todos; defendendo o direito de todas as crianças, jovens e adultos com
necessidades educacionais especiais, receberem o ensino de qualidade,
na escola comum.

Diante do grande desafio, o MEC (Ministério da Educação e Cultura)


também aderiu ao Projeto de Inclusão Educacional, buscando alternativas
para melhorar a qualidade de ensino.

• Mas, o que significa inclusão escolar?


• É o mesmo que integração?
• E normalização?
• Qual é a diferença entre tais conceitos?

Passamos a discutir agora os princípios filosóficos que têm norteado


as políticas públicas da Educação Especial no Brasil, bem como os
principais pressupostos que têm orientado e subsidiado as práticas
educacionais dessa área do conhecimento.

A discussão desses princípios faz-se importante no nosso trabalho, pois


tanto o processo de escolarização quanto o percurso histórico dos alunos
egressos da Educação Especial dependem do entendimento das leis e
dos princípios que orientam a prática educacional nessa área.

Simultaneamente, a partir das modalidades de atendimento existentes no


interior do sistema educacional, verificamos a relação e as contradições
existentes entre o discurso e as formas de materialização destes
princípios.
6 UNIUBE

IMPORTANTE!

As teorias podem ter conceitos diferentes entre os diversos pesquisadores.


Isso varia devido à concepção teórica que orienta a busca de conhecimentos
e a visão de mundo de cada um. Também são influenciadas pelo contexto
histórico e econômico. É importante ter claro que os conceitos evoluem com
o tempo e, assim, são redimensionados e aperfeiçoados.

Por exemplo, sobre a criação da Luz (Figura 1).

Por isso, é importante ficar atento, ler criticamente, comparar conceitos e


discutir as teorias com seus autores.

Figura 1: Criação da Luz.


Fonte: Wikipédia, 2010.
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1.2 Princípios que orientam a prática da educação especial:


normalização, integração e inclusão

A seguir, discutimos as principais tendências ou os princípios filosóficos


que orientam a prática educacional da educação especial. São eles:
a normalização, divulgada a partir de 1950, a integração, em 1970,
e a inclusão, em 1975, todas elas objetivando orientar a filosofia de
atendimento ao aluno com necessidades educativas especiais (NEE).

Mas, por que a discussão de tais pressupostos?

Percebemos que os preceitos que orientam o trabalho com as pessoas


com NEE foram se aperfeiçoando e, desta forma, alterando a sua
nomenclatura e a sua forma ao longo do processo histórico. Julgamos,
pois, importante fazer uma retrospectiva desses princípios, visando
compreender as suas diferenças e semelhanças, como também as
contradições presentes em cada um deles.

Inicialmente, podemos afirmar que a base que sustenta os discursos


presentes nos princípios filosóficos da Educação Especial é a defesa da
democratização da sociedade, a crença na “igualdade de oportunidades”
e a “participação” social e do direito de todos à “educação de qualidade”.

Estas bases coincidem com os fundamentos do liberalismo, que advogam


que: “todos são iguais”, que é preciso ter “igualdade de oportunidades” e
que a “educação é para todos” e ainda com a pretensão de que a “educação
deve visar à unidade de cultura, unidade de espírito, homogeneidade
nacional”.
8 UNIUBE

SAIBA MAIS

Liberalismo “A doutrina que tomou a si a defesa e a realização da liberdade no


campo político. Tal doutrina nasce e se afirma na Idade Moderna e pode ser
considerada dividida em duas fases: 1ª A fase do séc. XVIII, caracterizada pelo
individualismo; 2ª a fase do séc. XIX caracterizada pelo estatismo”. ABBAGNANO,
Dicionário de Filosofia, 1962, p. 576; Ainda : “a história do Liberalismo acha-se
intimamente ligada à história da democracia (...) O Liberalismo é um fenômeno
histórico que se manifesta na Idade Moderna e que tem seu baricentro na Europa
...” BOBBIO, Dicionário de Política, 1986, p. 686-687.

CURIOSIDADE

Essas são ideias liberais divulgadas em conferência proferida na Escola


Normal de São Paulo, em 24 de agosto de 1916, p. 19-54 (CARNEIRO LEÃO,
1917, p. 19-54).

Estes princípios conduzem também à ideia da “incorporação de crianças


com necessidades educativas especiais no ensino regular” (BUENO, 1999,
p. 8), para que todos possam aprender juntos e igualmente.

Além disso, estes preceitos defendem a justiça, a igualdade de direitos e o


resgate da cidadania, que possibilitariam a todos, indistintamente, o direito
à participação e à fruição de todos os bens da sociedade.

Esse discurso, que regularmente poucas pessoas se posicionam contra,


necessita ser discutido na tentativa de explicitar os seus limites, pois, no
nosso modo de entender, os discursos nem sempre coincidem com a prática.
UNIUBE 9

1.2.1 O princípio da normalização

Este princípio surgiu na Dinamarca, por volta de 1950, como estudos


e pesquisas sobre o atendimento educacional das pessoas com
necessidades especiais (PEREIRA et al 1980, apud MOUSSATCHÉ,
1997, p. 11). O conceito de normalização, cuja orientação só chega ao
Brasil por volta de 1970, defende a ideia de possibilitar aos deficientes
condições de vida normal, assemelhando-se com a de todos os outros
indivíduos considerados não deficientes.

Em documento oficial, o conceito de normalização vem expresso nos


seguintes termos:
Princípio que representa a base filosófico-ideológica
da integração. Não se trata de normalizar as pessoas,
mas sim o contexto em que se desenvolvem, ou seja,
oferecer, aos portadores de necessidades especiais,
modos e condições de vida diária o mais semelhantes
possível às formas e condições de vida do resto da
sociedade. (BRASIL, 1994, p.22).

Os signatários deste princípio sustentam a


ideia de que as crianças com NEE devem ser Signatários
educadas num ambiente normal. Tem a intenção
Que ou aquele
de igualar a todos no modelo padrão daqueles que que assina um
documento,
são considerados normais, por representarem a carta, recibo, etc.
maioria, e oferecer ao educando NEE ambiente e Defensor de uma
ideia.
recursos materiais o mais semelhante possível aos
dos demais educandos.

Com isso, seu objetivo é o atendimento da pessoa com deficiência de


forma menos segregadora. Contudo, a ideia de “criar um ambiente o
mais parecido possível com o das outras pessoas na sociedade” tem
sido interpretada por alguns como a criação de um mundo separado
onde houvesse moradia, escola, trabalho e lazer, totalmente adequados
e adaptados para atender as pessoas com necessidades especiais. É
a ideia de que existe possibilidade de fazer com que o diferente se torne
igual à maioria das pessoas.
10 UNIUBE

Para a concretização desse princípio, a realidade mostra que foram


instaladas várias escolas e classes especiais, houve um esforço para
eliminar as barreiras arquitetônicas dos prédios e ambientes educacionais
como também na sociedade em geral. Além disso, existiu – e existe –
uma preocupação com a formação de professores especialistas e com
os recursos materiais e didáticos para atender às necessidades desses
alunos. Contudo, muito pouco se fez ainda diante da necessidade de se
oferecer atendimento à demanda existente e de forma adequada ao aluno
com necessidades especiais, muitas vezes completamente excluído do
sistema escolar.

Estigmatização À esteira de MANTOAN (1998), o conceito de


Do verbo normalização pretende tornar acessíveis às
estigmatizar. Marcar
com estigma. pessoas socialmente desfavorecidas as mesmas
Rotular. Condenar.
Verberar.
condições e recursos que estão disponíveis apenas
para um pequeno grupo da sociedade. Segundo
Ideário
esta autora, trata-se de um novo paradigma para
Coletânea de ideias.
Feixe de ideias. a compreensão das relações entre as pessoas,
Exposição de ideias
que traduzem um
adotando medidas que visam à eliminação de toda
conceito. e qualquer forma de rotulação e estigmatização.

O ideário da normalização revela-se, desse modo, bastante utópico, diante


de nossa realidade tão desigual.

Por outro lado, CARMO (1998) se posiciona em outra perspectiva, quando


afirma que o
ideário de normalização, dissemina a ideia de que é
possível igualar o desigual, reproduzindo assim,
fielmente, a concepção liberal burguesa, que em sua
forma mais bem acabada, afirma ser possível, em nível
de abstração através de leis e /ou outros instrumentos
jurídicos, igualar os homens entre si. Esta visão de
homem e sociedade não tem permitido que se perceba
que o problema não está em tornar igual o desigual,
mas sim em fazer com que os homens compreendam
dinamicamente a igualdade na diferença e a diferença
na igualdade. (CARMO, 1998, p. 391).
UNIUBE 11

A base de sustentação deste autor é a construção


Antagônicas
social alicerçada na desigualdade, fruto da relação
capital x trabalho. Nessa sociedade, a forma como Em que há
antagonismo.
os homens se relacionam e produzem as suas Oposto. Contrário.

riquezas resulta em classes sociais antagônicas,


em que há uma minoria de pessoas privilegiadas com os bens sociais e
econômicos e uma maioria carente de todos esses recursos.

Com base nos dados coletados, o Atlas aponta que 42% dos municípios
brasileiros, o equivalente a 21% da população brasileira, estão em
situação de exclusão social.
Já era esperado que grande parte estivesse nessa situação.
Mas não deixa de surpreender o número de municípios
que estão excluídos. Apenas 200 municípios estão em
boas condições, boa parte está apenas em condições
intermediárias e a maioria ainda está em condição de
exclusão”, [...] Assim o levantamento aponta que mais de
25% dos brasileiros vivem em condições precárias, com baixa
renda, sem emprego formal e baixo acesso à educação.
(POCHMANN; AMORIM, 2003, p. 13).

A desigualdade entre os homens começa, então, pelas relações de posse


e poder. Por isso, as “condições dadas objetivamente que determinam o
modo de produção, e em consequência a organização social, determinam
o homem, suas ideias, assim como seus interesses”. (FROM, 1983, p. 22).

Na nossa percepção, tal princípio tornou-se contraditório, pois notamos


que o mesmo discurso que afirma que não devemos normalizar as
pessoas afirma também que todos devem viver do mesmo jeito. Não
se percebe que é impossível dar uma vida normal e igual para todos,
quando não se pode tornar igual o desigual.

Este princípio, portanto, dificilmente será alcançado tendo em vista a


desigualdade estrutural da sociedade. Acreditamos que a ideia de
melhorar as condições de vida das pessoas com necessidades especiais
12 UNIUBE

é muito justa, porém, insuficiente, pois a melhoria das condições de


acesso aos diferentes setores sociais não ocorrerá caso mudanças na
estrutura política, econômica e social não aconteçam em nosso país.
Portanto, a inclusão educacional depende da inclusão social e de
distribuição de renda mais justa, em nosso país.

1.2.2 O princípio da integração

Um outro princípio é o da integração, cuja divulgação ocorreu, no


Brasil, depois dos anos setenta. Segundo Saint-Laurent (1997), o termo
nasceu nos países escandinavos, precisamente na Dinamarca, mas
se desenvolveu nos Estados Unidos. Em seguida, o Canadá juntou-
se ao movimento, idealizado para atender aos objetivos da corrente
integracionista em defesa dos alunos portadores de alguma deficiência
ou com dificuldades específicas na aprendizagem.

Oficialmente, a integração nos dias atuais é entendida como “um


processo dinâmico de participação das pessoas num contexto relacional,
legitimando sua interação nos grupos sociais. A integração implica
reciprocidade” (BRASIL, 1994, p. 18). Por isso, “não podemos confundir
integrar, que significa fazer seu ou participar de, com integrar entendido
no sentido de fazer um elemento entrar num conjunto.” (VAYER &
RONCIN, 1989, p. 61).

Portanto, inserir e integrar tem significados diferentes. O primeiro diz


respeito à entrada de um elemento num determinado espaço, e o
segundo refere-se à participação do sujeito num dado ambiente, no
qual possa se sentir como componente ativo, no seu espaço, onde teria
condições de envolver-se nas atividades com liberdade e prazer.
UNIUBE 13

IMPORTANTE!

Há documentos oficiais que apresentam os conceitos aqui discutidos.


Confira no site do MEC sobre Educação Especial ou Educação inclusiva.
Sugestão do documento: BRASIL.MEC.SEESP. Política Nacional de
Educação Especial, 1994, p. 18.

Historicamente, o vocábulo integração é um termo complexo que recebeu


diferentes interpretações. Segundo Saint-Laurent (1997), o termo passou
por um processo de evolução distinguindo-se em fases distintas, as quais
abordaremos em seguida.

O primeiro momento da integração deu-se por volta de 1970, momento


no qual a modalidade e o atendimento da Educação Especial ficaram
organizados em formas diferenciadas dependendo da capacidade dos
alunos.

Desse modo, por um lado, os alunos com dificuldades leves (dificuldade de


aprendizagem, distúrbios de comportamento, deficiência intelectual leve)
foram encaminhados para as classes regulares, sem deixar de receber
apoio pedagógico complementar. Por outro, os alunos diagnosticados com
deficiências graves (déficit intelectual moderado e severo, deficiências
múltiplas etc.) foram encaminhados para a classe especial na escola
regular. Em ambos os casos, acreditava-se estar vivenciando a integração
escolar, pois todos os alunos poderiam estar inseridos na mesma escola
regular, sendo atendidos ora na classe comum, ora na classe especial.

No segundo momento, por volta dos anos 80, a discussão do tema


relacionado à Educação Especial se intensifica. A classe regular torna-se
reconhecida como o ambiente pedagógico mais indicado para os alunos
com NEE, sem desprezar o apoio pedagógico extra, em sala de recursos
e em turno diferente. Porém, ainda com restrições àqueles alunos que
apresentavam um déficit intelectual maior e para os quais a escola
regular sutilmente indicava uma instituição especializada, que, segundo
seus preceitos, seria mais propícia para a criança mais lesada.
14 UNIUBE

Numa perspectiva crítica, acerca da integração, destacamos a afirmação


de que a
“integração escolar, cuja metáfora é o sistema de
cascata, é uma forma condicional de inserção em
que vai depender do aluno, ou seja, do nível de sua
capacidade de adaptação às opções do sistema
escolar, a sua integração, seja em uma sala regular,
uma classe especial, ou mesmo em instituições
especializadas. Trata-se de uma alternativa em que
tudo se mantém, nada se questiona do esquema em
vigor”. (MANTOAN, 1997, p. 8).

Notamos que a autora denuncia a visão acrítica da escola, na defesa ingênua


de alguns que consideram que esta, na forma como está organizada, tem
sido eficiente no cumprimento de todos os seus objetivos.

MANTOAN (1998), em outro momento de seus estudos, coloca que


uma das opções de integração escolar denomina-se “mainstreaming”.
Este modelo defende a ideia que todos os alunos, inclusive os com
necessidades especiais, devem ter acesso à educação, cuja formação
deve ser adaptada às suas necessidades específicas. A autora afirma,
ainda, que este termo representa uma estrutura que recebeu o nome de
“sistema de cascata” por objetivar tornar o “ambiente o menos restritivo
possível”, oportunizando ao aluno a chance de transitar no “sistema”, da
classe regular ao ensino especial.

Outro autor que discute esta questão é Sassaki (1997), que acerca da
“mainstreaming” diz ser um termo que “tem sido utilizado sem tradução
e que significa levar os alunos o mais possível para os serviços
educacionais disponíveis na corrente principal da comunidade”. (ASSAKI,
1997, p. 32). Dessa forma, pode variar a modalidade de atendimento
oferecida ao aluno que possua alguma deficiência, de acordo com as
necessidades do aluno. Assim, ele pode ser inserido com os alunos da
escola regular na hora das refeições ou em atividades específicas, tais
como aulas de dança, música, artes e educação física, como também
em atividades extracurriculares organizadas pela escola.
UNIUBE 15

Outra forma de inserção do aluno com NEE existente, e que foi abordada
pelo mesmo autor, é a colocação do aluno “com deficiência” em diversas
classes, apenas por alguns momentos, e em determinadas aulas ou
atividades. Contudo, o aluno com necessidades educativas especiais,
na verdade, não pertenceria a nenhuma turma, ocorrendo apenas
“momentos” de inserção. 

Notamos que o sistema de cascata prevê, assim, serviços segregativos


que não batem com os objetivos da normalização. Na realidade, a
criança continua segregada na turma especial, ocorrendo apenas alguns
momentos de “socialização” com os outros alunos ditos “normais”. A
forma de inserção depende do aluno, ou seja, do nível de capacidade de
adaptação deste às opções oferecidas pelo sistema escolar: nas escolas
regulares, em sala comum ou na sala especial, e ainda em escolas ou
em instituições especializadas.

Portanto, ao mesmo tempo que a abordagem integracionista advoga a


inserção dos alunos “deficientes” no sistema educacional, defendendo
a igualdade de direitos e a democratização do ensino, advoga
também o encaminhamento dos alunos mais lesados para as escolas
especializadas, assumindo assim o despreparo da escola regular para
atender tais alunos, como também a aceitação da segregação.

A integração na escola comum, portanto, não é para todos os alunos com


necessidades especiais, mas somente para aqueles que se adaptarem
às classes regulares. Os demais serão encaminhados para escolas ou
salas especiais.

Para alguns autores como Beaupré (1997), “integrar é realizar estratégias


pedagógicas para que uma pessoa com deficiência tenha acesso a um
sistema de educação que corresponda às suas capacidades intelectuais e
motoras”. E acrescentam ainda que os “professores sejam acompanhados
com relação às suas reações perante os alunos deficientes” (BEAUPRÉ,
1997, p. 163-164) e para que estes consigam realizar um trabalho de
qualidade atendendo às diferenças é necessário que lhes seja oferecido,
além do apoio e orientações, o aperfeiçoamento contínuo.
16 UNIUBE

Santos (1997) coloca que, para a integração dos alunos no ensino


regular, torna-se “exigência que todos os professores se atualizem”
(p.130) e reforça a ideia afirmando que “é preciso instrumentalizar o
professor para saber trabalhar diversificado em sala de aula, porque a
realidade não é homogênea”. (p. 131). Para essa autora, o investimento
no professor, tão explicitado nos comícios e discursos políticos no Brasil,
seria o caminho necessário para a melhoria da qualidade da educação
geral.

Concordamos com os autores acima citados, que afirmam que a


formação e o aperfeiçoamento contínuo dos professores são de suma
importância. Porém, percebemos que só isto não basta, pois a formação
e a atualização dos professores não são suficientes para mudar a
concepção de uma sociedade alicerçada pelos pilares da desigualdade.
A questão envolve outros fatores, ligados ao modelo de organização da
nossa sociedade capitalista, tais como a estrutura da escola brasileira.

Comumente, as pessoas entendem a integração simplesmente como a


inserção dos alunos com necessidades especiais nas classes regulares,
sem o adequado suporte de apoio, o preparo dos profissionais, os
recursos adequados e a assistência ao aluno. Assim, a integração só
seria possível com o suporte e o apoio necessários. Caso contrário,
corre-se o risco de inserir a criança na classe regular e ela continuar
segregada na própria classe.

A maioria dos autores que defendem a integração defendem também a


ideia de se propiciar um atendimento diferenciado – em nível pessoal,
didático ou metodológico – às crianças da Educação Especial. No
entanto, quando cria tais serviços, organizando recursos pedagógicos
e didáticos especializados, a escola regular está sendo contraditória
em relação aos seus princípios, pois já está tratando de forma diferente
aqueles que recebeu como iguais. Percebemos, desse modo, que existe
uma “ambiguidade provocada pelo desejo de integrar quem é diferente e
a noção de necessidades específicas...” (VAYER & RONCIN, 1989, p. 61).
UNIUBE 17

Nesse sentido, Moussatché (1997) expõe seu ponto de vista dizendo que
“colocar na mesma sala de aula grupos heterogêneos
como crianças autistas com retardo mental e crianças
normais não serve para a integração, por não haver
como conciliar em um mesmo espaço demandas tão
diferentes e específicas”.

O autor vem confirmar então que colocar grupos diferentes no mesmo


espaço físico exige tratamento diferenciado, uma vez que não é possível
tratar como igual aquele que é diferente. Para atender a essa ideia,
existe a defesa do respeito às diferenças, o atendimento às diferenças
individuais. Dessa forma, torna-se difícil tratar igual à maioria aqueles que
necessitam de atendimento diferenciado.

Portanto, o mesmo discurso que defende a ideia de que todos são


iguais e devem ser tratados como iguais, com os mesmos direitos,
defende também a ideia de que cada indivíduo é único, aprende de
maneira diferente e, por isso, é preciso ensinar com métodos e recursos
diferentes, para atender às diferentes necessidades individuais.

Apresentando outro ponto de vista, alguns autores discutem a questão


da diversidade humana. Mantoan (1997) coloca que a “diversidade no
meio social é, especialmente no ambiente escolar, fator determinante
do enriquecimento das trocas, dos intercâmbios intelectuais, sociais e
culturais que possam ocorrer entre os sujeitos que neles interagem”.
Nesse mesmo sentido, Moussatché (1997) denuncia a dificuldade da
sociedade em lidar com a diversidade humana, percebendo-a como uma
incompletude. Em outro sentido, Mader (1997) diz que cada vez mais a
diversidade está sendo vista como algo natural.

Concordamos que a diversidade humana concreta nos leva ao


reconhecimento das diferenças. Contudo, não aceitamos a defesa de
que somente o reconhecimento das diferenças possa conduzir a atitudes
de cooperação entre as pessoas e promover a verdadeira integração dos
18 UNIUBE

deficientes e dos homens entre si. Pois é no sistema educacional e na


sociedade em que vivemos que a concepção de mundo e de homem
é reforçada pelos preceitos da sociedade capitalista, sustentada nas
desigualdades sociais. Estas não podem ser superadas apenas pela
“aceitação” imatura e irrefletida da diversidade humana, fazendo com
que o conceito de diversidade venha a ser compreendido como um
sustentáculo das desigualdades.

Como se materializa, no cotidiano do sistema educacional, o


princípio de integração?

Constatamos que, no Brasil, na evolução histórica do processo educacional


dos alunos com NEE, orientada pelo princípio de integração, foram feitas
várias tentativas de inserção desses alunos no sistema educacional. E, para
atender à orientação desse princípio, foram criadas várias modalidades de
atendimentos como as salas especiais, as salas de recursos, o professor
itinerante, nas Escolas Comuns e nas Escolas Especiais.

No Estado de Minas Gerais, especificamente, todos esses atendimentos


estão regulamentados e orientados pela Resolução nº 213/75, pelo Parecer
nº 212/75 e pela Instrução da Secretaria do Estado da Educação número
001/1992.

A primeira diz no inciso 2º do Art. 1º que deverá o “sistema estadual de


ensino incentivar a organização de centros ou serviços” para a educação
especial e continua no Art. 5º inciso 2º dizendo que as “escolas ou classes
especiais criadas pelo poder público terão tipologia, quadro de pessoal
e número de alunos por classe, adequados à natureza do trabalho que
realizem de acordo com legislação específica e as normas baixadas pela
Secretaria de Estado da Educação”.
UNIUBE 19

A segunda orientação é a do Parecer nº 212/75, que atende a essa


determinação trazendo as diretrizes sobre a clientela, currículo, regimento e
princípios da educação especial do Estado. Destacamos o seu Art. 6º letra
b, em que há a previsão da “criação de novos estabelecimentos...” e ainda
afirma que o “parâmetro não será o ensino regular, e sim a satisfatória
qualidade do conjunto de condições.”

A terceira orientação que destacamos no Estado de Minas Gerais é a


Instrução 001/92, que diz:
as escolas da rede regular de ensino poderão
receber alunos portadores de deficiência sensorial,
mental, física e múltipla, devendo, para isto, garantir
o acompanhamento especializado (...) as escolas ou
grupo de escolas receberão assistência dos serviços de
educação especial...

E essa mesma instrução também apresenta as alternativas de


atendimento da Educação Especial, dentro da escola comum de ensino
regular. A escola regular cria, então, serviços de apoio para tentar igualar
o aluno especial ao nível dos demais.

Os serviços de apoio se concretizam na criação de Salas de Recursos


e de Oficina Pedagógica de Artes ou semiprofissionalização, presentes
na escola regular ou especial, visando à complementação e ao apoio ao
trabalho realizado na sala de aula do ensino regular.

São as seguintes formas de atendimento apresentadas, buscando


atender ao pressuposto da integração do educando com necessidades
educativas especiais, no ensino regular:

1. A Turma Comum de ensino regular com número reduzido de alunos


(20-25), para que se possa atender às necessidades dos educandos
com necessidades educativas especiais, em qualquer faixa etária ou
nível de ensino.
20 UNIUBE

2. Na turma especial, onde o professor especializado pode atender de 8


a 15 alunos com organização curricular e metodologias alternativas.

3. O Ensino Itinerante, o qual o professor especializado ou a equipe


multidisciplinar itinerante se deslocam periodicamente, objetivando dar
o suporte e o apoio ao aluno matriculado na turma regular de ensino
bem como orientações ao seu professor.

4. A Sala de Recursos, que dispõe de recursos didáticos apropriados,


equipamentos e professor especializado para dar o apoio e complementar
o trabalho realizado na sala de ensino regular. Os atendimentos
devem ser organizados individualmente quando necessário ou com
grupos de até 8 alunos com necessidades educativas especiais, com
atendimentos de 50 minutos a 2 horas.

5. As Oficinas Pedagógicas profissionalizantes ou semiprofissionalizantes


existem para desenvolver atividades extracurriculares, objetivando
instrumentalizar o educando com necessidades educativas especiais,
com mais de 14 anos e com acentuadas dificuldades acadêmicas para
uma profissão, facilitando a sua integração social.

6. As Oficinas de Artes são destinadas ao trabalho da “criatividade,


da aprendizagem das artes, e ao trabalho manual como atividade
curricular”.

7. O NAPE (Núcleo de Assistência Psicopedagógica Educacional) é um


conjunto de serviços de apoio pedagógico especializado implantado
junto a uma escola estadual para oferecer diagnóstico e atendimento
educacional especializado ao portador de deficiência para facilitar o
processo ensino – aprendizagem.
UNIUBE 21

Desses serviços autorizados pela referida instrução, por algum tempo, o


mais comum, encontrado na escola regular, foi a turma especial. Neste
modelo, reúnem-se, num mesmo espaço, as crianças com “problemas” e
“deficientes”, que inevitavelmente se tornam segregadas e estigmatizadas
pela própria comunidade escolar.

PARADA PARA REFLEXÃO

Você conhece algumas das formas de atendimento citadas acima?

Já teve alguma experiência com alguma delas?

Troque com outras pessoas e registre a síntese dessa discussão em seu


caderno.

Em síntese, a escola regular não consegue atender o aluno com NEE,


sem discriminá-lo. Pois, ao separá-lo e tratá-lo de maneira diferente dos
demais, chama a atenção para as suas diferenças. Assim sendo, a escola
não consegue atender o aluno especial com eficiência de modo que
possa elevar a sua autoestima e lhe propiciar o avanço na aprendizagem.
Ela não se encontra preparada quanto aos recursos físicos, materiais e
humanos. Diante do impasse, a escola regular encaminha esses alunos
para a escola especial isentando-se da responsabilidade.

É importante lembrar que os atendimentos oferecidos pelas instituições


especializadas também respondem ao princípio da integração, por
receberem as crianças PNE que não se adaptaram à escola regular, e,
por isso, estariam ou poderiam estar fora da escola.

Por conseguinte, o atendimento do educando NEE realizado em


instituições de Educação Especial é, da mesma forma, orientado pela
Instrução 001/1992, da SEE de Minas Gerais, para a efetivação em
Escolas Especiais e em Centros de Educação Especial. A primeira é a
instituição que
22 UNIUBE

Dispõe de instalação, equipamentos, recursos didáticos


específicos, e professores especializados para prestar
atendimento a educandos portadores de acentuado grau
de deficiência, sem condições de serem beneficiados
temporariamente pelos serviços de educação especial
oferecidos pela escola da rede regular de ensino.

A escola especial, por sua vez, diferentemente da escola regular,


fundamenta-se nos princípios filosóficos das diferenças individuais.
Defende a ideia de que cada sujeito apresenta diferentes estágios de
evolução e desenvolvimento. A escola especial reconhece as diferenças
universais entre os homens. No seu discurso afirma que cada um é único
e que todos são diferentes na construção de sua história e também na
maneira de aprender, pois cada um tem seu ritmo próprio. Normalmente,
as escolas especiais são providas tanto de pessoal especializado,
como de adequações arquitetônicas e metodologias diversificadas e
especializadas.

Aos Centros de Educação Especial, além das funções da Escola


Especial, são acrescentas as funções de capacitação de recursos humanos,
atendimento complementar aos alunos integrados no ensino regular – por
meio das salas de recursos, oficinas de artes e semiprofissionalizantes –
e, ainda, a realização de estudos e pesquisas.

Esses atendimentos, oferecidos pela Educação Especial, apresentam


caráter transitório, representando o apoio às necessidades do indivíduo,
que, uma vez superadas, este deve ser encaminhado para a inserção
no ensino regular.

Vimos, então, como é que se materializou e como ainda se materializa


concretamente, no cotidiano do sistema escolar, o princípio de integração.
Os alunos com necessidades educativas especiais são, pois, inseridos
nesse sistema, ora na escola regular, ora na escola especial. Ambas as
formas de atendimento, como foi aqui explicitado, apresentam vantagens
e desvantagens, pontos positivos e também inúmeras contradições.
UNIUBE 23

Por conseguinte, a política oficial de integração não foi plenamente


alcançada, continuando a existir instituições e práticas de segregação. O
sistema educacional não conseguiu consolidar o princípio da integração,
pois este acabou não passando de um discurso com poucas atitudes em
favor de sua concretização.

De outra forma, o termo integração foi questionado por pressupor


objetivos de reinserção de alunos deficientes na escola regular, depois
de eles já terem sido excluídos do processo educacional. Segundo Vayer
e Roncin (1989), se não houvesse a não integração antes, não haveria
necessidade de integrar depois. Assim, o princípio pressupõe que a não
integração fora previamente instalada.

Por outro lado, chamou-nos a atenção a ideia da necessidade de tirar


a pessoa portadora de deficiência do isolamento em que se encontra.
Cremos que a pessoa não está integrada, está à margem da sociedade.
Isto desperta-nos a ideia de que se a pessoa PNE for retirada do
isolamento sociopolítico-econômico, acarretará a promoção da sua
autoestima e a evolução de suas potencialidades. Porém, não se discute
o papel da sociedade, que é quem coloca as pessoas nesse estado de
inércia e isolamento.

Na linha de apontar contradições acerca da integração, destacamos os


posicionamentos de Fernandes (1995) e Carmo (1998).

Fernandes (1995) realizou uma pesquisa objetivando conhecer a


concepção dominante de integração das pessoas com necessidades
educativas especiais, entre os professores que atuam na área. Constatou
que existem diversos pontos de vista sobre a integração, mas que é
preciso identificar os mecanismos gerados na sociedade capitalista,
que reforçam a ideia de que as pessoas com necessidades educativas
especiais não estão integradas na sociedade. Afirma que a integração
não deve ter a concepção de tirar a pessoa do estado de não participação
24 UNIUBE

e/ou do estado de inércia. Pois, na verdade, essas pessoas nunca


ficaram fora da sociedade. A sociedade capitalista, que se preocupa com
o valor da troca da mercadoria, é que define que todos têm um papel
definido dentro dessa mesma sociedade. Nessa perspectiva, o princípio
de integração deseja inserir os indivíduos com necessidades educativas
especiais na sociedade, local onde, porém, eles nunca estiveram fora.

CARMO (1998), com esse mesmo sentido, posicionou-se a respeito do


princípio de integração afirmando que os
defensores deste ideário ao buscarem a integração
estão em última análise afirmando que os ‘deficientes’
não estão integrados na sociedade. Além disto, fazem
esta afirmação tendo como leitura as carências desses
indivíduos em termos de trabalho, educação, saúde,
habitação, alimentação e muitas outras mazelas
geradas pela relação capital x trabalho na sociedade
brasileira. (p.391).

Os integracionistas não consideram, portanto, que as diferenças são


comuns entre todos os homens, e não só entre os deficientes.

No nosso entendimento, concordamos com os autores que afirmam que


nenhum sujeito encontra-se não integrado ou fora da sociedade. Pode
estar, sim, fora do contexto ou dos valores defendidos pela sociedade
capitalista, na qual todos têm de ter uma função definida e um papel
estabelecido, sendo o homem valorizado pelo que ele tem e pelo que
ele produz.

Autores como Fernandes (1995) e Carmo (1998) percebem que a questão


da integração é mais ampla, pois não deve se refletir apenas em relação
ao aspecto educacional ou escolar. Há outros fatores, como saúde, lazer,
moradia, assistência médica e alimentação, que são fundamentais para
a sobrevivência humana com o mínimo de dignidade. Desse modo, o
aspecto da exclusão se estende além das pessoas NEE.
UNIUBE 25

Há também um contigente enorme de crianças


Contingente
em idade escolar, que não tem conseguido o
acesso e a permanência – com sucesso – na Quantidade máxima
de pessoas ou
escola. E, nesse sentido, não só os deficientes crianças.

não estão integrados no meio em que vivemos,


mas todas as pessoas carentes que se encontram à margem da
sociedade. Dessa forma, a não integração é consequência dessa sociedade
capitalista na qual vivemos, formada por classes tão diferentes e desiguais.

Vista dessa forma, a integração torna-se uma questão infundada, pois


os problemas que os representantes do governo tentam resolver com
essa ação política não se restringem aos eficiente, mas a todos os
marginalizados da sociedade.

Fernandes (1995) diz ainda que o princípio de integração está acentuando


a intolerância à diferença, na “tentativa de igualar o igual ao desigual”.
Denuncia, dessa forma, a falsidade desse discurso e a não aceitação da
diferença.

Portanto a integração, segundo os autores citados, deveria ser para todos


e não somente para os deficientes. Todos os desassistidos, os carentes
dos recursos necessários a uma vida com dignidade, em nosso país
e no mundo todo, deveriam ser reintegrados na sociedade. Porém, a
igualdade de direitos só existe em nível abstrato, no discurso político ou
expresso nas leis, pois concretamente não se viabiliza numa sociedade
de classes construída sobre as bases das desigualdades sociais.

Reafirmamos essas ideias, na constatação de que,


por um lado, a corrente integracionista trata idealmente
a realidade, por outro, ela reconhece a igualdade
essencial entre os homens em direitos e deveres. Se
defende a inclusão dos deficientes no âmbito escolar,
seja em classes especiais, classes comuns ou escolas
26 UNIUBE

especiais de forma abstrata e universal, defende no


fundo o acesso ao conhecimento pelo ‘deficiente’; se
não consegue perceber as contradições mais profundas
existentes nas relações entre os homens, consegue
perceber e lutar para que os homens vivam e atuem
socialmente. (CARMO, 1991, p.124).

Em síntese, encontramos duas linhas de posicionamento distintas acerca


da integração: o primeiro grupo a defende de forma ingênua, destacando
os seus pontos positivos e a sua viabilidade; o segundo grupo, numa
outra perspectiva, pôs-se a denunciar a falsidade desse discurso.

Assim, os defensores desse ideário, de um lado, assumem uma posição


ingênua perante a realidade, pois, ao pretender igualar o desigual,
assumem a não tolerância pela diferença e o não reconhecimento da
diversidade humana. Por outro lado, não percebem a amplitude maior da
questão das desigualdades, que são sustentadas pelos pilares de nossa
sociedade capitalista.

Percebemos que o discurso da integração, defendido pela corrente


integracionista, na verdade advoga a igualdade entre os homens,
quando esses são totalmente diferentes. E, portanto, trata-se de um
falso discurso, que tem servido para camuflar a não aceitação pelas
diferenças. O princípio de integração torna-se, dessa forma, inviável
numa sociedade de desiguais.

Diante das contradições explícitas, em que pese toda a história de


insucesso do preceito de integração, surge uma nova orientação, sobre
a qual abordaremos em seguida: o ideal da escola inclusiva. Esta é a
nova e atual proposta de se atender os educandos com necessidades
especiais, com qualidade, sem estigmatização ou discriminação.
UNIUBE 27

1.2.3 O princípio da inclusão

A “chamada educação inclusiva teve início nos Estados Unidos em 1975”.


(MRECH, 1998, p. 37). Surge como uma reação contrárias às políticas
integracionistas cujo significado, bem como a efetivação da sua prática,
trouxe muita discussão e polêmica. Trata-se de uma nova expressão
que vem fazer da integração uma obrigação de todos: a inclusão, “que
significa que a resposta às necessidades pedagógicas de todos os alunos
se faça no mesmo contexto através de atividades comuns, embora
adaptadas”. (SAPON–SHEIN, 1992: FRIEND e BURSUCK, 1996, apud
SAINT-LAURENT. 1997, p. 68). As ideias desse ideário chegaram ao
Brasil na década de 90.

Esta nova política educacional visa à inserção não apenas dos


deficientes, mas de todos os alunos nas escolas regulares, de forma mais
completa e sistemática. Todos os alunos anteriormente excluídos devem
ser inseridos na vida social e educativa, não permitindo que ninguém
fique fora do ensino regular, desde o início da escolaridade. O conceito
de inclusão coloca um grande desafio para o sistema educacional, pois
o direito à educação na escola comum não é só para os “deficientes”,
mas para todos. Confirma-se isto nos seguintes termos:
as escolas devem acolher todas as crianças,
independentemente de sua condições físicas,
intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras.
Devem acolher crianças com deficiência e crianças bem
dotadas; crianças que vivem nas ruas e que trabalham;
crianças de populações distantes ou nômades;
crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e
crianças de outros grupos ou zonas desfavorecidos ou
marginalizados. (BRASIL, 1987, p.17-18).
28 UNIUBE

Encontramos autores que reafirmam essa ideia colocando que o termo


inclusão se originou de “full inclusion” e prescreve a educação de
todos os alunos nas classes e escolas de bairro; o conceito de inclusão
(“inclusion”) reflete mais claramente e precisamente o que é adequado:
todas as crianças devem ser incluídas na vida social e educacional da
escola e classe de seu bairro, e não somente colocadas no curso geral
(“mainstream”); “a ênfase nas escolas inclusivas deve-se aos meios de
se construir um sistema que inclua e que considere as necessidades de
cada um”. (STAINBACK E STAINBACH 1992 apud DORÉ, WAGNER,
BRUNET, 1997, p. 176). Defende-se, assim, a educação para todos
indistintamente, como também a atenção às necessidades individuais.

Notamos que há autores que não apresentam muita clareza na distinção dos
termos integração e inclusão. Alguns, preocupados com as deficiências mais
graves, afirmam que podem ser ou não a favor da integração, pois depende
do caso. Na verdade, eles defendem a integração, e não a inclusão. Assim,
defendem a inserção do aluno no ensino regular como algo que depende
da capacidade de adaptação do aluno.

Então, a integração não é para todos, mas somente para aqueles que se
adaptarem ao ambiente no qual foram inseridos.

Merece destaque, por se tratar de um documento base, a Declaração


de Salamanca, que defende a ideia de que “todas as crianças devem
aprender juntas, sempre que possível, independente de suas dificuldades
e diferenças”. (UNESCO, 1994, p. 23.)

Entretanto, ela recomenda também a escolarização de crianças em


classes e escolas especiais,
“...nos casos, pouco frequentes, nos quais se demonstre
que a educação nas classes comuns não pode
satisfazer às necessidades educativas ou sociais da
criança, ou quando necessário para o bem-estar da
criança ou das outras crianças”. (UNESCO, 1994, p. 24)
UNIUBE 29

Em nossa visão, contudo, aceitar a existência de instituições especializadas


é o mesmo que admitir a existência de processos segregativos, que são
valores defendidos pela integração.

Diante disso, percebemos que esse documento apresenta uma


contradição que deve ser aqui explicitada: ao mesmo tempo que ele
advoga que todas as crianças PNE podem aprender juntas com as outras
da escola regular, ele advoga também que elas podem aprender em
instituições separadas, portanto, segregativas.

Reconhecemos que este documento trouxe alguns aspectos positivos


para a Educação Especial. O principal deles é a defesa da possibilidade
da relação entre as diferenças, pois é por meio da convivência com as
diferenças que reconhecemos nossas limitações.

Outro aspecto importante da Declaração de Salamanca é que o documento


chama a atenção dos governantes para a necessidade de aplicar todo
investimento possível para o redimensionamento das escolas, quanto aos
seus aspectos estruturais e organizacionais, para que possam atender, com
qualidade, todas as crianças, independentemente de suas diferenças ou
desigualdades.

Outra autora coloca que a inclusão tem como metáfora o calidoscópio. A


metáfora foi explicada nos seguintes termos:
O calidoscópio precisa de todos os pedaços que o
compõem. Quando se retira pedaços dele, o desenho
se torna menos complexo, menos rico. As crianças
se desenvolvem, aprendem e evoluem melhor em um
ambiente rico e variado”. (FOREST & LUSTHAUS 1997
apud MANTOAN, 1998, p. 32).O calidoscópio precisa
de todos os pedaços que o compõem. Quando se retira
pedaços dele, o desenho se torna menos complexo,
menos rico. As crianças se desenvolvem, aprendem
e evoluem melhor em um ambiente rico e variado”.
(FOREST & LUSTHAUS 1997 apud MANTOAN, 1998,
p. 32).
30 UNIUBE

Reconhece-se, desse modo, a riqueza de se trabalhar com a diversidade


humana, bem como o valor da troca, da cooperação. A autora acrescenta
ainda que a
Inclusão se concilia com uma educação para todos
e com um ensino especializado no aluno, mas
não se consegue implantar uma opção de inserção
tão revolucionária sem enfrentar um desafio ainda
maior: o que recai sobre o fator humano. Os recursos
físicos e os meios materiais para a efetivação de
um processo escolar de qualidade cedem sua
prioridade ao desenvolvimento de novas atitudes
e formas de interação na escola exigindo mudanças
no relacionamento pessoal e social e na maneira de
se efetivar os processos de ensino e aprendizagem.
(MANTOAN, 1997, p. 8-9)

Essa autora acredita na viabilidade do ideário de inclusão, contanto


que haja uma mudança substancial na formação dos professores,
que conduzirão a novas atitudes, nos recursos físicos e materiais e no
relacionamento entre as pessoas. Em outro artigo, a autora destaca a
necessidade do aperfeiçoamento dos professores visando à oferta de um
“ensino ‘especializado em todos os alunos’” (MANTOAN, 1997, p. 127).

Nesse sentido, percebemos que a filosofia da escola inclusiva visa


atender a criança com alguma deficiência, dentro de suas necessidades
educacionais, oportunizando-lhe e favorecendo-lhe o máximo de
desenvolvimento das suas capacidades. Para isso, alguns autores
defendem que são necessárias muitas adaptações materiais no interior
da escola. No entanto, na nossa visão, entendemos que isto não seria
suficiente, pois, num sentido mais amplo, implicaria modificações de
ordem estrutural na organicidade da escola.

Os princípios que defendem a inclusão pretendem assegurar os direitos das


pessoas com necessidades educativas especiais, mediante modificações
e adaptações do ambiente físico e humano, para garantir e facilitar a
fruição dos direitos garantidos em lei. Os documentos oficiais chamam-nos
UNIUBE 31

a atenção para as parcerias com a comunidade, para colaboração e


conscientização dela quanto à compreensão e aceitação das diferenças.
Para que a escola dê conta desse seu novo desafio, chama-se a atenção
para a necessidade de se propiciar aos professores da classe comum
um suporte técnico, subsidiando-os para que encontrem formas criativas
de atuação junto às crianças especiais. Estes deverão se adaptar às
particularidades dos educandos, para atender às suas necessidades
educacionais.

SAIBA MAIS

• O princípio de inclusão é referendado pela legislação em vigor, tais


como a Constituição Federal de 1988; pela LDB/1996 (Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional); a Declaração de Salamanca e, ainda,
por Documentos da SEE-MG (Secretaria do Estado da Educação):
“Escola Sagarana – Educação para a vida com dignidade e esperança”
e a Resolução 08 de 26.01.2000, publicada no “Minas Gerais”, dia
27.01.2000,

• A Resolução n° 2/2001, aprovada pela Câmara de Educação Básica do


Conselho Nacional de Educação, coloca para os sistemas de ensino
o desafio de se organizar para incluir os alunos e atender às suas
necessidades educacionais especiais.

Veja mais informações no site do MEC: <http://portal.mec.gov.br/index.


php?option=com_content&view=article&id=12648%3Adiretrizes-nacionais-
para-a-educacao-especial-na-educacao-basica&catid=192%3Aseesp-
esducacao-especial&Itemid=860>.

Citamos então alguns autores que colocam como condição para a


efetivação do ideário da inclusão a efetivação de reformas e ajustes na
escola comum, como adaptações arquitetônicas e curriculares, compra
de material didático-pedagógico e o aperfeiçoamento dos professores.
32 UNIUBE

Dessa forma, alguns autores como MANTOAN (1997), SANTOS (1997),


entre outros, acreditam que, para se efetivar o processo de inclusão, seria
necessário equipar a escola com recursos e professores especializados,
recursos e instrumentos técnicos para o apoio pedagógico e prédios
adaptados. Concordamos com a ideia de que todo esse equipamento,
como também professores mais especializados traria benefícios positivos
para a educação. Contudo, questionamos se somente isto, seria suficiente
para a efetivação do processo de inclusão.

No nosso modo de entender, para que o ideal de inclusão realmente se


efetivasse, muitas mudanças seriam cabíveis na sociedade como um
todo. Seria necessário acabar com toda forma de preconceito e com todos
os mecanismos geradores de discriminação e de exclusão, existentes no
sistema educacional brasileiro. Isso pressupõe uma mudança na filosofia
do sistema educacional e da sociedade como um todo.

Na realidade brasileira, depararmos com uma sociedade preconceituosa,


que discrimina e exclui os diferentes. O padrão de normalidade é difundido
pela sociedade elitista, em que vence o melhor, o mais bonito, o mais
inteligente. Pais, profissionais, professores, todos discriminam e não
aceitam as deficiências. É muito forte o padrão de normalidade imposto pela
classe privilegiada. Soma-se a isso o despreparo da escola tanto quanto à
sua infraestrutura física, quanto aos recursos materiais pedagógicos, como
também quanto à preparação dos professores. Além do mais, as ações
isoladas, como a aquisição de alguns jogos pedagógicos, uma palestra
sobre as diferenças individuais e um seminário sobre a educação dos
alunos com necessidades educativas especiais são medidas paliativas
que não resolvem os problemas em discussão.

Acreditamos que o sistema educacional, para atender a este princípio


na sua plenitude, deva ser reestruturado radicalmente, a partir de sua
organicidade.
UNIUBE 33

A inclusão, segundo MADER (1997), é o termo


[...] que se encontrou para definir uma sociedade que
considera todos os seus membros como cidadãos
legítimos. Uma sociedade em que há inclusão é uma
sociedade em que existe justiça social, em que cada
membro tem seus direitos garantidos e em que sejam
aceitas as diferenças entre as pessoas como algo
normal. (MADER, 1997, p. 47).

No nosso entendimento, dificilmente conseguiremos “justiça social” numa


sociedade edificada sobre bases desiguais, existindo diferenças de cor,
sexo, classe social, direitos e deveres.

Essa mesma autora defende ainda que a “inclusão do portador de


deficiência depende da mudança de nossos valores; é a vivência de um
novo paradigma”. (MADER, 1997, p. 50). Esta posição da autora deixa
transparecer que bastaria então a compreensão e aceitação da diferença,
para que a inclusão se viabilizasse.

Entretanto, como já foi discutido anteriormente, o preconceito e a não


aceitação da diferença em nossa sociedade estão condicionados ao longo
processo histórico da humanidade.

A polêmica em torno do entendimento do que venha a ser inclusão fica


mais acirrada, ainda, quando alguns autores, ao discutirem este princípio,
não delimitam de forma necessária o entendimento sobre diferença e
desigualdade.

Na visão de CARMO (1999), são contraditórios os autores que não fazem


esta distinção, pois misturam desigualdade com diferença, como se
fossem a mesma coisa, isto é, a criança desigual é também diferente e
vice-versa. Segundo ainda este autor, a diferença diz respeito às nossas
características biológicas e as desigualdades às nossas diferenças sociais.
34 UNIUBE

Nesta perspectiva, “existe diferença na diferença e desigualdades nas


diferenças”. (CARMO, 1999, no prelo). A prova disso é que dois alunos
cegos, favelados ou abandonados, são completamente diferentes e
desiguais socialmente, com história e necessidades distintas. Dessa
forma, duas pessoas podem ter em comum uma deficiência, ou uma
condição social qualquer, porém continuarão tendo histórias e processos
de aprender diferentes um do outro.

O ideal de inclusão é dirigido a todos, independentemente das diferenças


e desigualdades que possuam. Porque são diferentes, todos podem
permanecer juntos, no mesmo espaço e tempo. Nessa linha de raciocínio,
trata-se de mais uma maneira de tentar igualar todos pela diferença e
pela desigualdade.

Assim sendo, se antes a integração defendia o discurso da igualdade


abstrata entre os homens, afirmando que todos são iguais, agora,
o princípio da inclusão afirma que todos somos diferentes, por isso
devemos permanecer juntos. Dessa forma, somos igualados agora pela
diferença. Assim, somos agora igualados pela diferença e desigualdade,
pois o que temos de comum ou de igual é a evidente constatação de que
todos somos diferentes.

Dessa forma, novamente percebemos que não são levados em conta e


nem são discutidos outros fatores intervenientes nas relações existentes
entre os homens e a realidade cultural. Na prática os desassistidos,
carentes dos bens básicos para se viver dignamente, continuam à margem
dessa sociedade, enquanto os privilegiados continuam usufruindo de
bens e vantagens maiores que os primeiros.

Outra questão, decorrente do caráter contraditório discutido anteriormente, é


o discurso que defende a equidade de oportunidades na educação, visando
oferecer as mesmas oportunidades para todos.
UNIUBE 35

Este ideário, se por um lado contribuiu para a abertura das escolas


regulares e para o recebimento dos alunos com necessidades educativas
especiais, mesmo sem o devido preparo das instituições educacionais,
por outro, como consequência, transferiu a responsabilidade do sucesso
e do fracasso única e exclusivamente para as crianças com necessidades
educativas especiais e as pertencentes às classes menos favorecidas,
ficando o projeto político da escola acima de qualquer suspeita. Os
defensores deste princípio utilizam este mecanismo de exclusão
com base na ideia de que a estas pessoas foram dadas as mesmas
oportunidades e, no caso de ocorrer o fracasso, a culpa é somente delas.

Justifica-se, desse modo, que foi dada oportunidade educacional igual a


todos e vencem os mais capazes e os que mais se esforçam. Vive-se, ainda,
na prática, a concepção darwiniana da educação, com a crença de que só
vencem os melhores. Não são levadas em conta as diferenças de natureza
biológica e muito menos os fatores sociopolítico-econômicos presentes
nesse processo.

SAIBA MAIS

Darwiniana: relativo a Darwin. O Darwinismo é a doutrina da evolução


biológica, enunciada por Darwin (1809-1882), “fundada em dois princípios:
1º a existência das condições ambientais, e das quais algumas, pela lei
da probabilidade, seriam biologicamente vantajosas; 2º a seleção natural
graças à qual sobreviveram, na luta pela vida, os indivíduos em que se
manifestassem as variações orgânicas mais favoráveis”.

Para conhecer mais sobre Charles Darwin, visite a página <http://pt.wikipedia.


org/wiki/Charles_Darwin>.
36 UNIUBE

Charles Darwin, naturalista e teórico da seleção natural, viveu entre 1809


a 1882 e, no decorrer de sua vida, tornou-se famoso internacionalmente
como um influente cientista estudando tópicos controversos.

Diante do exposto até aqui, torna-se conveniente isentar as políticas


públicas e as escolas de qualquer responsabilidade pelo mecanismo de
exclusão empregado.

Com o objetivo de fazer cumprir a lei, encarando o princípio de inclusão


como um dever, corremos o risco de colocarmos todos os alunos com
NEE, independentemente de suas condições, na escola regular, quando
esta não está preparada para recebê-los. Esta atitude pode conduzi-los à
segregação, ao fracasso e à evasão da escola, como também à perda da
autoestima, quando não conseguem responder às exigências dessa escola.

É do conhecimento comum que a escola regular dificilmente nas condições


atuais atenderá os alunos com NEE, uma vez que ela não tem dado conta
de cumprir a sua função nem mesmo com os alunos ditos “normais”.
Para se ter respostas mais claras, basta constatar que as taxas de
repetência evidenciam a baixa qualidade do ensino e a incapacidade dos
sistemas educacionais e das escolas de garantir a permanência do aluno,
penalizando, principalmente, os alunos de níveis de rendas mais baixos.
(BRASIL, 1997, p.25).

Outra questão polêmica acerca da inclusão é a inserção de todas as


crianças NEE na escola regular, inclusive as que possuem algum tipo
de deficiência severa. A proposta de uma escolarização geral, de forma
ampla e total, no ensino regular, sugere a abolição de todos os serviços
segregativos, extinguindo, desse modo, as classes especiais, os centros
e/ou as escolas especiais. Consequentemente, toda a responsabilidade
de atendimento dos alunos NEE seria transferida para a escola regular.
UNIUBE 37

Com isto, as diretoras das escolas regulares defendem a existência das


instituições especializadas para o atendimento dos alunos especiais,
desejosas de se livrarem do problema e, da mesma forma, as diretoras e
os profissionais que trabalham nas instituições especializadas defendem
a sua continuidade e ampliação, justificando-se pela importância do
trabalho que realizam.

A Secretaria do Estado da Educação de Minas Gerais, em setembro


de 1999, publicou seu projeto político pedagógico denominado “Escola
Sagarana – Educação para a vida com dignidade e esperança”, que,
definindo a ação do Estado para a Educação Especial, coloca como
objetivo “intensificar políticas de inclusão e integração social, de melhoria
da qualidade do ensino...” e, para a efetivação disto, define sua ação,
nos seguintes termos: promover novos estudos sobre critérios e métodos
de integração dos portadores de necessidades educativas especiais no
ensino regular, desenvolver projetos nas escolas de forma a facilitar essa
integração, manter convênios com instituições especializadas e acordos
operacionais para cessão de professores, técnicos e especialistas.

Este documento não faz referência à continuidade ou à existência das


escolas ou centros especializados. É colocada, apenas, a intensificação
do trabalho da Secretaria, visando alcançar a política da escola inclusiva.

A Secretaria Estadual de Educação encarregou-se de “suavizar” o texto da


Escola Sagarana e publicou a Resolução nº 08 de 16 de janeiro de 2000,
sobre a organização do ensino nas escolas estaduais, na Seção V, “da
Educação Especial”, em seu parágrafo único, acrescenta que o atendimento
educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados,
sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for
possível sua integração nas classes comuns de ensino regular.

Fica claro, neste documento, que a própria Secretaria de Educação do


Estado não distingue claramente os vocábulos integração e inclusão,
38 UNIUBE

pois, ao mesmo tempo em que defende a construção de escolas inclusivas


e a promoção gradativa dos alunos NEE no ensino regular, defende também
o encaminhamento de alunos para os centros e escolas especializadas,
sempre que “não for possível a integração nas classes regulares”. Dessa
forma, as orientações da Secretaria oscilam, ora avançando para a
implantação da escola inclusiva, ora retornando à defesa de atendimentos
em escola especiais, que representam ações do antigo princípio de
integração.

Mediante tanta contradição Carmo (2006, p.51) afirma que


O modelo social e educacional precisa excluir para
justificar a inclusão, alimentando-se dessa contradição.
Quanto mais tempo mantiver viva essa relação, mais
tempo perpetuará a dominação e a hegemonia de
alguns sobre os outros.

Mas, para que existem, então, as políticas educacionais voltadas para a


minorias excluídas?

Carmo (2006) acredita que os homens que dominam são também vítimas
do seu próprio processo de exclusão, pois, quando não conseguem
alimentar a cultura das massas, têm que ceder, nas relações sociais,
espaços para que culturas específicas e discriminadas possam se
manifestar e crescer.

Assim, há ‘permissão’ para os movimentos dos negros, das prostitutas,


dos índios, dos deficientes, dos homossexuais etc. e de todos aqueles que
representam as minorias e precisam de espaço de luta e manifestação,
como também de pequenas conquistas, visando manter a “ordem e o
progresso” e conter as violências.

Acredita-se, dentro desse prisma, que é mais uma estratégia do capitalismo


para manter a estrutura de desigualdade, orientada pela política neoliberal.
UNIUBE 39

Vamos ver se você entendeu o que falamos até aqui.

PARADA PARA REFLEXÃO

Como os princípios de normalização, integração e inclusão se materializam


na prática do cotidiano escolar?

Em síntese, podemos afirmar que toda essa discussão nos leva a


algumas ilações importantes acerca desses princípios de normalização,
integração e inclusão.

Em primeiro lugar uma das vantagens destes ideários é a possibilidade


da convivência com as diferenças, sendo que a interação com o outro, o
intercâmbio e as trocas sociais e culturais entre os diferentes e desiguais
são sempre enriquecedores.

Segundo: o discurso da equidade de oportunidade na educação, que visa


oferecer as mesmas oportunidades para todos, se por um lado contribuiu
para a abertura de diferentes espaços nas escolas regulares, visando
ao atendimento aos alunos com necessidades educativas especiais,
por outro, não conseguiu acabar ou minimizar os problemas relativos ao
fracasso e à permanência dessas crianças na escola, fato este marcante
também no processo de integração.

Terceiro: aparece agora um outro discurso, com uma nova roupagem,


chamado de inclusão escolar, visando colocar, no ensino regular, não
somente as crianças “deficientes”, mas todos os deserdados da educação.

Este ideário, ao advogar que todos somos concretamente diferentes,


está conseguindo de forma eficiente fazer crer que seja possível, pela
desigualdade, que todos sejam colocados em espaços e tempos comuns.
Em outros termos, é possível fazer com que as diferenças, bem como as
desigualdades, convivam harmoniosamente.
40 UNIUBE

PARADA PARA REFLEXÃO

Então a inclusão educacional é uma utopia?

O que realmente acontece, de fato, no interior das escolas da educação


básica com relação à inclusão?

1.3 A inclusão e a qualidade de ensino na escola pública

• Mas, será que não existe inclusão?


• Ou o que existe é a exclusão educacional, principalmente
para as pessoas com NEE?
• E os pobres, os negros, as crianças trabalhadoras, os nômades
e os que aprendem de forma diferente do que a maioria
necessitam de metodologia apropriada e diferenciada?
• Que tipo de escola existe para eles?

Lancemos nosso olhar para a escola pública, a mesma que acolhe


principalmente os educandos das classes desprovidas de riquezas,
aqueles que veem na escola uma possibilidade de se instrumentalizar e
se preparar para garantir um futuro melhor.

Mas, e as escolas públicas, destinadas às classes menos abastadas, como


se encontram dentro dessa sociedade capitalista, desigual e excludente?

E o conhecimento científico, a educação e, especificamente, as escolas,


poderão contribuir para a construção de um mundo melhor?

A realidade brasileira reflete a exclusão social e educacional. As escolas


públicas do Ensino Fundamental atendem a maioria, recebendo a
matrícula daqueles que a procuram. O que se anuncia é que há vagas
UNIUBE 41

para todos. Contudo, percebemos que falta qualidade de ensino para


todos. A escola não tem conseguido cumprir a sua função de ensinar a
toda diversidade de alunos presentes no seu cotidiano.

SAIBA MAIS

Terezinha A. Rios (2003, p. 21) afirma que é “comum utilizarmos o conceito


de qualidade como se ele já guardasse uma conotação positiva – dizemos
que algo é de qualidade querendo dizer que é bom. Entretanto, a qualidade
é um atributo essencial da realidade. Há boa e má qualidade nos seres com
que nos relacionamos, nas situações que vivenciamos. Trata-se, assim, de
qualificar a qualidade, de refletir sobre a significação de que ela se reveste
no interior da prática.

Por conseguinte, com a abertura da escola como direito de todos os


cidadãos, nos últimos trinta anos, aumentou consideravelmente o número
de vagas nas escolas e essa passa de seletiva para democrática. Cresce
o número de alunos e, consequentemente, a diversidade de educandos
no interior das escolas. E para atender a toda essa diversidade de
alunos, fazem-se necessários muitos ajustes, investimentos, mudança
de valores, de planejamento, de formas e muito mais. É uma nova e
desafiante realidade.

Como vimos, a ideia de diversidade trouxe a obrigação do reconhecimento


de que não há mais homogeneidade na escola. Antes, na escola
tradicional, os papéis dos educadores eram/são prescritos. Ensinava-se
de uma única maneira, para todos, supondo que todos aprendessem no
mesmo tempo e no mesmo espaço. Agora, o professor está diante de
algo que não conhece, o que representa um grande desafio.

Destarte, Rios (2003, p. 43) afirma que diante deste “mundo complexo,
também se tornam mais complexas as tarefas dos educadores.”
42 UNIUBE

Como voltar-se criticamente para a realidade, como definir os


caminhos do conhecimento, da aprendizagem, em última instância,
da construção do humano, de sua afirmação?

Nessa sociedade na qual impera a desigualdade, há um sistema escolar


desigual e contraditório, que se materializa na organização do sistema
de ensino dual, formado, de um lado, por escolas de má qualidade,
com infraestrutura inferior, carga horária restrita, com professores
com formação insuficiente, com ênfase na formação da mão de obra
especializada para atender ao mercado de trabalho; e, de outro, por
escolas particulares bem estruturadas e equipadas, com professores
especializados que oferecem os cursos propedêuticos e, por isso,
garantem o ingresso nas universidades públicas de boa qualidade.

O tema da qualidade de ensino já se fazia presente na antiguidade grega,


constituindo-se como uma das preocupações daquela civilização. No
período áureo da filosofia iluminista, na nascente modernidade, o pensador
Locke, no século XVIII, chegou a classificar a qualidade, evidenciando as
diferenças que ela é capaz de comportar. Nesse sentido, a história nos
mostra que a qualidade não é um tema inscrito na contemporaneidade e
que vem acompanhando a trajetória da humanidade e assumindo diversos
formatos e significados, nas diversas formações sociais que o mundo
conhece. É preciso, então, contextualizar a qualidade na história, no tempo
e no espaço.

Assim, a preocupação com a qualidade de ensino e as pesquisas sobre


os resultados da educação são antigas. Bárbara Freitag (1980, p. 61) já
apontava que de
(...) 1.000 alunos que em 1960 ingressaram no primeiro
ano primário, somente 466 atingiram a segunda série
primária. Na quarta série ainda restavam 239. Dessas,
somente 152 ingressaram em 1964 no ensino ginasial,
91 alcançaram a quarta série e 84 o último ano do
colégio. Dos 1.000 alunos iniciais em 1960, somente 56
UNIUBE 43

conseguiram alcançar o primeiro ano universitário em


1973. Isso significa taxas de evasão de 44% no primeiro
ano primário, 22% no segundo, 17% no terceiro. A elas
se associam taxas de reprovação que entre 1967 e
1971 oscilavam em torno de 63,5%.

A autora justifica que a situação caótica da educação nessa época


deve-se aos sistemas rígidos de avaliação classificatória, aos currículos
inadequados, professores mal preparados, aos parcos equipamentos e
a falta de infraestrutura para condições dignas do trabalho docente.

Entretanto, duas décadas depois disso, Silva e Vizim (2001, p. 30)


denunciam que em “São Paulo, o estado mais rico do país, a maioria dos
jovens de 18 a 24 anos (56,2%) está fora da escola, sendo que destes,
44,3% não completaram o ensino fundamental.”

Mais recentemente, os resultados da pesquisa realizada pelo SAEB


(Sistema de Avaliação da Educação Básica), em 2003, apontam que
a qualidade da educação pública apresenta índices ainda bastante
insatisfatórios. A pesquisa constatou, por exemplo, que, em média,
os alunos de 4ª série se atrapalham ao interpretar
textos longos ou com informação científica e não
conseguem ler horas em relógios de ponteiros. Também
não conseguem fazer operações de multiplicação com
números de dois algarismos (SANDER, 2006).

Os dados estatísticos, resultados das pesquisas, mostram que a escola


não tem conseguido cumprir integralmente a sua função social. E aqueles
que fracassam na escola são aqueles que justamente mais precisam
dela. São os filhos das classes subalternas que teriam, nesta, uma
chance de ascender socialmente e, mais importante que isso, recordando
Paulo Freire, aprender “ler o mundo” de forma crítica e tornar-se sujeito
com autonomia para construir e transformar a sua própria história.
44 UNIUBE

Se a escola não cumpre a sua função, acaba funcionando como aparelho


ideológico do estado (AIE) como denunciou Althusser (apud FREITAG,
1980 p.35) servindo de instrumento para a manutenção e a preservação
do status quo. Pois, a
reprodução da ideologia vem a ser uma condição sine
qua non da reprodução das relações materiais e sociais
de produção. A escola, como AIE mais importante das
sociedades capitalistas modernas, satisfaz plenamente
essa função (FREITAG, 1980, p.34-35).

CURIOSIDADE

Bárbara Freitag, em seu livro Estado, Escola e Sociedade (1980, p. 34-36 ),


relembra a tese de Althusser que afirma que as escolas representam
aparelhos ideológicos do Estado (AIE) por difundirem a ideologia dominante
e colaborarem para a manutenção do status quo, ou seja, a perpetuação da
classe dominante e, consequentemente, das desigualdades sociais.

PESQUISANDO NA WEB

Caso queira saber mais, sugerimos a leitura:

Louis Althusser afirmou que a escola funciona como aparelho ideológico do


Estado. Veja mais informações na página: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Louis_
Althusser>.

Contudo, sabemos que a escola não é a única causa da alienação ou


produção da falsa consciência, nem o único veículo de perpetuação das
relações de desigualdade.

Mas, será que a maioria dos professores tem consciência disso? Os menos
esclarecidos representam aqueles com uma visão mais estreita do mundo,
não passando de meros reprodutores, submissos ao sistema existente, e
que acabam contribuindo para a política neoliberal. Serão muitos?
UNIUBE 45

Dessa forma, a escola acaba reproduzindo a exclusão social, criando vítimas


do sistema capitalista excludente. Pois, sem o domínio dos conteúdos
científicos historicamente acumulados, de forma compreensiva, clara,
interdisciplinar e contextualizadas, o filho da classe operária torna-se um
indivíduo sem condições de concorrer a uma vaga no competitivo mercado
de trabalho. É, sem dúvidas, um candidato à exclusão social.

Diante do exposto, reafirmamos que a preocupação com a qualidade do


ensino não é recente e existem diferentes conceitos sobre a qualidade
de ensino.

E por que não conseguimos avançar? Por que diante de tanto


progresso e evolução da ciência ainda hoje falta qualidade no
ensino? E o que se entende por qualidade de ensino?

Recordamos que a escola tradicional de décadas atrás foi muito mais


seletiva, e os alunos que frequentavam a escola pública eram os filhos da
elite. Nesse prisma, o seu objetivo era formar líderes e também preparar
os jovens para o ingresso na universidade. Atualmente, a escola pública
democratizou suas vagas, trazendo os filhos da classe menos favorecida
para o seu interior. Entretanto, os objetivos do trabalho pedagógico
continuam muito parecidos com o da escola tradicional. Tais objetivos
restringem-se a preparar para o trabalho, para o ingresso na universidade
e para a aprovação nos exames, entre eles, o fadado vestibular. Por
isso, Paro (2007) denuncia a “falta de objetivos socialmente relevantes e
humanamente defensáveis a dirigir a ação escolar”, e a competência da
ação escolar fica restrita à sua capacidade de garantir a aprovação dos
alunos nos exames, é a cultura do mero treino para “tirarem boas notas”.

Nesse sentido, Lobrot (1992) afirma que a escola atual não nos desperta
para o desejo de conhecer, para a sede pela sabedoria. A nossa cultura
escolar faz com que as notas, as promoções em série, os diplomas e os
46 UNIUBE

certificados sejam valorizados no lugar do verdadeiro conhecimento. A


sede pelo saber nos conduziria à busca pelo conhecimento tendo-o como
valioso e inesgotável. A sabedoria, assim, seria o foco e a meta.

Ainda, nesse prisma, Lobrot (1992) afirma que a escola é monótona,


chata, sem cor e não dá prazer ao aluno. Além do mais é castradora e
repressiva. Cita como exemplo a ordem de que o aluno
(...) produza um fenómeno muito importante, e ver-se-
á que se produz, com uma frequência variável. O
aluno tem vontade de fazer outra coisa, quero dizer
algo que não o contato com essa fonte de informação
e obriga-se a fazê-lo. Chame-se A ao ato que ele
teria vontade de praticar, por exemplo, falar com os
colegas, brincar, sonhar, escrever uma carta pessoal,
realizar uma outra atividade escolar e, B, à atividade
escolar que é imposta, por exemplo, um exercício de
matemática. Para este preciso aluno, o facto de realizar-
se A não é, necessariamente em si, um ato penoso e
doloroso; eventualmente pode mesmo constituir uma
fonte de prazer. No entanto, torna-se penoso e doloroso
apenas porque impede a realização de uma outra
atividade, desejada e desejável. B torna-se uma fonte
de frustração. E apesar de ser recompensado, pelo
conjunto de vantagens que são oferecidas se ele for
efetuado, continua a ser extremamente penoso devido
à experiência verdadeiramente sentida que provoca
(p.47, 48).

Tal situação ilustra como a criança aprende a se afastar das atividades,


entregando-se a uma tarefa, numa experiência infeliz. Por isso, as
crianças desenvolvem as atividades sem prazer, por obrigação.

Para Saviani, a escola de qualidade vai garantir a aquisição dos


conteúdos vivos e atualizados aos alunos das classes menos favorecidas,
pois, a escola precisa mesmo ser de qualidade, uma vez que “(…)
o dominado não se liberta se ele não vier a dominar aquilo que os
dominantes dominam. Então, dominar o que os dominantes dominam é
condição de libertação.” (SAVIANI, 2005, p. 55). O autor destaca a ideia
UNIUBE 47

de que precisamos defender o “aprimoramento exatamente do ensino


destinado às camadas populares. Essa defesa implica na prioridade de
conteúdo.” (Ibid, p 55). Entretanto, valoriza o conteúdo que é da elite e
este deve ser de domínio do excluído, para sua libertação.

Nesse sentido, podemos então concluir que é preciso que haja um


conteúdo e um líder que imponha um saber e uma estratégia salvadora
àqueles que se encontram na opressão, este líder deve vir de fora. Pois,
se por um lado os oprimidos estão oprimidos porque não sabem, por
outro, poderão ser libertados e ascender socialmente, se vierem a deter
o conhecimento dos opressores. O conceito de qualidade concebido
dessa forma é preconceituoso e seletivo, uma vez que valoriza apenas
o conhecimento de uma determinada e privilegiada classe.

Voltamos ao pensamento de Rios (2003, p. 74) para afirmar que a


educação da melhor qualidade é a que “se coloca sempre à frente, como
algo a ser construído e buscado pelos sujeitos que a constroem” e Arroyo
(apud Rios, 2003, p. 74) acrescenta a ideia de qualidade sociocultural
que passa pela “construção de um espaço público, de reconhecimento de
diferenças, dos direitos iguais nas diferenças” e, contemporaneamente,
“renovação dos conteúdos críticos e da consciência crítica dos profissionais”,
pela “resistência a uma concepção mercantilizada e burocratizada do
conhecimento”, pelo “alargamento da função social e cultural da escola
e intervenção nas estruturas excludentes do velho e seletivo sistema
escolar”.

Mas, qual é a função social da escola?

Segundo Rios (2003, p. 91) “é tarefa da escola desenvolver capacidades


e habilidades e isso se realiza pela socialização dos conhecimentos,
dos múltiplos saberes”. Por isso, os conteúdos transmitidos, construídos
ou socializados na escola, têm de ter sentido para a construção do ser
humano, mais comprometida com o desenvolvimento humano.
48 UNIUBE

Para Lobrot (1992) o sucesso escolar é condicionado pela cultura da


família. Assim, “quando as crianças modernas aprendem a ler é porque
vivem num meio em que se dá importância à leitura” (p. 16). Assim,
o sucesso escolar é condicionado pela cultura de origem e que é
oficialmente rejeitada e constantemente desfigurada pelos processos
psicológicos escolares, considerando a forma em que está estruturada
a escola. A escola atual favorece o desenvolvimento e o aprendizado da
elite, que já possui toda uma estimulação e um modelo de cultura que
lhe é familiar.

Portanto, é importante que a escola pública tenha qualidade de ensino


adequado, que atenda às suas necessidades. Pois, talvez seja a única
chance das populações subalternas se desenvolverem no processo
de aprendizagem, tomar consciência de seus direitos e se libertarem
da ignorância e da opressão. Por isso, precisamos nos comprometer
com essa causa. Portanto, a escola pública precisa oferecer-lhes o
melhor ensino, pois o domínio do conhecimento conduz à autonomia e
representa um instrumento de libertação para os oprimidos.

Acreditamos que não podemos supervalorizar os conteúdos endossados


pela pequena elite burguesa e nem pressupor que a classe menos
favorecida precisa de um “salvador ” para libertá-la da opressão.

Nesse mesmo sentido, Rios (2003, p. 87) diz que “ A ética deve estar
presente na técnica, que não é neutra, e na política, que abriga uma
multiplicidade de poderes e interesses. A ética garante, então, o caráter
dialético da relação”. A ética é que problematiza e orienta o que é bom
ou mal e que define também o que é válido para o bem-comum.

Para a mesma autora, competência tem o sentido de saber fazer bem o


dever. Refere-se, então, a um conjunto de saberes e ao posicionamento
diante daquilo que é desejável e necessário. É preciso considerar,
nesse prisma, o saber, o fazer e o dever como elementos historicamente
situados e construídos pelos sujeitos em sua práxis.
UNIUBE 49

Em relato da sua experiência na Secretaria de Educação de São Paulo,


Paulo Freire afirmou que a escola, para ser prazerosa, deve ser atraente
e gostosa de ficar, evitando-se, assim, o desânimo, a falta de entusiasmo,
o descompromisso com a aprendizagem e, consequentemente, a evasão
e a repetência. Assim, as paredes, as portas, as carteiras escolares, tudo
deve ser bem cuidado, cheio de zelo e boniteza. Freire diz ainda que
“precisamos demonstrar que respeitamos as crianças, suas professoras,
sua escola, seus pais, sua comunidade, que respeitamos a coisa pública,
tratando-os com decência” (FREIRE, 2005, p.34). Não podemos falar de
princípio e valores se a escola estiver suja, invadida de água, de vento
frio, de sujeira, pois o “ ético está muito ligado ao estético” (Ibid).

Desse modo, a escola, para ser atraente, deve ser bonita, bem cuidada, com
professores bem preparados, valorizados e respeitados. É preciso explicitar
valoração e respeito aos sujeitos que frequentam a escola, tanto alunos,
quanto professores, quanto os pais dos alunos e os demais servidores. Para
manter o entusiasmo, o compromisso, o zelo e a dedicação, é preciso manter
o “cuidado” amoroso, o zelo e a boniteza interna e externa da escola enquanto
espaço físico e espaço de acolhimento e desenvolvimento das pessoas.

A educação de boa qualidade é uma prática exercida por profissionais


educadores comprometidos com o desenvolvimento, sob todas as
formas, da classe oprimida. Por isso, é uma “prática fundamentalmente
ética contra a exploração dos homens e mulheres e em favor de sua
vocação de ser mais”. (FREIRE, 2003, p. 42).

Diante do exposto, concluímos que a escola ainda não é de qualidade


para todos. Ela falha não só no atendimento aos educandos com NEE,
mas também no atendimento aos pobres, aos negros, aos nômades,
aos que aprendem de forma diferente; portanto, com aqueles que mais
necessitam dela.

A Figura 2 explica a evolução das teorias educacionais que orientam as


práticas educacionais na escola pública, bem como os desafios para a
conquista de uma escola de qualidade, portanto, mais inclusiva.
50 UNIUBE

Escola Pública
Normalização

Qualidade de ensino para


todos.

Mudanças de paradigmas
Integração

Inclusão educacional e social

Figura 2: Esquema da evolução das teorias educacionais que orientam o ensino público.

1.4 Inclusão: utopia ou perspectiva?

Retomando alguns conceitos, vimos que o princípio de integração escolar


é definido por Mantoan (2003, p. 22) como a alternativa de todos os
alunos terem “acesso às escolas por meio de um leque de possibilidades
educacionais, que vai da inserção às salas de aula do ensino regular
ao ensino em escolas especiais”. Nessa perspectiva, o aluno é que tem
que se adaptar à escola e esta em nada se modifica para atender às
diferenças individuais.

Por outro lado, Mantoan (2003, p. 24) compreende que a “inclusão


implica uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge
apenas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades de
aprender, mas todos os demais.” Nessa concepção, a escola tem que se
reestruturar para melhorar a qualidade de ensino e atender os alunos que
fracassam nas salas de aula, garantindo o desenvolvimento de todos.
UNIUBE 51

Nessa perspectiva, entre as diretrizes que norteiam nossa proposta da


inclusão, está presente a ideia da diversidade, pela qual as “escolas devem
acolher todas as crianças, independentemente de suas condições físicas,
intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras”. (BRASIL, 1987,
p.17-18). Vale ressaltar que essa diversidade deve ser compreendida como
uma riqueza que precisa ser bem atendida para que todos se desenvolvam.

A Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) afirma que para a


conquista da inclusão é preciso que os Sistemas Escolares “incluam
todo mundo e reconheçam as diferenças, promovam a aprendizagem
e atendam às necessidades de cada um”. Trata-se, sem dúvida, de
um documento importante, pois coloca para o sistema educacional o
desafio de se reestruturar para acolher todas as crianças, indistintamente,
independentemente de suas diferenças, dessa forma, atendendo-as
dentro das suas necessidades.

A Constituição Federal de 1988 (art.206, inciso


I) institui como um dos princípios do ensino a Pluralidade

igualdade de condições de acesso e permanência O que é plural e


apresenta grande
na escola. Além do mais, destaca a democracia, número, o geral,
multiplicidade,
na qual se estabelece a base para se viabilizar representa a
diversidade.
a igualdade de oportunidades, dando lugar à
expressão das diferenças e dos conflitos e, desse
modo, da convivência com a pluralidade.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9394/96) no Art.


59 garante que os sistemas de ensino “assegurarão aos educandos
com necessidades especiais currículos, métodos, técnicas, recursos
educativos e organização específica, para atender às suas necessidades.
Dessa forma, é garantido legalmente o atendimento especializado a
todos os educandos, de acordo com as suas necessidades.
52 UNIUBE

As políticas educacionais do MEC sobre a educação inclusiva trazem


a Resolução n° 2/2001, aprovada pela Câmara de Educação Básica
do Conselho Nacional de Educação, que coloca para os sistemas de
ensino o desafio de se organizar para incluir os alunos e atender às suas
necessidades educacionais especiais. Assim, no Brasil estabeleceu-se
em Lei o princípio de que a escolarização da criança com NEE deva
ocorrer preferencialmente em escolas regulares e com atendimento de
qualidade.

Reafirmamos que o princípio da Educação Inclusiva adotou a concepção


de que todas as pessoas têm direito à educação e, principalmente, à
educação de qualidade. E esse é também um princípio ético. Daí, as
pessoas com necessidades educacionais especiais, entre essas, as
que possuem alguma deficiência, terem direito à mesma educação de
qualidade, o que exige o atendimento de suas necessidades individuais.

A preservação da dignidade humana junto ao


Equidade
direito de constituir e reconhecer uma identidade
Relativo à
igualdade; retidão; própria conduz à ideia do respeito às diferenças e
imparcialidade
na concessão
no direito à igualdade, assegurando oportunidades
de benefícios e diferenciadas e, por certo, a equidade. “O princípio
atendimento aos
direitos; justiça. da equidade reconhece a diferença e a necessidade
de haver condições diferenciadas para o processo
educacional”. (BRASIL/MEC, 2001, p. 18).

Assim, viabilizar a inclusão escolar garantindo que todos os alunos,


independentemente da classe, raça, gênero, sexo, características
individuais ou necessidades educacionais especiais, possam aprender
juntos em uma escola de qualidade, é uma atitude humanitária e justa,
demonstrando uma prática alicerçada nos valores éticos de respeito à
diferença e ao compromisso com a promoção dos direitos humanos.
UNIUBE 53

Para tanto, exige-se o redimensionamento da prática pedagógica


aderindo a uma metodologia de caráter interdisciplinar, aberta, lúdica
e criativa. Tal proposta só pode ser viabilizada com sucesso dentro de
uma visão de trabalho que se orienta por meio de uma nova concepção
de educação que comunga com os novos paradigmas educacionais,
pautada pelos princípios da equidade na educação e da inclusão.

Contudo, ainda hoje, “deparamo-nos com uma sociedade preconceituosa,


que discrimina e exclui os diferentes. O padrão de normalidade é
difundido pela sociedade elitista, onde vence o melhor, o mais bonito,
o mais inteligente”. (DALBERIO, 2000, p.117). Portanto, a sociedade é
ainda preconceituosa e excludente.

Nesse sentido, os valores dos educadores, pais, alunos e sociedade


como um todo também deverão ser repensados. Toda forma de preconceito
deve ser superada, adotando-se uma atitude humanística e justa.

Acreditamos, ainda, que para a viabilização da inclusão educacional a escola


brasileira tem de ser redesenhada. Muitas adaptações e mudanças devem
acontecer marcando uma revolução que se concretiza na reestruturação do
espaço, do tempo e da prática pedagógica vivenciada na escola. Assim, a
escola inclusiva avançará, ao garantir que a homogeneização dê lugar à
individualização do ensino, na qual os objetivos, a sequência e ordenação
de conteúdos, o processo de avaliação e a organização do trabalho
escolar em tempos e espaços diversificados contemplem os diferentes
ritmos e habilidades dos alunos, favorecendo seu desenvolvimento e sua
aprendizagem. (RIBEIRO, 2003, p.49).

Ora, para a implementação da escola inclusiva, inicialmente, exige-se


a mudança de mentalidade e a construção de um novo paradigma
educacional. Deve-se avançar de uma sociedade preconceituosa para
uma sociedade humana e solidária com todos; de uma escola tradicional
e fechada a uma escola aberta e inovadora; de uma prática pedagógica
54 UNIUBE

homogeneizadora a ações voltadas para atender,


Homogeneizadora
com qualidade, toda a diversidade de alunos
Capaz de presentes no sistema educacional. É preciso
homogeneizar,
tornar homogêneo, entender que existem ritmos e tempos diferentes
igualar, tratar por
igual a todos, para aprender, como também diversas maneiras
uniformizar ações.
de ensinar.

Se por um lado, na escola tradicional os educadores avaliavam as crianças


dando enfoque às suas dificuldades e deficiências, portanto, fechando
suas perspectivas de desenvolvimento, por outro lado, na escola inclusiva
busca-se a construção dos novos paradigmas educacionais nos quais a
ênfase é valorizar a riqueza das diferenças humanas.

Diante de tudo que discutimos, você sabe o que é preciso fazer


para que a inclusão se efetive no cotidiano escolar?

Inicialmente, precisamos superar a ideia preconceituosa de que temos


que “tolerar” as pessoas com deficiência na escola comum, enturmando-
as por categorias e atribuindo a elas a responsabilidade pelo fracasso
e incapacidade de acompanhar o ensino comum. Em outro prisma, a
inclusão se efetivará dentro de um novo paradigma, “considerando cada
aluno o resultado da multiplicação infinita das manifestações da natureza
humana e, portanto, sem condições de ser encaixado em nenhuma
classificação artificialmente atribuída...” (MANTOAN, 2005, p. 28)

A formação dos professores deve merecer atenção especial, pois,


muitas vezes, a rejeição dos professores quanto à ideia de inclusão se
dá justamente por não se sentirem preparados para enfrentar o grande
desafio. Por isso, os professores precisam ser subsidiados com os
conhecimentos de como lidar com os alunos com deficiência e os demais.
Para ensinar a todos com qualidade é imprescindível que se esteja aberto
a aprender e a inovar sempre. Desse modo, o investimento na formação
permanente dos professores é fundamental para o processo de inclusão.
UNIUBE 55

O estudo de Carmo (2006) propõe a superação da escola seriada. Nesse


sentido ele argumenta que a escola seriada
Traz consigo uma contradição interna latente, isto é,
o mesmo discurso que reconhece as diferenças entre
os alunos, os insere em classes comuns, como se
fossem iguais. A ideia de classe, como local de iguais, é
também local de diferentes (CARMO, 2006, p. 63).

Dentro dessa perspectiva, as avaliações continuam


classificatórias e excludentes, pois os professores, Sine qua non

em nome da justiça social e igualdade entre os Sem a qual não é


possível, condição
homens, aplicam a mesma prova para todos os prévia, pré-requisito.
Uma pré-condição é
alunos e depois comparam seus desempenhos, um estado ou uma
propriedade que
sem levar em conta o desenvolvimento e a história devem ser atendidos
antes que qualquer
de vida de cada um. (CARMO, 2006, p. 63). outro estado ou
processo.

Desse modo, confirmamos a ideia de que o diálogo Interdisciplinaridade

com novos conhecimentos, a revisão dos currículos Qualidade do que


é interdisciplinar.
e da forma de avaliação, a prática pedagógica Interação e
diálogo entre as
na perspectiva da interdisciplinaridade e a diversas áreas do
reestruturação da organização escolar tornam-se conhecimento,
superação da
condição sine qua non para a mudança. fragmentação do
conhecimento.

Equânime
Reafirmamos que o avanço da inclusão educacional
Que tem
está entrelaçado com o avanço da inclusão social, equanimidade.
com uma distribuição de renda mais justa e Igualitária, igualdade.

equânime ou seja, com a construção do modelo de


uma sociedade menos excludente e mais igualitária.

Precisamos aprender a explorar e utilizar as políticas educacionais que nos


favorecem ações e atitudes para construir uma escola de maior qualidade,
portanto mais inclusiva. É preciso aproveitar as oportunidades para
56 UNIUBE

conscientizar a sociedade e buscar formas de


Driblar
driblar as intenções do capital, mobilizando
Em vários desportos, ações para a construção de uma sociedade,
conduzir a bola,
com fracos toques realmente, mais inclusiva, justa e democrática.
sucessivos, fintando
o adversário. No
presente texto, A discussão sobre a inclusão se faz necessária
significa ultrapassar,
assim, um porque ela ainda não é uma realidade, mas é,
adversário.
certamente, um desejo e se coloca como um
projeto.

É, ainda, uma utopia. Mas, pode ser uma utopia ou um sonho, que,
com a conscientização e o trabalho de toda a sociedade brasileira e,
principalmente, de nós educadores, poderá ser alcançado num futuro
bem próximo.

Então, a diversidade de educandos está presente no sistema escolar, o


que representa uma riqueza e a conquista relativa à democratização do
acesso à escola. As políticas educacionais relativas à inclusão investem
na melhoria da escola de maior qualidade. Precisamos, todos juntos,
trabalhar na perspectiva de se democratizar o acesso ao saber, para
todos.

Nesse prisma, estamos certos que a discussão sobre o respeito à


diversidade e à necessidade da busca de maior inclusão social e escolar
nos mobiliza à construção de uma sociedade mais humana. Assim,
Carmo (2006, p. 47) afirma que
Reconhecer a diversidade humana entre os indivíduos
e culturas é uma exigência dos princípios democráticos
e da equidade dos direitos humanos. A preocupação, a
responsabilidade, a civilidade, a tolerância e o respeito
com o outro são valores universais, que devem ser
promovidos e garantidos por toda a sociedade.
UNIUBE 57

1.5 Conclusão

Finalmente, concluímos a discussão sobre “A Diversidade, a Inclusão


e as Políticas Educacionais” à esteira de Gentili (1996), retomando a
sentença gramsciana, que aqui tem o sentido
Gramsciana
exato: o pessimismo da inteligência, otimismo da
vontade. Devemos usar o pessimismo de nossa Baseado em
Antônio Gramsci,
inteligência para compreender criticamente as teórico que viveu
entre 1891 e 1937,
políticas educacionais sobre a inclusão e como em Roma, Itália.

elas se materializam na prática, denunciando as


contradições das práticas excludentes com discursos inovadores. Porém,
não podemos abrir mão do nosso otimismo da vontade, o qual nos deve
manter esperançosos e ativos na luta contra o sistema de exclusão
social que enfraquece as bases de sustentação democrática no sistema
educacional e na sociedade como um todo. E, nesse sentido, restringe
“[...] o direito à educação como pré-requisito essencial para a conquista
da cidadania, uma cidadania completa que só pode ser efetivada numa
sociedade igualitária” (DALBERIO, 2009, p.64.), O esforço conjunto,
paciente, ativo e esperançoso de toda a sociedade, a mobilização e a
força dos educadores têm importância fundamental nessa missão.

PESQUISANDO NA WEB

Sugerimos que confira o site: http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Gramsci

Afirmamos que o alcance da Escola Inclusiva depende de um longo


processo que envolve muitas ações e mudanças, mas que pode ser
alcançado com a contribuição não só dos educadores, mas da sociedade
como um todo. Você também tem a sua parte e muito pode contribuir.
Vamos lá!...
58 UNIUBE

Referências

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org/wiki/Comenius>. Acesso em 29: dez. 2009.
Capítulo
Necessidades educacionais
especiais: O que são? Por
2
quê? Como trabalhar?

Denise Rodovalho Scussel

Introdução
É muito condizente, sobretudo em nossa profissão, o convite de
Lacerda (2001, p. 143) “Uma iluminação indireta pode revelar
detalhes que até à resplandecente luz do sol escaparam. Portanto:
olhe sempre de outros jeitos. “O profissional docente é o sujeito da
educação que sempre deve procurar diferentes formas e diferentes
focos de compreender e surpreender aqueles com os quais se
relaciona e interage em seu contexto de vida.

Após os estudos realizados referentes ao projeto político-


pedagógico, às relações que o homem estabelece ao aprender
e às diferentes teorias que defendem as formas diversas de
condução da aprendizagem, é chegada a hora de conversarmos
a respeito das necessidades especiais que surgem na escola e,
mais intimamente, na sala de aula. Então, vamos aprofundar nosso
conhecimento em relação à aprendizagem humana. Acredito que
possivelmente esse assunto já tenha lhe causado interesse e até
mesmo sido estudado em sua sala de aula, caso já trabalhe na área.

Neste capítulo, iremos abordar o caminho histórico das dificuldades


de aprendizagem; explicar as terminologias utilizadas para a
descrição de casos de dificuldade de aprendizagem, distúrbios
64 UNIUBE

e deficiências, bem como a diferenciação entre eles; analisar as


práticas que os educadores estão utilizando em seus contextos
escolares e refletir sobre aquelas que são mais convenientes entre
os diferentes casos.

Este estudo vem ao encontro das necessidades do profissional


docente e gestor que está na escola, esforçando-se para fazer
o melhor dentro das possibilidades e entraves que encontra. O
estudo também tem como finalidade chamar o educador para
desenvolver um trabalho de observador e investigador constante,
pois somente com essa análise investigativa, fundamentada na
teoria e em uma prática reflexiva, é que teremos o avanço não só
do aluno com necessidades especiais, mas de todos os alunos.

Objetivos
Neste capítulo, estudaremos as necessidades educacionais especiais
inerentes aos seres humanos. Após o estudo deste capítulo,
esperamos que você seja capaz de:

• compreender o estudo histórico das necessidades educacionais


especiais e os desdobramentos ocorridos de acordo com
cada época;
• diferenciar as terminologias utilizadas para a descrição
de casos de dificuldade de aprendizagem, distúrbios e
deficiências;
• compreender as práticas pedagógicas utilizadas nos contextos
escolares e refletir sobre aquelas que são mais convenientes
entre os diferentes casos;
• identificar as diferentes necessidades educacionais especiais
das crianças e dos jovens, considerando-os o eixo central
para a atuação pedagógica.
UNIUBE 65

Esquema
2.1 Compreendendo a história das necessidades educacionais
especiais
2.2 Conceituação e descrição de dificuldade de aprendizagem,
distúrbio e deficiência
2.3 Causas
2.4 Propostas pedagógicas
2.5 Conclusão

2.1 Compreendendo a história das necessidades educacionais


especiais

O início dos estudos das necessidades educacionais especiais partiu


do conceito que os estudiosos tinham de criança com lesão cerebral.
Somente a partir de 1963 é que os termos relacionados às necessidades
educacionais especiais ganham outras configurações e são oficializados.
Para melhor compreensão do assunto, Cruz (1999) organizou os
momentos históricos em quatro fases.

2.1.1 Fase da fundação (1800-1930)

A medicina, em especial a neurologia, que primeiro se interessou pelo


tema e pela observação de pacientes com algum tipo de lesão cerebral,
observou que, de acordo com a especificação e localização cerebral das
funções tais como a linguagem, memória, personalidade e inteligência,
as reações dos pacientes eram totalmente diferentes.

Em 1860, Pierre Broca descobre que o lado esquerdo do cérebro funciona


de modo diferente do lado direito, e as desordens da fala e da linguagem
expressiva devem-se a danos ou lesões em uma área específica do
cérebro. Outro fato a ressaltar foi o de 1908, em que Carl Wernicke,
em pesquisa, assinala que a área temporal esquerda é responsável
66 UNIUBE

pela compreensão verbal, tanto na compreensão


Girus angular
do hemisfério
como na associação de sons e da linguagem escrita.
esquerdo Em 1917, com estudos de James Hinshelwood, foi
Atua como conexão detectada a localização distinta para a memória
entre as regiões
auditivas e visuais, visual de tipo cotidiano, para memória visual
centro básico da de letras e para memória visual de palavras,
conversão do
estímulo visual- localizando-se estas últimas no girus angular do
grafema em
unidades auditivas hemisfério esquerdo.
equivalentes –
fonemas – ou seja,
o processo básico Samuel Orton, em 1928, relata que todos os
da leitura.
Fonte: Fonseca indivíduos têm um hemisfério cerebral dominante
(1995, p. 39).
e que o hemisfério dominante nos destros é o
esquerdo e, nos canhotos, o hemisfério cerebral
dominante é o direito.

Pode-se dizer que a história das pessoas com necessidades educacionais


especiais encontra suas heranças nos estudos neuropsicológicos de
adultos que perderam a habilidade para falar, ler, escrever ou calcular
depois de sofrerem uma lesão cerebral. Tais investigações e teorias
foram, posteriormente, alargadas às crianças que apresentavam um
desenvolvimento aquém do esperado das habilidades acadêmicas em
específico.

Essa fase da história foi muito importante para a ciência relacionada ao


desenvolvimento das capacidades e habilidades do homem, porém foi
também um período de estudos restrito ao grupo de teóricos e estudiosos
das ciências relacionadas à saúde.

2.1.2 Fase de transição (1930-1936)

Psicólogos e educadores começam a desenvolver instrumentos e


programas úteis para o diagnóstico e a recuperação de distúrbios
manifestados pelas crianças, no processo de aprendizagem. Podemos
dizer que algumas pessoas foram muito importantes para o estudo das
necessidades educacionais especiais nessa época, entre elas, citamos:
UNIUBE 67

• Werner (filósofo alemão);


• Strauss (antropólogo, filósofo e professor, considerado fundador da
antropologia);
• Marianne Frostig (realizou estudos voltados para o desenvolvimento
perceptivo e motor);
• Maslow (psicólogo americano);
• Lefèvre (neurologista que se dedicou aos testes e programas
psicomotores);
• Myklebust (estudioso dos distúrbios de aprendizagem, ligados ao
desenvolvimento psicomotor) e outros.

Verificou-se que a maioria dos estudiosos destacados já não procedia


do campo da neurologia, passando a ter origem no campo da psicologia
e da educação, o que justifica a proliferação de produção de testes e
programas de recuperação, verificados nesta época. Também, nesta
fase, as necessidades educacionais especiais ganham outra visão, além
da visão neurológica, constata-se a inferência da questão educacional,
pois, na realidade, os investigadores observavam uma variedade de
problemas presentes em crianças de inteligência normal, que pareciam
intervir na aprendizagem.

SAIBA MAIS

Essa fase foi muito importante para nós, educadores. Nessa época, o
espaço para educação começa a ganhar força!

2.1.3 Fase de integração (1963-1980)

Samuel Kirk, em 1965 (apud FONSECA, 1995), populariza o termo


dificuldade de aprendizagem (learning disability), com isso, surgem
métodos de avaliação e diagnóstico, bem como programas de intervenção
específica.
68 UNIUBE

A partir do momento em que surge, oficialmente, o campo da dificuldade


de aprendizagem e que ele se concretiza em sua área de atividade
própria, surgem interesses pelos possíveis problemas que podem surgir
no processo ensino-aprendizagem. Esse interesse foi manifestado em
diferentes formas por meio de publicações, programas universitários para
a formação de especialistas, associações de profissionais e disposições
legais para dotar, economicamente, serviços adequados que atendam
as crianças com dificuldades de aprendizagem a fim de que adquiram
habilidades escolares.

Mesmo que a educação tenha conseguido um espaço para discussão


e participação desse estudo, ele foi muito pequeno e restrito, pois se
acreditava que os professores não estavam aptos a discutir e a colaborar
com esse processo tão elaborado que é a construção do conhecimento
humano.

2.1.4 Fase contemporânea (1980-atualidade)

Alargam-se tendências para o diagnóstico e para a intervenção. Há


grande avanço nos trabalhos interdisciplinares entre os profissionais.
Nesse período, é possível estabelecer três quadros conceituais
relacionados às dificuldades de aprendizagem:

• Inicialmente, tem-se uma visão comportamental, nesse caso as


dificuldades de aprendizagens são explicadas por ações observáveis
entre respostas dadas em situações específicas de aprendizagem e
os estímulos recebidos. Nessa perspectiva, a aprendizagem é vista
somente como sendo a relação entre o estímulo fornecido e uma
resposta ou recompensa, de alguma forma, é providenciada pelo
indivíduo, ou entre esta resposta e um reforço.
• Outra visão é a inatista, que dá ênfase ao aspecto cognitivo
da criança. Nessa perspectiva, as pessoas com dificuldades de
aprendizagem necessitam de um controle, de um programa ou
UNIUBE 69

plano de ação; as crianças com dificuldades de aprendizagem são


aquelas que apresentam alterações nas capacidades de retenção
da informação na memória de trabalho, na seleção de informação
e/ou retêm pouca informação na memória de longo prazo.
• E, finalmente, a perspectiva neuropsicológica, que procura relacionar
o conhecimento neurológico relacionado à bagagem do indivíduo
dentro da neurociência com os aspectos psicológicos e os aspectos
educacionais. Essa abordagem acredita que a aprendizagem é
um comportamento complexo mediatizado por questões físicas,
emocionais, ambientais e pedagógicas.

É possível que você ainda esteja confuso(a) em relação ao que vem a


ser realmente uma dificuldade de aprendizagem e se as necessidades
educacionais especiais estão relacionadas ou não com as dificuldades
de aprendizagem, bem como com as deficiências.

Vamos tentar conversar mais um pouco sobre isso e esclarecer o que


são essas terminologias e também o alcance delas na escola e na
aprendizagem. 

SAIBA MAIS

Visão comportamental: é o conjunto das teorias psicológicas (entre


elas, a análise do comportamento, a psicologia objetiva) que postulam o
comportamento como o mais adequado objeto de estudo da psicologia.
O comportamento geralmente é definido por meio das unidades analíticas
de respostas e estímulos. Historicamente, a observação e a descrição do
comportamento fizeram oposição ao uso do método de introspecção.

Fonte: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Behaviorismo>. Acesso


em: 9 abr. 2012.
70 UNIUBE

Visão inatista: a visão inatista defende que os seres humanos nascem


programados biologicamente para falar, assim como os pássaros para voar.
Fonte: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_inatista>. Acesso em: 9 abr. 2012.

Memória de trabalho: entende-se memória de trabalho ou memória de


curto prazo como um componente cognitivo ligado à memória, que permite o
armazenamento temporário de informação com capacidade limitada.
Fonte: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mem%C3%B3ria_de_trabalho>.
Acesso em: 9 abr. 2012.

2.2 Conceituação e descrição de dificuldade de aprendizagem,


distúrbio e deficiência

A grande finalidade desse tópico no estudo das necessidades educacionais


especiais vem ao encontro do documento do MEC (BRASIL, 2003, p.
18), elaborado para a Educação Infantil. Esse documento refere-se
à funcionalidade e à capacidade de uma pessoa. Essa funcionalidade
é concebida como uma interação dinâmica entre os estados de saúde
(doenças, distúrbios, lesões e traumas), que podem trazer limitações no
desenvolvimento, e os fatores contextuais. Logo, antes de antecipar a
realização de um diagnóstico precoce e, por isso mesmo indevido, todos os
aspectos do desenvolvimento, bem como o meio cultural que esse sujeito
está inserido, devem ser considerados e analisados profundamente.

2.2.1 Conceituação

É sempre bom compreendermos a conceitualização e as diferenças entre


os termos dificuldade de aprendizagem, distúrbio e deficiência, pois ao
conhecê-los com maior propriedade melhor será nossa posição e nossa
intervenção frente a eles.
UNIUBE 71

2.2.1.1 Dificuldade de aprendizagem

A dificuldade de aprendizagem constitui uma inadequação de rendimento


acadêmico, não explicável pelo déficit cognitivo, pelo prejuízo sensorial
e físico ou pelo desajustamento emocional.

As causas das dificuldades de aprendizagem são diversas e podem


ser relativas à capacidade básica para aprender, às técnicas de ensino,
aos recursos físicos, humanos ou didáticos, às estratégias de ensino, à
avaliação e, por último, a um meio social e escolar pouco estimulante.

As crianças com queixas de dificuldades de aprendizagem apresentam


as seguintes características:

• problemas de atenção;
• problemas emocionais decorrentes do fracasso acadêmico;
• problemas de memória;
• dificuldades psicolinguísticas;
• dificuldades ou atrasos motores;
• dificuldades significativas na aquisição, compreensão e utilização
auditiva;
• dificuldades de linguagem oral, leitura, escrita e raciocínio lógico-
matemático;
• inadequação didático-metodológica do processo ensino-aprendizagem.

2.2.1.2 Distúrbio de aprendizagem

O distúrbio de aprendizagem está relacionado a quadros de alterações


neurológicas, descartando causas que provocam deficiências ou
dificuldades. Referem-se às pessoas que possuem problemas significativos de
aquisição e uso das capacidades de compreensão e expressão linguísticas
e das operações lógico-matemáticas. Manifesta-se costumeiramente
em uma ou poucas habilidades, sendo possível a criança ser ótima em
matemática e não conseguir ler e escrever satisfatoriamente.
72 UNIUBE

As causas advêm de disfunções cerebrais tanto de origem genética como


adquirida. As crianças apresentam comportamento “anormal” em relação
à aprendizagem e apresentam um cérebro anatomicamente “normal”.
As características dos distúrbios de aprendizagem comumente não
manifestam irregularidades em exames médicos.

As crianças com queixas de distúrbios de aprendizagem podem apresentar:

• distúrbio de leitura e escrita – dislexia;


• distúrbio na articulação da fala – dislalia;
• distúrbio na grafia – disgrafia;
• distúrbio na organização das palavras – disortografia;
• distúrbio na organização e no trabalho com números – discalculia.

2.2.1.3 Deficiência de aprendizagem

A deficiência de aprendizagem diz respeito a uma incapacidade intelectual


acentuada. Nesse grupo, geralmente estão crianças com déficits
cognitivos. Há, nesse grupo, um comprometimento geral nos aspectos:
motor, cognitivo e social. A aprendizagem está sempre atrasada em
comparação à dos alunos ditos normais.

Para que a criança seja considerada deficiente intelectual, é necessário


que sua conduta esteja aliada a duas ou mais dificuldades adaptativas
que correspondem à/ao:

• comunicação;
• autocuidado;
• vida familiar;
• vida social;
• autonomia;
• saúde e segurança;
• funcionalidade acadêmica;
• lazer;
• trabalho.
UNIUBE 73

É preciso que você compreenda a necessidade


Equipe
do educador em se aprofundar nos estudos de multiprofissional
cada característica para, então, poder auxiliar o É uma equipe
composta por
aluno, bem como a família dele. Não podemos diferentes
rotular nossos alunos com base em suspeitas profissionais.
Aqui, nesse caso,
e observações infundadas. As suspeitas e enfatizam-se os
profissionais da
observações são de grande importância desde saúde e educação.

que fundamentadas teoricamente e analisadas


por uma equipe multiprofissional.

2.2.2 Descrição

Dentro desse tópico, abordaremos as características e as causas


das dificuldades de aprendizagem, dos distúrbios e das deficiências.
Acreditamos ser de grande importância esse conhecimento, pois ele
poderá favorecer-lhe subsídios mais precisos para as suas observações
e atuações nas práticas pedagógicas.

2.2.2.1 Dificuldades de aprendizagem

As dificuldades de aprendizagens se manifestam de maneira tão sutil que


muitas vezes as crianças que apresentam essa característica passam
despercebidas no contexto de sala de aula e, consequentemente, não
recebem o devido cuidado.

CURIOSIDADE

Muitas crianças com dificuldades de aprendizagem têm a inteligência


superior, considerando a média. E em geral são boas e se mostram capazes
em algumas áreas e em outras apresentam muitas dificuldades!
74 UNIUBE

Como no exemplo de Smith e Strick (2001, p. 15) em que questiona:


Como uma criança pode saber tudo o que é possível
saber sobre dinossauros aos quatro anos, mas ainda
ser incapaz de aprender o alfabeto? Como um aluno
que lê aos três anos à frente do nível de sua série
entrega um trabalho por escrito completamente
incompreensível? Como uma criança pode ler um
parágrafo em voz alta impecavelmente e não recordar
seu conteúdo cinco minutos depois? Não admira que
os estudantes sejam acusados frequentemente de
desatentos, não cooperativos ou desmotivados.

Essa discrepância entre o que esperamos que a criança devesse fazer e


o que ela realmente faz com suas limitações é a marca das dificuldades
de aprendizagem. Como diz Smith e Strick (2001, p. 1), o que essas
crianças têm em comum é o baixo desempenho inesperado. Diversos
autores acreditam que algumas dificuldades de aprendizagem estão
ligadas a problemas neurológicos, o que não deixa de ser verdadeiro,
porém já foi percebido, por diferentes estudiosos, que os problemas mais
comuns que afetam essas crianças podem ou não estar relacionados com
disfunções neurológicas. Tais problemas estão relacionados à percepção
visual, ao processamento da linguagem, às habilidades motoras finas e à
capacidade para focar atenção. É importante ressaltar que Smith e Strick
(2001) observaram em crianças e jovens que apresentam dificuldades
de aprendizagem:

• fraco alcance de atenção: a criança se distrai com facilidade e não


consegue focar a atenção em apenas uma situação ou objeto;
• dificuldade para seguir instruções: as instruções não são
bem compreendidas ou assimiladas, então a criança pergunta
repetitivamente os comandos que lhe são fornecidos;
• imaturidade social: a criança age com se fosse mais nova do que
sua idade cronológica e prefere a companhia das crianças menores;
• dificuldade com a conversação: dificuldade em encontrar as
palavras certas para se expressar e, às vezes, apresentam gagueira
temporária até encontrarem a palavra que querem falar;
UNIUBE 75

• inflexibilidade: teimosia em continuar fazendo aquilo que já testou


e que não deu certo; também nega apoio e auxílio;
• fraco planejamento e habilidades organizacionais: não consegue
estabelecer um cronograma de tempo e organização para a
realização das suas atividades;
• distração: perdem com frequência seus objetos, roupas, esquecem-
se de compromissos referentes à realização de tarefas;
• falta de destreza: desajeitadas, deixam cair tudo, esbarram nas
pessoas e objetos e geralmente têm a caligrafia muito ruim;
• falta de controle dos impulsos: dificuldade de esperar sua vez
nos momentos de falar e agir. Interrompe com frequência a fala das
pessoas.

É possível afirmar que muitas crianças que apresentam dificuldades


de aprendizagem sofrem muito com esse comportamento e essas
manifestações. Por falta de informação e
conhecimento, são mal compreendidas pela escola Anatômica
e pela família. Contudo, acreditam, realmente, que Adj. 1 relativo ou
são incapazes e isso as leva a acreditar em rótulos pertencente à
anatomia, ex: traços
desrespeitosos (“desastrada”, “cabeça vazia”, a. [...] 2 corporal,
físico lesão ex:
“tartaruga”), que, muitas vezes, as pessoas dão a a.[...].
Fonte: Houaiss e
elas. Com autoestima baixa e incompreendidas, Villar (2009, p. 127).
muitas procuram os caminhos da dependência Fisiológica
química e o mundo do crime.
Relativo à Fisiologia
─ s.f. [...] estudo
das funções e do
2.2.2.2 Distúrbios de aprendizagem funcionamento
normal dos seres
vivos, esp. dos
Para você compreender melhor, ressaltamos processos físico-
químicos que
que os distúrbios estão intimamente ligados ocorrem nas
células, tecidos,
às disfunções neurológicas. Essas disfunções órgãos e sistemas
dos seres vivos
podem ser de ordem anatômica ou de ordem sadios, biofisiologia.
fisiológica. Os distúrbios estão relacionados com [...].
Fonte: Houaiss e
as dificuldades acentuadas de aprendizagem, Villar (2009, p. 900).
76 UNIUBE

dificuldades relacionadas às habilidades acadêmicas básicas de leitura,


escrita, ortografia, aritmética e linguagem (compreensão e expressão).
É importante excluir as causas relacionadas aos déficits (deficiências)
sensoriais, deficiência motora, desvantagem ambiental e distúrbios
emocionais e/ou psiquiátricos.

O parceiro ideal para auxiliar no diagnóstico dos distúrbios é uma equipe


multiprofissional como: médico, pediatra ou neurologista, psicólogo,
fonoaudiólogo, psicopedagogo e professores. Em relação à parte
pedagógica, a avaliação deve estar voltada para as questões pedagógicas
do ato de aprender, o olhar deve estar voltado para as questões que
revelem distorções na aprendizagem acadêmica e a prioridade delas na
vida da criança. A equipe dirigente, bem como a equipe pedagógica da
escola, deve valer-se da observação de atividades espontâneas, jogos,
brincadeiras, desenhos, assim como a produção escolar, para diagnosticar
a dificuldade acentuada de aprendizagem da criança. A conclusão
encontrada pelas equipes da escola deve ser confrontada com os outros
especialistas, como mencionamos anteriormente.

Vamos agora conhecer os distúrbios mais comuns perceptíveis dentro


da escola, os quais, muitas vezes, têm nos atormentado, deixando-nos
totalmente inertes frente às dificuldades e aos entraves apresentados por
eles.

Dislexia

A dislexia é um dos muitos distúrbios de aprendizagem. É um distúrbio


específico da linguagem de ordem constitucional, caracterizado pela
dificuldade de decodificar palavras simples, além de ser uma insuficiência
no processo fonológico. Garcia (1988) deixa claro que a dislexia vem de
uma dificuldade acentuada de processar a informação procedente da
linguagem escrita.
UNIUBE 77

Tais dificuldades, devido à complexidade dos sistemas funcionais


integrados, podem dar lugar a distintos sintomas relativos à leitura, à
escrita, tanto em nível gráfico como ortográfico. Geralmente a dislexia é
hereditária, ou, às vezes, adquirida, afetando a aprendizagem da leitura,
da escrita, da ortografia, da gramática e da redação. Assim, a criança
disléxica apresenta várias formas de dificuldades e, frequentemente,
problemas de leitura, na aquisição e na capacidade de escrever e
soletrar. Para efeito de melhor compreensão e intervenção, Condemarin
(1986) classifica e ressalta as manifestações mais comuns das dislexias
da seguinte forma:

a) Tipos de dislexia:

• Acústica: manifesta-se na insuficiência da diferenciação acústica


dos fonemas e na análise e síntese destes.
• Visual: imprecisão de coordenação visuoespacial, manifestando-se
na confusão de letras com semelhantes grafias.
• Motriz: evidencia-se em dificuldade na movimentação ocular.

b) Manifestações mais comuns:

• Inversão de palavras.
• Dificuldades para ler.
• Cópia de forma errada.
• Confusão de letras que têm o som parecido.
• Alteração na sequência das letras.
• Confusão de palavras parecidas.
• Erros na separação de palavras.
• Dificuldade no traçado das letras.
• Falhas na construção gramatical.
78 UNIUBE

Dislalia

A dislalia é o transtorno na articulação dos fonemas, por alterações


funcionais dos órgãos da fala. As dificuldades dessas crianças começam
com a palavra falada e, tipicamente, interferem na leitura e/ou na
escrita quando a criança ingressa na escola. A família tem consciência
dessa dificuldade antes mesmo que a criança inicie o processo de
escolarização. Os estudos de Morais (1986) classificam as dislalias:

a) Tipos de dislalia:

• Fisiológica: é a dislalia que se apresenta na criança durante o


desenvolvimento da fala e tende a desaparecer antes de chegar à
idade escolar.
• Funcional: caracteriza-se pela omissão, substituição ou deformação
de fonemas.
• Audiógena: é a dificuldade na articulação dos fonemas, que tem
como causa um déficit de audição.
• Orgânica: caracteriza-se por transtornos na articulação de fonemas,
causados por alteração anátomo-funcional nos órgãos da fala.

Segundo Smith e Strick (2001), as crianças que apresentam dislalia


geralmente apresentam:

b) Manifestações mais comuns:

• Atraso para aprender a falar.


• Dificuldade de modular o tom de voz (fala monótona ou muito alta).
• Problemas em citar nomes de objetos e de pessoas.
• Má pronúncia das palavras.
• Trocas, inversões, omissões de fonemas na linguagem oral e/ou escrita.
• Fala lenta ou com interrupções.
• Confunde palavras com sons similares.
UNIUBE 79

• Demonstra pouco interesse por livros e histórias.


• Com frequência, não compreende ou não recorda instruções.
• Dificuldade para analisar sons.

Disgrafia

A disgrafia é uma deficiência na qualidade do traçado gráfico. As crianças


ou jovens com esse tipo de problema motor não conseguem controlar
plenamente os grupos de pequenos músculos das mãos. Segundo Smith
e Strick (2001), esse distúrbio não tem impacto sobre a capacidade
intelectual, mas interfere no desempenho escolar, porque prejudica a
capacidade de o aluno comunicar-se pela escrita.

a) Segundo Ellis (1985), crianças que possuem disgrafia podem


apresentar:

• Má organização da página: está intimamente ligada à orientação


espacial. A escrita caracteriza-se pela apresentação desordenada
do texto com margens malfeitas ou inexistentes.
• Má organização das letras: caracteriza-se pela incapacidade a
criança em submeter-se às regras, às caligrafias, às hastes das letras
deformadas, aos contornos das letras enroscados, às irregularidades
em suas dimensões.
• Erros de formas e proporções: referem-se ao grau de clareza do
traçado das letras, das dimensões e do grau de organização das
formas de escrita muito alongada ou comprida.

b) Outras manifestações:

• Parecem desajeitados e atrapalhados.


• Apresentam dificuldades para manipular pequenos objetos, como
peça de quebra-cabeça ou blocos.
• Apresentam problemas com abotoamentos (botões, zíper, laços e
amarrar os cadarços).
80 UNIUBE

• Apresentam dificuldade para colorir, não conseguem manter a cor


dentro dos contornos do desenho.
• Dificuldade para o uso da tesoura.
• Desajeitados para segurar o lápis (podem segurar com muita força
ou frouxo demais).
• Atrasos para escrever letras e os números são malformados.
• Podem ter atraso na aprendizagem da fala ou ter problemas de
articulação.
• Erros de cálculos são comuns, devido a numerais ilegíveis, amontoados
e pouco alinhados.

Disortografia

A disortografia é a impossibilidade de visualizar a forma correta da escrita


das palavras. A criança escreve seguindo os sons da fala e sua escrita,
por vezes, torna-se incompreensível. É caracterizada pela dificuldade de
orientação no tempo e no espaço. A criança apresenta também falhas
de coordenação motora.

Segundo Condemarin (1986), os sinais que as crianças ou jovens podem


apresentar:

• Trocas de grafemas.
• Problemas de ligações lógicas e ideias.
• Problemas de concordância.
• Omissões de palavras/letras.
• Acréscimos indevidos de letras.
• Alterações na sequência de letras ou sons (prola – porta).
• Substituições de letras.

Segundo Guerra (2002), os erros mais comuns são:

• Erros fonéticos: semelhança visual da ortografia.


UNIUBE 81

• Erros visuais.
• Erros de substituição de letras.
• Erros de inserção ou acréscimo e de omissão.
• Erros sequenciais.

De acordo com Smith e Strick (2001), as crianças que apresentam essa


dificuldade acentuada da percepção visual têm problemas em entender
o que veem. O problema não é de visão, mas sim relacionado ao modo
como seus cérebros processam as informações visuais. Ainda ressaltam
que essas crianças podem ter problemas relacionados ao entendimento
de espectro de símbolos, números, diagramas, mapas, gráficos e tabelas.

Discalculia

A discalculia é um distúrbio de ordem neurológica com causas diversas


que envolvem as questões orgânicas e psiconeurológicas. Caracteriza-
-se pela dificuldade ou incapacidade para reconhecer e codificar sinais/
números, aspectos geométricos dos objetos e total inabilidade para
quaisquer cálculos matemáticos.

É sempre bom ressaltar que é necessário estar bem atento(a) às


características, conhecer bem o aluno e estar em comum acordo com o
diagnóstico da equipe multiprofissional, para que se possa distinguir o
distúrbio das falhas metodológicas do ensino.
As dificuldades específicas da aprendizagem da matemática, segundo
Guerra (2002), envolvem problemas na/no:

• Compreensão matemática: a criança com essa dificuldade poderá


escrever o numeral e não compreender o quanto este vale.
• Funções operacionais: dificuldades em somar, subtrair, multiplicar
ou dividir.
• Processo de seleção: dificuldade em selecionar a operação
apropriada para resolver o problema.
82 UNIUBE

• Memória sequencial: dificuldade de lembrar a ordem das operações


para resolver problemas.
• Organização sequencial: dificuldade em estabelecer ordem
numérica.
• Expressão matemática verbal: dificuldade em expressar termos e
conceitos matemáticos.
• Simbolização abstrata: dificuldade em entender a representação
dos números por símbolos (álgebra).
• Associação visual: dificuldade de identificar um número com
símbolo escrito (leitura dos numerais).
• Agrupamento: dificuldade de discernir ou identificar grupos ou
objetos.
• Manipulação matemática concreta: dificuldade em julgar o
tamanho e o número de objetos reais.
• Conservação de quantidades: dificuldade em entender que a
quantidade não altera com a forma.
• Estabelecimento da relação “um a um”: dificuldade de lidar com
proporções matemáticas constantes.
• Representação gráfica dos números: dificuldade em lembrar
como escrever números.
• Interpretação de sinais: dificuldade na leitura e na compreensão
dos símbolos aritméticos como “+” e “ –”, por exemplo.

2.2.2.3 Deficiências

As deficiências são consideradas necessidades educacionais


permanentes. A expressão pessoa com deficiência pode ser aplicada
ao nos referirmos a qualquer pessoa que possua dificuldades acentuadas
no comportamento, dificuldades acentuadas de comunicação e
sinalização – deficiência física; dificuldades de comunicação e sinalização
– surdocegueira; dificuldade acentuada na comunicação e audição –
surdez; dificuldade acentuada da percepção visual – deficiência visual;
altas habilidades e superdotação.
UNIUBE 83

Colocamos, de modo geral, todas as deficiências, mas iremos aprofundar


nossa conversa na deficiência mental. As sensórias (visual, auditiva),
física e altas habilidades são conteúdos de outros capítulos.

Para que a deficiência intelectual seja diagnosticada como deficiência


ou mais comumente como déficit cognitivo, é necessária a observação e
um estudo comparativo, levando em consideração as diferentes reações
e manifestações do indivíduo diante das dificuldades, entraves e mesmo
frente às situações que a vida cotidiana nos impõe.

Segundo documento do MEC, Carvalho (1997), que faz parte do


programa de capacitação de recursos humanos do Ensino Fundamental,
que descreve o trabalho com os recursos humanos que irão atuar com
as pessoas com deficiência intelectual, deixa claro que, para uma pessoa
ser identificada como deficiente, é necessário que, no mínimo, duas
áreas de habilidades adaptativas estejam defasadas.

Vejamos, a seguir, as áreas adaptativas descritas na conceituação.


Iremos detalhar cada uma delas.

• Comunicação: diz respeito às habilidades para compreender e


expressar informações por meio de palavras, faladas ou escritas, e
ainda para compreender as emoções e as mensagens das outras
pessoas.
• Autocuidado: refere-se às habilidades que asseguram a higiene
pessoal, a alimentação, o vestuário, o uso do sanitário etc.
• Vida familiar: refere-se às habilidades necessárias para uma
adequada funcionalidade no lar, no cuidado com os pertences,
com o ambiente doméstico, os cuidados com os bens da família, a
participação nos trabalhos domésticos, no convívio e nas relações
familiares.
• Vida social: diz respeito às trocas na comunidade, ao respeito e às
relações com vizinhos, colegas, amigos e membros da comunidade,
compartilhar e cooperar, respeitar limites e normas, fazer escolhas,
controlar impulsos, resistir às frustrações.
84 UNIUBE

• Autonomia: refere-se às habilidades para fazer escolhas, tomar


iniciativas, cumprir planejamento, atender aos próprios interesses,
cumprir tarefas, pedir ajuda, resolver problemas, defender-se,
explicar-se, buscar ajuda quando necessário etc.
• Saúde e segurança: diz respeito às habilidades para cuidar da
saúde, cuidar da segurança, evitar perigos, seguir leis de trânsito e
outras que visem ao bem-estar.
• Funcionalidade acadêmica: refere-se às habilidades relacionadas à
aprendizagem dos conteúdos curriculares propostos na escola, como:
ler, escrever, calcular, obter conhecimentos científicos e sociais.
• Lazer: diz respeito ao interesse de participar de atividades de
entretenimento individual ou coletivo, de acordo com a idade e com
o ambiente cultural e comunitário.
• Trabalho: refere-se às habilidades para realizar um trabalho
em tempo parcial ou total, comportando-se apropriadamente,
cooperando, compartilhando, concluindo as tarefas, tomando iniciativas,
administrando bem o salário, aceitando a hierarquia e as próprias
limitações e dos demais, realizando atividades independentes etc.

A descrição que colocamos foi exposta de modo geral, mas para


compreendermos melhor sobre cada item colocado é preciso que não
nos esqueçamos de enfatizar que é de grande responsabilidade e
perigoso um diagnóstico unilateral.

É preciso realmente o estudo, as observações e avaliações específicas de


cada área envolvida, da equipe de profissionais. Para nós, educadores,
cabe o acesso às informações, o aprofundamento do assunto por meio
de pesquisas. O que é de nossa real competência é fazer o trabalho
pedagógico focando as especificidades e capacidades de cada um, em
parceria com a família e com a equipe de profissionais envolvidos com
a dificuldade da criança.

Acreditamos ser necessário, para que este estudo fique mais completo,
expor as causas das dificuldades, dos distúrbios e das deficiências.
Então, vamos lá!
UNIUBE 85

2.3 Causas

As causas das dificuldades, dos distúrbios e das deficiências não são


muito diferentes umas das outras, mas é possível fazer a diferenciação
em relação às causas neurológicas, quanto à intensidade, à localização,
ao período e à fisiologia da criança ou do jovem.

RELEMBRANDO

Para você compreender melhor essa colocação, é preciso relembrar a divisão


do cérebro, suas áreas e as atribuições gerais de cada uma delas (Figura 1).

Figura 1: Divisão didática do cérebro humano.


Fonte: Acervo EAD–Uniube.

Área Frontal: do hemisfério esquerdo, centro do controle das unidades


motoras.
Área Parietal: centro da leitura.
Área Temporal: centro da compreensão das palavras.
Área Occipital: centro da identificação visual das imagens.
86 UNIUBE

Tratando-se de aprendizagem da leitura e da escrita, o cérebro é


dividido didaticamente em hemisfério direito e hemisfério esquerdo, um
responsável pelas questões verbais, outro pelas questões não verbais.
Para ilustrar, mostraremos, a seguir, sobre o que cada hemisfério é
responsável, diante da leitura e da escrita, segundo Kumura (1973 apud
FONSECA, 1995).

O hemisfério direito, responsável pelos conteúdos não verbais, realiza


preferencialmente as seguintes funções:

• Funções visuais:

• localização de pontos em duas dimensões;


• enumeração de pontos e formas;
• reconhecimento de faces e de figuras sem significado.
• Funções manuais (tátil-cinestésicas):
• reconhecimento de relevo (braille);
• reconhecimento de estruturas.
• Funções auditivas:
• sons da vida cotidiana;
• padrões melódicos.

Em compensação, o hemisfério esquerdo tem sido considerado responsável


pelos conteúdos verbais. Realiza preferencialmente as funções:

• Funções visuais:
• reconhecimento de letras e palavras.
• Funções manuais:
• movimentos complexos;
• fala.
• Funções auditivas:
• reconhecimento de palavras;
• reconhecimento de sílabas.
UNIUBE 87

Essa divisão serve como ilustração para melhor compreensão do caminho


da aprendizagem. Para que a aprendizagem ocorra, é necessário
que todas as partes estejam em plena integridade e funcionando
harmonicamente. As causas das dificuldades de aprendizagem são de
difícil especificação e, ao mesmo tempo, o grupo de alunos com esse
tipo de necessidade educacional é, sem dúvida, o maior.

Há sempre muitas perguntas, questionamentos: como isso aconteceu? O


que deu errado? Será que as crianças podem superar as dificuldades de
aprendizagem? Isso é uma doença? Tem cura? Mas pais e professores
nem sempre podem obter respostas claras para as questões relacionadas
aos problemas dos filhos e dos alunos. Os fatores são múltiplos e os
estudos também. Contudo, embora estudos e pesquisas tenham trazido
informações mais claras sobre as estruturas e o funcionamento do
cérebro, nem sempre é possível aplicar, na íntegra, essas informações
a um indivíduo. Entretanto, o desenvolvimento individual da criança e o
ambiente familiar e escolar são fatores que podem interferir no processo
de aprendizagem.

IMPORTANTE!

Embora, supostamente, as dificuldades de aprendizagem tenham uma


base biológica, o ambiente da criança determina a gravidade e o impacto
da dificuldade. Isso tem demonstrado que alterações no ambiente familiar
e escolar da criança fazem uma diferença impressionante no progresso
educacional.

Segundo Smith e Strick (2001), os fatores biológicos que contribuem


para as dificuldades de aprendizagem podem ser divididos em cinco
categorias gerais: lesão cerebral, alterações no desenvolvimento
cerebral, desequilíbrios neuroquímicos, hereditariedade e influências
ambientais.
88 UNIUBE

Por vários anos, os atrasos na aprendizagem foram explicados por meio


das lesões cerebrais, mas com o avanço das pesquisas foi possível
verificar que indivíduos sem lesões cerebrais também tinham atrasos
significativos na aprendizagem.

2.3.1 Lesão cerebral

Como vimos, o cérebro foi, didaticamente, dividido em partes e cada


parte é responsável diretamente por desempenhar funções específicas.
Mas, para que as ações, interações, pensamentos, sentidos e sensações
humanas ocorram de forma tranquila, é preciso que todas as áreas
estejam constituídas anatomicamente e fisiologicamente de forma
perfeita e estejam trabalhando harmonicamente entre si.

Nesse sentido, as dificuldades de aprendizagem, distúrbios e/ou


deficiência podem surgir a partir de lesões do cérebro. Entre os tipos de
lesões associadas aos atrasos no desenvolvimento e na aprendizagem
estão os acidentes, as hemorragias e os tumores cerebrais, doenças
como encefalites e meningite, transtornos glandulares não tratados na
infância e hipoglicemia na primeira infância. A desnutrição e a exposição
a substâncias químicas tóxicas (como chumbo e pesticidas) também
causam danos cerebrais. Eventos de privação de oxigênio, tratamento
com quimioterapia para câncer, doenças que ocorrem durante a gestação
e exposição ao álcool e drogas podem estar associados a uma variedade
de problemas de aprendizagem, déficit cognitivo, déficit de atenção,
hiperatividade e problemas de memória.

2.3.2 Alterações no desenvolvimento cerebral

O desenvolvimento do cérebro humano inicia-se na concepção e desde


então não para mais. Ele se desenvolve em estágios, e um dos períodos
mais importantes é entre o 5º e 9º mês. Período em que o córtex cerebral
está sendo pouco a pouco estruturado.
UNIUBE 89

As regiões do cérebro vão se tornando cada vez mais


Córtex
especializadas à medida que as crianças vão ficando
É uma estrutura
mais velhas. Durante a primeira e a segunda infância, de múltiplas
camadas que
novas conexões entre as partes do cérebro vão se forma o envoltório
estruturando e o pensamento dos infantes vai ficando do cérebro,
responsável por
mais elaborado. Se esse processo de maturação e praticamente todos
os aspectos da
ativação do cérebro for perturbado, poderão ocorrer atividade consciente
do homem. O seu
problemas no desenvolvimento global da criança. desenvolvimento
e funcionamento
pleno são
essenciais para o
O tipo de problema causado por alterações no pensamento e a
aprendizagem de
desenvolvimento cerebral depende das regiões nível superior.
do cérebro afetadas. É importante ressaltar que a
aprendizagem e outros comportamentos envolvem
diferentes e diversas partes do cérebro, assim, o prejuízo em uma das
áreas pode afetar o desenvolvimento em outra parte do sistema. Por isso,
é difícil um aluno com problemas de aprendizagem ter um problema único
e isolado; problemas associados são bem comuns nessas crianças.

2.3.3 Desequilíbrios neuroquímicos

As células cerebrais e os neurônios conseguem comunicar-se entre si por


meio de substâncias químicas, chamadas neurotransmissores. Qualquer
mudança na química do cérebro pode interferir nesses neurotransmissores
e prejudicar a capacidade do cérebro funcionar adequadamente.

Segundo diversos estudos, os medicamentos para equilibrar a química


necessária para o funcionamento preciso do cérebro e as adequações
educacionais realizadas conjuntamente têm dado resultados positivos,
principalmente para os alunos com déficit de atenção e dificuldade na
aprendizagem, decorrente de problemas de memória.
90 UNIUBE

2.3.4 Hereditariedade

Estudos com familiares das crianças com dificuldades de aprendizagem


e/ou deficiência demonstram incidência no problema. Muitas vezes,
quando o problema da criança é apresentado para os pais, eles afirmam:
“Mas eu também não consigo fazer isso!”

Nesse sentido, os pais também necessitam do apoio que é oferecido para


a criança, tanto dos profissionais quanto por parte de outros membros
da família.

2.3.5 Influências ambientais

Para compreendermos melhor a dificuldade de aprendizagem, é preciso


compreender também o ambiente doméstico e o ambiente escolar da
criança, pois eles afetam diretamente o desenvolvimento intelectual e o
potencial para a aprendizagem.

a) Ambiente doméstico: o ambiente doméstico exerce importante papel


no desenvolvimento da aprendizagem das crianças. Estudos apontam
que um ambiente enriquecido, estimulador e afetuoso não apenas tem
impacto na aprendizagem, na formação do autoconceito, como também
estimula o crescimento e o desenvolvimento cerebral.

Professores relatam que crianças com dificuldades de aprendizagem que


não tiveram estímulos e apoio em casa quando encontram problemas
antecipam o fracasso, parecendo “desistir” antes de começar. Outros
pontos a destacar em favor do ambiente doméstico são os aspectos
relacionados aos cuidados, como: a nutrição alimentar, o sono, a higiene,
os cuidados médicos, os hábitos de estudo, o estresse emocional, a
privação cultural, a proteção pessoal, a estimulação do bebê e da criança
pequena. Para ilustrar, vejamos um resumo do que Erik Erikson (apud
UNIUBE 91

SMITH; STRICK, 2001, p. 32), psicólogo americano, considerava mais


necessário para as crianças, em suas famílias, em cada estágio do
desenvolvimento.
• Confiança básica (do nascimento até 1 ano): os
bebês obtêm um senso de confiança básica quando as
interações com os adultos são agradáveis e prazerosas.
Os bebês precisam de pais calorosos, receptíveis,
previsíveis e sensíveis às suas necessidades.
• Autonomia (de 1 a 3 anos): a confiança na capacidade
para fazer escolhas e decisões é desenvolvida
enquanto as crianças exercitam as habilidades
exploratórias de caminhar, correr, escalar e manusear
objetos.
• Iniciativa (de 3 a 6 anos): os pré-escolares aprendem
sobre si mesmos e suas culturas por meio de jogos de
faz de conta, à medida que encenam diferentes papéis,
começam a pensar sobre o tipo de pessoa que desejam
tornar-se.
• Produtividade (dos 6 anos até a puberdade): durante
esse período é muito importante o estímulo às crianças
para o trabalho produtivo e cooperativo, para se
sentirem úteis e encorajadas aos desafios que a vida
adulta lhes imporá.
• Identidade (adolescência): essa fase é de integração
das fases anteriores, o que irá favorecer a construção
da identidade, favorecendo o entendimento de seu
lugar na sociedade, formando assim expectativas para
o futuro.

b) Ambiente escolar: a criança deve estar preparada para aprender e,


assim, as oportunidades dessa aprendizagem devem ser fomentadas
e oferecidas pelo sistema educacional. Se o aluno nunca tem a
oportunidade apropriada para desenvolver suas capacidades, torna-se
efetivamente “deficiente”, embora não tendo nada fisicamente errado com
ele. Sabemos que a escola e o professor enfrentam entraves que vão além
de suas competências, mas também é de conhecimento de todos que
necessitamos, como professores, de conhecimentos mais específicos e
aprofundados das diferentes metodologias. Muitas práticas, amplamente
aceitas, não oferecem variações normais no estilo de aprendizagem.
92 UNIUBE

PARADA PARA REFLEXÃO

Assim, podemos imaginar o seguinte:

Um aluno cuja orientação é principalmente visual e exploratória, ou seja,


que precisa ver e tocar as coisas para compreendê-las, não se sairá bem
com professores que “palestram” o tempo todo; não importando o quanto é
inteligente e interessado na matéria.

Quando deparamos com esse tipo de situação, é prudente indagar: o aluno


não aprende por que é problema dele?

Na verdade, muitos alunos que se saem mal na escola são vítimas da


incapacidade do sistema educacional de se ajustar às diferenças individuais
e culturais.

Ressaltamos que todas essas possíveis causas são relacionadas, aqui,


para que você tenha um entendimento mais aprofundado da questão,
visto que desejamos que seja um profissional a favor da promoção de
um ensino de qualidade e de um processo ensino-aprendizagem rico
e significativo. É importante lembrar que pais, professores e governo,
muitas vezes, ficam tentando descobrir o culpado ou os culpados
das dificuldades, dos distúrbios ou das deficiências e, geralmente,
questionam:

• Será que a culpa foi do médico?


• A culpa foi do alimento consumido na gestação?
• A culpa é do pai ou é da mãe ausente?
• A culpa é da falta de materiais nas escolas?

Indagações como essas são naturais, mas não são produtivas. Afinal,
descobrir como uma criança veio a ter uma necessidade educacional
especial é bem menos importante do que saber como esta afeta a visão
de mundo da criança e como encontrar os tipos de apoio e auxílio de
que ela necessita.
UNIUBE 93

2.4 Propostas pedagógicas

O papel do professor, bem como de toda a equipe escolar, consiste,


antes de tudo, em promover, por meio de ações, o apoio e, também,
o resguardo do desenvolvimento pleno da criança e do jovem. A ação
docente e as relações aluno e professor, na aprendizagem, devem
ser movidas de significados tanto para quem ensina como para quem
aprende. O professor necessita ser um profissional da educação
competente, criativo, seguro e com alto grau de autonomia.

O docente deve ter a autonomia de saber construir, com o aluno,


aprendizagens significativas, utilizando-se dos conhecimentos científicos.
O professor deve saber e dominar tais conhecimentos, articulando-os
aos conhecimentos e às vivências culturais dos seus alunos, tornando-
os aprendizes, criadores de conhecimentos de características próprias.

Assim, é também função do professor ter a autonomia de escolher sua


metodologia, fazer a seleção de conteúdos e atividades pedagógicas
mais condizentes com o interesse dos alunos, com suas necessidades
e dificuldades. Nesse sentido, o êxito do professor depende também de
sua capacidade de manejar a complexidade da ação educativa e resolver
problemas, por meio de uma interação inteligente e criativa, além de uma
boa formação inicial e continuada.

É exigido do profissional da educação conhecer e observar, constantemente,


seu aluno, compreender os contextos sociais e as questões contemporâneas
com as quais ele e seus alunos estão ampliando a concepção de educar
para além do instruir; deve também zelar pela qualidade das relações
afetivas e dos valores que permeiam as relações sociais na escola. É
importante ressaltar as trocas, o trabalho coletivo, aperfeiçoando-se
profissionalmente, individualmente e na troca com seus pares.
94 UNIUBE

É preciso pensar que, em nossas escolas, a realidade educacional está


estampada e o colorido relativo à diversidade de culturas e formas de
aprender nos pede ações pontuais e processuais. No entanto, é preciso
que voltemos o olhar para as práticas pedagógicas exercidas dentro
das escolas e nos esforcemos para que, por meio delas, consigamos
atingir todos os nossos alunos, inclusive os alunos com necessidades
educacionais especiais, que tanto já sofreram e têm sofrido com uma
educação excludente.

Nesse sentido, iremos pontuar, para você, alguns conhecimentos para os


quais o professor necessita estar mais atento, objetivando uma prática
pedagógica de qualidade.

2.4.1 Primeiro passo

Uma vez já detectada a dificuldade, os distúrbios ou as deficiências,


é preciso que a equipe escolar elabore ações específicas para esses
alunos, a fim de atendê-los em todas as suas dificuldades escolares. É
preciso pensar:

• De que serviços especiais o aluno necessita e quem oferecerá?


• Que turma será mais apropriada para a criança frequentar?
• Que tipo de acomodações ou modificações específicas serão feitas
para a criança?
• Que equipamento especial ou apoio técnico (se forem necessários)
serão oferecidos?
• Que objetivos serão estabelecidos?

Após esse levantamento, deverá ser feito o registro dos resultados e a


proposta deve ser iniciada. Nessa proposta de trabalho, segundo Smith
e Strick (2001), é importante estar bem claro que o trabalho deverá
ressaltar:
UNIUBE 95

a) As habilidades básicas: incentivar as habilidades básicas (leitura, escrita


e execução de cálculos). Textos e materiais didáticos especializados
são necessários. Essas habilidades devem ser ensinadas em nível
adequado de desenvolvimento de cada aluno, oportunizando-lhe a
aquisição de novas habilidades. Geralmente, esse tipo de ensino deve
ser oferecido individualmente ou em pequenos grupos, pois necessita ser
monitorado e mediado atentamente pelo professor. Muitos estudantes
com dificuldades mais graves e/ou deficiência não conseguirão soletrar
bem, e a matemática de nível avançado sempre será um mistério
para alguns. Nesses casos, é importante ensinar outras estratégias e
habilidades, pois até mesmo uma pessoa que não sabe ler ou escrever
pode educar-se se conhece outros meios de obter e dar informações. A
tarefa da escola é ensinar ao aluno com deficiência exatamente quais
são esses outros modos.

b) Permitir que o aluno acompanhe sua classe: às vezes, será


necessário modificar as tarefas acadêmicas para os alunos com
deficiências no processamento de informações. Algumas orientações
importantes:

Na sala de aula:

• permitir assentos preferenciais;


• permitir tempo extra para a resposta às questões e para completar
o trabalho escrito;
• providenciar cópias de anotações de laboratórios ou de palestras;
• permitir o uso de gravador para o registro da aula;
• permitir o uso da calculadora;
• providenciar o acesso ao computador;
• permitir atividades alternativas (exemplo: pedir ao aluno que prepare
um vídeo em vez de um relato por escrito);
• oferecer instruções tanto de forma oral como por escrito;
96 UNIUBE

• oferecer auxílios visuais melhores e em maior quantidade (dependendo


do tipo de deficiência);
• designar parceiros de estudo, para ajudar com as tarefas ou matérias
particulares;
• realizar pré-leitura do material escrito e discutir o conteúdo do texto.

Nos testes:

• permitir horários flexíveis (o aluno poderá fazer os testes em duas


ou mais sessões e horários diversificados);
• permitir que as instruções e as questões sejam lidas para o aluno;
• reformular as questões em uma linguagem mais simples, se necessário;
• permitir que o aluno responda às questões oralmente em vez de
por escrito;
• elaborar testes com respostas curtas (verdadeiro/falso ou múltipla
escolha);
• permitir que os testes sejam realizados no computador;
• reduzir o número de questões ou problemas.

Deveres de casa:

• entregar as tarefas de casa por escrito com regularidade diária ou


semanal;
• providenciar livro-texto gravado em fita;
• permitir que todo o texto ou parte dele seja lido para o aluno;
• permitir que os textos sejam escritos em uma linguagem mais
simples;
• permitir que o aluno registre sua tarefa em áudio em vez de por
escrito;
• permitir que o aluno dite seu trabalho a um escriba;
• não reduzir a nota ou tirar pontos por erros de ortografia.
UNIUBE 97

Esses apoios visam ajudar os alunos a acompanhar o conteúdo de aula


e, ainda, contribuir favoravelmente para que a escola cumpra sua tarefa.

É importante ressaltar que é necessário estimular muito o aluno a


fazer o máximo que puder, de atividades e tarefas, seguindo a mesma
metodologia da turma, em sala de aula, porém as modificações e os
ajustes serão bem-vindos sempre que necessário.

c) A utilização de estratégias apropriadas ao aluno com dificuldade:


geralmente as crianças com dificuldades de aprendizagem, distúrbios ou
deficiência têm problemas para aprender habilidades de organização e
de manejo do tempo, hábitos efetivos de estudo, métodos para aumento
da memória, estratégias de solução de problemas e tomada de decisões
e habilidades de autodefesa. O que os pais e professores devem fazer é
servirem de apoio, ficando ao lado, evitando assumir o comando, o que
é a tendência mais natural que conhecemos. Quando bem estimuladas
e bem trabalhadas na infância, à medida que essas crianças vão
crescendo, elas próprias vão descobrindo estratégias de memória, de
adaptação, resolução de problemas e socialização.

2.4.2 Conhecendo as necessidades fundamentais da criança na


Educação Infantil

As propostas curriculares para as crianças com necessidades especiais


se baseiam nas propostas já estabelecidas pelo MEC, por exemplo, os
Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, para a
pré-escola e creches.

Então, a proposta de atendimento às crianças com necessidades


educacionais especiais seria a flexibilização das metodologias a serem
aplicadas nas atividades da prática educativa.
98 UNIUBE

O que se diferencia nas propostas para esses alunos são os objetivos


didáticos e os tipos de ajuda que cada aluno pode requerer em função de
suas necessidades educacionais individuais. As crianças com qualquer
deficiência, independentemente de suas condições físicas, sensoriais,
cognitivas ou emocionais, são crianças. Crianças que têm as mesmas
necessidades básicas de afeto, cuidado e proteção e os mesmos desejos
e sentimentos das demais crianças.

IMPORTANTE!

Mais importante que a caracterização da deficiência, das dificuldades ou


limitações, é procurar compreender a singularidade da história de vida de
cada criança, suas necessidades, seus interesses, como interage, como se
relaciona com as pessoas, objetos e com o conhecimento.

Em seus estudos, em outros capítulos, o brincar e a socialização da


criança foram amplamente ressaltados. Entretanto, consideramos
importante trazer para nossa discussão a importância do brincar e da
socialização para o desenvolvimento infantil, mas, dessa vez, com
especial realce para as crianças com necessidades educacionais
especiais na fase da Educação Infantil.

O brincar

O brincar da criança, do nascimento aos seis anos, tem um significado


especial para a psicologia e para a educação, em seus múltiplos e
diferentes enfoques. Segundo Oliveira (2000, p. 15), o brincar é:
• condição de todo o processo evolutivo neuropsicológico
saudável, que se alicerça neste começo;
• manifestação da forma com que a criança está
organizando sua realidade e lidando com suas
possibilidades, limitações e conflitos, já que, muitas
vezes, ela não sabe, ou não pode, falar a respeito deles;
UNIUBE 99

• introdução da criança de forma gradativa, prazerosa e


eficiente ao universo sócio-histórico-cultural;
• mediador e facilitador do processo ensino-aprendizagem,
oportunizando a construção da reflexão, da autonomia e
da criatividade.

Como podemos perceber, o brincar é uma atividade altamente significativa


para a formação da personalidade da criança, oportunizando-lhe a
sociabilidade, a criatividade e a autonomia e, ainda, auxilia na identificação,
no controle e na canalização de impulsos provenientes de fantasias
agressivas. É importante afirmar que, nesse processo, a motricidade e
a capacidade de representar a realidade se entrelaçam num movimento
dinâmico, no qual esse movimento forma e reflete a estrutura mental da
criança.

Após toda essa reflexão da importância do brincar para a criança,


vamos pensar em uma criança ao nascer. Ela nasce com a capacidade
cognitiva e motora inata a ser desenvolvida. Tratando-se de uma criança
“normal”, essa capacidade é imensamente grande. Tratando-se de uma
criança especial, ela é “indefinida”, nunca sabemos qual será a sua
capacidade de desenvolvimento!

As crianças, convivendo com pessoas, objetos, lugares e situações em


casa, na escola e em outros ambientes sociais, vão aprimorando suas
capacidades e habilidades. Mas como acontece com as crianças com
necessidades educacionais especiais? Acontece do mesmo jeito? Sim,
da mesma maneira, se dermos a ela oportunidade de brincar!

Uma criança “normal” explora o ambiente, arrasta-se até o objeto de


interesse, pega esse objeto, joga-o pelo chão, coloca-o na boca... E o
que ela aprendeu com a brincadeira? Durante a exploração que fez do
objeto, recebeu informações quanto à forma, ao tamanho, à textura, ao
gosto, à temperatura, ao peso e outras. Adquiriu noções de peso, de
força, de velocidade e de distância, enfim, todos esses conteúdos vão se
aprimorando com a constante exploração do mundo pela criança.
100 UNIUBE

O que acontece com a criança com necessidades educacionais especiais?

Como ela vai brincar se não anda, ou não controla os movimentos de


seu corpo, ou mesmo não demonstra interesse pela brincadeira, devido
à grande deficiência intelectual que apresenta?

Para que ela tenha a oportunidade de brincar e explorar as coisas do


mundo, temos que levá-la até essas coisas ou trazer essas coisas até a
criança. Oportunizar estímulos, auxiliando-a na exploração, chamando
a sua atenção para eles, ajudando-a a manuseá-los quando necessário.

Ainda, é importante ressaltar que na brincadeira não devemos limitar o


espaço físico da criança, mesmo que ela não se locomova. Toda vez que
a criança tiver condições de escolher a brincadeira, quando conseguir
indicar de alguma maneira o que deseja fazer ou então souber escolher
entre duas opções oferecidas a que mais lhe agrada, sua vontade
deve ser respeitada. Mas, se ela não tiver condições de externar sua
vontade ou preferência, temos que escolher por ela e ficarmos atentos
às suas reações. Nessa situação, o adulto deverá explicar à criança, com
antecedência, todos os passos da brincadeira que irão fazer. Isso ajuda
a criança a entender o que vai acontecer e planejar suas ações.

A socialização

A socialização é fundamental para o desenvolvimento psicológico


saudável, bem como para a formação humana dos sujeitos. É também na
convivência com o outro que aprendo a me tornar homem. Esse assunto
também já foi alvo de grandes reflexões em seu curso, mas, agora, o
articularemos às crianças com necessidades especiais.

Nos passeios e na convivência social com outras crianças em espaços


públicos, o que mais dificulta a socialização das crianças com deficiência
é a dificuldade de transporte, locomoção, as barreiras arquitetônicas e
UNIUBE 101

a falta de adaptações nos banheiros e repartições. Outro motivo a ser


destacado é que alguns pais têm dificuldade em aceitar a deficiência e
sentem-se constrangidos com “olhares diferentes” das pessoas, tendo
vergonha de passear com seu filho em público.

Entretanto, na escola, mesmo ainda sendo um processo em construção,


isso se torna bem mais fácil, pois as crianças dificilmente rejeitam a
convivência com as crianças com deficiência. As experiências que temos
observado é que o ganho tem sido muito grande por ambas as partes.

O colorido da diversidade tem feito os profissionais da educação buscar


mais conhecimentos e informações, os alunos aprendem com a diferença
e as famílias se sentem mais seguras em confiarem seus filhos a uma
educação mais aberta e flexível.

2.4.3 A importância do estudo das funções cognitivas segundo


Feuerstein para a prática pedagógica

Considerando todo o estudo até agora realizado, vamos agora partir para
o eixo de atuação pedagógica diante das necessidades educacionais
especiais. Iniciaremos a reflexão trazendo para o nosso texto a teoria que
Reuven Feuerstein defende: a aprendizagem mediatizada.

Já está incorporada na fala dos profissionais da educação a necessidade


de conhecer o aluno e sua realidade, para se planejar e chegar a uma
aprendizagem significativa. Mas também sabemos que essa fala muitas
vezes não vira atitude, não sabemos se por falta de vontade ou de
conhecimento.

Para conhecer o aluno é preciso saber também como essa criança ou jovem
organiza suas habilidades cognitivas e como lida com elas na resolução
de problemas em seu cotidiano. O estudo que vamos abordar, agora,
analisa as particularidades do pensamento dos indivíduos com defasagens
significativas no desenvolvimento intelectual, de acordo com Feuerstein.
102 UNIUBE

O trabalho de Feuerstein é um estudo que nos leva a compreender os


impedimentos no desenvolvimento cognitivo que inclui as crianças com
dificuldades escolares até os casos específicos da deficiência mental. Esse
estudo ressalta as deficiências nas funções cognitivas dos alunos que têm
necessidades educacionais especiais. É importante ressaltar que
[...] Feurstein constitui um erro diagnosticar, em crianças com
dificuldades cognitivas, o baixo rendimento escolar como
mera ausência do conhecimento ou como simples reflexo
de um baixo nível intelectual. Em sua opinião, deve-se,
antes, averiguar quais funções deficientes prejudicam a ação
cognitiva individual (BEYER, 1996, p. 100).

Feurstein descreve três fases em que as funções cognitivas das crianças


com necessidades educacionais especiais podem estar comprometidas.
Segundo Beyer (1996, p. 101-102), elas estão dispostas da seguinte
maneira:
Fase da assimilação. Trata-se da dificuldade da
criança na consideração inicial do problema proposto
(destacam-se, aqui, as tarefas de solução de problemas):
a) percepção difusa e superficial;
b) consideração impulsiva e não sistemática dos dados;
c) conceitos inadequados, limitantes da capacidade de
diferenciação;
d) ausência ou inadequação de conceitos espaciais;
e) ausência ou inadequação de conservação de
medidas (tamanho, quantidade, forma);
f) necessidade limitada de exatidão ou precisão;
g) dificuldade em considerar duas ou mais fontes de
informação simultaneamente.

Fase da elaboração. Depois que os dados de um


problema foram assimilados, a criança demonstra
dificuldades para solucioná-lo adequadamente, devido:
a) à definição inexata do problema;
b) à incapacidade em diferenciar informações relevantes
de irrelevantes no ato comparativo;
c) à limitação no estabelecimento de relações;
UNIUBE 103

d) à falta de necessidade em trabalhar com evidências


lógicas;
e) à falta ou limitação de consciência dos próprios
processos de pensamento (debilidade metacognitiva);
f) à ausência do pensamento lógico-hipotético, com
base no raciocínio “se então”; g) à ausência de
métodos para averiguação das hipóteses;
h) à ausência ou limitação da conduta cognitiva
planejada;
i) à precariedade dos conceitos verbais.

Fase da resposta. Nesta fase, a criança tem determinadas


dificuldades para uma divulgação adequada dos
processos elaborados, devido:
a) à forma egocêntrica de se comunicar;
 b) a bloqueios de natureza afetiva ou emocional;
c) à conduta do tipo “tentativa e erro”;
d) ao vocabulário limitado para poder se expressar
adequadamente;
e) à incapacidade em manter os elementos visuais
abrangidos;
f) à conduta impulsiva.

Como podemos perceber, a fase da assimilação é caracterizada por


problemas que se apresentam na fase de introdução, na captação da
informação e na apresentação do conhecimento para a aprendizagem.
Quando o aluno apresenta um ou mais dos problemas que foram expostos,
a assimilação do conhecimento fica comprometida e dificilmente se
conseguirá absorver o conhecimento, nem tampouco externá-lo.

Já na fase da elaboração, chega o momento de a criança elaborar,


processar, a informação e o conhecimento. Nessa fase, ela deverá fazer
comparações, escolhas, levantar hipóteses e articulações com o que já
vivenciou e o conhecimento novo.
104 UNIUBE

Na fase da resposta, chega o momento de exposição, demonstração e


divulgação de todo o conhecimento que assimilou e elaborou. É possível
analisar que essa fase está muito ligada à questão da confiança, da
autoestima e às questões afetivas, emocionais.

Acreditamos que esse estudo de Feurstein veio contribuir para a análise


das dificuldades específicas de pensamento da criança e também para
auxiliar os professores no diagnóstico mais preciso, sobretudo, no
planejamento de uma intervenção mediadora específica e individualizada,
para superação das dificuldades encontradas.

2.4.4 O trabalho pedagógico com os distúrbios e com a deficiência


intelectual

A seguir, iremos apontar mais algumas estratégias para atuação


pedagógica com alunos com distúrbios de aprendizagem sem a intenção
de formatar um programa específico e fechado de intervenção. Sabemos
que cada criança é única, mesmo que tenha a mesma dificuldade de
outra criança, a história de vida é única, a realidade cultural é outra,
portanto as intervenções são mutáveis, cíclicas e dinâmicas, de acordo
com a necessidade de cada uma.

Por meio de diferentes estudos, chegamos a destacar algumas características


importantes a serem consideradas na atuação pedagógica em relação
ao distúrbio da leitura. Segundo Guerra (2002):

Distúrbio da leitura

O que envolve uma leitura competente:

• motivação;
• focalizar a atenção no texto;
• ver claramente as formas das letras;
UNIUBE 105

• mapear as letras da esquerda para a direita com os olhos;


• sequenciar letras das palavras, palavras das frases, formando a
unidade texto;
• as formas das letras têm que ser transmitidas em sequência para o
cérebro e a posição exata no espaço;
• conseguir a compreensão da unidade texto.

Erros mais comuns:

• nas palavras que possuem um ponto de articulação comum “d-t” e


“c-q”;
• inversões de sílabas “sol-los” e “as-sa”;
• dificuldade na soletração de palavras monossílabas;
• acréscimo ou omissão de sílabas “sapo-sapato” ou “sapato-pato”;
• leitura sem ritmo;
• confusão na visualização de letras parecidas graficamente “a-o”,
“e-d”, “n-h”, “m-n”.

Orientações aos pais e professores:

• escolher local e horários adequados de estudo e leitura;


• escolher o livro adequado para cada dificuldade;
• fazer material com melhor impressão M h;
• escolher livros com gravuras;
• colocar um colega ou ajudante sentado ao lado da criança;
• estimular a criança a fazer com que ela acompanhe a leitura com o
dedo ou com o lápis posicionado horizontalmente abaixo da linha
que está sendo lida;
• dividir a leitura em partes;
• não se preocupar com a entonação, por enquanto;
• ajudar a interpretar o que leu;
106 UNIUBE

• evitar comentários negativos;


• ler sempre que possível para a criança, para estimulá-la a ler
também;
• trabalhar de forma lúdica, utilizando atividades prazerosas e jogos
com leitura.

Distúrbio da escrita

Como pode ser avaliado:


• amostra da escrita: três amostras – redação com tema livre, trecho
de um ditado e uma cópia de algum material impresso;
• verificar a eficiência com que a criança escreve a legibilidade, a
postura e a forma de segurar a caneta ou lápis;
• ficar atento se há algum dano motor ou visual, se tem alguma
debilidade motora, tremor, movimentos involuntários.

Características:

• dificuldades no controle motor (afeta a maneira como as letras são


produzidas);
• dificuldade na percepção visual (afeta a maneira como as letras são
percebidas, a configuração da letra. Podem sobrepor letras, escrevê-
las ao contrário ou deixar longos espaços entre elas);
• distúrbios na forma de segurar o lápis;
• problemas na memória visual;
• problemas de controle espacial.

Proposta de trabalho:

• Analisar a maneira como a criança senta e segura o lápis. Estimular


a criança a segurar o papel com a mão que não escreve; ter um
descanso para os pés, caso estes não alcancem o chão.
UNIUBE 107

• Boa iluminação.
• Inicialmente serão produzidas escritas grandes em folhas grandes,
mais tarde a criança diminuirá o tamanho da letra e assim são
aconselháveis folhas com pauta e alinhamento.
• Inicialmente traçar com os dedos a forma da letra na areia, andando
sobre a forma da letra e, por fim, a escrita no papel.
• As letras com ponto de partida semelhante devem ser ensinadas em
grupo, para aprender a forma das letras é preciso traçá-las.
• No início da cópia o professor pode valer-se de sinais no papel que
possam indicar o ponto de partida de cada letra.
• Utilizar também o computador.

Distúrbio na ortografia

Como pode ser avaliado:

• testes que envolvem o ditado;


• abordar o reconhecimento da palavra impressa, para verificação da
grafia;
• diferenciar os tipos de erros ortográficos;
• verificar a discriminação auditiva.

Características:

• erros fonéticos: semelhança visual com a ortografia correta;


• erros visuais;
• erros de substituição de letras;
• erros de inserção ou acréscimo e de omissão;
• erros sequenciais.
108 UNIUBE

Proposta de trabalho:

• trabalhar uma oposição de cada vez;


• inicialmente trabalhar com atividades visuais;
• trabalhar sempre com apoio visual;
• começar trabalhando com palavras inteiras;
• trabalhar com recursos visuais aliados aos auditivos;
• trabalhar pedaços de palavras.

Distúrbio na matemática

Como pode ser avaliado:

• O jogo de regras oportuniza a verificação e compreensão do que a


criança já sabe sobre o mundo dos números e como utiliza esses
conhecimentos para resolver problemas.

Jogando a criança é capaz de:

a) Realizar um número maior de cálculos e de problemas do que


quando realiza as tarefas dos livros.
b) Exercitar a reversibilidade operatória.
c) Expressar-se de modo espontâneo.
d) Desenvolver as relações sociais e a própria cidadania.
e) Substituir o sentimento de rejeição pelo de aproximação dessa área
do conhecimento.
f) Ativar a memória.
g) Compreender a função social dos números.
UNIUBE 109

Características:

• problemas nas estruturas do pensamento lógico-matemático;


• dificuldades nas funções simbólicas (capacidade geral de compreender
e de criar símbolos: expressão corporal, expressão do grafismo,
comunicação nas variadas linguagens);
• problemas com a linguagem matemática (ideográfica, sistema
decimal posicional, combinação dos números naturais e outros).

Proposta de trabalho:

• análise cuidadosa da exata natureza do problema;


• ajudar o professor a ter uma boa compreensão e relação com a
matemática;
• trabalhar situações do cotidiano;
• seguir os estágios:

a) Números, contagem, distribuição, correspondência e ordenação.


b) Adição, subtração, multiplicação e divisão.
c) Medidas, formas, tempo e dinheiro.

• Construção do conceito de número: situações nas quais a criança


possa comparar quantidades, observando se tem o mesmo tanto,
se tem mais ou menos (isso pode ser observado nas provas de
conservação do método de Piaget).
• Contagem: valor cardinal e valor ordinal. Contagem mecânica, um
a um e contagem compreensiva (de dois em dois, cinco em cinco,
dez em dez).
• Notação numérica: partir da ideia de que nosso sistema é decimal
posicional, permitindo que a criança expresse suas hipóteses por
meio de registros numéricos.
• Operações e resolução de problemas: trabalhar a compreensão
dos enunciados dos problemas, propor atividades que antecipem
mentalmente as operações e as atividades que ajudem na sistematização
das operações. Trabalhar a mútua relação da linguagem escrita com
a linguagem matemática.
110 UNIUBE

Quando falamos em deficiência de aprendizagem durante nosso estudo,


estamos nos referindo à deficiência intelectual. As barreiras encontradas
na deficiência intelectual são barreiras referentes à maneira de lidar
com os conhecimentos e saberes, que refletem na construção dos
conhecimentos escolares. Quando essa educação é trabalhada nos
moldes da repetição, treino e adaptação, ela só vem reforçar a condição
de deficiente do sujeito.

Para que o aluno avance e seja o construtor do seu saber, é preciso que
ele passe da ação mecânica e automática para situações de aprendizado/
experiência, que possibilitem a ele selecionar e optar por meios mais
significativos de aprendizagem.

A acessibilidade ao conhecimento, nesse caso, não depende de suportes


externos ao sujeito; é preciso que ele tome conhecimento daquilo que
não sabe e, a partir daí, saia da posição passiva e automatizada diante da
aprendizagem para uma postura de apropriação ativa do próprio saber.

Segundo documento de educação inclusiva (MEC) – Atendimento


Educacional Especializado para a Deficiência Mental (BRASIL, 2006, p. 18):
[...] a pessoa com deficiência mental encontra inúmeras
barreiras nas interações que realiza com o meio para
assimilar, desde os componentes físicos do objeto de
conhecimento, como, por exemplo, o reconhecimento e
a identificação da cor, forma, textura, tamanho e outras
características que ele precisa retirar diretamente desse
objeto. Isso ocorre porque são pessoas que apresentam
prejuízos no funcionamento, na estruturação e na
reelaboração do conhecimento. Exatamente por isso
não adianta propor atividades que insistem na repetição
pura e simples de noções de cor, forma etc., para que
a partir desse suposto aprendizado o aluno consiga
dominar essas noções e as demais propriedades físicas
dos objetos e ainda possa transpô-las para um outro
contexto.
UNIUBE 111

Essa passagem não é algo simples para as crianças com deficiência


intelectual, ela exige ações práticas e a coordenação dessas ações em
pensamento, o que não ocorre de maneira natural nessas crianças. Essa
passagem deve ser estimulada e provocada para que o conhecimento
seja interiorizado.

SAIBA MAIS

Segundo o MEC (BRASIL, 2006, p. 19), o esquema, a seguir, ilustra esse


processo de construção mental do conhecimento, desenvolvido pela teoria
piagetiana...

... e assim sucessivamente.

2º nível

1º nível

Fonte: MEC (BRASIL, 2006, p. 19).

Caso você queira conhecer o documento Atendimento Educacional


Especializado para a Deficiência Mental (BRASIL, 2006), na íntegra,
sugerimos que acesse:

<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/defmental.pdf>

Diante dessa proposta de trabalho, o atendimento educacional especializado


para as crianças com deficiência intelectual vem ao encontro das
dificuldades e necessidades dessas crianças, demonstradas na abstração
112 UNIUBE

e na ação simbólica. O atendimento educacional especializado é um


atendimento feito no contraturno da sala regular com ações que partem
da prática da criança até chegarem à ação simbólica e à abstração.

Nesse sentido, entendemos o esquema anterior como a construção do


conhecimento, partindo de ações práticas vividas pelas crianças e, em
seguida, utilizando diferentes linguagens e metodologias para que essas
ações vividas sejam relacionadas com os conhecimentos científicos,
transformando-os em ações simbólicas e subjetivas. Com base nessa
abstração, a criança conseguirá atribuir significados próprios e emitir
julgamentos em diferentes contextos.

É preciso que o aluno com deficiência intelectual, como qualquer outro


aluno, desenvolva sua criatividade, capacidade de conhecer o mundo e
a si mesmo.

Geralmente, professores generalizam a capacidade das pessoas com


deficiência em nível mais baixo, atitude carregada de preconceitos e de
falta de informações!

O professor deve ser, sempre, aquele que busca e acredita na transformação


das pessoas por meio da educação e também o sujeito que sempre se
coloca na posição de aprendiz e crítico de sua prática pedagógica.

2.5 Conclusão

Neste capítulo, abordamos, inicialmente, a história das necessidades


educacionais especiais, para que você pudesse compreender o percurso que
a visão educacional das dificuldades, dos distúrbios e das deficiências teve.

Atualmente, os estudos relacionados às necessidades educacionais


especiais das crianças estão mais avançados e a prática pedagógica está
sendo repensada, devido à contribuição de vários segmentos e diferentes
contribuições teóricas.
UNIUBE 113

Em seguida, abordamos o conceito, a descrição e as causas das


dificuldades, dos distúrbios e das deficiências. Esse momento de
fundamentação de conceitos e compreensão das causas é fundamental
para o profissional da educação para ajudá-lo na realização da
identificação dos problemas que afetam a aprendizagem.

Logo após, refletimos sobre as práticas pedagógicas desfavoráveis e


aquelas que mais favorecem as crianças e os jovens com dificuldades,
distúrbios e deficiência. Tentamos colocar para você a importância da
observação do profissional da educação, nas diferentes manifestações dos
alunos, a dedicação aos estudos e buscas de estratégias/ metodologias
para cada criança com dificuldade e/ou distúrbio e/ou deficiência.

E, para finalizar, deixamos claro que a boa qualidade do atendimento


às crianças com necessidades educacionais especiais na escola, mais
precisamente na sala de aula, está no momento em que o professor
coloca como eixo central, da sua atuação pedagógica, o aluno.

Ainda é importante dizer que, ao final de mais um estudo ligado à


educação especial, vale ressaltar que a concepção de educação e de
metodologia discutida neste capítulo não é a única existente, mas, sim
aquela em que acreditamos, pois trabalha com as capacidades e as
habilidades das crianças e compreende o indivíduo como ser único e ao
mesmo tempo múltiplo. Único, porque somos singulares na construção
da nossa cultura, dos nossos valores, das nossas concepções e
nossos conhecimentos. Múltiplo, porque somos dotados de diferentes
capacidades.

Ainda sobre a concepção de educação nessa perspectiva, a inclusão


vem contribuir para efetivação de todo esse processo e ainda deixar claro
que o professor necessita ampliar seu olhar para todas essas mudanças,
colocando-se como sujeito investigativo e crítico.
114 UNIUBE

Resumo

• Este capítulo teve como finalidade chamar o educador para


desenvolver um trabalho de observador e investigador constante,
fundamentado na teoria e em uma prática reflexiva.
• O início dos estudos das necessidades educacionais especiais partiu
do conceito que os estudiosos tinham de criança com lesão cerebral.
Os momentos foram distribuídos em quatro fases: fase da fundação,
fase da transição, fase da integração e fase contemporânea até a
atualidade.
• Dificuldade de aprendizagem: constitui uma inadequação de
rendimento acadêmico, não explicável à base de déficit cognitivo,
prejuízo sensorial ou desajustamento emocional.
• Distúrbios de aprendizagem: neste caso, as crianças possuem
problemas significativos de aquisição e uso das capacidades de
compreensão e expressão linguísticas e das operações lógico-
matemáticas. Manifesta-se costumeiramente em uma ou poucas
habilidades, sendo possível a criança ser ótima em matemática e
não conseguir ler e escrever satisfatoriamente.
• A deficiência de aprendizagem diz respeito a uma incapacidade
intelectual acentuada. Nesse grupo, geralmente estão as crianças
com déficits cognitivos.
• As causas das dificuldades, dos distúrbios e das deficiências
não são muito diferentes umas das outras, mas é possível fazer
a diferenciação em relação às causas neurológicas, quanto à
intensidade, à localização, ao período e à fisiologia da criança ou
do jovem.
• O papel do professor, bem como de toda a equipe escolar, consiste,
antes de tudo, em promover, por meio de ações, o apoio e também
a prevenção do desenvolvimento pleno da criança e do jovem.
• A ação docente e as relações docentes com a aprendizagem de
seus alunos devem ser movidas de significados tanto para quem
ensina como para quem aprende.
UNIUBE 115

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Acesso em: 22 jun. 2011.
Capítulo
Interesses e necessidades
de crianças superdotadas
3
e talentosas

Mônica Corrêa Avelar

Introdução
É um enorme prazer estarmos juntos para dialogarmos e ampliarmos
nossos conhecimentos sobre os interesses e as necessidades
de educandos que possuem altas habilidades, superdotação e/
ou talento.

Para tanto, elucidarei no decorrer deste capítulo fatores inerentes


ao reconhecimento, à identificação, à compreensão, à orientação
e, sobretudo, à atuação pedagógica que tem como meta a
estimulação das potencialidades, das habilidades e dos talentos
desses alunos.

Começaremos nossa conversa fazendo uma pequena retrospectiva


histórica a respeito dos estudos de pesquisadores que abordaram
o tema no Brasil e no mundo, depois, em um segundo momento,
vocês irão conhecer o conceito de superdotação/alta habilidade e
talento; irão verificar as técnicas e os instrumentos usados para a
identificação; conhecer os aspectos emocionais, as características
comportamentais e os mitos em torno desses alunos; e, para
terminar, conhecerão os elementos essenciais para atendê-los
dentro do contexto educacional.
118 UNIUBE

É de extrema importância você, educador, conhecer, saber diferenciar


e atuar com tal público. De uma forma poética, podemos pensar
que eles são como as estrelas: possuem muito brilho e, para que
este não se ofusque chegando à total falta de luminosidade, se
faz necessário ao educador uma prática pedagógica embasada,
fundamentada e focada em seus interesses e necessidades.

Objetivos
Após o estudo deste capítulo, esperamos que você seja capaz de:

• identificar os alunos superdotados, talentosos e/ou auto-


habilidosos;
• compreender os interesses e necessidades educativas desses
alunos;
• conhecer os processos pedagógicos mediacionais e/ou
intervencionais, para esses alunos.

Esquema
3.1 Uma breve visão histórica da superdotação
3.2 Desmitificando conceitos
3.2.1 Aspectos de notável desempenho e elevada potencialidade
de crianças superdotadas e talentosas
3.2.2 Perfis individuais em relação à superdotação/talento
3.3 Identificando os mais capazes
3.3.1 Testes de inteligência (Q.I.)
3.3.2 Técnica da autoidentificação
3.3.3 Observação com base em checklist
3.4 Aspectos emocionais e comportamentais das altas habilidades/
superdotação
UNIUBE 119

3.5 Aspectos pedagógicos das altas habilidades/superdotação e


talentos
3.5.1 Formas de atender os alunos superdotados/talentosos
no contexto educacional
3.5.2 Estratégias pedagógicas para a modificação do conteúdo
curricular
3.5.3 O atendimento oferecido pelas salas de Atendimento
Educa­cional Especializado (AEE) – salas de recurso
3.6 A superdotação, os distúrbios e as dificuldades de aprendizagem
3.7 Como trabalhar com os alunos superdotados em sala de aula?
Qual é o papel da escola?
3.8 Conclusão

Quando se fala em educação inclusiva, pensa-se, num primeiro


momento, que ela está relacionada apenas a alunos com deficiência
mental, auditiva, visual ou física. Porém, é esquecido que, assim
como essas crianças, há os educandos superdotados, talentosos e
portadores de altas habilidades. Par­tindo dessa premissa, pergunta-se:

Mas quem são esses alunos?

Como identificá-los?

E, principalmente, como atendê-los?

Você está agora sendo convidado(a) a conhecer um pouco sobre


esses alu­nos para compreender e refletir sobre as necessidades
educativas que eles requerem, assim como os deficientes físicos,
sensoriais e mentais.
120 UNIUBE

3.1 Uma breve visão histórica da superdotação

Foi na Grécia que surgiram os primeiros registros históricos sobre


superdotação. Platão chamava as crianças superdotadas de crianças
de ouro e salientou a importância de um diagnóstico precoce, ainda na
infância também defendia a ideia de que estas tivessem um programa
que as preparasse para se tornarem líderes (SOUZA, 2002).

Já nos séculos XV e XVI, esses indivíduos eram considerados um perigo


para as pes­soas e eram vistos como seres do mal, chegando a serem
comparados com demônios e vistos como doentes mentais.

Francis Galton, cientista na Inglaterra no ano de 1869, após seus estudos,


editou um livro (O gênio hereditário) em que enfatizava o fator genético da
superdotação, ou seja, dizia que a superdotação era hereditária. Posição
que alguns teóricos defendem.

Alfred Binet, pedagogo e psicólogo, e Theodore Simon, psicólogo


na França, em 1905, desenvolveram o primeiro teste de inteligência,
nomeado de “Escala Binet”, e come­çaram a aplicá-la em crianças com
dificuldades de aprendizagem.

William Stern, da Alemanha, em 1911, desenvolveu em seus estudos


o conceito e a fórmula do Q.I. (quociente mental). Este assunto será
abordado com mais detalhes, posteriormente, no item identificação.

Em 1916, Levis Terman, psicólogo norte-americano, reviu a escala de


inteligência de Binet e, em 1921, iniciou uma pesquisa com crianças
com Q.I. acima de 140, na qual concluiu que o Q.I. aumentava ao
longo da vida. Estudou também o fator socioafetivo dos superdotados.
As pesquisas de Terman foram longas, abrangendo em torno de seis
décadas.
UNIUBE 121

Entre 1930 e 1940, no Brasil, Helena Wladimirna Antipoff, psicóloga e


pedagoga russa, fundou a primeira sociedade Pestalozzi para atender
crianças com deficiência. Antipoff ressaltou também a importância de
desenvolver ações que atendessem os superdo­tados.

Leta Hollingworth, psicóloga americana, na década de 1940, descobre em


suas pesquisas o fato de alunos superdotados apresentarem “problemas
de adaptação” devido a: tratamento inepto por adultos e falta de desafio
intelectual. A autora enfatiza a necessidade da escola em educar e
treinar essas crianças, levando em conta os fatores afetivos, sociais e
emocionais.

Na década de 1960, no Brasil, em Minas Gerais, Helena Antipoff, em


uma fazenda do estado, cria um Programa de Atendimento ao Aluno
Superdotado.

Em Israel, no ano de 1975, ocorreu a primeira Conferência Mundial sobre


Superdotação. No Brasil, no ano de 1976, a Fundação Educacional do
Distrito Federal deu início ao Programa para Atendimento ao Superdotado
e, em 1978, criou a Associação Brasileira para Superdotados.

Em 1983, Howard Gardner lança o livro Estruturas da mente e revoluciona


o conceito de inteligência, pois aborda a teoria das inteligências múltiplas,
que dimensiona sete inteli­gências (inteligência visual/espacial, inteligência
musical, inteligência verbal, inteligência lógica/matemática, inteligência
interpessoal, inteligência intrapessoal e inteligência corpo­ral/cinestética).
Gardner propôs também mais duas inteligências (a inteligência naturalista
e a inteligência existencialista).
122 UNIUBE

SAIBA MAIS

Essa foi uma pequena mostra da visão histórica da superdotação. Caso


queira aprofundar mais seus estudos, indicamos o site a seguir:

<www.derbp.com.br/praticas_educacionais_superdotados.ppt>

Esse site é da diretoria de ensino da região de Bragança Paulista. Ele possui


uma sessão chamada “oficina pedagógica”, que apresenta materiais diversos
sobre alfabetização, artes, tecnologia educacional, ciências, biologia, física,
entre outros, inclusive sobre educação especial. Dentro do item educação
especial, há vários materiais e orientações sobre esse tema. Há um subitem
do tópico educação especial que se chama orientações técnicas, no qual
encontramos alguns slides sobre a história da superdotação, assim como
outros materiais. Para acessar os slides sobre a história da superdotação,
você deverá entrar em “orientação técnica de 29-04-2009/ superdotação-
altas habilidades”. Vale a pena ser lido pelas pessoas interessadas e
comprometidas com a educação desses alunos.

3.2 Desmitificando conceitos

É comum ouvirmos notícias de crianças com idades entre um ano e


meio e dois anos que leem com rapidez e fluência, que conhecem os
países, suas respectivas capitais e bandeiras, que possuem habilidade
significativa em cálculos matemáticos, não é mesmo?

Na maioria dos casos, a família alega nunca ter ensinado a criança a ler,
a escrever e a contar. Mas será que realmente nunca oportunizaram a
elas a manipulação de livros ou algum tipo de treinamento?

Casos como esses geralmente aparecem na mídia e tanto os pais quanto


as emissoras de televisão se engrandecem muito com tal situação.
UNIUBE 123

Entretanto, precisamos ficar atentos, pois essas crianças podem estar


apresentando uma precocidade e, ainda, não se
pode identificá-las como superdotadas, talentosas Precocidade

ou portadoras de altas habilidades. Chamamos


de precoce
uma criança
que apresenta
Devemos analisar criteriosamente tais episódios, alguma habilidade
pois eles podem ser significativos para a identificação específica
prematuramente
e diagnóstico da superdotação e altas habilidades desenvolvida em
qualquer área do
em crianças com menos de sete anos. conhecimento.

Sendo assim, um fator extremamente importante


para a identificação de superdotação e/ou altas habilidades com crianças
da Educação Infantil é a observação sistematizada. Essa observação
deve ter o intuito de verificar se os seus traços superiores apresen­tados
são consistentes e irão continuar.

EXEMPLIFICANDO!

Uma criança prodígio e com uma habilidade excepcional foi Wolfgang


Amadeus Mozart, que começou a tocar piano com três anos, aos quatro
aprendia peças com facilidade e rapidez e, aos sete, já compunha e fazia
apresentações. Mozart foi capaz, também, de após ouvir uma peça inteira
apenas uma vez retê-la na memória e reproduzi-la sem cometer erros.

Assim como Mozart, temos Picasso, Einstein, entre outros considerados


gênios na história da humanidade, pois além de serem “excepcionais”,
deixaram marcas na História.

Veja que há diferenças entre o ser humano precoce, o prodígio e o gênio:

Precoce: crianças que apresentam alguma habilidade prematuramente


em qualquer área do conhecimento, como uma criança que lê entre três
e quatro anos ou um aluno que ingressa na universidade aos onze.
124 UNIUBE

Prodígio: crianças que realizam algo anormal para sua idade, que
demonstram desem­penho superior ao nível de um profissional adulto
em qualquer área, por exemplo, Mozart que tocava piano aos três anos,
aos quatro anos, sem orientação formal, já aprendia peças com rapidez,
e aos sete já compunha e realizava apresentações.

Gênio: é aquele que não apenas possui um talento relevante como


também o utiliza de forma produtiva, gerando obras de valor. A
superdotação intelectual não pode ser tratada como sinônimo de
genialidade, pois indica apenas um dado tipo de capacidade mental,
enquanto a genialidade resulta de uma condição de intelecto, condições
socio­econômicas, culturais, motivação e trabalho duro.

No Brasil, em 1995, a partir das Diretrizes Gerais para o Atendimento


Educacional aos Alunos Portadores de Altas Habilidades, Superdotação
e Talentos, estabelecidas pela Secretaria de Educação Especial do
Ministério da Educação e Desporto, foi proposta a seguinte definição:
Alta habilidade refere-se aos comportamentos observados
e ou relatados que confirmam a expressão de traços
consistentemente superiores em relação a uma média
(por exemplo, idade, produção ou série escolar) em
qualquer campo do saber ou do fazer. Deve-se entender
por “traços” as formas consistentes, ou seja, aquelas que
permanecem com frequência e duração no repertório
dos comporta­mentos da pessoa, de forma a poderem
ser registradas em épocas diferentes e situações
semelhantes (BRASIL, 1995, p. 13).

Podemos ressaltar que essa definição destaca os traços e comportamentos


acima da média, relacionando-os à permanência e à sua duração.

Superdotados seriam, de acordo com esta definição, aquelas pessoas


que apresentam traços consistentemente superiores em relação a uma
média e que sejam permanen­tes, podendo ser identificados em épocas
diferentes. Por exemplo, uma criança que aos dois anos reconhece e
nomeia todas as letras do alfabeto; aos dois anos e meio reconhece e
nomeia palavras simples; aos três anos lê muitas palavras e aos três
anos e meio lê livros fluentemente.
UNIUBE 125

3.2.1 Aspectos de notável desempenho e elevada potencialidade de


crianças superdotadas e talentosas

A definição de superdotação que consta na Política Nacional de Educação


Especial de 1994 diz que crianças superdotadas e talentosas são as que
apresentam notável desempenho e elevada potencialidade em qualquer
um dos seguintes aspectos, isolados ou combinados:

Capacidade intelectual geral: capacidade que envolve rapidez de


pensamento, com­preensão e memória elevadas, capacidade de pensamento
abstrato.

Aptidão acadêmica específica: atenção, concentração, rapidez de


aprendizagem, boa memória, motivação por disciplinas acadêmicas do
seu interesse, capacidade de produção acadêmica.

Pensamento criador ou produtivo: originalidade de pensamento,


imaginação, capa­cidade de resolver problemas de forma diferente e
inovadora.

Capacidade de liderança: sensibilidade interpessoal, atitude cooperativa,


capacidade de resolver situações sociais complexas, poder de persuasão
e de influência no grupo.

Talento especial para as artes: alto desempenho em artes plásticas,


musicais, dra­máticas, literárias ou cênicas.

Capacidade psicomotora: desempenho superior em velocidade, agilidade


de movi­mentos, força, resistência, controle e coordenação motora.

Assim como nós, os superdotados podem apresentar sentimentos, atitudes


e compor­tamentos diversificados, o que os caracteriza e os diferencia
como pessoa.
126 UNIUBE

3.2.2 Perfis individuais em relação à superdotação/talento

Um superdotado/talentoso pode se destacar em uma área ou combinar


várias, pode também apresentar graus de habilidades diferenciadas.

Destaca-se aqui a questão das características e dos perfis individuais, que


são aspectos relevantes com relação à superdotação/talento.

Perfis Os estudiosos George Betts e Maureen Neihart


São as após anos de estudos, observações e entrevistas
características gerais
de uma pessoa, distinguem os perfis dos alunos com talentos/
aspecto, caráter.
Informação sobre a
altas habilidades e superdotação em seis tipos:
estrutura mental de bem-sucedido, desafiante, escondido, desistente,
um indivíduo ou de
um grupo específico. rótulo duplo e autônomo.

Vamos abordar agora um pouco sobre cada um desses perfis, pois


estes podem nos auxiliar a compreender o modo de ser e de agir dos
alunos talentosos/superdotados, assim como nos ajudar a detectar suas
dificuldades, necessidade e interesses.

Tipo 1 – Bem-sucedido

Com certeza, a maioria dos alunos identificados nas escolas são do


tipo bem-sucedido, pois são alunos que se comportam adequadamente
ao sistema educacional. Eles aprendem satisfatoriamente e são
bem-sucedidos academicamente. Este tipo raramente apresenta problemas
comportamentais, pois se preocupa com a aprovação dos profes­sores,
pais e outros. É perfeccionista, é dependente, tem facilidade para
aceitar e se conformar mediante situações novas. Possui autoconceito
positivo, culpa-se por faltas e fracassos, é responsável e autocrítico. É
um realizador em potencial, é comedido. Não gosta de correr riscos.
UNIUBE 127

Na maioria das vezes é amado, querido e admirado pelos colegas,


professores e fa­miliares. Este tipo de aluno não está bem preparado
para os desafios e mudanças de vida, por isso, necessita de motivação
extrínseca, de correr riscos, de se posicionar, de perceber suas próprias
deficiências, de ser desafiado, de ter autonomia. Assim terá mais chances
de desenvolver sua criatividade, seus dons e talentos de modo pleno.

Tipo 2 – Desafiante

Este tipo possui problema de disciplina, possui um grau elevado de


criatividade, utiliza­-se de sarcasmos, gosta de desafiar e corrigir os
professores, competitivo, questiona regras e defende suas convicções.
Não é um tipo reconhecido pelos professores, pois suas relações sociais,
na maioria das vezes, envolvem conflitos. É irritante e rebelde, mas
alguns colegas o acham divertido. Tem tendência a se envolver com a
delinquência e com drogas, sente frustração, possui baixa autoestima,
é impaciente, defensivo, mas tem sensibilidade aguçada, apresenta-se
incerto sobre os papéis sociais, possui mu­danças de humor, é honesto
e direto.

Com relação aos hábitos de trabalho, demonstra inconstância e prefere


atividades al­tamente ativas e métodos questionadores. Dentro das
suas necessidades, destaca-se em ações que o levem a aprender o
autocontrole, a ser mais flexível, a desenvolver sua criatividade, suas
habilidades cognitivas e sociais e contratos de comportamentos. É
preciso ter uma comunicação clara e direta com esse tipo de aluno,
permitindo que ele expresse seus sentimentos.
128 UNIUBE

Tipo 3 – Escondido

Este aluno geralmente não é identificado, pois é quieto, tímido, ansioso,


obediente, inseguro, resistente a desafios. Tem tendência de negar
seus talentos para se sentir incluído em relação ao grupo, pois quer ser
aceito socialmente. Neste tipo, estão inseridas, na maioria das vezes,
as meninas.

Pode ser visto pelos outros como líder ou pode simplesmente ser
irreconhecido. Possui média escolar boa e é bem-sucedido. É necessário
desenvolver ações que proporcionem a este aluno o envolvimento com
outros superdotados, liberdade de fazer escolhas, informações sobre
universidade e carreira futura, apoio familiar, técnicas e dinâmicas de
autoaceitação.

Tipo 4 – Desistente

Para este tipo de aluno, a escola parece ser irrelevante e hostil, pois seus
interesses estão fora do currículo escolar. Sendo assim, não consegue
completar as tarefas, seu trabalho é inconsistente e, em sala de aula, fica
com o pensamento longe e se isola.

Tem tendência de criticar os outros e a si mesmo. Com relação ao


rendimento escolar, este é médio ou abaixo da média. É visto como
solitário, desistente, cabeça de vento, pe­rigoso e rebelde.

É comum adultos demonstrarem raiva e ficarem nervosos mediante o


comportamento deste tipo de aluno. Para esse aluno, é necessário um
programa individualizado com metodologias de estudos não tradicionais
voltados para seus interesses.
UNIUBE 129

Tipo 5 – Rótulo duplo

Este tipo parece estranho, bobo, não tem poder pessoal, tem baixa
autoestima, é frus­trado, raivoso e nervoso. Pode apresentar dificuldade
de aprendizagem e se sentir desencorajado, rejeitado, impotente e se
isolar.

Esse aluno pode negar que está tendo dificuldades e alegar que as
atividades são chatas. Demonstra trabalho inconsistente e suas notas,
normalmente, estão na média ou abaixo. É visto como incapaz e destaca-
se pelas suas produções e ações inade­quadas, como uma escrita ilegível
ou trocas/omissões e distorções de letras, chegando até mesmo a ser
encaminhado ao serviço de educação especial.

A escola tem tendência a se concentrar nas fraquezas desse aluno e


deixa de alimentar suas áreas de interesse e talentos. Para este tipo
é necessário dar ênfase nas áreas de seu interesse com o objetivo de
desenvolver suas habilidades e seus talentos, colocá-lo em programas
para superdotados, proporcionar alternativas de experiências de
aprendizagem diversificadas e oportunizar momentos de interação com
colegas.

Tipo 6 – Autônomo

Assim como o tipo bem-sucedido, o autônomo também aprende a


trabalhar eficazmente na escola. A diferença é que o autônomo usa o
sistema para criar novas oportunidades para si, ou seja, ele trabalha para
si, e não para o sistema.

Possui autoconfiança, autoaceitação, tem motivação intrínseca, aceita os


outros, aceita falhas, tem desejo de saber aprender. É aceito e admirado
pelos outros devido às suas habilidades. É visto como responsável e
capacitado e é psicologicamente saudável. Possui habilidades sociais
adequadas, trabalha independentemente, de­senvolve seus próprios
130 UNIUBE

objetivos, dá sequência às tarefas começadas, trabalha sem aprovação,


é criativo, luta por suas convicções, corre riscos, segue suas áreas de
paixão e interesse pessoal. Sente-se seguro criando seus objetivos
pessoais e edu­cacionais. É o tipo que percebe que pode desenvolver
mudanças em sua vida e não espera que os outros o façam para ele.

PONTO-CHAVE

Essa “tipificação” não é um modelo diagnóstico de classificação, mas um


referencial teórico que tem o objetivo de conscientizar os educadores que
esses alunos são influenciados pela família, pelas vivências, por seus
relacionamentos, sentimentos e pelo desenvolvimento pessoal de cada um.

Conhecer esses alunos e tipos é importante, pois poderá servir como base
teórica para a identificação, para orientação às famílias e planejamento
educacional apropriado para o aluno superdotado/talentoso.

Joseph Renzulli é psicólogo educacional, pesquisador do Centro


Nacional de Pesquisa sobre superdotados e talentosos na Universidade
de Connecticut, Estados Unidos. Ele foi pioneiro ao dizer que os
comportamentos de superdotação consistem na inter-relação de três
traços humanos:

1 – habilidade acima da média em alguma área do conhecimento (não,


necessariamente, muito superior à média);
2 – envolvimento com a tarefa, motivação, vontade de realizar, perseverança,
concen­tração;
3 – criatividade, pensar algo diferente, ver novos significados, retirar
ideias de um contexto e usá-las.

Para ele, superdotados são aqueles que possuem esse conjunto de


traços concomi­tantemente.
UNIUBE 131

PESQUISANDO NA WEB

Renzulli apresentou a inter-relação desses três traços humanos por uma


imagem chamada modelo dos três anéis ou modelo triádico de superdotação.
Caso você queira conhecer essa imagem, sugerimos que consulte o texto
“o que as palavras querem dizer?”, que corresponde ao Capítulo 2 do livro
Altas habilidades/superdotação: encorajando potenciais, de Angela M. R.
Virgolim, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial (2007).
Na página 36, a autora mostra o quadro 2, “Diagrama da teoria dos três
anéis”. O texto está no site da Fundação Catarinense de Educação Especial
– FCEE, disponível em:

<http://www.fcee.sc.gov.br/index.php?option=com_docman&task=cat_
view&gid=83&Itemid=91&limit=10&limitstart=0&order=hits&dir=ASC>

Vale a pena conferir!

A concepção e os modelos de Renzulli são significativos porque


sua definição e seus estudos provaram que os testes de Q.I. eram
insuficientes para a identificação dos superdotados.

Vamos continuar refletindo sobre os testes de Q.I.

3.3 Identificando os mais capazes

Agora que já sabemos um pouco mais sobre a definição de superdotação/


altas habili­dades, temos mais um desafio: como identificá-la?

3.3.1 Testes de inteligência (Q.I.)

Há décadas, o processo de identificação era relativamente fácil, pois para


tal bastava que fossem aplicados os testes de inteligência (Q.I.). O objetivo
dos testes de Q.I. é comparar a idade cronológica com a mental.
132 UNIUBE

Esse teste foi criado no início do século XX pelos estudiosos Binet e


Simon e tinha o objetivo de identificar crianças com retardamento
intelectual. No teste, há uma sequência de tarefas que focam as
habilidades do indivíduo em relação a pensar, resolver problemas, enfim,
raciocinar. As tarefas são de pensamento lógico-matemático, habilidade
linguística, pensamento analítico, capacidade de abstração teórica,
aptidão escolar, conhecimento e pensamento acadêmico. Com base no
desempenho do indivíduo nessa sequência de tarefas, é que chegamos
à sua idade mental.

A pontuação obtida no teste é uma indicação de como está o desempenho


do indivíduo em relação à maioria das pessoas de seu grupo de idade. O
Q.I. médio varia de 95 a 100 pontos, portanto a pessoa que obtém essa
média tem um nível de inteligência normal.

Uma criança de sete anos faz o teste e tem uma pontuação de 160. Isso
quer dizer que ela tem 60% a mais de inteligência do que o esperado para
as crianças de sete anos.

Nos últimos anos, observou-se a ineficácia desses testes, pois, como diz
Winner (1998, p. 15):
Os testes de Q.I. medem uma estreita gama de
habilidades huma­nas, principalmente facilidade com
linguagem e número. Há poucas evidências de que
superdotação em áreas não acadêmicas, como artes ou
música, requeiram um Q.I. excepcional.

Nesse sentido, há uma parcela da população que não está incluída


nessas estatísticas, já que os testes padronizados não privilegiam
áreas mais subjetivas, por exemplo, habilidades sinestésicas, musicais
e artísticas. A partir desse conhecimento, percebe­-se que para a
identificação de crianças superdotadas múltiplos critérios devem ser
utilizados, considerando-se informações obtidas de fontes variadas,
incluindo tanto a criança como seus professores, pais e colegas, além,
naturalmente, daquelas obtidas pelo psicólogo por meio do uso de testes.
UNIUBE 133

3.3.2 Técnica da autoidentificação

A técnica da autoidentificação é uma das técnicas sugeridas por Guenther


(1995) para auxiliar no processo de identificação. Esta técnica consiste
em perguntar à criança sobre seus hobbies, interesses principais,
atividades desenvolvidas fora da escola, formas de pensamento
preferidas, bem como reações a elementos de seu ambiente.

A nomeação pelos companheiros de sala de aula dos alunos que se


destacam em alguns traços é outro critério que deve ser utilizado no
processo de identificação. Essa nomeação refere-se à indicação
dos próprios alunos de sala de aula em relação às habilidades dos
colegas. Ou seja, pode-se pedir para que respondam, por exemplo, às
seguintes perguntas: “Quem consideram o colega mais inteligente?”,
“Quem consideram o mais criativo?”, “Quem consideram o mais amigo e
preocupado com o bem-estar de todos?” e outras.

É muito importante também o julgamento, a avaliação e a observação


do professor, pois ele desempenha um papel significativo no processo
de identificação. O julgamento do professor é o seu olhar. Quem na sala
de aula ele acha mais criativo, por exemplo, quem é o mais interessado,
comunicativo etc.

O papel do professor também é o de atender às necessidades dos alunos


e oportunizar o desenvolvimento de suas potencialidades.

3.3.3 Observação com base em checklist

O checklist é uma lista que contém atitudes, interesses, posturas, ações e


característi­cas comuns aos indivíduos superdotados-talentosos que alguns
autores sugerem para facilitar a identificação.
134 UNIUBE

Vejamos abaixo algumas dessas características:

• o melhor aluno;
• aquele com vocabulário maior;
• o aluno mais criativo e original;
• o aluno com maior capacidade de liderança;
• o aluno com pensamento crítico mais desenvolvido;
• o aluno com maior motivação para aprender;
• o aluno de que os colegas mais gostam;
• o aluno com maior interesse nas áreas das ciências;
• o aluno que está mais avançado na escola em
relação à idade. (ANTIPOFF, 1992, p. 36)

Ellen Winner, em seu livro Crianças superdotadas: mitos e realidades


(1998), ressalta também algumas características apresentadas em
relação às habilidades escolares e algumas atitudes às quais a família e
o professor devem ficar atentos:

• leitura precoce por volta dos quatro anos, ou antes, com instrução
mínima;
• fascínio por números e relações numéricas;
• memória prodigiosa para informação verbal e/ou matemática;
• frequentemente brincam sozinhas e apreciam a solidão;
• preferem amigos mais velhos, próximos a ela em idade mental;
• interessa-se por problemas filosóficos, morais, políticos e sociais;
• apresentam alto senso de humor em decorrência de habilidades
verbais.
UNIUBE 135

A pesquisadora Zenita Guenther, responsável pela criação do Centro


para o Desenvol­vimento do Potencial e Talento – CEDET, situado em
Lavras (MG), que é uma referên­cia no Brasil nessa área, após estudos
e pesquisas, também desenvolveu e utiliza um checklist para facilitar o
processo de identificação.

A lista de Zenita contém itens para observação em sala de aula e é


composta por ca­racterísticas referentes ao talento verbal, talento
científico/matemático, talento artístico, talento psicossocial, talento
psicomotor e também referente às capacidades de inteli­gência geral, de
pensamento abstrato e criatividade. A autora ressalta que:
não é propriamente o conteúdo de cada item de
observação listado que vai pesar como parâmetro
de identificação, mas a derivação dos troncos de
caracterização de dotados e talentosos, expressos
como construtos abstratos, relativos à população
escolar (GUENTHER, 2000, p. 175).

Ou seja, as características apresentadas, a seguir, deverão ser interpretadas


em toda sua totalidade, devem ser analisadas na forma de ser, agir e
reagir do aluno. Quando se diz, por exemplo, para indicar o melhor da
turma em comunicação e expressão, se faz necessário compreender e
analisar de fato como é a comunicação e expressão desse aluno, ou seja:
“Por que ele se destaca dos demais nessa área? O que o diferencia?
Ele está além do esperado tendo em vista seu contexto, sua realidade?
A forma que ele utiliza para se comunicar e expressar é realmente
inusitada? Na prática, em relação à ação e aos comportamentos visíveis,
como o aluno lida com essa comunicação e expressão?
136 UNIUBE

Portanto, é preciso saber utilizar as listas com coerência, com embasamento


teórico e com ética.

Vamos então conhecer agora, separadamente, as características de cada


talento e capacidade.

Inteligência e capacidade geral

Está relacionada ao potencial geral, destacando-se a vivacidade


mental, automotivação e confiança. A vivacidade mental é reconhecida
pela maneira como as crianças expres­sam curiosidade, questionam,
interrogam, perguntam, enfrentam e apreciam desafios, encontram
vias para expressar senso de humor, têm boa memória, domínio sobre
um considerável fundo de conhecimento e informações, aprendem,
compreendem, apreen­dem com facilidade e por vários meios (GUENTHER,
2000, p. 47).

A automotivação e a confiança, segundo Guenther (2000, p. 48), são


compostas por características de crianças que têm “cabeça própria”.
Sendo assim, está relacionada à independência, confiança, persistência,
segurança, compromisso com a tarefa, res­ponsabilidade, tomada de
iniciativas, motivação interna.

Para serem considerados com esta capacidade, é preciso que os alunos


apresentem pelo menos seis das características a seguir:

• melhores em atividades extracurriculares;


• mais curiosos, interessados, perguntadores;
• de melhor memória, aprendem e fixam com facilidade;
• mais persistentes, compromissados, chegam ao fim do que fazem;
• mais independentes, iniciam o próprio trabalho e fazem sozinhos;
• entediados, desinteressados, mas não necessariamente atrasados;
• mais ativos, perspicazes, observadores;
UNIUBE 137

• mais capazes de pensar e tirar conclusões;


• mais levados, engraçados, “arteiros”;
• o professor os considere os mais inteligentes;
• que produzem respostas inesperadas e pertinentes.

Ou apresentarem quatro das características:

• de melhor memória, aprendem e fixam com facilidade;


• mais independentes, iniciam o próprio trabalho e fazem sozinhos;
• mais originais e criativos;
• mais ativos, perspicazes, observadores;
• mais capazes de pensar e tirar conclusões;
• o professor os considere os mais inteligentes;
• produzem respostas inesperadas e pertinentes.

O talento verbal

O talento verbal está relacionado à capacidade acadêmica de se destacar


na linguagem verbal, na expressão e na comunicação, seja oral e/ou
escrita. A criança com este talento tem a capacidade de fazer uso da
língua em nossa realidade com qualidade, propriedade e domínio.

Para serem considerados com este talento, é preciso que os alunos


apresentem pelo menos três das características:

• melhores da turma nas áreas de linguagem, comunicação e expressão;


• mais verbais, falantes e conversadores;
• mais participantes e presentes em tudo, dentro e fora da sala de
aula;
• mais capazes de pensar e elaborar conclusões;
• o professor os considere os mais inteligentes.
138 UNIUBE

O talento científico-matemático (capacidade de pensamento abstrato)

Esse também é um talento acadêmico e está relacionado às habilidades de


associa­ção, comparação, análise, síntese, raciocínio, lógica, identificação de
causas e efeitos e de formação de conceitos. A maioria dos indivíduos com
este talento e capacidade apresenta enorme persistência e concentração.

Para serem considerados dotados deste talento, é preciso que os alunos


apresentem três ou mais das seguintes características:

• os melhores nas áreas de matemática e ciências;


• têm melhor memória, aprendem e fixam com facilidade;
• mais independentes, iniciam o trabalho e fazem sozinhos;
• mais capazes de pensar e elaborar conclusões;
• o professor os considere os mais inteligentes.

O talento artístico e/ou capacidade criativa

Esse talento e/ou capacidade relaciona-se com a


Pensamento
divergente capacidade de produção, de criação, de originalidade,
de autoria. Segundo Guilford (apud GUENTHER,
É um processo
de pensamento 2000, p. 48), a criatividade é considerada como uma
cujo objetivo é
achar o maior dimensão da inteligência.
número possível
de soluções para
um problema. Já Virgolim (2007, p. 59) comenta que nem sempre
Essa habilidade é
usada para gerar a pessoa mais inteligente é a que apresenta as
ideias e resolver
algo criativamente, respostas mais originais; da mesma forma, nem
em oposição sempre a pessoa mais criativa é a mais inteligente
ao pensamento
convergente, que entre seus pares.
consiste em achar
uma única solução
apropriada a um Os indivíduos criativos e com talento artístico
problema.
são, na maioria das vezes, considerados pela
Fonte: Wikipédia,
(2011). sociedade como estranhos e diferentes, pois
possuem pensamento divergente, apresentam
UNIUBE 139

inconformismo, são altamente críticos e autocríticos, o que pode gerar


conflitos e tensões seja em nível interpessoal como intrapessoal.

Embora seja curioso e imaginativo, com inclinação para brincar com as


ideias e dar respostas bem-humoradas e diferentes do usual, o estudante
criativo muitas vezes é percebido como o palhaço da turma, crítico
de si mesmo e dos colegas, sarcástico, bagunceiro, não conformista,
desrespeitoso para com as figuras de autoridade e para com as tradições.
(CLARK, 1992 apud VIRGOLIM, 2007, p. 59).

Para ser considerado com este talento e/ou capacidade, é preciso que o
aluno apresente pelo menos quatro das seguintes características:

• melhor nas áreas de arte e educação artística;


• mais crítico com os outros e consigo próprio;
• mais persistente, compromissado, chega ao fim do que faz;
• mais original e criativo;
• mais ativo, perspicaz, observador;
• produz respostas inesperadas e pertinentes.

O talento psicossocial

Esse tem a ver com a habilidade de saber relacionar, interagir, viver


e conviver em grupo. Está relacionado com a inteligência emocional,
que é a capacidade que temos de reconhecer nossos sentimentos e
os dos outros, assim como a capacidade de lidar com eles. O indivíduo
que possui este talento apresenta sensibilidade e preocupação com os
outros, possui um senso de justiça altamente aguçado e é uma pessoa
que valoriza e irradia valores, como respeito, bondade e amizade.

Para ser considerado com este talento, é preciso que o aluno apresente
pelo menos quatro das seguintes características. Observe as características
que estão em negrito, pois estas indicam capacidade de liderança:
140 UNIUBE

• melhor em atividades extracurriculares e extraclasse;


• mais participativo e presente em tudo, dentro e fora da sala de aula;
• mais sensível aos outros e bondoso com os colegas;
• preocupado com o bem-estar dos outros;
• mais seguro e confiante de si;
• mais simpático e querido pelos colegas;
• capaz de liderar e passar energia própria para o grupo.

Segundo Guenther (2000), esta área de talento não assegura bases


muitos claras para observação e necessita de melhores definições.

O talento psicomotor

O talento psicomotor está relacionado ao talento esportivo. O indivíduo


que possui esse talento tem habilidades sensório-motoras que proporcionam
elevada capacidade de desempenho físico-motor.

Para ser considerado com este talento, é preciso que o aluno apresente
as seguintes características:

• melhor em atividades extracurriculares e extraclasse;


• melhor desempenho em esportes e exercícios físicos;
• sobressair-se em habilidades manuais e motoras.

É viável que você, educador, indique em cada item os dois alunos


da turma, menino ou menina, que se destacam nas características
apresentadas acima e é interessante também indicar alguma criança
que apresente outros talentos especiais que não foram contemplados
na listagem.
UNIUBE 141

Guenther, em seu livro Desenvolver capacidades e talentos: um conceito


de inclusão (2000), diz que o processo de identificação desenvolvido no
CEDET, em síntese, constitui-se de três estágios, que são:

1º – a observação direta, registrada pelos professores da sala de


aula, orientada pela lista de indicadores, com revisão, reavaliação e
complementação das observações dos professores, feita pela equipe
técnica da escola;
2º– o acompanhamento da criança pelo facilitador do CEDET, durante o
ano de trabalho;
3º– a observação sistemática pelo professor que trabalhou com a criança
durante o ano que se segue à primeira observação, em comparação com
a nova turma de colegas.

Sendo assim, ao final de cada ano, tem-se o olhar de três profissionais


que acompa­nharam o aluno: 1) o professor que preencheu o checklist
no ano anterior, pois este é preenchido no final do ano; 2) o professor
da sala de aula do aluno, ou seja, da sala de aula que ele frequentou;
e 3) o facilitador do centro (CEDET), que teve o papel de oportunizar
situações de aprendizagem, diferenciadas e enriquecidas, para o aluno.
Estas atividades são desenvolvidas no contraturno no CEDET ou em
outras instituições da comunidade parceiras do centro.

SINTETIZANDO...

O conceito de superdotação/altas habilidades evoluiu ao longo do tempo!


Saiu de uma concepção unidimensional que se centrava em teste de Q.I. e
avaliação de habilidades cognitivas para uma concepção multidimensional
que valoriza também a criatividade, as habilidades artísticas, musicais,
esportivas e sinestésicas.

Com esta nova visão amplia-se o olhar que deixa de enxergar e valorizar
somente os talentos acadêmicos!
142 UNIUBE

3.4 Aspectos emocionais e comportamentais das altas habilidades/


superdotação

Você já pensou sobre a vida emocional dos superdotados/talentosos?


Será que eles são emocionalmente iguais aos demais? Vamos ver?

Existe um mito em relação à vida emocional desses alunos, muitos de


nós acreditamos que todos superdotados/talentosos apresentam ótima
saúde psicológica, mas estudio­sos da área estimam que 20 a 25% das
crianças superdotadas apresentam desajustes psicossociais.

Hellen Winner (1998, p. 168) diz que embora a maioria das crianças
superdotadas sejam social e emocionalmente bem ajustadas, uma
minoria bastante substancial de superdotados de fato apresenta
problemas sociais e emocionais que se originam das consequências de
ser superdotado.

Quanto mais elevado o nível de superdotação e abrangência da área de


domínio, mais dificuldades em se relacionar, de interagir com os outros,
são apresentadas, o que consequentemente leva a uma instabilidade
emocional. O fato de os alunos superdo­tados estarem em outro ritmo de
desenvolvimento, por si só, já acarreta dificuldade de relacionamento.

A estrutura da personalidade de um aluno superdotado/talentoso é


diferente da dos seus pares, pois são alunos que apresentam:

• alta motivação − prazer pelo trabalho, levando a excessivo empenho


na tarefa/talento;
• apreciação por desafios;
• perfeccionismo exagerado, medo de não atingir a perfeição;
• alta concentração;
UNIUBE 143

• autoestima elevada, preferencialmente na área de interesse/talento


e atividades acadêmicas;
• autoestima baixa nas interações sociais;
• independência e teimosia − realizam tarefas de seu jeito;
• liderança – domínio e comando de situações;
• independência de pensamento e valores – alto nível de raciocínio
moral;
• inconformismo − alto nível de raciocínio moral;
• introversão − dificuldade em se relacionar;
• alto poder de criticidade;
• agitação;
• desatenção;
• ansiedade e pessimismo;
• sensibilidade;
• solidão, necessidade de ficar sozinho.

Não podemos dizer que todos os superdotados/talentosos apresentam as


mesmas estruturas de personalidade, pois, como já foi dito anteriormente,
existe a questão das diferenças individuais. Cada ser é único e apresenta
comportamentos e sentimentos de acordo com suas vivências e
experiências ambientais, culturais, socioeconômicas e biológicas.

Mas podemos concluir que o superdotado/talentoso que esbanja saúde


emocional e social é apenas um mito.

SAIBA MAIS

Caso queira saber mais sobre a vida emocional do superdotado/talentoso,


sugerimos que assista ao filme Maluca paixão e fique atento aos
comportamentos e sentimentos da protagonista Mary Horowitz. Apesar de
ser uma comédia, fica evidente as dificuldades emocionais e sociais de uma
pessoa superdotada/talentosa.
144 UNIUBE

Título original: All About Steve


País de origem: EUA
Gênero: Comédia
Tempo de duração: 98 minutos
Ano de lançamento: 2009
Estúdio/Distrib.:Fox Film
Direção: Phil Traill

Agora que você conhece a definição e a identificação de algumas


características e comportamentos de crianças superdotadas/talentosas,
podemos começar a vislumbrar um trabalho pedagógico e educacional,
não é? Vamos lá?

Mas antes vamos refletir sobre esta fala de Albert Einstein acerca de
nosso papel de edu­cadores:
Não é bastante ensinar uma capacidade. Através dela
o indivíduo pode tornar-se uma espécie de máquina
útil, mas não uma personalidade harmoniosa. É
essencial que o profissio­nal adquira compreensão e
sensibilidade, viva para valores... tenha o senso de
belo e o do moralmente bom. Se tal não acontecer, com
todo seu conhecimento especializado, ele parecerá
mais um animal bem treinado do que um Ser humano
(GUENTHER, 2000, p. 113).

Assim sendo, já que não queremos ser animais bem treinados e somos
seres huma­nos dotados de compreensão e sensibilidade, vamos
conhecer algumas propostas pedagógicas para se trabalhar com nossos
alunos superdotados e talentosos para que possamos fazer diferença em
nossa prática pedagógica.
UNIUBE 145

3.5 Aspectos pedagógicos das altas habilidades/superdotação


e talentos

Será que nossas escolas sabem o que fazer com alunos com superdotação/
altas ha­bilidades e talentos?

Assim como existe o mito com relação à vida emocional e social, existem
outros mitos com relação às crianças superdotadas e talentosas, tais como:

• elas não precisam de ajuda para se desenvolver, ou seja, se


desenvolvem sozinhas;
• elas são fisicamente fracas;
• elas não são produtivas por muito tempo, ou seja, o talento
desaparece na vida adulta;
• a criança nasce superdotada e permanece pela vida toda e nada
poderá modificá-la;
• a criança superdotada continuará a demonstrar habilidade intelectual
superior inde­pendentemente das condições ambientais;
• boa dotação é sinônimo de sucesso, alta produtividade na vida;
• superdotação é um fenômeno muito raro, sendo poucas as crianças
e jovens de nossas escolas que podem ser de fato consideradas
superdotadas;
• a criança superdotada geralmente tem bom rendimento escolar.

Esses fatos precisam ser revistos e repensados por todos e cabe a


nós, professores e educadores, uma parcela importante no sentido de
reconhecer capacidades e talentos especiais dos alunos.

Segundo Charles Schulz, “não existe fardo maior do que um potencial


não realizado”, sendo assim, é preciso que aprendamos educar as
crianças superdotadas no sentido de orientá-las de modo a aumentar,
desenvolver, crescer e aperfeiçoar suas capaci­dades e talentos.
146 UNIUBE

SAIBA MAIS

Charles Monroe Schulz foi um cartunista americano, criador do desenho


Charlie Brown e seu cachorro Snoopy, entre outros.

3.5.1 Formas de atender os alunos superdotados/talentosos no


contexto educacional

Segundo Gallagher (1985 apud GUENTHER, 2000, p. 60) três elementos


são, de uma maneira geral, essenciais para atender esses alunos dentro
do contexto educacional.

Veja, a seguir, quais são esses elementos e quais ações cada um deles requer:

Modificação do ambiente: agrupar os alunos mais capazes em grupos


compatíveis para a realização de atividades paralelas ou integradas ao
trabalho regular da sala de aula.

Modificação da postura do professor: o professor, na maioria das


vezes, procura e oferece respostas para problemas, conceitos e
conteúdos colocados em sala de aula. Esta posição deve ser revista: por
que não colocar questões para os alunos em vez de oferecer respostas
prontas e acabadas? Desta maneira, eles procurarão por soluções. O
ensino deve ser centrado na compreensão da natureza do “problema”
em vez de respostas certas.

Modificação do conteúdo ensinado: os conteúdos devem focar temas maiores,


ideias abrangentes que integram uma gama maior de conhecimento, dentro
das diversas matérias e disciplinas do currículo. As estratégias mais comuns
para a modificação do conteúdo curricular estão centradas na aceleração,
no enriquecimento, na sofisticação e na novidade.
UNIUBE 147

Todos os elementos citados são fundamentais para a aprendizagem do


aluno, mas destaco como mais relevante a modificação do conteúdo
ensinado, pois de que adianta modificar o ambiente e a postura do
professor sem desenvolver adequadamente estra­tégias pedagógicas
para a modificação do conteúdo curricular?

A seguir, veremos algumas dessas estratégias utilizadas.

3.5.2 Estratégias pedagógicas para a modificação do conteúdo


curricular

A aceleração

A aceleração é uma estratégia que oportuniza ao aluno concluir sua


escolaridade em menor tempo. Para isso, deve ser realizada uma
avaliação do aluno pela escola, que deverá documentar, por meio de
registros, o desempenho do aluno a fim de justificar sua aceleração. Esta
estratégia está respaldada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1996 em seu capítulo V, art. 59, inciso II, que diz:
II – terminalidade específica para aqueles que não
puderem atingir o nível exigido para a conclusão do
ensino fundamental, em virtude de suas deficiências e
aceleração para concluir em menor tempo o programa
escolar para os superdotados.

Veja algumas formas de aceleração segundo Freeman e Guenther (2000,


p. 110):
• entrada mais cedo na fase seguinte do processo
educativo, do nível da Educação Infantil em diante;
• saltar séries escolares – promoção para séries
seguintes;
• aceleração por disciplina – frequentar séries mais
adiantadas em determinadas disciplinas;
148 UNIUBE

• agrupamento vertical – em classes mistas, com ampla


variedade de idades e séries, de modo que os mais
novos possam trabalhar com os mais velhos e mais
avançados;
• cursos especiais fora da escola que ofereçam mais
conhecimento em áreas curriculares específicas;
• estudos paralelos – cursar o Ensino Fundamental e o
Ensino Médio ao mesmo tempo, e assim por diante;
• planos de estudo auto-organizados – estratégia em
que os alunos desenvolvem atividades ou projetos de
seu interesse, enquanto esperam o resto da classe
completar o que eles já fizeram ou aprenderam;
• trabalho com um mentor, especialista de uma certa
área de inte­resse do aluno, na escola ou fora dela;
• cursos paralelos – por correspondência, televisionados
ou outra forma de ensino a distância.

Segundo Alencar (1986, p. 57), vários aspectos devem ser examinados


antes de se iniciar um programa de aceleração. O primeiro deles diz
respeito à necessidade de se conhecer as várias habilidades dos alunos
intelectualmente talentosos. Um segundo aspecto é com relação ao
professor (ou professores) que levará ou levarão a efeito o programa de
aceleração.

Sendo assim, é preciso ter muita cautela ao optar pela aceleração do


aluno, pois é necessário averiguar se esta será realmente benéfica.
Os fatores sociais e emocionais influenciam, muito, a construção da
aprendizagem, portanto é essencial analisar a situação em seu todo;
verificar se o aluno tem condições de ser acelerado realmente e se a
instituição, assim como seus profissionais, está preparada para que
esta estratégia traga sucesso e, principalmente, estímulo ao potencial
do aluno.
UNIUBE 149

Alencar (1986, p. 57-58) ainda coloca que vantagens e desvantagens da


aceleração têm sido lembradas por muitos que se dedicam à elaboração
de programas para o superdotado. Entre os argumentos daqueles que
se opõem e daqueles que veem muitas vantagens, salientam-se as
vantagens e as desvantagens descritas no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1: Desvantagens e vantagens da aceleração

Desvantagens e vantagens da aceleração

É importante manter o aluno com aqueles da mesma idade e


nível social e emocional.
A criança que salta uma determinada série deixa de aprender uma
Desvantagens
gama de conhecimentos importantes e necessários.
Nunca a aceleração se dá de forma adequada em todas as
áreas.

Este é um método que pode ser usado em qualquer escola.


Os alunos intelectualmente superiores tendem a escolher compa-
nheiros mais velhos, e a aceleração vai favorecer este contato.
A aceleração permite aos estudantes mais capazes dar início à sua
vida profissional mais cedo, o que resulta em maior produtividade.
Pelo fato de os estudantes permanecerem menos tempo na esco-
la, os custos diminuem.
Observam-se menos tédio e insatisfação entre os estudantes a
quem se permite acelerar nos estudos, os quais percebem o novo
programa como mais estimulante e menos enfadonho.
Vantagens O ajustamento social e emocional tem se mostrado superior nos
estudantes que participam de programas de aceleração.
A aceleração permite que se exija do aluno uma produtividade
mais de acordo com suas capacidades.
Se um estudante inusitadamente brilhante permanece com seus
colegas da mesma idade, ele possivelmente achará as tarefas
propostas pelo professor muito fáceis e desenvolverá hábitos ina-
dequados de estudo.
A oportunidade de interagir e participar de atividades acadêmicas
tende a favorecer uma atitude mais responsável por parte do aluno
e o estabelecimento de novos propósitos e objetivos.

Fonte: Adaptado de Alencar (1986, p. 57-58).


150 UNIUBE

Sendo assim, reveja o conceito de aceleração e pense sobre as vantagens


e as des­vantagens explicitadas. Lembre-se dos conhecimentos que tem
acerca da escola.

É muito importante que o educador pense nas vantagens e nas desvantagens


da ace­leração, especialmente em relação às singularidades do aluno em
questão.

O enriquecimento

O enriquecimento é uma estratégia que proporciona ao aluno o acesso a


experiências significativas de aprendizagem, com o objetivo de ampliar,
aprofundar e enriquecer o conteúdo curricular e, também, sua área de
interesse e talento.

Para que tenha um bom resultado, são necessárias orientações


sistematizadas. Esta estratégia pode ser desenvolvida individualmente e
em grupo com os pares, por meio de projetos orientados por um facilitador
ou mediador. Ela poderá acontecer na escola regular, em centros de
atendimento, em salas de recursos e/ou com pessoas eminentes na
sociedade (mentores).

Alencar (1986, p. 59) ressalta que é importante um programa de


enriquecimento que proporcione ao aluno liberdade de escolha dos
tópicos a serem estudados, a extensão e a profundidade desejadas,
permitindo-lhe ainda utilizar seu estilo preferido de apren­dizagem. Nesse
caso, o papel do professor seria, antes, o de facilitador na identificação
de problemas, favorecendo ainda a aquisição de métodos de pesquisa.
UNIUBE 151

EXEMPLIFICANDO!

Em visita ao Centro para o Desenvolvimento do Potencial e Talento –


CEDET, de Lavras, MG, tive a oportunidade de acompanhar um grupo de
alunos que participavam de aulas na universidade federal. Esses alunos
estudavam, pela manhã, no ensino regular e, à tarde, eram inseridos nos
programas de enriquecimento que o centro oferecia, por meio das parcerias
com a comunidade e na própria sede.

Os alunos se dividiam em dois grupos e iam assistir às aulas no laboratório


sobre clonagem de plantas e anatomia. Para fazerem parte dessas aulas
de enriquecimento, precisavam frequentar regularmente a escola e ter um
rendimento satisfatório. Em meu ponto de vista, essa é uma proposta válida,
pois todos, escola, aluno e família, se tornam parceiros e corresponsáveis
pelo processo ensino-aprendizagem.

Renzulli (2004, p. 75), sobre esta estratégia, diz que tem o objetivo de
desenvolver o conhecimento e as habilidades de pensamento, adquiridos
por meio da instrução formal, com aplicação de conhecimentos e
habilidades decorrentes da própria investigação feita pelo aluno. Tais
conhecimentos resultam no desenvolvimento de um produto criativo. Um
exemplo seria o aluno participar de um projeto que estimule seu talento e
sua área de interesse, tendo como objetivo oferecer oportunidades para
que ele aprofunde seus estudos, realize pesquisas e chegue a criar e/
ou descobrir algo novo.

O autor subdividiu a estratégia de enriquecimento em três:

Modelo de enriquecimento tipo 1: atividades gerais de exploração,


realizadas por meio de palestras, excursões, visitas, minicursos, internet,
filmes e outros que não fazem parte do currículo regular.
152 UNIUBE

Modelo de enriquecimento tipo 2: atividades de treinamento dos níveis


superiores de pensamento, como análise, síntese e avaliação. Atividades
que desenvolvem habilidades críticas, criativas de desenvolvimento
social, pessoal e de liderança. Por exemplo, pesquisas.

Modelo de enriquecimento tipo 3: atividades que oportunizem o aluno


a aprofundar, a desenvolver e a transformar a informação existente.
Neste modelo, o aluno deixa de ser um mero espectador da informação
existente, ele passa a atuar, a agir, a desenvolver algo, a criar. Por
exemplo, escrever livros, criar homepage etc.

É interessante pensarmos que esses três modelos se complementam


e o objetivo é que os alunos cheguem ao modelo três, não é mesmo?
Pois queremos que os alunos desenvolvam todo o seu potencial!

A compactação do currículo

A compactação do currículo é uma estratégia utilizada para oportunizar


ao aluno um caminhar mais rápido, perante os componentes curriculares
de seu domínio. O currí­culo normal é completado em metade ou na terça
parte do tempo previsto. Ou seja, é uma forma de tornar compacto os
conteúdos do currículo que o aluno já sabe e são desnecessários para
sua realidade.

Essa estratégia motiva o aluno a prosseguir seus estudos na sala de


aula regular, pois o ambiente torna-se mais desafiador e incentivador à
medida que o aluno tem a opor­tunidade de investir seu tempo em outros
tópicos de seu interesse.

Segundo Virgolim (2007, p. 62), dois procedimentos são essencias para


a compactação do currículo:
UNIUBE 153

1 - Um cuidadoso diagnóstico da situação.


2 - Completo conhecimento do conteúdo e dos objetivos
da unidade de instrução.

Esses são procedimentos importantes, pois o professor deverá analisar


o que o aluno domina realmente e até que ponto, assim como conhecer
os conteúdos do currículo em sua totalidade para que seja decidido o
que compactar.

A compactação oferece ao aluno oportunidades para trabalhar com as


estratégias de enriquecimento e de aprofundamento. A compactação do
currículo pode sugerir tam­bém uma aceleração. Tudo irá depender do
diagnóstico realizado pelo professor e do desempenho do aluno mediante
o conteúdo dominado.

Se, por exemplo, forem compactadas várias unidades de ciências, caberá


ao professor analisar se o aluno deve ser acelerado para o próximo ano,
se deverá aprofundar mais o conteúdo ou se deverá aproveitar seu tempo
em outro tópico/ disciplina de interesse.

3.5.3 O atendimento oferecido pelas salas de Atendimento Educacional


Especializado (AEE) – salas de recurso

O Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Educação


Especial (SEESP), instituiu as salas de Atendimento Educacional
Especializado (AEE). O AEE é um serviço de caráter complementar
ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular, voltado
para a formação dos alunos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, considerando suas
necessidades específicas de forma a promover acesso, participação e
interação nas atividades esco­lares. Ele perpassa todos os níveis, etapas
e modalidades de ensino, sem substituí-los, garantindo o direito de todas
as crianças e jovens à educação escolar comum. O AEE é realizado no
turno inverso ao da sala de aula comum.
154 UNIUBE

Deve ser realizado, prioritariamente, na Sala de Recursos Multifuncionais


da própria escola ou em outra sala de ensino regular, podendo ser realizado
também em centro de atendimento educacional especializado público ou
privado sem fins lucrativos, con­veniado com a Secretaria de Educação.

No caso dos alunos com altas habilidades/superdotação, são desenvolvidas


atividades de enriquecimento curricular a partir das áreas de interesse real
e potencial dos alunos. O interesse potencial surgirá a partir das vivências
e experiências, desenvolvidas por meio de situações inovadoras, criativas e
estimuladoras. Outro objetivo da sala de AEE para essa clientela é promover
uma articulação com instituições de ensino, de pesquisa, de artes, de
esportes etc., com a finalidade de oportunizar o estímulo e desenvolvimento
dos talentos e da capacidade criadora do aluno em questão, pois se o talento
não for estimulado, corre o risco de ser desperdiçado.

3.6 A superdotação, os distúrbios e as dificuldades de aprendizagem

Por um bom período de tempo, foi defendida a ideia errônea de que para
ser superdo­tada a criança deveria ser brilhante em todas as áreas.

CURIOSIDADE

Você sabia que Isaac Newton tirava notas baixas na escola? Que John
Kennedy tinha dificuldades em soletrar e baixo rendimento na escola?

Que Thomas Edison foi mau aluno e não frequentava a escola, era
desinteressado e quem o ensinou a ler foi sua mãe?

Apenas, há pouco tempo, que estudiosos começaram a identificar e a


reconhecer alu­nos superdotados que possuíam distúrbios e dificuldades
de aprendizagem, inclusive, a encontrar alunos superdotados com
discalculia, dislexia, disgrafia, problemas de percepção, com déficit
de atenção, entre outros.
UNIUBE 155

EXPLICANDO MELHOR

Discalculia: impede a criança de compreender os processos matemáticos.

Disgrafia: dificuldade de escrever letras e números.

Dislexia: dificuldade em não conseguir identificar símbolos gráficos (letras e/


ou números), tendo como consequência disso a dificuldade na leitura e escrita.

Fonte: Psicopedagogia Brasil (2011).

Você pode estar se perguntando, mas por quê?

Podemos encontrar alunos superdotados com discalculia, dislexia,


disgrafia, problemas de percepção, com déficit de atenção, entre outros
distúrbios, pelos seguintes motivos:

1) apresentarem uma desordem cerebral que os impeçam de receber,


processar e expressar informações, ou seja, apresentam um problema
de ordem orgânico/neu­rológico.

EXEMPLIFICANDO!

Há indivíduos que se destacam em atividades de raciocínio verbal abstrato,


mas não conseguem registrar no papel devido à sua disgrafia. Tais indivíduos
podem possuir um problema perceptivo que leve à inversão de letras.

2) serem academicamente superdotados, ou seja, possuírem uma


habilidade maior e um interesse em uma determinada área e/ou
disciplina.
156 UNIUBE

EXEMPLIFICANDO!

Uma criança aos dois anos sabia ler, mas também apresentou grande
fascínio por números. O tempo foi passando e seu interesse por números
crescia cada dia mais. Devido a esse fato seu interesse não se estendeu
para outras áreas do conhecimento.

Sobre este assunto, Winner (1998, p. 37) ressalta que:


[...] muitas crianças que nós claramente chamaríamos
de superdo­tadas têm habilidades matemáticas muito
mais altas do que verbais e vice-versa. Prodígios
em matemática também não tendem a ser prodígios
literários; nem prodígios em escrita tendem a se
destacar em matemática.

Vejam que o aluno pode se destacar em uma área de conhecimento, mas


não se des­tacar na outra.

3) apresentarem transtornos de déficit de atenção e hiperatividade. No


caso de transtorno de déficit de atenção, o indivíduo apresenta uma
inabilidade de focalizar e, realmente, não consegue prestar atenção.
No caso da hiperatividade, ele apresenta um estado físico de agitação,
inquietação e impulsividade.

É importante analisar se a agitação e a inquietação são de fato problemas


orgânicos, pois muitos alunos com superdotação/alta habilidade podem
desencadear tais compor­tamentos por estarem em um ambiente pouco
estimulador e pouco desafiador.

4) apresentarem um talento artístico, pois os alunos com esta capacidade,


na maioria das vezes, veem, pensam e sentem o mundo por meio de sua
arte, deixando para um segundo plano as outras áreas do conhecimento.
É como se o mundo para eles girasse somente em torno de seu interesse,
de sua habilidade e talento específico.
UNIUBE 157

SAIBA MAIS

Deixamos a sugestão do filme O som do coração. É um filme sensível e


suave, que conta a história de August Rush, um menino que mora em um
orfanato e possui alta habilidade musical.

Pode-se observar claramente esta questão assistindo a esse filme. O


protagonista deixa explícito que escuta música em todos os barulhos de
seu cotidiano. Ele diz: “Ouça, consegue ouvir a música? Eu consigo ouvi-la
em qualquer lugar, no vento, no ar, na luz... está ao nosso redor... a gente
precisa se abrir... a gente só precisa ouvir...”

Título original: August Rush


Lançamento: 2007 (EUA)
Direção: kirsten Sheridan
Atores: Freddie Highmore, Keri Russell, Robin Williams, Leon G. Thomas
III, Terrence Howard.
Duração: 100 min.
Gênero: Drama

Ao ler a biografia de Albert Einstein, percebe-se que ele apresentou


problemas escolares, pois não possuía alta habilidade em disciplinas
como geografia e história, que exigiam uma boa gestão da memória.
Também não se interessava por atividades físicas, mas possuía alta
habilidade em matemática e ciências naturais. Para alguns autores, ele
possuía características de dislexia, o que podemos verificar no trecho
desta reportagem da Revista da Folha (2004), intitulada “Confusão ao
pé da letra”, veja:
O físico alemão Albert Einstein não falou até os quatro
anos de idade; não conseguia ler até os nove. Falhou
nos exames de admissão para o colegial e só conseguiu
passar após um ano adicional de preparatório. Ao
se dedicar à Física, no entanto, seu elevado grau de
criatividade permitiu que ele alcançasse voos altos,
criando conceitos revolucionários para a época.
158 UNIUBE

Veja que a dislexia não tem a ver com falta de inteligência. O disléxico
pode ter altas habilidades em outras áreas.

Com certeza, temos muitos alunos em nossas escolas com distúrbios


e dificuldades de aprendizagem, mas mesmo assim superdotadas e
vice-versa, não é mesmo?

É emergencial ficarmos atentos às especificidades e às necessidades


desses alunos, pois é preciso saber reconhecer se eles apresentam
uma dificuldade, um distúrbio ou se estão apresentando um sintoma de
desinteresse e/ou tédio.
Contudo, imagine você quantos alunos temos em nossas
escolas que se enquadram neste perfil? Quantos alunos
diagnosticados somente como hiperativos temos por aí?
Será que são somente hiperativos? É preciso analisar
cada caso em especial e acima de tudo conhecer as
características da superdotação para poder auxiliar na
identificação e atendimento.

Renzulli e Reis (1985 apud VIRGOLIM, 2007, p. 39) ressaltam que:


[...] as pessoas que marcaram a história por suas
contribuições e conhecimentos e à cultura não são
lembradas pelas notas que obti­veram na escola ou
pela quantidade de informações que conseguiram
memorizar, mas sim pela qualidade de suas produções
criativas, expressas em consertos, ensaios, filmes,
descobertas científicas etc.

Sendo assim, seja qual for a causa é essencial compreendermos que:


[...] todo aluno tem direito a um ambiente educacional
flexível e responsivo, adaptado ao seu nível de
aprendizagem, que permita certo nível de escolha de
tópicos do seu interesse e que promova a excelência no
estudo (VIRGOLIM, 2007, p. 57).

Todos os alunos devem se sentir acolhidos na escola; mais do que isso,


devem sentir que a escola está fazendo diferença em sua vida.
UNIUBE 159

3.7 Como trabalhar com os alunos superdotados em sala de


aula? Qual é o papel da escola?

Vamos iniciar esse tópico, com uma reflexão de Helena Antipoff (1946
apud FREEMAN; GUENTHER, 2000, p. 94), vejamos:
[...] que lhes reserva a escola?
Ambiente de tédio irrespirável
Transforma esses meninos bem dotados
Em irriquietos, travessos, improdutivos,
Que mestres medíocres são incapazes
De manter, sem queixas,
Nas suas salas de aula.

Muitos estudantes superdotados não possuem experiências escolares


satisfatórias e exitosas. Vários pesquisadores relataram o fato de esses
alunos se saírem mal na escola e até mesmo se sentirem infelizes.

CURIOSIDADE

Veja, por exemplo, um pequeno trecho da vida escolar de Einstein:


[...] Este gênio do século XX teve uma infância solitária.
Gostava de ler e ouvir música, não se identificando
com os desportos praticados pelas outras crianças.
Einstein sempre demonstrou grande habilidade para a
compreensão dos conceitos matemáticos. Com 12 anos
de idade aprendeu sozinho Geometria Euclidiana e,
quando a sua família se mudou para Milão, em 1894,
Einstein dedicou-se à leitura de inúmeros livros de
ciências. “o Livro Popular das Ciências Naturais”, escrito
por Bernstein, em 1869, é considerado como uma das
obras que mais o marcou na sua juventude.
Einstein foi sempre crítico dos métodos de ensino
praticados na escola. Apesar de ter fracos resultados
escolares, Einstein tinha uma enorme curiosidade em
compreender o universo. Apresentou uma postura
160 UNIUBE

autodidata, afirmando que “preferia suportar qualquer tipo


de castigo a ter de papaguear as coisas aprendidas” e
autoclassificava-se como “livre-pensador fanático”.
Terminou a escola secundária em Arrau, Suíça, com boas
notas apenas em Matemática. [...]

Fonte: E-escola. Disponível em: <http://www.e-escola.pt/personalidades.


asp?nome= einstein-albert>. Acesso em: 7 fev. 2011.

Mas onde será que está a causa desse problema?

Na escola? Nos professores? Nos alunos? Nas políticas públicas? Nas


metodologias e nos métodos? Nos currículos?

Enfim, inúmeras são as variantes nas quais pode estar centrada a


resposta, e isso com certeza também dependerá da realidade de cada
aluno, das características e especifi­cidades de sua superdotação e do
contexto no qual o aluno e a escola estão inseridos.

Porém, a maioria dos alunos, quando entrevistados, responde que a


escola é de­sestimulante, que não aprendem nada interessante lá,
que eles sabem mais que os professores, que as práticas escolares
são cansativas e sem sentido, que aprendem mais sozinhos; enfim, que
aprendem mais fora da escola que dentro dela.

Mas por que será que possuem este sentimento?

Devido à rapidez e ao estilo de aprendizagem, as vivências escolares


para os alunos mais capazes e bem dotados quase sempre são diferentes
daquelas experienciadas pelas outras crianças. Na tentativa de conseguir
amigos e se “misturar” melhor com os outros em um grupo comum,
os mais capazes podem dissimular e esconder sua excepcionalidade
(FREEMAN; GUENTHER, 2000, p. 98).
UNIUBE 161

Outro fator que os alunos sempre ressaltam é que os professores e/


ou a escola não proporcionam um ensino diferenciado. Eles acham as
tarefas muito fáceis, sem desafios e criticam as metodologias, pois não
são inovadoras e tais dissabores podem gerar atitudes negativas como
a indisciplina.
[...] trabalhando com tarefas demasiadamente fáceis,
os mais ca­pazes podem então criar seus próprios
desafios, tal como testar, ou mesmo quebrar, as regras
estabelecidas (KANEVSKY, 1994 apud FREEMAN;
GUENTHER, 2000, p. 97).

Adotam posturas também de apatia, ficam alheios a tudo, como se


estivessem no mundo da lua o que pode levar a cometerem erros de
aprendizagem. Esta também é uma maneira de contornarem o tédio pelas
aulas e pelos conteúdos sem significados. Agem dessa forma para aliviar
o tédio daquilo que está desagradável e sem sentido ou por estarem
envolvidos em pensamentos mais elevados e com seus reais interesses.

PONTO-CHAVE

O professor tem papel fundamental para o desenvolvimento dos talentos de


nossos alunos “mais capazes”, portanto deixaremos como sugestão algumas
atitudes e ações que poderão fazer a diferença:

• elogiar sempre o aluno, mesmo que seja por um pequeno feito;


• checar, frequentemente, os avanços do aluno;
• dialogar com o aluno sobre metas, conteúdos, estratégias de aprendizagem;
• utilizar materiais e metodologias diferenciadas que vão ao encontro do
talento e interesse do aluno;
• possibilitar que o aluno seja “mentor, monitor” na sala de aula do seu
conteúdo e/ou área de destaque/talento;
• oportunizar que o aluno tenha um mentor na sua área de interesse/talento;
162 UNIUBE

• pedir ao aluno que faça uso de autoavaliações;


• aceitar e respeitar o aluno mediante sua diversidade.

Partindo do pressuposto que a escola é espaço de aprendizagem e


construção de co­nhecimentos e com o intuito de oportunizar uma escola
mais significativa para todos os alunos, venho propor uma mudança em
nossas práticas pedagógicas, tendo como pré-requisito a utilização de
metodologias pautadas na teoria das múltiplas inteligências.

Armstrong (2001, p. 38 apud VIRGOLIM, 2007, p. 54-55) descreve as


necessidades cognitivas específicas do aluno, a partir do seu tipo de
inteligência como podemos ver no Quadro 2.

Quadro 2: Necessidades cognitivas específicas do aluno, a partir do seu tipo de inteligência

Tipo de Como as
O que as De que as crianças
inteligên- crianças
crianças adoram precisam
cia pensam
Livros, fitas, materiais
Ler, escrever, con-
para escrever, papéis,
Linguística Em palavras. tar histórias, fazer
diários, diálogos, dis-
jogos de palavras.
cussões, debates.

Coisas para explorar e


Lógico- Experimentar, ques-
pensar, materiais cien-
tionar, resolver
-matemá- Raciocinando. tíficos, manipulativos,
problemas lógicos,
tica visitas ao planetário e
calcular.
ao museu de ciências.

Arte, legos, vídeos,


filmes, slides, jogos de
Por imagens e Planejar, desenhar, imaginação, labirintos,
Espacial
figuras. visualizar, rabiscar. quebra-cabeças, livros
ilustrados, visitas a
museus de arte.

Dramatização, teatro,
movimento, coisas para
Corporal- Dançar, correr, pu-
Por sensações construir, esportes e
-cinesté- lar, construir, tocar,
somáticas. jogos de movimentos
sica gesticular.
experiências táteis,
aprendizagem prática.
UNIUBE 163

Cantar, assobiar, Tempo para cantar, idas


Por ritmos e cantarolar, batucar a concertos, tocar músi-
Musical
melodias. com as mãos e os ca em casa e na escola,
pés e escutar. instrumentos.

Amigos, jogos de gru-


Liderar, organizar,
Percebendo o po, reuniões sociais,
Interpes- relacionar-se, mani-
que os outros eventos comunitários,
soal pular, mediar, fazer
pensam. clubes, mentores/apren-
festa.
dizados.

Em relação às
Lugares secretos, tem-
necessidades, Estabelecer objeti-
Intrapes- po sozinhas, projetos e
aos sentimen- vos, mediar, sonhar,
soal escolhas no seu ritmo
tos e aos obje- planejar, refletir.
pessoal.
tivos.

Brincar com ani- Acesso à natureza,


mais de estimação, oportunidade para inte-
Por meio da
cuidar do jardim, in- ragir com animais, ins-
Naturalista natureza e das
vestigar a natureza, trumentos para inves-
formas naturais.
criar animais, cuidar tigar a natureza, como
do planeta Terra. lupas e binóculos.

Fonte: Adaptado de Armstrong (2001, p. 38 apud VIRGOLIM, 2007, p. 54-55).

Um trabalho pedagógico desenvolvido a partir da realidade e dos estilos


de aprendiza­gem dos alunos possui mais chances de ser significativo e
prazeroso, pois parte das necessidades cognitivas específicas de cada um.
Um professor atento aos interesses dos alunos pode
detectar mais prontamente o maior envolvimento do
estudante com uma determi­nada tarefa, o que pode ser
o aspecto que vai levá-lo a desenvolver sua criatividade
e habilidades específicas na área de interesse
(VIRGOLIM, 2007, p. 62).

Cabe ao professor saber reconhecer os estilos de inteligência de seus


alunos e possi­bilitar um trabalho a partir de seus reais interesses. Dessa
forma, temos a certeza de que o sucesso será de ambas as partes.
164 UNIUBE

3.8 Conclusão

Muito pode ser feito para os alunos superdotados/talentosos, mas é


de extrema impor­tância estimular ao máximo o potencial e talento dos
“alunos mais capazes” por meio de ações, métodos e metodologias
adaptadas às suas necessidades educacionais especiais.

Não se esqueça de respeitar os interesses, as características e as


áreas de talento de cada um, pois somente dessa maneira você poderá
oportunizar que as potencialidades desses alunos germinem e se
desenvolvam. Podemos comparar o talento como uma semente que,
ao ser lançada, a terra germinará, crescerá, dará flores e/ou frutos caso
seja bem cuidada. Renzulli (1981 apud Virgolim, 2007, p. 38) explica-nos:
A superdotação emerge ou se esvai em diferentes
épocas e sob diferentes circunstâncias da vida de
uma pessoa. Assim sendo, os comportamentos de
superdotação podem ser exibidos em certas crianças
(mas não em todas elas) em alguns momentos (não em
todos os momentos) e sob certas circunstâncias (e não
em todas as circunstancias de sua vida).

Há, com certeza, em nossas escolas, inúmeros alunos esperando apenas


por uma oportunidade para demonstrarem todo seu potencial. Sendo
assim, por que não apro­veitar seus talentos?

Vejamos a mensagem de Ângela M. R. Virgolim (2002, p. 5):


Você deve sempre estimular a criança, desenvolver
sua imaginação. Instigar sua curiosidade para que
possa desenvolver sua potenciali­dade ao máximo,
oferecendo, acima de tudo, compreensão e amor
incondicionais, apoiando-a naquilo que a torna única,
diferente e, por tudo isso, ESPECIAL.

Termino aqui esta pequena reflexão sobre este tema e espero que tenha
estimulado você a aprofundar mais sobre este assunto tão fascinante: a
educação dos alunos mais capazes.
UNIUBE 165

Resumo

A superdotação é caracterizada por traços consistentemente superiores,


marcados por uma elevada potencialidade de aptidões, talentos, habilidades
e interesses específi­cos. Contudo, esses traços superiores devem
permanecer com frequência e duração na trajetória do aluno para poderem
ser confirmados em épocas diferentes, mas em situações semelhantes. Um
superdotado poderá se destacar em uma área ou combinar várias, poderá
também apresentar graus de habilidades diferenciadas. Os superdota­
dos, assim como outra pessoa qualquer, apresentam características,
comportamentos e sentimentos que os diferenciam como pessoa. Ou seja,
possui uma individualidade, um perfil, um caráter, uma estrutura mental e
emocional que revela sua forma própria de ser e estar no mundo.

Para reconhecer e identificar um aluno superdotado/talentoso, existem várias


técnicas, como a autoidentificação, os testes de Q.I., a observação do aluno,
tendo como refe­rencial os checklists de autores renomados nesta área.

Existem muitos mitos em relação aos alunos superdotados e talentosos, fato


este que dificulta a identificação e o atendimento desses alunos.

Com relação às práticas pedagógicas que podem ser desenvolvidas


com nossos alunos mais capazes, temos a modificação do ambiente, a
modificação da postura do professor e, no meu ponto de vista, a mais
elementar, que é a modificação do conteúdo ensinado. Dentro dela,
podemos optar pela compactação do currículo, pelo enriquecimento e pela
aceleração do aluno. Todas essas práticas podem ser desenvolvidas na
sala regular e/ ou em salas de recurso, tendo como pré-requisito um olhar
pedagógico voltado para os reais interesses e as necessidades do aluno.
Embora apresentem superdotação/altas habilidades, há alguns alunos que
merecem cuidado, pois apresentam baixo rendimento escolar, dificuldades
de aprendizagem, problemas comportamentais e distúrbios de aprendizagem
que podem ser uma manifestação de desinteresse pelo cotidiano escolar ou
realmente ser por um problema orgânico.
166 UNIUBE

Finalizando, muito pode ser feito por nossos alunos mais capazes, mas cabe
a nós, educadores, identificar, mediar, orientar para que seus talentos se
aperfeiçoem e suas capacidades cresçam e se desenvolvam, pois, como diz
Charles Schulz: “Não existe fardo maior do que um potencial não realizado”.

Referências
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WINNER, Ellen. Crianças Superdotadas: Mitos e Realidades. Porto Alegre:


Artes Médicas, 1998.
Capítulo
Da teoria da mediação
à prática da intervenção
4
pedagógica

Neire Márcia da Cunha


Selma Aparecida Ferreira da Costa

Introdução
No presente capítulo você terá a oportunidade de refletir sobre a
mediação e a intervenção como forma de otimizar o processo de
ensino e aprendizagem.

Para tanto, será preciso compreender as teorias psicológicas


abordadas por Vygotsky, Feuerstein e Wallon, bem como os
respectivos enfoques ressaltados por eles quanto aos diferentes
caminhos, nem sempre previsíveis, da aprendizagem.

É nosso objetivo aliar os estudos científicos que faremos com


a prática pedagógica em sala do ensino regular e classes de
Atendimento Educacional Especializado. Sugerimos então
algumas situações práticas, em que é devidamente aplicável esse
referencial teórico.

A principal fonte inspiradora foi a prática pedagógica circundada


pelas crianças com dificuldades de aprendizagem. A preocupação
com uma educação de qualidade e o respeito à diversidade
reforçaram-nos o desejo de contribuir para a reestruturação de
um olhar diferenciado sobre a capacidade do ser humano de
modificar-se. Pois, como já dizia Vygotsky (1988, p. 31), “O único
bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento”.
170 UNIUBE

Objetivos
Após o estudo deste capítulo, esperamos que você seja capaz de:

• compreender o ato da mediação como uma importante


estratégia de intervenção;
• conhecer os conceitos de mediação segundo Vygotsky e
Feuerstein;
• identificar conhecimentos necessários ao mediador da
aprendizagem.

Esquema
4.1 A mediação pedagógica e a aprendizagem
4.2 Os processos de aprendizagem
4.3 A função da intervenção pedagógica
4.4 Modificabilidade cognitiva estrutural
4.5 Intencionalidade da ação
4.6 Mediação
4.7 Prática pedagógica
4.8 Os dez mandamentos da aprendizagem
4.9 Teoria e prática pedagógica
4.10 Promovendo o desenvolvimento de forma integral
4.10.1 Pressupostos teóricos de Wallon
4.10.2 O movimento e o pensamento
4.10.3 Emoção a afetividade
4.11 Postulado
4.12 Conclusão

4.1 A mediação pedagógica e a aprendizagem

Neste capítulo, abordaremos a mediação pedagógica fundamentada nas


ideias de mediação descritas por Vygotsky (1988).
UNIUBE 171

RELEMBRANDO

Com o advento da teoria sociointeracionista apresentada por Lev Vygotsky,


iniciou-se uma nova concepção do ensino como sendo um processo
social. Consequentemente, ocorre uma inovação no papel da escola,
especificamente do professor, que deixa de ser apenas um mero transmissor
de conhecimentos preestabelecidos nos currículos escolares para se tornar
um agente fundamental na construção do conhecimento de seus alunos, por
meio da mediação pedagógica.

Um conceito central para a compreensão das concepções vygotskyanas


sobre como ocorre a gênese do desenvolvimento humano, principalmente
no que se refere aos aspectos da cognição, é a mediação. Ela, em linhas
gerais, seria o processo de intervenção de um elemento intermediário na
relação estabelecida entre o ensino e a aprendizagem, independentemente
do ambiente em que o indivíduo esteja, seja em casa, na igreja, na praça,
no trabalho, no cinema, na escola, entre outros.

A mediação pedagógica é uma expressão que se refere, de um


modo geral, ao relacio­namento professor-aluno em busca de uma
aprendizagem que se concretize dentro de um processo de construção
do conhecimento. O professor mediador assume o papel de facilitador
do aprendizado, não no sentido de dar as respostas prontas e resolvidas
a seus alunos, e sim aguçando a curiosidade, intervindo, subsidiando as
variadas formas de interpretação para que eles encontrem as respostas
aos desafios propostos. Ressaltamos que no contexto escolar a
mediação também se estabelece na relação aluno-aluno. Consideramos
esta relação de grande importância dentro do processo; no entanto, neste
capítulo, daremos enfoque à relação professor-aluno.

Vygotsky trabalha constantemente com a ideia de que a relação do


homem com o mundo não é uma relação direta, ou seja, baseada apenas
em estímulo e resposta. Para ele, ela é fundamentalmente uma relação
172 UNIUBE

mediada por ferramentas auxiliares da atividade humana, as quais ele


chamou de instrumentos (elementos externos ao in­divíduo) e símbolos
(orientadores psicológicos do indivíduo). Ou melhor, os signos são como
ferramentas que auxiliam nos processos psicológicos do indivíduo, como
lembrar, comparar, quantificar, relatar etc. Enquanto os instrumentos
auxiliam nas ações con­cretas, como provocar mudanças nos objetos,
controlar processos naturais, entre outros.

Em seus estudos, Vygotsky dedicou-se principalmente a compreender


o desenvolvi­mento dos processos mentais superiores ou funções
psicológicas superiores, que seria a capacidade que o ser humano
possui de tomar decisões diante de uma informação nova, estabelecendo
relações entre os diversos conhecimentos adquiridos. O mais importante
desse tipo de comportamento é o seu caráter voluntário, diferentemente
das ações condicionadas por reflexos.

Dessa forma, fica explícito que o professor deve


Dialética
saber como e onde intervir no processo de
Oposição, conflito aprendizagem de seus alunos, tendo sempre em
gerado pela
contradição entre mente qual o grau de dificuldade/habilidade deles,
princípios teóricos
ou fenômenos e quais procedimentos didático-pedagógicos
empíricos.
poderá lançar mão para que o aluno avance em
seu desenvolvimento cognitivo. O professor deverá
estar ciente também que o conhecimento se dá de forma dialética entre
o sujeito e o meio social em que está inserido.

4.2 Os processos de aprendizagem

Além de sua preocupação constante com a questão do desenvolvimento


humano, Vygotsky (1988) enfatiza em sua obra a importância dos processos
de aprendizagem. Para ele, desde o nascimento, a aprendizagem da
criança está relacionada ao seu de­senvolvimento. Obviamente, existe
um percurso natural de desenvolvimento, em parte definido pelo processo
UNIUBE 173

de maturação do indivíduo, mas é o aprendizado que possibilita o


desenvolvimento dos processos mentais superiores. O desenvolvimento
fica impedido de ocorrer na falta de situações propícias ao aprendizado.
Assim, podemos inferir que é principalmente na escola, pela interação
social com outras crianças e pela mediação “intencional” do professor,
que a criança aprende e se desenvolve.

IMPORTANTE!

A importância que Vygotsky outorga ao papel do mediador no desenvolvimento


do indivíduo é confirmada pela abordagem do conceito de zona de
desenvolvimento proximal em sua teoria, que veremos logo a seguir.

A forma de avaliação do desenvolvimento de uma pessoa se dá por


meio da comparação do que ela pode e sabe fazer sozinha com o
que ela só consegue fazer com a ajuda do outro. Vygotsky denomina
essa capacidade de realizar tarefas de forma independente nível de
desenvolvimento real, resultante de processos psicológicos evolu­tivos
já consolidados. As tarefas que a criança necessita de subsídios para
realizar ele denomina nível de desenvolvimento potencial. Essa
possibilidade de alteração no desempenho de uma pessoa em função
da interferência de outra é fundamental dentro da teoria de Vygotsky, em
virtude do fato de que ele atribui uma importância extrema à interação
social no processo de construção das funções psicológicas humanas.

EXPLICANDO MELHOR

O aprendizado individual ocorre em um ambiente social determinado e a


relação com o outro é imprescindível para o processo de construção do ser
individual.
174 UNIUBE

No entanto, há um meio termo entre essas duas


concepções de níveis de desenvolvimento real e
potencial. É justamente aí que Vygotsky define a
zona de desenvolvimento proximal como sendo a
distância entre o nível de desenvolvimento real, que se
costuma determinar através da solução independente
de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial,
determinado através da solução de problemas sob a
orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes (OLIVEIRA, 1997, p. 60).

Portanto, a zona de desenvolvimento proximal refere-se ao caminho


a ser percorrido pelo indivíduo, em que o ponto de partida é o que ele
consegue realmente realizar sozinho, e o ponto de chegada seria atingir
o ápice das potencialidades ainda em desenvolvimento.

COMPARANDO

A zona de desenvolvimento proximal é como se fosse uma escada rolante em


constante movimento, em que seus degraus representam os aprendizados
necessários para se alcançar a culminância do desenvolvimento psicológico
do indivíduo. Ao interferir nessa área de desenvolvimento, o professor ou
as crianças mais experientes contribuem para alavancar os processos de
evolução cognitiva da criança.

4.3 A função da intervenção pedagógica

Conforme o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2009), intervir


significa ingerir­-se, visando influir no seu desenvolvimento, interferir,
interceder.

É comum ouvirmos professores dizerem que têm dificuldades em


intervir no processo cognitivo de seus alunos por não terem segurança
quanto aos níveis de desenvolvi­mento deles, principalmente na fase de
alfabetização. É fundamental o conhecimento teórico-científico sobre o
desenvolvimento infantil.
UNIUBE 175

É importante conhecer a base teórica acerca dos aspectos constitutivos


dos níveis de escrita, para que o professor saiba quando, onde e como
interferir adequadamente na zona de desenvolvimento proximal de seus
alunos, provocando avanços que não ocorreriam aleatoriamente.

IMPORTANTE!

O professor deve ter o cuidado de não interpretar a teoria vygotskyana de


forma distorcida e, por deter o conhecimento, interferir de forma incisiva
e autoritária na aprendizagem de seu aluno, que, por sua vez, torna-se
simplesmente um receptor passivo. Dessa forma, estaríamos retrocedendo
à era da educação tradicional.

Vygotsky trabalha constantemente a ideia de “internalização”, apreensão


do conheci­mento por meio da interação do indivíduo com seu meio social.
A subjetividade peculiar a cada ser humano é para ele a essência do
desenvolvimento humano.

A interação social da tríade aluno – professor – alunos é a chave


para o enriqueci­mento intelectual do aprendiz. Um bom caminho é o
professor lançar mão de atividades promovidas em grupo, visto que as
crianças são sempre heterogêneas quanto aos diferentes momentos
da aprendizagem e podem, seguramente, intervir de maneira positiva
no processo de enriquecimento cognitivo umas das outras. Assim, é
evidente que a possibilidade de intervenção cabe tanto ao professor
quanto às demais crianças envolvidas no processo. No entanto, o papel
de intervir pedagogicamente, no sentido de mediar a aprendizagem, cabe
ao educador, pois é ele quem detém o conhecimento teórico-científico
que lhe dá condição de selecionar técnicas, metodologias, instrumentos
eficazes para intervenção, bem como os objetivos a serem alcançados e
o caminho a ser percorrido para que o “potencial” de seus alunos se torne
“real”.
176 UNIUBE

O estudo da teoria de Vygotsky reforça a tese de que o desenvolvimento


da inteligên­cia se dá primeiramente de forma interpessoal, por meio da
interatividade social entre as pessoas, para, em seguida, ser internalizado
pelo indivíduo. Ao ser internalizado, o indivíduo apropria-se de um
determinado conhecimento, resultando assim em uma mudança de
comportamento.

4.4 Modificabilidade cognitiva estrutural

Reuven Feuerstein se dedicou ao estudo da cognição e da sua


modificabilidade. Sua filosofia da Modificabilidade Cognitiva Estrutural
(MCE) baseia-se no fato de que todo ser humano é capaz de desenvolver
a capacidade de aprender, ou seja, não há limites para o desenvolvimento
da mente humana.

Vamos conhecer um pouco sobre a vida e a obra desse estudioso.


Reuven Feuerstein nasceu em Botosan (Romênia),
em 1921, no seio de uma família judia muito sensível à
cultura e à educação. Mostrou desde criança as suas
qualidades: aos 3 anos já falava duas línguas e aos 8
ensinava o hebraico às crianças de sua comunidade.
Quando em 1944 a Romênia foi ocupada, Feuerstein,
que neste período ensinava em Bucareste numa escola
para filhos de deportados, foi mandado para um campo
de concentração. Afortunadamente conse­guiu escapar
e imigrou para Israel, onde se dedicou à educação
dos adolescentes sobreviventes ao Holocausto. Tratava-
se, a maior parte, de órfãos, pertencentes a diversas
culturas, provindos de numerosos países europeus e
africanos, que, devido às terríveis experiências vividas,
apresentavam carências cognitivas muito semelhantes
aos indivíduos com deficiência mental. Foi a partir
dos estudos com estes adolescentes que Feuerstein
e seus colaboradores desenvolveram um sistema de
avaliação do potencial de aprendizagem (LPAD) e
um programa de intervenção cognitiva (PEI), que se
tornou conhecido no mundo como método Feuerstein.
Entre 1940 a 1944, Feuerstein frequentou o Teachers
College e Onesco College em Bucareste. Em 1944 e
1945 ele também estudou no Teacher Training Seminary,
UNIUBE 177

em Jerusalém. Retomou seus estudos em 1949 na


Suíça, onde frequentou palestras e seminários de Carl
Jaspers, Carl Jung e L. Szondy. De 1950 a 1955 estudou
na Universidade de Genebra, sob o comando de Andrey
Rey e Jean Piaget, completando a sua formação em
Psicologia Geral e Clínica (1952) e obtendo sua licença
em Psicologia (1954). Em 1970 Feuerstein conquistou
seu título de Ph.D. em Psicologia do Desenvolvimento
na Sorbonne. Sua principal área de estudo foi Psicologia
do Desenvolvimento, Clínica e Cognitiva desde uma
perspectiva intercultural (CDCP, 2011).

Sua teoria se contrapõe às teorias psicológicas do desenvolvimento, que


consideram a origem das limitações do ser humano no indivíduo (inatista)
ou nas condições de estímulos oferecidas em seu meio (ambientalista).

Seus estudos favorecem o surgimento de uma nova abordagem para


o atendimento psicopedagógico dos educandos com dificuldade de
aprendizagem e crianças com deficiência.
A MCE procura, objetivamente, descrever capacidade
única, peculiar, singular e plural de os seres
humanos mudarem ou modificaram a estrutura do
seu funcionamento cognitivo, visando à adaptação
às exigências, constantes e mutáveis das situações
que caracterizam o mundo exterior envolvente. [...]
A modificabilidade cognitiva deve ser definida como
estrutural, e não esporádica ou acidental, ou seja,
en­cerra uma mudança de uma parte, mas que afeta
um todo funcional da cognição. Trata-se de uma
transformação do processo cognitivo em si próprio,
no seu ritmo, na sua amplitude e na sua natureza
autorreguladora (FONSECA, 1995, p. 85).

A Modificabilidade Cognitiva Estrutural descortina uma nova perspectiva


para o atendi­mento às crianças com necessidades educacionais
especiais (dificuldade de aprendiza­gem, deficientes, altas habilidades,
transtornos globais do desenvolvimento) e favorece o surgimento de
uma nova concepção sobre a aprendizagem, tanto para estes como para
as crianças “ditas normais”. Consolida que a capacidade de aprender é
passível a todos os seres humanos e que todos nós temos a capacidade
de desenvolver nossas potencialidades, sejam elas cognitivas, afetivas,
emocionais, biológicas ou sociais.
178 UNIUBE

Fonseca (1995, p. 73) ressalta que, quanto aos deficientes:

A não ser em condições muito severas, em que entram


fatores defectológicos genéticos e orgânicos (nos quais
só as medidas de prevenção se justificam), o deficiente
está aberto à modificabilidade cognitiva em vários
estágios de seu desenvolvimento, fundamental­mente
nos mais precoces.

4.5 Intencionalidade da ação

Esse modelo teórico aborda a diversidade humana, respeitando suas


diferenças indivi­duais e valoriza as interações entre o indivíduo e seu
meio cultural. Os estímulos do meio e as mudanças intrínsecas do sujeito
são produtos de uma série de atos carregados de intenção. Assim,
Feuerstein reforça a importância da intenção da ação do professor
no processo ensino-aprendizagem. Demonstra que a natureza do ser
humano é ser flexí­vel e que a inteligência é dinâmica, disponível, aberta
às mudanças durante toda sua vida. O nível potencial de desenvolvimento
e aprendizagem irá depender da qualidade das interações do indivíduo
com seu meio e da intencionalidade da ação mediadora.

Fonseca (1995, p. 107) reafirma as palavras de Feuerstein e salienta


a importância de defendermos os direitos de todas as crianças a uma
boa educação. “Advogamos uma filosofia educacional em que qualquer
criança, independentemente do seu potencial de aprendizagem (normal
ou atípico), deverá ter o direito a uma educação que lhe permita realizar
o máximo de seu potencial humano”.

Para tanto, as escolas e os profissionais que nelas atuam devem estar


preparados para receberem todas as crianças.
UNIUBE 179

4.6 Mediação

Feuerstein define duas formas de mediação:

• a experiência direta de aprendizado: é a interação do organismo


com o meio ambiente; baseada na teoria de Jean Piaget, em que o
sujeito/aprendiz interage diretamente com o objeto de conhecimento
e diante destes estímulos ele dá sua resposta. Ou seja, a
aprendizagem acontece sem a interferência de outrem. Segundo
Feuerstein, esse modelo não atende às necessidades da criança,
pois para haver a aprendizagem significativa falta a presença do
mediador.

EXEMPLIFICANDO!

Podemos citar como exemplo o caso de uma criança que, passeando por um
roseiral, fica encantada por ver tantas rosas, de diversas cores, que sente
vontade de tocá-las (o estímulo).

Ao tocá-las, sente o perfume, a textura de suas pétalas e percebe uma


joaninha passeando sobre algumas pétalas. Neste exemplo, houve interação
direta com o objeto de conhecimento (no caso, as rosas e a joaninha).

Vejam bem, caros alunos, esse tipo de aprendizagem é essencial e


necessário para o processo de aprendizagem da criança, mas, segundo
Feuerstein, não é suficiente para garantir uma aprendizagem efetiva.

• a experiência de aprendizagem mediada: neste caso, requer a


mediação, a inter­venção intencional do outro na relação do aprendiz
com seu meio sociocultural. Sua presença torna-se fundamental
para auxiliar a organizar, a selecionar, a interpretar e a elaborar seu
conhecimento. A intencionalidade da ação serve de alavanca pro­
pulsora das novas aprendizagens.
180 UNIUBE

EXPLICANDO MELHOR

Voltemos ao exemplo anterior, a criança no roseiral. Se os pais da criança


estivessem juntos com ela e fizessem a mediação entre o aprendiz e o objeto
de conhecimento, enriqueceriam ou favoreceriam uma nova aprendizagem.
Ou seja, se os pais chamassem a atenção da criança para um aspecto
específico (estímulo), por exemplo, as cores, a joaninha ou os tamanhos
diferentes das roseiras, e explorassem bem esse aspecto com a criança,
eles poderiam favorecer o desenvolvimento de uma nova habilidade na
criança: habilidade de diferenciação de tonalidades; descoberta de diferentes
nomenclaturas de cores; insetos; diferentes tamanhos; entre outros.

Naquela situação, os pais poderiam ir além, favorecendo, por exemplo,


o conheci­
mento das questões sobre a necessidade do cuidado
com a natureza, com os insetos (joaninha) e sua relação na cadeia
alimentar, entre outros assuntos. Obviamente, com uma linguagem
simples, estariam estimulando a criança para a descoberta de
novos conhecimentos, assim como estariam sensibilizando-a para a
preservação da natureza. Muitas relações e conhecimentos poderiam
ser construídos aí.

Vocês percebem a importância da mediação, nesse caso?

Voltamos a ressaltar que ambas as formas de mediação, direta e mediada,


são ne­cessárias para o desenvolvimento integral das crianças, pois “a
exposição direta aos estímulos é fundamental para o desenvolvimento
cognitivo, mas a interação mediati­zada, isto é, a própria cultura, é que
permite o acesso às funções cognitivas superiores”. (FONSECA, 1995,
p. 89).
UNIUBE 181

Concordamos com o Hugo Otto Beyer, quando diz:


Feuerstein assimila a abordagem vygotskyana de
mediação parafra­seando-a através do seu conceito
da “Experiência de Aprendizagem Mediada”.
Conforme Feuerstein, a determinação diferencial
do desen­volvimento infantil dá-se em função das
oportunidades da criança em ter sua aprendizagem
informal e formal mediada. É isto exatamente o que
ele afirma na citação seguinte: “A experiência de
aprendizagem mediada pode ser considerada como o
ingrediente que determina o desenvolvimento cognitivo
diferencial” (BEYER, 1996, p. 81).

PESQUISANDO NA WEB

Caso queira conhecer mais sobre o que Beyer (1996) explica, leia o
artigo “o método Reuven Feuerstein: uma abordagem para o atendimento
psicopedagógico de indivíduos com dificuldades de aprendizagem,
portadores ou não de necessidades educativas especiais”, para isso, acesse
o site da Associação Brasileira dos Pesquisadores em Educação Especial e
a Revista Brasileira de Educação Especial, vol. 4, disponível no site:

http://www.abpee.net/homepageabpee04_06/artigos_em_pdf/revista4nu
 mero1pdf/r4_art07.pdf

E, ainda, podemos ir além, dizendo que a “Experiência de Aprendizagem


Mediada”, revelada por Feuerstein, constitui-se na intencionalidade da
ação do professor na “zona de desenvolvimento proximal”, descrita por
Vygotsky, dos seus educandos. E este ato determinante influenciará o
desenvolvimento da capacidade de “Modificabilidade Cognitiva Estrutural”.

4.7 Prática pedagógica

Quanto ao aspecto educacional, Feuerstein denomina “Experiência de


Aprendiza­gem Mediada” a relação entre mediador (professor) e mediado
(aluno), quando esta envolve alguns critérios específicos. Observemos o
que diz Fonseca (1995) em relação a esses critérios:
182 UNIUBE

• Intencionalidade e reciprocidade: o educador deixa clara a


“intencionalidade” da sua ação como facilitador do conhecimento,
seja por meio dos gestos, intensidade da voz ou das palavras
proferidas (sua postura), conseguindo provocar a “recipro­cidade” do
aluno para a receptividade para o aprendizado. Assim, é necessário
que o professor desenvolva uma boa relação interpessoal com
seus alunos, para que o processo de aprendizagem ocorra de uma
maneira dinâmica e natural.
• Transparência: o educador fornece subsídios para a percepção
(conscientização) de que a interação fornecida naquele momento
vai além dos fatos e das ações mo­mentâneas, pois “transcende” o
momento presente, ou seja, o aprendizado de hoje é subsídio para
o de amanhã, de forma dinâmica e dialética. Dessa forma, os alunos
perceberão os fundamentos norteadores de toda a aprendizagem,
correlacionando as etapas do seu desenvolvimento cognitivo.
• Significação: é a relação permeada na ação carregada de significado,
valores e atitudes. A aprendizagem deve ser carregada de estímulos,
de carga afetiva, para penetrar no sistema de significado, provocando
a aprendizagem. Por meio da ação pedagógica, são transmitidas
não só a cultura, mas também a filosofia de vida do grupo social.
A significação está diretamente interligada ao prazer de aprender,
ao estímulo às diversas curiosidades infantis, ao querer descobrir
algo novo a cada dia e, principalmente, no deleite do professor
empreendedor, que atribui significado a tudo o que faz.
• Sentimento de competência: não só é respeitada a experiência
e a capacidade da criança, como também fornece pistas para que
ela encontre êxito na tarefa, aumentando sua autoestima, sua
autoconfiança e melhorando a motivação para a aprendizagem.
Acredite sempre em seu aluno, demonstre isso a ele e, por maiores
que sejam suas limitações cognitivas, ele buscará caminhos, pois
aprendeu com seu mestre a acreditar em si.

Portanto, durante a prática pedagógica, o mediador deve deixar clara a


intenção de sua ação. Demonstrar que essa intenção vai além dos fatos
momentâneos, para penetrar, por meio da motivação, no sistema de
significado do sujeito, transmitindo a filosofia do seu grupo social com o
devido respeito em relação ao nível de desenvolvimento real da criança.
UNIUBE 183

Deve fazer com que ela perceba, por meio das reflexões durante todo
o processo, o seu próprio desenvolvimento potencial, elevando sua
autoestima e motivando-a para as novas aprendizagens.

Podemos perceber então a importância do papel do professor. O mediador


deve ser o condutor de valores, de saberes culturais, de significados e
estratégias que ajudam a interpretar a vida social, “provocando” o indivíduo
para suas aprendizagens, influen­ciando suas estruturas internas.

4.8 Os dez mandamentos da aprendizagem

Pozo (2002, p. 269) assim define os dez mandamentos da aprendizagem:


As Tábuas da Lei da Aprendizagem: partirás dos
interesses e mo­tivos. Partirás dos conhecimentos
prévios. Dosarás a quantidade de informação nova.
Farás com que condensem e automatizem os
conhecimentos básicos. Diversificarás as tarefas e
aprendizagens. Planejarás situações de aprendizagem
para a sua recuperação. Organizarás e ligarás as
aprendizagens umas às outras. Promove­rás a reflexão
sobre os conhecimentos. Proporás tarefas abertas e
incentivarás a cooperação. Instruirás no planejamento e
organização da própria aprendizagem de cada um.

Pozo reforça os pressupostos de Vygotsky que são sustentados e


sistematizados por Feuerstein. Por esse motivo, vamos, a partir deste
momento, elencar os conceitos con­tidos nesses mandamentos na
perspectiva de Pozo, como também trataremos de uma situação prática,
exemplificando a ação de cada um desses dez mandamentos, para que
se possa facilitar e aguçar a percepção dos profissionais de educação
quanto aos aspectos de intervenção e mediação pedagógica, tão
importantes no contexto escolar.
184 UNIUBE

Partirás dos interesses e motivos

O ponto de partida da aprendizagem deve ser o aluno. Cabe ao educador


promover ativamente o interesse dos alunos para a aprendizagem. A
motivação poderá levá-lo à proficiência, ao sucesso da aprendizagem
ou ao seu fracasso.

Portanto, deve-se incentivar o interesse intrínseco do aluno. Para tanto,


é necessário conhecer as capacidades prévias dos seus alunos. Para
conhecer essas capacidades, vocês deverão ter o conhecimento acerca
das teorias psicológicas do desenvolvimento, que lhes proporcionarão
informações precisas, úteis, dos possíveis e necessários “erros” que
poderão cometer durante suas aprendizagens.

Para que se sintam capazes, competentes e motivados para a descoberta


do conheci­mento, os alunos deverão perceber que os “erros” devem
ser considerados como caminho que todos percorrem para chegar ao
“acerto”, ou seja, cabe ao educador provocar a reflexão do aluno sobre
suas decisões e ações durante todo o processo de aprendizagem.
Nesse momento em que se busca a motivação intrínseca, as atividades
acadêmicas devem ser organizadas de forma cooperativa, nas quais eles
deverão se apoiar nos me­diadores, seja ele professor ou seus pares. O
importante é que os alunos compreendam o quê e como fazer e não que
devem, obrigatoriamente, sempre obter êxito na atividade.

Partirás dos conhecimentos prévios

Para que a aprendizagem ocorra de modo efetivo, faz-se necessário que


o educador planeje sua ação considerando o nível de desenvolvimento
real, ou seja, conhecer o que o aluno já consegue realizar sozinho.
A partir daí, ele irá fomentar o interesse do aluno na aquisição do
conhecimento formal. Ao mesmo tempo, deverá estabelecer uma
conexão entre o conhecimento do aluno e as novas aprendizagens.
UNIUBE 185

Para que esse processo tenha êxito, faz-se necessária uma avaliação
contínua e processual. E a concepção de avaliação aqui descrita refere-
se à avaliação do processo ensino­-aprendizagem, e não àquela focada
no desempenho quantitativo do aluno.

Dosarás a quantidade de informação nova

As novas informações deverão ser dosadas, de forma a respeitar o nível


de desen­volvimento mental da criança. Ao mesmo tempo em que essas
novas informações devem estar em consonância com as já internalizadas,
ou seja, o professor deverá atuar na zona de desenvolvimento proximal,
de maneira que o aluno atinja o nível de desenvolvimento potencial. Vale
lembrar que tais informações devem ser desafiadoras, questionadoras
e desestabilizadoras.

Farás com que condensem e automatizem os conhecimentos básicos

Com o objetivo de enriquecer os recursos de aprendizagens de seus


alunos, o profes­sor deverá propor situações que propiciem a condensação
dos conhecimentos alvos e, ao mesmo tempo, favorecer a capacidade do
educando de lançar mão de conheci­mentos já adquiridos na resolução de
novos propostos. Para isso, o educador deverá selecionar as informações
viáveis e verdadeiramente relevantes, pois conhecimentos automatizados
e pouco funcionais são normalmente esquecidos.

Diversificarás as tarefas e aprendizagens

O educador deverá propor situações de aprendizagens inovadoras


e criativas para que o aluno tenha a oportunidade de retomar um
mesmo conteúdo de maneiras diversifica­das, bem como a utilização de
recursos didáticos variados. Com isso, ao mesmo tempo que cristaliza
conhecimentos necessários, estabelece conexão com os vindouros.
186 UNIUBE

Planejarás situações de aprendizagem para a sua recuperação

O professor deverá conhecer as reais dificuldades de seus alunos para,


a partir daí, buscar diferentes estratégias e atingir seus objetivos. Nesse
caso específico, o que se deseja é a recuperação da aprendizagem,
lembrando que o educador deve sempre partir das habilidades conquistadas
dos alunos para conseguir sanar as dificuldades deles, considerando que
as estratégias utilizadas deverão ser contextualizadas, dife­renciadas e
prazerosas.

Organizarás e ligarás as aprendizagens umas às outras

O professor deverá organizar seu planejamento contemplando a


interdisciplinaridade, a contextualização e a diversificação da sua prática
pedagógica, de forma que atenda às necessidades dos alunos. Para
confirmar a internalização do processo da aprendizagem, o professor
deverá observar se o aluno está colocando em prática o que foi
aprendido, por meio da aplicação dos conhecimentos adquiridos nas
novas aprendizagens.

Promoverás a reflexão sobre os conhecimentos

O professor deverá oportunizar aos educandos vivências e situações


desafiadoras e enriquecedoras que propiciem aos aprendizes buscarem
suas próprias respostas e posicionamentos, consolidando sua autonomia
como cidadãos. Para o educando atingir essa autonomia, é necessário
que o professor tenha a clareza de que o aluno necessita de subsídios
teórico-metodológicos que lhe favoreçam o desenvolvimento da reflexão
sobre sua própria ação (metacognição).
UNIUBE 187

Proporás tarefas abertas e incentivarás a cooperação

O professor deverá oportunizar ao aluno a resolução de situações-


problema abertas e abrangentes, de forma a exigir o aprimoramento da
sua capacidade de percepção da realidade. Assim, tornará possível que
ele compreenda a complexidade cultural que o envolve, para, a partir
dela, tomar suas decisões para resolução das tarefas, utilizando­-se de
estratégias eficazes que o tornem proficiente.

Vivenciar situações de cooperação mútua, de modo a favorecer o


conflito cognitivo resultante da diversidade de pensamentos e, por meio
da mediação cooperativa dos elementos envolvidos no processo, o
aluno possa alcançar a melhoria de sua aprendi­zagem social e sinta-se
estimulado a aprender.

Instruirás no planejamento e organização da própria aprendizagem


de cada um

O professor deverá favorecer a elaboração e organização do pensamento


de seus alunos, para que eles possam, gradualmente, se tornar agentes
de sua própria apren­dizagem, conseguindo tomar suas decisões,
selecionar, planejar, fixar metas, propor estratégias e avaliar resultados.

Enfim, é essencial que se priorize a reflexão e a cooperação no


desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem.

4.9 Teoria e prática pedagógica

Com o objetivo de se aliar teoria e prática pedagógica, apresentaremos as


Tábuas da Lei da Aprendizagem, propostas por Pozo (2002), por meio de
técnicas efetivamente simples e dinâmicas, contextualizadas em relação à
realidade docente, não com o intuito de fornecer receitas prontas, testadas e
188 UNIUBE

aprovadas, como se fossem leis a serem seguidas, mas sim chamar a


atenção para determinados aspectos, às vezes imperceptíveis na construção
do conhecimento. Com o intuito de nortear a prática pedagógica, sugerimos
algumas ati­vidades simples, mas que, com a criatividade profissional de cada
um dos leitores, poderão ser ampliadas e adaptadas de modo a atender às
necessidades educativas de alunos. Partindo das citações de Pozo (2002),
sugerimos as atividades que seguem.

Partindo dos conhecimentos prévios

“Partirás dos interesses e motivos, partirás dos conhecimentos prévios.”

Quando dizemos partir dos interesses de seus alunos, estamos nos referindo
que se parta de algo que tenha significado para eles. Para a criança em fase
de alfabetização, a significação está relacionada ao lúdico, ao prazer de
brincar. E, para fazer a correlação entre interesse e conhecimento prévio, é
necessário que se faça uma sondagem inicial do nível de desenvolvimento
cognitivo da escrita em que se encontram os alunos. Por meio de conversas
informais, o professor terá condições de averiguar quais temas são do
conhecimento e interesse de seu grupo de alunos.

Nesse caso, sugerimos a “BRINCADEIRA DA FORCA”, para que o


professor possa diagnosticar a etapa de conhecimento inicial de cada
um de seus alunos e, subsequen­temente, possa agrupá-los de forma a
facilitar o trabalho com eles.

Dosando a quantidade de informação

“Dosarás a quantidade de informação nova, farás com que condensem


e automatizem os conhecimentos básicos.”

Na fase inicial de alfabetização, o conhecimento básico inicial é o domínio


da base alfabética (o alfabeto) pela criança.
UNIUBE 189

Para tanto, sugerimos o “BINGO DAS LETRAS” ou o “QUEBRA-CABEÇA


ALFABÉTICO” como forma de automatizar o conhecimento necessário,
aliado à ludicidade infantil. Com a utilização de atividades lúdicas, o
professor consegue efetivar a apren­dizagem de forma inovadora, de
modo a fazer com que seus alunos apreendam o conhecimento, sem
torná-lo massacrante.

Diversificando tarefas

“Diversificarás as tarefas e aprendizagens.”

É fundamental que o professor proponha atividades variadas e


desafiadoras, para que consiga despertar e manter o interesse de seus
alunos para a aprendizagem.

Tomando-se como base o exemplo citado anteriormente para o domínio


da base alfa­bética, existem inúmeras atividades lúdicas e desafiadoras
que o professor pode lançar mão, como: DOLMINÓ DAS LETRAS, JOGO
DA MEMÓRIA, BARALHO ALFABÉTICO, entre outras. Vale ressaltar que,
além de as atividades serem inovadoras, é importante que o ambiente
de estudo também seja diferenciado, ou seja, não fique restrito à sala
de aula, utilizando-se de outros espaços físicos, como a biblioteca, a
sala de vídeos, o pátio, a sala de informática, entre outros, que tornem o
estudo mais prazeroso. Assim como também é importante diversificar as
estratégias de ensino utilizadas pelo educador, desenvolvendo variadas
alternativas para se atingir um mesmo objetivo.

Diversificando situações de aprendizagem

“Planejarás situações de aprendizagem para a sua recuperação.”


190 UNIUBE

Ao diversificar as tarefas de aprendizagem, o educador estará automaticamente


pro­pondo atividades recuperadoras, ou seja, além de fixar melhor o
conhecimento para as crianças que dominam o código alfabético, ele
estará tornando possível a apreensão do código para aquelas que ainda
possuem dúvidas. É importante lembrar que se faz necessário por parte
do educador o conhecimento do estágio de desenvolvimento em que
se encontra cada um de seus alunos. Para tanto, é preciso conhecer os
estudos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky e suas pesquisas referentes
à psicogênese da leitura e da escrita, para poder propor atividades mais
desafiantes aos que já estão em um nível de conhecimento mais elevado,
além de propiciar a retomada do conhecimento de forma diversificada
àqueles detentores de algum tipo de dúvida ou dificuldade.

Ligando as aprendizagens

“Organizarás e ligarás as aprendizagens umas às outras, promoverás a


reflexão sobre os conhecimentos.”

Quando o professor consegue estabelecer uma conectividade entre as


aprendizagens, fica mais fácil para o aluno compreender que há um
significado por detrás de tudo o que aprendemos, e o que foi apreendido
hoje servirá como base para edificar o conhe­cimento de amanhã. Quando
falamos em conectividade de conhecimentos, estamos nos referindo
também à relação existente entre as diferentes disciplinas, o que, na
educação contemporânea, chamamos de intertextualidade. Em suma, o
aprendizado é uma constância infinita de degraus que vão se solidificando
mutuamente. Para isso, é importante que o educador, no início de cada
atividade, retome os conhecimentos trabalhados anteriormente como
ponto de partida para a introdução dos objetivos a serem atingidos.
UNIUBE 191

EXEMPLIFICANDO!

Num jogo de “QUEBRA-CABEÇA DE NOMES DE ANIMAIS (DESENHO/


NOME)”, o educador estará constantemente retomando as sílabas
conhecidas e simultaneamente introduzindo as sílabas novas ou complexas,
para que o educando vá assimilando a trama que compõe nosso código
linguístico escrito. Ele poderá, ainda, aliar os objetivos da língua portuguesa
com a matemática, propondo a contagem quantitativa das letras das palavras
ou dos nomes estudados, a escrita dos nomes dos numerais ou, ainda, o
jogo “BATALHA NAVAL”, em que se trabalha de forma concomitante letras
e números, entre outras.

Assim, o educador estará promovendo a interdisciplinaridade entre os


conteúdos, ou seja, estabelecendo conexões entre os conteúdos e
desenvolvendo a habilidade em seu aluno de perceber a importância
das aprendizagens conquistadas, a dar significação ao conhecimento
adquirido e continuidade do processo cognitivo.

Incentivando a cooperação

“Proporás tarefas abertas e incentivarás a cooperação.”

As atividades em grupo são fundamentais para o desenvolvimento


dos alunos em fase de alfabetização, pois favorecem a socialização
das crianças, bem como propiciam a in­teratividade dos alunos com o
conteúdo em estudo. A troca de experiências enriquece o conhecimento,
além de oportunizar o intercâmbio cultural, pois sabemos que as crianças
são excelentes mediadoras e são capazes de elucidar as dúvidas do
colega, às vezes, com mais eficácia que o próprio professor.
192 UNIUBE

EXEMPLIFICANDO!

Em uma aula em que as crianças se sintam à vontade para perguntar,


trocar experiências e conhecimentos entre si, elas por si mesmas vão se
agrupar de acordo com suas afinidades pessoais, e é justamente essa troca
de conhecimentos, uma ajudando a outra, que beneficia os envolvidos no
processo. A criança que ajuda o colega com dificuldades sente-se importante
e valorizada por deter o conhecimento, ao mesmo tempo que a que é
auxiliada sente-se amparada e capaz de absorver o conhecimento numa
linguagem acessível a ela.

Qualquer atividade que seja realizada em grupo possui uma gama de


efeitos positivos, desde que o educador não perca o foco dos objetivos
a serem atingidos. Os jogos, de uma maneira geral, exemplificam bem
esse aspecto. Com eles as crianças conseguem perceber a importância
do outro na construção e na efetivação do seu conhecimento.

Os jogos reforçam positivamente o aspecto socioemocional, mesmo


que em deter­minados momentos surjam impasses e discussões, pois
pode não parecer, mas as crianças crescem muito com isso, já que as
discussões são oriundas de um mesmo problema visto sob ângulos
diferentes, em que se buscam saídas diferentes para um mesmo desafio.

Instruindo no planejamento e organização

“Instruirás no planejamento e organização da própria aprendizagem de


cada um.”

A organização de um ambiente favorável à aprendizagem faz-se necessária


aos pro­fissionais da educação. Estimular o aluno a aprender, planejar
situações de aprendi­zagens motivadoras e desafiadoras, bem como
UNIUBE 193

estabelecer critérios organizacionais para a aplicação das variadas


propostas de desenvolvimento do saber, são atitudes primordiais que
garantirão a eficiência dos objetivos educacionais a serem atingidos.

Vale lembrar que um planejamento eficiente deve conter de forma clara


os objetivos a serem alcançados, interdisciplinarmente, de forma a
estabelecer a conectividade com as demais disciplinas, quais estratégias
serão utilizadas para a concretização desses objetivos, com atividades
dinâmicas e desafiadoras, e, ainda, uma avaliação criteriosa e contínua
do processo em desenvolvimento.

4.10 Promovendo o desenvolvimento de forma integral

Entender o processo de desenvolvimento do aluno de forma integral,


abrangendo os aspectos psicológicos, cognitivos e motores, é essencial
para a construção do co­nhecimento do professor e, consequentemente, o
aperfeiçoamento de sua atuação pedagógica. Com o objetivo de aprofundar
nossos estudos alusivos a essa temática, principalmente no que tange à
afetividade, a teoria walloniana auxilia na compreensão da forma de agregar
saberes constitutivos de uma prática profissional inovadora e eficaz.

Considerando a importância das concepções wallonianas para o contexto


educacional, relembraremos a seguir as principais colocações deste autor
para o estudo sobre a mediação e intervenção pedagógica.

4.10.1 Pressupostos teóricos de Wallon

Ao examinar os pressupostos teóricos de Wallon, percebemos sua


grande contribuição para o contexto educacional, e seus estudos foram
relevantes para uma nova forma de se perceber o ser humano como uma
pessoa integral, global. Ao longo de toda a vida, dedicou-se a conhecer
o desenvolvimento infantil, a trajetória do desenvolvimento do psiquismo
e a capacidade de aprender das crianças.
194 UNIUBE

Para este teórico, é impossível dissociar os fatores orgânico e biológico


dos fatores sociais no desenvolvimento do ser humano. Ele destaca
que o ser humano é um ser completo: evidenciando que há uma
interdependência entre os fatores afetivo, cognitivo e motor e que tais
fatores interagem de forma integrada, propiciando o desenvolvimento
pleno do ser humano.

Um aspecto importante que sua teoria destaca é que “As funções


psíquicas podem pros­seguir num permanente processo de especialização
e sofisticação, mesmo que do ponto de vista estritamente orgânico já
tenham atingido a maturação” (GALVÃO, 2003, p. 41).

Não se pode delimitar o desenvolvimento humano, seja quanto ao


aspecto da aprendi­zagem ou quanto à formação de sua personalidade.
O desenvolvimento dependerá das condições do desenvolvimento do
psiquismo do sujeito como também das condições desfavoráveis que o
meio lhe proporcionará.

Ele considera que o ritmo determinado às etapas de desenvolvimento


não é con­tínuos e poderá ser marcado por rupturas, retrocessos e
reviravoltas, dependendo das condições dos fatores orgânicos e sociais
que a criança vivencia. E, ainda, Wallon evidencia que “a passagem
de um ao outro estágio não é uma simples ampliação, mas uma
reformulação. Com frequência, instala-se, nos momentos de passagem,
uma crise que pode afetar visivelmente a conduta da criança” (GALVÃO,
2003, p. 41).

A passagem de um estágio para outro não é apenas a sobreposição ou


a justaposição entre os conhecimentos anteriores e os atuais. Exige uma
reestruturação, uma reela­boração do pensamento. Para isso a criança
dispensa um grande esforço, tanto afetivo quanto cognitivo e motor, pois
UNIUBE 195

corpo e mente trabalham juntos para apreender as novas aprendizagens.


Frequentemente, durante esta inter-relação (reelaboração), a criança
revela seu “esforço” por meio do movimento do seu tônus muscular
ou da motricidade (para Wallon, motricidade e psicomotricidade são
palavras sinônimas), que são perce­bidas em seu comportamento: raiva −
agitação motora; ansiedade – inquietude; alegria ou tristeza – contrações
musculares, entre outras. Somos pessoas completas, então não há
dissociação entre as reações orgânicas e as reações psíquicas.

Ressalta, ainda, que essa manifestação motora pode ocorrer em maior


ou menor in­tensidade, dependendo do grau de desenvolvimento da
criança. Ao se desenvolver, transforma a atividade que antes era motora
em atividade mental, ou seja, com o passar do tempo ela aprende a
“controlar” pelo pensamento suas manifestações orgânicas. Por isso, é
importante que o professor esteja atento às manifestações corporais de
seus alunos, pois, como dizemos popularmente, o corpo “fala”.

4.10.2 O movimento e o pensamento

Assim, a teoria walloniana estabelece uma relação entre movimento e o


pensamento, que consideramos importantíssima para nós, profissionais
da educação.

PONTO-CHAVE

Todos nós temos que ter a clareza da importância das atividades motoras/
psicomotoras no contexto da sala de aula, principalmente com crianças da
Educação Infantil e os primeiros anos do Ensino Fundamental. O movimento
é uma atividade infantil de extrema importância para o desenvolvimento da
afetividade e da cognição.
196 UNIUBE

Dantas, La Taille e Oliveira (1992) ressaltam que, segundo Wallon,


no início, é o ato motor que desencadeia e dirige o pensamento. Uma
criança quando chora imprime em seu corpo um tipo de sensação: mexe
com os braços, muda seu tônus muscular, sua rigidez; estabelece uma
comunicação com o mundo exterior. É a partir desse vínculo que se
coloca dentro do contexto cultural, pois a partir do momento que a mãe
atende às suas necessidades a criança estabeleceu seu vínculo cultural.
Obviamente, nesse momento a criança não “pensa” para realizar esse
vínculo, apenas manifesta suas sensações e emoções.

Com o passar do tempo e com os estímulos do meio, a criança se


desenvolve por meio da linguagem e das representações que ela faz da
realidade. Ela elabora e reelabora novos conceitos e aprende a controlar
seus gestos pelos seus pensamentos. Ou seja, o ato que antes era
motor passa a ser mental, conforme dissemos anteriormente. Durante
essa fase, das representações simbólicas, em que ocorre a descoberta
de novos signi­ficados, as atividades psicomotoras são essenciais,
são estímulos e meio de conexão entre o eu subjetivo e o eu cultural.
A criança tem necessidade do movimento como forma de exteriorizar
suas sensações, seus sentimentos e sua capacidade intelectual. Assim,
afirma-se que o educador deve utilizar as atividades psicomotoras
como forma de intervenção no processo ensino-aprendizagem para o
desenvolvimento pleno do educando.

4.10.3 Emoção e afetividade

A emoção, segundo Wallon, são revelações do estado do sujeito


ou existente nele (re­
velações subjetivas), exteriorizada por meio
das manifestações orgânicas. As alterações emocionais provocam
UNIUBE 197

modificações no tônus muscular, por meio das contrações mus­culares


e viscerais (órgãos maiores e mais profundos que se contraem, por
exemplo, as contrações intestinais), demonstram seu estado íntimo. E,
quando estimuladas pelo meio social, oportunizam a revelação do estado
subjetivo do sujeito. Assim, a emoção é considerada o primeiro e mais
forte vínculo entre os seres humanos.

Ao longo do primeiro ano de vida, a afetividade corresponde às manifestações


das funções orgânicas e dos aspectos vitais da emoção. Mais tarde,
com a ampliação e o fortalecimento do vínculo do ambiente socialmente
construído, das atividades orgânicas e dos aspectos psíquicos, essa
concepção se amplia, tornando-se mais vasta, envolvendo uma gama
maior de manifestações. Elas englobam tanto os aspectos biológicos
ligados à emoção como os aspectos psicológicos com a manifestação dos
sentimentos.

Um exemplo de um professor que trabalha com a postura pedagógica,


pautada nas definições de Wallon, relativas à afetividade e à concepção
de ser humano como ser integral: social, biológico e emocional, é aquele
que tem o conhecimento teórico meto­dológico aliado à sensibilidade de
perceber as características inerentes de seu aluno. A partir do respeito a
tais características, busca as estratégias adequadas a serem trabalhadas
na zona de desenvolvimento proximal. Ou seja, é aquele que respeita e
busca conhecer o desenvolvimento real e, a partir deste, envolve, motiva
os alunos para o desejo de aprender. Esse professor possui intrínseco,
em sua prática pedagógica, o respeito à diversidade, à liberdade de
expressão, ao conhecimento científico, à capa­cidade de colocar-se
no lugar do outro e, fundamentalmente, acredita na capacidade da
“modificabilidade cognitiva”, que todo ser humano possui.
198 UNIUBE

4.11 Postulado

Para nós, neste capítulo, seu postulado fundamental é que ao longo do


desenvolvimento integral do aluno, sobremaneira durante a infância, a
inteligência e a afetividade se in­fluenciam mutuamente numa dialética
entre os fatores orgânicos e os sociais. Portanto, tenhamos a consciência
da importância da mediação e das intervenções que devemos propor aos
nossos educandos.

A proposta deste capítulo é que o educador transforme a afetividade em


um fio condutor de toda a estratégia de intervenção, permeando sua
prática pedagógica, para conseguir o desenvolvimento integral de seus
alunos.

Concordamos com Almeida (2006, p. 86) quando diz que:


WALLON, o psicólogo e educador, legou-nos muitas outras
lições. A nós, professores, duas são particularmente
importantes. Somos pessoas completas: com afeto,
cognição e movimento, e nos rela­cionamos com
um aluno também pessoa completa, integral, com
afeto, cognição e movimento. Somos componentes
privilegiados do meio de nosso aluno. Torná-lo mais
propício ao desenvolvimento é nossa responsabilidade.

Que possamos a cada dia procurar aperfeiçoar nossos conhecimentos


para nos tor­narmos profissionais conscientes de nossa responsabilidade
como um mediador e interventor na vida escolar dos educandos. Dessa
forma, faremos a diferença em suas vidas, assim como temos a certeza
de que a cada novo desafio, a cada nova conquista, seja no aspecto
profissional como também no pessoal ou afetivo, os educandos tam­bém
fazem a diferença na vida do educador.
UNIUBE 199

4.12 Conclusão

Sendo assim, podemos concluir que o professor mediador é aquele


que acredita nas potencialidades de seus alunos e não mede esforços
para efetivamente concretizar os objetivos propostos, sendo capaz de
intervir com precisão nas dificuldades de seus aprendizes, transformando
anseios em ações.

Parafraseando o educador Paulo Freire, se o homem se considerasse um


ser acabado, a educação não seria possível. Dessa forma, o professor
deve sempre ter em mente o quão importante é seu papel, bem como
as imprescindíveis intervenções eficazes que realiza. O educador é, por
natureza, um sonhador. Sonha com um mundo humanamente melhor por
isso não se acomoda diante da controvertida realidade que se apresenta.

O verdadeiro educador irá agir, intervir e interferir de maneira a atingir


suas metas. A sua arma é o conhecimento, a aprendizagem, pois sabe
que, para realizar as mudanças necessárias, terá que oportunizar
diversificadas experiências cognitivas a seus alunos. Eis a força mágica
transformadora da educação de qualidade.

Resumo

A abordagem inicial deste capítulo foi sobre a mediação pedagógica.


Vimos que o pro­fessor mediador assume o papel de facilitador do
aprendizado e que no contexto escolar a mediação também se estabelece
na relação aluno-aluno. Os estudos realizados por Vygotsky nos
esclareceram que no contexto escolar a mediação também se estabelece
na relação aluno-aluno. Observamos também que é principalmente
na escola, pela interação social com outras crianças e pela mediação
“intencional” do professor, que a criança aprende e se desenvolve.
200 UNIUBE

É fundamental conhecer a base teórica acerca dos aspectos constitutivos


dos níveis de escrita, para que o professor saiba quando, onde e como
interferir adequadamente na zona de desenvolvimento proximal de seus
alunos, provocando avanços que não ocorreriam aleatoriamente.

Aprofundamos um pouco mais na teoria de Reuven Feuerstein, que se


dedicou ao es­tudo da cognição e da sua modificabilidade. Sua filosofia
da Modificabilidade Cognitiva Estrutural (MCE) baseia-se no fato de que
todo ser humano é capaz de desenvolver a capacidade de aprender, ou
seja, não há limites para o desenvolvimento da mente humana. A MCE
descortina uma nova perspectiva para o atendimento às crianças com
necessidades educacionais especiais. Feuerstein reforça a importância
da intenção da ação do professor no processo ensino-aprendizagem.
Demonstra que a natureza do ser humano é ser flexível e que a inteligência
é dinâmica, disponível, aberta às mudanças durante toda sua vida.

Reuven Feuerstein também salienta o papel da mediação no processo


ensino e aprendizagem. Estimular o aluno para aprender, planejar
situações de aprendizagens motivadoras e desafiadoras, bem como
estabelecer critérios organizacionais para a aplicação das variadas
propostas de desenvolvimento do saber, é atitude primordial que garantirá
a eficiência dos objetivos educacionais a serem atingidos. O processo de
desenvolvimento do aluno deve ocorrer de forma integral, abrangendo
os aspectos psicológicos, cognitivos e motores, sendo essencial para
a construção do conhecimento do professor e, consequentemente, o
aperfeiçoamento de sua atuação pedagógica.

Ao examinar os pressupostos teóricos de Wallon, percebemos sua


grande contribuição para o contexto educacional, seus estudos foram
relevantes para uma nova forma de se perceber o ser humano como
uma pessoa integral, global. Ele salienta a relação entre movimento
e pensamento, a importância do desenvolvimento psicomotor para a
aprendizagem e o papel da afetividade nesse processo.
UNIUBE 201

Referências

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6. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2006.

BEYER, Hugo Otto. O método Reuven Feuerstein: uma abordagem para


o atendimento psicopedagógico de indivíduos com dificuldades de aprendizagem,
portadores ou não de necessidade educativas especiais. In: Revista Brasileira de
Educação Especial, vol. 4, 1996. Disponível em: <http://www.abpee.net/
homepageabpee04_06/artigos_em_pdf/revista4numero1pdf/r4_art07
.pdf>. Acesso em: 18 jul. 2011.

BOQUETO, Ricardo. Vygotsky e a aprendizagem escolar. Porto Alegre:


Artes Médicas, 1998.

CDCP − Centro de Desenvolvimento Cognitivo do Paraná. Disponível em: <http://


www.cdcp.com.br/ reuven_feuerstein.php>. Acesso em: 11 de abr. 2011.

DANTAS, Heloysa; LA TAILLE, Yves de; OLIVEIRA, Marta kohl. Piaget, Vygotsky,
Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.

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Uma introdução às ideias de Feuerstein. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento


infantil. 12. ed. Petrópolis: Vozes: 2003.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da


língua portuguesa. Rio de Janeiro: objetiva, 2009.

LOPES, Maria da Glória. Jogos na educação: criar, fazer jogar. 3. ed.


São Paulo: Cortez, 2000.

MASETTO, Marcos. Didática: a aula como centro. 4. ed. São Paulo: FTD, 1997.

OLIVEIRA, Marta. kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um


processo sócio-histórico. São Paulo: Editora Scipione, 1997.
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Trad.: Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2002.

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salto para a modificabilidade cognitiva estrutural. Revista Educere et Educare,
Unioeste v. 2, n. 4, p. 297-310, jul./ dez. 2007. Disponível em: <e-revista.unioeste.
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VYGOTSKY, L. S. et al. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem.


São Paulo: Ícone/Edusp, 1988.
Capítulo
Necessidades
educacionais especiais e
5
as práticas pedagógicas
para a educação
inclusiva das pessoas
com deficiências
físicas e mentais
Denise Rodovalho Scussel / Judith Mara de Sousa Almeida /
Vivian Zerbinatti da Fonseca Kikuichi

Introdução
Neste capítulo, estudaremos um tema polêmico que intriga e
perturba os professores e gestores em geral. Afinal, não é tarefa
fácil ultrapassar os nossos próprios limites para conhecer o outro
ou desconstruir conceitos preestabelecidos para aceitar o novo, o
desconhecido. Como vimos, o trabalho na área educacional implica
esse deslocar, essa saída de si mesmo em busca do conhecimento
dos diferentes sujeitos que se apresentam no entorno de nós. É
entender que esses sujeitos têm diferentes culturas, diferentes
formas de aprender, diferentes níveis socioeconômicos, diferentes
desejos, jeitos e sonhos.

O olhar para o mundo, para as múltiplas relações que travamos


com ele, para os diferentes sentidos que somos capazes de
compor a partir de uma experiência vivida, é diferente de pessoa
para pessoa, porque cada ser humano é singular e vive as
experiências de maneira também singular. Por isso, neste texto,
204 UNIUBE

convidamos você para continuar refletindo sobre as pessoas com


deficiência, não com o olhar da limitação ou incapacidade, que,
muitas vezes, estamos habituados a enxergar, mas por meio do
olhar da possibilidade. Para isso, ressaltamos a importância desse
deslocar de olhar, dessa mudança de postura, tentando perceber
como essas pessoas compreendem e interagem com o mundo.

Juntos, analisaremos e descobriremos o potencial e a capacidade


de superação que essas pessoas têm; buscaremos estabelecer a
relação com os conceitos que a sociedade lhes atribui e aqueles
estabelecidos por estudiosos da área da deficiência física e da
deficiência mental na educação, percebendo a concepção de
homem e cidadania que perpassa esses conceitos ao longo da
história.

Pretendemos, também, com o nosso estudo, trazer para uma


realidade mais próxima de você, aluno(a), algumas práticas
pedagógicas que já estão acontecendo dentro das escolas;
práticas que ressaltam as possibilidades e habilidades das
pessoas com deficiência.

Objetivos

Ao final deste capítulo, esperamos que você seja capaz de:

• demonstrar o conceito de deficiência física e de deficiência


mental;
• estabelecer relações dos conceitos dessas deficiências e as
possibilidades de formação humana por meio da educação; e
• analisar as diferentes práticas pedagógicas existentes para a
atuação de qualidade do educador/gestor.
UNIUBE 205

Esquema
5.1 Marcos históricos e normativos da educação brasileira:
caminhando para uma proposta educacional inclusiva
5.2 Novo contexto educacional: um grande desafio para as escolas
5.3 Definição, caracterização e proposta de trabalho pedagógico
referente às deficiências físicas e mentais
5.3.1 Deficiência física
5.3.2 Deficiência mental
5.4 Proposta de trabalho pedagógico
5.5 Atendimento educacional especializado para pessoas com
deficiência física
5.6 Atendimento educacional especializado para pessoas com
deficiência mental
5.7 Conclusão

5.1 Marcos históricos e normativos da educação brasileira:


caminhando para uma proposta educacional inclusiva

Para iniciarmos nossa reflexão, faremos uma retomada, no que diz


respeito à educação das pessoas com deficiência e à educação inclusiva,
assuntos estes que já foram abordados em outros momentos do curso,
mas que se faz necessário serem relembrados.

O fato de o tema “deficiência” ser observado como um fenômeno


individual ou social é determinado por representações culturais, políticas,
éticas e morais de uma sociedade.

O século XVIII marca uma época em que a ignorância, rejeição e


discriminação do indivíduo deficiente eram comuns; naquele tempo, o
infanticídio era uma prática normal quando a criança apresentava alguma
anormalidade.
206 UNIUBE

Na Idade Média a prática do infanticídio passa a ser condenada pela


Igreja. Entretanto a anormalidade ou deficiência a partir de então são
justificadas por causas sobrenaturais. Pessoas com deficiência eram
submetidas ao exorcismo para se livrarem do demônio e de outros
espíritos malfeitores.

Durante os séculos XVI e XVII, os orfanatos, manicômios e, até mesmo,


as prisões serviam como internato às pessoas com deficiência mental.
É ao final do século XVIII e início do século XIX que surgem as primeiras
instituições especializadas no atendimento às pessoas com deficiência.
Considera-se essa época o início da Educação Especial. De caráter
excludente e primordialmente assistencialista, a pessoa com deficiência
recebia cuidados ao mesmo tempo que a sociedade se beneficiava por
não precisar conviver com ela.

A educação especial substituía o ensino comum e era desenvolvida


em instituições especializadas, escolas especiais ou classes especiais.
A filosofia de trabalho nessas instituições estava fundamentada na
dicotomia normalidade/anormalidade e ainda em uma abordagem clínica/
terapêutica.

Por meio desta breve retomada histórica, podemos concluir que a


educação de pessoas com deficiências nasceu de uma forma solitária,
segregada e excludente. Apenas no século XX, foram investigadas e
comprovadas as origens das deficiências, rompendo, assim, a visão
mítica que havia até então.

Por meio da Declaração dos Direitos Humanos (ONU, 1948), é assegurado


a todas as pessoas o direito à educação pública gratuita. Em 1961, a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, Lei no 4.024/61,
determina que as pessoas com deficiência tenham direito ao atendimento
educacional, de preferência, na rede regular de ensino.
UNIUBE 207

Atualmente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei no


9.394/96, em seu artigo 59, determina que os sistemas educacionais
ofereçam adaptações no currículo, nos métodos, nos recursos e na
organização do ensino e da classe para atender às necessidades dos
educandos. Com a descentralização do poder, surgem as Diretrizes
Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, com a
colaboração das diferentes esferas: União, Estados e Municípios.

PESQUISANDO NA WEB

Você conhece as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na


Educação Básica?

Se não, acesse o endereço: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/


diretrizes.pdf>.

É importante conhecê-las!

Com as diretrizes, ficou estabelecido que os atendimentos às necessidades


individuais devem acontecer, preferencialmente, nas escolas comuns e
apenas em relação às necessidades mais graves nas escolas especiais.

As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica,


Resolução CNE/CEB no 2/2001, no artigo 2o, determinam que:
Os sistemas de ensino devem matricular todos os
alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o
atendimento aos educandos com necessidades
educacionais especiais, assegurando as condições
necessárias para uma educação de qualidade para
todos (BRASIL, 2001).

O Decreto no 5.296/04, que regulamenta as Leis no 10.048/00 e nos


10.098/00, traz à tona a questão da acessibilidade das pessoas com
deficiência ou com dificuldade na mobilidade. A partir daí, os programas
e projetos de acessibilidade buscam a promoção do acesso universal
aos espaços públicos.
208 UNIUBE

Temos o hábito de acreditar que, a partir do momento que o direito se


constitui em lei, esse direito está resguardado e será praticado sem que
fiquemos atentos a ele. Entretanto, mesmo com os direitos legalmente
estabelecidos, as pessoas com necessidades educacionais especiais, na
prática, ainda têm problemas relacionados ao acesso e à permanência
no ensino regular.

IMPORTANTE!

A escola abriu seus portões, porém não modificou sua postura


homogeneizadora, suas práticas autoritárias e retrógradas nem tampouco
suas concepções educacionais. Sendo assim, ocorreu o que podemos
chamar de INTEGRAÇÃO do aluno com deficiência, e não o que chamamos
de INCLUSÃO.

O conceito de integração surge com o princípio da normalização


(KELSEN, 1959 apud FÁVERO et al., 2007, p. 18). Esse princípio visa
oferecer ao aluno condições e oportunidades iguais ou parecidas com as
dos demais membros da sociedade. Esse conceito (KAUFMAN, 1975;
WARNOCK, 1978; apud FAVERO; PANTOJA; MANTOAN, 2007, p. 22)
apresentava três dimensões abrangentes: integração física (espaço
físico, do ambiente), integração funcional (do funcionamento e utilização
de recursos) e integração social (a convivência e interação).

Por meio de várias discussões sobre o tema, o segmento que sempre


lutou pelo espaço das pessoas com deficiência decide, então, tomar
como norte para as tomadas de decisão a Declaração Mundial de
Educação para Todos, com os conceitos aprofundados e aperfeiçoados
na Declaração de Salamanca. Por meio dessa Declaração, o MEC
elabora documentos norteadores da educação do BRASIL (2007, p. 8),
que trazem conceitos importantes como:
UNIUBE 209

O termo necessidades educacionais especiais refere‑se


a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades
se originam em função de deficiências ou dificuldades
de aprendizagem. As escolas têm de encontrar uma
maneira de educar com êxito todas as crianças,
inclusive as que têm deficiências graves.

Nessa perspectiva, é responsabilidade da escola regular o atendimento a


todos os alunos, com ou sem deficiência, incluindo-se aqui aquelas com
deficiências graves ou ainda com dificuldades de aprendizagem.

5.2 Novo contexto educacional: um grande desafio para


as escolas

Por meio dos estudos que você já realizou e dos documentos que o MEC
nos disponibiliza, é possível perceber que os fundamentos importantes
na inclusão escolar iniciam-se pelos seguintes princípios:

• da identidade;
• do respeito à diversidade;
• do trabalho em equipe; e
• da interação entre todos os membros da escola, família e comunidade.

A sala de aula inclusiva é aquela em que as estratégias de ensino


são diferenciadas e modificadas, para que todos os alunos possam
se desenvolver e aprender, lembrando que uma estratégia de ensino
interessante para um aluno com deficiência pode ser igualmente
interessante para todos os demais que não têm aquela deficiência. Sendo
assim, as ideias utilizadas na proposta inclusiva podem ser as mesmas
para os alunos com necessidades educacionais especiais e para os que
não têm tais necessidades. Nessa perspectiva, não é necessário criar,
mas apenas adaptar as propostas existentes às especificidades de cada
deficiência.
210 UNIUBE

IMPORTANTE!

Nesse novo contexto educacional, a Educação Especial na perspectiva


da Educação Inclusiva não deverá mais oferecer educação substitutiva
ao ensino regular, entretanto sua parceria com as escolas regulares será
fundamental no que diz respeito ao oferecimento de ensino complementar
ou suplementar aos alunos com deficiência no atendimento educacional
especializado.

A construção da escola inclusiva está pautada no princípio da acessibilidade.


A partir desse princípio, as escolas passam a ser planejadas com
ambiente acessível e sem discriminação. Esse trabalho não está restrito
apenas a alguns profissionais, mas estende-se a toda a escola e a toda
a sociedade. Sua efetivação exige mudanças, como:

• a adaptação do espaço físico a fim de possibilitar que todos circulem


e se movimentem sem restrições;
• o acesso às tecnologias, mesmo que seja necessário alguma
adaptação, acesso à comunicação, mesmo alternativa;
• a adaptação das práticas pedagógicas às necessidades dos
educandos;
• a gestão democrática; e
• a ênfase à formação continuada do professor; acordos e parcerias
com o transporte, a saúde e outros setores da sociedade, a fim de
viabilizar a promoção humana.

Como já foram abordadas várias vezes aqui, não há necessidade de se


elaborar uma proposta pedagógica específica para as crianças e jovens
com necessidades educacionais especiais, mas, sim, a diferenciação de
metodologias das práticas pedagógicas que atendam às ESPECIFICIDADES
que cada deficiência e/ou dificuldade requer. Por isso, estudaremos agora
um pouco sobre as deficiências físicas e também sobre as deficiências
mentais, que são o foco do nosso estudo.
UNIUBE 211

5.3 Definição, caracterização e proposta de trabalho pedagógico


referente às deficiências físicas e mentais

Partindo de nossas retomadas e reflexões, vamos pensar no conceito


de deficiência?

Segundo documento BRASIL (2001, p. 14), a deficiência é considerada:


[...] uma restrição física, mental ou sensorial, de
natureza permanente ou transitória, que limita a
capacidade de exercer uma ou mais atividades
essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo
ambiente econômico e social.

Podemos perceber, assim, que a deficiência é encarada como uma situação ou


característica específica da pessoa; que pode ser agravada ou melhorada,
dependendo da forma com que essa é acolhida em seu meio.

Nesse sentido, uma pessoa pode sentir-se discriminada em um ambiente


que lhe impõe barreiras e que só destaca a sua deficiência ou, ao
contrário, sentir-se acolhida, graças às transformações deste ambiente
para atender às suas necessidades.

5.3.1 Deficiência física

Ao buscar definir a deficiência física, observamos que existem diferentes


conceitos na literatura. Trabalharemos com o conceito explicitado no
documento da legislação brasileira, Decreto no 3.298 de 1999, por
considerá-lo o mais completo:
Art. 4o deficiência física – alteração completa ou par-
cial de um ou mais segmentos do corpo, acarretando
o comprometimento da função física, apresentan-
do-se sob forma de paraplegia, paraparesia, mono-
plegia, monoparesia, tetraplegia, triplegia, triparesia,
hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de
membro, paralisia cerebral, membros com deformi-
dade congênita ou adquirida, exceto as deformidades
estéticas e as que não produzam dificuldades para o
desempenho das funções.
212 UNIUBE

A partir dessa definição, a função física pode ficar comprometida quando


faltar algum membro (amputação), sua má formação ou deformação
(alterações que comprometem o sistema muscular e esquelético). Ainda
temos as disfunções de ordem neurológica, que podem alterar as funções
motoras.

As alterações motoras decorrentes de lesão do sistema nervoso podem


ser de diferentes tipos, como alterações:

• de ordem muscular: podem ser denominadas hipertonias, hipotonias,


atividades reflexas, movimentos descoordenados e involuntários; e
• de ordem nervosa, no que diz respeito à sensibilidade e à força
muscular: podem ser denominadas hemiparesias, paraparesia,
monoparesia e tetraparesia.

Outro aspecto a ser ressaltado, que é importante para o conhecimento


do educador, são as denominações de comprometimento de movimento
e/ou sensibilidade em cada membro do corpo. As denominações, como
na sequência da figura abaixo, para MONO (um membro do corpo
comprometido), DI ou PARA (dois membros do corpo comprometidos
– geralmente são os membros inferiores), HEMI (envolvimento de um
lado do corpo superior e inferior) e TETRA (alteração de movimentos nos
quatro membros, o tronco e o pescoço) (Figura 1).

Figura 1: Esquema demonstrativo do comprometimento de movimento e/ou


sensibilidade em cada membro do corpo.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 213

Iremos agora conversar um pouco mais a respeito da paralisia cerebral,


por ser uma das causas mais presentes no segmento da deficiência física
que chega à escola.

IMPORTANTE!

As crianças que são acometidas pela paralisia cerebral sofrem grande


preconceito e discriminação na escola, pois as pessoas pensam que estas
têm também deficiência mental. Isso é um grande equívoco!

A criança com paralisia cerebral, muitas vezes, tem dificuldade de se


comunicar e/ou também de se expressar, devido às suas limitações
motoras e fonoarticulatórias, mas não cognitivas. Elas demonstram
um comportamento alheio à realidade, por falta de oportunidades,
desenvolvimento de formas alternativas de comunicação e de mediações
que lhes auxiliem na expressão de toda a sua vontade.

A principal característica da paralisia cerebral é o déficit motor, porém


quase sempre se pode encontrar um ou outro distúrbio decorrente da
lesão neurológica como: convulsões que podem levar ao déficit cognitivo,
alterações oculares e visuais, distúrbios de deglutição, comprometimento
auditivo, alterações nas funções corticais superiores, distúrbios do
comportamento. De acordo com o local e a extensão da lesão cerebral,
observam-se diferentes tipos de alterações no movimento (BLECK e
NAGEL, [s.d.] apud BRAGA 1995, p. 9).

Vale ainda ressaltar, mesmo que sinteticamente, as causas da paralisia


cerebral (BRAGA, 1995, p. 10). Essas causas podem aparecer isoladas
ou associadas entre si:

Pré-natais: as causas que se destacam são as infecções intrauterinas


(rubéola, toxoplasmose, citomegalia, herpes e sífilis), anóxia fetal,
exposição à radiação ou a drogas, erros de migração neuronal e outras
malformações cerebrais.
214 UNIUBE

Perinatais: complicações durante o parto (traumatismo cerebral ou


anóxia em trabalho de parto difícil ou demorado), prematuridade,
nascimento com baixo peso, hiperbilirrubinemia e infecções perinatais.

Pós-natais: as principais causas pós-natais são os traumatismos crânio-


encefálicos, infecções do sistema nervoso central (como encefalites e
meningites), anóxia cerebral (devido a asfixias, afogamentos, convulsões
ou paradas cardíacas) e acidente vascular cerebral.

IMPORTANTE!

Na escola, encontraremos diferentes tipos de deficiência física, por isso é


fundamental, para você, professor, saber:

• se o quadro é progressivo ou estável;


• se há alterações ou não na sensibilidade tátil-térmica ou dolorosa;
• se há a presença de complicações associadas, como epilepsia, ou
problemas de saúde que requerem cuidados e medicações.

Mantenha contato constante com os pais ou responsáveis por seus alunos.

5.3.2 Deficiência mental

O conceito de deficiência mental já foi muito discutido, entretanto


estudiosos ainda encontram dificuldades em relação a uma definição
que possa contemplar a nova visão de limitação cognitiva encarada pelas
sociedades modernas.

Em 1980, a Organização Mundial de Saúde propôs um conceito que


define a deficiência mental em três níveis, mas lembre-se de que é
importante observar com atenção o valor semântico que cada um dos
termos, a seguir, agrega:
UNIUBE 215

• deficiência: diz respeito à perda ou anormalidade na estrutura ou


funcionamento de um órgão;
• incapacidade: ocorre como consequência da deficiência, nesse
caso a pessoa é dependente em relação à realização de atividades
funcionais;
• desvantagem: prejuízos advindos da situação de deficiência. Há,
portanto, limitações e a necessidade de adaptação do indivíduo para
que haja a interação dele com o meio.

Ao analisar sucintamente os níveis, podemos perceber que a deficiência


e a incapacidade estão mais ligadas a fatores intrínsecos (internos) e a
desvantagem ligada a fatores extrínsecos (externos).

PARADA OBRIGATÓRIA

Em 2001, essa proposta foi revista e foi introduzido o conceito de deficiência


ligado ao desenvolvimento global do indivíduo em relação aos fatores do
seu contexto cultural e social. Esse conceito está ligado a uma visão mais
avançada de deficiência, podendo até mesmo dizer que a pessoa ESTÁ em
situação de deficiência, destacando os efeitos do meio sobre a autonomia
e independência da pessoa com deficiência.

As causas da deficiência mental podem ser inúmeras. As ocorrências


descritas, a seguir, podem ou não levar o educando a uma deficiência
mental. É importante que você as conheça para que possa ficar atento
e, também, para que seus alunos possam se beneficiar de um trabalho
mais seguro, pautado no conhecimento e no profissionalismo:

• doenças neurológicas;
• erros inatos do metabolismo;
• deficiências visuais e auditivas (por falta de estimulação e trabalhos
adequados);
• asfixia perinatal;
216 UNIUBE

• prematuridade;
• hiperbilirrubinemia;
• infecções congênitas;
• malformações congênitas;
• síndromes genéticas.

Em vários momentos, nos referimos à influência do meio para o


desenvolvimento das crianças. Com as crianças deficientes, isso não se
apresenta de forma diferente, e sim com mais êxito e com significativa
relevância.

As crianças, desde pequenas, já estão formando seu “banco de dados”.


Nesta fase, armazenam amplamente as experiências que vivenciam.
Por meio dessas experiências, elas passam por sensações que são
significativas em relação à afetividade, à intelectualidade e às percepções
corpóreas.

IMPORTANTE!

Neste sentido, todas as crianças devem gozar do direito da exploração do


espaço, do ambiente físico em que vivem, tanto em sua casa, quanto na escola.

As crianças com deficiência não podem estar em um mundo à parte para


desenvolver suas habilidades motoras, físicas, cognitivas e afetivas.

É preciso que elas recebam os benefícios dos recursos tecnológicos,


metodológicos e de reabilitação para que seja garantido a elas o direito da
interação com o objeto e com o outro.

A escola é um espaço social por natureza, de interação de uns com os outros.


É neste espaço que motivamos a comunicação, sentimos necessidade de
locomoção, entre outras habilidades que nos fazem sentir seres humanos!
UNIUBE 217

Quando as crianças crescem juntas, convivendo de forma natural com


a diversidade humana, elas não aprendem a enxergar e a construir
o muro invisível da exclusão, mas, sim, aprendem a se considerarem
apenas crianças e, no futuro, poderão considerar-se apenas homens e
mulheres, sem adjetivos que as separem ou rotulem, sem preconceitos,
sem espaços diferenciados.

5.4 Proposta de trabalho pedagógico


Como existem diferentes enfoques e abordagens para a educação das
pessoas com deficiência, logicamente as escolas desenvolvem diferentes
propostas de trabalho para elas. Porém, aqui, iremos optar por aquela
que condiz com nossa abordagem de homem, de aprendizagem e de
diferença.

Favero et al. (2007) ainda ressaltam que a aprendizagem é o centro


das atividades escolares e o sucesso dos alunos é uma das metas da
escola – independentemente do nível de desempenho a que cada um
seja capaz de chegar. Acolher as diferenças não é aceitá-las com suas
possibilidades, mas, sim, a receptividade diante dos diferentes níveis de
desenvolvimento das crianças e dos jovens. Nossa abordagem vem ao
encontro das palavras de Favero et al. (2007, p. 49):
[...] a inclusão não prevê a utilização de práticas
de ensino escolar específicas para esta ou aquela
deficiência, mas sim recursos, ferramentas,
tecnologias que concorram para diminuir/eliminar as
barreiras que se interpõem aos processos de ensino
e de aprendizagem.

Uma educação para todos precisa ser aberta com atividades diversificadas,
que possam ser abordadas por diferentes níveis de compreensão,
de conhecimento e de desempenho, sem que se evidenciem os que
sabem mais e os que sabem menos. Essas atividades devem ser
escolhidas pelos alunos e trabalhadas de forma a explorar ao máximo
as possibilidades e os interesses de cada um. Estratégias como debates,
218 UNIUBE

pesquisas, entrevistas, registros orais, escritos, fotografados, desenhados


e filmados, observações e vivências são alguns processos pedagógicos
que viabilizam a participação de todos os alunos e, ainda, oportunizam
a elucidação de conteúdos importantes a serem aprendidos.

Os alunos com grandes limitações provavelmente não vão aprender tudo


o que os outros colegas poderão assimilar, porém eles vão se beneficiar
da convivência social e poderão se beneficiar também, a seu modo,
segundo suas possibilidades intelectuais, dos conteúdos curriculares
trabalhados na sala de aula. As suas necessidades específicas poderão
ser minimizadas e/ou resolvidas com a sua participação nos Atendimentos
Educacionais Especializados.

O que é o Atendimento Educacional Especializado?


Como funciona? Qual é o perfil do aluno a ser atendido?

O Atendimento Educacional Especializado tem respaldo legal por meio


do Decreto no 6571/2008, que explicita:
Art. 1o A União prestará apoio técnico e financeiro aos
sistemas públicos de ensino dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, na forma deste Decreto,
com a finalidade de ampliar a oferta do atendimento
educacional especializado aos alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades ou superdotação, matriculados na rede
pública de ensino regular.
§ 1o Considera-se atendimento educacional especializado
o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e
pedagógicos organizados institucionalmente, prestado
de forma complementar ou suplementar à formação dos
alunos no ensino regular.
§ 2o O atendimento educacional especializado deve
integrar a proposta pedagógica da escola, envolver a
participação da família e ser realizado em articulação
com as demais políticas públicas.

O MEC desenvolve e trabalha na divulgação da política da educação


inclusiva que propõe a modificação do Ensino Regular e da Educação
Especial. Nesse sentido, são implementadas e implantadas diretrizes
UNIUBE 219

para ações que levem até as escolas o Atendimento Educacional


Especializado (AEE). Esse atendimento deve oferecer aos alunos com
deficiência a complementação da sua formação e não mais a substituição
ou o reforço do ensino regular.

O Atendimento Educacional Especializado deve ser realizado na sala de


recurso multifuncional; preferencialmente na escola que frequenta, em
turno oposto ao da sua turma comum.

A Sala de Recurso Multifuncional é um espaço organizado com


materiais didáticos, pedagógicos, equipamentos e profissionais
com formação para o atendimento às necessidades educacionais
especiais, projetada para oferecer suporte necessário a alunos
portadores de necessidades especiais, favorecendo seu acesso
ao conhecimento.

O professor dessa sala, ofertada pelo MEC, deverá selecionar recursos


e técnicas adequados a cada tipo de comprometimento físico e mental
do aluno para o desempenho das atividades escolares. Os objetivos
principais desses atendimentos são que o aluno desenvolva a
independência e a autonomia e tenha acesso aos recursos essenciais
para a inclusão na classe comum. Nesse sentido, o professor do ensino
comum e o professor do AEE precisam trabalhar de forma harmoniosa
em favor da inclusão e da qualidade de vida dos alunos.

5.5 Atendimento educacional especializado para pessoas com


deficiência física

No atendimento educacional especializado para a deficiência física, os


benefícios que a tecnologia assistiva oferece são utilizados.

O que seria, então, tecnologia assistiva?


220 UNIUBE

Segundo Bersch et al. (2007, p. 27), a tecnologia assistiva:


[...] deve ser entendida como um auxílio que promoverá
a ampliação de uma habilidade funcional deficitária ou
possibilitará a realização da função desejada e que se
encontra impedida por circunstâncias da deficiência.

Para melhor esclarecer como podemos fazer um trabalho pedagógico,


utilizando-se das tecnologias assistivas, o MEC elaborou um guia
pedagógico, explicitando diferentes materiais e instruções para a
utilização desses recursos nas salas multifuncionais e, se for o caso,
nas salas de aula regulares. Esses recursos devem ser solicitados à
Secretaria de Educação conforme especificações de especialistas na
área. O atendimento educacional especializado pode fazer uso das
tecnologias assistivas nas diferentes modalidades:

A) Uso da comunicação aumentativa e alternativa, para atender às


necessidades dos educandos com dificuldades de fala e de escrita
(Figura 2).

Figura 2: Blissymbolics.
Fonte: Acervo EAD-Uniube.

Sistema de comunicação criado por Charles K. Bliss, inspirado nos


caracteres chineses (Figura 3).

PESQUISANDO NA WEB

Caso você queira conhecer mais sobre os Blissymbolics, acesse o endereço:


<http://en.wikipedia.org/wiki/Blissymbols>. Acesso em: 22 nov. 2010.
UNIUBE 221

Figura 3: Organizador de símbolos para sala de aula.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.

São cartões que auxiliam a comunicação tanto de alunos não falantes


quanto de alunos falantes (Figuras 4 e 5).

AMBULÂNCIA

Figura 4: Prancha de comunicação alternativa.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.
222 UNIUBE

Figura 5: Prancha de comunicação alternativa sendo usada por


uma pessoa cadeirante.
Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.

B) Adequação dos materiais didático-pedagógicos às necessidades dos


educandos (Figuras 6 a 8).

Figura 6: Tesoura adaptada.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.

Figura 7: Engrossadores de lápis.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.
UNIUBE 223

Figura 8: Quadro magnético.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD-Uniube.

Esse quadro auxilia o aluno a desenvolver o raciocínio lógico-matemático,


associando números e quantidades.

C) Acessibilidade arquitetônica que auxilie o acesso das pessoas


portadoras de necessidades especiais em prédios públicos, escolares,
entre outros, por meio de projetos desenvolvidos em parcerias com
engenheiros, arquitetos e outros profissionais. Podemos citar como
exemplo rampas, portas alargadas para o acesso de cadeirantes,
elevadores, entre outros.

D) Adequação de recursos da informática: ponteira de cabeça, programas


especiais, teclado, mouse, entre outros (Figuras 9 a 11).

PESQUISANDO NA WEB

Caso você queira obter mais informações sobre as tecnologias assistivas


e recursos alternativos para pessoas com deficiência, acesse o endereço:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/aee_df.pdf>. Acesso em: 12
nov. 2010.
224 UNIUBE

Figura 9: Programa especial de teclado.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD – Uniube.

Figura 10: Programa especial e teclado.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD – Uniube.
UNIUBE 225

Figura 11: Ponteira de cabeça.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD – Uniube.

E) Uso de mobiliários adequados: mesas cadeiras, quadro, bem como


os recursos de auxílio à mobilidade: cadeiras de rodas, andadores, entre
outros (Figura 12).

Figura 12: Poltrona postural.


Fonte: Adaptada de Brasil (2007). Acervo EAD – Uniube.
226 UNIUBE

Os recursos humanos necessários para a efetivação das tecnologias


assistivas englobam toda uma parceria dos profissionais da Secretaria de
Educação, gestores escolares, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais,
fisioterapeutas, arquitetos, engenheiros, entre outros, para trabalharem
em prol da aprendizagem e do desenvolvimento da qualidade de vida
do educando.

Há alguns alunos com deficiência física com muito comprometimento


motor, que necessitam de cuidados especiais para alimentação, locomoção,
utilização de recursos médicos específicos. Para eles, há a necessidade
da presença de um acompanhante no período em que frequentam a
classe comum.

5.6 Atendimento educacional especializado para pessoas com


deficiência mental

As barreiras da deficiência mental se encontram em como o educando


lida com seus conhecimentos, como ele constrói sua bagagem
cultural, enfim, a maneira como lida com o saber em geral. E, como
já foi explicitado, o atendimento educacional especializado existe
para ajudar os alunos a ultrapassarem as barreiras encontradas em
relação às suas deficiências.

IMPORTANTE!

O atendimento educacional especializado necessita assessorar o aluno com


deficiência mental no sentido de que este saia do automatismo, ou seja, para
que ele ultrapasse as atividades mecânicas e chegue a um outro patamar, o
das atividades ativas descritas por Piaget. As atividades ativas são aquelas
em que o sujeito pode opinar, optar, selecionar os meios que julgar mais
conveniente para agir intelectualmente.
UNIUBE 227

Para as pessoas com deficiência mental, a acessibilidade não está nos


suportes externos ao sujeito, mas tem a ver com a mudança de posição
passiva e mecânica diante da aprendizagem para o acesso e a apropriação
ativa do próprio conhecimento.

As pessoas que não têm deficiência mental constroem seus conhecimentos


por meio de práticas e vivências da interação com os objetos e com o
mundo. Fazem projeções, interligações, comparações, julgamentos,
enfim, todas as atividades mentais superiores mais refinadas,
específicas dos seres humanos, com o simples estar em contato com
o conhecimento. Entretanto, para as pessoas com deficiência mental,
só essa interação não basta, por isso é necessário descobrirmos qual o
problema na interrupção de informação.

IMPORTANTE!

O atendimento educacional especializado para as pessoas com deficiência


mental está centrado na dimensão subjetiva do processo de conhecimento
e é trabalhado para se chegar à aprendizagem realmente efetivada. O
conhecimento acadêmico refere-se à aprendizagem do conteúdo curricular
e o atendimento educacional especializado, por sua vez, refere-se à forma
pela qual o aluno trata todo e qualquer conteúdo que lhe é apresentado e
como consegue significá-lo, ou seja, compreendê-lo.

O aluno com deficiência mental, como qualquer outro, necessita desenvolver


sua criatividade e a capacidade de conhecer o mundo por si só, e não
pelo que o outro pensa.
228 UNIUBE

PARADA PARA REFLEXÃO

O nosso maior engano é subestimar as capacidades desses alunos,


escolhendo o caminho mais fácil para ele percorrer, sem deixar que ele
próprio se conscientize da necessidade do aprendizado. Por isso, é de
fundamental importância o significado dessa aprendizagem para cada um.
Assim, o professor deve possibilitar atividades que sejam significativas e
relacionadas à história de cada sujeito.

O Atendimento Educacional Especializado – AEE não tem por compromisso


o desenvolvimento dos conteúdos acadêmicos, no entanto ele deverá
buscar meios para que os alunos se apropriem dos conhecimentos
que lhes permitam a leitura, a escrita e a quantificação. O objetivo do
AEE é de suprir as necessidades do aluno, possibilitando o acesso a
recursos que possam minimizar limitações impostas por uma deficiência
e, consequentemente, promover o desenvolvimento e a aprendizagem
desse aluno. Assim sendo, o ensino comum e o atendimento educacional
especializado precisam caminhar juntos, pois um se beneficia do
desenvolvimento do outro.

É relevante considerar que, no caso da deficiência mental, o desenvolvimento


cognitivo pressupõe a estimulação:

• da percepção, discriminação e interpretação dos estímulos que o


sujeito recebe do meio;
• da memória, destacando a necessidade de reflexão sobre a qualidade
das informações armazenadas, ou seja, somente recuperamos um
conteúdo se o aprendemos de fato e, principalmente, se ele for
significativo. Este fator é de maior relevância quando consideramos
a pessoa com deficiência mental;
• da atenção: esta precisa também ser estimulada com a utilização de
atividades significativas e que motivem o aluno a manter o foco no
que esteja sendo construído no espaço acadêmico;
UNIUBE 229

• do raciocínio: é fundamental que o aluno depare com atividades


que exijam raciocínio, análise, criatividade e também formação de
opinião;
• da linguagem: o trabalho com a linguagem precisa favorecer a
ampliação do vocabulário, da fluência verbal para expressão, quando
existe essa possibilidade, do desenvolvimento da compreensão.
Quando necessário, é importante desenvolver outras possibilidades
de comunicação alternativa, como já explicitado neste capítulo.

É o professor especializado quem pode orientar o professor da classe


comum, no sentido de adaptação de materiais e atividades, bem como
em outras necessidades que surgirem no decorrer do processo.

5.7 Conclusão

A articulação entre o ensino regular e o atendimento educacional


especializado acontecerá conforme a necessidade de cada caso.
Essa articulação não tem como primeira intenção garantir o bom
desempenho escolar do aluno com deficiência mental, mas, sobretudo,
a de que os professores do ensino regular e do atendimento educacional
especializado se empenhem em entender a maneira como esse aluno
lida com os seus conhecimentos e os processos que ele percorrem na
construção de conhecimento.

Entendemos que o professor é fundamental no processo de inclusão.


Nesse sentido, efetivar, na prática, uma educação que seja inclusiva
significa respeitar a diversidade, ou seja, o modo particular que cada um
tem frente ao processo de construção de conhecimento e de constituição
individual enquanto sujeito, sujeito este que é social, por se constituir na
relação com o outro, mas que é também singular, pois escolhe a sua
maneira de compor sentidos das experiências que vive e as histórias
que deseja viver. Assim sendo, não cabe à escola uma prática que seja
homogeneizadora.
230 UNIUBE

Escola é também lugar da heterogeneidade, de multiculturalismo,


construído por diversas identidades e permeado por experiências também
diversas. Receber informações, processá-las e construir conhecimentos
ocorre de maneira particular. Por esse motivo, enquanto educadores ou
gestores, precisamos assumir uma prática reflexiva que torne o ensino
sistematizado e formal da escola o mais significativo possível para a vida
dos alunos.

Não podemos deixar de abordar, mesmo que sucintamente, a configuração


do processo avaliativo frente à questão inegável da diversidade presente
no espaço acadêmico de aprendizagem formal, que é a escola.
Nesse contexto, não há espaço para a avaliação como um fim em si
mesma. A avaliação precisa ser observada como parte do processo
de ensino e aprendizagem, assim, ela é dinâmica e considera tanto o
conhecimento prévio e o nível atual de desenvolvimento do aluno quanto
as possibilidades de aprendizagem futura. Assim, configura-se uma
ação pedagógica processual e formativa, que analisa o desempenho
do aluno em relação ao seu progresso individual, prevalecendo na
avaliação os aspectos qualitativos que indicam as intervenções
pedagógicas do professor. No processo de avaliação, o professor
precisa criar estratégias, considerando que alguns alunos podem
demandar ampliação do tempo para a realização dos trabalhos e o
uso da língua de sinais, de textos em Braille, de informática ou de
tecnologia assistiva como uma prática cotidiana.

Outro aspecto importante e relacionado à avaliação é o fato de que ela


pode servir de base para o professor se autoavaliar, ou seja, avaliar sua
própria prática e redirecioná-la, caso haja necessidade.

Cabe aos sistemas de ensino, ao organizar a educação especial na


perspectiva da educação inclusiva, disponibilizar as funções de instrutor,
tradutor/intérprete de Libras e guia-intérprete, bem como de monitor ou
UNIUBE 231

cuidador dos alunos com necessidade de apoio nas atividades de higiene,


alimentação, locomoção, entre outras, que exijam auxílio constante no
cotidiano escolar.

Os sistemas de ensino precisam organizar as condições de acesso aos


espaços, aos recursos pedagógicos e à comunicação que favoreçam a
promoção da aprendizagem significativa e a valorização das diferenças,
de forma a atender às necessidades educacionais de todos os alunos. A
acessibilidade precisa ser assegurada mediante a eliminação de barreiras
atitudinais, arquitetônicas, urbanísticas, na edificação – incluindo
instalações, equipamentos e mobiliários – e nos transportes escolares,
bem como as barreiras nas comunicações e informações.

Por todas as reflexões realizadas, entendemos que o professor é


fundamental no processo de inclusão. Por isso, terminamos este capítulo
com o desejo de que você possa, realmente, fazer a diferença na vida
de seus futuros alunos!

Resumo

Neste capítulo, discutimos os marcos históricos e normativos da educação


brasileira, delineando o percurso da educação, antes segregacionista
e excludente, até a chegada de uma proposta educacional inclusiva.
Posteriormente, discutimos sobre os desafios enfrentados pelos
profissionais desse novo contexto educacional, que precisam garantir
educação de qualidade e equidade de oportunidades a todos os
alunos. Nesse sentido, atentamos nas questões relativas à identidade,
ao respeito à diversidade, ao trabalho em equipe e à interação entre
os membros da escola, família e comunidade. Destacamos que a
sala de aula inclusiva é aquela em que as estratégias de ensino são
diferenciadas e modificadas, oportunizando a aprendizagem a todos
os alunos, sendo necessário adaptar as propostas existentes às
especificidades de cada deficiência. Reafirmamos que a educação
232 UNIUBE

da pessoa com deficiência deve acontecer na escola regular e que o


papel de instituições especializadas na nova perspectiva educacional
denominada inclusiva é de apoiar o aluno e o professor nos processos
de desenvolvimento e aprendizagem, oferecendo principalmente o
que a escola regular não pode oferecer, por exemplo, fonoaudiólogo,
psicopedagogo, psicólogo, psicomotricista e, ainda, a parte diversificada
do currículo. Atualmente, essa parte diversificada é também desenvolvida
no contraturno de escolas regulares na sala de recursos multifuncionais
para atendimento educacional especializado. Apresentamos, ainda,
neste capítulo as questões referentes à acessibilidade das pessoas com
deficiência física e as propostas de trabalho pedagógico referentes às
deficiências físicas e mentais.

Referências

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e práticas. São Paulo: Summus, 1998.

BERSCH, Rita; MACHADO, Rosângela. Conhecendo o aluno com deficiência


física. In: Brasil MEC/Seesp Ministério da Educação e Cultura. Deficiência física.
Brasília: MEC, 2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/
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BRAGA, Lúcia Willadino. Cognição e paralisia cerebral: Piaget e Vygotsky em


questão. Salvador: Sarahletras, 1995.

BRASIL. Decreto no 6.571/2008 de 17 de setembro de 2008. Disponível em: <http://


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______. Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica/


Secretaria de educação especial. MEC; SEESP, 2001. Disponível em: <http://
portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf>. Acesso em: 8 nov. 2010.

FAVERO, Eugênia Augusta Gonzaga; PANTOJA, Luísa de Marillac P.; MANTOAN,


Maria Teresa Eglér. In: BRASIL, MEC/SEESP. Ministério da Educação e Cultura –
Introdução. Brasília: MEC, 2007.

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legais e orientações pedagógicas. Brasília: MEC, 2007.

GOMES, Adriana L. Limaverde; FIGUEIREDO, Rita Vieira de. A emergência da


leitura e da escrita em alunos com deficiência mental. In: BRASIL MEC/SEESP
Ministério da Educação e Cultura. Deficiência mental. Brasília: MEC, 2007.
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ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU) NO BRASIL. Declaração dos


Direitos Humanos. Disponível no site: <http://74.125.47.132/search?q=cache:
cQ5OeS5BUbcJ:www.onubrasil.org.br/documentos_direitoshumanos
Capítulo
Necessidades
educacionais especiais e
6
as práticas pedagógicas
para a educação inclusiva
das pessoas com
deficiência sensorial

Judith Mara de Sousa Almeida

Introdução
Há aproximadamente dez anos, as pessoas com algum tipo
de deficiência frequentavam escolas especiais, conforme
suas necessidades educacionais, Assim, havia instituições
educacionais para surdos, outras para alunos com deficiência
visual. A Associação de Pais e Amigos de Excepcionais ─ Apae
─ encarregava-se do atendimento especializado aos alunos com
Síndrome de Down e também àqueles com deficiências mentais
e assim por diante.

Esse modelo de atendimento educacional especializado caracterizava-


se como segregacionista, apresentava e ainda apresenta até hoje
recebe a denominação de “Educação Especial” e tinha como papel
essencial o atendimento aos excluídos do sistema escolar.
236 UNIUBE

comum. Entretanto, o advento da Educação Inclusiva trouxe


à tona o direito a todas as pessoas de frequentarem a escola
comum. Nesse sentido, surgiu a necessidade de que instituições
especializadas redefinissem o seu papel e passassem a apoiar o
aluno com necessidades educacionais especiais, bem como seu
professor na escola comum.

Entretanto, ter o apoio de um profissional especializado não isentou


o professor não especializado da necessidade de redefinir a sua
prática, prática esta aparentemente determinada pela tradição, mas
que se viu sem lugar em meio a tanta diversidade, agora marcada
pela presença da deficiência na escola idealizada apenas para
pessoas sem deficiência. Por esse motivo, estaremos neste capítulo
e, principalmente, nesta etapa de sua formação como pedagogo
refletindo sobre a relação entre prática pedagógica e as deficiências
sensoriais. Acreditamos que esta reflexão seja fundamental para sua
formação, visto que o desafio do momento é efetivar, na prática, a
educação inclusiva e o seu papel nesse processo, futuro pedagogo,
que é de suma importância. Nos inspiramos em Glat, Fontes e
Pletsch (2006) e convidamos você para repensar a escola, sua
cultura, sua política e, especialmente, as suas práticas pedagógicas.

Objetivos
Ao final deste capítulo, esperamos que você seja capaz de:

• demonstrar a relação existente entre práticas pedagógicas,


educação inclusiva e deficiências sensoriais;
• explicar sobre a utilização dos sentidos humanos para o
conhecimento e relacionamento com o mundo; e
• praticar o desenvolvimento da acuidade sensorial no sistema
educativo.
UNIUBE 237

Esquema
6.1  Os sistemas sensoriais
6.1.1  A estimulação sensorial na perspectiva inclusiva
6.2 Práticas pedagógicas: necessidades educacionais especiais
– deficiências sensoriais – educação inclusiva
6.2.1  Crianças cegas e com baixa visão
6.2.2 A prática pedagógica com alunos que apresentam
deficiência visual – cegueira
6.2.3 A prática pedagógica com alunos que apresentam
deficiência visual – baixa visão
6.2.4 A prática pedagógica com alunos que apresentam
deficiência visual e surdez – surdocegueira
6.2.5 A prática pedagógica com alunos que apresentam
surdez
6.2.6 A prática pedagógica com alunos que apresentam
deficiências múltiplas
6.3 Educação inclusiva
6.4 Conclusão

6.1 Os sistemas sensoriais

Ao nascer, nossa capacidade de percepção por meio dos sentidos


encontra-se bastante desenvolvida. Assim, com poucas horas de vida,
somos capazes de reconhecer a nossa mãe pelo olfato ou pela audição.
Entretanto, nossa acuidade sensorial vai decrescendo conforme nos
tornamos adultos. Por que será que isso ocorre? A resposta parece
simples, pois, se buscarmos, em nossa memória, as experiências
que vivemos no contexto escolar, observaremos que foram poucas as
situações relacionadas ao uso integrado dos sentidos, ou até mesmo,
ao uso de um deles. A interação por meio dos sentidos não faz parte da
nossa cultura educacional.
238 UNIUBE

Entretanto, o potencial perceptivo difere de pessoa para pessoa, principalmente


quando se trata de pessoas em que um ou mais de um sentido não
funciona ou apresenta-se prejudicado, diminuído, como os casos de
alunos com baixa visão, alunos que apresentam surdez, alunos cegos
ou ainda aqueles que apresentam surdocegueira.

6.1.1 A estimulação sensorial na perspectiva inclusiva

Considerando os casos específicos, anteriormente apresentados, como


trabalhar a estimulação sensorial em uma perspectiva inclusiva? E
quando falta um ou mais de um sentido?

Etnocêntricos que somos, não nos damos conta da percepção do


mundo pelo uso integrado de todos os nossos sentidos. O fato de
não apresentarmos nenhuma deficiência sensorial, geralmente, nos
impede de perceber a importância de todos os sentidos e nos leva a
supervalorizar apenas um deles, como a visão, por exemplo.

No início deste texto, comentamos que a utilização de todos os sentidos


não é comum em nosso dia a dia na escola, principalmente quando
lidamos com crianças maiores de seis anos de idade. Entretanto, no atual
contexto educacional, em que discutimos a educação na perspectiva
inclusiva, percebemos a necessidade de refletirmos sobre a estimulação
sensorial, considerando não somente as necessidades educacionais
especiais, mas principalmente o fato de que estimular os sentidos traz
benefícios para todos os alunos.

SAIBA MAIS

Etnocêntricos: temos a nossa maneira de observar, ou seja, como videntes,


observamos o mundo por meio da visão e acreditamos que a nossa forma
de ver, com os olhos, de observar o mundo, é a única, a melhor, a mais
completa (ALMEIDA, 2008).
UNIUBE 239

As deficiências sensoriais subdividem-se em: deficiência visual: cegueira


e baixa visão; surdez; surdocegueira ou ainda alguma deficiência
sensorial já citada associada a outro tipo de deficiência, como a mental,
por exemplo, o que caracterizaria a presença de deficiências múltiplas.

A cegueira é definida pela ausência total de percepção luminosa. O


contato com o mundo ocorre com a utilização dos sentidos que se
encontram preservados e o desenvolvimento da leitura e da escrita tem
como base o sentido do tato e a utilização do sistema Braille, sistema de
escrita em relevo e leitura tátil. Entretanto, é importante destacar que,
durante a prática pedagógica com alunos cegos, a atenção precisa ser
dada a todos os sentidos, para que eles sejam utilizados de maneira
integrada.

PARADA PARA REFLEXÃO

Você já parou para observar uma pessoa com deficiência visual?

Um primeiro contato com uma pessoa cega, geralmente, é suficiente para


que ela retenha na memória a sua voz, reconheça-lhe pelo toque ou talvez
pelo seu perfume. Isso não significa que a pessoa com deficiência visual
seja um ser extraordinário, como muitos consideram. Significa que ela
entra em contato com o mundo e com os outros por meio dos sentidos
remanescentes, isto é, os sentidos que permanecem preservados. Sentidos
estes que se tornam aguçados, pelo fato de serem estimulados, e que
favorecem a interação do sujeito com o meio.

A baixa visão ou visão subnormal ocorre quando a pessoa apresenta


dificuldade visual em ambos os olhos, mesmo após tratamento médico,
correção óptica com lentes de contato ou óculos convencionais ou, ainda,
após intervenção cirúrgica. Apesar de inúmeras pesquisas comprovarem
que o estímulo da visão residual favorece o ganho de eficiência na
240 UNIUBE

utilização da visão preservada, há casos em que uma perda visual severa


exige da pessoa o uso integrado de mais de um sentido, como a visão
associada ao tato, por exemplo, além da aprendizagem da leitura e da
escrita do sistema Braille. Sendo assim, geralmente, o resíduo permite
apenas a percepção de luz ou claridade natural que auxilia os processos
de orientação e locomoção no espaço, bem como as atividades da vida
prática, mas impede ou dificulta a aprendizagem por meio da visão.
Entretanto, há pessoas com baixa visão que apresentam visão útil para
a aprendizagem da leitura e da escrita por meios visuais, mesmo que,
para isso, necessitem de recursos específicos que serão apresentados
quando estivermos discutindo questões relacionadas à prática.

Para compreendermos melhor as definições de surdez, podemos nos


apoiar em Brasil (2006, p. 16-17), que traz as seguintes definições para
os diferentes níveis de surdez:

• deficiência auditiva leve ou surdez leve é quando a pessoa


pode apresentar dificuldade para ouvir o tic-tac do relógio ou uma
conversação baixa;
• deficiência auditiva moderada ou surdez moderada: a pessoa
pode apresentar alguma dificuldade para ouvir uma voz fraca ou o
canto de um pássaro;
• deficiência auditiva moderadamente severa ou surdez acentuada:
as pessoas apresentam dificuldade para ouvir uma conversação
normal;
• deficiência auditiva severa ou surdez severa: a pessoa poderá
ter dificuldade para ouvir o telefone tocando ou ruídos de máquinas
de escrever em um escritório;
• deficiência auditiva profunda ou surdez profunda: nesse caso,
a pessoa pode apresentar dificuldade para ouvir o ruído de um
caminhão, da música de uma discoteca, de uma máquina de serrar
madeira ou o ruído de um avião decolando.
UNIUBE 241

A surdez pode também ser classificada como unilateral ou bilateral,


quando acomete um dos ouvidos ou ambos respectivamente.

Brasil (2006) esclarece que, na presença de surdez leve ou moderada,


a criança pode desenvolver a linguagem oral, sendo que na surdez
acentuada, severa ou profunda a oralidade pode tornar-se mais difícil,
sendo necessário utilizar aparelhos de amplificação e ainda contar com
apoio especializado de fonoaudiólogo (BRASIL, 2006, p. 17). Nesses
casos, é importante que as pessoas tenham contato com a Libras (Língua
Brasileira de Sinais) para que possam interagir por meio da linguagem.
Mais complexos do que todo o exposto até aqui são os casos de
surdocegueira e deficiências múltiplas. Inspirados em Brasil (2006),
podemos definir a surdocegueira como uma deficiência única que
apresenta a perda da audição e visão de tal forma que a combinação
das duas deficiências impossibilita o uso dos sentidos de visão e audição
e cria necessidades especiais de comunicação. A interação pelo toque,
nos casos de surdocegueira, é fundamental para acessar informações e
compreender o mundo.

Já a múltipla deficiência sensorial é a deficiência auditiva ou a deficiência


visual associada a outras deficiências (intelectual e/ou física), bem como a
distúrbios (neurológico, emocional, de linguagem ou no desenvolvimento
global) que podem acarretar atrasos no desenvolvimento, devido às
dificuldades de interação com o meio.

Apresentamos limitações e algumas possibilidades em relação às


pessoas que apresentam deficiências sensoriais. Entretanto, conforme
Omote (1994, p. 69), não se justifica uma teoria que apenas explique
como as pessoas deficientes funcionam, mas o importante é explicar
como as pessoas em geral lidam com as diferenças, especialmente
aquelas às quais o grupo social atribui algum significado de desvantagem
e descrédito social.
242 UNIUBE

Nesse sentido, como poderíamos pensar em práticas pedagógicas


relacionadas às necessidades educacionais especiais, especificamente
as deficiências sensoriais? Partindo desse questionamento, apresentaremos
reflexões sobre a prática pedagógica e tentaremos justificar o porquê de
termos iniciado nossa discussão abordando o uso dos sentidos.

6.2 Práticas pedagógicas: necessidades educacionais especiais


– deficiências sensoriais – educação inclusiva

Os alunos com deficiência necessitam aprender tanto quanto as outras


crianças e, para isso, nem sempre será necessário um currículo ou método
de alfabetização diferente, mas, sim, adaptações e complementações
curriculares como: adequação de recursos específicos, tempo, espaço,
modificação do meio, procedimentos metodológicos e didáticos e
processos de avaliação adequados às suas necessidades (BRUNO;
MOTA, 2001, p. 150-151).

6.2.1 Crianças cegas e com baixa visão

No caso de crianças cegas que chegam à escola pela primeira vez, é


fundamental considerar que elas, na maioria das vezes, não vivenciaram
situações de exploração do mundo por meio de brincadeiras, imitações
e interação com outras crianças ou até mesmo com adultos. O fato de
não enxergar faz com que elas percebam somente aquilo que está ao
alcance de suas mãos ou em contato com o corpo.

Diferentemente das crianças que enxergam e associam o que ouvem


ao que veem, as crianças cegas necessitam tocar o que ouvem. O ideal
é agir, fazer junto com elas, para que possam compreender como as
pessoas agem, conhecem, identificam e imitam. São as experiências
UNIUBE 243

significativas, vividas de forma contextualizada, que possibilitarão a


formação de uma imagem mental, para que a criança consiga representar
mentalmente o que vivenciou, organizou e estruturou e, posteriormente,
se expressar verbalmente de maneira significativa. Assim sendo, é
importante dar sentido às percepções e ações da criança com deficiência
visual e isso acontece a partir da utilização integrada de todos os sentidos
na exploração do meio.

IMPORTANTE!

É essencial possibilitar que a criança brinque, manipule objetos, toque-os,


sinta com o corpo todo, por meio do contato com a pele, do sentido do tato.
Além de tocar os objetos e as coisas da natureza, a criança com deficiência
visual precisa ser tocada e tocar o outro para que possa conhecer as
características físicas das pessoas, diferenciar uma das outras etc.

O sentido da audição, para o deficiente visual, é fundamental na


comunicação, aprendizagem e na construção de conhecimento por
proporcionar a interação por meio da linguagem e ainda a participação
social. É também um sentido de apoio na aquisição de símbolos auditivos
importantes para a decodificação do ambiente, orientação no espaço
e locomoção independente. Entretanto, é necessário destacar que o
excesso de ruídos ou sons muito altos pode desorganizar, confundir ou,
ainda, estressar a pessoa com deficiência visual.

Os sentidos do olfato e da gustação são importantes na recepção e


tradução de informações químicas. O olfato pode antecipar informações em
relação a pistas e pontos de referência durante a orientação e locomoção
no espaço. Uma padaria e um posto de gasolina são exemplos de pistas
percebidas pelo olfato e que podem auxiliar na orientação da pessoa com
deficiência visual durante sua locomoção independente.
244 UNIUBE

SAIBA MAIS

Há programas específicos para trabalhar a utilização dos sentidos


na orientação e locomoção no espaço. São os programas de OM –
Orientação e Mobilidade que podem ser desenvolvidos em salas de
recursos multifuncionais ou centros especializados em deficiência visual.
No Brasil, existem instituições particulares, centros de atendimentos em
universidades públicas e outros locais que oferecem atendimento na
área de Orientação e Mobilidade. Há, também, programa de atendimento
em Centros de Apoio Pedagógicos para atendimento às pessoas com
deficiência visual – CAPs. As Secretarias de Estado de Educação podem
oferecer informações sobre onde encontrar esse serviço.

A existência dessas instituições específicas para atendimento às pessoas


com deficiência visual não isenta a escola regular e o professor da
responsabilidade em relação ao desenvolvimento e utilização dos
sentidos no processo educativo.

A mobilidade independente deve ser estimulada desde cedo, mesmo


que a criança necessite do rastreamento com as mãos, ou seja, com
o dorso das mãos ela toca uma parede para se locomover de maneira
independente.

Os sentidos também podem ser desenvolvidos e explorados em programas


de atividades da vida diária (AVD), que, de acordo com Bruno e Mota
(2001), consistem em um conjunto de atividades que objetivam o
desenvolvimento pessoal e social nas diversas tarefas do dia a dia.
O processo metodológico para o desenvolvimento das AVDs é o da
experimentação ativa, em que são consideradas as necessidades básicas
gerais, individuais e os interesses dos educandos. O programa básico
de AVD deve ter início o mais precocemente possível. Com intervenção
UNIUBE 245

apropriada e orientação à família, muitas influências negativas podem ser


compensadas ou superadas. Esse programa envolve: higiene pessoal,
vestuário, atividades domésticas, alimentação, boas maneiras e cortesia
social. O programa de AVD proporciona ao aluno com deficiência visual
independência física e emocional, permitindo-lhe a participação ativa no
ambiente.

6.2.2 A prática pedagógica com o aluno que apresenta deficiência


visual – cegueira

É fundamental proporcionar aos alunos cegos atividades que estimulem a


construção do sistema sensório perceptivo por meio da ação e utilização
integrada de todos os sentidos, ou seja, incentivar a criança a utilizar seu
potencial perceptivo e curiosidade na apreensão do mundo exterior.

É preciso apresentar os objetos à criança para que ela possa saber


da sua existência, conhecê-los e também manuseá-los. É importante
destacar que esses objetos precisam ser apresentados em um espaço
delimitado, como uma bandeja ou recipiente, por exemplo, para que eles
não se espalhem e a criança não os perca.

Apresente o espaço escolar à criança, ajude-a a encontrar pistas e pontos


de referência nesse espaço, essa postura irá auxiliá-la no processo
de adaptação. Desde cedo incentive a criança a caminhar sozinha,
após a apresentação e exploração do ambiente, e também proponha
experiências diversificadas que possibilitem o desenvolvimento motor e
o conhecimento do corpo.

Quando for contar histórias para as crianças, é importante descrever as


expressões fisionômicas e realizar essas expressões juntos e, ainda,
possibilitar o toque para que a criança compreenda melhor a ação.
246 UNIUBE

A vivência de experiências reais de aprendizagem e exploração tátil de


objetos e maquetes é importante na formação de imagens mentais por
parte das crianças com deficiência visual; inclua no programa educativo
visitas a diferentes lugares.

Histórias que envolvam animais podem causar medo ou tensão,


entretanto possibilitam a estimulação da imaginação, fantasia e criatividade,
além de possibilitar que a criança aprenda a lidar com emoções fortes,
situações novas e imprevisíveis.

Uma maneira para a criança expressar seus sentimentos, pensamentos


e fantasias é utilizando tinta guache ou cola colorida para pintura a dedo,
bem como materiais sensoriais variados capazes de proporcionar relevo e
volume, argila, elementos da natureza, como folhas, pedras, gravetos etc.

Proporcione a interação entre as crianças com deficiência e sem


deficiência, pois, juntas, elas compartilham e constroem conhecimento,
permita que a criança que apresenta deficiência visual toque os colegas
para que possa conhecê-los.

Explore o material disponível em sala de aula, bem como o mobiliário


e os objetos presentes no espaço escolar; caso haja alguma alteração,
esta precisa ser comunicada à criança, pois ela precisa se localizar e
orientar no espaço.

Promova a cooperação e o respeito mútuo entre as crianças, de maneira


que percebam as limitações e possibilidades da criança com deficiência
visual e possam colaborar para que ela se sinta incluída.

Estimule as brincadeiras para que a criança amplie suas experiências e


incentive a participação da criança com deficiência visual em apresentações,
danças e projetos da escola.
UNIUBE 247

Busque adaptações materiais que favoreçam o acesso à percepção por


parte da criança que apresenta deficiência visual: coloque etiquetas em
Braille no material da criança, da classe, murais, calendários, ilustrações
simples, tridimensionais e em relevo para histórias que podem ser criadas
pelas próprias crianças e transcritas para o Braille.

PESQUISANDO NA WEB

Existem materiais específicos que podem ser utilizados pelas pessoas


com deficiência visual para a produção escrita: reglete, punção, máquina
de datilografia Perkins. Para que você possa conhecer esses materiais,
acesse o endereço da Bengala Branca: <www.bengalabranca.com.br> ou
do Laramara <www.laramara.org.br>.

Busque apoio especializado e materiais adaptados em instituições para


atendimento às pessoas com deficiência visual. Esta será uma parceria
fundamental para o sucesso da criança com deficiência visual.

Vale ressaltar que as observações anteriores são igualmente importantes


em relação às crianças com baixa visão ou visão subnormal, exceto,
em alguns casos em que em vez do Braille a criança pode utilizar tipos
ampliados.

Inicialmente, as crianças com baixa visão necessitam de uma Avaliação


Funcional da Visão para que se verifique a necessidade de desenvolvimento
da leitura e da escrita por meios visuais e encaminhamento posterior ao
serviço de baixa visão para estimulação da visão residual, se for o caso.
Consideramos que, tanto para a avaliação funcional da visão quanto
para a estimulação visual, as pessoas com baixa visão precisam contar
com profissionais preparados para tal. Eles podem ser encontrados
nos CAPs (Centros de Apoio Pedagógico para atendimento às pessoas
com deficiência visual), escolas especiais, no Setor de Baixa Visão da
Unicamp (Campinas), no Instituto Benjamin Constant (Rio de Janeiro) e
no Laramara (São Paulo), entre outras instituições.
248 UNIUBE

Cavalcante (1995) destaca que existem alguns materiais e equipamentos


que auxiliam o aluno com baixa visão nos processos de leitura e escrita.
Esses auxílios são: ópticos, não ópticos e tecnológicos.

Os auxílios ópticos consistem em lentes que possibilitam o aumento


das imagens. Essas lentes são prescritas somente pelo oftalmologista.
Existem lentes para perto e para longe. Entre as lentes para perto, há
as manuais e as de apoio. Tanto as lentes para perto quanto as lentes
para longe restringem o campo visual, isso significa que a visão do texto
fica restrita apenas ao que a lente alcança. Para melhorar a visão a
distância, são utilizados sistemas telescópicos (telelupas) que podem ser
monoculares (em um olho) ou binoculares (nos dois olhos). Geralmente,
são monoculares e presos ao pescoço da criança por um cordão. São
utilizados para observar o quadro negro, assistir à TV, reconhecer ônibus
ou pessoas. Há também a possibilidade de se adicionarem aos recursos
ópticos lentes filtrantes que diminuem o reflexo de luz, oferecendo maior
conforto e eficiência.

Há também os auxílios não ópticos que são os recursos que não


utilizam lentes para melhorar o desempenho visual: iluminação
adequada; apoio adequado para leitura e escrita (estante de leitura
e material que permita aproximação para a escrita sem prejudicar a
postura); cadernos com pautas ampliadas; lápis 3B ou 6B; canetas
hidrográficas que permitem maior contraste; livros didáticos com tipos
ampliados; guia de leitura, que pode ser uma régua para marcar a
linha ou uma cartolina preta com uma abertura no centro, que serve
para destacar uma ou mais linhas; chapéus e bonés ajudam a diminuir
o reflexo da luz em ambientes externos.

Existem ainda os auxílios eletrônicos ou tecnológicos: CCTV – Closed


Circuit Television – sistema de circuito fechado de televisão. Este recurso
aumenta o tamanho e o contraste de objetos, das letras e das palavras
que são projetados em um monitor especial. O computador, além de não
UNIUBE 249

ser prejudicial, permite a aproximação tanto da tela quanto do teclado,


bem como há a possibilidade de aumentar o tamanho da letra e melhorar
o contraste. Se a visão for muito reduzida, podem ser utilizados recursos
para leitura da tela.

A utilização desses auxílios é importante no processo educacional


da criança com baixa visão, pois proporciona um conforto a mais nas
atividades que exigem esforço visual.

6.2.3 A prática pedagógica com alunos que apresentam deficiência


visual – baixa visão

Observe a reação de seu aluno em relação à iluminação: se há necessidade


de aumentá-la ou diminuí-la. Tenha paciência em relação ao tempo maior
que a criança com baixa visão necessita para realizar alguma cópia do
quadro de giz. Para essas crianças, esse tipo de atividade pode ser
bastante estressante; há casos em que a criança necessitará levantar-se
para ler o que está escrito e fará isso por várias vezes.

Há casos em que as crianças com baixa visão não conseguem realizar


cópias do quadro de giz, elas necessitam receber o material impresso e
ampliado para que possam realizar a leitura. Crianças com baixa visão
que realizam cópias faltando letras, sílabas ou até mesmo palavras
podem fazê-lo devido à presença de escotomas, que são pontos cegos
na área de visão. Assim, é importante encaminhá-las ao serviço de baixa
visão para que um profissional especializado possa orientar o trabalho
do professor.

Utilizar a visão por um longo período de tempo, para a leitura de textos,


por exemplo, pode levar a criança a uma situação de estresse visual que
pode se manifestar por sonolência, sudorese, irritação, lacrimejamento ou
olhos avermelhados, além de acarretar outros problemas, como o abalo
emocional, por exemplo. É importante intercalar entre as atividades que
exigem esforço visual outra que proporcione descanso.
250 UNIUBE

É importante observar se a criança com baixa visão consegue perceber e


diferenciar cores ou se há a necessidade de adaptação do material, como
escrever o nome das cores na ponta do lápis para que ela não corra o
risco de confundir algumas cores.

Muitas vezes, é necessário aumentar o contraste de desenhos e textos


para proporcionar maior conforto visual à criança. Para tanto, é preciso
reforçar o traçado com pincel atômico ou melhorar a qualidade da
impressão e ainda não utilizar material xerocado. O alto contraste pode
ser conseguido com a impressão de letras com tinta preta (negrito) em
papel branco, por exemplo.

Alguns alunos com baixa visão podem ler material xerocado, desde
que esses estejam ampliados a partir de 125%. Em alguns casos, é
preciso encorajar os alunos a utilizarem os recursos ópticos ou não
ópticos e conscientizar os colegas sobre o respeito às necessidades
de cada um.

IMPORTANTE!

A visão subnormal ou baixa visão é flutuante, assim, há dias em que a


criança enxerga bem e em outros dias, por algum abalo emocional, ela pode
não ver nada ou quase nada. Entretanto, a visão residual não precisa ser
economizada, pois ela não acaba por ser utilizada, pelo contrário, quanto
mais a criança utiliza o resíduo visual de maneira adequada, mais eficiência
visual ela ganha.

Duas crianças com uma mesma patologia podem apresentar potencial e


funcionamento visual diferenciados. Somente a avaliação da visão residual
possibilita a compreensão da visão de cada uma. Mas em muitos casos de
baixa visão é necessário integrar os outros sentidos à visão para melhor
exploração do mundo.
UNIUBE 251

Para as crianças com baixa visão, também é importante vivenciar


experiências significativas de aprendizagem e é fundamental que o
professor da escola comum saiba que precisa e pode contar com o apoio
do professor especializado para melhor atender o aluno com baixa visão.

6.2.4 A prática pedagógica com alunos que apresentam deficiência


visual e surdez – surdocegueira

A falta da audição e da visão implica limitações e insegurança nas


interações, entretanto essas limitações podem ser minimizadas pelo
toque. Inicialmente, as crianças podem não gostar do toque pelo fato
de desconhecerem sua origem e significado, nesse caso, os familiares
podem ser intermediários entre a criança e o professor para que haja
sucesso nas interações.

Nesse processo interativo, é importante que a criança seja motivada a


utilizar os sentidos preservados ou, do contrário, na ausência de estímulos,
ela poderá desenvolver comportamentos inadequados, como: movimentar
as mãos e corpo de maneira aleatória, emitir sons estranhos, direcionar o
olhar compulsivamente para a luz (quando há resíduo visual), provocar sons
em locais onde haja vibrações mais intensas que podem ser percebidas
pelo tato, balançar, bater os pés, apertar os olhos, agredir-se etc.

RELEMBRANDO

Você se lembra do filme “O milagre de Anne Sullivan”?

O filme mostra o trabalho da professora Anne Sullivan, que fez com que
Helen Keller, uma garota surdocega, se adaptasse e entendesse as coisas
que a cercavam. Para tanto, a professora entrou em confronto com os pais
da menina, que sempre sentiram pena da filha e a superprotegeram sem
nunca terem lhe ensinado algo, nem lhe tratado como qualquer criança. O
filme é também um exemplo de como pode ser a prática pedagógica com
alunos que apresentam surdocegueira.
252 UNIUBE

A criança surdocega necessita do apoio de professor especializado,


intérprete ou guia-intérprete, cuja função é, principalmente, a de dar
sentido às explorações e percepções da criança e ainda organizar
estímulos significativos que possam promover a consciência da imagem
corporal, o desenvolvimento motor e afetivo e a autonomia. O processo de
aprendizagem da via de comunicação exige atendimento especializado
e individual o mais cedo possível.

Amaral (2002) destaca a possibilidade de abordagens funcionais e


coativas no atendimento à criança surdocega. A primeira diz respeito a
aprendizagens, conhecimentos que sejam significativos para a vida futura
da pessoa surdocega, assim, elas devem ser centradas em experiências
reais de vida. Já a abordagem coativa tem como elemento central o
próprio corpo da criança, sendo utilizado como instrumento de exploração
do meio.

Van Dijk (1989) desenvolveu um programa de comunicação que é


composto por seis fases que serão descritas a seguir. O autor considera
importante ressaltar que essas podem ocorrer de maneira simultânea,
considerando-se as atividades propostas e também as necessidades da
criança.

Relação de apego e confiança: nesta fase, a preocupação é o


estabelecimento de um vínculo afetivo entre a criança e o adulto. A
criança precisa sentir-se confortável consigo mesma e com os outros
para que possa interagir. É preciso limitar o número de pessoas que
trabalham com ela e ainda estabelecer uma rotina diária de atividades,
favorecer estímulos externos consistentes e adequados, estes não
devem se exceder e nem faltar. Por exemplo, se a criança está no berço
e começa a chorar como reação emocional à fome, pegá-la e alimentá-la
pode indicar comunicação entre a criança e o adulto. A repetição dessas
ações e reações é que define uma maneira de comunicação entre a
criança e seus pais ou cuidadores.
UNIUBE 253

Ressonância: significa o movimento corpo a corpo, um diálogo que


acontece entre a criança e o adulto por meio do movimento do corpo,
sendo que a iniciativa em relação ao movimento deve partir da criança.
Para ilustrar podemos partir do seguinte exemplo: o professor em
contato corporal com a criança imita seus movimentos e em determinado
momento para e espera a reação da criança. Se a criança reiniciar o
movimento, essa ação pode ser interpretada pelo adulto como uma
resposta, uma solicitação para repetir o movimento.

Movimento coativo: é o movimento mão sobre mão em que o professor


realiza as ações junto às crianças se posicionando lado a lado e ampliando,
aos poucos, a distância em relação a ela. Nesta etapa, a criança tem
condições para compreender que as atividades têm início, meio e fim.

Referência não representativa: pelo toque, a criança é levada a


conhecer e reconhecer as particularidades do corpo, nela e no outro.
Posteriormente, o professor pode utilizar representações mais abstratas
com a utilização de objetos de referência. Esses objetos precisam ter uma
equivalência simbólica com o real e com as atividades desenvolvidas.
Utilizar, por exemplo, uma boneca para que a criança reconheça as
partes do corpo.

Imitação: a criança é incentivada a realizar a ação após a demonstração


do professor, na presença ou ausência dele. É importante utilizar objetos
conhecidos pela criança e com ações claras, ou seja, na ausência da
bola, o professor pode fazer junto à criança o movimento de jogá-la para
poder falar sobre ela.

Gestos naturais: quando a criança já consegue associar o gesto ao


objeto, mesmo na ausência dele, a capacidade de simbolização é
ampliada e a Libras – Língua Brasileira de Sinais – pode ser introduzida
254 UNIUBE

no processo de comunicação. Nesta etapa, os gestos naturais são


transformados gradualmente em sinais padronizados e a criança pode
ampliar suas antecipações por imagens metais, ou seja, a criança pede
um doce quando sente vontade e não somente na presença dele.

Pelo exposto até aqui, percebemos que a criança surdocega pode não
desenvolver a fala, mas é capaz de se expressar de diversas maneiras
e também receber mensagens por vias sensoriais preservadas. A
comunicação pode ser receptiva ou expressiva: a primeira diz respeito
à recepção e compreensão de mensagens, e a expressiva refere-se
à maneira como a criança expressa seus desejos, necessidades e
sentimentos. São vários os recursos de comunicação que podem ser
utilizados pela criança surdocega:

• sistemas alfabéticos: datilológico, letras maiúsculas, Tablitas, Braille,


máquina de escrever em Braille;
• e sistemas não alfabéticos: Libras, Libras adaptada, leitura labial,
Tadoma, movimentos corporais, sinais no corpo, símbolos, sistemas
suplementares de comunicação, como levantar a cabeça, Bliss, PCS
e COMPIC, desenhos etc.

SAIBA MAIS

Tablitas: feitas com plástico sólido, representam em relevo as letras,


números, sistema Braille. As letras e os números estão superpostos aos
caracteres Braille. O dedo da pessoa surdocega é levado de uma letra/
número a outra(o) ou de um caractere a outro, estabelecendo, desta forma,
a comunicação.

O sistema Bliss de Comunicação é um sistema simbólico gráfico-visual,


dinâmico, capaz de representar conceitos abstratos. Há diversas formas
de se expressar por meio dele: utilizando desde frases simples às mais
complexas e ainda por mensagens telegráficas. O que determina esses
níveis são a capacidade do usuário e o contexto comunicativo.
UNIUBE 255

O PCS – Picture Communication Symbols (Sistema Pictográfico de


Comunicação – é um sistema gráfico-visual elaborado a partir de desenhos
simples, podendo-se acrescentar, se preciso for, fotografias, figuras,
números, círculos para as cores, o alfabeto, outros desenhos ou conjuntos
de símbolos. O Sistema é dividido em seis categorias primárias, com cores
diferentes, conforme a função de cada símbolo. Como no Sistema Bliss,
a palavra escrita fica posicionada acima de cada pictograma. 1 – branco:
artigos, conjunções, preposições, conceito de tempo, alfabeto, cores etc.; 2 –
amarelo: pessoas e pronomes pessoais; 3 – laranja: substantivos. Em alguns
livros, verifica-se que alguns substantivos são agrupados separadamente (a
categoria de alimentos, por exemplo); 4 – azul: advérbios e adjetivos.

Pictogram Ideogram Communication (COMPIC): sistema composto por 400


símbolos (brancos em fundo preto).

Para as crianças surdocegas que estão na fase pré-linguística, as formas


de comunicação receptivas podem ser:

• pistas táteis, como o toque no ombro da criança para que ela saiba
que o professor se aproximou;
• objetos de referência, que são objetos utilizados no dia a dia da
criança e indicam o que vai acontecer e antecipam as ações da
criança, objetos em miniatura (crianças com resíduo visual),
calendário concreto (disposto em sequência, em caixas que
contenham um objeto referente à atividade, na ordem que será
executada pela criança;
• gestos naturais, que são expressões corporais, faciais e manuais
(crianças com resíduo visual);
• pistas de imagens (quando a criança já é capaz de abstrair: inicia-
se com fotos, posteriormente desenhos são introduzidos, contornos
dos objetos).
256 UNIUBE

Em fase pós-linguística, a criança pode utilizar:

• a língua de sinais tátil – os sinais são realizados em uma ou ambas


as mãos da criança surdocega;
• língua de sinais em campo visual reduzido – adéqua a produção dos
sinais ao espaço de visão da criança;
• alfabeto manual tátil ou datilologia – as letras são feitas sobre a
palma da mão da criança surdocega para que ela perceba pelo tato;
• sistema Braille tátil ou manual – as letras são feitas em cada falange
dos dedos indicador e médio; escrita na palma da mão – utilizam-se
as letras maiúsculas do alfabeto para escrever sobre a palma da mão
ou no braço da criança surdocega a mensagem a ser transmitida;
• tablitas alfabéticas;
• materiais técnicos do sistema alfabético com retransmissão
em Braille – equipamentos portáteis (máquinas de escrever ou
computadores portáteis) que possibilitam o registro da mensagem
no sistema alfabético para que possam ser impressos em Braille e
transmitidos para a criança surdocega;
• método Tadoma – percepção tátil da língua oral pelo toque do dedo
polegar da criança surdocega nos lábios do falante. Os outros dedos
se posicionam sobre a bochecha, mandíbula e garganta;
• sistema Malossi – marcação das letras do alfabeto e dos algarismos
de 0 a 9 nas falanges dos dedos e na palma de uma das mãos da
criança surdocega; pode-se utilizar uma luva com as letras e os
números indicando os lugares a serem tocados;
• escrita em tinta – escrita em tinta com caracteres ampliados para
que possam ser utilizados por crianças surdocegas que apresentam
resíduo visual;
• leitura labial – também realizada com a utilização de resíduo visual;
• língua oral amplificada – a mensagem é recebida por meio de
amplificadores sonoros, quando há resíduo auditivo.
• A comunicação expressiva da criança surdocega geralmente parte
do concreto para o abstrato e abarca comportamentos variados.
UNIUBE 257

• Em fase pós-linguística, a criança pode utilizar os movimentos


naturais:
• o balbucio, o choro, o sorriso, voltar a um lugar, indicando uma
necessidade etc.;
• movimento do corpo – movimentar a cabeça negativamente;
expressão facial – de alegria ou de tristeza;
• toque – forma de obter atenção;
• gestos – geralmente contextualizados e elaborados pelas mãos,
braços, cabeça, pernas ou todo o corpo;
• expressões emocionais – sons, sorrisos etc. que indicam se a
criança está satisfeita ou contrariada durante uma atividade;
• sinais incorporados – apontar para partes do próprio corpo quando
experimentam sensações agradáveis, pode, por exemplo, apontar
para a cabeça quando gosta de um “cafuné” e quer que a ação se
repita;
• Libras – na comunicação expressiva e receptiva;
• expressão oral – emissão de palavras isoladas ou sons para chamar
a atenção sobre algo que a desagrada.

Para melhor atender a criança surdocega na escola regular, o professor e a


criança contarão com o apoio do professor especializado (guia­‑intérprete),
que estabelece contato com a criança e permite a interação dela com
colegas e professor. Há algumas considerações importantes a serem
feitas:

1. o meio simbólico de comunicação da criança precisa estar definido;


2. o ambiente precisa estar organizado e adaptado conforme as
necessidades da criança surdocega;
3. é preciso motivar a criança surdocega a explorar o ambiente e os
objetos;
4. os materiais precisam ser adaptados conforme as necessidades da
criança surdocega.
258 UNIUBE

O professor especializado pode construir junto ao professor da classe


comum o calendário de atividades e o livro de comunicação da criança,
que é construído em conjunto com a criança e organizado em categorias
(alimentos, vestuário, brinquedos, pessoas da família etc.). Os livros
devem conter objetos e/ou imagens relacionadas às preferências da
criança, por isso é importante que sejam escolhidos por ela. É importante
que a criança tenha o livro em casa e na escola para que possa participar
ativamente desses dois ambientes.

A parede da sala deve ser pintada de cor clara e deve-se observar se a


iluminação é adequada ou se há a necessidade de alguma adaptação,
no caso de crianças com resíduo visual. É igualmente importante que
a área da sala seja espaçosa e tenha piso antiderrapante para permitir
melhor locomoção por parte da criança.

É preciso identificar a porta com etiqueta em Braille ou tipos ampliados


e, se necessário, utilizar objeto de referência.

A instalação elétrica precisa ser adequada para utilização, se necessário,


de equipamentos especializados.

Lousa preta e quadro branco (no caso de criança com resíduo visual)
oferecem um bom contraste para aqueles que necessitam.

Pode-se criar um cantinho de referência dos materiais de comunicação


e da rotina diária da criança para que ela tenha acesso.

O professor guia-intérprete tem como função:

a) orientar a criança surdocega em relação à orientação e locomoção


no espaço;
UNIUBE 259

b) contribuir para a organização de materiais permanentes no espaço


escolar para que a orientação e a locomoção da criança surdocega
sejam favorecidas;
c) interpretar para a criança, por meio da comunicação, todas as
informações veiculadas no ambiente escolar.

6.2.5 A prática pedagógica com alunos que apresentam surdez

As pessoas com surdez são extremamente visuais, o que favorece o


domínio de uma língua visual-espacial, Libras. Também é importante
considerar as pessoas que apresentam resíduo auditivo e, portanto,
carecem de estímulos dessa natureza.

IMPORTANTE!

Atualmente, o trabalho com o surdo considera a perspectiva bilíngue, ou


seja, o surdo tem como língua natural a Libras – Língua Brasileira de Sinais e
aprende a Língua Portuguesa na modalidade escrita, como segunda língua,
entretanto, cabe à família e/ou ao próprio surdo, se ele for capaz de decidir
por si mesmo a escolha em relação a uma língua oral ou visual-espacial.

A prática pedagógica com crianças surdas precisa considerar que,


inicialmente, o professor pode associar a linguagem verbal à linguagem
não verbal (desenhos, ilustrações, fotos etc.), que auxilie a criança surda
em seu processo de aprendizagem da leitura e da escrita.

O professor pode valer-se de recursos como datashow, retroprojetor,


cartazes com ilustrações, objetos concretos, filmes, vídeos, fotos,
gravuras de livros e revistas, desenhos, dramatizações, expressões
faciais e corporais, textos ilustrados para que a criança não se sinta
perdida em meio a tantas palavras escritas e possa se apoiar também
nas imagens para compor sentidos do texto.
260 UNIUBE

É importante que o professor desenvolva atividades que favoreçam a


interação surdo-ouvinte e a participação da criança surda em atividades
cívicas, comemorativas, roda de conversa, brincadeiras.

Dirigir-se à criança por seu nome ou seu sinal auxilia na descoberta de


sua identidade. É preciso também dirigir o olhar para a criança quando
estiver falando com ela e respeitar os turnos de conversação.

Em sala de aula, o rosto do professor deve estar


Leitura/orofacial
iluminado pela luz, sem reflexos que dificultem a
É a leitura das visualização e leitura orofacial, quando for o caso,
expressões da
face e da boca.
e, ainda, posicionado na altura do rosto da criança.
Por exemplo, seria inadequado se o professor
estivesse de pé e a criança sentada no chão.

Muitas vezes, a criança precisa ser encorajada a utilizar o aparelho de


amplificação sonora para que possa perceber sons do ambiente e se
basear também em pistas auditivas. O professor pode também realizar
vivências com a turma para que ela compreenda mais ou menos o que
é a surdez. O professor pode tentar falar sem emissão de sons, apenas
movendo os lábios.

Se a família da criança optar pela utilização da Libras, é importante que


os funcionários da escola e os colegas aprendam a transmitir e interpretar
pelo menos as mensagens mais básicas do dia a dia. É também
fundamental que haja um tradutor e intérprete da língua de sinais para
traduzir para Libras o que os ouvintes dizem e para o português o que a
criança surda relata.

Para tornar a mensagem clara, o professor pode utilizar expressões


faciais, movimentos corporais, das mãos e gestos. Se a criança utilizar
a fala, o professor precisa ter movimentos de lábios definidos e evitar
alterações de ritmo e entonação de palavras e frases.
UNIUBE 261

É importante manter o aluno surdo informado do que acontece em sala


de aula.

Se os pais da criança surda são ouvintes e ela se comunica por meio


da Libras, é fundamental que eles aprendam a língua de sinais para
que possam apoiar a criança em seus estudos em casa, bem como
comunicarem-se com ela.

A linguagem da criança deve ser estimulada de forma contextualizada e


significativa para que possibilite ao aluno surdo a comunicação por meio
de uma língua, das atividades de imitação, jogo simbólico, desenho,
mímica, dramatização, escrita e fala.

A dramatização é um recurso ímpar na educação da criança surda, pois


permite que ela reviva uma experiência, receba e interprete mensagens
e ainda possa se expressar.

Proporcione à criança surda o máximo de experiências reais de


aprendizagem: passeios, visitas, com apoio do tradutor e intérprete para
que haja acesso a informações verbais e ainda com o registro por fotos,
objetos que simbolizem os fatos observados.

Leve para a sala os diversos suportes textuais e gêneros que circulam


socialmente, encoraje o aluno surdo a ler, explore o vocabulário
desconhecido, mas lembre-o de que a leitura não necessariamente tem
de ser linear e, em vez de nos prendermos a palavras desconhecidas,
podemos nos apoiar naquelas que conhecemos.

Muitas crianças surdas necessitarão, no contraturno, de apoio de professor


especializado para auxiliá-las na aprendizagem da Língua Portuguesa
na modalidade escrita ou mesmo da Libras. Caso haja necessidade de
apoio especializado, procure o CAS (Centro de Apoio ao Surdo) mais
próximo à sua cidade ou ainda uma escola especializada no atendimento
ao aluno surdo.
262 UNIUBE

6.2.6 A prática pedagógica com o aluno que apresenta deficiências


múltiplas

Inicialmente, compreenda o tipo de deficiência que a criança apresenta


e tome como base, para construção do processo pedagógico, as
possibilidades e potencialidades da criança. Essa estratégia pode motivar
a participação dela nas atividades.

Realize, junto a uma equipe multiprofissional (psicólogo, terapeuta


ocupacional, professor especializado, fisioterapeuta etc.), um estudo
sobre as necessidades em relação a equipamentos e adaptações
necessárias à criança.

Procure compreender as formas de expressão da criança. Para tanto, a


cooperação da família é fundamental para informar sobre seus gostos,
preferências, rejeições e vivências, a forma como a criança interpreta as
sensações que recebe do ambiente.

Não use como referência as dificuldades da criança, ou seja, nunca diga:


“Não babe, porque é feio”; se ela baba, é porque há algum motivo que a
impede de controlar a salivação.

Nos casos de deficiências múltiplas, a criança necessitará de um professor


ou tutor disponível para dialogar ou mediar tanto a comunicação quanto a
ajuda física na realização de brincadeiras e tarefas.

As deficiências não impedem que a criança participe de atividades


variadas, como: construir coisas, brincar com o corpo, objetos, jogos,
histórias, teatro, música, modelagem, desenhos etc. Auxilie a criança na
exploração do meio, nas brincadeiras e evite subestimar ou superproteger
a criança.
UNIUBE 263

É importante construir, com as crianças, livros funcionais para comunicação,


com imagens, materiais em relevo que contenham dados sobre sua
história de vida, seus gostos, desejos, brinquedos e brincadeiras
prediletas, experiências positivas com colegas, familiares e comunidade.

Motive e organize interações que integrem a criança ao grupo, mesmo que,


para isso, haja a necessidade de adaptação de materiais e atividades.

Planeje, junto ao professor especializado, atividades que sejam significativas,


lúdicas e funcionais, pois, assim, é mais fácil despertar o interesse da criança.

6.3 Educação inclusiva

Magalhães (2001) afirma que a Educação Inclusiva propõe uma


escola que possa atender às demandas de sua clientela, mesmo que
esta possua ou não necessidades educativas especiais, seguindo os
princípios da democratização do ensino, uma escola que esteja apta a
trabalhar com o aluno real. Para tanto, ainda conforme Magalhães (2001),
é de suma importância discutir a prática pedagógica: metodologias de
ensino, formas de avaliação, currículos formais e, ainda, as interações
cotidianas estabelecidas entre professores,
alunos e outros profissionais da escola. Estigma
Portanto, matricular a criança com necessidades
Fruto do
educacionais especiais na escola regular e garantir preconceito, os
estigmas são
sua frequência não assegura a sua inclusão, pois juízos antecipados,
incluir pressupõe mudanças de valores e atitudes e sem fundamento,
e geralmente
envolve transformações dos padrões curriculares da funcionam como
um referencial
escola, que tradicionalmente reforçam os estigmas negativo sobre
associados às pessoas com deficiência. a pessoa com
deficiência.
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Magalhães (2001) acrescenta que a inclusão escolar supõe práticas


pedagógicas diferenciadas, baseadas na noção de que ao educador cabe
desenvolver o seu trabalho a partir das condições efetivamente existentes
e da clientela atendida, como já explicitado no início deste parágrafo.
A concepção de prática pedagógica diferenciada e inclusiva encontra-
se ancorada na tese de que a heterogeneidade dos alunos precisa ser
respeitada. Nesse sentido, Magalhães (2001) defende a contribuição do
multiculturalismo como perspectiva teórica e prática na construção da
educação inclusiva. Para definir o termo, a autora se baseia em Moreira
e Candau (2007, p. 27), que definem cultura como: “conjunto de práticas
por meio das quais significados são produzidos e compartilhados em um
grupo”. Assim sendo, a falsa ideia de homogeneidade não tem lugar no
contexto escolar, trata-se de um mito, pois a diversidade é característica
de todo ser humano, independentemente de apresentar ou não alguma
deficiência.

6.4 Conclusão

Pensar a Educação Inclusiva pressupõe repensar e até mesmo redefinir


a nossa prática, ou seja, não é possível conceber os alunos como
iguais, avaliá-los com os mesmos instrumentos, esperar os mesmos
resultados, utilizar as mesmas estratégias com todos, impor a nossa
maneira de perceber e interpretar os fatos, conceber o currículo com uma
estrutura rígida e definitivamente predefinida, alienada da realidade do
aluno. Faz­‑se necessário respeitar e valorizar a diversidade no contexto
educacional.

Somos nós, pessoas sem deficiência, que sistematizamos o ensino


e já estamos habituados a basear nossas práticas pedagógicas no
tradicionalismo, na abstração e na superficialidade. Acreditamos que
nossos alunos aprendem dessa maneira, porque foi assim que nós
aprendemos e também dessa forma nos ensinaram a ensinar, mas a
UNIUBE 265

proposta da interação em todos os sentidos e da vivência de experiências


reais de aprendizagem é apresentada aqui como forma de provocar uma
reflexão crítica, um olhar crítico, sobre a nossa prática cristalizada.

Independentemente da condição de apresentar ou não uma deficiência


sensorial, em uma pesquisa recente discutimos a necessidade de criar
oportunidades na escola para que todos os alunos possam desenvolver
seus sentidos por meio da vivência de experiências significativas. Que
eles possam cheirar e conhecer os diversos aromas existentes no nosso
dia a dia; que os alunos toquem os objetos, os elementos da natureza, as
pessoas, pois o toque também é um tema evadido da sala de aula. Que
possam explorar a diversidade de sons presentes no nosso cotidiano,
que experimentem a riqueza do gosto pelo paladar, que possam associar
seus sentidos e explorar situações reais de aprendizagem dentro e fora
da sala de aula.

É importante que abandonemos nossa concepção etnocêntrica de visão e


adotemos uma concepção de visão como um múltiplo, em que é possível
ver, sentir e conhecer com o corpo todo, esta é a interação em todos os
sentidos e não apenas utilizando a visão, como se este fosse o único ou
o sentido mais importante no conhecimento do mundo.

Acreditamos que a complexidade do tema “práticas pedagógicas e


deficiências sensoriais” não permite que afirmemos que esta discussão
se encerra aqui, entretanto, se, com a leitura deste texto, conseguirmos
despertar sua inquietação ou incômodo, se você refletiu sobre o tipo de
prática que adota em sua vida profissional, então, ousamos afirmar que
nossos objetivos foram alcançados. A semente foi lançada...
266 UNIUBE

Resumo

Este capítulo trata das práticas pedagógicas relacionadas às necessidades


educacionais especiais – deficiências sensoriais. Apresenta uma reflexão
acerca de uma prática voltada para utilização integrada dos sentidos,
baseada em vivências reais de experiências, planejadas para incentivar o
desenvolvimento das percepções sensoriais, das habilidades psicomotoras e,
consequentemente, favorecer a construção de conhecimento, considerando
as características e necessidades individuais de alunos que apresentam
deficiências sensoriais.

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Anotações
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