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Universidade de Uberaba
Reitor
Marcelo Palmério
Editoração e Arte
Produção de Materiais Didáticos-Uniube
Projeto da capa
Agência Experimental Portfólio
Edição
Universidade de Uberaba
Av. Nenê Sabino, 1801 – Bairro Universitário
A76 O ser humano e suas dimensões / Ana Silvia Abbade Mendes ... [et
al.]. – Uberaba : Universidade de Uberaba, 2017.
256 p. : il.
Capítulo 6 E
ntre palavras, pensamentos e ações:
a linguagem por muitas vozes.....................................................208
6.1 Pensamentos e palavras............................................................................................210
6.1.1 A linguagem: entre percepções e memórias, percepções e imaginações........214
6.1.2 Linguagem: conservando e interligando nossas ideias para uma ação............217
6.2 Somos feitos de silêncio e som: a linguagem e suas múltiplas dimensões...............220
6.3 A cura pela palavra: a linguagem e a elaboração dos sentimentos...........................240
Apresentação
Caro(a) aluno(a),
É com muita esperança que convidamos você a participar das leituras desse nosso
primeiro livro. Entretanto, essa nossa esperança não é a de quem espera sem nada
fazer, mas de pessoas que idealizam, acreditam e lutam para que seus ideais sejam
realizados! Mais do que isso, de pessoas que se unem para sonharem e construírem
seus projetos, na perspectiva de um “mundo melhor”.
Este livro foi feito para você! Durante nossa escrita, sempre nos perguntamos: será
que estamos sendo claros? Será que você já sabe um pouco sobre o que estamos
falando? De onde podemos partir? Até onde podemos chegar? Como chegar? Como
dizer? Como comover? Como trazer você, caro(a) aluno(a), para junto da gente?
Como fazer você gostar de aprender aquilo que gostamos tanto de ensinar?
Vamos iniciar nosso estudo, deste primeiro livro, com o capítulo “Quem somos nós,
processo ou produto?”, abordando o ser humano e suas interrelações com outros seres
humanos, com a sociedade e a natureza, em busca de sua humanização. Essa busca se
carateriza como um processo de grande importância para o conhecimento de si próprio,
do outro, da compreensão da diversidade cultural e do mundo em que vivemos.
Neste momento, nos perguntamos: onde você está? E imaginamos: talvez esteja em-
baixo de uma árvore frondosa, ou quem sabe, na cozinha de sua casa, ou no ônibus
indo para o trabalho, ou ainda, em uma embarcação atravessando um rio. Você pode
estar em tantos lugares! Mas, o espantoso é que mesmo estando tão longe fisicamente,
sentimos sua presença, como se estivesse aqui na nossa frente. Embora as distâncias
entre nós pareçam enormes, há uma linha invisível que nos une: o desejo de construir
conhecimento!
Esperamos que esse desejo se fortaleça a cada dia e que possamos, sempre, nos en-
contrar nestas linhas que só se completam com a sua leitura. E, então, juntos, possamos
vivenciar o processo ensino‑aprendizagem com compromisso, na busca incessante do
aprender, sabendo que o sucesso depende de nós!
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Introdução
Neste capítulo iremos abordar o ser humano e suas interrelações com outros
seres humanos, com a sociedade e a natureza, em busca de sua humanização.
Essa busca carateriza um processo, de grande importância para o conheci‑
mento de si próprio, do outro, da compreensão da diversidade cultural e do
mundo em que vivemos.
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
Esquema
1.1 Iniciando a discussão: quem é o Homem?
1.10 Conclusão
Essa é a primeira vez que você se depara com um questionamento sobre o significado da
palavra HOMEM?
Certamente que não. Nas ciências, na religiosidade, no cotidiano de nossa vida, nas
artes, na filosofia, o homem sempre esteve presente no topo das indagações. Por ter
diferentes concepções de estudo, fica difícil conceituar quem é o HOMEM sem um
contexto de estudo. Durante esse estudo, daremos a você condição de pensar de forma
diferente sobre a concepção de homem, seu papel na transformação do mundo e na
construção da sociedade em uma abordagem sócio‑histórica.
UNIUBE 3
Embora a palavra homem não seja novidade, ela traz em si Senso comum
mistérios, questionamentos, indagações que estamos sempre
Conjunto de opiniões
procurando responder. Nessa unidade temática, estudaremos geralmente aceitas
um pouco sobre a concepção de homem, que será nosso como verdades
objeto de reflexão durante todo o tempo. absolutas por um
grupo social em
determinado tempo
Para que isso aconteça, nesta seção estudaremos inicialmente
histórico.
o homem como um ser possuidor de um suporte biológico es‑
pecífico que o diferencia dos outros animais, um ser que age e Sócio-histórico
pensa, um produtor de conhecimento. Vamos ainda identificar
Abordagem que
os modos de atuação humana nos vários contexos culturais, estuda o homem
estabelecendo relações entre as concepções de senso co- como um ser social
mum e as de caráter científico sobre o ser humano e sua e histórico, capaz de
constituição social. Em seguida, estudaremos o homem como interagir com o mundo
e com a realidade que
um ser sócio-histórico que utiliza a linguagem, os instrumentos
o cerca, um ser de
de trabalhos, relaciona-se com os outros, um produtor de cul- relações sociais em
tura e saberes. Finalizando vamos abordar a importância da determinado tempo e
cultura e da educação na formação do ser humano. espaço.
PESQUISANDO NA WEB
Acesse o endereço abaixo para ler a letra da música “Caçador de mim”, interpretada por
Milton Nascimento.
Pense e reflita:
Após ler a seção, volte às suas respostas e veja se você pensa como a autora. E, se
preciso, faça suas considerações. Vamos à leitura?
Você já havia pensado sobre esse fato? Enumere pelo menos dois exemplos que justifiquem
essa afirmativa em seu TCA.
luz, não crescerá em linha reta, mas inclinada em direção à claridade, com suas folhas
amareladas, dependendo da quantidade de ar e calor que recebe. Animais, como os
gafanhotos e camaleões, mudam de cor em seu habitat para se defenderem do inimigo,
ficando da cor das folhas de alguns arbustos e árvores. As minhocas não têm olhos,
mas são dotadas de tato e olfato muito apurados e, por meio deles, conseguem garantir
sua sobrevivência.
Esses exemplos nos fazem perceber que todos os seres vivos se adaptam ao meio
ambiente de acordo com as necessidades de sobrevivência e para a perpetuação da
espécie. Então, é possível perceber que os seres vivos, pela busca de sobrevivência,
vão descobrindo formas de se adaptar ao meio ambiente onde vivem, modificando‑se
e adquirindo novas formas de sobrevivência. Animais vivem em constante harmonia
com a natureza, dela retiram apenas o que é necessário para a sua sobrevivência.
Com auxílio dos instintos que são regidos por leis biológicas, conseguem prever as
necessidades e se adaptar ao meio.
Como vimos, os outros animais, desde o surgimento da sua espécie sobre o planeta
Terra, há vários milhares de anos, repetem da mesma forma os mesmos padrões de
comportamento, vividos e perpetuados pelos seus ancestrais. São ações instintivas,
necessárias para a própria sobrevivência, resultantes de um código genético biologi-
6 UNIUBE
Pense, reflita e traga para seu estudo um exemplo que ilustre a interferência dos seres
vivos no meio ambiente, que você tenha vivenciado ou tomado conhecimento no coti-
diano. Registre em seu TCA.
Nas ilustrações podemos observar as diferentes interferências dos seres vivos, mais
especificadamente em relação a moradia, no mundo em que está. Cada construção
reflete a influência da necessidade do ambiente no qual está inserido.
Considerando o exposto, sugiro que pense, reflita e socialize com seus colegas sobre as
questões que apontamos. Vejamos:
Pensem em nossos antepassados ao chegar a uma terra distante chamada Brasil e ter que
adaptar‑se a novos modos de vida. Que podemos tirar de positivo sobre esse fato histórico
relacionando‑o ao nosso estudo?
Cremos que está na hora de apresentarmos para você ao nosso conceito de homem,
para tanto recorremos a tela de Gauguin para apresentar a nossa percepção do que
seja o homem.
8 UNIUBE
Figura 2: Paul Gauguin (1897) De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos?
Fonte: Wikipédia (Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Woher_kommen_wir_
Wer_sind_wir_Wohin_gehen_wir.jpg>).
Agora, leia a seguir a interpretação da obra, realizada por Cordi (apud SANTOS, 2000);
veja se existe algo em comum com a sua.
De onde viemos?
À direita do canto, vê‑se um bebê que dorme, cercado por três nativas
sentadas no chão. Duas figuras vestidas de vermelho trocam ideias.
Uma mulher de dimensões propositadamente maiores, a despeito da
perspectiva, ergue um braço e observa atônita essas duas figuras
que se atrevem a conjeturar sobre seus destinos.
Quem somos?
A figura central apanha uma fruta. Dois gatos perto de uma criança.
Uma cabra branca. O ídolo com os braços erguidos misteriosamente,
aponta para o além. O apanhador de frutas simboliza os prazeres da
vida: a figura em plenitude simboliza a eterna felicidade caso o ídolo
não estivesse lá para lembrar das verdades eternas – uma constante
ameaça à humanidade.
Uma figura sentada parece ouvir o ídolo. Uma velha, já bem próxima
da morte, parece aceitar com resignação sua própria sorte, fechando
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a história. Uma estranha ave branca, prendendo um lagarto com
os pés, representa a futilidade das palavras vazias. (CORDI apud
SANTOS, 2000, p. 30)
Acreditamos que a forma de interpretar a obra não tenha muita identificação com
o que você pensou. Afinal, estamos vivendo em tempos bem diferentes daqueles que o
artista vivenciou. Muitos séculos se passaram, estudos científicos e novas explicações surgi-
ram. Hoje, estamos em tempos nos quais a ciência, em nome do progresso e do bem-estar
humano, inventa a clonagem em laboratórios e células-tronco, entre outras descobertas.
A resposta para esses e outros questionamentos pode variar de acordo com a formula-
ção da pergunta, uma vez que as questões podem ter um caráter particular ou geral.
Irmãos
– Quem?
– Nos espermatozoides...
PESQUISANDO NA WEB
Leia algumas dessas diferentes visões sobre o homem deixadas por homens que pen‑
savam além de seu tempo e até hoje são motivo de estudos e indagações.
Após a obra A origem das espécies, de Charles Darwin, a espécie humana passou a ser con‑
cebida como uma dentre as espécies animais, sujeitas aos mesmos processos de evolução.
Segundo Albert Einsteim, não existe nenhum caminho lógico que nos conduz (as grandes
leis do universo). Elas só podem ser atingidas por meio de instituições baseadas em algo
semelhante a um amor intelectual pelos objetos da experiência. (COTRIM, 2000, p. 251)
Segundo Augusto Comte, o amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim.
(WIKIPÉDIA, 2009)
Segudo Marx, “não é a consciência dos homens que determina o ser social, mas ao contrário,
é o ser social que determina sua consciência”. (COTRIM, 2000, p. 216).
Segundo Hegel: “tudo que é real é racional, tudo que é racional é real”.
Segundo Merleau-Ponty, “as coisas estão revestidas de características humanas (dóceis, do‑
ces, hostis, resistentes) e, inversamente, vivem em nós como tantos emblemas das condutas
que amamos ou detestamos. O homem está investido nas coisas e as coisas estão investidas
nele”. (FILOSOFANDO, 2009)
12 UNIUBE
Segundo Heidegger, “a angústia é o sentimento que retira o homem da sua vida inautêntica
e o devolve à condição autêntica: um ser em aberto, que deve construir sua existência.”
(COTRIM, 2000, p. 217)
Alguns pensadores:
Segundo Paulo Freire, “não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no
trabalho, na ação‑reflexão”.
Segundo Carl Rogers, “os educadores precisam compreender que ajudar as pessoas a se
tornarem pessoas é muito mais importante do que ajudá‑las a tornarem‑se matemáticas,
poliglotas ou coisa que o valha” (Projetos pedagogicos).
Agora, você também poderia pesquisar o pensamento de outros pensadores nas di‑
versas áreas do conhecimento e ir anotando o modo como eles concebem o homem.
Qual a sua conclusão?
Buscando compreender o sentido mais amplo da vida, de seu papel no mundo, o ho-
mem aprendeu a escutar, absorver, reformar, rever, renovar, mas também a questionar,
relacionar, investigar, criar, propor. Ao questionar o que sabia, buscando as respostas
sobre o que precisava saber, ele foi transformando a natureza: mundo que independe
do homem para existir em um mundo cultural, significativo, dotado de consciência
humana.
Você conhece uma historinha infantil, da escritora Sylvia Orthof, chamada Maria vai
com as outras? A história é mais ou menos assim:
Era uma vez uma ovelha chamada Maria. Ela repetia tudo que as
outras ovelhinhas faziam sem questionar...
PESQUISANDO NA WEB
Acreditamos que você esteja pensado no final da história, quando Maria não salta do
penhasco, volta e vai comer feijoada. Nesse momento, ela agiu com consciência. Ela
foi capaz de fazer sua inteligência debruçar‑se sobre si mesma para tomar posse de
seu próprio saber, avaliando sua consistência, seu limite e seu valor. Quantas vezes
temos que agir assim, não é mesmo? A sociedade nos cobra ações o tempo todo. Mas,
quando não temos clareza dos fatos e nos deixamos levar pela opinião dos outros,
podemos estar seguindo os passos de outras Marias. Pense nisso!
É nesse sentido que ele é chamado, constantemente, a refletir sobre seu papel social,
a sua responsabilidade pelas transformações que produz na natureza e pelo compro‑
misso com a vida humana, de outros seres e do planeta.
Será que o homem se sente corresponsável pelas transformações que em nome do progresso
vem fazendo na natureza?
• Sendo o homem um ser consciente de seus atos, como analisar os problemas causados
pelo aquecimento global tão em foco hoje no mundo?
• Que outros problemas você poderia elencar referindo-se ao último parágrafo do texto
acima?
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Diante de tantas atitudes em nosso cotidiano que nos remetem a ter responsabilidade
social de nossos atos com ciência, vamos agora estudar esse homem, que ao mesmo
tempo é sujeito do conhecimento, isto é, relaciona‑se consigo mesmo. Mas, também,
pode ser objeto do conhecimento quando se volta para o mundo que o rodeia.
Já estudamos que o homem possui características comuns aos outros seres vivos, mas
também já vimos que isso não basta para torná‑lo humano. Ele precisa da capacidade
de pensar, de perceber o mundo com outro olhar, possibilitando‑lhe não apenas conviver
com a realidade, mas também conhecê‑la e, assim, poder transformá‑la e explicá‑la.
Isso só é possível por meio do conhecimento:
O conhecer torna‑se, a partir daí, um processo que envolve sujeito conhecedor (nossa
consciência, nossa mente) e um objeto (a realidade, o mundo, os inúmeros fenômenos).
Cordi (apud SOARES, 2000, p. 32) explica que existe um tipo de conhecimento que é
comum aos humanos e aos outros animais. Ele é adquirido por meio de nossas expe-
riências sensitivas e fisiológicas (tato, visão, olfato, audição e paladar), com a nossa
percepção com a realidade. Os sentidos nos oportunizam sentir as qualidades sensí-
veis do objeto externo: cores, sabores, odores, paladares, texturas, dimensões, como
também estados internos ou mentais: lembranças, desejos, sentimentos, imagens.
Estamos falando do conhecimento sensorial ou empírico.
Podemos sentir os objetos, o cheiro e o gosto do café, a maciez da lã, do pelo do gato,
lembrar de fatos e datas distantes que foram importantes em nossa vida. Portanto,
podemos percebê‑las por meio das sensações e a percepção.
Ainda Cordi (apud SOARES, 2000, p. 32) afirma que existe outra categoria de conheci-
mento exclusiva do ser humano. Somente ele é capaz de produzi‑lo. Estamos falando
de um raciocínio que pressupõe um pensamento, uma lógica, uma ação consciente.
É o conhecimento lógico ou intelectual. Por meio dele, conseguimos ultrapassar os
dados captados pelos sentidos, criando a imagem mental do objeto pensado. Quando
pensamos em um gato, a forma como o mentalizamos depende do gato que imagina-
mos e conhecemos. Conheço o gato quando estou consciente desse animal com as
determinadas propriedades que chamo de gato.
PESQUISANDO NA WEB
Acesse: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/07/AUGUST_RODIN_O_pensa‑
dor_(vista_frontal).jpg> e observe a foto da escultura O pensador, de Auguste Rodin.
Após observar a escultura que análise você faz dela? Registre‑a em seu TCA.
Mas, será que o homem consegue usufruir desse conhecimento somente pelo bem da
humanidade?
Pense no Brasil dos anos 1960. Os valores naquele contexto histórico do regime de Ditadura
Militar podem ter conotação diferente dos dias de hoje no Brasil? Por quê?
Em nome de Deus, do amor, homens se matam, fazem guerra, mas também são capazes de
atos solidários. Quanta coisa se faz, não é mesmo? Relacione o significado dessas atitudes
com o significado da escultura de Rodin e registre em seu TCA.
Quando dizemos que “Não adianta lutar contra o destino, o que tem de ser, será” ou
“Pau que nasce torto, morre torto” estamos afirmando que o ser humano não é livre,
mas, sim, predestinado a assumir pacificamente um determinado papel social. Levando
em consideração o dito popular: Deus ajuda a quem cedo madruga, vamos pensar nas
pessoas que levantam cedo, trabalham em sua casa antes de sair, pegam mais de dois
meios de transporte para chegar ao trabalho e ganham apenas um salário-mínimo,
nas mães babás que deixam seus filhos sem creches; nas mães de crianças menores
que, para ganhar o sustento tomam conta de filhos de famílias da classe média ou
alta, muitas vezes de crianças da idade das suas? Como fica esse dito popular? Esses
trabalhadores deveriam ter melhores condições de trabalho, creches de qualidade para
as crianças, afinal também levantam cedo, madrugam e trabalham muito.
Você que é professor, ou futuro pedagogo/professor, ou pai, ou mãe, pense sobre quantas
vezes na instituição escolar essa ideologia está presente.
Leia com atenção as questões apontadas; em seguida discuta sua compreensão destes pro‑
blemas com os colegas e socialize o resultado no Trabalho de Construção da Aprendizagem
(TCA).
O fracasso escolar se deve à falta de talento, preguiça e, desinteresse da família pelo desen‑
volvimento da criança.
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Como você se posicionaria diante dessas afirmações? Discuta com seu(sua) preceptor(a) a
respeito. Registre em seu TCA.
Se possível, ouça, cante e reflita sobre alguns versos da letra da canção “Ideologia”, de
Cazuza, que clama a favor da liberdade de expressão e critica a sociedade ideológica
em que estamos inseridos.
SAIBA MAIS
Mais conhecido como Cazuza (Rio de Janeiro, 4 de abril de 1958 – Rio de Janeiro, 7 de julho
de 1990), foi um cantor e compositor que ganhou fama como o vocalista e principal letrista da
banda Barão Vermelho. Sua parceria com Roberto Frejat foi aclamada pela crítica. Dentre as
composições famosas junto ao Barão Vermelho estão “Todo amor que houver nessa vida”,
“Pro dia nascer feliz”, “Maior abandonado”, “Bete balanço” e “Bilhetinho azul”.
Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cazuza>.
PESQUISANDO NA WEB
Acesse o endereço a seguir para ver a letra da música “Ideologia”, interpretada por Cazuza.
Mas, não é somente a cultura popular que acredita na predestinação do ser humano,
isto é, na ideia de que, ao nascer, o homem já traz consigo as qualidades que, no de-
correr de sua vida, poderão ou não se manifestar. Para muitos pensadores e filósofos,
o “Homem” constitui o ponto central de toda reflexão filosófica que também influenciou
a forma do homem pensar. Na Filosofia encontraremos diversas correntes filosóficas
com ideias semelhantes.
Bleger (1987, apud BOCK, 2000) mostra que há pelo menos três mitos filosóficos, que
influenciaram as ciências humanas em geral e a psicologia em particular, e que apre-
senta a ideia de que o homem nasce pronto.
Quantas vezes falamos frases do tipo: A ocasião faz o ladrão, Digas com quem andas,
que eu te direi quem tu és? Quando o fazemos, estamos acreditando que o individuo é
apenas influência do meio e que não pode se transformar, esquecendo que o homem é
produto histórico e hereditário, isto é, um ser cultural. Como diz Drumond: “O homem
não é apenas procriação e sobrevivência de sua espécie. Brote, frutifique as ideias do
homem e descobrirá o que ele é capaz de fazer”.
Mas, para que você entenda melhor essas reflexões, vamos aprofundar um pouco mais
nos diferentes papéis que o homem vivencia em sociedade.
O homem pertence a uma espécie animal – homo sapiens – segundo Aranha (1998)
“do latim: homem sábio, aquele que tem capacidade de conhecer a realidade, de ter
consciência de si e de seu papel no mundo”.
Os estudos da Biologia (ciência que estuda os seres vivos) explicam que desenvolver
determinadas características que foram herdadas, requer condições ambientais (físicas
24 UNIUBE
Movidos pelo instinto gregário, vivem juntos com a finalidade de sobrevivência e con‑
servação da espécie. Porém, se essa convivência pacífica é ameaçada, lutam entre si,
sobrevivendo apenas os mais fortes. Ao se adaptar a outro ambiente natural, algumas
características como a cor dos olhos e da pele podem se modificar, para que se adap‑
tem ao novo habitat. Segundo Bock (2000), pode‑se dizer que todos os traços físicos
ou mentais, normais ou não, são, ao mesmo tempo, genéticos e ambientais.
Os seres humanos também não são animais solitários. Ao nascer, o homem possui
um conjunto de traços herdados de seus ancestrais, como a cor dos olhos, da pele, do
cabelo, características físicas, que, em contato com um ambiente determinado, darão
a ele condições de sobrevivência, levando em consideração sua identidade individual
com características próprias.
Pense em você:
• Quais foram as características físicas que você herdou de seu lado paterno e de seu lado
materno?
• Você acredita que essas características bastam para você ser o(a) cidadão(ã) que é hoje?
Skank
Banda brasileira O conjunto musical mineiro Skank em sua música “Pacato
de pop rock e ska Cidadão”, chama a atenção para o cidadão que vive da mesma
formada por Samuel forma sempre, isto é, sem modificar a sua ação cotidiana. Ouça
Rosa (guitarra e voz),
Henrique Portugal a música, ou leia sua letra, e veja se há algo em comum com
(teclados), Lelo Zaneti o que você respondeu. Também pensamos como eles. A cada
(baixo) e Haroldo momento vamos criando novas possibilidades, isso acontece
Ferreti (bateria), porque não bastam as características biológicas herdadas para
em março de 1991
nos tornarmos um ser sócio‑historico. É preciso ser atuante no
em Belo Horizonte.
Disponível em: <http:// contexto em que vivemos.
pt.wikipedia.org/wiki/
Skank>. Acesso em:
15 nov. 2009.
UNIUBE 25
Portanto, o que a natureza (o biológico) dá ao homem quando ele nasce não basta para
lhe garantir uma vida em sociedade. Ele precisa se adequar ao meio, conviver com o
próximo, aprender, humanizar‑se. Assim, o homem vai se tornando um ser biológico e
social, com características herdadas e adquiridas, com aspectos individuais e sociais,
com elementos da natureza e da cultura, criados e desenvolvidos pelas civilizações no
decorrer da história.
Atitudes simples do nosso cotidiano, como escovar os dentes, usar vestuário, usar o
chuveiro, ler, escrever, dirigir são habilidades que surgiram a partir das necessidades da
vida cotidiana em sociedade e não são herdadas por fatores biológicos, são adquiridas
pela apropriação da cultura.
• Identifique algumas características que tornam o homem um ser sócio histórico. Registre
em seu TCA.
• Depois, confronte sua resposta com a figura, a seguir. Veja se ela contempla as palavras
da figura.
No texto, a seguir, vamos aprofundar um pouco mais no que seja a cultura criada pelas
gerações que nos precederam. Vamos analisar a importância deste enfoque para o
homem sócio‑histórico.
Caso tenha interesse em refletir mais sobre isso, assista ao filme Tempos modernos
de Charles Chaplin.
Este filme traz outro olhar sobre o trabalho enquanto produção humana.
Direção: Charles Chaplin. Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, 87 min. preto e branco,
Continental.
Pense em todas as atividades que você realizou hoje, a partir do momento que se levantou
da cama, anote‑as e veja se elas são:
ação de transformar a semente de trigo em pão? Você já havia pensado sobre isso? A
cultura pode ser considerada parte do ambiente que o próprio homem criou.
Sou um ser
sou um homem
penso...
Choro...
Sinto...
(Versos da autora)
Quando indagamos, por meio dos versos acima, sobre o valor, as particularidades do ser
homem, estamos situando‑o como um ser único que busca, nas gerações anteriores, a
identidade de ser no mundo e no qual, por meio do trabalho e o uso de instrumentos,
vem deixando marcas de sua história. Ele vai aperfeiçoando o que já existe. Veja o que
Aranha (1998) escreve:
• E os outros animais, por exemplo, a abelha, a formiga: suas ações podem ser consideradas
trabalho?
28 UNIUBE
Acredito que você já observou que os animais também têm suas atividades, suas
rotinas, seu habitat, a escolha de um ambiente mais favorável, dentre outras. Mas será
que podemos considerar essas ações como trabalho?
Mas, o trabalho humano é um fazer que gera produto, melhores condições de vida. Para
tanto, o homem inventa tecnologias que utiliza para transformar a natureza e conseguir
alcançar seu objetivo.
Bock (2001) conta uma breve história de um experimento para entendermos esta afir-
mação de que o macaco aprende, mas não conceitua.
Na ação do macaco citada como exemplo, não podemos considerar que utilizou ins‑
trumento de trabalho, porque não houve representação consciente da ação realizada.
Segundo o exemplo citado por Bock, o macaco aprendeu a utilizar o conteúdo do balde
para apagar o fogo, mas não conseguiu conceituá‑lo, já que não conseguiu perceber
que tanto no balde como no tanque havia água. Mas, se estivesse com sede, beberia
indistintamente tanto a água do tanque como a água do balde, sem fazer nenhuma
relação com a atividade anterior.
Estudamos que algumas ações podem ser praticadas instintivamente. Como poderíamos
diferenciar o trabalho da abelha fazendo mel do trabalho do chimpanzé pegando água com o
balde e o de uma criança tentando pegar uma fruta na árvore? Registre em seu TCA.
Se você colocou que a abelha age por instinto, porque a vida inteira fez o mel da mesma
forma, o chimpanzé pela inteligência concreta, pois age no momento. mas depois não
consegue relacionar o fato com o cotidiano e o menino por uma inteligência abstrata
porque cria e recria possibilidades para apanhar a fruta, acertou.
Existem outros exemplos que poderiam ilustrar esse momento. Pense e escreva. Se
tiver dúvida converse com seus colegas ou com seu preceptor.
Assim, podemos concluir que os animais permanecem na natureza, retirando dela sua
sobrevivência, enquanto o homem, através dos instrumentos e do trabalho, é capaz
de transformá‑la e produzir cultura, deixando sua marca no mundo.
EXPLICANDO MELHOR
Ela se refere ao mito grego, o de Sísifo. Conta‑se que Sísifo, após a sua morte, foi condenado
por toda a eternidade a rolar uma grande pedra de mármore com suas mãos até o cume de
uma montanha. Mas, toda vez que ele estava quase no topo da montanha, a pedra rolava
novamente montanha abaixo até o ponto de partida por meio de uma força irresistível. A ele
recomeçava novamente sua tarefa...
Ainda hoje encontramos situações de trabalho que retratam uma triste realidade: o
trabalho subumano em que homens em busca de um sonho vivem uma vida sombria
de pouco sonho.
Duas das fotos que nos chamam a atenção é sobre a Serra Pelada, garimpo da região
de Curionópolis no sul do Pará, desativado desde a década de 1980, mas que poderá
ser reaberto. A primeira retrata do alto e de longe, o garimpo de Serra Pelada onde as
figuras humanas têm o formato de um grande formigueiro humano. Em uma grande
cratera milhares de homens se amontoam em busca do ouro. Na outra foto, o fotógrafo
UNIUBE 31
O que poderíamos fazer para transformar essa perversa realidade, onde uns têm tanto e
outros têm tão pouco?
No Brasil atual, será que todos têm trabalho, educação e uma vida digna?
Procure outras imagens e/ou reportagens sobre o trabalho no Brasil, de preferência em re-
giões distintas. Recorte, faça sua análise e disponibilize no seu Trabalho de Construção da
Aprendizagem (TCA).
SAIBA MAIS
Legião Urbana, banda brasileira de rock surgida em Brasília ativa entre 1982 à 1996. Ao
todo, lançaram treze álbuns, somando mais de 20 milhões de discos vendidos. Ainda hoje, é
o terceiro maior grupo musical da gravadora EMI-Odeon, em venda de discos por catálogo, no
mundo, com média de 200 mil cópias por mês. O fim do grupo foi marcado pelo falecimento
de seu líder e vocalista, Renato Russo, em 11 de outubro de 1996. Disponível em: <http://
pt.wikipedia.org/wiki/Legi%C3%A3o_Urbana>. Acesso em: 15 out. 2009.
A Torre de Babel, segundo a narrativa bíblica no Gênesis, foi uma torre construída por um
povo com o objetivo que o cume chegasse ao céu, para que não fossem espalhados sobre toda
a Terra. Deus parou esse projeto ao confundir a sua linguagem e espalhar o povo sobre
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toda a Terra. Essa história é usada para explicar a existência de muitas línguas e raças dife‑
rentes. A localização da construção teria sido na planície entre o Rio Tigre e Eufrates, atual
Iraque, uma região estrategicamente boa por ser muito fértil.
Agora vamos falar da linguagem humana e retratar nossas origens, a partir do momento
em que o homem se humanizou. Se você observar a sua volta poderá perceber quanto
somos dependentes da linguagem.
Você já parou para refletir como surgiu a linguagem? Foi pela necessidade de expressar
os sentimentos, que a linguagem se desenvolveu. Inicialmente, o homem se comuni-
cava por meio dos gestos, posteriormente veio a aparecimento da linguagem. Nesta
seção, vamos nos ater a discussão na linguagem humana como fator importante na
produção da cultura.
No filme 2001, uma odisseia no espaço (A Space Odissey, 1968, EUA, sob a direção
de Stanley Kubrick – disponível em: <http://www.adorocinema.com/diretores/stanley
‑kubrick/>), tem uma cena que não passa despercebida a qualquer olhar humano. No
momento em que dois grupos rivais se encontram para a disputa da posse de um ter-
ritório, um integrante de um dos grupos toma em suas mãos um osso (um fêmur) e o
ergue no espaço em busca de demonstração, para o grupo adversário, de poder. E ele
atinge o seu objetivo, pois o outro grupo se retira. Esse gesto foi uma comunicação.
Segundo estudos realizados pelo psicólogo russo, nascido em Moscou, Alexis Leontiev,
o elemento concreto que permite ao homem ter consciência das coisas é a linguagem.
Mas, para chegar até a linguagem, o homem teve que evoluir muito. Se pensarmos em
termos evolutivos (teoria evolucionista de Darwin), o homem teve sua origem a partir
de um antropoide, Homem primata. Ancestral comum do homem e do macaco há cerca
de 5 milhões de anos!
Para Bock (2001), as condições para que o homem chegasse até a linguagem foram
as seguintes:
Observe uma criança. Aproximadamente com que idade ela começa a desenvolver a
fala? Segundo Piaget, por volta dos dois anos. Antes, ela diz apenas poucas palavras
soltas sem muita conexão. É nessa idade que ela também começa a se socializar mais
e a descobrir o mundo a sua volta. Este assunto será objeto de estudo na próxima seção
desta unidade temática. Leia o que Aranha (1986, p. 11) escreve:
que ela está vivenciando. Por que isso não acontece mais conosco? Porque nós temos
a arrogância de acreditar que temos o conhecimento de tudo. E, então, o animal não
chama mais a mesma atenção. Ao passo que se deparamos com um ser estranho aos
nossos olhos, nós voltamos a agir como a criança que vê um animal.
Por a linguagem ser um fenômeno eminentemente social, o homem não utiliza apenas
a linguagem verbal para se comunicar. Ele também se expressa por meio das artes, dos
gestos, dos números, da música, da fotografia, isto é, existem diferentes linguagens e
diferentes formas de se expressar.
Muito já estudamos e refletimos até agora. Vamos ver se você realmente compreendeu quais
foram os fatores que contribuíram para a humanização do homem.
REGISTRANDO
Espero que você tenha escrito que a criação dos instrumentos de trabalho, junta‑
mente com o despertar da consciência, o surgimento da linguagem e as relações
sociais foram os fatores indispensáveis para o desenvolvimento humano.
Para completar nosso estudo não poderíamos deixar de falar sobre a educação como
fator indispensável para o aprendizado e continuidade da cultura de um povo. Leia o
que Brandão (2001, p. 7) escreve sobre a educação:
36 UNIUBE
• Educação ou educações?
Cada sociedade tem um jeito próprio de educar, sendo responsável pela educação de
seu povo.
A seguir, contaremos para vocês uma história que li no livro de Carlos Brandão intitulado
O que é a educação, em que o autor exemplifica de uma forma bem clara e bonita
essa concepção de educação.
Segundo Brandão (2001, p. 8‑9) essa carta tornou‑se conhecida porque alguns anos
mais tarde Benjamin Franklin adotou o costume de divulgá‑la aqui e ali. Leiam alguns
trechos dessa carta que vão ilustrar nosso aprendizado:
[...] Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas
do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles vol-
tavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da
floresta e incapazes de suportarem o frio e a fome. Não sabiam como
caçar o veado, matar o inimigo e construir uma cabana, e falavam a
nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não
serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros.
Ao analisar os fatos históricos contidos nessa carta, podemos perceber que socieda-
des distintas possuem formas de educar também distintas. A educação em pequenas
sociedades tribais é diferente da concepção de educação nas aldeias de camponeses
e ela se difere das cidades de interior e das grandes metrópoles, independente do
processo de globalização.
A educação não é neutra. Existe sempre por traz das ações de quem controla o poder,
mesmo naquelas mais bem intencionadas, uma ação coercitiva, isto é, controladora,
em maior ou menor grau. Cada país, cada povo, cada sociedade possui realidades e
valores distintos e, por isso, tem uma concepção diferente de educação. Dessa forma,
busca‑se moldar o indivíduo à imagem e ao pensar das pessoas que mantêm a ordem
vigente, acreditando ser o melhor para uma nação. O ato educativo pressupõe ação
e reflexão, portanto a educação é um ato político. Foi para esse aspecto que o repre-
sentante das nações indígenas chamou atenção.
UNIUBE 39
[...] aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm
concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não
ficarão ofendidos ao saber que a vossa ideia de educação não é a
mesma que a nossa. (BRANDÃO, 2001, p. 8‑9)
Cada povo visa transmitir ao indivíduo o patrimônio cultural que acredita ser necessá-
rio às novas gerações, para integrá‑lo à sociedade e aos grupos que a constituem. A
transmissão cultural pode ocorrer de forma espontânea ou informal e intencional ou
formal.
REGISTRANDO
• uma cena em que uma criança observa e imita a mãe trabalhando e aprende os
afazeres domésticos;
Cada país, cada povo, cada sociedade possui realidades e valores diferentes e, por
isso, tem uma concepção distinta de educação.
Nas sociedades isoladas e, também, em muitas aldeias indígenas em que ainda não
existem escolas, a educação informal é a única forma de educação.
Hoje, pela necessidade cada vez maior de os responsáveis pela família trabalharem
fora dos lares, muito desses ensinamentos estão sendo relegados ao segundo plano; a
família cada vez mais coloca como responsabilidade da escola a educação dos filhos.
A escola, por sua vez, não os assume e diz ser de responsabilidade da família. O que
temos percebido é a perda de vários desses valores que não se encontram nos livros,
mas, sim, no ensinamento diário tão necessário ao aprendizado das crianças e jovens.
Este aprendizado é chamado de assistemático ou informal.
Outro fator que também nos chama a atenção: e que por meio dos meios de comuni‑
cação de massa, principalmente TV e também pela Internet, temos contato com várias
UNIUBE 41
informações ao mesmo tempo e nem sempre existe uma criticidade pelo que se vai
absorvendo. Tudo acontece de forma tão real, passando a ser também um padrão de
comportamento a ser seguido.
• Você tem o hábito de conversar com seus filhos, pais ou outros familiares sobre as cenas
que são marcantes para você em novelas, filmes ou propagandas?
• Já parou para pensar no caráter ideológico que está implícito em tais cenas?
Pois é, isso é muito importante de se fazer. Quando não o fazemos, deixamos que
tudo que se passa na mídia pareça real aos olhos de quem assiste. Absorvemos com
tamanha normalidade o que assistimos, que passa a ser natural em nosso cotidiano. E
vamos nos tornando como a ovelhinha da história “Maria vai com as outras”. Converse
com seus amigos sobre essa questão e anote suas reflexões no TCA.
SAIBA MAIS
Neste momento, finalizando nosso estudo, você deverá ler a referência bibliográfica a seguir:
FONTANA, Roseli; CRUZ, Maria Nazaré da. A psicologia na escola. In: Psicologia e trabalho
pedagógico. São Paulo: Atual, 1997. p. 3‑8.
Neste capítulo, a autora explica a escola como lugar de aprender e de brincar, o que
é ensinar, como a criança aprende e finaliza abordando um pouco do estudo científico
das nossas crianças. Esse será o primeiro passo para o estudo mais aprofundado da
educação nas próximas unidades temáticas. Após a leitura, faça a atividade de campo
da página 9 e aguarde outras informações. Essa atividade será necessária para ativi-
dades posteriores.
UNIUBE 43
1.10 Conclusão
Neste capítulo estudamos que o homem é um produtor de conhecimento que busca
sempre se conhecer e ao mundo que o rodeia. Nessa busca do conhecimento, difere‑se
dos outros seres vivos. Também aprendemos que não existe natureza humana, mas
uma condição humana que admite ser o homem possuidor de um suporte biológico
específico (corpo) que, em contato com outros homens, produz cultura.
Por tudo que vimos neste capítulo, podemos concluir que o ser humano possui uma
identidade formada ao longo do tempo, por meio da internalização da cultura e pela
educação recebida. Seu conhecimento está sempre em construção, por meio das re-
lações sociais que mantém com a sua comunidade ou com outros homens.
Pelo trabalho, ele se autoproduz e desenvolve, tornando‑se assim, um ser flexível, múl-
tiplo, capaz de interagir com as várias faces do mundo, com pessoas e grupos sociais
muito diferentes e estar sempre aprendendo.
Hoje, em nossa sociedade, quantas vezes também nos deparamos com fatos pare-
cidos como esses? Por exemplo: nas instituições sociais como a escola e a família
estão vivenciando tempos difíceis, nos quais a educação de nossas crianças e jovens
também está sendo colocada em cheque. Quantas vezes nos perguntamos: Que tipo
44 UNIUBE
de homem queremos formar? Por que educar crianças e jovens está tão difícil? São
esses e outros questionamentos que, por meio dos conhecimentos recebidos, fazem
o homem sair de si mesmo e, juntamente com o outro, buscar as respostas para suas
inquietações.
Mas, também, somos seres altruístas que buscamos o bem comum, fazendo renas-
cer sinais de vida, de solidariedade. Por todo o mundo, novas ONGs são criadas,
ampliam‑se os movimentos sociais, o voluntariado, lutando em defesa da vida e do
meio ambiente.
Neste início do século XXI e do novo milênio, a população mundial vive momentos não
só de crise, mas também de esperança. Pela educação, o homem pode alcançar a
liberdade de ir e vir no mundo. Pode ainda, pelo processo de aquisição do saber, levar
grupos sociais distintos a se descobrirem como coparticipantes da construção de um
mundo melhor e mais igualitário. Portanto, ser um processo cultural, transformando
tudo que é comunitário e de valor social, em um bem comum a todos.
Termino este roteiro com alguns versos da letra da música inicial, “Caçador de mim”,
cantada por Milton Nascimento e composta por Luís Carlos Sá e Sérgio Magrão, que
acredito sintetizarem o que estudamos sobre o homem: “Vou descobrir / O que me faz
sentir / Eu, caçador de mim”.
UNIUBE 45
Leitura sugerida
FONTANA, Roseli; CRUZ, Maria Nazaré da. A Psicologia na Escola. In: Psicologia e
trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997. (Formação do Educador.)
Atividades
Atividade 1
Você leu neste capítulo trechos da carta do chefe indígena para o governo americano.
Nela fica clara a importância da educação inserida na cultura de cada povo. Portanto
podemos afirmar que:
I‑ A educação de cada país, de cada sociedade, possui realidades e valores diferentes
e por isso, tem uma concepção diferente na forma de educar.
II ‑ Na educação, analisada por meio dos fatos históricos, percebemos que sociedades
distintas possuem formas de educar também distintas.
A ‑ ( ) I, III e IV apenas.
B ‑ ( ) I, II e V apenas.
C ‑ ( ) II, IV e V apenas.
D ‑ ( ) III, IV e V apenas.
Atividade 2
A partir dos tipos de conhecimento estudados neste capítulo, numere a segunda coluna
de acordo com a primeira.
Referências
ANDRADE, Carlos Drummond de. Especulação em torno da palavra homem. In: Obra completa. Rio de
Janeiro: José Aguilar, 1967.
ARANHA, Maria Lucia de Arruda; MARTINS, M. H. P. Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo:
Moderna,1992.
BOCK, Ana Mercês B. et al. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologias. 13. ed. São Paulo:
Saraiva, 2001.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 2001. (Coleção Primeiros
Passos.)
CORDI, Cassiano (Org.). Para filosofar. 4. ed. São Paulo: Scipione, 2000.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. História e grandes temas. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
FONTANA, Roseli; CRUZ, Maria Nazaré da. Psicologia e trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997.
(Formação do Educador.)
UNIUBE 47
FREIRE, Paulo. Pedagogia dos sonhos possíveis. São Paulo: Edunesp, 2001.
MARX, Karl. O capital. Crítica da economia política. Livro I – O processo de produção do capital. v. 1. 15. ed.
Trad. Reginaldo Sant’Anna. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.
SALGADO, Sebastião. Trabalhadores: uma arqueologia da era industrial. São Paulo: Companhia das
Letras, 1997.
SATIRO, Angélica; Wuensch, E. M. Pensando melhor. Iniciação ao Filosofar. São Paulo: Saraiva, 1997.
VERÍSSIMO, Luiz Fernando. Irmãos. In: O analista de Bagé. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. p. 19.
Referências eletrônicas
PAUL Gauguin (1897) De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos? Disponivel em: <http://
images.google.com.br/imgres?imgurl=http://4.bp.blogspot.com/_7Lca39m4sxE/SPUu90zpATI/
AAAAAAAAA7g/OGOAmY58aIg/s320/Nova%2BImagem%2B(16).png&imgrefurl=http://
naoqueroficarderec.blogspot.com/&usg=__e6ui9sqNrFkyRC5KXpy1TxB8Lk0=&h=126&w=320&sz=96&
hl=pt‑>. Acesso em: 2 out. 2009.
Introdução
Neste capítulo, vamos aprofundar as principais diferenças entre o ani-
mal e o homem abordando os aspectos e os fatores que intervêm no de‑
senvolvimento humano e animal. Você irá perceber como a Psicologia
do desenvolvimento estuda como nascem e como se desenvolvem as funções
psicológicas que distinguem o homem de outras espécies.
Você irá entender, ao longo deste capítulo, como as concepções inatista, am-
bientalista e interacionista podem interferir no modo como os(as) professores(as)
acreditam que a criança constrói o conhecimento. Não se preocupe em memo‑
rizar as características de cada teoria. Ao longo da leitura, você vai perceber
as diferenças entre elas.
50 UNIUBE
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
Esquema
2.1 Desenvolvimento humano versus desenvolvimento animal
2.4 Conclusão
Para iniciarmos a nossa discussão, sabemos que o animal precisa comer, beber, eli‑
minar resíduos por meio de fezes ou urina, dormir e reproduzir‑se. Enfim, manter o
corpo em funcionamento, com o máximo de conforto, para garantir sua sobrevivência.
E o homem?
EXEMPLIFICANDO!
Pense em um inseto. Uma aranha, por exemplo. Ela sabe o que comer, como fazer sua teia e
de que preparativos necessita para procriação, sem que tenha aprendido. Ela faz do mesmo
jeito em qualquer lugar onde viva. Aqui, ou na China, hoje como há 500 anos. Ela pode sofrer
mutações genéticas, e então adquirir novas características. Mas enquanto isso não ocorrer,
enquanto sua constituição biológica não mudar, o comportamento de todas as gerações será
o mesmo. Não se renova nem se perde. São comportamentos rígidos, mas que nos parecem
perfeitos devido à extrema habilidade com que são executados.
Embora fiquemos admirados com o joão‑de‑barro, que constrói sua casa, as abelhas,
que fazem suas colmeias, as aranhas, que tecem suas teias, constatamos que, em
qualquer tempo ou lugar, joões‑de‑barro, abelhas e aranhas repetem os atos dos ani‑
mais de sua espécie que os precederam, atendendo as necessidades que a natureza
impõe, de forma automática, naturalmente condicionada.
As reações dos animais ao ambiente estão muito bem programadas em seu corpo.
Por isso se diz que os animais são o seu corpo, e que estão determinados por ele.
Isso não quer dizer que nenhum tipo de animal possa aprender nada além do que está
biologicamente programado. Quem já ensinou boas maneiras a um cão sabe o quanto
ele é capaz de aprender. Mas os animais não precisam tanto da aprendizagem quanto
o homem para sobreviver. O conhecimento de que tem necessidade já nasce com eles.
Pode, às vezes, não estar pronto quando nascem, aparecendo somente a certa altura
do amadurecimento de seu corpo.
EXEMPLIFICANDO!
Os patinhos, quando nascem, não sabem nadar; somente após algumas semanas de vida
é que eles começam a exercitar essa habilidade. A pata mãe sabe quando estão prontos, e
então os leva e os ajuda no início. Ensina‑os? Como aprendem? Ela e os filhotes mais atirados
ajudam os que estão inseguros. Pois, só de ver os outros fazendo, as coisas parecem ficar
mais fáceis. Mas, mesmo quando o pato nasce e cresce isolado, chocado por uma galinha, e
longe de qualquer exemplar inspirador, ele saberá nadar tranquilamente quando ficar maior.
Sozinho! Sem lições, sem mestres, sem apoio familiar, sem apostilas ou preceptores. Esper‑
tinho, não é? Não. Isso está programado no corpo dele, como no nosso corpo as células se
comportam de acordo com sua programação biológica.
52 UNIUBE
Será que um bebê abandonado à própria sorte numa floresta, logo após o nascimento, sem
nenhum contato humano seria capaz de sobreviver?
Na história, houve alguns casos assim, em que bebês foram abandonados à sua própria
sorte e conseguiram sobreviver. Vejamos o caso das irmãs Amala e Kamala, apresen‑
tado por Davis e Oliveira (1990, p. 16):
Como vocês viram, o ser humano precisa aprender com outros seres humanos para
sobreviver. Sem perceber vamos aprendendo aspectos da cultura na qual fomos criados.
As pessoas mais velhas podem incentivar, e ajudar a acelerar esse processo. As crian‑
ças podem, também, aprender por elas mesmas, olhando e tentando copiar os outros,
experimentando e aprimorando as experiências, até saber fazer igual aos outros.
EXPLICANDO MELHOR
Quando reagimos a determinados odores que qualificamos como “cheiro ruim”, parece‑nos
uma reação meramente corporal e não uma questão de gosto ou cultural. Esses cheiros são
sentidos como desagradáveis ou até intoleráveis, mas não eram até aprendermos essas
regras.
Sabiam que mesmo o cheiro considerado ruim varia de cultura para cultura? Para
reconhecer isso, basta acompanhar um adulto tentando ensinar crianças em várias
situações:
54 UNIUBE
• ou então lembrar das caras feias e do alarde que se faz quando uma criança vai
engatinhando até um objeto perigoso.
Aprender as regras do que pode e do que não pode é um processo que leva meses
e meses. Mas, um tempo depois, as regras vão sendo incorporadas de tal forma que
passam a fazer parte das nossas reações, parecendo até mesmo naturais, como se
tivessem nascido conosco. Nessas situações agimos “automaticamente”, nem pen‑
samos o que fazer. Nosso corpo incorporou de tal forma esses comportamentos que
parecem instintivos.
O fato é que, comparados aos dos outros animais, nossos instintos são muito fracos.
O exemplo das meninas‑lobos nos mostra que temos que aprender para sobreviver.
Nem que seja aprender os hábitos de lobo. Mas, sem educação, sem aprendizagem,
não vivemos.
A aprendizagem é fundamental para a vida humana, por meio dela os seres humanos se
distanciaram da vida animal e passaram a se considerar seres que conseguem superar
suas limitações orgânicas; superando o orgânico, a espécie humana, de certa forma,
se libertou da natureza. Transformam a natureza e sua relação com o meio ambiente.
Para Davis e Oliveira (1994), ao transformar a natureza, os homens criam cultura,
refinam, cada vez mais, técnicas, instrumentos, saberes e transformam a si mesmos:
desenvolvem suas funções mentais (percepção, atenção, memória, raciocínio) e a sua
personalidade (sua maneira de sentir e atuar no mundo).
É importante lembrar que nossas reações biológicas são às vezes influenciadas pela
cultura, ou seja, variam no tempo e no espaço. Atitudes que chamamos de instintivas,
como “instinto materno”, “instinto de sobrevivência” e “instinto sexual” são aprendidas
e não determinadas por nosso corpo. Mesmo as reações que julgamos meramente
biológicas, como a fome e a dor, vão depender da forma como nossa cultura nos acos‑
tumou a senti-las e a tratá-las.
Converse com seus colegas e com seu (sua) preceptor(a) sobre isso. Troque ideias!
Você deve ter percebido, durante a discussão que a sensação de fome para alguns
causa irritação, para outros ansiedade, impaciência ou outras manifestações. Entretanto,
a sensação de fome não está unicamente relacionada à necessidade de alimentação.
Isso pode ser percebido, por exemplo, em leitos de hospital: mesmo que uma pessoa
UNIUBE 55
esteja recebendo pela veia nutrientes de que precisa, sente fome nos horários de refei-
ção. O fato de uma reação ser impulsiva ou irrefletida não quer dizer que ela possa ser
caracterizada, apenas, como instintiva. Aprendemos e desenvolvemos gostos pessoais
ou jeitos de ser, ainda que sem saber como ou por quê.
Vale ainda observar que mesmo os aspectos fisiológicos do corpo humano, como o
batimento cardíaco, o metabolismo e a reação aos estímulos nervosos, sofrem inter-
ferências dos padrões culturais. Repare como o coração bate mais forte em algumas
situações que variam de um contexto cultural para outro.
Em geral, o bebê nasce, cresce, vive e atua em um mundo social. É na interação com
outras pessoas que as necessidades do ser humano tendem a ser satisfeitas. Essas
necessidades implicam sua própria sobrevivência física (alimentação, abrigo, proteção
do frio etc.) e sua sobrevivência psicológica (carícias, incentivos, amparo, proteção,
segurança e conhecimento). É por intermédio do contato humano que a criança adquire
a linguagem e passa, por meio dela, a se comunicar com os outros seres humanos e
a organizar seu pensamento.
É também no convívio social, por meio das atividades práticas realizadas que se criam
condições para o aparecimento da consciência, que é a capacidade de distinguir entre
as propriedades objetivas e estáveis da realidade e aquilo que é vivido subjetivamente.
Através do trabalho, os homens se organizam para alcançar determinados fins, respon-
dendo aos impasses que a natureza coloca à sobrevivência. Para tanto, usam o conhe-
cimento acumulado por gerações e criam, a partir do trabalho, outros conhecimentos.
PESQUISANDO
Procure poesias, músicas, obras de arte que ilustrem como ocorre o processo do desenvol‑
vimento humano.
Registre, em seu TCA, as diferentes linguagens que pesquisou sobre o tema dessa seção e
relate a sua concepção de desenvolvimento humano, estabeleça uma relação entre a lingua-
gem escolhida e suas ideias, construindo um texto coerente e coeso.
Falar do desenvolvimento humano é, sem dúvida, deparar‑se com vários conceitos com‑
plexos, tais como reflexos e esquemas de ação, hábitos, independência, dependência,
individualizações, maturação neurológica, aprendizagem, cultura, funções psíquicas
elementares e superiores, entre outros.
UNIUBE 57
Algumas dessas estruturas permanecem ao longo de toda vida, pois a formação dessas
habilidades se dá ao longo da interação do indivíduo com o mundo social. Por exemplo, a
motivação está sempre presente como desencadeadora da ação, seja por necessidades
fisiológicas, seja por necessidades afetivas ou intelectuais. Essas estruturas mentais
que permanecem e garantem a continuidade do desenvolvimento.
Para Bock,
• A educação que teve na escola, na família, contribuiu para que chegasse ao que é hoje?
Em que medida?
• Procure lembrar‑se de três mudanças significativas que ocorreram com você, na sua in‑
fância, na adolescência, na vida adulta. Quais seriam os fatores que para você explicam
essas mudanças?
Não se esqueça, você está continuando o texto que iniciou anteriormente; sempre faça um
elo com o parágrafo anterior, para continuar os seus registros.
De acordo com o que você observou em sua vida e registrou em seu TCA, percebeu
como que o contato com nossos amigos, filhos, pais e pessoas, em geral, nos faz
constatar que as pessoas mudam durante seu ciclo vital. Nos primeiros anos de vida,
essa mudança é ainda mais visível. Rapidamente as crianças começam a andar, falar,
organizar‑se no mundo, discutir ideias, propor soluções para os problemas práticos.
Com o passar do tempo, essas crianças se tornam adolescentes e transformam seus
corpos e sua forma de pensar. Essas observações podem nos parecer banais até
certo ponto. No entanto, quando nos perguntamos “por que” e “como” essas mudanças
ocorrem, as respostas não parecem tão simples assim. Estudos e pesquisas de Piaget
demonstraram que existem formas de perceber, compreender e se comportar diante
UNIUBE 59
do mundo, próprias de cada faixa etária, isto é, existe uma assimilação progressiva
do meio ambiente, que implica uma acomodação das estruturas mentais a esse novo
dado do mundo exterior.
A discussão sobre a evolução psíquica do ser humano é alvo de um debate que teve
início no final do século XIX e continua até os dias de hoje. Diferentes autores, teorias
e modelos explicativos foram colocando posições de todo tipo, na tentativa de formular
uma explicação convincente, especialmente para a relação entre o desenvolvimento
e as diversas aprendizagens humanas. Dentre elas, algumas posições tornaram‑se
clássicas e dizem que vários fatores indissociados e em permanente interação afetam
todos os aspectos do desenvolvimento humano.
O desenvolvimento humano deve ser entendido como uma globalidade, mas, para efeito
de estudo, tem sido abordado em quatro aspectos básicos, destacam Davis e Oliveira:
Não é possível encontrar um exemplo “puro”, porque todos esses aspectos relacionam‑
-se permanentemente.
EXEMPLIFICANDO!
Quando uma criança tem dificuldade de aprendizagem, repete o ano, vai se tornando cada
vez mais tímida ou agressiva, tem poucos amigos e, um dia, descobre-se que as dificulda-
des tinham origem em uma deficiência auditiva. Quando isso é corrigido, todo quadro
reverte-se. A história pode, também, não ter um final feliz se os danos forem graves.
UNIUBE 61
SAIBA MAIS
Para Wallon (1934), o ser humano é biologicamente social, para ele, a constituição de todo com‑
portamento é função do meio no qual o indivíduo se insere, incluindo, portanto, a cultura.
• Você percebe como no processo de desenvolvimento, cada ser humano realiza sua indi‑
vidualidade?
Cada um se constitui como indivíduo por meio da relação com o outro, é na relação com
o outro que cada ser efetiva as possibilidades de desenvolvimento da espécie. Do ponto
de vista histórico, é a possibilidade de comunicação que permite a socialização dos
conhecimentos acumulados e a utilização dos instrumentos culturais construídos.
É importante ressaltar que essas teorias, como em qualquer estudo científico, depen‑
dem da visão de mundo existente em uma determinada situação histórica e evoluem
conforme se mostram capazes ou incapazes de explicar a realidade.
EXEMPLIFICANDO!
Podemos tomar essas falas como ponto de partida e exemplos para entender a corrente
teórica conhecida como inatista.
IMPORTANTE!
de cada pessoa passariam “de pai para filho” e, nesse caso, irmãos teriam comporta‑
mentos semelhantes porque tem a mesma genética. Assim, as qualidades e capacida‑
des básicas de cada ser humano já estariam definidas por ocasião do nascimento e as
várias fases do desenvolvimento estariam predeterminadas.
Segundo os inatistas, cada ser humano já traz consigo características básicas, definidas
desde o nascimento, só precisando que essas características sejam desenvolvidas ao
longo do tempo, com a maturação. Assim, para o Inatismo, o ambiente em que a criança
vive não interfere naquilo que ela vai aprender, pois suas características inatas vão se
desenvolver naturalmente em várias etapas predeterminadas.
EXEMPLIFICANDO!
Sabemos que, na prática, não é bem assim que acontece. Embora as crianças pos‑
sam aprender de formas diferentes, todas são capazes de aprender. Essa forma
de pensar dos inatistas trouxe muitas consequências para a prática escolar. Vamos
ver por quê?
Se concordarmos com essa teoria, a escola não tem muito que fazer, já que o apren‑
dizado da criança vai depender dos traços de comportamento que ela traz quando
nasce. No exemplo anterior, como você pode perceber, se o(a) professor(a) acreditar
que somente as crianças que nasceram com o dom da música podem aprender ritmo,
ele(a) não terá muito o que fazer em relação às outras crianças, não é verdade?
Vejamos outro exemplo, uma fala, que também ajudará a entender a teoria inatista e
que você pode ter ouvido ao longo de sua vida.
UNIUBE 65
EXEMPLIFICANDO!
“Pedrinho é carinhoso e sensível. Isso ele herdou da mãe. Mas herdou do pai teimosia e o
temperamento difícil. Não é possível mudar sua sina.”
Penso que você percebeu que nessa fala há uma excessiva valorização da
hereditariedade. Com base nessa ideia muitos(as) professores(as) acreditavam que
não havia muito o que fazer com a criança se ela era inteligente, era porque nasceu
em uma boa família. Se não correspondesse às expectativas do(a) professor(a), era
justificado pela frase: “também, com a família que tem!”.
Para os inatistas, a criança aprende de acordo com os seus dons. Se a criança não
aprende é porque não herdou o dom dos pais. Isso determina que ela nunca vai apren‑
der, porque já nasceu sem essa predisposição.
A concepção inatista contribuiu mais para rotular as crianças como incapazes do que
para entender o que realmente dificultava a aprendizagem.
EXEMPLIFICANDO!
Essa visão pode ser adequada para descrever o desenvolvimento das espécies animais mais
primitivas.
Elas já nascem “sabendo” como agir nas situações, um saber consolidado pela espécie no
decorrer de sua evolução e, por isso, não precisam do apoio e ensino do membro adulto da
mesma espécie.
A ideia inatista é ainda forte em nossa cultura e serviu de base para a formulação de
algumas teorias pedagógicas, influenciando muitas práticas educativas, em especial
as que ocorrem com crianças da Educação Infantil e Ensino Fundamental. Lembram
quando foram criados os “Jardins da Infância” nas escolas? Então, a ideia era que esse
fosse um lugar onde as crianças, pequenas sementes, seriam cuidadas pelos adultos,
jardineiros responsáveis por fazer brotar as características individuais delas.
A ênfase na hereditariedade fez com que muitos educadores pensassem que, diante
de cada criança, não há muito que fazer. Se ela é inteligente, é porque vem de uma
boa família; se não é, tal aspecto se justifica com a afirmação “também com a família
que tem!”. O perigo que daí decorre é o professor/educador “cruzar os braços”, achar
que “não tem nada a ver com isso!”.
Na concepção inatista, o homem “já nasce pronto”, pode‑se apenas aprimorar um pouco
aquilo que ele é, ou inevitavelmente virá a ser. O ditado popular “pau que nasce torto,
morre torto” expressa bem a concepção inatista, que ainda hoje aparece na escola,
camuflada sob o disfarce das aptidões, da prontidão e do coeficiente de inteligência.
Tal concepção gera preconceitos prejudiciais ao trabalho em sala de aula.
O que está sendo abordado, até o momento, acerca das relações existentes entre os
fatores biológicos herdados, e os sociais permite enfatizar que:
CURIOSIDADE
Destacamos algumas frases e exemplos para ilustrar a teoria inatista: “Filho de peixe, peixi‑
nho é”.
Você, em seu cotidiano, encontra alguma situação ou, até mesmo, outras frases que nos
remetam a essa teoria? Você pode descrevê‑las em seu TCA.
EXEMPLIFICANDO!
Por que será que essa frase foi usada para exemplificar a teoria ambientalista?
Para os ambientalistas, o mais importante são os fatores exógenos, ou seja, aquilo que
está fora do indivíduo. Para eles, a criança nasce sem as suas características psicológi‑
cas, seria como uma massa de argila a ser modelada, estimulada e corrigida pelo meio
em que vive. O desenvolvimento infantil seria um produto determinado basicamente
pelo ambiente que os membros de uma cultura tem.
Essa visão ambientalista tem o mérito de chamar nossa atenção para a plasticidade
do ser humano, que pode adaptar‑se a diferentes condições de existência, aprendendo
novos comportamentos, desde que existam condições favoráveis. Todavia, tal visão
termina por colocar os seres humanos como criaturas passivas frente ao ambiente.
Particularmente no caso da criança pequena, o adulto é visto como principal agente
e promotor do desenvolvimento infantil, o qual ensina e dá à criança tudo aquilo que
ela não tem, moldando seu comportamento, seu caráter e seus conhecimentos. Sem
a estimulação e ensino de um adulto, a criança não se desenvolveria.
E a escola? Qual era o papel da escola nessa teoria? E a função do professor? Registre suas
ideias no TCA.
RELEMBRANDO
Voltando aos nossos exemplos, podemos dizer que a frase “a criança é uma folha em branco”
supõe que a criança, ao nascer, não traz nenhuma característica inata: cabe ao meio dar‑lhe
conhecimento. Assim também, “é de pequenino que se torce o pepino” quer dizer que é de
pequena que a criança deve ser educada e corrigida pelo adulto.
Muitas vezes os professores que atuam diretamente com as crianças recebem respostas
inesperadas quando propõem algumas atividades, são surpreendidos com determinados
comportamentos que elas manifestam, mostrando que são capazes de compreender,
raciocinar, contestar, deduzir, fantasiar, ter desejos, imaginar etc. A teoria ambientalista
não leva em conta essas características das crianças.
A teoria ambientalista não foi suficiente para explicar o desenvolvimento humano por-
que, ao considerar a criança como passiva, podendo ser controlada ou manipulada
pela situação, desconsiderava suas diferentes capacidades.
CURIOSIDADE
Empirista porque valoriza a empiria (experiência) que a criança tem com o meio em que
vive.
70 UNIUBE
“As crianças são como uma tela em branco. Nós, professores(as), temos as tintas e os pincéis,
e depende de nós o quadro que será pintado nessa tela”.
Que relações podemos fazer entre este exemplo e a Teoria Ambientalista? Registre a res‑
posta em seu Trabalho de Construção da Aprendizagem – TCA fundamentando com o que
estudou.
PESQUISANDO
De acordo com o que leu, essa teoria contribuiu para explicar o processo de desenvolvimento
humano? Explique. Registre suas respostas em seu TCA.
É por meio da interação com outras pessoas, adultos e crianças que, desde o nasci-
mento, o bebê vai construindo suas características: modos de agir, de pensar, sentir e
sua visão de mundo, seu conhecimento. Assim sendo, a ideia de interação, ou seja, de
ação partilhada envolvendo ações de, no mínimo, duas pessoas, é destacada. Sendo
uma ação partilhada, a interação é influenciada por características de ambos os parcei-
ros. A contribuição da criança dependerá de seu nível de desenvolvimento, o qual por
sua vez, irá influenciar na resposta da mãe ou daquele que dela cuida. Nessa visão, o
adulto assume importante papel de mediador na relação da criança com o meio.
Dentro dessa perspectiva, a escola articula‑se com a vida cotidiana. Considera‑se que
as crianças e os adolescentes já têm conhecimentos prévios, ou seja, conhecimentos
construídos em seu dia a dia, e que esses conhecimentos têm de ser levados em conta
na sala de aula. Torna‑se, portanto, importante que o professor escute o aluno, deixe
que ele coloque sua forma de ver e pensar a vida, e estimule sua criatividade, sua ação
e suas formas de expressão.
Assim, o desenvolvimento humano vai se dar nessa rede de relações, nesse jogo de
interações, em que diferentes papéis complementares são assumidos e atribuídos
pelos participantes.
2.4 Conclusão
O processo de aprendizagem, capaz de nos fazer crescer, deve ser interativo, dinâ-
mico e desafiador, para que possamos nos desenvolver enquanto sujeitos inteligentes,
capazes de pensar com rigor.
O tempo de cada ser humano, nesse processo, é relativo. Enquanto educadores neces-
sitamos estar atentos ao fato de que nossos alunos vivem momentos específicos, alguns
com mais intensidade vivem a sua adolescência, outros a sua infância, a questão não
é passar de fase unicamente, mas perceber os significados destas experiências para
cada um e desta forma repensar a ação pedagógica para educar melhor. Buscando
promover atividades e reflexões que contribuam para aprofundar o nível de abstração
dos nossos alunos, favorecendo a construção de conceitos científicos.
72 UNIUBE
Falar do desenvolvimento humano, também nos faz pensar enquanto educadores que
lidam com crianças, no papel importante que exerce a brincadeira. As crianças pequenas
experimentam desejos impossíveis de serem realizados imediatamente e para resol-
verem essa situação, envolvem‑se em um mundo imaginário, onde seus desejos são
realizáveis, via brinquedo. Portanto, ao brincar, as crianças desenvolvem a imaginação
e constroem relações reais de organização e convivência.
Nosso papel nesse processo não é simples, precisamos observar, registrar e rever como
encaminhar, para que a aprendizagem seja significativa e promova crescimento.
Resumo
Nascemos biologicamente em condições de aprender, porque nascemos com um
arcabouço biológico que nos possibilita isso. No entanto, somente midiatizados pela
linguagem, expressão de culturas, é que efetivamente nos desenvolvemos enquanto
sujeitos que aprendem, elaborando conceitos.
A criança é um ser social: porque, ao nascer, já se encontra inserida numa classe social,
em um grupo cultural, em uma comunidade linguística, e isto será determinante no seu
processo de desenvolvimento e na constituição de suas peculiaridades psíquicas e de
comportamento.
Leitura sugerida
FONTANA, Roseli; CRUZ, Nazaré. A abordagem piagetiana. In: Psicologia e trabalho pe-
dagógico. São Paulo: Atual, 1997.
UNIUBE 73
Atividades
Atividade 1
De acordo com o que você leu nesse roteiro de estudo, coloque V nas afirmativas
verdadeiras e F nas afirmativas falsas.
B ‑ ( ) Os animais são o seu corpo e estão determinados por ele. Significa que nenhum
tipo de animal possa aprender nada além do que está biologicamente programado.
C ‑ ( ) O fato de uma reação ser impulsiva ou irrefletida, não quer dizer que ela possa
ser caracterizada como instintiva.
Atividade 2
Escreva quais são os aspectos do desenvolvimento humano, citados no capítulo e
exemplifique duas características desenvolvidas em cada aspecto.
Referências
BOCK, Ana Mercês B. et al. A psicologia do desenvolvimento: o desenvolvimento humano. In:
Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
DAVIS, Cláudia; OLIVEIRA, Zilma de. Psicologia na educação. São Paulo: Cortez, 1994.
LOPES, Karina Rizek; MENDES, Roseana Pereira; FARIA, Vitória Líbia Barreto de. Livro de estudo:
Módulo II. Brasília: MEC. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de Educação a Distância, 2005.
MOREIRA, Mércia; COUTINHO, Maria Tereza da Cunha. Um estudo dos processos psicológicos de
desenvolvimento e aprendizagem humanos, voltados para a educação: ênfase nas abordagens
interacionistas do psiquismo humano. Psicologia da educação. Belo Horizonte: Editora Lê, 2001.
OLIVEIRA, Zilma Moraes; MELLO, Ana Maria; VITÓRIA et al. Creches: crianças, faz de conta & Cia.
Petrópolis: Vozes, 2001.
74 UNIUBE
PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. Trad. Maria Alice Magalhães D’Amorim e Paulo Sergio
Lima Silva. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
____. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Rio de
janeiro: Zahar, 1975.
Referências eletrônicas
Desenvolvimento
Capítulo
humano: reflexões
3
sobre a hereditariedade
e as influências do
meio ambiente
Judith Mara de Souza Almeida
Introdução
Neste capítulo, estudaremos sobre os quatro períodos evolutivos do ser hu‑
mano e as mudanças que ocorrem com as pessoas durante o seu ciclo de
vida.
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
• diferenciar os quatro grandes períodos evolutivos do ser humano
(infância, adolescência, idade adulta e velhice);
• relacionar esses quatro períodos evolutivos com o fator das condições
estáveis como aspecto que potencializa ou limita os processos de
adaptação e mudança no decorrer do desenvolvimento humano;
• estabelecer relações entre a influência da “hereditariedade versus
meio ambiente” quanto ao desenvolvimento mental do ser humano;
identificando as bases conceituais em que cada uma delas se apoia.
Esquema
3.1 Desenvolvimento humano
3.3 Infância
3.4 Adolescência
3.6 Velhice
3.8 Conclusão
Você já pensou em quantas mudanças ocorrem com as pessoas durante o ciclo de vida? E
com você?
Você já pensou em quantas mudanças ocorrem com as pessoas durante o ciclo de vida?
Vamos analisar as mudanças que ocorrem durante o ciclo vital observando os be‑
bês. Quando nascem, possuem peso e tamanhos diferenciados. Vão crescendo e se
transformando conforme os meses passam. Do primeiro ano de vida até a idade de
ir à escola, muitas mudanças ocorrem nos níveis psicológico, físico e motor. Essas
mudanças continuam no decorrer dos dias, meses e anos da existência humana. Mas,
é importante destacar ainda que há variações entre duas pessoas da mesma idade,
o que pode estar associado a fatores que interferem no desenvolvimento humano:
hereditariedade e meio ambiente.
Pois bem, esses não são os únicos fatores que interferem no desenvolvimento humano,
entretanto são esses dois fatores que serão discutidos nesta etapa do seu estudo e
depois de discuti‑los vamos também caracterizar os quatro grandes períodos do nosso
ciclo de vida. É importante que você relacione as características desses períodos aos
aspectos que potencializam ou limitam os processos de adaptação e mudança do
desenvolvimento humano.
Você será capaz de responder a essa e outras questões ao final da leitura deste ca‑
pítulo.
Por que será que somos similares aos outros seres humanos, mas, ao mesmo tempo, somos
diferentes deles e parecidos com nossos familiares?
EXPLICANDO MELHOR
A hereditariedade pode ser definida como o conjunto de processos biológicos que asseguram
que cada ser vivo receba e transmita informações genéticas por meio da reprodução. Cromos‑
somos, DNA e genes são os agentes responsáveis pela transmissão dessas características.
EXEMPLIFICANDO!
EXEMPLIFICANDO!
Nossa primeira reação quando olhamos para um recém‑nascido é observar bem e dizer:
“nossa, como parece com o ‘Fulano’!”. O ‘Fulano’ é sempre alguém muito próximo, o pai ou
a mãe, ou ainda, outra pessoa da família. Nesse sentido, se observarmos atentamente po-
demos concluir que temos muitas semelhanças físicas com nossos pais, irmãos ou parentes
mais próximos.
Mas não são somente aspectos da forma do corpo ou aparência que são transmitidos
por hereditariedade, herdamos também aspectos relacionados ao funcionamento dos
órgãos e ao nosso comportamento.
o período em que cursou o ensino médio aprendeu que a biologia é a ciência que
estuda a vida? Pois bem, por isso ela também se dedica às questões relacionadas à
hereditariedade desde a reprodução. Entenda melhor lendo o trecho a seguir, extraído
de Moore (2000, p. 32).
SAIBA MAIS
Explicações da biologia:
A partir do momento em que a célula germinativa humana amadurece, ela se subdivide por
um processo denominado meiose, posteriormente dá origem a células haploides, que são os
espermatozoides no homem e os óvulos na mulher. Essas células são também chamadas de
gametas. Cada espermatozoide ou cada óvulo contribui com 23 cromossomos para a formação
do ovo ou zigoto* no momento da fecundação. Assim, a fusão dos dois núcleos dos gametas
resulta em uma nova combinação cromossômica em que qualquer ser humano herda o mesmo
número de cromossomos tanto da mãe quanto do pai. Os cromossomos são estruturas em
forma de filamentos espiralados, ora longos, ora curtos, portadores dos genes responsáveis
pela transmissão da hereditariedade. No que diz respeito às combinações de cromossomos
dos gametas masculinos ou femininos, temos milhões de espermatozoides ou óvulos genetica‑
mente diferentes. Dessa forma, um casal pode produzir milhões e milhões de zigotos distintos.
Essa enorme possibilidade de combinações de cromossomos faz com que em uma mesma
família todos os irmãos, exceto os gêmeos idênticos, sejam geneticamente diferentes, mesmo
apresentando várias semelhanças físicas e psicológicas. (MOORE, 2000, p. 32)
Mas e os gêmeos? Então, se considerarmos apenas a explicação acima, eles são iguais?
Percebemos, então, que as informações genéticas são transmitidas por meio dos genes,
porções de informações contidas no DNA dos indivíduos e que o organismo humano
começa quando um espermatozoide paterno penetra no óvulo materno, havendo, dessa
forma, a fecundação. A partir daí um novo ser passa a existir e a se desenvolver de
maneira rápida. Agora, eu convido você a refletir comigo.
80 UNIUBE
Vimos que herdamos características físicas e comportamentais de nossos pais. Será que
herdamos também a inteligência?
Essa é uma das preocupações da psicologia. Sabe por quê? Porque se a inteligência pode
ser herdada de pai para filho, em que sentido a hereditariedade poderia contribuir para a
aprendizagem?
Já temos uma definição para a hereditariedade, agora precisamos definir o que seria
o fator ambiental. Este pode ser definido como a soma total de estímulos externos que
atingem um organismo vivo, de modo a traduzir o código genético determinado no
momento de sua concepção. Todos os seres humanos possuem genes que são re‑
cebidos dos pais. Esses genes funcionam como uma programação ou conjunto de
instruções que, quando traduzidos e decodificados pelo ambiente, determinarão as
estruturas cerebrais, principais responsáveis pelos comportamentos.
SAIBA MAIS
O ambiente natural abrange mais que o ambiente físico, pois ele é formado pelo grupo social,
constituindo-se ao mesmo tempo em um ambiente social, afetivo e cultural. Nesse sentido,
presta‑se ao exercício da perspectiva interacionista entre fatores biológicos e hereditários,
pois não dá para definir um sem o outro. Ao se constituir em uma rede de relações sociais,
associadas a um modo de vida e de exploração de recursos, o ambiente natural humano é
também interacional, nesse caso, no sentido social do termo. (BUSSAB, 2000, p. 8)
UNIUBE 81
IMPORTANTE!
Se você ainda estiver se perguntando o que a hereditariedade e o meio ambiente têm a ver
com a educação, leia, com atenção, as considerações, a seguir, que foram elaboradas por
Coll, Palácios e Marchesi (1995).
EXEMPLIFICANDO!
Imagine uma mãe conversando com o seu filho de dois meses enquanto troca as fraldas dele.
A reação do bebê pode ser de atenção por meio do olhar, no máximo a criança sorrirá para a
mãe, pois um bebê de dois meses, mesmo apresentando um cérebro e os órgãos de fonação,
é incapaz de falar. Isso significa que a parte fechada de nosso código genético estabelece
certo calendário maturativo para a aquisição da linguagem. Quando as bases maturativas
estão prontas, a interação da criança com o meio propicia a aquisição da linguagem a que a
criança está exposta, entretanto são os estímulos recebidos pelo contexto que vão determinar
o falar mais cedo ou mais tarde, apresentar um vocabulário mais ou menos rico, estruturar
melhor as sentenças.
82 UNIUBE
Coll, Palácios e Marchesi (1995) acrescentam ainda que, assim como a linguagem, também
acontece com a autoestima.
EXEMPLIFICANDO!
Qual será a reação de uma criança de dois anos se você perguntar a ela como vai sua auto-
estima?
É claro que você não será compreendido pela criança, pois o calendário maturativo dela não
permite que ela o compreenda e dê uma resposta ao seu questionamento. É o código genético
impondo a sua lei. Coll, Palácios e Marchesi (1995) explicam que os processos psicológicos
são possibilitados pelos genes que nos definem como membros da espécie, mas encontram‑se
limitados por um determinado calendário maturativo que determina o momento em que certas
aquisições são possíveis, e são finalmente determinados em sua realização pelas interações
da pessoa com seu meio.
Assim, conforme Coll, Palácios e Marchesi (1995, p. 19), podemos pensar e sentir,
porque o cérebro nos permite, ou seja, a parte fechada do código genético nos impôs
esse “pensar e sentir” em relação aos objetos, às outras pessoas e a nós mesmos,
entretanto é nossa relação com o mundo, nossa história pessoal em relação ao meio
no qual crescemos e nos desenvolvemos, e não a evolução da espécie, que determina
como nos sentimos em relação ao meio e às experiências da vida.
IMPORTANTE!
Por que será que somos similares aos outros seres humanos, mas ao mesmo tempo, somos
diferentes deles e parecidos com nossos familiares?
Acreditamos que, até aqui, já apresentamos reflexões que nos indicam algumas pos‑
síveis respostas, mas Coll, Palácios e Marchesi (1995), baseados em Wallon (1934),
esclarecem que “o meio mais importante no que se refere ao desenvolvimento é o
meio humano, o meio social e não o meio material”. Isso significa que os objetos, os
estímulos não são mais importantes que as relações que as crianças mantém com eles
na mediação com o adulto. Nesse sentido, podemos estabelecer relação entre esse
pensamento e a teoria sociointeracionista de Vygotsky, que defende que é, principal‑
mente, nas interações com os pares que as pessoas constroem conhecimento. Assim,
a escola é considerada um ambiente privilegiado para construção de conhecimento, é
o lugar do conhecimento sistematizado e lugar de relação entre diferentes modos de
ser e agir, diferentes culturas e o papel da educação é determinado, em grande parte,
pelo grau de abertura do código genético:
Outro fator importante e que merece a nossa atenção é que, até aqui, consideramos pes‑
soas com desenvolvimento normal, entretanto se há alguma deficiência ou transtorno, o
papel da educação é fundamental para o desenvolvimento máximo das potencialidades
da criança. Mas, para tanto, é importante conhecer qual é a deficiência, suas origens,
como a criança se relaciona com o meio e com as outras pessoas para, posteriormente,
planejar uma intervenção educativa que favoreça o desenvolvimento global da criança
e, ao mesmo tempo, respeite suas limitações. Posteriormente discutiremos um pouco
mais sobre essa questão, agora vamos diferenciar os quatro grandes períodos evolu‑
tivos do ser humano: infância, adolescência, idade adulta e velhice.
3.3 Infância
Como já afirmado anteriormente por Coll, Palácios e Marchesi (1995), nos primeiros
anos de vida nosso desenvolvimento é fortemente canalizado, determinado pela parte
fechada do código genético e, portanto, por um calendário maturativo. Nesse sentido,
mesmo as crianças que recebem poucos estímulos do meio alcançam os níveis básicos
de desenvolvimento. O que não significa que o desenvolvimento infantil seja indepen‑
dente da estimulação, mas entre um ano e meio e dois anos, as crianças, normalmente,
já atingiram os níveis básicos de desenvolvimento.
EXEMPLIFICANDO!
Quando nasce, a criança é capaz de fixar o olhar em luzes ou objetos de cores fortes, esses
últimos por um período de tempo menor. Aos dois meses, começa a coordenar a fixação
binocular, posteriormente passa a reagir a cores e seguir os objetos em movimento e vai a
cada dia avançando na capacidade de enxergar e reagir aos estímulos visuais. Esse desen-
volvimento vai se sucedendo e constitui a base para atividades mais complexas envolvendo
a visão, por exemplo, a percepção de detalhes, a discriminação de objetos por semelhanças
e diferenças etc.
UNIUBE 85
Coll, Palácios e Marchesi (1995) ressaltam que a interação do ser humano com o am‑
biente é mediado pela cultura desde o momento do nascimento, sendo que os adultos
são os principais mediadores que auxiliam a criança, primeiramente assimilarem as
experiências culturalmente organizadas. Nesse sentido, a família tem papel funda‑
mental, a criança aprende por observação, por imitação ou participação em situações
cotidianas. Posteriormente, na escola, a criança tem contato com o saber sistematizado,
com atividades educativas diferenciadas das atividades cotidianas por estas últimas
apresentarem objetivos específicos relacionados à educação, à formação do cidadão
ativo e participativo em relação à esfera social da qual faz parte.
3.4 Adolescência
É a etapa que se estende dos 12/13 anos até, aproximadamente, o final da segunda
década de vida. É um período de transição, em que não se é mais criança, tampouco
adulto. Há aqueles que afirmam que é um período oferecido aos jovens para que eles
se preparem para exercer seu papel de adultos.
Nessa etapa da vida, o jovem busca a consolidação da sua autonomia frente ao entorno,
assim sendo, interioriza pautas culturais, mas sempre estabelecendo com elas uma
relação de julgamento e valor. Nessa fase, há também a busca de aperfeiçoamento de
habilidades técnicas, comunicativas e sociais.
SAIBA MAIS
Predomina nesta etapa uma longa continuidade, entretanto nas mulheres sadias há
uma descontinuidade no período da menopausa, quando cessam a ovulação e a mens‑
truação. Esse fato ocorre entre 45 e 50 anos, aproximadamente.
No que diz respeito aos relacionamentos, a fase adulta é o período em que se busca
a felicidade nesse aspecto.
PESQUISANDO NA WEB
Arnaldo Jabor escreveu um texto interessante, “Ser adulto”, sobre essa frase. Se quiser lê‑lo,
acesse:
<http://recantodasletras.uol.com.br/artigos/1453766>.
UNIUBE 87
3.6 Velhice
Por volta de 65 a 75 anos, o ser humano entra na lógica biológica da velhice. Nessa
fase, destaca‑se a deterioração que teve início na fase adulta: perda da elasticidade
muscular, reduções perceptivas que afetam principalmente a visão, diminuição do
tempo de reação etc.
A etapa que antecede a morte dá lugar ao que se denomina “descida terminal”, expres‑
são que se refere à redução da capacidade intelectual e alterações da personalidade
(PALÁCIOS, 1995, p. 320).
Nosso ciclo de vida acaba quando chega a morte, etapa em que nossos entes queridos
geralmente vivenciam sentimentos de luto e aflição. A intensidade desses sentimentos
depende das relações que se tinha com o falecido e também de sua idade, ou seja, a
morte de uma pessoa idosa é geralmente enfrentada com menos dor que a morte de
um jovem.
“Esta criança não está pronta para aprender a escrever, não tem maturidade.”
É certo que essas questões de maturidade, prontidão, aptidão, inteligência são bastante
discutidas e questionadas na atualidade, principalmente as referentes à prontidão. Po‑
demos citar, por exemplo, a pesquisadora Emília Ferreiro que defende que as crianças
não precisam passar por um período preparatório antes da alfabetização, pois elas se
desenvolvem nas interações e brincadeiras do dia a dia. Entretanto, para pesquisadores
que defendem a vertente inatista‑maturacionista – maturidade, prontidão, aptidão – são
88 UNIUBE
Pode parecer estranho tentar relacionar os fatores genéticos com a abordagem psicoló‑
gica da maturidade, das aptidões e da inteligência, mas para os teóricos dessa vertente,
assim como herdamos de nossos pais a cor dos olhos e dos cabelos, herdamos também
aptidões e inteligência. Assim, de acordo com a perspectiva inatista-maturacionista,
aptidão e inteligência estão determinados biologicamente quando a criança nasce,
dessa maneira, não dependem de aprendizagem e experiência.
EXPLICANDO MELHOR
CURIOSIDADE
Observando crianças de diferentes raças, o pesquisador Alfred Binet percebeu que crianças
brancas e negras, devido à herança genética de suas raças, apresentavam desempenho
diferente em relação à execução de tarefas. Assim, Binet foi um dos pioneiros a utilizar testes
UNIUBE 89
SAIBA MAIS
Alfred Binet (1857‑1911) formou‑se em medicina, mas interessou‑se pela psicologia da criança
e do deficiente. Participou de uma comissão de médicos, educadores e cientistas que ela‑
boravam instrumentos que permitissem identificar as crianças mentalmente deficientes. Em
conjunto com Théodore Simon, elaborou a primeira escala para medida da inteligência. Essa
escala passou por revisões e ainda inspirou a elaboração de outros testes de inteligência. No
Brasil, seus estudos e testes tiveram início em 1916, com educadores ligados ao Laboratório
de Psicologia do Rio de Janeiro. (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 13)
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
QI – quociente intelectual
É basicamente definido como uma comparação entre a idade mental e a idade real (cronoló‑
gica) da criança. A idade mental é determinada pelo número de tarefas que a criança consegue
resolver corretamente em um teste. Suponhamos que uma criança de 8 anos consiga resolver
todos os problemas propostos para a idade de 10 anos, mas nada além desse nível. Diremos
que a idade mental da criança é de 10 anos e, para calcular o QI, dividiremos 10 por 8, o que
dá um resultado de 1,25. Por convenção, esse resultado é multiplicado por 100, para que o
QI possa ser expresso por em números inteiros. Isso significa que a criança tem um QI de
125, que é considerado acima da média. QI = idade mental x 100: idade cronológica. Assim,
quando a idade mental e idade cronológica forem as mesmas, o QI será sempre 100. Se a
idade mental for inferior à idade cronológica, os resultados serão sempre inferiores a 100, o
que implicará um QI abaixo da média. No exemplo dado o QI apresentou‑se acima da média.
(FONTANA; CRUZ, 1997, p. 15)
EXEMPLIFICANDO!
Sobre o desenvolvimento motor das crianças, por exemplo, primeiro elas conseguem rolar,
depois sentar com apoio, com o tempo elas adquirem equilíbrio para sentar sem apoio, co‑
meçam a se arrastar de um lugar a outro. Com o tempo as crianças ficam de pé se apoiando
em móveis, dão os primeiros passos com apoio, engatinham, andam sozinhas, sem apoio.
As crianças que não apresentam nenhuma deficiência ou algum problema que afete o desen‑
volvimento motor conseguem realizar essa sequência de ações mais ou menos na mesma
idade, o que sugere que existe um padrão de desenvolvimento humano.
SAIBA MAIS
Arnold Gesell (1880 ‑ 1961) foi um pesquisador americano que se destacou devido às teorias
que elaborou sobre o papel da maturação no desenvolvimento humano. Em 1915, Gesell
passou a empregar a psicologia com vistas a proporcionar apoio pedagógico às crianças de‑
sadaptadas e passou a ser considerado o primeiro psicólogo escolar norte‑americano. Gesell
preocupou‑se com a criação de uma ciência do desenvolvimento humano que integrasse
todos os recursos da psicologia experimental, da biologia evolutiva e da neurofisiologia, de
1920 a 1961, dedicou‑se à pesquisa científica e à publicação de livros e artigos. (FONTANA;
CRUZ, 1997, p. 15)
EXEMPLIFICANDO!
Imagine uma criança que permanece muito tempo deitada no berço e não é colocada no
chão. Certamente, ela vai demorar um tempo maior para sentar, engatinhar e andar. Entre‑
tanto, em condições adequadas, seu desenvolvimento aconteceria no ritmo e na sequência
determinados pela maturação.
Inspiradas em Binet e Gesell, Fontana e Cruz (1997) afirmam que para os inatistas‑
‑maturacionistas: pouco importa o lugar ou as condições em que as crianças vivam, ou
mesmo as possibilidades educacionais a que tenham acesso, mas a criança “normal”
apresenta comportamentos característicos ao seu desenvolvimento em determinada
faixa etária.
Você se lembra do relato de Binet sobre diferenças na execução de tarefas por crianças brancas
e negras? Pois bem, pensemos agora como Binet e Gesell chegaram às suas conclusões: o
primeiro sobre a inteligência e o segundo sobre o desenvolvimento?
Binet e Gesell não tinham como objetivo estudar questões relativas à aprendizagem, até
porque acreditavam que aquilo que a criança aprende no decorrer da vida não interfere
no processo de desenvolvimento. Para esses pesquisadores acontece exatamente o
UNIUBE 93
Mas, é importante realizarmos uma pausa para reflexão: o que há de negativo em relação
à prontidão? Registre suas reflexões antes de continuarmos nossa discussão.
IMPORTANTE!
Há algum tempo, não muito distante, as crianças com déficits de inteligência eram enca‑
minhadas para salas especiais, devido às dificuldades que apresentavam. Atualmente,
com a perspectiva da educação inclusiva, elas são encaminhadas para o atendimento
educacional especializado.
Você sabe o que vem a ser o AEE – sigla utilizada para o nome Atendimento Educacional
Especializado? O que você sabe sobre isso?
94 UNIUBE
Com essas mudanças, você acredita que já podemos falar em inclusão de pessoas com ne‑
cessidades educacionais especiais? Converse com seus colegas e com seu (sua) preceptor(a)
sobre isso. Troque ideias!
Para que a inclusão ocorra de fato, precisamos mais que legislações impostas por polí‑
ticas públicas ou mesmo a garantia de matrícula do aluno que apresenta necessidades
educacionais especiais na escola comum, é necessário ainda garantir a sua perma‑
nência e também combater o preconceito em relação a essas pessoas, pois somente
recursos em salas multifuncionais não bastam.
Todas as teorias que estudamos nesta seção foram e continuam sendo importantes
também em relação à educação de pessoas com necessidades especiais, mesmo
sendo utilizadas considerando um padrão de normalidade, pois é a partir do que ficou
estabelecido para o desenvolvimento e a inteligência em determinada faixa etária, que
se percebe a necessidade de se avaliar os motivos e buscar o apoio de profissionais
especializados para possíveis intervenções quando há atrasos significativos no desen‑
volvimento provenientes de deficiências: mental, sensorial ou física.
UNIUBE 95
3.8 Conclusão
Este capítulo possibilitou a compreensão do desenvolvimento a partir da lógica que
descarta o social e considera somente o biológico e também a partir da vertente
que defende a interação entre ambos.
Com as ideias aqui apresentadas, objetivamos suscitar reflexões sobre a relação entre as
teorias estudadas e a educação, pois essas teorias interferem em nossas concepções de
educação e, consequentemente, em nosso fazer pedagógico do dia a dia da sala de aula.
Para finalizar, é importante ressaltar que biológico e social são aspectos que não se
excluem, mas se complementam para a constituição de um ser complexo, o ser humano,
que é ao mesmo tempo biológico, social, cultural, histórico e ideológico.
Resumo
• A hereditariedade pode ser definida como o conjunto de processos biológicos que
asseguram que cada ser vivo recebe e transmite informações genéticas por meio
da reprodução.
• O conceito de canalização refere‑se ao fato de que os seres humanos são mais se-
melhantes entre si quanto menores forem. O período sensório-motor está fortemente
canalizado, ou seja, determinado pela parte fechada do código genético.
Leitura sugerida
FONTANA, R.; CRUZ, M. N. A abordagem inatista‑maturacionista. In: Psicologia e
trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997.
UNIUBE 97
Nesse capítulo, as autoras discutem temas como a questão das diferenças individuais
e a hereditariedade da inteligência; os padrões do desenvolvimento; a construção dos
testes de inteligência, a elaboração das escalas de desenvolvimento; os comporta-
mentos típicos, as relações entre desenvolvimento e aprendizagem e as influências do
inatismo‑maturacionismo na escola.
Atividades
Atividade 1
Com base nos estudos, responda as seguintes questões:
Por que os seres humanos apresentam características tão comuns, mas ao mesmo
tempo se diferenciam da maioria?
Por que apresentam semelhanças físicas em relação aos parentes mais próximos?
Atividade 2
Qual a importância do calendário maturativo para os pesquisadores da teoria inatista-
‑maturacionista?
Referências
BRUNO, M. M. G. Deficiência visual: reflexão sobre a prática pedagógica. São Paulo: Laramara, 1997.
COLL, C.; PALACIOS, J.; MARCHESI, A. Desenvolvimento psicológico e educação. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995, v. 1.
FONTANA, R.; CRUZ, M. N. Psicologia e trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997.
Capítulo A dimensão
4 biológica dos seres
vivos
Introdução
O desenvolvimento humano inicia-se ainda dentro da barriga da mãe e tem
continuidade durante toda a vida do ser humano, perpassando pela genética
da espécie humana e pelos contextos no qual o indivíduo está inserido.
Dessa forma, visando oferecer uma sequência didática e que facilite a com‑
preensão sobre todo o conhecimento que perpassa o desenvolvimento hu‑
mano, a seguir explicita‑se como foram organizados os conteúdos de que
iremos tratar, bem como os objetivos a serem alcançados ao final dos estudos
de cada um dos itens relacionados:
UNIUBE 99
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
Esquema
4.1 Contextualização biológica dos seres vivos
4.2.1 A mitose
4.2.1.1 Prófase
4.2.1.2 Metáfase
4.2.1.3 Anáfase
4.2.1.4 Telófase
4.2.2 A meiose
4.2.2.1 Prófase I
4.2.2.2 Metáfase I
4.2.2.3 Anáfase I
4.2.2.4 Telófase I
4.2.2.5 Prófase II
4.2.2.6 Metáfase II
4.2.2.7 Anáfase II
4.2.2.8 Telófase II
4.3.2 A gametogênese
4.3.3 A espermatogênese
UNIUBE 101
4.3.4 A ovulogênese
4.3.5 A fecundação
4.4.4 A gastrulação
4.4.5 A organogênese
4.4.5.2 Âmnio
4.4.5.4 Alantoide
4.4.5.5 Placenta
4.6 Conclusão
A Terra abriga uma notável biodiversidade, com inúmeras espécies de seres que vivem
nos mais variados ambientes de toda a biosfera. Mas como surgiu toda esta diversidade
de seres vivos?
102 UNIUBE
EXEMPLIFICANDO!
Considerando o exemplo clássico das girafas, Lamarck supunha que, em tempos passados,
esses animais teriam pescoços curtos e membros anteriores com comprimento semelhante
ao dos posteriores. Viviam, porém, em ambientes onde a vegetação rasteira era relativamente
escassa; assim, teriam sido induzidas, por “solicitação” do ambiente, a se alimentar de folhas
situadas no alto das árvores. Na tentativa de terem acesso ao alimento, adquiriram então o
hábito de esticar o pescoço e as pernas anteriores. Com o uso frequente dessas estruturas,
elas foram se desenvolvendo e as características adquiridas foram lentamente sendo trans‑
mitidas de geração a geração, até resultar nas atuais girafas de pescoços longos e pernas
dianteiras desenvolvidas. (PAULINO, 2006, p. 133)
UNIUBE 103
Charles Robert
Em 1859, 30 anos após a morte de Lamarck, Charles Darwin,
Darwin que considerou algumas ideias do transformismo proposto por
Lamarck, propôs uma nova explicação para a diversidade de
Foi um naturalista seres vivos na Terra.
britânico que alcançou
fama ao convencer a
Segundo Paulino (2006, p. 134), para Darwin as diferenças
comunidade científica
da ocorrência da individuais entre indivíduos da mesma espécie já existiam
evolução. e eram apenas selecionadas naturalmente pelo ambiente,
tendendo então fixar os indivíduos portadores de variações
favoráveis e eliminar aqueles portadores de variações não favorá‑
veis naquele ambiente.
EXEMPLIFICANDO!
Gregor Johann A explicação de Darwin para a diversidade dos seres vivos foi
Mendel (1822-1884) satisfatória até meados do século XX, quando foram redesco‑
bertos os trabalhos de Gregor Mendel.
Foi um monge
agostiniano, botânico
e meteorologista aus- A partir dos trabalhos de Mendel foi possível entender melhor
tríaco, que estudou as a explicação de Darwin para a evolução, acrescentando‑se a
teorias da evolução ela o conceito de variabilidade genética (que são as mutações
e formulou as leis da
e as recombinações gênicas).
hereditariedade, hoje
chamadas de Leis
de Mendel. As Leis A reformulação da teoria de Darwin resultou na atual teoria
de Mendel regem que explica a evolução dos seres vivos, denominada neodar‑
a transmissão dos winismo ou teoria sintética da evolução. Esta última trata‑se
caracteres
hereditários.
104 UNIUBE
de uma ampliação das ideias de Darwin, explicando a causas das variações dos seres
vivos, ponto que o darwinismo não conseguiu explicar.
SINTETIZANDO...
Na tentativa de explicar a diversidade de vida na Terra, muitos estudiosos, entre o século XVIII
e XIX, aderiram ao fixismo, concepção que afirmava que a vida havia sido criada como ela
era e que era imutável com o passar dos tempos.
Em meados do século XIX, várias foram as transformações ocorridas e, dentre elas,a propo‑
sição de Lamarck para explicar a diversidade da vida. Para ele, a vida não era imutável, pelo
contrário, os seres sofriam transformações a partir da necessidade ocasionada pelo ambiente
e repassavam essas transformações sofridas para os seus descendentes.
A teoria da evolução, proposta por Darwin, só foi substituída na atualidade pela teoria sinté‑
tica da Evolução porque carecia de maiores explicações complementadas somente após o
ressurgimento dos trabalhos de Mendel.
Se toda a diversidade dos seres vivos surgiu com a evolução dos mesmos, quem terá
sido o primeiro ser?
Várias hipóteses foram formuladas na tentativa de explicar como teria surgido a vida
no planeta, dentre elas a da abiogênese ou geração espontânea, esclarecida por
Paulino:
Em meados do século XVIII, Francisco Redi, um biólogo italiano, abalou a ideia da ge-
ração espontânea. Provou que as larvas não nasciam em carne que ficasse protegida
por uma tela, tornando‑a inacessível às moscas. Dessa maneira, elas não poderiam
botar seus ovos na carne e, consequentemente, não nasceriam vermes na carne.
• Hipótese autotrófica: para defensores dessa hipótese os primeiros seres vivos teriam
sido autotróficos, ou seja, capazes de realizar a fotossíntese e produzirem o seu pró-
prio alimento (glicose) a partir dela. No entanto, sabe‑se que a síntese de alimentos
é bastante complexa, exigindo desse primeiro indivíduo bastante complexidade.
Essa hipótese contraria a teoria da evolução. Como poderiam os primeiros seres vivos
serem portadores de uma estrutura celular tão complexa e capaz de já realizarem a
síntese do seu alimento?
Os primeiros seres vivos teriam sido heterótrofos, isto é, incapazes de produzir seu
próprio alimento. Seriam formas relativamente simples de vida, surgidas pela evo‑
lução lenta da matéria inanimada, nas condições muito especiais da Terra primitiva.
(PAULINO, 2006. p. 97)
A partir do surgimento do microscópio, foi possível observar que os seres vivos, com
exceção dos vírus, são formados por células e que estas são constituídas de orga‑
nelas (estruturas capazes de executar diferentes funções responsáveis pela vida nos
organismos).
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
A palavra “célula” vem do latim: cellula (quarto pequeno). O nome descrito para a menor es‑
trutura viva foi escolhido por Robert Hooke. Em um livro que publicou em 1665, ele comparou
as células da cortiça com os pequenos quartos onde os monges viviam.
A célula representa a menor porção de matéria viva. São as unidades estruturais e funcionais
dos organismos vivos. Em nível estrutural podem ser comparadas aos tijolos de uma casa,
em nível funcional podem ser comparadas aos aparelhos e electrodomésticos que tornam
uma casa habitável. Cada tijolo ou aparelho seria como uma célula.
• Célula procariótica ou procarionte: são aquelas que não possuem membrana nuclear,
não tendo, portanto, um núcleo formado. Possuem apenas a membrana plasmática, o
citoplasma, os ribossomos e o material genético como seus componentes.
Figura 5: Ribossomos.
108 UNIUBE
Figura 8: Mitocôndria.
Fonte: Acervo EAD – Uniube.
Figura 9: Lisossomos.
110 UNIUBE
• Centríolos: são estruturas que atuam durante a divisão celular, nos animais.
Observe a figura que ilustra uma célula eucarionte com todas as suas organelas des-
critas anteriormente:
Quanto ao número de cromossomos que a célula possui, ela pode ser classificada
em:
• Célula diploides: são aquelas que possuem pelo menos um par de cromossomos
característicos da espécie, geralmente denominado por 2n.
As células podem ainda ser classificadas quanto ao seu envolvimento com a reprodu‑
ção:
• Células somáticas: são aquelas que não estão diretamente envolvidas com a re‑
produção. Exemplo: neurônio, hemácea.
Quando foi possível descobrir que os seres vivos são formados por células?
Como podem ser classificadas as células quanto à organização do material genético, número
de cromossomos e finalidade reprodutiva?
SINTETIZANDO...
Toda a biodiversidade existente é resultante do processo evolutivo dos seres vivos cujos pri‑
mórdios, segundo a hipótese heterotrófica, foram seres de grande simplicidade.
O descobrimento de que praticamente todo ser vivo é constituído por células tornou‑se pos‑
sível a partir do surgimento do microscópio, visto que grande parte das células não é visível
a olho nu.
Sendo a menor unidade que constitui um ser vivo, as células podem ser classificadas como
procariontes ou eucariontes quanto à organização do seu material genético; de haploides
112 UNIUBE
EXPLICANDO MELHOR
Todos nós, seres humanos, somos oriundos de uma única célula denominada
célula‑ovo ou zigoto. Foi essa célula que, por meio de sucessivas divisões,
propiciou a formação do nosso organismo, dotado de trilhões de células, que
nos conferem uma estrutura notavelmente harmoniosa. Basicamente, essas
células podem ser agrupadas de duas maneiras diferentes: as células so‑
máticas – associadas com a manutenção da vida no indivíduo – e as células
germinativas – destinadas à perpetuação da espécie.
Por essa resumida descrição, podemos notar que muitas células, ao serem
produzidas, contêm o mesmo número de cromossomos existentes nas células
que lhes deram origem. De fato, a partir de um zigoto diploide formam‑se
células somáticas e germinativas igualmente diploides. Entretanto, algumas
células exibirão apenas a metade do número de cromossomos existentes nas
células‑mães que dividiram; é o caso dos gametas haplóides que resultam
das divisões sofridas pelas células germinativas diplóides.
Assim, podemos distinguir nos seres vivos, em geral, dois tipos básicos de
divisão celular: a mitose, processo através do qual as células‑filhas conterão
o mesmo número de cromossomos existentes na célula‑mãe; e a meiose,
divisão em que as células‑filhas conterão a metade do número de cromos‑
somos existentes na célula‑mãe. (PAULINO, 2006, p. 168)
UNIUBE 113
4.2.1 A mitose
4.2.1.1 Prófase
Fonte: <http://
pt.wikipedia.org>.
4.2.1.2 Metáfase
Cromátide
É cada um dos
dois filamentos de
DNA formados pela
duplicação de um
cromossomo. Figura 13: Metáfase.
Fonte: Acervo EAD – Uniube.
Fonte: <http://
pt.wikipedia.org>.
4.2.1.3 Anáfase
4.2.1.4 Telófase
SINTETIZANDO...
Como se pode perceber, a mitose é um tipo de divisão celular na qual as células‑mães (aquelas
que serão reproduzidas) são multiplicadas e geram novas células (as células‑filhas) com a
mesma quantidade de material genético que as que lhe deram origem.
Mas, qual é a importância da mitose para os seres vivos? A mitose é uma divisão celular
importante, porque ela torna possível:
116 UNIUBE
4.2.2 A meiose
4.2.2.1 Prófase I
4.2.2.2 Metáfase I
4.2.2.3 Anáfase I
Cada par de cromátide (cromossomo homólogo) migra para os polos da célula, as fibras
do fuso meiótico encolhem.
4.2.2.4 Telófase I
4.2.2.5 Prófase II
4.2.2.6 Metáfase II
4.2.2.8 Telófase II
SINTETIZANDO...
A meiose é uma divisão celular reducional, ou seja, a célula‑mãe dá origem a quatro células‑
‑filhas, porém com a metade do número de material genético que continha a célula‑mãe.
EXEMPLIFICANDO!
Assim como a mitose, a meiose também tem grande importância na manutenção da vida; é
por meio dessa divisão que se dá a formação dos gametas, garantindo‑se, assim, a perpe‑
tuação das espécies.
120 UNIUBE
DICAS
A mitose é uma divisão celular típica de células somáticas, que estão associadas à manuten‑
ção da vida. Já a meiose é típica de células germinativas, que são destinadas à perpetuação
das espécies.
Sobre a divisão celular, podemos também discutir sobre as células‑tronco. Veja, a seguir,
o trecho extraído da Wikipédia que ilustra melhor esse assunto:
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Células‑tronco
As células‑tronco, também conhecidas como células‑mãe ou, erradamente, como células es‑
taminais, são células que possuem a melhor capacidade de se dividir dando origem a células
semelhantes às progenitoras.
O principal objetivo das pesquisas com células‑tronco é usá‑las para recuperar tecidos
danificados por essas doenças e traumas. São encontradas em células embrionárias e em
vários locais do corpo, como no cordão umbilical, na medula óssea, no sangue, no fígado, na
placenta e no líquido amniótico.
Como vimos, a ciência utiliza desses conhecimentos para melhorar a nossa vida!
Legenda
1 Bexiga urinária
2 Púbis
3 Pênis
4 Corpos cavernosos
5 Glande
6 Prepúcio
7 Abertura da uretra
8 Intestino grosso
9 Reto
10 Vesícula seminal
11 Ducto ejaculatório
12 Próstata
13 Glândula bulbouretral
14 Ânus
Figura 20: Sistema genital masculino. 15 Ducto deferente
Fonte: Acervo EAD – Uniube. 16 Epidídimo
17 Testículo
18 Escroto
• Testículos: constituído de túbulos seminíferos que são os locais onde são produzidos
os gametas masculinos (espermatozoides).
• Epidídimo: enovelado de túbulos que ficam na parte superior dos testículos, encar-
regados de armazenar temporariamente os espermatozoides formados nos túbulos
seminíferos.
• Ducto ejaculatório: canal que recebe o líquido encaminhado pelo ducto deferente
contendo espermatozoides, líquido seminal e da próstata e os encaminha para a
uretra.
• Pênis: órgão copulador masculino que abriga a uretra. Quando estimulado, projeta
o sêmen para fora do corpo masculino.
122 UNIUBE
CURIOSIDADE
Você sabia que problemas na ereção podem ser indício de câncer de próstata? Se quiser saber
mais, acesse: <http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A2ncer_de_pr%C3%B3stata>.
CURIOSIDADE
Por ano, há aproximadamente 500 mil casos novos de câncer de colo de útero no mundo.
Se quiser saber um pouco mais sobre isso, acesse: <http://www.inca.gov.br/conteudo_view.
asp?id=326>.
4.3.2 A gametogênese
4.3.3 A espermatogênese
Espermatogônias
No homem, as células germinativas primordiais transformam‑
-se em espermatogônias (2n) e, após passarem pelas fases
São células que da multiplicação, crescimento, maturação e diferenciação, dão
darão origem aos origem aos espermatozoides (n). Estes vão se acumulando nos
espermatozoides. tubos seminíferos.
4.3.4 A ovulogênese
4.3.5 A fecundação
EXPLICANDO MELHOR
CURIOSIDADE
Além do material genético que cada um dos gametas contribui para a formação do zi-
goto, os óvulos acumulam vitelo que é o material encarregado da nutrição do embrião.
O vitelo garante o desenvolvimento do zigoto nos estágios iniciais.
Artrópodes
Caracteriza‑se pela presença de vitelo na região central do
óvulo, ao redor do núcleo, sendo observado na maioria dos
Grupo de animais
artrópodes. No processo de clivagem, a segmentação desse
invertebrados
caracterizados por tipo de ovo é a meroblástica superficial. Nesse caso, o núcleo
possuírem membros sofre várias divisões e os núcleos formados migram para a parte
rígidos e articulados. periférica do ovo, organizando os blastômeros.
Ex.: aranhas, formigas.
• por volta de 30 horas após a fecundação, essas células se dividem em quatro blas-
tômeros, depois em oito blastômeros, e assim por diante. Enquanto essas divisões
estão ocorrendo, o zigoto segue na tuba uterina em direção ao útero;
Segundo Moore (2000, p. 4), depois de aproximadamente quatro dias após a fecundação,
a mórula entra no útero, e um fluido do útero penetra na mórula, formando um espaço
dentro dela cheio de fluido. Com isso, os blastômeros separam‑se em duas partes:
UNIUBE 129
• os trofoblastos: uma fina camada externa de células que dará origem à parte em‑
brionária da placenta;
RELEMBRANDO
O desenvolvimento humano inicia‑se logo após a fecundação. O zigoto passa por várias
clivagens enquanto caminha nas tubas uterinas em direção ao útero. Nesse percurso,
ele passa pelos estágios de blastômeros, mórula e blastocisto. Ainda no estágio de mórula,
dá‑se o início de implantação no útero que, auxiliada pelo sinciciotrofoblasto, células extre‑
mamente invasivas do epitélio do endométrio. Ao final da primeira semana, o blastocisto está
implantado superficialmente no endométrio.
130 UNIUBE
O blastocisto também pode implantar‑se em locais fora do útero! Esse tipo de gravidez
é chamada de ectópica.
CURIOSIDADE
Além da gravidez ectópica, o embrião corre outros riscos em suas primeiras semanas
de gestação, e um deles é o aborto espontâneo. A maioria deles ocorre durante as três
primeiras semanas.
É difícil determinar a frequência com que este tipo de aborto acontece porque eles ocor‑
rem sem, às vezes, a mulher saber que estava grávida. É comum acontecer logo após
o atraso da menstruação. Como o embrião é muito pequeno, é eliminado juntamente
do sangue e passa despercebido.
Como você pode ver a seguir, as causas dos abortos espontâneos podem ser variadas,
mas segundo Carr e Gedeon (1977) apud Moore (2000), calcula‑se que 50% de todos
os abortos espontâneos registrados resultam de anormalidades cromossômicas.
CURIOSIDADE
IMPORTANTE!
4.4.4 A gastrulação
Gastrulação é o processo por meio do qual as células embrionárias são totalmente remo‑
deladas, originando a gástrula e definindo o plano corporal do futuro animal.
No início da terceira semana de gestação, tem‑se a blástula (uma esfera cheia de líquido)
que diferencia um polo animal e outro vegetal. As células do polo animal dividem‑se
mais lentamente que as do polo vegetal. As do polo vegetal invaginam‑se, fazendo
com que o líquido no interior da blástula desapareça. Forma‑se, então, o arquêntero,
também chamado de intestino primitivo.
4.4.5 A organogênese
A partir desse estágio de formação do tubo neural, a gástrula passa a ser chamada de
nêurula, que abrange o início da formação dos órgãos (organogênese).
Depois da formação dos somitos, a mesoderme situada entre eles e abaixo do tubo
neural diferencia‑se e organiza um eixo de sustentação denominado notocorda.
Vesícula vitelínica, ou saco vitelínico, é um anexo que tem função, na maioria dos ani-
mais, de nutrir o embrião, permanecendo ligado ao intestino. À medida que o embrião
se desenvolve e faz o consumo do vitelo, consequentemente o saco vitelínico vai se
reduzindo até desaparecer.
Nos mamíferos, essa função não é muito relevante o papel de nutrir o embrião é
da placenta.
4.4.5.2 Âmnio
Trata‑se de uma membrana que envolve o embrião e os demais anexos. Ele ocorre
nos répteis, aves e mamíferos, mas nestes últimos contribui para a fixação do embrião
na parede do útero.
134 UNIUBE
4.4.5.4 Alantoide
O alantoide ocorre nos répteis, aves e mamíferos. Nos répteis e aves, ele tem
como função:
• armazenar excretas;
No entanto, nos mamíferos ele não tem essas mesmas funções descritas anteriormente.
Ele apresenta‑se reduzido e associado ao córion, participando apenas da formação
da placenta.
4.4.5.5 Placenta
CURIOSIDADE
A placenta humana impede moléculas de alto peso molecular entrarem em contato com o feto.
Mãe e feto nunca têm o sangue misturado, uma vez que os vasos sanguíneos de ambos não
são contínuos, ou seja, existe uma solução de continuidade que é preenchida pelo sistema
artério‑venoso da placenta, por si só um filtro importante. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/
Placenta>.
• a formação do blastocisto;
• a formação do hipoblasto;
• a gastrulação;
136 UNIUBE
• a neurulação;
• a formação da notocorda;
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
Como a placa neural, primórdio do Sistema Nervoso Central, aparece durante a terceira se‑
mana e dá origem às pregas neurais e ao início do tubo neural, a perturbação da neurulação
pode causar anormalidades graves do encéfalo e medula espinhal. Os defeitos do tubo neural
(NTDs) estão entre as anomalias congênitas mais comuns (FILLU, 1991). Estima‑se que, no
leste dos Estados Unidos, a incidência de NTDs chegue a 16 por 10.000 nascimentos (GRE‑
ENBERG et al., 1983). (MOORE, 2000, p. 61)
• o dobramento do embrião;
• a conclusão da neurulação.
• comum nesta fase a hérnia umbilical, um evento normal no embrião, que ocorre
é
porque a cavidade abdominal é pequena demais para acomodar o intestino.
4.6 Conclusão
O reconhecimento das dimensões biológicas dos seres vivos é necessário e envolve
a compreensão da origem da biodiversidade, origem da vida, bem como o estudo da
célula. A compreensão e discernimento das células haploides e diploides, dos tipos de
organização da célula, bem como das divisões celulares que acontecem em células
somáticas e germinativas é essencial para o entendimento do processo realizado na
gametogênese.
Resumo
Tamanha é a diversidade de vida na Terra que, já há algum tempo, estudiosos dedicaram-
‑se à pesquisa sobre a origem dessa diversidade. Por um longo tempo, a ideia fixista
de que os seres vivos eram imutáveis teve muitos adeptos, no entanto, prevaleceu o
evolucionismo.
O primeiro evolucionista foi Lamarck, porém, suas ideias não tinham fundamento
científico. Posteriormente, as ideias de Darwin culminaram na elaboração da Teoria da
Evolução que explica cientificamente a variedade de vida entre os seres vivos. A atual
teoria que explica a evolução é a Teoria Sintética da Evolução, uma reformulação da
teoria de Darwin, acrescida do conhecimento das descobertas de Mendel.
Descoberta a origem da biodiversidade, uma nova questão surgiu: quem teria sido o
primeiro ser vivo na Terra? Várias foram as hipóteses propostas, dentre elas a pansper-
mia, a hipótese autotrófica e a heterotrófica. Esta última teve maior número de adeptos
por considerar a simplicidade do primeiro ser, bem como a evolução a partir dele.
Como todo ser vivo, com exceção dos vírus, é formado por células, a partir do surgi-
mento do microscópio, tornou‑se possível o estudo delas. Elas podem ser classifica-
das quanto à organização do material genético (se são procariontes ou eucariontes);
UNIUBE 139
Atividades
Atividade 1
As figuras 1 e 2 representam divisões celulares que ocorrem nas células dos seres
vivos.
Figura 1 Figura 2
b) a Figura 2 trata‑se de uma divisão mitótica, a partir da qual originam‑se células com
a mesma composição genética;
c) a Figura 1 é uma mitose, divisão celular dividida em duas etapas: uma reducional e
outra equitativa;
Atividade 2
Elabore um esquema ou desenho que ilustre todos os órgãos que fazem parte do sis-
tema reprodutor masculino e o trajeto do espermatozoide, desde a sua formação até
a ejaculação.
140 UNIUBE
Referências
DISCOVERY CHANNEL. Gravidez: a vida antes do nascimento. 1 videocassete (25 min.), color. São
Paulo: Abril Vídeos, 1995.
____. Sexo: a atração vital. 1 videocassete (25 min.), color. São Paulo: Abril Vídeos, 1995.
____. Segunda semana do desenvolvimento humano. In: Embriologia básica. Trad. Fernando Simão
Vergman. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.
____. Introdução à embriologia humana. In: Embriologia básica. Trad. Fernando Simão Vergman.
5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.
____. Reprodução humana. In: Embriologia básica. Trad. Fernando Simão Vergman. 5. ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.
____.Terceira semana do desenvolvimento humano. In: Embriologia básica. Trad. Fernando Simão
Vergman. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.
Referências eletrônicas
TERRA, Márcia Regina. O desenvolvimento humano na teoria de Piaget. Disponível em: <http://www.
unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/d00005.htm>. Acesso em: 8 dez. 2009.
Capítulo Aspectos
5 biopsicossociais
do desenvolvimento
infantil
Introdução
Neste capítulo iremos estudar a importância dos aspectos biológicos, psico‑
lógicos e sociais da criança para o seu desenvolvimento harmônico e pleno.
Gostaria que você atentasse para a ênfase que será dada às características
de cada fase e também como o educador pode construir uma aprendizagem
mais científica a respeito do desenvolvimento infantil.
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
• compreender o desenvolvimento físico e psicossocial da criança;
• conhecer alterações que possam prejudicar o desenvolvimento físico
da criança;
• identificar o desenvolvimento e distúrbios psicomotores;
• identificar e utilizar métodos de prevenção e atuação deles;
• compreender a dinâmica mamãe/bebê e a evolução psicossocial da
criança;
• ser capaz de uma avaliação mais ampla num sistema aberto de análise
e atuação, considerando os diferentes contextos em que você, como
pedagogo, irá atuar: clínica, creches, escolas e hospitais.
Esquema
5.1 Desenvolvimento físico da criança
5.3.3 Prematuridade
5.3.6 Epilepsia
UNIUBE 143
Antes mesmo que a criança inicie seu desenvolvimento, Seria o retorno temporário
existem sinais que nos confirmam a prontidão desse bebê e não patológico a
uma fase anterior do
para que as aquisições sejam consolidadas. Estes sinais se desenvolvimento.
chamam reflexos. Os reflexos são “ensaios” da ação, ou seja, Exemplo: uma criança
em princípio são automáticos e involuntários, depois, pouco aprende a caminhar,
a pouco, na medida em que o sistema nervoso amadurece, mas a mãe se queixa
que ela deu os primeiros
transformar-se‑ão em ações na conduta consciente. Assim, passinhos e agora só
Cabrera e Palácios (1996) apontam os reflexos como previso- quer engatinhar. Essa
res nos quais poderemos observar se haverá desvios na nor- costuma ser uma fase
malidade da criança que se estuda. Esses sinais, ou reflexos curta de poucos dias, na
aparecem e desaparecem em idades determinadas. qual, mesmo sabendo
dar os passinhos, a
criança permanece
Quando a criança apresenta qualquer engatinhando. Seria
tipo de alteração, por mínima que seja, como se ela voltasse
esta se traduzirá como um transtorno de atrás um pouquinho para
desenvolvimento, o qual impedirá a apa- tomar coragem de investir
rição de uma correta integração funcional definitivamente na nova
[...] Desde o momento do nascimento, se aquisição.
146 UNIUBE
Para o observador, é mais fácil descobrir aqueles sinais que traduzem claramente a
situação do sistema nervoso do bebê. Aqui serão definidos aqueles que o professor
que trabalha na área de Educação Infantil deverá conhecer.
Haim Grunspun (1982) descreve os reflexos mais simples que serão definidos aqui.
Com esse guia prático, você poderá se beneficiar de uma observação preventiva no
seu trabalho. Preste atenção em cada um e observe em um bebê conhecido seu.
Idade em que
Idade em que Ausência do Persistência
Sinal não deve mais
aparece sinal tardia
persistir
Problemas de
desenvolvimento
Entre 3 e
Reflexo de do SNC 1, Paralisia
Nascimento 6 meses
moro fraturas de Cerebral
incompletos
clavícula ou
paralisia cerebral
4 meses
Problemas no
Reflexo de acordada Degeneração do
Nascimento desenvolvimento
sucção 7 meses SNC
do SNC
dormindo
Se apresenta
Reflexo de Problemas no
apenas em uma
preensão Nascimento 6 meses desenvolvimento
das mãos: Lesão
palmar do SNC
no SNC
Se apresenta em
Reflexo de Problemas no
apenas um dos
preensão Nascimento 10 meses desenvolvimento
pés: Lesão no
plantar do SNC
SNC
Lesão na medula,
Reflexo de problemas no Sem patologias
3 meses 18 a 24 meses
Landau desenvolvimento associadas
do SNC
1. SNC: Sistema Nervoso Central.
SAIBA MAIS
• sustenta a cabeça;
• arrasta‑se de barriga;
• dá passos;
• ri às gargalhadas;
• sorri ao espelho;
• indica cinco partes no corpo de uma boneca (Exemplo: braços, pernas e olhos);
CURIOSIDADE
Preste atenção aos itens dessa lista de exemplos na área da linguagem e constate algo
interessante. Um bebê surdo que seja estimulado desde cedo a comunicar‑se na língua de
sinais do seu país conseguirá vencer praticamente todos os itens aqui colocados. Ele emite
sons guturais, daí a impropriedade de chamá‑lo de surdo‑mudo. Ele não é mudo, pois tem
possibilidades de aprender a falar; solta gritos de alegria; diz três palavras (com sinais corretos,
ou tentativa dos sinais corretos, e essa tentativa é o “balbucio”, mesmo em língua de sinais),
e assim por diante em todas as solicitações da lista. Por isso essa área é também chamada
de Comunicação, que é um termo mais global. Nesse aspecto, um bebê surdo recebendo
estimulação precoce e sendo educado na língua de sinais de seu país, jamais pode ter seu
desenvolvimento considerado atrasado em qualquer escala ou exame.
Essas capacidades são mais facilmente adquiridas quando o meio é enriquecido por
pessoas que cuidam do bebê com interesse, brincam com ele, estimulam‑no, conversam
com ele e lhe oferecem objetos variados para que ele explore oportunidades diversas
(PEREZ‑RAMOS, 1996).
Decisões íntimas e não reveladas do tipo: “preciso ter filhos, pois a sociedade me exige
isso”, não tenderão a gerar a relação ideal da qual estou tratando aqui. O ser humano
nasce com uma necessidade de atenção, carinho e amor tão grande que pode muito
bem se equiparar à necessidade de alimentação e cuidados.
152 UNIUBE
Antes das pesquisas de Spitz, havia uma interessante discussão no meio científico.
Especialistas, como Sigmund Freud, por exemplo, diziam que na verdade o bebê só
demonstrava precisar da mãe porque esta satisfazia suas necessidades físicas, tais
como alimentação, higiene etc. Segundo eles, não havia provas de que essa criança
“amava” sua mãe, mas sim de que evidentemente “precisava” dela.
Uma incrível demonstração de que o amor materno vai além das necessidades físicas
foi feita pelo pesquisador Harry Harlow, na Universidade de Winscousin, nos Estados
Unidos (HILGARD, 1990). O doutor Harlow é autor do livro A natureza do amor (The
nature of love), um clássico na história da Psicologia infantil. Sobre isso, disse a psicó‑
loga Silvia Helena Cardoso:
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
No primeiro capítulo de seu livro Bebês e mamães (1981) são realizados os registros
acerca dos primeiros dias de vida da criança, considerando dois bebês diferentes, o
bebê normal e o bebê sossegado, dando aos leitores uma ideia global das caracte-
rísticas especiais de ambos.
Concordando com Spitz (1980), Brazelton (1981) deixa claro, também, que separar
a mãe do bebê é um problema sério enfrentado pela criança. Nos primeiros meses,
a criança sente a separação, mas varia muito de criança para criança. Entretanto,
quando completa seis ou sete meses, já reconhece a mãe perfeitamente e sente,
tremendamente, qualquer separação dela. Reconhece quando ela se prepara para
deixá‑lo e reage a isso com choro intenso. O autor coloca algumas experiências que
foram feitas no sentido do apego infantil, nas quais se percebeu que geralmente isso
ocorre com todos os bebês, porém em níveis diferentes.
Inicialmente, a sala desconhecida lhe causava desconforto de tal forma que sequer
explorava os brinquedos, depois a presença da pessoa estranha aumentava esse
desconforto. A saída da mãe era o ponto crítico do processo ansioso, no qual a criança
reagia chorando muito. Outras crianças mostravam pouca ansiedade em relação à
sala estranha e à pessoa estranha, e mesmo com a saída da mãe, continuavam a
exploração interessada dos brinquedos. Pode‑se perceber que crianças criadas em
creches desde pequenos tendem a estranhar menos lugares e pessoas diferentes.
essencial que a mãe cuide, sistematicamente, da sua relação com o bebê, pois a
cada etapa vencida no desenvolvimento da criança, aumenta-se o potencial cognitivo,
motor, social e comunicativo, segundo Piaget (1990).
Agora vamos estudar alguns problemas dos quais você provavelmente já ouviu falar
e que podem interferir no desenvolvimento da criança e no seu processo de apren‑
dizagem.
IMPORTANTE!
Em caso de incidentes com a criança, quanto mais cedo ele acontecer, mais prejuízo ele
poderá causar no desenvolvimento dela.
156 UNIUBE
Nessa perspectiva, Krynski (1983) alerta quanto aos cuidados necessários antes, du‑
rante e depois da gestação, tais como:
SAIBA MAIS
Raios X, delta e gama: Em linhas gerais são exposições a irradiações terapêuticas utilizadas
para tratamentos diversos. Costumam ser usadas nos tratamentos de câncer e seus sintomas.
Essas irradiações são notadamente prejudiciais à mãe e ao bebê. Em alguns casos, chegam
a ser prejudiciais mesmo antes da gravidez, causando alterações nas células que irão gerar
o feto. Em alguns países, os raios X não são usados, ou são usados com muito cuidado em
mulheres grávidas, pois a exposição tanto da mãe quanto do feto pode causar problemas de
desenvolvimento.
Drogas alucinógenas: drogas que causam estado alterado de consciência. Essas drogas
alteram o estado natural do indivíduo fazendo‑o ficar mais ativo, mais lento, mais alegre, mais
dinâmico, mais extrovertido, mais triste e mais pensativo, dependendo da droga que foi usada.
Algumas delas fazem a pessoa ver e ouvir coisas fora da realidade, esse efeito é conhecido
como “viagem”. Dependendo da droga e da pessoa que a utilizou, essa “viagem” pode ser
percebida como uma experiência boa ou como uma experiência terrível e assustadora. Es-
sas drogas podem gerar dependência psicológica e física. Algumas são tão poderosas que
a dependência já se estabelece na primeira vez que a droga é usada. Exemplos de drogas
alucinógenas: maconha, LSD, cocaína, heroína, crack etc.
Concepto: denominação destinada ao bebê, assim que nasce. Significa também: aquele que
foi concebido e nasceu.
Uma criança muito quieta e distraída precisa ser observada com cuidado, da mesma
forma que uma criança inquieta e bagunceira. A passividade extrema em uma criança
em desenvolvimento pode ser sinal de que algo errado está ocorrendo com ela. Por
outro lado, a inquietude pode estar associada a problemas neurológicos. Existe uma
excitabilidade natural que a criança apresentará, ao entrar em um ambiente ricamente
estimulativo e diferente para ela. Ali ela irá querer explorar aquilo que é tão interes-
sante e novo. Nessa exploração, você, professor poderá observar o que chamamos
de “hiperatividade útil”, na qual a criança pega um brinquedo, manipula‑o rapidamente,
larga para pegar outro e assim por diante, sempre explorando e tentando conhecer o
objeto. Entretanto existe a hiperatividade patológica na qual a criança vaga sem rumo
ou objetivos pelo ambiente e embora pegue alguns brinquedos e os largue, não se
beneficia de conhecer coisa alguma e quase sempre se mostra irritada e frustrada.
A seguir, vamos conhecer alguns dos problemas mais frequentes que afetam nossas
crianças em idade de desenvolvimento.
• e, por último, que seja feita paralelamente a Estimulação Precoce, que é o atendi-
mento às necessidades especiais dessas crianças, com a aproximação do meio e
a facilitação do desenvolvimento sem atrasos.
Iniciaremos os estudos dos incidentes que afetam a criança no início da vida a partir
da Síndrome de Down, por ser uma síndrome muito conhecida e por estar entre as
ocorrências de origem genética.
Esta seção pretende auxiliar você, professor(a), a estar preparado(a) para receber
uma criança portadora da Síndrome de Down com segurança, pois essa síndrome
estará sempre presente na rotina da sua escola.
• veja que a incidência da Síndrome de Down é tão grande que dificilmente você
encontrará alguém que nunca conheceu uma pessoa portadora dela;
• preste atenção no seu aluno como um ser humano e como uma criança igual às
outras. Nas palavras de um aluno portador da síndrome: Esqueça meu terceiro
cromossomo, olhe para mim como um ser humano que eu sou. Ser amigo, tolerante
e não discriminar é um dever do professor;
• pergunte o nome dele antes de querer saber dos problemas que ele poderá causar.
Ninguém pretende dizer que essa é uma tarefa fácil. Você descobrirá junto com
seu aluno como ajudá‑lo e aprenderá muito com ele;
UNIUBE 159
• a vida tem muitas surpresas. Nós todos somos mais diferentes que iguais. Estude
com dedicação as informações aqui colocadas e, quem sabe, nunca mais você
precisará dizer que não está preparado para receber algum aluno.
AMPLIANDO O CONHECIMENTO
A criança portadora dessa anomalia genética nasce geralmente com uma hipoto‑
nia grave, ou seja, uma moleza muscular que atrapalha o desenvolvimento neuro‑
-psicomotor. Na maioria dos casos os traços físicos apresentados pelos bebês, entre
outros, são, segundo Lefèvre (1972):
• dedos curtos;
• língua projetada;
Acima dessa idade, a incidência aumenta bastante, tornando uma gravidez extrema-
mente arriscada para a ocorrência da síndrome. Ainda é desconhecida a causa exata
para a ocorrência do acidente genético que coloca um cromossomo a mais no par 21.
Claudia Werneck (1993) faz um amplo estudo sobre tratamento da síndrome mostrando
dentre outras coisas que as crianças com Síndrome de Down necessitam do mesmo tipo
de cuidado que qualquer outra criança, entretanto, logo no início do desenvolvimento,
os cuidados essenciais que o portador da síndrome precisará serão os da intervenção
e estimulação precoce.
Essa técnica, que é essencialmente preventiva e lúdica, não só colabora para que a
criança tenha rapidamente independência motora, mas age em todo meio ambiente no
qual a criança está inserida. Os profissionais que nela atuam devem ter uma formação
multidisciplinar com o objetivo de oferecer orientação e atendimento específico que
previnam principalmente o atraso no desenvolvimento neuropsicomotor e a deficiência
mental.
Geralmente uma equipe multidisciplinar adequada para esse caso é composta por mé-
dicos neurologistas e pediatras, psicólogos, pedagogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos
e terapeutas ocupacionais.
A observação aparentemente ingênua de Langdon Down nos mostra que, sendo ex-
celentes imitadores, eles terão bem mais sucesso se tiverem como padrão de compor-
tamento colegas de uma escola comum. Além do que serão bem mais exigidos. Essa
afirmativa reforça a questão inclusiva que propõe que a escolarização de um portador
da Síndrome de Down deva ser feita, preferencialmente, no ensino regular. Essa fre-
quência no ensino regular deve estar dependente, é claro, de que a criança tenha tido
atendimento precoce, e que tenha condições de estar em sala de aula participando.
A afirmativa bastante comum de que as escolas não estão preparadas para receber
crianças com necessidades especiais de certa forma está correta, mas também é
correto o fato de que os pais de crianças especiais por sua vez, também não estavam
preparados para receber, assim, seus filhos, mas não puderam recusá‑los. Sem que
se tenha nas mãos o problema para senti‑lo, conhecê‑lo e dar‑lhe um nome, jamais
haverá desafio, sem desafio não se faz ciência.
Catarinense de Educação Especial por meio de sua equipe eficiente e muito amiga.
Na época (cerca de 1983), as crianças diagnosticadas com a síndrome, mesmo antes
da idade escolar, eram “rotuladas” de deficientes mentais moderados, pois segundo
a experiência dos profissionais da área, como DM moderado, nenhum down jamais
conseguiria aprender a ler. As equipes volantes interdisciplinares da LBA, vindas de
Florianópolis, acompanhavam nosso trabalho regularmente porque a LBA era órgão
financiador da instituição.
Em uma das visitas técnicas, foi examinada a pasta de um aluno (L.P.) com 11 anos,
portador da Síndrome de Down. Um dos membros da equipe espantou‑se com meu pa‑
recer psicológico diagnosticando L.P. como deficiente mental leve, uma vez que, dentre
outras capacidades, L.P. era alfabetizado. O colega contestou o laudo e comentou em
tom de brincadeira que nós naquele “fim de mundo” estávamos alfabetizando downs.
Sua contestação terminou quando apresentamos L.P. à equipe e ele conversou com
todos os presentes, e educadamente escreveu e leu tudo que lhe foi solicitado.
Esse fato nos dias de hoje pode parecer pequeno e insignificante. Mas diante dele,
podemos avaliar a evolução que os benefícios do processo educacional, da inclusão
e das pesquisas trouxeram para os portadores da Síndrome de Down. E é muito bom
sabermos que poderemos contar, esperançosos e confiantes, com o trabalho de tantos
professores, que como você se dedicam a esse estudo.
Em minha vida profissional, tive centenas de experiências com crianças e adultos por-
tadores da síndrome. Vi bebês crescerem, desenvolverem-se e tornarem-se adultos
capazes. Tive a oportunidade de vê‑los escrever livros, casar, atuar em filmes, receber
prêmios ou mesmo sucumbir às cardiopatias e a tantas doenças quando os recursos
eram escassos. Sorri e chorei com muitas mães. Mas nunca, em nenhum momento
sequer, duvidei da capacidade de crescer de nenhum dos meus pacientes.
CURIOSIDADE
Temos direito
• a saber que temos a síndrome e que isso nos seja explicado de forma compreensiva
para nós;
• a não sermos tratados como crianças, e sim como adultos, com igualdade e respeito;
• a fazer o que desejamos e não o que os outros acham que devemos fazer;
• a dizer “Não”;
As pessoas que tomam decisões podem ignorar um de nós, mas não podem ignorar
todos nós.
Sabe‑se que, nos três primeiros meses de gravidez, o bebê está em formação e que
são os meses mais delicados. Deveria ter‑se um cuidado especial não só com a mulher
grávida, mas com toda mulher em idade de procriação e com vida sexual ativa. Mui-
tas vezes a gravidez é uma surpresa até mesmo para os casais que tomam diversos
cuidados. Já se teve notícia de mulheres grávidas, no princípio da gravidez e sem o
UNIUBE 165
O uso do álcool durante a gravidez já foi visto como perigoso em altas dosagens. Por
altas dosagens é considerado, por exemplo, a ingestão por dia de uma garrafa de um
destilado (uísque, cachaça, vodka etc.). A mulher que faz a ingestão dessa dosagem
por necessidade é vista pelos especialistas como dependente do álcool.
Hoje se sabe que a ingestão de qualquer dose de álcool durante a gravidez é perigosa
para o feto. No começo da gravidez, quando as células cerebrais estão se formando
e se organizando para dar origem aos órgãos do corpo do feto, a ingestão de bebidas
alcoólicas em qualquer dosagem pode afetar a migração dessas células e em conse-
quência disso, essa organização (NIEBYL, 1983). E durante a gravidez em qualquer
época é igualmente perigoso o uso do álcool.
Nesses momentos, no início da gravidez, nos quais as células estão se preparando para
a formação dos órgãos do bebê, e de seu corpinho como um todo, o feto terá contato
com o álcool ingerido pela mãe, e esse álcool estará presente no sangue materno. As
células do organismo em formação, que estão a caminho de compor algum órgão, pode-
rão ser destruídas ou terem seu curso alterado. Esse fator poderá provocar problemas
futuros. Muitas vezes não se tem ideia da causa de diversos problemas de desempenho
escolar entre outras coisas que bem poderiam ter tido origem nesse dano causado pela
ingestão do álcool durante esse delicado processo (LEFÈVRE, 1972).
A fonoaudióloga Roberta Garcia et al. (2007) em uma pesquisa, mais recente que a
anterior, demonstra resultados que parecem confirmar os dados da referência anterior.
Nesta, uma mulher dependente do álcool, é mãe de dois filhos com problemas. Uma
menina de dezesseis anos e um menino de oito anos, os quais foram examinados
pelas fonoaudiólogas. Apesar de ambos terem o mesmo modelo genético e viverem
sob as mesmas condições familiares, puderam‑se observar prejuízos mais graves em
habilidades comunicativas na menina. As pesquisadoras referem que talvez a menina
possa ter sido exposta durante a gravidez a níveis mais elevados de álcool, mas essa
é apenas uma suposição.
Ao nascer, J.L. apresentou baixo peso e medidas cranianas compatíveis com provável
microcefalia. Chorava muito no hospital. A mãe relatou que enfermeiros colocavam
algodão com álcool no travesseiro do bebê, próximo ao seu rosto e essa prática o
acalmava. Segundo informações da própria mãe, a medida parecia ser para diminuir
a provável síndrome de abstinência alcoólica que o bebê sofria. Com a idade que o
recebemos, J.L. ainda não engatinhava. Seu rendimento nas escalas de desenvol-
vimento era muito baixo. J.L. foi atendido no setor, sendo trazido pela mãe, durante
cerca de seis meses com pouquíssima regularidade. Após algum tempo de ausência
J.L. chegou a ser trazido algumas vezes por voluntário de um orfanato conduzido
por grupo espírita de Uberlândia. O voluntário informou que a criança estava sendo
abrigada na instituição temporariamente por falta de condições da mãe em criá‑lo. O
desenvolvimento dessa criança foi muito prejudicado pelas constantes ausências que
impossibilitavam o trabalho. Tanto a mãe quanto os voluntários recebiam orientações
de exercícios e atitudes a serem tomadas no ambiente doméstico, ou da instituição,
para a melhora do caso de J.L. Sua mãe, apesar dos graves problemas de saúde e
sociais que possuía, demonstrava cuidado e muito carinho ao trazê‑lo. Era cooperativa
no atendimento, tinha boa aparência e era educada. O bebê estava sempre cheiroso,
de banho tomado e roupas limpas.
5.3.3 Prematuridade
SAIBA MAIS
Icterícia
Condição fisiológica que ocorre logo após o parto nos dias subsequentes ao nascimento. Por
um processo biológico, o organismo do bebê libera bilirrubina, uma substância que dá um
aspecto amarelecido à pele do bebê. Esse processo se inicia e termina em mais ou menos
uma semana, durante a qual, os médicos recomendam, entre outras coisas, farta ingestão de
líquidos, banhos frequentes etc. Caso essa condição se prolongue, é necessário outras pro‑
vidências para que o cérebro do bebê não sofra lesões. Em muitos casos, o bebê é internado
e recebe os conhecidos “banhos de luz”.
Raquel Gick Fan (2008), em sua dissertação de mestrado, afirma que a prematuridade
pode ser um fator que prevê problemas visomotores, visoespaciais e verbais. Esses
problemas podem gerar alterações de comportamento tais como ansiedade, agressi-
vidade e, mais tarde, déficit cognitivo.
A eficiência desse projeto está demonstrada por vários fatores tais como: aumento
do vínculo mãe/filho; menor tempo de separação mãe/filho, evitando longos períodos
sem estimulação sensorial; estímulo ao aleitamento materno, favorecendo frequência,
precocidade e duração; maior competência e confiança dos pais no manuseio do seu filho
de baixo peso, mesmo após a alta hospitalar; melhor controle térmico; menor número de
recém-nascidos em unidades de cuidados intermediários, devido à maior rotatividade
de leitos; melhor relacionamento da família com a equipe de saúde; diminuição da taxa
de infecção hospitalar; diminuição da permanência hospitalar. Por tudo isso, podemos
ver que o bebê, sendo cuidado diretamente por sua mãe, tem bem mais proveitos.
Dessa forma, um bebê, que nascera prematuro e já havia recebido alta hospitalar, foi
encaminhado a nós para acompanhamento durante o desenvolvimento neuropsico-
motor. Esse bebê, do sexo masculino, chegou a nós com pouco mais de três meses
de vida. O exame inicial de desenvolvimento mostrou que sua idade desenvolvimental
correspondia à sua idade cronológica, ou seja, o bebê não apresentava atrasos. Sua
mãe, muito dedicada, recebia bem as orientações, executava em casa os exercícios
e interessava‑se muito pelo progresso do menino. Essa colaboração materna foi estu-
dada amplamente por especialistas e confirmada mesmo em pesquisas (KRYNSKI et
al., 1983; ANDRADE, 2005).
Durante dois anos e seis meses foi feito um trabalho de observação, exames do de-
senvolvimento global e orientações. No final do processo, o paciente recebeu alta do
atendimento e ingressou no ensino regular.
Esse caso mostrou que a prematuridade não afetou o bebê nos primeiros anos de vida
nem prejudicou seu desenvolvimento. É interessante destacar a atuação da mãe junto
ao profissional no atendimento. Podem‑se ter muito mais resultados favoráveis no pro-
cesso educacional quando pais e profissionais se unem. A presença da mãe dentro de
uma situação clínica ou escolar pode ser extremamente útil quando o profissional que
ali atua se alia a ela, ao invés de se posicionar do outro lado como frio profissional. A
educação é um processo conjunto.
Você pode estar se perguntando, por que observar uma criança “normal” por tanto
tempo? A razão principal para isso é que em qualquer época desse período inicial da
vida da criança podem surgir problemas cuja causa tenha sido a prematuridade. Nesse
caso, é importante ter‑se em mente a preocupação de que assim que surgir o problema
ele seja trabalhado. Na idade escolar, quando a criança chega finalmente à sua sala
de aula, ela aparentemente era um bebê sem nenhuma “responsabilidade”, entretanto
agora tem a obrigação de estar no nível dos colegas de turma. Isso significa estar ca-
minhando e correndo, falando frases longas e contando pequenas histórias com início,
meio e fim, com atenção e concentração em condições normais etc. Qualquer coisa
fora dessa ordem será prejudicial a ela e ao seu aprendizado.
Agora veremos um problema tipicamente da fase perinatal que é a asfixia. Esta é, dentre
outras, uma das intercorrências do parto. São acidentes, ou alterações no processo
natural do nascimento, ou dos dias subsequentes.
UNIUBE 171
Você não precisa ficar preocupado com os termos médicos que aqui aparecem. Vamos
entender devagar cada um deles e a relevância que eles têm para esse estudo e a
utilidade do conhecimento deles para sua vida profissional. Se em um momento ou
noutro você precisar conversar com qualquer profissional da área de saúde, com um
médico, por exemplo, você saberá ao que se referir e entenderá quando a resposta
à sua dúvida lhe for dada. Esse conhecimento é necessário, para a sua vida dentro e
fora da escola. É interessante ver como pais americanos, ao receberem diagnóstico
dos filhos, pesquisam tanto a ponto de discutirem com os médicos as condutas e os
tratamentos e, por vezes, fazerem parte da equipe de tratamento. E é interessante ver
como a educação cada vez mais se une à saúde para o proveito de todos.
Fontes (1990), afirma que os termos hipóxia e anóxia se confundem no seu uso cos-
tumeiro e considera a anóxia aguda, a do momento do parto, como muito mais nociva
por levar muito mais e mais rapidamente danos ao sistema nervoso central do bebê.
A falta de oxigênio ao bebê também pode ocorrer durante a gestação por diversas
razões e é chamada de anóxia crônica.
É interessante destacar aqui a observação que o autor faz sobre os males do cigarro,
ao falar sobre anóxia crônica:
Desde os primeiros sinais do parto até seu término, sem dúvida, a asfixia é uma das
grandes preocupações dos obstetras. Um exame rápido e fácil, chamado índice de Ap-
gar, é feito pelo pediatra, ou enfermeira, no momento que o bebê nasce e repetido cinco
minutos depois. Nele se observam alguns aspectos que vão determinar as condições
de nascimento. Esses aspectos são apresentados no Quadro 2.
A pontuação muito baixa, ou seja, abaixo de cinco pontos na média dos dois momen‑
tos (primeiro e quinto minutos), significa que o bebê teve dificuldades respiratórias ou
de outra natureza. Esse fato leva à suspeita de que problemas sérios podem vir em
seguida atrapalhando as aquisições que ele precisará dar conta nos primeiros anos.
Uma observação durante todo período do desenvolvimento neuropsicomotor se fará
necessária.
CURIOSIDADE
Ao realizar uma pesquisa para minha dissertação de Mestrado com base nos dados de
pacientes atendidos na Apae de Araranguá (Santa Catarina), verifiquei que o percentual
de crianças nascidas com dificuldades no parto era de 39,6% da amostra de 275 pacientes.
Nestes, anóxia e hipóxia são dados constantes. Entretanto um detalhe me chamou a atenção.
Cerca de 112 pacientes sofreram Anóxia ou Hipóxia, sendo que a maioria deles, 60% nasceu
em hospitais com médicos atendendo e 39% em casa com o atendimento de parteiras. Isso
permitiu concluir que foi maior o percentual de danos causados nas crianças nascidas em
hospitais do que nas crianças nascidas em casa. (FERREIRA, 1988)
Embora esse caso não apresentasse sequelas físicas, as doenças mais comuns em
consequência dessas dificuldades respiratórias do parto costumam ser: a paralisia
UNIUBE 175
O pesquisador Juércio Samarão Brandão et al. propõe várias definições para a paralisia
cerebral, sendo uma delas:
Foi Sigmund Freud, o criador da Psicanálise, que em 1897, sugeriu a expressão paralisia
cerebral (PC), que, mais tarde, foi consagrada por Phelps, ao se referir a um grupo de
crianças que apresentava transtornos motores mais ou menos severos devido à lesão
do sistema nervoso central (SNC) (ROTTA, 2002).
O cérebro comanda as funções do corpo e cada área dele é responsável por uma de-
terminada função, como os movimentos dos braços e das pernas, a visão, a audição
e a inteligência. Uma criança com PC pode apresentar alterações que variam desde
leve falta de coordenação dos movimentos até a inabilidade para segurar um objeto,
176 UNIUBE
Diament (1997) coloca que as áreas motoras do cérebro são particularmente sensíveis
à falta de oxigênio nos últimos meses de gravidez, por isso o bebê prematuro tem maior
risco de ter PC em caso de sofrimento que inclua asfixia ao nascer. Isso ocorre em
menor número em bebês de partos a termo.
O sofrimento fetal na hora do parto continua sendo o maior fator causador de paralisia
cerebral. Outros fatores observados são infecções do sistema nervoso, hipóxia e trau-
mas de crânio. O desenvolvimento anormal do cérebro pode também estar relacionado
com uma desordem genética, e nestas circunstâncias, geralmente, observam‑se outras
alterações primárias além da cerebral. Em muitas crianças, a lesão ocorre nos primeiros
meses de gestação e a causa é desconhecida.
O tipo de sequela na criança, causado pela PC, está relacionado com a localização da
lesão no cérebro e a gravidade dela depende da extensão da lesão. A PC é classificada
de acordo com a alteração de movimento que predomina. Formas mistas também são
observadas.
IMPORTANTE!
Nem todas as crianças portadoras de paralisia cerebral terão deficiência mental. As dificul-
dades de comunicação por lesões presentes em diversas partes do corpo podem sugerir
que a criança seja deficiente mental. Recomendo exames cuidadosos por parte de colegas
psicólogos e pedagogos. Observações detalhadas, e entrevistas com pais e pessoas que
lidam direto com a criança são extremamente úteis antes de anunciarem um diagnóstico de
deficiência mental.
Se você optar por assistir ao filme: Meu pé esquerdo, sugerido no final desse capítulo,
poderá observar um portador da paralisia cerebral sem deficiência mental. O filme
trata de um caso verdadeiro. Como leigos, seus pais haviam aprendido que crianças
com essas sequelas eram deficientes mentais e, aos poucos, percebem que não era
o caso de seu filho. Esse e outros fatos entusiasmaram a família e fizeram com que o
personagem tivesse toda ajuda possível. Eram amorosos e dedicados. Incluíam‑no em
todas as atividades e celebrações da família. Elogiavam‑no sempre em suas aquisições
e procuravam todo tipo de recurso que pudesse fazer com que ele se desenvolvesse
plenamente. É um filme bastante didático e emocionante.
Uma criança com PC apresenta necessidades específicas em cada etapa do seu de‑
senvolvimento. Por exemplo, durante os seis primeiros meses de vida, predominam as
necessidades com relação aos cuidados médicos – avaliações clínicas, realização de
exames complementares, orientações sobre a patologia, aconselhamento e apoio aos
pais. Na medida em que a criança cresce, vão surgindo as necessidades relacionadas
178 UNIUBE
com a inserção social, como maior grau de independência, escolarização, orientação vo-
cacional e reforço do suporte psicológico à criança e à família nos momentos críticos.
A paralisia cerebral, assim como a Síndrome de Down está e sempre esteve presente
na minha rotina de psicóloga em Educação Especial, portanto não é difícil relatar inú-
meros casos dessas duas desordens.
Em meu trabalho na linda cidade de Torres, no estado do Rio Grande do Sul, tive a
oportunidade de atender a um menino portador de sequela de paralisia cerebral. O
menino, B.P. era trazido por sua mãe de uma cidade distante que não possuía qualquer
recurso para o atendimento de crianças com esse tipo de sequela. Seu atendimento
naquela instituição iniciou‑se quando B.P. estava com três anos e meio. A professora
que o acompanhava na Estimulação Precoce e auxiliava na aplicação das técnicas,
era a mesma responsável por estar com B.P. durante toda a jornada diária na institui-
ção. Essa jornada iniciava‑se quando o menino era recebido, trazido pela mãe desde
o transporte coletivo de sua cidade, até a rodoviária local e em seguida recolhido pelo
transporte escolar. A professora o recebia e o acompanhava nos atendimentos especí-
ficos, nas refeições junto com todas as crianças no refeitório da escola e no descanso
coletivo à tardinha para crianças de sua idade. Ao iniciar o laudo diagnóstico de B.P. eu
possuía poucas informações que me ajudassem a estabelecer um diagnóstico mental.
B.P. não falava, não respondia a solicitações, não movia eficientemente, nem braços
nem pernas. Portanto, não caminhava e não tinha controle de tronco, precisando de
apoio completo para sentar‑se. Usava fraldas, era alimentado e cuidado por alguém.
Era calmo e sorridente. A comunicação de seu olhar era evidente. Embora movesse a
cabeça com dificuldade, seguia uma pessoa pela sala virando a cabeça por onde essa
pessoa fosse, principalmente pessoas conhecidas e que cuidavam dele. Sorria quando
se brincava com ele e ficava sério quando se lhe falavam coisas sérias. Mas isso era
insuficiente para definir meu diagnóstico.
Sem dados suficientes e que pudessem dar qualquer sinal de que o paciente possuía
algum tipo de comunicação era comum definir a criança como deficiente mental de ní-
vel severo a profundo. Nesse tempo era rotina considerar os PCs imediatamente, sem
perda de tempo, como deficientes mentais, classificando‑os conforme as aquisições
demonstradas.
Antes que eu definisse o laudo, a professora que era responsável por B.P. na escola
me procurou e disse que tinha quase certeza de que ele compreendia tudo ou quase
tudo o que se falava ao seu redor, pois por vezes parecia rir de coisas realmente en-
graçadas, ou ter expressões faciais significativas diante das conversas. Mesmo assim,
achei estranho como chegara a essa conclusão e quis conversar detalhadamente com
ela. Depois de alguns minutos de conversa, as informações colhidas não me convence-
ram e tive a curiosidade de submeter B.P. a um exame psicológico de inteligência não
UNIUBE 179
verbal ajudada pela professora. Isso sim, parecia total perda de tempo. Ficou com-
binado que nos sentaríamos num tatame (pequeno colchonete) com B.P. e, uma vez
que ela o conhecia bem melhor que eu, ela daria ao menino as instruções do teste, e
colocaríamos as pranchas uma a uma na sua frente. Ele por sua vez, da forma que lhe
fosse possível, responderia à questão.
O teste que eu usei é muito simples. Compõe‑se de várias pranchas coloridas com três,
quatro ou cinco figuras dependendo da prancha. A criança precisa apenas apontar qual
das figuras não se parece com as outras, ou não combina com as outras. Apenas uma
resposta é a certa. E não há necessidade de falar, nem comentar as figuras. Assim foi
feito, e para nós inacreditavelmente, mesmo com muita dificuldade, B.P. abaixava a
cabeça e, posicionava a ponta do nariz na figura certa. O resultado final foi que B.P.
não só não era deficiente mental de severo a profundo, como tinha inteligência normal
para um menino de sua idade! Em outras palavras, a observadora professora estava
certa, ele compreendia tudo ou quase tudo que era dito ao seu redor, respeitando, é
claro, a sua idade e o seu limite de compreensão.
Nas palavras de Guerreiro e Guerreiro (1993), a epilepsia deve ser entendida como
uma síndrome, pois envolve conjunto de sintomas e sinais decorrentes de diferentes
causas que apresentam um elo fisiopatológico bastante comum. Sua classificação
pode ser feita de acordo com a causa, idade de início das crises, à possível existência
de lesão estrutural no cérebro, sinais clínicos ou neurológicos associados e história
familiar. A maioria não tem necessariamente causa comum.
5.3.6 Epilepsia
A frequência da epilepsia é maior na infância, uma vez que as crianças são mais vul-
neráveis a doenças tais como meningite, sarampo, varicela, caxumba, bem como a
acidentes que provocam traumatismos cranianos. Cerca de 80% da população porta-
dora de epilepsia é constituída por crianças ou apresenta o problema quando criança
(GUERREIRO e GUERREIRO, 1993).
180 UNIUBE
Grumspun (1982) propõe a seguinte classificação das epilepsias, tendo como base a
idade do início da crise:
Início neo‑natal:
Essas crises podem evoluir com enrijecimento e contrações musculares, que são
conhecidas como convulsões. Mas existem muitos tipos diferentes de manifestações
epilépticas e não apenas crises convulsivas, como se pensa, tais como: perda súbita do
tônus muscular, perda, ou alteração temporária da consciência e alteração temporária
do comportamento.
Segundo Fernandes e Souza (2001), uma criança em crise pode apresentar os se-
guintes sinais:
• movimentos mastigatórios;
• desidratação grave;
• hipoglicemia;
O que caracteriza a epilepsia é a repetição de crises não provocadas, ou seja, não deter-
minadas por um processo patológico agudo ou evento emocional (DIAMENT, 1996).
O professor não deve puxar a língua, ou introduzir qualquer objeto na boca da criança.
Como pensa o leigo é impossível engolir a própria língua. O que acontece em alguns
casos é que o relaxamento completo do indivíduo, em desmaios ou outros tipos de
crises sem convulsões, relaxa também a língua, podendo atrapalhar a respiração. Não
é esse o caso em uma crise convulsiva. A respiração pode alterar‑se durante a crise,
UNIUBE 183
essa é mais uma razão para não introduzir nada na boca do indivíduo, mas normaliza
nos primeiros minutos após a crise.
Todo episódio, se convulsivo, deve durar em média três minutos e é imprescindível so-
licitar ajuda, e encaminhar a criança a um atendimento especializado, pois pode haver
crises recorrentes que caracterizam o estado de mal epiléptico.
Após o incidente, é necessário que o professor converse com os outros alunos sobre o
ocorrido deixando claro que não há o que temer diante de uma situação desse tipo. O
colega não é diferente nem deve ser mantido distante de ninguém, ele apenas possui
uma condição que poderá necessitar em algum momento de ajuda do professor ou de
qualquer outro colega. Não há nada de contagioso no problema apresentado. É muito
importante deixar claro que uma pessoa portadora de Epilepsia, na maioria dos casos,
é perfeitamente normal, inteligente, sociável e produtiva. Na rotina de um epiléptico,
a crise ou as crises, poderão ocupar um pequeno momento e por vezes serem muito
raras, e de forma alguma deverão ser dramatizadas para que interfiram na vida toda
do indivíduo.
Tipos de tratamentos
Uma vez iniciado o tratamento com a ingestão de remédios, a dose somente deve ser
alterada conforme orientação médica. Jamais se deve interromper o tratamento sem
orientação. A suspensão súbita da medicação pode desencadear novamente as crises
com possibilidade de agravamento do quadro. É interessante que o professor tenha
esse conhecimento para alertar os pais e oferecer‑se para ministrar a medicação no
caso da criança fazer uso dela em horário escolar.
É muito comum observar‑se casos nos quais a criança tem uma crise, é levada ao
hospital, o médico introduz a medicação e os pais não obedecem ao que foi prescrito.
Uma vez interrompido o tratamento a criança volta a ter as crises precisando novamente
ser internada. Infelizmente por várias razões isso é comum, seja por falta de recursos
para continuar o tratamento, seja por ignorância da importância deste.
Portador de Epilepsia com crises convulsivas de difícil controle. R.S., na época com
16 anos, era um excelente aprendiz na oficina. Era calmo, bem comportado, amigo
e colaborador. O produto de seu trabalho era tão bom que, se não fossem as crises,
ele seria encaminhado ao mercado competitivo. R.S. chegava a ter de três a cinco
crises por dia. Constantemente sua medicação era revisada e modificada pelo médico
UNIUBE 185
sem que isso ajudasse na diminuição das crises. Na oficina, o marceneiro, que era
o professor e orientador dos trabalhos, e os colegas eram instruídos e já conheciam
detalhadamente os episódios de R.S. Conheciam até seus sinais e reações anteriores
à crise. Havia um local mais quieto e calmo no ambiente da marcenaria arrumado com
colchões que servia para que R.S. pudesse se recuperar de cada episódio. R.S. não
usava máquinas perigosas, do tipo das que cortavam a madeira, por exemplo. Uma
das minhas orientações a R.S. foi que ele começasse a reconhecer a antecipação da
crise, chamada de aura pelos especialistas. Não é muito difícil reconhecer a aura, a não
ser que o paciente tenha pouquíssimas crises. R.S. aprendeu a fazer isso e informou
ao professor e a seus colegas. Quando os sinais da crise começavam, e quando os
colegas mais próximos conseguiam perceber, ele era levado imediatamente ao local
preparado e ali permanecia até que sua consciência retornasse ao normal, sempre
observado pelo professor e por seus colegas. Essa observação pós‑crise é importante
porque o indivíduo poderá ficar confuso, caminhar sem rumo, ferir‑se ou ferir alguém
sem ter noção disso.
Vamos entender agora um pouco sobre como são feitos esses exames para detectar
exatamente se a criança se encontra atrasada em seu desenvolvimento.
Uma escala bem utilizada hoje é a Escala de Desenvolvimento de Denver II. Esse
teste auxiliou em pesquisa sobre a situação de crianças prematuras em São Luís do
Maranhão (CUNHA, 2007).
Como exemplo, para que você tenha uma ideia, cito aqui a escala de Brunet e Lezine
por ser o instrumento que mais utilizei em minha prática.
186 UNIUBE
A base para a escala das duas psicólogas foi a pioneira Escala de Gesell, um médico
americano que iniciou, dessa forma, o processo de medida do desenvolvimento. A
grande inovação de Brunet e Lezine foi a inclusão de medidas e fórmulas matemáticas,
as quais nos dão de forma exata uma idade de desenvolvimento (ID) e um quociente de
desenvolvimento (QD), facilitando muito a elaboração de uma programação terapêutica
no caso em que a criança se encontre com atraso em qualquer das áreas.
A grande vantagem oferecida por essa escala é a condição de se obter esses resulta-
dos exatos (quantitativos), além de resultados qualitativos e de ter aplicação e correção
fáceis e rápidas. Ao aplicar essa escala, ter‑se‑á a idade de desenvolvimento em que
essa criança se encontra e o percentual desse desenvolvimento sabendo‑se com exa-
tidão se essa criança está atrasada em seu processo evolutivo.
São poucas as escalas e testes que oferecem resultados quantitativos, tais como uma
idade de desenvolvimento e um nível de desenvolvimento percentual.
Não existem respostas certas ou erradas. O objetivo é que a criança siga determinadas
ordens e sugestões do examinador para que ele possa ter certeza de que a aquisição
foi adquirida. Numa tabela fornecida pelo livro, o examinador apenas marcará positivo
(+), caso a criança realize a ordem dada, ou negativo (‑), caso ela não consiga. Não
existe tempo estipulado para o exame. A criança apenas deverá estar bem disposta e
colaborando. Não se realiza o exame se a criança estiver chorando, com sono, com
fome, doente, irritada ou com medo do examinador e do ambiente. A mãe da criança
precisará sempre estar presente porque boa parte da investigação depende de res-
postas que ela dará ao examinador sobre aquisições que a criança possui; entretanto
poderá não demonstrar no momento do exame. Exemplo: “Puxa o lençol em direção a
si agarrando a perna e o joelho?”; “Sorri a rostos familiares?” etc.
• ma com seis figuras: um brinquedo, uma xícara de café, uma colher, um cão,
u
um sapato e uma casa;
• ma com oito figuras: um brinquedo, uma xícara de café, uma colher, um cão,
u
um sapato, uma casa, um relógio e uma faca.
Precoce ou Global e às vezes Estimulação Essencial. Esse contexto tem sua atuação
na detecção, diagnóstico e tratamento dos desvios do desenvolvimento infantil. Por
se tratar de um processo educacional, tem uma ação globalizadora e integral sobre o
indivíduo, visando o seu desenvolvimento. Considera‑se precoce por atingir a criança
em etapas críticas do seu desenvolvimento e é essencialmente preventiva.
A estimulação precoce está ligada a uma ideia de ação preventiva, para isso faz‑se
necessário que se inicie a intervenção o mais cedo possível. Essa intervenção é sempre
identificada com a palavra “cedo” (early em inglês e temprana ou precoz em espanhol).
O Ministério da Educação adota a terminologia estimulação precoce por ser dessa forma
que a técnica é bastante conhecida no Brasil, o que facilita a procura do atendimento
por parte da população. Portanto desde o nascimento, apresentando ou não alguma
condição especial, o cuidado do bebê deve ser orientado na direção de um conjunto
global de atenções, que incluam aspectos biopsicossociais e pedagógicos.
É importante frisar que nenhuma fase deve ser negligenciada; por exemplo, se a criança
está atrasada para engatinhar, não estimulá‑la a caminhar antes que engatinhe. Se você
se interessa por aprofundar seus estudos nesse assunto observe que os livros citados
aqui são de grande ajuda não só para detectar‑se a fase em que a criança deveria
estar, como para orientar as mães quanto ao tipo de estimulação.
De acordo com Oliveira (1982), toda criança em etapas críticas do seu desenvolvimento
neuropsicomotor, isto é, nos três primeiros anos de vida, tem como necessidades bási-
cas: Nutrição, Estimulação e Afetividade. A nutrição deve ser feita à base de proteínas,
uma vez que estas contêm todos os aminoácidos essenciais necessários. A estimulação
deve ser oportuna, ou seja, o indivíduo deve ter oportunidade de experienciar o próprio
corpo, explorando os objetos que o cercam, descobrindo gradativamente a relação entre
os objetos e a causalidade dos fatos ambientais. Tudo isso somente se integra se vier
acompanhado de motivação para aprendizagem. A base dessa motivação é a afetivi-
dade que essa criança recebe, daí a importância dos vínculos afetivos estabelecidos
pela criança nessa fase do desenvolvimento.
UNIUBE 189
Segundo Perneta (1977), se uma criança não recebe nutrição apropriada desde os
primeiros meses de vida, não desenvolverá normalmente e seus crescimento estatural
e ponderal serão diminuídos e/ou alterados. A ausência de alimentação adequada preju-
dica o funcionamento do cérebro, em alguns casos chegando a danificá‑lo permanente-
mente. A carência de calorias e de proteínas, e a desnutrição neonatal são, infelizmente
assunto quase diário em nossos jornais e revistas. E é um mal aparentemente crônico
nos países de terceiro mundo.
Se um bebê for privado de estimulação ambiental adequada nos três primeiros anos de
vida apresentará comportamentos desadaptados, e em casos mais graves apresentará
déficit intelectual tão significativo que o impedirá de frequentar o ensino regular. Uma
equipe da UNICEF, fazendo pesquisa de campo em aldeias na África, encontrou
uma criança de cerca de oito anos dentro de uma cabana semiescura, deitada numa
rede. Essa criança não caminhava, mal se expressava verbalmente e precisava de aju-
da para se alimentar. Ao ser investigado o problema da criança, a equipe foi informada
de que, há cerca de seis anos a criança havia contraído uma doença desconhecida e,
para que não contaminasse os outros membros da aldeia, fora isolada desde então.
Ao ser encontrada pela equipe, a criança não apresentava moléstia alguma, a não ser
as sequelas de seu isolamento (UNICEF, 1979).
As privações afetivas são tão danosas quanto as duas condições anteriores. E como
vimos anteriormente esses sintomas da carência afetiva em bebês foram amplamente
estudados por Spitz (1980).
A negligência do afeto e atenção, por parte daqueles pais muito ocupados, a negação
desse afeto e dessa atenção por questões de rejeição, ou abandono criam condições
que são consideradas pelos especialistas como originárias das neuroses e facilitadoras
das psicoses infantis.
• causas que dependam do meio ambiente, que influam sobre o crescimento normal,
como a já citada ausência de estímulo ambiental;
• alterações genéticas.
Caso você perceba que uma criança esteja atrasada em seu desenvolvimento ou tenha
apresentado algum impedimento significativo, a melhor orientação aos pais será procu-
rar atendimento em estimulação precoce o mais rápido possível em alguma instituição
que o ofereça. No Brasil, temos muitas associações, uma delas poderá encaminhar a
criança para o setor adequado ao seu caso.
Toda mulher antes de dar à luz um bebê deveria ser orientada e preparada para essa
expectativa e para essas funções, as quais, além de extremamente importantes, são
também incrivelmente gratificantes. A cumplicidade, o carinho, o companheirismo de
mãe e bebê são peças fundamentais na formação da personalidade de um indivíduo.
Matas (1994) sugere que somente a mãe pode tomar o mesmo ponto de vista de
seu filho sobre as coisas para viver em harmoniosa interação. Para Winnicott, a mãe,
ao identificar‑se com seu filho sabe o que ele sente e está, portanto, predisposta a
prover‑lhe tudo que lhe faça falta. Como estimular?
UNIUBE 191
Cabrera e Palácios (1996) mostram um enfoque prático nessa tarefa, oferecendo as-
pectos teóricos de grande importância, tais como: dados sobre Psicologia do desen-
volvimento, Neurologia evolutiva e Psicologia do comportamento. Se você, professor,
interessa‑se por essa área específica será indispensável aprender sobre esses aspectos
citados. Não é possível atuar em estimulação precoce sem saber como se dá o de-
senvolvimento infantil detalhadamente. Um pouco dessas informações visando esse
aprendizado consta nesse capítulo, porém é necessário estudar bem mais.
A estimulação precoce como terapêutica atua de zero a seis anos de idade, dividindo-
‑se em Primeira, Segunda e Terceira fases.
• Na primeira fase, que vai de zero a três anos, é dada ênfase às áreas: Motora, Cog-
nitiva, Linguagem e Socialização.
• Na segunda fase, que vai de três a seis anos, prioriza‑se a socialização. Formam-
‑se grupos de até cinco crianças com a finalidade de introduzir‑se a participação de
atividades em comum, facilitar a camaradagem, a divisão de brinquedos e tarefas. A
criança aprenderá a esperar sua vez para atuar nas atividades, compartilhar objetos
em um jogo etc. Nessa fase, a família é dispensada. Sem a presença da mãe, e de
familiares, a criança precisa aprender a conviver e relacionar‑se com seus compa-
nheiros de turma sob orientação da professora.
• A terceira fase, que vai de seis a oito anos, é a fase de preparação para as atividades
de alfabetização. A criança inicia esse delicado processo já de posse das aquisições
imprescindíveis a ele. Nesse momento, pais e professores são orientados pelo
pedagogo da equipe, pois esse processo precisa ser ministrado com bastante cuidado
no caso de crianças com outros prejuízos.
192 UNIUBE
Entendemos que uma criança pode chegar a essa fase pronta para ser alfabetizada,
porém com grandes prejuízos, que seriam, por exemplo, prejuízos sensoriais (visão e
audição) e físicos (sequelas motoras diversas). Essa criança terá necessidades espe-
ciais, mas está perfeitamente apta a enfrentar os desafios da fase.
Para a ajuda em atividades diversas com essas crianças, as instituições têm sempre
uma pessoa contratada e que se dedica somente a essa função que é o educador ou
educadora. É muito importante que o profissional interessado em atuar nessa área seja
previamente treinado para isso por algum membro da equipe, seja ele o psicólogo, o
fisioterapeuta, o pedagogo ou qualquer outro (OLIVEIRA, 1982).
Instituições diversas pelo Brasil afora criam manuais simples para as mães levarem
para casa, atuarem com o bebê e ensinarem aos familiares. E criam outros manuais
mais complexos para que educadores atuem dentro do atendimento e da orientação a
essas mães e familiares. Esses manuais sugerem e ensinam alguns exercícios, mas
é no dia a dia com a criança que se vão criando estratégias e métodos nesses atendi-
mentos. Muito do que se faz é fruto da imaginação e perspicácia da pessoa interessada
na técnica. Um exemplo de trabalhos que mostram sugestões interessantes é o de
Oliveira e Oliveira (2006).
Durante alguns anos atendi pessoalmente vários casos para poder sentir essa rotina.
Estar junto às mães e bebês e aprender a conciliar as relações mamãe/bebê, estimula-
dora/bebê e mamãe/estimuladora foi muito proveitoso para minha função de professora
de estimulação precoce. Em minha experiência como professora também aprendi muito
com minhas alunas e alunos nesse aspecto. Por diversas vezes observar as táticas e
alternativas que os alunos demonstravam era fascinante. Era aquela reação típica de
surpresa: “Por que não pensei nisso antes?”.
É bom reforçar o fato de que os exercícios não podem ser realizados se a criança não
estiver bem disposta. A estimulação precoce é uma técnica realizada com a colaboração
total da criança. Uma criança não pode ser atendida aos prantos ou apresentando sin-
tomas tais como: febre, sono, fome ou irritabilidade. A paciência, o carinho, a aceitação
e a inteligência da pessoa que exerce essa função são indispensáveis. Os exercícios
serão conduzidos de forma a que a criança adquira determinada capacidade e para
isso não podem ser executados à força.
UNIUBE 193
Uma das perguntas-chave que faziam parte do processo de seleção para participar do
estágio em estimulação precoce da Universidade de Federal de Uberlândia, do qual
eu era psicóloga responsável era: “Como você agiria para acalmar uma criança que
chora no momento do exercício?”. A pergunta desconsiderava mal-estar, sintomas di-
versos etc. Era levado em conta apenas um choro comum no qual a criança estranha
o ambiente e as pessoas.
Nesse caso eram vistas como corretas respostas tais como: sair com a criança do am-
biente por algum tempo; oferecer brinquedos diversos; pedir ajuda à mãe; e até mesmo
devolvê‑la ao colo de sua mãe.
Cada vez que a criança é examinada com uma escala de desenvolvimento são deter-
minados sua idade de desenvolvimento e o percentual desse desenvolvimento, e, em
seguida, estabelecidos os objetivos a serem alcançados. Esses objetivos precisam
ser os passos imediatos a essa evolução neurológica, ou seja, se um bebê ainda não
engatinha e já está pronto para isso, ele será trabalhado na intenção de engatinhar.
Um manual pode conter sugestões até cerca de três anos, porém aqui, nesta seção,
serão colocadas apenas algumas atividades de exemplo para cada área específica.
Isso servirá para que você tenha uma ideia de como são dadas essas sugestões e de
como elas são trabalhadas.
194 UNIUBE
4. Fixação ocular.
Objetivo 1: Estímulos para movimentar a cabeça nas posições de barriga para cima e
de barriga para baixo – seguindo um objeto em diferentes direções. Da esquerda para
direita; de cima para baixo; de baixo para cima.
Materiais sugeridos
1. Fixação ocular.
3. Persecução auditiva.
Objetivo 1: Aproximar o rosto, do rosto da criança, realizar mímicas faciais. Falar sua-
vemente. Pendurar no berço, diante do seu campo visual, objetos grandes coloridos.
Objetivo 3: Falar suavemente com a criança no seu campo visual e fora do seu campo
visual. Ativar dos seus lados direito e esquerdo um brinquedo musical.
Objetivo 5: Usar dois objetos coloridos e atraentes e chamar a atenção da criança para
os mesmos sacudindo‑os, balançando‑os, etc. Estimular a fixação do olhar da criança
ora num objeto, ora noutro objeto. Movimentar um objeto, deixar o outro parado.
Materiais sugeridos
• Rosto humano; voz humana; móbiles atraentes; chocalho colorido; brinquedo musical;
pulseiras coloridas de guizos; chocalhos diferentes e atraentes.
Por exemplo, em uma atividade em que se utiliza uma argola vermelha e um barbante,
a criança é estimulada na área cognitiva a alcançar a argola, puxando‑a pelo barbante.
Segundo Piaget (1990), é parte das aquisições da relação de causa e efeito. O bebê
aprende que o fio está em ligação com a argola a qual é o objeto que lhe chama aten-
ção.
4. Balbucios – ri fortemente.
Objetivo 1: Mãe usará tons de voz diferentes para ocasiões diversas. Estimulará o bebê
a lhe procurar.
Objetivo 7: Estimular o bebê a responder à voz humana. Repetir os sons emitidos pela
criança, estimular novos sons.
Materiais sugeridos
Essa área envolve o aprendizado de atividades de vida diária que inclui: tomar banho so-
zinho, pentear‑se, brincar, vestir‑se, alimentar‑se, além dos diversos hábitos sociais.
Objetivos
1. Favorecer a mastigação.
Materiais sugeridos
• Alimentos sólidos; copo plástico com a borda recortada; prato de plástico fundo.
A área social é muito mais trabalhada pela mãe da criança do que pelo educador na
instituição por conter objetivos e materiais essencialmente domésticos. Por essa razão
você deverá instruir a mãe com exemplos simples e claros, insistindo para que ela
execute diariamente as orientações recebidas. Você saberá se ela está seguindo suas
198 UNIUBE
Para facilitar sua tarefa, serão colocadas neste capítulo mais algumas sugestões do-
mésticas, indicadas a bebês desde bem pequenos até cerca de um ano e os objetivos
em relação ao que queremos deles.
Sugestão: converse com ela sempre que estiver chorando, chame sua atenção.
Sugestão: Brinque com ele, ria com ele, faça brincadeiras engraçadas com ele.
Sugestão: Brinque com ele, calce seus sapatos para demonstrar o gesto, penteie
seus cabelos.
Sugestão: Solicite sua ajuda quando for colocar os brinquedos e suas coisas
em ordem.
Onde estimular
Um local ótimo para os exercícios de estimulação institucional pode ser montado em uma
sala ampla e arejada, com paredes pintadas preferencialmente com tinta verde clara e
que possua uma pia em tamanho infantil. É recomendada a utilização de poucos móveis
para que tanto o bebê como as pessoas que o assistem possam se movimentar com
liberdade no ambiente. É necessário apenas: uma mesinha e cadeirinhas, um espelho
bastante largo e alto (2 m de largura por 1 m, 70 cm de altura) fixado em uma das pa-
redes na altura do rodapé da sala, um tatame com as mesmas dimensões do espelho,
posicionado abaixo do espelho e um armário fechado para conter os brinquedos. A ins-
tituição irá adquirir objetos específicos para o trabalho dos profissionais que ali atuarão,
tais como, por exemplo, para a fisioterapia: rolos de vários tamanhos, bolas plásticas
de vários modelos e cores, e mais a aparelhagem que o profissional solicitar.
UNIUBE 201
Como uma especialidade dentro da nova era da inclusão, a estimulação precoce tem
condições de oferecer oportunidades aos seus profissionais e melhor qualidade de
vida àqueles que dela se utilizam. A estimulação precoce é uma técnica que veio pos-
teriormente para o Brasil após ter sido desenvolvida em outros países. Entretanto, veio
significar também uma esperança nova. Veio dar uma injeção de ânimo surpreendente
na difícil caminhada do atendimento a criança portadora de necessidades especiais e
estabelece a garantia de um desenvolvimento satisfatório à criança dita normal. Vincu-
lada a ela, está a moderna visão do profissional interativo dentro da equipe e ligada a
isso está a participação do pedagogo e do professor como figuras indispensáveis nesse
complexo processo. Essas presenças são importantes na participação em reuniões de
estudo clínico, na elaboração do plano terapêutico, no levantamento das prioridades
terapêuticas, até mesmo na orientação de pais e responsáveis.
Não é raro perceber que, quando um casal deseja ter um filho, o sexo do bebê já é
assunto de discussão. A sociedade como um todo tem suas próprias exigências nesse
sentido. Se for o primeiro bebê, o sexo deste, para a sociedade na qual os pais estão
inseridos, até não faz muita diferença, mas do segundo bebê em diante, as exigências
começam. Se o primeiro bebê for menina, a expectativa é pelo menino, e vice‑versa.
O desejo por um sexo específico, por si só, já contribui com expectativas.
Estudos recentes sugerem que a criança deve ter liberdade de escolher suas ativi-
dades e brincadeiras sem preconceitos e ideias pré‑fabricadas. As expectativas dos
adultos não devem impedir as crianças de desenvolverem sua personalidade de acordo
com o seu potencial.
A construção do papel social do que é ser menino ou menina deve ser trabalhada pelos
pais com maior naturalidade possível, num incentivo para a quebra de preconceitos.
Essa construção se faz aos poucos, pois é preciso considerar que esses pais foram
criados com preconceitos. Entretanto, o crescimento da ciência como um todo e as
mudanças com a evolução dos conceitos para uma convivência melhor requerem
conscientização social. Mais tarde, na adolescência as influências recebidas serão
refletidas na escolha da profissão e do parceiro sexual. Esse reflexo se dará de forma
sadia quanto mais liberdade de escolha o indivíduo tiver e quanto menos pressão sofrer
contra sua própria maneira de ser.
Embora uma criança de cerca de três anos não possa saber a diferença sexual de um
menino para uma menina por não enxergar normalmente os genitais, se ela for questio-
nada sobre essas diferenças irá se referir a detalhes por ela observados. Provavelmente
dirá que uma menina geralmente tem cabelos compridos, usa vestidos e brinca com
bonecas. São características simples que vão distinguir diferenças importantes.
A identidade sexual é aprendida por informações sutis dadas pelos adultos em volta
da criança. Um elogio se a menina se veste de forma bem bonita, ou se o menino joga
uma boa partida de futebol fazem parte dessa sutileza consciente ou inconsciente dos
pais e são fortes o bastante para dar à criança a direção intencionada.
UNIUBE 203
Resumo
Após os estudos que você realizou vamos fazer uma conclusão geral dos assuntos
abordados. Aqui iremos ressaltar em tópicos que o consideramos mais relevantes.
• Os incidentes mais prevalentes que afetam as crianças no início e/ou durante suas
vidas são: Síndrome de Down, síndrome alcoólica fetal, prematuridade, asfixia neo-
natal por anóxia ou hipóxia de parto, paralisia cerebral e epilepsia.
Atividades
Atividade 1
Quais as características físicas mais comuns nos portadores de Síndrome de Down
pelas quais mesmo você, professor, poderá identificar um portador?
Atividade 2
Cite algumas condições que podem ser consideradas perigosas e que poderiam causar
ao bebê problemas no desenvolvimento.
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2010.
SPITZ, René. O primeiro ano de vida. São Paulo: Martins Fontes, 1980.
VIEGAS, Drauzio. Gravidez de alto‑risco, hipóxia e prematuridade. In: KRYNSKI, Stanislau et al. Novos
rumos da deficiência mental. São Paulo: Sarvier, 1983.
WERNECK, Claudia. Síndrome de Down: muito prazer, eu existo. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1993.
208 UNIUBE
Introdução
Neste capítulo, pretendemos abordar a linguagem em
Marilena Chauí diferentes dimensões, ressaltando sua importância.
Para isso, dialogaremos com poetas, personagens
Possui graduação de romances, artistas plásticos, filósofos, jornalistas
em Filosofia pela
Universidade de
e estudiosos. Dentre eles, destacamos Paulo Freire,
São Paulo (1965), na relação pensamento, palavra e ação; e a filósofa
especialização em Marilena Chauí, em relação aos conceitos filosóficos
Licenciatura pela e a historicidade desses conceitos, enfocando, inclu-
Universidade de sive as contribuições da linguística do século XX; por
São Paulo (1965),
mestrado em Filosofia isso, nos baseamos, em grande parte, nos capítulos
pela Universidade de 5 – “A Linguagem” e 6 – “O Pensamento”, do livro
São Paulo (1967) e Convite à Filosofia, dessa autora.
doutorado em Filosofia
pela Universidade
de São Paulo
Entendemos que as reflexões suscitadas aqui fo‑
(1971). Atualmente mentarão o seu entendimento em relação a outros
é professora titular capítulos, especialmente, aos que se referem ao de‑
da Universidade senvolvimento humano, à Literatura, à aprendizagem
de São Paulo. Tem
e ao ensino da língua materna. Objetivamos suscitar,
experiência na área
de Filosofia, com em você, o entendimento da linguagem e a utilização
ênfase em História dela pelo homem, a partir de diversos pontos de vista,
da Filosofia. Atuando percebendo que eles não são totalmente antagônicos,
principalmente nos seus significados se entrecruzam e, muitas vezes, se
seguintes temas:
imanência, liberdade,
complementam. Esperamos que você faça um esforço
necessidade, servidão, de buscar as conexões entre essas abordagens e
beatitude e paixão. entenda que a linguagem, como característica hu‑
(Fonte: Plataforma mana, não deve ser estudada de forma fragmentada,
Lattes)
mas com um olhar múltiplo, desperto, atento para a
UNIUBE 209
Foi para você, querido(a) aluno(a), que escrevemos este capítulo. Esperamos
que ele seja, entre várias coisas, mensageiro de nossa paixão pela docência
e pela linguagem, pois foi elaborado com grande prazer! Mas, nosso prazer
será maior ainda se você, ao lê‑lo, sentir‑se dono dele e, por isso, livre para
completá‑lo com suas indagações e pensamentos!
Objetivos
Considerando o exposto da introdução, este capítulo tem como objetivos:
• explicar a historicidade das reflexões sobre a linguagem;
• explicar a relação entre pensamento, palavra e linguagem;
• demonstrar diferentes abordagens filosóficas em relação à linguagem
que podem influenciar na educação;
• analisar conceitos linguísticos que interferem no ensino da língua.
Esquema
6.1 Pensamentos e palavras
6.4 Conclusão
210 UNIUBE
SAIBA MAIS
Dom Casmurro
É um romance que foi escrito por Machado de Assis, publicado pela editora Garnier em 1899.
Essa obra é considerada uma das mais importantes da Literatura Brasileira, e talvez, a mais
importante desse escritor. No romance, o personagem Bento, alcunhado de Dom Casmurro,
faz uma retrospectiva da sua vida, analisando, especialmente, a história de amor vivida com
Capitu.
Machado de Assis
humana. Além disso, a competência da elaboração da linguagem que utiliza é uma aula de
língua Portuguesa. Entendemos que nenhum brasileiro pode morrer sem ter tido o prazer e
a riqueza de ler essas obras, ainda mais se ele for professor!
Mas, Machado não foi o único a representar uma ideia. Nas Personificadas
histórias em quadrinhos, por exemplo, ela é representada pelo
desenho de uma lâmpada acesa! Em outras histórias, as ideias Personificar. 1.t.d.
são personificadas em um anjinho ou um capetinha, depen‑ atribuir dotes e
dendo do seu aspecto moral. Esses estão sempre emitindo qualidades de
pessoa a; tornar
suas opiniões ao pé do ouvido do personagem. igual a uma pessoa.
(HOUAISS. Antônio.
Pensamos que a ideia de representar uma ideia, é bem inte‑ VILLAR, Mauro
ressante! Por isso, convidamos você, para representar o sur‑ Salles. (Dicionário
Houaiss da Língua
gimento ou a reincidência de uma ideia. Como você imagina o
Portuguesa. Rio de
surgimento de um pensamento em seu cérebro? Que analogia Janeiro: Objetiva,
poderia fazer? A ideia teria comportamentos de animais, como a 2001. p. 2197)
de Bentinho? Teria comportamentos humanos? Ou nada disso?
Use o espaço do TCA e desenhe, descreva ou narre, ou tudo
isso junto! Seja criativo!
Mas, será que Dom Casmurro está certo? Nossos pensamentos sentem a necessidade de
vir ao ar e à vida?!
De serem expressados?
212 UNIUBE
Veja o que a filósofa Marilena Chauí, em seu livro Convite à Filosofia, nos diz sobre
o pensamento:
Nos momentos de reflexão, a concentração das pessoas parece tirá-las da sua realidade
imediata, transportando‑as para outros lugares, outros contextos!
Você conhece os versos “(...) O pensamento parece uma coisa à toa / mas como é
que a gente voa quando começa a pensar (...)” da canção “Felicidade”, composta por
Lupicínio Rodrigues?
Essa canção “estourou” no ano de 1947, quando foi composta e, daquela época em
diante, sempre esteve, de alguma forma, nas rádios, ou, nas bocas, cantada, pelas
diversas pessoas de nosso país. Podemos dizer que a canção “Felicidade” é popular
e tem sido cantada, por diferentes gerações!
CURIOSIDADE
Caso você queira ver a letra inteira, sugerimos que acesse o site Letras.mus.br:
<http://64.233.163.132/search?q=cache:6Y2jayIxSn4J:letras.terra.com.br/lupcinio‑rodrigues/
47152/+Felicidade+Lupic%C3%ADnio+Rodrigues&cd=1&hl=pt‑BR&ct=clnk&gl=br>.
UNIUBE 213
O compositor Lupicínio Rodrigues traz, nos versos dessa canção, esse poder que o
pensamento tem de nos fazer voar, de nos transportar para outros lugares. Veja que,
além do pensamento transportá‑lo, o seu voo é poderoso e veloz, uma vez que atra‑
vessa o mundo, num segundo!
Uma outra canção, igualmente bonita é “Aonde quer que eu vá”. Nela, Paulo Sérgio
Valle e Herbert Vianna, do grupo Paralamas do Sucesso, falam-nos sobre a possibi-
lidade de encontrarmos a pessoa que amamos nos sonhos e de a levarmos conosco,
no pensamento, para onde quer que a gente vá.
CURIOSIDADE
Caso queira conhecer essa linda canção, ela está disponível para ser executada no site
Letras.mus.br:
<http://64.233.163.132/search?q=cache:PBZTuLtlWw8J:letras.terra.com.br/os‑paralamas‑do‑su
cesso/30129/+Aonde+quer+que+eu+v%C3%A1&cd=1&hl=pt‑BR&ct=clnk&gl=br&lr=lang_pt>.
A partir das canções “Felicidade” e “Aonde quer que eu vá”, podemos interrogar:
Será que, pelo pensamento, somos capazes de trazer, para perto de nós, as pessoas que
amamos? Somos capazes de levá‑las conosco para onde vamos?
Quais são os sentimentos das pessoas quando cantam? O que elas lembram? O que ima‑
ginam?
Usufrua as imagens trazidas por elas! Sinta os sentimentos e os pensamentos que evocam!
Depois, quando tiver oportunidade, converse com seus colegas sobre essa experiência!
214 UNIUBE
Esperamos que você tenha usufruído de imagens prazerosas e que o exercício tenha
sido muito agradável!
Nesse exercício, por meio da canção, nos utilizamos da linguagem musical e da lingua‑
gem verbal, para lembrarmos situações que vivemos e imaginarmos outras que podem
ou não acontecer. Usufruímos da linguagem para instigar nossos pensamentos e nos-
sos sentimentos. Mas, qual a relação entre a linguagem e a memória, a imaginação, o
tempo e o pensamento?
PONTO-CHAVE
NOVOS CONHECIMENTOS
Veja, a seguir, uma memória de Dom Casmurro, dentre as várias que compõem o romance
com este nome. Trata-se de partes do capítulo O penteado.
Penteado
Capitu deu‑me as costas, voltando‑se para o espelhinho. Peguei‑lhe dos cabelos, colhi‑os
todos e entrei a alisá‑los com o pente, desde a testa até as últimas pontas, que lhe desciam
à cintura. Em pé não dava jeito: não esquecestes que ela era uma nadinha mais alta que
eu, mas ainda que fosse da mesma altura. Pedi‑lhe que se sentasse.
Sentou‑se. “Vamos ver o grande cabeleireiro”, disse‑me rindo. Continuei a alisar os cabe‑
los, com muito cuidado, e dividi-os em duas porções iguais, para compor as duas tranças.
Não as fiz logo, nem assim depressa, como podem supor os cabeleireiros de ofício, mas
devagar, devagarinho, saboreando pelo tato aqueles fios grossos, que eram parte dela. O
trabalho era atrapalhado, às vezes por desazo, outras de propósito para desfazer o feito e
refazê‑lo. Os dedos roçavam na nuca da pequena ou nas espáduas vestidas de chita, e a
sensação era um deleite. Mas, enfim, os cabelos iam acabando, por mais que eu os quisesse
intermináveis. Não pedi ao céu que eles fossem tão longos como os da Aurora, porque não
conhecia ainda esta divindade que os velhos poetas me apresentaram depois; mas, desejei
penteá‑los por todos os séculos dos séculos, tecer duas tranças que pudessem envolver o
infinito por um número inominável de vezes. Se isto vos parecer enfático, desgraçado leitor,
UNIUBE 215
é que nunca penteastes uma pequena, nunca pusestes as mãos adolescentes na jovem
cabeça de uma ninfa... Uma ninfa! Todo eu estou mitológico. Ainda há pouco, falando dos
seus olhos de ressaca, cheguei a escrever Tétis; risquei Tétis, risquemos ninfa; digamos
somente uma criatura amada, palavra que envolve todas as potências cristãs e pagãs.
Enfim, acabei as duas tranças. Onde estava a fita para atar‑lhes as pontas? Em cima da
mesa, um triste pedaço de fita enxovalhada. Juntei as pontas das tranças, uni‑as por um
laço, retoquei a obra alargando aqui, achatando ali, até que exclamei:
– Pronto!
– Estará bom?
– Veja no espelho.
Em vez de ir ao espelho, que pensais que fez Capitu? Não vos esqueçais que estava sentada,
de costas para mim. Capitu derreou a cabeça, a tal ponto que me foi preciso acudir com
as mãos e ampará‑la; o espaldar da cadeira era baixo. Inclinei‑me depois sobre ela, rosto
a rosto, mas trocados, os olhos de um na linha da boca do outro. Pedi‑lhe que levantasse
a cabeça, podia ficar tonta, machucar o pescoço. Cheguei a dizer‑lhe que estava feia; mas
nem esta razão a moveu.
– Levanta, Capitu!
Não quis, não levantou a cabeça, e ficamos assim a olhar um para o outro, até que ela
abrochou os lábios, eu desci os meus, e...
Grande foi a sensação do beijo; Capitu ergueu‑se, rápida, eu recuei até a parede com
uma espécie de vertigem, sem fala, os olhos escuros. Quando eles me clarearam, vi que
Capitu tinha os seus no chão. Não me atrevi a dizer nada; ainda que quisesse, faltava‑me
língua. Preso, atordoado, não achava gesto nem ímpeto que me descolasse da parede e
me atirasse a ela com mil palavras cálidas e mimosas... Não mofes dos meus quinze anos,
leitor precoce. Com dezessete, Des Grieux (e mais era Des Grieux) não pensava ainda na
diferença dos sexos.
PESQUISANDO NA WEB
Se sentir vontade de saber mais sobre a história de Bentinho e Capitu, você pode encontrá‑la
no romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, disponível no site Domínio Público:
<http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_
obra=2081>.
216 UNIUBE
Por meio das palavras, o narrador Dom Casmurro vai codificando suas percepções de
sentido como a visão e o tato, por exemplo, e então constrói expressões como: “sa‑
boreando pelo tato aqueles fios grossos”, “Os dedos roçavam na nuca”; “os olhos de
uma linha da boca do outro”, entre outras. Essas e outras expressões aguçam a nossa
memória e nos fazem imaginar a cena e sentir algo semelhante ao que o personagem
sentiu.
Por isso, esperamos que você tenha imaginado o primeiro beijo de Capitu e Bentinho
(Dom Casmurro, ainda menino)! E, que a cena imaginada tenha sido com detalhes, uma
vez que o narrador os traz, com riqueza. Esperamos mais ainda, querido(a) leitor(a),
digo, querido(a) aluno(a)! Esperamos que você tenha sentido sensações semelhantes
às do Bentinho! E... quem sabe? Tenha se lembrado do seu primeiro beijo de amor?!
PONTO-CHAVE
E, ainda, essas palavras nos levam a outro tempo, a um fluxo de tempo diferente do tempo
cronológico!
SAIBA MAIS
Memória visual
É aquela que vem pelos olhos e é responsável por cerca de 75% que se grava na memória.
Memória tátil é de ampla confiabilidade. Vai além do mero sentido do tato; inclui também a
percepção e a interpretação por meio da exploração sensorial (Fonte: Proavirtualec2).
UNIUBE 217
A linguagem não nos ajuda apenas a reviver nossas lembranças, nossos sentimentos
e a entender o outro. Ela também é inerente ao nosso pensamento, conservando e
interligando nossas ideias, em um fluxo de tempo, como explicou Chauí (2005).
Para refletir sobre isso, vamos pensar sobre o fragmento, a Monólogo interior
seguir, que evidencia a voz interior do sertanejo Fabiano. Este
é um personagem do romance Vidas secas, de Graciliano Ra- Lit. representação,
mos. No romance, o sertanejo e sua família tentam sobreviver em um monólogo ger.
no interior do sertão. A situação de carência vivida pelos per- Extenso, do fluxo da
consciência de um
sonagens condiciona‑os a uma série de injustiças, suprimindo
personagem ficcional,
direitos humanos fundamentais. O monólogo de Fabiano foi seus pensamentos
pensado, na ocasião em que foi preso injustamente. e sentimentos,
habitualmente com
Era bruto, sim senhor, nunca havia apren- uma desarticulação
dido, não sabia explicar‑se. Estava preso lógica dos períodos
e sentenças; diálogo
por isso? Como era? Então mete‑se um
interior. (Dicionário
homem na cadeia porque ele não sabe Houaiss da Língua
falar direito? Que mal fazia a brutalidade Portuguesa. Rio de
dele? Vivia trabalhando como um escravo. Janeiro: Objetiva,
Desentupia o bebedouro, consertava as 2001. p. 1953)
cercas, curava os animais − aproveitara
um casco de fazenda sem valor. Tudo Vidas secas
em ordem, podiam ver. Tinha culpa de ser
bruto? Quem tinha culpa? (GRACILIANO Romance do escritor
RAMOS, 2003, p. 35) brasileiro Graciliano
Ramos, considerado
por muitos como a
No monólogo, podemos ver claramente que, ao pensar sobre
maior obra do autor.
a situação, Fabiano levanta uma hipótese sobre a causa de O livro retrata a vida
ter sido preso: não sabia explicar‑se. E, à medida que vai pen- de pessoas que vivem
sando, constrói outras hipóteses, lapidando suas reflexões, no no sertão brasileiro
julgamento da situação que está vivendo. e o sacrifício delas
para sobreviver. Tendo
como tema a luta
Como Fabiano, nós também temos nossa voz interior e, a pela sobrevivência
todo momento, a usamos por meio de nossa inteligência, para diante do flagelo
resolver nossos problemas práticos e teóricos. Vejamos o que da estiagem, o
autor traz em seus
Marilena Chauí (2005) nos diz, sobre isso:
personagens muito da
alma nordestina nos
A inteligência humana, como atividade traços de Fabiano e
mental e de linguagem, pode ser definida sua família. (Fonte:
como a capacidade para enfrentar e co- Wikipédia)
locar diante de si problemas práticos e
téóricos, para os quais encontra, elabora
ou concebe soluções, seja pela criação de
instrumentos práticos (as técnicas), seja
pela criação de significações (ideias e
218 UNIUBE
Sobre a linguagem, sendo corpo do movimento de conhecer e, por isso, essencial para
consciência e enfrentamento dos problemas do mundo, Paulo Freire (1996), em seu
livro Pedagogia da autonomia, explica:
Veja que Fabiano considera difícil pensar. No fragmento O fio da ideia cresceu, en‑
grossou – e partiu‑se, o sertanejo percebe que o pensamento foi iniciado, mas não
conseguiu chegar à uma conclusão, rompendo‑se. Percebe, ainda, que se tivesse tido
estudo, certamente, conseguiria pensar com maior facilidade, entender melhor a história
que estava vivendo. Ele suspeita que, se conseguisse usar melhor os conceitos e as
ideias, botando as coisas nos seus lugares, conseguiria se defender, e, assim, poderia
participar de forma mais ativa e profícua em sua história, modificando‑a.
A história de Fabiano nos faz refletir sobre a libertação que o pensamento nos possi-
bilita, fazendo da história da qual fazemos parte um tempo de possibilidade e não de
determinismo. Sobre essa libertação, Paulo Freire nos diz:
x
que pode ser, ter sido ou vir a ser ou humanos), de modo que cada um
real; 3. restr. Hipótese, opção ou deles é completamente condicionado
alternativa possível; 4. Uso ou uti- pelos que o precederam.
lidade potencial; oportunidade.
(FERREIRA, 2005)
(FERREIRA, 2005)
Para pensamos melhor sobre isso, é importante refletirmos sobre os conceitos expostos
acima.
Se Fabiano conseguisse entender melhor a sua realidade, ele poderia atuar nela,
modificando‑a, criando novas possibilidades para aquele momento, tomando parte de sua
história. Entretanto, não conseguia progredir em seu pensamento, e, por isso, não conseguia
se defender, agir mudando o fenômeno, a situação de ter sido preso.
A palavra liberdade, aqui, ganhou duplo significado. Na situação da prisão, Fabiano foi apri-
sionado. Mas, o seu aprisionamento, ainda era maior e vinha antes dessa circunstância. Em
todas as situações de sua vida, ele se sentia aprisionado, ora por fenômenos naturais como
a seca que o empobrecia; ora por fenômenos humanos como a relação com seus patrões
que o exploravam, de certa forma, escravizando‑o. Sua vida, então, parecia um ciclo que
se repetia, interminavelmente, como se não houvesse a possibilidade de ser diferente!
O pensamento é triplamente libertador: ele nos leva para lugares diferentes, como cantou
Lupicínio Rodrigues; traz pessoas ao nosso encontro, como compuseram Valle e Viana,
e, ainda, nos ajuda a ver e a transformar a realidade, como explicaram Paulo Freire e
Marilena Chauí!
Não há como falar no pensamento, sem pensar na linguagem! Até este momento, você viu
o quanto à linguagem é importante ao pensamento, à inteligência. Mas, essa importância
não para por aqui! Ainda há muito sobre o que aprender em relação à linguagem. Então,
vamos lá!
PESQUISANDO NA WEB
Caso queira ver a letra inteira, sugerimos que acesse o site Letras.mus.br:
<http://letras.terra.com.br/lulu‑santos/35063/>.
SAIBA MAIS
Sinestesias
É a relação de planos sensoriais diferentes: Por exemplo, o gosto com o cheiro, ou a visão
com o olfato. O termo é usado para descrever uma figura de linguagem e uma série de fenô‑
menos provocados por uma condição neurológica (Fonte: Wikipédia).
Figuras de linguagem
São estratégias de escrita literária que o autor se utiliza no texto para provocar efeitos de
sentido.
As sereias são criaturas folclóricas cujo corpo é formado por metade mulher e metade peixe.
São musas que têm o poder de encantar todos aqueles que ouvem o seu canto.
O Flautista de Hamelim
Conto folclórico, reescrito pela primeira vez pelo Irmãos Grimm e que narra um desastre
incomum acontecido na cidade de Hamelin, na Alemanha [...]. A cidade de Hamelin estava
sofrendo com uma infestação de ratos. Um dia, chega à cidade um homem que reivindica
ser um “caçador de ratos” dizendo ter a solução para o problema. Prometeram‑lhe um bom
222 UNIUBE
pagamento em troca do sumiço dos ratos - uma moeda pela cabeça de cada um. O homem
aceitou o acordo, pegou uma flauta e hipnotizou os ratos, afogando‑os no Rio Weser. Ape‑
sar de obter sucesso, o povo da cidade abjurou a promessa feita e recusado‑se a pagar o
“caçador de ratos”, afirmando que ele não havia apresentado as cabeças. O homem deixou
a cidade, mas retornou várias semanas depois e, enquanto os habitantes estavam na igreja,
tocou novamente sua flauta, atraindo desta vez as crianças de Hamelin. Cento e trinta me‑
ninos e meninas seguiram-no para fora da cidade, aonde foram enfeitiçados e trancados em
uma caverna. Na cidade, só ficaram seus opulentos habitantes e seus repletos celeiros e
bem cheias despensas, protegidas por suas sólidas muralhas e um imenso manto de silêncio
e tristeza. E foi isso que se sucedeu há muitos, muitos anos, na deserta e vazia cidade de
Hamelin, onde, por mais que se procure, nunca se encontra nem um rato, nem uma criança.
(Fonte: Wikipédia)
Imaginamos que você já tenha ouvido falar das sereias e do Flautista de Hamelin.
Tais personagens são protagonistas de histórias folclóricas que são passadas de pais
para filhos. Essas histórias, pela beleza da linguagem, pelas temáticas, pelo poder de
encantamento que exerceram sobre gerações antecedentes, despertam na criança um
grande interesse, como ressaltam Pires e Sousa (2007):
As histórias folclóricas sobreviveram aos tempos em que não havia o registro escrito,
porque foram passadas oralmente. Ainda hoje, existem várias nações ágrafas, sobretudo
indígenas, que passam o seu legado de geração para geração de forma oral. Mas, não
é apenas nessas nações que a palavra oral tem poder.
zedores em processos de cura, e, até mesmo, nas expressões solenes que o reitor ou
o pró‑reitor irá pronunciar para você em sua colação de grau!
Chauí (2005, p. 249) nos explica que para referir‑se à palavra e à linguagem, os gre‑
gos possuíam duas palavras: mythos e logos. Segundo essa autora, a palavra grega
mythos significa
O mito tem o poder de fazer com que as coisas sejam tais como são
ditas ou pronunciadas. [...]
E a palavra logos:
Como vocês viram, ainda hoje, em diversos momentos de nossa vida, lidamos com
essas diferentes concepções sobre a palavra. Ao assumir duas dimensões, a palavra
parece habitar duas arenas, existindo ora sob uma concepção, ora sob outra, como não
pudesse existir em um só momento de forma múltipla, diversa. E isso, a gente percebe,
em vários momentos da nossa realidade.
EXEMPLIFICANDO!
Pelo depoimento de Temporão, podemos ver que a palavra sexo ainda é um tabu em
muitas famílias. Embora os pais, em geral, amem os seus filhos e saibam da importância
de esclarecê‑los sobre o sexo seguro, essa expressão ainda traz muito constrangimento
aos genitores. Por isso, muitas vezes, esse assunto, é deixado de lado, como se deixar
de falar nele fizesse os riscos de contágio das doenças sexualmente transmissíveis
desaparecerem.
Geralmente, a expressão fazer amor é utilizada como eufemismo para o ato sexual.
Esse eufemismo nos remete a dimensão romântica do sexo. Entretanto, embora o sexo
possa ser feito com amor, isso não garante a segurança necessária em relação à aids
e a outras doenças.
UNIUBE 225
Nesse exemplo, vemos que ao falar sobre o ato sexual usamos as duas dimensões
da linguagem:
Então, deve haver uma intersecção entre essas duas dimensões da linguagem, para
que haja uma discussão mais profunda e uma melhor compreensão sobre o assunto. A
palavra sexo deve ser contemplada como mythos + logos, para que seus significados
sejam desvelados, refletidos e ressignificados, desencadeando ações.
TROCANDO IDEIAS!
Converse com seus colegas e com seu (sua) preceptor(a) sobre isso. Troque ideias!
Segundo Marilena Chauí (2005, p. 151), muitos filósofos têm‑se preocupado em definir
linguagem e uma dessas definições afirma que:
Entretanto, para Chauí (2005), essa definição de linguagem não diz sobre várias coisas
e não respondem vários questionamentos, porque há uma divergência entre o que nos
dizem os empiristas e o que nos dizem os intelectualistas.
SAIBA MAIS
Afasia
s.f. Méd. Impossibilidade, por lesão cerebral, de expressão pela escrita ou por sinais ou de
compreensão da fala ou da escrita. (FERREIRA, 2005)
Agrafia
Surdez verbal
Cegueira verbal
IMPORTANTE!
Em outro capítulo do curso, você estudará o termo empirismo, de acordo com a perspectiva
pedagógica. Segundo essa visão, o empirismo valoriza o ambiente no aprendizado humano,
ou seja, a criança desenvolve suas características em função das condições em que vive, a
partir das estimulações que o meio proporciona.
Veja que, neste capítulo, estamos nos referindo ao termo empirismo apenas em relação à
linguagem!
228 UNIUBE
Chauí (2005), explica‑nos ainda que uma grande prova dos intelectualistas contra os
empiristas foi a história real de Hellen Keller. Hellen foi cega, surda e muda, entretanto,
sua professora Anna Sullivan conseguiu ensiná-la a ler e a escrever em braile.
IMPORTANTE!
Imagine o quanto deve ser difícil para uma pessoa que nunca tenha visto coisas, ouvido sons,
e pronunciado uma palavra ao menos, entender a linguagem e ser capaz de se comunicar
quer seja por meio de palavras orais, ou de palavras em braile. Veja que Hellen não ouvia nem
os próprios sons que emitia e não enxergava nada, ou seja, dos cinco sentidos que temos
audição, olfato, paladar, tato e visão, ela contava apenas com o olfato, o tato e o paladar, que
pouco contribuem com a comunicação.
Como Hellen Keller conseguiu compreender a função simbólica entre duas expressões
diferentes? Chauí (2005, p. 152), explica que:
[Ela] em uma das mãos sentia correr a água de uma torneira, en-
quanto a outra mão segurava um lápis e, guiada por sua professora,
ia traçando a palavra água: quando se tornou capaz de compreender
que uma mão traduzia o que a outra sentia, tornou‑se capaz de usar a
linguagem, isto é, passou a usar a linguagem dos gestos, a escrever
e a ler em braile.
SAIBA MAIS
Se possível, sugerimos que assista ao filme O milagre de Anna Sullivan, que encena esse
momento da vida de Hellen Keller e Anna Sulivan.
Gênero: Drama
PESQUISANDO NA WEB
Se quiser saber mais sobre Hellen Keller, sugerimos que acesse o site:
KELLER, Helen. Três dias para ver. In: Cérebro e mente, revista de divulgação científica em
Neurociência. Disponível em: <http://64.233.163.132/search?q=cache:ZsOfAnvXxVIJ:www.
cerebromente.org.br/n16/curiosidades/helen.htm+Hist%C3%B3ria+de+Hellen+Keller&cd=1&
hl=pt‑BR&ct=clnk&gl=br&lr=lang_pt>. Acesso em: 4 nov. 2009.
230 UNIUBE
X
Os empiristas ressaltam a Os intelectualistas ressaltam o
CURIOSIDADE
Note que o programador utiliza‑se de conectivos lógicos como “se, então, senão” para
ordenar o computador. Mas, não é só o computador que utiliza esse conectivos, a todo
o momento, usamos conjunções quando pensamos, falamos ou escrevemos. Mas, di‑
ferente dos computadores, a nossa linguagem não é inteiramente programável, muito
menos limitada e tão somente lógica.
E, ainda,
Além das descobertas que invalidavam o positivismo lógico, outros estudos também
criticaram as correntes empiristas e intelectualistas. Segundo Chauí (2005, p. 153), tais
estudos identificaram que:
PONTO-CHAVE
Não podemos imaginar um pensamento puro, mudo, silencioso, pois assim não o compreen-
deríamos, ou seja, ele não seria nada.
UNIUBE 233
Mas, ressaltamos, aqui, sobre o quanto a formação de Vygosty foi interdisciplinar e isso
nos aponta que as diferentes áreas do saber devem estar interligadas!
Apesar de não conseguirmos contemplar todas essas áreas neste texto, entendemos ser
importante trazer algumas reflexões feitas pela linguística, ciência que tem a linguagem
como objeto de estudo prioritário.
CURIOSIDADE
Vários linguistas contribuíram com conhecimentos importantes para diversas áreas do saber.
Dentre eles, ressaltamos Noam Chomsky, idealizador da gramática gerativo‑transformacional
que trouxe importantes conhecimentos para a informática. Bizzocchi (2000), do Programa de
Mestrado em Comunicação, da Fundação Cásper Líbero, de São Paulo, explica:
IMPORTANTE!
Pensamos que os conhecimentos linguísticos poderão instrumentalizá‑lo para que, você, aluno,
possa articulá‑los aos conhecimentos pedagógicos que possui e os que irá construir. Enten‑
demos assim, porque você, certamente, também será responsável pelo desenvolvimento da
linguagem pensada, falada e escrita em seus futuros alunos. Possivelmente, será um professor
alfabetizador, no sentido de que a alfabetização se dá em níveis de aprofundamento, durante
toda a nossa vida! Seja na sala de aula presencial ou virtual, seja nas mediações das discus‑
sões feitas com colegas de trabalho ou com professores que estiverem sob sua supervisão,
você deverá ter compreensão da importância e das possibilidades que a linguagem pode lhe
proporcionar, sabendo usá-la com competência.
Veja que nem todos os conhecimentos construídos, aqui, surtirão sentidos e efeitos
agora, imediatamente. Na verdade, eles vão se somando, se articulando como se fi-
zessem parte de um imenso quebra‑cabeça, que você está montando ao longo de sua
formação! O importante é que esses conhecimentos não sejam pormenorizados, mas
pelo contrário, que sejam adaptados ao que você já sabe, ou, que sejam guardados,
mas com a consciência de que eles existem e que poderão ser usufruídos no momento
oportuno!
Sendo assim, vamos tentar fazer um paralelo entre o que Chauí (2005) nos diz sobre
as contribuições da Linguística, a partir do século XX, e o que podemos entender.
Sobre isso, podemos entender que nós somos falantes da língua portuguesa, certo?
Por exemplo, se pegarmos um dicionário que contempla grande parte dessa língua,
veremos que ele tem aproximadamente 442 mil verbetes, ou seja, palavras. Entretanto,
cada um de nós não conhece todas as palavras que existem no dicionário, não fala-
mos todas as palavras da língua. Nesse exemplo, podemos notar uma das diferenças
básicas entre língua e fala, ou seja, a língua é muito maior por ser uma construção
histórica coletiva, por ser um sistema e a fala é menor porque se restringe ao uso que
cada falante faz da língua.
Fala
Sistema usado
por todos os falantes.
EXPLICANDO MELHOR
Na história de Marcelo, do livro Marcelo, marmelo, martelo e outras histórias, Ruth Rocha
brinca com esta questão da língua, uma vez que esse personagem não se conforma com
alguns signos, e, por isso, quer mudá‑los!
Por exemplo, Marcelo não se conforma com o signo travesseiro. Para ele, o suporte almofa-
dado, que colocamos debaixo da cabeça para descansarmos, deveria se chamar cabeceiro!
Embora a ideia de Marcelo seja interessante, ela não pode ser efetivada porque o signo con‑
vencionado na língua portuguesa para representar esse suporte almofadado é travesseiro!
Se começássemos usar a expressão cabeceiro em vez de travesseiro não conseguiríamos
nos comunicar, nos fazer entender pelos outros falantes da língua!
Ou seja: não podemos simplesmente inventar uma palavra nova quando acharmos que o
signo não representa bem uma ideia!
UNIUBE 237
CURIOSIDADE
Caso queira conhecer essa história, ela pode ser acessada no site:
<http://www.scribd.com/doc/5308703/Marcelo‑Marmelo‑Martelo‑Ruth‑Rocha>.
SAIBA MAIS
Convenção
s.f. acordo sobre determinada atividade, assunto etc., que obedece a entendimentos prévios e
normas baseadas na experiência recíproca <c. de sinais>. [...] 3.Conjunto de usos ou costumes
estabelecidos ou aceitos pelos indivíduos de determinado grupo [...] Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 542.
Travesseiro
s.m. 1. Almofada de paina, pena, algodão, espuma, etc. que se coloca à cabeceira da cama
e serve para descansar a cabeça, ao dormir. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 1874.
Veja que, como a língua é um código e faz parte do legado científico e cultural da huma‑
nidade, é de suma importância que seja contemplada e priorizada na educação formal.
Possibilitar a aprendizagem da língua com competência é possibilitar ao educando
desempenhá‑la com propriedade em diferentes circunstâncias e atingindo os objetivos
desejados. Ao dominar o código linguístico, o educando tem acesso a esse legado tão
238 UNIUBE
Não precisamos ser linguístas, ou seja, cientistas da língua, para a usarmos. Veja que
uma criança de dois anos, aproximadamente, já a utiliza quando chama por sua mãe
ou quando pede água. Num outro exemplo, percebemos que, antes de pronunciarmos
uma frase, não pensamos assim: vou usar um sujeito, depois um verbo e no final um
objeto direto para dizer: “Eu quero água”. Mas, apenas a pronunciamos! Desde peque‑
nos, internalizamos as regras da língua pelo uso que fazemos dela, em nossa casa,
em nossa comunidade.
EXPLICANDO MELHOR
Veja que para dirigir, não precisamos compreender todos os nomes das peças que compõem
um carro e explicar toda a estrutura de seu funcionamento. Mas, apenas precisamos saber
usar o automóvel com competência, considerando as regras de trânsito. Entretanto, o uso
dessas regras está condicionado ao local e às circunstâncias em que iremos dirigir. Por
exemplo, se você for dirigir num campo de futebol, sozinho, certamente não precisará usar
nenhuma delas!
Por outro lado, se não conseguimos entender esse código padrão, temos dificuldades em ler
uma enciclopédia, um artigo científico, uma lei, entre outros textos.
Além das contribuições citadas, há ainda linguístas que estudam a linguagem sob a
abordagem da Análise do Discurso. Esse campo da linguística e da comunicação analisa
as construções ideológicas presentes em um texto. Nessa perspectiva, o discurso é
considerado prática social, ou seja, uma construção social que só pode ser analisada
mediante o estudo de seu contexto histórico‑social e suas condições de produção. O
discurso reflete a visão de mundo de seu autor e da sociedade em que vive. O texto é
produto da atividade discursiva, por isso objeto de estudo investigado cientificamente
pelo linguísta.
CURIOSIDADE
Foi inaugurado, em 21 de março de 2006, o Museu da Língua Portuguesa que está locali‑
zado na Praça da Luz, no centro de São Paulo. O projeto foi avaliado em aproximadamente
R$ 37.000.000,00 (trinta e sete milhões de reais) e contou com sociólogos, museólogos,
especialistas em língua portuguesa e artistas que participaram de uma equipe de mais de
trinta profissionais. A equipe trabalhou sob a orientação da Fundação Roberto Marinho,
instituição conveniada ao Governo do Estado de São Paulo responsável pela concepção e
implantação do museu. No site Museu da Língua Portuguesa – Estação da Luz, podemos
ter uma noção dessa riqueza.
SAIBA MAIS
Caso você ainda não conheça o museu, saiba que vale a pena conhecê‑lo! Quem sabe você e
sua turma de curso não organizam uma excursão? Temos certeza que muitos conhecimentos
podem ser instigados nesse passeio!
Agora que terminamos esse breve passeio pelas contribuições da linguística, não po‑
demos terminar este capítulo sem nos remeter à linguagem enquanto instrumento de
elaboração dos sentimentos, por isso, vamos lá!
240 UNIUBE
Entendemos que, muitas vezes, todos nós, como o poeta, temos um sentimento de
angústia, sem saber qual o motivo, porque uma parte de nós é o que conhecemos pelo
pensamento, pela consciência, mas outra parte é o que existe e que não sabemos
decifrar, entender.
Essa parte escondida, da qual não temos consciência, chama‑se inconsciente e foi a
maior descoberta do médico austríaco chamado Sigmund Freud!
Se esses conceitos são desconhecidos para você, não se preocupe! Pela relevância
das contribuições desse importante cientista, você irá estudá-los, mais profundamente,
em outro texto. Aqui, queremos apenas mostrar o quanto a linguagem é importante no
processo de cura de perturbações e doenças mentais.
UNIUBE 241
SAIBA MAIS
Contingência
s.f. 1. caráter do que é contingente. 2. Possibilidade de que alguma coisa aconteça ou não. 3.
P. ext. fato imprevisível ou fortuito que escapa ao controle; eventualidade. Dicionário Houaiss
da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 818)
Inconsciente
adj. 2 g. 10 psicn segundo a primeira teoria da pisiquê formulada por S. Freud (neuropsiquiatra
austríaco,1856‑1939), diz‑se de ou sistema do aparelho psíquico constituído por conteúdos
recalcados, nos quais se desenrrolam processos dinâmicos que contribuem para determinar
a vida consciente. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,
2009).
Segundo Chauí (2005), para Freud, o nosso inconsciente não é representado pela
linguagem da mesma forma que a utilizamos quanto temos consciência de nossos
pensamentos e os expressamos. Mas, é representado:
• por nossos sonhos por meio de imagens que são pistas de pensa‑
mentos, sentimentos e ações;
Para tratar esses desconfortos, Freud fez profundos estudos e análises da vida psíquica,
e os chamou de Psicanálise. Uma das formas que criou para o tratamento foi a “técnica
de associação livre”. Até hoje, muitos psicanalistas se utilizam dessa técnica, que usa
a linguagem verbal e corporal na interpretação dos sentimentos e sua elaboração.
Nesse sentido, vemos que a linguagem, por meio da análise e definição dos sentimen‑
tos, também oportuniza a cura ou atenuação das angústias, tristezas, depressões e
neuroses do ser humano, possibilitando‑lhe um apaziguamento interior.
A psicanálise nos mostra também que a forma com que interpretamos as situa‑
ções que vivemos é fundamental na constituição de nossa memória, de nossas as‑
pirações e personalidade. Nessa perspectiva, as formas e as palavras com as quais
242 UNIUBE
6.4 Conclusão
Esperamos que você tenha percebido o quanto a linguagem é importante e o quanto
está presente e participa de diversas formas na/da existência humana. Entendemos
que muito do que falamos aqui é apenas “a ponta de um iceberg” do que ainda temos
que desvelar sobre esse tema, e contamos com você para isso! Estaremos felizes se os
conhecimentos que foram construídos por você, neste capítulo, levarem‑no a suspeitar
alguns dos fatores que se interagem na complexidade da relação entre linguagem e
Educação, possibilitando‑lhe uma reflexão e uma prática mais consciente.
Pensar e viver (ou seria viver e pensar?) na complexidade nos exige uma intensa
interação com outras pessoas e outros saberes, por isso, desejamos que esses co-
nhecimentos sejam, para você, como tentáculos a serem lançados para o passado e
para o futuro, em todos os sentidos, em todas as ciências, sem fronteiras, na busca
incessante do devir!
Resumo
Num primeiro momento deste capítulo, tentamos fazê‑lo refletir sobre a relação entre
pensamento, palavras e ações. A partir do capítulo O penteado de Dom Casmurro, de
Machado de Assis, abordamos a memória e a imaginação, discorrendo sobre a relação
entre elas e a linguagem. No item Linguagem: conservando e interligando nossas ideias
para uma ação, por meio do monólogo do personagem Fabiano, de Graciliano Ramos,
apresentamos uma situação prática em que a linguagem constitui‑se como instrumento
libertador, nesse sentido, remetemo‑nos à Educação Libertadora.
Por fim, sob o subtítulo A cura pela palavra: a linguagem e a elaboração dos sentimentos,
dialogamos sobre a psicanálise, ressaltando o método de associação livre, criado por
Freud, na cura das neuroses e doenças psicológicas. Nesse momento, ressaltamos a
importância da linguagem na constituição da personalidade humana.
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Atividades
Atividade 1
Leia o texto a seguir:
Em seus braços...
A canção chega tão serenamente. Num desafino, ouvem‑se vozes de crianças que experi‑
mentam a alegria de ser e apostam na certeza de um futuro irresistível. Seduzidas, sedutoras,
as vozes acariciam, embalam, lembram o coração que reina e sonha.
O cheiro. Cheiro de corpos de amigos que se esbarram ao fazer a fila. Depois, no pátio, as
palavras de boas‑vindas da diretora e a oração. Mãozinhas encontradas postas a orar. Os
olhos inquietos deveriam estar fechados, imaginando Deus. Mas, sorrateiros, teimam em
olhar para aquele céu tão irresistivelmente azul. O que será que há além do céu azul? Mamãe
explicou que em cima das nuvens há anjos de asas enormes que tocam harpas douradas e
cantam canções de amor.
E a imagem dos anjos cantantes se mistura com as vozes da canção que começa a ser
cantada em coro pelas crianças, naquele instante: “há um mundo bem melhor, todo feito pra
você...”.
O sol ardente, nos olhos infantis, impele-os a se fecharem. E as sensações se voltam para o
calor dos corpos dos colegas, um ao lado do outro: o suor, o hálito dos amigos cantantes, a
maresia, num experimento da quentura do mundo.
No pensamento, a imagem dos anjos tocando e cantando; anjos com rostos, vozes e cheiros
dos primeiros amigos na Terra, iluminados na manhã de um sol criança.
No caminho de volta para casa, a canção é cantada, pela menina, nas ruas do morro de Santa
Teresa. A criança equilibra seus pés e seu corpo naqueles paralelepípedos tão estreitos, en‑
quanto, deslumbrada, observa casarões que parecem se estender pelas copas das árvores,
tão igualmente grandes e antigas.
A beleza dos casarões, das árvores, dos bondes, das ruas ladeadas por muros de pedras é
explícita. Mas, ainda há uma beleza encoberta. Uma beleza que não se vê, que não se ouve,
mas que se sente. A beleza de tantos sentimentos que aquele lugar abriga. Quantas crianças
passaram por lá? Quantos pais contaram histórias embaixo daquelas árvores? Quantas mães
grávidas subiram aquelas ladeiras? Quantos beijos de amor foram dados ali?
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Na rua Ocidental, as árvores abrem passagem para o sol, pode-se avistar outros morros.
Ao chegar em casa, a menina ganha beijo de pai, de mãe e, na sacada, avista o amigo, de
braços abertos. Seu abraço vem com a maresia que, em gotas de mar, traz o cheiro da mata
Atlântica. Abraço de amigo com cheiro de pai, de mãe, de irmão-criança. Abraço com cheiro
de infância.
Mas, certo dia, levaram a menina de lá para um lugar onde bondinhos não existem.
Longe daquelas ruas, daquele bairro e dos amigos que havia ali, a criança descobriu a palavra
saudade. Impotente, a menina não tinha passagem de ônibus ou avião, nem mesmo dispunha
do pó de pirilim pim pim, mas desejava ardentemente voltar.
Foi assim, desejando, que ela descobriu o caminho de volta. Toda vez que sentia saudade,
começava a cantar a canção. E, magicamente, feito sonho, as ruas, as pessoas, os casarões,
o céu azul e sua casa cresciam em sua volta.
Na sacada, o amigo de braços abertos a esperava num abraço. Depois, enamorada, ela o
admirava de longe. Ele mantinha seu olhar altivo para o horizonte, de peito e braços abertos,
com o poder de um Pai. E o mundo diante dele parecia tão pequeno e, ao mesmo tempo, tão
vasto. Ela, diante dele, experimentava a vastidão do mundo sem medos.
O fato é que foi nos braços do Cristo que a menina foi acolhida no mundo. E, para os braços
dele, redenta, ela voltava sempre que sentia sua felicidade ameaçada.
Distância é coisa fácil de resolver para quem traz na alma o gosto do amor.
Nos braços do Cristo, a criança descobriu que o abraço do mundo para com a gente tem o
tamanho do ângulo de nosso abraço para com ele, com Ele.
Sempre, quando a mulher hesita, a menina que a habita pega carona na canção e vai de
encontro ao seu amigo que, ainda, a espera de braços abertos...
Na Seção Entre palavras, pensamentos e ações: a linguagem por muitas vozes, le-
mos:
Atividade 2
Chauí (2005, p. 249) nos explica que para referir‑se à palavra e à linguagem, os gre‑
gos possuíam duas palavras: mythos e logos. Segundo esta autora, a palavra grega
mythos significa
O mito tem o poder de fazer com que as coisas sejam tais como são
ditas ou pronunciadas. [...]
E a palavra logos:
Com base nessas definições, pesquise em jornais, revistas, textos em que possa per-
ceber essas duas concepções de linguagem, de forma separada. Depois, pesquise
textos em que possa perceber uma concepção de linguagem que considere essas
duas dimensões da palavra. Exemplifique as três situações, anexando os textos na
atividade e mostrando porque foram selecionados. Não se esqueça de fundamentar
suas escolhas.
Referências
ASSIS, Joaquim Maria Machado. Dom Casmurro. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bn000069.pdf>. Acesso em: 23 mar. 2010.
BIZZOCCHI. A. O fantástico mundo da linguagem. Revista Ciência Hoje, vol. 28, n. 164, 2000.
Disponível em: <http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/resource/download/41961>. Acesso
em: 16 out. 2009.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: o dicionário da língua portuguesa. 6. ed. Curitiba:
Positivo, 2005.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro:
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RAMOS, Graciliano. Vidas secas. Posfácio de Marilene Felinto. 91. ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.
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