Você está na página 1de 8

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

SETOR DE ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL - CAP/UFRJ

SEQUÊNCIA DIDÁTICA: MEDIAÇÃO DE CONFLITOS

Beatriz Mendes Queiroz (DRE:118029742)

Letícia de Sá e Souza de Oliveira Barcelos (DRE: 118069140)

Prof. Edson Soares

JUSTIFICATIVA

A composição desta sequência didática parte da compreensão de que os conflitos são


parte integrante da vida e da atividade social, e se origina da diferença de interesses, desejos e
aspirações (CHRISPINO, 2007). Por isso, ainda em diálogo com o autor, é necessário que as
práticas pedagógicas estejam orientadas não para encobrir o problema, mas para
compreendê-lo enquanto instrumento de crescimento e desenvolvimento de práticas
socioemocionais cada vez mais elaboradas e comprometidas com o fazer democrático. Além
disso, quanto mais diversificado o perfil dos estudantes maior é a tendência ao surgimento de
situações conflituosas de variadas ordens: de interesses, de poder, de valores, de relações
interpessoais… Portanto, a maneira como uma escola decide lidar com situações de conflito
revela muito sobre as concepções político-pedagógicas defendidas pela instituição.

Partindo deste cuidado necessário em relação ao modo como o conflito é


compreendido, Chrispino (2007) nos auxilia com o debate ao pensá-lo enquanto elemento
natural, inerente às relações humanas, portanto, inevitável. Os conflitos possuem um
potencial bastante positivo no que se refere à regulação das relações a partir do
reconhecimento da perspectiva do outro, auxiliando no exercício do movimento alteritário,
até mesmo em relação aos casos de maior agressividade, que dão preciosas pistas à escola em
relação aos encaminhamentos que podem ser pensados pela equipe gestora em relação ao
conflio:

Em geral, nas escolas e na vida, só percebemos o conflito quando este produz suas
manifestações violentas. Daí podemos tirar, pelo menos, duas conclusões: a
primeira é que se ele se manifestou de forma violenta é porque já existia antes na
forma de divergência ou antagonismo, e nós não soubemos ou não fomos
preparados para identificá-lo; a segunda é que toda a vez que o conflito se
manifesta, nós agimos para resolvê-lo, coibindo a manifestação violenta. E neste
caso, esquecemos que problemas mal resolvidos se repetem! (CHRISPINO, 2007,
p.16)

Outro desafio que se coloca em relação à mediação de um conflito diz respeito ao


modo como as emoções são vividas e compreendidas nesse processo. Reconhecê-las e falar
sobre elas nem sempre é uma tarefa fácil, especialmente na infância, onde o cérebro ainda
está se desenvolvendo para uma racionalização mais logicamente orientada dos
comportamentos. Nessa etapa da vida, é muito comum que as crianças expressem suas
emoções a partir do físico, havendo dificuldade, muitas vezes, em comunicar com palavras
aquilo que se sente. Nesse sentido, compreendemos que o surgimento de um conflito também
se relaciona ao modo como as crianças compreendem a si e aos outros, por isso, a reflexão
sobre as emoções tem um papel muito importante para que a mediação de conflitos não se dê
de forma autoritária - isso seria o contrário de mediação - mas de modo que se pense
autônoma e alteritariamente sobre a situação.

Para isso, a educação holística contribui com um arcabouço teórico-prático ao


propiciar uma nova perspectiva de existência relacionada ao mundo, em um movimento que
integra o ser no próprio sentido de ser. Ou seja, parte do autoconhecimento para unir, em
equilíbrio, a formação do ser individual e coletiva, conectando-a com a realidade, para a sua
compreensão (MACEDO, 2008). Nessa visão, a base da educação holística constrói-se
através da experiência humana, respeitando-se as necessidades emocionais, cognitivas,
psicológicas, físicas e espirituais. O holismo pode ser conceituado como uma visão global,
que conduz o ser humano a uma nova forma de pensar, uma nova visão de mundo, que lhe
possibilita perceber com todos os sentidos, a unicidade de si mesmo e de tudo que o cerca.
Por esta visão, o comportamento e as experiências emocionais se relacionam fisiologicamente
interagindo entre si (CREMA, 2008). Segundo Tavares (1994), tudo o que há na natureza -
seres humanos, insetos, moléculas, ou grandiosas galáxias - está interligado, numa totalidade
harmônica e funcional. Este parece ser o princípio da compreensão do holismo.

Nesse sentido, a educação holística tem muito a contribuir ao nos aproximar de uma
visão mais ampla de existência, uma existência que se conecta a tudo que existe, o que se
aproxima da filosofia Ubuntu: eu sou porque nós somos. Reconhece-se que a formação da
identidade dos sujeitos e a sua forma de intervir na realidade está ligada com seus valores,
com sua forma de pensar, sentir perante a realidade (CREMA, 2008), por isso, uma escola
que pensa holisticamente sua forma de educar, amplia sua própria percepção de conflitos.
Propor práticas capazes de intervir na sociedade da informação também é um grande desafio
que se propõe a escola, uma vez que tudo se passa muito rápido e temos dificuldade em
pensar com mais calma sobre a vida:

A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um


gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm:
requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar,
olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar,
demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a
vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir
os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar
aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e
espaço. (LARROSA, 2002, p.19)

Diante disso, o que Larrosa (2002) nos ajuda a pensar é no desafio da quietude
enquanto prática de vida, não em uma perspectiva disciplinarizante, mas de contato consigo
mesmo e atenção ao eu. Para isso, alinhando-se à educação holística, esta sequência propõe
práticas meditativas como um exercício de conexão consigo. Tolentino (2018) aponta o
quanto tais exercícios revolucionaram suas salas de aula, fazendo com que os estudantes
conseguissem conversar mais sobre seus próprios conflitos, se concentrar melhor em suas
atividades diárias, e exercitar a escuta com mais empatia e eficácia. Tudo a partir de
exercícios constantes de respiração e concentração em si.

PÚBLICO ALVO: Alunos do 1º ano do Ensino Fundamental

OBJETIVOS:

Geral: Reconhecer e expressar emoções;

Específicos:

- Exercitar a reflexão sobre si mesmo a partir da meditação;


- Pensar sobre o que se está sentindo e classificar emoções;
- (EI03EO01) Demonstrar empatia pelos outros, percebendo que as pessoas têm
diferentes sentimentos, necessidades e maneiras de pensar e agir.

CONTEÚDOS DISCIPLINARES: Mediação de conflitos


DURAÇÃO: 4 semanas

RECURSOS DIDÁTICOS:

● Aparelho de som;
● Livro “O Monstro das Cores;
● Cartolinas;
● Pilot;
● Lápis de cor;
● Impressos;
● Jogo;
● Rolo de barbante;
● Folha A4;
● Tintas;
● Pincéis.

DESENVOLVIMENTO

1° Semana

Dia 1: Convite aos alunos a sentarem no chão para a prática de meditação. Explicação do
motivo da sua importância, demonstração de possíveis posturas que podem ser realizadas no
momento da meditação (±5 min), e iniciação da atividade com música de fundo (1 min).

Dia 2: (20 min)

- Exercício meditativo (2 min);


- Leitura do livro "O monstro das cores" em roda.
- Conversa com as crianças para ouvir suas percepções a respeito do livro, e reflexão
acerca da complexidade de reconhecer as emoções e de como agir diante de cada
uma.

Dia 3: Conversa de revisão sobre o livro “O monstro das cores” e proposta de desenho
representando as cores das emoções que aparecem no livro + pensar em outra cor para
alguma emoção que não consta no livro e registrar. (50 min)
Dia 4: Exercício de meditação (3 min) e construção em conjunto de uma receita para vencer
o medo. A professora irá colocar um cartaz/folha no quadro e as crianças dirão coisas que
podem ajudar quando elas sentem medo, compondo uma lista para elas consultarem
posteriormente toda vez que sentirem esse sentimento. (30 min)

Dia 5: Exercício de meditação (4 min) e confecção de pequenos emojis dos sentimentos para
serem utilizados na próxima aula. (40 min)

2° Semana

Dia 1: (45 min)

- Organização no chão para início da meditação com música de fundo. (5 min)


- Conversa para relembrar o livro "O monstro das cores" e o que foi discutido na
semana anterior. (5 min)
- Apresentação para a turma da Ciranda das emoções com os emojis confeccionados na
aula passada, e explicação de como ela pode ser utilizada diariamente. (5 min)
- Utilização da Ciranda das emoções: momento em que um aluno por vez irá até a
ciranda para colocar seu nome no emoji referente ao sentimento de como está se
sentindo aquele dia, optando se irá querer falar sobre o motivo daquela emoção ou
não. A Ciranda será um cartaz em tabela com o nome e a foto de cada colega e os dias
correspondentes. (30 min)

Dia 2: Jogo "Quem sou eu?", onde o professor irá ler um cartão por vez com características
de uma emoção e as crianças terão que adivinhar qual é. Exemplo: Faço você se sentir bem e
ficar com vontade de sorrir o tempo inteiro. Quem sou eu? Nesse momento, as crianças
poderão acrescentar outras coisas que sentem vontade de fazer quando estão sentindo
determinada emoção. (40 min)

Dia 3: (40 min)

- Organização no chão para início da meditação com música de fundo. (6 min)


- Construção em conjunto da receita para vencer a raiva. (30 min)

3° Semana

Dia 1: (50 min)


- Organização da turma no tapete e realização de meditação com música de fundo. (7
min)
- Formação de roda para utilização da ciranda das emoções, onde um aluno por vez
colocará seu emoji na coluna referente a como está se sentindo no dia. (10 min)
- Realização da teia da empatia, que será realizada da seguinte forma: em roda, uma
criança irá jogar o barbante para outra pegar, e será convidada a falar uma coisa boa a
respeito do amigo que pegou o barbante. Exemplo: "Eu gosto da Maria porque ela…".
O barbante irá sendo passado de criança em criança até todas terem falado
características ou ações boas de seus colegas, e até ter sido formada uma teia que
conecta todas as crianças. (30 min)

Dia 2: Atividade de resolução de problemas: a/o professora/o pede para uma criança retirar
uma ficha aleatoriamente de sua mão, para a leitura do problema, e as crianças, em conjunto,
pensam em atitudes e ações que podem solucionar ou melhorar aquela situação. Exemplo de
ficha: “Pedro está muito chateado, pois seu colega não quer brincar da mesma brincadeira
que ele.” (30 min)

Dia 3: (40 min)

- Organização no chão para início da meditação com música de fundo. (8 min)


- Construção em conjunto da receita para vencer a tristeza. (30 min)

4° Semana

Dia 1: (30 min)

- Exercício de meditação com música de fundo. (9 min)

- Ciranda das emoções. Formação de roda para falar sobre como cada criança está se
sentindo no dia. (20 min)

Dia 2: Atividade de pintura: realização de desenho com tintas sobre o que o aluno aprendeu
durante as quatro semanas, ou o que mais chamou sua atenção. (40 min)

Dia 3: Encerramento (1h)

- Experiência de meditação no pátio com música de fundo. (10 min)


- Roda de conversa para mostrar os desenhos e falar a respeito do significado de cada
um e compartilhamento do que cada criança viveu a partir das práticas meditativas.
(20 min)

- Confecção de mural com todas as pinturas feitas pelas crianças. (10 min)

- Lanche coletivo (20 min)

AVALIAÇÃO

A avaliação será realizada de forma processual, ou seja, ao longo da sequência


didática, considerando pontos como participação, protagonismo e envolvimento dos alunos
nos registros da ciranda das emoções, nas atividades cotidianas propostas e, também, nas
falas e reflexões nas rodas de conversas. Além da participação nos exercícios meditativos, e
as composições artísticas exibidas no mural.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHRISPINO, Álvaro. Gestão do conflito escolar: da classificação dos conflitos aos modelos
de mediação. In: Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.15, n.54, p. 11-28, jan./mar.
2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v15n54/a02v1554.pdf

CREMA, Roberto. Introdução a visão holística: breve relato da viagem ao novo paradigma.
São Paulo. Editora Summus Editorial. 1989.

LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de


Educação, n. 19, jan./abr. 2002.

MACEDO, Malu. Educação holística. (2008). Disponível em: www.textolivre.com.br.


Consulta realizada em 02.06.10, às 23:58h. TAVARES, Clotilde. Iniciação à visão Holística.
Rio de Janeiro. Editora Record.2000.

TAVARES, Clotilde. Iniciação à visão Holística. Rio de Janeiro. Editora Record.2000.


TOLENTINO, Luana. Outra Educação é Possível: feminismo, antirracismo e inclusão em
sala de aula. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2018.

Você também pode gostar