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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
NITERÓI
2018
JANDIRA DA SILVA DE JESUS
Orientador:
Prof. Dr. José Roberto da Rocha Bernardo (UFF)
Niterói, RJ
2018
JANDIRA DA SILVA DE JESUS
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Orientador – Presidente: Prof. Dr. José Roberto da Rocha Bernardo (UFF)
_________________________________________________
Membro Titular: Prof. Dr. Nelson Barrelo Júnior (UFF)
_________________________________________________
Membro Titular: Prof.ª Dr.ª Giselle Faur de Castro Catarino (UERJ)
_________________________________________________
(Membro Suplente: Prof. Dr. Glauco dos Santos Ferreira da Silva (CEFET/RJ)
Niterói, RJ
2018
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
The work emphasizes the teacher’s precariousness caused by the legislation in force in Brasil
and to understand the situation of the readapted teacher and what this condition may represent
for him, the school and the students. Semi-structured interview, based on qualitative data to
understand through the analysis of the collected data, the situation of the readapted teachers.
A questionnaire was used to obtain information about the interviewer’s profile, such as age,
length of profession, time to readaptation and places where he / she has worked. Two
librarians, two coordinators and four readapted teachers, from the Niterói Municipal
Education, were interviewed. For those who were unable to conduct interviews in person, the
questionnaire and interview questions were sent by email. Of the four teachers interviewed,
only one stated that they did not relate their health problem to working conditions in public
education, but the intense workload worsened so that they could no longer work in the
classroom, needing to be readapted. A teacher related her necessity for readaptation to the
poor infrastructure conditions of public schools where she worked for lack of acoustic
protection, prompting her to force her voice, causing irreversible problems in the vocal
chords; two teachers directly related their physical health problems to emotional issues such
as panic and depression, to excessive bureaucracy, lack of infrastructure imposing crowded
classrooms, excessive overtime, many classes and the absence of public power to meet the
demands of professionals and education as a whole. The data show that teachers’
precariousness has affected the daily life of the teacher, causing their readaptation and the
abandonment of the classroom, besides directly affecting their physical and psychological
health. The lack of public policies aimed at education has caused the sickness and withdrawal
of teachers from classrooms and, in the cases studied, were directed to the school public
library or popular library, continuing their pedagogical work in a different manner,
considering the conventional way that teachers do their work.
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 11
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 73
APÊNDICE I ........................................................................................................................... 77
APÊNDICE II ......................................................................................................................... 78
APÊNDICE IV ........................................................................................................................ 80
APÊNDICE V ......................................................................................................................... 81
APÊNDICE VI ........................................................................................................................ 82
1 INTRODUÇÃO
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
De acordo com o Projeto de Lei (PL) 6.038/2013, para exercer a atividade de técnico
em biblioteconomia é necessário ter diploma reconhecido e expedido por escolas oficiais
brasileiras ou estrangeiras revalidado no Brasil; além de possuir registro no Conselho
Regional de Biblioteconomia (CRB) e estar em dia com as obrigações junto ao Conselho de
sua jurisdição. Estabelece também que o técnico deve ser supervisionado nas suas funções por
um profissional bibliotecário também com registro no CRB e em dia com suas obrigações no
referido Conselho. As atribuições de um técnico são as seguintes: “auxiliar nas atividades e
serviços concernentes ao funcionamento de bibliotecas e outros serviços de documentação e
informação; auxiliar no planejamento e desenvolvimento de projetos que ampliem as
atividades de atuação sociocultural das instituições em que atuam” (BRASIL, 2013). Compete
ao Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB) dispor sobre o código de ética, a anuidade e
as atribuições do técnico em Biblioteconomia; enquanto ao CRB da jurisdição que o
profissional atua, caberá a fiscalização do exercício da atividade. Deixando claro que na PL
citada somente trata sobre o cargo de técnico em Biblioteconomia, mas na Classificação
Brasileira de Ocupações (CBO) tem os dois cargos: auxiliar e técnico com atribuições
semelhantes.
Alguns autores destacam a importância do bibliotecário e de um bom acervo
bibliográfico para o êxito de uma biblioteca escolar. Isso implica, que para atingir tais
objetivos é fundamental: um profissional proativo, dedicado, atento às novidades, um agente
das mudanças sociais. O bibliotecário é um educador cujas funções são: “ensinar o aluno a
pensar, refletir e questionar os saberes registrados; verificar a pertinência, validade,
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aplicabilidade das ideias contidas nos livros” (CALDIN, 2005, p. 164). A escola é
representada pelos personagens do professor e do bibliotecário, assim devem trabalhar em
conjunto nesse contexto e inserir o educando nesse mundo de rápidas mudanças.
Souza (2009, p. 92) levanta a questão: “que profissional é o bibliotecário?” De acordo
com o autor, o profissional que encarar os problemas da sua profissão de forma objetiva,
estará apto a abrir caminhos, desenvolver com eficiência a proposta de levar o conhecimento
e a consciência crítica ao educando; dessa forma quanto à sua identidade profissional
deve-se indagar sobre seus objetivos e responsabilidades, seu valor para a sociedade
e status entre as demais carreiras profissionais e, consequentemente, o nível de sua
remuneração; quanto à organização da profissão como área do conhecimento, deve-
se indagar sobre a forma pela qual está organizada; como carreira profissional ou
como campo de investigação, como se processa sua formação profissional e como se
comunica com seus pares; quanto à relação com o usuário, deve-se indagar como vê
o usuário da biblioteca e como esse o vê; quanto ao desempenho profissional, deve-
se indagar em que consiste sua excelência, o que considera sucesso ou fracasso, se
está buscando emprego ou trabalho (p. 165).
Tardif (2002) discute os saberes da profissão docente para explicar sua formação e o
seu exercício ao afirmar que o saber dos professores é plural e heterogêneo porque envolve no
seu trabalho conhecimentos diversos de fontes variadas, esses saberes são confluências do
saber proveniente da sociedade, da família, da instituição escolar, da universidade, etc. É o
saber em si que está incorporado ao mecanismo social pelos instrumentos de trabalho,
currículo, etc.
Da mesma forma Contreras (2002) defende a ideia que “a escola, assim como a
sociedade não é uma instituição homogênea que representa valores e interesses internamente
coerentes”(p. 150); coloca ainda a ideia sobre a responsabilização dos professores em exercer
papéis variados na instituição escolar gerados por complexos problemas de ordem
institucional e social, os quais nenhuma formação acadêmica preparou para tal realidade;
situação comparável ao bibliotecário na disputa invisível da hierarquia dentro do espaço da
biblioteca com o profissional docente. O professor de escola pública é um agente do Estado
que atua de acordo com os parâmetros curriculares, regulações e normas, porém há a um
dilema entre seguir tais regulamentações ou atender às necessidades desse público escolar e
“fugir” das determinações diretas; porém ao mesmo tempo esse profissional se vê diante da
complexidade das condições burocráticas e do compromisso docente, entre outros fatores.
Alguns autores como Nóvoa (2011), defendem a necessidade de se construir políticas
que reforcem o conhecimento dos professores, seus saberes e os seus campos de atuação, que
valorizem as culturas docentes, e que a educação não seja um campo de dominação de outros
profissionais ou pela indústria do ensino, sem o comprometimento que a profissão exige para
o seu pleno desenvolvimento.
Bueno (2002) fundamenta a questão da desqualificação do professor, na virada dos
anos 2000 em diante, antes, nos anos 1980, o professor era ignorado, mas atualmente há uma
ênfase sobre o trabalho do professor e as reformulações propostas.
Percebe-se que as questões se interrelacionam com os saberes biblioteconômicos,
porque na formação docente também há esse questionamento sobre “como integrar” os
saberes e de que forma serão relevantes para os novos pares ao mesmo tempo que alguns
autores Valentim (2000), Souza (2009) e Corrêa (2004), discorrem sobre a importância do
profissional da informação interagir com outros pares.
Tardif (2002), diz que “ensinar supõe aprender a ensinar” (p. 20), quer dizer, a
dominar os saberes necessários à realização profissional, de acordo com o tempo,
progressivamente; são colocados em evidência os saberes anteriores, da vivência familiar,
com amigos, crenças e valores e isto pressupõe que de alguma forma os professores têm uma
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ideia de como ensinar antes mesmo de receberem uma formação formal nas universidades
para esse exercício, essa experiência adquirida persiste pelo tempo sem que o profissional a
perca. Tardif (2002) mostra que “o conhecimento do trabalho dos professores e o fato de levar
em consideração os seus saberes cotidianos permite renovar a nossa concepção não só a
respeito da formação deles, mas também de suas identidades, contribuições e papéis
profissionais.” (p. 23).
O autor fala da hierarquização do saber e questiona quais os princípios que regem
essas hierarquizações porque a diversidade de saberes traz à tona o problema da unificação e
da recomposição dos saberes “no e pelo trabalho”; sendo as diferentes fontes, os momentos
únicos profissionais e de experiência de vida que levantam essa tendência da utilização do
saber. Quanto menos utilizado, menor valor profissional terá esse saber porque segundo
Tardif (2002) “ensinar é mobilizar uma ampla variedade de saberes, reutilizando-os no
trabalho para adaptá-los e transformá-los pelo e para o trabalho” (p. 21).
A experiência nesse aspecto fundamenta o saber, é o alicerce da prática e da
competência profissional onde o professor realiza sua produção e ratifica seus saberes. Bueno
(2002) fundamenta essa questão da desqualificação do professor; caracterizada por Nóvoa
pelo “redirecionamento das pesquisas e práticas de formação” que tem início com a obra de
Ada Abraham – O professor é uma pessoa – publicada em 1984, pois é a partir de então que
“a literatura pedagógica foi invadida por obras e estudos sobre a vida dos professores, as
carreiras e os percursos profissionais, as biografias e autobiografias docentes ou o
desenvolvimento pessoal dos professores.” (NÓVOA, 1992, p. 15).
A ideia de reformulação e uma nova articulação na formação de professores é similar
às necessidades de revisão curricular na formação dos profissionais da informação, também
como uma exigência de um ponto de equilíbrio entre a demanda, as experiências de vida e os
conhecimentos produzidos pela universidade sendo a conjugação desses fatores uma questão
a ser considerada nos saberes cotidianos. Apesar do peso estratégico desses conhecimentos
entre os saberes sociais, há uma desvalorização do corpo docente em relação aos saberes que
possui e transmite como se houvesse um hiato entre todas as necessidades que são constatadas
onde só o professor com seu conhecimento pode suprir e o que de fato ele faz ou é
“permitido” que faça ou transmita.
Essa desvalorização percorre um longo caminho na trajetória docente perpassando
vários aspectos como o salário e as condições estruturais que não condizem com a
importância atribuída à função de professor, além da participação limitada nas escolhas que
atingem diretamente esse profissional, como a formação continuada, e nas reformulações e
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O saber docente é heterogêneo e plural, formado por diversos saberes que são
elementos constitutivos da prática docente. O que caracteriza a profissão docente são os três
saberes que se completam: disciplinares, curriculares e experienciais. O saber disciplinar está
integrado às diferentes disciplinas que são transmitidas nos cursos e na faculdade, além de
emergir da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes. O saber curricular
corresponde aos discursos e objetivos que a instituição escolar categoriza como modelo para a
formação escolar e que os professores devem aprender a aplicar. O saber experiencial é
baseado no trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio, esses saberes surgem da
experiência em confronto com as condições da profissão.
O docente é acima de tudo um formador, que traz relações com seus pares, as certezas
subjetivas que serão transformadas em um discurso sistematizado com suas experiências, sua
formação acadêmica e pessoal. Essa prática é destinada à sala de aula, ao ensinar as
disciplinas de acordo com uma sistemática estudada e regulamentada, porém quando esse
docente tem seu ambiente remanejado, toda uma política de métodos de educação deve ser
repensada assim como seus saberes experienciais na perspectiva de reorganizar o seu saber. O
professor readaptado exercendo a função na biblioteca poderá ter esses saberes repensados
para uma adaptação a outro ambiente diferente do seu habitual. A experiência pode provocar
uma retroalimentação em que o docente filtra e seleciona novos saberes como um processo de
aprendizagem no qual “retraduzem sua formação” e a adaptam às necessidades da profissão.
anos de 1990 as reformas educacionais centraram na equidade social, pois, era imperativo
aprimorar a educação com o objetivo de formar o indivíduo para a empregabilidade, como
requisito para a colocação no mercado formal e regulamentado, desta forma com o objetivo
de contenção da pobreza e da desigualdade.
A interferência dos organismos internacionais de financiamento, já presentes no país,
direciona as políticas educacionais inclusive nas bases curriculares. Na primeira década do
século XXI percebe-se os efeitos da globalização, do investimento pesado do sistema
capitalista, que atende a diversos interesses, e das consequências desses processos e da
atuação dos órgãos internacionais, que atrelam o financiamento à adesão as suas políticas de
orientação e controle educacionais.
A escola como está hoje, percebemos que, não foi favorecida nas negociações das
décadas passadas, o sistema público de ensino está desprestigiado e em crise; e aquela forma
de adesão às “negociações” sugeridas pelos organismos no século passado só seriam
compreendidas como um processo de mudança positivo e favorável para a sociedade se de
fato tais imposições viessem acompanhadas de comprometimento com projetos que gerassem
mudanças nas políticas públicas, sociais e culturais. O papel do Estado é controlar, no
entanto, neste aspecto, ele tem um processo de “descontrole controlado” (DU GAY apud
BALL 2002), onde novas posições de controle são lançadas com novas regras e
regulamentações, com isto os professores são incentivados a refletir sobre si próprios, seu
trabalho, acrescentando valor a si mesmos com o objetivo de aumentar sua produtividade; os
docentes passam a viver a experiência da meritocracia, quando passa a valer o mérito e não
somente a experiência, e a competir entre eles, o caráter pedagógico, a sua missão como
professor, dá lugar à “nova cultura da performatividade competitiva” (BALL 2002, p. 7). Esse
novo formato está ligado às várias práticas industriais que ligam a “organização e o
desempenho das escolas aos seus ambientes institucionais” (BALL 2002, p. 8).
A performatividade é “uma tecnologia, uma cultura e um modo de regulação que se
serve de críticas, comparações e exposições como meios de controle, atrito e mudança”
(BALL 2002, p. 4). Tal como a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico) se refere, a performatividade como “sistemas de monitorização” na “produção de
informação”. As relações dos professores com seus pares, a natureza da “alma do professor” e
o estudo da performatividade com a aplicação das tecnologias políticas da reforma, são a
fonte de estudo e preocupação de Ball. Para ele a análise das consequências tais como: “um
tipo diferente de esquizofrenia é vivido por professores individualmente, sendo o
compromisso e a entrega, o julgamento e a autenticidade dentro da prática sacrificados pela
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Marin (2009) destaca como fatores decisivos para a precarização do trabalho dos
professores
A ideia de outros autores citados acima, como Ball, Oliveira e Du Gay, que
relacionam a precarização do trabalho docente com o desgaste sofrido pelos profissionais com
constantes avaliações de desempenho causando insegurança, autocrítica e questionamentos;
coloca em suspenso a autonomia docente, a gestão e afasta o professor do seu público e
realizações, engessando sua prática.
profissional ao constatar que “ensinar não é o mais importante”. Nesse processo docente é
identificado o professor que atua na biblioteca por vontade própria, ele escolheu estar lá por
não aguentar mais o ambiente de sala de aula (depois de no mínimo dez anos de trabalho) e ao
escolher esse outro espaço, de certa forma, ele se sente atuando com os alunos ainda que de
forma diferente da sala de aula e sem o seu conhecimento curricular tradicional e de
formação; a perda de status, em alguns casos, na coleta de dados com docentes que atuam na
biblioteca, essa perda não foi percebida, porém uma das entrevistadas constatou um
reconhecimento e até um aumento de status junto à direção e aos colegas de profissão na
própria escola ao solicitar seu trabalho como dinamizadora (assim ela o definiu) com mais
frequência.
A perda da identidade profissional como dito acima implica para o profissional
docente um acúmulo de várias funções que não lhe cabem, como: psicólogo, enfermeiro,
assistente social, entre outras; por ausência do poder público atuante, pleno e sensível às
questões que o aluno demanda da escola e demonstra a fragilidade e o abandono da profissão
docente além do desprestígio. A educação é um fenômeno complexo, porque histórico,
influenciada em várias fronteiras, é produto do trabalho de seres humanos, dessa forma,
responde de maneiras diferentes aos contextos históricos, políticos e sociais, retrata e
reproduz a sociedade a qual está inserida, mas também projeta o que a sociedade deseja. Será
que o desejo da sociedade é a proletarização docente?
De acordo com Contreras (2002), a construção da autonomia profissional juntamente à
autonomia social vem através do processo democrático da educação, porém o Estado tem a
necessidade contraditória de legitimar seu papel junto à sociedade e às instituições com a
opressão característica de um poder que atua sobre o coletivo, através da ideologia do
profissionalismo ao subtrair possíveis movimentos de oposição e ao mesmo tempo
convocando a colaboração dos docentes para as reformas educacionais. Em contrapartida, os
professores criaram uma resistência em função dos seus interesses coletivos e individuais,
causando vários conflitos apesar do controle do Estado; essa forma de controle oferece aos
professores uma autonomia que não existe, uma pseudoautonomia gerando dentre outros
fatores a falta de controle sobre seu próprio trabalho que implica uma desorientação
ideológica.
De acordo com Young (2007, p. 1300) as escolas precisam de autonomia para
“desenvolver o conhecimento profissional, que é a base da autoridade dos professores e da
confiança que a sociedade deposita neles como profissionais”. Da mesma forma, na área da
informação, as reivindicações da sociedade, em especial ao acesso mais fácil à educação,
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Este benefício é concedido ao servidor público com vínculo efetivo pelo prazo
máximo de 1 (um) ano, de acordo com o Decreto Municipal 11.091/2012 que institui as
bibliotecas escolares municipais e dá outras providências. E a Lei Federal 11.301/2006 trata
sobre o professor readaptado.
No decorrer do período de readaptação o servidor realizará atividades compatíveis à
habilitação exigida para o ingresso no seu cargo público, com equivalência de vencimentos e
de carga horária. Caso o servidor não readquira as condições normais de trabalho no prazo
fixado na concessão inicial, a readaptação pode ser prorrogada após uma reavaliação da
perícia médica oficial. Na readaptação funcional ou seja, quando o profissional passa pelo
processo de readaptação, são considerados, além da doença e da capacidade física e psíquica
existente, o cargo ocupado, a idade e o tempo de serviço, não podendo durante sua vigência
ser concedida licença de saúde motivada pela mesma patologia que determinou a readaptação,
salvo nos casos de reagudização clínica (quando ocorre período de licença para tratamento de
saúde concomitante com o período de readaptação, após avaliação oficial).
Expirado o prazo da readaptação funcional o servidor retornará para a sua função
anterior. A readaptação não acarreta diminuição ou aumento da remuneração. Pode-se
destacar que não se aplica a perícia médica oficial na avaliação de requerimento de
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readaptação funcional e/ou reabilitação profissional de servidor regido pelo Regime Geral de
Previdência Social (RGPS).
De acordo com a resolução SE-12/2014, que dispõe sobre a situação funcional dos
servidores da Secretaria de Educação de SP que se encontram na condição de readaptados, diz
no artigo 3º: “atuar no Programa Ensino Integral, exclusivamente como docente responsável
pela Sala/Ambiente de Leitura”.; (citando como exemplo a cidade de São Paulo, por falta de
material de análise e comparativo suficiente que trate sobre a cidade de Niterói ou o Estado
do Rio de Janeiro).
Durante a realização do I Encontro Nacional de Coordenadores de Curso de Pedagogia
das Universidades Públicas, realizado em setembro (2006), foi considerado dentre outros
aspectos que estabelecem para o curso de DCN - Pedagogia (Diretrizes Curriculares
Nacional), que
também técnico, que pretende organizar o conhecimento de forma que atenda à demanda
escolar.
Para o gestor é mais um profissional a trabalhar nesse ambiente, como em qualquer
outro; para o bibliotecário, em alguns casos, há um certo enfrentamento “invisível” por ser
um profissional tradicionalmente com status dentro da escola, uma figura fundamental nesse
ambiente e que nesse momento faz parte do seu domínio, a biblioteca. O que pode se tornar
um local de “briga de egos”, pode ser também agregador ao trazer um profissional com
experiência pedagógica, que já desenvolveu atividades com um público diferenciado de
alunos como é o caso da escola pública, a qual tratamos aqui e que pode ser agregador;
destacando a presença da figura do bibliotecário que é o profissional de origem da biblioteca.
A ausência do termo “sala de leitura” ao longo desse trabalho foi proposital pois uma
antiga luta de todos os profissionais envolvidos com biblioteca, informação, leitura e livros,
travam com os governantes e legisladores que insistem em rotular a biblioteca como sala de
leitura; rótulo sim pois não há legislação ou qualquer outro aspecto sério e passível de
discussão para entender esse espaço de leitura e aprendizado como uma sala de leitura; a
descaracterização do espaço ao denominá-lo de sala de leitura deixa clara a desconfiguração a
que os governos se propõem abrindo espaço para o professor readaptado através de manobras
em artigos parágrafos nas leis que “autorizam” o professor nessa condição a “desenvolver
atividades pedagógicas nas bibliotecas” assim sem provocar qualquer tipo de problema com a
legislação.
A sanção da Lei Federal 12.244/2010 que fala sobre a universalização das bibliotecas
públicas e particulares em todo o país num espaço de 10 anos a partir da sua promulgação, se
mostrou um avanço (ao menos no papel e nas intenções) para o início da estruturação desses
espaços com mobiliário, material, recursos humanos, acervo atualizado, etc, especialmente
para o mercado de trabalho do bibliotecário pois, em um dos artigos da lei diz sobre a
“obrigatoriedade da presença do bibliotecário” (ao menos um) em cada biblioteca pública ou
particular. Uma questão paira no ar: diante da força de uma lei, ou melhor dessa lei, é possível
ainda manter espaços de conhecimento, aprendizado e leitura, denominadas bibliotecas
ignorando-as e tratando-as como sala de leitura?
Como pode-se observar ao longo desse trabalho, mesmo com uma lei federal com
prazo a ser cumprido faltam 2 anos e meio para a implementação de bibliotecas nas escolas
públicas e particulares em todo o Brasil, especificamente no município de Niterói somente 3
escolas públicas num total de 95 incluindo regulares, EJA ( Educação de Jovens e Adultos) e
UMEIs (Unidade Municipal de Educação Integrada) tem bibliotecas criadas por decreto com
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Oliveira (2008) relaciona dois fatores que fragilizam a manutenção dos paradigmas
discutidos acima: o armazenamento e a manutenção de acervos e documentos considerados
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mais importantes do que o conteúdo dos mesmos, e a avaliação dos serviços da biblioteca
relegando a figura do usuário, que é o elemento principal e final na dinâmica da
informação; essas características são fatores de atraso na compreensão do significado da
biblioteca como uma instituição social, dificultando a concretização desse espaço na
transformação da ideia como uma função social por parte das instituições e da sociedade.
Essa função social é entendida como “o fio condutor entre indivíduos e o
conhecimento” citado acima, que faz “a liga” entre o saber que o indivíduo traz de fora
ainda sem lapidação e o conhecimento estabelecido nos documentos do sistema, e assim
entra o trabalho do profissional da informação com as técnicas aprendidas na academia, a
experiência que Tardif (2002), Contreras (2002) e outros teóricos relacionados neste
trabalho citam sobre o profissional docente que forma a amálgama do conhecimento
profissional, mas que pode-se relacionar com qualquer área de outras profissões, neste caso
o bibliotecário: a experiência profissional, de vida, os conhecimentos da faculdade, cursos
e formação continuada e os saberes que ele traz consigo que o capacitam para ser um
profissional da informação, como também é conhecido o profissional de biblioteconomia.
Algumas questões são levantadas pelas autoras sobre o novo perfil profissional que
demanda na sociedade: “como desenvolver essas funções no novo contexto da sociedade de
informação? Que modificações devem ser efetuadas para que tanto a biblioteca quanto o
bibliotecário sejam membros dinâmicos da sociedade de informação?” (ARAÚJO; DIAS
apud OLIVEIRA, 2008, p. 119).
Ao pensar e sistematizar as questões ligadas à formação profissional e ao mesmo
tempo manter uma visão sintonizada com os paradigmas propostos e as atualizações
demandadas, nota-se que é desejável um conteúdo curricular que pense e ao mesmo tempo em
que enfoque a realidade brasileira. Esse desenho requerido atualmente está relacionado à
defasada estrutura curricular dos cursos de Biblioteconomia, muito criticada pelas escolas na
década de 1980, currículo esse coordenado pelo MEC denominado “currículo mínimo” que
delineava as matérias e os conteúdos não permitindo mudanças e inviabilizando
reestruturações e atualizações (VALENTIM, 2000, p. 9). A partir da nova Lei de Diretrizes e
Bases para a Educação (LDB), sancionada em 20/12/96, e os debates nacionais em torno do
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tônica seria a flexibilidade para acomodar os novos impactos. Entretanto, cabe refletir que,
com a formação dos cursos de Biblioteconomia generalista, torna-se bastante difícil para os
egressos desses cursos atuarem com desenvoltura nos ambientes. Assim, diante de tais
questionamentos e críticas, os docentes da área mostraram a urgência na adequação do ensino
às pressões do mercado de trabalho e da sociedade.
Nessas reflexões cabe assinalar que Tarapanoff (apud VALENTIM, 2000, p. 68)
defende a necessidade de reformulação dos currículos dos cursos de graduação em
Biblioteconomia, considerados defasados, rígidos e inadequados para o bibliotecário no
desempenho de novos papéis. De acordo com os estudos realizados por Tarapanoff (1999) as
soluções em alguns casos deveriam vir de forma pessoal, como um projeto individual de
suprir tais defasagens profissionais através de cursos de aprimoramento e especialização,
convívio com especialistas e o esforço em adquirir o conhecimento e o sentido do
aprendizado.
Apesar da presença de órgãos de representatividade da profissão, cursos formadores
reestruturados e um mercado de trabalho promissor, o desconhecimento sobre o campo de
atuação e as funções exercidas pelo profissional da informação no mercado de trabalho eram
perceptíveis na ocasião da formulação dessa proposta. Ainda vemos uma distorção da função
do bibliotecário, do papel que ele pode desempenhar que vai além da escola, das paredes da
instituição que abriga uma biblioteca. Acrescente-se a isso, as distorções estereotipadas
também pela mídia, as quais contribuíram para a entrada de outros profissionais no espaço da
biblioteca, além das razões e preocupações já citadas acima. De acordo com Valentim (2000),
um eficiente trabalho de marketing conjugado à estrutura normalizadora já atuante no Brasil,
é possível promover e fortalecer a imagem do profissional da informação. Assim várias ações
têm sido propostas para a consolidação da área e o desenvolvimento do profissional, dentre
elas:
Podem ser destacados o perfil e as funções sociais da profissão em três grandes eixos,
com suas funções: preservação; educação; e de suporte ao estudo e à pesquisa. Valentim
(2000) entende que a preservação compreende todos os processos de organização do
conhecimento registrado para garantir o acesso; na educação, a existência do bibliotecário
como professor prepara o indivíduo para buscar a informação; e, por fim, a função do suporte
está relacionada com o fornecimento de informações especializadas. No contexto das
bibliotecas públicas escolares a responsabilidade social do bibliotecário é mais evidente
porque ele está comprometido com o aprendizado e o exercício da cidadania conforme
mencionado, acima, e corresponde ao seguinte perfil:
- comunicador efetivo;
- organizador da informação;
- mediador no processo de transferência da informação;
- pesquisador das necessidades de informação das comunidades;
- criador de estratégias específicas para o atendimento de necessidades especiais;
- educador no que corresponde à criação de hábitos de leitura, estudo e pesquisa, e
competências para a escrita;
- líder no sentido de impulsionar o desenvolvimento dos indivíduos e da sociedade;
- dinamizador de bibliotecas como espaço de informação e convivência,
especialmente como espaço social (SANTOS apud VALENTIM 2000, p. 107).
conhecimentos, interaja com seus pares e esteja atento às transformações da sociedade. Atuar
nesse contexto exige do profissional uma postura proativa, criativa e de disposição constante
para enfrentar os desafios diários.
Interagir com outros profissionais em algumas situações se torna necessário (por
diversas razões) ainda que complexo, especialmente quando usufruem do mesmo espaço de
trabalho, como por exemplo, o professor readaptado na biblioteca escolar. Este exerce a
função na biblioteca, em situações de hierarquias diferenciadas, inversas as quais o professor
está acostumado e foi preparado para exercer na sala de aula.
Apesar de os conhecimentos que o bibliotecário agrega no curso de graduação e em
outras situações acadêmicas, fatores como esses (por exemplo: o docente que tem seu ponto
de referência na sala de aula e por razões diversas precisa sair) se tornam um desafio para
ambos os profissionais, porque não implica a formação tradicional e acadêmica, mas a
experiência, a sensibilidade, o bom senso e a relação social que é construída somente com o
exercício da profissão e a atuação junto aos seus pares, e a adaptação às mudanças e às
exigências institucionais.
3 METODOLOGIA DA PESQUISA
De acordo com Neto (apud MINAYO, 2004), entrevistas podem ser classificadas, de
acordo com o seu grau de estruturação, em estruturadas, não estruturadas ou semiestruturadas.
A entrevista do tipo não estruturada é aquela menos dirigida, mais aberta, onde “o
informante aborda livremente o tema proposto” (p. 58). A entrevista estruturada “pressupõe
perguntas devidamente formuladas” (p. 58). De acordo com o autor, há ainda a possibilidade
de articular as duas formas, em uma terceira modalidade denominada “semiestruturada” (p.
58).
Neste trabalho, as entrevistas foram realizadas a partir de roteiros previamente
organizados e se classificam como do tipo semiestruturada. Com os roteiros, foi possível
tornar os depoimentos mais objetivos e guiá-los em função do que era desejado, sem tirar a
liberdade do depoente em relação à sua exposição sobre cada uma das perguntas formuladas.
Foram elaborados diferentes roteiros, considerando o perfil do sujeito dentro da pesquisa:
professor readaptado, bibliotecário ou gestor (Apêndices VI, V e VI).
Das nove entrevistas, oito foram gravadas em áudio, transcritas integralmente e
apresentadas aos depoentes para que os mesmos tomassem conhecimento do conteúdo da
transcrição e dessem autorização final para a sua utilização. Uma das entrevistadas não
permitiu a gravação, devido à posição de gestora que ocupa na Secretaria Municipal de
Educação de Niterói. Neste caso específico, os dados foram obtidos das anotações realizadas
durante a entrevista.
Os diferentes instrumentos utilizados, como foi dito antes, possibilitaram a construção
de um conjunto de dados que subsidiaram a elaboração das categorias utilizadas na análise
dos dados.
A fim de esclarecimento, para em alguns casos em que foram utilizados o termo
entrevista e em outros, questionário. O questionário foi necessário para obter as informações
43
pessoais do entrevistado como nome (fictício na transcrição para a pesquisa), idade, tempo de
profissão, instituição que trabalha ou trabalhou, e no caso dos bibliotecários, o tempo de
experiência com um professor readaptado; para os professores readaptados seria o tempo
nessa condição. O termo entrevista é para as perguntas que foram utilizadas com a finalidade
de analisar os dados.
Uma das maneiras de realizar a análise do que é dito, ou do que é escrito, como no
caso dos dados produzidos nesta pesquisa, é por meio da chamada “análise de conteúdo”
(BARDIN, 2006).
De acordo com a autora, o termo refere-se a
Bardin (2006) recomenda que as categorias terminais devem ser provenientes “do
reagrupamento progressivo de categorias com generalidade mais fraca” (p. 113). Um conjunto
de categorias boas deve possuir as seguintes qualidades:
a excelência mútua: cada elemento não pode existir em mais de uma divisão.
a homogeneidade: um único princípio de classificação deve governar a sua
organização.
44
Este capítulo será explorado inicialmente a partir da caracterização dos sujeitos que
participaram da pesquisa e, em seguida, serão apresentadas as análises das entrevistas.
Inicialmente será feita uma breve apresentação dos sujeitos que concordaram em
participar da pesquisa voluntariamente, colaborando com o preenchimento de questionários e
por meio de entrevistas presenciais ou respondidas por e-mail, e conversas.
O colaborador Paulo foi entrevistado presencialmente e tem entre 30 e 40 anos.
Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública popular e exerce a função de
bibliotecário há quatro anos. Além da sua formação como bibliotecário trabalhou como
guarda municipal de Niterói antes de exercer sua atual profissão.
A colaboradora Márcia foi entrevistada presencialmente e tem entre 50 e 60 anos.
Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública escolar, e exerce a função de
bibliotecária há trinta anos. É formada em Licenciatura em Língua Portuguesa.
A colaboradora Ana foi entrevistada presencialmente e tem entre 50 e 60 anos.
Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública escolar, e exerce a função de
professora há trinta anos. É formada em Licenciatura em Artes, mas possui outras formações
em Letras e estudou Teatro. Exerceu a profissão de atriz e encontra-se na condição de
readaptada há quatro anos.
A colaboradora Deise foi entrevistada presencialmente e tem entre 50 e 60 anos.
Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública popular, e exerce a função de
professora há vinte e cinco anos. É formada em Licenciatura em Letras e encontra-se na
condição de readaptada há pouco mais de um ano.
A colaboradora Olívia respondeu ao roteiro da entrevista por e-mail e tem entre 60 e
70 anos. Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública escolar. Além de
formada em Letras (Português – Literatura) possui experiência como revisora crítica e
preparadora de textos, tendo participado do processo de confecção e da edição de livro
publicado.
A colaboradora Inês respondeu ao roteiro da entrevista por e-mail e tem entre 40 e 50
anos. Atualmente encontra-se trabalhando em uma biblioteca pública escolar. É formada em
Letras (Português – Literatura).
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A seguir são apresentadas as reflexões e trechos das falas dos sujeitos colaboradores
que se derem nas entrevistas realizadas.
Geralmente o professor, que já tem as suas atribuições definidas, que é dar aulas,
quando ele está na biblioteca ele não reconhece essas tarefas como dele e fica só
47
nas atividades de promoção da leitura. Eles não se relacionam com o público, uma
habilidade que é fundamental.
para os readaptados em relação à rotina das salas de aula. Nesse sentido, o depoente parece
enxergar a biblioteca como espaço de terapia possível.
De acordo com Paulo, o principal cuidado a ser tomado é reconhecer as limitações
dessas pessoas e procurar acolhê-las levando este fato em conta, entretanto, pondera
reconhecendo essa possibilidade desde que isso não ganhe status de política pública.
trabalhei com pessoas nessa situação... A biblioteca exige que seja compreendida
como como uma instituição dentro de outra; que tem regras próprias estabelecidas
fora do ambiente escolar. Creio que demora a se firmar uma identidade ou um
perfil de biblioteca, ou seja, ela deve atender um horário fixo, ter um corpo de
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funcionários por menor que seja, mas presente. Porém recursos são escassos e aí
um professor vai colar etiquetas, cobrar livros, arrumar estante, etc.
Sobre a sua relação pessoal com o professor readaptado, Márcia aponta mais uma vez
a questão da incompatibilidade nos horários como elemento importante e causador de
instabilidade, evocando a própria legislação para apontar o quanto a presença do professor
nessas condições pode comprometer o trabalho. Ela declara:
Não é muito estável. Em geral tem essa questão com que me bato. A biblioteca deve
ter horário fixo para as pessoas saberem que está aberta aquele horário e podem
contar com ela... Aí que não vai ter nunca um funcionamento regular. Não tem essa
pessoa para permitir uma regularidade e é difícil que a identidade da biblioteca se
firme desse modo. Isso é uma brecha para conflitos, já que as pessoas entendem que
farão seu horário de acordo com suas necessidades, mas não de acordo com as
necessidades do leitorado, coisa que é uma lei pública. Então a biblioteca vira algo
‘acessório’ e não fundamental para a escola.
Gosto de dar aula, é uma coisa que nasceu comigo... não sei ficar sem ter contato
com aluno... me jogaram na sala de leitura e eu estou adorando porque estou
podendo usar o meu potencial de professora de literatura, que eu fui, com o teatro...
eu estou querendo formar leitores... eu tô me realizando.
Cada professor de Artes é uma aula por semana, então eu numa matrícula tenho
doze turmas, dou uma aula em cada turma. Se eu ficar trabalhando duas vezes é
vinte alunos... é muito aluno, então a minha voz cansou... eu ficava rouca, já na
terça-feira não conseguia mais falar... a fono falou que as minhas cordas vocais
estão cansadas.
Eu adorei a sala de leitura porque a gente não tem que dar conteúdo. Eram muitas
aulas que eu dava... eu vi que era um lugar que eu... eu ajudo os professores
também.
O professor deve ensinar a ler, matemática, mas eu acho que passar conteúdo é o
menos importante, eu acho que Paulo Freire tinha razão, primeiro a gente precisa
de ensinar a pensar... se o aluno souber pensar, ele vai saber ler e escrever mas não
de forma automática... com pensamentos, com questionamentos... aí ele vai ver o
mundo criticamente.
É a formação de ajudar a pensar... é o que ensina a pensar, o que ensina a criar, a
construir um mundo mais justo. Eu acredito que a Educação possa mudar as coisas,
apesar que eu tenho tudo o que eu já passei nesse país em relação à opressão, à
censura, a tudo, mas eu vou morrer acreditando. Eu acho que se a política pública
fizer da escola um lugar onde o aluno possa pensar e criar... tiraram o estudo de
Artes agora da escola. A Arte é onde o aluno pensa, cria, faz coisas críticas... por
isso eu acho que, cada vez mais nós precisamos de professores... esse negócio de
dizer que o computador vai dominar... nós precisamos de gente... de educadores que
formem consciências […] desconstroem coisas prontas que a gente chega até a
acreditar. Tô vendo uma propaganda na televisão... agronegócio... uma pessoa que
não sabe pensa que a coisa melhor do mundo... eu acho que a gente na escola tem
que fazer, desconstruir e mostrar um caminho onde a gente possa pensar na
natureza junto com o homem e o progresso.
51
Problemas nas cordas vocais, como os apresentados pela professora Ana, podem ser
provocados pelo excesso de turmas, de alunos e pelas más condições de acústica das salas de
aula. São aspectos relacionados com a precariedade da infraestrutura da escola e com a
burocracia que impõem aos professores essas condições de trabalho, temas já discutidos por
Ball (2002) ao falar da “cultura da performatividade”.
Embora declare gostar de dar aulas, a professora afirma estar se realizando na
biblioteca, onde tem a oportunidade de implementar uma série de atividades que fogem à
lógica do currículo vigente inspirado na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e
centrado em conteúdo. Nesse sentido, para a professora colaboradora da pesquisa, o espaço da
biblioteca tem funcionado como local onde ela pode inovar a partir de saberes (TARDIF,
52
Em 2016... eu fui despedir das turmas (no final do ano) e comecei a me emocionar,
a chorar. Eu não sou assim... aí, no início do ano eu estava assim agoniada, não
queria voltar pra sala mais. Aí eu chorava à toa... aí eu falei, caramba eu não estou
aguentando ficar em sala de aula mais. Aí a diretora falou: você tem que pedir uma
readaptação então... eu achei que era cansaço físico... mas depois eu vi que ficava
mexida. Aí falei: tenho que fazer alguma coisa. Aí eu fui lá na Prefeitura... eu
queria trabalhar na biblioteca... porque eu ia ficar mais tranquila... eu não queria o
compromisso de turma.
Aí eu fui parar numa escola lá na Grota, a pior escola que já fui na minha vida... e
lá as escadas são assim (referindo-se à inclinação)... fora o tiroteio que lá tem todos
os dias na hora do almoço ... a gente come no chão, abaixado. Eu tenho problema
de coluna, e aí, com o emocional ferrado, as dores apareceram ... aí a diretora da
escola (da segunda escola) me devolveu... porque realmente eu não estava
aguentando as crianças... as crianças faziam o que queriam dentro de sala, eu
sozinha não conseguia. Aí fui pro médico e o médico falou que eu estava com
artrose... e me deu dois anos de readaptação e fui pra biblioteca pública popular.
Estou amando ficar lá! Agora, com 65 anos, você sabe que eu vou voltar para a
sala de aula?
53
De acordo com a depoente, a sua chegada à biblioteca pode ser considerada como um
momento de acolhimento. Em sua fala ganha destaque o papel do bibliotecário, por ser um
“super ser humano” e por deixá-la à vontade em relação à escolha das atividades a serem
executadas na biblioteca. Um contexto que lhe ofereceu oportunidade, inclusive, para que
Deise pudesse atuar mobilizando saberes da sua experiência ou da sua formação, como
aqueles que aponta Tardif (2002).
Ainda sobre a sua relação com a biblioteca, a professora Deise declara a sua simpatia
pelo local por considerá-lo uma possibilidade de ficar longe das salas de aula que lhe trazem
sofrimento, embora declare que esse estado de instabilidade emocional não está associado aos
alunos, de quem declara sentir falta.
Eu gosto (da biblioteca) porque eu não tenho o compromisso de sala de aula, mas
eu sinto falta dos alunos. Eu sinto falta deles. Mas está sendo bom, porque eu tenho
alunos, não tenho muitos, mas pelo menos duas vezes na semana...
Eu fui bem até 63, 64, dali pra cá não estava mais aguentando sala de aula. Não
são os alunos... é a cobrança... fazer relatório... faz o portfólio das crianças, um a
um, todo dia tem que escrever na agenda.
e destaca o quanto aquele espaço pode ser adequado para implementação de atividades onde
possa aproveitar seus saberes (TARDIF, 2002).
Essa satisfação da professora em relação à sua adaptação pode ter sido facilitada pela
sua própria formação em Letras. Nesse sentido os saberes docentes (disciplinares) obtidos da
55
acredito que a minha maior expectativa é conseguir motivar os alunos a lerem mais,
a sentirem o que é um livro, sua capa, o título, o que poderá conter em suas
páginas, a viagem que podemos fazer através da leitura, sua importância, o prazer
simplesmente de ler. Enfim, fazer da Sala de Leitura uma atração à parte. Tanto
que estou revitalizando o local, numa tentativa de as crianças se sentirem
estimuladas e felizes ao frequentarem esse Cantinho do Saber.
Fui dinamizadora do Projeto “A Voz/Vez do Leitor”, que, a meu ver, se não foi o
melhor, foi um dos projetos mais bem estruturados da rede. Possibilitava aos alunos
o acesso a livros de vários gêneros. Era a leitura pelo prazer de ler. A escolha era
do aluno. Não havia obrigação. Pela falta de tempo, não seria viável a explicação
da estratégia pedagógica no desenvolvimento desse projeto. Sintetizando, ao final
da leitura do livro, havia as rodas de leitura e a apresentação dos trabalhos, que
poderia ser feita através de peças teatrais, dança, contação de histórias, resumos,
resenhas críticas, etc. Foi um projeto prazeroso, tanto para os dinamizadores,
quanto para os alunos.
Olívia apresenta em suas reflexões duas visões abertas, a saber, sobre a profissão
docente e sobre o papel da biblioteca. No primeiro caso apresenta o professor como alguém
capaz de desenvolver atividades que transcendem à sala de aula, sobretudo no que diz respeito
às possibilidades de ações em bibliotecas. Sem a possibilidade de tecer reflexões sobre
experiências com bibliotecários, já que esta figura não existe em seu posto de trabalho, a
professora parece satisfeita com a sua condição de readaptada na biblioteca, local que define
como adequado para a realização de atividades menos rotineiras, uma característica do
trabalho docente. Nesse sentido, a mobilização daquilo que Tardif (2002) trata de saberes
docentes – saberes disciplinares e saberes experienciais – por parte da professora pareceu
favorecer sobremaneira esse processo de adaptação ao novo posto de trabalho, uma vez que,
inegavelmente, a formação em Letras pode facilitar ações e iniciativas como as que são
apresentadas pela professora em sua exposição na forma de atividades realizadas. Entretanto,
é importante chamara a tenção que, ainda assim, a professora parece ter consciência da
importância de se tratar a biblioteca como tal, quando chama a atenção para a importância de
se observar e ter atenção aos horários naquele espaço. Com isso, a professora parece lançar
57
mão da sua autonomia (CONTRERAS, 2002) sem deixar que o compromisso institucional de
lado.
Outro aspecto destacado pela professora Olívia se relaciona com questões apontadas
por autores como Ball(2002), a respeito da “cultura da performatividade” ou o excesso de
aulas que castiga os professores da educação básica em geral. A colaboradora descreve o
motivo da sua entrada na condição de readaptada como sendo uma calcificação nos ombros
devida aos longos períodos escrevendo no quadro negro que a retirou de dentro da sala de
aula.
Sobre a precariedade que envolve a estrutura escolar, embora não tenha explicitado
claramente, a colaboradora Inês nos apresenta um quadro bastante triste e que pode ser a
realidade de muitos professores, qual seja, a angústia vivida quando se tem um problema de
saúde e não se consegue sequer cuidar da doença. Readaptada há cinco anos, a professora Inês
informou ter levado muito tempo para que o diagnóstico da artrite reumatoide fosse
“enviado”, tendo ela que conciliar o seu sofrimento proveniente das fortes dores com as aulas
por muito tempo. A colaboradora declara estar consciente de que a sua doença não está
relacionada com o exercício da profissão.
Estou nessa função desde 2013, quando fui obrigada a passar pelo processo de
readaptação após anos tentando conciliar a sala de aula com a artrite reumatoide.
A artrite reumatoide atacou os pés, as mãos, os ombros, mas permaneci na sala de
aula, apesar de diversas licenças. Mas quando chegou ao maxilar, precisei entender
que não dava mais.
Não consigo identificar nenhuma relação com a minha profissão. Os primeiros
sintomas apareceram durante a gravidez; quando meu filho estava com 2 anos, eu
levei um tombo em uma escola e machuquei o ombro. De lá para cá os sintomas se
tornaram mais evidentes, o ombro já doía, com a queda começou a “gritar”. Do
ombro para as mãos, das mãos para os pés. O diagnóstico demorou a vir.
[ ...] a artrite impede seu exercício, impossível subir diversas escadas, correr de
uma escola a outra, falar por horas e, até mesmo, ter humor para lidar com
adolescentes divertidos e cheios de vida, quando se mora em um corpo adoentado e
enfraquecido pela dor e extremamente fatigado; sem contar que as crises que
impossibilitam algumas atividades [ ...]
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A respeito da sua relação com a biblioteca, Inês declara que não existe a figura do
bibliotecário presente no seu dia a dia, por isso trabalha com autonomia plena na biblioteca.
Entretanto, suas ações são sempre reféns do seu estado de sofrimento, tirando da informante
até mesmo a sua esperança no futuro.
Tenho total liberdade por parte da escola para trabalhar. Porém, desde o começo
desse ano estamos envolvidas na reorganização do espaço [ ... ] Não temos
bibliotecário, nós mesmas estamos estabelecendo critérios para a disposição dos
livros.
Sou readaptada devido à artrite reumatoide. Tenho períodos de crise que me
impedem de escrever e/ou falar [ ... ]
se transformar em políticas públicas, e o depoente fez isso sem deixar de ter também uma
visão institucional em certa medida.
pública ...
É um local diferenciado,
aprazível, onde qualquer
atividade pedagógica pode ser
realizada de forma menos
rotineira.
“a segunda é o problema
vocal”
69
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
porque não contempla a nenhum segmento dos atores envolvidos, pelo que aqui foi
verificado.
Ainda que possam ser encontrados espaços com pessoas com alto grau de
generosidade e sensíveis à causa dos readaptados nas bibliotecas públicas, não é aceitável que
o efetivo acolhimento desses professores fique refém e dependente de pessoas e espaços que
os recebam de forma minimamente respeitosa e profissional.
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REFERÊNCIAS
________. Lei Federal 11.301/2006. Trata sobre o professor readaptado. Disponível em:
<www.planalto.gov.br_Ato2004-2006>. Acesso em: 15/03/2017.
________. Lei Federal 12.244/2010. Trata sobre a universalização das bibliotecas públicas
e particulares em todo o território nacional. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso
em: 04/05/2017.
________. Resolução SE-12, de 18/03/2014. Dispõe sobre a situação funcional dos servidores
da Secretaria de Educação que se encontram na condição de readaptados, e dá providências
correlatas. Diário Oficial Poder Executivo. Seção I, 19 de março de 2014, p. 17-18.
Disponível em: <http://apeoesp.wordpress.com>. Acesso em: 30/05/2017.
FONSECA, Edson Nery da. Introdução à Biblioteconomia. Brasília: Briquet de Lemos, 2007.
MARCHIORI, Patrícia. Que profissional queremos formar para o século XXI. In: Informação
& Informação. Londrina, v. 1, n.1, p. 27-34, jan./jun. 1996.
SAMPAIO, Maria das Mercês F.; MARIN, Alda Junqueira. Precarização do trabalho
docente e seus efeitos sobre as práticas curriculares. In: Educ. Soc. Campinas, vol. 25, n.89,
p.1203-1225, set/dez de 2004. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>.
SILVA, Juliana de Souza; NETO, Samuel de Souza; BENITES, Larissa C. A docência como
profissão: um estudo sobre a dimensão (sócio-) afetiva do professor. UNESP, 1999, p. 788-
799.
YOUNG, Michael. Para que servem as escolas. In: Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 101, p.
1287-1302, set/dez de 2007. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em:
13/04/2017.
77
APÊNDICE I
3. Fale um pouco sobre as atividades que você, como bibliotecário, pensa que um
professor poderia desenvolver em uma biblioteca ou em uma sala de leitura.
4. Como tem sido a sua experiência como bibliotecário que convive com um professor
readaptado na biblioteca/sala de leitura? Fale um pouco dessa experiência.
5. Você tem expectativas em relação à parceria com professores readaptados? Quais são
as expectativas que você tem em relação a um trabalho mais articulado com um
professor readaptado? Fale um pouco sobre isso.
78
APÊNDICE II
Nome:
Naturalidade:
Idade:
a) Entre 20 e 30 anos
b) Entre 30 e 40 anos
c) Entre 40 e 50 anos
d) Entre 50 e 60 anos
e) Entre 60 e 70 anos
Tempo na profissão:
Instituição(ões) em que trabalha/trabalhou:
Tempo de experiência com algum professor readaptado:
79
APÊNDICE III
Nome:
Naturalidade:
Idade:
a) Entre 20 e 30 anos
b) Entre 30 e 40 anos
c) Entre 40 e 50 anos
d) Entre 50 e 60 anos
e) Entre 60 e 70 anos
Tempo na profissão:
Instituição(ões) em que trabalha/trabalhou:
80
APÊNDICE IV
APÊNDICE V
3. Fale um pouco sobre as atividades que você, como bibliotecário, pensa que um
professor poderia desenvolver em uma biblioteca ou em uma sala de leitura.
4. Como tem sido a sua experiência como bibliotecário que convive com um professor
readaptado na biblioteca/sala de leitura? Fale um pouco dessa experiência.
a. Como têm sido definidas as atividades que este desenvolve?
b. O que ele tem realizado?
c. Como é a sua relação (pessoal e profissional) com o professor readaptado?
APÊNDICE VI
5. Como tem sido a sua experiência em relação ao caso dos professores readaptados nas
bibliotecas/salas de leitura? Fale um pouco dessa experiência.
7. Você tem expectativas em relação aos professores readaptados? Fale um pouco sobre
isso.
83
Prezado(a) participante:
Sou pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação, no curso de
Mestrado, na Universidade Federal Fluminense (UFF) Niterói/RJ. Estou realizando uma
pesquisa para a minha Dissertação de Mestrado em Educação sob a supervisão do professor
Dr. José Roberto da Rocha Bernardo cujo título é ‘A Situação dos Professores Readaptados
em Bibliotecas e Salas de Leitura’.
Sua participação envolve a concessão de entrevista que será gravada, se assim você
permitir, e terá a duração prevista de 30 a 40 minutos. Após a gravação a entrevista será
transcrita e devolvida a você via e-mail para os ajustes e modificações que considerar
necessários.
A participação nesse estudo é voluntária e, se você decidir não participar ou quiser
desistir de continuar em qualquer momento, tem absoluta liberdade de fazê-lo. Os dados
obtidos serão utilizados apenas nesta pesquisa e os resultados divulgados apenas no texto da
dissertação, em eventos e/ou revistas científicas.
Em relação à sua identidade, esta será mantida no mais rigoroso sigilo. Serão omitidas
todas as informações que permitam identificá-lo (a), assim como não haverá nenhum custo ou
quaisquer compensações financeiras.
Mesmo não tendo benefícios diretos ao participar, indiretamente você estará
contribuindo para a compreensão do fenômeno estudado e para a produção de conhecimento
científico.
Quaisquer dúvidas relativas à pesquisa poderão ser esclarecidas pela pesquisadora
Jandira da Silva de Jesus, via telefone pelo número (21)986299211, ou por e-mail:
jandira70@yahoo.com.br.
Atenciosamente,
_____________________________________ _____________________________
Jandira da Silva de Jesus (Pesquisadora) Local e data