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Caderno #04 S E LO

URDUME

URDUME
Tapeçaria brasileira:
ecos no presente Carolina Bouvie Grippa
O CADERNO
Urdume
é um programa do Instituto Urdume, que tem
por objetivo partilhar, com aqueles que nos
acompanham, ensaios, esboços e referências
de pesquisas que temos realizado e têm nos
acompanhado nos últimos dois anos.

Sempre com foco em um tema específico,


os Cadernos chegam para complementar o
conteúdo plural que produzimos para a re-
vista, porém com mais argumentação his-
tórica e questionamentos que esbarram nas
lacunas existentes na produção teórica na
área. Convidamos você, estimado leitor, a
adentrar os cadernos e tramá-los conosco.

Boa leitura!
Sobre a autora
Carolina Bouvie Grippa é mestra em
artes visuais com ênfase em Histó-
ria, Teoria e Crítica de Arte (Ufrgs),
graduada em História da Arte (Ufrgs)
e em moda (Universidade Feevale).
Atua como produtora cultural, cura-
dora e pesquisa tapeçaria brasileira
desde 2017.
A o pensarmos em arte, o mais comum é relacioná-
-la com pinturas, aquarelas e esculturas, suportes
lembrados como mais tradicionais. E a tapeçaria?
Qual seria o seu lugar na história da arte brasileira?

Pode parecer estranho pensar em tapeçaria no Brasil, pois nunca houve


grandes centros da técnica, como Aubusson, na França. Mas há uma
relação entre tecelagem e influências africanas, técnicas de cestaria de
indígenas e os mais diversos bordados, rendas e técnicas têxteis que
são difundidas pelo país. Apenas a partir do século XX diversos artistas
brasileiros produzirão tapeçaria e o farão num contexto de expressão e
visibilidade internacional dessa linguagem, repensando esse meio artís-
tico até então subordinado à pintura.

Há alguns nomes que sobressaem quando tratamos da tapeçaria brasileira.


Um deles é o de Regina Gomide Graz (1897-1973), uma interessada pelas
artes decorativas. Ela viu na realização de tapetes e tapeçarias uma manei-
ra de explorar o art déco, estilo de arte vigente no início do século XX e
que tem como uma das principais características formas geometrizadas.

A artista realizou seus estudos em Genebra, na École des Beaux Arts,


onde as artes aplicadas eram bem-vistas e ocupavam metade dos cursos
oferecidos pela universidade. Ao retornar ao Brasil, na década de 1920,
ela e seu marido, o artista suíço John Graz, foram aceitos no círculo de
intelectuais de São Paulo e participaram da Semana de Arte Moderna,

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em 1922, na qual Graz expôs tapetes. A partir de então, o casal desenvol-
veu projetos decorativos para a elite paulistana, inclusive na casa moder-
nista de Gregori Warchavchik, o que era uma opção incomum na época.

Ana Paula Cavalcanti Simioni realizou a pesquisa mais completa sobre


a artista. Ela comenta que, naquela época, os artistas normalmente re-
corriam aos suportes tradicionais, como pintura e escultura, razão pela
qual o trabalho nas artes decorativas do casal Graz foi inovador.

Porém, havia uma divisão muito clara nos projetos: Regina Graz, por
ser mulher, era a responsável por criar os elementos decorativos liga-
dos ao têxtil, como tapetes, cortinas e almofadas, artefatos associados a
um saber feminino. Independentemente dessa situação, ela inaugurou
a Indústria Regina Graz, em 1940, e obteve sucesso até 1957, quando se
tornou muito difícil concorrer com produções totalmente industriais.

Outra artista que se voltou para a tapeçaria foi Madeleine Colaço, que,
casada com o jornalista e escritor Thomaz Ribeiro Colaço, foi morar
no município de Espraiado, cidade localizada a 70 quilômetros da ca-
pital fluminense. Era por volta dos anos 30, e Colaço desenvolveu, com
grande maestria, diversas tapeçarias, sempre olhando para a paisagem
brasileira – tanto a urbana quanto a da natureza. Seguidamente, a ar-
tista viajava para conhecer mais sobre fauna, flora, histórias, tradições
e arquitetura local e passava o que via para suas criações com linhas.

Madeleine Colaço também foi responsável pela criação do ponto bra-


sileiro, sendo este registrado no Centro Nacional de Tapeçaria Antiga

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e Moderna, da França. “O samba sempre me encantou, gosto de ou-
vi-lo enquanto trabalho. Foi sensibilizada por seu ritmo que inventei
o ponto brasileiro, feito de tal forma que se parece a um gingado”
(MATTAR, 2009, p. 57). A criação do ponto trouxe prestígio a Made-
leine, recebendo diversos convites para mostras, no Brasil e no exte-
rior. Também foi chamada para produzir uma tapeçaria para o Palá-
cio Itamaraty, de Brasília. Essa questão é importante para pensarmos
sobre a tapeçaria no Brasil, pois esse suporte se beneficiou da união
da arquitetura com a arte, muito em voga na arquitetura moderna,
conceito que tem como princípio a ligação intrínseca entre as artes
e a arquitetura, buscando unidade dos elementos artísticos com os
construtivos. No Brasil, a noção foi colocada em prática na casa mo-
dernista de Warchavchik (por isso, a participação de Regina e John
Graz), em 1927, com a construção do antigo prédio do Ministério da
Educação e Saúde, em 1936. Já o ápice se deu com o projeto da cidade
de Brasília, na década de 1950.

Assim, não é por acaso que há diversas tapeçarias, incluindo a de Co-


laço, nos acervos dos prédios públicos do Distrito Federal. Podemos
encontrar tapeçarias de Burle Marx, Concessa Colaço, Di Cavalcanti,
Norberto Nicola e Kennedy Bahia, por exemplo. A relação entre arte
e arquitetura era aparente no início da trajetória de Genaro de Car-
valho, outro nome da tapeçaria brasileira, pois um dos seus primeiros
trabalhos foi um mural realizado no Hotel Bahia e, justamente por
essa obra, Genaro de Carvalho recebeu a visita inusitada de Jean Lur-
çat em seu ateliê.

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Genaro de Carvalho. Horto da Esperança, s.d.
Tapeçaria bordada em lã sobre talagarça, 95 x 129 cm.
Acervo artístico do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS.
Fotografia: Fábio Del Re & Carlos Stein – VivaFoto.

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O artista francês Jean Lurçat se dedicou intensamente à tapeçaria,
tornando-se conhecido por formular o conceito de “nova tapeçaria”.
A noção propunha que os artistas criassem cartões mais adequados
ao suporte têxtil, priorizando desenhos sem perspectiva, sem som-
breamentos e usando poucas cores. Lurçat também criou a Associa-
ção de Pintores de Cartões de Tapeçaria, com o objetivo de conquis-
tar a autonomia da tapeçaria e envolver mais artistas com a técnica;
e também foi responsável pelo desenvolvimento e pelo sucesso das
Bienais de Lausanne, evento voltado para a exposição de tapeçaria
e arte têxtil, que ocorreu de 1962 a 1995. Apenas cinco artistas bra-
sileiros participaram da mostra suíça: Genaro de Carvalho, Zoravia
Bettiol, Jacques Douchez, Heloisa Silva Braun e Shirley Paes Leme.

Shirley Paes Leme.


Uno, 1991. Massa
de papel, galhos
secos de eucalipto
e arame, 100 m.
SESC Pompéia,
São Paulo, Brasil.

Essa foi a obra expos-


ta na 15° Bienal de
Lausanne, em 1992.
Genaro de Carvalho estudou na França, no fim da década de 1940, e
teve oportunidade de conhecer o movimento francês em prol da ta-
peçaria, interessando-se pelo assunto. Ao retornar ao Brasil, iniciou
uma produção pequena de tapeçarias e recebeu a visita de Lurçat,
confirmando que seu traço se adequaria muito bem ao têxtil. Car-
valho ampliou a produção de tapeçarias e abriu o primeiro ateliê em
Salvador, na Bahia. Realizando tapeçarias bordadas, o artista se des-
tacou pelo estilo próprio e fácil de ser identificado, com desenho grá-
fico colorido, remetendo a uma “exuberância tropical”, com vegeta-
ção abundante, girassóis, pássaros e borboletas. Infelizmente, faleceu
cedo, aos 45 anos, mas sua produção foi abundante, chegando a ter
um ateliê com cerca de 80 bordadeiras.

Nesse mesmo período, dois artistas tomaram a frente da produção


têxtil, levando a tapeçaria para a tridimensionalidade. Jacques Dou-
chez e Norberto Nicola se conheceram no Atelier Abstração (1951-
1960), de Samson Flexor, no qual a pintura praticada era da abstração
geométrica, linha que Flexor seguia. Douchez, nove anos mais velho
que Nicola, foi um dos primeiros alunos do Atelier, e os dois se tor-
naram muito amigos assim que se conheceram. Ambos participaram
de diversas exposições do grupo e seguiram os preceitos ensinados
por Flexor. Porém, a pintura foi repensada e, por volta de 1955, os
dois artistas começaram a se interessar pela tapeçaria. Inspirados pela
técnica, Douchez e Nicola buscaram a ajuda de Regina Gomide Graz,
devido ao seu conhecimento. A artista os estimulou, indicou a eles a
tecelã Gertrude Stuneff como professora e lhes deu um tear. Em 1959,
eles criaram o Atelier Douchez-Nicola, especializado em tapeçaria
tecida, ou seja, com o uso do tear.

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Norberto Nicola. Alba, 1979.
Lã, sisal, algodão em tear de alto liço, 105 x 152 cm.
Acervo artístico do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS.
Fotografia: Fábio Del Re & Carlos Stein – VivaFoto.

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A produção inicial dos dois artistas é de conhecimento e exploração
da lã, muito baseada na transposição dos desenhos já feitos na pintu-
ra para a tapeçaria. Mas, com o passar do tempo, e com mais conhe-
cimento da técnica e das possibilidades que o tear oferece, as obras
foram ficando mais complexas. Ainda assim, seguiam os preceitos da
renovação francesa, com um número reduzido de cores e simplifica-
ção nas formas.

Com a VIII Bienal de São Paulo (1965), a comissão organizadora da


Polônia, além de trazer pintores e gravuristas, participou da sessão
de Arte Aplicada expondo três artistas têxteis: Jolanta Owidzka, Wo-
jciech Sadley e Magdalena Abakanowicz. Esta ganhou o prêmio de
arte aplicada na edição. Artistas da Polônia, desde a sua aparição na
primeira edição da Bienal de Lausanne, chamaram muito atenção
do público e da crítica, devido à experimentação do tear, incluindo
diversos materiais e inovando nas formas.

O impacto da Bienal foi profundo, fazendo com que Nicola viajas-


se à Europa, conhecesse nomes importantes da tapeçaria, incluindo
Jagoda Buić, Magdalena Abakanowicz e Maria Łaszkiewicz. Ao re-
tornar ao Brasil, impactado com o que havia visto na Europa, Nicola
repassou as informações ao colega de ateliê, e os dois se voltaram
para o tear, redescobrindo a tecelagem e chegando a soluções tridi-
mensionais, que seriam apresentadas pela primeira vez, na Galeria
Documenta (São Paulo), em 1969.

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Jacques Douchez. Funambulesca, 1980.
Lã, sisal e algodão em tear de baixo liço. 134 x 131 cm.
Acervo artístico do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS.
Fotografia: Fábio Del Re & Carlos Stein – VivaFoto.

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Os trabalhos da dupla não mais se pareciam com a tradicional tape-
çaria, apresentando liberdade de forma e do convencional retângulo.
Nicola criou tapeçarias presas apenas pela parte superior, podendo ser
soltas no espaço, e o artista usava cordões, torções e entrançamento
de tiras tecidas. Essas características de seus trabalhos foram retoma-
das em diversos momentos de sua trajetória. Douchez criou uma obra
diferente, mais geométrica. A partir de fitas tecidas sobrepostas e cru-
zadas, o artista deu volume à obra.

Outra artista influenciada diretamente pelo têxtil produzido na Polô-


nia foi Zoravia Bettiol. Durante sua formação no Instituto de Artes da
UFRGS, ela fez uma viagem na qual teve a oportunidade de conhecer
o ateliê de tapeçaria de Genaro de Carvalho e de ver uma exposição
das tapeçarias de Lurçat, o que aflorou seu interesse.

Em 1955, recém-formada, Bettiol produziu sua primeira tapeçaria bor-


dada. Depois, passou a realizar tapeçarias de recorte. Mas foi em 1969,
em viagem a Varsóvia para estudar técnicas de tecelagem, que sua
produção têxtil ganhou força. Em um primeiro momento, a artista
frequentou aulas na Universidade de Belas Artes. Depois, tornou-se
aluna de Maria Łaszkiewicz, pessoa importante para a divulgação da
técnica na capital polonesa. Lá, Bettiol aprendeu a tecer e passou a se
valer da feitura da tapeçaria para o resultado, alternando com preen-
chimento e vazados na trama, dando efeitos de transferência e volume
à peça e misturando materiais como sisal, rami, lã e madeira. O reco-
nhecimento dessa nova produção chegou depressa: após o período na
Polônia, Zoravia foi a segunda artista brasileira a participar da Bienal
de Lausanne e, quando retornou para Porto Alegre, onde tinha ateliê,
seus trabalhos despertaram novos interesses.
Zoravia Bettiol. Transfigurações da pedra I: Tapeçaria n° 58, 1983.
Tecelagem manual com algodão e pedra. 71 x 134 cm.
Acervo artístico do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – MARGS.
Fotografia: Fábio Del Re & Carlos Stein – VivaFoto.

Com tapeçarias expostas no evento de arte mais importante do Bra-


sil, a Bienal de São Paulo, e com diversos artistas se apropriando e
produzindo tapeçaria e obras têxteis, sendo os aqui citados os pre-
cursores desse movimento, a tapeçaria teria o seu auge na história
da arte brasileira em 1970, quando diversas exposições se realizaram,
legitimando o suporte como arte e incentivando a criação de centros
de artistas, o que promoveu a união da classe.

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Anos 1970 – o auge da tapeçaria

Dado o passo inicial com a Bienal de Lausanne, em 1962 – primeira


grande exposição sobre tapeçaria e que tinha por objetivo a divulgação
do suporte têxtil junto ao público mais amplo –, diversos países cria-
ram os seus próprios eventos têxteis a partir da década de 1970. Não foi
diferente no Brasil. Nessa época, já havia movimentação em torno da
arte têxtil, com diversas exposições em museus e galerias. Nesse espí-
rito, algumas mostras se tornaram icônicas e impossíveis de não serem
comentadas quando o tema é a tapeçaria brasileira: Tapeçaria Brasilei-
ra, na Universidade Federal de Minas Gerais (1974); 1ª Mostra Brasilei-
ra de Tapeçaria, no Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando
Alvares Penteado (1974); as Trienais de Tapeçaria de São Paulo, no
Museu de Arte Moderna – MAMSP (1976, 1979, 1982) e Caminhos da
Tapeçaria Brasileira, na Galeria Funarte (1978).

Estas as mostras mais relevantes da história têxtil brasileira, tendo ex-


postos e premiados diversos artistas do país. Para se ter ideia da adesão
à tapeçaria pelos artistas nessa época, a 1ª Mostra Brasileira de Tape-
çaria exibiu 155 tapeçarias de 75 artistas; a I Trienal teve 66 artistas; e a
segunda edição contou com 67 participantes. Alguns artistas de tape-
çaria e arte têxtil eram constantes nessas exposições, como Bia Vascon-
cellos, Berenice Gorini, Carla Obino, Gilda de Azeredo de Azevedo,
Ignez Turazza, Inge Roesler, Iracy Nitsche, Liciê Hunsche, Marlene
Trindade, Michel e Xtiano, Salomé Steinmetz, Sonia Moeller e Parodi.

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Berenice Gorini.
Orunko: Axó Iemanjá,
1977. Fibra natural,
420 x 125 x 115 cm.
Acervo artístico do
Museu de Arte do Rio
Grande do Sul – MARGS.
Fotografia: Fábio Del Re
& Carlos Stein – VivaFoto.
Houve artistas com trajetórias mais consolidadas em outras técnicas, como
pintura, escultura e gravura, que flertaram com o têxtil e chegaram a pro-
duzir algumas tapeçarias. Encontram-se (com certa dificuldade) pelos
acervos e em coleções particulares tapeçarias de Alfredo Volpi, Aldemir
Martins, Francisco Brennand, Di Cavalcanti, Glênio Bianchetti, Iberê Ca-
margo, Nelson Jungbluth, Regina Silveira, Xico Stockinger, Djanira, Ma-
nabu Mabe, Vasco Prado e Carlos Scliar, por exemplo.

Em consequência da movimentação em relação à tapeçaria, criou-se, em


março de 1976, o Centro Brasileiro da Tapeçaria Contemporânea. A ideia
partiu dos artistas Jacques Docuhez, Norberto Nicola e Zoravia Bettiol,
que tinham por objetivo promover a tapeçaria e formar um núcleo agre-
gador para artistas que se interessavam pela técnica.

O Centro Brasileiro, infelizmente, não teve uma organização efetiva, mas foi
devido a esse passo inicial que se criaram outros centros regionais, como o
Centro Gaúcho da Tapeçaria Contemporânea, em 1980, Núcleo Paulista de
Tapeçaria, em 1982, e Centro Paulista de Tapeçaria, em 1986. Desses, o mais
atuante e longevo foi o Centro Gaúcho, que durou até 2000, somou cerca
de 200 inscritos e realizou mais de 50 exposições no Brasil e no Exterior. O
CGTC também tinha trocas constantes com Centro de Tapeçaria Uruguaio
(CTU) e Centro Argentino de Arte del Tapis (CAAT).

Entretanto, com toda essa movimentação nas décadas de 1970 e 1980, envol-
vendo exposições e artistas, a tapeçaria ficou à margem da história da arte, sen-
do pouco estudada e pesquisada. Houve algumas razões para seu apagamento,
como a ruptura entre Belas Artes e “artes aplicadas”, e a tapeçaria no segundo
grupo, com seus produtores reconhecidos por menor “intelectualização” em
função do saber manual e artesanal envolvido na produção. Essas técnicas tam-
bém estavam muito ligadas ao “mundo feminino”, entravando sua legitimação
perante a dificuldade da mulher em se estabelecer no mundo artístico.
Arte têxtil hoje

É perceptível o interesse de artistas contemporâneos por fios, bor-


dados e as mais diversas técnicas têxteis. Evocando conceito de me-
mória e ancestralidade e colocando em questão a ideia do “femini-
no”, diversos artistas brasileiros contemporâneos olham, novamente,
para técnicas têxteis variadas para criação de suas obras. Adrianna
Eu, Carolina Ponte, Laura Lima, Maria Nepomuceno, Randolpho
Lamonier, Rivane Neuenschwander, Rosana Paulino, Mônica Lóss,
Vanessa Freitag, Pedro Luis, Alexandre Heberte e Sonia Gomes são
pouquíssimos nomes de artistas que usam fios em suas obras.

Carolina Ponte
Sem título, 2011
Crochê e moldura
de madeira
200 x 340 x 175 cm

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Esse interesse também se reflete em exposições recentes, como a mostra
FIBRA, I Bienal de Arte Têxtil Contemporânea, realizada em 2019 na ci-
dade de Porto Alegre. Também em 2019, a exposição A memória que se
tece: o Centro Gaúcho da Tapeçaria Contemporânea apresentou obras
realizadas no período de existência do grupo, além de documentação e um
vídeo com relatos de associadas. A 12ª Bienal do Mercosul, intitulada Fe-
minino(s): visualidades, ações e afetos, que ocorreu virtualmente também,
teve a participação de artistas que lidam com o têxtil, como Chiachio e
Giannone, Brígida Baltar, Cecilia Vicuña, Lídia Lisbôa e Sandra Berduccy.

Na Fundação Iberê Camargo, em 2020, realizou-se a mostra O fio de


Ariadne, na qual o espectador conheceu tapeçarias realizadas pelo Artesa-
nato Guanabara a partir de cartões desenhados pelo artista. O evento será
itinerante, com apresentação no Instituto Tomie Ohtake, em São Pau-
lo, complementando duas exposições que abriram no fim de 2020 e que
contemplavam facetas do têxtil: Delba Marcolini: o feminino na tapeçaria
modernista, na Galeria Mapa, com obras da artista Marcolini, uma das
fundadoras do Centro Paulista de Tapeçaria e do Núcleo Paulista de Tape-
çaria na década de 1980; e Transbordar: transgressões do bordado na arte,
com curadoria de Ana Paula Simioni, no SESC Pinheiros, na qual se apre-
sentaram 39 artistas que usam o bordado para constituição de suas obras.

É evidente que está ocorrendo uma (re)descoberta do têxtil, tanto por esfor-
ços acadêmicos e de pesquisa, incluindo o próprio Instituto Urdume, quanto
por artistas que olham para os fios para concretizar suas criações. Que essa
movimentação se mantenha presente no futuro e nos faça olhar para esses
artistas do passado que merecem um lugar na história da arte brasileira.

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REFERÊNCIAS

BETTIOL, Zoravia. Zoravia Bettiol: a mais simples complexidade.


Porto Alegre: Território das Artes, 2007.

CÁURIO, Rita. Artêxtil no Brasil: Viagem pelo mundo da tapeçaria.


Rio de Janeiro: Ed. do Autor, 1985.

GRADIN, Maria Isabel de Souza. A tapeçaria no Brasil entre as décadas


de 1960 e 1980. 2018. 243 f. Dissertação (Mestrado em Culturas e Identi-
dades brasileiras) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. Disponível
em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/31/31131/tde-18032019-104032/
publico/Corrigida_MariaIsabelGradim.pdf. Acesso em: 29 set. 2020.

GRIPPA, Carolina Bouvie. A memória que se tece: o Centro Gaúcho da


Tapeçaria Contemporânea. 2017. 234 f. Trabalho de conclusão de curso (Ba-
charelado em História da Arte) – Instituto de Artes, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/
handle/10183/178356. Acesso em: 14 set. 2020.

GRIPPA, Carolina Bouvie. O início da trama: a produção têxtil de Zoravia


Bettiol e Yeddo Titze. 2021. 307 f. Mestrado em Artes Visuais, ênfase em His-
tória, Teoria e Crítica de Arte – Instituto de Artes, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2021.

MATTAR, Denise. Madeleine Colaço – a tapeceira dos trópicos. Salva-


dor, Rio de Janeiro: Caixa Cultural, 2009.

MATTAR, Denise (org.). Norberto Nicola – Trama Ativa. São Paulo: Impren-
sa Oficial do Estado de São Paulo, Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2013.

PASSADO COMPOSTO. Artistas da Tapeçaria Moderna. São Paulo, 2012.


Realização

INSTITUTO

URDUME
Coodernação: Estefania Lima e Paula Melech

Redação: Carolina Bouvie Grippa

Revisão: Aline Rochedo

Diagramação: Nathália Abdalla

Ilustrações: Gustavo Seraphim

Apoio

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