CArtografia O Sentir

Você também pode gostar

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 6

Doutorado em Administração

Cartografias, Territórios e Subjetividade

O SENTIR, O NÃO SENTIR, O RESSENTIR E RESSURGIR DO SISTEMA DE AFETOS


NAS DISCIPLINAS DO DOUTORADO

Por Mara Cristina Piovesan Cortezia

O que escrever, sempre vem a dúvida em começar, voltamos ao começo que,


cartografar é sentir, é viver, vivenciar os momentos a todo momento, de forma consciente,
porque alguns momentos passam, perpassam e repassam por nós sem termos afecção.
Vivemos sem afecção na vida cafetina, onde somos peças de uma máquina, que é equivalente
a um conjunto de coisas e peças que integram e regulam seu cotidiano, e o modo habitual como
isso ocorre faz com que o homem possa compor máquina. (DELEUZE/GUATTARI, 2010)
Ao propor escrever essa cartografia (sei la se será uma cartografia???), tento me
desprover de tudo que aprendi de como escrever um “artigo’, e me proponho em ver e sentir
os afectos com afecção tentando ser uma máquina desejante ao desenvolver o assunto
proposto.
A cartografia é uma maneira de dar voz, forma, colorido as minhas inquietações. Mais
que um método de pesquisa e referencial teórico, apresenta-se como uma possibilidade de
aproximação do denso universo do prazer, da produção de subjetividades e da produção de
cuidados em um contexto pós moderno. (VEIGA, 2011)
Antes de falar sobre os afetos sentidos no decorrer do semestre, vamos entender alguns
fatos. Ao escrever uma cartografia, nos propomos a transcrever, vivenciar afecções.
Para falar de afecções temos que entender o que é o corpo, CORPO é uma potência em
ato, uma força de existir. Espinosa o define como um aglomerado de partes duras e moles, um
conjunto de átomos, moléculas, tecidos, órgãos que possuem a capacidade de manterem-se
unidos, regenerarem-se e agirem em conjunto. Mas o mundo nos supera em muito e por isso,
1
Página
Doutorado em Administração
Cartografias, Territórios e Subjetividade

muitas vezes, não temos a capacidade de agir sobre ele, e somos levados como folhas ao vento.
(RAZÕES INADEQUADAS APUD ESPINOSA, 2023)
Já, as afecções são o corpo sendo afetado pelo mundo. As afecções vão além do afeto,
pois todos as experiencias podem nos afetar e ser afetado! As afecções são um encontro
pontual de um corpo com outro. Somos corpos que se relacionam com outros corpos; quando
sofremos suas afecções, quando somos afetados pelos outros corpos, sofremos uma alteração,
uma passagem, nossa potência aumenta ou diminui. Destas afecções ocorrem os afetos, uma
experiência vivida; é uma transição. (Espinosa, 2015)

Figura 1 – Nossos monstros

Fonte: a autora baseado em Espinosa

Segundo Espinosa (2015) aumentar a potência de sentir para também aumentar a


capacidade de pensar e existir, mente e corpo como duas expressões da substância, assim ao
acordar para vir as aulas matutinas o sentimento de obrigação te faz levantar, muitas vezes sem
querer, e vem todas aquelas frases que ouvimos ao longo da vida: “Deus ajuda quem cedo
madruga” ou “O hábito faz o monge”, ou seja, devemos “plantar para colher” frases de um corpo
cafetinado (é difícil ser um corpo liberto), mas ao chegar a sala de aula nossos afetos
(sentimentos) mudam, pois encontramos os amigos e colegas de turma, amigos são aqueles
mais chegados que partilham da nossa afetividade que tiram sorrisos nos dias mais nublados,
nos ajudam com um olhar ou palavra. Nas aulas vespertinas a preguiça pós almoço nos faz ver
o dia como longo e preguiçoso, mas as discussões, os professores, dão cores, vida, as nossas
dúvidas e quantas dúvidas, temos mais dúvidas do que certezas!
2
Página
Doutorado em Administração
Cartografias, Territórios e Subjetividade

Retomando, há uma diferença entre afeto e afecção explorada por Deleuze e Guattari.
Os afetos são os sentimentos, e se referem mais diretamente ao espírito e indicam uma
passagem ou transição de um estado a outro em nós (DELEUZE, 2002, p.56). Ainda, Deleuze
(2002) destaca que os afetos-sentimentos podem muito bem ser tidos como um tipo especial
de afecção, isto é, os sentimentos estão compreendidos no conjunto das afecções. Contudo, os
afetos não se confundem e nem se restringem às afecções.

Figura 2 - Afecção

Fonte: Texto DELEUZE, 1997, p.156 Imagens: Filme “Elementos”, Pixar, 2023

Logo, compreendemos que toda emoção é um afeto, mas nem todo afeto é uma
emoção: há sensações (de frio e de calor), desejos (sede, fome, sono), patologias (gripe),
comunicação nos mais diversos níveis (o filme a que assisto me afeta para compreendê-lo, me
afeta ao me emocionar, me afeta ao dobrar-me sobre minha própria memória etc.).
As relações que compõem o homem não se distinguem das leis universais da natureza,
formando um único plano de imanência. Nesse sentido, a afetividade humana se constitui como
uma expressão particular da potência global da natureza.
Assim, ao vir para as aulas do doutorado podemos ter várias posturas ser máquinas
sociais em muitos momentos, sobrevivemos as leituras e atividades sem afetos e mudanças de
3

ser máquinas desejamos, onde o único desejo é o término, mas alguns momentos nós somos
Página
Doutorado em Administração
Cartografias, Territórios e Subjetividade

capturados nos tornando máquinas desejante e é nesse momento que a subjetividade aflora e
crescemos em conhecimentos, nos despimos de rótulos e experimentamos ser um corpo sem
órgãos que é um corpo liberto, desterritorializado, sem constrangimento, com todos os desejos
potencializados, mesmo que temporariamente.
Mas outras vezes podemos ser comparados as "máquinas sociais pré-capitalistas" que
codificam os fluxos de desejo (185). Elas têm os homens como peças, somos peças num jogo de
tabuleiro, ou seja, seguimos as regras das disciplinas normativas e nos adequamos as normas
impostas ou interiorizadas no programa de pós graduação. (DELEUZE, GUATTARI, 2010)
Nesse sentido podemos afirmar que a máquina é, primeiramente, uma máquina social
constituída por um corpo pleno como instância maquinizastes, e pelos homens e ferramentas
que são maquinados na medida em que estão distribuídos sobre esse corpo. Há, por exemplo,
um corpo pleno da estepe que máquina homem-cavalo-arco, há um corpo pleno da cidade grega
que máquina homens e armas, há um corpo pleno da fábrica que máquina os homens e as
máquinas (DELEUZE/GUATTARI, 2010, p. 529).
A produção desejante e mais potencializada quanto mais se distancia da produção social.
Uma vida só de produção social é uma vida extremamente cafetina. A produção desejante para
ser potencializadora nessas codificações deve ser desprovida de moldes/controles.
Nós temos um território, mas sempre estamos num movimento de desterritorialização,
ao explorar novas experiencias, ao entrar no doutorado estamos em um novo território, onde
pensamos de início que será tranquilo, só umas disciplinas e uma tese, e que 04 anos passaram
rapidamente, que mentira! Nesse momento somos máquinas sociais levadas pela multidão!
Um novo território, uma nova realidade que se vislumbra, nos vestimos de personagens,
sem perder a essência a cada disciplina. É obvio que as disciplinas são protocolares temos plano
de ensino, conteudo a ser lido (e quanta leitura), trabalhos avaliativos, quantidade de faltas que
podemos ter para não reprovar, as disciplinas têm o intuito de nos apresentar e nos fazer pensar
fora das nossas caixinhas protegidas, nos fazer vislumbrar novos conhecimentos e quem sabe
territórios.
4
Página
Doutorado em Administração
Cartografias, Territórios e Subjetividade

Figura 3 – a mente

Fonte: a autora

Em epistemologia a minha sensação é de ser algumas vezes analfabeta funcional, leio,


releio, leio novamente e nada de compreensão, procuro ajuda nos colegas, mas todos tem todos
os textos e mais a sua apresentação, recorro ao professor que falou que devia ler mais porque
iria entender, nesse momento o meu sentimento de desespero e frustação, por me sentir
“burra” por não compreender um simples texto sobre a filosofia estruturalista, me dá impulso
da busca de conhecimento e de provar que posso compreender. Muito do conteudo das aulas
se perde na nossa falta de afeto, as vezes somente o corpo está presente.
Na aula de MQA – Metodos Quantitativos Avançados, o professor foi maravilhoso pois
nas aulas sentíamos, de verdade, que tínhamos entendidos os calculos e conseguiríamos fazer
qualquer interpretação após a aula, pensei que faria qualquer interpretação estatística, ledo
engano depois do trabalho final, entregue com faltando apenas 3 minutos para finalizar o prazo
as 23:57hrs de um domingo e depois de mais de 30 horas de estudo somente de quinta a
domingo, isso por que o trabalho já tinha sido iniciado a 15 dias, e como muita ajuda dos
companheiros de desespero, ops de sala, tenho certeza que o conhecimento que tive afetos na
que geraram afecção me senti aquela buchinha da figura 2 que foi tragada para dentro do
conhecimento.
E em Cartografia, Territórios e Subjetividade, a relação é diferente o comprometimento
é outro, pois a disciplina me gera o afeto da alegria, mesmo que as vezes eu me perca na
5
Página

subjetividade e confunda nos conceitos, esta me faz sair do corpo cafetinado onde tudo tem as
Doutorado em Administração
Cartografias, Territórios e Subjetividade

minhas caixinhas e aqui posso misturar. Obvio que ainda viajo ou não compreendo a
esquizoanálise no seu contexto total, que as minhas afecções podem ser afetos, que ainda não
compreendendo tudo o que Deleuze e Guattari afirma, estou muito longe disso, mas a
indisciplina nos traz ciência de ideias, conceitos e focos nunca pensado, para quem queria ir
embora no primeiro dia, acho que me encontrei ou me desencontrei.
E assim, findo a minha cartografia (ainda penso que não seja uma cartografia) e até os
próximos afetos.

Referencias
CONTER, Marcelo & Telles, Marcio & Silva, Alexandre. (2017). Semiótica das afecções: uma
abordagem epistemológica. Conjectura filosofia e educação. 22. 36-48.
10.18226/21784612.v22.n.especial.03.

DELEUZE & GUATTARI, F. (1972) O anti-Édipo. São Paulo: Editora 34, 2010.

ESPINOSA, B. Ética. Trad. Grupo de Estudos Espinosanos; coordenação Marilena Chauí. São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2015.

6
Página

Você também pode gostar