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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

YAGO RIBEIRO SILVA

CRISE VENEZUELANA: PRECEDÊNCIA E ECLOSÃO

RIO DE JANEIRO
2019
YAGO RIBEIRO SILVA

CRISE VENEZUELANA: PRECEDÊNCIA E ECLOSÃO

Trabalho de Conclusão de Curso ou


Monografia apresentado como requisito
parcial à obtenção do título de
Internacionalista / Universidade Estácio
de Sá

Orientador: Prof. Dra. Ângela Telles

RIO DE JANEIRO
2019
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................................................4
2. CAPÍTULO 1.........................................................................................................5
3. CAPÍTULO 2.........................................................................................................15
4. CAPÍTULO 3.........................................................................................................26
5.REFÊRENCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................38
4

1 INTRODUÇÃO

Recentemente, os olhos se voltaram para a Venezuela. A crise econômica, e


social atingiram patarames tão agigantados quanto à sua repercussão.
Este Trabalho de Conclusão de Curso visa traçar um paralelo cronológico de
eventos que acarretaram o apogeu desta crise, buscando também enxergar alguns
destes fenômenos com as "lentes" das teorias das Relações Internacionais.
No primeiro capítulo, são apresentados alguns aspectos da história e da
geografia venezuelana, que, em suas origens, apresentam elementos e
personalidades históricas que seriam diretamente ligadas ao contexto do cenário
atual. No segundo capítulo são estudados acontecimentos que podem ser descritos
como o ápice para a explicação da crise, onde as engrenagens se moveram com a
finalidade de orquestrar e manter um sistema que favorecesse o atual sistema,
enquanto que, no terceiro capítulo, é citado personalidades do contexto da crise que
foram protagonistas do embate entre as forças opostas que complementam o
quadro instável pelo qual é submetido o povo venezuelano.
5

CAPÍTULO 1: ASPECTOS HISTÓRICOS (PRECEDÊNCIA)

Para elaborar um panorama da situação da Venezuela é de suma


importância analisar seu período histórico e identificar os eventos que poderiam
levar acarretar sua crise atual, em que a sociedade vive um regime totalitário, onde a
democracia é funcional somente para aqueles que usufruem dela.
Ao nos voltarmos ao contexto global, analisamos os fenômenos das relações
internacionais e o que eles acarretam, suas variantes e tendências. Uma delas é a
de que os agentes do cenário global estão em uma constante corrida para a
manutenção de recursos naturais, já que são escassos, com a simplória e primitiva
motivação que se assemelha a de qualquer indivíduo: a sobrevivência. Tal ideia se
enquadra na teoria de relações internacionais de Interdependência Complexa, em
que procura-se entender a condução do relacionamento entre os Estados, com a
convicção de que não são regidos somente pensando no âmbito da segurança, mas
com outras finalidades.
Essa manutenção se dá por meio da preservação desses recursos no
âmbito interno ou a busca dessas riquezas na cooperação com outras nações, e
quando não há cooperação, tende-se ao o conflito, sendo eles internos (guerras
civis) ou externos (entre dois ou mais Estados). Cabe então ao próprio Estado
elaborar políticas para proteger seus recursos e convertê-las em ganho para sua
sociedade civil. Esta temática pode ser relacionada com a condução do destino da
Venezuela (petróleo), mas apesar de robusta, é evidentemente apenas uma, e não a
única. Uma revisão de seu período histórico pode nos remeter a eventos que podem
ajudar a entender as precedências da crise atual.
A Venezuela é uma das repúblicas oriundas da dissolução da outrora Grã -
Colômbia (1819-1831), República criada com motivações anti-coloniais por Simón
Bolívar (1783-1830), conhecido como O Libertador, em contrapartida ao Vice-Reino
de Nova Granada (1717-1819), colônia da Espanha, região onde hoje se encontram
repúblicas da Venezuela, Colômbia, Panamá e Equador. A razão desta unificação se
dava pela justificativa de que os povos daquela região compartilhavam uma cultura
comum (língua, religião, situação de colônia) 1.

1
Disponível em: <http://opiniaoenoticia.com.br/nesta-data/e-criada-a-republica-da-gra-colombia/>
6

De acordo com Ricardo Vélez Rodríguez (2012, p. 1-12), Emérito da Escola


de Comando e Estado-Maior do Exército, professor da Universidade Federal de Juiz
de Fora e ex-ministro da Educação, tanto os ideais Rousseaunianos do estado de
natureza, contrato social e moral baseada na liberdade, quanto a visão político-
estratégica de Napoleão Bonaparte eram presentes na orientação filosófica de Don
Simón Rodríguez, mentor de Simón Bolívar, o que naturalmente fez ecoar em seu
aluno o espírito revolucionário libertário.
A existência da Grande Colômbia foi uma breve fagulha no mapa histórico.
Enquanto o Vice-Reino de Nova Granada se perpetuou por 102 anos, a República
da Grã-Bretanha durou apenas 12, tendo sido desmantelada em 1830 com os
conflitos internos pela independência do Equador e da Venezuela. Neste período
colonial e de posterior independência, a Venezuela não era destaque no patamar
econômico, sendo basicamente funcionalizada na agricultura.
A República da Venezuela é o sexto maior país da América do Sul, mas as
variações em suas paisagens são capazes de rivalizar com as de países bem
maiores, como seus vizinhos Brasil e Argentina. Compartilha com Brasil e Roraima
um de seus mais deslumbrantes cartões postais, o Tepui, erguendo-se às planícies
da Gran Sabana. Se encontra ao extremo norte da América do Sul, fazendo fronteira
com Brasil, ao sul, guiana, ao leste, Colômbia ao oeste, e o Mar do Caribe ao norte.
Há que suas fronteiras parecem conglobar toda a América do Sul, no sentido da
biodiversidade, contendo pequenas extensões dos Andes,uma vasta planície
(ambos ao Oeste do país) considerada como um dos ecossistemas mais
importantes do mundo conhecida como Llanos, parte da Floresta Amazônica, da
costa caribenha e até mesmo um pequeno deserto. Inclui também paisagens
icônicas, como a maior cachoeira do mundo, Salto Ángel, em um afluente do Rio
Caroni. A Venezuela pode ser confundida com um país caribenho ao invés de um
país sul-americano, devido às suas costas e suas noitadas recheadas com ritmos
caribenhos. A sua proximidade com o Equador faz com que o país apresente um
clima peculiar, basicamente se dividindo na estação das chuvas e na estação seca,
sendo majoritariamente quente, com exceção das partes frias nas altitudes, como
nos Andes.2

2
Disponível em: <http://www.geographia.com/Venezuela/index.htm> Acesso em: 2 abr. 2019.
7

A capital da Venezuela, Caracas, fundada em 1567 por Diego de Losada,


tem um dos cenários mais intrigantes das cidades sul-americanas. Se encontra a
3000 pés do nível do mar em um longo vale que se estende do leste ao oeste. Os
declives do Parque Nacional de Ávila, preservados desde o século XIX sobre a
cidade, têm a aparência de uma gigante onda verde que parece estar sempre
prestes a quebrar. O Clima de Caracas pode ser descrito como incomparável,
devido à sua elevação e proximidade com o oceano, aos 15 quilômetros ao norte.
A modernização atingiu em cheio Caracas, que se transformou com o
advento do petróleo, entre os anos 70 e 80. Instalações coloniais foram dando lugar
a arranha-céus, mas ainda é possível presenciar algumas jóias sob as sombras do
modernismo. É nas imediações do centro da cidade, ao redor da Praça Bolívar, que
é possível ver as atrações arquitetônicas e culturais de Caracas. 3
Em seus primórdios, a Venezuela era habitada por nativos que faziam da
região, seu paraíso. Estes se dividiam em povoados de nome Arawak, Carib e os
Chibcha, sendo o último o mais desenvolvido, que viviam aos declives dos Andes.
As tribos conheciam bem a fórmula da auto-suficiência, sabiam pescar, reunir
alimento e caçar (sendo poucas vezes necessário dada a abundância da
terra).Tinham uma vocação esplêndida para a agricultura, cultivaram a terra em
esplanadas nos Andes e construíram sofisticados canais para irrigar suas safras.
4
Cristóvão Colombo foi o primeiro europeu a visitar a Venezuela, em 1498, durante
sua terceira viagem ao Novo Mundo.
Sua inicial intenção era de atracar nas Índias, almejando o ouro e as
especiarias, mas acabou se deparando com um continente que mais tarde viria a ser
chamado de América (Inicialmente atracando nas Bahamas, então Cuba e em
seguida Santo Domingo, ou seja, América Central). Seu primeiro destino na
Venezuela foi na Península de Paria. Ao atravessar a costa explorando o Delta do
Orinoco, Colombo havia chegado à conclusão de que havia encontrado muito mais
do que apenas mais uma ilha caribenha. A região viria a ser visitado por mais
exploradores, sendo Alonso de Ojeda o responsável pela origem de seu nome.
Chegando ao Lago de Maracaibo, o maior lago natural da América do Sul, Alonso se
deslumbrou com as palafitas construídas pelos índios e deu nome ao lugar de

3
Disponível em: <http://www.geographia.com/Venezuela/caracas/index.htm> Acesso em 2 abr.
2019.
4
Disponível em: <http://www.geographia.com/Venezuela/history.htm> Acesso em 2 abr. 2019.
8

Venezuela - "Pequena Veneza", um ano após os espanhóis se estabelecerem em


Nueva Cadiz, cidade que se encontrava em Cubagua e que foi alastrada por um
tsunami (hoje um sítio arqueológico).
A colonização da Venezuela foi menos violenta do que em outras partes da
América do Sul, tendo seu poder concentrado em Bogotá, através do Vice-Reino de
Nova Granada. A Venezuela era até então menos atraente aos olhos dos
colonizadores espanhóis do que os países do oeste da América do Sul, como
Colômbia, Bolívia, Peru e Equador, que eram colônias fornecedoras de minerais, o
que posteriormente faria o país ser destaque no cenário internacional seria a
descoberta de suas descomunais reservas de petróleo. Simón Bolívar, com seus
ideais revolucionários, fez empenhada e inesgotável campanha contra a Espanha
com ajuda de mercenários britânicos, marchando pela cordilheira dos Andes e
libertando da condição de colônia a Colômbia em 1819, Venezuela em 1821, e Peru,
Bolívia e Equador em 1825.
Seu exército era composto em sua maioria por nativos Venezuelanos. Ao
inaugurar o Congresso de Angostura, ante a criação da nova Grande Colômbia,
Simón Bolívar (1819) fez um longo discurso em que evidenciava um esboço da
futura constituição, com frases chave que expressavam suas visões do mundo,
afirmando que: "Um governo republicano foi, é, e deve ser o da Venezuela; suas
bases devem ser a soberania do povo, a divisão dos poderes, a liberdade civil, a
proscrição da escravidão, a abolição da monarquia e dos privilégios". Aqui, nota-se
um discurso de alto teor populista, em que o líder profere tendo contato direto ao
povo, em voz alta, na expectativa de conquistar as massas pelo carisma. A divisão
dos poderes mencionada se concretizou aos moldes de uma república legítima,
sendo o vice-presidente responsável por administrar três departamentos, nas
capitais Caracas, Quito e Bogotá5. Na primeira frase do discurso, menciona que
nada é pior do que a perpetuação de um mesmo cidadão no poder, pois isso gera
corrupção, um sistema cíclico onde o costume de hierarquia acaba se invertendo,
onde o povo passa a fazer as vontades do soberano.

5
Disponível em https://aulazen.com/historia/gra-colombia-o-que-era-resumo/> Acesso em: 20
abr. 2019
9

Em muitos pontos do discurso é enfatizado que era necessária a conquista


da liberdade do povo, quebrando as algemas da Europa. No entanto, seu governo
enfrentava descontentamento popular, apresentando o oposto do que Bolívar
sustentava. O estilo de governo de poder centralizado poderia ser pensado ser
funcional, mas era diferente da idéia estrutural de um Estado proposto por Simón. A
ideia de que o povo sul-americano deveria se libertar da Europa contradizia suas
ações, pelo fato de ter contratado os mercenários das legiões britânicas para lutar
nas guerras de independência dos países latinos contra a Espanha.
O discurso segue com linhas que evocam ânimos para objetivos comuns.

Um governo monstruoso e puramente guerreiro elevou Roma ao


mais alto esplendor de virtude e glória, e formou a partir da terra um
domínio romano para mostrar aos homens do que são capazes as
virtudes políticas e quão indiferentes tendem são as instituições.
(BOLÍVAR, 1819)6

Fica evidente que Simón Bolívar tinha aversão ao Institucionalismo, mesmo


que esse termo fosse alvo de debates, de acordo com William Richard Scott (1995,
p. 2), somente na Alemanha do final do século XIX, e tendo sido reconhecido
mundialmente nos Estados Unidos, no século XX, essa realidade já se mostrava
presente no cenário político do início do século XIX. Essa aversão se justificava por
teoricamente ser uma corrente de enaltecimento das instituições, enquanto aqueles
que realmente importam, o povo (indivíduos), fica em segundo plano. Simón
enxergava nos imperadores romanos a representação ideal de um governo forte,
centralizador, e conquistador, elogiando também o império da Grã-Bretanha, oriunda
da força do país núcleo, e o mais desenvolvido do mundo na época, a Inglaterra. Em
um trecho do discurso, faz a promessa de que o senado seria não só um baluarte da
liberdade, como um suporte para eternizar a República. Em várias frases do
discurso, reitera que seu povo não é nem europeu, nem norte-americano, mas uma
miscigenação da África e da América (com ênfase na América do Sul e Central) com
uma emancipação da Europa.
A independência da nova nação foi marcada por conflitos civis, guerras e
ditaduras através do século subseqüente. Alguns governantes autoritários
chegaram a buscar a realização de uma verdadeira reforma, mas a maioria
6
Disponível em <http://lahistoria200.blogspot.com/2019/02/las-principales-frases-del-discurso-
de.html> Acesso em: 20 abr. 2019
10

desfrutou de seus cargos para benefícios pessoais. Em meados de 1840, houveram


disputas de fronteira com a colônia britânica da Guiana, e apesar de nunca terem se
eruptido em guerras definitivas, a Venezuela compete pelo território até hoje.
Nos início dos anos 1900, a conturbada nação venezuelana finalmente
ergueu seus pilares econômicos com a descoberta do petróleo, e em meados dos
anos 20, começou a colher os frutos dessa descoberta. Infelizmente a maioria da
riqueza era limitada a ser repartida entre a classe governante. Juan Vicente Gómez
foi o homem que presidia a Venezuela durante este momento decisivo. Ao se
envolver com a política de sua região, Tachira, conheceu outro nativo, Cipriano
Castro, tornando-se sócios, mesmo com a reputação de aproveitador de Gómez.
Castro viria a se tornar presidente, e, em 1908, ao viajar para a Europa para ser
atendido quanto ao seu quadro clínico, concederia a Gómez nada menos que o
cargo de vice-presidente. Gómez fez jus à sua fama e tomou o poder, avisando à
Castro que não retornasse.
Com o primeiro poço de petróleo, companhias internacionais de petróleo
passaram a se aproximar da Venezuela, visando acordos comerciais. Juan Vicente
Gómez7 soube aproveitar bem esta situação, barganhando com estas companhias e
investindo na economia e infra-estrutura nacional. Em contrapartida, adquiriu
fortunas exorbitantes, e construiu um "império pessoal", implantando uma ditadura e
fortalecendo todo um exército às suas ordens (composto em sua maioria pelo povo
que vinha dos clives), perseguindo os opositores do seu regime, e até permitindo
que fossem concedidas terras a seus subordinados, com a condição de não o
desafiarem. Ao analisarmos estes atributos de Gómez, desenvolvimentista, ditatorial
e nacionalista, é quase inevitável nos remetemos à outra personalidade histórica,
Getúlio Vargas, ambos podendo ser inseridos na categoria dos líderes radicais que
sacrificaram até mesmo a liberdade do povo em prol do desenvolvimento.
A onda de ditadores perdurou até o ano de 1947, quando Rómulo
Betancourt liderou uma revolta popular e reescreveu a constituição. Anteriormente,
nos anos 30, Rómulo era um estudioso da realidade sociopolítica venezuelana, e
juntamente com outras personalidades que compactuavam com sua orientação
política, criou frentes populares, partidos políticos e obras literárias de cunho
oposicionistas aos governos militares regentes. O "tumulto" criado por Rómulo não
7
Disponível em: <https://biography.yourdictionary.com/juan-vicente-gomez> Acesso em 20 abr.
2019
11

agradava o então presidente Eleazar López Contreras, general do exército


venezuelano e ex-ministro da guerra Juan Vicente Gómez, levando Betancourt a ser
expulso do país, em 1937, mas sem antes organizar seu partido Ação Democrática
(AC) para coagir em uma controversa posterior decisão, a de elaborar um golpe de
estado contra o presidente Isaías Medina Angarita 8. Em meados dos anos 70, o
grande boom do petróleo fez derramar grande riqueza sobre a nação venezuelana,
mas, como de costume, a classe popular venezuelana pouco usufruiu dessa
prosperidade.
O país mais uma vez viria a sofrer uma crise, com a queda do preço do
petróleo nos anos 80. A capital Caracas viria a ser ocupada por manifestações, que
foram violentamente reprimidas, e em 1992 haveriam duas tentativas de golpe. Ao
analisar a passagem de Chefes de Estado da Venezuela, a sua grande maioria era
composta por líderes eleitos indiretamente, por golpes de estado, ou por indicações
internas.Países detentores de grandes fontes de recursos naturais geralmente são
alvejados, tanto por agentes internos, buscando alcançar o poder para surfar nas
ondas do progresso, quanto por agentes externos, outros países que se aproximam
destes tanto pacificamente, quanto violentamente, com olhos virados para estes
recursos.
Em alguns momentos, a Venezuela arrecadou fortunas exorbitantes com o
petróleo, mas se o lucro gerado com essa economia não é convertida em benefícios
para a sociedade, logicamente conclui-se que o governo retém a maioria da receita
dessas operações. Assim, o Estado agiganta-se, e se torna inflado, que conduz a
nação de maneira intervencionista, sendo possuidora do monopólio do comércio, da
economia e da prestação de serviços, e aplicando a política econômica de subsídios
e controles de preços.
O período da Guerra-Fria (1947-1991) foi marcada por mundo bipolarizado,
em que duas potências hegemônicas conduziam a ordem internacional, e buscavam
proliferar sua influência pelos países do globo. Mas essas duas potências eram
conflitantes, os Estados Unidos da América e Rússia se contrapunham em uma
guerra ideológica, representada pelo capitalismo contra o socialismo.É de comum
consenso de que, apesar do nome, foram travadas calorosas batalhas pelo mundo,
em que países se alinhavam com uma das duas potências. Países alinhados aos
8
Disponível em: <http://latinoamericana.wiki.br/verbetes/b/betancourt-romulo> Acesso em 4 abr.
2019
12

Estados Unidos apresentavam uma condução liberal da economia, e aqueles


pertencentes ao eixo socialista da Rússia (URSS), se mostravam mais fechados,
atribuindo aos suas respectivos Estados o controle do cenário econômico, sendo
dependente do financiamento de seus governos e da URSS. A ameaça de bombas
atômicas era a principal preocupação da população global, já que, se ambos os
países detonassem suas respectivas bombas, todo o planeta poderia ser devastado,
logo, toda agenda da ONU era pautada na perspectiva de segurança
internacional.Com o término da Guerra-Fria, era iminente a transformação do
cenário internacional.
Outrora bipolarizado, agora o mundo passava a ter uma única potência
hegemônica, os EUA, que emergiu vitoriosa da Guerra-Fria, e também por
instituições que regeriam os aspectos que cernem as nações, como ONU e OMC.
Com o advento do avanço da tecnologia, eclodiu o fenômeno da globalização, em
que as relações comerciais entre as nações ultrapassaram barreiras até então
instransponíveis, havendo processos de logística revolucionários. Em 1981, era
proposto o plano econômico chamado Consenso de Washington 9, em que
economistas americanos elaboraram medidas para ajudar países em
desenvolvimento. Alguns países adotaram essas medidas, como Argentina e
México.
O Chile já apresentava características de uma economia liberal, sob a
liderança de Augusto Pinochet. A privatização de estatais é o principal fator de
consenso dos liberalistas, que argumenta que a competição saudável entre
empresas que buscam o lucro e a fidelidade do consumidor gera retorno benéfico
para a sociedade, que desfruta de produtos e serviços melhores. Muitas empresas
foram privatizadas durante o governo de Carlos Andrés Pérez, do partido Ação
Democrática (AD), que tinha Rómulo Betancourt seu principiador. Apesar deste fato,
a sua principal estatal, a petrolífera Petróleos de Venezuela, S.A. continuou sendo
administrada pelo governo. A reforma econômica venezuelana gerou
descontentamento da população, e quando estes tomaram a iniciativa de se
manifestarem contra este novo programa, foram respondidos com violenta
repressão, sendo apresentados dados de cerca de centenas de mortos por fontes

9
Disponível em: <
http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300408870_ARQUIVO_ASRELACOESBILA
TERAISBRASILVENEZUELANOCONTEXTODAGLOBALIZACAO.pdf> acesso em: 26 abr. 2019
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conservadoras e mais de mil por fontes não-oficiais. O fato que chama atenção é
que o estopim desta manifestação foi o aumento da tarifas de transporte público,
algo muito semelhante ao ocorrido no Brasil em 2013 10, com manifestações que
totalizaram cerca de 13 mortos, dos quais não foram provocados por conflito direto
com a polícia, mas por acidentes, atropelamentos, e do famoso caso do cinegrafista
da Band, Santiago Andrade, em 2014.
De acordo com Eliel Waldvogel Cardoso (2011, p. 6), o Pacto de Punto Fijo
era o sistema bipartidário que mantinha a democracia estável na Venezuela,
protagonizados pelo partido Ação Democrática (AD) e o Comitê de Organização
Política Eleitoral Independente (Copei), e esse cenário seria fragilizado durante os
anos 90, com a tentativa do golpe de Estado de Hugo Chávez e o impeachment de
Carlos Andrés Pérez. Fernando Collor, do Partido da Renovação Nacional (PRN) foi
primeiro presidente eleito diretamente após o regime militar, vencendo o candidato
de esquerda Luís Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT).
Collor sofreria impeachment pelo mesmo motivo que o presidente
venezuelano Carlos Andrés Pérez, a suspeita de envolvimento em casos de
corrupção.Foram através dessas nuances que se deu a aproximação diplomática
entre Brasil e Venezuela. Enquanto a Venezuela limitava sua atuação diplomática
aos EUA e aos países caribenhos, como Cuba, Haiti, República Dominicana,
Jamaica, etc., o Brasil possuía um histórico diplomático bem mais extenso, olhando
por essa perspectiva.
O início das relações diplomáticas entre esses dois países foi protagonizada
pelo vice-presidente de Collor, Itamar Franco (1992) e pelo presidente Rafael
Caldera, retornando ao poder em 1994. Neste contexto foi criado o protocolo
Protocolo da Guzmania, que seriam voltados para a política de comércio, transporte,
fonte de energia e desenvolvimento, expandindo as relações bilaterais. Houve um
significativo aumento na exportação e importação realizada entre os países. Em
Comunidado Conjunto mencionaram a criação de uma área de livre comércio sul-
americana, projetos técnicos comuns à PDVSA e à Petrobrás (o que posteriormente,
em 2008, se converteria em práticas de associação econômica, como o contrato de
associação na Refinaria Abreu e Lima)11, e também motivaram-se a tocar na questão
10
Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/2014/06/pelo-menos-13-pessoas-morreram-
em-um-ano-de-protestos-pelo-pais.html> acesso em: 28 abr. 2019
11
Disponível em: <http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/comunicados-e-fatos-relevantes/
petrobras-e-pdvsa-assinam-contrato-de-associacao-na-refinaria-abreu-e-lima> Acesso em: 28
14

da infra-estrutura e do desenvolvimento sustentável na região amazônica que


correspondia o território divido entre ambos países. Era preciso investir em logística,
mais especificamente no transporte marítimo, pois o Sudeste brasileiro era uma
potencial região consumidora, mas distante da região fronteiriça. O presidente
Itamar Franco chegou a proferir um discurso, em decorrência de um almoço
oferecido por Rafael Caldera, com entusiasmo perante essa nova parceria.

Vejo chegado o momento, Senhor Presidente, de


empreendermos um ousado projeto comum de intercâmbio, diálogo e
integração, capaz de vivificar e consubstanciar a cooperação bilateral
em todas as suas vertentes. Para este fim, contaremos com a
Comissão Binacional de Alto Nível — instrumento apurado que, por
seu elevado nível e por sua abrangência constitui, para meu país,
iniciativa singular e pioneira. (FRANCO, p. 124)

É evidente que Itamar Franco não escondia seu apreço pela Venezuela e a
figura de Rafael Caldera, demonstrando comportamento ativo na condução da
diplomacia e acordos técnicos entre Brasil e Venezuela. A Comissão Binacional de
Alto Nível (1994), mencionada em seu discurso, foi criada para estudar os projetos
futuros de potencial benéfico para ambas as partes, como a construção de uma
rodovia BR-174, ligando os dois países, e a compra de energia venezuelana pelo
Brasil.12 Apesar de tudo, a política econômica interna venezuelana passava por
maus bocados, com seu governo apresentando uma recessão que perduraria por
três anos, pelo fato de, no início de sua gestão, buscar frear as políticas econômicas
neoliberais, o que provocou uma crise financeira. Sofreu também uma crise de
popularidade, por ter aderido às políticas do FMI para atenuar a crise. Já em 1998, o
Tenente-coronel Hugo Chávez Frías foi eleito presidente da Venezuela, com 56,2%
dos votos, pelo partido do qual foi criador, Movimento Quinta República ou
Movimento V República (MVR).

CAPÍTULO 2: DO BOLIVARIANISMO AO CHAVISMO

abr. 2019
12
Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1994/3/05/brasil/10.html> Acesso em: 28
abr. 2019
15

Hugo Chávez era um entusiasta pela figura de Simón Bolívar, era


simpatizante de ideais revolucionários, chegando a criar, nos anos 80, o MBR-200
(Movimento Bolivariano Revolucionário 200), do qual repassou aos integrantes do
movimento as doutrinas socialistas marxistas e libertárias (proeminentes de sua
formação militar) e que seria sua principal fronte na tentativa de tomada do poder,
em 1992, aproveitando-se do descontentamento popular com as medidas
econômicas do então presidente Carlos Andrés Pérez, fenômeno social conhecido
como Caracaço. Tais manifestações foram friamente reprimidas, com autorização de
que autoridades pudessem abrir fogo aos resistentes, mais uma vez encompridando
a fissura nas"pilastras da democracia" na Venezuela.
A tentativa de golpe contra o presidente Carlos Andrés Pérez não foi bem-
sucedida, resultando na prisão de Hugo Chávez e membros do MBR-200. 13 Mesmo
driblando a ameaça do movimento, Carlos Pérez teve seu cargo interrompido em
1993 devido a acusações de desvio de verba pública, abrindo espaço para Rafael
Caldera exercer seu segundo mandato. Com a adoção de políticas econômicas
liberais e a anteriormente citada aproximação com o Brasil de Itamar Franco,
Caldera também havia ordenado a anistia dos envolvidos na tentativa do golpe de
92. Chávez não havia desistido de seu projeto de ascensão, e no intuito de adquirir
força política, criou o partido Movimento V República (MVR), que depois seria
fundido a outros partidos de pauta socialista.
Devido ao descontentamento popular com a quarta república e os inúmeros
crimes de responsabilidade política conseqüentes do saturado Pacto de Punto Fijo,
Hugo Chávez e o MVR ganharam força, o que culminou na sua vitória nas eleições
de 1998, com 56,2% dos votos, e com a promessa de reestruturação da democracia
venezuelana, por meio do comércio de sua maior fonte de riqueza, o petróleo. Uma
forma de governo que mescla elementos do nacional-socialismo, patriotismo, e uma
convicção auto-declarada de oposição ao imperialismo e ao capitalismo. Seu
governo apresentava características do socialismo, pregando a estatização de
empresas privadas que geram mais lucro, isolacionismo parcial que corta relações
com países ideologicamente contrários, distribuição de programas sociais e

13
Disponível em: <https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/hugo-chavez.html>
Acesso em: 1 mai. 2019
16

concentração dos meios de produção nas mãos do Estado. Em seu discurso de


posse14, afirma:

Juro diante do meu povo que, sobre esta moribunda


Constituição, farei cumprir, impulsionarei as transformações
democráticas para que a república tenha uma nova Carta Magna
adequada aos novos tempos. (CHÁVEZ, 1999)

Para que a Revolução Bolivariana de Hugo Chávez fosse implementada, ele


teria que aparelhar o sistema político visando uma aceitação unânime dos seus
projetos de governo, e isso talvez não daria certo, não fosse o fato de que a
Assembléia Constituinte fosse em sua maioria favorável as suas propostas. O
primeiro passo para que isso acontecesse foi alterando a constituição, que foi
aprovada em um referendo em 15 de dezembro de 1999, sendo possível estender
seu mandato em seis anos através de novas eleições diretas. 15 Com esta e outras
alterações, Hugo Chávez garantiria sua perpetuação na presidência, curiosamente
indo contra os ideais de Simón, que em um dos trechos de seu discurso, proferia:

Nada é tão perigoso como permitir que um mesmo cidadão


ocupe por muito tempo o poder. O povo se acostuma a obedecê-lo e
o governante se acostuma a mandar, dando origem a usurpação e a
tirania. (BOLÍVAR, 1999)16

Se opondo a essa retórica, Chávez conseguiria a proeza de ser reeleito


quatro vezes. Pode não parecer um número expressivo, comparado aos líderes
africanos e asiáticos, mas sua intenção era permanecer o quanto pudesse enquanto
ainda em vida, como seus companheiros de ideais, Evo Morales, um dos líderes do
bolivarianismo que permanece até o presente momento no cargo, e Fidel Castro,
que ultrapassou todos os recordes, perpetuando-se no poder por 49 anos no poder
(de 1959 a 2008).17 Isto por que, em 2007, tentaria emplacar mais uma reforma
constitucional, que em uma de suas propostas concederia ao presidente da
república a possibilidade de disputar reeleição quantas vezes desejasse, não

14
Disponível em: <https://exame.abril.com.br/mundo/principais-frases-de-hugo-chavez/> Acesso
em: 4 mai. 2019
15
Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/fol/inter/ult30121999062.html> Acesso em 4
mai. 2019
16
Disponível em <http://lahistoria200.blogspot.com/2019/02/las-principales-frases-del-discurso-
de.html> Acesso em: 20 abr. 2019
17
Disponível em: <https://www.terra.com.br/noticias/educacao/infograficos/lideres-mais-tempo-
no-poder/> Acesso em 30 abr. 2019
17

estabelecendo limites. A reforma foi derrubada com 50,7% de rejeição do bloco A,


contra 49,3% dos votos a favor, do bloco B, num universo de 9 milhões de votos. 18
Hugo Chávez pretendia reorganizar o congresso, o governo e o poder
judiciário, alegando que suas ações almejavam eliminar a burocracia política e
restabelecer a democracia no país, que agora passaria a se chamar República
Bolivariana da Venezuela, com a nova constituição. Na prática, essas mudanças se
traduziam no fortalecimento do executivo, que passaria a ter decretos com força de
lei, na extinção do senado, e o poder legislativo teria uma câmara única para a
resolução das pautas.19
O termo "Socialismo para o século XXI" foi usado por Hugo Chávez para
designar o modelo político desenvolvido durante seu governo em 2006, após a
convocação de eleições diretas seguintes à tentativa de golpe sofrida em 2002,
pelos militares do exército que estavam insatisfeitos com as suas políticas que os
prejudicavam e aos membros do alto-escalão do governo, além de seu discurso
anticapitalista.
As políticas de distribuição de renda ajudaram a reduzir os índices de
pobreza e desemprego no país, juntamente com a elevação do Produto Interno
Bruto (PIB), mas, segundo Pedro Guerra, professor da Escola de Economia da
Universidade Central da Venezuela e ex-diretor do Banco Central da Venezuela
(BCV), é um cenário alarmante o fato de a Venezuela ter quase total dependência
(96%) das exportações provenientes do petróleo, e o fornecimento de alimentos
depender mais de 60% em importações de produtos finalizados, enquanto o país se
destina a vender matéria-prima e insumos utilizados inclusive na fabricação destes
(no ditado: "vender a laranja e comprar o suco", que é possui maior valor de
mercado).
O país aparentava um constante crescimento econômico devido a elevação
da cotação dos barris de petróleo, o aumento das exportações, e o acesso da
população à moradia, saúde e alfabetização, mas esses triunfos se ofuscavam
perante os índices soberbos da inflação (crescente elevação do preço dos produtos
no mercado), segundo Denilde Holzhacker, coordenadora de Relações
Internacionais das Faculdades Rio Branco, especialista em América Latina. Os

18
CONSELHO NACIONAL ELEITORAL VENEZUELANO. Caracas, 2007
19
Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/hugo-chavez/> Acesso em: 5 mai. 2019
18

números da inflação rondavam a casa de 30% em 2008, 20 mas seria no governo do


então vice-presidente Nicolás Maduro que os índices atingiria alturas estratosféricas.
Neste período que marca o fim dos anos 90 e começo dos anos 2000, a
ascensão da esquerda na América Latina parecia absoluta, com a vitória de Hugo
Chávez (na Venezuela), Lula (no Brasil), Nestor Kirchner (na Argentina), Evo
Morales (na Bolívia) e Tabaré Vázquez (no Uruguai). Para estes líderes de
esquerda, a integração entre os países membros do Mercosul e da União de Nações
Sul-americanas (UNASUL) não era suficiente para representar sua aliança, sendo
assim, buscavam no Foro de São Paulo e se reunir para discutir planos de política
nacional, envolvendo uma integração político-cultural.
Um exemplo inusitado da influencia destes líderes é o da escola de samba
carioca, Vila Isabel, que foi campeã em 2006 com o tema político Soy Loco por Ti
América, de cunho chavista e bolivariano, que retratava a importância de integrar a
América Latina em uma grande nação socialista. A escola teria recebido da
petrolífera venezuelana PDVSA uma quantia de US$ 450 mil dólares, que poderia
ser suficiente para arcar com os custos de um terço do desfile do ano.
Nelson Gonzáles, funcionário da Embaixada da Venezuela no Brasil, a
respeito da vitória da Vila Isabel, diz:

O triunfo da Vila Isabel demonstra que a consciência da


necessidade de integração dos países do Sul tem tomado força e é
também o triunfo da idéia de emancipação latino-americana e do
resgate dos valores originários dos povos do continente que vem
sendo defendida pelo presidente Hugo Chávez há seis anos.
(GONZÁLES, 2006)

Enaltecendo os ideais de Simón Bolívar compartilhados por Hugo Chávez, o


diplomata segue a fala:

O pensamento libertador de Bolívar está aí desde o século


XIX e, no entanto, ainda é muito pouco conhecido pelas camadas
mais populares no Brasil e até mesmo nos países de língua
espanhola. Como o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro
é transmitido pela televisão para várias partes do mundo,
acreditamos que a mensagem de Bolívar esteja um pouco mais
conhecida no Brasil e em outros países. (GONZÁLES, 2006)21

20
Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2013/03/governo-chavez-melhorou-pib-
mas-aumentou-dependencia-do-petroleo.html> Acesso em: 18 mai. 2019
21
Disponível em: <https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Midia/Titulo-da-Vila-Isabel-e-vitoria-
politica-de-Hugo-Chavez/12/9220> Acesso em: 21 mai. 2019
19

A mídia e partidos opositores a Hugo Chávez acusaram a politização


excessiva do Carnaval da Vila Isabel de 2006, expondo imagens na televisão de
pessoas com bandeiras da Venezuela, enaltecendo a luta latina e o repúdio aos
Estados Unidos e às elites imperialistas pelo mundo.
Também procurando realizar a sua revolução socialista, Hugo Chávez
adotou uma medida, em 2006, no mínimo polêmica, de reestruturação partidária
através da fusão, reunindo todos os partidos ideologicamente inclinados à esquerda
em um único super-partido, o Partido Socialista Unido da Venezuela. Mesmo que os
partidos posteriormente fundidos compartilhassem da mesma premissa ideológica,
eles poderiam apresentar ideias divergentes com relação a um tema, originando um
acordo aperfeiçoado oriundo de um trabalho conjunto, o que não seria possível no
unipartidarismo. Opositores alegaram que com essa medida, Hugo Chávez
pretendia transformar a Venezuela em uma segunda Cuba 22, uma ditadura
unipartidarista organizada no modelo marxista-lenista, que sofreu um profundo
colapso institucional, social, democrático e principalmente econômico no fim da
Guerra-Fria, quando deixou de receber recursos bélicos e financeiros da União
Soviética, que foi desmantelada no fim do período. A luta de classes é o tema
central da teoria marxista e em todas as entidades que fundamentam suas
operações baseadas na premissa do socialismo. Nesse sistema, o Estado deve
fazer papel de ator intervencionista e regulador do funcionamento da sociedade, até
que enfim seja alcançado um estado social onde as desigualdades beirem a
nulidade, com as riquezas sendo proporcionalmente distribuídas, posteriormente
sendo desnecessária a existência das classes sociais e do próprio Estado (tal
condição social seria o chamado Comunismo).
Em 2010, sucedeu-se um escândalo em uma das instituições criadas e
gerenciadas pelo Estado. Houveram toneladas de alimentos importados durante o
governo Chávez com validade expirada, na estatal Produção e Distribuição
Venezuelana de Alimentos (PDVAL). 23 Segundo a Mesa da Unidade Democrática
(MUD), aliança opositora, "poderiam chegar aos 170 milhões quilos a quantidade
alimentos fora do prazo de validade em estágio de decomposição, contrariando os
atuais números oficiais de 130 milhões". A quantidade de 6 quilos por cidadão

22
Disponível em: <http://news.bbc.co.uk/2/hi/americas/6192105.stm> Acesso em: 22 mai. 2019
23
Disponível em: < https://www.elmundo.es/america/2010/07/31/venezuela/1280591793.html>
Acesso em:22 mai. 2019
20

venezuelano, considerando uma população de 30 milhões, poderiam aumentar, caso


confirmasse as versões de que haveriam mais 17 barcos com alimentos importados
a serem autorizados a descarregar em Puerto Cabello. Após o escândalo, Hugo
Chávez repassou a administração da PDVAL para a vice-presidência, e, depois, ao
ministério da Alimentação.
Ainda em 2010, Hugo Chávez toma uma atitude inusitada, declarando
guerra econômica contra as empresas privadas, mais especificamente as Empresas
Polar, a empresa com a maior quantidade de estoque de alimentos do país.

Burguesia apátrida, me declararam a guerra econômica,


pois me declaro em guerra econômica e chamo o povo e os
trabalhadores (CHÁVEZ, 2010)

Ao se dirigir a Lorenzo Mendoza, chefe das Empresas Polar, Hugo Chávez


declara que a posição do sindicalista “dá pena”, que os trabalhadores das empresas
capitalistas “são como escravos” e que só o seu governo garante estabilidade
trabalhista, e segue:

Mendoza, aceito o teu desafio. Vamos ver quem aguenta


mais, Mendoza. Vamos tirar uma queda de braço, então: tu com os
teus milhões, eu com a minha moral. (CHÁVEZ, 2010)

Chávez acusou a companhia de esconder alimentos essenciais para


desestabilizar seu governo e elevar os preços, 24simulando uma falsa escassa oferta,
o que na verdade se configura como alta inflação provocada por sua própria gestão
assistencialista, que proporcionou maior poder de compra do cidadão venezuelano.
Ao demonizar as empresas privadas, é aberto o caminho para que as mesmas
empresas, gestores e investidores, abandonassem o país, possibilitando o
monopólio e a prosperidade das estatais.
Em 2011, Chávez recebe a notícia de um câncer na região pélvica, tendo
que se submeter a várias operações, o que acarretaria na sua ausência da
administração do governo. Nicolás Maduro, seu então Ministro das Relações
Exteriores, era o mais cotado por Chávez para o cargo de vice-presidente, e foi o
que aconteceu. Em 2012, ocorrem novas eleições na Venezuela, onde Chávez teria
como adversário o então governador do estado de Miranda, Henrique Capriles.

24
Disponível em: <https://veja.abril.com.br/mundo/chavez-declara-guerra-economica-contra-
empresas-privadas/> Acesso em: 24 mai. 2019
21

Apesar da acirrada disputa, devido a uma crise econômica em tímida ascensão no


país, é confirmado o favoritismo e o apoio popular de Hugo Chávez, que vence por
uma pequena diferença. Antes que pudesse exercer o cargo de fato, com apenas
dois meses com a faixa presidencial, Hugo Chávez falece, com a notícia sendo
televisionada com a palavra de Nicolás Maduro:

Nesta dor imensa desta tragédia histórica que hoje toca a


nossa pátria, nós chamamos todos os compatriotas, homens,
mulheres de todas as idades, a ser vigilantes da paz, do respeito, do
amor, da tranquilidade desta pátria. (MADURO, 2013)

Maduro demonstra grande admirado de Hugo Chávez, partilhando dos


mesmos ideais. Ainda no discurso, profere palavras de consolo aos admiradores da
figura de Chávez:

Pedimos ao nosso povo para canalizar nossa dor em paz e


tranquilidade. Suas bandeiras serão erguidas com honra e com
dignidade", afirmou. "Vamos ser dignos herdeiros filhos de um
homem gigante como foi e como sempre será na memória o
comandante Hugo Chávez. (MADURO, 2013)25

Nota-se que ele usa a palavra "tranquilidade" em ambos os trechos,


implicitamente evidenciando que tem a situação sob controle. Com a morte de
Chávez, emerge a obrigatoriedade de sucederem-se novas eleições. Desta vez
Maduro foi lançado como candidato a presidência, enquanto Capriles foi mais uma
vez concorrente ao cargo, fazendo o papel de oposição. Novamente as eleições
terminam com pouca diferença dos votos, e Maduro é eleito presidente da República
Bolivariana da Venezuela.
Maduo (2013)26, em seu discurso de posse foi bastante breve, enaltecendo
apenas o dever essencial a que lhe é atribuído: "Juro pelo povo da Venezuela, juro
pela memória eterna do comandante supremo que cumprirei e farei esta
Constituição ser cumprida".
Delegações de mais de 61 países teriam comparecido à posse de Maduro,
na Assembléia Nacional de Caracas, segundo a rede venezuelana Telesur. A

25
Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/03/morre-aos-58-anos-o-presidente-
da-venezuela-hugo-chavez.html> Acesso em: 24 mai. 2019
26
Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/04/nicolas-maduro-toma-posse-como-
presidente-da-venezuela.html> Acesso em: 24 mai. 2019
22

política de censura à sociedade civil ainda acontecia, havendo perseguição a quem


fosse contrário as ações do Estado e das Instituições, também havendo a prisão de
desertores. Sendo os agentes soberanos blindados de possíveis investigações que
viessem a trazer à luz quaisquer envolvimento com corrupção e ilegalidades na
gestão pública.
Em 2015, a MDU, oposição ao 'Chavismo', obteve vitória nas eleições
legislativas, onde conseguiram maioria significativa nas Assembleia Nacional, 99
assentos, em contrapartida ao Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), que
obteve apenas 46. Foi a primeira vez que a oposição obteve vitória, desde a criação
do parlamento, em 200027. Maduro reconheceu a derrota ao mencionar que os
seguidores do 'Chavismo' confiam no sistema eleitoral venezuelano. Esta vitória se
deu traduzindo a insatisfação popular com o a crise econômica que assolou o país. 28
A queda do preço do petróleo no mercado internacional reduziu drasticamente o
processo produtivo do país, que depende quase totalmente dessa atividade, porém,
notava-se que haviam problemas de gestão, pois a produção do petróleo da
venezuelano vinha desacelerando o ritmo desde antes da queda do preço petróleo.
Com a economia fragilizada, a entrada de dólares no país também foi ligeiramente
reduzida, assim, não havendo dinheiro para importação de produtos essenciais,
como alimentos e produtos de higiene pessoal, configurando alarmantes cenários
nos centros de distribuição e mercados: fileiras extravagantes de estantes vazias,
com escassez de produtos em todos os setores. Este fenômeno pode ser analisado
aplicando a teoria de interdependência complexa, de Robert Keohane e Joseph Nye,
que categorizam o cenário internacional como uma complexa rede de dependência
mútua entre os estados. O cenário internacional seria a mesa de sinuca, e os
Estados seriam as bolas de bilhar. Os fenômenos ocorridos involuntariamente, ou
em outros casos, ações premeditadas dos países (tanto no campo político,
econômico, cultural, e de segurança) são como o impulso que é aplicado à uma das
bolas (Estado) que em detrimento deste fato, se move carregando o peso dessas
ações ou fenômenos, atingindo outra bola de bilhar, em uma cadeia de eventos
imprevisível, ou calculada. O nível de dano calculado pelos agentes passivos desses
impactos é quantificado em dois graus, "vulnerabilidade" ou "sensibilidade". A
27
Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/12/com-9603-das-urnas-apuradas-
oposicao-tem-maioria-na-venezuela.html> Acesso em: 28 mai. 2019
28
Disponível em: <https://www.dn.pt/mundo/interior/presidente-nicolas-maduro-reconhece-
derrota-nas-eleicoes-4918815.html> Acesso em: 28 mai. 2019
23

vulnerabilidade determina a capacidade de um país influenciar outro, através de


recursos, ou por outros meios. Os efeitos de curto e médio prazo se caracterizam
como "vulnerabilidade" enquanto os de efeito imediato, se dão por "sensibilidade".
Levando isto em conta, a Venezuela sofreu impacto imediato (sensibilidade)
da queda do preço do petróleo, o que o arremessou em uma crise sem precedentes,
pois o país é mais de 90% dependente do petróleo, diferente de demais países, que
enxergaram com bons olhos este acontecimento (vulnerabilidade), como os
importadores de commodities.
Hugo Chávez alegava ser alvo de uma "guerra econômica" em que as
empresas privadas externas estariam boicotando o mercado venezuelano,
preservando produtos em estoque para então vendê-los quando valorizassem.
Maduro utilizou da mesma justificativa de "guerra econômica" para descrever o
cenário de crise de abastecimento, somando o fato de ter denunciado estratégias do
governo estadunidense de sanções à Venezuela, apesar da redução da cadeia
produtiva ter desacelerado antes mesmo do fato de os Estados Unidos terem
aplicado sanções econômicas à Venezuela.
A crise que afetou diretamente a população, impulsionou a sociedade a
pressionar cada vez mais Maduro, fazendo com que a fortalecida propusesse um
referendo revogatório e uma emenda que visava sua destituição 29. Em entrevista à
imprensa, o secretário da coalizão opositora, Jesús Torrealba, afirmou que: "A Mesa
da Unidade Democrática (MUD) tomou a decisão unânime de convocar o povo da
Venezuela a formar o maior movimento de pressão popular que já existiu para ativar
todos os mecanismos de mudança" (TORREALBA, 2016).
Em abril de 2016, o Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela decidiu vetar
a emenda que estabeleceria limites à permanência de Maduro no cargo. 30O líder da
oposição, e presidente da Assembleia venezuelana, Henry Ramos Allup, criticou a
decisão, em resposta ao Supremo: “Aos (às) malfeitores(as) da sala inconstitucional
[do] TSJ: a emenda não é fraude constitucional. Fraude constitucional são os
senhores. Vocês vão ver" (ALLUP). Este fato foi, figuradamente falando, um balde
de água fria nos ânimos aparentemente inabaláveis da oposição, que se revoltaram,
e alertando para possíveis rumos sombrios que a nação poderia tomar.
29
Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/03/oposicao-venezuelana-anuncia-
referendo-para-tirar-maduro-do-poder.html> Acesso em: 2 jun. 2019
30
Disponível em: <https://jornalggn.com.br/america-latina/na-venezuela-supremo-barra-tentativa-
de-destituir-maduro/> Acesso em 4 jun. 2019
24

Em uma sexta-feira, 13 de maio, 2016, Maduro decretou estado de


emergência de 60 dias devido à "forças" internas (na Venezuela) e externas
(Estados Unidos) estarem atuando sob lençóis contra seu governo, sem providenciar
depoimentos específicos. A oposição encarou este fato como uma tentativa
desesperada por parte do presidente de se agarrar ao poder, criticando o seu
comportamento vitimista31.
No dia seguinte, Maduro afirmou que essas forças eram originadas de
Washington e da direita fascista venezuelana, alegando que o governo americano
estaria fomentando um golpe contra ele. Suas justificativas é que Washington estava
por trás do impeachment contra a então presidente do Brasil, Dilma Roussef, e que
ele seria o próximo alvo das supostas operações da inteligência americana para
destituí-lo. Em entrevista à um programa televisivo, Maduro (2016) seguia firme com
sua versão, elaborando: "Washington está ativando medidas a pedido da direita
fascista da Venezuela, que é encorajada pelo golpe no Brasil". 32 Enquanto o
impasse político-jurídico paralisa o sistema venezuelano, a crise foi aos poucos se
agravando, com
No dia 29 de março de 2017, o Supremo Tribunal da Venezuela interfere no
Legislativo, passando a assumir todas as funções da Assembleia Constituinte, com a
pronúncia da corte frisando que: "[Enquanto perdurar] A situação de desacato e
invalidade dos atos da Assembleia Nacional, o Tribunal Constitucional garantirá que
os poderes parlamentares sejam exercidos diretamente por esta corte ou pelo órgão
que ela disponha”.
Esta medida foi tomada com a justificativa de que o Legislativo apresentava
comportamento omisso na análise de propostas do Executivo quanto ao
estabelecimento de empresas mistas no setor de energia. Segundo a corte, os
legisladores teriam deixado de analisar estas iniciativas, apesar de a Lei de
Hidrocarbonetos submeter estas tarefas ao membros da Assembleia Nacional. Esta
é uma sequência de uma decisão que quase inteiramente suspendia a função
legislativa da assembleia venezuelana, ao julgar recurso pela reativação da
aplicação da Carta Interamericana da Organização dos Estados Americanos (OEA).
O deputado Héctor Rodríguez Castro foi o responsável por apresentar o recurso que

31
Disponível em: https://www.reuters.com/article/us-venezuela-politics-idUSKCN0Y501X
32
Disponível em: <https://www.theguardian.com/world/2016/may/14/venezuela-president-
declares-60-day-state-of-emergency-blaming-us-for-instability Acesso em: 6 jun. 2019
25

anularia a imunidade da Assembleia Nacional Constituinte, utilizando de


fundamentação jurídica33.Esta prerrogativa do Supremo Tribunal Venezuelano teve
repercussão internacional, levantando polêmica sobre o próprio embasamento do
sistema de divisão dos três poderes, sendo Montesquieu seu principal percursor, e
a perturbação dessa ordem, devido á interferência do Judiciário no Legislativo e a
orientação imparcial das suas decisões.
Pesquisas realizadas apontavam a grave situação em que se encontrava a
Venezuela, como a realizada pela UPI, em Fevereiro de 2017, a Pesquisa de
Condições de Vida da Venezuela. Essa pesquisa constatou que 75% da população
venezuela havia perdido aproximadamente 8kg em 2016 devido à escassez de
produtos disponíveis no mercado. A pesquisa leva o nome de ENCOVI, e foi um
esforço conjunto conduzido pela Universidade Central da Venezuela, a Universidade
Católica Andrés Bello, e a Universidade Simón Bolívar, junto ao grupo de nutrição
Fundação Bengoa, e outras organizações não-governamentais 34. A Venezuela não
havia divulgado nenhum dado sobre a mortalidade infantil na Venezuela. Porém, um
link que apareceu em abril de 2017 no site do Ministério da Saúde venezuelano
informou que 11.446 crianças com menos de um ano morreram desnutridas em
2016 na Venezuela, ou seja, um aumento de 30% em um ano 35.

CAPÍTULO 3: UM VISLUMBRE DE ESPERANÇA E O APAGÃO NO FIM DO


TÚNEL

Além de alimentos e produtos de higiene básicos, também faltam


medicamentos para atender a demanda da população, tanto em hospitais públicos e

33
Disponível em: <https://moodle.ufsc.br/pluginfile.php/1255605/mod_resource/content/0/
Citacoes_em_Trabalhos_Cientificos.pdf> Acesso em: 8 jun. 2019
34
Disponível em: <https://www.upi.com/Top_News/World-News/2017/02/19/Venezuela-75-of-
population-lost-19-pounds-amid-crisis/2441487523377/> Acesso em: 10 jun. 2019
35
Disponível em: < https://tinyurl.com/y5svb3vs> Acesso em: 10 jun. 2019
26

privados, quanto nas farmácias, além do problema de contaminação da água e dos


alimentos disponíveis.36
A pesquisa também concluiu que 93% dos cidadãos venezuelanos não têm
dinheiro para arcar com as despesas alimentícias. Nas dietas diárias quase
desapareceram o número de gorduras boas.
Números e estatísticas podem ajudar a compreender a dimensão do objeto e
tema de estudo, como este exemplo recém-citado, porém, há casos em que o
estudo do comportamento humano seja impossível de ser medido.
O cientificismo era, inclusive, a premissa dos defensores do behaviorismo,
corrente de estudiosos que protagonizaram o segundo debate das relações
internacionais, contra os tradicionalistas da escola inglesa, que priorizavam uma
análise mais "humana" clássica da realidade, pautada na história, filosofia e cultura.
Por ser uma teoria baseada nos princípios humanos, em alguns casos pode
se inclinar para o discurso totalizante, que ostenta uma retórica adornada de alarme,
romantização ou dramatização, imparcialmente longe da correta análise do objeto de
estudo. Porém, justamente por esse fato, também poderiam ser mais capazes de
captar a atenção daqueles aos quais se dirigiam. Imagens de um vídeo da BBC, de
autoria de Vladimir Hernandez37 mesclam estas duas teorias de maneira positiva,
trazendo informações e estatísticas corretas quanto à matéria, ao mesmo tempo
exibindo imagens impactantes de uma realidade que favorece uma narrativa mais
dramática e alarmante, onde pessoas precisam recorrer ao drástico cenário de
buscar alimento no lixo.Desde abril de 2017, violentos protestos tomaram conta das
ruas de Caracas. Os números do Observatório de Segurança Venezuelano, ligado
ao Ministro do Interior, Justiça e Paz, entidade ligada ao governo Maduro, falavam
de 9927 mortes violentas pela nação até agosto de 2017. 38Por outro lado, o
legislador da oposição Simón Calzadilla39, demonstrava ceticismo quanto a esses
dados, citando dados do Observatório Venezuelano de Violência (OVV) 40, que
chegaram à estimativa de 27.875 mortes violentas em 2015 e 28.468 em 2016,

36
https://www.aljazeera.com/news/2019/02/medicine-food-venezuela-healthcare-crisis-
190208085644270.html
37
Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-40174600> Acesso em 11 jun.
2019
38
Disponível em: <https://venezuelanalysis.com/analysis/13081> Acesso em 12 jun.
39
Disponível em: <https://www.voanews.com/americas/venezuelas-government-reports-nearly-
10000-homicides-2017> Acesso em 11 jun.
40
Disponível em: <https://observatoriodeviolencia.org.ve/informe-ovv-de-violencia-2017/> Acesso
em 12 jun.
27

alegando fundamentar suas informações em três tipos de fontes diferentes: Dados


publicados na imprensa nacional, arquivos oficiais e pesquisas de vitimização. No
ano de 2017 completavam-se 14 anos consecutivos da censura sobre a estatística
oficial de criminalidade e violência, o que obrigou o instituto a recorrer aos índices
nacionais, estatais e regionais, como demonstra o informativo:
Figura 1: Índice de mortes de acordo com a OVV.

Fonte 1: Obs. Venez. de Violência (OVV)

Em meio ao caos total instaurado na Venezuela, parecem surgir


personagens que parecem ser oriundos da ficção. Foi o caso do policial combatente
Óscar Pérez, que foi uma figura marcante no contexto da crise recente na
Venezuela, por ter liderado uma oposição formidável contra o regime ditatorial de
Nicolás Maduro, não só civil, como bélico.
Óscar Pérez entrou para a Brigada de Ações Especiais, a elite da política
científica na Venezuela, com apenas 21 anos. Ele carregava em sua bagagem 15
anos de experiência no ramo militar, sendo capitão do helicóptero do Corpo de
Investigações Científicas, Penais e Criminalísticas (Cicpc), formando-se em cursos
de especialização, como mergulho e paraquedismo 41. Era altamente treinado em
diversas áreas de combate, recebendo o apelido de Rambo Venezuelano ou James
Bond Venezuelano.

41
Disponível em: <https://pleno.news/mundo/quem-foi-oscar-perez-simbolo-da-revolucao-
venezuelana.html> Acesso em 13 jun. 2019
28

Óscar foi teve papel fundamental de um filme nacional venezuelano


entitulado "Morte Suspendida" , filme da qual foi idealizador, protagonista e co-
produtor, considerado no país uma obra-prima do direto Oscar Rivas Gamboa.
A inspiração para Óscar Pérez era a luta contra a criminalidade e a filosofia
de má índole das pessoas, reflexão da qual lhe veio após perguntar para um
menino conterrâneo seu o que ele gostaria de ser quando crescesse, pergunta da
qual o menino respondeu: "Eu quero ser um bandido para ganhar dinheiro, as
mulheres mais bonitas e o respeito do bairro". A decisão de fazer um filme era uma
ótima ideia, pois apresentava ao público fragmentado venezuelano um possível
futuro, onde pudessem viver em paz e ter uma vida digna. Em uma entrevista
baseada na estréia do filme, pergunta-se qual a mensagem ele queria dar os
criminosos, Óscar respondeu:

Queremos demonstrar a capacidade que a instituição tem


quando realiza uma investigação que termina com o
desmantelamento de grupos criminosos. Somos a instituição policial
do país com mais detidos e processos, também queremos dizer que
temos as ferramentas e o conhecimento para evitar o crime. Os
caminhos dos criminosos são muito marcantes: prisão e morte em
um confronto. (PÉREZ, 2015)42

À esta altura Pérez ainda era um desconhecido para o mundo, pois o filme
não teve tanta repercussão fora dos cinemas nacionais.
Ainda quando perguntado sobre o que gostaria de expressar à população
venezuelana, Pérez respondeu:

Queremos alcançar as mentes da juventude das


favelas. Queremos que, uma vez terminada a função, tenhamos um
momento de reflexão. Deixe-os perceber que existe um futuro, que
eles podem ser bons e produtivos cidadãos. Que a mensagem
enviada pela TV que os crápulas e mal-feitores são os que triunfam,
não é verdadeira. Muitos filmes que vêm de fora dão mau exemplo
heróis negativos e é isso que nós queremos mudança 'suspendeu a
morte. Por meio de filme, que entrar na consciência dos
telespectadores, mostrando que existem polícia venezuelana que
são verdadeiros heróis, que dentro das instituições há pessoas com
vocação, que acreditam no respeito, na moral e nas boas maneiras.
(PÉREZ, 2015)

42
Disponível em: <https://web.archive.org/web/20170628015924/http://www.panorama.com.ve/
experienciapanorama/Funcionario-del-Cicpc-se-convirtio-en-protagonista-de-una-pelicula-
20151025-0041.html> Acesso em 13 jun. 2019
29

Talvez Maduro não tivesse pensado que suas denúncias de "forças internas"
fossem realmente se revelar. Isto por que no dia 27 de junho de 2017, um piloto e
um grupo de apoio se rebelaram contra a ditadura venezuelana, roubando um
helicóptero e lançando granadas e disparando tiros contra a sede do Supremo
Tribunal da Venezuela. Este piloto era ninguém menos que Óscar Pérez. O incidente
se passou sem o registro de feridos. 43Sob minha perspectiva pessoal,
acompanhando o incidente no noticiário em primeira mão, por alguma razão
imaginei que aquele helicóptero iria se lançar contra o prédio, com sua tripulação, ou
quem estivesse nele, ignorando completamente o instinto da autopreservação, mas
não foi o caso. Talvez tenha imaginado isso devido à triste e insustentável situação
em que o povo se encontra, apesar de, posteriormente, surgirem de fato notícias de
aumento do índice de comportamento suicida no país. 44
É curioso notar que o alvo da operação não era propriamente o presidente
Nicolás Maduro, mas o Supremo Tribunal da Venezuela. O que leva a crer que o
autor do ataque apostava alto que o Judiciário tinha uma significativa parcela de
culpa pelos infernos aos quais a população venezuelana é submetida.
Logo no dia seguinte a Venezuela emitiu ordem de captura contra Pérez,
fosse em solo estrangeiro ou solo pátrio. Pérez conseguiu permanecer fora do radar
do regime de Maduro por meses, quando reapareceu em dezembro, orquestrando
um ataque contra um quartel administrado pelo presidente do qual saqueou várias
armas, divulgando um vídeo com a confirmação de que era o responsável pela
investida.
Neste período, o número de mortos na Venezuela ultrapassaria aqueles
países em estado de guerra, 75 homicídios para cada 100 mil habitantes, contra 60
mortes violentas no Afeganistão, por exemplo. 45
Em 27 de Dezembro de 2017 Óscar
Pérez publicou mais uma vez um vídeo nas redes sociais, em que convocava a
população para se voltar com força total contra o Nicolás Maduro.
Foi então que, no dia 15 de janeiro de 2018, Óscar Pérez publica um vídeo
onde se vê cercado por tropas chavistas em seu esconderijo, onde clama pela
liberdade do povo venezuelano para sempre, sendo confirmada a sua morte no dia
43
Disponível em: <https://renovamidia.com.br/oscar-perez-heroi-venezuela/> Acesso em: 14 jun.
2019
44
Disponível em: <https://exame.abril.com.br/mundo/em-desespero-com-crise-cresce-o-numero-
de-suicidios-na-venezuela/> Acesso em: 14 jun. 2019
45
Disponível em: <https://noticias.r7.com/internacional/mortes-violentas-na-venezuela-superam-
as-de-paises-em-guerra-12122017> Acesso em : 14 jun. 2019
30

seguinte. Antes de ser executado, Pérez enviou uma mensagem a seus 3 filhos, que
dizia: "Sebastian, Santiago, Dereck, eles sabem que nós fizemos isso por vocês, por
todas as crianças da Venezuela. Espero vê-los em breve, eu amo vocês, crianças,
eu amo vocês." (PÉREZ, 2018).
Óscar Pérez foi um vislumbre de esperança para o povo venezuelano que se
opunha à ditadura de Nicolás Maduro, podendo, pelos seus feitos, ser lembrado
como "um exército de um homem só".
Maduro encerrou o ano de 2017 com um índice inflacionário acumulado de
2.616%, segundo o parlamento da Assembleia Nacional, sendo os únicos a
calcularem este valor, quando o Banco Central deixou de levantar estimativas em
2015. 46 Porém, de acordo com o Fundo Monetário Internacional, a Venezuela
iniciava o ano de 2018 com uma quantia completamente fora da capacidade da mais
substancialmente fértil imaginação, beirando os 930.000%. Maduro não reconhece
estes levantamentos por alegar que o FMI é um instrumento ativo dos EUA na
suposta "guerra econômica" contra a Venezuela, enquanto os críticos afirmam que a
verdadeira causa do colapso econômico é a política monetária de monstruosa
injeção de bolívares venezuelanos na economia e o descontrole de políticas
assistencialistas e salariais, causando uma bola de neve. 47
Quando lançou sua candidatura para as eleições presidenciais de 2018,
Maduro planejava "não correr riscos" assim banindo o registro eleitoral dos partidos
que se abstiveram nas eleições municipais. Em um outono do dia 21 de maio de
2018, Maduro vence as eleições gerais para um mandato de seis anos sob fortes
acusações de fraudes e manipulação, sendo alvo de questionamento da oposição,
que praticou boicote, dos Estados Unidos, da União Europeia do Grupo de Lima e
outros Estados, sendo, por outro lado, parabenizado por países vizinhos como
Cuba, Nicarágua, Bolívia e Equador, e as nações companheiras, como Rússia, que
é uma das grandes fornecedoras de material bélico ao país, e China, parceira
econômica.48
Em uma reunião em Lima, Peru, pela Oitava Cúpula das Américas, o vice-
presidente dos Estados Unidos Mike Pence (que cumpria agenda em nome do
46
Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/venezuela-fecha-2017-com-inflacao-de-
2616-aponta-parlamento.ghtm>l Acesso em : 14 jun. 2019
47
Disponível em:
<https://www.imf.org/external/datamapper/PCPIPCH@WEO/WEOWORLD/VEN> Acesso em:
48
Disponível em: <https://www.dw.com/pt-br/maduro-%C3%A9-reeleito-presidente-da-
venezuela/a-43865358> Acesso em: Acesso em : 13 jun. 2019
31

presidente Donald Trump), disse que os Estados Unidos não apoiaria um ato de
devolução da Venezuela ao colo da "ditadura", ameaçando adotar políticas de
sanções.49
O estado de calamidade na Venezuela se perpetuava, e, em atingia também
o Brasil. Uma onda de venezuelanos refugiados provocou uma crise migratória no
Estado de Roraima, da qual a capital Boa Vista era alvo de refúgio de milhares de
venezuelanos. O impasse político, velho conhecido dos brasileiros, agravou a crise
no estado. Se refugiaram para Roraima mais de 50 mil venezuelanos, o equivalente
a 10% da população do estado. A reação de alguns roraimenses era de
discriminação e xenofobia, não enxergando com bons olhos a vinda de tantos
estrangeiros para as proximidades de Pacaraima.50
Em uma quarta-feira, 23 de janeiro de 2019, ocorria o fato de traria outros
ares para a Venezuela. O presidente do Parlamento da Assembléia Constituinte,
Juan Guaidó, se declarou presidente interino da República Bolivariana da
Venezuela. Em uma ofensiva talvez até mais inusitada que a interferência do
Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela no Legislativo, Juan (2019) declarou:
"Juro assumir formalmente as competências do Executivo Nacional como o
presidente encarregado da Venezuela para conseguir o cessar da usurpação, um
governo de transição e ter eleições livres”.
Guaidó seria o responsável por liderar a oposição na busca pela restauração
do estado de direito do povo venezuelano, exigindo que Maduro entregasse as
rédeas do poder.

Em nota, o presidente Trump afirmou que irá usar de "todo o poder


econômico e diplomático dos EUA para pressionar pela restauração líder fazia o
discurso de que a Constituição estava com ele e com o povo: “Irmãos e irmãs: hoje
dou o passo com vocês, entendendo que estamos em ditadura" 51.
Igualmente pronto para se demonstrar favorável à figura a Guaidó,o
presidente do Brasil, Bolsonaro, disse, em seu Twitter, que: "O Brasil apoiará política

49
Disponível em:
<https://www.miamiherald.com/news/nation-world/world/americas/article208920324.html>
Acesso em : 14 jun. 2019
50
Disponível em: <https://www.dw.com/pt-br/embate-entre-uni%C3%A3o-e-roraima-agrava-crise-
migrat%C3%B3ria/a-45297184> Acesso em 14 jun. 2019
51
Disponível em: <https://istoe.com.br/juan-guaido-se-autoproclama-presidente-da-venezuela/>
Acesso em: 15 jun. 2019
32

e economicamente o processo de transição para que a democracia e a paz social


voltem à Venezuela".
Ambos presidentes do Brasil e dos EUA não enxergaram problemas em
apoiar uma figura até então pouco conhecida como presidente da Venezuela, pois
eram movidos ao mais puro repúdio às políticas e à própria imagem de Nicolás
Maduro, estando em pólos ideológicos totalmente opostos a Maduro, e estariam
dispostos a "pagar para ver" uma mudança de cenário definitiva na Venezuela.
Em uma terça-feira, 30 de abril de 2019, o líder opositor Juan Guaidó,
convocou a população venezuelana para uma investida contra o regime de Maduro.
O autoproclamado presidente da Venezuela, fez uma declaração em que afirmava
que tinha o apoio das principais unidades da Força Armada Nacional Bolivariana
(FANB). Com isso, ele fazia um apelo aos venezuelanos para irem às ruas para o
"fim da usurpação" do poder de Nicolás Maduro, fundamentado em sucessivos
golpes.
O Brasil, os Estados Unidos e o Canadá estão entre os países que
declararam apoio à Juan Guaidó, bem como a Organização dos Estados
Americanos (OEA), órgão que busca reconhecer a democracia nos países das
Américas. Os confrontos foram violentos, e tiveram grande repercussão na mídia
internacional. Pelo menos 69 se feriram, das quais 41 delas foram atingidos por
balas de borracha. Apesar de todo o alarde, os objetivos da oposição passaram
longe de se realizar. 52
No dia 4 de maio de 2019, Juan Guaidó convoca mais uma vez a população
às ruas, desta vez em manifestações pacíficas em direção aos principais quartéis e
centros estratégicos militares contra as tropas chavistas da Guarda Nacional, em
vários estados do país. A justificativa da manifestação era a súplica para que os
militares reconhecessem a figura de Guaidó como presidente interino da República
Bolivariana da Venezuela, do mesmo modo que mais de 50 países reconheceram.
De repente todos os olhos do mundo estariam voltados para a Venezuela, já
que não é só a liberdade de um povo que estaria em jogo. Há quem diga que um
conflito oficial entre dois Estados envolvendo a Venezuela poderia ser o gatilho até
mesmo para uma possível terceira guerra mundial. Já que, no cenário internacional

52
Disponível em: <https://veja.abril.com.br/mundo/ao-vivo-oposicao-e-forcas-leais-a-maduro-se-
enfrentam-na-venezuela/> Acesso em: 15 jun. 2019
33

nenhum país sobrevive sozinho. Alianças são construídas, e às vezes você pode
até negociar com o inimigo, satisfazendo interesses mútuos.
A pergunta que fica é, por que, depois de tudo isso, a Venezuela não sofreu
nenhuma intervenção externa?
Este é o ponto que o embaixador e ex-ministro da Indústria, do Comércio e
do Turismo, e vice-presidente do CEBRI (Centro Brasileiro de Relações
Internacionais), José Botafogo Gonçalves analisa, em seu artigo sobre os eventos
recentes na Venezuela: A Venezuela e o fim do recreio 53.
No texto, ele menciona o princípio da não ingerência, ou princípio da
autonomia, que é a premissa de que um Estado não deve interferir nos assuntos de
outro, já que cada Estado é soberano, e questiona se esse método de diplomacia
sempre foi respeitado pelo corpo diplomático brasileiro, o Itamaraty, já que a mídia
tem proposto polêmicos debates, onde algumas partes estariam acusando a
Instituição de não respeitar este princípio, após o reconhecimento de Juan Guaidó
como presidente interino da Venezuela. O questionamento se dá pelo fato de que a
crise na Venezuela pode ser interpretada como uma situação de emergência que
justifica uma intervenção, já que configura os requisitos da ONU para uma
intervenção, como a violação de direitos humanos, o extermínio da população,
condições de vida precárias, saúde, segurança, corrupção e da inconstitucionalidade
do cargo de Nicolás Maduro.
Ainda mencionando a ONU, José Botafogo Gonçalves analisa sua agenda
de assuntos voltados para a preservação das liberdades individuais, de proteção ás
mulheres, meio-ambiente, de luta às drogas, e dos casos mais graves de crimes
contra a humanidade poderem ser julgados do Tribunal de Haia, nos Países Baixos.

53
Disponível em: <https://www.forumdofuturo.org/a-venezuela-e-o-fim-do-recreio/> Acesso em:
16 jun. 2019
35

José Botafogo evidencia que a agenda da Organização das Nações Unidas


é nobre e altruísta, mas torna-se questionável, visto que a própria organização
chegou a reconhecer intervenções militares por parte de grandes potências, em
troca de representatividade no plenário. Cita também que a história do mundo foi
escrita com relatos de países intervindo em outros por todas as eras, o que originou
suas línguas, culturas, políticas e identidades, ou seja, que pavimentou seus
processos de formação, e isso proporcionou a evolução diplomática, como a didática
do seu princípio básico: o fato de que a guerra não é benéfica e não trás lucros à
ninguém, como Norman Angell cita em sua obra de cunho liberalista, A Grande
Ilusão.
Ao citar que o Brasil mudou nos últimos 200 anos e que terá de escolher um
lado entre os vizinhos latinos ou as superpotências, pode estar se referindo ao fato
de que a política cordial não floresce em um mundo cada vez mais radical, e alerta
para futuras tensões que terão de ser lidadas com equivalente rigidez.
Outra questão se refere à perpetuação de Maduro no poder. Mesmo com o
apoio de Rússia, China, e países aliados, é no mínimo questionável como um
sistema social e econômico praticamente falido ainda não sucumbiu completamente.
Se não há emprego, não há dinheiro, e, se não há dinheiro, não há como
pagar impostos. E já que não há como pagar impostos, o governo não arrecada,
portanto não pode ser funcional. Pode até ser verdade que o financiamento da
Rússia e da China podem "bancar" os banquetes de Maduro 54, mas o retorno para o
governo Russo não fica muito claro.
Outro fato que poderia estar providenciando suporte financeiro para a
Venezuela é a parceria da Venezuela-Turquia a respeito de uma negociação de
ouro. No dia 12 de fevereiro de 2019, o presidente turco Recep Tayyip Erdogan,
declarou estar animado em desenvolver comércio de ouro com a Venezuela, apesar
das sanções impostas pelos Estados Unidos. À imprensa venezuelana, Erdogan
disse : “Após nossa visita à Venezuela, o vice-presidente de [Nicolás] Maduro veio a
nosso país e fez avaliações aqui." De acordo com a BBC, o comércio de ouro com a
Venezuela vem prosperando, com números levantados de mais de US$900,00
milhões de dólares55

54
Disponível em: <https://www.focus.jor.br/em-video-maduro-mostra-como-a-carne-e-fraca/>
Acesso em: 1 jun. 2019
55
Disponível em: <https://www.bbc.com/news/world-europe-47092784> 17 jun. 2019
36

Apesar da crise econômica. Existem postos de trabalho que são de interesse


da Turquia, e seus recursos petrolíferos são também chamativos para o povo turco,
além dos férteis campos agrícolas. Isto comprova a teoria de que países com
abundante s recursos naturais atraem agentes hostis que procuram se estabelecer
na região para explorar estes recursos. Fato que se dava também no período do
auge das colônias. O governo venezuelano teria convidado homens turcos para
negociar um investimento de ponta na Venezuela, oferecendo 70% do ouro nas
minas e pedido 30% para o estado. Uma empresa turca já está na Venezuela para
explorar minas.56
Neste impasse político infindável, destacar agentes que foram de suma
importância na procura por um caminho pacífico.
É o caso da Noruega, que confirmou, do dia 17 de maio, que estava
mediando as negociações entre a oposição e os representantes do governo de
Nicolás Maduro. "A Noruega anuncia que manteve contatos preliminares com os
representantes dos principais atores políticos na Venezuela, como parte de uma
fase exploratória, em vista de contribuir para encontrar uma solução para a situação
do país". Afirmou, em nota, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela. 57

Apesar dos esforços, os encontros não originaram resultados, pois a


oposição não mudou suas demandas, como afirmou Juan Guaidó (2019):
"Ratificamos nosso caminho: fim da usurpação, governo de transição e eleições
livres como via para solucionar a tragédia que hoje sofre a Venezuela. Este encontro
acabou sem acordo" e então agradeceu as boas intenções da Noruega neste
contexto: "ao governo da Noruega por sua vontade de contribuir com um a solução
para o caos que sofre nosso país" .58
Hoje, o índice da inflação, de acordo com o FMI, chega aos 10 milhões por cento. E
sem a perspectiva de melhora, a economia pode recuar mais 25% em 2019, depois de ter
sofrido uma contração de 18% em 2018.59
CONCLUSÃO
56
Disponível em: <https://istoe.com.br/erdogan-quer-desenvolver-comercio-de-ouro-com-a-
venezuela/> Acesso em: 17 jun. 2019
57
Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/05/17/noruega-confirma-mediacao-
entre-governo-e-oposicao-da-venezuela.ghtml> Acesso em: 17 jun.2019
58
Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/06/01/crise-na-venezuela-por-que-a-
noruega-se-tornou-um-pais-chave-na-mediacao-de-conflitos.ghtml> Acesso em: 17 jun. 2019
59
Disponível em: <https://www.valor.com.br/internacional/6203865/fmi-estima-que-inflacao-na-
venezuela-vai-chegar-10000000-em-2019> Acesso em: 17 jun. 2019
37

Em um contexto geral, pode-se observar que alguns fenômenos acerca da


crise venezuelana, apesar de ser majoritariamente um problema interno, envolve
agentes do cenário internacional, e algumas teorias das Relações Internacionais são
utilizadas para análise do cenário, como a Teoria da Interdependência, de Robert
Keohane e Joseph Nye, explicitados na obra Power & Interdependence.
Um fator essencial para a crise foi a aplicação do "Bolivarianismo" no
sistema venezuelano, em que a constituição seria alterada para favorecer a
permanência do então atual presidente, Hugo Chávez, no cargo. Isto se deu também
pelo aparelhamento do Judiciário, onde julgava quase todas as causas em prol do
chefe do Executivo. Isto ficou ainda mais evidente quando a oposição conquistou a
maioria da Assembleia Nacional, quando exigiu que o presidente atual Nicolás
Maduro renunciasse acusado de fraudes eleitorais, coletando milhões de
assinaturas da população para um referendo que previsse sua saída, fazendo com
que o Legislativo não reconhecesse essas assinaturas e interferisse no Legislativo,
atribuindo todas as funções desta ordem ao Judiciário.
A economia, saúde, segurança e todos os setores da sociedade estão em
frangalhos desde então, com a política de intervenção estatal na economia, e a
manutenção do funcionamento do país dependente totalmente do petróleo e do
suporte dos países aliados do eixo. Por ser quase inteiramente dependente do
petróleo, um dos fatores cruciais a agravar a crise foi a queda do preço do petróleo,
que fez o Estado imprimir mais cédulas para cobrir as despesas, agravando ainda
mais a inflação.
Entre manifestações violentas entre a população, uns a favor do governo
chavista de Maduro, e outros que apoiam a oposição, há um impasse que parece
não ter data definida para resultados definitivos. Enquanto se dá esta queda de
braço, a crise se agrava, e inúmeras pessoas são convertidas em vítimas fatais do
contexto trágico em que se encontra a Venezuela.
38

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
http://www.ecsbdefesa.com.br/defesa/fts/Bolivar.pdf
http://lahistoria200.blogspot.com/2019/02/las-principales-frases-del-discurso-
de.html
http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/
14/1300408870_ARQUIVO_ASRELACOESBILATERAISBRASILVENEZUELANOCO
NTEXTODAGLOBALIZACAO.pdf
http://opiniaoenoticia.com.br/nesta-data/e-criada-a-republica-da-gra-
colombia/
http://www.geographia.com/Venezuela/history.htm
https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/hugo-
chavez.html
https://www.todamateria.com.br/hugo-chavez/
https://www.terra.com.br/noticias/educacao/infograficos/lideres-mais-tempo-
no-poder/
https://veja.abril.com.br/mundo/chavez-declara-guerra-economica-contra-
empresas-privadas/
http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/03/oposicao-venezuelana-anuncia-
referendo-para-tirar-maduro-do-poder.html

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