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A CULTURA DO CONHECIMENTO TÉCNICO NA MANUTENÇÃO.

A História da Manutenção Brasileira e seu efeito sobre a


Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção.
Obs.:
Esse é o segundo de 3 artigos sobre esse tema, que são:
- O que é, e sua importância.
- A História da Manutenção Brasileira e seu efeito na Cultura do
Conhecimento Técnico na Manutenção.
- As Evidências de uma Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção.
“Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção” é o sentimento
natural e moral dos profissionais em querer aprimorar e executar bem suas
funções técnicas, pela plena consciência de sua importância, e, obviamente,
com responsabilidade, visando sempre os interesses da empresa.

Introdução.
Neste artigo não iremos falar de história da Manutenção, como
acontece em diversas literaturas, onde contam que primeiro era a
Corretiva, depois a Preventiva, depois a Preditiva, etc.
Vamos em uma direção totalmente diferente, mostrando o que
aconteceu no Brasil, em várias empresas, não quer dizer que aconteceu em
todas, mas é interessante conhecer, porque, esse histórico retrata um
momento que, de certa forma, foi um facilitador para o enfraquecer da
Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção.
Resumindo o que apresentaremos com maiores detalhes, a
Manutenção do Brasil se viu obrigada a aprimorar seus métodos de gestão
em um momento, no qual estava ainda amadurecendo no corpo de
profissionais da Manutenção o Conhecimento Técnico e sua importância.
Isso obrigou a divisão de esforços, e, gerou uma potencial desatenção ao
Conhecimento Técnico, para melhorar a Gestão.
Esse fato causou influência mais significativa na especialidade de
Mecânica, pois que nas especialidades de Elétrica e Instrumentação, por
natureza, os profissionais já eram introduzidos na função com um maior
grau de instrução técnica.
Vimos empresas, ou áreas de Manutenção de uma empresa, lidarem
bem com essa situação, e, outras nem tanto, portanto é possível que
empresas, que apresentam atualmente alto número de corretivas,
reincidência de falhas, custos elevados, excesso de controles e reuniões
para tratamento de planos de ação, assim como dificuldades de melhorar
seus indicadores de Manutenção, possuam ainda resquícios dessa época,
da qual iremos tratar. E, em caso afirmativo, é um reforço para introduzir
a Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção.

A Manutenção nos anos 70-80


Nesse período, era ainda grande a presença de profissionais oriundos
de empresas de montagem na Manutenção. Na especialidade de mecânica
eram em grande maioria “práticos”, sem um Conhecimento Técnico
apurado de Manutenção, e, era mínima a existência de literaturas técnicas
para uso. Eram profissionais treinados em montagem, e não em
diagnósticos de defeitos e manutenção.
Podemos dizer que nessa ocasião, o grande foco dos Gerentes da
Manutenção era no Conhecimento Técnico.
Procurava-se fazer com que Supervisores e Executantes de
manutenção valorizassem as técnicas adequadas de manutenção, em
detrimento a muitas práticas aprendidas, que não eram corretas.
E, também, por parte dos Engenheiros e Gerentes, se buscava
aprofundar ao máximo nos Conhecimentos Técnicos, para a melhor
compreensão dos equipamentos e seus Mecanismos de Falhas.
Entre os anos 70 e 80, o livro de cabeceira do Gerente de Manutenção
era um livro técnico, tão raros eram os Conhecimentos Técnicos relativos a
Manutenção difundidos na ocasião.
Foi uma fase em que se buscava muito o Conhecimento Técnico como
ferramenta para melhorar a manutenção, onde o engenheiro experiente
era peça importantíssima, pela maior facilidade de acesso a informações,
pelo conhecimento adquirido, e, pela habilidade que seu estudo de
engenharia lhe oferecia, para melhor compreender novos sistemas e
equipamentos.
Os Supervisores, em grande parte, também eram profissionais que
alcançaram esse cargo pela experiência prática do como fazer, mas não
possuíam apurado Conhecimento Técnico, nem facilidade de adquiri-los.
A Gestão da Manutenção era precária, onde ainda muitos Gerentes
eram ex-chefes de obras de montagens, com seus velhos hábitos.

A Manutenção nos anos 80-90.


A evolução da Gestão da Manutenção no Brasil se observou
fortemente a partir do final dos anos 80 e início dos anos 90, quando a
Manutenção no Brasil, ainda se esforçava para adquirir e mostrar a
importância do Conhecimento Técnico.
Nessa ocasião entre os anos 80 e 90, surgiu uma avalanche de
conhecimentos de práticas de gestão da Manutenção, que trouxeram
grandes benefícios às empresas, importadas notadamente de países como
Japão e Estados Unidos (Gestão por Objetivos, Eficácia x Eficiência,
Motivação, TQC, Gerenciamento da Rotina, Padronização, TPM, etc.).
Importante se faz frisar que esses Países, Japão e Estados Unidos,
diferentemente do Brasil, já possuíam consolidada uma consciência da
importância do Conhecimento Técnico nos diversos níveis da Manutenção.
Os profissionais da Manutenção nesses países possuíam, não só os
Conhecimentos Técnicos de Manutenção, como a Cultura de que o
Conhecimento Técnico e sua aplicação era algo absolutamente
imprescindível.
Tivemos, particularmente a oportunidade de trabalhar com
profissionais japoneses, assim, como profissionais americanos, e era
notável a naturalidade com que entendiam a importância do Conhecimento
Técnico, e, muito se podia aprender com os mesmos.
Vamos apresentar alguns aspectos particulares e objetivos dos
potenciais complicadores, nessa fase, para a formação do Conhecimento
Técnico da Manutenção e da conscientização de sua importância:
Aspectos fudamentais:
- Redução do conhecimento de Engenharia na construção do
Conhecimento Técnico.
O conhecimento de Engenharia advinha do Gerente da Manutenção,
pela sua experiência, facilidade de adquirir novas informações e poder de
convencimento.
Com as novas práticas de gestão, essas passaram a ser o principal foco
de atenção dos Gerentes da Manutenção. Essa foi uma época em que se
deu grande avanço na gestão e nos resultados da manutenção,
indubitavelmente, mas, por uma questão de priorização de tarefas do
Gerente da Manutenção, facilitou o surgimento de uma era de redução na
intensidade da valorização do Conhecimento Técnico, que muito dependia
desse personagem.
Face a pouca atuação em aspectos técnicos, e a grande cobrança das
práticas de Gestão, novos gerentes já não se esmeravam no conhecimento
técnico, deixando-os para os Supervisores.
Podemos dizer que o Conhecimento Técnico dos Gerentes de
Manutenção foi reduzindo cada vez mais.
- Redução da motivação ao Conhecimento Técnico por parte dos
engenheiros e redução da influência do conhecimento de engenharia na
formação do Conhecimento Técnico da Manutenção.
Em um primeiro momento, os engenheiros se envolveram em
trabalhos de implementação das novas práticas de gestão, entusiasmando-
se pelas metodologias, pelo valor que a empresa dava a elas, e, grande
parte deles perdeu o interesse por assuntos técnicos, que não eram
valorizados, e procurava priorizar o seu desenvolvimento profissional em
tecnologias de gestão ou de suporte a essas.
Em um segundo momento, se criou a figura do Engenheiro de
Manutenção, que deveria ser um profissional técnico, ligado a uma área de
Engenharia de Manutenção. Esses, em parte profissionais com alguma
experiência e em parte novos engenheiros, que gostavam da parte técnica
aprendida na faculdade.
Esses profissionais, salvo algumas exceções, não conseguiram cobrir a
falta do conhecimento de Manutenção, outrora encontrado nos antigos
gerentes, pela falta de experiência de campo, que os colocava em
inferioridade aos Supervisores, e, assim, terminavam por se dedicarem a
questões de cunho mais acadêmico, que de cunho prático para a
Manutenção. Não conseguiam apresentar críticas ou sugestões de melhoria
aos processos de execução da Manutenção. E, no trato de problemas
técnicos, eram muito dependentes dos conhecimentos dos Supervisores e
Técnicos de execução da Manutenção, dando excessivo crédito ao que
diziam.
- Redução da motivação à evolução do Conhecimento Técnico por
parte dos Supervisores.
Em um primeiro momento, os Supervisores passaram a ser para a
Operação a referência técnica da Manutenção, visto os Gerentes estarem
mais afastados, e, de certa forma, se acomodaram com os conhecimentos
possuídos, para os quais recebiam o importante reconhecimento da
Operação, que tinha uma visão imediatista da Manutenção, valorizando a
solução de problemas imediatos, sem uma visão de longo prazo sobre o que
traria de fato confiabilidade à Manutenção.
Em um segundo momento, devemos dizer que em paralelo à
implementação das novas técnicas de Gestão, também iniciaram a surgir
empresas de Consultoria destinadas ao aumento de produtividade. E, na
área da Manutenção, essas empresas criaram um volume de burocracia de
relatórios a serem preenchidos pelo Supervisor, que o mesmo,
praticamente ficava sem tempo de ir ao campo, e, foi se desligando do
acompanhamento técnico da Manutenção, ao ponto de que algumas novas
manutenções eram pelo mesmo desconhecidas, e, para tratar das mesmas,
dependia de algum técnico que as aprendeu.
Com o passar do tempo, novos supervisores, já eram em grande parte
dependentes tecnicamente de seus técnicos.
- Redução da motivação pela evolução no Conhecimento Técnico dos
executantes.
A ausência do Gerente e dos Supervisores tratando de assuntos
técnicos com os executantes, aliados ao fato de que nem Supervisores, nem
Gerentes, e nem, Engenheiros liam o que eles escreviam nas Ordens de
Serviço, fizeram com que os executantes adquirissem a percepção de que
o seu conhecimento não era importante para a Manutenção, e, não era
viável investir em aprender mais além do básico. Muitos trabalhavam
esperando a oportunidade de serem aproveitados em outras posições,
como no Planejamento da Manutenção, que era mais valorizado. Outros,
tinham a oportunidade de fazer um treinamento prático sobre
determinado equipamento, e, por ser um conhecimento raro, se fixavam a
esse conhecimento como garantia de seu prestígio, sem buscar evoluir em
outra matéria.
Um aspecto que atenuou um pouco o efeito dessa desmotivação dos
executantes foi que, em paralelo, as empresas começaram a usar mais
técnicos formados na execução da manutenção, que possuíam mais
facilidade de aprendizagem em relação a práticos e alunos do Senai, mas
que, mesmo assim, não percebiam valor no conhecimento técnico, com
algumas exceções.
Sobre a Padronização e o TPM.
Tanto a Padronização quanto o TPM (Pilar de Educação e Treinamento)
foram práticas de Gestão, que se aplicavam em favor do Conhecimento
Técnico, pela busca em se aplicar treinamentos e definir padrões para a
execução correta das tarefas de Manutenção, contudo, essas práticas
foram idealizadas para o Japão, onde os profissionais já possuíam uma
consciência da importância do Conhecimento Técnico e, possuíam os
melhores Conhecimentos Técnicos para serem difundidos via treinamentos
e padrões.
No Brasil, não estávamos na mesma evolução, e, por esse motivo, não
geraram resultados significativos para as principais Manutenções, como
ainda promoveram a descrição de padrões ruins, por serem extraídos do
executante, ou seja, da forma como o mesmo executava a tarefa, que nem
sempre era a melhor forma. Como resultado, em muitas empresas, como
era necessário se elaborar padrões, para se estar alinhado com as diretrizes
das boas práticas, se gerou uma infinidade de padrões nunca utilizados.
Sobre a necessidade de Marketing.
Seguidamente, como as empresas passaram a ser avaliadas, também
por serem empresas de vanguarda, e, estarem aplicando essas novas
técnicas de gestão, surgiu a necessidade de marketing, por parte da
empresa de seus projetos em acordo com as melhores práticas.
Em função dessa necessidade de marketing, tanto externo quanto
interno, em diversos cursos e seminários surgiu uma frase, que se repetia
sempre “Não basta ser, tem de parecer que é”.
Essa frase, na Manutenção, de certa forma, ocupou mais ainda o
tempo dos profissionais, procurando se aplicarem em desenvolver
apresentações de destaque sobre o que estavam fazendo, que também
possuíam prioridade em relação a aprimorar o conhecimento técnico.

Concluindo:
Aspecto 1 - Por esse histórico, e, considerando que novos profissionais
desconhecem como foi formado o Conhecimento Técnico da Manutenção
em várias empresas, e, assim, consideram que o mesmo é sólido, é que se
torna necessário que as empresas façam uma avaliação interna, e, vejam a
importância de investir na “Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção”, como forma de estimular o valor desse conhecimento e
motivar os profissionais nos diversos níveis a estudarem mais
objetivamente sobre questões técnicas dos equipamentos da planta.
Aspecto 2 – A inteligência embarcada em muitos equipamentos, ainda
não substitui o conhecimento técnico do ser humano na Manutenção, por
mais que tenha sido um fator, que em muito agilizou soluções de
problemas. Isso porque a Inteligência embarcada, é fruto de um
conhecimento pré-existente de fabricantes, e, a complexidade dos
equipamentos associada à intensificação e evolução de técnicas de
monitoramento da condição (Essas evoluções não são do know-how do
fabricante do equipamento, mas de fabricantes das ferramentas, ou, da
experiência da empresa, propriamente dita.), e, ainda associada às
diferentes situações operacionais, tornam essa Inteligência, uma
ferramenta útil, mas não suficiente.
José Augusto Alvim – Consultor de Manutenção

Jose.alvim@decomconsultoria.com.br

(31)99450-2303

Outros artigos e publicações do autor:


- RCM – O ELO QUE FALTAVA - Artigo
- A Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção (Artigo 1/3) – O
que é e sua importância para a Confiabilidade - Artigo.
- Estratégia de Manutenção e RCM - O ELO QUE FALTAVA - E book 460 pg.

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